fabio brambilla - Faculdade Cenecista de Vila Velha
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26 OS INSTRUMENTOS DE CONTROLE INTERNO E A PREVENÇÃO DE PERDAS NAS EMPRESAS BRASILEIRAS Fabio Brambilla Rodrigues 1 Resumo: O presente trabalho tem como objetivo discutir a eficácia dos instrumentos de controle interno em relação à necessidade de prevenir perdas financeiras e patrimoniais nas empresas brasileiras, diante do crescente número de fraudes e a possibilidade de perdas milionárias resultantes do dolo de alguns de seus empregados, fornecedores e clientes em contrapartida ao baixo percentual de recuperação dos valores desviados. Palavras-chave: Controle interno. Fraude. Prevenção de perdas. Introdução Não raramente é noticiado na imprensa prisões de pessoas envolvidas em esquemas corruptos que envolvam membros da administração pública. Entretanto, são raros os casos que noticiam demissões, processos e eventuais prisões de empregados de empresas privadas que usaram de má-fé contra seus cofres e patrimônio. Isso pode demonstrar em um primeiro momento que os controles internos das empresas brasileiras são tão eficazes que não permitem que seus empregados causem danos. Será essa uma verdade absoluta? Os controles internos das empresas nacionais são realmente eficientes e eficazes? Ou será que existe um tabu sobre o assunto, fazendo com que as empresas fechem os olhos e acabem por tentar resolver o problema da forma mais rápida e discreta possível? Na busca por respostas será feita uma revisão bibliográfica do tema e utilizada à experiência de campo, bem como as recentes pesquisas sobre o tema, desenvolvidas por empresas especializadas do ramo. 1 Professor da Faculdade Cenecista de Vila Velha. Revista FACEVV | ISSN 1984-9133 | Vila Velha | Número Especial | Jan./Jun. 2011 27 Controle interno Sendo a empresa uma pessoa jurídica, sem alma ou vontade própria, cabe ao grupo de pessoas físicas e a relação entre si a responsabilidade por fazer a entidade existir e gerar benefícios de forma legal. Com isso, só existe entidade onde existam pessoas e essas são responsáveis por uma gama de atividade de diversos níveis de complexidade, agindo em prol de objetivos comuns. E são elas, as pessoas, que são passíveis das tentações da corrupção, seja por interesse próprio ou para beneficiar a terceiros. As pesquisas sobre fraudes vêm mostrando que as empresas estão a cada dia identificando mais prejuízos em seus cofres por conta de desvios. A consultoria Kroll2, empresa americana especializada em gerenciamento de risco, realizou uma recente pesquisa com 890 executivos em todo mundo que representavam empresas de diversos setores sendo 42% delas com faturamento maior que US$ 1 bilhão. A constatação é de que as perdas financeiras com fraudes aumentaram em todas as regiões do planeta, mesmo sendo muito difícil para um executivo admitir que a sua empresa foi vítima de uma fraude, exatamente para evitar desgastes vindo de questionamento nem sempre fáceis de serem respondidos. Com isso, a tendência é que ao responder um questionário sobre fraude o executivo omita informações e reduza alguns números. O curioso é que mesmo sendo um número questionável pelos motivos expostos acima, o fato é que as fraudes crescem, mas as notícias sobre o assunto são remotas. No Brasil, é possível observar que no setor público a atuação da força policial, em especial da Polícia Federal, é rotineiramente noticiada expondo a presença da corrupção nos meios governamentais. Já na iniciativa privada dificilmente são noticiados casos em que empregados utilizando de má-fé foram denunciados e obrigados a devolverem a empresa os danos causados por fraudes. Isso pode dar uma sensação aqueles que não conhecem a realidade das empresas que a fraude é um problema unicamente do poder público, cabendo as empresas em geral as virtudes e o bom comportamento. 