Anonymous e a formação da Opinião Pública – Jonas Attia FECAP
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Anonymous e a formação da Opinião Pública – Jonas Attia FECAP
ANONYMOUS: A FORMAÇÃO DA OPINIÃO PÚBLICA 2.0 Jonas ATTIA1 Helena JACOB2 Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado - FECAP INTRODUÇÃO Este artigo visa analisar a escalada da importância do grupo hacktivista Anonymous e como suas manifestações digitais e físicas influenciaram a Opinião Pública contemporânea atuando dentro do ciberespaço, por meio das redes sociais. Para isso, se faz necessária uma análise das circunstâncias sob as quais o Anonymous se tornou famoso na mídia contemporânea e uma retomada de sua história, a título de contextualização. O PRINCÍPIO: DO 4CHAN À EMANCIPAÇÃO DO TÍTULO DE MEME O Anonymous, originalmente, era composto por um grupo de usuários do imageboard3 4chan, um dos mais famosos e controversos imageboards existentes, conceituado por Cole Stryker como “o local mais interessante da internet”, “um imageboard incompreendido e misterioso definido pela anarquia e anonimato que influencia a forma de comportamento na rede, quer você perceba ou não” (Epic Win for Anonymous, 2011, p. 8). O termo anonymous é relacionado justamente ao fato de os usuários do 4chan postarem de forma anônima, criando essa esfera caótica onde, por não ser reconhecido, você pode falar ou exibir a imagem que bem entender sem preocupação com represálias sociais. Imagens que vão desde fotos de animais até pornografia infantil, convivendo juntamente com “futuros ativistas” expressando seus problemas e suas mágoas sobre tudo e todos abertamente. 1 Estudante de Graduação do 7º semestre de Comunicação Social com ênfase em Relações Públicas da FECAP. Email: [email protected]. 2 Orientadora da pesquisa. Doutoranda em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP, com pesquisa sobre Gastronomia e Mídia, sob orientação da Profa. Dra. Lucrécia D‟Alessio Ferrara. Professora da Faculdade Cásper Líbero e do Centro Universitário Fecap. Email: [email protected]. 3 Definido no próprio 4chan como sendo um tipo de fórum de discussão online onde qualquer usuário pode comentar postagens e compartilhar imagens, conceito originalmente no Japão. É impossível explicar o Anonymous sem ao menos fazer uma passagem por memes, termo criado por Richard Dawkins em seu livro “O Gene Egoísta” (1976) designando uma partícula autopropagatória da evolução cultural. A ideia de meme nos permite analisar a evolução humana por meio do social, e não apenas do biológico. Stryker analisa meme de acordo com o conceito de Dawkins, ou seja, “(...) Religião é um meme. Arte é um meme. Toda a forma humana de expressão social é memética. Nós estamos cercados por memes, indo de cada tradição familiar que apreciamos até os quadrinhos engraçados dos jornais de hoje. Alguns memes são difundidos, como o progressismo. Outros são específicos e íntimos, como a única conversa de bebê entre a mãe e seu filho.” (STRYKER, 2011). No entanto, precisamos trazer os memes para a área que nos interessa, ou seja, a internet. É possível atualizar conceito de Dawkins adicionando ao meme da internet a característica da viralidade4, aumentando sua velocidade e seu impacto causado ao receptor. Sua estrutura também é alterada, tornando possível a mutação de sua concepção, mas com seu aspecto mantendo referência ao meme original. Stryker conceitua o meme da internet como “uma parte de conteúdo (como um vídeo, história, musica, website, pegadinha, tendência, etc.) que conquistou popularidade primariamente pelo boca-a-boca na rede.” Ele propõe uma escala de acordo com o 4chan que ajudaria a compreender o processo de viralização dos memes: 1. Nascimento: Os internet memes surgiriam de qualquer material inserido na internet, mas são considerados territórios mais férteis as comunidades5 onde há intensa produção, como Youtube e DeviantArt; 2. Descoberta: O “produto” é postado em algum tópico no 4chan seguido de algum comentário que denote emoção (como LOL ou OMG 6). Se for um bom meme, se espalha para outros tópicos e tem uma explosão de 4 O significado do termo “viralidade”, originado de viral, diz respeito à forma como a mensagem é transmitida: de pessoa para pessoa (um boca-a-boca digital), com grande velocidade de propagação. 