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MADE IN CHINA Oportunidades e ameaças colocadas pela ascensão global da China para os trabalhadores latinoamericanos Realização Apoio MADE IN CHINA Oportunidades e ameaças colocadas pela ascensão global da China para os trabalhadores latinoamericanos Informe preliminar As Relações Geopolíticas e Econômicas entre o Brasil e a China de 1998 a 2008 Responsável pelo estudo Alexandre de Freitas Barbosa Data Outubro de 2009 Apoio Realização . As Relações Geopolíticas e Econômicas entre Brasil e China de 1998 a 2008 A primeira parte deste texto trata das relações geopolíticas entre Brasil e China desde os anos noventa até a recente visita do Presidente Lula ao país asiático, realizada em maio de 2009 - quando estas, além de se incrementarem de forma significativa no plano bilateral, extravasaram para a esfera multilateral. São também discutidas as percepções distintas de cada país acerca da parceria, considerada por ambos como estratégica. Em segundo lugar, o texto realiza um levantamento pormenorizado das relações comerciais entre os dois países e dos investimentos chineses no Brasil, apontando para as mudanças ocorridas no período recente. Analisa-se o perfil setorial destes fluxos econômicos, as estratégias empresariais utilizadas pelas empresas brasileiras face à concorrência chinesa, para depois se apontar algumas hipóteses sobre os possíveis cenários futuros em termos dos impactos da ascensão chinesa sobre o nível de emprego e as relações de trabalho no Brasil. A terceira parte foca nas migrações chinesas para o Brasil, as quais se caracterizam por fluxos populacionais reduzidos e bastante concentrados em algumas regiões do país. Ainda assim, percebe-se que a emigração chinesa para o país tem se elevado nos anos 2000, especialmente no que se refere aos migrantes ilegais. Na quarta parte, são finalmente discutidos os desafios colocados pela ascensão chinesa para o país e para o movimento sindical brasileiro. Parte-se do pressuposto de que inserção chinesa na economia global acarreta transformações estruturais de vulto que exigem uma redefinição da estratégia de desenvolvimento do país, para a qual o movimento sindical pode jogar um papel importante. MADE IN CHINA: Oportunidades e ameaças colocadas pela ascensão global da China para os trabalhadores latinoamericanos 3 . 1. As Relações Geopolíticas entre o Brasil e a China O Brasil reatou relações diplomáticas com a China, em agosto de 1974, 30 meses depois da visita oficial do presidente norte-americano Richard Nixon a Pequim. O Brasil atrasara-se em relação a outros países da região como Peru, México e Argentina (Conelly & Cornejo, 1992), o que se deveu, em grande medida, à resistência dos militares da chamada “linha dura”, que possuíam bastante influência no governo brasileiro até este momento. O novo governo Geisel conseguiu reverter o anacronismo brasileiro, seis meses após a sua posse, graças à pressão do chanceler Azeredo da Silveira (Gaspari, 2004). Antes disso, o Brasil organizara missões comerciais à China, especialmente durante a primeira metade dos anos sessenta nos governos Jânio Quadros/João Goulart. Entretanto, até os anos sessenta, as relações políticas entre o governo chinês e as forças de esquerda pró-China – no caso, o Partido Comunista do Brasil (PC do B), criado em 1962 - predominaram frente às questões de ordem econômica. O reatamento das relações diplomáticas encontrou os dois países desejosos de criar uma “nova ordem internacional”, segundo o jargão da época. Porém, se, por um lado, havia uma motivação política para a aproximação entre os dois países, nas décadas de setenta e oitenta, a parceria bilateral não encontrava respaldo nas relações econômicas. O fluxo comercial entre os dois países era baixo e não se falava em investimentos chineses no exterior e tampouco do potencial deste país para se transformar em motor de crescimento da economia mundial. As relações entre os dois países eram fundamentalmente conduzidas pelas esferas governamentais, mais especificamente pelos respectivos ministérios das relações exteriores. Para além de fóruns multilaterais como a UNCTAD e a Assembléia Geral da ONU, bilateralmente houve também entendimentos entre Brasil e China, sobretudo na área de cooperação em ciência e tecnologia. Um dos principais símbolos de parceria entre países do Sul é justamente o programa de satélites ChinaBrazil Earth Resources Sattelite (CBERS), aprovado durante o governo José Sarney em 1988. Desde então foram lançados três satélites como parte desta pareceria. O patamar das relações Brasil-China começou a mudar nos anos noventa com a intensificação das trocas comerciais entre os dois países. Entretanto, o pleito por uma nova ordem internacional onde os países do Sul tivessem mais relevância foi enfraquecido pela derrocada da União Soviética e pelo avanço da globalização econômica. Adicionalmente, neste período, verificou-se tanto a reorientação da política externa brasileira, que priorizaria a adesão aos regimes internacionais, como o crescente reconhecimento internacional da China. Um cenário novamente propício para a relação bilateral adviria apenas ao final dos anos noventa, quando a demanda chinesa por energia e alimentos, num contexto de forte expansão da potência asiática, atingiria “níveis geopolíticos” (Lanxin, 2008). Isto contribuiu para que o Brasil superasse a crise de balanços de pagamentos sofrida no rastro das políticas implantadas sob os moldes do Consenso de Washington. A China percebera a nova potencialidade do intercâmbio comercial antes que o Brasil e os demais países da América Latina, tendo acompanhado com preocupação as negociações da ALCA durante o final dos anos noventa (Cornejo, 2005). De fato, já em 1993, portanto muito antes de o Brasil “apostar” retórica e estrategicamente na cooperação Sul-Sul, a China elegera o Brasil o seu principal parceiro estratégico na região (Hirst, 2008). Para o Brasil, a China tornaria-se formalmente “estratégica”, apenas em 2003, ao início do governo Lula, quando já se materializara o boom das commodities, sob forte influência da demanda chinesa. Ao contrário do parceiro asiático, durante o governo Lula, a posição brasileira oscilaria entre o otimismo exagerado e um ceticismo de curto prazo, até que uma posição mais pragmática fosse esboçada ao final de 2008 (Barbosa & Mendes, 2008), antes da segunda visita oficial do Lula à região (maio de 2009). Entretanto, não se pode dizer que o governo brasileiro saiba exatamente o que quer ou o que pode querer da “parceria estratégica” com a China. MADE IN CHINA: Oportunidades e ameaças colocadas pela ascensão global da China para os trabalhadores latinoamericanos 5 Realização Apoio 1.1 Situação Atual Uma breve listagem do número de acordos de cooperação assinados entre ambos os países durante os governos FHC, em oito anos, e Lula, em seis anos – 17 contra 22 acordos – serve como primeira indicação das suas prioridades de política externa (quadro 1 em anexo). No ano de 2009, seriam ainda assinados mais 13 acordos de cooperação no âmbito da visita oficial do presidente Lula àquele país. Durante o governo Lula, de forma inédita, foram realizadas três visitas presidenciais do lado brasileiro (incluindo a ida às Olimpíadas) e uma do lado chinês, ao que se deve acrescentar 25 missões oficiais de representantes do primeiro escalão do governo brasileiro, contra 27 do governo chinês, conforme o quadro 2 em anexo. Há que se enfatizar, contudo, que as relações Brasil-China, especialmente no governo Lula quando alcançaram um novo patamar, não evoluíram de maneira linear. Antes pelo contrário, já que as relações econômicas interferiram nas relações geopolíticas. Adicionalmente, os contatos entre os dois países não se circunscreveram à esfera bilateral, já que estes se encontraram na esfera multilateral – Nações Unidas, G-8, G-20 financeiro, FMI, OMC - nem sempre mantendo relações convergentes. No auge do movimento brasileiro para mudar o patamar das relações diplomáticas com a China, chama a atenção a posição adotada pelo país em fóruns multilaterais como a Comissão de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas. Em 2004, o Brasil votou a favor de uma non-action motion que retirou da votação a resolução sobre a China. Outro movimento na mesma direção foi o anúncio do reconhecimento da China como economia de mercado pela diplomacia brasileira durante a visita de Hu Jintao ao Brasil em novembro de 2004, até hoje ainda não ratificado. Além da motivação política, a agenda de Lula para a China foi impulsionada por atores domésticos, mais especificamente empresas com interesses comerciais naquele mercado, sobretudo de setores exportadores de produtos básicos como carne, óleo vegetal, alimentos, madeira, café e celulose, além de bancos que operam no comércio internacional, empresas de transportes e tradings. Esse grupo de empresas exerceu um papel de liderança na criação do Conselho Empresarial Brasil-China. Entretanto, já a partir de 2005, outro grupo de empresários, sobretudo representantes de setores afetados pelo aumento das importações chinesas no mercado nacional, se organizou com o intuito de criar salvaguardas contra as importações chinesas de produtos têxteis. Esse grupo foi liderado pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). Além da questão das salvaguardas, o reconhecimento da China como economia de mercado também polarizou os dois grupos de empresários, já que - caso este fosse ratificado - se tornariam mais rígidos os critérios para investigações de dumping relacionadas às importações chinesas. A inclinação do governo brasileiro acabou pendendo para o lado do grupo dos empresários que adotavam posições protecionistas em relação à China. Como prova dessa nova atitude, cumpre destacar o distanciamento do Brasil em relação à China no que se refere aos entendimentos bilaterais e ao posicionamento do país nos fóruns multilaterais – com destaque para a participação como terceira parte no painel aberto pelos EUA contra direitos de propriedade intelectual. Também a elevação da Tarifa Externa Comum do Mercosul para produtos de calçados e vestuário provenientes da China, assim como a aplicação de diretos provisórios de anti-dumping sobre alguns produtos chineses, são evidências do novo posicionamento brasileiro, em alguma medida, influenciado pelo fato de os chineses terem se manifestado contrários à expansão do Conselho de Segurança da ONU. A percepção do governo brasileiro parece ser a seguinte. Se, por um lado, a aliança bilateral com os chineses pode gerar frutos nas áreas de ciência e tecnologia e meio ambiente e ampliar investimentos em infra-estrutura e exportações de commodities; é cada vez maior a presença de produtos chineses nos mercados latino-americanos. E, na medida em que as empresas brasileiras expandem suas operações para além das fronteiras, a concorrência com empresas chinesas também 6 se mostra preponderante. Além desses problemas específicos, é fato que a nova posição internacional chinesa traz outras prioridades em sua política externa, sobretudo na relação com Estados Unidos, Europa e seus vizinhos asiáticos, deixando em segundo plano o Brasil e demais países em desenvolvimento. Nestes países, mantém-se a retórica da parceria, mas a prioridade concentra-se nas relações econômicas, ainda que o governo chinês procure obter paralelamente dividendos políticos. Diante desse novo cenário, a relação bilateral Brasil-China tem passado por uma fase de amadurecimento. O objetivo da diplomacia brasileira é endurecer na defesa dos interesses nacionais, mas sem comprometer a parceria estratégica, a qual também deve ser atualizada frente ao crescente papel que a China joga na cena internacional. Em outras palavras, é importante, para o Brasil, que as relações bilaterais sejam negociadas em sintonia com a agenda comum multilateral (Hirst, 2008). Enfim, maior pragmatismo no sentido de isolar questões comerciais de questões políticas, como se percebe no reposicionamento do Brasil na Rodada Doha e na busca pela diversificação da pauta comercial com os chineses. E parceria estratégica no plano multilateral na medida em que o Brasil também aumenta sua presença internacional, enfrentando contenciosos, sobretudo na relação com países desenvolvidos, tal como no caso do etanol, para o que se busca o apoio da China. Outro indicativo deste redirecionamento da postura brasileira é a criação do Grupo de Trabalho Agenda China em dezembro de 2007. Tal grupo envolve representantes de diversos ministérios do Brasil – Relações Exteriores (MRE), Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC) e Agricultura, Pesca e Abastecimento (MAPA), além de empresários representados pelo Conselho Empresarial Brasil China. Concomitante a esse movimento foi indicado, ao final de 2008, um embaixador de alta patente para Pequim, Clodoaldo Hugueney, que antes comandava as negociações do Brasil nos fóruns de Genebra. A pauta na agenda da viagem do presidente Lula a Pequim para a abertura dos Jogos Olímpicos em agosto de 2008 reflete essa nova busca de equilíbrio. Entre as questões abordadas com Hu Jintao incluem-se: a preocupação com o colapso das negociações da Rodada Doha (na qual Brasil e China adotaram posições divergentes); o crescente déficit na balança comercial e o objetivo brasileiro em diversificar o perfil da pauta de exportação para a China; o interesse brasileiro em acolher investimentos chineses (principalmente nas áreas de energia, logística e mineração); e a necessidade de acertar com os chineses uma posição comum em questões relacionadas ao meioambiente e à promoção de biocombustíveis. Em maio de 2009, Brasil e China aproveitaram a oportunidade de fortalecer a relação bilateral quando da visita do Presidente Lula ao território chinês. Lula e Hu Jintao discutiram o Plano de Ação Conjunta 2010-2014 e assinaram 13 acordos de cooperação que englobam os setores de petróleo, máquinas, financeiro, tecnologia espacial, serviços portuários, produtos agropecuários, projetos de financiamento, entre outros, totalizando US$ 15 bilhões. 