Fatalismo e Determinismos

Transcrição

Fatalismo e Determinismos
Fatalismo e Determinismos
Fernanda Lobo Affonso Fernandes
Mestranda – UFRJ/PPGLM
Resumo: Na presente comunicação, parte da minha dissertação de mestrado, procedemos
à análise de quatro noções clássicas encontradas no debate acerca da liberdade humana, a
saber: as noções de determinismo causal, determinismo teológico, determinismo lógico e
fatalismo. Pretendemos, com esta análise, distinguir os diversos tipos de determinismo,
enquanto traçamos suas ligações com a noção de fatalismo. Sendo esta última noção
supostamente mais forte que as demais, ao estabelecer o vínculo entre cada tipo de
determinismo analisado com esta noção, estabeleceremos também qual desses tipos de
determinismo seria o mais forte no aaque à tese da liberdade humana.
A noção de determinismo simpliciter consiste na idéia de que os estados de coisas no
mundo estão todos predeterminados ou condicionados, de maneira que nada pode ser de outro
modo que não aquele que já é efetivamente. Esta tese remontaria à idéia de que tudo pode ser
racionalmente e exaustivamente explicado. Assim, a própria visão cientificista dominante no
mundo moderno envolveria a tese de que todas as coisas ou eventos do mundo estão dados ou
determinados.
Na antigüidade, esse princípio de inteligibilidade resultou no princípio que ficou
conhecido como o Princípio da Plenitude1 e foi aplicado às ciências da natureza. Segundo este
princípio, todas as possibilidades genuínas são atualizadas e apenas estas seriam
possibilidades genuínas. Podemos facilmente reconhecer em tal princípio uma instância da
tese determinista, afinal, se as únicas possibilidades admissíveis são aquelas que se efetivam,
as alternativas aos eventos que de fato ocorrem não podem mais ser consideradas como
possibilidades. Conclui-se disso, que todos os eventos são determinados, não havendo
alternativa genuinamente possível a nenhum deles.
Esta inalterabilidade dos estados de coisas é a tese em comum a todas as formas de
1
Este nome foi cunhado por Lovejoy [1936] para se referir a um princípio que, segundo ele, tem seu embrião
na teoria das idéias de Platão, especialmente no diálogo Timeu, e permeou toda a história humana posterior.
Segundo Lovejoy, este princípio surge do ideal de que há uma explicação para o mundo como um todo ser
como é - tanto no porquê deste mundo ter sido criado, como na questão de quantas espécies de coisas este
mundo deve conter. Essas perguntas são respondidas por Platão com o recurso à idéia de Bem supremo.
Sendo essa idéia a origem das demais idéias e também das suas réplicas mundanas, e sendo ela perfeita, ela
originaria o mundo por um mero ato de bondade. E, porque ela é completa, atualizaria neste mundo todas as
espécies possíveis. Posteriormente este princípio da plenitude embrionário seria expandido de modo a abarcar
outros conjuntos de inferências, dentre os quais está o conjunto de inferências acerca dos estados de coisas no
mundo.
determinismo, que variam apenas quanto às premissas utilizadas para derivá-lo. Ao longo da
história da filosofia, diversas formas de determinismo foram originadas. A seguir, veremos de
maneira bastante resumida apenas as mais clássicas2: o determinismo causal, o determinismo
teológico e o determinismo lógico.
O determinismo causal é a forma de determinismo oriunda da noção de causalidade,
sendo a tese de que todo evento é determinado por eventos anteriores em conjunto com as leis
da natureza, em especial a lei de causa-efeito. Partindo do suposto de que não há nada
incausado, como todo efeito tem uma causa, que por sua vez, pertence à uma cadeia causal
que remonta às causas últimas de tudo, então, desde sempre tudo estará determinado.
O determinismo teológico parte da premissa da onisciência divina para derivar a tese
determinista. Isto é, uma vez que o conhecimento divino é eterno e infalível, Deus deverá
conhecer este mundo em todo e qualquer aspecto, inclusive tudo aquilo que ocorrerá no
futuro. Logo, todos os fatos acerca do futuro já devem estar predeterminados.
O determinismo lógico pretende derivar a tese determinista exclusivamente a partir de
princípios lógicos. Ou seja, consiste na tese de que, por força das próprias leis da lógica, todos
os fatos, inclusive os do futuro, estão determinados. Muitas vezes é definido como o
determinismo gerado unicamente pelo princípio da bivalência3, o que se funda na idéia de
que, dado que toda proposição possui um valor de verdade, incluindo aí as proposições sobre
o futuro, então, estas proposições estão determinadas. Uma vez que cada proposição
corresponderia a um fato, esses próprios fatos estariam determinados.
