Monografia completa - Calem

Transcrição

Monografia completa - Calem
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO
UNIVERSIDADE TECNOLÓGICA FEDERAL DO PARANÁ
Centro Acadêmico de Línguas Estrangeiras Modernas
Curso de Especialização em Línguas Estrangeiras Modernas
Tânia Izabel Dudeque Andriguetto
A CRIATIVIDADE NA COMPOSIÇÃO DA LINGUAGEM POLICIAL: SUAS
GÍRIAS E JARGÕES
CURITIBA
2006
TÂNIA IZABEL DUDEQUE ANDRIGUETTO
A CRIATIVIDADE NA COMPOSIÇÃO DA LINGUAGEM POLICIAL:
SUAS GÍRIAS E JARGÕES
Monografia de conclusão do Curso de
Especialização em Ensino de Línguas
Estrangeiras Modernas da UTFPR.
Orientador: Professora Mestre Márcia dos
Santos Lopes
CURITIBA
2006
Agradeço:
A Deus, primeiramente, pela oportunidade da vida e da saúde.
Ao Paulo, Leonardo e Fernando, pela compreensão nos momentos de
ausência, pela tolerância nos momentos de ansiedade e pelo apoio nos momentos
de decisão.
Ao Marcelo, pelo apoio técnico nas horas de aflição.
Aos policiais que gentilmente forneceram os dados, primordiais para este
trabalho.
Aos professores do CELEM, que tento me ensinaram.
À minha orientadora professora Márcia dos Santos Lopes, pela dedicação e
paciência ao me orientar.
ii
“Mas, fundamentalmente, aprende-se o francês por
causa de Napoleão, de Victor Hugo, de Claudel,
evidentemente por causa de Paris, mas sobretudo para
aborrecer os americanos.”
Phillippe Rossillon.
iii
SUMÁRIO
LISTA DE ANEXOS.................................................................................................... v
RESUMO.................................................................................................................... vi
RÉS UMÉ .................................................................................................................. vii
1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 1
2 REFERENCIAL TEÓRICO ..................................................................................... 4
2.1 LINGUAGEM ........................................................................................................4
2.2 LINGUAGENS ESPECIAIS ..................................................................................7
2.3 GÍRIAS .................................................................................................................8
2.4 JARGÃO .............................................................................................................11
2.5 CALÃO ...............................................................................................................14
2.6 UMA NOÇÃO DE METÁFORA ..........................................................................16
3 METODOLOGIA ...................................................................................................19
3.1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................19
3.2 DELINEAMENTO E DELIMITAÇÃO DA PESQUISA .........................................20
4 ANÁLISE DOS DADOS ....................................................................................... 22
4.1 FORMAÇÃO DO CORPUS ................................................................................22
4.1.1 Delegacia Anti-Tóxicos – DATOX ...................................................................22
4.1.2 Delegacia de Furtos e Roubos de Veículos – DFRV ......................................25
4.1.3 Delegacia da Criança e do Adolescente – DA ................................................32
4.1.4 Delegacia da Mulher – DM ..............................................................................35
4.1.5 11º Distrito Policial – 11º DP ...........................................................................37
4.2 RESULTADOS E DISCUSSÕES .......................................................................42
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................45
REFERÊNCIAS .........................................................................................................47
ANEXOS ...................................................................................................................49
iv
LISTA DE ANEXOS
ANEXO 1 – GLOSSÁRIO DAS GÍRIAS UTILIZADAS PELOS POLICIAIS NAS
DELEGACIAS CONSULTADAS ......................................................... 49
ANEXO 2 – DECRETO Nº 4.884 DE 24/04/78 – REGULAMENTO E ESTRUTURA
DO
DEPARTAMENTO
DA
POLÍCIA
CIVIL
– DA DELEGACIA
ANTITÓXICOS ..................................................................................... 53
ANEXO 3 – DECRETO Nº 4.884 DE 24/04/78 – REGULAMENTO E ESTRUTURA
DO DEPARTAMENTO DA POLÍCIA CIVIL – DA DELEGACIA DE
FURTOS E ROUBOS DE VEÍCULOS .................................................. 55
ANEXO 4 – DECRETO Nº 4.884 DE 24/04/78 – REGULAMENTO E ESTRUTURA
DO DEPARTAMENTO DA POLÍCIA CIVIL – DA DELEGACIA DA
CRIANÇA E DO ADOLESCENTE ........................................................ 56
ANEXO 5 – DECRETO Nº 4.884 DE 24/04/78 – REGULAMENTO E ESTRUTURA
DO DEPARTAMENTO DA POLÍCIA CIVIL – DA DELEGACIA DA
MULHER.................................................................................................58
ANEXO 6 – DECRETO Nº 4.884 DE 24/04/78 – REGULAMENTO E ESTRUTURA
DO DEPARTAMENTO DA POLÍCIA CIVIL – DAS DELEGACIAS
DISTRITAIS DA CAPITAL (11º DISTRITO POLICIAL)......................... 61
v
***Agradecimentos***
v
v
RESUMO
Este trabalho trata da criatividade na composição da linguagem policial, com suas
gírias e jargões. A pesquisa abordou o uso de gírias por policiais civis em cinco
delegacias de polícia de Curitiba. Essas gírias foram obtidas através de coleta
realizada a partir de pedido verbal em cada delegacia. Por se tratar de uma
linguagem especial, o trabalho está essencialmente baseado em teorias lingüísticas
que abordam a importância do meio físico e social na formação de uma linguagem
própria. Toda a terminologia utilizada pelos policiais vem da necessidade de
compreensão nos depoimentos dados pelos criminosos. Trata-se, portanto, de um
repertório compartilhado, que gera um entendimento fácil e rápido, reconhecido, mas
nem sempre compreendido pelos demais indivíduos da sociedade, e que caracteriza
um grupo específico, numa comunidade específica. O estudo, baseado no método
descritivo, parte de uma análise teórica e genérica sobre a linguagem, passando por
linguagens especiais, metáforas, gírias, jargões e calão. Finalmente, com a
apresentação das gírias coletadas e relacionando-as com as delegacias de origem,
os resultados mostram que existe relação entre os termos utilizados pelos policiais e
as especificações funcionais de cada delegacia consultada. De uma maneira geral,
esta monografia procura enriquecer o entendimento da evolução do idioma que,
sucessivamente, recebeu influências e contribuições advindas dos mais variados
meios e das mais variadas situações.
Palavras-chave: linguagem, jargões, gírias policiais.
vi
RÉSUMÉ
Ce travail traite de la criativité dans la composition du langage policier, avec ses
argots et ses jargons. La recherche a abordé l’usage des argots par les agents de
police dans cinq commissariats de police à Curitiba. Ces argots ont été obtenus
auprès d’une enquête réalisée à partir d’une demande verbale chez chaque
commissariat de police. En s’agissant d’un langage spécial, le travail est
essentiellement basé sur des théories linguistiques qui abordent l’importance du
moyen physique et social pour la formation d’un langage propre. Toute la
terminologie employée par les agents de police est née de la nécessité de
comprehénsion des dépositions faites par les criminels. Il s’agit, alors, d’un répertoire
partagé, qui engendre un entendement facile et rapide, reconnu, mais pas toujours
compris par les autres individus de la société, et qui caractérise un groupe
spécifique, dans une communauté spécifique. L’étude, basé sur la méthode
descriptive, part d’une analyse théorique et générique à propos du langage, en
passant par les langages spéciaux, les métaphores, les argots, les jargons et le
“calon”. Finalement, avec la préséntation des argots obtenus et en les rapportant aux
commissariats d’origine, les résultats prouvent qu’il existe un rapport entre les termes
employés par les agents de police et les spécificités fonctionnelles de chaque
commissariat de police consulté. D’une façon générale, cette monographie cherche
d’enrichir la comprehénsion de l’évolution de l’idiome qui a successivement reçu des
influences et des contributions advenues des moyens et des situations les plus
variés.
Mots-clés: langage, jargons, argots policiers.
vii
1 INTRODUÇÃO
ROUSSEAU, citado por NICOLA (2005, p.315) afirma que as necessidades
ditaram os primeiros gestos e as paixões arrancaram as primeiras palavras e que,
portanto, as línguas tiveram origem nas necessidades morais, nas paixões. Diz
Rousseau: “As paixões aproximam os homens. Não a fome nem a sede, mas o
amor, o ódio, a piedade, a cólera arrancam as primeiras palavras”.
Para RECTOR (1975, p.42), “o ser humano, através da expressão oral da
palavra, manifesta todas as suas idéias, seus desejos e suas inquietações. Desde
sua infância, adquire um tesouro inestimável que é a linguagem”. Portanto, através
da linguagem o ser humano determina sua participação como ser social,
desenvolvendo sua relação com os outros indivíduos e consigo próprio. O fator de
distinção da linguagem humana com as demais é a língua. Numa mesma
comunidade, que se apresenta num determinado contexto social, a língua possui
elementos identificadores desse contexto social e da forma de que dispõe para se
comunicar. REMENCHE (2003, p.7) afirma que as relações entre a sociedade e a
língua são interdependentes, pois alguns fatores comuns aos falantes, dentre os
quais suas condições sócio-culturais, denotam como esses falantes “articulam
linguisticamente sua realidade”.
Sendo assim, pode-se ainda tomar como fator formador de determinado
grupo lingüístico, as profissões. Cada uma possui um conjunto de palavras mais ou
menos importantes que constituem a terminologia da atividade em questão. É assim
que militares ou marinheiros, engenheiros ou médicos, advogados ou policiais e,
mais recentemente os usuários de redes de computadores, utilizam entre si um
vocabulário especial, muitas vezes ininteligível pelos que não pertencem aos
referidos grupos.
Trabalhando há vários anos em instituição ligada à atividade policial civil em
Curitiba, sempre observamos a criatividade dos policiais na formação e uso de uma
linguagem própria, rica e bastante intrigante, por vezes inédita por vezes, óbvia.
Essa linguagem é caracterizada por termos emprestados da língua nacional corrente
e que, de tão usados, são freqüentemente reconhecidos pelo restante dos falantes
como próprios de uma comunidade específica, no presente caso, a dos policiais.
2
Essa comunidade torna -se detentora de um caráter lingüístico metafórico nem
sempre evidente aos indivíduos não pertencentes a tal comunidade.
Vale ressaltar que todo esse processo lingüístico/metafórico existente na
linguagem policial vem de um repertório compartilhado entre os policiais e os
criminosos. Muito embora façam parte de contextos sociais distintos, os policiais e
os criminosos fazem parte de um mesmo contexto lingüístico, destinado a efetivar a
comunicação que hora ou outra terão que promover. Tal fato, a princípio, se explica
por uma exigência da lei: os depoimento s tomados numa delegacia devem ser
transcritos exatamente na forma falada, passando então o policial a conhecer e a
fazer uso dos mesmos termos. Depreende-se daí a forte similaridade da gíria policial
com a gíria dos criminosos.
REMENCHE (2003, p.8) afirma que “a linguagem criada nas penitenciárias
é dinâmica, pitoresca e metafórica em sua essência, trazendo muitas vezes à tona o
comportamento social dos indivíduos que compõem esse ambiente”. Tal afirmação
expressa o que ocorre nas delegacias, pois, por meio da linguagem utilizada, o
policial se sente mais próximo do criminoso, aquele a quem deseja ver atrás das
grades da cadeia. Também expressa seus sentimentos de autoridade constituída
perante a sociedade em geral, ávida de proteção e segurança.
Neste texto monográfico, a ser apresentado como requisito parcial para
obtenção do certificado de especialista em ensino de língua estrangeira moderna ,
objetiva -se de maneira geral, o estudo lexical e semântico dos termos (vocábulos,
gírias) mais usados pelos policiais civis em cinco delegacias de polícia de Curitiba.
São propostos ainda, visando atender ao objetivo geral, os seguintes objetivos
específicos:
1. Definir linguagem especial, metáfora, gíria, jargão e calão.
2. Fornecer o significado das palavras (gírias) usadas nas delegacias.
3. Apresentar as acepções vocabulares com as possíveis diferenças e
semelhanças entre elas.
4. Estabelecer se existe relação das gírias com a área de atuação de cada
delegacia.
5. Elaborar um glossário de gírias faladas entre os componentes das
referidas delegacias.
3
A linguagem, como fenômeno social, revela através de seu estudo, as
relações entre língua, cultura e sociedade. De acordo com REMENCHE (2003,
p.12), conhecer tais relações é “um meio de observar os aspectos valorizados por
determinado grupo e mesmo as condições de vida impostas pelo meio físico” e, no
presente caso, também pelo meio profissional. Portanto, estudar as gírias utilizadas
nas delegacias, é uma maneira de se visualizar a sua realidade, bem como entender
melhor o processo de criação e uso de vocábulos em grupos sócio-profissionais
específicos.
Num primeiro momento, referente à fundamentação teórica, este trabalho
abordará a linguagem de forma genérica, com suas definições e funções. Inclui-se
nesse estudo, a definição de linguagens especiais, de metáfora como precursora
natural das gírias, e ainda a definição de gíria, jargão e calão, objetivando salientar
os limites semânticos entre eles.
Em seguida, no terceiro capítulo, será apresentada a metodologia,
enfocando a pesquisa assistemática, realizada junto às delegacias e que deu origem
ao corpus propriamente dito, objeto do capítulo quatro. Nesse capítulo, além da
apresentação dos vocábulos (gírias) obtidos, de seus significados e de uma breve
análise, se pretende avaliar até que ponto esses vocábulos têm relação com a área
de atuação de cada uma das delegacias consultadas, sempre lembrando que das
cinco, quatro são especializadas, ou seja, possuem definição funcional e atuação
delimitadas em estatuto próprio.
Finalmente, o capítulo cinco será dedicado às considerações finais.
O anexo da presente monografia será constituído pelo glossário das gírias
coletadas e pelo Decreto nº 4884/78 que trata do Regulamento e Estrutura do
Departamento da Polícia Civil, onde também serão apresentados os artigos do
Código Penal Brasileiro e da Lei das Contravenções Penais, objetos de investigação
de cada uma das delegacias pesquisadas.
4
2 REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 Linguagem
Desde Aristóteles, se costuma dizer que o homem é um animal social. Para
BALLY (1977, p.28), “a linguagem é o produto deste instinto de sociabilidade”.
