Consoantes em final de sílaba
Transcrição
Consoantes em final de sílaba
A aquisição da Rima em Português Europeu Ditongos decrescentes e consoantes em final de sílaba Susana Correia FLUL Esc. Superior de Saúde de Faro [email protected] 0. Introdução l Esta investigação centra-se em dois aspectos da aquisição da Rima em PE: - a aquisição das consoantes em final de sílaba (/s/, / l/ e / /); - o contraste V-VG. Lisboa, 10/2004 XX Encontro Nacional da APL, Fundação Calouste Gulbenkian Estádios propostos para a aquisição da Rima (1) l Inglês (Kehoe & Stoel-Gammon, 2001) e PB (Matzenauer & Bonilha, 2003): Estádio I: - As crianças não produzem nenhuma consoante em Coda nem dominam o contraste de quantidade (V-V:) ou V-VG ⇒ Rima não ramificada; Núcleo não ramificado (sílaba CV). Estádio II: - As crianças dominam o contraste de quantidade o u V- V G ⇒ N ú c l e o ramificado. N N Lisboa, 10/2004 R R R V(:) Estádio III: - As crianças produzem consoantes em final de s í l a b a ⇒ R i m a ramificada. V V N Cd V C XX Encontro Nacional da APL, Fundação Calouste Gulbenkian Estádios propostos para a aquisição da Rima (2) l Holandês (Fikkert, 1994) e PE (Freitas, 1997). Estádio I: - As crianças não produzem nenhuma consoante em Coda nem dominam o contraste de quantidade (V-V:) ou VVG ⇒ Rima não ramificada; Núcleo não ramificado (sílaba CV). R N V(:) Estádio II: - As crianças produzem as primeiras consoantes obstruintes em final de sílaba; as consoantes soantes ainda não são produzidas em final de sílaba e o contraste de quantidade ou V-VG ainda não é completamente dominado pelas crianças ⇒ Rima ramificada; Núcleo não ramificado (sílaba CVC). R Lisboa, 10/2004 R N V N Cd V Estádio III: - As crianças produzem erros do tipo VVCson -> VCson(Hol.), sílabas VV/VG e as consoantes soantes são produzidas em final de sílaba ⇒ Núcleo ramificado. [+soan] V/Csoan Cobst XX Encontro Nacional da APL, Fundação Calouste Gulbenkian Objectivos do estudo Neste estudo testa-se, com dados do PE recolhidos experimentalmente, as hipóteses formuladas com base em dados de recolha espontânea (Freitas, 1997), relativamente: A) ao diferente estatuto silábico das soantes e das obstruintes em final de sílaba, B) à relação existente entre a aquisição das soantes em final de sílaba e o domínio do contraste entre V e VG. Lisboa, 10/2004 XX Encontro Nacional da APL, Fundação Calouste Gulbenkian Metodologia l Recolha transversal-longitudinal, realizada mensalmente durante 13 meses. l 6 crianças portuguesas monolingues com idades compreendidas entre os 2;10 e os 4;6. l As produções das crianças foram provocadas a partir de um desenho experimental construído para o efeito, com o qual as crianças tinham contacto visual. l O desenho experimental continha 57 desenhos de palavras-alvo contendo / /, /l/ e /s/ em final de sílaba, em final e no meio de palavra, em sílaba tónica e em sílaba átona. l O desenho experimental continha ainda ditongos orais e nasais, seguidos e não seguidos de consoante fricativa, em sílaba tónica e em sílaba átona. l A base de dados (em formato Access) contém um total de 3654 registos. Lisboa, 10/2004 XX Encontro Nacional da APL, Fundação Calouste Gulbenkian Some remarks on the Rhyme of EP – diphthongs l No vowel length, no syllable weight; l Diphthongs (oral and nasal); (2) pau ‘stick’ [‘ ‘bread’ [‘ ] l ] vs. pão After a diphthong, only the obstruent consonant is admitted (3) pais ‘parents’ [‘ ] (4) pães ‘breads’ [‘ ] Lisboa, 10/2004 XX Encontro Nacional da APL, Fundação Calouste Gulbenkian Some remarks on the Rhyme of EP – syllable-final consonants (1) l Syllable-final consonants, word-finally and wordinternally: /s/, /l/ and / / (5) lápis ‘pencil’ [‘ ] festa ‘party’ [‘ ] par ‘pair’ [‘ ] verde ‘green’ [‘ ] sal ‘salt’ [ ] saltar ‘to jump’ [ ‘ ] l After a nasal vowel only obstruent consonants are allowed (6) transplante ‘transplant’ [ .