1 Entre os contratos de maior destaque estão o empréstimo de US$ 10 bilhões para a Petrobras 2, de US$ 800 milhões para o BNDES, de US$ 100 milhões para o Itaú BBA, além de investimento de US$ 4 bilhões de uma companhia chinesa no segmento de mineração. Um dos temas de discussão é a abertura do mercado chinês para a carne brasileira, envolvendo “Brazil's President in China for talks cementing partnership, securing 13 deals” – Reportagem do periódico China View, 19/05/2009, disponível em http://news.xinhuanet.com/english/2009-05/19/content_11402710.htm 1 “China vai emprestar US$ 10 bilhões à Petrobras” – Reportagem do portal de notícias G1, 19/05/2009, disponível em http://g1.globo.com/Noticias/Economia_Negocios/0,,MUL1159285-9356,00CHINA+VAI+EMPRESTAR+US+BILHOES+A+PETROBRAS.html 2 MADE IN CHINA: Oportunidades e ameaças colocadas pela ascensão global da China para os trabalhadores latinoamericanos 7 Realização Apoio um acordo para a eliminação de barreiras à venda de carne de aves, embora ainda tenha persistido um impasse com relação ao comércio de bovinos e suínos. A abertura do mercado chinês para a venda de carnes é de grande interesse do Brasil, visto que os chineses consomem cerca de 40% da produção mundial do produto. Paralelamente, manteve-se o bloqueio de um contrato de venda de 45 jatos da Embraer, com declarações vagas por parte dos representantes chineses de que os assuntos serão “analisados”. Ainda durante a visita, o governo chinês demonstrou colaborar para que suas empresas sejam levadas a investir no Brasil, caso o governo brasileiro autorize a entrada de empregados chineses para trabalhar no país. A China também manifestou disposição em negociar um acordo comercial com o Mercosul. Com relação aos investimentos oficializados, está a aprovação de um financiamento de US$ 10 bilhões do China Development Bank à Petrobras, para a exploração do petróleo pré-sal, tendo como contrapartida a venda de até 200 mil barris de petróleo por dia à estatal chinesa Sinopec. A maior montadora chinesa, Chery, confirmou que pretende instalar uma fábrica no Brasil para a produção de até 150 mil veículos por ano. A montadora estaria estudando possíveis locais para a instalação da fábrica. A empresa chinesa Wuhan confirmou a intenção de investir US$ 4 bilhões na construção de uma usina siderúrgica integrada de 5 milhões de toneladas no porto de Açu, no Rio de Janeiro, em parceria com as empresas brasileiras LLX Logística S.A. e a MMX Mineração e Metálicos S.A.3 Pelo menos mais dois negócios deverão ser anunciados: investimentos da companhia de tecnologia Huawei no Brasil e uma parceria entre a brasileira C. R. Motors e a chinesa Zongshen para a produção de motocicletas na Zona Franca de Manaus. No campo da cooperação científica, foi oficializada a parceria entre a Universidade Federal do Rio de Janeiro e a Universidade Tsinghua para a pesquisa em projetos com o objetivo de reduzir a emissão de gases do efeito estufa e identificar fontes alternativas ao biodiesel. O governo brasileiro irá investir nos próximos dois anos aproximadamente US$ 2 milhões para financiar o Centro BrasilChina de Tecnologias Inovadoras, Mudanças Climáticas e Energia, criado durante a visita. Além disso, foi acertada a instalação, em 2010, inicialmente em Pequim, de Laboratório no Exterior (LABEX), da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), em parceria com a Academia de Ciências Agrárias da China (CAAS), e assinado o Plano de Trabalho em Ciência, Tecnologia e Inovação, para os próximos cinco anos, nas seguintes áreas de interesse prioritário: ciências agrárias, agroenergia, energias renováveis, biotecnologia e nanotecnologia. Durante este encontro, também ficou patente a maleabilidade chinesa, que desenvolve as suas relações bilaterais de acordo com os seus interesses, mas levando em consideração os anseios dos seus parceiros. No caso brasileiro, por exemplo, que almeja a posição de potência regional, e questiona a assinatura de acordos de livre-comércio e de tratados bilaterais de investimentos, foi negociado um Plano de Ação Conjunta, com horizonte de 5 anos. Este será detalhado a partir de um segundo “diálogo estratégico” a se realizar no segundo semestre de 2009. Paralelamente, vale ressaltar que os dois países vêm assumindo posições semelhantes no âmbito do G-20 financeiro e que se reuniram, em junho de 2009, durante a primeira cúpula dos BRICs, indicando a existência de interesses potencialmente comuns também na esfera multilateral. O encontro de Lula e Hu Jintao, em maio, também permitiu com que fossem mapeados os principais interesses de lado a lado. No caso chinês, os empréstimos parecem estar vinculados ao setor de minérios e energia. Os investimentos dirigem-se para a área de mineração, podendo vir também “LLX, MMX e Wuhan Steel fecham parceria comercial” – Reportagem da Revista Época Negócios. 19/05/2009, disponível em http://epocanegocios.globo.com/Revista/Common/0,,EMI73479-16355,00LLX+MMX+E+WUHAN+STEEL+FECHAM+PARCERIA+COMERCIAL.html 3 8 para segmentos em que as exportações chinesas ainda não adentraram o mercado brasileiro, como no caso do setor automotivo. O governo chinês ressente-se da limitação à emigração chinesa vinculada a projetos de investimento no país e da escalada e medidas anti-dumping. O Brasil, por sua vez, procura abrir o mercado de carnes e atrair investimentos chineses nas áreas de infra-estrutura, energia e setores industriais de ponta, insistindo na retórica da diversificação das exportações. Paralelamente, acordos na área de ciência e tecnologia são estimulados por ambas as partes. A título de síntese, pode-se dizer que, entre 2003 e 2009, a relação bilateral foi marcada por idas e vindas, que refletiram a indefinição da posição brasileira, que depois se transformaria em crescente acomodação do governo brasileiro ao padrão de relações econômicas vigente. O Brasil passaria, então, a exigir vantagens no varejo, enquanto a China aceitaria manter uma relação diferenciada com o maior país da região. Ou seja, num primeiro momento, os resultados econômicos positivos estimularam o governo Lula a “apostar na China”, acreditando que os ganhos econômicos para o Brasil seriam irrestritos, e que se poderiam conceder vantagens econômicas à China em troca de uma maior projeção da política externa brasileira no cenário internacional, a qual contaria com o suposto apoio chinês. O Brasil passou a valorizar a relação com a China, mas sem perceber a sua transformação em potência econômica internacional e sem atentar para o pragmatismo das suas relações geopolíticas. A partir de 2004, os ganhos econômicos foram cada vez mais atenuados, em virtude da configuração de um novo padrão de comércio, gerando conflitos internos com parte do empresariado nacional, além de não terem sido obtidos os dividendos políticos, à medida se evidenciava que a agenda multilateral dos dois países não se afigurava plenamente coincidente. Isto fez com que a postura brasileira em relação à China fosse revista no plano multilateral, ao mesmo tempo em que se passou a cobrar desta potência um novo padrão de relacionamento bilateral, exigindo uma distribuição menos desigual dos benefícios do crescente intercâmbio econômico. Esta revisão não é definitiva, até porque as relações geopolíticas acompanham, de perto, as relações econômicas entre os dois países, assim como as posições de ambos no cenário global. Neste sentido, pode-se lançar a hipótese de que a transição para uma relação mais amadurecida e de longo prazo entre as duas nações depende, do lado brasileiro, de uma maior sintonia entre política econômica e política externa; e, do lado chinês, da conciliação entre a retórica Sul-Sul da sua diplomacia e o seu crescente estatuto de potência econômica global. 1.2 O Lugar do Brasil na Política Externa Chinesa Pragmatismo é a melhor palavra para definir a política externa chinesa a partir dos anos setenta. Este enfoque evolui à medida que a China passou a ganhar destaque no cenário internacional, mas sempre mantendo as premissas enunciadas por Deng Xiaoping ao final dos anos oitenta – “nunca assumir liderança, agir sempre, de cabeça erguida, mas de forma cautelosa” (Shixue, 2008). Segundo a “teoria dos três mundos”, formulada nos anos setenta, a China fazia parte do Terceiro Mundo, o que tornava essencial a ativação de relações bilaterais para além da dicotomia da Guerra Fria, assim como uma atuação conjunta nos organismos multilaterais. O objetivo era a busca de maior legitimidade internacional. Com o esfacelamento da União Soviética, passou-se a priorizar a criação de uma ordem multipolar. Aumenta, assim, a parcela de responsabilidade da China na própria condução da internacional. Na altura da virada do milênio, este país inaugura um “vocabulário diferente nas suas relações com o mundo”, deixando para trás a política anterior basicamente reativa (Lampton, 2008). Apenas se entende a atual política externa chinesa quando se leva em consideração que este movimento acima descrito é uma decorrência da sua preocupação central com os Estados Unidos MADE IN CHINA: Oportunidades e ameaças colocadas pela ascensão global da China para os trabalhadores latinoamericanos 9 Realização Apoio em escala global. Ou seja, desde os anos setenta, a China abandonou a sua política de “inclinação para um só lado”, informada pelos atritos com a União Soviética ao longo dos anos sessenta. Por outro lado, se a China passou a depender dos Estados Unidos crescentemente em termos econômicos e tecnológicos, o governo assumiu como estratégica a manutenção da sua independência a partir de um arco de alianças amplo, no sentido de resguardar a sua soberania e o seu poderio econômico (Anguiano, 2001). Esta relação complexa com os Estados Unidos se reflete no avanço chinês em relação à América Latina e a outras regiões do Sul do planeta. A elite política chinesa reconhece a América Latina com área de influência dos Estados Unidos, fazendo questão de diferenciar o econômico do geopolítico (Cornejo, 2005). Procura, desta forma, estabelecer relações com os países da região de acordo com as suas potencialidades econômicas. Porém, o elemento geopolítico não é jamais descartado, ainda que não apareça com destaque na agenda bilateral. Esta posição pode ser sintetizada da seguinte forma: “ao fazer amigos na várias partes do mundo, a China capitaliza a inimizade com relação aos Estados Unidos” (Lampton, 2008). Neste sentido, o Brasil ocupa o papel de parceiro estratégico na América Latina, em virtude do tamanho do seu mercado e do seu potencial como fornecedor de matérias-primas. E na medida em que o Brasil “compra” o discurso de uma nova ordem multipolar, o aspecto geopolítico vem à tona, mas apenas neste plano, pois é a relação bilateral com os Estados Unidos, especialmente em termos econômicos, que conta para a manutenção ou redefinição da estratégia de desenvolvimento da potência asiática. 1.3 O Lugar da China na Política Externa Brasileira A política externa brasileira das últimas três décadas sofre duas mudanças importantes. Passa-se do pragmatismo da ditadura militar, que havia rompido com o paradigma americanista, para a ilusão da “participação pela integração” dos anos noventa; e desta para a recente diplomacia SulSul, onde um novo pragmatismo nas relações com as grandes potências se mistura ao discurso em defesa do combate à pobreza mundial e de uma “nova geografia do comércio”. O fato de a República Popular da China ser um membro permanente do Conselho de Segurança da ONU reforçou o interesse recente do Brasil pela “parceria chinesa” num momento em que o pleito por um assento permanente nesse órgão voltava a fazer parte da estratégia internacional do país. Contudo, o multilateralismo mais realista do governo Lula (Cervo, 2008) encontra suas fragilidades nas coordenadas da inserção externa brasileira – a volatilidade cambial é a sua expressão mais evidente - e na própria dificuldade de fazer avançar a agenda regional. Estes dilemas fazem com que o Brasil se apresente lá fora como “nova potência”, ao mesmo tempo em que revela um padrão de inserção externa instável, correndo inclusive o risco de perder espaço no mercado regional para produtos de novos competidores externos, com destaque justamente para a China. De maneira semelhante, a China apareceu na política externa brasileira, de um lado, como comprador de commodities; e, de outro, como “parceiro” no intento de criação de uma nova ordem multipolar. Existe, portanto, uma incoerência entre estas duas visões sobre o papel da China para o país. Esta incoerência revela dois dilemas fundamentais. De um lado, a inserção externa ancorada apenas nos produtos de baixo valor agregado pode levar a em empobrecimento da estrutura produtiva brasileira, e a China contribui para agravar esta tendência. Por outro lado, se a China faz uso do discurso da nova ordem multipolar, ela depende bem menos, se comparada ao Brasil, de uma mudança na estrutura de poder global, em virtude do seu dinamismo econômico interno e da sua crescente competitividade externa. Ou seja, a relação bilateral do Brasil com a China corre o risco de enfraquecer 10 a posição do Brasil como país que pode jogar um crescente peso na ordem multipolar. Neste sentido, o lugar da China da política externa brasileira está sujeito a embates internos e a uma intensa discussão sobre a estratégia de desenvolvimento do país, resvalando para outros temas mais relacionados à política econômica, industrial e tecnológica e ao próprio projeto de integração regional. A dependência brasileira com relação à China – muito maior quando comparada à mínima “dependência” deste país em relação ao Brasil - assim como a maior vulnerabilidade da economia brasileira aos humores da economia internacional, tornam a relação bilateral desbalanceada para o lado brasileiro. Uma tomada de posição voltada à defesa dos interesses de alguns setores concretos mostra-se difícil no caso brasileiro, até porque a presença chinesa tende a afetar um conjunto cada vez maior de atividades econômicas no território nacional. Como resultado, o tratamento da relação bilateral passa a exigir o ataque a uma ampla frente de desequilíbrios estruturais. Em síntese, o lugar da China na política externa brasileira é ambíguo. O país é encarado, de um lado, como demanda externa para commodities e origem de investimentos externos – numa relação que espelha o padrão Norte-Sul; e, de outro, como “parceiro” na revisão da estrutura de poder das organizações multilaterais e no desenvolvimento de novas tecnologias. Trata-se de um equilíbrio difícil. Esta natureza ambígua das relações com a China é o que diferencia o Brasil dos demais países latino-americanos. MADE IN CHINA: Oportunidades e ameaças colocadas pela ascensão global da China para os trabalhadores latinoamericanos 11 Realização Apoio 2. Evolução das Relações Econômicas entre Brasil e China Este tópico procura traçar um panorama da evolução das relações comerciais entre o Brasil e a China, a partir de uma desagregação setorial dos dados, para depois situar o papel da China no comércio brasileiro em contraponto com as demais nações e regiões do mundo. Em terceiro lugar, lança-se um olhar sobre o perfil dos investimentos chineses no Brasil. Este tópico traz ainda uma tipologia sobre as estratégias empresariais utilizadas pelas empresas brasileiras face à crescente concorrência chinesa, além de tecer considerações sobre os possíveis cenários advindos desta relação em termos de nível de emprego e de relações de trabalho. 