Sendo assim, o homem se distingue de outros seres vivos, pois é o único ser falante
e, como tal, detentor de conhecimento teórico e prático. COSERIU (1982, p.17)
afirma que “a linguagem se apresenta concretamente como uma atividade humana
específica e facilmente reconhecível, a saber, como ‘falar’ ou ‘discurso’”. Mais do
que um fenômeno social, mas também uma atividade social e sistemática, a
linguagem envolve, no mínimo, dois indivíduos, o falante e o ouvinte. Entre esses se
estabelece uma comunicação cujos signos e significados, conhecidos e aceitos,
existem para que algo se torne comum. Eis a essência da linguagem verbal e que a
diferencia de outras formas de expressão.
A li nguagem,
formada
por
conteúdo
e
expressão,
se
concretiza
historicamente através de uma técnica determinada, a língua, que pode, por sua
vez, indicar também uma comunidade determinada. Afirmam BURKE E PORTER
(1993, p.27) que “a língua poderia moldar a identidade coletiva”. Assim, realidades
diferentes vividas por grupos sociais diferentes originarão formas diversas de
manifestações lingüísticas.
Mesmo que aos falantes pareça haver certa liberdade na maneira de se
expressar, quando dizem o que querem e, aparentemente, como querem, essa
liberdade é limitada por ser a língua um fenômeno social, formada por um conjunto
de convenções complexas. São, portanto, segundo REMENCHE (2003, p.14), dois
paradoxos da comunicação, ou seja, a coerção do sistema lingüístico e a relativa
liberdade que o falante detém para usar os elementos que constituem a língua. No
entanto, para COSERIU (1982, p.29), a linguagem é “fundamento e manifestação
primária do social e é uma obrigação livremente assumida”.
Em todo ato verbal, língua e fala são momentos simultâneos e inseparáveis
da linguagem, onde a fala, como realidade concreta, é a realização da língua e a
língua, como realidade abstrata, é a generalização e sistematização do ato de falar.
Qualquer falante, membro de uma comunidade, possui armazenado no cérebro o
5
seu acervo lingüístico pessoal que constitui parte do acervo lingüístico do seu grupo.
O que garante a dinâmica e a continuidade do sistema lingüístico da comunidade é o
fato de que, mesmo sendo inédito, o ato lingüístico se baseia num anterior vindo
dessa mesma comunidade, e servirá de modelo para outros atos lingüísticos
posteriores. Isso não impede que uma criação lingüística inédita desapareça como
apareceu, e nunca se torne língua ou volte a se repetir. Para BOUTON (1977, p.17),
a primeira característica de uma língua humana consiste no fato de que , através
dela , pode-se formular idéias já enumeradas e também traduzir em sinais
compreensíveis uma idéia nova.
Nesse processo criativo da linguagem, existem normas que o regulam e o
orientam. De início tem-se uma norma geral, da sociedade como um todo. Porém,
falantes de uma mesma comunidade escolhem comportamentos lingüísticos como
ideais visando se comunicar e transmitir informações necessárias à vida em comum.
Esses são hábitos lingüísticos que, de acordo com PRETI (1984, p.1), “se
convenciona chamar de uso”. Adotando determinado uso lingüístico os falantes se
submetem a normas que lhes permitam articular, de forma quase idêntica, os
mesmos pensamentos e idéias, levando-os também a se exprimir de forma única. As
realizações presentes na fala familiar, popular ou na linguagem coloquial, embora
contrariem a norma padrão, obedecem a normas específicas diretamente ligadas à
classe social e cultural do indivíduo, assim como à situação geográfica.
Atualmente, devido à abrangência dos meios de comunicação de massa,
observa-se um processo de unificação da linguagem, através do qual cada vez mais
se aprende a dizer as coisas de maneira igual. Não raro, se constata que a norma
urbana das grandes cidades encontra-se inserida nos meios rurais e que existe uma
tendência de que os regionalismos se tornem cada vez mais escassos (PRETI,
1984, p.2).
No entanto, mesmo dentro de uma mesma comunidade, os falantes
diferenciam-se por suas idiossincrasias nas formas de se expressar. São os
idioletos, ou características pessoais da fala, a forma de fala própria de um indivíduo
(RECTOR, 1975, p.33). Essas diferenças ocorrem cotidianamente, sendo que a
sociolingüística aponta diversos níveis de variação, que vão do individual ao coletivo
podendo ser internas, nos aspectos semântico, sintático, morfológico, fonético e
lexical. No âmbito do léxico, os valores semânticos ditos normais são decorrentes de
6
sua freqüência. Em contrapartida, os neologismos, sejam de forma ou de significado,
quando passam a fazer parte do uso lingüístico anteriormente referido, podem
causar impacto por se tratar de novidade. À proporção que eles vão se tornando
habituais, são incorporados ao conjunto de vocábulos da língua (REMENCHE, 2003,
p.15).
Os fenômenos lingüísticos estão também relacionados a fatores como
contexto, situação, tema do discurso e até mesmo os interlocutores. O que se
observa é que a cultura e a tradição social determinam padrões lingüísticos aceitos
pela sociedade, assim como o meio, através da atividade/profissão e do
pensamento, propicia o aparecimento de novas expressões. O resultado se reflete
nas linguagens especiais e nos diversos tipos de norma (culta, vulgar, coloquial,
comum e outras). Basicamente, a norma vulgar se caracteriza por ser utilizada por
falantes dotados de pouca instrução e por ser composta por variados vocábulos
gírios, assim denominados por PRETI (1984, p.3), que se encontram em desacordo
com a norma culta da língua. No entanto, deve-se levar sempre em conta a
amplitude do idioleto do falante, presente nas necessidades de comunicação e
expressão de cada um.
Para complementar este primeiro enfoque a respeito da linguagem,
constata-se em COSERIU (1982, p.61), três aspectos essenciais da linguagem, a
saber: linguagem representativa, enunciativa ou informativa, cuja finalidade é a de
informar sobre algo exterior ao falante ou ao ouvinte; linguagem expressiva, afetiva
ou emotiva, cuja finalidade é a de expressar um estado psíquico ou emocional do
falante e, ainda, a linguagem apelativa ou volitiva, cuja finalidade é a de obter
determinada conduta do ouvinte. Cada um desses aspectos, por serem
complementares, não são conflitantes entre si.
A seguir, considerando a riqueza e a dinâmica dos atos lingüísticos, serão
apresentadas abordagens sobre as linguagens especiais, destacando-se gíria,
jargão e calão, para, finalmente, numa forma de reconhecimento, chegar à metáfora,
origem de todas as outras.
7
2.2 Linguagens Especiais
Tendo sido apresentada uma breve análise genérica sobre a linguagem,
pode-se começar a restringir e a delimitar tema tão abrangente. Sendo assim, o
primeiro passo será abordar alguns pontos sobre as linguagens especiais. Não é
difícil haver alguma confusão entre linguagens especiais e estilo. O estilo, como
afirma MELO (1971, p.132), é do homem. Observando-se a maneira de um indivíduo
falar, pode-se identificar o seu estilo. Mas pode-se também relacioná-lo com
determinados grupos, pois sua pronúncia, escolha vocabular, sua preferência por
determinadas construções frasais, são fatores que podem identificar o país ou região
de origem do falante, o grupo social ao qual pertence, além da situação em que se
encontra. São fatores que podem definir grupos distintos com linguagens também
distintas. MELO (1971, p.140) destaca que a diferença no meio físico, no meio
social, na história determina a diversidade de imagens, de comparações, de
símbolos usados para que os indivíduos se expressem.
Para PRETI (1984, p.2), em decorrênc ia do comportamento social de
determinados grupos que se isolam, ocorre um comportamento lingüístico em que
esses grupos adotam uma linguagem especial em oposição ao uso comum.
Nessas linguagens especiais, além da originalidade, os termos adotados
adqui rem um caráter criptológico, fazendo com que, muitas vezes, apenas os
indivíduos do grupo se entendam. Conseqüentemente, tais linguagens refletem-se
na auto-afirmação, na realização pessoal e como marca original dos falantes, à qual
PRETI (1984, p.3) denomina signo de grupo. É o caso das gírias e jargões dos
hippies, dos estudantes, dos policiais, dos criminosos, dos vendedores ambulantes,
e mais recentemente, dos usuários e participantes de salas de conversas virtuais em
redes de computadores, só para citar alguns exemplos de linguagens especiais
decorrentes dessa dinâmica social e lingüística.
PRETI (1984, p.3) alerta que num primeiro momento, a comunidade pode
reagir com crítica e condenação ao uso das linguagens especiais, pois elas fogem
dos padrões li ngüísticos e podem ser vistas como manifestação de repúdio e
agressão ao convencional. Porém, a reação pode também ser de curiosidade, pois
os signos de grupo podem refletir hábitos, atitudes ou atividades pouco comuns.
8
De acordo com CABELLO (apud REMENCHE, 2003, p.17), a partir da
década de 70 verificou-se uma desmistificação do uso dessas linguagens. Em
função da expansão dos meios de comunicação de massa, especialmente o rádio e
a televisão, quando a gíria, o jargão e a linguagem erótica passaram a faze r parte da
linguagem “descontraída e despreocupada” das pessoas ou “como forma de
identificação grupal”. São transformações morais e sociais, às quais a sociedade é
submetida, e que implicam em transformações de atitude do falante, diretamente
relacionadas à ideologia moral de sua época e às características de sua
comunidade.
Essas linguagens especiais não têm um caráter apenas histórico, mas são
produto de relações sociais. Limitadas essencialmente ao domínio lexical, são
utilizadas para caracterizar a expressão de modos peculiares de pensar e agir ou
para designar grupos restritos como detentos, toxicômanos, homossexuais. Podem
também designar atividades técnico-científicas e atividades profissionais. Em todos
esses casos, a linguagem não é constituída por um código novo e nem por termos
totalmente originais. Quase sempre são empregados termos cujos significados são
alterados, por criação e processo metafóricos, de onde surge um vocabulário que
PRETI (1984, p.6) denomina de parasita.
Inicialmente, o estud o das linguagens especiais deve observar o que é de
uso individual, que conforme citado anteriormente, é de domínio estilístico e o que é
de uso coletivo, fenômeno de domínio lingüístico. Em seguida, REMENCHE (2003,
p.19) observa que se deve procurar identificar os limites existentes entre a gíria, o
jargão e o calão, tendo em vista que têm em comum se tratar de alterações
lingüísticas, dentro da história social, como formas de expressão relacionadas a
sentimentos contraditórios de conflito e de solidariedade e a desejos paradoxais de
continuidade e mudanças.
2.3 Gírias
Dentre as já referidas linguagens especiais, a gíria parece ser a que melhor
define a influência das variações sócio-culturais na maneira de se expressar de um
povo. Ou, pelo menos, é a mais popularizada quando se trata de se referir a uma
maneira própria de expressão, na qual se encontram intrínsecos sentimentos os
9
mais variados como pedantismo ou agressividade ou, tão somente, para que os
falantes se diferenciem do restante da população. Considerando-se que, de acordo
com COSERIU (1982,p.26), a linguagem, antes de ser emprego é criação de
significados, a gíria, como tal, cumpre com eficiência seu papel.
De fato, uma das características da gíria é que nela criam-se novas palavras
e, às já existentes, atribui-se semântica especial, o que a torna irreverente, sutil e
por vezes obscena. Na dinâmica da gíria, o léxico aparece como fundamental por
ser o elemento mais vulnerável e mais móvel da língua. E, segundo BORBA (1971,
p.58), esse vocabulário é resultado de: a) especializações de vocábulos da língua
corrente; b) uso de metáforas, que dão vida e respeitabilidade às expressões, e
metonímias; c) uso de estrangeirismos; d) uso de arcaísmo; e) deformação do
aspecto exterior das palavras; f) uso de onomatopéias. A gíria é, portanto, uma
linguagem que emprega palavras ou frases não convencionais para expressar coisa
nova ou velha, através de uma nova forma de expressão.
Para SERRA E GURGEL (1990, p.30), por estar associada à época e ao
módulo de situação, a gíria é o mais importante componente do modismo lingüístico.
Para os autores cada época tem a sua gíria e, por isso, está relacionada com a
moda.
Em RECTOR (1975, p.44) encontra-se um breve histórico etimológico da
palavra gíria. Segundo a autora, o termo jerga ou jeringonza aparece pela primeira
vez em 1734 e significa língua especial, de difícil compreensão, usada em algumas
profissões ou ofícios. O termo origina-se do francês antigo jargon ou gergon, cujo
significado é o gorjeio dos pássaros e, por isso, fala incompreensível.
Por volta do início do século XVI, já havia outros sinônimos para essa
linguagem especial. No espanhol germania, cujo significado em português é gíria
antiga, era a gíria do submundo. O termo pode ainda estar relacionado à forma
latina germanus, que significa irmão, de onde se constata a estreita ligação da gíria
como linguagem de uma irmandade, grupo ou confraria que a utiliza como elemento
de provocação, defesa ou afirmação. Por vezes, afirmam BURKE E PORTER (1997,
p.9), era também empregado o termo gringo.
Os autores destacam ainda o termo espanhol caló, em português calão, ou
linguagem dos ciganos, também referida à linguagem do submundo, uma vez que os
ciganos eram tidos como ladrões e vice-versa.
10
No inglês as gírias eram distinguidas por dois termos. O slang como gíria
geral, a língua de conhecimento geral da coletividade. Porém, o mais comum era o
cant, inicialmente referido à linguagem confidencial dos vigaristas, depois estendido
a alguns grupos de filósofos e de religiosos. Em resumo, o cant descrevia um mundo
criminoso isolado da sociedade respeitável. BURKE E PORTER (1997, p.116)
relatam que as pessoas que usavam o cant freqüentavam cervejarias e bordéis, seu
vocabulário se referia ao álcool e ao tabaco, sendo os substantivos referentes a
tipos de criminosos, jogos desonestos, ferramentas e métodos de roubos, tipos de
violência e de vítimas, os principais componentes do cant. Com o tempo essa gíria
teve seu uso estendido ao sistema penal, às prisões e à polícia.
Na França o argot antigo foi linguagem particular de criminosos. Segundo
CABELLO (apud REMENCHE, 2003, p.21), seu registro data entre os séculos XIV e
XV quando associações de mendigos, ladrões e vagabundos infestavam Paris. Já o
argot moderno não se encontra vinculado a esse tipo de comunidade. Equivale
preferencialmente a grupos marginais restritos e não aos marginais propriamente
ditos.