5 O sociólogo Phil Bartle (What is community, 1987) define comunidade como “construção sociológica”, “um conjunto de interações, com comportamentos humanos tendo importância e significado entre seus membros”. 6 Significando “Laughing Out Loud” e “Oh My God”, são expressões calcadas na internet que tem a intenção de passar emoção em poucas letras. comentários, ao mesmo tempo em que começam a surgir paródias e alterações do meme original; 3. Agregação: Passado certo tempo, o meme sai do 4chan e cai na rede “aberta”, geralmente por meio de algum filtrador de conteúdos dele próprio, como o Reddit ou o 9Gag, geralmente locais onde os memes do 4chan viralizam; 4. Boca-a-boca: Quando o meme adquire visibilidade no agregador, não demora muito para que ele seja compartilhado por outros meios, como tweets, posts em blogs e redes sociais, além de mensagens privadas; 5. Seleção: O meme é descoberto por blogs da cultura da internet, como o Know Your Meme 7 ou outro site da Cheezburger Network8, onde é adicionado contexto e descoberta sua história; 6. Exposição no Mainstream9: Com a adição do valor dos blogs, é provável que desperte o interesse da mídia tradicional e seja noticiado, com o teor do meme determinando qual mídia e o horário; 7. Comercialização: Poucos memes se tornam fortes o suficiente a ponto de serem lucrativos. No entanto, quando isso acontece, é por meio da venda de produtos relacionados ou patrocínio corporativo; 8. Morte: Na realidade, um meme nunca morre. Ele cai em uma espiral do silêncio10, sem ser mais discutido, editado ou remixado, ficando latente na “memesfera”11 até ser ressuscitado ou misturado com um meme novo para efeito de comparação cômica. A conceituação de internet meme se faz necessária para que seja possível explicar o que é o Anonymous, uma vez que o coletivo de indivíduos anônimos se tornou um meme por si só. E, como meme, o grupo poderia se tornar apenas 7 Website que tem o objetivo de administrar, analisar e pesquisar o fenômeno viral, conta atualmente com um arquivo de mais de 8500 memes entre confirmados, sendo pesquisados e descartados. 8 Rede de sites desenvolvida em Setembro de 2007, contanto com uma rede de “criadores de conteúdo” (na verdade, fans que desenvolvem imagens para os sites) de mais de 24 milhões, grande propagador e gerador de internet memes. 9 O termo designa algo comum, sendo utilizado nesse caso para apontar à mídia tradicional. 10 Termo desenvolvido por Elisabeth Noelle-Neuman (1972) dizendo respeito à tendência de ocultar opiniões que sejam divergentes da maioria, causado “pelo medo da solidão social, que se propaga em espiral e, algumas vezes, pode ate esconder desejos de mudança presentes na maioria silenciosa” (PENA, Teoria do Jornalismo, p. 155). 11 Expressão utilizada para denominar o lugar na rede reservado aos memes, novos ou esquecidos. engraçado ou então buscar humor em ações obscuras, ilegais ou imorais 12, de acordo com o conceito de bom e mau 13. De acordo com Shii14, um dos responsáveis por trazer o imageboard para o Ocidente, o 4chan criou ambos, não apenas em relação ao humor: membros do Anonymous como ativistas sociais e como perseguidores e provocadores, ambos ainda ativos. Como é dito por Stryker (Epic Win for Anonymous, 2011, p. 23), é possível tratar disso levando-se em conta outra ideia de Clay Shirky (Cognitive Surplus: Creativity and Generosity in a Connected Age, 2011, p. 60) o comportamento social humano, seja ele moral ou não, sempre esteve presente em cada pessoa. No entanto, é necessária a tecnologia certa que ative a característica pessoal e traga à tona comportamentos latentes até então15. Para Stryker, “(...) A escala que o Anonymous opera não seria possível dez anos atrás. Quando você olha para os Tópicos Superiores de Código de Área16, o que não é dito é que, obviamente, há pessoas suficientes, em qualquer área citada por usuários, que possa estar no fórum e levar o tópico para o topo dos comentados. Essa densidade não era assim dez anos atrás. Demora muito mais para as pessoas se acostumarem com isso do que apenas rolar a ferramenta.” (STRYKER apud. SHIRKY, 2011). A OPINIÃO PÚBLICA DE ACORDO COM SEU MEIO Assim como Shirky constata a necessidade do desenvolvimento tecnológico para que o Anonymous pudesse aumentar a quantidade de ações realizadas, o mesmo ocorreu com a formação da opinião pública. No século XVIII, época na qual Rousseau (1762, p. 57) passa a utilizar o termo Opinião Pública como é conhecido hoje17, se inicia um movimento de difusão da alfabetização graças ao aumento do 12 Trent Peacock, codinome de um dos membros do Anonymous, disse que entre eles há (ou havia) a frase em comum: “Nós fazemos isso pelas risadas”. 