FACULDADE DE PARÁ DE MINAS Curso de Direito Mônica Lopes
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FACULDADE DE PARÁ DE MINAS Curso de Direito Mônica Lopes
FACULDADE DE PARÁ DE MINAS Curso de Direito Mônica Lopes Teixeira O DIREITO DE IMAGEM: REDES SOCIAIS E SUA PROTEÇÃO JURÍDICA NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA Pará de Minas 2015 Mônica Lopes Teixeira O DIREITO DE IMAGEM: REDES SOCIAIS E SUA PROTEÇÃO JURÍDICA NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA Monografia apresentada à Coordenação de Direito da Faculdade de Pará de Minas FAPAM, como requisito parcial a conclusão do Curso de Direito. Orientador: Prof. Júlio Moraes Oliveira Pará de Minas 2015 Mônica Lopes Teixeira O DIREITO DE IMAGEM: REDES SOCIAIS E SUA PROTEÇÃO JURÍDICA NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA Monografia apresentada à Coordenação de Direito da Faculdade de Pará de Minas FAPAM como requisito parcial a conclusão do curso de Direito. Aprovada em / / Júlio Moraes Oliveira Professor avaliador Professor Avaliador Dedico este trabalho a todos aqueles que de alguma forma contribuíram para que meu sonho torna-se realidade. Agradeço a Deus por ter me dado forças para conseguir superar todos os desafios. Sem Ele nada seria possível. Agradeço aos meus pais Marlene e Elpidio que com muito carinho e apoio não mediram esforços para que eu pudesse concluir esta etapa da minha vida. A meu namorado Roberto, pela paciência, generosidade, companheirismo e por toda a confiança depositada em mim. Aos meus irmãos Alexandre, Alini e Dayane por todo o apoio, carinho e compreensão. Ao meu orientador Júlio, pela paciência na orientação tornaram e pelo possível aprendizado a conclusão que deste trabalho. E a todos os demais professores, mestres e doutores que passaram por minha vida. Por fim, agradeço a meus amigos e colegas por todos os momentos compartilhados durante esta trajetória. “O tempo é algo que não volta atrás. Por isso, plante seu jardim e decore sua alma ao invés de esperar que alguém lhe traga flores”. William shakespeare RESUMO O presente trabalho de conclusão de curso tem por finalidade apresentar e abordar o tema direito de imagem em redes sociais e sua proteção jurídica na legislação brasileira. Primeiramente, será abordada uma contextualização dos direitos da personalidade demonstrando seu lento desenvolvimento e os diversos procedimentos para inserí-los no ordenamento jurídico brasileiro. Além da titularidade, classificação e tutela jurisdicional, tendo como base o princípio da dignidade da pessoa humana. Posteriormente, devido ao aumento de casos de divulgação de imagens ocorrendo hodiernamente sem o consentimento do titular, será demonstrada a proteção jurídica da imagem, conceito doutrinário e suas limitações, tendo como parâmetros a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 e o Código Civil de 2002. Por fim, devido às redes sociais se encontrarem mais presentes na vida das pessoas, tornando-se um instrumento perigoso quando utilizadas inadequadamente, será demonstrado os danos ocasionados com a divulgação de imagens e suas formas de reparação, sendo exemplificado por meio de relatos de casos, e fundamentados com base nos posicionamentos dos Tribunais de Justiça acerca do tema com suas respectivas decisões. Palavras-chave: Direito da personalidade. Imagem. Redes sociais. Uso indevido. Danos. Proteção jurídica. SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 8 2. DIREITOS DA PERSONALIDADE ...................................................................... 9 2.1 Evolução histórica.............................................................................................. 9 2.2 Conceito de direito da personalidade ............................................................. 11 2.3 Titularidade e classificação dos direitos da personalidade ......................... 13 2.4 Características do direito da personalidade .................................................. 15 2.5 Da proteção aos direitos da personalidade ................................................... 20 3. O DIREITO DE IMAGEM E SUA PROTEÇÃO JURÍDICA................................. 24 3.1 Definição do direito de imagem e conceito de imagem ................................ 24 3.2 Trilogia conceitual (imagem-retrato, imagem-atributo e imagem-voz) ........ 26 3.3 Proteção jurídica da imagem e suas limitações ............................................ 27 4. DANOS DECORRENTES DA VIOLAÇÃO DO DIREITO DE IMAGEM EM REDES SOCIAIS ..................................................................................................... 41 4.1 Danos e meios de reparação ........................................................................... 41 4.2 Relato de casos ................................................................................................ 48 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................. 51 REFERÊNCIAS ........................................................................................................ 52 8 1. INTRODUÇÃO O tema a ser abordado neste trabalho será o direito de imagem em redes sociais e sua proteção jurídica na legislação brasileira. O desenvolvimento do mesmo deu-se em razão de se tornarem mais frequentes o desrespeito a este direito. A imagem vem sendo alvo de diversas violações, na qual, pessoas utilizam- se das redes sociais divulgam imagens de outras sem a prévia autorização, não se importando com as consequências advindas dessas exposições. Através das grandes repercussões dos inúmeros casos de exibições à imagem que vêm ocorrendo atualmente, este trabalho tem como objetivos principais a abordagem da proteção jurídica conferida pela legislação brasileira. Além de demonstrar a extensão da titularidade para requerer a tutela jurisdicional da imagem, bem como, abordar os danos causados com a divulgação de imagens em redes sociais. A imagem é um direito da personalidade atribuído a todos os seres humanos, sendo inviolável e protegida pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/88) e pelo Código Civil de 2002. Inicialmente será feita uma contextualização histórica sobre os direitos da personalidade, dispondo sobre o conceito, características, titularidade, classificação e proteção jurídica. Posteriormente, devido o uso indevido da imagem, será dedicado um capítulo para tratar do mencionado direito, abordando suas restrições e proteção no ordenamento jurídico brasileiro. Será realizada também uma análise com base na tricotomia da imagem, sendo essencial para a conclusão deste trabalho. Por último, serão demonstrados os danos advindos da divulgação de imagens nas redes sociais, a possibilidade ou não de cumulação e seus meios de reparação, sendo exemplificados por meio de casos famosos que tiveram grandes repercussões na mídia. Portanto, será utilizada uma metodologia bibliográfica, com dispositivos normativos da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/88) e do Código Civil de 2002, além de artigos jurídicos e periódicos coletados nas redes sociais. 9 2. DIREITOS DA PERSONALIDADE Neste capítulo será abordada a evolução histórica, conceito, características, titularidade, classificação e proteção jurídica dos direitos da personalidade. Nesse sentido, será demonstrado que os direitos da personalidade passaram por diversos períodos históricos antes de serem positivados no ordenamento jurídico brasileiro, tendo como fundamento o princípio da dignidade da pessoa humana. Os direitos da personalidade possuem uma lastra extensão, sendo protegidos pela legislação brasileira vigente, possuindo diversas características, as quais devem ser minuciosamente analisadas. Portanto, por serem direitos tidos como essenciais a condição humana será feito um breve relato sobre os tópicos acima mencionados, sendo necessários para um bom desempenho deste trabalho. 2.1 Evolução histórica Oliveira (2013) em seu artigo jurídico ensina que no decorrer dos anos, no contexto histórico da humanidade os direitos essenciais aos seres humanos eram tutelados conforme as classes sociais dos indivíduos, tendo como marco histórico o emprego de meios desumanos e cruéis contra as pessoas. Segundo Schreiber (2011), o liberalismo foi marcado pela não intervenção do Estado na esfera privada dos indivíduos, sendo este período contemplado pelas desigualdades sociais e econômicas. Assim, a liberdade das pessoas ficava condicionada a lei de quem possuía maior poder econômico, renunciavam direitos essenciais para a manutenção da dignidade da pessoa humana não existindo o livre arbítrio. A partir deste contexto surge a necessidade da quebra do direito liberal na busca de melhores condições de vida e respeito aos seres humanos. Os direitos da personalidade surgiram em meados do século XIX, tendo como marco inicial as revoltas e as guerras pautadas na desigualdade e no desrespeito entre as pessoas, buscando a proteção da dignidade da pessoa humana (SCHREIBER, 2011, p. 05). Nesse sentido, Novelino (2011) em sua obra ensina que: “Os direitos da personalidade emanam (NOVELINO, 2011, p. 451). diretamente da dignidade da pessoa humana” 10 Gonçalves (2011) afirma que a construção dos direitos da personalidade sustenta-se na tese de que os direitos com um valor econômico considerável também possuem a mesma proteção legal dos demais, pois são peculiares aos indivíduos e a eles estão unidos em caráter perpétuo, são os denominados direitos da personalidade, surgidos durante o jusnaturalismo, como o direito à vida, à imagem, dentre outros. A denominação direitos da personalidade foi concebida pelo direito natural francês e germânico, tendo como objetivo estabelecer direitos inerentes a pessoa humana, sendo considerados preexistentes, devendo serem observados pelo Estado. Os direitos da personalidade eram tidos como básicos e necessários para os indivíduos, nos quais todos os demais direitos relativos à pessoa não teriam importância se não houvesse os direitos da personalidade (SCHREIBER, 2011, p. 05). Nesse sentido, Farias e Rosenvald (2011) em sua obra ensinam que: “os direitos da personalidade constituem construção jurídica relativamente recente, fruto do cuidado da doutrina germânica e francesa, especialmente após a II Guerra Mundial” (FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 147). Os direitos da personalidade antes de serem positivados na legislação brasileira vigente possuíam determinadas características, que continuam hodiernamente vigorando no ordenamento jurídico nacional estendendo-se para o âmbito internacional. Nesse sentido, Schreiber (2011) ensina em sua obra que: “afirmava-se, nessa direção, que os direitos da personalidade eram absolutos, imprescritíveis, inalienáveis e indisponíveis, características ainda hoje repetidas na legislação pátria e estrangeira” (SCHREIBER, 2011, p.05). O posicionamento do Estado Liberal, em especial ao que se refere às relações entre particulares, fez com que os direitos da personalidade passassem a adquirir relevância no âmbito jurídico (SCHREIBER, 2011, p. 05). Segundo Oliveira (2013), os Códigos Civis eram omissos em relação aos direitos da personalidade, se dando de forma lenta o seu reconhecimento em parte de diversos países. Porém, os direitos da personalidade passaram a ganhar destaque com sua positivação na CRFB/88, sendo tutelados expressamente no artigo 5º, caput e inciso X, e posteriormente consagrados pelo Código Civil de 2002 nos artigos 11 a 21, passando a regulamentar direitos inerentes aos seres humanos. 11 Nesse sentido, seu desenvolvimento ocorreu vagarosamente em razão das várias divergências e críticas entre os juristas sobre os direitos que iriam compor o rol dos direitos da personalidade, não sendo recepcionados pelo Código Civil alemão de 1896, e nem pelo Código Civil brasileiro de 1916, gerando dissabores para as pessoas que o aderiram, pelo fato da lei ser omissa a essa respectiva categoria de direitos (SCHREIBER, 2011, pp. 05-06). Os doutrinadores Farias e Rosenvald (2011) relatam que: “entre nós, os direitos da personalidade foram admitidos após importantes contribuições doutrinárias, alçados à altitude legislativa por normas esparsas e consagrados pelo Texto Constitucional de 1988” (FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 148). Desse modo, os direitos personalíssimos foram aceitos depois das importantes ajudas doutrinárias, erguidas aos atos legislativos e por normas espalhadas e reconhecidas por toda a CRFB/88 (FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 148). Portanto, em meados do século XIX, essas divergências entre os juristas passaram a ser novamente analisadas sob a ótica da proteção da dignidade humana, buscando meios mais eficazes de proteção as pessoas em relação ao Estado, bem como entre particulares. Assim, surgindo no Brasil os direitos da personalidade, sendo estes positivados na CRFB/88, e posteriormente no novo Código Civil de 2002 (SCHREIBER, 2011, pp. 09-10). 