Fábio Olmos
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Perspectivas para Programas de Refaunação Fábio Olmos [email protected] Refaunação: introduzir animais nos seus habitats originais ou similares a estes. (conceito que também pode ser utilizado para outros seres vivos) Modelagem da distribuição do Mamute Mammuthus primigenius de acordo com o clima no Pleistocene e Holoceno. Climate Change, Humans, and the Extinction of the Woolly Mammoth PloS Biology April 1, 2008. DOI: 10.1371/journal.pbio.0060079 Prado et al. 2015. Megafauna extinction in South America: A new chronology for the Argentine Pampas. Palaeogeography, Palaeoclimatology, Palaeoecology 425: 41–49 A expansão de populações humanas é a variável que melhor explica a maior parte das extinções nos últimos 45.000 anos Sandom et al. 2014. Global late Quaternary megafauna extinctions linked to humans, not climate change. Proceedings of the Royal Society B. DOI: 10.1098/rspb.2013.3254 Megalocnus rodens, preguiça gigante de Cuba extinta ao redor de. 4700 BP., 1200 anos depois da primeira ocupação humana em Cuba, 5900 BP. Steadman et al. 2005. Asynchronous extinction of late Quaternary sloths on continents and islands. PNAS. 102, 33: 11763-11768. doi: 10.1073/pnas.0502777102 Como seria a riqueza de espécies de grandes mamíferos (> 45 kg) sem o impacto de humanos modernos (Homo sapiens)? A figura mostra a variação no número de de mamíferos de grande porte que ocorreriam em células de 100 x 100 m. A escala indica o número de espécies. Ilustração: Soren Faurby S. Faurby & J.-C. Svenning. 2015. Historic and prehistoric human-driven extinctions have reshaped global mammal diversity patterns. Diversity and Distributions. doi: 10.1111/ddi.12369 Para não dizer que só falei de mamíferos: entre outras coisas povos polinésios extinguiram c. 2.000 espécies de aves nos últimos 2 milênios, incluindo famílias inteiras. Steadman. 2006. Extinction and biogeography of tropical Pacific birds. University of Chicago Press VOCÊ VIVE EM UM PLANETA QUE É MAIS POBRE DEVIDO À AÇÃO HUMANA Graças a povos pré-industriais..... Isto é um Ecossistema Artificial, onde faltam peças Jalapão, Tocantins Isto é um Ecossistema MENOS Artificial, onde ainda há a maior parte das peças Tarangire National Park, Tanzania Mantemos a tradição de nossos ancestrais..... Alta Floresta Mato Grosso Resex Chico Mendes Acre Marco Antonio de Freitas Marco Antonio de Freitas Marco Antonio de Freitas Marco Antonio de Freitas Marco Antonio de Freitas Marco Antonio de Freitas Marco Antonio de Freitas Mudanças globais na biomassa total de mamíferos selvagens, humanos, gado bovino e total de animais domésticos entre 1900 e 2050. Ripple et al. 2015. Collapse of the world’s largest herbivores. Science Advances 01 May 2015. Vol. 1 no. 4 e1400103. DOI: 10.1126/sciadv.1400103 Redução na distribuição de três megaherbívoros africanos: Elefante Africano (ca. 1600 versus 2008), Hipopotamo (ca. 1959 versus 2008), e Rinoceronte Negro (ca. 1700 versus 1987). Ripple et al. 2015. Collapse of the world’s largest herbivores. Science Advances 01 May 2015. Vol. 1 no. 4 Altrichter et al. 2011. Range-wide declines of a key Neotropical ecosystem architect, the Near Threatened White-lipped peccary Tayassu pecari. Oryx, 46(1), 87–98 Limpa-folha-do-nordeste Philydor novaesi Pararu-espelho Claravis geoffroyi Mas não se trata meramente de extinções Processos ecológicos foram drasticamente alterados Alguns impactos de megaherbívoros (ainda vivos) no ecossistema: (A) Elefantes-africanos (L. africana) convertem savanasparque em savanas arbustivas, aumentando a disponibilidade de alimento para rinocerontesnegros e impalas. Ao danificar árvores, os elefantes aumentam a complexidade estrutural do habitat, beneficiando comunidades de lagartos. As atividades de grandes predadores é facilitada quando elefantes abrem vegetação impenetrável. Elefantes também dispersam sementes por grandes distâncias. (B) Hipopótamos (H. amphibius) mantém trilhas em pântanos, criando sistemas de canais. Áreas pastejadas