VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento VIII
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VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento VIII
Anais VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento Universidade de Brasília Organizadores: Maria Cláudia S. L. de Oliveira Diva Maria Albuquerque Maciel Jane Farias Chagas Maristela Rossato Mônica Neves Pereira Patricia Maria Campos Ramos Sylvia Regina Magalhães Senna De 12 a 15 de Novembro de 2011 C749 Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento (8. : 2011 : Brasília). Anais do VIIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento / Maria Cláudia Santos Lopes de Oliveira ... [et al.], organizadores. – Brasília : Associação Brasileira de Psicologia do Desenvolvimento, 2011. 1352 p. ; 21 cm. ISSN 2177-1413 1. Psicologia do desenvolvimento – Congressos. I. Oliveira, Maria Cláudia Santos Lopes de (org.). CDU 159.922 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento Sumário Apresentação ..................................................................................... 5 Comissões........................................................................................... 7 Estrutura do evento............................................................................ 8 Programação Científica....................................................................... 9 Sábado, 12/11 .................................................................................... 9 Domingo, 13/11.................................................................................. 9 Segunda-feira, 14/11 .......................................................................... 473 Terça-feira, 15/11 ............................................................................... 985 Índice por atividades .......................................................................... 1329 Índice Remissivo ................................................................................. 1333 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento APRESENTAÇÃO Prezados Participantes do VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento, É com grande prazer que apresentamos os Anais do VIII CBPD, um evento da Associação Brasileira de Psicologia do Desenvolvimento que neste ano tem por tema A Psicologia do Desenvolvimento para a Transformação da América Latina. O VIII CBPD traz à capital federal cerca de 600 participantes, entre pesquisadores, profissionais, estudantes de graduação e pós-graduação de Psicologia e áreas afins, oriundos de quase todos os estados brasileiros e de países das Américas e Europa. Este número constitui um recorde e dá testemunho da importância deste evento, que se consolida no calendário científico da Psicologia brasileira. São apresentados aqui aproximadamente 500 trabalhos, entre mesas redondas, simpósios, comunicações orais e pôsteres, relacionados a sete áreas temáticas. Constituem eles relatos de pesquisas e abrangem uma pluralidade de contextos, objetos e metodologias, em torno dos quais se tem construído a Psicologia do Desenvolvimento. Mas, encontramos também relatos de experiência profissional, trabalhos que enfocam o estado da arte da pesquisa da área e ensaios críticos, os quais expressam a diversidade de leituras do fenômeno do desenvolvimento humano na linha do tempo, uma pluralidade de perspectivas que temos buscado preservar neste Congresso! Este ano, o CBPD apresenta outras novidades. Abraçamos a vocação de promover e qualificar a interlocução e as redes de colaboração acadêmica com nossos colegas pesquisadores e profissionais de outros países da América Latina. Contamos com a presença de congressistas e renomados conferencistas de diferentes países do continente americano, com destaque para Colombia, Peru, Argentina, Cuba, Estados Unidos, além da Alemanha. Deste modo, visamos contribuir para dar expressão à riqueza do pensamento psicológico que se produz nos diferentes países desse continente, além de debater questões comuns a nossas realidades socioculturais de países constituídos a partir de relações coloniais. Desta forma, adotamos intencionalmente uma posição distinta da que marcou a construção histórico-social da nação brasileira que, ao longo dos cinco séculos de 5 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento história manteve o olhar direcionado para a Europa e a América do Norte, e as costas para o continente latinoamericano. Que essa realidade, que já vem se alterando, seja positivamente afetada pelos debates ocorridos neste Congresso! Aproveitamos a oportunidade para expressar nosso agradecimento à CAPES, CNPq, Universidade de Brasília e a todos aqueles participantes, membros das Comissões, avaliadores ad hoc, parceiros e patrocinadores, sem os quais não teríamos chegado até aqui. Brasília, 15 de novembro de 2011. Maria Cláudia S. L. de Oliveira Presidente da ABPD Comissão Organizadora do VIII CBPD 6 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento COMISSÕES Diretoria da ABPD Maria Cláudia Santos Lopes de Oliveira Adeiaide Alves Dias Ana Paula Soares da Silva Miriã Alves de Alcântara Zena Winona Eisenberg Comissão Científica Vera Maria Ramos de Vasconcellos (Coordenadora) Avaliadores Ad Hoc Adelaide Alves Dias Alba Cristiane Santanna Alessandra Oliveira Machado Vieira Alexsandra Zanetti Ana Cecília de Souza Bastos Ana Paula Soares da Silva Anamelia Lins e Silva Franco Angela Donato Oliva Angela Maria Uchoa de Abreu Branco Bernadete de L. Alexandre Mourão Carolina Lampreia Cecília Guarnieri Batista Cláudia Broetto Rossetti Débora de Hollanda Souza Diva Maria Albuquerque Maciel Elaine Pedereira Rabinovich Eliane Maria Fleury Seidl Elton Hiroshi Matsushima Gabriela Souza de Melo Mieto Ivalina Porto Jane Correa Jane Farias Chagas Ferreira Julio Rique Neto Leila Regina de O. d’ Paula Nunes Leila Sanches de Almeida Lucia Helena Cavasin Zabotto Pulino Lucia Vaz de Campos Moreira Maria Cláudia S. Lopes de Oliveira Maria Helena Fávero Maria Helena Vilares Cordeiro Maria Regina Maciel Mário Sergio Vasconcellos Maristela Rossato Miriã Alves de Alcântara Mônica Neves-Pereira Olga Maria Piazentin Rolim Rodrigues Patricia Alvarenga Rosalia Duarte Rosangela Francischini Ruben de Oliveira Nascimento Sávio Silveira de Queiroz Silviane Bonaccorsi Barbato Tania Mara Sperb Vera Maria Ramos de Vasconcellos Zena Winona Eisemberg Comissão Organizadora Local Diva Maria Albuquerque Maciel Jane Farias Chagas Ferreira Maristela Rossato Mônica Neves-Pereira Sandra Ferraz Castilho Freire Gabriela Souza de Melo Mieto Sylvia Magalhães Senna Comissão Executiva Ana Carolina Villares Barral Villas Boas Ana Paula Carlucci André de Carvalho Barreto Francisco Rengifo Herrera Julia Escalda Mendonça Julio Cesar dos Santos Manuela Smith Marina Kohlsdorf Mônica Rocancio Moreno Patricia Cristina Campos Ramos Polllianna Galvão Soares Rute Morais Nogueira Bicalho Sueli de Souza Dias Tatiana Yokoy de Souza Secretaria Executiva Cláudia da C. Freire 7 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento ESTRUTURA DO EVENTO Dia 12/11 - sábado Dia 14/11 - segunda-feira 17h-17h30 – Mesa de abertura 8h30-10h – Programação Científica 17h30-18h30 – Conferência de abertura 10h-10h30 – Coffee Break 18h30-19h30 – Apresentação musical 19h30 – Coquetel 10h30-12h30 – Programação Científica 12h30-14h – ALMOÇO 14-15h30 – Programação Científica 15h30-16h – Coffee Break Dia 13/11 - domingo 16h-18h – Programação Científica 18h-20h – Programação Científica 8h30-10h – Programação Científica 19h30 – Lançamento de Livros 10h-10h30 – Coffee Break 10h30-12h30 – Programação Científica Dia 15/11 - terça-feira 12h30-14h – ALMOÇO 8h30-10h – Programação Científica 14-15h30 – Programação Científica 10h-10h30 – Coffee Break 15h30-16h – Coffee Break 16h-18h – Programação Científica 10h30-12h – Programação Científica 18h-20h – Programação Científica 12h-14h - Programação Científica 8 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento DIA 12/11 - Sábado CONFERÊNCIA “La Psicología del desarrollo en la actualidad. Una mira desde lo histórico cultural“, proferida pelo prof. Dr. Guillermo Arias Beaton, da Universidad de La Habana, Cuba. DIA 13/11 - Domingo 8h30-10h CONFERÊNCIA “Bullying: Prevenção da Violência e Promoção da Cultura da Paz nas Escolas Angela Uchoa Branco – UnB Diversos estudos voltados para a investigação de crenças e valores entre crianças, adolescentes e professores têm demonstrado que, na maioria dos contextos escolares, os professores orientam seus alunos a competirem entre si ou a serem individualistas (e.g. Branco, 2003; Kohn, 1992; Palmieri, 2003). Essa orientação é geralmente implícita nas variadas formas de manifestação do “currículo oculto” associado à comunicação e à metacomunicação. O currículo oculto se expressa pela canalização, geralmente sutil, das crenças, valores e ações dos alunos em certa direção, e pode ocorrer, por exemplo, por meio da valorização da competição, e até mesmo da agressão física e verbal como estratégia de resolução de conflitos, minimizando-se o sofrimento emocional do aluno humilhado e discriminado pelos colegas. No contexto escolar, a mídia noticia com freqüência situações de bullying, onde crianças e adolescentes vivenciam incontáveis constrangimentos como apelidos relacionados à sua aparência e agressões por parte dos colegas. Observa-se que nesses contextos de violência gratuita e repetitiva muitas vezes a escola e os professores não encontram alternativas para lidar com a situação, uma vez que o bullying é um fenômeno complexo, sintoma de uma sociedade onde valores sociais positivos e a ética são colocados em segundo plano. Dessa forma, é necessário destacar a importância de se discutir sobre as emoções, as raízes afetivas e motivacionais do fenômeno bullying, e promoção da ética e cooperação entre os alunos, articulando o tema com a realidade da escola, com as características e conteúdos das próprias disciplinas e atividades pedagógicas e com as interações sociais que se dão no âmbito educacional. Nesta palestra, irei analisar e discutir estas questões, trazendo dados empíricos obtidos em pesquisa por mim coordenada sobre o tema, onde entrevistas e observações foram feitas com professores e crianças do quinto ano de escolas públicas e particulares. Tendo em vista a relevância da escola nos processos de socialização e desenvolvimento moral de crianças e adolescentes, e necessário a co-construção de uma Cultura de Paz. A Paz, porém, não é sinônimo de um estado estático de harmonia, caracterizado pela ausência de conflitos, mas sim deve ser entendida como um permanente processo (Jares, 2007) co-construtivo motiva9 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento do por valores de justiça, solidariedade e negociação de conflitos, onde sentimentos de empatia e compreensão mútua permeiem os processos de comunicação e as estratégias de ensino adotadas pelos professores. Para a paz ser promovida na escola, é necessário a re-significação subjetiva da violência e da competição por parte da cultura escolar como um todo, no sentido de se promover, diante de conflitos, a negociação cooperativa e inteligente. Nosso trabalho em relação à questão do bullying tem se inspirado particularmente na perspectiva sociocultural construtivista (e.g. Branco, 2006; Madureira & Branco, 2005; Valsiner, 2007). Esta abordagem teórica se apresenta bastante produtiva em abranger a complexidade do fenômeno bullying, e promover ações efetivas em prol de uma cultura de paz na escola. Internalizar desde a infância o princípio de que o “outro merece ser tratado como eu gostaria de sê-lo”, preveniria situações de violência e bullying na escola e, possivelmente, contribuiria para a construção da paz em contextos sociais mais amplos, como a família, o ambiente de trabalho e outros. Entretanto, para a construção do respeito mútuo e de um ambiente de paz na escola, é essencial que haja o empenho político e local para a formação dos professores, no sentido de prepará-los para prevenir o bullying e saber atuar caso este ocorra no ambiente escolar, de forma cooperativa e com o trabalho conjunto de todos os participantes da comunidade escolar. Não é mais possível desconsiderar a importância da promoção das interações sociais positivas para o desenvolvimento global da criança e do adolescente no âmbito das instituições educativas. Estas podem e devem atuar no campo da promoção concreta de 10 interações humanas saudáveis, éticas e respeitosas, promovendo valores relativos à justiça, dignidade humana e responsabilidade social. Quanto mais cedo isto for feito, mais os alunos serão beneficiados em seu desenvolvimento. Daí a necessidade de prevenção da violência na escola, especialmente a prevenção do bullying, por meio da promoção da educação para a paz como eixo transversal presente em todas as atividades exercidas no contexto escolar, das matérias estudadas às aulas de educação física, sempre passando pela qualidade atenciosa, respeitosa porém firme dos educadores. Afinal, os alunos precisam conhecer e compreender o significado da convivência pacífica, da mediação construtiva de conflitos e da construção permanente de um contexto democrático baseado na ética. O certo é que todos, professores e alunos, são sujeitos ativos na transformação de sua própria realidade, e somente a partir de suas convicções e motivações algo poderá ser transformado. A programação e implementação de atividades cooperativas entre os profissionais que atuam na instituição educativa e nas salas de aula, bem como atividades cooperativas incluindo as famílias, todas são relevantes para o sucesso de projetos integrados de prevenção do bullying e de promoção de uma Cultura de Paz. Somente com base em um trabalho conjunto de todos os profissionais envolvidos no contexto da escola, um trabalho de equipe no qual todos—inclusive funcionários como porteiros, merendeiras etc—participem ativamente, é que poderão ser gerados processos de transformação da cultura escolar no sentido da inclusão de todos, e do trabalho efetivo em relação a promoção da paz e da prevenção do bullying nas escolas. VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento CO 01-LT01 Emoção/Afetividade LT01-951 - REVISÃO BIBLIOGRÁFICA: A EMOÇÃO NO DESENVOLVIMENTO DO BEBÊ NO PRIMEIRO ANO VIDA Ludmilla Dell’Isola Pelegrini de Melo Ferreira - USP/RP [email protected] Kátia de Souza Amorim - USP/RP katiamorim@ffclrp.usp.br Financiamento: FAPESP, CNPq A emoção é tema presente em diversas áreas do conhecimento, dentre eles, a psicologia do desenvolvimento. Henri Wallon se destaca pelos seus estudos sobre a emoção, tornando-se um referencial para a investigação deste tema. Em sua teoria, a emoção é elemento central nos primeiros meses de vida, a qual propiciaria a constituição do vínculo entre bebê e ambiente social; representando, assim, o primeiro plano de sociabilidade que contribuiria para promover a solidariedade de comportamento e de atitudes entre o bebê e as pessoas no entorno. A partir da leitura deste autor e de alguns de seus estudiosos, no entanto, percebeu-se a exploração da emoção mais restrita ao plano teórico e aos primeiros meses de vida. Buscando aprofundamento dessa questão, traçou-se o objetivo de desenvolver um estudo empírico para investigar a emoção ao longo do primeiro ano de vida, investigando suas manifestações em processo de transformação ao longo deste período. Para a realização deste trabalho, um dos percursos foi verificar o que tem sido produzido na literatura, em termos de estudos empíricos, acerca da emoção relacionada ao desenvolvimento de todo o primeiro ano de vida. É essa revisão que será aqui apresentada. Para o levantamento bibliográfico, realizou-se revisão nacional e internacional sobre a temática seguindo as etapas: 1ª) escolha das bases de dados para pesquisa: uma base de dados nacional (BVS-Psi) e uma internacional (PsycINFO); 2ª) traçou-se critérios de inclusão (artigos, teses e dissertações; sem restrição de data na base nacional e restrição dos últimos cinco anos na internacional; idiomas inglês, português, espanhol e francês; trabalhos com disponibilidade de resumos) e exclusão (livros, capítulos de livro e resenhas; revistas exclusivamente da área médica); 3ª) pesquisa e definição das terminologias indexadas (emoções, desenvolvimento emocional, desenvolvimento infantil (BVS-Psi e PsycINFO), estados emocionais e bebês (BVS-Psi), e early childhood development (PsycINFO); e 4ª) busca pelas palavras-chave (bebê, infant e emoção), e os cruzamentos entre elas e os descritores. Algumas palavras buscadas - como emoções/emotions, bebê/infant, desenvolvimento infantil/infant development - resultaram em expressivos números de artigos; por outro lado, a partir dos cruzamentos, houve queda considerável deste número. Considerando que o objetivo desta revisão foi analisar o que tem sido produzido sobre emoção especificamente no desenvolvimento de bebês no primeiro ano de vida, a partir dos resumos e dos critérios de inclusão/exclusão, optou-se por afunilar as buscas aos cruzamentos, chegando-se a 249 trabalhos, 247 artigos e 2 teses. Ao analisar estes trabalhos, percebe-se a diversidade de estudos e, ao mesmo tempo, a escassez dos mesmos relacionados à emoção no desenvolvimento de bebês, pois a maior parte dos 11 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento trabalhos é realizada somente com o pai ou com a mãe dos bebês, analisando os aspectos emocionais dos pais no processo da maternidade e paternidade. Ainda, encontram-se relatos clínicos enfocando alguma dificuldade ou patologia materna, ou até mesmo a relação mãe-bebê de forma teórica ou clínica, predominantemente a partir da psicanálise. No entanto, foram encontrados trabalhos sobre o desenvolvimento de bebês considerando a emoção como um dos processos deste desenvolvimento. Estes estudos podem ser divididos entre teórico, revisão de literatura e empíricos. Os primeiros apontam para a importância e necessidade de novos estudos na área, principalmente longitudinais e da abordagem sociocultural e evolucionista. Os segundos são estudos realizados com bebês entre 0 e 2 anos, principalmente em laboratório, transversais, com vídeogravação ou observação e focando a díade mãe-bebê. Estes trabalhos têm analisado e discutido as expressões faciais, vocalizações, resposta ao meio e construção do repertório emocional, propondo, de uma forma geral, que as expressões faciais dos bebês estão intimamente e relacionalmente conectadas ao contexto e aos estímulos que lhes são apresentados, mostrando sintonia e reciprocidade com o ambiente e também a variabilidade individual das respostas emocionais. Compreende-se que estes trabalhos colaboram para a visualização dos aspectos emocionais e expressivos dos bebês ao longo do primeiro ano de vida, e contemplam o caráter biológico e social da emoção. Por outro lado, a análise mostra algumas lacunas entre esses estudos, como a ausência de investigações longitudinais, realizadas no ambiente do bebê, que não seja em laboratórios, e que acompanhem o processo 12 de/em transformação da emoção no desenvolvimento do bebê. Sendo assim, os estudos encontrados na literatura oferecem material empírico para a discussão da temática, e também apontam direções para estudos prospectivos. Palavras-chave: Emoção, bebê, desenvolvimento, revisão bibliográfica. Contato: Ludmilla Dell’Isola Pelegrini de Melo Ferreira - [email protected] LT01-1305 - RECONHECENDO EMOÇÕES: UM OLHAR DESENVOLVIMENTAL SOBRE O PAPEL DA MÚSICA NA ONTOGÊNESE HUMANA Nara Côrtes Andrade - UFBA, [email protected] A emoção é intrínseca à experiência que temos com a música, sendo que diferentes afetos podem ser expressos através dela, a exemplo de serenidade, tristeza, angústia, medo, entre outros. Apesar das reflexões sobre as relações entre música e emoção remontarem a pensadores como Platão, pesquisas científicas são recentes e vêm apontando que “as respostas emocionais para a música dentro de uma cultura aparentam ser altamente consistentes dentro da mesma e entre ouvintes, acurada, razoavelmente imediata e precisa” (Viellard et al, 2008, p. 721). As emoções são fenômenos complexos e multidimensionais que compreendem desde fenômenos biológicos a fenômenos subjetivos e sociais, sendo, muitas vezes, acompanhada de uma intensa reação fisiológica e psicológica. Defende-se que as emoções possuem três funções principais: 1) Social - comunicar informações sobre estado de ânimo, além de prováveis comportamentos e in- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento tenções; 2) Adaptativa - preparar fisiologicamente o indivíduo para a ação, aumentando suas chances de sobrevivência; Motivacional – facilitar os comportamentos motivados (Fernandez-Abascal et al, 2010; Freitas-Magalhães e Castro, 2009). Segundo Reeze (2006, p. 191), “as emoções são fenômenos expressivos e propositivos de curta duração, que envolvem estados de sentimento e ativação, e que nos auxiliam na adaptação às oportunidades e aos desafios que enfrentamos durante eventos importantes da vida”. Pesquisas sobre emoções básicas expressas por músicas vêm apontando que as respostas emocionais podem ser bastante consistentes e coincidentes entre as diferentes idades (Peretz, 2009). Muitos autores defendem que emoções como alegria, medo e tristeza podem ser induzidas através da música, sendo que estas estão presentes em diversos espaços do nosso cotidiano, como, por exemplo, em trilhas sonoras de filmes, especialmente aqueles dirigidos às crianças. Em termos ontogenéticos, as emoções dependem do amadurecimento de estruturas neurais que dêem sustentação a seu funcionamento. Segundo Férnandez-Abascal e cols. (2010), as emoções primárias, a exemplo da alegria, da surpresa, da repugnância (nojo), da tristeza e do medo, se desenvolvem no início da vida, enquanto as emoções secundárias ou sociais, tais como ciúme, culpa, vergonha, precisam tanto do desenvolvimento de estruturas neurais quanto aspectos referentes a aprendizagem e socialização, tais como internalização de algumas normas sociais ou desenvolvimento de identidade pessoal. Do ponto de vista adaptativo, é essencial que o bebê compartilhe seus estados internos com seus parceiros sociais (Bergamasco, 1997) e seja capaz de processar in- formações relativas ao estado afetivo dos mesmos. A criança começa a desenvolver a capacidade de percepção relativa às expressões vocais e faciais no seu primeiro ano de vida (Flom et al, 2008), sendo que aos 4 meses de idade, os bebês podem discriminar expressões bimodais (facial e vocal) de felicidade, tristeza e irritação e aos cinco meses diferenciam expressões unimodais vocais de raiva, felicidade e tristeza. As crianças prestam atenção preferencialmente a estímulos auditivos que expressem emoções. No caso da fala, por exemplo, as crianças atentam mais a falas emotivas do que a falas neutras (Kitamura & Burnham, 1998; Singh, Morgan & Best, 2002). Em pesquisa realizada como bebês de seis meses de idade, encontrou-se que as crianças apresentavam maior atenção sustentada a episódios de canto materno do que a episódios de fala materna (Nakata & Trehub, 2004). Estes autores salientam que a fala é um importante meio de transmitir emoções, entretanto, possivelmente a música é uma maneira mais eficaz de fazê-lo, especialmente entre crianças em estágio pré-linguístico, as quais podem as mensagens verbais em sua forma, mas não em seu conteúdo. Segundo Peretz e Sloboda (2005), estes achados sugerem que, possivelmente, a música pode ser considerada como mais poderosa que a fala no que diz respeito à expressão de emoções. Flom et al (2008), em pesquisa realizada com crianças saudáveis nascidas a termo e sem complicações neonatais, observaram que crianças entre 5 e 7 meses foram capazes de discriminar trechos felizes e tristes quando habituados a trechos tristes e não quando habituados a trechos alegres. Com 9 meses, entretanto, as crianças discriminaram todos os trechos musicais avaliados como 13 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento afetivamente diferentes. Kastern e Crowder (1990), em estudos realizado com crianças entre 3 e 12 anos, apontam que, mesmo as crianças mais jovens, de 3 anos de idade, mostram reconhecer a valência afetiva da música de sua própria cultura negativa, positiva - associando-a aos modos em que estas são compostas, modo menor e maior, respectivamente. Segundo Cunningham & Sterling (1988), aos 4 anos as crianças já são capazes de reconhecer explicitamente emoção de alegria expressa pela música. Entretanto, o estudo realizado por Dalla Bela e cols. (2001) encontrou que crianças de 3 e 4 anos não apresentam ainda habilidade no reconhecimento de emoções alegres e tristes. Estes autores destacam que questões metodológicas, tais como a tarefa apresentada de apontar para faces esquemáticas representando as reações emocionais, podem haver interferido no resultado, já que esta pode requerer habilidades ainda pouco desenvolvidas nesta faixa etária. Sendo que aos 5 anos as crianças são capazes de reconhecer músicas alegres e tristes (Dalla Bella & cols., 2001) e aos medo e ameaça (Dolgin & Adelson, 1990; Terwogt & Van Grinsven, citado por Vielard e cols., 2008). É importante salientar que estas pesquisas se referem a uma melhor acurácia no reconhecimento de emoções alegres e tristes, enquanto as emoções de medo e raiva são muitas vezes confundidas entre si. A música, historicamente, tem sido um elemento recorrente em todas as culturas conhecidas (Schellenberg & cols., 2008) com a qual a criança convive, a exemplo das canções de ninar, brincadeiras cantadas, etc. A mesma a dimensão emocional intrínseca à sua experiência é de imenso valor ao desenvolvimento, a exemplo da regulação emocional que exerce em crian14 ças muito pequenas, caracterizadas pelas canções de ninar; socialização e interação entre pares, a exemplo das brincadeiras cantadas (Pinto & Lopes, 2009); entre outras dimensões. Entretanto, como ressalta Baruch (2010), as pesquisas em psicologia da música com crianças são relativamente recentes, sendo ainda mais escassas no Brasil. As diversas pesquisas que têm sido realizadas acerca da à discriminação e ao reconhecimento de emoções em música com diferentes faixas etárias apontam para uma compreensão de como este fenômeno ocorre durante o desenvolvimento infantil. Entretanto, como podemos notar acima, é importante salientar que estas são, em sua maioria, recentes e pouco consensuais, sendo ainda escassas e apontando um campo de estudos em expansão. Palavras-chave: música, emoções, desenvolvimento humano. LT01-1307 - O TESTE DO DESENHO DA FAMÍLIA COMO UMA REPRESENTAÇÃO DOS MODELOS INTERNOS DE FUNCIONAMENTO Débora Matos - UFPE [email protected] Antônio Roazzi - UFPE [email protected] Financiamento: CNPq John Bowlby postulou que o comportamento de apego no ser humano, assim como em várias outras espécies é de ordem primária e instintiva, cuja função adaptativa seria a preservação da vida, tendo em vista que o filhote sozinho não tem a mínima chance de sobreviver. Assim, a criança tem uma tendência na- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento tural para buscar o contato e a proteção de um adulto, seja ele a mãe ou a figura de um outro cuidador. O tipo de cuidado oferecido pela mãe ou cuidador, ou seja a figura de apego primária, oferece um protótipo de relacionamento sobre o qual a criança é capaz de construir suas expectativas diante de relacionamentos outros que surgem ao longo da vida. Ainsworth (1978), em seu experimento “Situação Estranha” observou três estilos de apego, que se desenvolviam na criança conforme os critérios de sensibilidade desta figura primária para responder aos sinais do bebê e a quantidade e a natureza da interação entre os mesmos. Assim, crianças com estilo de apego seguro (B) apresentam um bom equilíbrio entre autonomia e proximidade, sendo capazes de utilizar a figura de referência como base segura. A qual é percebida pela criança como positiva, sensível e sempre disponível às suas requisições de ajuda. Nas crianças com apego evitante (A) há uma ênfase na autonomia e independência, mostram-se indiferentes à figura de apego, a qual é percebida como impaciente, negativa e rígida. As crianças com apego ambivalente (C), por sua vez, apresentam excessiva ativação do sistema de apego, buscando uma contínua confirmação da presença e proteção da figura de apego. É interessada, mas não consegue estabelecer rotinas sincronizadas, apresentando incoerências. Está convencida de não ser amável, enquanto que o outro é percebido como confiável e positivo. Os estilos de apego discriminados por Ainsworth (op. Cit.) sofreram uma evolução no sentido de não serem mais vistos como formas estanques de relacionamento. Os modelos Internos de funcionamento (MIF), como agora são denominados, podem sofrer mudanças durante a vida, de acordo com outras experiências vividas pelo indivíduo. O desenho tem sido usado há muito tempo pela psicologia como forma de acessar as representações do indivíduo acerca de si mesmo e do mundo que o cerca. Partindo do mesmo pressuposto o desenho da família foi estudado por diversos autores de forma a classificar características no mesmo que tivessem correlação com os estilos de apego (Kaplan, May, 1986; Fury, Carlson, Sroufe, 1997; Attili, Ruby, 2000; Maddigan, Ladd, Golberg, 2003). Mais recentemente Roazzi, & cols., (2011) também verificaram a possibilidade de acessar as representações acerca das relações afetivas por meio do desenho da família em crianças de educação infantil e ensino fundamental. Tal pesquisa, já realizada na Itália, está sendo trazida para o Brasil por meio deste trabalho, tendo em vista a necessidade de pesquisas com o tema, contextualizadas nesta realidade específica. Analisar a correlação entre as características do desenho da família e os Modelos Internos de Funcionamento, tomando como base os estudos anteroires. Prover uma base para futura validação do desenho como uma representação do apego por meio do uso de um instrumento já conhecido. Avaliação de uma amostra composta por 25 alunos do 1º ano do Ensino Fundamental de uma escola pública do Recife com relação aos estilos de apego por meio de uma versão modificada (Attili, 2001) do Separation Anxiety Test, de Klagsbrun e Bowlby (1979). Aplicação individual do teste do desenho da família validado para classificação dos estilos de apego por Fury e colaboradores (1997). A versão italiana do presente estudo demonstrou que o desenho da família pode ser considerado um método válido 15 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento para assessar os estados atuais de apego em crianças. Por meio de testes estatísticos tradicionais, utilizando o SSA (Smallest Space Analysis - Bloombaum, 1970; Guttman, 1965; Shye, 1985; or Similarity Structure Analysis - Borg & Lingoes, 1987), muitas características do desenho mostraram relação com as tipologias de apego. Dados obtidos por meio de simultâneas inercorrelações lançaram luz sobre as complexas estruturas representacionais da criança acerca de seus laços familiares. As seguintes variáveis dimensionais mostraram-se relevantes: Crianças coma pego ambivalente demonstraram maior probabilidade de situar seu próprio desenho mais próximo do desenho da mãe que os seguramente apegados (os quais se desenhavam a uma distância equilibrada da mesma: C < B, A; ʤ2 (2)= .28 p<0.05), além disso localizavam o desenho da família a uma distância maior da borda inferior da folha que as crianças seguras (C > B; ʤ2 (2)= 5.4 p<0,001), seus desenhos cobriam uma pequena área da folha em comparação comos desenhos das crianças com apego seguro (C < B; ʤ2 (2)=2.81 p<0.05).As crianças seguras se desenharam mais ao centro da folha que as crianças de apego evitante (B<A; ʤ2 (2)=3.8 p<0.01). Variáveis categoriais relevantes: Houve uma tendência por parte das crianças inseguras , em comparação às seguras, de desenharem figuras incompletas (B < A, C; ʤ2 (2)=3.41 p<0.05). No desenho de crianças ambivalentes havia ausência de chão em maior proporção que no desenho das demais (C < A, B; ʤ2 (2)= 10.9 p<0.05) e frequentemente suas figuras estavam flutuando (C > B, A; ʤ2 (2)= 13.3 p<0.001). Crianças seguramente apegadas mostraram maior probabilidade, embora não significativamente, de desenhar figuras com braços abertos (B > 16 A, C; ʤ2 (2)= 2.78 n.s.). Também desenharam mães com expressões faciais positivas (B>A, C; ʤ2 (2)= 8.2 p<0.05). Crianças evitantes desenharam com maior probabilidade barreiras entre os representantes da família (A > B, C; ʤ2 (2)= 8.7 p<0.05). Assim, temos fortes evidências que nos embasam no sentido de que os resultados do presente estudo têm contribuições similares, porém respaldadas pela singularidade da cultura brasileira. De forma que se apresente como uma contribuição relevantes no aprofundamento da temática da Teoria do Apego no país. Palavras-chave: desenho da família; representação interna; teoria do apego. LT01-1329 - WALLON E BOWLBY: AFETIVIDADE EM DISCUSSÃO Fabíola Lira Gonçalves - UFPE [email protected] Débora Matos - UFPE [email protected] Financiamento: CNPq O ponto de partida deste ensaio deu-se pela articulação entre teorias psicológicas do desenvolvimento humano que tratam da afetividade. Neste sentido, propõe-se um diálogo entre as abordagens teóricas, a saber: a teoria psicogénetica de Wallon e a teoria do apego de Bowlby, já que estes autores defendem uma concepção integrada do ser humano em seus aspectos cognitivos e afetivos. Historicamente, as teorias psicológicas têm gerado uma visão dicotômica entre cognição e afetividade. A teoria psicogenética de Piaget (2007) ressalta o aspecto cognitivo no desenvolvimento do indivíduo. Por outro lado, se VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento contempla na psicanálise a ênfase na singularidade do sujeito, tendo a afetividade um papel central na constituição deste. Na teoria walloniana as emoções e o afeto, tem papel fundamental na constituição da pessoa. A emoção teria primeiramente a função biológica calcada na concepção evolutiva de Darwin, tendo em vista que a espécie humana, em geral, tem um único filho por gestação, e um longo período de dependência deste em relação aos cuidados do adulto para o seu desenvolvimento pleno. A primeira manifestação de emotividade na vida humana, conforme esta abordagem é o choro, que é concebido como a garantia de que as necessidades do bebê serão prontamente atendidas pela mãe. Daí tem-se uma emoção, carregada de sua característica contagiosa e epidêmica, sendo à base da relação eu-outro. Esta manifestação emotiva se constitui na relação entre os aspectos biológico e social, pois o choro também é considerado por Wallon como uma expressão de linguagem, uma vez que a mãe ouve o choro do bebê, é contagiada por sua reação emocional de desconforto e reage atendendo às suas solicitações. Para Dantas (1992), na teoria walloniana, cuja orientação filosófica é o materialismo dialético, a emoção é simultaneamente biológica e social, circunscrita em um tempo historicamente situado, a premissa básica é da unicidade do sujeito nas dimensões que o integram. Desse modo, a emoção humana, se constitui por meio das manifestações de linguagem verbais e não verbais que só acontecem em função da mediação cultural e social entre sujeitos. As etapas do desenvolvimento humano em Wallon não são estanques. O sujeito não perde, ou substitui totalmente as emoções primárias, elas coexistirão com as no- vas emoções que surgirão durante toda a existência. Por essa via explicativa, o pressuposto integrador entre os aspectos biológicos, cognitivos e afetivos funcionam de modo sincrético, portanto indissociáveis. Wallon ressalta dois mecanismos reguladores do desenvolvimento psicogenético, a saber: alternância e preponderância, estes se articulam num jogo interacional intenso entre os componentes biológicos e sociais do psiquismo humano. À medida que as interações entre os indivíduos vão ocorrendo, vão surgindo novas formas de afetividade, por exemplo: o sentimento e a paixão que podem se manifestar tanto de modo verbal, pois há palavras que a expressam, bem como gestos e atitudes motoras que podem expressá-las do mesmo modo, sem que haja uma hierarquia na forma escolhida pelo sujeito para expressar a afetividade. O que demarca a escolha da expressão afetiva é o contexto interacional instaurado entre os sujeitos envolvidos no ato comunicacional. Para Bowlby, o vínculo da criança à sua mãe é, também, um comportamento inicialmente de ordem primária e instintiva, cuja função adaptativa seria a preservação da vida. Assim a criança tem uma tendência natural para buscar o contato e a proteção de um adulto, seja ele, a mãe ou a figura de outro cuidador. Essa busca de contato, manifestada primeiramente pelo choro, provoca determinado tipo de reação na mãe, que a partir de então, se configura como cuidadora. Constitui-se, assim, um estilo de relacionamento primário entre mãe e filho, ou cuidador e criança. O tipo de cuidado concedido por este, oferece um protótipo de relacionamento sobre o qual a criança é capaz de construir, por meio de generalização, suas expectativas diante de relacionamentos que surgem ao 17 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento longo de sua vida. Há, assim, duas condições que contribuem na formação ou não do apego a uma figura primária, ou ainda ao estilo de apego proveniente desta relação: a) a sensibilidade desta figura para responder aos sinais do bebê; b) a quantidade e a natureza da interação entre os componentes do par. Conforme estas variáveis, três padrões básicos de apego podem se desenvolver (Ainsworth, 1978): a) Crianças com estilo de apego seguro apresentam um bom equilíbrio entre autonomia e proximidade, sendo capazes de utilizar a figura de referência como base segura, a qual é percebida pela criança como positiva, sensível e sempre disponível às suas requisições de ajuda; b) Nas crianças com apego evitante há uma ênfase na autonomia e independência, mostram-se indiferentes à figura de apego, a qual é percebida como impaciente, negativa e rígida; e c) As crianças com apego ambivalente, por sua vez, apresentam excessiva ativação do sistema de apego, buscando uma contínua confirmação da presença e proteção da figura de apego. É interessada, mas não consegue estabelecer rotinas sincronizadas, apresentando incoerências. Está convencida de não ser amável, enquanto que o outro é percebido como confiável e positivo. Estes estilos de apego tornam-se relativamente estáveis entre o primeiro e o segundo ano de vida e se manifestam como uma “tendência geral” que influencia as relações do sujeito consigo, com o outro e com o meio. Estes estilos, porém, podem ser alterados a partir de outras experiências significativas ao longo da vida. Autonomia, autoconfiança, confiança para explorar e conhecer, são características intimamente relacionadas a um apego seguro. Percebe-se uma relação entre afetividade e cognição, de forma 18 indissociável, afetando todas as esferas da vida do indivíduo. Assim as duas teorias integram a base orgânica e contato com o outro, com o social, os quais impulsionam o afeto e a cognição. Este homem completo e total tem todos estes componentes constantemente interagindo entre si. Ele está, ao mesmo tempo, se adaptando ao meio, aprendendo o mundo ao seu redor, significando o mesmo e se relacionando com o outro a partir de suas experiências. Todas estas atividades coexistem e se nutrem mutuamente. Palavras-chave: Afetividade, Psicogênese da Pessoa Completa, Teoria do Apego. LT01-1373 - O DESENVOLVIMENTO DO OLHAR NO BEBÊ E SUA RELAÇÃO COM O DESENVOLVIMENTO POSTURAL: REFLEXÕES SOBRE RELAÇÃO, CULTURA E COMPLEMENTARIDADE Natália Meireles Santos - FFCLRP/USP nmeireles@aluno.ffclrp.usp.br Kátia de Souza Amorim - FFCLRP/USP katiamorim@ffclrp.usp.br O primeiro ano de vida é uma etapa de grandes transformações no desenvolvimento humano, em que inúmeras habilidades são adquiridas (Pio, 2007). Estudar o bebê é uma forma de aprender sobre quem somos e como somos constituídos (Bussab, Carvalho & Pedrosa, 2007). O bebê apresenta formas particularizadas de interação, reveladas por episódios “mais fugazes, desordenados, pouco estruturados e pouco intencionais” (Anjos, Amorim, Rossetti-Ferreira & Vasconcelos, 2004). Apesar disso, o bebê apresenta formas de expressão significativa, (gestos, expressões faciais, vocalizações, postura corpo- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento ral) com indícios importantes de intenção, desejos, incômodos, capazes de suscitar reações no outro, quer seja um adulto ou outra criança. No processo, o bebê mostra-se ativo dentro de um sistema cultural ao utilizar-se de capacidades interativas empregadas a partir de meios convencionais de comunicação direcionados ao outro, como o sorriso e o olhar (Anjos et al., 2004). O olhar destaca-se como recurso comunicativo, indo além da visão, atingindo a esfera relacional e propiciando comunicação (Belini & Fernandes, 2008). Nesse sentido, Elmôr (2009) aponta o olhar como uma ferramenta importante para estabelecer comunicação entre seres humanos. Fogel e cols. (1999) acrescentam a postura como aspecto influente no desenvolvimento do olhar no bebê, destacando que, nos primeiros meses de vida, o posicionamento corporal do bebê ainda está muito subjugado ao manejo adulto. Os autores ressaltam a importância de investigar o papel de fatores motores e sociais envolvidos nessa associação da postura e do olhar. Amorim (2008) aponta como a mudança postural proporciona uma modificação significativa na percepção e participação no ambiente por parte do bebê. Bebês que antes demonstravam certo isolamento em relação às coisas ao redor passam a ter maior atenção ao ambiente e a buscar ativamente a proximidade com outros. Os processos envolvidos na co-construção do engatinhar estariam ligados à emergência de maior intencionalidade e autonomia no bebê. Mas, há a necessidade de estudos mais sistemáticos a essa questão. Traçou-se assim, o objetivo do estudo. O objetivo tem sido investigar como se dá o processo de transformação do olhar como recurso expressivo no bebê; e como se dá a relação daquele com diferentes momentos de seu desenvolvimento postural, em dois bebês analisados em situação de interação em dois contextos (ambiente domiciliar e creche). Para a condução do projeto, o mesmo foi submetido à avaliação do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP), da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP/USP), sendo aprovado, em concordância com a Resolução n° 196/96. A coleta e análise de dados estão sendo conduzidas fundamentalmente através da perspectiva da Rede de Significações (Rossetti-Ferreira, Amorim, Silva & Carvalho, 2004). Estão sendo realizados dois estudos de caso (Yin, 2005), com acompanhamento longitudinal. Entende-se que o estudo de caso propicia a observação em ambiente natural, de forma a apreender a complexidade em que os processos estão imersos; e, de maneira a preservar as características significativas dos acontecimentos, dentro de seus contextos e relações (Freitas & Pozzebon, 1998). Criança em domicílio: Os sujeitos são um bebê (Marina), sua mãe (Júlia) / o pai (Pedro) e a avó (Mirian). O material empírico é do Banco de imagens do projeto Processos de (Trans)formação da Comunicação e Linguagem, ao Longo do Primeiro Ano de Vida: Um Estudo de Caso (Rodrigues, 2008). Esse estudo acompanhou o bebê, semanalmente, desde seu nascimento, ao longo de todo seu primeiro ano de vida, investigando o desenvolvimento da comunicação e da linguagem durante esse período. Serão utilizadas cenas da criança a partir do quarto mês de vida. Criança em creche: O sujeito pivô é Nisete, 5m e 6d ao ingresso na creche. Seu estudo se fará a partir do banco de Imagens do Projeto Integrado Processos de Adaptação de Bebês à Creche (Rossetti-Ferreira, 1994). Este projeto acompanhou os processos de ingresso e frequência de 19 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento 21 bebês, em uma creche universitária. Acredita-se que esses contextos permitam evidenciar processos de desenvolvimento significados de diferentes maneiras, pelas particularidades de organização dos espaços, bem como pelas práticas discursivas do contexto e das pessoas no entorno e em interação. As gravações dos bebês estão sendo vistas e algumas cenas, transcritas. Nessas são buscadas particularidades nos processos de olhar e da postura corporal. As cenas são analisadas microgeneticamente (Goes, 2000), de modo a apreender mudanças ao longo do tempo, através de recortes de episódios de diferentes momentos do desenvolvimento postural e do olhar no bebê. A partir do mapeamento realizado, foi recortado um episódio interativo no ambiente domiciliar: Júlia leva Marina (quatro meses) para o quarto para dar-lhe banho. Deita-a virada para cima na cama. Marina começa a choramingar. Júlia senta Marina na cama, segurando-a de modo que ambas ficam frente a frente (Júlia abaixa-se ao lado). Marina olha e passa a mexer nos pés. Começa um movimento em que Júlia insistentemente tenta chamar a atenção de Marina, utilizando-se de vários recursos auditivos e táteis. Nem sempre Marina retribui com o olhar, mas quando o faz ambas sorriem. Júlia levanta-se então e pega Marina no colo, e leva-a para frente de um espelho, com ambas voltadas para o mesmo. Enquanto isso, a pesquisadora passa por detrás com a câmera, chegando a aparecer no espelho. O olhar de Marina volta-se para a imagem da pesquisadora. Marina movimenta-se e esforça-se para virar-se para trás. Quando a mãe o percebe, vira seu próprio corpo, tornando possível que Marina olhe diretamente para a pesquisadora. No episódio, fica evidente a insistente e custosa ne20 gociação do olhar por parte da mãe que suscita reflexões sobre a inserção desse recurso em nossa cultura e como o bebê se apropria deste na interação, inclusive quando não há pontos de encontro; nem sempre Marina retribui o olhar à mãe, mas antes se volta para seu próprio corpo. Chama ainda a atenção o contato e manejo corporal do bebê realizado pela mãe em uma relação também negociada. Marina não é simplesmente subjugada às ações da mãe , mas esta também reage à comunicação do bebê (choro, movimento corporal, olhar), numa relação de complementaridade (Seidl de Moura & Ribas, 1999). Palavras-chave: olhar, comunicação, desenvolvimento postural LT01-1435 - A COMPREENSÃO INTERDISCIPLINAR DA RELAÇÃO MÃO-BEBÊ: UMA APROXIMAÇÃO DE WINNICOTT À NEUROCONCIÊNCIA DO DESENVOLVIMENTO Célia Regina de Souza Cauduro - USP/SP [email protected] Vera Silvia Raad Bussab - USP/SP [email protected] Na teoria psicanalítica de Donald W. Winnicott ((1983; 1988 a, b, c, d; 1990; 1994; 1997; 1999 a, b, c, d, e) sobre a constituição do sujeito e nos trabalhos da Neurociência do Desenvolvimento, existem afirmações sobre a importância da qualidade da experiência vincular nas primeiras etapas da vida pós-natal. A correspondência entre estas duas teorias se organiza por meio do conceito winnicottiano de experiência intersubjetiva: “o bebê no colo da mãe, que precisa crescer, isto é, constituir uma base para continuar existindo e VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento integrar-se numa unidade” (Loparic, 2008, p.145). Segundo Loparic (2008), “Winnicott introduziu um novo modelo ontológico do objeto de estudo da psicanálise, centrado no conceito de tendência para a integração, para o relacionamento com pessoas e coisas e para a parceria psicossomática“ (p.145). Esta afirmação de Loparic (2008) é apoiada pelas pesquisas neurocientíficas sobre o desenvolvimento humano que afirmam que o corpo materno é a principal fonte de provisão das informações ambientais, e funciona como um regulador externo que organiza os sistemas neurológico, perceptual, emocional e relacional pela sua presença física e pelo seu comportamento interativo (Feldman, 1996; 1999; 2003; 2006; 2007). A Neurociência do Desenvolvimento - As conclusões dos estudos da neurociência do desenvolvimento descrevem como as experiências vividas na interação entre a criança e o cuidador primário no período neonatal, podem alterar o processo de desenvolvimento do sistema nervoso. Os bebês, ao nascerem, apresentam considerável individualidade, são sensíveis aos estados afetivos do outro e mobilizam respostas em seu meio ambiente. Tal capacidade requer um grau significativo de inter coordenação pré-funcional entre o cérebro e o corpo. Atualmente, existe grande evidência que a organização do cérebro do neonato é altamente dependente da estimulação dos cuidadores, e que estas interações quando validadas por experiências adequadas, constituem um regulador da epigênese social da mente infantil, isto é, promovem as condições necessária para a autoregulação emocional. Estas experiências adequadas são proporcionadas por um cuidador primário (mãe) sensível capaz de decodificar ou entender as pis- tas não verbais dos comportamentos do bebê, crucial para o estabelecimento de um vínculo seguro (Schachner, Shaver, & Mikulincer, 2005). A autoregulação emocional é a habilidade para controlar estados internos ou respostas relacionadas aos pensamentos, emoções, atenção e desempenho. Os mecanismos neurais que sustentam os processos regulatórios podem ser os mesmos que fundamentam os processos cognitivos superiores. Existem processos complexos pelos quais a emoção relaciona-se à cognição e ao comportamento, que, conseqüentemente, interferem no processo de desenvolvimento (Bell & Wolfe, 2004; Bell & Kirby, 2007). A autoregulação emocional desempenha um papel central na socialização e no desenvolvimento do comportamento moral, depende do desenvolvimento do córtex pré-frontal; está associada ao desenvolvimento de diferentes estratégias de adaptação durante as etapas subseqüentes do ciclo vital (Levesque, A., 2004; Lewis & Stieben, 2004). As situações de negligência e maus tratos, eventos traumáticos que quando duradouros, representam risco ao desenvolvimento psiconeurobiológico infantil; estas situações podem estabelecer uma vulnerabilidade ao estresse pós-traumático (PTSD), e uma predisposição à violência na idade adulta. Situações de privação ou trauma que promovem interrupções no processo de formação do vínculo, causadas por fatores maternos (ex. depressão pós-parto) e/ou relacionadas ao bebê (doenças hereditárias, congênitas ou adquiridas), podem desorganizar a regulação psicobiológica e neuroquímica no desenvolvimento cerebral, conduzindo à neurogênese, sinaptogênese e diferenciação neuroquímica anormais.Os dados da pesquisa de Chelini et al., (2010) inclu21 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento ída no Projeto Ipê -Temático FAPESP no. 06/59192-2, que estuda possíveis efeitos da Depressão Pós-Parto (DPP) no desenvolvimento numa população atendida pelo sistema público de saúde apontam que “ a resposta do cortisol a um estressor leve foi maior em filhos de mães deprimidas (análise de medidas repetidas; t = 2,44, 94df, p = 0,0166). Este resultado indica que aos quatro meses após o parto o eixo HPA pode ter sido afetado pela DPP materna, já que filhos de mães deprimidas não mostraram a esperada supressão da resposta do cortisol comumente observada em torno de três meses”. Em concordância com Ovstscharoff e Braun (2001), a interação diádica entre o recém-nascido e a mãe funciona como um regulador do desenvolvimento da homeostase interna infantil. Interferem no funcionamento normal do eixo HPA (Hipotálamo-Pituitária-Adrenal) resultando na alteração do ritmo circadiano, elevando os níveis basais e reduzindo o volume cerebral. Os efeitos podem ser de longo prazo, conduzindo a uma intensa resposta do eixo HPA a qualquer situação desafiadora, atrofia hipocampal e prejuízos no desempenho cognitivo na vida adulta. Winnicott e a Neurociência do Desenvolvimento: a construção de uma hipótese interdisciplinar - A hipótese formulada a partir desta aproximação é que a relação de mutualidade entre o biológico, o emocional e o social (e não o emocional enquanto uma conseqüência linear da condição biológica, ou o biológico como condição direta do emocional) apontada pela neurociência, no processo de desenvolvimento humano, é estabelecida por meio de uma relação intersubjetiva fundada em uma maternagem que Winnicott (1988) chamou de “mãe suficientemente boa”.Estas 22 sutis interações emocionais alteram os níveis da atividade cerebral e exercem um papel importante no estabelecimento e manutenção dos circuitos do sistema límbico (Ziabreva, I., Poeggel, P., Reinhild, S., Braun, K., 2003; Wilkinson,2004; Cirulli, Berry, Alleva, 2003; Bradshaw, Schore, Brown, Poole, & Moss, 2005; Fonagy & Target, 2005; Ovstscharoff e Braun, 2001; Balbernie, R.(2001); Graham, et al.,1999; Schore, 2005). “A “mãe suficientemente boa” tambem não existe sem os outros. Ela não existe sem um campo sociocultural, que lhe dê possibilidades de exercer suas funções” (Safra, 2002).Coerente com afirmação de Fonseca, V.R.J.R.M. et al. (2010) - Projeto Ipê -Temático FAPESP no. 06/59192-2, “A sensibilidade materna é influenciada por fatores sócio-cognitivos e afetivos”. As conclusões da pesquisa de Defelipe, (2009) - Projeto Ipê -Temático FAPESP no. 06/59192-2: “A DPP1 parece capaz de perturbar os arranjos interativos tornando-os menos consistentes. Porém, apesar desta possível limitação, por vezes, mães com DPP podem interagir adequadamente com seus bebês. Por fim, a DPP por não se tratar de um fenômeno capaz de incidir linearmente sobre a interação mãe-bebê, e sobre o desenvolvimento posterior, deve ser investigada em associação com outros fatores psicossociais de risco.” Confirmam a compreensao de Aitken & Trevarthen (2001) que consideram o vínculo como resultado de um conjunto complexo de fatores individuais e ambientais que interagem de uma forma não linear. Palavras-chave: Psicanálise, Neurogênese, Vínculo 1 DepressãoPós-Parto. VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento CO 10 - LT01 Depressão Pós-parto LT01-901- DEPRESSÃO PÓS-PARTO: O IMPACTO SOBRE A RESPOSTA AO ESTRESSE DO BEBÊ É MODULADO PELO COMPORTAMENTO MATERNO Marie-Odile Monier Chelini - IPUSP [email protected] Vera Regina J. R. M. Fonseca - IPUSP [email protected] Vinicius Frayze David - IPUSP [email protected] Emma Otta - IPUSP [email protected] Financiamento: FAPESP A depressão pós-parto (DPP) afeta, mundialmente, uma entre cada cinco parturientes (Miller, 2002; Nemeroff, 2008), comprometendo o desenvolvimento e comportamento dos seus filhos (Essex et al., 2002; Herrera et al., 2004; Pearlstein et al., 2009). Particularmente, uma relação significante entre depressão maternal após o parto e disfunções do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HPA) de seus filhos foi evidenciada, com níveis de cortisol aumentados em bebês, crianças e adolescentes (Brennan et al., 2008; Kaplan et al., 2008). Em geral, os sintomas da DPP ficam evidentes algumas semanas após o parto (Robertson et al., 2004). Entretanto, uma detecção antecipada dos seus efeitos sobre o bebê permitiria implantar-se cuidados preventivos para limitar sua severidade. Uma reatividade psicológica e adrenal aumentada ao estresse psicossocial durante a gestação foi associada a um risco maior de DPP (Nierop et al., 2006), sugerindo que efeitos da DPP sobre a criança podem antecipar seu diagnóstico. O presente estudo teve por objetivo investigar se os efeitos da DPP sobre a função adrenal da criança podem ser detectados no recém-nascido. Também foi avaliada a relação entre a interação mãe/bebê e os níveis de cortisol. Hipotetizamos que: 1) recém-nascidos cujas mães desenvolverão DPP apresentam concentrações de cortisol salivar mais altas do que aqueles cujas mães não apresentarão DPP, 2) filhos de mães com DPP apresentam aos 4 meses de idade concentrações basais de cortisol mais altas do que filhos de mães sem DPP, 3) filhos de mães deprimidas apresentam aos 4 meses reação endócrina ao estresse mais acentuada do que filhos de mulheres sem DPP, e 4) há correlação negativa entre concentrações de cortisol dos recém-nascidos e intensidade da interação positiva mãe/bebê. Metodologia: A amostra continha 74 mães e filhos, participantes de um estudo longitudinal sobre DPP. O cortisol dos bebês foi mensurado em amostras de saliva coletadas dois dias após o nascimento (alta) e 4 meses depois do parto, antes e depois de um exame clínico. As mães foram classificadas quanto à DPP três meses após o parto, através da escala de depressão pós natal de Edimburgo (EPDS) (Cox et al., 1987), validada no Brasil (Santos et al, 1999). Foram consideradas deprimidas mães que receberam escores superiores a 11. Interação mãe/bebê: Foram analisados os 3 primeiros minutos da filmagem do primeiro encontro da mãe com o bebê. Baseado na escala de Biringen, et al. (2000), foi criada uma escala de 4 pontos (0 ausência e 3 máximo) para seis categorias de comportamento materno (vivacidade, falar espontâneo com o bebê e sobre o bebê, sorrir, tocar o bebê e olhar para o bebê) e quatro do bebê (vivacidade, exci23 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento tação, olhar e ser acalmado pelo contato com a mãe). Dados dos recém-nascidos foram obtidos dos prontuários. Análise estatística: Utilizamos testes t e chi quadrado entre os grupos com e sem DPP para identificar possíveis variáveis de confusão. Depois, foi formulado e ajustado um modelo linear misto (LMM), descrevendo a concentração do cortisol dos bebês como função da condição da mãe (DPP) e do tempo (Demidenko, 2004). Foram então testados efeitos possíveis de variáveis do recém-nascido e dos escores de relação mãe/bebê sobre cada medida de cortisol. O nível de significância adotado foi < 0,05. Resultados: Foram consideradas deprimidas 16 mulheres (23,8%). Não houve diferenças da interação avaliada para mães e bebês entre grupos, nem para nenhuma variável de confusão. O LMM mostrou efeito do tempo no cortisol (F2/71 = 25.52, p < 0.0001). Nos dois grupos, a concentração de cortisol era maior na alta que na linha de base aos 4 meses e aumentou após o exame clínico. Não houve efeito da DPP nem da interação DPP e tempo sobre os níveis de cortisol. Verificou-se, contudo, um coeficiente de variação (CV) maior na resposta endócrina de filhos de mães deprimidas em resposta ao estressor (CV = 124.54) do que no outro grupo (CV = 75.47). O modelo mostrou interação no tempo entre escore de interesse materno e DPP apenas entre filhos de mães deprimidas (F1/51 = 4.18, p = 0.046). Especialmente, foi evidenciada correlação negativa entre escore do interesse materno e variação do cortisol do bebê após o evento estressor apenas no grupo com DPP (Pearson r = -0.904, p = 0.005). Com o modelo, foi possível controlar as concentrações de cortisol pelo interesse materno, que então se mostraram maiores em filhos de mães deprimidas na alta 24 (19.9 ± 3.3 nmol/L vs 9.3 ± 1.8 nmol/L), aos 4 meses antes (8.2 ± 2.3 nmol/L vs 2.7 ± 0.5 nmol/L) e depois do evento estressor (11.1 ± 2.3 nmol/L vs 4.0 ± 0.6 nmol/L). Discussão: O nível de cortisol dos bebês aos 4 meses é semelhante entre os grupos, contradizendo alguns resultados (Brennan et al., 2008) mas consistente com Azar et al. (2007). Diferentemente de Azar, não foram encontradas diferenças na variação do cortisol frente ao estresse, entretanto, observou-se maior variação interindividual no grupo filhos de deprimidas, sugerindo reação mais heterogênea ao estresse. A análise mostrou uma explicação possível, evidenciando correlação entre maior resposta endócrina ao estresse e menores escores de interesse materno apenas no grupo com DPP. A análise inferencial mostrou também diferença entre os grupos nas concentrações basais de cortisol. Os níveis de cortisol estimados depois do controle para efeito do interesse materno sugerem que a qualidade da interação materna depois do parto pode tamponar o efeito da depressão no eixo HPA dos bebês, mesmo apenas 2 dias após o nascimento, quando a DPP ainda não é detectável. Efeitos similares foram reportados (Gunnar, 1998; Kaplan et al., 2008). Nossos resultados sugerem que intervenções visando melhorar a qualidade dos cuidados maternos, sugeridas em estudos prévios (Gunnar & Donzella, 2002; Wachs et al., 2009) podem ser implantadas desde os primeiros momentos de vida do bebê. Palavras-chave: Depressão pós-parto; cortisol; interação mãe-bebê. Contato: Departamento de Psicologia Experimental, Instituto de Psicologia, Universidade de São Paulo, São Paulo [email protected] VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento LT01-937 - RELAÇÃO ENTRE DEPRESSÃO PÓS-PARTO MATERNA E DESENVOLVIMENTO DA COOPERAÇÃO EM CRIANÇAS Laura Cristina Stobäus - IP/USP [email protected], Capes Maria Lucia Seidl de Moura - UERJ [email protected] Vera Silvia Raad Bussab - IP/USP [email protected] Financiamento: Capes, CNPq, FAPERJ e FAPESP Estudos em diferentes ambientes socioculturais têm mostrado uma incidência de depressão pós-parto (DPP) em 10 a 20% das mulheres. Dentre as decorrências relevantes do quadro, tem havido um interesse especial nos potenciais comprometimentos da interação mãe–bebê (Field, 2010), no desenvolvimento cognitivo e emocional da criança (Murray e Cooper, 1997) que repercute, entre outras dimensões, no desenvolvimento do comportamento cooperativo da criança. Este trabalho é parte do Projeto longitudinal “Depressão Pós-Parto como um fator de risco para o desenvolvimento do bebê: estudo interdisciplinar dos fatores envolvidos na gênese do quadro e em suas consequências” (temático Fapesp nº 06/59192). Díades mãe-bebê, usuárias do sistema público de saúde, têm sido acompanhadas desde a gestação até o terceiro ano da criança, de modo a investigar fatores ligados à DPP e seus possíveis efeitos no desenvolvimento infantil. A ontogênese da cooperação envolve uma representação interna das próprias intenções e objetivos, base para a inferência de que o outro também possui desejos e intenções semelhantes, isto é uma “Teoria da Mente” (Tomasello, 2009). Com um ano, a criança consegue distinguir e preferir um agente cooperativo a um não cooperativo (Hamlim, Wynn, Bloom, 2007), o que é, em si mesmo, indicativo da importância deste desenvolvimento precoce. A cooperação entre pares parece emergir ao final do segundo ano, através de jogos imitativos. No terceiro ano as crianças se tornam mais compreensivas quanto às ações e desejos dos outros, podendo entender quando estes não foram alcançados (Brownell, Ramani, Zerwas, 2006), condição básica para a potencial oferta de ajuda. As descobertas que as crianças fazem a respeito das emoções e de estados mentais dos outros são centrais para o desenvolvimento de suas relações sociais e vão se aprimorando através da experiência comunicativa nas relações familiares (Dunn e Brophy, 2005). Em pesquisas anteriores do presente projeto, microanálises mostraram diferenças nesta experiência comunicativa: por exemplo, arranjos interacionais mãe-bebê (4 meses) apresentaram-se menos estruturados na presença de DPP (De Felipe, 2009), bem como nos padrões gerais destas crianças que com 1 ano brincaram menos e ficaram mais ansiosas em situações de separar-se da mãe (Vicente, 2009). O desenvolvimento da capacidade de “teoria da mente” na criança está diretamente relacionado a aspectos essenciais desta experiência interacional, como o da atenção compartilhada e da linguagem. Ambas passam por etapas de aquisição e aprimoramento (Baron-Cohen e Swettenham, 1997; Carpenter, Nagel e Tomasello, 1998) e propiciam à criança compartilhamento e troca de experiências com as pessoas significativas da sua convivência, em especial a mãe (Peterson, 2000). Dentre as inúmeras influências maternas, ligadas ao desenvolvimento do apego e da regu25 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento lação emocional, pode-se destacar a que se inicia no “mamanhês”: as referências maternas ao classificar objetos presentes no foco de atenção da criança favorecem a aquisição da linguagem e o entendimento social (Ensor e Hughes, 2008). Evidentemente, importa o contexto significativo da composição familiar: embora a mãe em geral ocupe posição central, também podem estar presentes outros adultos e outras crianças (Dunn e Brophy, 2005). O objetivo do presente estudo foi avaliar, através de tarefas de cooperação infantil, se a DPP afeta o desenvolvimento do comportamento de cooperação de crianças, uma vez que esta condição pode afetar as experiências interacionais e afetivas da díade. MÉTODO. Participantes: Foram estudadas 50 crianças de três anos (16 meninos, 36 meninas), distribuídas igualmente quanto a indicadores de depressão pós-parto de suas mães (DPP) aos 4 meses pós parto (Escala de Depressão Pós-Parto de Edimburgo). Procedimento: Foi filmado o desempenho da criança em tarefas de cooperação: 1) ajudar a mãe, pessoa familiar, a guardar brinquedos, depois de uma sessão de brincadeira e 2) ajudar experimentador, desconhecido, a pegar objeto que ele deixa cair ao solo (adaptadas de Warneken et col. 2007). Resultados: Foram encontradas diferenças significativas (qui-quadrado) na ajuda ao experimentador na situação geral, agrupando ausência de ajuda no conjunto com a não ajuda na tarefa específica: crianças do grupo DPP, cooperaram menos que as demais (x²=6,52,p=0,02; 72%x36%). Embora não tenha havido diferença significativa entre os sexos nesta categoria, meninas tenderam a cooperar mais (x²=4,17, p=0,67; 56% x 26%). Na categoria específica de ajuda ao experimentador, meninas cooperaram 26 significativamente mais do que os meninos (x²=6,04, p=0,02, 71% x 30%). Não houve diferença na ajuda à mãe: a grande maioria das crianças ajudou, independentemente da DPP (80% das com DPP e 88% sem DPP), e do sexo (83% dos meninos e 86% das meninas). Discussão: Concluímos que a DPP materna influenciou algumas das respostas cooperativas das crianças, especificamente quanto à pessoa desconhecida. Evidentemente, a mãe, além de conhecida, ocupa lugar central na constelação afetiva da criança e isto deve ser levado em conta na discussão. Ainda assim a familiaridade parece relevante neste contraste de efeitos da DPP: a menor colaboração com a pessoa estranha pode representar dificuldade de estabelecimento inicial de relações no caso das crianças de mães com DPP. Também merece destaque a interação com o sexo da criança: como as meninas apresentaram mais propensão à ajuda do desconhecido do que os meninos, precisa-se avaliar, cercando-se de novos dados, se os meninos são mais afetados neste aspecto pela DPP materna. Os resultados são compatíveis com a suposição de que a condição de DPP afeta de modo complexo os processos subjacentes à interação social com pessoas não conhecidas e com a mãe. Conjugados com resultados anteriores que mostravam alterações interacionais das díades com DPP (em DeFelipe, 2009 e Vicente, 2009, acima apresentados), compõem um quadro de efeitos destas peculiaridades das experiências comunicativas no desenvolvimento subsequente. Não indicam um prejuízo generalizado na capacidade de assumir a perspectiva mental do outro, uma vez que a ajuda à mãe se processa da mesma maneira nos dois grupos. Mas mostram uma resistência à ajuda ao desconhecido, na VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento condição DPP, especialmente no caso dos meninos. De um modo geral, a constatação deste tipo de efeito da DPP no desenvolvimento da criança contribui para uma compreensão mais ampla do processo. Além disso, a constatação destes efeitos ligados à inserção social da criança confere importância adicional à prevenção e à intervenção. Palavras-chave: depressão pós-parto, cooperação infantil, interação mãe-bebê. Contato: Laura Cristina Stobäus e-mail: [email protected] LT01-957 - CORRELAÇÃO ENTRE SINTOMAS DEPRESSIVOS MATERNOS E PROBLEMAS DE COMPORTAMENTOS EM CRIANÇAS COM DESENVOLVIMENTO TÍPICO Ana Ribeiro Santana - UFRB/CCS [email protected] Gustavo Marcelino Siquara - UFRB/CCS [email protected] Thiago da Silva Gusmão Cardoso - UFRB/CCS [email protected] Mariângela Santos de Jesus - UFRB/CCS [email protected] Patrícia Martins de Freitas - UFRB/CCS [email protected] Financiamento: FAPESB e CNPq A família é uma instituição primária, na qual, o indivíduo tem contato com as primeiras interações sociais. Esse sistema pode ser compreendido como grupo de pessoas que interagem a partir de vínculos afetivos, consanguíneos, políticos e que estabelecem uma rede infinita de comunicação e de mútua influência. A família consolida-se como um importante nicho para o desenvolvimento global do indivíduo, devido às influências que pode exercer em seu comportamento. Os pais são considerados como a fonte primária que o ser humano possui de contato com o mundo, e desempenham um papel importante no comportamento e desenvolvimento da criança e adolescente, como mediadores entre eles e a sociedade. Diversos estudos ressaltam que a convivência das crianças com mães que apresentam transtornos psiquiátricos, incluindo a depressão, configura-se como um fator de risco para o desenvolvimento dos filhos. Nesse sentido, este estudo busca correlacionar sintomas depressivos de mães com problemas de comportamentos internalizantes e externalizantes de seus filhos. Os participantes do estudo foram 21 sujeitos, sendo 42% do sexo feminino e 58% do sexo masculino, com idade média de 8,90 anos (dp=0,91) entre 7 e 11 anos, que frequentam uma escola pública da cidade de Santo Antônio de Jesus-BA. Os instrumentos utilizados foram a Escala de Depressão Beck e a Lista de Verificação Comportamental (Child Behavior Checklist – CBCL), versão para pais. O Inventário de Depressão de Beck (IDB) é um instrumento de autorrelato constituído por 21 grupos de afirmações de múltipla escolha em que a pessoa deve responder qual a opção que esta de acordo com o seu estado na naquela determinada situação. Os itens estão relacionados aos sintomas depressivos como desesperança, irritabilidade, culpa além de sintomas físicos como fadiga, perda de peso e diminuição da libido. Já o CBCL é um questionário que avalia a competência social e problemas de comportamento em crianças e adolescentes em duas versões uma de 1 ano e 6 meses até 5 anos e outra de 6 a 18 anos, a partir de informações fornecidas pelos pais. As escalas do CBCL 27 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento identificam problemas de comportamento frequentemente encontrados na infância e na adolescência. As subescalas são classificadas como: Ansiedade/Depressão, Retraimento, Queixas Somáticas, Problemas socialização, Problemas Pensamento, Problemas Atenção, Comportamento Quebra-Regra, Comportamento Agressivo. Os pais foram convidados para uma reunião na qual foi apresentado o projeto. Após esclarecimentos os pais assinavam o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e responderam o CBCL e o BDI. Para análise de dados foi utilizado o programa estatístico SPSS 18.0. Os dados foram analisados através da correlação de Pearson. As correlações foram às seguintes entre o: BDI e Problemas de socialização (r= 0,507 e p=0,04*); Problemas de Pensamento (r= 0,509 e p=0,04*); comportamento de quebra de regra ( r=0,483 e p=0,03*); comportamento agressivo ( r=0,50 e p> 0,05); ansiedade e depressão ( r=0,477 e p=0,053); retraimento (r=0,343 e p=0,177); queixa somática (r=0,232 e p=0,370); problemas de atenção (r=0,370 e p=0,144). Pode-se verificar nos resultados que houve uma correlação moderada positiva entre o BDI, respondido pela mãe e as subescalas sobre os problemas de comportamentos do filho indicado pelo CBCL nos seguintes critérios: Problemas de socialização (r= 0,507 e p=0,04*); Problemas de Pensamento (r= 0,509 e p=0,04*); comportamento de quebra de regra (r=0,483 e p=0,03*); e comportamento agressivo ( r=0,50 e p> 0,05). A proporção de significância foi igual tanto para comportamentos internalizantes e externalizantes. Os resultados nos permitem confirmar a pressuposição de que há correlação entre sinais de depressão materna e problemas de comportamento, tanto para o perfil internalizante 28 quanto externalizante. Diante desse resultado, juntamente com a literatura atual, podemos concluir que os problemas de comportamentos representam déficits ou excedentes comportamentais que prejudicam o desenvolvimento cognitivo, físico e psicossocial. Esses comportamentos atribui nas crianças um sentimento de empobrecimento na capacidade pessoal, e incute o sentimento de incompetência pessoal, que podem se apresentar na forma de sentimentos de vergonha, dúvidas sobre si mesmas, baixa estima e distanciamento das demandas da aprendizagem. Assim, faz-se necessário que o processo desenvolvimental seja bem sucedido para que as crianças tornem-se adultos saudáveis e competentes para responder de modo satisfatório às demandas de seu ambiente emocional, social, familiar e profissional. Palavras-chave: depressão; comportamento; desenvolvimento. Contato: Ana Ribeiro Santana, Graduanda em Psicologia - [email protected]. LT01-965 - O SUPORTE SOCIAL COMO FATOR DE PREVENÇÃO DA DEPRESSÃO EM MÃES DE BEBÊS INTERNADOS EM UMA UTIN Claudia Moura de Sant'Anna C. Oliveira - UVV [email protected] Izabel Lima de Vasconcellos - UVV [email protected] Luciana Bicalho Reis - UVV [email protected] Marlucia de Souza Thompson - UVV [email protected] A internação de um filho, em geral, constitui-se numa situação geradora de estresse, acompanhada de alterações emocio- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento nais e psicológicas para as mães, sendo que nem sempre esses sujeitos recebem o apoio social adequado para lidar com tamanha adversidade. A presença de mães que se encontram em um quadro depressivo se revela comum em Unidades de Tratamento Intensivo Neonatais (UTIN), principalmente aquelas que não recebem suporte social adequado (Baptista, Batista & Torres, 2006). Mães com bebês internados em UTIN podem apresentar quadros de depressão e outros transtornos, sendo a internação, possivelmente, um dos fatores que contribuem para tal episódio. Como nos mostram Linhares et al (2006), a prematuridade e a hospitalização do bebê podem ocasionar às mães sentimentos conflitantes em relação ao bebê real e o imaginado, além de culpa, ansiedade, instabilidade emocional, baixo senso de competência e dificuldade de contato físico com o bebê, angústia ao ir à UTIN, medo de apegar-se ao bebê tendo que encarar a perda devido ao possível óbito, luto antecipatório entre outros. Ainda segundo as mesmas autoras, todos esses sentimentos podem ser indicativos de estado de depressão. Sarason, Levine, Bashan e Sarason (1983, citados por Ribeiro, 1999) definem Suporte Social como apoio ou auxílio que uma pessoa recebe de outra em quem possa confiar, que a valorize e que demonstre que gosta dela. No entanto, é necessário que o sujeito favorecido esteja disposto a ser ajudado e que perceba o suporte como disponível. Existem diversos tipos de suporte social, dentre eles, o familiar, grupo de amigos, o psicológico e o institucional. Coutinho et al. (2000, citado por Baptista et al., 2006) apontam que um apropriado suporte social propicia ajuda em diversas ocasiões, maior domínio do ambiente e autonomia no transcorrer da vida do indivíduo. Neste sentido, Kessler, Price e Wortman (1985, citados por Ribeiro, 1999), afirmam que o suporte social pode resguardar os indivíduos em risco de possíveis inquietações mentais. Segundo Dessen & Braz, (2000, citado por Baptista et al., 2006) o amparo familiar é o mais importante tipo de suporte social para a manutenção da saúde mental e o enfrentamento de situações estressantes, além de favorecer a adequação de comportamentos maternos em relação aos filhos. Neste sentido, na situação de internação de um filho, o suporte social pode mostrar-se como fator de prevenção e proteção da depressão materna. Assim, a presente pesquisa propôs verificar a relação entre depressão e ausência de suporte social em mães de bebês internados em uma UTIN de um hospital infantil na região de Vila Velha-ES. OBJETIVOS: Delinear o perfil socioeconômico e familiar de mães que participam do Grupo Psicoterapêutico de mães da UTIN; Analisar a percepção que os sujeitos têm acerca do suporte social que recebem (tanto informal quanto formal) durante o período de internação dos seus filhos; Verificar se a participação das mães no Grupo Psicoterapêutico constitui-se para os sujeitos uma fonte de suporte social; Verificar qual tipo de suporte social é o considerado mais importante para as mães no momento da hospitalização de seu filho e correlacionar se os sujeitos que têm melhor percepção do suporte social recebido são os que apresentam menos sentimentos negativos indicativos de depressão durante o período de internação do bebê. MÉTODO. Trata-se de uma pesquisa de caráter qualitativo e descritivo, realizada em uma UTIN de um Hospital Infantil no município de Vila Velha-ES. Integram a pesquisa mães 29 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento de bebês internados há pelo menos 15 dias e que participam do Grupo Psicoterapêutico de mães da UTIN. Na ocasião de ingresso na pesquisa, as mães assinarão o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e responderão a uma Entrevista Individual Semiestruturada, gravada em áudio e posteriormente transcrita para análise. Os relatos obtidos no grupo também integrarão os dados. Será utilizada ainda a Escala de Edimburgo – EPDS que é utilizada para identificar sintomas de depressão que se manifestam após o parto (Santos, 1995, citado por Ruschi et al 2007). Outro instrumento a ser utilizado será a Escala de Satisfação com o Suporte Social – ESSS (Ribeiro, 1999), que será adaptada ao contexto hospitalar. Esta Escala é constituída por 15 itens que se distribuem por quatro dimensões, satisfação com amigos (SA), intimidade (IN), satisfação com a família (SF) e atividades sociais (AS). Os sujeitos terão assegurados sua identidade e sigilo das informações fornecidas, que serão utilizadas somente para fins de produção científica e receberão apoio psicológico da equipe de pesquisadores. RESULTADOS PARCIAIS. A coleta de dados foi iniciada como projeto piloto e espera-se verificar o quanto o suporte social contribui para a prevenção da depressão. Nos dados coletados de forma preliminar, já se percebe que as mães entrevistadas relatam receber pouco suporte social (da família e grupos sociais aos quais pertencem), e apresentam sinais indicativos de depressão. Espera-se como benefício da pesquisa uma melhor compreensão das relações entre a vivência da maternidade na UTIN, a prevalência de sintomas depressivos nestes sujeitos e a relação disso com uma melhor ou pior rede de apoio social. Para os sujeitos, espera-se que a participação 30 nos Grupo Psicoterapêutico de mães da UTIN permita a construção de estratégias de enfrentamento da situação de adoecimento e internação do filho. Palavras-chave: maternidade, depressão, suporte social. LT01-974 - TECENDO FIOS: A VIVÊNCIA MATERNA E O VÍNCULO ENTRE MÃE E BÊBE INTERNADO EM UMA UNIDADE DE TRATAMENTO INTENSIVO Claudia Moura de Sant'Anna C. Oliveira - UVV [email protected] Izabel Lima de Vasconcellos - UVV [email protected] Luciana Bicalho Reis - UVV [email protected] Marlucia de Souza Thompson - UVV [email protected] Paula Maria Tonon - UVV [email protected] A maternidade é um acontecimento de muita importância para a mulher. Desde cedo, ainda menina, nas brincadeiras e na relação com as mães, a maioria delas começa a “brincar” de ser mãe. Ninam suas bonecas, cuidam de sua alimentação, trocam sua fralda, a fim de se preparar para ter o próprio filho. Durante a vivência da maternidade a mulher começa a idealizar um filho conforme a sua própria imagem e semelhança, esperando o momento de apresentá-lo à sociedade. Desta forma, a emergência do parto prematuro não está relacionada somente a antecipação do nascimento do bebê, mas também de sua mãe, que despreparada para esse momento, torna-se “prematuramente mãe”, necessitando reajustar-se a essa dura realidade. Aquilo que muitas vezes foi temido VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento durante a gravidez torna-se real e ambos estão agora vulneráveis, inseridos em um ambiente desconhecido que irá separá-los ainda muito cedo. O recém-nascido de risco, também chamado de prematuro ou bebê pré termo, é aquele que nasce com uma idade gestacional menor que 37 semanas e em casos extremos os que nascem com menos de 28 semanas de gestação. Alguns bebês prematuros podem nascer com complicações ou alterações orgânicas, além do baixo peso e respiração deficitária, necessitando assim de aparelhos especializados para a sobrevivência. Pesquisas revelam que atualmente no mundo 20 milhões de bebês nascem prematuramente, sendo que desses, um terço morre antes de completar um ano de idade (Romanoli & Moreira, 2008). A prematuridade traz em seu bojo significativas consequências emocionais que são marcadas pela perda desse bebê imaginado durante a gestação. A perda do bebê idealizado, o berço que estará vazio, as roupas que a princípio não serão usadas, a cobrança da família e do meio social, podem colocar em risco uma relação (mãe-bebê) que ainda se constrói. A internação de um bebê em uma Unidade de Tratamento Intensivo Neonatal (UTIN) contribui para o afastamento entre a mãe e o bebê, interferindo significativamente na relação de vínculo e apego. A separação, que não poderia ser de outra forma, traz consigo sentimentos de culpa, incompetência e luto pelo bebê idealizado, o que dificulta ainda mais o estreitamento dos laços parentais (Raad, Cruz & Nascimento, 2006). Assim, pode ocorrer uma ruptura no processo de vinculação já que muitas mães sentem-se receosas de tocar ou conversar com seu filho, o que pode gerar stress psicológico para ambos (Schumacher, 2002). A UTIN será por um bom tempo o lugar onde mãe e filho irão conviver no limiar entre a vida e a morte. A partir de agora, terão que “tecer fios”, criar laços, construir vínculos que poderão estar fortemente abalados a partir daquele momento. Neste sentido, a presente pesquisa tem por objetivo analisar como se dá a qualidade da relação e vínculo entre mães e seus bebês pré-termos que estão internados em uma Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN), ou seja, conhecer e analisar como a prematuridade e o ambiente artificial de cuidados iniciais ao recém-nascido podem trazer dificuldades ao estabelecimento deste vínculo inicial da mãe com o bebê e que recursos e estratégias são criados por estas mulheres para enfrentar tais adversidades. OBJETIVOS: (1) Identificar e analisar os sentimentos vivenciados pelas mães em relação ao nascimento prematuro e à internação de seus bebês na UTI neonatal; (2) Identificar as estratégias de enfrentamento adotadas pelas mães em relação à situação de hospitalização do bebê e na busca de criação de vinculo afetivo com o filho; (3) Verificar que tipo de conhecimentos as mães têm em relação à importância de se manter um vínculo afetivo com o bebê, mesmo que internado na UTI neonatal. MÉTODO: Trata-se de uma pesquisa qualitativa e descritiva, realizada através de entrevistas individuais, com roteiro semiestruturado em uma Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN) do Hospital Dr. Alzir Bernadino Alves (HIMABA) no município Vila Velha-ES. Fazem parte da pesquisa 10 mães de bebês prematuros e de baixo peso internados na UTIN desde o nascimento e que participam do Grupo Psicoterapêutico de mães da UTIN. Após aceite do convite, as mães serão esclarecidas quanto à sua participação na pesquisa e assinarão o Ter31 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento mo de Consentimento Livre e Esclarecido atendendo-se às exigências do Conselho Nacional de Saúde. Em seguida, será realizada a Entrevista Individual, seguindo-se ao roteiro pré-estabelecido. Também serão colhidas as informações oriundas dos atendimentos psicológicos individuais, bem como dos encontros do Grupo Psicoterapêutico das mães da UTIN. Tanto as entrevistas individuais, quanto reuniões em grupo serão gravadas em áudio e seu registro transcrito para posterior análise. Os prontuários dos bebês cujas mães integram a pesquisa servirão para complementar as informações fornecidas pelas mães relativas aos dados de saúde do bebê, tais como idade gestacional e peso ao nascimento, complicações/alterações presentes na ocasião do nascimento. RESULTADOS PARCIAIS. A coleta de dados já foi iniciada por meio de estudo piloto que pretende verificar a adequação do roteiro de entrevista. Pelas entrevistas realizadas até o momento, observou-se que as mães passaram o período da gravidez idealizando um bebê perfeito, sem problemas ou qualquer alteração de saúde. Porém, o nascimento prematuro e a internação na UTIN, constituem-se experiências emocionalmente difíceis. Quanto ao vínculo mãe-bebê, observa-se que não houve entre as mães já entrevistadas dificuldades em constituí-lo e mantê-lo, porém o ambiente hospitalar e as práticas de assistência ao recém-nascido foram citados pelas mães como um dos principais fatores dificultadores na interação com seus bebês. Palavras-chave: Maternidade-prematuridadeUnidade de Terapia Intensiva Neonatal Contato: Claudia Moura de Sant’Anna Carvalho de Oliveira - Centro Universitário Vila Velha [email protected] 32 LT01-1336 - ANÁLISE DE INDÍCIOS DE DEPRESSÃO PÓS-PARTO NAS MÃES QUE FREQUENTAM UM CENTRO DE EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA PARA ATENDIMENTO PUERPERAL EM ENFERMAGEM Vanessa Cavalcanti de Torres - AEB [email protected]. Aliny Valéria Bezerra Cavalcante - FAEB [email protected] Grasiela Nascimento da Conceição - FAEB [email protected] A depressão pós-parto (DPP) constitui fator agravante para dificuldade no período pós-parto, tendo sinais característicos tais como: humor deprimido, falta de interesse pelas atividades diárias, desinteresse pelos cuidados maternos para com seu filho, medo de não ser uma boa mãe, choro fácil, entre outros, que podem ser identificados para possível diagnóstico, através de uma consulta de qualidade onde o profissional deve estar atento a esses sinais para que seja realizado tratamento adequado, ou até mesmo a prevenção da instalação desta patologia. Durante o puerpério várias alterações ocorrem tanto na mulher como no recém-nascido, pois é um período que permite a troca de carinho, de segurança para o bebê durante os cuidados prestados pela mãe (Guedes-Silva et. al., 2003). O puerpério deve ser assim, um período prazeroso para a mulher, pois só dessa maneira ela conseguirá transmitir afeto para o seu filho, contribuindo para desenvolvimento saudável do seu bebê (Mattar et. al., 2007). Se a mesma não apresenta condições emocionais para cuidar da criança, isto o afetará diretamente, facilitando o desenvolvimento de patologias (Schwengber & Piccinini, 2003). Sendo assim, este estudo teve VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento como objetivo, identificar possíveis indícios de depressão pós-parto nas mães que freqüentam o CEPAC (Centro de Pesquisa e Atenção à Criança), no laboratório da FAEB (Faculdade de Enfermagem do Belo Jardim) em Belo Jardim-PE. A atenção à mulher no puerpério fica facilitada durante a consulta quando do encaminhamento de seus filhos para o CEPAC que é um Centro de Pesquisa e Atenção à Criança, pois no período em que essas mães levam seus filhos é o de maior incidência da DPP, facilitando assim, o diagnóstico inicial dessa doença. Portanto, mostra-se a importância da atenção não só à criança, mas, também à mãe que, muitas vezes, deixam de atentar para a sua saúde, porém seu estado físico e mental influenciará na saúde e bem estar de seu filho. Entendemos que o estado emocional da mãe alterado, incidirá sobre a qualidade de vida de seu filho e como conseqüência, uma dificuldade em estabelecer laços afetivos ao longo da vida entre ambos. Nesse estudo foram utilizados um questionário para os dados pessoais e a Escala de depressão pós-parto de (EPDS). A EPDS é composta por 10 itens e tem sido amplamente utilizado em todo o mundo, demonstrando ser um instrumento útil para detectar mulheres sob risco de apresentar depressão pós-parto. Idealizada por Cox Holder et al. em 1987, essa escala é de fácil aplicação e pode ser utilizada por profissionais de saúde de diversas áreas. Quanto à população desse estudo foi composta por 38 puérperas quando as mesmas levaram seus filhos para consulta de puericultura no CEPAC. A análise utilizou um método estatístico para o tratamento dos dados, de acordo com os critérios definidos pelo próprio instrumento empregado para avaliação das participantes, tendo como base o teste de t de student que apontou um intervalo de 95% de confiança a média da amostra é de 0,8; erro padrão de 0,07; mediana igual a 1; desvio padrão igual a 0,4 e variância igual a 0,2. Os resultados apontaram que (a) 32% da amostra apresentou indícios de depressão pós-parto suficientes para que fosse classificada no grupo de risco, (b) o número de mulheres que apresentou resultado indicativo foi maior nas de dezenove anos, tendo estas como estado civil respectivamente união estável que representou 32% da amostra, (c) quanto ao grau de escolaridade 18% tinha apenas ensino fundamental incompleto, observando-se desta forma que o número de mulheres que possuem pouca escolaridade é significativo, estando inclusas neste percentual a maioria das mulheres com indícios de DPP. Diante desses dados, percebe-se que o profissional de saúde deve estar habilitado para detectar precocemente os indícios de depressão pós-parto, tendo sensibilidade para entender as mulheres que apresentem os sinais preditivos nesta fase, podendo intervir no tratamento e encaminhamento para atendimento especializado. As consequencias da DPP não são apenas para a mulher, mais também para a criança, podendo afetar, inclusive, a relação conjugal, pois o comprometimento do binômio mãe-filho, pode ser ocasionado por mães menos afetuosas e mais ausentes nas respostas às necessidades de seus filhos, prejudicando, dessa forma, o cuidado com o mesmo. Palavras-chave: Depressão pós-parto; mãefilho; Puerpério. 33 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento LT05-801 - RELACIONAMENTO CONJUGAL, CLIMA AFETIVO DA FAMÍLIA E DEPRESSÃO PÓS PARTO Júlia Scarano de Mendonça - IPUSP [email protected] Vera Sílvia Raad Bussab - IPUSP [email protected] José de Oliveira Siqueira - IPUSP [email protected] Financiamento: FAPESP Essa pesquisa está inserida no Projeto Temático FAPESP Depressão pós-parto (DPP) como um fator de risco para o desenvolvimento do bebê: estudo interdisciplinar dos fatores envolvidos na gênese do quadro e em suas conseqüências (Processo 06/59192-2). A DPP tem sido apontada como um distúrbio emocional com potenciais implicações para a mãe e o bebê. Chama a atenção a predominância dos estudos com foco exclusivo na mãe e na criança, sendo o pai e outros membros da família menos estudados. Recentemente, estudos têm mostrado associações entre DPP e inadequações no funcionamento familiar (Burke, 2003; Johnson & Jacob, 1997). Cummings e Davies (1994) sugerem que além da DPP, o “distúrbio psicossocial na família” associado à depressão deva ser considerado como fator de risco para o desenvolvimento da criança. A associação entre DPP e problemas na relação conjugal também tem sido apontada na literatura da área (Burke, 2003; Cummings & Davies, 1994; Silva & Piccinini, 2009) bem como em análises prévias feitas no presente projeto temático (Silva, 2008). O conflito conjugal tem sido identificado como relevante para a qualidade da vida familiar, para a compreensão das origens da DPP e para prognósticos mais precisos sobre a influência do contexto familiar 34 no desenvolvimento da criança. O objetivo da presente pesquisa foi aprofundar o entendimento das relações entre DPP, avaliada aos 4 e 8 meses da criança, e conflito conjugal e familiar. Como associações significativas entre a ocorrência de DPP e a de Depressão Anterior independente da gestação (DA) foram constatadas previamente (Silva, 2008), as relações entre DPP e conflito serão também analisadas à luz da presença ou não de DA. Método. Cento e treze famílias da classe média baixa, atendidas pelo Hospital Universitário da USP e pelo SUS. Três entrevistas: na gestação, aos 4 e aos 8 meses da criança foram realizadas para coletar informações sobre a família e a criança. Foram analisadas questões sobre a relação conjugal, o clima familiar, a ocorrência de DA e a de DPP (Escala de Depressão Pós-natal de Edinburgh - EDPE), de Cox, Holden e Sagovsky (1987), aplicada aos 4 meses da criança. O teste exato qui-quadrado de Pearson mostrou associações significativas entre conflito conjugal e DPP aos 4 (X²=23.108; p=0,000) e aos 8 meses (X²=16.848; p=0,000), com percepção materna de baixo nível de conflito associada à ausência de DPP, e de alto nível de conflito associada à DPP. O tamanho estimado do efeito obtido por meio do V de Cramer foi de .474 e .413, respectivamente. Resultados análogos foram obtidos para o conflito familiar, indicando a percepção de baixo conflito na ausência de DPP e o aumento da percepção do conflito na presença de DPP, aos 4 (X²= 10.389; p=0,006 e V de Cramer=.303) e aos 8 meses ( X²=20.008; p=0,000 e V de Cramer =.423). Verificou-se associação significativa entre conflito conjugal e familiar, independentemente da DPP, aos 4 (X²= 28.687, p=0,000) e aos 8 meses da criança (X²= 76.689; p=0,000), com magnitudes VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento de efeito da ordem de .373 e .622, respectivamente. Com o objetivo de discriminar o efeito da DPP de possíveis efeitos de DA, os dados foram analisados separando-se os casos de DPP associados ou não à DA. Esta análise fortaleceu a idéia do efeito específico da DPP, pois, na ausência de DA, houve associação significativa com conflito conjugal aos 4 (X²=12.213, p=0.007 e V de Cramer=.440) e aos 8 meses (X²=12.095, p=0.011 e V de Cramer=.438); e com conflito familiar aos 8 meses (X²=12.813, p=0.009 e V de Cramer=.451), no mesmo sentido dos resultados gerais. Na presença de depressão anterior, não houve associações significativas em nenhum dos momentos. As associações entre DPP e conflito corroboram a idéia da importância do contexto conjugal e familiar para a compreensão do quadro. Os valores da magnitude do efeito relativamente baixos, como frequentemente acontece nos dados da literatura, são compatíveis com a interpretação de um fenômeno multideterminado: ao que tudo indica, um conjunto de variáveis associa-se à DPP, sendo uma parcela destas representada pelo conflito conjugal e familiar. Considerada a multideterminação, esta magnitude de efeito passa a representar participação relevante destes conflitos no quadro da DPP. A associação entre os conflitos conjugal e familiar sugere dependência entre essas variáveis, conforme previsto. O maior valor do quiquadrado aos 8 meses sugere aumento da associação com o passar do tempo. De forma similar, aos 4 meses, os valores mais altos do qui-quadrado para a associação entre a DPP e o conflito conjugal do que para o conflito familiar sugerem que nos primeiros meses após o parto (coincidentemente com o pico da DPP aos 3 meses após o parto) o conflito conjugal tenha um impacto maior. Importa salientar que os conflitos familiares e conjugais mostraram-se significativamente associados à DPP, independentemente da DA, o que apóia a compreensão de relações peculiares da DPP com o conflito. Contudo, pelo fato de as associações verificadas acima serem encontradas somente na ausência de DA, é possível que esta atue de forma diferente na constituição da DPP, com outras associações entre as variáveis. Há outra interação complexa entre apoio social (afetado por conflitos) e a DPP a ser considerada: as ligações entre baixo apoio e DPP sugerem causalidade, mas, ao mesmo tempo, a própria DPP poderia evocar apoio social no cuidado com a criança. Evidentemente, deve-se considerar ainda uma possível bidirecionalidade de efeitos entre conflitos conjugais e familiares com a DPP, pois os conflitos podem propiciar o desenvolvimento da DPP, e esta, por sua vez, intensificar os conflitos. As relações entre DPP e aspectos gerais de harmonia e apoio social têm se revelado importantes para a compreensão da origem e das conseqüências da DPP e tem merecido atenção especial no presente projeto, tanto pelo interesse teórico quanto pelo interesse em termos de prevenção e de políticas públicas. Palavras-chave: depressão pós-parto, relação conjugal, família Contato: [email protected] 35 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento LT05-925 - ESTILO DE APEGO E DEPRESSÃO PÓS-PARTO Carla Cristine Vicente - UFRRJ [email protected] Vera Silvia Raad Bussab - USP [email protected] Financiamento: FAPESP O estilo de apego que a criança constrói, a partir das diferentes interações das quais participa, se refere a estratégias ontogenéticas de desenvolvimento social. O apego se relaciona ao sentimento de segurança e proximidade do bebê em relação a suas figuras significativas, o que integrará o seu desenvolvimento global e construirá um modelo de funcionamento interno para seus relacionamentos futuros (Bolwby, 1990). A Depressão Pós-Parto (DPP) é um distúrbio com sérias implicações potenciais para a mãe, por propiciar a emergência de sintomas como humor deprimido, labilidade emocional, sentimentos de incompetência para lidar com a criança, distúrbio do sono, perda de prazer e ideação suicida, o que, por sua vez, pode acarretar prejuízos para o bebê, associados a atrasos no desenvolvimento físico e cognitivo (Patel, Souza & Rodrigues, 2003). Este estudo objetivou avaliar estilos de apego em bebês de mães com e sem indicativos de DPP, a fim de avaliar se a construção do vínculo de apego era influenciada pela depressão materna, de modo a aprofundar a compreensão sobre o desenvolvimento afetivo e da sua importância no desenvolvimento geral da criança. Este estudo esteve associado ao projeto temático “Depressão pós-parto como fator de risco no desenvolvimento: estudo interdisciplinar dos fatores envolvidos na gênese do quadro e em suas conseqüências”, no qual mães e bebês atendidos pelo sistema público de saúde foram acompanhados lon36 gitudinalmente, desde a gestação até o 3º ano da criança. O estilo de apego da criança foi avaliado através dos procedimentos da “Situação Estranha”, segundo protocolo desenvolvido por Ainsworth, Blehar, Waters e Wall (1978) e Main e Solomon (1990). Uma equipe de 04 pessoas treinadas participou das filmagens, feitas quando os bebês foram completando 12 meses. Todas as díades foram recebidas pela pesquisadora e instruídas para participar dos oito episódios, (duração de 21 minutos), nos quais ocorria uma seqüência de interações entre o bebê, a mãe e uma pessoa desconhecida do bebê, envolvendo separações e reuniões mãe-bebê. Foram analisadas 85 díades, divididas em dois grupos: experimental (com indicativos de DPP) e controle (sem DPP) (“Escala de Depressão Pós-Parto de Edimburgh - EDPE” (Cox, Holden, & Sagovsky, 1987). A classificação do padrão de apego (seguro; inseguro – evitante, ambivalente ou desorganizado) foi feita conforme o protocolo de Ainsworth e cols. (1978), que considera quatro dimensões: Procura de proximidade; Manutenção de contato; Evitação de proximidade, e Resistência ao contato e conforto, avaliadas via atribuição de valores de 1 a 7 pontos, detalhadamente definidos. A classificação foi realizada às cegas, separadamente, por duas observadoras para o índice de DPP da mãe. A confiabilidade das observações medida pelo índice Kappa de Cohen apontou concordância de 0,833, valor confiável para avaliações. Dadas as reconhecidas ligações entre os estilos de apego e a regulação da segurança afetiva com autonomia, exploração e brincadeira, foi desenvolvido um protocolo adicional de observação, para avaliar padrões de exploração do ambiente, de brincadeira e sinais de ansiedade, como movimentos repetitivos, desconcerto emocional e cessação de ativi- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento dade e de interação com a pessoa estranha, nas episódios de separação e retorno da mãe. Segundo os critérios do instrumento da Situação Estranha, predominou a classificação de apego seguro (82%), para o grupo como um todo (inseguros evitantes 11% e resistentes 7%). O mesmo perfil de distribuição de estilos foi verificado no subgrupo com DPP, com predominância de apego seguro em 87% dos casos. Dos bebês (27) de mães que tinham indicativos de DPP, apenas 4 foram classificados como inseguros, contrariando as expectativas. Apesar de não se refletirem na classificação final do estilo de apego, verificaram-se relações entre DPP e dimensões do protocolo da Situação Estranha, por análise de regressão múltipla (método stepwise), que indicou duas dimensões como preditivas da DPP materna: mais comportamentos resistentes (B=1,76; t=2,66; sig= 0,01); menos busca de contato (B= -3,40; 7= 2,61; sig= 0,01). As análises do protocolo adicional mostraram peculiaridades significativas nas crianças do grupo DPP: menos deslocamento exploratório (x2(1)= 4,307 p=0,038), menos manipulação de brinquedo (x2(1)= 5,434 p= 0,02), menos iniciativa na manipulação de brinquedos (X2 (2)= 5,939, p=0,005), mais comportamentos ansiosos nos dois episódios de separação (X2 (1)= 4,400, p= 0,036; e x2(1)= 3,398 p= 0,028), e menos retomada de exploração nos retornos da mãe (x2(1)= 3,896 p= 0,040; e x2(1)= 3,922 p= 0,038). Não houve predominância de estilos de apego inseguros no grupo com DPP, conforme esperada pelos indicadores da literatura sobre o desenvolvimento de vinculação afetiva. Entretanto, foram constatadas ligações significativas da DPP com as dimensões de comportamento resistente e de busca de contato, compatíveis com aspectos de insegurança neste grupo. Padrões de exploração do ambiente, de brincadeira e ansiedade nas crianças também apareceram prejudicados no grupo DPP. Nos episódios de separação da mãe, as crianças do grupo controle agiram com mais segurança, como se esperassem pelo retorno breve de suas mães. Na comparação com os dados observacionais, a classificação de segurança dos bebês esteve diretamente associada à desenvoltura, iniciativa, manutenção e retornos à exploração ambiental e dos brinquedos, quanto às oportunidades de interação com a figura materna. De acordo com a ênfase atual nos comportamentos dos bebês no retorno da mãe (Waters e cols., 1995), como base para a compreensão da natureza do vínculo, o presente estudo indicou efeitos relevantes: bebês do grupo controle, mesmo após a angústia pela separação, demonstraram apoiar-se mais na mãe como base segura para a exploração ambiental. Como os bebês de mães com indicativo de DPP, de modo geral, não retomaram as atividades após a separação da mãe, podemos presumir uma angústia maior ou falta de habilidade da mãe para restabelecer a confiança de seus bebês, o que é compreensível na situação em que se encontram. O conjunto de resultados aponta a importância de questões metodológicas, ligadas a um cenário de complexidade de determinações, bem como à necessidade de consideração de ajustamento dos instrumentos de avaliação do apego. Reitera, também, efeitos da DPP no desenvolvimento dos padrões ligados à vinculação afetiva e a relevância de estudos de acompanhamento para a compreensão do quadro e para a promoção de programas de intervenção. Palavras-chave: classificação de apego, depressão pós-parto, desenvolvimento social Contato: [email protected] 37 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento CO 07 - LT01 Envelhecimento LT01-905 - DETERMINANTES DO RISCO DE DEPRESSÃO EM IDOSOS EM UMA EQUIPE DA ESTRATÉGIA DE SAÚDE DA FAMÍLIA Cristiane Alves da Fonseca do Espírito Santo SMS/Goiânia [email protected] Cristina Ferreira Lemos de Castro Carneiro S.M.S/Goiânia [email protected] Helizett Santos de Lima - UNB [email protected] Lorena Baía de Oliveira Alencar - SMS/Goiânia [email protected] Olívia Cândida Pequeno - SMS/Goiânia [email protected] Sandro Rogério Rodrigues Batista - UFG [email protected] Os transtornos do humor são uma das desordens psiquiátricas mais comuns em idosos, sendo responsáveis pela perda de autonomia e pelo agravamento de quadros patológicos preexistentes. Dentre eles, a depressão é a mais frequente e está associada ao maior risco de morbidade e de mortalidade, ao aumento na utilização dos serviços de saúde, à negligência no autocuidado, à adesão reduzida aos regimes terapêuticos e maior risco de suicídio. A presença de comorbidades e o uso de múltiplos medicamentos são habituais na população idosa, fazendo com que, tanto o diagnóstico quanto o tratamento dos transtornos do humor se tornem mais complexos. Diante da importância desses transtornos e da dificuldade diagnóstica, a avaliação sistemática dos indivíduos idosos com queixas de tristeza e/ou anedonia 38 pode contribuir para melhorar a detecção dessas patologias. Diversos estudos mostraram que a Escala de Depressão Geriátrica (EDG) oferece medidas válidas e confiáveis para diagnosticar a depressão em idosos, sendo um dos instrumentos mais frequentemente utilizados. Os fatores ligados à depressão precisam ser observados de forma cuidadosa e criteriosa pelos profissionais da saúde, para que se possa realizar a prevenção e o tratamento, a fim de evitar sofrimento ao idoso e dificuldades para seus familiares ou cuidadores, além de consequências negativas para a sua qualidade de vida. O presente estudo teve como objetivos estimar o risco de depressão em idosos na equipe 1 da Unidade de Atenção Básica de Saúde da Família (UABSF) Leste Universitário e avaliar os determinantes do risco de depressão em idosos. A pesquisa foi desenvolvida no município de Goiânia, Distrito Sanitário Campinas-Centro, UABSF Leste Universitário. Foi realizado um estudo quantitativo, transversal, com 92 idosos (com idade igual ou superior a 60 anos) de ambos os sexos, no período de maio a junho de 2010, que responderam a um questionário sobre variáveis demográficas, socioeconômicas, comportamentais e de estado de saúde, além da Escala de Depressão Geriátrica (EDG-15). A análise dos dados utilizou o programa Excel® (Microsoft), bem como para a elaboração de gráficos e tabelas. Com relação à análise estatística foram adotados o teste exato de Fisher e o teste estatístico de hipóteses Qui Quadrado. Segundo os resultados obtidos com a pontuação na Escala de Depressão Geriátrica, observou-se que 68,5% (n=63) dos idosos apresentaram risco de depressão, pois alcançaram mais de 5 pontos no escore utilizado. Verificou-se também que VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento na amostra de 92 idosos, houve predominância do sexo feminino, com 75 mulheres (81,5%). Quanto à idade, a maior frequência dos idosos estava na faixa etária entre 60 e 79 anos (n=78) e que não houve diferenças significativas quanto à presença de depressão entre as faixas etárias estudadas. Para o estado civil, a frequência de sintomatologia depressiva foi maior entre os idosos casados (83%). Em relação à escolaridade, a maioria dos idosos não tinha escolaridade (n=36) sendo que 83% destes apresentaram frequência maior para risco de depressão. E ainda, que os idosos com curso superior apresentaram sintomatologia depressiva, demonstrando que o fato de ter cursado nível superior, demonstrou não ser fator de proteção para sintomatologia depressiva. Em relação à renda familiar mensal, o risco para depressão foi maior entre os idosos com renda familiar de até um salário mínimo (84,6%) e idosos que não possuíam aposentadoria (66,6%). Em relação à internação, dentre os idosos que estiveram internados (n=17), houve risco de depressão alto (83,3%). Para análise estatística da variável relacionamento familiar, as respostas foram dicotomizadas nas categorias ótimo/bom (91,3%) e regular/ruim (8,7%). E finalmente pode-se afirmar que dentre os participantes que consideraram seu relacionamento familiar como ruim, a frequência do risco de depressão foi de 87,5%. Há que se considerar que o aumento da população idosa vem sendo observado em todo o mundo, mas o reconhecimento e o tratamento de transtornos depressivos na população idosa, ainda permanecem como um desafio. Por isso, a identificação dos fatores de risco para depressão em idosos, associados com sua incidência pode ajudar os profissionais que atuam na Estratégia de Saúde da Família (ESF), a diagnosticar e propor intervenções mais precoces e adequadas. É fundamental, portanto, que os profissionais de saúde tenham familiaridade com as características desse agravo e estejam capacitados, preparados para investigar a presença de sintomas depressivos e seus determinantes de risco. Nesse sentido, a articulação da saúde mental com a atenção básica, principalmente através da ESF, é essencial para diagnosticar e propor intervenções mais precoces e adequadas, valorizando a inserção familiar e social deste indivíduo, através do trabalho multiprofissional, baseado na integralidade das ações, colaborando para a melhora da qualidade de vida do idoso. Palavras-chave: Saúde Mental, depressão, população idosa. Contato: Helizett Santos de Lima, Secretaria Municipal de Saúde de Goiânia e Universidade de Brasília, [email protected] LT01-1206 - CORPO E ENVELHECIMENTO EM DEBATE NA UNIVERSIDADE ABERTA À TERCEIRA IDADE Vilma Valeria Dias Couto - UFTM [email protected] Deise Coelho de Souza - UFTM [email protected] Cecília Fernandes Carmona - UFTM [email protected] Ana Alice da Silva Pereira - UFTM [email protected] A iniciativa de trazer os idosos para as universidades começou no Brasil em meados da década de 70 e desde então vem sendo implantada progressivamente em muitas universidades (Cachioni & Neri, 2004). Na Universidade Federal do Triângulo Minei39 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento ro, a Universidade Aberta à Terceira Idade (UATI) é um programa de extensão universitária, interdisciplinar, que tem o objetivo de possibilitar aos idosos acesso a universidade numa perspectiva de educação continuada e visa o resgate da cidadania, a promoção da saúde e desenvolvimento do idoso. O objetivo da psicologia é promover debates sobre o envelhecimento, considerando os aspectos subjetivos deste processo e suas implicações no desenvolvimento do idoso. Na UATI, elegemos o corpo como um dos eixos de reflexão do envelhecimento. O corpo passa por significativas transformações ao longo da vida e na velhice as perdas que atingem seu funcionamento, anunciam a chegada desta etapa da vida. Para muitos idosos, o corpo é fonte de angústia e preocupação, seja porque é foco de adoecimento ou devido ao significado que assume na nossa cultura que valoriza a imagem do corpo jovem. Sobre o corpo humano, o saber da biologia, ao compreendê-lo como uma somatória de órgãos e funções, acaba confrontando a pessoa com uma ideia de um corpo interior feito de pedaços sobre o qual ele nada sabe, pois sobre ele quem sabe é a medicina. A questão do corpo na psicanálise é abordada num outro registro, trata-se de um corpo que é mediador que organiza a relação entre a psique e o mundo externo e através do qual o sujeito é reconhecido e com o qual se identifica. Na UATI a proposta é ampliar a ideia do idoso sobre seu próprio corpo para além um corpo físico, falamos de um corpo sobre o qual os afetos, os prazeres e sofrimentos vão deixando marcas, construindo história, criando uma imagem corporal que permite reconhecimento, apesar das mudanças que o tempo ou as circunstâncias impõem (Goldfarb, 1998). O nosso 40 objetivo neste trabalho é compreender os significados atribuídos ao corpo na velhice, considerando as transformações que acontecem no envelhecimento. Metodologia: O projeto contou com a participação de 15 idosas. Foram feitos quatro encontros com duração de duas horas cada. As atividades foram realizadas por meio de oficinas e dinâmicas de grupo cujo propósito era refletir sobre o envelhecimento pela via do corpo. A metodologia envolve a participação ativa dos idosos na discussão, buscando incentivar a expressão de ideias e experiências de cada um. Para a apresentação da proposta, foi elaborado um vídeo contendo diferentes imagens de corpos que favoreciam o reconhecimento de transformações corporais que advém com a idade e a influência cultural na valorização do corpo jovem. Após exposição do vídeo, os idosos eram solicitados a falar das imagens. Nos encontros posteriores, trabalhamos com oficinas que abrangiam momentos de realização de tarefas seguidos de discussões. Na oficina “Espelho, espelho meu” todos eram convidamos a se mirarem no espelho. Buscamos trabalhar a imagem do corpo e o estranhamento que experimentamos diante da imagem do corpo refletida no espelho, especialmente diante da imagem que traz as marcas e sinais da idade. Nesta oficina, discutimos ainda o conceito de imagem corporal como a representação mental do nosso corpo. Na oficina “os sentidos do corpo”, trabalhamos os sentidos básicos do corpo humano por meio de atividades práticas envolvendo a visão e audição que confirmaram as restrições advindas com os anos de vida, e também permitiu discutir outras possibilidades de potencializar os sentidos, incluindo o resgate de lembranças relacionadas às sensações VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento já experimentadas em outros momentos de vida. Para atingir o propósito deste trabalho de compreender os significados do corpo atribuídos pelos idosos da UATI, consideramos como material de análise as falas que foram registradas durante a realização das oficinas. Trabalhamos com recortes de falas e as possibilidades de sentidos que podem advir. Resultados: Com base nas falas das idosas, percebemos que o corpo possibilita diferentes formas de olhar o processo do envelhecimento. Para algumas idosas, este processo é um evento natural, decorrente do desenvolvimento humano e as transformações do corpo é um evento inevitável, como assinalam as falas a seguir: “eu avalio as mudanças como consequências da vida, é natural, como a morte é natural”; “envelhecemos desde o dia que nascemos, todos vamos envelhecer e morrer.” Outras relacionam as mudanças do corpo na velhice como aspecto facilitador ao aparecimento de problemas da ordem física, tais como exemplificam as seguintes falas “quando fica mais velha engorda mais fácil”; “o peso também pode prejudicar a saúde, podemos dar colesterol, pressão alta, prejudica tudo isso”; “a gordura deforma a gente”. Algumas falas apontaram para uma imagem do corpo positiva diante dos sinais de envelhecimento do corpo: “cada ruguinha é uma experiência que a gente tem”. Outra fala mostra a satisfação com o corpo atual quando comparado com o corpo de sua juventude, aspecto que favorece a autoimagem: “quando olho no espelho vejo uma pessoa que já foi muito gorda, hoje é magra, sarada, gostosa. Hoje mudei muito, sei lidar com minhas dificuldades, depois dos 50 melhorou muito.” Entretanto, outras falas mostram que as mudanças do corpo ainda que inevi- táveis não são desejáveis:“claro que não estou melhor agora, as rugas começam a aparecer, esquece as coisas;é normal, mas não ficamos como antes.”; “muda tudo, a pele é a matéria que vai envelhecendo”; “nada me agrada”. Destacamos também algumas falas que marcaram a relevância dos cuidados dispensados ao corpo na velhice que são importantes tanto para garantir saúde como também para favorecer uma melhor imagem de si na velhice: “é importante cuidar do corpo para ter saúde”; “meu cabelo me agrada, quando corto arrumo, fico bem”; “nada como uma tinta para os branquinhos”; “todo dia acordo e passo batom.” Por fim, uma fala em especial aponta a estreita relação de cuidado entre o corpo e espírito: “...à medida que você cuida do corpo físico você está cuidando do corpo espiritual. temos que cuidar do corpo para que o espírito esteja bem e temos que cuidar do espírito para que o corpo esteja bem.” Considerações Finais: Compreendemos que o corpo é alvo de interesse e investimento não só pelo valor estético que assume na nossa cultura, mas como importante via de saúde e envelhecimento saudável. Verificamos que é recorrente o discurso em torno da responsabilidade do idoso no cuidado ao corpo físico, especialmente para prevenir ou retardar a ocorrência de adoecimentos que podem advir com a idade. Quanto à forma como o idoso vê e pensa seu corpo, a experiência possibilitou reconhecer que as transformações do corpo interferem negativamente na imagem que têm de si mesmo. Contudo, existem, igualmente, aspectos positivos nessas transformações que podem favorecer a imagem de si, especialmente quando significados como sinal de experiência e maturidade. Este trabalho possibilitou compreender 41 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento que o corpo ainda que marcado pelos sinais de envelhecimento e limitações pode continuar sendo alvo de investimentos suficientemente significativos que possibilitam realizações e reconhecimento. Palavras-chave: Envelhecimento. Corpo. UATI Contato: Vilma Valéria Dias Couto Universidade Federal do Triângulo Mineiro Departamento de Psicologia Clínica e Sociedade [email protected] LT01-1343 - INFLUÊNCIA DA AUTOEFICÁCIA GERAL E DA MEMÓRIA EM IDOSOS QUE BUSCAM CURSOS DE INFORMÁTICA Laina Jacinto Couto - UNITAU [email protected] Fernanda Rabelo Prazeres [email protected] Marluce Auxiliadora Borges Glaus Leão - UNITAU [email protected] As possibilidades de um processo de envelhecimento ativo e de uma vivência de velhice com autonomia, independência e qualidade de vida tem conduzido idosos a se ajustarem às demandas da vida cotidiana, principalmente aquelas relacionadas ao progresso tecnológico atual, como o domínio sobre conhecimentos de informática. O enfrentamento de situações novas como essa exige um equacionamento entre seus potenciais e limites biológicos, psicológicos e sociais, mobilizando o senso de autoeficácia do idoso, ou seja, a crença que tem em relação às suas capacidades para produzir resultados. Este estudo teve como objetivo investigar a influência da autoeficácia geral e da autoeficácia de memória em idosos 42 que ingressam em cursos de informática. Foi feita uma pesquisa quantitativa do tipo correlacional, junto a 23 idosos que se matricularam em cursos de informática, utilizando-se uma escala de autoeficácia geral e outra de autoeficácia de memória. Os resultados indicam elevado escore de autoeficácia geral e um baixo escore da autoeficácia de memória. Permitem supor que a baixa crença desses idosos em relação ao próprio potencial cognitivo de memória deve estar associada a estereótipos negativos sobre a velhice, todavia, os resultados da autoeficácia geral são indicativos de condições favoráveis ao ajustamento desse público às novas condições pessoais e contextuais. Com o aumento da expectativa de vida populacional ampliam-se as possibilidades de um processo de envelhecimento ativo e de uma vivência da velhice como uma fase da vida de autonomia, independência e qualidade de vida (Neri, 1995). Frente ao atual progresso tecnológico, adultos maduros e idosos buscam se ajustar às demandas da vida cotidiana por meio da educação continuada. A procura por cursos de informática, para além de uma estratégia educativa de inclusão social do idoso, exige um equacionamento entre seus potenciais e limites biológicos e psicológicos, que por sua vez, pode gerar desequilíbrios em relação às capacidades do indivíduo para produzir resultados. Fazer esse curso envolve uma avaliação das habilidades sociais necessárias para o alcance dos resultados. O constructo psicológico da autoeficácia tem sua origem na Teoria Social Cognitiva, a partir de uma visão do homem constituído pelos sistemas sociais, e que por meio das trocas vão ocorrendo adaptações e mudanças no comportamento, sendo essa relação de indivíduo com o meio, denominada reci- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento procidade triádica (Bandura, 2008; Azzi e Polydoro, 2006). Pajares e Olaz (2008) argumentam que a autoeficácia é considerada uma percepção que o indivíduo tem sobre suas capacidades, operando como um dos determinantes que regulam a motivação, o afeto e a ação humana, sofrendo mudanças de acordo com a dinâmica de interações desse indivíduo com o ambiente. As crenças de autoeficácia são formadas a partir de quatro fontes: experiência de domínio, experiência vicária, persuasões sociais e estados somáticos, determinando quanto de esforço a pessoa dedicará em uma atividade e quanto perseverará quando confrontada com obstáculos, ou seja, coloca em evidência seu potencial de resiliência frente a situações adversas. Para Neri (2006) o senso de autoeficácia da pessoa idosa pode ser afetado pelas perdas biológicas das quais está sujeita, influenciando seu autoconceito, suas emoções e metas pessoais. A crença na plasticidade da memória determina a escolha de tarefas e desafios em idosos, evidenciando uma relação recíproca entre o senso de autoeficácia em memória e em sua plasticidade. Considerando esses pressupostos, entende-se que a busca do idoso por cursos de informática pode gerar múltiplos benefícios, como a experiência de ampliação do contato social e da estimulação cognitiva, favorecendo o controle pessoal sobre os domínios que estão preservados, bem como ajudar nas habilidades cujo domínio esteja limitado. Investigar a influência da autoeficácia geral e da autoeficácia de memória em idosos que ingressam em cursos de informática. Trata-se de uma pesquisa quantitativa, do tipo correlacional, abordando sujeitos com 60 ou mais anos, que se matricularam em 2011 nos cursos de informática de um projeto socioeducativo destinado a esta população, em uma cidade do interior do Vale do Paraíba Paulista. Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética da Universidade de Taubaté, sob o nº 497/10. Do total de 48 matriculados, participaram 23. A coleta dos dados ocorreu nos dias e horários dos cursos, utilizando-se um questionário de características sociodemográficas, uma Escala de Autoeficácia Geral (Ribeiro, 1995) e uma Escala de Autoeficácia de Memória - MAC-Q (Croock et al, 1992, Mattos et al., 2001), respondidos por eles mesmos, com supervisão da pesquisadora. Os resultados estão sendo submetidos a provas estatísticas por meio da ferramenta computacional SPSS. Os resultados demonstram que nessa amostra 73,91% são mulheres e 26,8% homens; 40,5% apresentam experiência anterior com computador; sendo os principais indicadores de escolaridade – 21,7% Ensino Superior Completo, 47,8% Médio Completo. Os motivos para busca desses cursos foram: acompanhar o desenvolvimento tecnológico, estimular a mente, manter contato social e aumentar a disposição ou ânimo de viver. Constatou-se nas escalas um índice elevado de autoeficácia geral e um baixo escore da autoeficácia de memória, permitindo confirmar os achados de Neri (2006) de que a presença de uma crença negativa desses idosos em relação ao próprio potencial cognitivo de memória, pode estar baseada em estereótipos que associam velhice com incapacidade, falta de domínio sobre o ambiente e prejuízos de naturezas diversas. Todavia, ao buscarem esses cursos indicam um comportamento resiliente, uma estratégia de enfrentamento dos obstáculos, corroborado pelos motivos que alegam. Serão ainda aplicadas provas estatísticas de correlação 43 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento entre os resultados dessas escalas, e delas com a variável gênero, escolaridade e experiência anterior com computador. Estes resultados preliminares permitem pensar que a baixa crença de autoeficácia de memória desses idosos não está associada a perdas cognitivas advindas do envelhecimento biológico, visto apresentarem uma alta crença de autoeficácia geral, portanto, indicativos de potencial para modificar o modo como manejam suas vidas e essas crenças, facilitando assim o ajustamento deles às novas condições pessoais e contextuais. Palavras-chave: Idosos; Autoeficácia; Memória. LT01-1471 - ENVELHECIMENTO, DESENVOLVIMENTO E INSTITUCIONALIZAÇÃO: A EXPERIÊNCIA DE ESTÁGIO BÁSICO EM PSICOLOGIA Deyse Salatiel de Moura - UVV [email protected] Pâmella Vitória Moreno dos Santos Rigoni - UVV [email protected] Tainá Barreto Silveira - UVV [email protected] Sabrine Mantuan dos Santos Coutinho - UVV [email protected] O envelhecimento consiste em um processo dinâmico e progressivo, no qual se processam transformações diversas (morfológicas, fisiológicas, bioquímicas e psicológicas) que produzem a perda gradual da capacidade de adaptação do indivíduo ao meio ambiente, ocasionando maior vulnerabilidade e maior incidência de processos patológicos (Papaléo Netto, 1997) Diante do quadro de comprometimento físico e cognitivo decorrente em geral, do 44 surgimento de algumas doenças, muitas famílias optam pelo asilamento/institucionalização de seus idosos, visando, normalmente, garantir uma melhor assistência e qualidade de vida aos mesmos. Doenças típicas da idade porém, não exclusivas da mesma, como o Alzheimer, trazem muito sofrimento para os familiares por não saberem lidar com a patologia que o idoso possui. Além disso, os casos de comprometimento cognitivo não são tão facilmente identificados, deixando as pessoas no entorno do idoso confusas acerca de sua real condição. Engelhardt, Laks, Rozenthal e Marinho (1997) destacam que os quadros leves de comprometimento cognitivo são freqüentes, passando muitas vezes despercebidos, e há uma necessidade de distinguir (o que muitas vezes é difícil) entre manifestações iniciais de doença e modificações associadas com o processo normal de envelhecimento. As casas de repouso / asilos para idosos acabam sendo entendidos como boa ou única alternativa, já que, geralmente, acolhem e cuidam de idosos debilitados fisicamente e/ou psicologicamente. Por outro lado, a internação de idosos em asilos ainda é vista com preconceito, sendo considerada prejudicial ao seu desenvolvimento, sobretudo por levar ao isolamento, abandono e exclusão social. De fato, alguns autores apontam que o processo de institucionalização é permeado por dificuldades relacionadas à adaptação ao novo modelo, à perda de identidade e autonomia, o que pode acarretar problemas físicos e emocionais, acelerando e/ou acentuando a velocidade das perdas funcionais dos idosos. Este trabalho consiste em relato da experiência de Estágio Básico em Psicologia vivenciada por alunos do curso de Psicologia do Centro Universitário Vila Velha em uma Casa de Repouso VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento para idosos situada em Vitória/ES. Trata-se de instituição privada, que se dedica ao atendimento ao idoso, oferecendo serviços especializados, e para tanto conta com uma equipe composta por enfermeiras gerontólogas, técnicos de enfermagem, geriatra (acompanhamento mensal) e fisioterapeuta (acompanhamento semanal). O estágio, desenvolvido numa perspectiva psicossocial, teve início em Julho de 2010, e contava com uma carga horária prática semanal de 04 horas, cumpridas na casa de repouso por um grupo de três estagiárias do quarto período do curso de Psicologia. Nessa época a instituição estava atendendo, em média, 35 idosos, de idades variadas. Num primeiro momento, foi realizado estudo bibliográfico referente ao tema, e após esse período inicial, foi realizada a entrada no campo, que, inicialmente, consistiu em observação participante, visando conhecer a dinâmica institucional, levantar as demandas da instituição, os temas de trabalho a serem explorados e o estabelecimento de vínculo com os idosos e funcionários. Posteriormente foram organizadas atividades que visavam potencializar a interação social do grupo de idosos que tinham condições físicas e cognitivas de participar, bem como o estreitamento de vínculo – ressaltando que a necessidade de maior interação entre os idosos foi a principal demanda identificada. Moura, Passos e Camargo (2005) ressaltam que a comunicação é essencial para a sobrevivência do homem, em especial para o idoso, garantindo a manutenção de suas relações sociais e evitando a carência afetiva e emocional. Também foram desenvolvidas atividades grupais que tiveram como objetivo a reabilitação cognitiva (exercícios para a memória, por exemplo), já que muitos dos idosos residentes na ins- tituição sofrem de Alzheimer, doença que traz muitos prejuízos à memória. Entre as várias atividades desenvolvidas ao longo do estágio, pode-se citar: exibição de figuras/imagens que trouxessem aos idosos lembranças de momentos variados de suas vidas para compartilharem com o grupo; audição de músicas antigas, da época da juventude e fase adulta dos participantes, com a descrição do que lhes vinha à memória; leitura de contos e sua repetição pelo idoso para exercitar a memória; execução de dinâmicas de grupo que oportunizassem conhecer um pouco mais da vida de cada idoso e favorecer a interação entre o grupo; realização de entrevistas semiestruturadas sobre temas relacionados à história de vida dos idosos; realização de trabalhos manuais, como a confecção/ ornamentação de um diário pessoal para cada idoso, buscando o desenvolvimento da criatividade e a possibilidade de expressarem suas emoções e sentimentos diários. Houve situações em que algumas atividades programadas acabaram não sendo desenvolvidas em virtude do pouco interesse ou indisposição dos idosos. Na instituição, os idosos eram divididos pela enfermeira responsável para participar das atividades grupais, geralmente, de acordo com o nível de comprometimento físico e cognitivo. Nem todos os idosos participavam sempre de todas as atividades, o que variava de acordo com o estado de saúde do idoso naquele dia e de sua disposição para participar. Além de promover a interação social entre os idosos, o estágio também trouxe a possibilidade de criação de um espaço para acolhimento das questões individuais que não emergiam nas atividades grupais, assim como de um espaço permanente de contato com a equipe e com os familiares (realização de encontros 45 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento periódicos com a equipe e de reuniões com os familiares). Mesmo reconhecendo todas as dificuldades relacionadas ao processo de institucionalização, inclusive as mencionadas pelos próprios idosos (ficar longe da própria casa e da família e amigos; seguir uma rotina determinada por outros; conviver com pessoas desconhecidas, entre outras) crê-se que a mesma pode ser vivida de uma forma menos dolorosa ao se buscar a criação de um contexto que favoreça as potencialidades do idoso e seu desenvolvimento. É nesse sentido que o trabalho realizado buscou trazer suas contribuições, mostrando que a Psicologia tem muito a colaborar na intervenção com idosos institucionalizados. Como destacam Neri, Yassuda e Cachioni (2005), a Psicologia conta com “um conjunto de técnicas de diagnóstico, avaliação e intervenção voltadas ao tratamento dos problemas comportamentais e psicológicos que afetam o funcionamento e o bem-estar subjetivo dos idosos” (p. 19), podendo, assim, oferecer importantes contribuições para a qualidade de vida de idosos, sobretudo os funcionalmente debilitados. Palavras-chave: institucionalização, idoso, desenvolvimento, Psicologia LT02-950 - A RELAÇÃO ENTRE ESTILOS REFLEXIVOS E NARRATIVA EM IDOSAS Petra Paim Ehrenbrink - UFES [email protected] M. Lima de Souza - UFES [email protected] Laís Almeida Ambrósio - UFES [email protected] A queda da taxa de mortalidade e natalidade colabora para o envelhecimento da 46 população principalmente em países desenvolvidos. Estima-se que o Brasil, em 2025, terá a sétima maior população de idosos no mundo com cerca de 32 milhões de pessoas com 60 anos ou mais. O avanço da idade faz com que surjam doenças típicas da população idosa como a depressão, que, apesar de não ser uma doença exclusiva dessa faixa etária, tem sido apontada como um problema de saúde pública e afeta pelo menos um em cada seis pacientes idosos que recebem tratamento na atenção básica de saúde, nos pacientes depressivos há piora da saúde global, aumento de custos com a saúde, aumento de transtornos cognitivos, e mortalidade relacionada ao suicídio e a doença física. Por outro lado, estudos sobre os estilos de o processo reflexivo da consciência têm sugerido que determinados estilos de pensamento parecem estar associados a um funcionamento psicológico mais negativo, colaborando principalmente para o surgimento da depressão e de outras psicopatologias. Estudos constataram que internações psiquiátricas estão entre os dez principais motivos de internação em idosos. A ruminação é caracterizada por um tipo de pensamento repetitivo de caráter negativo que tende a exacerbar sintomas depressivos e ansiogênicos. A reflexão é um tipo de pensamento mais bem adaptado à resolução de problemas e pode amenizar o impacto negativo da ruminação. Acredita-se que pessoas do estilo reflexivo compreendem suas vidas de maneira positiva e sentem-se mais felizes. Neste sentido, investigar os estilos reflexivos da população idosa pode colaborar para um melhor entendimento dos processos psicopatológicos que acometem os indivíduos dessa faixa etária. Identificar os estilos reflexivos dos idosos e comparar com a VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento estrutura (forma e conteúdo) das narrativas sobre suas próprias vidas. Estudo qualitativo e exploratório com uma etapa de coleta de dados quantitativa. Participaram do estudo onze idosas com idades entre sessenta e dois e oitenta e três anos, que apresentaram condições de se expressar verbalmente através da escrita. Para a obtenção dos dados utilizamos o Questionário de Ruminação e Reflexão (QRR) e um protocolo de redação com o tema “Conte sua história”. A aplicação do instrumento foi realizadas individualmente na casa da participante. Inicialmente os dados foram tratados estatisticamente (média e desvio padrão). A partir dos escores fornecidos pelo QRR foram definidos os pontos de corte: Reflexivo alto= 42; Reflexivo médio= 39; Reflexivo baixo= 36; Ruminativo alto= 43; Ruminativo médio= 36 Ruminativo baixo= 29. Os idosos apresentaram cinco estilos de reflexividade: 1. Ruminativo baixo+Reflexivo médio (duas participantes) ; 2. Ruminativo médio+Reflexivo baixo (duas participantes); 3. Ruminativo médio+Reflexivo alto (três participantes); 4.Ruminativo médio+Reflexivo médio (três participantes); 5. Ruminativo alto+Reflexivo alto (uma participante). As narrativas apresentaram os estilos de gênero gramatical descritivo (predominância de substantivos e adjetivos na narrativa – ocorrência em cinco narrativas) quanto dinâmico (predominância de verbos e advérbios – cinco narrativas). Uma narrativa não teve predominância de nenhum dos dois estilos de gênero gramatical. Os temas abordados nas narrativas foram “breve relato sobre a história de vida”, “características pessoais”, “família”, “preocupação com os outros”, “religião” e a “importância em manter-se ativa”. Na categoria “breve relato sobre história de vida”. Participantes com altos escores no estilo ruminativo produziram narrativas que focalizavam características pessoais negativas como, por exemplo: “... Sou uma pessoa muito insegura... A ansiedade, muitas vezes me impede de viver feliz e fazer a felicidade dos outros.” Enquanto participantes com altos escores no estilo reflexivo produziram narrativas com características pessoais positivas como, por exemplo,” Gosto de ser quem eu sou por ter realizado minhas aspirações...” Esses dados confirmam nossas hipóteses de que pessoas com o estilo reflexivo compreendem sua vida de maneira mais positiva relatando sentirem-se mais felizes. Enquanto as de estilo ruminativo interpretam os acontecimentos de forma mais negativa. Sete participantes apresentaram o estilo reflexivo ruminativo médio ou alto. O estilo ruminativo por ter como característica um tipo de pensamento mais repetitivo, faz com que a pessoa rememore, e pense mais freqüentemente em acontecimentos do passado. Isto pode estar relacionado com o fato de cognitivamente idosos terem uma diminuição na capacidade de armazenamento de informações e memórias recentes, aumentando, assim, o uso da memória de longo prazo é a mais utilizada. Assim, acredita-se que os escores do estilo ruminativo na população idosa tenha sido mais alto. A terceira idade, é por muitas vezes, associada socioculturalmente como um período de sabedoria, formada por uma vida de experiências, esses indivíduos são vistos como pessoas sábias pela sua capacidade de lembrar de fatos, fazerem análises éticas e morais, e oferecerem soluções e alternativas para problemas cotidianos. Atividades estas, que exigem muita reflexão, análise e ruminação de algumas idéias, colaborando 47 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento também para um possível desenvolvimento do estilo ruminativo de reflexividade. Palavras-chave: Idosas; estilos reflexivos; narrativas. Contato: Petra Paim Ehrenbrink, UFES, [email protected] CO 16 - LT02 Novas tecnologias LT02-693 - GRUPOS FOCAIS ONLINE SÍNCRONOS EM PESQUISA QUALITATIVA: ASPECTOS COMUNICACIONAIS Gabriela Sagebin Bordini - UFRGS [email protected] Tania Mara Sperb - UFRGS [email protected] Financiamento: CNPq O grupo focal é uma técnica de coleta de dados que vem sendo largamente utilizada em pesquisa desde os anos 80, sobretudo como técnica de investigação qualitativa (Schneider, Kerwin, Frechtling & Vivari, 2002). Comumente, essa técnica é usada em seu formato tradicional, isto é, presencialmente. Sua utilização é usual principalmente entre os pesquisadores que têm interesse pela coleta de dados por meio da interação grupal (De Antoni et al., 2001). Este era o caso da pesquisa aqui relatada, cujo objetivo era conhecer as concepções de adolescentes sobre o que é ser homem e o que é ser mulher na atualidade. Tinha-se como base, o pressuposto de que os significados atribuídos ao masculino e ao feminino são culturalmente construídos e transmitidos socialmente através da interação (Diamond, 2002; Lou48 ro, 2004). Optou-se, então, por trabalhar com as narrativas produzidas por adolescentes em interação, mediante a realização de grupos focais em formato virtual, já que a internet vem sendo um dos contextos de interação privilegiados pelos adolescentes (Subrahmanyam, Greenfield, Kraut & Gross, 2001). Os chamados grupos focais online síncronos são grupos em que os participantes interagem via internet em tempo real (Walston & Lissitz, 2000). Esbarrou-se, contudo, na ausência de trabalhos científicos nesses moldes, na área da psicologia. Diante disso, foi necessário basear-se em alguns procedimentos utilizados por outras áreas da ciência, selecionando aquilo que se aplicaria aos objetivos da pesquisa em questão. Em relação às entrevistas virtuais, por exemplo, Nicolaci-da-Costa, Romão-Dias e Di Luccio (2009) sublinham que, comumente, as conversas online apresentam rupturas. Isso pode decorrer do intervalo que existe entre o envio de uma mensagem – que é realizado somente quando o participante terminou de redigi-la e optou por postá-la – e o recebimento da resposta relativa à mensagem enviada. Dado que, também nos grupos focais online síncronos, as participações de cada um dos membros iriam aparecer na tela de acordo com a ordem em que tivessem sido enviadas, e não seria possível interromper a escrita de cada um, esperava-se que a comunicação nesses grupos ficasse fragmentada. Provavelmente as discussões seriam descontínuas, intercaladas com outras discussões ou com outros assuntos. Por outro lado, Schneider et al. (2002) explicam que a alta velocidade em que se dá a postagem dos comentários escritos na comunicação virtual permite que a discussão não pare apenas porque um dos participantes está escre- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento vendo sua mensagem. Por isso, os componentes de grupos focais online síncronos, em comparação com aqueles dos grupos presenciais, fariam comentários mais curtos, emitindo pequenas frases simplesmente para expressar concordância com opiniões já apresentadas, propiciando uma discussão menos elaborada. Diante disso, esperavam-se dificuldades quanto à profundidade das discussões nos grupos focais online síncronos e em relação à obtenção de narrativas longas e individuais. O presente trabalho visa colaborar com o avanço da pesquisa qualitativa em psicologia no Brasil, por meio do relato e da discussão das especificidades comunicacionais encontradas nos grupos focais online síncronos realizados.Participaram 41 adolescentes com idades entre os 14 e os 15 anos, estudantes de uma escola estadual e de uma escola particular de Porto Alegre (RS), selecionados por conveniência. Com os adolescentes devidamente autorizados pelos responsáveis, foram realizados 6 grupos focais online síncronos, através do programa de bate-papo MSN, que possibilita conferências online. Todos os grupos tiveram 7 participantes, exceto um que contou com 6. Dois grupos foram compostos por adolescentes do sexo masculino, 2 por adolescentes do sexo feminino, e 2 eram mistos. Os grupos tiveram lugar na sala de informática das escolas em que os participantes estudavam e foram moderados pela pesquisadora. Esta e todos os adolescentes tinham um computador à sua disposição, conectado ao MSN. A discussão era realizada por escrito e iniciava com a questão de abertura, proposta pela moderadora: “Contem histórias que vocês acham que mostram bem o que é ser homem ou o que é ser mulher hoje.”. Os comentários e a identificação do participan- te que os fizera apareciam na tela de cada membro, de acordo com a ordem em que tinham sido postados. As interações nos grupos focais online síncronos foram discutidas com base na literatura já existente sobre o tema. A realização online dos grupos focais pareceu ter influenciado a produção dos componentes. Confirmando os apontamentos de Schneider et al. (2002), em geral, as participações foram curtas e os comentários, não muito elaborados e emitidos rapidamente. A comunicação entre o grupo mostrou depender da velocidade na qual cada componente era capaz de escrever suas mensagens e acompanhar as dos outros. Isso tornou difícil a manutenção de uma sequência de interações por parte do grupo, pois a comunicação não ocorria de maneira linear. Assim, também se confirmou a hipótese baseada em Nicolaci-da-Costa et al. (2009). A independência entre as participações dos componentes dos grupos realizados não foi vantajosa à elaboração de narrativas longas ou detalhadas. Ocorreu com frequência que, enquanto um participante escrevia uma mensagem mais longa ou em resposta a alguma mensagem postada anteriormente, outros já escreviam mensagens relacionadas a outros assuntos. As narrativas produzidas ao longo das discussões foram, na sua maioria, fragmentadas e entrecortadas por assuntos diversos do tópico proposto. Portanto, a utilização de grupos focais online síncronos não seria aconselhável quando o pesquisador pretende obter as tradicionais narrativas longas e sequenciadas. Este método seria mais adequado às investigações que têm como foco a interação entre os participantes. A pesquisa realizada mostrou que grupo focal online síncrono não é uma mera transposição do grupo focal presencial 49 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento para o ambiente virtual. Chamaram atenção as especificidades marcantes relativas à comunicação encontradas nessa técnica. Mais pesquisas são necessárias para que se conheçam essas particularidades e para que se possa esclarecer em que situações os grupos focais online síncronos são mais ou menos vantajosos, ou mesmo complementares aos grupos focais tradicionais. Palavras-chave: Grupos Focais Online; Pesquisa Qualitativa; Internet. Contato: Gabriela Sagebin Bordini (UFRGS) [email protected] LT02-958 - EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA ONLINE E DESENVOLVIMENTO HUMANO: INTERFACES E PERSPECTIVAS Jane Farias Chagas - FTBB/UnB [email protected] Um dos desafios inerentes a crescente demanda por cursos a distância na modalidade online consiste em garantir a qualidade de ensino por meio da incorporação de tecnologias de informação e comunicação, de novos processos espaço-temporais de interações que efetivamente sejam sustentados por teorias de aprendizagem e de desenvolvimento humano (Carvalho, Nevado & Menezes, 2005; Chagas, 2010). Nessa direção, Moraes (2002) chama a atenção quanto à necessidade de que os desenhos educacionais e as novas práticas pedagógicas reconheçam a natureza viva e transdisciplinar do processo de construção de conhecimento, a interatividade dos processos cognitivos e sejam capazes de recuperar a inteireza humana, os valores multiculturais e o respeito às diferentes maneiras de pensar. Ainda segundo Moraes (2002), a organização e planejamento 50 educacional e as relações estabelecidas entre os diversos componentes dos fluxos nutridores dos processos de aprendizagem e as trocas materiais e informacionais provocam mudanças estruturais de caráter postural, atitudinal e valorativo. Estas relações precisam ser mais congruentes com os princípios organizadores da vida, com a natureza dinâmica da matéria e da construção de conhecimento. Nesse sentido, o objetivo deste trabalho é descrever arquitetura de curso online com base no Modelo Bioecológico de Bronfenbrenner, considerando os componentes: pessoa, processo, contexto e tempo (Bronfenbrenner, 2005). A adoção desses pressupostos traz implicações para o planejamento de pesquisa, para o desenvolvimento de desenhos de cursos a distancia ou modelos educacionais. Do ponto de vista da pesquisa, ressignifica a relação entre pesquisador e pesquisado, requer análise do espaço de vida em termos de atividades, papéis e padrões de interação e a ampliação e triangulação de estratégias para sondar o conteúdo do campo psicológico. No âmbito educacional, os conhecimentos produzidos pela psicologia do desenvolvimento, especialmente os vinculados às teorias sistêmicas, têm contribuído para uma ampla discussão dos sistemas de ensino, os métodos e teorias de aprendizagem e promovido uma compreensão das particularidades dos processos educativos em interseção com o desenvolvimento humano e com a aprendizagem (Polônia & Senna, 2005). Desta forma, assumir uma postura ecossistêmica solicita repensar a relação professor-aluno, aluno-aluno, aluno-processo, entre outras, a partir da: (a) análise mais detalhada das atividades, papeis e relações em que esses atores se envolvem nos diversos ambientes ecológicos, (b) for- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento mulação ou reformulação do planejamento educacional a partir do mapeamento de características individuais e ambientais. É importante ressaltar que as mudanças produzidas nas concepções e/ou atividades da pessoa transferem-se para outros ambientes e outros momentos de vida. Ou seja, sugere considerar as triangulações interpessoais, a transição e validade ecológicas e as acomodações progressivas e mútuas entre um ser humano ativo, criativo, dinâmico e em desenvolvimento e as propriedades mutantes dos ambientes imediatos e distais (Chagas, 2008). Advém ainda, do emprego desses princípios, a necessidade de utilizar diferentes instrumentos e abordagem multimetodológica, currículos estruturados de acordo com as transições de desenvolvimento do indivíduo, o entendimento das mudanças no papel do aluno e do professor ao longo do curso de vida, os avanços tecnológicos e a práxis pedagógica (Polônia & Senna, 2005). Para Stokols (1999) diferentes contextos afetam de forma variada os processos de desenvolvimento, o que leva também a resultados divergentes. Isto significa que as condições ambientais encontram-se mediadas por atributos pessoais, pelas disposições circunstanciais e pelo estágio de curso de vida dos indivíduos envolvidos em processos de qualquer natureza, inclusive os educacionais. Esses resultados podem ser temporários, de curto ou longo prazo e exercem influência direta ou indireta sobre os processos de desenvolvimento, mesmo quando as condições ambientais transcendem o espaço geográfico. Sendo assim, a educação a distância na modalidade online exige tanto uma influência mútua ativa com os recursos tecnológicos e informacionais como também com eventos, informações e pessoas. Dinâmica que requer novos pa- drões de interação entre as pessoas e que fomenta uma gama variada de atividades desenvolvidas em mais de um ambiente ao mesmo tempo. Essa simultaneidade pode gerar tanto efeitos positivos quanto negativos. Entre os efeitos positivos cita-se o aumento da capacidade humana em lidar com um volume crescente de dados e como efeito negativo destaca-se o aceleramento e sobrecarga de informações. Essa estrutura e funcionalidade alteram as características dos processos distais e proximais que afetam o desenvolvimento. Várias tensões interpessoais e psicológicas podem surgir a partir das interações promovidas em um ambiente online que podem ser semelhantes ou não aquelas já conhecidas no mundo não-virtual. Contudo, torna-se relevante apontar que mesmo nos espaços de interação virtual, os participantes constroem um senso simbólico de espaço e lugar. Este cenário desafia as formas de organização educacional e os sistemas de crenças e valores dominantes (Stokols, 2005). Por outro lado, o envolvimento ativo em atividade molar constitui indicador do grau e da natureza do desenvolvimento. Nesse sentido, a atividade molar pressupõe comportamento continuado que possui um momento (quantidade de movimento, impulso) próprio e perceptível como portador de significado e intenção pelos participantes do ambiente. Isto posto, as interações em um ambiente de aprendizagem online, devem ser planejados de forma a permitir o engajamento em atividades significativas, intencionalmente elaboradas visando a construção de conhecimentos e o compartilhamento de experiências que promovam o desenvolvimento tanto intelectual, como afetivo e social. Ancorados nesta perspectiva, a aprendizagem e o desenvolvimento constituem 51 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento processos mediados pela participação da pessoa em padrões progressivamente mais complexos de atividades recíprocas, permeada por sentimentos positivos de mutualidade. Com isso, as propriedades da pessoa e do ambiente, as estruturas e funcionalidades dos cenários ambientais e dos processos que ocorrem dentro e entre os sistemas devem ser considerados como forma interdependente e analisados em rede. Os conteúdos das atividades molares possuem um alcance ampliado dependendo da quantidade de interações entre as pessoas, símbolos e objetos presentes em cada ambiente. A variedade, a qualidade e a quantidade de interações influenciam na durabilidade dos efeitos das aprendizagens ao longo do curso de vida. Palavras-chave: Educação a distância; Desenvolvimento Humano; Modelo Bioecológico; Arquitetura Educacional. Contato: Jane Farias Chagas, FTBB/UnB, [email protected] LT02-1208 - ANÁLISE DA RELAÇÃO ENTRE LINGUAGEM, COGNIÇÃO E INTERSUBJETIVIDADE NO CONTEXTO DA CIBERCULTURA COM BASE NA TEORIA DE VIGOTSKI Ruben de Oliveira Nascimento - UFU [email protected] Nesse trabalho discutiremos, com base em literatura especializada, a noção de que a interação social na Cibercultura traz consigo uma carga psicológica importante em nível de intersubjetividade, examinada a partir de contribuições da psicologia histórico-cultural de Vygotsky. Também analisa esse tema a partir da relação entre linguagem e processos cognitivos, como fatores 52 interligados favorecidos pela tecnologia. A relação entre sociedade e tecnologia sempre existiu de diferentes maneiras na história da humanidade, causando impactos no desenvolvimento humano. De uma perspectiva sociocultural, as novas tecnologias da informação e da comunicação são realizações atuais, exemplos contemporâneos do processo de humanização que sempre se apoiou, em cada época, em aparatos físicos (ferramentas) e culturais (símbolos, linguagem) para sua realização (Wertsch, 1995; Briggs & Burke, 2004; Cook, 2005; Vigotski, 2007). Nos dias de hoje, a Cibercultura é um exemplo do que acima apontamos. Pretto, Riccio e Pereira (2009) comentam que a Cibercultura é uma categoria do momento histórico atual, “que possibilita a associação do universo da cultura com o da comunicação e das tecnologias, especialmente as digitais” (p. 85-86). Para esses autores, “a marca principal é a liberação do pólo de emissão na comunicação, através da implantação das redes tecnológicas que potencializam a autoria e colaboração em rede” (Pretto, Riccio & Pereira, 2009, p. 85-86). Para esses autores, a interatividade que as novas tecnologias abarcam, dinamiza a difusão de mensagens, diminui fronteiras e auxilia na colaboração e atuação conjunta dos indivíduos, abrindo novas possibilidades de comunicação, interação, aprendizagem e práticas sociais. A Cibercultura trata de processamento de informação, o que implica em processos cognitivos. Segundo Fonseca (2007), cognição é um “sistema representacional com capacidade de sentir, integrar, pensar, comunicar e agir a partir de capacidades de processamento de informação” (Fonseca, 2007, p. 30-31). Mas, Fischer (2009) assinala que “a língua dá voz à ação humana, de maneiras com- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento plexas e sutis” (p. 219); e como cognição implica num sistema representacional, a linguagem acaba assumindo um papel importante, se observamos o conteúdo representacional, simbólico, de uma produção cultural digital (Costa, 2008). Fonseca (2007) explica que o desenvolvimento cognitivo não se dá somente pela autoregulação da estrutura, mas também pelo envolvimento do indivíduo em “sistemas de mediatização interindividual que se co-constroem em contextos sócio-históricos” (p. 36). A Cibercultura abarca essa noção e implica situações de intersubjetividade. A intersubjetividade tem importante papel nas relações sociais face a face (Berger & Luckmann, 2004). Mas, como acima mostrado, na Cibercultura ela possui a mesma importância psicológica, dado o caráter transcendente da linguagem (que independe de tempo e de espaço), e suas relações cognitivas. No uso de computadores, por exemplo, as interfaces permitem a mediatização tecnológica nas interações, e ainda afetam nossas formas de criar e comunicar. Segundo Johnson (2001), “os seres humanos pensam através de palavras, conceitos, imagens, sons, associações” (p. 17). O computador lida com representações e sinais, permitindo formas de interação à distância (Johnson, 2001). Nas redes sociais, as interações também assumem um caráter intersubjetivo muito importante na medida em que os indivíduos podem organizar suas ações em rede, em espaços mais informais (Marteleto, 2001). A psicologia histórico-cultural de Vygotsky traz importantes contribuições para essas discussões; entre elas a importância da mediação simbólica. Segundo Vygotsky, a mediação simbólica tem origem social e assume destaque na formação psicológica e na relação/ interação com pessoas, objetos, eventos, valores, crenças e atitudes culturalmente desenvolvidas e historicamente constituídas (Vigotski, 2001, 2007; Vigotski & Luria, 2007). Para Vygotsky (2007) era importante “entender o papel comportamental do signo em tudo aquilo que ele tem de característico” (p. 53). Vigotski (1991) afirma que o signo tem um papel importante nos processos coletivos, interpsicológicos, sendo meios de comunicação e de influência. Para Vygotsky (1991), “todo signo, si tomamos su origen real, es un medio de comunicación e podríamos decirlo más ampliamente, un medio de conexión de ciertas funciones psíquicas de carácter social.” (p. 78). De acordo com Vygotsky (1991a), a função de comunicação do signo endossa processos interpsicológicos, direciona a atenção, define papéis na comunicação e contribui para a internalização do que foi socialmente significado. A intersubjetividade, na perspectiva vigotskiana, está imbricada nesses fatores. Wertsch (1995) comenta que a intersubjetividade é um processo de comunicação humana que transcende o mundo privado dos participantes por meio da conduta comunicativa (situações de fala). Wertsch (1995) coloca que, na teoria vigotskiana, esse é essencialmente um processo semiótico numa dada situação. Entendemos que em interações sociais produzidas em ambientes virtuais, tais premissas são válidas, mas, queremos enfatizar suas possibilidades dialéticas. Nesse sentido, mencionamos Molón (2010) quando expõem a perspectiva de Smolka e colaboradores sobre intersubjetividade na teoria de Vygotsky, ao colocarem ênfase na relação dialética das dimensões intra e interpsicológica. Smolka e colaboradores comentam que “sendo a palavra e o sig53 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento no polissêmicos, a natureza e a gênese do processo de constituição do sujeito implicam, necessariamente, o diferente e o semelhante” (Molón, 2010, p. 58). Assim, entendemos que intersubjetividade numa perspectiva vigotskiana, envolve uma concepção interativa e semiótica de sujeito, constituída pelo outro via linguagem, como processos dialógicos, dialéticos e de significação, que não dicotomizam sujeito e social. Nesse sentido, a intersubjetividade ajudaria a constituir socialmente sujeitos e saberes, em atividades simbólica e cognitivamente formuladas. Segundo Fonseca (2007), a cognição “transformada na sua representação pela linguagem, dotou o ser humano da capacidade de raciocínio e de resolução de problemas” (p. 34). A Cibercultura é um ambiente onde essa premissa ocorre, utilizando-se as ferramentas que ela contém. Concluímos que a intersubjetividade no contexto virtual, na Cibercultura, pode diferir em alguns índices ou esquemas comunicacionais daqueles praticados face a face, porém mantém efeitos psicológicos semelhantes, porque se vale do caráter transcendente da linguagem e de processos cognitivos em comum, conseguindo realizar a passagem do privado para o coletivo, que é um aspecto marcante da intersubjetividade. Essas questões têm influência nos processos de desenvolvimento psicológico e social dos sujeitos no contexto tecnológico atual. O importante é examinar criticamente como as pessoas estão interagindo no ciberespaço, que construção social/interpessoal vem se formando e como têm sido objetivadas as percepções sociais dos sujeitos nesse contexto. Palavras-chave: Cibercultura; Intersubjetividade; Vygotsky. 54 LT02-1408 - AS RELAÇÕES ENTRE PROFESSOR-ALUNO NA EAD A PARTIR DA CONSTRUÇÃO DE CONHECIMENTO E DESENVOLVIMENTO DAS FUNÇÕES PSICOLÓGICAS Angélica de Fátima Piovesan - UNIT [email protected] Fabricia Borges - UNIT [email protected] Salete Peixoto - UNIT [email protected] Neste trabalho iremos discutir as relações de interação entre professor-aluno na Educação a Distância. Para isso, utilizaremos a Psicologia Histórico-Cultural através de Vigotski. Também, usaremos o conceito de “Inteligência Coletiva” desenvolvido por Pierre Levy, filósofo da informação que estuda as interações entre internet e sociedade. Sabemos que a construção destes conceitos e seus significados são distintos, construídos e estudados em épocas e contextos diferentes, no entanto, acreditamos que podemos relacioná-los para entender a construção de conhecimento e o desenvolvimento das funções mentais superiores através do uso das tecnologias. Vigotski desenvolveu sua teoria descrevendo como o indivíduo se constrói como ser humano a partir das relações sociais, entre o Eu-Outro e essas relações permitem que haja uma reconstrução interna (intrapessoal) de uma operação externa (interpessoal). Esse processo de internalização das formas culturais de comportamento se aplica à atenção voluntária, à memória lógica e formação de conceitos com base nas operações com os signos. No entanto, podemos dizer que as funções psicológicas superiores se originam das relações sociais e que as atividades cognitivas não se limitam ao uso de signos e instrumen- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento tos. Os signos são representados pela linguagem oral e gestual, pela escrita, pelos números, não modificando o objeto das operações psicológicas, mas dirigindo-se para o controle do próprio individuo. Já os instrumentos sofrem mudanças humanas sobre o objeto e são orientados externamente. As relações dialéticas entre as funções psicológicas percepção, atenção e as operações sensório-motoras são afetadas pelo uso de instrumentos quando relacionados à fala, auxiliando no desenvolvimento das funções psicológicas. A partir do entendimento do desenvolvimento das funções psicológicas, vamos tratar do uso das tecnologias no desenvolvimento psicológico. Lévy (2007) criou o termo “Inteligência coletiva”, onde as inteligências individuais são somadas e compartilhadas por toda a sociedade a partir do surgimento das novas tecnologias possibilitando trocas de conhecimento e aprendizagens coletivas. "Ela possibilita a partilha da memória, da percepção, da imaginação. Isso resulta na aprendizagem coletiva, troca de conhecimentos". Só existe “Inteligência Coletiva” se houver cooperação competitiva (relacionada às relações sociais) ou competição cooperativa (relacionada à liberdade). Fazendo uma relação entre os conceitos de Vigotski e de Levy utilizados neste trabalho, podemos dizer o seguinte: o desenvolvimento das funções psicológicas superiores pode ocorrer a partir da internalização de aprendizagens, da mediação semiótica nas interações professor-aluno e o uso de tecnologias interfere no processo de desenvolvimento da Zona de Desenvolvimento proximal (ZDP) mediado pelo professor quando abordamos a EAD. O professor propicia a aquisição de novos conhecimentos ao aluno através de atividades desenvolvidas nos ambientes virtu- ais de aprendizagens (AVA). Consideramos que o uso de tecnologias possibilita o desenvolvimento das funções psicológicas como também contribui para a formação da “Inteligência Coletiva”. Nosso objetivo foi identificar e descrever os significados construídos nas narrativas de dois professores da Educação a Distância em relação às interações professor-aluno mediadas pelo uso de tecnologias na EAD. Esse trabalho é um recorte de uma pesquisa realizada com professores de EAD de uma universidade privada de Aracaju, SE. As entrevistas narrativas e de histórias de vida foram gravadas, transcritas e realizadas na própria instituição de ensino. Após as transcrições construímos o mapa de significados para cada professor por meio do qual identificamos e descrevemos os significados construídos a partir das entrevistas sobre as interações entre Professor-aluno na Educação a Distância. Nas entrevistas os professores nos contaram sobre as novas experiências obtidas nas relações professor-aluno mediadas pelo uso de tecnologias. Para um deles não há como falar da Educação a distância sem comparar com o ensino presencial por causa do contato físico, visual existente no presencial. Uma forma de esse contato ocorrer na EAD é a partir da maior dedicação do professor ao aluno, dando mais atenção para que ele aprenda, identificando e re-significando formas de ser e agir no processo dialógico com o aluno. Também foi narrado sobre o desenvolvimento de relações de afetividades a partir do uso de emails, chats e fóruns, como nos contou um dos professores que recebeu emails de agradecimentos pelo aprendizado. Para ele, é um reconhecimento que muitas vezes não acontece no ensino presencial. Outro ponto refere-se a melhora 55 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento do desempenho profissional na educação presencial. Isso ocorre devido a maior dedicação prestada ao aluno e a necessidade de melhor planejamento das aulas na EAD. A consideração do Ambiente Virtual como um “ambiente frio” também é central nas narrativas, por isso enfatizam maior dedicação ao aluno. Esses discursos permeiam o imaginário dos professores possibilitando transformação no modo de dedicar-se ao aluno como também, propiciam maior interação e afetividade, que é tema central abordado pelos professores na melhoria da relação professor-aluno. Diante destas narrativas percebemos que a interação professor-aluno na EAD é marcada pelo desenvolvimento de novas formas de relacionamentos tanto para o professor como para o aluno. Palavras-chave: Interação Professor-aluno, Inteligência Coletiva, Educação a Distância. Contato: Angelica de Fatima Piovesan, Universidade Tiradentes, UNIT, Mestranda em Educação, bolsista PROSUP CAPES. Integrante do Grupo de Estudos GPECS. [email protected] LT01-859 - INTER-RELAÇÕES ENTRE DESENVOLVIMENTO HUMANO E EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA NA PERSPECTIVA DA APRENDIZAGEM Ruben de Oliveira Nascimento - UFU [email protected] A Educação a Distância (EAD) é uma modalidade educacional recente no Brasil, que vem crescendo bastante nos últimos anos. Esse crescimento deve vir acompanhado de muita pesquisa e discussão sobre seu processo ensino-aprendizagem. 56 A EAD é realizada por meio de tecnologia da informação e da comunicação; com os sujeitos separados temporal, espacial e fisicamente; com destaque em processamento de informação, interatividade/ interação e produção escrita, entre outros (Moore e Kearsley, 2008; Dias e Leite, 2010; Menezes, 2010). Como qualquer processo educacional a EAD tem relação com fatores de desenvolvimento cognitivo, afetivo e social de seus sujeitos. Por isso, nosso objetivo com este estudo é apontar teoricamente que a Psicologia pode contribuir com a EAD também investigando variáveis de desenvolvimento humano dos sujeitos que ela atende, em seu contexto educacional. Um caminho para isso é analisar o perfil do estudante de EAD. De acordo com o Censo EAD 2009, a idade dos alunos na EAD, “concentra-se na faixa etária de 25 a 39 anos, a maioria dos estudantes possui renda média de 1 a 10 salários, sendo que o grupo mais representativo (29%) recebe de 1 a 3 salários mínimos mensais” (p. 23). Além disso, o Censo EAD 2009 aponta que “apesar de um perfil diversificado, os estudantes de EAD não são constituídos por uma maioria de jovens recém-saídos do ensino médio” (p. 23). Ferreira e Mendonça (2007) mostram que a maioria dos alunos de EAD é de profissionais em atividade produtiva, casados, e que buscam a EAD para aumentarem seus conhecimentos. Nesse sentido, “os cursos a distância são uma maneira que as pessoas encontram de ficarem informadas e ainda assim dispor de tempo para a família, visto que podem acessar os cursos até mesmo de suas residências” (Ferreira e Mendonça, 2007, p. 7). O aluno de EAD também precisa “se empenhar em definir horários fixos de estudo em casa e/ou no trabalho para se VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento dedicar ao curso e ter disciplina para tal” (Behar, 2009, p. 26). Pela faixa etária dos alunos, podemos situá-los na fase inicial da vida adulta (Papalia e Olds, 2000). A definição de adulto somente pelo fator idade é uma questão complexa, porque o desenvolvimento depende de diversos fatores físicos e psicológicos que variam de indivíduo para indivíduo, e entre contextos socioculturais (Rogoff, 2005; Feldman, Papalia e Olds, 2009). Mas, o fator idade ajuda a situar estatisticamente os alunos de EAD num determinado momento do desenvolvimento, cujas características gerais permitiriam pensar sobre as outras variáveis do perfil. Assim, uma inter-relação entre EAD, desenvolvimento humano e aprendizagem, pode ser notada, especialmente se tratarmos a EAD como meio para formação continuada ou atualização profissional. Abordando formação continuada com alunos adultos, Alvarado Prada (1997) assinala que “o que caracteriza as pessoas adultas são suas experiências, sua história de vida, seus saberes” (p. 76). Papalia e Olds (2000) comentam que o aluno adulto costuma empregar mais a experiência de vida, enriquecendo com isso sua aprendizagem. Para o aluno adulto no contexto social atual, a aprendizagem formal continuada “é uma maneira importante de desenvolvimento de seu potencial, bem como de acompanhar as mudanças no mundo do trabalho” (Papalia e Olds, 2000, p. 453). Assim, o aluno de EAD, adulto, trabalhador, casado, tem prerrogativas pessoais e sociais que podem representar boa parte de sua motivação para os estudos e o que espera deles. Segundo Tapia e Garcia-Celay (1996), a motivação na aprendizagem envolve “que tipo de metas os alunos perseguem, de que modo influem em seu comportamento e que variáveis contextuais influenciam para que se perceba, em um dado momento, a consecução de algumas como sendo mais viáveis do que outras” (p. 162). Motivação é um componente pedagógico fundamental na EAD. Paralelo a isso, a Andragogia (ensino de adultos) considera que os alunos adultos apreciam ter certo controle e responsabilidade pessoal sobre o que está acontecendo; preferem definir o que é relevante para suas necessidades; preferem tomar decisões sozinhas ou pelo menos serem consultados; têm muita vivencia e gostam de utilizá-la no aprendizado; preferem adquirir informações ou conhecimento relevantes para resolver problemas no presente; geralmente tem motivação intrínseca para aprender (Moore e Kearsley, 2008, p. 173-174). Essas características podem ter impacto no processo de aprendizagem na EAD, que valoriza muito a autonomia do estudante frente ao seu programa de formação. Segundo Moore e Kearsley (2008) autonomia do aluno de EAD significa que o mesmo deve tomar decisões a respeito de seu aprendizado, organizando os recursos disponibilizados. Contudo, toda autonomia é relativa. Assim o sistema também tem responsabilidades com essa autonomia, e compreender aspectos relacionados ao desenvolvimento humano e à aprendizagem, contribui nesse sentido. Em termos de psicologia da aprendizagem, Bransford, Brown e Cocking (2007) mostram que conhecimentos, habilidades, crenças e conceitos prévios influenciam o modo como se percebe um ambiente educacional e a organização do conhecimento. Essas questões afetam as “capacidades de recordação, raciocínio, solução de problemas e aquisição de novo conhecimento” 57 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento (Bransford, Brown e Cocking, 2007, p. 27), de modo que aprender é mudar. Carvalho (1996) também mostra que desenvolver é mudar. O adulto continua seu processo de desenvolvimento, aprendendo, vivendo mudanças e estabelecendo metas e possibilidades. A EAD deve assimilar essas discussões ao seu contexto educacional, mas não para simplesmente adequar o aluno ao seu processo pedagógico. Segundo Vigotski (2003) a educação não deve somente comunicar hábitos e conhecimentos, mas promover a “formação de vários vínculos novos dentro de um sistema de comportamento previamente formado” (Vigotski, 2003, p. 82). Para Vigotski (2003), “deve-se considerar como característica da educação o momento de não-consolidação, de fluidez do crescimento e de mudanças originais no indivíduo” (p. 82). Assim, defendemos que na EAD deve-se promover uma “aprendizagem que passa à frente do desenvolvimento e o conduz” (Vigotski, 2001, p. 332). Essa perspectiva pode ajudar na discussão dos modelos de formação em EAD. Neste trabalho consideramos alguns aspectos gerais da vida adulta que não esgotam a discussão colocada, porém, indicam que o processo de aprendizagem na EAD tem, em especial, uma inter-relação com fatores do desenvolvimento humano a ser considerada pedagogicamente em seu contexto educacional. Palavras-chave: Aprendizagem, Desenvolvimento, Educação a Distância. 58 CO 31 - LT4 Cognição e Aprendizagem LT04-723 - INVESTIGANDO O DESENVOLVIMENTO SOCIOCOGNITIVO INFANTIL Jaqueline Pereira Dias - USP [email protected] Edna Maria Marturano - USP [email protected] Financiamento: CAPES O desenvolvimento sociocognitivo compreende o conhecimento sobre o mundo social; o pensar sobre as pessoas, o que elas fazem ou deveriam fazer e como elas se sentem. (Rodrigues & Tavares, 2009) De acordo com Bee (2003) tais conhecimentos envolvem processos e mecanismos da cognição social. A referida autora ressalta que a compreensão da criança em relação a ela mesma, as pessoas e os seus relacionamentos sociais reflete ou baseia-se em seu desenvolvimento cognitivo geral. Para tanto, aponta que a criança mais jovem direciona-se sua atenção a características externas das situações, enquanto as crianças com mais idade buscam as causas (princípios internos); as crianças pequenas tiram conclusões por meio de suas observações, enquanto as crianças mais velhas já são capazes de realizar inferências. Tais dimensões de mudança caracterizam, também, um desenvolvimento natural da cognição social (Bee, 2003). Segundo Fenning, Bake e Juvonen (2011) para se investigar a cognição social teóricos da área recorrem ao modelo do processamento da informação social, que esclarece como as informações são processadas e organizadas em uma situação VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento social. O modelo que tem evidenciado mais resultados empíricos é o de Dodge e Crick (1994); por meio do modelo em questão é possível compreender como a informação social se processa. Teglasi e Rothman (2001) aplicaram o modelo à exploração do conteúdo de histórias infantis, com base em seis passos mentais que se expressam nas seguintes questões: - o que está acontecendo? - o que os personagens estão pensando e sentindo? - quais são as intenções e metas dos personagens? - o que os personagens alcançam com suas ações? - como os personagens executam e monitoram seus comportamentos? - quais as lições aprendidas? No presente estudo, os seis passos do processamento da informação social propostos por esses autores são empregados para avaliar o desenvolvimento sociocognitivo de crianças. Seu objetivo é verificar se há diferenças desenvolvimentais na qualidade das respostas de crianças pré-escolares e escolares, ao serem questionadas, com as seis perguntas exploratórias, sobre uma história infantil rica em pistas sociais. Método – Sujeitos - Participaram do estudo 49 crianças, 19 crianças de 5-6 anos, pertencentes a uma escola de educação infantil e 30 crianças de 8-9 anos, pertencentes a uma escola de ensino fundamental. Ambas as escolas são de rede pública e situam-se em uma cidade do interior de Minas Gerais. Materiais e procedimentos - Para a investigação sociocognitiva selecionou-se um livro de história infantil, rico em pistas sociais, pertencente à pesquisa de Rodrigues e cols. (2007). A fim de sistematizar a investigação foi elaborado um roteiro de aplicação, estruturado em 80 perguntas, que visa explorar e discutir o conteúdo da história. Para a seleção das perguntas mais pertinentes a investigação realizou-se uma análise textual e das ilustrações do livro selecionado para o levantamento dos indicadores verbais e visuais de pistas sociais, internas e externas, em cada página. Com base nessa análise, as perguntas para a sondagem sociocognitiva foram organizadas em categorias de acordo com os seis componentes propostos por Teglasi e Rothman (2001). Sendo assim, tem-se 23 itens investigando o que está acontecendo; 24 itens investigando o que os personagens estão pensando e sentindo 12 itens investigando as metas e intenções dos personagens; 6 itens para o que os personagens alcançam com suas ações; 12 itens para como os personagens executam e monitoram seus comportamentos; e 3 itens para as lições aprendidas. Para a investigação propriamente dita, cada criança era retirada, individualmente, da sala de aula e participava da leitura-dialogada da história com base no roteiro de perguntas. A avaliação, com duração média de 20 minutos, era gravada e posteriormente transcrita para a análise de dados. Após todas as avaliações transcritas, realizou-se uma junção de todas as respostas a cada item, tanto para crianças de 5-6 anos quanto para crianças de 8-9 anos. As respostas foram organizadas em níveis de reflexão sócio-cognitiva estabelecidos por três juízes mediante consenso. Resultados - Para o componente o que está acontecendo? Em que a investigação direciona-se para a codificação e interpretação das pistas sociais, nota-se que as crianças de 8-9 anos captam mais pistas se comparadas às crianças de 5-6 anos. Estas últimas também são capazes de decodificar pistas e algumas delas apresentam respostas ricas em detalhes, no en59 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento tanto as crianças de 8-9 anos destacam-se na qualidade da respostas. A referida observação vai ao encontro das informações apontadas por Bee (2003) em que o pensar na infância altera-se com o desenvolvimento. Em relação ao componente o que os personagens estão pensando e sentindo? Nota-se que as crianças pequenas apresentam um vocabulário restrito de nomeação de sentimentos. Além disso, em algumas situações tais crianças fazem referência a uma situação e não a um sentimento; já as crianças mais velhas, de um modo geral, são capazes de nomear sentimentos e discriminá-los coerentemente a historia. Ao investigar metas e intenções, terceiro componente, observa-se que as crianças mais velhas apresentam respostas mais completas, no entanto as crianças pequenas são capazes de identificar corretamente a meta/intenção presente na cena. Ao se explorar a elaboração de alternativas de resolução de problemas para o personagem, as crianças mais velhas apresentam soluções mais consequenciadas. Para a investigação de resultados alcançados, quarto componente, e monitoramento e execução de comportamentos, quinto componente, muitas das crianças, incluindo ambas as idades, compreendiam o que estava sendo questionado, porém as crianças mais velhas apresentaram respostas mais detalhadas, apontando maior compreensão. Em relação ao último componente, quais as lições aprendidas, observa-se que a maioria das crianças mais velhas foi capaz de compreender a história como um todo, extraindo lições pertinentes do livro. Já as crianças mais novas, geralmente, ficaram presas aos acontecimentos da história, não sendo capazes de extrair as lições e transpô-las para a vida cotidiana. Tal fato 60 corrobora a afirmação de Bee (2003) de que crianças pequenas se prendem a observações e crianças mais velhas já estão aptas a realizarem inferências. O roteiro de investigação se mostrou sensível para a avaliação sociocognitiva. As crianças mostraram-se interessadas pela história e os resultados encontrados são corroborados pela literatura do desenvolvimento infantil. Palavras-chave: desenvolvimento sociocognitivo; infância, história infantis. LT04-970 - GRUPOS DE CONVIVÊNCIA: RELAÇÃO ENTRE CONCEITOS COTIDIANOS E CIENTÍFICOS Camila Lima Nascimento - UNICAMP [email protected] Cecília Guarnieri Batista - UNICAMP [email protected] O processo de desenvolvimento infantil, mais especificamente, referente a crianças com queixas de alterações no desenvolvimento e/ou dificuldades escolares, pode sofrer influências negativas, advindas dos efeitos das repetidas histórias de fracasso nas tarefas educacionais. Uma das possibilidades de redução desses problemas é a participação da criança em projetos de educação não formal, em grupos de convivência. Essa participação pode favorecer interações em que predominem momentos de aquisição e troca de experiências entre os participantes, permitindo a exploração de capacidades e o desenvolvimento de competências com diferentes propostas, como projetos voltados para a formação de conceitos. Cavalcanti (2005) destaca a formação de VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento conceitos como sendo um processo criativo, que se orienta para a solução de problemas e que depende, fundamentalmente, da experiência, na qual a apropriação de significados depende do contexto, da atividade e da participação do indivíduo. Oliveira, Chaves e Alves (2006) afirmam que a formação de conceitos depende de um movimento coletivo, trazendo a importância do contexto grupal, com flexibilidade nas atividades propostas, baseada na percepção dos comportamentos e conhecimentos trazidos pelos participantes. Vygotsky diferencia os conceitos aprendidos nas interações cotidianas (cotidianos) daqueles adquiridos no contexto escolar (científicos) e os relaciona, afirmando que os cotidianos conferem sentido aos científicos, por terem significados emocionais e pessoais (Van der Veer & Valsiner, 2001). Dessa forma, fundamenta as afirmações segundo as quais a formação de conceitos pode ser facilitada por um contexto de grupo em que adultos encorajem o estabelecimento de relações entre vivências do cotidiano e conhecimentos formais. Gerhardt (2010) destaca dois aspectos relacionados ao processo de formação de conceitos: o descolamento da realidade imediata e a articulação entre conceitos. Para a autora, o aprendizado consiste na formação de um espaço emergente, resultante do encontro dos processos individuais e ambientais em um momento único. O processo de aprendizado deve ser apresentado como uma realidade a ser construída (envolvendo conceitos científicos), baseada nas realidades já conhecidas (conceito cotidianos), permitindo que ambas as realidades sejam percebidas e conceptualizadas pelo sujeito em desenvolvimento. O objetivo do presente trabalho é apresentar um estudo sobre formação de conceitos, realizado com crianças que apresentam dificuldades escolares em grupos de educação não formal, buscando identificar exemplos de apropriação de conceitos científicos, com base na análise da dinâmica das interações entre adultos e crianças. Os dados apresentados foram selecionados do conjunto de filmagens das atividades desenvolvidas em grupos de convivência, constituídos por crianças com queixas de dificuldades escolares e, a maioria, com diagnósticos de alterações orgânicas no desenvolvimento. Os encontros eram semanais, realizados em um serviço de saúde de uma universidade pública, com duração de 60 minutos, sendo coordenados por uma equipe envolvendo docentes e estudantes de pós-graduação. A atividade dos grupos era fundamentada em proposta de educação não-formal, envolvendo o desenvolvimento de projetos temáticos (Batista & Laplane, 2007). Participaram do estudo quatro crianças com faixa etária entre doze e catorze anos, matriculadas em escolas regulares. O projeto foi aprovado por Comitê de Ética, e os pais assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. A coleta de dados consistiu na transcrição das sessões do estudo dos Solos, que foi parte do projeto temático “Geografia do Brasil”, das quais foram recortados episódios significativos (Pedrosa & Carvalho, 2005). As sessões envolveram demonstrações práticas, aula teórica com especialistas, estudo de campo, jogos de tabuleiro com tarefas relacionadas aos conteúdos apresentados, atividades de leitura e escrita permeadas por diálogos, incentivando os relatos das crianças participantes, cujos nomes apresentados são fictícios. A análise consistiu no levantamento dos conhecimentos que as crian61 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento ças já tinham previamente e dos indicadores de apropriação de conhecimentos pelas crianças, buscando problematizar a identificação de articulação de conceitos e descolamento da realidade imediata, na construção de conceitos cotidianos e científicos. Como parte dos resultados, um dos episódios do estudo é apresentado para exemplificar a análise realizada, o Episódio 3-3, em que o adulto apresenta questões relacionadas a noções já apresentadas. Cecília (ad): O que estraga o solo? Evandro: Produtos químicos, matadores de insetos artificiais. Camila explica o perigo dos pesticidas e agrotóxicos e continua as perguntas. Camila (ad): Por exemplo, quando chove muito e não tem planta em cima? O que acontece com o solo? Tamara: Entra dentro. (referindo-se ao deslocamento do solo) Camila (ad): A professora mostrou uma foto, vocês lembram? O que aconteceu com a estrada que estava em cima do solo? Tamara: Rachou. Celso: Rachou. Nesse episódio, o adulto retoma uma pergunta apresentada duas aulas antes (1). Evandro responde com elementos não apresentados em aula (2). O adulto expande a resposta e detalha mais a pergunta inicial (3). Tamara inicia a resposta (4) e o adulto concorda e completa, fazendo referência à aula expositiva (5). Então, Tamara (6) e Celso (7) respondem, apropriadamente. Considera-se que, no episódio, as crianças participaram de forma a con62 tribuir para a articulação entre diferentes eventos, todos relacionados aos “danos ao solo”, tendo o adulto atuado de forma a propiciar essa busca de articulação. Os episódios analisados permitiram identificar exemplos de apropriação de conceitos científicos pelas crianças, muitas vezes, enunciados de forma não canônica e relacionados a conceitos cotidianos. A partir dos estudos apresentados foram permitidas reflexões acerca das competências e capacidades das crianças participantes. Observou-se que a apropriação dos conceitos nem sempre é completa, mas, foram evidenciadas construções e apropriações por parte das crianças, sendo que cada criança apresentou sua própria maneira de demonstrar a apropriação de um conceito. A participação dos adultos mostrou-se importante, uma vez que as crianças apoiaram-se, constantemente, nas relações por eles apresentadas entre as experiências cotidianas e os conceitos apresentados, durante o processo de elaboração de conceitos. Desta forma, os dados indicaram capacidades e competências nas crianças participantes, cada uma a seu modo. Foi possível, assim, evitar a cristalização de incapacidades e queixas, possibilitando mudanças significativas nas formas de lidar com o aprendizado da criança e contribuindo para o seu desenvolvimento. Palavras-chave: desenvolvimento humano, necessidades especiais, grupos de convivência Contato: Cecília Guarnieri Batista, UNICAMP, [email protected] VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento LT04-1319 - INFLUÊNCIAS DO AMBIENTE NA PERCEPÇÃO DE APRENDIZAGEM NUMA SALA DE AULA DE IDIOMAS: BREVES CONSIDERAÇÕES A PARTIR DE UMA INVESTIGAÇÃO EM PSICOLOGIA AMBIENTAL Rodolfo Luís Leite Batista - UFSJ [email protected] Aliene Cássia Carvalho Gonçalves - UFSJ [email protected] Tatiane Rose Oliveira de Mendonça - UFSJ [email protected] Larissa Marinho Medeiros dos Santos DPSIC/UFSJ [email protected] É apresentado o estudo de caso acerca da influência causada pelo ambiente na percepção de aprendizagem de uma língua estrangeira – LE – entre os alunos de um projeto de extensão do Departamento de Letras, Artes e Cultura da Universidade Federal de São João del-Rei (DELAC/UFSJ). Os trabalhos foram conduzidos pelos autores durante o primeiro semestre de 2011 e apontam novas possibilidades de compreensão acerca de uma sala de ensino de LE a partir dos conhecimentos provenientes da Psicologia Ambiental. Tal estudo objetivou investigar a influência do ambiente em uma sala de ensino de idiomas mediante a realização de modificações acarretadas pelo uso de multimídias e modificações na disposição física da sala, principalmente, o posicionamento do professor e a disposição das cadeiras. Assim, buscou-se identificar a importância de diferentes meios didáticos para aprendizagem de uma língua estrangeira na percepção dos próprios alunos. Foi realizada breve revisão de literatura que pudesse amparar as modificações realizadas e subsidiar teoricamente o trabalho desenvolvido. Sendo a Psicologia Ambiental o campo da ciência psicológica cujo foco de estudo é a influência do ambiente na subjetividade e comportamento humanos (Moser, 1998; Sager, Sperb, Roazzi & Martins; 2003), compreende-se que ela surge enquanto possibilidade de compreensão da realidade de ensino-aprendizagem nas salas de aula de LE. Compreendendo que cada ambiente pode oferecer variados aspectos de influências ao comportamento humano (iluminação, temperatura, ruídos, sensação de aglomeração e apinhamento, por exemplo), optou-se por investigar a percepção dos alunos sobre a influência do ambiente em sua aprendizagem de uma língua estrangeira. Segundo Tuan (1980), o estudo da percepção permite compreender a ambiência, uma vez que elas envolvem características individuais – que variam conforme a idade, sexo, gênero e história de vida – e relacionadas à situação investigada. O processo de coleta de dados foi dividido em três grandes etapas: assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, uma série de observações e aplicação de um questionário semiestruturado. As aulas observadas classificadas da seguinte maneira: a) aulas expositivas e com carteiras dispostas em fila (consideradas como de situação natural e utilizadas como base para comparações); b) aula com atividades realizadas em duplas; c) aula com utilização de mídia auditiva na língua estrangeira; d) aula com audição de música; e) aula com atividade realizada em círculo sem uso de multimídia; f) aula em semicírculo, e g) aula com uso de vídeos. As observações foram realizadas com foco na participação dos alunos, sendo contabilizadas as interações entre aluno-aluno, aluno-professor e professor-aluno com utilização da LE. Cada sessão durou noventa minutos, período de dura63 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento ção da aula. A aplicação do questionário se fez após a realização da série de oito observações, sendo ele construído tendo em vista que o ambiente é vivenciado como campo unitário que se dá abaixo do nível de consciência, isto é, nem sempre é experienciado de modo que o percebamos. O questionário foi composto de doze itens, aos quais os voluntários deveriam pontuar em uma escala crescente de um a doze, indicando as alterações que mais afetaram seu processo de ensino-aprendizagem. Ao serem retomadas as discussões acerca do processo de ensino-aprendizagem de LE, deve ser ressaltado que tal processo se constitui como uma relação dinâmica e dialógica, ou seja, um acontecimento inédito a cada instante, que se modifica constantemente e é marcado pela interação de duas vias. Professores e alunos entram em contato ao abordarem o conhecimento. Enquanto relação, o processo de ensino-aprendizagem se revela como um processo de natureza complexa, marcado pela afetividade e pela motivação, que precisa ser compreendido uma vez que repercute no desenvolvimento dos indivíduos (Miccoli, 2010). Já quanto ao uso de multimídias nas salas de idiomas, Tondelli, Francisco, Reis e Sousa (2005) afirmam que seu uso é recente. Desta forma, gradativamente, a utilização de recursos didáticos que não a tríade lousa-livro-giz vem sendo substituída: os exercícios orais de repetição foram abandonados em função de uma abordagem comunicativa, pautada pelo ensino de quatro habilidades – escuta, fala, leitura e escrita – e com foco na interação entre professor e alunos na sala de aula através de trabalhos em duplas ou em grupos e situações simuladas com uso da LE. Esse avanço culminou com o uso do computador e da internet como recursos 64 tecnológicos na sala de idiomas, criando a possibilidade da interação em situação real de comunicação (Tondelli et al., 2005). Portanto, hoje o ensino-aprendizagem não é um evento que dá primazia à figura do professor ou dos livros do mestre (Miccoli, 2010). No entanto, o uso de multimídias ou modificações no ambiente da sala de aula não pode ser utilizado de modo arbitrário. Desta forma, Miccoli (2010) afirma que para que o professor atue como facilitador no processo de aprendizagem é necessário que ele conheça seus alunos e os diferentes métodos para definir o melhor caminho a ser trilhado. O domínio da língua estrangeira se fará de modo gradual, passando por um processo de refinamento até a obtenção da fluência ambicionada. Ao final do trabalho empreendido, aponta-se que, de maneira geral, os alunos consideraram a audição de mídias na língua estrangeira e conversação como os aspectos mais influentes na aprendizagem; aspectos referentes ao ambiente físico não foram mencionados como influências importantes na sala de aula; mudanças na ocupação do espaço físico da sala não influenciaram na interação nas categorias consideradas. Considera-se que a fim de otimizar o processo, cabe ao professor oferecer diferentes oportunidades de aprendizagem aos seus alunos. Portanto, é importante que haja uma integração dos meios disponíveis, com atividades que sejam do interesse dos alunos e que se aliem às técnicas pedagógicas, para a obtenção de um ambiente propício ao ensino-aprendizagem. Palavras-chave: Psicologia Ambiental, Ensino de Língua Estrangeira, Sala de aula. Contato: Rodolfo Luís Leite Batista, Universidade Federal de São João Del Rei, [email protected] VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento CO 35 - LT05 Relações Familiares 1 LT05-762 - CONJUGALIDADE E OS DESAFIOS DA CONTEMPORANEIDADE Camila Ferrari - UCSAL [email protected] Cristiane Cavalcanti - UCSAL [email protected] Juliana Orrico - UCSAL [email protected] Encontrar alguém para compartilhar a vida e ter filhos parece ser uma busca incessante, já que esta passagem configura-se como um rito significativo em muitas sociedades. Tal união é bastante cultivada em nossa cultura, seja pela profundidade e intimidade proporcionadas, seja pela companhia e autoafirmação advinda da relação estabelecida com o parceiro. O casamento é considerado o mais forte prognóstico de felicidade e bem-estar pessoal. Por outro lado, o casal contemporâneo é confrontado por duas forças paradoxais a individualidade e a conjugalidade - que se tencionam constantemente. Encontrar o equilíbrio entre essas energias tem sido um grande desafio dos cônjuges na atualidade. A relevância em estudar conjugalidade envolve o fato de que, em algum momento da vida, as pessoas irão experimentar a convivência com o outro, apresentando-se sob as mais variadas formas possíveis de organização. Muitos estudos sobre amor, casamento, família e divórcio, assinalam que a concepção do amor romântico ainda ocupa o papel central no imaginário amoroso das relações conjugais na cultura ocidental. O levantamento bibliográfico do tema da conjugalidade aponta para um crescente interesse nesta linha de pesquisa, estando a maioria dos trabalhos concentrados nos últimos cinco anos. Tópicos como adoecimento, infidelidade, parentalidade, migração, gênero, violência e relações de trabalho são os mais diretamente relacionados com o grande tema. Neste trabalho, visou-se analisar as relações conjugais, levando em consideração domínios como satisfação, investimento do casal na relação e processos adaptativos. Trata-se de um estudo de natureza exploratória e multicêntrica, de caráter qualitativo e quantitativo. Utilizou-se um roteiro de pesquisa com itens acerca do casamento e do significado de família, no qual incluiu duas questões abertas (“o que é família pra você” e “quem faz parte da sua família”). Foi realizada em Salvador-BA com uma população de 102 participantes. A população foi composta basicamente pelo sexo feminino em 78%, casada pela primeira vez (63,7%), com idade entre 30-35 anos (36,3%), funcionárias do setor privado (60%), com dois filhos (33,4%) e oriundas da classe média-alta. O conceito de família recebeu conotações positivas, associadas à base da pessoa (12%). Chama atenção a não valorização da relação entre família e sustento (0,7%), mas sim ao suporte incondicional (6,7%) e cuidado ʤ proteção (4%). A família extensa foi considerada pela maioria dos participantes como fazendo parte do seu sistema (41%), embora os agrupamentos monoparentais e reconstituídos já aparecerem com relativa frequência na pesquisa. Em relação à conjugalidade, a amostra acredita ser importante a estabilidade conjugal (93%), a gratificação pessoal dos cônjuges na relação (90%) e a geração e educação dos filhos (86,9%), na medida em que se mostraram satisfeitos com suas relações 65 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento (89,4%). Ser casado legalmente foi valorizado por 49,5%. A conjugalidade, na maioria da população entrevistada, possui características contemporâneas, ou seja, homens e mulheres estão envolvidos com o desenvolvimento profissional, a satisfação afetiva na relação com o outro e, no geral, compartilham a preocupação com a o bem-estar do mútuo. O espaço familiar é, por conta disso, propiciador de crescimento para todos os envolvidos. Nessa pesquisa, observou-se que existe uma preocupação com a satisfação do parceiro e uma tentativa de conciliar individualidade com conjugalidade, apesar de ser uma tarefa difícil nos dias atuais. O panorama social contemporâneo apresenta múltiplas formas de conjugalidade e um crescente aumento de dissoluções conjugais, sucedidas ou não de recasamentos, tornando-se cada vez mais importante o desenvolvimento de pesquisas que aprofundem a compreensão sobre as questões relacionadas ao laço conjugal, pois atualmente o casamento, não necessariamente envolve um projeto de filiação e descendência. Podem-se observar, da mesma forma, múltiplas facetas do desejo de procriação, representadas seja pela busca de um filho quando não existem possibilidades biológicas de concepção, seja por seu inverso, a escolha voluntária por não ter filhos. Esse cenário de dissociação, aliado aos avanços da medicina, permitiu, além de uma sexualidade sem procriação, seu reverso. Isso ocorre graças à outra característica da conjugalidade contemporânea, que diz respeito à busca de satisfação dentro da relação e a garantia do espaço para a individualidade, marcando bem a igualdade dos gêneros, e não mais o casamento como uma condição natural. Pode-se observar, como efeito, uma explicitação da homossexuali66 dade, um aumento no número dos divórcios e de recasamentos, bem como o surgimento da não obrigatoriedade da coabitação como regra conjugal. Para estudos prospectivos, pode-se pensar em analisar os resultados do questionário utilizado sob égide do gênero, pois é fato que teríamos definições e percepções diferentes da família e casamento. Palavras-chave: conjugalidade, família, laços conjugais Contato: Cristiane Cavalcanti, UCSal/FTC, [email protected] LT05-811 - GÊNERO E GERAÇÃO: DESCONTINUIDADES NAS INFÂNCIAS EM FAMÍLIAS DE UMA COMUNIDADE LITORÂNEA Angelina Nunes de Vasconcelos - UFPE [email protected] Heliane de Almeida Lins Leitão - UFAL [email protected] Gabriel Fortes Cavalcanti de Macêdo - UFAL [email protected] Financiamento: CNPq, FAPEAL A família se apresenta como cenário privilegiado para a investigação dos processos de constituição da subjetividade em sua indissociabilidade do contexto relacional e sociocultural. O estudo de questões de gênero no contexto familiar é de grande importância, pois é na família que ocorrem as primeiras experiências de relações de gênero e da transmissão intergeracional de atribuições e papéis de gênero na cultura. Além disto, é na família que se estabelecem as relações afetivas primárias, a partir das quais se constroem importantes processos de identificação VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento que formam o núcleo da identidade de gênero. As transformações observadas na família contemporânea têm levado a uma crescente necessidade de pesquisa acerca das relações familiares na atualidade, considerando-se particularmente as mudanças no comportamento feminino e o enfraquecimento dos valores tradicionais e suas repercussões nos papéis e relações de gênero. Entretanto, as mudanças observadas na família não afetam todos os grupos sociais da mesma maneira, sendo necessário investigar os diferentes contextos comunitários em que ocorrem. A organização familiar nas camadas populares apresenta especificidades, tornando-se necessário compreender questões de gênero neste contexto. Com freqüência prevalece um modelo tradicional de família com uma rígida divisão de papéis entre homens e mulheres. O homem é considerado o detentor da autoridade, estando este poder sustentado principalmente no seu papel de principal provedor da família, o que lhe garante, ainda, uma privilegiada relação com o mundo social e do trabalho. O presente trabalho apresenta uma discussão dos resultados obtidos numa pesquisa sobre gênero com famílias nucleares de uma comunidade litorânea do Nordeste. A comunidade estudada caracteriza-se como sendo de baixa renda, localizada numa área litorânea de forte potencial turístico, sendo sua história recente marcada por grandes transformações ambientais e culturais decorrentes da chegada do turismo de massa. O estudo buscou conhecer a infância nestas famílias, focalizando os indicadores de transmissão intergeracional de gênero. Os participantes do estudo foram seis famílias de uma comunidade litorânea, constituídas por pai, mãe e, pelo menos, duas crianças com idades entre 06 e 11 anos. As famílias apresentaram nível sócio-econômico baixo e, em sua maioria, eram nativas da comunidade. Os instrumentos utilizados foram: entrevistas semiestruturadas; histórias semiprojetivas; produção de “Retratos de família” através da realização de fotografias e desenhos; e estudo observacional nas casas de duas das famílias participantes e no espaço comunitário. Foram observadas importantes descontinuidades intergeracionais entre a infância vivida pelas crianças desta comunidade e aquela vivida por seus pais. As diversas influências e informações apreendidas pelas crianças na rua, na escola e através da mídia, geram descontinuidades de gênero entre as gerações, principalmente por produzir novas expectativas de futuro. A centralidade da escolaridade na vida destas crianças marca a principal diferença intergeracional na família e na comunidade. Em relação à nova geração, a oportunidade da escolarização formal equipara as experiências de gênero, na medida em que são oferecidas igualmente a meninos e meninas. Em relação aos meninos, a escolarização aponta para a aquisição de conhecimentos não acessíveis aos pais, o abandono de profissões tradicionais e novas possibilidades de inserção no mercado de trabalho. No caso das meninas, a escolaridade cria a expectativa de preparação para o mercado de trabalho, priorizando o desenvolvimento profissional e a autonomia financeira, em detrimento do casamento e da maternidade precoce vivenciadas por suas mães. Além disto, com a proibição do trabalho infantil, as crianças já não acompanham seus pais na rotina do trabalho adulto, enfraquecendo-se expectativas de transmissão de saberes e habilidades relacionadas a ocupações tradicionais, tais como a pesca para os homens e o 67 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento artesanato para as mulheres. Estas experiências promovem profundas modificações na vida familiar, causando estranhamento nos adultos. As mães relatam que acompanhavam suas mães nas atividades domésticas, assumindo-as como suas principais responsabilidades. Constatam, entretanto, que as meninas de hoje vivenciam rotinas diferentes daquelas vividas por elas, priorizando a experiência na escola e as decorrentes expectativas com relação ao futuro. As falas das meninas corroboram esta realidade, revelando que a escola se constitui em importante ambiente de referência e pertencimento no seu cotidiano. Por outro lado, numa clara reprodução dos estereótipos de gênero, observou-se que os meninos são mais “livres”, gozando de maior permissão para explorar o espaço da rua, enquanto as meninas sofrem restrições, devendo permanecer no espaço da casa, geralmente cuidando das tarefas domésticas. Verifica-se aí a manutenção da tradição e das desigualdades que caracterizam os espaços aos quais se vinculam homens e mulheres adultos. Entretanto, contrariando a expectativa de que mais liberdade geraria maior autonomia dos meninos, sugere-se sua maior dependência emocional. Os homens, em suas respostas às histórias semiprojetivas retratam os filhos como menos autônomos do que as filhas, recorrendo muito mais aos pais, principalmente à mãe, para a solução dos problemas emocionais apresentados. Esta diferença se confirma nas respostas dos próprios meninos às histórias em comparação com as das meninas. Uma possibilidade de compreensão dessa diferença estaria baseada numa concepção estereotipada destes pais de que sentimentos de tristeza, medo, fracasso e culpa sejam mais aceitáveis e “apropriados” à expe68 riência feminina, sendo esperado que as meninas estejam mais familiarizadas com estas situações e apresentem um repertório mais amplo de estratégias de soluções aos dilemas fictícios apresentados. Expectativas diferenciadas de quais emoções são apropriadas para cada gênero podem, de fato, produzir diferentes níveis de aceitação, enfrentamento e integração de determinadas experiências emocionais. Observamos que nestas famílias predominam papéis, funções e atitudes ligadas a um modelo tradicional de organização familiar, os quais são transmitidos através das conversas, das práticas disciplinares e da organização do ambiente doméstico e comunitário. Como resultado, as crianças exibem comportamentos consistentes com os estereótipos de gênero. Por outro lado, constata-se a valorização da escolarização das crianças que, gerando rupturas com a tradição, tende a igualar as experiências de meninos e meninas quanto ao acesso a novos conhecimentos, experiências sociais e expectativas para o futuro. Palavras-chave: família, gênero, intergeracionalidade Contato: Angelina Nunes de Vasconcelos, UFPE, [email protected] LT05-820 - TEMPO DA CRIANÇA NO LITÍGIO PARENTAL NA JUSTIÇA: REFLEXÕES SISTÊMICAS Marcia Regina Ribeiro dos Santos - TJDFT [email protected] Liana Fortunato Costa - UnB [email protected] Trata-se do recorte de uma pesquisa qualitativa realizada em mestrado acadêmico cujos dados foram coletados em um Tribu- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento nal de Justiça. O estudo versou sobre as significações do tempo entre as decisões em ações que envolvem litígio em Varas de Família, na perspectiva dos vários participantes envolvidos durante a execução do processo judicial: família, advogado, juiz de direito, promotor público e psicólogo – profissional do setor psicossocial da Justiça. Tendo como objetivo discutir o significado do tempo dado pela criança, foi selecionada uma dada família cujo processo retornou para estudo psicossocial pela segunda vez. O primeiro havia sido realizado há um ano. O processo era referente à disputa de guarda da filha em comum, em que a mãe era a requerente e o pai, o requerido. Para a realização da pesquisa, obteve-se aprovação do Conselho de Ética e todos os participantes tiveram acesso ao Termo de Compromisso Livre e Esclarecido-TCLE. Para identificar o significado do tempo para cada participante das decisões ao longo da tramitação processual, foram realizadas entrevistas semiestruturadas direcionadas a cada um dos membros participantes da família envolvida. Além desses, realizou-se entrevista com o juiz que encaminhou os autos para o setor psicossocial, com o promotor que se manifestou no decorrer do processo, com os advogados da requerente e do requerido e com o psicólogo que efetuou o estudo no referido setor. Apesar de a criança participante (sexo feminino, nove anos de idade) estar incluída durante a realização da entrevista com os componentes da família presentes – pai, mãe, avó materna e companheira do pai – não foi elaborada entrevista exclusiva para ela. A criança tinha estabelecido vínculo de confiança com a psicóloga e com a pesquisadora, demonstrando estar à vontade no ambiente oferecido para a realização da pesquisa. Ela teve espaço lúdico junto aos seus familiares durante o período da entrevista. O espaço utilizado foi uma das salas do setor psicossocial que estava equipada com os seguintes recursos: brinquedos, papéis, lápis coloridos, mesinha e cadeirinhas, dentre outros. Depois que todos os componentes da família responderam às indagações formuladas, a pesquisadora se dirigiu à criança e lhe fez perguntas que são apresentadas nos resultados. A primeira pergunta feita a criança foi se ela se lembrava a idade que tinha quando o processo teve início. Ela respondeu que tinha seis ou sete anos. Foi perguntado como ela esperava que o processo terminasse e ela disse que não sabia. E, tal como seus familiares, aguardava a decisão judicial. A exemplo de sua família materna, ela se queixou do tempo que passava com a mãe – fins de semana quinzenais e quartas-feiras com pernoite – considerando-o pouco. Por fim, verbalizou o desejo de ficar mais tempo com a mãe. Ela não fez referência ao pai nem aos familiares desse senhor durante a realização da pesquisa. A despeito disso, observou-se boa interação entre ela e o núcleo familiar do pai. A análise e a discussão tiveram como base as expressões da criança e o padrão interacional familiar observado. Depreendeu-se que os pais e os outros membros da família percebiam o sofrimento da filha. Eles, no entanto, não conseguiam evitar que a criança participasse dos desentendimentos existentes e, para amenizar as tensões, delegavam a ela o papel decisório. O litígio parental envolveu delegacia de polícia e documentos que buscavam comprovar a incompetência de um e de outro no exercício dos papéis materno e paterno. Lembranças oriundas do convívio interrompido geravam desconfianças e também contribuíam 69 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento para dificultar a livre prática das funções parentais. A partir das intervenções realizadas pela psicóloga do setor psicossocial que acompanhou o estudo, a família passou a aguardar a decisão do juiz, evitando sobrecarregar emocionalmente a criança. Do ponto de vista sistêmico, depreendeu-se que os conflitos que permeavam as relações afetavam a todos, em especial a criança, por ainda depender emocional e financeiramente de adultos responsáveis. Os resultados mostraram que o tempo de tramitação processual, três anos, era o tempo que a criança lembrava, ao se referir à idade que tinha quando este teve início. Observou-se que, do mesmo modo que faziam seus familiares, ela passou a transferir para o juiz a decisão de sua residência principal. A criança, ao fazer referência ao juiz como participante importante naquele momento de sua vida, evidenciou que tinha noção de sociedade e que dela fazia parte. Ademais, por ser leal ao afeto materno, a criança verbalizou o desejo de residir com ela. Parece que no entendimento da criança, o sofrimento da mãe e da avó diminuiria a partir dessa nova organização familiar. A criança demonstrou ter noção de tempo ao fazer menção de sua idade quando do início do processo judicial e de medida temporal ao dizer que era pouco o tempo que passava com a mãe. Ela demonstrou também noção de espaço, ao indicar o local em que gostaria de permanecer por mais tempo. A expressão da criança foi fundamental para subsidiar o relatório da psicóloga que realizou o estudo. A profissional concluiu pela sugestão da casa materna como residência principal, modificando a sugestão fornecida no primeiro estudo psicossocial realizado, que era a casa paterna. Depreendeu-se que as expressões da criança e 70 as relações existentes foram fundamentais para a sugestão da psicóloga do setor psicossocial para subsidiar o processo decisório do julgador. Entendeu-se que para a criança, o tempo mensurável, isto é, a quantidade de tempo que lhe era disponibilizada a passar com a mãe era considerada reduzida, preferindo aumentá-la. O desejo da mãe e da avó em acolhê-la por mais tempo no ambiente doméstico, poderia ser traduzido pela criança como espaço de segurança, proteção e afeto. A noção de sociedade, evidenciada pela criança, foi representada em sua fala quando mencionou que o juiz decidiria sobre sua guarda. Palavras-chave: tempo, criança, Justiça Contato: Marcia Regina Ribeiro dos Santos, TJDFT, [email protected] LT05-945 - O CRACK E A FAMÍLIA: UM ESTUDO SOBRE A DINÂMICA FAMILIAR DO USUÁRIO VICIADO Heron Flores Nogueira - UCB [email protected] Maria Alexina Ribeiro - UCB [email protected] A droga sempre existiu e é normatizada de acordo com compreensão legal de cada país, tornando a lícita e/ou ilícita. Pesquisando a temática droga verifica-se que ela e o seu consumo são assuntos historicamente antigos na discussão política, social e cultural, além disso, sabe-se que a motivação para o uso de drogas sofreu modificações no decorrer do tempo, pois antigamente, as drogas eram utilizadas em situações e ocasiões específicas e com grupos determinados. Autores como Ribeiro e Laranjeira (2010) dizem que a característi- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento ca comum das drogas com potencial para induzir adicção é o fato de terem a capacidade de alterar o comportamento ao aliviarem sintomas desagradáveis como dor, ansiedade, ou estresse ou, no pólo oposto, ao promoverem sensações de extremo prazer e bem-estar. Com relação a estudos envolvendo o crack no Brasil não há dados precisos sobre quando e como essa droga chegou ao país e tomando os dados epidemiológicos feitos com a população em situação de rua, eles demonstram não são apontados uso do crack até o ano de 1989. O primeiro estudo sobre o consumo de crack no Brasil aconteceu em São Paulo com um grupo de 25 usuários. O perfil descrito pelos autores sobre esse grupo estudado: homens desempregados, com menos de 30 anos de idade, baixa escolaridade e poder aquisitivo, provenientes de famílias conflituosas. Os primeiros estudos mostram que, de um grupo de 131 pacientes internados como dependentes de crack, 18% morreram nos cinco anos que sucederam a alta, sendo homicídio a causa mais frequente. Tanto em São Paulo quanto em Belo Horizonte, onde foram feitas pesquisas, o resultado apontou a mesma relação intrínseca entre homicídios e crack, correlacionado ao tráfico de drogas. De acordo com Penso et. al. (2004) nos últimos anos foram realizados estudos que objetivavam compreender como as famílias de dependentes químicos se estruturam e como as relações se constituem. Estas autoras ressaltam que a compreensão era focada na tríade família - pai, mãe e o filho dependente de droga. O pai foi a figura vista como desatento e distante e a mãe como super protetora e envolvida com a vida do filho. No entanto, recentemente, estudiosos como Penso, Costa e Sudbrack (2008), Trindade e Bucher (2008) e Fer- reira (2004), se propuseram a ampliar o olhar para a problemática das drogas no ambiente familiar buscando uma compreensão transgeracional dessa temática e automaticamente retirando o foco da relação linear descrita acima da tríade. Nesse sentido, objetivou-se com esta pesquisa compreender numa perspectiva transgeracional a dinâmica familiar de usuários de crack. Os objetivos específicos deste estudo foram: investigar como ocorriam as relações intrafamiliares entre membros nos diferentes subsistemas; identificar possíveis padrões de heranças transgeracionais; descrever os principais aspectos da dinâmica e estrutura familiar como papéis, fronteiras, limites, autoridade, afetividade; investigar o significado atribuído pela família à droga; descrever a expectativa dos membros sobre o futuro da vida familiar. Participaram desta pesquisa três famílias, todas com um membro usuário de crack com pelo menos dois anos de uso da droga e em tratamento de internação numa clínica de reabilitação psicossocial no Distrito Federal. Esta foi uma pesquisa qualitativa na modalidade de Estudo de Caso e foi adotada como aporte teórico a Teoria Sistêmica. Para coleta dos dados foram utilizados três instrumentos considerados por autores sistêmicos como fundamentais para a compreensão da dinâmica familiar: entrevista semiestruturada do ciclo de vida familiar, construção do Genograma e colagem em família. O contato inicial com os participantes se deu por meio de um convite verbal e pessoal para a participação na pesquisa, obedecendo aos critérios de disponibilidade de toda a família nuclear em participar da pesquisa nas duas etapas. O contato inicial possibilitou o agendamento dos dois encontros que ocorreram separadamen71 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento te e tiveram uma duração média de uma hora e meia cada. No primeiro encontro os participantes responderam ao questionário semiestruturado e construíram o Genograma familiar. No segundo encontro foi realizada uma colagem familiar. Os dados foram coletados no próprio local de internação, sendo cada encontro gravado em áudio e seu conteúdo transcrito na íntegra. Para compreensão das respostas adotamos o enfoque da Epistemologia Qualitativa, numa postura de produção de conhecimento construtivo-interpretativo. Foram construídas Zonas de Sentido que são categorias representadas aqui por metáforas relacionadas ao conteúdo obtido durante a coleta das informações. Como principais resultados apresentamos aqui algumas categorizações: “O uso do crack: uma herança familiar”. Onde é discutida a transmissão geracional do uso do crack, existente no sistema familiar como uma possibilidade de herdar os “valores” familiares; “Relações violentas: o carinho da família é a chibata”, apontada pelos participantes a violência aparece como uma das maneiras dos subsistemas se relacionar, é também interpretada como uma forma de comunicação e de transmissão de “afetos”; “O filho-pai”, os filhos usuários acabam assumindo o papel de pai da própria família, invertendo papéis, ao mesmo tempo, sendo “esposo” da própria mãe, onde há ausência do genitor e super proteção da genitora. Essa dinâmica dificulta o processo de desenvolvimento do sistema familiar; “Crack: uma maldição ou uma salvação?”, uma visão contraditória é encontrada quando as famílias atribuem um significado para a droga. Para uns ela é vista como uma maldição que acaba com a harmonia e com a saúde, para outros ela é considerada uma salvação para ameni72 zar os sentimentos gerados pelos conflitos familiares; “Uma vida sem drogas”, apesar de diversos estudos apresentarem a devastação que o crack representa para a saúde do usuário e as dificuldades apresentadas pelo adicto de manter-se abstinente, as famílias preservam otimismo quando o assunto é o futuro, acreditam que a droga deixará de fazer parte de sua realidade ao mesmo tempo em que delegam essa responsabilidade apenas para o usuário. Palavras-chave: crack, família, dinâmica familiar Contato: Heron Flores Nogueira, UCB, [email protected] LT05-1030 - MEU TEMPO, SEU TEMPO: REFLEXÕES SOBRE O RELACIONAMENTO ENTRE AVÓS E NETOS A PARTIR DO DESENVOLVIMENTO DE UM PROGRAMA INTERGERACIONAL NO CONTEXTO ESCOLAR Jacqueline F. C. Marangoni - GDF [email protected] Maria Cláudia Santos Lopes de Oliveira - UnB [email protected] A importância da família no desenvolvimento humano é inegável. Esta consiste no primeiro espaço de convivência e construção de significados do ser humano, promovendo a transmissão de valores e práticas socioculturais por meio dos relacionamentos entre as gerações. Ao longo da história as famílias mudaram e na contemporaneidade, não se pode falar em um modelo familiar único, devido à flagrante heterogeneidade das configurações familiares encontradas no cenário social. Novos modelos familiares se apresentam, VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento motivados pelas transformações intensas que perpassam as relações de gênero, as atitudes e valores humanos. A crescente inserção da mulher no mercado de trabalho, a intensa circulação de informações e inovações tecnológicas e o aumento da expectativa de vida, as separações e novos casamentos modificam a organização afetiva e social dos contextos familiares (Barros, 2006; Biasoli-Alves, 1997, 2000; Dessen & Braz, 2005; Rocha-Coutinho, 2006). Temos assim na experiência de diferentes famílias as expressões das mudanças históricas e culturais que podem ou não gerar conflitos, mas demandam constantes negociações entre as gerações jovens e as mais velhas, que tendem a conviver por um período maior de tempo (Oliveira, 2007; Rocha-Coutinho, 2006). Tataravós, bisavós, avós, netos e filhos interagem em diferentes espaços sociais, marcados por dimensões socioculturais e históricas próprias. As relações que se estabelecem entre eles são atravessadas por um conjunto de significados e sentidos importantes para a contextualização e entendimento da família transgeracional ou multigeracional. Um aspecto relevante é o processo de trocas intergeracionais no contexto familiar, em decorrência das dificuldades socioeconômicas de nosso país. Os idosos, ainda considerados em muitos discursos sociais como dependentes, começam a configurar-se como uma geração que oferece suporte afetivo e financeiro para as gerações mais jovens. Os avós emergem nesse cenário como personagens centrais na vida de suas famílias, participando ativamente da educação dos netos e proporcionando apoio afetivo-financeiro aos filhos (Dias, 2004; Dias & Silva, 1999, 2001; Oliveira, 2007). Essa realidade complexa demanda estudos que busquem compreender as transferências intergeracionais e as possibilidades de interações entre avós e netos nos diferentes contextos familiares. Como espaço encarregado da promoção de desenvolvimento, a escola, nesse contexto, assume o compromisso de formar cidadãos, pessoas comprometidas com a compreensão, a crítica e a transformação da realidade sociocultural, na direção de trocas sociais mais justas e equânimes (Milani, 2003). Entre as possíveis ações com as quais a escola deve estar comprometida, destacamos a construção de programas que favoreçam a interação entre gerações. O presente estudo parte de uma intervenção realizada em uma escola pública do Distrito Federal (DF). Seu objetivo é identificar e analisar os sentidos construídos por avós e netos em encontros intergeracionais delineados pela técnica do grupo focal. A metodologia está baseada na epistemologia qualitativa e desenvolvida como um processo construtivo-interpretativo. Participaram do estudo, oito avós, com idades que variaram de 50 a 69 anos. Entre os netos adolescentes, foram nove participantes, com idades que variaram de 13 a 18 anos. Dois moravam com os seus avós e eram criados por estes; os outros relataram já terem vivido a experiência de coabitar com os avós, em algum momento da infância. A análise dos dados foi realizada por meio da Epistemologia Qualitativa proposta por González-Rey (1997). Para o autor, pesquisador e pesquisados estabelecem uma relação dialógica e dinâmica em que as informações são coconstruídas. A análise das informações permitiu identificar quatro “zonas de sentido”: 1) avós como cuidadores principais ou corresponsáveis na educação dos netos - As narrativas ofertadas pelos participantes permiti73 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento ram reconhecer os avós como pessoas ativas no processo de desenvolvimento dos netos e esteio emocional e financeiro da família; 2) conflitos intergeracionais - Foi possível perceber que o relacionamento entre avós e netos se dá em um movimento dinâmico, marcado por atritos, confrontos e conflitos que tendem, em alguns momentos, a distanciá-los. Os netos apontaram as lacunas históricas que estabelecem diferenças de gerações (“meu tempo, seu tempo”) e a insistência dos avós em tratar de questões atuais a partir de valores coerentes com a lógica sociomoral de sua época como fatores que dificultam a relação com os avós; 3) realidade sociocultural contemporânea marcada pelo medo - O sentimento de medo foi sustentado discursivamente por avós e também por netos. O temor e a sensação de insegurança atravessaram as narrativas coerentemente com a cultura do medo que marca a atualidade, de modo a alterar a vida dos participantes, restringindo a convivência nos espaços sociais e tornando-se alvo recorrente das preocupações dos avós na educação de seus netos; 4) realidade sociofamiliar dos avós marcada por dificuldades - A experiência em grupo suscitou uma série de recordações por parte dos avós que remeteram às suas relações com os seus próprios avós, na infância, assim como trouxeram a experiência do começo de suas vidas conjugais e do nascimento de seus filhos e de seus netos. As narrativas dos avós contextualizaram situações e condições sociais, econômicas, históricas e culturais marcadas por dificuldades e sofrimento que influenciam a relação que estabelecem com seus netos. A análise das narrativas de avós e netos permite pensar que os valores da sociedade atual se mostram, intimamente, relacionados 74 às representações que uma geração atribui à outra, assim como influenciam os relacionamentos entre elas. Ficou evidente também que para entender as relações intergeracionais é preciso atentar-se para temas como a violência no contexto urbano, a relação de codependência afetiva e financeira entre as gerações de no contexto familiar, as dificuldades socioeconômicas e educativas na relação avós-netos, a negociação entre valores tradicionais e modernos, as representações sobre velhice e adolescência na perspectiva dos envolvidos e aquelas presentes no imaginário social mais amplo. Por fim, o estudo indica a necessidade de pesquisas sobre os relacionamentos intergeracionais, em especial, a relação avós-netos, no mundo contemporâneo e reitera a importância da escola como contexto para a realização de programas de integração entre gerações. Palavras-chave: relação avós-netos, programas intergeracionais, escola Contato: Jacqueline Ferraz da Costa Marangoni, GDF, [email protected] CO 41 - LT07 Violência/Gênero LT07-895 - VIOLÊNCIA E GÊNERO: O PODER DAS MULHERES NA REDE DO TRÁFICO DE DROGAS Dayane Martins José dos Santos - UFF [email protected] Financiamento: FAPERJ O presente trabalho tem por objetivo discutir as relações de poder estabelecidas pelas internas em um presídio feminino. VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento A pesquisa é realizada com mulheres que cumprem penas por envolvimento com o tráfico de drogas em um presídio na região norte fluminense, no Rio de Janeiro. Na pesquisa, a literatura foucaultiana é tomada a fim de conceituar o poder nos dias atuais e diferenciá-lo da concepção de poder tanto do Estado absolutista quanto da teoria marxista. Foucault (1979) vai dizer que o poder é disperso e é encontrado em todas as relações e campos sociais. Tais relações de poder assumem formas distintas nos contextos intra e extramuros em um presídio. No encarceramento, por exemplo, o poder pode ser refletido no comportamento de algumas mulheres que se “transformam” em homens e assumem o papel tradicional masculino numa relação homossexual. O poder é visto aqui como atrelado ao gênero. Fora do encarceramento, a menção ao poder é recorrente quando analisamos as motivações expressas por essas mulheres para o ingresso no tráfico de drogas. Tais mulheres almejam a obtenção de dinheiro a fim de satisfazer seus desejos de consumo de bens materiais, fomentados pela mídia e pela própria sociedade, além de almejarem o poder de ser bandida, que é um poder reconhecido socialmente como um poder masculino. Nosso objetivo no presente trabalho é discutir as relações de poder estabelecidas pelas internas em contextos intra e extramuros de um presídio. Em um primeiro momento, abordaremos o contexto extramuros prisional, analisando como as relações de poder influenciam na inserção dessas mulheres no tráfico de drogas. Posteriormente, iremos problematizar a mesma questão em contexto prisional. O trabalho de campo está sendo conduzido no Presídio Feminino Carlos Tinoco da Fonseca, na região norte fluminense do estado do Rio de Janeiro. Essa instituição abrange a maioria maciça de mulheres sentenciadas pelo envolvimento com a atividade do tráfico de drogas. Outros dados analisados na pesquisa foram coletados no Presídio Nelson Hungria, localizado no município do Rio de Janeiro. Esses dados fazem parte do grupo de pesquisa “Violência e Gênero”, que iniciou suas atividades no ano de 2007. Os dados a serem analisados são as entrevistas abertas em profundidade realizadas com as internas do presídio citado acima. Todas as mulheres entrevistadas foram condenadas por tráfico de drogas. A metodologia utilizada para analisar os dados é a Análise do Discurso Crítica (FAIRCLOUGH, 1992), que prima pela centralidade das relações do poder evidenciadas pelos relatos das participantes. A análise do discurso possibilita analisar as falas que atravessam a constituição subjetiva de tais mulheres, emergindo assim sua contradição, submissão e os discursos que são produzidos pela própria instituição. De início, podemos desmistificar a ideia de que tais mulheres se inserem nas atividades do tráfico exclusivamente como um meio de sustentabilidade. A atualidade se caracteriza pela produção de necessidades que não se referem à sobrevivência biológica do corpo, mas, principalmente, à sobrevivência num contexto social em que o consumo é altamente valorizado e possibilita a inserção em espaços mais privilegiados. A ditadura de mercado é incentivada cotidianamente, seja pelo meio midiático, seja pela própria sociedade, modificando e produzindo necessidades pessoais. Os dados coletados nos mostraram que a maioria das mulheres entrevistadas inicia as atividades ilícitas com o propósito de obter dinheiro para gastar com roupas, acessórios, carros, etc. Tendo 75 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento esses objetos de consumo, elas acabam por ganhar uma maior visibilidade e status perante à sociedade. Num segundo momento, ao analisarmos as relações de poder intramuros prisionais, notamos que há uma continuidade desse status conquistado fora da prisão. As mulheres que chegaram a ocupar cargos importantes na hierarquia do tráfico, ao serem presas, continuam a exercer e ocupar um certo lugar de destaque na prisão, devido à sua trajetória de vida alcançada nas atividades de drogas. Outra forma de poder notada nas entrevistas é atrelada ao gênero. Destacamos aqui a relação homossexual presente nas instituições, que é bastante comum devido à dificuldade que se tem para conseguir autorização para a visita íntima e ao abandono afetivo e sexual experimentado pela maior parte das mulheres no encarceramento. Porém, o que nos instigou e gerou questionamentos é que, em algumas dessas relações, havia uma “transformação” de uma das parceiras em “homem”. Essas mulheres travestidas se caracterizavam como homens, assumiam comportamento, vestimentas e codinomes masculinos. Para elas, o “virar homem” dentro da prisão possibilita uma maior visibilidade dentro da instituição e também um maior respeito das demais internas. Por fim, os resultados obtidos na atual pesquisa nos possibilitaram refletir e questionar sobre as relações de poder que perpassam a vida dos indivíduos, principalmente em um contexto prisional. Palavras-chave: gênero, poder, criminalidade, tráfico de drogas Contato: Dayane Martins José dos Santos, UFF, [email protected] 76 LT05-1032 - O PAPEL DAS RELAÇÕES AFETIVAS NA CONSTITUIÇÃO DA IDENTIDADE DE MULHERES ENCARCERADAS Carolina Ferreira Barbosa - UFF/PURO [email protected]ff.br O presente trabalho visa apresentar o papel das relações afetivas no processo constitutivo da identidade de mulheres encarceradas. Diversos autores, em consonância com os estudos em Criminologia, atentam para o fato de que a criminalidade feminina é, em geral, desprezada ou explicada em virtude dos relacionamentos amorosos com parceiros envolvidos em atividades criminosas (Barcinski, 2009a; Barcinski 2009b; Guedes, 2006; Souza, 2009; Zaluar, 1993). Uma atividade criminosa de extrema violência e constante risco de morte para aquele que exerce tal atividade é, em geral, relacionada aos homens. Eles são os “chefes” do negócio, os que são munidos de armas de fogo e que, fortes e destemidos, assumem a frente de combate (Zaluar, 1993). Por demandar uma série de características físicas e psicológicas particulares, podemos dizer que o mundo do crime faz parte do domínio masculino e, desse modo, a inserção masculina em atividades transgressoras é mais facilmente esperada. As mulheres, portanto, têm assumido um papel secundário no cenário do crime, vinculando-se em atividades menos violentas como roubo a lojas e supermercados ou, no caso específico do tráfico de drogas, por amor a um bandido ou pelo vício (Zaluar, 1993). Assim, como a inserção feminina em atividades criminosas é menos evidente e como a figura feminina desperta menos desconfiança neste meio, as mulheres são tidas, tradicionalmente, como VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento coadjuvantes neste cenário e os homens, como protagonistas. Para entendermos o papel dos homens/parceiros na iniciação criminosa de mulheres, podemos pensar que as relações afetivas estão no centro da constituição da identidade feminina, tal como afirma Miller (1987). Assim, o envolvimento das mulheres em atividades criminosas estaria intimamente relacionado à figura do homem como bandido e à proteção, por parte das mulheres, da relação estabelecida com seus parceiros criminosos e à proteção/criação dos filhos. A partir da ênfase no papel preponderante do afeto na constituição da subjetividade feminina, podemos entender que as relações afetivas estabelecidas no contexto prisional feminino evidenciam sua importância enquanto estratégia de sobrevivência emocional neste espaço e, consequentemente, contribuem para a constituição da identidade destas mulheres. Assim, as vinculações amistosas e amorosas entre as mulheres encarceradas, o “casamento” que reproduz papéis hegemônicos de marido e mulher no cárcere, a homossexualidade e o fenômeno do “travestismo”, por exemplo, contribuem para o enfrentamento do sofrimento advindo do abandono familiar na condição de encarceramento. Não excluindo o protagonismo e a iniciativa pessoal das mulheres como motivadores para um percurso criminoso feminino (Barcinski, 2009a), o objetivo deste trabalho é investigar o lugar das relações afetivas e as peculiaridades desse processo num contexto intra e extra muros prisional, bem como sua influência no percurso de construção da identidade de mulheres encarceradas. Em outras palavras, o foco está na análise do papel dessas relações afetivas para a constituição da identidade nesses dois contextos: a inserção e permanência das mulheres no tráfico de drogas e o período de encarceramento. O estudo se baseia em reflexões realizadas a partir de entrevistas qualitativas, em profundidade, com cinco mulheres encarceradas com histórico de envolvimento no tráfico de drogas no Rio de Janeiro. A partir da análise crítica de discurso (Fairclough, 2008), a análise versa sobre as tensões entre os discursos hegemônicos e os discursos de resistência constitutivos da identidade das participantes. Portanto, importa para a compreensão deste processo a fluidez dos significados produzidos pelo discurso no contexto sócio-histórico e cultural no qual as participantes estão inseridas e o modo como deles se apropriam. As entrevistas evidenciam o papel preponderante que as relações afetivas têm na constituição da identidade das mulheres, tanto no contexto intra muros, como no extra muros. Os dados demonstram que a vinculação amorosa dessas mulheres com traficantes contribui para a inserção delas no tráfico de drogas, e esta participação, em relação à inserção masculina em tal atividade, acontece de modo muito particular. Após o encarceramento, estereótipos afetivos passam a ser supervalorizados, como a idealização da figura materna e da maternidade em si. As relações amorosas entre as mulheres, que se estabelecem na prisão, são marcadas pelos referenciais heterossexuais tradicionalmente conhecidos, ou seja, há entre elas a exigência de uma figura masculina de atividade e uma feminina de passividade. No caso das “sapatões” (mulheres que se travestem de homens e adotam nomes masculinos), embora haja uma recusa ao relacionamento afetivo com homens, essas mulheres acabam por se aproximar deles no modo como se comportam e 77 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento exercem um poder diferenciado sobre as outras mulheres, poder este que está atrelado à figura masculina. Diante do exposto, percebemos que a inserção de mulheres em atividades criminosas evidencia uma ruptura com os discursos hegemônicos sobre o tipo de comportamento próprio do feminino, em especial no que se refere à capacidade de cometer crimes tidos como de dominância masculina, como a inserção no tráfico de drogas e o protagonismo dessas mulheres diante de seus atos – apesar de haver uma negociação deste lugar com o da vitimização. Sendo a prisão e a favela espaços marcados pela violência, as mulheres encontram meios para existir e até mesmo sobreviver nesses contextos, na tentativa de conciliar as marcas constitutivas que determinada cultura convenciona como ser mulher e o envolvimento em atividades criminosas tipicamente masculinas. Palavras-chave: gênero, discurso, criminalidade, relações afetivas, identidade Contato: Carolina Ferreira Barbosa, [email protected]ff.br / [email protected] LT07-1231 - CRIMINALIDADES E MULHERES: OS DESAFIOS DO EXISTIR NA CONTEMPORANEIDADE Carolina Ferreira Barbosa - UFF/PURO [email protected]ff.br Milena Rezende de Moraes - UFF/PURO [email protected] A atualidade possui configurações sociais dos tempos anteriores, o que possibilita dizer que hoje há fusão de valores modernos e contemporâneos convivendo na sociedade. A Modernidade se caracterizou pela criação de dispositivos que cap78 turavam as potencialidades políticas dos corpos, a fim de explorá-los como riqueza econômica. Os saberes se articularam ao Estado, produzindo modos de conceber a realidade, revestidos de veracidade. Essa articulação produziu efeitos significativos no modo de compreender os sujeitos, inserindo-os numa norma considerada ideal para experimentar a vida (Foucault, 2009). O exercício da disciplina apropriava das forças sociais suas habilidades. O objetivo principal era docilizar os corpos aos dispositivos. O poder sobre a vida, através dos saberes, tinha como alvo criar mecanismos reguladores que afetassem a população e os indivíduos, de maneira que se autorregulassem (Foucault, 2009). As instituições, como família e prisão, assumiram funções pedagógicas. Na primeira, cabia ao homem disciplinar sua casa e, na segunda, cabia ao Estado assumir esta função, já que a família não conseguia exercer com êxito seu processo de constituir-se como nuclear. Isso porque nem todas as famílias conseguiram se organizar segundo os padrões de heterossexualidade e papéis bem delimitados dos seus membros. As determinações de gênero são produções de verdades construídas historicamente para a regulação dos corpos. Sobre isso Saffioti (2010) diz que “o Estado tem ratificado um ordenamento social de gênero através de um conjunto de leis que se pretendem objetivas e neutras, porque parte da errônea premissa de que a desigualdade de fato entre homens e mulheres não existe na sociedade” (p. 445). Narvaz e Nardi (2007), a partir de Foucault, dizem que não cabe “libertar” o indivíduo do Estado, mas dos indivíduos estarem liberados quanto às práticas individualizantes que as instituições estatais promovem. Em seus estudos, Foucault VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento não atribuiu devida importância às lutas das mulheres contra aos valores androcêntricos que historicamente pautavam as relações humanas. Acreditamos que é estratégia estatal a segregação dos grupos sociais, para despolitizá-los. Um olhar atencioso para as questões de gênero se faz urgente para intervir nas práticas e discursos que colocam as mulheres como “minorias sociais” ou minorias políticas. Em relação à prisão, o que se tem visto é a reclusão de certos grupos sociais desprovidos de riqueza econômica e que se percebem com pouca visibilidade e poder social (Ciarallo, 2009). O lugar ocupado pela mulher criminosa é traçado nesse contexto de estigmas socialmente construídos, associados à classe e, principalmente, ao gênero. As representações sociais acerca do feminino constituem certos modos de se envolver afetivamente com o outro e com o trabalho. Essas representações são fortemente impulsionadas pelas práticas prisionais, que acabam constituindo formas de se existir pautadas no que se espera de uma mulher na sociedade em geral. Este trabalho objetiva conhecer os lugares ocupados pelo feminino na prisão e fora da prisão no que se refere aos contextos de trabalho e família, diante da fusão de valores que caracterizam a contemporaneidade. Entendemos que as relações nesses contextos são permeadas por relações de poder e de tensão. A busca das mulheres por visibilidade e poder é constante, sendo o protagonismo, a intencionalidade das ações das mulheres e a centralidade de gênero, norteadores de suas relações sociais (Barcinski, 2009). No presente estudo foram entrevistadas cinco mulheres encarceradas em um presídio do Rio de Janeiro. As entrevistas foram qualitativas, em que as mulheres foram convidadas a contar suas histórias de vida. O interesse maior foi em relação às formas pelas quais elas (re) criavam suas histórias, considerando os lugares que ocupavam nos seus grupos sociais (intramuros e extramuros) e o lugar que esse grupo ocupava na sociedade global. As participantes foram avisadas do caráter voluntário de sua participação e puderam interromper a gravação ou mesmo a entrevista em qualquer momento. Os dados foram analisados a partir da Análise Institucional do Discurso (Guirado, 2010). Considerando as participantes como “sujeitos institucionais” (Galvão e Serrano, 2007), buscamos compreender os lugares que as mulheres ocupavam a partir de regras socialmente construídas e o papel que as práticas institucionais possuíam na construção da subjetividade. O sujeito é objetivado por práticas institucionais, pois é regulado e normatizado a partir dos modos de funcionamento das instituições. O processo de subjetivação se refere à forma pela qual o sujeito apropria tais experiências (Foucault, 2009). As entrevistas mostram que os lugares ocupados pelas mulheres criminosas são construídos a partir do conflito de conciliar os relacionamentos amorosos, familiares e o trabalho. Fora dos muros prisionais, os lugares ocupados não se restringem ao espaço privado do lar, mas são lugares marcados por estigmas sociais de gênero. Na prisão, elas ocupam o lugar máximo de privação, abandono, exclusão e humilhação social. Sobre as perspectivas para a vida pós-encarceramento, algumas mulheres não vêem possibilidade de construir seu lugar no mundo fora da ilegalidade. Outras cogitam a possibilidade de “sair da vida do crime”, mesmo que isto signifique o exercício de menos poder social. Dentro 79 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento da prisão, alguns fenômenos conferem mais poder como a homossexualidade, o trabalho devido ao bom comportamento e o tipo de crime cometido. Fora da prisão, “ser mulher de traficante”, estar envolvida no tráfico de drogas e exercer a maternidade são posições de prestígio no grupo social das encarceradas. O papel da instituição prisional é de promover atividades em que a mulher esteja adequada aos papéis domésticos. Dentre as atividades e medidas tomadas, encontramos atividades de artesanato, dinâmicas feitas por religiosos que incentivam a afetividade e impedimentos para visitas íntimas com os parceiros, por exemplo. Por fim, as mulheres entrevistadas, marginalizadas economicamente, constroem seus lugares ora se colocando como vítimas, ora como protagonistas das relações sociais, buscando sempre maior exercício do poder. Esse poder pode ser exercido de forma explícita, pela violência ou de maneira implícita, camuflada, constrangida. Palavras-chave: criminalidade, mulheres, lugares sociais Contato: Carolina Ferreira Barbosa, UFF, [email protected]ff.br / [email protected] LT07-1414 - VIOLÊNCIA E DESENVOLVIMENTO SUBJETIVO EM RELAÇÃO HOMOAFETIVA FEMININA Carlos Felipe de Freitas Rossi - UNICESP O conceito de família tem sido utilizado para dar referência à unidade de reprodução biológica e social, criada por laços consangüíneos ou de aliança, instituído pelo casamento e/ou pelas uniões consensuais, por vínculo de descendência entre pais e filhos – biológicos ou não, in80 cluindo, os adotivos – e por laços de consangüinidade entre irmãos. (DURHAM, 1983; LÉVI-STRAUSS, 1986 apud ROMANELLI, 2003, p. 249). Nos dias atuais, é inegável que as constituições familiares estão em crise. Um desequilíbrio que não pode ser considerado patológico, mas sim um rearranjo frente às novas proposições e atuais condições históricas e sócio-econômicas (ROMANELLI, 2000). A conhecida família nuclear, composta por pai, mãe e filhos, deixa de ser o modelo comum e vigente no arcabouço social para dar lugar a instituições familiares de diversas constituições e dinâmicas de funcionamento (NEVES, 2006), como famílias constituídas por marido, esposa e filhos; aquelas constituídas por uniões estáveis, onde o enlace matrimonial jurídico não existe; famílias matrifocais chefiadas por mulheres, compostas por mães e filhos; famílias ampliadas agregando parentes do lado materno e/ou paterno; famílias recompostas, as quais um parceiro ou ambos já possui ou possuem filhos de união anterior e também famílias compostas por casais homoafetivas. No âmbito das relações homoafetivas, de acordo com o senso comum, os casais formados por homens possuiriam um grande número de parceiros e seriam infiéis ou inconstantes, não raro com histórico de violência entre os parceiros. Já nos casais do sexo feminino, por vários fatores, entre eles os fisiológicos, as mulheres supostamente baseariam suas relações no afeto, respeito, cumplicidade e instinto materno, sendo isentadas da violência relacional. Entretanto, em qualquer relacionamento, hetero ou homoafetivo, masculino ou feminino, existem casos de violência real, física e/ou simbólica que constituem fatores que determinam o curso do desenvolvimento da subjetivi- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento dade destes atores (ARIÉS, 1981). O objeto deste trabalho é apresentar um estudo de caso sobre violência entre um casal homoafetivo do sexo feminino. O fato das uniões estáveis entre pessoas do mesmo sexo ainda não serem plenamente reconhecidas, ainda que já legalizadas, pode fazer com que casais vivam à margem da sociedade e com que o preconceito e a falta de informações de parcela da sociedade incitem estes membros a permanecerem escondidos como casais, muitas vezes, obturando violências. O caso em foco é o de Vitória (V), residente de uma capital brasileira, sexo feminino, 38 anos de idade, divorciada, desempregada, sem filhos. Caçula de três irmãs, aos 18 anos perdeu o pai e até seus 23 anos não pode casar-se, pois cuidava da mãe. Seis meses depois do falecimento da genitora, após 7 anos de namoro, casou-se com José (J), negro, 5 anos mais velho que ela, com quem viveu junto por 9 anos. Segundo seu relato, nunca precisou (não lhe foi permitido) trabalhar, pois J era muito ciumento e não me deixava sair de casa para trabalhar ou estudar (sic). Ainda casada, conheceu Maria (M), 63 anos, funcionária pública aposentada, de alto poder aquisitivo, integrante de um círculo de amigas homossexuais, todas com elevado poder sócio-econômico. M incitou V a separar-se de J e, apesar da diferença de idade, mantiveram um relacionamento estável durante 6 anos, morando na casa de M. V relatou que, durante o relacionamento, M a tratava com desdém, utilizado expressões ofensivas e menosprezando todo esforço de desenvolvimento pessoal e/ou profissional: você é um resto de preto, não sabe fazer nada direito (sic). À semelhança de J, M afirmava que V não precisava trabalhar ou estudar, pois caberia àquela sustentá-la na união. Era tratada como inferior e incapaz de prover suas próprias necessidades. Você é burra, pobre, incompetente e incapaz de aprender qualquer coisa [...] ela tem 3 carros, eu tinha que andar de ônibus porque ela não me deixava pegar nenhum. Era eu que dirigia sempre, mas só podia dirigir se fosse pra sair com ela do lado (sic). A despeito do cenário de violência, V não tentou estudar ou trabalhar por acreditar-se incapaz para qualquer atividade exceto as obrigações de casa. Os atos de violência a que era exposta apareceram como inibidores da construção de seu autoconceito e tornar-se sujeito em desenvolvimento constituía um desafio quase impossível e desnecessário, desvelando o quanto M subtraia qualidades e capacidades de V, mantendo uma relação de dominação, de provedora e detentora da razão. O relacionamento ruiu. Com o término da relação, V procurou ajuda psicológica. Encontrava-se em estado de sofrimento profundo, queixando-se de depressão, falta de vontade de viver e sensação de culpa, além da preocupação do que os outros vão pensar de mim por ter terminado com ela (sic). Por ser constituída através das relações sociais, a subjetividade é entendida como uma realidade do ser humano; como um sistema de significações e sentidos constituídos nas relações que o indivíduo estabelece em seus mais variados estágios de desenvolvimento (REY, 1999). Qualquer forma de violência pode modificar, interferir, inibir, prejudicar ou até evitar o processo de desenvolvimento da subjetividade, que está inserida em um contexto histórico sócio-cultural único; o sujeito se torna um ente datado, histórico. V busca a psicoterapia e inicia a ressignificação de ser e estar no mundo. 81 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento No processo, começa a compreender que a construção subjetiva é um dado social e que cada parceiro tem seu objetivo na trama relacional. A descoberta de seu valor e papel social tem possibilitado o enfrentamento da posição autocrática e final do outro. Paulatinamente, vem superando dificuldades, estigmas e infantilização a ela imputados. V terminou seu curso técnico, planeja cursar um curso superior e aguarda ser contratada por uma empresa onde já estagia. A violência pode engendrar formas limitadoras do desenvolvimento subjetivo e da constituição do sujeito como pessoa. Quando velada, não deixa marcas visíveis no corpo da vítima, mas apresenta severas seqüelas no aparelho psíquico, podendo agravar-se, descambar-se para somatização de sintomas ou para o processo de violência física com efeito em cascata. Por estarem “fora dos padrões sociais”, muitos casos de violência em casais homoafetivos não são notificados, pela dificuldade de apresentar provas da violência simbólica. Nas agressões físicas, a vítima passa pelo constrangimento exigido pela burocracia legal de abertura de inquérito e buscas de provas para as investigações. Mais um golpe de violência é desferido contra a vítima, que poderá sentir-se envergonhada, exposta, humilhada, quando almejava proteger-se através dos métodos legais. Submeter-se, paradoxalmente, configura ato de proteção. Este estudo mostra que a violência e a opressão, embora sirvam de elemento limitador do desenvolvimento, dialeticamente podem forjar sua superação e engendrar papel catalizador no desenvolvimento, como no caso de V., realçando capacidades e potencialidades. 82 LT01-853 - A CRIMINALIDADE COMO RECURSO PARA A SAÍDA DA INVISIBILIDADE FEMININA Mariana Barcinski - PUC/RS [email protected] O ingresso de jovens de camadas mais pobres brasileiras na rede do tráfico de drogas como estratégia de fuga da invisibilidade social e da falta do sentimento de pertença que marcam suas vidas tem sido discutido na literatura (Cruz Neto, Moreira, & Sucena, 2001; Pereira, 2009). Excluídos de um sistema social que não reconhece sua existência no cotidiano ou em suas necessidades básicas de proteção, educação e trabalho, esses jovens optariam por atividades criminosas para se tornarem visíveis. Causar medo nas pessoas, através da associação com facções criminosas e da ostentação de armas ou tornar-se parte das estatísticas acerca da violência urbana são formas de adquirir visibilidade, mesmo que carregada de conotações e sentimentos negativos que, em última instância, servem para aprofundar a realidade de exclusão social experimentada por esses jovens. Quando tratamos da participação feminina no tráfico de drogas, a questão da invisibilidade como motivadora de comportamentos criminosos ganha contornos peculiares. Como o tráfico é, indiscutivelmente, reconhecido como uma atividade masculina, participar dele dá às mulheres traficantes a possibilidade de se distinguir de outras mulheres. Elas se tornam visíveis (diferentes de outras) ao desempenharem tarefas reconhecidas como masculinas. A saída da invisibilidade, no caso das mulheres envolvidas no tráfico, portanto, se dá primordialmente pela diferenciação, pela afirmação de um poder antes exclusivo dos homens e pelo reconhecimento exter- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento no deste poder. O objetivo deste trabalho, portanto, é compreender como mulheres traficantes definem a sua participação na rede do tráfico de drogas e de que forma a descrição desta participação – desde a motivação para a entrada até os papéis desempenhados na atividade – está permeada pela tentativa de saída da invisibilidade que marca determinado grupo socialmente marginalizado, especialmente as mulheres que o compõem. O engajamento de mulheres em atividades criminosas, notadamente no tráfico de drogas, é descrito de maneira geral na literatura como subordinado à participação dos homens nessas mesmas atividades. Sem ignorar o fato de que parecem, de fato, ser os homens os maiores motivadores para a entrada das mulheres na rede do tráfico de drogas (Zaluar, 1993), a ênfase quase que exclusiva na criminalidade feminina como decorrente de suas relações afetivas retira o protagonismo e reforça a invisibilidade feminina na prática de crimes violentos e atividades ilícitas. Ao ignorar as especificidades dos crimes cometidos por mulheres, a própria literatura atesta ou reforça a invisibilidade feminina no que se refere aos fenômenos sociais da violência e da transgressão. A partir de uma perspectiva de gênero podemos compreender que, para além da reduzida relevância social atribuída à criminalidade feminina, a ausência de estudos sobre mulheres envolvidas em atividades criminosas se deve também ao fato de a violência, da agressividade e da transgressão não estarem previstas nos discursos acerca do feminino. As explicações tradicionais para a diferença entre as taxas de criminalidade feminina e masculina baseiam-se na imagem da mulher como naturalmente dócil, passiva e menos suscetível à prática de comportamentos violentos (Walker, 2003). Sob esta mesma perspectiva, Goetting (1988) sugere que a falta de atenção em relação aos crimes femininos se deve, em grande parte, ao fato de as expectativas sociais sobre os papéis desempenhados pelas mulheres legitimarem a posição das mesmas como vítimas, mas nunca como perpetradoras de violência. Além das características associadas ao feminino servirem teoricamente como elementos protetivos à prática criminosa, a socialização feminina, com sua ênfase no espaço privado como domínio privilegiado de atuação das mulheres, seria a origem da participação subalterna das mulheres em atividades ilícitas e da característica não violenta dos crimes femininos. A invisibilidade das mulheres nas teorias acerca da criminalidade seria, então, justificada pelo caráter atípico dos crimes por elas cometidos. Através da análise discursiva sistêmica (Falmagne, 2004) de entrevistas com duas mulheres com uma história passada de envolvimento no tráfico de drogas, o presente trabalho discute a forma como o envolvimento das participantes na atividade representou uma estratégia de saída da invisibilidade que marca a existência de mulheres nas favelas. Através do desempenho de tarefas reconhecidamente masculinas, como carregar armas, entrar em confrontos armados com a polícia e com facções criminosas rivais e gerenciar pontos de venda de drogas em suas comunidades, tais mulheres marcaram uma distância significativa em relação a outras mulheres ao seu redor. Tal diferenciação, e especialmente o reconhecimento social do caráter atípico de suas atividades como traficantes, representou na história de vida dessas duas mulheres a saída (mesmo que temporária) da invisibilidade feminina na favela. Os dados analisados no presente 83 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento trabalho refletirão as especificidades da participação feminina no tráfico de drogas e a forma como as mulheres traficantes constroem esta participação primordialmente em oposição a outras mulheres ao seu redor. As referências ao poder e ao status adquiridos como traficantes ganham significado especial quando tratadas sob uma perspectiva de gênero, se entendermos a violência e a transgressão como prerrogativas masculinas. O discurso das participantes, portanto, reflete o investimento das mesmas em constituírem as suas identidades através da marcação de elementos que distinguem as suas trajetórias (e o reconhecimento externo desta distinção) da história de outras mulheres, em geral. Palavras-chave: gênero, criminalidade, invisibilidade social. LT01-980 – RELAÇÕES DE PODER E GÊNERO NO MUNDO DO TRABALHO: APORTES TEÓRICO-CONCEITUAIS2 Vânia Maria Lopes Venâncio - UnB [email protected] Maria Helena Fávero - UnB [email protected] O filme O Diabo veste Prada (2006), da obra de Lauren Weisberger (2003), explora o mundo do trabalho de uma revista de moda liderado por uma mulher autoritária, ambiciosa e de uma ética singular no trato das pessoas e dos negócios. Quais aspectos deste filme podem contribuir 2 Este estudo foi desenvolvido no âmbito da disciplina Psicologia do Desenvolvimento Adulto, do Programa de Pós-Graduação em Processo de Desenvolvimento Humano e Saúde, da Universidade de Brasília, sob a docência da Profa. Dra. Maria Helena Fávero. 84 para a análise dos estudos sobre trabalho, poder e gênero, sob a ótica da psicologia do desenvolvimento? Primeiro ele revela e desvela as especificidades da atividade laboral e seus aspectos psicossociais: grupos, organizações e comunidades em situações do dia-a-dia, sem separar indivíduo e coletividade, afeto e razão, processos inconscientes e processos sociais. O seu enredo explicita duas questões centrais para este trabalho: o tácito e o explícito nas relações de poder dentro de uma organização, que Fávero (2010) discute como políticas organizacionais e que dizem respeito ao processo cotidiano por meio do qual as abstrações sobre poder e organização são vividas e ainda os processos mascarados destas políticas, nas quais estão implicadas os processos gendrados e são intimamente relacionadas à masculinidade competitiva que age nos meios de trabalho. Tais questões inspiraram o presente trabalho que analisa artigos publicados em periódicos nacionais sobre as relações de poder e gênero no mundo do trabalho. Consultamos as bases de dados do Scientific Electronic Library Online (Scielo) e do Periódicos Eletrônicos em Psicologia (PePsic). Elegemos os seguintes critérios: (a) a articulação entre os descritores trabalho, poder e gênero em todos os índices e em pares; b) sem demarcação de período e de tempo e (c) autoria de pesquisador brasileiro. Encontramos 39 artigos, publicados em 24 revistas, de 1998 a 2010, sendo 31 do Scielo e 8 do Pepsic. A pesquisa compreendeu três démarches: identificação pela internet, leitura e análise dos artigos. Nesta última sistematizamos a análise em tabelas, como proposto por Fávero e Souza (2001), nas quais a primeira coluna fornece um contador relativo às referências; a segunda apresenta a referência completa VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento do estudo; a terceira, o país de origem do estudo; a quarta identifica o referencial teórico; a quinta identifica os objetivos do estudo; a sexta, o método e a sétima, os principais resultados. Identificamos diferentes abordagens em diferentes áreas do conhecimento: da Psicologia, da Sociologia, da Educação, da Administração e da Saúde. Entendemos que tal fato ressalta a necessidade de uma visão multidisciplinar na análise da complexa teia de significados que a articulação dos temas trabalho, poder e gênero suscita, assim como revela a necessidade de se intensificar a produção científica sobre esta articulação, ampliando o escopo de grupos sociais, incluindo diferentes categorias profissionais, considerando a Psicologia do Desenvolvimento do Adulto, que, como ressalta Fávero (2007), “permaneceu muito tempo como um espaço vazio entre o desenvolvimento do adolescente e o do idoso” (p.194). Nossa análise bibliográfica evidenciou que: a produção científica nacional apresenta publicações a partir de 1998 e se intensifica a partir de 2007; em sua maioria, os artigos discutem a tríade trabalho-poder-gênero, articulando os três descritores, mas prevalecendo a relevância em um dos temas, com o predomínio do tema trabalho, seguido de gênero e em menor monta a questão do poder; a complexidade do mundo do trabalho se revela e se desvela em relações de poder gendradas que contribuem para condições desiguais entre trabalhadores e trabalhadoras, como nos revela a análise de Anzorena (2008); trabalho, poder e gênero também estão configurados de acordo com algumas abordagens de referência; nas abordagens que tratam da liderança e gestão, em sentido lato, as condições materiais da produção aparecem como justificadoras da discriminação e desigualdade entre mulheres e homens, agravados quando entram os fatores de classe social, etnia e raça; a práxis nas organizações e nas relações privadas e públicas apresentam aspectos que corroboram a tese da situação desigual da mulher nas esferas sociais, econômicas, políticas e filosóficas; algumas categorias profissionais foram ressaltadas com base nessa questão, como os profissionais da área de enfermagem; grupos sociais informais foram sujeitos de vários estudos de casos como mulheres indígenas, mulheres em situação prisional e travestis. Temas particulares também foram evidenciados: as políticas públicas aparecem no questionamento do Programa Bolsa Escola, no aparato legal à questão da violência doméstica, na revisão dos programas de saúde coletiva e na adequação da legislação trabalhista. Em suma, os resultados dessa pesquisa bibliográfica apresentam importantes questões para reflexão: 1. A necessidade de incremento teórico-metodológico que fundamente os estudos para que se considerem efetivamente os temas trabalho, gênero e poder, tomados articuladamente; 2. Tal incremento deve considerar o aporte da psicologia do desenvolvimento e em particular da psicologia da vida adulta, considerando os temas em questão do ponto de vista do ciclo de vida; 3. Que se assuma o desafio da Psicologia crítica e reflexiva na consideração do referido aporte, isto é, se considere os chamados vieses culturais e políticos não como um problema metodológico, mas sim, por meio dos quais se considere as dinâmicas do gênero (Jill Morawiski, 1997, 2005). Esta é a nossa pretensão em futuros estudos. Palavras-chave: trabalho; poder; relações de gênero. 