Faça o - LTDS
Transcrição
Faça o - LTDS
Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 2ª Edição Publicada em Fevereiro de 2005 Editorial Combatendo as Causas dessa Inaceitável Infelicidade Das Razões de Ser da Revista GIS Roberto Bartholo Apresentar uma revista é explicitar seu compromisso, seu pacto fundamental. E fazemos isso mediante a referência a um "velho" testemunho de D. Helder Câmara (1987:128-129): ".... Lembro-me de certa vez que me convidaram para a inauguração de uma grande empresa. Era um dia de intenso calor, mas os escritórios dos diretores tinham o conforto dos aparelhos de ar condicionado. Os garçons passavam travessas e mais travessas com garrafas de uísque. Uma, duas, muitas vezes. Eu tomava apenas refrigerantes - não por virtude excessiva, pois até gosto de um pouco de vinho, o que não me causa nenhum problema de ordem moral - e sim porque o álcool parece não gostar de mim... Em dado momento um dos convidados se aproxima e, grosseiramente, me diz: ´ora, ora Dom Hélder! Como é que vai sua demagogia? O senhor ainda tem coragem de dizer que vivemos cercados de fome e miséria aqui em Recife?´ Outras pessoas juntaram-se a nós encorajadas por aquela provocação e querendo prossegui-la. Eu respondi a todos em alto e bom som: ´vejam só! Eu estava tranqüilo no meu canto, mas vocês preferiram provocar-me... Pois eu lhes garanto que se sairmos todos nos belos carros que vocês têm, em poucos minutos eu os mergulharei num ambiente da mais terrível fome e miséria... Para surpresa minha aceitaram o desafio. Em não mais que dez minutos chegamos a uma sapucaia, um desses lugares onde os serviços públicos despejam e depois incineram, o lixo da cidade. Eu conhecia bem o local... Chamei um conhecido, que é funcionário da prefeitura e por ali trabalha. Ele tem, a propósito o apelido de Doutor Lixeira... Longa experiência lhe ensinou a ver, no meio daquele lixo todo o que ainda pode ser aproveitado como alimento. É ele quem estabelece a classificação: comida de primeira classe, que funcionários da prefeitura reservam para si mesmos; comida de segunda classe, boa ainda para as pessoas que nada têm do que viver e se alojam por ali, disputando o refugo com os urubus que ciscam como galinhas pretas; comida de terceira classe, que se coleta e guarda para vendê-la depois nas tendinhas de quarta ou quinta classe, onde qualquer coisa serve para encher a barriga dos que vivem encharcados de álcool... O Doutor Lixeira explicou tudo isso muito direitinho às dezenas de chefes de empresa que me haviam acompanhado até ali. Tive a impressão de que marcara profundamente o meu ponto, ensinando-lhes uma dura lição... Mas qual! No dia seguinte, um deles me chama ao telefone, e diz: ´Dom Hélder, que sujeito formidável aquele Doutor Lixeira! Ele tem muita iniciativa! Bem que poderíamos empregá-lo...´ ii Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 2ª Edição Publicada em Fevereiro de 2005 Nosso compromisso com a atualidade do testemunho de Dom Hélder pode encontrar abrigo na afirmativa de um dos mais importantes economistas contemporâneos, A. O. Hirschman (1996: 257): "... o progresso político e o econômico não estão ligados entre si de modo fácil, direto, funcional". Essas conexões são construídas situacionalmente. E nesse sentido os estudos de Amartya Sen (2000, 2001) são exemplares para apontar como a igualdade formal de oportunidades deve necessariamente ser referida a um contexto situacional concreto. A proposição fundamental da antropologia filosófica de Martin Buber (Bartholo, 2001) pode vir a nosso auxílio ao confrontarmos essa questão. Ela nos afirma que antes de ser um ente político ou econômico o ser humano é um ser relacional. As formas políticas e econômicas correspondem a padrões historicamente construídos de institucionalização. Percebida desde essa perspectiva, como bem aponta Hassan Zaoual (2003): "... a pobreza é irredutível a uma simples insuficiência de renda. Todo o contexto da pessoa deve ser tomado em consideração, em particular sua capacidade de ser livre de mudar, de agir sobre a situação, de participar da vida social etc. Os espaços da desigualdade são, então, múltiplos e interativos; utilidades, bens de primeira necessidade, renda, liberdade, entre outros. Todos esses espaços nem sempre estão adequadamente relacionados uns com os outros. Ao se dar privilégio a um deles, podese produzir efeitos contrários sobre os outros". Nos contextos situacionais concretos somos chamados a responder a apelos diversos. E a dimensão ética da resposta é a responsabilidade. Responsabilidade situada, isto é, concreta, pessoal e rigorosamente intransferível. Não apenas a retórica de uma responsabilização formal. E nesse ponto podemos retomar o compromisso de Dom Hélder (Câmara, 1987: 129): "... lutar por meios pacíficos, mas corajosos, contra as estruturas impiedosas que esmagam e fazem sofrer a humanidade. Pois não basta socorrer as vítimas. É necessário atacar vigorosamente, antes de mais nada, as causas dessa inaceitável infelicidade". Para a Revista GIS, falar de iniciativas de interesse social é afirmar esse empenho e compromisso. Referências bibliográficas Bartholo Jr., Roberto S. (2001) Você e eu: Martin Buber, Presença, Palavra. Rio de Janeiro, Garamond. Câmara, Hélder (1987). O Evangelho com Dom Hélder. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira. Hirschman, Albert O. (1996). Autosubversão. São Paulo, Companhia das Letras. Sen, Amartya (2000). Desenvolvimento como Liberdade. São Paulo, Companhia das Letras. Sen, Amartya (2001). Desigualdade Reexaminada. Rio de Janeiro, Record. Zaoual, Hassan (2003). Globalização e Diversidade Cultural. São Paulo, Cortez. iii Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 2ª Edição Publicada em Fevereiro de 2005 Expediente Informações básicas A Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais é uma publicação científica gratuita, de periodicidade quadrimestral, do Laboratório de Tecnologia e Desenvolvimento Social (Programa de Engenharia de Produção da COPPE/UFRJ), cujo número piloto foi lançado em julho de 2003. Dedica-se a divulgar trabalhos voltados para a apresentação e análise de propostas e experiências ligadas à gestão de iniciativas sociais. Pretende manter uma atitude prospectiva, apontando possíveis tendências em temas ligados à gestão social. O formato da Revista foi formulado para ter como meio de divulgação a Internet, explorando as possibilidades do meio eletrônico para oferecer e trocar informações, em particular o recurso do hipertexto. Como seções fixas, a Revista inclui artigos, reportagens, entrevistas, apresentação de casos, resenhas críticas. O título abreviado da revista é Revista GIS, forma a ser utilizada em bibliografias, notas e referências. Copyright Os conceitos emitidos em artigos são de exclusiva responsabilidade de seus autores, não refletindo, necessariamente, a opinião da redação. Permite-se a reprodução total ou parcial dos trabalhos, desde que seja indicada explicitamente a sua fonte. Financiador A Revista recebe apoio do SESI. CORPO EDITORIAL Editor responsável Roberto dos Santos Bartholo Jr. - Professor do Programa Engenharia de Produção COPPE/UFRJ e Coordenador do Laboratório de Tecnologia e Desenvolvimento Social iv Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 2ª Edição Publicada em Fevereiro de 2005 Comitê editorial Carlos Renato Mota - professor do Instituto de Economia da UFRJ e pesquisador do Laboratório de Tecnologia e Desenvolvimento Social da COPPE/UFRJ Arminda Eugenia Marques Campos - pesquisadora do Laboratório de Tecnologia e Desenvolvimento Social da COPPE/UFRJ Conselho Editorial Geraldo de Souza Ferreira - DEGEO/UFOP, Ouro Preto, MG Marcel Bursztyn - CDS/UnB, Brasília, DF Maurício Cesar Delamaro - FEG/UNESP, Guaratinguetá, SP Michel Thiollent - COPPE/UFRJ, Rio de Janeiro, RJ Paulo Márcio Melo - UERJ, Rio de Janeiro, RJ Equipe de redação Cristina Maria Barros de Medeiros Simone Saviolo Rocha Secretaria Maria Joselina de Barros Revisão José Henrique de Oliveira Concepção do projeto gráfico, diagramação e webdesign Ivan Bursztyn v Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 2ª Edição Publicada em Fevereiro de 2005 Apresentação Este número da Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais tem como tema Empreendedorismo de Interesse Social. Nossa principal preocupação, ao selecionar os textos, foi buscar apresentar a maior diversidade possível de experiências e aspectos associados a esse assunto. A Revista GIS dedica-se a divulgar trabalhos voltados para a apresentação e a análise de propostas e experiências ligadas à gestão social. Pretende manter uma atitude prospectiva, apontando possíveis tendências nesse tema. Como seções fixas, apresenta artigos, reportagens, entrevistas, apresentação de casos e resenhas críticas. Procura utilizar ao máximo os recursos oferecidos pelo formato de periódico on-line, oferecendo sempre que possível links para fontes de informação complementar. O próximo número, a ser lançado em junho, terá como tema responsabilidade social empresarial. Aguardamos suas contribuições, que serão analisadas pelo Comitê Editorial da Revista. As informações necessárias para preparar os textos encontram-se na seção “Instruções aos autores”. Esperamos que aprecie nossa Revista. Navegue pelas seções e seus textos e depois nos envie seus comentários e sugestões. Boa leitura! vi Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 2ª Edição Publicada em Fevereiro de 2005 Sumário Espaço SESI SESI Empreende: Desenvolvendo atitudes empreendedoras - Andréa Novo Duarte, Carla Fichtner Patines, Mônica de Novais Latorre, Rita de Cássia Madruga de Souza, Rita de Cássia Madruga de Souza e Tânia Regina Paz....................... 01 Reportagem Empreendedorismo solidário na era da reprodutibilidade - Glaucia Cruz e Rosa L. Peralta ............................................................ 08 Entrevista João Joaquim de Melo Neto Segundo, coordenador do Banco Comunitário Palmas .......... 12 Estudos de Caso ATA – Apoio ao Trabalhador Autônomo: Um modelo de política pública de apoio aos trabalhadores autônomos da construção civil - Michelle Plubins Bulkool...... 18 Resenha Crítica Bio(sócio)diversidade e Empreendedorismo Ambiental na Amazônia de Joselito Santos Abrantes ......................................................... 22 Artigos Economia de comunhão: Absurdo e graça trabalhar é preciso - Heloisa Helena A. Borges Q. Gonçalves ............................................ 24 Participação dos cooperados no processo de gestão das sociedades cooperativas - Nemizio Antônio de Souza.................................................... 36 Empreendedor coletivo e economia social: Outra forma de empreender - Benoît Lévesque.................................................................... 44 Participação e processo decisório em uma pequena indústria autogestionária - Suzana Hecksher Oliveira........................................... 65 Rede dinâmica em aglomerados de empreendedores de base artesanal - Janio Caetano de Abreu ........................................ 77 vii Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição Publicada em Outubro de 2004 Espaço SESI SESI Empreende: Desenvolvendo atitudes empreendedoras Andréa Novo Duarte, Carla Fichtner Patines, Mônica de Novais Latorre, Rita de Cássia Madruga de Souza e Tânia Regina Paz * RESUMO Esse artigo versa sobre o Curso SESI Empreende, uma ação educativa voltada para o desenvolvimento de atitudes e comportamentos empreendedores dos jovens, convidando-os a sonhar, planejar e realizar sonhos no âmbito da comunidade onde vivem. O mesmo foi desenvolvido pelo SESI/ RS em consonância com as transformações sociais, políticas, tecnológicas, econômicas e demográficas. Pretende-se no presente trabalho apresentar a justificativa, os objetivos, a metodologia e alguns resultados a partir das experiências vivenciadas no Estado. Palavras-chave: ação educativa, desenvolvimento, jovem, SESI Empreende, empreendedor ABSTRACT That article turns on the Course SESI Undertakes, an educational action whose aim is the development of young people entrepreneurial attitudes and behavior, inviting them to dream, to drift and to accomplish dreams in the community where they live. The course was developed by SESI / RS in consonance with the social, political, technological, economical and demographic recent transformations. This text presents the course justification, objectives, its methodology and some of results obtained. Key-words: educational action, development, young, SESI Undertakes, entrepreneurship Introdução A Organização SESI vem buscando a sustentabilidade política e financeira dos serviços sociais de suas áreas de atuação, por meio de mudanças estratégicas. Neste sentido, a UER Educação, como Unidade Estratégica de Resultados, propõe-se a promover uma proposta de qualificação continuada, a fim de atender às exigências do mercado e às expectativas do SESI. Assim, a atuação do SESI – Educação do Rio Grande do Sul vem privilegiando valores empreendedores nos jovens gaúchos, visando promover a melhoria das condições de vida dos envolvidos. As mudanças tecnológicas, econômicas e culturais apontam para a necessidade de a educação transformar o modo de pensar e Pág. 1 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição aprender o mundo. Conforme o Planejamento Estratégico do SESI 2000 – 2004, vivemos: “em um ambiente marcado pela crescente competição e por fortes mudanças tecnológicas, o sucesso das empresas está cada vez mais associado a sua capacidade de implantar modelos de gestão baseados na mobilização das capacidades humanas de seus colaboradores, obtendo permanente flexibilidade e inovação como condição de competitividade”. (1999, p. 21). Além das características já salientadas do cenário atual, é freqüente a sinalização, por parte dos empresários, quanto à necessidade dos profissionais desenvolverem características empreendedoras com visão de negócio e prospecção de novas riquezas. A sociedade contemporânea é marcada por um ritmo acelerado de transformações sociais, políticas, econômicas e demográficas. Uma tendência marcante de nossa sociedade tem sido a valorização da atividade empreendedora como uma opção de carreira. Alterações estruturais no mercado de trabalho têm tornado cada vez mais difícil o processo de inserção profissional, num mercado cada vez mais competitivo. A atividade empreendedora passa a ser vista, por um número crescente de jovens, como uma possibilidade de aplicar os conhecimentos técnicos e científicos adquiridos durante sua formação. Todavia, estratégias para geração de riquezas constituem uma tarefa arriscada que exige atitudes, valores, habilidades e conhecimentos que pertencem ao domínio da área que vem sendo denominada Empreendedorismo. O empreendedorismo tem uma longa tradição em centros de ensino da Europa, Publicada em Outubro de 2004 Estados Unidos e Canadá. No Brasil, o tema vem disseminando-se com rapidez, bem como ampliando os seus espaços entre o governo, o meio empresarial e as instituições representativas de classe e de ensino. 1. Justificativa e Objetivos O conceito de empreendedorismo é amplo, mas, de modo geral, destaca-se que o empreendedor é aquele que é capaz de pensar e agir por conta própria, utilizando criatividade, habilidade pessoal, liderança e visão de futuro para inovar e criar condições para ocupar o seu espaço no mercado. Especialistas concordam que a capacidade de empreender não é apenas uma habilidade pessoal inerente à personalidade de cada um e acreditam que a maioria dos jovens, se estimulados, podem desenvolver seu potencial empreendedor. Para Souza (2001), o desenvolvimento do perfil empreendedor dos educandos está intimamente ligado à criação, condução e implementação do processo criativo na elaboração de novos planos de vida, de trabalho, de estudo e de negócios, responsabilizando-os pelo seu próprio desenvolvimento e pelo desenvolvimento da organização. O SESI – Educação / RS acredita na necessidade de implantar projetos que incentivem o desenvolvimento de atitudes e de comportamentos empreendedores nos jovens da comunidade gaúcha, com vistas a proporcionar meios para que os mesmos desenvolvam seu potencial criativo, vislumbrando a possibilidade de garantir o desenvolvimento de uma visão pró-ativa, emancipatória que viabilize sua futura inserção no mercado. Neste sentido, faz-se necessário estimular a cultura empreendedora, proporcionando o desenvolvimento de competências e de Pág. 2 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição comportamentos zacionais. individuais e organi- Frente a este cenário, o SESI Educação do Rio Grande do Sul está empenhado em fomentar a cultura empreendedora na comunidade gaúcha, por meio de uma ação educativa voltada para os jovens de forma que os mesmos contribuam para a promoção do desenvolvimento socioeconômico do Estado. O SESI Empreende é uma proposta que consiste numa ação educativa direcionada para jovens de 13 a 20 anos com escolaridade mínima sexta série do ensino fundamental que desejam desenvolver o espírito empreendedor tanto no que se refere a abrir seu próprio negócio, quanto a gerir sua carreira de forma dinâmica, crítica e consistente. Como objetivo geral, o SESI Empreende visa disseminar a cultura empreendedora e potencializar as oportunidades de inserção social do jovem. Para tanto, o curso contempla os seguintes objetivos específicos: resgatar a auto-estima e a perspectiva de futuro, munindo-os de competências necessárias à prática plena da cidadania e à inserção no mundo do trabalho; desenvolver a habilidade de planejamento pessoal e profissional, fornecendo subsídios iniciais para elaboração de um Plano de negócios seja referente à criação de um negócio, de uma organização social (ONG, Sindicato, Associação, etc.) ou de um Plano de Desenvolvimento Pessoal (desenvolvimento de carreira); promover a reflexão sobre o que é ser empreendedor (características e comportamentos); incentivar a cooperação dos jovens junto às comunidades a qual pertencem e ampliar redes de contatos. 2. Metodologia Publicada em Outubro de 2004 O curso é desenvolvido por meio de encontros presenciais, totalizando 6 Módulos independentes, abordando as seguintes temáticas: MÓDULO 0 - Eu, meus Sonhos, meu Futuro Temáticas: Conceito de Si, Levantamento de expectativas, Apresentação do curso SESI Empreende, Contrato de convivência, Quem é o empreendedor, Mapa dos Sonhos (Dolabela, 2003), Talentos e Valores. MÓDULO I - Quem é o Empreendedor? Quem sou Eu? Temáticas: Auto-imagem, Levantamento de expectativas, Apresentação do curso SESI Empreende, Contrato de convivência, Valores, Delineando Áreas de interesse, Motivação, Currículo e carta de apresentação, Metas pessoais e Entrevista de seleção. MÓDULO II - O Mundo do Empreendedor Temáticas: Sonhos, Cidadania, Principais características e comportamentos do empreendedor, Percepção X Empreendedorismo, Criatividade X Empreendedorismo, Idéia X Oportunidade, Tendências e necessidades, Inovação e empreendedorismo, Identificação de oportunidades, Iniciando um negócio, Erros fatais e Depoimentos de empreendedores. MÓDULO III - Desenhando meu Caminho Temáticas: Mapa de Vocação Pessoal (baseado em Bolles, 1998), Aprenda a atuar com planejamento, Iniciando o planejamento da própria carreira e Plano de Desenvolvimento Pessoal. MÓDULO IV - Planejando e fazendo acontecer Temáticas: Planejamento: conceito, elementos, Planejamento: detalhamento/etapas e Realização Pág. 3 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição MÓDULO V - Transforme a sua Idéia em Oportunidade Temáticas: Iniciando seu próprio negócio, Aprenda a atuar com planejamento, Plano de negócios e Fatores que afetam a oportunidade Os encontros são desenvolvidos por meio de aprendizagens vivenciais, dinâmicas de grupos, pesquisa (Internet/livros/revistas), jogos, estudos dirigidos, testes, estudos de caso, palestras e entrevistas. O curso aborda tanto questões teóricas quanto atividades eminentemente práticas, pois se acredita que a reunião desses elementos é de fundamental importância para uma das maiores contribuições do presente curso: a familiarização dos educandos no uso das ferramentas de planejamento, abordando as dimensões de carreira (Plano de Desenvolvimento Pessoal), de empreendimento (Plano de Negócios) ou de uma ação social. Ademais, é sabido que a atividade empreendedora deve estar diretamente associada à realidade dos sujeitos que, ao desenvolverem um conceito de si mais amplo, crítico e autônomo, almejam transformar o meio onde estão inseridos. O SESI Empreende tem a intenção de gerar melhorias no coletivo, pois prevê ações que enfatizam a cidadania e busca desenvolver valores que vão além das dimensões individuais e econômicas. Ou seja, corrobora com a noção de que a ação empreendedora implica um sonho e que o mesmo, quando realizado, deve também prever a geração de valores para a comunidade (DOLABELA, 2003). Dessa forma, os participantes são convidados também a sonhar, planejar e atuar tendo em vista a construção de um bem coletivo. Isso porque os jovens escolhem alguma situação a melhorar/resolver, no Publicada em Outubro de 2004 âmbito da comunidade onde vivem, elaboram planos e estratégias, bem como implementam as respectivas ações. Desenvolve-se, assim, a capacidade de cooperação, sinergia e alinhamento de esforços, o que fortalece e possibilita a construção de laços de identidade e solidariedade, elementos-chave para uma efetiva prosperidade: o desenvolvimento humano e social sustentável. Também podese perceber que o estabelecimento e a melhoria da conectividade entre os diversos setores da comunidade constitui-se um dos maiores desafios nacionais a serem trabalhados: “em geral os sistemas políticos, organizados verticalmente e atuando, em grande parte, autocraticamente, só conseguem se manter desativando o empreendedorismo, o protagonismo e a participação coletiva. Eles fazem isso através de três práticas principais: a centralização e o centralismo, o assistencialismo e o clientelismo. Essas três práticas se constituem como os grandes exterminadores do capital social” (FRANCO, 2004, p. 37). Conforme destaca Dolabela: “a educação empreendedora deve construir a capacidade da vida em comum, uma aspiração socialmente construída que não é conseqüência natural da ordem socioeconômica em geral (...)”.(2003 p.82). Nas palavras do autor: “no Brasil, o empreendedorismo deve ser uma arma de combate à exclusão social e a todas as formas de desigualdades e diferenças”.(2003 p.82). A construção do conhecimento pauta-se, portanto, no envolvimento e na experiência do educando sendo impressos, simultaneamente, um caráter pessoal e socialmente responsável nas principais atividades desenvolvidas no curso. Pág. 4 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição O SESI Empreende é desenvolvido nos Centros de Atividades do SESI do Rio Grande do Sul, em empresa ou outro local, composto de uma carga horária que varia entre 16h a 110 h. As turmas são constituídas de até 25 educandos. Publicada em Outubro de 2004 do mesmo, que os participantes se sentiram protagonistas no planejamento de suas próprias histórias de vida. O educador utiliza-se de estratégias específicas para garantir a qualidade, no desempenho da proposta, por meio de cronogramas, planejamento, execução e avaliação. Uma vez concluídos os módulos de Planejamento, é realizada uma exposição dos planos elaborados, cuja preparação está prevista durante o desenvolvimento dos encontros. Tal evento é denominado expoempreende e ocorre em auditório da comunidade local. Como principais objetivos essa exposição pretende divulgar os projetos elaborados pelos educandos e desenvolver sua rede de relacionamentos. A realização desse evento ocorre semestralmente, reunindo turmas constituídas durante o período. Ao final das exposições dos projetos, cada participante recebe o Certificado de participação, no qual constam nome e autor do projeto, além de data e local na qual foi realizada a apresentação. Acredita-se que tal prática evidencia um reconhecimento ao trabalho dos educandos, bem como os motiva a identificar estratégias para concretização de seu empreendimento/projeto. 3. Resultados Analisando a trajetória do SESI/RS, em 2004, na execução desta proposta educativa, nos Centros de Atividades de Ijuí, Esteio e Sapucaia do Sul, constatou-se que o curso alcançou à proposição prospectada inicialmente, uma vez que se percebeu, tanto durante, quanto no momento da conclusão Destaca-se que esse aspecto fica evidente que os educandos participaram dos seminários desenvolvidos no decorrer do curso, bem como da elaboração dos Planos de Desenvolvimento Pessoal e de Plano de Negócios, os quais foram apresentados na expo-empreende e que podem ser percebidos nos depoimentos a seguir: Todas as dicas, conselhos, conversas e debates que fizemos nessa sala, sei que vão nos ajudar muito na hora de encarar uma carreira profissional, de fazer escolhas e tomar decisões. (Entrevistado A) Estou achando o curso SESI Empreende ótimo, pois estou conseguindo desembaralhar todas as minhas idéias e conseguindo definir a minha área de trabalho. Enfim, o curso vai ser um benefício ótimo que eu vou levar durante o resto da minha vida. (Entrevistado B) Eu estou gostando muito das aulas, pois estão fazendo eu me conhecer melhor e ter mais noção do que quero para meu futuro profissional. Tenho a certeza que a hora que eu for fazer um currículo ou uma entrevista de trabalho, vou me lembrar do que foi dito em sala de aula e vou me sair melhor do que me sairia sem os conhecimentos desse curso (Entrevistado C). Pág. 5 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição Publicada em Outubro de 2004 Diante de tais depoimentos, infere-se que o SESI Empreende vai ao encontro de pressupostos amplamente defendidos por Dolabela, autor criador das metodologias Oficina do Empreendedor e Pedagogia Empreendedora: “o autoconhecimento e a auto-estima são elementos fundamentais na aprendizagem e na construção da pulsão empreendedora, influenciando tanto o processo cognitivo quanto às relações do indivíduo com o outro e com o mundo” (DOLABELA, 2003, p. 32). “na Pedagogia Empreendedora, a construção do conhecimento parte de situações reais capazes de criar vínculos naturais (e não artificiais) entre os conhecimentos anteriores e os novos conhecimentos do educando. Este identifica as fontes do conhecimento com a ajuda do professor, mas é de sua responsabilidade o acesso e a mobilização do conteúdo. (...) o aprendizado essencial não é a ferramenta ou o conteúdo, mas a construção da capacidade individual de agir de forma transformadora” (DOLABELA, p. 83). Também, pode ser evidenciado o reconhecimento do curso pelos pais dos educandos que salientaram sobre a importância da experiência vivida por seus filhos com relação à perspectiva de atuação. Da mesma forma, os pais salientaram: Eu notei um crescimento muito grande na minha filha. O curso foi muito válido, porque fez com que eles deixassem as inseguranças para trás. Quantos hoje de 30, 40 anos levam as inseguranças para toda a vida por não ter tido essa oportunidade. (Entrevistado D) A importância de semear a cultura empreendedora desde cedo com os jovens é destacada por Dolabela: “Tudo indica que quanto mais cedo o empreendedor decidir o que deseja ser e fazer, melhores suas chances de sucesso, pois mais tempo terá para moldar as atitudes mentais adequadas ao seu empreendimento”.(DOLABELA, p. 85). Mesmo evidenciando esses retornos, o SESI/RS, trabalhando num processo de melhoria contínua, levou em consideração todos os aspectos que necessitavam ser revisados e melhorados, tornando o curso ainda mais dinâmico, atrativo e experimental. Cabe salientar que as avaliações dos próprios educandos foram significativas para a reestruturação do curso. E, pensando em dar continuidade a essa proposta, o SESI/RS, em 2005 estará expandindo o curso no Estado. Referências Bibliográficas BOLLES, R. N. (1998), What color is your Parachute? A Practical Manual for Jobhunters and Career-Changers. California, Ten Speed Press. DOLABELA, F. (2003), Pedagogia Empreendedora. São Paulo, Editora de Cultura. FRANCO, A. (2004), O lugar mais desenvolvido do mundo: investindo no capital social para promover o desenvolvimento comunitário. Distrito Pág. 6 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição Federal, Agência de Educação para o desenvolvimento comunitário. SESI.DN. Plano Estratégico do Sistema SESI; 2000 – 2004. Brasília: 1999. 40p. Il. SOUZA, E. C. L. (2001), Empreendedorismo: competência essencial para pequenas e médias empresas. Brasília, Antropec. ------------------------* Andréa Novo Duarte - Pedagoga, formada pela FURG/RS, possui Mestrado em Educação, Especialização em Educação Brasileira pela FURG/RS e Especialização em Formação de Formadores em Educação de Jovens e Adultos pela UnB. Atualmente desenvolve suas atividades profissionais no Departamento Regional do SESI/RS, na sede da FIERGS em Porto Alegre, exercendo a função de Analista Técnico. Coordenadora Técnica do Curso SESI Empreende. Tel.: 051. 33478525 / email: [email protected] Carla Fichtner Patines - Pedagoga, formada pela UFRGS, possui Especialização em Formação de Formadores em Educação de Jovens e Adultos pela UnB. Atualmente trabalha nos SESI, no município de Esteio, exercendo a função de Coordenadora Publicada em Outubro de 2004 Educacional. Executa o Curso SESI Empreende. Tel.: 51. 