a construção do são joão de paz e amor em areia branca/se
Transcrição
a construção do são joão de paz e amor em areia branca/se
III Seminário de Estudos Culturais, Identidades e Relações Interétnicas GT 4 - Espaços religiosos, formas de expressão, festa e poder. A CONSTRUÇÃO DO SÃO JOÃO DE PAZ E AMOR EM AREIA BRANCA/SE: FESTA E IDENTIDADE. Liana Matos Araújo 2 A CONSTRUÇÃO DO SÃO JOÃO DE PAZ E AMOR EM AREIA BRANCA/SE: FESTA E IDENTIDADE. Liana Matos Araújo Universidade Federal de Sergipe [email protected] INTRODUÇÃO As festas juninas são manifestações culturais do Nordeste. Destinam-se a homenagear alguns santos católicos: Santo Antônio, dia 13 de junho, São João, dia 24, e São Pedro, dia 29 do mesmo mês. Dentro da diversidade de festas existentes no Brasil, a que será especialmente analisada, o São João de Paz e Amor, apresenta peculiaridades tanto por sua estrutura e forma de participação, quanto pela ideia de tranquilidade, aspectos fundamentais na construção da sua identidade. Segundo a crença católica, Filho de Zacarias e Isabel, prima de Maria, a mãe de Jesus, João Batista é o santo que introduziu a prática do batismo e preparou a chegada do Messias. As comemorações em sua homenagem datam de muito tempo, sem se conhecer um marco inicial. No ciclo de celebrações juninas, acordar São João é um aspecto importante na história dos festejos da cidade de Areia Branca (SE), visto que ele é seu patrono. A cidade tem 50 anos de emancipação e está localizada a aproximadamente 36 km do centro da capital, Aracaju, na região do vale do cotinguiba do Estado, e sua população é, aproximadamente, de 16.072 habitantes (censo de 2010 IBGE). O objeto do presente estudo é a festa junina que aí acontece. Mesmo sendo um município pequeno, tanto em extensão territorial quanto em atividades comerciais e econômicas, realiza uma festa de grande dimensão voltada para o turismo regional. Uma das festas mais ricas em usos e significados do Nordeste: o São João. “Vivida como tradição, o São João é uma festa popular que revela, ano a ano, a dinâmica da vida política, econômica e social da cidade” (CHIANCA, 2006, p.27). O objetivo deste artigo é analisar a construção do São João denominado como Paz e Amor a partir da apresentação dos diferentes modelos festivos implementados em diferentes contextos e apresentar o surgimento da caracterização da ideia de Paz e 3 Amor, na década de 90 e seu deslocamento, nos termos de Stuart Hall, nos primeiros anos do século XXI. Para tal fim foi necessário recorrer ao discurso oficial, ou seja, ao relato sobre a festa feito pela mídia impressa. Na cidade não há arquivo sobre a história da festa. Existem somente alguns trabalhos na Biblioteca Pública Josefina Simões de Araújo como, por exemplo, a monografia “O São João em Areia Branca e sua passagem de cultura popular para indústria cultural”, de autoria da pedagoga Anaelma Alves Ribeiro, apresentada à Faculdade Pio Décimo em 2002. E a monografia da jornalista Alessandra Barros, intitulada “Areia Branca na tela: o resgate do São João de Paz e Amor”, apresentada à Universidade Tiradentes em 2005. A solução encontrada foi pesquisar na cidade de Aracaju em um lugar de produção de significado – nos arquivos públicos: Arquivo Público Estadual, sem encontrar qualquer documento que citasse a cidade de Areia Branca; Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe, com poucas informações recolhidas; Arquivo Público da cidade de Aracaju, onde a quantidade de material jornalístico se fez mais presente e possibilitou obter uma noção de como o São João de Areia Branca circulava na mídia. Os jornais pesquisados foram o Jornal de Sergipe, a Gazeta de Sergipe e um pacotilho com alguns jornais diversificados. No Apêndice 1, estão relacionados os dados da pesquisa em jornais. Esses artigos jornalísticos, entretanto, foram insuficientes. Muitos dados não foram encontrados, e, com nova estratégia, voltou-se a campo para realização de novas entrevistas. Dessa vez foram selecionadas pessoas que vivenciaram a festa e que poderiam auxiliar na composição dos modelos festivos por quais o São João de Areia Branca passou. No Apêndice 2, estão incluídos os nomes dos informantes com as datas de entrevista. É importante ressaltar que nenhuma identidade pode existir fora de um contexto, pois a análise do contexto social é fundamental. 1. O SÃO JOÃO EM AREIA BRANCA/SE As celebrações em honra a São João geralmente aconteciam na véspera do seu dia, 23 de junho, com preparação de fogueiras, mastros e fogos, com o propósito de acordá-lo e avisá-lo de que seu dia estava chegando1. Entretanto, de acordo com a 1 Num passado recente, os preparativos e as celebrações características do ciclo junino concentravam-se na véspera. Sobre a importância da véspera nesse ciclo, ver MORAES FILHO, 1999. 