Acrescenta-se a estas noções clássicas a noção de fatalismo, que é a tese de que,
necessariamente, tudo aquilo que efetivamente acontece deve acontecer, e que tudo aquilo que
efetivamente não acontece não deve acontecer. Os antigos entenderam que este agente
necessitador era a força do destino, que agiria como causa eficiente da existência de tudo
aquilo que existe e da não existência de tudo aquilo que não existe4. Sendo o destino uma
força que age primordialmente sobre as ações humanas5, o fatalismo é comumente definido
2
Acima só mencionamos as formas mais clássicas de determinismo, mas estas são apenas alguns dos tipos
de determinismo tratados atualmente. Uma rápida busca sobre o assunto ainda revela noções como:
determinismo biológico (a tese de que fatores genéticos determinam as ações de um indivíduo),
determinismo psicológico (a tese de que o subconsciente determina as decisões conscientes dos indivíduos),
determinismo físico (a tese de que as leis da física também determinam a mente humana), determinismo
mecânico (a tese de que as leis da mecânica de Newton governam o homem, assim como governam corpos
celestes), determinismo histórico (a tese de que fatores materiais e espirituais fora do alcance da vontade
humana determinam o curso da história), determinismo comportamental/ behaviorista (a tese de que fatores
externos como o ambiente condicionam o comportamento dos indivíduos), determinismo lingüistico (a tese
de que a linguagem determina tudo o que podemos dizer e pensar) etc.
3 Cf. Jordan [1963].
4 Cf. Alexandre de Afrodísias, De Fato e Cícero, De Fato.
5 Cf. Cícero, De Fato. Nesta obra, que discute até onde vai a influência do destino, Cícero inicia a discussão
com uma série de exemplos que, segundo o senso comum da época, estavam destinados a ocorrer. Em todos
como sendo a tese de que as ações humanas estão fadadas a ocorrer tal como ocorrem, de
modo que não estaria em nosso poder agir de outra maneira que não aquela em que
efetivamente agimos6. Sendo assim, o fatalismo em última instância significa que o nosso
poder de deliberar e decidir se certas ações serão executadas ou não não passa de uma mera
ilusão.
A definição de fatalismo dada acima não permite uma distinção muito clara entre esta tese
e o determinismo simpliciter. Além disso, a explicação pela sua origem, i.e, ser resultado do
destino, permitiria a consideração do fatalismo como um dos subtipos do determinismo, e
poderiamos entender o fatalismo como aquele tipo de determinismo originado pela força do
destino sobre os eventos. Tampouco a mera característica de ser aplicada às ações humanas
diferenciaria estas duas teses, pois o determinismo em suas várias formas também pretende
ser uma tese com implicações no âmbito das ações humanas. Talvez por isso a noção de
fatalismo assuma tantos tratamentos diferentes: alguns autores tratam 'fatalismo' e
'determinismo' como se fossem intercambiáveis7, utilizando também termos como 'fatalismo
causal', 'fatalismo lógico', 'fatalismo teológico' etc; outros autores rejeitam o fatalismo
peremptoriamente, enquanto aceitam discutir acerca da plausibilidade do determinismo8.
Outros autores, contudo, encaram o fatalismo como sendo o pior rival da liberdade humana e
colocam em questão se algum tipo de determinismo poderia derivá-lo. Qual seria, então, a
diferença entre fatalismo e determinismo?
Além de a tese fatalista visar especialmente as ações humanas (o que tornaria o fatalismo
irredutível a concepções compatibilistas), enquanto os determinismos parecem se aplicar a
estas ações apenas conseqüentemente, podemos distinguir as duas teses através da
dependência em uma relação de anterioridade9. Explicando melhor: o dilema do determinismo
em suas variadas formas é sempre fruto da suposição de que há eventos anteriores ao evento
determinado e que estes eventos anteriores teriam alguma relação com este dado evento, de
modo que a existência dessa relação forçaria que o evento posterior, que ainda não aconteceu,
já esteja dado de algum modo. Assim, no determinismo causal temos a idéia de eventos
anteriores causando eventos posteriores; no determinismo teológico temos a idéia de que
6
7
8
9
os exemplos elencados fica claro que o foco do fatalismo é exclusivamente o destino humano: nestes
exemplos, os eventos que não envolveriam ação humana só são relevantes na medida em que estavam
relacionados a algum evento relacionado a uma ação humana, servindo de base para a premonição deste
evento (por exemplo, o nascer de uma estrela em determinado momento era o prenúncio de que quem nasceu
sob aquela estrela teria uma determinada sorte).
Cf. Cahn [1967].
Cf. Rice [2006], Zajzebski [2008]
Cf. Dennett [1984]
Cf. Bernstein [2003]
Deus conhece a existência de um fato antes mesmo deste fato ocorrer; e no determinismo
lógico temos a idéia de que um enunciado acerca de um evento futuro possua um valor de
verdade determinado antes deste evento ocorrer, determinando este evento de alguma
maneira.