‘ ] After a word-final liquid, vowel epenthesis is possible (optional); after an obstruent it is not possible. XX Encontro Nacional da APL, Fundação Calouste (7) mar ‘sea’ [‘ ]/[‘ ] Lisboa, 10/2004 Gulbenkian l Some remarks on the Rhyme of EP – syllable-final consonants (2) l Plural formation entails different phenomena, depending on the final consonant: i) after /R/ and /s/, the vowel [ ] is inserted (8) mar ‘sea’ [‘ ] mares ‘seas’ [‘ ] (9) rapaz ‘boy’ [ ‘ ] rapazes ‘boys’ [ ‘ ii) /l/ undergoes a semivocalization process (10) papel ‘paper’ [ ‘ ] papéis ‘papers’ [ ‘ ] Lisboa, 10/2004 ] XX Encontro Nacional da APL, Fundação Calouste Gulbenkian Some remarks on the Rhyme of EP – syllable-final consonants (3) /l/ blocks vowel reduction in unstressed position, unlike /R/ and /s/. The same happens with some diphthongs: l (11) sal ‘salt’ [ ‘ caixa ‘box’ [‘ [‘ ‘ barco ‘boat’ [‘ boat’ [ ‘ máscara ‘mask’[‘ ‘masked’ [ Lisboa, 10/2004 [‘ ] j ] ] ‘ ] ] salgado ‘salted’ caixinha ‘little box’ ] barquinho ‘little ] ] mascarado XX Encontro Nacional da APL, Fundação Calouste Gulbenkian Some remarks on the Rhyme of EP – syllable-final consonants (4) l The nasality is represented by a floating autossegment (Mateus & Andrade, 2000), and it is always realized in the Nucleus. (12) monstro ‘monster’ [‘ ] (13) limões ‘lemons’ [ ‘ ] l /s/ cannot be considered extrassylabic, as it may appear word-finally and word-internally. EP allows a tripositional Rhyme: (14) nariz ‘nose’ Lisboa, 10/2004 mães ‘mothers’ [‘ [ ‘ ] XX Encontro Nacional da APL, Fundação Calouste Gulbenkian ] Enquadramento teórico – Modelo de Princípios e Parâmetros (P&P) Parâmetros para a Rima l Parâmetro da Rima ramificada As Rimas podem ramificar em Núcleo e Coda [Sim/Não] l Parâmetro do Núcleo ramificado O Núcleo pode ser ramificado [Sim/Não] l Parâmetro Extra-Rima Uma Rima biposicional (final) pode ser seguida por uma consoante extra [Sim/Não] Lisboa, 10/2004 XX Encontro Nacional da APL, Fundação Calouste Gulbenkian Apresentação e discussão de resultados - ditongos Diferentes percursos de aquisição para: i) ditongos orais e nasais seguidos de consoante e ditongos nasais não seguidos de consoante (V GCfric, V G Cfric e V G ); ii) ditongos orais não seguidos de consoante (V G e VG). Produção de ditongos l Valores percentuais 100% VGNCfricT 80% VGCfricT 60% VGNT 40% VGT VGA 20% 0% S1 S2 S3 S4 S5 S6 S7 S8 S9 S10 S11 Sessões Lisboa, 10/2004 Figura 1 XX Encontro Nacional da APL, Fundação Calouste Gulbenkian Ditongos l A ordem de aquisição para os ditongos é: Estádio I - V V G Cfric e G Estádio II - V l GCfric, V G e VG. O erro mais frequente nas produções das crianças é VG -> V e, nesta altura, as consoantes soantes (excepto / / em final de palavra) não são produzidas de forma estável de acordo com o alvo. Lisboa, 10/2004 XX Encontro Nacional da APL, Fundação Calouste Gulbenkian Consoantes em final de sílaba l l As crianças portuguesas produzem precocemente a consoante fricativa /s/; As consoantes líquidas /l/ e / / em final de sílaba não estão adquiridas até tarde no processo de aquisição. Produção de consoantes fricativas vs. consoantes líquidas em final de sílaba Valores percentuais 100% Cfric 80% Clíq 60% 40% 20% 0% S1 S2 S3 S4 S5 S6 S7 S8 S9 S10 S11 Sessões Figura 2 Lisboa, 10/2004 XX Encontro Nacional da APL, Fundação Calouste Gulbenkian Consoantes em final de sílaba l As crianças observadas interpretaram a consoante fricativa /s/ e as consoantes líquidas /l/ e / / como pertencendo a diferentes constituintes. l As mesmas crianças revelaram