4 tradição católica, o santo dorme profundamente durante o dia que lhe é consagrado, e assim deve ser, caso contrário, atraído pelo clarão da fogueira e dos fogos, desceria do céu e o mundo acabaria pelo fogo (CASCUDO, s/d, p.477). Uma vez que o santo deve permanecer dormindo, o objetivo do ritual é, então, acordar os devotos para a festa (AMORIM, 2002, p.126). De acordo com os relatos dos moradores, em Areia Branca, as celebrações iniciavam-se no dia 31 de maio à meia-noite em meados dos anos de 1950 a 1980. O santo era saudado por meio de cantoria e louvor, que anunciavam a chegada de seu mês. Nessa noite realizava-se o ritual festivo denominado Batalhão 1º de São João. Predominava o caráter religioso, com novenas e procissões durante o mês. A festa congregava a comunidade desde seus preparativos até sua efetivação no denominado Batalhão 1º de São João. Fig. 1: Batalhão 1º de São João Foto: Acervo de Zé Dil, década de 50. Nesse contexto, a festa de São João, enquanto festa do interior, conseguia congregar a população local em torno de um símbolo religioso. No caso de Areia Branca, acreditava-se que o ritual de acordar São João anualmente, na passagem do dia 31 de maio para o dia 1o de junho, garantia a proteção do padroeiro durante todo o ano. A população acreditava na eficácia do rito. Mais tarde, já no final dos anos 80 e início dos anos 90, a participação da comunidade no Batalhão começa a decrescer. De acordo com Ascendino Sousa Filho, em 1982, o então prefeito José do Prado Franco Sobrinho, Zé Franco, que fica no poder até 1986, implementa um novo modelo festivo de caráter mais urbano, comercial e massivo, o “São João de Paz e Amor”2 que passou a ser realizado entre os dias 23 e 29 de junho, ainda sem grandes repercussões, concentrada num único espaço. Para esse empreendimento, ele contou com o auxílio do próprio Ascendino Sousa Filho, que se 2 A identidade Paz e Amor será discutida no próximo item do presente artigo. 5 tornou, posteriormente, prefeito local, por meio da promoção da festa. Essa gestão representou o processo de urbanização dos festejos juninos na cidade de Areia Branca. Em 1990, foi criada a abertura dos festejos juninos no dia 31 de maio, exatamente no mesmo dia em que acontecia num passado recente, o cortejo do Batalhão 1º de São João. Tem início um complexo jogo de permanências e mudanças capitaneado pela prefeitura da cidade em parceria com o governo do Estado. A implantação do novo modelo festivo não foi ignorada pela população da cidade: os antigos participantes do Batalhão 1º de São João questionavam as novas iniciativas e os jovens que se deparavam com tamanha proporção do evento e não ficavam alheios a essa manifestação. A administração pública passa a ver Areia Branca e sua celebração ao padroeiro como uma fonte de lucro com um aproveitamento político, econômico e turístico desses festejos. Esse aproveitamento turístico está presente em outros estados nordestinos que tem a festa junina como foco no calendário local. Seguem-se os anos e a festa cresce. Ela ganha tamanha dimensão que desperta a atenção de pesquisadores de outros estados nordestinos como, por exemplo, Elizabeth Lima que cita a cidade de Areia Branca em seu livro A Fábrica de Sonhos. Aponta a concorrência entre as cidades e a necessidade, que os administradores dos festejos tiveram, de reinventar os festejos da cidade de Campina Grande em função do crescimento de outras cidades nordestinas: Cada cidade busca chamar a atenção do turista para o seu arraial e ganha na audiência a cidade que melhor oferecer entretenimento com atrações que despertam as fantasias da festa. Neste sentido, a competição entre as cidades como Campina Grande, Caruaru, Estância, Areia Branca e São Luís, só para citar algumas de maior destaque na construção do evento junino, é uma constante. (LIMA, 2002, p.25). Assim, a festa se moderniza e movimenta a economia local. Uma urbanização festiva em que há valorização não somente dos símbolos característicos desta época do ano como a fogueira, as comidas típicas, mas também de todo o aparato tecnológico utilizado para que o evento se realize. Ou seja, uma mercantilização dos festejos juninos começa se firmar em Areia Branca à medida que eles passam a combinar elementos tradicionais junto a modernidade exigida pela indústria cultural como escreve Trigueiro (s/d; p. 10): Vivemos num mundo de coexistência entre as culturas tradicionais e modernas. A modernização não vem para acabar