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O PROBLEMA DO NEXO DE CAUSALIDADE NA RESPONSABILIDADE CIVIL AMBIENTAL DO ADQUIRENTE DE IMÓVEL RURAL DEGRADADO Wladimir Alcibíades Marinho Falcão Cunha1 1. INTRODUÇÃO – INTERSECÇÕES ENTRE O DIREITO CIVIL E O DIREITO AMBIENTAL NO ÂMBITO DA RESPONSABILIDADE CIVIL AMBIENTAL Corroborando o apontado esmaecimento da divisão ferrenha entre direito público e direito privado e a necessária intercomunicação entre os diversos ramos do direito, é possível afirmar que a chamada responsabilidade civil ambiental é tema que se situa num zona fronteiriça entre a teoria geral da responsabilidade civil, própria do direito civil, e as especificidades individuais do direito ambiental. Com efeito, se, de um lado, o direito ambiental se socorre de diversas categorias próprias da estrutura tradicional da responsabilidade civil geral, tais como o seu princípio fundamental, que evidentemente é o risco e não a culpa, e os seus elementos basilares, conduta, dano e nexo de causalidade, por outro lado nem sempre a transposição irrestrita de categorias se mostrará possível, sob pena da irresponsabilização. Tal ocorre, é facilmente perceptível, não só em face da natureza cambiante do âmbito de estudo e preocupação do direito ambiental, que é o meio ambiente ecologicamente equilibrado 2, como, especialmente, pelo caráter absolutamente complexo do dano ambiental, resultante de atividade poluente ou impactante ao meio ambiente3. 1 O autor é Doutorando em Direito Civil pela Universidade de São Paulo – USP, com estágio doutoral realizado perante a University of California, U.C. Berkeley. Mestre em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco. Professor Assistente do Departamento de Direito Privado da Universidade Federal da Paraíba. Juiz de Direito do Estado da Paraíba. 2 Para além da CF/1988, a elevação do meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito fundamental das presentes e futuras gerações já fora realizada pela Declaração de Estocolmo/1972: “Princípio 1: O homem tem um direito fundamental à liberdade, à igualdade e a condições de vida satisfatórias, num ambiente cuja qualidade lhe permita viver com dignidade e bem-estar. Ele tem o dever solene de proteger e melhorar o meio ambiente para as gerações presentes e futuras”. 3 Os conceitos legislativos de degradação e poluição do meio ambiente bem como de poluidor encontram-se, como sabido, no microssistema legislativo da Lei da Política Nacional do Meio Ambiente, em seu art. 3º. Numa noção já clássica no direito ambiental brasileiro, que com aqueles se coaduna, José Afonso da Silva estipula o meio ambiente como sendo ‘‘a interação do conjunto de elementos naturais, artificiais e culturais que propiciem o desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas formas” (In: SILVA, José Afonso de. Direito ambiental constitucional. São Paulo: Malheiros, 1994, p. 20). De igual modo, o impacto ambiental, tido como qualquer alteração do meio ambiente, resultante de ações antrópicas ou naturais, que afetem tanto a natureza quanto o meio ambiente social e seus processos relacionais, encontra-se amplamente previsto no art. 1º da Resolução CONAMA nº. 001/1986 (Artigo 1º - Para efeito desta Resolução, considera-se impacto ambiental qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia resultante das atividades humanas que, direta ou indiretamente, afetam: I - a saúde, a segurança e o bem-estar da população; II - as atividades sociais e econômicas; III - a biota; IV - as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente; V - a qualidade dos recursos ambientais). Se, para Álvaro Luiz Valery Mirra, “nos termos da Constituição Federal, Assim é que então, dentro da responsabilidade civil ambiental, temas complexos, cujo olhar tão-somente sob a lente do direito civil poderia resultar em visões míopes, têm sido tratados, dentre eles: o intricado problema do nexo de causalidade entre a conduta do agente e o dano ambiental causado, em que se chega a trabalhar mesmo com presunção de causalidade; a necessidade de identificação da participação efetiva de cada um poluidores numa mesma situação de poluição, ou a solidariedade irrestrita entre eles; a possibilidade de inversão do ônus da prova em desfavor do agente supostamente poluidor; a quantificação do dano ambiental etc. Por outro lado, o que os doutrinadores do direito ambiental têm chamado de responsabilidade civil ambiental pela aquisição de passivo ambiental, tema também amplamente explorado no âmbito dos tribunais, também integra a responsabilidade civil ambiental: trata-se da aquisição de propriedade rural já ecologicamente degradada pelo(s) proprietário(s) anterior(es) e a responsabilidade civil ambiental pela recuperação ou reposição daí advinda imputada ao adquirente e não aquele. Ora, é evidente que todas essas temáticas, mas especialmente essa última, avultam de importância não só ante o sempre freqüente conflito entre princípios e direitos fundamentais “impacto ambiental” não é qualquer alteração do meio ambiente, mas uma degradação significativa do ambiente” (In: MIRRA, Álvaro Luiz Valery. Impacto ambiental. Aspectos da legislação brasileira. 3. ed. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2006, p. 27), numa visão mais biótica, Helmut Troppmair relaciona tais alterações drásticas com a ocorrência em curtos espaços de tempo, propondo que aquele ocorrerá “quando as estruturas e os fluxos do sistema ecológico, social ou econômico são alterados profundamente no decorrer de um espaço de tempo muito reduzido” (In TROPPMAIR, Helmut. Metodologias simples para pesquisar o meio ambiente. Rio Claro, 1988, pp. 188 e 189, apud MIRRA, Álvaro Luiz Valery. Impacto... Op. Cit., p. 32-33). Percebe-se assim que, nem toda intervenção humana no meio ambiente de que resulte degradação ambiental implicará em poluição e produzirá impacto ambiental, mas apenas aquelas nocivas ao ambiente externo natural. De toda sorte, nota-se que os conceitos legislativos presentes na lei ambiental corporificam todos eles cláusulas gerais carregadas de conceitos jurídicos indeterminados. Ora, se de um lado essa intransponível indeterminabilidade de conceitos traz o grande problema de definir concretamente o que seja essa degradação significativa do meio ambiente, por outro lado pode acabar por maximizar a proteção ambiental, por facilitar apanhar todos os poluidores responsáveis pela degradação. De igual modo, as especificidades próprias dos processos ecológicos, até hoje não desvendados completamente pelo homem, e de suas categorias naturais de alteração, acabam por refletir na categoria jurídica do dano ambiental, tido por Luís Paulo Sirvinskas como “toda agressão contra o meio ambiente causada por atividade econômica potencialmente poluidora ou por ato comissivo ou omissivo praticado por qualquer pessoa” (In: SIRVINSKAS, Luís Paulo. Política Nacional do Meio Ambiente (Lei n. 9.638, de 31 de agosto de 1981). In: As leis federais mais importantes de proteção ao meio ambiente comentadas. Coords.: MORAES, Rodrigo Jorge e outros. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 129), o que contribui negativamente para o delineamento de seus contornos e limites dentro do caso concreto bem como, em consequência, a sua própria reparabilidade. Veja-se ainda que o dano ambiental é, acima de tudo, supra-individual, ainda que possa ocorrer dano de repercussão individualizável. Nesse sentido, diz a professora da USP Patrícia Faga Iglecias Lemos então que o dano ambiental atingirá a esfera humana individual apenas reflexamente ou por ricochete: “se considerarmos o meio ambiente como pertencente à sociedade como um todo, o dano causado será coletivo e difuso, o que o impede de ser simplesmente um dano pessoal. Por isso, o dano que atinge um indivíduo é chamado dano reflexo ou por ricochete”. (In: LEMOS, Patrícia Faga Iglecias. LEMOS, Patrícia Faga Iglecias. Meio ambiente e responsabilidade civil do proprietário. Análise do nexo causal. São Paulo: RT, 2008, p. 104.) A propósito, Andreas Krell, professor das pós-graduações da UFPE e UFAL, aponta que o dano ambiental tem como características essenciais, para além da periodicidade, a anormalidade, “que existe onde houver modificação das propriedades físicas e químicas dos elementos naturais de tal grandeza que estes percam, parcial ou totalmente, sua propriedade ao uso”, e a gravidade, “devendo ocorrer transposição daquele limite máximo de absorção de agressões que possuem os seres humanos e os elementos naturais” (In: KRELL, Andreas Joachim. Concretização do dano ambiental. Objeções à teoria do "risco integral". Disponível em: www.jus.com.br. Acesso em: 15/06/2010). constitucionalmente postos (princípios do desenvolvimento sustentável ou sustentabilidade versus princípios da propriedade e da livre iniciativa), como também à vista da recente chegada de um novo Código Florestal brasileiro (Lei n. 12.651/2012, com as importantes inclusões feitas pelas Medida Provisõria n. 571/2012), e do amplo debate nacional que lhe precedeu4. Feitas essas considerações, pode-se delinear um plano de trabalho para o presente artigo monográfico. Assim é que, num capítulo primeiro, trabalhar-se-á com os princípios do direito ambiental que influenciam a responsabilidade civil ambiental, em especial os princípios da prevenção e precaução, do poluidor-pagador e do desenvolvimento sustentável. Num segundo capítulo, tratar-se-á do talvez mais intricado problema da responsabilidade ambiental, qual seja a identificação do nexo de causalidade entre a conduta do agente poluidor ou dos agentes poluidores múltiplos e o dano ambiental ocasionado. Aqui analisar-se-ão as teorias do nexo de causalidade tradicionais e ver-se-á se elas são suficientes ou não à responsabilização civil ambiental, sendo então necessário ou não teorias mais alargadas do nexo de causalidade, como a teoria do escopo da norma jurídica ou a própria presunção de causalidade. Por fim, num capítulo último, ver-se-á os influxos doutrinários e jurisprudenciais, em especial no âmbito da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, acerca da responsabilidade civil por aquisição de passivo ambiental. 