85 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento LT01-1190 - "OS MENINOS ESTÃO PRONTOS PARA A MATEMÁTICA"; "OS MENINOS SÃO INTELIGENTES POR CAUSA DA GENÉTICA? O EMBATE ENTRE AS ADOLESCENTES, OS ADOLESCENTES E OS PROFESSORES DE MATEMÁTICA.” Francisca Zuita Alves Paiva - FAJESU/DF [email protected] Maria Helena Fávero - UnB [email protected]. Embora tenha havido nas últimas décadas um aumento significativa no número de mulheres na Educação Básica e no Ensino Superior, as pesquisa apontam que as mulheres superaram os homens em escolaridade, estão em maior número nas áreas de humanas e biológicas e os homens estão em maior número nas áreas de exatas. Evidencia-se ainda que esta tendência se mantém nos cursos de pós-graduação (Godinho, 2005; Ristoff, 2006; Chamom, 2005). Por isto mesmo, Fávero (2010 a) enfatiza uma das linhas de pesquisa sobre a relação entre gênero e socialização, focando a diferença que persiste nos dados dos estudos nacionais e internacionais sobre a entrada de mulheres na área de ciências e de tecnologias em comparação à entrada e permanência dos homens. Um dos aspectos ressaltados por esta autora diz respeito ao ensino de matemática e a natureza da mediação do conhecimento na instituição escolar. Fávero (2010 b) defende a tese segundo a qual, a instituição educacional mantém a ideologia do patriarcado na sua forma contemporânea, por meio da mediação significados sobre papéis de gênero em articulação aos significados sobre as diferentes áreas do conhecimento. Assim, Fávero & Salgado (2006; 2007) evidenciaram tal articulação tanto nas concepções de estudantes 86 universitários, como nas concepções de professores e pais de alunos. Os dados destes estudos foram confirmados em outro estudo desenvolvido em duas fases: 1/ entrevista com professores de matemática que atuam do 6º ao 9º ano do Ensino Fundamental, todos de uma mesma escola da Rede Particular de Ensino de uma cidade satélite do DF. As entrevistas foram semiestruturadas em 4 eixos – o desempenho de alunas e alunos em matemática; as possíveis explicações para as possíveis diferenças de desempenho; gênero e área do conhecimento. 2/ participaram 8 alunos do sexo masculino, entre 14 e 15 anos de idade, do 9º ano do Ensino Fundamental, todos de uma mesma escola da Rede Particular de Ensino de uma cidade satélite do DF, a quem propusemos a discussão: “na opinião de vocês quem se sai melhor em matemática, os meninos ou as meninas?” A análise da discussão evidenciou dados contraditórios com os das professoras e professores. Segundo os estudantes: as meninas são mais inteligentes na matemática; elas são mais maduras; elas estudam mais; aprendem com mais facilidade; a maioria dos meninos só quer “vadiar”; os meninos têm ter alguém “empurrando”, senão “a gente não aprende não”. Para comprovar sua posição o grupo forneceu dados: na sua classe de 35 alunos, 15 do sexo feminino e 20 do sexo masculino, 8 alunas se destacam em matemática contra 2 alunos. O estudo apontou indícios sobre o chamado “currículo oculto das escolas”, em referência aos valores sociais gendrados que permeiam as informações, os procedimentos e as próprias atividades escolares e que se constituem em peças fundamentais da socialização. Ficou evidenciado que os professores e professoras têm expectativas diferentes para meninos VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento e meninas e isso ainda permanece como um dado particularmente presente no caso do ensino da matemática (Paiva e Fávero, 2010). E as meninas o que será que pensam sobre estas expectativas? Para responder a esta questão desenvolvemos o presente estudo, que se focou nesta questão por meio da discussão entre adolescentes do sexo feminino. Constituímos quatro grupos focais: dois de seis alunas de sexto ano cada (um de uma escola da Rede de Ensino Público do DF e outro de uma escola da Rede Particular de Ensino do DF); e dois grupos de seis alunas do 3º ano do ensino médio cada (um de uma escola da Rede de Ensino Público do DF e outro de uma escola da Rede Particular de Ensino do DF). A todos os grupos foi proposto para discussão duas frases obtidas de estudo anterior prescrito acima. A primeira foi obtida junto a professores e professoras de matemática da Rede Particular de Ensino do DF: “As meninas vão bem em matemática porque se esforçam; os meninos estão prontos para o raciocínio matemático”. A segunda foi obtida junto a estudantes do sexo feminino do 9º ano do Ensino Fundamental de uma escola da Rede Particular de Ensino do DF: “As meninas são mais inteligentes em matemática; elas são mais maduras; elas estudam mais; os meninos só querem vadiar”. Cada frase foi apresentada separadamente, seguida do convite a sua discussão. Após o término da discussão da primeira frase foi apresentado a segunda e feito um novo convite a discussão. Ao término da discussão foi proposto as alunas que relatassem suas escolhas profissionais. As discussões nos grupos foram registradas em vídeo e os atos da fala foram tomados como unidades de análise. Quanto a primeira discussão, os resultados evidenciaram que: as alunas discordaram dos professores; acordaram que os alunos do sexo masculino não são melhores em matemática; argumentaram que a sociedade é machista e desqualificam a inteligência feminina. Ex: “então eles querem dizer que os meninos são inteligentes por causa da genética? A inteligência dos meninos está no DNA?”. Os resultados da segunda discussão evidenciaram que: as alunas acordaram que os alunos não são bons em matemática porque eles só pensam em “curtir a vida e deixam os estudos para depois; os meninos só pensam em som”; alegaram que apesar disto, os homens ocupam melhores posições no mercado de trabalho com melhores salários: “às vezes as mulheres fazem o mesmo trabalho do homem, mas recebem um salário menor”. Quanto as suas escolhas profissionais evidenciou-se a opção prioritária por áreas de humanas tais como: Nutrição, Educação, Medicina, Biologia, Arquitetura e outras. Podemos dizer que nossos dados apresentam uma questão particular que necessita de novos estudos: apesar de partilharem a concepção de que os alunos do sexo masculino não são melhores em matemática, as adolescentes declaram opções profissionais por áreas tidas como próprias aos papéis femininos. Assim concluímos sobre a necessidade, como outras autoras já salientaram (Abramo, 2004; Anzorena, 2008; Arnot, 2006; Fávero, 2010 a; 2010 b). de se desenvolver pesquisas que fundamentem ações para promover a mudança nas concepções sobre a relação entre gênero e capacidade intelectual e a relação entre gênero e escolha profissional. Palavras-chave: gênero, ciência e matemática; concepções sobre a matemática; escolarização e socialização gendradas. 87 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento DIA 13/11 - Domingo 10h30-12h MR LT06 - Mesa Redonda Convidada MR LT06-973 - DESCRIÇÃO E AVALIAÇÃO DE UMA CAPACITAÇÃO PARA PROFISSIONAIS DA REDE DE PROTEÇÃO À INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA NO INTERIOR DO RS Normanda Araujo de Morais - UFRGS [email protected] O objetivo desta Mesa Redonda é descrever e avaliar o processo de implantação de uma tecnologia social, proposta pelo Programa de Apoio a Núcleos de Excelência – PRONEX, realizado em um município do noroeste do RS. Trata-se de um projeto de pesquisa multicêntrica, realizada com a parceria de 10 Universidades, que tem como objetivo implementar e avaliar uma proposta de capacitação de profissionais das áreas da saúde, da educação e da rede de proteção de crianças e adolescentes nas seguintes temáticas: direitos humanos, violência e mediação de conflitos. O processo de capacitação teve a duração de 30 horas e trabalhou os seguintes temas: direitos das crianças e de adolescentes, mulheres e minorias étnicas e sociais; maus-tratos contra crianças; consequências psicológicas da violência; fatores de risco e de proteção; resiliência; comportamento infrator; uso de drogas na adolescência e mediação de conflitos. Além disso, ao final, os participantes mon88 taram um projeto de intervenção a ser implantado nos seus locais de atuação, a partir das demandas percebidas no seu cotidiano. A capacitação foi realizada com base em aulas expositivas dialogadas, trabalhos em grupos e discussão de filmes. Além disso, contou com a realização de um pré-teste, avaliação de cada módulo (Direitos Humanos, Violência e Mediação de Conflitos) e um pós-teste, ao final dos três módulos da capacitação. Os trabalhos que serão apresentados dizem respeito aos dados quantitativos do pré-teste e aos dados qualitativos obtidos nos diários de campo da equipe que participou da primeira edição do Pronex. A mesa será composta de três trabalhos. O primeiro deles buscará descrever a capacitação que foi realizada (organização dos temas, cronograma, caracterização dos participantes), assim como apresentar os primeiros dados qualitativos que resultaram da mesma (impressões da equipe sobre o envolvimento dos participantes, temas centrais, fragilidades identificadas na rede, etc). O segundo trabalho buscará descrever os índices de esgotamento profissional e de bem-estar no trabalho, apontados pelos participantes no momento do pré-teste. Por fim, o terceiro trabalho buscará apresentar, também com base em dados quantitativos do pré-teste, os principais valores que têm embasado a prática desses profissionais, bem como a sua percepção sobre como se sentem desde que começaram a trabalhar com essa população. Os dados aqui avaliados dizem respeito aos 30 participantes que responderam ao pré-teste, sendo a maioria do sexo feminino (n=28; 93,3%) e com média de idade de 38 anos (DP=10,93). A apresentação do conjunto de trabalhos permite estabelecer os pontos centrais dessa primeira edição do VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento PRONEX, quais sejam: a relevância de propostas de capacitações como essa, especialmente, para trabalhadores do interior do estado, para quem o acesso a cursos e capacitações é mais limitado; a relevância das estratégias de avaliação do impacto e do processo da tecnologia proposta; e, por fim, o importante papel multiplicador que estratégias desse tipo podem ter, ao criarem um espaço nos quais os profissionais da rede local podem se encontrar, discutir temas relevantes ao seu cotidiano e identificar estratégias que venham a fortalecer a rede. DESCREVENDO A CAPACITAÇÃO PARA PROFISSIONAIS DA REDE DE PROTEÇÃO À INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA NO INTERIOR DO RS Jeane Lessinger Borges - SETREM [email protected] Normanda Araujo de Morais - UFRGS [email protected] Trata-se de um recorte de um projeto de pesquisa multicêntrica, sobre a efetividade de uma tecnologia social junto a 1.200 profissionais da rede de proteção no estado do Rio Grande do Sul (RS), realizado através do Programa de Apoio a Núcleos de Excelência (PRONEX). O objetivo da pesquisa mais ampla é o de capacitar profissionais das áreas da saúde, da educação e da rede de proteção de crianças e adolescentes para a identificação de indicadores de violência, futuros encaminhamentos e acesso à rede de atendimento, bem como avaliar o impacto e o processo da capacitação. Visa-se que, ao final da intervenção, os participantes possam instrumentalizar-se e serem multiplicadores dos conhecimentos adquiridos e da vivência desenvolvida ao longo dos módulos de trabalho. Este trabalho busca descrever dados iniciais, referentes a uma proposta de intervenção junto a uma amostra de 30 profissionais da rede de proteção às crianças e adolescentes vítimas de violência da Região Noroeste do RS. Especificamente, busca-se com esse trabalho: descrever a capacitação realizada nessa primeira etapa do PRONEX e apresentar dados qualitativos acerca do processo de avaliação da mesma. A intervenção foi planejada a partir de três módulos, os quais contemplam os temas dos direitos de crianças e adolescentes, mulheres e minorias étnicas e sociais (6 horas); maus-tratos contra crianças, consequências da violência, fatores de risco e de proteção, resiliência, comportamento infrator e uso de drogas na adolescência (16 horas); bem como mediação de conflitos (4 horas). Além disso, um turno de trabalho (4 horas) foi dedicado à montagem de um projeto de intervenção pelos participantes, a partir das demandas percebidas no seu cotidiano. A intervenção totalizou 30 horas, e buscou-se avaliar a efetividade desta através de um levantamento pré e pós-teste. Além disso, foram adotados diários de campo para o registro de dados qualitativos, os quais foram elaborados pela equipe de psicólogas palestrantes e bolsistas de iniciação científica. Os participantes são, predominantemente, do sexo feminino (93,3%), sendo que 40% têm ensino superior completo e 46,7% têm pós-graduação. A idade média da amostra era de 38 anos (DP=10,93). Os participantes desta amostra incluem profissionais da Psicologia (30%), do Serviço Social (23,3%), da Enfermagem (26,7%) e da Educação (15,3%), representantes de cinco municípios da referida região. A renda mensal variava de R$ 600,00 a 5.000,00 (M = R$ 89 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento 2.004,90 reais). O principal vínculo de trabalho foi celetista e concursado (ambos com 26,7%; n = 8), seguido de estatutário (13,3%; n = 7). O tempo médio de trabalho na ocupação atual variava entre 1 mês e 30 anos (M = 7,3 anos) e o tempo médio de atuação profissional com o fenômeno da violência contra criança era de 4 anos (DP= 4,0). Em relação aos dados qualitativos, os resultados preliminares desta intervenção apontam: (a) a satisfação dos participantes com os temas abordados, sobretudo, com temáticas como resiliência e Psicologia Positiva, vistos pela primeira vez pela maioria deles; (b) a grande participação e motivação dos presentes no processo de capacitação; (c) a oportunidade criada na capacitação da rede local de proteção ser avaliada e discutida, inclusive, apontando suas fragilidades. Dessa forma, ficou visível a falta de uma rede de proteção articulada, ou seja, observou-se a existência de vários serviços da rede de proteção na cidade, porém, com atuações individualizadas; (d) predomínio de encaminhamentos da rede para os serviços de assistência social especializados (por exemplo, CREASs), como sendo o serviço de referência para as situações de violência contra a criança; (e) a alta rotatividade dos profissionais nos serviços da rede, sendo que os participantes demonstraram perceber a perda do vínculo do usuário com a equipe e com o profissional como sendo uma dificuldade no trabalho cotidiano em seus serviços de origem; e (f) a necessidade de formação permanente para os profissionais que atuam na rede de proteção. Os dados apontaram, ainda, que a capacitação possibilitou um momento para a elaboração de projetos de intervenção sobre diferentes temas, envolvendo infância e adolescência em situação de vulnerabilidade psicossocial 90 e o fortalecimento do trabalho em rede. Verificou-se que tais projetos abordaram tanto intervenções primárias quanto terciárias junto às crianças e suas famílias, a partir de um viés interdisciplinar. Nesse sentido, de um modo geral, os resultados encontrados nesta etapa inicial do PRONEX contemplam os objetivos da proposta mais ampla desta pesquisa. O recorte proposto neste trabalho problematiza o trabalho que vem sendo desenvolvido na rede de proteção à criança vítima de violência, apontando suas lacunas e possibilidades, num grupo de profissionais do interior do RS. Os resultados encontrados podem oferecer subsídios para políticas públicas no atendimento a crianças e suas famílias expostas a situações de violência. Além disso, aponta-se a necessidade de uma maior articulação entre os serviços da rede de proteção, em prol de uma maior integralidade das ações e de um atendimento mais humanizado. Palavras-chave: rede de proteção, criança e adolescente, capacitação. NÍVEIS DE BEM-ESTAR E SÍNDROME DE BURNOUT EM PROFISSIONAIS DA REDE DE PROTEÇÃO A CRIANÇA E ADOLESCENTE DO INTERIOR DO RIO GRANDE DO SUL Juliana das Neves Nóbrega - UFRGS [email protected] Clarissa Pinto Pizarro de Freitas - UFRGS [email protected] Normanda Araujo de Morais - UFRGS [email protected] Bruno Figueiredo Damásio - UFRGS [email protected] Silvia Helena Koller - UFRGS [email protected] VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento Este trabalho é um recorte do projeto “Avaliação de uma tecnologia social aplicada para a capacitação de profissionais da área da educação, saúde e da rede de proteção a crianças e adolescentes sobre direitos humanos, violência e mediação de conflitos”, o qual foi direcionado aos profissionais da rede de proteção à criança e ao adolescente, do estado do Rio Grande do Sul. Discutir-se-ão dados referentes à primeira etapa da capacitação, com profissionais de cinco municípios da região noroeste do Rio Grande do Sul. A satisfação que as pessoas têm com o seu trabalho pode ser explicada, em parte, pelos seus níveis de bem-estar no trabalho, sendo tal indicador uma importante ferramenta para avaliar o desempenho ocupacional e o comprometimento organizacional. O bem-estar é um construto amplo, o qual tem sido associado à felicidade, satisfação, afetos positivos e avaliação subjetiva de qualidade de vida. Quando vinculado ao trabalho, o bem-estar torna-se útil à medida que expõe a não equivalência entre a satisfação e insatisfação, demonstrando que uma não está diretamente vinculada à outra. Associado à insatisfação no ambiente ocupacional, identifica-se o burnout, ou síndrome do esgotamento profissional. Essa se caracteriza, entre outras coisas, pela predominância de sintomas emocionais disfóricos; de sintomas psicológicos e comportamentais, em detrimento de sintomas físicos; e diminuição gradativa no rendimento ocupacional. Apesar de não haver consenso na definição de burnout, existe uma significativa concordância em relação às dimensões que a constituem. São elas: exaustão emocional, despersonalização e baixa realização pessoal no trabalho. Considerando o exposto, o objetivo desse estudo foi analisar o nível de bem-estar e síndrome de burnout em profissionais da rede de proteção à criança e ao adolescente, de cinco municípios do interior do Rio Grande do Sul. Participaram 30 profissionais, dos quais 28 mulheres e dois homens. A média de idade foi de 38 anos (DP= 10,9). A maioria era de religião católica (n=24; 80%), possuía nível superior (n=14; 46,7%) ou algum tipo de pós-graduação (n=12; 40%). A área predominante de formação foi a Psicologia (n=9; 30%), seguida pelo Serviço Social (n=8; 26,7%) e pela Enfermagem (n=5; 16,7%), e a renda mensal variou de R$ 600,00 a 5.000,00 (M = R$ 2.004,90 reais). Quanto ao vínculo de trabalho, os principais foram celetistas e concursados (ambos os grupos com 26,7%; n = 8), seguido de estatutários (13,3%; n = 7). O tempo médio de trabalho na ocupação atual variou de 1 mês a 30 anos (M = 7,3 anos). Os instrumentos utilizados foram a Escala de Bem-estar Afetivo no Trabalho e Maslach Burnout Inventory (MBI). A primeira avalia os níveis de bem-estar no trabalho, por meio da subescala de afetos positivos e da subescala de afetos negativos; o MBI investiga os níveis de burnout através das três escalas: exaustão emocional, despersonalização e realização profissional. Os dados foram analisados por meio de estatísticas descritivas e da correlação de Pearson. Os valores do alpha de cronbach (α) da Escala de Bem-estar Afetivo no Trabalho na subescala de afetos positivos foi α=0.86 e na subescala de afetos negativos foi α = 0.86. Os valores do α do MBI para o fator exaustão emocional foi α = 0.79, para o fator despersonalização α = 0,25 e para baixa realização pessoal no trabalho α = 0,72 indicando, em geral, uma consistência interna significativa. Os resultados encontrados na Escala de Bem-estar Afetivo no Trabalho indicaram que os profissionais apresentam 91 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento uma relação positiva com o trabalho. Isso pode ser notado na média ponderada da subescala de afetos positivos M = 4,43 (DP = 0,41); complementando essa percepção, a média ponderada da subescala de afetos negativos foi de 2,50 (DP = 0,88). No MBI, a média ponderada para o nível de exaustão emocional foi de 2,08 (DP = 0,48), para despersonalização foi de 1,53 (DP = 0,43) e de baixa realização profissional foi de 1,79 (DP = 0,41). Os achados indicam que os profissionais apresentam baixos níveis de burnout. As análises de correlação de Pearson indicaram que as dimensões afeto negativo da Escala de Bem-estar Afetivo no Trabalho está positivamente relacionada às dimensões de exaustão emocional (r=0,71; p=0,001) e baixa realização no trabalho (r=0,54; p=0,002) do MBI. Com relação ao afeto positivo da Escala de Bem-estar Afetivo no Trabalho, observou-se que o mesmo está negativamente relacionado às dimensões de exaustão emocional (r=-0,53; p=0,003) e baixa realização (r=-0,59; p=0,001) no trabalho do MBI. No que se refere à dimensão de despersonalização do MBI, essa não está significativamente relacionada com a Escala de Bem-estar Afetivo no Trabalho. As correlações demonstraram que os dois instrumentos foram adequados para acessar os aspectos constituintes da relação dos profissionais com o próprio trabalho. Neste sentido, pode-se inferir que os profissionais que se disponibilizaram a participar da primeira etapa da capacitação apresentavam relações positivas com o trabalho por eles desenvolvido, aspecto corroborado pelos índices da Escala de Bem-estar Afetivo no Trabalho e pelo MBI. Palavras-chave: burnout, bem-estar, rede proteção 92 PERCEPÇÃO SOBRE VALORES QUE INFLUENCIAM A PRÁTICA DE PROFISSIONAIS DA REDE DE PROTEÇÃO A CRIANÇAS E ADOLESCENTES DO INTERIOR DO RS Normanda Araujo de Morais - UFRGS [email protected] Juliana das Neves Nóbrega - UFRGS [email protected] Clarissa Pinto Pizarro de Freitas - UFRGS [email protected] Bruno Figueiredo Damásio - UFRGS [email protected] Silvia Helena Koller - UFRGS [email protected] Este trabalho tem como objetivo avaliar os principais valores que embasam a prática de profissionais da rede de atendimento a crianças e adolescentes do interior do Rio Grande do Sul, assim como as percepções destes profissionais, sobre como têm se sentido desde que começaram a trabalhar com essa população. Esses profissionais (n=30) participaram da Capacitação promovida pelas Universidades Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e pela Faculdade Três de Maio (SETREM) acerca das temáticas de direitos humanos, violência e mediação de conflitos, com duração de 30 horas. No início das atividades, os profissionais responderam a um questionário de pré-teste, no qual constavam questões de caracterização sociodemográfica, além de escalas específicas, sobre esgotamento profissional, bem-estar no trabalho, valores que fomentam suas práticas e percepções de como se sentem desde que começaram a trabalhar com crianças e adolescentes. Os resultados destas duas últimas escalas foram analisados para o presente trabalho. Na escala de valores (seis itens; alpha = 0,70), o participante deveria apon- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento tar um valor entre 1 a 5 para avaliar a frequência (nunca a sempre) com que valores familiares, religiosos, institucionais, do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), formação técnica e experiência profissional influenciam a sua prática. Na escala de percepção sobre como se sentem desde que começaram a trabalhar com crianças e adolescentes (13 itens; alpha = 0,89), o participante deveria destacar numa escala de 1 a 5 (discordo totalmente a concordo totalmente) o quanto se sente mais otimista, cansado, feliz, preparado, pessimista e outros, desde que vem trabalhando nessa área. A amostra foi predominantemente do sexo feminino (n=28; 93,3%) e tinha, em média, 38 anos de idade (DP = 10,93). A maioria declarou-se católica (n=24; 80%) e possuía nível superior (n=14; 46,7%) ou algum tipo de pós-graduação (n=12; 40%). A área predominante de formação foi Psicologia (n=9; 30%), seguida por Serviço Social (n=8; 26,7%) e Enfermagem (n=5; 16,7%) e a renda mensal variou de R$ 600,00 a 5.000,00 (M = R$ 2.004,90 reais). O principal vínculo de trabalho foi celetista e concursado (ambos com 26,7%; n = 8), seguido de estatutário (13,3%; n = 7). O tempo médio de trabalho na ocupação atual variou entre 1 mês e 30 anos (M = 7,3 anos). Já o tempo médio do trabalho com direitos da criança e do adolescente foi inferior (M = 4 anos; variando de 1 mês a 21 anos). Entre os participantes, a experiência profissional (M = 4,66; DP = 0,55) foi apontada como o item que mais influencia a prática, seguida pelos demais valores: formação técnica (M = 4,50; DP = 0,78), valores institucionais (M = 4,17; DP = 0,87), valores familiares (M = 4,00; DP = 1,2) e valores religiosos (M = 2,87; DP = 1,33). Análises de correlação envolvendo esses valores e características sociodemográficas (idade, escolaridade, tempo médio de trabalho na ocupação atual, tempo de trabalho com direitos da criança e renda mensal) mostraram as seguintes correlações: valores familiares e idade (r = 0,39; p < 0,05); valores familiares e tempo de trabalho (r = 0,45; p < 0,05); valores religiosos e idade (r = 0,36; p < 0,05); valores religiosos e tempo de trabalho (r = 0,46; p < 0,05); valores religiosos e tempo de trabalho com direitos da criança e do adolescente (r = 0,51; p < 0,01); influência da legislação do ECA com escolaridade (r = 0,43; p < 0,05) e da legislação do ECA com a renda mensal (r = 0,37; p < 0,05). Ou seja, os valores familiares e religiosos tenderam a ser apontados por profissionais mais velhos e com mais tempo de trabalho; os valores religiosos também foram mais mencionados pelo grupo de profissionais que trabalha há mais tempo com direitos da criança; e, por fim, os valores do ECA foram mais mencionados pelo grupo de profissionais com maior escolaridade e renda. Quando convidados a avaliarem como se sentiam desde que começaram a trabalhar com crianças e adolescentes, os participantes ressaltaram que: (a) começaram a buscar conhecimentos que julgavam necessários (M = 4,52; DP = 0,50); (b) estavam certos que queriam continuar trabalhando na área (M = 4,45; DP = 0,63); (c) sentiram que agregaram conhecimentos que julgavam necessários à atuação (M = 4,38; DP = 0,56); (d) desenvolveram uma visão menos preconceituosa da população (M = 4,21; DP = 0,92); e (e) uma visão menos idealizada desta (M = 4,14; DP = 0,59). Os itens que obtiveram as menores médias foram aqueles que expressavam uma visão negativa, dentre eles: sentir-se mais pessimista (M = 2,10; DP = 0,90), sentir-se 93 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento mais cansado (M = 2,21; DP = 0,98) e sentir-se mais frustrado (M = 2,28; DP = 1,03). Análises de correlação dos itens dessa escala com variáveis sociodemográficas mostraram apenas uma correlação positiva, a saber: o tempo de trabalho com direitos da criança esteve correlacionado com o item “sentir-se mais otimista quanto ao sucesso do trabalho” (r = 0,48; p < 0,05). Em síntese, os resultados sugerem a importância da experiência profissional na prática cotidiana dos participantes. Inclusive, eles ressaltam a busca pelo conhecimento na área como um passo que deram desde que começaram a trabalhar com a temática de direitos da criança e do adolescente. Há, ainda, por parte dos participantes, uma visão positiva da sua prática, a qual é relacionada a sentimentos de felicidade e realização. Ambos os aspectos (busca de conhecimento técnico, sentimento de felicidade e realização) ficaram visíveis nos depoimentos e na forma como se mostraram engajados na capacitação. Palavras-chave: profissionais, rede de proteção, infância e adolescência Contato: Normanda Araujo de Morais, UFRGS, [email protected] MR LT02 - Mesa Redonda Convidada MR LT02-1503 - VIGOTSKI NA ATUALIDADE, UMA DISCUSSÃO TEÓRICO-METODOLÓGICA A mesa redonda tem por objetivo reunir especialistas em Vygotsky que trazem uma perspectiva atual na leitura dos textos e na prática de pesquisa. A mesa é compos94 ta por Ana Luiza Bustamante Smolka, uma das pesquisadoras vygotskianas do Brasil de maior proeminência, com destaque nos cenários nacional e internacional; pelo professor Bernd Fichtner, da Universidade de Siegen na Alemanha, que repensa a teoria de Vygotsky no contexto da produção das ciências humanas; pela professora Marta Sforni, pesquisadora ativa na área, com enfoque na Teoria da Atividade; e, por fim, Zoia Prestes, tradutora das obras de Vygotsky que levanta questionamentos atuais acerca da interpretação da teoria vygotskiana no Brasil. VYGOTSKY NA CONTEMPORANEIDADE: CONTRIBUIÇÕES, INSPIRAÇÕES E PROVOCAÇÕES Ana Luiza Bustamante Smolka - UNICAMP L. S. Vygotsky nos deixou uma obra extensa, densa e inacabada, repleta de intuições fecundas. Ao mesmo tempo em que nos inspira e nos fornece as bases de uma consistente sustentação teórico-metodológica, a obra se abre a múltiplas interpretações. Vygotsky privilegiou em seus estudos o desenvolvimento cultural da criança, chamando a atenção para a história do desenvolvimento cultural do ser humano. Apontando insistentemente para a importância de se considerar a história – das funções mentais superiores, da atividade humana, do desenvolvimento do gesto de apontar, dos signos, da linguagem, da consciência -, ele argumentava sobre a constituição social da personalidade individual forjada numa história de relações sociais. Vygotsky dizia que a história do desenvolvimento cultural nos leva, de cheio, aos problemas da educação. Suas preocupações se orientavam, assim, VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento para os modos de ensinar, para os modos de estudar as relações de ensino, e para os resultados ou efeitos dessas relações. Em sua perspectiva do desenvolvimento humano, a educação e o ensino, como o trabalho do homem sobre o homem, adquiriam fundamental relevância. Buscando compreender como a criança se apropria da cultura, ou como o coletivo cria as funções mentais superiores na criança, ele defendia a tese da participação do outro e dos instrumentos técnicos e semióticos como constitutivos da emergência de novas formas de atividade humana no curso da história. Perseguindo essas questões no campo da Psicologia e da Educação, Vygotsky não se cansou de levantar e discutir a questão do método. Interessado na emergência e no engendramento de novas formas de atividade, ele desenvolveu o que chamou de método instrumental, histórico genético, ou de dupla estimulação, no estudo das relações desenvolvimento/ aprendizagem/ pensamento/linguagem / experiência/consciência. Nos últimos anos de sua vida, chegou a afirmar que “a análise semiótica é o único método adequado para estudar a estrutura do sistema e o conteúdo da consciência” (Vygotsky, 1996:188). Sua obra plural e “em aberto” repercute e se desdobra hoje em uma diversidade de tendências. São muitos os aspectos que demandam aprofundamento. Participando das atuais discussões e visando a incitar o debate, trago para essa apresentação fragmentos do material empírico referente a um projeto de pesquisa em andamento que assume o referencial em questão e que tem como objetivo a melhoria do ensino público. A intenção aqui é problematizar e explorar o potencial teórico, conceitual e analítico de alguns pressupostos e construtos atribuídos a Vygotsky, em interlocução com outros autores contemporâneos. Tomando como foco e lugar de análise as enunciações dos professores em reuniões de estudo, a proposta é refletir sobre as possibilidades de (investigação do) desenvolvimento dos sujeitos e de desenvolvimento da própria da atividade de ensinar, considerando as con(tra)dições da contemporaneidade. A ABORDAGEM DE VYGOTSKY COMO PROVOCAÇÃO PARA AS CIÊNCIAS HUMANAS Bernd Fichtner - Universidade de Siegen/ Alemanha Nos últimos vinte anos vivenciamos o colapso e a dissolução de três fronteiras importantes: 1. a fronteira entre o homem e o animal foi definitivamente desconstruída pelos resultados da pesquisa sobre os primatas; 2. a fronteira entre organismo e maquina foi aniquilada pelas pesquisas da neuro-informática e nanotecnologia; 3. a fronteira entre o físico e o não físico desapareceu. Com o desaparecimento destas fronteiras todos os velhos dualismos, com os quais estávamos compreendendo a realidade, perderam a sua credibilidade, especialmente aqueles fundamentos das distinções dicotômicas: matéria/espírito, corpo/mente, indivíduo/sociedade. Neste contexto, a abordagem histórico-cultural de Vygotsky é uma provocação irritante formulando perguntas inúmeras. Quando nós hoje estamos examinando e analisando as obras de Vygotsky podemos dizer que ele também nos examina de perto. Nós mesmos somos o objeto de pesquisa quando queremos compreender um autor do passado. Nessas tentativas de compreender o pensamento de Vygotsky constru95 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento ímos sempre conhecimento novo sobre o nosso presente quer dizer a nossa compreensão da psicologia de desenvolvimento torna-se quase mais transparente nas suas estruturas, seus contornos, suas fronteiras e, sobretudo nos seus aspectos problemáticos. As ciências humanas se esforçam – com maior ou menor êxito – para conseguir aproximações cada vez mais precisas à realidade pesquisada. Com essa lógica as ciências humanas acreditam que essa realidade na sua essência já é entendida e compreendida. Assim a psicologia de desenvolvimento pode-se afirmar o que é desenvolvimento psíquico. A psicologia de desenvolvimento define também o que é uma criança ou o que é um adolescente. As crianças são pesquisadas há mais de cem anos. Encontramos uma acumulação impressionante de conhecimento cientifico. Nessa lógica com certeza sabemos hoje mais sobre crianças do que se sabia na época de Vygotsky. Porém, encontramos aspectos sobre este tema que ainda não são plenamente compreendidos. Como exemplo podemos questionar o pouco que realmente se sabe sobre os adolescentes e suas ligações com as novas tecnologias de informação e comunicação, a mudança atual de valores morais e éticos destes adolescentes, etc. Na perspectiva linear da lógica da pesquisa cientifica como aproximação cada vez mais precisa à realidade todos os problemas aparecem resolvíveis. Uma conseqüência disso: a importância dos métodos e da metodologia (metodologia: a avaliação e a análise do sistema dos métodos a respeito da sua “objetividade”, de sua “reliabilidade” e sua “validade”). Wanderley Geraldi (2005) critica esta direção e orientação, mais ou menos técnica, para os métodos e para a metodologia com estas palavras: 96 ”Nenhum vôo é permitido, exceto aquele que obedece às regras do que é requerido para a construção de novos enunciados”. Uma polícia discursiva (ou, uma polícia das ciências disciplinares) está pronta para voltar ao já firmado, ao já previsto, ao já estatuído, ainda que estivesse lá por ser dito. E há que fazer isso com rigor.” Sabemos realmente o que é o desenvolvimento de uma criança, de um adolescente – ou mais geral o que é uma criança, o que é um adolescente? Nas Arte e Filosofia encontramos que o conhecimento não tem nem uma acumulação linear nem uma hierarquização desse conhecimento. Aleijadinho não é mais avançado do que Velásquez e Cézanne não é mais avançado do que Aleijadinho. Espinosa não é mais avançado do que Descartes. Nem Hegel que Descartes. A filosofia e a arte estão indicando que esta ideia de uma “aproximação a realidade” é uma ilusão. Mas, o que arte e filosofia realmente têm em comum? Na lógica de uma obra de arte ou de um conceito fundamental de filosofia se encontra “a Perspectiva do Novo/o Ponto de Vista do Novo”. Isso significa ver e olhar um fenômeno, uma realidade como se os olhássemos pela primeira vez. No olhar da filosofia e no olhar da arte, a realidade nunca é já totalmente compreendida. Ao contrário, ela é indeterminada, aberta. Nesse sentido uma obra de arte e um conceito fundamental de filosofia são sempre pressupostos e tematizam uma relação formal com a realidade. A relação com essa realidade ou com esse fenômeno é precisamente e absolutamente determinada pela forma enquanto, que a realidade, o fenômeno fica aberto e indeterminado. O formal, a representação possibilita aqui a escolha de uma perspectiva: conceitos teóricos e obras de arte VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento como modelos de um diálogo com a realidade mediando uma relação. “A Perspectiva do Novo/o Ponto de Vista do Novo” exige aceitar o metafórico no processo de olhar e de ver, o que significa ver algo como algo (isso é isto). A metáfora não reflete semelhanças; não apresenta algo que seja comum entre objetos, como fenômenos e processos; algo que está já pronto, disponível e preestabelecido. A metáfora cria e constrói fundamentalmente relações. Metáforas são como crianças: impressionam o seu ambiente de uma maneira específica. Elas portam o novo, o não previsto. Representam enfoques de relevâncias junto com uma orientação para o futuro. Como uma criança é uma promessa de vida, vida que não é preestabelecida em seus passos. Metáforas não têm só uma função constitutiva na formação cítrica de nossa experiência, mas também para as mudanças, transformações e reestruturações delas. As fronteiras e limites de uma área preestabelecida de experiências podem ser destruídos, quebrados e alargados. Uma relação estandardizada e automatizada pode ser assim rompida. Muitas obras de Vygotsky se caracterizam pela confrontação e ruptura com o estabelecido, com o sistema estereotipado, fechado e fixado. O seu trânsito por e o interesse pela Arte e Filosofia lhe proporcionaram condições de ter uma visão mais ampla das questões psicológicas, incorporando contribuições dessas outras áreas de conhecimento. Encontra-se na abordagem de Vygotsky uma enorme riqueza e diversidade de temas, passando pela neuropsicologia, pela linguagem, pela educação, nomeadamente quando enfrenta problemas de deficiências, pelas questões semióticas do cinema, aliando questões teóricas e metodológicas, de modo que acaba por introduzir e apontar caminhos para todas as ciências humanas. Gostaria de mostrar como nas obras de Vygotsky a lógica geral de arte e de filosofia atua concretamente nas disciplinas humanas, sobretudo na psicologia do desenvolvimento. No centro da metodologia vigotskiana encontra-se o “Método Histórico” ou também o assim chamado “Método Genético” ou “Método Histórico” pelo qual Vygotsky tematiza o seu pressuposto fundamental: entender cada fenômeno vivo exige entendê-lo no seu início e também no processo do seu desenvolvimento. A este método está incorporado o famoso lema de Hegel: "O inteiro é sempre o resultado compreendido junto com o processo de seu desenvolvimento". Este lema foi assumido por Vygotsky como um principio universal metodológico. Este problema principal do desenvolvimento foi analisado e pesquisado através de três perspectivas metodológicas: (1) A abordagem de Vygotsky apresenta uma perspectiva monística, quer dizer, toda separação entre indivíduo e sociedade, corpo e mente, entre cognição e emoção, entre físico e espírito, entre ações exteriores e ações interiores foram rigorosamente negadas. (2) A abordagem de Vygotsky apresenta uma perspectiva holística, que se opõe a qualquer reducionismo, ou seja, processos complexos não se podem reduzir a processos elementares. Por exemplo, um processo psíquico não se pode explicar reduzindo-o a processos físicos ou químicos. Segundo Vygotsky se deve encontrar ou construir unidades de análise que permitam considerar os processos complexos. (3) A abordagem histórico-cultural apresenta uma perspectiva interdisciplinar ou multidisciplinar. A base desta perspectiva são sempre problemas sociais ou proble97 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento mas práticos. Um problema social sempre tem aspectos diferentes: individuais, psíquicos, culturais materiais etc. Os próprios especialistas em interdisciplinaridade não se encontram nos estudiosos ou nos pesquisadores, mas nos práticos, que devem resolver problemas práticos sempre multidimensionais. Na palestra vou tentar de concretizar esses aspectos ao respeito da conceitualização de “desenvolvimento” na abordagem de Vygotsky. PESQUISA SOBRE ENSINO, APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO: CONTRIBUIÇÕES DA TEORIA DA ATIVIDADE Marta Sueli de Faria Sforni - UFSC As discussões acerca do papel da escolarização sobre o desenvolvimento psíquico desencadeadas pela abordagem Vigotskiana ressaltaram o valor da educação escolar na constituição dos sujeitos. Porém, quando Vygotsky fala de ensino, não se refere a qualquer ensino, mas àquele que se “adianta ao desenvolvimento”, ao “bom ensino”, a uma “correta organização da aprendizagem” ou, ainda, ao “aprendizado adequadamente organizado” (VYGOTSKY, 2001). Ou seja, não basta ao indivíduo freqüentar escolas, não lhe basta ter acesso a conceitos científicos para que seus processos internos de desenvolvimento sejam acionados. Tal fato suscita dois possíveis problemas de investigação: O que qualifica um bom ensino ou uma correta organização da aprendizagem? Em que sentido a organização do ensino pode influenciar qualitativamente o processo de desenvolvimento? Davidov (1992) considera que o ensino que impulsiona o desenvolvimento está li98 gado à fundamentação lógico-psicológica da estruturação das disciplinas escolares. Isto é, o conteúdo e os meios didáticos por meio dos quais o conteúdo é ensinado determinam o tipo de consciência e de pensamento que se formam nos estudantes. Assim, a organização do ensino não é um assunto exclusivamente didático, mas está relacionado também ao potencial de desenvolvimento psíquico dos estudantes. Nesse sentido, as respostas aos dois questionamentos, expostos acima, podem oferecer conhecimentos importantes para a Didática e para a Psicologia. Mas para se chegar a tais respostas é necessário encontrar procedimentos de pesquisa que permitam identificar se uma forma de organização do ensino tem o potencial de promover o desenvolvimento dos estudantes. A necessidade de analisar como têm sido ensinados conceitos científicos na escola, bem como de identificar condições teórico-metodológicas para a organização do ensino em que a aprendizagem conceitual contribua para a promoção do desenvolvimento psíquico (Sforni, 2004), tem nos acompanhado desde a pesquisa de doutorado. Atualmente, as pesquisas que temos realizado conjuntamente com os membros do Grupo de Pesquisa Ensino, Aprendizagem e Conteúdo Escolar - UEM, e com os membros do GEPAPe-USP – Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Atividade Pedagógica, têm como objetivo “Investigar princípios teórico-metodológicos da atividade pedagógica, tendo como fundamento a Teoria Histórico-Cultural”. Além dos estudos de Vygotsky, contamos também com os subsídios da Teoria da Atividade de Leontiev (1983, 2004). Como procedimento metodológico para coleta de dados, temos organizado “experimentos didáticos” ou “experimentos formativos” VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento que permitem acompanhar o processo de aprendizagem dos sujeitos, quando inseridos em uma situação de ensino organizada de acordo com alguns princípios teórico-metodológicos que consideramos favoráveis ao desenvolvimento dos estudantes, sendo que, esses modos de organização do ensino também são objetos de investigação. Alguns conceitos desenvolvidos por Leontiev (2004) são orientadores de nossas ações, dentre eles os conceitos de objetivação e apropriação do conhecimento. Na compreensão dos conhecimentos científicos como instrumentos psicológicos, nos quais estão objetivados processos mentais já alcançados pelo gênero humano, encontramos valiosos indícios que podem orientar a tomada de decisões na organização do ensino. Apropriar-se de um conceito, nessa perspectiva, significa tomar posse desses processos mentais, o que implica colocar em movimento esses processos à medida que interagimos com o conhecimento. Daí a relação entre ensino, aprendizagem e desenvolvimento, destacada por Vygotsky. Nesse sentido, é preciso que os conceitos – objetos de ensino – estejam inseridos em uma atividade na qual sua função como instrumento seja explícita. Pensar a aprendizagem de conceitos nessa perspectiva implica reconhecer que a sua apropriação não se resume à definição e memorização, como normalmente ocorre no contexto escolar. Também os conceitos de ação e operação, apresentados por Leontiev (2004), têm nos permitido algumas inferências significativas. Esse autor explica que a assimilação do conhecimento implica a formação de ações mentais. Ao afirmar que no processo de aprendizagem motora ou intelectual, o sujeito passa da ação à operação com o objeto do conhecimento, sendo que a operação se constitui na ação automatizada, Leontiev oferece pistas para se pensar uma orientação metodológica para o ensino de conceitos. Mesmo que muitos conhecimentos sejam já operacionais ou automatizados na cultura, para que eles sejam desenvolvidos no sujeito como operações conscientes é preciso que elas se formem primeiramente como ações (Leontiev, 2004). É preciso que um dado conteúdo seja objeto direto da atenção, da percepção, do raciocínio do sujeito para que passe a compor o conteúdo e o modo de ele operar com os fenômenos da realidade, ou seja, para que, de fato, seja apropriado como instrumento simbólico pelo sujeito. Por quais meios investigar o impacto do ensino sobre aprendizagem e desenvolvimento dos sujeitos, já que esses são processos tão subjetivos? Se aprender é mais do que recitar definições, implica “fazer uso” dos conceitos na realização de ações e operações mentais, é preciso buscar elementos externos que explicitem os processos psicológicos envolvidos em determinadas atividades do sujeito, já que essas atividades podem revelar a forma pela qual o sujeito opera com os conceitos. Assim, em nossas pesquisas temos tomado como objeto de análise a própria atividade do sujeito com objetos e fenômenos. Observamos se ele realiza a atividade por meio de um pensamento categorial, em nível teórico, ou se depende de representações sensoriais, limitando-se ao pensamento empírico, o que significa diferentes níveis de desenvolvimento. Considerar a atividade como objeto de análise “significa a possibilidade de se analisar um elemento observável e, por meio dele, desvelar a forma e o conteúdo da subjetividade” (Sforni & Galuch, 2009, p. 127). Partindo do princípio de que 99 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento há unidade entre linguagem, pensamento e ação, tomamos como fontes de análise a linguagem e a ação, como meios que nos permitem inferir, mesmo que parcialmente, o pensamento conceitual promovido pelo ensino. Cabe destacar que tais procedimentos investigativos constituem-se em um caminho em construção, marcado por dúvidas e algumas limitações, mas que tem apresentado resultados promissores, o que nos estimula a continuar caminhando, apesar das incertezas. L. S. VYGOTSKY: A FORÇA E A ATUALIDADE DE SUA OBRA Zoia Prestes - UniCEUB Lev Semionovitch Vygotsky foi um pensador soviético e seu nome é bem conhecido hoje no Brasil, principalmente entre os que se dedicam aos estudos nas áreas da pedagogia e psicologia. A trajetória acadêmica no Brasil das obras de Vygotsky, seus colaboradores e alunos teve início no fim dos anos 70. Seus estudos estão presentes no mundo inteiro, editados e publicados nas mais diferentes línguas, tais como inglês, francês, italiano, espanhol, alemão, japonês, português, húngaro e dinamarquês. Se fizermos hoje uma rápida busca nas publicações das obras de Vygotsky na Rússia, por exemplo, veremos que, na última década, seus três principais livros foram relançados por diferentes editoras, assim como foram reeditados artigos publicados apenas nos anos 30, antes de serem proibidos, em coletâneas que estão surgindo novamente nas prateleiras das livrarias da Rússia. Quando se analisa a extensa produção escrita de Lev Semionovitch Vygotsky, nota-se que foram poucos os livros que escreveu: Psirrologuia iskuss100 tva (Psicologia da Arte), escrito em 1925 e publicado somente em 1965; Pedagoguitcheskaia psirrologuia (Psicologia Pedagógica) de 1926, e Michlenie e retch (traduzido no Brasil como Pensamento e linguagem ou Construção do pensamento e da linguagem), de 1934; e uma série de livros didáticos para o ensino à distância (por correspondência), tais como Pedologia da idade escolar (Pedologuia chkolnogo vozrasta), de 1928, Pedologia da juventude (Pedologuia iunochevskogo vozrasta), de 1929, e Pedologia do adolescente (Pedologuia podrostka), escrito entre 1930 e 1931. Alguns capítulos deste último livro didático foram republicados no volume 4 de Obras reunidas (Sobranie sotchineni). Os livros publicados, principalmente após a morte de Vigotski, reúnem artigos, textos e estenografias de aulas proferidas ou discursos em eventos científicos. O levantamento mais completo e sistematizado até o momento está apresentado em anexo à biografia escrita por Guita Vigodskaia, filha de Vygotsky, e Tamara Lifanova (1996) que relaciona 274 títulos. Embora Daniil Borissovitch Elkonin, contemporâneo, aluno e colaborador de Vygotsky, relacione cerca de 180 trabalhos (Elkonin, 1984). Essa divergência nas informações a respeito de sua produção teórica mostra não apenas o interesse que ainda desperta sua obra em seu país, mas também é uma divergência que está prestes a ser reduzida a zero com a publicação da obra completa. Um dos motivos da divergência é que na lista de Guita estão indicados até mesmo artigos e textos que ainda permanecem na forma de manuscritos e estão guardados nos arquivos da família que, atualmente, prepara o lançamento de dois volumes das obras completas que deverão conter 16 volumes, cada um com VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento uma média de 400 páginas. Além de proibidas na URSS por quase 20 anos, as obras de L.S. Vygotsky nem sempre tiveram um destino digno. Ao analisarmos detalhadamente o percurso de algumas de suas publicações, pode-se afirmar, sem medo, que foram muitas as adulterações, os cortes, as censuras que sofreram ao longo da história, tanto em sua pátria como fora dela. Desde a publicação de seus primeiros livros nos Estados Unidos e de traduções para o português a partir das versões norte-americanas, já se passaram mais de 30 anos. Sem dúvida, essas primeiras iniciativas de trazer para o Brasil os estudos de um dos mais importantes pensadores soviéticos do século XX merecem reconhecimento. No entanto, atualmente, a própria Rússia reconhece que muitos textos do autor, para que fossem publicados ainda no fim dos anos 50, foram cortados e alterados pelos editores (Zaverchneva, 2009, 2010). É desconcertante descobrir, por exemplo, que o livro Michlenie i retch (traduzido como Pensamento e linguagem) teve alguns parágrafos cortados e que, somente em 1996 (González, 2007, p. CXXXIV), foi publicada a primeira edição do texto original que se encontra microfilmado na biblioteca da Universidade Estatal de Moscou. Mais perturbador ainda é o fato de que, no Brasil, uma mesma editora publica duas versões (Vygotsky, 1987 e 2001) dessa obra de Vygotsky como se fossem livros diferentes. Na verdade, até são, já que uma delas, a edição resumida, não pertence de fato à pena do pensador, mas sim aos seus editores que a adulteraram, atribuindo a autoria a Vygotsky. Essa edição apareceu em 1987 pela editora Martins Fontes traduzida do inglês por Jefferson Luiz Camargo, a partir da edição do Instituto Tecnológico de Massachusetts. Mais recentemente, em 2001, no Brasil, foi publicada pela mesma Martins Fontes a versão completa de Michlenie e retch, sob o título A construção do pensamento e da linguagem, traduzida diretamente do russo por Paulo Bezerra. Na ficha técnica do livro não está indicada a edição russa da qual foi traduzida para o português, mas, ao comparar com a edição russa integral de 2001, pode-se afirmar que é o texto completo, pois contém todos os trechos suprimidos na edição soviética retalhada de 1956 (González, 2007, p. CXXXI). Mas parece que não foi somente a obra de Vygotsky que sofreu adulteração. Sua vida também é cercada de mistérios e fatos pouco esclarecidos. As divergências entre as interpretações de fatos importantes de sua vida permanecem ainda como um campo bastante nebuloso na história da psicologia soviética. Se forem feitas comparações entre textos biográficos publicados na União Soviética (por exemplo, Levitin, 1990), na Argentina (por exemplo, Blanck, 1984) e nos Estados Unidos (por exemplo, Kozulin, 1990) é possível detectar discrepâncias acerca de fatos importantes da vida e obra do autor. Assim, o estudioso de Vygotsky vê-se diante de informações, por vezes, até contraditórias e a melhor alternativa na busca de um quadro mais coerente da vida e obra do autor é a realização de exames comparativos das diferentes biografias disponíveis. Atualmente, além das biografias citadas, há a escrita por sua filha, em colaboração com T. M. Lifanova e encontra-se publicada em russo e em inglês (1996, 1999 a, b, c), esta última não totalmente na íntegra (faltam fotos e fac-símiles de alguns documentos). A outra biografia é de autoria de Iarochevski (2007) e foi publicada somente em russo. Além disso, em 2011, foi publicada 101 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento na Rússia mais uma biografia do pensador Misl i sudba psirrologa Vigotskigo (O pensamento e o destino do psicólogo Vigotski), de autoria de Igor Reif. Diante desse quadro, não resta dúvida de que há em todo o mundo um grande interesse pelas ideias e pela vida de Vygotsky. MR LT01 - Mesa Redonda Convidada MR LT01-1508 - O ENVELHECIMENTO BEM SUCEDIDO E A APOSENTADORIA: A PRÁTICAS DE HOMENS IDOSOS E DIFERENTES PROGRAMAS DE PREPARARO PARA A APOSENTADORIA Samia Abreu - UnB [email protected] Lilian Maria Borges Gonzalez - UCB [email protected] Cristineide Leandro França - UnB [email protected] Sheila Giardini Murta - UnB [email protected] Eliane Seidl - UnB [email protected] Isolda Gunther - UnB [email protected] Juliana Seidl - UnB [email protected] Ana Carolina da Conceição [email protected] Marina Pedralho - UnB [email protected] Nadielle Lira - UnB [email protected] Rochely Karen Moreira Carvalhedo - UCB [email protected] Andressa Gonzáles Azevedo Pinheiro Soares Macedo - UnB 102 [email protected] Juliane Rosa - UnB [email protected] João Luís X. M. de Negreiros - UnB [email protected] Brisa Oliveira - UnB [email protected] De acordo com a perspectiva do life-span, o envelhecimento humano é um processo multidimensional e multidirecional que engloba um delicado equilíbrio entre limitações (perdas) e vantagens (ganhos). Consonante com essa visão, o envelhecimento e a velhice constituem experiências heterogêneas e, como tal, devem ser abordados em sua complexidade e diversidade. A passagem para aposentadoria, é uma fase difícil e nem sempre enfrentada de forma positiva por alguns trabalhadores. Os Programas de Preparação para Aposentadoria surgem como medida preventiva para melhorar a qualidade de vida das pessoas que se encontram nessa fase e necessitam de ajuda para atravessá-la de forma saudável. O envelhecimento bem sucedido e a aposentadoria serão apresentados em suas manifestações frente a um estudo sobre a concepção e práticas de homens idosos (estudo 1), a implantação de um programa de preparação para aposentadoria (estudo 2) e avaliação de um intervenção preventiva breve no planejamento da aposentadoria (estudo 3). O presente estudo buscou investigar as percepções de treze homens com idades entre 62 e 78 anos, todos casados, aposentados e portadores de diferentes doenças crônicas, recrutados em um centro de convivência para idosos, os quais foram entrevistados individualmente acerca de suas concepções de envelhecimento bem sucedido e das práticas adotadas na busca de uma velhice saudável. As VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento respostas obtidas foram submetidas à análise de conteúdo de Bardin. Os relatos dos participantes foram agrupados em fatores físicos e psicossociais. Dentre os fatores físicos mencionados, foi possível identificar duas subcategorias, que apresentavam em comum o fato de enfatizarem as necessidades ou limitações orgânicas da pessoa idosa, a saber: busca de serviços médicos e uso da medicação e reconhecimento e respeito às limitações físicas. Os fatores psicossociais, por sua vez, foram organizados em oito subcategorias: manutenção de hábitos saudáveis; ausência de hábitos nocivos à saúde; manutenção de atividades de trabalho ou recreativas; esquiva ou manejo de situações estressantes; satisfação em viver; manutenção de bom relacionamento familiar; prática de ações solidárias e controle das finanças. Os participantes relataram manter em seus cotidianos práticas preventivas e promotoras da saúde, as quais foram organizadas tomando por parâmetro três eixos temáticos: busca e utilização dos serviços de saúde, hábitos saudáveis e vida ativa. A promoção do envelhecimento saudável e a prevenção de incapacidades devem assumir um papel central nas pesquisas e cuidados no campo da saúde dos idosos, considerando que podem assegurar um uso mais eficiente dos serviços de saúde e melhorar a qualidade de vida destas pessoas, ajudando-as a permanecerem independentes e produtivas. O objetivo do estudo é descrever as etapas de implantação do Programa de Preparação para Aposentadoria adotado pela Universidade de Brasília, chamado Viva Mais!. O modelo seguiu as seguintes etapas: Avaliação de necessidades - Inclui a revisão da literatura, elaboração do roteiro de entrevistas individuais e dos grupos focais com trabalhadores aposentados da Instituição. Criação de identidade visual e cartilha para os participantes - Consistiu na elaboração de todo o material gráfico, design da cartilha, convites e cartazes de divulgação. Sensibilização e Divulgação Foram realizadas visitas aos sindicatos e à diretoria de saúde da universidade. Informações sobre o programa foram disponibilizadas no site da UnB e convites entregues individualmente. Formação dos grupos e conteúdo da intervenção - Foram formados dois grupos, 13 servidores concluíram a intervenção. O programa contou com intervenções estruturadas em 8 módulos informativos e módulos vivenciais em um formato psicoeducativo, com duração de três horas semanais, totalizando 24 horas de programa. A partir da análise dos dados, foram encontradas seis dimensões de maior investimento pelos participantes, a saber: Aposentadoria, Finanças, Laços Afetivos e Sociais, Ocupação, Autoconhecimento e Saúde. Os temas citados pelos participantes, relacionados à categoria Aposentadoria, foram: a tomada de consciência em relação à aposentadoria e o planejamento de questões legais relativas à mesma. Na categoria Finanças, os participantes indicaram a realização de atividades com fins lucrativos e o cuidado com as finanças, como a quitação de dívidas bancárias. Quanto à categoria Laços Afetivos e Sociais, foi mencionado o cultivo de amizades, laços familiares e da relação com o parceiro. Além disso, investimento na atividade profissional, cumprimento de obrigações, lazer e responsabilidades com bens materiais foram temas que apareceram na categoria Ocupação. Por fim, na categoria Autoconhecimento, foram apontados os seguintes temas: lidar com mudanças e reflexão sobre seus comportamentos. Pode-se observar que os objetivos do programa 103 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento vêm sendo alcançados o que justifica a sua continuidade e propõe uma agenda de pesquisa para adaptação de procedimentos, novas formas de avaliação e aprimoramento desse modelo preventivo. Esse estudo teve como objetivo testar e aprimorar os procedimentos e estratégias de uma intervenção breve no planejamento da aposentadoria. Utilizou-se para esse fim uma oficina breve com técnicas psicoeducativas pré-estabelecidas. Participaram da pesquisa 09 trabalhadores, com a idade entre 22 e 63 anos, sendo 03 homens e 06 mulheres. Para coleta dos dados foram utilizados os seguintes instrumentos: Questionário Sociodemográfico para trabalhadores em situação de pré-aposentadoria e a Escala de Estágio de Mudança em Comportamento de Saúde. A intervenção ocorreu em sessão única, em grupo, com aproximadamente 180 minutos de duração. Consistiu na utilização de estratégias psicoeducativas e teve como base o modelo “FRAMES” (Feedback, Responsability, Advice, Menu de Option, Empathy, Self-eficacy). Para tratamento dos dados, utilizou-se a técnica de análise conteúdo de Bardin. O tratamento dos dados permitiu identificar que os preditores de uma aposentadoria promissora envolvem sentimentos de persistência, iniciativa, suporte familiar, busca de uma nova carreira e continuar os estudos. Como fatores de risco destacam-se as doenças, solidão, diminuição nas relações sociais, pouco dinheiro, condições de trabalho inapropriadas, ausência de políticas públicas para esse segmento populacional e falta de apoio da família e amigos. A segunda categoria investiga o que a intervenção breve possibilitou aos participantes descobrir, pensar e sentir sobre a transição para a aposentadoria. A terceira categoria abrange a descrição 104 dos recursos significativos para enfrentar as vulnerabilidades originadas nessa fase de transição. Sugere-se que esse modelo breve de intervenção seja investigado em um número maior de sujeitos e em outros ambientes organizacionais. Palavras-chave: envelhecimento bem sucedido, programa de preparação para aposentadoria, intervenção preventiva breve. MR LT01 - Mesa Redonda Convidada MR LT01-717 - “AS MELHORES COISAS DO MUNDO” COMO ESTÍMULO EVOCATIVO AOS DESAFIOS DA JUVENTUDE NA UNIVERSIDADE Francisco Silva Cavalcante Junior - UFC [email protected] Utilizando-nos do filme “As melhores coisas do mundo” (BODANSKY, 2010) como estímulo evocativo, os trabalhos propostos por esta Mesa Redonda apresenta um conjunto de autores que se debruçam sobre suas experiências docentes em cursos de graduação para refletir sobre os desafios da juventude com a qual convivem em suas aulas. Uma análise das condições de valia introjetadas por jovens universitários que os impedem de seguirem um caminho de desenvolvimento autônomo de suas trajetórias de vida é o primeiro tema abordado. Inovações metodológicas aplicadas na disciplina de Psicologia da adolescência, vida adulta e velhice permitem que professora e estudantes estudem, de forma autobiográfica, as condições valorativas que os impedem de navegarem em VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento fluxo vital pleno pelos estágios da vida. Na sequência, o professor visa compreender fenômenos das expressões e linguagens adolescentes que são expressas no ciberespaço, a partir da exibição do filme “As melhores coisas do mundo”, em sala de aula, abordando o crescente uso dos serviços das novas tecnologias por jovens universitários, assim como os variados “novos” fenômenos que se desdobram a partir desse espaço virtual que passa a ser amplamente utilizado e propagado. Narrativas adolescentes em redes sociais são registradas e analisadas neste estudo. Por fim, o desafio da tríade da neurose coletiva que se apresenta na juventude atual, ao matar, se matar ou se drogar, é ampliado, quando a morte passa a ser apresentada por adultos jovens na universidade como a única liberdade encontrada, tema também evocado e densamente trabalhado no filme “As melhores coisas do mundo”. Orientados por uma perspectiva da Abordagem Centrada na Pessoa cuja aprendizagem significativa emerge da experiência, os professores universitários aqui reunidos compartilham transformações que se constroem em suas práticas docentes, de forma espontânea, com uma capacidade transformadora de mobilização de todos os envolvidos no processo de ensino e aprendizagem do adulto jovem no contexto da universidade brasileira. PEDALANDO NAS TRILHAS DA VIDA Terezinha Teixeira Joca - UNIFOR [email protected] Desde a concepção, o bebê carrega uma bagagem impregnada de expectativas de seus pais. Dessa forma, a família e o meio exercem forte influência na constituição do sujeito como pessoa. E, desde muito pequenina, a criança percebe que esperam algo dela. Ao mesmo tempo em que começa a sentir a necessidade de consideração positiva de seus pais e de outras pessoas significativas. Passa a perceber o comportamento de aprovação ou reprovação daqueles que aprecia e a necessidade de aceitação é tão importante que passa a guiar seu comportamento a partir dessas experiências. Isso sugere que a experiência poderá não mais estar seguindo um fluxo natural de aperfeiçoamento de nosso organismo, mas caminhando em direção ao valimento do amor de nossos pais e aceitação da sociedade. Essas expectativas, essas condições para ser aceito e amado é o que chamamos de condições de valia. É uma valoração do amor a ser recebido. E todos nós trazemos condições de valia assinaladas em nossas vidas, que foram passadas por pais, professores, instituições, sociedade e por tudo que impõe algo a partir de um apreço condicional, que leva a pessoa mudar o curso de nossas escolhas para podermos ser aceitos ou amados e que frustra a nossa força motivadora em direção ao crescimento. Denominei essas condições de rodinhas da bicicleta emocional. Neste momento, pretendo lançar mão dessa metáfora que venho desenvolvendo a partir de uma pesquisa realizada com uma jovem em final de adolescência, que buscava irromper com as condições de valia impostas pelo meio e que disparava uma luta pelo seu próprio crescimento, tomando como abordagem, para o estudo, a etnográfica centrada na pessoa, proposta por Harry Wolcott (1999). Ampliei esse estudo através de minhas observações e das impressões apresentadas pelas pessoas ao lerem o texto, utilizado em sala de aula para jovens uni105 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento versitários, que imprimem suas reações, seus sentidos dados após o contato com essas rodinhas, que os remetem à infância e à adolescência. Aprofundado minha percepção sobre as condições de valia, percebi que, durante o percurso de vida, o sujeito não se torna isento das condições impostas pelo meio, pois poderá sobreviver uma ou outra que tropeçará no desejo de ser amado e aceito. Essa situação de condicionalidade poderá levar a pessoa à incongruência e, consequentemente, ao desenvolvimento de patologias. Dilatando o olhar, quando é conseguido retirar as rodinhas da bicicleta emocional segue-se adiante e passa a fazer uso de algo mais sofisticado, as marchas da bike. Esse novo recurso representa as formas que se possui para reagir aos problemas, modo como se percebe que não pode direcionar todas as culpas dos problemas ao meio e aos outros, passa-se a tomar consciência das próprias incapacidades e competências. Descobre-se e reconhece o seu valor interno. Lembrando que a adolescência não é só balada, diversão, papos livres e aventura e que os problemas surgem como terrenos diversos, enlameados, pedregosos, asfaltados, arenosos, que só se consegue sair se souber fazer uso da marcha adequada. Lembro, também, que as rodinhas da bicicleta emocional não estão presentes apenas na infância. Andar com rodinhas pode representar o sentir-se amado, amada. Um amor atarraxado à sua condição de crescimento, um amor atrelado ao pequeno espaço seguro, que não consegue vislumbrar novos caminhos a serem conquistados. Com a minha chegada à disciplina Psicologia da adolescência, vida adulta e velhice, apresentei o texto “Das Rodinhas da bicicleta as marchas de minha bike” logo após a exibição do filme “As 106 melhores coisas do mundo” (Bodanzky, 2010) e encantei-me com as reações emocionadas e as experiências trazidas pelos estudantes da evocação que essas duas obras geraram. Assim como os estudantes, passei a visitar as fases de desenvolvimento e, como propõe Amstrong (2011), fizemos uma navegação pelos estágios da vida, enveredamos pela “Odisseia do desenvolvimento humano” e resolvi desbravar esses novos caminhos, pedalando nas trilhas da Vida, cujas descobertas serão compartilhadas nesta comunicação. Palavras-chave: condições de valia, desenvolvimento humano, fluxo vital. LINGUAGENS ADOLESCENTES NO CIBERESPAÇO: VIDAS PÚBLICAS E PRIVADAS Márcio Silva Gondim - FANOR [email protected] Este estudo visa compreender fenômenos das expressões e linguagens adolescentes que são expressas no ciberespaço, a partir da exibição do filme “As melhores coisas do mundo” (Bodansky, 2010), em sala de aula do Ensino Superior. Trata-se de um tema relevante e atual, tendo em vista o crescente uso dos serviços das novas tecnologias, assim como os variados “novos” fenômenos que se desdobram a partir desse espaço virtual que passa a ser amplamente utilizado e propagado. Além disso, enfatiza-se que as narrativas adolescentes precisam ser registradas (Oliveira, 2006). Optou-se pela delimitação na adolescência, por ser o público representado no filme e pela possibilidade de debater temas atuais relacionados à juventude brasileira. O filme foi exibido em três sa- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento las de aulas, cada uma com uma média de quarenta estudantes, que foram convidados a escreverem as reações ao filme por meio de textos-sentidos (Cavalcante Jr, 2001). O filme citado apresenta cenas que demonstram situações específicas dos usos do ciberespaço: um blog em que um jovem registra escritos acerca de si e uma jovem que sofre agressividades e preconceitos por ter imagens íntimas expostas na Internet. “As melhores coisas do mundo” foi apresentado a estudantes do Ensino Superior da cidade de Fortaleza (CE). Destacaram-se, como pontos de reflexão, neste estudo: 1) Manifestação da escrita de si – pensamentos e emoções; 2) Manifestações da linguagem do preconceito, intolerância e agressividade. Em ambas as manifestações, com características e reflexões peculiares, observam-se em comum a exposição da vida privada por meio das novas tecnologias (especificamente blogs). Tendo em vista que os serviços tecnológicos são utilizados de modo crescente, nota-se também que a interioridade e as vidas íntimas ganham espaço e repercutem entre os adolescentes, de modo veloz e ágil, propagando informações privadas de modo amplo: tanto reflexões diárias acerca da vida e morte, como informações da vida íntima e sexual que ganham notoriedade pública na comunidade escolar. A possibilidade de uma hipervisibilidade (intencional ou não) parece haver em ambos os casos. Também é pertinente pensar acerca das motivações acerca das histórias dos outros (a espetacularização da vida pública, assim como um modo de anunciar publicamente uma importante decisão pessoal). No primeiro ponto discutido, “1) Manifestação da escrita de si – pensamentos e emoções”, percebeu-se que as experiências de escrita do jovem persona- gem do filme remeteu os estudantes (em sala de aula) a lembranças, pensamentos e sentimentos (Cavalcante Jr, 2001) acerca da escrita de si. Pode-se, então, considerar que as histórias de vidas são carregadas de particularidades e modos singulares de perceber a existência. Sendo assim, podemos verificar momentos em que as histórias de vidas permitem às pessoas fazerem um processo retrospectivo: olhar a um caminho percorrido, para acontecimentos, situações, atividades, pessoas significativas que encontraram, destacando que tudo o que é dito é importante, no sentido de descobrir a riqueza interior da experiência. Entende-se, assim, que se deve somar novas ferramentas estético-crítico-culturais no exercício pessoal e engajado de tornamo-nos sujeitos empoderados (Olinda, 2010). Recordações evocadas pelas pessoas mostram-se como ricos materiais para que os sujeitos entendam o que são (presente), porque são o que são (passado) e para onde querem direcionar as vidas (futuro). Dessa forma, os estudantes envolveram-se em uma atitude de reflexividade crítica acerca do mundo que nos rodeia, também escrevendo sobre si (Brandao, 2008). Ocorreu uma interação propiciada por um grupo reflexivo em sala de aula, no qual se contou, ouviu-se e representou-se imageticamente, conduzindo a aprendizagens biográficas. Desse modo, verificou-se a relevância de compartilhar experiências autobiográficas, proporcionando reflexões e relações em que as pessoas descobrirão nelas a capacidade de utilizarem essas relações para crescerem e se transformarem. Conforme Delory-Momberger (2006), a história de vida é a ficção verdadeira do sujeito: é a história que o narrador tem como verdadeira, e ele se constrói como sujeito no 107 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento ato de sua enunciação. O sujeito é objeto incessante de sua própria construção. Verifica-se que o ato de registrar por escrito as experiências e percepções, inscreve-se na dinâmica do projeto de si e concretiza uma forma particular dele, compreendendo a vida contada como uma construção de si, sempre aberta e sempre a refazer. Nessa primeira discussão, percebeu-se a publicação de si como algo transformador e útil aos sujeitos. No segundo ponto trabalhado, “2) Manifestações da linguagem do preconceito, intolerância e agressividade”, verificou-se a relevância de sensibilizar criativamente os estudantes em relação às questões psíquicas relacionadas ao bullying, fenômeno conhecido vulgarmente como assédio moral e físico em ambientes escolares, que vem crescendo em vários ambientes; desde o doméstico, empresas , escolas, universidades , penitenciárias, forças armadas e mais recentemente nos meios virtuais (ciberespaço), onde a intolerância, discriminação e as minorias são alvos de ataque a indivíduos reconhecidos como mais frágeis. O filme retrata exatamente o “cyber bullying”, quando uma jovem é submetida a vários constrangimentos públicos. O bullying é um problema social que deixa fissuras, muitas vezes, irreversíveis no sujeito (Antunes, 2008; Bandeira, 2010; Zaine, 2010). Tratando-se de uma pesquisa-ação qualitativa, convidaram-se os estudantes do Ensino Superior pro que expressarem reações ao filme (Cavalcante Jr, 2001), emergindo as seguintes discussões: a) pensar sobre o assunto, não refletido anteriormente; b) atenção para a gravidade do problema social; c) mobilizar-se com as situações vividas pela jovem personagem. Considerou-se, no filme, que o (cyber) bullying sofrido pela adolescente carac108 teriza-se como uma violência psíquica na qual se destacam atitudes intimidadoras conscientes com caráter de ridicularizar. Nesse caso, discutiu-se o quanto pode ser extremamente negativo a publicação de si no ciberespaço. Neste estudo, percebemos um movimento que Josso (2004, p. 171) denomina de uma “estranheza do outro” e “estranheza de si”, ou seja, diante de relatos de experiências de vida, somos levados a reflexões acerca de nós mesmos. A partir das descrições das cenas do “As melhores coisas do mundo”, compreende-se outras situações semelhantes que ocorrem na vida cotidiana, possibilitando assim uma significativa reflexão acerca desse tema. Espera-se, assim, promover reflexões nas quais o saber psicológico possa contribuir ao entendimento desses fenômenos. Palavras-chave: sala de aula, psicoeducação, filme brasileiro. QUANDO A MORTE É A ÚNICA LIBERDADE NA JUVENTUDE: “NINGUÉM ESCUTA A MINHA DOR” Francisco Silva Cavalcante Junior - UFC [email protected] André Feitosa de Sousa - FANOR [email protected] A tríade da neurose coletiva que se agrava nos dias atuais é um problema que ocupa os estudos da Psicologia Humanista há longo tempo. Em uma trilogia de ações que findam a vida ou subtraem os anos de existência, o ser humano mata, se mata ou se droga (Frankl, 2010). De todos os tipos de morte, o suicídio é analisado como o problema mais alarmante da vida (Hillman, 2009). Entretanto, em nenhuma VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento população do mundo, a aceitação da morte é recebida de forma natural quando acontece na juventude (Armstrong, 2011). No caso do suicídio, torna-se ainda mais desafiadora a sua compreensão. Abordando as várias facetas da juventude no Brasil, a temática do suicídio também está presente no filme “As melhores coisas do mundo” (Bodansky, 2010). Nele, acompanhamos o sofrimento do jovem Pedro (interpretado por Fiuk) para quem o blog é o principal veículo de expressão de suas emoções: “Ninguém escuta a minha dor... Podem te arrancar os braços, as pernas... mas sem a alma, você é apenas uma caixa de ovos boiando por aí... O meu desejo comanda o meu destino e a morte é a única liberdade”. O presente trabalho objetiva promover uma reflexão, no âmbito da Psicologia do Desenvolvimento, sobre a morte como a única liberdade encontrada na juventude e será ilustrado com um estudo de caso de uma jovem universitária, acompanhada em uma de nossas disciplinas na Universidade, cuja vida foi colocada em risco em tentativas recorrentes de consumar a sua morte. Utilizando-se de e-mail escreveu-nos: “professor me ajuda a morrer”. Em uma de suas contas em redes sociais, postou durante dias seguidos narrativas de seu sofrimento, o que gerou uma onde de sucessivos e-mails que nos foram enviados por seus colegas de turma com compartilhamento de preocupações e pedido de ajuda: “Eu estou muito preocupada, tenho medo que ela consiga enfim o que quer. Por favor, professor, tenta fazer alguma coisa.” Um outro dizia: “Estou a lhe enviar este e-mail pelo motivo do sr. ser da área e sabe como lhe dar com pessoas como ela. Recentemente ela tem colocado... mensagens depressivas, dizendo ter desistido da vida, que não aguentava mais...”. Analisamos, portanto, o papel do professor de Psicologia do Desenvolvimento no contexto de uma juventude que sofre e pede ajuda ao professor “da área”, muitas vezes o único profissional psicólogo no âmbito dos cursos de licenciatura para os quais esta disciplina é obrigatória. Por outro lado, desenvolvemos a proposta de que a abordagem da morte e do morrer em cursos de graduação torne-se uma temática transversal que não fique restrito à disciplina de Psicologia. O conhecimento de teorias sobre a morte e o morrer, em suas orientações teóricas e suas variações culturais, pode representar um conhecimento importante para ser desenvolvido por profissionais com diferentes formações. No caso em estudo, precedido por um episódio de suicídio consumado de uma outra estudante na mesma instituição, a preparação de texto informativo sobre a morte e o morrer permitiu aos professores de diferentes disciplinas, a abordagem do tema em suas salas de aula, com foco na vida como dádiva da morte; a compreensão do fato de que refletir sobre a morte pode ser um importante estímulo para a descoberta do significado de viver de forma consciente (Armstrong, 2011) dos adolescentes e adultos jovens que estão na universidade. Os episódios inesperados narrados nesta comunicação tiveram o potencial de promover importantes aprendizagens e mudanças no corpo docente e discente: o interesse pelo estudo dos temas integrantes do ensino da Psicologia do Desenvolvimento foi despertado; docentes e discentes passaram a escutar mais atentamente as dores de seus alunos e colegas, e um programa de tutoria para 109 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento os estudantes de graduação foi priorizado. Por fim, renovamos o potencial de uma aprendizagem que emerge da experiência, conforme difundiu amplamente Carl Rogers (1983: 22) na Abordagem Centrada na Pessoa: “Aprender, e especialmente aprender com a experiência, tem sido um elemento fundamental que faz com que a vida valha a pena”. Palavras-chave: juventude, ciclos de vida, suicídio. MR LT01 - Mesa Redonda Convidada MR LT01-1304 - A ÉTICA DO CUIDADO NO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO HUMANO: COMPREENDENDO AS RELAÇÕES FAMILIARES Maria Regina Basílio Teodoro Dos Santos UNIUBE Vilma Valeria Dias Couto Conceição Aparecida Serralha O conjunto de trabalhos apresentados nesta mesa redonda propõe discutir o desenvolvimento humano como corolário do cuidado propiciado pelo ambiente familiar, bem como pelos espaços educacionais que complementam este cuidado. Discute a importância dos papéis parentais e as relações que se estabelecem dentro da família, independentemente da configuração que esta apresenta. Atenta para a questão ética do cuidado, que deve estar presente não só em um contexto natural de cuidado, mas também em toda e qualquer intervenção político-social, educacional e profissional de apoio à família. A proposta 110 abrange o debate teórico e possibilidades de intervenção partindo das contribuições de duas importantes abordagens, a Psicanálise e a Centrada na Pessoa. Abrangem também atividades de extensão universitária realizadas, que enfocaram, no caso dos trabalhos de base psicanalítica, sobretudo as situações advindas de relações familiares disfuncionais que favorecem o recrudescimento da agressividade e a manifestação da violência, e que culminam em problemáticas no campo da saúde e da escola, dificultando o desenvolvimento saudável da criança, do adolescente e do adulto. Os diferentes enfoques trazem em comum a importância da clínica, que não se coloca à parte das questões sociais que envolvem o desenvolvimento humano, mas permite direcionamentos que visem ao cuidado às famílias, à subjetividade de seus membros e às relações interpessoais que ocorrem em seu seio. Assim, esses direcionamentos não se orientam por atitudes de avaliação, julgamento e medidas de correção, mas sustentam modos de cuidar que garantem a autonomia e a independência das famílias. A ÉTICA DO CUIDADO: PLATAFORMA E VIA DE POSSIBILIDADE DO DESENVOLVIMENTO HUMANO3 Conceição Aparecida Serralha – UFTM [email protected] MEC/SESu/DIFES – PROEXT 2010 Em se tratando de bebês e crianças pequenas, uma rede de cuidados, que se 3 Agradeço à FAPEMIG o apoio para a apresentação deste trabalho no VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento caracteriza por articulações que diversificam, integram e ampliam os cuidados oferecidos, tem se expandido abarcando a mãe e a relação mãe-bebê, bem como a relação educador-criança. Contudo, essa rede ordinariamente tão necessária, merece cuidados ela própria, pois, em alguns casos pode alterar-se rapidamente, assemelhando-se mais a outro tipo de rede (de pesca) com uma característica aprisionadora, imobilizadora e sufocante, do que a um apoio efetivo que leve em conta as reais necessidades dos envolvidos. A ideia de que se pode ter um método, uma técnica, ou um saber mais certo e perfeito que outros tende a se implantar com incrível facilidade. Isso nos faz pensar sobre a questão ética envolvida nos cuidados que são oferecidos, pois chama a nossa atenção sobre os equívocos gerados a partir de determinados saberes. A psicanálise, em suas várias escolas ou abordagens, discute a questão ética relacionada à naturalização das necessidades humanas e a proposição de cuidados universalizada e utópica, que retira a dimensão subjetiva daqueles que recebem e fornecem cuidados. De acordo com Motta (2011), “a ética do cuidado,” [pensada pela psicanálise, ...] é a do cuidado enquanto experiência essencialmente humana, se tiver por direção a localização subjetiva”, “não se refere a nenhum código [...] se refere ao sujeito, enquanto sujeito do desejo inconsciente (p. 149)”. Winnicott (1989/1994), entretanto, considerou-se “a figura de proa do movimento no sentido de um reconhecimento da satisfação da necessidade como mais inicial e fundamental que a realização de desejos” (p. 357), sem deixar de considerar o bebê necessitado como uma pessoa. É essa satisfação que irá possibilitar ao ser humano chegar à condição de poder desejar, e é a essa satisfação que podemos relacionar uma ética, uma vez que a dependência do ser humano de outro ser humano para a satisfação de suas necessidades é um fato. Isso implica uma responsabilidade de atender ao que o bebê necessita de uma maneira que favoreça o desenvolvimento de suas tendências herdadas, que lhe possibilite a sua pessoalidade. Este estudo pretende, portanto, discutir a natureza e a qualidade do cuidado ao indivíduo, as características do ambiente cuidador, a relação deste com a cultura em que se insere e da qual sofre influências, que são importantes para o desenvolvimento de suas tendências herdadas ou geneticamente determinadas. Tem por base a teoria do amadurecimento de D. W. Winnicott, bem como experiências em atividades de extensão realizadas com profissionais da educação infantil e familiares de crianças na primeira e segunda infância, que apresentavam alto grau de agressividade. Para tanto, foram realizadas leituras de textos winnicottianos e outros autores, bem como observações dos ambientes da criança, encontros com educadores e cuidadores, que possibilitaram diálogos importantes para a troca de conhecimentos, dúvidas e angústias próprias ao educar/cuidar. Sem um reconhecimento das questões inconscientes envolvidas no cuidado, uma ênfase em instruções técnicas para este é cada vez mais realizada, objetivando o atendimento às necessidades da criança para um desenvolvimento integral saudável. As atividades de extensão realizadas permitiram ver que, se por um lado, a partir do momento que essa noção de cuidado é difundida, mais e mais pessoas reconhecem o seu valor e se empenham em oferecer cuidados adequa111 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento dos aos bebês e crianças pequenas, como também apoio às mães e às famílias; por outro lado, vê-se crescer a construção de projetos de “escolas de pais”, “educação em saúde”, “orientações aos pais”, que passam a exigir condutas adequadas por parte das mães e dos pais, sem considerar seus contextos de vida e seus padrões de defesas individuais. Além disso, a “mãe suficientemente boa”, pensada por Winnicott (1988/1990), perde sua condição de adequação às necessidades de seu próprio bebê e se torna uma mãe padronizada, repleta de instruções a serem seguidas, ignorando individualidades e subjetividades. Esse tipo de vivência, em graus variados, pode ser frequentemente encontrada. Crianças rotineiramente estimuladas e obrigadas a dar conta do que não conseguem entender ou que não conseguem dar um único sentido sequer, fomentando a criação de novos diagnósticos psiquiátricos, que abarquem sua desorganização. Os pais e os educadores, enquanto crianças que, muitas vezes, cresceram sob esse tipo pressão, se vêm agora pressionados a cuidar/educar, sem uma base da qual possam se sentir seguramente apoiados. As reações de negatividade não são incomuns, e os cuidados que poderiam ser naturalmente intuídos a partir de uma sustentação emocional adequada, não são realizados por recusa, negligência ou indiferença. E então, os profissionais responsáveis pela “educação em saúde”, ou “pela educação continuada”, não entendem, e se perguntam por que os pais e os educadores não realizam as orientações dadas e aprendidas. Por mais que tenhamos consciência da importância de ambientes suficientemente bons para o amadurecimento emocional de nossas crianças, sabemos que nem 112 sempre esses ambientes serão possíveis. Correlatamente, podemos entender a importância de várias políticas públicas, que, apesar de não serem ideais, podem atender minimamente às necessidades das crianças e de suas famílias, o que é essencial, mas o que não quer dizer conseguir que elas alcancem um amadurecimento psicossomático. Para esse alcance, é necessária a presença de alguém que esteja física e emocionalmente bem, “vivo”, capaz de ver e ouvir este bebê, ou criança, como uma pessoa que tem necessidades próprias e preferências, podendo atendê-las; e não é raro o fato de que esse alguém não seja a própria mãe, até porque a esta pode estar faltando o apoio e a sustentação emocional necessários a um cuidador. O cuidado essencial não pode ser automático ou mecânico e, como bem disse Winnicott (1988/1990), desde que seja um cuidado propiciado por um ambiente humanamente envolvido, pode até ter falhas. O ambiente pré-escolar especialmente pode complementar bem esse papel. Contudo, compreender as questões das relações primárias da criança, que afetam o seu desenvolvimento e desempenho escolar, não retira a importância de se pensar sobre as multideterminações dos problemas encontrados tanto no cotidiano familiar quanto escolar, ou seja, sobre as características macrossociais e culturais também na constituição desses problemas, para que mudanças sejam promovidas. Palavras-chave: ética do cuidado; agressividade; ambiente. VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento A IMPORTÂNCIA DAS RELAÇÕES FAMILIARES PARA O DESENVOLVIMENTO Maria Regina Basílio Teodoro dos Santos – UNIUBE [email protected] A concepção e existência do outro origina-se numa díade e conclui-se numa tríade ou grupo maior. A organização dessa vivência e de sua dinâmica, observados os papéis de cada membro, indubitavelmente, favorece a manutenção da homeostase familiar. Em se tratando de abordagem, a Centrada na Pessoa prima pelas relações interpessoais. A mesma parte do pressuposto de que em todo indivíduo existe uma disposição à atualização, uma tendência inerente ao organismo para o crescimento, desenvolvimento e atualização de suas potencialidades numa direção positiva e construtiva. Esta tendência promovida em uma relação interpessoal é cercada por atitudes de empatia, consideração positiva incondicional e congruência. Por empatia entende-se que é a atitude de tentar se colocar no lugar da outra pessoa e tentar "ver com os olhos dela". É compreender a pessoa a partir de seu quadro de referência; neste sentido, na situação familiar, consideram-se todos os aspectos que constituem a pessoa como idade, estrutura em todos os sentidos, personalidade e outros. Para isto, é preciso deixar de lado nossas próprias perspectivas e valores para poder penetrar no mundo do outro sem julgamentos. Por consideração positiva incondicional, entende-se que é a atitude de aceitar cada aspecto da experiência da uma pessoa e não colocar condições para a aceitação ou para a apreciação desta. A consideração positiva incondicional sugere um cuidado não-possessivo, como forma de apreciação do outro como uma pessoa individualizada, a quem é permitido ter os seus próprios sentimentos e experiências. Congruência, por sua vez, pode ser entendida como atitude de integrar-se, vivenciando plenamente os sentimentos que fluem na pessoa no momento. A pessoa está congruente quando está livre e é profundamente ela mesma. Por isso, ser congruente significa ser real e genuíno. São estas atitudes que permitem o crescimento e a atualização das potencialidades criativas e positivas dos indivíduos em qualquer forma de relação interpessoal. Isto nos ajuda a compreender a amplitude do campo de aplicação da Psicologia através da referida abordagem, incluindo as áreas da psicoterapia, educação, resolução de conflitos, relações familiares, grupos de encontro, grupos de crescimento e grandes grupos de comunidade. Segundo Rogers (2009), como conseqüência de uma psicoterapia centrada no cliente, os clientes modificam sua vida familiar, da seguinte maneira: expressam melhor seus sentimentos – retiram a máscara que usavam; as relações podem ser vividas numa base real – o cliente descobre que pode-se viver uma relação com base nos sentimentos reais, podendo exprimir sentimentos de vergonha, de angústia e de aborrecimento e que a relação sobrevive a isso, em vez de fundar numa aparência defensiva; melhora a comunicação nos dois sentidos: compreendem a fundo as idéias e os sentimentos de outra pessoa e é compreendido por ela, isso é uma das experiências mais humana, rara e compensadora; e, finalmente, desejar que o outro seja independente – os clientes tendem a permitir 113 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento que cada membro da família tenha seus próprios sentimentos e seja uma pessoa independente. Em se tratando, especificamente das relações familiares, podemos dizer que a família é um contexto único e dinâmico para o desenvolvimento do ser humano. Portanto, para se falar em desenvolvimento é necessário compreender o indivíduo nesse contexto. A família é algo singular e complexo, especialmente se for considerado a forma como as relações acontecem nesse conjunto. Poderíamos dizer: famílias – meio ambiente/cultura - problemas/conflitos - possibilidades de soluções. A condição familiar, por mais complexa que seja, nos remete ao sentimento de pertencer a um grupo, nos tirando da solidão, que, segundo Camon (1993), “na maioria das vezes, é diretamente associada com desespero, sofrimento e com o suicídio.” Segundo este autor, é como se, suportar a questão de ser só, fosse dicifil ou desesperador para a maioria das pessoas. Camon, ainda completa que a solidão distancia quando se mantem um relacionamento estreito ou íntimo com uma pessoa que se ama, com a qual se tem proximiadade e afinidade. E a conclusão inevitável a que se chega é “cada um é um”, porém, como parte de um grupo ou de uma família (Camon, 1993). De acordo com Rogers (2009), verifica-se que um indivíduo pode encontrar satisfação em exprimir atitudes emocionais fortes no contexto em que surge, no caso, no contexto familiar. Dessa forma, para este autor, a pessoa descobre que é melhor viver em condição mais real do que numa relação dissimulada, exprimindo mais livremente, renunciando atitudes defensivas e ouvindo o outro. Compreendem, assim, o que a outra pessoa sente e porque é que sente. Salienta, ainda que, 114 “à medida que eu aceito melhor ser eu mesmo, descubro que me encontro mais preparado para permitir ao outro ser ele próprio, com tudo o que isso implica. Isso significa que o círculo familiar tende a encaminhar-se no sentido de se tornar um complexo de pessoas independentes e únicas, com valores e objetivos individualizados, mas unidas por verdadeiros sentimentos – positivos e negativos – que existem entre elas, e pela satisfação do laço da compreensão recíproca de, pelo menos, uma parte do mundo particular de cada um dos outros. É desse modo que as pessoas descobrem maior satisfação nas relações familiares, o que facilita, em cada membro da família, o processo de descobrir-se e de vir a ser ele mesmo.” (Rogers, 2009). No que se refere às relações familiares é fundamental discutir sobre contexto histórico, social e econômico em que as pessoas estão inseridas, enfim, analisar a diversidade cultural existente. Pois as alianças e os conflitos existentes nas relações familiares, influenciam, significativamente, no comportamento e desenvolvimento das pessoas, especialmente, crianças e adolescentes. Assim, pode-se dizer que a família, enquanto um espaço em que se pode desenvolver uma comunicação aberta entre os membros e eles podem expressar seus desejos e preocupações, favorece sobremaneira a coesão do próprio grupo familiar. Palavras-chave: Família. Conflito. Compreensão. VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento A RESPONSABILIDADE DOS PAIS NA PROBLEMÁTICA DA AGRESSIVIDADE DOS ADOLESCENTES Vilma Valeria Dias Couto - UFTM [email protected] br MEC/SESu/DIFES – PROEXT 2010 Na atualidade uma das problemáticas que perpassa a adolescência diz respeito à recorrência das manifestações de agressividade e violência. As estatísticas revelam o impacto da violência na população adolescente. Estudos mostram que a violência é um dos fatores determinantes nos índices de mortalidade na adolescência e apontam os jovens como os seus autores (Minayo, 1990; Adorno, Lima & Bordini, 1999; Waiselfisz, 1998). Essa situação exige dos profissionais diferentes possibilidades de compreensão e enfrentamento que os levam a propor intervenções nos contextos clínico, social, educacional e familiar. Com base num projeto de extensão universitária que sustenta intervenções junto a adolescentes de uma instituição socioeducacional, propomos discutir a influência dos pais na agressividade dos adolescentes. Uma das etapas do projeto propõe o debate de temáticas ligadas à agressividade na adolescência. De um modo geral, verificamos que o entendimento da agressividade e violência do jovem é associado a problemas familiares, especialmente dos pais. Essa constatação justifica a discussão da implicação dos pais na problemática da agressividade do adolescente. Ainda que as intervenções sejam realizadas diretamente com os adolescentes, reconhecemos que este trabalho deve visar também os pais na medida em que eles, de alguma forma, estão implicados nos conflitos que favorecem a agressividade. Neste trabalho, apresentamos algumas vias de compreensão da influência dos pais na questão emocional próprias à adolescência. Consideramos também a influencia da dimensão da cultura nas características da família contemporânea que dificulta a superação da experiência da adolescência e contribui para o aumento da agressividade e violência dos adolescentes. Em torno da família de um adolescente dito agressivo normalmente circulam discursos que culpabilizam os pais pelas dificuldades dos filhos. É freqüente ouvirmos falas que remetem para uma lógica de compreensão das perturbações dos adolescentes como decorrente de famílias desestruturadas, pais ausentes, negligentes ou permissivos demais. Somando a este entendimento generalizante e culpabilizante, encontramos estudos (Rutter, 1961, citado por Marcelli & Branconnier, 2007) que associam as dificuldades dos adolescentes aos indicadores de patologia familiar de divórcio, separação dos pais, doença mental e alcoolismo parental. Buscando avançar na discussão, recorremos a Marcelli (2007) que distingue três perspectivas de análise da influência da família nos conflitos da adolescência. A primeira compreende os conflitos entre pais e adolescentes como conseqüência do processo de adolescência e desse modo é o adolescente que entra num embate com os pais, se opondo a eles para marcar sua autonomia. Nesta perspectiva, a revolta e hostilidade do adolescente dirigida aos pais é um mecanismo de encontrar-se a si mesmo e constitui uma pressão necessária para superar os laços de dependência com os pais. Ainda que o adolescente deprecie seus pais, ele não deseja destruí-los como modelos para sua vida adulta. Por outro lado, numa segunda perspectiva, alguns autores julgam que 115 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento as condutas problemas dos adolescentes resultam em grande parte de atitudes patológicas dos pais que se vêem ameaçados pelas tentativas de independência do filho adolescente. Trata-se de pais frágeis que não suportam os esforços de separação do adolescente. Por último, uma terceira perspectiva, agrega autores que consideram que os conflitos entre os adolescentes e seus pais testemunham tanto dificuldade do adolescente de assumir seu crescimento e sua autonomia como dificuldade dos pais de superarem o que é chamado de crise parental. Nesta perspectiva, os conflitos do adolescente não são vistos simplesmente como resultado da adolescência, mas testemunham tanto as dificuldades dos adolescentes como dos pais. Apesar destes três pontos de vistas não serem excludentes, acreditamos que é possível reconhecer um entre eles que parece mais pertinente a cada adolescente e sua família. Compreendemos que os adolescentes precisam desafiar os pais, hostilizar sua autoridade já que este desafio é fundamental para o desenvolvimento de sua autonomia. Os pais devem suportar as provocações e os desafios de uma forma ativa, por meio de uma postura coerente e firme. Mas como os pais de hoje acompanham o adolescente em sua crise? Será que eles estão sendo capazes de reconhecer as reivindicações dos seus filhos adolescentes? Em acréscimo à discussão da agressividade dos adolescentes, consideramos que o funcionamento da família também é influenciado pelo contexto social. Estudos mostram que as características da família contemporânea dificultam a superação do processo da adolescência. Vários autores (Roudinesco, 2003; Figueira, 1987), analisando a transformações socioculturais que influencia116 ram o arranjo da família contemporânea, sustentam o enfraquecimento das figuras parentais. Mayer (1997, citado por Savietto, 2006), por exemplo, vai apontar a ambigüidade do lugar ocupado por homens e mulheres como pais na atualidade. Ele considera que a família atual está em crise, e remete essa situação à falta de estabilidade e à incerteza que estão em jogo no desempenho dos papéis dos membros da família. Para Levisky (2001), a confusão de papéis na família atual é fruto da ausência de hierarquia dos seus membros, que gera uma indiferenciação entre pais e filhos. Para ele, a falta de clareza dos papéis promove uma desorganização interna e externa que é capaz de gerar um sentimento de insegurança no adolescente que neste momento, precisa ter ao seu lado um adulto para confrontá-lo em suas reinvidicações e ajudá-lo a pensar e a se desenvolver. Este breve exame da influencia dos pais na problemática da agressividade dos adolescentes mostra que na clínica, não só o adolescente deve ser olhado e escutado, mas também a própria família. Hoje a avaliação do ambiente familiar de um adolescente em dificuldade deve fazer parte da abordagem dos profissionais. Entretanto, não se trata de tomar os pais em consideração para culpabilizá-los, mas de reconhecer a responsabilidade dos mesmos no processo de subjetivação do adolescente. Nesta perspectiva, destacamos a proposta de intervenção clínica que envolve um trabalho de apoio narcísico parental (Marty, 2006). Trata-se de uma proposta de tratamento da agressividade que passa pela tomada de consciência, por parte dos pais, do papel que devem exercer na constituição do self, em particular no momento da adolescência. Os resultados do projeto de extensão apontam que VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento apesar das resistências é possível maior implicação dos pais na problemática dos filhos adolescentes desde que se sintam apoiados e não culpados pela instituição e profissionais. Palavras-chave: Adolescência. Agressividade. Família. MR LT01 - Mesa Redonda Convidada MR LT01-785 - A CONSTRUÇÃO DA ESCOLHA PROFISSIONAL NO CURSO DA VIDA: UM LOCUS DE INTERLOCUÇÃO ENTRE A PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO E A PSICOLOGIA DO GÊNERO. Maria Helena Fávero - UnB [email protected] Financiamento: CNPq Nossas pesquisas têm focado o desenvolvimento psicológico e a Psicologia do Conhecimento e elas nos ensinaram que as áreas de conhecimento mantêm representações sociais próprias e particulares e que essas se articulam com os significados dos papéis de gênero. Há duas décadas nossos dados já evidenciavam que em uma situação de resolução de problemas o desempenho dos alunos e das alunas variava se as informações para a realização da atividade eram dadas por um homem ou por uma mulher. Temos desenvolvido uma linha de pesquisa para nos dedicarmos ao estudo da Psicologia do Gênero tendo em vista uma maior compreensão dos processos psicológicos desenvolvimentais. Temos insistido, então, em expor a ideologia do patriarcado contemporâneo - que fundamenta, por meio da tese da naturalização, as ideologias da masculinidade e da feminilidade - para sustentar a necessidade de reflexão sobre as práticas sociais e institucionais vigentes e sobre nossas próprias práticas profissionais e pessoais em relação ao gênero, que sustentam em última análise, um processo gendrado de socialização que mantém a ideia das chamadas escolhas profissionais adequadas segundo o gênero. Temos insistido também que este processo gendrado de socialização mantém padrões gendrados de emoção que mediam as aquisições individuais. Assim, as crenças gendradas sobre a emoção podem atuar na interpretação dos indivíduos sobre suas próprias experiências emocionais vividas em determinadas circunstâncias. Considerando o exposto, esta mesa redonda discutirá, através de relatos de pesquisas as seguintes questões particulares: (a) o acesso às diferentes áreas do conhecimento segundo o gênero e suas implicações na escolha profissional; (b) a desigualdade da participação de homens e mulheres nas áreas de ciências e tecnologia; (c) o ensino e a aprendizagem da matemática como um filtro crítico na manutenção desta desigualdade; (d) o acesso ao conhecimento sobre o gênero e a tomada de consciência da sua relação com a própria subjetividade; (e) a implicação da consideração do gênero na pesquisa desenvolvimental. Em suma, por meio do aporte e da articulação entre a Psicologia do Desenvolvimento, a Psicologia do Conhecimento e a Psicologia do Gênero esta mesa redonda abordará ambos: as interações particulares de gênero na construção e na mediação do conhecimento científico e que tais 117 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento interações particulares dizem respeito à igualdade de gênero, educação e cidadania democrática inclusiva. Palavras-chave: Socialização de papéis de gênero; Escolha profissional, Cidadania. ESCOLHA PROFISSIONAL E GÊNERO: UMA RELAÇÀO QUE DEMANDA UMA PSICOLOGIA REFLEXIVA E CRÍTICA. Maria Helena Fávero - UnB [email protected] Financiamento: CNPq O consenso nas publicações sobre epistemologia, filosofia e história da psicologia critica a ideia de se considerar os chamados vieses culturais e políticos como um problema metodológico e defende o interesse nos vieses sociais e históricos do conhecimento científico (Janice Haaken, 1988; Ronald Mather, 2000; Jill Morawiski, 2005; Jan Smedslund 2009; Kenneth J. Gergen, 2010). Neste consenso, a perspectiva feminista tem insistido na constituição de uma psicologia reflexiva e crítica que considere as dinâmicas do gênero (Jill Morawiski, 1997; 2005). Assumindo esta perspectiva temos defendido a tese da interação dialética entre o ser humano e a sociocultura para evidenciar a importância do gênero nessa interação, tanto nas construções pessoais como nas socioculturais (Fávero, 2010 a; 2010 b). Assim, temos procurado fundamentar a articulação entre desenvolvimento, conhecimento e gênero, defendendo que o plano do funcionamento interno não é dado: ele é construído (Fávero, 2007 a). É nessa perspectiva que entendemos a socialização: uma construção gendrada cujo ponto central reside no modo como entendemos a emoção e como a 118 filiamos aos significados do feminino e do masculino (Fávero, 2010a). Temos assumido dois desafios. O mais óbvio é evidenciar a manutenção da ideia de que homens e mulheres constituem duas categorias diferentes de indivíduos; o mais sutil diz respeito às noções de objetivo e de subjetivo, culturalmente e historicamente associados a essas duas categorias: a objetividade, associada à razão, à masculinidade e ao mundo público; a subjetividade, associada à afetividade, à feminilidade e ao mundo privado. Por exemplo, em um estudo sobre as representações de gênero com estudantes universitários, professores e pais de alunos obtivemos, frente à questão “Na sua vida escolar, entre professores e professoras, qual ou quais lhe marcaram mais, eles ou elas? Por quê?” duas proposições-chave: as professoras são mais afetivas; os professores são mais competentes. No geral, as professoras foram relacionadas às áreas sociais e humanas e os professores às áreas exatas (Fávero & Salgado, 2006). Em outro estudo, a análise dos atos da fala produzidas em grupos focais (Fávero, 2007 b) de professores indicaram 5 temas predominantes: 1º – gênero e exercício do magistério nas séries iniciais – evidenciando duas proposições: a sociedade espera que a mulher alfabetize; a instituição escolar concorda; 2º – a competência masculina no magistério – foco na racionalidade, autoridade e controle, segundo a premissa de que a figura masculina impõe respeito; 3º – magistério e maternagem – sensibilidade, natureza e cuidado fundamentaram a premissa de que a relação entre magistério, mulher e maternagem é natural; 4º – habilidades femininas – separação entre áreas de conhecimento e gênero: a mulher apresenta, naturalmente, mais habilidades linguísticas, artísticas e manuais; 5º – o VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento homem como chefe de família e provedor –os sujeitos defendem melhores salários, não pelo magistério em si, mas por serem homens e provedores (Fávero & Salgado, 2007). Estes dados confirmam a análise de Abramo (2004) e Anzorena (2008). Ou seja, um sistema de diferenças como o gênero, torna-se um princípio organizador das relações sociais: como os homens e mulheres mantêm intensa interação, seja no contexto privado, como nos contextos públicos, o gênero difere de outras formas de desigualdade; esta interação constrói experiências que confirmam, ou potencialmente determinam as crenças sobre as diferenças e desigualdades de gênero (Ridgeway e Smith-Lovin, 1999; Ridgeway e Correl, 2004). Portanto, defendemos que a escolha profissional é uma construção vinculada a uma socialização gendrada. Estas questões nos permitem focar duas questões particulares: 1. A desigualdade da participação de homens e mulheres nas áreas de ciências e tecnologia; 2. O ensino e a aprendizagem da matemática como um filtro crítico na manutenção desta desigualdade, já que está no centro das crenças parentais sobre as escolhas ocupacionais tidas como “apropriadas” aos papéis de gênero (Watt e Eccles, 2008). Igualmente, os professores e professoras têm expectativas diferentes para alunos e alunas particularmente no caso da matemática e isto se inicia muito cedo na escolarização (Mosconi, 2001). Comprovamos isto em um estudo sobre as concepções de professores e professoras de matemática: para as professoras, as alunas têm bom desempenho em matemática porque se esforçam; os alunos estão prontos para o raciocínio matemático; para os professores, as alunas tendem naturalmente para as áreas humanas e os alunos para as exatas; as alu- nas se esforçam para aprender, mas “não têm o raciocínio matemático desenvolvido”. Levando tais premissas para a discussão com alunos da 9ª série, entre 14 e 15 anos, obtivemos concepções distintas: “as meninas são mais inteligentes na matemática”; “elas são mais maduras”; “elas estudam mais”; “aprendem com mais facilidade”; “a maioria dos meninos só quer ‘vadiar’” (Alves & Fávero, 2010). Por outro lado, nossas pesquisas de intervenção com estudantes com dificuldade em matemática (Fávero, 2007 c) apontam como Dweck (2007) que, ver a competência em matemática como um dom fixo e “natural”, leva os estudantes a questionarem sua própria capacidade e perderem a motivação quando encontram dificuldades; ver a competência como um processo de desenvolvimento leva-os, diante de dificuldades, a procurar procedimentos ativos e efetivos. Nossos estudos têm nos permitido ampliar esta discussão para a questão mais ampla da relação entre conhecimento e cidadania e de trazer à pauta de discussão, “no contexto das diferentes áreas do conhecimento científico, a relação entre ensino, filosofia e cidadania, com o intuito de tornar explícita a possibilidade efetiva de considerar a responsabilidade humana e cidadã e pleitear que a instituição escolar assuma, por princípio, educar o cidadão e prover educação para a cidadania” (Fávero, 2009, p.16). Por isto mesmo concluímos, partilhando os aspectos consensuais dos estudos da linha de pesquisa que focamos aqui: 1. Pleitear uma educação que fundamente, por meio de sua prática, uma relação entre igualdade de gênero, pedagogia e cidadania (Arnot, 2006; Enslin e Tjiattas, 2006); 2. Conquistar justiça social, tanto no nível doméstico como no nível global (Howell, 2007); 3. Sustentar a tese segundo 119 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento a qual a afirmação dos direitos humanos universais caminha junto com a decisão de desafiar a distinção entre público e privado (Kaplan, 2001). Palavras-chave: psicologia critica; socialização gendrada e escolha profissional; cidadania. LA RESOLUCIÓN DE PROBLEMAS: INDICIOS ACERCA DE EL PROCESO DE CONSTRUCCIÓN DE LA ESCOGENCIA DE UNA PROFESIÓN Yilton Riascos Forero - UNICAUCA/COLÔMBIA [email protected] Maria Helena Fávero - UnB/DF fá[email protected]. La literatura nacional e internacional enfatiza la importancia de la relación entre género, ciencia y matemática y la relación entre desarrollo psicológico, conocimiento y género (Fávero, 2010 a). Se trata de una cuestión de punta que compara la igualdad en el acceso al conocimiento entre los géneros; sobre todo las áreas de ciencia y tecnología y su relación con las creencias culturales sobre género. Defendemos como Fávero (2010 b) que las instituciones educativas, lugar donde tales creencias están en juego, deben ser consideradas a través de la articulación entre a psicología del desarrollo, la psicología del género y la psicología del conocimiento. La resolución de problemas se presta para esto porque evidencia las interacciones entre regulaciones cognitivas y regulaciones sociales y expone el papel de la mediación semiótica en el desarrollo psicológico (Riascos & Fávero, 2010). En particular, la resolución de problemas estadísticos evalúa la lectura, análisis e inferencia sobre la distribución de los datos y los conceptos estadísticos, 120 ofreciendo así, subsidios para la Psicología cognitiva y educativa (ver Watson & Morritz, 2001). Presentamos los resultados de estudios en lo que hemos propuesto tareas sobre el contenido de dos conjuntos de cajas de fósforo de diferente marca (X e Y), que involucra en su solución la media aritmética, la mediana y la moda, a estudiantes de ambos sexo, de quinta y octava serie de enseñanza fundamental, de una escuela de Brasilia, DF (150 estudiantes) y de dos escuelas de Popayán, Colombia (85 estudiantes). En cada una de las 3 tareas se buscaba que los estudiantes determinaran la marca de fósforos que, segundo los datos presentados tendrían más contenido en sus cajas: “Las empresas X e Y, fabrican fósforos que venden en cajitas. Todas las cajas presentan una etiqueta que indica 40 fósforos de contenido. Se sabe, por observación y conteo que algunas cajas no siempre tienen el mismo número de fósforos. Algunas veces ellas presentan más o menos cantidad de fósforos; otras veces, presentan efectivamente la cantidad indicada (40)”.Se evidenció diversos comportamientos en el desarrollo de estrategia para la resolución, encontrando que las estrategias de mayor complejidad las desarrollaron los estudiantes brasileros. De las estrategias identificadas, se encontró con más frecuencia la de sumar los valores; pocos estudiantes utilizan división y tablas de frecuencias.Se identificó un comportamiento diferente entre las alumnas de 5ª serie y las de 8ª serie, contrario al de los estudiantes hombres respecto al número de tareas no resueltas. En el caso de los alumnos brasileiros, todos los de sexo femenino de la 5ª serie procuraron desarrollar una estrategia para resolver el problema, mientras que el 18,42% de los de sexo masculino no lo hicieron; este VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento dato se invierte en la 8ª serie: 27,91% de los de sexo femenino no desarrollan una estrategia de resolución, para 10% de los de sexo masculino que no lo hicieron. Este dato no fue observado en los estudiantes colombianos, sin embargo se observó el uso de estrategias más simples por los alumnos de sexo femenino. Las conclusiones corroboran las evidencias de otros estudios (Berger, 2004; Fávero e Soares, 2002; Gonzalez-Pienda & Coll., 2006; Fernandes & Healy, 2007; Fávero, 2009; Fávero & Pina Neves, 2009; Muniz, 2009) y apuntan a las dificultades de los alumnos brasileiros y colombianos en la utilización de instrumentos matemáticos en la solución de los problemas propuestos; la interacción particular del medio escolar con la lógica del sistema numérico decimal y su notación y una práctica de enseñanza que se viabiliza a través de reglas no efectivas en la mediación de este sistema lógico y su utilización como instrumento para la construcción de nuevos instrumentos de pensamiento, como analizado por Fávero & Soares (2002); la importancia de la enseñanza de la estadística en currículo de matemática de enseñanza fundamental; la importancia de considerar la articulación entre el género y la enseñanza y el aprendizaje de las diferentes áreas del conocimiento de modo que se pueda asegurar la paridad entre los géneros en lo que respecta a las profesiones relacionadas con la ciencia, la tecnología, las ingenierías, como propuesto por Fávero, 2010 a ; el papel de la psicología en esta cuestión, que se refiere a la escogencia de una carrera profesional y, en última instancia, respecto a la construcción de la ciudadanía. Palabras-clave: resolución de problemas, desarrollo cognitivo, género. O GÊNERO DA MATEMÁTICA NA FORMAÇÃO PSICOPEDAGÓGICA: O DESAFIO DA PESQUISA NA DOCÊNCIA Regina da Silva Pina Neves - SBEM [email protected] Maria Helena Fávero - UnB [email protected] Da última década do século passado para cá, houve uma ampliação significativa do número de mulheres na Educação Básica e no Ensino Superior (Godinho, 2005; Ristoff, 2006): as mulheres superaram os homens em escolaridade; estão em maior número nas áreas de humanas e biológicas; os homens estão em maior número nas áreas de exatas e, isto permanece nos cursos de pós-graduação (Chamom, 2005; INEP, 2011). Fávero (2010) discute essas diferenças argumentando que é necessário compreender a natureza das relações que crianças, adolescentes, jovens e adultos têm construído com as diferentes áreas de conhecimento e como tais relações têm influenciado a escolha profissional. Assim, Fávero (2010) defende uma linha de pesquisa particular, focada na investigação da escolha “profissional de postos relacionados à ciência, matemática e tecnologia; sobre a permanência da mulher nas carreiras tecnológicas e sua relação com os fatores emocionais; a relação entre gênero e tempo dedicado ao trabalho (p.188).” Dentro dessa linha de pesquisa, temos desenvolvido estudos focados particularmente na formação de pedagogas e psicólogas, estudantes de pós-graduação em psicopedagogia de uma universidade pública. Temos perseguido o duplo desafio de, primeiro, definir um procedimento didático para abordar o estudo do desenvolvimento de competências conceituais em matemática como uma disciplina do 121 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento curso em questão, considerando-se que ele deve responder à necessidade de discutir as questões pertinentes à Educação Matemática e, ao mesmo, mediar o conhecimento matemático. Segundo, tal situação didática deve se constituir em um lócus de pesquisa. Assim, num primeiro estudo, apresentamos a 26 pedagogas e 6 psicólogas, estudantes do já referido curso, duas tarefas: a resolução de uma situação-problema e a análise dos registros de sete alunos produzidos na resolução de três situações-problema. Os resultados evidenciaram que, no geral, as participantes descreviam o erro sem levantar hipóteses, atribuindo-o ao aluno e apresentavam um discurso construtivista, incompatível com suas respostas e dúvidas conceituais (Fávero & Pina Neves, 2009). No segundo estudo colocamos em experimentação um procedimento didático focado na relação entre resolução de problemas, didática e história da matemática, visando capacitá-los a intervir como psicopedagogos na mediação do conhecimento matemático na prática clínica e institucional. Evidenciou-se que a maioria associava a matemática ao medo, ao fracasso e à dificuldade. O procedimento didático que desenvolvemos desarticulou tal associação e desenvolveu: a competência para analisar a notação de alunos e colegas segundo o campo conceitual nos quais as resoluções se inseriam; a compreensão da mediação e da notação na conceituação matemática; a tomada de consciência sobre a importância do currículo de matemática e das práticas de avaliação; a prática da pesquisa na formação inicial e continuada de professores. Nossos dados corroboraram os estudos que têm investigado a relação entre gênero e aprendizagem de matemática por meio 122 de uma abordagem qualitativa segundo os quais existe um viés cultural relacionado com gênero no desenvolvimento dos currículos de matemática (isto é, exemplos mais relacionados com o universo simbólico de meninos, a partir sexto ano, por exemplo) e com a própria prática didática, como diferentes tipos de perguntas e incentivos para meninos e meninas (Walden e Walkerdine, 1985; Freire, 2002; Andrade et al, 2003; Souza, 2008). Insistindo na perspectiva de que a docência universitária pode e deve ser um lócus de pesquisa, recentemente desenvolvemos um terceiro estudo junto aos atuais estudantes do curso já mencionado, com o intuito de refinar nosso procedimento didático com os seguintes objetivos: 1/ compreender como avaliam a relação que estabeleceram com a matemática, seu ensino e aprendizagem ao longo da sua escolarização; 2/ analisar o seu desempenho sobre a conceituação matemática relacionada a tópicos curriculares presente na Educação Básica, 3/ compreender como a crença sobre sua própria competência impacta sua futura prática profissional de psicopedagogo. Participaram 23 mulheres, entre 23 e 48 anos, provenientes dos cursos de fonoaudiologia, psicologia e pedagogia. Tendo em vista os objetivos anunciados, lhes propusemos uma atividade em quatro etapas: 1ª / responderam perguntas que identificavam idade, formação, local de trabalho, atividade desenvolvida, atuação profissional; 2ª / completaram as duas frases: “Na minha vida escolar a matemática...”; “ Os professores de matemática na minha vida escolar...”, 3ª / resolveram uma situação-problema sobre conceitos algébricos e geométricos, extraída do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA) e, VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento 4ª / descreveram seus sentimentos durante a 3ª etapa. Os dados foram analisados considerando-se a filiação entre competências e dificuldades Fávero (2001, 2005b), e a natureza da tarefa proposta. Os dados da 1ª etapa evidenciaram atuações, como psicóloga, docente dos anos iniciais, orientadora educacional e coordenadora educacional, todas envolvendo trabalho com crianças e adolescentes em situação de risco, necessidades especiais e situação de dificuldade de aprendizagem, na maioria relacionada à matemática. Os dados da 2ª etapa evidenciaram: a consideração da matemática como importante área de conhecimento para a inserção dos sujeitos na sociedade atual; relatos de experiências escolares positivas com a matemática nos anos iniciais do Ensino Fundamental; relatos de que tais experiências mudam de natureza e passam a ser negativas na medida em que avançam na escolaridade, atingindo níveis de desinteresse, dificuldade e aversão no ensino médio; relatos sobre a diferença na mediação do conhecimento matemático por parte de seus professores e professoras a depender do nível de ensino, sendo mais acolhedores nos anos iniciais, menos acolhedores nos anos finais do ensino fundamental e no ensino médio, assumindo métodos mais investigativos, nos anos iniciais e mais formais nos demais níveis, influindo seus próprios modos de ver e aprender matemática. Os dados da 3ª etapa – resolução de problema – evidenciaram dificuldades na análise de padrões geométricos, na interpretação algébrica e na resolver da equação, evidenciando a não compreensão de fórmulas matemática e o significado de seus termos. Os dados da 4ª etapa evidenciam relatos associados a sentimento de medo, angustia e dúvidas sobre a própria competência diante da tarefa. Por fim, assumem a importância de desenvolver competências sobre o conhecimento matemático para a sua futura prática profissional em psicopedagogia. Tais resultados reforçam a necessidade de procedimento didático que articule resolução de problemas, didática e história da matemática para o desenvolvimento de competências matemáticas fundamentais para a prática profissional em psicopedagogia. Palavras-chave: conhecimento matemático, gênero, pesquisa didática. MR LT04 - Mesa Redonda Convidada MR LT04-1232 - CONTRIBUIÇÕES DA PSICOLOGIA ESCOLAR À PROMOÇÃO DO DESENVOLVIMENTO HUMANO ADULTO Cynthia Bisinoto - UnB [email protected] Baseando-se em uma perspectiva crítica, positiva e progressista da Educação, as práticas profissionais, de pesquisa e de produção de conhecimento em Psicologia Escolar vêm se disseminando para diversos espaços educativos nos quais a atuação e mediação da área se comprometem com os processos de aprendizagem e de desenvolvimento (Araujo, 2003; Guzzo, 1996, 2001; Martínez, 2003). Se, historicamente, o trabalho da Psicologia Escolar se consolidou no contexto da escola da educação básica, outros espaços de desenvolvimento humano, também responsáveis por promover processos educacio123 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento nais de diferentes naturezas, vêm sendo reconhecidos como campos legítimos de inserção do psicólogo escolar (Marinho-Araujo, 2009; Oliveira & Marinho-Araujo, 2009; Soares & Marinho-Araujo, 2010). Alguns destes contextos são as creches, orfanatos, abrigos, asilos, organizações não governamentais, cursinhos pré-vestibular, Instituições de Educação Superior, entre outros. Nesses diferentes espaços tem sido recorrente a preocupação e compromisso, sobretudo dos psicólogos escolares, com as múltiplas possibilidades de mediação em prol do desenvolvimento humano, particularmente o desenvolvimento humano adulto, o qual é um tema lacunar na Psicologia de forma geral (Fávero & Machado, 2003; Marinho-Araujo, 2009). Por conseguinte, têm crescido as discussões em torno das competências dos profissionais que atuam na educação, cujo trabalho deve comprometer-se com o desenvolvimento e aprendizagem (Marinho-Araujo & Almeida, 2005; Soares & Marinho-Araujo, 2010). Com base em ações contextualizadas e ampliadas a outros atores e instâncias institucionais, a Psicologia Escolar tem investido no desenvolvimento humano adulto por meio de ações que visem à formação de competências profissionais dos agentes da educação, sejam os próprios psicólogos escolares ou outros atores (coordenadores, professores, pais e alunos) envolvidos no processo educativo. Como campo de reflexão teórica, os pressupostos conceituais e metodológicos que orientam a prática dos psicólogos escolares têm se alicerçado, especialmente, nas proposições da abordagem histórico-cultural do desenvolvimento humano. Essa abordagem, que tem em Vygotsky (s.d./1999, s.d./2003, s.d./2009), Luria (s.d./2008) e 124 Leontiev (s.d./2004) seus maiores expoentes, concebe o homem como um ser ativo, social e histórico, e assume que ele se constitui a partir das interações sociais que são mediadoras da construção de suas características, sentimentos, pensamentos, crenças, conhecimentos e concepções, enfim, da sua subjetividade. Essa perspectiva incita-nos a pensar sobre os espaços contemporâneos do trabalho educativo como lócus para a elaboração de processos formativos e de mediação de competências que busquem favorecer o desenvolvimento, tanto individual quanto coletivo, sob uma perspectiva sistêmica, dinâmica e relacional (Araujo, 2003; Marinho-Araujo & Almeida, 2005). Nessa perspectiva, a mesa redonda aqui proposta apresenta relatos e pesquisas que discutem contribuições da Psicologia Escolar ao desenvolvimento humano adulto em diferentes espaços educativos e almeja suscitar reflexões sobre os desdobramentos das ações interventivas do psicólogo escolar junto aos profissionais desses contextos. Assim, o primeiro trabalho apresenta e discute uma proposta de atuação para os Serviços de Psicologia Escolar na Educação Superior. O segundo, apresenta experiências de intervenção do psicólogo escolar em espaços de trabalho cotidiano e de formação continuada. Na sequência, serão abordadas possibilidades de mediação da Psicologia Escolar junto a educadores sociais em organização não governamental, visando o desenvolvimento de competências profissionais. VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento PROPOSTA DE ATUAÇÃO PARA A PSICOLOGIA ESCOLAR NA EDUCAÇÃO SUPERIOR Cynthia Bisinoto - UnB [email protected] Um dos contextos emergentes de atuação e pesquisa em Psicologia Escolar é a Educação Superior, a qual tem como finalidade formar sujeitos para a vida em sociedade. Para além do foco na competência profissional, que é uma das dimensões do desenvolvimento dos sujeitos, a formação em nível superior deve incidir na preparação de pessoas capazes de enfrentar de forma ética e socialmente comprometida os desafios extremamente contraditórios, ambíguos e complexos que são característicos da sociedade contemporânea. Mais do que habilitar sujeitos a exercerem com competência e sucesso sua atividade profissional, a Educação Superior tem como finalidade formar cidadãos conscientes do seu poder transformador no combate à exclusão, injustiças, desigualdade, enfim, questões relevantes na área social, econômica, política e cultural de uma nação (Dias Sobrinho, 2004, 2005; Goergen, 2008; Marinho-Araujo, 2009; Morosini, 2005, 2006; Ristoff, 1999, 2008; Severino, 2000, 