com o folclore e a cultura popular por ser até mesmo uma de suas estratégias. A incorporação de bens 6 simbólicos modernos nas festas tradicionais não elimina a cultura folk mas, a transforma e insere no mercado de consumo de massa e do turismo. A organização da festa-espetáculo neste município envolveu a participação de diversos setores: pequenos e médios comerciantes de bebidas e comidas, artistas, cantores, trios pé-de-serra, profissionais da saúde, policiais civis e militares, governos municipal e estadual, para citar alguns. De modo geral, todos “os participantes são distribuídos dentro de uma determinada estrutura de produção e de consumo da festa, na qual ocupam lugares distintos e específicos” (GUARINELLO, 2001, p. 971). O que se tem, na realidade, é uma festa inventada, nos termos de Hobsbawm. Trabalha-se com a hipótese de que a construção do novo modelo festivo que ficou conhecido, na cidade e fora dela, como “São João de Paz e Amor”, preservou alguns elementos do Batalhão 1º de São João e assumiu características de uma tradição inventada. Por “tradição inventada” entende-se um conjunto de práticas, normalmente reguladas por regras tácita ou abertamente aceitas; tais práticas, de natureza ritual ou simbólica, visam inculcar certos valores e normas de comportamento através da repetição, o que implica, automaticamente, uma continuidade em relação ao passado. Aliás, sempre que possível, tenta-se estabelecer continuidade com um passado histórico apropriado. (HOBBSBAWN, 2008, p.9) Uma tradição que estabeleceu uma linha de continuidade com os elementos da tradição local, tal como a abertura dos festejos no dia 31 de maio com o Batalhão. Desta forma, a festa passa a ser realizada nessa e em outras datas do mês de junho, englobando em sua programação vários shows musicais. A ênfase no caráter espetacular dos festejos levou os novos organizadores a modernizá-los. Com o crescimento desse novo modelo, a festa passa a ser um produto lucrativo no meio social e um dos eventos turísticos mais importantes da cidade. Ela se transforma num produto que pode ser comercializado, vendido. Dessa forma, a festa junina torna-se objeto de consumo, mercadoria como qualquer outro objeto existente no mundo das trocas. Como objeto simbólico de consumo, é embalada, espetacularizada e comercializada. Como partes desse processo de empacotamento de mercadoria, vinculam-se e veiculam-se, no imaginário social, as significações e as construções identitárias através do conteúdo ideológico, pilar do processo hegemônico de grupos sociais que exercem a dominação local, gerando um sentimento de pertença aos participantes da festa, fazendo-os crer e sentir-se pertencidos imaginariamente a ela e ao seu lugar (MORIGI, 2007, p.41). 7 Areia Branca se tornou destaque no calendário dos festejos juninos do Estado e nacional nos anos 90. Nesse período a festa passa por várias etapas. Estas serão apresentadas no item seguinte a partir do discurso oficial, os jornais, junto às entrevistas com os moradores da cidade na fomentação de uma análise sociohistórica dos festejos e da construção de sua identidade Paz e Amor. No final da década de 90 e nos primeiros anos do século XXI, a capital do Estado e outras cidades do interior passaram a investir com mais afinco na produção dos festejos juninos, adotando o mesmo modelo comercial e midiático que se tornou hegemônico em todo o Nordeste, disputando demandas turísticas internas e externas. Assim, o São João de Paz e Amor começa a não ser mais destaque no cenário regional. É notório que vários fatores contribuíram para o esvaziamento do São João de Paz e Amor, desde a organização do evento, que vai perdendo seus símbolos e significados, até o surgimento de novos focos na produção de uma festa junina. Nas eleições do ano de 1999, Ascendino Sousa disputa a prefeitura com José Nivaldo, conhecido por Zé da Serraria. José Nivaldo assume a prefeitura e modifica a estrutura física da festa. Alguns elementos representativos, como o arraial dentro do espaço festivo, foram substituídos por stands. A decoração da cidade é reduzida e a programação inclui cantores que não têm como estilo musical o forró, o xote e o baião, a exemplo de Zeca Baleiro, da música popular brasileira, e Zezé di Camargo e Luciano, da música sertaneja. Com o propósito de revitalização os governos municipal e estadual buscam alternativas de organização do calendário junino. No ano de 2007 o discurso oficial presente em mídias impressas se concentra no slogan “Tô de volta” para enfatizar que o São João de Paz e Amor está mais uma vez em seu ápice e capitaneado por Ascendino Souza depois de