2.2 Conceito de direito da personalidade Os direitos da personalidade podem ser percebidos entranhados no âmbito privado dos indivíduos, não sendo mensuráveis por valores econômicos, estando assim ligados aos seus valores reais. Nessa linha de raciocínio, a personalidade consiste em um conjunto de peculiaridades, sendo estas atribuídas a cada pessoa de forma individualizada. Os direitos da personalidade podem ser conceituados como a veracidade dos direitos subjetivos adquiridos durante toda a vida, sendo estes inerentes à condição de cada indivíduo. Deste modo, possuem a finalidade de garantir a eficácia do princípio da dignidade da pessoa humana por meio de uma proteção jurídica conferida aos direitos tidos como fundamentais (FARIAS; ROSENVALD, 2011, pp. 149-150). Nesse sentido, Farias e Rosenvald (2011) afirmam que: 12 Nessa ordem de ideias, é possível asseverar serem os direitos da personalidade aquelas situações jurídicas reconhecidas à pessoa, tomada em si mesma e em suas necessárias projeções sociais. Isto é, são os direitos essenciais ao desenvolvimento da pessoa humana, em que se convertem as projeções físicas, psíquicas e intelectuais do seu titular, individualizando-o de modo a lhe emprestar segura e avançada tutela jurídica (FARIAS; ROSENVALD, 2011, p.149). Assim, através dos grandes avanços históricos os direitos da personalidade passaram a ganhar mais ênfase no âmbito jurídico, estando estes pautados na proteção da dignidade da pessoa humana, dentre outros princípios e valores pertinentes e essenciais a cada pessoa. Desse modo, a proteção jurídica poderá estender-se em face de outros seres humanos, bem como do Estado (FARIAS; ROSENVALD, 2011, p.150). O autor Schreiber (2011) em sua obra afirma que: “os direitos da personalidade consistem em atributos essenciais da pessoa humana, cujo reconhecimento jurídico resulta de uma contínua marcha de conquistas histórica” (SCHREIBER, 2011 p.12). Para o autor, o termo direito da personalidade, refere-se a características pessoais dos seres humanos, sendo considerados direitos personalíssimos atribuídos a cada pessoa, possuindo previsão expressa no ordenamento jurídico brasileiro em virtude de um avanço histórico. Assim, por se tratarem de direitos positivados, torna-se obrigatória a observância no plano constitucional e nas relações jurídicas entre particulares, estendendo-se para o âmbito nacional e internacional. Os doutrinadores Filho e Gagliano (2015) afirmam que: “conceituam-se os direitos da personalidade como aqueles que têm por objeto os atributos físicos, psíquicos e morais da pessoa em si e em suas projeções sociais” (FILHO; GAGLIANO, 2015, p.186). Segundo Venosa (2005), os direitos da personalidade são essenciais a todos os seres humanos, devendo ser respeitados por todos e reconhecidos pelo Estado, de modo a propiciar o mínimo de dignidade a pessoa humana, bem como uma convivência social harmônica. 13 2.3 Titularidade e classificação dos direitos da personalidade Em se tratando da titularidade dos direitos da personalidade, esta abrange a todos os seres humanos de forma geral, incluíndo os nascituros, esta última titularidade é conferida com fundamento na teoria da concepção. Tal teoria defende que mesmo não sendo atribuída a personalidade jurídica aos nascituros, estes possuem direitos aos quais são assegurados e protegidos pelo ordenamento jurídico vigente, estendendo-se aos direitos da personalidade (GAGLIANO; FILHO, 2015, p.191). A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/88), em seu art. 5º. V, X, traz as seguintes disposições: Art.5º, V – O direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem; X – São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação. Conforme o dispositivo acima mencionado, não há especificações sobre quais são as pessoas que possuem tal direito. Nesse sentido, este dispositivo deve ser interpretado de forma ampla, posto que faz menção à pessoas de forma genérica, proibindo a limitação de direitos e garantias a determinadas pessoas, sendo notável a abrangência da titularidade a todos os seres humanos sem qualquer distinção (GAGLIANO; FILHO, 2015, p.193). Gagliano e Filho (2015) relatam que: Sem demérito de reconhecer que a teoria dos direitos da personalidade tenha sido construída a partir de uma concepção antropocêntrica do direito, consideramos inadmissível a posição que limita a possibilidade de sua aplicação à pessoa natural (FILHO,GAGLIANO, 2015, p.193). A teoria sobre a titularidade dos direitos da personalidade tem sido alvo de grandes polêmicas no âmbito doutrinário, portanto, com o objetivo de terminar com essa discussão, o legislador fez inserir na redação do novo Código Civil de 2002 um dispositivo legal manifestando-se a esse respeito (GAGLIANO; FILHO, 2015, p.193). 14 O Código Civil de 2002 trouxe em seu art. 52 a seguinte redação: “Art. 52. aplica-se às pessoas jurídicas, no que couber, a proteção dos direitos da personalidade”. Assim, conforme o dispositivo normativo acima mencionado, os direitos da personalidade, estendem-se as pessoas jurídicas no que lhe forem pertinentes, como por exemplo, o direito à imagem, à honra, dentre outros. Segundo Farias e Rosenvald (2014), o direito à imagem estende-se as pessoas jurídicas, porém, a proteção conferida à imagem não poderá lhe ser atribuída como a das pessoas físicas. O ordenamento jurídico brasileiro confere as pessoas jurídicas somente a titularidade da imagem-atributo, com base nas peculiaridades que as tornam particulares no âmbito social. Portanto, devido à inexistência dos elementos comportamentais, biológicos e psicológicos, não lhe são conferidas a imagem-voz e nem a imagem-retrato, as quais se estendem somente as pessoas naturais. De acordo com Gagliano e Filho (2015), no que diz respeito à classificação dos direitos da personalidade os classificam conforme a proteção atribuída pelo ordenamento jurídico, utilizando-se do critério da tricotomia, a qual se subdivide em três categorias, sendo elas: corpo, espírito, e mente. Assim, sem pretender esgotá-los, classificamos os direitos da personalidade de acordo com proteção à: a) Vida e integridade física (corpo vivo, cadáver, voz); b) Integridade psíquica e criações intelectuais (liberdade, criações intelectuais, privacidade, segredo); c) Integridade moral (honra, imagem, identidade pessoal) (FILHO; GAGLIANO, 2015, p. 199). Farias e Rosenvald (2011) defendem a tese de que os direitos da personalidade possuem o condão de tutela de seu titular, sendo esta proteção atribuída em razão da condição de ser pessoa humana, devendo ser analisada em seus diversos aspectos, tais como, o aspecto corporal, intelectual, e alma. Surge assim, à necessidade de classificação dos direitos da personalidade, devendo tal classificação estar em consonância com a projeção da proteção prevista no ordenamento jurídico em todos os ambientes em que a pessoa se encontra, tendo como fundamento jurídico o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. 15 Em sendo assim, a classificação deve ter em conta os aspectos fundamentais da personalidade que são: a integridade física (direito à vida, direito ao corpo, direito à saúde ou a inteireza corporal, direito ao cadáver...), a integridade intelectual (direito à autoria cientifica ou literária, à liberdade religiosa e de expressão, dentre outras manifestações do intelecto) e a integridade moral ou psíquica (direito à privacidade, ao nome, à imagem etc.) (FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 177). Os direitos personalíssimos podem ser classificados em inatos, que são aqueles direitos que já nascem com os indivíduos, como à integridade física, moral, a vida, dentre outros, e também podem ser classificados em adquiridos, estes últimos podem ser entendidos como direitos derivados do próprio indivíduo, aos quais se encontram positivados no ordenamento jurídico brasileiro. Nesse sentido, para Gonçalves (2011) os direitos de personalidade são divididos em duas categorias: os inatos, como o direito à vida e à integridade física e moral, e os adquiridos, que decorrem do status individual e existem na extensão da disciplina que lhes foi conferida pelo direito positivo. Conforme Gagliano e Filho (2015), em se tratando da classificação dos direitos da personalidade acima mencionada, esta não deve ser interpretada como um rol taxativo, mas sim como referência acerca dos direitos da personalidade considerados primordiais. Deste modo, tal classificação não exaure o rol dos direitos personalíssimos, em razão da tutela conferida aos direitos ditos como essenciais a condição de vida das pessoas prevista no ordenamento jurídico. 2.4 Características do direito da personalidade Os doutrinadores Gagliano e Filho (2015) entendem que os direitos da personalidade por serem direitos inerentes aos seres humanos em seus aspectos físicos, mentais e morais, possuem determinadas características, as quais são consideradas próprias de cada indivíduo, sendo atribuídas como uma forma de individualização das pessoas no âmbito dos direitos particulares. Nesse sentido, os doutrinadores acima mencionados afirmam que: “sendo direitos ínsitos à pessoa, em suas projeções física, mental e moral, os direitos da personalidade são dotados de certas características particulares, que lhes conferem posição singular no cenário dos direitos privados” (GAGLIANO; FILHO, 2015, p.194). 16 Os direitos da personalidade possuem determinadas características, quais sejam: caráter absoluto, generalidade ou caráter necessário, extrapatrimonialidade, indisponibilidade, imprescritibilidade, impenhorabilidade e vitaliciedade (GAGLIANO; FILHO, 2015, p.194). O caráter absoluto dos direitos da personalidade se materializa na sua oponibilidade erga omnes, irradiando efeitos em todos os campos e impondo à coletividade o dever de respeitá-los. Tal característica guarda íntima correlação com a indisponibilidade, característica estudada abaixo, uma vez que não se permite ao titular do direito renunciar a ele ou cedê-lo em beneficio de terceiro ou da coletividade. Admite a doutrina especializada, porém, a existência de “direitos da personalidade relativos, como ocorre, exemplificadamente, com o direito à saúde, ao trabalho, à educação e à cultura, à segurança e ao meio ambiente” (GAGLIANO; FILHO, 2015, pp. 194-195). A primeira característica a ser analisada é o caráter absoluto, tal característica diz respeito à oponibilidade, ou seja, os direitos da personalidade possuem efeitos “erga omnes”, sendo assim, seus efeitos possuem aplicabilidade a todas as pessoas. Esta característica encontra-se relacionada com a indisponibilidade, a qual proíbe a disposição de direitos, não podendo o titular abrir mão do direito que lhe inerente em prol de outras pessoas. Portanto, produz efeitos “erga omnes”, devendo a observância por toda a coletividade. A doutrina entende que há direitos da personalidade que podem ser relativos, como o direito à saúde, educação, cultura, dentre outros, (GAGLIANO; FILHO, 2015, pp. 194195). Nessa mesma linha de raciocínio Gonçalves (2011) em sua obra ensina que: O caráter absoluto dos direitos da personalidade é consequência de sua oponibilidade erga omnes. São tão relevantes e necessários que impõem a todos o dever de abstenção, de respeito. Sob outro ângulo, têm caráter geral, porque inerentes a toda pessoa humana (GONÇALVES, 2011, p. 195). Em se tratando da generalidade conhecida também como caráter necessário, esta por sua vez entende que os direitos da personalidade por serem essenciais a condição humana são atribuídos a todos os indivíduos, bastando-se para tanto a sua existência (FILHO; GAGLIANO, 2015, p.195). 17 “A noção de generalidade significa que os direitos da personalidade são outorgados a todas as pessoas, simplesmente pelo fato de existirem” (FILHO; GAGLIANO, 2015, p.195). Em relação à extrapatrimonialidade, Gagliano e Filho (2015) entendem que uma das peculiaridades mais claras dos direitos legítimos da personalidade é a inexistência do objeto patrimonial imediato, mesmo que o prejuízo produza efeitos de natureza econômica. Porém, isso não proíbe que as manifestações de caráter pecuniário de determinadas naturezas de direitos possam adentrar no mercado jurídico. Dessa maneira, é certo alegar que em início os direitos personalíssimos são declarados extrapatrimoniais, não sendo impeditivo sob alguns aspectos, especialmente quando houver violação, podendo ser economicamente apreciáveis. Uma das características mais evidentes dos direitos puros da personalidade é a ausência de um conteúdo patrimonial direto, aferível objetivamente, ainda que sua lesão gere efeitos econômicos. Isso não impede que as manifestações pecuniárias de algumas espécies de direitos possam ingressar no comércio jurídico. Assim, é correto dizer que, em principio, os direitos da personalidade são considerados extrapatrimoniais, não obstante, sob alguns aspectos, principalmente em caso de violação, possam ser economicamente mensurados (GAGLIANO; FILHO, 2015, p.196). Farias e Rosenvald (2011) entendem que a extrapatrimonialidade dos direitos da personalidade restringem-se na insuscetibilidade de análise econômico dos direitos personalíssimos, mesmo que ocorra algum imprevisto que possa ocasionar lesão, cujos efeitos sejam de natureza pecuniária. Desse modo, afirmam em sua obra que: Já a extrapatrimonialidade consiste na insuscetibilidade de apreciação econômica dos direitos da personalidade, ainda que a eventual lesão possa produzir consequência monetária (na hipótese, a indenização por dano extrapatrimonial, comumente chamado de dano moral) (FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 156). Os doutrinadores Gagliano e Filho (2015) mencionam a indisponibilidade como uma característica genérica dos direitos personalíssimos, pois esta abrange a intransmissibilidade e a irrenunciabilidade, as quais possuem limitações previstas na legislação brasileira. A primeira