considerações sobre os bracos continentais, o perdigueiro

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considerações sobre os bracos continentais, o perdigueiro
Antologia Canina
CONSIDERAÇÕES SOBRE OS BRACOS CONTINENTAIS,
O PERDIGUEIRO PORTUGUÊS E O POINTER
Por Manuel Morêda
Os Bracos de parar continentais representam um grande grupo, que podem ser considerados de
isomorfos, pois as suas variações são muito pequenas, unicamente existentes em caracteres considerados
secundários. Quanto às caracteristicas psiquicas, morais e práticas, são muito uniformes.
A etimologia da palavra Braco não se sabe bem a sua origem. «Ad initio» esta palavra ou outras equivalentes
nas linguas europeias, serviu para definir qualquer cão de pequena estatura; mais tarde, no século XIX, passou a ter um
significado mais restrito e foi generalizada para unicamente classificar os cães de parar de pêlo raso, estabelecendo,
assim, uma separação entre estes e os outros cães Epagneuls e os Grifons ou Barbetos.
Desses antigos Bracos continentais, os ingleses pretenderam ter um cão aperfeiçoado e que viesse a ser
considerado em todo o mundo de ínclito.
Para tal, foram importados da Península Ibérica para o Reino Unido os Bracos peninsulares, segundo afirma a
maioria dos mais abalizados tratadistas; todavia, há quem afirme que para tal foram muitos Bracos de França, hipótese
aliás, pouco aceitável. Esse facto deu-se mais tarde, depois de existir o Pointer.
E tanto é assim que o cão de parar inglês em França era designado por «Spanish Pointer». A versão do Pointer
ter sido originário de cães de península é admissivelmente lógica.
Braco (cão de fundo)
e Pointer (de velocidade)
Devido às características físicas, morais e forma de caçar serem muito diferentes entre o Pointer insular e os
Bracos continentais, foram classificados cinologicamente em grupos distintos.
Torna-se curioso analisar – além de outros factos já citados – algumas semelhanças, que provam um parentesco
muito mais próximo entre o nosso Perdigueiro Português e o Pointer do que com os Bracos de origem francesa.
AIém de nos referirmos a semelhanças somáticas entre estas citadas raças, também as comparamos aos
demais Bracos e caracteres morais.
Os eixos superiores do crânio e do chanfro são divergentes para a frente nos Bracos e com linhas convergentes
no Pointer.
No Perdigueiro Português essas linhas também são convergentes.
A chanfradura nasal ou «stop» nos Bracos é pouco pronunciada, em forma de ângulo obtuso e no Pointer é
vertical (90º). No Perdigueiro é quase vertical (100°).
Outras divergências são marcadas no formato das orelhas, que são um pouco baixas, um pouco largas e viradas
entre os Bracos; altas, curtas e chatas no Pointer e no Perdigueiro Português. Há, todavia, Bracos que possuem orelhas
de inserção alta, por infusão de sangue Pointer.
O peito é largo e longo nos Bracos e alto e nitidamente separado do ventre no Pointer.
Em resumo: os Bracos são animais de fundo e o Pointer é um cão de velocidade.
Uma crise de «ismo» nos Bracos
Moralmente os Bracos são de temperamento calmo, ponderado, reflectido; o Pointer é impulsivo e nervoso.
Os primeiros caçam instintivamente, facilmente, sem ensino e muito pelo cérebro e o Pointer confia no seu
potencial olfactivo.
Comentando um pouco o caso dos Bracos continentais:
Nessa época, quando começaram a fixar-se os Bracos, um autorizado crítico, observou: «os Bracos continentais
conheceram uma crise de «ismo» que Ihes foi muito prejudicial: o particularismo, separatismo, sectarismo e racismo».
Em vez de criarem Bracos nacionais, para não dizer um especimem continental, dada a impossibilidade, pelo
grande número de países europeus com cães autóctones, começaram-se a isolar raças nacionais, raças regionais e até
mesmo raças familiares.
É o caso da França que possui o Braco de Ariege, Braco de Auvergne, Braco de Bourgonais, Braco Dupui
(Braco Francês de tipo grande e pequeno e Braco Saint-German).
Ao contrário de França, a maioria dos países europeus onde existiam Bracos adaptados ao seu meio,
selecciona-os devidamente passando a ser os seus autóctones. É o nosso caso (do Perdigueiro Português) da
Alemanha (com o seu Braco Alemão): o Kurzhaariger Vorstehhund, a Espanha (com o Perdigueiro de Burgos) a Itália
(com o Braco Italiano), a Hungria (com o Vizla), etc.