2 Relatório Global Anual de Fraude <http://www.krollamericalatina.com/about/library/fraudes/>. (2008/2009). Disponível Revista FACEVV | ISSN 1984-9133 | Vila Velha | Número Especial | Jan./Jun. 2011 em: 28 Dessa forma uma contradição se concretiza: se as pesquisas apontam para o fato do aumento no número de fraudes nas empresas, porque ainda é raro se perceber ações rígidas contra o fraudador e de recuperação de valores desviados? Duas possibilidades podem ser levantadas a partir disso. A primeira é que as medidas preventivas tomadas não estão sendo eficazes, tendo dificuldades em alcançar seu resultado final que é inibir a ação do fraudador. A segunda é que as medidas são eficazes, porém o tratamento dado após a identificação da fraude é enérgico o suficiente, bonificando o fraudador que sai ileso do ato ilegal e por vezes incentivando a ação de outros fraudadores. Antes de aprofundar a reflexão sobre as possibilidades citadas acima, se faz necessário conceituar controles internos. Cabe a eles buscar inibir a ação do fraudador e identificá-lo se a situação se concretizar, gerando assim evidências para a abertura da fase de tentativa da empresa em recuperar os valores perdidos. Conforme o Instituto de Auditores Internos do Brasil, Audibra3 “controles internos devem ser entendidos como qualquer ação tomada pela administração para aumentar a probabilidade de que os objetivos e metas estabelecido sejam atingidos”. Outro conceito de controle interno é dado por Chiavenato4 “o controle exerce uma função restritiva e coercitiva, no sentido de coibir ou restringir desvios indesejáveis, pode ser, também, um sistema automático de regulação no funcionamento de um sistema e, por fim, como função administrativa, através do planejamento, organização e a direção”. Franco e Marra5 entendem o controle interno como “[...] todos os instrumentos da organização destinados à vigilância, fiscalização e verificação administrativa, que permitem prever, observar, dirigir ou governar os acontecimentos que se verificam dentro da empresa e que produzem reflexos em seu patrimônio”. Cita-se ainda que conforme Attie6 “o objetivo do controle interno relativo à salvaguarda dos interesses remete-se à proteção do patrimônio contra quaisquer perdas e riscos devidos a erros ou irregularidades”. 3 INSTITUTO DOS AUDITORES INTERNOS DO BRASIL. Normas brasileiras para o exercício da auditoria interna. 2. ed. São Paulo: Audibra, 1992. 4 CHIAVENATO, Idalberto. Administração nos novos tempos. 2. ed. Rio de Janeiro: Campus, 2003. 5 FRANCO, Hilário; MARRA, Ernesto. Auditoria contábil. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2001, p. 267. 6 ATTIE, William. Auditoria: conceitos e aplicações. São Paulo: Atlas, 1985. Revista FACEVV | ISSN 1984-9133 | Vila Velha | Número Especial | Jan./Jun. 2011 29 Dessa forma conclui-se que os controles internos são inibidores do risco empresarial (probabilidade de algo dar errado no negócio). São alarmes contra as anomalias que possam existir na rotina da empresa. Procedimentos, normas internas, regulamentos, instruções, sistemas e avaliações, entre outros, são parte dos controles internos. A relação entre controle e risco é inversamente proporcional, ou seja, quanto maior o controle interno menor será o risco de perdas patrimoniais e financeiras. Isso porque o domínio das ações e das atividades pela empresa inibe a sensação de descontrole e consequentemente desencoraja parte das ações fraudulentas. Por outro lado, uma empresa que não se preocupa com o controle interno fatalmente estará criando à imagem de desorganização e desordem, ambiente propício as fraudes. Apesar de não ser o foco deste trabalho, cita-se a importância dos controles internos na parte administrativa das empresas. A padronização de procedimentos e processos, o controle de documentos, pessoas, veículos e mercadorias, geração de dados, entre outros, são ferramentas de auxilio a gestão da empresa. Um gestor atento perceberá que ter os principais dados da empresa sob sua visão permitirá fazer de uma tomada de decisão uma tarefa eficaz. Uma informação precisa ser exata, tempestiva e útil e é nesse ponto que os controles internos são fundamentais. Pior que não ter uma informação para uma tomada de decisão é ter uma informação errada, pois essa pode induzir o gestor a uma opção desastrosa. As políticas empresariais de prevenção de perdas De nada adianta os métodos de controle interno sem a devida sanção aos atos fraudulentos contra a empresa. É como se tivesse uma lei sem a prévia cominação legal, o que estimularia à prática de atos ilícitos e prejudiciais a empresa. Uma fraude é uma