2.1 Relações Comerciais entre o Brasil e a China No período coberto pelo gráfico abaixo, a corrente de comércio (exportações + importações) entre Brasil e China ampliou-se em quase 20 vezes, atingindo um montante de US$ 36,4 bilhões em 2008. Durante o mesmo período, a corrente de comércio do Brasil com o mundo mostrou-se bastante dinâmica, mas ainda assim crescendo a um ritmo bastante inferior, de 240%. Dois períodos podem ser separados para fins de análise, já que nos permitem acompanhar tendências diversas nos fluxos bilaterais. Entre 1998 e 2003, as exportações brasileiras para China crescem bem à frente das importações daquele país, 500% contra 260%, respectivamente, em termos acumulados. Ao final deste período, o Brasil apresentaria um saldo comercial com a potência asiática de US$ 2,4 bilhões, que representava cerca de 10% do superávit global brasileiro. Gráfico 1 – Exportações, Importações e Saldo Comercial do Brasil com a China (em US$ bilhões) 20,00 3,00 2,00 16,00 1,00 14,00 12,00 0,00 10,00 -1,00 8,00 6,00 -2,00 saldo em US$ bilhões export/import (em US$ bilhões) 18,00 4,00 -3,00 2,00 0,00 -4,00 1998 1999 2000 2001 2002 exportações 2003 2004 importações 2005 2006 2007 2008 saldo Fonte: Secex/Mdic. No período 2004-2008, a situação se inverte. Agora, as importações brasileiras da China crescem 833% para o período, contra um avanço mais lento das exportações para aquele país, de 262%. Em 2008, o Brasil apresentaria um déficit comercial com a China de US$ 3,6 bilhões. 12 Gráfico 2 – Taxa de Expansão das Exportações e Importações do Brasil com a China por Sub-Períodos (em %) 900,0 800,0 700,0 600,0 500,0 400,0 300,0 200,0 100,0 0,0 1998-2003 2004-2008 exportações importações Fonte: Secex/Mdic. Como explicar esta mudança de sinal nas relações comerciais entre os dois países? Uma conjunção de fatores parece ser a justificativa mais plausível. Desde a mudança no cenário da economia internacional – que envolve uma queda e logo depois uma nova ascensão -, assim como os cenários macroeconômicos internos vivenciados por ambas as economias. Do lado chinês, o período de 1998-2002, é aquele em que o país aciona um conjunto de políticas voltadas a manter o dinamismo interno e elevar a sua competitividade internacional, sem desvalorizar a sua moeda, na seqüência da crise asiática. Já o Brasil é forçado a desvalorizar a sua moeda, enfrentando neste processo uma semi-estagnação econômica, apenas interrompida no ano de 2000. No período pós-2003, a economia internacional ingressa em novo ritmo, para o que a China contribui de forma estratégica, já que tanto suas exportações como as importações se elevam de forma impressionante. A China joga um papel decisivo ao cobrir o déficit em transações correntes dos Estados Unidos e ao puxar para cima os preços das commodities. Não seria, pois, um exagero dizer que a melhoria das contas externas do Brasil – durante o período 1998-2003 – conta com a influência chinesa. O melhor desempenho externo permite com que o Brasil inicie uma trajetória de queda dos juros, já em 2004, mantendo a inflação razoavelmente sob controle. Este conjunto de fatores irá rebater sobre dinamismo do mercado interno. A título de ilustração, o PIB brasileiro entre 2004 e 2008 cresce a uma taxa média de 4,5% ao ano, o que não se vira no país nos 25 anos anteriores. Este momento em que a demanda interna brasileira cresce, demonstrando o setor industrial uma forte recuperação, coincide com a colheita dos resultados da transformação estrutural por que passara a economia chinesa durante os anos noventa. Ou seja, a China aparece no mercado internacional como exportadora de produtos industriais de baixo e, especialmente, de médio e alto valor agregado. É, portanto, esta conjunção de fatores, que explica a explosão das exportações chinesas para o Brasil, cuja estrutura produtiva herdada dos anos noventa aparece com alguns “buracos”, especialmente nos setores têxtil, eletrônicos e de bens de capital. MADE IN CHINA: Oportunidades e ameaças colocadas pela ascensão global da China para os trabalhadores latinoamericanos 13 Realização Apoio Gráfico 3 – Participação da China nas Exportações, Importações e Saldo Comercial Total do Brasil (em %) 25,0 20,0 15,0 10,0 5,0 0,0 -5,0 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 -10,0 -15,0 -20,0 exportações importações saldo Fonte: Secex/Mdic. Juntando as pontas destes dois períodos, o que sobressai é uma maior importância da China para a economia brasileira. Em 2008, a China surge como destino de 8,3% das vendas externas brasileiras, contra 1,8% em 1998. Do lado das importações, salta-se do mesmo percentual de 1,8%, no início do período, para 11,6%, ao seu final. Os dados mostram também que não fosse a China o superávit brasileiro seria 15% maior em 2008. Porém, este número deve ser lido com cautela. Em primeiro lugar, porque parte das importações provenientes da China vem a ocupar espaços vazios da estrutura industrial brasileira. Em segundo lugar, porque no momento da virada do ciclo, a China passa novamente a gerar superávits para o país, já que apresenta uma demanda estável para as commodities brasileiras, ao passo que a desaceleração da economia brasileira corta as compras chinesas. Em poucas palavras, o déficit comercial brasileiro com a China é função do forte ritmo de expansão da estrutura industrial da economia brasileira que enfrenta gargalos estruturais nos segmentos média e alta tecnologia. Esta nova mudança do sentido do saldo comercial já pode ser apreendida dos dados para o primeiro quadrimestre de 2009. Quando se analisa o superávit comercial do país por região do planeta, a China responde por 15% do superávit brasileiro no início do ano corrente, comprovando a tese acima esboçada. A desaceleração forçada da economia brasileira mais a leve queda do ritmo de expansão da demanda chinesa compõem uma receita capaz de fazer o saldo brasileiro voltar para o positivo. Contudo, um saldo positivo ou negativo não são em si bons ou ruins para uma economia capitalista, tudo dependendo da dinâmica que está por trás deste desempenho comercial. O grande desafio do Brasil parece, portanto, residir na capacidade de desenvolver uma dinâmica interna que permita conciliar expansão industrial sem a geração de déficits comerciais crescentes com a China, os quais se disseminam hoje por uma grande quantidade de setores e segmentos. 14 Gráfico 4 – Saldo Comercial do Brasil com Vários Países/Regiões do Mundo – janeiro a abril de 2009 (em US$ bilhões) 8,00 7,00 6,00 5,00 4,00 3,00 2,00 1,00 0,00 -1,00 China EUA U.Européia Aladi Ásia (exceto China) Outros Total -2,00 -3,00 Fonte: Secex/Mdic. Acompanhamos agora a estrutura das pautas de exportações e importações do Brasil com a China em termos setoriais. São apresentados abaixo os produtos – segundo a classificação em 6 dígitos - em ordem decrescente de participação no total do comércio brasileiro com o parceiro asiático. O primeiro dado digno de nota é a grande concentração das exportações brasileiras nos 8 principais produtos a partir deste critério já bem desagregado. Tais produtos – todos commodities agrícolas ou minerais – respondem por 80% das exportações brasileiras para a China. Se somarmos apenas os principais produtos cadeia de soja e minério de ferro, tal percentual supera a casa dos 60%. MADE IN CHINA: Oportunidades e ameaças colocadas pela ascensão global da China para os trabalhadores latinoamericanos 15 Realização Apoio Tabela 1 – Principais Produtos Exportados pelo Brasil para a China em Valor no Ano de 2007 (milhares de US$), em Percentual das Exportações Brasileiras para a China e Variação destas Exportações no Período 2000-2007 (em %) Fonte: UN/Comtrade. 16 Tabela 2 – Principais Produtos Importados pelo Brasil da China em Valor no Ano de 2007 (milhares de US$), em Percentual das Importações Brasileiras da China e Variação destas Importações para o Período 2000-2007 (em %) Fonte: UN/Comtrade. MADE IN CHINA: Oportunidades e ameaças colocadas pela ascensão global da China para os trabalhadores latinoamericanos 17 Realização Apoio No sentido oposto, os principais oito produtos das importações brasileiras provenientes da China representam apenas 20% das compras brasileiras. Ou seja, trata-se de uma pauta bem mais desconcentrada. Observa-se a existência de uma grande frente de produtos importados daquele país, que se distribuem pelos capítulos que compõem as indústrias eletroeletrônica, de máquinas e equipamentos, química e têxtil. Eles geralmente se localizam ou no final (bens de consumo duráveis) ou no início da cadeia produtiva (no caso de peças, componentes e máquinas). É como se a estrutura industrial integrada da China, em virtude do seu mercado interno dinâmico, e das suas exportações crescentes, produzisse fantásticas economias de escala, que se transferem para uma vasta gama de segmentos e setores, gerando uma competitividade sistêmica para todos ao mesmo tempo, à exceção daqueles intensivos em recursos naturais não disponíveis ou em tecnologia bastante sofisticada, estes importados de outros países. Um outro elemento que vale à pena ser ressaltado, por seu impacto nas relações geopolíticas entre os dois países, relaciona-se com a pequena importância do Brasil para a China em termos econômicos. Quando olhamos para os principais capítulos – classificação de dois dígitos – dos produtos exportados da China para o Brasil, percebemos que, na sua grande maioria, o Brasil sequer representa 2% do total das vendas chinesas destes produtos, ainda que a tendência seja, no geral, de elevação no período 1997-2007. Mesmo naqueles produtos onde a participação brasileira merece algum destaque, trata-se de um percentual praticamente marginal. È o caso das fibras sintéticas (2,97%), produtos químicos orgânicos (3,04%) e tecidos de malha (3,66%). Já no caso das exportações brasileiras de alguns produtos, como soja e minério de ferro, a dependência da China é maior, de cerca de 20% no caso dos minérios e de 30% na cadeia da soja. Em ambos os casos a participação brasileira, elevou-se entre 1997 e 2003, para se estabilizar entre este último ano e 2007. É aqui, aliás, que se encontra parte do interesse chinês nas relações com o Brasil, ou seja, na oferta segura e a preços estáveis de matérias-primas e alimentos. Tabela 3 – Participação do Brasil nas Exportações Totais Chinesas por Capítulos Fonte: UN/Comtrade. 18 Tabela 4 – Participação do Brasil nas Importações Totais Chinesas por Capítulos Fonte: UN/Comtrade. Já no que diz respeito à dependência do Brasil com a China, esta se mostra bem maior no que diz commodities brasileiras, como se depreende abaixo. Nos capítulos que compreendem minério de ferro e soja, a China representa, respectivamente, 32% e 42%, do destino das vendas externas brasileiras. r e s p e i t o à s e x p o r t a ç õ e s d e a l g u m a s Tabela 5 – Participação da China nas Export. Brasileiras Por Capítulos (em %) Fonte: UN/Comtrade. Quanto à presença chinesa na pauta de importações brasileiras, ela se mostra bastante disseminada, superando em muitos casos 20% das compras externas. É interessante perceber que nos produtos finais de menor valor agregado (vestuário, calçados e brinquedos), ela já supera mais de 60% das importações, enquanto nos bens intermediários (ferro, plástico, químicos, filamentos e tecidos) e nos bens de capital (máquinas e equipamentos), apesar de inferior, a participação chinesa vem crescendo de maneira mais dinâmica. Tabela 6 – Participação da China nas Import. Brasileiras Por Capítulos (em %) Fonte: UN/Comtrade. MADE IN CHINA: Oportunidades e ameaças colocadas pela ascensão global da China para os trabalhadores latinoamericanos 19 Realização Apoio 2.2 O Brasil, a China e os demais Parceiros Comerciais Como vimos, no tópico anterior, a China saltou de uma situação de quase irrelevância para outra de importância estratégica na pauta comercial brasileira. Deve-se, contudo, tomar cuidado para não se exagerar a participação chinesa. Por um lado, pode-se dizer que a China aparece como importante fonte de demanda para as exportações agrícolas e de minerais do Brasil, e como fornecedora de produtos industriais a baixo custo, em alguns casos inclusive deslocando a produção interna. Por outro lado, em termos agregados, mesmo após uma expansão de 1400% das exportações brasileiras e de 1540% das importações provenientes deste país entre 2000 e 2008, a China representava apenas 10% da corrente de comércio brasileira em 2008. Quando olhamos para as exportações, a participação dos países da região (ALADI) na pauta brasileira era 2,6 vezes maior que a chinesa (21,8% contra 8,3%) no ano de 2008. Além disso, as exportações do Brasil para a América Latina são em grande medida compostas de bens industriais, que possuem maiores encadeamentos setoriais, além de gerarem mais empregos e pagarem melhores salários. O mesmo acontece com as exportações brasileiras para o conjunto “outros” – que envolve África, Oriente Médio e os países do Leste Europeu que não se encontram na União Européia. E mesmo as exportações brasileiras para os Estados Unidos e para a União Européia, que caíram em termos relativos ao longo do período 1998-2008, ainda se mostram mais relevantes que o total vendido para a China. Gráfico 5 – Distribuição das Exportações Brasileiras por Destino (em %) 35,0 30,0 25,0 20,0 15,0 10,0 5,0 0,0 1998 1999 China 2000 EUA 2001 2002 U.Européia 2003 Aladi 2004 2005 2006 Ásia (exceto China) 2007 2008 Outros Fonte: Secex/Mdic. Já do lado das importações, a ascensão chinesa revelou-se mais forte, especialmente nos últimos anos. Mesmo assim, a participação deste país chegou a 11,8%, montante inferior ao alcançado pelos demais fornecedores brasileiros. A União Européia e o conjunto “outros” somados responderam juntos por 42% das importações brasileiras em 2008, totalizando os Estados Unidos, a Ásia exceto a China e a América Latina, cada um, 15% das compras brasileiras. Como veremos adiante, a China vem, contudo, ganhando espaço rapidamente em certos setores da indústria, onde sua participação nas importações cresce de maneira bastante pronunciada. 