Quanto a essas raças diversas que aparecem no mesmo país, como por exemplo a França, raças consideradas
de regionais ou de locais, geralmente adaptáveis ao meio, ao clima, a uma forma de utilização ou à fantasia do
seleccionador, feitas num tempo em que havia dificuldade nos transportes, as deslocações eram rudimentares, e as
selecções eram feitas em volta de si. Por isso fixaram-se em determinado local.
Mas modernamente não é admissível, pois, além porque tendem a desaparecer, por falta de características
étnicas essenciais para que sejam reconhecidas e apreciadas como raças perfeitamente distintas.
Os ingleses devem ter tido motivos para diferenciar várias raças de Pointers, devido aos muitos Bracos que
tiveram. Ainda há Pointers de todas as cores possíveis, assim como vários tipos corporais: pequenos, grandes, pesados
e ligeiros.
Mas os criadores britânicos, como toda a gente sabe, são grandes mestres na arte de criar, modificar,
aperfeiçoar e conservar raças de todos os animais. E se eles tiveram razões para conservar três raças de Setters, não
tiveram menor razão para ter unicamente uma raça de Pointers.
Bracos beneficiados com outros sangues
A maior parte das raças francesas para subsistirem tiveram de ser beneficiadas com outros sangues para terem
características mais apreciáveis, como por exemplo: o Braco Saint-German é um meio sangue, obtido em 1830 por
cruzamentos com o Pointer. Esses bracos originariamente eram brancos e amarelos, existentes no reinado de Carlos X.
Finalmente evoluiram para um tipo «pointerisado», e os poucos que aparecem nas exposições caninas são três quartos
deste sangue; o Braco Bourbonnais é um descendente do antigo Braco Francês, melhorado por cruzamentos com o
Pointer; o Braco de Auvergne, que é uma raça muito anosa, com uma história que data da idade Média e cheia de
lendas, não sendo provável que seja uma raça pura. O mais verosímil é que o Braco Azul do Auvergne seja descendente
de um cão francês e ao qual infundiram sangue de um Pointer preto ou preto e branco. A sua vivacidade, a finura do seu
nariz e a cor da sua pelagem, indicam claramente o sangue inglês.
Braco Francês
Quanto ao Braco Dupui é uma raça artificial. Depois de uma existência de duzentos anos, foi sabiamente
selecionado por um senhor Narciso Dupui que o cruzou com galgos. Apesar das grandes qualidades cinegéticas e
elegância de formas, foi uma raça que não se impôs.
O Braco de Ariege tem o nome do seu solar, sendo também conhecido por Braco de Toulouse ou do Midi. É
difícil definir a sua origem. É cão de pelagem branca com malhas assimétricas de cor de laranja. É uma raça que se vê
raramente nas exposições. Está em regressão.
Mas incontestavelmente, o tronco de todos os cães desta família francesa foi o Braco Francês. Conhecido e
desenvolvido em França desde o fim do século XVI, veio de Espanha, da região pirenaica, donde certamente partiram e
se formaram as restantes famílias dos bracos continentais adaptados a cada terreno.
Até o conhecido Braco Alemão (Kurzhaar) considerado de base muito antiga, há quem afirme que teve sangue
Pointer.
É um cão de formas fortes e perfeitas, dotado de um fino nariz, de grande iniciativa e de uma manifesta vontade
de procurar toda a caça. Essa versatilidade cinegética e as suas múltiplas utilidades, tornam-no diferente do pointer.
Parece que foi um aperfeiçoamento de um velho Braco, designado de «Kolossal» macisso, pesado, de grande
estatura (80 cm) e de grandes e pendentes lábios, o ancestral desta raça. A hipótese de ter sido um Pointer preto «Kilian
de Kanatsche» do canil Arkwright e uma cadela importada contribuirem para o apuramento destes cães prussianos, foi
principalmente para escurecer a cor da pelagem, pois os alemães consideram o castanho, com ou sem branco, como a
mais própria para cães de mostra.
Uma variedade desta raça é o Weimaraner, que foi uma curiosa selecção de propriedade exclusiva dos duques
de Saxe-Weimar, desde a metade do século XVII, até ao fim do século XIX.
Quanto ao nosso Perdigueiro Português é por configuração física, pelo seu temperamento linfático e pelos seus
dotes morais, um braco.
Mas incontestavelmente, aqueles que merecem mais a denominação de Bracos, de tipo mais representativo,
sem evolução, são o Perdigueiro de Burgos e o Braco Italiano.
In Jornal “O Mundo Canino” - Abril de 1973