anomalia intencional, ou seja, é uma omissão ou um ato danoso a empresa. Pressupõe então que para haver uma fraude deverá haver o dolo, a Revista FACEVV | ISSN 1984-9133 | Vila Velha | Número Especial | Jan./Jun. 2011 30 intenção, à vontade. E isso acontece porque o ambiente daquela empresa é permissivo a tal fato. Neste ponto entra em ação a política de prevenção de perdas que deverá ser estabelecida pela empresa. Comumente chamada de código de ética ou de conduta essas normas são bússolas direcionadoras de como os empregados devem agir nas mais diversas situações, induzindo ao trabalhador uma postura que seja alinhada com os princípios e seus valores da empresa. Respeito, transparência, honestidade, moral, justiça, sustentabilidade, integridade, entre muitas outras, são palavras comuns aos códigos de comportamento que nortear o trabalho ao que se entende ser razoável e aceitável. Além disso, serve como amparo legal em casos de processos judiciais, tendo em vista que comumente a empresa colhe evidências de que seus empregados estão cientes dos limites entre o permitido e o proibido. A partir deste ponto, atitudes que contrariem o permitido podem e devem ser apuradas. Sendo constatada a fraude, a empresa deverá agir com rigor para evitar que outros empregados não entendam na omissão diante da situação uma fraqueza e se sintam estimulados a também cometerem os mesmos erros. Entretanto, apesar de todas as empresas saberem que é necessário o estabelecimento de punições, inclusive a demissão por justa causa onde essa couber e os processos judiciais para a punição criminal dos envolvidos e a possível recuperação dos valores desviados, é muito comum a solução discreta, sem desgaste ou muitos questionamentos para “preservar” a imagem da empresa. Na verdade o que a prática mostra é um temor da Justiça Trabalhista, da reintegração do trabalhador, do mal estar de rever em seus quadros uma pessoa que o empregador não confia. Outro ponto são os estragos no clima organizacional e até mesmo na produtividade caso seja descoberto que aquela pessoa cometeu um ato fraudulento que passou impune. A receptividade negativa da equipe a um membro demitido por fraude e reintegrado posteriormente pode gerar um ambiente de desconfiança generalizado desviando o foco do trabalho produtivo e levando a uma espécie de temor coletivo, onde todos passam a dar mais valor e dedicar mais tempo a observar o que acontece do que efetivamente as tarefas de seu cargo. Isso pode acarretar outros processos, inclusive de assédio moral, justificando em parte o fato das empresas não utilizarem as medidas cabíveis no tratamento de uma fraude. Revista FACEVV | ISSN 1984-9133 | Vila Velha | Número Especial | Jan./Jun. 2011 31 Entre a demissão por justa e consequente risco de reintegração e a demissão sem justa causa a maioria das empresas opta pela segunda hipótese e busca a saída menos desgastante e mais segura. O que não se mede é o quanto isso servirá para incentivar a outros a cometerem ilícitos, tendo em vista que o empregado que cometeu o desvio é “bonificado” com todos os seus direitos trabalhistas e ainda os “ganhos” da fraude. Soma-se ao fato a possibilidade de recontratação futura do mesmo fraudador devido à falta de histórico ou registros que alimentem a memória da empresa. No final não há realmente um fator desmotivador para o fraudador e isso não é percebido pelas empresas. Alguns números confirmam o afirmado acima. Em uma recente pesquisa realizada pela Consultoria KPMG7 sobre a fraude no Brasil, foi constatado que 55% dos envolvidos em fraudes foram demitidos, mas em apenas 31% dos casos houve a denúncia criminal. Apesar de identificar o ato ilícito e seus envolvidos em mais da metade dos casos e demitir os envolvidos, apenas uma em cada três situações houve a denúncia criminal, transpondo os muros da corporação. Se considerado os pedidos de indenização o número se reduz drasticamente para 9%. A pesquisa KPMG ainda traz outros números que ratificam a ideia da “solução discreta” nos casos de fraude. Ao responder a pergunta se os controles internos são eficientes 29% dos entrevistados responderam que concorda totalmente e 60% que concordavam parcialmente. Apesar disso, na pergunta sobre a tendência dos atos