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As Pequenas e Médias Empresas e a Cadeia de Abastecimento da Indústria Aeronáutica As Pequenas e Médias Empresas e a Cadeia de Abastecimento da Indústria Aeronáutica PEDRO MANUEL CARRILHO FILIPE (MSc) – INTELI – [email protected] ALCIBÍADES PAULO GUEDES (PhD) - FACULDADE DE ENGENHARIA DA UNIVERSIDADE DO PORTO e ESCOLA DE GESTÃO DA UNIVERSIDADE DO PORTO - [email protected] Resumo: O presente artigo procura apontar um modelo de cadeia logística na indústria aeronáutica, no qual são mostradas algumas oportunidades para a inserção de Pequenas e Médias Empresas nas cadeias de abastecimento das indústrias aeronáuticas europeias e mundiais. Este trabalho tem por base a investigação efectuada em nove casos de estudo da indústria aeronáutica, da qual resultou uma tese de mestrado sobre “Definição de um Modelo de Cadeia Logística na Indústria Aeronáutica: O Caso Português”. A metodologia utilizada baseou-se em entrevistas realizadas a especialistas na indústria aeronáutica, em Portugal e no estrangeiro, procurando obter informação através de um contacto próximo com as empresas, que permitisse traduzir a evolução mais recente da indústria aeronáutica mundial. O suporte da informação recolhida nas entrevistas e na bibliografia e publicações da especialidade, permitiu a construção dos casos de estudo das cadeias logísticas de alguns dos principais projectos em desenvolvimento, lançamento e produção. O modelo da cadeia de abastecimento da indústria aeronáutica revelou-se, nos casos estudados, estratificada e hierarquizada. Concluiu-se ainda que a especialização tecnológica na base da cadeia ou a adopção de filosofias de integração de módulos e sistemas no topo da mesma, são factores que poderão traduzir oportunidades para que Pequenas e Médias Empresas se afirmem nas cadeias de abastecimento das indústrias aeronáuticas europeias e mundiais, como fonte de desenvolvimento daquelas empresas e dos seus países. Palavras-chave: cadeia de abastecimento, indústria aeronáutica, fornecedor, Portugal. 1 Introdução A indústria aeronáutica desde sempre que suscita um grande interesse e curiosidade, estando mesmo rodeada por uma aura mística. No entanto, este interesse tem vindo a tornar-se crescente desde a queda do muro de Berlim nos anos oitenta, com as implicações geopolíticas associadas e a importância crescente dos grandes grupos económicos de empresas do sector aeronáutico, resultantes da consolidação industrial verificada. O presente artigo tem por base a investigação efectuada em nove casos de estudo da indústria aeronáutica, da qual resultou uma tese de mestrado sobre “Definição de um Modelo de Cadeia Logística na Indústria Aeronáutica: O Caso Português”. A metodologia utilizada baseou-se em entrevistas realizadas a especialistas na indústria aeronáutica, em Portugal e no estrangeiro, procurando obter informação através de um contacto próximo com as empresas, que permitisse traduzir a evolução mais recente da indústria aeronáutica mundial. O suporte da informação recolhida nas entrevistas e na bibliografia e publicações da especialidade, permitiu a construção dos casos de estudo das cadeias logísticas de alguns dos principais projectos em desenvolvimento, lançamento e produção. Este artigo procura apontar um modelo de cadeia logística na indústria aeronáutica, e demonstrar algumas oportunidades para a inserção de Pequenas e Médias Empresas (PMEs) nas cadeias de abastecimento das indústrias aeronáuticas europeias e mundiais, como fonte de desenvolvimento daquelas empresas e dos seus países. As Pequenas e Médias Empresas e a Cadeia de Abastecimento da Indústria Aeronáutica 2 Evolução recente da Indústria Aeronáutica A indústria aeronáutica atravessa um período conturbado de consolidação do tecido empresarial, depois de uma vaga de fusões e aquisições, em que a busca de eficiência se esgotou nas unidades produtivas individuais ou consolidadas, passando a ser procurada nas cadeias de abastecimento e nas redes de cooperação empresarial, o que suscita o interesse pelo desenho e organização das cadeias logísticas na indústria aeronáutica. Historicamente, a indústria aeronáutica dependeu dos orçamentos governamentais para a área da defesa. Efectivamente, grande parte das políticas públicas para o sector aeronáutico passavam pelo financiamento da indústria com o objectivo da manutenção do controlo sobre os interesses da defesa e aerospacial, no sentido de evitar que o conhecimento sobre tecnologia importante pudesse passar para terceiros. Acresce, ainda, a necessidade de manter a capacidade de produção militar, enquanto reserva tecnológica estratégica, no caso de futuros conflitos bélicos. Na última década, tem-se assistido a uma transformação na abordagem governamental a esta indústria, por adopção de uma relação mais comercial, tipo cliente-fornecedor, abandonandose o financiamento directo. Esta transformação deve-se, por um lado, à redução de orçamentos disponíveis para a defesa, em virtude das alterações geopolíticas verificadas com a queda do muro de Berlim e o fim da Guerra Fria, e, por outro lado, à regulação efectiva da Organização Mundial do Comércio, através de leis contra mecanismos que subvertam a livre concorrência1. Consequentemente, os governos permitiram e estimularam fusões entre os grandes construtores por forma a beneficiar de sinergias