13 Utilizando a definição de Philip Atkinson, o bom é o que melhora a sociedade, sendo mau o contrário. 14 Pseudônimo do também programador creditado no 4chan como desenvolvedor do software de seus fóruns de texto. 15 Como exemplo é possível utilizar o próprio 4chan e o poder e liberdade que a anonimidade transferia a seus usuários, que tinham a sensação completa de impunidade para qualquer opinião manifestada. 16 Ou area code hookup threads, um tipo específico de tópico onde cada usuário posta o código da área onde se encontra ou mora para checar a proximidade com outros usuários. 17 Especificamente na obra Do Contrato Social, onde o autor trata da liberdade do homem e de suas formas de governos, sendo considerada de grande influência para a Revolução Francesa. poder econômico da classe média. Sarah Chucid (1983, p. 21) atribui à Reforma Protestante a responsabilidade por tal18, uma vez que torna o acesso e compreensão dos livros mais simples quando troca a literatura religiosa pelo romance epistolar19. Considerando-se a teoria de Jürgen Habermas, esta seria uma das etapas da formação de uma esfera pública 20, que por sua vez seria o meio no qual se desenvolveria a opinião pública. Considerando a Reforma como movimento tecnológico literário, é possível traçar um paralelo com o que ocorreu nos EUA no início do século XX com o desenvolvimento do Vale do Silício em polo tecnológico mundial 21 e, com o tempo, possibilitando o surgimento de novas formas de comunicação. O ponto de convergência em questão é o público: em ambos os casos houve a preparação do público para receber informações por meios até então não convencionais22. Além do público, a mudança do paradigma cultural também pode ser relacionada. No caso da França e Inglaterra no século XVIII ocorre uma troca de mãos de poder da corte para a burguesia, o que também é fator condicionante da preparação do público, uma vez que foi essa inversão que permitiu uma aproximação do público em geral dos livros e também dos concertos por meio da cobrança de entrada23. Existe semelhança com o caso do Vale do Silício, mas o controle não é perdido pelo governo: o desenvolvimento tecnológico torna a globalização real e com isso a mídia começa a perder o status de disseminadora única de notícias e também perde parte de sua credibilidade plena, sendo possível detectar o teor impresso na informação pelo veículo graças à facilidade de encontrar outras fontes dados e uma grande quantidade de novos periódicos online confiáveis. A Opinião Pública atual 18 DA VIÁ, S.C. Opinião Pública: técnicas de formação e problemas de controle. São Paulo: Edições Loyola, 1983. p. 21-22. 19 Alteração que pode ser considerada um tipo de revolução tecnológica uma vez que só é possível pelo desenvolvimento ferramental, neste caso sendo a prensa tipográfica a permitir a distribuição de uma literatura divergente à conhecida na época. 20 Teoria esta presente na obra A Mudança Estrutural da Esfera Pública, primeira de Habermas, que se tornou base de seus estudos. 21 Graças ao estabelecimento da Universidade Stanford, berço de criadores de tecnologias, e do surgimento de uma grande quantidade de empresas e empreendedores do ramo de tecnologia. 22 Em ambos os casos a preparação do público, mesmo que não intencional, foi a condição sine qua non para as mudanças posteriores. 