por hipopótamos são mais nutritivas, o que beneficia alguns antílopes. Há uma série de relações mutualísticas e semi-parasitárias entre hipos e aves. (C) Rinocerontes-brancos (C. simum) mantém gramados baixos em áreas nais úmidas, o que aumenta a disponibilidade de alimento para outros animais (antílopes e zebras) e altera o regime de fogo. Ripple et al. 2015. Collapse of the world’s largest herbivores. Science Advances 01 May 2015. Vol. 1 no. 4 e1400103. DOI: 10.1126/sciadv.1400103 Gill et al. 2009. Pleistocene Megafaunal Collapse, Novel Plant Communities, and Enhanced Fire Regimes in North America. Science 236: 11001103. Mcintosh. 2010. Fire, erosion and the end of megafauna. Australasian Science Como seria a dinâmica do fogo no Cerrado e nos Campos Sulinos quando a fauna local era assim? Mas podemos mirar o futuro e criar novos ecossistemas funcionais e diversos, já que é impossível recuperar um passado perdido E temos muito com que trabalhar Um ponto chave é manter e restaurar interações ecológicas !!! Por exemplo, dispersão de sementes Por quê???? Por exemplo: A Amazônia é responsável por 14% do carbono fixado pela biosfera terrestre e estoca 17% do carbono em ecossistemas terrestres Se isso estivesse na atmosfera nós não estaríamos aqui conversando 1% (182 spp) das espécies de árvores da Amazônia é responsável por fixar e estocar 50% deste carbono* Pense. Pense de novo. E considere se isso não é importante (embora ninguém pague por isso) Agora, faça a pergunta que não quer calar: que árvores são essas????? *Fauset et al. 2015. Hyperdominance in Amazonian forest carbon cycling. Nature Communications 6, Article number: 6857 doi:10.1038/ncomms7857 Boa parte desta espécies depende de animais para dispersar suas sementes Os mesmos animais que nós matamos Table 2: Top 20 most dominant species by aboveground woody biomass. Family * Species Biomass % Total Cumulative (Mg) biomass % biomass Rank by Rank by stem productivity* abundance Productivity ranks are based on the 221 plot productivity data set. Fabaceae Eperua falcata 2,217 1.93 1.93 8 8 Lecythidaceae Eschweilera coriacea 2,142 1.87 3.80 2 2 Lecythidaceae Bertholletia excelsa 1,498 1.31 5.11 243 4 Vochysiaceae Qualea rosea 1,452 1.27 6.37 30 88 Lauraceae Chlorocardium rodiei 1,340 1.17 7.54 71 13 Fabaceae Vouacapoua americana 1,340 1.17 8.71 27 5 Goupiaceae Goupia glabra 1,299 1.13 9.84 61 10 Burseraceae Tetragastris altissima 908 0.79 10.64 10 6 Fabaceae Dicorynia guianensis 898 0.78 11.42 56 16 Arecaceae Iriartea deltoidea 847 0.74 12.16 1 1 Moraceae Pseudolmedia laevis 819 0.71 12.87 4 3 Lecythidaceae Eschweilera sagotiana 784 0.68 13.55 22 62 Sapotaceae Pradosia cochlearia 736 0.64 14.19 176 275 724 Chrysobalanaceae Licania alba 0.63 14.83 17 90 Caryocaraceae Caryocar glabrum 689 0.60 15.43 149 50 Apocynaceae Aspidospermaexcelsum 648 0.57 15.99 74 14 Sapotaceae Pouteria guianensis 625 0.54 16.54 55 53 Fabaceae Swartzia polyphylla 624 0.54 17.08 203 19 Fabaceae Dicymbe altsonii 623 0.54 17.62 233 9 Olacaceae Minquartia guianensis 623 0.54 18.17 29 21 Processos de Refaunação têm várias facetas Os bichos podem tomar a iniciativa, às vezes com algum incentivo.... Brotogeris tirica e B. chiriri São Paulo, SP Capivara Hydrochaerus hydrochaeris Bonito, MS Processos de Refaunação têm várias facetas Os bichos podem tomar a iniciativa.... Ou nós podemos colaborar • Iniciativas voltadas a espécies em particular • Iniciativas “híbridas” voltadas a interações ecológicas • Iniciativas com foco em comunidades /ecossistemas nativos • Oportunidades que surgem com mudanças na economia e na sociedade Bontebok Damaliscus pygargus pygargus De Hoop Nature Reserve, África do Sul California Condor Gymnogyps californianus Big Sur, California Guará-vermelho Eudocimus ruber Cubatão - SP Araras (2 espécies) foram reintroduzidas com sucesso na região de Descalvado (SP) Papagaio-de-peito roxo Amazona vinacea Reintroduzido no PARNA Araucárias Processos de Refaunação tem várias facetas Os bichos podem tomar a iniciativa.... Ou nós