1 O Casamento. O Direito de Família, à luz da
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1 O Casamento. O Direito de Família, à luz da
1 O Casamento. O Direito de Família, à luz da dignidade humana.* Na vida do homem, tudo começa com um primeiro ato criador: uma semente lançada em solo preparado, que se multiplica e se multiplica, semelhante a pedras lançadas ao lago, formando a sociedade, a nação, o Estado, as comunidades internacionais, como em círculos concêntricos, que abrangem e incluem uns e outros, o todo e as partes, destinados ao bem comum. Introdução – 1. Filosofia Jurídica ou Teoria do Direito. 2. Princípios sobre a natureza do homem: a) Princípios e valores fundamentais: igualdade liberdade e vida; b) Fundamento constitucional da dignidade humana; c) A sociedade: pluralista, fraterna e solidária. 3. Instituição da família: a) Casamento, família e direito; b) Casamento e consentimento; c) Juridicidade intrínseca da família. 4. Valores informativos da vida familiar: a) Formação da comunidade familiar; b) Respeito e proteção aos entes familiares: Crianças e adolescentes. Idosos e deficientes; c) Educação para cidadania; d) Ética na comunicação social. 5. Bioética e Biodireito: novas tendências: a) Valor da vida humana e sua inalienabilidade; b) Direito a nascer dignamente; c) Direito a morrer com dignidade. Conclusão. Bibliografia. Introdução Família é instituição de ordem natural ordenada à congregação de uma sociedade e à fundamentação do Estado. Através de um viés dedutivo, a partir da dignidade da pessoa humana, procuramos visualizar as famílias, naturalmente constituídas, os corpos * Principais abreviaturas utilizadas: CF = Constituição Federal; CC = Código Civil 1916; NCC = Novo Código Civil 2002; LDB = Leis de Diretrizes e Bases; ECA = Estatuto da Criança e do Adolescente; CP = Código Penal. 2 intermediários1 e o Estado. Não há Estado sem sociedade estável que o organize, com o suporte de entidades familiares que se formam seguidamente. Para um estudo adequado da família, referida ao casamento, convém, portanto, adentrar em suas origens primeiras, pois finca suas raízes na própria natureza atrativa e gregária do ser humano, e transcende às pessoas que a compõem. Sua constituição é prévia à formação do Estado e, como tal, este não se substitui à família, nem pode intervir em sua composição, pois tem por missão reconhecê-la e protegê-la, de vez que a formação de um núcleo familiar se fundamenta na livre e espontânea adesão recíproca de um homem e uma mulher, pela sua natural vis atractiva. O instinto natural de formar um casal obedece à ordem universal da transcendência do homem e da mulher, através do amor mútuo e da procriação de filhos, como vocação natural de perpetuação da espécie. Este fundamento antropológico de atração recíproca dos seres humanos encontra-se na tradição bíblica: sob a aparência de um simbolismo ou metáfora, relata que o homem e a mulher deixarão pai e mãe e, se unindo, "serão dois em uma só carne" (Gênesis, 2, 24), com a missão de fazer crescer e multiplicar o gênero humano. A evolução dos grupos familiares se dá, pois, em sociedade, corpo social que se desenvolve e aperfeiçoa à medida em que se desenvolvem as famílias, como fenômeno interativo: os núcleos familiares compõem o patrimônio material e espiritual da sociedade, também esta molda as famílias com regras consuetudinárias de convivência, respeito, solidariedade, ajuda mútua, unidade protetora, etc, cujas sementes transformadoras recebeu daquelas mesmas comunidades familiares. 1 . Corpo ou grupos intermediários conceituam-se como entidades que associam pessoas ligadas por um interesse, para obtenção de determinada finalidade. Distinguem-se da simples sociedade, associação ou fundação, em virtude do vínculo que une seus integrantes, de forma a constituir um corpo. No referente à Família, assim define a Centesimus Annus, n. 13: “A natureza social do homem não é plenamente satisfeita no Estado, mas se realiza em vários grupos intermediários, começando com a família e incluindo grupos econômicos, sociais, políticos e culturais que se originam a partir da própria natureza humana e que têm autonomia própria, sempre levando em conta o bem comum”. 3 Não é apenas a família que cria regras de conduta à sociedade, mas esta, situando-se acima da desarmonia das agregações familiares, estabelece, igualmente, as normas do deverser, o que caracteriza uma das origens primeiras da lei civil. As sociedades assim constituídas desenvolvem paralelamente dois poderes fundamentais para o governo das pessoas, o político e o jurídico, os quais, através de tempos imemoriais, sempre conviveram em tensão pendular: ora predominando o poder político (freqüentemente através da força e da violência, que conduz coercitivamente os súditos do governante), ora prevalecendo o poder jurídico (mais evidente nos estágios democráticos das Cidades gregas, da República Romana ou no período medieval europeu). O Estado é originário desta tensão criadora: de um lado deve possuir a potestas, para estabelecer e manter a ordem na sociedade, de outro a auctoritas, para dar aos cidadãos, componentes da civitas, a necessária segurança jurídica para não serem esmagados pelo Leviatã que, afinal, acabaram de criar para lhes servir2. Enquanto a sociedade é um ente necessário por natureza3, composto de pessoas humanas reais, o Estado é uma criação, um artefato da sociedade, uma estrutura materializada em Governo(s), a que se reconhece, não obstante, o caráter incontestável de instituição. Em síntese, como instituição natural, a família caminha para a sociedade, pelo fundamento antropológico que faz do homem e mulher seres que se atraem e se completam naturalmente, e que necessitam se perpetuar através da geração de filhos. Esta, reciprocamente, se organiza para acolher outros grupos familiares e adequá-los à convivência social digna, respeitosa, criativa, ordenadora de condutas, solidária, pluralista, sem preconceitos, buscando a harmonia social.4 Para tanto, organiza a forma de governo de si 2 . Cf. Rafael DOMINGO. Teoria de la "auctoritas". Pamplona: EUNSA, 1987. . Cf. Johannes MESSNER. A razão de ser da sociedade. Ética Social (O Direito Natural no Mundo Moderno). São Paulo: Edit. Quadrante, pp. 130ss., s/d. 4 . Cf. Preâmbulo da Constituição Federal de 1988. 3 4 própria, o Estado, seja pela vontade de um Príncipe (tirano, ditador, conquistador), seja pelo pacto social (democracias). Idealizado o Estado, hoje, para ser o guardião e o defensor das liberdades individuais e o garante do desenvolvimento integral do homem e da mulher, nas famílias e na sociedade, élhe defeso interferir nas atividades privativas das sociedades conjugais, pela ordem natural que só a elas compete (a privacidade do lar, da convivência familiar, da educação dos filhos, a liberdade de trabalho, do lazer, etc)5; é-lhe igualmente interdito extrapolar abusivamente de sua função social, a de reconhecer e proteger os direitos dos núcleos familiares, não afrontando, através da legislação civil, a origem e a ordem natural da formação e desenvolvimento das famílias em sociedade6. Compete ao Estado, sobretudo no cumprimento dos direitos fundamentais constitucionais, zelar pela vida, na defesa do homem em sua origem, em sua evolução e em seu declínio, vedando ativamente a violação daqueles valores, superiores a todos os demais, que resguardam o direito à vida humana com dignidade. A Constituição Federal instituiu como fundamento da República brasileira a dignidade da pessoa humana (art. 1º, inc. III); elevada a valor supremo do ordenamento jurídico deve informar toda a legislação infra-constitucional, e as relações jurídicas e sociais. É no Direito de Família, em toda sua abrangência, que esta tutela da dignidade humana haverá de se aplicar, seja na fundação e desenvolvimento das relações familiares, seja na sua dissolução, pois é na família que se centra a pessoa, em relação de pro-existência com as demais. Na esteira dos fundamentos constitucionais, o Legislador inscreveu no novo Código Civil (Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002) princípios de tutela que haverão de preservar a 5 . Cf., v. g., o elenco das inviolabilidades garantidas pela Constituição Federal, artigo 5º e incisos VI, X, XI, além das liberdades individuais e coletivas. 6 . CF, Art. 226; NCC, Art. 1.513. 5 dignidade dos membros das sociedades conjugais, bem como coibir a violação de seus valores. Não pensamos em uma nova teoria sobre a família, mas em uma análise das categorias filosóficas e jurídicas que a envolvem, decorrentes da natureza antropológico-social do homem e da mulher, com reflexos sobre a nova lei civil positiva. Pretendemos, com isso, enfocar o dinamismo interno dos personagens familiares em sua comunicação com a Sociedade e o Estado. Nesta linha de análise metodológica serão apreciadas a incidência dos princípios gerais de direito e valores constitucionais, os dispositivos codificados, a legislação especial pertinente, e até mesmo as declarações internacionais de direitos, além das recentes opiniões doutrinárias. 1. Filosofia Jurídica ou Teoria do Direito Duas são as Teorias sobre o Direito que se aplicam igualmente à Família, o Direito natural e o Direito positivo: são faces da mesma realidade, opostas numa dialética de complementaridade, não de oposição. Nesta relação causal ou de dependência, o Direito natural se apresenta como fundamento e limite ao Direito positivo7. Este limite é marcado pela natureza das coisas e pela natureza do homem, como único ser dotado de razão, vontade, liberdade e sentimento. Nisto consiste a dignidade da pessoa humana: não ser igualada a outros seres, mas digna de valorização por sua origem superior e racionalidade. Para bem compreendermos o tema, vale recordar algumas noções filosóficas, como as de imanência, contingência e necessidade. 7 . Dentre outros, os princípios constitutivos de Direito Natural são: bonum faciendum (o bem deve ser feito), nemine laedere (não lesar a ninguém), suum cuique tribuere (dar a cada um o que é seu), respeitar a personalidade do próximo, as leis da natureza, etc. MONTORO, André Franco. Introdução à Ciência do Direito. 25ª ed. São Paulo: Edit. Rev. dos Tribunais, 1999, p. 51. 