Amigos para Sempre
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Amigos para Sempre
Posse Responsável Amigos para Sempre Patrícia Engel Secco Ilustrações Maria Eugênia Posse Responsável Amigos para Sempre Texto Patrícia Engel Secco Ilustrações Maria Eugênia V ou contar uma história para vocês... Melhor, vou contar duas. Duas histórias, tão interessantes que, por incrível que pareça, terminam do mesmo jeito e exatamente no mesmo lugar: aqui na minha clínica. Ah! Você não me conhece? Então, deixe que eu me apre- sente: sou o Dr. Leonardo, médico veterinário especializado, entre outras coisas, em consertar corações quebrados e sorrisos apagados, que são os temas das histórias que vou contar agora. 3 A primeira delas é a história de Oto, um cachorro muito curioso que, cá entre nós, deveria se chamar Xereta. Mas como ele era um filhote grande e forte, seus donos decidiram que Oto seria o nome ideal para um cão de guarda... Sem nem ao menos se preocupar se Oto gostaria ou não de se tornar um guarda. E aí começou a confusão. Oto adorava ficar sentado em frente ao portão. Afinal, o mundo do lado de fora era muito mais cheio de coisas e acontecimentos... – Que graça! – dizia sua dona ao marido. O Oto é tão corajoso que fica sentadinho aqui, dia e noite em frente ao portão, só para nos proteger! – Ele é realmente um fenômeno, um cãozinho espetacu- lar! – exclamava o marido, sem perceber que Oto era apenas um filhote curioso, que desde pequeno alimentava um sonho: queria ser levado para passear do lado de fora, correr no parque e conhecer outros filhotes. 4 Mas como seus donos não tinham tempo para isso, Oto ficava o dia inteirinho preso na frente da casa, sem nunca ter saído nem mesmo de seu pequeno quintal. Por essa razão, assim que surgiu a primeira oportunida- de, ou seja, assim que seus donos deixaram uma frestinha no portão, Oto escapuliu e, feliz da vida, foi conhecer o mundo do lado de fora das grades. Como ele nunca tinha tido oportunidade de correr e pular sem se preocupar com a falta de espaço, achou o passeio na rua a coisa mais maravilhosa do mundo. Gostou tanto que perdeu a noção do tempo e, quando voltou para casa, encontrou os donos com uma cara de poucos amigos... – De que nos serve um cão de guarda que foge? – per- guntou sua dona ao marido. – Realmente, não serve para nada! Só para ocupar espa- ço no quintal e nos fazer gastar dinheiro com ração! E assim, exatamente com essas palavras, o insensível casal decidiu expulsar Oto de casa, quer dizer, decidiu doar o cachorrinho a um amigo. – O João necessita de um cachorro para lhe fazer compa- nhia e, como mora em um apartamento, não vai precisar se preocupar com as escapadelas do Oto... – disse a dona. – Isso mesmo. Do apartamento é impossível fugir! – dis- se o marido, antes de entregar o filhotinho ao novo dono. João e Oto se deram bem e, como era de esperar, Oto fazia companhia para João e João levava Oto para passear. Passeavam tanto que Oto nunca nem pensou em fugir! Tudo corria às mil maravilhas até que o inevitável acon- teceu: Oto cresceu. O filhotinho robusto tornou-se um jovem cachorro grande, forte e vigoroso. Em outras palavras, transformou-se em um cachorrão imenso. O apartamento de João ficou bastante apertado para os dois, mas a amizade entre eles era tão gostosa que nenhum deles ligava para isso. Até que João decidiu se casar... A noiva de João, que não era lá muito amiga de bicho ne- nhum, tomou a decisão: – Só venho morar nesse apartamento se o Oto não esti- ver mais por aqui... 8 E de novo o jovem cão precisou mudar de casa e de dono. Ficou deitado por um dia inteirinho... No entanto, como a Da primeira vez, Oto nem achou tão difícil. Afinal, seus pri- tristeza não passou, resolveu ficar largado no chão por mais meiros donos não ligavam muito para ele. Agora, porém, a outro dia... E a tristeza piorou. Piorou tanto que, nos dias que história era outra. João era a única família que Oto conhecia, se seguiram, Oto não quis saber de comer nada, até que ficou seu melhor amigo e seu mais querido companheiro. Como tão fraco que precisou ser levado a uma clínica veterinária. ele poderia, de uma hora para outra, desistir de tantos sen- timentos importantes, tudo ao mesmo tempo? jovem cão que sofria de coração partido. Oto não conseguia compreender o que estava acontecen- do e, apesar de agora morar em uma agradável chácara no interior, não encontrava no olhar de nenhum de seus novos donos o carinho que João lhe oferecia. Na chácara, Oto achou todo o espaço que sempre so- nhara. Podia correr solto o dia inteirinho, conhecer animais diferentes. Mas, como seu melhor amigo não estava lá, Oto decidiu deitar e esperar por ele... 10 Foi exatamente nesse dia que eu conheci Oto, um lindo e A segunda história é a de