quatro anos fora da administração. Diversos jornais notificaram tal propósito logo na semana seguinte à abertura dos festejos juninos. O Jornal Cinform traz uma página inteira com o slogan da festa e sua programação. Já no Jornal do Dia (02/07/2007), o discurso ocupa a primeira página, em destaque. Nas chamadas das notícias, o título “Paz e Amor” está estampado no centro do periódico. No ano de 2009 assume a prefeitura o senhor Agripino Andrelino Santos e a festa toma novos rumos. O São João intitulado Paz e Amor ganha outra designação: “São João de Pé no Chão”. Esse processo de continuidade e descontinuidade da caracterização dos festejos será discutido no item que se segue com o propósito de 8 entender como o cidadão areibranquense se posiciona em meio a essas mudanças tanto políticas quanto culturais. 2. A IDENTIDADE PAZ E AMOR EM QUESTÃO A festa junina é um evento que engrandece a cultura tanto local quanto nacional em que as pessoas estabelecem redes de sociabilidades, se divertem e dançam o forró. Os festejos juninos foram implementados pela prefeitura de Areia Branca em parceria com o Governo do Estado nos anos 80 e 90 do século XX. À medida que isso ocorre foram criados símbolos de referência a tal denominação. Desta forma, busco analisar o São João de Paz e Amor da cidade de Areia Branca como um arcabouço simbólico de identidade, ao notificar as mudanças ocorridas no seu processo de urbanização, num empreendimento normativo bem como o seu processo de construção da identidade festiva a partir de dois valores: “Paz e Amor”. Esses valores foram amplamente utilizados como sinais diacríticos da festa pelos seus promotores para assinalar a tranquilidade e as redes de sociabilidades produzidas pela mesma, associando assim ao ambiente festivo de ideias-valores tais como paz, alegria e família, como conceitos simbólicos de distinção com relação a outros formatos. 2.1 A festa na praça 2.1.1 De 1983 a 1989: período de experiência Na década de oitenta, a festa começa a obter visibilidade ao ser divulgada na imprensa aracajuana, em jornais de grande circulação, a exemplo do Jornal de Sergipe, que destacou a sua programação como uma das melhores do Estado no ano de 1987. As informações necessárias à construção deste item têm como base uma pesquisa em jornais no Arquivo Público da Cidade de Aracaju, abrangendo o período que vai de 1983 a 1989. Tomando como base as ideias de Benedict Anderson em Comunidades Imaginadas, quanto ao papel da imprensa não só de noticiar, mas criar necessidades e legitimá-las. Se você quiser prestigiar os festejos juninos de Areia Branca, não vai se arrepender, a cidade é perto e lá a forrozada vai ser das melhores do Estado. A programação tem início dia 23 com apresentação de quadrilhas, concurso de forró, concurso de milho e apresentações de quadrilhas mirins e adultas (Jornal de Sergipe, 21 e 22/06/87). 9 Vários jornais passam a promover a cidade como um dos principais locais de celebração junina do Estado, enfatizando seus principais sinais diacríticos, como tranquilidade, segurança, alegria e ausência de fogos. Assim Areia Branca passou a ser vendida nos jornais, nos comerciais, nos panfletos e em diversos meios de comunicação. A festa, que acontecia na rua, é transferida para a praça do mercado no ano de 1990, quando se cria a abertura dos festejos juninos com shows musicais, além do Batalhão, no dia 31 de maio. A praça do mercado se transformava e era ornamentada com bandeirolas, balões, fogueiras artificiais. Havia toda uma estrutura, mesmo que pequena nos anos iniciais da festa, para atender às necessidades do público como, por exemplo, banheiros e estacionamento. E, dentro desse espaço, montava-se um arraial. O espaço foi um dos elementos mais significativos na estruturação do ciclo festivo de Areia Branca. Como afirma Cleodes Ribeiro (2002, p.43), as características e a tipologia do espaço festivo determinam, em algum grau, as diferenças formais das festas que ocorrem nos limites desse marco físico. 2.1.2 De 1990 a 1991: período de divulgação Em 1989, Ascendino Sousa assume a organização dos festejos, agora na condição de prefeito da cidade. Uma das suas primeiras medidas foi contratar o jornalista Beneti Nascimento, ex-diretor da Emsetur (Empresa Sergipana de Turismo) e ex-funcionário da TV Sergipe. Havia uma preocupação em suprimir o amadorismo em prol de uma ação mais planejada e mais técnica. Como relata um dos principais idealizadores dos festejos, Ascendino de Sousa Filho3: Quando assumi a prefeitura em 1989, resolvi profissionalizar o evento, contratamos uma pessoa de marketing, o Beneti Nascimento, exfuncionário da TV Sergipe, e Beneti vamos ver se a gente consegue transformar isso aqui num evento de turismo. Com esse objetivo, foi elaborado um projeto para atrair a iniciativa privada e promover o São João daquele ano, que teve como slogan “O Mais Gostoso São João do Brasil”. O ano de 1990 é o momento inicial de maior propaganda dos festejos juninos na cidade. Nesse ano, Estados vizinhos tomam conhecimento da festa e a cidade se torna pequena diante da proporção que o evento alcança. O fato se torna verídico nas palavras de Beneti Nascimento, no livro São João é coisa nossa: 3 Entrevista realizada em 12 de agosto de 2009. 