podemos colaborar • Iniciativas voltadas a espécies em particular • Iniciativas voltadas a interações ecológicas • Iniciativas com foco em comunidades /ecossistemas nativos • Oportunidades que surgem com mudanças na economia e na sociedade Parque Nacional Hortobagy Hungria Hermaness Nature Reserve Shetlands Processos de Refaunação têm várias facetas Os bichos podem tomar a iniciativa.... Ou nós podemos colaborar • Iniciativas voltadas a espécies em particular • Iniciativas “híbridas” voltadas a interações ecológicas • Iniciativas com foco em comunidades /ecossistemas • Oportunidades que surgem com mudanças na economia e na sociedade Addo National Park África do Sul Ulva Island Nova Zelândia Tiritiri Matangi Nova Zelândia Processos de Refaunação têm várias facetas Os bichos podem tomar a iniciativa.... Ou nós podemos colaborar • Iniciativas voltadas a espécies em particular • Iniciativas “híbridas” voltadas a interações ecológicas • Iniciativas com foco em comunidades /ecossistemas • Oportunidades que surgem com mudanças na economia e na sociedade Na Europa há menos gente dando tiros em animais e o êxodo rural e populações humanas em declínio levaram ao abandono de áreas que estão sendo devolvidas à natureza... Populações de grandes carnívoros estão reocupando a Europa. O continente hoje abriga 17,000 Ursos-pardos em 10 populations que ocupam 22 países. Há 9.000 linces em 11 populações em 23 países. Há mais de 12.000 lobos em 10 populações em 28 países. http://news.mongabay.com/2015/0512-hance-bison-triumph.html Urso-pardo Ursus arctos Déság, Romênia Como podemos promover a refaunação? 0 – Unidades de Conservação (públicas e privadas) são a base para qualquer esforço. Elas são as áreas-fonte a partir das quais paisagens com mosaicos de diferentes usos podem manter populações viáveis Garoupa-verdadeira Epinephelus marginatus. ARIE Queimada Grande, SP • Deveríamos olhar o exemplo de países de Primeiro Mundo, como a África do Sul, Botswana, Zâmbia, Austrália e Nova Zelândia, que adotaram o manejo ativo de suas UCs e onde translocações e reintroduções são rotina Como podemos promover a refaunação? 0.5 – A caça continua sendo um problema sério (apesar de 50 anos de proibição) e é necessário pensar medidas mais inteligentes para seu combate: • • • • • Mudanças na legislação Dificultar o acesso a munição Estratégias de fiscalização mais inteligentes (cães treinados, etc) Estratégias de educação (novelas?) Deixar o êxodo rural continuar seu curso 2 – Chega de manejo contemplativo. Temos que colocar a mão na massa e não ter medo de realizar mais ensaios dentro de Unidades de Conservação Há projetos óbvios que devem ser promovidos. Por exemplo: • Queixadas, araras e (no futuro) patos-mergulhões no PARNA Iguaçu • Queixadas, antas e jacutingas no PARNA Serra dos Órgãos e PE Três Picos • Jacutingas e antas nos PARNAs Itatiaia e Serra de Itajaí • Mutuns-do-sudeste nas REBIO União, Poço das Antas, PE Três Picos, PARNA Monte Pascoal (se os Pataxós deixarem) e PARNA Tijuca • Araras em diversas UCs na Mata Atlântica Etc, etc 3 – Áreas privadas (incluindo aqui as indígenas e quilombolas) devem ser engajadas em projetos de refaunação e restauração de habitats na escala de paisagem • • • • • Se o Código Florestal (original) tivesse sido respeitado o número de espécies ameaçadas (em habitats terrestres) seria 80% menor É preciso construir paisagens capazes de manter tanto a biodiversidade como os serviços ambientais O CAR abre possibilidades imensas para a construção destas paisagens. RPPNs (oficiais ou não) já tem papel importante em projetos de refaunação. Este deve ser reconhecido e ampliado. E financiado. E fica o meu desafio para que grupos que tem sido tão catastróficos para a biodiversidade, como parte dos ruralistas e grupos indígenas, deixem de ficar só no discurso e passem à prática conservacionista 4 – Melhorando a articulação entre o ICMBio, criadores e zoológicos • • • Para os criadores conservacionistas, acesso destes a recursos (como compensações ambientais ou patrocínios) em troca de contratos para fornecimento de indivíduos para projetos de reintrodução Para os comerciais, doação de indivíduos para projetos . P. ex., há dezenas de milhares de bicudos Sporophila maximiliani em cativeiro, o suficiente para criar dezenas de novas populações de uma espécie (praticamente) extinta na natureza Planos de ação para conservação devem lembrar que seu objetivo primeiro é conservar espécies, e não bancar dissertações ou teses. Pesquisa científica é fundamental mas o rabo não deve abanar o cachorro. 