um domínio mais precoce da fricativa em final de sílaba, quer esta estivesse em posição interna ou final, quer desempenhasse um papel morfológico ou não. Lisboa, 10/2004 XX Encontro Nacional da APL, Fundação Calouste Gulbenkian Consoantes em final de sílaba l Pelo contrário, as consoantes líquidas /l/ e / / em final de sílaba foram adquiridas tarde pelas crianças observadas, sobretudo em posição interna/medial à palavra: Produção de consoantes líquidas em posição final vs. posição medial Valores percentuais 100% 80% Clíq finais Clíq mediais 60% 40% 20% 0% S1 S2 S3 S4 S5 S6 S7 S8 S9 S10 S11 Sessões Figura 3 Lisboa, 10/2004 XX Encontro Nacional da APL, Fundação Calouste Gulbenkian Consoantes em final de sílaba Durante a aquisição, a posição na palavra parece desempenhar um papel importante no processamento das consoantes líquidas em final de sílaba: em posição final de palavra, / / é adquirido mais cedo e /l/ apresenta valores de produção mais altos em posição final do que em posição medial. l Produção de consoantes no meio de palavra Produção de consoantes em final de palavra 100% 80% Cfric 60% Clat Cvib 40% 20% 0% S1 S2 S3 S4 S5 S6 S7 S8 S9 S10 S11 Sessões Figura 4 Lisboa, 10/2004 Valores percentuais Valores percentuais 100% 80% Cfric 60% Cvib 40% Clat 20% 0% S1 S2 S3 S4 S5 S6 S7 S8 S9 S10 S11 Sessões Figura 5 XX Encontro Nacional da APL, Fundação Calouste Gulbenkian Consoantes em final de sílaba Comparando o comportamento das 3 consoantes em final de palavra e no meio da palavra, é possível observar que: l i) a fricativa apresenta uma produção sempre estável no decorrer das 11 sessões, com valores entre os 90 e os 100%, nas duas posições; ii) a vibrante revela um comportamento diferente em posição final e em posição medial: em posição final / / é adquirido mais cedo, com valores de produção comparáveis aos das consoantes líquidas em Ataque; em posição interna / / é o último segmento a ser adquirido; iii) a lateral é adquirida mais cedo em posição final do que em posição medial. Lisboa, 10/2004 XX Encontro Nacional da APL, Fundação Calouste Gulbenkian Consoantes em final de sílaba l A ordem de aquisição das consoantes em final de sílaba em PE é a seguinte: Estádio I – Consoante obstruinte (fricativa) Estádio II – Consoantes soantes (lateral e vibrante) l Estratégias usadas com mais frequência pelas crianças aquando da não produção de consoantes líquidas no alvo: vogal); - V/l/# –>VG (semivocalização) ou V/l/# -> V./l/V (epêntese de - V/l/. –> V∅ (apagamento) ou V/l/. -> VG (semivocalização); - V/ /# -> V./ /V (epêntese); - V/ / -> V∅ (apagamento). Lisboa, 10/2004 XX Encontro Nacional da APL, Fundação Calouste Gulbenkian Ditongos e consoantes em final de sílaba l l Assimetria na aquisição da consoante obstruinte e das consoantes soantes. Simetria na aquisição das consoantes soantes em final de sílaba (sobretudo em posição medial) e dos ditongos orais, sem consoante à direita. Produção de fricativas Consoantes líquidas vs. ditongos orais (em sílaba tónica) 80% Cfricm 60% 40% CfricL final 20% CfricL medial 100% Valores percentuais Valores percentuais 100% 80% VGC 60% VG 40% Cvib Clat 20% 0% 0% S1 S2 S3 S4 S5 S6 S7 S8 S9 S10 S11 S1 S2 S3 S4 S5 S6 S7 S8 S9 S10 S11 Sessões Sessões Figura 6 Lisboa, 10/2004 Figura 7 XX Encontro Nacional da APL, Fundação Calouste Gulbenkian Consoantes soantes mediais e ditongos orais sem consoante à direita Produção de ditongos orais e consoantes líquidas mediais (lateral e vibrante) Produção de fricativas 100% 80% Cfricm 60% 40% CfricL final 20% CfricL medial Valores percentuais Valores percentuais 100% 80% CvibM 60% ClatM Dit. orais 40% 20% 0% 0% S1 S2 S3 S4 S5 S6 S7 S8 Sessões Figura 6 Lisboa, 10/2004 S9 S10 S11 