10 O prefeito Souza percebeu ainda que o São João de Areia Branca é um grande negócio turístico: desde agosto de 1990 ele vem divulgando a festa da cidade em promoções que envolvem agentes de viagens e operadoras turísticas das principais capitais brasileiras. A idéia é atrair – para o próximo ano – os turistas do sul, sudeste e centro-oeste do País, quase sempre sem opções de viagens no meio do ano. A EMBRATUR, por exemplo considerou a iniciativa da Prefeitura como um exemplo que deve ser seguido por outras cidades do interior que possuem festividades populares e que podem se transformar em pólos atrativos. O atual presidente Ronaldo do Monte Rosa disse que a empresa vai apoiar promoções como as de Areia Branca (NASCIMENTO, 1990, p.238). Mesmo com o crescimento da festa, a cidade não avançava com o mesmo progresso no que se refere à estrutura física. Uma contradição notável, pois uma cidade pequena produz um espetáculo midiático de tamanha proporção e, no entanto, não possui infraestrutura para receber o turista. A saída encontrada foi o aluguel de casas dos moradores ou hospedagem em hotéis de Aracaju. Areia Branca não dispõe de hotéis, mas quem já conhece o São João daquela cidade não se importa com isso porque a festa não para e nem oferece tempo para ninguém descansar, o forró ali rola 24 horas por dia para garantir a condição que Areia Branca já ostenta de promover um dos melhores festejos juninos de todo o Estado de Sergipe (Jornal de Sergipe, 20/06/90). Areia Branca começa a ser considerada como a cidade que promove um dos melhores festejos juninos do Estado. A hospitalidade da população, a segurança e ausência de fogos passaram a ser evidenciados como os principais atrativos e fatores de reconhecimento. A segurança englobava as ruas da cidade, as estradas de acesso ao circuito festivo e a BR-235, que cruza a cidade. Esta era supervisionada pela Polícia Rodoviária Federal, como ainda hoje acontece. Na cidade, a segurança ficava por conta da Polícia Militar, que também assegurava a tranquilidade no espaço festivo e assim predominavam a segurança e a tranquilidade no perímetro da festa, características que se tornaram marcantes na sua construção identitária. Assim, num mundo em constantes mudanças sociais, com o surgimento de movimentos identitários em prol de algum fator social (etnia, religião) e o visível progresso nos meios de comunicação e de interatividade, uma forma de analisar essa identidade é elaborar uma abordagem construtivista dos processos identitátios em que os atores sociais construiriam suas identidades com base em representações simbólicas e na possibilidade de criação cultural. (Agier, 2000). Desta forma, a fomentação deste 11 artigo é de suma importância para se conhecer a construção de um modelo festivo predominante no Estado na década de 90 e sua transformação nos anos seguintes no tocante a identidade e o sentimento de pertencimento. Em 1991, Beneti Nascimento continua a capitanear os festejos ao lado do prefeito Ascendino Sousa. Uma nova estratégia de marketing contribui para divulgar e vender a festa com um novo slogan – “A Festa do Amor e da Paz”. Aspecto destacado por Fernando Dórea no Jornal de Sergipe: Com Paz e Amor estaremos em Areia Branca neste final de semana brincando o São João sem fogo, mas, com certeza, com todo fogo que nos é peculiar (Jornal de Sergipe, 20/06/91). Fig. 4 - Artigo sobre a ausência de fogos Foto: Jornal de Sergipe, junho de 1991 Percebe-se que, como uma comunidade nacional, a identidade Paz e Amor é também imaginada, no sentido de Benedict Anderson, e construída simbolicamente pelos veículos de comunicação por meio de uma produção simbólica, narrativa e discursiva. O uso dos substantivos Paz e Amor para identificar a festa foi decisivo na construção de uma nova identidade amplamente explorada no marketing em torno de valores como segurança e tranquilidade. Uma das bases dessa tranquilidade é a tradição local de não soltar fogos durante o período junino. Trata-se de uma lei consuetudinária, ou seja, baseada no costume, e não uma lei escrita. A esse respeito esclarece Ascendino Sousa: Aí queríamos fazer um São João sem fogos, e as pessoas às vezes me perguntam, qual é a lei que proíbe a queima de fogos no período junino em Areia Branca? E aí a gente vai buscar no direito consuetudinário, ou seja, no direito costumeiro, as pessoas criaram um costume de não queimar fogos aqui. Uma lei mais forte que versa os costumes daquele povo, tanto que se as pessoas soltassem fogos eram punidas judicialmente. 