2. A INFLUÊNCIA DOS PRINCÍPIOS AMBIENTAIS NA RESPONSABILIDADE CIVIL AMBIENTAL 2.1. Os princípios ambientais e a responsabilidade civil ambiental Diante da responsabilidade civil objetiva independentemente de culpa (§ 1º do art. 14 da Lei da Política Nacional do Meio Ambiente), os doutrinadores brasileiros debatem quais das teorias objetivas de responsabilidade civil teria sido adotada pelo ordenamento jurídico. Se a grande parte pende pela teoria do risco integral, a qual, na sua essência, inadmite a existência de causas excludentes de responsabilidade civil, isto é, o poluidor haveria de responder pelo dano ambiental causado mesmo na hipótese de caso fortuito ou força maior ou mesmo fato exclusivo de terceiro, alguns defendem a teoria do risco-proveito, que admite as 4 O presente trabalho se preocupará tão somente com o texto legal aprovado pela Presidente Dilma Rousseff, obviamente já com as inclusões realizadas pela Medida Provisória. Assim, transbordará de seus limites a análise tópica do projeto de lei na forma aprovada no Senado Federal e posteriormente modificada na Câmara dos Deputados, as acusações da influência e atuação de uma bancada ruralista nessa última Casa Legislativa, o movimento ambiental-social “Veta Dilma” que precedeu ao período de sanção ou veto ao projeto, dentre outros pontos. causas excludentes de responsabilidade5. De uma forma ou de outra, a responsabilidade civil ambiental possui condicionantes próprias, a serem vistas nos capítulos posteriores, como, por exemplo, a presunção de causalidade, a solidariedade em hipótese de múltiplos poluidores, a inversão do ônus da prova, que, por conduzirem a um patamar de máxima responsabilização do causador do dano ambiental, acaba por minimizar a discussão doutrinária de qual teoria objetiva foi adotada pelo direito ambiental brasileiro, se a teoria do risco integral ou a teoria do risco-proveito. Por fim, talvez mais importante seja vislumbrar, por fim, que a responsabilidade civil ambiental possui, para além de um mero caráter reparatório do dano ambiental, um fortíssimo caráter preventivo, que, não tolerando riscos ambientais, sejam conhecidos cientificamente, sejam apenas suspeitados pela ciência, faz de tudo para evitar que eles se transformem em perigos ou mesmo danos concretos. Nesse passo, mostra-se imprescindível a importância da principiologia ambiental, assentada no direito internacional público, por terem os princípios ambientais origem quase sempre em tratados e convenções internacionais. Implícita ou explicitamente albergados na Constituição brasileira de 1988, alguns deles tocam mais de perto ao tema ora abordado no presente estudo, quais sejam: a) Princípios da prevenção e precaução; b) Princípio do poluidor-pagador; c) Princípio do desenvolvimento sustentável. 2.1.1. Os princípios da prevenção e da precaução e a possibilidade de responsabilidade sem dano Certamente, a sociedade atual é marcada por perigos e riscos em escala numa antes experimentada pela humanidade, especialmente em virtude do progresso científico e tecnologia avançadas hoje existentes. Está-se a viver em meio à denominada “sociedade de riscos”, assim nominada pelo sociólogo alemão Ulrick Beck, dentro de uma identificada segunda modernidade pós-revolução industrial. Ora, dois princípios foram construídos pela doutrina internacional como relativos à questão da antecipação e gerenciamento de riscos dentro de uma sociedade marcada por estes, quais sejam os princípios da prevenção e precaução, ambos ligados às idéias éticas de 5 Veja-se, a propósito, Andreas Krell, o qual afirma que uma conseqüência importante da adoção da teoria do riscoproveito “é a possibilidade de admitir fatores capazes de excluir ou diminuir a responsabilidade como: o caso fortuito e a força maior, o fato criado pela própria vítima (exclusivo ou concorrente), a intervenção de terceiros e, em determinadas hipóteses, a licitude da atividade poluidora. Não são poucos os autores que, em primeiro momento, se declaram adeptos da teoria do risco integral, que não permite excludentes à responsabilidade, e depois, para fundamentar a sua posição, passam a recorrer a argumentos muito mais ligados à teoria do risco-proveito”. In: KRELL, Andreas Joachim. Concretização do dano ambiental. Objeções à teoria do "risco integral". Idem, idibwm. prudência e segurança. Com efeito, em sua tese de titularidade perante o Departamento de Direito Civil da USP, a profa. Titular Teresa Ancona Lopez anota que, diante dos rotineiros acontecimentos globais com o meio ambiente e a saúde – a profa. relembra os episódios da “epidemia da AIDS, o caso da “vaca louca”, as transfusões de sangue contaminado, o dano nuclear provocado por Chernobyl, a tragédia química das Usinas Carbide na Índia em Bhopa, Seveso, a gripe aviária, a febre amarela, a cólera no Peru”, dentre outros –, “a comunidade jurídica internacional criou o princípio da precaução e também mostrou que as atitudes de prevenção, quando os perigos são conhecidos, devem ser tomadas”.6 A distinção entre os dois princípios baseia-se na espécie de riscos, perigos e danos a serem antecipados e prevenidos: enquanto o princípio da precaução liga-se à existência de um risco hipotético ou potencial da ocorrência de um dano ambiental, o princípio da prevenção relaciona-se com o risco comprovado ou perigo concreto de tal ocorrência. Nesse sentido, Teresa Ancona Lopez bem precisa a distinção: Como bem explicam Philippe Kourilsky e Geneviève Viney, no Relatório ao Primeiro Ministro Francês Lionel Jospin, sobre o princípio da precaução, o risco pode ser em primeiro lugar potencial (hipotético) ou comprovado. (…) A noção de risco potencial é de manejamento delicado, é o “risco do risco”. Certamente, muitos riscos comprovados começaram por serem potenciais, mas numerosos riscos potenciais jamais foram comprovados.7 (…) É justamente a diferença entre o risco comprovado, que tem no seu conteúdo a ameaça de perigo, e o risco hipotético ou potencial, que vai fundamentar as diferenças entre prevenção e precaução. 8 (…) A diferença entre elas vem da diferença entre risco potencial e risco provado. A precaução diz respeito aos riscos-potenciais, como, por exemplo, riscos à saúde com o consumo de alimentos geneticamente modificados; a prevenção a riscos constatados, como aqueles que vêm das instalações nucleares. Esses últimos são conhecidos e provados. 9 Pode-se assim afirmar, de maneira bastante simples, que o princípio da precaução deseja evitar o risco, ainda hipotético, enquanto o da prevenção pretende evitar o perigo, já concreto. Na precaução, tem-se a probabilidade que a hipótese esteja certa, ao passo que, na prevenção, tem-se a probabilidade que o perigo se concretize. O princípio da precaução visa, dessa forma, à adoção de medidas antecipatórias e preventivas contra riscos potenciais ou hipotéticos da sociedade de riscos contemporânea, já que, como anota Ancona Lopez, “os riscos potenciais, a despeito do seu caráter hipotético, 6 LOPEZ, Teresa Ancona. Princípio da precaução e evolução da responsabilidade civil. São Paulo: Quartier Latin, 2010, p. 86-87. 7 LOPEZ, Teresa Ancona. Princípio... Op. Cit., p. 25. 8 LOPEZ, Teresa Ancona. Princípio... Op. Cit., p. 26. 9 LOPEZ, Teresa Ancona. Princípio... Op. Cit., p. 101. podem ter uma probabilidade de realização elevada. Na prática, a precaução pode estar compreendida como prolongamento dos métodos de prevenção aplicados aos riscos incertos”10. Por serem riscos ainda em aberto, tem-se então que um dos aspectos fundamentais do princípio da precaução, ou mesmo o seu conteúdo específico, é a incerteza científica11 quanto à exata mensuração do risco e da probabilidade de sua ocorrência, isto é, se ele efetivamente irá se transformar num perigo concreto, o que dirá então em um dano ambiental ocorrente, o que gera então a impossibilidade, ao menos no estágio inicial, de comprovação do nexo de causalidade. O conteúdo específico do princípio da prevenção, por sua vez, é a certeza científica do dano, concreto e mensurável e, portanto, passível de ocorrência, ao qual se visa a sua mitigação. Acabam ambos os princípios, em especial o princípio da precaução, sendo contrários à responsabilidade clássica reparatória, pois antecipam-se à causação do dano, a fim de evitálo, trabalhando em fase em que existe apenas risco e, muitas vezes, apenas risco hipotético. Para Patrícia Iglecias então, ambos os princípios “levantam a bandeira da máxima popular de que “é melhor prevenir do que remediar”, e então “são responsáveis por uma das modificações que a responsabilidade civil clássica passou para se adaptar ao direito ambiental, não englobando somente o dever de indenizar, mas também o objetivo de preservar o equilíbrio”.12 Diante do caráter amplamente preventivo da responsabilidade que prega ambos os princípios, diversos juristas do direito ambiental chegam mesmo a admitir a paradoxal responsabilidade sem dano, ou seja, a responsabilidade civil ambiental apenas fundamentada na antecipação e gerenciamento de riscos, sem que danos ainda tenham ocorrido, muitas vezes sem sequer tenha-se certeza científica de sua futura ocorrência. Anotando que a sociedade contemporânea enfrenta, por vezes, riscos inaceitáveis que podem ensejar danos graves, irreversíveis ou, por vezes, irreparáveis, não sendo producente correr o risco de sua realização, a Profa. Teresa propõe que, para equacionar a aparente contradição, é preciso separar os conceitos de responsabilidade e indenização e de responsabilidade civil reparatória 10 LOPEZ, Teresa Ancona. Princípio... Op. Cit., p. 102. Nesse sentido, são as palavras de Guilherme Purvin: “O princípio da precaução é aplicável nas hipóteses de incerteza científica acerca dos riscos ambientais concretos advindos da adoção de determinada tecnologia ou da introdução de determinado produto no mercado”. In: FIGUEIREDO, Guilherme José Purvin. Curso de Direito Ambiental. 