6 Diz-se imanente o que está contido em um ser, no caso o homem, independente de ação exterior. Tem correlação com os dons inatos ou imanentes com que nascemos e os quais não podemos descartar, mas deles dependemos para viver dignamente com os demais seres humanos e com a própria natureza. E contingente é o que é possível, “o que pode ser ou não ser”, logo, é necessário (S. Tomás). Pode-se falar em “verdades contingentes” (Leibniz), como a Liberdade, que “não pode não existir” (Sartre). Finalmente, necessidade é a dependência do ser vivo a outros seres ou coisas. Para o Homem, pode-se falar em necessidades materiais ou corporais, espirituais, de disciplina, de regras, de liberdade, afeto, felicidade, etc. No diálogo O Banquete, Platão introduz uma noção de valor: necessidade de amor, como carência ou busca do que falta; e, na República, atribui a origem do Estado à necessidade de ajuda mútua entre os Homens. Para Tomás de Aquino, necessário é o que não pode não ser, indicando o necessário material, necessário formal (natural e absoluto = que um triângulo tenha os três ângulos iguais a um reto), necessário final (ou utilidade = o alimento é necessário à vida), e necessário eficiente (ou de coação = não se pode agir de outra maneira = alguém furtar pão para não morrer de fome).8 Convém recordar alguns Princípios de Direito Natural, porquanto Casamento e Família são instituições referidas à natureza do homem. Diz a Filosofia clássica que, em geral, não há ciência se não fundada na natureza das coisas; Montesquieu, mesmo no início do seu famoso livro, enfatiza que “Leis são relações necessárias que decorrem da natureza das coisas”9, e a Filosofia do Direito, em especial, que, sendo o homem o objeto da ciência 8 . ABBAGNANO, Nicola. Diccionario de Filosofía. México: Fondo de Cultura Económica, 1992, 9ª ed. Verbetes Contingente, Necesario, Necesidad. 9 . Espírito das Leis, L. 1º, Cap. 1º. 7 jurídica, o Direito se funda na natureza do homem. (As leis são feitas pelo homem e para o homem).10 No campo do Casamento e da Família, origem, fundamento e segurança de toda vida humana, podem ser tomados como primeiros princípios ético-naturais, de caráter formal, os seguintes, dentre outros:11 Tratar a todos como a ti mesmo, assim explicado desde as antigas filosofias e no Evangelho de Lucas (6; 31); em sentido positivo: faz aos demais o que queres que eles te façam; e negativo: não faças aos demais o que não queres que eles te façam, síntese da segunda tábua do Decálogo: Amarás ao teu próximo como a ti mesmo. Fazer o bem e evitar o mal, que Tomás de Aquino deduz do primeiro princípio de razão prática: Bem é o que a todos apetece. Viver honestamente, não lesar a ninguém, e dar a cada um o que é seu, enunciado por Ulpiano, recolhido no Digesto e nas Instituições de Justiniano12. Estes princípios ou verdades naturais, em terminologia moderna abrangem concretamente todos os denominados direitos humanos ou fundamentais, destacando-se, para este estudo, os direitos à vida, à comunicação sexual, à procriação, à educação da prole, ao trabalho, à informação, mas também o direito à igualdade e à liberdade. 2. Princípios sobre a natureza do homem Prescreve a Constituição, preambularmente, que são valores superiores da sociedade brasileira o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, 10 . JUSTINIANO, Digesto, 1,5,2: “Por causa do homem é que todo o direito foi constituído”. . Cf. VALLET DE GOYTISOLO, Juan Berchmans. Qué es el derecho natural. Madrid: Speiro, 1997, p. 84. 12 . D. 1,1,10, 1; I. 1,1,3. Trata-se dos clássicos Tria iura praecepta: Honeste vivere, alterum non laedere, suum cuique tribuere, fundamentais até hoje, para a melhor compreensão do Direito. 11 8 o desenvolvimento, a igualdade e a justiça, reconhecendo os Constituintes que o faziam sob a proteção de Deus. Superaram, inegavelmente, o positivismo jurídico puro que predominou desde o século XIX na dogmática jurídica ao introduzirem na Lei Fundamental a Teoria dos Valores, inspirados em Max Scheler e Nicolai Hartman, que a seu tempo substituíram com vantagens a Teoria do Bem, advinda da Ética platônica e aristotélica. Todos aqueles valores elencados se subsumem no maior deles, que é a dignidade da pessoa humana, ou o tratamento da pessoa como ser digno da máxima proteção da sociedade e do Estado. Esse conceito da dignidade foi considerado e tratado, portanto, como valor supremo. Ao se considerar o homem numa visão axiológica, do ponto de vista de sua dignidade, constata-se ser um valor absoluto participado: “É um valor absoluto, não um valor instrumental: ele pertence à ordem dos fins, e não à dos meios, à ordem do frui e não àquela do uti, para usar e não para ser utilizado, na linguagem de Santo Agostinho”13. Trata-se de uma verdade estreitamente ligada ao conceito da pessoa: o homem é um valor absoluto porque é pessoa, um ser subsistente na ordem do espírito. Assim, v. g., o valor liberdade: o homem é livre porque esta é a primeira propriedade do espírito, ser livre e soberano; o valor dignidade é inviolável: a dignidade do homem não pode ser violada porque é real e sacra, enquanto o homem é espírito, que lhe confere este valor absoluto. Se o homem fosse só corpo, só matéria, teria valor meramente instrumental, seria realidade manipulada, instrumentalizada, não um fim, mas um meio. Por esta lógica, todos os crimes contra o homem tornar-se-iam possíveis, desde os caprichosos aos mais monstruosos: “pode-se matá-lo no útero materno, nos campos de concentração, nas câmaras de gás; pode-se 13 . MONDIN, Battista. Definição filosófica da pessoa humana. Bauru: Edusc, 1998, p. 43. 9 brutalizá-lo com a violência, com a droga, com a miséria, com a fome, com a desonra, com a injúria, negando-lhe a justiça e constrangendo-o ao desemprego”14. Mesmo os romanos, demonstrando profundo sentido do direito como objeto da justiça, estavam compenetrados de que a ordem jurídica tem um fundamento que transcende a vontade dos homens que governam.15 Cícero, filósofo e jurista, magistrado e advogado, político e homem de letras, assim se pronunciava: Se a vontade dos povos, os decretos dos chefes, as sentenças dos juízes constituíssem o direito, então, para criar o direito ao latrocínio, ao adultério, à falsificação dos testamentos, seria bastante que tais modos de agir tivessem o sufrágio e a aprovação da multidão. Se o poder e as opiniões dos insensatos se revestem de tal força, que lhes seja dado modificar a natureza das coisas, por que motivo não poderão os mesmos decidir que o que é mau e pernicioso seja tido por bom e salutar? Ou por que a lei, transformando a injúria em direito, não poderá converter o bem no mal? É que para distinguir as leis boas das más outra norma não temos senão a da natureza16. Contudo, todas estas ofensas à dignidade do homem são repelidas pelo Direito e pela Constituição, que protegem esse valor absoluto, sobretudo com a definição dos direitos fundamentais, novo nome dos direitos humanos. O novo Código Civil dá ênfase especial a conceitos pelos quais o Código de 1916 não estimou, tanto que o novo diploma, seguindo os postulados da Constituição, dá primazia aos valores da pessoa humana sobre o normativismo técnico-jurídico, prestigiando a boa-fé, a eqüidade, a justa causa e outros critérios que ampliam a atuação do julgador, conferindo-lhe 14 . MONDIN. Op. cit,. p. 43. . SOUSA, José Pedro Galvão de. A Constituição Romana. Revista de Estudos Jurídicos da UNESP-Franca. Franca, São Paulo, vol. 5, p. 192, 1998. 15 10 maior poder para realizar, no caso concreto, a solução mais justa e eqüitativa. Para o eminente jurista Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, este é “o ponto mais alto do novo estatuto civil”.17 Dignidade da pessoa humana e cidadania constituem dois caracteres de toda pessoa: o social e o individual; cidadão é o indivíduo formado para o exercício dos seus direitos em sociedade, portador de uma dignidade pessoal, que deve defender, e a sociedade pluralista respeitar. A dignidade não é dada à pessoa pelas Leis ou pela Constituição, mas ela lhe advém da própria natureza do Homem: o fato de ser diferenciado de todos os demais seres criados, primeiramente, e por ser o único ente dotado de razão, vontade e liberdade, fundamentam essa específica diferenciação. O ser humano não é apenas um indivíduo, é uma pessoa, "substância individual de natureza racional".18 a) Princípios e valores fundamentais: igualdade, liberdade e vida Este mesmo intróito constitucional aponta quais são aqueles valores supremos da sociedade humana: a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça, sem excluir outros de igual relevância, como a vida. E atribui ao Estado Democrático de Direito a destinação de assegurar aqueles valores, como direitos sociais e individuais, enfatizando o social como ambiente natural do desenvolvimento da personalidade humana. Ao assumir a tutela da dignidade da pessoa 16 . De legibus, I, 16, apud SOUSA, José Pedro Galvão de. Idem, p. 193. . TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo. (Org.). O Novo Código Civil. Rio de Janeiro: América Jurídica, 2002. p. IX. 18 . Conforme clássica definição do romano Severino Boécio (480-525), apud MARTINS FILHO, Ives Gandra. Manual Esquemático de História da Filosofia. 2ª ed. São Paulo: LTr, 2000, p. 74. Dignitas, dignitatis, significa decoro, qualidade superior, nobreza, excelência, lembrando Cícero que a idéia de dignidade está associada à de justiça e eqüidade (República, II, 53). 17 11 humana como valor fundamental do ordenamento, a Constituição imprime seu comando a toda legislação infraconstitucional, estando presente no novo Código Civil. O reconhecimento da igualdade entre cônjuges é fundamento inafastável para cumprimento da preservação da dignidade humana. A Constituição de 1988 a consagra no art. 5º, caput, e inc. I, declarando expressamente, no art. 226, § 5º, que: “Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher”. Todavia, as disparidades constantes da legislação ordinária criaram perplexidades e exigiram interpretações quanto à auto-aplicabilidade dos princípios às regras constitucionais. Foram os Tribunais que adequaram os princípios fundamentais às situações conflitantes com a lei antiga.19 Conforme a Constituição, o novo Código não conflita com a norma fundamental de absoluta igualdade de direitos e deveres dos cônjuges, resguardando sua dignidade. Assim dispõe o art. 1.511: “O casamento estabelece comunhão plena de vida, com base na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges”. A idade núbil foi fixada em 16 anos, para ambos os pretendentes ao casamento (art. 1.517); têm igualdade nos encargos da família, como consortes ou companheiros (art. 1.565); têm direito recíproco em adotarem o sobrenome do outro cônjuge (§ 1º), e responsabilidade igualitária no planejamento familiar (§ 2º). Estabelece o art. 1.566 os deveres de ambos os cônjuges; o artigo seguinte trata da direção da sociedade conjugal em colaboração, pelo marido e pela mulher; e o art. 1.568 prevê o concurso material de bens para a sociedade conjugal, proporcionais aos bens ou ganhos de cada membro, como aplicação concreta da justiça distributiva; o mesmo ocorre na escolha conjunta do domicílio (art. 1.569). 19 . SANTOS, Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos. Reparação civil na separação e no divórcio. São Paulo: Saraiva, 1999, pp. 64-70. 