No Brasil a palavra mais abrangente é gíria. Seu conceito está relacionado
ao conjunto de expressões de tipo popular, comuns na linguagem corrente e
despretensiosa e, de maneira geral, sua freqüência é maior nas esferas menos
cultas da população. Porém, a gíria pode designar também a linguagem de certos
meios especiais como escolas, prisões e outros. Nesse caso, o termo calão é
definido como sendo “uma gíria com caráter mais reservado, mais secreto; ao passo
que a gíria propriamente dita não passa de uma forma exagerada da linguagem
familiar” (LAPA, 1979, p.68).
Face ao que foi exposto, observa-se que germania, cant, slang, argot e gíria
percorreram caminhos diferentes embora possuam a mesma natureza e surgiram
através de grupos marginais.
Se a princípio a gíria assume características de vocabulário especial e
secreto, exclusivo a determinadas comunidades sociais ou profissionais, como no
presente trabalho, a dos policiais, sua vulgarização confunde os conceitos de
vocabulário gírio e vocabulário popular (PRETI, 1984, p.3). Certos termos que antes
serviam de elemento identificador e meio ideal de comunicação ou para diferenciar
seu falante na sociedade, já ultrapassaram os limites de linguagem de minorias,
11
para se incorporar ao idioma. Ascendendo na escala sócio-cultural, integram-se no
uso diário da comunidade, chegando mesmo a contextos literários.
Tais transformações podem ser explicadas pela interação entre a língua oral
e a escrita, proporcionada pelos textos de jornais, com a veiculação de fatos
policiais, por exemplo, e pela grande influência do rádio e da televisão, onde se
observa o uso corrente de alguns vocábulos pertencentes a algum tipo de gíria.
A gíria é um elemento de defesa na medida em que é apenas compreendida
pelos integrantes do grupo que dela fazem uso. Mas é também um elemento de
agressividade, com o qual os falantes demonstram seu desprezo pelo restante da
comunidade. PRETI (1984, p.6,7) salienta ainda que os jovens, para manter o signo
de grupo, resistem em manter sua gíria mesmo num diálogo com pessoas de
linguagem mais formal. Já para os habitantes das grandes cidades, a gíria está
relacionada à pressa que as pessoas têm em se comunicar.
Mais do que tentar impedir esse fenômeno lingüístico, pertencente à
dinâmica da língua e que a mantém viva, deve -se orientar os indivíduos sobre a
adequação do uso de gírias em situações pertinentes. Para tanto, vale observar em
SERRA E GURGEL (1998, p.26):
... que a gíria tanto pode contribuir para o enriquecimento da língua, com suas dialetações,
derivações, deformações, especializações, metaplasmos, metáforas, metonímias,
estrangeirismos, africanismos, brasileirismos, indigenismos, caipirismos, regionalismos,
arcaísmos e onomatopaísmos, além de outras variações morfológicas e fonemáticas, como
pode contribuir para o empobrecimento dessa mesma língua principalmente pelo
estreitamento do equipamento falado, portanto ágrafo, do grupo social.
De qualquer maneira, é sempre importante lembrar que a gíria é, acima de
tudo, elemento histórico e que, além da dinâmica da língua, detém um caráter
agregativo dentro dos mais variados contextos sócio-cultur ais.
2.4 Jargão
Nem sempre é fácil perceber a diferença entre os conceitos de gíria e de
jargão. Numa primeira tentativa de se estabelecer os limites semânticos entre
ambos, pode-se, de maneira bastante simplificada e sintética, afirmar que o ponto
fundamental de diferenciação consiste no fato de que jargão é, em primeira análise,
terminologia utilizada em linguagens ligadas às atividades profissionais. Levando-se
12
em conta o que foi referido sobre as gírias, no tópico anterior, verifica-se que para a
análise da linguagem policial, é bastante pertinente a abordagem sobre gírias e
jargões, pois nessa linguagem tanto são utilizadas gírias (como linguagem de grupos
restritos), quanto jargões (como linguagem de uma categoria profissional).
Antes de se fazer uma síntese histórica do vocábulo jargão e, para que
melhor se compreenda o seu significado, vale ressaltar os sinônimos apresentados
no dicionário, por FERREIRA (1986, p.984): “Do fr. jargon – 1. linguagem
corrompida; 2. língua estrangeira que não se compreende; 3. gíria profissional.”
No entanto, para BURKE E PORTER (1997, p.7), a tentativa de se
estabelecer uma definição isolada e particular não seria satisfatória do ponto de vista
lingüístico, pois o jargão depende de quem fala e de quem ouve. Esses autores
afirmam que a história da linguagem apresenta muitos exemplos de palavras que já
foram consideradas jargão e passaram a fazer parte do idioma.
BURKE E PORTER (1997, p.8) explicam, ainda, como o conceito sofreu
alterações desde a Idade Média. No início a palavra descrevia o gorjeio das aves e
também um gargarejo. Jargon em francês e gargle em inglês, saem da mesma raiz.
Ao se espalhar de uma língua para outra, o termo ganhou o sentido de gíria do
submundo e, só a partir do século XIX, com o surgimento de profissões, passou a
designar as linguagens técnicas, quando grupos de novos especialistas começaram
a marcar seus territórios temáticos, criando jeitos próprios de falar.
A extensa literatura dos séculos XVI e XVII que diz respeito aos jargões,
naquele tempo ainda considerados linguagem do submundo, mostra como os
letrados se fascinavam com essa forma de linguagem. Àquela época eram
estudados apenas como curiosidade, tornando-se mais profissional com o
aparecimento da Lingüística. O estudo do jargão de algumas profissões também
data de séculos passados, como é o caso da linguagem dos funcionários públicos,
do jargão médico, do jargão dos burocratas e da diplomacia, os de grupos nômades
como pedreiros, limpadores de chaminé, atores e outros. BURKE E PORTER (1997,
p.17) atribuem uma mais recente “extraordinária proliferação” de jargões à crescente
divisão de trabalho advinda da ascensão da sociedade industrial.
O jargão poderia ser considerado um signo identificador, muito embora seja
fruto de uma linguagem vulgarizada ou de uma “linguagem técnica banalizada”,
como define PRETI (1984, p.26), em função do uso e de neologismos abusivos.
13
Pode ser criado de forma individual, com curta duração, pois não chega a ser
utilizado pelo grupo. Pode, ainda, ser formado por termos técnicos que acabam
desgastados pelo uso inadequado. De qualquer forma, a existência e o conteúdo
dos jargões carregam significados simbólicos e são ricos em metáforas e
eufemismos.
Do telemarketing ao ministério, de mecânica ao magistério, todas as
atividades têm vocabulário próprio. Segundo PRETI (1984, p.27), algumas delas,
que gozam de maior prestígio social, apresentam linguagem que também possui a
mesma característica. Na ânsia de se colocar numa situação social mais
privilegiada, os profissionais dessas áreas abusam do uso de jargões, tirando deles
seu caráter técnico e restrito e colocando-os numa posição de linguagem comum.
Esse é um fenômeno que, muito provavelmente, explique a banalização dos
jargões acima mencionada, trazendo-os para um uso mais corriqueiro e que vai ao
encontro da definição de RECTOR (1975, p.40), segundo a qual jargões são
“modificações que um grupo sócio -profissional introduz na língua nacional”. Assim
pode-se citar também o jargão relacionado ao lazer e ao esporte como, por exemplo,
o das corridas e do boxe. De acordo com CÂMARA JR (apud RECTOR, 1975, p.40),
três motivos explicam essas alterações: “a natureza particular das coisas ditas; a
vontade de não ser entendido e o desejo do grupo de marcar sua originalidade”.
Para SERRA E GURGEL (1990, p.31), assim como no caso das gírias, o
jargão é um componente importante do modismo lingüístico. Mesmo se do ponto de
vista etimológico ainda se associe o termo a uma linguagem ininteligível e
corrompida, é necessário que se faça uma revisão conceitual de sua função,
colocando-o numa posição paralela à gíria nas linguagens especiais. No entanto, a
diferença entre esses dois fenômenos lingüísticos é menos científica e mais
baseada no status. “Na verdade, é uma distinção social. Jargão é a gíria dos bempostos, e gíria é o jargão dos despossuídos” (POSSENTI, 2005).
CABELLO (apud REMENCHE, 2003, p. 31) afirma que o termo jargão pode
receber o conceito de linguagem artificial, de caráter fechado, incompreensível aos
que não pertencem ao grupo e que reflete algum pedantismo. O falante muitas
vezes tende a complicar sua fala para camuflar a ignorância sobre alguns assuntos.
No entanto, não há problema com o vocabulário especial. O problema é o uso mal-
14
intencionado “quando há pedantismo, pretensão, quando alguém usa palavras
difíceis para mostrar superioridade intelectual” (PRETI, 2005).
Segundo NISKIER (2005), que entende o jargão tanto como linguagem
técnica como popular, “o jargão nasce e se desenvolve a partir de uma verdade do
povo, é o que pega, é o bordão que todo mundo entende”. Para ele, os defensores
da norma culta não podem criticá-lo nem dizer que é destituído de um procedimento
cultural.
2.5 Calão
A etimologia histórica do termo calão aparece sempre relacionada à história
dos ciganos ibéricos. Chegados da Ásia Menor à Península Ibérica, por volta de
meados do século XV, a princípio não provocaram muita hostilidade. Daí para frente
algumas medidas, que lhes cerceavam a liberdade, foram tomadas, colocando-os à
margem da sociedade estabelecida. Foram assim, segundo BURKE E PORTER
(1997, p.143), discriminados e marginalizados por seu estilo de vida, vestimentas,
costumes, ocupações, práticas matrimoniais e sua linguagem, o caló (ou calão).
Calé, forma plural de caló, era como esses ciganos se referiam a si mesmos. O
termo tem origem indiana, como a maioria das palavras desse tipo de linguagem, e
significa preto numa alusão ao tom da pele, mais escura que a dos não ciganos.
Salientam ainda, BURKE E PORTER (1997, p.143), que a importância e a
influência do caló na gíria de comunidades marginais foram observadas ainda em
grupos no sul da França e em Paris que falavam um argot francês entremeado de
caló; nos Estados Unidos entre os americanos mexicanos (chicanos texanos), cuja
gíria eles chamam também de caló além de ser usado como abreviação de
Califórnia; na Espanha, cuja linguagem dos ciganos desse país também é conhecida
por caló.
Mesmo se na reputação popular por muito tempo os ciganos representavam
tudo que era sinistro, blasfemo e satânico, não se pode negar que eles muito
acrescentaram na cultura popular da Espanha e seu caló contribuiu com várias
expressões pitorescas para o espanhol coloquial. BURKE E PORTER (1997, p.146)
se referem à pesquisa elaborada pelo inglê s Borrow sobre o caló e seus falantes e
cujo glossário demonstrou que aquela linguagem, diferentemente de ser apenas a
15
gíria do submundo e o castelhano incorreto, possuía uma identidade e uma
linhagem notáveis e merecedoras de estudo.
Para RECTOR (1975, p.44) o calão tem um significado específico. A autora
cita a definição contida no Dicionário da Real Academia Espanhola segundo a qual o
termo refere-se à fala dos ciganos, adotada em parte, pelas pessoas da classe mais
baixa do povo. A autora acrescenta que o termo foi aplicado, originariamente, aos
ciganos de Portugal. Em seguida, passou a designar a linguagem dos malfeitores.
No Brasil, em virtude dos contatos mantidos entre os malfeitores e ciganos, o calão
significa linguagem grosseira de ladrões, vigaristas e prostitutas, também
caracterizada por termos obscenos. Vem daí, portanto, sua relação com o popular
palavrão.
Como já referido nos itens sobre gírias e sobre jargão, o calão também é
considerado
como
modismo
lingüístico,
“linguagem
simples,
semi-acabada,
rudimentar, mas de qualquer forma criativa, popular, contendo as características
culturais de indivíduos e grupos sociais” (SERRA E GURGEL, 1990, p.28).
Além de se caracterizar por seu léxico próprio, o calão representa uma
alteração fonética inte ncional e apresenta nas suas variações semânticas, a ironia, o
menosprezo, a revolta contra a sociedade. A noção de linguagem obscena atribuída
ao calão, como descarga afetiva e injúria, pode se opor à linguagem corrente. Pode
ainda ser considerado de aspecto coloquial e de expressão carinhosa sem a
conotação injuriosa, em algumas situações nas quais se pretende impor uma
intimidade maior com o ouvinte. Atualmente, sua abrangência coloquial pode estar
relacionada a conflitos sociais, à violência, à insatisfação frente à crise econômica, à
revolução sexual, à queda de alguns tabus, dentre outros motivos (PRETI, 1984,
p.27).
De acordo com o exposto, observa-se que as linguagens especiais neste
trabalho representadas pela gíria e seus correlatos, o jargão e o calão, são
manifestações da língua viva, cujas diferenciações acentuam-se nos próprios grupos
de falantes, com suas formas peculiares de encarar a realidade e o mundo que os
cerca e as virtudes e defeitos que a linguagem usual permite.
16
2.6 Uma Noção de Metáfora
Como já mencionado, o presente trabalho visa abordar a linguagem
especial (gíria) adotada por policiais em cinco delegacias de Curitiba. Conhecer
esses termos, advindos de uma realidade que inclui o convívio com criminosos,
significa entender e apreciar um processo de criação metafórica que, de tão célebre,
já possui registros dentro de outras comunidades e da sociedade em geral.
Para que fique clara a razão da inclusão deste item neste estudo, basta que
se observe o que afirmam LAKOFF E JOHNSON (2002, Posfácio):
Mas as metáforas não são meramente fenômenos que devem ser decifrados. De fato, só é
possível decifrá-las usando outras metáforas. É como se a habilidade de compreender a
experiência por meio da metáfora fosse um dos cinco sentidos, como ver, ou tocar, ou
ouvir, o que quer dizer que nós só percebemos e experienciamos uma boa parte do mundo
por meio de metáforas. A metáfora é parte tão importante da nossa vida como o toque, e
tão preciosa quanto.
De origem grega Metaphorá, metáfora significa meta = trans + phérein =
levar, ou literalmente transposição. É o fenômeno lingüístico “em que se dá a
substituição da significação natural de uma palavra por outra, em virtude de uma
relação de semelhança subentendida” (CHERUBIN, 1989, p.44). É uma mudança
do sentido próprio da palavra para o sentido figurado. Ao se reportar ao que já foi
referido sobre as linguagens especiais, seja gíria, jargão ou calão, fica notório que
todas elas se apropriam da metáfora na criação de seus vocabulários.