23 Nesta época, Chucid afirma, os salões e cafés já possuíam maior controle sobre a Opinião Pública, sendo considerados fundamentais em sua formação. Se no século XVIII ocorre o primeiro aparecimento de uma esfera pública, atualmente vivenciamos há algum tempo a formação de uma esfera pública digital constituída no ciberespaço, com um número incontável de usuários participantes24 geradores de conteúdo e de opinião, inicialmente privada, que ao ir de encontro às demais gera uma Opinião Pública digital. Neste contexto, Antonio Francisco Magnoni25 diz que “No mundo conturbado do início do século XXI, as redes sociais da internet têm servido para denunciar, para pedir ajuda política e humanitária, para mobilizar para a solidariedade e a resistência civil, para tentar socorrer os perseguidos, para clamar pelos excluídos e apartados. As entidades sindicais utilizam as ferramentas comunicativas da rede para despertar a consciência de classe e mobilizar contra os ajustes ultraliberais, os contingentes de trabalhadores surpreendidos pela devastadora crise econômica dos EUA e da União Européia.” (MAGNONI, 2012).26 A cada nova evolução tecnológica, a formação de Opinião Pública se torna mais fácil: No princípio, os e-mails facilitaram a transmissão de informações e opiniões pela rede; depois, surgem os fóruns de discussão online27, que desenvolveu a vertente dos imageboards. Houve também o surgimento das redes sociais arcaicas, como a Usenet, que se desenvolveram até os atuais Facebook e Twitter, sem citar as redes voltadas apenas para os aparelhos portáteis28. ABORDAGEM CRONOLÓGICA DAS AÇÕES DO ANONYMOUS 24 No caso, todos aqueles que estiverem conectados à rede podem ter acesso a essa esfera pública, basta terem o interesse e procurarem pelas pessoas e informações. 25 Pós-doutorado em Industrias Culturais, membro do Conselho Consultivo do Fórum Nacional de Professores de Jornalismo e autor do artigo A Comunicação e a Opinião Pública na era das Redes Sociais. 26 Como visto na compilação Opinião pública : empowerment e interfaces, da Profª. Drª. Célia Maria Retz Godoy dos Santos. 27 Assim como os Wikis, conceituados por Christopher Lueg, autor de From Usenet to CoWebs: Interacting with Social Information Spaces, como “espaços de informações sociais online dessincronizados”, locais onde pessoas podiam conversar e marcar presença por meio de contribuições e compartilhamento de ideias de acesso disponível a qualquer hora. 28 Em pesquisa realizada pela Cisco em 2011, foi constatado aumento de tráfego de dados mobile de 159% em 2010. Pedobaiting29 Descrito por Stryker como passatempo dos membros do 4chan, pode ser considerado o primeiro ato hacktivista do grupo 30, ainda não formado oficialmente 31, tendo como motivação “um misto de bem-fazer heróico puro „shadenfreude‟32”, sendo “excitante conversar com um sicko 33, tendo como pagamento uma intensa sensação de moralismo intoxicante” (STRYKER, 2011). O talvez mais famoso caso de pedobaiting foi o de Chris Forcand, 53 anos, em 2007, com sua prisão no final do mesmo ano, sendo esta a primeira captura depois do pedófilo ser exposto por “Vigilantes anônimos da internet”. A caçada a pedófilos foi noticiada por grandes influenciadores de Opinião Pública, como o The Guardian34 e o Huffington Post35, em matérias relacionadas ao Anonymous. Além deles, também foi publicada pelos veículos online New Europe Online, Global Post, Examiner.com e ZDNet, apresentando já grande alcance na mídia. Project Chanology A organização anônima A Igreja da Cientologia36 já possuía um histórico de problemas com a internet37 quando se envolveu com o Anonymous. Depois de anos sem nenhum 29 Pedobaiting é a junção dos termos pedophilia (pedofilia) e bating (pesca/caça por meio de isca), é o ato de procurar pedófilos e agir como criança no intuito de conseguir provas incriminatórias e posteriormente a prisão do acusado. 30 Isso por ser o primeiro que realmente possuiu cunho socialmente positivo além de mera diversão. 31 O Anonymous surge como grupo oficialmente, formado por membros do 4chan e diversos outros canais digitais, no ataque a Igreja da Cientologia. 32 Palavra alemã significando o prazer na desgraça alheia. 33 Pessoa perturbada, pervertida, psicótica ou com obsessão mórbida. 34 Disponível em: <http://www.guardian.co.uk/technology/2009/nov/26/dark-side-internetfreenet?INTCMP=SRCH>. 35 Disponível em: <http://www.huffingtonpost.com/2012/01/30/anonymous-internetwar_n_1233977.html> 36 Crença na descendência dos humanos de alienígenas de 75 milhões de anos e tendo como objetivo autodeclarado “a iluminação e liberdade espiritual”. 