2002; Sguissardi, 2006, 2008). Nesse sentido, a Educação Superior é um dos espaços sociais privilegiados e fecundos à promoção do processo de desenvolvimento humano adulto justamente pelo fato de que as diferentes aprendizagens ali propiciadas são propulsoras do desenvolvimento. Por meio da relação com os vários objetos de conhecimento científico, a crítica, a reflexão e o exercício político da participação social, além das relações interpessoais que se constrói entre os sujeitos adultos e jovens adultos, a natureza da mediação que ocorre na Edu- cação Superior é qualitativamente distinta daquela que transcorre em outros contextos. O conhecimento científico, artístico e cultural intencionalmente contemplado nos planejamentos de ensino, as informações divididas, os saberes apropriados, as posturas éticas e ideológicas partilhadas, bem como as vivências pessoais e as relações intersubjetivas que se fomentam no contexto educativo são mediadoras do processo de aprendizagem e, por conseguinte, do desenvolvimento humano que tem nela sua base (Oliveira, 2011). Por essa razão, a Educação Superior como contexto no qual transcorrem múltiplos e complexos processos de aprendizagem tem papel primordial na mediação das funções psicológicas superiores dos sujeitos adultos que frequentam esse espaço, seja como estudantes ou como profissionais (Marinho-Araujo, 2009; Oliveira & Marinho-Araujo, no prelo). Entretanto, em virtude das inúmeras e complexas transformações características da sociedade contemporânea, as Instituições de Educação Superior (IES) têm se confrontado com desafios e dilemas relacionados ao seu papel frente às demandas do mercado; à expansão quantitativa das instituições e dos cursos; à efetividade dos programas de apoio ao acesso e permanência; à adequação dos objetivos pedagógicos e institucionais à realidade dos estudantes; à qualificação do corpo docente; à necessidade de inovações curriculares e pedagógicas; entre outros. Para enfrentar de forma mais eficiente estes desafios, as IES têm desenvolvido algumas estratégias como a criação de Serviços de Psicologia voltados ao apoio ao estudante, ao sucesso acadêmico, à inserção profissional, entre outros objetivos. Se, por um lado, nos países europeus e norte-americanos estes serviços estão em funcionamento há muitos anos, por outro, 125 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento no Brasil, a produção científica relativa à atuação da Psicologia Escolar no Sistema de Educação Superior e a presença dos psicólogos escolares nas IES são consideradas restritas e recentes (Bariani, Buin, Barros & Escher, 2004; Oliveira, Cantalice, Joly & Santos, 2006; Serpa & Santos, 2001). Dessa maneira, a Psicologia Escolar tem um grande desafio que é o de ampliar suas perspectivas de atuação por meio de práticas diferenciadas em um contexto ainda pouco explorado pela área. Com o intuito de conhecer o trabalho realizado nestes Serviços, desenvolveu-se um estudo com objetivo de investigar a atuação da Psicologia Escolar em IES do Brasil e, em especial, do Distrito Federal. Nesta apresentação, pretende-se, portanto, discutir alguns dos resultados relativos à atuação dos psicólogos escolares na Educação Superior brasileira e, na sequência, apresentar uma proposta de criação e estruturação para os Serviços de Psicologia na Educação Superior. No que tange aos resultados da pesquisa, nota-se que os Serviços de Psicologia distribuídos nas IES brasileiras não são privilégio de um tipo de instituição; ao contrário, eles se fazem presentes tanto nas universidades com perfil acadêmico quanto nas faculdades com perfil mais profissionalizante; em relação à natureza administrativa das IES com serviços, são as instituições privadas as que mais os têm. O foco principal da ação dos psicólogos nestes serviços são os estudantes, fundamentalmente os de graduação, todavia, apesar do objetivo principal estar centrado neste segmento da comunidade acadêmica, alguns Serviços já estendem suas ações para outros públicos da instituição, ampliando seu foco de intervenção. Considerando que são muitos e diversificados os espaços de aprendizagem, bem como são múltiplos os caminhos que levam 126 a um desenvolvimento saudável e pleno em suas potencialidades, é extremamente pertinente haver uma variedade de atividades que tenham como meta a promoção desses processos. Relativamente à proposta de criação e estruturação dos Serviços de Psicologia, ela se ancora na perspectiva histórico-cultural do desenvolvimento psicológico humano (Leontiev, s.d./2004; Luria, s.d./2008; Vygotsky, s.d./1999, s.d./2003, s.d./2009) e na abordagem preventiva e institucional de atuação em Psicologia Escolar (Araujo, 2003; Marinho-Araujo & Almeida, 2005). Se, por um lado, pretende-se, com este modelo de atuação, propor algumas linhas de intervenção para os psicólogos que trabalham nestas instituições, por outro, aspira-se que ele venha figurar como detonador de um movimento de reflexão, estudo, investigação e problematização acerca das possibilidades de atuação da Psicologia Escolar na Educação Superior. A proposta de atuação se organiza em seis eixos: (a) a fundamentação teórica que a sustenta, baseada na abordagem histórico-cultural do desenvolvimento humano; (b) os objetivos que se entende pertinentes aos serviços desse tipo; (c) o público alvo para o qual podem ser dirigidas as intervenções; (d) a descrição dos recursos humanos que podem compor os serviços, destacando as características do perfil dos psicólogos escolares, o número de profissionais e o vínculo de trabalho com a IES; (e) alguns elementos importantes sobre o funcionamento e organização do serviço; e, por fim, (f) possíveis atividades que podem ser desenvolvidas pelos profissionais, as quais estão organizadas em três dimensões interdependentes. Palavras-chave: Psicologia Escolar, Educação Superior, Serviços de Psicologia. VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento PSICOLOGIA ESCOLAR: RESSIGNIFICANDO METODOLOGIAS PARA ATENDER ÀS NOVAS DEMANDAS DA ATUAÇÃO Rejane Barbosa - SEEDF/FA, [email protected] O estudo acerca do desenvolvimento adulto vem se configurando como um importante e necessário campo de pesquisa, haja vista os avanços tecnológicos e a atual configuração sociocultural, que demandam o exercício de novas capacidades intelectuais, sociais e afetivas. Em uma perspectiva histórico-cultural, pode-se dizer que o ser humano desenvolve-se ao longo de todo seu curso de vida, uma vez que é capaz de manter e aperfeiçoar as interações com seus pares, com instrumentos e com o ambiente por meio das mais diferentes linguagens e signos culturais presentes no seu cotidiano (Vygostky, s.d./2007). Neste contexto, a Psicologia Escolar constitui-se como área de conhecimento que contribui fundamentalmente para que a escola possa atingir seus objetivos enquanto espaço de promoção das diversas aprendizagens, do desenvolvimento humano e da cidadania. Não somente para os estudantes, mas principalmente para os profissionais que ali atuam. Dessa, forma torna-se relevante pesquisar e apresentar possibilidades de formação continuada que favoreçam o desenvolvimento de habilidades e recursos pessoais, interpessoais, profissionais, cognitivos, éticos, entre outros que corroborem à formação de competências do psicólogo e dos demais atores da escola (Barbosa, 2008). Com base na abordagem histórico-cultural (Leontiev, s.d./2001; Luria, s.d./1990; Vygotsky, s.d./ 2000, s.d./2007) e na abordagem por competências (Kuenzer, 2002; Le Boterf, 2003; Wittorski, 1998; Zarifian, 1993), esta apresentação tem, dentre seus objetivos, compartilhar experiências de trabalho cotidiano e de formação continuada para profissionais da educação, mais especificamente voltada para professores e psicólogos que atuam no contexto da escola. O psicólogo escolar é um dos profissionais que deve contribuir com a ressignificação e oxigenação dos espaços subjetivos presentes no contexto educacional. Pode atuar por meio da promoção de espaços coletivos e individuais de reflexão, no qual compareçam assuntos relacionados à prática profissional, reconhecimento dos desafios e avanços presentes no contexto escolar, das potencialidades do grupo, discussão das concepções de desenvolvimento e aprendizagem presentes no grupo escolar, entre outros. O contexto de ensino atual solicita um profissional que, mediante o desenvolvimento de novas habilidades de compreensão da escola em sua conjuntura social, cultural, política e econômica, seja capaz de planejar estratégias de favorecimento ao desenvolvimento dos profissionais que ali atuam (Almeida, 2001, 2002; Araujo, 2003; Barbosa & Marinho-Araujo, 2010; Campos & Jucá, 2003; Campos, Lopes, Onofre, Alexandre & Silva, 2005; Cruces, 2003; Guzzo, 2001, 2005; Guzzo & Weschsler, 1993; Marinho-Araujo & Almeida, 2003, 2005; Neves, 2007; Souza, 2004, 2007; Vectore & Maimoni, 2007). A título de ilustração, serão apresentadas três experiências intervenção do psicólogo escolar em espaços de trabalho cotidiano e de formação continuada desenvolvidas entre os anos de 2009 e 2010. O primeiro focaliza o trabalho desenvolvido no âmbito da Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal (SEEDF) com o grupo de psicólogos escolares, o qual se refere a 127 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento reelaboração do documento norteador da atuação em Psicologia Escolar no DF, denominado Orientação Pedagógica do Serviço Especializado de Apoio à Aprendizagem (OP/SEAA). O modelo inovador do trabalho realizado proporcionou a todos os participantes a discussão acerca das concepções institucionais que balizam a atuação e a construção coletiva das ações que hoje estão presentes no cotidiano de muitos psicólogos escolares do Distrito Federal (Marinho-Araujo, Neves, Pena-Moreira & Barbosa, no prelo). O segundo apresenta a dinâmica de atuação do psicólogo escolar que compõe as equipes multidisciplinares de apoio à aprendizagem da SEDF, implementada em uma cidade do Distrito Federal proposta a partir da pesquisa desenvolvida por Barbosa (2008). O modelo de trabalho foi organizado em três dimensões denominadas: (a) intraequipe; (b). interequipes e (c) extraequipe, cujo objetivo geral foi viabilizar para os próprios psicólogos e para os demais membros da comunidade escolar – pedagogos, gestores, professores, alunos, pais, entre outros – o desenvolvimento de habilidades e recursos que subsidiem ações competentes e promotoras do sucesso escolar. O terceiro e último exemplo refere-se à atuação do psicólogo escolar no programa de acompanhamento ao aluno com altas habilidades, também da SEDF, que pautada pelas mesmas bases epistemológicas e teóricas vem ratificando este tipo de intervenção relacional e institucional já utilizada nas experiências anteriores como uma possibilidade de ampliação e ressignificação do trabalho do psicólogo escolar com vistas à promoção do desenvolvimento humano adulto no contexto escolar. Portanto, a apresentação do tema aqui exposto contribui com estratégias para a promoção do desenvol128 vimento adulto, as quais vêm sendo utilizadas, nos últimos cinco anos de trabalho em Psicologia Escolar, na esfera da SEEDF, de modo a cooperar com a ressignificação da atuação psicológica no contexto escolar, numa perspectiva preventiva, para além da remediação/tratamento das dificuldades de aprendizagem apresentadas pelos estudantes. Igualmente, abre novas possibilidades de compreensão das queixas escolares em um contexto muito mais complexo e permeado por possibilidades de desenvolvimento subjetivo de todos e por oportunidades de promoção do sucesso escolar e social. Palavras-chave: desenvolvimento humano adulto, atuação institucional, desenvolvimento de competências. ATUAÇÃO DA PSICOLOGIA ESCOLAR EM ONG: CONTRIBUIÇÕES PARA O DESENVOLVIMENTO DE COMPETÊNCIAS DE EDUCADORES SOCIAIS Pollianna Soares - UnB [email protected] Nas últimas décadas, a Psicologia Escolar tem revisto seus fundamentos epistemológicos para o estabelecimento de novas diretrizes de atuação profissional e produção de conhecimento nos contextos de educação formal e não formal (Campos & Jucá, 2003; Cruces, 2003, 2005; Marinho-Araujo, 2007, 2009; Marinho-Araujo & Almeida, 2005; Oliveira & Marinho-Araujo, 2009; Soares & Marinho-Araujo, 2010; Souza, 2006, 2010). O redirecionamento de sua práxis, que amplia seu escopo de atuação para distintos contextos educacionais, tem ocorrido em meio a diversas mudanças no campo político da educação no Brasil, ins- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento tigando a Psicologia Escolar a comparecer com um posicionamento crítico e levantando novas questões sobre a realidade educacional do país. Nesse cenário, as organizações não governamentais (ONGs) de natureza educacional vêm ganhando atenção da Psicologia Escolar por promoverem atividades educativas não formais, visando o desenvolvimento humano (Soares, 2008; Soares & Marinho-Araujo, 2010; Souza, 2009). As ONGs educativas surgem no cenário brasileiro, especialmente entre as décadas de 70 e 80, vinculadas a movimentos sociais que visam ao incentivo de ações direcionadas à garantia dos direitos civis relacionados à educação básica pública. A inauguração desses espaços tem demandado profissionais da educação com um perfil específico à natureza e filosofia institucionais, vinculado fortemente ao compromisso com a transformação social (Gohn, 2009, 2010). A esses profissionais, Romans, Petrus e Trilla (2003) têm denominado de educadores sociais, os quais proveem mediação pedagógica distinta dos contextos formais de educação. Surgido em meio às emergências da sociedade civil, o educador social ainda se encontra com um perfil profissional pouco definido, principalmente em virtude da falta de formação adequada, tanto inicial como continuada, para o exercício competente de sua atuação. Conforme Caro e Guzzo (2004), “muitas vezes, observam-se inadequações de educadores sociais bem intencionados, pela falta de formação, de apoio e até de uma orientação por parte de profissionais das diversas áreas de desenvolvimento” (p. 16). Diante desse desafio, entende-se que a área da Psicologia Escolar pode trazer contribuições às ONGs educativas e, entre as suas possibilidades de atuação, destaca-se urgência de ações que auxiliem no desenvolvimento e consolidação da identidade profissional do educador social. Tradicionalmente, se reconhece a Psicologia Escolar como uma das áreas científicas que contribuem para a discussão da formação do professor da educação formal (Facci, 2009). Nesse novo panorama social, há de se pensar sobre as possibilidades de mediação dos psicólogos escolares junto ao educador social nos contextos de educação não formal, que visem à transformação da realidade social. Dessa forma, considera-se que a Psicologia Escolar deve estar voltada para a mediação do desenvolvimento humano adulto, por meio da promoção de intervenção e mediação psicológica que objetive contribuir para a formação das competências necessárias ao exercício pedagógico crítico e politicamente comprometido com a transformação social (Barbosa, 2008; Guzzo, 2003, 2005). Para isso, é importante compreender o perfil necessário do educador social no recente cenário educativo brasileiro (Caro & Guzzo, 2003; Gohn, 2009). Entendendo que a constituição das competências do trabalho esteja ligada diretamente à subjetividade humana e ao desenvolvimento psicológico dos sujeitos (Araujo, 2003), considera-se o trabalhador como um sistema complexo e em contínua evolução nas esferas sociais, cujo processo de formação profissional está relacionado à constituição histórica do seu processo de subjetivação. Assim, ao se considerar o desafio da construção do perfil profissional do educador social, percebe-se a relevância em compreender o caráter político, social, econômico e cultural intrínseco aos problemas sociais que emergem na sociedade e que se presentificam na constituição da subjetividade desse sujeito trabalhador em especial. Nessa direção, defende-se que a perspectiva his129 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento tórico-cultural do desenvolvimento (Leontiev, s.d./2001; Luria, s.d./1990; Vygotsky, s.d./2000, s.d./2007), em articulação à abordagem por competências (Le Boterf, 2003; Wittorski, 1998; Zarifian, 1993), são aportes teórico-metodológicos relevantes à formulação de estratégias de desenvolvimento adulto. Em virtude do campo de atuação do educador social estar relacionado a compromisso e militância em favor dos setores sociais mais desfavorecidos, sua postura deve estar para além do caráter pedagógico, assumindo, também, posições de cunho político e ideológico (Romans, Petrus & Trilla, 2003). O comprometimento dos profissionais envolvidos nesse setor reflete uma atuação em prol da transformação social, o que se torna fator imprescindível para a conscientização de sua responsabilidade como agente do desenvolvimento e emancipação social dos sujeitos (Caro & Guzzo, 2004). É com essa conscientização que o Psicólogo Escolar deve estar comprometido quando sua intervenção direciona-se ao desenvolvimento adulto. Assim, a atuação em Psicologia Escolar nesse contexto deverá vincular-se ao desenvolvimento de competências de educadores sociais, considerando a constituição histórica e social das ONGs que requerem, em suas atividades institucionais, a expressão de recursos subjetivos e objetivos de seus profissionais, manifestos por meio de habilidades, conhecimentos, saberes e capacidades que compõe o perfil pessoal e profissional do ser educador. A trajetória de vida pessoal e profissional do educador e a própria história social dos espaços educacionais configuram a subjetividade social que constituem a identidade dessa categoria (Araujo, 2003; Marinho-Araujo & Almeida, 2005). Defende-se, nessa apresentação, que a atuação do 130 psicólogo escolar deve privilegiar o acompanhamento das práticas pedagógicas no próprio contexto educativo, lócus privilegiado para o desenvolvimento de processos de formação contínua dos educadores sociais. A formação continuada em serviço se constitui como estratégia bastante útil para o desenvolvimento de competências que promovam reflexões e processos de conscientização contínuos na práxis profissional (Guzzo, 2005; Marinho-Araujo & Almeida, 2005). Tal conscientização, mediada pelo psicólogo escolar, poderá evidenciar, criticar e denunciar concepções deterministas de desenvolvimento humano; práticas domesticadoras e autoritárias de ensino e de aprendizagem; processos de exclusão, marginalização e discriminação camuflados em processos avaliativos ou em procedimentos pedagógicos pouco críticos e autônomos em sua intencionalidade (Guzzo, 2003, 2005; Marinho-Araujo & Almeida, 2005). Palavras-chave: psicologia escolar, desenvolvimento de competências, educador social. MR LT04 - Mesa Redonda Convidada MR LT04-1399 - ESCOLA INCLUSIVA, ESTRATÉGIAS PEDAGÓGICAS E FOSSILIZAÇÃO DE APRENDIZAGEM Tânia Maria de Freitas Rossi - UNICESP [email protected] Financiamento: FAP-DF Esta mesa redonda discute a escola inclusiva, focalizando quatro temas interrelacionados: O primeiro, Sobre o conceito VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento de fossilização analisa o uso do termo fossilização na Psicologia e na Linguística, um conceito não monolítico dada a falta de uniformidade entre objetos de estudo. O uso abarca (1) construtos complexos vinculados falhas, desvios e estabilização de funcionamento cognitivo resistente à alterações; (2) causas individuais, não generalizáveis, subjetivas, com conotação histórica e cultural e, (3) efeitos da aprendizagem hebbiana nas construções lingüísticas em um nível não-ótimo de proficiência em relação à língua materna, de caráter dinâmico. Na Psicologia, a fossilização é estudada como sucessão de estágios necessários ao desenvolvimento e formação de hábitos histórico-culturais, urgindo se retomem a abordagem genética do fenômeno, transcendam sua identificação e focalizem a dinâmica de seu desenvolvimento. Sugere a investigação dos processos de mediação semiótica e de internalização do conhecimento, ou seja, do ensinar e do aprender, base da fossilização. O segundo, Estratégias pedagógicas para o ensino-aprendizagem de conceitos científicos em uma escola inclusiva investiga estratégias pedagógicas de quatro professoras na construção de conceitos científicos em quatro turmas de crianças com desenvolvimento típico e deficiência intelectual. Analisou-se atividades realizadas na introdução de um novo conceito e sua apropriação pelas crianças, baseado nos pressupostos vygotskianos. Foram realizadas entrevistas semiestruturadas com as professoras e filmadas interações entre estas e as crianças, especialmente aquelas com desenvolvimento atípico, retratando três momentos: apresentação, desenvolvimento e conclusão na constituição de um conceito novo. Os resultados indicam que as estratégias e recursos utilizados pelas professoras contribuem para o desenvolvimento dos conceitos nos dois grupos, mas suscitam melhor compreensão da (1) internalização dos conceitos pelas crianças, a ponto de tornar-se automatizados, (fossilizados); (2) dos processos que asseguram a continuidade do desenvolvimento. O terceiro tema, O processo de inclusão em salas regulares: pontos críticos, possibilidades pedagógicas e desafios na formação de professores, discute o modelo educativo tendo como referência a concepção de inclusão nas escolas, se valorizam e atendem à diversidade humana/cultural. Sustenta que, atualmente, há reconhecimento das diferenças, não como incapacidades, e que o objetivo é ensinar a todos dado que aprender é condição inerente aos seres humanos. Compreende a realidade educacional como multifacetada e as propostas pedagógicas devem refletir a ação educativa, embasada na autonomia, na construção coletiva do conhecimento e nas potencialidades a serem estimuladas no processo de ensino e de aprendizagem. O quarto tema, Atendimento especializado aos alunos inclusos em salas regulares, mostra que o atendimento educacional especializado às pessoas com deficiência deve realizar-se, preferencialmente, na rede regular de ensino, com estabelecimentos profissionais especializados próprios ao atendimento do aluno e professores capacitados à real integração, nas classes comuns. Entretanto, o quadro atual afigura-se outro: faltam material específico para atender aos alunos e profissionais especializados para atender à criança especial. Lembra que o papel a ser assumido pelos profissionais educacionais especializados seria o de catalisar demandadas e coordenar atividades coletivas que fomentem os processos 131 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento de discussão, reflexão e resolução coletiva e colaborativa dos problemas educativos. SOBRE O CONCEITO DE FOSSILIZAÇÃO Tânia Maria de Freitas Rossi - UNICESP [email protected] Vigotski (1997), ao estudar o desenvolvimento das funções psicológicas, deparou-se com processos que, ao longo do tempo, tornaram-se rígidos/mecanizados, sem que sua aparência externa sofresse modificação, enquanto que sua aparência interna era modificada e esmaecida. Em analogia à paleontologia, os denominou “processos fossilizados”. A fossilização refere-se ao automatismo e à mecanização de comportamentos e é o final de uma linha que une o presente ao passado, os estágios superiores do desenvolvimento aos estágios primários (Vigotski, 2003). O termo fossilização, de uso freqüente na Linguística, possui definições e entendimentos distintos, apresentação de argumentos teóricos e dados empíricos para descrição e explicação do fenômeno e conceituação que seguem a mesma diversidade. Assim, o objetivo deste estudo é analisar alguns desses usos correntes. A Linguística congrega grande parte das investigações e focaliza processos de automatização de comportamentos e seu uso não deliberado em situações de aprendizagem de uma segunda língua, com uso contínuo de formas desviadas da forma correta da língua em estudo. Todavia, há mais tentativas de descrição que de explicação do fenômeno. A noção de fossilização inicia-se em 1953, quando Weinreich (1953) demonstrou a existência da transferência gramatical permanente nas formas da língua nativa de um aprendiz de uma língua não-nativa 132 que foram erroneamente identificadas com formas equivalentes dessa segunda língua, para elas transferidas, tornando-se fossilizadas. Em 1961, Nemser (citado por Percegona, 2005) sustentou que, na aquisição de língua não-nativa, o sujeito cria um sistema intermediário (interlíngua) no qual a língua em estudo não é exatamente como a língua “oficial” e tampouco como a nativa. A fossilização compreenderia todos os estágios de competência lingüística não nativa, considerados permanentemente adquiridos. Selinker (1972; 1993), descreveu o fenômeno afirmando que são itens, regras e subsistemas lingüísticos que os falantes de uma língua nativa particular tendem a manter em sua interlíngua em relação a uma outra língua em estudo, não importando a idade do aprendiz, ou a quantidade de explicações que recebeu sobre esta. Nakuma (1998) examinou os pressupostos implícitos na definição de fossilização e concluiu que algum conhecimento desviado foi instaurado como padrão cognitivo e, nesse caso, estaria relacionado ao sucesso ou fracasso do sujeito ao adquirir certas regras de uma segunda língua. As formas fossilizadas seriam o resultado da esquiva, do desejo intencional de não adquirir uma dada forma porque acredita que ela já esteja disponível em sua bagagem cognitiva. Crer que a fossilização manifesta-se apenas através de formas desviadas fornece uma conotação pejorativa, como se formas não desviadas não fossem fossilizáveis. A fossilização surge da percepção individual do aprendiz da segunda língua a respeito das equivalências entre esta e a língua materna, cujo resultado pode ser positivo ou negativo. Selinker e Lakshmanan (1993) demonstram, posteriormente, que a estagnação na fossilização deve ser considerado ape- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento nas a estabilização do processo de aprendizagem em um patamar, focalizando algumas áreas localizadas. O estudante apresenta um desenvolvimento contínuo em algumas áreas da segunda língua e, ao mesmo tempo, uma relativa estabilização de erros em outras (Percegona, 2005). A falta de uniformidade quanto ao processo de fossilização na Linguística mostra que não se está diante de um conceito monolítico. Há construtos complexos vinculados a manifestações de falhas, desvios e a estabilização de um funcionamento cognitivo resistente às alterações. Há o delineamento de possíveis causas individuais, não generalizáveis, nas quais cada sujeito percebe a realidade de forma idiossincrática, o que institui uma conotação histórica, cultural e, ainda, subjetiva. Há a concepção da fossilização não como estabilização permanente da interlíngua, mas como efeitos da aprendizagem hebbiana nas construções lingüísticas em um nível não-ótimo de proficiência e complexidade em relação à língua materna, o que lhe assegura caráter dinâmico e não estável. De fato, interessantes contribuições da neurociência e de simulações computacionais têm sido desenvolvidas sobre como se realiza a aprendizagem na micro e na macroestrutura cerebral e faz lembrar da hipótese de uma estrutura latente de linguagem, de caráter biológico de Weinsreich (1967). Bliss e Lomo (citados por Lent, 2001) realizaram uma estimulação elétrica repetitiva nas fibras colaterais de Schaffer, situadas no hipocampo e registraram a atividade resultante nas células piramidais da região responsável pela consolidação da memória (Cornos de Amon – regiões CA). Eles constataram significativo aumento no potencial pós-sináptico excitatório na célula piramidal após a estimulação de potenciação de longo prazo (PLP), resultando na descoberta de um caso típico de plasticidade sináptica entre um neurônio pré e um neurônio pós-sináptico, tal como proposto por Hebb. (Lent, 2001). Se a PLP for adequada e possuir significado para o sujeito, ocorrerão a aquisição e a manutenção das habilidades cognitivas desejáveis. Se a ativação for inapropriada, o ajuste sináptico hebbiano tenderá a fortalecer as tendências existentes, impedindo o progresso na aquisição do efeito desejado. No caso da aprendizagem de uma segunda língua, se o sujeito não perceber as diferenças entre as formas da língua materna e da nova língua a ser aprendida, os padrões do sistema da sua língua materna continuarão sendo fortalecidos indevidamente, ou seja, haverá uma fossilização de determinadas formas da interlíngua. Na Psicologia, dentre os raros autores que se debruçam sobre o fenômeno e adotam a acepção vigotskiana, estão Gallimore e Tharp (2002) que afirmam ser a fossilização o conhecimento interiorizado, no qual o sujeito passa a resolver situações-problema sem precisar de ajuda assistida. Eles definiram quatro estágios genéticos situando-os na zona de desenvolvimento proximal (ZDP). O sujeito gradualmente necessita de menos assistência para executar uma atividade, aumentando sua capacidade de autoregulação e o comportamento assistido torna-se não assistido e autorregulado. O estágio I refere-se às atividades que o sujeito pode operar com auxilio de pessoas mais capacitadas para que, mais tarde, ele aja com independência. No estágio II, ele realiza tarefas sem assistência externa e ainda que sob influência do modo de funcionamento de outra pessoa e sem autodireção. No próximo estágio, a assistência e a autoassistência não 133 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento são necessárias, pois há interiorização e automatização do conhecimento, ou seja, fossilização. No último estágio há a desautomatização do funcionamento anterior (desfossilização), com a retomada de uma nova ZDP. No limite, as contribuições de Gallimore e Tharp (2001) são aproximações que descrevem o comportamento fossilizado por meio da sucessão de estágios necessários ao desenvolvimento, com formação de hábitos histórico-culturais. Carece sobremaneira, retomar a abordagem genética do fenômeno, transcender sua identificação e buscar a dinâmica de seu desenvolvimento. O conceito de fossilização é ainda uma grande lacuna e na psicologia reclama que se focalize e investigue os processos envolvidos com a mediação semiótica e a internalização de um dado conteúdo, em outros termos, do ensinar e do aprender. Palavras-chave: fossilização, aprendizagem. ESTRATÉGIAS PEDAGÓGICAS PARA O ENSINO-APRENDIZAGEM DE CONCEITOS CIENTÍFICOS EM UMA ESCOLA INCLUSIVA Divaneide Lira Lima Paixão - UCB [email protected] As atividades humanas são construídas, segundo Vygotsky (1984), ao longo da vida e são resultado de aprendizagens mediadas na e pela cultura, o que imprime às relações sociais e à atividade psicológica traços comuns que transcendem suas qualidades particulares. No seio dessa discussão, o processo de escolarização surge como uma significativa experiência que abre possibilidade de aprendizagem e, consequentemente, de desenvolvimento. 134 Analisar a dinâmica do processo de ensino e aprendizagem que ocorre nas escolas torna-se, pois, fundamental, uma vez que é nesse espaço que o desenvolvimento psicológico da criança pode alcançar níveis de aprimoramento de determinadas funções e estabelecer mudanças dos vínculos e das relações interfuncionais tal como indicadas por Luria e Yudovich (1985). O desenvolvimento de cada função psicológica particular, por sua vez, depende dessa mudança, como no caso do desenvolvimento de conceitos. Na aprendizagem de um conceito, as funções psicológicas superiores que pressupõem o uso das ferramentas intelectuais, são ativadas pela interação social, especialmente, sob a orientação ou a supervisão de pessoas mais experientes. Por isso, no tocante ao desenvolvimento de conceitos, as propostas pedagógicas devem levar em conta a adequação do material ao nível real e potencial dos sujeitos aprendizes, considerando a diversidade da aprendizagem e os ritmos diferenciados de cada um. Nesse sentido, o estudo ora apresentado buscou analisar as estratégias pedagógicas adotadas por quatro professoras, para o ensino-aprendizagem de conceitos científicos em quatro turmas formadas com crianças que apresentam desenvolvimento típico e crianças com deficiência intelectual (DI). Foram realizadas filmagens das professoras e seus alunos, buscando identificar e analisar as atividades realizadas com vistas à introdução de um novo conceito e sua apropriação pelas crianças, tendo como base os conceitos propostos por Vygotsky (1984), no que diz respeito à Zona de Desenvolvimento Proximal. Nas filmagens em vídeo foram privilegiadas as interações entre as professoras e as crianças, especialmente aquelas com DI, retratando três momentos distintos da VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento constituição do conceito científico: apresentação, desenvolvimento e conclusão. Foi realizada, também, com cada professora uma entrevista semiestruturada para investigar aspectos da ação pedagógica no decurso da apresentação de um conteúdo novo. Os dados apontam que entre as estratégias utilizadas pelas professoras para introduzir um novo conceito científico estão: contextualização do conteúdo e vivências por meio de dinâmicas variadas; o processo de aplicar, avaliar, fortalecer e reavaliar os conteúdos programados; o uso da leitura pausada do material selecionado. Quanto aos recursos acionados, são identificados: material concreto, música, figura/imagem, poemas, material do tipo impresso e cartazes. As professoras elaboram materiais diversificados para permitir e imprimir diferentes modos de abordar o assunto, evidenciando considerar o processo como diferenciado para cada um de seus estudantes, o que possibilita a todas as crianças com ou sem DI a construção de conhecimentos e de modos de funcionamento para lidar com o desenvolvimento dos conceitos. Alternam momentos de atendimento individual ao aluno com aprendizagem colaborativa, buscam empregar atividades lúdicas e de fixação de conteúdos, de forma a motivar os estudantes e levá-los a perceber a vinculação entre certos elementos estruturantes do conceito. São promovidas condições para o desenvolvimento de competências e internalização dos conceitos científicos, por intermédio de jogos, reálias, que, para elas contribuem para promover as funções psicológicas superiores como memória técnica, criatividade, raciocínio, comparação, discriminação e generalização de idéias, além do pensamento abstrato. Ao discutir o processo de construção do conheci- mento de crianças com DI, Vygotsky (2002) analisa que elas apresentam certa dificuldade em constituir o pensamento abstrato, e que se o conteúdo e as situações de aprendizagem não forem mediadas, isso fica mais difícil. Nesta direção é que a escola e professores devem assumir a iniciativa e a intervenção no processo de aprendizado de forma competente e consciente, na medida em que os esforços devem se focar para estágios de desenvolvimentos ainda não alcançados. O trabalho educativo deve fomentar novos conhecimentos, habilidades e competências, reconhecendo o nível real de desenvolvimento do aluno. Os procedimentos utilizados pelas professoras e o modo como elas os justificam corroboram a perspectiva teórica histórico-cultural ao passo que elas buscam introduzir um conceito paulatinamente, ressaltando sua construção social. Das quatro professoras, três salientaram empregar estratégias diversificadas para atender especificamente as crianças com DI. Ao serem planejadas estas atividades levam em consideração a necessidade e o direito de adaptação curricular e isso pressupõe o emprego de situações de aprendizagem em pequenos grupos ou duplas, considerando os níveis de aprendizagem e as dificuldades apresentadas, frente a um dado conteúdo. As professoras relatam fragilidades variadas no decorrer do processo, especialmente com relação à aprendizagem das crianças com DI, como manter a concentração, trabalhar a memória e otimizar o tempo de a realização das atividades; a não fixação dos conceitos e informações; a não compreensão e acompanhamento das atividades, como acontece com o restante da turma. Tal posição corrobora os achados de Bogoyavlensky e Menchisnskaya (1991) que sustentam não existir uma relação 135 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento direta entre a construção de noções e desenvolvimento cognitivo e, portanto, nem toda aprendizagem escolar possibilita ao aluno o desenvolvimento das funções mentais superiores. De fato e também para Vygotsky (1995), as pessoas com DI apresentam um desenvolvimento das funções psíquicas superiores com ritmo diferenciado, em relação às crianças com desenvolvimento típico, e um dos maiores entraves no desenvolvimento de conceitos para aquele grupo está justamente no processo de generalização e abstração, que não depende somente do caráter da gravidade da deficiência, mas também da realidade social na qual ele se desenvolve e dos recursos mediacionais que lhe são apresentados. As análises até aqui engendradas apontam que as estratégias e recursos utilizados pelas professoras participantes deste estudo contribuem para o desenvolvimento dos conceitos científicos nos dois grupos de crianças e suscitam uma melhor compreensão acerca da (1) internalização dos conceitos pelas crianças, a ponto de tornar-se automatizado, isto é, fossilizado; (2) do processo que assegura a continuidade do desenvolvimento. Palavras-chave: deficiência intelectual, aprendizagem de conceitos científicos, estratégias pedagógicas. O PROCESSO DE INCLUSÃO EM SALAS REGULARES: PONTOS CRÍTICOS, POSSIBILIDADES PEDAGÓGICAS E DESAFIOS NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES Ana da Costa Polonia - SEEDF/UnB O processo de inclusão, não se restringe a oportunidade de matricular a criança com 136 uma necessidade educativa especial e, possibilitar o seu acompanhamento educacional, em uma sala regular, com colegas que tenham desenvolvimento típico. Ele projeta também, os anseios da sociedade em constatar que todas as pessoas são capazes de aprender, independente de suas dificuldades e limitações. Estas condições ressaltam o potencial do ser humano, superando as deficiências físicas, intelectuais, emocionais, comportamentais, sendo reconhecidamente implementado, por um processo pedagógico de qualidade. Este solidamente construído, sobre bases teóricas e metodológicas e, intrinsecamente, vinculado às ações, às estratégias, aos materiais e aos espaços pedagógicos promotores do desenvolvimento e aprendizagem. Schwartzman (1997 apud Siqueira, 2008) ressalta que a legislação brasileira assegura a inclusão e, sobretudo, demanda que o sistema educacional, aceite a pessoa com necessidades educacionais especiais, em classes regulares ou comuns. Paradoxalmente, ele reflete que, se as escolas regularmente, não têm conseguido, com sucesso, promover os alunos denominados ‘normais’, como estender então este atendimento educacional aos que apresentam necessidades educativas especiais? Enfatiza a responsabilidade do sistema educacional, na medida em que, este não prepara os professores do ensino regular para atender e trabalhar pedagogicamente com alunos identificados com necessidades educativas especiais. Sem este preparo acadêmico, didático e metodológico fica precário, mesmo com a experiência e boa vontade do professor, adotar a premissa da inclusão. Sem dúvida, a formação inicial, experiência profissional, o domínio da estratégias de ensino e das proposta VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento didáticas, aliadas à formação profissional se em constituem pilares para estabelecer uma aprendizagem de qualidade que se estende a todos os alunos, sobretudo, aos que demandam constantemente um atendimento diferenciado. Como sublinhado por Vygotsky (1984), o bom ensino é aquele que se adianta ao desenvolvimento, isso implica que, o professor deve estar ciente e adote abordagens pedagógicas diferenciadas que possam incidir sobre a zona de desenvolvimento potencial do aluno, fazendo que, posteriormente, ele adquira a autonomia ao empregar aquele conhecimento. No entanto, condições como o número de alunos por turma e o apoio das equipes multidisciplinares e psicopedagógicas, são aspectos que devem ser avaliados, quando se discute o ensino de qualidade e a inclusão escolar. Considerando as condições educacionais brasileiras, Mazotta (2005) indica que são poucos os municípios, cidades e estados que contam com um sistema de ensino estruturado, nos aspectos físicos, materiais, humanos e políticos, de forma a responder as demandas e a contemplar as condições peculiares do aluno com necessidades educativas especiais. Sublinha que a educação de qualidade perpassa pelo equacionamento das políticas educacionais, voltadas ao atendimento destes recursos e à formação dos profissionais da escola, não se restringindo à ação pedagógica do professor. Consonante à proposição de uma abordagem educacional diferenciada, se enfatiza a necessidade de cursos de formação continuada, especificamente, aqueles que enfoquem estratégias pedagógicas e práticas, métodos e didáticas que atendam as necessidades dos alunos inclusos. E que substancialmente, possam apoiar os professores, em sua atuação em sala de aula, refletindo mudanças no planejamento, na avaliação e na reelaboração das atividades. Fávero, Pantoja e Mantoan (2004) reforçam que para ensinar a turma toda, é preciso programar atividades abertas e diversificadas, porque estas englobam distintos níveis de compreensão, conhecimento e até mesmo de desenvolvimento dos alunos, sem privilegiar ou persistir na noção, de que alguns sabem mais e outros menos. Subjacente a esta formação, está a condição de oferta contínua, diversificada e democrática de cursos ou capacitações para atingir o quantitativo de profissionais da educação, não apenas os professores, que atuam em escolas regulares. Deve-se ainda, associar, o espaço de apoio e supervisão psicopedagógica que existe nas escolas, resgatando o compartilhamento, a discussão e a reflexão, por meio de leituras e estudos de temas ligados ao processo ensino-aprendizagem, estimulando a elaboração de materiais pedagógicos e uma adequação curricular que atenda as condições peculiares dos alunos e que permita a superação progressiva de suas dificuldades. É consenso entre os pesquisadores que, a formação docente é um dos alicerces do sistema educacional, enfatizado o investimento constante, na formação continuada, considerando seus reflexos, na melhoria do ensino e as repercussões em sala de aula. Enfocando temas ou conteúdos que emergem das necessidades e das situações provenientes do contexto escolar, resgatando a vivência pedagógica como condição imprescindível à construção de conhecimento e às transformações geradas nas práticas educativas. Complementando esta discussão, Garcia e Yáñez (1997, apud Oliveira, 2009) resgatam que os profes137 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento sores são profissionais imersos em uma organização e, por esta condição, devem ser assegurados espaços direcionados ao desenvolvimento de seus próprios processos de aprendizagem, que de sobremaneira, interferem em seu planejamento e na dinâmica de suas aulas. Enfim, o modelo educativo tendo como referencia à concepção de inclusão, está sedimentado nos estabelecimentos de ensino que, prioritariamente, valorizam as diferenças e se preocupam em trabalhar a diversidade humana e cultural. Reconhecendo as diferenças, não como incapacidades ou limitações, e objetivam ensinar todos os alunos porque o aprender é condição inerente dos seres humanos. Em geral, rompem as barreiras entre as disciplinas curriculares, constroem uma rede de conhecimentos, evitando a concepção de currículo, sob ótica conteudista, valorizando a integração entre os saberes, tendo como referência a transversalidade (Gallo, 1999 apud Montoan, 2006). Nesta perspectiva, a realidade educacional é compreendida como múltipla e multifacetada e as propostas pedagógicas, refletem a ação educativa, embasada na autonomia, na construção coletiva do conhecimento e nas potencialidades que são constantemente estimuladas pelo processo ensino-aprendizagem. Estas diretrizes edificam ambientes polissêmicos, estimulando temas que partam da realidade do aluno, considerando sua identidade sociocultural, estabelecendo espaços criativos e diferenciados para aprender. Palavras-chave: formação de professores; inclusão; processos pedagógicos. 138 ATENDIMENTO ESPECIALIZADO AOS ALUNOS INCLUSOS EM SALAS REGULARES Teresa Cristina Siqueira Cerqueira - UnB A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 assegura, em seu Artigo 208, “o atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente, na rede regular de ensino” (Oliveira, 2009). Indicando que os sistemas de ensino devem ter em seus estabelecimentos profissionais especializados para o atendimento do aluno com necessidades educativas especiais, e ainda, professores capacitados para assegurar a real integração, nas classes comuns. Ele deve ser disponibilizado em todos os níveis de ensino, notadamente, pelas características presentes na escola regular, na medida em que se constitui em ambiente propício para garantir e estimular a convivência entre os alunos, independente, de sua condição, especialmente, quando se pretende romper com rótulos e preconceitos. Sabe-se que o processo de interação social é um fator que atua positivamente no desenvolvimento global dos sujeitos com ou sem deficiências (Montoan, 2006). Uma preocupação emerge em relação aos recursos humanos e psicopedagógicos, eles devem estar intimamente, associados às estratégias e aos materiais didáticos, estando disponíveis no contexto escolar, de forma a atender as demandas dos atores: professores, familiares, alunos e outros profissionais da educação. Principalmente, quando se vislumbra e se assegura o processo de inclusão, o considerando como fonte permanente de desenvolvimento e aprendizagem humana, tendo como eixo a diversidade cultural. Retomando a função e o atendimento especializado nos espa- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento ços escolares, Alves et al (2006) destaca que as salas de recursos multifuncionais são espaços na escola, centrados no atendimento educacional especializado, objetivando atender os alunos com necessidades educativas especiais, com o emprego de estratégias diferenciadas de ensino, de forma potencializar a aprendizagem e o fazer pedagógico. Visa então, favorecer e desenvolver a construção de conhecimentos e, concomitantemente, propiciar que todos os estudantes possam ativamente participar do currículo da escola, e desenvolver habilidades e competências imprescindíveis à qualidade do ensino. Nele se encontram materiais didáticos, pedagógicos, equipamentos e recursos outros, além dos profissionais com formação e qualificação para o atendimento às pessoas com necessidades educacionais especiais, estendendo, quando necessário, orientações aos professores da sala de aula. A perspectiva assegurada neste ambiente, é que o professor responsável considere as diferentes áreas do conhecimento, os estágio de desenvolvimento cognitivo dos alunos, seu nível de escolaridade, potenciais e dificuldades, aliados aos recursos específicos para sua aprendizagem, de maneira a possibilitar atividades de complementação e suplementação curricular. Assim, os alunos podem ser atendidos individualmente ou em pequenos grupos, conforme necessidade e programação especial, em horários diferenciados e opostos, de suas aulas, em sala regular. Configura-se como um espaço para atender, com qualidade, os alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e aqueles identificados com altas habilidades que fazem parte das turmas de ensino regular De 2005 a 2009, foram disponibilizadas 15.551 salas de recursos multifuncionais para todos os estado, incluindo o Distrito Federal, englobando 4.564 municípios brasileiros - 82% do total.4 Outro profissional presente na escola e que pode integrar esta rede de apoio psicopedagógico é o orientador educacional. Atualizando as suas funções, Placco (1994, apud Oliveira, 2009) enfatiza que o papel deste profissional sofreu transformações, não sendo mais a porta de ‘entrada de alunos problemas’. Sobretudo, emerge como um dos educadores da escola, envolvidos em uma ação escolar coletiva, estabelecendo processos voltados ao desenvolvimento de uma atividade pedagógica de qualidade, significativa e inserida no projeto político pedagógico da escola. Assim, ele pode atender o grupo de professores e as demandas particulares de cada um, ainda promover discussões e grupos de estudo, além de buscar outros profissionais que possam dar apoio profissional, de acordo com as necessidades do grupo de professores. Quanto aos profissionais que compõe o quadro de especialistas, focados no apoio educacional, se pode identificar, o supervisor escolar, o orientador educacional e o coordenador pedagógico, Oliveira (2009) retoma que na atualidade a função deste grupo converge para a qualidade da ação pedagógica: oferecer assessoramento ao docente, adotando uma perspectiva colaborativa de trabalho, fortalecendo as bases de uma atividade educacional de cunho coletivo, voltadas ao fazer pedagógico crítico e reflexivo, aliando a competência à experiência, como fundamentos do processo ensino-aprendizagem. Esta articulação possibilita trocas de experiência, 4 Implantação de salas de recursos multifuncionais, disponível em http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_ content&view=article&id=12295&Itemid=595, acessado em 21/11/2011, às 1:15. 139 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento conhecimentos e rede de apoio entre os profissionais da escola. Sobre a constituição da equipe psicopedagógica e seu papel no espaço escolar, Muller et al (2010) aponta entre os seus objetivos: promoção da melhoria da qualidade do processo de ensino e de aprendizagem, adotando uma perspectiva institucional, centrada na abordagem preventiva e interventiva, com vistas ao aprimoramento e contextualização das atividades profissionais, dos distintos atores que fazem parte das instituições educacionais. Visa então, fomentar e incrementar a qualidade educacional, retratada no desenvolvimento e aprendizagem efetiva dos alunos, fundamentada na cultura de sucesso escolar. Ela é atualmente, composta por um profissional formado em pedagogia e outro em psicologia, sendo rebatizada, como Equipes Especializadas de Apoio à Aprendizagem. Apesar do reconhecimento e da legislação que assegura este apoio educacional especializado, em grande parte das escolas, falta material específico para atender os alunos, profissionais especializados, como intérpretes de Libras para atender a criança com necessidade educativa especial, Ainda, o coordenador pedagógico e o orientador educacional, e entre outros profissionais especializados que estariam catalisando as demandadas e coordenando atividades coletivas, que fomentassem os processos de discussão, reflexão e proposição, visando à resolução coletiva e colaborativa dos problemas educativos. Mazotta (2005) ressalta que este atendimento é restrito e, não atingem uma boa parte dos municípios, cidades e estados. E a precariedade engloba desde o espaço físico destinado a sala de recurso ou destinada ao atendimento por parte das equipes atuarem. Além disso, os materiais didáticos, os recursos humanos e 140 o número reduzido de profissionais, retratam as dificuldades de sua implantação. Inclusive as políticas educacionais, por vezes, negligenciam o investimento nas equipes de atendimento especializado, sobrecarregando o professor, o deixando isolado e se sentindo responsável pelo processo pedagógico de inclusão. Palavras-chave: equipes de apoio à aprendizagem, educando com necessidades educativas especiais, sala de aula, sala de recurso, equipes multiprofissionais. SP LT03 - Simpósio SP LT03-1244 - AÇÕES EDUCATIVAS E O DESENVOLVIMENTO MORAL DA SOCIEDADE Vannuzia Leal Andrade Peres - PUC-Goiás/ UnB [email protected] Rafael de Almeida Mota - PUC-Goiás [email protected] Cândido Martins do Santos Neto - PUC-Goiás [email protected] Luciane Aparecida Muniz Mols - PUC-Goiás [email protected] Roberta Alves Dionisio - PUC-Goiás [email protected] Marina Magalhães David - PUC-Goiás [email protected] Com base nos resultados de pesquisa qualitativa sobre a “Expressão Moral do Goianiense”, realizada em quatro semestres consecutivos por alunos do Curso de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de Goiás, foram desenvolvidas ações educativas com adolescentes, adultos e idosos na perspectiva da psicologia histó- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento rico-cultural da subjetividade de González Rey. Com o objetivo de criar espaços sociais de desenvolvimento moral, essas ações consistiram na construção de diálogos e reflexões sobre a invisibilidade do outro, a despersonalização do sujeito e a produção da violência nas relações, dentre outras categorias construídas no processo da pesquisa. Para isso foram utilizados cartazes, panfletos, vídeos e jogos de ação envolvendo todos os participantes que foram escolhidos aleatoriamente e deram seu consentimento livre e esclarecido ao serem convidados nos diferentes espaços da cidade, dentre eles um clube de futebol e duas escolas, uma de ensino fundamental e outra de ensino médio. O envolvimento ativo dos participantes no diálogo e reflexão sobre as categorias e sobre os temas delas decorrentes, possibilitaram a construção do indicador de sentido de que é premente a realização de ações educativas que desafiem e comprometam os sujeitos com práticas sociais, atividades e relações que privilegiem o desenvolvimento moral da sociedade. A MORAL NO ESTÁDIO DE FUTEBOL – A ESSENCIA DO FUTEBOL NAS TORCIDAS ORGANIZADAS A partir de um estudo realizado por quatro semestres na matéria “Psicologia do Desenvolvimento III”, que visava compreender a expressão moral do Goianiense em vários espaços sociais, sendo um deles o estádio de futebol, teve-se direcionamento à segunda parte deste projeto, que ansiava práticas de modelos educativos para possibilitar a reflexão, consciência e envolvimento cognitivo-emocional das pessoas vinculadas aos times, no caso, participan- tes de torcidas organizadas, para que elas pudessem através de si mesmas, de sua subjetividade e de sua capacidade de análise compreender quais atitudes necessitavam ser metamorfoseadas para que a relação homem – sociedade estivesse pautada na Moral, abortando assim atitudes que são contrárias ao viver social harmônico, como a violência exacerbada, que se vê tão vinculada a estes meios que supostamente deveriam propiciar formas de lazer límpido, mas que na realidade só reafirmam a posição de Sujeitado de seus participantes. Foi realizada uma ação educativa, de caráter qualitativo (González Rey, 2005) em um clube de time local, quando teve-se a priori uma perspectiva de construção de conhecimento, com integrantes da torcida e estudantes de psicologia refletindo sobre este “indivíduo torcedor” e como o grupo o posiciona frente à agressividade, rivalidade, revanchismo e incapacidade de discernimento que o precipita à uma agressão cega em decorrência de desdobramentos futebolísticos. Mostrou-se visível como em organizações populares, grupos de massa, no caso, as torcidas organizadas, o processo de morte do Sujeito. Ele se torna exaurido de sua própria voz, sua capacidade de decisão não está mais pautada em si, mas no grupo, abdicando-se deste modo da sua subjetividade e agindo de acordo com a direção acenada pelo grupo, o que torna visível a compreensão do por que da violência estar tão latente nestes meios, tendo em vista que as amarras impossibilitam a autonomia e tornando-os sujeitados, fazendo com o que seu corpo grite a todo instante para ser retomada a posse de ser Sujeito de si mesmo. Palavras-chave: subjetividade, sujeito, torcidas organizadas 141 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento EDUCAÇÃO MORAL DE JOVENS NA ESCOLA – SERIA A ESCOLA UM DELIMITADOR CRIATIVO E SOCIAL? Tal trabalho surgiu da necessidade de se compreender como o sujeito moral, isto é, aquele que se orienta a partir da moral constitutiva de sua personalidade (González Rey, 1989) emerge de relações de extrema complexidade, muitas vezes ríspidas e que camuflam com discursos doces o marasmo, a estagnação e práticas deletérias que muitas vezes dão formas as silhuetas das Escolas. Como podemos discorrer sobre sujeitados sociais e sobre a incapacidade reflexiva de um grande número de pessoas, se em nosso modelo de educação vigente, as escolas, um dos primeiros passos das crianças à um meio social além de sua família, só impõem ainda mais o desligamento do homem de si mesmo, de suas sensações, sentimentos, manifestações, destituindo-o daquilo que o torna único, a sua subjetividade? A proposta de nosso trabalho de ação educativa era desafiar pais e professores a levarem em conta a necessidade de expressão da criança, de tornar-se sujeito e se envolver de forma ativa com o mundo que a circunda, para romper com uma relação de obrigatoriedade, automatizada e, assim, abandonar o patamar de sujeitada e tornar-se sujeito de seu próprio aprendizado. Tendo como direção teórica a perspectiva histórico-cultural da subjetividade de Fernando Gonzalez Rey, tivemos a oportunidade de construir junto aos pais e profissionais da educação a representação de uma escola onde o sujeito não fosse negado a todo instante, mas sim enxergado e valorizado. O abordar dessa escola tão pouco humanizada exigiu a reflexão sobre este fatídico da educação que se mostra 142 presente em todas as ramificações sociais dos meios de ensino, possibilitando assim a mudança nesta concepção de como se dá o ensino, o aprendizado e as relações dentro do ambiente escolar, para formar sujeitos morais. Palavras-chave: escola, educação moral, subjetividade ESCOLA E EDUCAÇÃO MORAL: MUDANÇA OU MANUTENÇÃO DO STATUS QUO? Com base na psicologia histórico-cultural da subjetividade de González Rey foi realizada ação educativa em uma escola, com o objetivo de criar um espaço de expressão autentica dos alunos, no tocante as suas relações cotidianas com os professores. Participaram da ação educativa, alunos do sexto ano do ensino fundamental de uma escola estadual. Motivados por cartazes ilustrativos de situações de opressão e violência, os alunos foram desafiados a expressarem suas idéias e emoções produzidas no espaço da sala de aula, com relação à escola e aos professores. Nesta atividade lúdica os alunos expressaram, por meio da arte, emoções produzidas nas práticas delimitadoras de suas relações no âmbito escolar, tais como: insatisfação, raiva, desmotivação, desconsideração. Deste modo, pôde-se perceber sua necessidade de participar ativamente da vida da escola, necessidade esta que se mostra escassa numa realidade escolar que busca a homogeneização. Se para Edgar Morin (2003), a moral é “a constituição do outro em mim”, como podemos pensar em Moral em um espaço onde a figura de autoridade desconsidera os anseios dos alunos? Portanto, existe constituição deste VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento outro moral em mim? Ele é simplesmente ignorado? O profissional da educação, ao tornar-se o detentor da verdade, não dificultaria o desenvolvimento do aluno enquanto sujeito? Na perspectiva de González Rey (2006) o desenvolvimento do sujeito somente é possível pela aprendizagem, o que implica em envolvimento do aluno no processo de educação e, portanto, na mudança deste status quo. Palavras-chave: escola, moral, desenvolvimento A MORAL DO GOIANIENSE NA FAIXA DE PEDESTRES A partir de pesquisa sobre a expressão moral do goianiense, na disciplina de Psicologia do Desenvolvimento do curso de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de Goiás, foi realizada uma ação educativa no trânsito, na perspectiva da teoria histórico-cultural da subjetividade, com o intuito de mobilizar as pessoas para refletirem e produzirem uma subjetividade sobre a importância de respeitarem a faixa de pedestres. Para isso foram utilizados panfletos, a partir dos quais as pessoas eram abordadas e convidadas a participarem da ação. Observou-se que a grande maioria dos participantes mostrou interesse e motivação para a discussão sobre o tema, bem como preocupação com a educação de motoristas e pedestres para se respeitarem mutuamente. Sobre a questão, ainda há muito que fazer, as pessoas precisam se conscientizar que respeitar a faixa de pedestres é um problema do âmbito da moral. Essa noção de respeito precisa ser desenvolvida por cada pessoa, fazer parte de sua orientação moral (González Rey, 1989) e não apenas ser uma obrigação. Impor leis e punições para pessoas que não respeitam a faixa pode ser uma medida imediata, mas não a solução quando para o desenvolvimento humano, o que significa não apenas obedecer às fiscalizações, mas respeitar os direitos do outro. Palavras-chave: desenvolvimento moral, subjetividade, faixa de pedestres. A MORAL DO GOIANIENSE NAS AGÊNCIAS BANCÁRIAS No primeiro semestre de 2011, na Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-Goiás), com base no conceito de González Rey de que a moral é um elemento da personalidade que orienta o sujeito nas suas relações e práticas sociais, foi realizada uma ação educativa visando o desenvolvimento moral de usuários e funcionários de duas agências bancárias da cidade de Goiânia, uma de um bairro periférico e outra de um bairro nobre. É importante enfatizar que as gerências de ambas as agências foram devidamente esclarecidas sobre o intuito da ação e permitiram que fosse realizada desde que a identidade da instituição fosse preservada. A ação consistiu na distribuição de panfleto contendo, como disparador para reflexão e discussão, a seguinte pergunta: “Como está sua moral dentro da agência bancária? As reflexões e discussões sobre a moral, tanto com os usuários quanto com os funcionários de ambas as agências, trouxeram aos estudantes a oportunidade de entrarem em contato com uma realidade complexa, em que cada pessoa pensa e age diferentemente da outra, ou seja, existe aquela que está indiferente, 143 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento aquela que ironiza sobre a problemática da moral e aquela que está atenta à ela, se interage com os estudantes e se mobiliza para ajudar a mudar a realidade. Entretanto, o fato de pessoas terem dado atenção à ação é um importante indicador de que o tema pode e precisa ser retomado em outras oportunidades. Uma vez registrado em vídeo, com a permissão dos participantes, o processo da ação educativa permitiu aos estudantes produzirem um pequeno documentário que deverá, então, servir a outras ações educativas que serão realizadas por outros estudantes em futuro próximo. Palavras-chave: agências bancárias, desenvolvimento e moral. CO 24 - LT4 Literatura e Brincar LT04-722 - LIVROS DE HISTÓRIAS: UM RECURSO PROMOTOR DE SAÚDE NA EDUCAÇÃO INFANTIL Jaqueline Pereira Dias - USP [email protected] Edna Maria Marturano - USP [email protected] Financiamento: CAPES A permanência na educação infantil acontece em uma fase crucial para o desenvolvimento social, escolar e emocional da criança. O Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (1998) ressalta que é função social da escola capacitar a criança para sua inserção na sociedade; para isso a formação pessoal e social e a aquisição do conhecimento de mundo 144 inserem-se como experiências de aprendizagem (Gonçalves & cols. 2008; Rodrigues & Oliveira, 2009). Neste contexto, as estratégias preventivas e promotoras de saúde vêm ganhando cada vez mais destaque (Borges & Marturano, 2009; Rodrigues, Dias & Freitas, 2010). Matinez (1996) assegura que a escola é um espaço potencial para se prevenir problemas e promover saúde. Um recurso promotor de saúde são as histórias infantis (Borges & Marturano, 2009; Kalyva & Agaliotis, 2009; Rodrigues, 2009; Teglasi e Rothman, 2001). Rodrigues e Oliveira (2009) salientam que o relato e a leitura de histórias favorecem a ampliação da realidade da criança, a escuta e observação dos outros em uma perspectiva de aprendizagem e conscientização de que as outras pessoas também possuem sentimentos, pensamentos, motivos e desejos e que cada ação tem uma consequência nos diversos contextos que vivenciam. Teglasi e Rothman (2001), utilizando a literatura infantil, elaboraram um programa para promover o desenvolvimento sociocognitivo de crianças agressivas, com base nos seis componentes do modelo de processamento da informação social proposto por Dodge e Crick (1994). Como resultados obtiveram redução de comportamentos externalizantes em alunos de 4º e 5º ano. Tendo como apoio teórico o mesmo modelo, o presente estudo teve por objetivo promover habilidades sociocognitivas, por meio da leitura de livros de histórias infantis, em alunos da educação infantil. Esperava-se que, com o desenvolvimento do pensar sociocognitivo propiciado pela intervenção, as crianças melhorassem suas habilidades sociais e seu comportamento nas relações com os companheiros. Método – Sujeitos - Participaram do estudo até o momento VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento 25 crianças de 5-6 anos, matriculadas no Pré III de uma escola de educação infantil filantrópica, no interior de São Paulo. Materiais e procedimentos - Para implementar a intervenção, foram selecionados 25 livros ilustrados de histórias infantis, ricos em pistas sociais, com base na pesquisa de Rodrigues e cols. (2007). A intervenção foi conduzida durante três meses, em 25 sessões, com cerca de 50 minutos cada, em grupos com até 9 crianças. Em cada sessão, a interventora lia um livro de história interativamente, visando explorar e discutir o seu conteúdo com as crianças, de acordo com o modelo de seis componentes do processamento da informação social. Na exploração do primeiro componente - o que está acontecendo? - as crianças observam e interpretam as pistas sociais. No segundo - o que os personagens estão pensando e sentindo? - as crianças são incentivadas a observar o “mundo interno” dos personagens por meio das ilustrações e leitura. No terceiro componente - quais são as intenções e metas dos personagens? - relacionam-se os sentimentos e pensamentos, já identificados, com os objetivos e as metas. No quarto - o que os personagens alcançam com suas ações? - Discute-se com as crianças a relação entre os objetivos e metas dos personagens e os resultados alcançados. No quinto - como os personagens executam e monitoram seus comportamentos? - as ações dos personagens são avaliadas levando em consideração as consequências do comportamento. O sexto e último componente - quais as lições aprendidas? - abre para a criança a oportunidade de estabelecer relações entre as experiências vivenciadas pelos personagens da história e aquelas vividas por ela própria em seu dia a dia. Dois instrumentos foram aplica- dos junto aos professores, antes e depois da intervenção, de modo a aferir os seus efeitos. Para avaliar as habilidades sociais das crianças, foi utilizado o Questionário de Respostas Socialmente Habilidosas QRSH-RP (Bolsoni-Silva, Marturano & Loureiro, 2009), composto por 24 itens agrupados em três fatores - Sociabilidade e Expressividade Emocional, Iniciativa Social e Busca de Suporte. Para avaliar problemas de comportamento, empregou-se o Questionário de Capacidades e Dificuldades – SDQ (Fleitlich, Cortázar & Goodman, 2000), composto por 25 itens em cinco escalas: sintomas emocionais, problemas de conduta, hiperatividade, problemas de relacionamento e comportamentos pró-sociais. Um procedimento de avaliação sócio-cognitiva também foi utilizado, porém seus resultados ainda não estão disponíveis. Os resultados das avaliações pré- e pós-intervenção foram comparados por meio do teste de Wilcoxon. Resultados e discussão - Os resultados apontaram incrementos significativos (p < 0,05) da pré para a pós-avaliação nos escores totais de dois fatores do QRSH-PR. No fator sociabilidade e expressividade emocional, com 14 itens, aumentaram os escores nos itens comunica-se positivamente, cumprimenta, expressa carinhos, expressa desejos, expressa frustração e desagrado de forma adequada, faz elogios e tem relações positivas. No fator iniciativa social (6 itens), houve incremento nos itens toma a palavra, participa de temas de discussão, negocia. Os itens usualmente está de bom humor e toma iniciativas mostraram tendência a aumento (p < 0,10). No SDQ, houve melhora da pré para a pós-avaliação nas escalas relativas a problemas de relacionamento e comportamentos pró-sociais. Os resultados demonstraram 145 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento uma redução de problemas de relacionamento e aumento nas taxas de comportamentos pró-sociais. Não tendo havido mudança nos indicadores de busca de suporte (QRSH-PR), sintomas emocionais, hiperatividade e problemas de conduta (SDQ), pode-se supor que os resultados refletem a especificidade do programa para promover comportamentos socialmente habilidosos e reduzir problemas de relacionamento. A evolução encontrada nos referidos resultados denota que com o programa de leitura de histórias infantis as crianças se tornam mais colaboradoras, empáticas, atenciosas e, provavelmente, mais capazes de analisar as consequências de cada comportamento (Rodrigues, 2009; Rodrigues & Oliveira, 2009), o que pode contribuir para a melhora da convivência na escola (Borges & Marturano, 2009). Conclusão - Programas promotores de habilidades infantis são de grande valia para favorecer o relacionamento interpessoal; a literatura infantil vem se mostrando benéfica dentro desta proposta. Por meio dos livros de história as crianças esclarecem de modo interativo, contextualizado e reflexivo o processamento da informação social tornando-se cada vez mais ajustadas ao meio social. Palavras-chave: desenvolvimento sociocognitivo, livros de histórias infantis, educação infantil LT04-744 - A MUSICALIZAÇÃO NO CONTEXTO DOS PROJETOS SOCIAIS DO VALE DO PARANHANA/RS Alexandre Herzog - FACCAT [email protected] Patrícia Fernanda Carmem Kebach - FACCAT [email protected] 146 Os projetos sociais são hoje uma realidade muito comum à sociedade brasileira. São iniciativas individuais ou coletivas que visam a proporcionar a melhoria da qualidade de vida de pessoas e comunidades. A sociedade se mobiliza, por meio de contribuições voluntárias, organizando e desenvolvendo projetos e ações sociais para transformar determinada realidade para o bem comum. A arte e a música, mais especificamente, representam a manifestação cultural de um povo e contribuem para qualificar a vida das pessoas, na medida em que, através da arte, o ser humano manifesta sua cultura e, correlativamente, suas emoções, ou seja, aquilo que compartilha socialmente e seu mundo subjetivo. Sendo assim, elas se tornam uma importante ferramenta para que os projetos sociais atinjam seus objetivos. Os resultados de pesquisas anteriores (Kebach, 2003; 2008) evidenciam que a educação musical nos espaços informais demonstra ser algo bastante produtivo em termos de musicalização e de trocas sociais, o que motivou a realização da pesquisa atual. Diante disso, o objetivo desta pesquisa é investigar no âmbito de projetos sociais no Vale do Paranhana/RS, como ocorrem as práticas musicais para compreender de que modo estes espaços podem contribuir para a construção musical, para a inclusão e resgate da cultura local dos sujeitos envolvidos neste processo. Através da pesquisa, poder-se-á mapear a Educação Musical informal na região de estudo e sua repercussão na sociedade local, legitimando-se este espaço. Pretende-se também contribuir para que os atuantes nos projetos sociais aprimorem seu trabalho e pensar na implantação da educação musical, obrigatória nas escolas a partir de 2011, em função da lei 11.769 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento publicada no Diário Oficial da União em agosto de 2008, de modo mais qualificado e significativo. A metodologia utilizada visa compreender o fenômeno em suas dimensões individual e social. Os sujeitos investigados serão os professores (ou outros proponentes) e participantes do processo de musicalização no contexto dos projetos sociais. Utilizar-se-á a técnica de observação coletiva e entrevistas individuais. Essas entrevistas serão realizadas com base na técnica de aplicação do Método Clínico Piagetiano (Delval, 2002), a fim de compreender, através da livre conversação com os agentes do processo, de que modo ocorrem a produção musical e as interações sociais nos espaços investigados. O método clínico se traduz pelo procedimento de coleta de dados através da observação das ações e livre conversação sobre determinada temática, para seguir o pensamento da pessoa entrevistada. No caso desta pesquisa, os dados referentes às ações musicais dos sujeitos serão registrados através de filmagens e as entrevistas gravadas e transcritas, para posterior análise. A eleição da observação das ações musicais e dos sujeitos entrevistados será feita através de entrevista com um proponente de atividade musical e um participante destas atividades de cada uma das seis cidades do Vale do Paranhana: Taquara, Parobé, Três Coroas, Riozinho, Igrejinha e Rolante. Serão mapeados espaços diversificados de projetos sociais, o que se caracteriza como pré-requisito para a eleição de determinados projetos, ou seja, em cada cidade, será eleito um espaço diferente para ser mapeado. Até o presente momento, a pesquisa permitiu verificar a existência de 25 projetos sociais ocorrendo nas cidades do Vale do Paranhana. A educação musical tem sido trabalhada nesses projetos através do ensino de instrumentos musicais e por meio da realização de corais, que permitem a construção do cantar dos participantes e a sensibilização musical. Nos projetos mapeados até o presente momento, de modo geral, objetiva-se trabalhar com a prevenção antidrogas, a promoção de saúde, melhorar a qualidade de vida dos participantes, promover a socialização de crianças e sua permanência na escola, profissionalizar o jovem e mantê-lo longe do trabalho sem condições, além de reunir a comunidade e fomentar o gosto pela espiritualidade e cultura local. Caracterizam-se como iniciativas movidas por diversos tipos de proponentes, desde igrejas, moradores dos municípios, secretarias de educação e de assistência social até escolas e programas federais. Esta pesquisa está em fase de coleta de dados e poderá contribuir para a construção de conhecimento acerca dos projetos sociais e as práticas de educação musical desenvolvidas na região do vale do Paranhana. Os projetos já mapeados revelam a relação entre a música e a qualidade de vida e, também, a intenção de promover uma educação musical qualificada. Na etapa em que os pesquisadores analisarão com mais profundidade os projetos eleitos em cada cidade do Vale do Paranhana, ter-se-á como objetivos os seguintes: analisar como as pessoas que trabalham com musicalização nestes espaços compreendem seu papel e o dos educandos para compreender a fundo os processos de ensino e aprendizagem musical; verificar as relações interpessoais estabelecidas nos projetos para compreender o que une as pessoas em torno das ações de educação musical; investigar a função, natureza e impacto que a Educação Musical causa nas localidades dos projetos sociais 147 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento onde é desenvolvida para compreender como os grupos em situação de vulnerabilidade e risco social podem vislumbrar novas perspectivas de estruturação social, a partir da interação nos cenários de musicalização nestes projetos. Palavras-chave: educação informal, projetos sociais, musicalização LT04-810 - JOGOS COOPERATIVOS E A PROMOÇÃO DA COOPERAÇÃO NA EDUCAÇÃO INFANTIL Marilícia Witzler Antunes Palmieri - UEL [email protected] Valéria Queiroz Furtado - UEL [email protected] Em muitas das práticas educativas no âmbito da educação infantil, desvelam-se diferentes procedimentos contemplando alternativas educativas e pedagógicas diversificadas. Estas permitem o trânsito de uma ampla gama de valores, conceitos, regras, orientações, idéias e concepções, configurando relações motivacionais altamente complexas e que implicam no desenvolvimento de diferentes padrões de interação social. O eixo central do estudo recai sobre a necessária superação de valores atrelados as práticas sócio-culturais competitivas e individualistas das relações humanas que se estabeleceu em nossa sociedade, as quais têm sido enfatizadas no exercício do cotidiano escolar (Branco, 2003, 2006; Crockenberg & Bryant, 1979; Johnson & Johnson, 1989; Palmieri, 2003; Salomão, 2001). Isto porque, dependendo das ações pedagógicas do professor, é ele quem define as normas e as regras, como também lidera e domina de forma quase absoluta o espaço comunicativo das atividades a serem desenvolvidas pelas 148 crianças. A idéia de educação infantil – entendida como aquela que se orienta para o desenvolvimento de crianças de zero a seis anos de idade (Brasil, 1998) – está associada, culturalmente, às dimensões do “cuidar” e do “educar”, visando garantir a não-fragmentação das experiências de ensino-aprendizagem à criança pequena (Angotti, 2000; Machado, 2000; Oliveira, 1999). Porém, muitas vezes, tais contextos se encontram à mercê de concepções teóricas e práticas não adequadas para expressar, em sua plenitude, o caráter educativo, pedagógico e formativo, implicado nas diversas experiências vivenciadas pela criança (Machado, 2000). Dentre as diretrizes apontadas pelo Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (Brasil, 1998) para o desenvolvimento do trabalho com crianças de quatro a seis anos está à promoção de interações que favoreçam a troca de idéias, oportunidade de expressão, de contato com outras vivências e a construção conjunta de conhecimentos e habilidades sociais, sublinhando a cooperação como o principal tipo de interação a ser estimulado e promovido. Nessa perspectiva a proposta pedagógica dos jogos cooperativos (Correia, 2006, 2007; Brotto, 2000; Salvador e Trotte, 2000; Soler, 2003) apresenta-se como um recurso educativo promissor para a modificação de práticas, conceitos e valores competitivos e individualistas comumente encontrados na escola, a qual enaltece o resultado e não o processo, ao valorizar a vitória como prêmio do sucesso individual (Correia, 2006; Salvador & Trotte, 2001). Chama-se de “cooperativos” jogos que alteram a estrutura dos jogos tradicionais de suas características de exclusão, agressividade, seletividade e exacerbação presentes em jogos competitivos, para uma estrutura de VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento jogos que sejam basicamente pautados na cooperação, no envolvimento e na diversão (Brotto, 2002). São jogos que aceitam as diversidades e as limitações dos participantes promovem o exercício da confiança pessoal e interpessoal, cumplicidade, solidariedade, respeito mútuo (Correia, 2006), uma vez que ganhar e perder são apenas referências para um contínuo aperfeiçoamento de todos, vislumbrando um verdadeiro exercício educativo para a paz (Brotto, 2002). Neste sentido, o melhor momento para introduzir os jogos cooperativos para o exercício da cultura da cooperação é a educação infantil, considerando que a criança ainda foi pouco exposta a experiências de competição (Soler, 2003). Acreditamos que as possibilidades e os limites dessa proposta no contexto da educação infantil contribuirão à análise do complexo processo construtivo de socialização entre professores e alunos inseridos em espaços educacionais que tem por base um contexto heterogêneo e dinâmico, ancorado em diferentes aspectos relativos à interdependência humana, aí convivendo, em princípio, orientações múltiplas e diversificadas. O presente trabalho é fruto de estudo anterior sobre o tema ludicidade e formação de educadores infantis realizado em um Centro de Educação Infantil do município de Londrina-PR. Uma oficina de Jogos Cooperativos foi promovida a quinze educadoras, as quais reconheceram a necessária promoção de atividades verdadeiramente cooperativas na educação infantil, e, ao mesmo tempo, revelaram desconhecer como este tipo de vivência pode ser promovido nas atividades lúdicas que desenvolvem com as crianças no dia-a-dia da instituição. Dentro deste contexto se insere o presente estudo (em fase inicial), desenvolvido na mesma insti- tuição, visando analisar, em nível microgenético, como três educadoras promovem ou inibem a cooperação entre seus alunos (4 a 6 anos), utilizando como recurso pedagógico os jogos cooperativos. O estudo inclui: 1) Registro das atividades diárias realizadas com as crianças (protocolo específico); 2) Entrevistas (inicial e final) com as educadoras (roteiro semiestruturado); 3) Planejamento dos jogos para orientar as professoras a reconstruírem e adaptarem jogos a uma concepção não competitiva ou cooperativa (categorização de Orlik, 1989, apud Correia, 2007); 4) Registro em vídeo de atividades de jogos cooperativos estruturados pelas educadoras. Como resultado parcial, os registros das atividades diárias têm revelado um grande volume de “atividades livres” sendo promovidas às crianças fora da sala de aula, onde predomina as instruções das educadoras sem, contudo, considerarem o interesse das crianças pelas brincadeiras. Quando se trata de atividades sendo estruturadas no contexto da sala de aula, as educadoras se orientam pelo objetivo de obter a atenção das crianças na realização de tarefas individuais ou em grupo, com a atenção orientada para a professora, desestimulando-as a interagirem entre si. Tais atividades, geralmente, se reduzem às educadoras contando uma estória para as crianças, repetidas vezes por um período determinado e, na seqüência, as instruem para a produção individual de trabalhinhos (pintura, desenho, recorte, colagem). Neste caso, não se observa preocupação das professoras com atividades estruturadas para as crianças interagirem cooperativamente que façam com que aprendam novos conceitos e experimentem algo novo no contexto da sala de aula. Questiona-se o pouco espaço para a criação de um ambiente propício a 149 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento negociações professoras-crianças, o que levaria a um posicionamento mais democrático na sala de aula. Problematiza-se o caráter educativo das atividades propostas e o tipo de interação estimulado e promovido no âmbito da instituição. Acreditamos que a prática dos Jogos Cooperativos nesse contexto educacional propiciará às crianças a participação em atividades lúdicas que incentivam a cooperação, visando o alcance de objetivos comuns, adquirindo também progressiva autonomia e independência para coordenar suas ações com a de outros. As educadoras poderão explorar as configurações motivacionais facilitadoras de modalidades construtivas de interdependência social, o que nos propiciará analisar os diferentes tipos de inter-relações que ocorrem no conjunto dos fatores que se apresentam típicos desse contexto. Palavras-chave: Jogos Cooperativos; Cooperação; Educação Infantil. LT04-1412 - A LITERATURA INFANTIL NO DESENVOLVIMENTO DA IMAGINAÇÃO E CRIATIVIDADE DE ALUNOS DE 2 A 5 ANOS DE IDADE Priscila Martins do Nascimento da Silva - UnB Norma Lucia Neris de Queiroz - UnB [email protected] O presente trabalho caracteriza-se com um estudo de pesquisa, cujo título é A literatura infantil no desenvolvimento da imaginação e criatividade de alunos de 2 a 5 anos de idade. Foi estabelecido como objetivo geral, analisar a prática pedagógica de um grupo de professoras da educação infantil de uma escola particular do Distrito Federal em relação à literatura infantil, especial150 mente, o desenvolvimento da imaginação e da criatividade de seus alunos. Definimos os seguintes objetivos específicos: identificar concepções de leitura, literatura infantil, imaginário e criatividade presentes no ideário das professoras participantes deste estudo; analisar estratégias pedagógicas utilizadas pelas professoras para realizar uma leitura prazerosa; descrever os projetos de literatura infantil desenvolvidos na escola, destacando o desenvolvimento da imaginação e criatividade de seus alunos; identificar os programas da escola para capacitação de professores no que diz respeito ao trabalho com projetos literários; identificar as possibilidades de aplicação das estratégias pedagógicas desenvolvidas no campo da literatura nessa escola, em instituições da rede pública do DF. Para que tais objetivos fossem alcançados, organizamos o referencial teórico que fundamenta todo o estudo com os trabalhos de Alencar (2003); Coelho (2000); Garcez (2008); Machado (2002); Martinez (1997); Vygotsky (2009); Zilbermam (2005). A metodologia escolhida para o desenvolvimento da pesquisa foi a de cunho qualitativo, utilizando instrumentos de coleta de dados como a observação participante em três turmas da educação infantil e a entrevista semiestruturada com as respectivas professoras. Os resultados deste estudo revelam que a prática da literatura realizada pelas professoras da escola investigada, mesmo que em alguns momentos precise de maior embasamento teórico e capacitação profissional no que diz respeito a intenções pedagógicas pautadas numa prática mais rica em possibilidades de criação e imaginação, faz com que a literatura chegue a seus alunos de maneira que favorece e possibilita a vivência de sua verdadeira essência, sem cobranças, ou seja, viver a literatura pela VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento própria literatura. Refletindo sobre os resultados, é possível dizer que para realizar uma prática pedagógica pautada na literatura, mais especificamente na literatura infantil, é preciso ir além dos fantoches e dramatizações e sim viver a leitura da palavra com encantamento e prazer. Palavras-chave: Literatura infantil; Educação infantil; Criatividade; Imaginação. LT04-1422 - O CIRCO: UMA PROPOSTA DE AÇÃO INCLUSIVA EM EDUCAÇÃO FÍSICA PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA. Vivianne Flávia Cardoso - UnB/UAB [email protected] Juliana Eugênia Caixeta - UnB [email protected] Nesse trabalho, discutimos a inclusão de alunos deficientes nas aulas de educação física, entendendo que a escola deixa de ser uma instituição social com forte apelo seletivo e passa a ser o lugar em que as potencialidades devem ser vistas, as dificuldades superadas e os resultados aproveitados em prol de uma sociedade melhor. O processo de aprendizagem aciona vários processos de desenvolvimento que sem este estímulo poderiam não vir a acontecer (Vygotsky, 1994). Quando falamos de inclusão de pessoas deficientes, o que temos que fazer é descobrir como promover zonas de desenvolvimento proximal que estimulem estas crianças a adquirir e formar o pensamento abstrato. Sabemos que a mediação do mais experiente impulsiona o desenvolvimento do menos experiente. “No processo de construção do conhecimento, as crianças se utilizam das mais diferentes linguagens e exercem a capacidade que possuem de terem idéias e hipóteses originais sobre aquilo que buscam desvendar” (Rcnei,1998, p.21) Compreender, conhecer e reconhecer a forma particular das crianças serem e estarem no mundo é um dos grandes desafios da educação infantil. A escola é uma instituição social privilegiada e responsável por promover este encontro com as mais diversas áreas do conhecimento, dentre elas, a da cultura corporal de movimento pela qual a Educação Física é diretamente responsável. Cultura corporal são todas as manifestações corporais humanas que são geradas na dinâmica cultural, são conhecimentos historicamente acumulados e socialmente transmitidos (PCN EF, 1992, 1998). Segundo o PCN EF (1992, p. 27) “É preciso que o aluno entenda que o homem não nasceu pulando, saltando, arremessando, balançando, jogando etc. Todas essas atividades corporais foram construídas em determinadas épocas históricas, como respostas a determinados estímulos, desafios ou necessidades humanas”. Assim, o aluno deficiente deve ser atendido em suas necessidades e desafiado em suas potencialidades como todas as outras crianças, pois o objetivo das aulas de educação física é a inclusão do aluno na cultura corporal de movimento por meio da participação e reflexão, de um conjunto de vivencias que contribuam para seu desenvolvimento global. Descrever e analisar o processo de inclusão de alunos deficientes nas aulas de Educação Física na educação infantil que foram realizadas em uma escola pública de Vitória durante os meses agosto a novembro de 2010. Nesse trabalho, realizamos a união da abordagem qualitativa de pesquisa com a pesquisa-ação em um estudo de caso. Participaram do estudo 25 crianças na faixa etária de 4 anos, incluindo uma 151 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento criança com Síndrome de Down, uma estagiária, a professora de Educação Física, a professora regente da turma 4A e a pesquisadora, que também atuou como mediadora das atividades. Como técnicas e materiais para coleta de dados foram utilizados observações e composição de diário de campo, filmagens, fotografias. Como procedimento foi adotado a implantação do planejamento da proposta pedagógica Circo em que cada dia havia uma atividade diferente. Na medida em que as atividades eram avaliadas, o planejamento inicial sofria ajustes. O tema circo foi escolhido por apresentar um universo lúdico muito rico para a criança, porque permite o trabalho com músicas, com personagens, como: o palhaço e o mágico e com diferentes expressões corporais, como: malabarismo, acrobacias (como cambalhotas), equilibrismo, trapézio, corda bamba, dentre outros. A intervenção foi planejada visando vivenciar com as crianças práticas corporais atreladas à temática do circo de forma lúdica e prazerosa. Durante a intervenção foi possível observar que todas as crianças participaram ativamente, inclusive João, portador da síndrome da Down. Todos os alunos demonstraram parceria e cooperação. O processo de mediação professor/ aluno foi muito importante para promover um ambiente inclusivo, pois à medida que pensávamos um processo de aprendizagem que incluísse todas as crianças buscamos também uma prática voltada para competências dos sujeitos e que contribuísse para superar as limitações impostas pela deficiência. Quanto à mediação aluno/aluno: das relações espontâneas, citamos a cooperação, esta acontecia toda vez que um colega ajudava o outro a realizar determinada atividade, como: virar cambalhota, alcançar o trapézio, subir e 152 se balançar no balanço de pneu. Quanto a relações mediadas, trabalhamos, além da cooperação, soluções de problemas e a tomada de decisões, pois assim nossos alunos poderiam acessar seu repertório motor, além de ressignificar movimentos culturalmente construídos e historicamente acumulados. De acordo com Melo (2010, p. 29), “na perspectiva em que o contexto da ação assume papel central no processo de desenvolvimento motor, o sujeito é considerado ator do seu próprio desenvolvimento”. Dentro da temática do Circo, realizamos intervenções variadas na turma, de forma que João tivesse oportunidade de ser atendido em suas necessidades individuais, vindas principalmente da hipotonia, uma das características da Síndrome de Down. Esta experiência mostrou que a Educação Física contribui para a construção de uma escola inclusiva à medida que integra saberes e fazeres diferentes dentro de um mesmo contexto, quando tece reflexões sobre os significados e sentidos que as ações corporais têm dentro da escola e na vida dos indivíduos envolvidos. Acreditamos que intervenções como as apresentadas nesse estudo evidenciam o papel da educação física como promotora do desenvolvimento integral das crianças, integrando o desenvolvimento cognitivo, afetivo e motor. Percebemos que a intervenção na educação física pode ir além dos “muros” da quadra e integrar ações da escola como um todo. Adultos e crianças, crianças e crianças vivenciaram e evidenciaram, neste estudo, as possibilidades que se abrem no trabalho coletivo, contextualizado à cultura infantil e, também, à cultura corporal de movimento. Palavras-chave: Inclusão Escolar, Educação Física, Cultura Corporal. VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento LT04-1423 - A CONSTRUÇÃO DO SI MESMO E DO OUTRO NAS BRINCADEIRAS DE FAZ-DE-CONTA Sônia Regina dos Santos Teixeira - UFPA [email protected] Os princípios teóricos e metodológicos adotados neste estudo tiveram como pressupostos o referencial da psicologia histórico cultural e foram utilizados para compreender como determinadas experiências inquietantes vivenciadas por crianças ribeirinhas, durante brincadeiras de faz-de-conta contribuíram para o processo de constituição cultural das mesmas. Para Vygotsky (1984), o indivíduo, ao nascer, ainda não é verdadeiramente humano. Somente passa a sê-lo quando, a partir da interação com outros sujeitos, internaliza os significados compartilhados no seu contexto sociocultural. Para o autor, em cada fase do processo de constituição cultural do sujeito há uma atividade que contribui de forma fundamental para a construção do psiquismo humano. Na fase por ele denominada pré-escolar, de três a seis anos, a brincadeira de faz-de-conta é a principal atividade a contribuir para esse processo. Assim, investigar como as crianças brincam, como interagem e os significados construídos durante as brincadeiras, pode ajudar na compreensão do processo de constituição cultural dos sujeitos. Considerando que, atualmente, muitas crianças nessa faixa etária participam de programas de educação infantil, as turmas de educação infantil constituem-se lócus importantes para a investigação dessa atividade e, consequentemente, do processo de constituição cultural das crianças, que delas participam. Valsiner (1997) afirma que o indivíduo, exerce um papel dialético no seu processo de constituição cul- tural. É construído porque os significados compartilhados nas interações tornam-se constitutivos do sujeito e é construtor, porque os significados compartilhados são resignificados, recriados pelo sujeito. Na brincadeira de faz-de-conta é possível perceber essa co-construção. A criança é construída pelos significados partilhados no seu grupo cultural, uma vez que a matéria da situação imaginária origina-se das experiências diretamente vividas ou presenciadas pela criança. Ao mesmo tempo, é construtora, na medida em que recombina os significados e cria situações ficcionais que são virtuais, não correspondendo a cópias literais dos significados partilhados. Para Simão (2004), o ser humano constrói o si mesmo e a cultura, por intermédio do constante diálogo entre o “mim mesmo” e o “outro”, principalmente, a partir de vivências que ferem as expectativas do “mim mesmo” e o instigam cognitivo e afetivamente – as “experiências inquietantes”. A autora questiona a relevância de estudos que buscam o acúmulo exaustivo e seletivo dos dados visando descrever a ‘interação em si’, ‘o mais objetivamente possível’. Para ela, ao examinar as falas das interações, o pesquisador, ao invés de procurar os diálogos marcados pelos consensos entre os sujeitos, deve tomar como objeto de suas análises as falas que expressem ‘momentos de tensão’, investigando para onde elas orientam os interlocutores, na negociação para a distensão e reconstrução do conhecimento sobre o conteúdo da conversa, mas, sobretudo, na reconstrução concomitante e interdependente do conhecimento sobre relações eu-eu e eu-outro. Nesse sentido, foi realizado o presente estudo para verificar as experiências inquietantes vivenciadas pelas crianças, durante as brinca153 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento deiras de faz-de-conta e como as mesmas contribuem para o processo de constituição cultural das crianças que participavam das interações. O estudo faz parte de uma pesquisa maior realizada durante o ano de 2005 e teve como participantes dez meninos e seis meninas, com idade entre quatro e cinco anos e a professora da classe de uma escola localizada na Ilha do Combu, no município de Belém, Pará. O procedimento de coleta constou de gravações em vídeo das brincadeiras que ocorreram no cotidiano da classe. As informações foram coletadas quinzenalmente, perfazendo um total de 16 registros. Os episódios de faz-de-conta foram transcritos e examinados do ponto de vista microgenético, de acordo com a forma concebida pela psicologia histórico cultural. A análise centrou-se na dinâmica do processo de construção de significados pelas crianças. Ficou evidente na análise dos episódios que as experiências inquietantes vividas pelas crianças, durante as brincadeiras, contribuíam para a tomada de consciência da diferenciação entre o si mesmo e o outro. Isso pode ser observado pelo uso frequente dos pronomes pessoais e possessivos e pela diversidade de formas de ocupação do lugar do outro da cultura, durante a representação de diversos papeis sociais. Tais achados confirmam a proposição de Góes (2000), de que a brincadeira de faz-de-conta é um excelente campo para investigar os indícios da construção do si mesmo e do outro, pelo fato, da criança, nessa atividade, manejar, constantemente, imagens de si e dos outros da cultura. A análise mostrou também como as crianças estavam constantemente significando e ressignificando a sua relação com os parceiros, figuras cognitivo-afetivas a quem alimentavam expectativas diversas a todo 154 instante (Simão, 2002, 2004). O estudo revelou momentos de tensão presentes nos diálogos entre as crianças, que as exigiam reconstruções afetivas e cognitivas constantes. É evidente na análise, que embora tenha sobressaído o investimento das crianças na negociação de conflitos para garantir o processo interativo do brincar, longe de ser um ambiente harmônico, este era um espaço marcado por tensões, desencontros e disputas. Verificou-se ressignificações de princípios de classificação dos sujeitos, presentes no contexto sociocultural das crianças, tais como: mais ou menos competente; mais velho e mais novo; adulto e criança; homem e mulher e feio e bonito. Tais ressignificações estavam na origem de diversas experiências inquietantes. Na análise ficou evidente que o processo de constituição cultural ocorre da diferenciação de elementos inicialmente indiferenciados. Tal diferenciação só é possível, por intermédio do distanciamento psicológico crescente, possibilidade que as crianças encontram no faz-de-conta, que as exige uma maior descentralização do si mesmo e uma menor contextualização. No faz-de-conta, na medida em que a criança discorda da outra, ela instaura um distanciamento entre o si mesmo e o outro. Isto a possibilita tomar consciência cada vez mais abrangente de seus contextos, de si mesma, dos outros e de suas relações com eles e a participar, de formas cada vez mais diferenciadas do processo de construção da sua subjetividade e da sua cultura. Palavras-chave: Brincadeira de Faz-de-Conta; Educação Infantil; Crianças Ribeirinhas. VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento CO 27 - LT4 Inclusão 2 LT04-798 - INCLUSÃO ESCOLAR DE ALUNOS AUTISTAS: CONCEPÇÕES DE PROFESSORES DE ESCOLAS PÚBLICAS DO DISTRITO FEDERAL Mara Rubia Rodrigues Martins - SEEDF [email protected] Sandra Francesca Conte de Almeida - UCB [email protected] As indagações acerca da possibilidade de inclusão escolar de pessoas com autismo habitam o imaginário dos envolvidos no processo educativo e lançam um debate sobre as condições que vão além da garantia dada por lei (acessibilidade) à escolaridade em salas comuns. Assim, é necessário que a escola e os professores se preparem para incluí-las. O presente trabalho investigou as concepções de 23 professores regentes de escolas públicas acerca da inclusão escolar de alunos autistas no ensino regular. A fundamentação teórica que embasou o estudo é a psicanalítica, enfatizando a compreensão do autismo, na perspectiva freudo-lacaniana, o conceito de educação terapêutica e as relações entre psicanálise e educação. A grande descoberta da psicanálise, a constituição do sujeito no campo do Outro, ensina que a pessoa se torna sujeito pelo desejo e que o sujeito só pode se constituir como sujeito desejante se o Outro o desejou, antes. Para que o sujeito se constitua não basta apenas que seja cuidado, é preciso também que seja desejado e que o Outro responda à sua demanda. Cabe ao professor, na função de suplência do outro, mas de um outro barrado, sobretudo em se tratando de crianças autistas, apresentar das mais diversas formas e de diferentes maneiras os objetos da cultura ao aluno, para que este encontre um lugar no mundo ou que nele possa advir como sujeito. A educação terapêutica (Kupfer, 2001) é um conjunto de práticas interdisciplinares que visa à retomada do desenvolvimento global do sujeito ou a reestruturação psíquica interrompida pelo surgimento do autismo. Na pesquisa, foi utilizada a abordagem qualitativa de tipo etnográfico, adotando-se como instrumento de coleta e construção de dados a entrevista semiestruturada. Os resultados indicaram congruência e semelhança de concepções e práticas pedagógicas entre os professores entrevistados. Observou-se que a maioria dos sujeitos entrevistados, vinte e um, era favorável à inclusão escolar de alunos com autismo, embora tivessem relatado o mal- estar que sentiam frente ao aluno autista, cuja “diferença” os remetia ao exercício constante da impotência, da incapacidade, da angústia, marcas significantes da castração. Apesar da formação acadêmica de nível superior, esta não os autorizava, de “per si”, a implicar-se subjetivamente no trabalho realizado com esses alunos. Cabe ressaltar que as concepções dos professores sobre o processo de inclusão escolar, bem como sua compreensão acerca do autismo, permitiam que se perpetuasse a ideia de que os autistas vivem em um mundo à parte, isolados da realidade e que, por tais motivos, as práticas inclusivas se restringiam a ações educativas de pouco impacto na subjetividade e no comportamento desses sujeitos. Os dados relativos aos fatores que facilitavam ou dificultavam a inclusão de autistas no ensino regular se expressaram sob a forma de uma aparente contradição. Foram 155 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento apontados como fatores facilitadores: a informação/conhecimento, a formação específica, a presença de um professor auxiliar, em sala de aula, e o envolvimento da família; como fatores que dificultavam a inclusão, apareceram esses mesmos aspectos, mas em situação de falta, de carência ou de ausência. Quanto às práticas pedagógicas diárias, foi possível observar que a grande maioria, dezenove dos vinte e três professores, realizava algum tipo de adaptação curricular, quer seja nas atividades propostas, no atendimento ou nas avaliações dos alunos autistas, o que nos permitiu inferir que os professores se preocupavam em oferecer atividades pedagógicas que levavam em consideração as peculiaridades e limitações de seus alunos autistas e as suas próprias. O papel do educador, nas vicissitudes da constituição do sujeito, é o de fornecer aos alunos autistas inscrições primordiais, conteúdos ideativos, objetos da cultura, a partir de diversas linguagens, instituindo o simbólico em torno do real, diferenciando-se da educação formal, ocupando o lugar de Outro barrado, transmitindo, além de conhecimentos, valores, ideais e um saber existencial. A educação terapêutica, prática interdisciplinar que visa à reestruturação psíquica da criança com transtorno global do desenvolvimento, foi sugerida como proposta de atendimento educacional aos alunos autistas inclusos no ensino regular, assim como a criação de um espaço de interlocução e de escuta dos professores, de modo que estes pudessem ressignificar suas angústias e rever suas certezas, desconstruir saberes e aprender a conviver com a impossibilidade de uma educação ideal, apostando no saber e no desejo de que, pelo ato educativo, um aluno-sujeito possa advir. A escuta dos educadores en156 volvidos no processo de inclusão escolar é de fundamental importância, pois dar voz a esses que são os protagonistas da educação inclusiva, juntamente com os alunos, significa apostar no professor e criar condições para que a educação terapêutica aconteça. Os resultados deste estudo confirmaram, ainda, a complexidade do processo de inclusão de autistas no ensino regular e apontaram para a necessidade de se dar continuidade a outros estudos e pesquisas que levem em consideração essa temática, sobretudo a função da escola e do professor no processo de reestruturação psíquica de crianças com graves problemas de desenvolvimento. Palavras-chave: Inclusão escolar; autismo; psicanálise. LT04-933 - O BRINCAR EM CRIANÇAS COM DEFICIÊNCIA VISUAL Letícia Coelho Ruiz - UNICAMP [email protected] Cecília Guarnieri Batista - UNICAMP [email protected] Muitos trabalhos discutem questões sobre o desenvolvimento de crianças com deficiência visual, por meio de comparações com aspectos do desenvolvimento de crianças videntes. Nesses estudos, as dificuldades e os déficits são salientados, por tomarem por base a relação normal/ deficiente. Warren (1994) sugeriu uma “abordagem diferencial”, que se caracteriza por buscar compreender as variações no desenvolvimento entre indivíduos com deficiência visual, considerando importantes os casos de indivíduos que se destacam pelo desenvolvimento de habilidades diferenciadas. A detecção de uma habilidade, VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento mesmo que em um único participante, já é indicação de que a deficiência não impede a sua aquisição. Sugere, portanto, que a pesquisa seja voltada para perguntas sobre os fatores que levaram essas pessoas a adquirir tais habilidades. Um contexto em que podem ser observados aspectos do desenvolvimento infantil é durante o brincar. Vygotsky (1988) discute sobre a relação entre o brincar e as funções mentais superiores, afirmando que, ao partir do brinquedo, com destaque para o brincar de faz de conta, a criança torna-se capaz de compreender o real e atuar de maneiras distintas e mais elaboradas, em relação às que costuma apresentar em seu convívio social. A atividade lúdica confere liberdade à criança, por meio destas ações simbólicas, e lhe permite ultrapassar os limites determinados por seu nível atual de desenvolvimento. Hueara, Souza, Batista, Melgaço e Tavares (2006) evidenciaram as competências apresentadas por crianças cegas e com baixa visão, durante atividades relativamente livres de exploração de brinquedos. A brincadeira relativamente livre, encorajada, mas não dirigida por adultos, levou à constituição de um ambiente muito propício ao desenvolvimento do faz-de-conta. Na conclusão do estudo, destacaram-se diversos exemplos de capacidades apresentadas por estas crianças, na criação de cenas, representação de papéis, estabelecimento de regras, que nem sempre eram evidentes em outros contextos, especialmente, os de avaliação formal. Na mesma direção, foi proposto um estudo envolvendo crianças com deficiência visual e/ou alterações visuais, a maioria com outras alterações no desenvolvimento. Procurou-se identificar habilidades e competências das crianças, a partir da análise de transcrições de vide- ogravações e análise qualitativa e microgenética de episódios, segundo Carvalho e Pedrosa (2005) e Góes (2000). O estudo abrangeu sete crianças de 4 a 8 anos, organizadas em dois grupos: (a) no Grupo 1 participaram três crianças, duas com baixa visão e uma cega; (b) no Grupo 2 participaram duas crianças com baixa visão e duas com alterações visuais e dificuldades escolares. As filmagens foram feitas de abril a junho de 2010. Foram videogravadas 8 sessões, com cada um dos grupos. As observações foram realizadas em situações que propiciaram contatos com brinquedos em momentos de interação. Foram preparados conjuntos de brinquedos variados, com atenção às necessidades referentes à deficiência visual (brinquedos coloridos, sonoros, etc). O pesquisador era o coordenador das sessões. Foram analisados episódios relevantes de faz de conta, em relação aos seguintes aspectos: modos de brincar entre as crianças, modos de manuseio de objetos e formas de atuação do adulto, de acordo com as categorias criadas para a análise. Os pais das crianças estudadas foram entrevistados no que se refere às formas de brincar dessas crianças. Foi elaborado um sistema de categorias, abrangendo os seguintes aspectos: Formas de Interação (adulto- criança e criança-criança) e Uso de Objetos. Foi, também, focada a questão das dificuldades específicas de crianças com problemas visuais durante a brincadeira. Dois exemplos de análise são apresentados. Na sessão “O lobo e o porquinho” (Grupo 1), no que se refere à Interação criança- criança, observou-se que o grupo manteve na maior parte do tempo, Ação conjunta. Quanto ao Uso de Objetos, as crianças elaboraram uma Cena de faz de conta análoga à história dos três porquinhos, com alguns elementos novos, 157 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento como a aparição de um policial, a prisão, o lobo chegando de carro. Na Interação adulto-criança, observou-se que o adulto apresentou Sugestão para integração das atividades e, depois que foi observada na Atividade conjunta das crianças, passou a apresentar Comentários e Avaliações Positivas. Na sessão “Mãe, pai e filho” (Grupo 2), quanto à Interação criança-criança,observou-se predomínio de Ação conjunta. No que se refere ao Uso de objetos, as crianças criaram uma Cena de faz de conta entre quatro crianças, de “fazer comidinhas”, com papéis de pai, mãe e filhos, cada um assumindo um papel combinado entre eles. E quanto à Interação adulto-criança, a atuação foi semelhante à da sessão já descrita. No final da sessão surgiu a necessidade, explicitada pelas crianças, de registro escrito da brincadeira para poderem dar continuidade à mesma na sessão seguinte. Também foi observado que, nessa sessão, uma das crianças pegou algumas caixas de alimento e leu os registros das caixas. É interessante destacar esses aspectos, pois, indicaram a compreensão da função da escrita, sendo que a maior queixa de aprendizagem desses alunos estava relacionada à leitura e escrita. A análise das sessões permitiu identificar estratégias das crianças para a exploração dos objetos e elaboração de faz de conta. Foi possível identificar alguns obstáculos na interação com a criança cega e alguns exemplos em que a intervenção do adulto pôde promover melhor interação entre as crianças. No grupo com a criança cega, o adulto descreveu a localização dos brinquedos, aproximou objetos e deu pistas verbais de direcionamento para que a criança realizasse deslocamentos. O adulto também orientou as outras crianças para que facilitassem a participa158 ção da criança cega (ex: permitir o contato com os brinquedos utilizados pelos outros). Quanto às crianças com baixa visão, o adulto orientou à exploração de objetos (ex: pistas para aproximação, exploração tátil e comparação entre objetos). Os resultados trazem subsídios para a intervenção educacional, com um modelo voltado para a facilitação das aquisições das crianças; apontam, também, para aspectos específicos, relativos a possíveis obstáculos para participação na brincadeira de faz de conta por parte de crianças cegas e com baixa visão mais severa; descrevem, ainda, soluções propostas pelo pesquisador, de forma a propiciar brincadeiras em níveis crescentes de elaboração e de superação dos obstáculos identificados. Palavras-chave: brincar, deficiência visual, Educação Especial Contato: Letícia Coelho Ruiz, CEPRE/FCMUNICAMP, [email protected] LT04-986 - A CONDIÇÃO UNDERACHIEVEMENT NO FENÔMENO ALTAS HABILIDADE/SUPERDOTAÇÃO: DESDOBRAMENTOS EMPÍRICOS Fernanda do Carmo Gonçalves - UnB [email protected] Vanessa Terezinha Alves Tentes - SEDF [email protected] Denise de Souza Fleith - UnB [email protected] Conceber o indivíduo superdotado, enxergar o seu potencial e ao mesmo tempo reconhecer suas limitações é um exercício desafiador, presente nos estudos sobre a condição de baixa performance acadêmica ou underachievement (McCoach & Siegle, 2003; Montgomery, 2009; Neihart, VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento 2002; Ourofino, 2005, 2007; Ourofino & Fleith, 2005; Reis & McCoach, 2002). A baixa performance acadêmica em indivíduos superdotados refere-se, portanto, a uma condição concomitante a de superdotação, que interfere no desenvolvimento do indivíduo, em consequência da discrepância entre o potencial previamente revelado e a performance atual exibida. A condição antagônica vivenciada pelo superdotado o coloca em situação de risco, de vulnerabilidade social e emocional, acentuando ainda mais suas necessidades educacionais especiais. As Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica reconhece o aluno superdotado, como aquele que apresenta “grande facilidade de aprendizagem que o leve a dominar rapidamente conceitos, procedimentos e atitudes” (Ministério da Educação, 2001, Art. 5°, III). A Política Nacional da Educação Especial, no que tange às altas habilidades/superdotação, define o superdotado como aquele que demonstra “potencial elevado em qualquer uma das seguintes áreas, isoladas ou combinadas: intelectual, acadêmica, liderança, psicomotricidade e artes, além de apresentar grande criatividade, envolvimento na aprendizagem e a realização de tarefas em áreas de seu interesse” (Ministério da Educação, 2008, p.15). Superdotação e insucesso escolar não se complementam mutuamente, pois se encontram em extremos opostos no espectro do ensino. No entanto, apesar da dissonância cognitiva que essa condição suscita, a realidade mostra que muitos superdotados exibem baixo rendimento escolar. Ao longo dos últimos trinta anos a preocupação com superdotados underachievers tem ganhado força e espaço de investigação. Para Heacox (1991), nos Estados Unidos exis- tem cerca de dois milhões de estudantes superdotados e a prevalência de underachievers pode chegar a 50% dos alunos identificados no contexto educacional. Mais recentemente, o Davidson Institute for Talent Development (2009) divulgou que a população de superdotados abrange 2.392.300 indivíduos, ou seja, 5% dos estudantes norte-americanos. Desse total, mais da metade é considerada underachiever. Esses dados reforçam a preocupação dos estudiosos da área de superdotação e confirmam a prevalência de underachievers em vários países, conforme verificado em estudos conduzidos na Espanha por Olivarez (2004), na Áustria por Schober (2004), na Alemanha por Sparfeldt (2006) e mais recentemente por Doeschot-Bults e Hoogeveen (2010), na Turquia por Baslanti e McCoach (2006), em Hong Kong por Phillipson (2007), na República Tcheca por Dvorakova (2008) e Holesovska (2010), na França por Villatte e Leonardis (2010) e na Inglaterra por Montgomery (2009), além da extensa produção verificada nos Estados Unidos da América e no Canadá. No Brasil, os estudos sobre desempenho escolar abarcam os alunos de modo geral (Pinheiro-Cavalcanti, 2009; Libório, 2009). No que tange especificamente à performance acadêmica de indivíduos superdotados, não foram encontrados estudos brasileiros que investigassem esse fenômeno. No entanto, chamam atenção os dados oficiais apresentados no Censo Escolar 2010 demonstrando que no país existem 53.791.142 estudantes matriculados na Educação Básica, sendo que deste total, 398.155 são alunos da educação especial, 5.186 alunos são considerados superdotados e, entre estes, apenas 465 estão matriculados no Distrito Federal (Ministério da Educação, 2010). Diante 159 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento deste quadro, se fortalece a concepção de que muitos alunos superdotados são invisíveis ao sistema e certamente dentre estes estão muitos underachievers. Ainda mais complexa é a situação daqueles que mesmo identificados como superdotados apresentam uma produtividade aquém de seu potencial, revelando uma desconexão entre capacidade, habilidade e o desempenho acadêmico real e, por esse motivo, acabam, de alguma forma, excluídos do processo educacional e os dados oficiais sequer os mencionam. (Ourofino & Fleith, 2005). O objetivo deste estudo foi identificar a prevalência de superdotados underachievers entre superdotados de um atendimento educacional, descrever as habilidades, as preferências, os interesses, os aspectos motivacionais, as características pessoais, as relações interpessoais e acadêmicas e os estilos de aprendizagem de alunos superdotados e superdotados underachievers. Investigar ainda possíveis diferenças entre os alunos desses grupos, dos gêneros masculino e feminino, em relação à inteligência, criatividade, motivação para aprender, autoconceito, desempenho escolar e atitudes parentais. Participaram do estudo 96 alunos, sendo 53 superdotados e 43 superdotados underachievers. Utilizou-se um delineamento descritivo-comparativo e uma combinação de instrumentos para acessar as variáveis investigadas. Foram empregados testes psicométricos de inteligência não verbal, de pensamento criativo verbal e figurativo e de desempenho acadêmico, bem como aplicadas escalas de características pessoais, acadêmicas e motivacionais, estilos de aprendizagem, autoconceito e atitudes parentais. A análise baseou-se também nos dados colimados no Protocolo de Investigação da Performance Aca160 dêmica de Alunos Superdotados, análise documental e questionário demográfico. Para o estudo comparativo foi realizada a análise de variância multivariada (MANOVA). Os resultados indicaram prevalência de alunos superdotados underachievers entre superdotados na razão de 2:1. As variáveis descritivas que mais se destacaram na autopercepção desse grupo foram, em sua maioria, coincidentes. Os alunos superdotados em comparação aos underachievers obtiveram desempenho significativamente superior nas medidas de inteligência, criatividade total e criatividade verbal, autoconceito (na dimensão conduta comportamental e autoestima global), desempenho escolar total e na dimensão escrita. Por outro lado, os underachievers se destacaram nas medidas de motivação extrínseca, quando comparados aos superdotados. Com relação ao gênero, os resultados sinalizaram diferenças significativas a favor do gênero masculino quanto à inteligência. Da mesma forma, as alunas obtiveram resultados superiores, quando comparadas aos alunos, nas medidas de criatividade verbal, motivação intrínseca para aprender, autoconceito na dimensão autoestima global e desempenho escolar na dimensão escrita. Interações significativas entre grupo e gênero foram observadas em relação à inteligência e autoconceito nas dimensões competência escolar, aceitação social e autoestima global. As alunas superdotadas underachievers obtiveram resultados inferiores em todas as medidas quando verificados os efeitos da interação grupo e gênero. Quanto às variáveis relacionadas à família, não existem diferenças significativas no que tange às atitudes parentais adotadas na educação de superdotados e superdotados underachievers. Alunos underachievers são invi- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento síveis ao sistema de ensino e estão de, algum modo, excluídos dos processos educacionais. É imperativo que a sociedade se mobilize para criar alternativas alinhadas com o movimento de educação inclusiva, a fim de reverter essa realidade paradoxal. Palavras-chave: Educação, Superdotação, Underachievement Contato: Fernanda do Carmo Gonçalves, UnB, [email protected] LT04-1036 - INCLUSÃO DE CRIANÇAS AUTISTAS: UM ESTUDO SOBRE CONCEPÇÕES E INTERAÇÕES NO CONTEXTO ESCOLAR Emellyne Lima de Medeiros Dias Lemos UFPB [email protected] Nádia Maria Ribeiro Salomão - UFPB [email protected] Financiamento: CNPq A interação social é de grande relevância no processo de desenvolvimento infantil entendendo que o sujeito, inserido em um contexto histórico-social, é um ser ativo em suas interações desde a mais tenra idade. Nesse processo destaca-se a importância do ambiente interpessoal para a aquisição de habilidades comunicativas ressaltando a convivência com outras crianças, assim como o suporte do adulto, uma vez que, sensível às necessidades conversacionais da criança é capaz de adequar seu comportamento comunicativo às capacidades desta última. O presente estudo adota uma perspectiva desenvolvimentista que concebe o desenvolvimento típico a partir da articulação entre capacidades biológicas iniciais para o engajamento social e as interações so- ciais posteriores. Nessa perspectiva, o autismo é caracterizado por prejuízos biológicos primários acarretando déficits nas interações sociais. Esta pesquisa aborda o transtorno autista que abrange um espectro heterogêneo de quadros comportamentais envolvendo desvios no desenvolvimento desde os primeiros anos de vida nas áreas de interação social, comunicação e imaginação. Inúmeras pesquisas são realizadas e muitos aspectos permanecem inconcludentes, sobretudo em relação à etiologia, as possibilidades terapêuticas e inserção em escolas regulares. A inclusão escolar dessas crianças é questionada por alguns educadores devido aos prejuízos inerentes às características da síndrome, mas este trabalho se apóia em estudos que admitem que embora seja uma prática difícil, é também realizável e possível, considerando os benefícios das vivências escolares tanto em termos de interações sociais quanto do desenvolvimento de habilidades cognitivas nas crianças do espectro. A falta de clareza quando aos benefícios da inclusão escolar dessas crianças traz implicações às concepções sobre os indivíduos autistas. Nesse sentido, destaca-se a importância de conhecer as concepções de pais e educadores visto que tais idéias apresentam implicações nas práticas e nas interações estabelecidas com a criança. Dada à importância da interação social e a influência dos contextos situacionais e interacionais o presente estudo tem como objetivos principais analisar as interações sociais entre as crianças com espectro autista e as demais crianças nos contextos de escolas regulares considerando a mediação das professoras, assim como, analisar as concepções dos pais e professores acerca da criança e do processo de inclusão escolar com ela rea161 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento lizado. Participaram deste estudo crianças e professoras de duas escolas regulares particulares da cidade de João Pessoa PB; sendo analisadas duas turmas de uma escola e três de outra, totalizando cinco professoras, como também cinco crianças com diagnóstico do espectro autista, com idades variando entre 3 e 5 anos, de classe sócio-econômica média e seus respectivos pais. Para a coleta dos dados, foram utilizadas entrevistas semiestruturadas com os pais e professoras registradas através de um mini-gravador, como também, foram realizadas duas filmagens em cada turma contemplando 20 minutos em cada uma das situações de pátio e sala de aula, dos quais foram transcritos e analisados 10 minutos. Com o objetivo de caracterizar as crianças deste estudo também foi utilizada a escala de avaliação CARS (Childhood Autism Rating Scale). Quanto à análise dos dados, as entrevistas foram transcritas e analisadas a partir da técnica de análise de conteúdo, as filmagens foram transcritas e foram analisadas através de categorias pós-formuladas tendo em vista a bidirecionalidade nas interações estabelecidas nos contextos escolares de pátio e sala de aula, assim como, a participação dos membros em termos de frequência e duração do comportamento. Os resultados apresentados neste trabalho contemplam parte dos resultados da pesquisa de dissertação de mestrado. Em relação à análise das verbalizações dos pais das crianças com espectro autista, embora considerando apenas 5 participantes alguns aspectos foram encontrados, quais sejam: percepção dos filhos como crianças carinhosas e afetuosas, atribuindo a dificuldade em comunicar-se como sendo a principal característica de criança autista; relatos de dificuldades em definir autis162 mo, alguns abordando que as dificuldades na interação social diferiam de preferência ao isolamento; satisfação com o processo de inclusão escolar realizado com seus filhos e reconhecimento da importância do papel da família nesse processo. Outro aspecto foi que embora atribuíssem expectativas mais voltadas à socialização, a maioria enfatizou as diferentes habilidades adquiridas pelos seus filhos após a entrada na escola. Quanto às professoras a maioria demonstrou estar reformulando suas concepções a partir das experiências estabelecidas com estas crianças no cotidiano escolar, adotando concepções que embora abordem as dificuldades das crianças, partem de aspectos positivos que envolvem as possibilidades e os resultados dos esforços dispensados com o trabalho de inclusão. No que diz respeito às interações estabelecidas no contexto escolar foram observadas categorias de comportamentos verbais e não verbais em três áreas: comportamentos da criança com espectro autista, comportamentos da professora e comportamentos das demais crianças. Na primeira área emergiram as seguintes categorias e subcategorias: Olhar, sendo este dirigido a pessoas, ações ou objetos; Iniciativa, sendo esta dirigida a pessoas, ações ou a objetos; Resposta adequada; Interação passiva; Imitação; Demonstração de afeto; Sorriso; Esquiva e Isolamento. Já na segunda área foram observadas as categorias: Mostrar; Gesticular; Apoio físico; Modelo; Demonstração de afeto; Diretivos, sendo estes de atenção, de instrução e de controle de comportamento; Informação e Feedback. Por último, sobre os comportamentos das demais crianças emergiram as categorias: Olhar; Iniciativa; Esquiva e Demonstração de afeto. Nos contextos de pátio foram VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento enfatizadas as brincadeiras sendo elas em conjunto ou isoladas. Resultados parciais indicam a importância da mediação das professoras, uma vez que as crianças autistas do presente estudo demonstraram se comportar, nos diferentes contextos, mais frequentemente em resposta a professora ou a situação do que por imitação. Pretende-se com este estudo subsidiar orientações a pais e profissionais principalmente no que se refere à inclusão escolar de crianças autistas, tendo em vista que as concepções podem influenciar os comportamentos dos adultos, como também, os comportamentos dessas crianças podem ser influenciados considerando os contextos interativos, a mediação do adulto e, sobretudo, as particularidades de cada criança. Palavras-chave: Espectro autista, Concepções, Inclusão Contato: Emellyne Lima de Medeiros Dias Lemos, UFPB, [email protected] LT04-1197 - A EDUCAÇÃO INCLUSIVA E O TRABALHO DAS ASSESSORIAS ESPECIALIZADAS Simone Cassiani - PM-Amparo [email protected] Alessandra Rodrigues de Almeida - PM-Amparo Marisol Regina Pavani de Oliveira - PM-Amparo A Rede Municipal de Ensino de Amparo vem desenvolvendo um trabalho em prol de uma educação inclusiva e de qualidade visando beneficiar a TODOS. Reconhecendo que a Constituição Federal de 1988 garante a todos o direito à educação e o acesso à escola (Art. 1º; 3º; 205; 206 e 208) e atendendo a esses princípios constitucionais, a Secretaria Municipal de Amparo, elaborou um documento intitulado, “A lógica da inclusão na rede municipal de ensino de amparo – estratégias de apoio para a construção da educação inclusiva”. O objetivo é contribuir com a prática e a compreensão de algumas das razões pelas quais é tão difícil saber como lidar e o que fazer quando temos alunos cujas características nos evidenciam a necessidade de trabalhar com as diferenças nos mais variados contextos do cotidiano de uma educação que se propõe a ser inclusiva. O Programa de Educação Inclusiva, intitulado “A educação tem muitas faces educando e aprendendo na diversidade”, tem como proposta o apoio aos professores, no qual consiste no levantamento de informações sobre o atendimento de diferentes casos nas escolas, buscando categorizar e caracterizá-los para o conhecimento da realidade e encaminhamentos pedagógicos e clínicos, encontros com profissionais da educação e saúde para discussão de dificuldades e indicações das intervenções realizadas, levantamento de propostas, orientações, encaminhamentos e registros. Segundo Sassaki (1998), na escola inclusiva há colaboração e apoio mútuo entre professores, terapeutas e consultores para se oferecer orientação na própria sala de aula em vez de retirar alunos do horário de aula para desenvolver terapias no ambiente escolar, o que seria muito inadequado, uma vez que a escola não se confunde com a clínica, e o papel de cada profissional deve ser respeitado. O trabalho clínico deve ser realizado fora do espaço escolar, com profissionais da saúde. Atualmente a Secretaria vem crescentemente investindo em formas de instrumentalizar os profissionais que atuam nas unidades escolares na perspectiva de qualificar o atendimento educacional e desenvolver uma prática de Educação In163 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento clusiva voltada a participação democrática de todos. Além de todo trabalho desenvolvido pela SME, composto no documento do Programa, vimos nesse texto enfatizar uma ação que tem sido de grande valia ao desenvolvimento dos alunos e à prática pedagógica dos professores, que é o trabalho realizado pelas assessorias contratadas pela SME para garantir o apoio e as orientações às unidades escolares e diretamente aos professores que atendem alunos com as diversas deficiências. A fim de desenvolver o reconhecimento e a valorização das diferenças humanas em todas as instâncias, minimizando os preconceitos e buscando garantir a implementação de práticas inclusivas mais adequadas, a qualificação e aprimoramento do atendimento educacional a todos os alunos, considerando suas diferenças, capacidades e ou limitações, e a competência de todos os profissionais das escolas, a Secretaria Municipal de Educação, dando continuidade as ações do Programa “A Educação tem muitas faces – Educando e aprendendo na diversidade”, vem investindo desde 2006, na contratação de assessorias especializadas e consultorias para o desenvolvimento desse trabalho: Assessoria em Gestão Inclusiva, LIBRAS e Comunicação Suplementar e Alternativa (CSA); Assessoria em Fisioterapia, Psicologia e Terapia Ocupacional, desempenhando atuação com todos os alunos matriculados nas salas