Já o fatalismo, por depender meramente da força misteriosa do destino, supostamente não
recorreria a este tipo de relação de antecedência, embora seja compatível com qualquer tipo
de determinismo. Como resultado, temos uma tese bastante difícil de ser refutada, uma vez
que parece ser dada sempre “a posteriori”. Isto é, enquanto o determinismo causal se
fundamenta na possibilidade de previsão de todos os eventos do mundo10 - mesmo que
factualmente ainda não consigamos alcançar esta total previsibilidade dos eventos -, o
fatalismo - apesar das previsões oraculares da antigüidade entenderem como ligados os
eventos futuros e certos eventos “naturais” - só permite afirmar que tal evento estava fadado a
acontecer quando ele acontece11. Neste ponto, talvez o fatalismo se aproxime mais dos
determinismos lógico e teológico, que também não envolvem uma noção de previsibilidade
que não seja semelhante à do Oráculo (ainda que estes determinismos sejam dependentes de
uma relação de anterioridade com algum outro evento).
Nos textos clássicos já encontramos a conexão entre o determinismo e a noção de
fatalismo. Portanto, os gregos já eram conscientes das implicações morais acarretadas pelo
determinismo12. Aliás, esse vínculo com as questões da ética e da moral parece ser o motivo
pelo qual o debate acerca do determinismo tenha se tornado tão popular até os dias de hoje.
Todavia, hoje em dia, enquanto muito se discute acerca do determinismo, especialmente o
causal e o biológico, é raro encontrarmos discussões sobre o determinismo lógico e teológico
que não possuam cunho meramente histórico, mesmo que estes dois tipos de determinismo
jamais tenham sido refutados de maneira totalmente satisfatória.
Também é relativamente comum vermos a tese fatalista ser prontamente descartada como
10
O ideal de uma previsibilidade total gerada pelo cálculo é, inclusive, a base para o determinismo causal tal
como definido na modernidade por Laplace.
11 A escolha dos exemplos de Cícero parecem visar a ridicularização destas previsões com base na conexão
aleatória de certos eventos, dando a entender que os Oráculos faziam “ajustes” para justificar suas previsões.
12 Mas parece que nem sempre esse vínculo foi percebido pelos gregos. Cf. Botros [1985], a discussão estóica
sobre o determinismo não envolvia a liberdade humana. Segundo ela, as discussões sobre determinismo e
liberdade só foram conectadas através de leituras posteriores dessas discussões. Como evidência, ela nota que
o único vocábulo grego usado para falar sobre liberdade só foi introduzido na discussão determinista
posteriormente. Cf. Bobzien [1998], a “descoberta” do problema da liberdade só foi feita tardiamente, no
final do século II A.C. Cf. Barreau [1975], Diodoro Cronus, que ao que tudo indica viveu por volta do século
IV A.C, ao formular o Dominador, não tinha em mente provar o fatalismo, mas apenas estabelecer um
quadrado das modalidades alternativo ao de Aristóteles, apesar do seu argumento ter entrado para posteridade
devido ao resultado fatalista.
uma aberração folclórica não merecedora de crédito. Mas isto se deve ao fato de ela ter sido
interpretada erroneamente ao longo da história13. Segundo essa má interpretação, defender o
fatalismo significaria defender que, não importa o que façamos, aquilo que está fadado a
acontecer, acontecerá. Esta leitura do fatalismo originou na antigüidade o argumento que
ficou conhecido como “preguiçoso” e que até hoje encontra eco na literatura sobre o assunto.
O argumento do preguiçoso segue mais ou menos da seguinte maneira:
“Se o destino para ti é convalescer desta doença, quer tu tenhas consultado um
médico quer não tenhas consultado um médico convalescerás; paralelamente, se o
destino para ti é não convalescer desta doença, quer tenhas consultado um médico que
não tenhas consultado um médico convalescerás – e um outro destino existe para ti:
logo, consultar um médico é indiferente”14
Em suma, quem interpreta o fatalismo desta maneira, pretende reduzí-lo a um absurdo,
pois defende que, se ele é verdadeiro, toda ação humana é inútil. Por uma via de um
raciocínio semelhante, poderíamos chegar a exemplos mais absurdos: suponha que está
determinado que João vai encontrar sua tia hoje à tarde. Pela premissa fatalista, tal como
entendida por estes autores, João encontrará sua tia hoje à tarde não importa o que ele faça
para impedí-lo. Suponha que uma das coisas que João faz para evitar o encontro é cometer o
suicídio na parte da manhã, sendo bem sucedido nisso. Pela premissa inicial, isso de nada
adiantaria, e ele irá encontrar sua tia, mesmo tendo morrido pela manhã. Diante desses tipos
de redução, poder-se-ia também reduzir a tese determinista, em suas diversas formas, ao
absurdo. Pois, se alguma das formas de determinismo deriva a tese absurda do fatalismo,
então, ela seria também absurda.