Na metáfora, a substituição acima referida pode se dar por desvio, por
empréstimo, por lacuna lexical ou por semelhança. COSERIU (1982, p.68), explica a
substituição de um signo porque se tornou totalmente inexpressivo, para evitar
desagradáveis confusões ou ainda, por causa do “tabu lingüístico”. Esse é um
fenômeno em que determinadas palavras relacionadas a superstições e crenças são
evitadas e substituídas por empréstimos, eufemismos, metáforas e outros. Observar
essas substituições acarreta a aceitação e a difusão das criações.
Sendo assim, explicar a metáfora significa descobrir o termo próprio
ausente, que foi substituído pelo termo figurado. Para isso, é necessário ter em
mente o esquema da metáfora que é composto pelo “teor” que é a coisa que se diz,
17
pelo “veículo” que é aquilo com que se quer comparar e pelo “fundamento” que é
representado pelos traços mínimos de significação (CHERUBIN, 1989, p.44).
CASSIRER (1992, p.104) associa o conceito fundamental de metáfora a
uma substituição consciente de um conteúdo pelo nome de outro conteúdo, desde
que ambos apresentem semelhança em algum traço ou qualquer analogia indireta.
CHERUBIN (1989, p.44) explica que desde Aristóteles a importância da
metáfora é reconhecida. Nos conceitos atuais, mais do que uma questão de estilo,
ela está intimamente relacionada à fala humana, representando fator fundamental de
motivação e artifício expressivo para as emoções intensas. Assim, a comunicação
humana se dá através da linguagem literal que é direta, lógica, conceitual e da
linguagem figurada, que é essencialmente metafórica.
Entretanto, tradicionalmente a metáfora sempre foi considerada apenas um
fenômeno de linguagem, um ornamento lingüístico sem valor cognitivo. Própria de
linguagens como a poética, a metáfora deveria ser evitada no discurso científico,
que, por sua vez, deveria empregar a linguagem literal, mais clara, precisa e
determinada. Segundo esse conceito, a ciência era feita com a razão e o literal e a
poesia, com a imaginação e a metáfora.
Esse aspecto retórico da metáfora é denominado “mito do objetivismo”,
segundo o qual a metáfora e outras figuras de linguagem devem ser evitadas
quando se pretende falar objetivamente. Mas, a partir de 1970 observa-se uma
ampla e marcante mudança de paradigma, na qual a metá fora passa a ter seu valor
cognitivo reconhecido, passando de uma simples figura de retórica para uma
operação cognitiva fundamental (LAKOFF E JOHNSON, 2002, p.11).
A teoria de LAKOFF E JOHNSON (2002, p.22) explica essa nova visão a
respeito da metáfora. Os autores argumentam que a metáfora, com seu valor
cognitivo, une razão e imaginação numa racionalidade imaginativa, fundamental
tanto para a ciência quanto para a literatura. Se antes só se podia compreender o
mundo através da linguagem literal, os mesmos autores mostram que isso é possível
através da metáfora, pois alguns conceitos básicos como tempo, quantidade,
estado, ação dentre outros e, ainda, alguns conceitos emocionais como amor e
raiva, são compreendidos metaforicamente. Assim, corpo e mente interagem para
construir metáforas com base em experiências corporais para então compreender e
dar sentido ao mundo.
18
Além disso, a linguagem cotidiana é “densamente metafórica e apenas
parcialmente literal” fazendo oposição ao fato de que “na tradição retóri ca a
linguagem figurada é um desvio da linguagem usual”. Portanto, como a figura deixa
de ser vista como “desviante, marginal ou periférica”, passa a ser um fenômeno
central na linguagem e no pensamento, estando presente em todos os tipos de
linguagem (LAKOFF E JOHNSON, 2002, p.21).
Em suma, se para a maioria das pessoas a metáfora é um recurso da
imaginação poética e um ornamento retórico, uma linguagem mais extraordinária
que ordinária e, ainda, uma questão mais de palavras do que de pensamento e
ação, LAKOFF E JOHNSON (2002, p.45) através de sua teoria, afirmam que a
metáfora está infiltrada na vida cotidiana, na linguagem, no pensamento e na ação.
Já COSERIU (1982, p.63) apresenta uma definição segundo a qual ao se
utilizar palavras conhecidas, num contexto diferente, para expressar idéias
diferentes numa situação que é, ou pelo menos já foi completamente diferente, se
está frente ao que, num sentido bastante amplo, chama-se metáfora. Mais do que
uma simples transposição verbal ou “comparação abreviada”, a metáfora é
expressão unitária, espontânea e imediata.
Não há como explicar a criação metafórica na linguagem, tendo em vista
que a criação é própria da linguagem por definição. Portanto, não há explicação para
“os movimentos caprichosos e insuspeitáveis da fantasia humana criadora”
(COSERIU, 1982, p.68).
O que se pode indicar são as razões da maior ou menor aceitabilidade duma
invenção numa determinada comunidade. São estas, em primeiro lugar, razões de prestígio
do criador e de expressividade do signo inventado; ou razões culturais mais gerais, como a
substituição duma cultura por outra, ou o contínuo progresso cultural, a contínua irrupção
no horizonte das consciências lingüísticas de objetos e idéias novas, que exigem
conhecimento e classificação. (COSERIU, 1982, p. 68)
Sendo assim, pode-se afirmar que a linguagem policial, cujas gírias e
jargões denotam um importante processo de criação metafórica, coloca em
evidência a estrutura do grupo que a cria, recria e a utiliza.
19
3 METODOLOGIA
3.1 Introdução
Como mencionado anteriormente, o uso de gírias por policiais nas
delegacias deve-se, fundamentalmente, à exigência da lei. Ao tomar os depoimentos
dos indiciados em inquéritos policiais, aqueles profissionais devem relatar os dados
exatamente na língua falada. Desse modo, aprendem e começam a fazer uso dos
mesmos vocábulos, em sua grande maioria as gírias empregadas pelos marginais.
Naquele ambiente de delegacia, entre o atendimento às vítimas dos mais variados
crimes e o contato com os prováveis culpados por esses crimes, os policiais acabam
por compartilhar ora de uma linguagem convencional, reconhecida pela maioria dos
falantes, ora de uma linguagem especial usada no mesmo contexto lingüístico dos
criminosos (PRETI,1984, p.2).
Além disso, a criatividade na formação de sua linguagem, faz dos policiais
um grupo reconhecidamente diferente do restante da comunidade, do ponto de vista
lingüístico (PRETI, 1984, p.3). Em alguns casos, esse fato coloca-os numa posição
de superioridade e até mesmo, como destaca CABELLO (apud, REMENCHE, 2003,
p.31), de mistério e de pedantismo. Conhecer as gírias e/ou jargões utilizados pelos
policiais, significa tomar conhecimento da realidade que os cerca, do seu ambiente
de trabalho e das suas relações sociais.
Importante salientar ainda que, a abordagem sobre a teoria de LAKOFF E
JOHNSON (2002, p.22), segundo a qual a metáfora deixa de ser um recurso poético
e passa a estar infiltrada na vida cotidiana, na linguagem, no pensamento e na ação,
foi fundamental para a análise dos dados obtidos nas delegacias. Verificou-se que a
criação metafórica na linguagem policial usufrui, com propriedade, da liberdade que
tal teoria oferece, e passa a refletir o contexto sócio-profissional dos policiais nos
seus ambientes de trabalho.
20
3.2 Delineamento e Delimitação da Pesquisa
Para o desenvolvimento desta monografia, foi utilizada uma coleta de dados
assistemática, que buscou os dados lingüísticos nos níveis lexical e semântico, junto
a policiais lotados em cinco delegacias de Curitiba. Todas essas delegacias
pertencem à estrutura do Departamento da Polícia Civil do Paraná, sendo, de
acordo com o Decreto nº 4884/78, a Delegacia Anti-Tóxicos subordinada à Divisão
de Investigações Criminais (DIC); a Delegacia de Furtos e Roubos de Veículo
subordinada à Divisão de Crimes Contra o Patrimônio (DCCP); a Delegacia da
Criança e do Adolescente e a Delegacia da Mulher subordinadas à Divisão de
Polícia Especializada e o 11º Distrito Policial, subordinado à Divisão Policial da
Capital. Para facilitar a apresentação deste trabalho, serão consideradas as quatro
primeiras delegacias citadas acima, como de atendimento especializado e o distrito
policial, como de atendimento genérico. Buscando facilitar a explanação, serão
utilizadas as seguintes legendas:
DATOX = Delegacia Anti-Tóxicos;
DFRV = Delegacia de Furtos e Roubos de Veículos;
DA = Delegacia da Criança e do Adolescente;
DM = Delegacia da Mulher;
11º DP = 11º Distrito Policial.
Após uma consulta individual, realizada informalmente com cada um dos
policiais adiante nominados, procedeu-se à coleta das gírias, da forma como segue:
as gírias da DATOX foram fornecidas pelo investigador Casemiro, através de
contato via rádio feito pela agente de operações policiais Rosângela Ramos e
entregues via fax. As gírias utilizadas na DRFV foram fornecidas pelo investigador
Adir Marcon e entregues em mãos por sua esposa a escrivã Leda Marcon. Na DA o
contato foi feito via rádio pela agente de operações policiais Rosângela Ramos, com
o investigador Altair Camargo e as gírias foram entregues via fax. As gírias usadas
na DM foram fornecidas pessoalmente e em mãos pela escrivã Marili Cavalheiro
Mendes. Finalmente, as gírias do 11º DP foram, também, fornecidas pessoalmente e
em mãos pelo investigador Luiz Quadros.
Alguns dos policiais consultados alegaram estarem as gírias em desuso nas
delegacias. Porém não foi o que se observou. Com exceção da DM, que forneceu
21
poucos termos, nas demais foram obtidos numerosos lexicais que deram suporte à
preparação do glossário. Cumpre salientar sempre que, visando verificar se existe
relação das gírias com as áreas de atuação de cada uma das delegacias, o Decreto
que regulamenta e estrutura essas delegacias, fará juntamente com o glossário,
parte dos anexos desta monografia.
Durante o ano de 2005 a coleta de dados foi realizada de maneira informal,
isto é, sem planejamento ou questionário estruturado. Como mencionado acima, os
pedidos foram orais, feitos pessoalmente ou por telefone. Alguns policiais
forneceram suas gírias de imediato, outros organizaram suas listas e as enviaram
posteriormente, em mãos ou via fax.
22
4 ANÁLISE DOS DADOS
4.1 Formação do Corpus
Conforme mencionado, o corpus é constituído de cinco corpora, cada um
relacionado a uma delegacia. A escolha por quatro delegacias especializadas devese ao fato de que, exatamente por tratarem de crimes específicos, sugerem também
uma
especificidade
maior
na
relação
função/atendimento/abrangência.
A
abrangência de cada uma das delegacias pode ser observada nos Anexos 2, 3, 4, 5
e 6.
Em seguida, ao se consultar o dicionário, observou-se se os itens lexicais se
encontram ali registrados, se com o mesmo sentido ou se com outro sentido. Para
tanto, o dicionário escolhido foi de linguagem comum e reconhecido pela seriedade
científica. Assim, foi adotado o Novo Dicionário da Língua Portuguesa de AURÉILIO
BUARQUE DE HOLANDA FERREIRA (1986), aqui representado pelas iniciais ABH.
No subitem a seguir será apresentado o primeiro corpora onde,
primeiramente aparece o termo utilizado na delegacia correspondente, entre
parênteses, o seu significado para os policiais, em seguida o seu significado em
ABH entre aspas e, por último, a análise do termo. Cumpre ressaltar que essa
ordem foi adotada para cada um dos corpora.
4.1.1 Delegacia Anti-Tóxicos - DATOX
BALA ou COMPRIMIDO (ecstasy): ABH (1986, p.221) define bala, na
entrada 5, como sendo “pequena guloseima de consistência firme, feita com calda
de açúcar aromatizada e acrescida de corantes ou de ingredientes com sabores
diversos”. Observa-se uma metáfora baseada na analogia da forma de apresentação
da substância e da bala comum. Já o termo comprimido é uma generalização que
remete a todos os medicamentos que apresentam o mesmo aspecto.
BASEADO (maconha
ou
cigarro
de
maconha):
ABH (1986, p.237)
apresenta a mesma definição, na entrada 1, portanto já foi lexicalizado. É um termo
de conhecimento e de uso corrente da população em geral.
23
BOI-DE-PIRANHA (aquele que transporta grande quantidade de droga):
Segundo a definição de ABH (1986, p.268), entrada 2, “é a pessoa que é
submetida ou se submete a um sacrifício de um grupo”. Constata-se, portanto, uma
metáfora baseada na analogia com a função de transportar drogas a mando de um
“superior” e ao perigo que se corre.
BRANQUINHA (cocaína): ABH (1986, p.282), na entrada 2 do vocábulo
branco, define -o como sendo “da cor da neve, do leite, da cal; alvo, cândido”. O
termo gírio é apresentado no gênero feminino e seguido do sufixo –inha, podendo
ser atribuído a ele uma metáfora a partir de uma analogia com a cor da cocaína.
BUCHA (cocaína): Na entrada 6 ABH (1986, p.290) define como “comida
que empanturra e de pouco valor alimentício”. Pode-se atribuir ao termo utilizado na
DATOX, uma analogia baseada no objetivo da droga que, como a comida, é de
satisfa zer o usuário.
CARETA (cigarro comum): ABH (1986, p.352) traz esse vocábulo na
entrada 5 como gíria brasileira, no sentido de “pessoa que não faz uso de drogas”,
não fazendo referência a cigarro. O significado da metáfora coincide com a definição
de ABH, se o cigarro for considerado como uma droga socialmente aceita cujo
usuário não é condenado pelo uso, enquadrando-se como um não usuário de droga
e, portanto, dentro da lei. É um termo possivelmente utilizado em outras unidades
policiais e por pessoas da população em geral.
CHEIRINHO ou LOLÓ (droga de cheirar): ABH (1986, p.394) apresenta
definição idêntica, que também é conhecida pela maioria dos falantes.
GERENTE (traficante ou braço direito do traficante): É uma metáfora a partir
da analogia com a definição apresentada por ABH (1986, p.847), segundo a qual
“gerente é quem gere ou administra negócios, bens ou serviços”.
