Untitled - Augusto Guzzo Revista Acadêmica
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Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS 2 Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS Copyrigth: Augusto Guzzo Revista Acadêmica. - http://www.campossalles.edu.br - ISSN:1518-9597 - ISSN-E: 2316-3852 Publicação Semestral das Faculdades Integradas "Campos Salles". Rua Nossa Senhora da Lapa, 270 - Lapa - São Paulo - SP - CEP 05072-000. É permitida a reprodução de qualquer matéria desde que citada a fonte. Presidente: Profa. Jacyra Guzzo do Carmo Curado (in memorian) (FICS). Diretor responsável: Prof. Carlos Augusto do Carmo Curado (FICS). Diretor Geral: Prof. Eduardo Césare Baságlia (FICS). Diretora de Edição: Prof. Neusa E. Anselmo (FICS). Coordenadora: Profa Dra. Mônica Maria Martins de Souza (FICS). Comissão Editorial Profa. Dra. Aida Hanania – (FFLCHUSP). Prof. Dr. Antonio Cesar Amaru Maximiano (USP). Prof. Dr. Celso Campos (Faculdades Integradas “Campos Salles” FICS-SP). Profa. Dra. 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Monica Maria Martins de Souza – Jornalista (MTE). Co-Editor: Prof. Ms. Claudinei Senger (UNISANTOS-SP). Augusto Guzzo Revista Acadêmica - http://www.campossalles.edu.br - é uma publicação semestral e multidisciplinar vinculada às Faculdades Integradas “Campos Salles” – FICS. No 10 – dezembro de 2012 - São Paulo: FICS, 2012. 28cm. Semestral – ISSN Impresso: 1518-9597 • ISSN Eletrônico: 2316-3852 Funcionário homenageado nesta edição por relevantes serviços prestados à instituição por mais de 40 anos: XXXXXXXXXXXX. 3 Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS ISSN Impresso: 1518-9597 • ISSN Eletrônico: 2316-3852 Augusto Guzzo Revista Acadêmica São Paulo No 10 Dezembro 2012 4 Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS Missão: proporcionar reflexões acerca de temáticas acadêmicas relevantes e principalmente ser um veículo de comunicação científica para dar publicidade às ideias e pesquisas do mundo atual; ser, de fato, um espaço para publicação de professores pesquisadores e alunos de iniciação científica divulgarem seus estudos e pesquisas. Sem prejuízo de acolhimento e difusão de contribuições da engenharia do conhecimento, este veículo acolhe todos os campos do conhecimento acadêmico e não elege nesta Edição, uma área temática preferencial. Privilegia a multidisciplinaridade e compõe os temas em dossiês - artigos, resenhas e similares, nacionais e internacionais, contribuindo para o debate intelectual. Convidados desta Edição Prof. Adriano Carlos A. de P. SOUSA (UFSC) Pesquisadora: Daniela MARQUES – (USP) Profa. Dra.Fernanda Cristina B. P. QUEIROZ (UFRN). Prof. Dr.Hélio Roberto HÉKIS (UFSC). Prof. Dr. Jamerson Viegas QUEIROZ (UFRN). Prof. Dr. Jean LAUAND (USP) Prof. Dr. Jorge Luis Risco BECERRA (USP) Pesquisador: Juan Felipe R. NARANJO (USP) Prof. Leonardo Dominguez DIAS (USP) Prof. Lucas Ambrósio B. de OLIVEIRA Prof. Dr.Marciano FURUKAVA Prof. Esp. Pesquisador: Mauricio Pedro da SILVA Pesquisadora: Mirelle Monique de O. FERNANDES (PUC-SP) Profa. Natália Veloso C. de VASCONCELOS Prof. Ms. Ricardo Araújo CAMARGO Prof. Dr. Rudá B. Carlos de AMORIM Prof. Ms. Ruy GUÉRIOS Prof. Dr. Victor Silva ECHETO (ESPANHA) Pesquisador: William Roberto DONDAS (PUC-SP) 5 Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS 6 Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS SUMÁRIO Editorial ........................................................................................................................ 8 Historia del miedo en la última década en Espanã ...................................................... 11 Gestão do fluxo de informações na cadeia de suprimentos: Visão do departamento comercial de uma empresa de fertilizantes .................................................................. . 22 A avaliação externa como fator relevante de ação para a formação continuada ......... 36 A importância das redes sociais no relacionamento interpessoal de alunos do ensino a distância .................................................................................................................... . 51 A educação superior e as novas tecnologias:Comprometimento de docentes e discentes ...................................................................................................................... . 61 O uso de novas tecnologias pelos docentes no processo de ensino e os seus problemas na prática .................................................................................................... . 74 A influência da tecnologia na formação do aluno de ensino superior no Brasil ........... 88 A modelagem matemática como instrumento de interação entre aprendizagem curricular e reflexões críticas na sala de aula de estatística ........................................ . 96 Cinema e História: uma reflexão sobre as possibilidades do cinema como fonte e como recurso didático .................................................................................................. . 113 Eles não usam Black-Tie: uma análise historiográfica ................................................. 127 As interações humanas no espaço social do trabalho: Homem e empresa em transform/ação .............................................................................................................. . 139 A sustentabilidade via controles estratégicos dos custos ambientais .......................... 155 O ERP como um recurso na Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos ................. 171 A necessidade de apresentação de certidão negativa de débito tributário como requisito para a concessão da recuperação judicial .................................................... . 186 Luis Veres José Augusto Liberato dos Santos, Nilton Cesar Lima, Jamerson Viegas Queiroz, Fernanda Cristina Barbosa Pereira Queiroz e Marcio Mattos Borges de Oliveira Marcos Roberto Celestino Angela Rizzo Robert Martins de Souza Benedito Claret Barbosa Luciano Schmitz Simões Otávio Roberto Jacobini, Denise Helena Lombardo Ferreira, Celso Ribeiro Campos e Maria Lúcia Lorenzetti Wodewotzki Silene Ferreira Claro Silene Ferreira Claro Monica Maria Martins de Souza Valerio Vitor Bonelli e Antonio Robles Jr Roberto Cezar Datrino Antonio Roberto Sanches Jr. 7 Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS O desenvolvimento de projetos, com o auxílio da engenharia de software e metodologia ágil scrum ................................................................................................. . 196 Do Local ao Ciberespaço : Uma introdução ao Micronacionalismo ............................. 209 Leonardo Di Francescantonio, Fernando Luiz de Almeida e Mauro Maia Laruccia Raphael Tsavkko Garcia 8 Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS EDITORIAL Abrir uma nova edição da revista Augusto Guzzo é esforço ousado, quase uma heresia, pois não é fácil manter a sua memória e classificação “Qualis A” atingida em 2007, ùltimo ano em que foi produzida pela Professora Jacira Guzzo, mantenedora das Faculdades Integradas Campos Salles, que em 2008 nos deixou órfãos. O carisma da professora e administradora provocava reflexões e construções teóricas em seus professores, intelectuais contaminados de realidade e de imaginário, e os induzia a organizar ideias, tanto cômicas, quanto ambíguas. Os induzia a investigar, concatenar informações ou simulações como os estudiosos que eram a buscar por meio de pesquisas, complexidades possíveis de desmontagens que sustentássem desenvolvimentos científicos. A contextualização desta revista é orquestrada por comunicações normatizadas, pertinentes aos temas acadêmicos. Os textos resvalam os recursos humanos e os enredos da educação em suas variadas formas, lineares ou multidisciplinares, encadeando de forma surpreendente outras áreas e temas, aparentemente impossíveis de se conciliar. As escrituras carregadas de sentido histórico superam a mesmice transpondo o banal de forma inesperada. Destoam do cotidiano e desafiam a rotina promovendo o eterno retorno da tentativa filosófica. Assim, pensando a multidisciplinaridade, esta décima revista se revela como campo fértil onde fervilham conceitos e antíteses de pensadores externos e internos, alunos e professores, um espaço para o qual os pesquisadores destinam os seus trabalhos, organizados e dirigidos a resultados, explorando as diversas faces do mundo acadêmico. Ela é o “caminho do meio” o ponto de encontro, entre os pesquisadores e os leitores, um depositário do árduo trabalho de pesquisa, estruturado em função de incentivos, cobranças ou desejo de consolidar a rica prática do pensar nesta instituição. Separa e une o percurso do professor pesquisador que revela conciliações filosóficas possíveis e o do aluno leitor que, ávido, busca alento para a sua suposta ignorância. Este contexto literário alimenta um jogo inevitável e dissimulador da existência acadêmica, um escreve para esquecer, e o outro lê para se convencer – um parecer ser de ambos que buscam a felicidade do saber, e para isso pagam o seu preço. Esta publicação consolida o esforço de pesquisadores, corpo docente, discente e funcionários, que trabalhando juntos, coroaram de êxito o esforço coletivo. Monica Maria Martins de Souza Editora 9 Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS 10 Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS 12 Luis Veres1 Historia del miedo en la última década en Espanã2 Recebido em: 30/09/2012 - Aprovado em: 14/10/2012 - Disponibilizado em: 26/12/2012 1. LOS ÚLTIMOS CINCUENTA AÑOS Es curioso que, a pesar de la importancia social y política que ha planteado el terrorismo en los últimos cincuenta años, sobre todo en España, este fenómeno ha tenido una repercusión pequeña en el terreno de la ficción, tanto en el cine como en la literatura, si se tiene en cuenta que durante la década de 1980 y 1990, el terrorismo, en el caso español, era una noticia que abría los telediarios de cada día y presentaba unas cifras de asesinatos y crímenes verdaderamente abrumadoras. Sólo en 1980 ETA mató a 91 personas. Un estudio encargado por Juan José Rosón, Ministro del Interior de UCD, presentaba la frecuencia con que ETA aparecía en la información nacional en comparación con los tres principales partidos democráticos: UCD, PSOE y PCE. UCD ocupaba un poco más de espacio que el PSOE y ambos el doble que el PCE, pero ETA había conseguido más tiempo de informativos que la suma del PSOE y UCD. A su vez, cada noticia de uno de estos partidos producía un escaso eco en los días siguientes, mientras que las n o t i c i a s p r o p o r c i o n a d a s p o r E TA cuadriplicaban esa repercusión , con la cual la conclusión parece evidente: ETA ganaba la batalla (Rosón, 1984; Domínguez, 2003). Un estudio realizado en 1988 por la agencia Vasco Press, sobre la imagen del País Vasco en la prensa de Madrid, confirmaba la presencia mediática del terrorismo. El 38,81% de las noticias publicadas en diarios nacionales sobre el País Vasco tenían como tema la violencia, muy por encima de la política (24,7 %) y de la economía (16,02 %) y sobre todo de la cultura (3,64 %). La conclusión del estudio señalaba en que uno de cada tres mensajes referidos al País Vasco tenía como protagonista al terrorismo. Años después, durante la primera década del siglo XXI, fue el terrorismo islamista el que ocupó portadas de periódicos y las parrillas informativas de todo el mundo, a partir de los atentados del 11 de marzo en 1Luis Veres nació en Valencia en 1968. Es Doctor en Filología Hispánica y Licenciado en las especialidades de Lengua Española, Literatura Española y Filología Valenciana. Ha sido profesor invitado en universidades de Perú, Polonia, Austria, Francia, Italia, Holanda, Rumanía, Reino Unido y Portugal. De 1996 a 2009 fue profesor de Teoría del Lenguaje y Crítica Literaria en la Facultad de Ciencias de la Información de la Universidad Cardenal Herrera-CEU (Valencia). Desde 2010 es profesor en el Departamento de Teoría de los Lenguajes de la Universidad de Valencia. Es autor de las novelas El hombre que tuvo una ciudad y El cielo de cemento, así como de los ensayos, La narrativa del indio en la revista Amauta, (2001), Periodismo y literatura de vanguardia en América Latina (2003), Literatura e imaginarios sociales (2003), Estrategias de la desinformación (2004), La retórica del terror (2006), Los reyes y el laberinto, Sobre Borges, Lugones y otros ensayos (2007), Entre la Cruz y la Media Luna (2007) y El sentido de la metaficción: de Woody Allen a Roberto Bolaño. Ha ganado el premio de novela Vicente Blasco Ibáñez y el Juan Gil-Albert de ensayo. E-mail: [email protected] Este trabajo se incluye dentro del proyecto de investigación financiado por la Universidad de Valencia titulado “Terrorismo y cine: de una perspectiva histórica a la problemática global” UV-INV-PRECOMP12-80758. 2 11 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS la estación de Atocha en Madrid (Veres, 2006). En esta situación sorprende una cuestión fundamental: aunque este interés mediático por el terrorismo, resulta verdaderamente curioso el escaso reflejo que el terrorismo ha tenido en el terreno de la ficción, tanto literaria como cinematográfica. Ese es un fenómeno que se agudiza en España frente a otras cinematografías como la norteamericana, a pesar de la presencia constante de grupos como ETA o GRAPO en los años de la Transición y en los años de la democracia consolidada en España. También es curioso que el atentado más brutal de la historia de España, ocurrido el 11 de marzo de 2004, tenga una escasa presencia, prácticamente inexistente en el cine, y muy reducida en la literatura. En estas circunstancias sería de esperar que, a causa de su trascendencia en el caso español, el terrorismo hubiera constituido una preocupación importante tanto en las obras de ficción de novelistas, como de cineastas, pero el resultado suena contradictorio. Sólo unas cuarenta películas desde 1977 recogen tramas insertas en el problema del terrorismo vasco. Para Santiago de Pablo esa cantidad es grande (2010: 144) y es cierto si se tiene en cuenta el volumen del cine español, pero es pequeña si se atiende a la presencia del terrorismo en el agenda informativa española en los últimos cincuenta años. 2. Un retrato histórico En relación con el terrorismo, el cine español ha tratado de confeccionar en la mayoría de los casos un retrato histórico de los hechos. La protagonista, en la mayoría 12 de los casos, ha sido la tristemente conocida banda terrorista ETA a causa del gran número de atentados con que ha amedrentado a la sociedad española durante los últimos cincuenta años (Elorza, 2000; Ezquerra, 2003). Pocas películas, como Sé quién eres (2000) de Patricia Ferreira o La soledad (2007) de Jaime Rosales,renuncian a identificar el grupo terrorista del que hablan para centrarse en una circunstancia más general. Por otra parte no existen películas sobre los GRAPO u otros grupos terroristas como Terra Lliure, el Exercito Guerrilero Gallego o el FRAP, aunque en la película La noche más larga (1991), de José Luis García Sánchez, hubiera referencia a ellos. La actitud documental pervivió en los años ochenta con películas como Euskadi hors d’État (1983) de Arthur Mac Caig y Días de humo (1989) de Antxon Eceiza. Incluso películas históricas vascas ambientadas en otra época recibían lecturas simbólicas: Akelarre (1983) de Pedro Olea, La conquista de Albania (1983) de Alfonso Ungría o Mina, Viento de libertad (1977), de Antxon Eceiza, en la que aparece el himno nacionalista vasco (De Pablo, 2010: 155). Películas como Camada negra (1977) de Manuel Gutiérrez Aragón, La fuga de Segovia (1981) de Imanol Uribe, Yoyes, (2000) de Helena Taberna o Lobo (2004) de Miguel Courtois, prestan atención a determinados periodos representativos de la historia de ETA. Quizás la más interesante resulte Yoyes, ya que fue la primera película que se atrevió a denunciar las disidencias internas de la banda terrorista. La película narra la historia de Dolores González Catarain, que fue uno de los primeros miembros de ETA en Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS atreverse a abandonar el grupo terrorista. ETA decidió asesinarla el 10 de septiembre de 1986 en Ordizia, localidad natal de la víctima, ante la presencia de su hija. 3. La historia del cine español Algunas películas como Ander eta Yul (1983) de Ana Díez, junto a algunos documentales como La resistencia vasca contra el franquismo (1977) o Ama Lur (1968) de Carlos Roldán Larreta, plantean propuestas justificativas sin presencia de crítica al fenómeno terrorista y a los asesinatos de una banda, que fue la principal causa de violencia armada durante la segunda mitad del siglo XX. Otras películas ambientan su trama en relación con atentados terroristas reales como La muerte de Mikel (1983) de Imanol Uribe, El pico (1983) de Eloy de la Iglesia, Días contados (1994) de Imanol Uribe o la reciente No habrá paz para los malvados (2011) de Enrique Urbizu, acerca del gran atentado del terrorismo islamista en la estación de Atocha de Madrid. Curiosamente, todas ellas tuvieron excelentes resultados de taquilla. Posiblemente, de todas estas películas, la más significativa sea Días contados, obra que durante varios años representó la muestra más valiente al retratar la historia de ETA, tema que en cierto modo era tabú hasta entonces. La película, basada en la novela del mismo título de Juan Madrid, publicada un año antes , abre el cine del siglo XXI en este asunto. Lo más sorprendente, dentro de la libertad que supone la adaptación cinematográfica reside en que, mientras que en la película el fundamento de la trama gira alrededor de la preparación de un atentado de ETA y la presencia del mundo de un comando terrorista, en el barrio de Malasaña, en la novela todo ello no presenta ni el más mínimo rastro. De gran trascendencia en la historia del cine español es un documental sobre ETA y la situación del País Vasco que suscitó una intensa polémica. Se trata de La pelota vasca, La piel contra la piedra (2003), del realizador Julio Médem. La pelota vasca tiene una realización impecable, pero, si entendemos el documental como el género de lo real (Nicholls, 1997: 7 y ss), lo es mentiroso. ¿Y por qué? En primer lugar, porque se lo realizó en unas condiciones difíciles. Una parte de los implicados en el conflicto: dirigentes del Partido Popular y representantes de las víctimas de ETA se negaron a aparecer en un video que otorgara la misma veracidad a sus testimonios que a los de personas que simpatizaban o defendían la postura del grupo terrorista, como Arnaldo Otegui, dirigente de Herri Batasuna. Como consecuencia, la película resultaba ya imposible, puesto que dejaba al film sin una parte de los testimonios, con lo cual se daba una situación muy similar a si se hubiera realizado un documental, sobre los campos de exterminio nazis, sin la presencia de los testimonios de las víctimas, mientras que el grueso de la película estuviera formado por las palabras de militantes del partido nazi, representantes de las SS y carceleros de los mismos campos. A ello se unen algunas cuestiones numéricas: son más numerosos los testimonios de la causa del nacionalismo radical; también es más larga la intervención de los testimonios de esta parte del conflicto; y, finalmente, el montaje, como en todo documental es decisivo y, en este caso, bascula hacia la 13 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS simpatía o, al menos, la comprensión del conflicto y la justificación, en cierta medida, del terrorismo. Intentar comprender un conflicto es distinto de intentar justificarlo, y eso fue lo que hizo Julio Médem. Ante la contemplación de los hechos, se puede ser testigo, pero también se puede ser colaborador. Como consecuencia del asesinato del concejal del PP Miguel Ángel Blanco, en la ciudad alavesa de Ermua, el 13 de julio de 1997 y las treguas de ETA, en los años 1998 y 1999, el interés por el terrorismo aumentó desde el cine. También hay que tener en cuenta que disminuyó la presión social de la banda y el temor que la población le tenía. También creció la indignación ante su barbarie. Surgieron, así, películas como A ciegas (1997) de Daniel Calparsoro, rodada antes del asesinato de Blanco y cuya lectura conduce a cierta ambigüedad. También se realizaron documentales como Sin vendas en la memoria (2008) de Manuel Palacios o Corazones de hielo (2007), ambas producidas por las asociaciones de víctimas existentes en España. La lucha del terrorismo de Estado quedó representada por películas como El caso Almería (1984), GAL (2003) y la mencionada Lobo (2004) de Miguel de Courtois. De una interpretación ecléctica del problema vasco, se pasó a una interpretación crítica que se vio reflejada, como consecuencia de la cruenta evolución del terrorismo vasco, en el género documental: desde La pelota vasca (2003) hasta el cine de Iñaki Arteta con El infierno vasco (2008) o Nada será igual (2010). Un vistazo a los títulos basta para observar que el grueso del cine español, que versa sobre asuntos relacionados con 14 el terrorismo, se ha centrado en el problema vasco y la presencia de los crímenes de ETA a lo largo de la historia de España, mientras que el terrorismo islamista ha quedado prácticamente ausente de toda mención en el cine español. La razón de esta ausencia puede radicar, en primer lugar, en el número de atentados: ETA adelanta al terrorismo islamista con mucho en materia de realización de atentados. La perduración de los crímenes de ETA proporciona fácilmente un buen corpus de materia para ficción. Por otra parte, el dramatismo de los hechos, en el fuerte dolor causado por los atentados de Atocha, cuya repercusión supera la producida en los atentados en Rabat contra la Casa de España, en mayo de 2003, supone, al igual que en el caso norteamericano, que tanto narradores como cineastas no se hayan atrevido a adentrarse en dichos sucesos por miedo a herir susceptibilidades o por temor a no tratar el tema con la debida eficiencia. Algo que podría ser explicable en un principio, en los primeros años. Pero, tras una década, las muestras son mínimas en comparación con el caso norteamericano, que dio muestras desde los primeros meses después de la catástrofe del 11 de Septiembre. Circunstancias diferentes son las que afectan al cine sobre ETA. Obviamente éste no se pudo realizar hasta los inicios de la democracia. Después, su escasa recurrencia no puede encontrar otra explicación que el miedo. ETA asesinó a periodistas, jueces, policías, militares y ciudadanos corrientes (Calleja, 2002). Todo el que estaba contra él era un objetivo del terrorismo y ello es razón, más que suficiente, para que no se diera tal visión de los hechos. Una película que Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS simbólicamente apunta en algunos momentos a ETA es Sé quién eres (2000) de Patricia Ferreira, que se centra en las consecuencias de un atentado durante la Transición y que durante mucho del tiempo de suspense de la película se sospecha de la autoría de ETA, aunque, finalmente, la investigación demuestra que los autores del atentado son policías infiltrados en un grupo de extrema izquierda cuyo nombre no se explicita. Se puede decir que las muestras más significativas del cine, en términos realistas sobre ETA, no llegan hasta el año 2000, con El viaje de Arián de Eduardo Bosch. Ambientada en los años ochenta, narra el periplo vital de una joven, Arian, que ingresa en las filas de ETA por medio de su novio Vivaldi. La película se ajusta a la estética realista y ese mismo realismo sirve para retratar con fidelidad la situación del País Vasco y el grupo terrorista. La película pasa revista a los escenarios del terrorismo, desde los locales de Jarrai- las juventudes de Herri Batasuna- a los métodos de captación de nuevos miembros para la violencia callejera a la preparación de atentados o el refugio en la frontera francesa. El realismo alcanza su máxima expresión porque retrata con exactitud lo que se sabe de la vida cotidiana de los terroristas y el dolor causado a las víctimas. La historia se desliza hacia la derrota del terrorismo y el desengaño de la protagonista, que intenta huir de las garras de la banda para encontrar finalmente un fatídico destino, que simboliza la historia de la disidencia en ETA. En el año 2000 surge una sugerente producción, La playa de los galgos de Mario Camus. Ambientada en los años ochenta, se trata de una reflexión sobre la catástrofe personal que rodea las personas insertas en el hecho terrorista, tanto a los que producen el daño como a los que lo reciben, familiares y víctimas. Historia de contradicciones que sigue las convenciones del triller de misterio, narra la historia de un refugiado, Pablo Arketa, que huye de sus propios compañeros de banda terrorista y que, retirado en Noruega, vive obsesionado con que algún día los suyos le den caza. Un día la esposa de una de sus antiguas víctimas, un ingeniero que recuerda la nuclear de Lemoniz, lo encuentra y lo mata tras convertirse en la amante de su hermano. Aunque en ningún momento se nombra ETA, su presencia es evidente, ya que la película se ambienta cerca del País Vasco en Castro Urdiales, provincia de Santander. El film reúne la crítica al terror y las motivaciones que lo mueven en cada uno de nosotros: “Tengo sobrados motivos para odiar a los que usan el terror contra quien no se les somete”, dirá uno de los protagonistas, o “la violencia no deja satisfecho a nadie”, se repetirá. Y esa crítica queda algo desdibujada al extenderse a todos los que quedan salpicados por el conflicto y no únicamente a sus verdugos. Caso aparte es la película La soledad (2007) de Jaime Rosales, en la que se muestra, de manera muy distanciada y fría, la casualidad con la que el terror y la catástrofe interrumpen la vida cotidiana de una joven que viaja en un autobús, en el que explota una bomba en el centro de Madrid. El mismo director rueda Tiro en la cabeza, en la que se cuenta el asesinato a manos de ETA de dos Guardias Civiles, Fernando Trapero y Raúl Centeno, que investigaban de incognito a la banda en la ciudad francesa de Capbreton. La película narra en tono muy distanciado el acontecer 15 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS vital de un joven que colaborará en el asesinato, pero lo curioso de la película, que es una constante en su director, es ese seguimiento anodino de lo cotidiano, que, en caso del tema del terrorismo de ETA, conduce a una interpretación muy realista de lo que es la irrupción de la catástrofe en las vidas de las personas. Posiblemente, la película más interesante de la década, dentro de esta temática, sea Todos estamos invitados (2008) de Manuel Gutiérrez Aragón. Su interés radica en que incluye numerosas novedades acerca de la realidad del País Vasco en relación con el terrorismo que se habían mantenido ausentes en los filmes anteriores. La película narra la historia de un miembro de ETA que durante un atentado resulta herido en un accidente de coche. En su recuperación traba amistad con su terapeuta, la cual es compañera de un profesor de la Universidad de País Vasco, que está amenazado por ETA y que finalmente será asesinado. En ese contexto, la película muestra una radiografía de la sociedad vasca que pone al descubierto la hipocresía de aquellos que, en el entorno social del protagonista, miran hacia otro lado. La película muestra, de este modo, la brecha que se abre en medio de la sociedad y que conduce a una de sus partes a justificar las muertes de sus ciudadanos, para hacer prevalecer sus ideas y su modelo político. La película es interesante porque desvela los entresijos de la vida cotidiana de los amenazados, su dependencia de las escoltas, su autoexclusión social, las molestias que esa compañía supone en comidas, cenas y aulas universitarias. El protagonista interpretado por José Coronado les dirá a sus amigos: “Me felicitáis. Sólo lo hacéis cuando no os ve nadie”. También la 16 película muestra la presencia y peso del mundo de ETA en la sociedad vasca, la hipocresía de cierta parte del clero y la dificultad que tienen los sujetos de ese universo para salir de su mundo y para arrepentirse del pasado. Todo ello hace de Todos estamos invitados la mejor muestra de este cine como testimonio ponderado de la realidad vasca en los últimos años de existencia de ETA. 4. Valentía intelectual para hablar con libertad C o m o s e p u e d e o b s e r v a r, l a representación del terrorismo de ETA fue un hecho tardío. Si se tiene en cuenta que ETA surge a finales de los cincuenta y que, cincuenta años después, es cuando se comienza a hablar de la banda terrorista y de la situación del País Vasco en el cine sin temor, es explicable la exigencia de una perspectiva histórica y cierto grado de valentía intelectual para hablar con libertad de estos fenómenos, circunstancias inexistentes hasta entonces. Y ello explica la situación que se ha dado en el cine en relación con el 11 de marzo, caso que ha ofrecido raros ejemplos cinematográficos. La conmoción de esta fecha y los atentados de Atocha, en 2004, han dado varias muestras de valía, que todavía son manifestación de su escasez. Destacan algunos documentales Hay motivo (2004), en el que 32 cortos pretendían hacer una radiografía crítica de la situación de España bajo el gobierno de José María Aznar, la entrada en la guerra de Irak y los atentados del 11 de marzo. Uno de esos cortos está formado por fragmentos de La pelota vasca de Julio Meden. A él le sigue Madrid: 11 M, Todos íbamos en ese tren Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS (2004) que recupera las imágenes de la catástrofe y analiza los motivos de la catástrofe como la participación de España en la guerra de Irak. Un repaso a los hechos: desde los atentados a la derrota electoral de Aznar se da en 11M Cuando la calle habló (2007) de Stephane M. Grueso. ¡Hay motivo! no se emitió comercialmente en cines, sino que fue proyectado en universidades y otros lugares que solicitaron expresamente su proyección. También se emitió en canales locales de televisión. Los propios cineastas utilizaron estos canales a fin de difundir la serie tan rápido como les fuera posible, por lo que también animaron a descargar la película por Internet. La película fue estrenada comercialmente el día 12 de noviembre de 2004 y proyectada hasta el día 25 del mismo mes, último día de exhibición de la cinta. Apenas 496 espectadores se acercaron al cine para verla (datos del Ministerio de Cultura). En una línea muy próxima, aunque se trate de cine de ficción, se encuentra la película Ilusiones rotas: 11 M (2005) de Alex Quiroga. Pero, lo significativo de estas películas es su escaso rédito de taquilla. Apenas superaron los 500 espectadores (De Pablo, 2010: 146), con lo cual, por sí solo, puede explicar la poca atención que, posteriormente ha suscitado el tema de estos atentados, aunque también hay que tener en cuenta que la realización de un film, sobre este asunto, resulta complicada después de la saturación de imágenes informativas que plagaron los telediarios de los años posteriores al suceso, ya que éstas no se limitaron a los días del atentado, sino que se emitieron durante los años posteriores de investigación del mismo. 5. Un hecho tardío Este recorrido por el cine y la novela en España, que desemboca en el siglo XXI, plantea numerosos interrogantes acerca de lo que va a ser el futuro del relato en los años siguientes. La catástrofe se configura como una fuente de argumentos y un semillero de críticas hacia la sociedad y su silencio, hacia la política y sus gestos de manipulación, hacia el miedo, el terror, la mentira que sufren unos ciudadanos que son sujetos anónimos y que sólo la ficción puede darles cabida. Atentados como los de Atocha o el del asesinato de Miguel Ángel Blanco han marcado de manera determinante la historia de España y de los relatos resultantes de esa misma historia. Por ello creemos que es interesante la indagación del fenómeno terrorista en España, como la manifestación de la catástrofe y la barbarie más actual y moderna en lo que se configura, como la corporeidad de la tragedia contemporánea, como canalización de los miedos y sufrimientos que atenazaron a una sociedad desde el siglo XX al XXI. 17 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS Referências Bibliográficas ATXAGA, Bernardo (1994), El hombre solo, Barcelona, Círculo de Lectores. _____ (1997), Esos cielos, Barcelona, Ediciones B. _____ (2003), El hijo del acordeonista, Madrid, Punto de Lectura. _____ (2005), Obabakoak, Barcelona, Ediciones B. BARRENETXEA, Igor y LÓPEZ DE MATURANA, Virginia (2010), “La conciencia del terrorista”, en Gaytán Esther, Gil, Fátima y Ulled, María, (Eds.), Los mensajeros del miedo, Madrid, Rialp. BERGER, Peter y LUCKMANN, Thomas (1968), La construcción social de la realidad, Buenos Aires, Amorrortu Editores. 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Diante desse enfoque, algumas hipóteses que motivaram a pesquisa nortearam sobre o sistema integrado de informações, o qual coordena as ações e auxilia no planejamento existente entre fornecedores e clientes em todo o canal de distribuição. O objetivo desta pesquisa versa sobre a importância do fluxo de informações nas empresas de fertilizantes, que envolve, por exemplo, o 1José Augusto departamento comercial e o logístico. O estudo também possibilitou observar as vantagens e desvantagens em manter parceria, revenda, filial ou centro de distribuição, permitindo reflexões sobre riscos e benefícios na utilização deste serviço em detrimento às vendas e entregas diretas. Notou-se que, para fazer uma análise sobre a visão comercial, especialmente no ramo de fertilizantes e do fluxo de informações na cadeia de suprimentos, bem como a viabilização de parceiros e negociações sobre entrega e transportes, é preciso avaliar a importância do estoque e de pontos de armazenagem em diferentes áreas. No caso de fertilizantes, existe uma variável muito grande: o ambiente climático. Antes de qualquer ação, o produtor deve avaliar as condições climáticas para então entrar com a aplicação do produto em escala gradativa: tratadores Liberato dos Santos - E-mail: [email protected] 2 Nilton Cesar Lima - UFAL - Universidade Federal de Alagoas. E-mail: [email protected] 3 Jamerson Viegas Queiroz -UFRN - Universidade Federal do Rio Grande do Norte. E-mail: [email protected] Fernanda Cristina Barbosa Pereira Queiroz - UFRN - Universidade Federal do Rio Grande do Norte. E-mail: [email protected] 4 5 Marcio Mattos Borges de Oliveira - USP - Universidade de São Paulo. E-mail: [email protected] 22 Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS de sementes, enraizadores, fertilizantes de solo e foliar. Como o tempo pode variar a todo instante e o produtor geralmente não estoca esse tipo de produto, é necessário que a indústria tenha centros de distribuições ou parceiros em pontos estratégicos, a fim de maximizar a entrega ao produtor no momento desejado, o que marca a importância do fluxo de informações na cadeia de suprimentos. Desse modo, é preciso estar integrado sobre a região, produto, clima, cliente e o fornecedor para aquisição da matéria prima, cumprindo o tempo de produção e entrega, além de estar ciente das condições dos meios de transporte, nesse caso, geralmente rodoviário. Portanto, o estudo sobre o gerenciamento do fluxo de informações não consiste apenas na entrega do produto no prazo, mas também, na redução do custo, na possibilidade de planejamento e avaliação da demanda em relação ao estoque da empresa, bem como expor os meios de transportes mais conhecidos e viáveis ao setor. Assim, o estudo de caso em uma indústria de fertilizantes no interior de São Paulo representou o cenário para o diagnóstico de uma gestão no fluxo de informações, tomando como foco o departamento comercial, com a finalidade de investigar sua viabilidade organizacional quanto às ações logísticas. Palavras-chave: Cadeia de suprimentos; Logística; Fluxo de informações; Canais de Distribuição; Fertilizantes. (Christopher, 2007, p. 04) 1. Introdução Cada vez mais as empresas e os grandes administradores estão reconhecendo a importância da cadeia de suprimentos, mais conhecida no meio como supply chain. Para que haja uma melhor adaptação, entendimento sobre o assunto e melhoria no serviço, no entanto, é fundamental a troca de informações entre os elos. Visando atender cada vez melhor os clientes e maximizar a qualidade no recebimento junto aos seus fornecedores, é essencial que as empresas se preocupem com esse gerenciamento e entendam que o processo não abrange apenas sua logística, mas também exige a cooperação e a confiança, bem como o reconhecimento de que, devidamente administrado, o todo pode ser maior que a soma das suas partes. Sob o aspecto do departamento comercial, mais precisamente no ramo de fertilizantes, esse processo é de suma importância, seja na fábrica, seja nos canais. Um dos fatores mais agravantes, contudo, é que grande parte da matériaprima é importada com difícil acesso, além de apresentar instabilidade em questões de preço e entrega, exigindo assim um planejamento especifico, uma vez que os agricultores fazem seus pedidos seis meses antes da retirada do produto, visando a entrega imediata ao término das chuvas. Neste período, o preço varia por diversas vezes, deixando as empresas incertas sobre a aquisição do cliente, podendo este aumentar o seu pedido, ou ainda, procurar por preços menores no mercado. Sem saber quando será o momento certo para aplicação (término das chuvas), as empresas devem posicionar de maneira 23 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS estratégica seus produtos em canais de melhor acesso, visando o atendimento imediato. Ao organizar a entrega, deve-se também decidir o modo como a qual será efetuada, podendo ocorrer de forma fracionada, em cargas fechadas, em frota própria ou terceirizada. Notou-se também nesta pesquisa que essa entrega realizada nos canais deve ser feita em comum acordo com a indústria, determinando os responsáveis pelo frete, bem como, indicando se o método de trabalho será com revendas ou comissionados, por exemplo. Neste contexto, o presente artigo parte do seguinte problema de pesquisa: Qual a importância do fluxo de informações na cadeia de suprimentos, sob a ótica do departamento comercial, em um enfoque aplicável ao setor de fertilizantes? Para isso, definiu-se como objetivo geral compreender o fluxo de informações, inferindo-se a uma análise no setor de fertilizantes em que o departamento comercial exerce decisões sensíveis à otimização logística. Especificamente, espera-se: (i) Apresentar os conceitos e definições que regem a cadeia de suprimentos e logística; (ii) Expor a importância do fluxo de informações e (iii) Analisar a importância do fluxo de informações em uma empresa do setor de fertilizantes. Para este estudo, observou-se que a decisão é acertada na venda direta, uma vez que as entregas aos produtores são feitas diretamente nas fazendas aos clientes, na maioria das vezes. No entanto, a logística interna deve permanecer altamente integrada, atentando-se, por exemplo, em determinar o que será descarregado primeiramente. Qualquer 24 erro na montagem da carga ou no trajeto a ser percorrido pode ser pior que o próprio atraso na entrega. De acordo com Ballou (1995, p.209) o controle de estoques exerce influência muito grande na rentabilidade da empresa, pois absorve um capital que poderia ser investido de outra maneira, o que se consolida na movimentação das cargas. No caso de fertilizantes, por exemplo, a grande maioria dos produtos não pode ser armazenada, devido a presença de ureia em sua formulação, que tende a se solidificar com o tempo. Os fluídos, neste caso, se tornam gelatinosos se o estoque for moroso e indevido, dificultando à aplicação; já os farelados se tornam sólidos e ficam empedrados, não diluindo mais em H2O como o recomendado. Surge então a necessidade de as empresas se planejarem quanto à venda antecipada e entrega futura, sendo essas de responsabilidade compartilhada entre os departamentos na organização, e não apenas da área comercial. Uma alternativa viável a orientar às decisões é o estoque de matéria prima e o cuidado de sua qualidade ao longo do tempo, tarefa esta que deve ser realizada por um responsável técnico. Nota-se, portanto, que é ávida a necessidade de integração na rede de suprimentos, na qual uma gestão no fluxo de informações coopere na viabilidade das decisões logísticas. O caso em questão, indústria de fertilizantes, concedeu para o presente estudo os acontecimentos e problemas existentes no departamento comercial, no que compete à integração da cadeia. Permitiu também avaliar a viabilidade das parcerias nas revendas, filiais ou centros de distribuição, além da análise das vantagens e desvantagens na Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS utilização de tais métodos, em detrimento as vendas diretas ao consumidor final, bem como permitiu a pesquisa sobre a utilização e importância do fluxo de informações na cadeia de suprimentos, especificamente no setor agroindustrial (fertilizantes). informações bem detalhadas. Similarmente, Godoy (1995) aponta que o método qualitativo proporciona uma grande diversidade de métodos de trabalho, estilos de análise e de apresentação de resultados, com diferentes considerações quanto aos sujeitos. Sendo assim, o presente estudo contribui para uma análise do gerenciamento no fluxo de informações da cadeia de suprimentos, contrastando com as ocorrências existentes dentre as necessidades do dia a dia do departamento comercial, em que sinaliza qual seria o ponto necessário para a devida integração. Dessa forma, vale-se da pesquisa bibliográfica para entendimento do setor, pois, conforme aponta Gil (2009), se trata de uma forma de estudo exploratório e de proporcionar familiaridade com a área proposta de análise, ou seja, faz-se uso do estudo de caso como forma de evidenciar o tratamento analítico do fluxo das informações da companhia observada.. 2. Metodologia 3. Fluxo de informações A metodologia do presente estudo está centrada no entendimento do contexto em que se insere o problema de pesquisa, bem como na análise e interpretação de dados contábeis, especificamente, no fluxo de informações na cadeia de suprimentos. Nesse sentido, faz-se uso da abordagem do estudo de caso a partir da análise da cadeia da empresa X, decorrente de suas ações logísticas no setor de fertilizantes. Assim, a metodologia se alicerça para o alcance do objetivo apresentado, inserindo-se ao problema de pesquisa, na análise e interpretação do caso, de modo que possibilite o entendimento no referido setor. O método proposto por este trabalho é o da pesquisa qualitativa. De acordo com Miles e Huberman (1994 apud GHAURI; GRONHAUG, 1995), este tipo de pesquisa é adequado em estudos de assuntos complexos e empírico, como o comportamento humano ou organizacional, permitindo que o pesquisador obtenha O poder da comunicação e do fluxo das informações tem sido o diferencial no gerenciamento das organizações. Spinato (2010) afirma que, no ambiente competitivo, a informação é um fator de elevada importância em qualquer gestão organizacional, por ser um recurso indispensável nos contextos internos e externos. Sendo assim, quanto mais confiável, oportuna e de fluxo contínuo forem estas informações, maior a coesão e competitividade por parte das empresas. Tendo em vista à sua abordagem, fica evidente que a cadeia de suprimentos não funciona adequadamente sem que haja entre seus elementos uma boa comunicação e organização. Para o administrador Paulo Spinato (2010) é possível notar que: O fluxo de informações eficaz e eficiente possui um efeito multiplicador com o poder de dinamizar todos os setores organizacionais, constituindo, por sua vez, a 25 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS força motora do desenvolvimento político, econômico, social, cultural e tecnológico. O acesso à informação e a capacidade de extrair e aplicar os conhecimentos são vitais para o aumento da capacidade concorrencial e o desenvolvimento das atividades comerciais num mercado sem fronteiras. As vantagens competitivas são agora obtidas através da utilização de redes de comunicação e sistemas tecnológicos que interconectem empresas, clientes e fornecedores com rapidez e custo reduzido. O correto uso e fluxo de informações tornaram-se uma necessidade organizacional, permitindo ultrapassar todo um conjunto de barreiras na medida em que existe uma nova maneira de pensar em tempo real e possível às empresas agir e reagir rapidamente aos clientes, mercados e concorrência. (Spinato, 2010, p. 19). Para cooperar com o fluxo das informações, Ballou (1995) retrata que um dos fatores mais relevantes ao desenvolvimento dos processos administrativos é a aplicação de tecnologia, proporcionando um grande aumento na eficiência da comunicação. Ta i s s i s t e m a s a b r a n g e m t o d a s a s ferramentas disponíveis para o controle e gerenciamento do fluxo de informação de uma organização. Existem no mercado alguns tipos de ferramentas que facilitam e tornam a informação mais acurada para aplicação na cadeia de suprimentos, como, por exemplo, o código de barras, o EDI (Electronic Data Interchange), o ECR (Efficient Consumer Response) e o ERP (Enterprise Resource Planning) que integram todos os outros. Segundo Spinato (2010), “a comunicação, desde os primórdios, é um instrumento de integração, instrução, troca mútua e desenvolvimento entre as pessoas em quaisquer atividades realizadas. [...] A origem epistemológica da palavra é tornar comum, ou seja, se uma pessoa consegue fazer com que sua ideia seja captada e 26 compreendida por pessoa” (PIMENTA, 2008). outra Observa-se, a partir dos autores aqui citados, que a comunicação não deve ser distorcida, mas antes ser clara e objetiva, de forma que o receptor compreenda a mensagem sem ruídos. Exige-se, para isso, inteligência, reflexão, estudos de casos, processos, disciplina, bom senso, velocidade e trabalho em grupo, por exemplo. Acompanhando estes dois pensamentos, pode-se afirmar, portanto, o quão vantajoso é manter um bom fluxo de informações nas empresas, devendo este ser claro, objetivo e de fácil entendimento. No setor logístico e na cadeia de suprimentos, a informação é uma aliada a mais na busca pelo justin time. Como complemento, Spinato (2010) afirma que um bom sistema de comunicação é o que fará com que todos dentro da empresa trabalhem na mesma direção, focalizando os esforços para alcançar os mesmos objetivos. É possível notar, contudo, que em um ambiente empresarial há vários modelos de comunicação, variando desde os mais antigos, como murais, bilhetes, recados e a voz, passando pelos mais tradicionais, como os memorandos, cartas, telegramas, chegando aos recursos de mais alta tecnologia, como netbooks e palm tops. Os e-mails também entram nesta lista, assim como o “boca a boca”, que talvez seja uma das mais simples e rápida forma de comunicação. Cabe à organização buscar formalizar os melhores processos de comunicação que possam agilizar e solidificar suas ações. 3.1. Conceitos de Logística Logística, de acordo com o Dicionário Aurélio, vem do francês logistique, e tem Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS em suas definições o tratamento sob o planejamento e a realização de projeto e desenvolvimento, obtenção, armazenamento, transporte, distribuição, reparação, manutenção e evacuação de material (para fins operativos ou administrativos). De acordo com os estudos apontados em Novaes (2003, p.35-36), a logística é entendida como sendo o processo de planejar, implementar e controlar a eficiência, o fluxo e armazenagem de mercadorias, serviços e informações correlatas do ponto de origem ao ponto de consumo, com o objetivo de atender às exigências dos clientes. O autor ainda afirma que a logística é tudo aquilo que envolve o transporte de produtos (entre clientes, fornecedores e fabricantes), estoque (em armazéns, galpões, lojas pequenas ou grandes) e a localização de cada participante da cadeia logística ou cadeia de suprimentos. Conforme as definições observadas, nota-se que planejamento e controle do fluxo de informações são os principais responsáveis pela integração de todos os setores, produção, comercial, clientes e fornecedores, gerando um único fluxo logístico de informação pra todas as áreas. Logística não se restringe a transporte, unicamente com o ato de carregar o produto em um determinado meio de locomoção e enviá-lo ao cliente, mas contemplam também pessoas, galpões e armazéns, produtos acabados e matériasprimas, estoques de produtos elaborados e em elaboração, previsão de demanda, entre outros. Tudo deve ser planejado de forma cuidadosa, testado e avaliado o quanto possível, pois uma falha no sistema pode acarretar um prejuízo enorme, evidenciando a importância de alocar recursos, sendo o planejamento uma ferramenta gerencial em logística capaz de promover tal ação. Esse planejamento se inicia no instante em que o cliente resolve transformar um desejo em realidade ( M A RT I N S , 2 0 0 3 , p . 2 5 2 ) . E m complemento a esta abordagem: Embora devesse ser objetivo de qualquer sistema logístico oferecer a todos os clientes o mais alto nível de serviços, é preciso reconhecer que inevitavelmente haverá a necessidade de priorizar alguns serviços em relação a outros. Quanto a isso, a lei de Pareto, ou regra do 80/20, pode proporcionar a base para desenvolver uma estratégia de serviços mais eficiente. A questão fundamental relativa aos serviços é que, não sendo todos os clientes nem os produtos igualmente lucrativos, será que deveríamos oferecer um serviço de melhor qualidade aos clientes e aos produtos mais importantes? Uma vez que possamos supor que o dinheiro gasto em serviços seja um recurso escasso, então deveríamos considerar a decisão de serviço como uma questão de alocação de recursos. (CHRISTOPHER, 2007, p.68). Ballou (1995) revela que um dos objetivos da logística é melhorar o nível de serviço oferecido ao cliente, sendo este a qualidade do fluxo de produtos, serviços e gerenciados. A logística, portanto, é um fator que pode ser utilizado como estratégia para uma organização. Sua aplicação se dá na escolha adequada de fornecedores, passando pela organização e chegando ao cliente. Antes, porém, a empresa deve analisar e escolher o melhor meio de utilizá-la. Observemos os itens abaixo: •Duto viário – tem pontos e rotas fixas, produtos específicos, poucas empresas participando no mercado e são difíceis as implantações de novos pontos; 27 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS •Ferroviário – tem terminais e rotas fixas, poucas empresas atuam no mercado e também existem poucas rotas (isso devido à falta de incentivos governamentais); •Aeroviário – tem terminais e rotas determinadas, poucas empresas atuando, modalidade muito regulamentada sendo difícil a entrada de novos concorrentes; •Aquaviário – tem portos e rotas fixas, poucas empresas atuam neste ramo; •Rodovias – muitos operadores, muitas rotas, muito utilizado para transporte de cargas por ser o mais viável na situação em que estamos hoje. 3.2. Integração da logística De acordo com Cavanha Filho (2001, p. 03), podemos definir o conceito de logística integrada como “a parte do processo da cadeia de suprimento que planeja, implementa e controla o eficiente e efetivo fluxo de estocagem de bens, serviços e informações relacionadas, do ponto de origem ao ponto de consumo, visando atender aos requisitos dos consumidores”. Como nem sempre esta definição é possível ser aplicada por parte das empresas, gradualmente foi-se integrando uma à outra, por meio da gestão integrada, na qual as empresas procuram planejar, organizar e controlar o fluxo de produtos, serviços e informações (Ballou, 1995, p. 38).. Figura 1 – Fluxo de Materiais e Informações Fonte: Bowersox & Closs (2001, p. 44). Conforme Figura 1, os autores demonstram que o serviço em logística deva ser integrado, e é representando pela livre troca de equipamentos entre os diversos modais de transportes. 3.3 Gestão da Cadeia de Suprimentos: Importância no setor de fertilizantes 28 Bond (2002) define cadeia de suprimentos como uma metodologia criada para alinhar todas as atividades de produção, armazenamento e transporte de forma sincronizada, visando à obtenção na redução de custos, minimizar ciclos e maximizar o valor percebido pelo usuário final em busca de resultados superiores. Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS Em paralelo, é possível constatar, no caso de fertilizantes, que a matéria pode ser tanto produto final como insumo pra outros, podendo, no entanto, se deteriorar com o tempo, como por exemplo, a ureia fertilizante, que endurece após um período sem utilização quando está em estado bruto ou mesmo sendo componente de outro produto. Observa-se, portanto, que a gestão de estoques também é fundamental, não somente no armazenamento, mas nas condições onde o mesmo se encontra. Para Ballou (1995, p. 209), o controle de estoques exerce influência muito grande na rentabilidade da empresa, uma vez que ele absorve um capital que poderia ser investido de diversas formas, ou seja, um gerenciamento de estoque apresenta custo elevado quando há situações de integração mal definida dentre a cadeia de distribuição. Poirier & Reiter (1996) afirmam que a cadeia de suprimentos é um sistema pelo qual as empresas entregam seus produtos e serviços para seus consumidores em uma rede de organizações interligadas. A gestão da cadeia cobre o fluxo de mercadorias do fornecedor por meio de manufatura e canais de distribuição até o usuário final, ou seja, é um grupo de fornecedores, fontes que provem ingredientes como matériasprimas e commoditties que dão início a cadeia de suprimentos. Posteriormente, o fabricante constrói ou monta o produto que é identificado como consumo no canal de distribuição. Essa conexão primária fonecedor-fabricante tem amplas oportunidades de realizar economias, como a redução do inventário de matéria-prima existente entre dois membros da cadeia. O último elo é a maneira como o produto ou serviço será entregue ao consumidor final; incluem os canais de distribuição e seus componentes como armazéns intermediários, varejistas e o consumidor propriamente dito. Tendo em vista as considerações acerca da cadeia de suprimentos, adotou-se analogamente ao setor de fertilizantes a importância de gerenciar o fluxo de informações, atendendo todos os requisitos desde o fornecedor, passando pela transformação e enfim entrega. Abrange também o gerenciamento dos estoques de maneira ágil, tanto de produto acabado, como principalmente de insumo, sendo essa ação vital para minimizar perdas, já que neste setor muitas matérias se deterioram com o tempo ou perdem o valor, como no caso da ureia que pode empedrar com o clima desfavorável. Em seguida, planejar e controlar o setor comercial, analisar as vantagens da venda direta em questões de preço e entrega, bem como monitorar os canais de distribuição, são atividades que otimizam o serviço logístico para o setor. Um dos fatores mais importantes na estrutura da cadeia de suprimentos é ressaltar o papel de cada elemento em relação aos demais. Há, por exemplo, cinco tipos de relacionamento entre a empresa e o canal dominante: a) Os que estão por dentro ou integrados – membros da cadeia dominante que gozam de acesso continuo a fontes preferenciais de suprimentos e de grande respeito no setor. Têm interesse na manutenção da situação atual e são os principais agentes que procuram forçar o cumprimento do código do setor. b) Os lutadores – empresas que estão procurando fazer parte da cadeia, mais ainda não fazem. Tem acesso descontínuos às fontes preferenciais de suprimentos e aderem ao código do setor pelo desejo de participar da cadeia. 29 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS c) Os complementadores – não estão e nem procuram integrar a cadeia dominante. Executam funções que os outros membros da cadeia normalmente não executam, ou então servem segmentos específicos do mercado. Geralmente tiram vantagem do sistema atual e tendem a respeitar o código do setor. d) Os transitórios – estão fora da cadeia dominante e não procuram integra-la. Entram e saem do mercado de acordo com as circunstancias, mas realmente integram outras cadeias. Tem expectativas de curto prazo e pouco incentivo de aderir ao código do setor. e) Os inovadores – empresas que desafiam e perturbam o funcionamento da cadeia dominante. (Kotler, 1998, p. 735-736). Para o setor industrial de fertilizantes, pode-se dizer que temos todos os tipos de relacionamentos: pequenos produtores que compram para atender suas necessidades; grandes produtores que compram para sua produção; cooperativas e indústrias de insumos que compram para a produção de novos produtos, armazenamento e estoque; e por fim, revendas e canais que os adquirem para distribuição e comercialização. A indústria de fertilizantes integra o complexo químico no bloco de commodities e, como tal, possui características tecnológicas, mercadológicas e logísticas próprias. Atualmente a disputa entre empresas de fertilizantes está tão acirrada que elas já não competem apenas entre si, mas sim, com a cadeia de suprimentos de cada uma, levando vantagem a que melhor gerenciar sua cadeia, controlar o fluxo de suas informações, estreitar relações com seus fornecedores e clientes, e até com seus próprios concorrentes. Conclui-se, portanto, que logística e o gerenciamento da cadeia têm importância muito além dos portões da empresa. Como 30 reforça Ballou (1995, p. 19) neste sentido: “sistemas logísticos eficientes formam bases para o comercio e a manutenção de um alto padrão de vida nos países desenvolvidos”. Segundo Christopher (2007, p. 22), [...] sob o regime do gerenciamento logístico, o objetivo é ligar o mercado, a rede de distribuição, o processo de fabricação e a atividade de aquisição, de tal modo que os clientes sejam servidos com níveis cada vez mais altos, ainda assim mantendo os custos baixos. 3.4 Canais de Distribuição: Conceito, Vantagens e Desvantagens Rebouças (2010) afirma que os canais de distribuição representam o caminho escolhido para o produto/serviço chegar ao consumidor final, por meio de unidades internas e externas (atacadistas e varejistas) da empresa. Definido pelo setor de marketing, dentro de uma cadeia logística todos os membros atuantes devem estar interligados. Sendo assim, tem-se que o canal de distribuição está inserido na cadeia logística e seus participantes são fabricantes, atacadista-distribuidores, varejistas e consumidor final. Já para Kotler (1998), os canais de marketing, ou de distribuição, são conjuntos de organizações independentes envolvidas no processo de disponibilização de um produto ou serviço para uso ou consumo. Ou ainda, todo produtor procura reunir o grupo de intermediários que melhor satisfaça o objetivo da empresa; este grupo de intermediários é chamado de canal de marketing ou canal de distribuição. Rebouças (2010) apresenta alguns principais objetivos do canal de distribuição: Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS * Disponibilizar produtos com rapidez; * Reforçar potencial de vendas; * Fortalecer cooperação entre os componentes da C.S; * Facilitar fluxo de informação e material; * Reduzir custos de forma integrada. O autor ainda reforça os objetivos com as seguintes funções no canal de distribuição: * Induzir a demanda; * Satisfazer a demanda; * Serviços pós-compra; * Troca de informações. Por fim, os participantes de um canal de distribuição podem ser primários ou especializados. Os primários são os fabricantes, atacadistas e varejistas, enquanto que os especializados são os que prestam serviços aos participantes primários, compreendendo os funcionais de serviço em transportes, armazenagem, montagem, atendimento, entre outros, além de estabelecer apoio em finanças, informação, publicidade, seguro, entre outros. (REBOUÇAS, 2010). Compreende-se, que “as redes de entrega diretas são aconselháveis se as lojas varejistas forem grandes o suficiente para justificarem tamanhos ótimos de lote de ressuprimento próximo a carga cheia de cada fornecedor para cada varejista.” (CHOPRA, 2003, p.275). Ou seja: A informação é crucial para o desempenho da cadeia de suprimentos porque disponibiliza os fatos de que os gerentes da cadeia precisam para tomar suas decisões. Sem informação, o gerente não sabe o que os clientes querem, quanto o estoque está armazenado e qual o momento de produzir ou embarcar mais produtos. Resumindo, sem informação, o gerente toma suas decisões no escuro. Portanto, a informação faz com que a cadeia de suprimento seja visível ao gerente. Com esta visibilidade, o gerente é capaz de tomar decisões para melhorar o desempenho da cadeia de suprimentos. (CHOPRA, 2003, p.342). 4. Caso – indústria de fertilizantes Com base no sistema de informação logístico, conhecido como “um subsistema do sistema de informações gerenciais, o qual providencia a informação especificamente necessária para administração logística” (BALLOU, 1995, p.279), esses sistemas funcionam como um elo que liga as atividades em um processo integrado, combinando hardware e software para medir, controlar e gerenciar as operações. O gerenciamento do fluxo de informações na cadeia de suprimentos, especificamente no setor de fertilizantes, tende a suprir as dificuldades encontradas por efeito da distância entre as localidades, a empresa e as propriedades rurais onde se encontram a maioria dos consumidores do setor. Com um bom fluxo de informações, o produtor fica mais próximo da empresa em questões de entrega, lançamentos e promoções, bem como, aproxima-se do produtor e do mercado em questões de preço praticado, necessidades da região e efeitos climáticos. Tal fato pode ser contracenado com uma empresa de fertilizantes, no qual coube investigar, empiricamente, a importância do gerenciamento no fluxo de informações como forma de facilitar os fluxos de materiais dentre a cadeia de distribuição. Localizada na região noroeste do estado de São Paulo, próximo a Ribeirão Preto, atualmente com três unidades fabris, ela 31 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS aplica a tecnologia em fertilizantes de solo, foliares e NPK, além de recentemente fazer parte de um grupo seleto no âmbito mundial de empresas que dominam a tecnologia do fertilizante de liberação gradativa. Destaca-se por concentrar todos os nutrientes necessários à cultura desejada, não precisando ser adubada varias vezes, e sim, uma única vez, tendo o produtor a responsabilidade de disparar gradativamente o nutriente necessário, seja para crescimento, enraizar, ou mesmo para controlar a produção. Seu mercado varia entre pequenos produtores, revendas, cooperativas e outras empresas do mesmo seguimento que utilizam de alguns de seus produtos acabados como matéria prima para a fabricação e elaboração de novos produtos. O ramo de fertilizantes e alimentação animal se estende por todo o território nacional e países da América do Sul, como Bolívia e Paraguai, podendo os fornecedores serem parceiros e ao mesmo tempo clientes, assim como os concorrentes, sendo esses os principais nichos para a empresa. A pesquisa de campo norteou algumas implicações gerenciais com relação ao fluxo de informações necessárias à cadeia de suprimentos, cujo enfoque é o setor comercial da empresa, no qual vantagens e desvantagens na venda direta ou manutenção nos centros de distribuições são observados a partir do fluxo de informações, estes como eixo de análise no presente estudo. Dessa maneira, a análise identificou que o problema se encontra no início da cadeia, com a aquisição da matéria prima. Originando-se da Argentina, Chile e China, as entregas da mesma chegam à empresa com até 90 dias, no entanto, o problema 32 estava longe de ser sanado, uma vez que os preços oscilam muito, de acordo com a demanda, e principalmente com o câmbio. Alguns produtos como ulexita e hidroboracita, componentes para a fabricação de produtos a base de Boro 10%, eram os mais difíceis de conseguir, tendo às vezes implicações no teor do produto, e ambos negociados a um teor e preço. Assim, sempre foi um desafio gerencial o controle de tais aquisições de matéria prima, despontando, a necessidade por uma busca insana de informações sobre o mercado, estreitando relações com os fornecedores. Na referida empresa, a sensibilidade das decisões se dá na flexibilidade de seus dirigentes, uma vez que não priorizam armazenar o estoque, por deflagrar alto custo à organização. Em desvantagem a tal decisão, acabavam por perder grandes negócios por falta de produto ou atraso na entrega. Em paralelo, Ballou (1995, p. 66) destaca que os estoques agem como “amortecedores” entre suprimento e demanda. Neste caso, entre suprimento e necessidades de produção. O autor ainda ressalta que manter em estoque todo o material para a produção pode ser ineficiente. Esta é uma questão de estratégia que deve ser tomada como uma das prioridades em qualquer cadeia, e no caso da empresa citada, era um dos fatores pelos quais se perdiam algumas de suas negociações. Surgiu então, o propósito da empresa manter estoques em vários centros espalhados pelo país, mas, até onde isto era vantajoso em detrimento às vendas diretas e a manutenção de estoques na fábrica? Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS No caso da indústria, um dos problemas quanto a isso é que, não se trata de produtos em série como celulares, televisores, geladeiras, e sim, produtos acabados ou semiacabados, que poderão servir ao consumidor final e, ao mesmo tempo, a outras indústrias que também os utilizam como matéria. No caso de fertilizantes, a venda direta representa uma vantagem se analisar-se que, os produtores se encontram em fazendas isoladas, com grande distancia a ser percorrida sobre estradas de terra. Sem condições de buscar o produto, muito menos de armazená-lo, ao comprar o adubo, por exemplo, seja de solo ou foliar, o produtor tem o desejo imediato de sua utilização. A revenda poderia ser uma alternativa, porém, desagrega o valor do produto, uma vez que a empresa tem de diminuir o preço para a mesma revender ou ainda pagar comissões a agentes credenciados. Contudo, várias revendas encontram-se na mesma região, o que pode acarretar uma diferença no preço de um mesmo produto. Este é o ponto onde se analisa a importância do fluxo de informações na empresa. A alocação de agentes, vendedores de campo, em nome da empresa, em localidades distintas, fazendo visitas técnicas, ministrando palestras e reuniões junto às cooperativas e aos produtores de um modo geral, é uma maneira de a empresa comunicar-se com o cliente, além ainda de ter maior possibilidade de acompanhar as tendências do mercado. 5. Considerações Finais Com base nas vantagens apresentadas ao longo deste trabalho, podemos considerar quão é vantajoso o fluxo de informações dentro da cadeia de suprimentos e a importância de um bom gerenciamento. Após o tratamento gerencial adequado do fluxo de informações, foi possível decidir entre o melhor meio de venda dos produtos, bem como o modelo de distribuição. A coordenação do fluxo de informações beneficia a empresa se considerar o caso como um todo, bem como, também auxilia no transporte, na redução de custos, na integração dos elos da cadeia: clientes, fornecedores, parceiros e representantes. Quanto à decisão pelo meio de transporte, o rodoviário e a opção da venda direta só são possíveis ao compreender-se o caso de modo sistêmico, já que a integração total das informações e coordenação dos elos na cadeia distributiva são o caminho da otimização da organização. Pode-se afirmar, com base nos fatos e problemas apresentados, que é vantajoso para empresa o gerenciamento do fluxo de informações desde a compra da matéria, passando por todo o processo gerencial, comercial e produtivo, até chegar ao destino desejado, com seus fluxos de informações coordenados pela empresa, já que esses são mais sensíveis aos custos que os próprios fluxos de materiais. Foi possível analisar também que as condições do mercado e do clima, em diversas regiões de atuação, possuem relação direta às decisões da organização, que se originam nas decisões comerciais da empresa por estar mais próximo do cliente. Assim, suas necessidades e inovações possibilitam reduzir custos, sendo ainda otimizados ao associar-se aos fluxos de informações em toda cadeia de 33 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS suprimentos, priorizando decisões ao tempo desejado tanto pela empresa, quanto pelo cliente, já que o produto é altamente perecível comercialmente. Ou seja, o gerenciamento do fluxo de informações na cadeia valoriza o produto, melhora a entrega, reduz seu preço perante o consumidor, aumenta a qualidade, otimizando processos e gerando competitividade à organização. Referências Bibliográficas BALLOU, R. H. Logística empresarial: transportes, administração de materiais e distribuição física. São Paulo: Atlas, 1995. BOND, E. 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Acesso 22 out. 2010. 35 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS 1 Marcos Roberto Celestino1 Avaliação externa como fator relevante de ação para a formação continuada Recebido em: 06/11/2012 - Aprovado em: 21/11/2012 - Disponibilizado em: 26/12/2012 Resumo É compartilhado por todos os educadores, não importa qual linha educacional, a importância da avaliação na prática educativa. A finalidade da avaliação pode ser diferente: (a) mensurar o progresso do aluno (sob o ponto de vista do próprio aluno ou do professor), (b) permitir ao professor verificar a eficiência e eficácia das estratégias de ensino e (c) viabilizar a avaliação interna ou externa de uma instituição de ensino. Qualquer uma dessas finalidades evidencia aspectos relevantes a serem considerados no processo ensinoaprendizagem, possibilitam também que se estabeleçam metas e ações para alcançá-las. O consenso, no entanto, não se faz presente com a mesma intensidade no que se refere a definir avaliação ou quando se aborda as maneiras de avaliar e com que níveis de exigência. Zabala (1998, p. 195) aponta a existência de definições diferentes, e muitas vezes ambíguas, sobre avaliação. Nota-se que há casos em que o aluno é o sujeito da avaliação, em outros é o grupo/classe ou até mesmo o professor ou a equipe docente; “[...] quanto ao objeto da avaliação, às vezes, é o processo de aprendizagem seguido pelo aluno ou os resultados obtidos, enquanto outras vezes se desloca para a própria intervenção do professor”. Com 1Prof. 36 Dr. Marcos Roberto Celestino vistas nisso, nesse artigo, abordaremos cada uma das três finalidades apontadas para a avaliação e analisaremos de que maneira a Coordenação Pedagógica pode se valer da avaliação externa como um fator relevante na formação continuada dos professores. Palavras-chave: Avaliação, formação continuada, coordenação pedagógica, avaliação interna e externa. Abstract It is shared by all educators, no matter which line is pinch education, the importance of evaluation in educational practice. The purpose of evaluation may be different: (a) measure student progress (from the point of view of their own student or teacher), (b) allow the teacher to verify the efficiency and effectiveness of teaching strategies, and (c) enables internal or external evaluation of an educational institution. Any of these purposes evidences relevant aspects to be considered in the teaching-learning process, also allow to establish goals and actions to achieve them. The consensus, however, is not present to the same degree in relation to define evaluation or when discussing the ways in which to evaluate and requirement levels. Zabala (1998, p. 195) points to the Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS existence of different definitions, and often ambiguous, on review, we note that there are cases where the student is the subject of the evaluation, in others it is the group / class or even the teacher or the teaching staff, "[...] as the object of evaluation is sometimes the learning process followed by the student or the results, while other times moves to the teacher's own intervention". Aiming at it, this article will discuss each of the three objectives Introdução Não se pode deixar de lembrar o importante papel que o coordenador pedagógico exerce na vida escolar. Cabe a ele valorizar as ações coletivas, vinculadas ao eixo pedagógico desenvolvido na escola; ele deve se colocar como o articulador dos diferentes segmentos da escola na elaboração de um projeto pedagógico. Sua metodologia de trabalho deve envolver: ação à reflexão à ação. É um processo continuo e dialético, uma vez que após cada ação praticada requer que se faça uma reflexão sobre as metas alcançadas, eficácia dos procedimentos e posterior ação corretiva do que pode causar desvio e, consequentemente, comprometer as metas traçadas, ou seja, impedindo que as mesmas sejam alcançadas satisfatoriamente. Um primeiro aspecto vinculado à especificidade da função do coordenador pedagógico “que é planejar e acompanhar a execução de todo o processo didáticopedagógico da instituição” (GEGLIO, 2006, p.115). Mais efetivamente pode-se ver a contribuição do coordenador pedagógico na formação docente quando outlined for the assessment and examine how the Pedagogical Coordination can take advantage of the external evaluation as a relevant factor in the continuing education of teachers.. Keywords: Evaluation, continuing education, pedagogical coordination, internal and external evaluation. “se reúnem para discutir questões e problemas pedagógicos, isto é, pertinentes à sala de aula, ao conteúdo de ensino, ao desempenho dos educandos e ao relacionamento com os alunos” (ibid., p. 11 7 ) , m e s m o a c r e d i t a n d o q u e a contribuição à formação do docente possa ocorrer individualmente (como aponta GEGLIO, 2006). Vemos então a descrição de um segundo aspecto que caracteriza a função do coordenador, que é ‘atuar como gestor do grupo docente’. Conhecedor das necessidades dos educandos e orquestrador das ações necessárias para soluções de problemas levantados pelos docentes (didático-pedagógicos, disciplinares ou de outra natureza), o coordenador pedagógico deve planejar a maneira que conduzirá os encontros coletivos (selecionando as leituras e mediando os debates), pois ele “deve ter observado as necessidades dos professores, na relação com os alunos, com o ensino, com a visão de educação, com a concepção de aprendizagem e avaliação” (SOUZA, 2005, p.28). O professor, profissional da educação, “deve desenvolver as competências necessárias e intrínsecas ao seu ofício” (CELESTINO, 2006, p.76), essas “competências profissionais, constroem-se em formação, ao sabor da navegação diária 37 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS de um professor, de uma situação de trabalho à outra” (LE BOTERF, 1997). Logo, o trabalho coletivo é parte integrante dessa formação, uma vez que viabiliza a troca de experiências e a reflexão da prática docente (CHRISTOV, 2005). Reiteramos que esses momentos de trabalho coletivo acrescentam muito à formação do professor, dado que o saber docente é “[...] é um saber plural, formado pelo amálgama, mais ou menos coerente, de saberes oriundos da formação profissional e de saberes disciplinares, curriculares e experienciais” (TARDIF, 2002, p.36). É nesse contexto que a avaliação se insere como importante instrumento, o qual, se analisado cuidadosamente, viabiliza que se estabeleçam parâmetros para um trabalho de acompanhamento do processo de ensino-aprendizagem e de formação continuada. O tema de nosso artigo: Avaliação externa como fator relevante de ação para a formação continuada está inserido nesse contexto. E o objetivo de nosso trabalho é apresentar um panorama sobre a avaliação do processo educativo e as principais avaliações externas que são aplicadas na Educação Básica brasileira. Além disso, analisar alguns aspectos ligados à avaliação e de que maneira esta pode ser útil, quando se pensa em formação continuada dos docentes e o papel da coordenação pedagógica nessa formação. Esse artigo está divido da seguinte maneira: No Tópico 1 - A avaliação de processos educativos – discorreremos sobre a avaliação da Educação Básica no Brasil. No Tópico 2 – Principais avaliações externas – dissertamos a respeito das 38 diversas avaliações externas a que a Educação Básica brasileira é submetida, qual o público alvo delas, suas características e sua sazonalidade. No Tópico 3 – Alguns aspectos relacionados à avaliação – analisamos três aspectos relacionados à avaliação, observando os pontos de vistas do educando e do professor, a maneira como a avaliação auxilia no acompanhamento do processo ensino-aprendizagem (elemento balizador) e como a unidade escolar pode analisar os seus resultados. No Tópico 4 – Coordenação Pedagógica e Corpo Docente: atuação conjunta e articulada – apresentamos uma reflexão a respeito da atuação da Coordenação Pedagógica na formação continuada, a atitude de liderança que essa coordenação deve desempenhar e o estímulo que deve propiciar à reflexão da prática docente, assim como conduzir os professores na análise dos resultados de avaliações internas ou externas. Em seguida, apresentamos as considerações finais, descrevendo de que maneira o docente e a Coordenação Pedagógica podem e devem estar comprometidos e promover ações conjuntas com vistas ao aprimoramento profissional e do processo de ensinoaprendizagem, mediante a promoção da formação continuada. 1. A avaliação de processos educativos Desde a década de 1980, verifica-se uma tendência mundial em avaliar os processos educacionais, motivados pelo desejo de imprimir qualidade à gestão de sistemas educacionais, alguns países que Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS demonstraram esse desejo e implementaram ações nesse sentido: Estados Unidos, França, Holanda, Suécia e Inglaterra. A Espanha, na década de 1990 implementa seu processo de avaliação institucional do sistema de ensino e, gradualmente, a avaliação institucional estendeu-se para diversos países em desenvolvimento, porém com a prerrogativa de complementar as reformas instauradas pela globalização, entre elas a descentralização das funções do estado. Segundo Oliveira et al. (2006), as avaliações do sistema educacional nesses países em desenvolvimento se deu: De par com os projetos nacionais de avaliação, organizações internacionais como a OCDE2 e a Orealc/Unesco3 desenvolveram amplos programas de avaliação, neste caso como diagnóstico comparativo internacional, e, portanto, como sustentação para a tomada de decisões políticas, em nível de nações ou mesmo de regiões mais amplas, como a América Latina (p.72). No Brasil, segundo Saviani (2007), este foi um momento de maturidade para a reflexão acadêmica, e, certamente, determinante para a qualidade da educação brasileira. Como exemplos, o autor cita a significativa ampliação da produção científica nesse campo e a influência dos educadores na proposta da Constituinte de 1988 e na LDB de 1996. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/96) em seu artigo 9º, inciso V, dispõe que "cabe à União a coleta, a análise e a disseminação de informações sobre educação (BRASIL, 1996)". O inciso VI, desse mesmo artigo, estabelece também que a União, em colaboração com os sistemas estaduais e municipais de ensino, deve assegurar um processo nacional de avaliação do rendimento escolar nos dois níveis de ensino com o objetivo de definir prioridades para melhorar a qualidade do ensino. A LDB em seu texto trouxe avanços significativos para a avaliação do sistema educacional e a partir da sua regulamentação é que surge a previsão de uma série de ações para aferir e melhorar a qualidade do ensino, entre elas. [...] implantação de um amplo sistema de avaliação da educação básica, com a finalidade de aferir a aprendizagem dos alunos do ensino fundamental e de prover informações para a avaliação e revisão de planos e programas de qualificação educacional. No decorrer da década, estas políticas foram sendo confirmadas pela institucionalização do Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB) e pela prioridade conferida à avaliação nos textos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB/1996) e do Plano Nacional de Educação (FONSECA, M.; 2006). Ainda em 1996, quando o MEC estava sob a gestão do ministro Paulo Renato, foi editado o Decreto MEC nº 1.917 que determinava, entre outras medidas, a criação da Secretaria de Avaliação e Informação Educacional (SEDIAE). Por meio dela, o MEC buscava dar concretude à determinação da LDB de assegurar um 2 Organização de Cooperação de Desenvolvimento Econômico (OCDE) é uma organização internacional e intergovernamental que agrupa os países mais industrializados da economia do mercado. Tem sua sede em Paris, França. Na OCDE, os representantes dos países membros se reúnem para trocar informações e definir políticas com o objetivo de maximizar o crescimento econômico e o desenvolvimento dos países membros. 3 Oficina Regional de Educação para a América Latina e o Caribe (Orealc/UNESCO) é o órgão responsável por realizar estudos internacionais comparativos na região, através do Laboratório Latino-Americano de Avaliação da Qualidade da Educação (LLECE). As provas avaliam resultados da aprendizagem dos alunos da terceira da educação básica. As matérias são matemática, linguagem e ciências, sendo que, as análises de desempenho são correlacionas com informações de questionários que focalizaram o entorno do processo educacional, como a família, a escola, opinião de professores e diretores. Disponível na Internet: http://llece.unesco.cl. 39 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS processo de avaliação do rendimento escolar. Algumas das atribuições dessa Secretaria eram: P l a n e j a r, o r i e n t a r e c o o r d e n a r o desenvolvimento de sistemas de avaliação educacional, visando o estabelecimento de parâmetros e indicadores de desempenho nas atividades de ensino do País; subsidiar a formulação de políticas e o monitoramento do sistema de ensino, com os dados gerados pelos sistemas de estatísticas e informações educacionais (Decreto nº 1917 - Artigo 22, inciso I e II). Segundo Neto (2007): Faziam parte da estrutura dessa Secretaria os departamentos de: Avaliação da Educação Básica, Apoio Técnico à Avaliação dos Cursos de Graduação e, por fim, Estatísticas Educacionais. Esta Secretaria teve vida curta e nove meses depois o decreto que a criou foi revogado pelo Decreto 2.146/97, que transfere as suas funções para o INEP, ao mesmo tempo em que aprova uma nova estrutura para esse Instituto (p.4). Dentre as atribuições do INEP, destacamos 4: - Organizar e manter o sistema de informações e estatísticas educacionais. - Planejar, orientar e coordenar o desenvolvimento de sistemas e projetos de avaliação educacional, visando o estabelecimento de indicadores de desempenho das atividades de ensino no país. - Apoiar os Estados, o Distrito Federal e os Municípios no desenvolvimento de sistemas e projetos de avaliação educacional. - Desenvolver e implementar, na área educacional, sistemas de informação e documentação que abranjam estatísticas, avaliações educacionais, práticas pedagógicas e de gestão das políticas educacionais. - Subsidiar a formulação de políticas na área de educação, mediante a elaboração de diagnósticos e recomendações decorrentes da avaliação da educação básica e superior. - Promover a disseminação de informações sobre avaliação da educação básica e superior. Percebe-se que as atribuições do INEP mudam, e uma nova concepção é dada ao seu objetivo central, que deixa de estar concentrado nas atividades de pesquisa e passam a se concentrar principalmente em atividades ligadas à avaliação da educação. E por fim, pode-se ver que no fim da década de 1990 o Brasil dá início ao processo de Avaliação Externa da Educação Básica com o intuito gerir estrategicamente o Sistema Educacional, ou seja, a partir da análise crítica dos resultados é possível estabelecer ações que agreguem melhoria ao sistema. Sendo assim, a Avaliação Externa é elemento importante no direcionamento de políticas públicas, e para a unidade escolar é elemento primordial para aferir o processo ensino-aprendizagem, uma vez que essa avaliação evidencia possíveis falhas, as quais devem ser analisadas criteriosamente, a fim de se tornarem foco de ações corretivas. Desta maneira, as adversidades inerentes ao processo de ensino-aprendizagem devem ser claramente esquadrinhadas, para que se possa, por meio de um planejamento estratégico, traçar metas e direcionar ações de forma a se não solucionar, minimizar seus efeitos. 2. Principais Avaliações Externas Apresentaremos a seguir um quadro que descreve as diversas Avaliações Externas que tem como objeto a Educação Básica, o 4 FONTE: INEP - <http://www.inep.gov.br/comped/instituicoes/inep.htm> 40 Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS p ú b l i c o a lvo, sua sazonalidade e características. Quadro 1: Brasil – Avaliação da Educação Básica Fonte: INEP (http://www.inep.gov.br/basica) Descreveremos cada uma dessas avaliações, destacando suas propostas e características. (A) SAEB FONTE: INEP (http://www.inep.gov.br/ basica/saeb/caracteristicas.htm) O Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB), conforme estabelece a Portaria n.º 931, de 21 de março de 2005, é composto por dois processos: a Avaliação Nacional da Educação Básica (ANEB) e a Avaliação Nacional do Rendimento Escolar (ANRESC). A ANEB é realizada por amostragem das Redes de Ensino, em cada unidade da Federação e tem foco nas gestões dos sistemas educacionais. Por manter as mesmas características, a ANEB recebe o nome do SAEB em suas divulgações; A ANRESC é mais extensa e detalhada que a ANEB e tem foco em cada unidade escolar. Por seu caráter universal, recebe o nome de PROVA BRASIL em suas divulgações. Características do SAEB Em 2005, a Portaria Ministerial n.º 931 alterou o nome do histórico exame amostral do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB), realizado desde 1990, para Avaliação Nacional da Educação Básica (ANEB). Por sua tradição, entretanto, o nome do SAEB foi mantido nas publicações e demais materiais de divulgação e aplicação deste exame. As avaliações do SAEB produzem informações a respeito da realidade educacional brasileira e, especificamente, por regiões, redes de ensino: pública e privada nos estados e no Distrito Federal, por meio de exame bienal de proficiência, em Matemática e em Língua Portuguesa (leitura), aplicado em amostra de alunos de 4ª e 8ª séries do ensino fundamental e da 3ª série do ensino médio. Desenvolvido pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), autarquia do Ministério da Educação (MEC), o SAEB é a primeira 41 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS iniciativa brasileira, em âmbito nacional, no sentido de conhecer mais profundamente o nosso sistema educacional. Além de coletar dados sobre a qualidade da educação no País, procura conhecer as condições internas e externas que interferem no processo de ensino e aprendizagem, por meio da aplicação de questionários de contexto respondidos por alunos, professores e diretores, e por meio da coleta de informações sobre as condições físicas da escola e dos recursos de que ela dispõe. As informações obtidas a partir dos levantamentos do SAEB também permitem acompanhar a evolução da qualidade da Educação ao longo dos anos, sendo utilizadas principalmente pelo MEC e Secretarias Estaduais e Municipais de Educação na definição de ações voltadas para a solução dos problemas identificados, assim como no direcionamento dos seus recursos técnicos e financeiros às áreas prioritárias, com vistas ao desenvolvimento do Sistema Educacional Brasileiro e à redução das desigualdades nele existentes. (B) As Matrizes de Referência do SAEB / Prova Brasil FONTE: INEP (http://www.inep.gov.br/ basica/saeb/matrizes/default.htm) A realização de uma avaliação de sistema com amplitude nacional, para ser efetiva, exige a construção de uma matriz de referência que dê transparência e legitimidade ao processo de avaliação, informando aos interessados o que será avaliado. As matrizes descrevem o objeto da avaliação, é referencial curricular mínimo a ser avaliado em cada disciplina e série, informando as competências e 42 habilidades esperadas dos alunos. Torna-se necessário ressaltar que as matrizes não englobam todo o currículo escolar. É feito um recorte com base no que possa ser aferido por meio do tipo de instrumento de medida utilizado no SAEB e na Prova Brasil e que, ao mesmo tempo, seja representativo do que está contemplado nos currículos vigentes no Brasil. Assim compreendidas, as matrizes não podem ser confundidas com procedimentos, estratégias de ensino ou orientações metodológicas, nem com conteúdo para o desenvolvimento do trabalho do professor em sala de aula. Estes elementos estão presentes nos guias ou propostas curriculares dos sistemas de ensino. As matrizes têm por referência os Parâmetros Curriculares Nacionais, mas foram construídas a partir de uma consulta nacional aos currículos propostos pelas Secretarias Estaduais de Educação e por algumas redes municipais. O INEP consultou também professores regentes de redes municipais, estaduais e de escolas privadas, de 4ª e 8ª séries do ensino fundamental e 3ª série do ensino médio e, ainda, examinou os livros didáticos mais utilizados para essas séries. As matrizes de referência são a base para a elaboração dos itens dos testes do SAEB e da Prova Brasil. Item é a denominação adotada para as questões que compõem a prova. Essa nomenclatura deve-se ao entendimento de que o termo item refere-se a questões que abordam, com preponderância, uma única dimensão do conhecimento. Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS Cada matriz de referência é estruturada em tópicos ou temas e respectivos descritores que indicam as competências e habilidades de Língua Portuguesa e Matemática a serem avaliadas. O descritor é uma associação entre conteúdos curriculares e operações mentais desenvolvidos pelo aluno, a partir dos quais os itens de prova são elaborados. As respostas dadas pelos alunos a esses itens possibilitam a descrição do nível de desempenho por eles atingido. A partir daí, é dado conhecer o desempenho dos sistemas de ensino. A preocupação com a articulação interna entre descritores e itens das provas, com vistas à sua coerência e à sua consistência, foi determinada pelo objetivo de avaliar, com mais rigor, o que os alunos realmente sabem e o que lhes falta alcançar a cada etapa conclusiva de nível ou ciclo de escolarização. V – Relações entre recursos expressivos e efeitos de sentido; VI – Variação linguística. Temas e Descritores da Matriz de Referência de Matemática - SAEB / Prova Brasil A Matriz de Referência de Matemática é apresentada em duas dimensões. Em uma são expressos os temas relacionados a cada área do conhecimento e, em outra, são descritas as habilidades a serem desenvolvidas ao longo de cada ciclo, e que resultam nos descritores avaliados nos testes. São quatro os temas da matriz de Matemática: I – Espaço e Forma; II – Grandezas e Medidas; III – Números e Operações /Álgebra e Funções; IV – Tratamento da Informação. Tópicos e Descritores da Matriz de Referência de Língua Portuguesa - SAEB / Prova Brasil As matrizes de Língua Portuguesa do SAEB e da Prova Brasil estão estruturadas da seguinte forma: na dimensão objeto do conhecimento, foram elencados seis tópicos, conforme disposto a seguir; na dimensão competência, foram elaborados descritores referentes a cada tema ou tópico. I – Procedimentos de leitura; II – Implicações do suporte, do gênero e /ou do enunciador na compreensão do texto; III – Relação entre textos; IV – Coerência e coesão no processamento do texto; (C) ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio) FONTE: INEP (http:// www.enem.inep.gov.br/enem.php) Criado em 1998, o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) tem o objetivo de avaliar o desempenho do estudante ao fim da escolaridade básica. Podem participar do exame alunos que estão concluindo ou que já concluíram o ensino médio em anos anteriores. O Enem é utilizado como critério de seleção para os estudantes que pretendem concorrer a uma bolsa no Programa Universidade para Todos (ProUni). Além disso, cerca de 500 universidades já usam o resultado do exame como critério de 43 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS seleção para o ingresso no ensino superior, seja complementando ou substituindo o vestibular. (D) ENCCEJA (Exame Nacional para certificação de competências de jovens e adultos) O principal objetivo do ENCCEJA é avaliar as habilidades e competências básicas de jovens e adultos que não tiveram oportunidade de acesso à escolaridade regular na idade apropriada. Dessa forma, o participante se submete a uma prova e, alcançando a média mínima exigida, obtém a certificação de conclusão daquela etapa educacional. O exame também se propõe a oferecer às secretarias de Educação uma avaliação que lhes permita aferir os conhecimentos e habilidades dos participantes no nível de conclusão do Ensino Fundamental e do Ensino Médio. Espera-se ainda, por meio do ENCCEJA, construir um indicador qualitativo que possa ser incorporado à avaliação de políticas públicas da Educação de Jovens e Adultos. (E) Programa Internacional de Avaliação de Alunos – PISA FONTE: INEP (http://www.inep.gov.br/ internacional/pisa/) O PISA (Programme for International Student Assessment) é um programa internacional de avaliação comparada, cuja principal finalidade é produzir indicadores sobre a efetividade dos sistemas educacionais, avaliando o desempenho de alunos na faixa dos 15 anos, idade em que se pressupõe o término da escolaridade básica obrigatória na maioria dos países. 44 Esse programa é desenvolvido e coordenado internacionalmente pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), havendo em cada país participante uma coordenação nacional. No Brasil, o PISA é coordenado pelo INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais “Anísio Teixeira”. As avaliações do PISA incluem cadernos de prova e questionários e acontecem a cada três anos, com ênfases distintas em três áreas: Leitura, Matemática e Ciências. Em cada edição, o foco recai principalmente sobre uma dessas áreas. Em 2000, o foco era na Leitura: em 2003, a área principal foi a Matemática; em 2006, a avaliação a ênfase foi em Ciências. Alguns elementos avaliados pelo PISA, como o domínio de conhecimentos científicos básicos, fazem parte do currículo das escolas, porém o PISA pretende ir além desse conhecimento escolar, examinando a capacidade dos alunos de analisar, raciocinar e refletir ativamente sobre seus conhecimentos e experiências, enfocando competências que serão relevantes para suas vidas futuras 3. Alguns aspectos relacionados à Avaliação LSão diversos e complexos os aspectos relacionados à Avaliação, mas elegemos três sobre os quais nos debruçaremos. São eles: (a) mensurar o progresso do aluno (sob o ponto de vista do próprio aluno ou do professor), (b) permitir ao professor verificar a eficiência e eficácia das estratégias de ensino e (c) viabiliza a Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS avaliação interna ou externa de uma instituição de ensino. 3.1. Mensurar o progresso do aluno Sabemos o quanto é difícil convencer os alunos que ele é parte integrante e grande interessado, ao menos deveria ser, de um processo de ensino-aprendizagem. Em geral, os alunos acreditam que as competências e habilidades já adquiridas são suficientes para dar conta de todas as situações-problemas (didáticas ou adidáticas) que virão a se defrontar. Estão sempre ansiosos em saber o final do processo e poucos têm consciência da necessidade de passar por várias etapas para então ter desenvolvida a capacidade de articulação entre a técnica, o conhecimento e a análise crítica; dessa forma serão criarão autonomia e futuramente serão capazes de selecionar, identificar e analisar. É para o professor um grande desafio conduzir seus alunos a esse status de autonomia, à obtenção desse grau de consciência. Utopia? Talvez! Mas creio ser necessário que enxerguemos como um ideal possível de ser alcançado. É imprescindível que o professor tenha plena consciência das competências e habilidades que a disciplina que ministra busca “criar” em seus alunos, pois, só assim, estará apto a conduzir suas estratégias de ensino a fim de alcançá-las. planejamento consiste em: Analisar conhecimentos não adquiridos, e traçar estratégias para minimizar obstáculos encontrados no processo de ensino-aprendizagem. Traçar metas a serem alcançadas e prazos (estimando tempo de realização). Criar instrumentos de acompanhamento do processo (como identificar as dificuldades encontradas pelos alunos ao tempo e não apenas ao final do processo). Precisamos avaliar o processo e não apenas os resultados. Mas se temos resultados, não podemos deixar de analisálos sob a óptica de análise crítica, destrinchando-os e procurando entender os pontos fortes e fracos do processo. A forma como os acertos e os erros se apresenta nas avaliações dão ótimos indícios de como replanejar. 3.2. Permitir ao professor verificar a eficiência e eficácia das estratégias de ensino Segundo Luckesi (1995, p.43), “a avaliação precisa ser o instrumento do reconhecimento dos caminhos percorridos e da identificação dos caminhos a serem perseguidos”. Não podemos olvidar que qualquer avaliação do processo ensinoaprendizagem, estará evidenciando de alguma maneira a eficácia desse processo; e por se tratar de um processo não podemos deixar de observá-lo como tal. Mas deve valer-se das avaliações para realizar um planejamento estratégico. Esse 45 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS Figura 1: Elementos do processo ensino-aprendizagem Fonte: Elaborado pelo autor em São Paulo 2012. Não se pode pensar em um processo sem a presença de material a ser transformado (conteúdos – transposição didática), sem métodos e instrumentos que operem sobre esse material (estratégias de ensino – objetivando minimizar obstáculos e criar situações de aprendizado) e sem acompanhamento das fazes do processo (avaliação – como saber se cada etapa do processo está realizando as transformações no objeto necessárias para obter o resultado final). Após a realização do processo espera-se obter ao final o produto almejado (no caso do processo ensinoaprendizagem, espera-se alcançar o aprendizado). O objetivo é tornar o processo de ensino-aprendigem não apenas eficiente (trata de como fazer – fazer certo aquilo que se propõe a fazer; produzir sem erros ou produzir com menos recursos), mas também eficaz (trata do o que fazer; de fazer as coisas certas na hora mais acertada, é escolher qual caminho a ser seguido). 46 3.3 Viabiliza a avaliação interna ou externa de uma instituição de ensino Por fim, destacamos que a avaliação, elemento presente em um processo de ensino-aprendizagem, viabiliza a avaliação interna ou externa de uma instituição de ensino. Analisaremos cada uma dela a seguir. - Avaliação Interna: Permite diagnosticar pontos fortes e fracos, no que diz respeito a avaliar as competências e habilidades desenvolvidas ou não nos alunos e, portanto permite que se trace um perfil do educando. Acima de tudo, viabiliza que se levantem as dificuldades e assim fomentar a discussão a respeito de meios para superá-las. - Avaliação Externa: Viabiliza um Diagnóstico. Por meio dos resultados dos alunos nas Avaliações Externas e comparar com os resultados das Avaliações Regulares elaboradas e aplicadas Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS pelos professores da própria Escola. Logo, é possível e desejável que se trace um comparativo objetivando estabelecer quais competências e habilidades devem ser focadas em uma etapa replanejamento; além disso, se trace estratégias para manutenção dos índices já superiores à média do universo pesquisado e melhoria dos índices abaixo dessa média. Essas três finalidades apresentadas e discutidas para a avaliação, devem permear nosso perfil de educando. Objetivar que a avaliação seja bússola para nossas ações como docentes é exercer essencialmente nosso papel na sociedade. 4. Coordenação Pedagógica e Corpo Docente: atuação conjunta e articulada Para que a os resultados da Avaliação Externa do processo ensino-aprendizagem sejam utilizados de maneira relevante por cada unidade escolar e possa, por fim, servir para a elaboração de um planejamento estratégico de melhoria, fazse necessário uma ação articulada entre coordenação e corpo docente para que, com vistas às habilidades e competências reconhecidamente necessárias, porém, não necessariamente presentes, tornem-se alvo da formação continuada. Sendo assim os principais atores do processo educativo estarão envolvidos a fim de minimizar seus pontos fracos e maximizar qualidades. Dessa forma, a formação docente apresenta-se centrada na escola e pode-se notar que ela advém de um processo colaborativo no qual há: discussão de estratégias e conteúdos, bem como propósitos da formação (IMBERNÓN, 2004). Destacamos aspectos desse paradigma colaborativo: foco do processo “ação-reflexão-ação 5”, o qual deve estar presente na escola e esta deve se dispor a modificar sua própria cultura; busca pela interdependência profissional e espírito colaborativo também são aspectos importantes; a colaboração passa a ser uma estratégia de gestão; há necessidade de ampliação da gestão escolar; respeito às habilidades e capacidades em um processo de “empowerment”. O professor deve ser visto como sujeito do processo de formação, pois ele deve envolver-se no processo de forma que suas necessidades e aspirações estabeleçam as metas e currículo de formação. Segundo Elliot (1990, p.245 apud IMBERNÓN, F., 2004, p.82): Nessa perspectiva da formação permanente do professor centrada na escola, a melhoria da prática profissional baseia-se, em última instância, na compreensão que os próprios professores têm de seus papéis e tarefas enquanto tais e não na que se requer a partir de um ponto de vista objetivo por um sistema impessoal. Diante disso, é necessário criar uma metodologia de trabalho que possibilite aos professores e direção/coordenação atuarem como protagonistas, sujeitos ativos no processo de identificação, análise e reflexão dos problemas existentes na escola e na elaboração de propostas para sua superação. Lembrando de estabelecer prioridades de plano de ação a curto, médio e longo prazo (GEGLIO, 2006). 5. Ação-reflexão-ação: É um processo continuo e dialético, uma vez que após cada ação praticada requer que se faça uma reflexão sobre as metas alcançadas, eficácia dos procedimentos e posterior ação corretiva do que pôde causar desvio e, consequentemente, comprometer as metas traçadas, ou seja, impedindo que as mesmas sejam alcançadas satisfatoriamente. 47 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS Portanto o coordenador pedagógico deve: (a) buscar compreender a realidade da escola em que atua – conhecer o corpo discente e docente, a comunidade e direção (b) identificar os problemas prementes analisar e investigar suas raízes (origem) e causas; envolver o corpo docente na reflexão crítica e (c) criar metodologia para o trabalho – elaborar propostas a fim de solucionar, ou quiçá minimizar, os problemas levantados. Cabe ao coordenador valorizar as experiências, projetos positivos em desenvolvimento na escola e compartilhar com todos, estimulando a participação dos docentes e, por valer-se da experiência positiva, criar outros projetos que auxiliam alcançar as metas estabelecidas em conjunto. intrínsecas ao seu ofício” (CELESTINO, 2006, p.76), essas “competências profissionais, constroem-se em formação, ao sabor da navegação diária de um professor, de uma situação de trabalho à outra” (LE BOTERF, 1997). Logo, o trabalho coletivo é parte integrante dessa formação, uma vez que viabiliza a troca de experiências e a reflexão da prática docente (CHRISTOV, 2005). Reiteramos que esses momentos de trabalho coletivo acrescentam muito à formação do professor, dado que o saber docente é “[...] um saber plural, formado pelo amálgama, mais ou menos coerente, de saberes oriundos da formação profissional e de saberes disciplinares, curriculares e experienciais” (TARDIF, 2002, p.36). Com vistas nisso, o coordenador pedagógico e o corpo docente não podem, quer no intuito conhecer sua realidade ou quer na ânsia de identificar problemas educacionais, olvidar dos dados advindos das Avaliações Externas Governamentais; são essas avaliações que municiarão a equipe escolar de elementos imprescindíveis para elaboração de um planejamento estratégico. A respeito disso, Setoguti e Zabatta (2007, p.105) escrevem: Dessa maneira a escola se torna uma “escola reflexiva”, pois continuamente está refletindo sobre si e estimulando aqueles que nela trabalham reflitam sobre seu papel profissional e de que maneira contribuem para o processo heurístico, simultaneamente avaliativo e formativo, inerente a uma “escola reflexiva” (ALARCÃO, 2003). A busca pela qualidade de ensino pressupõe a utilização de diagnósticos corretos com base, no caso brasileiro, em análise de dados coletados pelos censos escolares, por pesquisas domiciliares como a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios e por avaliações externas de aprendizado (KLEIN, 2006). A análise de Avaliações Externas, bem como o planejamento frente aos diagnósticos apresentados pelas mesmas, é elemento importante e de grande valia na formação continuada do professor. O professor, profissional da educação, “deve desenvolver as competências necessárias e 48 5. Considerações Finais Pode-se notar que o Brasil insere-se no contexto mundial ao promover a avaliação de sua Educação Básica, no entanto, há que se destacar a necessidade se implementar políticas públicas que se valham desses resultados, a fim que eles não se tornem apenas índices, mas sim que estes possam ser utilizados como norteadores de ações governamentais que viabilizem a melhoria de nossa educação. Outro aspecto relevante é utilizar os índices obtidos nas avaliações para Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS discussão de ações na unidade escolar, local em que a coordenação pedagógica e os docentes podem e devem analisar esses índices a fim de traçar um diagnóstico do processo de ensino-aprendizagem. O coordenador pedagógico pode e deve liderar os docentes nas ações de mudança, na condução do processo uma vez que ele tem a visão desse processo como um todo. Ele deve propor e organizar debates, estabelecer uma sistematização de estudo coletiva e ser o ‘fiel da balança’, ou seja, aquele que garante que as ações traçadas sejam exequíveis e coerentes com o projeto político-pedagógico da escola e que viabilizem a manutenção dos bons resultados e também sua melhoria, além de buscar meios de minimizar os pontos fracos. necessidades especificas de seus liderados e, portanto, empreender em seu planejamento momentos em que, intencionalmente, aborde as fraquezas dos componentes do grupo e do coletivo. O coordenador pedagógico deve munir os professores de habilidades e competências imprescindíveis à sua atuação como educador, e, portanto, é necessário que indique ou traga aos seus liderados meios para essa qualificação, ou ainda que se valha de meios próprios (atuando como formador em um processo de qualificação). Corrobora com esses aspectos citados a necessidade de que o professor tenha elementos para analisar sua própria pratica à luz das contribuições dos pensadores da educação. Mas não se pode esquecer que esse mesmo coordenador precisa atentar às Referências Bibliográficas ALARCÃO. I. - Gerir uma escola reflexiva.In: Professores reflexivos em uma escola reflexiva - São Paulo - Editora Cortez, 2003. BRASIL.-Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro d e 1 9 9 6 . D i s p . h t t p : / / p o r t a l . m e c . g o v. b r / s e e d / a r q u i v o s / p d f / t v e s c o l a / l e i s / lein9394.pdf>,acessado07/set/2010. ______. Decreto nº 1917 – Presidência da República – Casa Civil – Subchefia para assuntos jurídicos – 27 de maio de 1996. CELESTINO, M.R. A formação de professores e a sociedade moderna – Revista Dialogia, São Paulo, v.5,2006,pp.73-80. Disponível<http://www4.uninove.br/ojs/index.php/dialogia/ article/view/889/761>. 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A fundamentação teórica foi baseada na teoria da psicologia sócio-histórica de Lev S. Vygotsky, in LUCCI (2006). Palavras-chave: Redes sociais, interação, educação a distância. Twiter, entre outras. 1. Introdução As redes sociais virtuais surgiram há mais ou menos 15 anos, com o pioneiro Sixdegrees em 1997, viabilizando a interação entre pessoas na WEB, mas após três anos, por dificuldades em angariar recursos financeiros deixou de prestar serviço à comunidade. Após esse episódio, no período de 2003 a 2006 surgiram algumas redes sociais que conseguiram muito sucesso, algumas atingindo milhões de usuários como Orkut, Facebook, MSN, Vista essa história, notamos que a WEB tem beneficiado pessoas de todo mundo com sites de relacionamento, ambientes de informação e de aprendizado. As redes sociais virtuais possibilitam o encontro de pessoas e um relacionamento interpessoal mais informal na troca de informações, facilitando, assim, a interação na participação da vida e, por conseqüência um maior conhecimento do outro. A EAD – Educação a distância leva a possibilidade de formação para os 1Psicóloga clínica desde 2009. Mestre em Educação, Psicóloga e Pedagoga. Especialista em Educação a Distancia e em Análise Psicodramática na Escola Paulista de Psicodrama (área clínica). Docente do Ensino Superior desde 2002, ministrando disciplinas presenciais em cursos de tecnologia e bacharelado, bem como em Educação a Distância. Docente em nível de Pós Graduação desde 2011. Orientadora de Projetos e de atividades complementares. Possui experiência na área administrativa como Assistente de Direção (área pedagógica). Participou da construção da CPA – Comissão Própria de Avaliação Institucional na Faculdade Radial, atual UniRadial, de 2004 a 2009. Coordenou Capacitação Docente do Colégio e Faculdade Anchieta de 2006 a 2010. 51 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS indivíduos das mais restritas regiões do país e do mundo. Este artigo pretende abordar a questão da importância das redes sociais na EAD, por meio da troca de informações pessoais, torna o aluno mais próximo do seu colega de curso e proporciona identificações motivando-os nas escolhas dos colegas que farão parte de seus grupos de estudo e desenvolvimento de projetos ao longo do curso, seja ele qual for. Nesta pesquisa, especificamente, foi feito um questionário com a intenção de obter uma amostragem de alunos do Curso Superior de Tecnologia em Logística em Educação a Distância da Faculdade Anchieta, atual Anhanguera, na cidade de São Bernardo do Campo, SP. A idéia é de verificar se esses alunos se relacionam em redes sociais e se isso facilita ou não a interação e o relacionamento entre os colegas de curso. Acredita-se que a relevância dessa pesquisa ajudará docentes da EAD a motivarem seus alunos ao encontro com os colegas por meio das redes sociais virtuais, visto que eles não se encontram no dia-a-dia para conheceremse, tornando o trabalho do docente mais fácil no sentido de que os próprios alunos possam formar seus grupos de trabalho, por afinidades. Portanto, a ideia é que as redes sociais possam facilitar o conhecimento do colega de curso, possibilitando um envolvimento entre os alunos e facilitando o conhecimento do outro e a afinidade para os agrupamentos. Aqui cabe lembrar, que a reflexão por meio das trocas entre os parceiros são momentos significativos no processo ensino-aprendizagem e que, segundo a psicologia sócio-histórica2 , que 2 tem como base a teoria de Vygotsky (1996), concebe o desenvolvimento humano a partir das relações sociais que a pessoa estabelece no decorrer da vida. Nesse referencial, o processo de ensinoaprendizagem também se constitui nas relações nos diversos contextos sociais, sendo os mais atuais, as redes sociais virtuais. A EAD é um cenário novo no mundo educacional e necessário devido as grandes oportunidades de estudo que proporciona à sociedade, visto que nem todos tem acesso físico no tempo disposto pelas universidades no estudo presencial. Portanto cada estudo referente a EAD é benéfico e agrega valor aos profissionais que se dedicam a essa forma de propagação do conhecimento. O professor da EAD pode intervir com situações que atribuam significado aos alunos, tornando a relação amistosa e histórica, entre eles, pois conforme Vygotsky (1982), mais que superar os unilateralismos na análise da relação sujeito-objeto, o importante é buscar compreender as especificidades dessa relação quando sujeito e objeto são históricos e quando a relação entre eles também é histórica. Observa-se que na abordagem Vygotskyana o homem é visto como alguém que transforma e é transformado nas relações que acontecem em uma determinada cultura. O que ocorre não é uma somatória entre fatores inatos e adquiridos e sim uma interação dialética, que se dá, desde o nascimento, entre o ser humano e o meio social e cultural em que se insere. Assim é possível constatar que o ponto de vista de Vygotsky (1982) é que o desenvolvimento humano é compreendido http://www.crmariocovas.sp.gov.br/dea_a.php?t=002 acesso em 03/02/2012. 52 Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS não como a decorrência de fatores isolados que amadurecem, nem tampouco de fatores ambientais que agem sobre o organismo controlando seu comportamento, mas sim como produto de trocas recíprocas que se estabelecem durante toda a vida entre indivíduo e meio, cada aspecto influindo sobre o outro. Observa-se que nossa história é construída a partir da convivência com o outro. Em um curso de EAD essa convivência fica comprometida e por conseqüência sua história universitária também, visto que o contato com o outro está limitado e a relação em uma rede social pode ajudar na sua aprendizagem a medida que ocorram identificações com sujeitos e suas histórias. 2. Hipóteses Uma rede social é uma estrutura composta por pessoas ou organizações, a qual possibilita aos usuários um relacionamento mais afetivo, visto que compartilharam de informações sobre a vida particular dos colegas de curso. As instituições de ensino possuem locais para a projeção da EAD, que são plataformas de ensino, das quais podemos destacar o MOODLE e o TELEDUC. Essas plataformas possuem ferramentas para o desenvolvimento das aulas, mas são espaços limitados em aspectos da particularidade do aluno. Já em uma rede social, o aluno pode postar fotografias, comentar suas experiências de vida, enfim, mostrar seu estilo de vida e conhecer o dos seus colegas. Foi pensando na possibilidade de aproximação dos alunos que surgiu a idéia de trabalhar em um artigo sobre a possibilidade de motivar os alunos a trocarem informações nas redes sociais e com isso possibilitar o conhecimento dos seus pares. 3. Justificativa Atualmente os jovens estão muito influenciados pelo uso da internet e envolvidos com seus colegas em redes sociais, tipo Orkut, Facebook, Twiter, Linkedin, MSN, entre outras. O docente por sua vez, também participa de uma rede social, na qual seus alunos podem ter acesso. Esse contato aproxima as pessoas, é o que entendo por estar junto virtual, compartilhar da vida. Aproveitando-se deste estar junto virtual, poderíamos introduzir textos, filmes, fotos, situações de experiência de vida, entre outros, com a finalidade de proporcionar discussões a respeito de assuntos acadêmicos o que despertaria o interesse dos alunos pelo conhecimento. A EAD é uma forma de adquirir conhecimento pela internet, isso faz com que os docentes necessitem entrar no mundo virtual dos alunos para acompanhálos. Participar de redes sociais com eles é uma forma de acompanhá-los e motivá-los a conhecerem-se melhor para a formação dos grupos, visto que quase não se encontram no ambiente presencial (somente 20% do curso). Escrever sobre o uso de Redes Sociais na EAD vem ao encontro de uma nova comunicação e ajuda os docentes a encontrarem outras ferramentas de motivação para o aluno com este perfil. 53 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS 4. Metodologia A pesquisa exploratória será a metodologia utilizada neste trabalho, pois a idéia é proporcionar maior familiaridade com o problema, objetivando torná-lo mais claro e construir hipóteses. Irá envolver levantamento bibliográfico; entrevistas com pessoas que tiveram experiências práticas com o problema pesquisado; análise de exemplos que estimulem a compreensão (GIL, 1996). A pesquisa foi feita por meio da aplicação de um questionário em uma turma de 47 alunos com um retorno de 22 questionários respondidos, perfazendo 46,8% do total de alunos da turma. A Faculdade possui 113 alunos matriculados no Curso Superior de Tecnologia em Logística - modalidade EAD, sendo um referencial de 19,4% do total de alunos na amostragem desta pesquisa. Foram feitos os seguintes questionamentos aos alunos: 1. Você está cadastrado em uma rede social? (sim, não, porque) Se sim, desde quando? 2. Quais redes sociais mais utilizam? 3. Qual o motivo da escolha por essa(s) rede(s) Social (is)? 4. Q u a n t a s v e z e s p o r s e m a n a disponibilizam para se relacionar na rede social? 5. Considera que a rede social é importante para conhecer melhor os colegas de curso? (sim, não, porque). 6. Qual a importância da rede no relacionamento interpessoal com os colegas? 54 7. Na rede social, o que chama mais atenção, com relação ao relacionamento interpessoal geral? 8. Você considera que a rede social seria útil para uso dos docentes da EAD? (sim, não, porque). 9. E m s u a o p i n i ã o , p a r a q u e finalidades poderiam utilizar a rede? Observa-se que o artigo tem a característica de uma pesquisa qualitativa, pois o questionário aborda os dados subjetivos, e quantitativos, pois investiga o relacionamento interpessoal, a interação e motivação, apresentando partes que elucidam a rede social mais utilizada por esses alunos. O desenho deste processo se apoia nos elementos básicos da pesquisa segundo LUNA (2002, p. 16). A partir dos seus conceitos foi verificado: 1. Determinação das informações necessárias. 2. Busca de bibliografia sobre redes sociais. 3. Definição do conjunto de ações que produzam essas informações. 4. Leitura do material bibliográfico para fundamentação teórica e aplicação de questionário. 5. Produção de respostas. 6. Aplicação de questionários para os alunos de uma turma do Curso de Logística a Distância da Faculdade Anchieta, em São Bernardo do Campo, com a finalidade de verificar quais as redes sociais mais utilizadas por eles e o que pensam sobre a importância ou não de conhecer melhor seu colega de curso acessando esses sites de Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS relacionamento. Esta pesquisa foi realizada no mês de novembro de 2011. 7. Análise dos resultados. 8. A análise dos resultados foi feita pela tabulação das respostas pela autora e analisada como demonstrado abaixo nos gráficos. 5. Análise da Pesquisa Os dois gráficos abaixo (F1 e F2) mostram que 63% dos alunos que participaram da pesquisa estão cadastrados em uma rede social e que 13% deles, ou seja, a maioria, somente há três anos. Podemos deduzir que poucos são os alunos deste curso de EAD que se relacionam em redes sociais. Figura 1 – desenvolvida pela autora em 11/2011 Figura 2 – desenvolvida pela autora em 11/2011 55 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS Observa-se no gráfico abaixo (Figura 3) que as redes sociais mais utlizadas por esses alunos são, Facebook e Orkut com 36% das respostas e o MSN com 22%. Aqui podemos observar que os alunos procuram um relacionamento mais social do que de trabalho (Linkedin) ou em voz/ vídeo (Skype). Figura 3 – desenvolvida pela autora em 11/2011 Questão 4 – Qual o motivo da sua escolha por essa rede social? Dentre as respostas, obtivemos as seguintes: pesquisar; procurar amigos e conhecer as novidades; pela praticidade; conversar com pessoas; simplesmente contato de trabalho; ober um e-mail e utilizar mensagens; facilidades; compartilhamento incomum com amigos e família; facilidades de fazer amigos; ter notícias e reencontrar velhos amigos; utilização mais fácil e rápida; fazer amigos; contato com conhecidos ou não; facilidade para encontrar amigos e comunicar-se em diferentes horários; contatos. Confirma-se aqui que a maioria dos alunos buscam na rede social um 56 relacionamento social para fazer amigos ou reencontrar antigos amigos, o que constata a t e o r i a Vy g o t s k y a n a s o b r e o desenvolvimento humano ser compreendido como produto de trocas recíprocas que se estabelecem durante toda a vida, entre indivíduo e meio, cada aspecto influindo sobre o outro. No gráfico abaixo (Figura 4), observase que 13% dos alunos acessam a rede todos os dias e a mesma porcentagem somente uma vez por semana, ficando a média de acessos ou quase nunca em 9%. Essa análise nos mostra que poucos alunos disponibilizam seu tempo para relacionamentos na rede social. Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS Figura 4 – desenvolvida pela autora em 11/2011 Uma amostra interessante é definida no gráfico abaixo (Figura 5), 54% do grupo de alunos que participaram da pesquisa não acham que a rede social é importante para conhecer seu colega de curso e 40 % acham que contradição apresentadas indica que pesquisa. sim. Observa-se aqui uma com relação as respostas na questão quatro o que é necessário aprofundar a Figura 5 – desenvolvida pela autora em 11/2011 Questão 7 – Se sim, escreva um pouco sobre essa importância no seu relacionamento interpessoal com seus colegas. Dos 40% que acreditam que a rede social é importante para o relacionamento interpessoal com seus colegas de curso, observa-se as seguintes explicações: como 57 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS o curso que fazemos é em EAD, quase não conversamos nem nos vemos, nessas redes podemos conversar e compartilhar várias coisas; por termos acesso ao perfil dos colegas, assim conhecemos um pouco mais de seus costumes e valores; porque com um dia por semana de aula, não temos tempo de interagir com os colegas. As pessoas se expõe um pouco mais em suas redes sociais; gosto e perfiro conversar olhando nos olhos; para termos mais contato com os colegas e tirar algumas dúvidas sobre o curso; normalmente nos encontros presenciais nos perocupamos mais com a aula e não temos tempo para as pessoas em particular; importante para além do estudo, obter algumas informações; acho importante porém, estamos sufocados com tantas ferramentas eletrônicas disponíveis; podemos conversar com várias pessoas em vários locais ao mesmo tempo. Observa-se que a importância aqui relatada pelos alunos está relacionada com as experiências de vida, valores, interação e trocas de conhecimento. O que vem c o n f i r m a r a t e o r i a Vy g o t s k y a n a , novamente, de que o desenvolvimento humano acontece a partir das relações sociais que a pessoa estabelece no decorrer da vida. Questão 8 – O que na rede social mais lhe chama a atenção, com relação ao relacionamento interpessoal? As respostas apresentadas foram: nas redes sociais nos atualizamos; a rapidez 58 com que a informação se propaga; conhecer quais os ambientes que as pessoas freqüentam; se há compatibilidade familiar entre os colegas; velocidade na comunicação para os que a acompanham diariamente; a acessibilidade; a vida das pessoas, composta dos fatos de seu dia-adia, sua família, passeios e lazer; podemos trocar idéias e informações; facilidade na comunicação; poder mentir sem ninguém lhe questionar; às vezes é bom, mas não dependo desta ferramenta; para localizar amigos distantes; porque tenho pessoas em outro estado e me comunico melhor; a falta de sentimento e atenção, principalmente pela razão de não observar o tempo que o outro está disponibilizando. Observa-se nessas respostas que os alunos buscam um relacionamento rápido, no qual possam compartilhar informações e ocorrências pessoais com amigos distantes ou até mesmo com familiares, utilizando-se da rede social para ampliar seus contatos. No quadro abaixo (Figura 6), observamos que a maioria dos alunos diz que a rede social não seria útil aos docentes, 72% deles e 27% diz que seria útil. Observa-se nesta pesquisa que a relevância da resposta negativa sobre essa questão não foi investigada, por não estar nas propostas deste artigo, porém desperta uma curiosidade a respeito desse assunto. Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS Figura 6 – desenvolvida pela autora em 11/2011 A questão 10 – Se sim, eles poderiam utilizar a rede para que finalidade? 5. Conclusão As respostas sobre essa questão foram: divulgar informações sobre o curso ou as matérias; para conhecer melhor seus alunos, assim também teriam mais contato; orientar os alunos; bate-papo; comunicação mais rápida com os colegas; utilizar como fonte de informação e relacionamento; a rede social é algo para se distrair, não acho aplicável em curso ou para estudo; a plataforma de EAD basta para o curso. Encerrando as observações adquiridas com esta pesquisa, verifica-se, nas respostas dos alunos que as redes sociais são locais para fazer amigos ou reencontrar antigos contatos. Poucos alunos disponibilizam tempo para entrar na rede social todos os dias, somente 13%, mas 54% deles acham que a rede social é importante para conhecer seu colega de curso. Observa-se nessas respostas que os alunos acreditam que a rede social possa proporcionar um melhor conhecimento deles pelos docentes, que na rede teriam mais contato com o professor, poderiam bater papo ou esclarecer dúvidas, porém não acham aplicável para o curso e isso é relevante, pois nos cursos a distância existe uma plataforma de estudo que satisfaz as necessidades educacionais. Com relação à importância da rede social para os alunos de EAD, tema central deste artigo, observa-se que está relacionada com o conhecimento do colega sobre fatos pessoais, como, experiência de vida, valores, trocas de conhecimento. Neste caso, pode-se afirmar que as redes sociais aproximam as pessoas e facilitam o relacionamento, pois na medida em que se conhece o outro se estabelece uma afinidade, aumentando assim o interesse em aproximar-se desta ou daquela pessoa, para trocar conhecimento ou informações, 59 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS melhorando o relacionamento interpessoal entre os colegas de curso. são explicações para entendimento do que estão aprendendo, não o contato social. Confirma-se a teoria Vygotskyana de que o desenvolvimento humano acontece a partir das relações sociais que a pessoa estabelece no decorrer da vida. A relevância desta pesquisa está na clareza das respostas dos alunos, que demonstram a importância das redes sociais para seus relacionamentos e que não são significativas para disseminação de conhecimento, somente de informações. Com essa pesquisa, observa-se, ainda que o aluno não achasse interessante adicionar professores as suas redes sociais, visto que preferem ter um contato maior com os colegas e também porque o contato com professores se dá nas plataformas de EAD. Aqui cabe ressaltar que a relação professor-aluno está no âmbito da disseminação do conhecimento e para isso existe local específico, ficando assim preservada do social, estando claro, nas respostas, que o que esperam do docente Cabe aos docentes incentivar e aderir às redes de seus alunos para levar e discutir informações sobre atualidades e principalmente para motivá-los no sentido de melhorar e ampliar os relacionamentos interpessoais entre os colegas de curso, mostrando que a caminhada acadêmica será muito mais gratificante se for coletiva. Referências Bibliográficas GIL, Antonio Carlos. Métodos e Técnicas de Pesquisa Social: 5º edição. Atlas, São Paulo, 1999. LUCCI, M. A. A proposta de Vygostsky: A psicologia sóciohistorica. Artigo publicado na Revista de currículum y formación del profesorado, Universidade de Granada, Espanha, 2006. LUNA, S.V. Planejamento de pesquisa. Educ, São Paulo, 2002. VYGOTSKY, L.S. Obras Escogidas: problemas de psicologia geral. Gráficas Rogar. Fuenlabrada. Madrid, 1982. VYGOTSKY,L.S. A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos psicológicos superiores. 5.ed. Martins Fontes, São Paulo, 1996. SITES: http://www.bibliotecadigital.unicamp.br/document/?code=000789327 acesso em 22 de julho de 2011. http://www.crmariocovas.sp.gov.br/dea_a.php?t=002 acesso em 03/02/2012. http://www.ugr.es/~recfpro/rev102COL2port.pdf acesso em 03/02/2012. 60 Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS 1 Robert Martins de Souza1 A educação superior e as novas tecnologias: Comprometimento de docentes e discentes Recebido em: 03/11/2012 - Aprovado em: 12/11/2012 - Disponibilizado em: 26/12/2012 Resumo A educação é um dos temas mais recorrentes em toda a história do mundo. É sabido que os grandes pensadores incentivaram seus pupilos a difundirem os conhecimentos adquiridos, incrementaram o aprendizado, reescreveram os saberes passados por seus professores tornando-se eles mesmos os tutores de outras pessoas. Ao longo do tempo o ensino começou a ganhar metodologia didática, sendo seguido e desenvolvido por outros discentes que foram convertidos em docentes posteriormente. Mais tarde o sistema evoluiu para atender a necessidade de alcançar as pessoas que ansiavam por aprender, mas que não conseguiam, ou porque estavam muito distantes ou porque não tinham recursos suficientes para chegar ao professor. Aprendendo a ensinar os professores foram ao encontro aos alunos por meio do sistema educacional a distância, os sistemas de tecnologia da informação agregaram mais poder de transmissão do conhecimento, essa forma de compartilhar os saberes ganhou adeptos nas duas vertentes – discência e docência – com velocidade impressionante e atualmente a educação a distância alcança proporções crescentes ao mesmo tempo em 1 que a qualidade acompanha esse movimento. Palavras-chave: Educação, tecnologia da informação, discência e docência. Abstract Education is one of the most recurrent themes in the history of the world. It´s known that the great thinkers have encouraged their pupils to disseminate the acquired knowledge, enhance learning, this rewrote the old knowledge. Their pupils was become mentors to other people. The over school began to gain teaching methods being followed and developed by other students later evolved them to deserve to be teachers. Later the system evolved to meet the people who were eager to learn but who couldn´t because the insufficient resources or too far away to meet the teacher. When learned to teach the students education system the distance was erased. According to Alves, Barros and Okada (2009) the information technology added more power to transmit knowledge, this form of sharing the knowledge earned adherents in two sides - learning and teaching with impressive speed and the distance earned increasing with quality. Robert Martins de Souza. 