12 Com o propósito de tornar a festa mais atrativa, trazer mais turistas, mantê-la sob os holofotes da mídia e firmar a cidade como detentora das melhores comemorações juninas do Estado de Sergipe, a prefeitura cria uma nova tradição, batizada por Beneti Nascimento de “Comunhão do Forró”. Tratava-se de uma confraternização coletiva em um grande café da manhã realizado no meio da praça. Seu objetivo era recepcionar os forrozeiros no último dia dos festejos, na manhã do dia 30, por volta das oito horas. Quando amanhecia, uma grande mesa era montada na praça sem que o show precisasse ser interrompido. O primeiro café realizado utilizou as mesas dos bares forradas com plástico. Um relato de José Aldemir descreve como a população participava: Cada cidadão de Areia Branca fazia uma doação, tipo uma doação, um cuscuz, um quilo de inhame, quem tinha sítio dava um saco, um saco de inhame, um saco de milho, e em cima disso, a prefeitura paga as pessoas e os voluntários também vão lá, cozinhavam, quem podia levar cozinhado levava cozinhado, vinham pegavam em casa e levavam pela manhã. Cada barraqueiro usava suas mesas que beberam a noite toda, pra servir o pessoal. Fig. 6 - Primeiro café da manhã na praça do mercado (30/06/90) Foto: Acervo de Acássia Maria Nascimento de Sousa Com tal amplitude atingida pela festa, a praça do mercado não mais atendia ao crescimento do São João de Paz e Amor. Assim, a prefeitura passa a discutir a construção de um novo espaço. Em 1992, a prefeitura de Areia Branca e o Governo do Estado de Sergipe, representados respectivamente pelo prefeito Ascendino de Sousa Filho e pelo governador João Alves Filho, iniciam as obras do forródromo. Assim, é perceptível que o São João de Areia Branca é uma tradição inventada e de acordo com Hobbsbawn, apesar de romperem, em tese, com o passado histórico, mantêm com ele uma continuidade artificial. É importante ressaltar que a construção de uma identidade local, como a paz e amor, desenvolve-se num período muito longo, que vai desde o Batalhão 1º de São João até os dias atuais. Mesmo que muitos informantes 13 digam que essa nomenclatura surgiu na administração de Ascendino Sousa, o que de fato aconteceu, suas raízes estão no passado da cidade. Nesse sentido, elementos da tradição festiva local foram requisitados para a construção simbólica do São João de Paz e Amor. O ritual do 1º de São João era tido com uma manifestação de paz e amor visualizada na pessoa de Dona Filhinha4 e também no caráter comunitário que caracterizava o cortejo. Esse aspecto parece ter sido utilizado pelos promotores da festa para equilibrar os desejos e anseios da população diante do conjunto de mudanças que foram implementadas. 2.1.3 De 1993 a 2004: ápice dos festejos e modernização. No ano de 1993, a cidade tem como administrador o sobrinho de Sousa, Clodoaldo Andrade Júnior. Sousa continua atuando na prefeitura, mas somente na coordenação dos festejos juninos, à frente da organização da festividade. Clodoaldo Júnior mantém as comemorações juninas e todo o esquema da festa. A comissão organizadora é formada por Ascendino Sousa, Célia Andrade (irmã de Sousa e mãe do prefeito), professor Wellington (responsável pelo planejamento da festa) e Nadja Winne (responsável pela divulgação). Em entrevista ao jornal Gazeta de Sergipe, a mãe do prefeito fala sobre a importância e o poder que a festa tem no Estado e em Estados vizinhos: É um modelo de São João que até outras cidades estão copiando as decorações, os bonecos enormes, o café da manhã e deixando de soltar fogos. O que é bom deve ser copiado, disse Célia, mas é preciso reconhecer quem é o criador para que a identidade cultural de cada cidade seja mantida (Gazeta de Sergipe, 17/06/94). Depois da construção do forródromo, a cidade é elevada a um patamar turístico que superou alguns anos anteriores. Essa visibilidade alcançada se reflete não só nos meios de comunicação como jornais e revistas, mas também nas agências de viagem, que receberam maiores pedidos sobre os festejos do Estado de Sergipe e, principalmente, da então considerada capital sergipana do forró. Este título dado à cidade proporciona uma comparação com a festa junina realizada nas cidades de Caruaru/PE e Campina Grande/PB. Passados os quatro anos de administração pública de Clodoaldo Júnior, Ascendino de Sousa Filho retorna à prefeitura, reassume o comando da cidade e dos 4 Uma senhora carismática e muito respeitada entre os participantes e simpatizantes do batalhão 1º de São João, grande devota do santo padroeiro da cidade. O nome original dessa senhora não era conhecido dos entrevistados, nem foi localizado em estudos sobre a região. 