473-1338 / e-mail: [email protected] Mônica de Novais Latorre - Psicóloga, formada pela PUC/RS e Mestre em Educação na mesma Universidade. Atualmente é docente do PósGraduação “Profissionais do Terceiro Setor” da Fundação Irmão José Otão – PUC-RS, da Castelli Escola Superior de Hotelaria e da Faculdade São Judas Tadeu em disciplinas que enfocam a formação de empreendedores, equipes e recursos humanos. Consultora Técnica do Curso SESI Empreende. Tel.: 51.3224-7920 / e-mail: [email protected] Rita de Cássia Madruga de Souza - Pedagoga, formada pela FURG, possui Especialização em Formação de Formadores em Educação de Jovens e Adultos, pela UnB. Atualmente desenvolve suas atividades profissionais como Coordenadora Educacional do Serviço Social da Indústria de Sapucaia do Sul. Executa o Curso SESI Empreende. Tel. 51.4743127 / e-mail: [email protected] Tânia Regina Paz - Licenciada em Geografia – Licenciatura Plena pela Unijuí- Ijuí-RS e em Estudos Sociais pela UNICRUZ, Cruz Alta/ RS, possui Especialização em Formação de Formadores em Educação de Jovens e Adultos pela UnB. Atualmente trabalha no SESI de Ijuí, exercendo a função de Coordenadora Educacional. Apoiou na elaboração e execução do Curso SESI Empreende. Tel 55.33338489/e-mail: [email protected] Pág. 7 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição Publicada em Outubro de 2004 Reportagem Empreendedorismo solidário na era da reprodutibilidade Entidades governamentais e não-governamentais apostam em tecnologias sociais como instrumentos para a geração de trabalho e renda Gláucia Cruz e Rosa L. Peralta Atraso tecnológico e exclusão social o Instituto de Tecnologia Social (ITS), criado no mesmo ano, apresentou o Há muito se discute sobre os fatores que levantamento Terceiro Setor e Ciência, mantêm uma ampla parcela da população Tecnologia e Inovação, inserindo no em condições indignas, longe das debate a existência de inúmeras oportunidades de trabalho e mercado, e a experiências isoladas e bem-sucedidas, idéia de que o atraso tecnológico encontradesenvolvidas por associações se no cerne dessa problemática vem se comunitárias, ONGs, centros de pesquisa e consolidando no âmbito governamental governos locais, que se caracterizam pelo nos últimos anos. Em 1991, o Congresso grande envolvimento das comunidades na Nacional criou a Comissão Parlamentar construção, não só de práticas, mas Mista de Inquérito (CPMI) também de conhecimento intitulada Causas e para a solução de seus Dimensões do Atraso problemas. São saberes Tecnológico. Esse estudo tradicionais, populares e Origens do termo Renato Dagnino, em palestra sobre a apontou para a científicos e relativos ao conceituação da tecnologia social, remete a necessidade de se criar campo das ciências origem do termo à Índia, a partir do conceito de tecnologia apropriada. Usada pela primeira vez uma política estratégica na humanas e sociais, ou das no final do século XIX, a expressão denominava as tecnologias tradicionais que qual a produção científica ciências exatas. Mahatma Gandhi procurou reabilitar como e tecnológica do país fosse estratégia de luta contra o domínio britânico. Desde então, muitas expressões já foram pautada pelas demandas Tecnologia social: usadas: tecnologia alternativa, ecológica, limpa, humana, libertária, todas tendo em comum a sociais. A CPMI também evitando reinventar a contraposição à tecnologia convencional, mas destacou o papel roda com o receio de que não remetesse a uma tecnologia de baixa qualidade, muito simples e fundamental da sociedade não-avançado. Em 2000, pesquisadores no debate sobre a relação O que despertou ainda brasileiros começaram a usar tecnologia social para abreviar tecnologia para inclusão social. entre atraso tecnológico e mais interesse era o fato Tecnologia social: um conceito sujeito a exclusão social. dessas ações desenvolcontrovérsias verem processos passíveis Apesar de toda a discussão em torno do conceito, ainda não se chegou a um consenso. Em 2001, na I Conferência de replicação em escala, Em um encontro promovido pela Fundação Banco do Brasil, em janeiro deste ano, Nacional de Ciência e aumentando as chances entidades de vários setores levantaram questões Tecnologia, diversos dos resultados serem que não podem deixar de serem levadas em conta quando se pensa em tecnologia social: as atores da sociedade foram multiplicados. Mas não se especificidades de cada comunidade, a convocados para elaborar trata simplesmente de capacitação dos gestores locais para a criação de competências e a construção coletiva de um projeto em longo lançar mão de uma receita, conhecimento. Para Luis Fumio, diretor do Departamento de Ciência e Tecnologia da FBB, prazo de desenvolvimento sem levar em conta as a pluralidade de visões enriquece o debate e social, político, econômico especificidades locais. ajuda a busca constante de novos caminhos para a resolução dos problemas sociais. e cultural. Nesse encontro, Segundo Ladislau Dowbor, Pág. 8 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição professor da Unicamp, o que já funciona em outros lugares em termos de organização, tecnologias e processos produtivos pode ser adaptado de forma criativa, “evitando-se reinventar a roda”. Essas ações é que o se convencionou chamar de tecnologias sociais. Publicada em Outubro de 2004 sistematização das tecnologias, enquanto que o Instituto Pólis publica, há anos, o boletim Dicas Municipais, fazendo circular informações em todas a prefeituras do país. Empreendedorismo solidário e tecnologia social As iniciativas, de Segundo Jacqueline Cerimônia de abertura da I Conferência comprovado impacto Rutkowski e Sidney Internacional de Tecnologia Social, em novembro sobre a realidade Lianza, em artigo de 2004. (foto cedida pela Finep) social, contemplam as publicado no livro mais variadas áreas como saneamento, Tecnologia Social: uma estratégia para o água, meio ambiente, educação, habitação desenvolvimento, “a resposta dada às e geração de trabalho e renda. O soro imensas dificuldades de manter o nível de caseiro e a multimistura são exemplos que emprego decorreu primordialmente da ganharam grande notoriedade, enquanto sociedade civil, em forma de experiências experiências como a estação de tratamento auto-gestionárias, em geral denominadas de esgoto de baixo custo, desenvolvida empreendimentos da economia popular, pela Universidade Federal do Espírito social ou solidários”, organizadas como Santo, permanece desconhecida por grande cooperativas de trabalho, associações parte da população, embora já tenha sido comunitárias, ou pela apropriação da reaplicada em 40 municípios brasileiros e massa falida de empresas por seus antigos dois no exterior, beneficiando cerca de 3 funcionários e atuando em diversas milhões de pessoas. atividades econômicas. Para reverter esse quadro de dispersão e falta de visibilidade, diversas entidades se propuseram a identificar e facilitar o acesso às tecnologias sociais desenvolvidas pelo país. O Programa de Gestão Pública e Cidadania da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo já cadastrou cerca de 7 mil experiências. O Centro de Estudos e Pesquisas de Administração Municipal (Cepam) disponibiliza centenas de inovações no quadro do programa Novas Práticas Municipais. Em 2001, foi lançado o Prêmio Fundação Banco do Brasil de Tecnologia Social e hoje a FBB conta com 212 projetos em sua base de dados. O Centro Avançado de Tecnologias Sociais do Instituto Ayrton Senna atua também na criação, implementação, avaliação e Há muitos exemplos de empreendimentos que alcançaram resultados positivos e proporcionaram uma melhoria da qualidade de vida, podendo-se destacar a atuação de várias organizações comunitárias: a Associação de Artesãos de Riacho Fundo, na Paraíba, que encontrou na venda de 300 a 500 bonecas de pano por mês uma saída para o sustento de dezenas de famílias; a Organização de Catadores de Castanha no Amapá que, em vez de comercializar a castanha bruta, passou a extrair a essência e vendê-la diretamente para perfumarias francesas, eliminando os atravessadores; em Paracatu (MG), formou-se uma associação de catadores de lixo que obtém renda com a fabricação de vassouras a partir da Pág. 9 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição Publicada em Outubro de 2004 utilização de garrafas sociais. De acordo PET; o município de com um artigo do Cabaceiras provou que ITS, essa pluralidade o turismo pode ser permite incorporar desenvolvido mesmo diferentes visões e no agreste paraibano; e garantir o processo de a Associação em construção coletivo de Áreas de Assentaaprendizagem. mento no Estado do Maranhão (Assema), Para isso, a Finanadministrada por traciadora de Estudos e Rodrigo Fonseca, analista de projetos da Finep balhadores rurais e Projetos (Finep), a pelas quebradeiras de coco babaçu, que Fundação Banco do Brasil, a Petrobras, a chega a exportar 10 mil toneladas de Secretaria de Comunicação do Governo e sabonetes para os Estados Unidos. Gestão Estratégica da Presidência da República (Secom-PR) e o Ministério de Mesmo obtendo êxito, as iniciativas Ciência e Tecnologia (MCT), juntamente coletivas devem sempre procurar com outros parceiros, iniciaram a aperfeiçoar seus processos por meio de mobilização de recursos humanos e capacitação, busca de parcerias e apoios financeiros e definiram como foco de que tragam aportes técnicos sobretudo nas atuação a implementação de projetos áreas contábil, jurídica, administrativa e de voltados para a geração de trabalho e renda captação e otimização de recursos. Dentro nas regiões da Amazônia e do Semi-árido e dessa lógica, Dowbor afirma: “Uma bolsões de pobreza dos grandes centros iniciativa que pode ser imediatamente urbanos. Segundo Rodrigo Fonseca, implementada é a disponibilização analista de projetos da Finep, a escolha integrada do conjunto dos subsistemas de desse eixo se deve ao fato de que a RTS informação, cadastros de experiências, acredita que a criação de novos postos de pesquisas acadêmicas e relatórios setoriais trabalho e fontes de renda configura um que existem dispersos e subutilizados nas projeto estruturante, que levará a diversas instituições. (...) qualquer pessoa população, uma vez já organizada, a buscar ou organização local tem de poder soluções para outras demandas sociais. identificar formas de organização, tecnologias e processos produtivos capazes Com previsão para iniciar os trabalhos em de dinamizar os recursos (...) ” abril, a RTS pretende lançar um edital e criar um comitê técnico que irá selecionar Criação de rede é vista como nova os proponentes. A agricultura familiar e o forma de articulação cooperativismo são as duas atividades escolhidas para nortear as ações que, num Foi em julho de 2004, durante um encontro primeiro momento, utilizarão a reunindo instituições governamentais e metodologia do Projeto Mandalla, de não-governamentais, que surgiu a idéia da agricultura sustentável — cada família criação da Rede de Tecnologia Social divide sua terra em nove faixas circulares (RTS), visando promover a participação de plantação com um reservatório de água efetiva de todos os atores da sociedade — no centro, são as mandalas —, e do governo, institutos, fundações, ONGs, Programa Nacional de Incubadoras de universidades e empresas — na Cooperativas Populares (Proninc). Dessa divulgação e reaplicação das tecnologias forma, a Rede se configura não só como Pág. 10 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição um agente difusor, mas também como uma linha de apoio à reaplicação e ao desenvolvimento das TSs. Publicada em Outubro de 2004 estratégias de desenvolvimento e inclusão social, cairá no vazio. Fontes: Rede vê a participação do empresariado como meta Os objetivos da RTS indicam o caminho que o Governo pretende seguir para pautar os programas sociais na área de geração de trabalho e renda. É uma aposta de que as tecnologias sociais, ao apresentarem resultados mensuráveis, se tornarão cada vez mais atrativas aos investidores privados. Resta agora aguardar para saber se todo o entusiasmo em torno desse novo tipo de tecnologia levará a avanços concretos ou se, assim como outras Redes de apoio ao empreendedorismo e tecnologias sociais: artigo de Ladislau Dowbor, 23/11/2004. SINGER, Paul et alii. Tecnologia Social: uma estratégia para o desenvolvimento. Fundação Banco do Brasil, Rio de Janeiro: 2004. Tecnologia Social no Brasil: direito à ciência e ciência para a cidadania: Caderno de Debate – Instituto de Tecnologia Social, nov/2004. Pág. 11 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição Publicada em Outubro de 2004 Entrevista João Joaquim de Melo Neto Segundo, coordenador do Banco Comunitário Palmas Criado pela própria comunidade, motivada pela pobreza e condições precárias de habitação em que vivem, mas com potencial de produção e capacidade criativa, o Banco Palmas dá crédito àqueles moradores do Conjunto Palmeira que por uma série de motivos seriam recusados pelo sistema financeiro formal – sem comprovação de renda, inscrito no SPC como devedor, desempregado, ex-presidiário etc. Pretendem, a partir de um círculo virtuoso do tipo crédito-consumo-produção, gerar, e fortalecer, uma rede de socioeconomia solidária alocada neste bairro na periferia de Fortaleza. Os clientes deste banco informal tem o crédito avalizado pelo vizinho, utilizam o PalmaCard, uma espécie de cartão de crédito, ou trocam entre si o Palmas $, uma moeda social. Outras iniciativas com a “marca” Palm-, que vieram em decorrência, visam promover a auto-estima da comunidade e sua identidade. Entrevistamos João Joaquim de Melo Neto Segundo – coordenador do Banco Comunitário Palmas, experiência que se classificou entre as primeiras colocadas ao prêmio das Melhores Práticas de Dubai nos anos de 1999 e 2000. 1) Fale sobre a experiência do Banco Palmas, como começou, as dificuldades passadas e as atuais, o que foi superado. Explique como ele opera e qual é sua missão. JJ: O objetivo do Banco Palmas é desenvolver um sistema local de economia solidária, para isso atua estrategicamente nos quatro pontos da cadeia produtiva do ciclo econômico sustentável em áreas de baixa renda, quais sejam: capital solidário, produção sustentável, consumo ético, comércio justo. Criamos instrumentos para concessão de micro-créditos, compatíveis com a realidade da comunidade. São 4 as linhas de crédito do Banco Palmas: uma linha de micro-créditos para quem quer criar ou ampliar um pequeno negócio, o cartão-decrédito PalmaCard, que financia quem comprar nos produtores e comerciantes do bairro, incentivando o consumo local; uma linha de crédito específica para as mulheres em situação de risco social atendidas pelo Programa Incubadora Feminina; e o PalmaCasa, que visa melhorar as condições de moradia para melhorar as condições de produção ou de comercialização. Adotamos uma política de créditos e juros evolutivos, quem solicita o 2º crédito tem um limite de financiamento maior do que no 1º crédito, porém paga mais juros. A lógica é quem tem mais paga mais juros para subsidiar o empréstimo de quem tem menos. Não há exigência de consultas cadastrais, comprovação de renda ou Pág. 12 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição fiador. Quando um morador vem solicitar um serviço, primeiro, é informado das regras de funcionamento da rede de solidariedade. Depois um analista de crédito visita sua família e conversa com os seus vizinhos. É o depoimento da vizinhança que vai servir de aval para o futuro cliente. A partir do momento que o cliente é aceito no banco ele passa a ser acompanhado por toda a rede de solidariedade. Esse controle social fiscaliza as ações do banco e dos seus empreendedores, ajudando, inclusive a inadimplência ficar na casa de 1 a 3%. O Banco Palmas foi fundado em março de 1998, começou com apenas 10 clientes a partir de um empréstimo de R$ 2.000,00 contraído junto a Ong CEARAH Periferia. Alguns meses depois recebeu recurso a fundo perdido da cooperação internacional, através da Oxfam e da GTZ. O Sistema Palmas envolve atualmente 1.400 famílias atendidas por seus diversos produtos e uma carteira de créditos estimada em R$ 60.000,00. Hoje, além da ajuda de cooperação internacional que recebe, o Banco mantém algumas atividades pontuais com apoio de recursos públicos locais. Os recursos arrecadados com as taxas de juros dos empréstimos, pequenas, ajudam a custear despesas com o funcionamento do banco. Em sete anos de atuação no Conjunto Palmeira, enfrentamos muitas dificuldades, umas já superadas, outras estão nosso horizonte como desafios. Logo no início fomos processados pelo Banco Central, porque realizávamos uma poupança comunitária. Tivemos que convencer os parceiros quanto à capacidade da Associação dos Moradores do Conjunto Palmeira para fazer a gestão do Banco e superar a inexperiência da equipe em gerenciar uma estrutura financeira. Trabalha a dificuldade dos sócios em conviver com uma proposta econômica Publicada em Outubro de 2004 (créditos, juros, cobranças) dentro de um espaço de ações comunitárias. Buscamos ajuda de parceiros para superação dos problemas. Os analistas de crédito fizeram um treinamento promovido pela municipalidade. Os agentes administrativos do banco realizaram treinamento no CEARAH Periferia. A coordenação buscou aperfeiçoamento em planejamento e métodos de gestão participativa no projeto Prorenda/GTZ. Permanentemente são realizados ciclos de estudos que ajudem nas atividades do banco. O banco ainda continua enfrentando problemas com segurança; de organização contábil e gerencial; e excesso de demanda diante da capacidade financeira e administrativa de atendimento. 2) Apresente as outras iniciativas que integram as ações do Banco Palmas e visam o desenvolvimento da comunidade do Conjunto Palmeira. JJ: A idéia fundamental era criar um sistema no qual as pessoas pudessem produzir e consumir localmente, formar uma rede de “prossumidores”, um produz e o outro compra. Com esta finalidade o Banco Palmas criou vários produtos complementares que articulados entre si organizam no bairro uma rede solidária entre produtores e consumidores. Temos hoje em funcionamento 6 empreendimentos coletivos autogestionários: PalmaFashion (confecção); PalmaLimpe (produz material de limpeza); PalmArt (artesanato em tecido); PalmaCouros (bolsas e cintos); Palma Limpeza de Ambientes (serviços de limpeza); e PalmaNatus (produção de sabonetes e remédios naturais). São pequenas unidades produtivas, formais e informais, financiadas pelo Banco, Pág. 13 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição direcionadas para demandas locais. o atendimento de As ações de desenvolvimento local sustentável do Banco estão aliadas ao fortalecimento da auto-gestão comunitária. A Escola Comunitária de Socioeconomia Solidária (PalmaTech) oferece oficinas e cursos variados na área de capacitação profissional, gestão de empresas solidárias, criação de redes e instrumentos de Economia Solidária. A escola, que tem como valor central o controle da sociedade sobre a economia e o mercado como espaço de cooperação, colaboração e satisfação das necessidades humanas, é responsável pela formação de instrutores e técnicos e pela capacitação de empreendedores, produtores e consumidores. Já foram capacitados 1130 produtores. È comum recebermos no Banco um público feminino com perfil de risco pessoal e social. São mães que têm de cuidar sozinhas dos filhos. Desempregadas, sem profissão definida, analfabetas ou com pouco estudo algumas vivem de esmolas. Mal conseguem se alimentar e, em geral, têm um histórico de dependência de droga e de violência doméstica. Antes de ter acesso a crédito, essas mulheres necessitam ser reintegradas ao processo produtivo. Durante os 6 meses que participam do Programa Incubadora Feminina, elas aprendem uma profissão, recebem atendimento médico e psicológico e alimentação balanceada, seus filhos são encaminhados para as escolas e creches do bairro. São realizados cursos especiais sobre segurança alimentar, culinárias alternativas e uso medicinal de plantas e alimentos, para que elas apliquem esses conhecimentos em seus quintais. São auxiliadas na elaboração de uma estratégia que garanta sua sustentabilidade Publicada em Outubro de 2004 econômica fora da incubadora e que será financiada por uma linha de crédito específica do Banco. Cerca de 90 mulheres já foram atendidas no Programa Incubadora Feminina, que otimiza a utilização dos serviços públicos e comunitários já existentes na própria comunidade (posto de saúde, creches e escolas, centros sociais e unidades profissionalizantes). Temos um Balcão de Empregos em parceria com o Serviço Nacional de Empregos (SINE), o Instituto de Desenvolvimento do Trabalho (IDT) e o CESE (Centro Ecumênico de Serviços). O Banco Palmas também viabiliza uma rede de Troca de Serviços sem qualquer tipo de remuneração. Cada qual coloca à disposição sua atividade profissional. Essa estratégia é dirigida aos desempregados, mas nada impede que outras pessoas que já tenham empregos possam fazer parte da rede. Promovemos alternativas de comercialização como as feiras comunitárias e a Loja Solidária, onde os produtores que obtiveram crédito podem colocar seus produtos para exposição e venda. Organizamos também um Sistema de Compras Coletivas, adquirida em grande quantidade e diretamente dos produtores, conseguimos reduzir em 20% o valor da compra. Por outro lado, dá oportunidade aos pequenos produtores. A nossa moeda social Palmas $, que é um instrumento de incentivo ao consumo e que circula livre e diariamente por todo comércio local, como se o bairro todo fosse um grande clube de trocas. Percebemos que o modelo padrão de um clube de trocas não atendia nossa perspectiva de desenvolvimento, no máximo, garantia a subsistência das famílias envolvidas, onde o pouco que um Pág. 14 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição tinha era trocado com o pouco do outro. Era preciso avançar em uma estratégia que investisse no crescimento dos pequenos empreendimentos que estavam no clube de trocas, para que estes fossem aos poucos gerando mais riqueza. Os produtores, os comerciantes, os prestadores de serviço do bairro em geral aceitam o pagamento em Palmas, ampliando a circulação dessa moeda social. A Palmas $ tem lastro em Reais (R$), para cada Palmas em circulação há um correspondente em Reais depositado no Banco Palmas. É possível converter Palmas por Reais. O sistema de trocas com Palmas relaciona-se diretamente com o sistema de créditos do Banco Palmas, o tomador de crédito pode optar por Palmas ou Reais. As pessoas que antes não tinham acesso a Reais puderam, através de seu trabalho, conseguir Palmas que se transformam em Reais quando é necessário. Se a moeda social circula restritamente sem a possibilidade de se transformar em um ativo monetário capaz de potencializar as economias locais e garantir novos investimentos externos, é impossível gerarmos desenvolvimento local. O grande desafio deste sistema é conseguir o lastro para fazer aumentar a quantidade de Palmas circulando. Como fazer o isso sem carecer da cooperação internacional e outros? Esta pergunta continua sem resposta, haja vista que a Palmas está sob controle de um banco popular com reduzida capacidade de investimento. Agora em 2005 iniciamos um novo desafio: vamos construir nossa Cooperativa de Crédito Popular e Solidária, a PalmaCOOP. Os bancos comunitários, como o Palmas, tão importantes para iniciar os processos de inclusão e transformação social, têm em Publicada em Outubro de 2004 seu formato institucional e legal um grande fator limitante. Eles não conseguem prestar os serviços financeiros na mesma medida em que se dá o crescimento dos empreendimentos, nem podem acompanhá-los até sua fase de sustentabilidade. Precisamos de uma cooperativa de crédito para dar continuidade às atividades iniciadas pelo Banco Palmas. Acreditamos que esse casamento do banco comunitário com a cooperativa de crédito completa o circuito financeiro necessário para impulsionar o desenvolvimento sustentável de territórios de baixa renda. 3) Como fomentar um empreendedorismo de interesse social? JJ: Primeiramente acreditar nos pobres, acreditar no investimento feito neles. Valorizar sua história é um fator fundamental, assim como saber revelar suas demandas reais. O Banco Palmas é parte da história desta comunidade do Conjunto Palmeiras. Em 1997, a Associação dos Moradores realizou um seminário de Planejamento Estratégico onde identificou que boa parte da população começava a vender suas casas como fonte de renda e ia morar em favelas mais longínquas, ou em barracos na beira de rios. Era necessário oferecer uma alternativa de renda localmente para garantir a permanência das famílias. Foi decidido então em assembléia, que a grande prioridade para o bairro nos próximos cinco anos seria um projeto de combate à pobreza, com geração de renda e desenvolvimento local. Durante todo ano foram feitas dezenas de reuniões com diversos segmentos, envolvendo várias organizações populares do bairro, debatendo-se a natureza, estrutura, instrumentos e filosofia do projeto. Finalmente decidiu-se criar um banco popular de inclusão social. Pág. 15 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição Existe nas esferas governamentais e empresariais uma espécie de “senso comum” de que para os mais pobres só é possível a inclusão social com políticas compensatórias, de distribuição de renda, ou no máximo, pequenos projetos alternativos de geração de renda complementar. Não acreditam que pessoas que vivem por meio de programas assistenciais, normalmente, com baixíssimo grau de escolaridade e quase nenhuma capacitação profissional, ou na subsistência de pequenos biscates ou de sua pequena produção artesanal podem, com o apoio de um conjunto de ações tais como as implementadas pelo Banco Palmas (crédito subsidiado, mapa da produção e do consumo local para estimular a produção sob demanda de consumo, plano local de investimento estratégico, moedas circulantes locais articuladas com as políticas públicas locais e com o crédito, formas alternativas de consumo e comércio solidário), estar a frente de empreendimentos produtivos capazes de alcançar um nível de sustentabilidade, ou até, quem sabe, uma produção em escala. Outro equívoco é planejar uma intervenção que busca levar os moradores locais a se organizarem e já começarem a produzir como se estivesse numa fase de sustentabilidade. Nossa prática tem demonstrado que esses empreendimentos vivem um processo de formação que evolui pelas fases de assistência, subsistência, para então a de sustentabilidade. Atravessam um processo paulatino e contínuo de crescimento. Entender a existência desses degraus é fundamental. São etapas em que os trabalhadores dos empreendimentos vão se conhecendo, recuperaram a auto estima, adquirem experiência profissional, resgatam os valores da solidariedade, readaptam-se às lógicas do mercado, Publicada em Outubro de 2004 adquirem visão empreendedora e por aí em diante. Querer organizar uma cooperativa como primeira ação para se tentar gerar renda num local onde as pessoas estão desorganizadas e sem motivação, pode ser frustrante. É melhor organiza-las em um pequeno grupo de produção, de maneira informal capacita-las adequadamente e, aos poucos, ir estruturando a referida cooperativa. Ou seja, a cooperativa virá somente com o processo. E uma observação importante: não esperar um momento ideal ou estar com tudo “prontinho” para iniciar as ações, comece agora, os ajustes necessários vão sendo feitos ao longo do processo. 4) Qual orientação daria para quem quiser replicar a experiência do Banco Palmas? JJ: A metodologia Palmas consiste em criar um círculo virtuoso produçãoconsumo-produção no funcionamento de uma rede de economia solidária. Para este círculo poder existir e funcionar adequadamente é necessário que na comunidade sejam produzidas as mercadorias mais necessárias para a população consumidora. Neste sentido o Palmas apóia a criação de empresas comunitárias que vão, se multiplicando através de seus excedentes (na economia solidária o lucro chama-se excedente), aumentando a oferta de produtos fabricados localmente, as oportunidades de emprego e de renda. O mapeamento da produção e do consumo local é o primeiro passo para a criação da rede de economia solidária do Banco Palmas. Trata-se de um levantamento realizado sobre tudo que a população está consumindo e produzindo, incluindo os insumos utilizados na produção. São Pág. 16 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição identificados os locais onde os produtores e consumidores estão realizando suas compras, bem como a localização das indústrias comércios e serviços existentes no bairro. Para a realização da pesquisa de mapeamento são capacitados pesquisadores locais. É fundamental que todo o processo da pesquisa, (coleta de dados, sistematização e análise) seja compreendido pela comunidade, com apoio de uma assessoria técnica, para que ela se aproprie dos conhecimentos e seja capaz de reaplicá-los quando necessários. Apresentamos os resultados da pesquisa em um grande evento que reuniu vários segmentos locais (igrejas, associações, escolas, creches, poder público e outros). Na concessão de crédito, iniciamos com a capacitação e empoderamento dos moradores, despertando a sensibilidade para a solidariedade e a colaboração enquanto estratégia de um modelo de desenvolvimento justo e sustentável. Aprendemos algumas lições. A relação com o poder público deve se dar de forma permanente, buscando criar parcerias que garantam o diálogo entre a municipalidade e a comunidade. Essa relação deve sempre estar oficializada através de contratos, convênios, acordos e outros termos contratuais para assegurar o cumprimento de tudo que foi negociado mesmo com a troca do gestor público. Publicada em Outubro de 2004 O sistema de microcréditos de um banco popular precisa ser aperfeiçoado permanentemente, criando instrumentos complementares e adaptando-se às novas necessidades. Por isso, a necessidade que percebemos de criar a cooperativa de crédito. Os instrumentos utilizados pelo banco folhas de contrato, faturas, livros de controle contábil, cadastros e outros precisam ser bastante simples. Os desafios da gestão do banco aumentam à proporção que o banco cresce isso implica constante capacitação da equipe e rigorosidade na parte contábil. É necessário discutir bem com a comunidade quais são os objetivos do banco, a quem ele se destina, como vai ser seu funcionamento e qual a estratégia de desenvolvimento em longo prazo. Os critérios para concessão de crédito devem ser claros e amplamente divulgados, para não criar falsas expectativas. É fundamental na relação com a comunidade ser transparente divulgando a situação financeira do banco e principalmente as dificuldades. Participamos também nas experiências do Banco Par e do Projeto Rede Cidadã. Queremos estimular a criação de outros bancos comunitários, e de cooperativas de crédito urbanas por esse Brasil afora. É nossa missão. Pág. 17 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição Publicada em Outubro de 2004 Estudo de Caso ATA – Apoio ao Trabalhador Autônomo: Um modelo de política pública de apoio aos trabalhadores autônomos da construção civil Michelle Plubins Bulkool * pode-se verificar que a parcela destinada à metade mais pobre da população é de aproximadamente 13%, apresentando ligeira queda ao longo do tempo (IETS, 2001). Introdução O Brasil é o país das desigualda-des. Os dados do IBGE mos-tram que nossa desigualdade de renda é não apenas uma das mais altas do mundo, como Esse olhar que privilegia os grandes tem permaneceu es-tável ao longo dos últimos como uma de suas conseqüências um 30 anos (Instituto de Estudos do Trabalho Brasil extremamente desigual. A flagrante e Sociedade - IETS - 2002). Por outro lado, injustiça desses dados já é suficiente para o Brasil não é um país pobre: 78% da justificar um redirecionamento do olhar população mundial vive em países cuja para os pequenos. renda per capita é inferior à brasileira. A principal causa Gráfico 1 – Evolução da porcentagem da da pobreza, renda apropriada pelos diversos segmentos sociais aqui, é o excesso de desigualdade em 1% mais rico relação à norma internacional 9% seguintes para países com grau de desen40 % seguintes volvimento econômico semelhante. Este 50 % mais pobres excesso de desigualdade é fruto de um processo histórico e político que Além disso, dentre as famílias pobres, promoveu um estilo de desenvolvimento predominam chefes de família que são peculiar, baseado na aliança entre um trabalhadores autônomos ou empregados estado centralizador e grandes empresas, sem carteira assinada, em sua maioria que sobretudo multinacionais. Mesmo com a trabalham para as pequenas empresas. democratização, o que na verdade continua escondido, camuflado, é que no Brasil, só A perversidade do sistema pode ser se tem olhos para os grandes, os já observada no gráfico 2. A proporção de atendidos. famílias chefiadas por trabalhadores autônomos é hoje equivalente à de O Gráfico 1 mostra que a proporção da chefiadas por empregados com carteira renda abocanhada pelos 10% mais ricos da assinada, empregadas em grandes população se mantém estável em torno de empresas. Não obstante, enquanto as 47% da renda total. No outro extremo, famílias chefiadas por empregados formais 100% 90% 80% 70% 60% Renda 50% 40% 30% 20% 10% 0% 1981 1982 1983 1984 1985 1986 1987 1988 1989 1990 1992 1993 1995 1996 1997 1998 Pág. 18 1999 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição prevalecem, sobretudo, nas camadas médias da população, aquelas que são chefiadas por trabalha-dores autônomos são sobre-representadas nas camadas mais pobres. O mesmo ocorre, aliás, com os empregados sem carteira assinada.1 Pensar no pequeno exige também que se encontre condições de apoiar o seu desenvolvimento. Pesquisas mostram que o apoio através de serviços essenciais, serviços de apoio empresarial potencializam, e muito, a 50 ação dos pequenos empreendimentos. Com a 40 criação de um ambiente (% ) 3 0 favorável, é possível se pensar uma nova forma 20 de desenvolvimento, 10 apostando-se nos pequenos, garantindo 0 assim, a distribuição de renda. Crédito, qualificação, acesso à tecnologia, apoio ao associativismo, são ações efetivas capazes de contribuir para o surgimento de um novo ator, participativo, Indige nte s 1 Neste gráfico, são adotadas as linhas de indigência e de pobreza estabelecidas pelo IPEA. A camada social “média baixa” é composta por famílias que possuem renda per capita superior à linha de pobreza mais inferior à mediana (131,67 Reais de setembro de 1999). A “média média” é composta por famílias com renda per capita superior à mediana do terceiro quartil da distribuição (193,33 Reais de setembro de 1999). A “média alta” por famílias com renda per capita superior ao terceiro quartil, mas inferior ao nono decil da distribuição (571 Reais de setembro de 1999). Os “ricos” por famílias com renda superior ao nono decil, mas inferior ao último percentil da distribuição (2183,60 Reais de setembro de 1999). Os “extremamente ricos”, por fim, por famílias que pertencem ao 1% mais rico da população. Por outro lado: CC representa os empregados com carteira de trabalho assinada; SC os sem carteira; FP os funcionários públicos; DOM os empregados domésticos; CP os trabalhadores autônomos (ou por conta-própria); EMP os empregadores/; AC os que trabalham para seu auto-consumo e NR os que não foram registrados em nenhuma posição na ocupação catalogada pelo IBGE. Publicada em Outubro de 2004 capaz de chamar atenção para suas necessidades. Em um estudo realizado pelo IPEA, destacou-se que é a escassez de serviços financeiros e de políticas públicas são as maiores dificuldades para alavancar as atividades dos pequenos empreendedores. Desta forma, este estudo, sinaliza para Gráfico 2 - Composição das camadas sociais por posição na ocupação do chefe de família P o bre s M é dia -ba ixa M é dia -mé dia M é dia a lta R ic o s E xtre ma me nte ric o s CC FP SC DOM CP EMP AC NR To ta l C a m a d a s o c ia l políticas públicas de microcrédito, Insumos e tecnologia, regulamentação, cooperativação, comercialização, Educação formal, Formação profissional e capacitação técnica, Investimentos em infra-estrutura pública e outros programas de microfinanças, como forma de apoio aos nano-empreendedores, criando assim um ambiente favorável ao seu desenvolvimento. O ATA – Apoio ao Trabalhador Autônomo O Apoio ao Trabalhador Autônomo - ATA é um associação civil sem fins lucrativos. Uma instituição criada no âmbito da ampliação do espaço público, inserida numa proposta de política pública de geração de trabalho e renda. Além disso, o ATA está qualificado como uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público – OSCIP. O objetivo principal do ATA é de comercializar os serviços de trabalhadores autônomos, conta própria na área da Pág. 19 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição construção civil. O ATA possui um cadastro de trabalhadores qualificados como Mestre de Obras, Pedreiros, Pintores, Ladrilheiros, Serralheiros, Marceneiros, Eletricistas, Bombeiros Hidráulicos e Bombeiros Gasistas, além de contar agora também com arquitetos em seu banco de dados. O ATA oferece uma gama de serviços empresariais através de instituições parceiras, como o acesso ao crédito, a qualificação profissional, a certificação e o acesso a tecnologia da informação. Foi desenvolvida uma organização do trabalho participativa, realizando-se encontros periódicos para troca de informação, conhecimento e discussão do andamento da instituição. O ATA possui um Central de Atendimento onde é realizada a intermediação da mão de obra. Desta forma, o cliente demandante por esses tipos de serviços entra em contato com a Central através do telefone (021) 2517-3264 ou pela internet (www.ata.org.br) e faz a sua solicitação. O atendimento do ATA identifica o profissional da vez, que esteja disponível e melhor se encaixe nas características do serviço demandado. A Central encaminha dois profissionais para o cliente, informando apenas o nome e o telefone. Os profissionais entram em contato com o cliente, no prazo máximo de quatro horas, e agendam a visita, para a elaboração de orçamentos, sem custo para o cliente. A Central de Atendimento acompanha o pedido, desde sua entrada até o seu fechamento, seja este uma obra realizada ou mesmo uma desistência do serviço. No final, o ATA faz a avaliação junto ao cliente, um pós-venda. O serviço é acordado diretamente entre o cliente e o trabalhador. No entanto, é obrigatório ao trabalhador confeccionar um contrato junto ao atendimento do ATA. Este contrato serve de garantia para o cliente, para a central e para o trabalhador da perfeita execução dos serviços acordados. Publicada em Outubro de 2004 Em cima do valor da mão de obra contratada, o