61 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS Keywords: Education, information technology, learning and teaching. 1. Introdução O ensino no Brasil, depois da década de 80 em busca da adequação aos novos rumos da economia mundial passou por relevantes processos de transformação. Em função do fenômeno da globalização que afetou o mundo como um todo, mudou-se a natureza do modus operandi do ensino de uma forma geral e específica em todas as suas escalas. Assim, nesta investigação o foco será o ensino superior. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), promulgada em 1996, reformou o método de ensino educacional. Após este evento, o ensino em suas diversas fases passou a considerar as necessidades regionais, respeitando e privilegiando a cultura local (MARCHESSOU, 1996). Em 1996 o Ministério da Educação e Cultura - MEC permitiu que a educação, em especial o ensino superior, que até então privilegiava uma pequena elite, fosse acessada por outra camada da sociedade. Foi permitido às faculdades promover um curso de dois anos com status de curso superior – o curso sequencial que hoje se consagra como curso superior de tecnologia. A busca por empregos melhores passou a ser um sonho factível. Essa realização foi possível porque esses cursos atenderam a uma necessidade profissional que era inserir o aluno no mundo midiático, a mídia terciária - tecnologia. Além de desenvolver habilidades e competências. 62 Os cursos que eram compostos pelas aulas padrão traziam em seu planejamento a obrigatoriedade de aulas em laboratório de informática e atividades fora da sala de aula que deveriam ser feitas pelo computador e enviadas por um sistema com a utilização da internet. Ferramentas que até aquele momento não faziam parte do universo de conhecimento daquele contingente ingressante. Assim, a educação, e as novas tecnologias tornaram-se comprometimentos necessários aos docentes e discentes. Na década de 80, a globalização invadiu o mundo com a tecnologia da informação e radicais mudanças na economia, na administração, nas ciências e como não poderia deixar de ser na educação. Após a revolução industrial, despontava com toda a sua força a revolução do conhecimento como consequência da revolução tecnológica. A educação associada às ferramentas do sistema de informação inovou o ensino tradicional com o ensino virtual. O ensino a distância passou a utilizar o meio de comunicação virtual e os instrumentos tecnológicos para alavancar a aprendizagem e agregar valor ao método de ensino presencial. A melhor forma de atingir o sucesso desta modalidade de ensino foi qualificar as partes envolvidas transformando-os em tutores. Revolução que a educação superior empreendeu para propiciar empregabilidade e acesso ao domínio tecnológico à população menos privilegiada. Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS O Brasil, conhecido como a nação do futuro desde a década de 802 com a expressão sacramentada na música pelo grupo Legião Urbana, deu largos passos nessa direção. No entanto, esse futuro não vem sendo construído de forma sustentável, nem tão pouco de modo acelerado como se espera de um país com 193.067.7243 de habitantes. É necessário que sejam criados critérios e políticas que tragam à população a consciência necessária para entregar-se completamente e exigir a mesma proporção, em contrapartida daqueles responsáveis pela transferência de conhecimento. Essa demanda não pode esperar o futuro, precisa acontecer agora. 2. Políticas públicas educacionais De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) de 1996, a reforma do ensino educacional teria seu início para corrigir os problemas vigentes até então. O que se esperava à época era um modelo focado na forma de se lecionar para corrigir o perfil vigente do mestre – o único dono do saber – que sabedor de tudo, com uma plateia passiva, sem opções, que frequentava as aulas apenas para observar, admirar. As perguntas poderiam ser feitas a qualquer outra pessoa, menos “ao mestre”. Na melhor das hipóteses as perguntas ao docente ocorriam em momentos ‘extraclasse’, se o mestre entendesse como prudente fazê-lo. Procedimento oposto ao propalado pelos teóricos hoje que incentivam a troca de informações como 2 Russo, Renato. Lobbos, Daddo V. Bonfá, Marcelo. 1982. 3 IBGE, estimativa de atualização diária. meio mais produtivo de construir conhecimento. O processo de crescimento da pedagogia e a evolução da relação entre docentes e discentes vêm acontecendo muito em função das tendências de mercado, que exigem profissionais qualificados. 2.1 - O percurso da evolução Atualmente o mercado exige profissionais cada vez mais qualificados e competentes. Para atender tal demanda, as instituições de ensino têm caminhado no sentido do desenvolvimento de pessoas. Os cursos formam ou selecionam professores dedicados que empreendem esforços, privilegiando a qualidade na formação esmerada dos alunos. Os alunos impedidos de comparecer sistematicamente às salas de aula presenciais, por já terem suas funções de responsabilidade profissional optam pelos cursos com uma carga de aula virtual por motivos de logística. Esses estudantes não precisam comparecer à unidade física da instituição todos os dias ou em todos os horários. Os cursos oferecem um sistema virtual com apostilas que dá acesso do trabalho ou da residência em qualquer dia e horário. Antes da década de 80, a tecnologia mais avançada que existia, na modalidade de educação a distância, era feita com apostila e correio. Atualmente, há cursos parcialmente e totalmente a distância com aulas disponibilizadas no meio eletrônico. Neste 63 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS molde, o aluno agenda o seu comparecimento em períodos pré-definidos à unidade física da instituição. As trocas de experiências e a construção de valor agregado pelos conteúdos oferecidos são feitos eletronicamente pelas partes envolvidas em tempo real ou virtual. 3. O papel do professor tutor na evolução da educação no ensino a distância Com relação à importância do ensino a distância na evolução da educação, tanto a básica quanto a avançada, é imprescindível o aperfeiçoamento do papel do professor. Nesta evolução, on-line, ele desempenha tarefas e representa papéis. Em sua nova atuação, cabe-lhe a ensinagem e acompanhamento da aprendizagem além da própria reciclagem. Além de tutor, se precisa desenvolver e praticar a administração das quatro áreas para que se consolide o aprendizado e a permanente atualização tecnológica e cultural. As quatro áreas de domínio a serem administradas transitam entre si, entrelaçam, interagem e buscam fusão no espaço acadêmico: pedagógica, gerencial, técnica e social (COLLINS E BERGE, 1996). O seu papel nesse campo é tão importante como o do futebol em relação ao técnico. O professor deve estar atento aos fundamentos teóricos dos projetos de ensino que considerar necessários ao desenvolvimento didático no aspecto teórico-prático para formar o profissional 64 de modo que aplique as melhores práticas do seu aprendizado no mercado. O programa seleciona e prepara o currículo articulado com procedimentos e atividades pedagógicas. O acompanhamento do percurso dos alunos está nesta seara. Uma vez identificados os objetivos referentes às competências cognitivas, habilidades e atitudes que forem consideradas prioritárias para tornar possível o desenvolvimento idealizado, definir-se-ão bibliografia, videografia, iconografia, audiografia, tanto as básicas quanto as complementares para proporcionar possibilidades de até mesmo ir além do proposto se este for o objetivo do aprendiz. Cumprida esta etapa, elaborase o material didático adequado para programas a distância. Na fase de gestão acadêmica do processo de ensino-aprendizagem é necessário disponibilizar textos imaginativos, criativos que indiquem, comandem orientem as ações dos estudantes. As ações devem ser continuamente repensadas e readaptadas, como módulos que quando não se adéquam dão lugar a outros mais flexíveis. 3.1. As funções do professor É sua função observar ambiente social amigável, que é imprescindível à aprendizagem on-line. A atuação dele no ambiente educacional é o que garante o sucesso ou fracasso do processo da aprendizagem. No ambiente on-line, o professor é o facilitador. Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS Para Martin Starr4 , na função gerencial o ritmo do curso, os objetivos, as regras e as tomadas de decisões levam os alunos a permanecerem ou desistirem do curso. A evasão do egresso nesta modalidade é mais fragilizada. E a sua permanência está ligada ao vínculo estabelecido, e, o apoio que este oferece ao acesso propiciado às técnicas e tecnologias. O professor tutor é quem administra o curso on-line. Ele é quem dirige a discussão e a adaptação dos participantes. É um líder coaching on-line, gestor de competências, de tarefas, de tempo, dentro do cronograma, o ponderador. Os que progridem ou não a partir do seu comando o submetem a um teste diário, porque o fracasso da turma será o seu fracasso e o sucesso demonstra sua competência, a do sistema e a dos alunos. Como no futebol brasileiro atualmente, ele representa o técnico. O seu sucesso na verdade é demonstrado pelo desempenho dos discentes no mercado, como profissionais qualificados, o resultado da sua gestão não depende só dele, vai muito além da imaginária sala virtual, transcende os espaços da educação e se consolida na profissão. mercado. No discurso das organizações no momento da seleção do capital humano, exacerbam-se palavras como: qualificação profissional, qualidade, competência e capacidade técnica, domínio tecnológico, valor agregado e estratégia operacional. A instituição necessita que ele seja o tutor, líder coaching on-line ou presencial tenha preparando adequadamente o aluno, não como mera força de trabalho braçal, mas como capital intelectual, e até mesmo as empresas que não têm know-how para consumi-los, os utiliza. As faculdades trabalham com o foco na formação técnica e tecnológica que atendam às exigências específicas do mercado – mesmo que seja o interno qualificação de profissionais para as empresas do entorno da instituição no caso de regiões industriais comerciais, hospitalares e outras. Com isso, o ensino torna-se mais específico que geral e aproxima-se realmente do tutor empowerment. A função técnica no curso depende do domínio prático do líder, da sua capacidade de transmitir o domínio da tecnologia aos que devem conhecê-la, usá-la e com ela atuar com destreza durante o curso. Pesa na gestão de um professor o sucesso dos seus pupilos presenciais ou virtuais. Trata-se de uma função que passa a ser cada vez mais a de estimulador da criatividade para a solução de problemas coletivos. Esse procedimento carrega de sentido o ditado popular: “ensinar a pescar e não entregar o peixe”. Para atender a tal responsabilidade, precisa-se não apenas de reciclagem contínua, mas de especializações sucessivas, sendo assim, um pesquisador incansável que tem o estudo como ofício para aprender cada vez mais como ensinar. Depois do curso, alguns se transformam em profissionais sobre os quais pesa a responsabilidade de terem êxito no A função social é a facilitadora educacional o que representa a própria figura do professor tutor. Ele é responsável 4 Starr, Martin K. "Administração da Produção": Sistemas e Sinteses: Editora Edgard Blucher LTDA, 2ª Edição 1988 65 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS por facilitar e dar espaço aos aspectos pessoais e sociais da comunidade on-line. 3.2. As ferramentas de suporte ao professor O avanço tecnológico mudou a forma de ensinar no novo milênio. As aulas dos cursos presenciais também podem ter monitoramento on-line e assim, todos têm a oportunidade de mixar o sistema presencial/virtual, interagindo com mais produtividade e qualidade. Neste modelo atual de ensino, para que escola, curso e método atinjam o resultado com qualidade, atendendo ao mercado com profissionais qualificados, dependem do perfil do tutor tecnologicamente e humanamente qualificado. A qualificação pessoal constante se dará por sua vez por meio de equipamentos tão modernos quanto o conceito de ensino e não como a didática de outrora. Equipamentos como projetores de vídeo interativos, reprodutores de conteúdo anteriormente gravados, links de acesso a outros conteúdos e muita curiosidade para encontrar novos conteúdos serão necessários para mantê-lo em dia com as ferramentas que seus alunos utilizarão5 (ALVES, BARROS e OKADA, 2009). Os diferentes meios de comunicação, informática, programas educacionais, livros on line e acessórios com os quais se interage atualmente o induzem em sua busca constante sem deixá-lo constrangido por descobrir que determinados conteúdos são mais conhecidos por alguns. Na verdade, em sua função de coaching, o 5 professor conseguirá a conciliação dos aprendizados - sem necessitar, para tanto, ser ele próprio uma enciclopédia de conhecimentos. As mudanças depois dos anos 70 em função dos avanços tecnológicos adquiriram velocidades nunca antes imaginadas. No Brasil não tem sido diferente. Em relação à tecnologia e a educação, ele apresenta-se em atraso comparado às nações mais antigas e consequentemente mais modernas como o Japão, Inglaterra e EUA. Comparado à Índia, Rússia e China, os níveis de educação mostram-se mais eficientes (UNESCO, 2004) de tal sorte que a quantidade de anos que se estuda nestes países é quase 50% maior do que no Brasil. Com necessidades crescentes de evoluir com mais velocidade e qualidade devido ao custeamento mais agressivo da educação, nos últimos anos, por parte do Estado e das instituições privadas (Lei de Diretrizes Orçamentárias – GOVERNO FEDERAL), vem aumentando o número de pessoas que ingressam em cursos superiores. Os primeiros que ascendem no núcleo familiar recebem motivação para incrementar o status próprio por meio de um curso superior. 3.3. Desafios a superar O mero acesso ao ensino não muda a realidade de quem aprende caso não haja um professor que compreenda as óbvias diferenças culturais na turma e os avalie em relação ao seu contexto, sob pena de MOODLE, Estratégias Pedagógicas e Estudos de Caso, 2009, Editora da Universidade do Estado da Bahia EDUNEB. Lynn Alves; Daniela Barros; Alexandra Okada; (Organizadoras). 66 Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS sacrificar o progresso de um ou até de todos. Um aluno abastado tem mais possibilidade de receber formação cultural e educacional diferente daquele que depende de financiamento estatal, posto herdado da sua descendência cultural e talvez a carência do sistema público. A abordagem não trata de uma limitação intelectual em função de carência financeira, mas da falta de método em função da instituição de origem, não é novidade que escolas públicas normalmente não acompanham a evolução do ensino particular segundo Leite6 (2011). Embora o Brasil não possua castas como a Índia, as classes sociais fazem este papel informalmente. Assim a classe social acaba por se refletir na forma como a pessoa se relaciona com o mundo. A classe social constrói no indivíduo a idiossincrasia e o orienta na forma de ver, pensar e sentir o mundo. Na condição de classe menos favorecida, muitos já marginalizados pela falta de acesso à informação e ao domínio tecnológico, se apartam daqueles que a tem. Na condição de condutor de pessoas em grupos cada vez mais heterogêneos, se for capaz de compreender o fenômeno, e se importar com ele, torna-se a ponte da oportunidade para a evolução dos menos privilegiados. Esse movimento é capaz de criar a possibilidade para a condição do sentimento de igualdade. Esse processo seria uma solução para que a sociedade atingisse a sua meta de crescimento. Poderia levantar o país e encurtar os caminhos entre as pessoas menos privilegiadas e as que se encontram no topo da tabela social. Tudo isso por meio 6 Paulo da ação do tutor, uma imagem perdida no tempo. Grandes pensadores de outras eras tinham seus professores baseados em conhecimentos ainda mais antigos. Para que se destacassem, precisaram quebrar paradigmas com maior ou menor dificuldade de acordo com as orientações sociais e de seus mestres. Não é possível afirmar que Sócrates, Pilates, Platão ou Foucaut conseguiriam ter o mesmo desempenho nos tempos atuais porque não há comparação viável capaz de demonstrar isso, mas é um questionamento bastante interessante. É o que se exige hoje do tutor. O conhecimento técnico, o conhecimento humano, o geral e o específico. Assim, depois da globalização, mais especificamente após a lei LDB de 1996, obrigatoriamente, passou a se estudar tecnologia para conseguir se comunicar da maneira apropriada com seus alunos, colegas e realizar sua própria reciclagem. 4. O professor e a plataforma Moodle A Plataforma Moodle é uma ferramenta de ensino no sistema EAD que facilita o trabalho de todos os envolvidos, agregando eficiência e possibilitando integração mundial. O alcance e as facilidades que a ferramenta possibilita viabilizam pesquisas e criação de novos métodos de trabalho educacional. A interatividade inclusive de outras áreas, em Fórum aberto, permite ampla troca de conhecimento e democratiza o aprendizado. Eles podem desenhar o Moreira Leite, Revista Época, Artigo 07-07-2011. 67 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS projeto no qual querem interagir com seus tutelados e institucionalmente. 4.1. A importância da internet para a educação A internet surgiu como sistema criado para fins militares hoje viabiliza a comunicação mundial em tempo real. Atualmente, a rede mundial de tecnologia não tem fronteiras. No mundo moderno, a internet desempenha um papel fundamental para disseminação da educação. Ela exerce dois papéis; é o veículo da informação e ao mesmo tempo difunde conhecimento. Ajuda a levar às pessoas a consciência da ignorância que só é percebida depois que se toma conhecimento de sua existência. Conforme Platão: “Só sei que nada sei”. Um dos ditados mais antigos do qual se tem conhecimento. Na internet, contracena-se com um paradoxo, por meio do contato virtual isolado e frio, interage-se intensamente com o mundo. Inter-relacionam-se qualidades humanas, competências humanas, por meio do domínio da competência técnica. Fatores essenciais para o desenvolvimento de todo trabalho organizacional. O conhecimento e domínio dessa ferramenta permitem a demonstração do saber técnico, a capacidade de interação e compartilhamento, colaborando com a evolução da equipe, possibilitando integrar práticas de trabalho através de computadores e servidores interligados mundialmente. Os projetos envolvendo a engenharia social além dos que já existem, podem ser repensados com o objetivo de viabilizarem a criação de novos formatos, inclusive para se comunicarem 68 simultaneamente para os que tiverem interesse. O ensino a distância virtual é uma ferramenta para se trabalhar, com terceiros, a utilização da rede como ferramenta. A internet ocupa espaços antes inimagináveis, diferentes para pessoas diversas, permitindo a criação de uma nova era cada vez mais rápida. Os talentos que se utilizam da rede colaboram com sua evolução. Como uma inteligência coletiva, todos podem pensar em uma mesma direção e pesquisar temas semelhantes com conclusões próprias. Logo que alguém compreende um conceito e o emprega, outros, mesmo que por caminhos diferentes podem chegar ao mesmo lugar. Esse conceito pode ser aplicado ao ensino presencial e a distância. 5. O papel do professor do mundo real no campo virtual O professor eficiente é um dos profissionais mais completos do mercado de trabalho. Ele detém competências multidisciplinares, e compreende que sua função cumpre um papel social importante, já que colabora com a evolução das pessoas que o cercam, tem consciência que o seu conhecimento se não multiplicado, perde a sua utilidade porque morre com ele. O aperfeiçoamento contribui com a evolução da sociedade e ajuda na acessibilidade a novas tecnologias. Reconhecer falhas e a falibilidade humana como algo natural também podem ser observados pelo campo virtual; a comunicação precisa ter papel representativo, por isso, a busca incessante pelo conhecimento. Didática, empatia, Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS simpatia, bom humor, sem negligenciar o rigor, podem ser o diferencial do profissional bem-sucedido. Segundo Pimenta (2002), ele deve dominar o equilíbrio dos saberes, de tal forma que se possa falar que conhece e vivencia o campo do saber ao transmitir a informação. Deter qualidade de informações dos saberes, ter experiência e conhecer as teorias sem domínio da metodologia pode fazer com que a aula não se seja tão envolvente, motivadora, interessante. O tutor que deixa a desejar necessita se reciclar, reaprender e elaborar novas ideias, caso contrário, causa prejuízos a todos, pois lhe faltam saberes, que, possivelmente, estão associados a sua didática. Por omissão, ao não se preocupar com a qualidade de sua aula, o bom desenvolvimento dependerá de permanente reflexão e autoavaliação. Os professores fazem parte de um conjunto que presta serviços regulados por lei. Oferecer aulas de má qualidade é prestar serviços defeituosos. 5.1. As qualidades do professor contemporâneo Segundo Mattar7 (2006) a capacidade de informar, formar, reciclar e oferecer a cooperação mútua é de interesse de todos, que juntos vêm ganhando exponencialmente adeptos, o sistema de educação a distância tem potencial de atrair os que não têm condições de frequentar uma sala de aula todos os dias e com conhecimento técnico e tecnológico não apenas aprendem como ensinam. A oferta de conteúdo programático moderno beneficia quem recebe e quem oferece o conhecimento. A vontade de melhorar, utilizando metodologias modernas com pessoas diferentes, possibilita a absorção da matéria e facilita a transmissão do tema. Lecionar pela internet oferece a oportunidade de redução dos custos e agrega mais valor porque o próprio ato de estudar dentro dessa plataforma exige que se aprenda a trabalhar com os programas envolvidos que ficam interligados. As apostilas e cadernos utilizados nos sistemas de ensino convencionais estão sendo substituídos ou aperfeiçoados por fichários e documentos salvos no computador e disponíveis para impressão sempre que conveniente ou necessário. A utilização de produtos qualificados é facilitada com a redução dos custos de manutenção e atualização dos conteúdos, os cursos on-line com essa prática podem obter difusão ampla quase irrestrita, a tendência dessa modalidade de ensino possibilita que seu reconhecimento seja atingido em pouco tempo. Os docentes podem alcançar mais pessoas, ainda que fora das turmas, ao mesmo tempo se empenham com mais dedicação sem a necessidade de se deslocar até a turma; sendo qualitativo e quantitativo, o objetivo da matéria fica simplificado. Na opinião de Garrido (2002) que define a finalidade do ensino como uma atividade de papel dúbio, é antagônico e c o m p l e m e n t a r e d e v e c o n s e r v a r, memorizar, integrar e ritualizar. Na opinião 7 h(p://www.montesiao.pro.br/redecrianca/escolaporpricipios/contemporaneo.htm 69 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS de Morin (2002), pode-se verificar que os c o n c e i t o s c o n v e rg e m a o r e g i s t r o cumulativo dos conhecimentos sem criar dogmas. Uma vez que os dogmas em regra criam barreiras à renovação do conhecimento. O ensino superior serve muito bem à função de libertação do pensamento, mas com regras (ou rédeas já que há parâmetros bem definidos que não aceitam idéias sem comprovação científica quanto à sua viabilidade ou aceitação na comunidade acadêmica). 5. Considerações Finais O modelo de ensino superior no Brasil é incipiente e segundo os dados da UNESCO8 (2004) em seu Relatório de Desenvolvimento Juvenil, e ainda apresenta muitas áreas geográficas sem cobertura. Essa ausência tem consequência desde a base da cadeia de docência (a partir do fundamental) até a pósgraduação. Falhas graves do ensino básico ao médio criaram uma área extremamente sensível, uma vez que o ensino básico em comparação com o da graduação possui extremos diametralmente opostos. Durante a fase de ensino básico e médio, o desejo dos estudantes é conseguir manter-se afastados do ensino público, por outro lado, quando se atinge a fase do vestibular, o ensino público se transforma em objeto de cobiça da maioria dos candidatos. O conhecimento acadêmico superior incentiva novos estudos, estimula o 8 docente e discentes. O modelo atual – em evolução – favorece instituições de ensino dedicadas e profissionais interessados, já que se vive uma época em que o número de ferramentas disponíveis é maior do que as utilizadas em épocas anteriores. Os princípios de ensino vêm evoluindo rapidamente para acompanhar os progressos das áreas periféricas, de tal sorte que a qualidade do ensino possa acompanhar a crescente demanda. Ao longo da vida acadêmica universitária, tem-se o privilégio de observar o ambiente de grandes pensadores dos vários setores acadêmicos. As instituições de ensino superior, que buscam o método com o objetivo de transmitirem o conceito de aprendizagem constante, beneficiam toda a sociedade, devido aos melhoramentos propostos mesmo que seus efeitos não sejam percebidos em curto prazo. Compreender os saberes de sua época e desejar revolucionar já colabora, sobremaneira, para o alcance das metas qualitativas e quantitativas requeridas para alcançar o reconhecimento da sociedade como entidade de boa qualidade. A sociedade sempre evoluiu a partir de conceitos inovadores - com a internet, o ensino a distância, professores dedicados e bem treinados, materiais de suporte apropriados formam o conjunto necessário para o progresso tão esperado na qualidade do ensino brasileiro.. Relatório de desenvolvimento juvenil, 2003, Escritório da UNESCO no Brasil, Division of Social Sciences Research and Policy. Policy and Cooperation in Social Sciences Section/UNESCO-Paris, Waiselfisz, Julio Jacobo. 70 Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS Referências Bibliográficas ALVES, J. R. M. Educação a Distância e as Novas Tecnologias de Informação e Aprendizagem. Revista IPEP, v. 6, p. 9-10, 2006. ANDRADE, Arnon A. M.. Política e Afeto na Formação de Identidades de Pessoas e Instituições. Revista Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, v. 30, p. 133-138, 2005. ANDRADE, Arnon A. Mascarenhas; FREIRE, J. & CAVALCANTE, Gilmara. Análise do perfil dos alunos do curso de especialização em ensino de comunicação social da UNEB para o desenvolvimento de suportes. Revista IPEP, v. 6, p. 9-19, 2006. ANDRADE, A. A M. & FREIRE, J. Estudo de estratégias metacognitivas em ambientes virtuais de aprendizagem. Revista Técnica IPEP, v. 4, p. 57-63, 2004. CERCEAU, Alessandra, D. Formação à Distância de Recursos Humanos para Informática Educativa. 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Investiga a resistência dos diversos professores que ainda não fazem uso destas tecnologias e procura compreensão para o fato. The research on 'The use of new technologies by professors and teachers concerned in education and practical problems' promotes an argument about benefits which New Information Te c h n o l o g i e s a n d C o m m u n i c a t i o n (NITC's) can bring into the learning process, focusing on modality of Distance Learning (ODL). Investigating the resistance of several professors and teachers that do not yet use such technologies and seeking comprehension for this fact. Palavras-chave: Tecnologias; Ensino; Docente. 1. Introdução O desenvolvimento da pesquisa sobre “O uso de novas tecnologias pelos docentes no processo de ensino e os seus problemas na prática” envolveu profunda pesquisa, leitura, reflexão e análise, mas foi facilitado pelo vasto material virtual disponível. Embora o assunto esteja em discussão desde o nascimento da tecnologia, ele continua atual e necessita 1 Benedito Claret Barbosa. 74 Keywords: Technology, Teaching, Educators. de reflexões constantes. Não há novidade, nem é segredo, o debate sobre as inúmeras dificuldades encontradas pelos docentes com a tecnologia na educação, mas na modalidade a distância o descompasso salta aos olhos e incomoda os alunos nativos digitais. A falta da formação adequada dos docentes é consequência, tanto da sua escassa disponibilidade de tempo, quanto da falta de motivação e/ou interesse diante do raso reconhecimento financeiro das instituições. Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS O debate sobre “as novas tecnologias na educação” está longe de se esgotar, tendo em vista a sua constante renovação e permanente velocidade. Com a educação e as novas tecnologias caminhando juntas, isso contribui para a formação dos alunos porque facilita o processo de pesquisa e abre novos horizontes ao multiplicar a possibilidade de se ampliar o conhecimento. A relevante permanência do tema se deve ao crescimento significativo com adesão cada vez maior de estudantes profissionais ao processo de educação a distância, porém o mesmo possui vantagens e desvantagens em relação ao ensino tradicional. As desvantagens apresentam-se tanto no quesito que se refere ao relacionamento entre professores e alunos, quanto no acesso do estudante aos esclarecimentos do professor sobre as dúvidas com o conteúdo. O objetivo é discutir os benefícios proporcionados pelo uso das tecnologias multimidiáticas no processo de ensino, especialmente na educação a distância; compreender o motivo pelo qual grande parte dos professores ignora, desconhece, ou dispensa o uso das tecnologias no processo ensino-aprendizagem. A metodologia utilizada foi sustentada pela pesquisa bibliográfica real e virtual, com o intuito de alcançar os objetivos propostos. Para a análise dos aspectos relevantes da investigação foi imprescindível o uso das novas tecnologias da educação, trazidos por autores pesquisadores que avançaram nessa área. O referencial teórico contou autores como Moran (2007) que auxiliou na compreensão do processo educacional, Galli (2005) apontou as principais ferramentas na educação a distância. Brito e Purificação (2006) alertou sobre a impossibilidade de se pensar a educação dissociada da tecnologia. Masetto e Behrens (2000), Machado (2004), Almeida, Rosini e Calderón (2007) fizeram referências ao sentido das tecnologias educacionais na atualidade. Campestrini e Ferreira (2004) elucidaram a representatividade do computador como ferramenta mediadora na relação de aprendizagem. Liguori (1997) e Kenski (2004) alertaram para as mudanças como consequência da tecnologia na educação. Os desafios dos programas na modalidade EAD foram apontados por Letwin (2001). Papert (1988) lembrou que as tecnologias da comunicação não substituem o professor, mas modificam algumas das suas funções. Doll (1999) e Papert (1988) apontaram as angústias do professor diante da internet. Levy (1996) e Pretto (1996) fazem parte dos que defenderam a incorporação de novas tecnologias na educação, entre outros que auxiliaram na cansativa, mas profícua busca do esclarecimento e compreensão do tema. 2. As novas tecnologias na educação Nesse momento histórico em que as tecnologias ganham cada vez mais espaço no meio social, é impossível ignorá-las na educação. Na última década surgiram incontáveis novidades na tecnologia de informação e comunicação. Essas novas tecnologias foram imediatamente utilizadas e de várias formas se fazem presentes na sociedade, tanto no mercado trabalho, quanto no lazer e nas relações sociais, transformando-se uma das principais ferramentas na educação a distância. 75 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS Segundo Galli (2005, p.1), “As novas tecnologias, como produto da pósmodernidade, invadiram o cotidiano humano e com naturalidade ocupam cada vez mais espaço, seduzindo e tornando-se parte da vida das pessoas”. A sua expansão tem modificado quase que completamente a vida do sujeito-leitor-pesquisador e suas relações com a praticidade na busca do conhecimento. Na opinião de Brito e Purificação (2006, p.24) este é o momento em que “Todos devem (re) aprender a conhecer, a comunicar, a ensinar e a integrar, o humano e o tecnológico”. Hoje é praticamente impossível pensar em educação dissociada da tecnologia, pela presença desta no cotidiano dos alunos, especialmente daqueles que estudam a distância. A tendência atual de ensino faz com que a tecnologia da informação e comunicação seja uma ferramenta fundamental para introduzir novas perspectivas nos processos educativos e repensar os modelos pedagógicos utilizados pelos docentes no ensino. A nova realidade vivida delineia a necessidade de uma nova escola que ultrapasse a tradicional, cuja finalidade era a de transmissora do conhecimento, e contribua para a formação de sujeitos capazes de atuar com competência no meio social. As novas tecnologias, com naturalidade, contribuem para este processo. Por novas tecnologias na educação entende-se: O uso da informática, computador, Internet, CD-ROM, hipermídia, multimídia, e como ferramentas para educação a distância e chats, grupos ou listas de discussão nos correio eletrônico, e outros recursos e linguagens digitais do qual atualmente se dispõe colaboram significativamente para tornar o processo educacional mais eficiente e eficaz na opinião de Moran; Masetto e Behrens (2000, p.152). 76 Quando esses autores fazem referência às tecnologias educacionais, indicam que as ferramentas ou instrumentos disponíveis foram criados para facilitar a prática do processo ensino-aprendizagem. As tecnologias de informação e comunicação promoveram mudanças culturais e sociais e de sentido, sobre as formas tradicionais de comunicação entre os seres humanos, com novos canais para transmitir conhecimento. As redes telemáticas, televisão por satélite, Internet e realidade virtual modificaram os processos de comunicação e aquisição de conhecimentos criando canais de distribuição que oferecem novas possibilidades para a democratização e acesso à formação. Essas tecnologias se caracterizam como pontes de acordo com Moran (2007), e abrem a sala de aula para o mundo. Representam e fazem a mediação do conhecimento do mundo. A lousa sai da parede da sala de aula e passa para a tela do computador que mostra as múltiplas faces do mundo. São diferentes formas de representação da realidade, de forma mais abstrata ou mais concreta, mais estática ou dinâmica, mais linear ou paralela, porém todas elas, combinadas, integradas, possibilitam maior e melhor apreensão da realidade. Propiciam o desenvolvimento de todas as potencialidades do educando, despertando todos os diferentes tipos de inteligências e ampliando a construção do Conhecimento, das Habilidades e Atitudes humanas - CHA. Para Machado (2004, p. 99) não parece haver dúvidas sobre as imensas possibilidades da tecnologia na educação. Os recursos para instrumentalizar a ação do professor, nos diversos níveis de ensino, são cada vez mais numerosos. A inserção Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS das novas tecnologias na educação pode colaborar para que se atenue o atual e caótico quadro das carências pedagógicas nacionais, tendo em vista as múltiplas possibilidades pedagógicas. Na opinião de diversos autores essa ferramenta é mais do que a ponte, uma vez que: O advento das tecnologias de informação e comunicação – TIC trouxe novas perspectivas para a educação principalmente a distância, devido às facilidades de design e produção sofisticados, rápida emissão e distribuição de conteúdos, interação com informações, recursos e pessoas, bem como à flexibilidade do tempo e à quebra de barreiras espaciais conforme Almeida (s/d, p.3). Pode-se dizer que as novas tecnologias são capazes de superar as distâncias e as barreiras para o acesso ao conhecimento. Os recursos técnicos de comunicação sejam eles impressos, de áudio e vídeo, que hoje estão acessíveis a muitas pessoas, têm possibilitado o grande avanço da educação a distância. Eles se converteram em propiciadores da igualdade de oportunidades de acesso ao conhecimento e democratização das possibilidades da educação conforme Rosini, (s/d, p. 5): Universidades, escolas, centros de ensino, organizações empresariais, grupos de profissionais de design e hipermídia lançamse ao desenvolvimento de portais educacionais ou cursos a distância com suporte em ambientes digitais de aprendizagem que funcionam via internet para realizar tanto as tradicionais formas mecanicistas de transmitir conteúdos digitalizados como processos de comunicação multidirecional e produção colaborativa de conhecimento de acordo com Almeida (s/d. p.1). A mediatização realizada por meio das tecnologias pode auxiliar no processo de ensino-aprendizagem e na interação estudantes-estudantes, estudanteseducador, educador-mídia-estudantes, colaborando para o aprendizado. As NTIC’s são instrumentos mediadores entre o homem e o mundo. Na educação podem servir como um mecanismo pelo qual o aluno se apropria de um saber redescobrindo e reconstruindo o conhecimento. São auxiliares do professor na diversificação e dinamização das aulas, fazendo com que o aluno aprenda de forma mais satisfatória. Uma das tecnologias mais utilizadas na educação é o computador. Para Campestrini (2004) “o computador possibilita diversas formas de relação de aprendizagem, pois favorece o enriquecimento das experiências dos indivíduos, colaborando desta forma em seu desenvolvimento”. Para Ferreira (2004, p.22): O uso do computador como ferramenta mediadora do processo de ensinoaprendizagem pode proporcionar mudanças qualitativas na educação, desde que os educadores compreendam, vivenciem, aceitem, flexibilizem as inúmeras possibilidades da ferramenta, adaptando-a de forma a contribuir com a educação. O discurso não pode ficar só na teoria precisa encampar a prática. As novas tecnologias possibilitam o estudo em outros lugares, além das tradicionais salas de aula por meio da tecnologia. Assim, a lousa, a casa, o local de trabalho, e outros espaços educativos se transformaram em espaços de aprendizagem, um lugar a mais para estudar, realizar cursos de formação, pós-graduação, entre outros. Para Calderon, dessa forma: As novas tecnologias podem ter grandes efeitos sobre o desenvolvimento já que superam as barreiras do isolamento social, econômico e geográfico e aumentam o acesso à informação e à educação (Fórum Mundial de Educação, apud CALDERÓN, 2007, p. 3). As tecnologias na educação não pretendem impor-se como um instrumento 77 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS pedagógico por excelência, mesmo porque nenhum meio é capaz, isoladamente, de se tornar eficaz para todos os propósitos do ensino. Faz-se necessário que os educadores tenham uma escolha consciente dentro de certos princípios, que privilegie a aprendizagem dos alunos, e não somente ao modismo. A utilização das novas tecnologias pelos professores deve ter um objetivo maior que é o de melhorar a aprendizagem. As técnicas precisam ser escolhidas de acordo com o que se pretende que os alunos aprendam. Como o processo de aprendizagem abrange o desenvolvimento intelectual, afetivo, o desenvolvimento de competências e atitudes, pode-se deduzir que a tecnologia a ser usada deverá ser variada e adequada a esses objetivos na opinião de Masetto (2000, p.143). Utilizar novas tecnologias não é aprender uma técnica simplesmente, mas aprender sobre a tecnologia. Não basta conhecer o funcionamento das máquinas, porque de nada adiantaria. O constante avanço tecnológico torna o moderno maquinário obsoleto em pouquíssimo tempo. Aprender a utilizar as novas tecnologias diz respeito a compreender e saber utilizar os conhecimentos científicotecnológicos, proporcionados por elas. Sabe-se hoje, com precisão, que a utilização das novas tecnologias no processo de ensino-aprendizagem, colabora com a forma de elaboração do pensamento e a apropriação do conhecimento por parte do aluno que interage com elas. A utilização de novas tecnologias como computador, internet, blogs, deve ser vista como um recurso pedagógico auxiliar na promoção da aprendizagem. Quando 78 utilizados de forma coerente estes recursos podem revolucionar a educação. Além de facilitarem a construção e a ampliação do conhecimento de várias maneiras, agem como potencializadores da ação pedagógica, tendo em vista suas múltiplas possibilidades de trabalho. Acredita-se assim, que a educação e a tecnologia podem fazer uma parceria de sucesso, a inserção das tecnologias na educação possibilita construir uma educação ativa, que contempla as reais necessidades dos alunos inseridos nessa era da informação e da comunicação. No entanto, As instituições educacionais enfrentam o desafio não apenas de incorporar as novas tecnologias como conteúdos de ensino, mas reconhecê-las e partir dessas concepções (que os aprendizes têm sobre estas tecnologias), elaborar desenvolver e avaliar práticas pedagógicas que promovam o desenvolvimento de uma disposição reflexiva sobre os conhecimentos e os usos tecnológicos conforme Liguori (1997, p.85). Sobre isso Kenski (2004, p. 36) também aponta que: O estilo digital engendra, obrigatoriamente, não apenas o uso dos novos equipamentos para a produção e apreensão do conhecimento, mas os novos comportamentos de aprendizagem, novas racionalidades e novos estímulos perceptivos. O seu rápido alastramento e multiplicação, em novos produtos e em novas áreas, obrigam as pessoas a não mais ignorar sua presença e importância. O uso da tecnologia na educação a distância deve tornar-se efetivo, tendo em vista que nos dias atuais é impossível ignorar as mudanças sociais e culturais que vêm atingindo toda a sociedade e, por consequência, a educação. Especialmente quando se sabe que o desenvolvimento dessas novas tecnologias têm posto à disposição da educação alguns recursos que prometem uma renovação Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS metodológica, favorecendo, assim, o processo de ensino-aprendizagem. 3. As novas tecnologias da EAD A educação a distância possui uma série de barreiras que precisam ser ultrapassadas para que o aluno aproveite o máximo do curso, diminuindo o distanciamento p r o f e s s o r- a l u n o . O u s o d e n o v a s tecnologias, por meio da experiência multimidiática (imagética) mais completa, pretende suprir, para o discente, a falta do docente. A presença do texto permite ao discente estudar corretamente o tema que lhe foi proposto pelo docente sem que seja necessária a sua presença, e as dúvidas podem ser tiradas virtualmente. Para se otimizar a ação de um cursos a distância é necessário esforços para que o aluno não saia em desvantagem, em relação aos cursos tradicionais. Nestes em que o contato com o professor é maior referencial. O que possibilita o sucesso do curso á a disciplina do aluno diante das diversas mídias desenvolvidas com excelência para que todos os envolvidos no processo estabeleçam e alimentem o contato virtual. Assim: Desde o surgimento da educação a distância as diferentes tecnologias incorporadas ao ensino contribuíram para definir suportes fundamentais das propostas. Livros, cartilhas ou guias, especialmente redigidos foram propostas iniciais; a televisão e o radio constituíram os suportes da década de 70; os áudios e vídeos, da década de 80. Nos anos 90, a incorporação de redes de satélites, o correio eletrônico, a utilização da internet e os programas especialmente concebidos para os suportes informáticos aparecem como grandes desafios dos programas da modalidade conforme Letwin (2001, p.16). Há pouco tempo, as pessoas tinham dificuldades em realizar cursos, principalmente, os superiores. Com o advento da tecnologia, muitas pessoas mudaram essa situação, já que o uso dos recursos disponíveis na educação pode possibilitar oportunidades para realizar cursos em locais e horários compatíveis com a sua rotina. Hoje a graduação e a pós-graduação são ofertadas na modalidade a distância, com a qualidade do curso presencial. A educação a distância não oferece uma conexão real entre o professor e o aluno, sendo que a separação desses dois elementos atrapalha, muitas vezes, o aprendizado e o desenvolvimento do estudante, que fica impossibilitado de sanar suas dúvidas da maneira correta e para minimizar esses efeitos, mais uma vez, o uso de tecnologias aparece como uma alternativa relevante. Por isso, através das NTIC’s, os estudantes podem consultar diversas bibliografias pela rede mundial de computadores, participar de fóruns por meio de bate-papos, e fazer o seu horário de estudo, sem a necessidade de professores e alunos partilharem dos mesmos espaços geográficos. O professor pode também trabalhar a criação de blogs para fornecer material de instrução; conceituado como um laboratório de escritos criativos, cujo principal objetivo é oferecer à comunidade de escritores e leitores um local virtual onde possam se encontrar e interagir, trocando experiências, motivações, ideias e informações sobre temas de mútuo interesse. Pode-se dizer que essas são algumas das principais vantagens atribuídas ao uso das tecnologias, especialmente na educação a distância, a facilidade do acesso a informação e a rapidez desse processo. Além disso, as NTIC’s auxiliam a mediação pedagógica, 79 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS aumentam a interatividade entre aluno e professor, capazes de levar um mundo de conhecimento para dentro da sala de aula, através de várias formas, principalmente a Internet que vem se desenvolvendo rapidamente. Nesse sentido a utilização do computador, internet, blogs e tecnologias na educação tornam-se fundamentais. Através deles o aluno tem subsídios para construir e ampliar o seu conhecimento, de forma mais crítica e condizente com as demandas impostas pela atual sociedade da informação e da comunicação. O uso das novas tecnologias na educação a distância não se limita ao mero uso de equipamentos, pois se volta para a organização lógica das atividades, de modo que elas possam ser sistematicamente observadas, compreendidas e transmitidas. A utilização de novas tecnologias de comunicação na educação merece total atenção e preparo para que se adeque ao estilo e ao ritmo de aprendizagem dos alunos. 4. Dificuldades encontradas pelos docentes no uso das novas tecnolgias Para minimizar a desvantagem especialmente na educação a distância, o domínio de algumas tecnologias é imprescindível. Muitos professores apresentam resistência para usar aparelhos tecnológicos por diversos motivos. Esses nem sempre têm relação direta com o método de ensino do docente. Muitos não dominam a tecnologia e se recusam a aprender utilizá-la, ignorando os seus benefícios no processo de aprendizagem. Alguns dizem que é modismo - passageiro, outros, que não querem, não gostam ou não conseguem. 80 Integrar as tecnologias no contexto educacional ainda é um processo difícil e desafiador, diante da quantidade de profissionais que não as aceitam como instrumentos auxiliadores das práticas pedagógicas. Embora a TIC seja usada como facilitadora da educação e da formação, existe um grande abismo entre o seu potencial e que dela se pratica. Mesmo na instituição que possui; de fato, a TIC é subutilizada nos mais diversos contextos da educação formal de acordo com Junior e Coltinho (2007, p.8). Neste contexto se divide a responsabilidade. A maior parte das escolas não investe na formação do professor e os alunos, muito limitados no seu uso, acabam abandonando a escola por vergonha de serem vistos, utilizando de forma medíocre. A resistência, por parte dos profissionais da educação, muitas vezes, ocorre pela falta do conhecimento sobre a operacionalização. E como a aprendizagem se dá pela prática repetidamente, por falta de tempo ou interesse eles abandonam o processo de ensino-aprendizagem. Resulta desse processo a perda do docente e dos discentes. A incorporação de novas tecnologias na prática de sala de aula, muitas vezes é acompanhada pela crença docente, de que elas podem substituir os docentes. Como é o professor quem define quando, porque e como utilizar o recurso tecnológico a serviço do processo de ensinoaprendizagem não há como interferir. Ninguém pode ajudá-lo e todos saem perdendo. Ele é o responsável pelos processos que o seu ato desencadeia na construção do conhecimento dos discentes, e nesse sentido ele é insubstituível. Ás vezes é necessário explicitar aos docentes Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS que os recursos tecnológicos não substituem o professor e, muito menos, os processos criativos do próprio estudante, na construção do conhecimento. A tecnologia é um recurso potencializador da ação pedagógica, porque traz contribuições para atividade de ensino e para o processo de aprendizagem dos alunos. O responsável por planejar e desenvolver situações de aprendizagem e pela escolha didática das disciplinas com que irá trabalhar continua sendo o professor. A esse respeito Papert (1988, p. 21), afirma que: As tecnologias da comunicação não substituem o professor, mas modificam algumas das suas funções. A tarefa de passar informações pode ser deixada aos bancos de dados, livros, vídeos, programas em CD. O professor se transforma agora no estimulador da curiosidade do aluno por querer conhecer, por pesquisar, por buscar a informações mais relevantes. Num segundo momento, coordena o processo de apresentação dos resultados pelos alunos. Depois, questiona alguns dos dados apresentados, contextualiza os resultados, adapta-os a realidade dos alunos, questiona os dados apresentados. Transforma informação em conhecimento e conhecimento em saber, em vida, em sabedoria. Doll (1999, p. 60) também retrata algumas angústias do corpo docente em relação á utilização da internet na educação, que se resume em: • Interferência do ensino informal na rede formal de ensino (legitimação do discurso leigo pela comunidade virtual); • Des-hierarquização das fontes de conhecimento, com uma predominância da multireferencialidade; • Autodidatismo, através das diversas janelas da rede; • Temor infundado, que alguns educadores possuem da substituição do professor pela máquina e da falta de preparo técnico para lidar com o equipamento. Aliado a esta questão, está o fato de que, frequentemente, o corpo discente possui muito mais conhecimento ou predisposição do que o corpo docente para adquirir o manejo das redes de computadores. Isso faz com que o corpo docente questione e redimensione as suas funções contemporâneas. Conforme apontado por Kant (2011) “Pensamentos sem conteúdos são vazios; intuições sem conceitos são cegas”. A informação sozinha não produz conhecimento, mas a informação baseada em conceitos e práticas pode produzir conhecimento e o detentor desse binômio é o docente. Isso deixa claro a indisposição deles com relação ao uso de NTIC`s, quando vistas como ferramentas de informação. No que diz respeito ao respaldo do conhecimento adquirido em rede, as instituições que regem a vida real já começam a avançar e reconhecer o ciberespaço, como por exemplo, a ABNT, que regulamentou as normas de citações de documentos obtidos em rede para trabalhos científicos. Além disso, textos e documentos científicos virtuais sempre trazem o nome do autor com os títulos acadêmicos, e remetem, ao site da universidade na qual o autor está credenciado. Cabe ressaltar, que muitos professores usam os recursos tecnológicos de forma insuficiente, minimizam a sua potencialidade de uso e aplicação. De nada adianta a instituição possuir as tecnologias mais modernas se o professor não estiver preparado para utilizá-las. O grande impasse é que o professor em formação aprende apenas como usuário, entretanto, 81 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS como profissional, o mesmo terá de adquirir conhecimentos técnicos em informática nos quais talvez não esteja interessado, por não se sentir confortável na sua utilização, além de ter que decidir como adequar o uso da informática aos seus objetivos. Portanto, é urgente incorporar a tecnologia na vida do educador, porque é este que a insere na vida do educando. A idade do corpo docente, assim como os métodos que não incluem o uso de tecnologias é resultante do tradicionalismo e anacronismo de alguns professores em relação ao uso de máquinas no processo de ensino. Esses acreditam que os equipamentos interferem no processo de aprendizagem e deve manter uma relação apenas entre o professor e o aluno. Retrógrados não enxergam as tecnologias como ferramenta de auxílio, e sim como um obstáculo no processo de ensino-aprendizagem do aluno. Os educadores devem tornar esse processo mais significativo e atual para os alunos. O aspecto tecnológico é sempre novo porque está em permanente transformação. Para acompanhá-lo, os profissionais precisam constantemente (re)qualificar-se, (re)adequar-se e atualizar para manter-se habilitado ao uso. Esta é a condição de sobrevivência no contexto do seu trabalho, que é a formação pessoal e profissional do aluno. A significativa dificuldade apontada por muitos docentes, em relação ao uso das novas tecnologias na educação, seja presencial ou a distância, é o fato de que elas exigem do docente uma grande carga horária de trabalho maior que a habitual. Essa carga horária não refere a “aula”, mas ao fato do docente obrigatoriamente ter 82 que participar em tempo real com os alunos, fora do seu horário de aula de chats para tirar dúvidas, responder e-mails, ler, corrigir e dar devolutivas das atividades virtuais enviadas. Na EAD isto é imprescindível em função da distância deste para orientá-los nas dificuldades. Mesmo assim, muitos alunos reclamam que não conseguem sanar as suas dúvidas em função da demora do retorno do professor. Essa demora que os alunos apontam se deve ao grande número de alunos adeptos dessa modalidade de ensino ligados a um professor que na modalidade EAD é conhecido como tutor. O valor pago pela hora aula virtual é menor que a presencial e o professor trabalha em casa com os seus equipamentos tecnológicos a sua internet, sua energia. Ele compromete a sua relação familiar e a sua qualidade de vida, porque o número de alunos é superior àquele possível de ser atendido individualmente como exige o processo a distância. As instituições de ensino, em sua maioria, não reconhecem as dificuldades docentes, não os qualifica nem atualiza, não fornece equipamentos – notebooks pessoais, ou laboratórios com equipamentos e provedores que comportem a demanda e agilizem o trabalho. Essas dificuldades associadas transformam um fator que poderia ser positivo em negativo, para professores e alunos ligados pela tecnologia na educação a distância. 5. A formação do professor Ao serem aplicadas à educação, as tecnologias exigem cuidadoso planejamento e tratamento específico que Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS vão além da disponibilidade de equipamentos. É importante compreender que os desafios da educação a distância são congruentes com os desafios do sistema educacional em sua totalidade, cuja análise implica em reflexão sobre o que a educação pretende realizar, a quem se dirige, com quem será desenvolvida, com o uso de quais tecnologias e quais as abordagens mais adequadas para acelerar o processo de inclusão social da população brasileira (PAULEK, 2010, p. 1). A partir desse apontamento deve-se considerar, entre outros tantos fatores, o grupo ao qual se destina os objetivos visados, o grau de interação pretendido, o espaço, o tempo e os recursos disponíveis. Para utilizar novas tecnologias na educação a distância, é necessário que o docente tome cuidado para não reproduzir a forma tradicional de ensino nos novos equipamentos tecnológicos e vice-versa. Novas tecnologias e velhos hábitos de ensino não combinam conforme opinião de Messa (2010), que afirma ser necessário pensar, em qualquer modalidade de ensino. Não importa que a educação seja presencial ou a distância, é preciso refletir sobre “o tipo de formação se deseja desenvolver, que tipo de alunos se pretende formar, e quais tipos de tecnologias irão se enquadrar na proposta educativa das instituições de ensino”. A introdução das tecnologias nas novas formas de aprendizagem exige novas competências, e formas de se realizar o trabalho pedagógico. Isso significa “formar continuamente o professor para atuar com os alunos neste ambiente em transformação acelerada” (MERCADO, 1998). Se a instituição tiver os recursos tecnológicos adequados e souber explorar o potencial de cada professor, ambos promoverão a construção do conhecimento e facilitarão o processo de ensinoaprendizagem. O uso das ferramentas multimídia depende dos professores, se a maioria não utilizá-la em seu método de ensino a tecnologias que tanto beneficiam o aluno, o processo de aprendizagem se perde e perde a qualidade da educação. Brito e Purificação (2006, p.26) destacam “a importância da reflexão do professor sobre a sua ação escolar”. É dele a responsabilidade por elaborar e operacionalizar os projetos educacionais com a inserção das novas tecnologias da informação e da comunicação. Autores como Papert (1988); Levy (1996); Pretto (1996); Moran (1998) fazem parte daqueles que defendem a incorporação de novas tecnologias na educação, mas acreditam que a utilização da máquina, por si só, não representa mudança. É importante ressaltar que a mera introdução dessas tecnologias e o seu uso na educação não vão garantir o sucesso do processo de ensino-aprendizagem: sem o professor elas não resolverão os problemas enfrentados no ensino, pois são apenas instrumentos, mesmo que sejam significativos e favoreçam a aprendizagem. É importante não esquecer que a tecnologia possui valor relativo: ela só terá importância se for adequada para facilitar o alcance dos objetivos e se for eficiente para tanto. As técnicas não se justificarão por si mesmas, mas pelos objetivos que se pretenda que elas alcancem que no caso, serão de aprendizagem na concepção de Moran; Masetto e Behrens (2000, p. 144). Utilizar as tecnologias de informação e comunicação, como suporte para a educação a distância, somente colocando o aluno diante de informações, problemas e objetos de conhecimento, pode não ser suficiente para envolvê-lo e despertar-lhe motivação pela aprendizagem. É preciso que ele crie procedimentos pessoais que 83 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS permitam organizar o próprio tempo para estudos e participação nas atividades, independente do horário ou local em que se encontre (ALMEIDA, s/d, p.4). Quando utilizadas corretamente como instrumento significativo para favorecer o ensinoaprendizagem, as novas tecnologias poderão criar situações de aprendizagem motivadoras e envolventes como aponta Brito. A integração das tecnologias com a educação, o professor e aluno, deve estar aberto as mudanças e novos paradigmas, os quais o obrigarão a aceitar a diversidade, com atenção as exigências impostas pela sociedade que se comunica através de um universo cultural cada vez mais amplo e tecnológico, (BRITO e PURIFICAÇÃO, 2006, p.25). As tecnologias tanto servem para reforçar uma visão conservadora, individualista, como uma visão progressista. A pessoa autoritária utilizará o computador para reforçar ainda mais o seu controle sobre os outros. Mas, uma mente aberta, interativa, participativa, encontrará nas novas tecnologias ferramentas capazes de ampliar as interações. As intenções se materializam em práticas de transformação que, serão verdadeiras na medida em que se perceba que todos podem e devem contribuir na mudança. Independentemente da posição que ocupem na hierarquia de poder dentro da educação poder-se-á construir uma educação realmente eficiente para o aluno. Não se esquecendo da cuidadosa reflexão por parte de todos os que compõem a comunidade escolar. Para que as novas tecnologias no meio educacional possam, de fato, contribuir para a formação de indivíduos competentes, críticos, conscientes e preparados para a realidade em que vive se faz necessário repensar e reelaborar a sua utilização. 84 A mudança dessa realidade exige por parte da instituição, investimentos massivos em capacitação inicial, continuada e ao longo da vida, que promovam meios necessários para os professores “desenvolverem todas as suas potencialidades como mediador do conhecimento, só que agora com o auxilio das NTIC – novas tecnologias da informação e comunicação” de acordo com Mercado (2006, p. 18). Atualmente, conforme o autor, as novas tecnologias têm significativa participação nos diversos ramos da atividade humana. Ela se torna indispensável nas áreas em que está inserida A educação é uma delas e nela tem um importante papel relativo ao processo de aprendizagem. Na sociedade educacional brasileira, a presença das novas tecnologias é relativamente recente e está em processo de adaptação, embora pela sua característica de permanente transformação exija constante adaptação. As pessoas estão sempre aprendendo a conviver com as NTIC. Se todos os professores estiverem engajados neste propósito de aprendizagem adaptação, sem exceção, certamente será possível oferecer oportunidades para a aprendizagem e o desenvolvimento do aluno brasileiro. 6. Considerações Finais O objetivo da investigação foi observar o uso de novas tecnologias pelos docentes no processo de ensino e verificar os seus problemas na prática. Neste percurso com os autores escolhidos resvalou-se nos benefícios proporcionados pelo uso das tecnologias multimidiáticas no processo de ensino, especialmente, na educação a Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS distância. Foi possível compreender o motivo pelo qual grande parte dos professores resiste ao uso dessas tecnologias no processo de ensinoaprendizagem. Com base nas reflexões que foram aqui tecidas, utilizando-se do referencial teórico, constatou-se que a utilização das novas tecnologias no meio educacional é imprescindível, porque elas oferecem uma vasta gama de vantagens para o processo de ensino-aprendizagem. Cabe destacar aqui que o uso das novas tecnologias, no contexto educativo, apresenta efeitos positivos na aprendizagem dos alunos, desde que as metodologias aplicadas sejam adequadas. A utilização da ferramenta e da metodologia, sem uma proposta coerente, não garante eficácia na construção do conhecimento, por isso é preciso que os professores estejam preparados para trabalhar com essas novas tecnologias educacionais que se renovam e se aceleram permanentemente. As vantagens trazidas pelo advento das novas tecnologias tornam-se mais evidentes no contexto da educação a distância. Nesta perspectiva, elas são capazes de romper as barreiras físicas, auxiliando a interação entre professor e aluno. No entanto concluiu-se que muitos docentes não utilizam as novas tecnologias por despreparo para lidar com os aparatos tecnológicos, que se desdobra em várias alternativas de resistência. Pela crença de que podem ser substituídos por estas tecnologias; por não dominarem a técnica em consequência da falta de recursos próprios e não recebê-las das instituições; por vergonha de demonstrarem que não sabem; por serem resistentes a novos aprendizados e a modernidade; por considerarem que isso é modismo; porque a carga de trabalho virtual é muito maior que a presencial, porque a remuneração é menor para o trabalho virtual, embora gere custo para o professor que precisa adquirir equipamentos e provedores; por não receberem incentivos nem reconhecimento por este trabalho que levam para a casa e para a vida; ou por resistência de quebrar paradigmas simplesmente. A resistência de muitos se deve à idade, eles tiveram na formação uma base teórica sólida e encontram dificuldades de ver no uso dessas tecnologias vantagens para o processo de ensino-aprendizagem. A proposta da pesquisa atingiu o seu objetivo no sentido de promover discussões que viabilizem reflexões dirigidas ao desenvolvimento da pesquisa e contribua para que os professores, e os futuros professores se cerquem das novas tecnologias na educação, incluindo-as na sua rotina, considerando como facilitadora dos novos tempos no processo de ensinoaprendizagem. Referências Bibliográficas ALMEIDA, M. E. B. de. Tecnologia e educação a distância: abordagens e contribuições dos ambientes digitais e interativos de aprendizagem. Disponível em http://www.imed.edu.br/ files/contents/9. PDF. Acesso em 2/09/2011. 85 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS BRITO, G. PURIFICAÇÃO, I. Educação e tecnologias: um (re)pensar. Curitiba: IBPEX, 2006. CALDERÓN, G. C. 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Assim surgem novos conceitos sobre trabalho e emprego, bem como a necessidade de uma nova postura do trabalhador nesse mercado. Aquele trabalhador braçal, muito valorizado durante os séculos XIX e XX está com dificuldades para encontrar um ofício, já que hoje, são valorizados aqueles que dominam plenamente tecnologias e que são, principalmente, criativos. Por fim, a proposta deste texto é mostrar as transformações que advêm dessa nova revolução e refletir, com base empírica, sobre a nossa estrutura de ensino. Palavras-chave: Tecnologia. Educação. Mercado de trabalho. Jovem. 