pode ser entendida como a impossibilidade de alteração do sujeito, não podendo haver a transferência da titularidade dos direitos personalíssimos. Em se tratando da irrenunciabilidade, 18 entende-se que o ordenamento jurídico brasileiro não aderiu à possibilidade do titular renunciar o direito pela simples vontade. A intransmissibilidade e a irrenunciabilidade são característica que possuem previsão expressa no art. 11 do Código Civil de 2002, tal dispositivo traz a seguinte redação: “Art.11- Com exceção dos casos previstos em lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária”. Gonçalves (2011) em sua obra ensina que as características acima citadas de forma expressa pelo Código Civil brasileiro de 2002, ocasionam a indisponibilidade dos direitos personalíssimos. Assim, é vedado a seus titulares transferí-los a terceiros, ou deles dispor, posto que tais direitos por serem considerados inerentes aos seres humanos se iniciam e terminam juntos com seus titulares. Nesse sentido, o autor acima mencionado entende que nenhuma pessoa tem o direito de usufruir dos bens intrínsecos pertencentes aos outros indivíduos, como à honra, à vida, à liberdade, dentre outros. Entretanto, determinados direitos da personalidade autorizam seu uso, deste que haja consentimento por parte de seu titular, mediante uma recompensa em dinheiro, como exemplo, a imagem. Nessa linha de raciocínio, Gagliano e Filho (2015), afirmam que: “a indisponibilidade significa que nem por vontade própria do indivíduo o direito pode mudar de titular, o que faz com que os direitos da personalidade sejam alçados a um patamar diferenciado dentro dos direitos privados” (GAGLIANO; FILHO, 2015, p. 196). Tome-se o exemplo o direito à imagem. Em essência, esse direito é intransmissível, uma vez que ninguém pode pretender transferir juridicamente a sua forma plástica a terceiro. Ocorre que a natureza do próprio direito admite a cessão de uso dos direitos à imagem. Não se trata da transferência do direito em si, mas apenas da sua faculdade de uso. Essa cessão, realizada contratualmente, deverá respeitar a vontade do seu titular, e só poderá ser interpretada restritivamente (GAGLIANO; FILHO, 2015, p. 197). Conforme Gagliano e Filho (2015), outra característica dos direitos da personalidade é a imprescritibilidade, assim, não existe prazo prescricional para exigir tais direitos, não ocorrendo à cessação do direito pelo não uso. Além disso, não devem ser adquiridos em razão de um lapso temporal, pois, a doutrina 19 entende que estes direitos são do instinto dos seres humanos. A observação a ser feita é que ao mencionar o direito personalíssimo na imprescritibilidade, estará especificando os efeitos em relação ao tempo para a obtenção ou cessação de direitos. A imprescritibilidade dos direitos da personalidade deve ser entendida no sentido de que inexiste um prazo para seu exercício, não se extinguindo pelo não uso. Ademais, não se deve condicionar a sua aquisição ao decurso do tempo, uma vez que, segundo a melhor doutrina, são inatos, ou seja, nascem com o próprio homem. Faça-se uma ressalva: quando se fala em imprescritibilidade do direito da personalidade, está-se referindo aos efeitos do tempo para a aquisição ou extinção de direitos (GAGLIANO; FILHO, 2015, p.198). Em relação à impenhorabilidade, os autores Gagliano e Filho (2015) ensinam que há certos direitos que se apresentam patrimoniais, como o caso dos direitos autorais. Os direitos relativos à moralidade não podem ser passíveis de penhora, no entanto, não há vedação legal da penhora de créditos referentes aos direitos de natureza patrimonial. Adotando esta tese, deve-se autorizar a penhora dos créditos cedidos pelo uso da imagem. A indisponibilidade dos referidos direitos autorais não é absoluta, podendo alguns deles ter o seu uso cedido para fins comerciais, mediante retribuição pecuniária, como o direito autoral e o de imagem, por exemplo. Nesses casos, os reflexos patrimoniais dos referidos direitos podem ser penhorados (GONÇALVES, 2011, p. 189). Para Gonçalves (2011), em sendo os direitos da personalidade, fundamentais aos seres humanos são indivisíveis e indisponíveis. Porém, em se tratando dos direitos autorais essa indisponibilidade é relativa, podendo haver a cessão de determinados direitos para o exercício da atividade mercantil, através de uma compensação em dinheiro, como por exemplo, o uso de imagem. Nesse caso, pode haver penhora dos efeitos de natureza patrimonial. No que tange à vitaliciedade, Gonçalves (2011) afirma que: Os direitos da personalidade inatos são adquiridos no instante da concepção e acompanham a pessoa até sua morte. Por isso, são vitalícios. Mesmo após a morte, todavia, alguns desses direitos são resguardados, como o respeito ao morto, à sua honra ou memória e ao seu direito moral de autor, por exemplo (GONÇALVES, 2011, p. 189). 20 Os direitos da personalidade são naturais sendo concebidos no momento da fertilização e permanece com os seres humanos até seu falecimento. Desse modo, são vitalícios, e mesmo depois da morte, determinados direitos são preservados, como por exemplo, a memória e honra da pessoa falecida (GONÇALVES, 2011, p. 189). 2.5 Da proteção aos direitos da personalidade Os direitos da personalidade são direitos essenciais, e necessários para que as pessoas possam viver com um mínimo de dignidade possível no âmbito em que convive. Porém, pensando nisso o legislador ao criar o novo Código Civil de 2002 inseriu um capítulo inteiro dedicado a esses direitos, tendo como objetivo a proteção jurídica dos direitos personalíssimos, bem como do princípio da dignidade humana, alcançando-se assim, um grande progresso legislativo (GONÇALVES, 2011, p.189). Segundo Gonçalves (2011), determinados direitos individuais pertencentes aos seres humanos ganharam destaque e ao longo do tempo foram admitidos pela doutrina e pelo texto normativo, sendo tutelados pela jurisprudência. Estes direitos ditos como individuais não podem ser alienados, não sendo passíveis de comercialização, razão pela qual possuem proteção no ordenamento jurídico vigente. O princípio da dignidade da pessoa humana já possuía previsão expressa no art. 1º, III, da CRFB/88, sendo considerado um dos fundamentos constitucionais do ordenamento jurídico vigente no alcance da proteção dos direitos da personalidade (GONÇALVES, 2011, p.190) O texto constitucional trouxe em sequência o art. 5º, X, com a seguinte redação: “Art.5º, X- São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito de indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”. Nesse sentido, Gonçalves (2011) afirma que se uma pessoa vier a ocasionar um dano à outra em decorrência de uma violação aos direitos da personalidade, esta responderá civilmente pela conduta antijurídica praticada contra o titular do direito, podendo tal responsabilidade se estender para outros ramos do direito. 21 “A proteção dos direitos da personalidade dá-se em vários campos do ordenamento jurídico, desfrutando, assim, de estatutos disciplinadores diversos, variáveis em função do enfoque adotado” (GAGLIANO; FILHO, 2015, p. 225). A proteção aos direitos da personalidade não se limita somente aos dispositivos constitucionais acima descritos, tal proteção estende-se para o art. 12 do Código Civil de 2002, ao qual dispõe que: “Art. 12 – pode-se exigir que cesse a ameaça, ou lesão, a direito da personalidade e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei.” Nesse viés, Farias e Rosenvald (2011) entendem que o titular do direito poderá com fulcro no mencionado dispositivo acima utilizar-se das tutelas judiciais sempre que houver ameaça, ou lesão aos direitos personalíssimos, tendo como objetivo principal resguardar esses direitos ditos como próprios e essenciais a condição de vida dos seres humanos, as quais podem ser classificadas em reparatórias (repressivas) e inibitórias (preventivas). Segundo Farias e Rosenvald (2011), a tutela preventiva é uma medida que trata especificadamente dos direitos personalíssimos podendo ser aplicada pelo juiz diante de uma situação de violação ao bem jurídico tutelado. Tal medida tem como objetivo assegurar a proteção desses direitos, aos quais são inerentes aos indivíduos, podendo por determinação judicial ser aplicada uma multa a quem deixar de observar o dispositivo normativo sendo esta uma forma de inibir tal violação aos direitos da personalidade. Os doutrinadores Gagliano e filho (2015), em sua obra ensinam que: A proteção dos direitos da personalidade poderá ser: a) preventiva – principalmente por meio do ajuizamento de ação cautelar, ou ordinária com multa cominatória, objetivando evitar a concretização da ameaça de lesão ao direito da personalidade; b) repressiva – por meio da imposição de sanção civil (pagamento de indenização) ou penal (persecução criminal) em caso de a lesão já haver se efetivado (GAGLIANO; FILHO, 2015, pp. 225- 226). Conforme Gonçalves (2011), o titular do direito poderá acionar o Poder Judiciário quando houver violação aos direitos da personalidade, bem como ao princípio da dignidade da pessoa humana, atuando por meio das medidas judiciais adequadas, as quais podem ser classificadas como medidas judiciais de natureza preventiva, cominatória ou repressiva. 22 Em se tratando das primeiras, estas possuem efeitos suspensivos, visando à suspensão dos atos ofensivos a integridade moral, e física, em se tratando das medidas judiciais cominatórias, estas se encontram fundamentadas no Código de Processo Civil, e são aplicadas com intuito de fazer cessar os efeitos que possam causar ameaça de lesão a direitos, e por fim, as de natureza repressiva, visam antecipar os efeitos advindos da propositura de uma ação (GONÇALVES, 2011, pp. 190-191). Bittar (2015) afirma que os direitos da personalidade possuem proteção jurídica em ramos distintos do direito, quais sejam: constitucional, civil e penal, usufruindo, deste modo de regulamentos diferentes. Nessa linha de raciocínio, o autor acima citado ensina que: Desse modo, no âmbito constitucional, disciplinados, como liberdades públicas, recebem regulamentação como direitos de cunho fundamental no Estado, fruindo de garantias específicas, previstas no contexto da Carta Magna, na defesa da dignidade da pessoa, diante dos poderes públicos (BITTAR, 2015, p.87). Na esfera constitucional, os direitos fundamentais de primeira geração encontram-se regulamentados como direitos de caráter essencial no Estado, desfrutando de garantias individuais e políticas previstas no texto constitucional, com a finalidade de proteção da dignidade da pessoa humana, perante os poderes públicos. No plano penal, por via de diversas figuras, inseridas no Código próprio, contam esses direitos como tutela repressiva, em sua preservação contra atentados advindos de outras pessoas, em ações tipificadas como crimes (como os delitos contra a vida, a saúde, a honra, a intimidade, o segredo, os direitos intelectuais) (BITTAR, 2015, p.87). No âmbito da esfera penal, por meio de numerosas figuras introduzidas na legislação própria, os direitos de personalidade contam com a tutela repressiva para sua defesa contra violações resultantes de outras pessoas, em atos tipificados como delitos, como os crimes contra a vida, a honra, dentre outros. Por fim, no âmbito civil, os direitos da personalidade são tutelados através de mecanismos que tenham como finalidade resguardar os interesses particulares dos indivíduos incorporados na liberdade e na independência de cada pessoa (BITTAR, 2015, p. 87). 23 Concluí-se que antes de serem inseridos na legislação brasileira os direitos da personalidade passaram por diversos procedimentos, tendo como marco histórico diversos tratamentos desumanos contra as pessoas. Os direitos da personalidade surgiram pautados no princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, em razão de serem considerados essenciais para um convívio coletivo harmônico de todos os indivíduos. Assim, em razão de serem considerados necessários a todos os seres humanos, os direitos da personalidade vagarosamente ganharam destaque no âmbito jurídico, aos quais foram recepcionados pelo texto constitucional e posteriormente pelo Código Civil de 2002, estendendo-se a todos. 24 3 O DIREITO DE IMAGEM E SUA PROTEÇÃO JURÍDICA Neste capítulo será abordada a definição do direito de imagem, conceito, trilogia conceitual, proteção jurídica e suas limitações. Este capítulo foi inserido com intuito de demonstrar o que vem a ser imagem na esfera doutrinária, a qual encontra-se tutelada no âmbito constitucional, bem como na legislação civil, podendo ser analisada sob a ótica de seus três aspectos, sofrendo determinadas restrições. Assim, com todo o esboço acima levantado, bem como as violações a este direito ocorrendo hodiernamente com maior frequência, torna-se essencial um estudo sobre os respectivos tópicos aqui mencionados. 