escola de comando e estado-maior do exército
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escola de comando e estado-maior do exército
ESCOLA DE COMANDO E ESTADO-MAIOR DO EXÉRCITO CURSO DE PREPARAÇÃO E SELEÇÃO (ESCOLA MARECHAL CASTELLO BRANCO) CURSO DE PREPARAÇÃO AOS CURSOS DA ECEME (CP/ECEME) INFORMATIVO Nr 098 – 1º/2007 3º Volume 2 ÍNDICE INFORMAÇÕES IMPORTANTES............................................... 4 BRASIL: DESIGUALDADES SOCIAIS E REGIONAIS................. 5 BRASIL PODE TER A DÉCADA DA REDUÇÃO DA DESIGUALDADE, AVALIAM PESQUISADORES....................................................... 5 CIDADES BRASILEIRAS ESTÃO EM RELATÓRIO DE ONG BRITÂNICA COMO EXEMPLO NO COMBATE À CRISE MUNDIAL DA ÁGUA..................................................................................... 7 BRASIL: ESPAÇOS RURAIS E URBANOS................................. 8 SHOW DE VIOLÊNCIAS............................................................ 8 BRASÍLIA É A PRIMEIRA EM QUALIDADE DE VIDA........................ 9 AS CAMPEÃS EM INFRA-ESTRUTURA.......................................... 10 MST REFORÇA ATAQUE AO AGRONEGÓCIO................................. 13 AULA COLOMBIANA................................................................. 15 FALSO AMBIENTALISMO........................................................... 16 GENERAL É CONTRA O USO DAS FORÇAS ARMADAS NO POLICIAMENTO DO RIO............................................................ 17 BRASIL: GESTÃO DOS RECURSOS ESTRATÉGICOS................. 20 MINISTRO: CULTIVO DE CANA NO PAÍS É RESPONSÁVEL............. 20 HIDRELÉTRICAS AMEAÇAM A BACIA DO PRATA........................... 20 EDUCAÇÃO TRARÁ MAIS RETORNO QUE FÁBRICAS, DIZ LULA....... 21 VÁRIAS SOLUÇÕES.................................................................. 23 SHOW DE VIOLÊNCIAS............................................................ 24 FUNDADOR DO GREENPEACE DEFENDE ENERGIA NUCLEAR.......... 25 PEQUENA REVOLUÇÃO............................................................. 27 EDUCAÇÃO PÚBLICA NÃO É IGUAL PARA TODOS......................... 28 VÍTIMAS DE TODOS OS GOVERNOS........................................... 30 ENTRE A FINLÂNDIA E O PIAUÍ................................................. 31 PEQUENAS E INTELIGENTES..................................................... 33 ELES PRECISAM DE EDUCAÇÃO................................................. 36 CRISE AÉREA É PONTA DE ICEBERG.......................................... 38 PLANO PARA O ENSINO............................................................ 39 DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO........................................... 41 BRASIL: FORMA E REFORMA DO ESTADO.............................. 43 TRAGÉDIA BRASILEIRA............................................................ 43 3 NEGOCIANDO PELOS OUTROS.................................................. 44 SISTEMA FERROVIÁRIO BRASILEIRO PRECISA DE PLANEJAMENTO A MÉDIO E LONGO PRAZO, DIZ CNT.......................................... 46 ETANOL O MUNDO QUER.......................................................... 47 MANTEGA DIZ QUE GOVERNO QUER REMOVER OBSTÁCULOS A INVESTIMENTOS PRIVADOS..................................................... 56 PARTICIPAÇÃO DE ÁLCOOL E BIODIESEL NOS COMBUSTÍVEIS PODE CRESCER 10 VEZES ATÉ 2030.......................................... 57 ENERGIA. A ÚLTIMA FRONTEIRA............................................... 58 O DIA EM QUE O POÇO SECAR.................................................. 62 A RETOMADA DAS GRANDES USINAS......................................... 64 LULA CONFIRMA PROPOSTA BRASILEIRA PARA DESTRAVAR............................................................................ 66 A RODADA DOHA A BEIRA DO COLAPSO..................................... 67 NOVO PERFIL NAS IMPORTAÇÕES BRASILEIRAS.......................... 68 BRAZIL EMERGING AS GLOBAL TRADE LEADER........................... 69 UM TERÇO DAS CIDADES TEM MÉDIA 2 OU MENOR NO ENSINO BÁSICO.................................................................................. 71 BRASIL: ÁREAS DE INTERESSE............................................. 73 UNIÃO EUROPÉIA E BRASIL INTENSIFICAM DIÁLOGO.................. 73 BRASIL-MÉXICO...................................................................... 75 BRASIL ATRAI PARCEIROS........................................................ 76 LULA E BUSH VÃO ANUNCIAR PACOTE PARA HAITI...................... 77 O PETRÓLEO CONTRA-ATACA.................................................... 79 A PARCERIA PARA O PRESENTE E O FUTURO............................... 79 BRASIL, AINDA UM PAÍS DE FUTURO......................................... 81 BIOCOMBUSTÍVEIS UNEM BRASIL, ÍNDIA E ÁFRICA DO SUL......... 84 4 INFORMAÇÕES IMPORTANTES! Reiterando informações anteriores, esta publicação será a última apresentada sob a forma de arquivo. A partir do próximo Informativo, a forma de apresentação será feita de maneira continuada, inicialmente por meio da página do Curso (www.eceme.ensino.eb.br/cpeceme/). Posteriormente também será inserida no Ambiente EBAULA. Para acessar, basta seguir os links disponibilizados na página. LEMBRE-SE Adote o hábito de consulta à página eletrônica do CP/ECEME da ECEME na internet,( www.eceme.ensino.eb.br/cpeceme/) e por meio dela, o acesso ao EB AULA. Informações relevantes do curso são veiculadas por esses meios. Além disso, consulte os diferentes sites da Internet. Existe muita informação que pode ser extraída dessa fonte de informações. Procure sempre idéias que respondam os diferentes objetivos específicos constantes do PLADIS. Procure estudar em grupo. Dessa forma, a busca pelas idéias pertinentes que atendam as propostas constantes do PLADIS poderá ser dividida pelos seus integrantes e posteriormente, compartilhada. Isso aperfeiçoa a troca de informações e de conhecimento. Serão apresentadas atividades para serem executadas de forma individual ou em grupo. Algumas delas deverão ser remetidas por meio da Internet para a Tutoria, de maneira que possam ser analisadas e corrigidas. Faça um planejamento de estudo e procure ser rigoroso no seu cumprimento. Leia bastante, de forma seletiva e objetiva. REDIGIR MUITO, É A CHAVE DO SUCESSO. Você estará fazendo uso do Conhecimento, do Método e da Expressão Escrita. Atualize-se nos assuntos de Geografia e aprofunde os conhecimentos em História, pesquisando em diversas fontes, especialmente nas recomendadas. Seja simples, lógico e objetivo nas soluções das questões. Acredite na sua capacidade e visualize a vitória. Não deixe de reservar um tempo para o lazer e para a família. 5 BRASIL: DESIGUALDADES SOCIAIS E REGIONAIS Brasil pode ter a década da redução da desigualdade, avaliam pesquisadores Spensy Pimentel Repórter da Agência Brasil Brasília - O Brasil pode marcar definitivamente os anos 2000 como a década da virada, iniciando um processo de diminuição da desigualdade e da pobreza no país, concluem especialistas que avaliaram os números da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2005. A Pnad é realizada anualmente pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A de 2005 foi a mais recente a ser divulgada, no último mês de setembro. Segundo o IBGE, trata-se da maior pesquisa por amostra realizada anualmente no país e a que possui a mais longa série histórica, com dados desde o início dos anos 90. Hoje, um evento reuniu representantes de cinco ministérios e da Presidência da República para a apresentação de 15 pesquisas sobre educação, trabalho e indicadores de pobreza e desigualdade, todas baseadas nos dados da Pnad. Os pesquisadores que apresentaram trabalhos sobre esse último tema divergem em relação ao que o governo deve fazer para que a queda na desigualdade continue, mas são unânimes num ponto: a Pnad aponta uma redução consistente da desigualdade e da pobreza, nos últimos anos. Ricardo Paes de Barros, do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea), destacou o papel do Bolsa Família na redução da pobreza extrema. “O programa tem um enorme impacto para reduzir aquela pobreza que é a mais grave de todas”, disse ele. “O Bolsa Família vai aonde ninguém estava indo. Pela primeira vez, conseguiuse criar um canal de comunicação direto com a população mais pobre.” “O crescimento nos últimos anos não foi espetacular, mas a queda na desigualdade foi”, afirmou o pesquisador Marcelo Néri, da Fundação Getúlio Vargas. “Esta poderá ser a década da redução da desigualdade”, completou. As divergências entre os especialistas se dão em torno do papel jogado nessa melhoria dos indicadores sociais pelo reajuste real do salário mínimo nos últimos anos. Na avaliação de João Sabóia, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, houve um ganho real de 6 cerca de 40% (mais, ou menos, a depender do índice de inflação usado) para o salário mínimo, entre 1995 e 2005. Néri e Paes de Barros, entre outros, sublinham que o Bolsa Família é mais eficaz como programa social, por focar a pobreza extrema a um custo menor para os cofres públicos. Outros especialistas como Sabóia e Cláudio Dedecca, da Universidade de Campinas (Unicamp), lembraram que o reajuste do mínimo tem um papel importante por ele servir de referência para o mercado de trabalho, evitando que o “piso” geral seja achatado. Além disso, nos cálculos desses pesquisadores, cerca de 60% do mercado de trabalho pode ser diretamente beneficiado por um melhor reajuste para o mínimo. Para o secretário de Avaliação e Gestão da Informação do Ministério do Desenvolvimento Social, Rômulo Paes de Souza, as avaliações mostram que essas políticas têm que ser conjugadas, porque atingem diferentes objetivos. “O Bolsa Família se destina aos que ganham muito pouco. Já o salário mínimo visa definir um padrão de remuneração no país que seja o mínimo compatível com as necessidades mais básicas da população”, diz ele. Como também destacaram os pesquisadores, de qualquer forma, o Bolsa Família e a valorização do salário mínimo só resolvem parte do problema. Mais educação e expansão do mercado de trabalho com o crescimento econômico são fatores essenciais, entre outros. “A pobreza só pode ser enfrentada se conjugarmos tudo o que tivermos com esse fim”, resume o secretário. Entre as medidas sugeridas pelos especialistas ao governo estão o aperfeiçoamento do Bolsa Família e a vinculação da transferência de parte dos recursos às famílias ao desempenho escolar. Além disso, os pesquisadores recomendam que se adote uma diferenciação entre o valor recebido pelos aposentados e pensionistas que contribuíram para a Previdência Social e os que não o fizeram, como forma de incentivar a contribuição. Nos debates sobre a educação, emergiram a problemática da qualidade do ensino brasileiro, de forma geral, e a questão do acesso à educação infantil e ao ensino médio. Por isso, os pesquisadores recomendam medidas como a vinculação da transferência de recursos a metas de qualidade pelas prefeituras e estados, além de uma reformulação do currículo do ensino médio, como forma de torná-lo mais atraente para os jovens. Em 2005, a Pnad entrevistou cerca de 400 mil pessoas, em mais de 140 mil domicílios, distribuídos por todas as unidades da federação. 7 Por sua abrangência, a Pnad é considerada um poderoso instrumento para que o governo possa planejar melhor suas ações, tendo uma idéia mais clara do que acontece com os mais de 180 milhões de brasileiros. www.agenciabrasil.gov.br-Acessado em 07/03/2007 Cidades brasileiras estão em relatório de ONG britânica como exemplo no combate à crise mundial da água Ana Luiza Zenker Repórter da Agência Brasil Brasília - Quatro municípios brasileiros foram citados em um relatório apresentado pela organização não-governamental (ONG) britânica World Development Movement (WDM) como exemplos na solução de problemas de abastecimento de água potável e coleta e tratamento de esgoto. As quatro cidades brasileiras citadas no documento são Alagoinhas (BA), Guarulhos (SP), Unaí (MG) e Porto Alegre (RS). O relatório foi lançado por ocasião do Dia Mundial da Água, comemorado na última quarta-feira (21), e fala sobre o gerenciamento de recursos hídricos no Hemisfério Sul. O relatório defende pontos-chave no sucesso de projetos de administração do abastecimento de água e coleta de esgoto: eficiência, responsabilidade, transparência e participação da comunidade. Nos quatro casos brasileiros são mostradas iniciativas de administração autônoma de água e esgoto pelo município, envolvendo a população diretamente atingida pelas modificações. A ONG britânica escolheu as cidades com base em documentos da Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento (Assemae). Em Alagoinhas (BA), por exemplo, o texto afirma que desde 2001 foram incluídas nas contas de cada usuário as informações de receita e despesas do serviço. Lá, a comunidade escolheu políticas básicas e representantes para trabalhar em conjunto com o poder público no desenvolvimento de um plano detalhado de água e saneamento. O Brasil, entretanto, não atingiu o mesmo grau de saneamento dessas cidades-exemplo. De acordo com os dados apresentados pela WDM, 94.5% da população brasileira tem abastecimento de água, enquanto 50.3% é atendida pela coleta de esgoto. www.agenciabrasil.gov.br-Acessado em 25/03/2007 8 BRASIL: ESPAÇOS RURAIS E URBANOS Show de violências FERNANDO DE BARROS E SILVA SÃO PAULO - A percepção de que a violência passou a figurar no topo das aflições dos brasileiros era algo óbvio para quem acompanha os rumos do noticiário nacional nos últimos meses. Faltava-lhe apenas a confirmação estatística, obtida pelo Datafolha e divulgada ontem por este jornal. O desemprego, que reinou durante todo o primeiro mandato de Lula como maior problema do país, foi desbancado: hoje 31% dos brasileiros pedem em primeiro lugar por segurança; eram 16% em dezembro. Sim, algo mudou de figura muito rapidamente. O que isso nos faz pensar? Seria decerto simplista atribuir tal resultado apenas à exposição do assunto na mídia. Mas ignorar o alcance desse aspecto seria outro erro, maior. Parece claro, para dar logo nome aos bois, que a Rede Globo capitaneia, pelo menos desde a morte de João Hélio, uma campanha por "justiça já" que só tende a reforçar, ainda que involuntariamente, o caldo de cultura a favor do aprofundamento das injustiças do país. Há no ar (e na TV) um clima de "justiça justiceira", uma mistura de clamor punitivo com alarmismo social cultivado pela mídia. Serve como exemplo o reality show macabro protagonizado diariamente em horário nobre pelos pais do menino brutalmente assassinado. O "JN" os transformou em celebridades. A hiperexposição perversa do casal faz com que a dor inominável daquela família seja triturada num liqüidificador emocional até o ponto de servir de alimento ao desejo coletivo de vingança e morte. Só num ambiente social assim, de pernas para o ar, pode-se considerar a estranhíssima "demonstração de força" da Polícia Civil na última sexta como um gesto a favor da segurança e dos cidadãos. O que se viu -sobretudo em São Paulo, onde a operação foi idealizada e de fato executada- pareceu antes de mais nada uma mistura de manobra midiática com demanda corporativa, sugerindo como saldo quase um recado das forças de repressão do Estado ao governador. Algo como: "Estamos aí, chefia". FOLHA DE SÃO PAULO-26/03/2007 9 Brasília é a primeira em qualidade de vida Do Correio Braziliense 02/04/2007 07h58-Em uma lista encabeçada por Zurique, na Suíça, a capital federal aparece como a cidade brasileira mais bem colocada no ranking mundial de qualidade de vida feito pela Mercer Consultoria de Recursos Humanos. Brasília ocupa a 104ª posição, na frente de São Paulo (114º) e do Rio de Janeiro (115º). A capital paulista caiu seis posições na listas após os ataques do crime organizado, em 2006, que provocaram a morte de dezenas de pessoas. Na lanterna da lista está a capital do Iraque, Bagdá. “Com toda certeza, os ataques de maio foram a principal causa da queda de São Paulo”, disse a coordenadora regional de marketing da Mercer, Denise Perassoli. Há 10 anos, a empresa realiza o levantamento em mais de 200 cidades de todo o mundo. O objetivo é fornecer subsídios para empresas calcularem prêmios, aumentos salariais e outras vantagens a serem oferecidas aos funcionários escalados para trabalharem em outros países. A empresa observa 39 fatores de qualidade de vida agrupados em 10 categorias: ambiente político e social (estabilidade política, rigor da lei, entre outros), ambiente econômico (serviços bancários, regras de conversão monetária, entre outros), ambiente sociocultural (censura, limitações de liberdade individual e outros), saúde e saneamento, escolas e educação, serviços públicos e transporte, diversão, bens de consumo, acomodação e ambiente natural (clima, desastres naturais e outros). As 215 cidades avaliadas são comparadas com Nova York que sempre entra no ranking com 100 pontos. Os dados foram coletados entre setembro e novembro do ano passado e atualizados constantemente. Das 50 primeiras posições do ranking, 49 cidades são da América do Norte, Europa, Japão e Oceania. A única “intrusa” no grupo é Cingapura (34º lugar). A cidade sul-americana mais bem colocada é Montevidéu (Uruguai) na 76º colocação. Com 78,8 pontos, Brasília se manteve na mesma colocação do ano passado e está atrás de outras cidades do subcontinente, como Buenos Aires (Argentina, 87,4 pontos e 79º lugar) e Santiago (Chile, 86,5 pontos e 83º lugar). Embora tenha subido uma posição no ranking, o Rio manteve a mesma pontuação do ano anterior (74,5). Já a capital paulista foi prejudicada pela onda de ataques de uma facção do crime organizado a policiais em maio do ano passado. Segundo Denise Perassoli, no ano anterior, São Paulo tinha nota 2 — em uma escala até 10 — no quesito criminalidade. Com os ataques, caiu para 1. “Nota zero é o Iraque em guerra”, comparou Denise. Em 10 anos de avaliações, a Mercer constatou que a diferença entre as cidades bem colocadas e as últimas do ranking aumentou. “Recentemente, a diferença entre as cidades mal e bem colocadas 10 tem aumentado. Enquanto os padrões têm melhorado em algumas regiões, permanece um contraste total entre aquelas cidades onde a qualidade de vida em geral é boa e aquelas que enfrentam tumultos políticos e econômicos”, disse Slagin Parakatil, pesquisador sênior da Mercer. A cidade brasileira mais mal avaliada é Manaus, em 126º lugar. Jornal CORREIO BRAZILIENSE – 02/04/2007 As campeãs em infra-estrutura 16.11.2006 Pesquisa revela quais as cidades com a melhor infra-estrutura do país -- fator decisivo na atração de investimentos Lia Hama Ao anunciar que abriria no Brasil seu terceiro centro de tecnologia global, o conglomerado financeiro HSBC, com sede em Londres, recebeu propostas de vários municípios interessados em abrigar o pólo de excelência. Após analisar cuidadosamente todas as ofertas, o HSBC anunciou a cidade vencedora: Curitiba. O motivo? "Além de sediar a matriz da subsidiária do grupo no Brasil, Curitiba ofereceu as melhores condições. A cidade conta com uma ótima infra-estrutura de comunicação, um excelente sistema de transporte público e é referência em planejamento urbano", afirma Jacques Depocas, principal executivo do centro de tecnologia global do HSBC no Brasil. Inaugurado em agosto, o centro tem como objetivo desenvolver e exportar soluções de informática e serviços em tecnologia da informação (TI) para outras unidades do banco espalhadas por 76 países. A escolha do HSBC não se deu por acaso. Curitiba está entre os três municípios com a melhor infra-estrutura do país, atrás apenas de São Paulo e do Rio de Janeiro, de acordo com estudo exclusivo realizado pela consultoria paulista Simonsen Associados em parceria com EXAME. O levantamento evidencia o peso que a infra-estrutura de uma cidade tem nas tomadas de decisão de negócios de uma empresa. É natural que cidades como São Paulo e Rio de Janeiro ocupem as primeiras posições do ranking, dado o papel central que exercem na economia do país. São Paulo tem a maior frota de veículos, o aeroporto mais movimentado, o maior número de imóveis ligados à rede de água. Entre as dez primeiras cidades, o Rio tem o maior número de postos de gás natural veicular (GNV), o maior consumo per capita residencial de energia elétrica, a segunda maior frota de veículos. Mas outras cidades fora do eixo RioSão Paulo também se destacam. Uma delas é Goiânia, em oitavo lugar na classificação. No caso da capital goiana, o desenvolvimento da infra- 11 estrutura de transporte está diretamente ligado ao agronegócio. Localizada na região central do país, Goiânia fica próxima a Brasília e é vizinha de Anápolis, onde há um porto seco que possibilita as importações e exportações. Com estradas, ferrovias e hidrovias, a cidade consegue fazer todo o escoamento de sua produção de soja, milho, algodão e leite. O aeroporto da cidade, Santa Genoveva, está sendo modernizado. Com a riqueza gerada pelo campo, Goiânia tem mais veículos por habitante do que São Paulo. "E é só frota nova. Dificilmente você vê carro velho na cidade", afirma João de Paiva Ribeiro, secretário de Desenvolvimento Econômico de Goiânia. Mas não são apenas as capitais que aparecem na lista com destaque. Outro município que chama a atenção é Campinas (SP), a cidade do interior mais bem classificada no ranking -- quinto lugar, à frente de Porto Alegre e Belo Horizonte. Alguns fatores ajudam a explicar o excelente desempenho. Campinas encontra-se em uma posição geográfica privilegiada, entre as rodovias Anhangüera, Bandeirantes e Santos Dumont, e a apenas 100 quilômetros de São Paulo. Isso ajudou a transformá-la em um dos principais pólos de alta tecnologia, atraindo multinacionais como IBM, Compaq e HP. "Exportamos excelência para o mundo todo", diz Sinval Dorigon, secretário de Comércio e Indústria de Campinas. Esses fatores também foram colocados na balança pela gigante indiana TCS (Tata Consultancy Services), líder mundial em consultoria de TI. No final de 2005, a empresa decidiu instalar uma fábrica de softwares no parque tecnológico de Campinas. "A cidade representa 9% do PIB paulista e abriga indústrias de grande porte, que são potenciais clientes para nós. Tem excelentes universidades e o aeroporto internacional de Viracopos facilita a logística. Além disso, Campinas fica próxima a São Paulo", diz Carlos Elias, diretor da TCS do Brasil. Essa talvez seja a única (e leve) distorção do ranking. A proximidade com São Paulo acaba beneficiando cidades que, se ficassem em outros estados, não fariam tão boa figura. Mas a localização, claro, é um dado concreto, real, e não pode ser desprezada. São os casos, por exemplo, de São Bernardo do Campo e Guarulhos, empatados em nono lugar. Ambos os municípios têm localização privilegiada do ponto de vista logístico, principalmente pela proximidade com algumas das mais importantes rodovias do país (Dutra, Ayrton Senna e Fernão Dias) e com os portos de Santos e de São Sebastião, além, é claro, do aeroporto de Cumbica. Apesar da boa classificação, Guarulhos ainda tem um enorme desafio pela frente. A cidade enfrenta um problema grave de saneamento básico. A maior parte do esgoto da região vai para os rios que circundam o município. Além disso, a população da cidade vem crescendo de forma muito rápida -- em média, 3,3% ao ano --, o que provoca o aparecimento de favelas. "O crescimento vem se dando de forma desordenada. Há lugares com infra-estrutura muito boa e outros sem 12 nenhuma infra-estrutura", afirma Décio Pompeu, presidente da associação comercial da cidade. A questão do saneamento básico é, de forma geral, o mais vergonhoso gargalo da infra-estrutura brasileira. Mesmo numa cidade como São Paulo, primeira colocada no ranking, o índice de tratamento de esgoto é de apenas 68,5%. "Os municípios terão de enfrentar essa questão num contexto mundial em que há cada vez mais pressão pela preservação do meio ambiente", afirma Antonio João Vialle Cordeiro, sócio da consultoria Simonsen Associados e coordenador do estudo. "Outro ponto crucial é como as cidades estão se preparando para lidar com uma economia cada vez mais globalizada. Portos, aeroportos, ferrovias, estradas e frota de veículos são fundamentais para escoar a produção. Sem isso, a economia não cresce", diz Cordeiro. 