20 Gráfico 6 – Distribuição das Importações Brasileiras por Origem (em %) 35,0 30,0 25,0 20,0 15,0 10,0 5,0 0,0 1998 1999 China 2000 EUA 2001 2002 U.Européia 2003 2004 Aladi 2005 2006 2007 Ásia (exceto China) 2008 Outros Fonte: Secex/Mdic. Já em termos de saldo comercial, a China, entre 2006 e 2008 – graças à combinação de forte expansão industrial e câmbio valorizado no Brasil, mais a crescente competitividade daquele país especialmente nos produtos de maior valor agregado – teve uma contribuição negativa, compensada justamente pelo saldo bastante positivo do Brasil com os países da América Latina, da União Européia e do conjunto “outros”. A região latino-americana é, de fato, a única que tem contribuído, no período recente, de forma sustentável para este saldo, enquanto se reduz a participação daquelas outras duas regiões já em 2008, por conta da queda do preço das commodities. Gráfico 7 – Distribuição do Saldo Comercial Brasileiro por Região/País (em %) 20,0 15,0 10,0 5,0 0,0 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 -5,0 -10,0 China EUA U.Européia Aladi Ásia (exceto China) Outros Fonte: Secex/Mdic. MADE IN CHINA: Oportunidades e ameaças colocadas pela ascensão global da China para os trabalhadores latinoamericanos 21 Realização Apoio Tabela 7 – Taxa de Crescimento das Exportações e Importações Brasileiras por Região/País entre 20002008 (em %) Fonte: Secex/Mdic Observa-se ainda que a China, ao penetrar nos mercados de produtos industriais dos parceiros comerciais do Brasil na região, pode no curto e médio prazo reduzir o alcance das exportações brasileiras nestes mercados. Ou seja, estes fluxos de exportação – da China para a América Latina versus do Brasil para a América Latina - não podem ser analisados de forma isolada. Vários estudos têm demonstrado que o Brasil já tem sido deslocado em alguns dos mercados da região, onde se concentram suas vendas produtos industriais de alto valor agregado. Ou seja, os efeitos negativos do novo padrão de comércio Brasil-China resvalam para além da relação bilateral, afetando especialmente as possibilidades de integração regional com complementação produtiva. O gráfico 8 aponta para esta nova realidade, ainda que no caso do Mercosul, para o ano de 2006, a participação do Brasil no total das importações industriais deste bloco se mostrasse bem superior à chinesa (32,5% e 13,2%, respectivamente). Entretanto, estas participações estão se aproximando mesmo no Mercosul, enquanto no caso do Chile e dos países da CAN, a China já superou o Brasil. Para se ter uma idéia, basta tomar os respectivos percentuais de ambos os países nas importações da ALADI. Além disso, as importações dos países da ALADI provenientes de Brasil e China têm se mostrado cada vez mais similares, com a diferença que as exportações da potência asiática para a região se destacam pela maior diversidade. Isso indica que o Brasil está sofrendo uma crescente concorrência chinesa junto aos seus parceiros mais próximos (Sarti e Hiratuka, 2007) Já no caso do NAFTA, a comparação entre Brasil e China dispensa comentários: enquanto o Brasil representava 1,3% das importações industriais totais deste bloco em 2006, a China despontava com 20% do mercado regional. Outro estudo recente (Valls Pereira e Maciel, agosto de 2006) aponta que a China já responde por 29% das perdas de mercado das exportações brasileiras no Chile, 14% no México e 11% na Argentina. Nos Estados Unidos, a China representa 36% da perda de market-share das exportações brasileiras em setores que elas concorrem com as chinesas. Ainda assim, as perdas apuradas para o período 2002-2004, em comparação com o triênio anterior, estão concentradas em alguns poucos produtos como calçados, telefones celulares e aparelhos de ar condicionado. Vale acrescentar que foi justamente no período subseqüente, 2004 a 2007 - que as exportações chinesas explodiram no mercado brasileiro, o mesmo tendo acontecido nos demais países da região. 22 Gráfico 8 – Participação de Brasil e China no Total de Importações Industriais da Aladi, Mercosul e NAFTA, 2000 e 2006 (em %) Fonte: Neit-IE-Unicamp com base em Comtrade/ONU. Algumas estimativas indicam que as perdas de exportações brasileiras causadas pelo fator China ao longo do período 1990-2004 representaram 7,2% das exportações de produtos de baixa tecnologia e 2,1% das de alta tecnologia referentes ao ano de 2004 (Jenkins e Dussel Peters, 2007), enquanto este percentual para o período foi de 2,5% para o conjunto das exportações de manufaturados, percentual inclusive pouco superior ao verificado para a média latino-americana (Moreira, 2006). Deve-se ter cautela para não se culpar o fator chinês pelas crescentes dificuldades sofridas por alguns setores brasileiros no mercado externo, as quais se originam da política cambial recente, da elevada carga tributária, do baixo investimento em tecnologia e da insuficiência das ações adotadas pela política industrial brasileira. Analisemos agora como a China vem aumentando a sua participação na importação brasileira de alguns produtos industriais, ganhando espaço não apenas em relação aos fornecedores europeus e dos Estados Unidos, mas também da América Latina no período 1997-2007. Como as importações brasileiras de produtos industriais se incrementaram bastante no período, a maior presença chinesa não necessariamente se faz em detrimento dos demais concorrentes. E para avaliar se ela desloca a produção interna, teríamos que investigar se aumentou de forma expressiva o coeficiente de penetração das importações na oferta interna, o que não parece ter acontecido para o conjunto da indústria brasileira, já que a produção interna também voltou a se expandir especialmente entre 2004 e 2008, ainda que com ritmos diferenciados nos vários setores. O setor de produtos eletrônicos – que engloba tanto bens de consumo duráveis como bens de capital – é um caso onde se observa uma inequívoca expansão chinesa, que muito provavelmente levou ao deslocamento de outros concorrentes, de parte da produção interna e/ou ocasionou uma redução do valor agregado pelas empresas com produção no território nacional. Entre 1997 e 2007, a participação chinesa nas importações brasileiras destes produtos saltou de 3,2% para 28,9%, reduzindo quase na mesma magnitude a participação dos Estados Unidos e da União Européia, que juntos respondiam ao final do período por 26,5% das compras brasileiras de eletroeletrônicos. MADE IN CHINA: Oportunidades e ameaças colocadas pela ascensão global da China para os trabalhadores latinoamericanos 23 Realização Apoio Tabela 8 – Evolução da Distribuição das importações Brasileiras de Produtos Eletroeletrônicos * (em %) China USA UE-25 LDCLAC LDCEAP (except China) Others World 1997 3,2 30,4 22,4 5,8 6,9 31,3 100,0 2000 3,9 34,9 22,2 3,3 6,1 29,6 100,0 2003 10,5 24,7 21,7 3,5 9,6 30,1 100,0 2007 28,9 10,6 15,9 4,2 8,3 32,1 100,0 Fonte: UN/Comtrade. * refere-se ao capítulo 85 - MÁQUINAS, APARELHOS E MATERIAIS ELÉTRICOS, E SUAS PARTES; APARELHOS DE GRAVAÇÃO OU DE REPRODUÇÃO DE SOM, APARELHOS DE GRAVAÇÃO OU DE REPRODUÇÃO DE IMAGENS E DE SOM EM TELEVISÃO, E SUAS PARTES E ACESSÓRIOS. No caso de máquinas e equipamentos, a expansão da participação chinesa se faz ainda mais rápida. Entretanto, os patamares iniciais chineses são mais baixos, enquanto os de Estados Unidos e União Européia se afiguram mais elevados. Em 2007, a oferta chinesa chega a 13% das importações brasileiras do capítulo 84, contra uma participação de 37% e 24,3% da União Européia e dos Estados Unidos, respectivamente. Situação semelhante à aquela encontrada para os produtos químicos orgânicos. Tabela 9 – Evolução da Distribuição das importações Brasileiras de Máquinas Mecânicas * (em %) China USA UE-25 LDCLAC LDCEAP (except China) Others World 1997 1,0 29,9 46,0 5,9 0,9 16,3 100,0 2000 1,9 35,1 39,0 5,7 1,3 17,0 100,0 2003 2,8 30,2 39,5 4,6 1,6 21,3 100,0 2007 13,0 24,3 37,0 3,6 3,1 19,0 100,0 Fonte: UN/Comtrade. * refere-se ao capítulo 84 - REATORES NUCLEARES, CALDEIRAS, MÁQUINAS, APARELHOS E INSTRUMENTOS MECÂNICOS, E SUAS PARTES. Tabela 10 – Evolução da Distribuição das importações Brasileiras de Produtos Químicos Orgânicos * (em %) China USA UE-25 LDCLAC LDCEAP (except China) Others World 1997 3,0 36,0 35,8 7,5 0,3 17,5 100,0 2000 4,4 34,5 34,9 8,1 0,3 17,9 100,0 2003 7,0 31,6 34,6 7,4 0,3 19,2 100,0 2007 9,8 30,0 28,7 10,8 0,7 20,0 100,0 Fonte: UN/Comtrade. * refere-se ao capítulo 29 - PRODUTOS QUIMICOS ORGANICOS. O caso da indústria siderúrgica merece especial atenção. A China, de importador líquido de obras de ferro e aço do Brasil, durante os anos noventa, passa à condição de importante fornecedor, atingida entre 2003 e 2007. O Brasil importa especialmente produtos siderúrgicos de maior valor agregado, sendo o principal fornecedor a União Européia, com 38,5% das compras brasileiras, seguido por Estados Unidos (18,7% do total), e logo após pela China, já com 18%. Além de ganhar espaço frente a estes fornecedores, a China saltou à frente dos fornecedores latino24 americanos, que reduziram a sua participação nas importações de aço do Brasil, de 11,2% para 6,2% entre 1997-2007, justamente quando da ascensão chinesa. Este é mais um exemplo do efeito China em termos de desvio do comércio intra-Mercosul e intra-ALADI. Tabela 11 – Evolução da Distribuição das Importações Brasileiras de Produtos Siderúrgicos * (em %) 1997 2000 2003 2007 China 2,5 3,4 4,1 18,0 USA 28,7 31,7 23,0 18,7 UE-25 35,3 38,4 45,3 38,5 LDCLAC 11,2 7,4 5,7 6,2 LDCEAP (except China) 0,8 0,5 0,5 0,9 Others 21,5 18,6 21,3 17,7 World 100,0 100,0 100,0 100,0 Fonte: UN/Comtrade. * refere-se ao capítulo 73 - OBRAS DE FERRO FUNDIDO, FERRO OU AÇO. Situação semelhante ocorre com o setor têxtil, seja no caso dos filamentos sintéticos como dos tecidos de malha. Se no primeiro caso, a China possui uma presença importante, chegando a quase 1/3 das importações brasileiras em 2007, no segundo, a liderança deste país mostra-se inconteste, com mais de 80% das importações brasileiras. Enquanto no segmento de filamentos sintéticos a China ocupa o espaço antes detido por Estados Unidos e União Européia e os países latino-americanos, em tecidos de malha, a sua presença desloca especialmente os países latino-americanos e os países asiáticos sob a rubrica “outros”. Tabela 12 – Evolução da Distribuição das importações Brasileiras de Produtos Têxteis 1 * (em %) China USA UE-25 LDCLAC LDCEAP (except China) Others World 1997 1,3 16,2 12,8 26,8 6,6 36,4 100,0 2000 0,9 16,1 10,2 24,3 9,1 39,5 100,0 2003 17,8 8,4 9,0 9,6 15,7 39,5 100,0 2007 28,7 6,7 8,6 5,8 18,2 32,0 100,0 Fonte: UN/Comtrade. * refere-se ao capítulo 54 - FILAMENTOS SINTÉTICOS OU ARTIFICIAIS. Tabela 13 – Evolução da Distribuição das importações Brasileiras de Produtos Têxteis 2* (em %) China USA UE-25 LDCLAC LDCEAP (except China) Others World Fonte: UN/Comtrade. * refere-se ao capítulo 1997 2,1 3,4 6,1 10,2 0,6 77,5 100,0 2000 0,4 4,1 7,1 6,4 3,2 78,8 100,0 2003 4,1 1,4 21,9 14,0 1,3 57,3 100,0 2007 82,2 0,3 3,1 1,3 1,1 12,0 100,0 60 - TECIDOS DE MALHA MADE IN CHINA: Oportunidades e ameaças colocadas pela ascensão global da China para os trabalhadores latinoamericanos 25 Realização Apoio Nos setores de vestuário e calçados, a presença chinesa, que já era importante em 1997, incrementase de forma importante até 2007, chegando, respectivamente, a representar 58,2% e 70% das importações brasileiras. Estes dois setores concentram boa parte do desvio de comércio chinês intra-Mercosul e intra-ALADI, o qual também já havia se mostra significativo nos setores siderúrgico e têxtil, como verificado. Tabela 14 – Evolução da Distribuição das importações Brasileiras de Produtos da Indústria do Vestuário * (em %) China USA UE-25 LDCLAC LDCEAP (except China) Others World 1997 37,0 6,6 6,3 29,1 2,7 18,3 100,0 2000 22,6 4,9 22,3 21,7 6,3 22,2 100,0 2003 42,5 1,9 23,7 6,4 5,3 20,3 100,0 2007 58,2 0,8 10,4 5,0 4,2 21,4 100,0 Fonte: UN/Comtrade. * refere-se ao capítulo 62 - VESTUÁRIO E SEUS ACESSÓRIOS, EXCETO DE MALHA. Tabela 15 – Evolução da Distribuição das importações Brasileiras de Produtos da Indústria de Calçados * (em %) China USA UE-25 LDCLAC LDCEAP (except China) Others World 1997 30,6 1,7 3,0 29,4 25,9 9,4 100,0 2000 41,1 2,1 11,5 2,1 32,3 10,9 100,0 2003 59,4 4,3 10,4 1,8 16,1 8,1 100,0 2007 70,0 0,6 5,3 1,2 20,4 2,4 100,0 Fonte: UN/Comtrade. * refere-se ao capítulo 64 - CALÇADOS, POLAINAS E ARTEFATOS SEMELHANTES, E SUAS PARTES. 