3. ed. Curitiba: Letra da lei, 2009, p. 48. Ao contrário da crítica de alguns de que ele engessaria o progresso científico, entende-se que, na verdade, o princípio da precaução impulsiona a pesquisa científica, a fim de que sejam superadas as dúvidas a respeito do eventual risco ambiental da atividade ou produto específicos. 12 LEMOS, Patrícia Faga Iglecias. Meio ambiente... Op. Cit., p. 71. 11 e responsabilidade civil preventiva. São suas palavras derradeiras a respeito do tema: (...) responsabilidade civil não se resume ao ressarcimento de danos (apesar de ainda ser sua principal função); é também prevenção e precaução de eventos danosos. Hoje podemos afirmar que temos a responsabilidade civil reparatória e a responsabilidade civil preventiva.13 (…) Os princípios da prevenção e da precaução fazem parte da “responsabilidade civil preventiva”, que emerge da sociedade de risco e que não se choca com o tema da responsabilidade civil, porquanto tem o mesmo fundamento da responsabilidade civil ressarcitória, qual seja, o alterum non laedere.14 Pode-se afirmar, por fim, que ambos os princípios da prevenção, e mesmo o da precaução, encontram-se implicitamente previstos na Constituição Federal de 1988, no art. 225, § 1o, incisos IV e V, quando menciona o dever de preservação que toca à coletividade e ao Poder Público. 2.1.2. O princípio do poluidor-pagador e a assunção dos custos econômicos pelo empreendedor A unânime doutrina jurídica ambiental combate veementemente uma idéia literal que poderia advir da nomenclatura do princípio do poluidor-pagador, isto é, a de que ele representaria uma fórmula “poluiu-pagou” ou, pior ainda, “pague e tenha o direito a poluir”. Na realidade, o princípio do poluidor-pagador, muito mais do que a mera reparação dos danos ambientais, relaciona-se ao direcionamento ou à imputação dos custos econômicos e sociais da atividade impactante e poluente ao meio ambiente aquele que a produziu e a quem aproveita, quer se tratem de custos de prevenção, quer se tratem de custos de reparação, como bem coloca o Professor da Unisinos-RS e Doutor pela USP Marcos Jorge Catalan15. Em semelhante sentido, o professor da Universidade Federal da Paraíba Talden Farias chama a atenção de que o real objetivo do princípio “não é recuperar um bem lesado, nem criminalizar uma conduta lesiva ao meio ambiente”, mas “sim afastar o ônus econômico da coletividade e voltá-lo para a atividade econômica utilizadora de recursos ambientais”.16 Assim, a professora da USP Patrícia Iglecias alude que as “implicações práticas do princípio do poluidor-pagador estão em alocar as obrigações econômicas em relação a atividades causadoras de danos, particularmente em relação à responsabilidade, o uso dos instrumentos 13 LOPEZ, Teresa Ancona. Princípio... Op. Cit., p. 138. LOPEZ, Teresa Ancona. Princípio... Op. Cit., p. 141. 15 CATALAN, Marcos Jorge. Proteção constitucional do meio ambiente e seus mecanismos de tutela. São Paulo: Método, 2008, p. 81. 16 FARIAS, Talden. Introdução ao direito ambiental. Belo Horizonte: Del Rey, 2009, p. 51. 14 econômicos e a aplicação de regras relativas à concorrência e subsídios”.17 Portanto, o princípio do poluidor-pagador relaciona-se com a responsabilidade civil ambiental, tanto num sentido mais preventivo da ocorrência de danos, como de reparabilidade propriamente caso já tenham aqueles tido ocorrência. 2.1.3. O princípio do desenvolvimento sustentável O princípio do desenvolvimento sustentável teve certamente seu nascedouro no debate das nações no âmbito do Direito Internacional Público. Assim, se o princípio 13 da Declaração de Estocolmo sobre o Ambiente Humano18 foi um das primeiras normas internacionais a encampar o princípio, a Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio – 1992) erigiu-se em verdadeira carta do desenvolvimento sustentável, sendo certo que quase todos os seus princípios fizerem referência ao princípio, com especial destaque para os princípios 3 e 4. Do teor das declarações internacionais, bem se percebe que o princípio do desenvolvimento sustentável ou da sustentabilidade prega uma coordenação ou conciliação entre os princípios a priori antagônicos do desenvolvimento econômico e da proteção ao meio ambiente, atendendo às necessidades tanto das presentes gerações quanto das futuras. Deve-se optar assim, como bem propõe Luiz Regis Prado, por um “desenvolvimento econômico qualitativo”, por um “desenvolvimento racional do ponto de vista ecológico (utilização racional e equilibrada dos recursos naturais), acompanhado de uma gestão judiciosa do meio”19. Por outro lado, a Profa. Patrícia Iglecias resume, com percuciência, que o princípio deve importar deve ser num “conjunto de instrumentos preventivos que possam afetar as práticas econômicas, científicas, educacionais, conservacionistas, buscando a realização do bem-estar da sociedade”. 20 Por essas palavras, pode-se afirmar que o princípio do desenvolvimento sustentável foi expressamente introjetado no recentíssimo novo Código Florestal Brasileiro (Lei n. 12.651, de 25 de maio de 2012), já que, para além das disposições correntes ao longo do texto, em seu artigo 1-A (já incluído pela Medida Provisória n. 571/2012) propôs-se a estabelecer “normas gerais com o fundamento central da proteção e uso sustentável das 17 LEMOS, Patrícia Faga Iglecias. Meio ambiente... Op. Cit., p. 62. Princípio 13: “A fim de obter uma mais racional ordenação dos recursos e melhorar e melhorar as condições ambientais, os Estados deveriam adotar um enfoque integrado e coordenado de planificação de planificação de seu desenvolvimento, de modo que fique assegurada a compatibilidade do desenvolvimento com a necessidade de proteger e melhorar o meio humano em benefício de sua população”. 19 PRADO, Luiz Regis. Direito Penal do Ambiente. São Paulo: RT, 2005, p. 65. 20 LEMOS, Patrícia Faga Iglecias. Meio ambiente... Op. Cit., p. 60. 18 florestas e demais formas de vegetação nativa em harmonia com a promoção do desenvolvimento econômico”, e mediante o atendimento de uma série de princípios voltados à conciliação entre desenvolvimento econômico e proteção e uso florestal sustentável das florestas e demais formas de vegetação nativa21. 3. O NEXO DE CAUSALIDADE NA RESPONSABILIDADE CIVIL AMBIENTAL A responsabilidade civil ambiental, como dito ao longo do presente texto, possui especificidades próprias que não permitem uma transposição pura e simples de inúmeros aspectos da teoria da responsabilidade civil comum. Isso é extremamente veraz no que respeita ao problema do estabelecimento do nexo de causalidade entre a conduta do suposto agente poluidor e o dano supostamente resultante dessa conduta, o que ocorre em face de características únicas do próprio dano ambiental. Com efeito, existem uma série de fatores que influenciam na dificuldade de se comprovar o nexo de causalidade entre conduta e dano ambiental, ou mesmo impossibilidade dessa comprovação, tais como: a) a distância entre o local da conduta nociva e o local onde o dano ambiental efetivamente teve lugar; b) o tempo que medeia entre a conduta e o aparecimento do dano; c) a multiplicidade de agentes poluidores; d) a multiplicidade de causas, já que o dano ambiental pode estar sendo ocasionado por diversas condutas que, isoladamente, não seriam capazes de causar aquele dano, isto é, pode estar sendo ocasionado por causas e concausas, sem que se possa muitas vezes afirmar qual a causa principal e quais as causas secundárias; e) a dúvida científica acerca da possibilidade daquela conduta ter causado aquele dano específico. Tem-se, assim, que a dificuldade de delineamento do traçado do nexo causal entre conduta e dano ao meio ambiente é sobrelevada pela complexidade própria dos processos 21 Art. 1º-A. Esta Lei estabelece normas gerais com o fundamento central da proteção e uso sustentável das florestas e demais formas de vegetação nativa em harmonia com a promoção do desenvolvimento econômico, atendidos os seguintes princípios: (Incluído pela Medida Provisória nº 571, de 2012). I - reconhecimento das florestas existentes no território nacional e demais formas de vegetação nativa como bens de interesse comum a todos os habitantes do País; II - afirmação do compromisso soberano do Brasil com a preservação das suas florestas e demais formas de vegetação nativa, da biodiversidade, do solo e dos recursos hídricos, e com a integridade do sistema climático, para o bem-estar das gerações presentes e futuras; III - reconhecimento da função estratégica da produção rural na recuperação e manutenção das florestas e demais formas de vegetação nativa, e do papel destas na sustentabilidade da produção agropecuária; IV - consagração do compromisso do País com o modelo de desenvolvimento ecologicamente sustentável, que concilie o uso produtivo da terra e a contribuição de serviços coletivos das florestas e demais formas de vegetação nativa privadas; (...)VI - responsabilidade comum de União, Estados, Distrito Federal e Municípios, em colaboração com a sociedade civil, na criação de políticas para a preservação e restauração da vegetação nativa e de suas funções ecológicas e sociais nas áreas urbanas e rurais; VII fomento à inovação para o uso sustentável, a recuperação e a preservação das florestas e demais formas de vegetação nativa; VIII - criação e mobilização de incentivos jurídicos e econômicos para fomentar a preservação e a recuperação da vegetação nativa, e para promover o desenvolvimento de atividades produtivas sustentáveis. (Incluído pela Medida Provisória nº 571, de 2012). ecológicos. Nesse sentido é que o paraibano Ministro do STJ Antônio Herman Benjamim, um dos grandes doutrinadores brasileiros do direito ambiental, chama o nexo de causalidade ambiental do “calcanhar de aquiles” da responsabilidade civil ambiental, para quem: As dificuldades aumentam ainda mais quando inexiste um acidente delimitado, um evento repentino na origem do dano, manifestando-se este, ao contrário, de forma lenta e progressiva, como uma doença. A degradação usualmente é fruto de comportamentos cumulativos, que operam ao longo do tempo. O nexo causal é ainda enfraquecido pela distância entre o fato gerador e a manifestação do dano ambiental. 