O argumento do preguiçoso já havia sido respondido por Crisipo, lógico estóico que viveu
no século III A.C. Segundo o relato de Cícero, sua resposta recorria à diferença entre eventos
simples e eventos complexos, que dependem de outros eventos associados, ou condestinados.
Por exemplo, 'Socrates morrerá tal dia' seria um evento simples, enquanto 'Édipo nascerá de
Laio' seria um evento complexo. Os eventos simples poderiam ser contemplados pelo
argumento do preguiçoso, de modo que, caso estivesse determinado que Sócrates morrerá em
13
Cf. Bernstein [2003] e Solomon [2003]. Cahn [1967] fornece vários exemplos. Leach [1915], pg. 374, cita
algumas definições nesta mesma linha, dentre as quais transcrevemos as seguintes:
“G. H. Lewes in Problems of Life and Mind, I-309 thus defines fatalism: Fatalism says that
something must be and this something cannot be modified by any modification of the conditions.”
“John Stuart Mill thus delivers himself on the subject: A fatalist believes or half believes (for
nobody is a consistent fatalist) not only that whatever is about to happen will be the infallible
result of the causes which produce it, but moreover, that there is no use in struggling against it,
that it will happen however we may strive to prevent it.”
E, por fim, o próprio Leach conclui: “Fatalism benumbs and paralyzes the will, and apathy and stoical
submission are the only resource.”
14 Cícero, De Fato, XII – 28-29.
um certo dia, não haveria nada que ele pudesse fazer para evitá-lo. Mas eventos complexos
não se enquadrariam no caso do preguiçoso: Laio não poderia ser pai de Édipo sem uma
mulher, por exemplo. Logo, não se pode dizer que Édipo será filho de Laio mesmo que Laio
jamais tenha estado com uma mulher. Esse evento, Édipo nascer de Laio, é condestinado com
Laio esposar Jocasta, engravidá-la etc. Ou seja, requer toda uma cadeia de eventos para que
este evento em particular se realize.
Pode parecer com isso que a resposta de Crisipo ao argumento do preguiçoso é fraca, pois
concederia ao preguiçoso que nada podemos fazer para evitar certos eventos, como a própria
morte no dia em que ela estiver determinada. Entretanto, os eventos simples a que Crisipo se
refere parecem ser apenas descrições muito gerais, que nem mesmo especificariam uma
ocorrência de um fato. Dizer que Sócrates morrerá em tal dia, por exemplo, é vago o
suficiente para permitir inúmeras possibilidades e, precisamente por isso não pode ser evitado.
Ou melhor, não é que seríamos incapazes de evitar a morte de Sócrates em um dado instante
porque tal evento é impossível de ser evitado neste instante, mas apenas porque, uma vez que
a descrição deste evento não deixa claro quais são os eventos condestinados a ele, não
possuiríamos critérios para saber o que deveria ser evitado especificamente para eliminar a
causa da morte de Sócrates. Suponhamos que esteja predestinado simplesmente que Sócrates
irá morrer em um dia d. Nesse caso, no dia d Sócrates poderia escapar de um tiro, mas morrer
por atropelamento, ou escapar do atropelamento e morrer vítima de um infarto etc. As
hipóteses seriam inúmeras. Mas o evento em que Sócrates morre ao tomar cicuta em
determinado dia não poderia ocorrer “quer Sócrates tome cicuta, quer Sócrates não tome
cicuta” neste dia, nem tampouco ocorreria apesar de qualquer atitude tomada por Sócrates,
pois este evento requer outros fatos para ocorrer, sendo que a ausência de um deles poderia ter
evitado o evento em questão: Socrates poderia não ter irritado os cidadãos de atenienses,
poderia ter fugido, subornado um guarda para trocar a cicuta por outro líquido etc. Assim, o
preguiçoso não se aplica a nenhum evento quando este for suficientemente especificado.
Para chegar aos absurdos pretendidos pelo proponente do argumento do preguiçoso, ou de
qualquer versão moderna deste argumento, seria preciso considerar que o fatalismo envolve
uma quebra nas cadeias causais15. Quer dizer, ao considerar que um certo evento
necessariamente ocorrerá não importa o que façamos, precisariamos supor que nossas ações e
os eventos resultantes delas não são causas de nenhum evento posterior. Assim, uma das vias
de argumentação contra o fatalismo seria simplesmente indicar que essa quebra na cadeia não
15 Esta posição é bem caracterizada na definição do fatalismo feita por Lewes tal como citada por Leach que
citamos na nota 13 acima.
se dá: nossas ações presentes sempre afetam o futuro de alguma forma16.