13 Os 30 melhores Os municípios brasileiros que se destacam em infraestrutura Município Pontuação média=100) (em 1 São Paulo (SP) 180,27 2 Rio de Janeiro (RJ) 169,67 3 Curitiba (PR) 167,36 4 Brasília (DF) 163,67 5 Campinas (SP) 163,21 6 Porto Alegre (RS) 160,91 7 Belo Horizonte (MG) 159,52 8 Goiânia (GO) 153,07 9 São Bernardo do Campo (SP) 144,31 10 Guarulhos (SP) 144,31 11 Florianópolis (SC) 139,24 12 Salvador (BA) 136,93 13 Fortaleza (CE) 136,47 14 Caxias do Sul (RS) 136,01 15 Piracicaba (SP) 136,01 16 Jundiaí (SP) 135,09 17 Vitória (ES) 134,63 18 Recife (PE) 133,71 19 Ribeirão Preto (SP) 133,24 20 Londrina (PR) 131,86 21 Joinville (SC) 131,40 22 Sorocaba (SP) 131,40 23 Blumenau (SC) 130,48 24 São José dos Campos (SP) 130,48 25 Uberlândia (MG) 130,02 26 São José do Rio Preto (SP) 128,17 27 Santo André (SP) 127,71 % da 14 MST reforça ataque ao agronegócio Em parceria com Via Campesina, movimento planeja um mês inteiro de ações contra empresas transnacionais Roldão Arruda O Movimento dos Sem-Terra (MST) decidiu intensificar o ataque às grandes empresas do agronegócio. Especialmente as de capital internacional - também chamadas de transnacionais. Um sinal claro disso foi dado no início do mês de março, quando, em associação com a Via Campesina, o movimento realizou protestos contra essas empresas em vários Estados. Estuda-se agora a possibilidade de dedicar um mês inteiro a novas mobilizações contra elas. Em março, no Rio Grande do Sul e no Espírito Santo, ativistas ligadas ao MST e à Via Campesina ocuparam terras de reflorestamento de três empresas do setor de celulose - Aracruz, Votorantim e Stora Enso; no Paraná, fizeram protestos diante da Nortox, fabricante de herbicidas; em São Paulo, invadiram áreas da Usina Cevasa, produtora de álcool, que teve parte de seu capital vendido há pouco para a Cargill, gigante mundial do agronegócio, e, no Ceará, interditaram a chamada rodovia do agronegócio, usada por exportadoras de frutas. Essa inflexão do MST deve ser acentuada daqui para a frente, em decorrência dos problemas que, segundo seus líderes, são causados pelas transnacionais. Entre outras coisas, estariam impondo um modelo de monocultura ao País, com ênfase em produtos para exportação; promovendo novo processo de concentração de terras, com riscos para a agricultura familiar; causando desemprego e agredindo o meio ambiente, devido ao desmatamento e ao uso intensivo de agrotóxicos. Também são acusadas de controlar a produção de insumos ao redor do mundo e impor preços aos produtos agrícolas. A mudança do MST é impulsionada por dois fatores: seus vínculos cada vez mais estreitos com a Via Campesina e a necessidade de mostrar suas contradições com o governo Lula, que, no segundo mandato, estaria se mostrando mais conservador e mais próximo do agronegócio do que no primeiro. A organização internacional Via Campesina está na base de um esforço que vem sendo articulado ao redor do mundo contra as transnacionais, tentando reunir movimentos de sem-terra, pequenos agricultores e ambientalistas. Segundo Soraia Soriano, que faz parte da coordenação nacional do MST e representa a Via no Brasil, tratase de uma tentativa de globalizar a oposição a empresas globalizadas: “É natural que isso ocorra, uma vez que as mesmas empresas estão presentes em diferentes partes do mundo.” O que unifica os diferentes movimentos, ainda de acordo com suas explicações, é a defesa dos recursos naturais e do conceito de soberania alimentar. “No Brasil, a soja, a cana-de-açúcar e os 15 eucaliptos do reflorestamento estão ocupando cada vez mais espaço, empurrando a pecuária para as regiões de floresta. No Rio Grande do Sul, está sendo implantado um projeto que prevê um aumento de 100 mil hectares na área de plantio de eucalipto, para a produção de celulose. Não é só a luta pela terra. Trata-se de ameaça à soberania alimentar.” ALVOS Em fevereiro, a Via reuniu cerca de 600 representantes de movimentos rurais de diferentes partes do mundo, entre eles o MST, na pequena cidade africana de Sélingué, no Máli. Eles discutiram soberania alimentar durante cinco dias e concluíram que devem reforçar a luta contra “o imperialismo, o neoliberalismo, o neocolonialismo e o patriarcado, e todo sistema que empobrece a vida, os recursos, os ecossistemas e os agentes que os promovem, como as instituições financeiras internacionais, a Organizações Mundial do Comércio, os acordos de livre-comércio, as corporações transnacionais e os governos que prejudicam a seus povos”. Entre as corporações mais citadas no encontro estavam a Monsanto e a Syngenta, que estão na ponta das pesquisas, produção e comercialização de sementes transgênicas. No Brasil, elas têm sido sistematicamente criticadas pelo MST. Em relação a Lula, o MST vive uma contradição: tem mais liberdade para atuar do que em governos anteriores, conta com mais recursos e até influência no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), mas está convencido de que o presidente se rendeu ao agronegócio. Para seus líderes, ouvi-lo dizer que os usineiros “estão virando heróis nacionais e mundiais porque todo mundo está de olho no álcool” foi traição. Devem responder com mais ataques ao agronegócio. Jornal O ESTADO DE SÃO PAULO - 09/04/2007 Aula colombiana Com freqüência, a Colômbia é citada, no Brasil e em outros países com graves problemas de criminalidade, como exemplo de reação inteligente e eficaz do Estado. Não é à toa: os índices de homicídios, embora ainda altos, caíram acentuadamente na capital Bogotá e em outras cidades, como Medellín. Mas, como revelam as reportagens publicadas no GLOBO, a Colômbia está pagando um preço extraordinariamente alto por esse êxito: 5% do PIB serão gastos este ano com segurança. No Brasil, esse percentual equivaleria a R$50 bilhões, contra os atuais R$7,4 bilhões. O que exigiu um investimento tão pesado, num país de recursos escassos como a Colômbia, foi uma política passiva, no passado, semelhante à que tem imperado no Brasil há muitos anos, levando em conta, é claro, as diferenças entre os dois países. Primeiro, não se 16 agiu com a energia necessária quando a criminalidade era alavancada pelo narcotráfico; depois, apenas se assistiu à violência exacerbada pela guerra entre facções do tráfico; e, quando vieram as milícias lá, os paramilitares -, com seu poder de fogo e de organização muito superiores, derrotando traficantes e os expulsando de seus territórios, para muitos as coisas até mesmo pareceram estar tomando um rumo melhor - no pior dos casos, seria um mal menor. A percepção era de que, em troca das taxas cobradas dos moradores das comunidades pobres, as milícias trariam paz e segurança e manteriam as drogas ao longe. Em pouco tempo, na Colômbia, isso se revelou uma ilusão. Os paramilitares, além de explorarem, como aqui, máfias de transporte alternativo e de caça-níqueis, além da prática da extorsão, acabaram se associando aos próprios traficantes, ampliando e agravando a criminalidade. E, finalmente, por meio do financiamento de campanhas eleitorais, infiltraram-se na política. Não é de admirar o preço altíssimo que a Colômbia está pagando para reprimir o crime. O panorama no Brasil apresenta muitas semelhanças. Mas, felizmente aqui, já está ficando claro que as milícias, em vez de solução, são um agravamento do problema. A política de combate ao crime, além de ganhar real eficácia, precisa se adequar a essa percepção. As boas medidas adotadas na Colômbia devem ser seguidas enquanto o seu custo não se tornar inviável. Jornal O GLOBO - 11/04/2007 Falso ambientalismo Apesar de suas bandeiras, camisetas e bonés - com o mapa do Brasil em verde, dentro de um círculo branco no centro de um pano vermelho - estarem sempre novos em folha, a demonstrar que dinheiro não falta à entidade para sustentar seu marketing, o Movimento dos Sem-Terra (MST) sempre se nutriu de idéias vetustas e de um até ingênuo primitivismo ideológico, bem sintetizado no pensamento de seu guru maior, João Pedro Stédile, expresso no Estado de segunda-feira: “A direita só quer ganhar dinheiro e manter a exploração e para isso se alia e controla qualquer governo, mesmo que seja de um ex-líder operário.” Reconheça-se, no entanto, o senso de oportunismo desse movimento ilegal, que sempre usou métodos violentos - invasão de fazendas, matança de animais, depredação de sedes, colocação de trabalhadores rurais em cárcere privado, ocupação de estradas, saque e destruição de cabines de pedágio, etc. -, mas, de uns tempos para cá, longe de preocupar-se com reforma agrária, desfralda bandeiras ambientalistas para entrar na grande corrente de combate ao aquecimento global. É dentro dessa nova onda que, aliado à transnacional Via Campesina, o MST planeja intensificar, durante um 17 mês inteiro, seus ataques às grandes empresas do agronegócio, especialmente as transnacionais. Na verdade, essa programação de ataques intensificados já se iniciou em março no Rio Grande do Sul e no Espírito Santo, onde ativistas emessetistas e campesinistas ocuparam terras de reflorestamento de três empresas do setor de celulose - Aracruz, Votorantim e Stora Enzo -; no Paraná, onde os militantes dessas entidades fizeram protestos diante da Nortox, fabricante de herbicidas; em São Paulo, onde invadiram áreas da Usina Cevasa, produtora de álcool, que teve parte de seu capital vendido há pouco tempo para a Cargill, uma gigante mundial do agronegócio; e no Ceará, onde interditaram a chamada Rodovia do Agronegócio, usada por exportadores de frutas. No rol de invectivas que essas entidades - que, com boa vontade, podemos chamar de prototerroristas - lançam contra o agronegócio transnacional está que as empresas impõem um modelo de monocultura ao País, com ênfase em produtos de exportação, e que promovem novo processo de concentração de terras, com riscos para a agricultura familiar, causando desemprego e agredindo o meio ambiente, pelo desmatamento e uso abusivo de agrotóxicos. Além disso, elas controlariam a produção de insumos no mundo e imporiam preços aos produtos agrícolas. Sem dúvida, algumas dessas “acusações” poderiam constar do ideário de uma organização nãogovernamental de cunho ambientalista. Não, porém, com a metodologia operacional do MST e da Via Campesina, que é a vandálica invasão e destruição de equipamentos de laboratório, de sementes, de material de pesquisa científica para aperfeiçoamento genético - às vezes fruto de trabalho de muitos anos - e violências assemelhadas. A associação cada vez mais sólida entre o MST e a transnacional da depredação - a Via Campesina - parece ter juntado “a fome com a vontade de comer” no campo do primitivismo ideológico. Veja-se, a propósito, as conclusões a que chegaram, em fevereiro, 600 representantes de movimentos rurais de diversas partes do mundo, em reunião na pequena cidade africana de Sélingué, no Mali. Pretendendo defender a “soberania alimentar”, discutiram durante cinco dias e concluíram que devem reforçar a luta contra “o imperialismo, o neoliberalismo, o neocolonialismo e o patriarcado, e todo sistema que empobrece a vida, os recursos, os ecossistemas e os agentes que os promovem, como as instituições financeiras internacionais, a Organização Mundial do Comércio, os acordos de livre-comércio, as corporações transnacionais e os governos que prejudicam seus povos”. Agora, o que essas entidades não costumam enfatizar é o fato de serem confortavelmente subsidiadas. A transnacional da depredação é sustentada por produtores rurais europeus que não desejam a competição com o agronegócio caboclo. Já a nacional vive 18 dos subsídios do governo - utilizando-os, inclusive, para atacá-lo. Assim é fácil. Jornal O ESTADO DE SÃO PAULO - 11/04/2007 General é contra o uso de Forças Armadas no policiamento do Rio Mesmo assim, o governador Sérgio Cabral Filho pede hoje ajuda ao presidente Lula SERGIO TORRES DA SUCURSAL DO RIO O comandante do Exército, general Enzo Martins Peri, discorda do governador do Rio, Sérgio Cabral Filho (PMDB), que insiste no emprego de tropas militares nas ruas do Rio. A restrição em apoiar a proposta foi manifestada ontem em conversas com colegas da cúpula do Exército e com o general Luiz Cesário da Silveira Filho, comandante militar do Leste (representação oficial da Força no Estado). Nas discussões, Peri disse que só há uma alternativa para o Exército atender o governador: que ele se declare incapaz de desempenhar seu dever constitucional de suprir a segurança. Dessa forma, teria que formalizar o pedido ao Ministério da Defesa -na prática, uma intervenção militar nos órgãos de segurança do Estado. Quando assumiu, em janeiro, o governador já anunciara a disposição de ter Exército, Marinha e Aeronáutica nas ruas. Em reunião no Palácio Guanabara, ele manifestou essa pretensão ao general Cesário e aos comandantes do 1º Distrito Naval (Marinha), vice-almirante Luiz Umberto de Mendonça, e do 3º Comar (Aeronáutica), majorbrigadeiro Ailton Pohlmann. Ouviu que essa ação não tinha amparo na Constituição. Na reunião, coube ao comandante militar do Leste explicar ao governador os motivos da resistência. Mesmo assim, Cabral Filho insistiu na idéia. Pela Constituição (artigo 144), cabe ao Estado garantir e administrar a segurança pública. Só a decretação de uma intervenção federal autorizaria as Forças Armadas a atuar no patrulhamento ostensivo no Rio, em atuação na "garantia da lei e da ordem", concordam advogados constitucionalistas e militares ouvidos pela Folha. A medida é regulada pelo artigo 142 da Constituição e pela Lei Complementar 117, de 2004. Esta última prevê a atuação do Exército quando o governo estadual se declarar incapaz na execução dessa "missão constitucional". A partir daí, as Forças Armadas atuariam, mas, "de forma episódica, em área previamente estabelecida e por tempo limitado", em "ações de caráter preventivo e repressivo necessárias para assegurar o resultado das operações na garantia da lei e da 19 ordem". Nesse caso, o governo estadual perderia o comando de suas polícias enquanto perdurasse a ação das Forças Armadas, a quem caberia "o controle operacional dos órgãos de segurança pública". Vulgarização O comandante do Exército disse ontem a seu staff que a lei é clara: a "missão", se ocorrer, será dentro das formalidades da lei, com princípio e fim, senão haverá o que na cúpula da Força está se chamando de "vulgarização" do emprego de militares na segurança pública. Apesar da negativa dos comandantes, quando encontrar hoje com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva no Rio, Cabral Filho vai oficializar o pedido para que as Forças Armadas façam um trabalho de policiamento ostensivo no Rio por tempo indeterminado. Para ele, como as Forças Armadas têm seu maior contingente no Rio, a atuação desses militares é mais fácil do que a permanência da Força Nacional de Segurança pós-Pan. "O presidente teve uma reação muito positiva de dividir comigo esse problema", disse. Ao saber da intenção de Cabral, Lula disse que vai olhar "com carinho" o pedido e que "a criança [referindo-se à segurança pública]" é de todos. Tarso O ministro da Justiça, Tarso Genro, disse, por meio da assessoria de imprensa, que o uso das Forças Armadas em funções policiais ou supletivas de segurança é uma decisão exclusiva do presidente. "No caso do Rio, o presidente tomará uma decisão após ouvir a demanda do governador Sérgio Cabral, que está justamente preocupado com a segurança pública do seu Estado", disse. Colaboraram TALITA FIGUEIREDO, da Sucursal do Rio, e a Sucursal de Brasília Jornal FOLHA DE SÃO PAULO - 11/04/2007 20 BRASIL: GESTÃO DOS RECURSOS ESTRATÉGICOS Ministro: cultivo de cana no país é responsável Luís Carlos Guedes rebate críticas e afirma que produção é ambiental e socialmente sustentável CINGAPURA. O ministro da Agricultura, Luís Carlos Guedes Pinto, disse ontem em Cingapura que o cultivo de cana-de-açúcar no Brasil é ambiental e socialmente responsável. Guedes, que deve deixar o governo esta semana, viajou a Japão, Indonésia e Cingapura para tentar abrir o mercado asiático para a carne brasileira e buscar parcerias na produção de etanol. Segundo o ministro, as críticas a supostos danos ambientais e abusos trabalhistas na cadeia sucroalcooleira surgiram diante da competitividade do Brasil nessa área: - Toda vez que o Brasil avança isso acontece. O país é líder em soja, cana, carnes e outros produtos e, então, surgem as críticas. Mas não há qualquer fundamentação. A produção agrícola no Brasil é feita de forma sustentável do ponto de vista ambiental e social. Segundo Guedes, o último relatório da Organização Mundial do Trabalho (OIT) sobre serviços forçados, de 2005, constatou que há 12,2 milhões de trabalhadores nessa situação em todo o mundo. No Brasil, são apenas quatro mil. A OIT, disse o ministro, apontou o país como caso exemplar na repressão do trabalho forçado. Jornal O GLOBO-20/03/2007 Hidrelétricas ameaçam a bacia do Prata Rede de rios que banha centro-sul do Brasil está entre as dez do planeta mais afetadas pela ação humana, diz relatório Barragens e hidrovias previstas pelo PAC devem aumentar fragmentação dos cursos d'água da região, de cem milhões de pessoas DA REDAÇÃO A bacia do rio da Prata, na América do Sul, está entre as dez mais ameaçadas do mundo, listadas num relatório que a ONG WWF (Fundo Mundial para a Natureza) divulga hoje. A saúde dos rios da região está ameaçada por 27 projetos de barragens (seis já em construção) e obras de hidrovias. A bacia do Prata, que abriga cem milhões de pessoas em cinco países, inclui os rios Paraguai, Uruguai e Paraná, entre outros menores, como o Tietê. Segundo a WWF, a biodiversidade mais afetada será a do Pantanal mato-grossense. Ali, a hidrovia Paraná-Paraguai vai "aumentar a capacidade de drenagem da foz do rio, afetar populações de peixes locais e expor rios a invasões de espécies 21 exóticas por meio de ligações com a bacia do Amazonas". Na opinião do geógrafo Samuel Barreto, especialista em recursos hídricos do WWF, as obras projetadas, incluídas no PAC (Plano de Aceleração do Crescimento) -somente na região Sul do Brasil são 15 hidrelétricas- deverão se somar à fragmentação dos rios já causada por hidrelétricas existentes. "Haverá alteração do balanço hídrico e da dinâmica de espécies", afirmou. "A análise que a gente viu do PAC não faz nenhuma menção a critérios ambientais, o que é um erro estratégico", continuou Barreto. O presidente da Agência Nacional de Energia Elétrica, Jerson Kelman, contesta a visão geral da WWF. "A partir da década de 1970, a vazão da bacia do Prata tem aumentado", disse. "Há mais água no rio Paraná e no Prata. O lençol freático de Buenos Aires subiu." Para Kelman, sem barragens, "haveria prejuízos por causa de enchentes". Ele discorda que o PAC seja omisso com o ambiente. "O Brasil pode ser criticado por excesso [de rigor], não por falta. É o país que mais abdica de fazer obras por conta de restrições ambientais." O relatório do WWF aponta a construção de barragens e obras para hidrovias como as ameaças mais disseminadas pelo mundo. O excesso de extração de água, as espécies invasoras, a mudança climática, a sobrepesca e a poluição são os outros fatores de pressão. Para lidar com problemas como os da bacia do Prata, o relatório propõe medidas que minimizem o impacto humano. Seria preciso, por exemplo, "evitar barragens em grandes planícies", "permitir a passagem segura de peixes" e "controlar o fluxo de sedimentos". O continente com mais bacias hidrográficas ameaçadas listadas no relatório é a Ásia, com cinco. Enquanto rios como o Indo sofrem com o aquecimento global -suas águas vêm de geleiras que estão minguando-, outros, como o Yangtze, sofrem com poluição e sobrepesca. Colaborou a Sucursal de Brasília Jornal FOLHA DE SÃO PAULO – 20/03/2007 Educação trará mais retorno que fábricas´, diz Lula Presidente disse ainda que, com escolas, País exportará a ´inteligência do povo´ Lisandra Paraguassú 22 Presidente Lula durante inauguração de escola técnica em Inhumas INHUMAS, Goiás - O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse nesta terça-feira, 20, ao inaugurar uma escola técnica na cidade de Inhumas (GO), que os investimentos em educação no País trarão mais retorno do que a construção de uma fábrica ou outra empresa. Ao discursar para mais de mil jovens e políticos locais, Lula afirmou que proibiu o uso da palavra "gasto" quando se refere aos recursos da educação e cobrou de governadores e prefeitos a responsabilidade de também investir na área. "Educação não é gasto, é investimento que traz retorno para o País como nenhuma fabrica trará", afirmou. "Porque cada jovem formado passa a significar a possibilidade do Brasil começar a exportar a inteligência, o conhecimento, o valor agregado. Não ficar exportando apenas soja e minério de ferro, mas exportar inteligência do nosso povo". A escola inaugura ontem em Inhumas, a 40 quilômetros de Goiânia, é uma Unidade Descentralizada ligada a um Centro de Ensino Federal de Ensino Tecnológico (Cefet) já existente - uma nova forma que o governo encontrou para ampliar o número de escolas técnicas, criando campus avançado e, assim, reduzindo os custos administrativos e a burocracia. A escola teve as obras iniciadas em 1997, paralisadas em 1998 e retomadas em 2005. Deve começar as aulas no próximo mês com 180 alunos. Escolas técnicas e federais Entusiasmado com o tema, o presidente voltou a prometer a expansão das escolas técnicas e universidades federais. "Vamos fazer mais escolas técnicas e universidade que qualquer governo já fez na história desse Pais", prometeu. "Porque estamos convencidos de que esse é o caminho da igualdade, da cidadania, do crescimento econômico, do fortalecimento da democracia e.sobretudo, para que a gente aprenda definitivamente que é muito mais caro 23 construir uma cadeia que uma escola." Lula também voltou a falar da necessidade de usar a educação para evitar a violência. "Não tem outro instrumento para que a gente possa tirar a juventude brasileira da rua e da desesperança, para que a gente possa ganhar a juventude brasileira do crime organizado e do tráfico", afirmou. "Não existe outra coisa se a gente não criar uma palavra mágica na cabeça desses jovens chamada esperança e oportunidade. Se a gente não criar essa esperança que poderemos oferecer para vocês um futuro mais digno, uma formação escolar e profissional de qualidade e que vocês vão ter oportunidade de entrar no mercado de trabalho e construir a cidadania plena. Ou despertamos isso em vocês ou vamos criar uma geração de jovens totalmente perdida." Falando para uma platéia formada em sua maioria por adolescentes, Lula afirmou que o País já tem hoje uma geração de 18, 19 anos "praticamente perdida", mas que não perdeu a esperança de recuperá-los. "Eu sou um homem que acredito nas coisas. Se não acreditasse não seria presidente, porque eu estou aqui de teimoso", disse. http://www.estadao.com.br – Acessado em 21/03/2007 Várias soluções REYNALDO BARROS O Brasil precisa investir R$87,7 bilhões por ano em todas as áreas de infra-estrutura para garantir o crescimento desejado. Se o país crescer 5%, o consumo de energia deverá aumentar cerca de 6,8%. Diante do atual cenário da infra-estrutura energética, é impossível produzir essa quantidade. O déficit de infra-estrutura prejudica também o comércio exterior. Para atingir a meta de US$132 bilhões de exportações, o governo deve dar mais atenção ao sistema viário, parte essencial da logística das exportações. No Brasil, uma mercadoria leva 37 dias, em média, para ser transportada da fábrica ao navio em que será embarcada. Nos Estados Unidos esse tempo é de oito dias. Estudo realizado pelo Centro de Estudos em Logística (CEL) revela que os custos logísticos representam 12,8% do PIB do Brasil. Mais uma vez a comparação com os Estados Unidos: lá, os custos logísticos são de 8,19% do PIB. Boa parte das grandes obras de infra-estrutura já realizadas no Brasil, como a Ponte Rio-Niterói e a Linha Vermelha, nasceu de projetos desenvolvidos por empresas de consultoria de engenharia. Uma alternativa inteligente para que soluções mais práticas e eficientes sejam criadas nos próximos anos é a articulação do governo federal com estados, municípios e Conselhos Regionais de 24 Engenharia, Arquitetura e Agronomia (Crea) para a criação de um banco de projetos. Os profissionais da área estudariam os problemas do país a fim de definir o que é necessário ser feito e como deve ser realizado, dando uma importante contribuição para reverter a grave situação da área de infra-estrutura. Para que o desenvolvimento econômico do Brasil passe a ser plausível e não somente uma