2.3 Os Investimentos das Empresas Chinesas no Brasil Se a China vem cumprindo um papel crescentemente importante nas relações comerciais brasileiras – o que se percebe tanto na análise da pauta de exportações e importações do Brasil com a China, mas também a partir do deslocamento de produtos brasileiros em outros mercados – o mesmo não acontece quando se analisa a presença daquele país sob a forma de investimentos externos no Brasil. Muito provavelmente, o investimento chinês é maior do que permitem apurar as estatísticas, já que muitas empresas utilizam expedientes não convencionais nos seus processos de internacionalização. Às vezes, abrem representações fora da China Continental, como no caso de Hong Kong, ou em paraísos fiscais. Outras vezes são empréstimos de bancos chineses que viabilizam a implantação de novas empresas ou atividades produtivas. Ainda assim, segundo levantamento da UNCTAD (2004), em 2003, o Brasil ocupava a 11ª. posição no ranking global de estoque de capital externo chinês, com cerca de US$ 120 milhões investidos entre 1979 a 2002. Este montante, entretanto, representava apenas 1,3% do total investido pela China no mundo. Durante a presente década, a presença de multinacionais chinesas tem se ampliado para fora da Ásia, o que se deve ao excedente de reservas acumulado pelo país, aos incentivos fornecidos pelo governo, muitas vezes em troca de vantagens geopolíticas obtidas nos países hospedeiros, mas também à percepção de vantagens a serem potencialmente conquistadas em mercados pouco valorizados pelos países desenvolvidos em virtude do suposto “risco político elevado”. 26 Tudo indica também que os investimentos chineses no Brasil – ainda que diminutos sob qualquer critério - assumem um padrão mais diversificado do que o verificado na região, onde estes se direcionam em grande medida para o setor de infra-estrutura e produtos minerais. Além do setor madeireiro e de minério de ferro, o capital chinês no Brasil está presente nas atividades de maquinaria (tratores), geração de energia e telecomunicações. Mais recentemente, os investimentos chineses aportaram no setor de etanol, havendo indicações de que se possa contar com novas plantas de empresas do setor automotivo. Partindo de níveis bastante baixos, estes investimentos têm crescido de forma rápida no período recente, chegando em 2007 a um nível mais de 5 vezes superior ao fluxo apurado em 2003, segundo os dados do Ministério do Comércio chinês, apresentados no gráfico abaixo. Gráfico 9 – Investimentos Externos Diretos da China no Brasil em US$ milhões 60 50 40 30 20 10 0 2003 2004 2005 2006 2007 Fonte: Ministry of Commerce, China. A mesma tendência altista pode ser percebida a partir de uma análise dos dados do Banco Central brasileiro. O estoque de investimento externo direto multiplicou-se por 9,2 vezes entre 2000 e 2005, chegando a US$ 327 milhões neste último ano. Ainda assim, a participação chinesa segue marginal, tendo saltado de 0,03% para 0,2%. Parte expressiva dos investimentos continua localizada no setor industrial – este percentual salta de 63% para 86% - aumentando agora a participação do conjunto setor agrícola e extração mineral, em virtude desta segunda atividade. Percebe-se, ainda, que entre 2000 e 2005, não se presenciou uma mudança expressiva do perfil dos segmentos que respondiam pelo principal dos investimentos chineses. Enquanto antes a produção de madeira representava 42% do total, em 2005, a produção de celulose respondia por 79% do total, mantendo-se o setor de máquinas e equipamentos com um percentual de 5% do estoque total de investimentos chineses. Ou seja, tendem a predominar os setores industriais intensivos em recursos naturais, com expansão da extração mineral, e uma participação diminuta, mas não desprezível, dos setores de máquinas e eletroeletrônicos. Gráfico 10 – Distribuição do Estoque de Investimentos Externos Diretos da China no Brasil por Setor de Atividade, 2000 e 2005 (em %) 100 90 80 70 60 50 40 30 20 10 0 2000 2005 agric. extr. mineral indústria serviços Fonte: Bacen. MADE IN CHINA: Oportunidades e ameaças colocadas pela ascensão global da China para os trabalhadores latinoamericanos 27 Realização Apoio O quadro abaixo apresenta as principais empresas chinesas com atuação Brasil. Além dos setores de infra-estrutura, comércio e mineração, o setor de eletroeletrônico também merece destaque. Quadro 3 – Principais Empresas de Capital Chinês com Atuação no Brasil Empresa Setor Air China Bank Of China Baosteel do Brasil CCIC South America CGOG South America Logistica China Brasil Investimento Desenvolvimento Comercial Ltda China Civil Comércio Internacional Ltda. China Metais e Minerais Ltda (China Minmetals) Chinal National Machinery & Equipment Imp & Exp China Shipping Agency China Tabaco Intern. Do Brasil Chinatex Grain & Oils Import & Export Cosco Brasil S/A Feiyue Yamata do Brasil Ltda. Floresta Ying Madeireira Gree Electric Appliances, Inc. Haitian América do Sul Ltda. Hebei Brasil Com. Imp. & Exp. Ltda. Huawei Luneng Polycity do Brasil Ningbo Comercial do Brasil Ltda. SanFon Exportação de Madeiras Ltda. SDC do Brasil Serviços Marítimos Sinopec Sinosteel Br. Metalúrgica Ltda. SVA Brasil Ltda. Tiens - América do Sul United Electric Appliance Indústria e Comércio (GREE) Yangzi Brasil Corporation ZTE China South Industries Group (CSG) Transporte/ Logística Banco Siderurgia e Mineração Serviços Transporte/ Logística Investimentos Serviços Siderurgia e Mineração Trading Transporte/ Logística Diversos Trading Transporte/ Logística Eletroeletrônicos Diversos Eletroeletrônicos Diversos Trading/Diversos Eletroeletrônicos Diversos Diversos Trading Transporte/Logística Serviços em Petróleo e Gás Siderurgia Eletroeletrônicos Diversos Eletroeletrônicos Diversos Eletroeletrônicos Holding Fonte: EMBAIXADA da China no Brasil, abr. 2008, in EXAME, 1 maio 2008. Pode-se aventar a hipótese que os setores de mineração e a indústria eletroeletrônica comportam dois padrões de investimento externo chinês, os quais tendem a se diferenciar ainda mais no médio prazo, a depender da evolução de ambas as economias, da conjuntura internacional e da política industrial desenvolvida pelo Brasil. No caso do setor de mineração, os impactos da ascensão chinesa – que responde por 40% da produção mundial de aço bruto e contribui para elevar os preços das commodities - mais a combinação interna de câmbio baixo, juros altos e política industrial tímida, os quais predominaram até 2007, têm levado a uma tendência de consolidação deste setor no Brasil a partir dos elos menos intensivos em tecnologia, aproveitando-se o país das vantagens em termos de recursos naturais. As empresas chinesas com interesse no Brasil investem basicamente na produção e importação de minerais básicos. Ressalte-se ainda que a joint-veinture entre a Baosteel e a Companhia Vale do Rio Doce para a produção de chapas de aço encontra-se postergada em virtude da crise internacional. 28 Quadro 4 – Empresas Chinesas do Setor de Minério de Ferro/Siderurgia com Interesse no Brasil Fonte: IOS Já no setor eletroeletrônico, observa-se, a partir do quadro abaixo, que à exceção da Shangdong, com fábrica no país, as demais empresas chinesas deste setor concentram suas atividades internas na promoção e distribuição de produtos, no máximo optando pela terceirização das atividades de produção para outras empresas ou apostando na realização de joint-ventures com empresas multinacionais já sediadas no Brasil. Trata-se, de fato, de uma estratégia cautelosa voltada para o crescente aprendizado em relação às condições e ao potencial do mercado brasileiro, cujo acesso ainda se faz predominantemente por meio das importações. MADE IN CHINA: Oportunidades e ameaças colocadas pela ascensão global da China para os trabalhadores latinoamericanos 29 Realização Apoio Quadro 5 – Empresas Chinesas do Setor Eletro-Eletrônico com Atuação no Brasil Fonte: IOS 2.4 As Estratégias Empresariais frente à Concorrência Chinesa 4 Como o nível de investimento da China no Brasil ainda se mostra bastante limitado, tanto em termos relativos como absolutos, os principais impactos produtivos da ascensão chinesa sobre o Brasil se fazem sentir por meio da expansão das importações. As empresas – nacionais e multinacionais – brasileiras têm reagido de várias maneiras, as quais dependem do porte da empresa, da origem do capital e do setor de atividade. O quadro abaixo apresenta uma tipologia de seis estratégias empresariais distintas. Muitas empresas, face à concorrência chinesa, procuram reduzir os gastos com a folha de pagamento, evitando benefícios assegurados por lei, optando pela precarização ou então migrando para pólos internos onde os custos salariais são inferiores. Este tópico é uma versão condensada de parte do relatório de pesquisa elaborado com financiamento da DGB (ver IOS, 2008). 4 30 Há também aquelas – de grande porte, marca consolidada e acesso a capital externo - que deixam de investir em novas plantas em território brasileiro e partem para a China perseguindo os fatores que julgam ser a chave do sucesso asiático, estabelecendo neste país uma nova plataforma exportadora. Entre os extremos, existem ainda as empresas que buscam beneficiar-se dos preços baixos de bens intermediários para importá-los, utilizando poucos insumos nacionais e aproximandose cada vez mais do perfil de uma empresa maquiladora. Quadro 6 – Tipologia de Estratégias Empresariais como Resposta à Ascensão Chinesa com Informações sobre Empresas de Setores Específicos Fonte: IOS (2008). Em entrevista ao Observatório Social, José Carlos Guedes, Presidente da Confederação Nacional do Trabalhadores do Vestuário (CNTV), revelou que a principal ação em resposta à pressão chinesa é diminuir o custo final de produção e assim apresentar produtos mais competitivos ao mercado. Dos três ramos que a CNTV abrange - têxtil, vestuário e calçados - esse fenômeno é mais acentuado no último. MADE IN CHINA: Oportunidades e ameaças colocadas pela ascensão global da China para os trabalhadores latinoamericanos 31 Realização Apoio Empresas calçadistas representam a maioria dos casos de migração interna. A Alpargatas São Paulo S.A., dona da marca Havaianas, fechou a fábrica em São Paulo, transferiu investimentos para a Paraíba no segundo semestre de 2005 e aumentou a planta de Campina Grande. Em seguida, a empresa - que fabrica também as marcas Topper, Rainha e tem as licenças de Mizuno e Timberland - investiu nas plantas de Santa Rita, João Pessoa, Mogeiro e Ingá todas na Paraíba. Além da Alpargatas, outras empresas transferiram ou aumentaram suas plantas na Paraíba, como Moinho Tambaú, Coteminas, Lupo e Dakota. Destas, as três últimas vêm reforçando a tendência no setor ressaltada pelo presidente da CNTV. O exemplo abaixo revela que não se trata de uma tendência isolada. Desde que a Vulcabrás assumiu o posto de controladora da marca, a Azaléia vêm dando sinalizações de ações no mesmo sentido. A marca contará com mais sete pavilhões industriais no interior da Bahia. Serão cerca de R$ 30 milhões em investimento no complexo de Itapetinga. O presidente da CNTV cita ainda o caso da Valisère. “Eles vêm reduzindo o número de empregos em algumas plantas daqui [da região Sudeste]. Alegam que estão freando a produção. Mas a produção no Nordeste aumentou... é que outras regiões aceitam salários de 1/3 e ausência de benefícios”. A primeira planta da empresa fora de São Paulo começou a produzir em setembro de 2006, mas foi concluída apenas um ano depois. Por outro lado, alguns empresários optaram por escalar o muro, de modo a aproveitar as mesmas vantagens competitivas de seus concorrentes. Esta nova postura tem se revelado uma tendência mundial. Vejamos alguns exemplos destas estratégias que denominamos de plataforma de exportações. Um exemplo é a empresa Teka. Depois de lutar internamente contra os produtos chineses, a tradicional fabricante brasileira de cama mesa e banho decidiu se juntar a eles. A previsão de Marcello Stewers, diretor de exportações e relações com investidores da empresa, é de atingir 8% do faturamento de 2008 com importados provenientes das filiais asiáticas. A China aparece para a Teka como um pólo produtor de toalhas de banho. A Índia e o Paquistão também são importantes centros visados por essa nova estratégia da empresa. O Brasil e a Alemanha são os principais compradores das exportações das unidades asiáticas da Teka. Já a Santista anunciou que vem estudando a possibilidade de produzir na Ásia, embora ainda não tenha citado possíveis países que a abrigariam. Paralelamente, algumas empresas calçadistas começam a trilhar pelo mesmo caminho. Vejamos mais alguns exemplos. A empresa têxtil São Carlos também conta com produção asiática, embora a participação chinesa no montante asiático seja bastante menor se comparada ao caso da Teka. A empresa paulista, entretanto, investe no Oriente há mais tempo. Outra empresa nacional, a Karsten, já produz na Ásia. O plano da empresa é ampliar seu mercado brasileiro e consolidar-se para, em seguida, contar com uma planta asiática que suporte as exportações. Para Milton Cardoso, Presidente da Associação Brasileira da Indústria de Calçados (Abicalçados), “se o governo não defender os interesses do Brasil, as empresas vão resolver os problemas das empresas e não do Brasil”. O grupo que controla as marcas West Coast e Cravo e Canela – que há 20 anos fabrica em Ivoti (RS), e nunca havia produzido um par de sapatos sequer fora do país – terceirizará parte da produção em uma planta na Índia. Já a Strada Shoe, que tinha a totalidade de sua produção voltada para o mercado externo produzida no Brasil, passou a fabricar na China há dois anos. Atualmente, possui quatro unidades no Brasil e cinco na China. Outro caso digno de nota é a entrada da Coteminas na China. A indústria mineira se fundiu à americana Springs Mill, principal fornecedora da rede de hipermercados Wal-Mart. A transação deu origem à Springs Global, quem deve fornecer toda a linha de cama, mesa e banho com o logo da rede varejista. Porém, neste caso, já estamos falando de uma outra modalidade - a migração externa -, pois a 32 empresa decide transferir parte da produção para a China em busca de seu mercado interno. Algumas empresas multinacionais brasileiras apresentam essa ação estratégica. O fenômeno China figura para elas como a oportunidade de se lançar rumo a um mercado interno que se destaca pelo crescimento exponencial. Empresas como a Embraco, Embraer, Marcopolo e Weg não quiseram perder a oportunidade de conquistar uma importante parcela do mercado asiático. Para isso, tiveram que montar plantas na China, submetendo-se às condições impostas pelos chineses. A Empresa Brasileira de Aeronáutica S.A., a Embraer, anunciou no dia 19 de fevereiro na feira do ramo – a Singapore Airshow 2008 – que a região da Ásia-Pacífico deverá demandar 1,27 mil aeronaves regionais nos próximos 20 anos, uma movimentação de cerca de US$ 42 bilhões. A empresa brasileira realiza suas produções asiáticas na unidade Harbin Embraer, e tem como sócia a China Aviation Industry Corporation II, a Avic II. Outra estratégia é a utilizada pelo que chamamos neste estudo de quase-maquiladoras, que ocorre com bastante freqüência nos segmentos eletroeletrônicos e de máquinas, e tanto por empresas nacionais como multinacionais. Muitas unidades procuram elevar a sua lucratividade, importando determinados bens intermediários chineses a preços comparativamente baratos, ao invés de comprar de fabricantes nacionais. Isto não é inédito, nem a China o único país de origem de tais produtos. O problema surge quando a importação de um item é de tal monta que causa um definhamento da produção nacional. A unidade da Phillips de Manaus, por exemplo, tem grande parte de seus componentes oriundos de suas filiais chinesas. A estratégia é importar os bens intermediários e montar a peça final, com vistas ao mercado interno e os vizinhos da América do Sul. Para Humberto Barbato, presidente da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (ABINEE), “transferir as unidades para a China no setor [de eletro-eletrônicos] não é desejável. Faz parte da estratégia global se manter aqui e em pontos relevantes. Por outro lado, não vemos novidades, apenas montagem. Há tempos que não se inaugura aqui uma indústria de eletroeletrônicos” O principal exemplo desse fenômeno, confidenciou Barbato em entrevista ao Observatório Social, é a indústria nacional de semi-condutores, essencial a todo produto eletrônico, mas que consegue atender apenas cerca de 2% da demanda interna. Todo o resto é importado, grande parte da China. Mas esse é um nicho estratégico, do qual um país não pode prescindir. Portanto, mesmo que os dados de produção e emprego indiquem um crescimento, o decréscimo do valor agregado internamente é camuflado pela expansão econômica. Mario Mugnaini Jr., Diretor Executivo da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (ABIMAQ), segue na mesma toada: “corremos o risco de nos transformarmos em meras montadoras!”