14 festejos juninos. Em 1997 e 1998, Areia Branca permanece no auge dos festejos juninos do Estado e do Nordeste. A programação dos festejos no ano de 1998 se concentra numa mescla de cantores regionais, cantores nacionais e bandas que começam a se destacar nos shows nordestinos. Em 2000, como citado anteriormente, Zé da Serraria assume a prefeitura e moderniza o espaço festivo passando a organização da festa para o empresário Fabiano Araújo. Percebe-se aqui que essa mudança já começa a influenciar o esvaziamento dos festejos de Areia Branca bem como outros fatores já mencionados. O fato é que a população que se sentia parte da organização começa a ser distanciada da mesma e entra em um momento diferente de transição e mudança. 2.1.4 De 2009 a 2013: O São João de Pé no chão Em 2009 Agripino assume a prefeitura de Areia Branca. Como primeira medida quanto a organização dos festejos, uma mudança significativa de análise: de Paz e Amor a São de Pé no Chão. Um fato inusitado que causou questionamentos da população: adesão de uns e repulsa de outros. Tornou-se claro que a mudança do nome influenciou os discursos oficiais e os sentimentos de pertença dos entrevistados. Essa mudança se deve ao fato de os administradores alegarem falta de recursos financeiros para elaboração dos festejos. O São João de Pé no Chão é o São João sem recurso. Mas é presente também a ideia de rompimento com uma tradição cultural e política que associava o nascimento, auge e tentativa de resgate dos festejos a uma figura política única. A identidade cultural é construída socialmente por representações culturais, nos termos de Hall, e ela distingue a sociedade moderna. Ela é importante na fomentação de um sistema de representações simbólicas em que o sujeito passa a adquirir uma ideia de pertencimento, de identificação. O que é perceptível nas comemorações ao Santo Padroeiro em Areia Branca da década de 90. Com a mudança na nomenclatura dos festejos e a globalização/modernização dos mesmos no século XXI, essa identidade cultural se torna descentrada, deslocada, fragmentada (Hall,2006). E como consequência dessa globalização novas identidades vão sendo reinventadas pelos motivos mais diferenciados. Fica claro, a partir das entrevistas, que o cidadão areiabranquense se sente deslocado nesse período de transição. Quando acionado a falar sobre sua cidade, nos dias atuais, se refere à cidade como a cidade do forró de paz e amor e poucas vezes como a cidade do São João de pé 15 no chão. Mas é perceptível que eles sentem a necessidade de explicar, no seu ponto de vista, essa mudança tanto na nomenclatura quanto no sentimento de pertença social. 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS No decorrer da pesquisa, desde os primeiros contatos até a elaboração deste artigo, foi possível perceber quanto a manifestação cultural de Areia Branca, o São João de Paz e Amor, é importante não apenas para a comunidade local, senão também para a história dos festejos juninos do Estado. O resgate da memória coletiva do Batalhão 1º de São João possibilitou conhecer um período dessa história em que as festas tinham caráter mais religioso e comunitário. Além disso, pôde-se constatar o processo de folclorização do Batalhão à medida que um novo modelo festivo ia sendo criado: um modelo mais moderno, urbano e comercial, voltado para o turismo, que assume a forma de um grande espetáculo. Nesse contexto, os órgãos públicos, a prefeitura municipal e o Governo do Estado investiram maciçamente na estrutura dos festejos, transformando o forródromo no grande ícone dessa forma de celebração. Acompanhando essa transição de modelos festivos, verificou-se o sucesso do São João de Paz e Amor, que se tornou na década de noventa, marco do processo de modernização das celebrações juninas do Estado. Esse modelo acabou sendo adotado por outros Estados e municípios sergipanos, inclusive pela capital, na segunda metade da década de noventa, trazendo como consequência a descentralização dos festejos e a perda da posição hegemônica de Areia Branca e de Estância no ciclo de comemorações