37 Em 1991 na Usenet um grupo de discussões sobre a Cientologia foi aberto, com a entrada de um ex-membro três anos depois, com vazamento de informações secretas da organização, inflamando ainda mais o conflito. Em 1995, vários membros do grupo foram surpreendidos por policiais e advogados da organização, que iniciou uma distribuição de propaganda online no objetivo de esconder as informações negativas divulgadas anteriormente. novo incidente envolvendo a organização, Tom Cruise38 reacendeu o embate ao postar no Youtube um vídeo destacando as qualidades da Cientologia com a música-tema de Missão Impossível de fundo 39. No entanto, isso teve o efeito contrário ao esperado, resultando em infindáveis paródias e comentários jocosos à postura do ator. A igreja tentou tomar providências para retirar as paródias do ar, mas em 2008 isso já era impossível, apenas fazendo com que o material se tornasse “marginalizado”40. Com isso, despertou o interesse dos anons41 em atacar a Cientologia para obter liberdade de informação (e, claro, se aproveitarem da situação cômica já desenrolada e conseguir muitos LOLs em consequência). O 4chan neste momento se torna ferramenta de organização, uma vez que “(...) providenciou uma plataforma na qual centenas de manifestantes pudessem ser rapidamente mobilizados a participarem de um ataque DDoS42, que requeria pequeno esforço individual e podia causar um dano devastador em conjunto”. (STRYKER, p. 165) [tradução própria]. Em pouco tempo, a igreja recebeu inúmeros trotes telefônicos e “faxes pretos”43, graças à divulgação em diversos meios online pelo Anonymous. A oficialização do Anonymous Em 21 de Janeiro de 2008, o primeiro manifesto oficial do Anonymous foi divulgado, denominado “Mensagem à Cientologia”44, o vídeo narrado carregado no Youtube trazia o discurso de retaliação ao culto, contendo trechos como “Suas campanhas de desinformação; sua supressão à oposição; sua natureza litigiosa; 38 Ator Hollywoodiano de filmes como a série Missão Impossível e Vanilla Sky, além de membro ativo da Igreja da Cientologia. 39 Vídeo disponível em: <http://www.youtube.com/watch?v=UFBZ_uAbxS0>. 40 No caso, utiliza-se o termo marginalizado para definir um produto digital obtido de maneira ilegal por meio de redes P2P e BitTorrent. 41 Como forma de diferenciar as ações pré-formação oficial do Anonymous, utilizarei o mesmo principio de Stryker, a diferenciação pelo tamanho da caixa: Anonymous para o grupo oficial e anonymous (ou anon[s]) para o grupo de usuários do 4chan e demais fóruns pré-oficialização. 42 Ou Denial-of-service Attack (Ataque de Negação de Serviço) visa sobrecarregar um sistema (comumente e neste caso website) com solicitações e pacotes de dados, tornando-o indisponível. Costumam ser utilizados os LOICs - Low Orbit Ion Cannons - (fazendo referência ao jogo de estratégia em tempo real Command & Conquer) permitindo a qualquer pessoa, independentemente de sua habilidade, possa participar de ataques. 43 Páginas completamente pretas resultando em papel ensopado em tinta de fax, cara e desperdiçada. 44 Originalmente chamado de “Message to Scientology”, disponível em: <http://www.youtube.com/watch?v=JCbKv9yiLiQ>. todas essas coisas atraíram nossa atenção” e “nós devemos prosseguir com a sua expulsão da Internet e desmantelar sistematicamente a Igreja da Cientologia em sua presente forma”45. Neste ponto, começam a surgir as características do grupo. Ao final do vídeo, o motto46 do Anonymous já é reconhecível. Logo, o Anonymous divulgou outro manifesto 47, dessa vez direcionado à mídia, com o teor de negar que o primeiro manifesto objetivasse perseguição religiosa, quebrar o paradigma da teoria do espelho 48 e reafirmar “a tentativa, não apenas de subverter o livre discurso, mas sem pesar distorcer a justiça para silenciar quem falar contra eles”49. Em fevereiro de 2008 ocorre a primeira transposição do digital para o real, com a divulgação de outro vídeo encorajando os membros do Anonymous a realizarem manifestações nas sedes da Igreja da Cientologia em todo o mundo. A partir das ações no ambiente real surge outra característica do grupo: os manifestantes para permanecerem anônimos e assim não sofrerem represálias passam a adotar a máscara de Guy Fawkes50, simbolizando a anarquia tanto do personagem quanto presente no meio de convivência do grupo (o 4chan), que viria a se tornar um dos símbolos maiores do Anonymous. Resultados do Project Chanology De forma semelhante ao que ocorreu com o Pedobaiting, a ação contra a Cientologia foi noticiada em diversos meios. No entanto, devido a sua proporção, diversos veículos impressos (em proporção muito maior à manifestação anterior) cobriram o ataque, dentre eles a Fox News, The Economist, The Guardian, a Wired e a CNet (da CBS) . Além disso, a ação do Anonymous fez com que diversos 45 Em traduções livres do conteúdo, disponível na íntegra no mesmo link do vídeo referente. “We are Anonymous. We are Legion, We do not forgive. We do not forget. Expect us.”, sendo possível traduzir como “Nós somos Anonymous. Nós somos Legião. Nós não perdoamos. Nós não esquecemos. Aguardem-nos”. 47 Disponível em: <http://www.youtube.com/watch?v=pcr1trjtLaU>. 48 Teoria que tem como base “a ideia de que o jornalismo reflete a realidade”, com “as noticias sendo do jeito que as conhecemos por que a realidade assim as determina” (PENA, p. 125). 49 Tradução livre de trecho do manifesto. 50 Líder da Conspiração da Pólvora na Inglaterra, Fawkes (1570-1606) teve seu rosto utilizado como máscara pela personagem V da história em quadrinhos V for Vendetta, escrita por Alan Moore em 1982, responsável por uma revolução anárquica na Inglaterra pós-ataque nuclear em um futuro próximo, que tinha o mesmo objetivo de explodir o Parlamento da personagem histórico na qual foi baseada. 46 pesquisadores e jornalistas escrevessem sobre a Igreja da Cientologia de forma negativa, como Gabriella Coleman, que fez a seguinte declaração ao ser entrevistada por Stryker: “A Cientologia tem recebido tanta atenção negativa que eles abstiveram-se de táticas de intimidação legais. Se eu tivesse lançado alguns dos trabalhos que eu liberei recentemente seis anos atrás, eu teria sido envolvido em batalhas legais. Anonymous realmente mudou a paisagem”. Além deles, houve considerações de outras partes, como foi o caso de alguns usuários do fórum Why We Protest51, a exemplo de Jaycee Wiseboy52, comentando que “O Anonymous tem me impressionado desde que eu ouvi pela primeira vez sobre o assunto no noticiário da TV. Como ex-cientologista eu desisti de tentar explicar a Cientologia para a maior parte para as pessoas, uma vez que é um assunto tão enorme (...). Eu nunca pensei que era possível, pois os livros são tão chatos e cheios de um monte de palavras e ideias inventadas lunáticas. Certamente ninguém, exceto um cientologista teria a paciência de ler essa insanidade. Anonymous me deu alguma esperança. Antes, a Cientologia iria lidar com a sua mão cheia de críticas uma por vez, mas agora a tática é inútil, dada a natureza do fenômeno Anon.” Toda a repercussão dada pela mídia e os comentários gerados pelas ações do Anonymous corrobora com a afirmação de que o grupo é um dos geradores de Opinião Pública digital da atualidade. Operation Avenge Assange A operação Vingue Assange53 foi parte da operação intitulada Operation Payback54, criada com o intuito de retaliar as empresas e pessoas que de alguma forma prejudicaram o trabalho de Julian Assange ou do WikiLeaks. Isso incluiria os sites das empresas de cartão de crédito Mastercard e Visa, além do PayPal, por 51 Fórum que funciona como um local de encontro de ativistas online, onde podem interagir, trocar ideias e até mesmo organizar campanhas. 52 Pseudônimo de um usuário de dados não fornecidos. 53 Em tradução própria, fazendo referência a Julian Assange, fundados do WikiLeaks, conhecida organização sem fins lucrativos responsável pela divulgação de dezenas de documentos confidenciais do governo dos Estados Unidos. 54 A operação visava atacar e tirar do ar páginas dos responsáveis por processar sites e sistemas de compartilhamento de arquivos (piratas ou não). congelarem o envio de doações para a organização. O site do banco Postfinance também foi atacado por ter congelado a conta do próprio Assange, sem contar ainda o do senador Joe Lieberman55 e da ex-candidata a vice-presidente Sarah Palin56, assim como o site do advogado responsável pela ação contra Assange sobre a acusação de assédio e estupro de duas mulheres na Suiça. Essa ação foi determinante na análise do crescimento e do reconhecimento do Anonymous como força a ser considerada pela mídia. A Operation Payback e Avenge Assange foram noticiadas por grandes veículos da mídia internacional, como o nacional G1 e os internacionais BBC, The Australian, The Telegraph e Los