. Por exemplo, no setor de máquinas pesadas, a “informática embarcada” - componentes tecnológicos importados para a montagem no Brasil – compete com a indústria nacional e oferece custo final menor ao empresário, que opta gradativamente mais por peças e equipamentos importados. Uma quinta estratégia empresarial pode ser observada. É o caso das multinacionais que têm plantas no território nacional e que usam a China mais como ameaça fictícia do que como um elemento concreto. É o caso da ThyssenKrupp e da Gerdau em suas duas novas plantas, as quais contaram com concessões que o governo não estaria disponível a realizar em situações anteriores. Para Mugnaini Jr., “foi uma escolha triste, mas nada fácil: podíamos ter um índice de nacionalização baixo e ter que importar grande parte dos bens intermediários, ou então não ter nada em investimentos”. Esse perfil pode ser mais bem delineado a partir do caso da nova planta que a ThyssenKrupp construirá em Sepetiba (RJ), a ThyssenKrupp CSA Companhia Siderúrgica. A construção da ThyssenKrupp CSA Companhia Siderúrgica é anunciada pela empresa como o maior investimento privado da última década. A planta será a maior unidade industrial do setor no Brasil, e, a partir MADE IN CHINA: Oportunidades e ameaças colocadas pela ascensão global da China para os trabalhadores latinoamericanos 33 Realização Apoio dela, o grupo alemão prevê aumento da exportação brasileira em aço em 40%. O projeto da CSA pertence majoritariamente à ThyssenKrupp Steel, com 90% - o restante é de sua sócia, a Companhia Vale do Rio Doce, quem abastece as unidades da TK há mais de 50 anos. Lembremos que o complexo siderúrgico conta com uma coqueria, uma termelétrica, terminais marítimos e uma usina de placas, em um investimento de € 3 bilhões a ser terminado em março de 2009. O fluxo de produção inicia-se com a compra de minério de ferro de Minas Gerais e importação de carvão mineral; após o primeiro passar pela sinterização e o último pela coqueria, o processo é conduzido do alto-forno para a aciaria, onde é feito o lingotamento. Por fim, as placas de aço de 900-2.000 mm de largura e 6-12 m de comprimento partem para o terminal portuário, das quais aproximadamente metade do volume irá para a Alemanha e a outra metade para o NAFTA. A capacidade de produção da planta será próxima a 5 milhões de toneladas por ano. A empresa afirma que vem dando prioridade, na fase de implementação, para a geração de empregos locais. Uma média, segundo a empresa, de 10 mil empregos diretos, com um número de até quatro vezes mais empregos indiretos. A previsão é de R$ 4 bilhões em compras e serviços no Brasil. Já para a fase de operação, serão 3.500 empregos diretos e uma estimativa de R$ 250 milhões por ano em compras e serviços no Brasil. É por conta deste volume de investimento prometido, da expectativa de aquecimento de certos setores em função do abastecimento da planta, do fluxo de comércio e geração de divisas que o governo se esforçou em atrair a indústria. Mas esta é apenas uma parte da estória. No Encontro da Rede Nacional dos Trabalhadores na ThyssenKrupp, realizado nos dias 06 e 07 de dezembro de 2007, ficou claro que a preocupação dos trabalhadores das outras plantas brasileiras – e também dos trabalhadores da rede alemã – com o novo projeto se relaciona com a China. Segundo Valter Sanches, Coordenador da Área de Relações Internacionais da Confederação Nacional dos Metalúrgicos (CNM-CUT), nem os trabalhadores da rede, e tampouco a CNM, foram avisados pela empresa da intenção de trazer mão de obra chinesa para a planta. A novidade chegou aos ouvidos da CNM pela imprensa. Imediatamente, a Confederação entrou em contato com a empresa e com o governo. Sanches relatou que foi fundamental pressionar o governo no sentido de evitar a entrada de mão de obra chinesa em substituição à brasileira. Segundo Sanches, todas as outras partes envolvidas na negociação – os trabalhadores, através da CNM, o e o governo, através do Ministério do Trabalho e do Emprego e do Ministério de Relações Exteriores – envidaram esforços para que a presença chinesa se limitasse exclusivamente à tecnologia, e mesmo quanto a isso se mostraram relutantes, uma vez que também não era desejado que o equipamento fosse adquirido de uma companhia chinesa. Paralelamente, o sindicato IGMetal da DGB mostrou-se preocupado com a migração de investimentos e a criação de plantas na China em todos os quatro segmentos da ThyssenKrupp. Até agora, houve apenas 48 trabalhadores chineses com vistos concedidos pelo Brasil, enquanto outros 60 pedidos estão sendo avaliados para a próxima fase, os quais estão sendo supervisionados pela CNM. Finalmente, estratégia mais utilizada pelas empresas brasileiras – ao menos naqueles setores que sofrem mais fortemente a pressão competitiva chinesa - tem sido a do ajuste defensivo com precarização das condições de trabalho. Não se trata, entretanto, da única forma de enfrentamento à concorrência chinesa, estando ela vinculada a um regime macroeconômico que combinou até 2008 altas taxas de juros em termos relativos, câmbio elevado, ausência de política industrial e tecnológica coerente e ousada e de um padrão de proteção comercial que levasse em consideração elos da cadeia produtiva passíveis de reinserção competitiva. Ao invés de optar por uma estratégia de entrincheiramento – que levaria ao protecionismo exacerbado o Brasil, no novo contexto da ascensão chinesa, deveria ser capaz de revisar a sua estratégia de industrialização, até então voltada para a cópia da matriz industrial dos países desenvolvidos, o que não necessariamente implica um enxugamento da sua estrutura produtiva e da sua pauta de exportações 34 (Castro, 2008). Em síntese, a competitividade não se obtém apenas abatendo custos das empresas, e muito menos penalizando os salários e os empregos, mas a partir de uma definição das áreas estratégicas para o desenvolvimento de uma nação no longo prazo. 2.5 As Relações Econômicas entre Brasil e China e os Possíveis Impactos sobre o Emprego Neste tópico, procede-se, primeiramente, a uma síntese das relações econômicas entre Brasil e China, para que depois possamos levantar algumas hipóteses sobre a maneira como a crescente ascendência chinesa na economia global afeta os níveis de emprego e do padrão de relações de trabalho em alguns setores da estrutura produtiva do país. Por meio de uma análise setorial do saldo comercial brasileiro, percebe-se que, no caso das máquinas, computadas a partir do capítulo 84, o déficit com a China eleva-se mais de 100% entre 1998 e 2006, atingindo a casa de US$ 1,1 bilhão no último ano do período. Nos produtos eletroeletrônicos, computados a partir do capítulo 85, o déficit multiplica-se por 12 para o mesmo período, chegando a mais de US$ 3 bilhões em 2006. A participação da China no déficit comercial total do Brasil eleva-se ano após o ano para os produtos eletroeletrônicos, representando 46,8% em 2006. Já no caso de máquinas, esta elevação se mostra mais abrupta. Depois de uma queda desta participação entre 2000 e 2003 – período de desaceleração da economia brasileira -, a participação da China no saldo comercial negativo deste setor pula de 0,4% para 39,6%, entre 2003 e 2006. Trata-se de um movimento preocupante, que pode elevar excessivamente a dependência do Brasil com relação à China, além de exportar para aquele país os efeitos multiplicadores do investimento. Seguem abaixo duas tabelas que apresentam, respectivamente, a evolução do saldo comercial setorial do Brasil com a China e a participação percentual do saldo comercial com a China no que se refere ao saldo total do país para cada setor. Tabela 16 – Síntese da Evolução do Saldo Comercial dos Setores Superavitários de Brasil e China (em US$) C h i n a B R Setores 2000 2002 2004 2006 TEXTIL -14.256.688 -34.233.465 -157.387.811 -332.214.139 VESTUARIO -35.242.254 -41.154.856 -68.850.188 -183.913.823 CALCADOS -19.566.024 -25.457.109 -46.198.777 -89.001.150 BRINQUEDOS -56.989.661 -35.265.386 -66.998.784 -151.235.775 MAQUINAS -139.424.154 -54.965.316 -217.965.479 -1.103.315.880 ELETRONICOS -347.775.232 -386.968.509 -1.328.249.553 -3.056.205.196 QUIMICOS -153.572.361 -183.129.870 -289.484.999 -496.553.719 SOJA 336.909.570 823.873.242 1.620.226.482 2.429.537.912 MINERIOS 231.098.760 381.643.539 1.017.701.010 3.373.783.437 Fonte: Secex/Aliceweb. Elaboração: IOS. Tabela 17 – Participação do Saldo Comercial do Brasil com a China no Saldo Comercial Total do Brasil (em %) brinquedos têxtil vestuário calçados máquinas eletroeletrônicos químicos 1998 40,5 0,8 60,7 -3,2 1,5 3,6 4,3 1999 53,6 0,6 -561,1 -1,3 1,9 4,0 4,6 2000 77,8 0,8 -26,5 -1,2 2,9 5,6 7,4 2001 89,6 1,3 -48,5 -1,1 1,7 5,1 6,2 2002 89,0 1,9 -39,2 -1,7 1,4 9,8 9,2 2003 122,2 5,3 -22,3 -2,0 0,4 17,9 12,6 2004 120,7 8,2 -35,8 -2,5 14,0 24,7 12,0 2005 107,6 9,8 -89,5 -4,2 27,2 41,3 17,4 2006 93,1 12,1 343,7 -4,9 39,6 46,8 23,2 Fonte: Secex/Aliceweb. Elaboração: IOS. MADE IN CHINA: Oportunidades e ameaças colocadas pela ascensão global da China para os trabalhadores latinoamericanos 35 Realização Apoio Importa indicar, finalmente, o processo de primarização das exportações mesmo nos setores em que o Brasil apresenta-se como superavitário com relação à China. Quando se considera a cadeia da soja, por exemplo, observa-se que o Brasil mantém elevados saldos positivos com a China no início da cadeia – ou seja, em grãos – os quais inclusive crescem de 2004 em diante em termos absolutos e relativos: 42% da soja em grãos exportada pela Brasil dirigia-se para a China em 2006. O contrário acontece no segmento de óleos vegetais, onde se agrega mais valor. De 2004 em diante, o superávit brasileiro com a China cai de US$ 496 para US$ 115 milhões. Simultaneamente, a participação da China no saldo comercial total do país nesta etapa da cadeia produtiva cai de 36% para 10% no mesmo período. Gráfico 11 – Saldo Comercial do Brasil com a China, os Demais Parceiros e o Mundo para Soja em Grãos – 1998 a 2006 SETOR SOJA (EM GRÃOS) 6000 em milhoes 5000 4000 3000 2000 1000 0 98 19 99 19 00 20 BRASIL-CHINA 01 20 02 20 BRASIL-MUNDO 03 20 04 20 05 20 06 20 BRASIL-DEMAIS PARCEIROS Fonte: Secex/Aliceweb. Elaboração: IOS. Gráfico 12– Saldo Comercial do Brasil com a China, os Demais Parceiros e o Mundo para Óleo de Soja – 1998 a 2006 SETOR SOJA (ÓLEOS) 1400 em milhoes 1200 1000 800 600 400 200 0 98 19 99 19 BRASIL-CHINA 00 20 01 20 BRASIL-MUNDO Fonte: Secex/Aliceweb. Elaboração: IOS. 36 02 20 03 20 04 20 05 20 06 20 BRASIL-DEMAIS PARCEIROS Ou seja, nos setores onde se concentram as exportações brasileiras para a China, o Brasil tende a se especializar nos produtos menos processados. O mesmo verifica-se na cadeia do aço. Enquanto os superávits nas exportações de minérios – especialmente de ferro – crescem de maneira exponencial de 2000 em diante, os superávits tanto na exportação de ferro, como de aço, se reduzem a partir de 2003, em virtude não apenas da queda das exportações brasileiras, como também da elevação das importações brasileiras daquele país. Entre 2003 e 2006, as exportações brasileiras de aço para a China caem 75%, enquanto as importações brasileiras de aço daquele país saltam de praticamente zero para cerca de US$ 35 milhões, um montante ainda reduzido – 5% das compras externas brasileiras deste produto - mas com perspectivas de elevação. Gráfico 13 – Saldo Comercial do Brasil com a China em Minérios, Ferro e Aço – 1998 a 2006 COMPARACÃO MINÉRIOS, FERRO E AÇO 2500 em mi lhoes 2000 1500 1000 500 0 1998 1999 2000 FERRO 2001 2002 AÇO 2003 2004 2005 2006 MINÉRIOS Fonte: Secex/Aliceweb. Elaboração: IOS. A partir destes dados que procuram sintetizar as relações comerciais entre Brasil e China, pode-se dizer que os efeitos macroeconômicos positivos tendem a ser arrefecidos no médio prazo, ainda que se mantenham os termos de troca favoráveis ao Brasil durante o auge do ciclo econômico internacional; ao passo que os efeitos comerciais negativos (setores deficitários) tendem a deslocar os comerciais positivos (setores superavitários) no que tange aos seus impactos sobre o valor de produção