24
LARANJA (aquele que transporta pequena quantidade de droga, geralmente
o que vai preso): ABH (1986, p.1010) define como “pessoa ingênua, simples ou sem
importância”. Popularmente é conhecido como a pessoa que substitui outra em
algumas situações. O termo é utilizado em casos diversos e, no caso da DATOX, é
considerado o empregado do gerente.
MOCÓ (reunião de usuários): ABH (1986, p.1145) define como sendo
“roedor da família dos cavídeos que vive escondido no meio das rochas”. Pode ser,
portanto, uma metáfora baseada no fato de que assim como o animal, os usuários
de drogas também querem permanecer escondidos, sem que possam ser
encontrados.
MORANGUINHO (éter com essência de morango): O termo é composto do
vocábulo que designa o “fruto do morangueiro” seguido do sufixo –inho , numa forma
carinhosa de referência e não aparece em ABH (1986, p.1158) com outro
significado. Está associado ao sabor da essência adicionada à substância
entorpecente.
MULA (aquele que transporta droga): ABH (1986, p.1168) define como “a
fêmea do mulo”. É uma metáfora que faz uma analogia com a utilidade da mula
como animal de carga. O mula no ambiente das drogas funciona como um animal de
carga, encarregado de transportar “encomendas”.
NÓIA (usuário de droga): O termo apropriou-se de parte para designar o
todo, ou seja, paranóia, definido por ABH (1986, p.1268) como sendo “psicopatia
caracterizada pelo aparecimento de ambições suspeitas, que se acentuam,
evoluindo para delírios persecutórios”. Denota, portanto, uma analogia com o estado
psíquico do usuário de drogas.
PEDRA (crack): É uma metáfora baseada na analogia da forma e da
consistência sob a qual se apresenta a substância chamada crack com a forma de
uma pedra, definida por ABH (1986, p.1292), na entrada 1, como sendo “matéria
mineral dura e sólida, da natureza das rochas”.
25
SELINHO (entorpecente conhecido por LSD): O termo selo é definido por
ABH (1986, p.1564), na entrada 3, como sendo “marca estampada por carimbo,
sinete, chancela ou máquina de franquear”. Não foi encontrado qualquer registro
com outro sentido para o termo.
VAPOR, VAPORZINHO ou AVIÃOZINHO (aquele que vende pequena
quantidade de droga): O vocábulo vapor, na definição de ABH (1986, p.1752),
entrada 2, designa o “navio propelido por máquina de vapor”. Trata-se, portanto, de
uma metáfora a partir da analogia da função do navio de transportar cargas, com a
função da pessoa designada pelo termo. A mesma análise refere-se ao termo
aviãozinho. O sufixo diminutivo –zinho, denota em ambos os vocábulos, tratar-se de
meios de transporte com pequena capacidade de carga.
4.1.2 Delegacia de Furtos e Roubos de Veículos – DFRV
ACELERAR (apressar): Esse termo não apresenta registro com sentido
figurado, podendo ser considerado como de linguagem comum.
APAVORAR (ir ao banheiro da cadeia): ABH (1986, p.139) define o
vocábulo como “causar pavor, espantar”, o que denota uma analogia com o provável
mau cheiro do banheiro após o seu uso.
ARAME (dinheiro): O vocábulo não apresenta definição com sentido
metafórico, embora se possa sugerir uma analogia com o fato de, segundo ABH
(1986, p.154), ser definido como “liga de cobre e zinco ou de outros metais ”, assim
como as moedas que são compostas também de metal.
AREIA (açúcar): ABH (1986, p.160) apresenta nas entradas 1 e 3, a
definição de areia como sendo “partículas de rochas em desagregação que se
apresentam em grãos mais ou menos finos” e “qualquer pó”, respectivamente.
Observa -se, assim, uma metáfora baseada na analogia da consistência da areia e
do açúcar.
26
BLINDADA (marmita de papel alumínio, “marmitex”): É uma metáfora a
partir da analogia com o metal com o qual é produzida a marmita e o fato de que ser
blindado, segundo ABH (1986, p.264), significa ser “revestido com chapa de aço”.
BOCA SUJA (cinzeiro): O termo é uma criação metafórica por denotar, em
analogia com a função e a forma do cinzeiro, normalmente redonda e aberta, local
de depósito de resíduos impuros. Não foi encontrado registro em ABH (1986) para a
expressão.
BOI (banheiro): Da definição de ABH (1986, p.268), entrada 6, “tenda rústica
feita pelos barranqueiros nas coroas do rio São Francisco”, depreende-se uma
metáfora referente à analogia com o fato de banheiro, assim como uma tenda, ser
lugar de privacidade.
BOTINHA (cigarro comum com filtro): ABH (1986, p.279) identifica como
“bota de cano curto para senhoras e crianças”. Esse é um exemplo de metáfora
construída pela analogia entre o tipo de calçado que cobre apenas um pedaço da
perna e o filtro do cigarro comum, existente somente em parte do cigarro.
BRASA (isqueiro): É uma metáfora a partir da analogia com a definição de
ABH (1986, p.283), entrada 1, ou seja, “carvão incandescente ”, assim como a
chama do isqueiro.
CABRITO (carro ou carro roubado/furtado): ABH (1986, p.304) traz na
entrada 1 como “pequeno bode”. É uma metáfora zoomórfica na qual se transfere o
nome de um animal característico das regiões nordestinas e que, geralmente, não
recebe marca que identifique seu dono. Como conseqüência, uma vez roubado ou
furtado, dificilmente será encontrado, podendo o mesmo ocorrer com os carros que,
na maioria das vezes têm a numeração de chassis danificada ou adulterada,
dificultando assim sua identificação.
27
CANO (revólver): ABH (1986, p.337) define na entrada 3, como sendo “tubo
de armas de fogo por onde sai o projétil”. Trata-se de uma metonímia, na qual parte
designa o todo, ou seja, utiliza -se uma das peças do revólver, pelo próprio revólver.
CASTELAR (pensar): Não foi encontrado registro algum para o termo.
Entretanto, pode-se considerar uma metáfora baseada na analogia com o fato de
que, criar castelos na linguagem popular, significa imaginar coisas, fantasiar, sonhar.
CAXANGA (casa): Não foi encontrando registro algum para o termo.
CORUJA (cueca): Não há registro do termo com sentido metafórico, embora
se possa constatar uma analogia das cavas da peça de vestuário, geralmente
redondas e grandes, destinadas à passagem das pernas do usuári o com os olhos
das aves, conhecidos por serem de tamanho grande.
DESCANSA -PINHA (travesseiro): Embora não tenha sido encontrada
definição para o sentido figurado do termo pinha, o mesmo pode ser reconhecido
popularmente para designar cabeça, que é a parte mais alta do corpo, em analogia
ao fruto do pinheiro que se encontra no alto da árvore. Por extensão, descansapinha é o objeto que tem a mesma função do travesseiro.
DRAGÃO (isqueiro): Em ABH (1986, p.611) encontra-se a definição de
dragão como sendo “monstro fabuloso representado, em geral, com cauda de
serpente, garras e asas”. No entanto, no imaginário popular a figura do dragão vem
acompanhada do fogo que ele solta pela boca. Assim, cria-se a analogia com o
isqueiro que libera sua chama pela parte superior.
FITA (serviço): Na definição de ABH (1986, p.783), entrada 4, tem-se o
sentido figurado do termo que é “ação que tem por fim impressionar, chamar a
atenção”. O termo pode, portanto, sugerir uma ironia ao fato de que em serviço o
policial finge estar trabalhando.
28
GALETO (mistura de comida): A definição de ABH (1986, p.830), entrada 2,
designa “frango assado”, que por extensão pode se referir à comida de maneira
geral, tomando-se a parte pelo todo, ou seja, um tipo de comida pela própria comida.
GANCHA (calça): Pode ser considerada como metáfora criada a partir da
analogia com o termo gancho, definido por ABH (1986, p.833), entrada 4, como
sendo “parte da calça em que se unem as duas bandas”. O termo figurado é usado
no gênero feminino para reforçar a analogia com a peça de vestuário.
JACARÉ (serra): ABH (1986, p.978), entrada 1, define esse vocábulo como
“designação comum a todos os répteis crocodilianos da família dos aligatorídeos”,
além de na entrada 12 como termo característico da Bahia para designar “uma
espécie de facão sertanejo ”. É uma metáfora zoomórfica que faz analogia dos
dentes pontiagudos do jacaré com os dentes da serra, cujo formato é bastante
semelhante.
JEGA (cama da cadeia): Trata-se de uma corruptela do termo jegue, ou
jumento definido por ABH (1986, p.993), como “animal mamífero facilmente
domesticado e utilizado para tração e carga”. Sendo assim, tem-se uma metáfora
zoomórfica que faz analogia com o fato de a cama ser utilizada para suportar o
corpo que sobre ela se deita.
LAMBÃO TRICENTRO (relaxado): ABH (1986, p.1005) define apenas o
termo lambão, sendo na entrada 2 “aquele que se lambuza ao comer” e, na entrada
4, “aquele que faz mal o seu serviço”. Para tricentro não foi encontrado registro
algum.
MARROCOS (pão): Não foi encontrado registro algum.
MENCIBA (carta): Não foi encontrado registro algum para o termo, embora
esse termo sugira tratar-se de uma corruptela do termo missiva, cujo significado é o
mesmo.
29
MOCA (café pronto): ABH (1986, p.1145) define o termo na entrada 1 como
sendo “variedade de café superior, originário da Arábia”. Toma-se, portanto, a parte
para designar o todo, ou seja, utiliza-se um tipo de café pelo próprio café.
OITÃO (revólver calibre 38): Não foi encontrado registro algum para o
termo, que utiliza a parte pelo todo, isto é, utiliza-se parte do calibre trinta e oito do
revólver pelo próprio revólver.
PÁ (colher): É uma metáfora baseada na analogia com a forma de ambos
os objetos. ABH (1986, p.1243) define na entrada 2 do termo 1, como sendo
“qualquer objeto relativamente largo e achatado ao qual se prende uma haste mais
ou menos longa”.
PAPAGAIO (rádio): Trata-se de metáfora zoomórfica que apresenta
analogia ao fato de que, segundo ABH (1986, p.1259) o termo no sentido figurado
representa “pessoa que repete o que ouviu ou leu” ou “pessoa que fala muito,
tagarela”, nas entradas 3 e 4, respectivamente. Na entrada 15, encontra-se o termo
como gíria com o mesmo sentido do utilizado na delegacia.
PENA (caneta): No sentido figurado, ABH (1986, p.1299), entrada 4,
apresenta a definição do termo como sendo “instrumento de escrita”.
PÉ-REDONDO (policial militar): Trata-se de uma criação metafórica
referente à similaridade da forma do calçado, componente do uniforme do policial
militar, conhecido como coturno.
PORRONCA (resto de cigarro): Não foi encontrado registro algum, embora
o termo tenha sido apresentado como sendo a popular bituca de cigarro.
PORVA (suco): Não foi encontrado registro algum para o termo.
30
QUADRADA (pistola): É uma metáfora baseada na analogia da forma
geométrica das pistolas, que em comparação com outras armas de fogo, é a que
mais se aproxima da forma de um quadrado.
QUEBRAR LITRO (urinar): Não foi encontrado registro algum para o termo.
QTH (ocorrência): A sigla, pertencente ao código “Q” de comunicação via
rádio, de uso universal, significa “Qual a sua posição ou endereço?” Não há outro
registro com sentido diverso desse.
RALA-BOI
(escova
de
limpar
banheiro
da
cadeia):
Como
visto
anteriormente, o termo boi designa o banheiro da cadeia. Composto com o termo
ralar, definido por ABH (1986, p.1447), entrada 1, como “reduzir uma substância a
um fragmento pequeno ”, observa-se uma analogia com a função da escova que é
utilizada para tirar ou, pelo menos, diminuir a sujeira.
RATO (policial civil): ABH (1986, p.1454) apresenta na entrada 8,
a
definição de rato como gíria designando “agente de polícia”.
SAPO (cadeado): ABH (1986, p.1150) utiliza como designação comum para
“anfíbios anuros”. É uma metáfora zoomórfica que denota a semelhança entre o
formato da boca do sapo e o mecanismo de trava do cadeado.
SENTAR O DEDO (atirar): Não existe registro algum para a expressão,
podendo, entretanto, expressar uma metáfora baseada na analogia com o ato de
pressionar o dedo sobre o gatilho ou de sentar o dedo sobre o gatilho, para disparar
uma arma de fogo.
SUBIR O GÁS (matar): ABH (1986, p.1619) define subir na entrada 22,
como “exaltar, enaltecer, engrandecer” e gás, na entrada 2, como “animação,
entusiasmo, desembaraço” (ABH, 1986, p.838). Não foi encontrado registro algum
para a expressão.
31
TERRA (café): É uma metáfora a partir da analogia da cor marrom que
possuem a terra e o café.
TRUTA (mercadoria): O termo é definido por ABH (1986, p.1723), na
entrada 2, como “mamata, negociata”. Pode haver, então, uma analogia com o fato
de que, muito comumente, as mercadorias são objetos de negociatas.
UNHEX (cortador de unha): Não foi encontrado registro algum, embora seja
comumente conhecido como marca de cortador de unhas. O termo toma uma parte
para designar o todo, ou seja, uma marca de cortador de unha pelo cortador de
unha.
X9 (delator): Não foi encontrado registro algum para o termo.
XADREZ (cadeia): O registro do termo figurado em ABH (1986, p.1795),
entrada 7, apresenta o mesmo sentido. Trata-se de uma gíria que, devido à
freqüência do uso, incorporou-se à linguagem comum, sendo de fácil compreensão
da quase totalidade dos falantes.
ZÓIUDA (televisão): Não foi encontrado registro algum do termo, embora
represente uma corruptela de olhudo, definido por ABH (1986, p.1221) como “o que
tem olhos grandes”, numa analogia ao tamanho da tela de uma televisão ou à
abrangência da mídia em denunciar os malfeitores. O gênero feminino está
relacionado ao gênero do objeto.
32
4.1.3 Delegacia da Criança e do Adolescente – DA
AREIA (açúcar ou mentira): Para o termo areia utilizado com o sentido de
açúcar, trata -se de caso idêntico ao já analisado no item referente à DFRV. Em
relação ao sentido de mentira, tem-se uma metáfora por analogia à definição de
ABH (1986, p.160), entrada 6, segundo a qual areia significa “falta de juízo, tolice,
maluquice”.