profissional paga 10% do valor ao ATA. Todo trabalhador cadastrado também contribui com uma mensalidade para se permanecer ativo no sistema. São esses recursos que mantém a estrutura de funcionamento do ATA. O processo de trabalho da Central de Atendimento é dividido em três operações básicas: o atendimento ao cliente; a intermediação do serviço; e o acompanhamento e avaliação da qualidade do serviço. Todo o trabalho da Central de Atendimento é suportado por um sistema informatizado especialmente desenvolvido para atendê-lo. Este sistema é capaz de avaliar constantemente os resultados do ATA, reformulando estratégias e diretrizes quando necessário. O sistema de gerenciamento de informações permite ainda obter informações específicas do percurso dos profissionais no ATA. Assim, é possível um acompanhamento detalhado do desenvolvimento técnico e comportamental dos autônomos cadastrados. Para ingressar no ATA, os profissionais passam por um rigoroso processo de seleção, incluindo entrevista psicossocial, pesquisa junto ao IFP de antecedentes criminais e por avaliações técnicas a fim de identificar seu estágio profissional. A seguir são oferecidos cursos de qualificação técnica. Os aprendizes são encaminhados para cursos de formação, os profissionais médios para os de aperfeiçoamento. Os profissionais certificados, com excelência em suas atividades, passam por avaliação rigorosa em entidades de reconhecida capacidade técnica, como o SENAI, por exemplo. Paralelamente os profissionais passam por cursos de gestão e empreendedorismo em entidades como o SEBRAE. O sistema informatizado identifica o nível de desenvolvimento técnico e encaminha o Pág. 20 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição profissional adequado ao tipo de serviço solicitado pelo cliente. Os aprendizes são encaminhados somente como ajudantes dos profissionais certificados. Antes de cadastrar o profissional em seu banco de dados, o ATA trabalha a divulgação dos serviços ofertados. Assim, os profissionais atendidos recebem um número mínimo de serviços capaz de gerar uma renda minimamente adequada ao sustento de sua família. É este equilíbrio entre a oferta e a demanda de serviços que dá condições aos profissionais de pagar uma taxa de operação. Para o cliente, o ATA oferece serviços de qualidade, com segurança e a garantia da perfeita execução dos serviços. O cliente obtém todas as informações referente ao profissional que está colocando dentro da sua casa e tem a oportunidade de comparar preços entre os orçamentos que recebe. Se o cliente não ficar satisfeito, pode recorrer novamente a central e solicitar novos profissionais. Através da comercialização dos serviços de trabalhadores autônomos, o ATA aglutina, através de parcerias, uma vasta Publicada em Outubro de 2004 gama de serviços empresarias como forma de criar um ambiente favorável para o desenvolvimento de seu público alvo. A partir de políticas públicas integradas de geração de trabalho e renda, foram desenha-das ações de forma a constituir um ambiente propício ao desenvolvimento desses trabalhadores, oferecendo uma gama de serviços como aumento de escolaridade, micro-crédito, qualificação profissional, acesso à informação e a tecnologia. Até hoje o ATA já atendeu já atendeu a mais de 6.000 trabalhadores e a cerca de 10.000 clientes demandantes pelos serviços disponíveis. Já foram qualificadas mais de 4.000 pessoas, legalizadas 4 cooperativas de trabalho na construção civil e concedidos cerca de 100 créditos. A população carioca apóia o programa dando-lhe 97% de aprovação. ------------------------* Engenheira mestrado em COPPE/UFRJ. ocupando hoje de Produção pela UFRJ, com Engenharia de Produção, pela Trabalha desde 1999 no ATA, a função de diretora executiva. Pág. 21 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição Publicada em Outubro de 2004 Resenha Crítica Bio(sócio)diversidade e Empreendedorismo Ambiental na Amazônia Joselito Santos Abrantes Editora Garamond, Rio de Janeiro, 2002, 148pp por André Fernandes da Paz* O livro de Joselito Abrantes1 representa não apenas mais uma referência para a reafirmação da possibilidade de uma nova dinâmica à matriz econômica da região amazônica – comdizente com as necessidades de um desenvolvimento sustentavel em suas diversas dimensões-, como também uma profícua contribuição para o estudo e a realização do empreendedorismo ambiental na região. Em “Bio(sócio)diversidade e Empreendedorismo Ambiental na Amazônia”, o autor conseguiu condensar seus estudos acadêmicos na área de desenvolvimento sustentável com seu conhecimento prático sobre a realidade amazônica e a realização de projetos técnico-econômicos sustentáveis na região. O livro se caracteriza pela breve contextualização histórica e o mapeamento abrangente das diversas questões envolvidas com o empreendedorismo ambiental: desde as políticas de ocupação e desenvolvimento da Amazônia, os desafios e dilemas dos programas de desenvolvimento sustentável e a evolução da política ambiental no Brasil às potencialidades da biodiversidade amazônica, sua oportunidade econômica e os desafios presentes na implementação de 1 Formado em Economia pela Universidade da Amazônia (UNAMA), mestre pelo Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília (CDS/UnB), coordenador de Estágio Supervisionado e Pesquisa do Curso de Ciências Econômicas do Centro de Ensino Superior do Amapá e funcionário do SEBRAE/AP. um novo paradigma de desenvolvimento baseado no tripé ciência, tecnologia e empreendedorismo ambiental. Uma vez constatados os graves impactos sociais e ambientais da exploração puramente extrativista dos megaprojetos minero-metalúrgicos da década de 70 - enclaves voltados exclusivamente para o mercado externo-, o autor defende, em contraposição, o novo ciclo de desenvolvimento já relativamente em curso, apoiado na exploração equilibrada da biodiversidade e na inclusão da sociedade civil no processo de desenvolvimento local. Com este fim, por um lado, é apontado o potencial da região amazônica para os bionegócios sustentáveis e reafirmada a viabilidade técnico-econômica dos produtos naturais, freqüentemente desacreditada. Por outro, entretanto, são apontados os grandes desafios que precisam ser superados, como as dificuldades históricas de transporte, a instabilidade de demanda e produção, a falta de recursos humanos, as más condições sanitárias. No entanto, é a transferência de tecnologia e conhecimento a questão que recebe maior atenção no estudo de Abrantes, visto que esse fator tem uma importância central para o segmento dos produtos naturais com origem na biodiversidade e um papel imprescindível na transformação das vantagens comparativas da região em Pág. 22 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição vantagens competitivas nos mercados regional, nacional e internacional. O autor deixa claro que, para o melhor aproveitamento em benefício da comunidade, o ideal é agregar o máximo de valor possível na origem do produto, o que implica na necessidade de ações para capacitar recursos humanos, fortalecer a capacidade empreendedora e tecnológica da população, e de investimentos em capacidade inovativa. Nesse sentido, são apontados os benefícios trazidos pelo ambiente interinstitucional de articulação, interação, cooperação e aprendizagem, típico dos arranjos produtivos locais. As incubadoras são destacadas como os agentes principais, em função de seu papel imprescindível de difusão de conhecimento e tecnologia para as empresas e cooperativas. Tudo isso é confirmado pelos resultados auspiciosos encontrados na análise da trajetória de empresas e cooperativas de base tecnológica dos segmentos dos produtos naturais, em regime de incubação direta ou indireta pelo Centro de Incubação e Desenvolvimento Empresarial da Amazônia – CIDE, situado em ManausAM, pelo Parque de Incubação de Empresas de Bases Tecnológicas da Universidade Federal do Pará – PIEBT/UFBA, e pela Incubadora de Empresas de Bases Tecnológicas do IEPA, em Macapá-AP. Embora a biodiversidade seja vista pelo autor como um fator estratégico para o desenvolvimento da Amazônia, ainda muito pouco está sendo feito para alterar a matriz produtiva da região. Diante disso, Abrantes recomenda alguns caminhos a serem trilhados. Entre eles, é reforçada a necessidade das instituições públicas e privadas, em conjunto com a sociedade civil, desenvolverem os arranjos centrados nas inovações tecnológicas para os produtos naturais. O autor também defende um redirecionamento das políticas públicas para a região, no sentido de funcionarem como Publicada em Outubro de 2004 indutoras do processo de desenvolvimento. São necessárias políticas públicas coerentes, consistentes e adequadas à sociodiversidade, que sirvam de apoio não apenas às incubadoras, mas também à formação educacional e ao desenvolvimento de pequenas e micro empresas. O autor destaca o Acre e Amapá como estados onde estão sendo desenvolvidas políticas públicas coerentes com esse redirecionamento. Como exemplo, o estudo sobre o Programa de Desenvolvimento Sustentável do Amapá - PDSA – o caracteriza como uma iniciativa que conseguiu transformar o conceito de desenvolvimento sustentável em matriz das políticas públicas. Nesse sentido, cabe aqui mencionar que, em alguns momentos, Abrantes se precipita em atribuir a esse programa os resultados positivos encontrados nos Indicadores de Desenvolvimento Sustentável (2002) do Amapá apresentados pelo IBGE - nada, porém, que comprometa o trabalho do autor, nem muito menos coloque em dúvida a eficiência do programa. De fato, a principal contribuição do estudo de Abrantes é sistematizar conhecimentos acumulados sobre experiências empreendedoras sustentáveis de base tecnológica, passando por temas como a viabilidade técnico-econômica dos produtos naturais, o transporte e comercialização desses produtos e, sobretudo, a importância e a problemática da tecnologia para o segmento dos bionegócios sustentáveis. É dessa forma que o autor consegue também realizar seu declarado objetivo de sistematizar informações dessa área “(...) que possam orientar potenciais empreendedores da região para a linha de negócios da bioindústria como plantas medicinais, óleos naturais, óleos essenciais, oleaginosas, alimentos, fitoterápicos, fitocosméticos, perfumes e corantes naturais.” (ABRANTES: p.19, 2002) ----------------------------* Mestre em Engenharia de Produção pela COPPE/UFRJ. Pág. 23 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição Publicada em Outubro de 2004 Artigo Economia de comunhão: absurdo e graça trabalhar é preciso Heloisa Helena A. Borges Q. Gonçalves * RESUMO A existência de algo como a economia de comunhão na liberdade é uma abertura à “hermenêutica do cetismo” e só faz sentido quando nos rendemos à exortação teológica credere quia absurdum - acredite porque é Absurdo. O artigo contrapõe essa posição e anuncia a emergência de outra economia enraizada na vida humana, no amor-recíproco e na partilha. Palavras-chave: economia de comunhão, hermenêutica da emergência, trabalho humano. ABSTRACT The existence of something like economy of communion on liberty is an openning to “hermeneutics of cepticismo” and makes sense only when we surrender to the theological exhortation credere quia absurdum – believe because it’s an absurd. The article contraposes this position and announces the emergency of another on human lime, mutual-love and sharing economy rooted economy. Key-words: Economy of Communion, hermeneutics of emergency, human work. Fluidez e permanência do quê? No mundo contemporâneo do cálculo utilitário das conseqüências regido pela sociabilidade que preserva o individualismo legitimado pela “mão invisível”, aqui denominada de trinitária, detentora de eira (dinheiro e riqueza material acumulado nas mãos de poucos), beira (poder para dominação do outro) e tribeira (futuro só para descendentes dos poderosos), a possibilidade de existência da economia de comunhão é ex ante Absurdo e Graça, exclamariam simultaneamente indivíduos que podem se reconhecer nas categorias buberiana de ininicus, adversárius e amicus (BUBER 1982, p.69). Amicus argumentariam: - é Graça face a face, atravessando o limiar - a vida humana associada (RAMOS, 1989) - que adversárius evitam, quando encobrem admitir a possibilidade do que para eles parece Absurdo: a sociabilidade regida pela solidariedade, compaixão, ajuda mútua, simpatia, amizade leal, entusiasmo ativo, na realização de empreendimento conjunto (noções estranhas ao pensamento econômico e abominadas pela prática econômica neoliberal); cujo sentido é legitimado por outra mão (in)visível trinitária, detentora de eira (dinheiro e Pág. 24 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição riqueza material distribuídos às mãos de muitos), beira (poder para serviço ao outro) e tribeira (futuro para todos). Livres do comprometimento pessoal de conversação com o outro, adversarius teceriam fantasias oportunistas sobre a miséria e a pobreza estrutural, atribuindo a elas dentre outras causas indolência, preguiça, caráter de tara ou de vicio das camadas da sociedade que, segundo eles, não conseguem dominar a propensão desenfreada a procriar. Obviamente, com isso “encontram uma forma de sofismar o problema” (AKTOUF, 1996, p.70). Outros adversarius teceriam fantasias sobre uma possível prevenção da pobreza e da miséria por meio de discussão teórica. Os que têm influência espiritual teceriam fantasias sobre metáforas morais. Cada um em seu lugar dentro da conhecida separação natureza e sociedade (LATOUR,1994). Enquanto isso, o sistema berço da fantasia da “maré que sobe e eleva tudo” e promotor de exclusão social, em face à crítica artística e a crítica social (BOLTANSKI E CHIAPELO, 1999) admite brechas e continua a legitimar-se por falta de provas de sua responsabilidade no aumento exponencial da miséria em diversas populações do planeta; ou não é bem assim? Mas, é possível provar que a (in) responsabilidade do sistema é real? Isto é, por face a face os excluídos da socialização do individualismo com os incluídos que a promovem. A relação não é biunívoca tão pouco simétrica. Assim, não há resposta, o sistema econômico globalizado não reconhece o Rosto do Outro (LEVINAS, 1997), quiçá o “Rosto do Abandonado” como requer Chiara Lubich (1991) para a economia de comunhão. As conseqüências provocadas pelas economias desenraizadas da vida humana Publicada em Outubro de 2004 associada comprovam que ainda não sabemos fazer funcionar outra economia baseada na generosidade Cohen (1994), na cultura da partilha e no amor-recíproco (LUBICH, 1991). Explicações, dentre outras, estão postas por Boaventura de Souza Santos em sua obra Produzir para Viver (2002): vivemos numa época em que a idéia de que não há alternativa sistêmica viável ao capitalismo conseguiu aceitação sem precedentes devido à contaminação do sistema dominante resultando na denominada “hermenêutica do ceticismo” que rejeita a “hermenêutica da emergência” de todo tipo de experimentação social. Laville (2004) afirma que a origem destas posições é o reducionismo que explica a ação econômica apenas pelo interesse material individual, contudo, segundo as deduções de Karl Polanyi e Marcel Mauss a realidade da economia é plural, mas é fato mascarado pela análise utilitarista. Deste lugar, algo como a economia de comunhão só faz sentido quando nos rendemos à exortação teológica credere quia absurdum - acredite porque é absurdo - outra economia emergir enraizada na vida humana associada e em três princípios fundamentais incompatíveis com o sistema econômico capitalista: amar uns aos outros, fazer-se um com o outro, daí e vos será dado (LUBICH, 1991). Bauman (2004) ao discorrer sobre as dificuldades de “amar ao próximo” mencionou que o próximo, se lhe convier, não hesitará em injuriar, zombar, caluniar e demonstrar o seu poder superior. Acima de tudo é um competidor, tramando como qualquer competidor, “cavando buracos, preparando emboscadas, torcendo para que o outro venha tropeçar e cair”. Num jogo de sobrevivência, confiança, compaixão e clemência são fatores suicidas. Por isso, é lógico é ser mais duro e menos escrupuloso do que os outros para não ser Pág. 25 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição aniquilado por eles. Sendo assim, relacionamentos e compromisso incondicional com outras pessoas parece cada vez mais uma armadilha que se deve evitar a todo custo. Então, “qual é o objetivo de um preceito enunciado de modo tão solene se o seu cumprimento não pode ser recomendado como algo razoável?”, segundo Freud. Se o “amor ao próximo” é um mandamento que se justifica pelo fato de que nada mais contraria tão fortemente a natureza original do homem, conforme as conclusões freudianas. Entretanto, para Bauman aceitar o preceito do amor ao próximo é ato de origem da humanidade e pode exigir um salto de fé: passagem decisiva do instinto de sobrevivência para a moralidade condição sine qua non, da sobrevivência. E, com esse ingrediente a sobrevivência de um ser humano se torna a sobrevivência da humanidade no humano e o destino: a economia moral. A economia moral - cuidado e auxílio mútuos, viver para os outros, urdir o tecido dos compromissos humanos, estreitar e manter os vínculos inter-humanos, traduzir direitos em obrigações, compartir responsabilidade pela sorte e o bem-estar de todos depende da imaginação e inventividade e coragem humana de quebrar a rotina e tentar caminhos não experimentados (BAUMAN, 2004, p.94). Mas, salvaguardados os caminhos dos “socialistas utópicos”, os outros caminhos experimentados incluem desobrigar-se da necessidade de responder pelos resultados adversos: desigualdade econômica e de poder entre as classes sociais; separação entre capital e trabalho; apropriação privada dos bens públicos; acumulação de renda que causa desigualdades sociais no interior de cada país e entre países (BOAVENTURA SANTOS, 2002, p.27). Publicada em Outubro de 2004 Segundo Bauman, nesse processo os valores intrínsecos dos outros como seres humanos singulares estão (quase) desaparecendo. Há o esfacelamento das habilidades de sociabilidade, sob as instruções abertas ou subliminares do sucesso da ofensiva do mercado que leva ao “modo agêntico” - agir de maneira heterônima - guiando-se pelo desejo de seguir as instruções ao pé da letra e pelo medo de se afastar dos modelos atualmente em voga. Para Guerreiro Ramos (1989) é o mesmo, o indivíduo tornou-se uma fluida criatura calculista que se comporta de acordo com regras objetivas de conveniência e refém da “política cognitiva, que consiste no uso consciente ou inconsciente de uma linguagem distorcida cuja finalidade é levar as pessoas a interpretarem a realidade em termos adequados aos interesses dos agentes diretos e/ou indiretos de tal distorção”(p.87). Conseqüência: a solidariedade humana é a primeira baixa causada pela tendência inspirada no triunfo do estilo de vida consumista dominante na qual trata-se os outros seres humanos, como objetos de consumo julgando-os segundo o volume de prazer que oferecem em termos de seu “valor monetário” (BAUMAN, 2002, p.96). Mas, baixa não quer dizer necessariamente fim. Há sempre espaço para a inventividade espontânea dos seres humanos e como apontou Michael Bakunin tem apenas duas faculdades humanas em que se basear: a habilidade de pensar e a tendência (coragem) de se rebelar. As proposições de Whitehead (1967), não há mudança sem conservação e conservação sem mudança não pode conservar, ajudam a compreender porque Guerreiro Ramos (1989) afirmou que num mundo ordenado de acordo com regras contratuais de agregação social de Pág. 26 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição interesses competitivos, o sentimento de transitoriedade das coisas permanente e sem propósito é uma conseqüência da interiorização acrítica. Segundo Guerreiro, quando o centro ordenador da vida não está em parte alguma a identidade humana é sua própria criação e acaba em narcisismo, com isso o mundo social como um todo se torna estranho ao indivíduo e aí é inexorável a fluidez da individualidade de Arnold Hauser (1965). Inseridos nesses fios de experiências conflituosas, é possível a aprender a “amar ao próximo” e ser capaz de ultrapassar a transitoriedade das coisas e a fluidez da individualidade para responder às necessidades de sobrevivência básica de todos? A exemplo do que ocorre com os Milagres é pertinente admitir a possibilidade duma reversão no pensamento empresarial no que se refere à administração do lucro? O Bem e não (só) os bens Guerreiro Ramos (1989, p.52), afirmou que os processos não regulados do mercado jamais podem gerar uma boa sociedade. O bom homem (e a boa mulher), nunca é um ser inteiramente socializado; é antes, um ator sob tensão, cedendo ou resistindo aos estímulos sociais com base em seu senso ético. A boa sociedade, então, só pode resultar das deliberações de seus membros em busca da configuração ética, substantiva, de sua vida associada. Isto é, passa pela encarnação de valores virtuosos e pelo trabalho humano, portanto, “trabalhar é preciso”. Trabalhar é preciso convocou Miguel de Simoni (1996), engenheiro de produção, em sua reflexão teórica sobre o conceito de trabalho humano e suas implicações para a produção. Apontou para o trabalho humano, dentro da visão tradicional como forma de autoconhecimento, como Publicada em Outubro de 2004 forma de aproximação ao próximo e como forma de buscar o caráter sagrado da vida uma ligação com os demais aspectos da vida humana associada e finalmente um encontro com Deus. Para Simoni, o trabalho humano é algo não separado da vida, não é algo que atende apenas aos aspectos utilitários da existência humana e passa a ser parte inseparável da essência humana. Não é apenas um meio de ganhar a vida, de mantê-la, mas pode ser um caminho de transcendência. Todavia, o mundo do trabalho moderno produz a condição para o surgimento da doença essencial da nossa época: a perda da integridade do homem e da mulher e lamentou Simoni, “O processo de trabalho da época atual afasta as pessoas de uma vida mais singela, mais simples, mais parcimoniosa. Seus valores são a produção em massa, a busca do melhor método (aquele método que produz a mais em menor tempo), sem levar em consideração o que o método pode acarretar para as pessoas, apenas considerado a necessidade imperiosa do lucro. É uma base excludente, que, a priori, já avisa que haverá diferenciação entre as pessoas na sua participação no processo de trabalho. Diferenciação na sua inserção na estrutura produtiva, diferenciação na repartição do produto gerado. E a maneira pela qual cada pessoa poderá aumentar sua fatia de participação é o espírito de competição. Ganhar mais espaço significa diminuir o espaço de outrem, esse comportamento é, hoje, entendido como natural, e ensinado nas escolas, locais de trabalho, na família, e.por incrível que pareça, até em algumas instituições religiosas”. (SIMONI, 1996, p.32). Pág. 27 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição Publicada em Outubro de 2004 Sendo assim, constatou que para se trabalhar eficientemente, hoje, é necessário despessoar-se, perder uma característica humana básica: a possibilidade de se encontrar na busca do outro. Mas “Epa”, conforme Gonçalves (2003), exclamariam os inimicus e adversarius, reconhecer o rosto do outro não é preocupação para engenheirar a produção, é questão relegada ao campo ideológico e indignados acrescentariam: - é questão relegada aos campos filosófico e religioso, e encerrando o monólogo com a liberdade da enfática ironia, oriunda da ilusão da separatividade nomeada por Pierre Weil (1990), diriam: é questão relegada ao campo poético, não é da nossa conta e ponto. Tal episódio, a faz anunciar a economia de comunhão na liberdade. É com essas plurais mentalidades céticas, irônicas, cínicas dos adversarius e inimicus, ora dialógica ora monológica, que os empreendedores da economia de comunhão na liberdade entram em tensão. Com amicus, o silêncio diálogo autêntico daqueles que já deram razão à Guerreiro Ramos, que identificou o equívoco: considerar que a produção é apenas assunto técnico quando a produção é, ao mesmo tempo, uma questão técnica e moral (p.199), assim, reconhecem outro caminho: a possibilidade da produção de comunhão. Com adversarius e inimicus convite à escuta de uma nova chave de leitura emergente, pois o diálogo não se impõe a ninguém (BUBER, 1982, p.71). E, para a concretude da economia de comunhão convocou empreendedores com disposição voluntária (Aristóteles, Ética a Nicômaco) a responderem ancorados em valores ético-espirituais nos negócios: subsidiariedade, solidariedade, bem comum, primazia do trabalho sobre o capital, destinação universal dos bens e dignidade humana; empreendedores cuja compreensão é a empresa na sociedade com inclusividade humana e ambiental; empreendedores dispostos a destinarem o lucro das empresas para três finalidades: reinvestimento na empresa, partilha com necessitados que são parte essencial da economia de comunhão e para a formação de pessoas capazes de afirmarem a racionalidade de comunhão (BRUNI, 2002) nos processos organizacionais. “Responder não é um dever é um poder” Em 1991, Chiara Lubich, italiana, fundadora do Movimento dos Focolares (1947), movimento social que possui cinco milhões de integrantes leigos, religiosos, não religiosos, e sem credo religioso, em 182 países do mundo, vem ao Brasil e se surpreende com o visível contraste da exclusão social nas favelas e a opulência dos arranha-céus da cidade de São Paulo. “Ao contrário da economia consumista baseada na cultura do ter, a economia de comunhão é a economia do dar. Isto pode parecer difícil, árduo, heróico. Mas, não é assim, porque o homem (mulher), feito a imagem de Deus, que é Amor, encontra a própria realização justamente no amor, na doação. Esta exigência está no mais profundo do seu ser, tenha ele fé em Deus ou não. É justamente nesta constatação, comprovada pela nossa experiência que está a esperança de uma difusão universal da economia de comunhão”. No Quadro A, pode-se visualizar os fundamentos da economia clássica e da economia de comunhão. O quadro não tem caráter comparativo tendo em vista o estatuto de ciência que detêm a primeira. Segundo Chiara Lubich (2003), a empresa da economia de comunhão nasceu para partilhar seus lucros com os necessitados, se não faz isso está longe do projeto. Pág. 28 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição Porém, não se trata de serem empreendedores filantrópicos, pois vínculos relacionais são mantidos. Atualmente, são 900 empresas entre aquelas constituídas a partir da anunciação da economia de comunhão, em 1991, e aquelas que já existiam e aderiram a ela, instaladas em cinco continentes. No Brasil, há 89 micro, pequenas e médias empresas que atuam nos setores da indústria, comércio, prestação de serviço e agroindústira, nos estados de São Paulo, Paraná, Ceará, Alagoas, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Santa Catarina, Pernambuco, Amazonas, Pará, Sergipe, Brasília. E, dois pólos empresariais o Pólo Spartaco em Vargem Grande Paulista com seis empresas inseridas dentre elas a ESPRI S/A (1992) – Empreendimentos, Serviços e Projetos Industriais – empresa de capital fechado, que possui 3500 acionistas por meio da qual os interessados(as) em participar do projeto subscreveriam ações, ainda que com capital bem modesto. O Pólo Ginetta Calliari (2003) em Recife está em construção. No mundo estão em construção, o Pólo Lionello na Itália, o Pólo Solidariedad na Argentina e o Guilio Marchesi na França. Para realizar a economia de comunhão, o sentido de responsabilidade para o empreendedor(a) se constitui numa aprendizagem organizacional capaz de: • • Encarnar o princípio de comunhão, de solidariedade na organização do trabalho; Apreender competências para além da técnica, porque o empresário(a) e o trabalhador(a) aderem voluntariamente a um modo de gestão no qual o trabalho humano tem sentido para além de fonte financeira; Publicada em Outubro de 2004 Quadro A. Economia Clássica Economia de Comunhão Adam Smith fundador da economia política Chiara Lubich fundadora da economia de clássica. Um homem. comunhão. Uma mulher. Modo de produção capitalista Modo de produção de economia de comunhão A linha original de continuidade entre ética e economia é interrompida. A linha de originalidade entre ética e economia é incluída e mantida. O individualismo na base das relações econômicas. A solidariedade na base das relações econômicas. Cultura do ter. Cultura do dar. A racionalidade consiste na utilidade, na acumulação e em elevar ao máximo o lucro privado. A racionalidade consiste na doação e partilha do lucro e pressupõe a personalização do relacionamento e a felicidade humana. Homo Economicus, Homo Consumérico. Homo material, individualista, hedonista, egoísta. Homo doador. Solidário. Homo espiritual Oposição entre bem individual e bem social. Não oposição entre o bem individual e o bem social. O capital tem primazia em relação ao homem. O homem tem primazia em relação ao capital. A relacionalidade incorpora sempre o elemento de condicionalidade. A relacionalidade incorpora sempre o elemento de gratuidade. Prevalência da racionalidade instrumental. Racionalidade do Eu. Prevalência da racionalidade substantiva, da razoabilidade que segundo Aristóteles contém elementos de sabedoria. Racionalidade do Eu com Todos. Os indivíduos não estão ligados uns aos outros por nexos indivisíveis antes de iniciar a troca. Os indivíduos estão ligados uns aos outros por nexos indivisíveis antes de iniciar a troca. A cultura do ser para si. A cultura do ser com o outro. Apropriação privada do excedente. Apropriação do excedente privada e partilhada com dois atores beneficiários fora do processo produtivo. Foco na avaliação dos resultados econômicos de mercado. Foco nos atores sociais. Esquecimento da premissa antropológica. Afirmação da premissa antropológica. Empresa e sociedade Empresa na sociedade Isenção de valores religiosos Inclusão de valores religiosos • • Conceber o espaço organizacional como um lugar de encontro, de espiritualidade, aonde pessoas se auxiliam, mas através da ajuda mútua e do amor- recíproco, e, não apenas aprendendo juntas a manufatura dos produtos; Afirmar os valores greco-judaicocristãos como norteadores nas relações internas e externas da empresa; Pág. 29 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição • • • • • Construir relações fraternais entre empresário(a), trabalhador(a), fornecedor, cliente e concorrente, que geram a instituição de outros fins que não o simples êxito de ordem material; Destinar o lucro para a sustentabilidade dos sóciosproprietários, dos acionistas, dos trabalhadores, sobretudo para a cultura da partilha com os beneficiários(as) da economia de comunhão que não participam do processo produtivo: os necessitados; Pagar os impostos devidos ao Estado; Planejar um ritmo humanizado na execução das atividades produtivas, sobretudo no respeito ao ecossistema; Ter sensibilidade para produzir o bom, o belo, o útil e necessário; No encontro do Bureau Internacional de Economia e Trabalho, realizado em 1999, em Grottaferrata Roma, Itália, foi definido os princípios para a gestão de uma empresa da economia de comunhão, que podem ser aplicados a qualquer empresa, desde que os que a constroem sejam empreendedores com disposição voluntária para a lógica da comunhão (Boletim de Economia de Comunhão, 1997, n. 2, p. 7-8). São sete tópicos que compõem a carta de princípios. 1. Empresários, trabalhadores e empresa • • • • Formular estratégias, objetivos e planos econômicos considerando os critérios típicos de uma correta gestão. Investir com prudência e particular atenção na criação de novas atividades geradoras de empregos. Lembrar que, no centro da empresa, está a pessoa humana, e não o capital. Utilizar o talento dos funcionários do melhor modo possível, favorecendo a Publicada em Outubro de 2004 • • criatividade, a responsabilidade e a participação nas decisões. Adotar medidas para ajudar os funcionários que passam dificuldades. Administrar a empresa com a finalidade de produzir lucros. 2. Relacionamento com os clientes, com os fornecedores, com a sociedade civil e com terceiros: • • • Esforçar-se para oferecer bens e serviços úteis, de qualidade e a preços justos. Trabalhar com profissionalismo para construir e reforçar boas e sinceras relações com os clientes, os fornecedores e a comunidade. Estabelecer relacionamento leal com os concorrentes e observando a qualidade dos próprios produtos privando-se de ressaltar os defeitos dos produtos e serviços dos outros. 3. Ética: • • • • Promover, através do trabalho, o crescimento espiritual de todos os membros da empresa. Respeitar as leis e manter um comportamento eticamente correto perante as autoridades fiscais, os sindicatos e as organizações institucionais. Agir da mesma forma com os funcionários, dos quais a empresa espera semelhante comportamento. Esforçar-se não só para respeitar os próprios deveres contratuais, mas também para avaliar os reflexos objetivos da produção da empresa no bem-estar dos consumidores, no que se refere à qualidade de seus produtos e serviços. Pág. 30 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição 4. Qualidade de vida e de produção: • • • • • • • • Transformar a empresa numa verdadeira comunidade, o que constitui um dos principais objetivos dos empresários de EdC. Reunir-se periodicamente com diretores e gerentes para avaliar a qualidade dos relacionamentos. Empenhar-se para resolver situações difíceis, com a consciência de que esse esforço pode ter efeitos positivos nos membros da empresa, estimulando inovações e incrementando a maturidade e produtividade. Considerar a saúde e bem-estar de cada funcionário. Propiciar adequadas condições de trabalho – respeito às normas de segurança, ventilação, iluminação apropriada e outras. Evitar carga horária excedente, de modo que ninguém fique sobrecarregado. Construir relacionamentos de amizade no ambiente de trabalho, no qual deve reinar o respeito, a confiança e a estima recíproca. Produzir bens e serviços garantidos, tomar as devidas providências para não danificar o meio-ambiente e procurar economizar energia e reservas naturais, não só durante a produção, mas durante todo o ciclo de vida do produto. 