3.1 Definição do direito de imagem e conceito de imagem O direito de imagem apresenta-se como um direito inviolável protegido pela CRFB/88 e pelo Código Civil de 2002. Porém, em razão de ser considerado pela doutrina um direito personalíssimo inerente a cada pessoa este compõe o rol dos direitos de personalidade (GONÇALVES, 2011, p.202). O direito de imagem explícita o comando que cada indivíduo possui sobre alguma representação auditiva, ocular ou até mesmo palpável, sendo esta individualizada, podendo ser obtida por métodos tecnológicos de captação como vídeos, filmes, fotografias, armazenamento de informações por meio de computadores. Desse modo, estendendo-se para a atividade artística da invenção humana, por meio da escultura, pintura, desenhos, dentre outros (SCHREIBER, 2011, p.102). Portanto, o direito à imagem encontra-se como um direito autônomo, no qual sua proteção jurídica independe de lesão à honra do titular, tendo em vista que o direito à honra refere-se à soma dos conceitos positivos que cada pessoa goza no âmbito social. Neste viés, Schreiber (2011) ensina que: O direito à imagem independe, portanto, do direito à honra, enquanto o último diz respeito a reputação da pessoa em seu meio social, o direito à imagem exprime o controle que cada pessoa humana detém sobre “qualquer representação audiovisual ou tátil” da sua individualidade, “alcançada por instrumentos técnicos de captação, como filmes, teleobjetivas, registros computadorizados, bem como pela ação artística da criatividade humana nas telas de pintura, na escultura de qualquer tipo, inclusive artesanato” (SCHREIBER, 2011, p.102). 25 Segundo Farias e Rosenvald (2011), o direito de imagem é um direito personalíssimo, sendo a imagem derivada de cada pessoa, onde a mesma estende- se, prolonga-se e diferencia-se no âmbito social. A imagem é o vestígio da sua personalidade, podendo-se destacar do corpo e das representações de indeterminados processos, dentre estes, pode-se destacar as pinturas, os desenhos, as fotografias, os filmes, e outros. De acordo com Gagliano e Filho (2015), o direito de imagem deve ser pautado entre os direitos de natureza moral e não dos direitos relacionados ao corpo, pois, havendo violação do direito de imagem este repercutirá com maior intensidade no âmbito moral do que no físico. Em relação à imagem essa pode ser conceituada como uma demonstração da personalidade, onde é percebido reflexos da fisionomia e sensações das pessoas, assim como os atributos e hábitos que os tornam particulares, sendo esta uma forma de se destacar perante a sociedade. Conforme afirmam Farias e Rosenvald (2011) em sua obra: Efetivamente, a imagem corresponde à exteriorização da personalidade, englobando, a um só tempo, a reprodução fisionômica do titular e as sensações, bem assim como as características comportamentais que o tornam particular, destacado, nas relações sociais (FARIAS; ROSENVALD, 2011, p.212). Gonçalves (2011) afirma que: “No sentido comum, a imagem é a representação pela pintura, escultura, fotografia, filme etc. de qualquer objeto e, inclusive, da pessoa humana, destacando-se, nesta, o interesse primordial que apresenta o rosto” (GONÇALVES, 2011, p.202). Conforme Cavalieri Filho (2012), a imagem é um direito personalíssimo, sendo esta uma forma da pessoa ser identificada de forma individualizada pela sociedade, ou seja, será levada em consideração a imagem que tiver sido projetada ao longo da vida, servindo como base para traduzir sua personalidade. Dessa forma, a imagem pode ser destacada por pinturas, esculturas, desenhos, cartazes, fotografias, filmes, podendo ser utilizada somente mediante autorização. 26 Consiste no direito que a pessoa tem sobre a sua forma plástica e respectivos componentes distintos (rosto, olhos, perfil, busto) que a individualizam no seio da coletividade. Incide, pois, sobre a conformação física da pessoa, compreendendo esse direito um conjunto de caracteres que a identifica no meio social. Por outras palavras, é o vinculo que une a pessoa à sua expressão externa, tomada no conjunto, ou em partes significativas (como a boca, os olhos, as pernas, enquanto individualizadoras da pessoa) (BITTAR, 2015, p.153). A imagem baseia-se no direito que o ser humano possui sobre a sua aparência física em diversos e diferentes elementos, como por exemplo, o rosto, perfil, olhos, dentre outros. Desse modo, recaindo sobre a forma física do indivíduo, sendo tais peculiaridades essenciais para identificá-lo no âmbito da sociedade. A imagem é o liame que une o indivíduo à sua fisionomia externa, podendo ser total ou parcial (como a boca, as pernas, e outros aspectos que permitem a individualização de uma pessoa dentre outras) (BITTAR, 2015, p. 153). Segundo Pinto (2014), os seres humanos de forma geral acreditam que o direito à imagem encontra-se ligado apenas ao retrato. No entanto, a imagem não é somente a reparação do aspecto físico de uma pessoa, mas sim qualquer forma de exibição que possa diferenciar os indivíduos perante a sociedade. 3.2 Trilogia conceitual (imagem-retrato, imagem-atributo e imagem-voz) A imagem possui tutela expressa no texto constitucional e no Código Civil de 2002, podendo ser analisada sob três aspectos, tais como: a imagem-retrato, a imagem-atributo e a imagem-voz. A imagem-retrato, refere-se às características fisionômicas do titular, à representação de uma pessoa pelo seu aspecto visual, enfim, é o seu pôster, a sua fotografia, encarada tanto no aspecto estático- uma pinturaquanto no dinâmico- um filme-, conforme proteção dedicada pelo art.5º, X, da Constituição da República (FARIAS;ROSENVALD, 2011, p.212). A primeira imagem a ser analisada é a imagem-retrato, onde se podem destacar diferentes características fisionômicas das pessoas. A exibição desta se dá através do aspecto visual, onde sua fotografia poderá ser destacada como um aspecto estético, podendo ser feito mediante uma pintura, desenho ou retrato, ou no aspecto dinâmico que seria um filme, conforme tutela expressa no art. 5°, X da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 27 A imagem-atributo, é o consectário natural da vida em sociedade, consistindo no conjunto de características peculiares da apresentação e da identificação social de uma pessoa. Diz respeito, assim, aos seus qualificativos sociais, aos seus comportamentos reinterados que permitem identificá-los (FARIAS; ROSENVALD, 2011, p.212). Já a imagem-atributo refere-se às qualidades sociais e comportamentais que permitem identificá-la, ou seja, está relacionada com a qualificação da pessoa, sendo assim, as qualificações sociais e comportamentais se reinteram permitindo sua diferenciação no seio da sociedade. Entretanto, não se pode confundir a imagem-atributo com a imagem exterior, tomando-se sempre os devidos cuidados com o retrato moral. A imagem-voz concerne à identificação de uma pessoa através de seu timbre sonoro. Aliás, sem dúvida, a personalidade de alguém não se evidencia menos na voz que nas características fisionômicas. É importante deixar claro que o direito à imagem é um só, apenas projetando-se em diferente aspectos. Significa dizer que não existem três diferentes direitos, mas um único direito protegido constitucionalmente em sua tridimensionalidade (FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 213). Por fim, a imagem-voz diz respeito à identificação de uma pessoa por meio do seu timbre ou outros aspectos sonoros, sem dúvida, a personalidade dos indivíduos não se destaca menos na voz do que em suas características fisionômicas. Contudo os doutrinadores Gagliano e Filho (2015) entendem que a imagem possui somente dois aspectos, sendo eles a imagem - retrato, podendo ser definida pela parte fisionômica de cada indivíduo, devendo ser analisada de forma individualizada, e a imagem-atributo que refere-se ao comportamento da pessoa ao longo de sua vida, repercutindo no âmbito social. Entretanto, Farias e Rosenvald (2014) destacam o direito à imagem como sendo uno, devendo ser analisado conforme suas peculiaridades. Assim, não há três tipos de direitos, mas sim três formas de analisar a projeção do comportamento das pessoas perante a sociedade, estando tal direito protegido pelo ordenamento jurídico brasileiro com base na sua trilogia conceitual. 3.3 Proteção jurídica da imagem e suas limitações 28 A imagem possui previsão expressa no artigo 5º, V, e X, da CRFB/88 e no artigo 20 do Código Civil de 2002, sendo considerado um direito da personalidade irrenunciável, e indisponível, encontrando-se limitado pela a autorização por parte do titular, devendo observância e respeito a esse direito sob pena de indenização pelos danos que lhe vier a causar. Portanto nesse sentido Gonçalves (2011) define que: A Carta Magna foi explicitada em assegurar, ao lesado, direito de indenização por dano moral decorrente da violação da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas. Nos termos do art. 20 do Código Civil, a reprodução de imagem para fins comerciais, sem autorização do lesado, enseja o direito a indenização, ainda que não lhe tenha atingido a honra, a boa fama ou a respeitabilidade (GONÇALVES, 2011, p. 201). Os dispositivos normativos previstos na CRFB/88 e no Código Civil de 2002 possuem a função de limitação ao uso indevido da imagem, aos quais impondo o consentimento do titular do direito como uma forma de proteção da imagem projetada ao longo da vida. Assim, podendo ser aplicado o instituto da responsabilidade civil para a pessoa que deixar de observar estes dispositivos, pois o direito de imagem assim como os demais direitos explicitados como de personalidade, são indisponíveis. Os doutrinadores Farias e Rosenvald (2014) ensinam que uma vez autorizado o uso da imagem o titular está dispondo de forma relativa deste direito, não podendo futuramente ingressar na justiça alegando danos à imagem ou reparação civil. A imagem é um direito autônomo e essencial a todos os seres humanos, em assim sendo, torna-se necessária sua proteção pelo ordenamento jurídico. Nesse sentido, os autores aqui mencionados afirmam em sua obra que: “O direito à imagem é autônomo e independente, sendo inerente à própria personalidade e merecendo tutela jurídica específica” (FARIAS; ROSENVALD, 2011, p.215). O artigo 5º, inciso V da CRFB/88 confere proteção jurídica a imagem– atributo, propiciando ao titular o direito de resposta, bem como a respectiva reparação pelos danos decorrentes de sua violação. Novelino (2011), em sua obra ensina que o inciso X do artigo 5.º da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/88) possui o condão de tutela da vida particular dos seres humanos, lhe sendo assegurada a 29 sua inviolabilidade. Essa proteção encontra-se fundamentada na teoria das esferas, sendo aceita por vários doutrinadores estendendo-se no âmbito jurisprudencial alemão, na qual a tutela da vida íntima das pessoas poderá ser determinada pela extensão da violação dos direitos da personalidade. A esfera da publicidade compreende os atos praticados em público com o desejo de torná-los públicos. Não basta apenas que o ato seja praticado em local não reservado (elemento espacial), exige-se um elemento volitivo interno: a renúncia. Esta pode ser expressa (como a que ocorre nos programas televisivos de reality show) ou tácita (pessoas públicas em eventos públicos, como shows, comícios, noite de autógrafos, entrega de prêmios e solenidades em geral), mas somente será válida se ocorrer de forma casuística e temporária (“não exercício”) (NOVELINO, 2011, p.452). Conforme Novelino (2011), a área da publicidade abrange as ações que são desenvolvidas em público, tendo como finalidade a divulgação perante toda a sociedade. Porém, não basta somente que as ações sejam executadas em lugares públicos (elemento espacial), pois se torna essencial à presença de um elemento volitivo interno, (a recusa). No que tange ao último elemento, este poderá ser de forma expressa, sendo esta considerada uma forma de manifestação da vontade mediante uma expressão que conta se uma pessoa aceitou ou não algo, (como por exemplo, um gesto), ou tácita que é outra forma de manifestação da vontade que decorre do comportamento da pessoa. Em se tratando da segunda esfera defendida pelo autor acima citado, este ensina em sua obra que: A esfera pessoal abrange as relações com o meio social sem que, no entanto, haja vontade ou interesse na divulgação; a esfera privada compreende os dados relativos a situações de maior proximidade emocional (“contextos relacionais específicos”), como, por exemplo, as opções pessoas ou a orientação sexual do indivíduo. As duas esferas integram a vida privada do indivíduo (NOVELINO, 2011, p.452). A esfera pessoal compreende a ligação com a sociedade, ainda que, não exista vontade ou interesse na publicação da imagem. Esse campo particular abrange elementos referentes a circunstâncias próximas ao emocional de cada pessoa, dando a todos a possibilidade de escolha conforme seus interesses, como exemplo, a opção sexual feita por cada indivíduo. A esfera íntima se refere ao modo de ser de cada pessoa, ao mundo intrapsíquico aliado aos sentimentos identitários próprios (autoestima, 30 autoconfiança) e à sexualidade. Compreende as esferas confidencial e do segredo, referentes à intimidade (NOVELINO, 2011, p.452). Enfim, a esfera privada relaciona-se com o jeito individualizado que cada ser humano possui ao universo psicológico associado aos sentimentos de identificação pessoal, como a autoconfiança, a autoestima, dentre outros. Portanto, tal esfera engloba áreas particulares, reservadas, sigilosas, relativas à vida íntima e pessoal dos indivíduos. No âmbito constitucional as nomenclaturas intimidade e vida privada possuem um enorme grau de aproximação, entretanto, não se confundem, posto que possuem determinadas peculiaridades que as diferenciam. O critério de identificação de ambas é a amplitude da incidência. Portanto, quando houver um tratamento mais íntimo entre pessoas, como familiares, amizades, incidindo restritamente nas relações entre sujeitos estarão diante da intimidade. Ao contrário, em se tratando da vida privada esta deve ser interpretada de forma ampla, pois ocorrem nas demais relações entre seres humanos, como trabalho, estudo, incluindo as objetivas (MORAES, 2014, p. 54). Conforme Moraes (2014) na esfera restrita das relações familiares, os direitos relativos à intimidade e à vida particular possuem ampla interpretação, pois nesse caso em especial devem ser levados em consideração os laços de família, tornando- se essencial a presença de algumas precauções contra possíveis intervenções alheias. Em contrapartida, a interpretação dessa tutela constitucional deve ser restrita quanto aos ocupantes de cargos políticos e pessoas públicas de forma genérica, sendo necessária uma observância do texto constitucional quando houver casos de violações à honra, imagem, intimidade, bem como à vida privada. Uma vez que os políticos encontram-se submetidos a um controle específico pela sociedade e por todos os meios de comunicação, ao passo que as pessoas que exercem atividade artística demandam uma maior e permanente exibição nas mídias. Porém, essa indispensabilidade de uma interpretação restrita jamais retira a proteção conferida pela CRFB/88 contra afrontas desproporcionais e, especialmente sem um nexo de causalidade com profissão desempenhada (MORAES, 2014, pp. 54-55). A CRFB/88 confere a todos os seres humanos, incluíndo as pessoas 31 jurídicas uma tutela constitucional, a qual se encontra consagrada no art.5.