BERMA (bermuda): ABH (1986, p.251) apresenta, na entrada 4, a definição
como sendo “alargamento que se faz nos aterros assentados sobre terrenos
lodosos, para impedir o refluxo destes”. Entretanto, o termo pode ser considerado
corruptela do vocábulo bermuda, peça de vestuário bastante popular e utilizado por
jovens e adolescentes.
BLINDADA (marmita de papel alumínio, “marmitex”): Trata -se de caso
idêntico ao já analisado no item referente à DFRV.
BÔBO (relógio ou coração): ABH (1986, p.266) apresenta definição com o
mesmo sentido para “relógio” na entrada 5. Tem-se uma metáfora baseada no ritmo
similar do relógio e do coração.
BOCUDA (janela ou porta da cadeia): O termo pode ser considerado como
extensão do vocábulo boca, cuja definição de ABH (1986, p.266), entrada 10, é
“entrada de rua”.
BOI (banheiro): Trata -se de caso idêntico ao já analisado no item referente à
DFRV.
BOMBETA (boné): Não foi encontrado registro algum do vocábulo.
CANECA (todo tipo de copos): É uma metáfora a partir da analogia com a
função dos objetos que, segundo ABH (1986, p.334) é “vaso pequeno, com asa,
para líquidos”.
33
CORUJA (cueca): Trata-se de caso idêntico ao já analisado no item
referente à DFRV.
GALETO (carne): Trata-se de caso similar ao já analisado no item referente
à DFRV, embora na DA o termo seja empregado apenas para se referir à carne
como refeição.
GANCHA (calça): Trata-se de caso idêntico ao já analisado no item
referente à DFRV.
GOGÓ (pescoço): Trata -se de uma analogia com a definição apresentada
por ABH (1986, p.855), ou seja, “pomo-de-adão”, pois esse se localiza no pescoço.
JEGA (cama da cadeia): Trata-se de caso idêntico ao já analisado no item
referente à DFRV.
LATRÔ (travesseiro): Não foi encontrado registro algum para o termo.
LUNA (óculos): ABH (1986, p.1052) define o vocábulo como sendo “porção
de uma esfera limitada por dois semiplanos que se iniciam num diâmetro da esfera”.
Trata -se, portanto, de uma metáfora baseada na similaridade da forma comumente
apresentada pelos óculos.
MARROCOS (pão): Trata-se de caso idêntico ao já analisado no item
referente à DFRV.
MEIA -LUA (banana): ABH (1986, p.1112), na entrada 2, define o vocábulo
como sendo “semicírculo”, de onde se depreende a analogia com a forma da fruta.
MOCA (café pronto): Trata-se de caso idêntico ao já analisado no item
referente à DFRV.
34
OREBA (orelha): Não foi encontrado registro algum, embora o termo possa
expressar corruptela da palavra orelha.
PAPAGAIO (rádio): Trata-se de caso idêntico ao já analisado no item
referente à DFRV.
PEITA (camisa): Não foi encontrado registro algum, embora o termo possa
estar associado ao fato de que a camisa é uma peça de vestuário usada para cobrir
o peito. Tem-se, assim, uma metáfora por analogia, cujo gênero acompanha o
gênero do vocábulo original.
PENA (caneta): Trata -se de caso idêntico ao já analisado no item referente
à DFRV.
PH (papel higiênico): O termo toma parte para designar o todo, no caso,
utiliza-se as letras iniciais pelo próprio papel higiênico.
PINHA (cabeça): Trata -se de caso similar ao já analisado no item referente
à DFRV.
PIPO ou CATATAU (carta): Para o termo pipo encontra-se em ABH (1986,
p.1335) como sendo “pipa pequena e tubo por onde se extrai o líquido contido em
certas vasilhas” e, ainda, nos estados do Amazonas, Pará e Maranhão como sendo
“chupeta”. Trata-se de uma analogia com o fato de que a carta traz alento a quem
está na cadeia assim como a chupeta ao bebê. Já para catatau, na entrada 5, ABH
(1986, p.368) define como sendo “coisa grande ou volumosa”, denotando analogia
ao tamanho da correspondência.
PIRA (brincadeira): ABH (1986, p.1335) registra o termo com sentido gírio
como sendo “ir-se embora, sair, dar o fora”. Para o sentido de brincadeira não foi
encontrado registro, embora possa ser atribuída analogia com o sentido de
“qualquer fogueira”, também fornecido por ABH (1986, p.1335), entrada 2, tendo em
vista que na gíria popular as crianças pegam fogo quando estão brincando.
35
PISANTE (tênis): ABH (1986, p.1339) define o termo como gíria, com o
mesmo sentido.
PORVA (suco): Trata -se de caso idêntico ao já analisado no item referente à
DFRV.
TERESA (corda): Não foi encontrado registro algum para o termo, embora
no ambiente policial, delegacias, cadeias públicas ou presídios, é comumente
utilizado para designar corda feita com lençóis ou quaisquer tipos de tecido
entrelaçados, empregada para facilitar a fuga.
TRETA (desentendimento): Na entrada 1, ABH (1986, p.1711) define o
vocábulo como sendo “ardil, estratagema” e, no plural, como sendo “palavreado para
burlar”. Pode ser associado à supressão da sílaba mu- do termo mutreta, cujo
sentido é conhecido popularmente como briga, confusão ou ainda como atitude
suspeita.
ZINCO (estoque): ABH (1986, p.1805) fornece na entrada 3, o termo
definido como sendo “sabre, facão”. Trata-se, portanto, de uma metáfora baseada
na similaridade das formas do instrumento artesanal estoque, geralmente
confeccionado dentro das cadeias ou peni tenciárias e que são compostos por uma
haste à guisa de cabo, preso a uma lâmina qualquer de metal, com as formas de
facas e facões.
ZÓIUDO (ovo): Trata -se de caso similar ao já analisado no item referente à
DFRV. Representa, portanto, uma corruptela de olhudo, definido por ABH como “o
que tem olhos grandes”, numa analogia ao tamanho da gema do ovo.
4.1.4 Delegacia da Mulher – DM
CHAPA QUENTE (situação grave, complicada): Na entrada 13, ABH (1986,
p.390) define chapa como sendo “peça metálica de fogão, plana, lisa e resistente ao
36
calor, sobre a qual se cozem certos alimentos”. Não há registro para a expressão
com sentido gírio, podendo ser feita uma analogia com o fato de que, popularmente,
uma situação está pegando fogo ou está quente quando essa situação adquire uma
dimensão maior.
CORRERIA (preso de confiança): ABH (1986, p.484), na entrada 3,
apresenta o termo correrias como sendo “grupos de nordestinos armados que a
serviço de seringalistas cercavam aldeias, ao raiar do dia e destruíam tribos inteiras”.
Pode haver analogia com o fato de que os presos de confiança prestam alguns
serviços aos policiais.
DUQUE 14 (atentado violento ao pudor): É uma metáfora criada a partir da
analogia com o Código Penal Brasileiro que, no seu artigo 214 caracteriza o crime
de atentado violento ao pudor. Essa criação metafórica se apresenta através da
composição do vocábulo duque, que designa o segundo grupo do jogo do bicho,
mais o numeral 14.
FITA (serviço): Trata-se de caso idêntico ao já analisado no item referente à
DFRV.
MACHÃO DE COZINHA (agressor): O termo machão aparece em ABH
(1986, p.1059), entrada 3, como sendo “indivíduo que alardeia, ridiculamente, a sua
masculinidade”. A gíria, composta ainda pela expressão de cozinha, reforça o
conceito no sentido de referir-se ao homem agressor que demonstra sua força e
masculinidade atrás das paredes de um cômodo da casa.
TÁ PEDIDO (indivíduo com mandado de prisão): Não há registro para a
expressão. Composta pela contração da forma está mais o particípio passado do
verbo pedir, pode expressar uma metáfora baseada na analogia com o fato de que,
o Mandado de Prisão, expedido pelo Juiz de Direito, é uma solicitação, um “pedido”
para que o indivíduo seja preso.
37
TEM BRONCA (indivíduo com antecedentes criminais): O termo bronca
aparece em ABH (1986, p.288), entrada 3, como sendo “confusão, trapalhada”.
Portanto, pode tratar-se de uma metáfora a partir de analogia com o crime cometido,
motivo pelo qual o indivíduo apresenta registro de antecedentes criminais.
4.1.5 11º Distrito Policial – 11º DP
BASEADO (maconha): Trata -se de caso idêntico ao já analisado no item
referente à DATOX.
BINGA (isqueiro): ABH (1986, p.259) define o termo, na entrada 6, como
sendo “isqueiro tosco, usado no interior”.
BO (boletim de ocorrência, bronca): Trata-se das iniciais referentes ao
documento utilizado nas unidades policiais, onde são registradas as queixas ou a
ocorrência de determinado crime ou, por analogia, onde são registradas as broncas,
termo já analisado no item referente à DM.
BOCUDA (porta ou janela da cadeia): Trata-se de caso idêntico ao já
analisado no item referente à DA.
BOI (banheiro): Trata -se de caso idêntico ao já analisado no item referente à
DFRV.
BONDE (remoção): Trata-se de uma metáfora por extensão da definição de
bonde, apresentada por ABH (1986, p.273), entrada 1, ou seja, “veículo elétrico de
transporte para passageiros ou carga”.
BONECO (foto): ABH (1986, p.274) define na entrada 6, como sendo “entre
repórteres, retrato de protagonista de fatos policiais”.
CABRAL, CABRALZINHO (crack + maconha): Não foi encontrado registro
algum para os termos.
38
CAMISA DO PALMEIRAS (maconha): Pode representar uma analogia da
cor verde da camisa do uniforme do time de futebol Palmeiras com a cor da folha de
Canabis sativa, erva que dá origem à maconha.
CARRAPICHO (repórter policial): O termo aparece em ABH (1986, p.357),
entrada 2, como sendo “designação comum a numerosíssimos subarbustos das
famílias das leguminosas, compostas, gramíneas, malváceas e tiliáceas, cujos
pequenos frutos, que são vagens, se dividem em articulações, com pequenos
espinhos ou pêlos, os quais aderem facilmente à roupa do homem e ao pêlo dos
animais”. Trata-se, portanto, de uma metáfora baseada na analogia com o fato de o
repórter policial estar sempre atrás de fatos policiais que possam virar notícias.
CASA MUDA (casa vazia): Não há registro para a expressão, podendo ser
uma analogia ao fato de que uma pessoa muda não possui palavras assim como a
casa vazia não possui objetos e/ou pessoas.
CAXANGA (casa): Trata-se de caso idêntico ao já analisado no item
referente à DFRV.
CAXANGUEIRO (ladrão de casa): Não foi encontrado registro algum para o
termo, podendo ser constatada a associação ao termo caxanga acima referido.
CORINTIANO (viatura da polícia): Pode representar uma analogia das cores
branca e preta da camisa do uniforme do time de futebol Coríntians com as cores
oficiais das viaturas policiais civis no Estado do Paraná.
CORRE-CORRE (viatura policial): ABH (1986, p.483) define o vocábulo
como sendo “correria, grande afã, azáfama, lufa-lufa”. Possivelmente representa
uma analogia ao fato de que, no momento em que uma viatura chega a determinado
local de crime, pode haver uma correria das pessoas que não querem se ver
envolvidas no crime.
39
CORRERIA (preso de confiança): Trata-se de caso idêntico ao já analisado
no item referente à DM.
CORRÓ (cela provisória): ABH (1986, p.485) define o termo na entrada 1,
como sendo “designação comum a pequenos peixes sem valor, de rios e açudes”.
Pode haver analogia com o fato de que, por ser provisória, a cela tem menos valor
para o preso, no sentido de que não é ali que ele vai instalar sua “morada”.
CRISTAL (açúcar): Na definição de ABH (1986, p.500), entrada 1, trata-se
de “substância sólida cujas partículas estão arrumadas regularmente no espaço”,
podendo se contatar a analogia com a aparência do açúcar.
DUQUE 13 (estupro): É uma metáfora criada a partir da analogia com o
Código Penal Brasileiro que, no seu artigo 213 caracteriza o crime de estupro. Essa
criação metafórica se apresenta através da composição do vocábulo duque, que
designa o segundo grupo do jogo do bicho, mais o numeral 13.
FARINHA (cocaína): ABH (1986, p.758), entrada 1, define o termo como “pó
a que se reduzem os cereais moídos”. A metáfora ocorre nesse termo a partir da
analogia com a cor, normalmente branca, e com a consistência da farinha.
FIRMA (delegacia): A definição de ABH (1986, p.782) para o vocábulo,
entrada 3, é “estabelecimento comercial”. Por extensão, é popularmente utilizado
para designar o local de trabalho, de onde se depreende a analogia existente com a
gíria.
JEGA (cama da cadeia): Trata-se de caso idêntico ao já analisado no item
referente à DFRV.
JERERÊ (maconha): ABH (1986, p.987) apresenta a definição para o termo
como sendo “baseado”, já analisado no item referente à DATOX.
40
LATA (tíner): ABH (1986, p.1012) apresenta duas definições com sentido
figurado, “rosto, cara” e “recusa amorosa”. Não há, portanto, registro que reporte à
substância solvente. No entanto, pode haver analogia com o recipiente em que essa
substância é armazenada.
MACACA (metralhadora): Não há registro com sentido figurado para o
vocábulo que denote algum tipo de arma de fogo. No entanto, pode representar uma
analogia com o fato de que a metralhadora é carregada pendurada ao ombro, assim
como os macacos, quando domesticados, costumam andar apoiados ao ombro ou
ao braço do seu tratador. O gênero feminino é usado para acompanhar o gênero da
arma de fogo.
MALACO (bandido): É uma corruptela do termo maloqueiro, cuja definição
de ABH (1986, p.1072), entrada 3, tem o mesmo sentido.
MARROM (maconha): Não há registro do termo com sentido figurado,
podendo ser considerada uma analogia com a cor da erva quando pronta para
consumo.
MESCLADO (crack + maconha): O vocábulo aparece em ABH (1986,
p.1123), na entrada 2, como sendo “em que há mistura de duas cores”. Trata-se
portanto de uma metáfora baseada na analogia com o número de componentes da
droga.
MICHA (chave): ABH (1986, p.1130) não fornece definição com sentido
figurado, mas como sendo “pão feito de diversas farinhas misturadas”. No entanto,
pode-se detectar uma analogia com o conceito popularmente conhecido e
comumente utilizado nos meios policiais, segundo o qual micha é uma chave
utilizada em qualq uer fechadura, normalmente empregada na prática de crimes.