que lhes permitam obter um maior valor, a mais baixo custo, incluindo a redução do custo de desenvolvimento, bem como o risco a ele inerente. O sector aeronáutico viu-se, assim, confrontado com a necessidade de estabelecer compromissos de cooperação internacional para a criação e fabrico de novos aviões. Desta forma, os construtores têm procurado parcerias e partilha de custos e riscos de desenvolvimento, insuperáveis de forma isolada. Paralelamente, o custo da tecnologia tem vindo a crescer de uma forma bastante penalizadora para as empresas do sector, levando ao surgimento da tendência para a adopção de tecnologias já existentes noutros sectores, nomeadamente na indústria automóvel. A procura de aviões civis de grande porte depende directamente da procura deste tipo de aviões pelas linhas aéreas, que, por seu turno, dependem fortemente dos ciclos económicos. De acordo com Rogowsky (2001), a procura aos aviões civis de grande porte segue o ciclo económico desfasada de 36 meses. O mercado da aviação civil de longo curso2 é partilhado, em termos de fabrico, pela BOEING e pela AIRBUS, disputando cada uma destas empresas a liderança nas vendas neste sector. Segundo os dados de Novembro de 2001, existiam cerca de 20.496 aviões comerciais em circulação, incluindo regionais, sendo mais de metade, aviões fabricados pela BOEING. O segmento de mercado da aviação regional3 tem sofrido rápidas transformações ao longo dos últimos anos, registando-se um reposicionamento dos construtores a nível mundial, com a perda de importância dos construtores europeus e o crescimento do canadiano Bombardier, e do brasileiro Embraer. 3 A organização da cadeia de abastecimento na indústria aeronáutica Na investigação efectuada foram construídos nove casos de estudo, envolvendo aeronaves em vários pontos do seu ciclo de vida (desenvolvimento, lançamento e produção) e de diversos sectores da aeronáutica (comercial de longo curso e regional e militar), conforme ilustrado na Tabela 1. Os dados para a consolidação dos casos de estudo foram obtidos através de uma 1 Regulação anti-trust. Aviões com capacidade para transportar mais de 100 passageiros. 3 Aviões com capacidade para transportar entre 18 e 100 passageiros. 2 As Pequenas e Médias Empresas e a Cadeia de Abastecimento da Indústria Aeronáutica investigação que contou com o recurso a entrevistas com especialistas do sector industrial e logístico na Europa, EUA e Brasil. A recolha bibliográfica foi efectuada a partir das publicações das associações industriais e da imprensa da especialidade. Tabela 1 – Casos de estudo abordados Caso de estudo Tipo AIRBUS A321 Civil – longo curso AIRBUS A380 Civil – longo curso AIRBUS A400M Militar BOEING B737 Civil – longo curso BOMBARDIER BD100 Civil – regional EMBRAER ERJ 170/190 Civil – regional FAIRCHILD DORNIER DO328 Civil – regional FAIRCHILD DORNIER DO728 Civil - regional LOCKHEED MARTIN JSF Militar Fase Produção Lançamento Desenvolvimento Produção Desenvolvimento Lançamento Produção Lançamento Lançamento Fonte: FILIPE (2003) Os casos de estudo confirmaram a existência de um modelo piramidal, estratificado e hierarquizado para as cadeias de abastecimento da indústria aeronáutica, cuja liderança é determinada pelo OEM4. Este é proprietário do projecto e assume a selecção dos fornecedores de sistemas, estruturas e componentes principais de uma aeronave. Estes fornecedores constituirão o primeiro, segundo e terceiro níveis de abastecimento, conforme se pode verificar na figura 1. Conforme ilustrado, no topo da pirâmide encontram-se os grandes OEM, responsáveis pelo desenvolvimento do produto e pelo estabelecimento da rede de fornecimentos, necessária ao desenvolvimento colaborativo e produção do produto. A fileira de fornecedores de primeira linha tende a ser constituída por grandes empresas, especializadas em módulos particulares, com instalações e sucursais em diversos pontos da Europa e do continente americano, como é o caso da MESSIER-DOWTY, fornecedora de trens de aterragem. Na primeira linha desta hierarquia, encontram-se, também, fabricantes de aviões, motores, foguetes lançadores, satélites, mísseis, etc., que abastecem o OEM com módulos e sistemas completos, efectuando, principalmente, a consolidação de sistemas e montagem de módulos de unidades estruturais, como a empenagem ou módulos da fuselagem. Resultante da consolidação da indústria, salienta-se o facto que indica como fornecedores de primeira linha algumas das empresas adquiridas/emparceiradas nos grandes grupos de construtores aeronáuticos. Por exemplo, nos casos da AIRBUS ou da BOMBARDIER, verifica-se que os seus centros de competência se posicionam na primeira linha de abastecimento como integradores de módulos específicos, alimentando a empresa responsável pela montagem final, designado por OEM. Os fornecedores de segunda linha apresentam uma especialização em sistemas complexos, com desenvolvimento próprio, como sejam, por exemplo, a PARKER ou a ELECTROTECHNIQUE, com sistemas hidráulicos e eléctricos, respectivamente para o Bombardier BD100 e para o Fairchild Dornier DO728. Em terceira linha, surgem fornecedores que entregam subsistemas e componentes principais para integração nos sistemas produzidos pelos fornecedores de segunda linha. Por exemplo, a FR HITEMP, que fornece bombas de combustível que serão integradas no sistema de combustível a instalar nos módulos dos fornecedores de primeira linha (por exemplo, nas asas do A380). 