regulares e na orientação do trabalho do Atendimento Educacional Especializado da rede municipal de ensino. Foram observados resultados que beneficiaram: a) os professores, que se sentem mais seguros, esclarecidos, informados e valorizados, em sua prática e qualificado para atuar com todos os alunos com condições de trabalho, pensan164 do no processo de ensino e aprendizagem de seus alunos de maneira integral e inclusiva; b) os alunos são assistidos em suas necessidades, tendo a possibilidade e oportunidade de desenvolver todas as suas habilidades, de participar de todo processo educativo da escola, sendo visto como seres com potencial para aprender; c) os pais estão mais conscientes e informados sobre as ações da rede e se sentindo participantes do processo escolar, valorizados e comprometidos com seu filho e com todos da escola; d) a equipe escolar que está mais informada e comprometida com todos da escola, não somente com os alunos com necessidades educacionais especiais. Enfim, TODOS aprendem a conviver e a serem pessoas melhores com nossas diferenças. Em síntese, a inclusão escolar e em todos os âmbitos só ocorrerá se TODOS alinharmos nosso leme em direção ao acolhimento, compromisso com o próximo, acreditando em sua capacidade, competência e possibilidades, adotando posturas e atitudes que não dê brechas para o surgimento de barreiras, conservadorismo, resistências e ou ações preconceituosas e ou excludentes que levam ao impedimento da Inclusão. Precisamos rever nossos papéis como cidadãos e assumir nossa identidade em benefício do que acreditamos, numa sociedade mais justa e Inclusiva para TODOS. A Secretaria Municipal de Educação está investindo em ações que beneficiam não somente as pessoas do âmbito escolar, mas realizando ações interdisciplinares que envolvem e sensibilizam toda a comunidade escolar e a sociedade, ou seja, TODOS nós, sem exceção. Palavras-chave: educação inclusiva, assessorias, saúde. VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento LT04-1352 - CONTRIBUIÇÕES DA PRÁTICA DOCENTE PARA A INCLUSÃO DO ALUNO COM NECESSIDADE EDUCACIONAL ESPECIAL EM TURMA REGULAR Noélia Martins dos Anjos - Unb [email protected] O trabalho pedagógico concretizado por uma de suas vertentes, o trabalho docente, apresenta natureza dinâmica que deve reunir teoria e prática como ferramenta a ser utilizada, dentre outras coisas, no desenvolvimento de habilidades sociais. Nesse sentido, e tendo o professor no espaço escolar posição de sujeito mais experiente e, portanto, mediador de novos conhecimentos, o trabalho docente pode vir a ser uma das formas mais eficazes de inclusão de alunos com deficiência no ensino regular. Ao desenvolver meu trabalho como Pedagoga no Serviço Especializado de Apoio à Aprendizagem - SEAA em uma escola pública do Distrito Federal, observo que os professores regentes que atuam no ensino regular e que têm em suas classes alunos com necessidades educacionais especiais – ANEEs, diagnosticadas como deficiência apresentam dificuldade em compreender a inclusão deste aluno no ensino regular por meio do trabalho docente. A partir dessa observação e para melhor compreensão dessa realidade, busquei resposta à seguinte problemática: como as concepções de ensino e aprendizagem que nutrem os educadores, bem como as práticas docentes aplicadas em sala de aula contribuem, ou não, com a inclusão dos alunos com necessidades educacionais especiais no ensino regular? Por isso, como objetivo geral de pesquisa, pretendi entender de que forma o trabalho pedagógico docente pode tornar efetiva a inclusão de ANEEs no ensino regular, considerando se o professor na condição de sujeito mais experimentado e no exercício de um papel historicamente comprometido com mudanças sociais, tem sustentado em sua prática ações que consolidam os pressupostos da educação inclusiva, indo além de garantias como a socialização e interação, promovendo antes, a aprendizagem escolar. Ao passo que a pesquisa se lançou pela elucidação dessa primeira proposta, moveram também essa investigação os seguintes objetivos específicos: conhecer as concepções de ensino e de aprendizagem que norteiam as práticas educacionais dos professores participantes; quais medidas são tomadas pelo docente no que se refere à continuidade de sua formação inicial; quais relações estabelecidas entre discurso e prática e finalmente como são compreendidas pelos professores as contribuições de seu trabalho no que se refere ao desenvolvimento da aprendizagem escolar. Como pressupostos teóricos, a pesquisa pautou-se nos trabalhos de: Resende (2006), Pimenta (2006) e Dessen e Polônia (2007) para abordagens acerca do trabalho pedagógico e saberes da docência. Sobre as concepções de ensino e aprendizagem compreenderão os estudos de Freire (1997), Tunes, Tacca e Mitjáns Martinez (2006), Kassar (2006) e Vygotsky (2003). Por fim, as considerações referentes ao trabalho docente e educação inclusiva apresentam embasamento nas avaliações de Mantoan (2007), como também na legislação brasileira referente ao tema. A metodologia de pesquisa baseou-se nos pressupostos da abordagem qualitativa, cuja coleta de dados foi realizada por meio dos instrumentos de observação, questionário e entrevista semiestruturada aplicados junto aos professores de uma escola pública dos anos iniciais do Ensino Funda165 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento mental do Distrito Federal. O tratamento dos dados se deu de acordo os procedimentos próprios do método qualitativo, utilizando de análise interpretativa dos resultados com vistas à produção de reflexão e contribuições para a prática docente no lócus pesquisado. Dentre os resultados obtidos pela pesquisa a partir dos objetivos elencados, foi possível perceber que a passagem do ANEE pela escola e o trabalho dos profissionais envolvidos, colaboraram para que, de alguma forma, esse aluno experimentasse crescimento em algum aspecto de seu desenvolvimento: tanto na socialização, na convivência com seus pares ou até mesmo vencendo expectativas negativas que são feitas a seu respeito. Entretanto, verificou-se que dentre as concepções de ensino e de aprendizagem que embasam o trabalho docente, ainda permanecem arraigadas na prática dos professores pesquisados os pressupostos de uma educação voltada para os resultados obtidos a partir da aprendizagem de conteúdos escolares sem fins específicos, não sendo abertamente defendidas medidas de promoção de aprendizagem escolar que resultem na inclusão do ANEE no universo dos saberes formais. Outro tópico proposto pela pesquisa foi a condução do processo de formação continuada e se esta contemplaria os pressupostos necessários ao trabalho com o ANEE. Observou-se insuficiência na formação ao longo da carreira e na condição profissional que vincula as professoras ao exercício do seu trabalho, tendo em vista dificuldades impostas pelo sistema de ensino na seleção dos profissionais para oferta de formação continuada e no processo de escolha de turmas com ANEE que não tem sido conduzido de forma criteriosa. Também, foi possível observar imprecisões e divergên166 cias no processo de oferta e procura do atendimento especializado, visto que a própria rotina escolar e as incumbências profissionais de cada função envolvida podem ter tido influência significativa no afastamento observado entre as professoras regentes e àquelas encarregadas pelo apoio a ser oferecido. Finalmente, a última proposição a que se lançou esse trabalho foi a apuração de contribuições do trabalho docente para a aprendizagem escolar. Conforme já sinalizado pela análise da principal assertiva levantada pela pesquisa, não se pode deixar de observar diversos aportes ao processo de desenvolvimento do ANEE, efetuados por meio do trabalho docente. Porém, muito ainda há que ser feito para que essas contribuições contemplem de forma integral a aprendizagem escolar que ainda encontra-se em situação de desvantagem quando comparadas a outras contribuições, que nem sempre perpassam o fazer tipicamente docente e sua função precípua de promoção dos aspectos que favoreçam a relação de ensino e de aprendizagem. Dessa forma, o que se pode arrematar de todo esse trabalho é a expectativa de que o investimento na formação inicial e contínua do professor será o diferencial para que este pense e repense sua ação, não se conformando com um saber, que ainda válido ao seu tempo, encontra-se ultrapassado e insuficiente para as demandas da educação atual. Considera-se ainda que, para muitos, a aprendizagem escolar pode não ser o principal objetivo de quem enfrenta tantas adversidades provindas da condição imposta pela deficiência, entretanto, é esse o trabalho que deve ser desenvolvido por professores e professoras, até para que não se sustente mais uma forma de perpetuação da exclusão. VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento Palavras-chave: trabalho pedagógico, aprendizagem escolar, inclusão Contato: Noélia Martins dos Anjos, Universidade de Brasília, [email protected] CO 38 - LT06 Vulnerabilidades/risco LT06-866 - PROCURANDO A MORTE: O ZULLIGER NA AVALIAÇÃO DE PACIENTES COM TENTATIVAS DE SUICÍDIO Silvana Alba Scortegagna - UPF/RS [email protected] Luana Gasparetto Fontanella - FHST, Erechim/RS [email protected] O suicídio está entre as 10 principais causas de morte, no mundo, e entre as três primeiras quando se considera a faixa etária entre 15 e 35 anos. No Brasil, a incidência tem aumentado, especialmente, entre adolescentes e adultos jovens. O Estado do Rio Grande do Sul registra o maior coeficiente de suicídio no país - 9,88 casos/100.000 habitantes - com maiores coeficientes de mortalidade entre a população idosa (com mais de 70 anos de idade); porém, nos últimos anos, há elevação nas faixas mais jovens, entre 20 e 59 anos. A tentativa de suicídio pode ser considerada como uma reação frente à ação do traumático que, pela força do irrepresentável, leva o indivíduo ao ato de tentar dar fim à própria vida. Algumas dessas situações são resultantes de contextos nos quais o sujeito se vê acometido por um excesso, mostrando-se incapaz de processar e metabolizar a tensão (trauma/excesso) psiquicamente. O ato de matar-se expressa, então, além da impossibilidade de contenção do traumático via representação simbólica, a única via de descarga possível para uma demanda de trabalho para o qual o indivíduo não encontra recursos de mediação. Assim sendo, muitos desses atos se apoiam na insuficiência de recursos mentais, na incapacidade de dar figurabilidade à dor psíquica. Com isso, deflagram-se os fatores de risco psicossociais, de desenvolvimento, e os quadros psicopatológicos relacionados. Entre os primeiros destacam-se: nível socioeconômico e de escolaridade baixos; dinâmica familiar disfuncional, traumas e perdas pessoais; baixa autoestima, falta de controle da impulsividade e da agressividade, humor lábil, precários recursos para o enfrentamento de problemas, tentativas prévias e antecedentes na história familiar. Entre as perturbações mentais mais evidentes estão os transtornos borderline, a esquizofrenia, a dependência química e os quadros depressivos. Essas organizações permitem perceber que os atos suicidas podem ter motivações totalmente diversas, e que têm relação com rupturas em diferentes períodos do desenvolvimento afetivo-emocional. Considerando ser esse um problema de saúde pública e a escassez de estudos com esses pacientes que, frequentemente, encontram-se nas emergências dos hospitais e, em sua maioria, sobrevivem às tentativas de seus atos lesivos, há necessidade de se verificar a validade de instrumentos eficientes e rápidos de avaliação psicológica, para que possam auxiliar na compreensão da estrutura e da dinâmica psíquica dos mesmos. Com esse propósito, o presente estudo buscou investigar as características de personalidade de pacientes com 167 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento várias tentativas de suicídio, os fatores de risco relacionados e a validade do Zulliger nesse contexto. Foram participantes duas mulheres, de 41 e 47 anos de idade, divorciadas, uma auxiliar de serviços gerais e outra de indústria, com ensino fundamental e médio, respectivamente. Utilizaram-se como critérios de inclusão: (a) tentativas de suicídio anteriores; (b) hospitalização em decorrência da tentativa de suicídio, por um período de no mínimo três dias; (c) não fazer uso de medicações que pudessem interferir na fidedignidade dos achados. Como instrumentos utilizaram-se a entrevista clínica semiestrutura e o teste Zulliger no Sistema Compreensivo ZSC. Os dados foram analisados quanti e qualitativamente, trazendo elementos sobre a leitura da realidade, defesas psicológicas, autopercepção, percepção interpessoal e história de vida. A entrevista semiestruturada revelou que o Caso “A”, de 41 anos, é divorciada, mas vive, atualmente, com um companheiro; é mãe de um menino de 15 anos e de uma menina de 25 anos. A baixa hospitalar deu-se pela intoxicação por ingestão de 20 comprimidos de carbamazepina e de amitriptilina, sendo sua terceira tentativa de suicídio por consumo de medicamentos. As duas tentativas anteriores foram: uma aos 20 anos de idade, por ingerir veneno, ocasião em que começou a sentir vontade de se matar e, a outra, quando tentou cortar os pulsos por sua perícia ter sido negada. O início desses episódios foi relacionado com a morte de seus dois irmãos, que foram assassinados com tiro na cabeça. O Caso “A” pensa em se matar porque acredita que irá para um lugar melhor, mas, ao mesmo tempo em que quer morrer, quer melhorar para cuidar de seu neto. O Caso “B”, de 47 anos, é divorciada e 168 tem três filhos: duas meninas, uma de 14 e outra de 27 anos de idade e um menino, de 18 anos. A baixa hospitalar deu-se pelo consumo de 18 comprimidos de diazepam, sua quarta tentativa de suicídio, sendo uma anterior ao tentar atirar-se do quarto andar de um prédio. O início desses episódios foi relacionado com o excesso de trabalho, quando também começou a apresentar sintomas psicóticos. Dados da família de origem revelaram a presença de irmãos usuários de drogas, sendo um deles morto por overdose, e de morte por suicídio nos dois avôs, tanto por parte de pai quanto de mãe. O Caso “B” pensa em se matar porque não tem outra opção; além de querer morrer quer matar seus filhos. A análise comparativa dos protocolos de entrevista permitiu verificar que ambas as pacientes apresentaram cinco tentativas de suicídio cada uma, sobretudo pela ingestão de medicamentos; possuíam, em seu desenvolvimento, histórico familiar disfuncional e de perdas traumáticas; foram diagnosticadas com transtorno de personalidade borderline e participam de grupos de atendimento psicoterápico individual em ambulatório de saúde mental. A interpretação dos protocolos do ZSC, por sua vez, possibilitou confirmar a história do desenvolvimento pessoal por meio dos dados de personalidade e a identificar prejuízos na apreensão da realidade, de si mesmo, do outro e nas interações sociais, por meio de atribuições de aspectos subjetivos, distorcidos e falhos. Os dois casos apresentaram dificuldades de controle emocional, impulsividade, instabilidade nos relacionamentos e isolamento. Esses resultados podem ser úteis para ampliar a compreensão de pacientes com tentativas de suicídio, para predizer as possi- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento bilidades de novas ocorrências e, ainda, para direcionar programas de tratamentos mais eficientes e adequados. Além disso, conclui-se que o ZSC pode ser útil em contextos de avaliação clinica e hospitalar, respeitando-se as limitações de seu emprego. Palavras-chave: teste Zulliger, tentativa de suicídio, fatores de risco Contato: Silvana Alba Scortegagna, UPF/RS, [email protected] LT06-873 - ADOLESCÊNCIA, VULNERABILIDADE E RESILIÊNCIA: AVALIAÇÃO DE FATORES DE PROTEÇÃO EM UMA AMOSTRA DE ADOLESCENTES NO INTERIOR DO RIO GRANDE DO SUL Jeane Lessinger Borges - SETREM www.setrem.com.br ou [email protected] Sara Eduarda Pires - SETREM www.setrem.com.br ou [email protected] Este trabalho apresenta os resultados de uma pesquisa sobre a presença de fatores de proteção, associados a variáveis individuais e do contexto familiar e escolar, em uma amostra de adolescentes em situação de vulnerabilidade psicossocial. Este estudo foi realizado ao longo do primeiro semestre de 2011, durante a etapa inicial da prática de estágio curricular da segunda autora, sob orientação da primeira autora, junto a adolescentes que frequentavam uma escola pública de tempo integral, localizada num município da Região Noroeste, no interior do Rio Grande do Sul. Os aspectos teóricos norteadores deste estudo são a Teoria Bioecológica do Desenvolvimento Humano (Bronfen- brenner, 1996), a Psicologia Positiva e o conceito de Resiliência (Paludo & Koller, 2006, 2007; Yunes, 2006). Nesse sentido, os pressupostos teóricos subjacentes possibilitam uma melhor compreensão do desenvolvimento humano, sobretudo, no que se refere a crianças e adolescentes expostos a situações de vulnerabilidade psicossocial, uma vez que possibilitam investigar os efeitos dos fatores de risco e de proteção no desenvolvimento infanto-juvenil. A Teoria Bioecológica do Desenvolvimento Humano enfatiza a necessidade de uma melhor compreensão das características do contexto, da pessoa, dos processos envolvidos e do tempo no desenvolvimento humano. A Psicologia Positiva é uma nova sub-área, dentro da Psicologia, que busca investigar os aspectos positivos do desenvolvimento do ser humano, fortalecendo as potencialidades e a saúde do sujeito em desenvolvimento (Assis, Pesce, & Avanci, 2006; Yunes, 2006). Um constructo teórico importante da Psicologia Positiva se refere ao de resiliência, que pode ser compreendido como a capacidade do indivíduo de superar as situações de adversidades. Atualmente¸ a resiliência vem sendo considerada não como um evento isolado e de caráter individualizado, mas, sim, como um processo dinâmico e abrangente incluindo, além da pessoa, o contexto familiar (Yunes, 2003). Nesse sentido, uma maior compreensão da presença de fatores de proteção no contexto familiar e escolar, bem como de características individuais - por exemplo, autoestima e satisfação de vida - na mediação do impacto dos fatores de risco presentes no desenvolvimento de adolescentes, se tornou o foco de atenção desta pesquisa. A interação entre risco e proteção necessita ser melhor investigada, a 169 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento fim de se compreender como estes interferem na resiliência de adolescentes. Para tanto, foram entrevistados 40 adolescentes (52,5% meninos e 47,5% meninas), com idades entre 11 a 17 anos (M=12,97; DP=1,10), residentes na área urbana e periférica de um município gaúcho caracterizado, eminentemente, pela agricultura familiar. Os adolescentes foram convidados a participarem da pesquisa, tendo sido autorizados por seus pais, que assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Foi aplicado um Questionário com 16 questões estruturadas, sobre variáveis individuais e do contexto familiar e escolar, que pudessem estar associadas à resiliência. Este questionário foi elaborado a partir dos dados de Assis et al. (2006) e aplicado de forma coletiva. Os dados foram tabulados e analisados no programa SPSS versão 13.0. Foram realizadas análises estatísticas descritivas e de frequência simples, bem como cálculo de correlação de Spearman. Os resultados apontaram que a trajetória de vida destes adolescentes foi caracterizada pela exposição a eventos estressores (56,1%), incluindo separação dos pais, morte de um ente querido, uso de drogas por um familiar e violência doméstica. Os participantes relataram vivenciar algum sofrimento psíquico frente a estas diferentes situações adversas (41,5%). No entanto, estes adolescentes se percebiam como tendo uma autoestima alta (58,5%) e uma elevada satisfação de vida (82,9%), além de terem planos para o futuro (82,9%). Foi encontrada uma correlação positiva entre alta autoestima e monitoramento parental (r=.50; p<0,01), bem como entre satisfação de vida e relacionamento com os pais (r=.64; p<0,01). A família destes adolescentes caracterizava-se, em sua 170 maioria, pelo modelo nuclear (65%), embora 17,5% vivessem numa família monoparental, chefiada pela figura da mãe. O relacionamento com os pais foi avaliado de forma positiva (70,7%), sendo que monitoramento (63,4%), afeto (56,1%) e estabelecimento de regras (61%) foram avaliados pelos adolescentes como aspectos importantes na relação pais-filhos. Os relacionamentos com amigos e professores também foi avaliado de forma positiva (78,0% e 56,1%, respectivamente). Em relação às estratégias de enfrentamento utilizadas pelos adolescentes frente às situações adversas, os itens “continuar tentando resolver o problema” (75,6%), “acreditar em si mesmo frente às dificuldades que a vida lhe apresenta” (48,8%) e “pedir ajuda a alguém” (46,3%) foram os mais citados pelos adolescentes entrevistados. Nesse sentido, os resultados apontam que, apesar da presença de fatores de risco ao desenvolvimento destes adolescentes, sobretudo pela exposição a eventos estressores, os participantes apresentaram boa autoestima e elevada satisfação de vida. Observou-se, ainda, um predomínio de estratégias de enfrentamento adaptativas por parte dos adolescentes frente a situações adversas. A presença de fatores de proteção na família e no contexto comunitário (grupo de pares e escola) pode ser considerada uma variável importante para o processo de resiliência. Conclui-se que uma maior investigação da interação de características individuais e do contexto de desenvolvimento do adolescente podem dar subsídios para os estudos sobre resiliência em jovens, na tentativa de potencializar os aspectos saudáveis destes indivíduos e de sua capacidade de superação das dificuldades e adversidades da vida. VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento Palavras-chave: infância, vulnerabilidade, resiliência Contato: Jeane Lessinger Borges, Faculdade Três de Maio/SETREM, [email protected] LT06-898 - REDE DE APOIO, EVENTOS ESTRESSORES E AJUSTAMENTO NA VIDA DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES EM SITUAÇÃO DE VULNERABILIDADE SOCIAL Normanda Araujo de Morais - UFRGS [email protected] Marcela Raffaelli - UIUC mraff[email protected] Silvia Helena Koller - UFRGS [email protected] Este trabalho tem como objetivo: (a) descrever e comparar dois grupos de adolescentes em situação de vulnerabilidade social - um grupo em situação de rua e um grupo que vive com sua família - quanto ao número e impacto dos eventos estressores, à sua rede de apoio social e afetiva, e ao indicador geral de ajustamento; e (b) verificar se as características da rede de apoio (tamanho e qualidade) moderaram o efeito do número e impacto dos eventos estressores sobre o índice geral de ajustamento. Trata-se de um estudo transversal, que foi realizado com 98 crianças/adolescentes, em dois grupos: aqueles que vivem em situação de rua (n=32; 32,7%) e os que moram com suas famílias e frequentam uma instituição para jovens em situação de vulnerabilidade social (n=66; 67,3%). No grupo de base-rua (G1), a maioria (n=27; 84,4%) era do sexo masculino, com idade média de 14,69 anos (SD = 1,85). Já no grupo com base-familiar (G2), 38 (57,6%) eram do sexo feminino e tinham, em média, 15,53 anos (SD = 1,12). Foram utilizados os seguintes instrumentos: (a) Inventário de Eventos Estressores (para avaliar os fatores de risco), (b) Mapa dos Cinco Campos (para avaliar a rede de apoio – número de contatos e fator de proximidade) e (c) um bloco de instrumentos que compôs o Índice Geral de Ajustamento (Checklist de Sintomas Físicos, Escala sobre o Uso de Drogas, Escore de Risco para Comportamento Suicida, Índice Geral de Comportamento Sexual de Risco e a Escala de Afeto Positivo e Negativo). Houve diferença estatisticamente significativa entre os grupos, sendo que o de base-rua (G1) apresentou maior média de eventos estressores e valores de impacto e pior indicador geral de mau ajustamento, comparado ao grupo de base-familiar (G2). A comparação das médias entre os grupos também mostrou diferença estatisticamente significativa na variável “rede de apoio”. G1 apresentou maior número de contatos no campo “instituição”; maior fator de proximidade total e no campo “amigos/vizinhos e parentes”, quando comparado a G2. Uma ANOVA fatorial do tipo 2 (alto vs. baixo nível de proximidade familiar) x 2 (alto vs. baixo número de eventos estressores), em que o nível de ajustamento representou a variável dependente, revelou efeitos principais significativos tanto para a proximidade familiar quanto para os eventos estressores. Foi encontrado um efeito de interação significativo entre estas duas variáveis. A descrição gráfica dessa interação mostrou que houve moderação da proximidade familiar, no nível de ajustamento de indivíduos que vivenciavam alto nível de eventos estressores. Ou seja, na presença de um alto nível de proximidade familiar, 171 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento o impacto de eventos estressores sobre o ajustamento foi menor do que quando o nível de proximidade familiar era baixo. Os resultados do presente estudo corroboram, empiricamente, a importância da “proximidade” familiar como um fator de proteção na vida de adolescentes que vivem em situação de vulnerabilidade social. Mais especificamente, sobre a vida daqueles/as que estão submetidos a um maior número de eventos estressores. Nenhum estudo que testava a associação entre rede de apoio e ajustamento, a partir do Mapa dos Cinco Campos, foi identificado até então. Quase sempre, as pesquisas que utilizam esse instrumento o fazem para descrever as características da rede de apoio dos participantes. A utilização deste instrumento com adolescentes em situação de vulnerabilidade social (na rua ou na família) mostrou-se apropriado, pela riqueza de dados produzidos e pelo aspecto lúdico e terapêutico que sua aplicação possibilita. Durante a aplicação do Mapa, foi frequente a expressão de sentimentos e relatos de vida que, talvez, demorassem mais tempo para serem expressos, caso apenas a entrevista tivesse sido utilizada. À luz desses resultados, confirma-se a necessidade de programas e políticas sociais que tenham a família como foco de atenção e interesse. A retomada da família como referência das políticas públicas é justificada como a estratégia mais adequada (ao lado das intervenções sociais tradicionais – saúde, educação, habitação, renda, etc.) para o desenvolvimento de programas sociais efetivos de enfrentamento das diversas situações que implicam em vulnerabilidade social (tais como, pobreza, violência, situação de rua etc.). Além disso, o foco na família está relacionado com a visão 172 de que programas e políticas públicas com foco no indivíduo tendem ao fracasso, assim como intervenções pontuais, compensatórias e assistencialistas. Tão importante quanto o suprimento de condições materiais e econômicas às famílias é a existência de programas sociais que visem um acompanhamento mais sistemático destas. Embora a miserabilidade econômica seja considerada um dos fatores que mais contribuem para a fragilidade dos vínculos familiares, isso não significa dizer que o problema será resolvido, quando as famílias receberem apenas o apoio financeiro necessário. Ao contrário, as propostas assistencialistas vigentes, até então, apenas reforçam a percepção dessas famílias como incapazes e desqualificadas para o cuidado de seus filhos. Urge uma nova concepção de família, a qual esteja baseada não apenas nas suas vulnerabilidades e fragilidades, mas, que as reconheça, também, em suas próprias potencialidades e recursos, e que atue fortalecendo-as. Palavras-chave: rede de apoio, família, vulnerabilidade social Contato: Normanda Araujo de Morais, UFRGS, [email protected] VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento LT06-1015 - DESENVOLVIMENTO EM RISCO: RELATO DE INTERVENÇÃO PSICOLÓGICA JUNTO A CRANÇAS E ADOLESCENTES EM SITUAÇÃO DE RISCO. UMA EXPERIÊNCIA DE EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA Emily Souza Gaião - UEPB [email protected] Luciano Edgley dos Santos - UEPB [email protected] Lívia Sales Cirilo - UEPB [email protected] Ana Karine Gonçalves dos Santos - UEPB [email protected] Aline Ribeiro - UEPB [email protected] Ana Karoliny da Silva Carolino - UEPB [email protected] Clarissa Loureiro das Chagas Campêlo - UEPB [email protected] Gabriella Cézar dos Santos - UEPB [email protected] Johanna Sales Pereira - UEPB [email protected] No Brasil, assim como em outros países, a pobreza ainda é um traço marcante na sociedade, como resultado da má distribuição de renda. As dificuldades advindas desse fato podem comprometer o desenvolvimento de crianças e jovens brasileiros menos favorecidos economicamente, por dificultar o acesso a diversos tipos de informações levando-os, em muitos casos, a começar a trabalhar precocemente, reduzindo suas potencialidades e os expondo a situações delicadas de violência física e psicológica, desestruturação familiar, uso de drogas (lícitas ou ilícitas), abuso e exploração sexual, comportamento sexual promíscuo, relações sexuais desprotegidas, ausência de referência apropriada, entre outros. Cada vez mais, as políticas de atenção à criança e ao adolescente em situação de risco se deparam com mais desafios na busca de melhorar as precárias condições de vida em que estas se encontram vivendo, muitas vezes, em um cotidiano de situações extremas de exclusão social, no qual os direitos assegurados no Estatuto da Criança e do Adolescente não são respeitados (ECA, 1990). São consideradas em situação de risco as crianças e adolescentes que apresentam um atraso no desenvolvimento esperado para a sua faixa etária, de acordo com a cultura em que se encontram (Bandeira et al., 1996). Hutz e Koller (1996) classificam tais situações em três categorias: risco físico (doenças genéticas ou adquiridas, prematuridade, problemas de nutrição, entre outros); risco social (exposição a ambiente violento, a drogas) ou risco psicológico (efeitos de abuso, negligência ou exploração), podendo, ainda, terem como causa fatores externos (relacionados com condições ambientais adversas) ou internos (relacionados a comportamentos que acentuem a possibilidade de conseqüências adversas para o desenvolvimento do indivíduo). Esta situação de risco acaba se traduzindo por dificuldades na freqüência e no aproveitamento escolar; nas condições de saúde, de forma geral; e nas relações afetivas, consigo mesmo, com sua família e com o mundo, tendo como conseqüências a exposição a um circuito de sociabilidade marcado pela violência, pelo uso de drogas e pelos conflitos com a lei. Muitas vezes, estas experiências de vida facilitam dinâmicas expulsivas da família nuclear e da casa, e o ingresso no circuito da rua e das instituições de abrigamento. Nos casos em que as situações de risco são detectadas por órgãos públicos como a Vara da Infância e Juventude 173 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento ou Conselho Tutelar, geralmente, as crianças são transferidas para abrigos; em outros casos, faz-se um acordo com a família para que a criança possa estar assegurada. Um dos aspectos mais observados em crianças que adentram nos abrigos é a situação de abandono que, algumas vezes, são encontradas em situação desumana. Entretanto, de acordo com Hutz e Koller (1996), os estudos relacionados ao desenvolvimento de crianças e jovens tendem a focar no desenvolvimento de crianças brancas da classe média de nossa sociedade, fato que se torna mais grave devido ao fato de que, apesar do grande número de problemas sociais que o país enfrenta, os estudos em Psicologia sobre indivíduos expostos aos riscos provocados por estes problemas têm merecido pouca atenção (Hutz & Koller, 1996). O déficit de estudos nessa temática deixa à deriva essa população, tão necessitada de atenção e de cuidados. Uma das ferramentas que as universidades possuem para intervir sobre os problemas sociais é a extensão universitária, que visa contribuir para a viabilização e fortalecimento da relação universidade-sociedade. Objetivando auxiliar na redução das conseqüências das situações de risco ao desenvolvimento de crianças e adolescentes usuários da Organização Não Governamental (ONG) “Menina Feliz”, residentes em bairros de periferia da cidade de Campina Grande-Paraíba, foram realizadas oficinas temáticas e terapêuticas por graduandos do curso de Psicologia, como atividade do componente curricular “Extensão II”, presente na grade curricular do curso de Psicologia da Universidade Estadual da Paraíba. O público atendido por essa atividade era de meninas com idades entre 6 e 16 anos, de duas unidades da ONG “Menina Feliz”. 174 Os encontros foram realizados quinzenalmente, durante o período de um ano. De modo intercalado às intervenções, os encontros com as meninas eram avaliados e os resultados eram discutidos pelo grupo de extensão, possibilitando a elaboração de novas atividades para o encontro seguinte. Nas oficinas foram trabalhadas temáticas como sexualidade, violência na sociedade, relações familiares, violência doméstica e outros, em dinâmicas de grupo, rodas de conversa, grupos de escuta, a partir das sugestões advindas das participantes. Os relatos que refletiam uma dinâmica familiar conturbada, ausência de orientação, atos de violência e comportamento sexual não adequado estiveram presentes durante as atividades realizadas. Os encontros se mostraram importantes para o desenvolvimento das meninas, primeiramente, por terem propiciado momentos de convívio de maior proximidade entre elas, uma vez que a convivência com pessoas da mesma idade, principalmente, quando em relação de amizade, oferece grandes experiências e contribuições para o desenvolvimento. Moreno (2004) assinala estas contribuições como claramente distintas das proporcionadas pelas relações de parentesco. Ainda de acordo com o autor, o contato com iguais permite ao indivíduo situações de aprendizagem ao refletir sobre si mesmo, tecer considerações do eu a partir da perspectiva do outro, compartilhar experiências e desenvolver suas competências sociais. Apesar da resistência em falar sobre os temas propostos, algumas participantes abordaram as situações de violência vividas, demonstraram curiosidade em questões de ordem sexual, enfatizando a necessidade de realização constante de oficinas de expressão e grupos de escuta, VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento para que tivessem um espaço para elaborar seus sentimentos diante das situações vivenciadas. Faz-se necessário que essas crianças em situação de risco continuem sendo acompanhadas através de outros projetos de extensão; que as políticas governamentais se tornem mais eficazes em relação às possibilidades de acompanhamento, através dos órgãos competentes e que os profissionais possuam um olhar mais atento, com o objetivo de minimizar as conseqüências que podem ser geradas pelas situações difíceis, enfrentadas por essas crianças. Palavras-chave: desenvolvimento, situação de risco, extensão universitária Contato: Emily Souza Gaião, UEPB, [email protected] LT06-1018 - DESENVOLVIMENTO HUMANO E COMUNITÁRIO MEDIADO PELO SERVIÇO DE PROTEÇÃO SOCIAL BÁSICA: REFLEXÕES TEÓRICAS SOBRE PERSPECTIVAS E ATUAÇÃO DA PSICOLOGIA. Alexsandra Maria Sousa Silva - UFC [email protected] Nara Maria Forte Diogo Rocha - UFC [email protected] A presente pesquisa nasce da interface da Psicologia do Desenvolvimento e da Psicologia Comunitária. Pergunta-se sobre o lugar da Psicologia no serviço de Proteção Social Básica, examinando teoricamente e analisando a noção de desenvolvimento humano e comunitário, propostas pela Política Nacional da Assistência Social, à luz da Teoria Sócio-histórica e da Psicologia Comunitária. Experiências de extensão e estágio em Psicologia instigam a pro- blematização sobre as possibilidades da práxis “psi” no serviço de proteção social básica, lócus imprescindível para a promoção do desenvolvimento humano e comunitário. A noção de desenvolvimento humano e comunitário, dentro da política de Assistência Social, nos parece um problema que exige atenção e requer aprofundamento teórico, tanto na perspectiva das leis que regem a política de assistência social, quanto na perspectiva das possibilidades de atuação da Psicologia que se faz no cotidiano em movimento. Diante disso buscamos sistematizar, neste documento, os conceitos de desenvolvimento humano e comunitário; problematizar esses conceitos, dentro da política pública de assistência social; e refletir acerca de sua compreensão e importância na práxis do psicólogo no contexto social e político atual. Como referência teórica, partimos de Vygostky, entendendo que estudar o desenvolvimento é estudar o movimento - por isso a perspectiva histórica – e estudar as relações – por isso a perspectiva social, enxergando o sujeito como interativo, por conta de uma aprendizagem que se dá pelas suas relações intra e interpessoais de troca com o meio social. Para Leontiev (1978), a consciência humana diferencia a realidade de seu reflexo, o que permite diferenciar o mundo das impressões, possibilitando o desenvolvimento da capacidade de auto-observação. Afirmamos, com isto, que ter consciência de alguma coisa é distinguir o reflexo entre esta coisa e como este reflexo se dá em meio à realidade, atentando para como se dá o desenvolvimento humano, a partir dessa (auto)percepção. Por desenvolvimento comunitário consideramos que, hoje, se fale nessa compreensão atrelada à formação de lideranças locais e à participação comunitária onde, 175 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento através de vínculos afetivos, cooperação e solidariedade, os moradores-sujeitos tornam-se responsáveis pela construção de sua história coletiva. A isso se relaciona o conceito de sujeito da comunidade (Góis, 2008), como sendo aquele que, saindo do véu da submissão e implicado com a realidade que lhe afeta, compreende melhor o modo de vida de sua comunidade e de si mesmo, enxergando seu valor e poder, para descobrir-se e desenvolver-se. É válido, ainda, esclarecer a diferença entre desenvolvimento comunitário e desenvolvimento da comunidade, uma vez que este último refere-se a ações mais intensas de agentes externos e não propriamente ações nascidas do potencial comunitário, de comum acordo com o agente externo. E perpassando uma dimensão histórica de como a Psicologia foi adentrando o campo da assistência, afirma-se que o trabalho do psicólogo é priorizar as potencialidades e, assim, é percebida a sua importância para a superação do viés assistencialista, bem como para re-inventar uma práxis capaz de promover o protagonismo e a autonomia, tanto individual quanto coletiva, da família e da comunidade. O CREPOP (2007) compreende que “a capacidade de enfrentamento das situações da vida é afetada pelas experiências, condições de vida e significados construídos ao longo do processo de desenvolvimento” (p. 17). Esta percepção é consoante com o ideal do psicólogo, de ser um dos responsáveis pela facilitação do processo de transformação social. Dessa forma, se pode enxergar a importância a ser dada a compreensão que esses profissionais têm, diante de sua atuação, sobre o que é desenvolvimento humano e comunitário. Utilizamo-nos da pesquisa qualitativa e, como guia, da pesquisa bibliográfica. Na Política Nacional de 176 Assistência Social, a Proteção Social Básica se assume com o objetivo de atuar no sentido de “prevenir situações de risco por meio do desenvolvimento de potencialidades e aquisições, e o fortalecimento de vínculos familiares e comunitários” (PNAS, p. 27). Dando-se conta de que a Política de Assistência Social, em nível de Proteção Social Básica, se constrói no sentido da prevenção, pode-se perceber que o exercício da atividade comunitária tende a levar o sujeito a um caminho para além, que é o da promoção do desenvolvimento e da autonomia e, portanto, a cidadania. Sendo assim, a concepção de desenvolvimento humano e comunitário, dentro da PNAS, busca afastar-se da concepção assistencialista através da promoção da autonomia, definindo-se como o desenvolvimento de potencialidades e fortalecimento dos vínculos familiares, e compreendendo o sujeito numa dimensão histórico-cultural, considerando a participação social, a cidadania e o desenvolvimento que se dá ao longo de toda a vida. Além do que, compreender o ser humano fundando, epistemológica e metodologicamente, no materialismo histórico e dialético, como concebe a teoria sócio-histórica, dá possibilidades ao psicólogo de apreender os fenômenos humanos e sociais na sua mais concreta forma de existir e se manifestar, favorecendo uma compreensão contextualizada com a realidade que nos encharca, transitando entre as dimensões que são pessoais, familiares, comunitárias (e, portanto, sociais). Assim, a práxis do Psicólogo perpassa a facilitação humana e comunitária, que pode se dar pela compreensão de ir aonde o povo está, nas ruas e nas comunidades. Além disso, atentamos para a atuação conjunta das tantas políticas públicas. Concluímos com o compromisso da Psicologia de de- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento nunciar e anunciar novas possibilidades de se sentir, perceber e transformar a realidade, pela via do desenvolvimento humano e comunitário. Palavras-chave: desenvolvimento humano, desenvolvimento comunitário, proteção social básica Contato: Alexsandra Maria Sousa Silva, Universidade Federal do Ceará/campus Sobral, [email protected] LT06-1248 - TENTATIVA DE SUICÍDIO E AS CARACTERÍSTICAS DE PERSONALIDADE POR MEIO DO HTP Luana Gasparetto Fontanella - FHST, Erechim/RS [email protected] Silvana Alba Scortegagna - UPF/RS [email protected] O suicídio está entre as 10 principais causas de morte no mundo. No Brasil, a incidência tem aumentado e o Estado do Rio Grande do Sul registra o maior coeficiente de morte por suicídio do país. Entre os principais fatores de risco relacionados destacam-se: os níveis socioeconômicos e de educação baixos; os problemas com o funcionamento da família (dinâmica familiar conturbada); as relações sociais e os sistemas de apoio precários; as perdas traumáticas; as perturbações mentais como depressão, perturbações da personalidade, esquizofrenia e abuso de álcool e outras substâncias; a baixa autoestima; a falta de controle da impulsividade e os comportamentos autodestrutivos; a labilidade do humor; e a inabilidade para gerenciar e enfrentar os problemas. Outros fatores associados ao suicídio dizem respeito às tentativas prévias, à doença afetiva, ao isolamento social, à história familiar e à declaração de intenções. Com o objetivo de investigar características de personalidade de pacientes que cometeram tentativa de suicídio, foram avaliadas 4 mulheres, com idades entre 29 e 47 anos, usuárias do SUS, que se encontravam internadas em um hospital geral por tentativas de suicídio. As participantes – denominadas, simbolicamente, de Rosa, Orquídea, Bromélia e Hortência - eram casadas, tinham filhos, possuíam diferentes níveis de escolaridade, não exerciam atividades profissionais, estavam sob auxílio doença e tinham histórico de transtorno mental na família. Como critérios de inclusão, consideraram-se: (a) tentativas de suicídio anteriores; (b) hospitalização em decorrência da tentativa de suicídio, em um período de no mínimo 3 dias, para haver estabilização do quadro clínico; (c) não fazer uso de medicações que pudessem interferir na fidedignidade dos relatos da entrevista e do teste psicológico. Como instrumentos, foram utilizados a entrevista clínica semiestrutura com as pacientes e os familiares, e o teste HTP. Os resultados da entrevista revelaram que Rosa teve baixa hospitalar devido à tentativa de enforcamento (amarrou uma corda no suporte da televisão e uma na maçaneta da porta, subiu num banquinho e se atirou); fez uso de drogas e medicamentos (clorpromazina, tegretol e haldol) antes da tentativa; após ser atendida no hospital, a mesma quis ir embora e seu marido assinou o termo de responsabilidade. O marido fotografou o episódio, após terem-na encontrado, para que ela pudesse ver e, quem sabe, se sensibilizar e mudar. Já teve internação em clínicas para dependentes químicos, onde, também, teve tentativa de suicídio devido à abstinência. As demais tentativas foram devido a não aguen177 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento tar mais viver e a querer terminar com o sofrimento de sua família. É usuária de cocaína injetável e de medicações anestésicas injetáveis (morfina e dolantina). Encontra-se em tratamento no CAPS AD e já apresenta sintomas psicóticos (paranóia, alucinações). Orquídea foi hospitalizada em decorrência da ingestão de 18 comprimidos de diazepan e para ser encaminhada para uma clínica psiquiátrica, pois, tem diagnóstico de transtorno borderline. Encontra-se em tratamento psiquiátrico e psicológico há, aproximadamente, dois anos. Relata que segue o tratamento correto até certo ponto: “é que nem criança quando ganha chocolate e dizem pra ela comer um pedacinho por dia e ela segue isso, mas, de repente, come tudo de uma vez só... eu faço a mesma coisa, eu tomo certinho um comprimido por dia, mas tem dias que dá vontade e eu tomo um monte pra testar até aonde eu aguento”. Frequentemente, faz ameaças, dizendo que vai matar seus filhos. Bromélia foi internada devido à intoxicação de medicamentos (20 comprimidos de carbamazapina e de amitriptilina); é sua terceira tentativa de suicídio utilizando medicamentos, sendo que teve outra tentativa, quando estava com 20 anos, ingerindo veneno. Bromélia relata que desde essa idade pensa em se matar, acreditando que “lá em outro lugar vai ser melhor”. Nessa época esse sentimento foi agravado com a morte de um de seus irmãos, assassinado com um tiro na cabeça e, há mais ou menos 8 anos, outro irmão foi assassinado da mesma forma. Hortência teve baixa hospitalar porque queria tentar se matar de qualquer jeito; tentou enforcar-se, atirar-se da janela e cortar-se com facas. A família não sabe dizer quantas tentativas Hortência já teve, sua filha diz que ela esta sempre 178 tentando, sendo que começou há mais ou menos 6 anos, quando ela se mudou para o interior onde não há vizinhos e ela fica sozinha o dia todo. Hortência relata que fizeram “mal feito” na casa onde ela mora, pra separar ela e seu marido, porque ela diz que fica “possuída” e faz essas coisas. Seu marido trabalha de motorista; já moraram em várias cidades, porque ele troca de emprego seguidas vezes. O resultado do teste HTP apresentou características comuns, considerando-se a localização dos desenhos (esquerda), a linha de solo, os detalhes na casa como na porta (aberta). Na figura da pessoa, detalhes como a presença de dedos indicaram atuação e detalhes no pescoço, impulsividade. Essas características são consonantes com aspectos relacionados às características de personalidade de indivíduos que cometem tentativas de suicídio, especialmente, no que diz respeito à incapacidade de tolerar frustrações, impulsividade, intolerância e atuação. Na realização do HTP, as narrativas das participantes sobre os desenhos revelaram idéias de morte, sentimentos de frustração, carência afetiva e evidenciaram a utilização de mecanismos de defesa como identificação projetiva, o que é, comumente, empregado por pacientes com Transtorno Borderline. Apesar da amostra reduzida do estudo, esses resultados auxiliam na melhor compreensão das características de personalidade de indivíduos que apresentam risco de suicídio e na capacitação de profissionais que atuam nesse contexto. Palavras-chave: tentativa de suicídio, teste HTP, características de personalidade Contato: Luana Gasparetto Fontanella, Fundação Hospitalar Santa Terezinha, Erechim/RS, [email protected] VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento LT01-976 – TRABALHO INFANTIL: CAUSAS E CONSEQUÊNCIAS PARA O DESENVOLVIMENTO IDENTIFICADAS NAS PRODUÇÕES EM PERIÓDICOS DE PSICOLOGIA. Antonielli Jatobá Bezerra Tinoco - UFRN [email protected] Mariana Pinheiro Cabral - UFRN [email protected] Rosângela Francischini - UFRN [email protected] A inserção de crianças em atividades laborativas é registrada, na história do Brasil, desde o período colonial. À época, crianças escravas trabalhavam para prover a própria subsistência, situação corroborada tanto pela diferença de classes, como pelo status secundário que a infância tinha na sociedade de então. Essa concepção sobre a infância só veio a ser modificada, não de forma abrupta e generalizada, a partir do século XVIII, período esse em que a criança passou a ser vista como sinônimo de fragilidade e inocência. Embora seja um fenômeno presente ao longo da história, o trabalho infantil foi sendo caracterizado de formas diferenciadas. Assim, temos uma diversidade de conceitos cujos critérios são igualmente diferenciados. Os critérios mais recorrentes são: faixa etária, remuneração, regularidade, frequência, tipo e local da atividade. Considerando a idade mínima recomendada para o trabalho, a Convenção 138, da Organização Internacional do Trabalho (OIT, 1973) fixa em 16 anos. Por outro lado, para atividades que coloquem em risco a saúde, a segurança e a moralidade do sujeito, essa idade passa para 18 anos. Ainda em relação a esse critério, a Constituição de 1988 mantém a recomendação da OIT. A promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA. Brasil, 1990) consolida essa idade mínima proibindo qualquer trabalho a pessoas menores de 16 anos, salvo na condição de aprendiz, a partir dos 14 anos. Outro critério relevante na conceitualização do trabalho infantil é a frequência e regularidade dessas atividades. Muitas vezes, as crianças são impedidas de exercitarem outros direitos: frequência à escola, convivência familiar e comunitária, prática do lazer e do esporte, cultura. No que se refere ao local e ao tipo de atividade, a Convenção 182 e a Recomendação 190 da OIT preconiza que as “piores formas” de trabalho infantil são aquelas que resultam em prejuízo à saúde, à segurança e à moral da criança. Diante das questões apontadas acima, estabelecemos, como objetivo deste trabalho, identificar, nas produções em Psicologia, enquanto eixos temáticos: 1.) os conceitos de trabalho infantil e suas causas; b) as consequências para o sujeito. Foi realizada, então, uma revisão bibliográfica na Base de Dados Scielo, no período de janeiro de 1991 a dezembro de 2010. Acrescentamos a essa fonte, a leitura dos principais livros/ documentários impressos recorrentemente presentes na bibliografia da área. Na pesquisa eletrônica, foram empregadas as seguintes Palavras-chave: crianças de rua, crianças e adolescentes em situação de rua, crianças em situação de rua, crianças em situação de trabalho nas ruas, trabalho de menores, trabalho infantil, trabalho infantil agrícola, trabalho infantil de rua, trabalho infantil produtivo, trabalho infanto-juvenil, trabalho precoce. Procedeu-se à leitura dos resumos e foram excluídos os artigos que não atendessem aos objetivos deste trabalho. Desse processo, resultaram 44 artigos. Procedeu-se, então, à leitura desses artigos, observando os 179 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento eixos temáticos aqui definidos. A leitura de livros/documentários centrou-se nas produções da OIT e foram fundamentais para a compreensão dos conceitos de trabalho infantil adotados pelos autores dos artigos. A partir da leitura e identificação dos eixos propostos, com apoio na Análise de Conteúdo Temática, sistematizamos os elementos e compomos um quadro, caracterizado a seguir: 1.) Tipos de atividades desenvolvidas e faixa etária considerada. Iniciando por essa última unidade de sentido, a faixa etária citada e/ou considerada pelos autores é aquela proposta pela legislação, principalmente o ECA e as Resoluções da OIT. O Estatuto, em conformidade com as propostas internacionais, e com atenção às especificidades locais, estabelece, em 1990, a proibição do trabalho infantil para menores de 14 anos, sendo essa condição sido alterada, pela Emenda Constitucional de número 20, Artigo 7º, inciso XXXIII (Brasil, 1998), fixando a proibição do trabalho a menores de 16 anos de idade, ressalvando a condição de aprendiz, a partir dos 14 anos. No que diz respeito aos tipos de atividades desenvolvidas, comparecem as mais diversas, incluindo aquelas consideradas “piores formas de trabalho infantil”. Em relação aos fatores explicativos para inserção de crianças na condição de trabalhadores - foram identificados dois grandes grupos, denominados fatores macroestruturais e fatores microestruturais. Acrescente-se, no entanto, fatores considerados de ordem cultural, como a importância atribuída ao trabalho, pelas famílias, a consideração do trabalho como alternativa única para impedir a inserção da criança no mundo das ruas, das drogas, da vagabundagem. Acrescente-se, ainda, a ineficiência de políticas públicas voltadas para a população 180 de baixa renda. (Campos e Francischini, 2003). A pobreza é o principal fator apontado pelos autores. Com a insuficiência de ganhos, as famílias obrigadas a inserirem seus filhos no mercado de trabalho, ampliando, assim, o orçamento doméstico. Dentre os fatores microestruturais, destacam-se as relações entre os membros das famílias e sua dinâmica interna, muitas vezes, permeada por outras formas de violência. Em relação às consequências do trabalho para o desenvolvimento da criança, destacamos, as consequências para a escolarização (dificuldades para ingresso no sistema educacional, altos índices de evasão e de repetência, baixo desempenho escolar). Impossibilidades de vivência da cultura lúdica, fator importante para o exercício do Ser Criança, também são indicadas pelos autores. Do ponto de vista da saúde, muitas consequências são apontadas: cansaço físico e mental, dores no corpo e na cabeça, doenças infecto-contagiosas causadas por acidentes com materiais cortantes e perfurantes contaminados, contaminação por agrotóxicos ou outros produtos químicos, traumatismos decorrentes de acidentes de trânsito, dores na coluna e dores musculares, sintomas devidos a exposição às alterações climáticas e à poeira sem as devidas proteções, DSTs, gravidez precoce e indesejada, intoxicação decorrente da exposição à nicotina. Considerando a ampla variedade de consequências do exercício de atividades de trabalho pelas crianças, resta-nos questionar: porque, então, o trabalho infantil persiste e sua erradicação não se torna uma realidade? Estarão, as produções acadêmicas contribuindo para o entendimento dessas questões? Em artigo denominado Trabalho Infantil e Produção Acadêmica nos anos 90: tópicos para reflexão, Ferrei- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento ra (2001), indica a necessidade de pesquisas interdisciplinares que possam tornar visíveis os determinantes e impactos do trabalho precoce. As instituições de ensino superior têm responsabilidade ímpar nessa tarefa. Os artigos aqui apontados sinalizam para algumas respostas e fazem emergir a urgência e seriedade necessárias no tratamento dessa questão. Palavras-chave: Trabalho Infantil, Crianças, Trabalho Infanto-juvenil. LT03-906 - PROJETO CONSULTÓRIO DE RUA DO MUNICÍPIO DE GOIÂNIA: CONQUISTANDO A CIDADANIA Elaine da Cunha Fernandes Mesquita - SMSG [email protected] Helizett Santos de Lima - SMSG/UnB [email protected] Marcelo Santos Ribeiro - SMSG [email protected] Rôzi-Mayry Oliveira Soares Duarte - SMSG [email protected] Sheila Alves da Cunha - SMSG [email protected] Roberto Vaz de Abreu - SMSG [email protected] O uso de substâncias psicoativas por pessoas em contexto de vulnerabilidade social, em situação de rua, tem preocupado a sociedade brasileira. No município de Goiânia esta realidade não é diferente e percebe-se a necessidade de ofertar o acesso aos serviços de saúde existentes para essa parcela da população que se encontra excluída da sociedade e em condições precárias de sobrevivência. O Plano Emergencial de Ampliação do Acesso ao Tratamento e Prevenção em Álcool e outras Drogas (PEAD 2009-2010), do Sistema Único de Saúde (SUS), tem como objetivo a expansão de estratégias de prevenção e tratamento relacionadas ao consumo de álcool e outras drogas, mediante ações intersetoriais, ou seja, ações integradas de setores como saúde, justiça, assistência social, educação, cultura, esporte e lazer, tanto na esfera governamental como não-governamental, com prioridade para os cem maiores municípios brasileiros, abrangendo todas as capitais. Visa a ampliação do acesso, qualificação dos profissionais, prevenção, promoção da saúde e redução de danos relacionados ao consumo de substâncias psicoativas e, ainda, o resgate dos direitos humanos e de cidadania da população usuária. Os dispositivos consultórios de rua no SUS tem como princípios a garantia dos direitos humanos, combate ao preconceito e estigma, inclusão e reinserção social, baseadas em ações de redução de danos e integradas a outras políticas públicas de saúde no campo da saúde mental. É composto de equipe volante multiprofissional, com técnicos da saúde mental, atenção básica, educadores sociais, oficineiros e redutores de danos que desenvolvem trabalho extramuros nos locais onde se encontram as pessoas que vivem em situação de rua e fazem uso de substâncias psicoativas, prioritariamente a população jovem. Esses dispositivos devem integrar a rede de saúde mental local, trabalhar com ações voltadas para a intra e intersetorialidade, para possibilitar aos usuários o acesso aos diversos serviços de saúde disponíveis e, ainda, outros serviços como da assistência social de acordo com as demandas específicas apontadas pela clientela atendida. Entre os projetos da rede especializada em saúde mental de Goiânia, que foram aprovados recentemente pelo Ministério 181 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento da Saúde e estão em fase de implantação e execução, destaca-se o Consultório de Rua 1, projeto de intervenção, que tem equipe multiprofissional composta de dezesseis técnicos, sendo três educadores de rua/ redutores de danos, três psicólogos, uma enfermeira, uma assistente social, um clínico geral com formação em saúde mental, um oficineiro, um profissional de educação física e cinco alunos de graduação estagiários do PET Saúde Mental. A equipe atua na região Campinas-Centro, próximo ao Terminal Rodoviário de Goiânia, onde se encontra parcela considerável de pessoas vivendo em situação de rua do município. A população atendida é qualquer pessoa em situação de alta vulnerabilidade social, com uso abusivo de substâncias psicoativas, principalmente o crack, que vive em condições precárias no espaço da rua, com prioridade para crianças, adolescentes e jovens. É relevante apresentar esse novo dispositivo de atenção e suas contribuições para o atendimento dessa clientela, pois o mesmo traz inúmeros desafios, como: mudança no modelo de atendimento, busca do contato com o usuário pelo atendimento in loco (na rua), identificação das necessidades/demandas da clientela a partir da escuta da mesma, bem como a efetivação das parcerias intra e intersetoriais e o atendimento em rede. Ademais, essa modalidade de atenção pode favorecer o resgate de direitos humanos e de cidadania da clientela-alvo, com enfoque em experiências anteriores e nas políticas públicas voltadas para esta área. Palavras-chave: redução de danos, uso de drogas, jovens em situação de rua Contato: Helizett Santos de Lima, SMSG/UNB, [email protected] 182 CO 03 - LT01 Transtornos de Desenvolvimento LT01-770 - AUTISMO E AMIZADE NO CONTEXTO ESCOLAR: ESTUDO A PARTIR DO MODELO PIAGETIANO DE INTERAÇÃO SOCIAL. Claudia Broetto Rossetti - UFES [email protected] Lorena Santos Ricardo - UFES [email protected] Financiamento: CNPq Jean Piaget afirma que os aspectos sociais e individuais constituem polos indissociáveis de uma única realidade no processo de desenvolvimento humano. O referido autor argumenta ainda que as pessoas são a fonte de toda classe de cognições e de sentimentos e que, se a criança sente necessidade de socializar seu pensamento, esta necessidade pode satisfazer-se quando esta tem amigos, com os quais brinca sem constrangimentos. Assim, para além dos aspectos científicos, a importância social das amizades também deve ser considerada. Com o advento da inclusão de pessoas com deficiência em escolas regulares, as crianças passaram a ter contato com uma realidade diferenciada na sala de aula. No caso específico dos transtornos do espectro autista, a manifestação dos comportamentos estereotipados, típicos do quadro, pode acabar afastando as demais crianças, ou, ao contrário, dependendo de como é feita a inclusão, esse contato pode resultar em novas experiências e aprendizados sobre o respeito às diferenças e sobre o convívio social. Dessa maneira, a presente pesquisa objetivou investigar se há diferença no VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento conceito de amizade, no respeito às diferenças e na formação de relacionamentos de amizade no contexto escolar entre 17 crianças que estudam com um autista em classe inclusiva (CI) e 17 crianças que estudam em classe não inclusiva (CNI). Assim, participaram 35 crianças, com idades variando entre 7-8 anos, estudantes do 2º ano do ensino fundamental de duas escolas da rede pública de um município do interior do Espírito Santo. Para a coleta de dados foram criados 14 cartões com desenhos de crianças em diversas situações, sendo seis específicos para meninas (1- duas meninas brincando; 2- duas meninas brigando; 3- uma menina mais velha e uma menina mais nova; 4- um grupo de meninas conversando e uma menina isolada, num canto; 5- uma menina cega, com óculos escuros e bengala, e uma menina que não é cega; 6- uma menina na cadeira de rodas e outra menina em pé, ao lado), seis cartões específicos para meninos (as mesmas situações dos cartões detalhados anteriormente, mas com desenhos de meninos) e dois cartões para ambos (1- um menino e uma menina; 2um grupo de crianças, sendo um menino negro, uma menina asiática, uma menina loira, um menino gordo e ruivo). Além disso, utilizou-se um roteiro de entrevista baseado no método clínico Piagetiano. O encontro com cada criança ocorreu individualmente, na própria escola, após a aprovação pelo Comitê de Ética e a assinatura dos Termos de Consentimento Livres e Esclarecidos pela diretora e pelos responsáveis. Primeiramente os cartões foram apresentados a cada participante. Em seguida, era solicitado que a criança descrevesse o que via, dissesse se as crianças do desenho poderiam ou não ser amigas e justificasse sua resposta. Logo depois era realizada a entrevista cujo roteiro continha 14 questões divididas em três grupos temáticos: o primeiro visava investigar a concepção de amizade dos participantes; o segundo, compreender a relação entre a percepção de diferenças (e respeito a elas) e a possibilidade de um relacionamento de amizade com aqueles que são vistos como diferentes; e, o terceiro, analisar a formação dos relacionamentos de amizades na escola, nos contextos de classe inclusiva e não inclusiva. Todas as etapas da coleta de dados foram gravadas em áudio. Os cartões foram descritos de forma bem semelhante pela maioria dos participantes. De maneira geral, ambas as classes apontaram para a possibilidade de amizade entre as crianças dos cartões, embora na CI tal possibilidade apareça em 75% das respostas dadas aos cartões enquanto na CNI esse número se reduz (66%). Em relação ao primeiro grupo temático da entrevista, tanto a CI (40%) como a CNI (50%) entendem amizade como brincar/se divertir e o “brincar” é apontado como principal facilitador para se ter amigos. Sobre o que atrapalha a ter amigos, “fazer mal” é apontado como o principal fator. Quanto ao segundo grupo temático investigado, na CI a maioria dos participantes (60%) acha possível ter um amigo que é diferente, enquanto que na CNI apenas 40% considera essa possibilidade. Quando questionados sobre o que consideravam “diferente”, a maioria das respostas da CI (30%) apontou para diferenças no comportamento. No caso da CNI o “diferente” foi mais associado a características físicas (55%). Além disso, enquanto mais participantes da CNI afirmaram haver alguém diferente na sala na qual estudam, mais participantes da CI se consideram amigo das crianças apontadas 183 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento como diferentes. Por fim, no terceiro grupo temático investigado todos os participantes afirmaram ter amigos na escola. Quando perguntados sobre quem na sala tem mais amigos, houve maior coesão entre as respostas dos participantes da CI, ou seja, poucas crianças foram citadas. Na CNI foram muitas crianças. O motivo mais apontado pela CI (59%) e pela CNI (79%) para determinada criança ter muitos amigos foi a boa comunicação/interação dela com os demais colegas. Sobre “ficar mais sozinho”, a maioria dos participantes afirma que existe alguém assim na sala e tanto a CI (33%) como a CNI (46%) apontam como motivo o fato de ninguém gostar da referida criança. Todos os participantes da CNI e 94% dos da CI afirmam que é bom ter amigos na escola. Entre os motivos, a maioria dos participantes assinalou a possibilidade de brincar com os amigos no contexto escolar. A maioria dos participantes de ambas as classe afirmou que ter amigos na sala é benéfico, pois pode ajudar a aprender os conteúdos das matérias, uma vez que um amigo pode ajudar o outro quando houver dificuldades. De forma geral, os participantes de ambas as classes conseguem definir bem o termo “amizade” e percebem o diferente de forma semelhante, embora os alunos a CI pareçam se dispor a respeitar e se relacionar mais com aqueles que são vistos como diferentes do que os alunos da CNI. Dessa maneira, espera-se que os resultados da presente pesquisa venham a contribuir para uma compreensão maior da temática abordada, que possam auxiliar na elaboração de novas estratégias para que o processo de inclusão se torne cada vez mais viável no contexto escolar, em especial para os portadores de transtornos do espectro autista. 184 Palavras-chave: Teoria de Piaget, Desenvolvimento Atípico, Inclusão Contato: Claudia Broetto Rossetti. Universidade Federal do Espírito Santo [email protected] LT01-774 - TRANSTORNO DE DÉFICIT DE ATENÇÃO E HIPERATIVIDADE (TDAH): PENSANDO O DESENVOLVIMENTO ATÍPICO A PARTIR DA TEORIA PIAGETIANA Camila Tarif Ferreira Folquitto - USP [email protected] Maria Thereza Costa Coelho de Souza - USP [email protected] Financiamento: FAPESP O Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) é uma das principais causas de procura nos ambulatórios de saúde mental infantil no Brasil. Embora não haja consenso a respeito de algumas características do TDAH, acredita-se que se trata de um fenômeno biopsicossocial. Assim como ocorre em outros transtornos, os sintomas de TDAH são aspectos que, em certo grau, estão presentes em crianças de diferentes idades e contextos. Portanto, o que diferencia crianças com um desenvolvimento considerado dentro do esperado, de crianças com este transtorno é que, nestas, tais aspectos manifestam-se com uma frequência e intensidade consideradas sintomáticas, comprometendo a adaptação, socialização e desenvolvimento. O termo “desenvolvimento atípico” é utilizado para descrever trajetórias de desenvolvimento de crianças nas quais há uma ausência de atributos, características ou construções essenciais para o desenvolvimento, ou quando estas são conquistadas de maneira mais lenta, VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento muitas vezes necessitando de mais trocas e experiências com o meio. No caso do TDAH, a literatura demonstra que crianças com tal diagnóstico apresentam um desempenho em baterias neuropsicológicas comparável aos resultados de crianças mais novas não diagnosticadas. Outra importante característica é a dificuldade em “pensar antes de agir”, entendida no campo da Neuropsicologia como uma dificuldade em inibir pensamentos ou atitudes impulsivas, justamente por uma dificuldade em antever suas consequências. Portanto, acreditamos que o próprio campo de pesquisas sobre o TDAH aponta a necessidade de uma investigação mais detalhada a respeito do desenvolvimento das crianças diagnosticadas com este transtorno. A partir da teoria de Jean Piaget, temos um referencial teórico que permite realizar pesquisas sobre o TDAH à luz da Psicologia do Desenvolvimento. A teoria piagetiana procura responder a questão de como é possível a construção de conhecimento. Por meio de um processo dialético de interação e adaptação ao mundo, os indivíduos desenvolvem-se progressivamente, em seus aspectos cognitivos, afetivos e morais. Embora Piaget não tenha estudado especificamente crianças diagnosticadas com algum tipo de transtorno, suas contribuições podem ser aplicáveis a este campo de pesquisa, já que, na teoria piagetiana temos como foco o sujeito epistêmico e suas ações no mundo. Assim, as particularidades e o contexto social não são descartados, mas procura-se entender as regularidades e semelhanças dos processos de desenvolvimento em diferentes contextos. Com base na teoria piagetiana, temos como objetivo realizar reflexões que contribuam para uma maior compreensão sobre o TDAH, a partir de dois eixos principais: 1) o estudo do desenvolvimento de crianças com este transtorno, com ênfase na construção de noções operatórias, em especial na noção de tempo; 2) a diferenciação entre aspectos estruturais e procedimentais das ações, suas interrelações e funções no desenvolvimento das noções operatórias. Em relação ao desenvolvimento das referidas noções, pesquisas demonstram que, em provas operatórias, crianças hiperativas apresentam uma tendência em emitir julgamentos e respostas típicos do período pré-operatório de desenvolvimento, no qual ainda não estão construídos aspectos importantes para o desenvolvimento da inteligência operatória, como a conservação, interiorização da ação em pensamento, flexibilidade mental e reversibilidade. Os sintomas de impulsividade podem ser compreendidos de forma mais detalhada diante desses indícios de defasagens no desenvolvimento. Para que a criança consiga “pensar antes de agir”, é necessário que ela consiga coordenar os eventos passados, à luz dos acontecimentos presentes, para tomar uma decisão acertada, prevendo as consequências futuras. Para Piaget, a construção da noção de tempo é o aspecto necessário para a coordenação desses eventos, e, em consequência, para a possibilidade do estabelecimento das relações causais. Portanto, o tempo, para este autor, é compreendido como uma noção cognitiva, estruturante do real e organizadora das experiências do indivíduo. O tempo pode ser apreendido de maneira objetiva ou subjetiva, e, a respeito dessa questão, Piaget distingue o tempo físico, que se refere à duração métrica do tempo, e o tempo vivido, que seria a duração psicológica do tempo, ou seja, a sensa185 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento ção dos sujeitos em relação à passagem do tempo. Serão apresentados dados de pesquisa realizada com 62 crianças, que investigou as noções temporais em crianças com TDAH, e os possíveis efeitos das medicações psicoestimulantes utilizadas para o tratamento do transtorno no desenvolvimento das noções operatórias. Crianças com TDAH tenderam a apresentar dificuldades em mensurar intervalos de tempo, e demonstraram, em suas respostas às perguntas feitas na aplicação das provas piagetianas, uma noção temporal não dissociada da noção de espaço. Em relação ao uso do metilfenidato na amostra clínica, não foi observada diferença entre o desempenho de crianças com TDAH medicadas e não medicadas. Portanto, por meio destas pesquisas podemos pensar que crianças com TDAH possuem sintomas que as impedem de focar a atenção em estímulos importantes; em decorrência disso, as trocas com o meio, que possibilitam construções cognitivas essenciais, ficariam prejudicadas, acarretando um atraso no desenvolvimento, na apreensão de noções abstraídas das relações dos objetos do mundo físico. A partir desses resultados, realizaremos uma discussão teórica a respeito da interação entre os procedimentos, isto é, as ações pontuais que os sujeitos realizam para atingir determinado fim, e as estruturas, que dizem respeito ao conjunto das implicações necessárias para a realização das ações, que são atemporais e interiorizadas. Refletir sobre as relações entre o par procedimentos/estruturas nos permite pensar a respeito da qualidade das ações e procedimentos de crianças com TDAH, sobre o que “sabem fazer” e o quanto elas “compreendem as razões” destes procedimentos. Exemplificaremos 186 esta construção teórica com dados de pesquisa em andamento, que busca realizar intervenções em crianças com TDAH a partir de jogos e situações problema. Assim, esperamos que tais pesquisas e apontamentos teóricos possam contribuir para um melhor entendimento de crianças TDAH, e contribuir para a elaboração de estratégias de intervenção no campo da Psicologia e da Educação. Palavras-chave: desenvolvimento atípico; TDAH; teoria piagetiana. Contato: Camila Tarif Ferreira Folquitto. Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo E-mail: [email protected] LT01-969 – A MEDIAÇÃO AFETIVA NO PROCESSO DE INCLUSÃO ESCOLAR DO ALUNO COM TRANSTORNO GLOBAL DO DESENVOLVIMENTO - TGD – UM ESTUDO DE CASO. Érika Goulart Araújo - UAB/UnB [email protected] Geane de Jesus Silva - UAB/UnB [email protected] O estudo levanta uma inquietação científico-pedagógica e constitui-se num estudo de caso evidenciado no contexto de uma escola pública do Distrito Federal na perspectiva de uma criança do sexo feminino diagnosticada com Transtorno Global do Desenvolvimento – TGD portadora de Autismo atípico, matriculada no 2° Ano do Ensino Fundamental. A pesquisa teve como principal problemática: entender até que ponto a mediação afetiva no contexto escolar pode contribuir com o processo de inclusão educacional de um aluno com TGD. Para isso, como objetivo VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento geral visou compreender como a mediação afetiva pode contribuir para o processo de inclusão educacional de um aluno com TGD. Como metas específicas, foi necessário identificar a contribuição da mediação afetiva entre professor e aluno, observar a interação entre o aluno e seus pares, verificar as limitações específicas da aluna e sua relação com as trocas afetivas e a identificação da mediação pedagógica que o professor lança mão para a interação com o aluno com TGD. O trabalho de pesquisa embasou-se em teóricos como: Piaget, Vygotsky, Wallon, Sassaky e Documentos e legislação específica sobre Educação Inclusiva. Com intuito de estabelecer relação entre afetividade e interação social, buscou-se refletir sobre a mediação no contexto escolar considerando as teorias construtivistas e sociogenéticas que evidenciam os aspectos individuais, sociais e culturais do desenvolvimento. A discussão foi direcionada para educação inclusiva, especificamente a inclusão do aluno com TGD, dimensionando o papel da mediação afetiva e do outro no processo de inclusão educacional. Desta forma, este aluno foi caracterizado e focado em suas especificidades, apresentados frente à mediação do outro e de suas interações com o ambiente. Empregou-se na metodologia a abordagem qualitativa de pesquisa, pois seu caráter dialógico possibilita a obtenção de dados descritivos mediante contato direto e interativo do pesquisador com o objeto de estudo no intuito de entender os fenômenos segundo a perspectiva dos participantes da situação estudada. E, nesse caso, como a realidade a ser pesquisada refere-se ao contexto escolar de um aluno TGD, optou-se pelo estudo de caso, pois tal método atende ao propósito da pesquisa em questão. Participaram da investigação o Professor Regente, a Supervisora Pedagógica e a Professora do Atendimento Especializado – Sala de Recursos, a Orientadora Educacional e a aluna. Os instrumentos empregados na estruturação do levantamento das informações foram os seguintes: a observação, diário de campo, entrevista semiestruturada e análise documental sendo discutidos à luz do caráter interpretativo-construtivo. Sendo assim, foram construídas as seguintes categorias de análise com base nos objetivos específicos desse trabalho: Mediação afetiva; Interação social do TGD; Limitações específicas e a Participação do outro no processo de inclusão. Tais eixos nortearam a organização dos dados obtidos por meio de cada um dos instrumentos utilizados e também a apresentação dos resultados alcançados. Nesse sentido, os principais resultados obtidos revelaram que com base na ideia de mediação sendo a intermediação, de algo interposto entre uma coisa e outra tendo como base a afetividade, podemos evidenciar que a mediação afetiva proporcionou à aluna um ambiente de permanente desenvolvimento. Sobre a interação da aluna, suas limitações não implicam em seu isolamento, pois há interação, uma vez que respeitada seu ritmo e sua individualidade. Em relação à possibilidade real de desenvolver e romper com as limitações específicas da aluna a partir da intervenção do outro como mediador proporcionou identificar o inexorável papel da medição afetiva que revelou ser de extrema importância dentro do processo de inclusão educacional de um aluno TGD. No que concerne à participação do outro no processo de inclusão, os dados sugerem ainda o fortalecimento do outro no ambiente escolar 187 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento o qual é espaço privilegiado de interação social, pois possibilita a apropriação da diversidade cultural e aprendizagem de conteúdos, base para a constituição da pessoa em si e também do outro. Portanto, o papel do outro na superação das dificuldades de aprendizagem e no caso, de inclusão educacional, tem relevância significativa e status de mediador propulsor das potencialidades do indivíduo sendo o outro sujeito ativo, concreto que atua em sistemas históricos complexos da atividade interativa. Tendo em vista tais resultados, chega-se a seguinte resposta para a pergunta inicial: a mediação afetiva contribui significativamente com o processo de inclusão educacional de alunos com TGD, pois o que se caracteriza como obstáculo dentro de um quadro de espectro autista, ou seja, a dificuldade nas relações e trocas afetivas, é o que substancialmente justifica ações interativas que possibilitem seu desenvolvimento. Com este estudo pôde-se apreender que o processo de inclusão da aluna torna-se efetivo a partir das trocas afetivas e da participação do outro, o qual compõe o cenário da aluna de maneira bem particular, pois é a partir dele que ela se mostra e se constitui. A contribuição dessas reflexões possibilita reelaborar questões sobre o papel do outro no processo de inclusão escolar a partir da mediação afetiva, indicando sua eficácia quando resguardada a individualidade do aluno com necessidades educacionais especiais. Palavras-chave: Educação Inclusiva, Mediação Afetiva, transtorno global do desenvolvimento. Contato – Érika Goulart Araújo – UAB-UnB – [email protected] 188 LT01-1046 – AUTISMO: CONCEPÇÕES DE PROFISSIONAIS DAS ÁREAS DA SAÚDE E EDUCAÇÃO Cibele Shírley Agripino Ramos - UFPB Nádia Maria Ribeiro Salomão - UFPB Financiamento: CAPES O autismo é um dos transtornos do desenvolvimento mais estudados atualmente, cuja compreensão representa um fator relevante para a formação de diversos profissionais. Embora seja um tema bastante investigado, ainda não existe um consenso a respeito da sua etiologia, visto que as explicações variam dependendo do enfoque teórico adotado, o que dificulta a elaboração do próprio conceito de autismo. Apesar das divergências teóricas envolvendo a sua etiologia e das mudanças de enfoque ocorridas ao longo dos anos, pode-se dizer que há um consenso a respeito da existência de um comprometimento em três importantes áreas para o desenvolvimento infantil nesse transtorno: interação social, comunicação/linguagem e comportamento, sendo esta tríade de prejuízos utilizada como critério diagnóstico de autismo. O diagnóstico de autismo deve ser realizado até os três anos de idade, entretanto, muitas vezes, ele só é feito mais tardiamente, por volta dos quatro ou cinco anos de vida da criança. Tem sido ressaltada, nos últimos anos, a importância de uma identificação precoce do autismo, já que por meio dela é possível antecipar a intervenção. A identificação e a intervenção precoce são de extrema importância para que sejam amenizados os prejuízos decorrentes do autismo, o que justifica a necessidade de os profissionais se informarem a respeito dos avanços relacionados a essa área, principalmente aqueles VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento referentes ao diagnóstico do transtorno. Vários profissionais estão envolvidos tanto no diagnóstico quanto na intervenção do autismo. No entanto, poucos estudos têm sido realizados a fim de investigar as concepções ou crenças de profissionais de diversas especialidades acerca deste transtorno. Nesse sentido, o presente estudo teve como objetivo investigar as concepções que profissionais de diversas áreas, que comumente lidam com o grupo autista, possuem a respeito de tal transtorno. Considera-se que a forma como eles concebem o autismo influencia na maneira como será feito o diagnóstico e a intervenção, e, consequentemente, trará reflexos importantes para o desenvolvimento da criança com autismo. Participaram deste estudo 29 profissionais, sendo sete psicólogos, sete fonoaudiólogos, seis pedagogos, três psiquiatras, três neurologistas e três pediatras. Estes profissionais foram procurados em instituições públicas e privadas que recebem indivíduos com necessidades educativas especiais, bem como em consultórios particulares, todos localizadas na cidade de João Pessoa - PB. Os instrumentos utilizados neste foram um questionário de identificação aplicado ao profissional e uma entrevista estruturada, com perguntas referentes às concepções dos participantes quanto às causas, indicadores, prognóstico e intervenção no autismo, bem como ao papel que a família desempenha no desenvolvimento das crianças que possuem esse transtorno. A análise das respostas foi realizada buscando-se as convergências e divergências entre as concepções dos profissionais das diferentes áreas do saber. Verificou-se que a maioria dos profissionais acredita em uma causa orgânica para o autismo, embora, dentre estes, alguns considerem que fatores ambientais possam desencadeá-lo. Um número menor de profissionais caracterizou o autismo como sendo de origem multifatorial, isto é, que envolve uma associação de fatores orgânicos, psicológicos e ambientais. Houve ainda profissionais que não se posicionaram a respeito. No que se refere à identificação do autismo, os profissionais, em geral, acreditam ser possível identificá-lo antes dos três anos de idade. Entretanto, nem todos acreditam na possibilidade de o fechamento do diagnóstico ser realizado antes dessa idade. Dentre os aspectos que possibilitam a realização da identificação precoce, foi destacada a importância do olhar diferenciado do pediatra, cujo acompanhamento contribui para que as características do autismo possam ser percebidas mais facilmente. As características relatadas com maior frequência pelos participantes quanto aos sinais precoces de autismo foram a ausência do contato visual, isolamento, movimentos e atividades repetitivas e chorar demais. A confusão com outras condições, como déficit auditivo, por exemplo, foi mencionada como um dos problemas que interferem na identificação precoce, tendo sido ressaltada, assim, a importância do diagnóstico diferencial. No que diz respeito ao prognóstico do autismo, a grande maioria dos profissionais acredita que é possível haver uma evolução positiva nesse transtorno, mas que esta depende de alguns fatores, como o grau de autismo que a criança apresenta e se a intervenção é iniciada precocemente. Destacaram-se ainda como importantes para um bom prognóstico a necessidade de a criança ser acompanhada por uma equipe multidisciplinar e de haver a participação da família no tratamento. Quanto às propostas 189 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento de intervenção mais eficazes para o autismo, os profissionais, em geral, acreditam que é preciso atentar para as necessidades de cada criança em particular, bem como para o seu contexto familiar. Além da importância de uma equipe multidisciplinar no tratamento, destacou-se também como importante a integração entre pais, profissionais e escola. Dentre os profissionais que citaram métodos específicos para o tratamento, os mais mencionados foram o TEACCH, o ABA, o PECS e o Son-Rise. A maior parte dos profissionais considera válidas estratégias alternativas, como a musicoterapia, a arteterapia e a equoterapia. Contudo, nem todos acreditam que estas estratégias devam ser utilizadas isoladamente, mas como um complemento a outras formas de intervenção. Quanto ao papel da família no auxílio ao desenvolvimento das crianças com autismo, os aspectos mencionados com maior frequência foram a necessidade de haver estimulação por parte dela e a aceitação. Por fim, considera-se que alguns profissionais não conseguem definir claramente o que causaria o autismo, o que talvez tenha feito com que eles não se posicionassem a respeito. Acredita-se que a falta de um consenso na literatura acerca das causas do autismo, bem como a diversidade de quadros clínicos encontrados, possam ter contribuído não apenas para que alguns profissionais não se posicionassem a respeito da etiologia, como também para a diversidade de explicações sobre as causas do autismo apresentada por eles. Enfatiza-se a necessidade de outros estudos sobre as concepções dos profissionais acerca do autismo que envolvam uma quantidade maior de profissionais, especialmente os da área médica, que foram minoria na presente investigação. 190 Palavras-chave: autismo; concepções; profissionais. Contato: Cibele Shírley Agripino Ramos - Estudante de Pós-Graduação (mestrado) Universidade Federal da Paraíba [email protected] LT01-1052 - A CRIANÇA COM SÍNDROME DE DOWN E SUA FAMÍLIA: UM ESTUDO SOBRE A DINÂMICA FAMILIAR DE ACORDO COM A PERSPECTIVA SISTÊMICA Luciene Pires de Araújo Lins - UCB Maria Alexina Ribeiro – UCB [email protected] A Síndrome de Down caracteriza-se pela existência de um cromossomo extra, ou seja, em cada célula há 47 cromossomos, quando o esperado são 46 cromossomos. As crianças com Síndrome de Down possuem características físicas específicas, que podem ser observadas pelo médico ao fazer o diagnóstico clínico. O diagnóstico da Síndrome de Down, atualmente, pode ser obtido antes mesmo do nascimento do bebê durante o acompanhamento pré-natal. Se o acúmulo de fluído na nuca fetal, conhecido como translucência nucal (TN), for excessivo, no período de 11 a 136/7 semanas, há um risco aumentado para a ocorrência de anomalias cromossômicas, malformações fetais e síndromes genéticas. A revisão da literatura mostrou que há uma escassez de estudos que envolvem todos os membros da família e seu funcionamento, necessitando, portanto, de mais investigações na área, principalmente no tocante especificamente ao papel do pai nesse contexto, onde foram encontrados poucos estudos. Em geral, há certa predominância de tra- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento balhos que priorizam, especificamente, a relação da mãe com a criança que possui Síndrome de Down, bem como os aspectos sócio-educativos, na maioria das vezes com o enfoque particular em um ou mais membros da família. Dificilmente esses estudos têm enfatizado a família e sua dinâmica como um todo. Estudos apontam para a importância da família no desenvolvimento da criança com Síndrome de Down, pois mesmo com toda a dificuldade que a família tem que lidar nas várias situações difíceis, é ela que vai fazer de tudo para que o filho possua um atendimento especial e de qualidade. Assim, uma vez que a família é o primeiro universo de socialização da criança e é a mediadora das relações desta com seus diversos ambientes, é fundamental que pesquisadores e profissionais foquem sua atenção para a compreensão da dinâmica de funcionamento de famílias de crianças com Síndrome de Down. Este trabalho apresenta um estudo sobre a dinâmica familiar e os padrões de relacionamento de uma família com um filho com Síndrome de Down. Trata-se de uma dissertação de mestrado da primeira autora orientada pela segunda. O objetivo do estudo foi conhecer a dinâmica de uma família com um filho diagnosticado pela Síndrome de Down, enfocando alguns aspectos dessa dinâmica, visando contribuir com o conhecimento sobre o tema e possibilitar uma melhor assistência às famílias. Privilegiou-se o referencial da pesquisa qualitativa de González Rey com utilização do estudo de caso. A pesquisa teve como participante uma família constituída por pai, 39 anos, militar, mãe, 42, uma filha, 16, e um filho de 18 anos que possui Síndrome de Down. A família é natural do nordeste brasileiro e reside em Brasília/ DF há seis anos. A família foi convidada a participar da pesquisa por meio da pesquisadora e, após ser informado sobre os procedimentos do estudo, assinou o Termo de consentimento Livre e Esclarecido. O projeto foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Católica de Brasília - UCB. Para o levantamento dos dados foram realizados três encontros com a família com o objetivo de conhecer a história familiar, com base em um roteiro, elaborar o genograma, o ecomapa e a confecção da colagem com a participação de todos os membros da família que teve como tema “Nossa família”. A análise dos dados foi feita de acordo com a abordagem construtivo-interpretativa de González Rey a partir de três Zonas de Sentido: 1) História familiar e fases do ciclo de vida; 2) Subsistemas, fronteiras e hierarquia e 3) “Em Brasília é difícil fazer amizades”: relações da família com outros sistemas sociais. Os resultados apontam para a falta de preparo dos profissionais ao atender uma criança com deficiência, sem acolhimento e sensibilidade ao lidar com família; a dificuldade, por parte da família, em aceitar a deficiência do filho, tendo que elaborar o luto pelo filho ideal perdido; o medo dos pais de terem outros filhos com deficiência; o relacionamento entre irmãos permeado de cooperação e apoio mútuo, embora haja sentimentos de ciúmes; reestruturação familiar durante as várias etapas do ciclo de vida, possibilitando aos membros exercerem outros papéis e funções familiares; pouca permeabilidade das fronteiras com os outros sistemas sociais, ou seja, a família possui poucos relacionamentos sociais. A escolha do método e a abordagem sistêmica foram essenciais para o alcance dos objetivos de pesquisa 191 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento e proporcionaram um melhor entendimento sobre a dinâmica de uma família que possui um membro com Síndrome de Down. Como sugestões para pesquisas futuras, consideram-se importantes estudos que abordassem a questão religiosa como enfrentamento para aceitar o filho com deficiência. Também seria muito interessante a realização de um estudo que focalizasse somente o pai, uma vez que a revisão bibliográfica nos trouxe poucos dados a respeito da relação do pai com o filho com Síndrome de Down. Palavras-chave: Síndrome de Down, dinâmica familiar e abordagem sistêmica. Contato: Luciene Pires de Araújo Lins Universidade Católica de Brasília – UCB [email protected] PO-LT04-A LT04-702 - A EDUCAÇÃO INCLUSIVA NA PERSPECTIVA DOS PROFESSORES Lanusa Menezes da Silveira - UCB A inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais (ANEEs) no ensino regular tem encontrado inúmeras barreiras, e tem sido motivo de muitas discussões e estudo. O presente trabalho tem como objetivo contribuir para o estudo do processo da Educação Inclusiva na perspectiva dos professores de uma escola da rede pública da cidade do Gama-DF. Deste modo, este estudo buscou analisar: “A Educação Inclusiva na perspectiva dos professores”, com intuito de promover reflexões sobre as possíveis soluções diante das dificuldades encontradas na 192 educação inclusiva. Participaram do estudo quatro professores do Ensino Médio que atendem alunos com necessidades educacionais especiais em uma escola da rede pública de ensino. Os procedimentos e instrumentos utilizados para a investigação do objeto de estudo foram concretizados através de uma entrevista semiestruturada que continha doze perguntas, que investigavam a educação inclusiva na perspectiva do professor, para conhecer as impressões que os docentes têm a respeito dos seus alunos com necessidades educacionais especiais, buscando um maior conhecimento quanto aos seus sentimentos, dificuldades, angústias e representações que possam facilitar ou dificultar seu desempenho profissional diante da proposta inclusiva. Assim sendo, esta pesquisa se caracteriza por ser qualitativa pautada por teóricos representativos. A discussão dos resultados deu-se mediante a análise do conteúdo. A análise dos resultados obtidos, indicou a carência de recursos pedagógicos para trabalhar com alunos com necessidades educacionais especiais, a falta de capacitação profissional, a necessidade de um ambiente adequado aos alunos com necessidades educacionais especiais e a falta de contato com a família. Esses desafios estão aliados a uma má formação dos profissionais da Educação em relação à educação inclusiva. Palavras-chave: Educação inclusiva; Alunos com Necessidades Educacionais Especiais (ANEEs); Capacitação; Professor. VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento LT04-705 - CONCEPÇÕES DE PROFESSORES/AS DA REDE PÚBLICA DE EDUCAÇÃO DO DISTRITO FEDERAL SOBRE INCLUSÃO ESCOLAR Vanuza Sales - UNB [email protected] Carla Francini H. Terci - UNB [email protected] A Educação como possibilidade de desenvolvimento humano sempre foi uma maneira que encontramos para nos referir a capacidade cognitiva do outro.Entretanto, na perspectiva da educação inclusiva é preciso, vislumbrarmos um novo contexto escolar, onde outras questões e olhares possam ser delineados no relacionar-se com o diferente, principalmente na experiência da escola. A educação inclusiva pressupõe essas novas interações, principalmente no ambiente pedagógico, onde deveriam ser vivenciadas relações que denominamos de educativas, ou ‘pedagógicas’. E através dessas, percebemos a necessidade de usá-la, como recurso, no processo educativo. A inclusão escolar é entendida como um processo complexo de profundas transformações: na estrutura dos sistemas educacionais e das escolas e nas práticas educacionais. Para Maciel e Barbato (2010) é um recente fenômeno sociocultural que, entre outras características, se configura complexo por evidenciar a separação conflituosa que é habitualmente feita entre o individual e o social. As concepções de desenvolvimento e de aprendizagem também já se constituíram em objeto de estudo feito por Vygotski (1977), quando propõe uma análise das teorias que enfocam as relações entre essas concepções, investigando quais são as implicações educativas de determinados princípios teórico-práticos que dão sus- tentação a essas teorias. Vigotski (1991), presume do entendimento de que o ser humano se constitui como tal mediante as relações social, histórica e cultural, e esse estabelece a aprendizagem como o eixo dessas relações, admitindo ser esta que promove o desenvolvimento. Segundo Fonte (2005), é na sala de aula que ocorre o momento crucial da educação escolar, e encontro de duas vidas, ambas buscando crescer e alcançar plenitude comunhão aluno professor. [...] O relacionamento entre estes dois elementos constitui a chave do processo ensino aprendizagem. [...] (p. 04). Dos professores espera-se que conduza o seu grupo de estudantes, buscando compreender e negociar os diferentes processos de significação que envolvam situações de aprendizagem que planejou. (Tunes, Tacca & Bartholo, 2005, p. 01). Analisar as concepções de professores da rede pública do Distrito Federal - SEE/DF, ensino básico - sobre a Inclusão Escolar na escolarização formal. Examinar que concepções teóricas sobre inclusão escolar que norteiam a prática pedagógica dos professores. Identificar na relação professor x estudante que elementos foram favorecedores no processo de inclusão escolar. Participantes: três (03) professoras de três escolas de ensino fundamental séries iniciais, sendo uma, (01), de cada uma, das escolas acompanhadas pelo profissional psicólogo escolar. Os respectivos profissionais professores são todos pertencentes a escolas públicas do DF. Elaborou-se um roteiro de entrevista narrativa para os professores. Os professores foram investigados a partir de suas práticas, para chegar a concepções, o que implica, conseqüentemente perceberem que concepções construíram no percurso de suas práticas de ensino e aprendiza193 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento gem, e, possibilitando ressignificar essas na perspectiva da educação inclusiva. Foi realizada uma análise qualitativa dos dados, por aproximação de sentido dos conteúdos levantados entre as participantes entrevistadas. As falas foram organizadas e agrupadas em categorias a partir dos temas cujos sentidos eram semelhantes, sendo essas denominadas por uma expressão que melhor as representasse pela força dos temas recorrentes. Os professores embora sejam os principais agentes dessa ação, não percebem ainda, nem consideram como elemento principal do processo pedagógico a relação professor e estudante, portanto, reestruturar a escola deve compreender repensar as práticas, as ações e acima de tudo considerar as possibilidades relacionais como espaço do processo de ensino e aprendizagem, como recurso educativo. A pesquisa por meio da análise dos dados nos permite concluir que com a fragmentação do conhecimento pedagógico influenciado pelo ecletismo do senso comum, a falta de diálogo com o conhecimento teórico influencia nas concepções dos professores sobre inclusão escolar. Percebe-se nas percepções das profissionais entrevistadas, uma lógica particular que sustenta a importância crescente da necessidade da mudança da prática pedagógica a partir da relação professor e estudante. Verificou-se que o trabalho dos profissionais professores não é fundamentado em uma única concepção de inclusão, o que pôde ser demonstrado pela coexistência de várias percepções e práticas indistintas. Constatou-se que as abordagens dos profissionais da escola são permeadas pela prática intuitiva, discutindo-se, a partir da perspectiva sócio interacionista, as diversas possibilidades relacionais como 194 espaço de aprendizagem para os atores da escola numa cultura colaborativa de desenvolvimento e inclusão escolar. Palavras-chave: Inclusão escolar, concepções, prática, pedagógica, vínculo professorestudante. LT04-738 - O ALUNO QUE NÃO APRENDE: DIFICULDADE OU TRANSTORNO DE APRENDIZAGEM? Aline Pacheco de Medeiros Ferro - UPM [email protected] Giuliano Michel Mussi - UPM [email protected] Lígia Canellas - UPM [email protected] Nathália Zoli Sant`Ana – UPM [email protected] Paulo Roberto Pereira de Souza - UPM [email protected] Sérgio Martins Lopes - UPM [email protected] José Salomão Schwartzman - UPM [email protected]). No Brasil, a evasão escolar ainda é um grande desafio para as escolas, para os pais e para o sistema educacional. Segundo dados do INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Anísio Teixeira), de 100 alunos que ingressam na escola na 1ª série, apenas 5 concluem o ensino fundamental, ou seja, poucos terminam a 8ª série. Estudos mostram que em torno de 15% a 20% das crianças no início da escolarização apresentam dificuldade em aprender e, logo, mau desempenho escolar. Essas estimativas podem chegar a 30%-50% se forem analisados os primeiros seis anos de escolaridade. O mau desempenho escolar (MDE) nestes estudos, VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento é definido como um rendimento escolar abaixo do esperado para determinada idade. O diagnóstico precoce do MDE é um ponto fundamental para a superação das dificuldades escolares, pois além de orientar os educadores e pais sobre a melhor forma de lidar com a criança, direciona a elaboração de programas de reforço escolar e a adoção de estratégias clínicas e/ou educacionais que auxiliam a criança no desenvolvimento escolar. Objetivos: Levantar as principais causas do MDE; Identificar os fatores intrínsecos e extrínsecos envolvidos no MDE; Diferenciar os conceitos dificuldade e transtorno de aprendizagem; Descrever quais são os transtornos de aprendizagem segundo o DSM-IV(Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais); Descrever outros transtornos envolvidos no MDE: Transtorno de déficit de atenção/hiperatividade e Transtorno de desenvolvimento de coordenação. O presente estudo trata-se de uma pesquisa descritiva, com levantamento bibliográfico em bases de dados científicos: SCIELO, LILACS, DEDALUS. Utilizamos como descritores: mau desempenho escolar; transtorno de aprendizagem; transtorno de déficit de atenção/hiperatividade; dificuldade de aprendizagem O MDE depende de diferentes fatores: os fatores extrínsecos (ambientais), como: características da escola (físicas, pedagógicas, qualificação do professor), da família (nível de escolaridade dos pais, presença dos pais e interação dos pais com escola e deveres); e, os fatores intrínsecos, ou seja, o próprio indivíduo. Os termos dificuldades e transtorno de aprendizagem têm gerado muitas controvérsias entre os profissionais, tanto da área da educação quanto da saúde. Isto porque, há uma sintomatologia muito ampla, com diver- sidade de fatores etiológicos, quando se considera o aprendizado da leitura, escrita e matemática. Entretanto, é necessária uma adequação nestas terminologias a fim de possibilitar uma homogeneização quando estes casos são discutidos pelos profissionais das áreas afins. O DSM-IV classifica o transtorno de aprendizagem (TA) e o define como a situação na qual os “resultados do indivíduo em testes padronizados e individualmente administrados de leitura, matemática ou expressão escrita estão substancialmente abaixo do esperado para sua idade, escolarização e nível de inteligência. Os problemas de aprendizagem interferem significativamente no rendimento escolar e nas atividades de vida diária que exigem habilidades de leitura, matemática ou escrita.” O mesmo manual de diagnóstico divide os transtornos de aprendizagem em: Transtorno da Leitura (dislexia); Transtorno da Matemática (discalculia); Transtorno da Expressão Escrita; Transtorno da Aprendizagem Sem Outra Especificação. A dislexia é um distúrbio de linguagem, de origem constitucional, caracterizado pela dificuldade em decodificar palavras simples. Mostra uma insuficiência no processo fonológico, sendo que essas dificuldades em decodificar palavras simples não são esperadas para a idade. Apesar da instrução convencional, adequada inteligência, oportunidade sociocultural e ausência de distúrbios cognitivos e sensoriais fundamentais, a criança falha no processo de aquisição da linguagem com frequência, apresentando problemas na leitura, na aquisição de novas palavras e na capacidade de soletrar. No transtorno da matemática (ou discalculia), a capacidade matemática, individualmente testada, encontra-se abaixo do esperado para 195 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento idade cronológica. Corresponde a 6% dos Tas e ocorre igualmente em ambos os gêneros. Algumas situações específicas podem associar-se a ela como: epilepsia, Síndrome de Turner, TDA/H, síndrome alcoólica fetal, fenilcetonúria tratada, entre outros. No transtorno da expressão escrita, a disgrafia e disortografia, individualmente testadas, apresentam-se acentuadamente abaixo do esperado para idade cronológica. Corresponde a 8% a 15% dos TAs e compromete todas as áreas acadêmicas. Pode ser resultado de alterações motoras, de percepção espacial, de linguagem, além de memória e atenção. Já, o transtorno da Aprendizagem Sem Outra Especificação envolve, de acordo com o DSM-IV, os transtornos da aprendizagem que não satisfazem os critérios para qualquer Transtorno da Aprendizagem específico, podendo incluir problemas em todas as três áreas (leitura, matemática, expressão escrita) que, juntos, interferem significativamente no rendimento escolar. Para o diagnóstico do Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) é necessário que o profissional tenha experiência clínica significativa, conhecimento teórico e, muita reflexão. As escolas, a cada dia que passa se envolvem em uma tendência de explicar o MDE de seus alunos pela presença do TDAH e muitas vezes este diagnóstico realizado na escola pode estar equivocado. O Transtorno do Desenvolvimento da Coordenação (TDC) que ocorre quando há atraso no desenvolvimento de habilidades motoras ou dificuldades para coordenar os movimentos sem causas neurológicas ou sensoriais identificadas, também causam prejuízos, contribuindo para o MDE. Infelizmente, no decorrer do processo ensino-aprendizagem, esbarramos com alguns proble196 mas que podem atrasar ou comprometer todo um trabalho educacional, uma vez que a educação não tem apenas histórico de sucessos e aprovações. Muitas vezes, a criança em idade escolar, por estar apresentando um MDE é discriminada e até emocionalmente agredida por professores, pais e pelos próprios colegas da escola. Porém, o MDE pode estar completamente ligado ao ambiente em que ela está inserida, sendo assim uma dificuldade de aprendizagem ao invés de um transtorno. Cabem a nós, pais, professores, orientadores e educadores em geral, termos a sensibilidade de enxergar em nossos alunos quando algo não vai bem e encaminhá-los a uma equipe multidisciplinar para que este seja acompanhado de perto e diagnosticado de maneira correta, a fim de obter um bom rendimento. É de fundamental importância analisar a qualidade das mediações estabelecidas em diferentes contextos sociais (como a família e a escola), considerando que o esfacelamento das relações entre os indivíduos se tornou uma característica da pós-modernidade, na qual se verifica o surgimento de verdadeiras epidemias de desordens de aprendizagem. Palavras-chave: mau desempenho escolar; transtorno de aprendizagem; transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade; dificuldade de aprendizagem. VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento LT04-751 - O BRINCAR FAVORECENDO O DESENVOLVIMENTO E O APRENDIZADO DA CRIANÇA PEQUENA NA ESCOLA Tuana Porto Lima Cordeiro - UFPB Andréia Dutra Escarião - UFPB [email protected] Financiamento: PROLICEN Introdução: Este projeto surge da necessidade em avançar os estudos na área da educação infantil, pensando a formação do professor numa perspectiva que atenda a necessidade da criança pequena na escola. Não há como pensar numa escola que favoreça o desenvolvimento e o aprendizado da criança, sem relacionar esses aspectos à brincadeira, a uma prática pedagógica que objetive o aprender brincando. A questão da formação docente para a educação infantil está longe de constituir-se em uma questão resolvida no cenário educacional brasileiro. É preciso destacar que historicamente temos avanços e recuos, tanto no plano teórico, quanto no plano da prática, a questão envolve debates, por perpassar distintas concepções da prática educativa e por constituir-se numa atividade que envolve um alto grau de complexidade para a sua realização. Ainda se constitui um grande desafio para a educação infantil consolidar-se enquanto etapa de fundamental importância na educação básica. Infelizmente é comum, educadores demonstrarem falta de conhecimento acerca dos fundamentos da educação infantil e das técnicas que podem ser utilizadas como meio de favorecer o desenvolvimento integral da criança, sendo a brincadeira uma delas. Ligadas a esta problemática, emergem algumas questões cujas respostas seriam indicadoras da possibilidade da formação incidir positivamente na melhoria da prática pe- dagógica na escola e capaz de repercutir na qualidade da educação infantil: como os estudantes da UFPB, vêem a importância da brincadeira como meio de favorecer o desenvolvimento e a aprendizagem da criança pequena? Quais os limites e as contribuições da formação acadêmica na ressignificação da identidade dos docentes da educação infantil? Quais as dificuldades encontradas pelos professores em compreender de fato o objetivo pedagógico das brincadeiras utilizadas na escola infantil? Estas se constituem nas principais questões de estudo, cujo aprofundamento a ser realizado, em fase subseqüente, permitirá perceber a existência ou não de mecanismos articuladores da prática na formação no cotidiano das práticas pedagógicas dos professores, com vistas à melhoria da Educação infantil. Sabemos que a criança traz consigo um conjunto de características que se expressam, sobremaneira, no campo educacional, ou seja, traz para escola aspectos emocionais próprios, apresentam comportamentos, valores, interesses e dificuldades, aprendizados e cultura decorrentes de sua vivência social e familiar. A partir desta realidade, faz-se necessário embasar teoricamente os estudos sobre a criança da educação infantil. Evidentemente, esta pesquisa deverá analisar o seu objeto tendo como marco referencial o contexto que essas crianças estão inseridas, e as políticas voltadas para educação infantil. Analisar como a brincadeira pode favorecer os processos de desenvolvimento e de aprendizagem da criança pequena na escola; Identificar as concepções teóricas sobre a criança pequena e a educação infantil; Identificar as contribuições da brincadeira como ação pedagógica lúdica no desenvolvimento integral da criança pequena; Verificar se os 197 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento professores da educação infantil fazem a relação entre a brincadeira e o desenvolvimento e o aprendizado da criança pequena na escola; Desenvolver atividades lúdicas que favoreçam o desenvolvimento integral da criança pequena em articulação com os professores. Nossa pesquisa é de natureza etnográfica em razão desta abordagem metodológica permitir aos pesquisadores uma vivência direta na realidade onde se insere a pesquisa. A pesquisa abrangerá o docente que se encontra em pleno exercício de suas atividades docentes na etapa da educação infantil na Escola de Educação Básica do Centro de Educação da Universidade Federal da Paraíba. A esse estudo, caracterizado com pesquisa e intervenção, interessa observar como a brincadeira vem sendo trabalhada na etapa de educação infantil, assim como pretende contribuir com a elaboração de propostas de atividades lúdicas que possam ser inseridas no processo de planejamento dos professores que trabalham com crianças pequenas na escola nas suas práticas docentes. O projeto atende direta e indiretamente os professores que trabalham com a Educação Infantil e às crianças pequenas matriculadas na escola, lócus da pesquisa. A metodologia prioriza a parceria, o trabalho coletivo facilitado pelo exercício do diálogo e da avaliação permanente para retroalimentar o projeto, corrigido o que for necessário em busca da consecução dos seus objetivos. O trabalho de pesquisa está sendo realizado coletivamente por meio de reuniões de estudo, seminários, debates, produção de textos e atividades junto às crianças contando com a participação dos professores da escola. A pesquisa encontra-se em andamento. Espera-se que esse estudo favoreça uma ampla reflexão da produção de práticas 198 educativas em prol da melhoria da educação infantil, tanto no plano da formação dos sujeitos envolvidos, quanto no plano das escolas do sistema público de ensino. Portanto, argumentamos a necessidade da sua viabilidade em razão da relevância do estudo, ressaltando a importância de refletir criticamente sobre o brincar na educação infantil como forma de favorecer o desenvolvimento e o aprendizado da criança pequena na escola, assim como, a possibilidade de revisão das práticas pedagógicas dos professores da educação infantil como forma de garantir uma melhoria na qualidade da educação atendendo às reais necessidades e expectativas da criança pequena na escola. Palavras–chave: Educação Infantil. Prática Pedagógica. Brincadeira. LT04-884 - A EDUCAÇÃO DE ESCOLARES COM BAIXA VISÃO: PERCEPÇÕES DOS PRÓPRIOS SUJEITOS. Marília Costa Câmara Ferroni - UNICAMP [email protected] Maria Elisabete Rodrigues Freire Gasparetto - UNICAMP [email protected] Nos dias atuais, a inclusão é uma questão central em todos os ambientes em que vivemos: famílias, escolas, mercado de trabalho, espaços de lazer e todas as situações da vida do ser humano (Amiralian, 2009). Educar os escolares com baixa visão é favorecer-lhes condições para que desenvolvam suas possibilidades naturais e possam contribuir com seu trabalho para uma comunidade à qual tenham o sentimento de pertença (Masini, 2007). Considera-se baixa visão quando o valor VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento da acuidade visual corrigida no melhor olho é menor que 20/60 e igual ou maior que 20/400, ou o campo de visão seja menor que 20 graus com a melhor correção óptica. A baixa visão subdivide-se em três categorias: perda visual moderada, em que o indivíduo apresenta acuidade visual < 20/60 e ≥ 20/200; perda visual grave < 20/200 e ≥ 20/400; e cegueira Legal < 20/400 e ≥ 20/1200 (OMS, 2003). Para melhorar o desempenho visual de escolares com baixa visão, é recomendada a utilização dos recursos de Tecnologia Assistiva, uma área do conhecimento de característica interdisciplinar que engloba produtos, recursos, metodologias, estratégias, práticas e serviços que objetivam maior funcionalidade, autonomia, independência, qualidade de vida e inclusão social da pessoa com deficiência (Gasparetto et al., 2009). Qualquer recurso que potencialize o funcionamento visual do indivíduo com baixa visão, em suas atividades diárias, é caracterizado como recurso de Tecnologia Assistiva e pode ser classificado em recursos óptico, não óptico, eletrônico e de informática. Em pesquisa sobre a percepção de diretores do sistema público sobre a inclusão educacional, verificou-se que faltavam recursos de tecnologia assistiva e materiais pedagógicos destinados ao uso do escolar com deficiência visual (Janial & Manzini, 1999). Quando se trata da educação de escolares com necessidades especiais, questões relacionadas à interação social se tornam ainda mais importantes, por possuírem algumas limitações quanto às possibilidades de locomoção e exploração de objetos. Freqüentemente, são considerados incapazes de executar certas atividades, participar, decidir por si mesmos, contribuir nas atividades em grupo e em brincadeiras livres, havendo subestimação de suas potencialidades e capacidades (Bezerra & Pagliuca, 2007). Esses escolares são, muitas vezes, isolados do contato com parceiros e têm interações restritas à relação com o adulto limitando, assim, suas experiências fora da família. Esse isolamento pode ocorrer nas relações parentais, com a vizinhança, escolares e em caráter terapêutico, embora a interação constitua importante elemento da vida social do escolar, pois, promove um contexto propício ao desenvolvimento de suas competências sociais. A relação com os pares também é um elemento importante a ser considerado no processo de construção, desenvolvimento e transformação do indivíduo, da cultura e da sociedade (Souza & Batista, 2008). As necessidades visuais de cada pessoa variam de acordo com cada fase e momentos de sua vida, em atividades escolares, de lazer, de vida diária, do trabalho ou na vida adulta e, para o bom desempenho dessas pessoas, se faz necessária a parceria entre a área da saúde, escola, família e ensino especializado (Carvalho et al., 2005). Os profissionais que atuam na educação, habilitação e reabilitação de escolares com baixa visão necessitam conhecer esta população, para uma melhor elaboração de programas de habilitação e/ou reabilitação visual, que propiciem desenvolvimento, transmissão de conhecimentos de acordo com as necessidades de cada um, transformação em novos saberes, aprendizagem e preparo para a inclusão social. A presente pesquisa tem por objetivos: conhecer a percepção de escolares com baixa visão em relação às suas dificuldades visuais; investigar suas opiniões sobre a comunidade escolar; verificar o uso de recursos de tecnologia assistiva nas atividades cotidianas. Realizou-se um 199 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento levantamento descritivo, tipo transversal. A coleta de dados foi realizada no período de janeiro a agosto de 2010, com aplicação de um questionário semiestruturado a escolares com baixa visão, observações e leitura de prontuários. Para elaborar o instrumento e adequá-lo à realidade estudada, realizou-se um estudo exploratório, com a finalidade de descobrir novos enfoques, conhecimentos, vocabulários e percepções dos escolares com baixa visão em relação ao tema estudado. A população foi composta por 19 escolares na faixa etária entre 12 e 17 anos, com baixa visão congênita (94,7%) ou adquirida (5,3%), regularmente matriculados no Ensino Fundamental II (63,2%) ou no Ensino Médio (36,8%) e que freqüentavam os serviços de Habilitação e ou Reabilitação Visual nos municípios de Campinas ou em Ribeirão Preto. Destes, 52,6% eram do sexo feminino e 47,4% do sexo masculino; verificou-se que os dados do Censo Demográfico de 2000 apresentaram maior prevalência de pessoas com deficiência visual do sexo feminino. De acordo com a classificação de baixa visão, 79,0% dos escolares entrevistados apresentam baixa visão moderada; 15,7%, cegueira Legal e 5,3%, grave. Verificou-se que 94,7% declararam ter dificuldades visuais na escola, destacando-se as dificuldades para enxergar a lousa (33,3%), ler dicionário (22,2%) e realizar leitura de livros (16,7%). Em relação à autopercepção das dificuldades visuais, verificaram-se: dificuldades acadêmicas, pegar ônibus, andar a noite e assistir televisão. Enfatizando as relações com a comunidade escolar, a maioria dos alunos possui bom relacionamento com professores (79,0%) e 68,4% indicaram possuir boa relação colaborativa com os colegas de classe, pois, os mesmos ditam 200 a matéria. Embora a maioria dos entrevistados (52,4%) tenha relatado não possuir relacionamento com a direção, coordenação e outros funcionários da escola, esses profissionais fazem parte da comunidade escolar e deveriam ajudar os escolares em relação à orientação, estimulação e integração, já que são responsáveis pela inclusão educacional, de modo a favorecer a aprendizagem, a independência e a autonomia dos escolares com baixa visão (Bezerra & Pagliuca, 2007). Sobre o uso de recursos de Tecnologia Assistiva, prevaleceram os recursos de informática, no qual 76,7% dos respondentes declararam fazer uso de recurso específico para baixa visão. É imperativo que uma atenção maior seja dada à educação de escolares com baixa visão, pois, as maiores dificuldades enfrentadas são do âmbito acadêmico. Acredita-se que uma das formas de minimizar ou sanar as dificuldades é com o preparo da comunidade escolar, por meio de palestras, reuniões com profissionais especializados, leituras de textos informáticos, exibição de vídeos e estudos nos HTPC (hora de trabalho pedagógico coletivo). Outra ferramenta importante é a utilização de Recurso de Tecnologia Assistiva, destacando o uso da informática, um recurso importantíssimo a ser explorado pelos alunos com deficiência visual, pois, pode auxiliar no desenvolvimento da programação e conteúdo escolar, proporcionando melhor desempenho visual na leitura de livros e dicionários disponíveis na internet. Palavras-chave: educação, inclusão, deficiência visual Contato: Marília Costa Câmara Ferroni, CEPRE- FCM- UNICAMP, marilia_ferroni@ hotmail.com VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento LT04-995 - APRENDIZAGEM EM CRIANÇAS AUTISTAS: DUAS VISÕES Ana Karina C. R. de-Farias [email protected] Ângela Suzana Rodrigues Guimarães - UniCEUB [email protected] Alyne Farias Moreira - UniCEUB [email protected] Isabele Raiana de Mendonça Rangel - UniCEUB [email protected] Thaís Polônio Ribeirinho - UniCEUB [email protected] O autismo é classificado como um dos Transtornos Globais do Desenvolvimento, segundo o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, o DSM-IV-TR (Associação Americana de Psicologia, APA, 2002). Dentre os critérios diagnósticos, estão falta de reciprocidade nas interações sociais, comportamentos estereotipados, limitação nas atividades e interesses, assim como falhas na aquisição e/ ou na emissão de algum comportamento verbo-gestual ou vocal (Martins, 2010). Para o sucesso na aprendizagem de autistas, é importante que o professor acredite na capacidade de aprender desses alunos. Essa interpretação da realidade determinará as práticas e comportamentos do professor e o investimento por ele creditado aos alunos (Abric, 1998). Dessa forma, esse estudo se propôs a investigar as crenças e práticas de duas professoras que lidam com crianças autistas por meio de dois estudos de caso, sendo que uma delas trabalha com ensino especial e a outra com ensino inclusivo. O instrumento escolhido para a coleta de dados foi uma entrevista semiestruturada, dentro de uma perspectiva qualitativa de produção de conhecimento, com itens como, por exemplo: “Como você definiria o au- tismo?”, “Qual é o papel de um professor que trabalha com autistas?” e “Quais são as dificuldades de aprendizagem de um aluno autista?”