12 O acordo mútuo sobre a guarda dos filhos na separação ou divórcio, é outra regra sob regência do princípio da igualdade (art. 1.583); quanto aos filhos, são equiparados tanto os havidos ou não da relação de casamento, como por adoção, vedada qualquer espécie de discriminação (art. 1.596). Das mais expressivas aplicações do princípio da igualdade é a que se encontra na definição do art. 1.631 sobre o poder familiar: “Durante o casamento e a união estável, compete o poder familiar aos pais; na falta ou impedimento de um deles, o outro o exercerá com exclusividade”. A liberdade é inerente à condição humana: não há homem não livre. Está relacionada com a igualdade, em tensão dialética, em que ambas se buscam para dar plenitude ao ser humano. Sempre foram tratadas como valores fundamentais em todos os tempos, embora não com os conceitos modernos, mas como bens pelos quais o homem deve lutar para possuí-los e deles não ser despojado. Não são as leis, pois, que criam e outorgam estes valores ao ser humano, como se fossem direitos, pois são atributos imanentes ao homem, e, portanto, protegidos pela Constituição com as cláusulas pétreas de inalienalibilidade (Art. 5º e incisos IV, VI, IX, X, XI, XII, XIII, XV, XVII e outros). No casamento, a liberdade de contratar, ou a livre manifestação da vontade do homem e da mulher, se expressam claramente no ato de consentimento ao matrimônio [NCC art. 1.514, CF art. 226, § 1º, definindo o casamento contrato (NCC art. 104, CC art. 82, sobre a validade do negócio jurídico)]. Sobre este relacionamento dialético entre liberdade e igualdade, Celso Ribeiro Bastos invoca lição de Zippelius segundo a qual “A realização contínua de uma certa dose de igualdade, a manutenção das desigualdades dentro de alguns limites que estas não possam ultrapassar, 13 tanto no plano jurídico como no plano material, é indispensável à subsistência da liberdade.”20 Em outros termos, na família, igualdade e liberdade pugnam para alcançar o necessário equilíbrio e bem-estar que garantam a permanência e o crescimento harmônico do núcleo familiar. Tocante ao valor vida, inegável sua ampla proteção pela Constituição (art. 5º) e pelo NCC (art.2º), sobre ela teremos oportunidade de melhor discorrer no Capítulo 4, especialmente quanto ao respeito e proteção aos entes familiares, e no Capítulo 5, sobre Bioética e Biodireito. b) Fundamento constitucional da dignidade humana O princípio fundamental da Constituição de 1988 é reconhecidamente o da dignidade da pessoa, em todos os setores da vida humana, e assim aplicado ao longo do texto constitucional. A nova formulação fundamental do Direito de Família reconhece e legitima a dignidade natural das pessoas dentro dos diferentes núcleos, grupos ou entidades familiares. Essa dignidade exsurge do simples fato de o homem ser pessoa. Não necessita ser declarada pela lei, apenas ser positivada e protegida, pois nenhuma lei pode derrogá-la. Ao distinguir essas entidades no art. 226, abrangendo a diversidade de famílias, a Constituição procurou resguardar a dignidade única de cada uma delas, preservando, no seu próprio interior, o caráter pessoal de seus membros. E ao elencar os grupos familiares, em ordem de especialização, o Constituinte preservou-lhes sua dignidade intrínseca, para estimular seu desenvolvimento, ao reconhecer 20 Comentários à Constituição do Brasil. 2º vol. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 16. 14 os efeitos civis do casamento religioso (§ 2º), ao incentivar a promoção da união estável em casamento (§ 3º), e ao proteger a entidade familiar monoparental (§ 4º). São explícitos, nessa esfera de proteção, os princípios da igualdade de direitos e deveres dos cônjuges (§ 5º); no planejamento familiar, a reafirmação da dignidade humana (e da paternidade responsável) (§ 7º); e na assistência contra a violência interna às famílias (§ 8º). Ademais, o princípio da dignidade da pessoa aflora em outras regras sobre a família, quando, v.g., no art. 227, de primorosa expressão normativa, assegura à criança e ao adolescente todos os direitos, “com absoluta prioridade”, aí compreendidos o respeito e a dignidade; quando estabelece normas favorecendo as pessoas portadoras de deficiências (§ 2º e art. 244); quando equipara as filiações oriundas ou não do casamento e adoções (§ 6º); quando, pelo princípio da solidariedade e mútuo auxílio, estabelece deveres de assistência aos filhos menores pelos pais, e reciprocamente na velhice destes (art. 229); e quando, em nome do direito à vida (digna) das pessoas idosas, impõe à família, à sociedade e ao Estado o dever de ampará-las (art. 230). Em todas estas circunstâncias existenciais da vida familiar, iluminada pelo Constituinte de 1988, ressalta sua motivação axiológica para com os princípios de valorização da pessoa humana no interior da família, independente de suas categorias relacionais. Nesse sentido, pode-se falar até mesmo na formação de um “meio ambiente familiar”. As entidades familiares se constituem, por conseqüência, em núcleos agregadores de respeito e auxílio mútuo, de preservação e desenvolvimento da dignidade das pessoas, ressaltando-se que esta dignidade se explicita no exercício da doação recíproca, no interrelacionamento das pessoas, milenarmente chamado de amor, fonte real, igualmente, de toda dignidade humana: amo, ergo sum, na esteira do ensinamento de Santo Agostinho. 15 Como se observa, a idéia fundamental da Constituição é reconhecer e amparar o núcleo essencial inerente ao homem e à mulher, que consiste em sua dignidade pessoal imanente. Essa proteção é confiada às próprias famílias, que se reconhecem de muitos aspectos; como o arco-íris, de sete cores que se resumem a uma só, igualmente a família é una, ainda que com denominações diversas. A dignidade intrínseca da “pessoa familiar”, interna à família, ademais de ser reconhecida pela Lei Maior, está vocacionada a ser instrumental no aperfeiçoamento de si mesma, a fim de que seus membros se encaminhem, organicamente, em direção a níveis de maior unidade e duração, em busca de mais estabilidade e felicidade. É na autonomia e independência que consiste o direito natural do homem – ter uma família, uma casa - que a Lei Civil vem positivar e proteger, não dispensando, nada obstante, o dever de auxílio da sociedade e do Estado, de maneira subsidiária ou mesmo concomitante. Exemplo vigoroso da não intervenção do Estado nos negócios da família é o dispositivo constitucional que prevê o planejamento familiar (art. 226, § 7º): invocando os princípios éticos da dignidade (do futuro filho) e da paternidade responsável (regra moral), o Constituinte não quis interferir na vida familiar e editou mera recomendação de conduta, mas o Estado deve estar preparado para oferecer ampla assistência aos pais.21 Na mesma orientação segue o novo Código, no § 2º de seu art. 1.565: “O planejamento familiar é de livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e financeiros para o exercício desse direito, vedado qualquer tipo de coerção por parte de instituições privadas ou públicas.” À primeira vista, entretanto, pode parecer que, mesmo com a ampliação de seu prestígio constitucional, a família tenha perdido seu valor intrínseco como instituição, passando a ser valorada de maneira instrumental, e tutelada somente como núcleo 16 intermediário de promoção da dignidade do casal e desenvolvimento da personalidade dos filhos22. Como vimos de início, sendo a família pré-ordenada ao Estado, a melhor das constituições não teria legitimidade de negar sua origem natural e de lhe retirar a primazia nas relações pro domo suo, com reflexos na sociedade e na nação. Em sua autonomia interna, a família é fonte e origem da vida, berço das relações matrimoniais e da educação dos filhos, o que justifica não poder ser instrumento senão de si própria23. É entendimento unânime que a Constituição ampliou o conceito de família (art. 226), denominada igualmente de sociedade conjugal (§ 5º), dos quais o casamento civil e as entidades familiares (casamento religioso, união estável e família monoparental) são espécies. O gênero é a família, "base da sociedade, (que) tem especial proteção do Estado". Esta tutela especial afasta a mínima intervenção do Estado para instrumentalizá-la ou torná-la intermediária de qualquer ente social. Sobre a família existe um consenso universal, explicado pelo próprio caráter da instituição familiar. Pelo próprio desenvolvimento da vida humana, a família nasce como sociedade natural, assentada de forma imediata em instintos primordiais. Não existe, portanto, nenhuma outra instituição tão próxima da natureza24. Encontram-se em todos os povos civilizados organizações familiares bastante semelhantes; sendo uma instituição tão próxima da natureza, as exigências naturais são também mais rigorosas no campo da família; como o desenvolvimento da humanidade está intimamente relacionado ao respeito pelas leis da natureza humana, também se encontra 21 . Sabe a História dos dolorosos incidentes na Índia, sobre esterilização de mulheres, o que causou a queda da então Primeira Ministra Indira Ghandi. 22 . TEPEDINO, Gustavo. A Disciplina Civil-constitucional das Relações Familiares. Temas de Direito Civil. Rio de Janeiro: Renovar, 1999, pp. 347-366. 23 . Qualquer ingerência externa à família contraria os pressupostos fundamentais de inviolabilidade da liberdade, da segurança e da vida (art. 5º CF). Incide, com propriedade, neste contexto, o princípio de subsidiariedade, explícito nos artigos 227 e 230, em que há uma gradação de responsabilidades: primeiro a família, depois a sociedade e só após o Estado. Em certos casos pode haver concomitância de procedimentos em prol da família, mas em nenhum momento constitucional a família perdeu sua independência, para se tornar simples instrumento, a nosso sentir. 24 . LECLERC, Jacques. A família. São Paulo: Quadrante, 1968, p. 9. 17 vinculado às leis do regime familiar; se a sociedade as viola, pode cair na barbárie, ou naquilo que chamamos de "crise da família". A moral familiar é, pois, uma moral natural.25 A promoção da dignidade da pessoa é princípio que sempre esteve na base da educação familiar, sobretudo a partir do cristianismo, que estabeleceu na cultura ocidental os princípios da igualdade e da universalidade de direitos, que implicam no respeito ao próximo. Bem por isso, como ordenamento positivo, a Constituição legitimou uma regra ou princípio de direito natural.26 Por tais razões superiores, de ordem natural, a família não deve ser considerada como "núcleo intermediário", pois possui identidade e finalidades próprias, como entidade familiar subsistente por si mesma; ao conviver com outras famílias, para formar uma sociedade, o núcleo familiar não perde sua identidade e autonomia, mas estabelece um processo de intercâmbios recíprocos, reproduzindo as relações de amor naturais entre os cônjuges e com os filhos e parentes. c) A sociedade: pluralista, fraterna e solidária Já em seu Preâmbulo a Constituição foi explícita ao se referir aos valores de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social. Simplificadamente, pode-se afirmar que somos uma sociedade pluralista mas solidária; como as partes dentro de um todo (o Um e o Múltiplo de Parmênides, em Platão). Por isso constituímos uma sociedade aberta, democrática, com liberdade de consciência e de expressão, em que devemos conviver com idéias divergentes, mas não excludentes, buscando a harmonia do todo social. 25 . Idem, p. 10. . MARTINS FILHO, Ives Gandra da Silva. A legitimidade do Direito Positivo. Direito natural, democracia e jurisprudência. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1992, p. 51: "Por aí se percebe a função norteadora que o Direito Natural possui em relação ao Direito Positivo: aponta para o mínimo ético que a legislação positiva deve observar, sob pena de se tornar injusta e instrumento de dominação de um determinado grupo sobre os demais". 26 18 Respeitante à Família, e sensível à realidade cultural brasileira, o Constituinte reconheceu a necessidade de proteger e amparar socialmente outras modalidades de núcleos familiares, denominando-os de união estável e família monoparental, além do próprio casamento religioso. Poderíamos atribuir ao art. 226 da Constituição o haver instituído um “sistema familiar constitucional”, de caráter aberto, não discriminatório, que acolhe e ampara as diversidades, com os mesmos direitos: ao mesmo tempo em que aplica o princípio da igualdade, também respeita o da liberdade dos casais escolherem o tipo de vida familiar pretendido. Não obstante, deixa livres o homem e a mulher para transformarem sua forma de vida familiar, passando do casamento religioso e da união estável para o estado matrimonial27, e optando, na dissolução, entre a separação e o divórcio. 3. Instituição da Família O Direito de Família28, com tudo o que comporta - entre outras coisas o direito a fundá-la, mantê-la e viver nela estavelmente - é uma das partes do Direito civil que mais estritamente se encontra vinculada ao Direito natural e aos princípios fundamentais da Constituição. O homem tem direito natural a uma família, direito que implica uma série de especificações: direito de fundar um lar; direito dos filhos de serem educados por seus pais; direito dos parentes a se auxiliarem mutuamente, direito dos idosos e pessoas deficientes a um tratamento digno, etc. A sociedade e o Estado têm por obrigação primeira reconhecer estes 27 . A propósito, afirmam os juristas Euclides de OLIVEIRA e Giselda Maria Fernandes Novaes HIRONAKA: “Deu-se, portanto, acertada valorização do casamento religioso, uma vez que podem ser admitidos os seus efeitos civis a qualquer tempo, desde que regularizado mediante habilitação dos contraentes e o devido registro. Note-se que os efeitos, ainda que tardio o registro, retroagem à data da celebração do casamento religioso”. . Do Casamento. Direito de família e o Novo Código Civil. Coordenadores: PEREIRA, Rodrigo da Cunha; DIAS, Maria Berenice. Belo Horizonte: Del Rey, 2002, p. 18. 19 direitos fundamentais, e respeitar as condições gerais desta ordem natural, somente podendo adaptá-las às circunstâncias especiais de tempo e lugares. A família é, portanto, uma sociedade natural que supõe relações éticas e jurídicas prévias a todo Direito positivo; a este incumbe apenas a criação de normas para reconhecimento e proteção desse status. Deste caráter natural da família decorre sua transcendência para o desenvolvimento e o bem da Humanidade. O princípio nuclear da família surgiu como pátrio poder29, e com base na procriação determinava um estilo de autoridade e uma dependência natural dos filhos, de modo algum absoluta ou despótica, mas regulada pelo amor e pela comunidade de interesses, necessária em todo corpo social. Pai e mãe participam de modo qualificado na procriação e, sendo princípio da geração da prole, tornam-se ambos igualmente responsáveis pela educação dos filhos, desenvolvimento e aperfeiçoamento de suas qualidades e faculdades humanas. De outra parte, é missão também do Estado a conjugação dos direitos da família com os da pessoa e com a ordem e estabilidade sociais. Os direitos da pessoa e da família estão orientados ao mesmo fim, e onde se respeitam e resguardam os da família florescem também os da pessoa individual. Para Santo Agostinho, a família é um seminarium civitatis, escola de disciplina e fortaleza, e garantia de estabilidade. a) Casamento, Família e Direito Existem nas sociedades modernas, ao lado de famílias de fundação matrimonial, outras entidades, como as uniões estáveis, ou até mesmo como produto das novas técnicas de 28 . NCC, Do Direito de Família: Livro IV (arts. 1.511 a 1.630). . Pátrio poder: CC/1916, arts. 379 a 395; face ao princípio constitucional da igualdade, o novo Código trata, agora, do Poder familiar, exercido pelos pais, ou por um deles, na falta do outro. (Art. 1.630). 29 20 reprodução assistida30, as quais a Constituição qualifica, em sentido amplo, de entidades familiares. Sob uma perspectiva teleológica, é maior a funcionalidade social da família matrimonial, como ambiente de procriação, humanização e socialização dos filhos. Sua maior estabilidade a credencia como núcleo mais apto à realização de suas funções, em relação à estabilidade relativa das uniões de fato, ou famílias incompletas. Basta lembrar que a presença de ambos progenitores garante a educação segura da prole, o que se estima de alto interesse social.31 A família estabelecida tem deveres para com a sociedade política na qual está integrada: o dever da família é o bem comum da sociedade civil.32 Este interesse justifica a especial proteção à família matrimonial, frente a outros modelos familiares. Bem por isso, as políticas familiares, para serem socialmente mais eficazes, devem incentivar a preservação do tipo de família matrimonial, inclusive orientando as demais para alcançarem o máximo de estabilidade. Já se afirmou com autoridade que: Nenhuma lei humana poderia apagar de qualquer forma o direito natural e primordial de todo homem ao casamento, nem circunscrever o fim principal para que ele foi estabelecido desde a origem: ‘Crescei e multiplicai-vos’ (Gênesis 1,28). Eis, pois, a família, isto é, a sociedade doméstica, sociedade muito pequena certamente, mas real e anterior a toda sociedade civil, à qual, 30 . No NCC o tema está inserido no Capítulo sobre Filiação, prevendo o art. 1.597, no inc. III, a hipótese de fecundação artificial homóloga, no IV, a situação de concepção artificial heteróloga, no inc. V, a hipótese de inseminação artificial heteróloga. V. Conclusões de política legislativa. 31 . MARTINEZ DE AGUIRRE. Op. cit., p. 199. 32 . FONSECA. Idem, p. 7. 21 desde logo, será forçosamente necessário atribuir certos direitos e certos deveres absolutamente independentes do Estado33. A chave para entender o casamento está, pois, na estabilidade, que nasce do compromisso que lhe deu origem. Casamento estável implica em duração; por sua natureza, o casamento está destinado a durar.34 Para tanto contribui o conceito de indissolubilidade do vínculo matrimonial, que lhe dá maior fixação, duração e estabilidade. O divórcio, ao contrário, equivale à instabilidade institucional do casamento (justamente a instituição que deveria fixar a estabilidade). E indissolubilidade, aqui, é sinônimo de fidelidade, em que o homem é feliz na medida em que é fiel aos princípios que adota, às normas que acolhe, aos valores que defende e à sociedade que ajuda a estabelecer, baseada na família em que vive ou irá construir.35 Sobre o tema, assim doutrina o Prof. Hélio Borghi: No Direito canônico, a indissolubilidade é elemento essencial do casamento, e, por isso, inderrogável. Ela foi utilizada, por alguns anticontratualistas, como argumento para tentar desclassificar o casamento como contrato, o que não procede de modo algum, ao nosso ver. Tal argumentação poderia prevalecer enquanto o divórcio não havia sido incluído nas legislações de quase todos os países. Essa questão é entendida em face da doutrina pura, e mesmo aqui não se pode argumentar com a indissolubilidade, já que ela falta 33 . LEÃO XIII, Encicl. Rerum Novarum, n. 19. Cfr. AUBERT, Roger; SCHOOYANS, Michel. Da Rerum Novarum à Centesimus Annus. São Paulo: Loyola, 1993, p. 81. 34 . “A primeira e mais relevante reflexão que se impõe visa o nexo intrínseco entre o matrimônio como princípio e o matrimônio como função social. O matrimônio em primeiro lugar, é uma função; isto é compreensível só a partir da história humana, pois serve ao homem em seu caminho existencial... O sentido de duração do matrimônio não é mais compreendido na cultura moderna, seja a nível difuso, de massa, seja a nível de reflexão intelectual”. D’AGOSTINO, Francesco. Op. cit., pp. 115-116. Não obstante, o convencimento de que o matrimônio seja, por suas razões intrínsecas, destinados a durar para além da vontade das partes, é idéia cultural que vem se tornando própria de setores parciais e minoritários da opinião pública e de restritos grupos confessionais. 35 . FONSECA, ibidem, p. 10. 22 em quase todo o mundo, atualmente, fato que deve ser levado em consideração36. De todas as espécies de entidades familiares que a Constituição distinguiu, [de que família (art. 226) e sociedade conjugal (§ 5º) são gênero], a dissolução pelo divórcio só se aplica ao casamento civil, a indicar que o próprio Estado reconhece a este uma estabilidade formal de dissolução mais complexa que a das demais, diríamos quase uma “cláusula pétrea”. Por isso que o vínculo conjugal só pode ser dissolvido após prévia separação judicial por mais de um ano nos casos expressos em lei, ou comprovada separação de fato por mais de dois anos (CF., art. 226, § 6º, NCC, art. 1.571, e inc. IV e § 1º). Já a separação judicial (arts. 1.572, 1.574 e 1.576) é um minus em relação ao divórcio, pois podem os cônjuges restabelecer, a todo tempo, a sociedade conjugal, por ato regular em juízo (art. 1.577), ou requerer sua conversão em divórcio (art. 1.580). b) Casamento e consentimento O que fundamenta o casamento é o consentimento matrimonial dos cônjuges (art.1.514 do novo Código), reforçado pelo art. 1.538-I: não há casamento se algum dos contraentes “recusar a solene afirmação da sua vontade” (repetindo a mesma redação do art. 197-I do Código Civil revogado). Desenvolvido pelo Direito canônico, é princípio fundamental para se entender o casamento: a) a distinção entre casamento e consentimento matrimonial; b) a qualificação do consentimento como matrimonial; c) e o duplo caráter de contrato e de instituição. 36 . BORGHI, Hélio. Casamento e união estável. Formação, eficácia e dissolução. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2001, p. 40. 23 Consentimento não é casamento, mas causa dele: em Roma, o estado matrimonial supunha consentimento contínuo dos cônjuges, mas cessava o casamento quando cessasse o consentimento; com o Direito canônico, ao contrário, o consentimento inicial dos esposos definia o casamento; com o divórcio, pela cessação de vontades o Direito contemporâneo retorna à concepção romana.37 Defende-se ser a vontade o fundamento do casamento, como aceitação de um estado de vida, e procede de quem tem consciência do que assume, impregnada pelo amor conjugal.38 O consentimento matrimonial qualifica o ato de fundação do casamento como um contrato. Mas o acordo de vontades entre os cônjuges institui um vínculo matrimonial que, a partir daí, cria vida própria: não fica mais submetido à vontade das partes, nem do Direito positivo, mas à sua estrutura natural. Ao transcender a vontade das partes, o casamento se identifica com o conceito de instituição, mais de caráter natural do que meramente legal. Não é o Direito ou a sociedade que criam ou decidem quais devam ser os fundamentos da Família, pois estes provêm da natureza social do homem e da mulher. A lei positiva deve limitar-se a reconhecer esta instituição natural e estabelecer os conteúdos indispensáveis à sua proteção (v.g., a exigência de forma solene para o casamento, os impedimentos matrimoniais, etc).39 O reconhecimento, pela lei positiva, desta instituição natural, está expressa no art. 1.514 do novo Código Civil: “O casamento se realiza no momento em que o homem e a mulher manifestam, perante o juiz, a sua vontade de estabelecer vínculo conjugal, e o juiz os declara casados, e uma vez instituída a família o Estado a protege, proibido a qualquer pessoa, de direito público ou privado, interferir na comunhão de vida instituída pela família” (art. 37 . MARTINEZ DE AGUIRRE. Op. cit., p. 173; MOREIRA ALVES, José Carlos. Direito romano, vol. II. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1972, pp. 298-99. 38 . FONSECA, Fernando Affonso Gay da. A família. Revista Cultura e Fé. Porto Alegre, vol. 79, p. 7, out-dez 1997. 39 . MARTINEZ DE AGUIRRE. Idem, p. 180. 24 1.513)40. As exigências de formas solenes, impedimentos matrimoniais, processo e cabeçalho, provas e invalidade, estão expressos nos artigos 1.515 a 1.564, principalmente. A Constituição não apresenta uma regra expressa a respeito, mas a autonomia da família como instituição pode ser deduzida do art. 5º, que procura proteger todos os direitos individuais como invioláveis. Ora, de início, a família é fundada por duas pessoas, que levam seus direitos a esta proteção, pelo princípio da livre vontade. A inviolabilidade desses direitos é uma extensão, assim se nos afigura, dos incisos X (proteção da intimidade e vida privada) e XI (proteção da casa como asilo inviolável), especialmente. O mesmo se verifica quanto à direção da sociedade conjugal, na qual deve haver colaboração de ambos os cônjuges, no interesse do casal e dos filhos (art. 1.567). E ainda, no concurso proporcional de recursos para sustento da família e educação dos filhos (art. 1.568), além da escolha conjunta do domicílio do casal (art. 1.569). Relativamente às relações de parentesco, não são menos comunitárias e sociais a configuração da parentela (art. 1.591), em linha colateral ou transversal (art. 1.592), inclusive por afinidade (art. 1.595), formando-se, desta sorte, um primeiro entrelaçamento de famílias a latere, de mesmo sangue ou não. c) Juridicidade intrínseca da família É o casamento uma instituição de interesse social pelas suas funções e finalidades, em especial pela prole que gera, e portanto pela formação de uma família. Como tal, o casamento não interessa à sociedade (ao Direito) enquanto relação de caráter afetivo ou sentimental; mas 40 . “Sobre a vedação legal da interferência de terceiros nessa comunhão de vida, parece que – não obstante a justeza da norma proibitiva – se afigura, a norma, desnecessária ou pleonástica, diante de todo o conjunto de regras atinentes ao casamento e seus efeitos jurídicos com relação às partes, dando inteira segurança ao ente familiar. Por outro lado, se o preceito fosse necessário, então não poderia se restringir às pessoas de direito público ou privado, mas a todas as pessoas, sejam naturais ou jurídicas, sem tal incompreensível limitação”. OLIVEIRA, Euclides de; HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Op. cit., p. 11. 25 interessa enquanto fundamento da família, e, portanto, como instituição essencial para a continuidade da sociedade, seja do ponto de vista biológico, seja pela qualificação da convivência social. Casamento contraído com a condição de não procriar filhos não é um casamento, por contrariar seu fim natural.41 O reconhecimento jurídico do casamento e da família não visa dar relevância ao Direito, como vontade política do Estado, mas tem por finalidade regular e proteger uma estrutura antropológica concreta.42 Casamento e família têm uma estrutura interna objetiva (em seus aspectos essenciais, não os contingentes ou relativos), que se poderia chamar de juridicidade intrínseca, constitutiva da família. Deriva do caráter conjugal, como princípio próprio do casamento: o compromisso de vontade dos cônjuges. Neste campo, o Estado e a sociedade devem respeitar as exigências naturais desse Direito das famílias, que não é campo de ingerências externas e reclama defesa intransigente; pois é a única em condições de salvar a afetividade dos núcleos familiares, protegendo-os dos ataques ideológicos do nosso tempo. De fato, a instituição familiar corre hoje sérios riscos de alterações legislativas, orientadas por uma mentalidade ou cultura social niilista e pluralista, tais como definir modelos de educação sexual, veicular campanhas sobre natalidade, procriação artificial, aborto etc., que se chocam frontalmente com a autonomia do ensinamento familiar. Recentemente se ouviu que “entre as verdades obscurecidas por causa da crescente secularização e do hedonismo reinante ficam especialmente afetadas todas as realidades sociais relacionadas com a família. Em torno da família é que se trava hoje o combate fundamental pela dignidade do homem”43. 41 . D’ORS, Álvaro. Derecho y sentido común. Siete lecciones de derecho natural como límite del derecho positivo. Madrid: Civitas, 1995, p. 135. 42 . D’AGOSTINO, Francesco. Linee di una filosofia della famiglia. Milano: Giuffrè, 1991, p. 164. 43 . JOÃO PAULO II, no Congresso Teológico-Pastoral, Rio de Janeiro, outubro de 1997. 26 A dignidade de cada homem e mulher começa em cada família. A ética e a moral começam na família. A educação do homem e da mulher será o que a família lhe ensinar, e a família será o modelo para a sociedade. Os valores relativos à dignidade da pessoa e a cidadania de uma sociedade serão aqueles que a família exercitar existencialmente. 4. Valores informativos da vida familiar Por que a sociedade e o Direito se interessam pelo casamento, e pela família como entidade jurídica preferencial? Quais as funções da família? Vimos que casamento e família são realidades naturais, derivadas do caráter sexuado da pessoa humana, dotada ademais de inteligência e vontade; estão ligados à procriação e educação dos filhos. A existência de novos membros assegura a sobrevivência da sociedade, porquanto são responsáveis por sua humanização e integração harmônica no corpo social. Esta inter-relação das várias funções da família (assistência moral, afetiva, espiritual e econômica) se apresenta como invariável e de caráter permanente (porque é da natureza própria do homem), a saber: a) função material ou biológica: perpetuação da espécie (reprodução e sobrevivência de seus membros); b) função de humanização: educação afetivoespiritual e social (desenvolvimento das potencialidades intelectuais, volitivas, afetivas e sociais, concomitante ao desenvolvimento biológico). Ao terminar esse processo de formação, o indivíduo se constituiu existencialmente em um ser humano, tem uma personalidade, é “alguém” para si e para os demais, sua humanidade tem um conteúdo concreto. O resultado é uma personalidade integrada, inserida em uma família e em uma sociedade. Portanto, a família constitui uma estrutura insubstituível para a “humanização” do homem, mais simples e eficaz que a do Estado; o casamento responde a uma necessidade 27 física e moral da espécie humana e destas funções deriva o caráter natural e permanente da família. 44 a) Formação da comunidade familiar Qual a origem desta comunidade, fundada na natureza da pessoa humana? Quando se fala “Pai”, de imediato pensamos em um “Filho”, e também pensamos em uma “Mãe”, pois ninguém é “Filho” sem uma “Mãe” e um “Pai”. Vemos, então, que a realidade Pai é essencialmente relacionada com a realidade Mãe. “Relacionado” significa estar voltado para outra realidade, enfim, é ser para alguém.45 Do mesmo modo, ninguém pode ser Mãe sem a realidade de outra pessoa, que é o Pai. A Mãe está, pois, em relação ao Pai, e este em relação mútua com aquela. Esta é a primeira realidade “essencialmente relativa” ou “relacionada em essência”, entre duas pessoas. E mais, ninguém é Filho, se não tiver alguém que seja seu Pai e sua Mãe. Assim, “ser filho” é ser “relação”, é ser para alguém que é Pai ou Mãe. Ora, a relação Pai-Mãe ou PaiMãe-Filho é sempre uma realidade amorosa. Assim, também o amor entre as pessoas é “relação”, é um “estar relacionado”, é o ser para da pessoa que ama a pessoa amada. Este relacionamento essencial, entre Pai, Mãe e Filhos, tem por finalidades se realizarem, primeiramente como Pessoas, como Comunidade familiar, e depois Comunidade social, e constituem os fundamentos que informam a vida familiar e comunitária em geral. 44 . MARTINEZ DE AGUIRRE. Op. cit., p. 91. . Cfr. CATAPAN, D. Joel Ivo. Fundamentos Cristãos da Política, v.1, São Paulo: Cidade Nova, 1992, pp. 13ss. 45 28 Desde a criação de Eva, a partir de um lado de Adão (Gênesis 2,21), se dá a atração recíproca entre Homem e Mulher para reconstruir a unidade originária.46 Observa-se que em todo relacionamento do homem, como um ser para, há o sentido da reciprocidade: O “ethos” profundo da família. Pois a família tem por base o dom: a mãe dá ao filho a vida, o leite; o pai provê o seu sustento e lhe dá educação; os irmãos dividem fraternalmente entre si o que adquirem, etc. Esse padrão do dom recíproco foi transferido das unidades familiares para formações sociais mais abrangentes. É, pois, na família que o ser humano faz a experiência da reciprocidade – lei fundamental da sociedade humana – de sua ética, de sua organização social e do funcionamento pacífico de suas instituições. 47 Bem por isso, primeira das condições do matrimônio, mas não única, é a atração física de corpos; porém, esta entrega recíproca não se plenifica se Homem e Mulher permanecem no nível do instinto; na verdade, o amor humano emerge a nível de espírito, transcende do plano da necessidade para o da liberdade, do sentido e dos valores, inclusive para o Absoluto. Giulia Paola di Nicola e seu marido Attilio Danese, discorrendo sobre comunicação e reciprocidade no casamento, atentam para a autonomia de identidade dos cônjuges: Para uma satisfatória relação de reciprocidade, hoje tornou-se mais importante respeitar a alteridade do outro... No conceito de reciprocidade está implícito que ambos permaneçam como duas pessoas, cada uma completa em si, capazes de viverem juntos não por uma interior dependência 46 . Como se vê, não há primazia histórica nem ontológica do Homem sobre a Mulher: “Eis aqui agora o osso dos meus ossos e a carne de minha carne” (Gênesis 2,23). Cfr. BIGO, Pierre, SJ; ÁVILA, Fernando Bastos, SJ. Fé Cristã e Compromisso Social. São Paulo: Paulinas, 1982, p.229. 47 . MENESES, Paulo. A família: uma abordagem filosófica. Universidade e Diversidade. Recife: Fundação Antônio dos Santos Abranches – FASA, 2001, p. 189. 