CRIAÇÃO DE DOURADO (Salminus brasiliensis) E ANÁLISE
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CRIAÇÃO DE DOURADO (Salminus brasiliensis) E ANÁLISE
CRIAÇÃO DE Salminus brasiliensis E ANÁLISE ESTOMACAL DOS ALEVINOS EM SISTEMA DE RIZIPISCICULTURA Emanuel Bruno Neuhaus* e Uwe Horst Schulz * UNISINOS, São Leopoldo, RS. E-mail: [email protected] Resumo Um dos grandes problemas na piscicultura do dourado Salminus brasiliensis é a alta taxa de canibalismo durante as primeiras fases da vida e o alto custo da produção de larvas forrageiras. O objetivo do trabalho foi aproveitar as grandes áreas da lavoura, com ou sem plantio de arroz, para introduzir larvas de S. brasiliensis em baixas densidades utilizando a disponibilidade de alimentos do sistema da lavoura de arroz. Foram utilizadas três quadras de arroz (Quadra 1, 2 e 3) com densidades diferentes. Os conteúdos estomacais analisados apresentaram preferência por cladóceros na fase larval dos dourados. A maior sobrevivência, de 18,4 %, foi observada na quadra com menor densidade preparada previamente com cal virgem. Introdução O dourado S. brasiliensis é um peixe da família Characidae e habita rios de planície da América do Sul. É um peixe carnívoro desde o estágio larval com hábitos diurnos. Na época reprodutiva, que se estende de outubro a fevereiro, os adultos migram para as cabeceiras dos rios para desovar. No Rio Grande do Sul é considerada como uma espécie vulnerável a extinção (Marques et al., 2002). As principais ameaças contra o dourado são: interrupção do seu ciclo de vida devido às construções de barragens, degradação do seu hábitat, eutrofização e poluição das águas, além da pesca predatória. Durante o desenvolvimento na natureza, apresenta planctivoria no estágio larval, passando em seguida a se alimentar de larvas de peixes e insetos (Morais-Filho & Schubart, 1955). Apesar de este peixe ser de grande importância econômica (Koch et al., 2000), a piscicultura desta espécie torna-se um processo difícil. Pelo fato do dourado aceitar somente alimentos vivos e devido às altas taxas de canibalismo quando acondicionado em altas densidades, torna-se necessário introduzir um grande número de larvas forrageiras. Weingartner & Zaniboni Filho (2005) recomendam o uso de 32 larvas forrageiras para cada larva de dourado, o que representa um alto custo para o piscicultor. Pelo fato de as quadras precisarem ser inundadas durante o cultivo, acaba-se criando um banhado artificial, ecossistema rico em alimentos como plâncton, macroinvertebrados e peixes. O objetivo deste trabalho foi testar num projeto piloto se as extensas áreas da lavoura de arroz poderiam ser aproveitadas para a criação de S. brasiliensis em baixas densidades, usufruindo, assim, da produtividade deste sistema. Material e Métodos O local do experimento foi uma lavoura de arroz no município de Santo Antônio da Patrulha, RS. Nesta lavoura, os espécimes foram mantidos em três quadras com baixas densidades. Na primeira quadra (Quadra 1), foram soltas no dia 27/10/2005 mil larvas com 5 dias de idade. Esta quadra estava sem arroz e possuía uma área de 1 ha e profundidade média de 30 cm. Na segunda quadra (Quadra 2), no dia 1º/12/2005, foram soltas 500 larvas também com 5 dias de idade. Assim como a primeira, esta quadra possuía 1 ha de área e estava sem arroz, mas diferenciava-se por ter sido previamente tratada com cal virgem para eliminar possíveis predadores. A terceira quadra (Quadra 3) era a maior, com uma área de 5 ha de cultivo de arroz. No dia 11/11/2005 foram soltas 4.500 larvas de dourado com 3 dias de vida e um número não contabilizado de larvas de grumatã para servirem de alimento aos dourados. É importante salientar que estas quadras de arroz sofreram adaptações para estes experimentos. Estas adaptações consistiram de valas feitas nas margens das quadras para servirem de refúgio para os peixes quando as lavouras fossem drenadas. Ocorreram dois tipos diferentes de recapturas. A primeira delas foi com o intuito de capturar alevinos de dourado através de pesca elétrica, realizada 15 e 30 dias depois da soltura nas Quadras 1 e 2, e 8 dias depois na Quadra 3. A partir de 5 cm de comprimento total não foi mais possível capturar os indivíduos pela pesca elétrica. A segunda teve o propósito de capturar juvenis de dourado e de grumatã depois de um período de 3 a 4 meses. A lavoura foi drenada e os peixes se abrigaram nas valas de refugio, onde foram pescados com uma rede de arrasto (malha 10 mm entre nós adjacentes). As recapturas com arrasto ocorreram 4 meses depois da soltura nas Quadras 1 e 2, e 3 meses depois na Quadra 3. Os alevinos foram medidos e pesados. O conteúdo estomacal dos peixes até 6 cm foi analisado com o intuito de averiguar a alimentação nesta primeira fase da