. Notou-se que a professora do ensino especial ocupa esse cargo por vontade própria, por causa de eventos da sua vida pessoal; apresenta uma visão interacionista da aprendizagem, apropriando-se do papel de mediadora; recusa o papel de cuidadora; e assume a responsabilidade pelas dificuldades de aprendizagem em sala de aula. Já a professora do ensino inclusivo acredita que o professor tem a função de transmitir o conhecimento; reconhece a necessidade de assumir o papel de cuidadora; enfatiza as dificuldades de aprendizagem próprias de alunos autistas; e busca a aprendizagem formal. Ambas acreditam na importância da escola para a melhora do espectro autista. Sabe-se que visões interacionistas da aprendizagem consideram o desenvolvimento como advindo das relações entre o indivíduo e seu meio. Dessa forma, essa interação seria uma base propícia a mudanças (Baum, 1994/2006; Vigotsky, 1998). Portanto, compartilhando de uma visão interacionista da aprendizagem, a professora do ensino especial parece propensa a acreditar na possibilidade de desenvolvimento das crianças autistas. Também, por seu maior interesse na execução de sua função e por ter investido mais em sua formação, a professora do ensino especial mostra-se, atualmente, melhor preparada para lidar com alunos autistas. Palavras-chave: Autismo infantil, Ensino especial, Ensino inclusivo Contato: Thais Polonio Ribeirinho, UniCEUB, [email protected] 201 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento LT04-1039 - ESTRATÉGIAS DE ENSINO APRENDIZAGEM PARA O DEFICIENTE INTELECTUAL Cristiane Alves Cardoso - UAB/UnB [email protected] Patrícia Cristina Campos Ramos - UnB [email protected] Andrea Moreira Couto Fournier - UAB/UnB [email protected] Financiamento: CNPq É na escola que os direitos dos Alunos com Necessidades Educacionais Especiais (ANEEs) são garantidos. Por esse motivo, a instituição escolar desempenha papel importantíssimo no processo inclusivo do aluno, já que é através dela que este poderá obter novos conhecimentos e consolidar aqueles adquiridos em outros contextos de seu convívio social. Influenciada por diretrizes internacionais, a educação inclusiva brasileira está ampliando seus horizontes, e vem conquistando espaço na legislação do país, que tem demonstrado crescente preocupação em integrar ao meio os grupos historicamente excluídos em função de classe, etnia, idade, gênero, deficiência entre outros. Garantir a qualidade de ensino educacional a cada um de seus alunos, reconhecendo e respeitando sua diversidade, é uma das características do sucesso de uma escola inclusiva. Atualmente, existem avanços significativos ao que se refere à educação especial e, mais propriamente para o nosso foco de interesse, a Deficiência Intelectual (D.I.). A D.I. afeta uma parcela significativa das pessoas na população em geral e, também, das crianças em idade escolar. Essa deficiência ainda não é suficientemente compreendida e, por isso, constitui objeto de investigação de inúmeras áreas de 202 conhecimentos. A DI se caracteriza por registrar um funcionamento intelectual considerado por alguns autores como significativamente inferior à média, impossibilitando o indivíduo de responder, conforme se espera, às demandas da sociedade. Tendo em vista as questões destacadas até aqui, o objetivo geral desta pesquisa foi o de buscar compreender o processo de ensino-aprendizagem de uma criança diagnosticada com D.I.; e como objetivos específicos: conhecer as causas e conseqüências da D.I e verificar o desenvolvimento da criança com D.I em relação ao processo de ensino-aprendizagem durante o 2º semestre de 2010. A metodologia empregada buscou alcançar resultados qualitativos, através do acompanhamento da vida acadêmica e sócio-cultural de um aluno com deficiência intelectual, matriculado no 4º ano do Ensino Fundamental em turma regular de uma escola pública do DF, em que a pesquisadora atuava como professora regente. A instituição de ensino fundamental escolhida como fonte de pesquisa para este estudo possuía 44 turmas em 2010, ano em que foi desenvolvido o estudo. Além do aluno com diagnóstico de D.I, participaram do estudo a mãe do aluno e a professora da sala de recursos. Para a construção das informações junto aos participantes foram utilizados alguns materiais, como livros, artigos, roteiro de entrevistas, câmera digital, computador. Para iniciar a construção de informações, foi pedida autorização para a instituição escolar e, após consentimento, deu-se início ao processo de esclarecimentos relevantes ao trabalho. As informações necessárias foram obtidas na própria instituição escolar, pela pesquisadora. Os envolvidos no processo da construção destas informações preencheram VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento e assinaram o Termo de Consentimento Livre Esclarecido para início das atividades de pesquisa. O familiar responsável pelo aluno também autorizou a participação da criança na pesquisa, após conversa em reunião com a professora pesquisadora, que lhes garantiu o sigilo das informações e seu uso apenas para fins de pesquisa. Ao serem informados sobre o processo, tanto o responsável quanto o aluno demonstraram satisfação em serem escolhidos para tal, e seus nomes não foram divulgados, sendo ambos referenciados apenas por nomes fictícios. Para descrever o aluno e o seu processo de aprendizagem foram utilizadas todas as informações a que tivemos acesso na instituição escolar, como: relatórios de apoio ao docente, relatórios psicopedagógicos, relatório médico e relatório de desempenho escolar. Foram retiradas, desses documentos, informações consideradas relevantes para a construção desta pesquisa. Os resultados alcançados demonstraram que o acompanhamento diferenciado e adequado às especificidades e necessidades do aluno contribuiu, significativa e positivamente, para o processo de ensino-aprendizagem. Analisando o histórico da vida escolar do aluno nas escolas pelas quais passou, percebemos que na primeira escola o aluno não teve muito progresso e a mãe esteve ausente. Na segunda escola, com a troca de professor, o aluno apresentou melhorias significativas em seu rendimento escolar. Segundo relatório, naquele período, o aluno aprendeu a ler, embora tenha continuado com dificuldades na resolução de operações matemáticas; a ausência da mãe foi um ponto mencionado mais uma vez pela equipe escolar. Na terceira escola a mãe também se mostrou ausente e as atividades desenvolvidas com o aluno tinham por objetivo buscar sua autonomia na realização das atividades. Contraditoriamente, analisando a entrevista com a mãe, observou-se, por parte dela, uma grande preocupação de que seu filho aprendesse os conteúdos curriculares; além disto, que se sentia incomodada pelo fato de o filho brincar com crianças de idade inferior à dele, além de acreditar que a escola já atendia suas necessidades. O diário de campo e o portfólio, confeccionados com o objetivo de verificar o desenvolvimento cognitivo do aluno, traziam atividades realizadas com o intuito de atingir os objetivos da adequação curricular. Nele, o aluno apresentou avanço significativo na realização de suas produções; organizou as ideias e conseguiu transmitir seus pensamentos. O conhecimento adquirido foi expresso através de ilustrações. A percepção do aluno sobre os conteúdos ministrados, no entanto, foram representados da forma com que ele conseguia interpretar os fatos, sendo que, na maioria das atividades, foi necessária a intervenção da professora. Conclui-se, então, que o aluno participante desta pesquisa, diagnosticado com deficiência intelectual, conseguiu manter um bom desenvolvimento educacional, provavelmente, porque a prática educativa esteve direcionada às suas particularidades, já que sabemos que cada indivíduo tem o seu tempo para aquisição de novos conhecimentos e aprimoramento dos antigos. O direcionamento das atividades facilitou o aprendizado do aluno e, através dos resultados obtidos, foi possível notar que o atendimento individualizado, a adequação das atividades e a participação dos colegas como monitores contribuíram para que o aluno se desenvolvesse e se sentisse incluído naquela instituição. A conclusão que chegamos, 203 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento inspirados em Vigotski, é que o olhar do educador deve estar sempre voltado para as potencialidades do educando e nunca, como corriqueiramente ocorre, para as suas deficiências e limitações. Palavras-chave: Deficiência intelectual, Ensino-aprendizagem, Inclusão Escolar Contato: Cristiane Alves Cardoso, UAB/UnB, [email protected] LT04-1043 - CONTRIBUIÇÕES DA PSICOLOGIA PARA A EDUCAÇÃO EM SAÚDE DE ADOLESCENTES EM UM SERVIÇO DE SAÚDE Etiene Oliveira Silva Macedo - UnB [email protected] Maria Inês Gandolfo Conceição - UnB [email protected] Financiamento: CNPq O presente trabalho visa apresentar as contribuições da inserção da Psicologia nas atividades voltadas à educação para a promoção da saúde de adolescentes atendidos no serviço público de saúde. Trata-se dos resultados parciais de pesquisa desenvolvida pela 1ª autora, sob orientação da 2ª, para obtenção do título de mestre, cuja dissertação se encontra em andamento. Tomou-se como referência a realização de grupos temáticos, desenvolvidos dentro de um Programa de Atenção Integral à Saúde do Adolescente. Essas atividades tiveram duração de 3 meses, organizadas em 12 sessões estruturadas a partir do referencial metodológico do sociodrama (Nery, Costa & Conceição, 2006) e tiveram como objetivo, propiciar aos participantes da pesquisa, por meio de jogos e dramatizações, a vivência sócio-afetiva sobre seu momento no processo de desenvol204 vimento humano, enquanto sujeitos em transformação, inseridos num contexto de relações e condições historicamente constituídas. Participou dessa pesquisa um total de 26 adolescentes, organizados em dois grupos, com 14 e 12 participantes, respectivamente, organizados por faixa etária (10 a 14 anos e 15 a 19 anos). Selecionaram-se os temas desenvolvidos durante as vivências nos grupos, a partir das diretrizes nacionais para a atenção integral à saúde de adolescentes e jovens, na promoção, proteção e recuperação da saúde, do Ministério da Saúde (Brasil, 2010), os quais incluíram: direitos sexuais e direitos reprodutivos, projeto de vida e cultura de paz. Além disso, também foram abordados temas considerados importantes pelos participantes, diretamente relacionados aos anteriores, como processos identitários e relações familiares. A relevância desse trabalho está na contribuição teórico-metodológica que a Psicologia pode oferecer a partir da inserção nos espaços públicos que atendem essa população. Desde a década de 1970, os psicólogos têm participado do Sistema Único de Saúde, sobretudo na atenção terciária, a partir da Psicologia Hospitalar. Relatos e pesquisas sobre a inserção do psicólogo na atenção primária estão ainda em construção, devido ao pouco tempo de inserção do profissional nesse espaço (Boing, Crepaldi & Moré, 2010). Especificamente em relação à promoção da saúde integral de adolescentes, observa-se que esses relatos são escassos. Dentre as contribuições alcançadas por esse estudo, pode-se destacar o fortalecimento da atuação da psicologia em contextos não-clínicos, mas, essencialmente, terapêuticos. Nessa perspectiva, tem-se a expansão da concepção de fato clínico: fatos sociais e psicológicos VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento se complementam ou se suplementam em torno do objeto estudado, o que exige intervenções terapêuticas cada vez mais criativas (Nery & Costa, 2008). Outra contribuição é a aproximação da Psicologia com a Saúde, o que requer um posicionamento ético-político junto ao seu objeto de estudo. Para se compreender o sujeito em sua integralidade é preciso reconhecer sua inserção num espaço histórico e cultural. No presente estudo, a adolescência é concebida como um momento no processo de desenvolvimento humano, cuja transição é multifacetada, mediada por relações que se dão num contexto sociohistoricamente constituído. De acordo com Vygotsky (1996), o adolescente só pode ser compreendido a partir de relações que são objetivadas na cultura: adolescentes de contextos diferentes vão se desenvolver também com especificidades diferenciadas. Logo, essa transição não pode ser tomada como um “a priori”. Do contrário, corre-se o risco dessa transitoriedade legitimar o caráter de invisibilidade desses sujeitos, como o vir a ser, o inacabado que almeja a vida adulta. Em relação à promoção da saúde, buscou-se o entendimento da saúde em sua concepção mais ampliada, com dimensões e causalidades múltiplas (Brasil, 2010). Além de contribuir para o desenvolvimento psicossocial dos adolescentes participantes, essa pesquisa discute também a prática da Psicologia no Sistema Único de Saúde, pois comparece como um fazer transversal, inseparável dos princípios norteadores dessa política, na busca de uma saúde possível aos participantes, neste caso, os adolescentes atendidos, considerando seus múltiplos contextos de inserção (Santos, Quintanilha & Dalbello-Araújo, 2010). Discutem-se também como as ações e práticas podem convergir para possibilitar aos participantes a realização de escolhas possíveis em prol da saúde; ações que busquem a autonomia e a saída coletiva para problemas que também são vividos na coletividade. Palavras-chave: Adolescência, Psicologia, Sistema Único de Saúde Contato: Etiene Oliveira Silva de Macedo, UnB, [email protected] LT04-1048 - VALIDADE DO ZULLIGER NA AVALIAÇÃO DA COMPETÊNCIA INTERPESSOAL Jucelaine Bier Di Domenico Grazziotin [email protected] Silvana Alba Scortegagna - UPF/RS [email protected] A avaliação psicológica é uma prática frequente no contexto organizacional, pois possibilita melhor compreensão das habilidades do indivíduo, do seu funcionamento psicológico e, ainda, dos aspectos preditivos do desenvolvimento de seu comportamento. Atualmente, as habilidades de competência interpessoal nesse âmbito, passaram a ser um requisito imprescindível em todos os níveis ocupacionais, desde aquele que atende à comunidade externa à empresa como aos clientes e ao público em geral, até aqueles que convivem diariamente com o público interno, no mesmo setor e intersetores. Assim, a competência interpessoal é a habilidade de lidar eficazmente com as relações interpessoais, de lidar com outras pessoas de forma adequada às necessidades de cada uma e às exigências da situação. Perceber de forma acurada uma situação e suas variáveis permite que o sujeito desempenhe melhor o seu traba205 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento lho, tanto na dimensão técnica requerida pela natureza dessa atividade quanto na de ser capaz de se posicionar de forma habilidosa na rede de relações interpessoais, interna e externa, no local de trabalho. A competência interpessoal é revelada nas relações estabelecidas entre indivíduo-indivíduo e indivíduo-grupo, englobando assim atitudes individuais e coletivas, sendo estas jamais indissociáveis. Desse modo, para avaliar o desenvolvimento e a aquisição da competência interpessoal é necessário a utilização de instrumentos válidos, que reúnam um conjunto de evidências que assegurem a sua relevância, a sua utilidade nos usos propostos e nas interpretações geradas. É nesse contexto, que o teste Zulliger no Sistema Compreensivo ZSC se insere, especialmente por integrar diversos aspectos da personalidade, com base tanto nos preceitos da psicometria, como nos da projeção e por possibilitar uma investigação mais completa do universo psíquico do examinando, tão solicitada no campo empresarial. Assim sendo, o objetivo deste estudo foi verificar as evidências de validade do Zulliger no Sistema Compreensivo ZSC, focalizando a variável relacionamento, a saber: SumT (sombreado textura); Fd (comida ou ação de comer); H (humano inteiro), Hd (detalhe humano),(H) (para-humano inteiro), (Hd) (detalhe para-humano); GHR (boa representação humana) e PHR (representação humana pobre); a (movimento ativo) e p (movimento passivo); (isolamento); PER (resposta personalizada); AG (movimento agressivo); COP (movimento cooperativo) que, por hipótese, estariam correlacionadas com os fatores de Habilidade IHS: F1) autoafirmação e enfrentamento com risco; F2) autoafirmação na expressão de afeto positivo; F3) conversação e 206 desenvoltura social; F4) autoexposição a desconhecidos e situações novas; F5) autocontrole da agressividade em situações aversivas. Participaram dezenove sujeitos, entre 18 e 43 anos de idade, média 27,5 anos (DP=8,83), dez (53%) do gênero feminino e nove (47%) do gênero masculino, quinze (78,94%) com ensino médio completo e quatro (21,05%) ensino médio incompleto. Todos exerciam atividades de atendimento direto ao cliente em uma loja de uma rede de supermercados. Destes, sete (36,84%) na função de operadores e frente de caixa; sete (36,84%) como atendentes de perecíveis e cinco (26,31%) no cargo de atendentes de loja. Os participantes responderam ao ZSC seguido pelo IHS, de forma individual em uma única sessão. Nos resultados, em relação ao ZSC, apenas as variáveis SumT e Isolamento oscilaram entre os parâmetros normativos. Também os fatores do IHS, mantiveram-se nos índices normativos. Os resultados, além disso, demonstraram que os indicadores GHR, GPHR, pure H, Sum H, que informam sobre o bom relacionamento e percepção interpessoal adequada, correlacionaram-se positiva e significativamente com fatores GIHS, F3 e F1 do IHS. A variável COP, apesar de não ter apresentado índices significativos de correlação com o IHS, apontou aspectos positivos qualitativamente, manteve-se na média normativa e em comparação à AG, mostrou-se superior. As variáveis AG, PHR, SumT, que podem informar sobre o relacionamento e a percepção interpessoal prejudicados, correlacionaram-se negativa e significativamente com os fatores GIHS e F5 do IHS. Portanto, sendo a idéia principal desse estudo, verificar as evidências de validade do ZSC em correlação com os fatores do IHS, que teoricamente ava- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento liam construtos similares, relacionamento e habilidade social, a correspondência dos resultados obtidos entre os instrumentos, forneceu uma importante contribuição para a sua legitimidade. Por fim, mesmo sendo um estudo de caráter preliminar, os resultados contribuíram para afirmar a validade do Zulliger na avaliação psicológica da competência interpessoal no contexto organizacional. Palavras-chave: competência interpessoal, Zulliger no Sistema Compreensivo, evidência de validade. LT04-1193 - A INCLUSÃO NO PROGRAMA DE EDUCAÇÃO PRECOCE NO DISTRITO FEDERAL: DIFERENTES MOMENTOS Andrea Moreira Couto Fournier - UnB [email protected] Patrícia Cristina Campos Ramos - UnB [email protected] Cristiane Alves Cardoso - UnB [email protected] O desenvolvimento da criança tem sido estudado, ao longo do tempo, sob diferentes enfoques. Para a teoria da maturação biológica, por exemplo, o desenvolvimento ocorre de forma natural e tem uma raiz endógena; a teoria ambientalista, por sua vez, preconiza que o conhecimento vem da experiência do indivíduo; já de acordo com a abordagem construtivista, a aprendizagem ocorre com a interação sujeito-ambiente, enquanto teóricos da abordagem histórico-cultural apontam o papel da cultura, da sociedade e da história como essenciais para o desenvolvimento individual. Assim, cada criança é singular no modo de aprender e desenvolver-se, e podemos compreender o desenvolvimento como decorrente do fluxo de interações entre características estruturais da pessoa e diferentes contextos dos quais ela participa. Entre estes contextos, a escola é uma instituição social que faz parte do processo de desenvolvimento do indivíduo, com a função de ampliar as capacidades interpessoais/ intrapessoais, de pensar, planejar, memorizar, o que não se diferencia no âmbito da inclusão de crianças com necessidades educacionais especiais. Portanto, o objetivo geral desta pesquisa foi traçar um paralelo entre o funcionamento do Programa de Educação Precoce no DF, em dois diferentes momentos e contextos: o atendimento no Centro de Ensino Especial e o atendimento em uma escola de ensino regular de educação infantil. Os objetivos específicos deste estudo foram: observar as diferenças e semelhanças entre estas duas realidades e identificar, com base nos depoimentos e opinião dos participantes, os fatores que atuam como facilitadores ou dificultadores no processo de inclusão da criança. Trata-se de uma pesquisa qualitativa, da qual participaram professores, coordenador e pais integrantes do Programa de Educação Precoce em realidades distintas, que tratam do funcionamento do Programa de Educação Precoce em Centros de Ensino Especial e em Centros de Educação Infantil. Os participantes deste estudo foram: uma professora educadora física, a coordenadora do Programa (ambas já trabalharam nas duas realidades citadas), a gestora da escola de educação infantil e o pai de uma criança que também frequentou o Programa em ambos os contextos. A referida criança atualmente integra o 2º período da Educação Infantil, na mesma unidade de ensino em que já participou 207 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento do Programa de Educação Precoce, também tendo participado do mesmo Programa em Centro de Ensino Especial. A condição definida para esta participação foi que todos estivessem envolvidos com o programa, direta ou indiretamente. As entrevistas foram realizadas por meio de procedimentos similares e pautadas por referenciais teóricos e pressupostos metodológicos comuns. Os três instrumentos foram idealizados para entrevistas semiestruturadas, sendo que o primeiro era destinado ao gestor da instituição que já atuava na escola antes do Programa de Educação Precoce se iniciar lá. O segundo instrumento era aplicado em professores e coordenador do Programa. O terceiro, destinado à entrevista com a família da criança. Buscamos, com isto, valorizar o ambiente natural, bem como o significado que as pessoas participantes deram e dão à inclusão e à educação. O estudo foi realizado em uma escola de Educação Infantil localizada em uma Região Administrativa de Brasília, no Distrito Federal. As entrevistas foram transcritas em sua integridade e foram considerados temas recorrentes para a definição das categorias utilizadas para análise. Os entrevistados trouxeram, em suas verbalizações, a importância do processo de inclusão e aspectos que favorecem o desenvolvimento infantil dentro da escola comum, além disto, salientaram a importância da presença de outras crianças no processo de desenvolvimento das crianças em situação de necessidade especial, como referências uma para as outras. Segundo eles, esse processo é uma via de mão dupla, pois as crianças (com ou sem necessidades especiais) aprendem com as diferenças. Ainda para os participantes, é importante que este processo ocorra o mais cedo possí208 vel, por que o preconceito ainda não está cristalizado, e as crianças que convivem com a diferença na escola tendem a ser mais compreensivas com a diversidade. A criança em situação de necessidade especial, inserida na escola desde cedo e que faz parte do alunado, aos poucos vai conquistando seu espaço, interagindo com funcionários e outras crianças, com os próprios colegas em sala de aula e participando das atividades coletivas da escola. Outro aspecto trazido nas entrevistas foi o impacto na percepção dos pais ao levarem seus filhos para serem atendidos no Programa de Educação Precoce e se depararem com crianças, jovens e adultos nos Centros de Ensino Especial que apresentam um desenvolvimento muito aquém do esperado, podendo comprometer a frequência da criança no Programa devido ao preconceito, o que pode levar a própria criança a não se desenvolver de forma adequada. Outro aspecto trazido nas entrevistas foi relativo à dificuldade no processo de inclusão como as barreiras arquitetônicas, falta de monitor, respeito à estratégia de matrícula, a qualificação profissional, a resistência e a aceitação do profissional com a criança com necessidades especiais. Apesar de tudo, foi relatado que com o Programa em funcionamento na escola comum os professores estão mais sensíveis ao processo de inclusão. Também é reconhecida, pelos participantes deste estudo, a importância do Programa para o desenvolvimento das crianças com necessidades especiais e sua futura inclusão na rede pública de ensino regular. Os trabalhos desenvolvidos nos Programas de Educação Precoce, tanto nos Centros quanto em escolas regulares, objetivam a inclusão. No entanto, através dos relatos, foi possível concluir VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento que, além do Programa ser particularmente benéfico para o desenvolvimento infantil, o funcionamento do mesmo em escolas regulares é mais favorável para o processo de inclusão. É consenso entre os participantes a importância do Programa de Educação Precoce inserido em escola regular, devido a vários processos positivos inerentes a este modo de inclusão. No futuro, políticas institucionais podem ser implementadas, de forma a contribuir ainda mais para o processo de inclusão, já que esta população de 0 a 3 anos não é amplamente atendida, ainda, no Brasil. Palavras-chave: Centro de Educação Infantil, Centro de Ensino Especial, Educação Precoce. Contato: Andréa Moreira Couto Fournier, UnB, [email protected]. LT04-1253 - FORMAÇÃO CONTINUADA: UM ESPAÇO PARA REFLEXÃO EM EDUCAÇÃO INFANTIL Caroline Andrea Pöttker - UEM [email protected] Este artigo se originou do relatório de estágio na área de Psicologia Escolar, que ocorreu durante um ano, foi realizado num Centro de Educação Infantil, localizado em um município de Santa Catarina. Para se referir ao local de estágio será usado o nome fantasia, C.E.I. Algodão Doce. A educação infantil sempre mostrou-se necessária, mesmo que suas finalidades e objetivos mudassem com o tempo para atender as solicitações de uma sociedade em transformação. Ela exige um ambiente que encoraje e apóie as expressões de sentimentos, interesses e valores pelas crianças e isso só será possível se o professor assegura-se de que as experiências de aprendizagem sejam apresentadas às crianças de uma forma adequada a seu nível de pensamento. É imprescindível que o professor da educação infantil tenha uma formação específica para trabalhar com seus alunos. O objetivo dessas formações continuadas é auxiliar as professoras a problematizarem as atividades realizadas por elas na escola, para que possam refletir, ter consciência do fim a atingir e assumir o papel de mediadoras entre os alunos e as atividades desenvolvidas na escola e na sociedade. Para tanto, a formação continuada deve ser concebida como um trabalho de reflexibilidade crítica sobre as práticas e de construção permanente de uma identidade pessoal e profissional em interação mútua. Com essa premissa, esse trabalho teve como objetivo propiciar um espaço de reflexão e conscientização sobre a prática pedagógica de cada professora e transmitir conhecimentos gerais da Educação Infantil, para as Agentes de Educação Infantil, visando um melhor desenvolvimento das suas atividades pedagógicas. Participaram do estudo 10 agentes de educação infantil e 6 professoras. Para isso utilizou-se de encontros quinzenais com o grupo das Agentes, e encontros grupais, mensalmente, e individuais, semanalmente, com as professoras. Com as agentes de educação infantil foram realizados 4 encontros, onde priorizou-se os seguintes temas: abordagens em aprendizagem (Tradicional e Integradora), as funções de uma Instituição de Educação Infantil: cuidar e educar, desenvolvimento infantil e o brincar. Desse modo, na realização do primeiro encontro com as agentes de educação infantil foram abordadas as diferenças entre duas abordagens da Aprendizagem: a Tradicional e a Integra209 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento dora. Viu-se como essencial proporcionar às agentes um momento de reflexão e conhecimento sobre as diferenças entre a Tradicional e a Integradora, bem como, a relevância de se ter clareza dos conceitos de cada abordagem e seguir conscientemente uma teoria escolhida. Pois, segundo Almeida (2002), ao oportunizar-se uma formação de qualidade aos profissionais de Educação Infantil, estaremos subsidiando-lhes na construção de suas práticas, proporcionando-lhes consciência das opções teórico-práticas que fazem e, assim, podendo oportunizar que se libertem das amarras impostas pelas inseguranças originárias do desconhecimento de seu objeto de trabalho – a infância. No segundo encontro foram trabalhados os objetivos da Educação Infantil: o cuidar e educar. O cuidado e a educação são indissociáveis, pois a instituição deve promover práticas de educação e cuidados, que possibilitem a integração entre os aspectos físicos, emocionais, afetivos, cognitivos/lingüísticos e sociais da criança, entendendo que ela é um ser completo e indivisível. Já no terceiro encontro o tema proposto para discussão foi o desenvolvimento infantil. Darezzo (2004) afirma que algumas informações sobre o desenvolvimento infantil, as fases que caracterizam seu desenvolvimento em termos de habilidades, limites e descobertas, ajudam muito o adulto nas decisões frente a problemas que surgem no dia a dia. Portanto, pode-se dizer que o conhecimento sobre o desenvolvimento infantil permite realizar aconselhamento de pais e formação de programas educacionais mais eficazes. Por último, no quarto encontro, foram levados para o debate três conceitos da educação infantil: o brincar, a brincadeira e o brinquedo. Sylva e Lunt 210 (1994) postulam que a brincadeira parece ser importante para diversos aspectos do desenvolvimento, e essas vivências lúdicas são necessárias para que a criança se desenvolva normalmente. Como as agentes estão constantemente em contato com as crianças, principalmente nos momentos das brincadeiras, é imprescindível que elas compreendam a importância do momento lúdico para o desenvolvimento da criança e, com isso, possam proporcionar-lhes um ambiente agradável e criativo. Na atividade com as professoras foram realizados encontros grupais e individuais. O encontro grupal foi realizado mensalmente no turno vespertino, com grupo fixo, na sala dos professores. Para a realização do primeiro encontro foi abordado as diferenças entre duas abordagens em Aprendizagem: a Tradicional e a Integradora. Já para os demais encontros os temas foram definidos tendo-se como base os encontros individuais com as professoras. Os encontros individuais foram realizados semanalmente, tanto no período da manhã como no da tarde, com duração de aproximadamente uma hora, sendo que os horários dos encontros foram combinados com as próprias professoras. Tanto com os encontros individuais e grupais pode-se perceber a abertura das professoras para novos conhecimentos e discussão das dificuldades enfrentadas em sala de aula, foi discutido sobre a construção de propostas pedagógicas e curriculares, que espelhe as conquistas e saberes já existentes nestas práticas, e também sejam capaz de vislumbrar encaminhamentos futuros. O trabalho do professor de educação infantil exige a mobilização de muitos conhecimentos para cuidar e educar as crianças, interagir com as famílias e lidar com as exigências VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento institucionais. Diante disso, Nóvoa (1995) aponta que um modelo construtivo de formação continuada para professores parte da reflexão interativa e contextualizada, articulando teoria e prática. E neste processo formativo, centrado na profissão e na vida da escola, que se entende, deva residir o foco de origem e de retorno da formação continuada fundamentada nos princípios da reflexão crítica compartilhada. Formação esta que, longe de constituir uma formulação acabada, se apresenta como uma categoria da formação docente. Após a realização das atividades percebeu-se que as professoras e agentes refletiram sobre suas práticas profissionais e, com isso, modificaram algumas de suas formas de atuações. Como no caso, as funcionárias relatam terem dificuldades na disponibilidade (falta) de tempo para a realização das atividades programadas para o dia, após a intervenção passaram a se reorganizarem e desenvolver as atividades. Palavras-chave: Educação Infantil, Formação Continuada, Professores LT04-1269 - A PERCEPÇÃO DE AUTOEFICÁCIA EM ALUNOS COM DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM Fernanda Elis Matte - FACCAT Paula Grazziotin Silveira Rava - FACCAT [email protected] A percepção que o indivíduo tem sobre a sua capacidade para desempenhar determinada tarefa é conceituada como autoeficácia. Estas percepções acompanham o sujeito, podendo ter influências positivas ou negativas sobre o seu desempenho real. Pode-se afirmar que a autoeficácia compreende um julgamento pessoal de capacidade relativa a um domínio específico e não necessariamente representando a real capacidade de um indivíduo, mas o que o mesmo acredita ser capaz de realizar, em uma variedade de circunstâncias (Souza; Brito, 2008). A autoeficácia é conceituada entre dois componentes: a expectativa de eficácia e a expectativa de resultado. A expectativa de eficácia corresponde, então, à crença individual de capacidade ou a falta dela para a realização de uma tarefa específica. Já a expectativa de resultado é a crença de que determinado comportamento leva a um resultado (Hall; Lindzey; Campbell, 2000). Alguns fatores exercem um papel na origem e no desenvolvimento destas crenças: experiências, realizações e desempenhos anteriores, experiência vicariante, persuasão social e estados fisiológicos e afetivos (Souza; Brito, 2008). As crenças de autoeficácia podem influenciar como as pessoas sentem, pensam, se motivam e se comportam. Tais consequências são provocadas através de quatro processos principais: processos cognitivos, relacionados à antecipação do resultado dos próprios comportamentos, processos motivacionais, afetando variáveis como esforço e tempo que uma pessoa emprega em uma determinada atividade, processos afetivos, relacionados às reações emocionais dos indivíduos, quando experimentam atividades que julgam difíceis e os processos de seleção, já que as pessoas escolhem realizar as atividades que pensam ter um desempenho eficiente (Souza; Brito, 2008). As dificuldades de aprendizagem correspondem a uma falta de habilidade específica, como na leitura, na escrita ou na matemática, em crianças que apresentam um rendi211 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento mento bem abaixo do esperado para seu nível de desenvolvimento, escolaridade e capacidade intelectual. O transtorno de aprendizagem pode ser suspeitado em um aluno que apresente uma inteligência normal, habilidades motoras e sensoriais de acordo com o esperado, bom ajuste emocional e um nível socioeconômico e cultural mínimo (Rotta; Ohweiler; Riesgo, 2006). As dificuldades de aprendizagem são de difícil solução já que são de causa multifatorial. Dell’Agli, Caetano e Castanho (2009) sugerem que a chave para estudarmos uma solução estaria em unir os aspectos cognitivos aos afetivos, pois, segundo elas, não podem ser avaliados separadamente. A afetividade pode acelerar ou retardar a aprendizagem, pois é considerada o combustível, a motivação para aprender, sendo a inteligência, a estrutura, a organização. Portanto, para aprender o sujeito necessita de uma estrutura de inteligência, mas ainda de um motor que a impulsione, sendo esta a afetividade (Dell’agli; Caetano; Castanho, 2009). Outros estudos também têm apontado a relação entre afetividade e inteligência. Alunos que apresentam um alto senso de autoeficácia são capazes de realizar atividades utilizando mais estratégias cognitivas e metacognitivas, persistindo por mais tempo do que os alunos com baixa percepção de autoeficácia (Medeiros et al. 2003). Já os alunos que apresentam um rendimento escolar fraco e atribuem isso à incompetência pessoal distanciam-se das atividades intelectuais, demonstrando problemas emocionais e comportamentos internalizados (Roeser; Eccles, 2000 apud stevanato et al. 2003). Quando os estudantes pensam serem capazes de realizar a tarefa, vivenciam o momento como prazeroso e interessante, 212 ao passo que, em situações aversivas, em que consideram não ter capacidade para desenvolver as atividades, não apresentam gosto, nem real interesse, apenas realizam-nas, pois lhe é solicitado (Dell’agli; Caetano; Castanho, 2009). Quando um estudante experimenta situações de dificuldades de aprendizagem, o sentimento é de fracasso, pois, por não obter êxito nas atividades escolares, sente-se incapaz, gerando sentimentos de frustração e comportamentos disfuncionais, entre outros (Carneiro; Martinelli; Sisto, 2003). A criança que apresenta dificuldades de aprendizagem, então, encontra-se diante de um problema de circularidade causal, quando sua baixa crença de autoeficácia a deixa menos motivada e atenta às atividades acadêmicas, gerando de fato um mau desempenho e, assim, confirmando sua ideia de que não é capaz. Há uma forte relação entre o desenvolvimento intelectual e as crenças autorreferenciadas. Apenas ter habilidades cognitivas, portanto não explica um sucesso ou fracasso escolar. Assim, profissionais da educação precisam buscar desenvolver, além dos conteúdos de cada disciplina, autopercepções de capacidade positivas (Souza; Brito, 2008). Este estudo buscou avaliar a percepção de autoeficácia de alunos com dificuldades de aprendizagem e de alunos sem dificuldades de aprendizagem. Para tanto, utilizou-se o Roteiro para a avaliação da autoeficácia (Medeiros; Loureiro,1999 apud Medeiros et al., 2000) em 38 alunos, sendo 19 alunos com dificuldades de aprendizagem e 19 alunos sem dificuldades de aprendizagem. Objetivou-se investigar se há relação entre a percepção de autoeficácia e dificuldades de aprendizagem, através da comparação entre os dois grupos de alunos. Encontrou-se VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento diferença significativa entre os dois grupos, sendo que os alunos com dificuldades de aprendizagem apresentaram uma percepção de autoeficácia mais baixa que os alunos sem dificuldades de aprendizagem. Diante dos resultados apresentados, percebe-se que, alunos que experimentam situações de dificuldades de aprendizagem, sentem-se muitas vezes fracassados. Carneiro, Martinelli e Sisto (2003) afirmam que, por não obterem êxito nas atividades escolares, alunos com dificuldades de aprendizagem sentem-se incapazes, gerando sentimentos de frustração e comportamentos disfuncionais, entre outros. Portanto, como sugerem as mesmas autoras, estes alunos apresentam um problema de circularidade causal, em que a baixa percepção de autoeficácia os deixa menos motivados, gerando um real mau desempenho e, então, confirmando sua ideia de incapacidade no âmbito escolar. Dentre a amostra analisada, o teste de Mann Whitney apontou não existir diferença significativa entre a variável sexo e a percepção de autoeficácia (P=0,928), refutando a hipótese de que os alunos do sexo masculino apresentam uma percepção de autoeficácia mais baixa. Entretanto, o grupo de alunos com dificuldades de aprendizagem foi constituído, em sua maioria, pelo sexo masculino (79%), demonstrando que a maioria dos estudantes, com dificuldades de aprendizagem, nesta escola e nos anos pesquisados, é do sexo masculino. Palavras-chave: autoeficácia, dificuldades de aprendizagem, crianças. Contato: Paula Rava, FACCAT, [email protected] LT04-1280 - A INFÂNCIA CONTEMPORÂNEA NA PERSPECTIVA DOS PROFESSORES Dayane Aparecida do Nascimento - UFMT [email protected] Raquel Gonçalves Salgado - UFMT [email protected] Financiamento: FAPEMAT e CNPq As discussões sobre a temática da infância constituem um campo inesgotável de informações e descobertas. Por isso, ao nos depararmos com cenas em que as crianças aparecem como protagonistas de experiências que atestam saberes e competências nas suas relações íntimas com as tecnologias e a cultura do mundo contemporâneo, é inevitável que se produza um estado de perplexidade e dúvida com relação aos nossos saberes sobre a infância. Diante desse fato, surge a necessidade de considerar o tema da infância contemporânea como um campo para a configuração de outros mapeamentos e imagens, dada a diversidade de experiências, valores e conhecimentos que as crianças têm construído. Por outro lado, há de se considerar os adultos, principalmente aqueles que assumem a tarefa de educar, na alteridade que seus saberes, experiências, valores e concepções revelam ao se depararem e se relacionarem com a infância vivida pelas crianças hoje. Diante dessa dupla tarefa, a pesquisa em questão busca compreender a infância contemporânea no diálogo entre gerações. No sentido de problematizar a idéia da criança como ser inacabado, em estado transitório para a vida adulta, situamos o escopo teórico desta pesquisa no campo da Sociologia da Infância, que se propõe a interrogar a sociedade a partir de uma perspectiva que 213 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento considera as crianças como eixo da investigação sociológica, com vistas não apenas à produção de conhecimento sobre a infância, mas sobretudo à compreensão da sociedade em seu conjunto (Sarmento, 2005). Nesta pesquisa, constituem-se como parâmetros de análise tanto os discursos dos adultos (professores) sobre a infância vivida pelas crianças hoje (seus alunos) quanto os discursos das próprias crianças sobre as experiências que revelam e assumem como legítimas de suas infâncias. Trata-se, portanto, de analisar as tensões entre os modos como os adultos atribuem sentidos à infância vivida pelas crianças nos dias atuais e os modos como elas próprias definem as experiências que marcam seu tempo de vida. Nesse diálogo de temporalidades e valores, destacam-se os discursos que historicamente atravessam o conceito de infância e se materializam em valores para os adultos e aqueles que se apresentam como referências simbólicas às crianças para a constituição de experiências próprias de seu tempo de vida. Este estudo, em particular, como um dos subprojetos da pesquisa abordada, enfatiza as experiências da infância contemporânea sob a ótica dos professores. Seus objetivos consistem em analisar os sentidos que os professores atribuem às suas experiências de infância e àquelas vividas pelas crianças hoje e compreender, nas interlocuções entre professores e crianças, os contrapontos em relação aos sentidos que atribuem à infância. Além disso, busca-se delimitar como eixo teórico-metodológico a alteridade presente nessa produção discursiva, uma vez que a criança se apresenta como o outro situado no passado do adulto (Bakhtin, 1992). Trata-se de uma pesquisa-intervenção, em que as relações estabelecidas entre os su214 jeitos que dela participam e o pesquisador se definem ao mesmo tempo como objeto de investigação, à medida que se tem como foco a produção discursiva que se processa nesse contexto, e como postura metodológica, haja vista a intervenção que se efetiva na deflagração dessa produção discursiva. Nessa dupla dimensão da pesquisa, os sujeitos que dela participam não são apenas informantes de dados a serem traduzidos pelo texto analítico do pesquisador, posto que constroem conhecimentos e refletem sobre suas próprias concepções, valores e práticas. Para que as relações entre as crianças e os professores não sejam capturadas pelas amarras institucionais da escola, o locus da pesquisa é o Laboratório Especial de Ludicidade (Brinquedoteca) do Campus de Rondonópolis da Universidade Federal de Mato Grosso. Trata-se de um Laboratório que funciona, desde 2008, como um programa de extensão e tem oferecido atendimento a instituições de Educação Infantil da rede pública municipal de Rondonópolis, situadas nas imediações do Campus. Como as turmas de crianças que frequentam a Brinquedoteca estão sempre acompanhadas por seus professores, é válido afirmar que esse espaço oferece condições favoráveis para que ambos os sujeitos possam compartilhar suas experiências, tendo como mediação o brincar. Atualmente, a Brinquedoteca tem atendido três instituições com o perfil acima descrito. Os sujeitos participantes desta pesquisa são: as crianças, de 5 a 6 anos, de três turmas do 2º agrupamento da Educação Infantil, sendo duas de uma escola e uma de outra; e os professores responsáveis por essas turmas. Como estratégia metodológica, temos a realização de grupos de discussão com as crianças e os professores, or- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento ganizados sob a forma de oficinas, como forma de suscitar debates sobre questões relacionadas à infância contemporânea. Entendemos que, desse modo, seja possível que todos, à sua maneira, inclusive o pesquisador, participem do processo de construção de sentidos (Castro, 2008). Outro importante recurso metodológico é a realização de entrevistas semiestruturadas com as professoras sobre as suas experiências de infância e os modos como significam as experiências de infância vividas pelas crianças com quem atuam. Salientamos, nessas entrevistas, o entrecruzamento dos valores relativos à infância, constituídos a partir das experiências que marcaram a infância das professoras, com os sentidos que estas atribuem à infância vivida pelas crianças hoje – como se apresentam, seus saberes, suas práticas e suas relações com os adultos. Nesse diálogo de temporalidades e gerações, temos observado, nos discursos das professoras, um estado de perplexidade, com tom saudosista, diante da quebra de uma imagem tradicional da infância – subordinada ao adulto e inocente – devido à constatação de experiências e saberes manifestos pelas crianças hoje muito mais avançadas e complexas do que os de outras gerações e, por isso, considerados como fora de seu tempo. Palavras-chave: infância contemporânea, relações intergeracionais, professores. Contato: Dayane Aparecida do Nascimento, UFMT/Rondonópolis, [email protected] LT04-1340 - O QUE PENSAM OS AGENTE AUXILIAR SOBRE SUAS CRECHES Ana Carolina Monnerat Fioravanti - PUC/Rio [email protected] Amanda Cristina de Freitas Souza - NEIPE/ UERJ [email protected] Daniele Vieira de Azevedo - NEIPE/UERJ [email protected] Vera Maria Ramos de Vasconcellos - PROPED - NEIPE/UERJ [email protected] Este trabalho apresenta alguns dados referentes aos questionários de “Avaliação das Creches” preenchidos pelos Agente Auxiliar, que atuam em cinco creches municipais do Rio de Janeiro e que fazem parte da pesquisa Agente Auxiliar de Creche: Educadores da Infância Carioca. Em 2007 houve um concurso público para esta função (Edital nº1 de 04/08/2007), que desconsiderou as premissas da LDB 9394/96 e não exigiu nem mesmo o ensino médio na modalidade normal para trabalhar na educação infantil. Apesar de protestos contra a efetivação do mesmo, a partir de junho de 2008, foram oferecidas 1.519 vagas regulares, e 81 para pessoas com deficiência e, a partir de então, o quadro de pessoal das creches públicas passou a contar com novos profissionais, marcando uma nova trajetória na história dessas instituições. Frente à nova realidade, sentimos necessidade de investigar quem eram estes profissionais e o que intencionavam ao fazer um concurso público. Assim surgiu através do Núcleo de Estudos da Infância: Pesquisa & Extensão (NEI:P&E) e na Linha de Pesquisa Infância, Juventude e Educação do Programa de Pós-Graduação em Educação, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (ProPEd/UERJ) a pesquisa que tem por ob215 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento jetivo acompanhar e analisar, junto com os educadores a trajetória de formação em serviço dos mesmos e suas concepções sobre criança, infância, educação e creche. Realizamos a partir de 2009, um trabalho conjunto com os educadores das cinco creches e a Universidade. Dentre outras ações propostas, desenvolvemos encontros coletivos de formação continuada para os novos profissionais em setembro, outubro, novembro de 2009 e outubro 2010. Neste trabalho apresentaremos parte dos resultados desses encontros e de práticas reflexivas realizadas em cada creche. O objetivo desta apresentação é aumentar o foco, via um olhar mais sistemático às respostas das práticas das educadores das 5 creche situadas na 1ª e na 3ª CRE do Rio de Janeiro. A observação do dia-a-dia e as respostas das crianças no cotidiano da instituição são trazidas pelas co-pesquisadoras para o lócus universitário, através de sessões reflexivas que acontecem de 15 em 15 dias no (NEI:P&E – UERJ). O outro olhar foi a resposta que os demais educadores deram através do questionário, após dois anos da pesquisa (2009 – 2010), que incluiu os Centros de Estudos Coletivos, realizados na UERJ. Foram 74 (setenta e quatro) educadores em 123 que devolveram o questionário respondido. São eles agentes auxiliares de creche, recreadoras e professoras articuladoras, divididas em 22 (vinte e duas) na primeira creche; 12 (doze) na segunda, 24 (vinte e quatro) na terceira, 12 (doze) na quarta e na quinta creche 9 (nove) educadores (dos 34 atuantes). O questionário foi composto com perguntas abertas e objetivas, para avaliar tanto questões da prática como questões relacionadas a estrutura básica de funcionamento das unidades. São sete eixos principais: Planejamento institucional (regimen216 to interno, projeto político pedagógico e centros de Estudos), divisão multiplicidade de experiências e linguagens (desenvolvimento infantil, respeito a valores familiares, etc), dimensão e interações, saúde e prevenção de agravos, materiais e mobiliários, formação e condições de trabalho e cooperação e troca com as famílias. Uma ANOVA nas questões objetivas em relação ao escore total do questionário demonstrou que houve diferença significativa entre as cinco creches F( 72 ) = 11,224; p < 0,004. Tal diferença foi marcada principalmente pelas creches 3 e 4 por apresentarem menor média na avaliação total do inventário. Esse padrão de comportamento se repetiu em muitas outras dimensões avaliadas dentro do próprio questionário. Dentro do eixo Planejamento Institucional, foram analisadas as diferenças entre as creches em 4 subescores. Através da ANOVA no subescore Regimento Interno (RI)-4 itens, encontramos diferença entre as creches F(72,1)= 8,414477; p<001 atribuída as médias muito baixas das creches 1 e 2. No subescore Proposta Pedagógica Consolidada (PP)- 21 itens, não foi encontrada diferença significativa entre as creches F(72)= 2,579672; p= 0,044939. No subescore Planejamento, Acompanhamento e Avaliação (PAA)- 4 itens, encontramos diferença entre as medias F(72)=10,03138; p< 0,001, devido as baixas médias das creches 4 e 5 e no subescore Registro da Pratica Educativa (RP)- 3 itens encontramos diferenças entre as medias F(72)= 35,69113, p<0,001, devido a creche 1. Dentro do eixo - Dimensão Multiplicidade de Experiências e Linguagem foram analisadas diferenças entre 3 subescores. No subescore Crianças construindo sua autonomia e tendo experiências saudáveis com o próprio corpo (AE)- 3 itens a ANOVA demonstrou diferen- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento ça significativa F(72)= 11,61414; p<0,001 atribuída as baixas médias das creches 3 e 4, do mesmo modo, no subescore Crianças relacionando-se com ambiente natural e social (ANS)- 5 itens encontramos diferença significativa F (72)=8,833919; p<0,001, também em função das creches 3 e 4. Já no subescore Crianças expressando-se por meio de diferentes linguagens plásticas, simbólicas, musicais, teatrais, e corporais e tendo experiências agradáveis variadas e estimulantes com a linguagem oral e escrita (LOE)- 5 itens não foram apresentadas diferenças entre as 5 creches analisadas F(72)= 1,449122; p= 0,227418. Dentro do eixo - Dimensão Interações, foram analisadas diferenças entre 2 subescores: Respeito a dignidade, às diferenças, das crianças e estímulo a cooperação mútua (RD)- 3 itens onde a ANOVA encontrou diferença entre as medias das creches F(72)= 3,283955; p<0,05 em função da media muito baixa da creche 3 e Respeito a idéias conquistas e produções das crianças (RCP)2 itens onde em função das baixas medias das creches 3 e 4, também foi encontrada diferença entre as médias F(72)=3,283955; p<0,05. Dentro do eixo - Dimensão Promoção de saúde e prevenção de agravos, o subescore Constituição de hábitos alimentares (HA)- 3 itens a ANOVA apresentou diferença entre as médias das creches F(72)=5,471698; p<0,005 em função de baixas médias das creches 3 e 4 ao passo que o subescore Avaliação de riscos, segurança e medidas de prevenção de acidentes (RSP) - 6 itens, não apresentou diferença entre as 5 creches estudadas F(72)= 2,09616 ; P=0,090814. Dentro do eixo - Dimensão Espaços materiais e mobiliários a ANOVA demonstrou diferença significativa no subescore Espaços, mobiliários e materiais que favorecem as experiências das crianças (EM)- 3 itens F(72) = 9,36783; P<0,005 em função das baixas médias dos itens 3 e 5 e no subescore Espaços, mobiliários e materiais para responder aos interesses dos adultos (EMA) - 4 itens F(72) = 7,831102; P<0,005, em função das baixas médias dos itens 2, 3 e 5. Dentro do eixo Dimensão formação e condições de trabalho das professoras, professores e demais profissionais a ANOVA não demonstrou diferença significativa no subescore Formação inicial (FIP) – 3 itens, F(72) = 2,091485, p= 0,09143, mas por outro lado, em função da baixa média da creche 4, houve uma diferença significativa entre as creches no subescore Formação continuada e condições de trabalho adequada (FC) – 4 itens, F(72)=9,492752; P<0,005. Dentro do eixo Escore na Dimensão cooperação e troca com as famílias e participação na rede de proteção social, a ANOVA demonstrou diferença entre os grupos em função das menores medias das creches 3 e 4 no subescore Respeito e Acolhimento (RA) – 4 itens F(72)=7,760763; P<0,005. Assim como também foi encontrada diferença no subescore Garantia do direito das famílias de acompanhar as vivencias e as questões ligadas as crianças (DF) – 5 itens F(72) = 4,479957, p<0,005 atribuído a maior média da creche 1. No subescore Participação da instituição na rede de proteção aos direitos da criança (DC) – 10 itens a diferença entre os grupos foi atribuída as menores medias das creches 4 e 5, F(72) = 7,092314; p<0,005. Uma ANOVA nas Diferenças entre os escores totais do questionário em relação as funções (Recreador e Auxiliar) não demonstrou diferença significativa F(70) = 1,865164 p = 0,176465 Estes dois olhares (respostas das co-pesquisadoras e avaliação quantitativa do questionário) nos demonstraram que houve uma dualidade de 217 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento respostas, entre as observações das co-pequisadoras, que levantam a questão da discrepância entre a proposta da formação continuada e o que acontece no dia-a-dia das creches e as respostas dadas aos questionários pelas educadoras. Apesar das respostas dos questionários e as observações das co-pesquisadoras não corresponderem, compreendemos que quando elas nos informam questões distintas das que ocorrem no cotidiano, estão demonstrando conhecimento de como deveria ocorrer. Externando pelo menos a intenção de realizar melhor no futuro. Palavras-chave: avaliação, creche, educadores e formação continuada. LT04-1348 - A INFÂNCIA NA PERSPECTIVA DAS CRIANÇAS Rayssa Karla Dourado Porto - UFMT [email protected] Rayany Mayara Dal Prá - UFMT [email protected] Raquel Gonçalves Salgado - UFMT [email protected] Financiamento: FAPEMAT As experiências, os saberes e as competências que as crianças hoje revelam em suas interações cotidianas com os meios de comunicação, cada vez mais integrados às novas tecnologias, têm feito com que os nossos saberes sobre a infância, na maioria das vezes assentados como “verdades”, sejam postos em xeque. Este trabalho consiste em um subprojeto de uma pesquisa que busca compreender a infância contemporânea a partir do diálogo entre os sentidos que crianças e adultos produzem sobre esse fenômeno, ou seja, como esses sujeitos, nas suas singularidades e situados 218 em tempos distintos, definem e significam o que caracteriza a infância nos dias de hoje. Ao recusar-se a conceber a infância como tempo de vida em transição para a vida adulta, esta pesquisa tem como fundamentação teórica os estudos realizados no campo da Sociologia da Infância, que busca compreender os fenômenos sociais e culturais a partir da infância, admitindo que a criança não apenas se apropria de uma cultura que já encontra constituída, mas nesta também opera transformações ao interpretá-la e a partir dela produzir práticas sociais (Sarmento, 2008). Nessa perspectiva teórica, dois enfoques assumem relevância: por um lado, as crianças são vistas como atores sociais em seus mundos de vida e, por outro, a infância se define como uma categoria geracional socialmente constituída. Regida por esses vieses teóricos, esta pesquisa busca compreender a infância na contemporaneidade numa perspectiva intergeracional, entendendo que os adultos em questão são os professores, sujeitos que assumem a tarefa de educar as crianças, também participantes da pesquisa. Este subprojeto, em particular, tem como foco as experiências que as crianças constroem a partir dos diversos aparatos culturais que circulam na cultura contemporânea, bem como os sentidos e os valores que atribuem a essas experiências. Busca-se, portanto, compreender como as crianças definem e significam o que, para elas, é próprio da infância tal como se apresenta hoje. Este estudo pretende problematizar as verdades e as autoimagens, como destaca Arroyo (2008), do pensamento pedagógico ao se deparar com as experiências concretas da infância, marcadas pela época e pela cultura em que são produzidas. Tem se tornado cada vez mais insustentável a manutenção de VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento imagens e discursos sobre a infância, sobretudo aqueles que, produzidos no campo da psicologia do desenvolvimento, vão ganhar corpo no pensamento e na prática pedagógica, sem a confrontação com os modos como as crianças concretas vivem e significam suas próprias experiências. A pesquisa, em sua abordagem metodológica, define-se como uma pesquisa-intervenção, na qual as relações estabelecidas com as crianças são, ao mesmo tempo, foco de análise e uma postura diante da realidade investigada, posto que são instauradas situações desencadeadoras dos discursos em torno do objeto em questão – a infância. Desse modo, as crianças não são apenas informantes de dados, mas se apresentam como sujeitos que constroem conhecimentos e refletem sobre suas próprias concepções, valores e experiências no processo de pesquisa. O locus da pesquisa é o Laboratório Especial de Ludicidade (Brinquedoteca) do Campus de Rondonópolis da Universidade Federal de Mato Grosso, que tem oferecido, desde 2008, na condição de programa de extensão, atendimento a instituições de Educação Infantil da rede pública municipal de Rondonópolis, Mato Grosso, situadas nas imediações do Campus. Atualmente, participam da Brinquedoteca três escolas municipais de Educação Infantil, que atendem crianças na faixa etária de 4 a 6 anos. Entretanto, da pesquisa participam apenas três turmas de 2º agrupamento, com crianças de 5 a 6 anos, sendo duas de uma escola e uma de outra. Consistem em estratégias metodológicas a observação participante das brincadeiras e das interações das crianças no contexto da Brinquedoteca e a realização de oficinas, como espaços de discussão sobre questões como: o que significa ser criança; o que é ou não próprio da infância; o que uma criança pode ou não saber/fazer. Busca-se, com esta pesquisa, desconstruir, tanto teoricamente quanto metodologicamente, a idéia de uma infância apartada da vida, das experiências e das culturas produzidas pelas crianças, no sentido de redimensioná-la como um tempo da vida humana cujo valor e significado não se efetivam prospectivamente, mas se configuram no próprio exercício de vivê-lo. Assim, objetiva-se identificar nos discursos das crianças as experiências que elas próprias assumem como legítimas de seu tempo de vida. Nas oficinas desenvolvidas, até então, observou-se que as crianças, diante de figuras de objetos e imagens, que, em grande parte, poderiam ser consideradas como próprias do universo adulto, as definem, na maioria das vezes, como pertencentes tanto à infância quanto à vida adulta, quando instigadas a situá-las como “coisas” de crianças, de adultos ou dos dois. Estamos diante de um estreitamento das fronteiras entre esses mundos. Cada vez mais, torna-se evidente a participação das crianças em situações sociais antes não acessíveis a elas, construindo experiências e conhecimentos não previsíveis em décadas passadas. Diante disto, perguntamo-nos: que implicações éticas e educativas esse novo mapeamento da infância em sua relação com a vida adulta nos traz? Como estabelecer, no campo da educação, um diálogo entre as gerações marcado pelo reconhecimento do outro, ao mesmo tempo, como singular e legítimo? Estas são questões que mobilizam a pesquisa que aqui se apresenta. Palavras-chave: infância, contemporaneidade, relações intergeracionais Contato: Rayssa Karla Dourado Porto, UFMT/ Rondonópolis, [email protected] 219 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento LT04-1445 - CONCEPÇÕES DE PROFESSORES SOBRE EDUCAÇÃO INCLUSIVA: UM EXERCÍCIO DE INVESTIGAÇÃO Pedro Mar Rebello - UnB Luísa Pereira Nishioka - UnB Carolina Braga Cunha - UnB Bruna Pedrosa Mundim - UnB Lúcia Helena Cavasin Zabotto Pulino - UnB [email protected] O que é uma criança? O que é uma criança com problema de desenvolvimento? Em que aspectos estas crianças se diferem? Será que deve haver um tratamento diferencial para crianças portadoras de necessidades especiais? Tais questionamentos foram motivadores para este exercício de investigação, que tem como objetivo conhecer a concepção dos professores sobre as escolas inclusivas, e é de extrema importância para isso o pensar sobre o conceito de crianças com problemas de desenvolvimento, já que é a partir desta concepção que os professores vão trabalhar com tais crianças. Para que os professores das escolas inclusivas possam trabalhar de forma igualitária com os alunos, é preciso que eles conheçam o processo de desenvolvimento de uma criança. Segundo Vygostsky (1984), o desenvolvimento deve ser pensado em dois níveis: o nível de desenvolvimento real e o nível de desenvolvimento potencial. No real, considera-se o que uma pessoa já tenha alcançado e no potencial, aquilo que se espera que ela alcance. A zona de desenvolvimento proximal neste contexto, sustenta o teórico, “é a distância entre o nível de desenvolvimento real, que se costuma determinar através da solução independente de problemas, e o nível de desenvolvimento potencial, determinado através da solução de problemas sob 220 orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes”. De acordo com esse conceito, o autor defende que o processo de ensino-aprendizagem na escola deve ser construído na zona de desenvolvimento proximal, tomando como ponto de partida o nível de desenvolvimento real da criança - num dado momento e com relação a um determinado conteúdo a ser desenvolvido - e como ponto de chegada o nível de desenvolvimento potencial, que são os objetivos estabelecidos pela escola, supostamente adequados à faixa etária e ao nível de conhecimentos e habilidades de cada grupo de crianças. Desta forma, uma criança com problemas de desenvolvimento é vista como uma criança cujo processo de desenvolvimento pode ser marcado por uma especificidade, o que não impede os processos mediacionais que promovem a sua educação, da mesma forma como ocorre com todas as outras crianças. Vygotsky (1993) enfatiza que uma condição de deficiência não impossibilita o desenvolvimento da criança, e que a noção de que um portador de deficiência se torna um cidadão incapaz é uma construção social e que a própria criança pode se apropriar dessa ideia. Esta pesquisa foi realizada como trabalho final da disciplina Psicologia da Infância, ministrada para alunos do segundo semestre do curso de psicologia na Universidade de Brasília. Utilizou-se metodologia qualitativa. Participaram deste estudo duas professoras de diferentes escolas inclusivas, sendo que a entrevistada 1 lecionava em uma escola associativa de educação infantil localizada em um bairro nobre de Brasília (DF) e a entrevistada 2 lecionava em uma escola pública de ensino fundamental localizada no município de Duque de Caxias (RJ). As professoras foram escolhidas por terem dado aula para crian- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento ças com problemas de desenvolvimento em contextos diferentes. Na entrevista, foi utilizado um roteiro de questões orientadas para uma entrevista semiestruturada contendo oito perguntas que focalizavam as seguintes dimensões: concepção do que é ser professor, ser criança, ser uma criança com problema de desenvolvimento, ser professor de uma criança com problemas de desenvolvimento e concepção sobre escolas inclusivas. Por meio das entrevistas pode-se constatar que as professoras partilhavam concepções semelhantes. Ambas apresentaram a visão de criança como um novo ser que chega ao mundo já construído, como indivíduos que possuem sua singularidade, individualidade e especificidades, de forma que as crianças com problemas de desenvolvimento devem ser consideradas crianças como outras quaisquer. Elas ressaltaram que o desenvolvimento não é linear e que cada criança tem seu ritmo e seu caminho, de forma que o professor possui a função de trabalhar cada uma em sua individualidade. Segundo elas, o professor tem uma função mais ampla do que a de passar conhecimentos; enfatizam a importância de se ter uma relação de afetividade com os alunos e de respeitar as diferenças que se apresentam. Elas concordam também na importância da integração de todos na sociedade e no papel fundamental que escolas inclusivas desempenham nesse âmbito, mas que, em sua maioria, as escolas não são inclusivas, pois não possuem condições para lidar com a diversidade. As entrevistadas tiveram visões diferentes no que diz respeito à necessidade de um preparo especializado para professores que lidam com crianças portadoras de necessidades especiais: a professora 1 acredita que o preparo deve vir naturalmente da convivência com as di- ferenças e demonstrou preocupação com a possibilidade de um preparo formal limitar a visão dos profissionais às teorias aprendidas, cegando-os para as crianças reais com quem estariam trabalhando, enquanto a professora 2 afirmou que um preparo formal é essencial para um trabalho adequado com tais crianças. Além disso, a primeira entrevistada enfatiza que as diferenças de cada criança devem ser trabalhadas em toda a turma de forma a evitar qualquer segregação. A segunda entrevistada acrescenta que todos possuem problemas de desenvolvimento, na medida em que todos possuem desenvolvimentos distintos em diferentes áreas e que ninguém nunca fica pronto, acrescentando também que a relação dos alunos com os professores é dialética e que os professores estão constantemente aprendendo com seus alunos justificando uma relação menos hierarquizada nas salas de aula. Conclui-se que a questão da inclusão é mais complexa do que meramente o cumprimento de uma lei; é uma questão de transformação do pensamento das pessoas, pois inclusão não é apenas a inserção da criança nas escolas regulares, mas proporcionar a sua inclusão dentro do contexto escolar. É necessário que o professor perceba a singularidade de cada criança a fim de adaptar as atividades escolares para que esta possa participar juntamente com as outras crianças. Dessa forma, ela poderá desenvolver suas habilidades de acordo com o seu ritmo de desenvolvimento, além de poder estabelecer contato com um novo ambiente, diferente do que ela está acostumada. Palavras-chave: educação inclusiva; professor; desenvolvimento Contato: Pedro Mar Rebello, UnB, pedrom. [email protected] 221 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento LT04-1469 - TDAH: UMA ANÁLISE DA ESPECIFICIDADE DO TRABALHO PEDAGÓGICO Evanilda da Silva Correia - FACITEC [email protected] Helen Tatiana dos Santos Lima - FACITEC/SEEDF [email protected] Sabe-se que o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) interfere diretamente na vida social e no desempenho acadêmico dos sujeitos nesta condição. Atualmente, a Associação Brasileira de Déficit de Atenção (ABDA), chegou a conclusão que o quadro é um transtorno neurobiológico cerebral, que acompanha vários indivíduos desde a infância até a idade adulta, e que cerca de 3 a 5 % das crianças em idade escolar sofrem desse mal (Silva, 2003). Os sintomas do quadro podem variar a depender do tipo de transtorno apresentado pelo sujeito que, conforme o DSM IV (Silva, 2003), pode ser predominante desatento, predominante hiperativo ou combinado. Em ambos os casos, tais sintomas podem comprometer a vida social e escolar do sujeito. Assim, o TDAH predominante desatento, de acordo com Silva (2003), é aquele que apresenta falta de atenção; está passivo de erros por pequenos descuidos, tanto nas tarefas escolares como em outras; tem dificuldade para concluir tarefas; evita atividades que exigem esforços mentais e frequentemente perde objetos pessoais. Rotta et al. (2006) acredita que os alunos desatentos são os mais prejudicados com relação ao aprendizado, uma vez que esse transtorno é o que mais influi negativamente na dimensão cognitiva. O TDAH do tipo hiperativo, segundo Silva (2003), é aquele que, com frequência, mexe ou sacode pés e mãos, se remexe nos acentos, se levanta da carteira, 222 é facilmente distraído por estímulos externos, tem dificuldades de esperar sua vez em brincadeiras ou em situações de grupos, dispara respostas para perguntas que ainda não foram completadas, tem dificuldades em seguir instruções e ordens e tem dificuldades em manter a atenção em tarefas ou mesmo atividades lúdicas. Frequentemente, muda de uma atividade inacabada para outra, não conseguindo brincar em silêncio ou tranquilamente e; na maioria das vezes, fala em excesso. Já o TDAH do tipo combinado, ainda conforme a autora, é aquele que reúne, no mínimo, seis ou mais sintomas de desatenção associados a outros seis de hiperatividade e impulsividade. Silva (2003) afirma que a maioria das crianças ou adolescentes que possuem o transtorno, se enquadra nessa última categoria. Cabe ressaltar que a criança com o transtorno, independente do tipo, pode desenvolver normalmente sua capacidade cognitiva. No entanto, Bee (2003) enfoca que estas crianças podem ter uma baixa autoestima caso não seja acompanhada de forma diferenciada pelo professor no que tange ao desempenho escolar. A autora defende que esta criança necessita de uma interação sadia entre família, escola e o meio onde vivem, para que o transtorno não afete sua estrutura cognitiva, social e cultural no futuro. Para tanto, Silva (2003) alega que o trabalho pedagógico necessita ser reorganizado para atender a especificidade dessa criança. Dorneles (2000) corrobora afirmando que estudantes com TDAH necessitam de intervenções para que suas dificuldades comportamentais e acadêmicas sejam amenizadas. Para isso, segundo o autor, os professores precisam perceber as áreas a serem trabalhadas com seus alunos e, com a ajuda de psicólogos e psicopedagogos, descobrir as dificuldades e facilida- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento des vividas pelos mesmos, afim de elaborar um planejamento e um programa de intervenção acertada. O docente deve, também, saber utilizar a comunicação assertiva; dar ordens de modo cortês, mas com firmeza e sempre olhar para a criança antes de emitir uma frase ou advertência. Além disso, ele deve ser democrático, compreensivo, amigo e empático. É importante, portanto, que o professor desenvolva recursos de ensino para descobrir o estilo de aprendizagem de cada sujeito, de modo que possa favorecer um desempenho escolar mais satisfatório. Sabendo disso, este estudo se propôs a identificar a forma pela qual o professor trabalha com os alunos que tenham esse transtorno. Para isso, foi realizada uma pesquisa qualitativa, por meio de entrevistas com 3 professoras dos anos iniciais do Ensino Fundamental de uma escola da rede pública de ensino do DF. Os resultados da pesquisa evidenciaram que as professoras identificam a necessidade do desenvolvimento de estratégias pedagógicas específicas para com o aluno com TDAH para que haja uma aprendizagem favorecida. Pode-se pensar que, na dinâmica pedagógica, tais concepções são colocadas em prática, pois elas relatam que sua ação é norteada pelo trabalho diversificado, em que usam recursos diferentes para promover a aprendizagem deste aluno, imagens, movimentos, histórias, brinquedos lúdicos, músicas e jogos. Entretanto, elas denunciam as dificuldades encontradas para trabalhar com esse aluno, dentre as quais citam a falta de apoio da instituição escolar, o pouco recurso didático disponível e o grande número de alunos em sala. Assim, pode-se concluir que ensinar a criança com esse transtorno pode ser uma tarefa difícil se as posturas e medidas necessárias não forem tomadas. Entretanto, entende-se que estas medidas não envolvem apenas o professor, mas, a família, a criança e toda a comunidade escolar. Por isso, a interação entre essas partes é de extrema importância, uma vez que ela reflete diretamente no fracasso ou sucesso escolar do educando. Palavras-chave: Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade; Professor; Trabalho Pedagógico. Contato: Helen Tatiana dos Santos-Lima; FACITEC/ SEEDF; [email protected] LT04-1480 - FOTOGRAFIA E FAZ DE CONTA Aline do Carmo Oliveira - IESB [email protected] Emanuelle Mendes das Chagas - IESB [email protected] Alice Araujo Costa - IESB [email protected] Rafael dos Reis Braga - IESB [email protected] Anaí Haeser Peña - IESB/UnB [email protected] Muitas vezes conhecida como uma das formas mais comuns do comportamento humano, especialmente durante a infância, a brincadeira marca a vida de muitas crianças em diferentes sociedades, constituindo uma prática cultural típica dessas crianças. Criatividade e espontaneidade casam-se na brincadeira, ao mesmo tempo em que regras sociais e morais são exercitadas e testadas e aprendizagens são construídas. Segundo Siaulys (2005), a brincadeira permite à criança vivenciar o lúdico e descobrir a si própria, pois nessa atividade ela apreende a realidade ao mesmo tempo em que se desenvolve. Dito de outra maneira, através do brincar a criança se humaniza, no sentido de constituir uma forma de 223 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento participação cultural, de permitir o contato e o exercício com atividades e forma de funcionamento da comunidade na qual a criança está inserida. Vygotsky (1998) afirmou que o sujeito se constitui nas relações com os outros, por meio de atividades caracteristicamente humanas, mediadas por ferramentas técnicas e semióticas. A brincadeira infantil, nesta perspectiva, assume uma posição privilegiada para a análise do processo de constituição do sujeito, pois constitui uma atividade em que, tanto os significados social e historicamente produzidos são construídos, quanto novos podem ali emergir. A brincadeira e o jogo de faz-de-conta seriam considerados como espaços de construção de conhecimentos pelas crianças, na medida em que os significados que ali transitam são apropriados por elas de forma específica. Paralelamente, os objetos com os quais a criança se relaciona são significados em sua cultura e a relação estabelecida com eles se modifica à medida em que a ela se desenvolve. Dessa maneira, num primeiro momento essa relação é marcada pela predominância de sentidos convencionais, característicos da cultura em que está inserida, de tal forma que o objeto diz para a criança, de certa forma, como deve agir. Com o passar do tempo, de modo gradativo, a relação entre objeto significado e ação se altera, tendo a brincadeira um lugar de destaque nessa mudança. Na situação da brincadeira há mudança na relação da criança com os objetos, pois estes perdem sua força determinadora. Dessa maneira, ao brincar a criança pode dar outros sentidos aos objetos e jogos, partindo de sua própria ação, de sua imaginação, da trama de relações que estabelece com os amigos com os quais produz novos sentidos e os compartilha (Cerisara, 2002). “A criança vê um objeto, mas age 224 de maneira diferente em relação ao que vê. Assim, é alcançada uma condição que começa a agir independentemente daquilo que vê.” (Vygotsky, 1998, p. 127). A partir do exposto, verifica-se a fundamental importância da brincadeira para o desenvolvimento infantil ao permitir a transformação e produção de novos significados. Vygotsky (1998) defende que a criação de situações imaginárias na brincadeira surge a partir da tensão entre o indivíduo e a sociedade. A brincadeira libera a criança das amarras da realidade imediata e oferece a oportunidade de controlar uma situação existente (Cerisara, 2002). A fotografia, por seu turno, pode ser definida como um verdadeiro ato icônico (Dubois, 1993), um encontro entre o ato de fotografar um objeto ou cena em circunstâncias específicas, com o ato de sua percepção e contemplação. O fotografar permite a recriação da realidade, pois apresentam um recorte da realidade realizado a partir de uma intenção específica daquele que fotografa. O presente trabalho apresenta análises preliminares de um estudo que tem como objetivo identificar o papel da fotografia como instrumento em brincadeiras de faz de conta, em duas situações diferentes: uma na qual as crianças são ao mesmo tempo os fotógrafos e os fotografados, e outra em que são fotografadas em situação de brincadeira de faz de conta com a participação de um adulto. As duas situações são apresentadas para as crianças como brincadeiras. Na primeira situação as crianças são incentivadas a brincar de fazer caras expressando sentimentos ou a fazer caretas em frente a uma webcam e aprendem a tirar fotos de si mesmas fazendo essas caras ou caretas. Depois de um momento de aprendizagem e ambientação das crianças são deixadas a vontade e sem a presença VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento do adulto para brincar e tirar fotografias utilizando a webcam. A situação de brincadeira de faz de conta com a participação de adulto consistiu na escolha livre, pelas crianças, de situações para brincarem e representarem. As crianças escolheram brincar que eram, por exemplo, o Zeca Urubu e o Pica-pau em uma situação em que um engana o outro, em outro momento brincaram de Chapeuzinho Vermelho e Lobo Mau, e em outro de super-heróis. As cenas eram fotografadas tanto pelas crianças quanto pelo adulto presente. Em ambos os casos as fotografias são apresentadas às crianças, que as vezes as identificam como produto ou continuidade da brincadeira. Palavras-chave: faz de conta, brincadeira, fotografia, desenvolvimento Contato: Aline Do Carmo Oliveira, IESB, [email protected] LT04-1513 - PERCEPÇÃO DAS MÃES ACERCA DO CONSUMO INFANTIL Eugênia Lúcia Paiva de Oliveira - UFPB [email protected] Patrícia Nunes da Fonsêca - UFPB [email protected] Walkyria dos Santos Farias Machado - UFPB [email protected] Vivian Kelle Lau Alves - UFPB [email protected] Nájila Bianca Campos Freitas - UFPB [email protected] Nas últimas décadas, percebe-se um aumento significativo do consumo em todo o mundo, motivado principalmente pela sociedade capitalista. As empresas investem muito em produção de bens e anúncios publicitários para atrair cada vez mais o consumidor. O consumidor consciente sabe da importância de comprar as mercadorias que necessitam, ao contrário do consumista, que compra constantemente produtos supérfluos, seja pelo simples prazer de comprar ou para mostrar o seu poder financeiro frente ao seu grupo social. Os consumidores adultos têm uma grande responsabilidade não apenas com a sustentabilidade do planeta, mas, sobretudo, com os modelos de comportamentos transmitidos as crianças. Os pais ou responsáveis devem ter a consciência de que a família é o primeiro contexto de socialização da criança e, portanto, ela vai adquirir valores e crenças acerca da vida e do mundo a partir de suas primeiras relações. Deste modo, é fundamental que os pais demonstrem aos filhos comportamentos de consumo condizentes com suas condições sociais e necessidades. Estudos mostram que pais que consumem em excesso, sejam roupas, alimentos, utensílios para casa e carro influenciam negativamente no comportamento dos filhos que, provavelmente, vai se tornar uma criança consumista. A literatura também aponta que pais consumistas geralmente negligenciam os filhos e tornam-se permissivos do consumo infantil. Na atualidade, há um crescimento considerável no consumo por parte de crianças, isto tem preocupado profissionais de diversas áreas, tais como: psicólogos, educadores, psicopedagogos, sociólogos, nutricionistas e médicos. Tem-se constatado que o consumo em excesso tem provocado uma série de problemas à vida das crianças, especialmente, de natureza física, emocional e social. As crianças estão mais propensas a se alimentarem inadequadamente, frente à infinidade de opções de comidas, muitas delas gordurosas sem nutrientes necessários e importantes para a saúde infantil. A isto, tem sur225 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento gido um aumento no número de crianças obesas e com doenças adquiridas a partir da má alimentação, levando-as a aumentar as fileiras dos grupos de risco. O consumo também prejudica a vida emocional da criança uma vez que o brinquedo ou o jogo nada mais é do que um substituto da atenção e amor dos pais. Na atual realidade social, a criança não é mais um sujeito que depende exclusivamente das escolhas do adulto na hora de comprar, mas um cliente decidido, que opina e consome. As crianças tem se tornado um público exigente quanto ao consumo, pois muitas delas querem adquirir objetos de marca consolidada no mercado. Para assegurar ainda mais o comportamento consumista da criança, as empresas estão investindo em diversidade de produtos e publicidade voltada para o mundo infantil, especialmente no que se referem a brinquedos, alimentos, roupas, objetos de uso pessoal, etc. Há uma variedade de produtos que encantam os olhos e o paladar da criança. Frente ao crescimento do consumo infantil, o Instituto Alana, tem desenvolvido ações relacionadas ao fomento de uma consciência crítica na sociedade a respeito do consumo de produtos e serviços por crianças e adolescentes e, principalmente, atividades que buscam debater e apontar meios de minimizar os impactos negativos do consumismo na infância. O presente trabalho teve por objetivo verificar o comportamento consumista das crianças da segunda infância, especialmente no que se referem a brinquedos, alimentos, filmes e passeios. Participaram 20 mães com idades entre 25 a 45 anos. Moravam no interior do estado da Paraíba, onze eram profissionais autônomas, sete eram donas de casa, uma assistente administrativa e uma técnica enfermagem. Todas tinham filhos com idade entre 3 e 5 anos. Elas responderam um questionário 226 contendo quatro questões relacionadas ao consumo infantil, especificamente, em relação à alimentação, aos brinquedos, a filmes e ao lazer. Na oportunidade foi comunicado que o estudo era voluntário e que o nome dos participantes seria mantido em sigilo. Foi feito uma análise quantitativa das respostas maternas. Os resultados mostraram que, segundo as mães, as crianças consomem na alimentação mais chocolate (20,8%), refrigerante (16,6%) e bombons (16,6%); nas compras, consomem mais brinquedos (28%) e bonecas e bonecos (25%); no lazer, pedem para sair para parques (28,5%) e pizzaria (17,3%). Na aquisição de filmes infantis, as meninas pedem para comprar mais da Barbie (17,8%) e os meninos do BEM 10 (17,8%). Conclui-se que o consume das crianças tem sido um comportamento cada vez mais comum na nossa sociedade, mesmo em idades tão precoces as crianças decidem e ordenam que os pais correspondam as suas exigências. Pode-se constatar que, na alimentação, as crianças demonstram consumir alimentos sem nutrientes necessários ao perfeito funcionamento do organismo, ao mesmo tempo em que mostra a passividade das mães em corroborar com o filho e não impor as regras de uma boa alimentação. No quesito compras, percebe-se que os brinquedos e as bonecas/ bonecos foram os que se sobressaíram, isto pode indicar que apesar do consumo, as crianças da faixa etária do estudo preferem este tipo de brinquedo até porque estão na época propícia ao desenvolvimento das representações simbólicas. No que se refere às compras de objetos, constata-se a escolha pela marca consolidada da mercadoria, o que revela ser um consumidor bastante exigente e até disposto a pagar mais caro pelo produto. Então, observa-se a necessidade de uma discussão sobre o VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento tema, seja através de campanhas na mídia ou nas escolas, a fim de promover uma reflexão da sociedade, especialmente, de pais e professores sobre a importância de se ter um consumo consciente e o reflexo do consumismo no desenvolvimento da formação da personalidade, dos hábitos e dos comportamentos sociais. Palavras-chave: Consumo, crianças, educação infantil. Contato: Patrícia Nunes da Fonseca, UFPB, [email protected] LT04-1516 - ESCOLA COMO COMUNIDADE: COMPARAÇÃO SOCIODEMOGRÁFICA Jaciara de Lira Almeida Dantas - UFPB, [email protected] Patrícia Nunes da Fonsêca - UFPB [email protected] José Farias de Souza Filho - UFPB [email protected] Nájila Bianca Campos Freitas - UFPB [email protected] Samara Pereira Cabral - UFPB [email protected] Em todas as culturas há sistemas organizados, de maior ou menor complexidade, que preparam os jovens para sua incorporação à sociedade. Entretanto, na sociedade brasileira, por exemplo, as escolas são, por excelência, a instituição encarregada de transmitir conhecimentos, normas e valores da cultura, fontes basilares para o desenvolvimento adequado do jovem e de sua inserção à sociedade. A escola constitui-se um contexto de socialização, que é presumivelmente, distinto do contexto familiar. A diferença baseia-se em padrões de comportamentos, regras de interação, métodos de comunicação e procedimentos de transmissão da informação. Alguns autores mostram que as escolas que adotaram a perspectiva de escola como uma comunidade possibilitaram um desenvolvimento interpessoal e intrapessoal aos alunos. Com isso, os alunos reduziram os conflitos interpessoais e tiveram maior interesse pelos outros, demonstrando aceitação e confiança nos valores democráticos. Evidenciou-se ainda o envolvimento dos alunos em atividades de grupo e um elevado desempenho acadêmico. Como se pode perceber, o senso de comunidade é um fator de integração na medida em que promove o envolvimento entre estudantes na sala de aula e na escola como um todo, a ponto destes adotarem as normas e os valores da escola como uma ação comum. O senso de comunidade na sala de aula envolve dois elementos principais: (a) a percepção de ajuda e trabalho coletivo em prol de um objetivo comum, e (b) a percepção de que cada aluno deve contribuir significativamente para o crescimento da classe como um todo. A percepção e avaliação que os jovens formavam acerca da escola, das atividades nela desenvolvidas e do seu papel na sua vida, verificaram que as percepções positivas destes jovens estavam diretamente correlacionadas com a participação em atividades extra-curriculares, com o ato de pegar livros emprestados na biblioteca e de estudar com outros colegas da escola. Em contrapartida, identificaram uma correlação inversa com gazear aulas e desrespeito aos professores. Assim, buscando-se compreender melhor a realidade brasileira, especificamente de João Pessoa/PB, decidiu-se realizar um estudo com o objetivo de verificar se há diferenças na percepção dos jovens acerca da escola como comunidade, considerando o sexo, a faixa etária e o tipo de escola (particular vs. pública). Participaram deste estudo 242 jovens matricula227 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento dos regularmente no ensino fundamental (23,1% e 38,4% cursavam a 6ª e 8ª séries, respectivamente) e médio (38,5% estavam cursando o 2º ano). A maioria foi do sexo feminino (57,7%) e de escola privada (53,7%) de João Pessoa, PB. Os participantes tinham idades entre 11 e 20 anos (m = 14,3; dp = 1,88). Esta foi uma amostra de conveniência, não probabilística, tendo participado os jovens que, presentes nas salas de aula visitadas e tendo sido requeridos a colaborar, decidiram formar parte do estudo. Os participantes responderam a Escala de Percepção da Escola como Comunidade. Os dados foram analisados no O Statistical Package for the Social Sciences (SPSS). Foi realizada uma MANOVA para medidas repetidas, observando-se diferenças entre suas pontuações [Lambda de Wilks = 0,73, F (2, 240) = 43,70, p < 0,001]. O teste post hoc de Bonferroni relevou que as pontuações dos participantes diferiram entre os três fatores (p < 0,001), na ordem apresentada: colaboração, ajuda e proximidade (m = 3,1, dp = 0,80), relações interpessoais positivas (m = 2,7, dp = 0,77) e influência do estudante (m = 2,5, dp = 0,77). Um passo seguinte foi conhecer a influência de três variáveis demográficas em relação às pontuações dos participantes, a saber: tipo de escola (pública versus privada), série (6ª e 8ª séries do ensino fundamental e 2º ano do ensino médio) e sexo. Neste sentido, realizou-se uma MANOVA considerando como variáveis critérios os três fatores de percepção da escola como comunidade, e as variáveis demográficas como antecedentes. Duas destas variáveis apresentaram efeitos principais: série [Lambda de Wilks = 0,94, F (3, 454) = 2,38, p = 0,03] e sexo [Lambda de Wilks = 0,96, F (3, 227) = 2,74, p = 0,04]. Os testes univariados indicaram a influência da série em relação ao fator colaboração [F (2, 229) = 3,78, p = 0,003], com o teste post 228 hoc de Bonferroni revelando que os jovens de 6ª série do ensino fundamental obtiveram maior média neste fator (m = 3,36) do que aqueles do 2º ano do ensino médio (m = 2,89). Por outro lado, o sexo teve efeito principal em relação ao fator influência [F (1, 229) = 2,59, p = 0,04], em que os rapazes obtiveram pontuação maior (m = 2,68) do que as moças (m = 2,46). Nenhum efeito de interação foi observado entre as três variáveis consideradas. Os estudantes de séries mais elementares tendem a apresentar melhor percepção da escola como comunidade do que os de séries mais avançadas. Isso foi exatamente o que se observou no presente estudo, em que os estudantes de 6ª série apresentaram médias maiores do que aqueles da 8ª série (ensino fundamental) e do 2º ano do ensino médio. Contudo, o fizeram unicamente no fator colaboração, ajuda e proximidade. É provável que os alunos das séries iniciais mostrem um envolvimento maior com a escola, tendo melhor relação com seus colegas e administradores da instituição, além de apresentarem um bom rendimento acadêmico. Isto posto, demonstram ser mais responsáveis e ajustados ao contexto escolar, ou ao menos mais obedientes, cumpridores de normas sociais convencionais. Por outro lado, os alunos de séries mais avançadas podem estar começando a se interessar por atividades extraescolares (por exemplo, shoppings, namoro, campeonatos), o que diminui a probabilidade de apresentarem um padrão consistente de percepção da escola como comunidade, haja vista que esta pode ser menos influente nas suas vidas do que outros grupos ou instituições de referência. Palavras-chave: Escola; Percepção; Comunidade. Contato: Jaciara de Lira Almeida Dantas, UFPB, [email protected] VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento DIA 13/11 - Domingo 14h-15h30 CONFERÊNCIA “ONDE FICAM OS BEBÊS NOS DIREITOS DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES?” Fúlvia Rosemberg - FCC SP LT04 - Simpósio SP LT04-845 - A TEORIA HISTÓRICOCULTURAL DA SUBJETIVIDADE: DESAFIOS PARA A EDUCAÇÃO E A PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO HUMANO Maria Eleusa Montenegro - UNICEUB [email protected] Vannuzia Leal Andrade Peres - PUC-Go/UnB [email protected] Ana Maria Orofino Teles - FE/UnB [email protected] Geisa Nunes de Souza Mozzer - UFG [email protected] Reflexões e pesquisas na perspectiva da teoria histórico-cultural da subjetividade de Fernando González Rey têm sido realizadas em diferentes instituições de ensino superior, por diferentes professores. Neste momento, em que a necessidade é analisar os avanços concretos desta proposta e os desafios que ela coloca para as áreas da educação e do desenvolvimento humano, as autoras vêm expor suas produções com o objetivo de ampliar o debate sobre um pensamento que é plenamente aberto à novidade. Inicialmente faz-se uma reflexão sobre os possíveis avanços da teoria da subjetividade com relação à psicologia soviética e, a seguir, sobre as relações entre a aprendizagem e o desenvolvimento humano nessa perspectiva, quando comparecem os principais conceitos desenvolvidos por González Rey nessa direção. Por último são apresentadas duas pesquisas na perspectiva histórico-cultural da subjetividade: uma sobre a violência nas escolas e outra sobre a criatividade infantil, pesquisas essas que se articulam e se desdobram na tensão dos questionamentos e problematizações gerados na construção interpretativa das produções subjetivas dos sujeitos, acessadas e expressas no decorrer do momento empírico e que tem se constituído em um grande desafio para a educação e a psicologia do desenvolvimento. A TEORIA DA SUBJETIVIDADE NA PERSPECTIVA HISTÓRICO-CULTURAL DE FERNANDO GONZÁLEZ REY: UM AVANÇO À PSICOLOGIA SOVIÉTICA Maria Eleusa Montenegro - UNICEUB [email protected] Atualmente, a educação, carente de qualidade e de valorização, busca em diferentes teorias educacionais e psicológicas elementos que possam contribuir para o processo de ensino-aprendizagem. Em vista disso é que se pretende, com este trabalho, propiciar aos profissionais da educação a teoria da subjetividade, na perspectiva Histórico-Dialética do autor cubano contemporâneo Fernando González Rey (2000; 2004; 2005); como uma alternativa de continuidade, avanço e aprofundamento dos teóricos clássicos soviéticos, sobretudo de L. S. Vygotsky (1984; 229 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento 1987; 1988). Inicialmente houve a preocupação em conceituar o Materialismo Histórico-Dialético de Marx, filosofia de base da Psicologia Histórico-Cultural, e de apresentar os conceitos desta Psicologia e da Educação na perspectiva Histórico-Dialética. Como aspectos básicos do trabalho foram discutidas as categorias de sentido, de significado, de subjetividade, do papel do outro e da emocionalidade para os autores L. S. Vygotsky e Fernando González Rey. Percebeu-se em González Rey, por meio da teoria da subjetividade, uma visão mais aprofundada do homem também como sujeito da própria história. O papel das emoções e do outro é visto, para este autor, de uma forma mais subjetiva. O outro não é percebido com um papel de caráter instrumental, mas como ser de relações, detentor de expressões diferentes que dependem da qualidade do próprio curso no contexto social e cultural. Para González Rey a educação é um “processo vivo que não aceita ‘receitas’ pré-fabricadas e cujo curso define-se nos sentidos e nos significados que as atividades e formas de comunicação implicadas nesse processo vão produzindo por meio dos sujeitos que o configuram”. A cultura das relações e da comunicação passa a ter um lugar central para a teoria da educação. Acredita-se, também, que maior aprofundamento da teoria da subjetividade de González Rey somente tem a contribuir com o conhecimento do indivíduo, da educação, do desenvolvimento e do processo ensino-aprendizagem, propiciando subsídios para a superação dos problemas educacionais. Palavras-chave: Teoria da Subjetividade. Histórico-Cultural. Psicologia Soviética. 230 A APRENDIZAGEM E O DESENVOLVIMENTO HUMANO SOB A PERSPECTIVA DA TEORIA DA SUBJETIVIDADE Ana Maria Orofino Teles - UnB [email protected] O modelo ou enfoque científico de caráter empírico e analítico prestigia o controle das variáveis, a objetivação do fenômeno estudado e o isolamento do mesmo de seu contexto, o que parece ser impossível nas investigações que estudam o humano, principalmente em seu atributo de "ser social". Nesse sentido, as abordagens de ordem hermenêutica e fenomenológica contribuem para ampliar o sentido do fazer ciência e da construção do conhecimento. O saber deve ser contextualizado e o mundo como coisa em si cede espaço ao mundo como representação e construção de um observador que compartilha certos consensos sociais. Na esteira desse processo de rupturas paradigmáticas encontramos em González Rey o pensador capaz de apresentar uma teoria para a integração das diversas partes isoladas em que se desenvolveu a psicologia como ciência. Talvez seja até possível falar em psicologias, ao invés de uma só psicologia, pela diversidade de teorias que co-habitam esse campo de conhecimento resultante desse modelo de compartimentalização do saber. A aprendizagem, por sua vez, ficou restrita ao campo do comportamento observável, ou então ao campo dos processos cognitivos e, na maioria das vezes, entendida como algo mecânico que se dá através de um processo de interiorização linear de algo que vem de fora. A teoria da subjetividade de González Rey (2002, 2004, 2005a, 2005b, 2008) vem para apresentar um pensamento que VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento responda a uma psicologia geral, uma ciência de amplitude e reunião dos conhecimentos fragmentados. Uma teoria que conjuga a epistemologia e a metodologia necessárias à integração lógica do fazer ciência em psicologia. Com González Rey temos uma maneira interessante de entender a aprendizagem, e também o desenvolvimento, pois ambos passam a ser concebidos como processos subjetivos. Não exclusivamente cognitivo, não uma simples interiorização, mas de produção de sentidos subjetivos que reconfiguram a subjetividade da pessoa. Ou seja, o aprendiz irá aprender na medida em que produzir novos sentidos, que são unidades subjetivas formadas pela total integração entre o simbólico e o emocional. A personalidade, entendida como uma configuração de configurações subjetivas, se transforma no processo de aprendizagem e, com isso, aquele que entrou na sala de aula será diferente daquele que sair. Esse entendimento do humano e de seu desenvolvimento explica a aprendizagem como um processo complexo que implica a subjetividade individual da pessoa, seja criança ou adulto; a sua subjetividade social, pois essa pessoa está subjetivamente imersa no tempo e no espaço e seu contexto histórico e social são relevantes; implica também a tensão entre sua emocionalidade e sua racionalidade, onde a aprendizagem se dá nas contradições e não só nas linearidades e nas transmissões diretas de informação; e também na produção do sujeito, pois, para González Rey esse processo acarreta a produção de sentidos subjetivos e as reconfigurações subjetivas e não exclusivamente a interiorização de algo externo e alheio. Para a teoria da subjetividade não existe desenvolvimento e aprendizagem sem uma participação ativa de um sujeito concreto que produz. Nessa perspectiva de subjetividade cultural-histórica a motivação não vai estar na atividade, nem na tarefa proposta, muito menos no professor e na sua simpatia. A motivação está no sujeito que aprende e a aprendizagem acontece quando o conteúdo passa a fazer sentido para o sujeito, implicando nisso também a sua emocionalidade. Para a teoria da subjetividade existe uma integração complexa entre o sentir, o pensar e o agir; e existe o sujeito. Os atos mecânicos de memorização não significam aprendizagem, ou seja, aprender é um processo subjetivo complexo que passa por um sujeito concreto e todo e qualquer processo de massificação do ensino anularia esse sujeito e sua capacidade singular de aprender. O próprio conceito de desenvolvimento ganha outro caráter ao conjugar não só o "andar para frente" na aprendizagem e também o "adquirir conhecimentos", mas também as contradições, os processos cíclicos e as ambiguidades inerentes ao complexo sentido da subjetividade humana. Palavras-chave: subjetividade, desenvolvimento, aprendizagem, sujeito. A PRODUÇÃO SUBJETIVA DA VIOLENCIA NAS ESCOLAS Vannuzia Leal Andrade Peres - PUC/Goiás [email protected] Já não é mais novidade que a violência nas escolas é um fenômeno mundial. Para isso é só observar as notícias veiculadas nos meios de comunicação de massa, especialmente a televisão. O problema é que pouco se sabe, de fato, como essa violência tem sido constituída na com231 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento plexidade do real social das diferentes escolas e como diferentes crianças e adolescentes poderiam estar subjetivamente com ela envolvidos em seus processos de aprendizagem e desenvolvimento. Na abordagem complexa e subjetiva do psiquismo humano, proposta por González Rey (2011), o primeiro passo para a explicação dessa constituição é uma análise de como o sistema econômico, o sistema político-social e as ideologias vigentes estão sendo mediados por professores e alunos no cotidiano da escola. Este autor compreende que os fatos sociais, econômicos e culturais que constituem a realidade social perpassam pela constituição dos processos psicológicos dos sujeitos, não de forma imediata, mas por meio de sua mediação subjetiva que inclui suas produções cognitivo-emocionais geradas e expressas no espaço escolar. Pergunta-se, então, como o processo ensino/ aprendizagem tem envolvido os professores e seus alunos na produção subjetiva do espaço social da escola, que ao mesmo tempo é seu espaço social de constituição psicológica? Para González Rey (1999) a subjetividade integra dialeticamente o individual e o social, implicando, para isso, o sujeito com sua história e seu espaço social que o constitui e é por ele constituído em um processo recursivo. Entre o sujeito e seu espaço social, no qual ele atua, há um processo dialético que lhe possibilita constituir sua psique que é gerativa, não reprodutiva. Buscamos, assim, refletir sobre a qualidade do diálogo e da dialética daqueles que atuam nas escolas, especialmente professores e alunos, e como esse processo poderia estar complexa e subjetivamente envolvido com a constituição e a expressão da violência entre eles. Ao articular emoções, pro232 cessos simbólicos e significados, para a compreensão da organização psicológica subjetiva do sujeito, González Rey (1999, 2003, 2011) desenvolve um outro conceito, o de “sentido subjetivo” que nos permite ir mais além e fazermos, finalmente, a seguinte pergunta: que registros complexos das experiências de relação na escola, poderiam estar envolvidos na constituição psicológica do sujeito e na sua produção subjetiva da violência? Para González Rey (2011), entretanto, a ênfase, ainda hoje, é nas funções cognitivas mediadas pelos signos, supostamente internalizados, deixando-se de lado a expressão simbólico-emocional do sujeito, fruto de sua imaginação, sua fantasia e emoção, o que confere à psique um caráter gerativo. Essa ênfase no cognitivo, mediado por aspectos da vida objetiva, de forma direta e imediata, viria dificultar o desenvolvimento de um modelo teórico que explicasse como as emoções, os processos simbólicos e os significados são articulados na organização psicológica do sujeito e na sua produção subjetiva de seus cenários sociais. Em síntese, a falta desse modelo viria dificultar a explicação de como o cenário social escolar, no qual o foco deveria ser a aprendizagem e o desenvolvimento do sujeito, é, ao contrário, palco de produção subjetiva da violência, em níveis cada vez maiores. A partir da implantação da disciplina "Estágio Básico em Psicologia Escolar" na PUC-Goiás, em 2009, desenvolvemos uma pesquisa sobre o tema nas escolas estaduais. As informações foram construídas pelos alunos por meio de observações interativas, redações, desenhos, discussão de temas, complementação de frases e entrevistas. Além disso, realizaram ações interativas com professores e alunos nas salas VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento de aula. Pode-se dizer que, com base na Psicologia Histórico-Cultural da subjetividade de González Rey buscaram fazer uma leitura das realidades das escolas e desenvolver ações compatíveis com a proposta de uma psicologia escolar/educacional que visa à aprendizagem e ao desenvolvimento humano, considerando a diversidade desses processos em cada sujeito concreto. A realização das ações interativas os ajudaram a compreender: 1) que a diversidade não é um empecilho para o desenvolvimento do cenário da sala de aula, mas a sua riqueza; 2) que o diálogo deve ser uma prática cotidiana da sala de aula para que alunos e professores desenvolvam uma reflexão sobre suas histórias e necessidades; 3) que as práticas pedagógicas devem atender à diversidade do processo de aprendizagem e à necessidade de desenvolvimento da imaginação criativa e da inventividade, ora relegadas a segundo plano na maioria das escolas, o que torna invisíveis as crianças e os adolescentes concretos; 4) que a produção subjetiva, possibilitada pelo exercício da imaginação criativa, ajuda a superar as barreiras das condições objetivas das relações entre professores e alunos, tais como o mau humor, a impaciência, a falta de atenção e a indiferença. Compreenderam, ainda, a necessidade que há das crianças e adolescentes poderem expressar a realidade social das escolas, nas suas relações com a realidade social mais ampla, mediadas por suas emoções muitas vezes contraditórias. Afinal, pudemos, todos nós, vivenciar o desafio da psicologia histórico-cultural da subjetividade, isto é, de buscar ultrapassar o pensamento da causalidade clássica e considerar a subjetividade de alunos e professores, tanto na realização de práticas pedagógi- cas que atendam à diversidade da sala de aula quanto na educação para uma convivência pacífica e respeitosa entre eles. Palavras-chave: subjetividade, escola, violência A CRIATIVIDADE INFANTIL NA PERSPECTIVA HISTÓRICO-CULTURAL DA SUBJETIVIDADE Geisa Nunes de Souza Mozzer - PUC/Goiás [email protected] Esta pesquisa teve como objetivo central buscar compreender como se expressa a criatividade nas crianças na Educação Infantil, privilegiando a atividade de ouvir e contar histórias, entre crianças de 3 a 6 anos de idade. Para tanto, é apresentado um breve levantamento bibliográfico sobre o conceito de criatividade e criatividade infantil abordando como esses temas estão sendo discutidos na literatura especializada. Durante a comunicação da pesquisa, buscou-se responder as seguintes questões: Por que estudar criatividade? Como ela se expressa? Como a criatividade é concebida à luz da teoria Histórico-Cultural da Subjetividade? Com quais recursos subjetivos/personológicos a criatividade das crianças está relacionada? Quais as maiores barreiras para o seu desenvolvimento? Como a criatividade se relaciona com a Literatura Infantil nesta fase inicial da vida da criança? Buscou-se também analisar os elementos contextuais que podem interferir na expressão da criatividade das crianças na Educação Infantil, sempre privilegiando a atividade de conto, reconto, criação e interpretação de histórias, a partir da Teoria Histórico-Cultural da Psicologia, inaugurada por Lev Vigotski (1896-1937), e 233 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento da Teoria Histórico-Cultural da Subjetividade desenvolvida pelo pesquisador cubano Fernando González Rey (1999, 2007). À luz desta última, propomos discutir o conceito de subjetividade, personalidade, sujeito, sentido subjetivo, unidades subjetivas do desenvolvimento e subjetividade social. Segundo Vigotski (1930-1990), a criança tem a criatividade menos desenvolvida que o adulto, pois este último estaria mais capacitado à produção criativa. Para o autor, o processo de imaginação e de criação não é espontâneo e o mundo cultural é, em grande parte, produto da imaginação, fantasia, memória e imitação. Sendo assim, a imaginação e a criatividade, juntamente com outras funções psicológicas superiores, são o que distingue o mundo cultural do mundo natural. Essas funções se desenvolvem no contexto histórico-cultural. O domínio histórico-cultural, para Vigotski, não representa o histórico social do indivíduo nem seu contexto cultural presente, mas refere-se à natureza do desenvolvimento dos processos psicológicos humanos (Neves-Pereira, 2007). A concepção de criatividade como processo da subjetividade, foi analisada à luz dos estudos desenvolvidos por Mitjáns Martínez (1997, 2002, 2006, 2007). Esta autora apresenta a criatividade como uma expressão da personalidade que se manifesta de forma diferente em cada um dos sujeitos, estando relacionada com a sua constituição subjetiva. Ou seja, fazendo um contraponto com a ideia de que a criatividade é um traço isolado da personalidade, esta abordagem teórica entende que a criatividade se expressa e está relacionada com a capacidade cognitiva, com a forma pela qual o indivíduo interage dialeticamente com o contexto social, bem como com a subjetividade social constituída nos espaços sociais 234 nos quais as crianças atuam. Diferentes técnicas qualitativas foram utilizadas à luz da concepção epistemológica qualitativa, proposta por González Rey (2002, 2005). A pesquisa empírica se dividiu em duas fases: a primeira com um grupo de 20 crianças de 5 anos de idade, quando foram realizadas sessões de conto e reconto de histórias de personagens infantis escolhidos pelas próprias crianças. Nestas sessões foram exploradas questões cognitivas, como escrever o nome dos personagens da história, descobrir as cores das roupas dos personagens, formar palavras a partir do nome dos personagens, dentre outros. Depois desta etapa foi solicitada a algumas crianças que vestissem a fantasia dos personagens das histórias. Elas ficaram fantasiadas durante o período de um dia, ou seja, todo o período de permanência no CMEI (Centro Municipal de Educação Infantil), quando foram feitas as observações. As análises ainda estão sendo realizadas, mas os primeiros resultados demonstram que a criatividade, nesta fase da vida criança, manifesta-se de forma diferente em cada um dos sujeitos, mas sempre mediada, principalmente, pela memória, cognição, percepção, atenção, imitação, afetividade, ou seja, mediada e relacionada com as configurações subjetivas de cada uma, bem como com a subjetividade social constituída nos espaços sociais nos quais as crianças atuam. Assim, nessas pesquisas temos observado crianças pré-escolares em diferentes interpretações de histórias através das quais a criatividade tem se manifestado de forma bastante relacionada com a personalidade e subjetividade de cada um dos sujeitos observados. As crianças, ao interpretar os personagens das histórias, demonstram características dos mesmos que se misturam à sua própria constituição subjetiva. VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento Percebemos ainda que o contexto social, por exemplo, a relação estabelecida com a professora e com as outras crianças do grupo, também interferem na expressão e manifestação da criatividade das crianças. Desta forma, buscamos discutir também a relação da criatividade com a Literatura Infantil. Ou seja, como a criatividade pode ser melhor desenvolvida nas Escolas de Educação Infantil através da atividade de contar, recontar, interpretar e criar histórias. Assim, buscamos observar quais características gerais dos contextos que podem provocar, assim como preconiza Mitjáns Martínez (1997), circuitos negativos e positivos para o desenvolvimento, manifestação e expressão da criatividade, dentre outros aspectos. Palavras-chave: subjetividade, criatividade, educação infantil SP LT04 - Simpósio SP LT04-930 - INCLUSÃO ESCOLAR: AÇÕES E REFLEXÕES NAS ESCOLAS DA SECRETARIA DE ESTADO DE EDUCAÇÃO DO DISTRITO FEDERAL Mírian Barbosa Tavares Raposo - UnB [email protected] Albenira Alves Rodrigues Soeira - SEE/DF [email protected] Ana Ester Soares Oliveira - SE/DF [email protected] Claudia Maiana Silva - SEE/DF [email protected] Esse simpósio representa o fruto de um trabalho desenvolvido no Curso de Especialização em Desenvolvimento Humano, Educação e Inclusão Escolar, oferecido pela Universidade de Brasília, em parceria com a Universidade Aberta do Brasil. O curso, de 420 horas, foi oferecido na modalidade a distância e ocorreu durante os anos de 2010 e 2011, atendendo a quase 500 alunos advindos de diferentes localidades no Brasil. A proposta do curso buscou dar respostas à demanda de educadores que solicitam um curso de qualidade para sua formação continuada, representando uma iniciativa conjunta para atender à demanda de escolas, hospitais e do contingente de profissionais que trabalham em diversas associações, que procuram instâncias formadoras e especializadas para promover sustentabilidade ao processo inclusivo. Seu objetivo era o de qualificar profissionais que lidam com a questão do desenvolvimento humano e com o campo da educação, para atuar na promoção e sustentabilidade da inclusão escolar de alunos com necessidades especiais. Entre as atividades de formação oferecidas pelo curso, incluía-se a construção de uma pesquisa monográfica orientada, que ocorreu nos últimos seis meses de funcionamento do curso. Tal pesquisa abrangeu todos os diversos componentes do currículo do curso, como ação integradora que visava assegurar a indissolubilidade teoria e prática. Os trabalhos apresentados representam uma síntese de três monografias construídas ao longo do curso, todas produzidas nas escolas da rede pública de ensino do Distrito Federal. As principais pesquisadoras dos três estudos são professoras dessa rede, em formação continuada, e cada uma delas, a partir de suas especificidades, visou refletir a respeito do processo inclusivo na escola, buscando construir recursos teórico-metodológicos que pudessem orientar e facilitar a 235 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento ação dos diversos participantes desse processo. Consideramos que seus resultados representaram uma importante contribuição para a organização do trabalho pedagógico da escola e da sala de aula, uma vez que possibilitaram um exercício reflexivo sobre a prática educacional inclusiva, tanto para os pesquisadores em formação como para os contextos educacionais nos quais as pesquisas foram desenvolvidas. A INCLUSÃO ESCOLAR DOS ALUNOS COM NECESSIDADES EDUCACIONAIS ESPECIAIS NA EDUCAÇÃO INFANTIL E SUAS FAMÍLIAS Albenira Alves Rodrigues Soeira - SEE/DF [email protected] Mírian Barbosa Tavares Raposo - UnB [email protected] O contexto atual em que vivemos, na sociedade, incentiva o movimento de inclusão. Esse movimento parte da idéia de que gozamos dos mesmos direitos e que todos os cidadãos têm garantias e direitos primordiais para a sua vida, como: saúde, educação, segurança, trabalho, previdência social e lazer (Brasil, 1988). A inclusão deve partir da inserção do indivíduo na sociedade e da garantia de seus direitos. De acordo com Madeira Coelho (apud Kelman, 2010), a inclusão é um termo interessante, e serve de bandeira globalizada para os grupos ditos minoritários e marginalizados da sociedade. No tocante a educação, o dever do Estado de proporcionar o direito à educação encontra-se em seu artigo 205: "Educação direito de todos e dever do Estado" (Brasil, 1988). Bronfenbrenner (1996 apud Kelman, 2010) afirma que a família e a instituição escolar são ambientes que promovem o desenvolvi236 mento humano. De acordo com Moreira (apud Dessen & Weber, 2009), tanto a família como a escola podem trazer situações que incentivem o crescimento da criança, como também podem contribuir para o desencadeamento de situações adversas que podem prejudicar a criança no seu desempenho educacional. Esse trabalho pretendeu, portanto, compreender atitudes positivas para a inclusão nos dois sentidos, ou seja, da família e da escola. Na visão de Bronfenbrenner, família e escola são microssistemas, entendidos como contextos de maior influência para o desenvolvimento de uma criança (apud Dessen & Silva, 2004). A família é o primeiro local de convivência de uma criança e deveria ser o maior incentivador de quebra de preconceitos, em se tratando da criança com necessidades educacionais especiais. Já o papel da escola é o de incluir e criar estratégias para o crescimento dessa criança. Aranha (apud Barbosa, Rosini & Pereira, 2007) ressalta que a educação inclusiva é um projeto a ser construído por todos os envolvidos na comunidade escolar, e que só terá êxito quando as atitudes em relação à inclusão escolar forem positivas. Ao se falar de família, escola e pessoa com necessidades especiais ou com deficiência, tem-se em mente as palavras diversidade, respeito e igualdade de oportunidades. De acordo com Glat e Duque (2003), o papel dos profissionais é fundamental para minimizar os sentimentos de superproteção ou segregação e promover orientações e esclarecimentos sobre as capacidades do filho com necessidades especiais, bem como provocar um olhar dos pais sobre si mesmos. Ainda com Glat (2004) uma vez orientados e sensibilizados para a nova situação, os pais podem influenciar, posi- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento tivamente, na autoconfiança do filho para o desenvolvimento de suas capacidades. Este trabalho teve por objetivo compreender a relação família-escola no processo de inclusão dos alunos com necessidades educacionais especiais na Educação Infantil do Ensino Regular. Quanto à abordagem, a mais indicada foi a pesquisa qualitativa. De acordo com Maciel e Raposo (2010), tal pesquisa representa um processo permanente de construção do conhecimento pela interação do pesquisador, do pesquisado e da pesquisa, em si. A escola contexto da pesquisa selecionada para o estudo é uma escola da rede pública, inaugurada em 11 de outubro de 1978; está localizada na zona urbana de uma das regiões administrativas do DF, atendendo crianças da própria comunidade e de regiões próximas. Participaram desta pesquisa uma mãe de aluno NEE inserido numa turma de educação infantil e a regente da turma desse mesmo aluno. O instrumento mais adequado para as situações propostas foi a entrevista semiestruturada. O roteiro para a efetivação da entrevista foi organizado em três blocos de questões sobre os entrevistados: (a) apresentação; (b) seus conhecimentos teóricos sobre o assunto proposto; e (c) sua prática vivenciada. A entrevista foi realizada com o auxílio de um gravador. Para analisar as informações construídas por meio das entrevistas, portanto, optamos pela construção de categorias teóricas de análise. As categorias elencadas são frutos da análise de informações construídas por meio das entrevistas. Os títulos das categorias foram formulados a partir de temas que envolviam tanto a sociedade quanto a comunidade escolar, e as categorias são: conhecimento e vivência compartilhada. O segundo tema mais explo- rado pelas entrevistadas foi a preparação prévia da sociedade, família e escola para a inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais, tanto no meio social como educacional. Outro tema foi: A inclusão - bem comum, já que a inclusão foi muito citada pelas duas participantes da pesquisa como o envolvimento de todos da sociedade nesta luta; elas citaram a inclusão como uma causa não abraçada por todos da sociedade, a começar pelas autoridades que fazem as leis e as colocam em prática. O terceiro tema mais explorado foi denominado: A qualidade no cotidiano educacional e inclusivo, pela busca na qualidade no atendimento no ambiente escolar, já que o ambiente pode ser educacional, mas, não necessariamente, inclusivo; reconhecer e conhecer quais são as atitudes da sociedade, família e escola nessa etapa de vida do ANEE é essencial para assegurar sucesso. O último tema levantado foi denominado: Os frutos da inclusão nos parâmetros de igualdade para todos, tendo recebido este título por incluir os resultados de uma boa inclusão e da convivência entre sociedade, família e escola. As percepções e traduções feitas ao longo desse período – de pesquisa, entrevistas e análises - são que alguns assuntos ou temas são antigos, mas, com soluções e atitudes ainda tímidas e pequenas para o que a realidade pede. A intenção, com este trabalho, não é apontar erros e falhas da família ou da escola, mas, a de buscarmos, juntos, a resolução dos problemas encontrados ao longo do percurso. Se a maior tarefa é da escola, inclusive, ao dar subsídios para a família, no entanto, precisamos rever nossos conceitos e atitudes. Precisamos entender que não adianta estarmos num local onde a inclusão deve acontecer, se 237 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento não tivermos mente aberta para aceitar e incentivar não somente o aluno NEE, mas todo o excluído. Palavras-chave: inclusão, necessidades educacionais especiais, relação família-escola PROGRAMA DE ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO COMPLEMENTAR Ana Ester Soares Oliveira - SEE/DF [email protected] Mírian Barbosa Tavares Raposo - UnB [email protected] Atualmente, o grande desafio da educação tem sido o de promover o desenvolvimento da aprendizagem, onde a diversidade constitui um traço marcante no contexto escolar. Diante desta realidade, diversas ações são sugeridas, a fim de contemplar as peculiaridades do processo de aprendizagem dos alunos com necessidades educativas especiais. A Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal, a partir das Diretrizes Pedagógicas, disponibiliza atendimentos educacionais especializados complementares, aos alunos inclusos em escolas regulares, a fim de complementar o processo de desenvolvimento da aprendizagem. Hoje, atendimentos como: Educação Física adaptada, Artes, Informática adaptada, Jardinagem e Argila são realizados pela SEE-DF, em centros de ensino especial, com caráter complementar, no horário contrário ao de aula. O Programa de Atendimento Educacional Especializado Complementar visa contemplar as particularidades e necessidades dos alunos e auxiliar no processo inclusivo. A diversidade de conhecimentos é elemento propulsor do desenvolvimento humano e da apren238 dizagem; sendo a escola um ambiente que reúne diversidade de conhecimentos, atividades, regras e valores, permeados por conflitos, problemas e diferenças (Mahoney apud Dessen & Polonia, 2007), ela se transforma em espaço privilegiado de desenvolvimento. Ressaltando a importância da educação na diversidade, cabe à escola criar meios que superem as dificuldades, assegurem o desenvolvimento e promovam ações que conduzam a atividades que transcendam a educação informativa. O estímulo a atividades desportivas, recreativas e culturais aproxima os diferentes, rompendo com as barreiras do monoculturalismo (Kelman, 2009). A Secretaria de Educação Especial, por meio dos seus programas e ações, apresenta possibilidades para viabilizar o processo inclusivo e apoiar os sistemas de ensino com programas de formação continuada de professores na educação especial, programa de implantação de salas de recursos multifuncionais e demais programas que buscam implementar a educação inclusiva e o direito à diversidade. Segundo o Decreto nº 6571/2008, entende-se por atendimento educacional especializado todo o conjunto de recursos de acessibilidade e pedagógicos organizados institucionalmente, ofertados de forma complementar ou suplementar à formação dos alunos no ensino regular. Este documento enfatiza, ainda, a importância da transversalidade das ações do ensino especial no ensino regular, no intuito de viabilizar e consolidar o processo inclusivo. Diante destas concepções, as diretrizes pedagógicas do DF contemplam o processo inclusivo, ao apresentarem orientações para a realização do atendimento educacional especializado na perspectiva inclusiva. Dentre os programas apresentados, o Programa de Atendimen- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento to Educacional Especializado Complementar tem o intuito de oferecer atendimentos que não são ofertados no ensino regular. Esta é mais uma ação que sugere o fortalecimento do processo inclusivo, a partir da reelaboração dos ambientes educacionais, com o intuito de efetivar o processo de inclusão escolar e embasar a construção da sociedade inclusiva. Neste estudo, buscamos compreender a importância dos atendimentos educacionais especializados complementares, na implantação e manutenção do processo de inclusão, bem como a relevância destes no processo de desenvolvimento humano e educacional dos alunos com necessidades educativas especiais. O contexto da pesquisa foi um centro de ensino especial, que disponibiliza vários ambientes para a realização dos atendimentos complementares. Para este estudo foram selecionados dois professores, sendo um do atendimento complementar e um do ensino regular; a mãe de um aluno matriculado no atendimento complementar, também foi convidada a participar desta pesquisa. A entrevista semiestruturada foi o instrumento de construção de informações, por preservar a naturalidade e possibilitar que as informações construídas refiram-se aos mais diferentes ambientes sociais (Gil, 1989). O procedimento de análise foi a categorização de dados, elaborada com base nas transcrições das entrevistas aqui mencionadas. Através da elaboração de um quadro, focalizamos, nas falas dos participantes, aspectos essenciais do desenvolvimento do aluno. Como parte dos resultados, a partir da categorização das informações, foram levantadas três categorias: Diagnóstico: compreensão da realidade - os participantes expuseram as dificuldades na precisão de um resultado diagnóstico de uma criança com TGD e a importância da família como promotora de possibilidades para favorecer o desenvolvimento humano. Segundo Carvalho (2010), apesar dos avanços, o diagnóstico é dificultado pela significativa heterogeneidade de comportamento e atitudes, pois, as manifestações autísticas variam de pessoa para pessoa. Dessen e Polonia (2007) enfatizam que os laços afetivos, principalmente entre pais e filhos, podem ser aspectos positivos para desencadear um desenvolvimento saudável, possibilitando o ajustamento do indivíduo em diversos ambientes. Processo de Adaptação da escola à necessidade do aluno: Inclusão - nesta categoria, percebemos que as ações educacionais aplicadas favoreceram o processo educacional de um aluno participante do Programa Educacional Especializado Complementar. Em dois espaços diferentes, os professores transformaram suas práticas, a fim de proporcionar o desenvolvimento da aprendizagem do aluno. Segundo Carvalho (2010), os aspectos educacionais considerados evidenciam a importância da mediação educacional, favorecendo maior aproveitamento dos espaços escolares, bem como ações efetivas de aprendizagem, promovendo o desenvolvimento do aluno. Rede de apoio à inclusão: Programa de Atendimento Educacional Especializado Complementar - os participantes definiram os atendimentos especializados complementares como atividades essenciais no auxílio e apoio ao processo educacional regular; ainda, ressaltaram a importância de profissionais capacitados no atendimento a alunos com necessidades especiais. Professor e aluno, por estarem "mergulhados em diferentes possibilidades interativas", constroem um espaço versátil e enriquecedor para o processo de ensino/aprendizagem. Em outra vertente, a ação do pro239 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento fessor também é pautada pela definição da função da educação, que não seria só a de prover oportunidades para o crescimento e expressão, mas, essencialmente, de nutrir possibilidades relacionais (Bartholo, Taca & Tunes, 2007). A partir das informações aqui apresentadas, verificamos a importância dos atendimentos especializados complementares, no apoio e fortalecimento do processo inclusivo. As estratégias de divulgação devem ser fortalecidas, a fim de alcançarem maior quantitativo de alunos inclusos. Outro aspecto que reforçamos é a utilização de todos os espaços educacionais, de modo a se constituírem ambientes inclusivos. E, finalmente, reiteramos a importância da elaboração de uma política inclusiva, onde todos os segmentos educacionais possam participar da construção de ações como o Programa de Atendimento Educacional Especializado. Palavras-chave: inclusão escolar, atendimento educacional especializado complementar, desenvolvimento humano e da aprendizagem A REALIDADE EDUCACIONAL E A INCLUSÃO ESCOLAR Claudia Maiana Silva - SEE/DF [email protected] Mírian Barbosa Tavares Raposo - UnB [email protected] Atualmente, as diversas demandas educacionais exigem que as escolas regulares estejam preparadas para receber alunos com necessidades educacionais especiais, proporcionando-lhes uma educação de qualidade com condições igualitárias, onde as diferenças sejam respeitadas no processo de ensino e aprendizagem. Na antiguidade, pessoas com deficiências 240 eram intituladas anormais e possuidoras de forças malignas muito ligadas a crenças sobrenaturais; elas eram consideradas um mal para a sociedade (Boaventura, 2008). A Declaração de Salamanca de 1994 marca a luta contra o preconceito; a partir dela, se iniciaram discussões voltadas à inclusão e de atendimento em todo o mundo, inclusive, no Brasil (Moraes, 2009). Bueno (2001) refere-se ao movimento brasileiro de integração escolar que, desde a década de 1970, privilegia a detecção de características individuais que possam prejudicar a escolarização dos alunos e que, diante deste diagnóstico, incorpora cada aluno à educação regular ou especial. No Brasil, historicamente, o sistema segregado de ensino, somado à educação bancaria (Freire, 1987), torna ainda maior o desafio de mudanças. Bueno (2001) destaca que, ao lado dessas práticas de reprovação, está o ensino seriado ou a ausência de qualquer seriação na educação especial. Segundo a Orientação Pedagógica da Educação Especial do Distrito Federal (2010), a rede publica de ensino, visando tornar sua estrutura organizacional pedagógica mais inclusiva e, para efetivar esse processo, define que ele deverá acontecer de maneira paulatina, tendo em vista a acessibilidade curricular e o aprimoramento das perspectivas organizativas, de maneira coerente e responsável, respeitando a flexibilização da dimensão da temporalidade e de outros aspectos, para que o sistema de ensino se torne cada vez mais inclusivo. Quanto à qualificação profissional do professor, Leão (2004) entende que essa qualificação seja essencial para a inclusão e deva ser continuada. Ferreira (2005), a esse respeito, afirma que o processo de inclusão pressupõe uma escola que possui uma política participativa com cultura VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento inclusiva, de maneira que os membros da comunidade escolar sejam colaboradores entre si, apóiem-se mutuamente e aprendam uns com os outros. Esta pesquisa teve por objetivo analisar como gestores e professores de uma escola regular na cidade de Ceilândia viabilizam o processo de inclusão. Foi nossa intenção específica compreender que aspectos da organização do trabalho pedagógico da escola e da sala de aula poderiam ser consideradas fundamentais para o desenvolvimento e a aprendizagem do aluno com necessidades educacionais especiais. Como parte da metodologia, entendemos que a pesquisa qualitativa responde a questões muito particulares; ela se preocupa, nas ciências sociais, com um nível de realidade que não pode ser quantificado. Para a realização desse trabalho participaram o diretor da instituição de ensino e uma professora que atua com alunos especiais (NEEs) na área da surdez. As estratégias empregadas para a construção dessa pesquisa foram a pesquisa documental e as entrevistas. Foi elaborado um roteiro com 46 perguntas, que foram distribuídas em cinco categorias, para a realização da entrevista. Após ouvirmos atentamente as entrevistas, procuramos transcrevê-las fielmente, não omitindo nem acrescentando nada além daquilo que foi dito. Dentre os resultados, de acordo com o PPP da escola pesquisada, o processo de avaliação não se refere, apenas, a uma verificação do rendimento escolar do aluno, mas, sim, a todo um processo de adaptação e crescimento que consciente de que seu papel apresente domínio sistêmico, evidenciado nas demonstrações e articulações práticas com a vida. As entrevistas demonstram a concepção do diretor e da professora em relação às práticas da inclusão. A partir da analise desses instrumentos chegamos a três categorias: (a) a formação dos professores: por meio dessa categoria foi possível observar que a formação do professor deve acontecer durante todo o processo, ou seja, deve ser inicial e continuada, partindo da realidade do professor, da escola e dos alunos envolvidos no processo; (b) a família como parceira: percebeu-se a profunda necessidade da participação da família, numa perspectiva bidirecional, de maneira que um possa alimentar o outro de informações fundamentais que contribuam para o desenvolvimento do aluno NEE; (c) o currículo e suas adequações: sugere-se, a partir dessa categoria, que os alunos possam vivenciar, no processo educacional, um currículo contextualizado, interdisciplinar e que sofra adequações compatíveis com as necessidades específicas de cada um dos alunos em formação; e (d) avaliar no dia a dia: a avaliação, a partir dos resultados do estudo, deve ser processual, contextualizada, formativa e servir como ponto de referência para reorganização das atividades escolares. Concluímos que ainda não seja possível realizar a inclusão que desejamos, mas, entendemos que a experiência relatada seja relevante, no que diz respeito ao processo evolutivo da escola como espaço inclusivo. O professor pode utilizar as estratégias apresentadas para enriquecer o seu trabalho e para refletir sobre suas estratégias e instrumentos utilizados no processo de ensino aprendizagem, a fim de alcançar os objetivos desejados. A inclusão de qualidade é possível, apostando numa postura de respeito dos professores frente aos seus alunos com dificuldades de aprendizagens, sendo eles NEEs ou não. Como formaremos cidadãos que promoverão as mudanças necessárias no meio em 241 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento que vivemos construindo uma sociedade melhor? Ansiamos por educadores que sejam capazes de desencadear ações que tornem os seres humanos melhores, que pensem no outro e no futuro do planeta, e que utilizem, para isso, criatividade, disposição e, como falou o diretor, sentimento. Acredita-se que este estudo possa oferecer importantes contribuições quanto à inclusão escolar de qualidade e proporcionar, aos professores, oportunidade de reflexão quanto a sua prática pedagógica, com um novo olhar e uma nova postura, em relação à educação inclusiva. Palavras-chave: inclusão/avaliação/ adequações curriculares, relação famíliaescola, formação de professores Contato: Mirian Barbosa Tavares Raposo, UnB, [email protected] SP LT04 - Simpósio SP LT04 1293 PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO E POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO INFANTIL NO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO Vera Maria Ramos de Vasconcellos - ProPEd/ UERJ [email protected] Fátima Veról Rocha - SME/RJ [email protected] Maciel Cristiano da Silva - ProPEd/UERJ e SEMED/NI [email protected] Flávia Maria Cabral de Almeida - ProPEd/ UERJ [email protected] Marcia Gil - ProPEd e SME/RJ [email protected] 242 A proposta apresentada é parte das discussões e reflexões realizadas no Núcleo de Estudos da Infância: Pesquisa & Extensão (NEI:P&E) e na Linha de Pesquisa Infância, Juventude e Educação do Programa de Pós-Graduação em Educação, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (ProPEd/UERJ). Com foco nas Políticas Públicas busca estabelecer um trabalho profícuo de parceria com a Secretaria Municipal de Educação da Cidade do Rio de Janeiro (SME/RJ), onde a pesquisa Agente Auxiliar de Creche: Educadores da Infância Carioca é desenvolvida. Visa, entre outros objetivos, apoiar a implementação das políticas públicas do governo municipal na formação em serviço dos agentes auxiliares de creche, aprovados no concurso público realizado em 2007 (Edital nº1 de 04/08/2007) e dos Professores de Educação Infantil (Edital nº 91, de 25 de outubro de 2010). A pesquisa está situada nas áreas de Educação Infantil e Desenvolvimento Humano e visa influenciar na produção de discussões sobre as questões de desenvolvimento e formação de subjetividade de crianças (0 a 42 meses) e adultos (educadores da infância e familiares), num ambiente educacional específico (creche). Articula temas de pesquisa, valorizando a produção nacional da Psicologia do Desenvolvimento em interlocução com a Educação da Infância. Este Simpósio apresentará quatro pesquisas interrelacionadas, são elas: (i) Formação de Educadores de Creche: Compartilhando Experiências; (ii) Infância & Inclusão: Olhares sobre as Práticas Pedagógicas e o Desenvolvimento Humano; (iii) Diálogo entre Família e Educadores de Creche; e (iv) De um Concurso a Outro: a trajetória de um município na Construção de Identidade do Educador Infantil. VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento FORMAÇÃO DE EDUCADORES DE CRECHE: COMPARTILHANDO EXPERIÊNCIAS Fátima Veról Rocha - PROPED/UERJ e SME/RJ [email protected] Ana Lúcia Ferreira - FE/NEIPE/UERJ [email protected] As mudanças no cenário nacional após a promulgação da CF/88, no âmbito educacional, referente à educação das crianças de zero a seis5 anos, vincula o atendimento em creches e pré-escolas à área de Educação. Tal fato representou o primeiro passo rumo à superação do caráter assistencialista que, até então, predominava nos programas de atendimento à infância e seu texto deixa claro que as propostas educacionais devam basear-se em princípios de respeito aos direitos das crianças. Posteriormente, o Estatuto da Criança e do Adolescente (1990) e a LDBEN6 9394 (1996) surgem com o objetivo de concretizar e regulamentar seus dispositivos nas diferentes esferas da sociedade. Neste cenário, os profissionais que desenvolvem o trabalho com as crianças, também passam a ter importância reconhecida legalmente e os debates acadêmicos sobre a qualidade dos serviços oferecidos aos pequenos têm enfatizado também, a questão da formação de profissionais que atuam neste nível da ensino. De acordo com a LDBEN/96, art. 62 “a formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil [...] é o nível médio, na modalidade normal”. (BRA5 O que já foi alterado pela Emenda Constitucional nº 53, de 19 de dezembro de 2006 que estabelece: IV - educação infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5 (cinco) anos de idade. 