4 Original Equipment Manufacturer, fabricante detentor da marca. As Pequenas e Médias Empresas e a Cadeia de Abastecimento da Indústria Aeronáutica OEM 1ª Linha Integradores de Sistemas 2ª Linha 3ª Linha Sistemas e fornecedores principais Grandes fornecedores Fabricantes de tamanho médio Sub-sistemas e componentes principais Elementos da estrutura e componentes 4ª Linha 5ª Linha Aviões, Mísseis, Espacial, Motores Pequenas empresas Sub-fornecedores Materiais, Processos, Produção, Software e serviços Fonte: AECMA Figura 1 – Organização típica da cadeia de abastecimento na indústria aeronáutica Os fornecedores de quarta linha encontram-se, muitas das vezes, classificados em terceira linha, sendo a fronteira muito ténue entre estes dois níveis de abastecimento. Nos nove casos de estudo abordados, apenas em três deles, foi possível delinear um quarto nível caracterizado por fornecedores de elementos simples de estrutura e componentes, que não fornecessem, igualmente, sub-sistemas e componentes principais. Por exemplo, no caso do AIRBUS A380, os fornecedores de conjuntos maquinados em Varel abastecem os fornecedores de Nordenham, que, por sua vez, entregam os sistemas de anéis de fuselagem à EADS-DASA em Hamburgo, a qual se constitui como fornecedora de primeira linha. Este caso, tal como os da BOMBARDIER, BOEING ou FAIRCHILD-DORNIER, parece apontar para a existência de um factor de proximidade geográfica entre o fornecedor de segunda linha e os fornecedores de terceira e quarta linhas, fomentando o abastecimento local de componentes e serviços tecnológicos como maquinações, conformação de compósitos ou montagem de pequenos conjuntos. Os fornecedores deste tipo de serviços tecnológicos e de fornecimento de materiais constituem a base da pirâmide da cadeia de abastecimento aeronáutico. Os fornecedores prestadores de serviços, tais como, maquinações de precisão, electroerosão, tratamentos superficiais, etc., são PME, cujo negócio na indústria aeronáutica constituí, muitas vezes, apenas uma fatia reduzida do seu volume de vendas. Ao longo dos casos de estudo verificou-se que a organização da cadeia logística exposta apresenta algumas variantes, quer quanto ao número de níveis, quer quanto à especialização de cada um dos níveis. Assim, enquanto no caso do JSF são declarados pela LOCKHEEDMARTIN tão somente quatro níveis de abastecimento, no caso do AIRBUS A380, foi possível identificar um ramal da cadeia com cinco níveis, de acordo com a informação disponível. Por outro lado, quanto à especialização em cada nível verificamos que nalguns casos, como o do A321, num mesmo nível de abastecimento, existem módulos tão complexos como uma asa completamente equipada fornecida pela BAE SYSTEMS, em paralelo com peças como os mastros dos motores fornecidos pela MATRA. Este facto parece indicar que, apesar da tendência agregadora existente, e crescente ao longo do sentido ascendente da cadeia logística, a desagregação do avião em módulos completos está muito dependente do desenho de concepção do próprio avião e da organização do processo de montagem do mesmo. As Pequenas e Médias Empresas e a Cadeia de Abastecimento da Indústria Aeronáutica 4 Implicações da organização da cadeia de abastecimento 4.1 (Des)integração vertical Os resultados empíricos obtidos com os casos de estudo apontam para que os processos de produção da indústria aeronáutica se caracterizem por uma decrescente integração vertical. Contudo, o grau de integração vertical difere de empresa para empresa. Por exemplo, no caso de estudo da montagem do BOEING 737, verificou-se a existência de cerca de 30 linhas de sub-montagem alimentando uma linha principal de montagem final, todas elas propriedade da BOEING. Este facto reflecte que a BOEING chama a si grande parte da montagem do avião, inclusive de sub-montagens que poderiam ser efectuadas por outrem. Por seu turno, no caso do AIRBUS A321, verifica-se um nível superior de outsourcing, em que aquele tipo de sub-montagens foi transferido para fornecedores de primeira linha, ou até para fornecedores de segunda linha. Neste caso, estes integram as sub-montagens nos módulos consolidados pelos fornecedores de primeira linha. A este propósito, podem identificar-se três factores responsáveis pela diminuição da integração vertical de processos na indústria aeronáutica: 1 - As diversas tecnologias de vanguarda presentes no desenvolvimento e produção de um avião, tais como materiais, electrónica e sistemas aviónicos requerem a participação de companhias muito especializadas, que possuem competências por vezes únicas no mercado, como é o caso dos trens de aterragem invariavelmente fornecidos pela MESSIER-DOWTY ou pela GOODRICH. 2 - A reestruturação estratégica do sistema de produção e a busca na redução de custos e partilha de investimento conduzem à passagem de operações das grandes empresas para fornecedores (processos de outsourcing e parceria), como se constatou no caso EMBRAER ERJ170/190. 