º, inciso X, do respectivo texto normativo. Tal proteção estende-se à imagem em relação à mídia, abrangendo revistas, internet, televisão, dentre os diversos meios disponíveis de comunicação (MORAES, 2014, p.54). Segundo Novelino (2011), é vedada a obtenção e a divulgação da imagem sem a prévia autorização de seu titular, posto que tal limitação encontra-se fundamentada no direito à imagem positivada no ordenamento jurídico brasileiro. Entretanto, existem exceções quanto a estas restrições, as quais poderão ser justificadas conforme os bens, valores, interesses ou princípios constitucionais. A tutela conferida à imagem é autônoma quanto à honra. Dessa forma, mesmo que não exista afronta à avaliação valorativa própria (honra subjetiva) ou a conceitos que a sociedade atribui a alguém (honra objetiva), é proibido o uso da imagem sem a autorização de seu titular, ressalvado os casos em que houver motivos que a justifique. Nesse sentido, Moraes (2014) em sua obra ensina que: “Os direitos à intimidade e à própria imagem formam a proteção constitucional à vida privada, salvaguardando um espaço íntimo intransponível por intromissões ilícitas externas” (MORAES, 2014, p. 53). Bittar (2015) seguindo o raciocínio do autor acima mencionado ensina em sua obra que: Na divulgação da imagem, é vedada qualquer ação que importe em lesão à honra, à reputação, ao decoro (ou à chamada “imagem moral”, ou “conceitual”), à intimidade e a outros valores da pessoa (uso torpe), verificando-se, nesse caso, atentado contra os aspectos correspondentes (e não violação ao direito de imagem, que se reduzirá a meio para o alcance do fim visado) (BITTAR, 2015, p. 156). No ordenamento jurídico brasileiro admitem-se as chamadas limitações legítimas, que são aquelas imagens cuja divulgação somente poderá ocorrer desde que permitidas por lei. Assim, devem ser respeitados os parâmetros jornalísticos de indiscutível relevância para a sociedade em geral, tal como, a obtenção de imagens mediante dispositivos eletrônicos de tráfego, câmeras de segurança, ainda que colocadas em ruas, lugares destinados ao público e festas de interesse público (NOVELINO, 2011, p. 453). AÇÃO INDENIZATÓRIA – DIREITO DE IMAGEM FOTOGRAFIA DE AUTORA ESTAMPADA EM REPORTAGEM JORNALÍSTICA – IMAGEM 32 CAPTADA EM LOCAL PÚBLICO AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO – LIBERDADE DE INFORMAÇÃO CONDUTA LÍCITA – INEXISTÊNCIA DE CONTEÚDO VEXATÓRIO OU CONOTAÇÃO PEJORATIVA – VIOLAÇÃO DO DIREITO DE IMAGEM NÃO CONFIGURADO – DANO MORAL NÃO CARACTERIZADO. Ainda que a imagem em debate tenha sido publicada sem a devida autorização, concluí-se pela licitude da conduta da apelada, tendo a fotografia servido exclusivamente para ilustrar matérias jornalísticas, de indiscutível interesse social, sem qualquer alusão depreciativa, identificação ou indicação do nome da autora. Não se vislumbra qualquer dano capaz de justificar o dever indenizatório por tal exposição. Matéria com intuito meramente informativo, não comercial. Improvimento ao recurso (TJRJ, Ac. 17ª Câmara Cível, AP. 0102564692011819000/RJ, Des. Edson Aguiar de Vasconcelos, j. 19.02.2014). A imagem pode ser captada em espaços públicos ou privados, em ambos os casos quando for possível a identificação de uma pessoa ou peculiaridades que a diferencie de outras, esta não poderá ser utilizada sem o consentimento de seu titular, devendo ser respeitadas as restrições previstas em lei (BITTAR, 2015, p.157). Segundo Farias e Rosenvald (2014), caso esteja o titular em locais públicos o direito à imagem será relativo, sendo necessária uma cautela específica com a divulgação de imagens das pessoas que ali se encontram, como praias, bailes, estádios de futebol, etc. Dessa forma, é perceptível que estando em locais abertos ao público, presume-se que a imagem é pública, principalmente se o caso for relevante para a sociedade com cobertura pelos jornais e outros meios de comunicação. Apesar disso, estando uma pessoa em lugares acessíveis ao público à imagem encontra-se protegida pelo ordenamento jurídico brasileiro, pois trata-se de um direito personalíssimo inerente aos seres humanos. Dessa maneira, Farias e Rosenvald (2014) afirmam que se a captação da imagem for feita de forma genérica não conseguindo distinguir uma pessoa das outras não caracteriza o dano, uma vez que neste caso a imagem é destinada ao público. No entanto, se a imagem focalizar uma pessoa sendo possível a sua individualização perante outras, esta não poderá ser divulgada sem a autorização da mesma, pois estaria diante da violação dos direitos da personalidade. Nesse sentido, a tecnologia é um instrumento de trabalho que não deve ser utilizada como um meio violador do direito à imagem, não devendo com ela obter vantagens econômicas decorrentes de tais violações. EMENTA: RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. CIVIL. DIREITO 33 À IMAGEM. VIOLAÇÃO AO ART.535 DO CPC: INCIDÊNCIA DA SÚMULA284/STF. CONTRARIEDADE AOS ARTS. 28, 30 E 79 DA LEI 9.610/98: AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO (SÚMULA 211/STJ). IMAGEM DE PESCADOR EM ATIVIDADE CAPTADA EM LOCAL PÚBLICO. AUSÊNCIA DE CONTEÚDO OFENSIVO: DIVULGAÇÃO: CAMPANHA PUBLICITÁRIA. FINALIDADE COMERCIAL. INEXISTÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO. PROVEITO ECONÔMICO. USO INDEVIDO DA IMAGEM. DANO MORAL CONFIGURADO (SÚMULA 403 STJ). RECURSO IMPROVIDO. 1 Relativamente à infringência ao art. 535 do CPC, cumpre salientar que a recorrente fez apenas alegação genérica de sua vulneração, apresentando uma fundamentação deficiente que impede a exata compreensão da controvérsia. Incidência da Súmula 284/STF. 2 Os arts. 28, 30 e 79 da lei 9.610/98 não foram prequestionados no v. acórdão recorrido. Incidência da Súmula 211/STJ. 3 O uso e divulgação, por sociedade empresária, de imagem de pessoa física fotografada isoladamente em local público, em meio a cenário destacado, sem nenhuma conotação ofensiva ou vexaminosa, configura dano moral decorrente de violação do direito à imagem por ausência de autorização do titular. É cabível indenização por dano moral decorrente da simples utilização de imagem de pessoa física, em campanha publicitária, sem autorização do fotografado (Súmula 403/STJ: “Independente de prova do prejuízo a indenização pela publicação não autorizada de imagem de pessoa com fins econômicos ou comerciais”). 4 Recurso Especial improvido (STJ, Ac. 4ª T., REsp.1307366/RJ, rel. Min. Raul Araújo, j. 03.06.2014). Bittar (2015) afirma que no âmbito jurídico os valores referentes aos direitos disponíveis como à imagem e os relativos a determinados bens intelectuais, antes de qualquer exposição ao público, torna-se essencial o consentimento de seu titular. Entretanto, essa autorização exige a forma expressa em um contrato específico, devendo constar os modos em que a pessoa aparecerá diante do público. Portanto, o contrato firmado entre as partes gera uma relação jurídica, funcionando como uma garantia de adimplemento das obrigações nele contidas, bem como um instrumento limitador na participação de terceiros na relação contratual existente entre o titular do direito e a parte contratante. Assim sendo, Bittar (2015) afirma que: Desse modo, na circulação jurídica de seus valores componentes - desde que disponíveis, como os direitos à imagem e os sobre certos bens intelectuais -, premissa fundamental de qualquer utilização pública é a autorização expressa e específica do titular e por via de contratos adequados, para que, previamente, possa eleger os modos pelos quais aparecerá perante o público. Esses mecanismos - unidos ao sistema sancionatório exposto - permitem garantir ao titular, de outra parte, a remuneração correspondente ao uso ajustado, evitando, ademais, que estranhos possam, sem título jurídico próprio, ingressar no respectivo circuito, daí auferindo proveitos econômicos (BITTAR, 2015, p.84). 34 Entretanto, Farias e Rosenvald (2014) entendem que o consentimento do titular para o uso da imagem não exige a forma expressa e escrita, podendo ser feito na forma implícita, sem as observâncias das formalidades defendidas por Bittar. Desse modo, entendem que esta é a forma mais normal e frequente adotada por toda coletividade. Assim, tal consentimento encontra-se notável quando uma pessoa autoriza ser filmada ou fotografada em eventos, tendo o conhecimento que tais imagens poderão ser utilizadas nas redes sociais. Portanto, dessa forma a jurisprudência vem reconhecendo a possibilidade do consentimento tácito para o uso da imagem. Além disso, a anuência não precisa ser expressa, nem escrita. Apresentase perfeitamente possível que se conceda o uso da imagem de forma implícita, informal. É, inclusive, o modo mais comum, habitual. É a hipótese de alguém que se deixa fotografar ou filmar em eventos, sabendo que a câmera que está registrando é de uma rede de televisão pela logomarca estampada ou pela identificação do fotografo de uma revista de variedades. Corretamente, inclusive, a jurisprudência vem admitindo o consentimento tácito (FARIAS; ROSENVAL, 2014, p. 238). Segundo Bittar (2015), além do uso da imagem sem a autorização de seu titular são considerados ilícitos os atos de aproveitamento dos limites estipulados no contrato, como meio, prazo, fim dentre outros. Assim, em havendo a permissão de uma pessoa para a utilização de sua imagem em lançamento de determinado produto, esta não poderá ser aproveitada em empresa diversa ou em outro produto a não ser aquele especificado no contrato. DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS CUMULADA COM COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS. UTILIZAÇÃO DE IMAGEM APÓS EXTINTO O CONTRATO DE CESSÃO DE USO. DANO MORAL IN RE IPS. ARTIGOS ANALISADOS: 11, 20 E 398 DO CC. 1 Ação de reparação de danos materiais cumulada com compensação por danos morais ajuizada em 14/02/2008. Recurso especial concluso ao Gabinete em 13/082012. 2 Demanda em que se discute a existência de dano moral puro decorrente da utilização de imagem com fins comerciais após a extinção do contrato de cessão em razão do advento do termo contratual. 3 Dispensa-se a comprovação de dor e sofrimento, sempre que demonstrada a ocorrência de ofensa injusta à dignidade da pessoa humana. 4 A violação do direito à imagem, decorrente de sua utilização para fins comerciais sem a prévia autorização, caracteriza dano moral in re ipsa a ser compensado (Súmula 403/STJ). 5 Em se tratando da responsabilidade extracontratual, os juros da mora contam-se desde a data do evento danoso, nos termos da Súmula 54/STJ, sejam os danos materiais ou morais. 35 6 Recurso especial provido (STJ, Ac. 3ª T., REsp. 1337961, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 03.04.2014). Portanto, com exceção as restrições naturais, o uso da imagem encontra-se limitado nas cláusulas contratuais. Nesse sentido, o autor acima citado ensina em sua obra que: Nenhum uso pode, salvo as limitações naturais, exceder aos contornos contratuais: assim, a empresa que dispõe de fotografia de atriz para publicidade do filme não pode, paralela ou posteriormente, utilizá-la em revista ou na divulgação de produto de outra empresa, ou cedê-la para qualquer outra inserção. Também não estão autorizados os bancos ou arquivos de fotos - constituídos, em especial, para a alimentação da publicidade e da edição de revistas e jornais - a fazer usos não previstos no ajuste com o interessado, ou não condizentes com sua atividade, ou, enfim, contrários aos princípios expostos (BITTAR, 2015, p.155). Desse modo, assim como os demais direitos privados à imagem possui restrições especificas, as quais derivam das imposições colocadas pela sociedade, abrangendo as seguintes limitações: o destaque de uma pessoa, sendo que nesse caso torna-se necessária a anuência do titular do respectivo direito assegurando a proteção da sua intimidade; o ingresso em cargos públicos, em razão de ser a divulgação considerada necessária; o trabalho exercido por servidores da justiça e autoridades policiais; a presença de finalidades científicas, culturais; a repercussão relativa a eventos ou acontecimentos voltados para o interesse da sociedade dentro dos parâmetros limitadores de informação ao público que por sua vez, é considerado limite natural e constitucional de proteção à imagem (BITTAR, 2015, pp. 158-159). Farias e Rosenvald (2014) em sua obra fazem críticas ao artigo 20 do Código Civil de 2002 entendem que a legislação civil banalizou o direito à imagem, pois a tutela ao respectivo direito somente existiria em casos de violações a honra ou quando houver proveitos econômicos advindos do uso não autorizado da imagem alheia. Nesse sentido, dispõe o artigo 20 Código Civil de 2002 a seguinte redação: Art. 20 CC: “Salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais”. 