Gabriel, um menino muito res- pondão e malcriado, que vivia ficando de castigo. Gabriel morava em uma simpática cidade no interior, mas seu pai trabalhava na capital. Todos os dias o pai precisava viajar para ir trabalhar e, à noite, quando chegava em casa, estava tão cansado que não dava a menor atenção ao menino. Gabriel até que tentava tudo para que o pai lhe fizesse um pouco de companhia, mas, ao que me parece, o pai de Gabriel não tinha tempo nem mesmo para perceber o que estava acontecendo. A mãe de Gabriel era uma médica muito dedicada. Todos na cidade adoravam seu trabalho, que era visitar as famílias em casa e verificar se alguém estava com algum problema de saúde, se alguma criança não estava se alimentando bem etc. e tal. Era um trabalho muito importante, mas a mãe de Gabriel dedicava tanto tempo às outras famílias que se esquecia da sua. 13 Isso é realmente muito triste, mas, infelizmente, aconte- aceitável e passou a fazer coisas detestáveis, como machu- cia na casa de Gabriel, que, para chamar a atenção dos pais, car gatinhos indefesos. decidiu se transformar no menino mais mal-educado da cida- de: ele comia de boca aberta, jogava futebol na sala e rabis- bom. E ao ver o gato caído no jardim, pegou-o no colo e o cava as paredes do quarto, sem contar o enorme número de levou imediatamente a uma clínica veterinária, por acaso, a nomes feios que ele conhecia muito bem e fazia questão de minha. falar para todo mundo. apagado. Até que um dia Gabriel resolveu jogar uma pedra em um gato que passeava calmamente em cima do muro de sua casa. Ele pegou a pedra no jardim, mirou bem no pobre gatinho e, sem pensar duas vezes, atirou a pedra com toda força. O que ele não esperava era acertar o gato da forma que acertou, bem na barriga. O bichano até que foi valente, porém, segundos depois, cambaleou e caiu no quintal de Gabriel, miando de dor. Gabriel era mesmo muito levado, mas, se você se lembra bem, ele queria apenas chamar a atenção dos pais. Já que não andava obtendo resultados, perdeu a noção do que era 14 Mas o coração dele ainda era o coração de um menino Foi assim que eu conheci Gabriel, o menino do sorriso Não sei se foi coincidência ou, ainda, o destino, mas, assim que eu comecei a atender o Oto, Gabriel entrou correndo na minha sala. Como ele era mesmo supermalcriado, de nada adiantou a recepcionista explicar que eu estava ocupado, pois ele simplesmente invadiu a área gritando feito um doido: – Doutor, doutor, me ajude! Acho que machuquei muito este gatinho, quer dizer, tenho certeza de que machuquei... Coitado, foi sem querer, quer dizer, eu queria acertar a pedra nele, mas não queria machucar! Ah! Me ajuda, vai!!! Eu preciso dizer que a gritaria era tanta e a confusão de palavras era tamanha que peguei o gatinho no colo e me desliguei de todo o resto. Estava mesmo muito chateado com aquele garoto bobo que achava divertido acertar animais indefesos. Coloquei o animalzinho na mesa de exames e durante uns 15 minutos me dediquei totalmente a ele. Por sorte, o gato era muito forte e, pelo que pude consta- tar, nada de mais grave tinha acontecido: bastava um pouco de descanso e ele ficaria novinho em folha, quer dizer, ficaria ótimo novamente. Assim que me virei para dar a boa notícia ao menino, me deparei com uma cena inesquecível: o Oto, que não levantava, não andava e nem mesmo balançava o rabo havia vários dias, estava fazendo a maior algazarra, rolando no chão, feliz da vida com o tal menino. Eu, que estava muito compenetrado e não tinha ouvido to arrependido. Eu queria mesmo fazer uma coisa ruim, mas nenhum barulho até então, percebi naquele instante nunca pensei que eu pudesse ser tão malvado. Sabe, doutor, que tanto o Oto quanto o garoto estavam muito feli- na verdade eu não sou malvado, não! zes, brincando na maior alegria. o quê? Eu precisava atender o Oto. Pedi para que o Gabriel Pedi para que o menino levasse o gatinho até a Achei aquele papo do Gabriel muito estranho, mas fazer sala de repouso e, a partir daquele momento, passei fosse logo levar o gato, mas ele continuou falando: a conhecê-lo melhor. – Eu nunca tinha visto um cachorro legal como este. – O meu nome é Gabriel, doutor. Olha, pode dei- Qual é o nome dele? Onde ele mora? Quem são seus donos? xar que eu vou cuidar bem do gatinho, pois fiquei mui- Quantos anos ele tem? Ele gosta de gatos? É, porque se esse gatinho for morar comigo, ele vai ter que se acostumar e... Na hora eu percebi que alguma coisa mágica havia surgi- do entre Oto e Gabriel, mas só algum tempo depois descobri o que era: amizade. 