5. Harmonia no local de trabalho: • • Adotar sistemas de gerência e estruturas organizacionais capazes de promover tanto o trabalho em grupo quanto o crescimento individual. Manter os locais de trabalho organizados, limpos e agradáveis, deixando o ambiente harmonioso. Publicada em Outubro de 2004 6. Formação e instrução: • • • • Favorecer a criação de uma atmosfera de ajuda recíproca, de respeito e de confiança. Colocar à disposição, livremente, os talentos, idéias e capacidades de cada um, em benefício do crescimento profissional de todos. Estabelecer critérios de seleção do pessoal e de programação de desenvolvimento profissional para os funcionários. Promover freqüentemente cursos de reciclagem e aprendizado. 7. Comunicação: • • • • Estabelecer uma comunicação aberta e sincera que favoreça o intercâmbio entre diretores e funcionários. Estender essa comunicação a todas as pessoas que contribuem com o desenvolvimento da EdC. Utilizar os meios mais modernos de comunicação, com a finalidade de desenvolver relacionamentos econômicos, úteis e produtivos. Alegrar-se com o sucesso e valorizar as dificuldades, as provações ou o insucesso dos outros, num espírito de colaboração e solidariedade. Cabe destacar que a carta de princípios ex ante não é um código de ética estático, é um experenciar, uma aprendizagem de comunhão de bens há sessenta anos na cultura do Movimento dos Focolares. Assim, o sentido de responsabilidade para os empreendedores da economia de comunhão é assumir as características de sacralidade, transcendência, de aproximação com o próximo, e de confiança na Providência nas circunstâncias de cada dia. A novidade parece estranha ao leitor ou a leitora? De qual lugar estão fazendo a leitura? Pág. 31 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição No Quadro B, pode-se apreciar características que diferenciam a economia de comunhão dos empreendimentos das economias capitalista e solidária. Publicada em Outubro de 2004 Quadro B. EdCs Capitalistas Solidárias Finalidade básica é maximizar o lucro considerando os meios para adquiri-los para depois partilhar com beneficiários da EdC, além dos acionistas as ESPRI S/A e dos proprietários (as) dos meios de produção e os trabalhadores (as). Finalidade básica é maximizar o lucro sem considerar os meios para depois ser apropriado pelos investidores, acionistas e aqueles proprietários dos meios de produção. Finalidade básica não é maximizar o lucro, mas a quantidade e a qualidade do trabalho. Numa rápida leitura no Acumulação do capital Distribuição das sobras Quadro B, seguindo as Partilha do capital financeiro financeiro formulações de Laville Autoridade e o controle pertence Autoridade e o controle Autoridade e o controle pertencem aos investidores, pertencem aos (2004, p.52) de que as aos empresários(as), ou aos trabalhadores(as) quando são aos acionistas. trabalhadores (as). finalidades de um cooperativas. HETEROGESTÃO AUTOGESTÃO empreendimento dependem HETEROGESTÃO/AUTOGESTÃ da configuração dos O entre trabalho e a posse Separação entre trabalho e a Não há separação entre direitos de propriedade, ou Separação dos meios de produção é mediada posse dos meios de trabalho e a posse dos produção é mediada pela meios de produção. seja, das partes envolvidas pela racionalidade capaz de comunhão. racionalidade instrumental. que detêm estes direitos Tem lucro que é apropriado pelo Tem lucro que é apropriado Não tem lucro porque uma vez que determinam empresário(a),pelos beneficiários pelo capitalista e pelos nenhuma parte de sua da EdC e pelos acionistas, ou investidores. receita é distribuída em seus objetivos, pode-se reserva quando de trata de proporção as cotas de capital perceber que ao contrário cooperativa. dos empreendimentos Poder de mando está concentrado Poder de mando está Poder de mando está nas mãos dos empresários (as) ou concentrado nas mãos dos concentrado nas mãos capitalistas algumas nas mãos dos cooperativados. capitalistas. dos trabalhadores (as). empresas não são Inserção de valores religiosos Isenção de valores Isenção de valores religiosos religiosos controladas por investidores, e sim por empreendedor para admitir que a partilha outros tipos de partes recebedoras, na dimensão econômica pode ser justa e conseqüentemente, seus objetivos se lucrativa. diferenciam da acumulação do capital, como sublinhou Benedetto Gui (2002). “Alter-economias” abrindo o campo do possível Estudo recente comprovou que existem organizações produtivas nas quais seus empreendedores estão em processo de aprendizagem de consolidação de valores como a comunhão, amor-recíproco e espiritualidade da unidade traduzindo nos processos organizacionais intensidades mais acentuadas de dádiva/afetividade na dimensão social. Outras em que há evidências mais acentuadas de poder/participação traduzindo valores de solidariedade, cooperação, participação, autonomia, comunicação, liberdade, da dimensão política; e no que se refere à organização da produção os valores cogestão, autogestão e heterogestão vai depender da configuração dos direitos da propriedade e da abertura do “Alter-economias”, segundo a interpretação de Laville, expressão decorrente de sua análise sobre a abordagem plural da economia esboçada por Mauss e Polanyi, retrata com primor a “hermenêutica da emergência” da economia de comunhão na liberdade. Nela, o trabalho da implantação dos seus princípios na gestão da produção é um meio de vida e um meio de dar vida à concepção de Chiara Lubich: dar vida à própria pessoa, dar vida aos companheiros de trabalho, dar vida aos que utilizarão os produtos fabricados. Numa aproximação Pág. 32 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição radical dar a própria vida aos outros, sacrificar-se. Amar. Embora haja polêmica sobre o preceito de amar ao próximo, é esta a base para a existência da economia de comunhão, nascida dentro do sistema capitalista. É uma inovação para o mundo do negócio, mas, não é nenhuma novidade em face às experiências das comunidades dos primeiros cristãos, dos anarquistas, e do socialismo utópico. O que há de comum entre essas experiências é que são evidências de que o conceito de responsabilidade precisa ser recambiado, do campo da ética especializada, de um dever que flutua livremente no ar, para o domínio da vida humana associada. Todavia, sabe-se que poucos compreendem que é preciso aprender a amar (FROMM, 1966) para a sustentabilidade dos vínculos interhumanos. Para tanto “trabalhar é preciso”. Amar, responsabilidade genuína só existe onde existe o responder verdadeiro (BUBER,1982, p.49). Responder a quê? Ao rosto do outro. Aos efeitos que nos acontece, que nos é dado ver, ouvir e sentir, gerado pela sociabilidade do individualismo e do auto-interesse exacerbado, apreendido também nas escolas e imposto pelo modelo econômico hegemônico como a única saída para a sobrevivência. Para tanto “trabalhar é preciso”. À economia que o discurso neoliberal constitui como modelo a ser globalizado, interpõem-se agentes e instituições impregnados de pressupostos herdados do incrustamento em um mundo econômico particular, de características, pretensamente universais, incrustada numa sociedade particular, enraizada em um sistema de crenças e valores e numa visão moral do mundo ligado a uma ordem social particular (BOURDIEU, 2001, Publicada em Outubro de 2004 p.29). Por isso, adversarius e inimicus céticos que vivem num mundo de espelhos, qualificam as iniciativas solidárias como absurdas, utópicas, irracionais, irreais e até imorais. O que diriam então duma engenharia de produção com características da economia de comunhão? Para tanto “trabalhar é preciso”. Obviamente, a economia de comunhão está na contramão do sistema econômico hegemônico, é inteligente, e, sobretudo é necessária porque a vida humana e Deus nela estão associados. Estranho? Não, para aqueles que “jamais foram modernos”. As empresas da economia de comunhão estão em processo de tradução (Callon,1989; Latour 1992; Bernoux, 1989) e aprendizagem organizacional por tentativas e erros, marchas e contramarchas, buscando limites, regulativos éticos em função de objetivos determinados, em relação aos efeitos que podem causar. Deste lugar, podem afirmar valores que são fundados não apenas em função de critérios instrumentais e de eficiência. Mas, comprometidos por um determinado empenho de valores como o justo, o bem e o belo. Para tanto “trabalhar é preciso”, pois necessita de engenheiros com E maiúsculo com condições de construírem um projeto civilizatório diferente deste em que nos encontramos palco de exclusão humana, violência, injustiça social e degradação do ecossistema. Ou será que o atual projeto civilizatório é bom? Pode-se tomar emprestado as afirmativas de Bartholo(2002) sobre ética para compreender as empresas de economia de comunhão. Empresas de economia de comunhão, não se define pelo êxito, pelo resultado, pelo sucesso, estão para além do utilitarismo do mercado. Não é apenas algo que funciona, não é um comprometimento com o operar de algo. É o Pág. 33 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição comprometimento com os valores desse operar. Para tanto “trabalhar é preciso”. É assim para os engenheiros que hoje se ocupam com a administração da produção coexistindo com os vínculos antecedentes da economia de comunhão. Também será para aqueles que venham a ocupar postos de trabalho numa dessas empresas. Estarão preparados? “Trabalhar é preciso”. Diferente da sociabilidade individualista, a sociabilidade amorosa - comunitária que deve estar presente nas empresas de EdC é aquela fruto da disposição das pessoas que a conduzem e que nelas trabalham com responsabilidade com o rosto do outro, iguais e desiguais, por meio de Benevolência, Paz e Caridade. Absurdo? Graça? A paciência histórica responderá? Ou será um novo trabalho de engenheirar a produção? Enfim, a economia de comunhão é uma economia emergente e necessária, todavia, por estar enraizada no âmbito micro do Movimento dos Focolares que a concentra e a redistribui é prematuro considerá-la universal ou como um novo modo de produção que substitua o capitalismo. Mas, pode dar a este um novo sentido, sobretudo, no que diz respeito a como são apropriados os lucros decorrentes da atividade produtiva “Trabalhar é preciso”. Referências Bibliograficas: BARTHOLO, Roberto Santos jr. Passagens. Rio de Janeiro, Garamond, 2002. BAUMAN, Zygmunt. Amor Líquido, sobre a fragilidade dos laços humanos. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor, 2004. Publicada em Outubro de 2004 BUBER, Martin. Do diálogo ao dialógico. São Paulo, Perspectiva, 1992 BOURDIEU, Pierre. Contrafogos 2. Rio de Janeiro, Zahar Editores, 2001. BRUNI, Luigino. Rumo a uma racionalidade capaz de comunhão. In.Economia de comunhão uma cultura econômica em várias dimensões. Vargem Grande paulista, Editora Cidade Nova, 2002. FROMM, Erich. A arte de Amar. Belo Horizonte, Editora Itatiaia, 1966. GONÇALVES, H.H.A.B. “Epa”! In: Anais do XIV Encontro Nacional dos Cursos de Graduação em AdministraçãoENANGRAD. Foz do Iguaçu, agosto de 2003. GUI, Benedetto. Organizações produtivas com finalidades ideais e realização da pessoas:relações interpessoais e horizontes de sentido. In. Economia de Comunhão uma cultura econômica em várias dimensões. Vargem Grande Paulista, Editora Cidade Nova, 2002. LAVILLE, Jean-Louis. Empresas sociais: rumo a uma abordagem teórica. In: A Nova Ordem Social, perspectiva da solidariedade contemporânea. Brasília, Editora Paralelo 15, 2004. LEVINÁS. Entre nós: ensaios sobre a alteridade. Petrópolis, Vozes, 1997. RAMOS, Alberto Guerreiro. A nova ciência das organizações. 2ed. Rio de Janeiro. Editora da Fundação Getúlio Vargas, 1989. SANTOS, Boaventura de Sousa. Produzir para viver, os caminhos da produção não capitalista. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 2002 Pág. 34 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição SIMONI, Miguel. Trabalhar é preciso. Reflexões sobre o conceito de trabalho humano e suas implicações para a engenharia de produção. Rio Grande do Sul, Editora SCHDS, 2004. Publicada em Outubro de 2004 WEIL, Pierre. A arte de viver em Paz. São Paulo, Editora Gente,1990. ---------------------------* Doutoranda em Engenharia de Produção, COPPE/UFRJ - [email protected] Pág. 35 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição Publicada em Outubro de 2004 Artigo Participação dos cooperados no processo de gestão das sociedades cooperativas Nemizio Antônio de Souza * RESUMO Diante de um mercado competitivo e excludente, as sociedades cooperativas destacam-se como alternativa aos problemas socioeconômicos, onde os cooperados representam o ponto central de um empreendimento coletivo que busca satisfazer as necessidades econômicas e sociais de seus cooperados. Diferencia-se das demais sociedades por ter suas bases sustentadas nos valores e princípios cooperativistas, com uma gestão democrática, devendo prevalecer a liberdade e a participação, num processo que propicie o desenvolvimento humano, sendo o grande desafio dos dirigentes conciliar o econômico e o social. Palavras-chave: cooperativas, quadro social, gestão, participação, econômico-social. ABSTRACT In face of a competitive and excluding market, the cooperative societies stand out as an alternative to the socioeconomic problems, in which the cooperates represent the central point of a collective enterprise that aims at satisfying the economic and social necessities of the cooperates. They differ from the other societies for having their bases supported on cooperative values and principles, with a democratic management. The liberty and participation must prevail in a process that affords the human development, being the biggest challenges of the managers to conciliate the economic and the social. Key words: Cooperatives, membership, Management, Participation, Social-economic issues Introdução De acordo com a Lei 5.764/71 “as cooperativas são sociedades de pessoas, com forma e natureza jurídica próprias, de natureza civil, não sujeitas a falência, constituídas para prestar serviços aos associados”. A sociedade cooperativa se fundamenta nos valores humanos e dignidade pessoal. É um instrumento que busca solução de problemas que, de maneira individual, apresentam dificuldades em serem resolvidos. Constitui, ainda, uma forma de viabilizar economicamente o cooperado, através da produção e prestação de Pág. 36 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição Publicada em Outubro de 2004 serviços, apoiado no desenvolvimento cultural e profissional de seus associados. formação e informação; intercooperação e interesse pela comunidade. Sendo a cooperativa uma sociedade que presta serviços a seus associados, é extremamente importante que estes compreendam o empreendimento do qual são donos. Portanto é importante que os negócios da cooperativa sejam conduzidos de forma transparente, oportunizando aos cooperados a definição e aprovação de estratégias que atendam os seus interesses e favoreçam na solidificação da cooperativa. A capacidade de gerar bons resultados garante a sobrevivência da empresa, além de propiciar retorno para os cooperados. Alguns autores criticam a forma de atuação das cooperativas com base na doutrina herdada dos pioneiros de Rochdale, como Laidlaw (1980), em seu estudo sobre as tendências de desenvolvimento do cooperativismo mundial, onde critica o cooperativismo rochdaleano afirmando que: “a visão rochdaleana tornou-se uma imagem confusa e longínqua de uma idade terminada, sem grande significação atual. Raros são aqueles que participam ainda da crença de que o mundo moderno possa ser reformado ou mudado por um sistema limitado de comércio varejista. Quase ninguém está verdadeiramente satisfeito com a maneira pela qual os princípios cooperativos são presentemente formulados”. No entanto, há de se levar em conta que os resultados de uma cooperativa estão condicionados à participação, fidelização, responsabilidade e profissionalismo de seus cooperados, pois são eles os legítimos donos da cooperativa. Aliado ao caráter social, este empreendimento deve apresentar capacidade competitiva num mercado globalizado. 1. Aplicação dos Princípios Cooperativistas Embora as sociedades cooperativas estejam inseridas num mercado capitalista, devendo atuar de forma competitiva, é importante ressaltar que o que realmente as diferencia das empresas capitalistas é a forma como deverão ser geridas, bem como o seu objetivo principal, que é traduzir, através dos seus valores e princípios a liberdade, a democracia, a solidariedade e o desenvolvimento das pessoas que compõem o seu quadro social. A gestão das sociedades cooperativas deverá estar norteada pelos princípios cooperativistas que são: adesão voluntária e livre; gestão democrática pelos membros; participação econômica dos membros; autonomia e independência; educação, Apesar dessa observação sobre a visão rochdaleana, as cooperativas são encaradas como soluções de vários problemas sociais, passam a ser a alternativa para várias pessoas que foram esquecidas pelo perverso modelo capitalista. Como afirma Thenório Filho (2002): “a doutrina cooperativista, na ideologia econômica, tem o capital como meio e o homem como fim, ao contrário do mercantilismo capitalista que coloca o homem a serviço do capital”. Dessa forma, podemos questionar algumas técnicas da moderna administração nas cooperativas, a fim de que possam ser competitivas e gerar melhores resultados. Do ponto de vista da lógica das empresas capitalistas, estas técnicas parecem perfeitas, pois atuando com boas estratégias e transformando as cooperativas em instrumentos de competitividade os resultados irão aparecer. Em alguns casos, devido à incapacidade técnica dos Pág. 37 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição dirigentes, são contratados administradores que têm toda experiência do mercado capitalista, mas nenhum conhecimento sobre a doutrina cooperativista. Mas será interessante adaptar as cooperativas a esse modelo capitalista, desprezando seus princípios e valores? Como ficam os cooperados? Exemplos nos revelam que as cooperativas que focaram apenas nos resultados, acabaram esquecendo do seu quadro social, passaram a tratar os seus cooperados como empregados ou estabeleceram uma relação de negócio que colocava dirigentes e cooperados de lados opostos da negociação. É bom lembrar, que implantar nas cooperativas o mesmo modelo de gestão que diariamente expurga milhares de profissionais de seus postos de trabalho, colocando-os a margem de um processo do qual não conseguimos mais avaliar o que é bom ou o que é ruim, o que é certo ou o que errado, foge ao propósito do movimento cooperativista. Pois o cooperativismo é justamente uma alternativa de desenvolvimento humano, sem exploração e exclusão social. O abandono dos propósitos sociais de uma cooperativa contribui para o aparecimento de conflitos, conforme estudos de SCHNEIDER (1999): “a) Conflitos com os associados: estes, não podendo compreender as razões da evolução de sua cooperativa, distanciavam-se dela, abdicando de sua condição de “donos” e passando a assumir com ela uma relação de “meros clientes”, diminuindo sua participação ou afastando-se totalmente, por não identificarem mais nela a “sua”organização. b) Conflitos de atribuições entre dirigentes eleitos e quadro executivoadministrativo, os últimos como Publicada em Outubro de 2004 especialistas e com elevada qualificação: - os dirigentes eleitos nem sempre tinham a mesma qualificação que os executivos, podendo então ser manipulados ou cooptados pelo quadro executivo-administrativo; - os dirigentes eleitos dispunham da mesma qualificação dos executivos, assumindo funções executivas, ou, quando sem funções executivas, interferiam na parte administrativa; - ou então, os dirigentes eleitos também exerciam funções administrativas, quando às vezes careciam de preparação técnica para administração. A conseqüência dos conflitos não superados foi que as cooperativas eram cada vez mais conduzidas pela tecnoburocracia, em busca de mais racionalidade e eficiência da “empresa”, como resposta necessária diante da concorrência.” A prática dos Princípios Cooperativistas dentro das cooperativas faz com que essa organização de pessoas tenha suas bases fundamentadas em seu quadro social. Afinal, é justamente o conjunto de seus cooperados que resultará no desenvolvimento e força nos negócios da cooperativa. Não existe cooperativa forte sem cooperados conscientes e participativos. São eles a mola mestra, o alicerce da organização cooperativa. Para isso, há de se trabalhar a educação cooperativista, que é um dos seus princípios, para que tenhamos cooperados que conheçam verdadeiramente o seu valor dentro do cooperativismo. É possível, então, praticar os Princípios Cooperativistas e ter eficiência empresarial, sendo a cooperativa uma associação de pessoas? Pág. 38 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição NAVES (1999) complementa esta indagação afirmando que se a “cooperação” passa a ser uma palavra importante nas atuais estratégias capitalistas, muitas cooperativas, ao mudarem seu estilo de gestão em busca de maior eficiência administrativa, assumem formas empresariais rígidas, centralizadoras, hierárquicas e tradicionais, muitas vezes, ultrapassadas e voltadas para o resultado econômico imediato, que não é o seu objetivo. A direção e o controle da sociedade acabam ficando, em muitos casos, nas mãos dos dirigentes e gerentes, bloqueando a participação de seus associados e centralizando as decisões a um pequeno grupo. As sociedades cooperativas que incorporam essas características caminham na contramão de seus princípios e objetivos sociais. Dessa forma, deixam de se caracterizar como uma autêntica cooperativa. Praticamente não se consegue mais distingui-las das sociedades não cooperativas. A cooperativa passa a ser uma entidade compromissada, unicamente, com o mercado e com os resultados financeiros que possam atender uma lógica capitalista, transformando seus associados em espectadores. As operações de mercado jamais deveriam ser fixadas como prioridade, em detrimento dos interesses dos associados. Quando acontece, há uma inversão dos objetivos da sociedade, substituindo os interesses e necessidades dos cooperados pela eficiência econômicofinanceira. Embora todos nós saibamos que as sociedades cooperativas atuam num mercado capitalista, logo, deverão dispor de ferramentas e estratégias para o alcance de seus resultados, há de se preocupar de não esquecer o seu lado social, uma vez que sociedades de economia social. Portanto, preservar os interesses dos cooperados, atuando de forma eficiente e transparente é o grande desafio para os Publicada em Outubro de 2004 dirigentes e gestores das cooperativas. Não podemos deixar que a mentalidade capitalista, enraizada em nossas experiências, seja uma viseira que nos impeça de enxergar um caminho novo, onde a cooperação seja o fio condutor para obter resultados coletivos, onde não haja tanta injustiça e exclusão social. 2. A participação dos cooperados no processo decisório A participação através do voto é um princípio que desde os inícios do cooperativismo de Rochdale está presente e é claramente explicitado nos estatutos das cooperativas. A participação pelo voto, que permite a escolha dos dirigentes da organização, expressa de fato quem é o dono efetivo da organização. Através da escolha dos dirigentes, que sempre devem prestar contas aos que os escolheram, os associados influem na definição dos objetivos e das políticas da organização. Porém, como em qualquer outra organização que se rege pelo princípio democrático, também sua prática pode ser manipulada, distorcida, escapando ao controle dos sócios. Entre outros, são indicadores de baixa participação em nível de voto: a apresentação sucessiva de chapa única para as eleições, elaborada exclusivamente pelos que estão na direção da cooperativa, a repetição alternada das mesmas pessoas nos cargos de direção durante anos seguidos, bem como a própria baixa freqüência dos sócios às assembléias gerais. A participação no processo de elaboração das decisões e no controle sobre a execução das mesmas passa a ser uma exigência cada vez maior por parte do quadro Social. Dessa forma é importante que os dirigentes estejam aptos a Pág. 39 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição proporcionar o processo de democratização nas cooperativas, propiciando a autogestão. Todavia, não podemos entender participação apenas pelas assembléias gerais, é extremamente importante que o associado tenha uma atuação mais ativa junto a sua cooperativa, conforme destaca Schneider: Como viabilizar a participação em ambas as etapas? Tem se verificado em épocas recentes, nos casos de cooperativas grandes e das estruturas integradas, que a escassa assembléia geral anual geralmente exigida por lei, embora necessária, não é mais uma forma suficiente de participação e de controle do quadro social (SCHNEIDER, 1999). Dessa forma, é necessário que as cooperativas criem novas formas de participação dos seus associados e, para isso, seus dirigentes devem ser estimuladores dessa participação. No entanto, os dirigentes devem estar preparados para trabalharem o processo de democratização dentro das cooperativas, que poderá ser feito através dos comitês educativos. A eficiência de uma cooperativa está amparada no seu capital humano e não pelo capital formado por dinheiro, máquinas e prédios. Sãos os cooperados os elementos mais importantes de todo o processo. Daí a importância dos dirigentes em estimular a participação e apoiar projetos que possam contribuir no desenvolvimento do quadro social. É preciso que se crie um ambiente que favoreça o desenvolvimento humano, que estimule o aprendizado e favoreça a formação de uma conscientização cooperativista. Publicada em Outubro de 2004 Sabemos que a construção de um ambiente que estimule a participação e o comprometimento não é tarefa fácil. Principalmente quando o quadro social cultua a velha relação de poder, trazida de organizações não cooperativas, onde prevaleciam estruturas hierárquicas verticalizadas e rígidas. No entanto esse é o grande desafio dos dirigentes das cooperativas. Suas atribuições vão além dos processos econômicos da organização, é preciso percorrer a seara da satisfação humana, é estar atento aos anseios de um quadro social que necessita mais do que resultados financeiros. Precisam encontrar dignidade no que fazem e mais ainda, compreender que o outro é importante e faz parte de sua realização. Outro aspecto desafiador para as lideranças cooperativas, é que as ações devem estar baseadas nos valores e nos princípios cooperativistas, a fim de que possa criar laços de afinidade entre todo o quadro social. O processo decisório de uma cooperativa implica muito mais do que atribuir essa tarefa aos dirigentes. Há de se considerar que existe interesse de vários donos em torno de cada decisão tomada. O fato dos cooperados serem donos do empreendimento exige que os mesmos participem do processo decisório. Considerando que os dirigentes das cooperativas são eleitos, atendendo um processo eleitoral que está explicito num estatuto social, deve-se levar em conta que suas atitudes devem estar pautadas sob os interesses e expectativas de todo o quadro social. Compreendendo que ele é representante dos cooperados nos negócios da cooperativa. Pág. 40 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição As sociedades cooperativas defrontam-se, portanto, com uma situação em que têm que conciliar sua atividade econômica empresarial com a concretização de formas mais participativas e controladoras da parte de seus cooperados. Esta é a contradição fundamental da ação cooperativa numa economia de mercado, expressa nos conflitos de um negócio coletivo. No entanto há de se lembrar que as cooperativas são sociedades de economia social que buscam ser uma resposta ao atual modelo econômico, uma alternativa para as contradições sócio-econômicas. Dessa forma, os dirigentes devem buscar sincronizar os interesses dos cooperados a um sistema de livre comércio, a fim de viabilizar a inserção econômica dos cooperados no mercado e a sua participação no processo de controle e decisão empresarial. A qualificação dos dirigentes é importantíssima, para que possam lidar com toda adversidade nos negócios e no quadro social. Observa-se freqüentemente que cooperados e cooperativa buscam o benefício próprio e imediato. O cooperado usa os benefícios oferecidos pela cooperativa, mas não estabelece com a empresa uma relação de exclusividade e fidelidade na sua atividade produtiva e na demanda por serviços, motivo da cooperação. Dessa forma, caso os dirigentes não estejam preparados para desenvolver estratégias que possam preservar o interesse da maioria, educando os imediatistas, acabarão por tentar satisfazer a vontade de um pequeno grupo em detrimento da coletividade, o que se qualifica como ingerência. Portanto, a autogestão é o caminho para se conquistar a libertação do controle do capital sobre o trabalho. Nessa forma de gestão, todos os associados têm iguais direitos e deveres junto aos processos Publicada em Outubro de 2004 administrativos adotados, bem como os resultados alcançados. Assim, todos constroem a organização, seus valores e compartilham sua própria gestão, comprometendo-se fortemente. Não devem existir hierarquias rígidas e verticalizadas, pois isto significa alienação e dominação. Há de se ousar em flexibilizar no processo de gestão, cortando as amarras de um modelo de poder e dominação que contraria a liberdade e o sonho. Há de se buscar uma nova proposta de gestão onde todas as decisões têm de ser tomadas pelo coletivo. Para isso, a formação dos comitês educativos tem papel importantíssimo, a fim de que todos os cooperados tenham acesso às informações necessárias, e igual responsabilidade para com a cooperativa. Considerações finais Apesar da influência dos valores tecnocráticos sobre o pensamento cooperativista e de todas as mudanças socioeconômicas atuais, o conceito de uma administração libertária da vida e da sociedade, pode ser utilizado conjuntamente a uma estratégia de gestão eficaz e rentável em uma empresa cooperativa. Mesmo sofrendo todas as pressões de um mercado capitalista, com predomínio da acumulação voraz de capital, deve prevalecer a autonomia e a autogestão, a fim de propiciar a resolução de problemas econômicos e técnicos, bem como morais e sociais. O sucesso do movimento cooperativista está condicionado às pessoas que o integram. Existem vantagens do agir coletivo a partir do cooperativismo, tendo em vista seus princípios norteadores que estimulam a democracia e o comprometimento pessoal uma vez que, ao aderir ao sistema cooperativo os associados tornam-se responsáveis diretos pelos processos decisórios da organização. Pág. 41 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição Por isso compreendemos como fundamental a identificação dos interesses e necessidades tanto individual quanto coletivamente. O desafio está em construir a idéia de bem comum numa sociedade que estimula a individualidade e o desejo de posse. Com isso podemos destacar que não se edifica facilmente um empreendimento cooperativo sem trabalhar a educação cooperativista. É inegável que as cooperativas também atuam num ambiente competitivo do mercado, tendo de alcançar retorno financeiro para distribuir a seus associados, sendo este seu objetivo principal. Por isso, mesmo neste tipo de empreendimento deve-se ter a preocupação com a eficiência, deve ser uma das metas a ser alcançada, para que se garanta o retorno econômico e a conseqüente estabilidade financeira da cooperativa. Por outro lado, não deve ser abandonado o seu caráter social, lembrando que a força do empreendimento reside justamente no seu quadro social. Esse é o grande desafio para os gestores das organizações cooperativas, uma vez que não basta repetir ou maquiar modelos administrativos aplicados em organizações não cooperativas. Dessa forma, a melhor maneira de autogerir uma empresa cooperativa é através de um funcionamento adequado e permanente dos organismos de base, comitês, núcleos, assembléias etc. Procurar estabelecer diferentes fóruns deliberativos em que todos os membros da organização tenham o direito de participar, elaborando, intervindo e deliberando. Assim, a empresa passa a desfrutar da possibilidade de ter quase todos os associados pensando e repensando continuamente os rumos, os processos organizacionais e sociais do empreendimento. Publicada em Outubro de 2004 sociedade de caráter social, que se difere das outras empresas não cooperativas. Temos de olhar a cooperativa como uma ponte que liga o sonho à realização, onde as expectativas das pessoas comuns possam vir a ser o alicerce de várias conquistas. Contudo, precisamos praticar mais o cooperativismo. Precisamos trabalhar o coletivo e deixar bem claro, para todos aqueles que participam do movimento cooperativista, que o ser humano é muito mais importante do que o capital. Referências Bibliográficas: _________ . III Encontro de investigadores Latino-americanos de Cooperativismo. UNISINOS, 2004. BENATO, João Vitorino. O ABC do cooperativismo. São Paulo: ICA, 1994. __________ . Constituição da República Federativa do Brasil, 1988. CARNEIRO, Palmyos Paixão, Cooperativismo: o princípio cooperativo e a força existencial-social do trabalho. Belo Horizonte: FUNDEC, 1981. CRÚZIO, Helmon de Oliveira. Como organizar e administrar uma cooperativa: uma alternativa para o desemprego. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2001. FIGUEIREDO, Ronise de Magalhães. Dicionário Prático de Cooperativismo. Belo Horizonte: Mandamentos, 2000. FURQUIM, Maria Célia de Araújo. A Cooperativa como Alternativa de Trabalho. São Paulo: LTr, 2001. Por isso, praticar os valores e princípios cooperativistas faz com que tenhamos uma Pág. 42 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição HARTUNG, Alcyr Peters. O cooperativismo: ao alcance de todos. Florianópolis: OCESC, 1996. HOLYOAKE, George Jacob. Os 28 tecelões de Rochdale. Porto Alegre: WS Editor, 2000. LAIDLAW, J. As cooperativas no ano 2.000.Belo Horizonte: OCEMG, 1980. _________ . Legislação Cooperativista – Lei n. 5.764 de 16 de Dezembro de 1971. MAURER JR., Theodoro Henrique. O cooperativismo uma economia humana. São Paulo, Fundo de Fomento e Programa do Cooperativismo, 1966. NASCIMENTO, Fernando Rios do. Cooperativismo como alternativa de mudanças - uma abordagem normativa. Rio de Janeiro: Forense, 2000. NAVES, Flávia L.. Prática de gestão em organizações capitalistas e cooperativistas: similaridades e centralizações. Perspectiva Econômica, São Leopoldo, v 34, n. 105, p. 67-80, 1999. (Série Cooperativismo, 45) OCB – Organização das Cooperativas Brasileira – www.ocb.org.br OLIVEIRA, Djalma de Pinho Rebouças de. Manual de gestão das cooperativas: uma abordagem prática. São Paulo: Atlas, 2001. Publicada em Outubro de 2004 PADILHA, Draúzio Leme. Sociedades Cooperativas. São Paulo: Atlas, 1996. RICCIARDI, Luiz Pedro P. e LEMOS, Roberto Jenkins. A necessidade da conscientização dos cooperados. Espírito Santo: OCES, 1997. SCHNEIDER, José Odelso. Democracia, participação e autonomia cooperativa. São Leopoldo: UNISINOS, 1999. SILVA FILHO, Cícero Vírgulino da. Cooperativas de Trabalho. São Paulo: Atlas, 2001. THENÓRIO FILHO, Luiz Dias. Pelos caminhos do cooperativismo: com destino ao crédito mútuo. São Paulo: Central das Cooperativas de Crédito do Estado de São Paulo, 2002. VALADARES, José Horta (org.). Coletânea de textos – encontro de docentes do curso de pós-graduação em Gestão do Cooperativismo. Belo Horizonte, IDECOOP, 2002. _____________________ * Especialista em Gestão de Cooperativismo e em Gestão de Iniciativas Sociais. Professor no MBA Gestão de Cooperativismo e Coordenador Adjunto do Núcleo de Estudos do Cooperativismo e Associativismo da Fundação Pedro Leopoldo, Consultor do SEBRAE-MG e da OCEMG/ SESCOOP-MG.- [email protected] Pág. 43 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição Publicada em Outubro de 2004 Artigo Empreendedor coletivo e economia social: Outra forma de empreender * Benoît Lévesque ** RESUMO Verificamos o estabelecimento de empreendimentos coletivos de economia social que tentam responder a urgências devidas a grandes transformações sócio-econômicas e à incapacidade dos setores público e privado de responder a elas. Outras iniciativas resultam também de aspirações e novos valores relativos à organização do trabalho e a modos de vida. Em comparação com os empreendimentos privados, os empreendimentos coletivos são em geral mais complexos e têm características específicas que demandam uma atenção especial pelos que se interessam em buscar formas adequadas de apoiá-los. Palavras-chave: empreendedorismo, economia social, economia solidária ABSTRACT We witness the establishment of collective enterprises of social economy aimed at meeting urgent needs caused by wide socio-economic transformations and to the incapacity of the private and public sectors to deal with those needs. There are also other initiatives which result of aspirations for new forms of work organization and for new ways of life. Compared to the private enterprises, the collective endeavors are in general more complex and have very specific characteristics. This makes it necessary to pay close attention to their needs, especially by those who are interested in providing adequate forms of supporting them. Key words: entrepreneurship, social economy, solidary economy Introdução A ciência econômica, em particular a micro-economia, põe o empreendedor individual no centro da produção da riqueza enquanto a casa é o seu equivalente no plano do consumo. Se o empreendedor individual representava no século XIX a base da economia capitalista, isso já era bem menos verdadeiro no fim desse século, com a emergência dos monopólios, e menos ainda no século XX, com as tecnoestruturas dirigindo a produção em massa nas grandes corporações, como mostrou o economista americano de origem canadense Galbraith (1968). Ainda que esse foco no empreendedor individual possa ser questionado de várias maneiras, ele tem de qualquer forma favorecido uma reflexão em profundidade sobre a natureza e o papel do empreendedor na economia. Em contrapartida, o empreendedorismo coletivo que encontramos nas iniciativas da economia social ainda não recebeu uma sistematização comparável. Pág. 44 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição Dispomos de um certo número de teorias sobre empreendimentos cooperativos e sociais (Craig, 1993, Desroche; 1976, Fauquet, 1965; Pichette, 1971 e 1972; Vienney, 1980 e 1994), que propiciam elementos para caracterizar o empreendedor coletivo, mas a questão do empreendedorismo só costuma ser examinada indiretamente. A história das iniciativas da economia social permite identificar também nesse domínio verdadeiros empreendedores, mas a atenção se orienta em geral mais para o movimento ou para a associação que para a função do empreendedor coletivo (MacPherson, 1979; Cole, 1944). Os empreendedores sociais e o empreendedorismo coletivo vêm sendo postos em questão há no máximo dez anos. Em suma, os conhecimentos sobre o empreendorismo coletivo não têm sido sistematizados por pesquisas que o tivessem definido como prioridade. A renovação dessa forma de empreendedorismo torna essa tarefa mais e mais urgente. Dito isso, nossa contribuição constitui apenas um convite a um engajamento urgente nesse caminho, ao propor algumas indicações para a reflexão. Antes de entrar no tema propriamente dito, começarei por um testemunho que permita ver como a situação do empreendedorismo coletivo evoluiu rapidamente no curso dos últimos anos e sugerirei em seguida uma constatação que deixe perceber a especificidade do Quebec nesse assunto. Em 1979, quando era professor na Universidade do Quebec em Rimourski, organizei um colóquio internacional no âmbito da Universidade cooperativa internacional, presidida então por Henri Desroche, famoso sociólogo francês, já falecido, que relançou a idéia de economia social na França na metade dos anos 1970. Esse colóquio visava a tratar de experiências de animação social, desde o Publicada em Outubro de 2004 período do BAEQ (Bureau d’aménagement de l’Est du Québec) àquilo que podíamos então observar no campo nas pegadas das Operações Dignité, da Sociedade de exploração de recursos em comum do Vale de Matapédia, a serraria comunitária da vila do Espírito Santo, o JAL (iniciativas das vilas de St-Juste, Auclair e Lejeune), o Teatro dos oprimidos e a Reunião dos organismos culturais de Rimourski. Como temática para o programa e para a publicação de anais desse colóquio, eu propus: Animação social e empreendimentos comunitários e cooperativos (Lévesque, 1979). Hoje, posso lhes dizer que isso não ocorreria. O termo empreendimento coletivo não teria suscitado forte reação, mas o de empreendimento comunitário teria feito reagir boa parte dos militantes comunitários como “o diabo diante da cruz!”. Se a temática proposta por este evento “o empreendedorismo na economia social” parece se impor naturalmente, é necessário admitir que a reflexão está em atraso em relação à prática. Isso me leva à constatação que também desejo partilhar. No Quebec temos a Fundação para o Empreendedorismo1, que realiza há um bom tempo um excelente trabalho de promoção e de apoio do empreendedorismo. Não desejo que minha constatação seja entendida como uma crítica a essa Fundação, pois, para mim, se ela não existisse, seria necessário inventála. Além dos mais, há alguns anos ela encoraja igualmente o empreendedor coletivo e faz esforços louváveis para promovê-lo (Conselho da Cooperação do Quebec, 1999). No entanto, o que se pode notar é que os principais parceiros que mantêm essa Fundação, dedicada principalmente ao empreendedorismo privado, são majoritariamente empreendimentos públicos e coletivos, 1 http://www.entrepreneurship.qc.ca/fr/accueil/default.asp Pág. 45 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição como Hydro-Quebec, Movimento Desjardins, o Fundo de solidariedade dos trabalhadores etc. A única conclusão é que no Quebec o empreendedorismo coletivo é essencial e que temos a tendência espontânea de esquecê-lo e, sobretudo, de não enxergá-lo. O empreendedorismo coletivo está presente em numerosas iniciativas emergentes, mas também em algumas grandes empresas do Quebec, principalmente no mundo financeiro e o dos recursos naturais (agricultura, energia e florestas). Dessa perspectiva, o Quebec se caracteriza por uma economia plural em que os principais pilares são sem dúvida as iniciativas privadas, mas também as iniciativas públicas e da economia social. Para os pesquisadores, como para os envolvidos com a intervenção, interessados em inovações e experimentos, o Quebec representa uma espécie de laboratório. Jaroslav Vanek, conhecido economista americano, reconhecia isso ao dizer que o Quebec era “o paraíso das iniciativas coletivas”. Em minha exposição, me fixarei principalmente nas iniciativas coletivas emergentes. Na primeira parte, me esforçarei por caracterizar em grandes traços as iniciativas da economia social. No segundo momento, tentarei mostrar como o empreendedorismo coletivo se distingue substancialmente do empreendedorismo capitalista, ainda que partilhe formalmente a maior parte das características gerais. As diferenças são, não obstante, potencialmente plenas de conseqüências para a manutenção e o desenvolvimento de iniciativas de economia social. 1. Economia social: iniciativas para responder a necessidades e a aspirações Publicada em Outubro de 2004 A economia social é a parte da economia que reconhece explicitamente a dimensão social, primeiro, pelos valores que lhe correspondem, mas, sobretudo, pelas regras darem prioridade às pessoas mais que aos capitais, no que diz respeito às decisões (o poder) e aos resultados (organismos sem fins lucrativos, cooperativas, mutualidades, convenções de acionistas). Diversamente das iniciativas capitalistas, para as quais o poder e os lucros pertencem exclusivamente aos acionistas, as iniciativas da economia social se baseiam na associação de pessoas e na capacidade de mobilizar uma grande diversidade de recursos, originados desde a filantropia à redistribuição do Estado, passando em muitos casos pelo mercado. Desse ponto de vista, as iniciativas de economia social permitem realizar em grupos ou coletivamente o que não se pode fazer isoladamente. Esse grande potencial para responder a necessidades novas a partir de uma grande diversidade de recursos significa que o empreendimento da economia social é mais complexo e mais “rico” que o tradicional, o que não deixa de ter conseqüências para as condições de desenvolvimento desse tipo de iniciativa. De mais a mais, cada uma das gerações de empresas de economia social apresenta certas especificidades que nos parece importante levar em consideração. 1.1 Quatro tipos de iniciativas2 No contexto atual, pode-se identificar quatro grandes tipos de iniciativas no âmbito da economia social emergente. Esses quatro tipos de iniciativas resultam da combinação de duas séries de dimensões: 2 Esta seção sobre os quatro tipos de iniciativas do âmbito da economia social retoma no geral algo apresentado anteriormente em outro artigo. Ver Benoît Lévesque (2001). Pág. 46 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição 1. as razões que dão sentido ao projeto da iniciativa; 2. a predominância de formas de atividade desenvolvidas (ex: forma mercantil ou forma não mercantil). As razões que inspiram a maioria dos novos projetos de economia social extraem uma boa parte de seu significado do contexto de “grande transformação” que é o nosso, seja aquele de questionamento do modelo de desenvolvimento estabelecido no período após a segunda guerra mundial, seja o das propostas ditas neoliberais, que dizem respeito à abertura das fronteiras, à liberalização e a reestruturação da economia, sem esquecer a financeirização e a concorrência exacerbada (Orléan, 1999; Cohen, 2001). Essas transformações provocaram o crescimento das desigualdades entre sociedades do Norte e do Sul, assim como no seio de todas as sociedades, inclusive as do Norte. Mais precisamente, observa-se um crescimento do desemprego, uma nova pobreza, exclusão social e geográfica, redução dos serviços coletivos e um conjunto de danos que constituem tantas situações de urgência (Boyer, 1997; Gélinas, 2000). Em suma, um novo contexto de necessidade dando lugar a uma multiplicidade de iniciativas da parte da sociedade civil já que nem o Estado nem as empresas oferecem soluções a essas novas necessidades, pelo menos em médio prazo. Entre as iniciativas que buscam responder a essas situações de urgência podemos mencionar como exemplos os centros de acolhida, os abrigos, os bancos de alimentos, os restaurantes populares, as lojas de roupas usadas, os círculos de empréstimos, as iniciativas de inclusão social etc. A nova economia social de hoje, como a do passado, não se limita a responder a situações de urgência. De fato, como as associações que lhes dão origem (aí Publicada em Outubro de 2004 incluídas as de situação de urgência) são mantidas por novos movimentos sociais (ex: movimentos feministas, ecologistas, culturais, regionalistas), as experiências e as iniciativas são alimentadas também por aspirações por uma outra sociedade ou ainda por viver e trabalhar de outra forma. Desse ângulo, o novo contexto oferece igualmente oportunidades para repensar o desenvolvimento a partir de iniciativas em geral locais. Esse contexto não deixa de ser percebido pelos promotores da nova economia social, motivados principalmente pelo desejo por mais democracia, por uma sociedade que reconheça o lugar das mulheres, por uma sociedade mais igualitária, por um desenvolvimento sustentável etc. Como exemplos de iniciativas aparentemente inspiradas por aspirações desse gênero, destaquemos as experiências no domínio da educação e da saúde alternativas, o comércio justo, as iniciativas de reciclagem e de reutilização (como alguns brechós...), ou, ainda, uma agricultura biológica, o turismo social e alternativo, as empresas de auto-gestão, a poupança e o investimento solidários etc. A economia social e solidária, que emerge sob o impulso da necessidade ou de aspirações como as expostas acima, pertence ao domínio da economia plural, na medida em que tem êxito em mobilizar recursos oriundos do mercado, de uma redistribuição alimentada pelo Estado, da reciprocidade, ou mesmo de doação por parte de indivíduos ou coletividades do âmbito da sociedade civil (formas mercantis, não mercantis e formas nãomonetárias) (Laville, 1992). Mas, como indica a tabela 1, a forma dominante das atividades pode ser algumas vezes mercantil, outras vezes, não mercantil. Desse ponto de vista, as iniciativas da economia social e solidária podem se inscrever principalmente: Pág. 47 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição a) no desenvolvimento social, como resposta à crise do Estado-previdência (ou sua ausência, nos países do Sul); b) no desenvolvimento econômico, como solução à crise de empregos ou mesmo de trabalho (Comeau et alii, 2001). Essas diferenças devem ser levadas em conta, pois, do ponto de vista do empreendedorismo e da democracia, os desafios variam segundo a forma dominante das atividades: a) no caso do desenvolvimento social com predominância não mercantil, a autonomia pode ser ameaçada pelo controle estatal ou pelo risco de insensibilidade; b) no caso do desenvolvimento econômico com predominância mercantil, o risco é a invasão do mercado, havendo ainda o risco de ocorrer sub-contratação. Mas, em todos os casos, as iniciativas devem apostar numa economia plural segundo dosagens variáveis entre o mercantil, o não mercantil e o não monetário. Segundo as etapas de desenvolvimento das organizações e das iniciativas, a parcela das diversas contribuições poderá variar igualmente em grau considerável. Essa distinção de quatro tipos de organizações da economia social não deve ser rígida ou utilizada para hierarquizar as iniciativas e experiências, pois 1. por um lado, as situações podem evoluir, ainda mais que existem experiências híbridas em que necessidades e aspirações encontramse intimamente ligadas; 2. por outro lado, o desenvolvimento econômico e o social são cada vez menos realidades separadas na Publicada em Outubro de 2004 perspectiva do desenvolvimento local (Levésque, 2001) Além disso, essa distinção de quatro tipos de organizações da economia social permite destacar o lugar e o papel distintos que uma sociedade pode atribuir à economia social (Vaillancourt e Laville, 1998; Lévesque e Mendell, 1999). 2. O empreendedor coletivo e social, um empreendedor como os outros? Um exame da teoria econômica clássica do empreendedor capitalista permite ver com clareza que o empreendedor coletivo não se distingue formalmente do empreendedor capitalista mas se diferencia dele substantivamente. Como o empreendedor capitalista, o empreendedor coletivo tem que correr riscos calculados, inovar e dispor de um projeto de empreendimento (do ponto de vista formal), mas dele se distingue pela natureza dos riscos, dos meios de que dispõe e do projeto de empreendimento que o anima (do ponto de vista substantivo). 2.1 O empreendedor capitalista Quando falamos de empreendimento, pensamos em sobretudo no empreendimento capitalista. Devemos reconhecer de imediato que a noção de empreendimento é recente, pois o sentido que lhe damos hoje só apareceu no século XVIII (Vérin, 1982). As palavras “empreendimento e empreendedor” já existiam antes, mas tinham outros significados, alguns dos quais se relacionavam à aventura e ao risco, como os cavaleiros ou, ainda, as conquistas. Três contribuições teóricas sobre o empreendedor parecem-me de particular interesse, pois serão retomadas posteriormente: Pág. 48 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição • • A primeira, elaborada no século XVIII pelo economista Richard Cantillon, definia o empreendedor capitalista como um homem racional capaz de enfrentar o desafio do risco, e em particular o da economia de mercado. As outras duas, elaboradas no século XX por Max Weber e Joseph A. Schumpeter, afirmam entre outras coisas que o empreendedor capitalista é um homem mais ou menos racional cujas ações não derivam apenas da lógica da racionalidade formal ou instrumental, mas também de valores e crenças (e, portanto, de um mundo irracional). Desse ponto de vista, os elementos determinantes não serão nem a racionalidade nem o risco, mas os valores e a inovação. No Ensaio sobre a natureza do comércio em geral (1735), Richard Cantillon mostra bem como o empreendedor pertence à classe “dos que vivem na incerteza, ou seja, que devem o tempo todo refletir, usar a razão”. Para esse economista francês, “o empreendedor é o homem racional por excelência, porque ele opera numa sociedade mercantil em que tudo se regula pela concorrência do mercado, em que se deve saber avaliar o provável, em que só se pode decidir após ter deliberado, julgado. O empreendedor, um homem que se encontra então, a exemplo do filósofo, como que obrigado de ele mesmo se conduzir.” (Vérin, 1982). Em resumo, já que o mercado só avisa posteriormente sobre a pertinência ou utilidade da produção realizada, o empreendedor deve ser racional para calcular os riscos. Desse ponto de vista, o empreendedor individual contrasta com as associações de produtores (ex: corporações de ofícios), pois essas últimas, por se limitarem ao mercado local e à proximidade, não correm Publicada em Outubro de 2004 riscos. Mantendo-se nas relações de proximidade, os “empreendedores associados” podem com facilidade fixar sua produção à demanda local, limitando, por outro lado, as possibilidades de crescimento de seus empreendimentos. Em vários países, a escalada dos empreendedores capitalistas foi acompanhada da proibição de manter-se associações outras que não fossem as de auxílio mútuo. Em busca do lucro individual, o empreendedor subverte a ordem estabelecida, com destaque para a do antigo regime a que estava submetida a ordem mercantil. Sem contestar por completo a parcela de cálculo e de racionalidade que se supõe no empreendedor capitalista, Max Weber mostra que o empreendedor capitalista está longe de ser racional. Na medida em que seu empreendimento se baseia numa acumulação de excedentes acima de suas próprias necessidades e na medida em que igualmente se recusa a gozar a vida para se dedicar de corpo e alma a esse projeto, o empreendedor do capitalismo nascente obedecia a uma lógica cujo sentido era dado por crenças religiosas (e, portanto, por uma forma de irracionalidade): “ele não tira nada de sua riqueza para si mesmo, para além do sentimento irracional de haver realizado bem sua labuta” (Weber, 1964: 73). Além do mais, como seu comportamento é inovador em relação à tradição, o empreendedor dessa época “enfrentou com freqüência o desprezo, talvez o ódio e, sobretudo, a indignação moral” (ibid: 71). Ainda que não argumente nos mesmos termos que Weber (e, portanto, usando sua referência explícita às crenças religiosas), Schumpeter mostra igualmente que o empreendedor não é um ser puramente utilitarista e racional. Para o economista de origem austro-húngara: Pág. 49 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição 1. O empreendedor é um líder que busca ir além das limitações usuais. Caracteriza-se, pois, por sua capacidade de conceber o novo, de apreender o essencial, de agir rapidamente e de compreender por intuição. Deve ser capaz de ir além das críticas que necessariamente recebe o que é novo e inovador. As pessoas em torno dele o vêem como um desviante e, mesmo, como ameaçador. Ele ocupa portanto uma posição precária na sociedade. Ainda que partilhe algumas características com os líderes do passado (religiosos ou militares), é menos heróico, pois faz parte de uma civilização racional e materialista. Desse ponto de vista, a psicologia do empreendedor se constitui de uma mistura de elementos racionais e emocionais. De um lado, estão os elementos racionais, como a previsão e a inserção num ambiente racional em que encontramos o dinheiro, a ciência, o direito etc. De outro lado, os elementos irracionais, como a emoção e a paixão que suscita o sonho de estabelecer uma dinastia, uma grande família, um império. Desse ponto de vista, o empreendedor é desviante em relação a uma cultura que define a racionalidade de um ponto de vista estreito e limitado ao curto prazo. 2. De forma positiva, o empreendedor se caracteriza principalmente pela inovação. Ele não é um inventor, mas um indivíduo capaz de introduzir a invenção na indústria e, assim, produzir inovação, seja a fabricação de um novo bem, a introdução de um método de produção (procedimento), a abertura de um novo negócio (entrar num mercado onde antes não estava presente), a conquista de uma nova fonte de matéria-prima ou de produtos semi-acabados, o estabelecimento de uma nova organização (ex: novos métodos de gestão) (Schumpeter, Publicada em Outubro de 2004 1939). Essa nova dimensão do empreendedor permite distingui-lo com clareza da função de gerente: o primeiro inova, enquanto o segundo gere sem necessariamente inovar. Em seguida, compreendemos que a função empreendedora é uma função que se exerce em momentos bem precisos, pois a inovação tem mais chance de se produzir no momento da criação de um empreendimento ou, ainda, no início de uma fase de expansão, do que numa fase de crescimento regular. Dito de outra forma, ninguém pode ser empreendedor a vida inteira e em todas as suas decisões. 3. Outro elemento que Schumpeter aporta à teoria do empreendedor é o fato de que as inovações ocorrem usualmente em grupos. A um período de crise sucede um período de expansão em que as inovações se generalizam e se difundem. Em conseqüência, haveria períodos mais propícios que outros para inovar e se tornar empreendedor, períodos em que existem mais oportunidades que outros. Nessa perspectiva, pode-se formular a hipótese de que entramos num período mais favorável à inovação, tendo como corolário a turbulência característica dos momentos de transformação social. Por fim, uma melhor compreensão do empreendimento e das organizações levou alguns economistas a propor uma visão do empreendedor que foca menos a personalidade do empreendedor que os mecanismos que tornam possível seu projeto. Ao definir a ação de empreender como a de mobilizar meios e pessoas “a fim de constituir uma estrutura de produção, ou fazer evoluir uma estrutura, por meio da inovação”, Gómez chega à conclusão de que a ação de empreender consiste “em convencer os atores necessários à realização de um objetivo comum” (Gómez, 1996: 224). Ao fazer Pág. 50 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição isso, o fato de empreender pode ser internalizado no próprio empreendimento. Ao mesmo tempo, “se o empreendedor tem êxito, é porque contribuiu para constituir (ou modificar) um sistema de informação com o objetivo comum da eficiência, que se revela mais coerente que o sistema alternativo” (Ibidem: 228). Continuando, o empreendedor pode ser definido como “um artesão do sistema de convencimento”, ou, ainda, como alguém que tem êxito criar sentido a partir de um projeto. Desse ponto de vista, a natureza da iniciativa e da organização deve ser levada em consideração. As quatro contribuições teóricas que acabamos de examinar nos permitem fixar um certo número de dimensões que caracterizam a função de empreendedor: em primeiro lugar, a do risco calculado e, portanto, da racionalidade que ela supõe (Cantillon); em segundo lugar, a da paixão que suscita o projeto do empreendimento (Weber e Schumpeter); em terceiro lugar, a da inovação, que permite diferenciar o empreendedor do administrador (Schumpeter); em quarto, a capacidade de convencer e de criar sentido a partir de um projeto (Gómez). Ainda que essas dimensões possam estar presentes tanto no indivíduo como numa coletividade, permanece igualmente que não existiria “perfil de personalidade bem definido” para identificar o empreendedor (Fillion, 1996: 217). Como lembra o título do livro de Patrícia Pitcher, o dirigente de um empreendimento, seja empreendedor ou administrador, pode corresponder a configurações tão diversas como as de artista, artesão ou tecnocrata (Pitcher, 1997). Em períodos de turbulência ou de crise, a figura do tecnocrata parece a menos apropriada e conseqüentemente menos valorizada que as demais. 3 3 Como bem demonstraram Luc Bernier e JeanPierre Fortin, pode-se encontrar verdadeiros empreendedores nas iniciativas públicas. Ver Luc Publicada em Outubro de 2004 2.2 O empreendedor social De alguns anos para cá, o termo empreendedor social é cada vez mais usado num sentido que não necessariamente coincide com o de empreendedor coletivo, na medida em que o empreendedor social pode ser um empreendedor individual atento aos interesses coletivos sem estar juridicamente submetido a uma organização associativa (organismos sem fins lucrativos, cooperativas, convenções de acionistas), como é o caso do empreendedor coletivo. Seja com for, o empreendedor social, como o empreendedor coletivo, apóia em geral uma iniciativa fortemente enraizada na coletividade local ou numa organização comunitária. Mesmo que a organização não seja uma empresa no sentido jurídico e mesmo que não pratique a distribuição de lucros, como é o caso de uma OBNL, sempre há a produção de um bem ou de um serviço e, portanto, a mobilização de recursos materiais e humanos (Lorendahl, 1997). Por outro lado, essas organizações podem distribuir excedentes de forma indireta, ao melhorar serviços ou as condições de trabalho ou, ainda, reduzindo os custos de inscrição. Como essas organizações se multiplicaram em todos os países no curso dos últimos anos, devemos formular a hipótese da emergência de uma nova classe de empreendedor que não saberíamos denominar senão como empreendedor social. Num relatório sobre o empreendedor social, os britânicos Stephen Thake e Simom Zadek definem esse conceito e mostram sua pertinência. De um lado, Bernier e Jean-Pierre Fortin, “Le entrepreneurship public dans las societés d’État au Québec”, in Reveu Organisation. Réflexion et action sur la gestion de las organizations, vol 6, n. 1 (Hiver 1997), pp. 13-24. Pág. 51 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição dizem eles, “os indivíduos que trabalham pela melhoria social das comunidades encontram com freqüência soluções inovadoras para os problemas que enfrentam as comunidades”, de outro lado, partilham “diversas características com os empreendedores comerciais” (Thake e Zadek, 1996). Os empreendedores sociais têm o mesmo desejo de pesquisar oportunidades que os empreendedores capitalistas, a mesma preocupação com a inovação, a mesma capacidade de mobilizar recursos para transformar um sonho em realidade. Por outro lado, se distinguiriam claramente por seu interesse pela justiça social. Além disso, combinariam habitualmente três conjuntos de aptidões que são com freqüência independentes: • • • ativismo militante com competências profissionais; capacidade de ser visionário sendo ao mesmo tempo pragmático; um sentimento ético (convicção) com uma confiança tática (senso de responsabilidade). Diante de fábricas desativadas, diante de recursos sem uso, diante de pessoas desempregadas, eles vêem oportunidades que os outros não enxergam. Em compensação, o relatório britânico conclui que os poderes públicos e certos atores sociais não vêem com clareza a contribuição social e econômica que propiciam esses empreendedores, embora suas intervenções possam ser determinantes numa sociedade ameaçada de ruptura (Lipietz, 1996). Por outro lado, mais que o empreendedor tradicional, o empreendedor social necessita apoiado, por sua proveniência de meios em que existem barreiras significativas para ter acesso a capitais e a redes de negócios (cf. a pesquisa de D. Côté que mostra que os empreendedores cooperativos oriundos de Publicada em Outubro de 2004 meios modestos e as mulheres estão mais presentes nas OBNL que em outras formas de iniciativas da economia social). Em conseqüência, os empreendedores sociais carecem de reconhecimento tanto nos meios de que são oriundos quanto nos meios em que devem buscar apoio financeiro e orientação. O empreendedor social não se insere nem na busca exclusiva do lucro (não há excedentes a distribuir) nem na racionalidade instrumental, apenas. Em compensação, é um líder que mobiliza recursos a partir de uma visão e de um projeto. Desse ponto de vista, é um visionário e um inovador capaz de transformar ameaças em oportunidades, problemas sociais em soluções, lançando mão da forma empreendimento. Resumindo, qualquer um que seja capaz de refazer um mundo novo a partir de um mundo que se desfaz. Dessa forma, o empreendedor social estabelecerá uma organização (organismo sem fins lucrativos) ou uma empresa que responderá a necessidades coletivas não satisfeitas nem pela empresa capitalista nem pelo Estado, ou, ainda, satisfeitas de forma imperfeita por um ou por outro. Ao fazer isso, o empreendedor social consegue transformar necessidades individuais em necessidades coletivas, uma demanda sem solução em demanda solucionável. O empreendedor social pode alcançar esse ponto na medida em que sua empresa ou organização mobiliza não apenas recursos mercantis, mas também recursos de reciprocidade ou de doação, sem excluir o apoio estatal. Por essas duas razões, seu empreendimento não pode se por em marcha e, posteriormente, se desenvolver, sem um forte envolvimento da comunidade em questão (Laville, 1995). Dessa perspectiva, “os empreendedores sociais não criam riqueza para si mesmos mas riqueza coletiva para a comunidade em seu conjunto” (Thake e Zadek, 1996). Ao fazêPág. 