S1 S2 S3 S4 S5 S6 S7 S8 S9 S10 S11 Sessões Figura 8 XX Encontro Nacional da APL, Fundação Calouste Gulbenkian Consoantes soantes e ditongos – uma posição no Núcleo l Esta simetria pode indicar que ambos concorrem para uma posição num Núcleo ramificado. As soantes não concorrem com as glides dos ditongos nasais uma vez que o autossegmento nasal, que se difunde sobre o nó do Núcleo, não pode nasalizar essas consoantes. l De facto: okV Cfric monstro [‘ Lisboa, 10/2004 mas *V ] Clíq XX Encontro Nacional da APL, Fundação Calouste Gulbenkian Consoantes soantes e ditongos – uma posição no Núcleo l Argumentos de natureza fonotáctica: - VGCfric l l mas *VGClíq - V G Cfric mas * V G Clíq Evidências do sistema fonológico: - bairro [‘ ] / bairrista [ ‘ ] - mal [‘ ] / maldade [ ‘ ], cadáver [ ‘ ] vs. - pasta [‘ ] / pastinha [ ‘ ] Estratégias usadas durante a aquisição - as líquidas são frequentemente substituídas por glides, facto nunca observado com a consoante fricativa. Lisboa, 10/2004 XX Encontro Nacional da APL, Fundação Calouste Gulbenkian Aquisição precoce de Rimas mais salientes Porquê uma aquisição mais precoce de Rimas com maior grau de complexidade ou mais salientes - VGCfric ou V G (Cfric)? Alguns estudos evidenciam que, em línguas cuja estrutura da Rima é mais saliente, a aquisição deste constituinte é mais acelerada: l Fikkert & Freitas (1998) afirmam que a aquisição da Rima do PE é mais tardia, quando comparada com a do Holandês. Lisboa, 10/2004 XX Encontro Nacional da APL, Fundação Calouste Gulbenkian Aquisição precoce de Rimas mais salientes Kehoe & Lleó (2003a) (estudo sobre a aquisição do bilinguismo – Espanhol/Alemão): Crianças cujas línguas de input eram o Espanhol e o Alemão manifestaram uma aquisição mais precoce das consoantes em final de sílaba, em Espanhol, do que as crianças cuja língua era apenas o Espanhol. Tal deve-se, segundo as autoras: – – – Lisboa, 10/2004 ao maior número de consoantes admitidas em Coda, em Alemão; à elevada frequência de palavras com consoantes em Coda, em Alemão; à maior complexidade da estrutura da Coda, em Alemão. XX Encontro Nacional da APL, Fundação Calouste Gulbenkian Aquisição precoce de Rimas mais salientes l Apesar de o PE não ser considerado tradicionalmente uma língua sensível à quantidade ou ao peso, as crianças portuguesas observadas manifestaram sensibilidade na aquisição de Rimas mais ‘salientes’, habitualmente classificadas como pesadas/superpesadas em línguas com essas propriedades. l A frequência de ditongos nasais no input pode também favorecer uma aquisição mais precoce dessas estruturas. Lisboa, 10/2004 XX Encontro Nacional da APL, Fundação Calouste Gulbenkian Conclusões - Estádios de desenvolvimento para a Rima do PE Estádio I R N V Lisboa, 10/2004 XX Encontro Nacional da APL, Fundação Calouste Gulbenkian Conclusões - Estádios de desenvolvimento para a Rima do PE Estádio II l As crianças produzem consoantes obstruintes em final de sílaba. R Lisboa, 10/2004 N Cd V Cobst XX Encontro Nacional da APL, Fundação Calouste Gulbenkian Conclusões - Estádios de desenvolvimento para a Rima do PE l Nesta altura (Estádio II), mesmo sendo capazes de produzir ditongos nasais (seguidos ou não de consoante fricativa), as crianças ainda não dominam totalmente Núcleos ramificados. l Mais tarde (Estádio III), as crianças dominam totalmente o contraste V-VG e adquirem as consoantes soantes em final de sílaba. Lisboa, 10/2004 XX Encontro Nacional da APL, Fundação Calouste Gulbenkian Conclusões - Estádios de desenvolvimento para a Rima do PE Estádio III l As crianças adquirem o Núcleo ramificado. R N V [+son] Lisboa, 10/2004 Cd V/Cson Cobst XX Encontro Nacional da APL, Fundação Calouste Gulbenkian Obrigada!