3 - Os acordos de contrapartidas, utilizados pelos governos de Países compradores de equipamento (militar) assentam no compromisso da participação da indústria desses Países, no processo de fabrico dos aviões, como forma de desenvolvimento daquela. Em tais acordos, os grandes construtores obrigam-se a ceder alguma quota de trabalho, tal como se pode constatar, de algum modo, no caso AIRBUS A400M. De facto, a tendência dos OEM se focalizarem nas montagens de um número mais reduzido de módulos e sistemas, traduz uma procura de vantagens tecnológicas em módulos específicos, mais eficiência operacional, menores custos de produção, procurando, igualmente, vantagens comerciais. 4.2 Abordagem em módulos e sistemas A abordagem produtiva em módulos e sistemas resulta da operacionalização da menor integração vertical. Como referido no caso de estudo da EMBRAER, esta empresa conseguiu uma evolução na organização dos seus processos de produção e logísticos, desde o ERJ120. Neste caso, no princípio dos anos oitenta, efectuava a montagem completa de todas as peças, enquanto para o mais recente ERJ170 já possuí cerca de 16 parceiros fornecedores que abastecem a EMBRAER com grande parte das montagens dos módulos requeridos para este avião. Em comparação com o sistema mais tradicional de aquisição de peças unitárias e sua montagem, a aquisição de módulos e sistemas garante a responsabilização do produto pelo fornecedor. A responsabilidade sobre um módulo completo recai no fornecedor do módulo, tal como o custo de identificação do responsável final pela falha ocorrida. A centralização da responsabilidade num fornecedor preferencial, que agora fornece um módulo completo já testado e inspeccionado, é uma das formas de diminuir este tipo de custos operacionais. A abordagem produtiva que privilegie a integração de módulos e de sistemas só é passível de ser adoptada quando existe um desenvolvimento inicial de produto que considera este factor. Caso contrário, torna-se bastante oneroso efectuar uma mudança, obrigando a alterar desenhos, moldes, sistemas produtivos, pontos de conexão especiais entre módulos, etc. As Pequenas e Médias Empresas e a Cadeia de Abastecimento da Indústria Aeronáutica 4.3 Redução na base de fornecedores A tendência para os produtores de estruturas aeronáuticas se tornarem integradores de sistemas, levou os fornecedores a abdicar de actividades secundárias e a adquirir outras competências mais centradas no seu negócio principal e nas suas competências críticas. A especialização é, assim, realizada ao nível do fornecimento de submontagens ou montagem de conjuntos completos, testados e com garantia. Esta tendência induz igualmente uma redução no número de fornecedores directos, como se pode detectar no modelo DO728 da FAIRCHILD-DORNIER, desenvolvido posteriormente ao DO328. A diferença do número de fornecedores directos é de 400, no DO328, para 40 fornecedores directos, no DO728, o modelo mais recente. A redução na base de fornecedores coloca um dilema estratégico na cadeia da indústria aeronáutica. Este dilema que se coloca aos fornecedores intermédios consiste na opção entre a especialização no produto e a especialização na tecnologia. Assim, quando a especialização é feita no produto, possibilita ao fornecedor subir a um nível hierárquico superior na cadeia de valor, no qual as margens são maiores e o contacto com o OEM é mais próximo. No entanto, verifica-se uma maior necessidade de investimento em desenvolvimento de novas soluções tecnológicas para o acompanhamento dos requisitos do OEM e dos seus clientes. Este processo requer um vasto leque de competências consolidadas e elevadas somas de capital, que permitam a participação no risco de desenvolvimento de novas aeronaves. Por outro lado, um reposicionamento através da especialização tecnológica obriga a um reposicionamento na cadeia hierárquica para um nível inferior, remetendo-se este tipo de fornecedores para a produção de peças com menor valor acrescentado e para um tipo de produção centrado nos factores de custo operacional. 4.4 Critérios de selecção de fornecedores Com a redução no número de fornecedores em primeira linha, verifica-se um relacionamento e interdependência aprofundado entre fornecedores e OEM, e entre os vários níveis de abastecimento. Na verdade, os principais fornecedores de conjuntos e componentes para aeronaves são escolhidos no momento da definição do desenho e permanecem parceiros enquanto aquele modelo de avião estiver no mercado, como sucede, por exemplo, com a GE que fornece o motor CF34 ao avião ERJ170 da EMBRAER. Esta sólida relação comercial mantém-se normalmente durante todo o ciclo de vida de cada produto, que pode durar entre 10 a 15 anos. Tal característica tem um impacto importante no cliente final, fazendo da qualidade da assistência técnica e dos serviços de apoio ao cliente e pós-venda, factores determinantes na aquisição de uma aeronave e cruciais para o OEM que a comercializa. Deste modo, a selecção de fornecedores por parte de um OEM torna-se extremamente importante. Decorrente dos casos de estudo, parece existir uma tendência para a criação de métodos de selecção de fornecedores que possibilitem uma aferição objectiva do desempenho e capacidade de cada empresa. Neste sentido, podem referir-se os exemplo dos sistemas da BOEING “preferred supplier certification” ou o caso da EMBRAER com o seu “EMBRAER supplier award”. Perspectiva-se que, a breve trecho, esta seja uma tendência a seguir por toda a indústria aeronáutica, contrariando a perspectiva anterior, na qual os acordos de longo prazo assentavam frequentemente em critérios subjectivos de selecção de fornecedores (Paliwoda, 1994). A partir dos casos de estudo