29 e necessidade de compensação, mas na livre e recíproca doação consensual.48 Família é, pois, um dom mútuo do esposo e da esposa, dos pais e dos filhos, dos irmãos entre si, dos parentes em geral, criando laços de solidariedade: cada membro cresce em dignidade humana na medida em que se empenha na valorização do outro; daí dever ser a família um modelo para as sociedades.49 A aplicação do dever de reciprocidade evidencia-se pela redação do art. 1.696 do novo Código ( reproduzindo o art. 399 do antigo), assim expresso: “O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros”. Trata-se aqui, tanto da comunidade familiar restrita, como o seu desdobramento, a comunidade social, mais ampla. Pode-se dizer que a trindade familiar, Pai-Mãe-Filho, é essencialmente ser para uns aos outros, necessária, imediata e mutuamente, bem como para todos os parentes, ascendentes e colaterais.50 Onde houver o ser para de uma pessoa para a outra, ali haverá “comunidade” familiar. Portanto, só há comunidade onde cada pessoa está voltada para atender aos desejos e necessidades das demais pessoas.51 Lembra-nos o filósofo MONDIN que a coexistência implica os conceitos de proexistência e proximidade; proexistência é transformar o viver com os outros em um viver para os outros, em um ser para os outros, um pro-existir: 48 . DI NICOLA, Giulia Paola; DANESE, Atilio. Lei & lui. Comunicazione e reciprocità. Torino: Effata Editrice, 2001, p. 115. 49 . Cfr. GILISSEN, John. Introdução histórica ao Direito. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian,1988, pp. 56364. 50 . Não por acaso a palavra parente, em inglês, é relative... NCC Art. 1.591 São parentes em linha reta as pessoas que estão umas para com as outras na relação de ascendentes e descendentes. (CC Art. 330) (NCC Art.1.696. O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros, CC Art. 397). 30 A proexistência é a generosidade e a dedicação, o espírito de sacrifício, de renúncia de si mesmo. É dar precedência ao outro, é preocupar-se pelo outro mais do que por si mesmo. Para certas pessoas (o pai, a mãe, a esposa, o amigo, o herói, etc.) esta atitude é algo de instintivo e de conatural.52 O âmbito do exercício da coexistência é o próximo, que significa ser vizinho, e “o critério quem é o próximo é o de simplesmente ser vizinho no momento que ele precisar de nossa ajuda, de nossa aproximação, simplesmente porque é homem”.53 Para Emmanuel Lévinas, a proximidade é relação fundante que une todos os homens: o próximo se refere a mim, em primeiro lugar; antes de qualquer argumento, antes de qualquer compromisso assumido ou refutado. Sou ligado a ele, que vem em primeiro lugar; sem conotações que dividem, antes de qualquer ligação de contrato. Me ordena antes de ser reconhecido. Relação de parentela, antes de qualquer relação biológica, contra qualquer lógica54. Conclui Mondin, em apreciável síntese, que A realização de si mesmo passa necessariamente através do próximo. Por este motivo, para definir adequadamente a pessoa, não basta a subsistência nem a coexistência, é necessário também a proexistência, e o âmbito da proexistência é o próximo.55 51 . NCC Art. 1.566. Deveres entre os cônjuges: fidelidade recíproca, vida em comum, mútua assistência, sustento, guarda e educação dos filhos, respeito e consideração mútuos. (CC Art. 231). 52 . MONDIN, Battista. Definição filosófica da pessoa humana. Bauru: Edusc, 1998, p. 30. 53 . Idem, p. 32. Insuperável o exemplo de conduta do Bom Samaritano, descrito em Lucas 10, 25-37, como resposta à pergunta de um doutor da Lei, “E quem é o meu próximo?”. 54 . LÉVINAS, Emmanuel. Altrimenti che essere. Milano: Jaca Book, 1983, p. 108, apud MONDIN. Op cit., p.33. 55 . MONDIN. Op. cit., p. 35. 31 Como estes princípios se positivaram na Constituição Federal e no Código Civil atual? A Lei Maior prescreve que a assistência, a criação e a educação dos filhos menores é dever dos pais (relação descendente), e é dever dos filhos maiores a ajuda e o amparo aos pais na velhice, carência ou enfermidade (art. 229, que, quanto aos menores se repete no art. 22 da L. 8.069/90-ECA); ademais, o amparo às pessoas idosas é dever primeiro da família, mas acolitada pela sociedade e pelo Estado, para assegurar sua participação na comunidade, na defesa de sua dignidade e bem-estar, como garantia do direito à vida (art. 230; L. 8.842/92). E o novo Código, além de definir o casamento como comunidade plena de vida (art.1.511), proíbe a qualquer pessoa, de direito público ou privado, interferir na comunhão de vida instituída pela família (art. 1.513); no relativo à eficácia do casamento, homem e mulher assumem mutuamente a condição de consortes, companheiros e responsáveis pelos encargos da família (art. 1.565), institui como deveres de ambos os cônjuges aquilo que se define como pro-existência, ao propor relações mútuas estritamente pessoais, como fidelidade, vida em comum, assistência, sustento, guarda e educação aos filhos e respeito e consideração (art. 1.566, incs. I a V), adotando expressões de forte cunho moral, que estabelecem uma ética interna, informativa da vida familiar, voltada ao bem comum. b) Respeito e proteção aos entes familiares É inegável o interesse da Constituição em proteger a família e os entes mais desprotegidos.Valiosos os artigos 226, 227 e 230, que ora ressaltamos. Pelo art. 226, a família (aí compreendidas as entidades familiares) merece toda a proteção do Estado. No art. 227 há o dever solidário da família, da sociedade e do Estado em relação à criança e ao adolescente, que gerou Estatuto específico para sua proteção (Lei 8.069/90). Esta é, a nosso ver, uma 32 norma constitucional das mais abrangentes quanto à explicitação dos direitos fundamentais, sejam positivos como negativos. O art. 230 repete o mesmo dever solidário em relação aos idosos, com expressa reiteração à defesa de sua dignidade e bem-estar e garantia do direito à vida. Por fim, o art. 244 não olvidou a proteção aos portadores de deficiência, reiterando disposição do § 2º do art. 227, muito embora timidamente, por não abranger outras proteções necessárias, como a garantia do pleno emprego. Neste aspecto a nova Lei Civil, seguindo os ditames da Lei de Alimentos (Lei 5.478/68, bem como as Leis 8.971/94 e 9.278/96, sobre a União Estável), ampliou as regras de proteção dos parentes, cônjuges ou companheiros, no capítulo sobre Alimentos, assim regendo a matéria: Art. 1694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação. Art. 1696. O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros. (CC. arts. 396, 397). Crianças e adolescentes. Na Constituição estão traçadas as linhas que dão absoluta prioridade à proteção dos direitos fundamentais à criança e ao adolescente, e na nova Lei Civil a proteção da pessoa dos filhos merece um capítulo próprio, dos arts. 1.583 a 1.590. Cuidam, todavia, da guarda dos filhos nos casos de separação por dissolução da sociedade, separação ou divórcio, em que a primazia é o acordo do casal (art. 1.583), ou atribuição 33 judicial, em que influirão critérios eqüitativos, como “a quem revelar melhores condições” de exercer a guarda (art. 1.584), ou “a pessoa que revele compatibilidade” (pár. único), ou “a bem dos filhos, regular de maneira diferente” (art. 1.586); regulam, igualmente, o direito de visitas (arts. 1.588, 1.589); ambas disposições estendem-se aos filhos incapazes (art. 1.590). Está prevista a adoção nos arts. 1.618 a 1.629 do novo Código (arts. 368 a 378 do anterior), ressaltando-se as diversas possibilidades abertas por cônjuges ou companheiros (art. 1.618, par. único), a unicidade do ato (art. 1.622), até mesmo por divorciados ou separados (par. único), mediante ato judicial (art. 1.623), a equiparação do adotado a filho (art. 1.626), inclusive a substituição do sobrenome (art. 1.627)56, e o estabelecimento das relações de parentesco com os adotantes, descendentes e parentes daqueles (art. 1.628). É permitida a adoção por estrangeiros segundo a lei específica (art. 1.629). De alta relevância para a sociedade brasileira o instituto da adoção, que “atingindo os fundamentos da relação de filiação, realiza profunda intervenção no status familial do indivíduo, de modo a reformulá-lo de inteiro. É, pois, desses atos jurídicos que tem por objeto o estado de família integral”, segundo o ensinamento do saudoso Walter Moraes.57 56 57 . Com o que guarda simetria com o art. 1.565, § 1º, que permite o uso do sobrenome de um nubente pelo outro. . Adoção e verdade. São Paulo: Edit. Rev. dos Tribunais, 1974, p. 101. 34 Idosos e deficientes. Pela Constituição, há um dever geral de solidariedade e auxílio mútuo entre pais e filhos, que se entende extensíveis aos parentes próximos (art. 229), havendo explicitamente o dever da Família, da Sociedade e do Estado em relação aos idosos (art. 230), consistentes em criar programas para seu amparo no lar (§ 1º), e de usufruírem da gratuidade nos transportes públicos (§ 2º). No referente aos portadores de deficiência, a Lei Maior prevê seu amparo e proteção no § 2º do art. 227 mediante acesso adequado a logradouros, edifícios e veículos, o que vem repetido no art. 244, bem como o acesso a cargos e empregos públicos no art. 37, inc. VIII58. No seio da família, contudo, valem as regras constitucionais, bem como as Leis 7.853/89 (Amparo às pessoas portadoras de deficiência) e 8.899/94 (Passe livre à pessoas portadoras de deficiência em transportes coletivos). c) Educação para a cidadania Esta “natureza humana” implica e impele para a vida em comunidade: o homem é um animal social, por essência, conforme ensinamento aristotélico. O homem é, de fato, essencialmente um ser social, existe com os outros e realiza-se em cooperação com os outros: “Cada pessoa humana tem necessidade dos outros: para vir ao mundo, para crescer, para nutrir-se, para educar-se, para programar-se a si mesma e para realizar seu próprio projeto de humanidade”59. Ser social significa comunicar-se, solidarizar-se. E estas são atividades eminentemente sociais. Quando ultrapassa os seus limites familiares e sociais mais próximos, e age visando o bem comum da comunidade, alcança a dimensão política, no sentido amplo de cidadania. 35 Ensinava Platão que o Homem é uma pátria em pequeno, e que a pátria é um homem grande. Educar o homem é educar para a cidadania, que implica serviço à pátria, como um todo social. É um serviço ao bem comum. E é na família que este projeto da Paidéia grega se realiza existencialmente60. Dentre os princípios formativos da República, o Constituinte brasileiro elencou a cidadania como fundamento, e sobre a formação do cidadão, em específico, editou regra abrangente de solidariedade e subsidiariedade: Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. d) Ética na comunicação social Ao tratar da livre manifestação do pensamento, através dos veículos de comunicação social, a Lei Constitucional insculpiu normas sobre “a produção e a programação das emissoras de rádio e televisão”, ressalvando o interesse da família com os seguintes princípios: I - preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas; IV – respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família. Novamente o Constituinte adota a expressão valor, a demonstrar o renovado apreço pelos princípios morais que devem prevalecer no campo da educação social e familiar. 