MIKE (microfone): Não foi encontrado qualquer registro para o termo.
41
MIOLEIRO (chaveiro): É um termo derivado do vocábulo miolo, cuja
definição de ABH (1986, p.1138), na entrada 7, designa “a parte interior de qualquer
coisa”. E, por analogia, o chaveiro é o profissional que também trabalha com o miolo
da fechadura.
MOCADO (escondido): Em associação ao vocábulo mocozear, definido pôr
ABH (1986, p.1146) como sendo “por em lugar de recato, esconder”, o termo gírio
aparece numa suposta forma de particípio passado.
MOCÓ (esconderijo): Trata-se de caso similar ao já analisado no item
referente à DATOX.
PAPELEIRO (estelionatário): É uma metáfora baseada a partir da analogia
com o crime de estelionato, relacionado na grande maioria das vezes, com papéis e
documentos. Assim, a pessoa que comete esse tipo de crime é, como na definição
de ABH (1986, p.1262), entrada 1, “aquele que trabalha no fabrico de papel”.
QUEIJO (cocaína): Não foi encontrado registro algum para o sentido
figurado, podendo haver uma analogia com a forma de apresentação de alguns
queijos ralados e a cocaína em pó.
SAMANGO, MANGO (policial militar): ABH (1986, p.1543) define samango,
na entrada 3, como “policial, tira”. Para mang o há a supressão da primeira sílaba.
SAPO (cadeado): Trata-se de caso idêntico ao já analisado no item
referente à DFRV.
X9 (delator): Trata-se de caso idêntico ao já analisado no item referente à
DFRV.
XIS (cadeia): ABH (1986, p.1799) define apenas como “o nome da letra X”.
No entanto é um termo que toma parte da palavra, a letra X, pela significação da
palavra xadrez já analisada no item referente à DFRV.
42
4.2 Resultados e Discussões
Para a verificação da existência ou não de relação das gírias com as
especificações funcionais de cada uma das delegacias pesquisadas, como já
mencionado anteriormente, foi consultado o Decreto nº. 4.884 de 24 de abril de
1978 que regulamenta e estrutura os órgãos do Departamento da Polícia Civil do
Paraná. Sendo assim, apresenta-se a seguir o resultado dessa análise:
Todos os termos, ou seja, 100% das gírias obtidas na Delegacia AntiTóxicos, apresentam relação com as especificações funcionais da referida
delegacia, constantes no Anexo 2. Levando-se em consideração que, dentre outras
atribuições, à DATOX cabe “a prevenção e repressão ao tráfico e uso de
substâncias consideradas tóxicas ou que causem dependência física ou psíquica”,
fica configurada a compatibilidade do uso das gírias pelos policiais daquela
delegacia, como por exemplo, baseado, bucha e nóia, termos diretamente
relacionados ao uso e tráfico de drogas.
Dentre as gírias obtidas na Delegacia de Furtos e Roubos de Veículos,
cerca de 32% delas, ou seja, arame, cabrito, cano, caxanga, jacaré, oitão, papagaio,
quadrada, QTH, sapo, sentar o dedo, subir o gás, truta, X9 e xadrez apresentam
relação com as especificações funcionais da referida delegacia, constantes no
Anexo 3. As demais não se enquadram aos crimes investigados pela referida
delegacia, por se tratarem de termos com significados mais genéricos, ou seja, não
estão relacionados a fatos criminosos.
Dentre as gírias obtidas na Delegacia da Criança e do Adolescente, cerca
de 15% delas, ou seja, areia (para mentira), pira, teresa, treta e zinco apresentam
relação com as especificações funcionais da referida delegacia, constantes no
Anexo 4. No que se refere às demais gírias, como no caso anterior, são termos
cujos significados não apresentam relação com fatos criminosos, cuja investigação é
de responsabilidade da DA.
Dentre as gírias obtidas na Delegacia da Mulher, cerca de 71%, ou seja,
chapa quente, duque 14, machão de cozinha, tá pedido e tem bronca apresentam
relação com as especificações funcionais da referida delegacia, constantes no
Anexo 5. O restante das gírias, como nos demais casos, são termos cujos
43
significados não se relacionam aos fatos criminosos investigados naquela delegacia,
podendo também ser utilizados em outros ambientes policiais.
Finalmente, dentre as gírias obtidas no 11º Distrito Policial, cerca de 77%
delas, ou seja, baseado, BO, bonde, boneco, cabral/cabralzinho, camisa do
Palmeiras, casa muda, caxanga, caxangueiro, corintiano, corre-corre, corró, duque
13, farinha, jererê, lata, macaca, malaco, marrom, mesclado, micha, mike, mioleiro,
mocado, mocó, papeleiro, queijo, sapo, X9 e XIS apresentam relação com as
especificações funcionais da referida delegacia, constantes no Anexo 6. O restante
das gírias não apresentam relação com fatos criminosos. Vale ressaltar que, no 11º
DP, por ser uma delegacia cujas atribuições são de caráter genérico, há uma
incidência de gírias que também apareceram em outras delegacias pesquisadas,
como por exemplo, o caso de baseado, utilizado também na DATOX.
O
resultado
acima
apresentado
denota
que,
proporciona lmente
à
quantidade de gírias fornecidas, a maioria delas apresenta relação com as
especificações funcionais das delegacias de origem. Observa-se, por exemplo, o
caso da DM onde, dos sete léxicos listados, cinco relacionam-se com os crimes
investigados e, da DATOX, onde todos os léxicos relacionam-se com os crimes
investigados.
Para finalizar, apresenta -se a seguir, um breve estudo da freqüência das
gírias nas delegacias, isto é, quais as gírias aparecem em mais de uma delegacia:
areia foi citada pela DFRV e pela DA;
baseado foi citado pela DATOX e pelo 11º DP;
blindada foi citada pela DFRV e pela DA;
bocuda foi citada pela DA e pelo 11º DP;
boi foi citado pela DFRV, pela DA e pelo 11º DP;
caxanga foi citada pela DFRV e pelo 11º DP;
correria foi citada pela DM e pelo 11º DP;
coruja foi citada pela DFRV e pela DA;
fita foi citada pela DFRV e pela DM;
galeto foi citado pela DFRV e pela DA;
gancha foi citada pela DFRV e pela DA;
jega foi citada pela DFRV, pela DA e pelo 11º DP;
44
marrocos foi citado pela DFRV e pela DA;
moca foi citado pela DFRV e pela DA;
mocó foi citado pela DATOX e pelo 11º DP;
papagaio foi citado pela DFRV e pela DA;
pena foi citada pela DFRV e pela DA;
porva foi citado pela DFRV e pela DA;
sapo foi citado pela DFRV e pelo 11º DP;
X9 foi citado pela DFRV e pelo 11º DP.
Dos termos acima listados, observa -se que, com exceção de areia (para
mentira), baseado, mocó, papagaio, sapo e X9 , os demais são de uso genérico, o
que explica aparecerem em mais de uma delegacia.
Vale ressaltar ainda que os termos acelerar, areia (para mentira), baseado,
binga, bôbo, bocuda, boi-de-piranha, boneco, cano, caneca, careta, cheirinho ou
loló, correria, gogó, jererê, laranja, machão-de-cozinha, malaco, papagaio, pena,
pisante, rato, samango, tem bronca, treta, xadrez e zinco já se encontram
registrados em ABH (1986), isto é, são lexicalizados.
45
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O objetivo da pesquisa do léxico de uma comunidade é “entender as várias
relações que os indivíduos desenvolvem entre si, com o meio e, ainda, com outras
comunidades” (REMENCHE, 2003, p.101). As gírias usadas nas delegacias
consultadas denotam uma realidade em que o cotidiano profissional exerce forte
influência. Constatou-se que os policiais transformam e adeqúam o sentido das
palavr as de acordo com a sua realidade. Seja por haver relação dos termos
utilizados com os crimes investigados por cada delegacia, seja pela necessidade de
interagir com os envolvidos nesses crimes, a criatividade na composição da
linguagem policial está basicamente no uso de metáforas, algumas óbvias, outras
inéditas, todas ricas.
Esse caráter enriquecedor, comum a todas as formas de linguagem,
depende das palavras ali contidas, nobres ou vulgares, conforme quem as
empregue, conforme as associações fônicas e significativas que despertem e
conforme as situações em que sejam utilizadas. De qualquer maneira, não se pode
desprezar o fato de que a linguagem é dinâmica, pois as palavras mudam
continuamente, não só do ponto de vista fônico, mas também do ponto de vista
semântico. Uma palavra nunca é exatamente a mesma. Em cada momento há uma
inovação na forma da palavra, no seu emprego, no seu sistema de associações
(COSERIU, 1982, p.76).
Essa mudança contínua, de criação e recriação, ficou bastante evidente no
decorrer do presente trabalho, ao se buscar entender o que são os níveis de
linguagem e a diferença entre a gíria, o jargão e o calão. Teoricamente, constatou-se
que os limites, entre as linguagens especiais analisadas, são tênues. O estudo
demonstrou que o calão sempre esteve relacionado a comunidades do submundo, a
marginais e em contextos obscenos, o que lhe confere um caráter pejorativo.
Entretanto, com o uso freqüente de determinados termos pertencentes a esse tipo
de linguagem, tem-se observado um “verdadeiro processo desmistificador do
chamado ‘palavrão’” (PRETI, 1984, p.27). Que o jargão, por um período também
considerado linguagem do submundo, com o passar do tempo e com a evolução das
profissões, tornou-se linguagem técnica própria dessas profissões. E que, finalmente
46
a gíria, assume um papel social, por ser uma reação lingüística num determinado
contexto social cada vez mais incorporada à linguagem cotidiana.
Sendo assim, “a gíria constitui um elemento diferenciador a que certos
grupos e, de maneira geral, as camadas mais diversas da população jamais
renunciariam, sob pena de perderem uma das formas mais eficientes de marcarem
sua presença na grande comunidade” (PRETI, 1984, p.8).
Não poderia ser diferente no caso das gírias policiais aqui analisadas. Como
grupo social restrito e como grupo profissional, observou-se que os policiais
envolvidos num ambiente de depoimentos, fazem contato com os termos utilizados
por representantes de outro grupo social, os criminosos. Evidencia-se, portanto, o já
citado repertório
compartilhado.
Numa
“democracia
lingüística”,
aqueles
se
apropriam de alguns vocábulos da gíria destes e formam o seu próprio léxico,
normalmente reconhecido pelo restante da comunidade como sendo “a gíria dos
tiras”.
Além disso, essa gíria apresentou relação com os crimes investigados por
cada uma das delegacias. Eis, portanto, a linguagem representando uma realidade.
Finalmente, vale ressaltar que a abordagem da teoria de LAKOFF E
JOHNSON (2002), foi especialmente importante na análise dos vocábulos gírios.
Comprovou-se que a metáfora encontra-se inserida em todos os níveis de
linguagem e faz parte da criatividade e do cotidiano dos policiais e, por extensão, da
população em geral.
O que se pretende é que o presente trabalho seja uma contribuição à
evolução do idioma, em todas as suas particularidades e em toda a sua dinâmica,
como reflexo da evolução do próprio ser humano.
47
REFERÊNCIAS
ACQUAVIVA, M.C. Vademecum universitário de Direito. 8ª edição atualizada e
ampliada. São Paulo: Editora Jurídica Brasileira, 2005.
BALLY, C. El lenguaje y la vida. Tradução de Amado Alonso. 7ª edição. Buenos
Aires: Editorial Losada, 1977
BORBA, F.S. da Pequeno vocabulário de lingüística moderna. São Paulo: Editora
Nacional, Universidade de São Paulo, 1971.
BOUTON, C.P. O desenvolvimento da linguagem. Tradução de Carlos Domingos
e Cláudia Possolo. 1ª edição. Lisboa: Moraes Editora, 1977.
BURKE, P.; PORTER, R. (Org.). Linguagem, indivíduo e sociedade: história social
da linguagem. 1ª edição. São Paulo: Unesp, 1993.
_____. Línguas e jargões: contribuições para uma história social da linguagem. 1ª
edição. São Paulo: Unesp, 1997.
CASSIRER, E. Linguagem e mito. 3ª edição. São Paulo: Editora Perspectiva, 1992.
CHERUBIN, S. Dicionário de figuras de linguagem. São Paulo: Pioneira, 1989.
COSERIU, E. O homem e sua linguagem. Tradução de Carlos Alberto da Fonseca
e Mário Ferreira. Rio de Janeiro: Presença, 1982.
FERREIRA, A.B.H. Novo dicionário Aurélio da língua portuguesa. 2ª edição
revista e aumentada. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 1986.
LAKOFF, G.; JOHNSON, M. Metáforas da vida cotidiana. Coordenação de
tradução de Mara Sophia Zanotto. São Paulo: Educ, 2002.
LAPA, M. R. Estilística da língua portuguesa. 10ª edição. Coimbra: Coimbra
Editora Limitada, 1979.
MELO, G. C. de A língua do Brasil. 2ª edição. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio
Vargas, 1971.
NISKIER, A. Disponível em http://www.folha.uol.com.br. Acesso em 14 novembro
2005.
POSSENTI, S. Disponível em http://www.folha.uol.com.br . Acesso em 14 novembro
2005
PRETI, D. A gíria e outros temas. São Paulo: Edusp, 1984.
_____. Fala e escrita em questão.
Acesso em 14 novembro 2005.
Disponível em http://www.folha.uol.com.br.
48
RECTOR, M. A linguagem da juventude: uma pesquisa geo-sóciolinguistica.
Petrópolis: Vozes, 1975.
REMENCHE, M. L. R. As criações metafóricas na gíria do Sistema Penitenciário
do Paraná. Londrina, 2003. Dissertação (Mestrado em Estudos de Linguagem) Universidade Estadual de Londrina.
SERRA E GURGEL, J.B. Dicionário de gíria: modismo lingüístico – o equipamento
falado do brasileiro. 4ª edição. Brasília: Gráfica Valci Editora, 1990.
_____. Dicionário de gíria: modismo lingüístico – o equipamento falado do
brasileiro. 5ª edição. Brasília: Gráfica Valci Editora, 1998.
TACLA, A. Dicionário dos marginais. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1981.