2. Metodologia 1. Objetivo O trabalho procura problematizar as relações entre o jovem, o sistema de ensino/aprendizado e o mercado de trabalho, cuja dinâmica, ora provoca desequilíbrios sociais e econômicos, ora, busca conjuntamente alternativas para superar desafios. 1 A fim de permitir uma análise comparativa entre a realidade do sistema de ensino brasileiro e de outros países, foi considerada como fonte de informação a base de dados da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura – UNESCO. No contexto brasileiro, outras três bases de dados foram usadas: a primeira menciona o número de Luciano Schmitz Simões é doutorando em Sociologia pela PUC/SP. 88 Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS vistos de trabalhos emitidos pelo Ministério das Relações Exteriores para estrangeiros que vieram trabalhar no país nos últimos anos. A segunda base é do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA, que aponta o número de jovens que trabalham para complementar renda no Brasil. Por último, considero os dados no MEC/INEP para mostrar a discrepância entre os números de matriculados e concluintes do ensino superior no Brasil. Ainda assim, a contextualização do texto será feita com base no trabalho de Manuel Castells, bem como, em trabalhos de autores como Carlos Benedito Martins. 3. As tecnologias As mudanças tecnológicas estão nos levando a uma reflexão sobre o conjunto em que as instituições de ensino superior público e privado estão estruturadas para oferecerem qualificação ao futuro jovem trabalhador. O papel destas instituições tornou-se fundamental para acompanhar e antecipar-se às transformações tecnológicas, já que este processo é irreversível em tempos de modernização e automatização de serviços e produtos, pois ele não aceita rotinas ou qualificações obtidas pelo esforço repetitivo do trabalhador. Essas novas exigências de mercado, muitas vezes já suplantam métodos ineficientes e ultrapassados dos sistemas formais de educação sugeridos pelos Estados, fazendo com que empresas do setor privado invistam, independentemente, na formação, bem como, na atualização técnica e cognitiva de jovens funcionários. Na verdade, essas mudanças se processaram velozmente nos últimos 20 a n o s . Tu d o p o r q u e o m o d e l o d e industrialização sofreu grandes adaptações, a fim de acompanhar o cenário globalizante da economia, provocando efeitos sociais irreversíveis, como a eliminação de muitos postos de trabalho. No caso do Brasil, por exemplo, a liberalização do comércio fez com que a produção fosse internacionalizada e, assim, aumentasse a concorrência entre empresas e países, estabelecendo novas exigências profissionais que até então não eram conhecidas. Essas novas exigências modificaram a estrutura do mercado de trabalho e obrigaram instituições de ensino público e privado a repensarem o papel do trabalhador neste novo contexto. Porém, a adaptação deste segmento é lenta, provocando um descompasso entre o ensino e as novas exigências deste mercado. Geralmente, o resultado desse processo é uma crise no emprego formal que, para ser evitada, devem-se mobilizar ações tripartite2, com o envolvimento de vários atores sociais, a fim de buscar soluções mais efetivas para lidar com tais transformações. Enfim, esta é uma época em que antigos e novos trabalhadores experimentam grande instabilidade profissional em função das novas mudanças nos processos produtivos, que afetam diretamente o mercado de trabalho e, sobretudo, o jovem que está iniciando sua vida profissional. 2 Baseado na Declaração Tripartite da Organização Internacional do Trabalho – OIT, que é composta pelos três principais atores do mercado de trabalho: representantes de entidades dos trabalhadores, empregadores e governo. 89 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS De fato, devemos reconhecer que esta sempre foi a dinâmica do capitalismo, em que as tecnologias surgem repentinamente para otimizar os processos produtivos e que, em alguns momentos, substituem por completo o trabalhador. Castells (2007), porém, acredita que esta mesma dinâmica do capitalismo contemporâneo, baseada na tecnologia da informação, está abrindo novos postos de trabalho, numa proporção jamais vista em qualquer outro momento da história, não existindo, contudo, instituições de ensino e tampouco mão-deobra qualificada capazes de acompanhar estas mudanças. É deste último ponto que surge o grande problema para o autor: a deterioração nas condições de trabalho, cujas consequências são a precarização e a exclusão social. Essas características são bastante comuns em países que não conseguem acompanhar plenamente esta revolução tecnológica, em que indivíduos e até mesmo grupos inteiros de profissionais ficam com sua atuação limitada no mercado de trabalho por não existir mais oferta de determinadas funções para a aplicação de sua especialização técnica profissional. Neste caso, a tendência destes indivíduos é submeter-se a qualquer tipo de atividade para garantir minimamente a sua sobrevivência. É neste sentido que Castells vai definir a forma atual de exclusão social, sendo para ele: [exclusão social] um processo pelo qual certos indivíduos e grupos são impedidos sistematicamente de ter acesso a certas posições que lhes permitiram uma subsistência autônoma dentro dos níveis sociais determinados pelas instituições e 90 valores de um contexto dado. Em circunstâncias normais, no capitalismo informacional, esta posição costuma associar-se com a possibilidade de obter um trabalho remunerado relativamente regular ao menos a um integrante de uma unidade familiar estável. De fato, a exclusão social é o processo que desqualifica uma pessoa como trabalhador no contexto do capitalismo. (CASTELLS, 2007, p. 187) Isto é, a variável “desqualificação” provocada pela introdução da nova tecnologia. Para Castells, caracterizará o movimento possível de excluir,do mercado de trabalho, parcelas cada vez mais numerosas da população. E isto representa uma agressão ao estatuto universal da condição humana, cujo instrumento sugere igualdade, equidade e cidadania. Talvez, se estados-nações investissem mais recursos na formação de seus cidadãos, provavelmente poderíamos retardar ou nem passar por esta situação. Porém, não é isso que se percebe quando consideramos alguns números. Dados da UNESCO mostram que, em média, os países gastam aproximadamente 0,97% do PIB com o ensino superior. O Brasil se encontra ligeiramente acima da média, com 1% do PIB investido, superando inclusive muitos países já desenvolvidos na área da educação (Tabela 1). Mas na prática, este investimento não tem o mesmo retorno, uma vez que, o valor investido por estudante (ver tabela 2) não assegura necessariamente uma educação formal com qualidade e a garantia do ingresso desta população no mercado de trabalho em posições profissionais, que correspondam todo este investimento. Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS Tabela 1 Tabela 2 Despesa pública com educação superior como proporção do PIB (2003) Gasto com educação superior por estudante (2003) Países Alemanha Ensino Superior 1,2 Argentina Brasil Chile Coréia Espanha EUA França India Itália Japão México Portugal Reino Unido Suíça Média 0,6 1 0,5 0,6 1 1,5 1,2 0,7 0,8 0,6 1 1,1 1,1 1,6 0,97 Fonte: UNESCO (2003) – Elaborada pelo autor. No caso do Brasil, a tabela aponta a ineficiência do nosso sistema de ensino, no qual, mesmo havendo gastos parecidos com o de países já avançados neste quesito, não conseguimos garantir boa formação técnica/intelectual do nosso aluno, a ponto de prepará-lo adequadamente para este mundo em transformação. Por outro lado, o nível de escolaridade deste público está nitidamente maior, se comparado à escolaridade do adulto. Segundo relatório da OIT, “enquanto 41% destes [adultos] tinham de 0 a 4 anos de estudo, esse mesmo percentual caía para 3 Países Alemanha Ensino Superior (US$/ ano) 11.594 Argentina Brasil Chile Coréia Espanha EUA França Índia Itália Japão México Portugal Reino Unido Suíça Média 2.896 10.054 7.011 7.089 8.943 24.074 10.704 2.243 8.764 11.556 5.774 7.200 11.866 25.900 10.378 Fonte: UNESCO (2003) – Elaborada pelo autor. 11,9%, no caso dos jovens de 15 a 24 anos. (...) Os dados mostram [também] que a juventude atual tem feito um maior investimento em educação formal, um reflexo da demanda do mercado de trabalho por níveis de educação mais elevados” (2009: p. 27). Entretanto, é importante destacar que, apesar do jovem brasileiro passar mais tempo na escola nos últimos anos, dados da UNESCO3 demostram que, entre 1999 e 2007, a expectativa do nosso aluno em permanecer na escola caiu 0,3 pontos, passando de 14,1 para 13,8 anos de estudo, conforme aponta a tabela 3. Global Education Digest 2009: Comparing Education Statistics Across the World, p. 158 – 162. 91 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS Tabela 3 Expectativa de vida na escola 4 (em anos) 1999 2007 Alemanha N.D. N.D. Argentina 14,3 15,4 Brasil 14,1 13,8 Chile 12,8 14,5 Coréia 15,3 16,9 Espanha 15,8 16,2 EUA 15,7 15,8 França 15,7 16,2 Índia 8,4 10 Itália 14,7 16,5 Japão 14,4 15 México 11,8 13,6 Portugal 15,7 15,4 Reino Unido 15,9 15,9 Suíça 14,7 14,9 Média 14,2 15,0 Fonte: UNESCO, 2009 – Elaborado pelo auto. Mas vale lembrar que, apesar de tudo, o país está vivendo um bom momento econômico nos últimos anos, colaborando para uma taxa de desemprego muito baixa comparado com alguns países da Europa, como a Espanha5, por exemplo. Entretanto, mesmo com este cenário econômico favorável, o mercado agora está percebendo que não existe profissional capaz de assumir funções mais complexas, isto é, que requerem maior nível intelectual. Segundo o Ministério do Trabalho, o Brasil está importando cada vez mais mão-de-obra especializada, já que o número de vistos de trabalho concedidos para estrangeiros, que vieram atuar no Brasil, aumentou 19,4% entre 2010 e 2011. Este, talvez, seja mais um indicador de que não estamos formando profissionais qualificados. Enfim, as consequências desta combinação são grandes, pois sem uma formação adequada e um mercado de trabalho global competitivo, o jovem estará naturalmente em desvantagem para obter uma chance, a fim de comprovar suas habilidades profissionais. É exatamente sobre este ciclo que Castells (2007) se refere na introdução deste texto. Ele chama a atenção para a falta de capacidade das instituições em geral, especialmente aquelas responsáveis pela elaboração de programas de políticas públicas em educação, em acompanhar na mesma velocidade as transformações tecnológicas geradas pela competitividade. Isto é, o esforço necessário para este acompanhamento precisa ser gigantesco, pois se deve considerar desde a capacitação docente até a operacionalização de uma estrutura de ensino que desperte efetivamente o interesse do aluno na busca de um conhecimento crítico/analítico. Por fim, Castells (2007) afirma que, como resultado desse desinteresse na formação, jovens trabalhadores se submeterão a empregos que necessitam de menos qualificação, gerando a precarização e subalternização do trabalho em função desta nova ordem mercantilista. Isso ocorre, principalmente, 4 Notas: (1) Os países selecionados competem com o Brasil em termos econômicos. (2) Alemanha, China, Rússia e Turquia não tem dados computados no referido relatório. Segundo a Pesquisa Mensal de Emprego do IBGE, a taxa de desempregados jovens está atualmente em 14,5%. Na Espanha esta taxa está em 46% e a média mundial em 12,6%, segundo dados da Organização Internacional do Trabalho – OIT. 5 92 Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS entre os alunos de famílias pobres e temos dois grandes motivos para considerar: o primeiro porque, na maioria das vezes, são eles os responsáveis pelo complemento familiar; e, o segundo, por não encontrar na escola o meio ideal para a sua formação técnica/intelectual. Estes jovens que trocam desde cedo as salas de aula pelo trabalho, mal conseguem uma inserção profissional que garanta um futuro mais promissor em termos de renda6. Além do mais, as formas mais eficazes de inserção de jovens no mercado de trabalho costumam acontecer somente no topo da pirâmide social, isto é, para uma parcela muito pequena de estudantes se comparada ao total de estudantes que ingressam na vida acadêmica. No gráfico 1, podemos observar quantos alunos, de fato, ingressam e concluem o ensino de nível universitário. Gráfico 1 Evolução matrícula/concluinte no ensino superior (2000 – 2010) Fonte: Censo da Educação Superior – MEC/INEP – Elaborado pelo autor. Por fim, há de se considerar que somente a educação não garantirá uma ocupação e nem resolverá o problema do desemprego. Como já mencionado no desenvolvimento do texto, esta solução depende também de um quadro econômico favorável, bem como, de variáveis demográficas e de incentivos do setor público e privado. Porém, em termos de probabilidade, uma educação com qualidade àquele que teve acesso, pode ser decisiva no momento de se conseguir uma ocupação no mercado de trabalho (CORBELLINI, 2004). Isto é, baseado na lógica de estudo-emprego, este sistema obriga não só um esforço maior do estudante que vem de camadas mais baixas da sociedade, como também, do trabalho redobrado de instrutores e docentes no 6 Segundo o IPEA a taxa de desemprego entre os pobres é, em média, 5,2 vezes maior que a taxa de desemprego para quem não se encontra em situação de pobreza. 93 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS incentivo e motivação destes jovens profissionais. Nesse sentido, conforme observado por Martins (2000, p. 47), [...] o ensino superior assumiu, nesse momento, maior visibilidade para determinados setores das camadas médias urbanas, mais desprovidas de capital econômico e/ou de capital cultural, que viam nele um possível campo de manobra para colocar em prática suas estratégias de reconversão para obter melhores posições materiais e/ou simbólicas. Essa demanda foi absorvida, em parte, por uma relativa expansão do ensino público e, em maior escala, pelo setor privado, que apresentou um acentuado crescimento nessa época. Mas para que a educação do ensino superior ocorra de uma forma mais homogênea entre todos os tipos de instituições, algumas perguntas deverão ser feitas, como, por exemplo: 1. Qual seria o novo papel do Estado em relação às instituições de ensino? 2. Considerando este novo contexto da globalização, qual deve ser a relação adotada entre o educador e o educando? 3. Uma nova metodologia, talvez mais adequada ao contexto econômico global, deve ser pensada na formação dos jovens? De certa maneira e corroborando com Castells (2007), Martins (2000, p. 57) afirma que, [...] este novo cenário da expansão deve combinar, mais do que nunca, o aumento da capacidade de atendimento do sistema à maior qualificação acadêmica. Essa dinâmica se soma a outra, presente no mercado de trabalho, cada vez mais exigente e seletiva quanto ao perfil dos profissionais que se dispõe a empregar, aliado ao progressivo esgotamento dos segmentos do mercado mais interessados em profissionais de nível superior com perfil diferenciado. 94 Assim, podemos considerar que as respostas para cada pergunta acima perpassam, necessariamente, pela aplicação de uma nova metodologia, cujo elemento deve considerar a tecnologia, que já faz parte integral de nossas vidas e da formação destes jovens. Porém, deve estar claro que acessos à internet, bons computadores, entre outros instrumentos tecnológicos, bem como estruturas em boas condições de uso, não vão garantir a qualidade do processo de ensino/ aprendizado sem o papel de um educador também bem qualificado. 4. Considerações Finais Percebe-se que muitos especialistas têm escrito sobre a força da tecnologia em decidir os rumos da economia de mercado e, principalmente, os rumos do mercado de trabalho. Para reforçar essa tese, boa parte dos responsáveis pela elaboração de programas de políticas públicas dizem que os jovens, por exemplo, devem começar desde já a se preparar para um mundo totalmente interligado, com elevadíssima produtividade e com processos altamente automatizados. Por outro lado, um número crescente de críticos desta “nova revolução”, questiona a eficiência do atual e, principalmente, do futuro processo de desenvolvimento e capacitação destes jovens, uma vez que, cada vez mais se observa o deslocamento constante e repentino da tecnologia de uma parte para a outra do mundo, bem como, a perda de emprego e a consequente precarização do trabalho deste grupo social numa determinada região do planeta. Por fim, cabe aos muito bem organizados movimentos sociais de Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS resistência às mudanças acompanhar mais de perto a implementação dessas forças tecnológicas e de mercado, pois assim seria possível fornecer tempo para a sociedade refletir e absorver as novas formas de relação do trabalho de uma maneira mais homogênea. Neste sentido, também poderíamos evitar a corrosão da capacidade do estado em administrar eficazmente seus programas de políticas públicas de educação, a fim de garantir ao jovem trabalhador e a outros cidadãos meios para acompanhar todas essas mudanças. Referências Bibliográficas BRASIL. Ministério da Educação. Censo da Educação Superior, em 28 de junho 2012. _______. Ministério do Trabalho e Emprego, em 28 de junho de 2012. CASTELLS, M. Era da informação: a sociedade em rede. V. 1. 10 ed. São Paulo: Editora Paz e Terra: 2007 CORBELLINI, M. L. Empreededorismo juvenil: caminhos e travessias. Pontíficia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo: 2004. IPEA. A desigualdade no desemprego no Brasil metropolitano. Brasília: 2009. MARTINS, C. B. O ensino superior brasileiro nos anos 90. São Paulo: Perspectiva. Vol.14 no.1 São Paulo jan./mar, 2000 OIT. Trabalho Decente e Juventude. Brasília: 2009. UNESCO. World Education Indicators Programme, 2003. 95 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS 1234 Otávio Roberto Jacobini1 Denise Helena Lombardo Ferreira2 Celso Ribeiro Campos3 Maria Lúcia Lorenzetti Wodewotzki4 A modelagem matemática como instrumento de interação entre aprendizagem curricular e reflexões críticas na sala de aula de estatística Recebido em: 17/11/2012 - Aprovado em: 22/11/2012 - Disponibilizado em: 26/12/2012 Resumo Neste artigo buscamos mostrar a associação entre aprendizagem curricular de conteúdos estatísticos e reflexões críticas decorrentes dos trabalhos investigativos intrínsecos aos cenários pedagógicos centrados na modelagem matemática. Inserimos este estudo no campo da Educação Estatística Crítica e após algumas considerações teóricas sobre a interface existente entre as competências estatísticas (a literacia, o pensamento e o raciocínio estatísticos) e a modelagem matemática, apresentamos um ambiente de modelagem matemática construído em uma sala de aula de Estatística. Com base nesse ambiente, mostramos a potencialidade pedagógica dos projetos de modelagem matemática, caracterizada de um lado, por contribuições do coletivo em benefício do processo de ensino e de aprendizagem, pela valorização da busca da informação, pela percepção do aluno da relevância da disciplina na sua formação intelectual e profissional, e pela compreensão da realidade ao seu redor. E, de outro lado, tal como preconizado por Skovsmose em seus trabalhos sobre a Educação Matemática Crítica, pelas valorizações da crítica e da criatividade do aluno (e, consequentemente, do seu crescimento político e social), e da contribuição dos projetos de modelagem para as reflexões intrínsecas a todos os momentos vivenciados por ele. Concluímos o artigo, refletindo sobre as possibilidades pedagógicas oferecidas pela associação dos assuntos inerentes aos temas dos projetos de modelagem com fatos discutidos pela 1 Otávio Roberto Jacobini é Doutor em Educação Matemática (UNESP/Rio Claro, 2001), é professor da Faculdade de Matemática do CEATEC/PUC-Campinas. Rod. D. Pedro I, Km 136 – Parque das Universidades, Campinas/SP – CEP 13086-900. e-mail:[email protected] 2 Denise Helena Lombardo Ferreira é Doutora em Educação Matemática (UNESP/Rio Claro, 2000), é professora da Faculdade de Matemática do CEATEC/PUC-Campinas. Rod. D. Pedro I, Km 136 – Parque das Universidades, Campinas/SP – CEP 13086-900. e-mail: [email protected]. 3 Celso Ribeiro Campos é Doutor em Educação Matemática (UNESP/Rio Claro, 2007), é professor da FEA/PUC-SP, São Paulo, SP, Brasil, R. Monte Alegre, 894, Perdizes, São Paulo/SP – CEP 05014-901.e-mail: [email protected]. 4 Maria Lúcia Lorenzetti Wodewotzki é Livre docente em Estatística Aplicada à Educação (UNESP-Rio Claro, 1998), é professora da Pós Graduação em Educação Matemática, UNESP-Rio Claro. Av. 24A no.1515 - Bela Vista, Rio Claro/SP CEP 13506-900. Coordenadora do GPEE, Rio Claro, SP, Brasil. e-mail:[email protected]. 96 Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS imprensa, romanceados pela literatura e mostrados em filmes e em documentários. Palavras-chave: Modelagem matemática. Conteúdos estatísticos. Educação estatística crítica. Críticas e reflexões. Abstract In this article we have as purpose to show the association between learning curricular statistical content and critical reflections resulted from the investigative work closely related with the pedagogical scenarios focused on mathematical modeling. We insert this study in the field of Critical Statistics Education and after some theoretical considerations about the interface between statistical competencies (literacy, thinking and reasoning) and mathematical modeling, we present a mathematical modeling environment built on a Statistics classroom. Based on this environment we showed the pedagogical potential of mathematical modeling projects characterized on the one hand, by 1. Introdução É crescente o número de pesquisas que abordam o ensino e a aprendizagem de conteúdos estatísticos na escola. Muitas dessas pesquisas mostram a importância do trabalho com projetos, com particular destaque à presença da modelagem matemática, nas aulas de Estatística (Campos; Wodewotzki; Jacobini, 2011; Mendonça; Lopes, 2010; Andrade, 2008) e, concomitantemente, do papel da mídia (jornais, revistas, televisão e Internet) como fonte de fornecimento pedagógico de contributions of the collective at benefiting the process of teaching and learning, by valorization of information searching, by students' perception of the importance of discipline in their intellectual and p ro f e s s i o n a l f o r m a t i o n , a n d b y understanding the reality around. And on the other hand, such as recommended by Skovsmose in his works on Critical Mathematics Education, regarding the valorization of criticism and creativity of the student (and hence their social and political growth), and the contribution of modeling projects to the reflections intrinsic to all experienced moments by them. We conclude the article reflecting on the pedagogical possibilities offered by the association of the issues inherent to the topics of modeling projects with facts discussed by the press, romanticized by literature and depicted in movies and documentaries. Keywords: Mathematical modeling; Statistical contents; Critical statistics education; Reviews and reflections. informações, verdadeiros conteúdos vivos presentes em nosso cotidiano. Essa fonte é formada de exemplos que envolvem gráficos e tabelas, de índices e de análises comparativas que requerem leitura dos mais variados tipos de dados. As informações disponíveis precisam ser analisadas e criticamente interpretadas, o que faz com que a presença da Estatística nas formações acadêmica e pessoal do estudante, de diferentes áreas e níveis escolares, seja cada vez mais valorizada. Como constatam Batanero e Godino (2005), o papel da Estatística na sociedade moderna se destaca por prover ferramentas 97 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS metodológicas para análise dos dados, para descrição e quantificação do relacionamento de variáveis, para o planejamento e análise de estudos e experimentos, para estimativas e tomada de decisões em situações de incerteza. Daí sua importância nos ambientes escolares. Nessa direção, os Parâmetros Curriculares Nacionais, no Brasil, com a intenção de fornecer uma formação ampla e crítica ao estudante, destacam a importância do conhecimento de conteúdos estatísticos já nos níveis fundamental e médio. No ensino superior, além da relevância do conhecimento de conteúdos estatísticos nas ciências exatas, a sua importância está sendo igualmente reconhecida nas ciências sociais, nas ciências humanas e na área da saúde. Se por um lado são indiscutíveis a importância e a necessidade da presença da Estatística na sala de aula, de outro lado é igualmente perceptível que há problemas pedagógicos em todos os níveis escolares, quer em relação ao ensino, quer em relação à aprendizagem. E esses problemas são responsáveis por muitas das dificuldades enfrentadas pelos alunos em suas atividades curriculares. Como explicado em Campos, Wodewotzki e Jacobini (2011), essas dificuldades pedagógicas têm incentivado pesquisadores a buscar suas origens, dando início assim a essa nova área de atuação pedagógica denominada Educação Estatística (EE). Investigar essas dificuldades e buscar procedimentos pedagógicos para superá-las tem sido o principal objetivo do nosso grupo de pesquisa (GPEE – Grupo de Pesquisa em Educação Estatística da UNESP de Rio Claro). 98 A EE, como campo de ação, extrapola as preocupações com dificuldades pedagógicas (de aprender e de ensinar) e concentra seu interesse no desenvolvimento de uma postura investigativa, reflexiva e crítica do aluno em uma sociedade globalizada (e desigual), marcada pelo acúmulo de informações e pela necessidade de tomada de decisões em situações de incerteza. Nesse contexto, a EE tem mostrado que a eficiência do ensino e da aprendizagem dos conteúdos de Estatística está fortemente associada com o desenvolvimento de três competências, relacionadas entre si: a literacia, o pensamento e o raciocínio estatísticos. Essas competências, baseadas principalmente na interpretação e na compreensão críticas de informações provenientes de dados reais, estão associadas a uma educação voltada para a formação de uma cidadania crítica. Nessa linha, vemos o desenvolvimento dessas competências em harmonia com o pensamento pedagógico de Skovsmose (2008) que, focado na importância da formação de um estudante crítico, investigador, questionador e consciente dos problemas que afligem a sociedade, e com seu olhar voltado para as ideias de Paulo Freire, defende um ambiente pedagógico responsável pela promoção de uma educação problematizadora, dialógica e que estimule a criatividade e a reflexão do estudante. Em nosso Grupo de Pesquisa inserimos a EE nesse ambiente idealizado por Skovsmose e, via de regra, nos baseamos nos princípios pedagógicos da modelagem matemática para trabalhar o ensino e a aprendizagem de Estatística por meio de Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS projetos. Vemos essa conduta pedagógica como um instrumento de ação que possibilita ao aluno vivenciar situações nas quais ele tenha que avaliar resultados, questionar informações e desenvolver atitudes críticas e criativas. Agindo dessa forma, pensamos em um ambiente de aprendizagem que busca, no particular, favorecer o desenvolvimento de habilidades para lidar com os conceitos estatísticos no seu cotidiano e, no geral, contribuir fortemente para a formação de um cidadão crítico e consciente das suas obrigações sociais e políticas. Temos defendido em nossos estudos um processo de ensino e de aprendizagem na perspectiva investigativa, no qual o aluno vivencia a geração e a análise de dados e, consequentemente, participa ativamente da construção do seu conhecimento. Outros trabalhos como os de Campos (2007) e Campos et al. (2011) têm esse mesmo propósito, defendendo o chamado learning by doing ou active learning, que traduzimos por aprender Estatística fazendo Estatística, e trazendo para a prática escolar os conceitos de Educação Estatística Crítica (EEC). Buscamos, neste artigo, mostrar que é possível associar, por intermédio de projetos de modelagem matemática, as três competências que para nós formam o núcleo da EE – a literacia, o raciocínio e o pensamento estatísticos com o desenvolvimento do conhecimento curricular do aluno, com a valorização do seu pensamento crítico e, consequentemente, com o seu crescimento político. Para tanto nos baseamos em um ambiente de modelagem matemática, construído em uma disciplina de Estatística, ministrada em um curso de Administração. Em nossas conclusões fortalecemos essa associação com uma abordagem combinatória entre os resultados obtidos com os projetos de modelagem, com fatos discutidos pela imprensa, romanceados pela literatura e mostrados em filmes e documentários.. 2. Competências estatísticas e modelagem matemática O termo literacia nos remete à habilidade de ler, compreender, interpretar, analisar e avaliar textos escritos. A literacia estatística refere-se ao estudo de argumentos que usam a estatística como referência, ou seja, a habilidade de argumentar usando corretamente a terminologia estatística. Entendemos que a literacia estatística inclui também habilidades básicas e importantes que podem ser usadas para a compreensão de informações estatísticas. Essas habilidades incluem as capacidades de organizar dados, construir e apresentar tabelas e trabalhar com diferentes representações dos dados. A literacia estatística também inclui entendimentos de conceitos e de técnicas, de vocabulário, de símbolos e de probabilidade como medida de incerteza. Essa visão de literacia tem sofrido variações, ao longo do tempo e, com o avanço da EE, diferentes autores foram introduzindo perspectivas mais abrangentes para essa competência. Rumsey (2002), em seus estudos, identifica os componentes da literacia, relacionando-a com a educação para a cidadania. Segundo a autora, para os alunos se tornarem bons cidadãos estatísticos, eles devem entender o suficiente para consumir as informações 99 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS que permeiam nossa vida diariamente, sendo capaz de pensar criticamente sobre essas informações de modo a tomar decisões com base nelas. O raciocínio estatístico é definido por Garfield (2002) como a maneira com a qual uma pessoa raciocina e se posiciona com base nas ideias e nas informações estatísticas. Isso engloba interpretações baseadas em conjuntos de dados e representações ou sumários estatísticos dos dados nas formas de gráficos e de tabelas. Em muitos casos o raciocínio estatístico envolve ideias de variabilidade, distribuição, chance, incerteza, aleatoriedade, probabilidade, amostragem e testes de hipóteses, o que leva a interpretações e inferências acerca dos resultados. O raciocínio estatístico pode ainda envolver a conexão de um conceito com outro (medidas centrais e variabilidade, por exemplo), ou pode combinar ideias sobre dados e chance. O raciocínio estatístico também incorpora o entendimento de um processo estatístico e as capacidades de interpretar os resultados obtidos de um problema baseado em dados reais e de explicá-los. Como diz Ben-zvi (2008), essas habilidades são importantes para o cotidiano dos cidadãos e devem, assim, constituir um ingrediente padrão na educação de todo estudante. delMas (2004) afirma que o desenvolvimento do raciocínio estatístico deve configurar um objetivo explícito no ensino de Estatística. Para isso o autor diz que devem ser construídas atividades na sala de aula que extrapolam a aprendizagem de procedimentos e que buscam valorizar métodos que exijam dos estudantes um conhecimento mais profundo dos processos estocásticos. 100 Assim como Campos (2007) acreditamos que é possível ajudar os estudantes a desenvolver o raciocínio estatístico e, para tanto, certos procedimentos, como incentivos para a descrição verbal e escrita do processo estatístico que está sendo analisado, devem ser incorporados ao diaa-dia da sala de aula. O pensamento estatístico, de acordo com Mallows (1998), pode ser entendido como a capacidade de relacionar dados quantitativos com situações concretas, admitindo a presença da variabilidade e da incerteza, explicitando o que os dados podem dizer sobre o problema em foco. O pensamento estatístico ocorre quando os modelos matemáticos são associados à natureza contextual do problema em questão, ou seja, quando surge a identificação da situação analisada e se faz uma escolha adequada das ferramentas estatísticas necessárias para sua descrição e interpretação. Uma característica particular do pensamento estatístico é prover a habilidade de enxergar o processo de maneira global, com suas interações e seus porquês, entender suas diversas relações e o significado das variações, explorar os dados além do que os textos prescrevem e gerar questões e especulações não previstas inicialmente. O pensador estatístico, segundo Chance (2002), deve ser capaz de ir além do que lhe é ensinado no curso, de pesquisar, de refletir sobre o que está sendo investigado e de questionar espontaneamente. Vemos a modelagem matemática como um importante instrumento de ação na sala de aula, capaz de tornar o ambiente pedagógico menos árduo para quem ensina e mais significativo para quem aprende. E, Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS concomitantemente, de transformar a sala de aula em um cenário político, centrado em ações, atuações e participações dos atores (alunos e professor) na sociedade, no qual o professor tem a oportunidade de explorar possibilidades que possam contribuir para a formação crítica do estudante e para a construção da sua cidadania. Ademais, como já dissemos em outro momento (Ferreira; Jacobini, 2009, 2010), a modelagem matemática, além de ser um importante instrumento de aplicação da matemática para resolver problemas reais, também gera necessidades para o levantamento de dados e para simplificações das situações da realidade. Nessa direção, a modelagem matemática contribui para a construção de um ambiente pedagógico no qual os alunos, de um lado, podem realizar simulações e fazer analogias na medida em que um mesmo modelo pode ser útil na representação de diferentes situações. E, de outro lado, eles podem identificar aplicações em outras áreas do conhecimento e em diferentes contextos, além de associar o conteúdo curricular com o mundo do trabalho. Ve m o s , a s s i m , o p r o c e s s o d e modelagem com o seu início e com o seu término no mundo real, passando por investigações e por reflexões que fundamentem a construção ou a escolha de modelos matemáticos, pelas etapas de validação e de interpretação de resultados, e pela sistematização do conteúdo. Além disso, esse processo de modelagem deve envolver igualmente investigações não matemáticas e discussões, chamadas paralelas por Barbosa (2007), que envolvem, dentre outras, as percepções sobre a realidade social na aula de matemática e o uso do conhecimento matemático para legitimar os discursos que analisam as questões da vida na sociedade (contexto social e cultural). A modelagem matemática, quando aplicada no ensino de Estatística, permite a construção de ambientes pedagógicos que possibilitam ao aluno vivenciar a aplicabilidade dos conteúdos estatísticos e, ao mesmo tempo, desenvolver as capacidades de pesquisar, de realizar trabalhos em grupo, de discutir, de refletir, de criticar e de comunicar suas opiniões. A incorporação dos princípios pedagógicos da modelagem matemática aos procedimentos didáticos da Estatística, operacionalizada pelo trabalho com projetos, mostra-se relevante justamente por incentivar e contribuir para o desenvolvimento das capacidades de literacia, raciocínio e pensamento estatísticos. Avaliamos no nosso grupo de pesquisa que essa relevância evidencia-se com mais intensidade se no cenário pedagógico centrado na modelagem matemática forem valorizados trabalhos com dados reais (realizados preferencialmente em grupos), relacionamentos desses dados com o contexto em que eles estão inseridos, recomendações para interpretações dos resultados conseguidos, e incentivos tanto para a construção de ambientes na sala de aula voltados para críticas, discussões e reflexões, quanto para o compartilhamento com a comunidade (a própria escola ou o meio no qual a escola está inserida) dos resultados obtidos com os trabalhos realizados. É com nosso olhar atento nessas valorizações que buscamos interagir aprendizagem curricular e reflexões críticas. Essa interação que aqui 101 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS abordamos baseia-se em um cenário pedagógico que construímos em uma sala de aula de Estatística e que valoriza a EEC na medida em que, conforme Campos et al. ( 2 0 11 ) , p r o m o v e u m a e d u c a ç ã o problematizadora, dialógica, criativa e reflexiva; estimula a inserção crítica do estudante na realidade em que ele vive; incorpora os aspectos políticos envolvidos no processo educativo; incentiva o trabalho em grupo e colaborativo; proporciona o desenvolvimento de relacionamentos sociais; combate as posturas alienantes dos alunos e defende a ética e a justiça social. 3. A modelagem matemática como instrumento de interação entre aprendizagem curricular e reflexões críticas na sala de aula de Estatística Para essa abordagem nos baseamos em um ambiente pedagógico, centrado em projetos de modelagem matemática, construído pela professora da disciplina de Estatística de um curso de graduação em Administração (segunda autora deste trabalho) e que contou com a participação de uma mestranda em Educação Matemática na UNESP (Rio Claro/SP, Brasil). O projeto foi desenvolvido durante o 1º semestre de 2010 e o acompanhamento e a análise das atividades realizadas resultaram na elaboração da dissertação, intitulada “Educação Estatística Crítica: uma possibilidade?” (SAMPAIO, 2010). As atividades desenvolvidas no ambiente de aprendizagem foram acompanhadas pelo 5Resultados GPEE – Grupo de Pesquisa em Educação Estatística da UNESP de Rio Claro. 5 Para o desenvolvimento desses projetos foram feitas as seguintes escolhas: Trabalhos realizados em grupo com liberdade para suas organizações. • Temas dos projetos escolhidos pelos alunos com as participações da professora da disciplina e da mestranda que acompanhou o trabalho. • Atividades dos grupos realizadas tanto na sala de aula quanto fora do horário escolar. • Abordagem na sala de aula dos conteúdos estatísticos necessários para os trabalhos. • No início do curso, com uma exposição preliminar, a professora da disciplina procurou mostrar aos alunos que as atividades relacionadas com seus trabalhos contribuiriam para a vivência de um processo de investigação estatística em um ambiente de modelagem matemática, para a percepção da aplicabilidade de certos conteúdos curriculares estatísticos em problemas reais e para a compreensão de aspectos importantes inerentes aos seus temas de trabalho. A professora também informou que cada grupo deveria realizar uma pesquisa de opinião com questões relacionadas com o assunto escolhido, além de obter informações especificas sobre ele em fontes apropriadas (livros, filmes, jornais, revistas, Internet, etc.), elaborar um relatório com os resultados obtidos e discutir esses resultados com extraídos deste cenário também foram analisados no trabalho “O ensino e a aprendizagem de conteúdos estatísticos por meio de projetos”, apresentado pelos autores na VIII CIAEM - Conferência Interamericana de Educação Matemática, em 2011 (FERREIRA et al., 2011). 102 Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS seus pares dentro dos grupos e em sala de aula. Esses projetos fariam parte do processo de avaliação. Para o desenvolvimento de suas atividades os grupos receberam algumas recomendações: A escolha do tema de trabalho deveria estar acompanhada da respectiva justificativa. • Os objetivos do trabalho deveriam ser explicitados. • Para a pesquisa de opinião sobre o tema, o questionário para a coleta de dados precisaria conter no mínimo três variáveis qualitativas e três quantitativas. • Os cruzamentos entre as variáveis envolvidas na pesquisa e os seus respectivos gráficos, bem como a obtenção de medidas estatísticas das variáveis numéricas (tais como média, moda e mediana, estudo da simetria, desvio padrão e coeficiente de variação) eram imprescindíveis. • Algumas dessas variáveis quantitativas deveriam conter estudos sobre correlação e mostradas pelos gráficos de dispersão contendo a reta de regressão e o coeficiente de determinação. • Os relatórios dos projetos deveriam obedecer a seguinte estrutura: introdução; apresentação dos dados; análise, discussão e interpretação dos resultados; comparação desses resultados com os de outras pesquisas publicados na mídia (Internet, jornais e revistas); conclusões e comentários finais; referências bibliográficas. Depois de algumas orientações sobre procedimentos, discussões em sala de aula e superação das principais dificuldades, os seguintes temas de trabalho foram escolhidos pelos grupos: Alimentação dos estudantes; Bebidas; O uso do computador; Futebol e Sociedade; Meios de Informação; McDonald’s; Preocupação com a saúde; Qualidade no transporte público na cidade de Campinas; Viagens; Avaliando o nível da alimentação. Após a escolha dos seus temas os grupos definiram quais variáveis deveriam constar dos questionários que seriam aplicados aos entrevistados. Essa definição de variáveis é relevante em projetos que envolvem questionários estatísticos na medida em que a análise dos dados em pesquisas de opinião é feita com base nos resultados apresentados por elas e pelos seus relacionamentos. Algumas variáveis como gênero, idade, renda e escolaridade fizeram parte de todos os questionários. As entrevistas para a obtenção dos dados foram realizadas pessoalmente, por telefone, ou por e-mail. As amostras, convenientes e não aleatórias, foram escolhidas pela facilidade de acesso dos grupos aos entrevistados. Por essa razão os resultados encontrados foram trabalhados exclusivamente para a abordagem de conteúdos curriculares de Estatística e para a construção de ambientes favoráveis para discussões e reflexões críticas. E, como explicamos aos alunos, esses resultados não poderia ser inferidos para a população. 4. Aprendizagem curricular e reflexões críticas Como dissemos anteriormente, mantendo nosso olhar pedagógico nos 103 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS princípios filosóficos da Educação Matemática Crítica e em consonância com os fundamentos da Educação Estatística, centramos nossa atenção tanto na formação acadêmica do estudante quanto no seu crescimento político e social. Os projetos desenvolvidos pelos alunos mostraram-se adequados para investigações estatísticas, voltadas para o desenvolvimento do conteúdo curricular da disciplina, e para investigações não estatísticas relacionadas com situações inerentes aos assuntos que estavam sendo investigados. Essa combinação entre as investigações estatísticas e as não estatísticas fica evidenciada nos relatórios elaborados pelos grupos, mormente nas análises apresentadas por eles, quer em relação às variáveis individuais, quer em relação aos relacionamentos entre elas. Em trabalhos anteriores realizados no nosso grupo de pesquisa mostramos que a combinação desses dois modelos de investigação contribui tanto para a compreensão de importantes aspectos que envolvem os temas de trabalho quanto para a formação acadêmica e para o desenvolvimento do pensamento crítico e reflexivo do estudante. Essa combinação, no âmbito da Educação Matemática, é abordada por Jacobini (2011), e é também percebida por Sampaio (2010) que, com base nas ponderações de Barbosa (2007) e com seu olhar voltado para a Educação Estatística, destaca a natureza das discussões surgidas no ambiente da sala de aula e as classifica em Matemáticas, Técnicas, Reflexivas e Paralelas. Com o enfoque no conteúdo programático da disciplina buscamos 6O conduzir as atividades de modo que elas propiciassem a aprendizagem de conceitos relacionados com a Estatística Descritiva (tabelas, gráficos, resumos numéricos de medidas, linhas de tendência, correlação). Aproveitamos para introduzir assuntos não previstos no programa da disciplina (amostragem, margem de erro, nível de confiança e tamanho da amostra), mas que eram necessários para a compreensão de alguns princípios de inferência. Para facilitar a percepção desses assuntos e das relações entre eles, organizamos uma atividade relacionada com a simulação de resultados amostrais com base em um parâmetro conhecido (no caso, o resultado da eleição presidencial de 2010). Essa atividade foi desenvolvida no Laboratório de Informática. Também no Laboratório de Informática trabalhamos com a Tabela Dinâmica do Excel e com O EstatD+ 6 para a organização e apresentação dos dados por meio de tabelas e de gráficos e para a geração dos resumos estatísticos, da reta de regressão e do coeficiente de determinação das variáveis numéricas. Os resultados obtidos com base na análise das variáveis e dos cruzamentos entre elas, mostrados nos relatórios apresentados pelos grupos, propiciaram discussões e reflexões entre os seus integrantes e debates na sala de aula. Alguns desses resultados, mesmo não tendo havido a priori formulação de hipóteses, confirmaram o que já era esperado. Outros deles, entretanto, foram surpreendentes, já que não coincidiam com o que se imaginava encontrar, como foi o caso do resultado encontrado pelo grupo responsável pelo tema Alimentação dos estudantes que, ao analisar o cruzamento EstatD+ é um software de domínio público e está disponível em: www.calculo.iq.unesp.br/estatistica.html. 104 Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS da variável “quem é responsável pelo preparo da refeição na sua casa” versus a variável “Gênero”, concluiu que, diferentemente do que se pensava, 41% dos respondentes masculinos disseram ser eles mesmos os responsáveis pelo preparo de sua própria comida (contra apenas 36% das mulheres). Esses resultados trouxeram discussões entre os alunos e motivaram a busca de justificativas para tais porcentagens. Dentre essas justificativas destacaram-se as comparações entre as atividades profissionais da mulher nos dias de hoje, em contraste com o passado, quando a maioria delas se dedicava apenas aos afazeres domésticos e a criação de seus filhos. Essas descobertas estatísticas, algumas conflitantes com o senso comum, despertaram o interesse dos alunos em confrontar seus resultados com aqueles que a mídia tem revelado sobre os temas e esse confronto serviu como pano de fundo para a discussão sobre a importância da compreensão da Estatística para a percepção crítica das informações divulgadas nos meios de comunicação. Diversos resultados, além de evidenciarem conflitos envolvendo índices, mostraramse igualmente polêmicos, motivaram críticas e propiciaram reflexões. O grupo responsável pelo tema Bebidas, por exemplo, ao analisar seus dados, constatou que aproximadamente 60% dos respondentes masculinos já haviam dirigido alcoolizados. Os alunos do grupo comentaram que esse desastroso resultado encontrado por eles contraria a chamada “lei seca”, denominação popular dada a uma legislação que impõe severos limites ao consumo de álcool para quem dirige veículos automotores. Esse índice obtido pelo gênero masculino foi bastante contrastante com o apresentado pelo gênero feminino, já que apenas 22% das mulheres disseram ter dirigido após o consumo de algum tipo de bebida alcoólica. Em seu relatório, e complementando suas análises a respeito desses índices, o grupo destacou que o consumo excessivo de bebidas alcoólicas é uma das principais causas de acidentes de trânsito. No debate relacionado com esse tema e ocorrido na sala de aula os alunos comentaram sobre o bar localizado nas proximidades da Universidade, o que dá a impressão de que ele é uma extensão da instituição. Ademais, os estudantes, criticando o Poder Público que permite tal proximidade, disseram que essa localização possibilita que muitos alunos troquem a sala de aula pelo bar, e lá, além de gastar dinheiro, acabam bebendo e fumando. Na maioria das vezes são jovens que não têm ideia do prejuízo que esses vícios trazem à sua saúde e que ignoram o perigo de dirigir alcoolizado, com riscos a si próprios e à vida de pessoas inocentes. Os alunos concluíram que as leis deveriam ser mais severas, regulando tanto a venda quanto o consumo de bebidas alcoólicas, principalmente em locais próximos de instituições escolares. A descoberta de que conhecimentos de informática eram maiores entre as mulheres do que entre os homens, obtida pelo grupo responsável pelo tema O uso do computador, trouxe a tona o debate sobre a ampliação da presença feminina em todos os setores da sociedade. Se por um lado, e como já era esperado, “pérolas” negativas, como frases que diziam que “os homens apenas estavam dando oportunidade às mulheres” ou que os “homens eram 105 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS responsáveis pelo raciocínio e as mulheres pela execução” foram mencionadas, por outro lado os resultados confirmavam que a presença feminina no mercado de trabalho acentua-se neste início de século 21, principalmente em setores que, em épocas anteriores, eram exclusivamente de responsabilidade dos homens. Exemplos de mulheres que conquistaram sucesso em suas carreiras, assumindo importantes funções tanto em empresas privadas como públicas, foram trazidos para o debate na sala de aula. Significativas polêmicas surgiram com os resultados apresentados pelo grupo responsável pelo tema Futebol e Sociedade. Naturalmente resultados já esperados e que fazem parte do conhecimento geral foram apresentados pelo grupo, como principalmente aqueles que mostravam que os homens têm bem mais interesse pelo futebol do que as mulheres. Entretanto, em relação ao futebol feminino, surpreendentemente, os resultados mostraram que os homens têm mais interesse no seu desenvolvimento do que as próprias mulheres. Esses índices, mesmo não podendo ser inferidos para a população, contribuem para justificar a fraca presença do futebol feminino brasileiro no cenário mundial, em contraste com o sucesso alcançado pelos futebolistas masculinos. O cruzamento entre as variáveis “Renda” e “Origem do produto adquirido (oficial ou pirata)” indicou que a maioria dos consumidores de produtos oficiais de clubes (camisas, bonés, etc.) é formada de pessoas provenientes das camadas mais pobres da sociedade. Esse resultado, apesar de bastante questionável, indica que, possivelmente, pessoas com menor poder 106 aquisitivo preferem comprar produtos que rendem recursos financeiros para seus clubes, em contraste com aquelas mais ricas, que parecem não ter essa preocupação. Talvez essa opção, na medida em que produtos piratas relacionados com clubes esportivos são fartamente oferecidos, seja justificada pela apaixonante identificação das pessoas dessa camada da sociedade com seus times de futebol. A possibilidade de que pessoas com níveis de escolaridade mais altos (como esperado entre os mais ricos) nem sempre fazem uso de seus conhecimentos para agirem corretamente, também foi levantada no debate entre os alunos. Como mostra Sampaio (2010), o grupo também comparou seus dados com os resultados apresentados por recente pesquisa sobre a popularidade dos diversos times brasileiros, realizada pelo instituto DataFolha e, simultaneamente com essa comparação, fez uma análise crítica tanto do trabalho que eles realizaram (amostragem deficiente, estratificação, etc.) quanto da pesquisa realizada pelo instituto ligado ao Jornal Folha de S. Paulo. Nos trabalhos realizados pelos grupos, as três competências estatísticas (literacia, pensamento e raciocínio) foram valorizadas na medida em que os alunos trabalharam com dados reais, obtidos por eles próprios nas entrevistas que realizaram; relacionaram seus dados e seus resultados ao contexto em que eles estavam inseridos e os compararam com aqueles que estavam sendo apresentados pela mídia; interpretaram seus resultados e elaboraram relatórios escritos; debateram com seus pares de grupo e com seus Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS colegas de classe seus resultados e suas descobertas; participaram de uma atividade prática (no Laboratório de Informática), na qual puderam realizar experimentações de amostragem e, assim, verificar que seus resultados, obtidos de forma conveniente, não poderiam ser generalizados. Especialmente em relação à literacia estatística, ela foi estimulada na medida em que os alunos aprenderam conceitos estatísticos e souberam relacioná-los com seus dados e usar a Estatística como referência em seus argumentos, organizando os dados obtidos, construindo tabelas e gráficos, e obtendo informações quantitativas. Além disso, eles discutiram criticamente as informações veiculadas pela mídia, mormente aquelas que estavam relacionadas com seus temas. O raciocínio estatístico foi valorizado no momento em que os alunos, com seus projetos de modelagem, puderam vivenciar um processo estatístico e precisaram explicá-lo aos seus colegas. Além disso, os estudantes interpretaram estatisticamente os resultados encontrados e, para essa interpretação eles precisaram fazer diversas conexões entre os dados e os conceitos estatísticos estudados no curso, como, por exemplo, aqueles relacionados com medidas de centro e dispersão, variáveis e correlação. Por fim, quanto ao pensamento estatístico percebemos avanços na medida em que os alunos, de um lado, souberam relacionar os dados quantitativos com situações concretas, associar os modelos matemáticos utilizados com o contexto do problema, e identificar as ferramentas estatísticas adequadas (medidas de posição e dispersão, variáveis qualitativas e quantitativas, coeficiente de correlação, etc.) para a descrição e interpretação dos resultados de suas pesquisas. E, de outro lado, conseguiram utilizar criticamente seus resultados, como mostraram os casos acima apresentados. Assim, essa junção das três competências no ambiente pedagógico construído com base nos projetos de modelagem, tal como preconizado por Skovsmose (2008), contribuiu para valorizar um processo educacional problematizador, dialógico e estimulante para a crítica e para a criatividade do aluno, tanto em relação à aprendizagem curricular quanto em relação à sua aplicabilidade no trabalho prático e à sua contribuição para as reflexões intrínsecas a todos os momentos vivenciados por eles. Além disso, o ambiente construído auxiliou os alunos na compreensão das limitações dos conteúdos que aprenderam, na observação das diferentes dimensões entre a teoria e a prática. Ademais, eles se sentiram valorizados ao expor suas ideias e incertezas, o que propiciou uma rica troca de experiências. 5. Interação entre aprendizagem curricular e reflexões críticas nas aulas de estatística: novas possibilidades e perspectivas Neste artigo buscamos mostrar a associação entre aprendizagem curricular de conteúdos estatísticos e reflexões críticas decorrentes dos trabalhos investigativos intrínsecos aos cenários pedagógicos centrados na modelagem matemática. Em um ambiente investigativo na sala de aula, aprendizagem curricular e conhecimento sobre o que envolve o objeto do ensino entrelaçam-se e se relacionam. 107 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS Não são estanques, nem paralelos e muitos menos separados um do outro, independentemente da disciplina e da pedagogia. Agora, em nossas considerações finais, e com a intenção de ampliar tanto a perspectiva investigativa quanto os meios para a construção de cenários apropriados para a valorização de discussões na sala de aula, concentramos nossa atenção nas possibilidades pedagógicas oferecidas pela associação dos assuntos inerentes aos temas dos projetos de modelagem com fatos discutidos pela imprensa, romanceados pela literatura e mostrados em filmes e em documentários. Vemos este modelo de ambiente de investigação, construído com base na integração entre o pedagógico e o cotidiano discutido na mídia, como uma forma de educação voltada para a responsabilidade social que busca contribuir tanto para o enriquecimento cultural e científico do estudante quanto para a sua formação crítica expressa pelo seu crescimento político-social e pelo seu amadurecimento enquanto cidadão presente em uma sociedade que, concomitantemente com uma expressiva riqueza de consumo e com uma forte presença tecnológica, convive com enormes desigualdades sociais. Na discussão sobre a ampliação da presença feminina no mercado de trabalho, investigações mais aprofundadas mostrariam exemplos de mulheres que conquistaram sucesso em suas carreiras, assumindo importantes funções tanto em empresas privadas como públicas. Confirmam esses exemplos as funções políticas de extrema responsabilidade exercidas por Dilma Roussef, Angela 108 Merkel e Cristina Kirchner, chefes de governo respectivamente do Brasil, Alemanha e Argentina, e de Michelle Bachelet, eleita e reeleita para governar o Chile após longo período de ditadura militar. Reforça a ampliação feminina na responsabilidade pela condução política do Brasil a significativa presença das mulheres na chefia de diversos ministérios e órgão públicos, na Câmara Federal e no Senado da República, além do Supremo Tribunal Federal. Na política mundial, destacam-se a figura marcante de Hillary Clinton como Secretária de Estado dos Estados Unidos, função quase tão importante quanto aquela do presidente do país, sucedendo a também mulher Condoleezza Rice, e Christine Lagarde, primeira mulher a dirigir o Fundo Monetário Internacional (FMI). O caso de Patrícia Melo, comandante de avião, é outro exemplo do sucesso feminino em campos profissionais amplamente dominados pelos homens. Fatos associados ao consumo de bebida alcoólica, trazidos pela mídia e relacionados com graves acidentes automobilísticos, com exemplos negativos de personalidades pegas em batidas policiais, e com casos de doenças graves e de mortes precoces, mostrariam novas possibilidades ao trabalho apresentado pelo grupo responsável pelo tema Bebidas. Filmes e livros que mostraram a decadência de importantes ídolos mundiais colaborariam significativamente com essas novas possibilidades. O filme “Edith Piaf – um hino ao amor”, produzido em 2007 e dirigido por Olivier Dahan, por exemplo, mostra a ascensão e a queda de uma das maiores artistas francesas, destruída pela bebida e, como decorrência, pelas drogas. Mais recentemente, a película dirigida por Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS José Henrique Fonseca sobre a vida de Heleno de Freitas, cuja figura foi brilhantemente interpretada por Rodrigo Santoro, conta a trajetória de um dos maiores ídolos futebolísticos do passado, morto em um sanatório aos 39 anos de idade. Na literatura, Ruy Castro mostra o lado triste da vida do grande Garrincha, atleta que tinha tudo em suas mãos, mas acabou destruído pela bebida (CASTRO, 1995). Situações similares às de Garrincha são vividas nos dias de hoje por inúmeros jogadores e ex-jogadores de futebol. Como abordado em Jacobini (2011), e especificamente sobre o futebol, outros caminhos poderiam ser explorados. O papel da mídia no endeusamento e na destruição de atletas é um deles. Investigações sobre o tema na literatura, no cinema e até mesmo na academia também proporcionariam novos encaminhamentos ao debate. Algumas histórias publicadas versam sobre proezas e encantamentos, como as escritas sobre Pelé, considerado o melhor jogador de futebol de todos os tempos. Mas muitos outros, com enredos nem sempre repletos de glamour (como a vida de Heleno de Freitas e o livro de Ruy Castro), contém fatos e verdades sobre dificuldades enfrentadas pela maioria dos atletas, principalmente nos momentos de despedida dos campos. Inúmeros documentários e diversos trabalhos acadêmicos têm sido produzidos sobre situações envolvendo o mundo da bola, o futebol e seus ídolos, as paixões populares que envolvem esse esporte, as fanáticas torcidas pelos times de futebol (e algumas trágicas consequências desse fanatismo) e a vida de atletas e de ex-atletas. No cinema, e igualmente como apontado em Jacobini (2011), os dois filmes dirigidos por Ugo Giorgetti são fontes obrigatórias de investigação sobre o tema. O primeiro deles (“Boleiros – era uma vez o futebol”, realizado em 1998) retrata a vida futebolística, mostrando um grupo de ex-jogadores que se reúnem quase todas as tardes para relembrar antigas glórias do passado. Depois, na continuação com “Boleiros – vencedores e vencidos”, realizado em 2006, a abordagem se volta para o grande negócio envolvendo transações de jogadores para países da Europa. Já o filme “Linha de Passe”, dirigido por Walter Salles e Daniela Thomas, aborda o sonho de um jovem de periferia em se tornar atleta de um grande time, mas que vê suas chances se reduzirem com o avançar da idade. Para conseguir seu objetivo, estratégias nem sempre éticas e às vezes ilegais são utilizadas. Dentre elas o filme aborda a alteração da data de nascimento e o pagamento de propina para empresários do mundo da bola. Concluímos reafirmando que os caminhos que se abrem com a opção pela modelagem matemática na sala de aula, baseada em temas contemporâneos e do interesse da comunidade e, na sequência, pela valorização do papel da mídia como importante agente pedagógico e de fonte de informação, apontam para a inserção desse modelo pedagógico nas aulas de Estatística em um contexto fortemente identificado com a Educação Estatística Crítica. Assumimos esse modelo com a intenção de ampliar o horizonte do estudante, quer em relação ao conteúdo programático, quer em relação aos fatos inerentes às temáticas abordadas nos projetos. Consideramos esse modelo como um instrumento político capaz de conduzir o estudante à compreensão de aspectos 109 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS importantes relacionados com essas temáticas e, consequentemente, de contribuir no sentido de torná-lo mais sensível para refletir sobre esses aspectos, de modo que o seu julgamento sobre eles s e j a o rg a n i z a d o c o n s c i e n t e m e n t e , independentemente dos chamados “formadores de opinião”. Referências Bibliográficas ANDRADE, M. M. Ensino e aprendizagem de Estatística por meio da modelagem matemática: uma investigação com o ensino médio. 2008. 193f. Dissertação (Mestrado em Educação Matemática) Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Universidade Estadual Paulista, Rio Claro, 2008. BARBOSA, J. C. Mathematical modelling and parallel discussions. In: 5th Congress of the Europen Society for Research in Mathematics Education, 2007, Larnaca. 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From this perspective, we argue that the history teacher can utilize the same methodology for conducting historical research to develop their lessons. Given this, we analyze the film as source raising the potential of its use as teaching material in all three levels of education. Palavras-chave: Cinema; História; Ensino de História; Metodologia de análise. Keywords: Cinema; History; History Teaching; Methodology of analysis. 