52 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição lo, participam do empowerment coletividades e, portanto, democratização da sociedade civil. das da 2.3 O empreendedor coletivo O empreendedor coletivo, principalmente aquele do tipo cooperativista ou mutualista é mais tio-avô que primo do empreendedorismo social, pois sua origem remonta ao século XIX (Petitclerc, 2001; Desroche, 1976). O empreendedor coletivo partilha diversas características com o empreendedor social, mas distingue-se dele por dois aspectos: em primeiro lugar, o empreendimento coletivo supõe um funcionamento democrático para realizar plenamente seu potencial; em segundo lugar, a criação de uma iniciativa coletiva supõe em geral a constituição prévia de um grupo de pessoas. Vejamos rapidamente essas duas especificidades. O primeiro aspecto destaca o fato de que as vantagens4 da economia social não se podem concretizar sem um funcionamento democrático, que se torna assim uma condição sine qua non para o êxito da iniciativa. De fato, o funcionamento democrático é indispensável para que as outras características da economia social possam alcançar pleno resultado. Assim, a participação ativa das pessoas associadas 4 Essas forças são relativamente bem conhecidas. Trata-se de : a) sua familiaridade com as novas necessidades e aspirações, o que lhe permite buscar com rapidez soluções, freqüentemente inéditas; b) sua capacidade de mobilização de recursos diversos (hibridação: mercantil, não mercantil, não monetário), capacidade fundada na aliança de atores oriundos de diferentes meios e aderindo a um projeto mais amplo; c) sua consideração, na produção de bens ou de serviços, do social, das externalidades e do longo prazo (contra a volatilidade e a versatilidade do mercado) e de uma capacidade de cálculo mais justo da viabilidade de um projeto; d) suas regras, que permitem entre outras coisas a participação das pessoas nas decisões e uma equidade na divisão dos resultados. Publicada em Outubro de 2004 nessa iniciativa aparece como indispensável para identificar bem as necessidades não-satisfeitas, necessidades em geral pouco visíveis, como as necessidades sociais. Da mesma forma, “a construção conjunta da oferta e da demanda pelos usuários e os profissionais” que caracteriza os serviços de proximidade fornecidos pela economia social, supõe um espaço público que permita o debate, a deliberação (aquilo que chamávamos antigamente de assembléias de cozinha) para verificar bem como algo que parecia a soma de problemas individuais constitui na realidade um problema social (Laville, 1994). Desse ponto de vista, a mobilização e a hibridação de recursos mercantis, não mercantis e não monetários não se podem realizar, e, sobretudo, não se podem manter, sem o reconhecimento de todas as pessoas envolvidas na experiência. Enfim, na medida em que a economia social visa a reconhecer o social na economia e a economia no social, ela não pode se referir apenas ao mercado, ou, se preferirmos, ao balanço contábil da iniciativa, nem pode se referir apenas ao Estado e seus mandatos, diretrizes e programas para identificar o social. O segundo aspecto remete à própria estrutura do empreendimento coletivo, que se distingue de todas as outras formas pelo fato de que se constitui da “combinação de um empreendimento e de um agrupamento de pessoas reunidas pelo duplo vínculo de associação e de atividades” (Vienney, 1980 e 1994). Ora, isso supõe, de um lado, que a reunião das pessoas deva habitualmente se constituir antes que o próprio empreendimento apareça e, de outro lado, que os empreendedores sejam capazes de mobilizar recursos durante um intervalo de tempo importante, antes que o próprio empreendimento entre em operação. Numa imagem rápida, diríamos que o empreendedor coletivo deve ser capaz de mobilizar de início capital social, mas que Pág. 53 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição esse capital social não adquire valor no projeto de empreendimento sem o capital financeiro. Dessa perspectiva, o projeto cooperativo pode ser proposto por um indivíduo (segundo a pesquisa recente de Côté e Robitaille, um terço de todos os empreendedores cooperativos são indivíduos e os grupos representam a metade dos casos dos empreendedores cooperativos), mas, quando é esse o caso, esse último deve ser capaz de partilhar rapidamente seu projeto com uma rede de membros fundadores para que eles dele se apropriem e o tornem coletivo. Muito freqüentemente, o projeto de empreendimento coletivo é conduzido desde o início por um grupo de pessoas relacionadas entre si a partir da proximidade geográfica ou profissional. Enfim, sendo ao início um indivíduo ou um grupo, o empreendedor coletivo deve demonstrar paixão, imaginação e razão, para definir concretamente o projeto e para mobilizar os recursos humanos e financeiros necessários. O período de gestação de um empreendimento coletivo é freqüentemente mais longo e mais difícil que o da empresa capitalista. Os pontos fortes da iniciativa coletiva (funcionamento democrático e combinação de uma associação e de uma empresa) podem representar ao mesmo tempo oportunidades de fracasso, principalmente no nível de partida do projeto. A respeito desse ponto, Jaroslav Vanek sugere dar muita atenção à preparação do plano de negócios, que deve se justificar não apenas no plano financeiro mas também no plano da mobilização dos atores envolvidos. Para evitar conseqüências financeiras e sociais que seriam lamentáveis, Vanek sugere até mesmo realizar uma simulação. “Essa forma de proceder, escreve, faz pensar na decolagem de um avião (que exige a verificação e o funcionamento de um grande número de instrumentos diferentes); mas a simulação é muito mais Publicada em Outubro de 2004 complexa no caso de uma cooperativa, pois o vôo está previsto para uma duração de tempo incomensurável e convoca à coordenação” de diversos departamentos, como o de administração e coordenação, o financeiro, o de marketing, o jurídico, o da produção e da tecnologia, o de relações humanas etc (Vanek, 1989: 241). Se a fase de experimentação de um dado projeto de empreendimento coletivo pode durar até dois anos (ver, novamente, a pesquisa de Côté e Robitaille), a difusão da iniciativa cooperativa num dado setor pode se alongar por uma década como testemunham tanto os casos da caixas populares no início do século como o das cooperativas de pesca nos anos 1940. Esse período que vai da experimentação à constituição de um setor pode ser encurtado se os aprendizados e as expertises são partilhados e se são concedidos apoios adequados, o que explica o interesse por agrupamentos setoriais e locais, por recursos técnicos e por financiamento específico. Tudo isso permite entrever a complexidade do empreendedorismo coletivo e a grande mobilização que exige ao início. Em contrapartida, a iniciativa coletiva apresenta um grande potencial para a inovação. Sua estrutura oferece a possibilidade de ser inteligente e apaixonado a muitos (parafraseando Claude Béland). A partir de cinco, dez pessoas ou mais, torna-se possível demarcar bem as necessidades não satisfeitas e inovar ao propor bens e serviços não oferecidos ou oferecidos a um custo muito elevado. Além da inovação em forma de novos bens ou a criação de novos mercados, pode-se igualmente encontrar inovações nos procedimentos e, mesmo, na organização (ex. o trabalho em equipe ou polivalente, que as cooperativas de trabalho experimentaram antes das empresas capitalistas e japonesas). Em Pág. 54 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição suma, as iniciativas coletivas que surgem são obrigadas a ser inovadoras, o desafio que encontram é o de como permanecer inovadoras. Publicada em Outubro de 2004 participação no capital. Se compararmos os diversos tipos de empreendedores, que são o empreendedor capitalista, o empreendedor social e o empreendedor coletivo, fica nítido que partilham formalmente certas características no plano do cálculo, da inovação e do risco, mas substantivamente (do ponto de vista do conteúdo e do significado) existem enormes diferenças. Em primeiro lugar, no nível da racionalidade e do projeto, o empreendedor coletivo e o empreendedor social orientamse para a comunidade ou o coletivo. Os riscos, que são antes de tudo financeiros para o empreendedor capitalista, são não apenas financeiros, mas sociais, para o empreendedor social e o cooperativo. Tudo isso faz com que a tentação ir à falência seja menos vantajosa para esses últimos, se as coisas não ocorrerem como estava previsto. Além disso, nesse caso, podem mais facilmente apoiar-se em redes comunitárias ou coletivas. Por fim, o empreendedor social e o empreendedor cooperativo são constrangidos a inovar, pois seu projeto surge em geral para responder a necessidades não satisfeitas nem pela empresa privada nem pelo Estado. Adicionalmente, o empreendimento coletivo corre usualmente menos riscos que o empreendimento capitalista, por ser capaz de mobilizar recursos de um coletivo ou de uma comunidade, por se basear num projeto que dá sentido a investimentos com origem na reciprocidade ou mesmo em doações. Assim, a taxa de sobrevivência de cooperativas é bem impressionante: “45% das cooperativas constituídas após 1960 ainda existiam em 1997” (dados do Setor de Cooperativas, Ministério da Indústria e do Comércio, Ensemble, janeiro de 1999, vol 2, n. 1). O bom desempenho da Caixa de economia dos trabalhadores e trabalhadoras do Quebec, que se especializou em financiamento de cooperativas e empreendimentos comunitários, testemunha de forma eloqüente os baixos riscos que representam esses empreendimentos (Lebossé, 1998:100). Dito isso, deve-se reconhecer que o empreendimento coletivo não favorece a capitalização extrema, em razão da não remuneração do capital e da impossibilidade de aquisição de direitos de Tabela 1. Tipologia das formas de empreendedorismo Dimensão/ Tipo Indivíduo Coletivo Comunidade Racionalidade Risco Capitalista Sobretudo indivíduo Sobretudo Financeiro formal (cálculo contábil) Social Indivíduo Sobretudo em valor para a comunidade (proximidade) Comunidade Coletiva Indivíduo Coletivo Sobretudo em valor para o coletivo (os membros) Financeiro e social (reputação diante da comunidade) + Riscos menores Financeiro e social (reputação diante dos membros) + Riscos menores Projeto Sobretudo individual (realização própria e da família) Sobretudo engajamento social Sobretudo empreendedor, mas coletivo Inovação Sentido schumpeteriano Desenvolvimento local (interesse geral), Necessidades não satisfeitas + Formas de organização Necessidades não satisfeitas + Formas de organização Pág. 55 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição Outras tipologias são igualmente possíveis, como a que propõe Roger Spear e Allan Thomas (1997), que fixam duas séries de variáveis: a primeira se fundamentando na presença mais ou menos forte do social e da economia nos projetos; a segunda, sobre a natureza dos empreendedores e promotores que são indivíduos ou organizações ou instituições (segundo seu caráter mais ou menos formal). Desse ponto de vista, o empreendedor cooperativo tem projeto mais para o econômico que para o social (ex: gráfica cooperativa), enquanto o empreendedor social se orienta mais para o social que para o econômico. Pode haver fórmulas híbridas, como demonstram as ACEF (Association Coopérative d’Économie Familiale). Da mesma forma, um empreendimento cooperativo pode ser realizado por um coletivo, mais que por um indivíduo. Considerando essa perspectiva, os grupos de apoio ao empreendedorismo podem ser, eles mesmos, mais ou menos atentos ao econômico e ao social, mais ou mentos atentos à dimensão individual ou coletiva. Publicada em Outubro de 2004 Por fim, os grupos de apoio são em geral mais formais e institucionalizados que os projetos que eles apóiam e que algumas fórmulas, como as incubadoras de empresas. Antes de prosseguir, parece-nos necessário demarcar um pouco melhor a especificidade do empreendimento cooperativo. Conclusão Estamos assistindo a uma nova onda (ou grupos) de empreendimentos de economia social que tentam responder a urgências advindas de uma grande transformação sócio-econômica e da incapacidade do setor público e privado de a elas responder rapidamente. Esses empreendimentos não devem ser dissociados de iniciativas que respondem menos a necessidades que a aspirações e novos valores relativos tanto à organização do trabalho quanto a modos de vida. Num caso como no outro, esses empreendimentos que surgem no âmbito do desenvolvimento social como no do desenvolvimento econômico, se inserem espontaneamente no âmbito do desenvolvimento local. Tabela 2. Os modelos de empreendedorismo Fonte: Spear et Thomas, 1997 Pág. 56 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição Em comparação aos empreendimentos privados, os empreendimentos coletivos são em geral mais complexos, pois resultam da combinação de uma empresa e de uma reunião de pessoas. Ao fazer isso, internalizam o que os outros empreendimentos consideram como externalidades, mas não conseguem realizá-lo senão na medida em que apostam em seu funcionamento democrático, o que lhes permite igualmente mobilizar recursos não apenas de mercado, mas também extra-mercado e, até mesmo, não monetários. Essa complexidade, combinada com as dificuldades específicas a sua estrutura de propriedade, fazem com que não possam se desenvolver sem um apoio apropriado tanto do ponto de vista financeiro quanto do ponto de vista da orientação e de recursos técnicos. Em contrapartida, uma vez em marcha, esses empreendimentos parecem poder se manter em operação mais que o conseguem as empresas privadas. Enfim, seus baques sócioeconômicos cobrem um espectro que vai além da mera viabilidade financeira, de sorte que sua rentabilidade social se impõe em razão mesmo de sua missão. Examinamos os empreendimentos coletivos principalmente sob o ângulo de sua forma institucional dada em grande parte pelo estatuto jurídico desses empreendimentos (organismos sem fins lucrativos, cooperativas, mutualidades, convenções de acionistas). Essas regras são sem dúvida mais rígidas para as cooperativas que para as OBNL (Bouchard, Carré, Côté e Lévesque, 1995), mas, num caso como no outro, os empreendimentos coletivos se diferenciam nitidamente dos empreendimentos capitalistas. Assim, essas regras dão aos empreendimentos coletivos uma superioridade evidente, com destaque para seu funcionamento democrático e a Publicada em Outubro de 2004 atenção que dispensam por princípio a seus membros. Assim, as regras asseguram a divisão do poder e de excedentes entre seus membros, definindo um campo de atividades ligado às necessidades dos membros da cooperativa. Permitem também às instâncias democráticas realizar arbitragens desempenhadas pelo mercado no caso dos empreendimentos capitalistas. É o caso do salário de trabalhadores de uma cooperativa de trabalho, os quais são concretamente determinados não apenas pelo mercado mas pelo conselho de administração, arbitrado entre os excedentes destacados ou acumulados. Em conseqüência disso, se o funcionamento democrático dos empreendimentos coletivos for imperfeito, as conseqüências poderão ser bem mais graves que para uma empresa capitalista aberta à participação. A forma institucional da iniciativa coletiva deixará então de ser uma vantagem, para tornar-se um handicap. Será esse também o caso quando a iniciativa coletiva se burocratiza, como se pode observar na maior parte das cooperativas. Nesse caso, opera-se então uma reviravolta das regras, em virtude da qual submetem-se à tecnoestrutura a associação e as escolhas dos membros. Daí a importância de uma gestão adaptada (forma organizacional) já que o funcionamento do empreendimento coletivo não pode ser ótimo sem a participação dos membros, sem investimento em democratização e formação (Belley e Mevellec, 1993: 69). Se passarmos a examinar os empreendimentos coletivos em suas modalidades concretas de gestão, descobrimos efetivamente que as formas organizacionais não são necessariamente adequadas a sua forma institucional (ou suas regras). Numa pesquisa sobre as cooperativas de trabalho, mostramos que ainda que certas cooperativas de trabalho Pág. 57 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição tivessem adotado formas de gestão de vanguarda, com origem na parceria e na concertação, outras remontam ao taylorismo e a formas autoritárias de gestão sem uma autêntica preocupação com formação (Comeau e Lévesque, 1994). Esses casos de gestão tradicional nas cooperativas surpreendem ainda mais se considerarmos que as empresas capitalistas se engajam cada vez mais em formas organizacionais inovadoras de participação dos trabalhadores (Bélanger e Lévesque, 1994; Grant, Bélanger e Lévesque, 1997). À luz dos diversos tipos de configuração5 propostos por Mintzberg (1990), nós sugeriríamos a hipótese de que a configuração empreendedora não é sem dúvida a mais coerente com a forma institucional da iniciativa coletiva. De fato, se na configuração empreendedora “as decisões relativas à estratégia e às operações tendem a se concentrar na escrivaninha do dirigente”, a conseqüência é uma concentração evidente das decisões. Como escreve Mintzberg, “a expansão das idéias democráticas” nas organizações acabou por fazer sair de moda a organização empreendedora em muitos ambientes da sociedade contemporânea” (Mintzberg, 1990: 194-195). Seríamos igualmente levados a considerar como 5 Desse ponto de vista, pode-se igualmente caracterizar as cooperativas a partir de formas organizacionais identificadas por Henry Mintzberg (1990), ou seja, as sete formas, que são: 1organização empreendedora; 2- organização mecanicista; 3- organização compartimentada; 4organização profisisonal; 5- organização inovadora, 6- organização missionária e 7- organização politizada. Concretamente é sem dúvida possível encontrar iniciativas cooperativas em cada uma dessas formas organizacionais, ainda mais que essas configurações são simplificações (tipos ideais). Se certos fatores de contingência e de situação devem ser levados em conta para compreender a pertinência de uma configuração mais que de outra, não é menos verdade que a coerência organizacional e institucional constitui uma vantagem. Publicada em Outubro de 2004 pouco coerentes com a forma institucional do empreendimento coletivo a configuração compartimentada (mais adequada à grande empresa que à pequena) e a configuração mecanicista, que se fundamenta numa forte divisão entre concepção e execução, pouco propícia à participação. Do mesmo modo, a configuração política parece menos conveniente à forma organizacional de uma empresa, mesmo que as questões políticas nunca estejam jamais completamente ausentes das empresas. Por outro lado, certas configurações poderiam apresentar uma certa coerência com a forma institucional das iniciativas coletivas; tal seria o caso das configurações a seguir: a) a configuração profissional, que convém aos serviços a pessoas, mas que apresenta o inconveniente de tender à burocratização, mesmo sendo potencialmente descentralizada; b) a configuração inovadora, mais adaptada a um setor de alta tecnologia, pois demanda um nível de especialização elevado, favorecendo entretanto as equipes de projetos de pequeno porte, e encorajando a adaptação uns aos outros; c) a configuração missionária, definida a partir dos casos das empresas japonesas, em que a ideologia é utilizada como instrumento de gestão: “as normas e as crenças tomam o lugar de padrões e procedimentos” (Mintzberg, 1990: 320). Na configuração missionária, as formas de gestão se definem a partir da ideologia e do projeto, talvez da missão. “No meu entender”, escreve Mintzberg, “a chave do desenvolvimento da ideologia organizacional numa nova organização ou numa organização já existente é uma Pág. 58 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição liderança apoiada em uma crença precisa em uma missão e participando de um devotamento honesto em relação àqueles que deverão apoiar a revelação dessa missão” (1990: 324). No modelo japonês e no modelo da cultura de empresa, a identificação com a empresa se baseia com freqüência em um engajamento individual cujas bases materiais são às vezes bem limitadas. Os empreendimentos coletivos, em razão de sua forma institucional, propiciam uma base sólida para tal identificação. No entanto, como escreve Peter M. Senge (1997), “no campo do conhecimento, desmontamos facilmente o mito dos líderes como heróis isolados, comandando suas organizações a partir do alto”. A organização baseada na parceria e na concertação lança luz sobre dois problemas da grande empresa capitalista: a insuficiência de lideranças hierárquicas e sua dificuldade de aproveitar a inteligência das pessoas que se encontram em todos os níveis da organização. A partir dessa constatação, Peter M. Senge acrescenta, falando apenas da empresa capitalista: “Nossas respostas podem ironicamente nos conduzir a um futuro que se inspiraria num modo de organização mais antigo e mais natural: comunidades de diversos líderes que fortalecem sua organização para aprender com sua cabeça, com seu coração e com sua mão”6. Em suma, as formas de gestão mais inovadoras nas empresas capitalistas poderiam se inspirar nos empreendimentos coletivos, se quisessem dar um fundamento mais verossímil a seu convite à concertação e à parceria. 6 "Our responses may lead us, ironically, to a future based on more ancient and more natural - ways of organizing: communities of diverse and effective leaders who empower their organizations to learn with head, heart, and hand" (Peter M. Senge, 1997), « Communities of Leaders and Learners », in Harvard Business Review, vol. 75, no 5, p. 32. Publicada em Outubro de 2004 Sobre o empreendimento coletivo como tal, mostramos que ele partilha algumas características com o empreendedorismo individual (cálculo de risco, capacidade de sonhar e de inovar), mas que se distingue não só por uma visão diferente (valores diferentes e um projeto coletivo), mas igualmente por regras de partilha do poder e de divisão do excedente. Isso supõe igualmente uma forma organizacional mais complexa e mais inovadora. Em seguida, verificou-se que o empreendedorismo coletivo é mais complexo e difícil (não necessariamente mais arriscado) para o início de funcionamento que o empreendimento capitalista, de forma que a passagem do projeto ao empreendimento é mais laboriosa; o empreender coletivo (na situação de emergência das iniciativas) é bem mais rico (mais possibilidades de mobilização dos parceiros/integrantes) e potencialmente mais inovador que o capitalista (tanto micro-organizacional quanto macro-institucional); que a fórmula cooperativa não é utilizada em seu pleno potencial, entre outros motivos, porque o empreendedorismo coletivo não saberia desabrochar sem condições bem especificas e sem um apoio externo (que não é necessariamente estático). Referências Bibliográficas Beauchamp, Claude, "La coopération au Québec, évolution du projet et de la pratique au 20e siècle, Revue du CIRIEC, vol. XIII, no 1-2 (1980-1981), pp. 23-36. Beauchamp, Claude, "Les débuts de la coopération et du syndicalisme agricole, 1900-1930: quelques éléments de la pratique", Recherches sociographiques, vol. 20 no 3, pp. 337-381. Belley, Michel et Pierre Mévellec, "De l'optimisation des résultats à l'optimisation des processus", in Coopératives et Pág. 59 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição Publicada em Outubro de 2004 Développement, Vol.24, no 1 (1992-1993), pp. 63-84. de la Fondation de l’entrepreneurship, 194 p. Bernier, Luc et Jean-Pierre Fortin, "L'entrepreneurship public dans les sociétés d'État au Québec", in Revue organisation. Réflexion et action sur la gestion des organisations, Volume 6, no 1 (Hiver 1997), pp. 13-24. Côté, Alain, "La genèse du mouvement coopératif québécois", in Interventions critiques en économie politique, no 2 (1978), pp. 118-128. page 29 Bouchard, M., Carré, G., Côté, D. et B. Lévesque, " Pratiques et législations coopératives au Québec: un chassé-croisé entre coopératives et État", in Alberto Zevi et José Luis Monzon Campos (Eds), Coopératives, marchés, principes coopératifs, Bruxelles, De BoeckUniversité/CIRIEC, 1995, pp. 213-242. Boyer, Robert (1997), “ Les mots et la réalité ”, La mondialisation au-delà des mythes, Paris, La Découverte, 1997, 29. Cohen Elie (2001), L’ordre économique mondial. Essai sur les autorités de régulation, Paris, Fayard, 320 p. Cole, G.D.H., A Century of Co-operation, Manchester, Co-operative Union, 1944. Comeau, Yvan et Benoît Lévesque (1993), “Workers’ Financial Participation in the Property of Entreprises in Quebec”, in Economic and Industrial Democracy, Vol. 14 no 2 (1993), pp. 233-250. Comeau, Yvan et Benoît Lévesque (1994), La participation des travailleurs dans les coopératives de travail et dans les entreprises capitalistes au Québec, Montréal, Chaire de coopération GuyBernier, 1994 (Cahier no 0994-064), 22 p. Conseil de la coopération du Québec (1999), Démarrer et gérer une entreprise coopérative, Montréal et Québec, Les Éditions Transcontinental et Les Éditions Côté, Daniel, "Modèle d'analyse stratégique des coopératives", in Coopératives et Développement, Vol.24no 1 (1992-1993), pp. 17-39. Craig, John G., The Nature of Cooperation, Montreal/New York, Black Rose Books, 1993, 256 p. Deschênes, Gaston, " Le premier siècle du mouvement coopératif", in Revue du CIRIEC, vol. XIII, no 1-2 (1980-1981), pp. 15-22. Deschênes, Gaston, "Le mouvement coopératif québécois. Guide bibliographique", in Revue du CIRIEC, vol. 11, no 1-2 (1978-1979), pp. 3-13. Desroche, Henri (1976), Le projet coopératif, son utopie et sa pratique, ses appareils et ses réseaux, ses espérances et ses déconvenues, Paris, éditions Ouvrières, 462 p. Desroche, Henri (1983), Pour un traité d’économie sociale, Paris, CIEM, 254. Favreau, Louis et Benoît Lévesque, Développement économique communautaire. Économie sociale et intervention, Québec, Presses de l'Université du Québec, 1996, 230 p. Favreau, Louis et Yves Vaillancourt (2001), « Le modèle québécois d’économie sociale et solidaire », Revue internationale de l’économie sociale (RECMA), no 281, pp.69-83. Pág. 60 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição Fillion, Louis-Jacques, "L'entrepreneur et la stratégie", in Taïeb Hafsi et Jean-Marie Toulouse (Sous la dir.), La stratégie des organisations : une synthèse, Montréal, Les Éditions Transcontinental, 1996, pp. 213222. Fecteau, Jean-Marie, L'émergence de l'idéal coopératif et l'État au Québec, 18501914, Montréal, Cahier de la Chaire de coopération Guy-Bernier, 1989, 110 p. Galbraith, John Kenneth (1967), The New Industrial State (traduction : Le nouvel État industriel, Paris, Gallimard, 476 p.). Gélinas, Jacques B. (2000), La globalisation du monde. Laisser faire ou faire? Montreal, Ecosociété, 340 p. Grant, Michel, Bélanger, Paul R. et Benoît Lévesque (1997), Nouvelles formes d'organisation du travail, études de cas et analyses comparatives, Paris et Montréal, L'Harmattan 1997, 332 p. Gueslin, André (1998), L’invention de l’économie sociale, Paris, Economica, 430 p. Jean, Bruno, Les idéologies éducatives agricoles (1860-1890) et l'origine de l'agronomie québécoise, Québec, Université Laval (collection études sur le Québec), 1977, 237 p. Hafsi, Taïeb, " "Les grands gestionnaires et leurs oeuvres", in Piffault, Joëlle avec la coll. de Marcel Côté, Les Coopérants. Le rêve inachevé d'un leadership démocratique, Québec, PUQ, 1996, pp. IX à XIV. Publicada em Outubro de 2004 mutations d'une culture économique", Recherches sociographiques, vol. XXVII, no 2 (1986), pp. 195-218. Larocque, Paul, Pêche et coopération au Québec, Montréal, Éditions du jour, 1978, 379 p. Larocque, Paul, "La Fédération des pêcheurs unis du Québec: les dernières années (1969-1983)", in Coopératives et Développement, Vol 23 no 1 (1991), pp. 738. Laville, Jean-Louis (dir) (1994), L’économie sociale, une perspective internationale, Paris, Desclée de Brouwer. Lebossé, Joël, Micro-finance et développement local, Montréal, IFDEC, 1998,139 p. Lévesque, Benoît (1979), Animation sociale et entreprises communautaires et coopératives, Montréal, Ed. Albert SaintMartin. Lévesque, Benoît (1997), « Démocratisation de l'économie et économie sociale », in G. Laflamme, P.-A. Lapointe et alii (sous la dir.), La crise de l'emploi. De nouveaux partages s'imposent, Québec, PUL, 1997, pp.87-123. Lévesque, Benoît, Bélanger, Paul R., Bouchard, Marie et Marguerite Mendell (2001), Lê Fonds de solidarité FTQ, un cas exemplaire de nouvelle gouvernance, Montréal, Fonds de solidarité, 107 p. Katz, Robert, "Shills of an Effective Administrator", Harvard Business Review, Jan.-Feb. 1955. Lévesque, Benoît, Bourque, Gilles L. et Éric Forgues (2001), La nouvelle sociologie économique. Originalité et tendances nouvelles, Paris, Desclée de Brouwer, 268 p. Labrecque, Laurent, "Le déclin des coopératives de consommation et les Lévesque, Benoît et Marguerite Mendell (1999), « L’économie sociale au Québec. Pág. 61 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição Eléments théoriques et empiriques pour un débat et pour la recherche », Lien social et Politiques (anciennement Revue internationale d’action communautaire), No 41, pp. 105-118. Lévesque, Benoît et Bill Ninacs (2000), « The Social Economy in Canada : The Quebec Experience », Eric SHRAGGE et Jean-Marc FONTAN (Eds), Social Economy. International Debates and Perspectives, Montreal, Black Rose Books, pp. 112-129. Lévesque, Benoît, "La coopération, une formule en mutation", in Coopératives et Développement, Vol. 22 no 2 (1990-1991), pp.1-10. Lévesque, Benoît, "Les coopératives au Québec. Un secteur sratégique, à la recherche d'un projet pour l'an 2000", Annales de l'économie publique, sociale et coopérative/ Annals of Public and Cooperative Economics (Université de Liège), vol. 60, no 2, 1989, pp. 181-215. Lévesque, Benoît et Daniel Côté, "Le changement des principes coopératifs à l'heure de la mondialisation: à la recherche d'une méthodologie", in Alberto Zevi et José Luis Monzon Campos (Eds), Coopératives, marchés, principes coopératifs, Bruxelles, De BoeckUniversité/CIRIEC, 1995, pp. 1-16. Lipietz, Alain, La société en sablier. Le partage du travail contre la déchirure sociale, Paris, La Découverte, 1996, 332 p. Lovendahl, Bengt, "L'intégration de l'économie publique et de l'économie sociale et coopérative. Vers un nouveau modèle suédois", in Lionel Monnier et Bernard Thiry (Eds), Mutations structurelles et intérêt général. Vers quels nouveaux paradigmes pour l'économie publique, sociale et Publicada em Outubro de 2004 coopérative? Bruxelles, CIRIECInternational et De Boeck Université, 1997, pp. 72-88. MacPherson, Ian, Each for All: A History of the Co-operative Movement in English Canada, 1900-1945, Toronto, MacClelland&Steward (Carleton Library Series), 1979. Malo, Marie-Claire, Naissance et croissance du secteur coopératif de consommation au Québec (1938-1953), Mémoire de maîtrise en administration (École des HEC), 1976. Melnyk, George 1985), The Search For Community. From Utopia to a Cooperative Society, Montreal, Black Rose Books, 170 p. Melucci, Alberto (1989), Nomads of the Present. Social Movements and Individual Needs in Contemporary Society, London, Hutchinson Radius, 288 p. Mispelblom Beyer, Fredrik, L'entreprise politique. tentative de construction d'un objet sociologique, Les Cahiers d'Évry, Université d'Évry Val d'Essonne (Centre Pierre Naville), no 2/97, 70 p. Mintzberg, Henry, Le management. Voyage au centre des organisations, Montréal, Lês Éditions d’organisation et Les Éditions Agence d'Arc Inc., 1990, 570 p. Mintzberg, Henry, "The Manager's Job", Harvard Business Review, July-Aug. 1975. Monnier, Lionel et Bernard Thiry (1997), « Architecture et dynamique de l’intérêt général », in Lionel Monnier et Bernard Thiry (dir.), Mutations structurelles et intérêt général. Vers quels nouveaux paradigmes pour l’économie publique, sociale et coopérative? Bruxelles, De Boeck-Université, pp.11-30. Pág. 62 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição Morels, Réginald (1999), « Économie sociale et coopération internationale », dans Jacques DEFOURNY, Patrick DEVELTERE et Bénédicte FONTENEAU (dir.), L’économie sociale au Nord et au Sud, Bruxelles, De Boeck Université, pp. 256-264. Offe, Clauss et Ulrich Preu (1997), "Les institutions démocratiques peuvent-elles faire un usage efficace des ressources morales?" in Claus OFFE, Les démocraties modernes à l'épreuve, Montréal et Paris, L'Harmattan, pp.199-231. Orléan, André (1999), Le pouvoir de la finance, Paris, éditions Odile Jacob, 1999, p. 254. Pichette, Claude, Définition et classification des coopératives", Archives internationales des sciences sociales de la coopération, no 29, janvier-juin 1971. Pichette, Claude, Analyse microéconomique et coopérative, Sherbrooke, Université de Sherbrooke, 1972. Piffault, Joëlle avec la coll. de Marcel Côté, Les Coopérants. Le rêve inachevé d'um leadership démocratique, Québec, PUQ, 1996, 182 p. Pitcher, Patricia, Artistes, artisans et technocrates dans nos organisations, Montréal, Québec-Amérique/Presses HEC, 1997, 264 p. Putnam, Robert D. (1993), Making Democracy Work: Civic Traditions in Modern Italy, Princeton, Princeton University Press. Schumpeter, Joseph A., Business Cycles: A Theoretical, Historical and Statistical Analysis of Capitalist Process, New York and London, Mc Graw-Hill, 1939, 2 Vols. Publicada em Outubro de 2004 Schumpeter, Joseph A. The Economics and Sociology of Capitalism, Princeton, Princeton University Press, 1991, 492 p. (Voir le chapitre 10: "Comments on a Plan for Study of Entrepreneurship"). Senge, Peter M. (1997), "Communities of Leaders and Learners", in Harvard Business Review, Vol. 75, no 5, p.32. Thake, Stephen et Simon Zadek (1996), Pratical People, Noble Causes. How to Support Community-Based Social Entrepreneurs. London, New Economics Foundation, 60 p. Vaillancourt, Yves et Jean-Louis Laville(1998), "Les rapports entre associations et État : un enjeu politique", Revue du MAUSS Semestrielle (PARIS), no 11, pp. 119-135. Vaillancourt, Yves (2001), « Le modèle québécois de politiques sociales et ses interfaces avec l’Union sociale canadienne », Back to the Table : A New Social Union for 2002? (à paraître). Vanek, Jaroslaw, "De l'entreprise capitaliste à l'entreprise coopérative: problèmes et méthodes", in B. Lévesque et alii (Sous la dir.), L'autre économie: une économie alternative?, Québec, PUQ, 1989, pp.235-244. Vérin, Hélène, Entrepreneurs entreprise. Histoire d'une idée, Paris, PUF, 1982, 262 p. Vienney, Claude, L'économie sociale, Paris La Découverte, 1994, 126 p. Vienney, Claude, Socio-économie des organisations coopératives, Paris, CIEM, 1980 (tome 1) et 1982 (tome 2), 396 p et 333 p. Pág. 63 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição Weber, Max, L'éthique protestante et l'esprit du capitalisme, Paris, Plon, 1964, 342 p. ---------------------------* O artigo original, em francês, de fevereiro de 2002, foi apresentado no Forum “L’entrepreneuship en économie sociale: oser l’entrepreneuriat différemment”. Pode ser lido na íntegra em www.aruc-es.uqam.ca/aruces/publications/I-022002.PDF. Publicada em Outubro de 2004 Esta tradução reduziu o artigo para ficar mais compatível com as diretrizes da Revista GIS. A autorização para traduzir parcialmente o artigo foi dada pelo autor em janeiro de 2005. Traduzido por Arminda Campos (equipe da Revista GIS). (N. da Tr.) ** Professor associado do departamento de sociologia da Universidade do Quebec em Montreal (UQAM), fundador do Centro de Pesquisas sobre as Inovações Sociais (CRISES) da UQAM (www.crises.uqam.ca). (N. da Tr.) Pág. 64 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição Publicada em Outubro de 2004 Artigo Participação e processo decisório em uma pequena indústria autogestionária Suzana Hecksher Oliveira* Francisco Duarte** RESUMO Este artigo, resumo da dissertação de mestrado (OLIVEIRA, 2002), primeiramente traz uma breve exposição sobre os objetivos da gestão participativa e o modo como ela vem sendo aplicada nas empresas capitalistas, discutindo as características que limitam a cooperação e a ampliação da participação.Em seguida, são vistas as condições que favorecem ou dificultam a participação eficiente nas indústrias autogestionárias. O trabalho segue com a apresentação do estudo de caso realizado em uma cooperativa industrial de pequeno porte. A partir da confrontação entre o que foi visto na revisão bibliográfica e o que foi vivenciado durante a pesquisa de campo, são estabelecidos os principais obstáculos que as cooperativas devem transpor para realizar uma gestão participativa eficiente. Palavras chave: autogestão, cooperativa, participação. ABSTRACT This article starts by briefly presenting the objectives of participative management and how it has being applied in capitalist enterprises, emphasizing the characteristics that restrict the cooperation possibilities and the widening of participation. It examines then the conditions that may favor or hinder the efficient participation in the self-management system industries. The work also contains a case study, about a small size industrial cooperative. The references found in the bibliography about the theme and the field research made possible to characterize some of the main obstacles cooperatives must face to attain effective participative management. Key words: self management system, cooperatives, participation. 