4 – Há um brutal desperdício de terras subutilizadas onde a falta de florestas compromete tanto a segurança hídrica como a biodiversidade. É mais do que hora de tratar da restauração em escala de paisagem de regiões como o Vale do Paraíba... .... e outras na faixa da Mata Atlântica Rio das Contas Jequié, BA 5 – É FUNDAMENTAL engajar o público estimulando visitantes nas UCs (mais visitantes, menos caçadores) e também possibilidades de voluntariado. Isso passa pela ampliação das possibilidades de concessões e parcerias. Parque fechado ao público é parque aberto para a degradação PARNA Emas 6 – Podemos ser ousados o suficiente para fazer experimentos: • Introduzir espécies fora de sua área de distribuição (oficial) para nos anteciparmos às mudanças climáticas, expansão urbana e outros desastres • Introduzir espécies fora de sua área de distribuição para reduzir sua probabilidade de extinção • Estudar os experimentos involuntários já em andamento e introduzir espécies para restaurar interações e dinâmicas perdidas PARNA Aparados da Serra PARNA Aparados da Serra Formicivora erythronotus Alex Mariano 6 – Podemos ser ousados o suficiente para fazer experimentos: • Introduzir espécies fora de sua área de distribuição (oficial) para nos anteciparmos às mudanças climáticas, expansão urbana e outros desastres • Introduzir espécies fora de sua área de distribuição para reduzir sua probabilidade de extinção • Estudar os experimentos involuntários já em andamento e introduzir espécies para restaurar interações e dinâmicas perdidas The Paradox of Invasive Endangered Species Conservation By Dr. Tag Engstrom Invasive species are a major threat to natural ecosystems. Conservation strategies for invasive species usually involve elimination of the invasive. Chris Radford with turtle But, what if the introduced species wreaking havoc on a natural ecosystem is also endangered in its native habitat and this introduced population may represent the last of its kind anywhere else on the planet? Center for Ecosystem Research (CER) biologists Dr. Tag Engstrom and Dr. Michael Marchetti have been chipping away at this interesting conservation conundrum through their research on the Chinese Wattle-necked Softshell Turtles introduced to Hawaii. http://www.csuchico.edu/cwe/features/tag-engstrom.shtml PARNA Aparados da Serra 6 – Podemos ser ousados o suficiente para fazer experimentos: • • • Introduzir espécies fora de sua área de distribuição (oficial) para nos anteciparmos às mudanças climáticas Introduzir espécies fora de sua área de distribuição para reduzir sua probabilidade de extinção Estudar os experimentos involuntários já em andamento para restaurar interações e dinâmicas perdidas - e criar coisas novas? Equus asinusAparados da Serra PARNA Babaçulândia, TO Estancia Los Venados Equus asinusAparados da Serra PARNA Uruguay Babaçulândia, TO Há búfalos ferais no Vale do Guaporé e Pantanal. Como afetam a dinâmica dessas áreas úmidas? Funcionam como os hipopótamos funcionam na África? Onça-pintada Panthera onca A introdução de javalis será positiva para as onças ? E o que aconteceria se somássemos guanacos aos cavalos e bois dos campos sulinos (onde a maioria das plantas depende de distúrbios causados pela herbivoria e/ou fogo) ? Isso pode acontecer na Chapada dos Guimarães. Como as comunidades nativas irão reagir? Qual herança deixaremos? A degradação continuada passada de geração a geração há 50 mil anos ou O início de um processo de restauração ? PARNA Aparados da Serra Obrigado