1Silene Ferreira Claro - Doutora em História Social pela FFLCH-USP (2008). Bacharel em História pela Universidade de São Paulo (1999) e graduação em Licenciatura em História pela Universidade de São Paulo (1999). Docente no Curso de Pedagogia nas Faculdades Integradas Campos Salles, cadeira de Metodologia do Ensino de História, Tecnologias da Informação e Comunicação aplicadas à Educação e História da Educação. Docente nos cursos de História e de Pedagogia da Faculdade Sumaré. Fui professora do Centro Universitário Sant’Anna e monitora PAE no Departamento de História da Fac. de Filosofia, Letras e Ciências Humanas – USP, em 2005. Experiência na área de História, com ênfase em História Regional do Brasil, Historiografia e História do Brasil Contemporâneo, África e cultura Afro-brasileira, atuando principalmente nos seguintes temas: educação, cultura brasileira, história cultural, didática do ensino de História e uso de tecnologias na e para a educação. Membro do NDE - Núcleo Docente Estruturante, dentro da Faculdade Sumaré desde agosto de 2012 e também no Centro Universitário Sant’Anna, nos cursos de Licenciatura em História e de Música, conforme orientações do MEC, entre 2008 e 2010. Colaboradora do NDE das Faculdades Integradas Campos Salles. Autora colaboradora na Editora Oxford do Brasil desde 2011. Fui tutora no curso da Escola de Formação de Professores Paulo Renato de Souza na edição de preparação de cursistas para o concurso em 2011. Atuo também como professora de História, Sociologia e Filosofia nos ensinos Fundamental e Médio, na rede privada, em Osasco-SP. E-mail: [email protected] 113 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS 1. Introdução Desde as críticas formalizadas por Lucien Febvre e Marc Bloch2 o campo da História passou por inúmeras transformações. Buscava-se romper com os velhos modelos de pesquisas historiográficas que privilegiavam apenas fontes escritas oficiais, visto que historiadores “profissionais” dedicavam-se aos “grandes feitos de figuras ilustres”. As propostas apresentadas por Bloch e Febvre permitiram a ampliação da noção de fonte histórica, que deixou de ser apenas a documentação escrita, para englobar toda produção humana. Desta forma, atualmente é ponto comum entre os historiadores conceber que toda produção humana pode ser utilizada como fonte histórica, de acordo com as respostas que o pesquisador procura responder. Assim, ao longo do século XX, para uma boa parte dos historiadores, a história que se escreve (historiografia) é sempre história contemporânea como afirmou Benedetto Croce3 . O historiador busca no passado formas para compreender o presente, sempre através das fontes históricas selecionadas. Com a ampliação do conceito de fonte histórica, a partir da inovação introduzida pela Escola dos Annales, selecionamos aqui o cinema como objeto de análise neste breve ensaio. Analisar a produção cinematográfica nos permite a utilização dos métodos de pesquisa da historiografia, como demonstrou Cristiane Nova: um filme pode ser submetido às críticas interna e externa, como já demonstrou Collingwood, em seu livro A idéia de História4 . Assim, o filme passa a ser um documento no qual é possível resgatar as representações que se tem da sociedade à qual pertence. Por outro lado, se o filme tiver uma proposta de reconstituição histórica, ele estará falando muito mais das representações que tal sociedade tem de determinado momento do passado do que propriamente daquele período. Ao analisarmos filmes com conteúdo “histórico”, podemos classificá-los em fontes primárias ou secundárias. Os filmes com conteúdo histórico, que foram analisados como fontes históricas, podem ser considerados do tipo primário, se pretendemos estudar a sociedade na qual foi produzido. Desta forma, por mais que a obra se proponha analisar ou discutir o passado, as características da sociedade que a produziu são as que encontramos. Para exemplificar, podemos fazer referência ao filme Tróia, de 2004, dirigido por Wolfgang Petersen. Apesar de se basear na célebre história tratada na obra Ilíada, de Homero, o filme narra os acontecimentos sem a interferência dos deuses. Coloca a questão como um conflito entre o Ocidente pragmático e o Oriente “religioso”. Assim, percebemos o quanto a obra dialoga com a situação mundial contemporânea, utilizando-se do passado como veículo de discussão do presente. 2 Lucien Febvre e Marc Bloch foram dois historiadores franceses que, no final da década de 1920, propuseram uma nova visão de História que passou a ser conhecida como Escola dos Annales. Tal proposta entende que toda produção humana pode ser considerada fonte histórica, que é a matéria-prima da pesquisa do historiador. 3 GARDINER, Patrick. Teorias da História. 4 ed., Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1995, pp. 274-292. 4 COLLINGWOOD, R. G., A idéia de história. 4 ed., Portugal-Brasil: Editorial Presença-Livraria Martins Fontes, s/d. e GARDINER, Patrick. Teorias da História. 4 ed., Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1995, pp. 302-319. 114 Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS Quando analisamos uma fonte do tipo secundária, conseguimos resgatar formas de uma representação do passado que alimentam o presente. Utilizando o mesmo exemplo do filme Tróia, podemos observar quais aspectos do passado são reconstruídos, desde construções, gestos, vestimentas, até formas de compreensão do mundo. A personagem Aquiles, representada pelo ator Brad Pitt, em uma conversa com a mãe, na qual discute a escolha de viver uma vida comum ou ser lembrado por toda a eternidade, ele escolhe a segunda opção. Observamos aí, uma relação com o passado que reflete de alguma forma, as propostas de Heródoto, ao registrar o que testemunhava para que o futuro não se esquecesse. Todos estes elementos estão presentes na análise do historiador quando este se debruça sobre a produção fílmica. Em suma: debate-se com problemas de ordem metodológica, política, ideológica e econômica numa única fonte que é ao mesmo tempo produto cultural de uma sociedade industrial capitalista e exerce grande influência sobre o público que o consome, numa relação dialética. A questão de o cinema ser considerado como produto cultural está ligada à nossa sociedade na medida em que cada vez mais a população como um todo tem acesso aos vários meios de comunicação de massa, os quais veiculam ideologias e representações da mesma sociedade. Nossa sociedade “consome” a cultura que é veiculada por tais obras. Em muitos casos, é nas personagens do cinema que muitos grupos encontram modelos de comportamento, de conduta, de “heróis”. 2. Possibilidades de classificação de filmes e suas relações com a sociedade Ao longo de nossa carreira docente, nos últimos dez anos, introduzimos o uso do cinema em nossas aulas nos três níveis do ensino: Fundamental, Médio e Superior. A utilização sempre foi acompanhada de reflexões teóricas e metodológicas na elaboração de roteiros que pudessem ser desenvolvidos juntamente com os alunos. Por outro lado, sempre procuramos observar o envolvimento dos mesmos com a ferramenta e as diversas maneiras de dialogar com ela. Conforme indicamos no início desta reflexão, optamos por analisar e trabalhar com filmes comerciais, na maior parte das vezes com produções recentes, todos se enquadrando na categoria de não documentários, segundo a proposta apresentada por Cristiane Nova5 . De acordo com a autora, os filmes podem ser divididos em dois tipos: documentários e não documentários. Não optamos por documentários porque escolhemos filmes que, além de proporcionar uma análise histórica da produção fílmica, uma análise cinematográfica da história e uma discussão do presente, compreendemos que existe em nossa sociedade um movimento que procura divulgar conhecimentos históricos considerados adequados ou até mesmo úteis para o funcionamento da sociedade. Grupos que assim se posicionam muitas vezes são capazes de deter os meios de comunicação e o cinema é um deles. Por este motivo, podemos 5 NOVA, Cristiane. O cinema e o conhecimento da História. O Olho da História, 3. Disponível em: <http:// www.oolhodahistoria.ufba.br/o3cris.html> Acessado em: 16/10/2006 115 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS através do circuito comercial tentar resgatar uma cultura histórica contida nos filmes. Napoleão (1927, Abel Gance), Cromwel (1970, Ken Hughes), Lamarca (1994, Sérgio Resende) ou Rosa Luxemburgo (1986, Margareth von Trotta). Os não documentários, ou “filmes históricos”, segundo a autora, os quais optamos por trabalhar, podem ser subdivididos em quatro subcategorias: reconstrução histórica; biografia histórica; filme de época; ficção-histórica e filmemito. Procurando enquadrar nossa produção nesse contexto, podemos distribuir os filmes que utilizamos da seguinte forma: Acrescentamos, a esta lista: Lutero; Joana D’Arc; Amadeus; Caramuru – a invenção do Brasil; Elizabeth; Agonia e Êxtase (sobre a vida de Michelangelo); Rei Arthur; Em nome de Deus (sobre a vida do filósofo Abelardo); Elizabeth – a era do ouro; Sandino; Napoleão – a última batalha do imperador; Stalin; Átila; Demetrius e os gladiadores; Olga; São Francisco; Alexandre; Zuzu Angel. “Reconstrução histórica: corresponde aos filmes que abordam acontecimentos históricos cuja existência é comprovada pela historiografia e que contam com a presença de personagens históricos reais no seu enredo (interpretados por atores), cuja fidelidade é relativa e se modifica de um filme para outro. Não se trata apenas dos filmes em que se realiza uma reconstrução audiovisual do passado (o que dificilmente é levado às últimas conseqüências) ou mesmo dos fatos, mas também daqueles em que são esboçadas interpretações históricas, utilizando fatos comprovadamente reais. Como exemplos de reconstruções históricas, podemos citar Outubro (1927, S. Eisenstein), A lista de Schindler (1993, S. Spilberg), Spartacus (1960, S. Kubrick), 1592: a conquista do paraíso (1992, Ridley Scott) ou A rainha Margot (1994, Patrice Chéreau). Filme de época: compreende aqueles filmes cujo referente histórico não passa de um elemento pitoresco e alegórico, e cujo argumento nada possui de histórico no sentido mais amplo do termo. São inúmeros os exemplos de filmes de época: Sissi (1955, Ernst Marishka), A amante do rei (1990, Axel Corti) ou Angélica e o rei (1965, Borderie). Mesmo assim, alguns deles podem possuir elementos interessantes para o historiador, principalmente aqueles em que existe uma preocupação formal maior com a reconstrução ambiental e dos costumes, como é o caso de Ligações perigosas (1988, Steaven Frears), por exemplo. Propomos a ampliação da lista acima com outros títulos, mais recentes e comerciais. O Príncipe do Egito; Spartacus; Gladiador; Cruzada; A Missão; As vinhas da ira; 1492 – a conquista do paraíso; Batismo de sangue; Estado de sítio; Munique; O novo mundo. Biografia histórica: trata-se dos filmes que se debruçam sobre a vida de um indivíduo e as sua[s] relações com os processos históricos. Na maior parte dos casos, esses filmes se limitam à abordagem da vida dos chamados "grandes homens", ou seja, aqueles indivíduos destacados pela historiografia escrita e, principalmente, a tradicional. Como exemplos, citamos 116 Acrescentamos a esta lista: Desmundo; O piano; O ovo da serpente; A casa da Rússia; O carteiro e o poeta. Ficção histórica: abarca os filmes cujo enredo é ficcional, mas que, ao mesmo tempo, possui um sentido histórico real. Como exemplo deste tipo de filme, podemos citar O nome da rosa (1986, Jean-Jaques Annaud), A greve (1923, Eisenstein), A guerra do fogo (1981, Jean-Jaques Annaud), Lili Marlene (1980, Fassbinder) etc. Gostaríamos de acrescentar a esta lista os seguintes filmes: Círculo de fogo; Diamante de sangue; Gladiador; Cruzada; O menino do pijama listrado; A vida é bela. Filme-mito: são aqueles filmes que se debruçam sobre a mitologia e que podem conter elementos importantes para a reflexão histórica. Muitas vezes, o mito é apresentado Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS em paralelo a fenômenos históricos reais. Podemos citar, por exemplo, El Cid (1961, Antonny Mann) e A guerra de Tróia (1961, Giorgio Ferroni). Além dos filmes propostos pela autora, sugerimos também: El Cid – a lenda (animação); Tróia; Odisséia; As brumas de Avalon; Excalibur; Fúria de Titãs; Tristão e Isolda; Kirikou e a feiticeira; Kirikou e os animais selvagens; O feitiço de Áquila; A lenda da flauta mágica; A lenda de Beowulf. Filme etnográfico: agrupa os filmes realizados com interesses científicoantropológicos. Como exemplo, podemos citar a produção pioneira de Flaherty (Nanouk, o esquimó). Adaptações literárias e teatrais: engloba os filmes que são oriundos de uma adaptação de obras literárias e teatrais do passado. Alguns exemplos são Germinal (1995, Claude Berri) , Luciola: o anjo pecador (1975, Alfredo Sternheim), Os miseráveis (1978, Gleal Joadan), Hamlet (1990, F. Zeffirelli), Henrique V (1945, Laurence Olivier), 1984 de Orwell (1984, Michael Readford).”6 Os filmes que são adaptações de obras literárias e que podem ser classificados segundo as categorias acima, fazendo parte, inclusive de mais de uma categoria. Podemos citar uma breve lista de obras literárias e/ou teatrais que ganharam versões cinematográficas: 2001 – Uma Odisséia no Espaço, Desmundo, Germinal, O homem da Máscara de Ferro (também podem ser considerados como filmes de época); As Brumas de Avalon, Tróia, Odisséia, Tristão e Isolda (que se enquadram na categoria filme-mito). Sonho de Uma Noite de Verão, Hamlet, O Mercador de Veneza, adaptações da obra de Shakespeare, podem ser enquadrados como filmes de época também, além de alguns nacionais como O Cortiço, Memórias Póstumas de Brás Cubas, A Moreninha. Macunaíma, adaptação literária, também pode ser enquadrada como filme-mito. Alguns filmes serão analisados mais detalhadamente como: O Nome da Rosa, um filme de época adaptação literária e Eles Não Usam Black-tie, adaptação cinematográfica de uma produção teatral, assim como O Auto da Compadecida. Caramuru – a invenção do Brasil, é uma adaptação de um poema épico do século XVIII com diálogo com outra obra: Os Lusíadas. Outra adaptação literária é A Revolução dos Bichos, que pode ser enquadrado como filme-mito. 3. Professor de História e Historiador: utilização dos métodos de pesquisa como recurso didático Marc Ferro nasceu em 1924, na França e desde cedo dedicou-se a estudar o cinema. Integrou-se ao grupo dos Annales, trabalhando na como co-diretor da revista do grupo. É conhecido como um dos pioneiros da teorização e da aplicação da relação cinema-história. Seu artigo inaugural “O filme: uma contra-análise da sociedade” foi publicado na “enciclopédia” da Nova História, dirigida por Jacques Le Goff e Pierre Nora, Faire de l’histoire. Marc Ferro, no seu livro A manipulação da história no ensino e nos meios de comunicação, teorizou sobre os usos ideológicos do cinema. Segundo ele, “Hoje já está em tempo de se colocarem frente a frente todas essas representações NOVA, Cristiane. O cinema e o conhecimento da História. O Olho da História, 3. Disponível em: <http:// www.oolhodahistoria.ufba.br/o3cris.html> Acessado em: 16/10/2006 6 117 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS porque, com a ampliação do mundo, sua unificação econômica e fragmentação política, o passado das sociedades é mais do que nunca um dos alvos do confronto entre Estados e Nações, entre culturas e etnias. Controlar o passado ajuda a dominar o presente e a legitimar tanto as dominações como as rebeldias. Ora, são os poderes dominantes, Estados, Igrejas, partidos políticos ou interesses privados que possuem ou financiam livros didáticos ou histórias em quadrinhos, filmes e programas de televisão. Cada vez mais eles entregam a cada um e a todos um passado uniforme.” O uso do cinema no ensino de História pode contribuir para a construção de competências necessárias para o aprendizado histórico, para que o aluno desenvolva uma formação histórica. A partir de tal reflexão, propomos a necessidade de que o ensino de História, nas escolas de nível Fundamental e Médio, inclua a utilização dos meios de comunicação de massa, já que os estudantes têm acesso com grande facilidade a tais veículos. Por outro lado, é necessário que seja uma utilização crítica de tais produções culturais, e para comprovar é que iniciamos este ensaio discutindo sobre as fontes históricas e a metodologia de análise das mesmas. Tal procedimento é um caminho para uma utilização crítica da produção fílmica em sala da aula. Isso pressupõe que o professor e o historiador atuem conjuntamente neste processo. • transmitir uma memória coletiva, revista e corrigida a cada geração, que coloca o aluno diante de uma consciência coletiva; A atuação do professor-historiador em sala de aula permite que os filmes utilizados sejam compreendidos como uma representação daquela sociedade, de um determinado passado e tal representação é um discurso possível, dentre tantos outros nos quais as fontes históricas podem permitir, dependendo dos questionamentos feitos. “A linguagem própria da imagem auxiliará na construção do conhecimento histórico do aluno, construção esta que passa por elaboração de operações mentais, para resultar em efeitos sociais, como os enumerados por Jean Peyrot, citado por Henri Moniot: • formar a capacidade de julgar — comparando sociedades em épocas diferentes, e a existência delas ao mesmo tempo em locais diferentes — que tem como efeito social o desenvolvimento do espírito crítico e da tolerância; • analisar uma situação — aprendendo a isolar os componentes e as relações de força de um acontecimento ou de uma situação — que leva ao refinamento do espírito, antídoto ao simplismo de pensamento; • formar a consciência política como instrumento de coesão social, memória de um grupo que toma consciência de um destino comum. 7 Avançando para o tópico desenvolvido na sequência, compreendemos que o aprendizado pode levar à formação histórica esta, por sua vez, ajuda a nos identificar e relacionar com a consciência histórica, elemento que proporciona significação ao nosso entendimento da nossa relação com a sociedade e com o tempo. Para a construção da consciência histórica, percebemos que pode se valer de competências que são necessárias para a compreensão de um filme. 7 ABUD, Kátia Maria. A construção de uma Didática da História: algumas idéias sobre a utilização de filmes no ensino. História, São Paulo, 22(1); 2003, p. 190. 118 Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS “Na perspectiva acima, pode-se afirmar que o filme promove o uso da percepção, uma atividade cognitiva que desenvolve estratégias de exploração, busca de informação e estabelece relações. Ela é orientada por operações intelectuais, como observar, identificar, extrair, comparar, articular, estabelecer relações, sucessões e causalidade, entre outras. Por esses motivos, a análise de um documento fílmico, qualquer que seja seu tema, produz efeitos na aprendizagem de História, sem contar que tais operações são também imprescindíveis para a inteligibilidade do próprio filme.”8 Compreendemos, então, que tais competências muitas vezes são as mesmas utilizadas pelo historiador quando desenvolve uma pesquisa, assim como quando observa suas fontes procurando conexões entre os dados encontrados. Se o historiador pretende oferecer uma explicação ou uma compreensão do passado, ele utiliza-se dessas – e de outras – operações intelectuais presentes nos métodos racionais de indução, dedução e abdução, por exemplo. Cabe então ao historiador que exerce o papel de professor criar mecanismos para que tais competências sejam acionadas e percebidas pelos alunos, que passarão a utilizá-las em outros contextos além da análise fílmica. 4. Discussão sobre roteiro de análise de um filme a ser utilizado Durante os anos letivos de 2005, 2007, 2008, 2011 e 2012 aplicamos em duas escolas da rede particular de ensino, em São Paulo, um projeto de apresentação e discussão sobre filmes que reconstituem o passado, numa proposta de “revisar” o conteúdo programático de história para os alunos do nono ano do Ensino Fundamental, além dos três anos do Ensino Médio. No ano de 2005, participaram apenas os alunos do terceiro ano do Ensino Médio que prestaram provas vestibulares naquele ano. A montagem do projeto seguiu ao pedido do grupo de alunos que acompanharam os filmes durante o ano. As produções eram apresentados uma vez por semana, em dias fixos, às tardes, no horário inverso ao de aula daquelas turmas. Desta forma, apenas os alunos que podiam dispor destas horas participaram voluntariamente, sem nenhum vínculo com avaliações que fossem feitas. Aliás, as avaliações formais não foram realizadas, apenas ao final de cada discussão eles julgavam o que tinham apreendido a partir da proposta do filme do dia. Nesse aspecto, utilizamos as perspectivas da Didática da História que valoriza a narrativa como uma forma de construção e manutenção da consciência histórica. Iniciamos com um grupo pequeno de alunos que diminuiu na medida em que se aproximavam as provas, pois muitos também faziam cursinhos preparatórios. Terminamos nos anos de 2005, 2007 e 2008, com um grupo oscilante entre ficaram até a última apresentação. O processo ainda está em andamento desde o ano de 2011. A proposta da apresentação dos filmes, seguindo opção do grupo, foi uma seqüência cronológica dos acontecimentos históricos tal como se encontram distribuídos no material didático que, por sua vez, atende aos critérios das propostas de conteúdos programáticos indicados pelo sistema educacional brasileiro. Apesar do critério de escolha cronológico das obras, o 8 ABUD, Kátia Maria. A construção de uma Didática da História: algumas idéias sobre a utilização de filmes no ensino. História, São Paulo, 22(1); 2003, p. 191. (Grifos nossos) 119 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS desenvolvimento das discussões procurava estabelecer discussões temáticas, saindo da perspectiva de história linear. Destacamos assim que, mesmo trabalhando com materiais “tradicionais”, quando o professor de História conhece os meandros teóricos e metodológicos de sua profissão, consegue contornar essa dificuldade. a) F i c h a t é c n i c a : N o m e original; local e data de produção; estúdio produtor; diretor e roteirista; elenco com identificação das personagens; gênero; duração e classificação da produção. Fora nossa opção escolher filmes comerciais, recentes, para que, através das críticas, análises anacrônicas, pudéssemos debater acerca do momento histórico selecionado, revisando a historiografia, ao mesmo tempo em que foram discutidos alguns problemas da nossa sociedade, visto que os filmes escolhidos eram conhecidos pelos estudantes que, até então, os viam apenas como entretenimento. Para todos os filmes apresentados, elaboramos um roteiro de análise, contendo crítica interna e externa, para orientação dos alunos. c) Comentários: Uma breve biografia e filmografia do diretor, descrição dos conflitos durante a produção do filme, custos e críticas. Conhecer a biografia do autor fornece elementos para compreender melhor cada uma das obras, pois é possível situar o contexto em que o filme foi produzido, assim destacando a discussão que ele retoma. Gradativamente procuramos instrumentalizar a consciência histórica dos nossos como pertencentes de uma organização temporal. Por outro lado, procuramos estimular as competências de comparação, crítica, análise, e outras constitutivas de um posicionamento consciente diante da sociedade. 5. Explicação da metodologia desenvolvida Conforme destacamos acima, para todos os filmes que assistimos com os estudantes, preparamos um roteiro de análise (críticas interna e externa), cujos alunos liam antes de assistir às imagens e depois para as discussões do grupo acerca do filme. Apresentamos abaixo o esquema do roteiro desenvolvido: 120 b) Sinopse: Um breve resumo sobre o enredo do filme. d) Conceituação: Uma análise, com base na historiografia referente ao assunto, sobre o período que o filme procura retratar. e) Roteiro de análise das imagens: Uma forma de direcionar o olhar dos alunos para determinados pontos do filme que podem tanto destacar aspectos do tempo representado quanto da sociedade em da qual o filme é produto. Neste ponto são colocadas interrogações acerca de práticas, convenções e mesmo o uso de cores e características das personagens. f) I n t e r d i s c i p l i n a r : U m a proposta de colocar o filme como um trabalho interdisciplinar, através de sugestões de pesquisas ou questões envolvendo outras áreas do conhecimento. Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS g) Para refletir: São levantadas, nesta parte, várias questões que propõe que o aluno pense na relação passado-presente, na observação de permanências e rupturas e na ideologia da sociedade na qual ele vive pretende que seja a “certa”. h) Bibliografia: Apresentamos a bibliografia consultada para a montagem de cada um dos roteiros, disponibilizando inclusive endereços de websites para os alunos que se interessarem em pesquisar mais sobre o assunto. 6. Avaliação da utilização e vantagens e desvantagens Gostaríamos de destacar que esta metodologia é apenas uma possibilidade, que não pretende ser única. Para os níveis do ensino com o qual trabalhamos, tal metodologia funcionou satisfatoriamente, Entretanto, para o Ensino Fundamental a mesma metodologia foi além dos limites de assimilação dos estudantes, sendo necessárias determinadas reduções. O que não significa que o professor-historiador não possa montar tal roteiro. Entendemos que um roteiro como este, pode ajudar inclusive o professor na organização de discussões, mesmo que a turma não tenha acesso ao roteiro. Destacamos ainda que o projeto tem o caráter escolar, não pretendendo oferecer uma análise historiográfica acadêmica da produção fílmica. Este fato não nos impediu de utilizarmos a metodologia acadêmica para conseguirmos montar tais esquemas, conforme discutimos nos itens sobre a formação do historiador, do professor de História e o tratamento das fontes. A proposta é abrangente, porque estimula nos alunos um olhar crítico sobre os produtos que eles e a sociedade toda consomem de forma mecânica. Muitos deles relataram que durante as provas dos vestibulares, ou outros testes realizados, eram as imagens dos filmes que os ajudavam a relembrar e reorganizar o conhecimento na hora de responder às questões. Desta forma, avaliamos o resultado como positivo, pois, até outras disciplinas foram contempladas pelas “lembranças” dos filmes e pelas discussões em torno dos mesmos. Acreditamos que tal fato seja vantajoso, já que os alunos tiveram acesso ao mesmo conteúdo que teriam pela forma escolar, porém numa linguagem muito mais agradável e inteligível a eles. Observamos algumas desvantagens como: a falta de estrutura (equipamentos, salas adequadas) para que os alunos pudessem assistir aos filmes de forma confortável, visto que são filmes de longa duração. A dificuldade que muitos tiveram pelo fato de as seções acontecerem em horários diferentes aos da grade escolar. Se as sessões fossem durante o horário das aulas, um número maior de alunos tivesse acesso. Entretanto, uma iniciativa como essa precisaria deixar de ser um costume isolado de um ou outro professor, como foi no nosso caso, para ser uma proposta realmente interdisciplinar. 121 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS 7. Comparação de linguagens: literatura e cinema e as possibilidades de análise das adaptações cinematográficas que articulam o conhecimento histórico. Esse mesmo procedimento pode ser utilizado para que indivíduos e grupos se orientem no tempo, utilizando assim a consciência histórica. Já apontamos anteriormente que o cinema passou, e em muitos casos ainda convive com conflito de identidade. Ao dialoga com a música, com a literatura, com o teatro, com pintura e escultura, a produção fílmica engloba todos os tipos de arte. Ao empregarmos outra linguagem, a imagética, conseguimos, de certa forma, dar cor e forma às ideias abstratas. É nesse ponto que percebemos que a utilização do cinema complementa tais operações mentais que tanto podem partir de abstrações quanto podem chegar a elas. Isso significa dizer que tanto podemos iniciar a construção de conceitos históricos através da abstração, para depois se consolidarem através das imagens, quanto podemos partir das imagens para a construção de conhecimentos abstratos. Para os limites desta reflexão, pretendemos levantar algumas questões sobre as relações entre cinema e literatura, principalmente. São duas formas de narrativas que, com seus diferentes formatos, podem contribuir para a construção da narrativa sobre a história que cada um pode fazer, no sentido de perceber e consolidar a consciência histórica. A literatura tem uma característica que pode contribuir e muito para a construção do conhecimento da História. Trata-se do uso da linguagem escrita. Esta, conforme se desenvolve, logo que o indivíduo dela se apropria, tem maior a capacidade de abstração, de uso de pensamento racional. Conhecer e compreender a história escrita exige que o pensamento racional tenha competências de sistematização, comparação, estabelecer conexões e relações, que podem ser apropriados a partir da linguagem. Aliás, compreendemos que um pensamento só se efetiva através de palavras e quanto maior for o domínio das mesmas, melhor será a capacidade de encadeamento de pensamentos, ideias. Em grande parte, o pensamento que gera a História escrita funciona através de analogias, operações mentais complexas 122 É importante destacar que há um diálogo entre as duas linguagens. Muitas obras cinematográficas são, em sua origem, obras escritas, mesmo que não tenham sido adaptações de obras literárias. Nesse ponto é importante destacar que o que vemos nas telas é apenas uma parcela de um trabalho imenso que se inicia quase sempre em um roteiro escrito. As ideias estão ali colocadas e precisam ser transformadas em imagens. Quantas páginas José de Alencar utilizou para descrever sua Iracema? Em quanto tempo de filme essa descrição se realiza? Outra importante característica dos filmes com conteúdo histórico é a de que existe toda uma equipe que se dedica ao levantamento de aspectos visuais da época retratada. É um verdadeiro trabalho de pesquisa. Lembremos o filme O nome da rosa. A história se passa em um mosteiro do século XIV. Para Umberto Eco descrever em palavras há uma complexidade. Para Jean-Jacques Anaud, Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS diretor do filme, descrever em imagens requer outro grau de complexidade. A preocupação com a verossimilhança em muitas obras faz com que equipes inteiras se desdobrem para sua reconstrução, como no caso do filme citado, que teve assessoria do medievalista Jacques Le Goff. Teoricamente, se o historiador pretende que sua escrita proporcione ao seu leitor a consciência histórica capaz de orientá-lo em sua vida prática, a comparação das linguagens, culminando na imagética, pode proporcionar o reconhecimento da situação representada e até mesmo a identificação do pertencimento a um tempo. Quando se inicia pela leitura para depois usar a imagem cinematográfica – opção que geralmente utilizamos na Educação Básica, trabalhamos com as várias competências que podem contribuir para a construção e manutenção de uma consciência histórica, já que nossos alunos têm chances de identificar como a mesma aparece na cultura histórica. . Referências Bibliográficas ABUD, Kátia Maria. A construção de uma Didática da História: algumas idéias sobre a utilização de filmes no ensino. História, São Paulo, 22(1); 2003 ALMEIDA, Juniel Rabêlo de; ROVAI, Marta Gouveia de Oliveira (Orgs.) Introdução à História Pública. São Paulo: Letra e Voz, 2011. ALVES, Giovanni; MACEDO, Felipe. 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Desde seu surgimento, tem suscitado inúmeras críticas, muitas positivas, outras negativas, mas seu caráter de produto cultural e sua capacidade de alcance tem chamado a atenção de inúmeros setores. Nos anos 20, nos EUA, a indústria cinematográfica ganhou grande destaque, colaborando para a disseminação de um Keywords: Cinema; History; Cinema Brasileiro; Labor Movement; Unionism. sentimento de euforia com o vertiginoso progresso norte-americano. Na década de 30, foi a vez dos governos nazifascistas utilizarem a força do veículo para organizarem uma gigantesca e irresistível propaganda política de divulgação da ideologia dominante. Nas décadas seguintes, o cinema continuou demonstrando cada vez mais o seu potencial como produto, artefato cultural e difusor de ideologias, passando a 1Silene Ferreira Claro - Doutora em História Social pela FFLCH-USP (2008). Bacharel em História pela Universidade de São Paulo (1999) e graduação em Licenciatura em História pela Universidade de São Paulo (1999). Docente no Curso de Pedagogia nas Faculdades Integradas Campos Salles, cadeira de Metodologia do Ensino de História, Tecnologias da Informação e Comunicação aplicadas à Educação e História da Educação. Docente nos cursos de História e de Pedagogia da Faculdade Sumaré. Fui professora do Centro Universitário Sant’Anna e monitora PAE no Departamento de História da Fac. de Filosofia, Letras e Ciências Humanas – USP, em 2005. Experiência na área de História, com ênfase em História Regional do Brasil, Historiografia e História do Brasil Contemporâneo, África e cultura Afro-brasileira, atuando principalmente nos seguintes temas: educação, cultura brasileira, história cultural, didática do ensino de História e uso de tecnologias na e para a educação. Membro do NDE - Núcleo Docente Estruturante, dentro da Faculdade Sumaré desde agosto de 2012 e também no Centro Universitário Sant’Anna, nos cursos de Licenciatura em História e de Música, conforme orientações do MEC, entre 2008 e 2010. Colaboradora do NDE das Faculdades Integradas Campos Salles. Autora colaboradora na Editora Oxford do Brasil desde 2011. Fui tutora no curso da Escola de Formação de Professores Paulo Renato de Souza na edição de preparação de cursistas para o concurso em 2011. Atuo também como professora de História, Sociologia e Filosofia nos ensinos Fundamental e Médio, na rede privada, em Osasco-SP. E-mail: [email protected] 127 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS influenciar o comportamento de milhões de pessoas. Sendo produto cultural, o cinema deve ser pensado como reflexo da lógica capitalista que pretende alcançar o lucro planejado em sua idealização. Como difusor de ideologias, pode construir ou destruir sistemas de pensamento. Em ambas perspectivas um filme pode, também, ser considerado e analisado como fonte histórica, que ajuda a desvendar muitas facetas de um mesmo objeto. É interessante como um filme tem o poder de agregar e revelar a visão que um determinado segmento tem de seu tempo. Um filme analisado como uma fonte histórica deve estar sujeito às críticas interna e externa. Assim, as primeiras informações que precisamos ter são as condições de produção. Identificar equipe técnica, elenco e empresa financiadora. Todas essas informações, e também a recepção do público, nos ajuda a entender sobre quem produz para quem e como o produto repercutiu. A crítica interna é a análise do enredo perseguindo os vestígios, ideologias explícitas e implícitas da sociedade que o produziu e recebeu. É dentro da perspectiva acima que procuramos analisar o filme Eles não usam Black-Tie, produção nacional de 1981, sob a direção de Leon Hirszman, com adaptação e roteiro de Giafrancesco Guarnieri, ambos militantes ligados à esquerda comunista durante as décadas de 60 e 70, e que utilizavam a arte que produziam como uma forma de engajamento político, acreditando que assim, colaboraram para a conscientização da sociedade. 128 O filme é uma adaptação de uma peça teatral encenada pela primeira vez em 1958. De Guarnieri, Eles não usam BlackTie, escrita quando o artista tinha ainda 24 anos de idade, representa uma inovação no mundo do teatro por dois motivos: primeiro, porque promoveu a recuperação do Teatro de Arena de São Paulo e, segundo, porque foi a primeira peça a introduzir uma temática popular. A história encenada em 1958 apresentava o movimento operário e o cotidiano das favelas do Rio de Janeiro na década de 50. A transposição de tal temática para o cinema, vinte anos depois, exigiu efetiva intervenção no roteiro, o que foi feito pelo próprio autor. No filme, Eles não usam Black-Tie vemos a representação de São Paulo no final dos anos 70, destacando o movimento operário e a sua intervenção e a luta pela redemocratização do país. Inicialmente o filme foi proibido no Brasil, entretanto, depois de receber inúmeros prêmios como o Leão de Ouro do Festival de Veneza, dentre outros, o governo brasileiro foi obrigado a liberar a sua exibição. Com isso, dentro e fora do Brasil, Eles Não Usam Black-Tie ganhou grande repercussão. Os militantes Hirszman e Guarnieri conseguiram atingir grande parte do público que desejavam e se lançaram no cenário artístico nacional devido ao sucesso do filme. Recentemente, a história foi encenada nos palcos de São Paulo, em 2001, e do Rio de Janeiro, em 2007, o que demonstra a narrativa que procurava ser uma crítica da sociedade durante a década de 50 ainda é atual. Constatação que nos leva a refletir que mesmo após 50 anos alguns problemas na nossa sociedade ainda continuam atuais. Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS 2. Análise historiográfica do filme Nossa análise do filme Eles não usam Black-Tie foi organizada em eixos temáticos. O agrupamento foi escolhido como forma metodológica de discutir o maior número de temas suscitados pelo filme, procurando evitar a dispersão da análise. Os eixos temáticos escolhidos são: o cotidiano da classe trabalhadora e o mundo do trabalho; o movimento operário e a crítica à sociedade perpassam os eixos. 3. O cotidiano da classe trabalhadora As imagens do filme, juntamente com os diálogos e trilha sonora escolhidos nos permitem fazer uma leitura do cotidiano sofrido, repleto de tensões e conflitos de todos os tipos. O cenário apresentado desperta uma sensação de aridez e desconforto, sugestionando as dificuldades da vida do trabalhador brasileiro. A própria organização da casa das personagens centrais – Otávio e Tião -, espelha a dinâmica do grupo. Moradia pequena, sem muitos móveis, com o filho mais novo da família dormindo na sala, mal acomodado. A questão da privacidade também é enfatizada, visto que o sono do jovem não é motivo para a família deixar de se reunir na sala muito tarde da noite. As reuniões familiares ocorrem geralmente em horários que acabam diminuindo a duração do contato, visto que ocorrem à noite, antes de dormir cedo, “pois amanhã é dia de trabalho”, frase que é repetida frequentemente no filme. As refeições matinais acontecem sempre com alguns membros da família em pé ao redor da mesa, continuamente com pressa. Estas duas observações nos remetem à ideia de que o trabalho impunha os horários para os trabalhadores. Ratificando tal ideia, destacamos a relação entre o pai, Otávio, e o filho, Tião, que trabalham na mesma fábrica, mas nem sempre conseguem se encontrar. Assim, além confirmar a ideia do tempo da fábrica, é ressaltado que o trabalho acaba se interpondo nas relações sociais. As relações sociais entre as pessoas, nos poucos momentos em que não estão trabalhando, costumam acontecer em um bar, no qual os operários se encontram frequentemente para conversar e compartilhar a bebida. A estável recorrência à bebida, como uma forma de amenizar o sofrimento, ou, como aparece na fala de Otávio, “calibrar”, reforça a ideia do cotidiano sofrido que só pode ser suportado se tiver alguma compensação: no caso, a bebida. A única personagem que foge desses espaços de sociais é Tião, no início do filme, que aparece saindo do cinema, junto com a namorada. Tião é um operário que procura outros padrões de vida, moldes burgueses, e o fato de ser o único que rompe com o circuito casafábrica-bar, sugere a sua desvinculação da classe. A violência familiar também é sugerida quando as cenas estão voltadas para o núcleo da família de Maria. Em um primeiro momento, ao chegar a casa, ela ouve gritos de socorro de uma mulher, que apanhava do marido. Ninguém ajuda a personagem, a qual ouvimos somente a voz. Uma referência à violência contra a mulher da qual a sociedade se omitia. Também, dentro da família de Maria o mesmo assunto é abordado, quando o 129 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS irmão dela sugere que o pai bêbado bateria na mãe deles, que iria “começar de novo”. Na cena do confronto final entre Maria e Tião, ele chega a bater nela, mais uma demonstração de uma sociedade machista p r a t i c a n t e d a v i o l ê n c i a f a m i l i a r, principalmente contra mulheres e crianças. Outra questão sutil apresentada é a vida das pessoas influenciadas pela programação da televisão. Nas cenas em que o televisor aparece, geralmente são mostrados programas da TV Globo, como o Fantástico. O fato de todos assistirem aos mesmos programas nos indica o controle exercido sobre a população pela emissora naquele momento. Apesar de Eles Não Usam Black-Tie ser uma obra datada, com um discurso político muito claro, as questões cotidianas dos trabalhadores não parecem ter sido superadas totalmente. Se hoje, uma boa parte da população tem acesso às linhas de crédito para consumirem cada vez mais os produtos eletrodomésticos, que oferece uma falsa sensação de ascensão social, um grande número de pessoas continua vivendo com seus aparelhos em moradias em péssimas condições, em bairros sem a infraestrutura necessária. A TV Globo continua a influenciar cada vez mais a vida das pessoas transformando o comportamento de gerações inteiras. E, a recorrência às bebidas continua existindo. As permanências históricas se fazendo presente, muito mais que as rupturas, tão necessárias nesses casos. 4. O mundo do trabalho Neste eixo temático o filme sobrepõe três profissões diferentes, sem, no entanto, aprofundar no diálogo entre eles. As 130 profissões são: metalúrgicos; office-boys e operários da construção civil. O trabalho mais mostrado é dos metalúrgicos, que obtém destaque e são representados como uma classe organizada e preocupada com seus problemas As demais aparecem quase que desconectadas, como se houvesse uma hierarquização entre as profissões. Por outro lado, não podemos esquecer de que o filme é datado e produzido dentro do ressurgimento do movimento operário tendo como base a redemocratização do país, numa obra produzida por artistas militantes da esquerda, que tinham alguns posicionamentos políticos que se misturam com a obra. A referência aos office-boys é sutil. Ocorre logo no início do filme quando Tião e Maria chegam a casa dele, e o jovem irmão de Tião dorme na sala. Ao acordar, conta para o irmão sobre o sonho com o time de futebol dos office-boys. Outra alusão acontece quando Otávio, saindo para trabalhar, lembra a esposa, Romana, de não deixar o filho mais novo, Chiquinho, perder a hora, pois não podia “ser descontado” de novo. Nesta família proletária, todos precisam contribuir trabalhando e a referência ao emprego do filho mais novo sem muita discussão reforça a ideia de hierarquização entre as profissões. Entretanto, uma referência às greves de 1979, na qual bancários e officeboys ensaiaram uma greve que, apesar de ter sido duramente reprimida, serviu para mostrar para a sociedade a importância da organização. A construção civil também é destacada no filme através do pai de Maria. O homem que passava a maior parte do tempo embriagado, devido às péssimas condições da família por sua falta de Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS emprego, só consegue se libertar, temporariamente do alcoolismo quando encontra um emprego. A ilusão de um futuro melhor é logo destruída pela morte em um assalto. Mas, a breve cena em que aparece, demonstra um grupo sem coesão. Ao contrário dos metalúrgicos que utilizam uniformes, gerando um elo a mais de identificação, os operários da construção civil não se identificam nem pela aparência. movimento operário da década de 50, quando existia certa disputa entre “nacionais” e “estrangeiros”. Entretanto, tais conflitos eram pequenos. O mais provável é a referência ao movimento operário em seus primórdios, quando a presença imigrante nas indústrias brasileiras, muitos influenciados por anarquistas e posteriormente comunistas, se fez mais presente, principalmente na década de 20. O núcleo metalúrgico é o grande destaque do filme. Entretanto, o filme enfatiza poucas vezes a linha de produção e montagem, porém quando são mostradas a iluminação e a escolha de ângulos ajudam a reforçar a sensação de péssimas condições de trabalho O próprio som da fábrica colabora para aumentar essa percepção. A questão do arrocho salarial que soterrava o poder de compra dos trabalhadores é notado em vários diálogos: dentro da fábrica, mas principalmente nos confrontos entre Otávio e Tião. Este último em vários diálogos faz referência às péssimas condições salariais representadas nas condições de vida da família, desacreditando assim do movimento operário como forma de conquistar melhorias. Desse modo, observa-se o confronto entre o coletivismo de Otávio, consciente de que os ganhos maiores são os da classe, como o individualismo de Tião, que discute ao longo do filme a questão de que a realização na vida é resultado do esforço individual. E, a introdução do FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço), dispositivo criado pelos governos militares para quebrar a estabilidade no emprego, só aparece na fala de Tião, que reconhece tal benefício como mais um ganho individual. Desta forma, Tião não se compromete e nem se preocupa com a classe. A crítica é em relação ao FGTS é uma análise à legislação criada para enfraquecer o trabalhador diante do poder do capital e dos governos militares. O FGTS está incorporado à mentalidade trabalhista e, atualmente, devido à ampliação do mercado informal de trabalho, é cada vez menor o número de Entretanto, o maior destaque dado as cenas da fábrica são os encontros, as conversas nos vestiários, refeitórios, entrada ou saída do estabelecimento. Provavelmente são nesses diálogos que repousam a grande crítica que o filme deseja fazer: o papel do sindicato na organização operária, dos partidos de esquerda dentro do sindicato. Há também a discussão em torno do peleguismo, tanto dentro do sindicato quanto na própria fábrica. Eles Não Usam Black-Tie está muito afinado com o momento em que foi produzido, pois a grande organização dos trabalhadores ocorreu principalmente dentro das fábricas e não pela ação sindical, já que os sindicatos estavam controlados pelas autoridades naquela época. Um anacronismo precisa ser apontado no discurso: a personagem chamada de “italiano” é muito mais referência ao 131 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS trabalhadores que podem contar com tal benefício, por mais desagregador que tenha sido em sua origem. Mas, apesar da introdução da questão do FGTS, os operários no filme são demitidos por questões políticas ou pessoais, não por falta de posto de trabalho. Isso aparece nas falas de Otávio e Tião: ambos afirmam que, se perderem o emprego, não demorariam muito para encontrar outro, pois tinham uma profissão. Novamente o destaque para a categoria metalúrgica. Atualmente, o movimento operário encontra-se mais enfraquecido, visto que o desemprego é uma realidade entre milhões de pessoas ao redor do mundo, decorrentes das novas formas de organização do trabalho, com valorização de um novo tipo de formação flexível, como fragmentação da produção, associada à automação. Se nos anos 70 o desemprego entre os metalúrgicos não era fator desagregador da união da categoria, atualmente ocorre o contrário. 5. Movimento operário e crítica social Do núcleo metalúrgico passamos para a questão da greve que é o debate principal do filme. A divisão entre os operários aparece em algumas cenas, como quando discutem no vestiário da fábrica, assim como saem do sindicato ou se encontram no domingo no campo de bocha, refletindo as críticas ao sindicalismo da época. De um lado há os partidos de esquerda (partidos comunistas), criticados pela extrema burocratização ou pela opção em agir violentamente. Os operários procuravam um movimento que 132 implicasse, em sua essência, luta pelas questões econômicas e salariais. A violência policial é discutida durante todo o filme, de forma explícita, às vezes, e de forma implícita outras situações. Essa realidade não afetava apenas o movimento operário, mas estava em todas as esferas. Em vários momentos a repressão é mencionada ou mostrada Uma das primeiras cenas do filme é de uma batida policial em que o dono do bar media o contato entre os oficiais e o grupo de músicos. Outras cenas, como a da morte do ladrão nos fundos do mesmo bar, sendo ouvida por Otávio e Tião, sugerem a sensação da indignação calada a força. A personagem de Fernanda Montenegro, Romana, esposa do sindicalista Otávio, e mãe de Tião, no momento da greve fez inúmeras recomendações, para os dois, como para levarem documentos e endereço, pois de acordo com a fala da personagem: “se acontecer alguma coisa ficamos sabendo logo”. A repressão à greve, primeiro com o cordão de isolamento para os trabalhadores entrarem na fábrica, depois a perseguição e espancamento, principalmente das operárias. Por fim, o assassinato de um dos companheiros de Otávio durante o piquete por um policial militar. A consciência e a coragem no filme são representadas pelas mulheres Maria e Romana. Uma incentiva o noivo a participar da greve, ser solidário com a classe. A outra salva o marido das garras do DOPS, uma demonstração de que a sociedade civil havia perdido o medo e estava pronta para lutar por sua liberdade e seus direitos. “Por fim, há o debate sobre o aborto, uma temática que aparece nos diálogos Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS entre Tião e Maria, assunto que é discutido entre Tião e Maria, o aborto é abordado como um meio de solucionar problemas”. A questão do aborto no filme aparece disputa de gênero entre o casal. Mas, o debate continua muito atual. A descriminalização do aborto recentemente, com a vinda do Papa Bento XVI, em maio de 2007, voltou aos debates de religiosos e autoridades. Após análise, observamos que o filme mesmo não sendo uma produção atual, ainda trata de questões, que ainda hoje são atuais em nossa sociedade. Por outro lado, algumas rupturas são sugeridas relacionadas com as características do mundo do trabalho na sociedade globalizada. Se há trinta anos os trabalhadores eram frágeis diante do capital, atualmente encontram-se muito mais vulneráveis, pois a sociedade atual pressupõe melhor qualificação visto que os processos de produção utilizam automação. Por outro lado, os trabalhadores têm mais responsabilidades pela qualidade ao longo do processo. Os sindicatos não conseguem mais representar as classes operárias, primeiro porque a maior parte da população economicamente ativa encontrase no setor terceirizado. Segundo, com o surgimento das transnacionais, as empresas quebraram a força das categorias, pois a qualquer momento podem fechar uma unidade e reabrir em outra localização. Assim, o movimento operário não conseguiu superar as inúmeras dificuldades ao longo dos anos e, a atual estrutura do mercado de trabalho coloca outras tantas para o trabalhador resolver. 6. Roteiro de Análise do Filme Filme: Eles não usam Black Tie Título Original: Eles não Usam BlackTie Ano de Lançamento (Brasil): 1981 Distribuição: Embrafilme Direção: Leon Hirszman Roteiro: Gianfrancesco Guarnieri e Leon Hirszman Produção: Leon Hirszman Produções e Embrafilme Música: Adoniran Barbosa, Chico Buarque de Hollanda e Gianfrancesco Guarnieri Fotografia: Lauro Escorel Desenho de Produção: Jefferson Albuquerque Júnior e Marcos Weinstock Figurino: Yurika Yamasaki Edição: Eduardo Escorel Elenco: Gianfrancesco Guarnieri – Otávio; Paulo José – Padre; Francisco Milani – Santini; Milton Gonçalves – Bráulio; Fernanda Montenegro – Romana; Bete Mendes – Maria; Antonio Petrim – Tião; Carlos Alberto Ricelli – Tião. Locação das imagens: São Paulo Gênero: Drama Duração: 134 minutos 6.1. Sinopse: O filme se passa na cidade de São Paulo, em 1980, narrando a história do jovem operário Tião e sua namorada Maria que decidem se casar, pois descobrem que a moça está grávida. Ao mesmo tempo, eclode um movimento grevista que divide a categoria metalúrgica. Preocupado com o 133 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS casamento e temendo perder o emprego, Tião fura a greve, entrando em conflito com o pai, Otávio, um velho militante sindical que passou três anos na cadeia durante o regime militar. 6.2. Comentários: O filme foi dirigido por Leon Hirszman (1937-1987), engenheiro de formação, mas que escolheu o cinema como profissão. Filho de judeus poloneses, transformou-se em um marco na cinematografia nacional, pois é considerado um ícone Cinema novo, era considerado pelos colegas como o “maior articulador” do cinema brasileiro. Destacou-se na direção de A Falecida, adaptação de Nelson Rodrigues, e São Bernardo, adaptação da obra de Graciliano Ramos. Com a obra Eles não usam BlackTie, recebeu os prêmios Leão de Ouro do Festival de Veneza, o Grande Prêmio Coral Negro no 3º Festival Internacional do Novo Cinema Latino-Americano; Grande Prêmio do Festival dos Três Continentes; Espiga de Ouro do Festival Internacional de Vallodolid. E em 1982 obteria o Prêmio Air France.. Hirszman destaca-se também por sua notória politização e militância comunista (PCB) desde a juventude, produzindo filmes sempre engajados. Hirszman fez vários estudos sobre produção cinematográfica que serviram de estudos para a legislação de proteção ao cinema brasileiro. Morreu aos 50 anos vítima da AIDS. Filmografia: Bahia de Todos os Santos (interrompido, 1984) - direção (junto com Paulo Cesar Sarraceni); Imagens do Inconsciente (1983-86) - roteiro e direção; Eles Não Usam Black-Tie (1981) - roteiro (junto com Gianfrancesco Guarnieri) e direção ABC da Greve (1979-90) - roteiro 134 e direção; Que país é este? (1977) - roteiro (com Zuenir Ventura) e direção; Rio, Carnaval da Vida (1977) - roteiro (junto com Sérgio Cabral) e direção; Partido Alto (1976-82) - roteiro e direção; Cantos do Trabalho: Cacau (1976) – direção; Cantos do Trabalho: Cana-de-açúcar (1976) – direção; Cantos do Trabalho: Mutirão (1975) – direção; Cinema Brasileiro: Mercado Ocupado (1975-95) - roteiro e direção; Megalópolis (1972) – direção; Ecologia (1972) – direção; São Bernardo (1972) - roteiro e direção; A Vingança dos 12 (1970) - produção executiva; Garota de Ipanema (1967) - roteiro (com Eduardo Coutinho) e direção; A Falecida (1965) roteiro (com Eduardo Coutinho) e direção; Sexta-Feira da Paixão, Sábado de Aleluia (1964) – direção; Nelson Cavaquinho (1964) – direção; Maioria Absoluta (1964) - roteiro e direção; Pedreira de São Diogo (1962) - roteiro e direção; A Mais-Valia vai Acabar, seu Edgar (1959-60) - colagem de filmes usada na peça de Oduvaldo Vianna Filho; Juventude sem Amanhã (1958) assistência de direção Giafrancesco Guarnieri, artista de cinema, teatro e televisão, italiano de nascimento e brasileiro de adoção, foi o autor da peça que deu origem ao filme. Inicialmente chamava-se O Cruzeiro Lá no Alto, estreado no Teatro de Arena em 1958, numa provocação ao TBC (Teatro Brasileiro de Comédia), foi rebatizado de Eles não usam Black-Tie, primeira apresentação teatral que levou o cotidiano dos trabalhadores para os palcos. Guarnieri também é roteirista do filme de 1981, fazendo algumas adaptações para a linguagem cinematográfica e também para o período, mais de vinte anos depois da estréia no teatro. Guarnieri, como Hirszman, também militou desde a Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS juventude. Os dois se conheceram nos anos 60 em atividades relacionadas com o CPC (Centro Popular de Cultura) e a UNE (União Nacional dos Estudantes). O filme foi distribuído nos EUA pela New Yorker Films com o título de They Don't Wear Black Tie. 6.3. Conceituação: O final da década de 1970 foi marcado por muitas transformações no Brasil com o enfraquecimento dos governos militares, de um lado, e o ressurgimento do movimento operário no Brasil. O modelo econômico baseado no desenvolvimentismo adotado pelos militares levou a classe trabalhadora a grandes perdas salariais, pois, associado a tal modelo econômico, o governo aplicou uma política econômica de arrocho salarial e manipulação dos dados econômicos. Tais medidas promoveram uma perda real no poder de compra dos salários dos trabalhadores de cerca de 30%. Por esta conjunção de motivos, em 1978 acontecem as primeiras greves do movimento operário, a partir dos metalúrgicos do ABC Paulista. As greves, apesar da dura repressão que sofreram, continuaram em 1979 e 1980, despertando a adesão da população que enxergou nas greves por questões salariais um bom momento para ampliar os protestos para o campo político. Desta forma, o movimento operário do final dos anos 70 serviu de base para a organização da sociedade civil contra os governos militares. Do ABC logo se alastraram por outras regiões de São Paulo, sempre contando com o apoio da Igreja Católica. principalmente no interior das fábricas. Nas greves de 1979 ocorreu a morte do operário Santo Dias em um piquete, assassinado pela PM de São Paulo. A missa deste trabalhador tornou-se uma espécie de símbolo e de alimento para a ampliação das lutas. Nessa movimentação ocorre a campanha pela Anistia em paralelo com o surgimento do Partido dos Trabalhadores, um dos grupos articuladores da subseqüente campanha pelas Diretas-Já. 6.4. Roteiro de análise das imagens: Observar nas cenas: •A moradia dos operários e a sua organização interna. •As relações familiares nos vários momentos de encontro entre os membros, sempre com pressa e discutindo sobre o trabalho. •A violência policial em todos os setores da vida das pessoas. •Os espaços de sociabilização das pessoas: a fábrica, o sindicato e o bar. •A vida, as moradias e a falta de infra-estrutura nas favelas. •Relação entre gêneros. •O processo de produção na linha de montagem. •A organização de greves e as disputas internas dentro do movimento. •A busca dos padrões burgueses como casa, conforto, escola particular. •Discussões sobre aborto. Foi um movimento desvinculado de orientações partidárias, organizando-se 135 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS 6.5. Interdisciplinar: ✓ Estudar, através da História, o período dos governos militares no Brasil. ✓ Estudar, através da Geografia, as mudanças no mundo do trabalho dentro da sociedade globalizada. Eles não usam Black-tie. Direção de Marcus Vinícius Faustini. Em cartaz no Teatro Sesi do Rio de Janeiro. Esteve em cartaz em São Paulo em 2001. 6.7. Para Refletir 6.6. Refilmagens ou obras relacionadas 1. Quais são as novas características do sindicalismo brasileiro dentro de uma sociedade em que um grande número de trabalhadores está no mercado informal? Eles não usam Black-Tie. Peça teatral escrita em 1955 por Gianfrancesco Guarnieri e encenada no Teatro de Arena em 1958. 2. A inclusão de novas camadas no teatro pode ser considerada uma busca do popular real, influência dos pensamentos modernistas? GUARNIERI, Gianfrancesco. Eles não usam Black-Tie. São Paulo: Civilização Brasileira, 1995. 3. Qual a importância da legislação trabalhista dentro do Brasil contemporâneo? É necessário modificá-la ou ainda é capaz de organizar o mundo do trabalho no país? Referências Bibliográficas ALMEIDA, Juniel Rabêlo de; ROVAI, Marta Gouveia de Oliveira (Orgs.) Introdução à História Pública. São Paulo: Letra e Voz, 2011. ALVES, Giovanni; MACEDO, Felipe. Cineclube, Cinema & Educação. Londrina: Práxis, Bauru: Canal 6, 2010. ALVES, Giovanni. Trabalho e Cinema: o mundo do trabalho através do cinema. Londrina: Práxis, 2006. ALVES, Giovanni. Trabalho e Cinema: o mundo do trabalho através do cinema. Londrina: Práxis, Bauru: Canal 6, 2010 (Volume 3). ANTUNES, Ricardo C. O que é sindicalismo. 14ª ed., São Paulo: Brasiliense, 1988. BARROS, José D’Assunção. O campo da História: especialidades e abordagens. 6. Ed., Petrópolis: Vozes, 2009. BARROS, José D’Assunção. O projeto de pesquisa em História: da escolha do tema ao quadro teórico. Petrópolis: Vozes, 2009. BUARQUE, Fernanda. 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Desta forma, promove-o e determina seu deslocamento, sua hora de acordar, de levantar, de se ligar e desligar - universo simbólico, espaço de tranform/ação. Participa com ele em condições de orientá-lo, de determinar a relação, e todo o tempo, ambos permanecem alerta, vendo e sendo vistos. A missão da empresa integra todos os recursos que o homem precisa para se orientar, ou seja, os vínculos comunicacionais. Entra em sua vida com tamanha impetuosidade que marca o seu cotidiano, governa o seu sentido e a sua presença, mesmo quando ausente. Longe da empresa, o homem mantém sua forma de comunicação e interação, programada por ela: a missão organizacional. Assim nas interações humanas no espaço social do trabalho tanto o homem quanto a empresa se transformam enquanto dançam em um jogo que devora e faz devorar – a norma, por ser transforma/ dor. Palavras-chave: Missão Organizacional; Aquisição de Competência, Comunicação, Cultura e Universo Simbólico; Vínculos Comunicacionais; Espaço de transform/ ação. Abstract Investigations concerning on the organizational mission - mediator text about the employee to reach to a conjunction – seek the comprehension of the strength mission about worker. The mediation mission enables such cohesion 1Doutora em Comunicação e Semiótica pela PUC/SP. (2005), Mestre em Administração de empresas pelo Mackenzie/SP. (1999). Especialista em Administração. de RH pela UNA. União de Negócios Adm. de BH, MG. (1995), e especialista em Tecnologia Educacional pela UNINOVE SP. (2000), é Psicóloga graduada Newton Paiva de BH/ MG. (1991). Atualmente é Profa convidada pela Pós-graduação do Mackenzie. Desde 2006 é avaliadora INEP. Profa. Dra, Pesquisadora da Faculdade ENIAC, coordena grupos de pesquisa e iniciação científica, organizadora dos Seminários Anuais desde 2009 e da Revista Acadêmica ENIAC PESQUISA. É Profa. Dra. Pesquisadora, coordenadora de Cursos e da Revista Acadêmica Augusto Guzzo das Faculdades Integradas Campos Salles - FICS desde agosto de 2010. Consultora da Euroatlantica Ghesa Brasil Ltda. 139 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS in this relationship that the employee goes beyond the representation of a role in the acquisition of competence. In the process of identification with the company he becomes subject to this higher category through the action of the mission. The text role in the mission - communication and culture - be constituted in a continuity, and emphasizes and talks to the employee as the subject. Thus promotes and determines its displacement, time to wake up, get up, turn on and off; symbolic universe and space transformation. Participating with him under conditions of guide him and determine the relationship, and the whole time, both of them remain alerts seeing and being seen. The company mission connects all resources that man needs for guidance - communication links. It comes into your life with such 1. Introdução Nesta investigação, propomos-nos a analisar a relação do sujeito, missão da empresa e do funcionário, objeto valor, e a forma como o sujeito possui a competência de promover o reconhecimento do objeto, a despeito da sua diferença, fazendo dele uma parte integrante de si. O corpus, missão, vai abordar o objeto de construção, para dar sentido à sua vida no espaço organizacional. Ele será re/construído a partir dos valores da empresa que serão transmitidos pelo texto da missão. O funcionário vai ficar contaminado pelas crenças da empresa e vai se despojar de suas próprias crenças. O afastamento das próprias crenças é difícil porque elas fazem parte da construção da vida, tanto do sujeito como do objeto. Mas a missão é um sujeito que 140 impetuosity that let a mark in your daily life, governs its meaning and presence, even when absent. T he man, far from the company, keeps his communication way and interaction, for her scheduled the organizational mission. Scheduled for her organizational mission. Therefore in human interactions within social work both the man and the company in turn while playing a game which devours and is devoured - rule, because it transforms the pain. Keywords: Organizational Mission; Acquisition of Competence, Communication, Culture and Symbolic Universe; Links Communicational; transformation space. intercepta e desperta para o outro, um outro aspecto da vida, e este objeto adquire papel de sujeito pela ação que a missão nele intercede. Esse conceito da reversibilidade sujeito/objeto, o sujeito que faz: fazer pode ser o agente do fazer. No modelo semiótico de Greimas “Da Imperfeição”, pensamos na reversibilidade em que temos um objeto com um fazer de sujeito. O funcionário já possui um saber fazer, mas quando entra na empresa ele vai re/aprender o fazer desta empresa dentro dos seus moldes. Este novo fazer torna-a actante, e ocupa um papel central. Quando temos um actante temos um fazer. E a reunião dos fazeres é que leva à transformação. A estrutura do percurso narrativo da missão vai produzir os estados transformados em outros estados, aqueles desejados pela empresa. Essa transformação é o que define a narratividade. Há o encadeamento de Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS estados e transformações que dão este caráter narrativo às mensagens da missão, no sentido da estrutura dos estados de transformações. Isto é universal. Esta universalidade é uma pressuposição. Todos os textos têm, o seu folclore, seus mitos e na empresa, isso é muito mais intenso. A manifestação textual convoca e reúne sentidos levando o funcionário a reproduzir (não mais criar seu próprio trabalho, mas apenas repetir) no sistema de ordem. A transformação desejada pela missão considera cada grupo cultural, cada comunidade, pelos seus fazeres, pelas suas ações, pelos seus rituais, pelas suas formas de relacionamento e sua estrutura, os textos da cultura. E o estudo da cultura da empresa, é feito pelos seus textos. E na semiótica estamos tratando a missão como manifestação dessa cultura. E enquanto manifestação textual é construída a partir de valores. Ela retoma o posicionamento a partir da visão de mundo da empresa, um estado no mundo. Não é uma visão individual, a empresa é composta por pessoas que têm suas crenças partilhadas. A enunciação da missão convoca à aquisição de competência para o poder, saber, fazer, e no espaço organizacional a significação pode ser concretizada2 . O fenômeno será observado pelo viés da comunicação mediado pelo trabalho, vínculo que enreda homem e empresa, em um jogo de mútua sedução. Para isso, é fundamental considerar a relação da missão com os fatos da cultura3 emergindo de signos que ressignificam o comportamento do homem, que, neste espaço, sedado reproduz, fazendo do seu tempo o tempo da empresa, possuído pela narrativa enunciadora que promete a competência de um Deus 4 e que possibilita a sua plenitude na terra. Pode-se observar aqui a relação estética tratando o imaginário como potência de construção do sujeito, produzindo o simulacro da presença. O funcionário imbuído da promessa representa um papel no fazer da empresa que o devora. Submetido à mensagem organizacional, promotora da competência cognitiva e sensível, previamente programadas. Sujeito 1- missão da empresa, e sujeito 2 - funcionário, fundemse mediados pelo trabalho, e unificados mais do que em proximidade física. Comungam no espaço de reprodução buscando conjunção. Compreender o sentido do trabalho como mediador no texto da cultura organizacional5 convocado pelo texto “sagrado”, a missão, nos faz pensar que o homem dança uma coreografia definida que permite uma única representação possível, a coletiva. O passo de dança 2 OLIVEIRA, A.C. LANDOWSKI, E. Do inteligível ao sensível, São Paulo, Educ, 1995. 