22 Em face dessas dificuldades, quase sempre a comprovação do nexo de causalidade ambiental há de fugir das teorias clássicas civis acerca do tema em suas formatações originárias, servindo-se ora de teorias ambientais próprias, ora teorias civis extremamente adaptadas ao direito ambiental, tudo encaminhando-se para uma amenização do nexo de causalidade entre conduta e dano ambiental. Ou ainda servindo-se a responsabilidade civil ambiental de mecanismos facilitadores da responsabilização, tais como a solidariedade entre os agentes, a inversão do ônus da prova, dentre outros. 3.1. Teorias civis do nexo de causalidade Costumeiramente, as teorias do nexo de causalidade são divididas entre teoria generalizadora e as teorias individualizadoras, indicando os ambientalistas ainda teorias modernas que tocam mais de perto apenas ao direito ambiental. A grande teoria generelizadora, proveniente das lições de direito penal do magistrado da Suprema Corte Alemã Maximiliano Von Buri, é a teoria da equivalência dos antecedentes causais, segundo qual todo e qualquer acontecimento anterior ao dano poderia ser identificado como sendo a sua causa. Certamente essa teoria possui muito mais interesse histórico, eis que é impossível a extensão tão demasiada do nexo de causalidade: tudo e todos poderiam ser considerados como integrantes do nexo, como causas do dano provocado. As teorias individualizadoras, por sua vez, foram muitas. Primeiramente, as teorias mais antigas da causa próxima, da causa eficiente e da causa preponderante, essas duas últimas de criação alemã. Num segundo momento, as teorias mais modernas da causalidade adequada, teoria do nexo causal direto e imediato ou da interrupção do nexo causal e a teoria do escopo da norma jurídica. 22 BENJAMIN, Antônio Herman de Vasconcelos e. A responsabilidade civil pelo dano ambiental no direito brasileiro e as lições do direito comparado. Disponível em: <http://bdjur.stj.gov.br/dspace/handle/2011/8632>. Acesso em: 15/05/2010. Quanto à primeira teoria da causa próxima, essa se mostrou inservível à responsabilidade civil ambiental e foi de logo abandonada pela doutrina, eis que nem sempre é a última causa, ou aquela mais próxima, que causou o dano ambiental, ou a que ao menos mais contribuiu para sua causação. A teoria da causa eficiente, de origem alemã, a seu turno, pregava que a “causa deve ser estabelecida de acordo com o seu grau de eficiência para causar o dano (causa eficiente), opondo-se claramente ao princípio da equivalência das condições”23, não importando, assim, a proximidade com o evento. Na teoria da causa preponderante, por sua vez, “a causa é a condição que rompe o equilíbrio entre os fatores favoráveis e contrários à produção do dano, ou seja, tem preponderância na causação do dano”24, o que já demonstra, segundo a professora, a fragilidade da teoria, pois o nexo de causalidade ambiental não pode ser fixado apenas com base nesse fator de atribuição. Ademais, existe enorme dificuldades práticas em se detectar a denominada causa eficiente ou causa preponderante. Mais importante em relação ao presente estudo, segundo a professora da USP, “essas teorias não são adequadas para a responsabilidade ambiental, pois, com a adoção da responsabilidade objetiva e da responsabilidade por causas e concausas, não importa o grau de eficiência para haver responsabilidade”. É dizer, para ela, “(…) no dano ambiental não se distinguem causas e concausas, além de aplicar-se a solidariedade, nos termos do art. 942 do CC brasileiro”25. 3.2. Teoria da causalidade adequada De criação do jurista alemão Ludwig von Bar e desenvolvida por seu conterrâneo Johanes von Kries ao fim do século XIX, a teoria da causalidade adequada caracteriza-se pela verificação, sob o ângulo da experiência comum e numa análise abstrata, mediante a realização de um juízo de probabilidade chamado de prognose póstuma, se determinada causa era, de per si, apta e adequada para a produção do dano. Para os autores, a causa deveria ser verificada em abstrato como adequada e idônea, o que, contudo, não ocorreria em face de circunstâncias especiais ocorrentes na cena causal, como nos simplórios exemplos a seguir: a) Dou um pequeno empurrão numa pessoa, que morre porque estava próxima de ter um AVC. Não é causa idônea e adequada. Porém, se eu soubesse dessa situação, a causa será adequada; b) Lesiono uma pessoa que morre num 23 24 25 LEMOS, Patrícia Faga Iglecias. Meio ambiente... Op. Cit., p. 133. LEMOS, Patrícia Faga Iglecias. Meio ambiente... Op. Cit., p. 134. LEMOS, Patrícia Faga Iglecias. Meio ambiente... Op. Cit., p. 134. incêndio no hospital. Não há causalidade adequada. Resumindo a teoria, Patrícia Iglecias anota que ela “trabalha com a adequação da causa em razão da possibilidade ou probabilidade de um resultado. Adequação no sentido de adaptação, ou seja, o efeito deve ser apropriado à forma de agir do sujeito em função do dano resultante, que era de esperar para aquelas condições”. É dizer, dentro da teoria da causalidade adequada, “para que exista nexo de causalidade, a ação deve ser idônea para produzir aquele resultado. A noção de causalidade adequada supõe que na pluralidade de casos será causa aquilo que normalmente ocorre em situações semelhantes”.26 Ainda que tenha representado um avanço perante as demais teorias e tenha sofrido grande desenvolvimento no âmbito do direito português, e mesmo alguns apontem a sua presença no direito brasileiro27, é fato que a teoria da causalidade adequada apresenta razoável ponto fraco ao conferir grande arbítrio ao juiz para estabelecer, de forma abstrata e retroativa, a causa adequada dentre muitas concausas. Assim é que a autora citada, muito embora pondere que a teoria tenha o mérito de trazer um critério mais objetivo para a responsabilização, “mesmo assim não se adapta plenamente ao dano ambiental, pois para a causalidade adequada só será causa a atuação idônea a produzir o resultado e, na análise da concausa, poderia haver quebra do nexo causal, gerando uma distinção entre a responsabilidade do causador principal e daquele que apenas contribuiu para o dano realizando a concausa”.28 3.3. Teoria do dano direto e imediato, ou teoria da necessariedade do dano, ou da causalidade necessária, ou ainda teoria da interrupção do nexo causal A teoria em tela distingue, dentro do conjunto de antecedentes causais, a causa das condições, sendo, em princípio, apenas uma única a causa necessária do dano, não necessariamente a mais próxima do dano. O dano indireto pode ser indenizado se for conseqüência de um ato ilícito ou de um ato lícito objetivamente considerado. A propósito, Patrícia Iglecias anota: A doutrina da necessariedade da causa foi a que melhor explicou o significado da expressão “direto e imediato” como “necessário”. Assim, 26 27 LEMOS, Patrícia Faga Iglecias. Meio ambiente... Op. Cit., p. 134-135. Veja-se, a propósito, o Enunciado 47 da I Jornada de Direito Civil: Art. 945: o art. 945 do Código Civil, que não encontra correspondente no Código Civil de 1916, não exclui a aplicação da teoria da causalidade adequada. 