Contudo, o fatalista de modo algum defende essa tese e, como já mencionamos
anteriormente, o fatalismo é compatível com todos os tipos de determinismo, inclusive o
causal. Talvez um objetor que siga esta linha não perceba que essas quebras nas cadeias
causais implicariam um enfraquecimento da tese fatalista e até mesmo a tornaria
autocontraditória. Afinal, estaria garantido que pelo menos algumas vezes a vontade humana
seria livre para executar ações visando o impedimento de certos resultados (mesmo que sem
sucesso). Mas na verdade, a tese fatalista, apesar de mais sutil, é muito mais forte do que isso:
de acordo com ela, não só o evento em questão estaria fadado a ocorrer (ou não ocorrer),
como também todos os eventos ligados a ele e, portanto, todos os eventos no mundo estariam
fadados a ocorrer (ou não ocorrer). Por isso não se pode dizer que o defensor do fatalismo
sustenta a tese de que um evento predestinado ocorrerá não importa o que façamos; o que o
fatalista defende é simplesmente que não estará em poder de ninguém fazer ocorrer qualquer
evento que previna a ocorrência daquele evento predestinado ou garanta a ocorrência de um
evento predestinado a não ocorrer. Logo, se está determinado que João vai encontrar sua tia à
tarde, ele simplesmente não poderá fazer nada que impeça esse encontro de acontecer e, logo,
não estará em seu poder cometer o suicídio, ou sair do país, dentre outras coisas.
Sem dúvida esta má interpretação do fatalismo apresentava uma vantagem: a de ser
facilmente descartada. Mas, fim de não atribuir à filosofia a propagação de uma tese tão
evidentemente absurda desde o seu início até os dias de hoje, seguiremos a definição
inicialmente sugerida, utilizando 'fatalismo' para exprimir a tese de que as ações humanas
estão fadadas a acontecer tal como efetivamente acontecem e que não temos em nosso poder
meios para alterar essas ações. Com isto, a tese fatalista não pode ser descartada sem um
exame mais minucioso. Nem tampouco as diversas formas de determinismo, caso elas
derivem o fatalismo.
Costumou-se considerar as noções de fatalismo e determinismo lógico como sendo
intimamente ligadas17. Cahn [1967] por exemplo, afirma que o fatalismo se baseia na alegação
16 Cf. Wilson [1955]
17 Podemos destacar, além de Cahn, Gaskin [1995], que utiliza 'fatalismo', e vezes 'fatalismo lógico', e
'determinismo lógico' intercambiavelmente, Helm [1975], pg. 356, que, ao analisar um argumento de
natureza teológica para o fatalismo, o recusa como tal na medida em que ele “depende de considerações
extralógicas, e por essa razão não pode ser considerado um argumento para o fatalismo” [minha tradução].
Além desses, podemos ver uma certa tendência em utilizar 'fatalismo' para tratar do determinismo lógico.
Não podemos, contudo, deixar de mencionar Wolff [1960], que assume uma posição contrária a essa,
sustentando que é o determinismo causal, e não o lógico, que deriva o fatalismo.
Bernstein [2003], apesar de também ser contra a identificação do fatalismo como uma tese puramente
lógica, reconhece amidentificação entre fatalismo e determinismo lógico. O propósito de Bernstein parece, na
de que uma prova lógica para o determinismo é possível 18. A princípio, tal alegação parece
estar baseada meramente no fato de que o fatalismo decorreria de uma prova para o
determinismo cujas premissas fossem fortes, e a princípio irrefutáveis. Todavia, Cahn vai
mais longe e chega a identificar o fatalismo com o determinismo lógico:
“Fatalism is the thesis that the laws of logic alone suffice to prove that no man has
free will, suffice to prove that the only actions which a man can perform are the actions
which he does, in fact, perform, and suffice to prove that a man can bring about only
those events which do, in fact, occur and can prevent only those events which do not, in
fact occur.”19
Caso o determinismo lógico derive o fatalismo tão inevitavelmente a ponto de poder ser
identificado a ele, então, o determinismo lógico seria mais radical do que todos os demais
tipos de determinismo, já que implicaria necessariamente uma tese que exclui qualquer
chance do homem agir livremente. Mas a mera irrefutabilidade de uma premissa não é
suficiente para concluir a identidade entre essa premissa e a conclusão derivada a partir dela.
É preciso, portanto, de alguma conexão mais forte entre essas duas noções. Assim, para que
algum tipo de determinismo de fato derive o fatalismo e, além disso, possa ser identificado a
ele, requerer-se-ia que a forma de determinismo em questão partisse de princípios que
seguissem dois critérios: (i) força, i.e, um princípio que não pudesse ser facilmente rejeitado/
refutado20, e (ii) qualidade, i.e, um princípio que possua algum vínculo ou algo em comum
com as ações humanas em particular, ou seja, um princípio tal que tenha relação (de
preferência direta) com a vontade humana.