utopia, é preciso investir em projetos de infra-estrutura que minimizem os custos das empresas e promovam o avanço social. Somente essa dinâmica permitirá que as pessoas movimentem e façam a economia crescer. Os problemas já foram há muito identificados e as soluções são inúmeras. REYNALDO BARROS é presidente do Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia do Rio de Janeiro (CreaRJ). Jornal O GLOBO-26/03/2007 Show de violências FERNANDO DE BARROS E SILVA SÃO PAULO - A percepção de que a violência passou a figurar no topo das aflições dos brasileiros era algo óbvio para quem acompanha os rumos do noticiário nacional nos últimos meses. Faltava-lhe apenas a confirmação estatística, obtida pelo Datafolha e divulgada ontem por este jornal. O desemprego, que reinou durante todo o primeiro mandato de Lula como maior problema do país, foi desbancado: hoje 31% dos brasileiros pedem em primeiro lugar por segurança; eram 16% em dezembro. Sim, algo mudou de figura muito rapidamente. O que isso nos faz pensar? Seria decerto simplista atribuir tal resultado apenas à exposição do assunto na mídia. Mas ignorar o alcance desse aspecto seria outro erro, maior. Parece claro, para dar logo nome aos bois, que a Rede Globo capitaneia, pelo menos desde a morte de João Hélio, uma campanha por "justiça já" que só tende a reforçar, ainda que involuntariamente, o caldo de cultura a favor do aprofundamento das injustiças do país. Há no ar (e na TV) um clima de "justiça justiceira", uma mistura de clamor punitivo com alarmismo social cultivado pela mídia. Serve como exemplo o reality show macabro protagonizado diariamente em horário nobre pelos pais do menino brutalmente assassinado. O "JN" os transformou em celebridades. A hiperexposição perversa do casal faz com que a dor inominável daquela família seja triturada num liqüidificador emocional até o ponto de servir de alimento ao desejo coletivo de vingança e morte. Só num ambiente social assim, de pernas para o ar, pode-se considerar a estranhíssima "demonstração de força" da Polícia Civil na 25 última sexta como um gesto a favor da segurança e dos cidadãos. O que se viu -sobretudo em São Paulo, onde a operação foi idealizada e de fato executada- pareceu antes de mais nada uma mistura de manobra midiática com demanda corporativa, sugerindo como saldo quase um recado das forças de repressão do Estado ao governador. Algo como: "Estamos aí, chefia". CORREIO BRAZILIENSE-26/03/2007 27/03/2007 - 09h36 Fundador do Greenpeace defende energia nuclear JANAINA LAGE da Folha de S.Paulo, no Rio Patrick Moore, um dos fundadores do Greenpeace, é hoje um dos principais defensores da energia nuclear. Em 1991, fundou uma consultoria, a Greenspirit, que trabalha em parceria com governos e empresas em projetos de equilíbrio entre necessidades econômicas e preservação ambiental. Em entrevista à Folha, Moore afirma que a resistência dos ambientalistas à energia nuclear é motivada por uma mentalidade típica da Guerra Fria. Para ele, o Brasil tem condições de se tornar líder no setor de álcool, mas deve procurar desenvolver em escala comercial a produção a partir do bagaço da cana para não se tornar um imenso canavial. Ele destaca que a produção a partir de alimentos como cana, milho e soja pode afetar negativamente a indústria alimentícia. FOLHA - O que o fez mudar de idéia em relação à energia nuclear? PATRICK MOORE - Cometemos um erro nos anos 70. Estávamos focados em armas e em guerras nucleares, preocupados com a possibilidade de a civilização e o ambiente serem destruídos pelo holocausto nuclear. Vejo que cometemos um erro ao incluir a energia nuclear como parte disso. Falhamos em distinguir o uso pacífico da tecnologia do destrutivo. Além disso, a preocupação com as mudanças climáticas criou uma situação muito diferente no mundo. Agora queremos reduzir o consumo de combustíveis fósseis, não só pelas mudanças climáticas como pela poluição do ar. Outro argumento é que uma parcela significativa dos combustíveis fósseis é proveniente de áreas de instabilidade política e até potencialmente hostis. A única forma de reduzir o consumo de combustíveis fósseis de maneira significativa é fazer isso com um programa agressivo de energias renováveis combinado à energia nuclear. FOLHA - As energias renováveis não podem cumprir esse papel? MOORE - Não acredito que matematicamente seja possível mostrar que a energia solar e a energia eólica possam fazer isso sozinhas. Devemos usar energia hidrelétrica, a mais importante fonte de energia renovável, biomassa ou biocombustíveis, como vocês têm feito com a cana-de-açúcar. Mesmo isso não pode fazer tudo. Precisamos de uma grande quantidade de energia que seja 26 confiável, segura e que não polua o ar, e isso é a energia nuclear. FOLHA - E é seguro ter países como o Irã enriquecendo urânio? MOORE - Isso é um problema. Seria benéfico para o Irã ter energia nuclear, a não ser que o país queira usar essa tecnologia para fins maléficos. O que temos que ter é a Parceria Global da Energia Nuclear, com maior controle sobre urânio e plutônio. Até a Rússia está começando a criticar o Irã. Se todos os Estados que usam energia nuclear, como EUA, China, Rússia e França, entrarem nesse grupo, eles vão controlar o urânio e o plutônio de forma que não caiam em mãos erradas. Você não precisa de um reator nuclear para fazer uma arma nuclear. As armas nucleares que estão sendo construídas no mundo são feitas com plutônio de reatores nucleares militares, que é outra categoria. Mesmo se fecharmos todos os mais de 400 reatores que estão em funcionamento, isso não vai fazer os generais desistirem de seus reatores nucleares militares. É preciso distinguir o uso pacífico da energia nuclear do uso militar de armas nucleares. FOLHA - No Brasil, o governo está bastante próximo de retomar o projeto nuclear, mas há resistência entre ambientalistas e o Ministério do Meio Ambiente. Por que os ambientalistas em geral ainda resistem ao uso dessa fonte de energia? MOORE - É uma infelicidade. Acredito que eles ainda estão presos a uma mentalidade da Guerra Fria. O movimento pacifista é focado em guerras e armas e incluíram a energia nuclear como se fosse a mesma coisa. O princípio que devemos adotar é que não podemos banir os usos benéficos de uma tecnologia só porque ela pode ser usada para o mal. Mais de 1 milhão de pessoas já foram mortas na África com um simples facão. Essa é também a ferramenta mais importante para fazendeiros. Eles limpam o terreno e cortam a madeira, mas ela também pode ser usada para cortar braços de humanos e matá-los. Temos que usar a energia nuclear para fins pacíficos e dar ao mundo um exemplo. O Brasil pode fazer isso, mostrar ao mundo que pode usar tecnologia nuclear, sem armas nucleares. O problema com a posição dos ambientalistas é que, de um lado, eles estão dizendo que as mudanças climáticas serão uma espécie de catástrofe que vai destruir o ambiente e a civilização. Por outro lado, eles se recusam a aceitar que a energia nuclear é a única grande fonte de energia que pode substituir os combustíveis fósseis. FOLHA - Mas a indústria nuclear já teve o acidente de Chernobyl... MOORE - Chernobyl representou um erro estúpido. Foi uma combinação do estilo ruim do reator construído pelos soviéticos com um erro dos operadores. O saldo relacionado ao acidente, no entanto, é de 56 mortes. Do ponto de vista industrial, não foi um acidente tão grande assim. Meu Deus, 1,2 milhão de pessoas morrem em acidentes de carro todo ano! FOLHA - A indústria já encontrou uma solução para os resíduos? MOORE - O combustível que é tirado do reator não é totalmente desperdiçado. Quase 90% poderia ser reciclado. O que devemos fazer é armazenar o combustível usado de forma segura e cuidadosa até o momento em que possa ser reciclado. Isso tem sido feito na França, na Rússia e no Japão. E deve ocorrer logo nos EUA. Eles fizeram a opção de não reciclar o combustível nuclear na gestão Jimmy Carter, que estava preocupado com a possibilidade de o plutônio cair em mãos erradas. O que posso dizer é que há mais de 400 27 reatores em uso e ninguém nunca foi ferido pelo combustível guardado em recipientes porque é armazenado de forma segura. FOLHA - O Brasil tem condições de tornar o álcool uma commodity? MOORE - Sim. Estive no Brasil por dez dias, vi as vastas plantações de cana. O Brasil é provavelmente o líder mundial em biomassa e biocombustíveis. Isso é muito importante, mas também é preciso considerar quanto do ecossistema natural queremos transformar em um imenso canavial. Temos que ter um equilíbrio para não transformar o país inteiro numa fábrica de fazer açúcar e álcool. FOLHA - É possível convencer outros países a usar álcool nos carros? MOORE - Sim. Os EUA também estão fazendo álcool, mas a partir do milho, e biodiesel a partir da soja. O problema é que você está retirando comida da indústria alimentícia. A visão futura é fazer o álcool a partir do bagaço da cana. Se tivermos sucesso nisso, podemos evitar a competição com as commodities alimentícias e usar o açúcar, a soja, e o milho para alimentar pessoas. A quantidade necessária desses produtos para substituir combustíveis fósseis teria um impacto grande no suprimento alimentar. FOLHA - Qual é a sua avaliação sobre o desmatamento na Amazônia? MOORE - É muito hipócrita que pessoas da Ásia e da América do Norte apontem o dedo para o Brasil sobre desmatamento, porque o fato é que a Amazônia tem mais de sua floresta original do que os EUA e a Europa. As pessoas gostam de pensar que elas não fazem desmatamento onde vivem, mas toda a agricultura nos EUA e em cidades da Europa são sinais de desmatamento. Antes eram locais de florestas. No Brasil, você tem que ter comida, assim como no restante do mundo. Estive na Amazônia e vi quão rapidamente a natureza se recompõe, se você a deixa em paz. O clima tropical significa que as plantas podem crescer o ano todo. Voei de um lado a outro da Amazônia e fiquei surpreso de ver quão vasta é a área de floresta que continua lá. Acho que o Brasil está fazendo um bom trabalho em definir áreas grandes para proteção ambiental. Pequena revolução ANTONIO DELFIM NETTO NOS ÚLTIMOS dias, o Brasil recebeu duas mensagens extraordinárias, capazes de abrir novos horizontes para o desenvolvimento econômico e social do país. A primeira foi apresentada pelo presidente Lula no dia 15 último. Trata-se do Plano de Desenvolvimento da Educação, criado pelo ministro Fernando Haddad. Finalmente, pela primeira vez, o governo enfrentou o mais dramático problema nacional. Revelou uma nova ênfase no suporte ao futuro (a educação de crianças e jovens) correspondente à que, até agora, tinha dispensado ao passado (os idosos). O diagnóstico do setor no que respeita ao ensino na pré-escola, no fundamental e no técnico mostrou a crueldade com que tratamos o futuro e a formidável incompetência que tem acompanhado a educação no 28 Brasil. A falta de controle da qualidade do ensino e de sua avaliação ao longo do aprendizado surpreenderam e horrorizaram o Brasil: mostrou um país em que pobres alunos e infelizes professores produzem analfabetos funcionais incapazes de compreender o significado de uma frase simples e absolutamente ignorantes da mais comezinha tabuada. Num mundo onde o "motor do crescimento" é o conhecimento, nada pode ser mais preocupante do que a qualidade do ensino que estamos dando às nossas crianças e aos nossos jovens. Recusandolhes um mínimo de igualdade de oportunidade, comprometemos a legitimidade da "economia de mercado". O PDE apresentado pelo ministro Haddad será, se realizado, uma pequena revolução com grande conseqüência. Juntando objetivos claros e seleção pelo mérito, com avaliação segura, competição e incentivos adequados para prefeitos, diretores, professores e alunos, ele poderá mobilizar e cooptar a vontade nacional em torno da eliminação do analfabetismo e dar à educação um papel muito maior do que uma necessidade econômica e social. Ela transcende esse utilitarismo: é ela que transforma o bípede animal em ser humano! A segunda boa notícia foi o anúncio feito pelo secretário de Gestão Pública do Estado de São Paulo, Sidney Beraldo, de que o governo José Serra pretende eliminar os perniciosos aumentos lineares de salários na administração pública, introduzindo mecanismos objetivos de avaliação do funcionário e estabelecendo reajustes por merecimento. De novo, objetivos claros, avaliação e incentivos para atingi-los. Trata-se ainda de uma promessa, mas vale a pena estimular a sua realização. O Brasil vai surpreender-se. Vai descobrir que o que nos falta mesmo é boa gestão, e não recursos! FOLHA DE SÃO PAULO-28/03/2007 Quarta-feira, 28 março de 2007 OPINIÃO Educação pública não é igual para todos Estudo realizado pela ONG Ação Educativa constata que rede pública de ensino não oferece a mesma qualidade de educação para as regiões do Brasil MARIA REHDER, [email protected] O sistema educacional público não atende de maneira igual a todos os brasileiros. Essa é a constatação de um estudo realizado por Sérgio Haddad, presidente da ONG Ação Educativa, que cruzou os indicadores do Ministério da Educação (MEC) - taxas regionais de evasão e repetência, distorção idade-série no Ensino Fundamental, matrículas por nível de ensino, índices de analfabetismo e acesso da 29 população à Educação Infantil e às turmas de Jovens e Adultos (EJA). Segundo Haddad, que divulgou ontem o estudo, foi possível constatar que o sistema educacional público faz com que as escolas reproduzam as desigualdades sociais das regiões em que estão inseridas. “Nas regiões Norte e Nordeste, as mais pobres, há uma oferta de professores com menor qualificação, que acabam recebendo menores salários em relação aos que atuam nas demais regiões do País, pois justamente são as áreas mais carentes que acabam recebendo menor verba do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef), cuja variação é dada de acordo com a arrecadação de impostos.” Na cidade de São Paulo, a reprodução das desigualdades socioeconômicas das regiões onde as escolas estão inseridas também impacta na qualidade da educação. “Nosso estudo teve ênfase na avaliação dos dados por regiões do Brasil, mas é evidente que, ao comparar escolas da extrema periferia da Capital com as situadas nas regiões centrais, é possível constatar que há entre elas uma oferta qualitativamente diferente do próprio ambiente físico e até em relação aos professores, pois os que vão às regiões mais distantes geralmente têm menos experiência.” Dentro da mesma escola De acordo com Mônica Peregrino, especialista em educação da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), as desigualdades também estão presentes dentro de uma mesma escola. “Ao realizar pesquisas com escolas públicas pude constatar diferentes perfis institucionais em uma mesma unidade, como é o caso da segregação de classes por desempenho. Os considerados maus alunos acabam recebendo atendimento diferenciado dos bons alunos.” Universalização ainda é falsa O estudo de Haddad destaca o dado de que no Brasil ainda quase 68 milhões de pessoas acima de 14 anos não têm acesso a um direito garantido por lei: o Ensino Fundamental de 8 anos. “A universalização que todo mundo fala se restringe ao acesso e não ao tempo necessário à qualidade, os 8 anos. Quase 97% das crianças de 7 a 14 anos estão na escola. Apesar da universalização estar próxima aos 100%, atingir essa minoria que está fora das escolas é o maior desafio”, diz Jorge Telles, diretor de Avaliação e Informações Educacionais da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade do MEC. O especialista também destaca o desafio de reter as crianças que chegam às escolas. “Apenas dois terços das que se matriculam 30 se formam no Ensino Fundamental.” Um dos caminhos apontados por Telles para o possível combate à desigualdade da oferta de ensino público no País são os programas de ações educativas. “A partir do momento em que reconhecemos essas desigualdades, desenvolvemos programas específicos para atuar sobre elas. Como exemplo, as políticas de ações afirmativas para a inclusão do negro. Essas ações, juntamente com merenda e transporte, ajudam a reter o aluno na escola.” Já Sérgio Haddad acredita que o governo deveria criar uma política que motivasse os professores mais experientes a atender o público das regiões mais carentes. “É neste contexto que também acredito que a criação de políticas compensatórias, como a oferta de transporte público para os alunos, ajudariam a combater as desigualdades.” No Estado de São Paulo, essa proposta já começa a ser aplicada: ontem, o governador José Serra firmou um convênio com 606 municípios que irá garantir transporte aos estudantes que moram em locais distantes da área de abrangência da escola onde estão matriculados. EXCLUSÃO X ENSINO 57,4% dos jovens de 15 a 17 anos da região Sudeste cursam o Ensino Médio. No Nordeste, a taxa cai para 30,1%. 10.541.043 dos moradores da região Sudeste com 15 anos ou mais são analfabetos funcionais. No Nordeste, o número sobe para 13.325.961 http://www.jt.com.br/editorias - Acessado em 28/03/2007 Enviado por Míriam Leitão 9.4.2007 | 0h20m Vítimas de todos os governos O dado que está sendo divulgado pelo Globo nesta segunda-feira, de que existem no Brasil dois milhões e quatrocentos mil analfabetos jovens é alarmante e inaceitável. O analfabetismo brasileiro tem índices altos, mas concentrado em pessoas de idade mais alta: metade dos analfabetos tem mais de 50 anos. São vítimas dos velhos erros do Brasil de não dar a devida atenção à educação. Um dos argumentos usados por alguns especialistas é que se são mais velhos, não valeria a pena gastar tanta verba para alfabetizá-los 31 já que o dinheiro tem que estar concentrado na educação de crianças e jovens. Mas e quando o dado é esse: quando se tem um número tão impressionante de jovens analfabetos? O que o dado revela é que eles são vítima dos erros recentes. Quem tem trinta anos chegou à idade escolar, quando a ditadura já tinha acabado e o governo Sarney prometia que seria "Tudo pelo Social". Depois veio o governo Collor que prometia modernização, acabar com carroças, abrir o país para o mundo. Depois veio o governo Itamar que indicou um dos seus amigos para o Ministério da Educação. Depois veio o governo Fernando Henrique que fez a campanha "Toda Criança na Escola". Depois veio o governo Lula com seus três ministros e o primeiro deles, era Cristovam Buarque que prometia acabar com o analfabetismo. Os dois milhões e quatrocentos mil analfabetos que têm menos de 30 anos não foram incluídos por nenhum desses governos, nenhuma dessas campanhas. Para eles, todos os governos, os ministros, as campanhas, as políticas, falharam. http://oglobo.globo.com/economia/miriam - Acessado em 09/04/2007 Ponto de vista: Claudio de Moura Castro Entre a Finlândia e o Piauí "Os sistemas educativos que deram certo no mundo são simples, óbvios e robustos. Praticam o feijão-com-arroz da educação" A Finlândia tem o melhor sistema educativo do mundo. O Piauí possui a melhor escola secundária do Brasil. O que mais haverá de comum entre a Finlândia e o Piauí? É simples, ambos praticam a teoria do feijão-com-arroz educativo. Ouvindo alguns oráculos da nossa educação, sentimos falta de um dicionário para entender certas palavras e de suplemento de oxigênio para navegar nos ares rarefeitos das teorias recitadas. Para outros, sem doses fartas de tecnologia nada se vai resolver. Mas, esquadrinhando o mundo em busca dos sistemas educativos que deram certo, vamos descobrir que são simples, óbvios e robustos. Praticam o feijão-com-arroz da educação. Vejamos o que dizem as pesquisas peneirando os traços comuns das boas escolas e dos bons sistemas. 32 • Boas escolas têm clara percepção dos rumos em que navegam, isto é, possuem metas. Além disso, são poucas metas, que não mudam de uma hora para outra e são compartilhadas por todos. E não é só isso. As metas são quantificadas (exemplo: em dois anos, ganhar tantos pontos nos testes). • O ambiente é sempre saudável, os fluidos são bons e os professores estão satisfeitos. De fato, para os professores, a atmosfera da escola é pelo menos tão importante quanto o salário. Ademais, a sociedade valoriza e prestigia os professores. • As autoridades dão às escolas muita autonomia para operar. Há forte liderança do diretor ("a escola tem a cara do diretor"). Ele manda. É um real gerente, estando livre para se mover. Mas deve atingir as metas estabelecidas, e seu desempenho é avaliado com rigor. Quase não é preciso dizer: nem sua indicação é moeda de troca na política nem ele é eleito pelos seus pares. • Sejam públicas ou privadas, as escolas são administradas como as boas empresas. Há cobrança de resultados e vantagens para quem desempenha bem seu papel. Os melhores mestres são colocados nas turmas mais difíceis. Ao mesmo tempo, malandros e incompetentes ganham puxões de orelha. • Provavelmente, os professores nunca ouviram falar nem nos autores nem nas teorias da moda pedagógica. Contudo, conhecem bem os assuntos que ensinam e aprenderam a ensinar. De fato, pedagogia para eles significa saber ensinar cada ponto da matéria. • Há muita ênfase em aplicar as teorias em problemas da vida real – em vez de decorar fatos, fórmulas e definições. Os livros são de boa qualidade, detalhados e universalmente usados. Os professores não precisam "criar" sua aula (embora não esteja proibido), pois existe uma retaguarda de planejamento e explicitação de tudo o que acontece na aula (os livros e os guias dos professores oferecem bancos de perguntas, de exercícios e de aplicações práticas). • Os currículos oficiais são claros e precisos, dizendo exatamente o que é para ser ensinado e aprendido. Segundo um funcionário do Ministério da Educação da Finlândia: "Nosso currículo prescreve, nossos professores ensinam e nossos alunos aprendem as mesmas competências e conhecimentos que são avaliados no Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Alunos)". • A sala de aula é convencional. Existem avaliações freqüentes, bastante dever de casa e muito feedback para o aluno. A jornada de 33 trabalho é longa (pelo menos cinco horas), mas não há necessariamente tempo integral. Os alunos são seriamente cobrados e precisam estudar. A disciplina é "careta" (por exemplo, não se pode conversar durante a aula). • A família acompanha a vida escolar do aluno e o vigia de perto, para assegurar que ele fez o dever de casa. Além disso, conversa muito com ele e garante a existência de um ambiente físico e psicológico que favorece o estudo e o aprendizado. Televisão berrando ou sintonizada na novela pode ser a distração da família, mas desvia o aluno do seu maior projeto de vida, que é a educação. • Quando examinamos as melhores escolas do Enem, lá está também a predominância da doutrina do feijão-com-arroz, observada nas melhores escolas de outros países. Colecionam os melhores lugares as instituições (confessionais ou não) de tradição rígida, os colégios militares e outras do mesmo estilo. Ainda bem que não são necessárias fórmulas mirabolantes para oferecer uma boa educação. http://veja.abril.com.br/040407/ponto_de_vista.shtml - Acessado em 03 Abril Pequenas e inteligentes 16.11.2006 O interior serve de campo de testes para a criação de cibercidades onde todos têm acesso à internet rápida Ana Lúcia Moura Fé Quando se pensa em vanguarda tecnológica, o mais natural é imaginar que as inovações obedeçam sempre a um roteiro predeterminado: são adotadas nas grandes metrópoles para, bem depois, espalhar-se pelas cidades menores. Em relação à internet banda larga, está acontecendo uma inversão desse caminho. Hoje, são as pequenas cidades que estão servindo de piloto para a implantação de programas revolucionários na área de internet. Algumas experiências no Brasil já se destacam no cenário mundial. É o caso de Piraí, município fluminense que ligou, via web, todas as repartições públicas da cidade e conseguiu que todos os seus 23 000 habitantes tenham acesso a serviços online e à internet de alta velocidade. Em 2005, a iniciativa de Piraí foi reconhecida em Nova York como um dos sete melhores projetos de tecnologia de 34 comunicação do mundo -- um feito inédito no Brasil. Numa cidade digital, ou cibercidade, pessoas e instituições estão interconectadas por meio de uma infra-estrutura de comunicação de alto desempenho. Em Piraí, o projeto de universalização da internet banda larga começou a ser implantado em 2003, com o