e do contacto directo obtido através das entrevistas realizadas, parece ser plausível que a evolução da envolvente concorrencial conduza a um conjunto de factores críticos distintivos da competitividade entre fornecedores na indústria aeronáutica. Os factores diferenciadores mencionados na Tabela 2 são actualmente procurados a nível global pelos departamentos de compras dos grandes fornecedores. A perda do valor estratégico do sector aeronáutico, em termos de indústria de Defesa, traduziu-se na possibilidade de qualquer OEM poder adquirir peças ou sistemas em qualquer parte do globo, quer para a aviação As Pequenas e Médias Empresas e a Cadeia de Abastecimento da Indústria Aeronáutica militar, quer para a aviação civil. A abordagem global da função compras traduz-se na possibilidade de adquirir peças desenvolvidas por países com capacidade tecnológica específica, que até aqui não poderiam ser envolvidos no desenvolvimento e fabrico aeronáutico. Devido a este facto, a concorrência aumenta e os preços tendem a baixar com benefício para o preço final do avião. Tabela 2 – Principais factores de diferenciação de competitividade entre fornecedores Factores de custo capital curvas de aprendizagem curvas de lançamento economias de escala eficiência produtiva mão de obra Factores de não-custo capacidade de produção flexível competências principais entregas atempadas Fonte: FILIPE (2003) Contudo, esta flexibilização da função compras fica a dever-se em parte às novas tecnologias de informação e comunicação, como o desenho assistido por computador, principalmente quando a contratação envolve o desenvolvimento de produto por fornecedores situados a longa distância. Entre os exemplos mais recentes, podemos realçar o da KAWASAKI, no caso de estudo do ERJ170/190 ou o da MITSUBISHI, no caso de estudo do BOMBARDIER Continental, onde o primeiro fornece do Japão para o Brasil, enquanto o segundo fornece do Japão para o EUA. 4.5 Relacionamento entre os elos da cadeia logística A principal forma de relacionamento cliente (contratante) e fornecedor aeronáutico traduz-se na subcontratação directa de uma peça, sistema ou serviço, não existindo a participação do fornecedor no projecto do avião. Esta é uma forma de relacionamento mais utilizada nos níveis inferiores da cadeia logística, entre elos mais distantes do OEM. Porém, dadas as dificuldades de financiamento de novos projectos, surgiu a figura do parceiro de risco, através da qual o fornecedor se empenha no desenvolvimento do projecto de um sistema ou componente e no desenvolvimento do método produtivo associado. Neste caso, o fornecedor investe no desenvolvimento do sistema adjudicado, esperando ser remunerado no preço final da peça a cobrar ao OEM, de acordo com os volumes de vendas previstos. Uma das causas que pode ter provocado a queda da FAIRCHILD-DORNIER prende-se com a tardia adopção desta forma de partilha de risco e de investimento para o desenvolvimento, tal como se pode constatar no caso de estudo do DO328. Note-se que, no caso do avião seguinte da mesma empresa, o DO728, foi já considerado o desenvolvimento e produção em parceria com um número restrito de fornecedores, opção que se pode ter revelado demasiado tardia para garantir a viabilidade da empresa e do projecto. A relação mais estreita entre cliente e fornecedor traduz-se na figura do parceiro de risco e de lucro, também apelidado de parceiro de desenvolvimento, o qual envolve o financiamento de uma parte do projecto pelo fornecedor-parceiro. Este fornecedor assegura, assim, uma quota de trabalhos em cada avião produzido, bem como um maior controlo sobre as opções do projecto, desde a sua fase de desenvolvimento inicial. Tal é o exemplo da MITSUBISHI na parceria efectuada com a BOMBARDIER para o fabrico das asas para o caso de estudo BD100 Continental. Por seu turno, o cliente OEM garante um menor investimento de capitais próprios, assumindo um menor risco no desenvolvimento de uma nova aeronave. A situação de grande competitividade entre os fornecedores da indústria aeronáutica, principalmente nos segundo, terceiro e quarto níveis de acordo com o modelo da pirâmide da AECMA, revelou que a solução para muitas empresas poderá estar numa aposta na gestão eficaz da cadeia logística, como forma de obtenção de vantagens competitivas que não conseguem obter de forma isolada. As Pequenas e Médias Empresas e a Cadeia de Abastecimento da Indústria Aeronáutica No entanto, este tipo de colaboração integrada ao longo de toda uma cadeia logística estratificada e hierarquizada, exige fluxos de informação eficazes, um desenho para produção adequado, requer um melhoramento continuado ao longo da cadeia e acordos comerciais e éticos firmes entre os elos da cadeia. Confirmando esta tendência, o programa Supply Chain Relationships in Aerospace (SCRIA), coordenado pela SBAC, lança um conjunto de acções que procuram fomentar a colaboração e trabalho em equipa ao longo da cadeia logística, constituindo um passo fundamental para a integração da mesma. A iniciativa SCRIA vem demonstrar a importância do relacionamento entre fornecedores das cadeias logísticas, e do longo caminho que ainda está por percorrer até à existência de cadeias logísticas estrategicamente alinhadas e sincronizadas. 