49
ANEXOS
ANEXO 1 - GLOSSÁRIO DAS GÍRIAS UTILIZADAS NAS
DELEGACIAS CONSULTADAS
Acelerar – apressar
Arame – dinheiro
Areia – açúcar ou mentira
Apavorar – ir ao banheiro da cadeia
Aviãozinho – aquele que vende pequena quantidade de droga
Bala ou comprimido – ecstasy
Baseado – maconha ou cigarro de maconha
Berma – bermuda
Binga – isqueiro
Blindada – marmita de papel alumínio, “marmitex”
BO – bronca, boletim de ocorrência
Bôbo – relógio ou coração
Boca-suja – cinzeiro
Bocuda – janela ou porta da cadeia
Boi - banheiro
Boi -de-piranha – aquele que transporta grande quantidade de droga
Bombeta – boné
Bonde – remoção
Boneco – foto
Botinha – cigarro comum
Branquinha – cocaína
Brasa – isqueiro
Bucha – cocaína
Cabral, cabralzinho – crack com maconha
Cabrito – carro
Caxanga – casa
Camisa do Palmeiras – maconha
Caneca – todo tipo de copo
50
Cano – revólver
Careta – cigarro comum
Carrapicho – repórter policial
Casa muda – casa vazia
Castelar – pensar
Chapa quente – situação grave, complicada
Cheirinho ou loló – droga de cheirar
Corintiano – viatura caracterizada
Corre-corre – viatura
Correria – preso de confiança
Corró – cela provisória
Coruja – cueca
Cristal – açúcar
Descansa-pinha – travesseiro
Dragão – insqueiro
Duque 13 – estupro
Duque 14 – atentado violento ao pudor
Farinha – cocaína
Firma – delegacia
Fita – serviço
Galeto – mistura de comida ou carne
Gancha – calça
Gerente – traficante
Gogó – pescoço
Jacaré – serra
Jega – cama da cadeia
Jererê – maconha
Lambão tricentro – relaxado
Laranja – aquele que transporta pequena quantidade de droga
Lata – tíner
Latrô – travesseiro
Luna – óculos
Macaca – metralhadora
51
Machão de cozinha – agressor
Malaco – bandido
Marrocos – pão
Marrom – maconha
Meia-lua – banana
Menciba – carta
Mesclado – crack com maconha
Micha – chave
Mike – microfone
Mioleiro – chaveiro
Moca – café pronto
Mocado – escondido
Mocó – reunião de usuários ou esconderijo
Moranguinho – éter com essência de morango
Mula – aquele que transporta droga
Nóia – usuário de droga
Oitão – revólver calibre 38
Oreba – orelha
Pá – colher
Papagaio – rádio
Papeleiro – estelionatário
Pedra – crack
Peita – camisa
Pena – caneta
Pé-redondo – policial militar
PH – papel higiênico
Pinha – cabeça
Pipo ou catatau – carta
Pira – brincadeira
Pisante – tênis
Porronca – ponta de cigarro
Porva – suco
Quadrada – pistola
52
Quebrar litro – urinar
Queijo – cocaína
QTH – ocorrência
Rala-boi – escova de lavar banheiro da cadeia
Rato – policial civil
Samango, mango – policial militar
Sapo – cadeado
Selinho – LSD
Sentar o dedo – atirar
Subir o gás – matar
Ta pedido – com mandado de prisão
Tem bronca – com antecedentes criminais
Terra – café
Teresa – corda
Treta – desentendimento
Truta – mercadoria
Unex- cortador de unhas
Vapor, vaporzinho – aquele que vende pequena quantidade de droga
X9 – delator
X – cadeia
Xadrez- cadeia
Zinco – estoque
Zóiuda – televisão
Zóiudo – ovo
53
ANEXO 2
Decreto nº 4.884 de 24/04/78
Regulamento e Estrutura do Departamento da Polícia Civil
Da Delegacia Anti -Tóxicos
Art. 23 – À Delegacia Anti-Tóxicos cabe adotar medidas necessárias para a
investigação, prevenção, repressão e processamento dos crimes previstos no
Código Penal Brasileiro, em seus artigos 328 a 331, 343 e 344 * , bem como nas
infrações previstas pela Lei das Contravenções Penais nos seus artigos 62, 63 e
68** , a prevenção e repressão ao tráfico e uso de substâncias consideradas tóxicas
ou que causem dependência física ou psíquica, prevista na legislação especial e
quando não configurado o tráfico que transcenda as fronteiras de outros Estados
soberanos, limítrofes ou não com o território paranaense; a fiscalização permanente,
em regime de cooperação com outros organismos públicos e privados, ou sob sua
supervisão direta, de locais públicos e privados, freqüentados por dependentes e
mercadores de drogas perigosas em geral; a colaboração com a Secretaria de
Estado da Saúde e do Bem-Estar Social na fiscalização da medicina e farmácia;
participar, através do respectivo Titular, de Conselhos a nível estadual ligados à área
de drogas perigosas; as investigações tendentes à localização e destruição de
plantações de ervas geradoras de tóxicos e entorpecentes e apreensão de objetos,
utensílios e equipamentos em locais destinados à produção dos mesmos; a
promoção ou participação em programas comunitários destinados a eliminar a
disseminação de drogas, seu uso e conseqüências, bem como de campanhas de
caráter educacional de orientação e alertamento à utilização ilegal de drogas
perigosas; outras atividades correlatas.
* Código Penal Brasileiro (ACQUAVIVA:2005)
Art. 328 – Usurpar o exercício de função pública.
Art. 329 – Opor-se à execução de ato legal, mediante violência ou ameaça a
funcionário competente para executá -lo ou a quem lhe esteja prestando auxílio.
54
Art. 330 – Desobedecer a ordem legal de funcionário público.
Art. 331 – Desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão
dela.
Art. 343 – Dar, oferecer ou prometer dinheiro ou qualquer outra vantagem a
testemunha, perito, contador, tradutor ou intérprete, para fazer afirmação falsa,
negar ou calar a verdade em depoimento, perícia, cálculos, tradução ou
interpretação.
Art. 344 – Usar de violência ou grave ameaça, com o fim de favorecer
interesse próprio ou alheio, contra autoridade, parte, ou qualquer outra pessoa que
funciona ou é chamada a intervir em processo judicial, policial ou administrativo, ou
em juízo arbitral.
** Lei das Contravenções Penais (ACQUAVIVA:2005)
Art. 62 – Apresentar-se publicamente em estado de embriaguez, de modo
que cause escândalo ou ponha em perigo a segurança própria ou alheia.
Art. 63 – Servir bebidas alcoólicas:
I – a menor de 18 (dezoito) anos;
II – a quem se acha em estado de embriaguez;
III – a pessoa que o agente sabe sofrer das faculdades mentais;
IV – a pessoa que o agente sabe estar judicialmente proibida de freqüentar
lugares onde se consome bebida de tal natureza.
Art. 68 – Recusar à autoridade, quando por esta justificadamente solicitados
ou exigidos, dados ou indicações concernentes à própria identidade, estado,
profissão, domicílio e residência.
55
ANEXO 3
Decreto nº 4.884 de 24/04/78
Regulamento e Estrutura do Departamento da Polícia Civil
Da Delegacia de Furtos e Roubos de Veículos
Art. 22- À Delegacia de Furtos e Roubos de Veículos cabe adotar medidas
necessárias para investigação, prevenção, repressão e processamento dos crimes
de furto ou roubo de veículos motorizados terrestres, bem como das infrações
previstas pela Lei das Contravenções Penais em seus artigos 24 a 26 e 68 * ; outras
atividades correlatas.
* Lei das Contravenções Penais
Art. 24 – Fabricar, ceder ou vender gazua ou instrumento empregado
usualmente na prática de crime de furto.
Art. 25 – Ter alguém em seu poder, depois de condenado por crime de furto
ou roubo, ou enquanto sujeito à liberdade vigiada ou quando conhecido como vadio
ou mendigo, gazuas, chaves falsas ou alteradas ou instrumentos empregados
usualmente na prática de crime de furto, desde que não prove destinação legítima.
Art. 26 – Abrir, alguém, no exercício de profissão de serralheiro ou ofício
análogo a pedido ou por incumbência de pessoa de cuja legitimidade não se tenha
certificado previamente, fechadura ou qualquer outro aparelho destinado à defesa de
lugar ou objeto.
Art. 68 - Recusar à autoridade, quando por esta justificadamente solicitados
ou exigidos, dados ou indicações concernentes à própria identidade, estado,
profissão, domicílio e residência.
56
ANEXO 4
Decreto nº 4.884 de 24/04/78
Regulamento e Estrutura do Departamento da Polícia Civil
Da Delegacia da Criança e do Adolescente
Art. 35 – À Delegacia de Proteção ao Menor cabe adotar as medidas de
prevenção e elucidação de atos anti-sociais atribuídos aos menores, mediante o
cumprimento do previsto pela legislação específica, em estreita articulação com o
Juízo competente; custodiar os menores encaminhados pelas unidades policiais e
apresentá -los à Justiça de Menores; prosseguir nas diligências para localização de
menores responsáveis por fatos anti -sociais, constantes de autos remetidos pelas
delegacias quando a conclusão dependa apenas do êxito nas providências pedidas
no relatório da autoridade que instaurou o procedimento; elaborar estudos e
viabilizar a sua execução, quanto ao aperfeiçoamento do desempenho de suas
atribuições, em cooperação a ser prestada por entidades públicas ou privadas,
visando atingir ampla assistência e amparo aos menores em trânsito pela Delegacia;
realizar, referendado pela Diretoria da Polícia Civil, a execução das medidas
aplicáveis a menores abandonados, carenciados e infratores e treinamento de
servidores policiais civis em entidades ligadas a área de assistência a menores;
proceder a prevenção, investigação e repressão dos crimes previstos pelo Código
Penal Brasileiro, artigos 328 a 331 e 344* e da infração prevista pela Lei das
Contravenções Penais em seu artigo 68**; outras atividades correlata s.
* Código Penal Brasileiro
Art. 328 - Usurpar o exercício de função pública.
Art. 329 – Opor-se à execução de ato legal, mediante violência ou ameaça a
funcionário competente para executá -lo ou a quem lhe esteja prestando auxílio.
Art. 330 – Desobedecer a ordem legal de funcionário público.
57
Art. 331 – Desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão
dela.
Art. 344 - Usar de violência ou grave ameaça, com o fim de favorecer
interesse próprio ou alheio, contra autoridade, parte, ou qualquer outra pessoa que
funciona ou é chamada a intervir em processo judicial, policial ou administrativo, ou
em juízo arbitral.
** Lei das Contravenções Penais
Art. 68 - Recusar à autoridade, quando por esta justificadamente solicitados
ou exigidos, dados ou indicações concernentes à própria identidade, estado,
profissão, domicílio e residência.
58
ANEXO 5
Decreto nº 4.884 de 24/04/78
Regulamento e Estrutura do Departamento da Polícia Civil
Da Delegacia da Mulher
Art. 2º - À Delegacia da Mulher cabe adotar medidas necessárias para
investigação, prevenção, repressão e processamento dos ilícitos praticados contra a
pessoa do sexo feminino, previstos no Código Penal Brasileiro, em seus artigos 129
a 131, 146 a 149, 213 a 220, 227 e 228, 230 e 231* , e artigo 61** da Lei das
Contravenções Penais.
* Código Penal Brasileiro
Art. 129 – Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem.
Art. 130 – Expor alguém, por meio de relações sexuais ou qualquer ato
libidinoso, a contágio de moléstia venérea, de que sabe ou deve saber que está
contaminado.
Art. 131 – Praticar, com o fim de transmitir a outrem moléstia grave de que
está contaminado, ato capaz de produzir o contágio.
Art. 146 – Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, ou
depois de lhe haver reduzido, por qualquer outro meio, a capacidade de resistência,
a não fazer o que a lei permite, ou a fazer o que ela não manda.
Art. 147 – Ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro
meio simbólico, de causar-lhe mal injusto e grave.
Art. 148 – Privar alguém de sua liberdade, mediante seqüestro ou cárcere
privado.
59
Art. 149 – Reduzir alguém à condição análoga à de escravo, quer
submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a
condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua
locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto.
Art. 213 – Constranger mulher à conjunção carnal, mediante violência ou
grave ameaça.
Art. 214 – Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a
praticar ou permitir que com ele se pratique ato libidinoso diverso da conjunção
carnal.
Art. 215 – Ter conjunção carnal com mulher honesta, mediante fraude.
Art. 216 – Induzir mulher honesta, mediante fraude, a praticar ou permitir
que com ela se pratique ato libidinoso diverso da conjunção carnal.
Art. 217 – Seduzir mulher virgem, menor de 18 (dezoito) anos e maior de 14
(catorze), e ter com ela conjunção carnal, aproveitando-se de sua inexperiência ou
justificável confiança.
Art. 218 – Corromper ou facilitar a corrupção de pessoa maior de14
(catorze) e menor de 18 (dezoito) anos, com ela praticando ato de libidinagem, ou
induzindo-a a praticá-lo e a presenciá-lo.
Art. 219 – Raptar mulher honesta, mediante violência, grave ameaça ou
fraude, para fins libidinosos.
Art. 220 – Se a raptada é maior de 14 (catorze) anos e menor de 21 (vinte e
um), e o rapto se dá com seu consentimento.
Art. 227 – Induzir alguém a satisfazer a lascívia de outrem.
60
Art. 228 – Induzir ou atrair alguém à prostituição, facilitá-la ou impedir que
alguém a abandone.
Art. 230 – Tirar proveito da prostituição alheia, participando diretamente de
seus lucros ou fazendo-se sustentar, no todo ou em parte, por quem a exerça.
Art. 231 – Promover ou facilitar a entrada, no território nacional, de mulher
que nele venha exercer a prostituição, ou a saída de mulher que vá exercê-la no
estrangeiro.
** Lei das Contravenções Penais
Art. 61 – Importunar alguém, em lugar público ou acessível ao público, de
modo ofensivo ao pudor.
61
ANEXO 6
Decreto nº 4.884 de 24/04/78
Regulamento e Estrutura do Departamento da Polícia Civil
Das Delegacias Distritais da Capital (11° Distrito Policial)
Art. 42 – Às Delegacias Distritais da Capital compete, como unidades policiais
básicas, atender, indiscriminadamente, todas as ocorrências que se verificarem no
âmbito de suas jurisdições territoriais, devendo solicitar o prosseguimento das
diligências pelas Delegacias Especializadas competentes quando verificada a
autoria desconhecida ou incerta; outras atividades correlatas.