Angeles Times, sem contar veículos segmentados como Wired, PCWorld, InfoWorld, Digital Trends e Mashable. Operation: Tunisia/Egypt e a Primavera Árabe Movimento precursor A insurreição começa na Tunísia, com o primeiro protesto no dia 17 de Dezembro de 201057. Centenas de jovens quebraram janelas de lojas e avariaram carros até serem dispersos pela polícia, com manifestação motivada por Mohamed Bouazizi, que ateou fogo no próprio corpo após ter frutas e legumes que estava vendendo confiscados pela polícia58. Este movimento isolado foi o precursor de uma série de manifestações próliberdade e críticas ao governo em diversos países do Oriente Médio, sendo os mais visíveis Tunísia, Egito, Líbia e Iêmen. Apesar disso, praticamente todos os países presentes na área tiverem alguma forma de movimento, sendo alguns mais reprimidos e pouco noticiados. O conjunto dos protestos destes países ficou conhecido como Primavera Árabe59. 55 De acordo com o periódico The Australian, o site do senador foi atacado por ele ter pedido que cessassem o suporte técnico ao WikiLeaks, amplamente aceito. 56 Tendo sua conta de e-mail invadida e criticas feitas ao WikiLeaks divulgadas à mídia. 57 De acordo com a linha do tempo desenvolvida pelo The Guardian, disponível em: <http://www.guardian.co.uk/world/interactive/2011/mar/22/middle-east-protest-interactive-timeline>. 58 Noticia divulgada pela Reuters Africa, disponível em: <http://af.reuters.com/article/topNews/idAFJOE6BI06U20101219>. 59 Termo utilizado por fazer referência à época na qual as manifestações no mundo árabe ganharam importância com a Revolução do Cedro, em Fevereiro de 2005, sendo primavera a estação do mês. O termo foi criado por Albrecht Hofheinz em seu artigo The Internet in the Arab World: Playground for Political Liberalization. Op Tunisia De acordo com a Wired60, o apoio do Anonymous aos manifestantes da Tunisia começa em 2 de Janeiro de 2011. No entanto, diferentemente das ações até o momento, o grupo não agiu por conta própria: Dessa vez, prepararam os tunisianos para que eles próprios fossem responsáveis pela revolução. Como auxílio, atacaram diversos sites do governo tunisiano, além de terem dado aos manifestantes ferramentas digitais para poderem acessar a internet sem as barreiras da censura governamental. Juntamente com isso, uma mensagem: “Esta revolução é de *vocês*. Ela não vai nem ser Twittada, nem televisionada ou IRCada. Vocês *devem* ir para as ruas ou vocês *vão* perder a luta. Permaneçam sempre seguros, uma vez que você for preso não pode fazer nada por você ou seu povo. O governo *está* de olho em vocês.” (Anonymous, 2011) [sic][tradução própria]. Não há maneira de determinar o quanto o Anonymous foi responsável pela revolução na Tunisia, mas é sabido que em menos de um mês após Bouazizi queimar o próprio corpo, o ditador tunisiano Ben Ali fugiu do país após 23 anos de governo opressor. Podemos supor que a opinião pública foi afetada neste caso por meio da ação dessa mídia digital representada pelo grupo hacktivista. Op Egypt A Operation Tunisia foi a primeira de uma série de manifestações conhecidas como Freedom Ops 61, sendo realizadas em diversos outros países do Oriente Médio em sequência. Os primeiros a seguir os tunisianos foram os egípcios, em uma manifestação com peculiaridades mais complexas. O início da Op Egypt foi semelhante ao da Op Tunisia, com a ocupação da Praça Tahrir 60 62 e o Dia da Revolta63, com a derrubada de sites do governo por Em texto disponível em: <http://www.wired.com/threatlevel/2012/01/anonymous-dicators-existentialdread/>, falando especificamente sobre ações do Anonymous em 2011. 61 Operação Liberdade, em tradução própria, tendo esse nome por se tratarem de manifestações ligadas especificamente à retomada de poder do povo em países marcados por governos opressores e ditaduras de muitos anos de duração. 62 Em uma forma precursora de ocupação como a vista em Occupy Wall Street. 