4.6 Proximidade geográfica Através das entrevistas efectuadas e da informação recolhida para os casos estudados, parece verificar-se a influência da proximidade geográfica na relacionamento entre os fornecedores. A primeira causa para este facto estará relacionada com a especificidade do tecido industrial localizado na órbita das grandes empresas aeronáuticas, e que historicamente se desenvolveu para servir estas empresas. Deste modo, a existência de grandes empresas, que funcionam como âncora dos grandes investimentos, parece induzir um efeito de desenvolvimento dirigido para responder às necessidades das empresas que lideram os consórcios geograficamente concentrados. Outra motivação resulta da complexidade dos processos de produção que exigem frequentemente trocas de informação e conjugação de esforços cruzados entre fornecedor e cliente OEM (ou integrador de sistemas), para os quais a proximidade geográfica se constitui como um factor facilitador. A maturidade da cadeia logística da indústria aeronáutica situa-se ao nível da existência de alguma integração externa, com reforço de processos comuns e partilha de informação entre os intervenientes na cadeia, sustentados em planos de acção coordenados entre fornecedores e clientes. De facto, e no exemplo das grandes aeronaves de longo curso da BOEING e AIRBUS, verifica-se que estas empresas desenvolvem o projecto e organizam a rede de colaborações, globalmente, com as empresas de primeiro e segundo níveis. As empresas de segundo nível organizam cadeias de abastecimento locais, principalmente na sua área de implementação, induzindo o desenvolvimento industrial e económico através da subcontratação de empresas locais, que constituem a sua cadeia de abastecimento. 4.7 Cruzamento com técnicas da indústria automóvel No decorrer da investigação realizada, e tomando como base o estudo IMVP5 realizado pelo MIT6 para o sector automóvel (Womack, 1994), constatou-se existirem pontos de contacto entre as indústrias automóvel e aeronáutica que não devem ser descurados, antes aprofundados, o que poderá traduzir-se numa mais valia das empresas que já actuam num dos sectores e que pretendam lançar-se (ou desenvolver-se) no outro sector industrial. De facto, existem metodologias que são já utilizadas por ambas as indústrias, como sejam o desenvolvimento colaborativo do produto, a adopção de plataformas comuns de produção, a convergência e integração tecnológica, a montagem e integração de módulos e sistemas, a utilização do Lean Manufacturing, os sistemas de fornecedor único, da gestão da produção ou da selecção de fornecedores. Apesar das diferenças de volume e escala, entre a indústria automóvel e a aeronáutica, a produtividade e eficiência alcançadas no fabrico de automóveis podem servir de modelo para a fabricação de aviões e seus componentes, através de algumas das melhores práticas utilizadas e anteriormente descritas. 5 6 International Motor Vehicle Program Massachussetts Institute of Technology As Pequenas e Médias Empresas e a Cadeia de Abastecimento da Indústria Aeronáutica 4.8 Algumas limitações do modelo O modelo de organização das cadeias logísticas, preconizado neste artigo, pode limitar o desenvolvimento eficiente de novos produtos. O modelo piramidal, cujas linhas de comunicação funcionam em cascata, não permite que toda a cadeia funcione de forma síncrona e contribua para o desenvolvimento de novos produtos. Para que tal aconteça, revela-se necessário o recurso a ferramentas electrónicas de informação e comunicação, que são, por vezes, de difícil implementação, nomeadamente, quando existem diferentes filosofias de produção ao longo da cadeia de abastecimento, ou quando as empresas interligadas têm importâncias e estratégias dispares. 5 A integração das PMEs A evolução, representada na figura 2, mostra que os grandes construtores OEM são cada vez mais os responsáveis pelas plataformas de integração, recorrendo a uma complexa cadeia de fornecedores de sistemas e subsistemas. Desta circunstância resulta o aparecimento de fornecedores integradores de sistemas e de maior valor acrescentado, que têm um impacto significativo em toda a estrutura do sector e que têm levado a novos níveis de eficiência e competitividade, de acordo com a SBAC7. Montagem de Plataformas Sistemas – Integração em larga escala Integradores de Sistemas Integradores de Sistemas OEM Módulos – Integração em pequena escala Peças e conjuntos de valor acrescentado Fabrico de peças e conjuntos por desenho Matérias-Primas Evolução Fonte: SBAC Figura 2 – Evolução da organização da cadeia logística na indústria aeronáutica Numa segunda fase, onde se encontram, actualmente, a maior parte dos OEM, estes colocamse na posição de montadores de plataformas e grandes integradores de sistemas, deixando a integração dos módulos e peças finais para os fornecedores de primeira linha, cada vez maiores e em menor número. Os fornecedores de serviços e fabricação por desenho, por seu turno, são cada vez menos, remetidos para a prestação de serviços com menor valor acrescentado. Simultaneamente, as suas margens encontram-se esmagadas face ao seu posicionamento no final da cadeia e devido ao fraco poder negocial em relação aos seus clientes (fornecedores de nível superior), que se revelam cada vez mais consolidados. Neste sentido, parece verificar-se uma tendência caracterizada pela última fase descrita na figura 2, e pelo modelo piramidal, em que os OEM adoptam uma filosofia de produção e organização de