Com respeito ao primeiro critério, dentre os candidatos mencionados anteriormente (i.e,
os três tipos mais clássicos de determinismo), o determinismo causal não parece satisfazer a
condição de irrefutabilidade, a começar pelo fato de que o princípio que o origina, a
causalidade, ser um dos mais controversos na filosofia. Desde o empirismo humeano há a
verdade, não ser o de separar estas duas noções, mas o de apontar dois erros ao definir o fatalismo como uma
noção puramente lógica: (i) a suposição de que a necessidade reivindicada pelo fatalismo é uma necessidade
lógica, enquanto, na verdade, é uma necessidade metafísica e (ii) supor que os argumentos para o
determinismo lógico utilizam apenas princípios lógicos, enqanto, na realidade, eles também recorrerm a
premissas metafísicas sobre a natureza do tempo e da verdade. Trataremos a (ii) posteriormente. Por hora,
indicamos que a posição defendida na presente dissertação está de acordo com a de Bernstein quanto ao fato
de os argumentos para o determinismo lógico não serem argumentos estritamente lógicos, embora
consideremos que há mais do que premissas adicionais sobre a natureza do tempo e da verdade nestes
argumentos. Contudo, para o nosso propósito neste momento, supomos que o determinismo lógico é baseado
estritamente em premissas lógicas, procurando mostrar que, nesse caso, ele derivaria inevitavelmente o
fatalismo.
18 Cahn [1967], pg. 8 “Fatalism rests on the claim that such a proof [i.e, a proof for determinism using as
premisses only the laws of logic] is possible.” a observação entre colchetes é minha.
19 Ibid.
20 Observar que esta condição exigida por Cahn garante não a relação de derivabilidade entre um tipo de
determinismo e o fatalismo, mas a chance que um determinismo tem de efetivamente provar o fatalismo, ou
seja, tem a ver com a factualidade do fatalismo. Já a relação de derivabilidade poderia ser estabelecida
mesmo que a premissa fosse facilmente refutável.
hipótese de que a lei da causalidade seja apenas a melhor maneira de explicarmos certas
conexões que observamos no mundo, sem que ela possua um estatuto ontológico primitivo e,
logo, sem afetar em nada a liberdade humana. Uma outra dificuldade que os defensores do
determinismo causal enfrentam é o da causalidade estocástica, onde um mesmo conjunto de
causas iniciais pode gerar mais de um efeito, o que poderia indicar que nem tudo aquilo que é
causado é necessário. Sendo o princípio da causalidade distinto da noção de necessidade, não
sendo suficiente para derivá-la, e sendo o fatalismo uma tese que envolve a necessidade,
parece que o princípio da causalidade não teria força para derivá-lo (e, talvez, nem mesmo
para derivar o próprio determinismo, já que este também envolve o domínio do necessário).
Uma outra dificuldade consiste na falta de um critério para determinar se uma certa ação é
causada ou não pela vontade do agente21. Nesse caso, para afirmar o fatalismo, a causalidade
deveria ser capaz de determinar a própria deliberação do agente, mas isso nenhuma teoria
causal parece ter estabelecido até o momento e, mesmo que a teoria naturalista explique a
vontade humana por meio de processos bioquímicos que sigam nexos causais, ainda assim
poderíamos reaplicar o contraexemplo da causalidade estocástica a essas reações bioquímicas,
uma vez que ainda não foi estabelecida uma correlação 1:1 entre certa configuração cerebral
e um estado emocional do agente. Com isso, o determinismo causal também falharia com
respeito ao critério de qualidade.
Voltamo-nos agora para o caso do determinismo teológico. Uma vez que tem o
conhecimento divino como princípio, este tipo de determinismo satisfaria a primeira
condição, pois tal premissa seria necessária dada a própria definição de Deus e, uma vez
necessária, irrefutável. Contudo, tal necessidade é fragil, uma vez que é sustentada por um
condicional: apenas se Deus existe, o seu conhecimento é necessário. E, logo, tal premissa
poderia ser refutada assim que se provasse que Deus não existe. Entretanto, sendo essa uma
das provas mais difíceis de serem dadas e como não há evidências satisfatórias a favor e nem
contra tal matéria, suporemos a existência de Deus e a necessidade da premissa da perfeição
do conhecimento divino.
Ainda assim o caso teológico encontraria um problema na doutrina do livre arbítrio, que,
embora controversa, alega justamente a autonomia das ações humanas. Sendo assim, essa
própria noção serviria de base para a postulação de que a determinação cessa nas ações
humanas, ou, ao menos, que a vontade humana é livre de alguma maneira e, logo, essa
premissa não passaria pelo segundo critério: o de relação íntima com a vontade humana.