juninas do Estado. No caso específico de Areia Branca, ficou difícil competir com a capital, que contava com um maior aporte de recursos e possuía melhor infraestrutura. Os investimentos no São João de Paz e Amor passaram a oscilar de acordo com as alianças políticas entre o município e o Governo do Estado, denotando a apropriação e uso o político do evento para fins eleitorais. É possível, portanto, concluir que o São João de Paz e Amor de Areia Branca faz parte da história cultural do Estado de Sergipe. Sua linguagem, seus símbolos, suas práticas são expressões de um modo de celebrar os santo e a vida. Apresentam aspectos comuns a outras formas de celebração existentes em várias cidades e municípios da região Nordeste, e também sinais diacríticos responsáveis pela afirmação de uma identidade festiva amplamente conhecida como São João de Paz e Amor. 16 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AGIER, Michel. Distúrbios identitários em tempos de globalização. Mana. vol. 7 n. 2. Rio de Janeiro, out, 2001. ANDERSON, B. Comunidades imaginadas. São Paulo: Cia das Letras, 2008. AMORIM, Maria Alice. Os rituais pagãos do ciclo junino. In: BARRETO, José R. Paes & PEREIRA, Margarida M. de Souza (org). Festejos Juninos: uma tradição nordestina. Recife: Editora Nova Presença, 2002. ALENCAR, Aglaé D’Ávila Fontes de. São João é coisa nossa. Aracaju. FUNDESC/ Ed. J. Andrade, 1990. (Série Memória viva v.II). CASCUDO, Luís da Câmara. Dicionário do Folclore Brasileiro. São Paulo: Edusp, 1988. CHIANCA, Luciana de Oliveira. A festa do interior: São João, migração e nostalgia em Natal no século XX. Natal: EDUFRN, 2006. GAURINELO, Norbrto Luiz. Festa, trabalho e cotidiano. In: Jancsó István & Kantor Iris (orgs.). Cultura e sociabilidade na América portuguesa. São Paulo: Edusp, 2001. HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de janeiro: DP&A, 2006. HOBSBAWN, Eric; RANGER, Terence. A invenção das tradições. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997. LIMA, Elizabeth C. de A. A fábrica dos sonhos: a invenção da festa junina no espaço urbano. João Pessoa: Ideia, 2002. MORIGI, Valdir José. Narrativas do encantamento: o maior São João do mundo, mídia e cultura regional. Porto Alegre: Armazém Digital, 2007. RIBEIRO, Cleodes M. P. J. Festa e identidade: Como se faz a festa da uva. Caxias do sul: Educs, 2002. RIBEIRO, Anaelma Alves. O São João em Areia Branca e sua passagem de cultura popular para indústria cultural. Monografia. Faculdade Pio X, Aracaju, SE, 2002. WEBGRAFIA TRIGUEIRO, Apropriações do folclore pelos meios de comunicação de massa e pelo turismo: O caso concreto do São João de Campina Grande – Paraíba. Disponível on-line via www no URL:http://www.bocc.ubi.pt/pag/trigueiro-osvaldo-apropriacaofolclore.pdf SITE PESQUISADO http://www.ibge.gov.br 17 APÊNDICE 1: JORNAIS PESQUISADOS JORNAIS PESQUISADOS NO ARQUIVO PÚBLICO DA CIDADE DE ARACAJU Jornal de Sergipe - (21/06/1987 - 23/06/1992) Referências, volumes e anos pesquisados. -J8 volume 03 de 1978 -J8 volume 80 de 1986 -J8 volume 07 de 1979 -J8 volume 91 de 1987 -J8 volume 08 de 1979 -J8 volume 92 de 1987 -J8 volume 19 de 1980 -J8 volume 103 de 1988 -J8 volume 20 de 1980 -J8 volume 104 de 1988 -J8 volume 31 de 1981 -J8 volume 115 de 1989 -J8 volume 32 de 1981 -J8 volume 116 de 1989 -J8 volume 43 de 1982 -J8 volume 127 de 1990 -J8 volume 44 de 1982 -J8 volume 128 de 1990 -J8 volume 60 de 1984 -J8 volume 139 de 1991 -J8 volume 61 de 1984 -J8 volume 140 de 1991 -J8 volume 70 de 1985 -J8 volume 151 de 1992 -J8 volume 71 de 1985 -J8 volume 152 de 1992 -J8 volume 79 de 1986 -J8 volume 157 de 1993 Gazeta de Sergipe - (23/06/1991 - 30/06/1998) Referências, volumes e anos pesquisados. -J8 volume 67 de 1990 -J8 volume 97 de 1995 -J8 volume 73 de 1991 -J8 volume 103 de 1996 -J8 volume 79 de 1992 -J8 volume 109 de 1997 -J8 volume 85 de 1993 -J8 volume 115 de 1998 -J8 volume 91 de 1994 18 APÊNDICE 2: QUADROS COM NOME DOS ENTREVISTADOS ENTREVISTAS SOBRE A CONSTRUÇÃO DA FESTA DE PAZ E AMOR Quadro representativo das pessoas entrevistadas sobre a construção da festa de paz e amor. Nome dos entrevistados Data da entrevista Aldaci Almeida Melo 17/05/09 Maria da Conceição Mendonça Costa 17/05/09 Zoraide Oliveira Mota 28/05/09 Everaldo José de Souza 04/06/09 Fernandes Santos de Andrade 06/06/09 Vicente Almeida Góes 06/06/09 José Ademilton de Almeida 06/06/09 e 13/06/13 Gicelma Dias 06/06/09 Luzimary Dias dos Santos 06/06/09 e 16/06/13 José Araújo dos Santos Filho 06/06/09 e 16/06/13 José Aldemir de Almeida 07/06/09 Maria Suzana dos Santos Sá 07/06/09 Otávio Santos Cunha 28/06/09 Ascendino de Sousa Filho 12/08/09