fraudulentos no futuro, 50% dos entrevistados responderam acreditar que as fraudes aumentarão. Isso pode até levar a uma conclusão contraditória, mas serve para comprovar a tese aqui exposta. Os controles em média são eficientes, mas as ações das empresas não são inibidoras de novos atos. Ou seja, a resposta para a pergunta “vale à pena?” na média tem sido “sim”, tendo em vista que mesmo que seja descoberto o fraudador contará com a beneficência da empresa. A conta torna-se muito positiva para o fraudador que fica com os resultados da fraude, soma-se ainda os benefícios sociais e trabalhistas legais previstos para uma demissão sem justa 7 A fraude no Brasil Relatório de pesquisa 2009. <http://www.kpmg.com.br/publicacoes/forensic/Fraudes_2009_port.pdf>. Disponível Revista FACEVV | ISSN 1984-9133 | Vila Velha | Número Especial | Jan./Jun. 2011 em: 32 causa e sai tranquilo sabendo que não correrá o risco de sofrer um processo criminal e/ou de reparação de danos. Por isso, conforme a mesma pesquisa, 68% das empresas possuem 0% de recuperação de valores, ou seja, após a fraude, algumas envolvendo montantes milionários (23% das fraudes registradas possuíam valores acima de R$ 1milhão e 5% envolveram valores superiores a R$ 10 milhões), a empresa não vê nenhum centavo retornar ao seu caixa: zero recuperação, perda total. É uma espécie de “prêmio da Mega Sena” sem aposta. Este cenário torna-se combustível para novas ações fraudulentas. Empregados predispostos a atos de má-fé se sentirão incentivados a executarem suas ideias de causarem danos às empresas em benefício próprio ou de terceiros. Na primeira oportunidade a empresa poderá ser novamente vítima de um fraudador. Não se pode esquecer ainda a possibilidade da ação por parte de prestadores de serviço terceirizados, fornecedores e até clientes. Principais instrumentos de controle interno Para inibir as ações ilícitas a empresa deve agir de forma preventiva e em casos de ações concretas ela deve buscar a recuperação dos valores perdidos, se possível em sua totalidade. Para isso, além da melhoria contínua nos controles internos, a apuração da fraude deverá gerar o máximo de evidências possíveis de forma a suportar o departamento jurídico em caso de processos. Isso porque a empresa buscará recuperar suas perdas, porém isso não descartar que a pessoa demitida tente uma reintegração. É neste ponto que se percebe a importância dos instrumentos de controle interno. Em um primeiro momento como forma de inibir a fraude. Em um segundo momento gerando evidências que facilitem a ação da empresa em tomar ações para recuperar os valores perdidos e buscar a punição dos culpados. Os arquivos documentais organizados, os sistemas de gerenciamento, a checagem de identificação, as auditorias, os relatórios e os recursos tecnológicos, entre outros, poderão gerar evidências essenciais para o sucesso em processos judiciais. A Revista FACEVV | ISSN 1984-9133 | Vila Velha | Número Especial | Jan./Jun. 2011 33 prática mostra que apenas as testemunhas com relatos de atitudes ou de fatos não são tão eficientes na avaliação dos magistrados. Por outro lado, diferente do fraudador, a empresa deve sempre agir legalmente para gerar suas provas. A teoria jurídica dos “Frutos da Árvore Envenenada” coloca todo o processo em dúvida, não sendo um bom negócio nem para o processo e nem para a imagem da empresa. Cabe a quem acusa provar a culpa e não ao fraudador a sua inocência. Contudo, é importante lembrar que a empresa possui as condições e a obrigação de se antecipar ao fraudador montando controles internos que possam de maneira lícita colher evidências. Ressalta-se que o risco de uma prova ilícita ser usada por uma empresa pode causar um prejuízo muito maior que o da própria fraude. Neste momento a relação custo x benefício para analisar os investimentos em controle interno deve considerar os riscos de uma fraude, bem como a possibilidade de recuperação das perdas. Normalmente, os gastos necessários para se manter um controle eficiente são altos. Isso porque podem envolver sistemas gerenciais informatizados, monitoramento e controle de acesso eletrônico, ciclos periódicos de auditorias, entre outros, ações que envolvem mão de obra qualificada, manutenção constante, contratação