trabalho enquanto integradores de sistemas. Nesta perspectiva, os OEM efectuam, apenas, a produção nos casos em que os módulos são críticos ou onde a tecnologia 7 Society of the British Aerospace Companies. As Pequenas e Médias Empresas e a Cadeia de Abastecimento da Indústria Aeronáutica é confidencial e exclusiva, considerada como vantagem competitiva no mercado onde operam. Esta estratégia parece abrir uma janela de oportunidade para o desenvolvimento de fornecedores que apostem na inovação e no desenvolvimento de produtos / soluções, específicos e especializados, com vista a abastecer os grandes integradores. Esta questão assume uma relevância fundamental, dada a importância da indústria aeronáutica como instrumento de dinamização da inovação e do desenvolvimento industrial e económico das nações, atentos, entre outros, os seus efeitos de disseminação tecnológica para outras indústrias. De acordo com Rogowski (2001), os factores relevantes para os fornecedores da indústria aeronáutica são recursos financeiros, experiência em programas anteriores, colaboradores qualificados e licença para operar no sector. No entanto, estas barreiras à entrada de novos fornecedores podem ser mitigadas por empresas que apresentem inovação ao nível do processo produtivo, aproveitando a protecção da certificação do seu cliente. Existe assim a oportunidade para o estabelecimento de uma relação win-win, para ambos. Por um lado as PMEs necessitam da certificação do cliente (fornecedor de nível superior) para penetrarem nas cadeias de abastecimento da indústria aeronáutica; por outro lado, o fornecedor integrador necessita de fornecimentos especializados, coordenados, optimizados, flexíveis e de baixo custo, que lhe permitam obter vantagens competitivas no sector aeronáutico. O acesso ao mercado aeronáutico, além de um efeito de marketing no curto prazo, pode traduzir-se no estímulo para a investigação de novas soluções tecnológicas que possam ser transpostas e adaptadas ao sector económico de origem das PMEs, gerando o efeito de disseminação tecnológica característico da indústria aeronáutica. 5.1 O efeito cluster De acordo com Porter (1993), a competitividade de uma nação é proporcional à inovação que produz. Por outro lado, a experiência inovadora de cada nação está dependente de três grupos de factores, segundo Wharton (2001): • infra-estrutura de inovação comum; • sustentabilidade de condições para a existência de clusters; • força das ligações entre as indústrias interrelacionadas. De acordo Porter (1993), o efeito de clusterização é mais eficaz quando existe uma coexistência de indústrias relacionadas numa mesma área geográfica, por forma a existir um intercâmbio constante de conhecimento, informação e volume de negócio. Estes factores contribuem para a consolidação de uma massa crítica e vantagem competitiva que permite a penetração destas empresas nas cadeias globais de abastecimento, com efeitos directos no desenvolvimento económico nacional. Assim, diversos países possuem políticas públicas que fomentam o efeito de clusterização na indústria aeronáutica, na tentativa de maximização da disseminação tecnológica e criação de novos produtos com alto valor acrescentado para um desenvolvimento económico mais sustentado. De facto, existem estudos realizados que demonstram que é expectável um factor multiplicador elevado devido ao incentivo estatal concedido, como é o caso do apoio às instituições e infra-estruturas do cluster americano de Wichita onde foi conseguido um factor de 13:1, de acordo com KLRD (2001). Para além de todos os apoios governamentais é na iniciativa empresarial e nas relações e parcerias entre elas, que reside o sucesso da abordagem em cluster a este sector. De acordo com um estudo sobre clusters industriais a nível mundial, efectuado por Wharton (2001), os factores geográficos e relacionados com a localização são relevantes no arranque da formação de um cluster; factores económicos e verticais (como a existência de uma cadeia de abastecimento) consolidam o cluster; factores sociais e culturais (como a disponibilidade de mão-de-obra) aglutinam os factores que tornam um cluster operacional. As Pequenas e Médias Empresas e a Cadeia de Abastecimento da Indústria Aeronáutica Segundo a mesma fonte, um ambiente de políticas públicas favoráveis foi determinante para a formação de todos os casos de clusters no Reino Unido, através de empréstimos, cedência de terrenos, melhorias nas infra-estruturas e políticas de planeamento pró-activas. Por outro lado, nos Estados Unidos da América, na região do Minnesota, os clusters foram bem sucedidos por serem dirigidos para a indústria, e por terem tido uma forte liderança governamental e empresarial. O processo passa, em primeiro lugar, pela promoção da consciência das vantagens da actuação em cluster e pela dinamização do interesse no cluster, e em segundo lugar, por uma forte liderança para coordenação dos esforços governamentais, de formação e de investigação e para o desenvolvimento de um relacionamento forte e produtivo entre as referidas entidades e a indústria. Entre os clusters mais activos da indústria aeronáutica, destacam-se aqueles onde está baseada a maior parte da indústria relacionada com a maior empresa europeia, a AIRBUS: os espanhóis de Hegan (País Basco), Sevilha e Madrid, o francês de Toulouse, os alemães de Hamburgo e Munique, os