Porém, uma vez que a doutrina do livre-arbítrio não é unânime e muito menos livre de
21 Hoefer [2008]
problemas, assumiremos que talvez o determinismo teológico possa ser identificado ao
fatalismo. Todavia, podemos notar que a única parte realmente “teológica” da argumentação
em prol deste determinismo é a premissa inicial de que Deus é onisciente; a partir disso, toda
a argumentação do caso teológico é feita por força puramente lógica. Até mesmo a
problemática do livre arbítrio se deve exclusivamente a fatores lógicos, i.e, à preocupação
com a consistência do sistema religioso em questão como um todo. É apenas relativamente ao
entendimento humano que a abrangência do conhecimento divino parece se contrapor à
vontade humana. Tendo isso em vista, parece que o determinismo teológico poderia ser
tratado juntamente com o determinismo lógico nesta questão. E, com isso, nos voltamos para
este último.
Quanto ao critério de força, o determinismo lógico parece não levantar problemas, já que
o domínio dos princípios lógicos é o domínio da necessidade por excelência sendo estes
princípios, portanto, os mais difíces de serem refutados. Mais do que isso, tais princípios são
condição para o nosso pensar, já que são condições para que sequer signifiquemos alguma
coisa. Mas, ora, sendo os princípios lógicos a condição de possibilidade para nosso
pensamento e linguagem, eles seriam também condição da nossa própria deliberação, dado
que esta ocorre por meio de certos raciocínios. Com isso, os princípios lógicos também
passariam no critério de qualidade. E, assim, um argumento válido que utilize apenas
princípios lógicos como premissas além de ser muito mais difícil de ser refutado, uma vez
provado, demonstraria que tudo estaria sob o domínio da necessidade, especialmente as ações
humanas.
Contudo, algumas objeções poderiam ser levantadas com respeito a esta conclusão:
Em primeiro lugar, poder-se-ia alegar que algumas ações não são deliberadas; por
exemplo, ações tomadas por impulso. Sendo assim, não seriam condicionadas por princípios
lógicos e, portanto, poderiam ser livres ou, mesmo que não fossem livres, não pertenceriam ao
domínio do determinismo lógico. Além disso, poder-se-ia dizer que algumas vezes queremos
ao mesmo tempo duas coisas contraditórias, o que indicaria que nossa vontade não seria
sempre determinada por princípios lógicos, já que nesse caso estamos claramente indo contra
o princípio da não contradição.
Todavia, parece que ambos os casos não são totalmente livres de determinação lógica.
Quando queremos duas coisas contraditórias, realmente desconsideramos o princípio da não
contradição. Mas este “querer” que tratamos aqui não é o mesmo tipo de querer que propicia
uma certa tomada de atitude. Esta querer pode ser o princípio de uma atitude apenas na
medida em que paraliza o agente. Mas isto porque é impossível que o agente tome duas
atitudes contraditórias, ou contrárias simultaneamente, o que se deve ao próprio princípio da
não contradição. Assim, parece que também neste caso nossas ações seriam reguladas, em
última instância, por leis lógicas.
O mesmo se dá no caso em que agimos por impulso. Mesmo sem deliberação alguma
(supondo que atos impulsivos não sejam fruto de nenhuma deliberação, por mínima e breve
que seja), por força lógica, o agente só poderá executar aquelas ações que forem logicamente
possíveis (embora ele não possa executar todas as ações logicamente possíveis). Assim, ações
por impulso também estão sob o domínio das leis lógicas, e uma vez que se demonstre que
essas leis são determinísticas, as ações por impulso também estariam no domínio das coisas
determinadas.
Mas, em segundo lugar, poder-se-ia objetar que a lógica rege apenas o domínio do que é
pensado, o que não seria suficiente para concluir que a lógica rege o domínio do real e, logo,
que o determinismo lógico se aplicaria a algo além das ações humanas (caso se aplique a
essas). De fato esta inferência não parece ser autorizada. Todavia, que o mundo segue as leis
da lógica é uma assunção que fazemos cotidianamente, tanto nas ações mais banais, como na
idéia de que há ciências que revelam e explicam o mundo. É importante ressaltar que para
aqueles que primeiro discutiram o determinismo lógico, as leis da lógica tinham fundamento
no mundo. O princípio da não-contradição, por exemplo, é tomado por Aristóteles não apenas
como princípio lógico, mas tambem como um princípio ontológico. Ser ele condição do
discurso inteligente é conseqüência da linguagem ser um espelho do pensamento, que por sua
vez reflete a realidade. Porém, mesmo que esta visão sobre linguagem, pensamento e mundo
não se mantenha exatamente assim até hoje, ninguém conseguiu fornecer um argumento
convincente contra certos princípios lógicos básicos como o princípio da não-contradição, por
exemplo. Assim, mesmo que o mundo não seja determinado pela lógica, o vínculo
estabelecido entre lógica e as ações humanas, já seria o suficiente para derivar o resultado
mais preocupante com respeito ao determinismo, que é justamente a sua conseqüência sobre
as ações humanas.