28 LEMOS, Patrícia Faga Iglecias. Meio ambiente... Op. Cit., p. 136. mesmo que a inexecução resulte de dolo do devedor, ele só responde pelos danos que são consequência necessário do inadimplemento. Ficam excluídos os danos posteriores, advindos de novas causas, quando não são efeito direto e imediato do inadimplemento. De fato, a teoria faz distinção entre causa e as demais condições no conjunto de antecedentes causais, que não ensejarão o dever de indenizar.29 Não é a distância do dano que vai interromper o nexo causal, mas sim o aparecimento de uma outra causa ou série causal, seja quando o credor ou terceiro seja o autor dessa outra causa direta e necessária, seja quando atribuível a um fato natural (por exemplo, nas hipóteses de força maior), admitindo-se, portanto, causas excludentes da responsabilidade civil. Essa interrupção do nexo causal, porém, obedece a limites: é preciso que a segunda série causal seja completamente independente da primeira causa e que a sua eficácia causal sozinha tenha produzido o dano.30 Ora, a presente teoria é, segundo Agostinho Alvim, coordenador inicial do Livro de Direito das Obrigações do Código Civil de 2002 e diversos outros estudiosos brasileiros, a teoria adotada pelo Código Civil em seu art. 403. Por outro lado, a teoria do dano direto e imediato admite concausas: duas causas necessárias num mesmo evento. As causas podem ser concorrentes (quando ambas eram aptas para causar o dano) ou complementares. O problema da teoria é que o estreitamento da causalidade necessária para a produção do dano pode levar a situações de baixa indenizabilidade, não só no aspecto da identificação dos causadores dos danos, como no próprio quantum indenizatório, o que se mostra mais grave ainda na seara da responsabilidade ambiental. A propósito, Patrícia Iglecias afirma que“(...) nos danos ao meio ambiente (…), não se permite a distinção entre causa principal e causa acessória, primando-se pela mais ampla reparação dos danos causados. Por isso, a responsabilização apenas daquele poluidor que praticou a causa idônea para produzir o dano deve ser afastada. Todos os causadores do dano são responsáveis”.31 3.4. Teorias ambientais propriamente ditas Duas teorias de explicitação do nexo de causalidade tiveram nascimento dentro do Direito Ambiental, segundo indica a professora livre-docente da USP, uma de origem holandesa, outra de origem norte-americana, as quais, no entanto, mesmo assim não resolvem 29 30 31 LEMOS, Patrícia Faga Iglecias. Meio ambiente... Op. Cit., p. 139. LEMOS, Patrícia Faga Iglecias. Meio ambiente... Op. Cit., p. 139. LEMOS, Patrícia Faga Iglecias. Meio ambiente... Op. Cit., p. 140. por completo o problema do nexo de causalidade. Segundo ela, na chamada teoria holandesa da causa alternativa ou disjuntiva (industry wide or enterprise theory of liability): (...) o demandante não precisa provar o nexo de causalidade quando, em função do elevado número de possíveis sujeitos agentes, fica impossível que a vítima prove materialmente quem é o causador do dano cuja reparação se busca. Assim, deve haver solidariedade entre os possíveis sujeitos intervenientes, com o que se reforça a proteção da vítima. O direito brasileiro adota a regra de solidariedade entre os causadores do dano no art. 942 do CC, mas não exime que se prove quem é o causador do dano, bem como o liame de causalidade.32 Por outro lado, a teoria americana de participação no mercado, ou market share: (...) determina que o autor da ação não tem que provar o nexo causal se os demandados são fabricantes de determinado produto que causou o dano. Se o autor não pode identificar o produtor que efetivamente causou o dano, todos os produtores que têm uma quota relevante do mercado poderiam ser 33 demandados. 3.5. Teoria do escopo da norma jurídica A professora de Direito Ambiental da USP expressa, na obra em referência, predileção pela denominada teoria do escopo da norma jurídica como adequada para o problema do nexo de causalidade entre a conduta do poluidor e o dano ao meio ambiente ocasionado. De fato, segundo essa teoria, “(...) a distinção entre os danos indenizáveis e não indenizáveis não deve tomar por base a causalidade adequada do fato, mas sim os reais interesses tutelados pelo fim do contrato ou pelo fim da norma legal”. 34 Em outras palavras, “a teoria tomar por base o fato de que não há um único critério válido para aferição do nexo causal, o que exige que o julgador considere a função da norma violada, para verificar se o evento danoso está sob sua proteção”. 35 Com apoio em Antunes Varela, afirma assim que “(...) a seleção dos danos reparáveis não está na ideia fática de causalidade, mas no elemento positivo do fim da proteção contratual ou legal”. 36 32 33 34 35 36 LEMOS, Patrícia Faga Iglecias. Meio ambiente... Op. Cit., p. 142. LEMOS, Patrícia Faga Iglecias. Meio ambiente... Op. Cit., p. 142-143. LEMOS, Patrícia Faga Iglecias. Meio ambiente... Op. Cit., p. 136. LEMOS, Patrícia Faga Iglecias. Meio ambiente... Op. Cit., p. 137. LEMOS, Patrícia Faga Iglecias. Meio ambiente... Op. Cit., p. 145-146. E prossegue: “Considerando as dificuldades de um único critério para aferição do nexo de causalidade em todos os casos de responsabilidade civil, a teoria determina que o juiz deve voltar-se para a função da norma violada, aferindo se o evento danoso recai sob o seu âmbito de proteção”. 37 Levando em conta que a questão do nexo de causalidade é muito mais jurídica, no sentido de, muitas vezes ou quase sempre, existir uma norma de atribuição da responsabilidade civil, do que propriamente fática, a professora Patrícia Iglecias arremata: Na verdade, o reconhecimento do direito ao meio ambiente sadio e ecologicamente equilibrado, ao qual corresponde um dever de preservação para as presentes e futuras gerações, como um direito fundamental do homem, decorrente do próprio direito à vida, justifica a adoção da teoria do escopo da norma violada para análise da responsabilidade ambiental.38 (...) Entendemos que a teoria da norma jurídica violada tem o mérito de afastarse da aproximação fática, buscando o nexo causal jurídico na norma violada, o que nos parece significativamente melhor para a responsabilização por danos ao meio ambiente. Temos que considerar as dificuldades típicas da questão ambiental como a distância, a multiplicidade de fatores incidentes, o problema do tempo para que se verifique a ocorrência do dano e até mesmo a falta de certeza científica em diversas hipóteses. Assim, a aplicação da teoria do escopo da norma violada aliada às presunções de responsabilidade e a mais ampla inversão do ônus da prova são primordiais para a realização do direito ao meio ambiente sadio e 39 ecologicamente previsto no art. 225, caput, da CF. 3.6. Presunções de causalidade A comprovação do nexo de causalidade entre conduta e dano ambiental é, por vezes, tão intricada e, em algumas situações, até mesmo impossível, que surgiu na doutrina ambientalista a teoria da presunção de causalidade, ou causalidade suposta ou pressuposta. Com efeito, uma série de fatores influenciam na dificuldade de se comprovar o nexo de causalidade entre conduta e dano ambiental, como a distância entre o local da atividade poluente e o local da ocorrência do dano ambiental, o lapso temporal entre uma e outro, a multiplicidade de causas ocasionadoras do dano, no que é chamado de causalidade complexa, e, especial, a dúvida científica acerca da possibilidade daquela conduta ter causado aquele dano específico. Assim, para a teoria da presunção da causalidade, se não se tem certeza científica se 37 38 39 LEMOS, Patrícia Faga Iglecias. Meio ambiente... Op. Cit., p. 147. LEMOS, Patrícia Faga Iglecias. Meio ambiente... Op. Cit., p. 149. LEMOS, Patrícia Faga Iglecias. Meio ambiente... Op. Cit., p. 150. determinada conduta provocou o dano, diante então de alguns indicativos encontrados mediante início de prova robusta, quase sempre prova técnica, presume-se então que sim. 3.7. Inversão do ônus da prova em desfavor do poluidor Outro mecanismo voltado a enfrentar às dificuldades do estabelecimento do nexo de causalidade em matéria ambiental é a inversão do ônus da prova em desfavor do suposto poluidor, o qual então terá que provar que não foi o responsável direto ou indireto por aquele dano ambiental. Tal possibilidade processual mostra-se possível em face do que determina a redação atual do art. 21 da Lei da Ação Civil Pública, a qual afirma que “aplicam-se à defesa dos direitos e interesses difusos e coletivos o capítulo processual do CDC”. Ora, tratando-se o direito básico do consumidor à inversão do ônus da prova (art. 6, inciso VIII) de uma regra sobretudo de direito processual, clarividente está a justificativa legal para a sua ocorrência nos processos em que se discutam a reparabilidade de danos ambientais. Ademais, tratando-se a responsabilidade ambiental de responsabilidade objetiva, e sendo certo que é a empresa que detém o manacial técnico adequado para demonstrar que não poluiu, a lógica jurídica já determinaria a inversão do ônus da prova, paradigma já confirmado pelo Superior Tribunal de Justiça no âmbito ambiental40. 3.8. Solidariedade entre poluidores A solidariedade entre vários poluidores também é encampada pela doutrina e jurisprudência ambiental como forma de amenizar as dificuldades por vezes encontrada de estabelecimento adequado do nexo de causalidade entre a conduta de vários agentes e um dano ambiental que se mostra único. Assim, é que, muito embora haja uma previsão apenas implícita na Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (inciso IV de seu art. 3º), a respeito da solidariedade entre o responsável direto e indireto do dano, a doutrina e jurisprudência construíram a tese da solidariedade a partir do arts. 1518 do CC 1916 e 942 do CC 2002. Portanto, se três poluidores participem de um único dano ambiental, nas proporções hipotéticas de 10, 30 e 60%, todos responderão solidariamente, isto é, aquele que participou 40 Veja-se o julgado paradigmático: AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROVA PERICIAL. INVERSÃO DO ÔNUS. ADIANTAMENTO PELO DEMANDADO. DESCABIMENTO. PRECEDENTES. (…) II - Aquele que cria ou assume o risco de danos ambientais tem o dever de reparar os danos causados e, em tal contexto, transfere-se a ele todo o encargo de provar que sua conduta não foi lesiva. III Cabível, na hipótese, a inversão do ônus da prova que, em verdade, se dá em prol da sociedade, que detém o direito de ver reparada ou compensada a eventual prática lesiva ao meio ambiente - artigo 6º, VIII, do CDC c/c o artigo 18, da lei nº 7.347/85. IV - Recurso improvido. (REsp 1049822/RS, Rel. Min. FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, j. 23/04/2009, DJe 18/05/2009) com a menor parcela poderá arcar com toda a recomposição e reparação. Logicamente que as relações internas entre eles encontra-se mantida, de modo que se lhe fará possível a proposição de demanda regressiva em face dos demais. Registre-se que, mais uma vez, o Superior Tribunal de Justiça já teve oportunidade de reconhecer esse mecanismo de facilitação dos danos, sendo ilustrativo, por exemplo, o julgamento do REsp 880.160/RJ41. 