3 WINKIN, Yves. A Nova comunicação. Da teoria ao trabalho de Campo. Campinas, Papiros. 1998. (Org. Etienne Samain). 4 HILLMAN, James. Encarando os deuses. São Paulo: Cultrix/Pensamento, 1997. 5 WEICK K. E. (1985) "The Significance of Corporate Culture." In: Organizational Culture. California: Sage. 141 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS “reproduzir” 6, e uma ação mecânica, signo midiático da conjunção. A missão é o instrumento comunicativo7 que determina o ritmo e a performance dos dançarinos em busca da competência, e esse movimento implica na perda da identidade individual que será substituída pela coletiva, condição sinequanon para que a dança se efetue8 . A empresa acena para o homem com papéis fixos como os dos deuses; e míticos e funcionais como os da sociedade. E ele, seguindo o percurso narrativo, busca aquisição dessa competência divina para se tornar um sujeito de fato e de direito. Nesse espaço não se permitem práticas individuais, existem valores que governam as ações coletivas e as práticas sociais que promovem a coletividade com a qual todos devem se identificar: o coletivo9. Va m o s e n t e n d e r a í o c o n c e i t o saussureano - a relação entre língua e fala, entre história, passado, diacronia e sincronia, presente, entre contexto e texto; que é uma noção de Greimas, quando vai retomar as oposições saussureanas. Na empresa não há a concepção de língua isolada, individual - ela é sempre coletiva – é resultado de acordos sociais. O que move as pessoas dessa comunidade são as crenças, valores superstições e seus emblemas criados como logo 10. Quando pegamos o texto de uma empresa, nos deparamos com a filosofia da empresa. A empresa constrói e se constitui como sujeito, possui uma identidade, da mesma maneira que a escola, a família e a sociedade. Suas regras, normas, são pensadas como coletivas e se relacionam, se articulam segundo esses valores. Não há norma, axiologia, ou ética, separada dessa forma de organização. O homem e a empresa enredados pelo vínculo comunicativo, permeado de normas deflagram atitudes de fidelidade e comprometimento, colocando o trabalho em primeiro lugar 11, e isso, gradativamente o consome. As formas de organização da missão são formas estéticas. Como todo arranjo que tem maior ou menor teor de esteticidade é a forma de articulação. Um enredo, uma construção um todo de sentido que o enunciador do desenredo vai trabalhar. Promove a construção da nova identidade do funcionário a partir da identidade do outro: a empresa. Considerando que o outro tem seus arquétipos, seus papéis fixos e seus deuses, e ainda que seus papéis míticos sejam funcionais na sociedade. Cada um dos deuses tem uma função. O da empresa é a missão, deusa do poder, do saber e do fazer fazer. Quando o funcionário vai para a empresa, se dirige a esse deus como sujeito e busca a competência deste deus para se tornar competente. Alia-se a este sujeito em um percurso narrativo, que é de aquisição. O percurso de aquisição provoca uma quebra na normalidade; desestrutura 6 FERRARA, Lucrecia. 2000. Os Significados Urbanos. São Paulo. Edusp/Fapesp 7 WATZLAWICK, P; BEAVIN, J. e JACKOBSON, D. D. Pragmática da comunicação Humana. São Paulo, Cultrix, 1993. 8 PROSS, Harry, Estructura Simbolica del poder, 1980:36. 9 LANDOWSKI, E., FIORIN, J. L. O gosto da gente o gosto das coisas. Abordagem semiótica. Trad. Brandão. E.São Paulo: EDUC/PUC, 1997. 10 LANDOWSKI, E. e OLIVEIRA, A. C. de (eds.), Do inteligível ao sensível, São Paulo, Educ, 1995. 11 KAMPER, D. (1997). O trabalho como a vida, SP: Annablume. 142 Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS todo o seu conjunto de hábitos e de convenções, reguladores do seu viver. Agora, as práticas individuais desaparecem dando lugar à norma coletiva, governada pelo deus missão. Os seus valores é que vão promover o funcionário e ajudá-lo a se identificar na narrativa. Isso provoca a quebra da normalidade anteriormente estabelecida. seus objetivos pessoais e abraça os da empresa como se fossem os seus. Greimas mostra que o evento estético acontece nos comportamentos mais efêmeros, criando significado e sentido. Na análise semiótica, o significado aparece na narrativização do comportamento. Cada ato adquire novo sentido. O parecer oculta o ser, e na empresa, esta é a possibilidade do homem. Com a identidade coletiva, ele se transforma e transfere seus valores para outra organização de outra cultura com um conjunto de práticas sociais, distintas. Dois universos diferentes em valores, nas práticas e nas experiências se aproximam e ocorre a organização da prática interativa. A interação dos sujeitos é um grande texto, de troca de projetos, práticos, ideias, valores. Um novo mundo de novos mitos e magias. Duas formas de conhecimento que se integram e constroem a transformação, dirigida, no entanto, pela missão. Greimas em “Da Imperfeição” afirma que todo o mundo cultural é ordenado, e vai ordenar a vida daquele que nela se insere. Assim o é na empresa. A figuratividade que é o recurso primeiro de um texto é a possibilidade da missão. Suas mensagens sedutoras se colocam nas estruturas do texto, e as formas de reconhecimento social, situam o texto no mundo organizacional. Aparece inicialmente de forma des/pretensiosa e fala sem causar estranhamento. Faz o sujeito percorrer a civilização através dele, como parte dele, re/conhecendo nele, características do seu ser. Aparece de modo natural, e por conseguinte, marca temporalidade. A narrativa é um encadeamento. As fraturas da inserção vão aparecer na estrutura do sujeito, no percurso narrativo que vai compondo a sua nova identidade. A troca da identidade anterior pela atual. O seu tempo passa a ser o tempo da empresa que cria para ele uma rotina devoradora12. Esse sistema é estabelecido a priori e o homem responde às suas expectativas, atua, veste a camisa, adota comportamentos, delimita o seu cotidiano, permitindo que o seu fazer e o seu lazer sejam programados e ditados pela empresa. Inserido e comprometido nesse contexto, acredita que poderá realizar o propósito de ambos e iludido nesse jogo, aliena-se de 12 O estado anterior do funcionário era composto pelo comportamento de um fazer diferente. Uma vez inserto, a missão produz nele as transformações, e o seu fazer se modifica. Ela gera um ato que afeta o sujeito que se transforma de objeto em outro sujeito, parece automática a re/ gravação e a ordenação dos atos e fazeres anteriores. Ele sabia um fazer diferente, a transformação ocorreu na mudança do ritmo, no ato, no formato, na constância. Este novo fazer aparece timidamente. E vai adquirindo um ritmo marcado por outra constância. A substituição da identidade individual pela coletiva, e a mudança de constância, no ritmo de vida e de trabalho do funcionário, provoca uma ruptura. A BAITELLO, N. O animal que parou os relógios. SP: Annblume. 2ª, ed 1999. 143 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS ruptura ocorre naquele que sofre a ação. A convocação sensorial do encadear das ordens sensoriais da missão provoca a tensão. A distensividade ocorre, mesmo havendo o desejo do funcionário de inserirse nesse meio que ele deseja. Na adaptação da nova identidade no novo ritmo, se faz sentir a suspensão tensiva do seu fazer anterior. Ele gera uma anormalidade do comportamento, porque agora ele tendo sido sancionado positivamente, não pode mais errar. Na quebra da rotina instala-se a figura da dis/ tensividade. Ele perde o equilíbrio anteriormente estabelecido e precisa se apoiar em novos costumes. Este evento extraordinário, a sanção positiva, e o desejo de aí permanecer, afeta o sujeito nos seus sentidos, audição, visão, sentido corpóreo pela orientação, pelo movimento. Quando há suspensão do tensivo, a suspensão da rotina anteriormente marcada, muda o percurso do sujeito, Essa mudança é sentida no corpo, no que há de mais significante, no equilíbrio. “O lampejo do medo do não saber e do medo de não fazer correto provocando a exclusão, é que desencadeia a fratura”. Ser sancionado positivamente pela empresa é o deslumbrar e o medo da exclusão é ofuscamento da luz. O lampejo do medo ofusca, não deixa ver, não deixa raciocinar, faz sentir, a quebra de normalidade. O fazer da missão transformou o objeto em sujeito, ele saiu da disjunção para a conjunção, lugar do poder e status, que para ele significa valor. Agora o medo, ação desta distensão e evento extraordinário, leva à transformação do sujeito. determinando o comportamento de 13 um corpo e a atitude de um devir do sujeito13. A missão doa ao sujeito a competência tornando-o mais capaz na sua cotidianidade, sem a presença de eventos fora do seu controle. Agora ele pode figurativizar, concretizar e materializar o que estava nos seus sonhos e esperanças. A empresa através da missão ordena os mecanismos construídos e valorados socialmente. Ordena também o seu cotidiano neste mundo definido e marcado, no qual só goza do respeito social aquele que está vinculado a uma empresa, que possui cargos, altos salários e bens que denunciam satus. A articulação de valores como reconhecimento social, o leva a fazer o quadrado semiótico. No conjunto do texto temos a vida do funcionário aceito pela empresa, como eufórico ou disfórico. Chegamos às oposições a partir das isotopias que vão ser reiteradas. É a semântica; quando temos a figuratividade e a tematicidade. Ele vai adquirindo os atributos da empresa através da missão, esta vai construindo nele a sua figuratividade, e a partir deste atributo define o seu ser, suas formas e seus sentidos. São temas concretizados pelas normas organizacionais, e a normatização da empresa, que por um lado tira-lhe a identidade individual por outro, liberta o indivíduo da opressão e da exclusão social. Este trabalho ocorre paralelamente na figuratividade. O tema: missão da empresa e funcionário é uma abstração a partir da figuratividade que está mais perto e mais concreto. A identidade da empresa assumiu o papel social do homem, através da OLIVEIRA, A. C., Eric Landowski, Caderno de Discussão do Centro de Pesquisa Sociossemiótica PUC: COS - USP: FFLCH – CNRS: PARIS, 2003. 144 Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS missão. No nível profundo temos uma oposição semântica identidade x alteridade. O nível discursivo trabalha no texto da missão que põe em discurso o nível sintático, o trabalho do enunciador. Este trabalho do enunciador aciona os mecanismos sintáticos de instauração, do enunciador e do enunciatário. Os valores da empresa são delegados aos que nela trabalham. A comunicação se dá entre quem enuncia e aquele para quem é dirigida a enunciação; um dos conceitos mais importantes da semiótica porque são as artimanhas, as astúcias da enunciação, que permitem ver quem enuncia, como é que enuncia e a maneira de enunciar. O texto da missão faz fazer e diz como fazer, quando e onde, pela maneira de mostrar, plano de expressão e fazer ouvir. O enunciado define a disposição dos atores em uma figuratividade sinestésica, o sujeito é completamente tomado e não consegue resistir ao chamado do objeto, confundindo-se com ele, mas a sua competência é doada a ele que se transforma em sujeito. A gestualidade do corpo instaurada, desde que inserto no texto da empresa, adquire um ritmo específico e marcado, o seu comportamento e linguagem, postura e forma de expressão, já não são mais do seu domínio14. Ambos, sujeito e objeto, agora, sujeito, buscam a conjunção na ilusão de encontrar a plenitude. A missão afasta o desconhecido (a exclusão do homem deste meio), para concretizar a conjunção, porém esta é uma eterna construção. A ênfase na conjunção, no fazer parte de, no relacionar com o sujeito, tem a função de desconstruir a ideia do afastamento, figurativizado com a ênfase de que esse é o lugar onde se pode realizar o desejo de poder, que possibilita o saber e o fazer, e isso afasta a angústia da não pertença, a fratura. A possibilidade de construção do sujeito potencializa, exalta a fidelidade, a lealdade, a dedicação incondicional como objeto de apreensão estética. O sujeito semiótico tem vontade de conjunção. Ele se coloca no mundo da cultura da empresa, adota seus valores, constrói novas relações, encena e se faz contemplar enquanto simulacro15. 2. Missão em análise Pensando analisar este simulacro, buscamos informações sobre a missão de uma empresa em um site, de domínio público, observando alguns fragmentos e seus desdobramentos. Na empresa escolhida, uma indústria de alimentos, destacamos a seguinte narrativa: Figura 1 “A empresa iniciou o século 21 com um novo desafio: tornar-se, na próxima década, a principal provedora de soluções para nossos clientes dos setores agrícolas e de alimentos”. Reconhecemos que somente 14 MORIN, E. Introdução ao Pensamento Complexo. Lisboa: Inst. Piaget, 1990. “a convivência, só é possível em virtude da submissão dos indivíduos”. 15MORIN, E. O Método/ O conhecimento do conhecimento. Porto Alegre. Sulina, 1999, “todo indivíduo tem importância na empresa para a qual colabora com sua própria complexidade, sua visão do mundo, seus projetos pessoais, suas atitudes imprevisíveis, suas estratégias, sua dinâmica de evolução. Para ele a empresa é "a sua" representação da empresa”. 145 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS obteríamos sucesso em nosso negócio se criássemos valores diferenciados para nossos clientes. Levamos para esta jornada; nossos tradicionais pontos fortes que são integridade e confiabilidade. Também trazemos nosso conhecimento e experiência, acumulados pela nossa atuação nas mais diversas localidades, produtos e serviços. A partir desta base, formaremos relacionamentos mais sólidos com cada cliente, possibilitando: Explorar necessidades não atendidas; Descobrir juntos as melhores maneiras de atendê-las; Criar soluções únicas e valorizadas; e Entregá-las de maneira confiável. Adotamos, como empresa, esta missão e ela reflete como vemos o futuro. O nosso novo logotipo e o sistema de identidade corporativa, também representam as aspirações da nossa companhia. “As mudanças são as consequências dos poderosos símbolos de uma empresa mais dinâmica, acessível e inovadora na qual estamos nos tornando.” O estilo do logotipo é dinâmico e indica movimento em direção ao futuro. O nome da empresa em forma de berço – aquele que acolhe, é sobreposta por uma gota em movimento e em direção para adiante indicando movimento, caminhando em um sentido. É colocado em perspectiva diacrônica, inscreve-se como agente e testemunha do seu próprio devir. Aquele que atua acolhe e assiste. Exalta o investimento da empresa no crescimento, visando aumentar a participação no mercado. Reduzido e formatado no alto da página acima do texto da missão e das metas, o logotipo indica pretensão à prospecção, de mágico. Aquele que faz, faz fazer e assiste o fazer do outro. Seguido do enunciado da missão e reduzido ao estado de mensagem no papel é o equivalente simbólico metonímico ou metafórico do outro. Um sujeito figurado, um simulacro inscrito no espaço retangular que equivale ao ausente da imagem. Acompanhado da visão e da missão, confere sentido ao enunciado16 . Sujeito e objeto são caracterizados neste contexto como entidades chamadas a entrar em conjunção pela estratégia das suas posições actanciais. O jogo de sedução aqui realizado é analisável como processo recursivo, fundado na reprodução especular de posturas adotadas alternadamente, enunciação e enunciado tem a intenção de atualizar competência. No logo, o contraste das cores: verde/preto/ amarelo, em seu formato reduzido, saltam da superfície do papel em uma abstração esquematizante, produzindo o simulacro da presença da empresa com sua narratividade17. “A nossa visão expressa as aspirações coletivas das pessoas que aqui trabalham. Ela nos unifica, dirige nossos esforços e nos diferencia das outras empresas. Possui quatro elementos: nosso objetivo: é ser líder mundial em alimentos. Nossa missão: criar valores diferenciados. Nossa abordagem: sermos dignos de confiança, criativos e empreendedores. Nossas medidas de desempenho: funcionários engajados, clientes satisfeitos, comunidades enriquecidas e crescimento rentável.” O apelo mítico e apelativo da visão, como a concretização de uma verdade 16 TEIXEIRA, L., "Relações entre o verbal e o não verbal: pressupostos teóricos", in Caderno de discussão do VII Colóquio do Centro de Pesquisas Sociossemióticas, 2000, pp. 415-426. 17 OLIVEIRA, A. C., LANDOWSKI, E. Caderno de Discussão do Centro de Pesquisa Sociossemiótica. São Paulo: ed. CPS. 2002 146 Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS coletiva, enaltece valores sociais, humanos e profissionais, como a expressão “as aspirações coletivas das pessoas que aqui trabalham”. Possui grande poder de persuasão18 e instiga o sentimento subjetivo do animal simbólico, explora uma forma de conhecimento significativo para o humano e remonta à memória do nômade que só sobrevive como grupo. de longo prazo trata da busca por nossas metas, nossa missão reflete a realidade competitiva do mercado. Só obteremos sucesso nos negócios criando valor agregado para nossos clientes, nossos fornecedores, funcionários, acionistas e vizinhos. Criar um valor diferenciado significa construir relações mais fortes com os clientes e apresentar comportamentos orientados para a solução do cliente que podem se resumir na frase: Explorar, Descobrir, Criar e Entregar.” “Nosso Objetivo é "Alimentar as pessoas" reflete nosso enfoque agrícola e em alimentos e a ideia mais ampla de melhorar a qualidade de vida das pessoas. Isto também quer dizer que o nosso objetivo fundamental é atrelar nosso conhecimento e energia para oferecer produtos e serviços necessários para a vida, saúde e crescimento. Implica em cumprir um leque de expectativas, desde aprimorar a produtividade agrícola até melhorar os alimentos para promover um desenvolvimento econômico sustentável. Também transmite uma cultura de alimentar com base na confiança, valorização das relações e na realização de todo o seu potencial.”. A narrativa da missão tem o intento de unificar a multiplicidade dos interpretantes atributivos, sintetizar os traços diferenciais do seu produto, e eleger o atributo considerado mais significativo. Reunir variadas qualificações em torno de um ponto de convergência virtual, ponto este que se situa num espaço possível e inusitado do universo linguístico-cultural. Associada ao logo, o conjunto texto/ imagem opera importante mensagem com intenção de comunicar o caráter, a imagem e a personalidade da empresa como objeto valor, não apenas para o funcionário, mas também para o público externo20 . Seus efeitos retóricos adquirem um caráter prático e popular que expressa a ideia, a imagem e o seu imediato reconhecimento pelo receptor. Pelo procedimento de textualização, “O seu objetivo é Alimentar as pessoas", o discurso verbal procura ser atraente para o enunciatário. O enquadramento e a inserção da informação são elementos semióticos capazes de promover e/ou fazer surgir efeito de sentido19. Enaltece os valores humanos reconhecidos socialmente. É um jogo de linguagem de u m a m e s m a g r a m á t i c a d o o l h a r, caracterizada pelo registro figurativo, que explora e pela sintaxe interacional que utiliza. “Nossa Missão, valor diferenciado, está no centro da nossa ação estratégica. Encontra-se nos pilares do foco do cliente, inovação e alto desempenho. Enquanto o nosso objetivo O texto escrito fornece uma chave de sentido conduzindo a leitura da imagem e guiando a sua interpretação. A imagem é, por essência, polissêmica, ao passo que o texto escrito tem caráter mais unívoco; daí ser este o caminho para privilegiar um sentido possível, ou o sentido desejado e intencional. No plano da expressão o formante matérico da missão, apresenta-se 18 IASBECK, L. C. A. (2002) A arte dos Slogans: as técnicas de construção das frases de efeitos do texto publicitários São Paulo: Annambule: Brasília: Upis. (pág.111) 19 OLIVEIRA, A. C, Colóquio do Centro de Pesquisas Sociossemióticas, 2003, p.196. 20 AGUILAR, G. Hernández (ed.), Sentido y significación (Puebla, Premia Edit., 1987). 147 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS em um cartaz retangular que vai contrastar com a cor do logo. O eidético e o topológico vão homologar com o plano do conteúdo. O texto é, marcadamente, sedutor e convincente, diretivo e forte, como as cores e o estilo do logo. As cores fortes e destacadas do logo em prospecção se mostram com o texto sobre o papel cromático amarelo claro. O enunciado busca o devir do sujeito, a conjunção, a dinâmica sugere movimento do logo com a persuasão do texto 21 . A estratégia midiática de textualização explorada em “... encontra-se nos pilares do foco do cliente, inovação e alto desempenho. Enquanto o nosso objetivo de longo prazo trata da busca por nossas metas, nossa missão reflete a realidade competitiva do mercado...”, nos incita a olhar os valores ressaltados na atualidade. O funcionário submetido à missão, sujeito de estado, se transforma em sujeito de fazer. A enunciação tem um efeito modificador nos estados do sujeito. A construção da imagem da empresa se faz conjunta com ele e o induz ao simulacro, dirige-se ao sujeito e instala-se em seu interior, já desnudado do invólucro que o protege: a sua identidade. A missão tem a função de divulgar valores que olham direto para o sujeito que anseia ser “modelo” 22 . O funcionário contempla o objeto valor e transforma-se em sujeito actante, como segue: “Só obteremos sucesso nos negócios criando valor agregado para nossos clientes, nossos fornecedores, funcionários, acionistas e vizinhos. Criar um valor diferenciado significa construir relações mais fortes com os clientes e apresentar comportamentos orientados para a solução do cliente que podem se resumir em: Explorar, Descobrir, Criar e Entregar”. As performances vocálicas acima citadas realçam e sugerem um convite a participar dessa competência. Esse aspecto adquire um poder de pregnância no destinatário, que automaticamente se põe em conjunção. A função conotativa interage com as demais para atingir seu objetivo no sujeito que ali se encontra, em busca da competência que o sancione positivamente. Nesse enunciado, todas as funções prescritas jogam com a finalidade de tornar a comunicação efetiva; a eficácia da mensagem está na quantidade cumulativa de funções, ou na sua maior densidade, atuando simultaneamente para convencer os funcionários. A contaminação da comunicação “Criar um valor diferenciado, significa construir relações mais fortes...” é suficiente para produzir o efeito desejado. A “Função Fática” aí presente chama a atenção para a própria mensagem, destacando o canal e não necessariamente a mensagem - mais pela sua forma do que pelo seu conteúdo. Ela é breve, compacta, afirma autoridade, pretende imprimir prestígio ao anunciado, é anônimo, causa impacto e pretende comunicação imediata dispensando reflexões demoradas. Essas características estão contidas na estrutura e não no que, eventualmente pretenda dizer. A “Função Referencial” que pode ser explícita, dissimulada ou mesmo ausente, substituída por expressões metalinguísticas, pode ser observada no 21 OLIVEIRA, A. C. M., "Notas sobre a presentificação: inteligibilidade e sensibilidade na primeira página do jornal", in Caderno de discussão VI Colóquio Centro de Pesquisas Sociossemióticas, 2000, pp. 177-188. 22 MORIN, E. Ciência com Consciência. Rio de Janeiro: Bertrand-Brasil, 1996, “Morin diz que a sociedade é um conjunto de homens com grupos de diversas dimensões e significados que unificados por algo maior que eles, compõem a humanidade”. 148 Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS texto da missão. A presença da possibilidade da sua aplicação na empresa determina a força da mensagem. Ela não tem a finalidade de informar, deixa isso a cargo do texto argumentativo no seu todo: visão, objetivo e medidas de desempenho. A função da frase no contexto é seduzir e motivar o destinatário à inserção. A referência é dissimulada por eufemismos e metáforas, “construir relações mais fortes...”, pode servir a uma série infindável de ideias, mas aqui, especificamente, se refere à conjunção dos atores. A "informação" fala diretamente ao destinatário. Ultrapassa a própria missão para elevar o funcionário “conjunto com a empresa” com o seu diferencial, o nome da instituição, seu prestígio, sua solidez e demais atributos culturais relacionados ao seu produto. Aproxima o funcionário da referência "deslocada" do produto, de preferência os encantatórios. A análise sócio semiótica do fragmento, “Só obteremos sucesso... ”, tem a intenção de construir junto e com, um perfil que nos dá a conhecer, se mostra e se oculta numa relação de sedução e tentação entre sujeito, observado e observador. A empresa e a sua missão nos olham de frente, é provocativa, seduz, se dá a conhecer insinuando que o sujeito é parte integrada, mas oculta a contra partida, “enquanto atendê-la integralmente”. Sua impressão organiza-se num contínuo descontínuo, manipulador, provoca um querer fazer, para prender a atenção e o interesse do enunciatário: “... o nosso objetivo de longo prazo trata da busca por nossas metas, buscas audaciosas. Nossa missão reflete a realidade competitiva do mercado”. Mas, isso só será possível se você enunciatário, se mantiver conjunto conosco. As projeções actoriais e espaciais “Só obteremos sucesso nos negócios criando valor agregado para nossos clientes, nossos fornecedores, funcionários, acionistas e vizinhos”, atuam como âncora que busca identificação e reconhecimento de elementos da narrativa por parte do enunciatário. As estratégias de textualização outorgam singularidade, que constroem procedimentos que apresentam mecanismos característicos, como o procedimento discursivo figurativo, o discurso temático e o discursivo enunciativo. Os arranjos textuais “... Nossas medidas de desempenho reconhecem que o alto desempenho começa com funcionários engajados que enfocam os esforços na satisfação do cliente, e que testemunham nosso compromisso em comunidades habitáveis e sustentáveis...”, variam conforme os procedimentos adotados pela enunciação. As estruturas semionarrativas e o modo como o texto narra a estratégia global é persuasiva. Ela desencadeia a tentação no enunciatário de vir a ser objeto valor e nesse momento provoca nele a aceitação do contrato proposto. No contexto das atividades produtivas, a missão da empresa se insere no funcionário de uma forma dinâmica e ritual, atendendo a uma necessidade com a finalidade de compor a coletividade. A empresa utilizase dos artifícios da missão para criar efetivamente esse fenômeno. É importante entendê-la como linguagem diferenciada e verificar sua importância na sociedade moderna. Ela ultrapassa a mera função de informar. Coexistindo com as estratégias mercadológicas ela contamina e é contaminada. Assume o caráter de discurso que "joga para manter os mecanismos de 149 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS hegemonia política do capitalismo mundial” 23 . Aí se singulariza, não só ideologicamente, como também esteticamente. Está presente nos manuais de administração das empresas que, geralmente, fazem parte do conhecimento cotidiano dos funcionários. A divulgação de ideias persuasivas tem nítidas intenções ideológicas. Explora o desenvolvimento da teoria dos sentidos, da percepção e traz o repertório de signos que se perfilam desde o século XVII com o desenvolvimento da industrialização. Esses signos correspondem a uma ideologia social e constituem uma forma de falar e representar no universo organizacional. Como a missão tem a função de empolgar o destinatário, ela possui intenso grau emotivo. Ela sensibiliza a opinião com questões que valorizam a importância de caráter, procurando atingir o perfil do receptor previamente selecionado. Utilizase de termos e expressões que sugerem as práticas da sedução, “quer fazer parte da nossa equipe? Nós alimentamos o mundo”. Neles, há uma dose reguladora de linguagem afetiva, “você quer alimentar o mundo?”, nós ajudamos você em seus propósitos, mas para isso é preciso que se integre ao nosso corpo coletivo. Morin (1996) diz que “a sociedade é um conjunto de homens com grupos de diversas dimensões e significados que unificados por algo maior que eles, compõem a humanidade”. A empresa é um micro da humanidade. 23 A função emotiva envolve conceitos culturais ligados aos valores muito explorados na atualidade como, a solidariedade, a não violência e a ecologia. A chamada “ser digno de confiança”, inspira integridade na relação que construímos com o cliente. É um mecanismo verbal que objetiva o incitamento dos funcionários, compelindoos a um comportamento ativo e favorável à incorporação da mensagem. “Nossas Medidas de Desempenho reconhecem que o alto desempenho começa com funcionários engajados que enfocam os esforços na satisfação do cliente, e que testemunham nosso compromisso em comunidades habitáveis e sustentáveis. E elas refletem que organizações que apresentam estes comportamentos terão o crescimento lucrativo necessário para sustentar o desempenho do tempo.” Aqui a função incitativa caracteriza comunicação centrada no destinatário. A função gramatical mais pura da função conativa d eix a d e s er imp er ativ o ex p lícito , dissimulando a natureza incitativa em insinuações “sutis”. O enunciado apresenta e anuncia que a empresa pensa à frente e é orientada pela ação, a função metalingüística tem a intenção de confirmar um código, e a função emotiva pelo caráter intersubjetivo da frase, propõe a cumplicidade afetiva. A função poética encontra-se na ruptura do paralelismo semântico. Por um lado provoca surpresa, e por outro, a perplexidade da liberdade de poder acrescentar algo positivo ao objeto valor24 . “... reconhecemos que o alto desempenho dos funcionários proporciona satisfação ao nosso cliente.” A narrativa a seguir, nos remete a um todo harmônico, que supera sua origem comercial e seu fim imediato, introduzido nos rígidos limites do contrato algo IASBECK, L. C. A. A arte dos Slogans: as técnicas de construção das frases de efeitos do texto publicitários São Paulo: Annambule: Brasília: Upis. 2002. 24 FIORIN, José Luiz , As astúcias da enunciação, São Paulo, Ática, 1996. 150 Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS essencialmente humano25 . “... Nossas medidas de desempenho reconhecem que o alto desempenho começa com funcionários engajados... ,... a visão da Cargill expressa as aspirações coletivas das pessoas que aqui trabalham. Ela nos unifica, dirige nossos esforços e nos diferencia...” Umberto Eco26 diz que a estética tem lugar na publicidade enquanto mecanismo retórico-persuasivo, que envolve e convence o homem a ação. Sobre a conjunção texto/imagem, observando o logo indicando dinamismo e ação e o texto: “... a visão da empresa expressa as aspirações coletivas das pessoas que aqui trabalham...”. Segundo Perez Tornero 27, reaviva as distinções entre expressão e conteúdo. Promove o fazer criativo, com o saber e a operatividade do funcionário proporcionados pela missão da empresa, conforme segue: “Perfil do Funcionário: A empresa encerrou 2001 apresentando, mais uma vez, um crescimento do seu quadro de funcionários, como conseqüência dos contínuos investimentos que estão sendo realizados para que a empresa aumente a sua participação nos mercados onde atua e esteja cada vez mais presente na vida de todo brasileiro. Durante 2001, o quadro de funcionários teve um aumento de 10,85%. O quadro funcional feminino, por exemplo, aumentou 9%. A Cargill fechou o ano com 5.057 funcionários. Deste total, 21% está na empresa há mais de dez anos”. Aqui observamos que dentre os valores que culturalmente são esperados de uma empresa, enfatiza que podemos relacionar: segurança, proteção, honestidade, garantia, 25 MORIN, E. O Paradigma Perdido. Portugal: Europa América, 2000. 26 ECO, Umberto.. I Limiti dell´Interpretazione. Milão Bompiani1999. 27 PEREZ, T. Semiótica de la publicidad, Ed. Mitre. Barcelona, 1982 confiança, força, eficiência, presteza, entre outros. O nome de uma empresa em que predomine a função referencial de linguagem assume a forma afirmativa direta, e é escolhida entre as demais pelas qualidades desejáveis sendo eleita como a mais atraente: “... a visão da empresa expressa as aspirações coletivas das pessoas..., e. nosso objetivo é alimentar as pessoas". A empresa não faz a sua função sem as pessoas, ambas precisam uma da outra para possibilitar suas ações. De acordo com Morin (1999), todo indivíduo tem importância na empresa para a qual colabora com sua própria complexidade, sua visão do mundo, “seus projetos pessoais, suas atitudes imprevisíveis, as suas estratégias, sua dinâmica de evolução contribuem para a existência da empresa que é "a sua" representação da empresa”. As mensagens da missão são partes de um pressuposto e se dirigem a um público específico. Este público está predisposto captar as mensagens porque foi previamente selecionado, confinado em um espaço e submetido à cultura da empresa. A sua linguagem poética tende a elitizar o seu destinatário, por trabalhar com o mesmo paradigma “alimentar o mundo”. Juntos poderão de forma eficiente atingir os seus objetivos, utilizando-se das características da linguagem referencial. A missão não visa apenas informar. Interessalhe, seduzir e cativar o destinatário em potencial das ideias veiculadas, a necessidade do comprometimento para o sucesso da empresa. Para conseguir a 151 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS dosagem ideal deste comprometimento, ela trabalha um vasto repertório de estereótipos entendidos aqui como procedimentos paradigmatizantes já consagrados pela cultura e de fácil decodificação para o seu destinatário28. Observamos que o texto atua na inferência por similaridade. Ele resultando em uma percepção intuitiva que, conjugado com o interesse do funcionário, provoca contiguidade sígnica, o ponto de partida para atuação da força dos metassignos. A metáfora tem, pois, a competência de iconizar sentidos em um processo eminentemente metalinguístico, no qual as palavras falam mais de si mesmas, chegando a esquecerem-se como signos primários. 3. Considerações Finais De acordo com as investigações podemos concluir que a missão da empresa, texto mediador, e o funcionário, chegam a uma conjunção. A mediação da missão possibilita tamanha evolução nessa relação, que o funcionário vai além da representação de um papel. No processo de identificação com a empresa ele se transforma em sujeito, elevado a essa categoria pela ação da missão. O papel do texto da missão passa a se constituir em continuidade, e enuncivo destaca e fala ao funcionário como sujeito. Desta forma, o promove e determina o seu deslocamento, a sua hora de acordar, de levantar de se ligar e desligar. Participa com ele em condições de orientá-lo e de determinar a relação, e em todo o tempo, ambos permanecem alertas, vendo e sendo vistos. A missão da empresa costura todos os recursos que o homem precisa para se orientar. Entra em sua vida com tamanha impetuosidade que marca o seu cotidiano, governa o seu sentido e a sua presença, e mesmo quando ausente. Longe da empresa o homem mantém a sua forma de comunicação e interação, programada por ela. A partir do texto da missão, homem e empresa unificam-se. Mais do que proximidade física integram-se. E com a tecnologia da comunicação, essa interação torna-se muito mais comprometida29 . Nesse momento, o homem não apenas manuseia uma ferramenta apertando um parafuso permitido pela liberação das mãos, com o advento da hominização. Com as mãos livres, e competentes, o seu mundo de acesso vai muito além30 . Metaforicamente ele passa a ter o mundo nas mãos através do poder, saber e fazer adquiridos. O sedentarismo da empresa o aprisiona, e seduzido pelo espaço organizacional ele fica agregado. Espaço de comunhão dos diferentes iguais, diferentes personalidades e competências eficiências e conflitos, dirigidos pelo mesmo texto: a missão da empresa. Eles foram pescados no mercado de recursos humanos por profissionais que, estrategicamente, desenharam seus estereótipos e os classificaram como passíveis de adaptação. O seu perfil foi encaixado no cargo mais próximo ao adequado à sua personalidade, que 28 FIORIN, J. L. Elementos da análise do discurso. São Paulo: Contexto, 1994. 29 KAMPER, D.(1997). O trabalho como a vida, SP: Annablume. 30 Norval Baitello. O animal que parou os relógios, 1997. 152 Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS selvagem, é domesticada a essa cultura. A empresa aprimora através de treinamentos os que atendem à sua necessidade, potencializando os traços coletivos. Ao entrar no sistema de ordem e se sedentarizar para trabalhar na linearidade, engessado às normas da empresa, ele abre mão de sua identidade. Incorpora a identidade coletiva, reproduz e se permite refém. mesmo viver livremente, pois é governado pela missão. Missão promotora de transformação que desconstrói o pensamento do nômade que é livre e vive aos saltos, alguns não se permitem desconstruir. Esses que optam pela liberdade, a empresa descarta como excremento. E na definição de Kamper, o que pode transformar em imagem permanece, o resto naufraga31. Mas, apenas permanecerão aí os nômades contaminados pela loucura da vaidade, da ambição e desejo de status, que atraídos por este cenário, vão consolidar e alimentar seus vínculos. O preço da sua permanência é a fratura, suspensão tensiva que gera uma anormalidade do comportamento. Gerada pela substituição da identidade e da mudança de constância, no ritmo de vida e de trabalho. Esse homem não mais poderá escolher, nem Nesses que naufragam observamos um fenômeno determinante que denuncia a sua capacidade de usar o seu livre arbítrio e fazer escolhas. O advento da loucura32. A esse fenômeno, Bateson denomina esquizofrenia, Foucault e Erasmo, de loucura, Dejours de sofrimento psíquico, e os psiquiatras de alteração ou desvio do comportamento, designado como padrão de normalidade. Resta-nos a pergunta: Qual normalidade? Referências Bibliográficas AGUILAR, G. Hernández (ed.), Sentido y significación (Puebla, Premia Edit., 1987). BAITELLO, N. O animal que parou os relógios. 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D. cidades, 1979, “o homem é nômade, nasce nos vales e vai até os cumes para adquirir informações que o possibilite construir outros mapas mentais. Ele é livre para ficar ou retornar, mas se retornar jamais será integrado, porque possui outros mapas, assim, ele jamais se reintegrará, pois no cume é estrangeiro, e se retornar aos vales também ai o será porque partiu.” 153 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS LANDOWSKI, E., FIORIN, J. L. O gosto da gente o gosto das coisas. Abordagem semiótica. Trad. Brandão. E.São Paulo: EDUC/PUC, 1997. LANDOWSKI, E. e OLIVEIRA, A. C. de (eds.), Do inteligível ao sensível, São Paulo, Educ, 1995. MORIN, E. Introdução ao Pensamento Complexo. Lisboa: Inst. Piaget, 1990. “a convivência, só é possível em virtude da submissão dos indivíduos”. MORIN, E. Ciência com Consciência. Rio de Janeiro: Bertrand-Brasil, 1996. MORIN, E. O Método/ O conhecimento do conhecimento. Porto Alegre. Sulina, 1999. MORIN, E. 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Etienne Samain). 154 Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS 12 Valerio Vitor Bonelli1 Antonio Robles Jr2 A sustentabilidade via controles estratégicos dos custos ambientais Recebido em: 03/12/2012 - Aprovado em: 16/12/2012 - Disponibilizado em: 26/12/2012 Resumo O objetivo do presente artigo esta fundamentado na necessidade da implantação de um sistema de apuração dos custos ambientais em uma organização, demonstrar a necessidade de uso dos relatórios como ferramenta aos gestores para acompanhamento do comportamento destes custos sempre visando a melhoria contínua e a excelência na qualidade total. O sistema de custos proposto toma por base a contabilidade por atividades, tendo em vista propiciar informações aos gestores e colaboradores, facilitando e motivando a tomada de decisões mais corretas dentro do atual ambiente, de um lado mais competitivo, porém de outro lado mais responsável com a preservação do meio ambiente rumo à sustentabilidade empresarial. Propõe a definição de um Sistema de Informações Ambientais Gerenciais (SIAG), monitorado pela Controladoria da empresa. Palavras-chave: Sustentabilidade, Custos Ambientais, Melhoria Contínua. Abstract The purpose of this article is based on the need to implement a system of calculation of environmental costs in an organization, demonstrate the need to use the reports as a tool for managers to monitor the behavior of these costs always seeking continuous improvement and excellence in total quality. The proposed system is based on cost accounting for activities in order provide information to managers and employees, motivating and facilitating decision making more correct within the current environment, a more competitive side, but on the other hand more responsible with the preservation of the environment towards corporate sustainability. It proposes the definition of an Environmental Management 1Doutorando em Ciências Sociais pela PUC/SP, Mestre em Controladoria e Contabilidade Estratégica pela Fecap/Facesp, graduadoem Ciências Contábeis, Administração de Empresas, com Pós-graduação em Finanças, Membro da ABCAssociacão Brasileira de Custos. Professor Universitário na PUC/SP. Co-autor do livro Gestão da Qualidade e do Meio Ambiente: Enfoque Econômico, Financeiro e Patrimonial, pela Editora Atlas. Doutor e Mestre em Contabilidade e Controladoria pela Universidade de São Paulo; Autor dos livros: Custos da Qualidade – Uma Estratégia para a Competição Global, Custos da Qualidade – Aspectos Econômicos da Gestão da Qualidade e da Gestão Ambiental e Co-autor dos livros: Alquimia de uma Corporação – A Magia de um Treinamento e Contabilidade de Custos: Temas Atuais. Professor na USP e no programas de Graduação e de Pós-Graduação Mestrado na PUCSP. Coordenador do curso de Ciências Contábeis da PUCSP. Assistente Doutor da Universidade de São Paulo, Avaliador de IES e cursos do INEP. 2 155 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS Information System (SIAG), monitored by the Controller of the company. 1. Introdução A internalização dos custos ambientais é uma maneira de equilibrar as forças de mercado e de distribuir mais equitativamente os danos que a sociedade esta suportando como efeitos da modificação da qualidade do meio ambiente. As experiências desenvolvidas em todo o mundo quanto aos instrumentos de interiorização dos custos ambientais mostram que as mudanças no sentido de tentar conciliar os diversos interesses envolvidos na questão já estão sendo efetuadas, colocando a todos os agentes principalmente não industriais o desafio de participar do processo e elevar seus níveis de percepção e atuação. Trata-se, porém, de iniciativa em desenvolvimento e muito ainda deve ser feito no sentido da busca da qualidade de vida para toda a população. O meio ambiente tornou-se um elementochave para a reformulação dos valores e vigentes na sociedade e estabelecerem-se novas formas de pensamento e ação em todas as práticas produtivas. 2. Conceito em gestão ambiental A Gestão Ambiental consiste de um conjunto de medidas e procedimentos bem definidos e adequadamente aplicados que visam a reduzir e controlar os impactos introduzidos por um empreendimento sobre o Meio Ambiente. O ciclo da Gestão Ambiental, para que haja eficácia, deve cobrir, desde a fase de concepção do projeto até a eliminação efetiva e contínua dos resíduos gerados pelo empreendimento 156 Keywords: Sustainability, Environmental Costs, Continuous Improvement. depois de implantado, durante toda sua vida útil, devendo também assegurar a melhoria contínua das condições de segurança, higiene e saúde ocupacional de todos os seus empregados e um relacionamento sadio com os segmentos da sociedade que interagem com esse empreendimento e a empresa. A Gestão Ambiental exige, como premissa básica, um comprometimento da alta direção da empresa e de seus acionistas com o estabelecimento de uma Política Ambiental clara e definida que irá nortear as atividades da organização com relação ao Meio Ambiente assumindo compromisso formal com a sociedade, definindo suas intenções e princípios com relação a seu desempenho ambiental. 2.1. Responsabilidade social A responsabilidade social, como é chamada com frequência, implica um sentido de obrigação para com a sociedade. Esta responsabilidade assume diversas formas, entre as quais se incluem proteção ambiental, projetos filantrópicos e educacionais, planejamento da comunidade, equidade nas oportunidades de emprego, serviços sociais em geral, de conformidade com o interesse público. Essa responsabilidade social das corporações, que excede a produção de bens e serviços, tem-se intensificado nas últimas décadas, notadamente a partir dos anos 60, em respostas às mudanças ocorridas nos valores de nossa sociedade. Mudanças essas que incluem a responsabilidade de ajudar a sociedade a resolver alguns de seus problemas sociais, Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS muitos dos quais as próprias organizações ajudaram a criar. A justificativa para o sentido de responsabilidade social por parte da empresa fundamenta-se na liberdade que a sociedade concede à empresa para existir. Podemos considerar a existência de um contrato social. Uma empresa, como outras organizações legítimas, tem a liberdade de existir e trabalhar por um objetivo legítimo. O pagamento dessa liberdade é a contribuição da empresa para a sociedade. Além disso, segundo Donaire (1995:20), “os termos desse contrato não são permanentes, mudam com o tempo. Atualmente esta claro que os termos do contrato entre as organizações e a sociedade estão de fato sofrendo substancias e importantes modificações. Os novos termos desse contrato baseiam-se na visão de que as empresas que tem finalidade unicamente econômica acabam acarretando alguns efeitos à sociedade ou à parte dela que representam um custo social para todos. Nesse sentido, o crescimento econômico não esta ligado, como antigamente se apregoava, ao progresso social. Em muitos casos, o crescimento esta afeto à deterioração física do ambiente, a condições insalubres de trabalho, exposição a substâncias tóxicas, discriminação a certos grupos sociais, deterioração urbana e outros problemas sociais”. Esta responsabilidade social é fundamentalmente um conceito ético que envolve mudanças nas condições de bemestar ligadas às dimensões sociais das atividades produtivas e suas ligações com a qualidade de vida na sociedade. Portanto, consubstancia-se na relação entre a empresa e seu ambiente de negócios. 2.2. Desenvolvimento Sustentável Desenvolvimento sustentável significa atender às necessidades da geração atual sem comprometer o direito das futuras gerações atenderem a suas próprias necessidades. Nessa definição estão embutidos dois conceitos com os quais precisaremos doravante conviver. O primeiro é o conceito das necessidades, que podem variar de sociedade para sociedade, mas que devem ser satisfeitas para assegurar as condições essenciais de vida a todos, indistintamente. O segundo conceito é o de limitações, que reconhece a necessidade da tecnologia desenvolver soluções que conservem os recursos limitados, atualmente disponíveis e que permitam renova-los na medida em que eles sejam necessários às futuras gerações. Na realidade a poluição industrial é uma forma de desperdícios e um indício da ineficiência dos processos produtivos até agora utilizados. Resíduos industriais representam, na maioria dos casos, perdas de matérias-primas e insumos. Na medida em que as empresas vão aderindo aos conceitos da Qualidade Total e se preocupam mais com a eficiência de seus processos produtivos, passa a haver uma convergência de interesses técnicos, econômicos e comerciais que tenderá a reduzir a geração de poluentes pela indústria. 2.3. Autofinanciamento Do ponto de vista empresarial, quando se menciona meio ambiente sob o aspecto econômico a ideia inicial é a de que haverá aumento das despesas e o consequente acréscimo dos custos do processo produtivo. Na realidade um sistema de gestão ambiental estruturado, com metas 157 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS estabelecidas, consegue se auto financiar, pois tecnologias limpas, mudanças de processo e tratamento de resíduos, torna possível contabilizar ganhos. De acordo com DONAIRE (1995:51): “algumas empresas, porém, tem demonstrado que é possível ganhar dinheiro e proteger o meio ambiente mesmo não sendo uma organização que atua no chamado ‘mercado verde’, desde que as empresas possuam certa dose de criatividade e condições internas que possam transformar as restrições e ameaças ambientais em oportunidades de negócios.”. Entre essas oportunidades podem ser citadas a reciclagem de materiais que tem trazido uma grande economia de recursos para as empresas; o reaproveitamento dos resíduos internamente ou sua venda para outras empresas através de Bolsas de Resíduos ou negociações bilaterais; o desenvolvimento de novos processos produtivos e como já foi dito com a utilização de tecnologias mais limpas ao ambiente, que se transformam em vantagens competitivas e até mesmo possibilitam a venda de patentes; o desenvolvimento de novos produtos para um mercado cada vez maior de consumidores conscientizados com a questão ecológica, geração de materiais de grande valor industrial a partir do lodo tóxico, estações portáteis de tratamento, miniusinas para uso de pequenas empresas e o aparecimento de um mercado de trabalho promissor ligado à variável ambiental que deverá envolver auditores ambientais, gerentes de meio ambiente, advogados ambientais, bem como o incremento de novas funções técnicas específicas. 158 2.4. Accountability - Prestaçao de Contas A responsabilidade social empresarial é entendida como o relacionamento ético e a prestação de contas da empresa com todos os grupos de interesse que influenciam ou são impactados pela atuação da mesma (stakeholders), assim tanto no respeito ao meio ambiente quanto no investimento em ações sociais. É a expansão e evolução do conceito de empresa para além seu ambiente interno. Na medida em que a empresa esta inserida na sociedade, observa-se uma relação de interdependência entre ambas. Este relacionamento com os denominados stakeholders e o meio ambiente deve estar de acordo com seus valores, políticas, cultura e visão estratégica. O desenvolvimento da comunidade em que esta inserida, a preservação do meio ambiente, uma comunicação transparente interna e externa, o investimento no ambiente de trabalho, no bem estar dos funcionários, o retorno aos acionistas, a satisfação dos clientes e a sinergia com os stakeholders, são exemplos de ações que se caracterizam como prestação de contas e responsabilidade social. Os investimentos em programas de gestão ética nas organizações surgiram a partir de demandas da sociedade, legislações, movimentos anticorrupção e de transparência internacional, se tornando questão estratégica, fator diferencial de competitividade e aumento de produtividade. A ética empresarial envolve desde as práticas utilizadas pela empresa na venda de produtos ao mercado a fim de alcançar Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS seus objetivos, até o relacionamento transparente com todos os “stakeholders”. ecossistema no qual se inserem as atividades da empresa. “Stakeholders” são os grupos de interesse que se relacionam, afetam e são afetados pela organização e suas atividades. O termo “stakeholders” é mais abrangente do que “stockholders” que significa, exclusivamente acionista, enquanto que como “stakeholders”, além dos acionistas, há os clientes, os fornecedores, os funcionários, a comunidade e todos os demais grupos sob o raio de influência próximo ou remoto da empresa. Um desses grupos poderá ser afetado pelas políticas ambientais praticadas pela entidade, daí o fato que para questões ambientais o orçamento tem que ser impositivo. Empresas que pretendam obter financiamentos no mercado internacional, que sejam fornecedoras de grupos internacionais e que almejem ser líderes nos segmentos da economia em que atuam não podem prescindir da Qualidade Ambiental como parte de sua imagem. 2.5. Qualidade ambiental A conscientização ambiental dos dirigentes de uma empresa pode provocar alterações profundas em suas prioridades estratégicas e algumas mudanças de abordagem que vão modificar as atitudes e o comportamento de todos os seus funcionários. O quadro nº 1 mostra, de forma esquemática, essas mudanças de abordagem motivadas pela conscientização ambiental. A qualidade Ambiental é parte inseparável da Qualidade Total ansiada pelas empresas que pretendem se manter competitivas e assegurar sua posição em um mercado cada vez mais globalizado e exigente. A Qualidade Ambiental consiste no atendimento aos requisitos de natureza física, química, biológica, social, econômica e tecnológica que assegurem a estabilidade das relações ambientais no As ferramentas utilizadas para alcançar a Qualidade Ambiental são, em sua essência, idênticas aquelas utilizadas pela empresa para assegurar sua qualidade de produção: treinamento, plano de ação, controle da documentação, organização e limpeza, inspeções e análises periódicas da situação. Para assegurar a Qualidade Ambiental devem-se prever, já na fase de concepção de um produto e no desenvolvimento do respectivo processo produtivo, soluções para resíduos que serão gerados. O desenvolvimento do produto e do processo, o gerenciamento dos resíduos resultantes e o gerenciamento da produção passam, assim, a ser tratados de forma integrada. Essa integração requer o levantamento do chamado ciclo de vida do produto, identificando toda sua trajetória, desde as matérias-primas e insumos utilizados em sua fabricação, aos resíduos que gera até seu descarte final. Esse levantamento é importante do ponto de vista da Qualidade Ambiental, pois um produto pode ser ambientalmente limpo e correto apenas durante sua vida útil, porém não a montante, em processo produtivo, ou a jusante, em sua destruição após o uso. Por isso numa etapa seguinte seu ciclo de vida deve ser analisado para que se possa assegurar, de forma global, sua qualidade do ponto de vista ambiental. 159 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS 3. Contabilidade baseada em atividades O custeio por atividades, ou ABC (Activity Based Costing), tem se mostrado o mais apropriado, até o momento, para auxiliar a gestão estratégica de custos da 160 empresa. Os custos indiretos têm aumentado significativamente nas últimas décadas, devido aos novos métodos de produção, exigindo, entre outros pontos maior flexibilidade, que exige maior necessidade de maior estrutura de apoio, do tipo: Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS • Planejamento; • Qualidade; • Logística; • Desenvolvimento; • Meio ambiente; 3.1. Diferencial de apresentação O controle de custos ambientais demonstra o nível de falhas existentes e o volume de gastos necessários para eliminar e/ou reduzir essas falhas, seja na forma de investimentos de natureza permanente ou de insumos consumidos no processo operacional. De acordo com Ribeiro (1998: 69), “os custos ambientais devem compreender todos aqueles relacionados, direta ou indiretamente, com a proteção do meio ambiente, como: Todas as formas de amortização (depreciação e exaustão) dos valores relativos aos ativos de natureza ambiental possuídos pela companhia; • Aquisição de insumos próprios para controle/redução/eliminação de poluentes; • Tratamento de resíduos dos produtos; • Disposição dos resíduos poluentes; • Tratamentos de recuperação/ restauração de áreas contaminadas; • Mão de obra utilizada nas atividades de controle/preservação/ recuperação do meio ambiente. • O processo de identificação e quantificação dos custos relacionados ao meio ambiente exige envolvimento de vários departamentos da empresa, como Compras, Meio Ambiente, Saúde e Segurança, Finanças e Contabilidade. Identificar e trilhar dados de custos ambientais tem por finalidade chave o levantamento de informação necessária para valorar, e talvez, realocar o uso de ativos da empresa, ou seja, tomar melhores decisões sobre investimentos. Uma das consequências desse exercício é o reexame do valor adicionado de cada atividade necessária. Uma vez diagnosticado que a atividade é primordial, deve-se verificar a possibilidade de substituição desta, por outra. Os tipos de custos que são atribuídos ao meio ambiente são classificados em quatro categorias, como descreveu o “Pollution Benefits Manual” publicado pela U.S. Environmental Protection Agency - EPA e em subsequentes publicações, sendo a m a i s a ‘ E PA’s A n I n t r o d u c t i o n Environmental Accounting as a Business Management Tool: Key Concepts and Terms (1995). Os custos ambientais também foram classificados em quatro categorias: Custos Convencionais: inclui os custos que, na maior parte das vezes, recebem atenção especial na contabilidade gerencial, tais como investimentos em equipamentos, matéria-prima, mão de obra e materiais indiretos. Dessa forma, os custos convencionais incluem todos aqueles associados com os aspectos ambientais tangíveis de tais processos e atividades. Seu controle conduz ao aumento da eficiência produtiva por eliminar o desperdício. • 161 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS Custos potencialmente ocultos: são aqueles ligados a todas as atividades necessárias para que a empresa se mantenha em conformidade com as leis e outras políticas ambientais inerentes à própria organização. A integração de exigências regulatórias nos planos de negócio enfoca os custos de conformidade para adequar produtos e processos e expõe formalmente custos ocultos. Como exemplos, destacam-se o monitoramento ambiental, treinamento, relatório ambiental, entre outros. • Custos em Contingências: envolvem todos os gastos que podem ou não ocorrer devido a futuros custos de regulamentações, multas e penalidades, gastos com recuperação de recursos naturais danificados, etc. Conhecer o fato gerador de tais custos, antecipadamente, possibilita à empresa definir ações a fim de evitá-los. • Custos de Imagem e Relacionamento: envolve a percepção e o relacionamento que os acionistas, comunidade e governo desenvolvem com a companhia. Apesar de difícil quantificação o desempenho ambiental pode melhorar ou prejudicar o relacionamento da empresa com terceiros, e os impactos gerados podem ter custos e/ou implicações financeiras. • A gestão dos custos ambientais permitirá a avaliação dos possíveis riscos ambientais que a empresa esteja 162 assumindo. Estas contingências precisam ser conhecidas pelos gestores e devem ser retratadas, sob o ponto de vista gerencial da empresa. 3.2. Custos ambientais por processos Em se tratando de atividades voltadas ao controle, à proteção e preservação ambiental, os custos segregados por processos tem a finalidade de contribuir para assegurar que os procedimentos, que tem por finalidade proteger e preservar o meio ambiente estão consumindo recursos dentro dos parâmetros previstos, e, portanto, estariam produzindo os resultados técnicos esperados. Obviamente que esta análise deve feita em conjunto com as técnicas operacionais, pois, os gastos podem estar em conformidade com os previstos, mas os níveis de poluição decorrentes do processo podem estar acima do que o esperado. O monitoramento dos custos ambientais por processos, principalmente quando o processo tem por objetivo específico atividades relacionadas ao controle, proteção e preservação ambiental, além de buscar assegurar a conformidade das medidas empreendidas com aquelas realmente necessárias, permite ainda, a obtenção de dados que possibilitam a avaliação de continuidade ou terceirização. No caso dos processos específicos, os quais requerem que a empresa monte uma estrutura especial para a realização do referido processo, pode-se apresentar dados em que se vislumbre que a contratação dos serviços de terceiros pode resultar em custos menores para a empresa. Segundo CHING (1995:22) “a gestão de processos e atividades deve ser conduzida Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS de forma que atinja os quatros objetivos a seguir” • Reduzir custos; • Diminuir o ciclo de tempo; • Melhorar a qualidade; Agregar valor ao cliente em termos de serviços, flexibilidade etc. • Os objetivos acima se enquadram também entre os objetivos do sistema de gerenciamento ambiental, pois na medida em que se reduzem custos, perder-se-á menos tempo na elaboração de produtos que serão descartados como resíduos da produção. Assim sendo, sem resíduos há melhoria de qualidade ambiental, tanto no produto como no processo de elaboração, agregando valor ao cliente, pois elimina problemas de recusa do produto em função de qualidade ambiental. Caso os gastos orçados para controle ambiental não se efetivem em sua plenitude, a empresa com essa “economia” pode estar deixando de implantar projetos planejados para diminuir a poluição de meio ambiente, o que deve ser investigado pela Controladoria, pois se o gasto orçado não foi realizado, por qualquer motivo, a variação orçamentária não deve ser considerada como favorável, mas sim desfavorável, pois pode afetar resultados futuros. 4. Gestão ambiental baseada em atividades A gestão ambiental baseada em atividades deve pressupor a definição dos vários processos gerenciais da função Meio Ambiente, essa função teria o mesmo status na empresa das demais funções, como Marketing, Finanças, Produção, Recursos Humanos e outras. Essa função poderia ser alocada à Logística da empresa ou ficar subordinada diretamente à Presidência, constituindo uma Diretoria autônoma. De acordo com FURLAN (1997:37), uma lista parcial dos processos gerenciais da função 'Meio Ambiente', de uma 'Usina de Geração de Energia', poderiam contemplar: “Planejamento do meio ambiente; Controle de poluição; Tratamento dos efluentes; Desmatamento e reflorestamento; Piscicultura; Controle de insetos; Programa básico ambiental; Recuperação ambiental; Acompanhamento meteorológico; Proteção ambiental; e, Elaboração de projetos de poluição harmônica”. FURLAN (1997:38). Para este último processo, FURLAN, propõe a definição: “Estudar o fenômeno de poluição harmônica (distorção nas ondas de tensão e corrente), provocada por d e t e r m i n a d a s c a rg a s e s p e c i a i s d e consumidores que colocam em risco a integridade de equipamentos elétricos e afetam a qualidade da energia elétrica entregue, recomendando-se as medidas necessárias”. Posteriormente, cada processo gerencial deveria ser detalhado por atividades, evidentemente, de acordo com a necessidade de detalhes gerenciáveis, sempre levando em consideração a clássica confrontação do custo da informação em relação ao respectivo benefício. 4.1. ABM aplicado à gestão ambiental A gestão ambiental baseada em atividades (Activity Based Management) consiste em nortear as diferentes decisões com relação ao meio ambiente, de acordo 163 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS com os relatórios de custos das atividades ambientais. Para tanto, a modelagem dos diferentes sistemas ambientais, deve estar voltada para a definição dos processos ambientais, e x e m p l i f i c a d o s n o i t e m a n t e r i o r, detalhados em atividades. A visão sistêmica desses processos ajuda a modelagem dos sistemas ambientais. Adequando-se ao proposto por POLYA (1973), in CHRISTOFOLETTI (2000:25), a questão da modelagem dos sistemas ambientais, assemelha-se à solução de problemas matemáticos, ou seja: “a) Compreender o problema, questionando, Qual é a questão? b) estabelecer um plano para a solução do problema: Como se pode resolvê-lo? c) executar o plano: Qual é uma resposta? d) checar a adequação da resposta: A resposta está correta?” (POLYA, 1973 in CHRISTOFOLETTI, 2000:25). Dessa abordagem, poder-se-ia inferir os sistemas de modelos de custos ambientais, que seriam básicos para a gestão ambiental baseada em atividades. A construção desses modelos deveria seguir quatro etapas básicas: 1) Formulação, definindo-se os objetivos do modelo; 2) Verificação, validação prévia; 3) Calibragem ou Nivelamento; e 4) Análise e Avaliação do Modelo. Em cada etapa, seriam testadas as premissas. Caso essas premissas não atendessem o objetivo geral e de cada fase, elas teriam que ser discutidas e reformuladas. O conjunto de sistemas, processos e atividades, constituiriam o Sistema de Informações Ambientais Gerencias - SIAG. (POLYA, 1973 in CHRISTOFOLETTI, 2000:25). 