interno. Entretanto, saldo estrutural negativo para a estrutura produtiva brasileira pode ser ocultado pelas políticas macroeconômicas capazes de levar a uma expansão vigorosa da demanda interna, mesmo que puxada pelos setores menos intensivos em tecnologia. Adicionalmente, o deslocamento brasileiro nos mercados externos pode assumir magnitudes importantes, ao passo que o efeito postergação de investimentos das multinacionais no Brasil – que montariam na China fábricas para fornecimento global – poderia se revelar superior ao efeito de atração de novos capitais chineses. Sugere-se assim que a China acarreta uma espécie de efeito armadilha para a inserção externa do Brasil. Para superá-lo, fazem-se necessárias medidas de curto prazo na área de defesa comercial e um tratamento coerente entre as políticas macroeconômicas, as iniciativas de integração regional e os programas industriais e de desenvolvimento tecnológico, que atuam sobre as variáveis de longo prazo. Os efeitos da crise financeira internacional tendem a alterar este cenário apenas parcialmente. Se o Brasil ganha certa “proteção” com relação à China derivada da desvalorização cambial transitória e da redução da demanda interna; a China, por outro lado, pode redirecionar os seus estoques de bens industriais para além dos seus mercados tradicionais localizados no mundo desenvolvido, o que traria impactos ainda mais negativos para o Brasil quando do novo auge do ciclo de crescimento interno, especialmente se este vier ancorado numa nova tendência de valorização cambial. MADE IN CHINA: Oportunidades e ameaças colocadas pela ascensão global da China para os trabalhadores latinoamericanos 37 Realização Apoio Procuramos agora, de maneira sintética, apontar como as tendências acima, em termos de evolução dos fluxos de comércio com a China, se relacionam com o comportamento da produção e do emprego. Se começarmos pelos setores brasileiros mais positivamente afetados pela emergência chinesa no cenário global, podemos diagnosticar uma importante elevação do nível de emprego em termos relativos. Na cadeia da soja e no setor de minérios, a elevação do emprego entre 2000 e 2005, foi de 153% e 58%, respectivamente, em termos acumulados. Ao todo, foram gerados 45 mil e 16 mil empregos nos dois setores. Quando analisamos apenas a produção de soja em grão e de minério de ferro, a expansão do emprego entre 2000 e 2005 foi de 314% e 64%, respectivamente. Nestes dois segmentos – onde o impacto chinês se faz mais direto - o total de novos empregos gerados chegou a 36 mil e 10 mil, respectivamente. Apesar de estes dados estarem em alguma medida subestimados, pois se referem apenas ao emprego formal, vale ressaltar que no período de maior volume de vendas comerciais para a China, o país gerou pouco menos de 50 mil empregos diretos para os dois segmentos. Isto se deve ao fato de estes serem bastante intensivos em capital. Gráfico 14 – Empregos Formais no Brasil na Cadeia de Soja e no Setor de Minérios – Brasil, 2000 a 2005 (Números Absolutos) 80.000 70.000 60.000 50.000 40.000 30.000 20.000 10.000 0 2000 2001 2002 SOJA 2003 2004 2005 MINERIOS Fonte: RAIS/MTE. Elaboração: IOS. Não se quer subestimar a importância destes setores em termos econômicos e da sua contribuição para o saldo positivo das contas externas. Apenas se quer ressaltar o seu limitado alcance em termos de encadeamentos para frente e para trás e o seu baixo potencial de geração de empregos diretos. Em conseqüência, do ponto de vista da estratégia de inserção externa de mais longo prazo, a concentração das exportações – tanto para a China como para o mundo - nestes setores sequer tangencia os problemas estruturais do mercado de trabalho brasileiro. O contraste com os setores industriais analisados no presente estudo é evidente. Apesar da maior penetração dos produtos chineses, que demonstrou ser mais vigorosa nos setores de calçados e eletroeletrônicos, todos estes setores se destacaram, até o presente momento, por uma elevação do emprego formal. Quando se somam os setores de baixo valor agregado (setores I) com de elevado valor agregado (setores II), o incremento no nível de emprego em termos acumulados, entre 2001 e 2005, situa-se na casa de 21%. No primeiro caso, foram quase 200 mil novos empregos gerados, enquanto no segundo, pouco mais de 100 mil. 38 Pode-se lançar aqui a hipótese de que a combinação de valorização da moeda pós-2004 e entrada crescente de produtos chineses, reduziu o potencial de expansão da produção e do emprego industriais, e afetou, em alguma medida, a capacidade de agregação de valor interno. Como o final deste período – 2004-2005 – coincide com um reaquecimento da demanda industrial interna, este fator possivelmente compensou os efeitos deletérios das exportações chinesas para o Brasil, que, como veremos adiante, se concentraram em alguns poucos segmentos. Tabela 18 – Empregos Formais por Segmentos da Indústria de Transformação – Brasil, 2000 a 2005 (Números Absolutos) Têxtil Vestuário Calçados Setores I Químicos Máquinas Eletroeletrônicos Setores II 2000 2001 2002 2003 2004 2005 Variação 2000-2005 (em %) 222.686 216.466 217.894 215.238 234.939 240.860 406.128 415.493 438.134 433.769 487.701 514.468 271.583 281.436 298.313 310.471 356.312 341.398 900.397 913.395 954.341 959.478 1.078.952 1.096.726 8,2 26,7 25,7 21,8 27,8 26,4 14,6 21,2 60.508 61.690 61.868 67.491 74.326 77.323 215.703 229.250 242.320 240.110 265.247 272.587 228.151 221.442 215.146 218.175 247.216 261.571 504.362 512.382 519.334 525.776 586.789 611.481 Fonte: RAIS/TEM. Elaboração: IOS. Algumas conclusões parciais emergem a partir da leitura destes dados. De fato, ao menos até 2005, dinâmica produtiva destes setores não parece ter sido drasticamente afetada pela expansão das importações brasileiras de produtos chineses, permitindo uma continuidade na elevação dos empregos. Em segundo lugar, os setores que se expandiram menos – têxtil e eletroeletrônicos – são aqueles onde o Brasil tende a se afirmar como importador da China de matérias-primas industriais e componentes. Isto tende a gerar uma especialização da indústria brasileira em alguns nichos e segmentos. Em terceiro lugar, estes dados não captam os efeitos negativos da excessiva valorização cambial, que prosseguiu entre 2006 e 2007, e pode – somado ao fator China – ter gerado fortes deslocamentos produtivos de empresas atuando tanto no mercado interno como no externo. Agrega-se a este fato, a possibilidade de que os dados de emprego formal da RAIS estejam superestimando os postos de trabalho criados, na medida em que alguns casos houve apenas ampliação da coleta ou mudança de vínculo de trabalhadores do setor informal para o setor formal. De qualquer maneira, de acordo com dados da RAIS, alguns segmentos já apresentaram quedas superiores a mil postos de trabalho formais no período de 2000 a 2005. São eles: tecelagem de fios e filamentos artificiais ou sintéticos, fabricação de tênis de qualquer material, fabricação de produtos farmoquímicos, fabricação de geradores, de equipamentos transmissores de rádio e televisão e de aparelhos telefônicos e sistemas de comunicação. A crescente especialização produtiva – gerando efeitos negativos em termos de emprego, os quais se localizam em alguns segmentos – não se mostra necessariamente negativa. O problema está quando este processo não se encontra respaldado por ações de política industrial, as quais se mostram inclusive questionadas pela forte valorização cambial processada de 2004 em diante. Em síntese, a combinação entre o fator China, valorização cambial acelerada e ausência de política industrial ampla, coerente e de conhecimento dos atores sociais pode comprometer de forma dramática não apenas os empregos existentes, mas a capacidade de geração de empregos no futuro, especialmente nos setores mais afetados pelas importações chinesas. Vale lembrar que estes setores industriais agregavam 1,7 milhões de empregos diretos formais, contra um total de apenas 75 mil empregos diretos formais no cultivo de soja e na fabricação de minérios de ferro. Ou seja, o potencial destrutivo de empregos nestes setores mostra-se bastante mais elevado do que as perspectivas de incremento de postos de trabalho nos setores onde o Brasil se mostra francamente superavitário. MADE IN CHINA: Oportunidades e ameaças colocadas pela ascensão global da China para os trabalhadores latinoamericanos 39 Realização Apoio Procedemos agora a um acompanhamento dos dados de produção e emprego destes setores a partir dos dados da Pesquisa Industrial Mensal/IBGE. Importa ressaltar que estes dados se confrontam com aqueles coletados pela RAIS e divulgados acima. Caso os dados do IBGE estejam mais próximos da realidade, os impactos sofridos pela ascensão chinesa sobre o Brasil tendem a ser maiores, e inclusive dramáticos para alguns setores. Ressalve-se, entretanto, que este não parece ser o caso, já que os dados do IBGE computam apenas o pessoal ocupado em empresas com mais de 30 empregados. Por um lado – ao se tomar como horizonte de análise o período de 2001 a 2007 –, os dados de produção física não chancelam o comportamento do emprego tal como apresentado pela RAIS. Em vários setores – à exceção de máquinas e eletroeletrônicos - o nível de emprego RAIS cresce bem mais rapidamente do que a produção segundo o IBGE. Ainda que as delimitações setoriais não sejam exatamente as mesmas, as diferenças se mostram substanciais. Por exemplo, verifica-se um crescimento da produção da indústria de transformação de 24% entre 2001 e 2007. O único setor que se destaca por uma expansão acima da média é o de máquinas e equipamentos. Depois aparecem, com crescimento positivo, mas inferior à média, os segmentos de material eletrônico e equipamentos de comunicação e a indústria química. Os segmentos da indústria têxtil, de vestuário e de calçados apresentam queda da produção para o acumulado do período, ainda que esta se recupere a partir de 2005 para a indústria têxtil e de 2006 para a do vestuário. Ou seja, aqui a demanda interna compensa a “invasão” chinesa. Já a indústria de calçados presencia uma queda contínua da produção de 2004 em diante, chegando em 2007 a um nível 16% inferior ao apurado em 2001. De outro lado, os dados de emprego do pessoal ocupado assalariado, segundo a base do IBGE, apresentam uma elevação apenas para o segmento de máquinas e equipamentos. A indústria de transformação em geral eleva o seu nível de emprego em 3,3% entre 2001 e 2007. O dado relevante é a queda expressiva do emprego, especialmente nos segmentos do vestuário e calçados, chegando esta a 25% e 30%, respectivamente. Se estiverem “corretos” estes dados – o que parece difícil ao menos na magnitude observada – a pressão competitiva chinesa, somada ao câmbio, já estaria acarretando impactos deletérios no emprego dos setores de menor produtividade do trabalho. Gráfico 15 – Números-Índices da Produção Física na Indústria de Transformação em Alguns Segmentos com Ajuste Sazonal (2001=100) 151,6 150,0 140,0 130,0 ind Transf. 124,1 Têxtil 115,6 Calçados e couro 120,0 Vestuário e acessórios 110,0 108,8 Químicos Máquinas e equipamentos Material eletrônico/comunicação 100,0 97,9 90,0 88,8 84,1 80,0 2002 2003 2004 Fonte: IBGE. Elaboração: IOS. 40 2005 2006 2007 Gráfico 16 – Números-Índices do Pessoal Ocupado Assalariado na Indústria de Transformação e alguns Segmentos com Ajuste Sazonal (2001=100) 125,0 122,2 115,0 ind Transf. 105,0 103,3 100,7 96,4 95,0 Têxtil Vestuário e acess. Calçados e couro Químicos Máquinas e equip. 85,0 Mat. eletrônico/comunicação 75,3 75,0 69,3 65,0 2002 2003 2004 2005 2006 2007 Fonte: IBGE. Elaboração: IOS. Apesar dos resultados contrastantes, pode-se afirmar com algum grau de embasamento empírico, que o nível de emprego nos setores têxtil, de calçados e vestuário tende a sofrer uma pressão baixista, a se manter a valorização da moeda e o caráter limitado da política industrial, mantendo-se umas poucas empresas competitivas, justamente aquelas com menor número de empregos com relação ao valor de produção. Os efeitos nocivos, concentrados nas menores empresas dependentes essencialmente do mercado interno, podem, entretanto, em alguns segmentos, ser contrabalançados pela pujança da produção interna. No caso dos setores químicos, máquinas e eletroeletrônicos, talvez os efeitos nocivos em termos de emprego e renda possam, para alguns segmentos, ser empurrados para o início da cadeia produtiva, especialmente no caso das grandes empresas nacionais e multinacionais. Porém, tende-se a processar, no longo prazo, um encolhimento da matriz industrial. No primeiro caso, o risco é a destruição de empregos e a conformação de um padrão de baixos salários; enquanto no segundo pode se comprometer a própria capacidade de geração de empregos no médio prazo em virtude do encolhimento da matriz industrial. Quadro 7 – Cenários para Alguns Segmentos da Indústria Brasileira num Contexto de Elevação das Importações Chinesas, Real Valorizado, Recuperação da Demanda Interna e Política Industrial Reativa MADE IN CHINA: Oportunidades e ameaças colocadas pela ascensão global da China para os trabalhadores latinoamericanos 41 Realização Apoio 3. As Migrações Chinesas para o Brasil Durante o período colonial, o Brasil entrou em contanto com a China e o Oriente por meio dos comerciantes portugueses. Os chineses estavam distantes, mas a porcelana, as colchas, os aparelhos de chá, os fogos de artifício – e tudo indica que o chapéu-de-sol - cedo se aclimataram na colônia. Era o tal do “negócio da China”. Este processo de assimilação de produtos orientais teria sido facilitado, segundo Gilberto Freyre (2003), pela paisagem social que então se criava. As distâncias entre senhores e escravos facilitavam a emergência de um modo de vida – a casa, comida, as relações humanas –, mais oriental que europeu. Com o século XIX, veio a europeização e a China no máximo aparecia como mão-de-obra. Alencastro (1997) ressalta que a presença da imigração chinesa no Brasil do século XIX teria se circunscrito ao debate parlamentar em torno do tipo de imigrante que se queria trazer para o país. O projeto de coolies chineses, para substituir o tráfico de escravos declarado ilegal em 1850, sofreria