4. RESPONSABILIDADE CIVIL POR AQUISIÇÃO DE PASSIVO AMBIENTAL Ainda sobre o tema do nexo de causalidade fático entre conduta e dano, chega-se mesmo a defender a sua desnecessidade na seara da responsabilidade civil ambiental, como no caso paradigmático da responsabilidade do adquirente de terra já desmatada ou danificada. Essa questão, contudo, não é tão simples, envolvendo múltiplos aspectos, os quais se iniciam pela própria função socioambiental da propriedade agrária, titularizada pelo proprietário, o que, segundo Patrícia Iglecias, implica então que esse “fica obrigado não somente a um comportamento negativo, mas também a um comportamento ativo, que envolve defender, reparar e preservar o meio ambiente”. Segundo ela, “há um direito à preservação do bem, que é superior ao direito individual de propriedade. É o que chamamos de direito socioambiental de titularidade difusa. A proteção volta-se ao bem, pouco importando a sua titularidade no caso concreto”. 42 Assim, se a função socioambiental assenta a responsabilidade do proprietário em si de toda e qualquer propriedade agrária, encontra-se ao menos construído o fundamento éticojurídico para decisões que determinam ao adquirente de imóvel agrário já degradado a obrigação de recompor tal dano ambiental. Particularmente, talvez um dos principais pontos em que a responsabilidade do adquirente de imóvel rural avulta de importância está na recomposição ou regeneração tanto 41 AMBIENTAL. DRENAGEM DE BREJO. DANO AO MEIO AMBIENTE. ATIVIDADE DEGRADANTE INICIADA PELO PODER PÚBLICO E CONTINUADA PELA PARTE RECORRIDA. NULIDADE DA SENTENÇA. PARTE DOS AGENTES POLUIDORES QUE NÃO PARTICIPARAM FEITO. INOCORRÊNCIA DE VÍCIOS. LITISCONSÓRCIO PASSIVO FACULTATIVO. SOLIDARIEDADE PELA REPARAÇÃO DO DANO AMBIENTAL. IMPOSSIBILIDADE DE SEPARAÇÃO DA RESPONSABILIDADE DOS AGENTES NO TEMPO PARA FINS DE CONDENAÇÃO EM OBRIGAÇÃO DE FAZER (REPARAÇÃO DO NICHO). ABRANGÊNCIA DO CONCEITO DE "POLUIDOR" ADOTADO PELA LEI N. 6.938/81. DIVISÃO DOS CUSTOS ENTRE OS POLUIDORES QUE DEVE SER APURADO EM OUTRA SEDE. (…) 3. Também é remansosa a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça pela impossibilidade de que qualquer dos envolvidos alegue, como forma de se isentar do dever de reparação, a não-contribuição direta e própria para o dano ambiental, considerando justamente que a degradação ambiental impõe, entre aqueles que para ela concorrem, a solidariedade da reparação integral do dano. (…) (REsp 880.160/RJ, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 04/05/2010, DJe 27/05/2010) 42 LEMOS, Patrícia Faga Iglecias. Meio ambiente... Op. Cit., p. 82. da reserva legal florestal quanto de área de preservação permanente43 eventualmente existente pelo adquirente de imóvel rural degradado, sendo esse certamente uma das principais possibilidades de passivo ambiental. No tocante a esse importantíssimo tema de responsabilidade civil ambiental mesmo que o adquirente da propriedade não tenha provocado o dano ou degradação ambiental, há de se observar que, nos últimos anos, observaram-se modificações legislativas variadas ao longo das últimas duas décadas até o advento do novo Código Florestal brasileiro que acabaram por imputar normativamente a responsabilidade. De igual modo, o tema foi enfrentado pela jurisprudência, inclusive do Superior Tribunal de Justiça, tendo sido observado reflexa mudança de sua orientação. Com efeito. Legislativamente, muito embora o antigo Código Florestal brasileiro (Lei n. 4.771/1965), com a então redação dada pela Lei n. 7.803/1989, impusesse restrições ao exercício de propriedade no tocante à exploração das florestas de domínio privado e/ou demais formas de vegetação nativa, impondo limites mínimos de conservação a título de reserva legal – o limite mínimo de 20% era recorrente na então redação legislativa –, a verdade é que a obrigação de recomposição da reserva legal somente foi incorporada ao ordenamento jurídico brasileiro com a Lei da Política Agrícola brasileira (Lei n. 8.171/1991), que, em seu artigo 99, determinava a recomposição pelo proprietário rural da reserva, “mediante o plantio, em cada ano, de pelo menos um trinta avos da área total para complementar a referida Reserva”, sendo que o §2o do mesmo artigo determinava que o reflorestamento seria “efetuado mediante normas que serão aprovadas pelo órgão gestor da matéria”. Quanto ao velho Código Florestal em si, foi somente a MP n. 2.166-67, de 24 de agosto de 2001, que não só introduziu a proibição de supressão da reserva mínima legal (§ 2o do art. 16) como também impôs a própria obrigação de sua recomposição pelo proprietário ou possuidor de imóvel rural, recomposição da “área de floresta nativa, natural, primitiva ou regenerada ou outra forma de vegetação nativa em extensão inferior ao estabelecido nos incisos I, II, III e IV do art. 16”, “mediante o plantio, a cada três anos, de no mínimo 1/10 da 43 Os conceitos legislativos de reserva legal e área de preservação permanente estavam presentes tanto no antigo quanto no novo Código Florestal (Lei n. 12.651/2012). No novo Código, são os seguintes: “Art. 3o Para os efeitos desta Lei, entende-se por: II - Área de Preservação Permanente - APP: área protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas; III - Reserva Legal: área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, delimitada nos termos do art. 12, com a função de assegurar o uso econômico de modo sustentável dos recursos naturais do imóvel rural, auxiliar a conservação e a reabilitação dos processos ecológicos e promover a conservação da biodiversidade, bem como o abrigo e a proteção de fauna silvestre e da flora nativa;” área total necessária à sua complementação, com espécies nativas, de acordo com critérios estabelecidos pelo órgão ambiental estadual competente” (art. 44). Sob esses influxos, a orientação originária do STJ era no sentido de que o novo proprietário seria parte ilegítima ad causam para responder pela recomposição arbórea ou florestal, já que não havia dado causa ao dano de desmatamento44, isto é, por inexistência de nexo de causalidade entre sua conduta e o dano ambiental provocado, não havendo obrigação legal prevista no Código Florestal para tanto, sendo, por outro lado, inaplicável o art. 99 da Lei de Política Agrícola 45. Porém, a partir do ano de 2002, com apoio nas normas cogentes acima indicadas, bem ainda no entendimento de que a obrigação de recomposição seria do tipo propter rem, o Superior Tribunal de Justiça passou definitivamente a entender pela responsabilidade civil ambiental do adquirente pela recomposição das florestas e/ou demais formas de vegetação nativa46 47. 44 Para além do julgado precursor EDcl no REsp 156899/PR, da lavra do Ministro GARCIA VIEIRA, julgado em 15/06/1998, vejam-se os julgados paradigmas a seguir: a) DANO AO MEIO AMBIENTE - AQUISIÇÃO DE TERRA DESMATADA - REFLORESTAMENTO - RESPONSABILIDADE - AUSÊNCIA - NEXO CAUSAL – DEMONSTRAÇÃO. Não se pode impor a obrigação de reparar dano ambiental, através de restauração de cobertura arbórea, a particular que adquiriu a terra já desmatada. O artigo 99 da Lei nº 8.171/91 é inaplicável, visto inexistir o órgão gestor a que faz referência. O artigo 18 da Lei nº 4.771/65 não obriga o proprietário a florestar ou reflorestar suas terras sem prévia delimitação da área pelo Poder Público.Embora independa de culpa, a responsabilidade do poluidor por danos ambientais necessita da demonstração do nexo causal entre a conduta e o dano. Recurso provido.(REsp 214.714/PR, Rel. Ministro GARCIA VIEIRA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/08/1999, DJ 27/09/1999 p. 59); b) Ação Civil Pública. Dano ao meio ambiente. Ilegitimidade do adquirente de propriedade já desmatada. Reflorestamento. Responsabilidade. Artigo 16, "a", da Lei 4.771/65. 1. Não tem legitimidade para figurar no pólo de ação civil pública o proprietário de terras que já as adquiriu desmatadas, pois a ele não se pode impor o ônus do reflorestamento, se não foi o agente do dano. 2. Precedentes da Primeira Turma. 3. Recurso não provido. (REsp 218.781/PR, Rel. Ministro MILTON LUIZ PEREIRA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 05/02/2002, DJ 24/06/2002, p. 191) 45 É bem verdade a existência do REsp 222.349/PR, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 23/03/2000, DJ 02/05/2000, p. 105, em sentido contrário, porém veja-se que, em nenhum momento de seu inteiro teor, o Ministro prolator situou a responsabilidade civil ambiental de recomposição à luz do art. 99 da Lei de Política Agrícola. 46 Os dois julgados precursores da nova ordem jurisprudencial foram os seguintes: a) ADMINISTRATIVO - DANO AO MEIO-AMBIENTE - INDENIZAÇÃO - LEGITIMAÇÃO PASSIVA DO NOVO ADQUIRENTE. 1. A responsabilidade pela preservação e recomposição do meio-ambiente é objetiva, mas se exige nexo de causalidade entre a atividade do proprietário e o dano causado (Lei 6.938/81). 2. Em se tratando de reserva florestal, com limitação imposta por lei, o novo proprietário, ao adquirir a área, assume o ônus de manter a preservação, tornando-se responsável pela reposição, mesmo que não tenha contribuído para devastá-la. 3. Responsabilidade que independe de culpa ou nexo causal, porque imposta por lei. 4. Recurso especial provido. (REsp 282.781/PR, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 16/04/2002, DJ 27/05/2002 p. 153); b) RECURSO ESPECIAL. FAIXA CILIAR. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. RESERVA LEGAL. TERRENO ADQUIRIDO PELO RECORRENTE JÁ DESMATADO. IMPOSSIBILIDADE DE EXPLORAÇÃO ECONÔMICA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. OBRIGAÇÃO PROPTER REM. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO CONFIGURADA. As questões relativas à aplicação dos artigos 1º e 6º da LICC, e, bem assim, à possibilidade de aplicação da responsabilidade objetiva em ação civil pública, não foram enxergadas, sequer vislumbradas, pelo acórdão recorrido. Tanto a faixa ciliar quanto a reserva legal, em qualquer propriedade, incluída a da recorrente, não podem ser objeto de exploração econômica, de maneira que, ainda que se não dê o reflorestamento imediato, referidas zonas não podem servir como pastagens. Não há cogitar, pois, de ausência de nexo causal, visto que aquele que perpetua a lesão ao meio ambiente cometida por outrem está, ele mesmo, praticando o ilícito. A obrigação de conservação é automaticamente transferida do alienante ao adquirente, independentemente deste último ter responsabilidade pelo dano ambiental. Recurso especial não conhecido. (REsp 343741/PR, Rel. Ministro FRANCIULLI NETTO, SEGUNDA TURMA, julgado em 04/06/2002, DJ 07/10/2002, p. 225) 47 A propósito do caráter propter rem da obrigação, veja-se o belíssimo e recente acórdão da lavra do Min. Paraibano Herman Benjamim: EREsp 218.781/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/12/2009, DJe 23/02/2012. Ora, num primeiro momento, sob um ótica estritamente clássica da responsabilidade civil, poder-se-ia entender que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça simplesmente dispensou a existência do nexo de causalidade fático entre a conduta e o dano, pois esse aparentemente seria inexistente no caso, já que o dano foi provocado pelo proprietário anterior do imóvel agrário. Na realidade, contudo, para além do argumento de que a obrigação de recomposição ambiental adviria de seu caráter propter rem – de resto normativamente introduzida no novo Código Florestal brasileiro, o que impende reconhecer é que o nexo de causalidade no âmbito da responsabilidade civil ambiental, como dito, é um problema muito mais jurídico-normativo do que propriamente fático. Em outras palavras, na hipótese em referência de responsabilidade civil ambiental por aquisição de passivo ambiental, o nexo de causalidade definitivamente não é fático, mas sim normativo, já que sempre derivou de deveres legais de recomposição vegetal da reserva legal mínima, previsto tanto no art. 99 da Lei da Politica Agrícola (Lei n. 8.171/1991) quanto no art. 44 do antigo Código Florestal de 1965. Indiscutivelmente, agora, tanto no que se refere às reservas legais quanto às próprias áreas de preservação permanentes – APP, mesmo no que se refere ao novo conceito legislativo da chamada área rural consolidada até 22 de julho de 200848, tal obrigação legal de recomposição florestal ou das demais formas de vegetação nativa, por nexo normativo e não fático, continuará a existir à luz do novo Código Florestal brasileiro (Lei n. 12.651/2012), derivadando-se de diversos artigos seus, em especial 7o, 17, 61-A, 61-B e 6649. 48 Art. 3o Para os efeitos desta Lei, entende-se por: IV - área rural consolidada: área de imóvel rural com ocupação antrópica preexistente a 22 de julho de 2008, com edificações, benfeitorias ou atividades agrossilvipastoris, admitida, neste último caso, a adoção do regime de pousio; XXIV - pousio: prática de interrupção de atividades ou usos agrícolas, pecuários ou silviculturais, por no máximo 5 (cinco) anos, em até 25% (vinte e cinco por cento) da área produtiva da propriedade ou posse, para possibilitar a recuperação da capacidade de uso ou da estrutura física do solo; (Incluído pela Medida Provisória nº 571, de 2012). }49 Art. 7o A vegetação situada em Área de Preservação Permanente deverá ser mantida pelo proprietário da área, possuidor ou ocupante a qualquer título, pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado. 49 Art. 7o A vegetação situada em Área de Preservação Permanente deverá ser mantida pelo proprietário da área, possuidor ou ocupante a qualquer título, pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado. § 1o Tendo ocorrido supressão de vegetação situada em Área de Preservação Permanente, o proprietário da área, possuidor ou ocupante a qualquer título é obrigado a promover a recomposição da vegetação, ressalvados os usos autorizados previstos nesta Lei. § 2o A obrigação prevista no § 1o tem natureza real e é transmitida ao sucessor no caso de transferência de domínio ou posse do imóvel rural. § 3o No caso de supressão não autorizada de vegetação realizada após 22 de julho de 2008, é vedada a concessão de novas autorizações de supressão de vegetação enquanto não cumpridas as obrigações previstas no § 1o. Do Regime de Proteção da Reserva Legal Art. 17. A Reserva Legal deve ser conservada com cobertura de vegetação nativa pelo proprietário do imóvel rural, possuidor ou ocupante a qualquer título, pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado. (…) § 3o É obrigatória a suspensão imediata das atividades em Área de Reserva Legal desmatada irregularmente após 22 de julho de 2008. (Redação dada pela Medida Provisória nº 571, de 2012). § 4o Sem prejuízo das sanções administrativas, cíveis e penais cabíveis, deverá ser iniciado o processo de recomposição da Reserva Legal em até dois anos contados a partir da data da publicação desta Lei, devendo tal processo ser concluído nos prazos estabelecidos pelo Programa de Regularização Ambiental – PRA, de que trata o art. 59. (Incluído pela Medida Provisória nº 571, de 2012). Das Áreas Consolidadas em Áreas de Preservação Permanente Art. 61-A. Nas Áreas de Preservação Permanente é autorizada, exclusivamente, a continuidade das atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo e de turismo rural em áreas rurais consolidadas até 22 de julho de 2008. (Incluído pela Medida Provisória nº 571, de 2012). § 1o Para os imóveis rurais com área de até 1 (um) módulo fiscal que possuam áreas consolidadas em Áreas de Preservação Permanente ao longo de cursos d’água naturais, será obrigatória a recomposição das respectivas faixas marginais em 5 (cinco) metros, contados da borda da calha do leito regular, independentemente da largura do curso d´água. (Incluído pela Medida Provisória nº 571, de 2012). § 2o Para os imóveis rurais com área superior a 1 (um) módulo fiscal e de até 2 (dois) módulos fiscais que possuam áreas consolidadas em Áreas de Preservação Permanente ao longo de cursos d’água naturais, será obrigatória a recomposição das respectivas faixas marginais em 8 (oito) metros, contados da borda da calha do leito regular, independente da largura do curso d´água. (Incluído pela Medida Provisória nº 571, de 2012). § 3o Para os imóveis rurais com área superior a 2 (dois) módulos fiscais e de até 4 (quatro) módulos fiscais que possuam áreas consolidadas em Áreas de Preservação Permanente ao longo de cursos d’água naturais, será obrigatória a recomposição das respectivas faixas marginais em 15 (quinze) metros, contados da borda da calha do leito regular, independentemente da largura do curso d’água. (Incluído pela Medida Provisória nº 571, de 2012). § 4o Para os imóveis rurais com área superior a 4 (quatro) módulos fiscais que possuam áreas consolidadas em Áreas de Preservação Permanente ao longo de cursos d’água naturais, será obrigatória a recomposição das respectivas faixas marginais: (Incluído pela Medida Provisória nº 571, de 2012). I - em 20 (vinte) metros, contados da borda da calha do leito regular, para imóveis com área superior a4 (quatro) e de até 10 (dez) módulos fiscais, nos cursos d’agua com até 10 (dez) metros de largura; e II - nos demais casos, em extensão correspondente à metade da largura do curso d’água, observado o mínimo de 30 (trinta) e o máximo de 100 (cem) metros, contados da borda da calha do leito regular. § 5o Nos casos de áreas rurais consolidadas em Áreas de Preservação Permanente no entorno de nascentes e olhos d’água perenes, será admitida a manutenção de atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo ou de turismo rural, sendo obrigatória a recomposição do raio mínimo de: (Incluído pela Medida Provisória nº 571, de 2012). I - 5 (cinco) metros, para imóveis rurais com área de até 1 (um) módulo fiscal; II - 8 (oito) metros, para imóveis rurais com área superior a 1 (um) módulo fiscal e de até 2 (dois) módulos fiscais; e III - 15 (quinze) metros, para imóveis rurais com área superior a 2 (dois) módulos fiscais. § 6o Para os imóveis rurais que possuam áreas consolidadas em Áreas de Preservação Permanente no entorno de lagos e lagoas naturais, será admitida a manutenção de atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo ou de turismo rural, sendo obrigatória a recomposição de faixa marginal com largura mínima de: (Incluído pela Medida Provisória nº 571, de 2012). I - 5 (cinco) metros, para imóveis rurais com área de até 1 (um) módulo fiscal; II - 8 (oito) metros, para imóveis rurais com área superior a 1 (um) módulo fiscal e de até 2 (dois) módulos fiscais; III - 15 (quinze) metros, para imóveis rurais com área superior a 2 (dois) módulos fiscais e de até 4 (quatro) módulos fiscais; e IV - 30 (trinta) metros, para imóveis rurais com área superior a 4 (quatro) módulos fiscais. § 7o Nos casos de áreas rurais consolidadas em veredas, será obrigatória a recomposição das faixas marginais, em projeção horizontal, delimitadas a partir do espaço brejoso e encharcado, de largura mínima de: (Incluído pela Medida Provisória nº 571, de 2012). I - 30 (trinta) metros, para imóveis rurais com área de até 4 (quatro) módulos fiscais; e II - 50 (cinquenta) metros, para imóveis rurais com área superior a 4 (quatro) módulos fiscais. § 8o Será considerada, para os fins do disposto no caput e nos §§ 1o a 7o, a área detida pelo imóvel rural em 22 de julho de 2008. (Incluído pela Medida Provisória nº 571, de 2012). (...) § 13. A recomposição de que trata este artigo poderá ser feita, isolada ou conjuntamente, pelos seguintes métodos: (Incluído pela Medida Provisória nº 571, de 2012) I - condução de regeneração natural de espécies nativas; II - plantio de espécies nativas; III - plantio de espécies nativas conjugado com a condução da regeneração natural de espécies nativas; IV - plantio de espécies lenhosas, perenes ou de ciclo longo, sendo nativas e exóticas. (...) § 16. As Áreas de Preservação Permanente localizadas em imóveis inseridos nos limites de Unidades de Conservação de Proteção Integral criadas por ato do Poder Público até a data de publicação desta Lei não são passíveis de ter quaisquer atividades consideradas como consolidadas nos termos do caput e dos parágrafos anteriores, ressalvado o que dispuser o Plano de Manejo elaborado e aprovado de acordo com as orientações emitidas pelo órgão competente do SISNAMA, nos termos do que dispuser regulamento do Chefe do Poder Executivo, devendo o proprietário, possuidor ou ocupante a qualquer título, adotar todas as medidas indicadas. (Incluído pela Medida Provisória nº 571, de 2012). (...) 