de empresas especializadas e tantos outros gastos por vezes de difícil prova da sua validade. Por isso, infelizmente, a maioria das empresas ignoram a necessidade de implantar medidas de prevenção de perdas. Essa é uma das causas da passividade da organização ao sofrer uma fraude: não houve a preocupação da prevenção quando necessário e para evitar questionamentos sobre a gestão dos riscos também não haverá uma reação a altura do problema. Considera-se ainda que por vezes a má-fé do fraudador inclua a premeditação de todos os eventos, inclusive do ato de apagar as evidências. Um fato relevante é o acesso que o fraudador tem aos mais diversos níveis gerenciais da empresa, facilitando o trabalho de limpar o caminho percorrido para concretizar a fraude. Pessoas de confiança, empregados antigos e líderes de alto escalão participam ativamente do perfil do fraudador por possuir acesso livre a toda a organização e por vezes são capazes de alterar os instrumentos mais frágeis dos controles internos. A pesquisa KPMG mostra que quase metade dos fraudadores (47%) ocupava cargos de chefia (supervisores, gerentes e diretores), ou seja, pessoas com formação acadêmica e de alto grau de confiança da organização Revista FACEVV | ISSN 1984-9133 | Vila Velha | Número Especial | Jan./Jun. 2011 34 desviando valores financeiros que desfrutam da confortável posição de não suspeitos. Poucos imaginam que os profissionais com os maiores salários da empresa podem ser capazes de agir de forma desleal. Este é um grande equívoco, pois não há relação direta entre baixas remunerações e fraude, logo, até que se tenha a solução do caso todos devem se checados, inclusive as lideranças. Destaca-se ainda da pesquisa KPMG o fator tempo de contratação. 43% dos fraudadores possuíam seis anos ou mais de empresa. Por isso são conhecedores dos pontos fortes e principalmente os pontos fracos e consequentemente as oportunidades de se fraudar a organização. Também são pessoas que contam com a confiança da organização, de companheiros de trabalho, de fornecedores e clientes, ou seja, conseguem agir sem levantar suspeitas e por vezes passam longe de serem incluídos no rol de possíveis culpados. Dessa forma o desafio será montar um controle interno capaz de atuar de maneira eficaz e inibir a ação de qualquer um que possa querer fraudar a empresa. Para isso as ferramentas a serem utilizadas devem possuir um grau de independência que impeça que alterações sejam feitas e evite que se apaguem as evidências que possam auxiliar a empresa a desvendar o ocorrido. A consultoria Kroll, em uma pesquisa mundial realizada nos anos de 2008 e 2009, concluiu que 25% das fraudes nas empresas acontecem por conflitos de interesse da alta administração das empresas. Também destaca que a maior preocupação das empresas é a fuga de informações estratégicas que se caracteriza por ser uma fraude de quem detém dados importantes, o que significa normalmente empregados de alto escalão. Logo, o controle interno das empresas deve ser capaz de deixar um rastro de evidências das anomalias causadas por qualquer um dos empregados. Acessos a áreas restritas, invasões de sistemas, tentativas de alterar documentos, download ou envio de arquivos confidencias para outras mídias, imagens de movimentos de pessoas, cargas e veículos, atas de reuniões, entre outros, podem ser usados como fonte de prevenção de perdas ou recuperação de valores por parte das empresas. Até os contratos de trabalhos devem conter cláusulas de prevenção como, por exemplo, as relativas aos acordos de confidencialidade. O que se espera é a inibição das ações dos fraudadores pela ação direta e explicita da empresa, sem desculpas, sem omissões, sem medo de se expor. Cabe Revista FACEVV | ISSN 1984-9133 | Vila Velha | Número Especial | Jan./Jun. 2011 35 ressaltar que todas as medidas propostas devem ser estudadas a fundo pela assessoria jurídica a fim de tranquilizar a empresa sobre a obediência das normas legais e o respeito às garantias constitucionais. A importância dos controles internos na prevenção de perdas A presença de câmeras de monitoramento como forma de diminuir os crimes nas grandes cidades é um exemplo da reação humana ao saber está sendo observado. Ao perceber que