36 Conforme Farias e Rosenvald (2014), a tutela jurídica do direito à imagem com base na interpretação gramatical da redação do mencionado dispositivo legal acima citado fica condicionada a existência de afrontas a determinados direitos personalíssimos. Dessa maneira, somente seria possível acionar o poder judiciário quando as violações se estenderem à honra, boa fama ou dela resultar vantagens econômicas. Assim os doutrinadores entendem que em havendo a divulgação da imagem sem a anuência de seu titular, não alcançando à honra e com a inexistência de fins econômicos, não seria considerada ato antijurídico, ocorrendo dessa forma uma violação a proteção do direito à imagem. Entretanto, a interpretação ao respectivo artigo deve obediência ao texto constitucional, nesse sentido Farias e Rosenvald (2014) ensinam que: Por obvio, exige-se uma interpretação conforme a constituição do aludido art. 20 da Codificação de 2002. Em sendo assim, reconhecida a autonomia conceitual e a proteção fundamental da imagem, a simples utilização indevida da imagem de uma pessoa, mesmo sem afronta à sua honra e sem exploração comercial, já impõe a reparação por dano, a partir do garantismo constitucional (CF, art. 5º, V e X) (FARIAS; ROSENVALD, 2014, p. 234). Com base nas críticas doutrinárias levantadas acerca deste dispositivo, os tribunais pacificaram entendimento jurisprudencial, editando assim, a seguinte Súmula. Súmula 403, STJ: “Independente de prova do prejuízo a indenização pela publicação não autorizada de imagem de pessoa com fins econômicos ou comerciais.” Nesse sentido, a Súmula 403 do Superior Tribunal de Justiça impõe o direito de indenização ao titular da imagem indevidamente utilizada, pois tal ato violaria o direito da personalidade, bastando tão e somente à divulgação sem o prévio consentimento para fazer jus à respectiva reparação, não sendo relevante o critério qualitativo da imagem (FARIAS; ROSENVALD, 2014, p. 234). EMENTA: DIREITO À IMAGEM. CORRETOR DE SEGUROS. NOME E FOTO. UTILIZAÇÃO SEM AUTORIZAÇÃO. PROVEITO ECONÔMICO. DIREITOS PATRIMONIAL E EXTRAPATRIMONIAL. LOCUPLETAMENTO. DANO. PROVA. DESNECESSIDADE. ENUNCIADO N. 7 DA SÚMULA/STJ.. INDENIZAÇÃO. QUANTUM. REDUÇÃO. CIRCUNSTANCIAS DA CAUSA. HONORÁRIOS. CONDENAÇÃO. ART. 21, CPC. PRECEDENTES. RECURSO PROVIDO PARCIALMENTE. 37 I – O direito à imagem reveste-se de duplo conteúdo: moral, porque direito da personalidade; patrimonial, porque assentado no princípio segundo o qual ninguém é lícito locupletar-se à custa alheia. II – A utilização da imagem de cidadão, com fins econômicos, sem a sua devida autorização, constitui locupletamento indevido, ensejando a indenização. III – O direito à imagem qualifica-se como direito de personalidade, extrapatrimonial, de caráter personalíssimo, por proteger o interesse que tem a pessoa de opor-se à divulgação dessa imagem, em circunstancias concernentes à sua vida privada. IV – Em se tratando de direito à imagem, a obrigação de reparação decorre do próprio uso indevido do direito personalíssimo, não havendo de cogitar- se da prova da existência de prejuízo ou dano. O dano é a própria utilização indevida da imagem, não sendo necessária a demonstração do prejuízo material ou moral. V – A indenização deve ser fixada em termos razoáveis, não se justificando que a reparação venha a constituir-se em enriquecimento sem justa causa, com manifestos abusos e exageros, devendo o arbitramento operar-se com moderação, orientando-se o juiz para pelos critérios sugeridos pela doutrina e pela jurisprudência, com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e do bom senso, atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso (STJ, Ac.4ªT., REsp.267.529/RJ, rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, j.3.10.00, DJU 18.12.00). O direito de imagem em razão de sua generalidade engloba todos os seres humanos, porém em relação às pessoas famosas devem ser observadas determinadas peculiaridades que as diferenciam perante a coletividade, tornandose obrigatória a tutela pelo ordenamento jurídico. Em contrapartida, tal direito estende- se aos eivados indiretos previstos no artigo 12 parágrafo único do Código Civil de 2002. Assim, tanto os seres humanos vivos quanto os falecidos possuem o respectivo direito, pois os direitos da personalidade não se extinguem com a morte, cabendo aos seus sucessores o direito próprio de defender o “de cujus” contra qualquer violação aos direitos personalíssimos (BITTAR, 2015, pp. 157158). Com base no parágrafo único do artigo acima mencionado, a legislação brasileira atribuíu de forma igualitária proteção jurídica aos indivíduos lesados diretamente, aos quais encontra-se previsto no Caput do respectivo dispositivo, bem como aos lesados indiretos, expressos no parágrafo único do artigo 12 do Código Civil de 2002, conferindo a titularidade do direito de defesa, ao cônjuge sobrevivente (incluído o companheiro e parceiro), os ascendentes, descendentes e aos parentes colaterais (até quarto grau) (FARIAS; ROSENVALD, 2014, p. 198). Nesse sentido, o artigo 12 parágrafo único do Código Civil de 2002, traz a seguinte redação: “Em se tratando de morto, terá legitimação para requerer 38 a medida prevista neste artigo o cônjuge sobrevivente, ou qualquer parente em linha reta, ou colateral até o quarto grau”. Os direitos da personalidade são considerados intransmissíveis, entretanto, conforme o dispositivo legal acima citado a titularidade do direito de zelar pela imagem, honra, e o bom nome da pessoa falecida, dentre outros direitos, é conferida tão e somente aos herdeiros e não ao “de cujus”, figurando-se assim no polo ativo da relação jurídica. EMENTA: RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO CELEBRADO APÓS A MORTE DO USUÁRIO, INSCRIÇÃO INDEVIDA NOS ÓRGÃOS DE PROTEÇAO AO CRÉDITO. EFICÁCIA POST MORTEM DOS DIREITOS DA PERSONALIDADE. LEGITIMIDADE ATIVA DA VIÚVA PARA POSTULAR A REPARAÇÃO DOS PREJUÍZOS CAUSADOS À IMAGEM DO FALECIDO. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 12. PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO CIVIL. 1 Contratação de cartão de crédito após a morte do usuário, ensejando a inscrição do seu nome nos cadastros de devedores inadimplentes. 2 Propositura de ação declaratória de inexistência de contrato de cartão de crédito, cumulada com pedido de indenização por danos morais, pelo espólio e pela viúva. 3 legitimidade ativa da viúva tanto para o pedido declaratório como para o pedido de indenização pelos danos decorrentes da ofensa à imagem do falecido marido, conforme previsto no art. 12, parágrafo único, do Código Civil. 4 Ausência de legitimidade ativa do espólio para o pedido indenizatório, pois a personalidade do “de cujus” se encerrara com seu óbito, tendo sido o contrato celebrado posteriormente (STJ, Ac.3., REsp. 1209474/SP, rel. Min.Paulo de Tarso Sanseverino, j. 10.09.2013). Entretanto, em relação ao direito à imagem prevista no parágrafo único do artigo 20 do Código Civil de 2002, a legitimação do direito de defesa dos lesados indiretos encontra-se limitada a determinadas pessoas do seio familiar, não fazendo menção aos parentes colaterais previsto no parágrafo único do artigo 12. Assim tal dispositivo excluiu a titularidade dos colaterais, conforme previsto na legislação civil: “Em se tratando de morto ou ausente, são partes legitimas para requerer essa proteção o cônjuge, os ascendentes ou os descendentes”. Nesse sentido, Farias e Rosenvald (2014) defendem a tese que o parágrafo único do artigo 20 é um rol exemplificativo, pois os parentes colaterais que possuíam um vínculo afetivo com a pessoa falecida podem vim a ser lesados indiretamente por algum dano causado pela inobservância de determinados direitos personalíssimos do morto. Assim entendem que a relação de afeto construída entre os colaterais poderá ser idêntica ou até mais intensa quanto à 39 dos parentes em linha reta, sendo este o fundamento da tese defendida pelos doutrinadores. Desse modo, ao ser reconhecido a este respectivo dispositivo legal o seu caráter exemplificativo, o direito de ingressar no polo ativo da relação jurídica estende-se aos colaterais, podendo ser titulares quando houver danos à imagem do falecido, deste que comprovada à relação de afeto entre a pessoa morta e o parente colateral. Entretanto, para uma melhor compreensão, os autores acima mencionados trazem em sua obra a denominação do que vêm a ser lesados indiretos, nos quais são conceituados da seguinte forma: Os lesados indiretos são as pessoas que têm legitimidade para requerer a medida de proteção quando o titular dos direitos da personalidade já tiver falecido. Ou seja, pode a pessoa viva defender, em nome próprio, um direito próprio da personalidade consubstanciado em resguardar a memória da personalidade de alguém de sua família que já faleceu. É a hipótese do filho que defende, judicialmente, a honra ou a imagem do pai falecido, indevidamente violado após o óbito. Nesse caso, insista-se, o titular defende um direito próprio, até porque o morto já não mais titulariza qualquer direito da personalidade (FARIAS; ROSENVALD, 2014, pp.198199). Conforme Farias e Rosenvald (2014), em razão da vitaliciedade, os direitos da personalidade deixam de existir quando a pessoa for declarada morta com base no ordenamento jurídico brasileiro. Dessa forma, o falecido não detém mais a titularidade dos direitos personalíssimos, posto que a proteção jurídica prevista no parágrafo único do artigo 12 estende-se aos seres humanos com vida, sendo assim atribuída a titularidade do direito de defesa dos direitos da personalidade ao parente da pessoa falecida. Assim, os parentes em linha reta ou colateral passam a ter legitimidade processual para o ajuizamento de uma possível demanda. Portanto, ocorrendo à divulgação indevida do nome ou imagem de uma pessoa já falecida o dano será direto em relação ao morto, deixando de gerar efeitos jurídicos, posto que a personalidade cessou com a morte. Porém, em se tratando dos parentes vivos este será afetado de forma direta, cabendo o direito de requerer mediante vias judiciais os efeitos de natureza patrimonial (FARIAS; ROSENVALD, 2014, p. 200). Conforme a redação do artigo 943 do Código Civil de 2002, em ocorrendo a violação dos direitos da personalidade poderá haver a transmissão dos efeitos de caráter patrimonial que decorrerem da inobservância legal, dispondo tal enunciado 40 da seguinte forma: “O direito de exigir reparação e a obrigação de prestá-las transmitem-se com a herança”. Em contrapartida, se o ofendido tiver sofrido um dano em vida e ingressar com uma demanda de reparação vindo a óbito antes de seu término, os familiares vivos poderão dar continuidade à mesma, desde que seja feita dentro do prazo prescricional. Neste caso em especial será transmitida aos seus herdeiros os efeitos patrimoniais advindos da respectiva ação ajuizada, sendo proporcional ao que o falecido teria direito se estivesse vivo. Desse modo, não se confunde com o parágrafo único do artigo 12, pois conforme bem dispõem, na hipótese do respectivo dispositivo legal os familiares da pessoa morta são vítimas e ingressam na relação jurídica em nomes próprios (FARIAS; ROSENVALD, 2014, p. 200). A imagem por ser um dos direitos da personalidade merece proteção jurídica específica, sendo feita através das medidas judiciais adequadas, quais sejam, a tutela de natureza preventiva, também denominada de inibitória ou por intermédio da tutela repressiva. No entanto, a denominada preventiva tem o condão de evitar a ocorrência ou o alastramento do dano, não excluíndo uma possível reparação patrimonial caso o dano vem a se confirmar mesmo que inexista os danos materiais (FARIAS; ROSENVAL, 2014, p. 236-237). Concluí-se que a imagem é um direito intrínseco aos seres humanos, sendo uma forma de individualização dos indivíduos perante a sociedade, utilizando-se como referência os aspectos físicos, morais ou intelectuais projetados ao longo da vida, podendo ser analisada conforme sua tridimensionalidade. Entretanto, a imagem por ser considerada um dos direitos da personalidade, o ordenamento jurídico brasileiro a conferiu tutela expressa na CRFB/88 e no CC/02. Assim, uma vez violada caberá ao titular o direito de defendê-la, utilizando-se dos meios judiciais adequados, conforme abordado no primeiro capítulo deste trabalho. 