5. Passivos ambientais O passivo ambiental deve ser reconhecido nos relatórios financeiros se é de ocorrência provável e pode ser razoavelmente estimado, existindo vários 164 padrões de “contingências” que devem ser usados para caracterizar o que seria um evento de ocorrência provável. No caso de haver dificuldades na estimação do valor de um passivo ambiental, deverá ser provisionado um valor razoável, sendo registrados os detalhes dessa estimativa em notas explicativas. O passivo ambiental que não será liquidado no curto prazo, expressa preferência pela medição através do método do valor presente de uma estimativa de custos e despesas futuras, realizada com base em custos correntes que a atividade requer e supondo a existência de exigência legal e/ou outras, alertando, que a incerteza inerente a essa abordagem é minimizada se: “A taxa de desconto para o valor presente for baseada na taxa de risco semelhante à dos títulos de governo; Os avanços tecnológicos que se espera que aconteçam no curto prazo forem levados em conta (note-se que os avanços de longo prazo não devem ser considerados); A expectativa de inflação for levada em conta; O total do passivo ambiental for revisado a cada ano e ajustado por qualquer mudança relativa às estimativas de gastos futuros anteriormente assumidos; e As estimativas de obrigações adicionais forem baseadas em fatores relevantes para o período em que essas mesmas obrigações s u r j a m ” ( P O LYA , 1 9 7 3 i n CHRISTOFOLETTI, 2000:25). 6. Tendências para as empresas serem responsáveis Diversos são os caminhos hoje existentes a serem trabalhados por uma organização na busca pelo desenvolvimento sustentável. A destinação dos resíduos gerados pela sociedade se torna mais complexa à medida que aumentam a população o nível de Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS industrialização e o consumo de material. Como consequência, para se enfrentar a carência de locais adequados para lançar esses resíduos iniciou-se a busca por soluções mais eficazes do que a dispersão dos mesmos no meio ambiente. Em vez de simplesmente dispor seus resíduos, passouse a procurar alternativas mais lógicas, que se propõem a tratar, reaproveitar, minimizar ou até eliminar a geração dos resíduos, contribuindo, cada uma dessas alternativas, em escala crescente, para a solução efetiva do problema. Essas soluções são escolhidas a partir de abordagens distintas, observadas sob os seguintes ângulos: “Minimizar – abordagem preventiva, orientada para reduzir o volume e o impacto causado pelos resíduos. Em casos excepcionais, pode-se eliminar completamente a geração do resíduo. Valorizar – abordagem orientada para extrair valores materiais ou energéticos que contribuem para reduzir os custos de destinação dos resíduos e, em alguns raros casos geram receitas superiores a esses custos. Reaproveitar – abordagem corretiva, orientada para trazer de volta ao ciclo produtivo matérias-primas, substâncias e produtos extraídos dos resíduos. Dispor – abordagem passivo orientada para conter os efeitos dos resíduos, mantendo-os sob controle, em locais que devem ser m o n i t o r a d o s ” ( P O LYA , 1 9 7 3 i n CHRISTOFOLETTI, 2000:25). As abordagens pelo reaproveitamento, por sua vez, pode ter três enfoques distintos: “Reciclagem, quando há o reaproveitamento cíclico de matérias-primas de fácil purificação como, por exemplo, papel, vidro, alumínio etc. Recuperação, no caso de extração de algumas substâncias dos resíduos, como, por exemplo, óxidos, metais etc. Reutilização ou reuso, quando o reaproveitamento é direto, sob a forma de um produto, tal como as garrafas retornáveis e certas embalagens r e a p r o v e i t á v e i s ” ( P O LYA , 1 9 7 3 i n CHRISTOFOLETTI, 2000:25). As tecnologias limpas que visam a eliminar ou reduzir a geração do resíduo, a partir do processo produtivo. “1º - Os tratamentos convencionais que visam a reduzir os efeitos dos resíduos, através de processos físicos, químicos, biológicos ou térmicos. 2º - As tecnologias novas que visam, através de pesquisa e desenvolvimento, encontrar soluções para problemas específicos que carecem de soluções próprias, ou que requerem soluções a l t e r n a t i v a s ” ( P O LYA , 1 9 7 3 i n CHRISTOFOLETTI, 2000:25). As soluções encontradas para encaminhar adequadamente os problemas ambientais obedecem, portanto, a uma sequencia lógica e natural, expressa pelas seguintes providências: 1º-Minimização da geração de resíduos através de modificações no processo Produtivo, ou pela adoção de tecnologias limpas, mais modernas e que permitem, em alguns casos, eliminar completamente a geração de materiais nocivos; 2º Reprocessamento dos resíduos gerados, transformando-os novamente em matéria prima, ou utilizando-os para gerar energia; 3º - Reutilização dos resíduos gerados por uma indústria como matéria-prima para outra indústria; 4º - Separação de substâncias nocivas das não nocivas, reduzindo o volume total de resíduo que deva ser tratado ou disposto de forma controlada; 5º - Processamento físico, químico ou biológico do resíduo, de forma a torna-lo menos perigoso ou até inerte, possibilitando sua utilização como material reciclável; 6º - Incineração, com o correspondente tratamento dos gases gerados e a disposição adequada das cinzas resultantes; 7º - Disposição dos resíduos em locais apropriados, projetados e monitorados de forma a assegurar que não venham, no futuro, a contaminar o meio ambiente. Valle (2000). O professor Cyro Eyer do Valle (2000) enfatiza que: “essas soluções, na sequência em que estão apresentadas, decrescem em eficácia, pois partem de um conceito de eliminação do problema (o de evitar a geração do resíduo) e terminam na 165 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS disposição vigiada do problema não solucionado (isto é, um aterro ou uma lagoa)”. A figura 1 sintetiza essa sequencia e mostram que, na maioria dos casos, as soluções mais lógicas, mesmo de complexidade crescente em sua aplicação, acarretam custos globais decrescentes para a sociedade e contribuições mais eficazes para solucionar os problemas ambientais. Algumas atitudes de ordem eminentemente prática ajudam a equacionar os problemas acarretados pela geração dos resíduos e contribuem para a escolha da solução mais adequada em cada caso: Redução das quantidades de resíduos evitando misturar materiais contaminados, que irão requerer tratamento ou disposição especial, com matérias não contaminados, que poderão ser reaproveitados. Secagem ou desidratação dos resíduos, reduzindo seu volume e seus custos de transporte e facilitando a disposição das frações secas. 166 Extração, por processos físicos, químicos ou biológicos de frações valiosas contidas nos resíduos, reduzindo os custos de destinação das frações remanescentes (Valle, 2000). De outra parte, alguns fatores que não são de ordem técnica afetam também a escolha da solução. São eles: a)Fatores econômicos: custo da tecnologia e dos investimentos necessários; valor dos materiais recuperados; comparação entre os custos de tratamento e de disposição final etc. b)Fatores de imagem da empresa: soluções mais limpas, mesmo que sejam mais. c) Dispendiosas; decisão de não depender de aterros ou do processamento de seus d)Resíduos por terceiros etc.; Desenvolvimento da abordagem para solucionar os problemas com resíduos: Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS 6.1. Controladoria da gestão ambiental companhias e, consequentemente, a continuidade dos negócios destas. Considerando que o sistema de gestão ambiental consome recursos, ressaltamos a indispensável, integração entre o gerenciamento ambiental e a gestão estratégica de custos. A gestão estratégica de custos tem se mostrado uma necessidade premente para a conquista e manutenção de espaços no mercado nacional e internacional, cuja concorrência torna-se cada vez mias acirrada. Na área ambiental, seja na forma preventiva, de controle ou de recuperação os gastos tem significativo impacto sobre o patrimônio das empresas e, por esta razão, deve ser alvo de criteriosas estratégias, de forma a garantir o sucesso dos sistemas de gerenciamento ambiental adotados pelas A contabilidade por atividades tem um papel importante, podendo propiciar informações valiosas para a gestão econômica da empresa, ao custear a menor unidade de consumo de recursos, que são as atividades. Estas consomem os recursos; 167 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS portanto, o custo destes recursos deve ser apropriado às atividades que os exigiram. Os produtos e processos consomem atividades, recebendo, por conseguinte, os custos dos recursos consumidos pelas mesmas. Usando-se esta metodologia se elimina, consideravelmente, a necessidade de rateio dos custos indiretos e, consequentemente, as arbitrariedades provocadas pelo subjetivismo da escolha dos parâmetros para a distribuição de tais custos e se identifica, por fim, os custos ambientais em função das atividades executadas inerentes ao controle ambiental. O correto custeamento das atividades relativas ao controle, preservação e recuperação ambiental pode resultar na redução de custos, em função da eliminação de perdas e desperdícios de recursos, como também o aumento de receitas em decorrência de melhorias que podem ser implantadas a partir da identificação de falhas na utilização dos recursos. O conhecimento dos custos reais na área ambiental, principalmente a forma como se distribuem no processo operacional, proporciona condições para o estudo, análise e avaliação do grau de essencialidade das atividades desenvolvidas, do montante de capital consumindo pelos processos de proteção ambiental, evidenciado, consequentemente, a partir da análise da relação custo/ benefício, a necessidade de reestruturação, de novos investimentos, além de fornecer subsídios para a tomada de decisão sobre ser ou não necessário buscar capital adicional para atender tais necessidades. Informações quanto ao consumo de recursos pelas atividades de proteção ambiental e pelos produtos possibilitam 168 melhores condições para a determinação de preço e ainda uma real avaliação dos custos/benefícios gerados pela sua manutenção. 6.2. Indicadores de gestão A apresentação de indicadores de desempenho ambiental torna-se importante no processo de fornecer informações em que o processo de transparência passa pela padronização e começa a utilizar estes indicadores que procurarão sintetizar as informações quantitativas e qualitativas relativas ao seu desempenho ambiental. Indicadores de desempenho ambientais confiáveis são medidas necessárias para conferir transparências aos negócios das empresas. Esses indicadores serão mais valiosos se forem transparentes no tempo, se consistirem em indicadores relativos e se forem comparáveis com indicadores de outras empresas. Outras qualidades importantes requeridas para esse tipo de indicador são a sua padronização e a sua aceitação pelos usuários. Estes indicadores vêm sendo progressivamente incorporados pelas empresas, na medida em que as empresas ficam conscientes, que além de reduzir o impacto das atividades empresariais no meio ambiente, aumentam a rentabilidade. Podendo ser dividido em: Em indicadores de processo, de sistemas eco financeiros, podem ser divididos em outros dois tipos: os absolutos, quando são itens simples, tais como o custo ambiental do período; e os relativos, que consistem em uma razão existente entre dois ou mais itens por período, por exemplo, o custo ambiental Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS apresentado como um percentual do faturamento. Existem três combinações de possíveis pares de indicadores que podem ser usados para descrever o desempenho ambiental: Indicador financeiro relacionado com outro indicador financeiro, como por exemplo, passivo ambiental/patrimônio líquido; • Indicador financeiro relacionado com indicador ecológico, como, por exemplo, emissão de CO 2/ unidade de produto produzido; e • Indicador ecológico relacionado com outro indicador ecológico, como por exemplo, resíduo produzido/recurso utilizado. • Considerações Finais As informações dos resultados obtidos pelo custeamento das atividades ambientais servirão como subsídio para as decisões internas em relação às medidas necessárias para a continuidade do sistema de gerenciamento ambiental e consequentemente a continuidade da empresa, serão também de grande utilidade para que a empresa preste contas de sua responsabilidade social à comunidade onde está inserida e aos demais com quem mantém relações. As exigências crescentes, verificadas atualmente num mercado competitivo, além da preocupação com o esgotamento e o comprometimento dos recursos naturais, levam as empresas a observarem as disposições da legislação ambiental aplicável de forma a se enquadrarem nos padrões superiores de qualidade de seus processos e produtos. Referências Bibliográficas AZAMBUJA, M. O Brasil e a Cidadania Empresarial, Jornal Valor, 20/04 São Paulo, 2001. BARRETO, M. G. P. A simplicidade de um sistema de custos da qualidade. Anais do VI Congresso Brasileiro de Custos, São Paulo, 1995. BERGAMINI JUNIOR, S. “Custos emergentes na Contabilidade Ambiental” Revista Pensar Contábil – Edição Especial da 50º Convenção dos Contabilistas do Rio de Janeiro, Out/2000. BERGAMINI JUNIOR, S. “Custos e Riscos Ambientais” Seminário de Contabilidade Ambiental auditório do BNDES dias 5 e 6 – Nov/98. BONELLI. V. V. ROBLES JR, A. Gestão da qualidade e do meio ambiente: enfoque econômico financeiro e patrimonial. 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Será apresentada uma funcionalidade de informações para todas as áreas da empresa: vendas, contabilidade, engenharia, suprimentos, manufatura e também será apresentado no final um sistema ERP da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos e suas vantagens após a implantação. The proposal for this article is to briefly reflect on the ERP (Enterprise Resource Planning - Enterprise Resource Planning) is a management model based on an information system, with the objective of promote integration between business processes of the company and provide elements for strategic decisions. The system also allows the company to automate and integrate the majority of its business processes, share data and practices across the enterprise and produce and access the information in real time. You will see a functionality of information for all areas of the business: sales, accounting, engineering, procurement, manufacturing and at the end will also be presented of an ERP system Brazilian Post and Telegraph and its advantages after deployment. Palavras-chave: ERP; Sistemas de informação; Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos. Keywords: ERP; Information Systems, Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos. 1Roberto Cezar Datrino - Mestre em Administração de Empresas, Pós-graduado em Metodologia e Didática do Ensino Superior, Pós-Graduando em MBA Gestão de Negócios em Logística, Graduado em Administração de Empresas e Economia, Professor da Faculdade Anhanguera de Osasco e das Faculdades Campos Salles, Professor do Senac de Osasco, Membro da Equipe de Trabalhos Interdisciplinares e do Núcleo de Iniciação Científica da Faculdade Anhanguera de Osasco, Membro do Comitê Técnico-Científico do Anuário da Produção Acadêmica Docente da Revista Anhanguera Educacional, orientador dos trabalhos de conclusão de curso das Faculdades Campos Salles e das Faculdades Anhanguera de Osasco e Supervisor dos Estágios da Faculdade Anhanguera de Osasco, membro do NDE (Núcleo Docente Estruturante) dos cursos de Administração de Empresa e Logística das Faculdades Campos Salles e membro do NDE do curso de Logística da Faculdade Anhanguera de Osasco. E-mail: [email protected] 171 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS 1. Introdução Com o avanço da Tecnologia da Informação, as empresas passaram a utilizar sistemas computacionais para suportar suas atividades. Geralmente, em cada empresa, vários sistemas são desenvolvidos para atender aos requisitos específicos das diversas unidades de negócio, plantas, departamentos e escritórios. Por exemplo, o departamento de planejamento da produção utiliza um sistema próprio e o departamento de vendas utiliza outro. Dessa forma, a informação fica dividida entre diferentes sistemas. Os principais problemas dessa fragmentação da informação são a dificuldade de obtenção de informações consolidadas e a inconsistência de dados redundantes armazenados em mais de um sistema. Os sistemas ERP (Enterprise Resource Planning - Planejamento dos Recursos da Empresa) solucionam esses problemas ao agregar, em um só sistema integrado, funcionalidades que suportam as atividades dos diversos processos de negócio das empresas. Os sistemas ERP surgiram a partir da evolução dos sistemas MRP (Material Resource Planning). Neles, foram agregados as funções de programação mestre da produção, cálculo grosseiro de necessidades de capacidade, cálculo detalhado de necessidade de capacidade, controle do chão de fábrica, controle de compras e, mais recentemente, Sales & Operations Planning (Planejamento de 172 Vendas e Operações). Dessa forma, os sistemas MRP deixaram de atender apenas às necessidades de informação referentes ao cálculo da necessidade de materiais, para atender às necessidades de informação para a tomada de decisão gerencial sobre outros recursos de manufatura. O MRP passou, então, a ser chamado de MRP II (Manufacturing Resource Planning Planejamento de Recursos de Manufatura). Com o objetivo de ampliar a abrangência dos produtos vendidos, os fornecedores de sistemas desenvolveram mais módulos, integrados aos módulos de manufatura, mas com escopo que ultrapassa os limites da manufatura. Como exemplo, foram criados os módulos de Gerenciamento dos Recursos Humanos, Vendas e Distribuição, Finanças e Controladoria, entre outros. Esses novos sistemas, capazes de suportar as necessidades de informação para todo o empreendimento, são denominados sistemas ERP. . 2. Alguns conceitos O surgimento do ERP, segundo Laugeni e Martins (2005), pode ser visto como uma evolução a partir dos sistemas MRP e MRPII. O MRP, materials requirements planining –, Planejamento das Necessidades de Materiais – surgiu em meados de 1960, a partir “da necessidade de se planejar o atendimento da demanda dependente, isto é aquela que ocorre da demanda independente”. (p.354). Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS Figura 1 – Evolução dos sistemas: do MRP ao ERP. (Fonte:LAUGENI & MARTINS, 2005, p.388). Já no final da década de 50, quando os conceitos modernos de controle tecnológico e gestão corporativa tiveram seu início, a tecnologia vigente era baseada nos gigantescos mainframes que rodavam os primeiros sistemas de controle de estoques que tinham automatização cara e lenta, mas que já demandavam menos tempo que os processos manuais. Era necessário então, um conjunto de sistemas que possiblitasse o planejamento dos insumos internos e a comunicação e administração entre as diversas etapas de um processo produtivo. Como grande parte das empresas produzia vários tipos de produtos, surgiu também a necessidade de um sistema de computador que pudesse auxiliar e tornar este processo mais preciso e eficaz: MRP II. redes a servidores mais baratos e fáceis de usar que os mainframes, tornado assim, os processos logísticos mais eficientes, controlando também o maquinário envolvido nos processos. (Cf. LAUGENI & MARTINS, 2005; GAITHER & FRAZIER, 1999). Gera-se, então, a necessidade de integrar o MRP a outras partes da empresa, nascendo o MRPII. O MRP II possibilita às empresas que elas aliem a lista de materiais com os pedidos em carteira dos clientes, para que sejam atendidos em tempo, além de calcular a quantidade e o momento em que haverá a necessidade de determinado material; diferenciado-se do MRP, que só conseguia determinar a lista de materiais e não conseguia tomar decisões com antecedência. Na década de 80, a tecnologia permitiu que os computadores fossem ligados em 173 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS ! Figura 2 – Esquema de planejamento das necessidades de materiais de MRP. (Fonte: SLACK, 2002, p.455). O MRP II apresenta-se, pois, segundo Slack et alli (2002), como uma evolução do sistema MRP e tem por finalidade dar suporte às necessidades da empresa, a partir da qual deve-se levar em consideração as decisões de capacidade, ou seja, como produzir as questões já respondidas pelo MRP. Assim esse sistema reúne os programas de controle da produção e faz uma realimentação desta informação que provém do chão de fábrica. confiabilidade na entrega, porém necessita de exatidão de dados. Assim, o novo sistema criado se baseia em uma estrutura de planejamento num processo hierárquico de decisão, verificação, visando chegar a um plano de produção viável em termos de disponibilidade de materiais e de capacidade produtiva. Portanto, o novo sistema se assemelha ao anterior na medida em que realiza a integração dos diversos setores da empresa através da informação, reduz os estoques e garante a O próximo passo seria então, já na década de 80, um sistema que pudesse agilizar os processos e que estabelecesse uma comunicação mais eficiente que os modelos anteriores. Para tal, surgiu o ERP agregado a novos sistemas de gestão. Foram diversos os departamentos que se valeram dessa nova tecnologia como: finanças, compras e vendas e recursos humanos, entre outras, ou seja, setores com uma conotação administrativa e de apoio à 174 Porém, o MRP II ainda depende de pessoas para ser controlado, pois são elas que farão a análise por meio dos resultados apresentados pelo sistema, para a tomada de decisão, finalizando assim o ciclo. Para Laugeni & Martins (2005), na prática, o MRP II já poderia ser chamado de ERP pela abrangência de controles e gerenciamento. Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS produção ingressaram na era da automação. A nomenclatura ERP ganhou muita força, segundo Gaither e Fraizier (1999), na década de 90, devido à revolução ocorrida com as Novas Tecnologias da Comunicação e da Informação, que garantiam a disseminação da arquitetura cliente/servidor – microcomputadores ligados a servidores, com preços mais competitivos – e não mais mainframes. Figura 3 – visão geral de um ERP. (Fonte: LAUGENI & MARTINS, 2005, p.388). Assim, um sistema ERP se caracteriza por apresentar-se como suporte às necessidades de informações para a tomada de decisão gerencial de um empreendimento como um todo. Esse termo tem sido cunhado como o estágio mais avançado dos sistemas tradicionalmente chamados de MRP II. (Cf. SLACK et alli, 2002). O ERP (Enterprise Resource Planning) ou SIGE (Sistemas Integrados de Gestão Empresarial) é um sistema da informação que integra todos os dados e processos de uma organização em um único sistema. O ERP, em linhas gerais, é uma plataforma de software desenvolvida para integrar os diversos departamentos de uma empresa, possibilitando a automação e armazenamento de todas as informações de negócios, eles, segundo Gaither & Frazier (1999), automatizam processos de manufatura e modernizam departamentos corporativos. 175 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS A integração pode ser vista sob a perspectiva funcional (sistemas de: finanças, contabilidade, recursos humanos, fabricação, marketing, vendas, compras) e sob a perspectiva sistêmica (sistema de processamento de transações, sistemas de informações gerenciais, sistemas de apoio a decisão). O ERP é um modelo de gestão corporativo, baseado num sistema de informação, tem como objetivo promover a integração entre os processos de negócios da organização e fornecer elementos para as decisões estratégicas, isto é, é uma evolução dos modelos de sistemas apresentados anteriormente. O sistema ainda possibilita à empresa automatizar e integrar a maioria de seus processos de negócio, compartilhar dados e práticas em toda a empresa e produzir e acessar as informações em tempo real. Os autores Laugeni & Martins definem o ERP como: Um software que integra todas as diferentes funções de uma empresa e que apresenta uma base de dados que opera em uma única plataforma consolidando toda a operação do negócio em um único ambiente computacional. O objetivo do ERP é de colocar a informação uma só vez no sistema, tornando-a imediatamente acessível a todos os clientes do sistema e da informação. Assim, todos utilizam sempre a mesma informação, eliminando erros. Portanto, um sistema tem características de ERP quando este possibilita à empresa automatizar e integrar a maioria de seus processos de negócio, compartilhar dados e práticas em toda a empresa e produzir e acessar as informações em tempo real. (LAUGENI & MARTINS, 2005, p. 389). O ERP tem como objetivos fundamentais: • controlar e possibilitar um fluxo de informações único, contínuo e consistente por toda a 176 empresa, o que permite administrar os negócios em uma única base de dados. • integrar várias funções administrativas que estejam direta ou indiretamente, envolvidas com o planejamento da produção, como: controles financeiros, contabilidade, folha de pagamento, faturamento, compras, produção, estoque e logística • fornecer suporte a todos os processos de uma empresa, sejam operacionais, produtivos, administrativos ou comerciais. (Cf. SOARES, s/d). É um instrumento destinado à melhoria de processos e das informações em tempo real, isto é, tal sistema permite que os gestores das empresas visualizem as transações efetuadas, o impacto delas em cada área da empresa, desenhando um amplo cenário dos negócios. A implantação de um sistema ERP gera análises dos processos da empresa, treinamento dos colaboradores, investimentos em informática e reformulação nos métodos de trabalho. O ERP atualmente está presente na maioria das empresas. Alguns autores atribuem a grande implantação desse sistema da informação, e de suas vendas, no final da década de 90, ao que foi designado na época como “bug do milênio”, e também pela sua grande característica de ser um excelente sistema de controle, muito mais que de planejamento. Para Slack et alli (2002), o sistema ERP permite que o gestor consiga analisar o que as tomadas de decisões feitas em uma parte da empresa, refletem nos demais Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS departamentos. O software do ERP tem como objetivo auxiliar o gestor na tomada de decisão, ele oferece ferramentas para o desenvolvimento de novos produtos, para a compra de novos itens, inventários, integração com fornecedores e acompanhamento da produção. O sistema opera então com uma base de dados comum, isto é, o banco de dados interage com todos os aplicativos do sistema, eliminando a redundância e redigitação de dados, assegurando a integridade e confiabilidade nas informações obtidas. Os vendedores de ERP também oferecem aplicativos especializados em gerir processos diferenciados de atividades específicas. Tais módulos atendem a mercados verticais assim como repartições públicas, planos de saúde, financeiras, etc. A tendência atual mostra as vendas movendo-se mais ainda para áreas específicas assim como gerenciamento do chão de fábrica, logística e automação de marketing direto. Figura 4 – A integração da informação em um sistema ERP. (Fonte: SLACK et alli, 2002, p.474). 3. A importância do ERP nas empresas Entre as mudanças mais palpáveis que um sistema de ERP propicia a uma corporação, sem dúvida, está a maior confiabilidade dos dados, agora monitorados em tempo real, e a diminuição do retrabalho. Algo que é conseguido com o auxílio e o comprometimento dos funcionários, responsáveis por fazer a atualização sistemática dos dados que alimentam toda a cadeia de módulos do ERP e que, em última instância, fazem com que a empresa possa interagir. Assim, as informações trafegam pelos módulos em tempo real, ou seja, uma ordem de vendas dispara o processo de 177 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS fabricação com o envio da informação para múltiplas bases, do estoque de insumos à logística do produto. Tudo realizado com dados orgânicos, integrados e não redundantes. Para entender melhor como isto funciona, o ERP pode ser visto como um grande banco de dados com informações que interagem e se realimentam. Assim, o dado inicial sofre uma mutação de acordo com seu status, como a ordem de vendas que se transforma no produto final alocado no estoque da companhia. O ERP automatiza as tarefas envolvendo a performance de um processo, tal qual a finalização de um pedido, o qual envolve pegar o pedido de um cliente, enviá-lo e cobrá-lo. Com o ERP, quando um representante recebe o pedido de um cliente, o sistema apresenta as informações necessárias para completálo. Todas as pessoas na empresa vêm o mesmo visor e têm acesso a um único banco de dados que guarda o novo pedido do cliente, fazendo com que não haja, ou se diminua, o retrabalho, os ruídos e a perda de tempo em repassar as informações. Quando um departamento termina a sua parte em um pedido, este é enviado automaticamente para o próximo departamento através do ERP. Para saber em que ponto está um pedido, em um determinado momento, é só verificar no sistema. Ao desfazer a complexidade do acompanhamento de todo o processo de produção, venda e faturamento, a empresa tem mais subsídios para se planejar, diminuir gastos e repensar a cadeia de produção. 178 Um bom exemplo de como o ERP revoluciona uma companhia é que com uma melhor administração da produção, um investimento, como uma nova infraestrutura logística, pode ser repensado ou simplesmente abandonado. Neste caso, ao controlar e entender melhor todas as etapas que levam a um produto final, a companhia pode chegar ao ponto de produzir de forma mais inteligente, rápida e melhor, o que, em outras palavras, reduz o tempo que o produto fica parado no estoque. A tomada de decisões também ganha outra dinâmica. Imagine uma empresa que por alguma razão, talvez uma mudança nas normas de segurança, precise modificar aspectos da fabricação de um de seus produtos. Com o ERP, todas as áreas corporativas são informadas e se preparam de forma integrada para o evento, das compras à produção, passando pelo almoxarifado e chegando até mesmo à área de marketing, que pode assim ter informações para mudar algo nas campanhas publicitárias de seus produtos, e ser realizado em muito menos tempo do que seria possível sem a presença do sistema. Entre os avanços palpáveis, podemos citar o caso de uma indústria média norteamericana de autopeças, situada no estado de Illinois, que conseguiu reduzir o tempo entre o pedido e a entrega de seis para duas semanas, aumentando a eficiência na data prometida para envio do produto de 60% para 95% e reduzindo as reservas de insumos em 60%. Outra diferença notável: a troca de documentos entre departamentos que demorava horas ou mesmo dias caiu para minutos e até segundos. Esse é apenas um exemplo. Porém, de acordo com a empresa, é possível Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS direcionar ou adaptar o ERP para outros objetivos, estabelecendo prioridades que podem tanto estar na cadeia de produção quanto no apoio ao departamento de vendas como na distribuição, entre outras. Com a capacidade de integração dos módulos, é possível diagnosticar as áreas mais e menos eficientes e focar em processos que possam ter o desempenho melhorado com a ajuda do conjunto de sistemas. Para Laugeni & Martins, o ERP é um sistema que facilita o fluxo de informações dentro de uma empresa, integrando as diferentes funções: manufatura, logística, finanças, recursos humanos e engenharia, entre outras. Ainda apresenta uma base de dados que opera em uma única plataforma e que consolida todas as informações em um único ambiente computacional. (LAUGENI & MARTINS, 2005, p. 388). Há várias razões pelas quais as empresas implementam o sistema ERP, a s a b e r, a l u m a s d e l a s : p e r m a n e c e r competitivas no mercado; melhorar a produtividade, a qualidade e os serviços prestados aos clientes, uma vez que estará unificando processos, métodos e sistemas dentro de diferentes unidades da empresa; reduzir custos dos estoques e sua respectiva alocação; para integrar dados financeiros, fazendo com que haja uma unificação, por exemplo, de valores entre os diversos departamentos de uma empresa; para uniformizar as informações de Recursos Humanos, fazendo com que o funcionário receba de forma mais eficiente, eficaz e em menor tempo, informações sobre benefícios e serviços. Alguns fornecedores de sistemas ERPs são: SAP (Alemã), Oracle (USA), (Brasileiros), Microsiga, Datasul, Starsoft e Siscorp. 3.1. Vantagens do ERP Para Laugeni & Martins: (Laugeni e Martins, 2005, p. 389) a vantagem do ERP é que ele possibilita o acesso mais fácil às informações pelo fato de ser um sistema integrado. O sistema integrado permite melhorar as informações gerenciais e assegura dados consistentes e maneiras de cálculo idênticas para as mesmas medidas em cada um dos negócios da empresa. Um dos pontos fortes do sistema, conforme afirma Laudon (2004), é a integração entre os módulos. Os monitores, as operações e a navegação dentro do sistema são de tal forma padronizada que, à medida que o utilizador se familiariza com um módulo, aprende mais facilmente e rapidamente os demais. Os acessos às informações são realizados através de menus com utilização de senhas, permitindo que se controle quais os utilizadores que têm acesso a que tipo de informações. Além disso, os menus são customizados de forma que cada utilizador visualize e tenha acesso somente às operações que atendam aos objetivos específicos de seu interesse. Algumas das vantagens da implementação de um ERP numa empresa são, conforme Slack (2002): • eliminar o uso de interfaces manuais; • reduzir custos; • otimizar o fluxo da informação e a qualidade da mesma dentro da organização (eficiência); • otimizar o processo de tomada de decisão; • eliminar a redundância de atividades; 179 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS • reduzir os limites de tempo de resposta ao mercado; • melhor comunicação não só interna, mas também externa; • reduzir as incertezas do Lead time; • maior eficiência e níveis de produtividade; • incorporar melhores práticas (codificadas no ERP) aos processos internos da empresa; • eliminar a redundância de atividades; • auxiliar na formação dos custos. O sistema serve como instrumento de planejamento, pois permite à empresa calcular o planejamento de compras, a necessidade de contratação ou demissão de pessoal, quanto a empresa necessita de capital de giro, necessidade de equipamentos e demais insumos produtivos. Serve também como um simulador, permitindo que empresa visualize diferentes cenários nos quais possa vir a atuar, considerando as diferentes demandas e seus efeitos. É um excelente instrumento para tomada de decisão. As soluções ERP ajudam a ganhar eficiência e a diminuir custos. As reduções de custos obtêm-se pela eficiência nas funções administrativas, pelo controle de estoques e pelas melhorias nos níveis dos serviços e ciclos produtivos. As soluções de ERP dão suporte aos principais processos e funções da empresa, integrando os dados procedentes de diferentes áreas. As vantagens que justificam a implantação de uma solução ERP são, segundo Laudon (2004), muito semelhantes às apresentadas pelo autor citado anteriormente, a saber: • um sistema totalmente integrado; 180 • melhorar a monitoração e facilitar o processo de planejamento empresarial; • melhorar o serviço prestado ao cliente; • eliminar o uso de interfaces manuais; • garantir a disponibilidade da informação de suporte à tomada de decisão contribuindo para a sua otimização; • delegar as decisões nos níveis convenientes, mantendo o controle de gestão adequado. 3.2. Desvantagens do ERP Geralmente, as desvantagens na implementação de um sistema ERP são menores que as vantagens, sendo que muitas das dificuldades encontradas podem ser evitadas caso sejam realizados investimentos, formação e envolvimento adequados. O sistema é uma ferramenta para auxiliar o controle e planejamento dos processos de compra de matéria-prima e de produção, porém ele depende muito do comprometimento de seus operadores para que ele seja funcional. No entanto, o sucesso da implantação deste sistema não depende só da experiência e das competências da força de trabalho para se adaptar rapidamente ao novo, mas sim de outras situações, como: Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS (Cf. LAUGENI & MARTINS, 2005; LAUDON, 2004). 3.3. Módulos hoje disponíveis na Maioria dos ERPs • A customização em muitas situações é limitada e dispendiosa; Hoje, embora com diferenças de nomenclaturas, os ERPs mais avançados possuem módulos integrados (o que significa integração e qual o grau de integração são perguntas pertinentes) que abrangem o seguinte escopo: • requer mudanças substanciais n a o rg a n i z a ç ã o e n o s s e u s processos (reengenharia); • processo de implementação é longo e complexo; • os sistemas ERP podem ter custo proibitivo para instalar e executar; • a utilização do ERP por si só não torna uma empresa verdadeiramente integrada; • dependência perante o fornecedor do ERP; • torna os módulos dependentes uns dos outros, pois cada departamento depende das informações do módulo anterior. Logo, as informações têm que ser constantemente actualizadas, uma vez que as informações são em tempo real (on line), ocasionando maior trabalho; • excesso de controle sobre as pessoas, o que aumenta a resistência à mudança e pode gerar desmotivação nos funcionários. Os principais fatores críticos de sucesso para um projeto de implantação de um ERP podem ocorrer devido à falta de envolvimento do usuário e ao apoio da direção, à falta de um planejamento adequado e de marcos intermediários; comprometimento; visão e objetivos claros; infra-estrutura adequada. a) Módulos relacionados a Operações e Supply Chain Management: Previsões / Análises de Vendas (forecasting / Sales analysis); Listas de Materiais (BOM – Bills of Material); Programação Mestre de Produção / Capacidade Aproximada (MPS – Master Production Schedulling/RCCP – Rough-CUT Capacity Planning); Planejamento de Materiais (MRP – Material Requirements Planning); Planejamento Detalhado de Capacidade (CRP – Capacity Requirements Planning); Compras (Purchasing); Controle de Fabricação (SFC – Shop Floor Control); Controle de Estoques (Inventory); Engenharia (Engineering); Distribuição Física (DRP – Distribution Requirements Planning); Gerenciamento de Transporte ( T M – Tr a n s p o r t M a n a g e m e n t ) ; Gerenciamento de Projetos (Project); Apoio à Produção Repetitiva; Apoio à Gestão de Produção em Processos; Apoio à Programação com Capacidade Finita de Produção Discreta; Configuração de Produtos. b) Módulos relacionados à Gestão Financeira / Contábil / Fiscal: Contabilidade Geral; Custos; Contas a Pagar; Contas a Receber; Faturamento; Recebimento Fiscal; Contabilidade Fiscal; Gestão de Caixa; Gestão de Ativos; Gestão de Pedidos; Definição e Gestão dos Processos de negócio (Workflow). 181 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS c) Módulos relacionados à Gestão de Recursos Humanos: Pessoal (Personell) e Folha de Pagamentos (Payroll). 4. O ERP na Empresa de Correios e Telégrafos A ECT deu um passo importante na implementação da Solução Integrada de Gestão Empresarial (ERP). Após adotá-la nas áreas de recursos humanos (cadastro, benefícios e pagamentos) e financeira (contabilidade, cadastro de órgãos e fluxo de caixa), chegou a vez da área de administração, com a implantação do módulo de Ativo Fixo (bens móveis) e do módulo de gestão de contratos nas DRs – Diretorias Regionais e na AC – Administração Central. Tratou-se de um trabalho complexo, uma vez que envolveu o exame e o "carregamento" no sistema de dados relativos a mais de 8.200 contratos da ECT com fornecedores. Na área de administração, a implantação do ERP alcançou os módulos de contratações, licitações e estoque. Foi implantado o módulo de manutenção da área de tecnologia pela manutenção corretiva, foram concluídas as funcionalidades de manutenção preventiva e a utilização de coletores de dados portáteis para abertura de ordem de serviço. Instalar o ERP é um processo que demanda tempo nas empresas, uma vez que sua implantação, em média, é de três a seis meses e as transformações ocorrem efetivamente entre um e três anos; porém, mesmo assim, sua utilização é de grande valia para as empresas, já que se configura como um projeto com retorno de capital financeiro garantido, podendo gerar uma 182 economia anual em torno de U$1.6 milhões. (PADOVOZE, 2004). A implantação desse sistema integrado de informações requer uma reorganização na forma como as atividades estão estruturadas, além de externamente com clientes, fornecedores ou parceiros, mas, sobretudo, internamente na empresa. O ERP foi integrado à infraestrutura de gestão da ECT pela automatização dos processos, agilizando o fluxo de informações sobre processos administrativos e de negócios. Por meio do ERP, dados são compartilhados de forma rápida pelas áreas da empresa. "Os benefícios do ERP são muito grandes", diz o gerente da Diretoria de Tecnologia da ECT. "Onde a solução foi implantada, melhorou todos os processos internos." A transformação dos dados gerados pelo ERP em informações é viabilizada pelo Data Warehouse, que funciona como um armazém de dados, permitindo o cruzamento de informações históricas de diversas áreas e municiando a administração de informações na tomada de decisões. "Ele armazena o passado, auxiliando na realização de projeções, análises e simulações", diz o gerente da Diretoria de Tecnologia da ECT. Na área de recursos humanos, é possível analisar pagamentos, cadastro, benefícios e cargos e salários sob vários ângulos, como visões do efetivo por unidade, tipo de despesa ou de benefício. A solução permite análise do perfil dos empregados por faixa etária, sexo, nacionalidade, escolaridade e tipo de dependente. Na área financeira, analisa a evolução dos saldos de conta contábil. Na área operacional, é possível estabelecer visões gerenciais sobre o tratamento e a Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS distribuição de encomendas e cartas registradas, de modo a avaliar o tempo médio entre postagem e entrega, taxa de ocupação das aeronaves e tipos de objetos transportados. Na área comercial, os executivos podem analisar os produtos mais vendidos e sua sazonalidade por região ou agência. A implantação do ERP confirma a estratégia da ECT de se manter alinhada com as mais avançadas tendências de gestão empresarial. Exemplo é a comercialização de selos. No sistema tradicional, as operações de venda devem ser informadas várias vezes a diferentes áreas da empresa, de modo a assegurar fluxo constante de impressão, remessa e a manutenção de níveis adequados de estoque. Com o ERP, a venda é informada uma vez. Em tempo real, os dados são enviados às áreas envolvidas. Integrados num único sistema, ficam disponíveis aos setores que deles necessitam. Com isso, os processos e o controle administrativo ficam mais eficazes. A Empresa de Correios e Telégrafos realizou a implantação da Solução Integrada de Gestão Empresarial (ERP), e teve todos os seus módulos completamente implantados na ECT, ação que representou a consolidação de mais uma etapa do esforço de modernização tecnológica do dia-a-dia da empresa, ganhando em eficiência. A adoção do ERP teve como finalidade promover a integração da infraestrutura de gestão da empresa por meio da automatização de processos. O novo sistema tornou mais ágil todo o fluxo de informações corporativas, com impactos positivos em toda a organização, principalmente nas áreas administrativas e de negócios, graças à padronização de procedimentos e ao estabelecimento de uma base única de dados para onde convergem às informações corporativas. Ao possibilitar uma gestão mais eficiente, o ERP favorece a aplicação de práticas mais eficazes no desenvolvimento dos processos administrativos e dos negócios, com ganhos de produtividade e velocidade na tomada de decisões. Com a solução implantada, os dados gerados pela ECT poderão ser compartilhados de forma rápida pelas mais diversas áreas da organização. Outra vantagem da integração do fluxo de dados corporativos é a conquista pelo empregado de uma maior objetividade no exercício das atividades profissionais, o que contribui para a eliminação de trabalhos repetitivos e redundantes. " C o m o s r e c u r s o s d o E R P, o colaborador passa a ser um profissional ainda mais pró-ativo", diz o gerente da Diretoria de Tecnologia e Infra-estrutura. "O profissional terá mais tempo para dedicar-se às atividades de análise e de planejamento, graças à interatividade proporcionada pela solução." O ERP já faz parte da rotina dos colaboradores das áreas econômicofinanceira, comercial, de recursos humanos, administração e tecnologia da empresa nos módulos de Contabilidade, Orçamento e Contas a Pagar, Força de Vendas, Folha de Pagamentos, Cadastro e Benefícios, Gestão de Contratos, Contratações e Controle de Estoques e Manutenção de Equipamentos. O módulo operacional foi implantado na DR-PR (Diretoria Regional do Paraná) para validação dos procedimentos, abrangendo o controle da frota de veículos. Todos os 183 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS recursos da solução tecnológica foram integrados a esse segmento da ECT. As áreas da Empresa de Correios e Telégrafos apresentam como módulos de ERP implantados: a) Área Administrativa: Módulo Contabilidade; Módulo Tributos; Módulo Contas a Pagar; Módulo Faturamento; Módulo Contas a Receber; Módulo Custos; Módulo Orçamento; Módulo de Cadastro; Módulo de Tabela Corporativa de Órgãos – TCO; b) Área Comercial: Módulo Gestão de Contratos; Módulo Contratação; Módulo Ativo Fixo (Patrimônio); Módulo Estoque e Distribuição; Módulo de Manutenção de Equipamentos; Módulo de Estoques; Módulo Operacional – Gestão de Frotas; Módulo Operacional – Gestão de Linhas Transportes de Cargas Postal. 5. Considerações Finais Podemos considerar nesse artigo que cremos que a implantação e uso do sistema ERP exige que a empresa se reorganize, tendo como foco o processo do seu negócio como um todo, eliminando a gestão departamentalizada da empresa. Isso é facilitado pelo sistema ERP, pois este é integrado, e as informações que são geradas por um departamento são compartilhadas por outros. O ERP facilita o controle, pois com todas as informações armazenadas no sistema, pode-se verificar o desempenho das várias áreas da empresa. Também fornece suporte as tomadas de decisões da média e alta gerência. Como poderá verificar na Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos. 184 A implantação do sistema ERP na Empresa de Correios e Telégrafos, utilizado como exemplo prático nesse estudo, proporcionou um melhor controle, um atendimento mais eficaz e maior qualidade dos serviços. O novo sistema torna mais ágil todo fluxo de informações corporativas, com impactos positivos em toda a organização, principalmente nas áreas administrativas e de negócios, graças à padronização de procedimentos e ao estabelecimento de uma base única de dados para onde convergem as informações corporativas. Ao possibilitar uma gestão mais eficiente, o ERP favorece a aplicação de práticas mais eficazes no desenvolvimento dos processos administrativos e dos negócios, com ganhos de produtividade e velocidade na tomada de decisões. O sistema de automação da rede de agências possibilitou um melhor gerenciamento das atividades comerciais, financeiras e tecnológicas. O sistema ERP tornou mais ágil, todo o fluxo de informações corporativas com impactos positivos em toda empresa, levando a decisões estratégicas mais precisas e mais rápidas. Este artigo com o tema “ERP (Enterprise Resource Planning – Planejamento dos Recursos da Empresa)” pretende resumir as características desse sistema e apresentar as suas contribuições para as empresas. Não pretende esgotar o assunto, apenas fornecer a base para um melhor entendimento sobre o que se espera de uma grande empresa que utiliza este sistema e incentivar novas pesquisas nessa área. Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS Referências Bibliográficas CORRÊA, H. L. Planejamento, Programação e Controle da Produção: MRP II/ERP conceitos, uso e implantação. São Paulo. Atlas. 2001. EMPRESA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS. Disponível em: <www.correios.com.br>. Acesso em 13 mai. 2010. GAITHER, N. & FRAZIER, G. Administração da Produção e operações. São Paulo: Guazzelli, 1999. LAUDON, K. C. Sistemas de Informações gerenciais: administrando a empresa digital. São Paulo: Prentice Hall. 2004. LAUGENI, F.P. & MARTINS, P.G. Administração da Produção. São Paulo: Saraiva, 2005. PADOVOZE, C. L. Sistemas de informações contábeis: fundamentos e análise. São Paulo: Atlas. 2004. PRE. Disponível em:<http://groups.google.com.br/group/ publicitariosversuspublicidadepropaganda/browse_thread/thread/e36970308b5daeab>. Acesso em 10 mai. 2010. SLACK, N. et alli. Administração da produção. São Paulo: Atlas, 2002. SOARES, E. “O que é um sistema ERP”. Disponível em: <http://wnews.uol.com.br/site/noticias/materia_especial.php? id_secao=17&id_conteudo=452>. Acesso em 10 mai. 2010. 185 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS 1 Antonio Roberto Sanches Junior1 A necessidade de apresentação de certidão negativa de débito tributário como requisito para a concessão da recuperação judicial Recebido em: 30/09/2012 - Aprovado em: 14/10/2012 - Disponibilizado em: 26/12/2012 Resumo O estudo discute a exigência de certidões negativas de débitos tributários para a concessão de recuperação judicial, nos termos do art. 57, da Lei n.º 11.101/05. O objetivo é demonstrar a atual situação do tema no cenário jurídico nacional, notadamente o entendimento da doutrina, da jurisprudência e a atuação do Poder Legislativo quanto à eficácia do instituto recuperação judicial ante a exigência das certidões negativas de débitos tributários para a concessão da recuperação judicial. A discussão justifica-se pelo elevado número de empresas, no Brasil, que passam por precária situação financeira e vêem, como única solução, a recuperação judicial. No entanto, essas empresas, muitas vezes com elevadas dívidas tributárias, não conseguem o benefício legal por não conseguirem as certidões negativas de débitos tributários. Ainda com a possibilidade de parcelamento dos débitos as empresas ficam impedidas de 1 Antonio obter o parcelamento, na medida em que não conseguem arcar com os parcelamentos oferecidos em curtos prazos ou não encontram possibilidade legal de parcelamento, já que cada entidade da federação tem de ter Lei própria e específica autorizando o parcelamento de seus devedores. O estudo tomou por base o art. 57, da Lei n.º 11.101/05, sua interpretação doutrinária e jurisprudencial, bem como os Projetos de Lei destinados a atenuar ou mesmo extinguir a exigência. Palavras-chave: recuperação judicial; certidão negativa; débitos tributários. Abstract The study discusses the requirement for clearance certificates of tax debts for granting judicial reorganization, pursuant to Article 57 of the Federal Act n.º 11.101/05. The objective is to demonstrate the current state of the subject in national Roberto Sanches Junior. Mestrado em Direito pela Universidade Católica de Santos - UNISANTOS (2008), Especialização em Direito Civil pela Universidade Paulista (2005) e graduação em Direito pela Universidade Paulista (2004). Advogado Inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil São Paulo desde 2004, atuando no contencioso Cível e Empresarial. Além de Advogado é professor de Direito Processual Civil na Faculdade de Direito da Universidade São Judas Tadeu - USJT; Direito Civil, Empresarial e do Consumidor na Faculdade de Direito da Universidade Nove de Julho UNINOVE; Direito Civil nos cursos de Pós-Graduação Lato Sensu das Faculdades Metropolitanas Unidas FMU; e Direito Processual CIvil, Empresarial e do Consumidor nos cursos de Pós-Graduação Lato Sensu e MBA da Universidade Municipal de São Caetano do Sul - USCS / IMES; professor licenciado na Sociedade Acadêmica Amparense em Registro/SP. Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito Civil, Processual Civil, Empresarial e do Consumidor. E-mail: [email protected]. 186 Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS legal scenario, especially the understanding of the doctrine, jurisprudence and the role of the legislature as to the effectiveness of the institute judicial reorganization against clearance certificates of tax debts for granting judicial reorganization. The discussion is justified by the large number of companies in Brazil, passing through precarious financial situation and see it as the only solution to judicial reorganization. However, these companies often with high tax debts, can not benefit because they don’t have access to obtain the clearance certificates of tax debts. Even with the possibility of installment debts companies are prevented from obtaining the subdivision, to the extent that they can not afford the installments offered for short periods or are not legal possibility of installments, as each entity of the federation must have own law and specific authorizing installment of their debtors. The study was based on the Article 57 of the Act n. º 11.101/05, doctrinal and jurisprudential interpretation, as well as the bills of law intended to attenuate or even extinguish requirement. Keywords: judicial reorganization; clearance certificates; tax debts. 1. Introdução A Lei n.º 11.101/05 estruturou o novo sistema de recuperação de empresas e falência. Ao invés de visualizar a falência, como fazia o sistema anterior, o novo sistema prioriza a recuperação de empresas. Isso fica muito claro quando comparada a ementa da Lei atual (“Regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária”) com a do Decreto-Lei anterior (“Lei de Falências”). Como se não bastasse, o novo sistema positivou o princípio da recuperação da empresa, na medida em que considera a atividade empresarial importante à sociedade. Confiram-se as expressões utilizadas pelo legislador no art. 47, da Lei n.º 11.101/05: “fonte produtora”, “emprego dos trabalhadores”, “função social” da empresa.2 Indo além, enquanto estabeleceu uma espécie de falência, possibilitou quatro modalidades diversas de recuperação. Há a recuperação judicial, que se divide em duas espécies: i) recuperação judicial ordinária (arts. 48 e ss. da Lei n.º 11.101/05): aquela possível para todos aqueles a quem a Lei n.º 11.101/05 se aplique e preencham os requisitos; ii) recuperação judicial especial (arts. 70 e ss. da Lei n.º 11.101/05): para as 2 Art. 47. A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica. 187 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS empresas que se qualificam como Microempresas ou Empresas de Pequeno Porte3 . Estabeleceu, também, duas modalidades de recuperação extrajudicial. Utilizando terminologia de Fabio Ulhoa C o e l h o4 , c l a s s i f i c a m - s e e m : i i i ) recuperação extrajudicial de homologação facultativa (art. 162 da Lei n.º 11.101/05) e i v ) re c u p e r a ç ã o e x t r a j u d i c i a l d e homologação obrigatória (art. 163 da Lei n.º 11.101/05), respectivamente, conforme consigam, ou não, anuência de todos os credores envolvidos no plano. Ante essas breves observações verificase a preocupação do legislador em preservar a atividade empresarial. Ocorre que um dispositivo da Lei n.º 11.101/05 aparentemente vai contra o sistema estabelecido para a preservação da atividade empresarial. Trata-se do artigo 57, que condiciona o deferimento da recuperação judicial à apresentação, pelo devedor, de certidões negativas de débitos tributários. A discrepância desse dispositivo vem sendo reconhecida pelo Poder Judiciário, ao afastar essa exigência para a concessão da recuperação judicial às empresas que, após obterem aprovação do plano de recuperação pelos credores, não conseguem apresentar certidão negativa (ou positiva com efeitos de negativa) de débitos tributários. O presente estudo discute algumas peculiaridades desse dispositivo, bem como do entendimento dos Tribunais que vêm decidindo pela recuperação daqueles que não conseguem as certidões. 2. Entendimento doutrinário Antevendo a inviabilização do instituto recuperação judicial a doutrina já alertava para o problema causado pela exigência de certidões negativas de débitos tributários para a concessão de recuperação judicial. Manoel Justino Bezerra Filho5 já salientava que essa exigência tratava-se, na verdade, de um meio indireto de o Poder Público cobrar seus créditos. Argumentou, ainda, com absoluto acerto, a nosso sentir, que se a empresa necessitasse de recuperação judicial, por óbvio em conseqüência de dívidas com credores, muito mais deveria ao fisco, o que sepultaria de vez a possibilidade de parcelamento e, por via de conseqüência, de obtenção da recuperação judicial. Com a perspicácia que lhe é peculiar Ricardo Negrão indaga: “Contudo, se as certidões não forem juntadas, qual é a sanção?”6 . Salientando a ausência de 3 Os conceitos de ME e EPP são estabelecidos pela Lei Complementar n.º 123/06: Art. 3º Para os efeitos desta Lei Complementar, consideram-se microempresas ou empresas de pequeno porte a sociedade empresária, a sociedade simples e o empresário a que se refere o art. 966 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002, devidamente registrados no Registro de Empresas Mercantis ou no Registro Civil de Pessoas Jurídicas, conforme o caso, desde que: I - no caso das microempresas, o empresário, a pessoa jurídica, ou a ela equiparada, aufira, em cada ano-calendário, receita bruta igual ou inferior a R$ 240.000,00 (duzentos e quarenta mil reais); II - no caso das empresas de pequeno porte, o empresário, a pessoa jurídica, ou a ela equiparada, aufira, em cada ano-calendário, receita bruta superior a R$ 240.000,00 (duzentos e quarenta mil reais) e igual ou inferior a R$ 2.400.000,00 (dois milhões e quatrocentos mil reais). 4 Curso de direito comercial. v.3., 7.ed., São Paulo: Saraiva, 2007, p. 433. 5 Nova Lei de Recuperação e Falências Comentada, 3.ed., São Paulo: RT, 2005, p. 167. 6 Manual de direito comercial e de empresa, v.3., 2.ed., São Paulo: Saraiva, 2007, p. 181. 188 Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS solução legal, pontua possibilidades que se abrem ao juiz caso isso ocorra: i) entender desnecessária a apresentação das certidões; ii) entender que a exigência da s certidões negativas depende da regulamentação do art. 68, de maneira que ausente possibilidade de parcelamento dos débitos tributários prevista em Lei, não é aplicável a exigência do art. 57, da Lei n.º 11.101/05. Cita, ainda, Eduardo Secchi Munhoz, para quem: “sem o adequado tratamento dos débitos tributários, o sistema de recuperação da empresa não se sustentam não dispensando a esperada disciplina equilibrada e proporcional aos diversos interesses em jogo. Esse equilíbrio e proporção, contudo, não foi assegurado na atual lei de recuperação, nem na Lei complementar tributária que a acompanhou (LC 118/2005). Espera-se que a Lei a ser editada para recuperar o parcelamento de débitos tributários para fins de recuperação, nos termos do § 3º do art. 155-A do CTN, venha a adorar critérios adequados e bem alinhados com o sistema de recuperação preconizado pela Lei 11.101/05, de forma a atenuar os problemas ora apontados em relação à matéria. Até que isso ocorra, caberá unicamente à jurisprudência interpretar o art. 57 de sorte a não inviabilizar o regime de recuperação preconizado pela nova Lei” 7 Inovadora (embora cogitada antes da promulgação da Lei n.º 11.101/05) é a posição de Jorge Lobo, que defende a possibilidade de perdão do crédito tributário para as empresas que demonstrarem reais possibilidades de recuperação.8 Nas palavras do advogado: “Para, de fato, propiciar a recuperação judicial da empresa econômica e financeira viável ou política, social e estrategicamente importante, é necessário mais, bem mais, muito mais! É necessário não apenas alterar o art. 155a, do CTN, que trata da dilação dos prazos de pagamento do crédito fiscal, mas inovar, modificando, substancialmente, com ousadia e rígidos critérios, a disciplina da ‘exclusão do crédito tributário’ (CTN, art. 175 e ss.), de forma a permitir que o fisco federal e estadual, ao examinar caso a caso e ao constatar a viabilidade da empresa, possam perdoar parte da dívida fiscal em limites adrede especificados em decreto do Poder Executivo, a exemplo do que ocorre em França (art. 179 do Decreto 85-1.388, c/c art. L.247, do Livro de Procedimentos Fiscais, e art. L. 621-60, do Código de Comércio) (...)” 9 É certo que a proposta de o fisco abrir mão de seus créditos em benefício da recuperação da empresa é ousada, mas factível se percorrido o caminho da legalidade imposta ao administrador público, mormente depois de o sistema da recuperação de empresas ter declarado que a atividade empresarial é importante para o Estado (art. 47, da Lei n.º 11.101/05). Como mencionado no estudo de Jorge Lobo, a França adota esse modelo. Contudo, não há projetos de lei nesse sentido tramitando. 7 Comentários aos artigos 65 a 69. in SOUZA JUNIOR, Francisco Satiro de; PITOMBO, Antônio Sérgio A. de Moraes. Comentários à Lei de Recuperação de Empresas e Falência, São Paulo: RT, 2006, p. 283, apud NEGRÃO, Ricardo. Manual de direito comercial e de empresa, v.3., 2.ed., São Paulo: Saraiva, 2007, p. 182. 8 LOBO, Jorge. A recuperação judicial da empresa e o perdão do crédito tributário. Boletim de Doutrina ADCOAS. São Paulo. v.7. n.14. p.271-2. jul. 2004 9 Idem 189 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS 3. Entendimento jurisprudencial Os Tribunais dos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná e Minas Gerais vêm afastando o rigor da norma para fins de permitir a recuperação judicial daquelas empresas que não conseguem apresentar as certidões tributárias após obterem aprovação do plano de recuperação por parte de seus credores. Em Minas Gerais10 o Poder Judiciário tem entendido que a Lei n.º 11.101/05 deve ser interpretada de forma sistêmica, ressaltando o princípio insculpido no art. 47 da mesma Lei, de maneira que a exigência das certidões negativas inviabilizaria quase que por completo o instituto da recuperação judicial. A Jurisprudência mineira fundamenta seu entendimento na necessidade de permitir que a Lei atinja seu objetivo, qual seja, a recuperação das empresas. Ademais, nos termos do art. 155-A, do CTN, depende de Lei Específica, o que, por vezes, não se verifica nas três esferas da federação às quais a empresa requerente se encontra vinculada. Aduzem os julgadores que enquanto não editadas as leis que permitam o parcelamento resta inviabilizada a aplicação da exigência do art. 57 da Lei n.º 11.101/05. No Rio de Janeiro a situação não é tão segura assim. Na recuperação da Varig houve a concessão da recuperação sem as certidões negativas, mas isso se deveu ao fato de o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro não ter conhecido do recurso. Assim alguns entendem que o entendimento do Tribunal do Rio de janeiro é pela desnecessidade de apresentação das certidões. Entendemos que esse posicionamento não pode ser tido como certo. No caso da Varig, o Juiz de Direito Luiz Roberto Ayub, magistrado presidente do processo de recuperação assim determinou: “a ausência de lei especial disciplinadora do parcelamento de créditos tributários de quem esteja em processo de recuperação exige tratamento que for mais benéfico ao contribuinte, sendo inaplicável a norma do art. 191-A do CTN, enquanto não se dê cumprimento ao disposto no § 3º do art. 155-A daquele diploma legal”11. Contra essa decisão a União interpôs agravo de instrumento12. O agravo, por maioria, não foi conhecido, mas o relator, voto vencido, conheceu do recurso e a ele deu provimento para fins de exigir a apresentação das certidões negativas. Nas palavras do relator: “não se vê na lei de regência alguma regra que excepcione a obrigação das devedoras inserida pelo seu art. 57”. 10 TJ-MG, 5ª Câmara Cível. Agravo de instrumento n.º 1.0079.06.288873-4/001, Rel. Des. Dorival Guimarães Pereira, j. 29/05/2008, DJ 06/06/2008. TJ-MG, 5ª Câmara Cível. Agravo de instrumento n.º 1.0079.07.348871-4/007, Rel. Des. Maria Elza, j. 08/10/2009, DJ 21/10/2009. TJ-MG, 7ª Câmara Cível. Agravo de instrumento n.º 1.0079.07.371306-1/001, Rel. Des. Heloisa Combat, j. 29/09/2009, DJ 16/10/2009. 11 Transcrição feita por Manuel Justino Bezerra Filho, Jurisprudência da Nova Lei de Recuperação de Empresas e Falência, São Paulo, RT, 2006, pp. 152-171, apud NEGRÃO, Ricardo. Manual de direito comercial e de empresa, v.3., 2.ed., São Paulo: Saraiva, 2007, p. 183. 12 TJ-RJ, 4ª Câmara Cível. Agravo de Instrumento nº 2006.002.07023, Rel. Des. Jair Pontes de Almeida, Vogal designada para acórdão Des. Ana Maria Pereira de Oliveira, j. 24/10/2006. 