sua identidade poderá ser revelada e não mais estará sujeito ao anonimato um meliante sente-se inibido de praticar um crime, pois sabe que a impunidade, tão presente em algumas áreas da sociedade, pode não reinar naquela situação. Este é o mesmo princípio dos controles internos nas empresas: ao saber da possibilidade de uma fraude ser descoberta e com ela a identidade do fraudador, um empregado com certeza irá refletir muito sobre a validade do seu ato. As fraudes acontecem pela combinação de três fatores, o chamado triângulo da fraude: o motivo, a oportunidade e a racionalização. O motivo e a racionalização são pessoais e somente o fraudador pode explicar o que levou a cometer aquele ato. Pressão financeira, frustração profissional, alpinismo social, entre outras, são justificativas comumente usadas para se tentar explicar uma fraude. Apesar disso, nem sempre o fraudador deixar transparecer sua intenção, não sendo fácil captar os sinais de que determinada pessoa está planejando um ato nocivo à empresa. Porém, a oportunidade se dá pela falta ou falha nos controles internos. Atuar na melhoria dos controles é minimizar a possibilidade da criação da oportunidade para a fraude. Com isso, mesmo que na organização existam pessoas intencionadas a causar um dano este não será possível ou será de grande risco para quem quiser executá-lo. Logo, a melhor maneira de impedir ou ao menos inibir uma fraude são os controles internos eficazes e eficientes. Se não é tão fácil para a empresa agir diretamente sobre o motivo e a racionalização da fraude, por outro lado é responsabilidade e dever da empresa restringir as oportunidades. Revista FACEVV | ISSN 1984-9133 | Vila Velha | Número Especial | Jan./Jun. 2011 36 Isso explica porque 93% dos executivos entrevistados pela KPMG afirmaram que para evitar à repetição de atos fraudulentos a ação da empresa seria melhorar os controles internos sendo a ação mais citada, com quase o dobro de preferência em relação à segunda proposta que foi a elaboração de um manual de comportamento profissional com 57% de indicação. Esse dado é a comprovação da importância dos controles internos para a prevenção de perdas e combate a fraude. Na prevenção de perdas os controles internos atuam na inibição dos atos. No combate a fraude os controles internos serão de suma importância para a geração de evidências que possam auxiliar a empresa nas medidas rígidas que deverão ser tomadas contra o fraudador. As principais ações são a demissão por justa, os processos judiciais com o objetivo da condenação do fraudador e a recuperação de perdas e a eliminação da fragilidade que possibilitou aquele ato que não poderá ser repetido por mais ninguém. A divulgação do ocorrido também é uma das possíveis ações propostas que deverá ser realizada com o devido acompanhamento jurídico de forma a não criar qualquer situação constrangedora e ao mesmo tempo deixando clara a forma com que a empresa trata seus casos de fraude. A apuração de uma fraude deve ser detalhada e cuidadosa a fim de impedir uma conclusão errada e caluniosa. Pior que a fraude seria a imagem que a empresa criaria se acusasse um empregado por algo que não cometeu. Este sim é um erro normalmente imperdoável pela justiça trabalhista. Por isso a juntada de evidências deve ser o mais completa possível. Senhas, atas de reunião, boletins de medições, relatórios diários de acompanhamento de obras e serviços, notas fiscais de compra e venda, contratos com terceiros, entre outros, são exemplos de itens a serem controlados. Neste momento ressalta-se que um dos pontos mais discutidos é o direito da empresa monitorar os e-mails da organização. Conforme decisões recentes, o e-mail profissional é da empresa e por isso ela tem o direito de checar o que lhe interessar. Logo, o e-mail corporativo pode ser utilizado como prova da fraude, desde que possa ser auditado e comprovado sua origem. Revista FACEVV | ISSN 1984-9133 | Vila Velha | Número Especial | Jan./Jun. 2011 37 Comprovada a má-fé a Consolidação das Leis Trabalhistas – CLT8, que rege as relações de trabalho no Brasil, prevê a demissão por justa causa em seu artigo 482 enquadrando as seguintes possibilidades: a) ato de improbidade; b) incontinência de conduta ou mau procedimento; c) negociação