21 Os novos donos de Oto vieram buscá-lo na clínica e, de- pois de muita conversa com Gabriel, que não desgrudava mais do cachorro e queria saber tudo a seu respeito, decidiram fazer um teste: deixar Oto morar com Gabriel por uns dias. Quem sabe esse não seria o remédio para o cachorro, que andava tão tristonho? Eu preciso dizer que os donos de Oto eram pessoas muito boas e, apesar de gostarem dele, percebiam claramente que ele estava muito infeliz. Em compensação, ficaram apaixonados pelo gatinho que Gabriel havia machucado... Bem que eles queriam levar o gato para a chácara, mas, acho que eu esqueci de contar que, apesar de ser um gato vira-lata, ele tinha uma coleira com nome e telefone. Assim, telefonamos para a dona de Jeremias, que na mesma hora veio buscá-lo junto com seus pais. Por mais incrível que possa parecer, a menina estudava na classe de Gabriel e, quando soube os detalhes do ocorrido, disse horrorizada: – Só podia mesmo ter sido você, seu, seu, seu terrível! Nós não conseguimos deixar de rir, mas foi a resposta de No dia combinado, quando os donos de Oto foram bus- Gabriel que nos surpreendeu: cá-lo na casa do menino, tiveram uma surpresa: os pais de Gabriel estavam esperando por eles. Queriam pedir para que – Eu sou terrível, mas você é insensível! Sei que fiz algo errado, e já disse que faço o que for preciso para me descul- Oto pudesse morar lá. par... Agora, vocês da classe nem sabem que eu existo! Pelo menos agora tenho um amigo na vida, o Oto! todos podiam ver nitidamente a felicidade estampada nos olhos dele, deixaram. Aquelas palavras, mesmo saindo da boca de um menino Seria a quarta mudança na vida do cachorro, mas, como muito levado, fizeram com que todos percebessem como era importante para Gabriel ter um amigo de verdade. A decisão Tinha até mesmo feito um acordo com a mãe pelo qual, da- de deixar Oto ficar por um tempo com Gabriel pareceu então quele momento em diante, ele seria o responsável por acom- bastante acertada. panhar Oto até a minha clínica, comprar ração, levá-lo para E foi exatamente o que aconteceu! passear... Os dias que Oto passou na casa de Gabriel foram exce- lentes tanto para o cão, que dessa vez tinha espaço e carinho, tudo em uma única casa, quanto para o garoto, que de uma hora para outra parou de rabiscar paredes, jogar bola na sala, falar nomes feios e atirar pedras em gatinhos. Está certo que ele ainda comia de boca aberta, mas aí já seria esperar demais... 24 Os pais de Gabriel ficaram muito felizes, e ele, radiante. Essa aproximação entre Gabriel e seus pais foi muito im- portante, pois a presença de Oto os fez perceber que muito do que o filho fazia era para chamar sua atenção. Está certo que eles continuaram ainda muito ocupados, mas nunca mais deixaram de dar atenção ao menino. 26 E eu, que sou apenas um médico veterinário apaixona- do por animais e crianças, tive a fantástica oportunidade de contar para você esta história. A história de uma amizade que consertou o coração quebrado de um cachorro e acendeu o sorriso no rosto de um menino. Ambos precisavam de atenção, mas felizmente o menino sabia gritar. Ao cachorro, que mudou tantas vezes de casa e de família, restou ficar doente. Sorte que tudo terminou bem!!! Um abraço Dr. Leo A vivência, e é escolha NOSSA cuidar deles. Por isso, temos de pensar sobre a responsabilidade que temos como proprietários os pais dos animais. Os animais precisam de carinho e atenção. Por esse motivo, pessoas que não têm tempo nem “jeito” com eles devem pensar duas vezes antes de se tornar proprietárias de um. O conceito de posse responsável é baseado nessa premissa: somos responsáveis por nossos amigos de estimação do mesmo modo como somos responsáveis por nossos filhos. Os animais dependem de nós para sua sobre- As crianças devem ser instruídas a cuidar dos animais de estimação com atenção e respeito, tendo consciência de que ganhar um “bichinho” é ganhar também responsabilidade, além de umas boas lambidas... Devemos ensinar a nossas crianças que a posse responsá- vel é um ato de amor. Tomar conta de um bichinho de estimação (dando carinho, oferecendo os cuidados relativos a higienização, alimentação, tratamento veterinário etc.) é uma atitude de responsabilidade e uma forma de mostrar como se gosta do animal. As crianças devem ser orientadas a participar ativamente do cuidado com o animal de estimação, responsabilizando-se por ele e acompanhando seu crescimento e seu desenvolvimento. Dessa forma, poderemos formar um grupo de pessoas mais preparadas e maduras, capazes não apenas de “amar” os animais, mas de fazer o mais difícil, que é demonstrar esse amor por atos (cuidando do animal, tratando bem dele). 31 Posse Responsável – Amigos Para Sempre Patrícia Engel Secco Ilustrações Maria Eugênia Projeto Gráfico & Editoração Lili Tedde Revisão Frank de Oliveira Coordenação Editorial Secco Consultoria Empresarial Concepção e Realização Patrícia Engel Secco Editora Boa Companhia www.projetofeliz.com.br