190 Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS O acórdão não chegou a analisar a questão de fundo (exigência, ou não, da CND para a recuperação judicial). O único desembargador que o fez, foi para fins ratificar a exigência legal mas, como restou vencido, seu entendimento não prosperou. A União interpôs Recurso Especial13 buscando obstar o deferimento da recuperação judicial pela não obtenção das certidões negativas. O recurso ainda não foi julgado, mas a ele já foi juntado parecer do Ministério Público favorável à concessão da recuperação ainda que sem as certidões negativas. Antes do julgamento do Recurso Especial pelo STJ, infelizmente, foi decretada a falência da Varig, o que terá como conseqüência a perda do objeto do Recurso Interposto perante o STJ, retirando do Tribunal a possibilidade de se debruçar sobre a questão e solucionar a controvérsia.14 13 Na Comarca de Ponta Grossa – Paraná, o Juiz Luiz Henrique Miranda, da 1ª Vara Cível, presidindo o pedido de recuperação j u d i c i a l d a e m p r e s a Wo s g r a u Participações Industria e Comércio Ltda. também deferiu a recuperação independente da apresentação de certidões negativas tributárias ao argumento que “a exigência de apresentação de certidões comprobatórias de inexistência de débitos junto ao Fisco e à previdência, feita pelo art. 57 da Lei n. 11.101/05, ofende o princípio constitucional da razoabilidade e agride as garantias constitucionais ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa dadas ao contribuinte”15. A par das decisões acima mencionadas, de Juízos de primeira e segunda instância, a maior quantidade de decisões afastando a exigência de CND encontra-se no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, por meio de sua Câmara de Falências e R e c u p e r a ç õ e s J u d i c i a i s .16 E s s e posicionamento é unânime, de acordo com STJ – 3ª T. REsp n.º 1.166.600, Rel. Min. Vasco Della Giustina (desembargador convocado do TJ/RS). 14 Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, autos n.º Processo 0260447-16.2010.8.19.0001, notícia publicada em 20/08/2010: <http://srv85.tjrj.jus.br/publicador/exibirnoticia.do?acao=exibirnoticia&ultimasNoticias =20318&classeNoticia=2&v=2> – acesso em 24/08/2010 15 Transcrição feita por Manuel Juystino Bezerra Filho, Jurisprudência da Nova Lei de Recuperação de Empresas e Falência, São Paulo, RT, 2006, pp. 152-171, apud NEGRÃO, Ricardo. Manual de direito comercial e de empresa, v.3., 2.ed., São Paulo: Saraiva, 2007, p. 183 16 TJ-SP, Câmara Reservada à Falência e Recuperação, Agravo de Instrumento n.º 994.09.273364-3, Rel. Des. Romeu Ricupero, j. 01/06/2010, (acórdão n.º 03059391). TJ-SP, Câmara Reservada à Falência e Recuperação Agravo de Instrumento n.º 994.09.282083-3, Rel. Des. Romeu Ricupero, j. 01/06/2010 (acórdão n.º 03059392). TJ-SP, Câmara Reservada à Falência e Recuperação, Agravo de Instrumento n.º 990.10.010712-7, Rel. Des. Romeu Ricupero, j. 04/05/2010 (acórdão n.º 02978088). TJ-SP, Câmara Reservada à Falência e Recuperação, Agravo de Instrumento n.º 994.09.317882-5, Rel. Des. Lino Machado, j. 04/05/2010 (acórdão n.º 02978340). TJ-SP, Câmara Reservada à Falência e Recuperação, Agravo de Instrumento n.º 990.10.005006-0, Rel. Des. Pereira Calças, j. 06/04/2010 (acórdão n.º 02926040). TJ-SP, Câmara Reservada à Falência e Recuperação, Agravo de Instrumento n.º 994.09.6331764-5, Rel. Des. Lino Machado, j. 26/01/2010 (acórdão n.º 02791220). TJ-SP, Câmara Especial de Falências e Recuperações Judiciais, Agravo de Instrumento n.º 994.08.057310-5, Rel. Des. Lino Machado, J. 05/05/2009 (acórdão n.º 02326271). TJ-SP, Câmara Especial de Falências e Recuperações Judiciais, Agravo de Instrumento n.º 994.07.098182-0, Rel. Des. Lino Machado, j. 30/01/2008 (acórdão n.º 01580147). TJ-SP, Câmara Especial de Falências e Recuperações Judiciais, Agravo de Instrumento n.º 994.07.114143-5, Rel. Des. Pereira Calças, j. 30/01/2008 (acórdão n.º 01569600). TJ-SP, Câmara Especial de Falências e Recuperações Judiciais, Agravo de Instrumento n.º 994.07.099855-3, Rel. Des. Romeu Ricupero, j. 01/08/2007 (acórdão n.º 01366938). TJ-SP, Câmara Especial de Falências e Recuperações Judiciais, Agravo de Instrumento n.º 994.06.028559-0, Rel. Des. Pereira Calças, j. 17/01/2007 (acórdão n.º 01198967). TJ-SP, Câmara Especial de Falências e Recuperações Judiciais, Agravo de Instrumento n.º 994.06.032241-0, Rel. Des. Romeu Ricupero, j. 08/11/2006 (acórdão n.º 0 1155552). 191 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS as pesquisas efetuadas, e é, ademais, citado por acórdãos de outros estados, já mencionados neste estudo. Em apertada síntese, três são os argumentos a fundamentar o posicionamento da corte paulista: i) a incongruência entre a exigência da CND e o princípio da manutenção da atividade empresarial insculpido no art. 47, da Lei n.º 11.101/05; ii) a inconstitucionalidade dos artigos 191-A do CTN e 57, da Lei n.º 11.101/05, que ferem o princípio do devido processo legal, na medida em que constituem, em verdade, meios pelos quais o Fisco busca cobrar, sem o devido processo legal, créditos que tem com as empresas. Com base nesses dois fundamentos, o Tribunal pontua o terceiro fundamento, segundo o qual, enquanto não regulamentado o art. 68, da Lei n.º 11.101/05, que prevê a possibilidade de parcelamento dos débitos fiscais, não se sustenta a exigência de certidões negativas (ou positivas com efeito de negativas) fiscais para a concessão da recuperação judicial. 4. Projetos de Lei Desde a tramitação do projeto de Lei que se transformou na Lei n.º 11.101/05 já se antevia a problemática que ora se estuda, de maneira que tramitam, desde então, projetos paralelos sejam para a disponibilização de parcelamento dos débitos fiscais para os casos de empresas que requeiram a recuperação judicial, seja para a supressão do próprio artigo 57, da Lei n.º 11.101/05, que faz a exigência. O Projeto de Lei do Senado n.º 245/2004 estabelece a possibilidade de parcelamento dos débitos federais e 192 determina que em não havendo legislação sobre parcelamento nos demais entes federativos aos quais estiver vinculada a empresa, a aplicação das leis gerais de parcelamento do ente da Federação ao devedor em recuperação judicial, não podendo, nesse caso, ser o prazo de parcelamento inferior ao concedido pela Lei federal, caso aprovada (84 ou 72 meses, conforme o caso). Ademais, altera o art. 57, da Lei n.º 11.101/05 para incluir a apresentação das certidões negativas ou comprovante de suspensão da exigibilidade dos débitos tributários. Nos parece quebra do pacto federativo a imposição de legislação geral àquelas entidades da federação que não tiverem leis próprias de parcelamento para que este seja concedido aos devedores tributários. Se um município, v.g., não contemplar, de maneira legislativa, hipóteses de parcelamento de seus créditos para com os contribuintes, não se pode, data venia, impor à entidade as regras gerais estabelecidas pelo estado-membro. O projeto se encontra apensado ao Projeto de Lei da Câmara n.º 5.250/2005, que adotou o mesmo texto e concentra, como apensos, todas as propostas legislativas que tratam de parcelamento de créditos fiscais, abaixo mencionadas. O Projeto de Lei da Câmara n.º 246/2003, prevê o parcelamento em 240 prestações, não contendo nada de especial para a recuperação de empresas, exceto o prazo, bem maior do que aquele de 84 meses do projeto acima citado. O Projeto de Lei n.º 6.447/2005 prevê a possibilidade de parcelamento das dívidas tributárias em até cento e oitenta parcelas. Para isso o parcelamento deverá ser requerido até o último dia útil do mês Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS subseqüente ao do deferimento do processamento da recuperação judicial, perante a unidade da Secretaria da Receita Federal, da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional ou do Instituto Nacional de Seguridade Social responsável pela cobrança do respectivo débito. O Projeto de Lei n.º 4.982/2005 prevê a possibilidade de parcelamento para as empresas em recuperação judicial. O parcelamento será de até 120 parcelas mensais e deverá ser requerido até o último dia útil do segundo mês subseqüente ao do deferimento do processamento da recuperação judicial perante a unidade da Secretaria da Receita Federal ou da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, responsável pela cobrança do respectivo débito. Condição interessante é a dispensa de garantia ou arrolamento de bens. Os Projetos de Lei 6.028/2005 e 7.636/2006 simplesmente revogam o art. 57, da Lei n.º 11.101/05 para que não mais sejam exigidas as certidões tributárias para a concessão da recuperação judicial. De trâmite legislativo lento, todos os Projetos de Lei, que tramitam em conjunto, apensados ao Projeto de Lei da Câmara n.º 5.250/2005, apresentam medidas para o caso. Certamente aquela que mais se coaduna com o princípio da manutenção da atividade empresarial é a revogação do art. 5 7 , d a L e i n . º 11 . 1 0 1 / 0 5 , p a r a simplesmente deixar de exigir as certidões negativas. 5. Conclusão De há muito está consolidada a interpretação sistêmica como indispensável ao processo exegético. Infelizmente a hermenêutica parece não permear os meandros do processo de elaboração das leis. Exemplo disso é a absurda desproporcionalidade entre crimes e penas, verificada no sistema penal, em que crimes mais brandos por vezes são apenados com penas mais severas, às vezes sob a ilusão que a exasperação de penas resolverá a questão penal, às vezes para responder aos reclamos da sociedade, muitas vezes com propósitos eleitoreiros.17 Dessa maneira, mais uma vez a falta de proporcionalidade e visão sistêmica fica clara com a exigência feita pelo art. 57 da Lei n.º 11.101/05 que exige, de uma empresa que não conseguem nem pagar seus credores, quitação com as fazendas federal, estadual e municipal. É patente que em situação de déficit financeiro uma empresa preferirá pagar seus fornecedores, que garantirão a continuidade de sua atividade, ao invés do fisco. Nesse passo, quando a empresa empreende negociação para obter junto de seus fornecedores a recuperação de sua crise econômicofinanceira já conta com alto passivo tributário. Exigir, nesse momento, quitação dos débitos tributários significa impedir que a empresa se recupere. Ademais o art. 47, da Lei n.º 11.101/05 é claro ao demonstrar a principiologia informadora da nova Lei. Trata-se de 17 Para uma melhor compreensão de um dos motivos da desenfreada produção legislativa, recomendamos o estudo de NEVES, Marcelo. A constitucionalização simbólica, São Paulo: Martins Fontes, 2007. Segundo Pedro Lenza, trata-se de trabalho apresentado pelo autor para a obtenção do cargo de Professor Titular da Universidade Federal de Pernambuco, em 1992. Lenza comenta os principais aspectos do estudo. (LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado14.ed., São Paulo: Saraiva, 2010 p. 70 e ss.) 193 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS medidas para a recuperação e manutenção da atividade empresarial. recuperação judicial, ainda que com débitos tributários. Incluir em uma Lei destinada à manutenção e recuperação da atividade empresarial dispositivo impeditivo da consecução do objetivo da Lei é um absoluto contrassenso. Tamanho é o absurdo que o texto legal permite ao empresário ajuizar o pedido de recuperação judicial, obter o deferimento do processamento da recuperação, com a conseqüente apresentação do plano de recuperação para seus credores, a posterior discussão desse plano pelos credores em assembléia para, ao final, depois de percorrido esse exaustivo iter e obtida a aprovação de seu plano pelos credores, exigir as certidões negativas tributárias, como que mantendo, durante todo o processo, uma espada de Dâmocles sobre a cabeça do empresário. Em breve a questão seria apreciada pelo Superior Tribunal de Justiça, quando se esperaria fosse confirmado o entendimento que vem predominando nos Tribunais estaduais para uniformizar a jurisprudência no sentido da dispensa das certidões negativas tributárias para o deferimento da recuperação judicial. Felizmente o Judiciário atentou para a falta de estrutura sistêmica da Lei e vem, acertadamente, ressalte-se, afastando a exigência de certidões negativas para a concessão da recuperação judicial. Pioneiro nesse entendimento, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo vem decidindo nesse sentido desde o início da vigência da Lei, no que vem sendo seguido por outras cortes. Saliente-se que o entendimento pela desnecessidade de apresentação de certidões negativas não é só medida obtida em sede recursal. Ao contrário, assim vem sendo decidido pelos juízos de primeira instância, o que tem desafiado agravos de instrumento, com a conseqüente manutenção das decisões de primeiro grau pelos tribunais. Com esse reconhecimento logo em primeiro grau de jurisdição, as empresas têm mais segurança ao pleitear sua 194 Infelizmente os operadores do direito terão de aguardar, eis que com a decretação da falência da Varig o REsp que trata da matéria perderá objeto, pelo que será arquivado sem a manifestação do STJ sobre o tema. Dessa maneira, sem prejuízo da essencial uniformização de jurisprudência perpetrada pelo STJ, que ainda pode ser feita caso outro recurso análogo a ele chegue, a controvérsia tende a ser definitiva e absolutamente resolvida com a aprovação dos projetos de Lei que tramitam. Verifica-se, contudo, que o trâmite dos Projetos de Lei que cuidam do tema tramitam a passos lentos, talvez pelo fato de que a aprovação da dispensa da CND para os requerentes de recuperação judicial signifique, prima facie, perda de receita pública o que, em nosso entender é um equívoco, na medida em que as empresas em dificuldades financeiras que, por não conseguirem a CND não obtiverem a recuperação judicial estão arriscadas a falir, com o que, aí sim, com certeza, se terá a perda da respectiva receita tributária, na medida em que, em regra, uma empresa que tem a falência decretada já tem todos os bens dados em garantia de contratos de mutuo, cujos mutuantes (em regra, as instituições financeiras) recebem antes do Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS fisco, nos termos do art. 83, da Lei n.º 11.101/05. É cediço que várias são as propostas tramitando no Poder Legislativo, mas sem dúvida a melhor delas é a simples supressão dos artigos 57, da Lei n.º 11.101/05 e do art. 191-A, do CTN, na medida em que ambos estabelecem a mesma norma, qual seja, a necessidade de quitação dos débitos tributários para a concessão da recuperação judicial. Como visto os Projetos de Lei 6.028/2005 e 7.636/2006 pretendem a revogação do artigo 57, da Lei n.º 11.101/05, mas data venia pensamos que não é suficiente para encerrar a controvérsia, na medida em que o art. 191A, do CTN permanece a condicionar o deferimento da recuperação judicial à quitação tributária, pelo que duas opções se nos apresentam como viáveis: i) aprovar, também, uma Lei Complementar para, simplesmente, suprimir o art. 191-A, do CTN; ou ii) aprovar os próprios Projetos de Lei n.ºs 6.028/2005 e 7.636/2006 como Lei Complementar, suprimindo, de uma só vez, o artigo 57, da Lei n.º 11.101/05 o art. 191-A, do CTN, o que seria possível ante o quorum maior exigido para Lei Complementar, o que autorizaria essa modalidade legislativa à derrogação de Lei Ordinária. A incongruência legislativa prejudica a interpretação sistêmica do direito. Isso, contudo, é fenômeno que ao invés de reduzir-se, tente a aumentar com o passar dos anos e das legislaturas. Nesses casos, importantes se demonstram doutrina e jurisprudência como ferramentas de coesão do sistema jurídico. Felizmente, verifica-se atenção, por p a r t e d o l e g i s l a d o r, d o e s f o r ç o jurisprudencial para dar coesão ao sistema, caso em que transformam as manifestações jurisprudenciais em direito positivo, restabelecendo a coesão do sistema jurídico, ao menos de maneira parcial. Referências Bibliográficas BEZERRA FILHO, Manoel Justino. Nova Lei de Recuperação e Falências Comentada, 3.ed., São Paulo: RT, 2005. COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. v.3., 7.ed., São Paulo: Saraiva, 2007. LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado, 14.ed., São Paulo: Saraiva, 2010. LOBO, Jorge. A recuperação judicial da empresa e o perdão do crédito tributário. Boletim de Doutrina ADCOAS. São Paulo. v.7. n.14. p.271-2. jul. 2004. NEGRÃO, Ricardo. Manual de direito comercial e de empresa, v.3., 2.ed., São Paulo: Saraiva, 2007. NEVES, Marcelo. A constitucionalização simbólica, São Paulo: Martins Fontes, 2007. 195 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS 123 Leonardo Di Francescantonio1 Fernando Luiz de Almeida2 Mauro Maia Laruccia3 O desenvolvimento de projetos, com o auxílio da engenharia de software e metodologia ágil SCRUM Recebido em: 26/10/2012 - Aprovado em: 12/11/2012 - Disponibilizado em: 26/12/2012 Resumo Abstract Engenharia de Software tem se mostrado uma grande ferramenta de trabalho para o auxílio no desenvolvimento de software. Dentre esses conceitos e metodologias encontra-se o SCRUM, metodologia ágil que facilita o gerenciamento do desenvolvimento, facilitando a comunicação da equipe, controle do tempo, distribuição da atividade, trazendo maior qualidade ao produto final. Software engineering has proved a great tool to aid work in software development. Among these concepts and methodologies is SCRUM, Agile methodology that facilitates the management of the development, facilitating team communication, time management, distribution of activity, bringing higher quality at the end product. Palavras-chave: Engenharia de Software, SCRUM, Desenvolvimento de Software, Metodologias Ágeis, Java. 1. Introdução Há algum tempo, os softwares vem se tornando uma ferramenta imprescindível nas empresas. Esse avanço tem impactado, K e y w o r d s : S o f t w a re E n g i n e e r i n g ; SCRUM; Software Development; Agile Methodologies; Java não somente as grandes corporações, mas também as pequenas e médias empresas. O que acarretou um grande aumento da demanda de software e com isso, o conceito de Engenharia de Software 1Leonardo Di Francescantonio - Graduando em Faculdade de Computação e Informática da Fundação Armando Álvares Penteado – FAAP. Rua Alagoas, 903, São Paulo, Brasil. E-mail: [email protected] Fernando Luiz de Almeida - Professor Doutor da Faculdade de Computação e Informática da Fundação Armando Álvares Penteado – FAAP. Rua Alagoas, 903, São Paulo, Brasil. E-mail: [email protected] 2 Mauro Maia Laruccia - Professor Doutor da Faculdade de Economia e Administração PUC/SP e da Fundação Armando Álvares Penteado - FAAP e Professor Pesquisador do Grupo de Pesquisa e Iniciação Científica, orientador da Oficina de Artigos das Faculdades Integradas Campos Salles. Rua Nossa Senhora da Lapa, 284, São Paulo 05072-000, Brasil. E-mail: [email protected] 3 196 Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS ganhou força, passando, inclusive, a ser visto como uma importante disciplina dos cursos relacionados a desenvolvimento de aplicações para computadores. Conceitualmente, a Engenharia de Software compreende um processo, um conjunto de métodos (práticas) e ferramentas que possibilitam aos profissionais desenvolverem softwares de altíssima qualidade (PRESSMAN, 2011; SOMMERVILLE, 2011). É comum existirem problemas entre desenvolvedores e clientes, ao decorrer do processo de criação e amadurecimento de projetos, devido à dificuldade na comunicação, prejudicando o desenvolvimento de softwares de qualidade dentro de prazos cada vez mais apertados. Com a Engenharia de Software, o desenvolvimento torna-se mais organizado e produtivo, pois, a partir da combinação de inúmeras técnicas, o processo de comunicação entre clientes e desenvolvedores é otimizado, resultando em softwares complexos e de qualidade, que respeitam os prazos de desenvolvimento. Com base nos conceitos e métodos abordados em engenharia de software, foi proposto o desenvolvimento de um sistema para uma corretora de seguros, com o objetivo de gerenciar as informações referentes a planos e seguros saúde, abrangendo a adesão de pessoas físicas e pessoas jurídicas, Omicron Zeta GIPSS Sistema de Gerenciamento de Informações de Plano e Seguro Saúde – é um sistema dividido em cinco seguimentos de informação: Empresa, Funcionário, Cliente Individual, Prestadores e Relatórios. Cada uma dessas frentes de atuação, com exceção dos Relatórios, conta com funcionalidades de Cadastro, Edição e Consulta, ações essas que são executadas respeitando os perfis de acesso definidos pelo administrador do sistema, que além das funcionalidades citadas, possui o acesso e controle dos usuários. Durante o desenvolvimento, foram colocadas em prática técnicas abordadas pela Engenharia de Software, tendo em mente um trabalho em conjunto com o cliente, que participou ativamente de todo o processo. 2. Metodologia A construção do projeto foi orientada por alguns modelos de engenharia de software, que auxiliam na criação de um projeto de qualidade, são eles: •Etapas do arcabouço, que orientam no desenvolvimento de software dividindo o mesmo em cinco etapas: Comunicação, Planejamento, Modelagem, Construção e Implantação; •Filosofia do modelo espiral, que serviu de base para o desenvolvimento em conjunto com o cliente, sugerindo que o cliente faça parte da criação, motivando-o a se envolver com o projeto; •Processo Unificado, RUP (Rational Unified Process), que orienta no desenvolvimento, apoiando-se nos melhores recursos e características dos modelos convencionais de processos de software; •D o c u m e n t a ç ã o U M L (Linguagem Unificada de Modelagem), que auxiliou na 197 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS criação de diagramas ilustrativos dos processos e da comunicação do software; •Método Ágil de Gestão Scrum, que auxiliou no controle e gestão do tempo e das atividades do projeto; •Desenvolvimento em camadas, dividindo o desenvolvimento em três frentes: Camada de Apresentação, Camada Lógica e Camada de Acesso a Dados. O projeto foi iniciado com conversas entre a corretora Jr&Marto Consultoria e Seguros (cliente) e a equipe de desenvolvimento, onde foram identificadas algumas necessidades e possibilidades de melhorias. Dentre elas, a dificuldade no gerenciamento das informações de clientes e prestadores de serviço. Depois de mapear os pontos de melhoria, foi criado junto ao cliente um escopo de trabalho, que tem como principal ponto a informatização dos processos, criando uma ferramenta que facilite o gerenciamento e controle das informações. Juntamente com o cliente foi desenvolvido o cronograma de trabalho, que possibilita estimar o prazo de entrega do sistema, prevendo reuniões periódicas para que sejam alinhadas ideias e sugestões relevantes ao desenvolvimento do projeto. A documentação referente ao projeto foi desenvolvida baseada nos diagramas UML, ilustrando o projeto de acordo com os parâmetros definidos em conjunto com o cliente, elaborando Diagramas de Caso de Uso, Diagramas de Classe e Diagramas de Sequência, a fim de facilitar e agilizar o desenvolvimento do sistema. 198 Para demonstrar ao cliente o layout das telas do sistema foram desenvolvidos protótipos de tela (PRESSMAN, 2011), que foram submetidas à aprovação e teste do cliente, utilizando filmagens para melhor acompanhar as reações durante os testes, com o intuito de desenhar interfaces gráficas adequadas para facilitar o uso. Como ferramenta de desenvolvimento foi utilizado o NetBeans (NETBEANS, 2012), por meio de linguagem Java, utilizada como ambiente de desenvolvimento das principais funcionalidade e telas do sistema, visando solucionar da melhor forma as necessidade do cliente. Após a conclusão do desenvolvimento do projeto, o cliente passou por um treinamento, para possibilitar a melhor utilização do sistema. Por fim, o sistema foi implantado, e utilizado em produção. 3. Desenvolvimento Ao iniciar a comunicação com o cliente foi possível identificar suas necessidades, que possuía as informações de clientes e prestadores de serviços, armazenadas fisicamente. Havia grande interesse por parte do cliente em buscar uma solução informatizada que se adequasse aos seus custos, uma vez que muitas das soluções existentes no mercado requerem grande investimento. Observando essa realidade, foi proposta a criação de um software que ajudasse a gerenciar as informações utilizadas na corretora, para agilizar os processos e facilitar o acesso, trabalhando a informação de forma segura e integrada. Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS Na definição do escopo do projeto, ficou definida a criação de um sistema de cadastro e consulta de informações referentes a convênios e seguros saúde, com uma hierarquia de acesso que garantisse a segurança da informação, além de relatórios que facilitasse a visualização de resultados conforme a necessidade dos gestores. Junto ao cliente foi cronograma, no qual se tempo estimado para o construção, implantação e equipe. elaborado um contemplou o planejamento, treinamento da 2011), utilizando a metodologia SCRUM (SOMMERVILLE, 2011). Conforme ilustrado na Figura 1, foi definido que cada funcionalidade do sistema seria equivalente a um Product Backlog, sendo cada parte dessa funcionalidade, tais como Interface, Regra de Negócio, Acesso aos Dados, tidos como um Sprint Backlog, adotando o tempo médio de uma semana para cada Sprint, resultando em entregáveis (Deliverable) semanais. Entretanto, devido à composição da equipe, não houve necessidade de reuniões diárias (Daily Scrum). O trabalho foi dividido em etapas como é sugerido pelo arcabouço (PRESSMAN, Figura 1: Ciclo SCRUM Foi criada uma Task Board, para auxiliar no controle das atividades, conforme ilustrado na Figura 2. A mesma ficou com a seguinte estrutura: •TO DO: Sprints Backlogs não iniciados, atividades que estão aguardando para estar na etapa de desenvolvimento; •D O I N G : Fase de desenvolvimento, nesse momento os Sprints Backlogs estão em construção; •TO VERIFY: Momento em que as funcionalidades são submetidas à validação do cliente, nessa etapa, o cliente entrava em contato com a 199 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS interface, e vídeos eram gravados, durante a execução, como é sugerido no processo de prototipação; •D O N E ! : F u n c i o n a l i d a d e concluída, última fase do desenvolvimento da funcionalidade, Deliverable, após a validação a funcionalidade estava finalizada. •IMPEDIMENTS: Nesse espaço do quadro, eram identificados os impedimentos, e dificuldades que impactavam a sequência do desenvolvimento. •TO DISCUSS: Itens a serem discutidos, ideias que agregariam funcionalidade, porém caso não houvesse não impactaria no resultado final, seriam tratados como segundo plano, dentro das possibilidades do cronograma. •UNPLANNED ITEMS: Espaço para sinalizar funcionalidades novas que não haviam sido identificadas no escopo inicial, funcionalidades de menor prioridade. Figura 2: Task Board Buscando uma melhor forma de observar a evolução no desenvolvimento, foi adotado o Burndown Chart, o qual teve fundamental importância na identificação de problemas durante desenvolvimento, alertando a equipe do projeto sobre em que momento era necessária maior atenção para o cumprimento do prazo. Como é possível observar na Figura 3, que apresenta um gráfico onde o tempo é 200 representado no eixo X, e as funcionalidades pendentes no eixo Y, as linhas representadas no gráfico referem-se ao desenvolvimento planejado (linha A), e ao desenvolvimento real (linha B), ou seja, quando a linha B está abaixo da linha A, entende-se que o desenvolvimento está dentro do período planejado, no caso inverso o desenvolvimento está atrasado. Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS Figura 3: Burndown Chart Em uma segunda fase do projeto, foram elaborados diagramas para a criação da documentação UML do projeto, utilizando a ferramenta de modelagem StarUML (STARUML, 2012). O Diagrama de Caso de Uso foi utilizado para definir quais os níveis de 3 acesso seriam criados para atender as necessidades do cliente e definir as funcionalidades do sistema. A Figura 4 ilustra o os níveis de acesso para as funcionalidades referentes ao módulo de Pessoa Física. Cadastrar Empresa 2 Alterar Empresa 4 Consultar Empresa 1 5 Figura 4: Caso de Uso – Módulo Empresa Os níveis de acesso foram definidos em uma hierarquia de 1 a 5, sendo cinco, o nível mais alto da cadeia, equivalente ao nível de administrador. O Diagrama de Classes (Figura 5), que apresenta de forma simplificada como estão distribuídas as classes do sistema, e como ocorre o relacionamento entre elas. 201 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS EMPRESA CORRETORA +CadastrarEmpresa() +EditarEmpresa() +ConsultarEmpresa() +CadastrarUser() +EditarUser() +ExcluirUser() +ConsultarUser() PRESTADORA +CadastrarPrestadora() +EditarPrestadora() +ConsultarPessoaFisica() FUNCIONARIO CLIENTE +CadastrarCliente() +EditrCliente() +ConsultarCliente() +CadastrarFunc() +EditarFunc() +ConsultarFunc() DEPENDENTE CLI DEPENDENTE FUNC +CadastrarDependenteCli() +EditarDependenteCli() +ConsultarDependenteCli() +CadastrarDependenteFunc() +EditarrDependenteFunc() +ConsultarrDependenteFunc() Figura 5: Caso de Classe Simplificado Todo o sistema foi desenvolvido a partir do conceito de Orientação a Objeto (DEITEL e DEITEL, 2005), respeitando uma arquitetura de camadas, para um melhor aproveitamento das classes do sistema, evitando redundâncias e acesso descontrolado ao banco de dados, conforme ilustra a Figura 6. Figura 6: Arquitetura de Camadas O Diagrama de Sequência retrata de forma genérica como está o fluxo da informação dentro do sistema. A Figura 7 ilustra o processo de cadastro, desde o 202 cadastramento da informação realizada pelo usuário, até o momento em que o sistema retorna uma mensagem com a confirmação do cadastro. Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS Figura 7: Caso de Classe – Cadastro (Genérico) Em paralelo a elaboração dos diagramas UML, foi criado o Modelo Entidade Relacionamento, que auxiliou na criação do banco de dados que foi estruturado utilizando a ferramenta MySQL Workbench (ORACLE CORPORATION, 2012) conforme ilustra a Figura 8. Figura 8: MER - Banco de Dados Como já mencionado anteriormente, o desenvolvimento do sistema, foi realizado com a ferramenta NetBeans (NETBEANS, 2012), utilizando a linguagem de programação Java, e em conjunto com o cliente, foram criadas interfaces gráficas e funcionalidades para melhor solucionar as necessidades de gerenciamento das informações da corretora. A Figura 9 é uma ilustração da tela de Login do sistema, que além da funcionalidade de validação de usuários, conta com um recurso, para configuração de IP e PORTA do servidor para acesso ao banco de dados. 203 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS Após a validação do usuário, a tela Menu, (Figura 10) é construída conforme o nível de acesso do usuário. A árvore das funcionalidades (canto superior esquerdo, Figura 10-A) é estruturada apresentando as funcionalidades de acordo com a hierarquia de acessos, além da barra de menus, que segue a mesma lógica, além de possuir alguns itens apenas para o administrador do sistema. No canto inferior esquerdo (Figura 10-B), estão apresentadas as informações do usuário que está logado no sistema. Figura 9: Tela Login Figura 10: Tela Menu Na Figura 11, está ilustrado a tela Buscar Empresa, que segue o padrão dessa funcionalidade independente da informação em questão. Nessa tela, a busca pode ser realizada de duas formas, tanto através de CNPJ, 204 quanto pela Razão Social. Ao executar a busca, a funcionalidade retorna em lista os itens encontrados. Na parte inferior da interface, estão as ações que o usuário pode realizar (consultar, editar, selecionar prestadora ou cancelar). Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS Figura 11: Tela Buscar Empresa A tela apresentada a seguir, Figura 12, ilustra a interface para o cadastramento de novos funcionários, essa tela conta, com uma lógica para a validação do CPF, além de identificar os campos tidos como de preenchimento obrigatório, foi criada uma inteligência para a montagem do ComboBox CIDADE, onde a partir do estado selecionado, é realizada uma busca no banco de dados para o preenchimento. Figura 12: Tela Cadastrar Funcionário As telas de consulta e edição foram padronizadas conforme a tela de cadastramento de cada módulo, visando facilitar a identificação dos campos. Pensando na parte gerencial do sistema, foram desenvolvidos relatórios que possibilitam a impressão das informações, utilizando da ferramenta JasperReport (JASPERFORGE, 2012) e iReport (JASPERFORGE, 2012) para o NetBeans. Cada módulo contém uma tela de consulta, a qual possui um botão para a geração de um relatório com as informações que estão visíveis na tela, como ilustra a Figura 13. 205 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS Figura 13: Relatório de Dados Detalhados do Funcionário Na Figura 14 é apresentado um relatório gerencial, que possibilita uma análise das movimentações da carteira de clientes, utilizando de diferentes filtros para obtenção do relatório como, por exemplo, data de adesão. Figura 14: Relatório de Adesões de Empresas por período Após o fim do desenvolvimento, o sistema foi implantado, e o cliente foi devidamente treinado, finalizando assim o projeto, conforme definição das etapas do arcabouço (etapa de Implantação) (PRESSMAN, 2011). 206 4. Resultado Resultante desta pesquisa científica envolvendo a tecnologia Java, banco de dados MySQL e gerenciamento de projetos com a metodologia ágil Scrum, foi criado o Omicron Zeta GIPSS - Sistema de Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS Gerenciamento de Informações de Plano e Seguro Saúde, sistema para a automatização do gerenciamento de informações utilizadas na Jr&Marto Consultoria e Seguros, que até então eram realizados de forma manual. objetivo, proporcionando aos seus clientes um atendimento de qualidade, além de um acesso rápido as informações do sistema. Como já mencionado anteriormente, o processo de desenvolvimento deste projeto contou com o auxílio da Metodologia Scrum, que por sua vez, proporcionou maior velocidade no desenvolvimento e comunicação contínua entre a equipe de desenvolvimento e o cliente, evitando assim, surpresas com o resultado final de cada incremento do software. Além disso, este processo auxiliou na priorização das atividades e na elaboração de planos para mitigar os ricos do projeto (pontos muito exaltados pelo cliente). Porém, ao fazer uso de uma metodologia de gerenciamento há de certa forma, uma burocratização do processo de desenvolvimento, pois acaba provocando um aumento das atividades no processo de desenvolvimento. Mesmo assim, vale ressaltar que a inclusão deste processo, não trouxe prejuízos ao projeto. Durante todo o processo de desenvolvimento do sistema Omicron Zeta GIPSS - Sistema de Gerenciamento de Informações de Plano e Seguro Saúde, a metodologia SCRUM, junto à Engenharia de Software auxiliaram na modelagem e no processo de comunicação com o cliente. Com o sistema em pleno funcionamento, a corretora atingiu seu 5. Conclusão A Metodologia Ágil Scrum foi de grande relevância no controle e gestão do desenvolvimento, pois através de suas ferramentas, foi possível acompanhar a evolução do projeto, além de auxiliar na tomada de decisão para solucionar os eventuais atrasos no desenvolvimento. As técnicas do arcabouço utilizadas no desenvolvimento auxiliaram para uma comunicação eficaz com o cliente, facilitando o mapeamento das necessidades e a validação das etapas desenvolvidas, que por sua vez, facilitou o alinhamento com as necessidades identificadas. Referências Bibliográficas COHN, M. Desenvolvimento de Software com Scrum: Aplicando métodos ágeis com sucesso. Porto Alegre: Bookman, 2011. DEITEL, H. M.; DEITEL, P. J. Java: como programar. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2005. GONÇALVES, E. Desenvolvendo Relatórios Profissionais Com iReport™ para Netbeans IDE. Rio de Janeiro: Ciência Moderna, 2009. 207 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS JASPERFORGE. iReport. Jasperforge Community, 2012. Disponivel em: <http:// j a s p e r f o r g e . o r g / w e b s i t e / i r e p o r t w e b s i t e / I R % 2 0 We b s i t e / i r _ d o w n l o a d . h t m l ? header=project&target=ireport>. Acesso em: 1 Setembro 2012. JASPERFORGE. Plugins. Jasperforge Community, 2012. Disponivel em: <http:// community.jaspersoft.com/search?query=plugins%20esp%20frs%20optional%20download>. Acesso em: 3 Setembro 2012. NETBEANS. NetBeans IDE 7.2. NetBeans Community, 2012. Disponivel em: <http:// netbeans.org/downloads/index.html>. Acesso em: 1 Setembro 2012. ORACLE CORPORATION. MySQL Workbench 5.2.42. MySQL, 2012. Disponivel em: <http://www.mysql.com/downloads/workbench>. Acesso em: 2 Setembro 2012. PRESSMAN, R. S. Engenharia de software: uma abordagem profissional. Porto Alegre: Mc Graw Hill, 2011. SIERRA, K.; BATES, B. Use a Cabeça Java. Rio de Janeiro: Alta Books, 2010. SOMMERVILLE, I. Engenharia de Software. São Paulo: Pearson Education - Br, 2011. STARUML. StarUML Download. The Open Source UML/MDA Platform, 2012. Disponivel em: <http://staruml.sourceforge.net/en/download.php>. Acesso em: 1 Setembro 2012. 208 Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS 1 Raphael Tsavkko Garcia1 Do Local ao Ciberespaço : Uma introdução ao Micronacionalismo Recebido em: 26/11/2012 - Aprovado em: 12/12/2012 - Disponibilizado em: 26/12/2012 Resumo Abstract O presente artigo tem por objetivo introduzir a atividade micronacional e relacioná-la com fenômenos como a fragmentação, desterritorialização, globalização e outros dentro dos marcos da cibercultura. Inicialmente se busca situar a atividade na internet, entendida como um novo veículo de atribuição de identidades e de re-significação. Busca-se, através de bibliografia diversa, situar o micronacionalismo como uma atividade real que tem como objetivo/fim a formação de uma comunidade imaginada e de uma cultura própria na internet em meio à fragmentação de identidades e a desterritorialização atual em que se encontra o mundo. O homem re-significa sua identidade na internet, criando uma realidade alternativa, mas ao mesmo tempo real e tangível e encontra um espaço propício à criação de uma nova identidade e agrupamentos humanos em um ambiente virtual. The present article has the main goal to introduce the Micronational activity and re l a t e i t w i t h p h e n o m e n o n ’s l i k e fragmentation, des-territorialization, globalization and others inside the marks of the cyberculture Initially it searches to situate the activity at the internet, understood as a new vehicle of identity attribution re-signification. It searches, with the support of diverse bibliography, to situate the as a real activity that has as an objective/end the making of as Imagined Community and a own culture on the internet and within the current global identity fragmentation and desterritorialization. The man re-signifies his identity in the Internet, creates an alternative reality but, at the same time, tangible and real and it finds a favorable space to the creation of a new identity and human groupings in a virtual environment.. K e y w o r d s : M i c ro n a t i o n ; Vi r u t a l Community; Desterritorialization. Palavras-chave: Micronação; Comunidade Virtual; Desterritorialização; Micronacionalismo. 1Raphael Tsavkko Garcia - Graduado em Relações Internacionais - PUCSP e Mestre em Comunicação - Cásper Líbero. Email: [email protected] 209 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS 1. Introdução O Micronacionalismo se apresenta como uma atividade baseada – mas não limitada – na internet, no ciberespaço (consequentemente, virtual em seu locus), mas uma atividade real, onde compartilhamos e nos re-significamos enquanto indivíduos. Uma atividade em meio a um ambiente de fragmentação identitária e desterritorialização causada pela globalização e situando-a como fenômeno pouco conhecido da cibercultura, diretamente influenciada pela chamada compressão espaço-tempo; e apresentá-la como um campo singular de resignificação, e relacionamento que vem de encontro com o individualismo dos últimos tempos, face à crescente necessidade de compartilhamento. Por fragmentação identitária compreendemos a busca por uma nova ou novas identidades, através das comunidades virtuais e das redes de comunicação, enquanto nada mais que reflexos da globalização que vai de encontro com a idéia clássica de sociedade bem delimitada, causando então um enfraquecimento e fragmentação da 2 Hall, 2001 3 Giddens, 1991 4 Ortiz, 1999; Haesbaert, 2004 5 Appadurai, 6 1990 210 1990, 1997; Haesbaert, 2004 identidade nacional2 que é logo retificada ao se adotar uma nova identidade – tanto subjetiva quanto objetiva – micronacional. Por sociedade clássica e bem delimitada entendemos a Modernidade, definida por Giddens como um “estilo, costume de vida ou organização social que emergiram na Europa a partir do século XVII e que ulteriormente se tornaram mais ou menos m u n d i a i s e m s u a i n f l u e n c i a ”3 . A Modernidade é a era do consumismo, da racionalização da vida e do sujeito, do capitalismo e, por fim, da industrialização. A globalização é, ainda, responsável pelo fenômeno conhecido como desterritorialização4 das relações culturais através da ampliação da identidade individual em uma identidade coletiva e que não respeita barreiras nacionais e não precisa de um território para se fixar. Esta identidade coletiva é o reflexo da busca dos indivíduos por uma identidade baseada em interesses comuns, por características não-impostas ao indivíduo pelo Estadonacional e que foram fragmentadas. Os indivíduos vão à internet em busca de quem a ele seja semelhante e encontra no micronacionalismo um campo fértil de reterritorialização5 de sua identidade individual. Segundo Appadurai6 e Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS Haesbaert 7, toda desterritorialização gera novas formas de reterritorialização e o micronacionalismo nada mais é que uma manifestação deste fenômeno. Na internet os indivíduos buscam formar sociedade, ou melhor8 , por sentir cada vez mais a necessidade de se envolver com pessoas que compartilhem algo em comum. Não se fala apenas de deslocamento físico, mas também em interação à distância, através das redes onde é possível “estar” em diversos lugares ao mesmo tempo em uma verdadeira “mobilidade virtual”, no que Lemos 9 nomeia como ‘territorialidades simbólicas”, ou seja, a formação de coletivos, de comunidades, um lócus de interação social integrado ainda que os indivíduos se vivam em cidades ou até países diferentes. É possível hoje não só contatar, mas também agir sobre territórios totalmente distintos do nosso sem que precisemos nos locomover fisicamente10 , criando assim a idéia de multiterritorialidade e “territórios-rede”. A fragmentação da identidade faz o indivíduo viver em uma realidade diferente, sem barreiras espaciais, temporais e geográficas (tão) significativas11 . E, ao mesmo tempo, 7 2004 8 Maffesoli, 1996 9 2002 10 Haesbaert, 2004 11 Hall, 2001 12 Rheingold, 1998, online 13 Hall, 2001 14 2002 buscar pessoas com as quais possa compartilhar interesses em comum, uma identidade próxima, uma maneira de se relacionar socialmente, que são aproximadas pelas redes de computadores, que eliminam distâncias e criam um mundo virtual e ao mesmo tempo real em sua dimensão. As comunidades virtuais nada mais são que agrupamentos humanos construídos no ambiente virtual12. Estas amplificam a realidade em um processo de simultaneidade onde se ligam os espaços físicos e digitais, tornados um só. A internet – e seu reflexo no que é conhecido como globalização - permite que se adquira (crie, até) identidades sempre que se queira. Há um afrouxamento da identidade nacional (“macro”), o que facilita a criação de laços com uma micronação, com uma nova identidade nacional não imposta, mas escolhida livremente e fruto típico das sociedades fragmentadas do séc. XXI, em busca de algo que as conecte, que crie laços de lealdade primordialmente culturais 13. André Lemos14 nos propõe o termo Cibersocialidade, abarcando desde a socialidade meffesoliniana, os processos de tribalização e resignificação social em 211 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS conjunto com as novas tecnologias do ciberespaço e, a partir deste ponto podemos compreender melhor o processo de formação de laços culturais em uma sociedade fragmentada em um ambiente virtual, um processo de rompimento de barreiras físicas, de abolição do espaço físico e substituição pelo espaço virtual. As comunidades virtuais são um porto seguro ao indivíduo jogado em meio à tormenta informática e um locus social onde este pode se encontrar, se resignificar. O micronacionalismo surge como uma ampliação de nossa percepção de pertencimento, de comunidade15 em meio à fragmentação e à globalização – compreendida como uma dialética entre o local e o global16 – em uma sociedade de cultura dinâmica, de uma “nova cidadania”, ligada à velocidade das informações e das relações globais e globalizadas, não mais definidas em termos de fronteiras estatais, jamais uma “simulação do mundo” na visão de Baudrillard quando este defende que o ciberespaço não permite verdadeiras simulações, mas apenas a simulação destas 17, numa visão pessimista de que temos hoje a mera circulação de informações e não um processo de aproximação e relacionamento entre os diversos indivíduos pelo mundo. 2. Micronação enquanto EstadoNação 15 Anderson, 2005 16 Siqueira, 2003 17 Baudrillard In Lemos, 2002 212 Micronação é o termo consagrado, derivado do inglês “Micronation”, cuja melhor tradução em Português seria “Micropaís”. A micronação pode ainda ser chamada – e por vezes o é – de MicroEstado ou apenas de Nação em Miniatura que aponta para uma existência real e não simulada. Não se trata de uma imitação, mas, nada além de uma realidade plena, com regras e características próprias. Se tomarmos como base a usual classificação de Estado, sendo: Monopólio do uso da força; Legitimidade e Soberania (sobre povo/território); Governo constituído; Território propriamente dito. As micronações, possuem um território, virtual, sobre o qual exerce de fato soberania, sendo estes suas listas de discussão, sites e afins. As micronações possuem governos que são legitimamente constituídos por seus cidadãos, pelo povo, e sobre ele exerce soberania e é respeitado e, como não poderia deixar de ser, por ter controle único das listas, sites, comunidades e etc onde se desenrola a atividade micronacional, possui o monopólio legítimo da força, que seria o poder de moderação, suspensão e até expulsão do cidadão. Estado é a entidade necessária em que se observa o exercício de um governo dotado de soberania para exercer seu poder sobre uma população, num determinado território, onde se cria, executa e aplica seu ordenamento jurídico, visando ao bem comum. Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS Chega-se, então, à conclusão de que o Estado é uma entidade soberana político e juridicamente organizada18 que abarca uma população definida (àquela que escolheu por livre e espontânea vontade adentrar à micro, assinar o contrato, poderíamos dizer) sob um território definido, virtual e por vezes também referencial. 3. Teoria Geral do Estado Micronacional “uma micronação é uma simulação política e de sociedade, em que pessoas voluntariamente escolhem participar, aceitando suas ‘regras’ (leis) e ‘parceiros’ (concidadãos)”19 . Indo além destes conceitos, a maioria das micronações lusófonas adota a noção de Território Referencial. Uma referência reivindicativa (virtualmente e apenas entre a as comunidade virtuais ditas micronacionais) de um território físico no globo terrestre (ou por vezes no espaço onde, segundo Virilio20 se dará a nova 18 Góes; Garcia, 2007, online 19 Cava, 2004 20 2000 21 Góes; Garcia, 2007, online corrida mundial por território por parte das grandes potências) que não pode de maneira alguma passar despercebida ou ser ignorada. A micronação possui, portanto, um lócus virtual delimitado chamado de Território Virtual, que consiste em suas listas, grupos, sites e tudo mais que possa ser administrado por seus membros em função da atividade e ao mesmo tempo um lócus “por convenção” territorial, referencial ainda que, por vezes, não seja adotado e não tenha absolutamente relevância além da mera referência lúdica – o que não impede aos mais ferrenhos modelistas/virtualistas lutas e conflitos com utilização de e-mails bombas e vírus além de táticas hacker na “defesa” de seu território-referência. Abaixo, é apresentado um esquema simples da configuração do Estado Micronacional em contraposição – ou complementaridade – ao Estado clássico 21. 213 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS a. Povo/População: Cabe, antes de mais nada, distinguir Povo de População, o segundo sendo apenas um indicador numérico de quantas pessoas residem ou estão momentaneamente em uma micronação, na comunidade e o primeiro um fenômeno que depende da identificação e criação de laços, da formação de uma identidade nacional e corresponde apenas aos nacionais, os de fato identificados com uma micronação específica. Vale notar que em ambos os modelos de Estado Micronacional o elemento Povo/População – chamado doravante “Povo” – é preponderante, pois é elemento primeiro e essencial para a existência de qualquer comunidade. Todos os elementos – direta ou indiretamente – restantes existem para e em função do Povo.22 22 Góes; Garcia, 2007, online 23 Silva, 2002, online 24 Levy, 1996, Silva, 2008, online 214 b. Território (Virtual): É a área, o “lugar virtual”23, onde a nação exerce sua soberania, onde sua população encontra-se e no caso micronacional, este lócus que dá sentido a um tipo de relação social são as listas de discussão (YahooGrupos, GoogleGroups, etc), sites (www), chats de MSN, ICQ, mIRC e outros, comunidades sociais e etc. Este Território (Virtual) nada mais é que um território digital, algo como um corredor de movimentação de informações e imagens que demanda organizar zonas de fixação24 e estas zonas de fixação seriam exatamente as listas e demais meios utilizados pelos micronacionalistas para suas comunicações diárias. c. Território Referencial ou de Referência: Elemento Acessório e resquício dos primórdios do Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS micronacionalismo, mas em muitos casos mantido pelo valor simbólico e pela identificação já fundamentada ou ainda em respeito à uma história em comum em que se baseia a nacionalidade, o Território Referencial nada mais é que a reivindicação de um território do globo terrestre (i.e Ilha de Reunião, Ilha de Marajó, sua própria casa, etc.) de maneira apenas virtual, ou seja, apenas de “brincadeira”. Em realidade, esse território “extramicronacional” é reclamado por uma micronação que nele exerce uma soberania apenas referencial e é, portanto, comumente reconhecido pelas demais. Em alguns casos tal Território é utilizado como elemento cultural, seja por Referência Geográfica – quando este serve apenas para delimitar “fronteiras” – ou ainda como Referência Cultural onde, além da área geográfica, a micronação adota ainda a cultura e os costumes deste local, adaptando para o mundo micro uma identidade cultural macro. Os Territórios Referenciais são, de fato, fictícios, não refletem o “estar”, o lócus micronacional, servindo apenas como diversão e como referência histórica e criando então uma história e uma identificação comum. É uma mera abstração subjetiva que não está presente na concepção do Estado Micronacional Clássico e apenas no Modelista e, como se vê, está claramente ligado ao Estado e indiretamente ao Povo. d. Soberania/Governo: Em primeiro, deve-se diferenciar os elementos, estando o primeiro diretamente ligado ao Povo – Soberania Popular – e ao Território, 25 também relacionada tenuemente ao Te r r i t ó r i o R e f e r e n c i a l n o s c a s o s Modelistas. No micronacionalismo a Soberania passa pelo controle (ownership) por parte do governo das listas de discussão onde acontece primordialmente a atividade micronacional, porém, vale lembrar que o Poder micronacional assim o é caracterizado, através do consentimento. Os verdadeiros soberanos o são por mero consentimento do Povo e governam sobre um território porque os demais micronacionalistas consentem e compartilham da idéia. Quanto ao Governo, é possível descrevê-lo como: “O conjunto de pessoas que exercem o poder político e que determinam a orientação política de determinada sociedade. (...) Existe uma segunda acepção do termo Governo mais própria do Estado moderno, a qual não indica apenas o conjunto de pessoas que detêm o poder de governo, mas o complexo de órgãos que institucionalmente têm o exercício do poder”25. e. Soberania Virtual ou Relativa: Ligada intimamente ao Território Referencial, esta categoria existe apenas nos casos Modelistas, implica no reconhecimento de determinado território de referência de uma micronação por outra, validando os litígios territoriais micronacionais. Atribui-se a esta categoria acessória os mesmos elementos e características da Soberania propriamente dita, porém aplicada exclusivamente ao Território Referencial e respeitando as devidas limitações e o fato deste Território ser apenas nominalmente parte da micronação. f. Objetivo de Identificação Cultural (OIC): Intenção de criar uma Identidade Levy In Bobbio, 2000 215 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS cultural. É a intencionalidade de se formar uma identidade nacional através da formação de laços culturais entre os indivíduos de uma micronação. 4. Micronacionalismo versus MMORPGs e RPGs Cabe, de início, definir MMORPGs (Massive Multiplayer Online Role-playing Games) como jogos de interpretação online, similares aos jogos de RPG (Role Playing Game), onde os indivíduos assumem personas, avatares ou personagens dentro de um “mundo sintético”, ou seja, “um ambiente expansivo, similar a um mundo, para um grande número de pessoas, feito por humanos, para humanos e mantido, gravado e renderizado por computadores”26 . Diferenciamos o Micronacionalismo de um simples jogo MMORPG ou RPG pelo primeiro não ser meramente “similar a um mundo” senão parte integrante deste mesmo mundo em que vivemos, em outras palavras, o micronacionalismo é parte de nossa realidade, sendo uma ampliação desta não se constituindo, portanto, em um mundo separado, similar ou parecido com o que vivemos. Ainda que, segundo Rheingold27 o agrupamento de jogadores, por afinidade, acabe por criar relações de amizade e confiança ao participar em um dos mundos 26 Castronova, 2005 27 1998 28 1958/2001 29 Castronova, 2001 216 sintéticos de um jogo em particular, criando algo como uma proto-comunidade imaginada, Caillois28 afirma ser o jogo uma atividade essencialmente “separada: circunscrita dentro de limites de tempo e espaço, previamente definidos e fixados”. Os jogos são meros intervalos, escapes da vida real, do dia-a-dia, meios de relaxamentos e nada mais, o micronacionalismo é um projeto de sociedade. Os jogos MMORPG e RPG são, invariavelmente, criados como um universo pronto, com regras pré-definidas que devem ser cegamente seguidas por todos os participantes. A história e o enredo são igualmente pré-definidos e em alguns casos há um mestre único que comanda a história e o desenvolvimento da história. Busca-se, nestes jogos, interação social29, porém esta tem por base a nãorealidade, os personagens fictícios, e os objetivos dos jogos se resumem aos simplórios “ganhar”, “zerar”, “acumular” ou “ser melhor que o inimigo” enquanto o micronacionalismo se constrói diariamente, sem um fim último que não o de sua constante reprodução e continuidade.. 5. Comunidade Imaginada e nacionalismo O Micronacionalismo “existe” em uma realidade alternativa ou aumentada que Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS coexiste livremente com nossa realidade física e “real” e age como um ponto de fixação das relações sociais. O micronacionalismo – através do que chamamos de seu Território (virtual) - é, portanto, uma realidade virtual, com memória coletiva, identidade e limites próprios e trocas simbólicas que potencializa a experiência com o espaço e ainda assim permanece real e com ele conectado sendo apenas uma outra dimensão do espaço, inserido em uma ciberexistência.30 Esta realidade virtual propicia uma rede de relacionamentos entre pessoas, reproduz relações sociais e produz identidades que, no micronacionalismo, são ampliadas até se tornarem realmente embriões de um sentimento nacional, uma forma de pertencimento específica da atividade e que encontra eco nas Comunidades Imaginadas de Anderson31 ou ainda, nos mundos imaginados.32 “[...] comunidade política imaginada – e imaginada como implicitamente limitada e soberana. Ela é imaginada porque nem mesmo os membros das menores nações jamais conhecerão a maioria de seus compatriotas, nem os 30 Rheingold, 1998, online 31 2005 32 Appadurai, 33 Anderson, encontrarão, nem sequer ouvirão falar deles, embora na mente de cada um esteja viva a imagem de sua comunhão.”33 O ser humano busca, portanto, sua comunidade imaginada34, busca escapar de sua “identidade imposta” ligada à origem e através do lugar de origem35 vinda do Estado-Nação e criar a sua própria em um ambiente virtual – em uma micronação – de livre escolha e construindo com o coletivo uma nova identidade livre. O micronacionalismo nada mais é que esta comunidade imaginada que difere das demais apenas em escala, não em substância36 e é construída não do nada, mas sociologicamente, por meio da mídia e das relações sociais. Não é um simulacro do que a sociedade deveria ser – utopia – mas uma sociedade em si, em constante processo de construção e com características próprias e únicas. Podemos ainda ampliar a idéia de A n d e r s o n37 e t r a t a r d o s m u n d o s imaginados38 , entendendo-os como “os múltiplos universos que são constituídos por imaginações historicamente situadas de pessoas e de grupos espalhados pelo globo”. 2004 2005 34 Idem 35 Bourdieu, 1998 36 Goés, 2007 37 2005 38 Appadurai, 2004 217 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS A identidade é algo que se adquire, é formada com o tempo, mas é ao mesmo tempo e paradoxalmente imposta pela sua nacionalidade, pelos costumes de seus vizinhos imediatos. O micronacionalismo é uma busca por criar livremente uma nova identidade, uma nova comunidade imaginada sem a tentativa de homogeneização e padronização que ignora qualquer tipo de diferença em um espaço de comunicação, espaço virtual, que não existe em oposição ao real. Podemos ainda considerar o micronacionalismo uma atividade de agregação identitária e embrião de uma real comunidade. Segundo o autor, existem algumas características que afirmam a experiência comunitária, todas de caráter sentimental e que concordam com Anderson 39 quando este diz que os aspectos centrais do sentimento de comunidade são a fraternidade e o sentimento de cumplicidade e proximidade entre os indivíduos. O micronacionalismo é um espaço para criação de identidades a partir das diferenças. É a combinação ou recombinação e a hibridização cultural levada ao seu grau máximo, ainda que submetido a um corpo de regras e leis préestabelecidas. Esta tese está em conformidade com Castells 40, que afirma ser a internet o veículo preferencial de conexão que ultrapassa os limites físicos 39 2005 40 2003 41 2002 42 2002 218 do quotidiano, propiciando a proliferação e desenvolvimento de projetos individuais com o objetivo de dar sentido à vida a partir do que se é e do que se quer ser. O “nacionalismo” em “micronacionalismo” nada mais é que um sentimento de pertencimento, que vem da partilha de interesses comuns em uma comunidade e do convício diário com os demais participantes desta em um ambiente virtual com regras, conflitos, partilhas, identificação, união, inovação e memória coletiva. Lemos41 dá ainda a definição perfeita do “sentimento nacional” próprio das comunidades virtuais ao afirmar que é nelas onde existe, por parte de seus membros, o sentimento expresso de uma afinidade subjetiva delimitada por um território simbólico, sendo o compartilhamento de emoções e a troca de experiências essenciais para a coesão do grupo e, por conseqüência, do sentimento nacional. Seguindo Lemos 42 podemos concluir ainda que a aderência do indivíduo a um projeto específico depende de seus interesses presentes e o sentimento de aderência permite múltiplos pertencimentos permitindo que o indivíduo navegue de um grupo ou uma comunidade à outra, de uma micronação à outra em busca de uma real aderência que complete seus interesses individuais. Augusto Guzzo Revista Acadêmica - No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS Outro fator que diferencia as comunidades virtuais das comunidades tradicionais é a ausência de território, de uma localização geográfica. A existência de uma base territorial fixa não é mais necessária, embora o ciberespaço apresente-se como um espaço público fundamental para a existência de comunidades virtuais, um território simbólico.43 direito, assuntos culturais, sociologia, geografia. A Micronação pode ser tanto uma simulação de um país inventado, um projeto totalmente inovador, ou a cópia de um modelo social, cultural e político já existente. Tal afirmação está parcialmente correta no que concerne às micronações enquanto comunidades virtuais e imaginadas, por um lado estas existem no ciberespaço, sem limitação geográfica ou fronteiras físicas, porém, adota suas listas de mensagens – estruturada em um estabelecimento virtual ou virtual settlement -, seus sites, seus grupos de e-mail e outras ferramentas como Território Virtual. Como afirma Recuero44 , a comunidade virtual possui fronteiras simbólicas e não concretas em um espaço abstrato, mas delimitado, há um senso de lugar e um lócus virtual, ou seja, é um lugar demarcado no espaço, onde os indivíduos participantes da comunidade encontram-se para estabelecer e manter relações sociais. Esta delimitação ao espaço abstrato é entendida como uma limitação imaginária, construída por nós mesmos 45. O Micronacionalismo é fruto da globalização e do pós modernismo em que estamos inseridos hoje, uma atividade de socialização e sociabilização, com características próprias e únicas em um espaço social próprio, o ciberespaço. Uma micronação, em suma, nada mais é que uma Comunidade Imaginada, que se atribui características de Estado-Nação. Um lócus de contato, comunicação e relacionamento de pessoas interessadas primeiramente em política, passando por temas relacionados a partidos, história, 43 Corrêa, 2005 44 2001, online 45 Recuero, 2003, online 6. Conclusão As identidades fragmentadas dos indivíduos se encontram em um locus ou território organizado e regido por leis próprias e funcionamento único, que se diferencia do mero jogo – celebrizado pelos MMORPG’s – com compartilhamento e instantaneidade inegáveis e a criação de profundos laços de sentimento nacional. O estudo do micronacionalismo é o estudo mais profundo de uma das mais relevantes facetas da cibercultura, fenômeno este que tem por base o ciberespaço e o relacionamento de indivíduos dispersos em comunidades virtuais e a formação de laços tanto virtuais quanto reais e duradouros entre os indivíduos desta comunidade. Cada micronação pode ser interpretada como uma micro-comunidade virtual que, unidas, formam uma comunidade virtual 219 Augusto Guzzo Revista Acadêmica -No 10 - dezembro de 2012 - São Paulo: FICS com características próprias e únicas, conhecidas como fonias e, indo além, um corpo único que agrega a todas as fonias nos seus relacionamentos diários, o micronacionalismo. A internet promove um “compartilhamento temporal”, pois promove uma aproximação, no mesmo solo nacional, de atos e atores que não precisam estar necessariamente ligados por laços étnicos, culturais e nacionais, porém, o sentimento de pertencimento de um grupo a uma coletividade se dá quando ele se conhece e se reconhece como uma comunidade. Entende-se esta visão enquanto interpreta “solo” por território (virtual) micronacional, onde diversos indivíduos se juntam sem antes possuir qualquer tipo de laços senão os de um ou outro interesse comum e visam à formação de uma identidade nacional a partir destes e apenas destes interesses não havendo qualquer tipo de laço de identidade nacional ou cultural previamente existente. O espaço passa a ser entendido por redes comunicacionais ou pelo emaranhado destas, onde a difusão de informações acaba por reduzir as distâncias e reunir indivíduos dos mais diversos lugares no globo em um único território virtual marcado pela presentificação e interatividade on-line que subverte a percepção espacial e temporal. Da simples utilização de grupos de discussão e Boards a criação de sites e sistemas políticos complexos observamos um longo período, muito trabalho e um constante processo de criação e re-criação, culminando com uma sociedade complexa, uma cibercultura específica e forte, contando com milhões de adeptos pelo mundo em projetos que vão desde o peculiarismo torpe até complexos sistemas políticos e legais. Referências Bibliográficas ANDERSON, Benedict. Comunidades Imaginadas. Editora 70, 2005. APPADURAI, Arjun. Disjuncture and Difference in the Global Cultural Economy. In Featherstone (Ed.) Global Culture: Nationalism, Globalization and Modernity. 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