vida. Para as análises estomacais, calculou-se o número total de indivíduos encontrados e a freqüência de ocorrência das principais ordens encontradas nos estômagos. Resultados e Discussão Através da pesca elétrica foram capturados 13 alevinos nas Quadras 1 e 2. Na Quadra 3 foram capturados 21 alevinos de dourado, totalizando entre as três quadras 47 alevinos. O comprimento deles variou de 1,30 a 6,7 cm e o peso entre 0,0187 a 3,3535 g. Em relação ao conteúdo estomacal, foram encontrados no total 3.829 organismos de 15 ordens diferentes. A ordem Cladocera foi a mais consumida, com um total de 3.542 (92,5% do total) indivíduos encontrados, seguida de Hemiptera 126 (3,3%), Copepoda 124 (3,2%), Acarina 14 (0,36%), Diptera 5 (0,13%) e outras que, somadas juntas, totalizaram 18 (0,47%) indivíduos do total. Mai & Filho (2005) também observaram preferência alimentar por cladóceros em larvas de S. brasiliensis. No decorrer da análise estomacal foi presenciado apenas um caso isolado de canibalismo na Quadra 3. Esta única ocorrência pode ser explicada pela baixa densidade de estocagem nas três quadras. Também notou-se que os maiores alevinos preferiram hemípteras, indicando uma mudança alimentar de planctivoria para insetivoria. Outro fato importante a ser destacado é que não foram encontradas larvas forrageiras de Prochilodus lineatus (grumatã) nos estômagos analisados. A provável explicação para isso é a preferência observada dos dourados por zooplâncton neste estágio de crescimento, fato que corrobora com os resultados de Mai & Filho (2005). A média de cladocera consumida por alevino de dourado não foi significativamente diferente entre a Quadra 1 (média 114, e.p. 32,6) e a Quadra 2 (média 123,1 e.p. 27,4; MannWhittney U 72,5; P=0.55). Porém o teste Kruskall-Wallis demonstrou uma diferença significativa entre as três amostras (Qui-quadrado = 10.234, P = 0,006;), desta forma diferenciando a Quadra 3. Esta diferença, provavelmente, está relacionada ao fato de haver na Quadra 3 um considerável número de espécimes de grumatã e outras espécies convivendo na mesma área que os dourados, o que resulta em uma maior competição por alimentos. 200 Cladocera (n) 150 100 50 n=13 n=13 n=19 2 3 0 1 Quadr a Figura 1. Média e erro padrão de cladóceros digeridos por alevino de dourado em cada quadra. A quadra 2 apresentou a maior taxa de sobrevivência (fig 2) porque foi previamente tratada com cal virgem, o que elimina possíveis predadores e porque a densidade de estocagem dos alevinos foi menor do que nas demais quadras, reduzindo assim o canibalismo e a competição por alimentos. Por outro lado, a quadra 3 apresentou a menor taxa de sobrevivência porque, assim como quadra 1, não foi feito o tratamento prévio com cal virgem e também por haver plantio de arroz nesta quadra, o que aumenta o número de predadores. Sobrevivência 20 % 15 10 5 0 Quadra 1 Quadra 2 Quadra 3 Figura 2. Valores das sobrevivências nas três quadras ao final do experimento. O comprimento médio foi de 15 cm na quadra 1, 18,7 cm na Quadra 2 e 18,2 cm na Quadra 3. O teste ANOVA mostrou que houve diferença dos comprimentos médios (F=53,8; P<0,001). Essa diferença pode estar associada à variação na dieta alimentar entre as três quadras, porém, para comprovar esta hipótese, novos estudos deverão ser feitos dando ênfase à alimentação dos juvenis. Conclusão Observou-se a preferência por cladóceros nos alevinos de dourado e, devido às baixas densidades, foi registrado somente um caso de canibalismo durante os experimentos. Obtevese maior taxa de sobrevivência na quadra sem arroz, de menor densidade e tratado com cal. A experiência demonstrou a viabilidade da criação de dourados na lavoura de arroz, porém, os procedimentos devem ser otimizados. Referências KOCH, W. R., MILANI, P. C., GROSSER, K. .M.,. Guia Ilustrado de Peixes Parque Delta do Jacuí. Porto Alegre: Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul, 2000. 91p. il. (Publicações Avulsas FZB, 9) MAI, M. G.; ZANIBONI FILHO, E. Efeito da idade de estocagem em tanques externos no desempenho da larvicultura do dourado Salminus brasiliensis (Osteichthyes, Characidae). Acta Scientiarium Biological Sciences, Maringá, v. 27, n.2, p. 287-296, abr.-jun. 2005. MARQUES, A. A. B.; et al. Lista de Referência da Fauna Ameaçada de Extinção do Rio Grande no Sul. Decreto nº 41.672, 10 de junho de 2002. Porto Alegre: FZB/MCT PUCRS/PANGEA,. 52 p., 2002 MORAIS FILHO, M. B.; SCHUBART, O. Contribuição ao estudo do dourado (Salminus maxillosusVal.) do Rio Mogi Guassu (Pisces, Characidade). Ministério de Agricultura do Brasil, São Paulo, pp. 1 – 50 , 1995. WEINGARTNER N., ZANIBONI FILHO E. Dourado. In: BALDISSEROTO B.; CARVALHO GOMES L. (editores). Espécies nativas para piscicultura no Brasil. Editora UFSM, 470 p., 2005.