apoio da prefeitura. Atualmente, o parque instalado soma 450 computadores distribuídos pelos prédios públicos municipais. Todas as escolas da cidade contam com laboratório com, no mínimo, 20 computadores. A infra-estrutura digital instalada na cidade é híbrida, parte a cabo, parte sem fio. Mas a população pode acessar a internet, por meio da tecnologia wi-fi (wireless fidelity), de qualquer ponto. Os moradores também têm acesso gratuito à rede mundial nos telecentros e quiosques espalhados pelos pontos de maior movimento. Uma cidade antenada Por que Piraí é um exemplo no mundo digital - O município instalou em todo o seu território, inclusive na zona rural, uma rede sem fio e a cabo que transmite dados, voz e imagem em alta velocidade. - A rede de banda larga interliga 450 computadores públicos, grande parte colocada à disposição da população para acesso gratuito à internet. Todos os prédios públicos estão interconectados. - Os moradores têm acesso livre a 66 terminais instalados em locais como praças, rodoviária e sindicatos. São nove quiosques e quatro telecentros. - Cerca de 6 300 alunos de 20 escolas municipais acessam a internet de alto desempenho por meio de 188 computadores. Esses alunos representam mais de 90% dos estudantes do município. O sucesso da experiência digital de Piraí foi resultado de um trabalho repleto de desafios. O primeiro deles foi o tecnológico. O município está situado em uma região montanhosa, o que exigiu a instalação de um maior número de estações de radiobase (ERB) para a transmissão do sinal digital. Ainda hoje, alguns problemas com a rede não estão devidamente equacionados. "Ainda não encontramos a melhor solução para a manutenção de todos os equipamentos que estão espalhados por 540 quilômetros quadrados", diz André Manuel de Moura Macara, coordenador técnico do projeto. Outro desafio era fazer com que a população se engajasse no projeto. Mas essa foi uma tarefa bem mais simples do que se imaginava a princípio. "Aqui, todos abraçaram a causa. Muita gente 35 ofereceu o terreno de suas casas, energia e cabos para a instalação das estações de radiobase", diz Macara. Hoje, as crianças acessam o computador na escola para a realização de deveres, na hora do recreio e mesmo depois das aulas. Quando não estão no colégio, podem utilizar os quiosques espalhados pela cidade para dar uma "navegada", gíria que eles já adotaram. O site preferido dos meninos é o do programa de televisão Sítio do Picapau Amarelo. O das meninas é o da boneca Barbie. Além das crianças, os adultos também vêm aproveitando intensamente a oferta de internet banda larga na cidade. Na rodoviária, onde estão instalados alguns computadores da rede, chama a atenção dos visitantes a grande concentração de pessoas esperando para acessar a internet. Aos poucos, a experiência digital de Piraí começa a ser estendida para cidades vizinhas. A primeira a se beneficiar foi Rio das Flores, município com 8 500 habitantes, conectado à rede mundial por meio de uma ligação de satélite fornecida pelo Ministério das Comunicações. Fora do estado do Rio de Janeiro, outras iniciativas do gênero começam a ganhar corpo. Em Sud Menucci, município de 7 500 habitantes no interior de São Paulo, a prefeitura cobriu toda a cidade com rede wi-fi. Para ter acesso gratuito e ilimitado à internet, os moradores só precisam ter computador com sistema operacional Windows ou Linux e uma placa de rede sem fio com a freqüência de 2,4 GHz. Para manter a operação, a prefeitura investe pouco mais de 3 000 reais por mês. Em Tiradentes, município de 7 000 habitantes no sul de Minas, quem está por trás da empreitada digital é a Cisco, fornecedora de tecnologia. "Escolhemos Tiradentes por ser uma cidade de serra, com terreno ondulado, ideal para enfrentar todos os desafios de implementar a tecnologia Mesh, que é similar à da telefonia celular", diz Jorge Coelho, diretor da Cisco. Tiradentes conta hoje com acesso à internet em banda larga, telefonia IP e serviço de vigilância. São cinco câmeras para a proteção do patrimônio público, monitoradas desde o prédio da polícia. A administração municipal constituiu um comitê para definir um modelo de sustentação do projeto. Os benefícios são visíveis. "Surgiram lan houses, casas para reparos de micros e lojas de informática que já praticam até comércio eletrônico. Antes, isso era encontrado apenas em cidades maiores da região", diz Coelho. Além da Cisco, quase todas as grandes empresas de tecnologia da informação e telecomunicações, como a Nortel, a Motorola, a HP e a Intel, estão investindo alto nas tecnologias que estão por trás das iniciativas de cidades digitais. Na Intel, a estratégia consiste em fazer contatos com as prefeituras e os órgãos do governo estadual para 36 explicar como a tecnologia funciona e doar a rede para que sejam feitos os testes. Participando de diversas iniciativas de cidades digitais no país, entre as quais Piraí, Ouro Preto (MG) e Mangaratiba (RJ), a Intel aposta que a velocidade com que a população está se conectando à rede mundial irá acelerar o surgimento das cibercidades. "São 1 bilhão de computadores conectados à internet no mundo, número que vai dobrar até 2010", afirma Maurício Bouskela, diretor da Intel. "Esse crescimento se dará, certamente, a partir das cidades menores." http://portalexame.abril.com.br/static/aberto/infraestrutura - Acessado em 09/04/2007 Eles precisam de educação Brasil tem 2,4 milhões de jovens analfabetos entre 10 e 29 anos, segundo a Pnad Demétrio Weber A universalização do ensino fundamental não fechou a torneira do analfabetismo. Dos 15,5 milhões de brasileiros acima de 10 anos que não sabem ler nem escrever, 2,4 milhões - 15% - têm menos de 30 anos. Embora o problema atinja todas as regiões do país, 65% dos jovens analfabetos vivem no Nordeste. Considerados apenas os jovens entre 15 e 29 anos, são 1,8 milhão de iletrados. São pessoas que chegam ao mercado de trabalho incapazes de ler a placa do ônibus ou anotar um número de telefone. Conseguir emprego fica difícil: - É quase impossível. Não conseguem emprego estável, recebem baixos salários - resume o presidente do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade, Simon Schwartzman, que presidiu o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no governo Fernando Henrique. Mesmo na escola, crianças iletradas Os dados dizem respeito ao chamado analfabetismo absoluto. Foram estimados em 2005, pelo IBGE, a partir da última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad). A maioria da população iletrada - 8,4 milhões - tem mais de 50 anos. São pessoas que estavam em idade escolar nas décadas de 1950 e 1960, quando estudar era privilégio. Naquela época, nem metade das crianças e jovens tinha acesso ao sistema de ensino. Hoje 97,3% dos brasileiros de 7 a 14 anos freqüentam a escola. - É uma situação grave. Num país populoso e de extensão territorial como o Brasil, um pequeno percentual que fique fora da 37 escola já representa muita gente. Tem que haver uma política específica para esse público - diz a coordenadora de Programas da organização não-governamental Ação Educativa, Vera Masagão Ribeiro. A Pnad 2005 mostra que o analfabetismo atinge 578 mil crianças de 10 a 14 anos. São crianças que podem ter freqüentado a escola, sem aprender a ler e escrever, ou mesmo nunca ter estudado. O IBGE estima que 2,7% dos 27,4 milhões de brasileiros com idade entre 7 e 14 anos não estavam matriculados. Ou seja, o país tinha, em 2005, 741 mil crianças e jovens fora da escola nessa faixa etária. A secretária de Educação do Distrito Federal, Maria Helena Guimarães de Castro, que foi ministra interina no governo Fernando Henrique, afirma que o problema é agravado pela baixa qualidade do ensino. O Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb), prova aplicada a cada dois anos, mostra que mais da metade dos alunos de 4ª série tem dificuldade de compreender o que lê. - Está demonstrada, pelo Saeb, a enorme dificuldade de alfabetização no Brasil. É um problema da escola - diz Maria Helena, elogiando a proposta do governo Lula de aplicar a Provinha Brasil, teste para verificar a alfabetização das crianças de 6 a 8 anos. A taxa de analfabetismo entre a população com mais de 10 anos é de 10,2%. O índice sobe para 10,9%, se considerada apenas a parcela acima de 15 anos - 14,9 milhões de pessoas. No Nordeste, a proporção, nesse caso, chega a 21,9%, a mais alta do país, contra 6,5% no Sudeste e 5,9% no Sul, a mais baixa. O IBGE estima também o índice de analfabetismo funcional, que vale para quem consegue ler e escrever palavras ou frases, mas é incapaz de compreender um bilhete ou fazer cálculos simples de soma. A taxa brasileira de analfabetismo funcional é de 23,5%, alcançando 45,8% no meio rural, segundo a Pnad 2005. Brasil Alfabetizado será reformulado Diante da persistência dos altos índices de analfabetismo no país, o Ministério da Educação decidiu reformular o Brasil Alfabetizado, programa lançado em 2003 e que teve pouco efeito na redução do problema. O ministro Fernando Haddad já declarou que a pequena queda na taxa de analfabetismo - de 11,5%, em 2003, para 10,9%, em 2005 - não é resultado do programa, que já consumiu mais de R$700 milhões. Haddad lançará nos próximos dias o novo formato do Brasil Alfabetizado. A principal inovação é que professores da rede pública serão contratados para dar aulas, no lugar de alfabetizadores leigos. Com isso, o governo espera melhorar a eficácia do ensino não só de jovens e adultos, mas das próprias crianças, uma vez que os docentes receberão treinamento específico para ensinar a ler e escrever. 38 Jornal O GLOBO - 09/04/2007 Crise aérea é ponta de iceberg Gustavo Loyola* A crise dos transportes aéreos no Brasil é apenas a ponta de um iceberg de grandes proporções que há muito tempo vem afundando o crescimento econômico do País. Houve, de fato, grande incompetência na prevenção e no controle dessa crise específica por parte do governo Lula. Porém o diagnóstico do problema não deve parar nessa constatação quase óbvia, sob pena de assistirmos nos próximos meses e anos à múltipla eclosão de episódios assemelhados em outros segmentos da economia brasileira. É necessário considerar inicialmente que a semente do colapso da infra-estrutura do transporte aéreo foi plantada nos idos de 1988, pela chamada “Constituição cidadã”. Ao criar direitos sociais onerosos sem nenhuma preocupação com a aritmética das contas públicas, os constituintes de 1988 deram partida a uma tétrica engrenagem que, nos últimos 19 anos, praticamente aniquilou a capacidade de investimento público no Brasil, embora tenha feito duplicar a carga tributária como proporção do produto interno bruto (PIB). Por causa disso, o Brasil sofre o paradoxo de ter elevada carga tributária com péssimos serviços públicos. O Estado é grande, mas ineficiente. As carências são enormes em áreas essenciais como saúde, segurança e educação. Em contrapartida, os gastos de custeio com pessoal e Previdência aumentaram exponencialmente nas duas últimas décadas. No caso do governo federal, o porcentual de despesas gerenciáveis cai seguidamente, pressionado pela elevação contínua dos gastos obrigatórios. Desse modo, o caos orçamentário é um dos responsáveis pela crise do setor aéreo. O crescimento do tráfego aéreo não foi acompanhado pelos necessários investimentos em infra-estrutura. Como resultado, é provável que, no período mais recente, os coeficientes de segurança se tenham estreitado e a carga de trabalho dos profissionais do setor, aumentado de forma desarrazoada. Vale ressaltar que esse estado de coisas não difere muito do que vem ocorrendo em outros setores de infra-estrutura, como o de estradas e o de portos. Entretanto, há um outro ingrediente perverso da Constituição de 1988 presente na atual crise do setor aéreo. Hoje, o administrador público está praticamente engessado no que se refere à prática de uma política de pessoal coerente para os servidores civis e militares. A “isonomite” - doença típica da “Constituição cidadã” - dificulta o exercício de uma política de pessoal que dê os incentivos corretos aos servidores, sem que isso importe no colapso das contas públicas. Assim, o que se vê hoje é uma política do “leva quem grita mais”, gerando distorções monumentais nas remunerações dos servidores e 39 incentivando atitudes extremas como a assumida pelos controladores de vôo. Não bastasse isso, a paralisia no governo Lula do processo de modernização do Estado iniciado nas Presidências anteriores também contribuiu para a eclosão dos problemas do setor aéreo. Num nítido retrocesso, o governo atual adota uma postura estatizante que, por exemplo, incentivou a Infraero a se tornar mais uma empresa de administração de “shopping centers” do que de aeroportos. O ordálio sem fim dos passageiros no Aeroporto de Congonhas ilustra bem a lógica das prioridades invertidas dessa empresa estatal, que leva as pistas a serem recuperadas somente após a construção do novo terminal. O produto das caras taxas aeroportuárias pagas no Brasil deveria estar sendo canalizado para fins mais nobres do que para a construção de “aeroshoppings”, que, aliás, poderiam ser erigidos com recursos exclusivamente privados. Além do retrocesso estatizante, o governo Lula é culpado pela politização das escolhas dos dirigentes das agências reguladoras, incluindo os da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). Trata-se de uma agência recentemente criada, mas que aparentemente não conseguiu substituir o antigo Departamento de Aviação Civil (DAC) com vantagem. Ao contrário, a condução pela agência dos problemas do transporte aéreo nos últimos meses vem deixando muito a desejar, provavelmente pela inexperiência de seus diretores nos assuntos sob sua responsabilidade. Nenhum dos problemas acima citados é exclusivo do setor aéreo. Eles existem também em outras áreas da infra-estrutura, como transportes terrestres, portos, energia e saneamento. Lastimavelmente, o recém-lançado Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) indica que o radar do governo ainda não captou as verdadeiras causas da crise da infra-estrutura no Brasil, já que abriu mão de realizar as reformas necessárias para recuperar a capacidade de investimento do setor público e melhorar o ambiente para o investimento privado. Nada nos resta, ao que tudo indica, a não ser torcer para que esse titanic chamado Brasil não encontre outros icebergs mais adiante. *Gustavo Loyola, doutor em Economia pela EPGE/FGV,expresidente do Banco Central, é sócio-diretor da Tendências Consultoria Integrada, em São Paulo O colunista Ribamar Oliveira está em férias. Jornal O ESTADO DE SÃO PAULO - 16/04/2007 PLANO PARA O ENSINO Escolas também 'perto da perfeição' Ao lançar plano, Lula diz que educação no Brasil será uma das melhores do mundo Chico de Gois 40 Ao lançar ontem o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse estar convencido de que, se as medidas forem postas em prática em sua totalidade, seu governo passará para a História por deixar a educação brasileira "em pé de igualdade com qualquer país do mundo". Há um mês, ao anunciar pela primeira vez o pacote de medidas para a educação, Lula reconhecera que o ensino no país está entre os piores do mundo. Ontem, ele não fez por menos: - Não tenham medo de errar, se nós implantarmos tudo o que anunciamos aqui hoje, nós certamente passaremos para a História como a geração de políticos que, definitivamente, não apenas disse que a juventude era o futuro da nação, mas que preparou, como legado para a juventude, um sistema de educação que finalmente pôde colocar o Brasil em pé de igualdade com qualquer país do mundo desenvolvido na área da educação - disse o presidente. Ano passado, ao falar de outro setor vital, ele também dissera que não estava longe "de a gente atingir a perfeição na saúde". Lula disse enxergar um novo século na educação, no qual prevalecerão "o mérito sobre a riqueza familiar" e onde haverá uma elite do saber e não mais uma "elite de sobrenomes". - Vejo nele (no PDE) o início do novo século da educação no Brasil. Um século capaz de assegurar a primazia do talento sobre a origem social e a prevalência do mérito sobre a riqueza familiar. Um século de uma elite de competência e do saber, e não apenas de elite do berço ou do sobrenome. Críticas indiretas ao governo FH Lula lembrou que, durante muito tempo, afirmou-se que a juventude era o futuro do país, mas que o que se vê são jovens de 15 a 24 anos na criminalidade e meninas se prostituindo: - Tudo isso porque em algum momento da História não foram feitas as coisas corretas que deveriam ter sido feitas neste país, sobretudo na questão da educação. Segundo Lula, o PDE é um "esforço técnico e político do governo". Ele criticou, indiretamente, o ex-presidente Fernando Henrique, que havia proibido a criação de escolas técnicas. Apesar de destacar que o governo vai disponibilizar mais recursos para aplicação na educação - o que rendeu até elogio aos ministros Guido Mantega (Fazenda) e Paulo Bernardo (Planejamento), por estarem liberando verbas -, Lula destacou que a solução para os problemas do ensino não depende apenas de mais dinheiro. O presidente disse que o PDE vai tornar realidade seus compromissos de campanha na área de educação. Para ele, o PDE é complemento ao PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), lançado no fim de janeiro. - Para diminuir a desigualdade entre as pessoas, a alavanca 41 básica é a educação; e para diminuir as desigualdades entre as regiões, a alavanca básica são os grandes programas de desenvolvimento, que ampliam a infra-estrutura produtiva e social. Lula, que constantemente é criticado pelo número de medidas provisórias que encaminha ao Congresso, sublinhou ontem, também de forma bem-humorada, aos presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), que, desta vez, só está enviando ao Congresso projetos de lei. - Vocês já me conhecem e sabem que estarei no calcanhar de vocês para que cada coisa prometida seja cumprida até o final do nosso governo - disse aos 17 ministros presentes. Jornal O GLOBO - 25/04/2007 Desenvolvimento da Educação Uma das 47 medidas que compõem o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) - saudado pelo presidente Lula como o “mais abrangente” do gênero na história brasileira - estipula que até 2010 todas as 130 mil escolas públicas de ensino básico do País estarão dotadas de computadores, a um custo estimado em R$ 650 milhões. Ao todo, o programa deverá transferir para o setor nos próximos 3 anos recursos adicionais da ordem de R$ 8 bilhões. Essa notícia está nos jornais de ontem. Nos jornais da segunda-feira, porém, a informação mais significativa na área era outra: a partir de um levantamento técnico, o governo de Pernambuco mandou interditar 72 escolas ameaçadas de desabamento, deixando sem aula mais de 68 mil alunos. Outras 275 unidades, consideradas precárias, também poderão ser interditadas. Ao justapor as duas notícias, que simbolizam o contraste entre o espírito modernizador do chamado PAC da Educação e as amargas realidades da educação nacional, não se pretende, de forma alguma, desdenhar do programa que acaba de ser lançado oficialmente e cuja primeira versão foi divulgada em meados de março. Os comentários favoráveis ao PDE, no editorial publicado em seguida àquela primeira apresentação, se sustêm, agora que o projeto ficou pronto. Não há uma vírgula a remover da apreciação positiva inicial, sobretudo - e isso é duplamente auspicioso - no que se refere às suas propostas para o que mais importa: o resgate do ensino de base no País do estado calamitoso em que jaz, com os piores índices de nãoaprendizagem já apurados nas provas anuais do Saeb, além de taxas intoleráveis de evasão e repetência. Mas é impossível deixar de ressaltar, de um lado, a imensa distância a percorrer até que se considerem cumpridos os objetivos do programa e, de outro, a escassez de meios ao alcance do Estado 42 nacional para assegurar a travessia, apesar do anúncio de valores miliardários a serem aplicados. O máximo com que se acena é pouco perto do que se precisa para levar a cabo a revolução que tanto tarda num sistema que quase nada ensina aos muitos milhões de crianças e jovens que conseguiu levar nos últimos anos às salas de aula - um feito que não se deve omitir. Atente-se para o que o PDE contempla em matéria de remuneração dos professores, sabendo da importância crucial da valorização do magistério na batalha pela qualidade da escola pública. Projeto de lei propõe um piso de R$ 850 mensais, a ser alcançado por etapas até 2010. Pois bem. Embora seja mais do que recebem cerca de 40% dos professores brasileiros, esse mínimo é claramente insuficiente para o imprescindível upgrading da profissão, que em outras gerações conheceu dias melhores. E dificilmente as muitas prefeituras hoje incapazes até de pagar o piso de R$ 300, vigente desde 1994, terão ao longo dos próximos 3 anos os meios para emitir contracheques nos novos valores estabelecidos. Prova disso é que o ministro da Educação, Fernando Haddad, ainda que se diga seguro do cumprimento da meta, como não poderia deixar de ser, aconselha desde já os professores cujos salários ficarem aquém do piso a fazer “o mesmo que qualquer trabalhador que não recebe o salário mínimo: recorrer à Justiça”. Outra evidência do trabalho de Hércules para transpor o abismo entre “a intenção e o gesto” está num cálculo dos técnicos da Educação. O Ministério estimou que só em 2021 - daqui a 14 anos, portanto - o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), que mede o desempenho do ensino público, poderá avançar da atual marca média, inferior a 4, para 6. Se tudo sair como planejado. Pelo menos não se dirá que o ministro Haddad, com a cabeça nas nuvens, faz promessas mirabolantes. Já o presidente Lula, no lançamento do PDE, teve uma recaída de apoteose mental. Falou que o seu governo entrará para a história se colocar o Brasil “em pé de igualdade com qualquer país do mundo desenvolvido na área da educação”. Já será um feito histórico o País reduzir no período de uma geração a sideral diferença que o separa do mundo desenvolvido em matéria de produção e transmissão de novos conhecimentos - o fim último da atividade educativa, ainda mais quando o destino das nações depende das suas elites “da competência e do saber”, como observou Lula. Jornal O ESTADO DE SÃO PAULO - 26/04/2007 43 BRASIL: FORMA E REFORMA DO ESTADO Tragédia brasileira ANTONIO DELFIM NETTO É CADA VEZ mais evidente que a execução do brilhante Plano Real deixou como herança um Estado obeso e endividado que impõe o baixo crescimento. A tabela abaixo registra a taxa de inflação de 2006 e a taxa média de crescimento do PIB desde o início de quatro programas de estabilização. Todos os latinoamericanos tiveram um resultado pífio, mas o do Brasil foi o pior. Israel, mesmo numa situação de permanente beligerância, tem crescido à média de 5% ao ano há 20 anos. O quadro é muito pior do que parece. O crescimento anual da população do México é de 1%, o que produz um crescimento per capita do PIB da ordem de 2,2% ao ano (dobra em 32 anos), e a Argentina vê também sua população crescer a 1% ao ano, com um crescimento per capita de 2,3% (dobra em 30 anos). O Brasil registra um crescimento populacional de 1,4% ao ano, o que nos deixa com um crescimento per capita de 1% ao ano (dobra a cada 70 anos!). Em 2005, o PIB per capita (em paridade de poder de compra, US$) dos três países era o seguinte: Em mais uma geração, se continuarmos a conversar sobre o crescimento em lugar de realizá-lo, teremos os PIBs per capita previstos no quadro anterior na mesma unidade (US$PPP-2005). Não se trata de destino. Aceitar a possível tragédia do empobrecimento relativo do Brasil depende só de nós: da nossa capacidade de decidir o que fazer para crescer a uma taxa per capita de pelo menos 3% a 3,5%, o que significa um crescimento do PIB em torno de 4,5% a 5%. A mensagem cruel é que será muito difícil fazer isso: 1º) com a sociedade do "bem-estar" social construída com mais paixão do que 44 razão na Constituição cidadã. Ela se acomodaria muito mal mesmo se tivéssemos o triplo do nosso PIB per capita; 2º) se insistirmos em ampliar a ênfase no passado (previdência e assistência) em detrimento do futuro (educação e saúde dos jovens, o que começa a ser corrigido pelo PDE) e 3º) se insistirmos em aumentar as despesas de custeio do governo em detrimento