6 Lei que disciplina a educação escolar, que se desenvolve, predominantemente, por meio do ensino, em instituições próprias. (Art.1º, § 1º). SIL, 1996). No município do Rio de Janeiro, por força da legislação, as creches públicas passaram a integrar a SME/RJ. Desde então, mudanças estruturais aconteceram em decorrência do processo transitório. A principal mudança na estrutura de funcionamento das instituições ocorreu após o concurso público (Edital - SME/SMA nº8, de 24/07/2007 ). Em junho de 2008, o quadro de pessoal das creches públicas do município do Rio de Janeiro passou a contar com os novos profissionais egressos do concurso. Este estudo apresenta parte dos resultados da pesquisa “Creche Odetinha: um estudo de caso”, desenvolvida no mestrado em Educação do PROPED/UERJ (2008 - 2010). A pesquisa teve por objetivo descrever e analisar o processo de formação de um grupo de 34 educadores7 (AAC), recém concursados e atuantes numa creche municipal, localizada na zona norte do Rio de Janeiro. Os instrumentos utilizados na pesquisa foram questionários, sessões reflexivas (em pequenos/grandes grupos), além de análise dos relatórios de avaliação e registros produzidos pelos educadores. Nesta apresentação será destacado o perfil dos educadores, com o objetivo de refletir sobre a formação em serviço necessária para atender às especificidades de trabalho com criança de zero a três anos. Para produzir esses dados, utilizamos um questionário que continha itens relativos a: i) dados pessoais; ii) aos aspectos formativos (trajetória escolar e nível de escolaridade); iii) profissionais (vínculo empregatício, carga horária de trabalho, experiência anterior e atividade laboral exercida antes de trabalhar na creche) e iv) sobre as atri7 Agente Auxiliar de Creche: educadores das creches públicas do município do Rio de Janeiro que integram o quadro de pessoal de apoio à educação, desde 2008. 243 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento buições profissionais (atividades desenvolvidas com as crianças e expectativas em relação ao cargo e a creche). A análise permitiu conhecer alguns traços da história de profissionalização dos educadores nesta creche. Quanto ao gênero, 3 são do sexo masculino e 31 são educadoras (91%). Nível de escolaridade, dos 34 educadores: 1 tem pós- graduação lato sensu em educação e 16 possuem 3º grau completo. Deste total, apenas 9 possuem formação em pedagogia. O restante compreende outras formações como: psicologia, administração de empresas, direito, engenharia civil, fisioterapia, marketing e licenciatura em educação física. Ainda em nível superior, 10 possuem 3º grau incompleto: 4 estão cursando a formação superior em pedagogia e 6 educadores em outras áreas: farmácia, licenciatura em história (2), matemática, geografia e educação física. Encontramos ainda, 10 funcionários com ensino médio completo e, deste total, somente 6 concursados possuem formação em curso Normal8 , os outros 4 educadores têm ensino médio regular9. Analisando o grau de escolaridade, constatamos que apesar do edital do concurso para o cargo de Agente Auxiliar de Creche contrariar a disposição da LDBEN/96 de que “a formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil [...] [é] a oferecida em nível médio, na modalidade Normal” (BRASIL, 1996, art. 62.), nenhum educador concursado, atuante nesta instituição, possui formação mínima. Na realidade, nesta creche, 79% do grupo de educadores têm ou estão cursando o 3º grau (formação superior). Os dados encontrados nos mostram que, apesar 8 Atualmente, três cursando nível superior (licenciaturas em áreas diversas) 9 Deste total, três estão cursando o PROINFANTIL. 244 dessa formação superar o nível fundamental exigido no edital, 50% dos funcionários concursados, não possui formação específica para o exercício do magistério. Este quantitativo soma 17 funcionários leigos, sendo que do total, 59% (10 educadores) atualmente estão cursando o PROINFANTIL10. Em relação à experiência profissional anterior ao concurso: 44% dos educadores nunca tinham trabalhado com criança, 30% já haviam desenvolvido algum tipo de atividade com a faixa etária acima de quatro anos e, somente, 26% já possuía experiência anterior em creche. A não exigência de formação específica em educação como pré requisito para o cargo trouxe, para as creches, educadores leigos, com nível de escolaridade elevado, entretanto, muitas vezes, sem experiência anterior de trabalho na Educação Infantil. Dados que denotam uma mudança significativa do que havia sido apresentado como a realidade do cenário nacional, apontado em estudos anteriores: leigos, com baixa escolaridade, providos dos saberes da experiência profissional. (Oliveira et al., 2006; Cerisara, 2002; Kishimoto, 1999). Dos 4 educadores que já atuavam na área de ensino, sem experiência em creche, encontramos professor nível fundamental, de pré-escola, de educação de jovens e adultos e de curso preparatório, todos oriundos da rede privada. Dos 9 educadores que tinham experiência em creche, 7 já trabalhavam nesta creche, antes do concurso. Durante a pesquisa, as propostas de intervenção não fugiram daquilo que era proposto pela SME/ 10 Trata-se de um curso semipresencial de formação para o magistério, em nível médio, na modalidade Normal, oferecido para professores em exercício na educação infantil, que atuam em creches e pré-escolas da rede pública e da rede privada que não possuem a formação exigida pela legislação vigente. VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento RJ como espaço de formação: os Centros de Estudos. Tivemos por objetivo, ao longo de 2009, avaliar o que ia mudando na concepção destes profissionais em relação ao conceito de “creche” e do trabalho por eles realizado que integrasse “educação e cuidado”. Esperamos que as considerações ora apontadas, possam contribuir e embasar as discussões sobre políticas públicas e sociais voltadas para a infância, assim como na estruturação de diretrizes para a formação das profissionais que lidam com crianças tão pequenas. Palavras-chave: Educação Infantil, Creche, Formação de Professores. INFÂNCIA & INCLUSÃO: OLHARES SOBRE AS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS E O DESENVOLVIMENTO HUMANO Maciel Cristiano da Silva - ProPEd/UERJ e SEMED/NI [email protected] Fabíola Lira Gonçalves - FE/NEIPE/UERJ [email protected] O presente trabalho enfoca as primeiras articulações desenvolvidas na pesquisa de mestrado “Inclusão de Crianças Focais na Educação Infantil”. A pesquisa analisa dados de um follow-up com crianças participantes de duas investigações anteriores. A primeira “Infância, Educação e Inclusão: um estudo de caso”11 e a segunda “Crianças Focais: uma triangulação educação-família-saúde na creche”12. Apresenta a 11 SILVA, Maciel Cristiano da. Infância, Educação e Inclusão: um estudo de caso. 2009. Monografia (Graduação de Pedagogia) UERJ. Rio de Janeiro. 12 OLIVEIRA, Miriam P. R. de. Crianças Focais: a triangulação educação-família-saúde na creche. 2009. Dissertação (Mestrado em Educação) UERJ. Rio de Janeiro. discussões referentes ao Estudo de Caso da primeira pesquisa mencionada que teve como foco uma criança com múltiplas deficiências. Inicialmente o diagnóstico era de surdez, porém na instituição os educadores perceberam outras dificuldades, que prejudicavam a participação da criança nas atividades por eles propostas. Para mergulhar, no cotidiano, das práticas pedagógicas de Educação Infantil fez-se necessário uma proposta metodológica de imersão do pesquisador na instituição para compreender a dinâmica da mesma. Por ser uma única criança observada (e seu entorno), optou-se pelo estudo de caso. Para Yin (2001) esta proposta metodológica é utilizada para compreender processos na complexidade social nas quais eles se manifestam: seja em situações problema, em análise de obstáculos, seja em situações bem-sucedidas, para avaliação de modelos exemplares. Esta proposta possibilita compreender um caso particular em sua complexidade. Exige do pesquisador investigar a realidade articulada a determinado contexto e definir recursos metodológicos capazes de aprofundar e construir explicações que permitam captar o real. Para tanto, há que se consideram as dimensões e os movimentos da criança e de seus outros sociais (educadores e outras crianças). No primeiro momento da pesquisa decidimos relativizar o Caso estudado, dialogando com as práticas pedagógicas de Jean Itard, tendo por base seus relatórios de 1801 e 1806 (In: Banks-Leite & Galvão, 2001) e no filme O Menino Selvagem de François de Truffaut (1970). Para tal usamos como referencial teórico a perspectiva sócio-histórica de Lev Vygotsky (1998 e 2007), focando os processos de desenvolvimento e sociabilidade presentes no material empírico de Jean Itard. Para o levantamento de dados 245 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento adotamos como procedimentos metodológicos: observações com registro e entrevistas semiestruturadas, com a mãe adotiva13 do menino e cinco educadores. As entrevistas aconteceram no decorrer das atividades de acompanhamento e observação da criança na creche. Nas análises dos escritos de Itard, percebemos que o médico tinha por propósito desenvolver os sentidos de seu jovem pupilo, dando grande importância aos aspectos sensoriais. A prática desse médico era baseadas na concepção filosófica empirista de Condillac (1715-1780), na qual o sujeito era entendido como desprovido de experiência. Dr. Itard intencionava moldar e controlar o comportamento de seu aprendiz a partir de estímulos sensoriais e uso de recompensas e punições. No que tange ao desenvolvimento de Victor, deve-se considerar que enquanto vivera isolado nas Florestas de Avyeron, não precisara de nenhum recurso de comunicação humana para satisfazer suas necessidades fisiológicas, dependia tão somente de sua astúcia física na superação dos obstáculos da natureza. Em sua nova fase de vida, Victor necessitava de da mediação de sujeitos sociais para o mundo que lhe era apresentado. Somente imerso num contexto humano, poderia atribuir sentido e sentir necessidade do uso da fala oral. Vale destacar que mesmo com um universo interpessoal restrito e pela necessidade de comunicação com os outros sujeitos, Victor desenvolve o que é chamado de “linguagem da ação”, constituída de gestos e mímicas (Banks-Leite & Souza, 2001). Tais recursos de comunicação que foram apropriados pelo menino eram ignorados por seu tutor que só objetivava o desenvolvimento da fala. Para o médico, as linguagens corpo13 A biológica faleceu durante o parto. 246 rais e gestuais não eram consideradas forma de linguagem valida para que houvesse processo comunicativo. O Dr Itard compreendia tais manifestações como primitivas e, portanto, um obstáculo ao aprendizado da verdadeira linguagem: a fala. Sobre essa relação Banks-Leite & Souza(2001) esclarecem que o fato do jovem Victor usar a linguagem da ação e através dela ser entendido, evidencia que o convívio social não lhe era estranho. Como bem é destacado pelas autoras o gesto de apontar só é entendido como tal, como efeito de um ato de interpretação por outrem. Passando agora à descrição das observações das cenas cotidianas do menino na creche (Estudo de Caso), destacamos a presença de alguns indícios de interação social que para seus educadores, de forma similar ao médico-educador Itard, não eram valorizadas. O menino observado mantinha-se, muitas vezes, próximo de outras crianças e adultos, independente de estar numa atividade de relacionamento com elas. Nos relatos dos educadores é enfatizado um peculiar interesse da criança por água, assim como os relatados pelo médico-educador, sobre o menino de Avyeron. No trabalho com os educadores buscamos valorizar o que a criança conseguia apresentar. Por exemplo, constatamos que seu relacionamento com outros sujeitos ocorria em forma de gestos, ou seja, a partir do que os outros conseguiam perceber na ação dele. Tal fato era muitas vezes interpretada como agressão. Verificamos também que a participação do menino nas atividades da creche era reduzida propositalmente pelos educadores, pois solicitavam que o menino chegasse um pouco mais tarde e saísse sempre antes das demais crianças. Esta decisão prejudicava a participação da criança em foco nas atividades pedagógicas orientadas, ou seja, VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento deixava-se de oportunizar momentos de interação mediada pelos educadores. Conforme os relatos e observações partilhadas, passamos (pesquisador e educadores) a perceber que a criança compreendia e interpretava fatos e ações que ocorreriam ao seu redor. Do mesmo modo, apresentava um potencial comunicativo facilmente compreendida pelos sujeitos ao seu redor, mesmo sendo elas denominadas pelos educadores de agressivas; na verdade isto pode ser alguma possível forma de comunicação com os demais sujeitos. Em suma, esta fase da pesquisa possibilitou articular uma reflexão dos fazeres cotidianos dos recém chegados agente auxiliares de creche, com crianças que demandavam outros fazeres pedagógicos, como, por exemplo, o menino em estudo. Forneceu suporte à formação continuada dos educadores, (re) significando algumas práticas de cuidar-educar. As discussões permitiram aos educadores e ao pesquisador momentos de reflexão sobre o tema, além de prestar apoio técnico-pedagógico à equipe de coordenação da creche. Palavras-chave: Infância, Inclusão, Práticas Pedagógicas. DIÁLOGO ENTRE FAMÍLIA E EDUCADORES DE CRECHE Flávia Maria Cabral de Almeida - ProPEd/UERJ [email protected] Amanda Cristina de Freitas Souza - FE/NEIPE/UERJ [email protected] Em nossa sociedade, é crescente o número de famílias que decide colocar suas crianças pequenas na creche. Esta procura deve entrar na pauta das políticas públicas para a ampliação de vagas e a garantia da quali- dade do serviço oferecido para essas crianças (BRASIL, 2006). Quando se trata de oferta e qualidade das creches, devemos levar em consideração as necessidades das famílias, especialmente das mães trabalhadoras (Aquino & Vasconcellos, 2005; Mizrahi, 2004) e das famílias que necessitam de uma rede social de apoio (Piccinini et al., 2007). Embora legítimas as necessidades dos adultos, a criança deve ser o alvo principal, sendo reconhecida como sujeito de direito a ser educado em um ambiente complementar à família (Brasil, 1996). O objetivo deste trabalho é apresentar parte da tese que vem sendo construída sobre a relação creche-família, apresentando resultados obtidos nas análises preliminares. A tese tem como finalidade analisar o processo de construção da relação família-educadores ao longo de três anos em uma creche pública municipal do Rio de Janeiro. Estudos sobre o desenvolvimento humano afirmam que a família é a primeira mediadora entre o homem e a cultura, garantindo uma unidade dentro das relações afetivas, sociais e cognitivas presentes no grupo (Dessen & Polônia, 2007). Essa instituição depara-se com desafios vindos do mundo do trabalho, das questões de gênero, do advento de novas tecnologias. A maneira como se organizam frente a esses desafios é relevante para verificar a necessidade de compartilhar o cuidado com os filhos e/ou contar com o suporte das redes de apoio social. A formação dessas redes deve ser estimulada, levando-se em conta que as famílias também estão constantemente lidando com fatores de estresse próprias da dinâmica do relacionamento entre seus membros (idem). A creche constitui um dos braços dessa rede de apoio e compartilha com as famílias a educação de suas crianças, representando mais um espaço 247 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento para o desenvolvimento. A interação família e creche tem sido considerada um palco de negociações de valores e crenças, mas também de conflitos entre os saberes de um e de outro. Alguns desses conflitos se traduzem na falta de confiança, na disputa (real ou imaginária) pelo amor da criança (Maranhão & Sarti, 2008). Investigações nesse campo têm demonstrado que, em geral, os momentos de encontro são breves (na entrada e/ou despedida) e baseadas na solução de problemas imediatos, porque as professoras se dividem entre as crianças e os familiares, que geralmente estão apressados. Tanto as professoras quanto as famílias almejam um contato mútuo, embora o que geralmente motiva o diálogo sejam as insatisfações de ambas as partes (Bahia, Magalhães & Pontes, 2009; Sarkis & Bhering, 2009). Mesmo quando a creche planeja e incentiva a comunicação pode haver constrangimentos entre famílias e professores (Bhering & Sarkis, 2007). Em geral, famílias e professores concordam sobre os ganhos sociais que as crianças adquirem quando frequentam a instituição de educação infantil, mas de diferentes pontos de vista: os pais não enfatizam os aspectos pedagógicos; as professoras, por sua vez, valorizavam a preparação das atividades pedagógicas e não mencionam a relação com pais para a ampliação das possibilidades educativas (Bhering, 2009). A creche, por ser uma instituição onde as crianças passam uma grande parte do seu tempo, convivendo com outros colegas e adultos, lidando com as normas coletivas, é um novo contexto de desenvolvimento. Isto traz implicações para os estudos sobre o desenvolvimento humano, já que é diferente dos contextos que as teorias do desenvolvimento até então analisavam. As questões que antes eram restritas aos am248 bientes familiares, agora são compartilhadas com os educadores da creche (Bhering & Sarkis, 2007). Os sujeitos da pesquisa são educadores e famílias de 42 crianças que frequentam a creche desde 2009 (quando tinham entre quatro e doze meses) até o ano de 2011. Adotamos a perspectiva do estudo de caso longitudinal, optando por fontes de dados diversificadas, que permitem uma visão mais abrangente do objeto (Alves & Azevedo, 2010). Utilizamos questionários, entrevistas, diário de bordo e observações. Para este trabalho, apresentaremos os resultados obtidos através de 3 questionários: ficha de acompanhamento e observação do período de inserção e avaliação do trabalho da creche (2009 e 2010). Os questionários foram submetidos a exame quanti e qualitativo. Os resultados preliminares do primeiro questionário indicam que os aspectos importantes observados na inserção de crianças são semelhantes para educadores e famílias, o que diferencia é a ordem de importância. As famílias ficam atentas aos fatores comumente relacionados ao “cuidado” (alimentação, sono), deixando em último lugar o que é típico de um ambiente coletivo: a relação com outras crianças e adultos. A idade das crianças em 2009 também deve ter contribuído para que os aspectos ligados ao “cuidado” apresentassem maior destaque. Os educadores, por sua vez, estão mais atentos aos aspectos ligados ao trabalho desenvolvido na creche, como a brincadeira e a interação. O choro para ambos constitui um forte indicador para saber se a criança está bem ou não durante a inserção. Nos outros dois questionários, verificamos que a busca pela creche se devia ao fato de a mãe trabalhar fora. As famílias respondentes estavam satisfeitas com o trabalho promovido VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento pela instituição, e mais da metade afirmou que colocaria o filho na creche, mesmo se não trabalhasse. Todos os pais disseram participar das reuniões, sendo presentes no cotidiano da instituição e estabelecendo diálogo constante com os educadores e a direção. A presença na creche contribuiu para que conhecessem o trabalho da instituição, reconhecendo que a atividade da creche era educar e cuidar, e complementar à família. A independência e interação foram os aspectos mais destacados no desenvolvimento do filho, sendo também destacadas quando mencionavam as vantagens da creche. No questionário de 2010, a mudança significativa foi a comunicação e socialização como aspectos que foram desenvolvidos com a frequência da criança à creche. Através da análise desse material e dos demais utilizados na investigação, esperamos ampliar o conhecimento sobre o tema em estudo. Acreditamos que a creche pode contribuir no desenvolvimento da criança, mas também na própria relação desta com sua família. Palavras-chave: Creche; Família; Infância. DE UM CONCURSO A OUTRO A TRAJETÓRIA DE UM MUNICÍPIO NA CONSTRUÇÃO DE IDENTIDADE DO EDUCADOR INFANTIL Márcia de Oliveira Gomes Gil - PROPED/UERJ [email protected] Daniele Vieira de Azevedo - FE/NEIPE/UERJ [email protected] RESUMO O presente artigo apresenta um breve histórico da trajetória de organização do corpo docente e de apoio que atuam junto à Educação Infantil no município do Rio de Janeiro. É intenção olhar especificamente a partir do ano de 2005, com a criação da categoria funcional de Agente Auxiliar de Creche14, que passou a integrar o Quadro de Pessoal de Apoio à Educação, através da Lei 3985 de 08 de abril, até criação do cargo de Professor de Educação Infantil em 201015. Este percurso é analisado a partir de concursos públicos realizados nos últimos 3 anos, voltados para o profissional que atua com funções pedagógicas junto às crianças pequenas. Em 2007, foi realizado o primeiro concurso público para agente auxiliar de creche, através de provas e títulos, ocorrendo a seleção de forma regionalizada, isto é, por CRE16, com exigência de formação mínima em nível fundamental17 e carga horária de 40 horas semanais. Esta pesquisa analisa as mudanças nas políticas educacionais públicas da cidade do Rio de Janeiro, desde o edital conjunto SME/SMA nº8, de 24 de julho de 2007 (com oferta de 1.519 vagas regulares e 81 para pessoas com deficiência), para Agentes Auxiliares de Creche, até o edital nº 91, de 25 de outubro de 2010 (com 14 No ano de 2005, o poder executivo do município do Rio de Janeiro, através da Lei 3985 de 08 de abril, criou a categoria funcional de “Agente Auxiliar de Creche”, que passou a integrar o Quadro de Pessoal de Apoio à Educação. O ingresso ao cargo, deu-se através de concurso público realizado em 2007, constituído de provas e provas de títulos, sendo exigido a formação mínima em nível fundamental e carga horária de 40 horas semanais. A seleção ocorreu regionalmente, isto é, pelas Coordenadorias Regionais de Educação (CRE). 15 Projeto de de lei nº 701/2010, cria no quadro permanente do poder executivo do Município do Rio de Janeiro a categoria funcional de professor de Educação Infantil. 16 Coordenadoria Regional de Educação – a cidade do Rio de Janeiro está divididas em 10 Coordenadorias 17 Em desacordo com a LDBEN 9394/96, que no seu artigo 62 define “a formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil [...] é o nível médio, na modalidade normal”. 249 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento oferta de 1424 vagas regulares e 76 para pessoas com deficiências). A chegada dos agentes auxiliares de creche às instituições buscava substituir o recreador - profissional contratado junto às Organizações da Sociedade Civil (OSC)18. Também trouxe alguns questionamentos pertinentes à nossa discussão. Para começar, as funções dos agentes auxiliares de creche são descritas no edital do concurso e envolvem ações pedagógicas19, tais como: disponibilizar e preparar os materiais pedagógicos a serem utilizados nas atividades; auxiliar nas atividades de recuperação da autoestima, dos valores e da afetividade; observar as alterações físicas e de comportamento, desestimulando a agressividade; estimular a independência, educar e reeducar quanto aos hábitos alimentares, bem como controlar a ingestão de líquidos e alimentos variados. Ainda de acordo com o edital e pela própria nomeclatura do cargo, estava descrito com função esse profissional atuar em apoio pedagógico a um professor. Participar da execução das rotinas diárias, de acordo com a orientação técnica do educador; Colaborar e assistir permanentemente o educador no processo de desenvolvimento das atividades técnico-pedagógicas; Receber e acatar criteriosamente a orientação e as recomendações do educador no trato e atendimento à clientela. Na realidade, não havia um educador para cada grupamento. Um olhar mais atento ao documento20 que ainda norteava o funcionamento dessas instituições, aponta que a estrutura técnico-administrativa da creche conta com: um diretor, professor ou especialista de educação da rede de ensi18 Resolução SME nº 816/2004 19 Edital conjunto SME/SMA nº8 de 24 de julho de 2007 20 Resolução SME nº 816/2004 250 no; um professor regente articulador, também professor da rede; cozinheiro ou merendeira; lactaristas, para as creches com berçário; auxiliar de serviços gerais e recreadores. Estes últimos, mesmo depois de 2008, com a chegada dos agentes auxiliares de creche dependendo da localização da unidade, permaneceram nas creches até junho de 2011. A Professor(a) Regente Articulador(a) tem a responsabilidade de coordenar o trabalho pedagógico de toda a creche.. Assim, os fazeres cotidianos junto às crianças ficam centrados no recreador/agente auxiliar de creche ou seja, em profissional sem formação específica para tal função. Enfatizamos a importância de uma formação anterior àqueles que se dedicam ao trabalho educativo, sem desconsiderar a formação que ocorre no cotidiano das ações. Segundo Vasconcellos (2001) a formação de professores e outros profissionais para o trabalho nas instituições de educação infantil só são possíveis pela construção coletiva e reconstrução pessoal de sentidos, significados e valores referentes a uma filosofia de educação infantil para todas as crianças, independente de raça, religião ou etnia.(p.?) As questões apontadas acima contrariam diretamente a legislação, e parecem demonstrar um caráter de precariedade no atendimento oferecido às crianças. Com a posse de uma nova gestão na Cidade, algumas mudanças tiveram curso, e estão sendo analisadas nesta pesquisa. Dentre elas está a criação do cargo de Professor de Educação Infantil, com realização de concurso público em 2010. Desta vez, o edital exigiu a formação mínima Normal Médio (na modalidade normal), Normal Superior ou Pedagogia (com Licenciatura Plena, com habilitação para docência na Educação Infantil e anos iniciais do Ensino Fundamental ou especí- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento fica para Educação Infantil). A carga horária é de 22 horas e trinta minutos semanais. O cargo tem como descrição sumária: Planejar, executar e avaliar, junto com os demais profissionais docentes e equipe de direção, as atividades da unidade de Educação Infantil e propiciar condições para o oferecimento de espaço físico e de convivência adequados à segurança, ao desenvolvimento, ao bem-estar social, físico e emocional das crianças. Com a chegada dos novos profissionais (Professor de Educação Infantil) às creches um novo dilema se instala, isto é: profissionais com funções próximas, carga horária e salários distintos. Esta pesquisa pretende realizar um estudo que acompanhe a constituição/produção da identidade do educador da infância carioca. São questões de estudo: Como será a convivência dos Agentes Auxiliares de Creche e os Professores de educação Infantil? Como se dará a partilha das tarefas diárias? Qual o impacto da entrada dos professores no desenvolvimento e na educação da infância carioca? Observar as duas políticas e buscar entender os significados lá expressos e os sentidos reconstruídos por cada profissional é fundamental para constituir um olhar sobre as políticas de Educação Infantil que se concretizam nesta cidade. Uma nova identidade do Educador da Infância Carioca parece estar se constituindo. O olhar pedagógico vem ganhando força com novas políticas que assentam o professor nesta etapa de ensino, e desta forma, atendem à necessidade urgente de oferecer atendimento de qualidade às crianças, na forma de seu direito assegurado em lei. Palavras-chave: Agente Auxiliar de Creche, Concurso Público, Professor de Educação Infantil, Identidade do Educador da Infância. SP LT06 - Simpósio SP LT06-1404 - AVALIAÇÃO E INTERVENÇÃO EM PSICOLOGIA PEDIÁTRICA: PROPOSTAS PARA MINIMIZAR RISCOS AO DESENVOLVIMENTO Kelly Ambrósio Silveira - UFES [email protected] O campo da Psicologia Pediátrica tem sido definido como um domínio interdisciplinar e de interface da Psicologia do Desenvolvimento e da Psicologia Clínica. Este campo se ocupa do funcionamento e do desenvolvimento físico, cognitivo, social e emocional, além do seu relacionamento com a saúde de crianças, adolescentes e suas famílias. No cenário brasileiro, a Psicologia Pediátrica vem se consolidando como um campo de saber científico, em que existe uma preocupação bastante clara em enfatizar uma visão global e psicossocial do desenvolvimento humano, sobretudo, nos contextos da saúde e da educação. Nesse sentido, estudos nessa área têm enfocado a eficácia de propostas metodológicas de avaliação e intervenção, em uma perspectiva desenvolvimentista, e que sejam aplicadas a populações em situação de vulnerabilidade, ou seja, com risco de problemas e atraso no desenvolvimento. No presente simpósio, pretende-se apresentar e discutir pesquisas realizadas em nível de pósgraduação, em Psicologia Pediátrica, com enfoque na avaliação e intervenção, com diferentes tipos de população em condição de vulnerabilidade biopsicossocial: (a) crianças inseridas no contexto hospitalar por problemas diversos, como bebês prematuros e com baixo peso internados em UTIN e enfermaria pediátrica, e (b) crianças 251 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento entre 6-11 anos de idade hospitalizadas, e bebês prematuros e com baixo peso, com idade entre 18 e 36 meses, freqüentando Ambulatório de Neurologia, em hospitais públicos. O Estudo 1 deste simpósio abordará as estratégias de enfrentamento (coping) de crianças entre 6 e 11 anos que se encontram hospitalizadas e de seus cuidadores, utilizando dois instrumentos de avaliação de coping: Instrumento de Avaliação do Enfrentamento da Hospitalização (AEH) e Escala Modos de Enfrentamento (EMEP), também analisando os problemas de comportamento entre as crianças estudadas por meio do Child Behavior Checklist (CBCL/6-18 anos). Esta escala também foi utilizada no Estudo 2 deste Simpósio, que aborda as percepções maternas sobre cuidados e problemas comportamentais de filhos prematuros e com baixo peso, com idade entre 18 e 36 meses. Com essa mesma população, o Estudo 3 analisará uma proposta de intervenção com mães de bebês prematuros e com baixo peso, internados em UTIN, integrando dados de pesquisas realizadas em hospitais públicos de Vitória, ES e do Rio de Janeiro, RJ, em parceria entre universidades (UFES, UFRJ, UVV e Faculdade Salesiana de Vitória). Enfocando mais diretamente o cuidador - geralmente a mãe -, pessoa central no processo de desenvolvimento infantil, os dados dessas pesquisas podem contribuir ou contêm propostas de intervenção que conduzem à melhoria nas estratégias de enfrentamento dos problemas apresentados pelos filhos, adquirindo, assim, um caráter protetor de seu desenvolvimento. Pretende-se discutir como essas propostas podem contribuir para consolidar a área da Psicologia Pediátrica como campo de estudo, pesquisa e intervenção no cenário acadêmico-científico no Brasil. 252 Palavras-chave: Psicologia Pediátrica, riscos ao desenvolvimento, estratégias de enfrentamento HOSPITALIZAÇÃO INFANTIL: ESTRATÉGIAS DE ENFRENTAMENTO DE CRIANÇAS E CUIDADORES Camila Ramos Medalane Cravinho - UVV [email protected] Claudia Pedroza Canal - UVV/ [email protected] Alessandra Brunoro Motta Loss - UFES [email protected] Financiamento: FUNADESP/UVV/CNPq A implantação do modelo de assistência psicológica e de humanização, em serviços de saúde pediátrica, tem contribuído para que aspectos do desenvolvimento físico, cognitivo e emocional da criança sejam minimamente afetados pela doença. De outro lado, os vários tipos de tratamento provocam mudanças na rotina da criança, exigindo freqüentes idas ao hospital, internações, afastamento escolar e familiar, exposição a procedimentos médicos invasivos, entre outras alterações do cotidiano, que provocam reações de stress e sofrimento (McCaffrey, 2006). No caso da hospitalização, estudos mostram que um período de internação superior a cinco dias é fator de risco para o desenvolvimento de transtornos comportamentais (Dias, Baptista & Baptista, 2003). Deve ser levado em consideração, ainda, que a hospitalização tem impacto não somente sobre a criança em desenvolvimento, mas, também, sobre sua família. O cuidado diário da criança no hospital implica no abandono temporário das atividades cotidianas e dos outros VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento membros da família, bem como a responsabilidade de gerenciar os cuidados com a criança doente em um ambiente hostil, no qual a tomada de decisão sobre esses cuidados está centrada em pessoas até então desconhecidas (Weisz, McCabe & Dennig, 1994). Assim, uma vez que o comportamento da criança pode afetar o modo como ela lida com a hospitalização, interferindo no curso da recuperação, e que o contexto adverso associado à hospitalização é suficiente para gerar reações de stress e sofrimento, exigindo a necessidade de enfrentamento da situação para a eliminação ou minimização do estressor; este estudo buscou investigar as estratégias de enfrentamento de crianças hospitalizadas e de seus cuidadores, bem como verificar a presença de problemas de comportamento entre as crianças estudadas. Para tanto, realizou-se um estudo descritivo, de corte transversal, com 15 crianças: 7 meninos e 8 meninas, com idades entre 6 anos e 3 meses a 12 anos e 11 meses (média de 9 anos e 5 meses), internadas em hospital público de Vila Velha/ES, que responderam ao Instrumento de Avaliação do Enfrentamento da Hospitalização (AEH) (Motta & Enumo, 2004, 2010), que fornece informações sobre os comportamentos durante a hospitalização e permite verificar as estratégias de enfrentamento da hospitalização, a partir do relato das crianças; e ao Child Behavior Checklist (CBCL/6-18 anos) (Achenbach & Rescorla, 2004), que avalia a competência social e problemas de comportamento anteriores à hospitalização. Para a análise do enfrentamento dos familiares, 15 cuidadores - sendo a maioria mães - responderam à Escala Modos de Enfrentamento (EMEP) (Faria & Seidl, 2006; Seidl, Rossi, Viana, Meneses & Meireles, 2005). As informações coletadas na avaliação foram analisadas quantitativa e qualitativamente, de acordo com as normas dos instrumentos. Em relação aos comportamentos apresentados pelas crianças durante a hospitalização, obtidos a partir do AEH, verificou-se o predomínio de comportamentos facilitadores (M = 1,93) sobre os comportamentos não-facilitadores (M = 0,77). A análise por tipo de comportamento destaca a média maior dos comportamentos: assistir TV e tomar remédio. Os comportamentos que apresentaram menor média foram buscar informações e cantar. Entre os comportamentos não-facilitadores, verificou-se uma pontuação média maior na prancha pensar em milagre e desanimar. Esconder não foi referido por nenhuma criança como um comportamento emitido no hospital. A pontuação média superior no comportamento de assistir TV pode ser justificada pelo fato de ser o único recurso de distração disponível para a criança durante a internação, mostrando a relevância de ações institucionais que promovam o brincar nesse contexto. Quando se analisam as justificativas das crianças para suas respostas, a fim de obter a estratégia de enfrentamento que está sendo relatada, foi verificada uma proporção maior da estratégia de distração (40,5%), seguida da estratégia de ruminação (31,1%), busca por suporte (25,7%) e solução do problema (20,3%). A estratégia que apresentou menor proporção foi regulação da emoção (1,3%). A estratégia de distração tem sido predominante em outros estudos com crianças hospitalizadas por doenças crônicas, como o câncer, mas a freqüência da estratégia de ruminação é um indicador da necessidade da inclusão do psicólogo na equipe de saúde, 253 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento avaliando e desenvolvendo propostas de intervenção que favoreçam o processo adaptativo da criança. Na análise de competência (CBCL), as crianças foram referidas, na maioria, como não-clínica (Social = 87,5%; Escolar = 81,2%). Com relação ao envolvimento da criança em atividades esportivas e de lazer, a maioria foi referida como clínica, indicando o baixo envolvimento em atividades recreativas. Já a análise de problemas de comportamento (CBCL) mostrou que a maioria das crianças foi referida como clínica. A análise por tipo de comportamento permitiu verificar que a indicação de problemas é do tipo internalizante, caracterizado por um padrão de depressão, retraimento e desânimo. Esses achados ressaltam a importância da inserção do psicólogo na Pediatria, uma vez que um padrão de desânimo e depressão anterior à hospitalização pode repercutir na variabilidade de estratégias da criança para lidar com a hospitalização. Com relação à avaliação das estratégias de enfrentamento dos cuidadores, verificou-se que dos quatro fatores da EMEP, o Fator 3 (Busca de prática religiosa/pensamento fantástico) apresentou média de pontuação superior (M= 2,95 e DP= 1,77), seguido do Fator 4: Busca de suporte social (M= 2,83 e DP= 1,82) e do Fator 1: Enfrentamento focalizado no problema (M= 2,81 e DP= 1,73). O fator que apresentou menor média foi o Fator 2: Enfrentamento focalizado na emoção (M= 1,75 e DP=1,21). A análise por itens destaca médias superiores nos itens 44 – “Eu me apego à minha fé para superar esta situação” (M = 3,65) e 6 – “Espero que um milagre” aconteça (M = 3,55), ambas as estratégias do Fator 3. A freqüência maior de estratégias do Fator 3 mostrou-se coerente com estudos que indicam a 254 busca da religiosidade no enfrentamento de problemas, especialmente, em situações de pouco controle, como é o caso da hospitalização. Além disso, considera-se a cultura religiosa como variável que interfere na resposta de enfrentamento. Espera-se que a presente avaliação possa contribuir para o subsídio de intervenções com crianças hospitalizadas, bem como com seus cuidadores, prevenindo danos emocionais gerados pela hospitalização. Palavras-chave: estratégias de enfrentamento, hospitalização infantil, cuidadores. Contato: Camila Ramos Medalane Cravinho, Centro Universitário Vila Velha/UVV, [email protected] PERCEPÇÕES MATERNAS SOBRE CUIDADOS E PROBLEMAS COMPORTAMENTAIS DE FILHOS PREMATUROS E COM BAIXO PESO Kelly Ambrósio Silveira - UFES/IESFAVI [email protected] Schwanny Roberta Costa Rambalducci Mofati Vicente - UFES [email protected] Sônia Regina Fiorim Enumo - UFES [email protected] Financiamento: CNPq A literatura tem apontado a prematuridade e o baixo peso como fatores que podem conferir maior vulnerabilidade ao desenvolvimento infantil. Seus efeitos podem ser observados durante a primeira infância e, até mesmo, na fase escolar (Linhares, Bordin & Carvalho, 2004; Magalhães, Catarina, Barbosa, Mancini & Paixão, 2003). Diversos estudos mostram VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento que crianças em condições de nascimento prematuro e com baixo peso (PT-BP), quando comparadas a crianças com peso ≥2.500g e >37 semanas de gestação, são mais propensas a apresentar comprometimentos no desenvolvimento cognitivo e comportamental (Espírito Santo, Portuguez & Nunes, 2009; Linhares, Chimello, Bordin, Carvalho & Martinez, 2005). Ao mesmo tempo, a Psicopatologia do Desenvolvimento tem indicado a ação de fatores biopsicossociais que tendem a produzir efeitos diferenciados ao longo da trajetória de desenvolvimento infantil (Laucht, Schmidt & Esser, 2004). Nesse contexto, a interação de criança e seus familiares parece ser crucial para o desenvolvimento de variadas habilidades (Linhares, Martins & Klein, 2004). Ressalta-se, também, que as condições neurológicas e familiares da criança atuam de modo significativo a suavizar ou agravar tais comprometimentos. Estudos têm apontado que mães com filhos PT-BP mostram-se mais atentas nos cuidados com os filhos, assim como mais sensíveis em relação aos sinais emitidos por eles (Feldman, 2007). Esses comportamentos maternos podem constituir-se em uma forma de compensação perante os riscos aos quais os bebês estão expostos. Por outro lado, as mães podem apresentar comportamentos menos assertivos ao lidar com o filho, em decorrência da fragilidade do recém-nascido e sentimentos de culpa vivenciados (Feldman, 2007; Morsh & Abreu, 2008). Diante disso, esta pesquisa investigou queixas comportamentais relacionadas aos filhos, além de formas de cuidado e interação entre crianças PT-BP com idade entre 18 e 36 meses e suas mães, inscritos em Programa de Follow up de um Ambulatório de Neurologia de um hospital público da Grande Vitória, ES. Participaram da coleta 30 mães de crianças PT-BP, divididas em três grupos: mães de crianças de 18 a 24 meses (G1= 10), 24 a 30 meses (G2= 10) e 30 a 36 meses (G3= 10). Foram aplicados: um questionário sobre dados familiares e de nascimento e uma entrevista semiestruturada contemplando percepções sobre formas de cuidado com os filhos, métodos de estimulação que as mães utilizavam e expectativas sobre o desenvolvimento do filho. Também foi aplicado o Child Behavior CheckList – CBCL (1½ a 5 anos) (Achenbach & Rescorla, 2004), que avalia problemas comportamentais do tipo internalizante e externalizante, além de conter escalas orientadas pelo DSM-IV que, no caso do presente estudo, apontaram predominância de problemas externalizantes, com 30% da amostra apresentando perfil Clínico para esse problema comportamental. Os problemas mais frequentes foram de ordem atencional (50% da amostra). A maioria das crianças (20) apresentou perfil clínico para pelo menos um tipo de problema comportamental, com maior proporção no G1 (7). Considerando as médias obtidas pelos T scores, os problemas atencionais e a agressividade tiveram as maiores pontuações, sobretudo, em G1 (60,5 e 61,3) e G2 (65,0 e 62,2), respectivamente. Considerando as escalas orientadas pelo DSM-IV, foi observada maior frequência em G1 e G2 de Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (5 crianças cada) e Transtorno Desafiador e Opositor (2 e 3 crianças, respectivamente). A partir da entrevista, foi possível identificar que 80% das mães acreditavam que o fato do filho ter nascido PT-BP não influenciava seu desenvolvimento e que a assistência que a criança iria receber seria primordial. As mães relataram 255 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento que levavam sempre a criança para consultas com médico, fisioterapeuta e outras especialidades que fossem necessárias. Costumavam, também, estar muito presentes na vida dessas crianças, dando carinho e apoio, fatores que elas acreditavam ser fundamentais para o desenvolvimento de seus filhos. Uma pequena parte das mães (20%) acreditava que a PT-BP influenciava o desenvolvimento de seus filhos, mas, todas concordavam que a estimulação era essencial. Todas as mães falaram sobre a importância de sua ajuda no desenvolvimento da criança; essa ajuda foi traduzida, em 72,5% das mães, em cuidados com a saúde, como acompanhamento com profissionais de saúde, boa alimentação, uso de remédios e vitaminas; dar atenção, carinho e cuidar foi relatado por 62,5% das mães; e realização de atividades lúdicas, por 37,5% das mães. Foram relatadas outras atividades com baixos índices, tais como levar para escola e creche, com 15%, e também praticar natação, com 7,5%. Com relação às atividades que realizavam juntos, as mais citadas foram: passeio no parque ou pracinha, visita aos parentes e atividades realizadas em casa, tais como brincar. Verificou-se que, enquanto a frequência de menção às visitas a parentes diminuiu de G1 a G3, a menção de atividades lúdicas e de lazer aumentou. De acordo com as mães, os pais tiveram um papel secundário no cuidado dos filhos, desenvolvendo atividades voltadas à vigilância e às atividades lúdicas. Na perspectiva das mães, os familiares costumavam lidar com as dificuldades externalizantes, demonstrando os seguintes comportamentos, em ordem decrescente de frequência: tentar distrair a criança (11), ajudar a criança por achá-la frágil (9), mesmo irritado, não 256 interferir (7), bater (3) e não dar atenção (2). Observou-se que em G1 houve maior frequência de comportamentos pouco assertivos, ligados, sobretudo, a ajudar a criança por achá-la frágil (5), tentar distrair a criança (4) e não interferir, mesmo nervoso (3). Diante dos resultados obtidos, é possível concluir que as mães de crianças PT e BP acreditam que esses fatores podem não afetar o desenvolvimento da criança, a partir do momento em que elas se disponibilizam ao cuidado. Sugere-se que o sentimento de culpa frente ao nascimento de risco, porventura, experimentado pelas mães e demais familiares, pode contribuir para a manutenção de repertório comportamental que contemple a superproteção, como forma de compensar a vulnerabilidade apresentada pelos filhos e o desconforto frente aos problemas apresentados. G1 apresentou discurso relacionado à superproteção e ao cuidado não assertivo, e teve maior frequência de crianças com problemas comportamentais externalizantes. Os dados presentes confirmam a literatura quanto à vulnerabilidade de crianças nascidas PT-BP para a manifestação de problemas comportamentais, sobretudo, os de padrão externalizante, e a presença de cuidados familiares pouco assertivos, indicando a necessidade de apoio aos pais, com treinamento de habilidades ligadas à estimulação dos filhos. Palavras-chave: risco ao desenvolvimento, prematuridade, avaliação do desenvolvimento Contato: Schwanny Roberta Costa Rambalducci Mofati Vicente, Universidade Federal do Espírito Santo, [email protected] VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento ANÁLISE DE UMA PROPOSTA DE INTERVENÇÃO COM MÃES DE BEBÊS PREMATUROS E COM BAIXO PESO INTERNADOS EM UTIN Ana Cristina B. Cunha - UFRJ [email protected] Luciana F. Monteiro - UFRJ [email protected] Cristiane T. Rocha - UFRJ [email protected] Ana Paula A.S. Medeiros - UFRJ [email protected] Anderson M. Rodrigues - UFRJ [email protected] Camila S. Pereira - UFRJl [email protected] Fabiana Pinheiro Ramos - UFES [email protected] Schwanny Roberta Costa Rambalducci Mofati Vicente - UFES [email protected] Maria Luiza Guidoni Macedo - UFES [email protected] Kely Maria Pereira de Paula - UFES [email protected] Sônia Regina Fiorim Enumo - UFES [email protected] Financiamento: CNPq/MCT/CAPES/MEC/ FAPERJ/CNRMS/MEC Situações de risco podem acarretar maior vulnerabilidade para atrasos de desenvolvimento, sobretudo, quando no nascimento de um bebê estiverem presentes condições de risco, como a prematuridade e o baixo peso (PT-BP). Tais condições podem, freqüentemente, ser causa de internação dos bebês em Unidades de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN) e provocar alterações nas expectativas maternas acerca do seu desenvolvimento, modificando, assim, as possibilidades de interação da día- de mãe-bebê (Carvalho, Linhares, Machado & Martinez, 2004). A UTIN, dispositivo que oferece o máximo de suporte para o desenvolvimento do recém-nascido, também se constitui em potencial fator de risco, devido às privações de estímulos sensoriais ou excesso de estimulação decorrente da atividade humana e tecnológica presentes nesse ambiente (Raeside, 1997). As complicações neonatais podem constituir indicadores para ocorrência de efeitos negativos no desenvolvimento, tais como: deficiências motoras, visuais e auditivas; retardo mental; distúrbios de atenção; dificuldades de aprendizagem em idade escolar e pior desempenho em testes de capacidades cognitivas e lingüísticas, se comparados aos de crianças nascidas a termo e com peso adequado (Espírito Santo, Portuguez & Nunes, 2009; Linhares, Bordin & Carvalho, 2004). Isso tudo pode ser agravado quando a percepção materna da condição da criança resulta em maiores níveis de estresse, ansiedade e depressão, que podem perdurar mesmo após a alta, indicando a necessidade de intervenção psicológica (Feldman, 2007). Nesse contexto, a realização de intervenção durante o período em que a mãe fica internada com o bebê pode minimizar os impactos da hospitalização infantil no bem-estar emocional materno, com possíveis reflexos na interação mãe-criança e no desenvolvimento infantil (Gasparetto & Bussab, 1994; Melnyk, Feinstein & Fairbanks, 2006; Melnyk et al., 2006). O objetivo deste estudo foi analisar uma proposta de intervenção em Psicologia Pediátrica (Barros, 2003), conduzida em duas maternidades públicas de referência para assistência pré-natal e perinatal de alto risco - na Região Metropolitana da Grande Vitória, ES (n=18) e na 257 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento Maternidade-Escola da Universidade Federal do Rio de Janeiro (n=14). Seguindo as normas éticas, as mães foram abordadas pessoalmente e convidadas a participar do grupo de intervenção, que ocorreu em duas sessões consecutivas. O critério de inclusão na amostra era o bebê ser PT-BP e estar internado na UTIN. Na sessão 1 do grupo de intervenção foram explicitados às mães os objetivos e as etapas da pesquisa. Após a concordância assinada, as mães responderam, individualmente, um protocolo de registro de dados sobre seu perfil psicossocial, sendo entregue um material de apoio com informações sobre desenvolvimento infantil, prematuridade, baixo peso e a internação na UTIN, conteúdos transmitidos às mães nos dois dias do grupo, sob a forma de palestra informativa seguida de discussão, com apoio de material audiovisual. Na sessão 2, as mães responderam um inventário de satisfação do usuário e um questionário de avaliação da intervenção psicológica implementada, para verificar se a participação no grupo as ajudou a enfrentar melhor a situação de internação do bebê. As categorias analisadas foram: (a) se o grupo ajudou a mãe no enfrentamento da situação do bebê; (b) o que a mãe achou mais interessante ou importante (ou não interessante/importante) no grupo; (c) como a mãe se sentiu após as sessões: “muito melhor”; “melhor”; “igual”; “pior” ou “muito pior”; (d) o que a mãe aprendeu sobre o bebê internado em UTIN: “nada”; “muito pouco”; “alguma coisa”; “várias coisas” ou “muitas coisas”; (e) o que a mãe aprendeu sobre como lidar com o bebê internado: “nada”; “muito pouco”; “alguma coisa”; “várias coisas’ ou “muitas coisas”; (f) estado emocional da mãe após o grupo para cuidar do bebê internado: 258 “nada confiante”; “um pouco confiante”; “o mesmo que antes”; “mais confiante’ ou “muito mais confiante”; (g) percepção materna do quanto o grupo ajudou a enfrentar a internação do bebê: “não ajudou”; “ajudou pouco”; “nem ajudou, nem atrapalhou”; “ajudou um pouco” ou “ajudou muito”; (h) sentimentos maternos sobre participar do grupo: “detestou muito”; “detestou um pouco”; “sente-se neutra”; “gostou um pouco” ou “gostou muito”. Os resultados mostraram que todas as mães avaliaram que o grupo ajudou no enfrentamento da situação de internação do seu bebê, quer seja porque elas adquiriram conhecimento (n=12), quer seja porque puderam contar com suporte psicossocial (n=14) ou ambas as coisas (n=5). Todas as mães consideraram interessante e importante o conteúdo transmitido ao grupo, sendo que a maioria (n=20) avaliou como interessante e importante o conhecimento adquirido (características do bebê PT-BP, como cuidar do bebê, marcos do desenvolvimento infantil, por exemplo), além da troca de experiência que o grupo promoveu (n=7), entre outros aspectos. Sobre como as mães se sentiram após as sessões, 8 relataram que se sentiram “um pouco melhor do que antes”, enquanto 24 mães declararam se sentir “muito melhor do que antes”. Quando questionadas sobre o que aprenderam sobre o bebê internado em UTIN, a maioria (n=20) disse ter aprendido “muitas coisas” sobre o bebê internado e “muitas coisas” sobre como lidar com o bebê na UTIN (n= 21). Após participar do grupo, apenas uma mãe declarou se sentir da mesma forma que antes em relação a estar confiante para cuidar do bebê, enquanto que a maioria se declarou “mais confiante” (n= 13) ou “muito mais confiante” (n=18); além dis- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento so, a maioria afirmou ter “gostado muito do grupo” (n= 31) e 27 mães também consideraram que o grupo “ajudou muito” a enfrentar a internação do bebê na UTIN. Os sentimentos e percepções maternas acerca da participação no grupo indicam uma avaliação positiva da proposta de intervenção psicológica adotada, capaz de promover estratégias mais adequadas de enfrentamento da hospitalização do bebê, a partir do conhecimento adquirido, bem como do suporte psicossocial e da troca de experiências que o grupo proporcionou às mães. Palavras-chave: grupo de mães, estratégias de enfrentamento, prematuridade e baixo peso Contato: Cristiane Tonnensen Rocha, Universidade Federal do Rio de Janeiro, [email protected] CO 17 - LT02 Surdez LT02-1382 - COGNIÇÃO E LINGUAGEM DOS SURDOS: UM ESTUDO EXPLORATÓRIO COM BASE NO TESTE WISC-III Tharso Meyer - UCPel-RS [email protected] Vera Figueiredo - UCPel-RS [email protected] Considerando o número cada vez maior de surdos inseridos na comunidade acadêmica/escolar, surge uma demanda de profissionais especializados, metodologias e instrumentos adequados para atender às necessidades dessa população com características tão específicas. A avaliação da inteligência dos surdos é uma atividade muitas vezes relevante para decidir quanto ao encaminhamento e/ou planos de intervenção para a efetividade dos processos inclusivos. As escalas Wechsler de inteligência, em suas diversas edições, são amplamente utilizadas na avaliação de crianças e adolescentes, estimando a capacidade intelectual geral em função dos domínios das habilidades verbais e não-verbais. Encontram-se vários estudos que utilizam estas escalas também com surdos, administrando, principalmente, o conjunto de subtestes não-verbais, os quais não exigem respostas que envolvam a linguagem oral do examinando. Devido ao atraso no desenvolvimento da linguagem, os surdos, geralmente, têm desvantagens nos subtestes verbais. As aplicações costumam ser administradas de maneira informal (gestualização), oral (leitura labial) e mesmo, no caso de utilizar a Língua de Sinais, não há referências de estudos de adaptação. Os resultados apontam para escores médios na escala não-verbal e médios inferiores a limítrofes na escala verbal. Além de problemas relacionados à falta de adaptação do instrumento, outros fatores podem justificar o baixo desempenho dos surdos nos subtestes verbais das escalas Wechsler. Segundo a literatura, as oportunidades limitadas de ouvir informações e a falta do reforço auditivo prejudicam a aquisição e o aumento do vocabulário dos surdos. A limitação em compreender conceitos científicos pode estar associada à ausência de algumas aprendizagens do cotidiano, previamente adquiridas. A dificuldade ao acesso a uma língua que seja oferecida de forma natural pode levar a criança surda a um tipo de pensamento mais concreto. Os pais de 90 a 95% dos surdos são ouvintes, a maioria 259 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento demonstrando resistência no aprendizado e na utilização da Libras. Consequentemente, o filho surdo chega à escola sem dominar nenhuma língua, encarregando a instituição de criar condições para esta aquisição. A língua brasileira de sinais – Libras foi reconhecida no país em abril de 2002 e é considerada a língua materna dos surdos. Por ser uma língua recente e em construção, há uma limitação de expressões, não havendo, ainda, sinais formais para alguns vocábulos do português. O sinal utilizado para determinado conceito em Libras, pode abranger outros significados que representam, no português, palavras diferentes. Assim, a dificuldade dos surdos pode estar associada à privação de ferramentas da competência gramatical. Apresentar alguns resultados sobre a capacidade cognitiva e o desenvolvimento da linguagem dos surdos, segundo seu desempenho nas provas do teste de inteligência WISC-III. Com intuito de verificar a adequação do instrumento para a comunidade surda, o WISC-III, na sua forma original, adaptado ao contexto brasileiro, foi apresentado a um grupo de especialistas para analisar a adequação dos itens ao contexto dos surdos. Logo, foram feitas algumas modificações pertinentes e, após, os itens e as instruções do instrumento foram traduzidas para Libras. O teste WISC-III traduzido foi filmado e gravado em DVD para treinamento e padronização das aplicações. O instrumento foi aplicado em uma amostra-piloto constituída de 14 escolares surdos de ambos os sexos, usuários da Libras, matriculados de quatro escolas públicas, inclusivas e exclusivas, duas cidades da região sul do país. Apesar de o teste ser padronizado para a faixa de 6 a 16 anos, foi aplicado em participantes com idades entre 7 a 21 260 anos, considerando-se o critério mais relevante, a escolaridade dos adolescentes, uma vez que, normalmente, há um atraso na escolarização dos surdos. O teste foi aplicado nas próprias instituições escolares por duplas de pesquisadores com domínio da Libras; um sinalizava os itens e outro registrava as respostas. Em relação aos subtestes não-verbais, foram testadas as instruções e os itens iniciais de cada subteste. Os participantes não tiveram dificuldades de compreender e executar as tarefas, demonstrando terem potencial para o raciocínio prático-concreto e facilidade para percepção e organização de estímulos visuais, confirmando dados da literatura. No subteste Informação, os dados mostraram que os alunos surdos parecem ter dificuldade de memorizar e assimilar conteúdos dos itens relacionados com a vivência pessoal e o currículo escolar. Em Semelhanças, o tipo de estímulo utilizado é breve, já que inclui perguntas simples e repetitivas, exigindo que o indivíduo identifique a similaridade entre os dois conceitos ou objetos apresentados. As respostas referiram-se, geralmente, às diferenças entre os objetos, sendo associadas às situações concretas, demonstrando dificuldade no raciocínio abstrato. No subteste Vocabulário, dos 30 itens que compõe o subteste, 14 palavras não foram encontradas no dicionário de Libras, indicando pobreza lexical da língua. A tarefa no subteste exige que o examinando identifique o significado da palavra dando sinônimos. Observou-se repertório limitado de vocabulário, uma vez que, um único sinal em Libras, pode ter vários sinônimos e significados diferentes. No subteste Compreensão, que envolve conhecimento de situações sociais do cotidiano, os participantes não conseguiram dar VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento dois argumentos diferentes nos itens que exigem duas respostas, sugerindo pensamento mais concreto e dificuldade para expressar as ideias. No subteste Dígitos, o examinando deve repetir uma série de números, sinalizados pelo examinador. Identificou-se dificuldade sequencial visual e limitações na memória imediata. No subteste Aritmética que exige cálculos a partir da sinalização do examinador de problemas matemáticos, os participantes evidenciaram dificuldade de executar cálculo mental, e déficit de atenção. O desempenho nos subtestes verbais, que envolve domínio e aprendizagem da língua e raciocínio teórico-reflexivo, demonstrou pouca qualidade na elaboração das respostas. Pode-se concluir que, apesar das limitações em algumas habilidades cognitivas dos surdos e restrições na comunicação familiar, a falta de recursos léxicos da própria Língua de Sinais e a estrutura inapropriada dos subtestes verbais dificultam o processo de avaliação deste grupo clínico, por meio do teste WISC-III sem um processo de adaptação. LT02-1448 - OS EFEITOS DO NASCIMENTO DE UMA CRIANÇA SURDA EM UMA FAMÍLIA OUVINTE – CONSIDERAÇÕES DESDE A PSICANÁLISE Letícia Silveira Vasconcelos - UFBA www.ufba.br Sônia Maria Rocha Sampaio - UFBA www.ufba.br Duas correntes principais e opostas sobre a surdez são encontradas na psicologia e nas demais áreas que se ocupam do tema. A mais antiga, vinculada a um modelo médico, denominada modelo clínico-terapêutico, se alinha a uma concepção da surdez como uma deficiência que deve ser reparada. Esta perspectiva está referida a um conceito fixo de normalidade. É uma tendência, neste modelo, atribuir-se ao surdo desvantagens maturativas, sejam elas de origem neurológica ou psicológica. Na psicologia, a concepção clínico-terapêutica foi dominante especialmente entre os anos 50 e 60, dando origem à Psicologia da Surdez, que atribuía ao surdo dificuldades de ordens motora, intelectual e comportamental. (Bisol, Simioni & Sperb, 2008; Solé, 2005). Em oposição a esta corrente, surge o modelo socioantropológico, que se desenvolve em interface com os Estudos Culturais, as antropologias de grupos minoritários, políticas de educação, políticas identitárias, entre outros. Este conjunto de estudos é denominado Estudos Surdos. Ele parte de uma compreensão da surdez como diferença, cultural e lingüística, e propõe a construção de saberes e práticas que considerem as particularidades da aquisição da linguagem e construção do conhecimento pelos surdos como qualitativamente diferentes dos ouvintes. (Skliar, 2010; Bisol et al, 2008; Solé, 2005). Um terceiro grupo de trabalhos sobre a surdez pode ser identificado, ainda que não se constitua como um modelo. São os trabalhos que se constroem a partir da teoria psicanalítica. Segundo Solé (2005), só recentemente este tema tem sido estudado por psicanalistas e ainda há um número pequeno de artigos publicados. Esses estudos devem ser considerados como um grupo a parte, não se alinhando com nenhuma das correntes citadas anteriormente. Em um artigo no qual analisam a produção da psicologia brasileira sobre a surdez, Bisol et al (2008) também situam os estudos de concepção psicanalítica como um terceiro grupo. Dos 34 artigos 261 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento encontrados, seis foram identificados pelas autoras como pertencentes ao modelo clínico-terapêutico, 24 ao socioantropológico e quatro à concepção psicanalítica. Desde a psicanálise, a surdez vai ser tomada a partir da forma como se inscreve na história do sujeito e daqueles com quem vai estabelecer seus primeiros laços. Desse modo, como afirma Solé (2005, p.35), a psicanálise “não se atém à normalização e não busca a cura”, mas vai se perguntar sobre as especificidades da estruturação subjetiva de cada sujeito marcada pela surdez. Este trabalho parte da idéia de que a surdez se apresenta para a teoria psicanalítica, de cara, como um desafio, uma vez que vai demandar um repensar sobre algumas questões centrais à psicanálise, em especial àqueles que trabalham com a psicanálise e o desenvolvimento infantil. Porém, justamente por isso, que é na própria psicanálise que se poderá produzir contribuições importantes sobre o tema. Entre estes pontos destaca-se a centralidade incontestável da linguagem para esta teoria e sua conseqüente importância para a estruturação subjetiva; a importância atribuída pela psicanálise, desde Freud, às primeiras experiências da criança com a linguagem, mediada pelo Outro Primordial; e o papel fundamental da voz materna, e do manhês, para o enlaçamento do bebê à linguagem. Neste trabalho, buscamos artigos empíricos de outras áreas de pesquisa para verificar essas idéias. Entre outros, Beauchemin, González-Frankenberger, Trembla et al., (2010) ressaltam a importância da voz, em detrimento de outros estímulos sonoros, para o córtex auditivo, em especial de vozes familiares. Este estudo demonstrou que bebês não só reagem à voz materna de forma mais ativa, como reagem de forma diferente, 262 ativando áreas corticais relevantes para a linguagem. Também Kuhl (2007) mostra que o uso do manhês por adultos encoraja a reciprocidade nas crianças e demonstra que mesmo recém-nascidos preferem as falas dirigidas aos bebês, ainda que não sejam produzidas por suas próprias mães e mesmo que não sejam ditas em sua língua materna. Os estudos sobre a aquisição da linguagem ressaltam a importância de que a criança seja, desde seu nascimento, inserida em um ambiente lingüístico natural, em que a língua lhe seja apresentada cotidianamente. Esta compreensão se sustenta no entendimento de que a língua e a linguagem são adquiridas em relação com o outro e com o meio. De modo geral, os trabalhos sobre a surdez definem a língua de sinais como língua natural, ou língua materna, dos surdos, justamente por ser essa uma língua que o surdo pode apreender naturalmente. No entanto, entre 90 e 95% das crianças surdas nascem em famílias ouvintes, que não dominam a língua de sinais. Algum tempo se passa até que a família possa se adaptar às necessidades lingüísticas deste novo membro e que possa escolher que caminho vai tomar no que diz respeito à inserção de seu filho na língua. Diante do exposto perguntamos o que pode nos dizer a psicanálise sobre os efeitos do nascimento de uma criança surda em uma família de ouvintes. Três grupos de efeitos são analisados: os efeitos na entrada do bebê na linguagem, os efeitos na alienação e separação entre os corpos da mãe e do bebê e os efeitos na apresentação do mundo ao bebê. Entendemos que, embora apresentados de forma separada, estes são eventos essenciais ao processo de estruturação subjetiva. A análise destes três eixos, a partir de artigos teóricos, relatos de casos e experiência VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento profissional com crianças surdas e suas famílias, demonstrou que a surdez, enquanto ausência de percepção do estímulo auditivo, não impede o processo de estruturação subjetiva. No entanto, ela coloca algumas barreiras, especialmente por conta da diferença lingüística entre o bebê e sua família. Não é a lesão real, mas a lesão fantasmática (Bergès, 1988b) que pode trazer efeitos mais nocivos e permanentes para o sujeito surdo. Sob todos os aspectos, ficou bastante clara a necessidade de um diagnóstico o mais precoce possível da surdez. Do lado estrutural, o saber sobre a surdez e o poder elaborar o luto pelo filho idealizado é que vão dar início à construção de um novo lugar para o bebê. Do lado instrumental, um acompanhamento interdisciplinar poderá ajudar a família a lançar mão de diferentes possibilidades lingüísticas, ainda nos primeiros momentos de sua entrada na linguagem. Palavras-chave: surdez, psicanálise, estruturação subjetiva Contato: Letícia Silveira Vasconcelos – UFBA – [email protected] LT03-1004 - PROJETOS DE VIDA DE UNIVERSITÁRIOS SURDOS EM UMA PERSPECTIVA ÉTICA Alline Nunes Andrade - UFES [email protected] Heloisa Moulin de Alencar - UFES [email protected] Financiamento: FAPES A moral passa por desenvolvimento (Piaget, 1932/1994; Kohlberg, 1992) e se origina da indeterminação, que “obriga o ser humano a construir o modo como quer ser e o modo como se quer viver” (Puig, 1998, p. 26). La Taille (2006) diferencia moral de ética, sendo moral referente aos deveres e ética relacionada às reflexões acerca da felicidade. Nesse contexto, é possível emergirem perguntas como “quem eu quero ser?” (La Taille, 2006, p. 46) e “que vida eu quero viver?” (p. 36), instigando a investigação sobre projetos de vida. Para Damon (2009), o projeto de vida, em uma perspectiva ética, é “uma intenção estável e generalizada de alcançar algo que é ao mesmo tempo significativo para o eu e gera consequências no mundo além do eu” (p. 53). Pesquisas sobre projetos de vida em tal perspectiva destacam a escassez de projetos de vida em que o outro comparece de forma central (D'Áurea-Tardeli, 2005; La Taille & Madeira, 2004; Miranda, 2007). Para investigar a relação entre moralidade e legitimação de atos violentos, La Taille e Madeira (2004) analisaram projetos de vida de adolescentes e observaram que, em linhas gerais, o uso da violência não foi condenado moralmente pelos participantes. Os autores ressaltam que "grande parte dos adolescentes justificam hipoteticamente a violência [...] e, no plano ético, não inclui outrem como parceiro nos seus projetos de vida." (p. 30). Em sua pesquisa, D'Áurea-Tardeli (2005) verificou que somente 29,55% dos participantes apresentaram aspirações solidárias em seus projetos de vida. Por sua vez, Miranda (2007) também considerou as justificativas dos projetos de vida de adolescentes em conectados, nos quais outras pessoas eram incluídas como protagonistas e participantes, ou desconectados, quando outras pessoas eram consideradas, mas de modo instrumentalizador. As principais justificativas (66,7%) caracterizaram 263 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento os projetos de vida como desconectados (Miranda, 2007). Com base nesses dados, pretendemos investigar o grau de consideração do outro em projetos de vida estabelecidos por universitários surdos, usuários da língua de sinais. Os surdos fazem parte de uma comunidade minoritária que, de acordo com Gesueli (2006), é usualmente discriminada, comumente pela adoção de uma perspectiva médica da surdez ou modelo clínico da surdez. Porém, Skliar, Massone e Veinberg (1995) alegam ser possível assumirmos a perspectiva socioantropológica, que considera o surdo como parte de uma comunidade para a qual a língua de sinais exerce um papel fundamental. Nebel (2006) observa que por ter sido comum o modelo clínico da surdez na área educacional, “a escola não tinha compromisso com o desenvolvimento cognitivo do aluno” (p.12). Histórias de fracasso escolar e proibição do uso de Libras nos espaços escolares foram relatadas por pessoas surdas em estudos sobre humilhação (Andrade, 2006; Andrade & Alencar, 2008, 2010). Pretendemos, assim, investigar a existência de projetos de vida em uma perspectiva ética, com a participação de 16 universitários surdos, da região da Grande Vitória-ES, usando o método clínico piagetiano, por meio de uma entrevista semiestruturada em língua de sinais e filmada na íntegra. Perguntamos aos participantes ‘Quem é você no futuro do jeito que você gostaria que fosse?’. Em resposta, foram citados 102 projetos de vida. Os principais projetos de vida são de ‘atividade profissional’ (n=29), ‘formação acadêmica’ (n=27), ‘relacionamento afetivo’ (n=20) e ‘bens materiais’ (n=11). Em ‘atividade profissional’ (n=29) identificamos como principal intenção o desejo de tornarem-se professores de 264 surdos e de Libras. Os projetos de ‘formação acadêmica’ (n=27) destacam cursar uma pósgraduação lato ou strictu sensu e concluir a graduação atual ou cursar uma nova graduação. Esse dado vai de encontro aos resultados apresentados por Miranda (2007), em cujo estudo os projetos de formação acadêmica foram pouco considerados. Os projetos de ‘relacionamento afetivo’ (n=20) abrangem tanto o propósito de casar e constituir uma família, como apenas ter filhos, adotar crianças surdas, investir na formação dos filhos e cuidar dos próprios pais. Os ‘bens materiais’ (n=11) foram considerados em menor quantidade e dizem respeito à aquisição de casa e carro, além de ter melhores condições financeiras. Em relação às justificativas, propomos o Grau de Consideração de Si e do Outro (GCSO), pois a maneira como o outro e/ou si próprio foram considerados nas justificativas caracterizou a conexão ou desconexão dos projetos. Nessa análise, os projetos citados pelos participantes podem ser do tipo: 1) ‘autocentrado’ (n=158), com referência às próprias características, necessidades, habilidades, possibilidades de satisfação pessoal ou benefício pessoal, em que o outro pode aparecer, mas figurativamente; 2) ‘conectado com a comunidade surda’ (n=63), com referência aos integrantes da comunidade surda como protagonistas; 3) ‘conectado com a sociedade’ (n=32), com preocupação em promover a inclusão, considerando o próprio relacionamento com os ouvintes como pessoas capazes de conhecer, interagir, respeitar e/ou reconhecer o valor positivo dos surdos; 4) ‘conectado com pessoas próximas’ (n=24), em que o outro é alguém ou mais pessoas com relação de proximidade com o participante ocupando um VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento papel de protagonismo em seu projeto; 5) ‘desconectado de pessoas próximas’ (n=9), em que o outro é alguém ou mais pessoas com relação de proximidade com o participante, porém considerado como meio para realizar um projeto. Os dados apresentados indicam o quão é urgente, para esses participantes, o investimento em si próprio, haja vista a quantidade de argumentos categorizados como auto centrados, ressaltando a importância do sentimento de expansão de si próprio (La Taille, 2006) como crucial para a experiência do sentido da vida. Em contrapartida, as justificativas que apontam para a conexão com o outro, em níveis diferentes de relação, totalizam um número considerável (n=119). Em tais argumentos identificamos que o participante se beneficia com o beneficio conquistado ao outro por meio de seus projetos de vida, especialmente projetos de atividade profissional e de formação acadêmica. Lembramos que projetos de vida que incluíam o outro de forma solidária foram pouco encontrados nos estudos mencionados (La Taille & Madeira, 2004; D’Áurea-Tardeli, 2005; Miranda, 2007). Pretendemos contribuir para a ampliação das pesquisas em Psicologia da Moralidade, no que tange aos estudos sobre projeto de vida em uma perspectiva ética, tendo pessoas surdas como público-alvo, a respeito de quem existem poucas pesquisas realizadas. Palavras-chave: moralidade, projetos de vida, surdos Contato: Alline Nunes Andrade, UFES, [email protected] LT03-1007 - EXPECTATIVAS E ESTRATÉGIAS DE UNIVERSITÁRIOS SURDOS SOBRE SEUS PROJETOS DE VIDA Alline Nunes Andrade - UFES [email protected] Heloisa Moulin de Alencar - UFES [email protected] Financiamento: FAPES O mal-estar moral vivido pela sociedade contemporânea tem sido alvo de reflexões (La Taille & Menin, 2009), instigando a realização de pesquisas sobre projetos de vida. Projeto vital é "uma intenção estável e generalizada de alcançar algo que é ao mesmo tempo significativo para o eu e gera consequências no mundo além do eu" (Damon, 2009, p. 53). Pesquisas recentes destacam a escassez de projetos de vida em que o outro comparece de forma central (D'Áurea-Tardeli, 2005; La Taille & Madeira, 2004; Miranda, 2007). Em sua pesquisa, D'Áurea-Tardeli (2005) verificou que somente 29,55% dos participantes apresentaram aspirações solidárias em seus projetos de vida. Miranda (2007) também classificou as justificativas dos projetos de vida de adolescentes como conectados, nos quais outrem era incluído como protagonista, ou como desconectados, quando outras pessoas eram consideradas, mas de modo instrumentalizador. As principais justificativas (66,7%) caracterizaram os projetos de vida como desconectados (Miranda, 2007). Expectativas positivas em relação ao futuro são verificadas em estudos sobre projetos de vida de adolescentes (Sarriera, Silva, Kabbas, Lópes, 2001; Miranda, 2007; Oliveira & Saldanha, 2010) e de estudantes universitários (Callegaro & Zimmerman, 2007). Por outro lado, autores identificam a indefinição do perfil profissional exigido 265 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento pelo mercado como fator de influência negativa das expectativas de estudantes universitários (Gondim, 2002; Bardagi, Lassance, Paradiso, Menezes, 2006). Autores como Matheus (2003), Furlani & Bonfim, (2010) consideram que determinadas condições sociais vivenciadas por jovens podem resultar em restrição de expectativas a metas mais palpáveis. Furlani e Bonfim (2010) observam ainda que seus participantes “expressavam a falta de criatividade e motivação para projetar planos objetivos e metas diversificadas para suas vidas” (p. 57), o que pode estar relacionado à condição econômica desfavorável. Com base nesses dados, pretendemos investigar os projetos de vidas, as expectativas e as estratégias de realização por parte de universitários surdos. Estudos apontam para a existência de humilhação nas histórias de vida de surdos (Andrade, 2006; Nebel, 2006; Gesueli, 2006; Andrade & Alencar, 2008, 2010) marcadas pela exclusão e pela impossibilidade de comunicação devido à adoção de uma perspectiva médica da surdez. Para Skliar, Massone & Veinberg (1995), a perspectiva médica impõe uma visão patológica, resultando em estratégias e recursos de ‘normalização’ do sujeito surdo; em contrapartida, a perspectiva socioantropológica considera o surdo como parte de uma comunidade para a qual a língua de sinais é central. Considerando esse histórico de restrições às pessoas surdas, entrevistamos 16 universitários surdos da Grande Vitória-ES, utilizando o método clínico piagetiano (Piaget, 1932/1994) em língua de sinais, com filmagem integral. Perguntamos aos participantes ‘Quem é você no futuro do jeito que você gostaria que fosse?’. Como resposta, foram citados 102 projetos de vida: ‘atividade 266 profissional’, ‘formação acadêmica’, ‘relacionamento afetivo’ e ‘bens materiais’ . Posteriormente, realizamos as seguintes perguntas e respectivas justificativas, para cada projeto mencionado: 1) ‘Você acredita que você realizará esse projeto?’ e 2) ‘De que maneira você pretende realizar esse projeto?’. Sobre as expectativas de realização dos projetos, obtivemos como principais respostas: ‘sim’ (n=65) e ‘depende’ (n=26). As justificativas das expectativas são do tipo ‘autocentrado’ (n=71), ‘conectado’ (n=39) e ‘desconectado’ (n=28). Em geral, argumentos autocentrados explicam as expectativas positivas de realização dos projetos, pois os participantes se baseiam em suas próprias habilidades, desejos e condições. Também nota-se que a conexão com pessoas próximas, com a comunidade surda e com a sociedade, presente nas justificativas do tipo ‘conectado’, motivam os participantes a crerem na concretização de seus projetos. Porém, respostas categorizadas em ‘depende’ revelaram argumentos desconectados, especialmente aqueles em que o participante está desconectado de si e centrado no outro. Assim, embora desejáveis, alguns projetos estão dependentes de outras pessoas para que sejam realizados, gerando instabilidade na projeção de si no futuro. Sobre como os participantes pretendem realizar os projetos, as principais estratégias foram ‘acadêmicas’ (n=63), ‘profissionais’ (n=44) e de ‘cuidado com o outro’ (n=20). Para esses participantes, a realização dos seus projetos depende principalmente de estudar, concluir a graduação e conhecer novas tecnologias. Em seguida, obter um trabalho futuro, avaliar alternativas de trabalho e participar de concursos configuram estratégias ‘profissionais’. VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento O ‘cuidado com o outro’ foi mencionado apenas pelas mulheres, principalmente em relação ao cuidado e à educação dos filhos já existentes. As justificativas das estratégias foram categorizadas em ‘autocentrado’ (n=103), ‘conectado’ (n=79) e ‘desconectado’ (n=45). As referências às próprias habilidades, necessidades e características foram novamente consideradas pelos participantes, à frente dos argumentos que remetem à conexão com a comunidade surda, com pessoas próximas e com a sociedade. Argumentos desconectados foram mencionados pelos participantes, em especial a desconexão de pessoas próximas e a sociedade desconectada dos surdos. Logo, se parte das estratégias eram conectadas devido ao desejo de criar oportunidades de desenvolvimento aos surdos, de proporcionar o desenvolvimento intelectual e moral dos filhos e de favorecer a inclusão propiciando o relacionamento entre ouvintes e surdos, as estratégias desconectadas sugerem o uso de pessoas próximas – nesse caso, intérpretes e filhos -, como meio para a realização dos seus projetos. Outro tipo de desconexão aparece em argumentos nos quais a sociedade está desconectada dos surdos. Logo, o fato de as políticas de inclusão educacional serem criadas sem considerar a opinião dos surdos, o mercado de trabalho local não propiciar a inclusão de trabalhadores surdos e os participantes não saberem como será seu futuro profissional após a formatura exemplificam essa desconexão. Lembramos que a indefinição do perfil profissional foi apontada por alguns autores (Gondim, 2002; Bardagi, Lassance, Paradiso, Menezes, 2006) como aspecto negativo da expectativa futura. Constatamos que as expectativas e as estratégias para reali- zação dos projetos de vida apresentavam justificativas do tipo autocentrado, seguido por argumentos conectados. Esse dado parece indicar a valorização que os participantes atribuem a si próprios, mas que também assinalam o lugar do outro em suas aspirações, de forma conectada; sendo que esta última forma foi pouco encontrada noutros estudos (La Taille & Madeira, 2004; D’Áurea-Tardeli, 2005; Miranda, 2007). Pretendemos contribuir para a ampliação das pesquisas sobre projeto de vida em Psicologia da Moralidade, tendo pessoas surdas como público-alvo, a respeito de quem existem poucas pesquisas realizadas. Palavras-chave: surdos; expectativas; estratégias Contato: Alline Nunes Andrade, UFES, [email protected] LT07-1429 - SURDEZ E HOMOSSEXUALIDADE: ASPECTOS DA FORMAÇÃO IDENTITÁRIA DE SUJEITOS SURDOS NO ENFRENTAMENTO DO DUPLO PRECONCEITO Fabrício Santos Dias de Abreu - FE/UnB [email protected] Daniele Nunes Henrique Silva - UnB [email protected] Aqueles considerados deficientes fogem aos padrões normatizados de desenvolvimento e são concebidos culturalmente como sujeitos incapazes de viverem amplamente em sociedade. No que tange às limitações sociais impostas a essas pessoas, a expressão da sexualidade é uma temática não problematizada; um lugar de negação da dimensão erótica. Em geral, prevalece a ideia de que as pessoas 267 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento deficientes são assexuadas, consideradas infantis e inocentes (incompletas pelo defeito). O pensamento mais tradicional dirige-se para o argumento de que a sexualidade do sujeito com peculiaridades no desenvolvimento inexiste, apesar da bibliografia científica recente apontar no sentido de contestar a relação entre deficiência e assexualidade (ou de problemática sexual) como sinônimos (Beche, 2005; Bisol, 2008 Maia, 2006 e Moukarzel, 2003). Apesar desses apontamentos, o que prevalece nos discursos cotidianos a respeito da sexualidade de pessoas com deficiência é que ela se manifesta de forma atípica e infeliz (Maia, 2006). Quando se fala em homossexualidade relacionado às deficiências, o assunto é envolto em uma penumbra, com raros estudos investigativos. O que se percebe são indícios de discussões teóricas ainda incipientes (Maia e Ribeiro, 2010). A escassez dos trabalhos acadêmicos parece refletir a dificuldade de abordagem do assunto. Assim, não se imagina uma pessoa com deficiência gay ou lésbica. Essa cartografia subjetiva (forma(to)s de identidades sexuais) apresenta, no seu fundo de análise, o problema do duplo-preconceito; ser deficiente e ser homossexual. O que prevalece no discurso hegemônico é a noção de que a sexualidade ora inexiste, ora é deformada, assim como a pessoa que a expressa. È, portanto, uma dimensão que se manifesta de forma atípica (quase patológica) e infeliz. Segundo Ferrari e Marques (2010), existem estratégias de desqualificação a todos aqueles considerados desviantes dos padrões estabelecidos pela sociedade hegemônica. Muitos indivíduos, em função disso, se posicionam a partir do lugar de subalternidade. De acordo com Foucault (1999), existem des268 qualificações que se constituem de maneira dupla; síntese da junção de vários fatores de desqualificação em um mesmo individuo como: ser surdo (“deficiente”) e ser homossexual. Nos estudos de Beche (2005), em que se discute a relação entre deficiência e sexualidade, a autora aponta a percepção dos surdos sobre a homossexualidade, evidenciando que o tema ainda causa dúvida e incompreensão, pois há pouca informação disponível (na família, na escola e outras instituições de apoio) sobre a temática. Além disso, são escassos os espaços inclusivos (com uso da libras) para sanar dúvidas acerca da sexualidade e suas diversas manifestações. Segundo Anderson e Kitchen (2000), a maior dificuldade encontrada na vida de uma pessoa com deficiência, no que tange as questões da sexualidade, é causada pelo fracasso informacional dos recursos educacionais (e de outros serviços) em proporcioná-los esclarecimentos sobre o tema. Nessa linha, Bisol (2008) afirma que o surdo não encontra na família espaço proveitoso para dirimir suas duvidas sobre sexualidade, pois, na maioria dos casos, a comunicação é precária devido a não fluência em Libras. Dessa forma, é na escola e no convívio com surdos adultos que pode acontecer o tratamento da temática. O presente trabalho aborda conceitualmente essas temáticas interdisciplinares, tentando preencher, pontualmente, a lacuna e a carência de pesquisas nesse campo. A partir de relatos de dois homens surdos, que assumem uma identidade bilíngue homossexual como fator constitutivo de suas vivências, buscou-se problematizar: a) aspectos gerais da condição social do surdo; b) experiências e vivências homossexuais; e c) (duplo)preconceito. Por meio de entrevistas semies- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento truturadas, contando com a participação de uma interprete fluente em Libras (já conhecida e aprovada pelos sujeitos entrevistados), os dados, ainda em fase preliminar de análise, demonstram que, para esses sujeitos, existe um marco (ponto de transição) definidor do reconhecimento da sua condição homossexual: a primeira relação sexual ocorrida na infância tardia. Nesses termos, a condição homossexual se refere ao ato sexual propriamente vivido, restrita a genitalidade e ao sexo. Os surdos entrevistados parecem identificar a sexualidade como algo relacionado à ação, não necessariamente vinculado à dimensão do afeto, da comunicação, da gratificação libidinosa ou de construção de vínculos. Além disso, observa-se que os sujeitos ouvidos estabelecem estratégias de ocultamento da homossexualidade como forma de não sofrerem um duplo preconceito. As estratégias mais relevantes apontadas dizem respeito ao controle do corpo, no que tange aos trejeitos estabelecidos socialmente como femininos, e ao silenciamento em relação à opção sexual nos diversos ambientes em que os sujeitos transitam. Os dados encontrados revelam que a condição homossexual ainda é pouco compreendida pelos surdos, pois há dúvidas, preconceitos e mitos acerca da experiência sexual. Desse modo, torna-se relevante ampliar os estudos nessa área e sua interface com as políticas públicas de assistência e formação das pessoas surdas. Palavras-chave: surdez, homossexualidade, identidade Contato: Fabrício Santos Dias de Abreu, UnB, [email protected] CO 32 - LT4 Violência LT04-812 - CONSELHO TUTELAR E ESCOLA: REPERCUSSÕES DE PRÁTICAS SOCIAIS COM CRIANÇAS E ADOLESCENTES Maria das Graças Vasconcelos Paiva - UERJ O objetivo deste trabalho é investigar o impacto produzido pela ação do Conselho Tutelar em escolas do subúrbio, periferia e zona norte da Cidade do Rio de Janeiro. Foram realizadas entrevistas com professores das respectivas escolas para verificar suas opiniões sobre o Conselho Tutelar. A escolha deste órgão foi determinada pela sua estreita ligação com a comunidade, inovando a forma de interação entre Poder Público e a sociedade. Age vinculado administrativamente ao Poder Executivo Municipal. Recebeu a função de garantir que os preceitos do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) fossem exercidos pela família e pela sociedade e pelas entidades de atendimento. Por outro lado, a Psicologia social comunitária, em seus vários enfoques, mostra seu compromisso com qualidade de vida da população e com os direitos humanos. Seu campo de pesquisa em práticas sociais é bastante amplo, pois, considera prática social toda prática de interação entre sujeitos sociais. Neste trabalho, serão enfocadas aquelas praticadas sobre as crianças e adolescentes nas escolas que deveriam dizer respeito aos seus direitos e deveres infantis e juvenis. As práticas educativas constituem um tipo de prática social na infância. Denunciar, observar maus tratos e faltas excessivas são práticas sociais, pois, exigem 269 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento a ação do sujeito em favor de outro. Seu sentido se fundamenta em fazer surgir efeito em outros, planejada, consciente ou inconscientemente. O Conselho Tutelar é uma instituição mediadora entre as vidas da criança e do adolescente e a vida coletiva, institui, portanto, uma nova prática entre outras que podem ser consideradas no tratamento das questões da infância. Cabe a seguinte pergunta: Em que medida a escola receberá a intervenção desta nova prática? Este trabalho tem como hipótese: a cultura solidificada das instituições escolares torna-se um empecilho para o pleno desenvolvimento das práticas sociais tutelares. Professores que lecionam em escolas da rede pública estadual e municipal de ensino fundamental e médio da zona norte, subúrbio e periferia da cidade do Rio de Janeiro Dez participantes são do sexo masculino, idade: 28 e 52 anos e 48, do sexo feminino, idade 23 e 60 anos. Média de idade, 40 anos (DP=10,16). Exercem o magistério em média a 15 anos (DP=9,43) e residem no subúrbio e da zona norte desta cidade. A escolaridade varia do segundo grau à pós-graduação: 4 professores possuem apenas segundo grau, 41, superior completo e 13, pós-graduação. O nível socioeconômico a partir do grau de escolaridade, embora não homogêneo, pode ser avaliado variando entre o nível médio baixo, médio e médio alto. Entrevista visando atender os objetivos subjacentes considerados pertinentes aos temas centrais do estudo. O instrumento foi desenvolvido no sentido de obter informações dos professores sobre o conceito de conselho tutelar (CT); a relação, dificuldades e barreiras encontradas no relacionamento entre escola e o CT; os encaminhamentos, suas principais causas; credibilidade na atuação do CT; as atitudes, crenças com 270 relação ao CT. Composta de nove perguntas transcritas em folha de papel. Os cinco temas mencionados anteriormente foram abordados em questões abertas e os outros quatro em questões fechadas. Os contatos nas escolas foram feitos através dos diretores ou coordenadores pedagógicos. As entrevistas foram respondidas por escrito por grupos de professores. O propósito inicial era realizar entrevistas individuais. Contudo, a rotina escolar a que estão submetidos os professores impediu por falta de tempo de responder individualmente às entrevistas. Como alternativa metodológica, as perguntas foram oferecidas transcritas e o registro dos dados foi feito em uma folha de papel onde se encontravam registradas as nove perguntas. No primeiro contato com os professores, pedia-se a colaboração voluntária e informava aos participantes sobre o objetivo e o tema da pesquisa. Pedia-se também que assinassem um termo de consentimento informado. O anonimato e a confidencialidade dos dados obtidos eram assegurados a todos. Em cada escola visitada, entregava-se a grupos de professores a entrevista que respondiam na presença do psicólogo, por escrito, e devolviam a seguir. Conhecimento do que é Conselho Tutelar- 62% conhecem; 38% desconhecem o conceito de Conselho Celular. Causas de encaminhamentos ao CT- Para 31% da amostra, o CT é uma alternativa para solucionar problemas de mau comportamento escolar, esgotadas todas as possibilidades de a escola resolver com a família. Para 29%, a causa é o comportamento inadequado na escola provocado por transtornos familiares Relação Conselho Tutelar versus Escola - Para 28%, o relacionamento com o CT é ineficiente, os conselheiros despreparados, omissos e desinteressados e VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento desconhecem a realidade escolar. Os professores não têm informação de como o CT funciona, onde situam e afirmam desconhecer as atribuições dos conselheiros (24%). Para 21%, a relação foi considerada apenas insatisfatória, sem parceria entre Conselho Tutelar e a escola. Para 17%, a relação é unilateral, da escola para o CT e de um cunho disciplinar e punitivo. Apenas uma minoria (10%) considera a relação positiva e que ainda poderia ser melhor se o CT fosse menos burocrático e contasse com mais recursos. As atitudes pessoais com relação ao Conselho Tutelar - Os participantes variam desde aqueles que são radicalmente contra, alegando que o órgão é ineficaz, inútil, burocrático e não devia existir; os de centro, argumentando “que pode melhor”; “que em algumas escolas funcionam em parceria”. E professores que são totalmente a favor e defendem como necessário para a defesa dos direitos das crianças e apoio à escola. Credibilidade na intervenção do Conselho Tutelar - Os participantes agrupam-se em três grupos gerais: a maioria (55%) não acredita na ação do CT na escola porque sua intervenção seria “paliativa” e/ou burocrática, e os “episódios” continuam se repetindo mesmo com sua intervenção. 25% alegam que não possui conhecimento para avaliar a pergunta. Para 21%, a relação foi considerada apenas insatisfatória, sem parceria entre Conselho Tutelar e a escola. A minoria (20%) acredita que a escola precisa de ajuda para casos complexos junto às famílias. Com base nos dados da pesquisa, conclui-se que o impacto sobre as práticas sociais educacionais não é relevante. Palavras-chave: Conselho Tutelar; Infância e Juventude; Práticas sociais educacionais LT04-904 - O BULLYING NA PERSPECTIVA SOCIOCULTURAL CONSTRUTIVISTA Raquel Gomes Pinto - UnB [email protected] Angela Branco - UnB [email protected] No contexto sociocultural do século XXI, alcançar o sucesso e a felicidade parece significar, para a maioria das pessoas, adquirir bens de consumo e realizar projetos individualistas considerando-se, cada vez menos, as necessidades e a dignidade do outro, bem como as condições do meio ambiente no qual vivemos. Desde muito cedo, crianças e adolescentes são expostos, de forma explícita ou implícita, a situações onde o competir é considerado a melhor forma do sujeito se constituir como pessoa e atingir seus objetivos. Crenças e valores orientados para a acirrada competição e o individualismo têm sido promovidos de forma recorrente, em diversos contextos sociais. Situações onde competição e individualismo são valorizados promovem a progressiva desvalorização da ética e a emergência de agressões e violência. A incidência crescente do bullying nas escolas retrata a necessidade de mudar o paradigma educacional. Segundo a psicologia científica, não existem fórmulas mágicas e o fenômeno precisa ser analisado considerando o papel da cultura, do sujeito construtivo, e da causalidade múltipla. Prevenir o bullying implica que a escola assuma, intencionalmente, o trabalho dos valores sociais positivos com alunos e professores, de forma a incluir a paz como eixo transversal no currículo escolar. Com o objetivo de investigar como a escola pretende promover ações preventivas e de resolução de situações de bullying, 271 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento analisamos um projeto de prevenção do bullying, desde sua implantação, ainda em 2011. A pesquisa inclui análise de documentos, observação das atividades previstas no projeto e entrevistas com a coordenadora, com seis professores e com seis crianças do quinto ano de uma escola pública da cidade de Brasília – DF. Os eixos norteadores da pesquisa foram: como o projeto define e compreende o fenômeno bullying, quais os seus objetivos e quais as atividades desenvolvidas para o alcance destes objetivos. O projeto é, assim, analisado e discutido a partir das falas dos entrevistados e das observações realizadas, buscando-se identificar coerência, bem como convergências e divergências no discurso de educadores e alunos. Consideramos que as instituições educativas podem e devem atuar no campo da promoção concreta da paz, de interações humanas saudáveis, éticas e respeitosas, promovendo valores como justiça, dignidade e responsabilidade social. Consideramos que o presente estudo contribuiu para a análise de iniciativas da própria escola sob a orientação e supervisão da coordenadora, e os resultados obtidos deverão gerar subsídios para a elaboração e a avaliação de projetos desta natureza, auxiliando na prevenção da violência na escola e promovendo ações concretas em prol da paz. Palavras-chave: bullying, sociocultural, violência Contato: Raquel Gomes Pinto, UnB, raquel. [email protected] 272 LT04-1311 - CULTURA DE PAZ, PREVENÇÃO DA VIOLÊNCIA E SOCIALIZAÇÃO NA PERSPECTIVA DE POLICIAIS MILITARES Letícia de Sousa Moreira - PMTO [email protected] Angela Uchoa Branco - UnB [email protected]. A sociedade pós-moderna apresenta uma configuração social bastante diversificada, onde crenças e valores são diretamente influenciados pelo contexto sócio-histórico-cultural em que a pessoa está inserida. As transformações e construções humanas decorrem tanto de um processo interno quanto externo, permeados pelos diversos agentes que compõem a sociedade. O desenvolvimento humano, portanto, é fruto da interação de uma série de fatores e, sobretudo, das relações aí estabelecidas. A partir dessa idéia, surgiu o interesse na seguinte questão: como o ser humano desenvolve suas ações vislumbrando a paz ou a violência? Entende-se que os conflitos violentos têm sido protagonistas de grandes tragédias ao longo do tempo em todo o mundo. Isso ocorre porque a sociedade persiste promovendo práticas culturais onde competição, agressão e violência são toleradas ou mesmo incentivadas, e assim a grande maioria das pessoas não internalizam o valor, o sentimento e a vivência da paz em suas vidas. A Cultura de Paz está intrinsecamente relacionada à cooperação e à resolução não-violenta dos conflitos. É uma cultura concebida como processo orientado para a tolerância, solidariedade e compartilhamento em base cotidiana, uma cultura que respeita os direitos individuais, o princípio do pluralismo, que assegura a liberdade e divergência VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento de opinião. Ela se empenha em prevenir conflitos violentos resolvendo-os em suas fontes ou origens. Na perspectiva sociocultural construtivista aqui adotada, a Paz é concebida como um conceito caracterizado pela convivência cooperativa entre seres humanos em geral, ou seja, como um conceito positivo e não como a simples ausência de conflitos ou enfrentamentos. Considerando o processo de desenvolvimento humano como dinâmico e contínuo, torna-se possível a (re) construção de valores, crenças, emoções e expectativas para serem desenvolvidos na família, escola e sociedade objetivando a construção de uma Cultura de Paz. Fazendo um recorte para um contexto específico, foi escolhida a Polícia Militar do Estado do Tocantins como campo de pesquisa, por suas peculiaridades de atuação social, sendo por vezes preventiva e por vezes coerciva, e por ser o campo de trabalho da pesquisadora. Assim sendo, este estudo buscou investigar e compreender como o sistema de crenças e valores pessoais, permeado pela instituição militar, influencia as convicções e ações de policiais militares para a construção de uma Cultura de Paz neste contexto específico. Nesse sentido, tornou-se necessário compreender quais as práticas e concepções estão presentes na vida dos policiais militares para pensar em sua atuação, visando a construção de uma Cultura de Paz. O desenvolvimento dessa visão de vida e de trabalho, vinculada à noção da paz, busca promover um aprimoramento concreto na prestação de serviços da instituição, sempre de forma articulada com os demais setores da sociedade. A realidade atual da Polícia Militar no Brasil tem por objetivo aperfeiçoar a qualidade das relações entre o policial e a sociedade, de for- ma que este seja um mediador de conflitos, utilizando o poder de polícia somente em casos extremamente necessários. O ideal da Polícia Comunitária, Jornada Formativa de Direitos Humanos e Proerd (programas desenvolvidos pela Secretaria Nacional de Segurança Pública), propõem que os policiais estejam preparados para lidar com os problemas cotidianos dos cidadãos comuns, de forma preventiva e não somente coerciva, como há anos se postulava. A metodologia utilizada foi baseada na pesquisa qualitativa, a partir de entrevistas semiestruturadas, onde os indicadores empíricos foram construídos ao longo do processo de interação pesquisador-pesquisado. Foram selecionadas seis entrevistas, de um estudo mais amplo, com quatro homens e duas mulheres e o critério de seleção foi a diversidade de posicionamentos apresentados pelos policiais entrevistados. Todos os participantes ingressaram na instituição há pelo menos cinco anos, um tempo razoável para que haja maior familiarização com a cultura institucional militar. Todos os participantes selecionados têm filhos, pois também buscou-se avaliar possíveis preocupações dos participantes com o futuro deles na sociedade de forma geral. O procedimento de análise seguiu o modelo construtivo-interpretativo, que busca transformar as informações dos participantes em algo que tenha sentido para eles e para a pesquisa. A partir do discurso dos participantes, observou-se que os policiais militares têm dificuldades com o tema da Cultura de Paz, em conceituar e admitir a existência de conflitos positivos. Os indicadores obtidos com as entrevistas revelam crenças permeadas pela cultura institucional, na qual a paz é vista como algo subjetivo, ligado muito mais à noção 273 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento de harmonia interior e espiritualidade do que à paz social. A visão de paz no sentido mais preventivo, permeado por ações concretas, é algo distante do pensamento dos participantes. Ficou evidenciado que os participantes da pesquisa não se reconhecem nesse papel de agentes multiplicadores da paz e transformadores da sociedade, modelo de atuação social e presença forte do estado nas ruas. Eles não conseguem visualizar a ressonância e abrangência de suas ações enquanto portadores de uma identidade profissional que, além de tudo, é uma autoridade constituída e deve ser usada em favor da comunidade. No entanto, forneceram muitas sugestões para a construção de uma Cultura de Paz na instituição e todos se colocaram como voluntários para participar, mesmo sem definir exatamente como poderiam colaborar. Nesse sentido, acredita-se que uma mudança de cultura institucional pode favorecer a integração entre os membros da instituição, tão requisitada pelos participantes deste estudo, e também deve contribuir para promover diálogos cooperativos, campo fértil para o cultivo e amadurecimento de idéias e sugestões. Dessa forma, a realização deste trabalho visou construir subsídios para desenvolver valores e competências que levem os policiais militares a serem promotores da Cultura de Paz no exercício das diversas funções que desempenham, dentro e fora da instituição, melhorando a qualidade de vida dos envolvidos nesse processo de construção. Palavras-chave: Cultura de Paz, Construtivismo Sociocultural, Polícia Militar. Contato: Letícia de Sousa Moreira, Polícia Militar do Tocantins, [email protected] 274 LT04-1349 - PALAVRAS E AÇÕES QUE MACHUCAM Claudilene Pereira - Me Ninar Creche Escola [email protected] Amanda Nogueira Cordeiro - UMINHO amandanc_uff@hotmail.com Atualmente, questões relacionadas à agressão verbal, física, coação e constrangimento entre crianças nas escolas são muito comentadas. Tais atitudes (isoladas ou em conjunto), quando praticadas entre pares, numa relação desequilibrada de poderes, de forma regular e intencional caracterizam o bullying, podendo causar transtornos físicos, cognitivos e psicológicos em suas vítimas. Este tema começou a ser estudado na Noruega, nos anos 70. Uma pesquisa realizada no Rio de Janeiro pela extinta ABRAPIA, em 2002, com mais de 5000 crianças, revelou que 40,5% dos alunos já tinham participado em casos de bullying, sendo 16,9% alunos vítimas, 12,7% alunos agressores e 10,9% vítimas/ agressor. Mas que providências são concretamente tomadas? Que trabalho desenvolver com as crianças? Que caminho seguir? Segundo Barros, Carvalho e Pereira (2009): “num primeiro momento há de reconhecer que a violência é um problema social e que a escola tem um papel fundamental na sua redução por meio de ações e programas preventivos buscando parcerias com as famílias dos alunos envolvendo-os com o problema.” Por isso, apontamos que um programa de prevenção primária pode ser o primeiro passo no intuito de que as crianças e a comunidade educativa, incluindo pais e professores, percebam que o tema deve ser tratados por todos. Casas (1998) aponta que a prevenção relaciona-se com realidades conhecidas, onde são conhecidos os efeitos VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento negativos que podem ter. Segundo Caplan (apud Casas 1998), a prevenção primária caracteriza-se por ter um enfoque comunitário, por ser interdisciplinar e proativa, interconectar os diferentes aspectos da vida (orientação bio-psicossocial), utilizando técnicas educativas e sociais orientadas para dotar os indivíduos de recursos ambientais e pessoais, e assim enfrentarem seus problemas e promoverem contextos sociais justos. A prevenção primária dirige-se a grupos que não manifestam sinais evidentes de enfermidade ou problema social, onde só existe a consideração que alguns membros possam estar em risco. Partindo da teoria de Brofenbrenner, detentora de uma visão bioecológica do desenvolvimento humano, adotamos uma visão sistêmica onde o desenvolvimento se dá através de forças emanadas por múltiplos ambientes e das relações entre eles, através da interação sinérgica de quatro núcleos inter-relacionados: Processo, Pessoa, Contexto e Tempo (Narraz & Koller). Naquele o destaque é dado para o conceito de processos proximais, que são formas particulares de interação entre organismo e ambiente que operam ao longo do tempo. Em relação a Pessoa, parte-se do princípio que suas características são tanto produtoras, quanto produtos do desenvolvimento. O conceito de Contexto refere-se à interação recíproca de quatro níveis ambientais interdependentes estruturados de forma concêntrica: microssistema, mesossistema, exossistema e macrossistema. O Tempo também influencia o desenvolvimento humano através de mudanças e continuidades. Notamos uma crescente desvalorização de atitudes gentis e cordiais entre as crianças. A busca pela perfeição, competitividade, intolerância com as diferenças e brincadeiras ofensivas e demasiadas têm sido protagonistas nas interações escolares e relações em geral. Diante disto, em 2010, foi iniciado o projeto “Palavras e ações que machucam”, surgido da vontade da Equipe Pedagógica e professores da Me Ninar Creche Escola (escola particular situada em Niterói-RJ) de trabalhar com as crianças (dos 6 aos 10 anos) questões relacionadas aos valores éticos culturais e de convivência entre as pessoas. Para tomar uma ação preventiva junto às crianças sobre o tema bullying, escolhemos potencializar as interações dentro da escola, desta com a família e da criança com a comunidade, considerando os diferentes níveis ambientais de interação. Neste caso consideramos a escola como microssistema para as crianças e, a relação entre a escola e a família como mesossistema, contudo não desconsideramos a influência do mesossistema e do macrossistema no seu desenvolvimento. Os principal objetivo deste projeto foi diminuir episódios comportamentais nas crianças que possam interferir de forma negativa o desenvolvimento e as interações entre pares na escola. Para isto foi preciso repensar (equipe e crianças) atitudes e palavras ditas no dia-a-dia, para atingir uma melhor convivência, trabalhando valores como respeito, cooperação, entendimento, compreensão, tolerância e fraternidade. A idéia foi promover junto à comunidade acadêmica um entendimento de questões sócio-culturais pertinentes à atualidade, para que percebam que idosos, portadores de necessidades especiais, diferentes etnias, classes sociais, culturais e credos devem ser respeitados e compreendidos em suas particularidades,e assim aumentar o respeito mútuo no ambiente escolar. A primeira ação foi a apresentação do 275 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento vídeo “Palavras que machucam” (sessão coletiva), em sequência, conversas com professores e Equipe Pedagógica e ações pontuais com as crianças (encontro quinzenal com a psicóloga da escola denominado “grupo de reflexão) e atividades em parceria com professores regentes. Outras estratégias utilizadas foram: Leitura dos livros “A ovelha rosa da Dona Rosa” e “O colecionador de segredos”, e desenvolvimento de atividades a estes relacionados. -Dinâmicas de grupos voltadas para o respeito aos pares e aos demais; Elaboração de “combinados” (regras particulares para cada turma) referentes aos comportamentos; Autoavaliação individual das crianças; Reunião de pais promovendo parceria no processo de conscientização das crianças; Reunião junto à Equipe Pedagógica para discussão de textos sobre bulliyng e valores éticos e sociais; Visitas a espaços promotores de auxílio a idosos e portadores de necessidades especiais. É importante ressaltar que este projeto é uma ação preventiva que não se caracteriza por ter uma temporalidade determinada, por isso buscamos atingir seus objetivos constantemente na dinâmica cotidiana da escola. Entretanto, no seu período de maior intensidade de ações, pudemos notar alguns resultados concretos: Identificação das atitudes e comportamentos a serem repensados pelas crianças; Conscientização da equipe de professores acerca dos resultados de suas falas e atitudes frente às crianças; Exposição de trabalhos realizados pelas crianças sobre a temática na mostra de Arte e Expressão da escola; Aumento da parceria entre as famílias e a equipe pedagógica; Sucesso da visita a Casa de Repouso Lar Esperança, onde as crianças propuseram atividades de leitura e ofereceram lanche. A compreensão de 276 pais e crianças sobre a importância da visita foi surpreendente, ficando evidenciada no cuidado que tiveram ao oferecerem alimentos que condiziam com as limitações biofísicas dos idosos. Publicação de textos coletivos no Informativo Interno da escola. Por fim, acreditamos que houve o despertar de um julgamento moral das atitudes e responsabilização em relação ao respeito ao próximo, às diferenças e aos seus iguais. Palavras-chave: prevenção primária, valores sócio-culturais, bullying Contato: Claudilene Francisco Pereira, Creche Escola Me Ninar, [email protected] LT04-1507 - VALORES HUMANOS E ATITUDES FRENTE À ESCOLA: UM ESTUDO CORRELACIONAL Patrícia Nunes da Fonsêca - UFPB [email protected] Rildésia Silva Veloso Gouveia - UNIPÊ [email protected] Deliane Macedo Farias de Sousa - UFPB [email protected] Kátia Correa Vione - UFPB [email protected] Larisse Helena Gomes Macedo Barbosa UFPB [email protected] Eugênia Lúcia Paiva de Oliveira - UFPB [email protected] As pesquisas sobre as atitudes no contexto escolar têm sido bastante diversificadas e demonstram um novo foco de interesse na área escolar ou da educação. Por mais de vinte anos estas estiveram voltadas, predominantemente, a abordar o desempenho acadêmico dos estudantes de uma forma mais objetiva (isto VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento é, notas nos exames escolares), o que atendia ao interesse imediato de pensar e modificar as políticas públicas de educação. Entretanto, embora este tema ainda ocupe espaço importante na agenda daqueles que fazem a educação, aspectos mais subjetivos dos estudantes têm recebido cada vez mais destaque, a exemplo da satisfação do estudante com a escola, das experiências vivenciadas e das atitudes apresentadas frente ao contexto escolar (Daly & Defty, 2001). Coerente com esta linha de interesse, Willms (2003) constatou, em pesquisa realizada pelo Programa Internacional de Assistência ao Estudante, que os jovens que participavam mais das atividades oferecidas pela escola parecem ter melhor relação com seus colegas e administradores da escola, além de apresentar um bom desempenho acadêmico. Por outro lado, aqueles que apresentam atitudes negativas, de desafeto com as pessoas inseridas na escola podem, gradualmente, vir a demonstrar comportamentos desajustados. Reforçando este aspecto, Duarte (2004) indica que a falta de envolvimento, interesse e vontade por parte dos jovens refletem seu descompromisso total frente às atividades da escola, atuando como fator de risco. Por outro lado, algumas pesquisas têm mostrado que as atitudes positivas dos estudantes em relação à escola compreendem um fator de proteção quanto à delinqüência e ao uso de substâncias proibidas (Cheng & Chan, 2003). Deste modo, cogita-se que as atitudes apresentadas pelos jovens frente à escola podem influenciar em seu engajamento na escola, bem como o seu desempenho acadêmico. Mas a que fatores estariam associadas essas atitudes? Um desses fatores, de acordo com Fonsêca (2008), poderiam ser os valores humanos, uma vez que estes são entendidos como um construto que influencia as atitudes e as ações humanas e servem como padrões avaliativos do comportamento (Gouveia, 2003). No presente estudo, parte-se do modelo acerca dos valores proposto por Gouveia (1998, 2003; Gouveia & cols., 2008) que define os valores como critérios de orientação que guiam as ações do homem e expressam as suas necessidades básicas. Ainda de acordo com este autor seria possível observar seis subfunções valorativas, a saber: interativa, normativa, suprapessoal, existência, experimentação e realização. Deste modo, objetivou-se conhecer se e em que medida os valores humanos e as atitudes frente à escola estão relacionados.Para lograr tal objetivo, contou-se com uma amostra de conveniência (não probabilística) composta de 291 estudantes do ensino fundamental, sendo a maioria do sexo masculino (53%), de escolas públicas (53,5%) e com idades variando entre 10 e 18 anos (m = 13,2; dp = 1,76). Estes responderam a um livreto composto pelos seguintes instrumentos: Questionário de Valores Básicos (QVB – Gouveia, 1998; 2003), Escala de Atitudes Frente à Escola (Cheng & Chan, 2003; Fonseca, 2008), e por fim, questões demográficas (sexo, idade, tipo de escola). Inicialmente, entrou-se em contato com as escolas, procurando obter a autorização para coletar os dados. Em seguida, enviou-se o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para os pais ou responsáveis assinarem, permitindo a participação dos estudantes. Após essa etapa, os participantes responderam ao instrumento individualmente, porém em ambiente coletivo de sala de aula, e em média, 30 minutos foram suficientes para concluírem o preenchimento do 277 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento questionário. Para a análise de dados foi utilizado o Pacote Estatístico para Ciências Sociais (PASW), versão 19. Foi realizada uma análise de correlação de Pearson entre as seis subfunções valorativas e as atitudes frente a escola a fim de verificar se existe relação entre tais variáveis. Os resultados indicaram que, com exceção da subfunção experimentação (r = -0,00, p < 0,987), as demais apresentaram correlação direta e significativa com as atitudes frente à escola, a saber: normativa (r = 0,37, p < 0,001), suprapessoal (r = 0,37, p < 0,001), interativa (r = 0,32, p < 0,001), existência (r = 0,31, p < 0,001) e realização (r = 0,17, p < 0,001). Diversos estudos têm corroborado a adequação psicométrica do modelo proposto por Gouveia (1998; 2003) para o entendimento dos valores humanos, destacando-se sua capacidade para explicar diversos comportamentos e atitudes sociais (Chaves, 2006; Pimentel, 2004; Santos, 2008). Como é possível observar nos achados deste estudo, os valores normativos estão relacionados às atitudes frente à escola, pois estes refletem, de algum modo, o quanto os jovens aderem ou não às normas existentes na escola, como se integrar, ajustar e engajar ao contexto escolar (Fonsêca, 2008). No que diz respeito à relação entre a subfunção suprapessoal e as atitudes em questão, justifica-se uma vez que os tais valores refletem a busca pelo conhecimento, por aprender coisas novas e interessantes (Gouveia, Fischer & cols., 2008). Além destas relações, observou-se ainda que a subfunção interativa também apresentou uma correlação com as atitudes frente à escola, o que faz todo sentido, uma vez que a escola é um ambiente onde a interação é de fundamental importância (Gouveia, 2009). Ademais a relação en278 tre os valores de existência e as atitudes frente à escola pode ser compreendida já que as pessoas que adotam tais valores são pessoas preocupadas em assegurar sua sobrevivência, planejando o futuro em busca de estabilidade e a escola é tida como um ambiente onde se adquirem ferramentas (sociais e acadêmicas) para assegurar o futuro estável. Por fim, observou-se a relação entre as atitudes frente à escola e os valores de realização ocorre em razão das pessoas que adotam tais valores serem orientadas ao êxito, enfatizarem a busca pela eficiência sendo capaz de alcançar metas, terem um ideal de realização e orientarem suas vidas nesta direção. Tais valores estão em consonância a um dos principais objetivo da educação que é o bom desempenho, a aquisição de conhecimentos e habilidades pessoais e sociais, aspectos necessários para progressão satisfatória na vida acadêmica, social e profissional no futuro. Deste modo, considera-se de suma importância ampliar os conhecimentos acerca das diferentes formas de influências sofridas pelos jovens acerca dos valores humanos, e como estes podem vir a interferir nas atitudes frente à escola para que a lacuna encontrada no âmbito escolar seja preenchida. Uma vez que, diversos estudos têm demonstrado que altos níveis de engajamento escolar e atitudes positivas frente à escola estão associados à um melhor desempenho acadêmico e a uma redução na probabilidade de abandono escolar (Finn & Rock, 1997; Fredricks, Blumenfeld & Paris, 2004). Palavras-chave: Engajamento Escolar; Valores Humanos; Atitudes. VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento LT03-803 - CULTURA DA PAZ E PREVENÇÃO DA VIOLÊNCIA NA ESCOLA SEGUNDO PROFESSORES DE ESCOLA PÚBLICA DE BRASÍLIA Bruno Campos - UnB Lorena Leite - UnB Alia Barrios - UnB Angela Branco - UnB Crenças e valores são frequentemente citados pelos educadores como importantes objetivos da educação formal. Entretanto, a dimensão motivacional, constituída por valores e crenças, não têm sido discutida no processo de construção dos currículos escolares e das metodologias pedagógicas. Valores ligados a competição e ao individualismo estão presentes nas salas de aula das escolas brasileiras e estas têm enfrentado sérias dificuldades em relação às interações agressivas que cada vez mais se observa no cotidiano escolar. Esses valores competitivos e individualistas, de forma oculta ou explícita, se fazem presentes especialmente nas práticas pedagógicas e nas interações sociais que se estabelecem nas salas de aula. Nos projetos para a educação básica no Brasil existe como objetivo o desenvolvimento da independência e da autonomia dos alunos, mas não se explicita a necessidade de que esta autonomia seja associada à responsabilidade e a moralidade. Este tipo de socialização, segundo Rogoff (2005), tende a influenciar o individuo para uma atuação individualista, orientada quase que exclusivamente por interesses pessoais em detrimento dos interesses coletivos. E é assim que a competição e o individualismo têm sido cada vez mais observados em várias pesquisas e, segundo autores como Staub (2002) e Branco (2003), práticas e valores desta natureza estão significativamente relacionados a motivações anti-sociais. A Cultura da Paz é um contexto importante para a internalização e prática dos direitos humanos. A promoção da Cultura da Paz em nível mundial tem sido bastante mencionada pela Organização das Nações Unidas, tanto é que a revisão feita em 1989 da Declaração Universal dos Direitos da Criança de 1959 foi bastante influenciada pelo tratado que estabelece a necessidade da Cultura da Paz. Portanto, emerge no âmbito das ciências psicológicas a necessidade de se compreender os processos de internalização de valores como pré-requisito para a co-construção da paz, uma vez que “co-construir a paz significa analisar e favorecer as configurações do sistema motivacional que sejam compatíveis com as crenças e valores que caracterizam o que denominamos paz” (Branco, 2009). Nesse sentido, o presente trabalho teve como objetivo a construção de dados que permitissem analisar e refletir criticamente sobre a questão da ontogênese dos valores humanos, e a possibilidade de contribuir concretamente para a promoção de valores humanistas, de orientação cooperativa e solidária, no contexto escolar, de acordo com a Cultura de Paz. Para tanto, foram entrevistados doze professores de quarto ano de escolas públicas do Distrito Federal acerca de sua opinião sobre a socialização de seus alunos, os valores humanos, o papel da educação, o papel do conflito, o desenvolvimento da criança, e sobre estratégias para a construção da Cultura da Paz, assim como dificuldades e empecilhos para esta construção. A realização de projetos para a construção de Cultura de Paz na escola foi considerada importante ou necessária pelos entrevistados, sendo que a maioria deles afirmou ter disposição para participar como voluntário de projetos deste tipo. Diversos fatores foram apontados como 279 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento empecilhos para a Construção da Cultura de Paz, sendo que a grande dificuldade de comunicação entre a escola e a família foi considerada central. Houve menção às divergências entre família e escola quanto aos papeis e objetivos específicos de cada contexto, e foram discutidos fatores como desigualdade social, violência urbana e influência negativa da mídia sobre as crianças. Os professores apresentaram vários tipos de definição de Paz, mas quase todas eram definições ingênuas e individualistas. Entre elas encontramos definições como a “ Paz é a ausência de conflito” ;“é uma característica interna”; “é tranqüilidade” interna ou externa, “é ligada ao convívio harmonioso” e assim por diante. Para a grande maioria dos professores não existem conflitos desejáveis, os conflitos são sempre negativos; entretanto alguns, especialmente quando solicitados a se posicionar se “existem conflitos desejáveis?”, diziam que sim e que estes poderiam gerar crescimento pessoal. Como sugestões e passos concretos para a construção da Cultura da Paz, os entrevistados citaram a promoção de palestras (tanto para pais quanto professores), dramatizações, aulas voltadas para o tema e discussão de filmes. Foram relatadas e analisadas histórias envolvendo “alunos problema”, casos de professores agredidos por alunos, brigas entre alunos e bullying. Verificando o grau de desconhecimento dos professores quanto a questões de socialização e internalização de valores, o estudo discute a grande necessidade de orientar os educadores para que possam bem conceituar, compreender e saber posicionar-se na prática de forma a atuar como promotores de uma Cultura de Paz. Palavras-chave: cultura da paz; violência; escola pública 280 LT03-816 - VIOLÊNCIA NA ESCOLA E CULTURA DA PAZ: COM A PALAVRA AS CRIANÇAS Bruno Campos - UnB Lorena Leite - UnB Alia Barrios - UnB Angela Branco - UnB Considerando que todo cientista tem o compromisso de favorecer a saúde e bem-estar dos indivíduos e da sociedade, o objetivo do presente trabalho consistiu em construir dados que permitam analisar e refletir criticamente a questão da violência nas escolas na percepção e avaliação de crianças do quinto ano do ensino fundamental, bem como analisar suas sugestões acerca do que pode ser feito para se promover uma cultura de paz no ambiente escola. Nosso objetivo foi construir subsídios para contribuir com o desenvolvimento de valores humanistas, de orientação cooperativa e solidária, no contexto escolar. Para o cumprimento de tal objetivo e como guia teórico-metodológico para a realização do trabalho, partimos de uma perspectiva sociocultural de caráter construtivista cujo foco se dá na qualidade semiótica do desenvolvimento humano, com ênfase na linguagem e na comunicação não verbal das pessoas. Ainda são poucos os estudos encontrados na literatura que produzem dados na direção da reflexão acerca da origem e do desenvolvimento dos valores humanos, e em como estes são culturalmente disseminados. Segundo Juberg (2000), as pessoas são agrupadas de acordo com características que, conforme a ideologia dominante, são julgadas como boas ou ruins, positivas ou negativas. Tais julgamentos constituem a base de preconceitos geradores de violência, pois, segundo VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento a autora, esses estimulam a discriminação social, legitimando a agressividade e atitudes segregacionistas. Seguindo essa lógica, os indivíduos passam a serem percebidos e tratados em função de estereótipos e preconceitos associados ao grupo a que pertencem. Essa tendência, cada vez mais freqüente nos contextos educacionais atuais, origina o fenômeno do bullying, definido pela execução de um mal não percebido, causado por ações pequenas, mas que são repetidas frequentemente (Staub, 2003). As ações violentas são causadas, na maior parte das vezes, psicologicamente produzidas por frustrações e aprendizagem de formas agressivas de resolução de conflito, e múltiplas são as motivações para comportamentos pró-sociais como o bullying. A metodologia utilizada para a investigação das percepções e avaliações das crianças quanto ao bullying e a cultura da paz qualitativa, uma vez que nosso objetivo foi identificar e analisar os processos de significação no contexto da diversidade dos participantes da pesquisa, que gerou uma riqueza de informações ao longo do processo de construção interativa dos dados. Nesta pesquisa realizaram-se dois grupos focais em duas escolas públicas do Distrito Federal (A e B) com crianças de 5º ano, com idade entre 10 e 11 anos de idade, o grupo A com a participação de quinze alunos (nove meninos e seis meninas), e o grupo B com a participação de onze (sete meninas e quatro meninos). Eles aconteceram de acordo com um roteiro semiestruturado, contendo perguntas que abordavam a reflexão conjunta sobre as experiências e avaliação das dificuldades de interação e relacionamento entre as crianças, com os professores e entre as pessoas em geral no contexto de sala de aula; a questão do bullying nas interações em sala de aula e fora dela; E a criação de atividades e práticas específicas de natureza cooperativa e sugestões diversas para a construção da paz e prevenção do bullying no contexto escolar. Realizados os grupos, observou-se resultados muito interessantes. Na escola A, as crianças revelaram que, para elas, as características que definiriam uma vítima de um agressor seriam diversos atributos físicos, inclusive antagônicos (como ser baixo ou alto, gordo ou magro), dado esse que confirma a esterotipia criada com padrões culturais de beleza idealizados no grupo a que se pertence. Na escola B isso se confirmou, pois um dos sujeitos participantes do grupo, que era negro, disse que os outros gostavam de chamá-lo de ‘lacraia’, e que ele não gostava disso. Ninguém explicou o porquê desse apelido, mas uma suposição que podemos fazer é que este menino tem uma aparência não muito compatível com os padrões de beleza vigentes em nossa sociedade. Nessa escola evidenciou-se, também, a presença generalizada do bullying, pois a discussão do tema surgiu antes mesmo do pesquisador lançar a pergunta sobre bullying para ser discutida entre as crianças após a exibição do vídeo de um menino que contava a sua história de vítima de bullying. Além dos resultados encontrados que corroboram as questões levantadas e discutidas na literatura, foi possível verificar a ampla diversidade de motivações e contextos geradores de bullying, que precisam ser melhores investigados. Tudo indica que um aspecto importante seja a dinâmica das interações e relações que ocorrem em contextos competitivos, como a escola. A internalização de valores e padrões de agressão e violência como forma 281 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento de obter sucesso e popularidade entre os colegas, o que eleva a autoestima do “ganhador”, acaba gerando situações de grande sofrimento para todos, pois nem sempre existe apenas uma vítima envolvida na situação: como observamos no grupo B, quase todos desqualificam-se uns aos outros. Aprender a resolver conflitos de forma pacífica, por exemplo, não faz parte do cotidiano dessas crianças. Isto tudo confirma a necessidade crescente de se realizar ações preventivas tanto no contexto educacional, como em outros setores da sociedade. Afinal, a capacidade de resolver conflitos de forma pacífica e a tolerância exige o desenvolvimento de estratégias específicas para a promoção de práticas, crenças e valores para a construção da paz articulando crianças e adultos, família, escola e comunidade. Palavras-chave: cultura da paz, violência na escola, escola pública CO 48 - LT03 Abrigamento e Adoção LT03-764 - SITUAÇÃO DE ABRIGAMENTO PARA CRIANÇAS, POLÍTICAS PÚBLICAS E SOFRIMENTO PSÍQUICO Ana Maria Monte Coelho Frota - UFC [email protected] Ângela de Alencar Araripe Pinheiro - UFC [email protected] No Brasil, a política de atendimento à infância e à juventude, em situação de abandono, vem sofrendo transformações profundas: do gerenciamento da Igreja, 282 passando por profissionais liberais até o domínio do Estado, presente na contemporaneidade. A histórica da infância no Brasil (Pinheiro, 2006) é marcada por abandono, crueldade, violência. Na Colônia, já existia o abandono de crianças índias, brancas e negras (Leite, 1997). Priore (1996 e 2000) e Marcilio (1997) explicitam práticas de abandono e violências físicas, morais e sexuais no Brasil, por longo período. No século XIX, emergiram tentativas filantrópicas de cuidados à infância abandonada e, no século XX, surgiram instituições para crianças dentro das exigências produzidas no período (Rizzinni e RizzinniI, 1990): compuseram um sistema de proteção, solidificado na era Vargas, presente até os anos 60; os anos 70 configuraram práticas compensatórias de educar crianças asiladas (Nunes, 2009). Pela falência do sistema de acolhimento das crianças abandonadas, o Estado passou a ser cobrado de prover-lhes