Logo, se o homem é um ser lógico, e se o argumento lógico para o determinismo for
válido, teremos que aceitar que não está em nosso poder tomar atitudes alternativas às que
efetivamente tomamos, i.e, seremos obrigados a reconhecer uma simetria entre passado e
futuro contrária ao nosso senso comum, que crê ser apenas o passado fechado a alteraçãoes,
enquanto sobre o futuro podemos deliberar e modificá-lo conforme essa deliberação. Se o
determinismo lógico for real, teremos de aceitar que aquilo que chamamos de deliberação não
passa de mera ilusão. Enquanto as noções de determinismo causal e teológico parecem aceitar
posições deterministas moderadas, ou pelo menos não são incompatíveis em princípio com a
posição moderada22, aceitando a compatibilização entre determinismo e liberdade, o
determinismo lógico, por partir de princípios que atuam diretamente sobre a deliberação
humana, não permitiria nenhum tipo de liberdade em seu cerne. Portanto, dada essa relação
com o fatalismo, o determinismo lógico parece ser em sua própria natureza o tipo mais radical
(pelo menos dentre esses tipos clássicos) de determinismo.
Bibliografia:
Alexandre de Afrodísias, De Fato. Translated by: R.W. Sharples. Duckworth: 2003.
Aristóteles, De Interpretatione. Translated by: J.L Ackrill. Clarendon Press, Oxford:1963.
Cícero, Sobre o Destino. Tradução: José Rodrigues Seabra Filho. Nova Alexandria, São
Paulo: 1993.
Barreau [1975], Le Maitre Argument de Diodore: Son interprétation traditionnelle, sa
signification historique, sa reconstrution contemporaine in Fundamenta Scientiae, No. 46,
1975.
Bernstein [2003], “Fatalism” in The Oxford Handbook of Free Will, Oxford University
Press, New York: 2003. pp.65-80.
Bobzien [1998], “The Inadvertent Conception and Late Birth of the Free Will Problem”,
Phronesis XLIII/ 2, pp. 133-175.
Botros [1985], “Freedom, Causality, Fatalism and Early Stoic Philosophy”, Phronesis, 30
(1985), pp. 274-304.
Cahn [1967], Fate, Logic, and Time. Yale University Press, New Haven: 1967.
Dennett [1984], The Elbow Room: The Varieties of Free Will Worth Wanting, MIT Press,
Cambridge: 1984.
Gaskin [1995], The Sea Battle and the Master Argument: Aristotle and Diodorus Cronus
on the Metaphysics of the Future. De Gruyter, New York:1995.
Helm [1975], “Fatalism Once More”, The Philosophical Quarterly, Vol. 25, No. 101 (Out.
1975), pp. 355-356.
Hoefer [2008], “Causal Determinism”, The Stanford Encyclopedia of Philosophy (Winter
2008 Edition), Edward N. Zalta (ed.).
22 Conforme dito anteriormente, o determinismo religioso talvez só possa ser compatível com a vontade livre
caso abramos mão de critérios compreensíveis pelo intelecto humano, considerando apenas a vontade e
capacidade divina. Pois, a princípio, Deus poderia, dada sua onipotência, fazer coisas que fogem à lógica, que é
algo da esfera humana.
URL = <http://plato.stanford.edu/archives/win2008/entries/determinism-causal/>
Jordan [1063], “Logical Determinism”, Notre Dame Journal of Formal Logic, Vol. 4,
No.1, (Jan. 1963), pp. 1-38
Leach [1915], “Fatalism of the Greeks”, The American Journal of Philology, Vol. 36, No.
4 (1915), pp. 373-401.
Lovejoy [1936],
A Grande Cadeia do Ser: Um Estudo da História de Uma Idéia.
Tradução: Aldo Fernando Barbieri. Editora Palíndromo, São Paulo: 2005.
Rice [2006], “Fatalism”, The Stanford Encyclopedia of Philosophy (Fall 2008 Edition),
Edward N. Zalta (ed.).
URL = <http://plato.stanford.edu/archives/fall2008/entries/fatalism/>
Solomon [2003], “On Fate and Fatalism”, Philosophy of East and West, Vol. 53, No. 4
(Out. 2003), pp. 435-454
Wilson [1955], “Space, Time and Individuals”, The Journal of Philosophy, Vol. 52, No. 22
(Oct. 1955), pp. 589-598.
Wolff [1960], “Truth, Futurity and Contingency”, Mind, New Series, Vol. 69, No. 275
(Jul. 1960), pp. 398-402.
Zajzebski [2008], “Foreknowledge and Free Will”, The Stanford Encyclopedia of
Philosophy (Fall 2008 Edition), Edward N. Zalta (ed.).
URL = <http://plato.stanford.edu/archives/fall2008/entries/free-will-foreknowledge/>