das de investimento. Isso está longe de sugerir a necessidade de um retorno aos bem-vindos avanços sociais conseguidos. Exige apenas que se melhore o seu "foco" e se aprofunde o seu monitoramento. ANTONIO DELFIM NETTO escreve às quartas-feiras nesta coluna. Jornal FOLHA DE SÃO PAULO – 21/03/2007 Negociando pelos outros O chanceler Celso Amorim continua empenhado, sem grande resultado nos últimos tempos, em unir as economias em desenvolvimento para enfrentar Estados Unidos, União Européia e Japão nas negociações globais de comércio. Só a união daquelas economias, disse o ministro num discurso em Jacarta, na Indonésia, poderá garantir que a Rodada Doha seja de fato a Rodada do Desenvolvimento. Foi essa a meta proclamada por mais de 140 ministros na conferência da OMC realizada em dezembro de 2001 na capital do Catar. As negociações, passados mais de cinco anos, continuam travadas não só pelas diferenças entre ricos e pobres, mas também pelas divergências no grande e diversificado grupo das economias “em desenvolvimento”. Foi principalmente para cuidar dessas divergências que o ministro brasileiro foi à reunião do Grupo dos 33 (G-33). Os países do G-33, liderado pela Indonésia, reivindicam maior acesso aos mercados do mundo rico para seus produtos agrícolas, mas não estão dispostos a abrir os próprios mercados. Pretendem manter elevadas barreiras protecionistas, sob o argumento de que precisam proteger milhões de pequenos produtores pobres. O ministro Celso Amorim foi à Indonésia para tentar uma aproximação entre o G-20, por ele coordenado, e o G-33. Se essa união resultar numa posição menos protecionista, será mais fácil cobrar dos EUA e de outros parceiros desenvolvidos uma abertura maior para o comércio agrícola. Se os governos do mundo em desenvolvimento não forem mais flexíveis em relação ao comércio agrícola, dizem os negociadores americanos, não haverá como convencer os congressistas dos Estados Unidos a apoiar maiores concessões. Mas a mera proposta de aproximação entre G-20 e G-33 é ilusória, neste momento. Alguns membros do G-20, como a Índia e a 45 Indonésia, participam também do outro bloco. Nos dois grupos há países com políticas protecionistas para o campo. A única diferença é que no G-20, organizado em 2003 por iniciativa brasileira, há alguns produtores agrícolas altamente competitivos, como o próprio Brasil e a Argentina, que podem batalhar com muito mais eficiência por uma ampla liberalização do comércio agropecuário. Mesmo entre estes, no entanto, há diferenças políticas. Enquanto a Argentina defende a competição mais aberta nessa área, o Brasil aceita, embora com reservas, a pretensão indiana de criação de uma lista de produtos especiais que ficariam sujeitos a maior proteção. Não se trata, no caso, apenas de uma relação de produtos “sensíveis” para os quais haveria salvaguardas especiais. Em princípio, qualquer país poderia negociar uma relação desse tipo. A pretensão de países como a Índia e a Indonésia vai além disso. A idéia é proporcionar uma defesa adicional para pequenos produtores, considerados incapazes de competir globalmente. Objetivamente, essa proposta é incompatível com os interesses comerciais do Brasil, porque dispomos de condições de competir com sucesso no comércio de grande variedade de produtos. Ao admitir a pretensão indiana, os negociadores brasileiros cederam às pressões do Ministério do Desenvolvimento Agrário, indisfarçavelmente empenhado numa política de apoio à ineficiência e ao atraso. A influência dessa política sobre a diplomacia comercial brasileira é uma negação do sucesso alcançado pelos produtores que se modernizaram, ganharam poder de competição e têm todo o direito de lutar por um comércio mais livre. A diplomacia brasileira desperdiça esforços por falta de uma clara definição dos interesses nacionais. O G-20 foi importante para os primeiros avanços da negociação agrícola na Rodada Doha, mas hoje é um entrave. A liberalização agrícola está longe de ser uma unanimidade nesse grupo e no conjunto dos países em desenvolvimento. Não é unanimidade sequer no interior do governo brasileiro, que defende ao mesmo tempo a modernidade e o atraso. Índia, China e Indonésia sabem o que desejam e põem seus interesses em primeiro lugar. Valeria a pena Brasília tentar algo semelhante. O primeiro passo seria descobrir quais são de fato os interesses nacionais. Jornal O ESTADO DE SÃO PAULO-22/03/2007 Sistema ferroviário brasileiro precisa de planejamento a médio e longo prazo, diz CNT Gláucia Gomes Repórter da Agência Brasil 46 Brasília - Embora a utilização do sistema ferroviário brasileiro tenha aumentado nos últimos cinco anos, ainda é preciso ter um planejamento de médio e longo prazo para melhorar o desempenho e reduzir as dificuldades do setor. A conclusão é da Pesquisa Ferroviária 2006, divulgada hoje (22) pela Confederação Nacional dos Transportes (CNT). O estudo traça um panorama do setor a partir de meados da década de 90, quando começou o processo de concessão das malhas federais à iniciativa privada. A primeira pesquisa nesse sentido foi publicada em 2002. Apesar de 11 das 12 malhas (que juntas somam cerca de 29,5 mil quilômetros de extensão) serem administradas atualmente pela iniciativa privada, o levantamento afirma que faltam investimentos por parte do governo federal. Segundo a pesquisa, aliados aos recursos do setor privado, o investimento público permitiria aumentar a produtividade e a capacidade operacional das ferrovias brasileiras. “É preciso injetar mais recursos, principalmente para a ampliação da malha”, disse o presidente da seção de Transporte Ferroviário da entidade, Rodrigo Vilaça. Segundo ele, o investimento público é "baixo", considerando que o orçamento para 2007 é de R$ 330 milhões. Vilaça defende que "todos" os recursos arrecadados pelo sistema ferroviário que geram receita para o governo deveriam ser reinvestidos no próprio setor. "Se considerarmos que foram arrecadados R$ 6,1 bilhões na primeira década [após a concessão] apenas em impostos [Constribuição Intervenção no Domínio Econômico (Cide) e outros tributos], sem adicionar os investimentos privados, em torno de R$ 12,2 bilhões nos 10 anos de concessão, temos condições de, com o que geramos, eliminar entraves que são de responsabilidade da União, como, por exemplo, as invasões de domínio”. De acordo com a pesquisa, hoje existem 824 focos de invasão nas faixas de domínio, o que tem prejudicado o desempenho do transporte ferroviário. A legislação determina que não pode haver pessoas e construções à margem dos trilhos em uma distância de pelo menos 7,5 metros de cada lado. O estudo também apontou que os corredores ferroviários (trechos da malha em que a maior parte da produção é escoada) mais problemáticos são os que levam aos portos, principalmente ao de Santos (SP); São Luís (MA); Vitória (ES); e Rio Grande (RS). Isso ocorre porque esses corredores sofrem interferência da população e das passagens de nível (o cruzamento de uma ou mais linhas com uma rodovia principal ou secundária no mesmo nível). A CNT informa que o sistema ferroviário brasileiro é o maior da América Latina. Está distribuído nas regiões Sul, Sudeste e Nordeste e em parte do Centro-Oeste e Norte. Os principais produtos transportados são soja, minérios e combustíveis. Em 2005, foram trasnportadas 392 bilhões de toneladas úteis, cerca de 100 bilhões a mais que em 2000, 47 quando foram transportadas 286 bilhões de toneladas úteis. www.agenciabrasil.gov.br - Acessado em 22/03/2007 Etanol o mundo quer. O Brasil tem.O álcool virou a principal estrela do mercado energético global -- e nenhuma economia tem tanto a ganhar quanto a nossa Lia LubamboUsina Vale do Paranaíba, em Minas Gerais: modernidade Por Alexa Salomão e Marcelo Onaga EXAME- A negociação foi mantida em absoluto sigilo por seis meses e concluída com discrição na manhã de 10 de junho. Na sala de janelas largas de um prédio comercial em Ribeirão Preto, no interior de São Paulo, estavam apenas o holandês Auke Vlas, representante da trading americana Cargill, maior comercializadora de alimentos do mundo, e o empresário Maurílio Biagi Filho, um dos mais importantes donos de usinas de álcool e açúcar do país. O encontro foi rápido -Vlas trouxe os documentos já assinados e Biagi preencheu as poucas linhas que lhe foram reservadas. A partir daquele momento, o empresário retirou-se da Cevasa, indústria por ele fundada em 1999, e a Cargill finalmente assumiu o controle de uma usina no Brasil, após quase dois anos de tentativas. O detalhe mais revelador do negócio é o fato de a Cevasa não produzir um único grama de açúcar, apenas álcool combustível -- o etanol. Com a aquisição, a Cargill ingressa em um novo ramo de negócios no Brasil, o de energia. Sua principal concorrente, a Bunge, também tem feito prospecções no Brasil e, segundo especialistas, deve anunciar em breve uma compra semelhante. O Brasil no centro da revolução energética Nos últimos anos, uma forte escalada no preço do petróleo, principal produto da matriz energética global, tem levado o mundo a buscar alternativas. O álcool desponta como a principal promessa A disparada do preço do petróleo... Preço do barril de petróleo (em dólares) 2000 27 2001 23 2002 25 2003 29 2004 37 2005 54 48 2006 75(1) 1) Em abril Fontes: Unica e Energy Information Administration ...Abriu espaço para o álcool brasileiro... Exportação de álcool (em milhões de litros) 2000 95 2001 545 2002 780 2003 1100 2004 2600 2005 2500 2006 2500(1) (1)Previsão Fontes: Unica e Energy Information Administration ...e esse mercado deve continuar a crescer Projeção da produção mundial de álcool (em bilhões de litros) 2004 41 2005 50 2006(1) 54 2007(1) 58 2008(1) 61 2009(1) 66 2010(1) 70 (1)Estimativa Fonte: F.O. Licht A estréia da Cargill no mercado brasileiro de álcool é o exemplo de uma das mais impressionantes transformações em curso na economia nacional. As usinas de álcool brasileiras, há séculos parte de um cenário que era símbolo do atraso, estão hoje no epicentro de uma revolução energética que envolve todo o planeta. No ano passado, o mercado brasileiro de etanol movimentou 6 bilhões de dólares. Em 2010, deve chegar a 15 bilhões -- quase o equivalente ao faturamento atual do negócio de telefonia celular. Seria um equívoco comparar o rápido crescimento do setor com o movimento vivido pelas usinas nas décadas de 70 e 80, quando o governo brasileiro, à base de fartos subsídios, criou o Proálcool, programa oficial de etanol. 49 Desta vez, não é o braço estatal a impulsionar o mercado -- mas o próprio setor privado. Além disso, agora o que se vislumbra não é apenas a demanda de carros brasileiros, mas de todo o mundo. Nos últimos seis meses, o etanol foi alçado da condição de produto tupiniquim, confinado ao Brasil, à posição de combustível potencialmente global, em teoria capaz de aliviar de uma só vez dois grandes males do século 21, a escassez do petróleo e o efeito estufa. O álcool entrou na agenda de governantes, empresas de tecnologia e, principalmente, de investidores interessados nas grandes oportunidades que o setor tende a oferecer daqui para a frente. O homem mais rico do mundo, Bill Gates, fundador da Microsoft, comprou 25% da Pacific Ethanol para produzir álcool de milho nos Estados Unidos. Especula-se que Gates esteja prestes a concretizar a aquisição de uma usina de etanol no Brasil. Larry Page e Sergey Brin, do Google, estiveram em janeiro no interior de São Paulo para conhecer a produção local e analisar oportunidades. Outro bilionário, o investidor húngaro George Soros, fechou em fevereiro a compra da usina Monte Alegre, em Minas Gerais. Em 2006, o setor de etanol deve receber investimentos de 9,6 bilhões de dólares, entre construções de novas usinas, aquisições e expansões. Embalados pela sede mundial de combustível verde, consultores e corretores trocam os elegantes escritórios nas metrópoles e se deslocam para o interior em busca de usineiros interessados em fazer parcerias ou vender seus negócios. Bancos rivais, como o UBS/Pactual e o Credit Suisse Group, agora disputam clientes entre produtores de cana na tentativa de lançar ações de usinas na bolsa de valores. Mesmo com a atual instabilidade dos mercados financeiros, o primeiro fundo de private equity criado para usinas, com patrocínio do banco francês Société Générale, conseguiu arrecadar mais de 200 milhões de dólares em pouco mais de um mês. A tendência é que feche o ano com 1 bilhão em carteira. A Votorantim, um dos maiores grupos empresariais do país, é uma das empresas com atuação mais marcante no mercado de etanol. Nos últimos três anos, a empresa da família Ermírio de Moraes investiu 40 milhões de dólares em duas empresas destinadas à pesquisa de ponta no setor. Até mesmo as petroleiras, em princípio contrárias ao sucesso do etanol, já perceberam que não dá para ignorá-lo. No início de junho, a anglo-holandesa Shell passou a exportar álcool brasileiro para os Estados Unidos, o maior mercado mundial. Nos últimos meses, representantes das tradings japonesas Mitsubishi e Mitsui circulam pelo interior do país prospectando negócios. O próprio mercado de trabalho no Brasil deve sentir os efeitos do crescimento do setor -- executivos de várias indústrias já percebem as oportunidades que vão se abrir com a profissionalização da gestão das companhias de etanol. "Estamos assistindo a uma 50 verdadeira corrida do ouro", diz Marcelo Junqueira, sócio da Econergy, empresa americana especializada em comercializar crédito de carbono e dona de um fundo com 100 milhões de dólares para investir em energias renováveis. "Não faltam bons negócios." Usina de lucros Os negócios com álcool no Brasil movimentaram bilhões no ano passado 2,9 bilhões de dólares com a venda de álcool para misturar na gasolina 2,2 bilhões de dólares com a venda de álcool combustível 766 milhões de dólares em exportação para 46 países 373 milhões de dólares para indústrias de alimentos, perfumes e cosméticos 19 milhões de dólares com a venda de álcool como insumo para a indústria química Total 6,2 bilhões de dólares Fonte: Datagro O que está aguçando o apetite de tanta gente é a projeção de que o mercado internacional de álcool, hoje ainda modesto, crescerá exponencialmente nos próximos anos. Nos últimos meses, vem se consolidando a percepção de que a era do petróleo barato está perto do fim. "A aposta é que a cotação se mantenha elevada daqui para a frente, pois custa caro explorar as reservas que restaram", diz Shigeaki Ueki, ex-ministro de Minas e Energia e consultor na área de petróleo. A aposta é que a frota mundial de automóveis terá, necessariamente, de adotar a mistura de gasolina e álcool nos próximos anos, seguindo o modelo pioneiro do Brasil. A indústria automobilística mundial já aderiu em massa aos veículos bicombustíveis, que permitem o uso tanto do álcool como da gasolina (veja reportagem na pág. 28). Portanto, do ponto de vista tecnológico, as condições para o sucesso do etanol estão equacionadas. O que falta, agora, é que mais países adotem o novo combustível. As maiores empresas do mundo Brasil e Estados Unidos ocupam a liderança na produção de álcool Empresa Produção anual(1) (em milhões de litros) 51 ADM (EUA) 4000 Copersucar (Brasil) 2700 Crystalsev (Brasil) 1030 Cosan (Brasil) 1000 VersaSun Energy (EUA) 871 Aventine Renewable (EUA) 783 Hawkeye Renewables (EUA) 757 ASAlliances Biofuels (EUA) 757 Abengoa Bioenergy (EUA) 750 Midwest Grain (EUA) 575 U.S. Bioenergy (EUA) 549 Cargill (EUA) 454 São Martinho (Brasil) 440 Irmãos Biagi (Brasil) 403 João Lyra (Brasil) 251 Tércio Wanderley (Brasil) 230 Nova América (Brasil) 200 Carlos Lyra (Brasil) 196 (1) Em 2005 Fonte: Datagro O sinal mais vigoroso de que isso pode ocorrer em breve veio do presidente americano, George W. Bush. Bush é um republicano típico, pouco afeito a programas ambientais e com sólidas ligações com as maiores petroleiras do mundo. Mesmo carregando esse currículo, em janeiro passado condenou publicamente "o vício americano pelo petróleo" e passou a defender enfaticamente as energias renováveis. Os americanos são donos de 40% da frota de veículos do planeta, mas o álcool responde por apenas 2,5% do mercado local de combustíveis. Pelos planos do Departamento de Energia dos Estados Unidos, até 2030 essa participação subirá para 30%, o que representa o consumo de impressionantes 230 bilhões de litros -- ou 14 vezes a produção brasileira de álcool combustível prevista para este ano. "O etanol é a principal alternativa ao petróleo", diz Lawrence Russo, coordenador do Programa de Biomassa do Departamento de Energia americano. O combustível conta também com o apoio da oposição -- a senadora democrata Hillary Clinton, virtual candidata à sucessão de Bush, pediu que o senado libere 1 bilhão de dólares em pesquisas com etanol. Com tais movimentos, acredita-se que os Estados Unidos levem outros países a seguir a 52 mesma rota. Afora Suécia, Austrália e um punhado de países, o restante do globo só começou a avaliar com seriedade o álcool recentemente. Esse despertar mundial coloca o Brasil à frente da corrida da energia alternativa -- o que não é pouca coisa. E estimula potenciais produtores. Jamaica, Nigéria, Índia e outros países que cultivam cana tentam organizar a produção inspirados nos moldes brasileiros. A criação de mercados pelo mundo é considerada fundamental pelos produtores locais. A percepção é que, enquanto o Brasil for quase monopolista no comércio internacional de álcool, dificilmente será possível convencer os países desenvolvidos a misturá-lo à gasolina. "A experiência do petróleo ensinou que a concentração da produção de combustível não é boa para os países consumidores, que se tornam dependentes", diz Eduardo Pereira de Carvalho, presidente da União da Agroindústria Canavieira. "É importante que vários países fabriquem etanol para que haja segurança de abastecimento." Ainda assim, dificilmente algum outro será capaz de tirar a liderança brasileira nesse campo, pelo menos no curto prazo. O Brasil tornouse uma espécie de meca na produção em larga escala de combustíveis renováveis graças a uma perfeita combinação de clima, extensão territorial e reservas de água. A produtividade é de longe a maior do mundo. De cada hectare de cana plantada no país, produzem-se 6 800 litros de álcool. Nos Estados Unidos, hoje o maior produtor mundial de etanol, o álcool é feito de milho, e cada hectare da cultura gera 3 200 litros de álcool -- abaixo da metade do rendimento brasileiro. O preço da produção nacional é igualmente imbatível. O litro custa cerca de 20 centavos de dólar, ante 47 centavos do álcool de milho americano e 32 centavos do álcool de cana produzido na Austrália. "A beleza do processo brasileiro está principalmente na eficiência ambiental", diz Plinio Nastari, diretor da Datagro, consultoria especializada em açúcar e em álcool. “No Brasil, as máquinas que fabricam o álcool são movidas à energia elétrica produzida pela queima do bagaço de cana, o que reduz os custos. Nos Estados Unidos, o processo depende da energia gerada do carvão, do óleo combustível ou do gás natural, o que encarece o produto final." Para proteger os produtores americanos de milho, a importação do álcool brasileiro é taxada, o que fere sua competitividade. Hoje há muita pressão pela derrubada dos impostos. Dois projetos que tramitam no Congresso americano suspendem a cobrança. Jeb Bush, governador da Flórida e irmão do presidente, vem fazendo uma cruzada para derrubar a taxação sobre o produto brasileiro. Se a mobilização vingar, o Brasil deve virar um pólo ainda maior de atração de investidores -- o que muitos consideram a senha para a transição de um setor com ilhas de atraso para a modernidade. 53 Os pontos fracos do Brasil O que pode tirar o país da liderança do comércio mundial de álcool Infra-estrutura deficiente Hoje o transporte de álcool é feitoprincipalmente por caminhão. Para exportar grandes volumes a custo baixo, o país precisa construir dutos, investir em ferrovias e hidrovias e equipar os portos Baixo investimento em tecnologia Por ano, o governo americano investe 350 milhões de dólares, a fundo perdido, em biotecnologia para aumentar a produção de álcool de milho. No Brasil, as pesquisas com cana estão restritas a algumas empresas privadas. O total investido por ano no país é cerca de 25 milhões de dólares Falta de credibilidade Historicamente, o preço do açúcar guia a produção de álcool — se o açúcar fica mais caro, o usineiro reduz a produção de álcool. Para se estabelecer como fornecedor global, a indústria precisa manter uma produção regular de álcool e formar estoques . Os produtores brasileiros ainda dominam a fabricação de álcool no país -- e é difícil prever hoje por quanto tempo essa realidade deve se manter. Há em operação no Brasil cerca de 350 usinas, a maioria delas controlada por famílias tradicionais, como Ometto, Junqueira, Balbo, Zillo e Lyra. Apenas 3% desses negócios estão em mãos de grupos estrangeiros. Há hoje quase 100 usinas de álcool sendo construídas sobretudo por empresários locais. "Entender as peculiaridades da produção agrícola no Brasil não é para qualquer um", diz Pedro Mizutani, vice-presidente executivo da Cosan, o maior grupo privado brasileiro do setor. "Os estrangeiros têm dificuldade em lidar com a produção agrícola e de entender as legislações tributária e trabalhista." É por isso que -- pelo menos por enquanto -os investidores de fora têm optado por assumir o controle de usinas, mas deixar a parte agrícola para os brasileiros, como fez a Cargill na Cevasa. A multinacional americana ficou com pouco mais de 60% de participação. O restante ainda pertence à Canagril, uma sociedade de agricultores que fornecem a cana. Quando se olha para o futuro, no entanto, é possível visualizar um agressivo aumento da participação dos estrangeiros. "Pelo menos 30% das sondagens que recebemos de novos projetos de usinas é de estrangeiros", diz José Luiz Olivério, vice-presidente de operações da Dedini, a maior indústria de equipamentos para construção de usinas de etanol do mundo. "Se os negócios forem efetivamente fechados, vamos assistir a uma radical mudança no perfil do setor e no tamanho do mercado." O crescente interesse dos estrangeiros já está produzindo uma superlativa valorização das usinas. Unidades 54 pequenas, muitas delas com problemas financeiros, esqueletos tributários e dívidas trabalhistas, estão sendo avaliadas pelos donos em 50 milhões de dólares. As maiores e mais produtivas podem ser cotadas em meio bilhão de dólares. É um dinheiro considerável. E, assim como aconteceu com os setores de autopeças e de têxteis na década de 90, a maior parte dos empresários brasileiros do etanol enfrenta o momento de definir qual será seu papel no futuro. "Os acionistas precisam decidir se vão continuar sozinhos, buscar associações com estrangeiros ou esperar a melhor oferta para uma boa venda", diz Renato Gennaro, especialista em agronegócio da BCS, área de consultoria da IBM. "A tendência é que haja forte processo de consolidação, com fusões e aquisições, pois escala será fundamental." Na Nova América, empresa que detém a marca de açúcar União, a opção é crescer. Roberto Rezende Barbosa, presidente do grupo, estuda a possibilidade de abrir o capital para expandir os negócios com álcool. "Daqui para a frente será necessário produzir em escala mundial", diz Barbosa. "Quem quiser competir precisa se preparar." A Nova América tem uma estrutura de comando incomum no setor. O poder está nas mãos de Roberto e dois irmãos. Três pessoas, portanto, tomam as decisões. Em muitas usinas, o patrimônio está dividido entre dezenas de parentes com os mais diversos pontos de vista e idiossincrasias pessoais. Eleger estratégias é uma operação delicada. É o que se vê, por exemplo, na Vale do Rosário, uma das melhores e maiores usinas do país, localizada em Morro Agudo, no interior de São Paulo. A Vale do Rosário tem uma centena de acionistas. Em julho, o grupo deve se reunir para discutir o futuro do negócio. Alguns acionistas acreditam que o momento é ideal para vender a empresa. Outros pensam que o melhor é abrir o capital para financiar uma expansão mais agressiva. Se prevalecer essa segunda opinião, a Vale seguirá os passos da Cosan, empresa dona de 16 usinas e única do setor com ações cotadas na bolsa de São Paulo. "Nos próximos cinco ou dez anos, vamos dobrar nossa participação e atingir 20% do mercado interno", diz Rubens Ometto Silveira