habitual por conta própria ou alheia sem permissão do empregador, e quando constituir ato de concorrência à empresa para a qual trabalha o empregado, ou for prejudicial ao serviço; d) condenação criminal do empregado, passada em julgado, caso não tenha havido suspensão da execução da pena; e) desídia no desempenho das respectivas funções; f) embriaguez habitual ou em serviço; g) violação de segredo da empresa; h) ato de indisciplina ou de insubordinação; i) abandono de emprego; j) ato lesivo da honra ou da boa fama praticado no serviço contra qualquer pessoa, ou ofensas físicas, nas mesmas condições, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem; k) ato lesivo da honra ou da boa fama ou ofensas físicas praticadas contra o empregador e superiores hierárquicos, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem; l) prática constante de jogos de azar. Normalmente, o enquadramento mais comum para os casos de fraudes é a improbidade. Conforme definição do dicionário Aurélio “Ímprobo é o desonesto” que adjetiva de maneira completa o fraudador. Uma pessoa que se dispõe a lesar a 8 Consolidação das Leis Trabalhistas. Disponível em: lei/del5452.htm>. <http://www.planalto.gov.br/ccivil/decreto- Revista FACEVV | ISSN 1984-9133 | Vila Velha | Número Especial | Jan./Jun. 2011 38 quem quer que seja por intermédio de um meio fraudulento é um desonesto. Porém, isso não elimina os outros enquadramentos no processo de demissão por justa causa citados na CLT. Após a comprovação da fraude os controles internos deverão ser capazes de mensurar os prejuízos causados pelo desvio para que se possa, além da denúncia criminal contra o fraudador, buscar a recuperação de valores perdidos. Cabe ressaltar que existe a possibilidade do fraudador ser um empregado terceirizado, um fornecedor ou mesmo uma pessoa jurídica. Independente de ser pessoa física ou jurídica, empregado próprio ou contrato, fornecedor ou cliente a empresa lesada deve ser enérgica em suas medidas buscando sempre a quebra do vínculo contratual ou empregatício sem ônus, a condenação criminal dos responsáveis e a recuperação dos valores desviados. Não se devem confundir as medidas preventivas contra fraude com truculência ou assédio moral. Cabe aqui destacar que o objetivo da empresa deverá ser o de levar o possível fraudador a refletir sobre a validade de seu ato, ou seja, levá-lo a responder “não” para a pergunta “vale à pena?” Neste momento a empresa estará agindo preventivamente para minimizar as perdas provenientes das fraudes e isso não é só um direito, mas um dever que empresa tem de preservar a integridade de seu patrimônio e das suas finanças. Conclusão Apesar das pesquisas apontarem para o aumento considerável do número de fraudes em todo o mundo ainda são raras as notícias sobre ações de repreensão por parte das organizações. No Brasil, as pesquisas mostram que os executivos estão preocupados com o assunto, pois já reconhecem que as perdas estão tomando dimensões tal que já afetam seus balanços e indicadores. Isso mostra a relevância do tema e a importância da tomada de ações que inibam a prática de tais atos ilícitos. Os controles internos desempenham uma missão árdua, mas crucial para o alcance do objetivo de redução das fraudes. São eles que, sendo aprimorados dia a dia, poderão inibir a atuação do fraudador e em caso de tentativa identificá-lo. Dessa Revista FACEVV | ISSN 1984-9133 | Vila Velha | Número Especial | Jan./Jun. 2011 39 forma, minimizam os riscos do negócio e causam a sensação de segurança tão importante ao crescimento da empresa. Além disso, caberá aos controles internos a missão de gerar evidências que suportem a empresa em um futuro processo de recuperação de valores desviados, bem como na ação de demissão e possível tentativa de reversão na justiça trabalhista nos casos de enquadramento como “justa causa”. Porém, sem medidas eficazes o fraudador será premiado com sua demissão, quando ocorrer, sem justa causa e ainda levará consigo os valores desviados. Considerando que estes valores podem chegar a cifras milionárias, o empregado de má-fé que mesmo sabendo que será reconhecido se sentirá motivado a agir pela impunidade que a omissão da empresa vai gerar. Neste momento caberá a empresa