58 . Art. 37, VIII: “a lei reservará percentual dos cargos e empregos públicos para as pessoas portadoras de deficiência e definirá os critérios de sua admissão”. 59 . MONDIN. Idem, p. 29. 60 . Lembremos as palavras clássicas de Rui Barbosa: “A pátria é a família amplificada. E a família, divinamente constituída, tem por elementos orgânicos a honra, a disciplina, a fidelidade, a benquerença, o sacrifício... Multiplicai a célula, e tendes o organismo. Multiplicai a família, e tereis a pátria. Sempre o mesmo plasma, a 36 Inegável a forte influência dos meios de comunicação, sobretudo o televisivo, sobre a educação das crianças e adolescentes, subtraindo-os dos estudos sérios e eficientes, e formação de um cidadania consciente e não manipulada. É do senso comum que os meios de comunicação, impulsionados pelos interesses de mercado, induzem fortemente ao consumo de supérfluos, ao hedonismo, à liberação de energias mentais, em detrimento da economia de riquezas e de pensamentos e atitudes. A influência da comunicação social incide diretamente na educação de crianças e adolescentes, sobretudo, competindo aos pais dirigir-lhes a criação e educação, no exercício do poder familiar (art. 1.634, inc. I). Se de um lado, muitas famílias se deixam sucumbir pela força do poder da mídia, e a própria sociedade se sente incapaz, muita vez por omissão, de adotar medidas inibitórias para a educação dos filhos, aceitando os meios de comunicação como “educativos”, compete ao Estado, pelo dever de subsidiariedade, coibir os excessos praticados pelas empresas de comunicação, sob pena de tornar nulos aqueles princípios constitucionais do art. 221. 5. Bioética e Biodireito: novas tendências61 Ética e Direito são ciências humanas do espírito, nunca dissociadas, porque ambas cuidam das normas de conduta humana em sociedade. Se a Ética é de ordem metafísica, a Filosofia moral do dever-ser do homem, orientando a fazer o bem e evitar o mal (bonum faciendo, malo vitando), bem como não fazer a outrem o que não gostaria que lhe fizessem, o mesma substância nervosa, a mesma circulação sangüínea...” Discurso no Colégio Anchieta, in Obras Completas de Rui Barbosa, v. 30, t. 1, p. 358, 1903. 61 . Ver sobre o tema as obras de: DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. São Paulo: Saraiva, 2001; D’AGOSTINO, Francesco. Bioetica. Torino: G. Giappichelli Editore, 1996; D’ONOFRIO, Felice; GIUNTA, Riccardo. La bioetica nel futuro dell’uomo. Napoli: Grafite, 1999; ESTRELA GUTIÉRREZ, Graciela N. Messina. Bioderecho. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 1998; GAFO FERNÁNDEZ, Javier. 10 palavras-chave em Bioética. São Paulo: Paulinas, 2000; JUNQUERA DE ESTÉFANI, Rafael. Reproducción asistida, filosofía ética y filosofía jurídica. Madrid: Editorial Tecnos, 1998; LADUSÃNS, Stanislavs (coord.). Questões atuais de 37 Direito é sua expressão prática e concreta, que se apresenta sob a forma positiva das normas jurídicas. A ameaça da técnica sobre a humanidade, afirma Maria Helena Diniz, gerou uma ética para a civilização biotecnológica a fim de que se pudesse preservar a dignidade da pessoa humana dos abusos do biopoder, da revolução biológica desencadeada pela descoberta do DNA, da geneterapia, das novas técnicas biomédicas e farmacológicas e do desenvolvimento da genética molecular, mediante uma reflexão, que é 62 tipicamente Bioética, sobre o fenômeno da vida e da morte . Bem por isso, os cientistas de um âmbito maior das ciências da vida despertaram um apurado sentido do ser humano e se interrogam sobre o que devem fazer, o que podem fazer, quais os limites para a ação médica ou técnico-científica, passando-se do imperativo científico-tecnológico para o imperativo ético63. Pode-se considerar a Bioética como filosofia personalista, “por analisar o homem como pessoa ou como um ‘eu’, dando valor fundamental à vida e à dignidade humanas, não admitindo qualquer intervenção no corpo humano que não redunde no bem da pessoa, que sempre será um fim, nunca um meio para a obtenção de outras finalidades”64. Ao mesmo tempo, não se pode impugnar os valores relativos à liberdade científica, nem o Estado interferir nas práticas bio-médicas para lhes impor limites. A liberdade de Bioética. São Paulo: Loyola, 1990; PESSINI, Leocir; BARCHIFONTAINE, Christian de Paul de. Problemas atuais de Bioética. São Paulo: Brasil, 1991, e outras. 62 . DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 6. 63 . A Constituição de 1988, em seu art. 5º, IX, “proclama a liberdade da atividade científica como um dos direitos fundamentais, mas isso não significa que ela seja absoluta e não contenha qualquer limitação, pois há outros valores e bens jurídicos reconhecidos constitucionalmente, como a vida, a integridade física e psíquica, a privacidade, etc., que poderiam ser gravemente afetados pelo mau uso da liberdade de pesquisa científica”. DINIZ, Idem, p. 7. 64 . Idem, ibidem. 38 criação do cientista e, pois, à ciência65, tem seus contornos no campo ético da consciência individual, que deve ser estimulada a se aprofundar no conhecimento dos limites exigidos pela dignidade da pessoa, objeto de suas investigações e aplicações. Há, portanto, um conflito de princípios constitucionais entre a livre atividade científica e o direito fundamental de proteção da pessoa humana. A solução ou ponto de equilíbrio está em respeitar a dignidade da pessoa, explícito no art. 1º, inc. III, da Constituição, como valor fundante do Estado Democrático de Direito. A repercussão social dos avanços científicos em relação ao homem desafia a argúcia dos juristas e legisladores para sanção de normas que atendam às novas necessidades da vida, mas defensoras da pessoa humana, para que não se torne objeto de pesquisa, coisa a ser descartada ou “reificada”66. O Biodireito é esta nova disciplina, estudo jurídico que, tomando por fontes imediatas a Bioética e a biogenética, teria a vida por objeto principal, salientando que a verdade científica não poderá sobrepor-se à ética e ao direito, assim como o progresso científico não poderá acobertar crimes contra a dignidade humana, nem traçar, sem limites jurídicos, os destinos da humanidade67. Enquanto a Bioética caminha no sentido de “biologizar” ou “medicalizar” a lei, o biodireito busca “juridicizar” as “ciências da vida”, e ambos “caminham pari passu na difícil tarefa de (....) determinar, com prudência objetiva, até onde as ‘ciências da vida’ poderão avançar sem que haja agressões à dignidade da pessoa humana”.68 65 . Idem, ibidem. . DINIZ, Idem, p. 8. 67 . Idem, ibidem. 68 . DINIZ, Idem, p. 9. 66 39 A Bioética pode ser definida como “a instância normativa do processo de humanização”, ou também como “a ética aplicada às ciências da vida”, evitando qualquer ameaça para o ser humano69. E o Biodireito nasce como “consideração normativa, social, doutrinal e jurisprudencial das novas técnicas sobre a vida humana”.70 a) Valor da vida humana e sua inalienabilidade Se a vida é o bem supremo da pessoa humana71; tal relevância exige condições para conservar, desenvolver e maturar a vida. As Constituições democráticas garantem a inviolabilidade do direito à vida (CF, art. 5º) além de inúmeros dispositivos que reconhecem a vida intimamente relacionada com a família, como causa e condição de procriação dos filhos, assegurando-lhes defesa e proteção. Assim enfatiza o artigo 227: É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. 69 . JUNQUERA DE ESTÉFANI, Rafael. Reproducción asistida, Filosofía Ética e Filosofía Jurídica. Madrid: Tecnos, 1998, p. 26. 70 . Idem, p. 30. 71 . V. LEJEUNE, Jerome. Um homem é um homem in Pergunte e Responderemos. Rio de Janeiro: Lumen Christi, nº 346, pp. 98-104, mar. 91. 40 De ambas ciências se exige que sejam considerados dois critérios fundamentais: a dignidade da vida humana, que vai amparar e fundar qualquer outro critério; e os direitos humanos, como conseqüência desta dignidade pessoal. Federico Fernández de Buján, ao fundamentar jusfilosoficamente a vida como “princípio reitor” do Direito, em suas conclusões enuncia: A análise da Bioética e das questões transcendentais que suscitaram os prodigiosos avanços biomédicos, nos levam a constatar que o respeito e a proteção à vida humana segue sendo o primeiro dever ético e obrigação moral por excelência. A vigência do preceito que exige respeitar a vida deriva de pertencer a uma ordem natural que, per se, é inderrogável, por mais que variem as circunstâncias socio-políticos, culturais ou científicas. 72 Bem por isso, a Comissão Nacional de Proteção dos Direitos Humanos da Pesquisa Médica e Comportamental dos Estados Unidos enunciou três grandes princípios: a) de beneficência (ou não maleficência = fazer o bem); b) de autonomia (Kant), correspondendo ao consentimento esclarecido, o respeito às decisões do doente; c) de justiça, dar a cada um o seu direito (Ulpiano), além do princípio de honestidade e eficiência, posteriormente acrescentado.73 b) Direito a nascer dignamente Pela natureza humana, sempre que uma vida principia ali há uma família, legítima ou natural, permanente ou eventual, acima do que a lei disponha. Por tais condições, toda criatura 72 . FERNÁNDEZ DE BUJÁN, Federico. La vida. Principio rector del derecho. Madrid: Edit. Dykinson, 1999, p. 156. 73 . GAFO FERNANDEZ, Javier. 10 palavras-chave em Bioética. São Paulo: Paulinas, 2000, p. 22. 41 tem o direito a ter um pai conhecido e uma mãe certa, e, no momento oportuno, saber quem são eles.74 Os direitos do nascituro não são apenas econômicos, mas morais, como a gestação assistida, o nascimento confortável, sem comprometer o pleno desenvolvimento físicopsíquico75. Obstáculos ao direito de nascer se multiplicaram neste século, atingindo limites impensáveis: o aborto, a fecundação in vitro, a manipulação genética, e agora a clonagem76. Fernández de Buján tem posição definida sobre este tempo da vida humana: Da proteção civil ao nasciturus, que defende seus interesses patrimoniais, equiparando-o ao nascido para tudo o que lhe seja favorável, resulta coerente deduzir, de acordo com um critério hermenêutico do conjunto do ordenamento jurídico, uma proteção penal ao concebido, que tenha como fim defender sua vida. Nada lhe é mais favorável do que nascer, pois deste 77 fato deriva qualquer outro direito” . O Código Penal prevê duas hipóteses apenas para permitir o aborto: o necessário e o resultante de estupro (C. Penal, art. 128). Projetos inúmeros pretendem ampliar estas hipóteses, uma delas a da malformação do feto. 78 As outras ameaças ao nascimento com vida digna dizem respeito não mais à vida intra-uterina, mas à engenharia da vida extra-uterina, ainda que a geração se desenvolva no seio de uma mãe. 74 . Daí derivam as ações de investigação de paternidade e maternidade. Os interesses morais são o nome e a tradição. Os econômicos, são a herança e sua justa partilha. 75 . D’AGOSTINO, Francesco. Bioetica. Torino: Giappichelli, 1996, p. 263ss. 76 . D’ONOFRIO, F.; GIUNTA, R. La bioetica nel futuro dell’uomo. Napoli: Grafite, 1999, p. 78. 77 . FERNÁNDEZ DE BUJÁN, Federico. Op. cit., p. 156. 