de Mello, controlador da Cosan. Mesmo com os preços em alta, a empresa mantém a estratégia de aquisições para se manter na liderança do setor. Paralelamente, estuda a possibilidade de ingressar no mercado americano. A supremacia brasileira no mercado de álcool, no entanto, não deve ser encarada como definitiva. O país tem debilidades que tendem a agravar-se com o tempo. A mais perigosa é a falta de investimentos em ciência e tecnologia. Assim como o desenvolvimento de novos tipos de soja levou a produção de grãos para o cerrado, o desenvolvimento de novas espécies de cana, resistentes a pragas e adaptadas a regiões mais áridas, será fundamental para abrir novos 55 pólos de produção e elevar a produtividade. A cultura já está migrando. Novas usinas estão sendo erguidas em Minas Gerais, Goiás, Paraná e até no Pará. O trabalho científico, no entanto, está concentrado em poucas instituições, como o Centro Tecnológico Canavieiro, algumas universidades federais e as empresas privadas CanaVialis e Alellyx, mantidas pela Votorantim Novos Negócios (VNN). "Num cenário de 30 anos, os Estados Unidos tendem a utilizar essa tecnologia para reduzir dramaticamente o custo de produção", diz Fernando Reinach, diretor da VNN. "Se o Brasil não investir em pesquisa, não conseguirá manter custos competitivos." Outra falha elementar é a falta de infra-estrutura. A maior parte do álcool produzido no país deixa a usina em caminhões, um meio de transporte caro que compromete a rentabilidade de áreas no interior do país. Também falta estrutura nos portos. "Se algum importador comprar álcool hoje, vai ter de esperar até setembro para receber", diz o empresário Maurílio Biagi Filho. Parte da solução do problema estaria na construção de alcooldutos cortando o país. Um projeto da Petrobras prevê a abertura de um duto que ligaria Goiás à refinaria de Paulínia, em São Paulo, passando pelas principais regiões produtoras. Para o economista Guillaume Le-Fur, diretor da Diapason Management, empresa suíça especializada em commodities, a presença de uma companhia como a Petrobras é estratégica para o mercado brasileiro. "Uma grande empresa com capital, capaz de competir com as petroleiras, será decisiva para a expansão do mercado de álcool", diz Le-Fur. Os empresários, no entanto, vêem com desconfiança o avanço da estatal. A Petrobras monopolizou o mercado interno de gasolina e de gás natural, e suspeita-se que tente fazer o mesmo com o álcool. O ponto nevrálgico para o sucesso do Brasil, no entanto, está nas mãos dos usineiros: garantir a produção do álcool. Pode parecer um item primário na sofisticada agenda do setor de energia, mas historicamente os usineiros locais reduzem a produção de álcool toda vez que o preço do açúcar sobe -- e neste momento ele nunca esteve tão alto. Essa velha artimanha para aumentar o faturamento da usina no curto prazo tende a minar a confiança dos consumidores de outros países. "O mercado de combustíveis trabalha com contratos de longo prazo que precisam ser respeitados", diz José Ronaldo Rezende, consultor da PricewaterhouseCoopers. "Temos de colocar o pé no chão para não fazer besteira", diz João Lyra, presidente do Grupo João Lyra, um dos mais modernos do setor. "Não respeitar contratos pode ser fatal para as empresas e para o país." Os entusiastas do etanol Várias lideranças americanas apostam no combustível verde Hillary Clinton 56 A senadora democrata propôs no Congresso a aplicação de 1 bilhão de dólares em pesquisas para duplicar a produção americana de álcool de celulose George W. Bush O presidente americano aumentou a isenção tributária do álcool, destinou meio bilhão de dólares a pesquisas e aposta no etanol como alternativa ao petróleo George Soros O megainvestidor acaba de comprar uma usina de álcool em Minas Gerais por 200 milhões de dólares Bill Gates O fundador da Microsoft investiu 84 milhões de dólares na Pacific Ethanol, cuja ação subiu 500% antes mesmo decomeçar a produção Sergey Brin e Larry Page Os fundadores do Google visitaram uma usina em São Paulo e mostraram-se abertos a fazer investimentos no país www.portalexame.abril.com.br – Acessado em 27/03/2007 Mantega diz que governo quer remover obstáculos a investimentos privados Stênio Ribeiro Repórter da Agência Brasil Brasília - Depois de destacar os aspectos macroeconômicos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), o ministro da Fazenda, Guido Mantega, afirmou hoje (13) que o governo quer “remover os obstáculos” a maiores investimentos da iniciativa privada, como é o caso da carga tributária que está no patamar de 39% do PIB (Produto Interno Bruto, a soma das riquezas produzidas no país) . Mantega fez a avaliação ao participar de audiência pública conjunta das comissões de Assuntos Econômicos e de Serviços e InfraEstrutura, do Senado. Também participam os ministros do Planejamento, Paulo Bernarddo, e da Casa Civil, Dilma Rousseff. Primeiro a falar aos senadores, Mantega disse que este é o momento adequado para adotar medidas de crescimento “mais vigoroso” porque o país vive uma estabilidade monetária confortável, com inflação abaixo de 4%, com ganhos de salário e renda e um “robustecimento” da demanda interna. A presença dos três ministros no senado tem o objetivo de esclarecer eventuais dúvidas dos parlamentares sobre o PAC, de modo a agilizar a aprovação das medidas provisórias e projetos de lei que compõem o programa, anunciado no final de janeiro pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Os três ministros já participaram de audiência pública 57 também na Câmara. Ao instalar a audiência, o presidente do Senado, Renan Calheiros, manifestou integral apoio de seu partido, o PMDB, a todas as iniciativas voltadas para o crescimento do país. http://www.agenciabrasil.gov.br/noticias - Acessado em 13/03/2007 27/03/2007 - 19h52 Participação de álcool e biodiesel nos combustíveis pode crescer 10 vezes até 2030 CLARICE SPITZ da Folha Online, no Rio Os biocombustíveis podem ampliar em dez vezes sua participação nos combustíveis para transporte nos próximos 23 anos. A estimativa é do representante do braço de biocombustíveis da BP (British Petroleum), Phil New, que participou nesta terça-feira do seminário organizado pela Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável, no Rio. Segundo ele, o álcool e o biodiesel correspondem hoje a 3% de todos os combustíveis para transporte e podem chegar a participação de 8,5% em 2015 e saltar para 30% em 2030. Isso significará um aumento de cerca 10 bilhões de litros por ano nos próximos dez anos. New afirmou que o Brasil vai desempenhar um papel fundamental na produção de álcool, mas que, assim com o o resto do mundo, precisa solucionar quatro questões: a disponibilidade de terras para o plantio de matéria-prima para os biocombustíveis, a qualidade e a sustentabilidade da produção, e o estabelecimento de preços competitivos. "Uma grande preocupação que temos é que os biocombustíveis não sejam produzidos de uma maneira sustentável. Seria muito trágico se isso acontecesse", afirmou. http://www1.folha.uol.com.br/folha/ - Acessado em 27/03/2007 Energia A última fronteira Com tecnologia menos agressiva ao ambiente, novas usinas na Amazônia evitarão repetir os desastres de Balbina e Tucuruí Duda Teixeira Uma nova fronteira está sendo aberta na Amazônia. Não se está falando, desta vez, de agricultura, e, sim, de energia. O governo 58 federal pretende construir três hidrelétricas gigantes na região. Duas delas, a de Santo Antônio e a de Jirau, no Rio Madeira, em Rondônia, que constam do Programa de Aceleração de Crescimento (PAC), são a solução que o Palácio do Planalto habitualmente contrapõe à previsão feita por especialistas de que uma crise energética de grandes proporções se aproxima. Pela vontade oficial, as construções no Rio Madeira começariam no ano que vem, de modo que Jirau entrasse em operação em 2011 e Santo Antônio em 2012. Com capacidade somada de 6.450 megawatts, as duas usinas poderiam atender sozinhas ao consumo do estado do Rio de Janeiro. A terceira hidrelétrica, a de Belo Monte, no Rio Xingu, no Pará, proporcionaria ainda mais energia, 11.000 megawatts, e também está no PAC. Apesar do empenho pessoal do presidente Lula, todos os projetos permanecem em compasso de espera devido a restrições ambientais. Na semana passada, o Ibama informou que o estudo da licença prévia das usinas do Rio Madeira, iniciado há 22 meses, chegou à fase final. Já os estudos de impacto ambiental de Belo Monte, embargados pelo Ministério Público desde 2001, recomeçaram a ser feitos em janeiro, com autorização judicial. O Brasil dispõe de uma rigorosa legislação de proteção ambiental. Ela impõe aos projetos de novas hidrelétricas exigências minuciosas para reduzir ao máximo os efeitos negativos sobre a natureza e os moradores das proximidades. Na prática, infelizmente, as regras são usadas mais para bloquear obras de infra-estrutura do que para fiscalizar e proteger a natureza. Pelos dados do Ministério do Meio Ambiente, só no período de doze meses anteriores a agosto de 2006, 13.100 quilômetros quadrados de Floresta Amazônica – o equivalente a meio estado de Alagoas – foram derrubados para abrir espaço para a pecuária, a soja e outros fins. Os dados da devastação acelerada comprovam que a ameaça ambiental não está na construção de novas hidrelétricas, sobretudo porque estas adotam hoje tecnologias menos agressivas à natureza. O que aumenta o risco de o avanço energético na Floresta Amazônica fugir ao controle é o avassalador fracasso demonstrado pelo estado brasileiro no cumprimento da tarefa de fiscalizar e impedir a destruição de áreas que devem ser preservadas. "As obras do Rio Madeira poderiam incentivar a ocupação de uma vasta área da Amazônia cujo ecossistema é muito delicado", preocupa-se o biólogo americano Thomas Lovejoy, presidente do Centro Heinz para a Ciência, em Washington. Os desafios ambientais e econômicos das três usinas previstas para a Amazônia são proporcionais ao seu tamanho. Belo Monte, no Pará, foi projetada ao lado de florestas com grande biodiversidade e tem como vizinhos dez tribos indígenas. As usinas do Rio Madeira estão perto demais de áreas preservadas e de terras indígenas e longe demais dos principais centros de consumo. O custo da linha de transmissão até o Sudeste já foi estimado em 10 bilhões de reais, o que encareceria bastante o projeto, orçado inicialmente em 20 bilhões de 59 reais. O desafio ambiental, por sua vez, foi enfrentado com novas tecnologias de construção com menores impactos diretos na natureza. Dessa forma, será possível evitar a repetição dos desastres causados no passado pela construção de grandes hidrelétricas na região, como Balbina e Tucuruí. Inaugurada em 1984, Tucuruí, no Pará, alagou uma vasta área de floresta e afogou, sem remorso, toda a fauna que ali vivia. Também atraiu indústrias e migrantes, o que provocou a devastação de mais da metade da floresta nos sete municípios mais próximos. Nada disso se repetirá no Rio Madeira. Em vez de uma só usina com um grande reservatório, o projeto prevê duas menores, cujas turbinas serão acionadas pelo sistema a fio d'água. Nesse método, toda a água que chega é aproveitada pelas turbinas, do tipo bulbo, e, em lugar de formarem um lago, as águas avançam 500 metros em cada margem do rio durante o período de cheia. O projeto prevê ainda que as árvores da área a ser alagada sejam retiradas antes e de forma progressiva. Desse modo, os animais podem sair andando e não se forma um lago que se tornaria uma fonte de gases de efeito estufa causado pela decomposição do material orgânico, como ocorre hoje na Usina de fio d'água no Danúbio, na usina de Balbina. As empresas Furnas e Rio Áustria: sem Odebrecht, que financiaram os relatórios de impacto ambiental das usinas, propõem que reservatório os canais laterais para a passagem dos peixes que sobem o rio no período da desova tenham curvas e fundo irregular, para imitar o leito natural. Seria possível controlar a quantidade de água e a correnteza para favorecer diferentes espécies de peixe, de acordo com a época do ano. As medidas para reduzir os impactos ambientais nas novas hidrelétricas representam uma gorda fatia do total da obra. Na usina de Peixe Angical, uma obra da iniciativa privada inaugurada no ano passado no Rio Tocantins, as medidas sociais e ambientais responderam por 13% do orçamento. O projeto exemplar incluiu a construção de hospital e residências para as pessoas desalojadas, aterros sanitários, cursos de educação ambiental, viveiros de espécies retiradas e o resgate de 55.000 animais, entre eles um milhar de invertebrados. Até minhocas foram recolhidas e transportadas para locais seguros. Nas usinas do Madeira, grupos de investidores já deram demonstrações de que aceitam arcar com esse custo ambiental. "A maior ou menor degradação do ambiente depende de quanto um país está disposto a investir em medidas que reduzam ou compensem o impacto", diz o engenheiro Rafael Schechtman, diretor do Centro Brasileiro de Infra-estrutura (CBIE), uma consultoria do Rio de Janeiro. "A questão é saber se a sociedade está disposta a arcar com esse custo." 60 O último projeto das usinas do Rio Madeira enviado para análise do Ibama reserva áreas para a construção, em uma segunda etapa, de eclusas, tanques de água que permitem às embarcações superar o desnível das barragens. Uma vez concluídas, as eclusas vão permitir que a produção agrícola de Rondônia e de Mato Grosso – que hoje é transportada com dificuldade por uma estrada federal toda esburacada – seja levada em barcaças até Porto Velho ou Itacoatiara, no estado do Amazonas. Neste último porto, o carregamento poderia ser transferido para navios maiores e seguir diretamente para destinos em qualquer ponto do mundo. Com a construção de mais uma usina na fronteira com a Bolívia e outra no país vizinho – projetos que teriam o apoio e o financiamento brasileiros –, a hidrovia pode chegar a 4.155 quilômetros, por vários rios. Um estudo considera que a hidrovia proporcionará um aumento na produção de grãos de 28 milhões de toneladas ao ano na área de influência do projeto. De acordo com uma conta feita pela ONG Amigos da Terra, isso vai requerer um aumento de 350.000 quilômetros quadrados na área agrícola, o que daria uma área maior do que São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo juntos. Evidentemente, cabe ao estado o dever de impedir que o crescimento da produção ocorra à custa de desmatamentos da Floresta Amazônica. As dificuldades criadas por motivo ambientalista vão adiar, mas não devem impedir para sempre, a instalação de outras hidrelétricas na Amazônia. A pressão por novas fontes de energia no Norte tem boas razões para existir. Dados da Eletrobrás mostram que o Brasil dispõe em seus rios de quedas-d'água em quantidade suficiente para multiplicar por quatro sua capacidade hidrelétrica – mas 40% de todo esse potencial está na bacia do Rio Amazonas. Fora da Região Norte, poucos locais poderiam receber usinas com capacidade maior do que 1.000 megawatts, o necessário para abastecer uma cidade com 3 milhões de habitantes. "Estamos todos voltados para o norte. As grandes hidrelétricas que podiam ser feitas no restante do Brasil já foram construídas", diz Renato Lanzi, diretor da Alstom, que cogita instalar uma fábrica de turbinas em Porto Velho para suprir futuras obras na Amazônia e no exterior. Se a economia brasileira crescer 5% ao ano, como está nos planos do governo Lula, será preciso acrescentar 3.500 megawatts por ano à capacidade energética do país. Com a construção das pequenas hidrelétricas e termelétricas que já receberam licença ambiental, o máximo de acrescimento até 2010 será de 1.272 megawatts anuais, segundo o CBIE. "A partir do ano que vem, o sistema elétrico já poderá operar no limite", diz Adriano Pires, diretor da consultoria. "Bastará uma temporada de chuvas fracas ou um aumento no consumo para que tenhamos um novo apagão." Das usinas de menor porte que conseguiram a licença prévia do Ibama e foram oferecidas em leilão para ser construídas pela iniciativa privada, poucas despertaram o interesse dos investidores. 61 Um dos motivos é o medo de ter a construção interrompida. Atualmente, qualquer cidadão munido de título de eleitor pode recorrer à Justiça e mudar completamente o andamento da obra de uma usina caso a ação seja aceita por um juiz. Segundo a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), existem 25 usinas hidrelétricas com cronograma parado ou atrasado devido a obstáculos criados pelo Ibama, pelo Ministério Público, por órgãos estaduais e movimentos ambientalistas. O preço congelado das tarifas e a elevada carga tributária que incide nas contas de luz, de 51%, também afugentam os investidores. "Não podemos nos comprometer com projetos que nos farão perder dinheiro. É minha obrigação dar um retorno aos acionistas", diz António Martins da Costa, diretor-presidente da Energias do Brasil, grupo europeu responsável pela hidrelétrica de Peixe Angical. A Energias anunciou no ano passado a disposição de investir 1 bilhão de reais em novas usinas, mas o dinheiro ainda está guardado no banco. "Em vez de termos um desenvolvimento sustentável, estamos enfrentando uma estagnação insustentável", define Jerson Kelman, diretor-geral da Aneel. 62 O dia em que o poço secar 16.11.2006 Enquanto busca retardar o declínio da produção de petróleo, a Petrobras amplia investimentos em energias renováveis. Stèferson Faria / Petrobras Campo de Albacora, no Rio: tecnologia para adiar o fim Por Ursula Alonso Manso Foram necessários 125 anos para que o mundo consumisse o primeiro trilhão de barris de petróleo, mas bastarão 30 anos para consumir o segundo. A frase, de um recente anúncio publicitário do grupo americano Chevron Texaco, ilustra o dramático aumento do consumo de petróleo no planeta nos últimos anos. Prever quando essa escalada vai levar ao esgotamento dos poços é um exercício de futurologia -- a Agência Internacional de Energia (AIE), por exemplo, diz que a produção mundial do óleo negro vai atingir o pico em algum ponto "entre 2013 e 2037". Mas uma coisa é certa: é preciso se preparar para viver num mundo sem petróleo. A recomendação é especialmente válida para quem tem no 63 petróleo seu principal negócio, como a Petrobras, a maior empresa do país. Das 276 concessões da estatal, 199 -- 72% -- estão na maturidade, eufemismo para se referir aos campos em fase de declínio da produção. Essas áreas representam 40% das reservas provadas da Petrobras e cerca de 75% do óleo e do gás produzidos no Brasil. Na bacia de Campos, no Rio de Janeiro, 30 das 32 concessões já entraram na fase de maturidade. Na tentativa de adiar o declínio dos campos maduros, a Petrobras lançou em 2005 um programa de revitalização que combina o uso de novas tecnologias com melhorias no gerenciamento das operações. Com investimento de 2,4 bilhões de dólares até 2011, a meta é recuperar 800 milhões de barris de petróleo, o correspondente à descoberta de um campo gigante. Os primeiros resultados começam a aparecer. Em Albacora, na bacia de Campos, por exemplo, que hoje produz 116 000 barris por dia, a empresa inaugurou um sistema inédito de injeção submarina de água no reservatório que deverá resultar num ganho de 45 000 barris diários em 2010. Biocombustíveis Além de tentar adiar o inevitável, a Petrobras começou a atuar em outra frente: a das energias renováveis. Mais do que uma companhia de petróleo, a estatal quer cada vez mais ser vista como uma empresa integrada de energia. "Nossa estratégia prevê a expansão da participação no mercado de biocombustíveis, liderando a produção nacional de biodiesel e ampliando a participação no mercado de etanol", disse o presidente da Petrobras, José Sergio Gabrielli, no final de julho, ao apresentar o plano de negócios da companhia para o período 2007-2011. O plano prevê investimentos de 700 milhões de dólares em projetos de energias renováveis e biocombustíveis, e mais 660 milhões de dólares na expansão de alcooldutos. O projeto dos alcooldutos foi ampliado para contemplar a Região Centro-Oeste e deverá triplicar as exportações brasileiras de álcool. Demanda para isso não falta. "Estamos fechando contratos com a Venezuela e a Nigéria que deverão somar 250 milhões de litros de álcool neste ano", diz Paulo Roberto Costa, diretor de abastecimento da Petrobras. A partir de janeiro de 2008, todo o óleo diesel comercializado no país deverá ter adição de 2% de biodiesel. Antecipando-se à medida, a Petrobras está construindo três complexos industriais para a produção desse combustível nos estados da Bahia, do Ceará e de Minas Gerais. Orçadas em 90 milhões de dólares e previstas para entrar em operação no final de 2007, as fábricas terão capacidade para produzir 144 milhões anuais de litros de biodiesel extraído de óleo de mamona, algodão, soja e dendê. Além disso, a Petrobras vai processar outros 425 milhões de litros de óleo vegetal em suas refinarias. O objetivo é adicionar o óleo vegetal ao diesel comum num processo desenvolvido pelo Centro de Pesquisas da Petrobras (Cenpes) e batizado de H-Bio, que resulta num "diesel verde", menos 64 poluente. Durante os testes do H-Bio, foram usados até 18% de óleo vegetal na composição do novo combustível. "Vamos plantar diesel", afirma Costa. A nova aposta Os investimentos da Petrobras em energias renováveis — em milhões de dólares 2002/ 2006 65(1) 2007/ 2011 700(2) (1) Estimativa (2) Previsão Outro projeto é o desenvolvimento de parques eólicos de geração de energia elétrica, principalmente na Região Nordeste. No Rio Grande do Norte, a estatal opera, desde 2003, a Usina Eólica de Macau. Com capacidade de 1,8 MW (megawatt), ela fornece energia para a operação de poços e unidades de produção de biodiesel. A meta para os próximos cinco anos é ampliar a capacidade instalada de geração de energia elétrica de fontes renováveis para 240 MW, suficiente não só para o consumo próprio da Petrobras como também para comercializar a energia excedente no mercado. Entre outros estudos em andamento no Cenpes, está o uso da energia geotermal, que flui do interior da Terra sob a forma de calor. Valendo-se da elevada temperatura das águas subterrâneas em Mossoró (RN), a Petrobras está utilizando um poço antes abandonado no município para preaquecer a água que vai para seus geradores de vapor. "Agora, queremos testar o uso do gás geotérmico para produzir energia", diz João Norberto Noschang Neto, coordenador do Programa Tecnológico de Energias Renováveis (Proger), criado pela Petrobras em 2004. http://portalexame.com.br/static/aberto/infraestrutura/ Acessado em 04/04/2007 A retomada das grandes usinas 16.11.2006 A meta do governo é ampliar a capacidade instalada no país em mais de 40% nos próximos dez anos. Mas ainda há entraves importantes a superar 65 Image China Termelétrica na China: obras grandiosas para atender à crescente demanda de energia As grandes obras que marcaram o setor elétrico nas décadas de 70 e 80 estão de volta. Nos próximos dez anos, pelo menos três projetos gigantescos devem sair do papel: as usinas de Santo Antônio e Jirau, no rio Madeira, e a primeira etapa de Belo Monte, no rio Xingu. Essa, pelo menos, é a expectativa do governo federal, que também conta com a instalação de usinas de menor porte, mas não menos importantes. O objetivo é garantir, até meados da próxima década, uma potência instalada de 134 gigawatts (GW) no sistema interligado brasileiro, ante os 94 GW atuais. O mercado ainda se mostra cauteloso diante desses projetos energéticos monumentais, que também têm sido implantados lá fora -- a China, por exemplo, está investindo 25 bilhões de dólares na construção da usina hidrelétrica de Três Gargantas, que será a maior do mundo. Por um lado, os especialistas do setor no Brasil estão animados com o volume elevado de investimentos previstos no plano do governo federal -- a previsão para os próximos dez anos é de gastos da ordem de 40 bilhões de dólares. Por outro, ainda mantêm uma dose de ceticismo quanto à viabilidade dessas obras colossais. Afinal, embora o novo modelo do setor tenha definido o formato de contratação da energia, alguns entraves ainda persistem -- como as dificuldades para a obtenção de licenças ambientais. Em particular, já começaram a surgir problemas para licenciar as grandes hidrelétricas previstas para a Região Norte. Outro projeto que está atrasado por causa da legislação ambiental é o da usina nuclear Angra 3, prevista para entrar em operação em 2013. O principal motivo de controvérsia, nesse caso, é que não haveria um formato seguro de acondicionamento dos rejeitos nucleares. Em defesa dos projetos hidrelétricos, o governo afirma que as novas usinas são muito mais ecológicas do que as obras hoje em operação. Enquanto as usinas existentes alagaram uma área de 0,52 quilômetro quadrado por MW instalado, os novos projetos devem exigir 0,27 quilômetro quadrado por MW -- pouco mais da metade. Tais medidas devem diminuir o impacto ambiental desses projetos, mas não são suficientes para tranqüilizar o mercado. A experiência com outros empreendimentos que, no passado, causaram polêmica devido ao porte grandioso, como as usinas de Itaipu e de Tucuruí, faz com que 66 alguns especialistas temam possíveis atrasos nos cronogramas previstos pelo governo. Essa perspectiva deve ser levada em conta na licitação das novas usinas: é certo que os empreendedores vão exigir um preço maior pela energia por causa dos riscos associados aos projetos. E essa conta, fatalmente, será repassada aos consumidores. http://portalexame.com.br/static/aberto/infraestrutura/ em 04/04/2007 - Acessado ECONOMIA LULA CONFIRMA PROPOSTA BRASILEIRA PARA DESTRAVAR O presidente Luiz Inácio Lula da Silva confirmou ontem a proposta do governo brasileiro de redução das barreiras ao comércio internacional em função da condição econômica de cada país. 13/03/07 Gazeta Mercantil Antecipado por este jornal na sexta-feira, o plano para destravar a Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC) prevê, por exemplo, que os cortes de subsídios agrícolas deverão ser mais expressivos para beneficiar os países mais pobres. Em contrapartida, quanto mais forte a economia, menor será a concessão. "Estamos dispostos a fazer a nossa parte, levando em conta a propor-cionalidade e a riqueza de cada país, disse Lula, ontem, em seu programa semanal de rádio "Café com o Presidente". "Um pouco de concessão é que vai garantir o acordo que todos estamos torcendo para que aconteça, porque seria a salvação dos países mais pobres", declarou Lula. Três dias depois de receber a visita do presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, Lula declarou que considerar "irreversível" a transformação do álcool em uma commodity, tal qual foi defendido pelo governo brasileiro. "Na medida em que o álcool começa a ganhar corpo e ser misturado na gasolina, e os países do mundo inteiro começam a se preocupar em diminuir a emissão de gás carbônico, significa que logo, logo, o álcool vai ter um preço internacional. Portanto, vai ser commodity. Suprimento Segundo o presidente, o crescimento do plantio de canade-açúcar, necessário para garantir o suprimento de álcool nos mercados brasileiro e internacional, não terá como conseqüência o aumento de áreas desmatadas nem prejudicará o cultivo de alimentos. O etanol e outros combustíveis alternativos, como o biodiesel, voltarão à pauta de negociação dos dois presidentes no 67 próximo dia 31, durante a visita de Lula aos Estados Unidos. A RODADA DOHA À BEIRA DO COLAPSO O Brasil será o grande perdedor se houver um colapso das negociações globais de comércio, um perigo cada vez mais próximo, dado o impasse em torno da questão agrícola. 