41 4 DANOS DECORRENTES DA VIOLAÇÃO DO DIREITO DE IMAGEM EM REDES SOCIAIS Neste capítulo, serão abordadas as repercussões dos inúmeros casos de exposições à imagem acontecendo nos dias atuais, os danos e os meios de reparação. Tal capítulo tem como finalidade demonstrar que atualmente à imagem, bem como os demais direitos da personalidade vem sendo violados frequentemente, tornando-se um problema, estando este ligado a evolução tecnológica, as quais muitas vezes são utilizadas inadequadamente, ocasionando sérias consequências. Desse modo, será feito um estudo sobre os mencionados tópicos, visando o esclarecimento de dúvidas surgidas na elaboração do projeto de pesquisa. 4.1 Danos e meios de reparação Atualmente, os instrumentos de comunicações bem como as redes sociais encontram-se cada vez mais frequentes no âmbito da sociedade. O uso indevido dessas ferramentas vem ocasionando diversos problemas, aos quais repercutem na esfera jurídica. Nota-se que diariamente aumentam os números de casos relacionados a ofensas, divulgações, e violações aos direitos da personalidade, dentre eles, à imagem, à honra e o bom nome, tais abusos são provenientes das redes sociais (SILVA, 2012). Segundo Silva (2012), os abusos comprovam o domínio das redes sociais na coletividade, colocando em todas as pessoas certa fragilidade, nos quais todos podem se encontrar de forma imprevisível em uma situação de violação aos direitos personalíssimos. Desse modo, as redes sociais podem ser vistas como um meio de facilitação para a violação dos direitos da personalidade. Porém, ocorrendo à ofensa contra tais direitos, o ordenamento jurídico brasileiro permite com que as vítimas pleiteiem mediante as medidas judiciais a respectiva reparação dos danos causados. O artigo 1º da CRFB/88 em seu inciso III traz o princípio da dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos para a formação do Estado Democrático de Direito. Dessa forma, atualmente prevalece a denominação de direitos constitucionais intrínsecos a condição humana. Assim, os danos morais 42 passaram a ganhar destaque no texto constitucional, pois a dignidade da pessoa humana é considerada um dos pilares dos valores morais, servindo como parâmetros para os direitos da personalidade (FILHO CAVALIERI, 2012, p. 88). Os danos morais encontram-se previstos na CRFB/88 em seu artigo 5º, incisos V, e X, aos quais englobam a imagem, bem como os demais direitos da personalidade, sendo assegurada ao ofendido a respectiva reparação decorrente de sua violação. Nesse contexto, Venosa (2013) em sua obra ensina que: O dano moral abrange também e principalmente os direitos da personalidade em geral, direito à imagem, ao nome, à privacidade, ao próprio corpo etc. Por essas premissas, não há que se identificar o dano moral exclusivamente com a dor física ou psíquica. Será moral o dano que ocasiona um distúrbio anormal na vida do indivíduo; uma inconveniência de comportamento ou, como definimos, um desconforto comportamental a ser examinado em cada caso. Ao se examinar o dano moral, o juiz se volta para a sintomatologia do sofrimento, a qual, se não pode ser valorada por terceiro, deve, no caso, ser quantificada economicamente (VENOSA, 2013, p. 47). Dessa forma, o dano moral pode ser conceituado como o prejuízo que atinge a esfera psicológica, moral e intelectual de uma pessoa, tendo como campo de atuação os direitos personalíssimos. Assim, no âmbito dos direitos da personalidade o prejuízo direciona-se ao incalculável, elevando o grau de dificuldade para determinação de uma reparação devida e adequada ao dano sofrido (VENOSA, 2013, p. 47). RECURSO INOMINADO. USO INDEVIDO DA IMAGEM DO AUTOR. FALTA DE AUTORIZAÇÃO.VIOLAÇÃO DO DIREITO DE IMAGEM. DANOS MORAIS CONFIGURADOS.QUANTUM INDENIZATÓRIO MANTIDO.DANOS MATERIAIS NÃO CARACTERIZADOS.1.Narra o autor que concorreu a uma cadeira de vereador na última eleição, gastando uma quantia elevada em dinheiro, sendo surpreendido pela ré com a publicação de seu nome e sua imagem a título de deboche nas redes sociais da internet, juntamente com a de uma mulher, a qual desconhece (fl.07). 2. A ré alega que realizou uma “brincadeira” junto com seu colega, onde fizeram montagem de falso material publicitário eleitoral, utilizando a imagem do autor e uma colega da requerida, com intuito de brincar com a colega e nunca ofender a integridade do autor.3.Quanto ao autor não ter sido eleito, não ficou comprovado que tenha ocorrido alguma relação com os fatos em discussão.4.A conduta da ré, ao divulgar a imagem do autor sem autorização, caracterizou situação que ultrapassa os limites do mero dissabor, acarretando violação a direito da imagem (art.5º inc. V eX da CF/88).5.Manutenção do quantum indenizatório fixado na origem R$3.500,00, pois adequado às peculiaridades do caso concreto, de forma a impedir o enriquecimento sem causa do autor, sendo suficiente para reparar os danos causados e servir como desestímulo à reiteração da conduta indevida, observando, ainda, os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.6.Sentença mantida 43 por seus próprios fundamentos. RECURSO IMPROVIDO (TJRS, Ac.1ªTurma Recursal Cível, 71004588117/RS, Rel. Roberto José Ludwig, j. 26.11.2013). De acordo com Cavalieri Filho (2012), sob a ótica da vigente Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/88), os danos morais podem ser conceituados em duas diferentes dimensões, quais sejam: em sentido estrito e amplo. Em se tratando do sentido estrito, o dano moral surge em decorrência da inobservância do princípio da dignidade da pessoa humana, assim, o texto constitucional por reconhecer que a inviolabilidade à intimidade, à vida privada, à honra e a imagem são resultados do direito à dignidade humana, fez inserir em seu artigo 5º, incisos V, e X o dever de reparação do dano moral (CAVALIERI FILHO, 2012, pp. 88-89). Contudo, os direitos da personalidade abrangem demais peculiaridades dos seres humanos que não se encontram diretamente relacionados à dignidade. Nessa classe englobam-se os denominados novos direitos personalíssimos, como a imagem, o bom nome, as relações de afeto, os direitos autorais, convicções políticas, religiosas dentre outros. Dessa forma, os direitos da personalidade podem ser executados em distintos aspectos, bem como poderão sofrer violações em diversos níveis. A partir deste contexto surge o dano moral em seu sentido amplo, o qual alcança diferentes graus de violação aos direitos personalíssimos, incluindo as afrontas praticadas contra os seres humanos podendo esta ser de forma individualizada ou coletiva, mesmo não atingindo a sua respectiva dignidade (CAVALIERI FILHO, 2012, p. 90). Nota-se, que em havendo uma violação aos direitos personalíssimos, a consequência será a produção de resultados negativos no âmbito da personalidade, aos quais determinarão ao ofensor o dever de reparação dos danos de natureza extrapatrimonial (moral). Desse modo, o ordenamento jurídico brasileiro prevê medidas punitivas contra aquele que violar direitos personalíssimos inerentes a outros, aplicando-se uma determinada indenização como forma de reparação dos danos morais. Além disso, a vítima amparada pela legislação brasileira poderá utilizar-se das medidas jurídicas adequadas com o intuito de obter a devida proteção dos direitos da personalidade (FARIAS; ROSENVALD, 2014, p. 190). 44 APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATORIA POR DANOS MORAIS. UTILIZAÇÃO PELA RÉ DE FOTOGRAFIA DO AUTOR PUBLICADA ANTERIORMENTE EM OUTRO PERIÓDICO. AUSÊNCIA DE PRÉVIA AUTORIZAÇÃO DO AUTOR AO RÉU PARA A PUBLICAÇÃO DE SUA IMAGEM. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. 1 Os direitos da personalidade são inalienáveis, intransmissíveis e irrenunciáveis e a permissão para o uso de imagem deve ser sempre temporária e limitada a casos específicos, sob pena de caracterizar verdadeira renúncia ao direito. Por conseguinte, o consentimento de publicação de fotografias em determinada matéria não permite o uso irrestrito destas mesmas imagens em outras impressões, sobretudo em outra editora ou periódico. 2 O entendimento jurisprudencial do STJ é firme na direção de que os danos extrapatrimoniais por violação ao direito de imagem decorrem diretamente do seu próprio uso indevido, sendo prescindível a comprovação da existência de outros prejuízos por se tratar de modalidade de dano “in re ipsa”, o teor da Súmula 403 do STJ: independente de prova do prejuízo a indenização pela publicação não autorizada de imagem de pessoa com fins econômicos ou comerciais. 3 Indenização por danos morais arbitrados em R$ 5.000,00, observadas as peculiaridades do caso concreto. 4 Pedido de publicação no jornal do teor do julgado que se afasta, considerando que a reparação pecuniária é suficiente para a ofensa perpetrada pelo réu na hipótese dos autos. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO (TJRJ, Ac.11ª Câmara Cível, AP. 001950747.2008.8.19.0038/RJ, Des. Fernando Cerqueira Chagas, j. 22.07.2015). O dano decorre de algum prejuízo sofrido pela pessoa, podendo ser tanto individual quanto coletivo, moral ou material, bem como de cunho economicamente apreciável ou não, sendo tal conceito alvo de diversas controvérsias doutrinárias. Nesse sentido, para se configurar o dano torna-se essencial o prejuízo da vítima, assim, a indenização somente será possível caso o ato ilícito gere dano a alguém. Os danos de cunho jurídico são passíveis de reparação mesmo se possuírem conteúdo de natureza moral, religiosa, social dentre outros. Dessa forma, a reparação do dano estende-se tão e somente as transgressões da esfera principiológica do direito obrigacional (VENOSA, 2013, p. 02). Nesse sentido, Venosa (2013) entende que o dano deverá ser atual e determinado não podendo a início serem indenizadas as hipóteses danosas. Dessa forma, com a ausência de danos ou interesses de natureza patrimonial ou moral violado não haverá indenização, pois para a configuração do respectivo dano torna- se necessário a presença do prejuízo direcionado ao ofendido devendo este provar a ocorrência danosa. Entretanto, Schreiber (2011) em sua obra firma um posicionamento diferente de Venosa, o qual afirma que o dano surge em decorrência do uso 45 indevido da imagem, não dependendo de prejuízo. A apropriação indevida da imagem de certa pessoa configura, por si só, dano indenizável. O dano por uso indevido de imagem independe de atentado à honra ou à privacidade do retratado. Trata-se, como já tantas vezes repetido, de direito autônomo. Não é necessário, portanto, para a obtenção de indenização por dano à imagem que o retratado demonstre qualquer efeito “negativo” da veiculação da sua representação exterior. O dano decorre simplesmente do uso desautorizado, mesmo que sua repercussão possa ser “favorável” ao retratado (SCHREIBER, 2011, p. 118). Os bens que compõem a personalidade consistem em valores diversos dos de cunho patrimonial, sendo a ofensa uma consequência do denominado dano moral. Portanto, a partir dessa afirmação o dano moral diferencia-se do dano material, podendo este ser requerido mediante uma medida jurídica autônoma, razão pela qual não devem ser confundidos (CAVALIERI FILHO, 2012, p. 89). Neste sentido, o autor acima mencionado afirma em sua obra que: “O dano patrimonial, como o próprio nome diz, também chamado de dano material, atinge os bens integrantes do patrimônio da vítima, entendendo-se como tal o conjunto de relações jurídicas de uma pessoa apreciáveis economicamente” (CAVALIERI FILHO, 2012, pp. 77- 78). Conforme Cavalieri Filho (2012), a nomenclatura dano pode ser conceituada como sendo o abatimento ou a redução de determinado bem jurídico, independentemente de sua natureza, podendo ser um bem de cunho patrimonial, bem como um elemento particular que compõe a personalidade do ofendido, como a honra, a imagem, etc. Em resumo, o dano é aquele que surge em decorrência de uma violação de algum bem jurídico, podendo ser de caráter moral ou econômico (CAVALIERI FILHO, 2012, p. 77). Seguindo esta linha de raciocínio, o autor acima mencionado afirma em sua obra que: O dano é, sem dúvida, o grande vilão da responsabilidade civil. Não haveria que se falar em indenização, nem em ressarcimento, se não houvesse o dano. Pode haver responsabilidade sem culpa, mas não pode haver responsabilidade sem dano. A obrigação de indenizar só ocorre quando alguém pratica ato ilícito e causa dano a outrem. O dano encontra-se no centro da regra de responsabilidade civil. O dever de reparar pressupõe o dano e sem ele não há indenização devida. Não basta o risco do dano, não basta a conduta ilícita, sem uma consequência concreta, lesiva ao patrimônio econômico ou moral, não se impõe o dever de reparar (CAVALIERI FILHO, 2012, p. 76-77). 46 O Código Civil de 2002 traz em seu artigo 927 Caput e parágrafo único a obrigação de reparar o dano quando este for decorrente da pratica de um ato antijurídico. Dessa forma, caso inexista o dano não existirá a reparação da conduta ilícita praticada pelo agente com dolo ou culpa, nesse sentido, dispõe que: Art. 927- Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. A Súmula 403 do STJ já mencionada no capítulo anterior traz a seguinte redação: “Independe de prova do prejuízo a indenização pela publicação não autorizada de imagem de pessoa com fins econômicos ou comerciais.” Conforme o enunciado da Súmula 403 do Superior Tribunal de Justiça será assegurado o direito de indenização pela divulgação de imagens indevidamente utilizadas, pois tal ato implica uma ofensa contra o titular do direito, tornando-se passível de reparação. EMENTA: CIVIL. AGRAVO RIGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. UTILIZAÇÃO DE IMAGEM SEM AUTORIZAÇÃO PARA FINS COMERCIAIS. CONFIGURADO O DANO MORAL. INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 403 DO STJ. PRECEDENTES. 1 As instâncias ordinárias reconheceram que a utilização da imagem da autora sem autorização, para fins comerciais ou econômicos, configurou o dano moral. 2 O uso ou a divulgação de imagem destacada sem autorização do titular mesmo sem conotação ofensiva ou vexatória, caracteriza o dano moral. 3 A empresa-responsabilizada não apresentou argumento novo capaz de modificar a conclusão da origem que se apoiou na incidência da Súmula nº 403 do STJ. 4 Agravo regimental não provido (STJ, Ac. 3ª T. AgRg no AREsp. 583.679/ CE, rel.Min. Moura Ribeiro, j. 21.10.2014). Deste modo, o dano moral não se limita ao sofrimento do ofendido, no qual sua proteção atinge também os bens relacionados à personalidade e os conjuntos de natureza ética. Assim, em razão de sua amplitude, os danos morais podem ser conceituados como um desrespeito a um determinado direito personalíssimo, estando sujeito a uma análise pecuniária, a qual poderá ser aplicada ao responsável pela violação dos direitos de outrem, sendo uma forma de compensação do dano causado à vítima. Portanto, o dever de reparação do dano possuiu um conteúdo mais satisfatório do que indenizatório, buscando amenizar o 47 sofrimento das vítimas (CAVALIERI FILHO, 2012, p. 90-91). Com efeito, o ressarcimento do dano moral não tende à restitutio in integrum do dano causado, tendo mais uma função satisfatória, com a qual se procura um bem que recompense, de certo modo, o sofrimento ou a humilhação sofrida. Substitui –se o conceito de equivalência, próprio do dano material, pelo de compensação, que se obtém atenuando, de maneira indireta, as consequências do sofrimento (CAVALIERI FILHO, 2012, p. 91). A reparação do dano poderá ser feita mediante o pagamento de um valor em dinheiro, sendo este fixado pelo juiz, entretanto, não é possível voltar ao estado anterior. Dessa forma, a quantia pecuniária, nada mais é do que um meio de compensar o sofrimento da vítima. Neste sentido, Gagliano e Filho (2009) ensinam em sua obra que: Sendo a reparação do dano, como produto da teoria da responsabilidade civil, uma sanção imposta ao responsável pelo prejuízo em favor do lesado, temos que, em regra, todos os danos devem ser ressarcíveis, eis que, mesmo impossibilitada a determinação judicial de retorno no status quo ante, sempre se poderá fixar uma importância em pecúnia, a título de compensação (GAGLIANO; FILHO, 2009, p. 38). Os danos não patrimoniais também denominados de danos morais podem ser configurados sem a presença de provas, dor, humilhação ou qualquer outra emoção de caráter negativo. O dano moral pode ser caracterizado pela simples prática de violação aos direitos inerentes aos seres humanos, assim, estabelecem que a respectiva prova desse dano é in re ipsa, ou seja, decorre do próprio fato, e no caso em questão ocorrerá com a violação dos direitos pessoais, bem como do princípio da dignidade humana do titular. Nesse sentido, todos os danos de cunho moral derivam da inobservância dos direitos personalíssimos. Assim, em havendo a prática de atos ilícitos contra os direitos relacionados à personalidade dos indivíduos, independentemente de sofrimento da vítima será aplicado ao ofensor um valor de natureza indenizatória (FARIAS; ROSENVALD, 2014, p. 190-191). Conforme Cavalieri Filho (2012), a Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB/88) reconheceu expressamente a possibilidade de reparação do dano moral em seu artigo 5º, incisos V e X. Entretanto, várias foram as indagações em relação à cumulabilidade dos danos morais com os de cunho material, porém, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) com o objetivo de colocar fim a essas 48 questões surgidas com o respectivo assunto, editou a súmula 37, trazendo a seguinte redação: “São cumuláveis as indenizações por dano material e dano moral, oriundos do mesmo fato”. Portanto, com base na respectiva súmula do Superior Tribunal de Justiça (STJ), poderá haver a cumulação dos danos de cunho moral e os danos de natureza material, desde que tais danos sejam em decorrência de uma mesma conduta antijurídica, cabendo à respectiva indenização ao titular do direito violado. Entretanto, a cada direito inerente a personalidade dos seres humanos violado, consequentemente equivalerá a uma determinada reparação, sendo esta autônoma e passível de cumulação com outro dano de natureza moral. Desse modo, leva-se como um exemplo a possibilidade de acumulação do dano à honra com o da imagem (FARIAS; ROSENVALD, 2014, p. 192). 4.2 Relato de casos A lista de apetrechos que auxiliam a obtenção de imagens alheias é extensa, como Câmeras digitais em aparelhos telefônicos, webcams, câmeras internas de segurança eletrônica, zooms que possibilitam dimensões ilimitadas, dentre outros. Concomitantemente, a internet possibilita a divulgação anônima de imagens por todo o mundo, sendo um instrumento acessível a todos, na qual não se lamenta por qualquer conteúdo. Assim, devido seu livre acesso ao público, vídeos e fotos podem ser colocados voluntariamente em diversos sites, ainda que posteriormente sejam difíceis de serem rastreados. Desse modo, os danos à imagem decorrentes da publicação em redes sociais são considerados irreversíveis (SCHREIBER, 2011, pp.119-120). Segundo a revista Veja (2012), no dia 04 de maio de 2012, aproximadamente trinta e seis fotografias particulares da atriz Carolina dieckman foram publicadas em diversos sites, nas quais a vítima aparecia em diversas posses sensuais, gerando diversas repercussões na mídia. Porém, após a publicação das fotografias, a atriz manifestou-se nas redes sociais, que estava sendo chantageada antes das imagens serem divulgadas na internet mediante ligações telefônicas, e por e-mails desconhecidos, impondo o pagamento de uma quantia em dinheiro no valor de R$ 10,000,00, sendo esta uma condição para que os criminosos não publicassem suas fotos íntimas 49 (LEMOS, 2012). Portanto, devido à recusa da atriz em pagar o valor estipulado pelos crackers, suas fotos foram inseridas indevidamente nas redes sociais, no qual após investigações chegaram aos autores do delito, sendo estes residentes no interior do estado de Minas Gerais e São Paulo, aos quais foram responsabilizados pelos crimes de extorsão, difamação e furto. Porém, visando a proteção da imagem da atriz o advogado de Carolina Dieckmann requereu judicialmente a remoção do conteúdo das imagens dos sites de busca. Assim, em razão da vasta repercussão do caso Carolina Dieckmann foi aprovada em dezembro a lei 12.737/12, cujo texto normativo dispõe que os indivíduos que violarem senhas, ou adquirirem dados pessoais e comerciais sem a anuência do titular, poderão ser submetidos a penas privativas de liberdade de três meses a dois anos, e multa (Valle, 2013). Conforme o artigo jurídico de Oliveira Junior (2013), a lei 12.737/12 ganhou a denominação de Lei Carolina Dieckmann dispondo sobre os tipos penais dos delitos relacionados à informática. Tal denominação deve-se a invasão da privacidade da atriz, tendo seus arquivos particulares subtraídos e posteriormente divulgados nas redes sociais, ocasionando assim, violação ao direito da personalidade com possíveis danos. Outro caso que teve grande repercussão na mídia foi o da modelo Daniela Cicarelli. Em 2006 durante um passeio em uma praia na Espanha, a modelo juntamente com o seu namorado Tato Malzoni tiveram sua intimidade violada por um cinegrafista do paparazzi, o qual obteve imagens do casal utilizando-se de uma câmera. Posteriormente, com as imagens em punho foi feito a edição de um filme, repleto de frases ardentes, sendo este divulgado no YouTube, tornando-se de forma acelerada um dos vídeos mais acessados pelos brasileiros. Desse modo, o caso foi parar no Poder Judiciário, no qual o casal utilizando-se das medidas judiciais moveu contra o YouTube uma ação inibitória com a finalidade de por fim a divulgação das imagens (SCHREIBER, 2011, p. 121-122). Assim, o Tribunal de Justiça de São Paulo determinou liminarmente o bloqueio do site YouTube, impedindo a todos os internautas o acesso ao respectivo site, gerando dissabores a todos os brasileiro e estrangeiros. Entretanto, perante a extensa reprovação da sociedade, a Corte passou a revisar sua decisão, restringindo o acesso somente do vídeo referente a modelo 50 Daniela Cicarelli (SCHREIBER, 2011, p. 122). Coisa inteiramente diversa é a divulgação da imagem, que não pode ser usada como meio de punição pela conduta imprópria. Sob o prisma jurídico, tal pena seria flagrantemente inconstitucional. Sob o prisma ético, representaria um contrassenso, pois acabaria por propagar o mal causado, permitindo que todos os usuários da rede mundial, incluindo crianças e adolescentes, continuassem a ter livre acesso ao comportamento considerado reprovável (SCHREIBER, 2011, p. 122). Entretanto entre um recurso e outro finalmente a decisão sobre o caso Daniela Cicarelli foi proferida. No dia 13 de outubro de 2015 o relator Ministro Luis Felipe Salomão da 4ª turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu unânimente pela redução da multa de R$96 milhões para R$500,000,00. Tal quantia foi fixada contra o Google, devido a desobediência em deixar de remover o vídeo feito por um cinegrafista do paparazzi, que posteriormente foi divulgado no site do YouTube. A modelo Daniela Cicarelli e seu ex-namorado Tato Malzoni pleitearam a execução judicial no valor de R$96 milhões a título de multa. Sendo estipulada pela desobediência do cumprimento da decisão proferida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), o qual determinou no ano de 2008 a retirada das imagens do ar, sob pena de sofrer uma multa diária no valor de R$250, 000,00 para cada autor, acrescido de juros e correção monetária (GALLI, 2015). Portanto, concluí-se que atualmente a internet tornou-se uma ferramenta essencial no dia a dia, sendo esta considerada um dos melhores meios de comunicação. Entretanto, devido aos avanços da tecnologia com a criação de aplicativos e sites, as pessoas vêm sendo cada vez mais expostas ao perigo de terem suas imagens divulgadas em redes sociais pela a inadequação do uso de determinadas pessoas. A imagem é um direito personalíssimo, em assim sendo, ocorrendo sua violação consequentemente haverá a produção de danos que podem ser de natureza material ou moral, a partir daí surge a responsabilidade do agente causador em repará-lo. Portanto, os dois casos acima relatados são exemplos que retratam a violação do direito à imagem. Porém, o primeiro caso ensejou a criação da Lei Carolina Dieckmann (12.737/12), sendo considerado um marco no ordenamento jurídico brasileiro, repercutindo no âmbito da legislação civil, bem como no campo penal, servindo como embasamento jurídico para os Tribunais de Justiça na aplicação do caso em concreto. 51 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Concluí-se que o direito de imagem é um direito personalíssimo inerente aos seres humanos, e que as redes sociais possuem uma lastra influência na sociedade. As dúvidas levantadas no projeto de pesquisa foram totalmente respondidas com êxito neste trabalho. Sendo confirmado que o uso da imagem encontra-se limitado ao consentimento do titular, e que uma vez autorizado à utilização da mesma, não poderá pleitear futuramente uma reparação civil, inexistindo neste caso a violação ao respectivo direito. Assim, havendo a captação de imagem de uma pessoa ainda que em local público, sendo possível identificá-la perante outras, esta poderá utilizar-se das medidas judiciais adequadas, requerendo a respectiva indenização pelo dano sofrido. Sendo confirmado também que o direito de imagem se estende para as pessoas jurídicas, e que os herdeiros possuem o direito de defender em nome próprio a imagem do falecido. Assim, conclui-se que os danos configuram-se pela simples divulgação de imagem sem a autorização do titular, independendo de prejuízo. O embasamento jurídico utilizado neste trabalho para a obtenção destas respostas foram a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/88), o Código Civil de 2002, doutrinas e jurisprudências dos Tribunais de Justiças. Além das conclusões acima, pode-se concluir também que os casos decorrentes das relações virtuais encontram-se cada dia mais presentes nos Tribunais de Justiça. A imagem, a intimidade, dentre outros direitos da personalidade demonstram-se vulneráveis frente aos avanços tecnológicos. Portanto, o problema não é somente em decorrência dessa tecnologia desenvolvida, mais também da falta da sociedade em saber utilizá-la, bem como das perdas dos valores éticos e morais da coletividade. 52 REFERÊNCIAS BITTAR, Carlos Alberto. Os direitos da personalidade. 8.ed. São Paulo: Saraiva, 2015. Caps. XII, p. 87-90; XXI, p. 153-161. BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado, 2003. BRASIL. Código Civil. Obra coletiva de autoria da Editora Saraiva com a colaboração de Luiz Roberto Curia, Lívia Céspedes e Juliana Nicoletti.16.ed.atual.ampl. São Paulo: Saraiva, 2013. BRASÍLIA. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial, n. 267529/RJ. Icatu Hartford. Seguros S/A versus Genivaldo de Oliveira Lins. Relator Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, Acórdão de 03 de outubro de 2000. Jurisprudência. 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