1. Introdução A abertura dos mercados aos capitais e produtos estrangeiros, a reestruturação produtiva, o surgimento de novas tecnologias intensivas em capital e poupadoras de mão-de-obra, têm gerado uma redução brusca do número de postos de trabalho. Surgem índices inéditos de desemprego no Brasil. Mas além dos altos índices, é a duração do desemprego que desenha um quadro extremamente trágico (SINGER, 1998). Apesar das dificuldades, mais recentemente, é crescente o número de trabalhadores que, na tentativa de manter seus postos de trabalho, começam a se organizar na formação de associações ou cooperativas autogestionárias. A Pág. 65 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição constituição da maioria das empresas autogestionárias, principalmente no setor produtivo, vem ocorrendo em caráter de urgência, de forma pouco estruturada, a partir de indústrias que vão à falência. Dáse a mudança repentina de função dos trabalhadores que passam também a ser donos e gestores da empresa. O grupo de trabalhadores assume a difícil tarefa de reverter o processo de falência para garantir a continuidade de seus empregos. É preciso inovar, flexibilizar a produção e conquistar novos mercados. As dificuldades encontradas são enormes e muitos são os casos de fracasso. Esta dificuldade de realizar uma gestão eficaz, adaptando-se às necessidades de mercado e utilizando-se das especificidades de uma indústria autogestionária, tem sido constatada em diversas pesquisas sobre a autogestão no Brasil (GONÇALVES, 2000). Apesar do histórico de fracasso de muitas indústrias autogestionárias, o modo de produção cooperativo apresenta algumas características que surgem como indícios de viabilidade e fazem crer que as cooperativas podem ser capazes de competir no mercado capitalista. Em qualquer negócio, a viabilidade se dá em determinadas condições financeiras, de mercado e de trabalho. As restrições financeiras ou de mercado são determinantes no sucesso de qualquer empreendimento e pouco diferem pelo fato da indústria ser autogerida. Dificuldades financeiras e mercadológicas justificaram grande parte dos fracassos de iniciativas autogestionárias de empresas industriais no Brasil, uma vez que a maioria surgiu a partir de indústrias convencionais falidas ou em processo falimentar, com parques industriais obsoletos, sem capital para investimento e giro. Portanto o fracasso foi do negócio e precedeu o modelo de autogestão. O estudo de viabilidade em indústrias de autogestão deverá ser principalmente diferenciado na investigação das condições Publicada em Outubro de 2004 relativas ao trabalho, tais como: a organização do trabalho e a qualificação da mão-de-obra. Devido a concorrência de classe mundial que as empresas vêm enfrentando, a administração científica do trabalho, marcada pela cisão entre planejamento e execução e baseada na prescrição externalizada da tarefa e no controle acirrado, já não consegue dar conta dos patamares de excelência exigidos. Na busca de atingir o aproveitamento máximo do potencial da mão-de-obra, progressivamente, o capital começa a considerar e ter interesse na subjetividade do trabalhador. Nesta nova abordagem, reduzem-se os níveis hierárquicos, passa a ser demandado que o trabalhador não se limite mais a cumprir as tarefas, mas também as melhore. As atividades de trabalho são ampliadas (integrando atividades de produção, qualidade e manutenção) e o melhor desempenho da empresa passa a ser conseguido com aproximação entre as funções de gestão e o chão de fábrica, ampliação da participação, maior autonomia dos trabalhadores e com o trabalho em equipe. Surgem os grupos de melhoria, grupos semi-autônomos, grupos multifuncionais de projeto, etc. Contudo, é preciso motivar o trabalhador para que ele mobilize toda sua capacidade (física e cognitiva) em favor do melhor desempenho da empresa. As modernas empresas vêm investindo em técnicas de incentivo à participação dos trabalhadores, geralmente avaliando o seu desempenho e associando recompensas à performance que atenda às expectativas da empresa. A maioria destas técnicas que funcionam como apelo à colaboração, por outro lado, incentivam a competitividade e o comportamento individualista, o que limita os benefícios do trabalho em grupo. Os limites à expansão da gestão participativa nas empresas capitalistas também são dados pela incompatibilidade entre as idéias de eliminar a divisão planejamentoexecução e manter a separação capitaltrabalho. Mesmo nos mais avançados Pág. 66 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição sistemas de remuneração, os lucros não são repassados aos trabalhadores na mesma proporção em que cresceram por conta do trabalho participativo e do maior envolvimento e dedicação dos mesmos (MARTINS, 1995). Lima (1995) aponta as contradições existentes em relação às características de personalidade que estas empresas buscam em seus trabalhadores: altamente competitivo e altamente cooperativo; muito individualista e capaz de trabalhar em equipe; capaz de tomar iniciativa e de se conformar perfeitamente às regras ditadas pela organização; etc. Nas cooperativas a motivação inicial para a participação e colaboração surge naturalmente já que, de fato, todos são donos, dependem diretamente do sucesso do negócio e entendem que o êxito do empreendimento será fruto da sua ação coletiva. Extinta a dicotomia capitaltrabalho, os trabalhadores, motivados pelas oportunidades de crescimento pessoal e de apropriação do capital (produto do trabalho coletivo que retornará para a coletividade), passam a colaborar como podem e a desenvolver novas habilidades e conhecimentos para melhor participar da gestão da empresa. Segundo Holzmann (2001), o desafio assumido é motivação suficiente para que assumam novas funções e se interessem em ampliar o repertório de conhecimento técnico e de gestão para dar provas à comunidade externa à fábrica (fornecedores, clientes e familiares) em dúvida quanto à viabilidade da iniciativa. “A percepção em maior ou menor grau, de que agora “trabalha-se para si mesmo e não para o patrão”, parece ser, de fato, a pedra de toque das mudanças de comportamento. (...) Ademais, o aumento do compromisso com o desempenho da empresa indica que agora o trabalhador enxerga seu futuro diretamente relacionado ao da empresa.” (Lopes et al., 2002, p.61 e 62) Publicada em Outubro de 2004 Apesar dos indicativos de que a gestão participativa incrementa a competitividade e de que a cooperativa seria um ambiente favorável para a implantação ampla da gestão participativa, no Brasil, não se pode negar a dificuldade de realizar uma gestão eficaz, adaptando-se às necessidades de mercado e utilizando-se das especificidades da indústria autogestionária. Para Peixoto e Lopes (1999) a dificuldade de alcançar um grau mais elevado de cooperativismo/associativismo esta associada a comportamentos e atitudes herdados da cultura anterior. Isto é verificado principalmente pela dificuldade de redução das barreiras de comunicação entre a administração e o chão-de-fábrica/ campo. Sabendo da ineficiência da gestão na maioria das cooperativas, coloco como hipótese que um dos principais problemas é que estas empresas são formadas a partir de um sistema herdado do modelo hierárquico de onde são extraídos instrumentos de controle e enxertados espaços de participação, sem que de fato a organização do trabalho seja adequada a um modo de produção participativo nem o desenvolvimento dos trabalhadores seja suficiente para que se sintam aptos a contribuir e se responsabilizar pelas decisões tomadas. O objetivo deste estudo é inicialmente entender porque a gestão participativa, consagrada pela velocidade que imprime nos processos de inovações e melhorias, não é a arma fundamental das indústrias autogestionárias para se diferenciar dos concorrentes na disputa pelo mercado. Ao contrário, a morosidade do processo decisório acaba sendo um dos fatores que inviabiliza a competitividade destas empresas. O estudo pretende ainda concluir sobre as condições necessárias para desenvolvimento de uma gestão participativa eficaz nas cooperativas. A pesquisa justifica-se na medida em que a grande maioria dos estudos organizacionais a cerca dos benefícios e limites Pág. 67 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição da autonomia, da gestão participativa e do trabalho em grupo foi baseado em grandes empresas capitalistas. Há pouco estudo realizado em pequenas ou médias empresas nacionais e menos ainda em empreendimentos industriais autogestionários. As grandes referências nacionais sobre autogestão e cooperativismo, em geral, tem caráter político e social e não se aprofundam na questão do impacto que a forma de organização do trabalho tem no desempenho da empresa. Tratam de forma cada vez mais consistente a análise comportamental, as implicações institucionais da autogestão no desenvolvimento e comportamento do indivíduo e do grupo ou trazem excelentes discussões sobre as possibilidades de crescimento da economia solidária. Estas pesquisas geralmente destacam os efeitos positivos que a liberdade de participação e a apropriação do lucro pelos próprios trabalhadores têm na disposição para colaboração, no interesse em desenvolver-se (aprendendo outras funções e tendo uma melhor noção dos negócios da empresa) e no comprometimento com os resultados. Por outro lado, apontam problemas como a necessidade de qualificação, de acesso a crédito, de formação de redes de negócio entre cooperativas, de apoio do governo e de mudanças na legislação. Mas normalmente não se aprofundam na questão da organização do trabalho nem na, sempre citada, necessidade de capacitação gerencial da mão-de-obra. Esta pesquisa pretende justamente investigar estas dificuldades em situações reais de trabalho, considerando que isto é necessário para melhor compreender o que falta para que as cooperativas industriais efetivamente se utilizem da gestão participativa como diferencial competitivo. 2. O Estudo de caso Esta pesquisa está centrada sobre o caso da COOPARJ (Cooperativa de Produção de Parafusos do Rio de Janeiro LTDA.). O poder de generalização dos resultados da pesquisa está relacionado à representatividade do caso escolhido uma Publicada em Outubro de 2004 vez que nele são encontrados os principais aspectos típicos dos empreendimentos autogestionários no Brasil, definidos por Gonçalves (2000): histórico de formação a partir da falência de uma empresa; quadro de pessoal forte na área de produção e deficiente nas demais áreas; eqüidade de remuneração; obsolescência tecnológica dos parques industriais; capital de giro insuficiente; dificuldades de acesso a crédito; falta de controle adequado de custos; conflitos internos; dificuldades em gestão e controle; grande quantidade de concorrentes e competição principalmente baseada em preço. A pesquisa de campo teve como base metodológica a pesquisa-ação, que consiste em acoplar pesquisa e ação em um processo no qual pesquisadores e pesquisados interagem procurando elucidar a situação em que estão inseridos, identificando problemas, buscando e experimentando soluções em situação real. Simultaneamente, há produção e uso de conhecimento (THIOLLENT, 1997). A pesquisa-ação prevê que as prioridades sejam ditadas pela situação através da interação, em situações reais de trabalho, entre pesquisador e atores do processo. Sendo assim, durante os 6 meses de pesquisa e mais de 40 visitas à empresa, a interação ocorreu em diversas reuniões gerais e reuniões do conselho diretor e na atuação conjunta com diversos cooperados em atividades como: levantamento do custo dos produtos, histórico de vendas para previsão de demanda, elaboração de planilha para cálculo de necessidades de matéria-prima, planejamento e controle de produção, visita a clientes e pesquisa de mercado, análise de oportunidade de produto, avaliação estratégica, entre outras. A COOPARJ, como outras tantas cooperativas industriais, surgiu a partir da falência de uma empresa privada. O início da formação da cooperativa foi em 10 de janeiro de 1996. Na composição inicial eram 44, dos 290 ex-funcionários da extinta Parafusos Águia S.A.. Pág. 68 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição A retirada (remuneração) de todos os cooperados é igual, independente da função ou do desempenho. A equidade de remuneração, que deveria favorecer a participação igualitária, acaba gerando insatisfação do grupo que é mais empenhado e que afirma não ser justa uma remuneração igual para níveis de dedicação e envolvimento diferentes. Devido à dificuldade financeira, o valor da retirada está congelado há anos e bastante defasado da média de mercado, para a maioria dos cargos. Por isso, eles preferem adiar a discussão da diferenciação de remuneração para quando houver possibilidades de elevar os valores. As máquinas, apesar de obsoletas, em um só turno, geram uma capacidade produtiva que ainda supera a demanda atual. A estrutura conta agora com 28 cooperados e 6 não cooperados na área de vendas e contabilidade. A estrutura organizacional é muito informal. Não há definição clara das responsabilidades de cada cargo. Há ineficiência e falta de controle em áreas como: financeira/custos, PCP, marketing e vendas. Isto era esperado, devido a falta de experiência nestas áreas. Mas para agravar o quadro, são freqüentes as mudanças dos responsáveis por estas funções e não é prevista a capacitação para executar as novas funções assumidas. A origem e formação dos cooperados justifica em grande parte as carências de capacitação diagnosticadas durante o processo de pesquisa. Dos 44 cooperados referidos, 02 vieram do departamento de pessoal (as duas únicas mulheres) e os outros 42 eram oriundos da área de produção. Não faziam (nem fazem) parte da COOPARJ nenhum cooperado com experiência prévia em áreas como: finanças, contabilidade, fiscal, vendas, marketing, compras ou PCP. Além disso, a experiência de gestão da Parafusos Águia (empresa de origem) não foi incorporada, porque a cooperativa se formou sem nenhum representante do poder (diretores ou gerentes). Publicada em Outubro de 2004 A Parafusos Águia era uma indústria com estrutura bastante hierarquizada e sem nenhum incentivo à participação dos operadores nas tomadas de decisão e nem mesmo nos processos de melhoria. Sendo assim, a ausência dos antigos gestores na estrutura da cooperativa poderia facilitar o processo de rompimento com os padrões de trabalho anteriores, facilitando a democratização das relações de trabalho e favorecendo a participação efetiva dos cooperados. Por outro lado, o tempo de exposição a este sistema de trabalho e a própria idade dos cooperados (média 45 anos), dificultam a mudança de postura no trabalho. A idéia de que o sistema hierárquico, com fiscalização severa, é o caminho para a eficiência não estava somente na cabeça dos gestores. Parte dos cooperados trazem consigo este pensamento: “Se não tiver ninguém pra mandar e regular, a gente relaxa mesmo. Eu mesmo, aqui, não trabalho tanto, não faço tanta coisa, quanto eu fazia lá na Águia.” (Depoimento de um cooperado, durante uma reunião geral) Esta mentalidade não é exclusividade da COOPARJ, a maioria das empresas de autogestão passa pela mesma dificuldade: reverter a mentalidade habitual de funcionários cumpridores de ordens para uma nova mentalidade de sócios e coresponsáveis pelas decisões e resultados (LIMA et al., 2000). No entanto, existe na COOPARJ um grupo consciente e dedicado, que não se cansa de lutar pelo sucesso da cooperativa. A diretoria atual conduz uma gestão transparente e democrática. Alguns chegam a reclamar da falta de autoridade. A humildade da diretoria para realizar qualquer tarefa que considerem necessária é impressionante e impensável em uma estrutura hierarquizada. Quando preciso, a presidente da cooperativa faz e serve o almoço, o diretor comercial faz entregas, o diretor financeiro faz todos os pagamentos Pág. 69 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição em banco, o diretor administrativo não deixou de ser o responsável pela ferramentaria e o diretor industrial faz manutenção nos equipamentos. Ainda no segundo semestre de 2001 a situação financeira era bastante crítica devido à queda de 35% no volume de vendas em relação ao ano 2000. O endividamento crescente (contas e retiradas atrasadas) vinha ocorrendo em função do baixo faturamento que, ao longo do ano, não estava sendo suficiente para cobrir as despesas. O capital de giro, que sempre foi escasso, tornou-se inexistente. A empresa não possuía estrutura de custo dos produtos e os preços eram definidos a partir da opinião dos cooperados e representantes de vendas. Após montarmos, juntos, o custo e o preço mínimo para determinado ponto de equilíbrio, foi fácil identificar que, no patamar de vendas da época, o custo total dos parafuso da COOPARJ era alto e boa parte das vendas vinha sendo realizada com prejuízo. 3. A participação e o processo decisório na COOPARJ As características da cooperativa (ausência de hierarquia, história de luta conjunta e alinhamento de objetivos) motivam o envolvimento, a participação ampla e a contribuição para a solução de problemas. “Na empresa anterior, eu já não dava mais idéias. Porque o encarregado ignorava minhas idéias ou passava para o gerente como se fossem idéias dele. Puxa! Desde de que montamos a COOPARJ nós já fizemos uma porção de melhorias nestes equipamentos.” (Declaração de um cooperado) Na COOPARJ a gestão participativa não é bem estruturada. Em média 2 vezes por mês são feitas longas reuniões com a presença de quase todos os cooperados para a discussão de temas recorrentes como: a queda no faturamento, o atraso nas Publicada em Outubro de 2004 entregas, a insatisfação com a remuneração, a falta de empenho dos cooperados, etc. A motivação para a participação e a liberdade de expor opiniões e propor soluções é percebida no dia-a-dia e nas freqüentes reuniões. Os cooperados demonstram ter clareza dos principais problemas da cooperativa. As reuniões são férteis em proposições, no entanto, não são conclusivas. Além disso, o processo de desenvolvimento das idéias não é sistematizado e tem pouca capacidade de implementação. “Levamos quatro anos até decidir e começar a fabricar o parafuso fenda cruzada (Philips) e mesmo agora, que estamos produzindo e vendendo, ainda não sabemos se é um bom negócio.” (Presidente da COOPARJ) A falta de conhecimento e informações é uma marca destas reuniões. Todas as discussões estratégicas na COOPARJ (novos produtos, novos mercados, parcerias, definição de preços, etc.) são fortemente marcadas pelo “achismo”, pela falta de dados concretos. Dados que deveriam embasar as propostas, facilitar os acordos coletivos, sustentar as decisões e reduzir os riscos. Sendo assim, as decisões acabam não sendo tomadas por uma insegurança geral e o clima de conflito se agrava. Um exemplo das conseqüências da falta de controles e informações está no resultado das atividades de programação e controle da produção (PCP). A ineficiência destes processos é evidenciada pela recorrência mensal de problemas como: falta de matéria-prima, produção para estoque enquanto há pedidos em atraso, sobrecarga e ociosidade simultâneas de máquinas e pessoas. Apesar da relação conflituosa entre as áreas de vendas, produção e PCP, todos são cientes de que a ausência de programação e controle prejudica os resultados da empresa. Tive oportunidade de presenciar mais de uma reunião geral em que todos debateram e decidiram pela introdução de controles formais na Pág. 70 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição produção. No momento da implantação a proposta era criticada e abandonada. Era como um medo de que os controles fossem ressuscitar a relação de hierarquia entre a administração e a produção. A administração daria as ordens de produção, os trabalhadores teriam de cumprí-las e a diretoria cobraria o cumprimento das metas. Esta idéia eles rejeitavam, pois viam a ausência de hierarquia e a liberdade de expressão como as principais vantagens concretas de serem cooperados, ao invés de assalariados (uma vez que a expectativa de melhoria da remuneração ainda não havia sido alcançada). A cooperativa vivia o dilema: a ausência de controles (mais confortável, porém reconhecidamente ineficiente) ou a introdução de controles que deveriam elevar a produtividade, mas destruir o relacionamento de igualdade que vinha sendo construído. Estava claro que eles desconheciam os mecanismos e as possibilidades de um planejamento participativo. Quando pensavam em controles, remontavam ao que existia na Parafusos Águia, reproduzindo a forma e adotando inclusive termos impróprios à cooperativa como a O.P. (ordem de produção). Por outro lado, o episódio relatado a seguir, sobre a avaliação de uma oportunidade de desenvolvimento de produto, ilustra a capacidade de realizar um processo decisório participativo e eficiente. A reflexão sobre a experiência serviu ao grupo para enxergar o conhecimento instalado, ver que a integração deste conhecimento os torna mais competentes como empresa e também valorizar a disponibilidade de informações que, em parte, substituíram o “achismo”, suportando as discussões e acelerando o processo decisório. Durante reunião com o conselho diretor, analisávamos a queda de faturamento e a impossibilidade de oferecer preço competitivo para os parafusos de linha em vista do alto custo. Concluíamos, com base Publicada em Outubro de 2004 na avaliação estratégica, a necessidade de desenvolver novos produtos (fixações especiais) que pudessem ser comercializados com uma margem melhor, preferencialmente através de venda para pequenas indústrias. Neste momento, o diretor comercial (que também é entregador), lembrou ao grupo que havia um produto em vias de desenvolvimento que tinha sido deixado de lado, apesar do interesse do cliente. A história era a seguinte. Enquanto realizava entregas em um cliente regular (fabricante de fechaduras), o entregador percebeu que eles fabricavam pinos para as fechaduras com um processo manual e lento. Identificou então a possibilidade de produzir aqueles pinos nas prensas automáticas da COOPARJ. Vale destacar a vantagem de contar com um entregador/vendedor que entende do processo produtivo e está motivado a buscar soluções para sua empresa. No mesmo momento, verificou o interesse do cliente e o consumo mensal médio. Feita a identificação da oportunidade, a idéia então foi levada para a cooperativa. O diretor comercial discutiu a possibilidade com o diretor administrativo (que também é o ferramenteiro) e juntos, fizeram a verificação da viabilidade técnica. O processo é bem mais simples que a produção de parafuso, podendo ser realizado em uma única etapa, em maquinário ocioso. A matéria-prima é disponível (mesmo arame de alguns parafusos de linha) e nenhum investimento seria preciso. Mais uma vez eles chegaram a conclusão de que era possível produzir, mas não sabiam se valia a pena e a história tinha parado por aí. Neste momento, decidiu-se dar prosseguimento a avaliação da oportunidade naquela reunião. A reunião durou pouco mais de uma hora e contou apenas com a participação das pessoas chaves: entregador (diretor comercial, que identificou a oportunidade e previu a demanda), o ferramenteiro (diretor administrativo, que havia feito o estudo de Pág. 71 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição viabilidade técnica), o diretor financeiro (que ajudou na estimativa do custo e formação do preço), o vendedor (que ficou responsável por fazer contato com o cliente). Eu estive presente somente para motivar a uma discussão que fosse sustentada por dados (mesmo que aproximados) e fosse conclusiva. A conclusão foi favorável ao desenvolvimento do produto já que estava claro o benefício básico para o cliente: preço abaixo do atual custo dele e prazo muito reduzido. O interesse para a COOPARJ também estava claro: aumentar o faturamento através da utilização de equipamento ocioso e gerar lucro através da venda com uma margem muito superior a média praticada para os produtos de linha. É nesta dinâmica, agilidade e ausência de burocracia dos processos e também na motivação e na versatilidade das pessoas que está o diferencial competitivo da cooperativa. As idéias chegam diretamente a quem pode levá-las adiante. É claro que o desenvolvimento do pino para fechaduras não é a solução única e definitiva para os problemas de faturamento da COOPARJ, no entanto este teve um papel crucial de provar, para eles próprios, que são capazes de ser eficientes no processo de desenvolvimento de produtos. Mais do que isso, são capazes de criar e encontrar alternativas de sobrevivência para a COOPARJ. A expectativa não é tornar-se líder de mercado, mas garantir a sobrevivência do negócio e a manutenção dos empregos, através da criatividade e busca constante do seu espaço no mercado. Apesar do interesse, um mês depois, envolvidos nos problemas de rotina e nas tantas atividades que a diretoria acumula, eles ainda não haviam contactado o cliente para propor o preço e tentar fechar o negócio. Isto chama a atenção para o seguinte problema: as atividades que visam a transformação da situação, como o Publicada em Outubro de 2004 desenvolvimento de produtos, não estão previstas como funções dos cooperados, isto dificulta a condução de processos de mudança até a implementação. 4. Conclusão Sobre a organização do trabalho, pode-se observar que, no mundo inteiro, a gestão participativa (GP) vem sendo adotada como estratégia patronal para obter redução de conflitos e maior envolvimento e dedicação dos trabalhadores, o que resulta em ganhos de produtividade. Salerno (1999) propõe a “gestão democrática”, visando sistemas de produção ao mesmo tempo mais eficientes e menos predatórios da força de trabalho. A “gestão democrática” seria um diferencial competitivo de rapidez e acertividade tanto para inovações de produto e melhoria do processo, quanto para fazer face a eventos cotidianos que prejudicam a produtividade. Esta proposta de participação, ousada para empresas capitalistas, é a característica primeira de legitimidade da autogestão. Este é um facilitador para uma gestão moderna e competitiva. No entanto, na maioria dos casos de indústrias autogeridas brasileiras, o modelo de gestão implantado não propicia uma participação eficiente dos trabalhadores, nem sequer o desenvolvimento dos mesmos para que se sintam capacitados a contribuir e se responsabilizar pelas decisões tomadas. Nesses casos, como o da COOPARJ, o processo decisório torna-se moroso e desgastante. No caso estudado, o interesse e a abertura para participação de todos podem ser vistos nas freqüentes reuniões, sempre lotadas, ou no exercício do direito de entrar, quando querem, nas salas da diretoria, administração ou vendas e colocar suas inquietações ou proposições. Foi percebida na Cooparj a influência das características que favorecem a participação, tais como: igualdade de voto em questões decisivas para o negócio, Pág. 72 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição possibilidade de eleger seus dirigentes, ausência de hierarquia e redução das diferenças de remuneração, além da postura humilde e aberta da 2ª e atual diretoria (os cooperados afirmam que na 1ª gestão a abertura e igualdade não eram as mesmas). Cabe ressaltar que as condições aqui expostas realmente favorecem a participação ampla, mas nem sempre a participação eficiente. Para que a atuação integrada e eficiente passe a fazer parte da estratégia permanente de atuação da Cooparj, elevando a competitividade do negócio, o coletivo dos trabalhadores precisa transpor alguns obstáculos. A experiência acumulada durante a realização do estudo de caso permite indicar possíveis respostas para os seguintes questionamentos: “Quais os obstáculos para a transformação em um ambiente onde tudo sugere a cooperação e a participação? Que adequações as cooperativas devem realizar para utilizar a participação ampla como vantagem competitiva?” Os principais obstáculos que a cooperativa deve transpor para tornar eficiente a gestão participativa são os seguintes: acúmulo de funções e indefinição de responsabilidades (gera ineficiência dos processos rotineiros e reduz a capacidade de implementação de melhorias), falta de visão global de gestão (o conhecimento instalado não é suficiente e está disperso), carência de informações e controles (dificulta a construção dos acordos coletivos, retardando a tomada de decisões) e ausência de canais de participação adequados (dificulta o tratamento de conflitos, a integração e difusão do conhecimento). Acúmulo de funções e indefinição de responsabilidades Não existe uma definição clara das funções e responsabilidades de cada cooperado, o que prejudica o andamento das atividades de rotina. Além disso, as atividades ligadas à transformação da situação (busca de oportunidades, projeto de produtos, projeto Publicada em Outubro de 2004 de melhorias no processo etc.) não estão previstas nas funções e responsabilidades dos cooperados e portanto, não fazem parte da estratégia permanente de atuação da Cooparj. Etapas destes processos acontecem de forma esporádica e são geralmente preteridas em função de atividades de rotina. Existe um baixo entendimento da necessidade e dos objetivos das atividades de planejamento e projeto. Portanto, estas atividades não são bem aceitas, nem valorizadas pelo grupo. Por exemplo, quando o supervisor de vendas decidiu passar alguns dias recalculando os preços mínimos para acabar com as discussões, quase diárias, a respeito da lucratividade ou não das vendas realizadas pelos representantes, o comentário de um dos cooperados representou bem a percepção do grupo: “A gente não entende o que é que ele tanto escreve. Não é supervisor de vendas? Devia estar na rua vendendo. O que a gente precisa é faturar mais.” Isto acaba, de certa forma, forçando o grupo de dirigentes a envolver-se em atividades paralelas, dedicando-se menos a reverter a difícil situação da cooperativa. Muitas vezes, eles próprios preferem estar envolvidos em atividades de resultado imediato, nas quais seja visível a contribuição da sua força de trabalho para a cooperativa, do que dedicarem-se a atividades de mais longo prazo que envolvam algum risco de insucesso. Esta consumição em atividades de rotina por um lado quebra barreiras e estimula a cooperação, por outro reduz o tempo disponível para dedicação à gestão da empresa e a projetos de melhoria. Falta de visão global de gestão Apesar da notada ampliação do repertório de conhecimento técnico e de gestão dos cooperados, evidenciado em vários momentos da pesquisa e desenvolvido com ajuda de alguns cursos, mas principalmente pela experiência prática ao longo de seis anos de trabalho cooperativo, os Pág. 73 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição trabalhadores ainda não têm uma visão global de como e quando este conhecimento deve ser integrado e utilizado. A visão global é especialmente importante nas atividades que visam transformar a situação, tais como: projeto de produtos, melhorias de processo etc. Para realizar mudanças de forma eficiente é preciso ter noção do processo como um todo. Deve-se envolver aqueles que podem contribuir de fato, planejar as atividades, definir responsabilidades, reunir as informações necessárias em cada etapa do processo e acompanhar o andamento dos trabalhos até a implementação das soluções encontradas ou decisão de abandono. Era esperado e, de fato, é uma dificuldade, que eles não possuíssem todo este embasamento, devido à sua formação e às limitadas oportunidades de acesso a novos conhecimentos. Na Cooparj estas atividades ainda não são previstas e sistematizadas, mas depois de interagir em situações reais de trabalho, como exemplificado pela avaliação de oportunidades de produto, ficou claro que eles têm pleno potencial para desenvolver esta capacitação. A partir da sistematização das informações e de discussão em grupo, eles realizaram boa parte dos processos e ao final puderam compreender a importância e complementaridade das etapas que tinham sido realizadas. Como eles definiram no caso do pino de fechaduras: “Eu já sabia que o cliente estava interessado.” (levantamento da oportunidade) “Passei para o Willian e ele viu que dava para fazer.” (estudo de viabilidade técnica) “Mas a gente não sabia se valia a pena” (estudo de viabilidade econômica). Foi esta última etapa que fizemos em grupo e eles puderam perceber o processo global, a necessidade e interrelação entre as diferentes etapas realizadas. Carência de informações e controles Publicada em Outubro de 2004 Outra importante deficiência do sistema participativo ali encontrado é a carência de informações. Fator que torna moroso e desgastante o processo decisório. Pôde ser percebido nas freqüentes, longas e pouco conclusivas reuniões, onde devido à falta de informações que suportassem as propostas colocadas, surgiam impasses infindáveis e os acordos coletivos ficavam inviabilizados. Por outro lado, pôde ser valorizada no momento da avaliação estratégica quando as informações levantadas ajudaram a confirmar ou descartar a viabilidade de antigas idéias sobre quais