04/04/07 O Estado de SP Se a Rodada Doha for interrompida nas próximas semanas, ou mesmo nos próximos dois meses, dificilmente se poderá retomá-la antes de 2010 - e ninguém sabe quais serão as condições políticas no momento do reinício. O risco para o Brasil é especialmente grande porque o governo jogou todas as fichas na rodada geral e na busca de alianças de inspiração terceiro-mundista. Enquanto isso, os concorrentes buscaram ampliar sua participação nos principais mercados e formularam acordos bilaterais e regionais orientados pelo pragmatismo e não por bandeiras ideológicas. Segundo pesquisa conduzida pela Comissão Européia, 60% dos cidadãos dos 27 países membros do bloco defendem a manutenção ou a ampliação dos subsídios agrícolas. Reformas da política são apoiadas por 80% dos europeus, mas em benefício do ambiente, da segurança dos alimentos e do bem-estar dos animais. A liberalização do comércio agrícola não está entre as bandeiras valorizadas. Dias antes da publicação da pesquisa, o candidato conservador à presidência da França, Nicolas Sarkozy, declarou-se contrário à redução de subsídios. Sua posição pode ser mais dura que a do governo atual, mas a ministra do Comércio, Christine Lagarde, já tem desautorizado o principal negociador da União Européia, Peter Mandelson, acusando-o de ir além de seu mandato na apresentação de concessões aos parceiros. As palavras de Sarkozy podem conter uma dose de retórica eleitoral, mas obviamente refletem um ambiente político muito desfavorável à abertura do mercado agrícola. Em Bruxelas, discutem-se novas barreiras à importação de etanol, sustentadas com o pretexto de proteção ao meio ambiente nos países produtores.Trata-se de uma evidente manobra de caráter preventivo, diante da onda internacional de valorização de combustíveis alternativos. Se essa onda crescer, o Brasil estará pronto para se apresentar como um importante fornecedor de etanol e talvez de biodiesel e os produtores europeus não terão, pelo menos durante muitos anos, condições de enfrentar esse competidor. Do lado americano, o presidente George W. Bush promete um esforço para salvar a Rodada Doha, mas a principal negociadora dos Estados Unidos, Susan Schwab, deixou clara, em visita ao Brasil, a pouca disposição de apresentar maiores ofertas em matéria de agricultura. 68 Enquanto a discussão internacional prossegue, o novo projeto de lei agrícola em tramitação no Congresso americano embute um aumento dos subsídios. Além disso, o fato de os democratas terem obtido maioria no Legislativo é um prenúncio de resistência a novas concessões comerciais. A autorização para o Executivo negociar acordos não passíveis de emenda pelo Congresso vai expirar no final do semestre. Uma nova autorização poderá ser conseguida, mas provavelmente será condicionada a restrições maiores que as do atual mandato negociador. Cláusulas sociais e ambientais poderão complicar seriamente a formulação de um acordo global de comércio.Tanto europeus quanto americanos cobrarão dos emergentes e pobres maior abertura para o comércio de produtos industriais e para o setor de serviços. Brasileiros e americanos têm explorado a possibilidade de acordos setoriais no caso da indústria, mas o europeu Peter Mandelson já se pronunciou contra essa forma de negociação, defendendo uma redução ampla e geral de tarifas.Europeus e americanos cobram também uma abertura dos emergentes para o comércio de produtos agrícolas, mas não há acordo entre os países em desenvolvimento. Alguns, como Índia e Indonésia, pretendem manter uma elevada proteção, enquanto exportadores de peso, como Brasil e Argentina, se mostram mais preparados para aceitar a competição. O diretorgeral da Organização Mundial do Comércio (OMC), Pascal Lamy, deve apresentar um esboço de acordo aos negociadores de maior peso até meados de abril. Se aprovado, será proposto ao conjunto dos 150 membros da OMC. Se não der certo, o governo brasileiro terá de pensar, com anos de atraso, numa estratégia alternativa, e mais pragmática, para a diplomacia comercial. "Novo perfil nas importações brasileiras" (Editorial da Gazeta Mercantil, 4 de abril de 2007) Os dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior relativos à balança comercial do primeiro trimestre registram queda no superávit brasileiro de 6,4% em relação ao mesmo período de 2006. Se a comparação for feita apenas em relação ao mês de março, o quadro agravase, uma vez que a redução do superávit atingiu 8,5%. Parte deste recuo na balança comercial pode ser localizada em um atípico movimento na corrente de comércio entre Brasil e Argentina. As importações brasileiras do vizinho cresceram 40,5% no primeiro trimestre (atingindo R$ 2,2 bilhões), ante o mesmo período do ano passado, enquanto as exportações avançaram 15,5% (US$ 2,8 bilhões). Este saldo, de US$ 581 milhões, é bem inferior aos US$ 855 milhões obtidos nos três primeiros meses de 2006. O secretário de Comércio Exterior, Armando Meziat, observou que esta redução representa uma "distensão" com os parceiros do Mercosul. O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, foi mais preciso ao ponderar que intercâmbio comercial com a Argentina deve apresentar constante crescimento 69 porque, para o chanceler, "é importante o mínimo de equilíbrio". Com razão, o secretário Meziat lembrou que os vizinhos sempre se queixam às autoridades brasileiras do saldo negativo nas relações comerciais com o Brasil, concluindo que o recuo no superávit demonstra o "acerto" das negociações com os argentinos. Conforme o secretário, o crescimento das vendas dos vizinhos "é preocupação nossa". Este é, de fato, o ponto relevante: equilíbrio de negócios. É exatamente deste equilíbrio que depende o futuro do Mercosul. O objetivo maior do bloco é a busca de complementaridade de cadeias produtivas entre os dois lados da fronteira. E o primeiro passo para que esta vontade se transforme em realidade está, obviamente, na fina sintonia entre importação e exportação do Brasil e da Argentina. O Mercosul foi feito para intensificar comércio, não enfrentamentos. Obtido o equilíbrio, será bem mais fácil tanto expandir comércio no bloco como enfrentar as novas formas de negociações comerciais internacionais. O perfil das importações brasileiras, por outro lado, demonstra que bens de capital avançaram 24% no primeiro trimestre, ante 2006, e matérias-primas e produtos intermediários, 28,1%, mostrando, como argumentou o secretário Meziat, que a indústria está "querendo produzir mais, reduzir custos e competir com os importados". O item mais preocupante da pauta de importações é o bem de consumo. No trimestre, as compras externas de bens de consumo avançaram 39%, comparadas ao ano anterior, embora representem apenas 13,2% das compras do País. Para o secretário do Comércio Exterior, o consumo reflete a taxa de câmbio favorável, mas só será preocupante, segundo Meziat, "quando se tornar avassalador". Frente a tanto otimismo, convém lembrar que o dólar ontem fechou a R$ 2,037, embicado na direção da quebra do valor simbólico dos R$ 2, apesar de toda a tranqüilidade vigente no governo. As exportações argentinas para o Brasil tradicionalmente concentramse em bens de consumo, com exceção do setor automotivo. Sobre o perfil das exportações dos dois maiores integrantes do Mercosul valem algumas cautelas, principalmente quanto às vendas externas brasileiras e não às da Argentina. No acumulado de 12 meses, as exportações de manufaturados subiram 15,6%, abaixo dos semimanufaturados, que aumentaram 16,4%, e muito abaixo da expansão das exportações dos primários, 26,4%. Aliás, como apontou a Associação de Comércio Exterior do Brasil, entre janeiro e março as exportações brasileiras de motores foram 11,4% menores e a de automóveis, 14% piores do que as registradas no primeiro trimestre de 2006. O equilíbrio de comércio entre Brasil e Argentina está na própria origem do Mercosul. Vale lembrar que o bloco se consolidou no Tratado de Comércio de Buenos Aires, de 1988, que, a exemplo da União Européia, construída a partir da aliança França/Alemanha, incentivava um mercado comum inicial e consolidado entre Brasil e Argentina. Neste aspecto, equilíbrio na corrente de comércio entre os dois países é realmente benéfico. "Brazil emerging as global trade leader" (The Miami Herald [EUA] - 16 de setembro de 2006) 70 Jornal: The Miami Herald (EUA) Título: 'Brazil emerging as global trade leader' Data: 16/09/2006 Crédito: Jack Chang Seeking to move stalled trade negotiations, Brazil is fast stepping to the forefront as a global trading power along with the aid of a unified coalition of nations known as the G-20. BY JACK CHANG McClatchy News Service BRASILIA, Brazil - This giant South American country has long dreamed of becoming a great global power. Now, at least part of that dream seems to be coming true. From global trade negotiations to diplomatic circles, Brazilian officials are speaking out for fellow developing countries, and much of the Third World is following its lead. That was underlined this past weekend when representatives of 27 developing countries came to Rio de Janeiro to seek a common position on stalled trade negotiations with the United States and other industrialized countries. The group agreed to meet again. From Argentina to Zimbabwe, the countries came at the invitation of Brazil, which leads the coalition. They're known as the Group of 20, or G-20, though the coalition's membership totals 21. Six observer nations also attended. Over the past three years, the G-20 under Brazil has presented a unified front to protect domestic farmers while negotiating proposals to slash worldwide trade barriers. Brazil's leadership will continue Wednesday, when the leaders of India and South Africa come to Brasilia for the first summit of what Brazilian officials say is a ''south-south'' coalition of developing countries. The goal, officials say, is to foster more trade among such countries rather than rely on U.S. and European markets. Such initiatives follow Brazil's quest for a permanent seat on the U.N. Security Council and its hosting of a summit last year between Arab and South American countries, a meeting many saw as a challenge to U.S. leadership in the Middle East. Brazilian diplomats deny the country is seeking a larger international role but add that the country's size makes it a trendsetter. With the world's fifthlargest population, Brazil is one of the top producers of sugar, soybeans and coffee, among other products. "The idea of Brazil as a leader comes from outside the country," said Carlos Henrique Cardim, head of a research group linked to Brazil's foreign 71 ministry. "Yes, we are launching many of these initiatives, but we are working with other countries to do it." Foreign diplomats, however, said Brazil has clearly taken the lead on several fronts, including creating the G-20 and guiding the Mercosur trade bloc, which is made up of Brazil, Argentina, Venezuela, Paraguay and Uruguay. Since taking office in 2003, Brazilian President Luiz Inacio Lula da Silva has crisscrossed developing regions of the world, such as Africa and South Asia, drumming up trade and promoting Third World unity. "Before, it had been a very delicate and gentle situation, with Brazil seeking more say behind the scenes," said David Fleischer, a University of Brasilia political science professor. "Now, with this government, it's very ostentatious and direct. Brazil is clearly seeking a greater international role." With the presidential election on Oct. 1, the government's foreign policy has become a subject of political debate in Brazil. Top presidential challenger Geraldo Alckmin, who badly trails Lula in polls, has accused the government of following political rather than economic principles in developing foreign policy. "With this thing of south-south, why would we diminish the world for workers and why would we diminish the world for business people?" Alckmin asked during a recent campaign speech in Brasilia. ``We have to look for markets and make bilateral and multilateral trade agreements to guarantee markets." Brazil's ambitions also have generated some international criticism. India's minister of state for commerce, Jairam Ramesh, mocked Brazil's southsouth vision in an interview with the Brazilian newspaper O Estado de Sao Paulo. "The idea that India and Brazil are natural allies is a little naive," Ramesh said. "We are competitors." Despite promises to strengthen trade with the developing world, Brazil still remains highly dependent on the United States, its largest trading partner. Brazil and the United States traded $35.6 billion worth of goods in 2005, about 15 times more than what Brazil traded with India that year. To Brazilian officials, however, such numbers only show there's plenty of room for growth in trade among developing countries. Brazilian exports to India jumped by nearly 75 percent between 2004 and 2005. "These are countries with a lot to share and a lot of room to grow together, and they are going their own way in pursuing it", said Pedro Motta Pinto Coelho, sub-secretary for political affairs in Brazil's foreign ministry. "We believe in these kind of global coalitions, and we think it's something that's completely new". http://www.mre.gov.br - Acessado em 16/04/2007 18 de abril de 2007 - 16:35 Um terço das cidades tem média 2 ou menor no ensino básico A média nacional é 4, mas o País tem como meta chegar a 6, em 15 72 anos Andréa Portella SÃO PAULO - Cerca de 30% dos municípios brasileiros - 1,8 mil cidades - têm média igual ou menor a 2 no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb). A média nacional é 4, mas o País tem como meta chegar a 6, em 15 anos. A informação foi dada na terça-feira, 17, pelo ministro da Educação, Fernando Haddad. “Estou citando só municípios porque não há nenhum Estado numa situação tão crítica”, disse. O Ideb está em fase final de elaboração pelo Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). O índice usará uma escala de 0 a 10, levando em conta avaliações, repetência e evasão escolar. A meta de atingir a média 6 deve-se ao fato de que, segundo Haddad, os países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) teriam essa nota. Para chegar a esse patamar, o País precisaria aumentar sua média no Sistema Nacional da Avaliação Básica (Saeb) em 50 pontos. Ou seja, alunos de 4ª série teriam de passar a ter um conhecimento que hoje equivale ao dos alunos de 8ª. O ministro participou, em São Paulo, de um encontro promovido pelo Grupo de Institutos, Fundações e Empresas (Gife). Ele apresentou as linhas gerais do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) a um grupo de representantes de instituições ligadas, principalmente, a grandes bancos e empresas. O projeto ambiciona estabelecer sistemas de definição de metas, de avaliação e de cobrança de resultados nas escolas de todo o País. Haddad anotou sugestões, críticas e perguntas. Muitas delas referiam-se a investimentos e gestão. “O Brasil realmente deixa a desejar em investimentos”, disse. Segundo ele, a implementação do PDE deve enfrentar dificuldades políticas e administrativas. “Os municípios que aderirem terão de abrir mão de certas prerrogativas, como a de escolher um diretor de escola por questões políticas, e fazer escolhas por mérito”, afirmou. “E há questões de ordem executiva. O MEC tem de se preparar para implementar o plano, o que não é fácil.” Uma comissão do Gife reuniu-se ontem para avaliar o encontro e divulgou nota, informando que quer conhecer melhor as propostas do governo e deve apoiá-las, caso contemplem dez pontos considerados essenciais. Entre eles estão a formação de um pacto multissetorial e a priorização de políticas de Estado em detrimento das políticas de governo. http://www.estadao.com.br -Acessado em 20/04/2007 73 BRASIL: ÁREAS DE INTERESSE União Européia e Brasil intensificam diálogo Eneko Landaburu Diretor-geral de Relações Exteriores da Comissão Européia Brasília sediará amanhã a X Reunião da Comissão Mista União Européia — Brasil e, nesse contexto, realizo visita oficial ao país na qual, além de presidir a contraparte européia nesse encontro, terei reuniões com autoridades brasileiras para avançarmos ainda mais as estreitas relações bilaterais. Estou seguro de que 2007 é um ano crucial para fazer progredir o nosso relacionamento. Além da Comissão Mista, a UE, sob a presidência alemã, e o Brasil vão ter pela primeira vez “consultas políticas” para dar à sua relação um enfoque mais estratégico e geopolítico. Ano passado, o presidente da Comissão Européia, Durão Barroso, convidou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva a participar da Conferência Internacional sobre Biocombustíveis, a ser realizada no dia 7 de julho próximo, em Bruxelas. Detentor da mais avançada tecnologia nessa nova fronteira dos combustíveis renováveis, o Brasil muito terá a aportar para o êxito da reunião e para o maior conhecimento dessa importante matriz energética que tem um potencial imenso para a cooperação bilateral. As relações entre a UE e o Brasil são fundamentadas em sólidas bases históricas, étnicas e culturais. Difícil encontrar outros dois parceiros que compartilhem valores essenciais como o compromisso com a democracia e o estado de direito, a valorização dos direitos humanos, o desenvolvimento com justiça social, o fortalecimento do multilateralismo e a promoção da paz e segurança internacionais. Tamanha identidade faz com que o Brasil e a UE rejeitem a pena de morte e figurem entre os membros do Tribunal Penal Internacional. Faz também com que sejam defensores intransigentes do Protocolo de Kyoto e de suas iniciativas na luta pela preservação do nosso planeta. Existe ainda uma forte convergência no plano de valores culturais, tendo o Brasil e a UE assinado a Convenção da Unesco sobre a proteção e promoção da diversidade e expressão cultural. Essa sinergia e convergência de posturas se reflete nas relações econômicas e comerciais bilaterais. Assim, nos últimos anos a UE persiste como principal parceiro comercial do Brasil. Em 2006, esse intercâmbio somou 23,8 bilhões de euros, com um superávit brasileiro de 7,8 bilhões de euros. É de se destacar que mesmo num setor em que é criticada por seu suposto protecionismo, o do comércio de produtos agrícolas, a UE continua sendo o principal mercado para a competitiva agroindústria brasileira. Em 2006, o intercâmbio agrícola com a UE gerou para o Brasil um saldo de 6,5 bilhões de euros. 