um veto interno. Quando muito, 3 mil chineses teriam aportado no Brasil ao longo do século XIX. Em 1940, o Censo Demográfico brasileiro reportaria apenas 646 chineses de um total de quase 1,3 milhão de imigrantes, os quais perfaziam 3% da população vivendo no Brasil. t r a z e r Na prática, portanto, a imigração chinesa para o Brasil ocorreria apenas a partir da década de cinqüenta, em função do final da guerra sino-japonesa e da implantação do socialismo, que produziriam uma significativa diáspora do povo chinês. Entre tais imigrantes encontravam-se muitos técnicos e industriais, principalmente de Shandong e Shanghai, que transferiram suas fábricas têxteis e moinhos para o Brasil. Nas décadas de oitenta e noventa, com a política de abertura da China, o número de imigrantes chineses aumentou consideravelmente, tendo estes se inserido preferencialmente no setor comércio. Os chineses foram ainda a população estrangeira mais beneficiada pela anistia da Polícia Federal de 1998. Foram regularizados 9.229 chineses, número que superou até o de bolivianos (9.155), que se destacam pela forte imigração para o Brasil5. Já as estatísticas oficiais sobre estrangeiros no Brasil, realizadas a partir do último Censo, de 2000, indicam que o número de chineses no Brasil no ano 2000 era de 10.291, o que corresponde a 1,5% do total de 683.182 de imigrantes no país. Ainda de acordo com o Censo Demográfico de 2000, as unidades federativas que apresentaram maior concentração de imigrantes chineses estão localizadas nas regiões Sul e Sudeste. O estado de São Paulo aparece em primeiro lugar com 6.862 imigrantes, seguido do Rio de Janeiro (1.331), Paraná (653) e Rio Grande do Sul (409). Gráfico 17 – Estados brasileiros com maior presença de imigrantes chineses 10,07% 3,97% 66,68% 6,35% 12,93% Total de imigrantes chineses: 10.291 São Paulo Rio de Janeiro Paraná Rio Grande do Sul Outros Estados Fonte: IBGE, Censo 2000 “Anistia da PF regularizou 9.229 imigrantes“ – Reportagem do jornal Folha de São Paulo, 23/07/2000, disponível em http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff2307200009.htm 5 42 Como se observa, além dos imigrantes chineses em situação regular, também há que se considerar o número de imigrantes chineses ilegais, que tem crescido nos últimos anos. Uma das portas de entrada para imigrantes chineses ilegais se dá através dos países vizinhos - Equador, Peru e Bolívia. Ao chegarem nestes países, o ingresso no Brasil é feito pelo Acre ou por Rondônia, de onde seguem por terra para o estado de São Paulo. Na verdade, a introdução ilegal de chineses no Brasil aproveita-se das mesmas redes de aliciamento de trabalhadores sul-americanos. Em busca de melhores oportunidades no Brasil, o imigrante chinês – de acordo com a Polícia Federal - em geral tem entre 20 a 25 anos, não domina o idioma português e chega ao país com pouco dinheiro6. O estado de São Paulo é o destino preferencial e abriga a maioria destes imigrantes que trabalham no comércio de propriedade de chineses já estabelecidos no país. Ou seja, predomina uma rede de relações sociais tecidas entre comunidades chinesas no Brasil e na China e que dependem da assimilação de novos trabalhadores chineses inseridos nas franjas do mercado de trabalho brasileiro. Como não conhecem o mercado, não têm direitos e não falam a língua local, tornam-se presa fácil da super-exploração. Em julho de 2009, o presidente Lula da Silva sancionou o projeto de lei 1.664-D de 2007 – a também conhecida Lei da Anistia Migratória – que concede a residência provisória a cidadãos estrangeiros em situação irregular no país 7. Esta nova legislação prevê a regularização de todos os estrangeiros que tenham entrado no Brasil até 1º de fevereiro de 2009, permitindo aos imigrantes ilegais a liberdade de circulação, direito de trabalhar, acesso aos serviços públicos de educação e saúde e o amparo da Justiça brasileira. Os beneficiados incluem todos os cidadãos estrangeiros que tenham entrado de maneira irregular no país, que estejam com o visto de entrada vencido ou que não tenham sido beneficiados pela última Lei de Anistia, de 1998. De acordo com o Ministério da Justiça, cerca de 50 mil pessoas poderia se beneficiar com a nova lei, sendo que entre os principais grupos de imigrantes estão: bolivianos, chineses, paraguaios, peruanos e russos. A legalização destes cidadãos visa combater o tráfico de pessoas e inibir as condições precárias de trabalho. Na cidade de São Paulo, até o final de agosto de 2009, os chineses representavam o terceiro grupo com mais anistias, ficando atrás apenas de paraguaios e peruanos 8. Entretanto, para além da via jurídica, há que se prosseguir na fiscalização dos ramos de atividade e nas áreas geográficas onde a imigração ilegal se faz mais presente. Enquanto houver miséria nos países de emigração e atividades econômicas pautadas na super-exploração no país hospedeiro, este fluxo tende a prosseguir. O caso chinês merece acompanhamento do governo e dos movimentos sociais brasileiros já que a imigração tem aumentado, se encontra associada à pobreza e leva ao fortalecimento de laços de exploração. Ao invés de despertar sentimentos de xenofobia no país de destino, deve-se ter presente que estes trabalhadores são na maior parte dos casos vítimas de um processo de super-exploração que envolve a participação de brasileiros e chineses. “PF faz operação contra imigração ilegal de chineses em 3 estados”– Reportagem do portal de notícias G1, 25/05/ 2009, disponível em http://g1.globo.com/Noticias/Brasil/0,,MUL1163864-5598,00PF+FAZ+OPERACAO+CONTRA+IMIGRACAO+ILEGAL+DE+CHINESES+EM+ESTADOS.html 6 “Lula sanciona lei que anistia imigrantes em situação irregular no Brasil” – Reportagem do jornal Folha de São Paulo, 02/07/2009, disponível em http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u589800.shtml. 7 “PF anistia 6,5 mil estrangeiros irregulares em SP” – Reportagem do Jornal o Globo, 24/08/2009, disponível em http://oglobo.globo.com/cidades/mat/2009/08/24/pf-anistia-6-5-mil-estrangeiros-irregulares-em-sp-paraguaios-saoos-maiores-beneficiados-767293167.asp 8 MADE IN CHINA: Oportunidades e ameaças colocadas pela ascensão global da China para os trabalhadores latinoamericanos 43 Realização Apoio 4. Desafios da Ascensão Chinesa para o Brasil e o Movimento Sindical Se, até 2008, a forte expansão das importações chinesas não trouxe impactos fortemente negativos sobre o nível de emprego brasileiro nos setores mais afetados pela sua penetração – têxtil, vestuário, calçados, máquinas, eletroeletrônicos e indústria química –, tal se deveu ao forte incremento da demanda interna. Com o desenrolar da crise financeira internacional, é provável que se reduzam em alguma medida as importações industriais chinesas no curto prazo; porém, ao se recuperar a demanda interna, e num contexto de câmbio valorizado, perdas expressivas de emprego em alguns setores podem se vislumbrar no médio prazo, acompanhadas de precarização das relações de trabalho nos elos iniciais e finais da cadeia produtiva. Este quadro tende a se mostrar cada vez mais sombrio, caso não se acionem medidas de política industrial e acordos de complementação produtiva entre os países da região, cujo comércio passa ser desviado pela penetração de produtos chineses. Por outro lado, o nível de emprego gerado diretamente por meio das crescentes exportações chinesas tem se mostrado pouco significativo, já que se estas se encontram concentradas em setores intensivos em capital, como no caso da cadeia de soja e de minério de ferro. No que diz respeito aos investimentos chineses, o seu baixo volume, apesar da elevação recente, não permite inferir, ao menos até o presente momento, nenhuma tendência no sentido de uma ainda maior precarização das condições e relações de trabalho. Esta poderia ocorrer em regiões ou setores específicos, onde, aliás, o desrespeito à legislação sindical e trabalhista independente da origem do capital. O país deveria, portanto, ser capaz de elaborar uma estratégia de desenvolvimento e de inserção externa para além da conjuntura de crise internacional. O objetivo principal parece ser o de limitar os impactos sobre o deslocamento da produção interna - com repercussões negativas em termos do nível e das condições de emprego - quando da recuperação econômica e, conseqüentemente, das importações brasileiras da China. Paralelamente, deve se avançar no enobrecimento da estrutura produtiva nacional, avançando inclusive em novos setores e segmentos de vanguarda tecnológica. Esta perspectiva assume que o desafio chinês veio para ficar e que ele está ancorado num modelo de desenvolvimento – que apesar de ampliar as desigualdades sociais – viabilizou uma profunda transformação das bases produtivas daquele país. No outro extremo, existe a tentação de ver estes problemas como passageiros e relacionados a alguma artimanha competitiva produzida pelos “chineses”. Esta visão tem sido estimulada pelo discurso racista sobre o “perigo amarelo”, o qual tem se difundido pela imprensa internacional e por líderes políticos conservadores dos países desenvolvidos. A solução seria simples: fechar as portas aos produtos chineses. O argumento estaria na concorrência desleal por eles prática, o que se poderia comprovar pelos baixos custos da força de trabalho naquele país. Daí a associação tão corriqueira entre mercadorias “made in China” e produtos de má qualidade ou oriundos da pirataria. Ainda que isto aconteça, e não seja irrelevante, a expansão chinesa recente – inclusive no mercado brasileiro, como vimos - tem se concentrado cada vez mais nos produtos mais intensivos em tecnologia, deslocando a produção interna, pela ausência de políticas de defesa comercial, mas principalmente pela ineficácia destes países em desenvolver políticas industriais e de inovação tecnológica. Portanto, a ameaça chinesa não se deve à mão-de-obra barata, mas à incapacidade de desenvolver políticas nacionais e regionais de desenvolvimento por parte dos países latino-americanos. Obviamente que a se manter o quadro atual, os impactos se farão sentir sobre o nível e a qualidade do emprego, elo mais fraco dos custos totais incorridos pelas empresas com atuação local. Daí a necessidade de que os trabalhadores brasileiros e demais movimentos sociais interfiram nas 44 políticas econômicas, comerciais, industriais e de integração regional implantadas pelos seus próprios países. E de que não “comprem” o discurso de parte do empresariado de que “não dá para competir com os produtos chineses, partindo de uma legislação trabalhista de Primeiro Mundo”. Este texto parte da visão de que apenas se enfrenta o desafio chinês por meio do reforço dos mecanismos de integração regional, de modo a desenvolver complementaridades produtivas. Do contrário, as tênues cadeias produtivas regionais podem ser desarticuladas de forma definitiva. A ascensão da China não pode servir - tal como outrora o conceito vago de globalização - como bode expiatório para que se abra mão, numa visão fatalista, das políticas de desenvolvimento nacional, de integração regional e de reforço do papel do Estado com regulação social. Estas políticas, a serem concebidas pela sociedade brasileira, junto com o governo, de modo a enfrentar os desafios oriundos de uma economia global crescentemente sino-cêntrica, poderiam contemplar ações de curto, médio e longo prazo. No curto prazo, encontram-se as políticas macroeconômicas (neste caso, a mais importante se refere ao estabelecimento de uma taxa cambial competitiva) e as políticas de defesa comercial, negociadas conjuntamente com os países do Mercosul. No médio prazo, situam-se as políticas industriais e tecnológicas, tanto aquelas voltadas para a reconversão dos setores mais afetados pela presença chinesa (têxtil, vestuário, calçados, químicos, máquinas e eletroeletrônicos), com foco nos segmentos onde a substituição competitiva de importações se faz mais viável e onde se encontram os maiores níveis e potenciais de geração de empregos; como aquelas que buscam o fortalecimento de novos nichos e setores favorecidos pela expansão chinesa ou não afetados diretamente por ela. È o caso basicamente de produtos relacionados às novas tecnologias. No longo prazo, o maior antídoto que o Brasil e os seus trabalhadores têm face à maior presença chinesa na economia mundial é a capacidade de turbinar o seu mercado interno, potencializando inclusive a atração de capitais chineses. Se o foco do investimento externo é a expansão do mercado interno, reduzse o incentivo para aumentar a rentabilidade com precarização das condições e relações de trabalho. Paralelamente, tudo indica que a economia chinesa nos próximos dez anos se voltará crescentemente para o seu mercado interno, ampliando a importação proveniente do resto do mundo não apenas de matérias-primas e alimentos, mas também de produtos industriais e de serviços de vários nichos. Estas políticas de curto, médio e longo prazo deveriam ser formuladas a partir de um consenso social nacional, além de negociadas com os parceiros do Mercosul e da região. Do ponto de vista do movimento sindical brasileiro, seria importante que elas fossem acompanhadas por um monitoramento contínuo dos níveis de emprego e salários nos setores analisados, de modo a reavaliar o impacto das políticas adotadas. À medida que o investimento externo chinês no Brasil se mostrar mais relevante, este monitoramento poderia se voltar para as relações de trabalho nas principais plantas de produção. MADE IN CHINA: Oportunidades e ameaças colocadas pela ascensão global da China para os trabalhadores latinoamericanos 45 Realização Apoio Anexos Quadro 1 – Acordos de Cooperação entre Brasil e China entre 1995 e Início de 2009 46 Fonte: MRE. Quadro 2 – Visitas Presidenciais e Missões Oficiais entre Brasil e China durante o Governo Lula Fonte: MRE. MADE IN CHINA: Oportunidades e ameaças colocadas pela ascensão global da China para os trabalhadores latinoamericanos 47 Realização Apoio Bibliografia ALENCASTRO, Luiz Felipe e Maria Luiza Renaux, Caras e Modos dos Migrantes e Imigrantes, in: História da Vida Privada no Brasil, vol. 2. São Paulo: Companhia das Letras, 1997. 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