63 Ocorrido em 25 de Janeiro de 2011. ataques DDoS. No entanto, em represália, o presidente Hosni Mubarak ordenou o desligamento da internet no Egito, tornando impossível se comunicar por qualquer forma online. O reestabelecimento da conexão se deu no dia 2 de Fevereiro, mas os ataques DDoS à sites governamentais reiniciaram juntamente com a volta do serviço. Assim como Ali na Tunisia, Mubarak não resistiu por muito tempo e abandonou o governo egípcio em 11 de Fevereiro. Com isso, apesar da resistência do exército em tentar reprimir os manifestantes, 77% dos egípcios 64 votaram pelo direito de escolher seu presidente e seus parlamentares. Novamente, não há forma de determinar a importância do Anonymous na revolução egípcia, mas é possível observar as ações tomadas em apoio aos manifestantes. Repercussão na mídia A Primavera Árabe foi um dos eventos mais noticiados dos últimos tempos, sendo acompanhado diariamente por redes internacionais de noticias, sendo possível citar dentre a infinidade de veículos que cobriram as manifestações o Le Parisien, The Guardian, New York Times, El País, The Economist, The Washington Post, Boston Globe, BBC e BBC News, Yahoo, além de nacionais como Globo (em todos os veículos), O Estado de São Paulo, Folha de São Paulo, e unicamente digitais UOL, Terra, R7 e Ig. CONCLUSÃO Esta pesquisa visou tornar possível analisar a forma como o Anonymous influenciou a mídia e a opinião pública, através de um estudo de algumas das mais importantes ações positivas ou benéficas à sociedade 65. Também visamos analisar se o grupo hacker-ativista é, de fato, capaz de transformar a opinião pública digital. Até este momento da pesquisa, com as informações apresentadas, foi constatado que o grupo foi de fato um dos maiores influenciadores desta nova forma de 64 Dados do The Guardian, disponíveis em: <http://www.guardian.co.uk/world/2011/mar/21/egyptiansendorse-reform-arab-discontent>. 65 Vale lembrar que o Anonymous, até hoje, possui ramificações que não se importam diretamente com a sociedade, mas sim com o ataque a alvos que gerem o lulz citado anteriormente. constituição da opinião pública, desenvolvendo ações midiáticas responsáveis por grandes manifestações sociais – o maior exemplo a ser considerado neste ponto-devista é, certamente, a Primavera Árabe. É importante ressaltar que as ações digitais do Anonymous passaram a influenciar não só o meio nas quais foram criadas, mas também todos os outros meios passíveis de serem alcançados por informações. No entanto, as ações digitais na internet não cessaram em nenhum momento, mesmo com a transposição do movimento para a esfera real66, o que mostra também a força com a qual o digital influencia o real nos dias de hoje. A análise de como essa transposição ocorre, dos meios tradicionais aos digitais, será desenvolvida no decorrer do projeto de pesquisa de iniciação científica em andamento. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AVELAR, Idelber. Ocupar Wall Street e o poder constituinte da multidão. Revista Forum, São Paulo, nº 104. p. 12-13. LAKHANI, Karim R; WOLF, Robert G. Why Hackers Do What They Do: Understanding: Motivation Effort in Free/Open Source Software Projects. 2003. Working Paper – MIT Sloan School of Management, Cambridge, 2003. LEVY, Pierre. Cibercultura. São Paulo: Editora 34, 2011. p. 28-222. KAZMI, Ayesha. How Anonymous emerged to Occupy Wall Street. The Guardian, sep. 2011. Disponível em: <http://www.guardian.co.uk/commentisfree/cifamerica/2011/sep/27/occupy-wallstreet-anonymous?INTCMP=SRCH>. NORTON, Quinn. Anonymous 101: Introduction to the Lulz. The Guardian, nov. 2011. Disponível em: <http://www.wired.com/threatlevel/2011/11/anonymous101/all/1>. 66 Como no caso do redirecionamento de sites governamentais da Síria, durante a Primavera Árabe, para um infográfico contento o número de pessoas mortas durante as manifestações, chamados pelo grupo de “Mártires pela Liberdade” em tradução própria. _______. Anonymous 101 Part Deux: Morals Triumph Over Lulz. The Guardian, dez. 2011. Disponível em: <http://www.wired.com/threatlevel/2011/12/anonymous-101part-deux/all/1>. _______. 2011: The Year Anonymous Took On Cops, Dictators and Existential Dread. The Guardian, jan. 2012. Disponível em: <http://www.wired.com/threatlevel/2012/01/anonymous-dicators-existential-dread/>. SAMUEL, Alexandra Whitney. Hacktivism and the Future of Political Participation. 2004. Dissertação (Doutorado em Filosofia) – Harvard University, Cambridge, 2004. STRYKER, Cole. Epic win for anonymous: how 4chan‟s army conquered the web. New York: The Overlook Press, 2011. 304 p.
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