78 . Cfr. PENTEADO, Jacques de Camargo. A família e a justiça penal. São Paulo: Edit. Rev. dos Tribunais, 1998, p. 86ss. 42 Já citamos o novo Código Civil, que na redação do art. 1.597, no Capítulo da Filiação, acolhe a fecundação artificial homóloga (inc. III), a concepção artificial heteróloga (inc. IV) e a inseminação artificial heteróloga (inc. V); não guarda coerência e não é cientificamente correta, pois heteróloga se refere a espécie diferente; ambas as formas de procriação são de inseminação artificial (IA): no primeiro caso, quando o sêmen procede do cônjuge ou companheiro, o mais correto é falar de IAC; no segundo e terceiro, quando o sêmen procede de um doador, deve-se citar como IAD. Importa considerar que o bem humano aqui protegido é o nascituro (mesmo o concebido natural ou artificialmente). É o seu direito à vida que deve ser preservado, enquanto único e supremo nesta quadra de sua existência. Os bens, a herança, o nome, a honra, serão também objetos de proteção, mas sempre dentro da família. Incide, neste campo, o direito à personalidade: repetindo o conteúdo do art. 4º do Código revogado79, o art. 2º do novo Código afirma que “A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro”80. A criação do homem está na sua originalidade, em sua natureza dualista, em que corpo e espírito se criam num mesmo ato. Trata-se de bem superior indisponível para experiências científicas, ainda que sob elevados propósitos de suprir a dor, a doença, a esterilidade ou o aperfeiçoamento da espécie. Compete, aos operadores do Direito, sobretudo na área do Direito Familiar, concentrar estudos, promover discussões e intervir politicamente para esclarecer a opinião pública, governantes e legisladores, de que uma lei positiva com poder ofensivo a qualquer aspecto da geração da vida contraria frontalmente o Direito do Homem, que é o Direito natural garantido pela Constituição (art. 5º, caput). 79 . VENOSA, Silvio de Salvo. Novo Código Civil. Texto Comparado. São Paulo: Atlas, 2002, p. 519. 43 c) Direito a morrer com dignidade Tem o homem um “direito a morrer”? A escolher uma morte antecipada ou indolor? O suicídio não é punido pela Lei Penal, apenas o auxílio ao suicida; mas procurar a morte por qualquer forma é, pelo menos, um grave dano à família, à sociedade e ao gênero humano. Único ser consciente de sua vida, é inconcebível que procure a não-vida pelas próprias mãos ou com auxílio de quem se disponha a fazê-lo, salvo casos de demência evidente.81 Na família, qualquer membro que falte (até por morte natural), gera vazios crescentes: a ausência do membro ativo que sustentava a casa (pela presença, pela comunicação, pelo trabalho, pela cultura), é insuprível. A perda de um cidadão pela sociedade; na empresa, um talento gerador de economia; o mundo se apequena. É uma vileza. A eutanásia ativa, sobretudo a que visa lucro, é ignomínia maior, desrespeita o ser, ultraja os códigos de ética, médica e sanitária, afronta o Direito, burlando as normas penais. Admite-se a passiva, que não alcança os limites da ética, por deixar os pacientes ao influxo da natureza, para um decesso natural, com dignidade83. A pena de morte é mais grave ainda. Mata-se o homem para punir os crimes que cometeu. É a vingança estatal. A lei que admitir ou adotar tal pena, pode satisfazer a sociedade, num dado momento, por causa da extrema violência que se registra, mas jamais serão justas, porque o direito à vida é da natureza do homem, e não depende da opinião de alguma maioria ocasional. Ademais, em nenhum país que a adota decresceu o índice de criminalidade violenta, pela simples existência da pena de morte. 80 . Cfr. CHAVES, Benedita Inês Lopes. A tutela jurídica do nascituro. São Paulo: LTr, 2000. . D’ONOFRIO, F; GIUNTA, R. Op.cit., p. 137. 83 . GAFO FERNANDEZ. Op. cit., pp. 86ss; D’ONOFRIO, Felice; GIUNTA, Riccardo. Op. cit., p. 119. 81 44 A III Idade. Os problemas dos anciãos são problemas de todos: marginalização, assistência, formação e ocupação, participação84. A velhice sadia, porém, tem sentido e valores especiais, como a gratuidade da doação do ancião e anciã, a memória, a experiência, a interdependência, uma visão mais completa da vida.85 Antes de morrer, contudo, as pessoas ficam idosas, envelhecem, não trabalham, causam problemas de toda ordem à família, e esta recorre aos asilos, onde acabam esquecidos, e muita vez ali mesmo terminam sua vida86. No entanto, é da natureza humana nascer e morrer no seio de uma família. O idoso tem o direito de ficar com a família: C.F. Art. 230 A família, a sociedade e o Estado têm o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida. C.C. de 1916. Art. 399. Par. único. No caso de pais que, na velhice, carência ou enfermidade, ficarem sem condições de prover o próprio sustento, principalmente quando se despojaram de bens em favor da prole, cabe, sem perda de tempo e até em caráter provisional, aos filhos maiores e capazes, o dever de ajudá-los e ampará-los, com a obrigação irrenunciável de assisti-los e alimentá-los até o final de suas vidas. Este dispositivo não foi reiterado pelo novo Código Civil, apenas seu caput, através do art. 1.695, que trata dos alimentos aos que dele necessitam. No entanto, como se vê, este Parágrafo, acrescentado pela Lei nº 8.648/93, serviu de antecedente ao dispositivo constitucional. 84 . Conselho Pontifício para os Leigos. A dignidade do ancião. São Paulo: Paulinas, 1999, pp. 21-25. . Idem, pp. 9-13. 86 . D’ONOFRIO, Felice; GIUNTA, Riccardo. Idem, sobre a Ética da velhice, p.107 85 45 Doação de órgãos dos mortos. Cabe lembrar a lei sobre transplante de órgãos, mais de expropriação pelo Estado que doação propriamente (Lei Nº 9.434, de 4.2.97, dispondo sobre a remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo humano para fins de transplante e tratamento). Já não se trata de “morrer com dignidade”, mas ter o corpo respeitado após a morte87. Antígona enfrentou um tirano, Creonte, porque ousara enterrar seu irmão Polinice. Por sua boca, compilando tradições longevas, Sófocles nos legou um testemunho dos mais antigos sobre o Direito natural.88 Mesmo após a morte, o corpo humano guarda uma sacralidade digna de contemplação reverencial. O significado de uma pessoa morta transcende ao conhecimento, invade o campo da sensibilidade e só obtém resposta na metafísica e no sobrenatural. Assim como o homem vive como um todo, orgânico e espiritual, assim o corpo deve ser respeitado e dignificado89. Ainda que altamente louváveis os propósitos da lei, não tem as salvaguardas necessárias e indispensáveis para proteger os recém-mortos de uma desapropriação privada, com escusas intenções. O sublime pode ser sacrificado pela ganância. Ademais, penalmente poderia caracterizar destruição de cadáver.90 Conclusão A nosso sentir, a questão global que se apresenta nas relações Homem-Mulher e Sociedade, no estudo sobre o casamento, é a da segurança e felicidade do ser humano. Peter Wust, existencialista alemão da primeira metade deste século, em profunda análise concluiu que o Homem é o mais inseguro dos animais e seu destino é a busca 87 . IDEM, idem, p. 153. . “ ...as leis divinas, não escritas, mas intangíveis, não é desde hoje, ou de ontem, mas desde a origem de tudo que essas leis estão em vigor, e ninguém as viu nascer”. Sófocles, Antígona. 89 . Há um nasciturus e um defunctus, mas ambos merecem o mesmo respeito pela mesma dignidade. 88 46 constante de segurança, que só alcança na família, como ilustra com a figura do Filho Pródigo91. Este vivia com o pai na fartura e no aconchego do lar, mas resolveu experimentar o mundo; só encontrando insegurança, retornou a tempo para o seio da família, onde o Pai o esperava com festas e alegria.92 Assim é o Homem, que alterna sua vida entre o desamparo e o amparo, mas a única referência segura que encontra não está na Sociedade ou no Estado, mas no círculo familiar que freqüenta. -------- Se a Constituição foi engendrada para dar segurança ao Homem e à Mulher, dentro da Família, é a esta que se deve, com absoluta prioridade, amparar e defender, através das novas Codificações e das instituições do Estado. Como afirmam Rodrigo da Cunha Pereira e Maria Berenice Dias, ilustres Presidente Nacional e Vice, do Instituto Brasileiro de Direito de Família, “não se pode dizer que a família tenha sofrido um processo de desagregação”, pois “permanece irrefutável a premissa de que a família ainda é o que sempre foi e será: a célula básica da sociedade, ponto de partida a possibilitar o desenvolvimento das outras relações sociais.”93 De fato, a entidade familiar é plural e não mais singular, tendo várias formas de constituição (art. 226 da CF); não há mais discriminação de filhos, havidos dentro ou fora do casamento (art. 227, § 6º); e o princípio de igualdade entre homens e mulheres se impôs, “derrogando mais de uma centena de artigos do Código Civil de 1916”94. 90 . C. Penal, Art. 211. . Lucas 15, 11-32. 92 . WUST, Peter. Incertidumbre y riesgo. Madrid: Rialp, 1955. V. tb. ALCORTA, José Ignacio, Peter Wust, filósofo espiritualista de nuestro tiempo. Bilbao: Junta de Cultura de Vizcaya, 1965. 93 Direito de família e o novo Código Civil, p. IX. 94 Idem, idem, p. XII. 91 47 O novo Código Civil como um todo merece acolhimento pelos juristas e jurisconsultos para adquirir as formulações que melhor atendam às exigências da sociedade brasileira contemporânea, como sempre foi feito com êxito pelos doutrinadores pátrios e juízes de nossos Tribunais. Bibliografia consultada e indicada ABBAGNANO, Nicola. Diccionario de Filosofía. 9ª ed. México: Fondo de Cultura Económica, 1992. ALCORTA, José Ignacio, Peter Wust, filósofo espiritualista de nuestro tiempo. Bilbao: Junta de Cultura de Vizcaya, 1965. ALMEIDA, Silmara Juny de A. Chinelato e. Do nome da mulher casada. Direito de família e direitos da personalidade. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001. AUBERT, Roger; SCHOOYANS, Michel. Da Rerum Novarum à Centesimus Annus. São Paulo: Loyola, 1993. BASTOS, Celso Ribeiro; MARTINS, Ives Gandra. Comentários à Constituição do Brasil. 2º vol. 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Mestre e Doutor pela USP. Professor e Orientador nos Cursos de Pós-graduação em Direito da UNESP e Fundação de Ensino Eurípides Soares da Rocha de Marília. Conselheiro do Tribunal de Ética Deontológica da OAB/SP, Membro do Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP) e do Instituto Jacques Maritain do Brasil (IJMB). Professor do Centro de Extensão Universitária de São Paulo. Administrador e Orientador do Portal www.academus.pro.br. E-mail: [email protected]. Jurídico Academus – Livros publicados: Poderes Éticos do Juiz (P. Alegre, Sérgio A Fabris, 1989), Segurança Jurídica e Jurisprudência (São Paulo, LTr, 1996); Direitos Humanos, Urgente! (São Paulo, Oliveira Mendes, 1998); Franco Montoro. Humanismo e Política, (Org.) (São Paulo, Loyola, 2001); Aspectos Psicológicos na Prática Jurídica (Capítulos 1. As Tendências Contemporâneas da Ideologia e Práticas Jurídicas; 5. As Escolas de Direito no que tange ao Preparo Psicológico) (São Paulo, Millennium, 2002); Medidas Provisórias e Segurança Jurídica, (Org.) (São Paulo, Juarez de Oliveira, 2003).