5. CONCLUSÃO A responsabilidade civil ambiental certamente é dos temas mais palpitantes de todo o direito ambiental, em face da multiplicidade de possibilidades advindas das particularidades do próprio dano ambiental, muitas vezes impossível de ser identificado e atribuído a um único poluidor específico, algumas vezes repartível entre vários, outras tantas dano anônimo. Diversos temas da responsabilidade civil ambiental encontram-se ainda em aberto e são alvo de amplas discussões doutrinárias e jurisprudenciais, a exemplo da teoria objetiva encampada no direito brasileiro, se a teoria do risco integral ou do risco-proveito, ou no que respeita à teoria indicadora do nexo de causalidade fático entre a conduta do poluidor ou dos poluidores e o dano ocasionado ao meio ambiente. De igual modo, diante das dificuldades do estabelecimento desse nexo de causalidade, diversos mecanismos visando à imputação vêm sendo utilizados pela doutrina e jurisprudência, como, por exemplo, a inversão do ônus da prova, a presunção de causalidade, a solidariedade entre múltiplos poluidores, dentre outros. Na hipótese específica da responsabilidade do adquirente de propriedade agrária já Art. 61-B. Aos proprietários e possuidores dos imóveis rurais que, em 22 de julho de 2008, detinham até 4 (quatro) módulos fiscais e desenvolviam atividades agrossilvipastoris nas áreas consolidadas em Áreas de Preservação Permanente, é garantido que a exigência de recomposição, nos termos desta Lei, somadas todas as Áreas de Preservação Permanente do imóvel, não ultrapassará: (Incluído pela Medida Provisória nº 571, de 2012). I - 10% (dez por cento) da área total do imóvel, para imóveis rurais com área de até 2 (dois) módulos fiscais; e II - 20% (vinte por cento) da área total do imóvel, para imóveis rurais com área superior a 2 (dois) e de até 4 (quatro) módulos fiscais. (...) Seção III Das Áreas Consolidadas em Áreas de Reserva Legal Art. 66. O proprietário ou possuidor de imóvel rural que detinha, em 22 de julho de 2008, área de Reserva Legal em extensão inferior ao estabelecido no art. 12, poderá regularizar sua situação, independentemente da adesão ao PRA, adotando as seguintes alternativas, isolada ou conjuntamente: I - recompor a Reserva Legal; II - permitir a regeneração natural da vegetação na área de Reserva Legal; III - compensar a Reserva Legal. § 1o A obrigação prevista no caput tem natureza real e é transmitida ao sucessor no caso de transferência de domínio ou posse do imóvel rural. § 2o A recomposição de que trata o inciso I do caput deverá atender os critérios estipulados pelo órgão competente do Sisnama e ser concluída em até 20 (vinte) anos, abrangendo, a cada 2 (dois) anos, no mínimo 1/10 (um décimo) da área total necessária à sua complementação. § 3o A recomposição de que trata o inciso I do caput poderá ser realizada mediante o plantio intercalado de espécies nativas e exóticas, em sistema agroflorestal, observados os seguintes parâmetros: I - o plantio de espécies exóticas deverá ser combinado com as espécies nativas de ocorrência regional; II - a área recomposta com espécies exóticas não poderá exceder a 50% (cinquenta por cento) da área total a ser recuperada. § 4o Os proprietários ou possuidores do imóvel que optarem por recompor a Reserva Legal na forma dos §§ 2o e 3o terão direito à sua exploração econômica, nos termos desta Lei. (...) Art. 67. Nos imóveis rurais que detinham, em 22 de julho de 2008, área de até 4 (quatro) módulos fiscais e que possuam remanescente de vegetação nativa em percentuais inferiores ao previsto no art. 12, a Reserva Legal será constituída com a área ocupada com a vegetação nativa existente em 22 de julho de 2008, vedadas novas conversões para uso alternativo do solo. Art. 68. Os proprietários ou possuidores de imóveis rurais que realizaram supressão de vegetação nativa respeitando os percentuais de Reserva Legal previstos pela legislação em vigor à época em que ocorreu a supressão são dispensados de promover a recomposição, compensação ou regeneração para os percentuais exigidos nesta Lei. desmatada ou danificada em repor a cobertura vegetal, chega-se mesmo a abandonar o nexo de causalidade fático entre conduta e dano ambiental, já que quem o causou não foi o adquirente da área, mas sim o alienante, em prol de um nexo normativo de causalidade e de imputação de obrigação legal, postos tanto no art. 99 da Lei da Politica Agrícola, no art. 44 do antigo Código Florestal de 1965, quanto no novíssimo Código Florestal brasileiro de 2012 (Lei n. 12.651/2012), especialmente por seus artigos 7o, 17, 61-A, 61-B e 66. Ao encampar em sólida linha jurisprudencial essa transmutação legislativa dos últimos anos, o Superior Tribunal de Justiça bem como outros tribunais que a seguiram, como o próprio TRF da 5a Região50, adotam inexoravelmente caminho voltado à máxima reparabilidade dos danos ambientais. 6. REFERÊNCIAS BENJAMIM, Antônio Herman Vasconcelos. A responsabilidade civil pelo dano ambiental no direito brasileiro e as lições do direito comparado. Disponível em: <http://bdjur.stj.gov.br/dspace/handle/2011/8632>. Acesso em 15 de maio de 2010. BIANCA, C. MASSIMO. Diritto civile. La responsabilitá. Milano: Giuffrè, 1994. CATALAN, Marcos Jorge. Proteção constitucional do meio ambiente e seus mecanismos de tutela. Método: São Paulo, 2008. CRUZ, Gisela Sampaio da. O problema do nexo causal na responsabilidade civil. Renovar: Rio de Janeiro, 2005. DIAS, JOSÉ DE AGUIAR. Da responsabilidade Civil. XI ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. DIEZ-PICAZO, Luis Maria. Derecho de daños. Madrid: Civitas, 2000. FARIAS, TALDEN. Introdução ao direito ambiental. Belo Horizonte: Del Rey, 2009. FIGUEIREDO, Guilherme José Purvin. Curso de Direito Ambiental. 3. ed. Curitiba: Letra da lei, 2009. GOMES, Orlando. Transformações gerais do Direito das Obrigações. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1980. 50 Vale observar o instigante acórdão do TRF – 5a região a seguir, relativamente a desmatamento e obrigação de recomposição ocorrida nos limites da região metropolitana de João Pessoa/PB: CONSTITUCIONAL, PROCESSUAL CIVIL E AMBIENTAL. DESMATAMENTO. ÁREA DE RESERVA LEGAL. DESNECESSÁRIA A VERIFICAÇÃO DA CULPA OU NEXO CAUSAL. INCUMBE AO PROPRIETÁRIO/POSSUIDOR O DEVER DE RECUPERAR A FLORA NATIVA.1. Sentença que julgou procedente o pedido inicial, condenando a Companhia Usina São João ao IBAMA, a quantia de R$ 50.000,00 a título de indenização, bem como executar projeto de recomposição florestal, a ser apreciado pelo referido Ente em 90 (noventa) dias, incluindo o isolamento da área em recuperação e o plantio de espécies da flora nativa para acelerar sua regeneração. (…) 3. Nada obstante declare a Recorrente não ter havido comprovação do desmatamento, porque a área em questão é destinada há muito tempo ao cultivo de cana-de-açúcar, a vistoria realizada pelos Agrônomos do IBAMA e o Laudo Pericial atestam o corte da vegetação nativa. (...). 5. A responsabilidade pela recuperação da área de reserva legal emerge da posse/propriedade, sendo descabida a verificação de culpa ou nexo causal. Precedentes STJ. Apelo improvido. (PROCESSO: 200682000048951, AC528815/PB, DESEMBARGADOR FEDERAL GERALDO APOLIANO, Terceira Turma, JULGAMENTO: 24/11/2011, PUBLICAÇÃO: DJE 13/12/2011 - Página 25) HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Responsabilidade pressuposta. Belo Horizonte: Del Rey, 2005. LEMOS, Patrícia Faga Iglecias. Meio ambiente e responsabilidade civil do proprietário. Análise do nexo causal. Rt: São Paulo, 2008. LOPEZ, Teresa Ancona. Princípio da precaução e evolução da responsabilidade civil.São Paulo: Quartier Latin, 2010. MIRRA, Álvaro Luiz Valery. Impacto ambiental. Aspectos da legislação brasileira. 3. ed. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2006. KRELL, Andreas Joachim. Concretização do dano ambiental. Objeções à teoria do "risco integral". Disponível em: www.jus.com.br. Acesso em: 15/06/2010. PRADO, Luiz Regis. Direito Penal do Ambiente. São Paulo: RT, 2005. SIRVINSKAS, Luís Paulo. Política Nacional do Meio Ambiente (Lei n. 9.638, de 31 de agosto de 1981). In: As leis federais mais importantes de proteção ao meio ambiente comentadas. Coords.: MORAES, Rodrigo Jorge e outros. Rio de Janeiro: Renovar, 2005.
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