seriam as boas oportunidades de negócio para a empresa. Mesmo reconhecendo a importância das informações e a deficiência dos controles que as geravam eles não conseguiam reverter este quadro. Uma análise que ajudou a esclarecer o cerne desta questão foi a da relação programação-produção, exposta no item 3. Na Cooparj, o fim da separação planejamento-execução não havia sido conseguido através do planejamento participativo, mas da desvalorização e quase total desconsideração das atividades de planejamento/programação. Sem conhecer outras referências de gestão, eles importaram o sistema hierárquico da antiga instituição e extraíram ou minimizaram a importância de tudo aquilo que os incomodava (por exemplo, as metas e controles de produção). Então, quando pensavam na introdução de controles, acreditavam que isto ressuscitaria a divisão planejamentoexecução e toda a idéia de hierarquia que está por trás desta dicotomia. Dicotomia que o planejamento participativo procura amenizar e que, no caso de cooperativas, onde não existem limites para a participação e acesso a todo tipo de informação, pode não fazer mais sentido. No entendimento dos cooperados, a escolha seria entre manter a liberdade e igualdade pagas com a ausência de informações e ineficiência ou optar pela Pág. 74 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição implantação de controles que traria o reaparecimento da relação hierárquica entre administração e produção, mas seria recompensada com possível elevação da eficiência. Estava claro que eles desconheciam as possibilidades de um planejamento participativo. Tinham como única referência o sistema hierárquico, no qual faziam remendos tentando adequá-lo à realidade da cooperativa. Ausência de canais de participação adequados O que inicialmente parecia barreira de comunicação entre administrativo e produção, foi melhor definido com o andamento da pesquisa como ausência de canais adequados para interação entre setores. A primeira impressão de que eram “arraigados ao sistema de gestão anterior” foi completamente descartada. Na verdade, eles o rejeitam e tentam afastar-se o quanto podem dele, só não o fazem de forma mais eficaz por não terem referência (teórica, nem prática) de outro sistema que possa substituí-lo, adequando-se ao cooperativismo. Na Cooparj, a relação PCP-produção deixa clara a necessidade de criar espaços formais para interação entre saberes e articulação das diferentes lógicas. É um exemplo de que, quando isto não ocorre, a liberdade e a autonomia acabam sendo usadas para criticar e desconsiderar o trabalho alheio ao invés de servir para a construção coletiva de soluções. Nestes espaços formais de interação, a ausência de limites à autonomia e a possibilidade de acesso irrestrito a todo tipo de informação poderiam ser diferenciais das cooperativas para realização eficiente da explicitação e mediação entre lógicas conflitantes (produção, PCP, vendas, estoque, finanças etc). Para estes grupos, seria mais fácil compreender a complementaridade destas lógicas, facilitando o estabelecimento de prioridades em alinhamento com o interesse final da empresa (que é de todos). Publicada em Outubro de 2004 Se conhecessem os mecanismos e as possibilidades de um planejamento participativo, poderiam adequá-lo, implantando um sistema que o superasse em autonomia e eficiência. Para que estas empresas sejam capazes de competir no mercado capitalista com outras pequenas e médias empresas (PMEs) tradicionalmente organizadas, entre outras coisas, será preciso apoiá-las no desenvolvimento de uma gestão participativa própria e eficiente. A Engenharia de Produção e as universidades podem vir a ter uma contribuição significativa e fazer com que mais empreendimentos autogestionários possam se viabilizar como uma alternativa, uma forma mais solidária de organização do trabalho, deixando de ser apenas um paliativo temporário de combate à crise do emprego. Referências bibliográficas GONÇALVES, L. A. S. (2000). Empresas Autogestionárias no Brasil – Principais Problemas e Proposta da Metodologia de Pesquisa-ação; Tese M.Sc., COPPE/UFRJ, Rio de Janeiro. LIMA, M. E. A.; Os equívocos da excelência, Petrópolis, RJ : Vozes, 1995. LIMA, F., CAMPOS, N., DUARTE, F. (2000). As resistências organizacionais no processo de desenvolvimento de Produto. In: 2º Congresso Brasileiro de Gestão de Desenvolvimento de Produto. UFSCar. São Carlos. LOPES, J.R. et al., 2002; “Sobre a cultura do trabalho autogestionária”; In: Fórum Social Mundial - Economia Popular Solidária; pp. 60-65, Porto Alegre; 2002. MARTINS, J.F.G., 1999; “Vivências e experiências dos trabalhadores nos processos participativos: a busca do sentido da vida” In: VI Encontro Nacional da Associação Brasileira de Estudos do Pág. 75 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição Trabalho (ABET); Salvador; 1999. Anais Publicada em Outubro de 2004 Eletrônicos; espaços de comunicação-negociação. Editora Atlas S.A. São Paulo. OLIVEIRA, S. H. (2002). A Autogestão como Diferencial Competitivo: o caso de uma cooperativa industrial. Tese M.Sc., COPPE/UFRJ. Rio de Janeiro. SINGER, P. (1998). “Administração autogestionária: uma possibilidade de trabalho permanente” In: Empresa Social e Globalização. ANTEAG. São Paulo. PEIXOTO, J. A.; LOPES, V. F. M.; A reestruturação produtiva no Brasil e o caso de empresas industriais sob regime de autogestão ou co-gestão, Rio de Janeiro, 1999. THIOLLENT, M. (1997). Pesquisa-ação nas organizações. Editora Atlas. São Paulo. SALERNO, M. S. (1999). Projeto de Organizações Integradas e Flexíveis: processos, grupos e gestão democrática via ------------------------* Doutoranda do Programa de Engenharia de Produção da COPPE/UFRJ, trabalhando na área de arranjos produtivos locais e pequenas e médias empresas. ** Professor do Programa de Engenharia de Produção da COPPE/UFRJ. Pág. 76 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição Publicada em Outubro de 2004 Artigo Rede dinâmica em aglomerados de empreendedores de base artesanal Janio Caetano de Abreu * RESUMO O presente estudo refere-se a proposta de rede dinâmica em aglomerados (APL’s) para empreendedores de base artesanal. Foram estudados quatro APL’s de municípios da Microrregião de São João Del Rei, em Minas Gerais. São utilizadas quatro categorias de análise e de ação, tendo como suporte a orientação dos estilos participantes de pesquisa, em especial, da pesquisa-ação. É constatada a importância de fatores contemporâneos e também históricos no incremento desses APL’s. Observa-se uma função complementar na atividade de base artesanal e tem-se que, aplicando a metodologia utilizada neste esforço, são verificadas condições para as respostas em ambientes aglomerados. As ações em rede intra e intercluster, apoiadas por mecanismos de integração propiciam um encadeamento multiplicador de esforços que disparam os ganhos, criando perspectivas de fortalecimento dos atores envolvidos. Palavras chave: Aglomerados de empreendimentos, rede dinâmica. ABSTRACT The study verifies the importance of contemporary and historical factors in the inprovement of those productive agglomerates. It observes a complemental function in the activity of handmade base. The research verifies that, by applying the methodology used in this effort certain conditions for answers in environment of those clusters were provided, such as regarding earnings in scale through coordinated exchanges, in the form of alliances and partnerships because of the construction of a dynamic and flexible net. The intra and intercluster networked actions based on integration mechanisms propitiate a linkage multiplier of efforts that favors the earnings, creating perspectives of the involved actors' invigoration. Key words: productive agglomerates, dynamic network. Introdução Este artigo se refere aos Empreendedores de base artesanal (EBA’s), que compõem um cenário aglomerado de produção no âmbito de quatro cidades da Microrregião de São João Del Rei – Minas Gerais. Mobilizam a maior parte da população trabalhadora, dos quatro municípios, nas atividades respectivas de produção de artigos de couro (Dores de Campos e Prados), tecelagem artesanal (Resende Costa) e de biscoitos (São Tiago), tornando cada atividade como socioeconômicamente predominante. E, à feição dos pequenos e micros empreendimentos (PME’s) brasileiros, têm problemas, seja no campo da ação política, seja na mobilização e Pág. 77 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição organização para aproveitamento de oportunidades geradas pela ação aglomerada, o que impacta diretamente as cidades. O presente texto se alicerça sobre uma sinopse do referencial teórico, da metodologia e dos resultados formulados em ABREU (2002). Porém, atualizações foram necessárias. É que trabalhamos com o conceito de rede dinâmica e o processo de enredamento impõe ajustes. Mais, o estudo original é sustentado pelos estilos participantes de pesquisa em que os atores, ao invés de serem objeto, são sujeitos e, assim, se beneficiam de forma imediata e cumulativa. Rede e Aglomerados Produtivos Locais (APL’S) A rede estratégica é formada por “um grupo de empresas independentes, unidas por meio de alianças múltiplas para alcançar um objetivo comum”. (LEWIS, 1992). São várias tipologias: redes verticais ou de adição de valor; redes de divisão de tecnologia e redes de participação acionária (LEWIS, 1992). LYNCH (1994) propõe pequenas diferenças nessas abordagens. Ele chama de teia as redes estratégicas, mas considera as mesmas tipologias. RANGAN et al (1996) falam das redes internas extensivas de subsidiárias e das redes externas; KOTLER (2000) destaca a rede de marketing e TEIXEIRA et al. (2002) propõem redes de firmas verticais e horizontais. Já CASAROTO FILHO et al. (1998) sugerem as redes topdown, ou seja, as redes em que as PME’s estão vinculadas e dependentes de uma empresa-mãe, como terceirizados, subcontratados, ou como faccionistas, satelitizadas (MONTAÑO, 1999), além de outras formas de repasse de produção. A outra rede é chamada rede flexível de PME’s, com criação alternativa de organização, como os consórcios que substituiriam uma grande empresa (GE). GRANDORI et al (1995) propõem critérios, tais como: tipo de mecanismos de coordenação utilizados, grau de Publicada em Outubro de 2004 centralização da rede e grau de formalização. São três tipos: as redes sociais, burocráticas e proprietárias. Podem ser simétricas ou assimétricas. A simetria é a inexistência de um poder centralizado, onde todos possuem a mesma capacidade de fluência. Nas assimétricas há o agente coordenador central. Nas burocráticas há um contrato formal regulador das especificações de fornecimento de produtos e serviços e a organização da rede. Já o Aglomerado Produtivo Local - APL (cluster), a partir do que se depreende em ABREU (2002 e 2004) é quase sempre relacionado à atividade industrial ou, como estudado aqui, à atividade de base artesanal, ou ainda artesanal. O APL estaria em um estágio emergente, após précluster, considerando o processo de evolução de um cluster. O último estágio seria um aglomerado produtivo independente, o que podemos chamar de arranjo produtivo. O arranjo produtivo também é chamado de APL e, não raro, vê-se confusões entre as terminologias arranjo produtivo e aglomerado produtivo. Os APL’s são empreendimentos produtivos em mesma base territorial, há especialização produtiva, e vínculos de cooperação inerentes, como processos de aprendizagem entre os atores que compõem a cena aglomerada. A diferença do arranjo para o aglomerado é que, no primeiro, há uma articulação planejada, está se operando uma estruturação setorial e local autocoordenada e há presença de atores complementares, com funções bem definidas. Uma estratégia é a organização de coletivos (associações, cooperativas de empreendimentos). Um outro passo é a formação de consórcio. CASAROTO FILHO et al. (1998) asseguram que os consórcios não são capazes, sozinhos, de promover o desenvolvimento das PME’s de um determinado local. Há que se estruturar o segmento e constituir mecanismos de integração. Os autores têm se referido à constituição de agências de Pág. 78 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição desenvolvimento ou de fórum local de desenvolvimento, ou, ainda, de qualquer mecanismo de integração regional como um complemento Metodologia No estudo original (ABREU, 2002), partiu-se de uma questão: “é possível fortalecer artesãos autônomos, micros e PME’s, produtores de artigos de couro, de tecelagem artesanal, e da produção de biscoitos, usando etodologia cooperativa na forma de rede intra e inter aglomerados?”. A partir dessa questão formulou-se algumas dela decorrentes e, dessas, foram selecionadas algumas para esse artigo: - Os EBA’s em aglomerado podem ser mobilizados, apreender aspectos acerca de ações de cooperação em rede e, assim, envidar esforços que disparem um processo integrador de um enredamento dinâmico e uma estruturação microrregional. - Há uma constelação de empreendimentos e atores de apoio setorial em ações compartilhadas, que ganham eficiência quando implementados esforços metodológicos do tipo rede dinâmica proposta neste trabalho. - Os EBA’s são originados de relações históricas de produção e o produto artesanal conserva características centenárias na atividade produtiva, mas sofreu transformações no processo de produção. - É possível se verificar traços de cooperação histórica e manifestações sociais coletivas, o que favorece a consolidação da rede. Da referência sobre redes estratégicas, propôs-se uma estratégia metodológica tendo como seqüência a caracterização, a mobilização e a gestão. Orientada pelos estilos participantes de pesquisa, cujo centro é estudar as coisas mudando-as, como ensina GAJARDO (1986). Fez-se a coleta de dados em seminários; nas entrevistas, utilizando o Roteiro de Publicada em Outubro de 2004 Entrevista – RE (158 entrevistados, divididos nas categorias de empregados, artesãos e proprietários em Resende Costa, Prados e Dores de Campos, em São Tiago, apenas os proprietários foram abordados); observações – participação em reuniões das associações e em eventos ocorridos nas cidades e pesquisa em fonte eletrônica e de papel e pesquisa bibliográfica (pesquisa documental). A pesquisa-ação se deu em três estágios: a pré-mobilização (os contatos preliminares, as primeiras reuniões, observação não participante); a mobilização intensiva (realização de seminários, aplicação de questionários, reuniões para busca de soluções ante a questões levantadas pelos EBA’s); e a mobilização mantenedora. As demais ações são relacionadas à organização da estrutura da rede e setorial, além do aprendizado e experiência de gestão autodeterminada. Caracterização e aspectos da organização produtiva A população apresenta especificidades, como adaptar-se a um desenvolvimento tecnológico, incorporar sobras da indústria, adaptar rudimentos tecnológicos da indústria à atividade artesanal, e conviver em nichos, ou verdadeiros vácuos do mercado industrial oligopolista e cumprir o papel de absorver uma massa crescente em circunstâncias sociais de exclusão.1 Na junção destas pré-condições tem-se EBA’s, não capacitados para acompanhar a corrida tecnológica e impactados pela reestruturação produtiva. Inscrevem-se em fragmentos diversos, por exemplo, se verificados sob a ótica do que DANTAS (2002) classifica: categorias de “empregados das empresas de ponta; os empregados das terceiras; trabalhadores do mercado informal e os excluídos”. Assim, os EBA’s são 1 Ver a esse respeito ABREU, 2003. Pág. 79 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição “ artesãos, empreendedores de produtos artesanais, tradicionais, PME’s, que empregam a expertise do artesão, mesmo que utilizando ferramental, equipamentos, acessórios e matéria-prima, relacionados à indústria. São também EBA’s, empreendedores que trabalham nas funções de interdependência, como fornecedores diretos de matéria-prima, executores de processos em atividade desverticalizada, vendedores lojistas, ambulantes, distribuidores dos produtos dos aglomerados; profissionais construtores de ferramentas, equipamentos, acessórios ou confeccionadores de produtos que serão empregados na atividade fim de origem artesanal” (ABREU, 2002). Aspectos Formadores dos APL’s A tecelagem artesanal é uma atividade milenar. Utiliza os chamados teares de pau, ou de madeira. Nas imediações de onde está a circunscrição microrregional, essa atividade, durante todo o século XIX, fazia parte da longa cadeia produtiva, principalmente, de subsistência das fazendas, mas também constituía em significativa atividade de populações dos núcleos urbanos em formação, os artífices de ofício. Em 1940 há registro (MORETTI, et alii, 1998) que tecelagem artesanal não somente serve como subsistência, mas também inaugura uma fase de produção e comércio mais intensa. A industrialização que inibiu a atividade fornece matéria-prima para o tecelão artesão. O novo ciclo, fortalecido a partir da década de 1940, utiliza refugos, no início conseguidos gratuitamente. Após a expansão da atividade por volta dos anos 1970, o tecelão irá comprar retalhos, sobra da indústria têxtil. O processo de produção tem a cadeia encurtada. Já não se produz fio, mas trabalha-se o retalho, para então constituir o novelo que substitui a lançadeira. Nos últimos anos o retalho tem minguado, há dificuldades para sua obtenção. A indústria ainda é fornecedora da matéria-prima, agora, não em forma de Publicada em Outubro de 2004 refugos, ou apenas de sobras da sua operação, mas da linha, um produto acabado. Isso cria um híbrido processo de produção têxtil. A produção coureira data de 1835, como apurado nas entrevistas e em autores (PEREIRA, 1996). Essas fontes falam da vocação centenária ao afirmarem que Dores de Campos e Prados eram passagem de tropas e boiadas vindas principalmente do Rio de Janeiro em direção à capital de Minas Gerais, Ouro Preto. A produção de biscoitos tem início no final do século XVIII e grande parte do século XIX, segundo historiadores, “... era um ponto de parada de viajantes, no chamado ‘Caminho Novo’ ou ‘Caminho do Sertão’, por onde transitavam comboios, manadas de gados, caravanas, tropas vindas do Rio de Janeiro rumo ao Triângulo Mineiro, Goiás e vice-versa”. (Tribuna de Lavras, 2/10/1999:12) Ainda que apenas na última década do século XX a atividade tenha ganhado proporções, os chamados quitandeiros sempre estiveram presentes no município.2 A atividade é típica de um fenômeno iniciante. Até dez anos antes do ano 2000 a produção se restringia a uma ou outra padaria local para atender a população da cidade. A partir de 1990 é que a procura local foi aumentando, combinando com um movimento de visitantes ao município que incitou a produção em maior escala. Alguns entrevistados nos afirmam em seus depoimentos que o número de produtores estabelecidos chegou a ser o dobro do que se registra hoje. Depois veio o período de “quebradeira”. Agora se pode dizer que se está vivendo “... um terceiro momento de crescimento, só que agora estruturado”. (Jornal Farol, Outubro, 1999:4). A População Empreendedora 2 Ver a matéria da Gazeta de São João Del Rei, de 24 de Setembro de 1999. Pág. 80 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição As cidades possuem população de cerca de 8 mil habitantes (Prados e Dores de Campos) e pouco mais de 9 mil (Resende Costa e São Tiago). Na atividade coureira o maior contingente de trabalhadores é do sexo masculino (89%). Em Resende Costa pode-se afirmar que não há uma predominância e, na atividade de biscoito de São Tiago, predominam em torno de 10% a mais as trabalhadoras. Cerca de 50% não terminaram o ensino fundamental. Cerca de 40% afirmaram ter iniciado o ensino médio. A renda é variada e se situa entre os artesãos (Dores de Campos e Prados), na faixa compreendida entre 1 a 3 salários mínimos. Os empregados percebem em todos os três APL’s entre 1 a 2 salários mínimos e, como, sobretudo em Dores de Campos os EBA’s têm portes variados, a renda dos proprietários varia entre 2 a até 20 salários mínimos, segundo pudemos apurar. Isso na média, porque a atividade coureira apresenta uma melhor remuneração, seguida da produção de biscoitos. O contraponto disso são os cortadores de retalho de Resende Costa que percebem, em média, setenta reais mensalmente. Em Resende Costa prevalecem os domicílios de trabalho (tecelões, urdidores, cortadores de retalho e enroladores de linha). A tecelagem artesanal é eminentemente informal. Cerca de 90% dos trabalhadores não possuem vínculo empregatício ou empreendimentos formalizados. Em Dores de Campos e Prados esse número cai para cerca de 40% e, em São Tiago, não chega a 10% o grau de informalidade. Os EBA’s são constituídos por unidades produtivas que se organizam de diversos modos. Vê-se desde o artesão autônomo em seu domicílio, sendo este o local de habitação e de trabalho, até o empreendimento formal. Esse, tanto pode ser uma oficina de trabalho, uma pequena manufatura, um estabelecimento comercial de produção e venda e distribuição, um local somente de venda e distribuição ou, Publicada em Outubro de 2004 ainda, uma pequena indústria. Os empreendimentos formais constituem o ponto de venda e de produção, são uma extensão do domicílio, no duplo sentido, lugar de residência ou segundo a lei, sede dos seus interesses. São comuns as lojas ocuparem o primeiro andar, a residência, o segundo, e a manufatura ou oficina, os fundos. As cortadeiras e, basicamente, toda a população tecelã utilizam varandas, coberturas, subsolos ou qualquer cômodo para operar. Os curtumes necessitam de lugares especiais. Eram construídos em beira de córregos onde eram jogados os resíduos. As leis ambientais de agora têm mudado esse procedimento e, as exigências legais impõem outro processo de organização. As estações de tratamento são uma imposição. O velho curtume tem sido readaptado para atender as determinações da lei. Na produção de biscoitos tem-se fabriquetas construídas em anexo às residências ou nas proximidades. Por ser uma unidade produtora de alimentos, devese também cumprir exigências sanitárias. Exigem por isso mesmo uma construção específica. Grande parte da população de EBA’s desempenha o papel de homem-cadeia3 que acumula as atribuições de produção, venda, distribuição. Quanto à tecnologia, tem-se desde atividades manuais, passando pelo nível da tecnologia adaptada até o terceiro nível - empreendimentos que utilizam equipamentos mais próximos do industrial. Um EBA pode estar em qualquer nível. Pode estar em dois ou três níveis de tecnologia propostos como tipologia. O Produto dos EBA’s Classificamos os produtos da atividade coureira estudada em três classes: a) o curtume - o produto do seu processo é a sola e a vaqueta; b) selaria - acessórios e 3 Ver COUTINHO (2001). Pág. 81 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição outros componentes de montaria e de tração animal (esta pode ser chamada de atividade principal); c) outros artigos derivados do couro e produtos da interdependência (são artigos diversos de couro, derivados do couro ou compostos também por couro). Nos produtos de interdependência estão as manufaturas produtoras de armações de ferro que compõem o casco da sela ou arreio e partes do estribo. Já a produção da tecelagem artesanal se assemelha ao que ALBUQUERQUE et al. (2002) chamam de clusters horizontais na industria e em que há um compartilhamento de recursos locais. Um produtor produz para dinamizar o processo produtivo. São as bolinhas de retalho ou de linha produzida pelos domicílios, em geral, a serviço de distribuidores intermediários, a teia (o plano da tecelagem confeccionado), e o produto tecido (forros, colchas, caminhos, tapetes, etc.). A produção de biscoitos em São Tiago possui duas categorias simples de biscoitos: doces e salgados; o que varia é a criatividade das receitas.4 A base é o polvilho, seguido do fubá e, em menor escala, a farinha de trigo. Os condimentos são os mais variados. Queijos, canela, cravo, cebola, alho, dentre outros, estabelecendo uma variedade de textura e sabor. É a rosquinha, a broa de queijo, o pão de queijo, a torradinha, o biscoito neném, a broa de queijo, a broa de trigo, o biscoito de fubá, a rosca caseira, o biscoito farinha, o biscoito de quatro pedaços, o biscoito barbacena, a pamonha, dentre outras. A relação de produção em São Tiago muito pouco se assemelha ao que ALBUQUERQUE et al. (2002) denominam de clusters horizontais para o caso da indústria. Nesses clusters há um compartilhamento de recursos locais, em que um produtor produz para dinamizar o processo produtivo. Seu produto integra, 4 Ver MATTA(2002). Publicada em Outubro de 2004 horizontalmente, a cadeia de produção, configurando como atividade complementar. Em São Tiago pouco existe a confecção de produtos intermediários que cumpram o papel de dinamizarem a produção. A mobilização e a gestão compartilhadas, atual e projetadas A pesquisa-ação aplicada na estrutura das categorias, caracterização, mobilização, organização e gestão como se fossem fases, quase sempre interdependentes e intervenientes, encontrou no ambiente aglomerado as condições (mobilização préexistente) para a edificação de uma atividade compartilhada, seja intra e inter aglomerado. Iniciada ainda em etapa de caracterização do ambiente aglomerado, a mobilização intensiva implicou em reuniões em cada cidade e que foram preparatórias para os Seminários Interaglomerado. Foram cerca de 18 reuniões nas cidades dos EBA’s e 6 seminários. Nesses eventos foram feitas palestras, foram promovidos debates acerca de estratégias compartilhadas (alianças, redes) existentes e potenciais. Preocupações e interesses dos EBA’s foram discutidos, com os coletivos (através dos associados) e até com não-associados, pessoas interessadas em participar. Eram convidados outros parceiros institucionais, tais como, entidades públicas, cooperativas de crédito, centros catalisadores de tecnologia, agências regionais de desenvolvimento e outros. Um dos instrumentos gerados, além de outras ações, foi um Plano de Ação para a Rede de EBA’s e a elaboração da Projeto Rede de EBA’s, que focalizavam o reforço à atividade mobilizadora e a busca de novos parceiros para fortalecimento da Rede. No âmbito local buscou-se criar entidades representativas dos EBA’s, como em São Tiago, Prados e Dores de Campos e, para Resende Costa, fixou-se como objetivo principal o fortalecimento da Associação dos Artesãos (ASARC). A fase de organização é constante, como são a Pág. 82 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição mobilização (mantenedora) e a gestão, em busca de procedimentos autogestionários. A estruturação de um Centro de Pesquisa de Tecnologia Artesanal/CPTA (apoiado pela Fundação de Apoio de Ciência e Tecnologia de Minas Gerais/ FAPEMIG) a partir de dezembro de 2004, com a participação de diversas entidades estaduais é o exemplo de organização da rede e estruturação regional. Atualmente, o Projeto Rede de EBA’s, mais o Grupo de Pesquisa interinstitucional – GBARTE (formado por pesquisadores da UFMG, UEMG e UFSJ), têm se reunido com gestores estaduais e municipais para o fortalecimento dos EBA’s. Ressalte-se que os coletivos integrantes da Rede de EBA’s são incubados pela Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares – ITCP/UFSJ e têm apoio da FINEP através do programa PRONINC. Como resultado, destacam-se ainda dois capítulos de livros, duas dissertações de mestrado em andamento e um projeto de doutorado relacionado com o trabalho da Rede de EBA’s. Além disso, são duas monografias de especialização, diversas publicações em eventos, revistas e jornais. Conclusão Pode-se concluir que é possível fortalecer os EBA’s do âmbito estudado, incrementando uma metodologia participativa e que integre os potenciais e as oportunidades desses APL’s em relações intra e inter aglomerados. E isso é necessário porque, em que pese haver o crescimento do número de integrantes produtores nos APL’s, e praticamente ausência de falta de trabalho e oportunidades geradoras de renda, existem aspectos nefastos na estrutura produtiva: exploração, condições precárias (ABREU, 2003), morte de empreendimentos, baixa remuneração, dentre outros. Nas condições que se apresentam aos EBA’s, cumprindo os referenciais propostos neste estudo, ou seja, a utilização de uma metodologia para constituição da Rede Dinâmica que leve Publicada em Outubro de 2004 em conta as referências das categorias propostas, é possível que a população aprenda, implemente ações e dispare um compartilhamento estruturado. A resposta positiva é demonstrada na participação nos nossos trabalhos de campo. São deslocamentos, reuniões feitas por eles, às vezes sem a nossa participação. Como ocorre principalmente em Resende Costa que tem trabalhado no fortalecimento da participação dos associados na ASARC e em Dores de Campos, em que o esforço está centrado na constituição de uma entidade coletiva, em cooperação com a cidade de Prados, a propósito, já iniciada, com o apoio do Projeto Rede de EBA’s. Também em Prados e Dores, com apoio da Gestão Municipal das duas cidades, buscase em conjunto solução para o problema de resíduos da atividade coureira. Pode se afirmar ainda que os APL’s estudados ganham eficiência quando implementados esforços metodológicos do tipo rede dinâmica proposta neste trabalho, na forma de estratégias planejadas. Porque há uma mobilização em cada APL e isto facilita o trabalho dos estágios de mobilização subseqüentes. A mobilização da rede é favorecida se pré-existe uma mobilização. Pode-se dizer ainda que se encaminham de uma condição aglomerada em cluster emergente para um arranjo produtivo local. Quanto a serem originados de relações históricas de produção e o produto artesanal conservar características centenárias na atividade produtiva, que sofreu transformações no processo de produção, isso pode ser confirmado em parte. Houve uma atualização tecnológica, o tradicional encontra-se presente na confecção do produto de base artesanal. Somente não se pode falar de produtos tradicionais, de forma purista, como a velha economia classifica. Pode-se falar que há inserção em processo tradicional atualizado em bases industriais contemporâneas. Isto é o que os diferenciam de artesãos no sentido estrito. Pág. 83 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição Tampouco são empreendimentos eminentemente industriais. Referências bibliográficas ABREU, J. C., 2002, Estratégia e oportunidades locais: um estudo sobre rede dinâmica em aglomerados de empreendedores de base artesanal. Tese de D.Sc., COPPE/UFRJ. Rio de Janeiro (mimeo). __________. Condições de trabalho e relações precárias nas atividades dos empreendimentos de base artesanal em aglomerados produtivos. In: SALIM, C.A. et. alii. Saúde e Segurança no Trabalho, novos olhares e saberes. Belo Horizonte: Fundacentro/UFSJ, 2003 __________ (2004) Aglomerado produtivo local rural – APLR: uma perspectiva de modelo de organização para o incremento de micro e pequenos produtores rurais. IN: YAMAGUCHI, L.C. T. et. alii.. (org) A cadeia produtiva do leite na Região Campo das Vertentes. Juiz de Fora: Embrapa, pp. 161-172. ABREU, J. C. e ALVES, J C. M O Projeto Acontece: um estudo sob a luz da organização em Rede de Cooperação IN: Anais do XII Seminário de Iniciação Científica da UFOP,22 a 24 de novembro de 2004 COUTINHO, E. P. (2001). Dinâmica da modernização do setor de produção de aguardente de cana-de-açúcar no Brasil: construindo uma cachaça de qualidade. Tese D.Sc., COPPE/UFRJ, Rio de Janeiro (mimeo). DANTAS, R.A. A. (2002) “Paradigmas, epidemiologia e saúde ocupacional em tempo de reestruturação produtiva: algumas considerações”. In: SALIM, C. A. e CARVALHO, L.F (org). Saúde e segurança no ambiente de trabalho: contextos e vertentes. Belo Horizonte: Ed. Fundacentro/UFSJ. Publicada em Outubro de 2004 ALBUQUERQUE, E. M. e BRITTO, J (2002). “Cluster industriais na economia brasileira”. Revista Estudos Econômicos, v. 32, n. 67, pp. 71-102. DENCKER, A.F.M. (1998) Métodos e técnicas de pesquisa em turismo. São Paulo: Futura. DUARTE, Jorge (2000). Redes sociais: as inter-relações organizadas. Setor 3 . Disponível em http://www.setor3.com.br/senac2/calandra. Acesso em 05/03/2004. GAJARDO, M. (1986) Pesquisa participante na América Latina. São Paulo: Brasiliense. GRANDORI, R. e SODA, A. (1995) Interfirm network: antecedents, mechanisms and forms. Organization Studies. KOTLER, P. (2000) Administração de marketing: a edição do novo milênio, 10 ed. São Paulo: Prentice Hall. LEWIS, J. (1992) Alianças estratégicas: estruturando e administrando parcerias para o aumento da lucratividade. São Paulo: Ed. Pioneira. LYNCH, R. P. (1994) Alianças de negócios, a arma secreta competitiva: como planejar, negociar e gerenciar alianças estratégicas competitivas. São Paulo: Ed. Makron Books.. MATTA, I.M.A. (2002) Festival do café com biscoito: São Tiago/MG, 1999/2000. São João Del Rei: Ed. Gráfica da APAE. MONTAÑO, C.E. (1999) Microempresa na era da globalização - uma abordagem histórico-crítica. São Paulo: Cortez. PEREIRA, J.L. (1996) Na terra da figueira encantada. A história de Dores de Campos. Juiz de Fora: Esdeva. Pág. 84 Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais – 1ª Edição SANTOS, M. C.L. e SILVA, G. M. (1997) Tear: o artesanato de Resende Costa. São João Del Rei: FUNREI. TEIXEIRA, F e GUERRA, (2002) O. “Redes de aprendizado em sistemas complexos de produção”. RAE – Revista de Administração de Empresas, v. 42, nº 4, pp. 93 – 105 TURK, M.G.M.G. (2001) Rede interna e rede social: o desafio permanente na teia das relações sociais. Porto Alegre: Tomo Editorial. Publicada em Outubro de 2004 ----------------------------* Doutor em Engenharia da Produção (COPPE/UFRJ), Professor Adjunto da Universidade Federal de São João del Rei/UFSJ, Coordenador da Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares – ITCP/UFSJ, líder do Grupo de Pesquisa GBARTE (CNPQ) e Pró-reitor de Planejamento e Desenvolvimento da UFSJ. Endereço: Campus Santo Antônio – Praça Frei Orlando, 170 – Centro. São João del-Rei/MG. CEP.: 36.307-352. Fone: (32)3379-2330 e-mail: [email protected] Pág. 85