74 Aos dados do comércio deve-se somar o fluxo de investimentos diretos realizados pelos países europeus no Brasil. Ano passado, essas inversões totalizavam 6,8 bilhões de euros, o que fez da UE o maior investidor estrangeiro no país. Marco importante do adensamento das relações bilaterais foi a visita pioneira ao Brasil do presidente da Comissão Européia, José Manuel Durão Barroso, em maio de 2006. Naquela oportunidade foram identificados diversos pontos de interesse comum e lançou-se importante agenda de trabalho para o futuro. É dos mais relevantes o papel desempenhado pelo Brasil nas negociações da Rodada de Doha. Na condição de líder empenhado e ativo do G20 das economias emergentes, o Brasil é ator de primeira grandeza desse processo vital para maior equilíbrio no comércio entre países industrializados e nações em vias de desenvolvimento. Um acerto de posições entre a UE e o Brasil é certamente decisivo para a conclusão da Rodada de Doha. Além disso, o avanço significativo dessas negociações produzirá reflexos positivos no desenrolar das negociações entre a UE e o Mercosul visando à assinatura de um pioneiro e inovador Acordo de Associação entre os dois blocos. É nesse ambiente de convergência de interesses e posturas políticas que será realizada em Brasília a X Reunião da Comissão Mista que eu irei co-presidir. A agenda dos trabalhos é variada e densa, em perfeita sintonia com os elevados interesses que unem os dois parceiros. No campo das relações comerciais, haverá oportuna troca de opiniões sobre o comércio bilateral e acerca das negociações na OMC e no plano bilateral com o Mercosul. Serão ainda tratadas questões referentes ao agronegócio e aos diálogos setoriais bilaterais nas mais diversas áreas. Por tudo isso, tenho grandes expectativas quanto aos resultados da reunião. Ela ocorre num momento em que a UE desempenha função cada vez mais relevante na arena internacional. Essa função fornece à UE plataforma firme para o desenvolvimento de relações mais estreitas com seus parceiros no mundo, especialmente com o Brasil. Independentemente dos desafios internos com que se defronta, a UE continuará voltada para o mundo, para seus interesses e seus parceiros. Estabelecer sólidos vínculos de cooperação e amizade com o Mercosul e em particular com o Brasil é parte importante da projeção internacional da União Européia. Jornal CORREIO BRAZILIENSE – 20/03/2007 75 BRASIL-MÉXICO Energia vai puxar aproximação Acordos sobre petróleo e biocombustíveis serão carro-chefe das relações bilaterais, impulsionadas pela visita da chanceler Patricia Espinosa a Brasília. Lula é esperado em agosto pelo colega Felipe Calderón Silvio Queiroz Da equipe do Correio O México aguarda o presidente Luiz Inácio Lula da Silva no segundo semestre, possivelmente em agosto, para assinar os primeiros acordos de cooperação que começaram a ser discutidos pela Comissão Binacional instalada ontem em Brasília, como marco da visita da chanceler Patricia Espinosa. Ela e o colega brasileiro, Celso Amorim, classificaram o mecanismo como “único e especial”, destinado a elevar as relações bilaterais “à dimensão que devem ter entre dois grandes países, as duas maiores economias da América Latina”. Como ocorreu neste mês com Estados Unidos e Itália, também com o México a locomotiva da cooperação deverá ser o setor energético, com destaque para os biocombustíveis. No almoço e na entrevista conjunta que deram em seguida, os dois chanceleres elogiaram o modelo da nova comissão, que prevê reuniões periódicas entre ministros das áreas envolvidas nos acordos. “É comum que tenhamos um grande número de ministros quando presidentes viajam, mas aqui eles já se reuniram e começaram a trabalhar”, disse Amorim na coletiva. Acompanharam a chanceler em Brasília os ministros da Economia, Eduardo Sojo, e de Energia, Georgina Kessel. Ela deve se reunir hoje, no Rio de Janeiro, com o presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, para discutir a parceria com a estatal mexicana Pemex na prospecção e exploração de petróleo em águas profundas. Pelo lado brasileiro, estavam com Amorim os ministros da Fazenda, Guido Mantega, das Minas e Energia, Silas Rondeau, e do Desenvolvimento e Comércio Exterior, Luiz Fernando Furlan. A próxima reunião da comissão binacional está prevista para 2009, no México, mas o chanceler brasileiro não descartou a possibilidade de que, durante a visita de Lula, os dois presidentes decidam antecipar o encontro. Vistos Antes da viagem do presidente brasileiro ao México, a agenda de contatos prevê para julho a visita de uma missão comercial mexicana. Em maio, será realizada a segunda reunião para tratar da exigência de visto feita aos turistas brasileiros — para coibir o trânsito por território mexicano de candidatos a migrar ilegalmente para os Estados Unidos. Na entrevista, a chanceler mexicana afirmou que até aqui o problema recebeu “o tratamento adequado, que 76 permitiu identificarmos um número bem menor” de brasileiros em situação irregular. Falando reservadamente ao Correio, um alto funcionário mexicano que integrou a delegação confirmou o interesse em “chegar o quanto antes a uma solução que contemple os interesses dos dois lados”. A aproximação com o Brasil confirma uma inflexão “para o sul” na política externa mexicana desde a posse de Felipe Calderón, conservador como o antecessor imediato, Vicente Fox, porém menos afinado com os Estados Unidos. Calderón veio ao Brasil em outubro passado, ainda como presidente eleito. “Uma parte importante da estratégia do presidente é promover a integração com a América Latina, sem exceções”, frisou Patricia Espinosa. Ao receber a visita do presidente George W. Bush, há duas semanas, Calderón criticou a construção de um muro antiimigrantes do lado americano da fronteira, e colocou-se à parte das diferenças entre Bush e o presidente venezuelano, Hugo Chávez. Jornal CORREIO BRAZILIENSE – 29/03/2007 Brasil atrai parceiros Claudio Dantas Sequeira Da equipe do Correio O chanceler Celso Amorim acha que “o Brasil está na moda”. Pelo menos foi essa sua constatação feita ontem em audiência pública na Comissão de Relações Exteriores do Senado, onde falou sobre os lineamentos da política externa do governo Lula neste segundo mandato e o papel da diplomacia dentro do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Amorim comentou o recente interesse de nações desenvolvidas, como os Estados Unidos e a União Européia (UE), em firmar parcerias estratégicas com o país. “Acho que a questão energética tem grande papel nisso. Nosso avanço na área de biocombustíveis tem atraído a atenção desses mercados”, avaliou Amorim. No último mês, o Brasil recebeu a visita do presidente norteamericano, George W. Bush, e do alemão Horst Köhler. Na quartafeira passada, foi a vez do premiê italiano, Romano Prodi, vir a Brasília. No sábado, Bush é quem receberá o presidente Luiz Inácio Lula da Silva em sua residência de veraneio em Camp David (Maryland). O memorando sobre promoção do etanol está na mesa de discussões. Além disso, eles vão criar um conselho empresarial EUA-Brasil para explorar as possibilidades de investimento e comércio nos dois países. Segundo Amorim, a agenda do encontro será ampla. O ministro descartou qualquer relaxamento das tarifas de importação do açúcar e do etanol brasileiros por parte dos EUA. Lembrou o enterro da Área de Livre Comércio das Américas (Alca) e se disse otimista com a possibilidade de que a visita impulsione as 77 negociações da Rodada de Doha (da OMC), sobre um acordo global de liberalização de comércio. “Um bom resultado na Rodada de Doha ajudaria a potencializar nossas exportações para os EUA e o resto do mundo desenvolvido. Vamos continuar pressionando”, prometeu. Rio+20 Outro tema abordado por Amorim foi a iniciativa para que o governo organize em 2012 uma nova reunião nos moldes da Conferência das Nações Unidas sobre Ambiente e Desenvolvimento de junho de 1992, a Rio 92. A idéia de uma Rio+20 foi bem acolhida pela diplomacia. “Poucos países terão a credibilidade e a legitimidade do Brasil para atrair uma conferência como essa”, disse. Mas o diplomata demonstrou preocupação com a sugestão do senador Fernando Collor (PTB-AL) de se transformar o atual Programa Mundial para o Meio Ambiente numa agência internacional com sede no Brasil. Na audiência, a proposta foi defendida pelo senador Aloizio Mercadante (PT-SP), que propôs a taxação de 1% sobre as importações realizadas em todo o mundo. Em resposta, Amorim disse que o governo brasileiro pode aceitar a criação da agência, desde que ela cuide tanto do meio ambiente como do desenvolvimento. E que continue sediada em Nairóbi, capital do Quênia. O chanceler aproveitou a ocasião para pedir aos senadores que ajudem na rápida aprovação da medida provisória 354 sobre a destinação de R$ 20 milhões para o reassentamento de brasileiros que vivem na fronteira boliviana, e estão ameaçados de desapropriação pelo governo de Evo Morales. “É uma questão humanitária”, alertou. Jornal CORREIO BRAZILIENSE – 30/03/2007 Lula e Bush vão anunciar pacote para Haiti Maior parte dos US$ 9,2 mi que serão investidos vem do BID; meta é desenvolver indústrias de biodiesel na América Central. Grupo de trabalho bilateral se reuniu ontem para acertar detalhes da cooperação; foco da visita, porém, deve ser Doha. SÉRGIO DÁVILA DE WASHINGTON Os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e George W. Bush anunciarão um pacote de investimento financeiro de US$ 9,2 milhões para que países da América Central e do Caribe possam pesquisar e implantar ou desenvolver suas próprias indústrias de biocombustível. O principal destino do dinheiro será o Haiti, mas os nomes de ao menos outros três países da região devem ser anunciados no encontro que o brasileiro tem com o americano amanhã, no retiro presidencial de Camp David, no Estado de Maryland. O Brasil faz parte de uma Força de Estabilização de Paz naquele país. 78 Do total previsto para o pacote, US$ 7 milhões virão do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), US$ 1 milhão do Brasil, a mesma quantia dos EUA, e US$ 200 mil da ONU (Organização das Nações Unidas). O dinheiro será usado sobretudo em pesquisas. No caso do Haiti, a meta será a implantação de uma indústria de biodiesel. Segundo um funcionário do governo dos EUA, que não quer ser identificado pois o anúncio ainda não foi feito, os dois países e as entidades preparariam o terreno para que a iniciativa privada encontrasse condições de investir. A idéia é agir rapidamente. Para tanto, serão despachados grupos de estudo de viabilidade e avaliação técnica, e está previsto um intercâmbio de cientistas entre Brasil e EUA. O assunto foi tema do primeiro encontro do grupo de estudos de biocombustíveis criado pelo memorando bilateral assinado por Bush e Lula, em São Paulo. A reunião ocorreu ontem em Washington e teve a participação do embaixador Antonio Patriota, representantes do governo dos EUA, do Inmetro e da ABDI. Chave para Doha O detalhamento da agenda dos biocombustíveis será a face institucional do anúncio formal que os dois presidentes farão às 16h locais (17h de Brasília) de amanhã -até a conclusão desta edição, era estudada a possibilidade de levar a Camp David os embaixadores dos países da América Central e Caribe contemplados no pacote. Ainda assim, membros envolvidos na preparação da reunião disseram que "o verdadeiro foco" do encontro será a discussão sobre a Rodada Doha, de comércio exterior, e outros temas comerciais, ainda que nada seja anunciado. Na avaliação dos governos, Brasil e EUA podem ser a chave para destravar as negociações. Os presidentes e as equipes aproveitarão o segundo encontro dos líderes em três semanas para levar adiante um possível tratado de tributação bilateral, reivindicação antiga de empresários de ambas as nacionalidades. Um primeiro passo foi tomado nesta semana, com a assinatura de um tratado de troca de informações entre a Receita Federal e o fisco dos EUA. Aproveitarão também para tentar desbastar o que estão sendo chamadas de "complicações" na relação entre as economias, como incompatibilidades técnicas. Estão na pauta também uma maior colaboração dos dois países na África. Jornal FOLHA DE SÃO PAULO – 30/03/2007 O petróleo contra-ataca ELIANE CANTANHÊDE 79 BRASÍLIA - Depois de passar quatro anos exercitando a política externa da luta de classes (sul-sul versus a maior potência), Lula chegou ao segundo mandato de portas abertas para o Primeiro Mundo. Num único mês, março, recebeu em Brasília os primeirosministros da Alemanha e da Itália, teve um encontro com o presidente dos EUA e terá outro amanhã. Para início de conversa, Lula fala sobre o mundo do futuro e desfila as maravilhas dos biocombustíveis e do álcool brasileiro, novo fator de fortalecimento das relações com os EUA e pretexto para programas comuns na África, na América Central e no Caribe em primeiro lugar. Fidel e Chávez não demoraram a passar recibo ao classificar o etanol como um exterminador do futuro, que vai arrasar a agricultura dos países pobres em favor da cana e do milho e matar de fome milhões de pessoas mundo afora. O temor faz sentido. Não exatamente o temor da fome, mas o do etanol, pois a Venezuela come e vive do petróleo, e Cuba come na mão da Venezuela e sobrevive à custa dos petrodólares de Chávez. Imagine-se o que ambos andam falando de Lula. No mínimo devem dizer que quem é cooptado por "el diablo" acaba no inferno com ele. Mas o nosso Lulinha da cocada preta sabe como ninguém driblar ciúmes, críticas, adversários. Ao sair da intimidade de Camp David, ele já estará arrumando as malas e o discurso para receber Rafael Correa (Equador) e visitar a Venezuela e a Argentina -antes que Kirchner engrosse o coro dos aliados Chávez e Fidel contra o etanol e todos passem a criticar abertamente Lula e o Brasil. Lula tem que correr. Em tempo: nada como fundo americano, que compra empresa falida de ""país em desenvolvimento", se livra do passivo e leva mais de US$ 100 milhões em meses. Negócio da China. Quer dizer, do Brasil. Jornal FOLHA DE SÃO PAULO – 30/03/2007 A parceria para o presente e o futuro Clifford M. Sobel * Algumas semanas atrás acompanhei o presidente George Bush a São Paulo para um dia intenso de reuniões e encontros que terão um impacto significativo para o futuro das relações EUA-Brasil. Posso dizer que, ao final daquele dia, o presidente e a sra. Bush ficaram plenamente satisfeitos com a visita. Eles gostaram particularmente de se encontrar com muitos paulistanos, em especial na Associação Meninos do Morumbi, onde conversaram (e dançaram) com muitos jovens promissores que representam o futuro brilhante do Brasil. Em nome do presidente e da sra. Bush, quero agradecer a todos os paulistanos pela hospitalidade e por terem suportado as 80 inconveniências causadas pela visita presidencial. O presidente Bush foi calorosamente recebido pelo presidente Lula e, no decorrer de um encontro bilateral prolongado, eles se concentraram em discutir maneiras como os dois países poderiam cooperar, não somente na questão dos biocombustíveis, mas também nas áreas de saúde, educação e no apoio às instituições democráticas na América Latina e no resto do mundo. Houve muita convergência de opinião e uma troca positiva de idéias e do compromisso compartilhado de aprofundar ainda mais os nossos vínculos, que certamente terá continuidade durante a visita do presidente Lula a Camp David no dia 31 de março. Essa será a primeira visita dessa natureza de um líder latino-americano durante a Presidência de Bush. Muito foi realizado durante a visita do presidente Bush. Primeiro, o Memorando de Entendimento sobre biocombustíveis, assinado pela secretária Rice e o ministro Amorim, abre caminho para um aumento sem precedentes da cooperação bilateral em um campo que não trará benefícios apenas para os nossos dois países, mas também tem o potencial de transformar as economias dos países menores do hemisfério e ajudá-los a sair da pobreza. Com incentivo ao desenvolvimento de combustíveis limpos, podemos gerar empregos e renda, ajudar a proteger o meio ambiente e estimular o investimento no setor privado. A produção maior de etanol permitirá que os países da América Latina, do Caribe e da África com pouca disponibilidade financeira reduzam sua dependência do dispendioso petróleo importado - liberando assim recursos para o aumento do desenvolvimento social. Brasil e Estados Unidos, como parceiros, estarão democratizando esse novo recurso energético transformador. A visita do presidente Bush à América Latina enfatizou o compromisso dos EUA de promover maior desenvolvimento econômico e justiça social e garantir que os nossos povos colham os benefícios da democracia. A visita ao Brasil certamente deu o tom. Em suas conversas, os dois presidentes ressaltaram o fato de que, na década de 1970, alguns países na América Latina trocaram a ditadura militar pelo regime democrático. Atualmente, esses mesmos países têm-se expressado por meio do poder do voto democrático e é mais importante do que nunca não perder a fé de nosso povo e de nossos vizinhos. Resolver o impasse da Rodada Doha trará muitos benefícios para americanos e brasileiros e os presidentes conversaram bastante sobre isso. Esse assunto é tão importante que nossa representante de Comércio, embaixadora Susan Schwab, permaneceu no País por mais um dia para dar continuidade ao seu diálogo com o ministro Amorim e os líderes empresariais locais. A resolução e o avanço do comércio global é uma questão importante para ambos os presidentes, e eles buscam ativamente formas de encontrar uma solução. No momento, estamos vivendo um período intenso neste ano de 81 engajamento e diálogo, cuja soma produzirá resultados tangíveis. Pouco antes do acordo histórico sobre biocombustíveis, assinei um novo acordo sobre ciência e tecnologia para ampliar a cooperação bilateral em saúde, ciência e meio ambiente. Logo após a cúpula de 9 de março, assinei um Acordo para o Intercâmbio de Informações Relativas a Tributo com o diretor da Polícia Federal, Jorge Rachid, que visa promover a aplicação eficaz da lei, tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos. Estamos na expectativa de negociar outros acordos que poderão aumentar nosso comércio bilateral. Na última sexta-feira, o Brasil e os Estados Unidos anunciaram a criação de um Fórum de CEOs EUA-Brasil. Esse novo fórum bilateral será convocado pelo Planalto e pela Casa Branca, e será co-presidido pelo ministro de Comércio e Desenvolvimento e pelo secretário de Comércio. O objetivo do fórum é expandir nosso relacionamento de comércio e investimento com o Brasil. Nosso relacionamento estratégico é de muitas formas liderado por nossos dois presidentes. O presidente Bush e o presidente Lula têm uma relação excelente, fundamentada pelo respeito mútuo e amizade sincera. Esse relacionamento ditará o tom para os próximos anos em nosso crescimento como verdadeiros parceiros. * Clifford M. Sobel é embaixador dos Estados Unidos no Brasil Jornal O ESTADO DE SÃO PAULO – 30/03/2007 DESENVOLVIMENTO Brasil, ainda um país de futuro Relatório da consultoria Eurasia Group, com sede em Nova York, mostra que estabilidade econômica e política faz do mercado brasileiro o de melhor perspectiva de crescimento no grupo BRICs, que engloba Rússia, Índia e China Vicente Nunes Enviado especial Xangai — Desde outubro de 2003, quando o banco americano Goldman Sachs criou o termo BRICs, grupo que reúne Brasil, Rússia, Índia e China, apontados como as futuras potências econômicas do mundo nos próximos 40 anos, consolidou-se a visão de que, dessas economias, a de menor perspectiva de crescimento era a brasileira. Pois um relatório divulgado há poucos dias pela Eurasia Group, com sede em Nova York, joga por terra essa teoria e garante: dos quatro países, é justamente o Brasil que agrega, hoje, o melhor conjunto de fatores para avançar no cenário internacional. No documento de cinco páginas, a Eurasia justifica sua posição. “Com estabilidade econômica consolidada e estabilidade política, o Brasil se diferencia dos demais países e passa a exigir uma atenção especial dos investidores”. Para os analistas da consultoria, ao optar pela disciplina fiscal, por políticas macroeconômicas favoráveis ao livre mercado e por ter solidificado o sistema democrático, o país 82 criou os alicerces necessários para crescer por anos seguidos sem atropelos. A Eurasia alega ainda que o pragmatismo do presidente Lula, visto como uma grande ameaça pelo capital antes de sua eleição em 2002, é hoje uma garantia de segurança. “Felizmente, Lula não seguiu o caminho traçado por Hugo Chávez, presidente da Venezuela. Ao mesmo tempo em que executa políticas voltadas para a população mais pobre, mantém uma política econômica responsável”, sintetiza a consultoria. A Eurasia reconhece que, para muitos, o Brasil pode parecer, neste momento, uma aposta estranha, por ter registrado, nos últimos anos, taxas de crescimento econômico bem abaixo da média dos demais BRICs, ter uma carga tributária elevadíssima, próxima de 40% do Produto Interno Bruto (PIB), e por conduzir, de forma muito lenta, o processo de reformas constitucionais tão ansiado pelos investidores. “Mas as transformações realizadas nos últimos anos no Brasil, com as contas externas ajustadas, saldo comercial acima de US$ 40 bilhões por ano, expansão do crédito, inflação sob controle e risco de calote próximo de zero, pavimentaram um futuro promissor,” frisa a Eurasia. É essa visão que pode explicar parte da enxurrada de dólares que tem migrado atualmente para o país. A previsão é de que os investimentos estrangeiros diretos, voltados para o aumento da produção e para a geração de emprego, alcancem, neste ano, US$ 25 bilhões, o maior volume desde 2000, quando se encerrou o período áureo das privatizações. Anders Pettersson, presidente da Magnum Opus Consultoria, considera essa visão tão positiva do Brasil um exagero. “Mas tenho de reconhecer que a economia brasileira conjuga, sim, fundamentos muito melhores do que tinha em um passado recente”, ressalta. “O governo, porém, precisa encampar rapidamente as reformas constitucionais, para que o país se torne mais competitivo na nova ordem mundial”, diz Pettersson. Educação e Previdência Assim como o Brasil, destaca a consultoria, a democracia também dá vantagens competitivas à Índia. O problema, frisam os analistas da Eurasia, é que, a despeito dos avanços registrados pelo país nos últimos anos, seus fundamentos econômicos ainda são frágeis. Na avaliação dos especialistas, o governo indiano necessita empreender uma ampla reforma do sistema educacional, para melhorar o nível dos trabalhadores que, futuramente, entrarão no mercado de trabalho. A despeito de a Índia ser apontada como um centro de talentos na área de Tecnologia da Informação (TI), somente 25% das universidades locais têm condições de formar trabalhadores capacitados para exercer funções no setor de serviços, que têm sustentado o crescimento daquele país. “A falta de coordenação 83 política para as reformas e a deficiência na infra-estrutura sugerem que o atual crescimento econômico da Índia — em torno de 8% ao ano — pode não se sustentar no futuro”, alerta e Eurasia. No caso da China, mesmo com o desempenho espetacular de sua economia nos últimos anos, com crescimento médio anual de 10%, os desafios a serem enfrentados são maiores do que os colocados para Brasil e Índia, destacam os analistas da consultoria. A China é extremamente dependente de matérias-primas e alimentos, o que exigirá contratos seguros de fornecimento de longo prazo. Essas matérias-primas estão, principalmente, na América Latina e na África, regiões com riscos que o Partido Comunista Chinês (PCC) não está suficientemente preparado para lidar. O maior desafio chinês, contudo, será a abertura de suas fronteiras para idéias, informação, fluxo de dinheiro e de serviços na velocidade que a globalização exige. O Estado ainda é o grande senhor da economia. A Eurasia ressalta que o atual processo de crescimento da China já escancarou seu lado negativo: destruição acelerada do meio ambiente, concentração de riqueza e forte migração do campo para áreas urbanas despreparadas para absorver tamanho fluxo de pessoas. A China terá de encarar ainda uma população idosa crescente e carente de um sistema previdenciário consistente. Somente para mudar o atual sistema para uma estrutura mais eficiente, incorporando a população rural, o governo chinês terá de gastar pelo menos US$ 100 bilhões segundo os cálculos do Fundo Monetário Internacional. Até 2020, a China terá 265 milhões de pessoas com mais de 65 anos. Para a Eurasia Group, entre os BRICs, a Rússia merece uma análise a parte. A economia russa está muito concentrada na produção de energia, particularmente petróleo. O problema é que, mesmo respondendo por 20% do PIB da Rússia, o setor emprega apenas 1% da mão-de-obra do país. A falta de dinamismo da economia russa é tamanha que as pequenas e médias empresas, tradicionais empregadoras, representam apenas 13% do PIB. A situação se agrava porque os investidores que poderiam bancar a diversificação e a expansão da economia se sentem desconfortáveis com a insegurança política do país. Segundo a consultoria, quando assumiu o poder pela primeira vez, em 2000, o presidente Vladimir Putin assegurou que sua administração seria marcada pela consolidação do sistema democrático, pela transparência, por leis consistentes e pela abertura de mercados. Sete anos depois, praticamente nada avançou. Houve, inclusive, retrocessos sérios nos direitos democráticos. Quando criou o termo BRICS, o Goldman Sachs ressaltou que, para que o crescimento de longo prazo se consolidasse e os quatro países fossem alçados a categoria de potências, seria preciso manter políticas e instituições sólidas. A Rússia ainda está longe de se adequar a esse figurino. 84 O repórter viajou a convite do IEL Jornal CORREIO BRAZILIENSE - 09/04/2007 Biocombustíveis unem Brasil, Índia e África do Sul Países assinam acordo para pesquisar o nanotecnologia em novos combustíveis Jamil Chade uso da Brasil, Índia e África do Sul querem aplicar os avanços da nanotecnologia ao desenvolvimento de biocombustíveis. Neste fim de semana, os três assinaram acordo para iniciar pesquisas sobre o uso da tecnologia no etanol e em outros combustíveis. O acordo, assinado na Índia, prevê que cada um dos três países destinará US$ 1 milhão às pesquisas em um primeiro momento. Mas os recursos podem ser ampliados caso as pesquisas mostrem resultados. Só a Índia, por exemplo, destina quase US$ 4 bilhões por ano para pesquisas no uso da nanotecnologia em vários segmentos. No caso brasileiro, a esperança é que a nova tecnologia consiga decifrar formas para tornar alguns produtos agrícolas mais competitivos para a geração de energia. O açúcar já é considerado como um dos produtos mais competitivos para ser transformado em etanol. Mas com o governo americano gastando mais de US$ 200 milhões ao ano para encontrar formas mais eficientes de produzir esse combustíveis, o governo brasileiro sabe que não pode depender só da cana. Jornal O ESTADO DE SÃO PAULO - 09/04/2007