assistência (Rizzinni e RizzinniI, 2004). O Serviço de Atenção ao Menor, criado durante o Estado Novo, faliu quase de imediato, surgindo a Fundação Nacional do Bem Estar do Menor, prometendo uma prática de atenção social a menores em vias de marginalização ou marginalizados. A partir dos anos 70, com denúncias regulares na imprensa, principalmente após o golpe militar e o fracasso do milagre econômico, voltou a se pensar esta problemática (Passetti, 1996). O Ano Internacional da Criança, marca o início do enfrentamento da crueldade com o atendimento à criança abandonada e o abrigamento é situação extraordinária, provisória e excepcional. O Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa do Direito de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária –PNPPDDCA- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento CFC- (2006) explicita a provisoriedade do abrigamento, e a necessária convivência da criança com a família e comunidade. Contudo, abrigos continuam crescendo em número e quantidade de abrigados. Segundo Arpini (2003), Siqueira, Dell’aglio (2006), Yunes, Miranda, Cuello (2004), os abrigos somente conseguem atender necessidades de sobrevivência física, deixando brechas para sofrimentos psíquicos, aproximando-se da conceituação de instituição total (Goffman, 1996). Políticas Públicas são abordagem recente (anos 1990) entre psicólogos, e mais ainda sua execução e formulação, como campo de atuação (Bock, 2003; Contini, 2002; Gonçalves, 2003; Yamamoto, 2003). A inclusão das políticas públicas no fazer psicológico vincula-se ao reconhecimento do ser humano como constituidor e constituído pelo contexto; aos anseios inolvidáveis da população, destituída de bens e serviços fundamentais, com implicações em sua subjetivação. Campo tenso e contraditório, as políticas públicas no País são ainda reconhecidas mais como benemerências do que como instrumentos de universalização de direitos humanos. Focalizando práticas de abrigamento, vale refletir: com prevalência no campo da caridade, têm sido executadas prioritariamente por instituições religiosas/humanitárias. Concepções discriminatórias para crianças tidas fora do casamento contribuíram para manter a prevalência de práticas assistencialistas, repercutindo no processo de subjetivação (Pinheiro, 2006); CF e ECA trazem inovações que se contrapõem às práticas referidas, requerendo reordenamentos institucionais. Lembremos princípios legais que colocam o abrigamento como direito: CF, Art. 208 – O dever do Estado com a Educação será efetivado mediante a garantia de... IV: atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a seis anos. Art. 227, Parágrafo 6º. – Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação. A Doutrina da Proteção Ingeral e o PNPPDDCACFC igualmente contribuem para colocar o abrigamento no campo da cidadania, fortalecendo a concepção de abrigamento como direito e situação. As reflexões levam-nos a um questionamento: como garantir o usufruto do direito à convivência familiar e comunitária para crianças que vivem mais permanência no abrigo do que provisoriedade? Parece-nos quase impossível pensar nesta garantia. Anunciamos como possibilidade que os abrigos sejam construídos como instituições de pequeno porte, que possam construir laços afetivos e de confiança, e vínculos assemelhados aos dos diferentes agrupamentos familiares. Necessário atentar para a inserção da criança abrigada nos diferentes espaços sociais da comunidade. Utópico? Certamente, e norte para a transformação da sociedade e do atendimento de direitos da criança. Palavras-chave: Infância, Abrigamento, Políticas Públicas 283 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento LT03-960 - VERIFICAÇÃO DE UM MODELO MEDIACIONAL ENTRE A EMPATIA E O PERDÃO INTERPESSOAL EM RELAÇÃO A UM OFENSOR. Júlio Rique Neto - UFPB [email protected] Nilton Formiga - UFPB [email protected] Felipe Fernandes de Medeiros - UFPB [email protected] Financiamento: CNPq Este trabalho verificou um modelo de mediação entre a Consideração Empática (CE) e a Tomada de Perspectiva (TP) para o perdão interpessoal. Buscou-se saber se a CE e a TP influencia na redução da mágoa em relação a um ofensor facilitando o perdão. O tema do perdão é presente na ciência, senso comum e conhecimento religioso. Na psicologia, autores têm se interessado em verificar as variáveis preditoras do perdão visando uma melhor qualidade nas relações humanas. De acordo com Enright, Freedman e Rique (1998) o perdão interpessoal é uma atitude moral na qual uma pessoa considera abdicar do direito ao ressentimento, julgamentos negativos, e comportamentos negativos para com outra pessoa que a ofendeu injustamente. Bem como, o perdão tem a função de fomentar na pessoa a compaixão para com a pessoa que ofendeu. Para o perdão, faz-se necessário um re-enquadramento cognitivo (ou reframing) da situação, ou seja, a vítima reelabora o evento sob uma nova perspectiva. Neste processo, é esperado que a vítima desenvolva a CE e TP do ofensor como variáveis facilitadoras do perdão (Enright & Fitzgibbons, 2000). Davis (1983) definiu a CE como a capa284 cidade do observador simpatizar com o outro e se inclinar a ajudá-lo e TP como a habilidade cognitiva de tomar a perspectiva do outro e entende-lo(a) a partir do contexto no qual ele(a) está inserido(a). Rique e cols. (2010) testaram um modelo no qual a CE é associada ao grau da mágoa e a TP é associada ao grau do perdão, porém, tal modelo não permitiu avaliar a existência de uma mediação entre essas variáveis e o perdão interpessoal explicando o grau da mágoa em relação a um ofensor. Este trabalho propõe verificar esta mediação. Participaram deste estudo, 201 jovens do sexo masculino e do sexo feminino, estudantes secundaristas e universitários com media de idade de 19 anos (DP = 2,06) do município de João Pessoa – PB. Os sujeitos responderam as seguintes escalas: a escala do perdão – EFI (Enright Forgiveness Inventory, Enright & Rique, 2000), uma escala objetiva composta inicialmente por uma Folha de Rosto que coleta informações sobre a mágoa e uma breve descrição da ofensa, depois um Inventário de 60 itens divididos em três subescalas de 20 itens cada (10 positivos e 10 negativos) sobre afetos, comportamentos e julgamentos, é respondido em uma escala de concordância com seis pontos (1 = discordo e 6 = concordo) e, finalmente, o Item do Perdão, que corresponde a uma questão objetiva: "Por favor, indique o quanto que você perdoou a pessoa que você avaliou na Escala EFI". Essa questão é respondida em uma escala de cinco pontos (1 = não perdoei e 5 = perdoei completamente). Administrou-se também uma adaptação das escalas de CE e TP da EMRI (Davis, 1983, adaptada por Ribeiro, Koller & Camino, 2001). Foram feitas adaptações semânticas nos itens destas escalas para VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento que os participantes respondessem pensando no ofensor que foi avaliado na escala EFI. Após as modificações, os itens adaptados foram aleatoriamente distribuídos e medidos em uma única escala objetiva de cinco pontos (1 = baixo e 5 = alto) com 14 itens no total. Por último, foi utilizada uma escala sócio demográfica para informações sobre idade, sexo etc. A ordem das escalas foi a seguinte: primeiramente a escala sócio demográfica, em seguida a EFI com o item do perdão e, por último, a escala de CE e TP. O estudo atendeu as recomendações éticas da resolução 196/96 do CONEP. Os estudantes foram convidados verbalmente a participarem do estudo e a administração dos questionários ocorreu em sala de aula, com cada participante respondendo individualmente todas as medidas. Para testar o efeito de mediação da variável independente - VI (CE e TP) na variável mediadora -VMe (o perdão) sobre a variável dependente – VD (a mágoa), efetuou-se o teste de Sobel. Este teste tem como função avaliar a VMe como preditora da VD e como a VI deve ser preditora da VMe. Assim, na presença de ambas – VI e VMe – uma relação significativa prévia entre a VI e a VD decresce em magnitude, demonstrando o efeito da mediação (Baron & Kenny, 1986; MacKinnon, Warsi & ,1995; Sobel, 1982). Este cálculo é caracterizado por uma relação que altera para mais ou para menos a influência da VI sobre a VD. Sendo assim, modelo proposto foi considerar a CE e a TP como VIs influenciando o perdão. O perdão passou então a ser uma variável de mediação da VD (intensidade da mágoa). Para verificar o modelo proposto, inicialmente buscou-se avaliar a validade da escala de CE e TP em relação ao ofensor. Os resultados mostraram indicadores de ajuste que garantiram a adequabilidade de sua estrutura (c2/gl = 1,12; RMR = 0,05; GFI = 0,96; AGFI = 0,93; CFI = 1,00; TLI = 0,99; RMSEA = 0,02, CAIC = 365,92 e ECVI = 0,80) observando uma associação positiva entre a TP e CE (l = 0,77). A EFI também mostrou índice de confiabilidade interna Alfa satisfatório de 0,97 na amostra do presente estudo. Em seguida, dois modelos foram testados separadamente. No primeiro modelo, os resultados mostraram que a CE apresentou um escore preditivo positivo com a mágoa, porém, não significativo. Por outro lado, a CE influenciou positivamente o Perdão que, como predito, influenciou negativamente, a Mágoa (z = 12,47; p < 0,001) explicando 33% da amostra na relação entre essas variáveis. No segundo modelo, verificou-se que a TP influenciou significativamente de forma negativa a Mágoa e positivamente o Perdão, que por sua vez explicou negativamente, a mágoa (z = 12,47; p < 0,001) 32% da amostra no modelo. Nesse sentido, encontrou-se tanto uma relação direta da CE e TP sobre a mágoa como uma relação mediada pela variável do perdão, influenciando negativamente a mágoa. Considerando esses resultados, confirmou-se o modelo de mediação do perdão sobre a mágoa. Uma vez encontradas maiores magnitudes da CE e TP no perdão e na mágoa, exponencialmente maior será o impacto do grau de perdão sobre a intensidade da mágoa. Palavras-chave: perdão interpessoal, consideração empática, tomada de perspectiva, mágoa Contato: Júlio Rique Neto, UFPB, [email protected] 285 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento LT03-1024 - CASAS DE ACOLHIMENTO E AS RELAÇÕES DE RESPEITO EXISTENTES EM SUA ROTINA Carla Andressa Placido Ribeiro - UNESP [email protected] Adrián Oscar Dongo Montoya - UNESP Patrícia Unger Raphael Bataglia - UNESP Financiamento: FAPESP Na Lei nº 8.069, de julho de 1990 no Estatuto da Criança e do Adolescente a criança é vista como pessoa em desenvolvimento e goza de todos os direitos fundamentais intrínsecos ao ser humano assegurando-lhe o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social. No caso das crianças e adolescentes institucionalizadas por razão de maus tratos, abandono ou por serem órfãs, seus direitos são preservados pelo Estado sendo garantido um abrigo, seja em famílias substitutas ou em casas de acolhimento (abrigos provisórios). Com o objetivo de entender como as relações estabelecidas nas rotinas dessas casas contribuem para o desenvolvimento moral de seus acolhidos, pesquisamos uma casa de acolhimento na cidade de Marília-SP, e observamos qual o tipo de relação (respeito unilateral ou respeito mútuo) que predomina em sua rotina e consequentemente qual o tipo de educação moral estabelecida, pois, segundo Piaget (1994), a pressão exercida pelo adulto à alma da criança acarretará resultados diferentes do que a livre cooperação entre crianças e, dependendo de como ocorre a educação moral moldará as consciências e determinará comportamentos de modos diferentes, ou seja, a relação educativa de caráter unilateral (coação adulta) resulta na heteronomia, contrariamente as 286 relações de respeito mútuo (cooperação) promove a autonomia. Para as realidades morais se constituírem é relevante que os indivíduos estabeleçam relações sociais, pois, é nessas relações entre os indivíduos que se estabelecem as normas. Não há, portanto, moral sem educação moral. "[...] não há uma única moral e nem haverá tantos tipos de reações morais quanto as formas de relações sociais ou interindividuais que ocorrem entre a criança e seu meio ambiente" (PIAGET, 1930/1996, p. 3). Na casa de acolhimento pesquisada, apesar dos acolhidos serem assistidos em suas necessidades básicas, as ações educativas junto às crianças e adolescentes se fundam, sobretudo, em relações de respeito unilateral à autoridade e às regras estabelecidas, as quais não promovem a responsabilidade interior e a vida cidadã. O cumprimento das regras nem sempre solicita, por parte as crianças e adolescentes, a necessária tomada de consciência das suas ações. E sabemos que a participação na elaboração e exercício consciente das regras é absolutamente necessária para o seu cumprimento responsável. “As crianças são heterônomas quando fazem um uso imitativo das regras e quando as consideram sagradas, pois vindas da tradição e imutáveis... As crianças são autônomas quando fazem um uso racional e social das regras, e quando as consideram produtos do e para o grupo” (MENIN, 1996, p.46). Observamos que o processo de tomada de consciência na construção de regras também não é uma prática junto aos funcionários da instituição. As crianças pesquisadas não têm um espaço social e coletivo onde possam agir e experienciar valores de respeito mútuo. Assim, as relações entre crianças, via de re- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento gra, não se pautam pelo respeito mútuo e pelos laços de solidariedade, pelo contrário, são relações de competição que se sobrepõem a essas relações. Suas noções de justiça se fundamentam no respeito à autoridade adulta e não em laços de cooperação entre iguais, de solidariedade e respeito mútuo. Esses dados mostram que as relações que ocorrem no interior da instituição (entre adultos e acolhidos e entre os próprios acolhidos) não estariam promovendo a autonomia moral e/ ou não estariam conseguindo alterar os efeitos das práticas educativas vivenciadas com suas famílias e noutros centros educativos. Se para Piaget (1994) o desenvolvimento da noção de justiça de um indivíduo se estabelece, principalmente, em função das relações estabelecidas em seu meio social, podemos afirmar que é fundamental o papel da educação moral motivada na autonomia e na reciprocidade. “O alcance educativo do respeito mútuo e dos métodos baseados na organização social espontânea das crianças entre si é precisamente o de possibilitar-lhes que elaborem uma disciplina, cuja necessidade é descoberta na própria ação, ao invés de ser recebida inteiramente pronta antes que possa ser compreendida” (PIAGET, 1973, p.77). Com isso, propomos à instituição uma pesquisa de intervenção com o objetivo de constituir junto aos funcionários da casa e acolhidos um ambiente favorável ao desenvolvimento moral das crianças e adolescentes, estabelecendo em suas relações rotineiras o respeito mútuo. Assim, podemos refletir se um ambiente favorável à tomada de consciência das regras, baseado no princípio do respeito mútuo e na relação de cooperação entre todos os membros dessa instituição adultos, possa promo- ver o desenvolvimento moral dos acolhidos. A proposta foi aceita pela instituição e encontra-se em sua etapa final no que diz ao trabalho de intervenção junto aos funcionários (reuniões que promova a reflexão crítica das condutas entre adultos e para com os acolhidos) e em andamento no trabalho de intervenção junto aos acolhidos. Podemos assim, expor os resultados preliminares divididos em dois grupos: junto aos funcionários, e, junto aos acolhidos. No primeiro grupo alguns funcionários já fazem reflexões críticas a respeito de suas práticas colocando-se no processo de educação moral das crianças e adolescentes e nos problemas da instituição. Também apresentam interesse em adquirirem novas posturas que auxiliem no bom desempenho de seu trabalho enquanto educador, no entanto ainda há os que não se enxergam como tal e apresentam resistência em se colocar nos problemas da instituição. Muito ainda devemos percorrer para a constituição de um ambiente favorável ao desenvolvimento moral, mas julgamos que o principal que é a visão da necessidade desse ambiente já tem alcançado grande parte dos funcionários e o interesse de alguns em se orientarem para estabelecerem com as crianças e adolescentes uma relação de respeito mútuo. No segundo grupo o trabalho tem sido bem minucioso com o propósito dos acolhidos perceberem qual o caráter que a regra apresenta em sua convivência na instituição (preservar os princípios de respeito, justiça, igualdade... e de sua reciprocidade) e de perceberem que a regra em si não é imutável, mas seguindo um princípio moral válido, ela pode ser modificada e constituída pelo grupo. Para isso, trabalhamos com brincadeiras, contos e con287 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento fecções de materiais promovendo identificação com o grupo e a necessidade de respeito mútuo e de cooperação para se estabelecer um bom convívio, dentro e fora da instituição. Palavras-chave: casa de acolhimento; educação moral; relações de respeito Contato: Carla Andressa Placido Ribeiro, UNESP, [email protected] LT04-1437 - PROPORCIONANDO RELAÇÕES QUE FAVORECEM A CONSTRUÇÃO DA AUTONOMIA DE CRIANÇAS EM SITUAÇÃO DE ABRIGAMENTO Arytanna Zuitá Barbosa Ferreira - UnB [email protected] Lorena de Abreu Menezes Araujo - UnB [email protected] Regina Lúcia Sucupira Pedroza - UnB [email protected] A realidade das relações interpessoais no contexto de abrigamento, no Brasil, tem sido evidenciada por certo fatalismo da impossibilidade de crescimento de recursos de personalidade que permitam a construção da autonomia. Defendemos que, apesar desse contexto deparar-se com regras rígidas, por exemplo, com os horários predeterminados e fixos para todas as atividades do dia a dia e pouco espaço para a criança exercer sua individualidade, é possível criar condições favoráveis ao desenvolvimento da pessoa como sujeito ativo e de direitos, deveres e desejos. Entretanto, ainda prevalece a idéia de que a criança só pode se desenvolver por completo no seio de uma família, de forma que a adoção aparece como única possibilidade para essas 288 crianças, ao invés de se proporcionar uma reestruturação da família de origem para que ela exerça seu direito de viver com seus filhos. Sendo assim, refletimos sobre a importância de um trabalho cujo foco inclua o desenvolvimento da autonomia desses sujeitos. Baseando-se na experiência de trabalho no projeto de extensão “Os afetos em cena: a brincadeira nas relações em um abrigo para crianças e adolescentes”, desenvolvido por alunos de Psicologia da Universidade de Brasília, vimos pensando e buscando desenvolver essa questão. Ao tratar da autonomia, é importante ser colocado que acreditamos nesse processo como uma construção, como algo que se constitui a partir das relações interpessoais desenvolvidas em parceria. Acreditamos, também, que para que se comece a pensar na construção de tais relações é preciso adotar um olhar diferenciado sobre a criança, um olhar que em si mesmo traga a ideia de que é possível que esse sujeito seja autônomo. Um exemplo disso está no questionamento de Rogers que, ao pensar em sua relação com o outro, questiona “como posso proporcionar uma relação que essa pessoa possa utilizar para seu próprio crescimento pessoal?” (Rogers, 2001, p.36). Diferentemente disso, o que encontramos nos abrigos é, muitas vezes, um olhar assistencialista sobre o outro, que, ao se questionar, por exemplo, como seria possível mudar ou transformar aquela pessoa, carrega uma percepção que retira a possibilidade de movimento e protagonismo do sujeito. Segundo Foucault, conquista-se a autonomia a partir de uma libertação que ocorre pelo exercício individual e conjunto de práticas de liberdade. No entanto, deve-se entender a construção de autonomia como VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento mais que um processo de libertação, ou um sinônimo de independência. Dentro dessa questão, podemos pensar, então, em qual é a medida da liberdade dentro desse processo. De fato, a autonomia está estreitamente ligada ao conceito de liberdade; no entanto, tal liberdade não significa retirada de limites, pelo contrário, como traz Paulo Freire: “a liberdade não se autentica sem o limite da autoridade, mas o limite que a autoridade se deve propor a si mesma, para propor ao jovem a liberdade, é um limite que necessariamente não se explicita através de castigos” (Freire, 2001, p. 250). Partimos do pressuposto que esse limite é constituidor do sujeito e, portanto, necessário para a diferenciação do eu psíquico. O autor propõe, ainda, que seja alcançado um equilíbrio entre autoridade e liberdade, já que, quando esse equilíbrio se desfaz em favor da autoridade, nos deparamos com uma realidade de autoritarismo; por outro lado, quando se desfaz em favor da liberdade, tem- se um clima licencioso, e, assim, a liberdade não é liberdade, e a autoridade se esvazia como tal. No trabalho desenvolvido pelo projeto de extensão citado anteriormente, busca-se manter esse equilíbrio e se acredita que, dessa forma, seja possível estabelecer as relações interpessoais favorecedoras à construção do processo de autonomia. Referindo-se ainda a esse projeto, ao trabalhar com a questão da autonomia, o instrumento que se utiliza para construir não só tais relações interpessoais, como também o espaço favorável para seu desenvolvimento, é a brincadeira. Busca-se proporcionar um espaço do brincar seguro, em que a criança pode ser ela mesma, pode ser diferente, ou simplesmente pode ser. É um espaço em que é dada a oportunidade para a criança escolher, experimentar, tentar, sonhar, ser plenamente, mesmo em aspectos que normalmente seriam reprimidos, como experimentar sentimentos de raiva, tristeza, angústia e até agressividade – sempre de forma mediada e responsável e dentro dos limites humanos éticos. Por meio do brincar abre- se um espaço em que é possível à criança exercer sua individualidade, sendo respeitada e escutada, sem censura, pois acreditamos que seu desenvolvimento, como um todo, deve respeitar sua unicidade e individualidade como ser humano. As relações com esses sujeitos são construídas buscando-se não carregar olhares e atitudes comumente pré-concebidas e determinantes, como estereótipos de crianças em situação de abrigamento como sendo agressivas ou possuidoras de desenvolvimento cognitivo e motor inferiores; além disso, não há espaço para um olhar penoso, que pensamos ser extremamente nocivo para a constituição de qualquer indivíduo. Assumindo as ideias expostas, e tendo como norteador de atuação profissional o respeito e a honestidade para o desenvolvimento de qualquer relação interpessoal saudável, o objetivo deste trabalho é refletir sobre as possibilidades de se construir relações interpessoais diferenciadas que favoreçam o desenvolvimento da autonomia de crianças em situação de abrigamento. Palavras-chave: Abrigamento; Desenvolvimento Infantil; Autonomia. 289 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento LT07-1234 - PINTANDO E BORDANDO: UMA REFLEXÃO ACERCA DA INFÂNCIA E DA SITUAÇÃO DE ABRIGAMENTO Alyne Farias Moreira - CEUB [email protected] Bianca de Moraes Ávila - UnB [email protected] Camila Moura Fé Maia - UnB [email protected] Lídia Furtado Oliveira - UnB [email protected] Regina Lúcia Sucupira Pedroza - UnB [email protected] Thaís Polônio Ribeirinho - CEUB [email protected] Um levantamento bibliográfico realizado por Ayres, Coutinho, Sá & Albernaz (2010), a respeito de crianças que se encontram em situação de abrigamento, aponta para uma delicada situação: a construção de uma identidade institucional, a “criança de abrigo”. Há uma lógica determinista que atribui características psicológicas às crianças em decorrência dessa situação. Afirma-se a vitimização da criança por estar vivendo longe de sua família, demarcando um lugar específico de segregação em relação àquelas não abrigadas. Neste estudo, buscamos fazer uma reflexão crítica sobre a identidade institucional que despersonaliza e dificulta a visão da criança como sujeito ativo e em constante mudança com possibilidades de se desenvolver em contextos adversos. Já em 1958, Anna Freud e Burlingham, em estudo sobre crianças em situação de abrigamento, notaram um atraso de seis meses na linguagem dessas crianças e atribuíram-no à falta de contato com a mãe. Além disso, apontaram que as crianças parecem mais agressivas do que outras que vivem com a família. Do ponto de vista cognitivo, as 290 autoras citaram estudos que comprovavam que crianças em instituições apresentaram atraso no desenvolvimento, exteriorizado pelo atraso na linguagem, pela dificuldade de memorização e pelo não reconhecimento de pessoas do convívio. Estudos atuais continuam atribuindo essa identidade deficitária particular às crianças de abrigo. Dell’Aglio e Hutz (2004), em pesquisa sobre depressão e desempenho escolar em crianças institucionalizadas, colocam que tais crianças possuem médias mais baixas relativas ao seu desempenho escolar e maior depressão quando comparadas com as que vivem com suas famílias. Percebe-se, portanto, que pesquisas relacionadas a crianças em situação de abrigamento, muitas vezes, se limitam a descrever as diferenças do contexto que teriam como conseqüência déficits de desenvolvimento cognitivo, afetivo e social. Esses estudos classificam tais crianças em uma identidade estática e focada nesses déficits (Ayres et al., 2010). As representações sobre a criança no abrigo possuem profunda relação com o processo histórico-cultural de políticas assistenciais à infância. Historicamente, os abrigos surgiram como instituições que acolhiam tanto adolescentes em conflito com a lei, como aqueles que foram separados de suas famílias por negligência, abandono ou maus tratos. Além disso, as características negativas endossadas por concepções psicológicas estigmatizantes se baseiam em comparações entre percepções sobre as crianças que estão em abrigos e as crianças que estão com suas famílias (biológicas e nucleares). Ou seja, há uma concepção de que o único espaço de desenvolvimento saudável possível é o seio familiar. Deve-se lembrar, entretanto, que a família nuclear é uma construção sócio- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento -histórica, como bem aponta Ariès (1978), e não contém, per se, todas as condições que viriam a caracterizar um ambiente saudável. As crianças quando retiradas do seu seio familiar, ao serem abrigadas, entram em contato com uma nova organização de espaço e tempo e passam a conviver com novas pessoas, normas e hábitos. Essas mudanças súbitas podem causar estranhamentos devido às origens, histórias, angústias e dificuldades tão diversas de cada um. Sendo assim, reações vistas como de agressividade, de depressão e déficits podem aparecer em situações de abrigamento. No entanto, não são características inerentes das crianças, e sim expressões dos conflitos vividos. Apontamos, portanto, que a visão estática desse processo apenas estigmatiza as crianças, impossibilitando o acolhimento e a ressignificação desses fenômenos. O presente trabalho não se propõe a qualificar qual o melhor ambiente de desenvolvimento, mas sim de propor uma reflexão crítica dos conceitos de instituição familiar e de abrigamento. Nesse sentido, visamos não só descrever a situação da criança em abrigo, mas, a partir da construção de diferentes tipos de relações, oferecer possibilidades de produzir novos sentidos para seu desenvolvimento. Assim, o trabalho volta-se para a criança como sujeito de direitos que se desenvolve imersa em relações interpessoais. Estamos resgatando, portanto, uma visão de criança enquanto sujeito ativo, que é construtor e construído em um meio único e próprio. Sendo assim, a infância é algo indeterminado, relativo e imprevisível (Larrosa, 2004) que transforma seu meio em um constante vir a ser. As considerações aqui resumidas a partir das reflexões dialógicas entre a teoria e a prática são provenientes de um trabalho de extensão realizado em uma instituição de abrigamento no entorno do Distrito Federal. Esse trabalho é um projeto de extensão do Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília, denominado Pintando e Bordando: desenvolvimento de crianças e adolescentes em abrigos. Tem por objetivo a criação de um espaço diferenciado de relações interpessoais, lazer e comunicação. Utiliza-se a brincadeira como instrumento que favorece essas relações, possibilitando o desenvolvimento de recursos de personalidade como a criatividade e a autonomia. Por meio do brincar, as extensionistas criam um meio ativo de desenvolvimento afetivo e cognitivo, em que transforma a criança e é por ela transformado. Isso só é possível a partir da disposição das extensionistas em se colocarem como psicólogas em constante atenção à escuta das demandas das crianças. Dessa forma, a brincadeira permite uma aproximação entre adultos e crianças e entre elas mesmas. Nesse espaço, a criança pode tomar a iniciativa e propor novas brincadeiras onde lhe é assegurado que possa colocar seus desejos, sendo acolhida nos limites constituintes. A partir das atividades de brincadeira, construímos com as crianças uma forma de se relacionar pautada no respeito, promovendo o desenvolvimento de recursos de personalidade que os tornem mais capazes de fazer suas próprias escolhas, lidar com contradições do cotidiano, perceber que existem diferentes tipos de relações pessoais, elaborar a questão da separação e do abandono entre outros. Reafirmamos, portanto, a imprevisibilidade do sujeito que se constitui nas relações de abrigamento, sendo impossível determinar a forma como irá ocorrer o desenvolvimento de cada criança. Sendo assim, nos291 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento so trabalho visa proporcionar um espaço de brincadeira que permita a criança lidar com situações adversas do abrigamento no seu processo de desenvolvimento. Isso só pode ser feito se a criança é vista como sujeito único, acolhida e respeitada em seus desejos e suas histórias. Palavras-chave: abrigo, infância, identidade Contato: Camila Moura Fé Maia, UnB, mila. [email protected] DIA 13/11 - Domingo 16h-18h Mesa Redonda Convidada A JUVENTUDE NA AMERICA LATINA: VALORES E DESENVOLVIMENTO HUMANO Júlia Sursis Nobre Ferro Bucher-Maluschke - UCB Silvia Helena Koller - UFRGS Fernando González Rey - CEUB/UnB Normanda Araujo de Morais - UNIFOR Esta mesa redonda se propõe a apresentar e discutir resultados de pesquisas realizadas no Brasil e em países da América Latina que enfocam o desenvolvimento dos jovens e sua relação com a formação de valores. Partindo do conceito de virtude desenvolvido pelos gregos na antiguidade como “um traço de caráter merecedor de admiração, tornando seu portador melhor, quer seja do ponto de vista moral ou intelectual, quer na conduta de matérias es292 pecíficas” abordaremos a noção de valor que definido por Gerard Legrand traduz a “passagem do desejo para o conjunto doutrinário e prático que constitui uma moral fundada (explicitamente ou não) em um conjunto de valores que são também abstrações representando o que se tem por desejável”. Nesta perspectiva inúmeras são as questões que se colocam na contemporaneidade sobre a construção e vivência de valores para os jovens. O Prof. Fernando Rey a partir de suas pesquisas realizadas em Cuba, na Guatemala e no Brasil, abordará o tema dos desafios dos valores dos jovens em diferentes realidades da América Latina, discutirá alguns dos processos macro e micro sociais que hoje vivem esses três países da América Latina e os desdobramentos desses processos nos problemas específicos do desenvolvimento de valores dos jovens. Serão analisados os processos de configuração subjetiva dos valores morais, aspecto central no processo de desenvolvimento da juventude. A Profª.Sílvia Koller apresentará os resultados da pesquisa desenvolvida com Prof.Carlos Nieto sobre o desenvolvimento de valores em adolescentes e jovens em situação de rua no Brasil e na Colômbia. Serão discutidos aspectos relacionados às questões biosociodemográficas desta população, os fatores que os levam à situação de extrema vulnerabilidade e alguns aspectos protectivos, incluindo valores sociais e pessoais, que os auxiliam na sobrevivência e na superação. O Prof. Benedito dos Santos apresentará os resultados de sua pesquisa sobre (In)justiça emocional: o sentido de justiça de crianças e adolescentes que fogem de casa. Será abordada a formação do senso de justiça entre crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade e violência intrafamiliar para ar- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento gumentar que o sentido de injustiça emocional é um componente importante no entendimento dos atos de fugir de casa. A Profª. Normanda Araújo apresentará reflexões acerca dos valores atribuídos por jovens em situação de vulnerabilidade social acerca de suas famílias a partir da pesquisa realizada com dois grupos de jovens. Um grupo que ainda mora com suas famílias e que frequenta o Trabalho educativo e outro grupo que vive em situação de rua. Semelhanças e especificidades dos contextos familiares para os dois grupos são discutidas. A Profª. Júlia Bucher-Maluschke apresentará a partir da pesquisa de histórias de vida de jovens, filhos de pais “fora da lei”, como construíram e vivenciam seus valores pessoais num contexto intrafamiliar e social contraditório. Esperamos suscitar com esta mesa-redonda novos encaminhamentos para a investigação nesta área do desenvolvimento humano. MR LT04 - Mesa Redonda Convidada MR LT04-979 - REFLEXÕES TEÓRICOMETODOLÓGICAS EM PESQUISAS COM CRIANÇAS Rosângela Francischini - UFRN [email protected] Angela Coutinho - UFSC [email protected] Sônia M. Gomes Sousa - PUC/Goiás [email protected] O objetivo principal desta Mesa é apresentar trabalhos que se propõem a refletir sobre questões teórico-metodológicas que perpassam a atividade de pesquisa com crianças. Assim, serão abordadas questões específicas, relacionadas ao trabalho de investigação com crianças pequenas - bebês -, considerando-as, a partir do referencial da Sociologia da Infância, sujeitos sociais, portanto, que estabelecem relações com o outro, grupo geracional ou não e, nessas relações, tem um papel ativo na composição dos contextos em que estão inseridas. O contexto eleito para o trabalho empírico foi uma creche em Braga/Portugal e os resultados apontaram para a importância das ações das crianças/ bebês na condução da ação do(s) outro(s) e nas transformações de suas próprias ações. Aliando a perspectiva teórico-metodológica da Psicologia Sócio-Histórica às reflexões sobre as condições de exclusão/inclusão dos sujeitos sociais crianças, considerando, inclusive, aquelas que vivem em contextos onde a violação de seus direitos se faz presente, a segunda exposição aborda a condição da criança - e a persistente desconsideração por essa condição - enquanto sujeito que produz sentidos e significados aos acontecimentos de seu cotidiano, considerando os contextos instituicionais e seus atores. Assim, afirma a autora: “O reconhecimento da criança como sujeito concreto, inserido num contexto que ajuda a produzir e que o produz, leva a compreender a posição desse sujeito no contexto social, a situá-lo numa realidade mais ampla e a tentar apreender o processo pelo qual ele (sujeito) se forma. Sem esse enfoque, tem-se uma análise parcial do problema, uma espécie de ‘psicologismo’, uma abordagem insuficiente, incapaz de dar conta do processo de exclusão–inclusão social a que estão submetidos milhares de seres humanos. Portanto, é necessário compreender a realidade social como uma construção humana, e não simplesmente como um 293 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento dado natural, pois é no processo de produção de sua realidade social que o homem produz-se a si mesmo como ser histórico e cultural.” A terceira exposição tem por objetivo estabelecer um diálogo entre a Psicologia Sócio-Histórica e a Sociologia da Infância. A partir da constatação de que na bibliografia especializada em Sociologia da Infância comparecem críticas recorrentes à Psicologia do Desenvolvimento, principalmente, de vertente piagetiana, a autora se propõe a sinalizar as possibilidades de aproximação entre essas duas áreas do conhecimento, considerando, no entanto, a Psicologia Sócio-Histórica representada por Vygotsky, cujo desafio é pensar o desenvolvimento do sujeito a partir do materialismo dialético, das interinfluências e das transformações recíprocas sujeito-ambiente. Por seu lado, da Sociologia da Infância é chamada à cena a tese da “reprodução interpretativa”, elaborada por Corsaro, que assume a capacidade e o poder que as crianças têm de transformarem os elementos de seu contexto, através das interpretações que fazem desses elementos, sinalizando para a importância das relações intrageracionais. DESAFIOS METODOLÓGICOS PARA O ESTUDO DAS RELAÇÕES SOCIAIS DOS BEBÊS Angela Coutinho - UFSC [email protected] Financiamento: Alβan – Programa de bolsas de alto nível da União Europeia para América Latina Esta comunicação tem por objetivo apresentar algumas reflexões sobre os desafios metodológicos na pesquisa com bebês, 294 bem como as possibilidades de diálogo entre diferentes áreas do conhecimento no estudo de problemáticas interdisciplinares, como são as relacionadas às crianças e às suas infâncias. Para tanto, toma como referência uma pesquisa de doutorado desenvolvida no âmbito de um programa de doutorado em Estudos da Criança. Trata-se de um estudo com orientação etnográfica, que foi desenvolvido em um contexto de educação infantil do tipo creche, em Portugal, tendo como objetivo conhecer a ação social dos bebês no contexto da creche e, especificamente, identificar a recorrência e o modo como ocorrem tais ações sociais. As perguntas que orientaram o estudo são: Como ocorre a ação social entre os bebês, nas relações cotidianas no contexto da creche? Quais elementos são constituidores de tal ação? As relações e as ações sociais são ideias e práticas similares? O que caracteriza a ação de bebês na estruturação das suas experiências, no contexto da creche? Há uma ordem social diferenciada para adultos e crianças, no interior das instituições? Como elas são estruturadas? Quais indicativos para a formação das professoras de educação infantil emergem do conhecimento da ação social dos bebês na creche? A base teórico-metodológica selecionada encontra-se na interface das Ciências Humanas com as Ciências Sociais, nomeadamente a Sociologia da Infância, numa perspectiva que situa a criança como ator social e a infância como construção histórica e cultural (Ariès, 1981; James & Prout, 1990; Pinto & Sarmento, 1997). Dentre os pressupostos a serem abordados está a ideia de que a infância deve ser estudada a partir de si própria, considerando que as crianças são as melhores informantes sobre as questões que lhe dizem respeito. VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento Tratando-se de bebês, há questões importantes a serem debatidas em torno da escolha de instrumentos de coleta de dados e o trato dispensado aos dados coletados. Isso porque, ao buscar superar a ideia de negatividade ou falta atribuída à infância, desde a etimologia da palavras infans que é aquele que não fala - a legitimidade da competência social dos bebês passa pela descortinamento de seus modos de ser e estar no mundo, não pela ausência da fala, mas, pela presença de múltiplas outras formas de comunicação. A capturação das vozes dos bebês ocorreu, neste estudo, por meio da utilização de instrumentos como o diário de campo e o vídeo, sendo o último um instrumento valioso, sobretudo, porque essas vozes manifestam-se pelo gesto, pelo corpo, pelo silêncio, pelo olhar, enfim, por múltiplas formas de comunicação. Ainda na esteira da abordagem em torno da recolha de dados junto às crianças bem pequenas, nos deparamos com questões éticas que se referem não só à utilização de termos de consentimento informado dos familiares/ responsáveis ou devolutiva dos resultados às partes interessadas - aspectos fundamentais a qualquer processo de pesquisa -, mas, algumas questões bastante sutis, contudo, fundamentais quando partimos de perpectivas de pesquisa que tomam as crianças como atores sociais, pois, como respeitar o direito dos bebês de escolherem ou não participar de uma pesquisa? Ou, ainda, de participar da pesquisa apenas em determinados momentos? Como “ler” a sua opinião, que nem sempre é direta, sobre a presença de um outro adulto em seus espaços de vida, para satisfazer uma necessidade que lhe é alheia? Devemos considerar, ainda, que a partir dos childhood studies temos acompanhado, sobretudo, nas últimas duas décadas, um crescente número de estudos que revelam a competência social das crianças (James, 1998; Hutchby & Moran-Ellis, 1998), no entanto, as crianças envolvidas em tais estudos, quase sempre, encontram-se em uma faixa etária em que as formas de comunicação aproximam-se das utilizadas correntemente pelos investigadores-adultos. Esse dado nos provoca a pensar que, mesmo que tais estudos avancem no sentido de considerar a opinião das crianças como legítima e relevante, eles ainda não conseguem superar a marginalização das crianças bem pequenas, algo posto como desafio para as diferentes áreas. Mesmo aqueles que têm se proposto a ouvir as vozes das crianças bem pequenas: em que medida as crianças são atores e não meros objetos de estudo? O que diferencia esses papéis? As questões apresentadas constituem o eixo orientador da proposta de comunicação ora proposta que, como anunciamos inicialmente, toma como base um estudo de doutorado, que por preocupar-se com tais questões e tomá-las como fundamentais ao processo de pesquisa, permitiu compreender que os processos constitutivos das ações sociais dos bebês relacionam-se a diferentes categorias sendo que, neste grupo, em específico, nossa interpretação permitiu relacioná-los com a elaboração cultural e, de modo bastante recorrente, às situações de brincadeira; ao corpo, à sua dimensão social e enquanto expressividade; as relações entre os pares, com ênfase para as relações de gênero e a problematização das relações a partir da classe social. A idéia da competência dos bebês, no que tange à estruturação de ações que são sociais, porque são mobilizadas pela ação de outro, se revelou de modo complexo e nas minúcias de 295 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento sua expressividade, seja nas situações de brincadeira, no revelar das preferências por determinados pares, assim como da sua condição social enquanto menina ou menino pertencente a uma determinada classe e estatuto social. Os bebês agem socialmente, determinando a ação de outros, modificando a sua própria ação, assim como atuando sobre a estrutura, que embora tenha um poder interferente, não conforma as suas ações, dada a sua capacidade enquanto agente. Palavras-chave: pesquisa com bebês, metodologias de pesquisa, estudos sociais da infância O ESTUDO DA INFÂNCIA COMO REVELADOR E DESVELADOR DA DIALÉTICA EXCLUSÃO–INCLUSÃO SOCIAL Sônia M. Gomes Sousa - PUC/Goiás, [email protected] A psicologia sócio-histórica, que tem como sujeito principal de investigação a criança ou o adolescente, têm produzido pesquisas que privilegiam aspectos ausentes das investigações em outros momentos históricos. Desse modo, ao voltar-se para temas como a violência contra crianças, o abandono, a exploração sexual, o trabalho infantil etc, essas pesquisas contribuem para a construção de um campo investigativo que alcança e focaliza a dimensão da exclusão–inclusão (Sawaia, 1995 e 1998) na vivência infantil. Investigar os sentidos e significados que as crianças atribuem a diversos fenômenos da sua vivência cotidiana na contemporaneidade – família, convivência com os pares, escola, traba296 lho, lazer, violência física, sexual e/ou psicológica – é uma tentativa de romper com a concepção dominante, que vê a criança como o infante, ou seja, ‘aquele que não tem fala’, para colocá-la num lugar de protagonista, em defesa de seu status de sujeito de direitos. O estudo da infância e da criança objetiva, assim, desvelar o real, subvertendo a aparente ordem natural das coisas, pois, compreende que a criança fala não apenas de seu mundo e de sua ótica infantil, mas, também, do mundo adulto e da sociedade contemporânea (Kramer, 1996). E, nessa perspectiva, pretende também colaborar na elaboração de políticas públicas não excludentes e que vejam a infância não como risco, mas, fundamentalmente, como oportunidade (Rizzini et alii, 2000). A opção por estudar/pesquisar a infância parte do pressuposto de que a criança, na vida que vive e nas diversas formas de subjetivação que produz, revela e desvela o mundo e expressa a história dos homens. Assim, estuda-se a infância, buscando captar a criticidade da criança sobre o mundo e a do pesquisador sobre a relação criança–mundo. Contudo, essa perspectiva teórico-metodológica não é ainda usual, pois, estudar a criança quase sempre parece ao adulto interessar-se por um ‘objeto’ menor. Uma prova disso é que, quase sempre, as teorias sobre a infância estão profundamente marcadas pela ótica do ajustamento da criança à sociedade dos adultos, não apenas esquecendo a sua forma específica de ver e viver o mundo, mas, tentando transformá-la em adulto idealizado. Geralmente, não se leva em consideração que tal ajustamento deve ser o resultado de um processo histórico e cultural e que a transmissão/assimilação cultural não se dá de uma forma completa, nem tampouco passiva e pacífica. Da VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento visão fragmentária da infância, que não permite a compreensão plena da criança em sua singularidade, resultaram teorias nas quais se perdeu a dimensão dos conflitos, das crises e das tensões vividas por ela, em seu processo de desenvolvimento. O reconhecimento da criança como sujeito concreto, inserido num contexto que ajuda a produzir e que o produz, leva a compreender a posição desse sujeito no contexto social, a situá-lo numa realidade mais ampla e a tentar apreender o processo pelo qual ele (sujeito) se forma. Sem esse enfoque, tem-se uma análise parcial do problema, uma espécie de ‘psicologismo’, uma abordagem insuficiente, incapaz de dar conta do processo de exclusão–inclusão social a que estão submetidos milhares de seres humanos. Portanto, é necessário compreender a realidade social como uma construção humana e não, simplesmente, como um dado natural, pois, é no processo de produção de sua realidade social que o homem produz-se a si mesmo como ser histórico e cultural. Embora Ariès (1986) tenha, na década de 1960, defendido teses como a de que o sentimento de infância não estava presente no mundo medieval e a de que a infância é uma construção social, não raro, encontramos, na sociedade atual e no mundo acadêmico, questionamentos sobre a importância de seu estudo. Os questionamentos comparecem travestidos pelo discurso do rigor científico – a criança é um sujeito confiável?, como acessar o seu discurso?, o que ela “fala” tem importância? Na realidade, tais questionamentos expressam a condição social subalterna (Charlot, 1986) a que a infância tem sido submetida. E, mesmo na aparência da sociedade capitalista contemporânea, em que a infância parece posta em destaque – em função do estí- mulo exagerado ao consumo, da exposição à mídia etc. –, a criança continua, cotidianamente, não confirmada como sujeito do seu tempo e da sua história. Refletir sobre o sofrimento ético-político em situação de exclusão–inclusão social “é uma oportunidade de refletir sobre subjetividade enquanto fator histórico e confronto político e participar do debate transdisciplinar capaz de romper a cisão clássica entre homem/sociedade e subjetividade/ objetividade”, na compreensão de Sawaia (1998, p. 6). Há um aspecto que não deve nem pode ser esquecido, especialmente, quando se trata da realização de pesquisas com crianças: o pesquisador é portador de um poder expresso por sua condição social, por sua formação, pela hierarquia de idade. E é óbvio que essas condições, presentes nas relações sociais, marcam sua relação com os sujeitos pesquisados. Por isso, é sempre importante ele se perguntar e se avaliar – assim como também ser avaliado pelos seus pares – a respeito de como utiliza esse poder nas suas relações com os seus pesquisados, mais ainda, quando estes são crianças. É indispensável ao pesquisador que investiga a temática da infância, a formação adequada. Ele tem de extrapolar a sua área específica, entender as implicações e os procedimentos jurídicos, científicos e técnicos atinentes a essa área. Sobretudo, deve ter sempre presente que “a pesquisa não pode representar apenas um momento de coleta de dados, que beneficie somente o pesquisador e a comunidade científica. Este processo deve representar um fator de proteção para a criança que será ouvida, protegida e ajudada” (Lisboa & Koller, s.d., p. 20). É fato que a sociedade reconhece a infância como o momento da vida em que o indivíduo deve ser cuidado, no sentido biopsicossocial. 297 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento Todavia, é notório que essa compreensão não encontra suporte na realidade nem alcança o universo das crianças brasileiras. O reconhecimento dessa fase da vida, em sua plenitude, exige a garantia – a todas as crianças – da possibilidade concreta de ser criança e do direito à infância, resguardado pela sociedade e pelos adultos que a compõem. Palavras-chave: Psicologia sociohistórica, infância, dialética exclusão/inclusão social A INFÂNCIA EM QUESTÃO: DIÁLOGOS ENTRE A PSICOLOGIA SÓCIO-HISTÓRICA E A SOCIOLOGIA DA INFÂNCIA Rosângela Francischini - UFRN, [email protected] O objetivo deste trabalho é estabelecer um diálogo entre a Psicologia Sócio-Histórica, representada por Vygotsky, e a Sociologia da Infância. Sua emergência deve-se às opções teórico-metodológicas que orientam nossas atividades de ensino, pesquisa e extensão e às inquietações decorrentes de leituras da produção acadêmica em Sociologia da Infância. Nesse contexto, chamou-nos atenção as observações das críticas recorrentes à Psicologia do Desenvolvimento, que comparecem na bibliografia em Sociologia da Infância. Os temas privilegiados nas/das investigações são: desenvolvimento cognitivo e desenvolvimento social do sujeito, embora não sejam os únicos. Assim, as principais teorias do desenvolvimento, que têm em Piaget o teórico de maior destaque, centram-se nesses domínios. A partir das traduções de parte da obra de Vygotsky, observou-se a emergência e acentuação de grupos de pesquisas, na Psicologia e 298 na Educação, principalmente, com produções acadêmicas que sinalizam a filiação teórico-metodológica à abordagem sócio-histórica. Interacionismo, construtivismo, aprendizagem e desenvolvimento passam a ser focos privilegiados de discussão acadêmica. Neste trabalho, retomamos alguns pressupostos da Psicologia Sócio-Histórica cujo diálogo com os pressupostos básicos da Sociologia da Infância nos seja possível. Em nosso caso, estaremos considerando o sujeito-criança. Com esse propósito, iniciamos com uma abordagem das críticas à Psicologia do Desenvolvimento que comparecem nas principais obras em Sociologia da Infância. Observamos, inicialmente, que as críticas à Psicologia, presentes nas obras de referência em Sociologia da Infância, centram-se, principalmente, na Psicologia do Desenvolvimento piagetiana. Essa opção deve-se ao fato de que a Epistemologia Genética teve grande influência, no século XX, principalmente na Psicologia e, também, na Educação, área em que se concentram as pesquisas em Sociologia da Infância. Segundo James e James (2008), a Psicologia do Desenvolvimento concebe o sujeito a partir de estágios de desenvolvimento e das estruturas cognitivas que os caracterizam, enquanto processo linear e diretamente relacionado à idade cronológica. Acrescente-se, ainda, a concepção de desenvolvimento como um processo caracterizado por aquisições progressivas de determinadas competências, que têm no universo adulto o modelo/ perspectiva a ser alcançado. Essa atribuição de uma condição de transitoriedade à criança, acrescida de sua condição de dependência em relação ao adulto, é criticada por Sarmento (2006), que afirma: “Neste domínio, a psicologia do desenvolvimento tem sido a mais consistente promotora de uma re- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento presentação social da infância sustentada na incompletude, na incompetência e na imperfeição das formas de pensamento, que, por isso mesmo, necessita de acompanhamento e promoção nas sucessivas ‘etapas de desenvolvimento’ legitimando não apenas o controlo adulto, mas a assimetria radical de poderes intergeracionais na condução da vida das crianças” (Sarmento, 2006, p. 52). Ainda, o mesmo autor afirma que coube à Sociologia da Infância resgatar a infância das “perspectivas biologistas (...) e psicologizantes, que tendem a interpretar as crianças como indivíduos que se desenvolvem independentemente da construção social das suas condições de existência e das representações e imagens historicamente construídas sobre e para elas” (Sarmento, 2006, p. 43). Ressalva, no entanto, é feita pelo autor à Vygotsky, cuja abordagem atenta para os contextos sociais de desenvolvimento e para o papel das crianças nesse processo. Assim, a Sociologia da Infância reivindica a “construção social da infância” nos estudos sobre a criança e seu desenvolvimento, reivindicação esta presente no clássico de Ariès (1981), História Social da Criança e da Família. Considerando os apontamentos iniciais deste trabalho afirmamos que, em Vygotsky, comparece, igualmente, uma reflexão sobre o desenvolvimento infantil tendo como norteadores os estágios de desenvolvimento; no entanto, esses estágios não são concebidos como agregados de traços psicológicos separados, mas, antes, por estruturas cujo caráter integrativo de seus componentes compõe as tendências do desenvolvimento nas diversas faixas etárias, ao longo de seu percurso. Considere-se, no entanto, a fluidez entre as fronteiras das idades e o caráter qualitativo das diferenças que os conformam (Bo- zhovich, 2009). Dessa forma, os estágios de desenvolvimento são pensados a partir da composição de diferentes processos e funções mentais, e das distintas possibilidades de combinação entre esses processos e funções. Ainda, como indicadores de diferentes domínios e predominâncias de formas de interação com os contextos. As alterações qualitativas que são observadas nas interações da criança representam momentos de transição e de desenvolvimento de novas funções mentais que, por sua vez, resultam em novas organizações da consciência como um todo. Consequentemente, de novas possibilidades de ação e de transformação tanto de si, quanto do contexto. À ciência Psicológica, portanto, e mais especificamente à Psicologia do Desenvolvimento, é colocado o desafio de pensar o desenvolvimento do sujeito a partir do materialismo dialético, das interinfluências e das transformações recíprocas sujeito-ambiente. Por seu lado, a Sociologia da Infância, aproximando-se do exposto acima, ao tecer uma revisão crítica sobre os processos de socialização, se opõe a determinadas vertentes da Sociologia em que as crianças são “tematizadas como objecto de um processo de inculcação de valores, normas de comportamento, e de saberes úteis para o exercício futuro de práticas sociais pertinentes” (Sarmento, 2006, p. 54). As crianças são consideradas atores sociais, grupo geracional com características próprias, com capacidade de ação e de criação da cultura. Portanto, longe de serem reprodutores passivos nos processos de socialização, Corsaro (1997) propõe a tese da “reprodução interpretativa”, que assume a capacidade e o poder que as crianças têm de transformarem os elementos de seu contexto, através das interpretações que fazem desses elementos. 299 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento Nesse contexto de discussão, a interação social assume papel de relevância. Uma aproximação com o conceito de Zona de Desenvolvimento Proximal de Vygotsky é sinalizada, considerando, no entanto, que a Sociologia da Infância, diferentemente, sinaliza para a importância das relações intrageracionais. Concluímos com a observação de que outros pontos de diálogo são sinalizados, observando, com James e James (2008), que: “precisamente por causa de sua complexidade, um entendimento compreensivo da infância não pode ser realizado/alcançado através de uma perspectiva epistemológica e disciplinar única: um fenômeno complexo requer estudo interdisciplinar, assim, o estudo da infância tem que ser compreendido como uma atividade multi e interdisciplinar” (p. 26). Palavras-chave: infância, Psicologia Sócio-Histórica, Sociologia da Infância MR LT01 - Mesa Redonda Convidada MR LT01-939 – TRANSTORNOS ALIMENTARES E OBESIDADE NO CICLO DE VIDA FAMILIAR: O PAPEL DA FAMÍLIA Maria Alexina Ribeiro - UCB [email protected] O objetivo da mesa redonda é apresentar dados importantes de pesquisas e intervenções realizadas na Universidade Católica de Brasília – UCB, bem como discutir questões relacionadas ao tratamento que é oferecido no DF para crianças e adolescentes com transtornos alimentares – anorexia nervosa e bulimia nervosa – e 300 obesidade. Esses transtornos e a obesidade são reconhecidos como graves problemas de saúde, atingindo um número grande de pessoas, o que tem preocupado as autoridades de saúde do nosso país. Participarão dessa mesa redonda pesquisadoras participantes do projeto de pesquisa “Construção de metodologia de atendimento psicossocial a crianças e adolescentes com transtornos alimentares e suas famílias”, em andamento na Universidade Católica de Brasília – UCB e coordenado pela proponente dessa mesa redonda. A equipe responsável pelo projeto é formada por seis professoras doutoras da UCB e UnB, uma médica da Secretaria de Saúde do DF, quatro alunos de mestrado em psicologia da UCB e oito alunos de iniciação científica cursando graduação em psicologia na UCB. A primeira participante da mesa é a Dra. Denise Leite Ocampos, médica, atualmente respondendo como chefe do Núcleo de Saúde do Adolescente da Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal, que vai apresentar dados sobre o atendimento aos adolescentes no Distrito Federal, contextualizando a questão dos transtornos alimentares e obesidade. Em seguida, teremos a participação da psicóloga é Aldenira Barbosa, Cavalcante, Mestre em Psicologia pela UCB, apresentando sua pesquisa de mestrado sobre anorexia nervosa na adolescência, orientada pela proponente dessa mesa, que também participará como co-autora do trabalho. A última participante da mesa é Ana Flávia Nascimento Otto, nutricionista e Mestre em Psicologia pela UCB, apresentando sua pesquisa de mestrado sobre obesidade grave e TCAP em adultos, orientada pela proponente dessa mesa, que participará como co-autora do trabalho. VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento ATENÇÃO INTEGRAL À SAÚDE DE ADOLESCENTES NO DISTRITO FEDERAL: A QUESTÃO DOS TRANSTORNOS ALIMENTARES E OBESIDADE Denise Leite Ocampos - SES/DF [email protected] A adolescência é marcada pela experimentação de valores, de papéis sociais e de identidades e pela ambiguidade entre ser criança e ser adulto. No entanto, a adolescência não deve ser vista somente como fase, etapa, período provisório ou de transição. Esse momento é marcado por aprendizados, descobertas e desafios biopsicossociais. Tendo em vista esse momento especial de intenso aprendizado na vida do ser humano, a Organização Mundial de Saúde e Ministério da Saúde do Brasil instituíram o Programa de Saúde de Adolescentes em 1989 e o Distrito Federal oficializou o Programa em 1991. Atualmente as ações de Atenção Integral a Saúde de Adolescentes no DF são administradas pelo Núcleo de Atenção Integral à Saúde do Adolescente da Secretaria de Estado da Saúde. Essas ações encontram-se implantadas nas 15 Regionais de Saúde e têm, como prioridade, três eixos de ação: crescimento e desenvolvimento saudáveis, promoção da saúde sexual e reprodutiva e redução da morbi-mortalidade por acidentes e violências. A população na faixa etária da adolescência, de 10 a 19 anos, no DF, corresponde a 20,1%, cerca de 469.000 adolescentes. O total de atendimentos aos adolescentes chega a 35%, o que é considerado ideal em relação ao total de atendimentos da população em geral. Há uma ligeira predominância de pacientes na faixa etária de 10-14 anos (36,4%) em relação aos da faixa de 15-19 anos (53,7%) e de pacientes do sexo masculino (56,3%) em relação ao feminino (43,7%). Dentre os principais diagnósticos realizados nos atendimentos de janeiro de 2009 a junho de 2010, os diagnósticos mais frequentes foram: 23 diagnósticos de saúde mental: TDAH, Dificuldade com Autoridade, Distúrbio de conduta, Ansiedade, Deficiência Mental, Superproteção Parental, Depressão, Dificuldade Escolar, Timidez, Alcoolismo Parental, Violência Familiar, Obesidade ou Sobrepeso, Opressão Familiar, Drogas, Luto, Fobias, Adoção, Depressão Materna, Conflitos Familiares, TEPT, TPM e/ou cólicas, Conflitos com a Sexualidade, Rebeldia. Destes, 10 dizem respeito a diagnósticos psiquiátricos propriamente ditos, sejam do adolescente ou de seus pais: TDAH, Distúrbio de conduta, Ansiedade, Deficiência Mental, Depressão, Alcoolismo Parental, Drogas, Fobias, Depressão Materna, TEPT. Em termos de frequência, a importância da prevalência de problemas mentais entre os/as adolescentes fica também evidente: 70% são de saúde mental e, desses, 37,6% são de quadros psiquiátricos. Entre os diagnósticos biomédicos, predominaram Rinite Alérgica, Acne, Cefaléia, Deficiência Auditiva ou Visual, Epilepsia, Gastrite e Hipercolesterolemia. Os transtornos alimentares e a obesidade, embora não constem entre os mais frequentes, têm aparecido como queixa frequente nas consultas dos adolescentes que procuram o Núcleo. Este tem se preocupado com os referidos diagnósticos, o que motivou a busca de parceria com a Universidade Católica de Brasília – UCB, visando proporcionar aos técnicos da Secretaria de Saúde que atendem aos adolescentes um melhor embasamento teórico e instrumental para um atendimento mais eficaz dos casos. A partir desse cenário, e apoiados pelos indicadores, reconhecendo a complexidade desses fenômenos, que 301 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento escapam do domínio do indivíduo e alcançam a família e a sociedade, e adotando a lógica da vigilância à saúde, são oferecidos serviços de promoção à saúde e prevenção dos agravos aos adolescentes na atenção básica: acolhimento, acompanhamento Biopsicossocial, grupo de adolescentes, grupo interventivo para pais, acompanhamento de pré-natal, planejamento reprodutivo, acompanhamento nutricional, oficinas temáticas, imunização e articulação interinstitucional. As equipes são multidisciplinares e são compostas por: médico(a) s, enfermeiro(a)s, técnico(a)s de enfermagem, assistentes sociais e psicólogo(a) s, sendo que a composição da equipe varia de serviço para serviço. As principais atividades realizadas são: acolhimento, atendimento individual, grupo de instrumentalização de pais, grupo para pais de adolescentes em situação especial de uso de drogas, grupo de adolescentes, grupo de adolescentes gestantes, grupo de planejamento sexual e reprodutivo, além de oficinas e ações nas escolas, por meio do Programa Saúde na Escola – PSE. Compreendemos que, embora a média de atendimentos alcançou o objetivo quantitativo em relação ao ideal estabelecido, é preciso que haja um grande empenho na melhoria qualitativa dos atendimentos, com investimentos variados na qualificação profissional e na organização da rede para o acolhimento desta população, considerando as várias especificidades que apresenta. Ao mesmo tempo, é necessário investir na busca ativa e na atenção integral, já que a demanda espontânea é principalmente motivada por acidentes, doenças agudas e à gravidez na adolescência. Palavras-chave: adolescência, transtornos alimentares, obesidade. 302 ANOREXIA NERVOSA NA ADOLESCÊNCIA: O PAPEL DA FAMÍLIA NO SURGIMENTO E MANUTENÇÃO DO TRANSTORNO Aldenira Barbosa Cavalcante - UCB [email protected] Maria Alexina Ribeiro - UCB O aumento significativo do número de pacientes com Anorexia Nervosa nas ultimas décadas, leva a pensar numa verdadeira “epidemia” do transtorno. O desequilíbrio da relação do individuo com a sua forma de se alimentar, tem preocupado os especialistas em saúde mental. A Anorexia Nervosa caracteriza-se por uma perda de peso acentuada, resultante de uma restrição calórica voluntária do paciente devido a um temor exacerbado de engordar e a uma busca implacável da magreza. Estudos apontam a incidência de pessoas cada vez mais jovens, e a média de idade das meninas com anorexia caiu de 12-14 anos para 7-8 anos. Esta dissertação de Mestrado objetivou compreender a dinâmica de famílias que possuem um membro adolescente portador de Anorexia Nervosa, identificando aspectos do relacionamento intrafamiliar específicos de famílias com esta problemática. A adolescência é considerada uma etapa do desenvolvimento humano que pressupõe a passagem de uma situação de dependência infantil para a inserção social e a formação de um sistema de valores que definem a idade adulta, segundo estudiosos. Encarada como uma fase do ciclo de vida familiar, a adolescência apresenta tarefas particulares, que envolvem todos os membros da família. Pode-se dizer, então, que este período se constitui como uma fase de transição do indivíduo, da infância para a idade adulta, evoluindo de um estado de intensa dependência para uma VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento condição de autonomia pessoal. Adotamos uma metodologia baseada na proposta da pesquisa qualitativa, pesquisa-ação e uma adaptação da metodologia de Grupo Multifamiliar, o qual se fundamenta nos pressupostos: a) da Terapia Familiar, tendo a visão de família enquanto sistema, sendo a relação o ponto focal do trabalho, priorizando o interpsíquico mais que o intrapsíquico, e utilizando os recursos sistêmicos como a circularização e a provocação; b) da Psicologia Comunitária, visando ao trabalho em equipe com diferentes saberes, científicos e populares ; c) do Sociodrama em que o grupo é o protagonista e as famílias possuem objetivos comuns, além de se identificarem mutuamente; d) e da Teoria das Redes Sociais, que enfoca a interação humana com a troca de experiência, desenvolvendo a capacidade autorreflexiva e autocrítica. Os participantes foram três famílias com adolescentes do sexo feminino diagnosticadas com Anorexia Nervosa, em atendimento em uma instituição pública de saúde da SES/DF, em Brasília. Os instrumentos utilizados foram: roteiro de entrevista semiestruturada, genograma, colagem, construção do ciclo de vida familiar e gravação em áudio - MP3. Os dados foram submetidos à análise de conteúdo e interpretados de acordo com a abordagem sistêmica da família. A análise demonstrou dificuldades múltiplas no sistema familiar, tais como: padrão de comunicação pouco claro; presença de conflito conjugal com a adolescente anoréxica se posicionando triangulada com os pais; negligência dos pais da adolescente; depressão das mães; mães dependentes afetivamente das filhas, fronteiras internas difusas e evitação de conflitos. Alguns aspectos foram sinalizados pelas famílias ao final dos gru- pos multifamiliares: 1) de que não existe uma única forma correta de lidar com as dificuldades decorrentes da doença; 2) a conclusão de que precisam observar melhor as mudanças de comportamento dos filhos; 3) a percepção de que o momento do diagnóstico causa sofrimento a todos; 4) o grau de importância de buscar informações sobre os sintomas da filha; 5) o entendimento de que o tratamento familiar é eficaz para a união da família; 6) o sentimento de que dividir as angústias em relação à AN, com as demais famílias é importante; 7) o entendimento que a adesão ao tratamento exige mudanças no ambiente familiar; 8) e por fim, relataram o fortalecimento dos vínculos familiares após compartilhar seus sofrimentos com outras famílias. Nessa perspectiva, este estudo mostrou que as interações que se estabelecem entre pais, mães, filhos e filhas permeadas por sofrimentos, conflitos, valores e crenças interagem com as questões biológicas, nutricionais e psicossociais que envolvem a dinâmica familiar dos sujeitos pesquisados. Esses dados mostram a complexidade da doença, cujo conhecimento exige uma leitura que inclua várias dimensões do contexto onde está inserida e reforçam a importância da terapia familiar no tratamento dos transtornos alimentares. Palavras-chave: anorexia nervosa, família, adolescência. 303 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento OBESIDADE E TRANSTORNO DA COMPULSÃO ALIMENTAR (TCAP) NA IDADE ADULTA: CONHECENDO A FAMÍLIA DO PACIENTE E SUA DINÂMICA Ana Flávia Nascimento Otto - UCB [email protected] Maria Alexina Ribeiro - UCB Entre as pessoas com obesidade grave existe uma sub-população com características semelhantes, que não respondem ao tratamento comportamental para perda de peso. Este grupo apresenta um tipo de transtorno alimentar conhecido como Transtorno da Compulsão Alimentar Periódica (TCAP). Essa patologia é uma nova categoria diagnóstica proposta pelo Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, 4ª edição - DSM-IV, para possível inclusão nos transtornos alimentares, sendo que até o momento, está inserida nos transtornos alimentares sem outra especificação. É caracterizada pela presença periódica de compulsão alimentar com subsequente angústia, devido à ausência de comportamentos regulares voltados para eliminação do excesso alimentar Apesar de diversos estudos investigarem o ambiente familiar de pessoas com transtornos alimentares, existe uma escassez de estudos que aliem funcionamento familiar, obesidade e TCAP. Por isso, o objetivo deste trabalho foi investigar a dinâmica familiar de um adulto com obesidade grave e TCAP, a partir do arcabouço teórico da Abordagem Sistêmica da Família. A pesquisa foi delineada na forma de um estudo de caso realizado a partir dos dados levantados em duas visitas domiciliares para construção do genograma familiar, ecomapa, colagem da família e realização de duas tarefas: tarefa nº 2 de Féres-Carneiro e tarefa nº 4 de Watzlawick. O estudo demonstra a 304 ligação entre o papel da alimentação no desenvolvimento infantil, pertencimento familiar e a eclosão da compulsão alimentar na fase adulta A literatura aponta que a interação da mãe com o bebê, via aleitamento, e, posteriormente, a interação da família com a alimentação da criança, constitui fator fundamental no surgimento de alguns casos de obesidade. Muitas mães e famílias têm uma excessiva preocupação com a alimentação da criança e a alimentam de forma exagerada, criando um hábito alimentar que pode se manter. Essa relação alimento-afetividade foi intensificada na vida de Eva, pela ênfase que a mãe dava em alimentá-la, parecendo ser essa a única forma de carinho que a mãe lhe dedicava. A expressão de afeto através do alimento iniciada na amamentação e perpetuada com o uso de outros alimentos, pode ter influenciado ou predisposto ao surgimento da compulsão alimentar e da obesidade. As perdas são outro aspecto que chamou a atenção na história da família de Eva. Elas permeiam o ciclo de vida familiar desde a sua família de origem: o pai de Eva abandonou a família assim que ela nasceu. As perdas sempre provocam uma desestabilização do sistema familiar, e a experiência de superá-la fortalece a capacidade resiliente da família para enfrentamento de adversidades futuras. Entretanto, quando este ajuste ocorre em apenas parte do sistema familiar, cria-se um desequilíbrio entre os membros, onde uns tornam-se mais resilientes que outros e estas diferenças podem afastá-los, justamente nos momentos de reorganização de papéis e de vínculos na família. A vivência desta crise pode paralisar a família no seu processo natural de desenvolvimento e favorecer o surgimento de sintomas. No caso da Família Dias, a saída do pai de Eva VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento foi a primeira crise enfrentada por ela. A família, na tentativa de adaptar-se a essa nova realidade, promoveu Eva à condição de filha parental. Ela, além de cuidar da mãe alcoolista, também cuidava dos seus irmãos, apesar de ser a filha mais nova. Essa troca de papéis quando temporária constitui a base de identificação da criança com os pais e esse arranjo natural não acarreta, necessariamente, prejuízos para o funcionamento familiar. Mas se a parentalização tornar-se um modo habitual e prevalente de relação, como no caso de Eva, o filho parental é excluído do subsistema fraterno e inserido no subsistema parental, assumindo prematuramente uma considerável responsabilidade emocional, que o obriga a desenvolver um falso-self de autonomia, independência e autossuficiência. Esse filho fica triangulado e fusionado com figuras parentais indiferenciadas, transformando esse papel num aspecto de sua própria identidade. Provavelmente, a parentalização de Eva tenha dificultado o seu relacionamento com seus irmãos, referidos por ela como “inimigos”, visto que sua permanência no papel parental a impediu de desenvolver uma relação de igualdade no subsistema fraterno. Já na fase adulta, quando Eva já era casada e suas filhas eram pequenas, morre seu irmão mais próximo e em seguida sua mãe adoece gravemente. Nesse momento de luto e de dificuldades financeiras, Eva começa a desenvolver os sintomas de compulsão alimentar. Nos seus relatos refere não ter tido apoio dos irmãos para cuidar da mãe, o que demonstra o ambiente desligado de sua família de origem. O desenvolvimento do TCAP parece estar intimamente ligado a um sistema familiar desligado. De fato, um baixo nível de coesão familiar enfraquece a resiliência familiar, entendida aqui, como a capacidade do grupo familiar de suportar crises e adversidades acionando o potencial de reparação e superação. Dessa forma, a estrutura familiar desligada pode ter dificultado o manejo da crise iniciada com a morte do irmão e agravada pela doença materna, e gerado uma sobrecarga na família nuclear, culminando no surgimento de um novo sintoma, o TCAP. Outras características identificadas similares quanto ao funcionamento de sistemas com obesidade descritos na literatura foram: fronteiras internas difusas e externas rígidas; ênfase à lealdade familiar; forte ligação entre alimentação, afetividade e pertencimento e comunicação marcada por pouca expressão de sentimentos. Sobre o funcionamento familiar de pessoas com TCAP, também foi observado características relatadas na literatura, como vulnerabilidade à obesidade e baixa coesão na família de origem. Por outro lado, a pesquisa identificou aspectos da dinâmica que não foram encontrados nos estudos revisados e que podem estar relacionados com o desenvolvimento de obesidade e TCAP: a parentalização do paciente com o sintoma e uma comunicação familiar paradoxal. Com base nesses resultados salientamos que a obesidade não se limita ao indivíduo, ela está intimamente ligada ao sistema familiar e, portanto, precisa ser tratada de forma sistêmica. Se conseguirmos mudar o nosso olhar, do indivíduo para o contexto, e incluir a família no tratamento da obesidade e do TCAP, não como fonte de suporte, mas como agente primordial de mudança, possivelmente teremos melhores resultados ao longo prazo. Palavras-chave: obesidade/TCAP; família, dinâmica familiar. 305 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento MR LT01 - Mesa Redonda Convidada MR LT01-1013 – IMPLICAÇÕES DO ENVELHECIMENTO PARA A PERCEPÇÃO VISUAL E AUDITIVA Luciana Carelli Henriques de Andrade - InPA [email protected] Maria Ângela Guimarães Feitosa - UnB [email protected] Roberta Ladislau - UnB [email protected] O aumento da expectativa de vida da população tem despertado crescente interesse de pesquisadores em diferentes áreas para estudar o envelhecimento, pelos seus aspectos econômicos, sociais, biológicos e psicológicos. Na presente mesa redonda dá-se atenção aos aspectos biológicos caracterizados por um processo degenerativo progressivo, marcado por alterações estruturais e funcionais e aos aspectos psicológicos relacionados a decréscimo no funcionamento sensorial, perceptual e cognitivo. São apresentadas e problematizadas alterações na percepção que acompanham o processo de envelhecimento, abordando tanto alterações usuais não necessariamente vinculadas a doenças, como as alterações na percepção de fala e no processamento temporal auditivo, quanto às alterações associadas a doenças crônico-degenerativas, como as alterações na percepção da emoção em idosos com doença de Alzheimer. São examinadas as implicações destas alterações para outros aspectos da percepção e para a vida social do idoso, as relações dessas alterações de percepção com as dimensões biológica e cognitiva do fun306 cionamento da pessoa, e as implicações do conhecimento já disponível para ações voltadas para a atenção ao idoso, proporcionando-lhes mais qualidade de vida. O ENVELHECIMENTO DO SISTEMA AUDITIVO E A PERCEPÇÃO AUDITIVA EM IDOSOS: A COMPREENSÃO DA FALA EM DESTAQUE Luciana Carelli Henriques de Andrade - InPA [email protected] O envelhecimento constitui processo degenerativo progressivo, marcado por alterações estruturais e fisiológicas nos sistemas cardiovascular, respiratório, músculo-esquelético, nervoso e sensorial os quais desencadeiam complicações importantes para os processos sensoriais e cognitivos (Feitosa, 2001). A perda da audição começa em torno dos 20 anos de idade, entretanto, nesta fase, esta perda não é notada e nem facilmente mensurável. Ela começa a ser percebida em torno dos 50 anos. Em geral, os homens apresentam uma perda auditiva notável mais cedo que as mulheres (Yost, 2007). Homens a partir dos 69 anos têm limiares auditivos mais altos do que mulheres na faixa de 4000Hz. Observa-se a partir dos 50 anos o aumento progressivo nos limiares auditivos detectados por meio da audiometria tonal (Syka, 2002). Segundo Baraldi, Almeida e Borges (2007) é na faixa etária de 80 anos que a dificuldade para ouvir sons em alta frequência está mais acentuada, e depois dos 90 o nível de perda se estabiliza. A perda auditiva bilateral e simétrica que ocorre progressivamente em função do avançar da idade é chamada de presbiacusia. A presbiacusia gera dificuldade de localização espacial, VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento processamento de informações sobre frequência, tempo, intensidade dos sons e compreensão da fala. As diversas mudanças anatômicas que ocorrem no sistema auditivo do idoso, tanto na parte periférica quanto central interferem na eficácia do processamento da compreensão da fala. A presbiacusia é percebida como o principal fator explicativo para a dificuldade de compreensão da fala desta população (Humes, Watson, Christensen, Cokely, Halling & Lee, 1994). A presbiacusia atinge cerca de 60% dos idosos acima de 65 anos e inclui mudança gradual na sensibilidade auditiva para todas as frequências, sendo as perdas para as altas freqüências as de maior magnitude (Bess, Hedley-Williams & Lichtenstein, 2001). A perda da sensibilidade para altas frequências ocorre porque as estereocílias das células ciliares da base da cóclea, responsável pela transdução do som, são estimuladas diante de todas as frequências sonoras, assim seu desgaste é maior e ocorre primeiro, se comparado com as estereocílias das células do ápice, que demoram um pouco mais para ficarem flácidas e processam apenas frequências baixas. Como as células da base da cóclea são especialistas em processar sons de alta frequência, o prejuízo na compreensão dos sons agudos ocorre primeiro (Syka, 2002; Yost, 2007). O envelhecimento do sistema auditivo (SA) está correlacionado com várias alterações, as quais podem ser resumidas em mudanças cognitivas, morfológicas e fisiológicas. Como mudanças morfológicas constata-se, segundo Syka (2002): a) a desestruturação das células ciliadas internas e externas e b) as perdas das células ganglionares espiraladas que formam as fibras do nervo auditivo. Nas mudanças fisiológicas identifica-se: a) a diminuição na amplitude dos reflexos acústicos, b) a diminuição dos potenciais de tronco encefálico, c) a diminuição da inibição do sistema nervoso auditivo central (SNAC) e d) o prolongamento das latências das respostas do tronco encefálico. Encontram-se, também, evidências sobre irregularidades no processamento da informação no que tange a: a) alterações no processamento e na resolução temporal, b) alterações no processamento espacial (i.e. localização de sons), c) diminuição progressiva e acentuada da sensibilidade para frequências altas, d) declínio na resolução de frequências, e) o aumento do limiar de audibilidade para tons puros e f) lentificação na velocidade de processamento. Como a intenção das autoras relaciona-se aos processos de percepção da fala, serão argumentados de forma seletiva os aspectos relacionados a esta temática. Parte da diminuição progressiva na compreensão de fala associada à idade avançada é devido a um declínio na capacidade do processamento funcional, a deterioração da memória episódica secundária e a diminuição na velocidade dos processos mentais (Gordon-Salant, 2005; Marshall, 1981). Em resumo, observa-se que a ocorrência da presbiacusia em idosos compromete várias habilidades relacionadas com a audição. Compreender e discutir sobre o processo de envelhecimento sensorial e os seus efeitos é uma tarefa importante para os profissionais de saúde que lidam com idosos, pois isto possibilita a busca de meios mais eficazes e positivos para a comunicação e relacionamento com os idosos. Palavras-chave: Envelhecimento, Envelhecimento do sistema auditivo, Percepção de fala. 307 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento ENVELHECIMENTO E PROCESSAMENTO TEMPORAL AUDITIVO Maria Ângela Guimarães Feitosa - UnB [email protected] É de longa data conhecido que com o processo de envelhecimento, as pessoas vão gradualmente perdendo a sensibilidade auditiva, com prejuízo em maior grau para homens do que mulheres, e para sons de frequência alta do que frequências baixas. Acompanha este processo uma dificuldade crescente de comunicação oral, com eventual prejuízo para a própria autonomia pessoal, e estes dois tipos de prejuízo são componentes centrais da presbiacusia . Uma série de estudos tem analisado aspectos específicos do processamento do som que também acompanham o envelhecimento e há documentação importante de prejuízo crescente em processamento temporal, em discriminação de frequência e de intensidade, e em uma série de tarefas em que o ambiente acústico inclui ruído ou distorções, especialmente se estas tarefas são de reconhecimento de fala. Revisões abrangentes deste cenário podem ser encontradas em Fozard & Gordon-Salant (2001) e Fitzgibbons & Gordon-Salant (2010). Muitas vezes, um aspecto importante da informação auditiva é a sua organização no tempo, demandando que o ouvinte realize um processamento temporal do som. Nesta apresentação damos atenção diferenciada ao envelhecimento do processamento temporal, uma habilidade considerada importante para a percepção de sons complexos e com características acústicas altamente dinâmicas ao longo de intervalos de tempo razoavelmente curtos, como as envolvidas no reconhecimento da fala e na percepção auditiva do espaço, incluin308 do a localização de fontes e a percepção de movimento. O processamento temporal vem sendo estudado em dois aspectos centrais e com metodologias comportamentais psicofísicas próprias. De um lado aquelas situações em que é necessária a integração de informação ao longo de um período relativamente longo, como na detecção de sinais fracos; de outro lado aquelas situações em que é necessário um processamento rápido para evitar o efeito mascarador de outros sons antecedentes ou subsequentes, ou seja uma boa acuidade ou resolução temporal (Eddins & Green, 1995; Helfer & Freyman, 2008). Mais recentemente o aspecto temporal da informação tem sido ampliado para o estudo da percepção de fluxos, objetos e cenas auditivas (por exemplo, Sakai, Chimoto, Qin & Sato, 2009). Dentro da temática de processamento temporal, e mais especificamente no estudo da resolução temporal, encontramos vários estudos utilizando procedimentos em que a tarefa do participante é identificar a presença de falhas, interrupções, em um sinal contínuo e mostramos a partir de estudos realizados por diferentes grupos de pesquisadores que a resolução temporal diminui com a idade (por exemplo, Snell, 1997; Neves, 2005; Ross, Schneider, Snyder & Alain, 2010). Procuramos argumentar que a diminuição da competência do processamento temporal não se relaciona com a diminuição na sensibilidade a tons puros, mas se relaciona a outras competências de importante valor adaptativo, como a percepção da fala, do espaço, e de aspectos mais subjetivos como a análise de cenas. Por fim, comentamos sobre a dificuldade em dissociar os componentes sensoriais e cognitivos do processamento auditivo. VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento Palavras-chave: Processamento temporal, Envelhecimento auditivo, Desenvolvimento sensorial. PERCEPÇÃO EMOCIONAL NO ENVELHECIMENTO Roberta Ladislau - UnB [email protected] O aumento da expectativa de vida da população despertou o interesse de muitos profissionais para estudar o envelhecimento. Falcão e Dias (2006) advertem que em 2025, o Brasil será o sexto país com maior população de idosos no mundo. Esse processo de envelhecimento tem trazido diversas consequências. Uma delas é o aumento de doenças crônico-degenerativas, como as demências, que vêm se tornando muito comuns na população mundial, chegando a duplicar a cada cinco anos, após os 60 anos (Caramelli & Barbosa, 2002). O DSM-IV considera demência toda síndrome que apresenta declínio da memória, de alguma outra função superior (e.g. linguagem, gnosias, praxias ou funções executivas) e que interfira nas atividades de vida diária. Caramelli e Barbosa (2002) e Farah e Feinberg (2005) afirmam que a Doença de Alzheimer (DA) é a causa mais comum de demência, atingindo 50% dos idosos acima de 65 anos. A DA evolui, inicialmente, com o prejuízo na orientação temporo-espacial e nas memórias de curto-prazo e episódica. A seguir, ocorrem déficits na linguagem, nos distúrbios de planejamento, nas habilidades visuoespaciais e no processamento emocional. Nos pacientes mais idosos, é comum a ocorrência de sintomas psicóticos (Caramelli & Barbosa, 2002). É comum observar, nesses idosos, alterações emocionais também. No envelhecimento normal, o idoso passa por uma série de transformações emocionais e psicológicas. Sua autoestima e a sua aceitação de si mesmo podem ficar mais vulneráveis à medida que sofre alterações em sua autonomia, em sua liberdade, no seu convívio social e nos vínculos afetivos no grupo. (Gáspari & Schwartz, 2005). Como consequência, pode-se ter um isolamento social e um cenário facilitador de depressões. Porto, Bertolucci, Ribeiro e Bueno (2008) explicam que os idosos possuem uma maior habilidade na regulação das suas emoções do que os jovens. Conforme os autores, os idosos focariam em uma resposta antes de gerar a emoção. Eles utilizam a teoria da seletividade socioemocional, segundo a qual, os idosos valorizariam mais objetivos com significado emocional, investindo mais cognitiva e comportamentalmente nessas situações. Assim, a emoção direcionaria processos cognitivos, e, ao direcioná-los, a memória formada poderia sofrer influência em seu conteúdo. No caso da DA, Abrisqueta, Ueta, Oliveira, Bertolucci & Bueno (1998) afirmam que essa população apresentam capacidade de atribuir conteúdo afetivo aos estímulos. Contudo, a associação entre a emoção e a memória nesses pacientes não é consistente, pois a emoção não promove uma melhora na evocação de informações. Para os autores, é possível que o conteúdo emocional seja retido pelos idosos. Contudo, essa retenção não deve ser suficiente para a evocação do conteúdo cognitivo dos estímulos. Os autores sugerem ainda que é possível que os pacientes com DA percam, em estágios iniciais, a capacidade de evocar o conteúdo emocional dos estímulos, provavelmente devido ao comprometimento da 309 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento amígdala. Devido a essa dificuldade no processamento das emoções, o presente trabalho buscou estudar o reconhecimento de expressões emocionais da face em idosos com DA por considerar a importância desse reconhecimento para a regulação do comportamento e para a interação social do idoso. Como resultados, observou-se que os idosos com DA em estágio moderado obtiveram índice de reconhecimento próximo de 80% para a face de alegria; de 36% para a de tristeza e as restantes ficaram abaixo de 20% de reconhecimento. Esses dados sugerem que o reconhecimento da face de alegria é a única que está preservada nesse grupo. Como sugerido no estudo de Luzzi, Piccirilli e Provinciali (2007), o déficit no reconhecimento de expressões faciais emocionais em idosos com DA está relacionado ao hemisfério direito. Mais especificamente, o hemisfério direito está voltado para o processamento de emoções negativas (Perry et al., 2001). A preservação do reconhecimento da face de alegria sugere que ainda há uma memória residual voltada para essa expressão emocional facial. Considerando que a emoção é eliciada por representação mental e memória (Scherer & Ekman, 1984), parece que os déficits encontrados na percepção de faces emocionais estão mais relacionados à progressão da DA, que afeta tanto as habilidades visuoespaciais quanto o processamento da emoção. O aspecto emocional, portanto, deve ser bem estudado a fim de favorecer os programas de estimulação para os idosos, proporcionando-lhes mais qualidade de vida. Nesse trabalho, entede-se qualidade de vida como envelhecer de forma satisfatória e isso “depende do delicado equilíbrio entre as limitações e as potencialidades do 310 indivíduo, o qual lhe possibilitará lidar, em diferentes graus de eficácia, com as perdas inevitáveis do envelhecimento” (Néri, 2000, p. 12-13). Palavras-chave: Envelhecimento visual, Reconhecimento de expressões faciais, Doença de Alzheimer. Contato: Maria Ângela Guimarães Feitosa, UnB, [email protected] MR LT04 - Mesa Redonda Convidada MR LT04-1235 - TECENDO INFÂNCIAS: CONTRIBUIÇÕES DA PSICOLOGIA E DA EDUCAÇÃO PARA A FORMAÇÃO DE PROFESSORES Paula Cristina Medeiros Rezende - UFU, [email protected] Paula Amaral Faria - ESEBA/UFU, [email protected] Pâmela Faria Oliveira - ESEBA/UFU, [email protected] Denise Bortoletto - ITV [email protected] Esta mesa pretende contribuir com o debate sobre a constituição e formação de professores, a partir do encontro entre a Pedagogia e a Psicologia, abordando questões atuais relativas à Educação Infantil. Atualmente, a infância tem-se apresentado como tema central na constituição de um novo paradigma que convida a compreender a natureza histórica-cultural da criança, tentando romper com a ideia de infância enquanto in-fans, ou seja, criança sem fala, sem voz. Concomitante a este movimento de legitimação de uma infân- VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento cia “rica” e ativa, constatamos que o educador infantil, diretamente responsável por este universo, se encontra sem espaço para uma interlocução teórica-prática sistematizada que o ajude a ampliar suas possibilidades de intervenção neste contexto. Deste modo, a formação em serviço dos professores da educação infantil coloca-se em pauta na ordem da urgência, intimando os profissionais que atuam na área da educação a problematizarem e compartilharem suas práticas e fundamentações teóricas. Assim, pretendemos articular esta temática possibilitando legitimar as diferentes vozes que compõem o cenário escolar, a saber: professores da educação infantil, pedagogo e psicólogo escolar. A primeira fala abordará a formação em serviço do educador infantil, destacando a relevância da arte como ferramenta útil no processo de ampliação dos sentidos sobre a atuação deste profissional no cotidiano da educação infantil. Por meio da metáfora do Parangolé, proposto pelo artista Hélio Oiticica, pretende-se articular os recursos e as potências que o educador da infância pode desenvolver em sua prática diária. A segunda apresentação, proposta por uma professora da educação infantil de uma Escola de Educação Básica, versará sobre as perspectivas teóricas do campo da Educação e da Psicologia que sustentam as práticas educativas, dando destaque às especificidades deste profissional; a formação inicial e em serviço e as possibilidades de diálogos com a proposta educativa de Reggio Emilia. Em seguida, por meio das experiências de uma educadora infantil, também de uma Escola de Educação Básica, pretende-se abordar a importância do desenvolvimento de habilidades e competências necessárias para instrumentalizar o profissional da educação, culminando em uma atuação coerente com a perspectiva que compreende a criança como produtora de cultura. A quarta fala será desenvolvida por uma pedagoga que compõe uma equipe de apoio pedagógico da Educação Infantil de uma instituição privada, onde refletirá e explicitará as intervenções possíveis neste campo, delineando uma formação de professores que esteja voltada e comprometida com os processos de desenvolvimento e aprendizagem das crianças. Palavras-chave: formação de professor, educação infantil, infância. PARANGOLÉS: Formação em Serviço de Professores da Educação Infantil. Paula Cristina Medeiros Rezende, UFU, [email protected] O presente trabalho, desenvolvido a partir da experiência de uma psicóloga escolar com um grupo de formação de educadores da educação infantil, inspira-se nos Parangolés do artista plástico Hélio Oiticica quando convida o espectador a assumir um posicionamento ativo na constituição da atividade criadora, abandonando o lugar de mero espectador. Parangolés são capas, estandartes, bandeiras para serem vestidas ou carregadas pelo participante de um happening. As capas são constituídas de tecidos coloridos estampados com palavras e imagens que aparecem com o movimento da pessoa que o carrega. Ao vestir o parangolé o participante se constitui obra de arte e supera a ideia de suporte para a capa. De acordo com Oiticica há uma “incorporação do corpo na obra e da obra no corpo”. De acordo com Salomão (2003) a “relação artista-propositor com o participante que veste o parangolé não é a relação frontal do espectador e do espe311 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento táculo, mas como que uma cumplicidade, uma relação oblíqua e clandestina, de peixes do mesmo cardume”. A intenção do artista é provocar o público, convidando-o a abandonar o lugar de espectador em atitude meramente contemplativa e a ocupar o lugar de participante ativo na constituição da atividade criadora, experimentado também uma inundação sensorial vibrante no corpo inteiro pela cor, tato e movimento rápido e improvisado. Assim, o conceito de exposição de obra de arte para ser apreciada pelo público passa a ser problematizada, inserindo na questão a idéia de invenção criativa do espectador, agora participante. O objetivo da participação é oferecer ao homem a possibilidade de experimentar, de se descobrir na criação. A obra, como objeto de arte em si, não diz nada. Fica à espera do seu interlocutor para comungar no movimento a experiência artista. De acordo com Favaretto (1992) o interesse de Oiticica, ao criar o Parangolé, não foi outro senão o de levar o indivíduo ao dilatamento de suas capacidades artísticas, para a descoberta de seu centro interior criativo, de sua espontaneidade expressiva adormecida, condicionada ao cotidiano. A transposição das intenções de Oiticica para a arena da Educação Infantil nos permite refletir sobre como os educadores da infância tem se posicionado em relação a práticas educativas que legitimem os direitos fundamentais das crianças e colaborem na construção de uma sociedade mais democrática. Quais os espaços que este educador tem para dar continuidade ao seu processo de formação que possibilite exercer com autoria uma prática marcada por experiências criativas, com sentidos voltados para a formação da criança autônoma, também autora de suas experiências? A visão de infância que temos como 312 fio condutor neste trabalho está de acordo com a perspectiva sócio-histórica, que considera o homem como um ser ativo, social e histórico; e a sociedade, como produção histórica dos homens (Bock; Gonçalvez, Furtado, 2009). Assim, esse sujeito se constitui e constrói o mundo dialética e dialogicamente, não podendo ser compreendido independentemente de suas relações e vínculos. Deste modo, adulto e criança se constituem mutuamente durante a história e dentro de um contexto sócio-cultural. Juntos constroem sentidos e significados do mundo infantil e adulto, se opondo, contrapondo e complementando; demarcando um campo de tensão e confronto presente no cotidiano desses sujeitos (Prado, 2005). A criança se constitui e se constrói em relação com adultos, jovens, idosos, não estando para vir a ser um adulto. É um autor e ator social, um interlocutor que se relaciona com o mundo conversando, brincando, questionando e, na medida em que realiza esse intercâmbio, possibilita a construção de diferentes versões de sentido. Para Corsaro (1997), citado por Müller (2006), as crianças são responsáveis pelas suas infâncias, uma vez que contribuem ativamente para a mudança social e para a construção da cultura a partir da interação com seus pares e com os adultos. Elas são agentes ativos que constroem suas culturas e colaboram para a produção do mundo adulto, afetam e são afetadas pela sociedade. Dahlberg, Moss e Pence (2003) aproximam-se desse pensamento à medida que apontam para o reconhecimento de algumas características deste novo paradigma da infância, as quais são de suma importância para este estudo, tais como: a infância como uma construção social e sempre contextualizada; as crianças enquanto atores sociais que VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento exercem atividade e função; o direito de terem seus relacionamentos sociais e cultura estudados, e de contribuírem para os recursos e produções sociais; a legitimação de que as crianças têm uma voz própria e devem ser ouvidas de modo a serem consideradas com seriedade; a necessidade de se atentar para a maneira como o poder do adulto é mantido e usado, assim como a elasticidade e a resistência das crianças a esse poder. Desta forma, os Parangolés de Hélio Oiticica, nos convidam a trabalhar no sentido da construção de uma educação composta por sujeitos criativos, ativos, co-responsáveis de práticas educacionais voltadas para a democracia. A formação em serviço de Educadores da Infância sustentada pela teoria sócio-histórica e tramada nas interações cotidianas entre educadores e crianças, pode anunciar-se como uma forma alternativa para alcançarmos uma educação infantil de qualidade. FORMAÇÃO DO PROFESSOR PARA EDUCAÇÃO INFANTIL: DIÁLOGOS TEÓRICOS Paula Amaral Faria - UFU, [email protected] O trabalho tem como intenção articular as principais perspectivas teóricas disponíveis socialmente no campo da Educação e da Psicologia, com o processo de constituição e formação de uma educadora infantil de uma escola de Educação Básica da Universidade Federal de Uberlândia. Esta instituição, por ser uma escola de aplicação, constitui-se também em um espaço que recebe estagiários do curso de pedagogia e psicologia para desenvolverem projetos de pesquisa juntamente com a comunidade, o que possibilita ampliar a discussão para a formação inicial de professores. Em torno da formação em serviço dos professores que atuam na primeira infância alguns tópicos merecem ser destacados como fundamentais para sustentar uma prática diferenciada: as especificidades do professor de educação infantil; formação inicial e em serviço; desafios atuais diante da formação desse setor e possibilidades de diálogos com a proposta educativa de Reggio Emilia. Primeiramente acredita-se importante situar o momento atual em que o segmento da Educação Infantil tem atravessado no cenário da Educação brasileira, dado esse relacionado com a formação dos nossos educadores. Tomam-se como base as discussões travadas no XV ENDIPE (2010). Neste foi discutido que o setor da educação infantil está vivendo um intenso processo de revisão de concepções sobre a educação de crianças em espaços coletivos, e de seleção e fortalecimento de práticas pedagógicas mediadoras de aprendizagem e do desenvolvimento das crianças. Discutiu-se também sobre a não antecipação de processos para o Ensino Fundamental. Embora o momento atual apresente um quadro de maior regulamentação, as análises realizadas indicam permanências, redefinições e tensões que ainda demandam mobilizações dos diferentes setores envolvidos, e das políticas públicas voltadas para as questões da infância. Um dessas tensões apresentadas durante o referido evento, especificamente por Cruz (2010) refere-se à formação de professores da Educação Infantil. Um dado discutido diz respeito à necessidade do professor da primeira infância constituir uma profissionalidade específica relativa a aspectos diferenciadores do papel de professor de crianças pequenas, de zero a cinco anos. A formação do professor de313 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento veria contribuir para uma ação docente que inclua, dentre outros aspectos: avaliar cuidado e educação; planejar experiências diversificadas, que atendam aos vários aspectos do desenvolvimento infantil; estabelecer e manter uma relação cooperativa e amistosa com as famílias; aprender a ser parceiro do desenvolvimento infantil, estimulando-o, mas não o apressando; abordar as diferentes áreas de conhecimento de maneira integrada; vincular a aquisição de novos conhecimentos e habilidades pelas crianças aos seus reais desejos e necessidades, promovendo uma verdadeira aprendizagem significativa; dar atenção privilegiada aos aspectos emocionais, especialmente durante o período de inserção a criança a creche ou a pré-escola; dar oportunidade e estímulo para a criança expressar os seus sentimentos, desenvolver a sua autonomia, ajudando-a a desenvolver a sua identidade cultural, racial e religiosa. Ao que se refere à formação inicial do educador, de crianças pequenas, a autora defende que os cursos que cuidam dessa etapa da formação deveriam repensar, sistematizar e enriquecer dois conjuntos de informações, intimamente relacionados: as referentes ao desenvolvimento e a aprendizagem infantil, focalizando a criança concreta, localizada histórica e socioculturalmente. Aspectos fundamentais para que o professor possa desenvolver com qualidade seu trabalho, contextualizá-lo e posicionar-se diante dos problemas que a área enfrenta, dentre eles: a constituição histórica da infância; as políticas públicas da Educação Infantil; a identidade profissional docente. Sobre a formação em serviço do professor as leituras indicam que a formação precisa ter como referência o saber docente, o reconhecimento e valorização do que o 314 professor acumulou na sua vivência pessoal e profissional – o que é importante para que ele também reconheça e valorize o conhecimento da criança. Para desempenhar bem seu trabalho cotidiano, esse profissional precisa aprender a refletir sobre a sua prática, construindo um projeto educativo que leve em consideração a utilização de recursos que possam os auxiliar na construção de uma educação para a infância de maior qualidade como: a documentação, a avaliação, a pesquisa e a observação, desde que não seja suprimida a importância de sensibilizar, de brincar, de ler, dialogar e escutar a infância. Identifica-se em Dahlberg, Moss e Pence (2003) que os desafios atuais diante da formação do educador para a primeira infância referem-se em aceitar as limitações temporais e espaciais, de que não há concertos rápidos e nem projetos universais. Mas há possibilidades de conhecimento e ações locais: o indivíduo interessado pode ler e refletir sobre temáticas relativas a sua formação e sobre a infância, bem como outras que por ventura surgirem necessidades; o grupo, a equipe de uma instituição, podem discutir e explorar diferentes recursos e possibilidades para o aperfeiçoamento da sua formação, como exemplo, a documentação pedagógica. Podendo assim aprofundar o seu entendimento do trabalho pedagógico e levando a refletir sobre as concepções que construímos sobre a criança e a infância, e nesta discussões podemos buscar inspirações em trabalhos como o de Reggio Emilia, e assim fortalecer uma formação docente de qualidade. Edwards, Gandini e Forman (1999), a partir de suas experiências nas escolas de Reggio, recomendam que os professores devem ter o hábito de questionar suas certezas, devem possuir uma VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento sensibilidade imensa, devem ser conscientes e estar disponíveis, devem assumir um estilo crítico em relação às pesquisas e conhecimento continuamente atualizado sobre as crianças, devem manter uma avaliação enriquecida do papel dos pais, e devem possuir habilidades para falar, ouvir e aprender com. Contudo é fato que a educação para a primeira infância é um direito da criança. A criança não tem direito apenas ao acesso a creche e/ou a pré-escola, mas a uma experiência educativa de qualidade, que realmente seja prazerosa e eficaz na promoção das suas múltiplas aprendizagens e desenvolvimento. Como o professor é a figura mais importante para a qualidade dessa experiência, é imprescindível que a sua formação inicial e em serviço seja foco de atenção por parte das políticas públicas e dos cursos de formação desses profissionais. DIÁLOGOS SOBRE A INFÂNCIA: EXPERIÊNCIAS DE UMA EDUCADORA INFANTIL Pâmela Faria Oliveira - UFU, [email protected] Ao longo da história da infância percebemos uma história da marginalização que abrange os mais diversos âmbitos, seja social, cultural ou econômico. As crianças precisavam viver sempre em um mundo que não era o seu, que não estava feito a sua medida, sendo vista como um adulto em miniatura. Contudo, atualmente, percebemos uma ampliação no modo como temos visto e interagido com a infância. Inicia-se uma configuração de um mapa de direitos da infância cada vez mais preciso e comprometido com as novas teorias e políticas educacionais, reafirmando o compromisso que a sociedade deve assumir em relação à infância. Diante desde quadro devemos encontrar novas formas de se trabalhar com crianças, incluindo entre estas a valorização das múltiplas linguagens infantis buscando o desenvolvimento integral das mesmas. Também exige um bom entendimento por parte do professor sobre este desenvolvimento e aprendizagem das crianças, pois oferecer uma educação de qualidade demanda conhecimentos profissionais, estratégias e cuidado únicos apropriados a infância. E para isso exige-se também uma boa formação do professor que atua na educação infantil, pois a qualidade do trabalho com a criança é intrinsecamente vinculada à formação e qualificação do profissional da área. Pensando em dialogar sobre estas questões pretendo, a partir da minha experiência como educadora infantil da Escola de Educação Básica da Universidade Federal de Uberlândia, contribuir com a reflexão sobre a formação do professor da educação infantil, destacando a importância do desenvolvimento de habilidades e competências necessárias para instrumentalizar este profissional da educação para um trabalho mais rico, prazeroso e efetivo. A partir do diálogo rico entre a pedagogia e a psicologia, temos refletido e estruturado novas formas de compreender a infância e, por conseguinte, temos buscado experimentar em nosso cotidiano escolar uma atuação coerente com esta perspectiva que se apresenta. Dahlberg, Moss e Pence (2003) nos colocam que há muitas crianças e muitas infâncias, a primeira infância é a base do progresso bem sucedido na vida posterior. É o início de uma jornada de realização da incompletude da infância para a condição humana plena da idade adulta. A infância deve ser entendida como uma 315 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento construção social, elaborada para e pelas crianças, em um conjunto de relações sociais, e a principal fase onde se constrói a identidade infantil, portanto merece atenção especial por parte dos educadores que trabalham com a educação infantil. Faria e Mello (2005) nos mostra que hoje temos um acervo bem denso de pesquisas revelando infâncias diferenciadas, crianças curiosas e inventivas, capazes de estabelecer múltiplas relações e levantar hipóteses de várias naturezas, derrubando por terra, portanto as concepções da criança incompleta, incapaz, egoísta por natureza, assim desafiando o adulto profissional da educação a trabalhar de acordo com as múltiplas linguagens infantis. Teóricos como Vygotsky, Piaget e Wallon também contribuem para os nossos estudos, trazendo uma melhor compreensão do processo de constituição dos sujeitos, de seu desenvolvimento e de sua construção de conhecimento. O estudo destes autores tem dado sustentação teórica ao trabalho do educador infantil e auxiliado na compreensão do desenvolvimento infantil. As contribuições destes teóricos nos fazem compreender que a aquisição de conhecimento é um processo construído pelo indivíduo durante sua vida. Assim nós educadores devemos desenvolver práticas pedagógicas alinhavadas aos saberes infantis, pois isto leva a situações privilegiadas de aprendizagem infantil onde o desenvolvimento pode alcançar níveis mais complexos, exatamente pela possibilidade de interação entre os pares em uma situação imaginária e pela negociação de regras de convivência e de conteúdos temáticos. Uma criança nunca pode perder a curiosidade a respeito do mundo que a envolve, e esse certamente há de ser um grande objetivo da Educação Infantil. Um exemplo 316 prático que nos mostra que a possibilidade de realizar um desenvolvimento e aprendizagem significativos, valorizando uma prática pedagógica em sua dimensão libertadora, criativa, participativa, inclusiva e democrática, por um processo de interação com o outro, mediado pela cultura, uma prática pedagógica que contemple o lúdico, a cultura, a formação humana e a construção de conhecimentos pela criança, são as escolas de Educação Infantil de Reggio Emillia. Edwards, Gandini e Forman (1999) referem que o respeito a cooperação, a solidariedade, a autonomia, a inclusão, o direito de brincar a manifestação e valorização da pluralidade cultural, social e ética, ou seja a interação da criança com o seu meio promove o desenvolvimento integral da criança. Nas escolas de Reggio as crianças são encorajadas a tomarem suas próprias decisões e a fazerem suas próprias escolhas. Os educadores exploram as múltiplas linguagens da infância, incentivam os relacionamentos e entendem as crianças como promotoras do seu próprio desenvolvimento, abrindo as portas para as cem linguagens infantis. Charlot (2005) coloca que há uma grande diferença entre ensinar e formar, a idéia de ensino implica um saber a transmitir, e a idéia de formação implica em dotar o indivíduo de competência. Assim formar o professor é dotá-lo de competência que lhes permitirão gerir tensões e construir mediações entre a teoria e a prática. Assim o autor defende uma formação de professores, onde é necessário trabalhar saberes e práticas em diversos níveis, e articular estas com as lógicas de desenvolvimento da criança na educação infantil. O professor deve formar uma identidade profissional estruturada na sua relação com o mundo e com teorias. Edwards, Gandini e Forman VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento (1999) nos mostram que o sucesso da escola está intimamente relacionado com a boa formação de seus professores. De acordo com o autor os professores de Reggio realizam sua formação em serviço e desenvolve seus conhecimentos enquanto trabalham com as crianças. Estes fazem questionamentos constantes sobre o seu ensino, e trabalham em conjunto com toda a comunidade escolar, deixando de lado o modo isolado e silencioso de se trabalhar. Mostrando-nos a importância do professor reflexivo. NOVOS OLHARES SOBRE A EDUCAÇÃO INFANTIL: A FORMAÇÃO EM SERVIÇO DE PROFESSORES COMO POSSIBILIDADES DE DIÁLOGOS SOBRE A INFÂNCIA Denise Bortoletto - ITV [email protected] O presente trabalho tem como objetivo apresentar o relato de experiência da autora, junto à equipe de apoio pedagógico da Educação Infantil de uma instituição privada de ensino de Uberlândia-MG. A literatura esclarece que o trabalho do Pedagogo nas equipes de apoio pedagógico precisa estar relacionado ao desenvolvimento de projetos e de práticas educacionais que intentem criar condições favoráveis à autonomia das crianças e dos educadores, de modo a desenvolver suas competências e habilidades, que só serão efetivadas por meio de condições de aprendizagem facilitadoras (Porto, 2009; Bassedas, 1996). A aprendizagem é entendida aqui como decorrente de uma construção, de um processo permeado por questionamentos, hipóteses e reformulações, enfim, uma dinâmica ação pedagógica que envolva o construir e o reconstruir saberes histo- ricamente acumulados e culturalmente comunicados. Nesta instituição, as ações da autora são realizadas com as crianças e suas famílias e com os educadores. Estes últimos constituem foco principal desta apresentação. O cotidiano escolar revela uma multiplicidade de saberes e práticas, muitas vezes não vivenciados pelos professores em seu processo de formação inicial. Por isso, acreditamos ser necessário investir esforços de modo a viabilizar intervenções que valorizem a formação dos professores em serviço, na tentativa de possibilitar a eles novos olhares sobre a infância e sobre as crianças e, ainda, sobre as suas relações estabelecidas com elas. Além disso, reflexões sobre as suas salas de aulas, as suas práticas didático-metodológicas e sobre a nova realidade escolar tornam-se indispensáveis. Conforme esclarece a literatura educacional, investir em situações que sejam favorecedoras da aprendizagem significativa, valorizar o conhecimento prévio dos alunos, relacionar os conhecimentos escolares com a realidade atual, constituem alguns dos desafios do educador frente ao novo contexto econômico e cultural. As investigações atuais referentes à formação de professores revelam a necessidade de se instrumentalizar os futuros professores ou os professores em serviço para pensarem ativamente na realidade escolar, bem como em sua própria inserção nela. Como pode ser observado nos estudos de Facci (2009), Sawaya (2002) e Souza (2002) é na formação em serviço do professor que se encontra uma possibilidade de que suas práticas pedagógicas sejam refletidas, repensadas e até mesmo reestruturadas. Estamos de acordo com o pensamento de Sawaya (2002) ao sugerir que uma das contribuições fundamentais da psicologia ao campo educa317 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento cional está relacionada à formação de professores. Todavia, a autora alerta que este processo deve estar sustentado em ações que levem o professor a rever criticamente as relações que constituem o seu fazer educacional, e ao mesmo tempo, que ele possa refletir sobre suas concepções, seus modos de atuação e sua relação interpessoal na instituição escolar. Como pode ser visto em Machado (2002), se na escola não existirem estratégias coletivas para pensar os acontecimentos do cotidiano, se faltarem recursos para atender aos interesses diversificados das crianças, se não se realizam discussões que auxiliem o processo ensino-aprendizagem, as dificuldades tornam-se fatalidades. Assim, torna-se urgente repensar junto aos professores as suas concepções de infância, criança e de Educação Infantil e, é no espaço de formação em serviço, que esses saberes poderão ser construídos e reelaborados. Para isso, busca-se um novo significado ideológico e social da infância a partir das ideias de Piaget e Vygotsky. Tomando por base esses referenciais teóricos, a criança passa a ser vista como agente construtor do conhecimento e sujeito ativo no processo educacional. Por conseguinte, as contribuições desses autores sinalizam uma nova etapa na história da educação das crianças. Frente ao até aqui exposto pode-se considerar que a formação em serviço de professores precisa estar pautada em processos e estratégias que permitam tratar a criança em sua individualidade, para assim buscar melhorias para os processos de desenvolvimento e aprendizagem das crianças, especialmente àquelas inseridas na Educação Infantil. Contato: Paula Cristina Medeiros Rezende, UFU, [email protected] 318 MR LT04 - Mesa Redonda Convidada MR LT04-1337 - PRÁTICAS SOCIAIS E DESENVOLVIMENTO HUMANO EM CONTEXTOS EDUCACIONAIS Luciano Santana Lopes - FAPRO, [email protected] Alice Farias de Araújo Marques - SEE/EMB [email protected] Denise de Oliveira Alves - Anhanguera [email protected] Luciana Câmara Fernandes Bareicha Anhanguera [email protected] As temáticas ora desenvolvidas giram em torno de práticas sociais inseridas nos diferentes contextos cotidianos, sobretudo nos ambientes educacional e esportivo. São ressaltados os princípios e intenções grupais que encorpam as práticas sociais, em especial as pedagógicas, bem como suas interações que favorecem o desenvolvimento humano. Os trabalhos apresentam proposições conceituais relevantes para a compreensão do desenvolvimento humano em uma dimensão sócio-histórica, atribuindo centralidade aos “processos” e às características da pessoa. O primeiro aborda a inclusão educacional de pessoas com deficiência no ensino superior, tomando como eixo estruturante o acolhimento e a valorização das diferenças e da diversidade humana, questões socioculturais nas quais se apóiam ou deveriam se apoiar as práticas sociais. O segundo trabalho relaciona a construção da subjetividade ligada às representações sociais, comprometimentos de grupos e valores sociais VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento estimulados e valorizados nas práticas educacionais. O terceiro discute as práticas esportivas associadas à formação motora e psicossocial de crianças e adolescentes no âmbito do esporte de alto rendimento. O último trabalho apresentado discute a conjunção subjetividade e práticas sociais, especificamente as educativas escolares, como uma necessidade de reflexão nos setores da psicologia social e educação. O objetivo da mesa é discutir os aspectos relacionais sob distintas perspectivas teóricas, promovendo um debate que perpasse vários espaços de práticas sociais. Os autores também apresentam posicionamentos epistemológicos, os quais dão visibilidade aos aspectos psicológicos da trama social na qual se detém. Os trabalhos apresentam proposições conceituais relevantes para a compreensão do desenvolvimento humano em uma dimensão sócio-histórica atribuindo centralidade aos “processos” e às características da pessoa em desenvolvimento. Algumas considerações finais são apresentadas: 1) As ações educacionais para a inclusão refletindo o avanço no desenvolvimento dos direitos humanos devem envolver um rigoroso processo de planejamento e organização de recursos de acessibilidade, rompendo, assim, com as barreiras que obstaculizam a plena participação e aprendizagem de estudantes com deficiência no ensino superior. 2) Conhecer como a criança é representada internamente pelos estudantes de pedagogia nos revela a forma como essa fase do desenvolvimento humano é retratada pelos formandos da educação. Pode-se considerar que existe uma construção subjetiva vinculada às representações sociais na relação criança e adulto que interfere significativamente na aceitação ou não da criança em compreender o mundo em que ela vive. 3) A teoria psicológica que discute os aspectos do desenvolvimento infantil e adolescente nem sempre pauta a práticas cotidianas dos profissionais que trabalham com iniciação esportiva. Daí a importância de articular suas práticas pedagógicas com o estágio de desenvolvimento no qual o atleta se encontra, considerando os aspectos cognitivo, afetivo, físico e social. 4) É importante considerarmos que durante o processo educacional a subjetividade perpassa a inserção do professor na relação com os seus pares, de maneira a responsabilizá-lo pela intencionalidade de seus atos pedagógicos. Ressaltamos que a subjetividade com características intencional e subjetiva, atravessa as interações sociais também no contexto educacional influenciando na construção de valores humanos e, portanto sendo necessária a atenção devida a essas práticas sociais contemporâneas. ACESSABILIDADE DE ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA AO ENSINO SUPERIOR Denise de Oliveira Alves - Anhanguera, [email protected] A inclusão social e educacional de pessoas com deficiência constitui, hoje, processo mundial que eclodiu no Brasil a partir da década de noventa e tem como filosofia estruturante o acolhimento e a valorização das diferenças e da diversidade humana. Sua proposição conceitual toma como referência alguns documentos internacionais que passam a nortear a formulação de políticas públicas. Entre eles destacam-se: a Declaração Mundial Sobre Educação para Todos (Tailândia, 319 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento 2009); a Declaração de Salamanca (Espanha, 1994); a Convenção Interamericana para Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Pessoas Portadoras de Deficiência (Guatemala, 1999); a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, (Estados Unidos, 2006). O conteúdo expresso nestes textos constitui um marco histórico em defesa da inclusão de grupos sociais em situação de vulnerabilidade e tem importante repercussão na educação, exigindo uma reinterpretação da educação especial, que passa a ser compreendida no contexto da diferenciação adotada para promover a eliminação das barreiras que dificultam ou impedem o acesso à escolarização por parte das pessoas com deficiência. Vários autores, ao tratarem da educação inclusiva, traduzem a dimensão de um “projeto revolucionário”. Eizirick (2005) utiliza a guerra como metáfora para defender a idéia de ser a inclusão um processo complexo, difícil e doloroso e demandar a “gestação de uma mentalidade inclusiva”; em Mantoan (2006) encontramos “andar no fio da navalha” para expressar o embate, a resistência, a ruptura epistemológica, inerente à proposição de uma escola aberta para todos; ainda, Forest e Lusthaus (1987), pesquisadores canadenses, utilizam o caleidoscópio como metáfora para a inclusão. Caleidoscópio é um aparelho formado por um pequeno tubo de metal, com pequenos fragmentos de vidro colorido, que, por meio do reflexo da luz exterior em pequenos espelhos inclinados, apresenta, a cada movimento, combinações variadas e agradáveis efeitos visuais. Quem já teve oportunidade de conhecer o brinquedo impressionou-se com a infinidade de desenhos que os pedaços de vidro podem produzir. O mais 320 importante, para a reflexão que pretendemos trazer aqui, é que se retirarmos qualquer pedaço ele perde parte de sua beleza. Especificamente relacionado ao âmbito educacional o conceito toma a dimensão de um redirecionamento das práticas educacionais e dos sentidos subjacentes às mesmas. Trata-se de uma postura ativa de identificação de barreiras que alguns grupos encontram no acesso a educação e também na busca de recursos necessários para ultrapassá-las. Tal concepção difere substancialmente de outras formas de inserção escolar de pessoas com deficiência, requerendo uma visão ampliada de educação, dos recursos, da estrutura, do currículo e uma mudança estrutural do sistema educacional. Com relação à inclusão de estudantes com deficiência no ensino superior, apesar de um crescente ingresso deste alunado, o que confronta as práticas discriminatórias e a cultura seletiva da universidade, dados do Censo escolar/2009 revelam que, em um universo de 5.954.021 estudantes com matrícula, apenas 20.019 apresentam algum tipo de deficiência, o que equivale a um percentual de 0,34%. Este contingente mínimo que consegue acessar ao ensino superior encontra uma instituição despreparada, em suas bases política, organizacional e, principalmente, na dimensão epistemológica, ou seja, na concepção que está subjacente a ação docente dos professores universitários. Para uma melhor contextualização desta realidade precisamos não perder de vista uma perspectiva mais ampla que é a análise das condições nas quais se deu o nascimento da universidade no Brasil. Sabemos que sua criação não se concretizou alicerçada às especificidades da nossa realidade educacional, nem tampouco VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento se pautou em políticas governamentais construídas a partir da preocupação de que a universidade viesse a assumir o papel social de democratizar o direito à educação. Mesmo com a concretização, em 1931, do Estatuto das Universidades Brasileiras, considerado como um dos grandes marcos estruturais da universidade em nosso país, pouco se alterou do caráter excludente e seletivo que vinha caracterizando o ensino superior. Ao contrário, de acordo com Garcia (2000), o estatuto corrobora para consolidar a “(...) hegemonia dos que se pretendiam proprietários do saber, que eram também os proprietários das terras e de todas as riquezas produzidas, e que se utilizavam do saber para justificar seu poder” (p. 68-69). Isto demonstra que o Documento revelou-se insuficiente para diminuir o quadro de exclusão social na educação brasileira. Em 1994 podemos localizar a primeira iniciativa por parte do Ministério da Educação com relação ao acesso de estudantes com deficiência no ensino superior.Trata-se da Portaria nº 179/1994 que recomenda a inclusão da disciplina “Aspectos Ético-Político-Educacionais da Normalização e Integração da Pessoa Portadora de Necessidades Especiais”. A recomendação era, prioritariamente, para os cursos de Pedagogia, Psicologia e demais licenciaturas, e a inclusão de conteúdos relativos a essa disciplina em cursos da saúde, serviço social e demais cursos superiores, de acordo com as suas especificidades. Em 2007 é lançado o Plano de Desenvolvimento da Educação: razões, princípios e programas – PDE, reafirmado pela Agenda Social, tendo como um de seus eixos o acesso e a permanência das pessoas com deficiência no ensino superior. O Documento focaliza a qualidade da educação e apresenta instrumentos de aferição do nível de eficácia do ensino ministrado nas escolas brasileiras. Recentemente, em 2008, é publicada a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva. Em seu texto o Documento traz a prerrogativa de que, na educação superior, a educação especial se efetive por meio de ações que promovam o acesso, a permanência e a participação dos estudantes com deficiência. Estas ações envolvem o planejamento e a organização dos recursos e serviços para a promoção de acessibilidade arquitetônica, nas comunicações, nos sistemas de informação, nos materiais didáticos e pedagógicos, que devem ser disponibilizados nos processos seletivos e no desenvolvimento de todas as atividades que envolvam o ensino, a pesquisa e a extensão. Essas proposições conceituais têm desencadeado um conjunto de ações e políticas que dão conseqüência aos princípios filosóficos da inclusão. A inclusão de estudantes com deficiência no ensino superior é, portanto, uma proposição visionária, que considera a evolução dos direitos humanos e nos convida a refletir sobre a essencialidade epistemológica e o caráter emancipatório desta nova perspectiva. Palavras-chave: Inclusão, docentes universitários, estudantes com deficiência, acessibilidade. Contato: Denise de Oliveira Alves, Faculdade Anhanguera de Brasília, [email protected] 321 VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DO “SER CRIANÇA”: A INFÂNCIA NA SUBJETIVIDADE DOS ESTUDANTES DA PEDAGOGIA Luciana Câmara Fernandes Bareicha Anhanguera, [email protected] No Brasil, durante o século XVI, como nos lembra Del Priore (1992), vislumbramos o momento áureo da ocupação jesuítica. Nesse período, nossas crianças eram retratadas como anjos gordinhos e bochechudos que brincavam em jardins. Pareciam simbolizar, por um lado, aspectos místicos da infância e, por outro, os mártires dos ensinamentos dos professores jesuítas. O que mais chama atenção nas produções artísticas e literárias dessa época é a elaboração de um modelo de criança que resultou em dois aspectos. O primeiro revela uma visão de criança como detentora de poderes místicos, que a levava a suportar provações físicas em “nome da sua fé”, valorizando qualidades intrínsecas ao indivíduo. O segundo revela uma criança que incorpora as características do Menino Jesus que, através de uma imagem divinizada e associada à inocência que transmitia, era usada para interceder junto aos fiéis da Igreja Católica e para converter os infiéis. A infância era vista como um momento propício para o que se chamava catequese, sendo a criança, sobretudo a indígena, passível de aceitação dos conteúdos doutrinários. A criança indígena era tratada como depósito de informações, sem se levar em consideração suas características físicas, psicológicas e de interação social. Usadas como símbolo para a propagação de informações de caráter religioso, as crianças eram subme- 322 tidas ao rigor de treinamentos e penitências durante a época colonial. Na expectativa de conquistar novos adeptos ao pensamento católico, elas foram as primeiras a serem catequizadas, recorrendo-se a artifícios punitivos quando necessários (Del Priore, 1999). Com o passar do tempo, as crianças indígenas do Brasil tornaram-se adolescentes ou, como disse Pe. Manoel da Nóbrega, chegaram aos anos da puberdade que eram caracterizados pela autonomia, iniciando questionamentos quanto à necessidade de abandonar seus costumes (Del Priore, 1992). Esse ponto de vista aponta uma diferença entre a infância e a adolescência, sendo a infância suscetível à aceitação direta de informações, diferentemente do adolescente que levanta dúvidas a respeito dos temas ensinados através de avaliações críticas dos conteúdos assimilados. Nesse período, como observa Chambouleyron (19