ingleses de Filton e Broughton. Outros clusters a destacar relacionam-se com grandes construtores, como o de Wichita e Seattle (EUA), Montreal (Canadá) e São José dos Campos (Brasil). No entanto, em Portugal, como noutros países, as PMEs produzem essencialmente peças por desenho, “commodities” e peças onde a escala é importante porque o valor acrescentado é diminuto. Para completar este cenário, as PMEs não se têm colocado numa perspectiva de cadeia e de parceria, um dos factores essenciais para a existência de um cluster. A importância já referida da existência de clusters para a indústria aeronáutica requer assim acções que vão no sentido de dotar estas empresas do espírito de parceria e participação empreendedoras (e lucrativas), através da proposta de desafios e da oferta de préstimos no sector da formação e da investigação e desenvolvimento. Com tais incentivos, pretende-se alcançar uma nova forma estratégica de pensar a empresa, a sua envolvente no cluster local e a sua integração na cadeia de abastecimento. 6 Conclusões A organização das cadeias logísticas da indústria aeronáutica, apresenta uma evolução no sentido da estratificação de fornecedores em níveis bem definidos, liderados por um OEM integrador. Ao longo do estudo, verificou-se que o estado evolutivo de integração da cadeia logística difere de empresa para empresa, de acordo com a actualidade dos projectos dos aviões em causa. Efectivamente, os projectos mais recentes apontam para um desenvolvimento e integração com partilha de investimento e risco entre os líderes da cadeia e os fornecedores consolidados de primeira linha, e por vezes, até os de segunda linha. Neste sentido, os fornecedores consolidados de módulos e sistemas, numa primeira linha de abastecimento, demonstram uma necessidade crescente de abastecimentos de elevado valor acrescentado para poderem responder às necessidades do líder da cadeia. Este tipo de relacionamento com o OEM, líder da cadeia de abastecimento, revela algumas semelhanças com as cadeias de abastecimento da indústria automóvel. A informação recolhida nas entrevistas realizadas e na literatura permitiu demonstrar uma maior especialização tecnológica na base da cadeia de abastecimento, enquanto no topo da mesma se assiste a um maior enfoque na integração tecnológica. Este tipo de competências complementares ao longo da cadeia de abastecimento abre perspectivas de inserção de PMEs. No entanto, para concretizar esta oportunidade parece ser necessário a estes fornecedores um posicionamento traduzido na oferta de produtos integrados e com desenvolvimento próprio. A potencial oportunidade para as PMEs penetrarem nas cadeias de abastecimento da indústria aeronáutica mundial traduz-se, simultaneamente, na possibilidade de criação de produtos de maior valor acrescentado e desenvolvimento de novas tecnologias que permitam um crescimento económico sustentado. O relacionamento entre as PMEs e as cadeias de abastecimento da indústria aeronáutica poderá ser acelerado através da criação de condições que promovam o crescimento empresarial, a actualização tecnológica e a inovação. Uma destas condições passa pela As Pequenas e Médias Empresas e a Cadeia de Abastecimento da Indústria Aeronáutica localização geográfica comum entre as referidas entidades, consubstanciada num pólo aeronáutico assente no tripé I&D, formação e indústria, tal como o caso de sucesso do Brasil (Silva, 1998). Ao longo do presente documento, ficou, ainda, patente a importância económica da indústria aeronáutica, quer pelos seus efeitos directos, quer pela disseminação de tecnologias para outros sectores industriais. Deste modo, a investigação realizada aflora, apenas, algumas questões relacionadas com a indústria aeronáutica, que merecem ser aprofundadas, no sentido de proporcionar uma base de trabalho à estruturação e impulso para o desenvolvimento das PMEs. Dada a quase inexistência de um tecido industrial aeronáutico em Portugal, os dados recolhidos para a presente tese foram conseguidos através das entrevistas realizadas, do contacto directo com empresas estrangeiras e de documentação publicada. Na verdade, não foram criadas as condições que permitissem a quantificação necessária a uma análise econométrica em que, por exemplo, se comprovasse o sucesso da implementação de técnicas lean com a correlação entre o nível de outsourcing e o volume de vendas. A aproximação a uma forma de agrupamento empresarial que possa funcionar relacionado entre si e para o exterior, como cluster, poderá acelerar o desenvolvimento e afirmação deste sector no mercado internacional e nos consórcios de desenvolvimento. Assim, será profícuo um aprofundamento do estudo do relacionamento ao longo das cadeias de abastecimento na indústria aeronáutica, como contributo para a organização empresarial das PMEs. Pretende-se pois, que este trabalho possa servir como um ponto de partida para futuras investigações e acções que promovam as PMEs no sector aeronáutico internacional, para que o desenvolvimento inerente e associado possam permitir a melhoria da competitividade das mesmas e dos seus Países. Referências AECMA (2002). AECMA Position Papers. www.aecma.org. FILIPE, Pedro C. (2003). Definição de um modelo de cadeia logística na indústria aeronáutica: o caso português. Tese de Mestrado em Logística. 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