analisar o que considera melhor a sua continuidade e decidir entre a omissão e a ação enérgica. A omissão dará a empresa à falsa sensação de solução rápida e sem desgastes em uma passageira tranquilidade que será quebrada assim que outra fraude aparecer. Por outro lado, a ação enérgica levará à empresa a via judicial, vai expor seus controles e a sua imagem e testar se seus controles realmente são eficazes, porém trará a empresa a certeza que outros empregados que pensavam agir de igual maneira verão no fraudador um exemplo de insucesso e isso os levará a pensar sobre a validade da tentativa de fraudar. Mas as empresas ainda estão preferindo tratar o assunto com discrição e absorvendo os prejuízos causados pelas fraudes. Isso acaba por premiar os fraudadores e encorajar outros a tentarem o mesmo. A empresa perde ao não recuperar os valores desviados, ao rescindir o contrato com o empregado fraudador sem justas arcando com todas as obrigações trabalhistas, ao encorajar outros empregados a reiniciarem o ciclo e ainda, por não guardarem qualquer histórico sobre o assunto, correm o risco de readmitir o empregado fraudador ou contratá-lo como terceiro permitindo que ele volte ao convívio novamente no ambiente de trabalho atingido. Faz-se então a necessidade de investimentos em controles internos. Esses investimentos vão desde a simples confecção de procedimentos escritos, passando por sistemas de monitoramento e controle de acesso até modernos softwares de gerenciamento integrado da empresa, conforme necessidade de cada organização. Revista FACEVV | ISSN 1984-9133 | Vila Velha | Número Especial | Jan./Jun. 2011 40 Caberá também ao gestor buscar a melhor metodologia para implantação, execução e avaliação dos resultados dos procedimentos. Dessa forma, fica explicito a necessidade das empresas realizarem o estudo da relação custo x benefício para implantação de controles internos cada vez mais rígidos de forma a inibir as fraudes ou evidenciá-las, caso aconteçam, evitando as perdas dos desvios ou buscando apoiar os processos de recuperação de valores. Cita-se ainda a importância dos controles internos para a administração da empresa. A organização da rotina e a fiscalização das atividades desempenhadas são exemplos da utilidade que os controles internos podem ter para um gestor. Dessa forma, os investimentos nas ferramentas de controle também serão úteis para a busca da excelência na gestão da organização. Conforme discutido, o fraudador em sua maioria é um empregado. Porém, isso não descartar a possibilidade de fornecedores, prestadores de serviços e clientes serem fraudadores. O que não pode mudar é a forma rígida de tratamento de uma fraude: rescisão sem ônus, busca pela condenação criminal e pela recuperação dos valores desviados e divulgação do caso como forma de desencorajar outras ações. Não esquecendo os limites da legalidade, é dever da empresa preservar seu patrimônio e suas finanças. Neste ponto os controles internos são aliados imprescindíveis na luta contra as fraudes, seja na prevenção de perdas com o uso das ferramentas para inibir as anomalias ou nas ações de recuperação de valores e punição do infrator. REFERÊNCIAS: ATTIE, William. Auditoria: conceitos e aplicações. São Paulo: Atlas, 1985. INSTITUTO DOS AUDITORES INTERNOS DO BRASIL. Normas brasileiras para o exercício da auditoria interna. 2. ed. São Paulo: Audibra, 1992. BRASIL. Decreto Lei 5452 de 1º de maio de 1943. Disponível <http://www.planalto.gov.br/ccivil/decreto-lei/del5452.htm>. Acesso em: 08 de abril de 2011. em: CHIAVENATO, Idalberto. Administração nos novos tempos. 2. ed. Rio de Janeiro: Campus, 2003. KROLL. A fraude no Brasil: relatório de pesquisa 2009. Disponível em: <http://www.kpmg.com.br/publicacoes/forensic/Fraudes_2009_port.pdf>. Acesso em: 05 de maio de 2011. FRANCO, Hilário; MARRA, Ernesto. Auditoria contábil. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2001, p. 267. Revista FACEVV | ISSN 1984-9133 | Vila Velha | Número Especial | Jan./Jun. 2011 41 KPMG. Relatório Global Anual de Fraude (2008/2009). Disponível <http://www.krollamericalatina.com/about/library/fraudes>. Acesso em: 05 de maio de 2011. Revista FACEVV | ISSN 1984-9133 | Vila Velha | Número Especial | Jan./Jun. 2011 em: