3 Vol XIX 2010 - Revista Nascer e Crescer

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3 Vol XIX 2010 - Revista Nascer e Crescer
Revista do Hospital de Crianças Maria Pia | Departamento de Ensino, Formação e Investigação | Centro Hospitalar do Porto
Ano | 2010 Volume | XIX Número | 03
Directora | Editor | Sílvia Álvares; Directora Adjunta | Associated Editor | Margarida Guedes
Presidente do CA do Centro Hospitalar do Porto, EPE | Director | Pedro Esteves
- Cidade Rodrigues, CHP - HMP
- Clara Barbot, CHP - HMP
- Conceição Casanova, CHPV-VC
- Eloi Pereira, H Maria Pia, CHP - HMP
- Eurico Gaspar, HS Pedro - CHTMAD
- Fátima Praça, CHVNG - E
- Filomena Caldas, CHP - HMP
- Gama Brandão, CHAA
- Gonçalves Oliveira, H Famalicão, CHMA
- Henedina Antunes, HBEB
- Hercília Guimarães, HSJ, FMUP
- Ines Lopes, CHVNG - UE
- José Barbot, CHP - HMP
- José Carlos Areias, FMUP
- José Carlos Sarmento, CHVS
- José Cidrais Rodrigues, HPH – ULSM
- José Pombeiro, MJDinis – CHP - MJD
- Lopes dos Santos, HPH – ULSM
- Lucília Norton, IPOPF-G
- Luís Almeida Santos, HSJ, FMUP
- Luís Januário, HPC
- Luís Vale, CHP - HSA
- Manuel Salgado, HPC
- Manuela Selores, CHP - HSA
- Marcelo Fonseca, HPH – ULSM
- Margarida Lima, CHP – HSA, ICBAS
- Margarida Medina, CHP - HSA
- Maria Augusta Areias, CHP - MJD
- Nuno Grande, ICBAS
- Octávio Cunha, Hospital Privado da Boa-Nova
- Óscar Vaz, H Mirandela – CHNordeste
- Paula Cristina Ferreira, CHP - HSA
- Pedro Freitas, HS Oliveira, Guimarães – CHAA
- Raquel Alves, CHP - UMP
- Rei Amorim, HS Luzia - CHAM
- Ricardo Costa, H Pêro da Covilhã, CHCV
- Rodrigues Gomes, Fundação Calouste Gulbenkian
- Rosa Amorim, CHP - UMP
- Rui Carrapato, HS Sebastião – CHEDV
Secretariado Administrativo | Secretary
Maria José Bento, IPOPF-G
Conselho Científico Internacional |
| International Scientific Board
tel: (+351) 226 089 900; fax: (+351) 226 000 841
Conselho Científico Nacional |
| National Scientific Board
- Alain de Broca (Amiens), Centre Hospitalier Universitaire Amiens
- Anabelle Azancot (Paris), Hôpital Robert Devré
- D. L. Callís (Barcelona), Hospitals Vall d’Hebron
- F. Ruza Tarrio (Madrid), Hospital Infantil Universitario La Paz
- Francisco Alvarado Ortega (Madrid), Hospital Infantil
Universitario La Paz
- George R. Sutherland (Edinburgh), University Hospital
- Harold R. Gamsu (Londres), Kings College Hospital
- J. Bois Oxoa (Barcelona), Hospitals Vall d’Hebron
- Jean François Chateil (Bordeaux), Hôpital Pellegrin
- José Quero (Madrid), Hospital Infantil Universitario La Paz
- Juan Tovar Larrucea (Madrid), Hospital Infantil Universitario
La Paz
- Juan Utrilla (Madrid), Hospital Infantil Universitario La Paz
- Peter M. Dunn (Bristol), University of Bristol
Os trabalhos, a publicidade e a assinatura, devem ser
Corpo Redactorial | Editorial Board
Artur Alegria, MJDinis - CHP; Armando Pinto, IPOPF-G; Carmen
Carvalho, MJDinis - CHP; Conceição Mota, H Maria Pia - CHP;
Cristina Rocha, CHEDV; Gustavo Rocha, HS João, João
Barreira, HS João, Laura Marques, H Maria Pia - CHP; Miguel
Coutinho, H Maria Pia - CHP; Rui Almeida, HP Hispano, Rui
Chorão, H Maria Pia - CHP
Editores especializados | Section Editors
Artigo Recomendado – Helena Mansilha, H Maria Pia - CHP;
Maria do Carmo Santos, H Maria Pia - CHP; Tojal Monteiro,
ICBAS
Perspectivas Actuais em Bioética – Natália Teles, INSRJ-INSA
Pediatria Baseada na Evidência – Luís Filipe Azevedo, FMUP;
Altamiro da Costa Pereira, FMUP
Ciclo de Pediatria Inter-Hospitalar do Norte – Almerinda Pereira,
HBEB, Armando Pinto, IPOPFG; Carla Carvalho, HSM Maior;
Conceição Santos Silva, CHPV-VC; Fátima Santos, CHVNGVC; Fernanda Manuela Costa, HS António - CHP; Helena
Jardim, HS João; Isolina Aguiar, CHAA; Joaquim Cunha, CHVS;
Miguel Costa, CHEDV; Rogério Mendes, MJDinis - CHP; Rosa
Lima, H Maria Pia - CHP; Sofia Aroso, HP Hispano; Sónia
Carvalho, CHMA.
Caso Dermatológico – Manuela Selores, HS António - CHP;
Susana Machado, HS António - CHP
Caso Electroencefalográfico – Rui Chorão, H Maria Pia - CHP
Caso Endoscópico – Fernando Pereira, H Maria Pia - CHP
Caso Estomatológico – José Amorim, H Maria Pia - CHP
Caso Radiológico – Filipe Macedo, CHAA
Genes, Crianças e Pediatras – Esmeralda Martins, H Maria Pia
- CHP; Margarida Reis Lima, HPP
Pequenas Histórias – Margarida Guedes, HSAntónio – CHP, ICBAS
Coordenação Técnica | Editorial Coordenation
Margarida Lima, HS António – CHP, ICBAS
Consultora de Epidemiologia e de Bioestatistica
- Alberto Caldas Afonso, HSJ, FMUP
- Agustina Bessa Luís
- Almerinda Pereira, HBEB
- Álvaro Aguiar, FMUP
- Ana Maria Leitão, HSSM
- Ana Maria Ribeiro, CHEDV
- Ana Ramos, CHP - HMP
- António Lima, CHEDV
- António Martins da Silva, ICBAS
- António Vilarinho, CHVNG - E
- Arelo Manso, C H Trás-os-Montes e Alto Douro (CHTMAD)
- Braga da Cunha, H Pe Américo - CHTS
- Carlos Duarte, CHP - UMP
Carolina Cortesão
Paulo Silva
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Vila Nova de Famalicão
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NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
índice
ano 2010, vol XIX, n.º 3
número3.vol.XIX
143 Editorial
144 Artigos Originais
Sílvia Álvares
Enurese Nocturna:
a Experiência de uma Consulta Especializada no CHPPV/VC
Pedro Silva Almeida, João Monteiro, Célia Madalena
149 Casos Clínicos
Um Caso Raro de Retenção Urinária Aguda
Marta Santalha, Miguel Fonte, Filipa Correia e Cristina Ferreira
152
Dor Abdominal e Retenção Urinária Aguda em Adolescente:
Apresentação Clínica de Hematocolpos e Revisão da Literatura
Helena Sousa, Helena Fonseca e Lurdes Sampaio
155 Artigo de Revisão
Paralisia Facial Periférica – Diagnóstico, Tratamento e Orientação
Tiago Correia, Maria João Sampaio, Rui Almeida e Cristina Garrido
de Pediatria Inter-Hospitalar
161 Ciclo
do Norte
Hidropisia Fetal e Colestase Neonatal – Caso Clínico
Ariana Afonso, Ana Margarida Alexandrino, Ermelinda Santos Silva,
Alexandra Almeida e Gilberta Neves Santos
166 Qual o seu Diagnóstico?
Caso Hematológico
Patrícia Nascimento, Emília Costa, Beatriz Porto e José Barbot
169
Caso Dermatológico
Ana Oliveira, Iolanda Fernandes, Inês Lobo e Manuela Selores
171
Caso Electroencefalográfico
Ana Graça Velon, Célia Xavier, Adriana Ribeiro e Rui Chorão
174
Caso Endoscópico
Fernando Pereira
176
Caso Estomatológico
José M. S. Amorim
178
Caso Radiológico
Ana Filipe Almeida, Filipe Macedo
180
Genes, Crianças e Pediatras
Anabela Bandeira, Maria João Oliveira e Esmeralda Martins
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
182 Pequenas Histórias
As Mães nem Sempre Têm Boas Intenções…
Manuel Salgado
XXII Reunião do Hospital de Crianças
Maria Pia – Resumo das Intervenções
S185
Cuidados Continuados Pediátricos –
Abordagem Multidisciplinar – Mesa Redonda
A nutrição
Helena Ferreira
S189
A reabilitação
Rosa Amorim
S192
Cuidados Paliativos e Continuados Pediátricos
– Presente e Futuro – Mesa Redonda
O papel da Comunidade
Maria José Ribas
S195
Experiência do Serviço de Pediatria do IPO
Ana Maia
S198
Ginecologia em Pediatria – Mesa Redonda
S200
Contracepção e Gravidez na Adolescência –
Mesa Redonda
Puberdade Tardia: Amenorreia Primária
Márcia Barreira
Doenças Sexualmente Transmissíveis
Manuel Rodrigues
S201
Gravidez na Adolescência
Rosa Maria Rodrigues
S202
Grande Prematuridade – Mesa Redonda
S204
Prematuridade Tardia – Mesa Redonda
Grande Prematuridade: Nutrição e Crescimento
Luísa Carreira
Prematuridade Tardia: a Nova Epidemia
Gilberta Santos
S207
Experiência da Maternidade Júlio Dinis
Cristina Godinho
Resumo das Comunicações Orais
S210
S219
Nascer e Crescer para o
234 Prémio
Melhor Artigo Original
235 Normas de Publicação
Resumo dos Posters
NASCER E CRESCER
summary
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
number3.vol.XIX
143 Editorial
144 Original Articles
Sílvia Álvares
Nocturnal Enuresis: Experience of a Specialized Consultation at CHPV/VC
Pedro Silva Almeida, João Monteiro, Célia Madalena
149 Case Reports
A Rare Case of Acute Urinary Retention
Marta Santalha, Miguel Fonte, Filipa Correia, Cristina Ferreira
152
Adolescent With Abdominal Pain and Acute Urinary Retention:
Clinical Presentation of Hematocolpos and Review of the Literature
Helena Sousa, Helena Fonseca, Lurdes Sampaio
155 Review Articles
Peripheral Facial Palsy – Diagnosis, Treatment and Follow-up
Tiago Correia, Maria João Sampaio, Rui Almeida, Cristina Garrido
161 Paediatric Inter-Hospitalar Meeting
Hydrops Fetalis and Neonatal Cholestasis – Case Report
Ariana Afonso, Ana Margarida Alexandrino, Ermelinda Santos Silva,
Alexandra Almeida e Gilberta Neves Santos
166 What is your Diagnosis?
Hematology Case
Patrícia Nascimento, Emília Costa, Beatriz Porto, José Barbot
169
Dermatology Case
Ana Oliveira, Iolanda Fernandes, Inês Lobo, Manuela Selores
171
EEG Case Report
Ana Graça Velon, Célia Xavier, Adriana Ribeiro, Rui Chorão
174
Endoscopic Case
Fernando Pereira
176
Oral Pathology Case
José M. S. Amorim
178
Radiological Case
Ana Filipe Almeida, Filipe Macedo
180
Genes, Children and Paediatricians
Anabela Bandeira, Maria João Oliveira, Esmeralda Martins
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
182 Short Stories
Mothers’ intentions: not always good…
Manuel Salgado
XXII Meeting of children’s Hospital
Maria Pia – Abstracts
S185
Paediatric Continuing Care – Multidisciplinary
Approach – Round Table
Nutrition
Helena Ferreira
S189
Rehabilitation
Rosa Amorim
S192
Paediatric Palliative and Continuing Care –
Present and Future – Round Table
The Role of Community
Maria José Ribas
S195
Experience of the Paediatric Department of IPO
Ana Maia
S198
Gynecology in Paediatrics – Round Table
S200
Contraception and Pregnancy Among
Adolescents – Round Table
Delayed Puberty: Primary Amenorhoea
Márcia Barreira
Sexually Transmitted Diseases
Manuel Rodrigues
S201
Adolescent Pregnancy
Rosa Maria Rodrigues
S202
Extreme Prematurity – Round Table
S204
Late Prematurity – Round Table
Extreme Prematurity: Nutrition and Growth
Luísa Carreira
Late Prematurity: the New Epidemics
Gilberta Santos
S207
Experience of the Maternidade Júlio Dinis
Cristina Godinho
Oral Presentations – Abstracts
S210
S219
e Crescer: Best Original
234 Nascer
Article
235 Instructions for Authors
Posters Presentations – Abstracts
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
editorial
Bem-vindos à I Reunião do CMIN/XXII Reunião do Hospital de Crianças Maria Pia.
Tendo já no nosso património cultural e científico XXII realizações, esta é a primeira
de uma nova fase da nossa história. Continua a ser nosso compromisso manter um
espírito de colaboração interinstitucional e entre os diferentes níveis de cuidados de
saúde, no sentido de uma melhoria da qualidade assistencial. Acresce que, nos dias
de hoje, a saúde é entendida como um direito social, num conceito mais abrangente
que o simples direito equitativo a cuidados para tratamento de doença. Importa, pois,
considerar que o estado de saúde não é só condicionado pelos cuidados de saúde. As
condições sócio-económicas e ambientais, os factores de comportamento e estilo de
vida são determinantes preponderantes na melhoria do estado de saúde. Esta ligação
e interdependência entre os cuidados de saúde e a comunidade, a necessidade de
uma interdisciplinaridade no tratamento da doença crónica, vão estar bem presentes
na discussão sobre os Cuidados Paliativos e Continuados Pediátricos. Ainda no âmbito
desta problemática iremos também desenvolver um tema actual “A Prematuridade”, a
nova epidemia em Pediatria, que exige também uma orientação multidisciplinar.
Outros temas incluídos no programa são a “Ginecologia Pediátrica”, uma área
desafiante para o Pediatra, face ao alargamento da idade pediátrica e às alterações
dos padrões de comportamento social dos adolescentes. Como sempre, esperamos
dinamizar a assistência com a sessão interactiva de Infecciologia e trazer os avanços da
Cirurgia de Mínimo Acesso.
Incluímos dois cursos pré congresso: o curso de Suporte de Vida Pediátrico e o
curso de Ventilação não Invasiva, e o curso pós congresso de Imagiologia Pediátrica.
Teremos ainda sessões de comunicações livres que serão, sem dúvida, um espaço
de debate e de promoção de troca de saberes e experiências. Esperamos recompensar
o esforço dos colegas com a atribuição dos prémios para a melhor Comunicação Oral
e Melhor Poster.
Procuramos apresentar um programa com um conteúdo equilibrado e de elevado
nível científico, englobando a nossa prática clínica, os problemas do dia-a-dia, a
organização de cuidados, as perspectivas futuras da Pediatria.
Salientamos a colaboração de todos os Serviços de Pediatria da região Norte
e agradecemos o seu entusiasmo, dedicação e empenho nesta nossa reunião, já
tradicional no panorama científico pediátrico do Norte do país.
Anunciamos ainda que será entregue na sessão de encerramento da reunião o
Prémio Nascer e Crescer para o melhor Artigo Original 2009 que este ano foi atribuído
ao trabalho intitulado: “Esferocitose hereditária. Esplenectomia e Colecistectomia.
Experiência de um Hospital Pediátrico” da autoria de Susana Soares, Berta Bonet,
Ferreira Sousa, Carlos Enes, Cidade Rodrigues, Marika Bini Antunes e José Barbot.
Deixamos aqui também o nosso reconhecimento à Liga de Amigos e à Associação do
Hospital de Crianças Maria Pia, bem como às empresas farmacêuticas que colaboraram
connosco, pelo seu contributo e interesse na divulgação e actualização científica.
Contamos com todos para criar um espaço de diálogo, de rigor científico, de
cooperação e de complementaridade num ambiente agradável e de convívio familiar.
Sejam pois, e mais uma vez, bem-vindos!
Sílvia Álvares
editorial
143
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
Enurese Nocturna: a Experiência de uma Consulta
Especializada no CHPV/VC
Pedro Silva Almeida1, João Ricardo Alves Monteiro2, Célia Madalena3
RESUMO
Introdução: A enurese nocturna
(EN) é um problema comum em Pediatria. Aos 5 anos, a sua prevalência é de
cerca de 15%. A maioria corresponde a
EN Monossintomática (ENM).
Objectivos: Caracterizar a população de crianças com EN seguidas na
consulta de Enurese (CE) do Centro Hospitalar da Póvoa de Varzim/Vila do Conde
(CHPV/VC).
Material e métodos: Estudo observacional, analítico e retrospectivo dos
doentes da CE do CHPV/VC com 1ª consulta entre Julho/2003 e Dezembro/2007.
Dados recolhidos da consulta do processo clínico tratados em Microsoft Excel
2007®.
Resultados: Incluídas 137 crianças
(67% rapazes), entre os 5 e os 17 anos.
Em 87,6% a EN era primária, em 57,7%
era ENM, em 76,5% havia episódios todas as noites e em 72% havia poliúria.
Todas as crianças efectuaram exame de
urina tipo II.
Dos 77 casos de ENM, em 3 foram
instituídas inicialmente apenas medidas
de reforço positivo, tendo-se verificado
cura em 2; em 74 foi instituído tratamento
com desmopressina, curando 42%. Em
17 casos foi associado alarme sonoro
(AS) à desmopressina, curando 88,2%.
Nos 53 casos de EN Não-Monossintomática (ENNM) foi instituído tratamento com oxibutinina em todos os casos, com cura em 11% (em monoterapia).
Em 47 crianças foi associada desmo__________
UCSP Modivas, ACES Grande Porto V – Póvoa de Varzim/Vila do Conde
2
USF das Ondas, ACES Grande Porto V – Póvoa de Varzim/Vila do Conde
3
Centro Hospitalar da Póvoa de Varzim/Vila
do Conde
1
144
artigo original
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pressina, com cura em 43%. Em 7 casos
associou-se AS à desmopressina, com
cura em 43%.
Discussão e conclusão: Na ENM
houve bons resultados associando desmopressina ao AS, quando esta não teve
sucesso terapêutico isoladamente. Nos
casos de ENNM verificou-se que a terapêutica isolada com oxibutinina foi pouco
eficaz, recorrendo-se frequentemente à
associação de 2 fármacos e/ou AS.
Palavras-chave: Enurese, crianças, tratamento
Nascer e Crescer 2010; 19(3): 144-148
INTRODUÇÃO
A Enurese Nocturna (EN) é um problema comum em idade pediátrica(1), sendo a patologia urológica pediátrica mais
frequentemente observada ao nível dos
Cuidados de Saúde Primarios(2). É definida como uma micção normal involuntária
durante a noite, após os cinco anos de
idade(2,3). Trata-se de uma causa importante de stress para a família e para a
criança, podendo causar significativa diminuição da sua auto-estima. Cerca de
15% das crianças entre os cinco e os seis
anos apresenta enurese(1,2). Dois estudos
portugueses revelaram uma prevalência
de Enurese Nocturna entre os 6,1 e os
15,6%, ambos realizados em crianças do
ensino primário(3,4). A EN é duas a três vezes mais frequente em rapazes do que em
raparigas(1,5) e tem uma taxa de resolução
espontânea de cerca de 15% por ano(1,2).
A probabilidade de resolução espontânea
da enurese é tanto menor quanto maior
for a duração da enurese(1).
A EN é classificada em Primária ou
Secundária e em Monossintomática ou
Não-Monossintomática. A EN Primária é
definida em crianças que nunca tiveram
controlo vesical e a EN Secundária surge em crianças que tiveram um controlo
vesical prévio de pelo menos seis meses.
Na EN Monossintomática não há sinais
ou sintomas urinários diurnos e representa cerca de 80 a 85% dos casos(1,2). No
que diz respeito à EN Não-Monossintomática, há uma associação de sinais ou
sintomas urinários diurnos, tais como polaquiúria, imperiosidade ou incontinência,
sugestivos de instabilidade vesical(2).
A etiologia da EN permanece mal
esclarecida, pensando-se que é de causa
multifactorial. Em cerca de 2 a 3% podem
ser encontradas causas orgânicas, tais
como infecção do trato urinário, malformações urológicas, obstipação e/ou encoprese, síndrome de apneia obstrutiva
do sono ou diabetes. Várias teorias têm
sido estudadas, desde a hereditariedade,
o ritmo circadiano da produção de vasopressina, o ambiente psicossocial e familiar, a fisiologia do sono ou a disfunção
vesical(1,3).
A intervenção terapêutica apropriada justifica-se pelos benefícios psico-afectivos e sociais para a criança e a
sua família. Existem várias opções terapêuticas, que englobam terapêutica
comportamental (reforço positivo, treino
vesical), alarme sonoro e o uso de fármacos (desmopressina, oxibutinina, entre
outros)(1,2,5,6).
Com este trabalho pretendeu-se caracterizar a população de crianças com
EN seguidas na Consulta de Enurese do
CHPV/VC, bem como avaliar a resposta
ao tratamento.
MATERIAL E MÉTODOS
Foi efectuado um estudo retrospectivo com recolha de dados dos processos
clínicos das crianças seguidas na Consulta
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
de Enurese do CHPV/VC no período entre
Julho de 2003 e Dezembro de 2007.
A população do estudo corresponde
à totalidade de crianças seguidas na referida consulta, que tiveram a primeira consulta no período referido. A recolha dos
dados foi feita pela análise dos processos clínicos (Figura 1) e foram definidos
como critérios de exclusão a ausência de
consulta de seguimento e a existência de
processo clínico incompleto.
Foram avaliadas as seguintes variáveis: sexo, idade, proveniência, tipo de
enurese, número de noites molhadas por
semana, número de micções por noite e
padrão miccional diurno (através de informação subjectiva referida pelos pais),
ingestão hídrica habitual, características
do sono, uso de fralda, co-morbilidades
[obstipação definida como diminuição da
frequência da defecação (< 3 dejecções
por semana) ou defecação acompanhada
de dor ou desconforto e encoprese, definida como expulsão de fezes (voluntária
ou involuntária) em local não apropriado
ou perda involuntária e repetida de fezes,
sujando continuada ou frequentemente a
roupa interior](7), história familiar, repercus-
Figura 1 – Folha de registo usada na Consulta de Enurese do CHPVVC
são na família, motivação da criança para
o tratamento, tratamento prévio, exames
auxiliares de diagnóstico, tratamento, resposta ao tratamento e data de alta. A resposta ao tratamento foi definida como: (1)
Cura, se a criança apresentou menos do
que uma noite molhada por mês durante
pelo menos 3 meses após suspensão do
tratamento; (2) Melhoria, se houve uma
diminuição igual ou superior a 50% do
número de noites molhadas; (3) Mesmo
estado, se o número de noites molhadas
se manteve inalterado ou houve uma diminuição inferior a 50% do número de noites molhadas; (4) Bem sob tratamento se
a criança apresentou menos do que uma
noite molhada por mês.(8)
Os dados foram registados e processados em Microsoft Excel 2007®.
RESULTADOS
Foram 148 as crianças observadas em Consulta Externa de Enurese no
CHPV/VC. Destas, foram excluídas 11
por informação incompleta no processo
clínico ou por ausência de consultas de
seguimento. Assim, foram incluídas 137
crianças neste estudo, 67% do sexo masculino. A maioria das crianças tinha entre 5
e 8 anos à data da primeira consulta, com
uma média de 7 anos e 10 meses de idade e uma mediana de 7 anos (Figura 2).
A maioria dos doentes apresentava
EN Primária (87,6%), Monossintomática
(57,7%), usava fralda à data da 1.ª consulta (51%), molhava 7 noites por semana
(76,5%) e molhava a cama mais de uma
vez por noite (72%). O sono profundo era
também uma característica referida na
maioria destes doentes (87,5%), assim
como o hábito de ingerir bebidas gaseificadas ou com cafeína durante o dia e
beber leite ou água ao deitar (73%).
A maioria apresentava antecedentes familiares de enurese (77%). Havia
pelo menos uma co-morbilidade associada em 78% dos casos, sendo as mais
prevalentes a obstipação (37 casos) e
a encoprese (17 casos). Em 51,5% dos
casos era referido (pela criança ou pelos
pais) que a enurese tinha impacto no seu
bem-estar e repercussão nas relações
familiares.
A abordagem terapêutica anterior à
primeira consulta de EN no CHPV/VC já
artigo original
original article
145
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
havia sido realizada em 48% dos doentes, tendo sido a desmopressina o fármaco mais frequentemente prescrito (92%
dos casos).
As crianças foram observadas na
consulta, em média, 1 a 3 meses após
o início do tratamento, sendo reavaliadas
de 3 em 3 meses. A última consulta era
geralmente 3 meses após a suspensão
do tratamento.
O tempo médio de seguimento foi
de 12,6 meses (mínimo: 6 meses; máximo: 44 meses).
Todos os doentes realizaram exame
de urina tipo II na avaliação inicial; 74 doentes realizaram ecografia renovesical,
9 realizaram cintigrafia renal com DMSA
(Scan com ácido dimercaptosuccínico) e
4 realizaram Cistouretrografia miccional
seriada (CUMS) (Figura 3).
Em 7 casos não foi possível obter
dados relativamente à resposta ao tratamento. Relativamente aos doentes com
EN Monossintomática (N=77), 3 foram
tratados, inicialmente, apenas com reforço positivo, 57 com desmopressina oral e
17 com desmopressina oral associada ao
alarme sonoro.
Das 3 crianças tratadas apenas
com medidas de reforço positivo (RP),
2 (66,7%) ficaram curadas; das tratadas
com desmopressina e RP (n=57) a resposta foi favorável em 86% (49/57), com
cura em 54,4% (31/57) e nos casos tratados com alarme sonoro associado a desmopressina e RP (n=17) 88,2% (15/17)
ficaram curados (Figura 4).
No conjunto de crianças com EN
Monossintomática, 62,3% (48/77) ficaram curadas, 3,9% (3/77) encontravam-
Figura 2 – Distribuição dos doentes por idade em anos (N=137)
Legenda: CUMS – Cistouretrografia miccional seriada; DMSA – Scan com ácido dimercaptosuccínico
Figura 3 – Número de doentes que realizaram exames complementares de diagnóstico
146
artigo original
original article
-se bem sob tratamento, 22% (17/77)
tiveram melhoria, enquanto que 11,7%
(9/77) mantiveram o mesmo estado com
o tratamento instituído.
Todas as crianças com EN Não-Monossintomática (N=53) foram tratadas inicialmente com oxibutinina, em
40 casos associou-se à oxibutinina a
desmopressina oral e em 7 crianças foi
usado o alarme sonoro após tratamento
prévio com oxibutinina e desmopressina
oral. Com o tratamento isolado com oxibutinina verificou-se cura da enurese em
6 casos (11,3%). Dos casos tratados com
oxibutinina e desmopressina oral, 90%
(36/40) responderam favoravelmente, e
metade (20/40) ficaram curados. Nos doentes medicados com oxibutinina e desmopressina associadas a alarme sonoro,
86% (6/7) responderam favoravelmente e
42,9% (3/7) ficaram curados (Figura 5).
Destas abordagens terapêuticas resultou uma taxa de cura global das crianças com EN Não-monossintomática de
54,7% (29/53), 9,4% (5/53) encontravam-se
bem sob tratamento, em 26,4% (14/53)
verificou-se melhoria da sintomatologia
e 9,4% das crianças (5/53) mantiveram o
mesmo estado clínico.
Dos doentes avaliados neste estudo, 58% já tiveram alta da consulta, 10%
encontram-se em seguimento e 32%
abandonaram a consulta.
CONCLUSÕES
O estudo da consulta de Enurese do
CHPV/VC revelou uma população maioritariamente do sexo masculino, que predominantemente molhava a cama todas
as noites e mais do que 1 vez por noite.
O facto de ser causa de conflito familiar em 51,5% dos casos e de 24% das
crianças terem idade igual ou superior a 10
anos à data da primeira consulta demonstram a importância da patologia em causa
e do grau de perturbação que pode ter no
dia-a-dia dos doentes e suas famílias.
Na maioria dos casos havia história
familiar positiva (77%), o que demonstra
a importância da herança familiar nesta
patologia.
Em 46% dos casos já havia sido tentada uma abordagem terapêutica prévia,
maioritariamente com desmopressina, sem
sucesso provavelmente devido aos curtos
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
períodos de tratamento ou à existência de
sintomatologia diurna associada.
Como abordagem terapêutica inicial, a todas as crianças são instituídas
medidas de reforço positivo, que consistem em retirar as fraldas, realizar o registo das noites secas e sua valorização,
reforçar a ingestão de líquidos durante o
dia e o treino vesical (espaçar as micções
e interromper o jacto urinário), reduzir a
ingestão de líquidos nas 2 horas prévias
à hora de deitar, urinar antes de deitar e
ao acordar. Procede-se também ao tra-
Inalterado
Bem sob tratamento
tamento da obstipação e/ou encoprese
quando existentes.
Estima-se que 30% das crianças
com enurese respondem totalmente ao
tratamento com a desmopressina e 40%
têm resposta parcial(9). O mecanismo de
acção da desmopressina (análogo sintético da hormona antidiurética) parece
resultar não só da sua actividade antidiurética, mas também da sua acção a
nível do sistema nervoso central(8,9,10). A
desmopressina intranasal deixou de ser
recomendada no tratamento da enurese,
Melhoria
Cura
Legenda: RP – Reforço Positivo; DP – Desmopressina; AS – Alarme Sonoro
Figura 4 - Tratamento dos doentes com Enurese Monossintomática (N=77)
Inalterado
Bem sob tratamento
Melhoria
Cura
Legenda: OX – Oxibutinina; DP – Desmopressina; AS – Alarme Sonoro
Figura 5 - Tratamento dos doentes com Enurese Não-Monossintomática (N= 53)
existindo a formulação oral em comprimidos e liofilizado oral, este último disponível em Portugal desde Outubro de 2008.
Na Consulta de Enurese avaliada neste
estudo, a formulação oral foi utilizada
em substituição da intranasal a partir de
2004, na dose de 10 a 40 μg.
Nas crianças com ENM é pedida a
análise de urina tipo II. Na ENNM para
além da análise de urina tipo II é também
realizada ecografia renovesical com avaliação do resíduo pós-miccional.
Assim, após a avaliação da população em estudo, verificou-se que foram
realizados exames complementares de
diagnóstico em 87 doentes. A ecografia
renal foi efectuada em doentes com EN
Não-monossitomática ou história prévia
de infecção do tracto urinário; a DMSA e/
ou CUMS foram realizadas no contexto
de investigação de infecções urinárias febris ou assimetria renal.
No tratamento da EN Monossintomática (57,7% dos casos), a desmopressina em monoterapia teve uma resposta positiva em 66% das crianças e
curou 42% das mesmas. A associação
do alarme sonoro com a desmopressina,
nos casos em que a monoterapia com
desmopressina não revelou resultados
satisfatórios, teve uma resposta positiva
em 100% dos casos, curando 88% dos
doentes. Não se verificou a ocorrência de
efeitos laterais.
A oxibutinina é usada para melhorar
a capacidade vesical e reduzir a hiperactividade do detrusor na ENNM. Estudos
recentes referem benefício do seu uso
na EN monossintomática nas crianças
que não respondem à terapêutica isolada
com desmopressina6.
O tratamento das crianças com EN
Não-Monossintomática foi individualizado.
Em 6 crianças (11,3%), a cura ocorreu com
esquema de oxibutinina isolada. A associação de oxibutinina com desmopressina
foi usada em 40 casos, com resposta positiva em 90% dos casos e cura em 50%
dos mesmos. Por fim, em 7 doentes, foi
feita a associação de alarme sonoro após
a terapêutica com desmopressina e oxibutinina, com resposta positiva em 86% dos
doentes e cura em 43%.
As medidas de reforço positivo,
apesar de importantes porque permitem
artigo original
original article
147
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
à criança participar activamente no tratamento, apresentam sucesso terapêutico
reduzido. Todavia devem ser aconselhadas numa abordagem inicial.(8)
O alarme sonoro resulta em cura
em cerca de 2/3 das crianças(9). Trata-se
de um tratamento comportamental com
efeito condicionado a nível do sono, facilitando a inibição do reflexo de micção
e aumentando a capacidade vesical(9).
No entanto, requer motivação e colaboração por parte da criança e seus familiares. É considerado pela maioria dos
autores como o tratamento mais eficaz,
requerendo um mínimo de 2 a 3 meses
de aplicação ou até um mínimo de 14
noites secas consecutivas. As recaídas
implicam um segundo curso de tratamento(9). O tratamento combinado com
a desmopressina é defendido por alguns
autores, particularmente nas crianças
mais velhas com grande número de episódios enuréticos, com o objectivo de
aumentar o número de noites secas e
aumentar a motivação da criança e dos
pais para o tratamento, fundamentais
para o sucesso terapêutico(11).
Verificou-se neste estudo que em
doentes com EN Monossintomática o
uso de alarme sonoro em associação
com demopressina teve uma taxa de
cura de 88,2%. Em doentes com EN Não-monossintomática, mesmo com terapêutica optimizada com desmopressina, oxibutinina e alarme sonoro, a taxa de cura
não ultrapassou os 42,9%.
Os resultados favoráveis, provavelmente, traduzem a abordagem terapêutica individualizada, tendo em conta a
multiplicidade de factores implicados na
Enurese.
O estudo realizado apresenta algumas limitações metodológicas, nomeadamente o tamanho amostral pequeno,
o facto de se tratar de um estudo retrospectivo e o uso de variáveis pouco
objectivas, tais como a avaliação do padrão miccional diurno e nocturno, que se
basearam num questionário subjectivo
aos pais e não numa folha de frequência/
volume, diário miccional ou pesagem da
fralda, que são formas mais mensuráveis
destas variáveis.
148
artigo original
original article
NOCTURNAL ENURESIS:
EXPERIENCE OF A SPECIALIZED
CONSULTATION AT CHPV/VC
ABSTRACT
Introduction: Nocturnal enuresis
(NE) is a common problem in childhood
healthcare. At the age of 5 nocturnal enuresis’ prevalence is 15%. Most patients
have monosymptomatic NE (MNE).
Objectives: To study the children
with NE followed at the Enuresis Consult
at the Centro Hospitalar da Póvoa de Varzim/Vila do Conde(CHPV/VC).
Material and methods: Observational, analytic and retrospective study
of the patients of the Enuresis Consult at
the CHPV/VC, with the first appointment
between July 2003 and December 2007.
The data was collected from clinical files
and coded with Microsoft Excel 2007©.
Results: The study included 137
children (67% of males), aged 5 to 17
years. In 87,6%, the NE was primary, in
57,7% it was MNE; in 76,5% there was
enuresis every night and in 72% there
was polyuria. All the children performed
a urine analysis.
Of the 77 cases of MNE, in 3 children positive enforcement was instituted
with cure in 2; 74 children were treated
with desmopressin, curing 42%. In 17
patients the alarm was associated to
desmopressin, curing 88,2%.
In the 53 cases of non-monosymptomatic NE (NMNE) it was instituted treatment with oxibutinin, with a cure rate of
11%. In 47 children desmopressin was
added, with a cure rate of 43%. In 7 the
desmopressin was associated to the
alarm, with a cure rate of 43%.
Discussion and conclusion: The
association of desmopressin with alarm
was efficacious in the treatment of MNE.
In cases of NMNE the therapy with oxybutynin alone was ineffective, often resolving with the combination of two drugs
and/or alarm.
Key words: Enuresis, children,
treatment
Nascer e Crescer 2010; 19(3): 144-148
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desmopressin for nocturnal enuresis.
Acta Paediatr 1995; 84: 1014-8
CORRESPONDÊNCIA
João Ricardo Alves Monteiro
Rua Frei João de Vila do Conde, 12, 2º
4480-817 Vila do Conde
Tlm: (00351) 912 811 613
E-mail: [email protected]
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
Um Caso Raro de Retenção Urinária Aguda
Marta Santalha1, Miguel Fonte2, Filipa Correia1, Cristina Ferreira1
RESUMO
A retenção urinária é pouco frequente na infância, podendo ser congénita
ou secundária a processos traumáticos,
inflamatórios, cirúrgicos, neurológicos,
mecânicos, medicamentosos ou psicogénicos.
Apresenta-se o caso clínico de uma
adolescente de treze anos, com quadro
de algia hipogástrica, retenção urinária e obstipação. Ao exame objectivo
constatou-se uma massa arredondada
hipogástrica. A radiografia simples do abdómen evidenciou imagem radiopaca no
terço inferior do abdómen e a ecografia
abdomino-pélvica mostrou conteúdo impuro sugerindo hematocolpos e hematometra. Realizada himeniotomia cirúrgica
com evolução favorável.
A inspecção atenta dos genitais externos é fundamental, logo após o nascimento, para o diagnóstico de hímen
imperfurado. Quando não detectado e tratado no período neonatal, na sua maioria
o diagnóstico é realizado tardiamente em
idade pubertária perante o aparecimento
de complicações.
Palavras-chave:
Hematocolpos,
hematometra, retenção urinária
Nascer e Crescer 2010; 19(3): 149-151
INTRODUÇÃO
O hímen é uma membrana de tecido
conjuntivo coberta por epitélio, interposta
entre o tracto uterovaginal proximal e o
intróito vaginal(2).
No feto, pelas nove semanas de
gestação, o ducto mulleriano alonga-se e
atinge o seio urogenital formando o canal
__________
1
2
CH Alto Ave – Unidade de Guimarães
CH Trás-os-Montes e Alto Douro
útero-vaginal. O seio urogenital dá origem
aos 2/3 inferiores da vagina. Por volta do
quinto mês a canalização da vagina está
completa. A ausência desta canalização
origina o hímen imperfurado(4).
O hímen imperfurado é habitualmente uma anomalia congénita, que
ocorre geralmente de forma esporádica,
estando também descritos casos familiares(1).
Tem uma incidência estimada de
0,1% em recém-nascidos do sexo feminino(1,2).
Geralmente é um achado isolado
mas pode estar associado a síndromes
como a de Mckusick- Kaufman ou a de
Bardet-Biedl, estando também descrita
a sua associação com outras anomalias
tais como polidactilia, anomalias ano-rectais congénitas e rins displásicos
multiquísticos1.
A apresentação clínica é variável
de acordo com a idade. Estão descritos
casos de diagnóstico pré-natal ecográfico de obstrução vesical por hidrocolpos
ou mucocolpos(1,4), devido a estimulação
estrogénica materna.
Quando não detectado no período
neonatal geralmente só é diagnosticado
no período pubertário por amenorreia primária, dor abdominal, por vezes cíclica,
pélvica ou lombar, disúria, polaquiúria,
retenção urinária e obstipação(2).
CASO CLÍNICO
Adolescente do sexo feminino, treze
anos, raça caucasiana, trazida ao serviço de urgência (SU) por dor hipogástrica
com agravamento progressivo, acompanhada de retenção urinária e obstipação,
com quatro dias de evolução.
No primeiro dia de doença foi observada no SU e efectuou esvaziamento
vesical por algaliação com saída de 1500
ml de urina, sendo o sedimento urinário
normal. Realizou também estudo analítico
com hemograma e proteína C reactiva que
não revelaram alterações significativas.
No dia seguinte recorreu ao médico assistente, que a medicou com co-trimoxazol (35 mg/kg/dia) por suspeita
de infecção do tracto urinário.
Após quatro dias, por agravamento
das queixas álgicas com novo episódio
de retenção urinária e obstipação, recorreu novamente ao SU. Negava febre, dor
abdominal recorrente ou sintomas constitucionais (astenia, anorexia, emagrecimento). Sem antecedentes cirúrgicos ou
hábitos medicamentosos, nomeadamente anti-colinérgicos e anti-histamínicos.
Negava início de actividade sexual.
Destaca-se nos antecedentes pessoais, prematuridade de 32 semanas,
muito baixo peso ao nascimento (1011g),
restrição do crescimento intra-uterino,
com posterior atraso do desenvolvimento psico-motor e fácies compatível com
síndrome alcoólico fetal. Fruto de uma
gravidez não vigiada, com consumo etílico e tratamento tuberculostático durante
a gestação. A adolescente coabitava com
uma tia materna desde os três anos de
idade, após ter sido retirada do seu agregado familiar disfuncional e de precárias
condições económicas. Como antecedentes ginecológicos salientava-se ausência de menarca, com estádio IV/V de
Tanner M:IV, P:V.
Ao exame físico, apresentava-se
com abdómen globoso, evidente distensão hipogástrica e palpação dolorosa de
massa arredondada na região hipogástrica. Sem posição anti-álgica. Não foi
realizado exame ginecológico ou toque
rectal.
Efectuou radiografia do abdómen
simples sentada, que evidenciou mar-
casos clínicos
case reports
149
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
cada aerocolia na metade superior do
abdómen e imagem radiopaca no seu
terço inferior. A ecografia abdomino-pélvica mostrava distensão marcada da
cavidade vaginal e uterina, por conteúdo
impuro, sugerindo hematocolpos e hema-
tometra; a cavidade vaginal apresentava
dimensões aumentadas medindo cerca
de 15 cm de diâmetro longitudinal e 5 cm
de diâmetro antero-posterior, associada a
dilatação da cavidade uterina com diâmetro antero-posterior de 2,2 cm.
Figura 1 – Ecografia Abdomino-pélvica mostrando dilatação da
cavidade vaginal e uterina (seta)
Figura 2 – Hímen imperfurado na inspecção
Figura 3 – Himeniotomia cirúrgica
150
casos clínicos
case reports
Sem evidência de lesões ocupando
espaço nas áreas anexiais e sem uretero-hidronefrose. (Figura 1)
A posterior observação dos genitais
externos, evidenciou a presença de uma
membrana azul-escura abaulada, confirmando o diagnóstico de hímen imperfurado. (Figura 2)
Foi realizada himeniotomia cirúrgica
com drenagem de moderada quantidade
de líquido hemático. (Figura 3) No primeiro dia de pós-operatório encontrava-se assintomática com abdómen mole
e depressível, sem massas palpáveis,
tendo alta ao quarto dia de internamento,
orientada para consulta de Ginecologia e
Pediatria.
DISCUSSÃO
O hímen imperfurado é uma das
causas de retenção urinária por compressão da uretra pela colecção hemática vaginal ou por irritação do plexo sagrado.
Associadamente o efeito mecânico exercido na parede posterior da bexiga altera
o ângulo da uretra com consequente obstrução do tracto urinário(1,5,6).
Outras causas de retenção urinária
são congénitas (anatómica) ou secundárias
a causas traumáticas, inflamatórias, cirúrgicas, medicamentosas (anti-histamínicos
e anti-colinérgicos), neurológicas (Bexiga
Neurogénica, Mielite Transversa Aguda,
S. Guillian Barré), obstrutivas extrínsecas,
intrínsecas da uretra (neoplasia, cálculos)(6)
ou psicogénicas.
No caso apresentado, apesar de
não haver antecedentes de dor abdominal prévia, provavelmente a obstrução ao
fluxo menstrual já teria meses de evolução, resultando no preenchimento vaginal e uterino com conteúdo hemático,
consequente dilatação destas estruturas
e compressão da uretra com obstrução
ao fluxo urinário. A pressão rectal exercida pela dilatação da cavidade vaginal
terá causado as queixas de obstipação
da adolescente.
Outras complicações do hematocolpos são a infecção do tracto urinário
por estase urinária(3), hematometra com
fluxo menstrual retrógrado das trompas
de Falópio para a cavidade peritoneal3
com consequente endometriose e risco
de infertilidade.
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
O tratamento é cirúrgico, consistindo na incisão do hímen com drenagem
do conteúdo hemático da vagina, útero
e trompas de Falópio(1) com prognóstico
habitualmente favorável.
Como complicações cirúrgicas destacam-se as agudas: infecção, hemorragia, e estenose do orifício vaginal; e as
tardias como doença inflamatória pélvica
e infertilidade(4).
CONCLUSÃO
A inspecção cuidada dos genitais
externos é fundamental desde o nascimento, para o diagnóstico de hímen imperfurado.
Salienta-se a importância de uma
correcta anamnese e exame físico completo e atento (não esquecendo a avaliação do desenvolvimento pubertário)
perante sintomas pouco frequentes em
adolescentes com amenorreia e desenvolvimento de caracteres sexuais secundários, de modo a que, o correcto
diagnóstico e atempado tratamento seja
instituído, prevenindo assim complicações que podem resultar em graves sequelas.
A RARE CASE OF ACUTE URINARY
RETENTION
ABSTRACT
Introduction: Acute urinary retention is uncommon in childhood, and it can
be congenital or secondary to traumatic,
inflammatory, surgical, neurological or
mechanical processes, drug-induced or
psychogenic.
Case report: We report a clinical case of a thirteen year old girl with
hypogastric pain, urinary retention and
constipation. On physical examination
a rounded hipogastric mass was palpable. An abdominal X-ray revealed a radiopaque image in the lower third of the
abdomen and the abdominal-pelvic ultrasonography revealed an impure content
suggesting hematocolpos and hematometra. A surgical incision of the hymen was
performed, with favorable outcome.
Conclusion: A careful inspection
of the external genitalia immediately after birth is essential for the diagnosis of
imperforated hymen. When not detected
and treated in the neonatal period, most
of them have a delayed diagnosis during
puberty when complications may occur.
Keywords: Hematocolpos, hematometra, urinary retention
Nascer e Crescer 2010; 19(3): 149-151
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Stanton BF, Jenson HB, Behrman
RE, editors. Nelson Textbook of Pediatrics. 18th ed. Philadelphia: Saunders Company, 2007; 2287-9
CORRESPONDÊNCIA
Marta Filipa Ferreira Santalha
Serviço de Pediatria do Centro
Hospitalar do Alto Ave, Guimarães
Rua dos Cutileiros, Creixomil
4835-044 Guimarães
[email protected]
casos clínicos
case reports
151
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
Dor abdominal e retenção urinária
aguda em adolescente
apresentação clínica de hematocolpos e revisão da literatura
Helena Sousa1, Helena Fonseca2, Lurdes Sampaio3
RESUMO
Introdução: O hematocolpos é uma
patologia rara resultante da acumulação
vaginal de sangue menstrual nas jovens
com hímen imperfurado.
Caso clínico: Adolescente de 13
anos e 11 meses, sexo feminino, previamente saudável, que recorreu ao serviço
de urgência por dor abdominal e lombar,
tenesmo e retenção urinária aguda. Ausência de menarca. Ao exame objectivo:
estadio pubertário IV de Tanner, distensão abdominal e massa pélvica. O exame
ginecológico revelou membrana himeneal azulada e proeminente. A ecografia
pélvica evidenciou globo vesical muito
exuberante, acumulação de fluido ecogénico na vagina e hímen imperfurado.
A himenectomia de urgência, efectuada
poucas horas depois, decorreu sem intercorrências. Clinicamente bem na reavaliação um mês pós-operatório.
Conclusão: Numa adolescente com
amenorreia primária e dor abdominal ou
retenção urinária aguda, o hematocolpos
é um diagnóstico a colocar. A avaliação
do estadio pubertário e história menstrual
deve ser incluída nas consultas de rotina.
Palavras-passe: hematocolpos, hímen imperfurado, amenorreia primária.
Nascer e Crescer 2010; 19(3): 152-154
INTRODUÇÃO
Durante o desenvolvimento embrionário do sistema genital feminino o lúmen
vaginal está separado do seio urogenital
pela membrana himeneal. Na fase final
__________
1
2
3
Hospital Geral de Santo António – CHPorto
Hospital de Santa Maria – CH Lisboa Norte
Unidade de Endocrinologia Pediátrica, Hospital de Santa Maria – CHLisboa Norte
152
casos clínicos
case reports
da embriogénese, por degeneração das
células epiteliais centrais, esta membrana rompe-se. No entanto, tal não acontece em cerca de 1/2000 meninas que
nascem com hímem imperfurado, uma
das principais causas de obstrução do
trato genital feminino(1,2,4).
O hematocolpos é uma colecção
de sangue menstrual na vagina, habitualmente secundário a um hímen imperfurado, que se manifesta na adolescência com amenorreia primária, dor e
massa abdominal, disúria ou retenção
urinária aguda(1,2,3). O exame ginecológico pode ser muito sugestivo revelando
uma membrana himeneal proeminente
e de tom azulado pelo sangue retido. O
atraso do diagnóstico está associado a
um prolongamento do sofrimento destas
jovens com risco de complicações que
podem comprometer a fertilidade na idade adulta(3,7,8).
Com a apresentação deste caso
clínico pretende-se alertar para esta entidade perante uma adolescente com
amenorreia primária e dor abdominal ou
retenção urinária.
CASO CLÍNICO
Adolescente do sexo feminino, 13
anos e 11 meses, estudante, raça caucasiana. Recorre ao Serviço de Urgência
Pediátrico do Hospital de Santa Maria
(Lisboa) por dor abdominal tipo cólica,
irregularidades do trânsito intestinal (períodos de obstipação a alternar com diarreia) e dor ao defecar com cerca de 15
dias de evolução. Nos últimos cinco dias
associada também dor lombar bilateral
sem irradiação e tenesmo. Referia retenção urinária nas últimas duas horas. Desde o início do quadro apresentava recusa
alimentar parcial, negando febre, emagrecimento, naúseas, vómitos ou disúria.
Na história pregressa a referir obstipação na infância; ausência de menarca
ou início de actividade sexual.
Veio acompanhada pela mãe, com
aparente boa relação entre ambas. Na
admissão apresentava-se queixosa, ansiosa e com sensação de desconforto.
Bom estado geral, palidez cutânea mas
mucosas coradas. Frequência cardíaca
81 bpm; pressão arterial 119/66 mmHg;
temperatura axilar 37.1ºC. Auscultação
cardiopulmonar sem alterações. Abdómen ligeiramente distendido e globoso,
globalmente doloroso à palpação com
maior intensidade nos quadrantes inferiores, massa palpável no hipogastro de
limites mal definidos com cerca de 4 cm
de altura, sem sinais de irritação peritoneal. Região lombar sem alterações visíveis, Murphy renal negativo bilateralmente. Estadio pubertário de Tanner G4/M4.
Restante exame objectivo sem outras
alterações.
Pela possibilidade de estar perante
um quadro de obstipação associado a alguma ansiedade da paciente foi administrado inicialmente citrato de sódio por via
rectal, que não exerceu efeito.
Agravamento clínico progressivo
com choro inconsolável, agitação, aumento da intensidade da dor abdominal assim como da urgência miccional.
Verificou-se aumento da distensão abdominal com massa hipogástrica arredondada de maiores dimensões (limite superior
cerca de 6 cm acima da sínfise púbica) e
ao exame ginecológico observou-se uma
membrana himeneal proeminente de cor
azulada. Perante a suspeita de hematocolpos foi pedida a colaboração por ginecologia. Realizou ecografia pélvica que
confirmou o diagnóstico revelando globo
vesical muito exuberante, sem hidronefrose, acumulação de fluido ecogénico na
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
vagina (15 x 8 cm), útero globoso, hímen
imperfurado. Realizado cateterismo vesical com saída de cerca de 1500 mL de
urina com melhoria da sintomatologia.
Algumas horas depois, no bloco
operatório e sob anestesia geral, foi realizada a himenectomia que decorreu sem
intercorrências. Reavaliação no 1º mês
de pós-operatório sem complicações.
DISCUSSÃO
O hímen imperfurado é uma anomalia obstrutiva rara do sistema reprodutor feminino que ocorre em cerca de
0,1% das recém-nascidas(1,2,4,7). Apesar
da maioria dos casos serem esporádicos
estão descritas algumas situações familiares, com provável transmissão autossómica dominante ou recessiva(1,4). Um
hímen imperfurado é quase sempre um
achado isolado mas pode estar associado a outras anomalias, nomeadamente
polidactilia, malformações genitourinárias
ou anorectais(4).
As manifestações clínicas do hímen
imperfurado variam de acordo com a idade ao diagnóstico. Há casos descritos de
diagnóstico por ecografia pré-natal com
obstrução vesical por hidro ou mucocolpos. Na recém-nascida pode-se observar
um intróitus proeminente por acumulação
de muco secretado sob estimulação dos
estrogéneos maternos; se o diagnóstico
não for realizado, o muco será reabsorvido e a criança manter-se-á assintomática; raras vezes o mucocolpos pode estar
associado a infecções urinárias ou obstrução vesical com hidroureter e hidronefrose. É na adolescência, habitualmente
entre os 12 e os 15 anos, a coincidir com
a idade da menarca, que os sintomas
surgem e o diagnóstico é realizado(1,4,8).
O hímen imperfurado, por ser habitualmente assintomático durante a infância, escapa ao pediatra, apresentando-se
mais tarde, na adolescência, ao ginecologista(1,4,7). Um estudo revela bem essa
discrepância na apresentação clínica,
com 90% das meninas com menos de 4
anos a serem diagnosticadas incidentalmente versus 100% das com mais de 10
anos a apresentarem sintomas na altura
do diagnóstico(6).
A acumulação de sangue menstrual na vagina e útero pode-se manifestar
com dor abdominal cíclica, disúria, retenção urinária aguda, dor lombar, obstipação, dor ou desconforto na defecação.
O efeito de massa do hematocolpos na
uretra e bexiga condiciona os sintomas
obstrutivos urinários, sendo a obstipação
explicada pelos mesmos mecanismos
compressivos. A irritação do plexo sacral
ou das raízes nervosas pode explicar a
dor lombar referida(1,3,7).
O hematocolpos é um diagnóstico que exige alto grau de suspeição.
Um estudo demonstra que em 50% dos
casos outros diagnósticos tinham sido
previamente estabelecidos, incluindo infecção urinária, nefrolitíase, apendicite,
obstipação e tumor abdominal, com toda
uma panóplia de exames auxiliares de
diagnóstico a acompanhá-los. Em média,
o tempo de evolução dos sintomas até ao
diagnóstico é de 15 dias(6).
A menarca ocorre habitualmente entre os 12 e os 13 anos, nos estadios III ou
IV de Tanner. Numa observação geral a
discrepância entre um estadio pubertário
avançado e a ausência de menarca deve
constituir de imediato um importante sinal
de alerta(1,2,3,4,7,8). No exame ginecológico
de uma adolescente com hematocolpos,
a simples retracção dos lábios revela
uma membrana himeneal protuberante
e azulada. A realização da manobra de
Valsalva é sugestiva de um hímen imperfurado caso se verifique um aumento da
convexidade da membrana e permite o
diagnóstico diferencial dum septo vaginal
transverso. O exame com espéculo não
tem indicação(3).
A ecografia é um exame simples,
barato, indolor e inócuo que permite de
imediato a confirmação do diagnóstico,
assim como a detecção de complicações
(endometriose, hematosalpinge) e a exclusão de malformações urogenitais (duplicações/agenesias genitais, hipoplasia/
aplasia renal) raramente associadas(1,3,5).
Foi descrita uma maior sensibilidade da
ecografia transrectal em relação à abdominal(3).
Os diagnósticos diferenciais de hímen imperfurado incluem o septo vaginal
transverso ou longitudinal, a agenesia
vaginal e a atrésia cervical. Nestas situações mais complexas, em que a ecografia
é insuficiente para uma boa caracteriza-
ção anatómica, a ressonância magnética
será o exame mais indicado(3,5,7).
O tratamento é simples e consiste
na himenectomia cirúrgica sob anestesia,
com incisão em cruz do hímen que liberta o tecido obstrutivo preservando o anel
himeneal intacto(3,5).
Ainda que o prognóstico seja bom,
as complicações associadas ao atraso
no tratamento - endometriose ou hematosalpinge – podem condicionar riscos
de infertilidade e gravidez ectópica no
futuro(3,4,8).
Os casos assintomáticos diagnosticados durante a infância podem ter algum
benefício com o adiamento da intervenção até ao início da puberdade, depois
dos tecidos já estarem sob estimulação
estrogénica. Os restantes casos, que
constituem a maioria, têm indicação para
cirurgia urgente(5).
CONCLUSÃO
O diagnóstico de um hematocolpos
reflecte bem a necessidade da complementaridade de uma boa anamnese com
um exame objectivo atento para que o
diagnóstico seja correcto e célere, obviando o sofrimento das adolescentes e
gastos desnecessários em exames auxiliares.
A realização do exame ginecológico
nas consultas de rotina seria uma forma
possível de antecipar este diagnóstico e
prevenir as suas complicações mas, a
falta de privacidade na generalidade dos
locais de atendimento público, o treino
insuficiente dos pediatras nesta área e
a persistência de alguns preconceitos
ou inibição por parte dos profissionais
de saúde, constituem importantes barreiras.
Numa adolescente com amenorreia
primária que se apresente com dor abdominal ou lombar ou retenção urinária aguda há sempre que incluir o hematocolpos
nos diagnósticos diferenciais. Esta patologia, ainda que rara, é a anomalia obstrutiva mais comum no aparelho reprodutor feminino. Nunca é demais realçar
a importância da avaliação do estadio
pubertário e da história menstrual na observação inicial das adolescentes.
casos clínicos
case reports
153
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
ADOLESCENT WITH ABDOMINAL
PAIN AND ACUTE URINARY
RETENTION: CLINICAL
PRESENTATION OF HEMATOCOLPOS
AND REVIEW OF THE LITERATURE
ABSTRACT
Introduction: Hematocolpos in adolescents with imperforate hymen resulting
from vaginal blood accumulation is a quite
rare pathology.
Case report: A previously healthy
almost 14-year-old girl, was admitted to
the emergency department with lower abdominal pain and acute urinary retention.
No previous menstruation. Objective examination with pubertal Tanner stage IV,
abdominal distension and pelvic mass.
Gynecological examination revealed a
blue imperforate hymen bulging from the
vagina introitus outwards. Ultrasonography showed exuberant vesical globe
and echogenic fluid accumulation in the
vagina. Cruciate hymenotomy was uneventful. Asymptomatic in the follow-up,
one month later.
Conclusion: The diagnosis of imperforate hymen and hematocolpos is
154
casos clínicos
case reports
probable in an adolescent girl with primary amenorrhea, abdominal pain or acute
urinary retention. Evaluation of the pubertal stage and menses should be included
in routine practice.
Keywords: hematocolpos, imperforate hymen, primary amenorrhea.
Nascer e Crescer 2010; 19(3): 152-154
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anos. Acta Pediatr Port 2000; 31:
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CORRESPONDÊNCIA
Helena Sousa
Rua Brito e Cunha, 487, 2º Esq. Ft.
4550-088 Matosinhos.
[email protected]
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
Paralisia Facial Periférica
Diagnóstico, Tratamento e Orientação
Tiago Correia1, M. João Sampaio2, Rui Almeida3, Cristina Garrido3
RESUMO
A paralisia facial periférica (PFP) é
frequente em idade pediátrica. Inerente à sua designação existe um conceito
anatómico que pressupõe a localização
da lesão distalmente aos núcleos do sétimo nervo craniano. Contudo, define-se
melhor pela clínica, consistindo na parésia dos músculos da mímica facial da
hemiface ipsilateral à lesão, associada
ou não a hiperacúsia, xeroftalmia e perda do paladar nos dois terços anteriores
da língua. As principais causas médicas
são a PFP idiopática ou de Bell (65%) e
o Herpes Zoster Ótico (12%). Em áreas
endémicas, também a doença de Lyme
pode ter um papel relevante.
Sendo um tema de consensos difíceis, os autores apresentam uma revisão
da literatura e propõem um protocolo de
actuação na perspectiva do diagnóstico,
tratamento e orientação.
Palavras-chave: Paralisia Facial
Periférica, Paralisia de Bell, Herpes Zoster Ótico
Nascer e Crescer 2010; 19(3): 155-160
INTRODUÇÃO
O nervo facial, pelo seu percurso no
osso temporal através de um canal inextensível, é particularmente susceptível a
agressões de várias naturezas. Outro aspecto anatómico de relevo relaciona-se
com o tipo de fibras que o nervo veicula
tais como fibras eferentes motoras (músculos da mímica facial, músculo tensor
do estribo, entre outros), fibras eferentes
parassimpáticas (glândulas salivares e
__________
1
2
3
Interno Complementar de Pediatria, CHPorto
Interno Complementar de Pediatria,
CH Tâmega e Sousa
Assistente Hospitalar, CH Tâmega e Sousa
lacrimal), fibras aferentes sensitivas (canal auditivo externo e pavilhão auricular)
e fibras aferentes gustativas (2/3 anteriores da língua).(1)
A entidade clínica – Paralisia Facial
Periférica (PFP) – é frequente, incluindo
na faixa etária pediátrica.(2) Múltiplas patologias, com abordagens e terapêuticas
muito diferentes, têm como expressão
final a PFP. O diagnóstico mais frequente é o de paralisia facial de Bell (PFB),
correspondendo a cerca de dois terços
dos casos. Embora tradicionalmente usado como sinónimo de PFP idiopática, a
identificação de DNA do vírus Herpes na
saliva desses doentes, tem sustentado a
hipótese da intervenção patofisiológica
deste agente. Por outro lado, este é um
diagnóstico de exclusão que exige um
meticuloso exercício de diagnóstico diferencial (Quadro1).(3)
O primeiro grupo etiológico a considerar é o das causas infecciosas. Dentro
destas, o Herpes Zóster Ótico (HZO) é o
mais prevalente (12%). Resulta da reactivação do vírus Varicella zoster no gânglio
geniculado, causando paralisia facial e
exantema vesicular no território sensitivo
– pavilhão auricilar. Por contiguidade, por
migração axonal ou pelos vasa-vasorum,
lesa também o nervo vestibulococlear(2,4).
A apresentação de quadros incompletos,
em que não surgem as características
vesículas no território do nervo intermédio (Zoster Sine Herpete - ZSH), faz prever que a sua prevalência esteja subestimada, podendo corresponder a cerca
de 8% dos doentes com o diagnóstico
de PFB(5). Em áreas endémicas, a doença de Lyme, zoonose causada pela
Borrelia burgdorferi, é uma patologia a
considerar, podendo ser causa de cerca
de 25% das PFP. Resulta do processo
inflamatório desencadeado em resposta à adesão desta espiroqueta ao nervo
facial(2,6,7,8). Um outro grupo importante
é o das doenças neoplásicas, estando
descrita a infiltração leucémica do nervo
facial, em leucemias agudas já conhecidas ou como sintoma de apresentação(9).
Particularmente em casos de instalação
progressiva do quadro clínico, devem ser
consideradas as neoplasias da parótida
e do próprio nervo, sobretudo schwano-
QUADRO 1 – Etiologia de PFP
Idiopática
Infecciosa
Inflamatória
Imune pós-infecciosa
Traumática
Iatrogénica
Neoplásica
Outras
Paralisia Facial de Bell
Vírus do Grupo Herpes
Rubéola; Parotidite; Sarampo
Doença de Lyme – Borrelia burgdorferi
Mycoplasma pneumoniae
Otopatias agudas e crónicas
Meningite e encefalite
Vacinas
Síndroma de Guillain-Barré
Fracturas do osso temporal
Cirurgia no território do nervo facial
Parótida; leucemias; Schwanomas
Hipertensão arterial severa
Adaptado de referência 3
artigo de revisão
review articles
155
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
mas(2,3). A hipertensão arterial (HTA) grave também se pode manifestar por PFP,
secundária a complicações hemorrágicas no canal do facial. Louis S. descreveu uma incidência de PFP em até 20%
dos doentes internados com hipertensão
grave(5). O síndrome de Guillain-Barré é
uma polineuropatia desmielinizante inflamatória aguda de carácter auto-imune,
tipicamente caracterizada por tetraparésia arrefléxica de início subagudo. Estão
muitas vezes associadas as neuropatias
dos pares cranianos estão e, dentro destas, a PFP, geralmente bilateral, é a mais
comum(10). As fracturas transversais do
temporal resultantes de traumatismos
cranianos complicam-se frequentemente
de PFP. Outra causa de fácil diagnóstico
é a lesão iatrogénica no decorrer de intervenções cirúrgicas que envolvam o território deste nervo, nomeadamente pelas
especialidades de Otorrinolaringologia ou
de Cirurgia Plástica.(3)
Os autores apresentam uma proposta de protocolo de actuação no âmbito do
diagnóstico, tratamento e orientação dos
doentes com PFP, focalizando-se nos casos de PFB e HZO, as principais causas
médicas.
DEFINIÇÃO
A Paralisia facial periférica é um
síndrome de diagnóstico essencialmente
clínico resultante de lesão do nervo facial localizada para além dos núcleos do
nervo facial na ponte. Caracteriza-se por
parésia dos músculos da mímica facial da
hemiface ipsilateral, associados ou não a
hiperacúsia, xeroftalmia e perda do paladar nos 2/3 anteriores da língua. Por contraposição, a paralisia facial de origem
supra-nuclear é contralateral à lesão e
poupa os músculos frontal e orbicular das
pálpebras que recebem inervação cortical bilateral. O mesmo se passa com as
respostas faciais emocionais.(1,2,3,5,11,12)
,
DIAGNÓSTICO
O diagnóstico etiológico de PFP
centra-se na dicotomia PFB versus os
seus diagnósticos diferenciais. Depende
da colheita cuidada da história clínica e
de um exame objectivo exaustivo, com
alguns pontos fulcrais descriminados em
seguida.
156
artigo de revisão
review articles
Anamnese
A forma de instalação dos sintomas
é o primeiro aspecto de diferenciação entre PFB e os seus diagnósticos diferenciais. Caracteristicamente, a primeira, tem
um início súbito, com paralisia máxima ao
terceiro dia de doença. O mesmo não se
verifica na maioria das outras apresentações, nomeadamente nas causas neoplásicas, cuja instalação é, geralmente,
progressiva.(2) A duração dos sintomas
tem implicações terapêuticas, porque
existem janelas temporais restritas para
o tratamento farmacológico.(1,2,3,11,12,13) Os
sintomas acompanhantes devem ser explorados, pois podem sugerir uma patologia específica (Quadro 2). Na PFB, para
além dos sintomas resultantes da interrupção das diferentes fibras veiculadas pelo
sétimo par (motoras, parassimpáticas,
aferentes sensitivas e gustativas), não
são comuns outros sintomas. A referência
a dor ou disestesia periauricular, erupção
vesicular no mesmo território, hipoacúsia,
QUADRO 2 – Algoritmo – Diagnósticos diferenciais e orientação
Paralisia Facial Periférica
Sinais de alarme?
Não
Sim
Início súbito
Paralisia máxima ao 3º dia
Sem outras queixas
Restante exame normal
Infecção vírica há 3-4semanas
65%
PFP de Bell (idiopática)
Dor/disestesia peri-auricular
Vesículas peri-auriculares
Hipoacúsia, acufenos
Vertigem, nistagmo, vómitos
Hepes Zoster Ótico
Otalgia, Febre, OMA
Otomastoidite
Otopatia crónica
Colesteatoma
ORL
Instalação progressiva
Massa parotídea
ORL
12%
Pós-traumático (>2 semanas)
Pós cirúrgico
Neuroimagem / ORL
Instalação progressiva
Anomalias exame neurológico
Neuroimagem
Neurocirurgia
Hipertensão arterial
Investigar e tratar
Púrpura, equimoses, palidez
Adenomegalias
Hepatosplenomegalia
Dor óssea…
Rastreio
Hemato-oncológico
Área rural/florestal
Picada de carraça
PFP bilateral
Eritema migrans, mal-estar,
mialgias, cefaleias, febre
Rastreio
doença de Lyme
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acufenos e vertigens é muito sugestiva e
virtualmente diagnóstica de HZO.(4,14,15,16,17)
Característico é também o quadro clínico
sugestivo de Doença de Lyme. Em crianças que residam ou visitem áreas florestais
do norte do país ou a região do Alentejo,
que refiram a picada por uma carraça (geralmente por um período superior a 48h)
e que apresentem outros sintomas sugestivos como o eritema migrans, mal-estar,
cefaleias, mialgias e febre, esta deve ser
a primeira hipótese de diagnóstico.(7,8,18,19)
Ao inquirir sobre antecedentes pessoais
são relevantes informações relativas a
traumatismos ou intervenções cirúrgicas
no território do facial, otopatia crónica,
HTA, doença neoplásica ou auto-imune,
que podem estar na origem da lesão do
nervo facial. A referência a diabetes mellitus é também relevante pelo facto de a
PFB ser mais comum nestes doentes e
por ter impacto negativo no prognóstico.
(20)
Por vezes o doente ou pais recordam a
existência de síndrome virusal nas semanas precedentes, o que é compatível com
o diagnóstico de PFB. Foram descritos
casos de PFP após vacinas anti-gripais intra-nasais e, apesar de não haver relatos
recentes, tendo em conta que esta vacina
muda anualmente, é necessário manter a
vigilância.(21,22)
Exame objectivo
No exame objectivo de uma criança
com PFP é relevante salientar:
A avaliação da tensão arterial, indicada por permitir o diagnóstico de HTA
que, quando grave, se pode complicar
de PFP.
A inspecção cuidada de toda a superfície cutânea, permitindo identificar
lesões como eritema-migrans, palidez,
púrpura, equimoses, entre outras anomalias.
O exame otorrinolaringológico, visando o rastreio de otopatias agudas
(otite média aguda (OMA), otomastoidite)
ou crónicas (otite média crónica colesteotomatosa, ou simples), bem como a inspecção da orofaringe, pavilhão auricular
e canal auditivo externo para identificação do característico exantema vesicular
do HZO.
A palpação da parótida, cadeias
ganglionares, fígado e baço.
O exame neurológico que, caracteristicamente, não identificará outras
anomalias no caso da PFB. Já no caso
do HZO é comum existirem alterações
vestibulares, com Romberg positivo com
desequilíbrio para o lado afectado e nistagmo com fase rápida de orientação
contralateral à lesão.(2,3,11,12,17)
Por fim, a paralisia facial deve ser
quantificada, sendo a escala de HouseBrackmann (Quadro 3) uma das mais
utilizadas.(23)
MEIOS AUXILIARES DE
DIAGNÓSTICO
O diagnóstico de PFB é essencialmente clínico(2,5) e não se recomenda
investigação complementar na ausência de sintomas ou sinais de “alarme”
(Quadro 4).3 Brown JK et al sugerem a
requisição por rotina de hemograma com
esfregaço de sangue periférico para excluir casos de apresentação de leucemia aguda.(3) Contudo, esta patologia é
uma causa extremamente rara de PFP,
QUADRO 3 – Escala de House-Brackmann
Grau 1
Função Normal
Função Normal
Grau 2
Disfunção Ligeira
Grau 3
Disfunção moderada
Grau 4
Disfunção moderada/severa
Grau 5
Disfunção severa
Grau 6
Paralisia total
Parésia ligeira só detectável com inspecção cuidada
Fecha olho completamente com mínimo esforço
Assimetria só no sorriso forçado
Sem complicações
Parésia evidente, mas não desfigurante
Fecha olho, mas com grande esforço
Boca com desvio evidente
Podem surgir espasmos, contracturas, sincinésias
Parésia evidente e desfigurante
Não fecha o olho. Sinal de Bell
Simetria em repouso
Espasmos, contracturas e sincinésias graves
Quase sem movimento do lado afectado
Assimetria em repouso
Geralmente sem espasmos, contracturas,
sincinésias
Sem qualquer tipo de movimento
Sem espasmos, contracturas, sincinésias
QUADRO 4 – Sinais e Sintomas de “alarme”
Instalação progressiva
Pós-traumático ou pós-cirúrgico
Febre
Hipertensão arterial
Otalgia, dor ou disestesia peri-auricular
Vesículas canal auditivo externo, pavilhão auricular, palato mole
Outras anomalias do exame neurológico
Otite média aguda e crónica, colesteatomas, mastoidite
Adenomegalias, hepatomegalia, esplenomegalia,
Púrpura, equimoses, exantemas
Tumefacção parotídea
Adaptado de referência 3
artigo de revisão
review articles
157
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ano 2010, vol XIX, n.º 3
pelo que não consideramos necessária
a realização por rotina desse exame. O
diagnóstico de HZO é também clínico.
(15,17)
Se persistirem dúvidas no diagnóstico, nomeadamente em casos de ZSH,
em que a associação a sintomas vestibulo-cocleares pode alertar o diagnóstico mas não existe a erupção vesicular,
poderá ser útil a avaliação dos títulos de
IgG para o vírus varicella zoster na fase
aguda e convalescença. É de salientar,
contudo, que a elevação de quatro vezes do título só é identificada em até
50% dos casos.(4) Outro método mais
sensível de confirmação do diagnóstico
é a pesquisa de DNA vírico por PCR no
exsudado vesicular4,15,16 (situação que,
pela evidência clínica, dispensa a confirmação laboratorial). Todos os doentes
com o diagnóstico de HZO deverão ser
observados por Otorrinolaringologista
para a realização de audiometria, que
visa identificar a presença de hipoacúsia
neurossensorial.(12,15)
A electromiografia e o estudo da
condução nervosa são técnicas que, embora nem sempre disponíveis, poderão
ter um papel importante na definição do
grau de lesão nervosa e assim prever o
prognóstico.
TRATAMENTO
Medidas gerais
Um dos aspectos fulcrais do tratamento é a implementação de medidas
gerais que visam prevenir uma das complicações mais frequentes – a úlcera de
córnea. É recomendada a lubrificação
ocular com lágrimas artificias aplicadas
cada 60 minutos durante o dia e a utilização de óculos de sol para protecção
contra corpos estranhos. No período da
noite, sugere-se a oclusão ocular com
pensos oftálmicos.(1,3,5,11,12)
Intervenção por Fisiatria
Embora exista controvérsia e ausência de prova científica clara do benefício
das técnicas de reabilitação conhecidas,
a sua intervenção passa pela estratificação do grau de lesão e estabelecimento
de um prognóstico funcional, prevenção
de complicações (aplicação de calor,
massagem, estimulação eléctrica…) e
tratamento das mesmas (técnicas de bio-
158
artigo de revisão
review articles
feedback, ultrassons, aplicação de toxina
botulínica, entre outras).(24,25,26,27,28)
Deste modo, o Fisiatra desempenha
um papel fulcral na orientação destes doentes, devendo a sua colaboração ser
requisitada precocemente.
Tratamento farmacológico
Nos últimos anos, vários autores,
evocando a identificação de DNA vírico
na saliva de doentes com o diagnóstico
de PFB, sobretudo do vírus herpes simplex, recomendaram a associação de
aciclovir ou valaciclovir ao tratamento tradicional.(1,2,11,12,29,30,31) Contudo, a maioria
dos estudos não demonstraram benefício
com esse tratamento.(3,13,33,34) Pode mesmo observar-se um ligeiro agravamento
do prognóstico.(13)
Actualmente, a opção terapêutica
na PFB mais sustentada cientificamente
é a corticoterapia isolada, recorrendose à prednisolona em doses de 1mg/kg/
dia, sendo um dos esquemas proposto
fazê-lo durante uma semana, seguida
de uma outra de suspensão gradual.
Esta deve ser iniciada tão cedo quanto possível e admite-se o seu benefício
quando instituída até ao quinto dia de
doença.(1,3,13)
O tratamento farmacológico de eleição no HZO é a associação de prednisolona com aciclovir. O seu benefício está
demonstrado e é tanto maior quanto mais
precoce for o seu início. Assim, recomenda-se o seu início até ao 3º dia de doença, na dose de 80mg/kg/dia (máximo
3,2 g/dia) em quatro doses diárias, por
via oral, durante cinco dias.(14,15,17,35) A via
parentérica não apresenta benefícios.(17)
EVOLUÇÃO
Existem dois marcos temporais importantes na evolução dos doentes com
PFP, qualquer que seja a sua etiologia. O
primeiro é o 20º dia de doença. Nessa altura, os casos de agressão nervosa mais
ligeiros, que configurem apenas quadros
de neuronite resultantes da compressão
nervosa, poderão já evidenciar recuperação funcional completa. Quando tal não
se verifica, podemos assumir que terá
existido um quadro de morte axonal que
necessitará de um período de tempo mais
prolongado para que ocorra crescimento
e reinervação, geralmente entre quatro a
seis meses.(11)
De uma forma geral, a PFP em
idade pediátrica tem um excelente prognóstico. Ocorre recuperação total sem
sequelas em cerca de 96% dos doentes
com PFB(3,36,37) e em até 75% dos doentes
com HZO.(15)
Tentar prever o prognóstico com
maior acuidade é um exercício clínico
importante perante pais que geralmente
demonstram um elevado grau de ansiedade (Quadro 5).(36,37,38) Os estudos neurofisiológicos podem dar uma perspectiva
mais objectiva sobre o carácter da lesão
e o seu prognóstico. Técnicas como o
Hilger test – minimal electrical stimulation – demonstram um pior prognóstico
em doentes com um diferencial de estímulo entre o lado são e o lado afectado
superior a 2,5 mA. Contudo, estes métodos implicam um elevado grau de colaboração, o que nem sempre é possível
com os doentes destas faixas etárias. Por
outro lado nem sempre estão facilmente
disponíveis.(38)
QUADRO 5 – Factores clínicos de mau prognóstico
Idade >10anos
Início progressivo
Parésia grave – grau IV, V, VI segundo escala de House-Brackmann
Vertigem e outros sintomas concomitantes
(lacrimejo, digeusia, xeroftalmia)
Casos secundários, nomeadamente a Herpes Zoster ótico
Diabetes mellitus
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ano 2010, vol XIX, n.º 3
O seguimento proposto para estes
doentes passa por uma primeira consulta
de reavaliação às três semanas de doença e, quando não há recuperação completa, dever-se-á manter uma vigilância
regular em consulta externa até esta se
verificar. Na avaliação em consulta é
importante a classificação seriada e objectivada da parésia facial, o rastreio de
complicações (Quadro 6) e a sua orientação(5,27). Quando existem sequelas
importantes, cujo potencial de recuperação é diminuto ou ausente (baseado
em critérios temporais – seis meses de
doença – e neurofisiológicos), os doentes
devem ser orientados para consultas de
Cirurgia Plástica e Oftalmologia. Algumas
técnicas cirúrgicas (transposição de músculos, anastomoses nervosas, ressecção
de pele, suspensão da fáscia, implantes
de pesos nas pálpebras superiores) podem ter resultados estéticos e funcionais
positivos.(39,40)
As sequelas resultantes da PFP
surgem pela regeneração incompleta das
fibras motoras originando parésia facial
permanente (4% na PFB e até 25% no
HZO) que se manifesta por incompetência oral (perda ou acumulação de alimentos e saliva do lado afectado), lagoftalmo
e epífora (queda da pálpebra inferior com
alteração da dinâmica de drenagem das
lágrimas), contracturas e aumento do
risco de úlcera de córnea (xeroftalmia
causada pela não oclusão palpebral). A
reenervação aberrante origina sincinésias (movimentos involuntários, quando
se tenta executar outra acção) ou a apre-
sentação menos frequente do síndrome
das lágrimas de crocodilo (reinervação
das glândulas lacrimais com fibras parassimpáticas destinadas às glândulas
salivares). Por último, a regeneração
incompleta das fibras sensitivas pode
manifestar-se por digeusia ou ageusia
(alteração ou perda do paladar nos dois
terços anteriores da língua) e disestesias
no território sensitivo do nervo facial.(41)
EM DESTAQUE
A identificação da causa de uma
paralisia facial periférica implica um
cuidadoso exercício de diagnóstico diferencial.
A corticoterapia é o tratamento
farmacológico de eleição para a paralisia facial de Bell, devendo ser associado o aciclovir no Herpes Zoster ótico
HIGHLIGHTS
PERIPHERAL FACIAL PALSY –
DIAGNOSIS, TREATMENT AND
FOLLOW UP
ABSTRACT
Facial palsy (FP) is a common disorder in children. It is caused by an aggression to the seventh cranial nerve
distally to its emergence from the pons.
The best way to define FP is by its clinical
manifestations: paralisis of the muscles
of the ipsilateral side of the face with or
without hyperacusis, decreased production of tears, and loss of taste at the anterior two-thirds of the tongue. The most
common medical causes are idiopathic
FP, also known as Bell’s palsy (65%) and
herpes zoster oticus (12%). In endemic
areas, Lyme disease is also an important
etiology.
As this is a controversial subject, the
authors present a review of the most recent literature and propose a protocol to
guide diagnosis, treatment and follow up.
Keywords: Facial nerve palsy, Bell
Palsy, Herpes Zoster oticus
QUADRO 6 – Complicações
Úlcera de córnea
Contractura
Parésia / Paralisia permanente / Incompetência oral
Disgeusia
Disestesia
Lacrimejo, epífora
Síndrome das lágrimas de crocodilo
(reinervação anómala das glândulas lacrimais com fibras parasimpáticas do núcleo salivatório)
Sincinésias
(movimento involuntário de um grupo de músculos quando se executa outro movimento)
Fenómeno de Marcus Gunn invertido
(inibição do elevador da pálpebra com ptose quando se abre a boca)
The identification of the cause of a
peripheral facial paralysis entails a careful exercise of differential diagnosis.
The corticosteroid treatment is
first line therapy for Bell’s palsy. Acyclovir must be associated in Herpes
Zoster oticus.
Nascer e Crescer 2010; 19(3): 155-160
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CORRESPONDÊNCIA
Tiago Correia
Serviço de Pediatria
Hospital Geral de Santo António, EPE
Largo do Professor Abel Salazar
4099-001 Porto
Tel: 222 077 500
[email protected]
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
Hidropisia Fetal e Colestase Neonatal
Caso Clínico
Ariana Afonso1, Ana Margarida Alexandrino1, Ermelinda Santos Silva2, Alexandra Almeida1, Gilberta Neves Santos1
RESUMO
As possíveis etiologias associadas
a hidropisia fetal não imune e colestase
neonatal são numerosas. A investigação
destas situações, mesmo quando exaustiva, nem sempre permite estabelecer um
diagnóstico etiológico.
A abordagem clínica deverá assentar na exploração minuciosa dos dados
da anamnese e do exame objectivo. A
realização de exames complementares
deve ser orientada pela clínica, tendo
por objectivo identificar rapidamente os
casos graves e as patologias potencialmente tratáveis.
Os autores descrevem a abordagem diagnóstica e terapêutica de um
recém-nascido admitido numa Unidade
de Cuidados Intensivos Neonatais ao
nascimento por hidropisia fetal e prematuridade, que desenvolveu um quadro de
colestase a partir do 2º dia de vida.
Palavras-chave: Hidropisia fetal,
colestase neonatal, icterícia
Nascer e Crescer 2010; 19(3): 161-165
INTRODUÇÃO
A hidropisia fetal (HF) resulta de um
excesso de acumulação de líquido no
feto, condicionando elevada morbilidade
e mortalidade neonatal1. O seu diagnóstico baseia-se na avaliação ecográfica prénatal, na qual deverão estar presentes
duas ou mais das seguintes alterações:
edema cutâneo, derrame pleural, derrame pericárdico, ascite ou polihidrâmnios1.
De acordo com a sua etiologia, subdivi-
__________
1
2
Serviço de Neonatologia - Maternidade Júlio
Dinis, CHPorto
Serviço de Pediatria - Hospital de Crianças
Maria Pia, CHPorto
de-se em dois grandes grupos: hidropisia fetal imune (HFI) e hidropisia fetal
não imune (HFNI)2. As situações imunomediadas resultam de anemia fetal grave
condicionada pela destruição dos eritrócitos fetais por anticorpos maternos de tipo
IgG. As causas de HFNI são múltiplas e
variadas (Quadro 1), sendo, actualmente, responsáveis por cerca de 90% dos
casos1. Nas causas de HFNI inclui-se a
colestase neonatal.
A colestase é resultante da redução
da excreção hepatocitária ou de um bloqueio do fluxo ao nível das vias biliares
(intra ou extra-hepáticas) dos componentes biliares para o intestino delgado3-4,
traduzindo-se por hiperbilirrubinemia directa. Esta define-se por um doseamento
sérico de bilirrubina directa (conjugada)
superior a 20% da bilirrubina total, quando o valor de bilirrubina total é superior a
5mg/dL, ou por um doseamento sérico de
bilirrubina directa superior a 1mg/dL, se o
valor de bilirrubina total é inferior a 5mg/
dL5. Constitui a principal manifestação de
doença hepatobiliar3, com uma incidência estimada de 1:2500 recém-nascidos
vivos3,5.
Dada a multiplicidade de etiologias
que podem determinar colestase neonatal (Quadro 2), a abordagem destes casos torna-se, por vezes, bastante difícil.
Em séries mais antigas6-8 a hepatite neonatal idiopática aparecia como
responsável por cerca de 70-80% dos
casos. Os avanços na investigação permitiram reduzir os casos sem diagnóstico
etiológico. Num estudo retrospectivo de
50 casos de E. Santos Silva et al (1999)9
a atrésia das vias biliares extra-hepáticas
e o défice de alfa-1-antitripsina foram responsáveis por 42% dos diagnósticos, as
doenças infecciosas (citomegalovírus, sífilis, hepatite B, infecção urinária a E. coli,
vírus herpes simples tipo 1) por 16%, e
as síndromes dismórficas (S. Alagille, S.
Down) por 8%, a hepatite neonatal idiopática 6%, e sem diagnóstico 8%. Em séries
mais recentes5 a alimentação parentérica
e a colestase multifactorial transitória são
responsáveis por um número significativo
de diagnósticos.
A abordagem dos quadros de colestase neonatal deverá ter em vista identificar atempadamente as situações graves,
em que o doente corre risco de vida, bem
como os casos potencialmente tratáveis
cuja instituição precoce de tratamento
(médico ou cirúrgico) pode ser determinante para a vida futura do doente10. Da
mesma forma, é importante o estabelecimento de um diagnóstico em caso de doença hereditária, de modo a proporcionar
aconselhamento genético adequado. Por
outro lado, é importante reduzir a investigação ao estritamente necessário e diferir o esclarecimento das patologias não
urgentes, sobretudo nos recém-nascidos
e lactentes gravemente doentes10.
Os autores descrevem a abordagem diagnóstica e terapêutica de um
recém-nascido admitido numa Unidade
de Cuidados Intensivos Neonatais ao
nascimento por hidropisia fetal e prematuridade, que desenvolveu um quadro de
colestase a partir do 2º dia de vida.
CASO CLÍNICO
Recém-nascido (RN) do sexo masculino, admitido na Unidade de Cuidados
Intensivos Neonatais da Maternidade de
Júlio Dinis na 1ª hora de vida por hidropisia fetal e prematuridade. Filho de pais
jovens, saudáveis, não consanguíneos.
Antecedentes familiares irrelevantes. Mãe
sem hábitos tabágicos, sem história de
contacto com doenças infecto-contagiosas e sinais/sintomas de infecção genital
ciclo de pediatria inter hospitalar do norte
paediatric inter-hospitalar meeting
161
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
Quadro 1 – Causas de hidropisia fetal não imune
Cardiovascular
Metabólica
Hematológica
Gastrointestinal
Urinária
Anomalia torácica
Cromossómica
Anomalia cardíaca estrutural
Arritmias
Anomalia vascular
Neuroblastoma
Anomalia placentar
Corioangioma
Hemangioma do cordão umbilical
Doença de Gaucher
Doença de Niemann-Pick
Doença de Farber
Mucopolissacaridose
Gangliosidose
Deficiência de carnitina
Hemocromatose neonatal
Hemorragia intra-uterina
Transfusão feto-materna
Défice de glicose-6-fosfato desidrogenase
Talassémia
Malrotação intestinal
Duplicação intestinal
Peritonite meconial
Tumor/quisto hepático
Malformação vascular hepática
Colestase
Estenose/atrésia uretral
Válvulas da uretra posterior
Síndrome de prune-belly
Malformação adenomatóide quística congénita
Quisto broncogénico
Hérnia diafragmática
Massa intratorácica
Sequestro pulmonar
Quilotórax
Monossomia X
Trissomia 21
Trissomia 13
Trissomia 18
Trissomia 12
Condrodisplasias e outras
anomalias genéticas
Infecciosa
Vírus
VIH
Citomegalovírus
Herpes vírus
Parvovírus B19
Ecovírus
Adenovírus
Vírus coxsackie
Bactérias
Sífilis
Protozoários
Toxoplasma
(Adaptado de Speer ME. Postnatal care of hydrops fetalis.
In: UpToDate, Basow DS (Ed), UpToDate, Waltham MA, 2009)
162
ciclo de pediatria inter hospitalar do norte
paediatric inter-hospitalar meeting
durante a gravidez. Gestação vigiada,
com as seguintes serologias maternas:
toxoplasmose não imune, VDRL negativo, AgHBs negativo, anti-VHC negativo,
anti-VIH negativo. Ecografias fetais do 1º
e 2º trimestres descritas como normais. A
ecografia fetal às 32 semanas evidenciou
polihidrâmnos e ascite, levantando-se a
suspeita de hipoplasia pulmonar/atrésia
traqueal. Foi efectuada cesariana emergente às 32 semanas por descolamento
de placenta/placenta prévia. Ruptura de
membranas peri-parto, com líquido amniótico hemático. Verificou-se necessidade
de reanimação, com índice de Apgar 3/5/7
e intubação endotraqueal ao 1º minuto.
Ao nascimento, o RN apresentava
edema generalizado e ascite volumosa,
sem dismorfias aparentes, com hipotonia
global ligeira e dificuldade respiratória
moderada; a auscultação cardio-pulmonar era normal. O estudo analítico revelou anemia (12g/dL), trombocitopenia (35
000/uL) e hipoalbuminemia (1.8g/L), com
função renal e hepática normais. A radiografia de tórax não mostrou alterações.
Foi efectuada transfusão de plaquetas e
albumina humana, com boa resposta. O
ecocardiograma excluiu patologia cardíaca estrutural. Iniciou antibioterapia com
ampicilina e gentamicina por risco infeccioso. Na ecografia transfontanelar em
D1 de vida foi notada hiperecogenicidade
peri-ventricular, sem outras alterações de
relevo. Foi extubado antes de completar
24 horas de vida, tendo-se mantido posteriormente em CPAP nasal, necessitando de oxigenoterapia suplementar nos
primeiros 2 dias de vida. Desde então
manteve-se sempre em ventilação espontânea, sem necessidade de oxigénio
suplementar.
Ocorreu regressão progressiva do
edema generalizado e da ascite, tendose mantido hemodinamicamente estável,
sem necessidade de suporte inotrópico.
Em D2 foi evidenciada icterícia colestática, sem atingimento da função de
síntese hepática (normoglicemia, transaminases e provas de coagulação sempre
normais). Verificou-se agravamento progressivo da colestase até D6, altura em
que iniciou ácido ursodesoxicólico e suplemento de vitaminas lipossolúveis, com
melhoria progressiva. Hepatomegalia
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
detectada em D6. Noção de colúria, sem
acolia fecal.
Em D5 foram notadas lesões cutâneas dispersas, inicialmente interpretadas como petéquias, que foram coalescendo, adquirindo relevo e tonalidade
acastanhada.
Foi administrada alimentação parentérica de D3 a D7 de vida, com aumento
progressivo do aporte entérico por sonda
de declive, com óptima tolerância. Em D9
desenvolveu quadro compatível com enterocolite necrotizante, tendo suspendido
alimentação entérica e reiniciado alimentação parentérica total. Completou 10 dias
de antibioterapia com metronidazol e 16
dias de vancomicina e cefotaxima, tendose verificado melhoria progressiva. Reiniciou alimentação entérica em D18, com
aumento progressivo e boa tolerância.
Procedeu-se a um estudo complementar exaustivo, tendo em vista identificar a causa da hidropisia fetal/colestase
neonatal.
O teste de Coombs directo foi negativo, assim como o teste de KleihauerBetke (mãe). A electroforese de hemoglobina e cinética do ferro não revelaram
alterações, apresentando anisopoiquilocitose no esfregaço de sangue periférico.
O doseamento de glicose-6-fosfato desidrogenase foi normal.
O estudo virológico (serologia para
citomegalovírus, vírus Epstein Barr, enterovírus, vírus coxsackie, adenovírus, vírus herpes simples tipo 1 e 2, parvovírus
B19 e PCR para CMV no cartão de Guthrie) foi negativo, tal como a cultura de
citomegalovírus na urina. A ecografia reno-pélvica não revelou alterações. A eco-
grafia abdominal mostrou hepatomegalia
moderada, tendo sido visualizada vesícula biliar. A avaliação oftalmológica foi
normal, permitindo excluir coriorretinite,
catarata e mancha vermelho-cereja. Do
restante estudo destaca-se: pesquisa de
substâncias redutoras urinárias e teste de
Guthrie negativos; alfa-1-antitripsina normal; ácido homovanílico, ácido vanilmandélico e catecolaminas urinárias normais;
alfa-fetoproteina normal; perfil lipídico
normal e função tiroideia sem alterações.
O estudo metabólico realizado (aminoácidos plasmáticos, aminoácidos e ácidos
orgânicos urinários, acilcarnitinas, ácidos
gordos de cadeia muito longa, transferrina deficiente em hidratos de carbono,
glicosaminoglicanos e oligossacarídeos
urinários) não revelou alterações. Cariótipo 46,XY. Foram excluídas as mutações
Quadro 2 – Causas de colestase neonatal
Doenças das vias biliares
Colangiopatias
Outras
Atrésia das vias biliares extra-hepáticas
Quisto do colédoco
Colangite esclerosante neonatal
Perfuração espontânea das vias biliares
Estenose dos ductos biliares
Doença de Caroli
Síndrome de Alagille
Paucidade canalicular não sindromática
Síndrome de bile espessa
Colelitíase
Tumores/massas (intrínsecas e extrínsecas)
Colestase hepatocelular
Doenças metabólicas
Síndromes colestáticos
Défice de alfa-1-antitripsina
Aminoacidopatias (tirosinemia, …)
Doenças dos carbohidratos (galactosemia, fructosemia, glicogenose tipo IV)
Doenças do ciclo da ureia (argininemia, citrulinemia)
Doenças dos lipídos (doença de Niemman-Pick, doença de Gaucher, doença de
Wolman, doença dos ésteres do colesterol)
Doenças dos peroxissomas (síndrome de Zellweger, doença de Refsum, …)
Defeito da síntese de sais biliares
Citopatias mitocondrias
Fibrose quística
Hemocromatose neonatal
Endocrinopatias (hipotiroidismo, hipopituitarismo)
PFIC tipos 1,2,3
BRIC (mesmo gene do PFIC 1)
S. Dubin-Johnson (deficiência de
MRP2)
Colestase hereditária com
linfedema (S. Aagenaes)
Hepatite neonatal
Idiopática
Vírica: citomegalovírus, vírus
herpes simples 1 e 2, rubéola,
adenovírus, enterovírus,
parvovírus B19, hepatite B, VIH)
Bacteriana e parasitária: sépsis
bacteriana, listeriose, sífilis,
tuberculose, toxoplasmose,
malária
Tóxica: fármacos, alimentação
parentérica
Miscelânia
Choque /Hipoperfusão
Lúpus neonatal
Histiocitose X
Doença venooclusiva
Eritroblastose fetal
Doença enxerto contra hospedeiro
Síndrome de McCune-Albright
Síndrome de Donahue
Síndrome de Down
ciclo de pediatria inter hospitalar do norte
paediatric inter-hospitalar meeting
163
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
Figura 1 – Ascite e lesões cutâneas
mais frequentes associadas a fibrose
quística. O estudo anatomo-patológico
da placenta evidenciou edema vilositário
com moderadas lesões de corionite aguda, sem outras alterações de relevo.
O RN teve alta ao 43º dia de vida,
apresentando, nessa altura, anemia
(8.4g/dL) e icterícia ligeira (bilirrubina
total 1.8mg/dL; bilirrubina directa 0.9mg/
dL), com função hepática e provas de
coagulação normais. Ao exame objectivo
era ainda evidente hepatomegalia ligeira
e escassas lesões maculares, de tonalidade acastanhada, dispersas; o restante
exame objectivo era normal.
Manteve-se em vigilância em consulta de Neonatologia e Hepatologia, sob
terapêutica com ácido ursodesoxicólico e
suplemento de vitaminas lipossolúveis. A
evolução foi favorável, com normalização
progressiva dos parâmetros analíticos:
pelos oito meses de vida apresentava
uma hemoglobina de 11.9g/dL e bilirrubina total de 0.2mg/dL. Aos quinze meses
de idade tem uma boa evolução estaturoponderal, com desenvolvimento psicomotor adequado, sem registo de qualquer
intercorrência.
DISCUSSÃO
De entre a lista de problemas associada ao caso apresentado, destacamse a hidropisia fetal não imune (teste de
Coombs directo negativo) e o quadro de
colestase. Assim, e neste contexto, o estudo complementar foi orientado tendo
em vista descartar as principais causas
destas duas entidades (Quadros 1 e 2).
Relativamente às anomalias cardiovasculares associadas a HFNI, e embora
não se tivesse constatado qualquer alteração à auscultação cardíaca, os estudos
electro e ecocardiográfico permitiram ex-
164
cluir arritmias graves e anomalias estruturais1, respectivamente. A existência de
neuroblastoma foi igualmente descartada
perante doseamentos normais de ácido
homovanílico, ácido vanilmandélico e
catecolaminas urinárias. O estudo anatomo-patológico de placenta não revelou
alterações compatíveis com corioangioma ou angioma do cordão umbilical.
No que diz respeito à etiologia hematológica, o teste de Kleihauer-Betke
excluiu transfusão feto-materna. Da mesma forma, uma electroforese de hemoglobina sem alterações e um doseamento de glicose-6-fosfato desidrogenase
normal eliminaram, respectivamente, as
hipóteses de talassémia e deficiência de
glicose-6-fosfato desidrogenase.
Do ponto de vista metabólico, foi
realizado um estudo bastante alargado,
o que reduz drasticamente a probabilidade de se tratar de uma afecção deste
tipo. Para além disso, estas situações
condicionam, regra geral, evolução desfavorável, com mau prognóstico1, o que
não se verificou neste caso. A ausência
de qualquer outro tipo de manifestação
habitualmente presente neste tipo de patologia, como hipoglicemia, coagulopatia
ou alterações neurológicas, reforça também a convicção de não se tratar de uma
doença metabólica.
A normalidade das ecografias
reno-pélvica e abdominal eliminou as
hipóteses de malformação urinária ou
gastrointestinal. Da mesma forma, uma
radiografia de tórax normal tornou pouco
provável a existência de qualquer malformação torácica. Contudo, a exclusão
definitiva deste tipo de patologia exigiria
a realização de exames de imagem com
maior resolução, como tomografia computorizada ou ressonância magnética1.
ciclo de pediatria inter hospitalar do norte
paediatric inter-hospitalar meeting
Dada a inexistência de qualquer sinal ou
sintoma sugestivo, o estudo não prosseguiu neste sentido.
Relativamente à etiologia infecciosa, as serologias foram negativas para
os agentes investigados. Contudo, outros microorganismos poderiam ser considerados, pelo que esta possibilidade
não pode, de todo, ser esquecida, ideia
reforçada pela demonstração de lesões
de corionite aguda no estudo anatomopatológico da placenta.
Finalmente, e relativamente às principais causas de HFNI, a ausência de
dismorfias, num RN com cariótipo normal, permite descartar uma parte das
cromossomopatias, assim como condrodisplasias.
Restava, finalmente, a colestase
como causa de HFNI. Assim, prosseguiuse a investigação tendo em causa as potenciais causas de colestase neonatal. A
hipótese de atrésia biliar foi, de imediato,
afastada, perante a identificação de vesícula biliar em exame imagiológico e a
inexistência de acolia fecal ou alteração
das transaminases. De facto, é essencial proceder ao despiste desta patologia
tão precocemente quanto possível, uma
vez que o prognóstico será tanto melhor
quanto mais precoce a intervenção cirúrgica4. Foram igualmente descartadas
outras anomalias estruturais hepáticas
e biliares. Da mesma forma, não foram
reunidos critérios de diagnóstico de síndrome de Alagille.
A pesquisa de substâncias redutoras na urina e o teste de Guthrie foram
negativos pelo que se excluiu a galactosemia. A cromatografia de aminoácidos
foi normal e a pesquisa de succinil-acetona na urina não foi efectuada pelo facto
de o diagnóstico de tirosinemia ser pouco
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
provável (colestase de instalação muito
precoce e ausência de hipoglicemia e de
sinais de insuficiência hepatocelular). A
exclusão destas entidades é, também, de
importância vital, dado existir terapêutica
específica para as mesmas4.
Embora a evolução clínica favorável
não fosse compatível com hemocromatose neonatal, a qual se apresenta, habitualmente, como insuficiência hepática
fulminante4, foi efectuado estudo da cinética do ferro, que não revelou alterações,
pelo que se colocou de parte esta doença. Apesar da apresentação de fibrose
quística sob a forma de colestase ser
pouco frequente4, foi solicitado estudo
molecular do cromossoma 7, não tendo
sido identificada nenhuma das principais
mutações associadas a esta doença. A
deficiência de alfa-1-antitripsina foi igualmente investigada e excluída.
Apesar de a toxicidade associada a
fármacos e a nutrição parentérica constituírem causas frequentes de colestase
neonatal, a cronologia dos acontecimentos torna pouco provável esta associação. De facto, habitualmente a icterícia
surge cerca de 2 semanas após o início
da alimentação parentérica4, ao contrário
do que sucedeu no caso descrito, em que
a colestase foi detectada na mesma altura em que se introduziu este tipo de alimentação. Parece, pois, tratar-se de um
processo previamente instalado.
Mais uma vez, a etiologia infecciosa
não pôde, em definitivo, ser excluída, pelas razões previamente apontadas.
Assim, e perante o exposto, neste caso não foi possível estabelecer um
diagnóstico definitivo, o que acontece
em cerca de 5-8% dos casos de HFNI1.
Contudo, os autores acreditam tratar-se
de uma situação de hidropisia fetal não
imune de causa possivelmente infecciosa, sem agente identificado, que condicionou igualmente um quadro de coles-
tase neonatal, mantida e prolongada por
múltiplos factores, como a prematuridade, a administração de fármacos, a instituição de alimentação parentérica e a
sobreposição de uma situação infecciosa
grave como a enterocolite necrotizante.
De referir, a reforçar esta hipótese, a evolução favorável, a evidência de anemia1
(frequentemente desencadeada pelos
agentes infecciosos), as alterações da
placenta sugerindo um processo infeccioso pré-natal1, a hepatomegalia1 e as
lesões cutâneas observadas (possivelmente traduzindo áreas de hematopoiese
dérmica1).
HYDROPS FETALIS AND NEONATAL
CHOLESTASIS – CASE REPORT
ABSTRACT
There is a wide variety of disorders
associated with non-immune hydrops fetalis and neonatal cholestasis. Besides
exhaustive investigation, in some cases
it is not possible to identify an etiological
factor.
The approach to these entities
should be supported by detailed anamnesis and a meticulous physical examination. Additional testing must be oriented
by clinical manifestations and the aim
is prompt identification of potential lifethreatening diseases and treatable disorders.
The authors present the diagnostic
and therapeutic approaches in a premature newborn with hydrops fetalis, admitted in an Intensive Care Neonatal Unit
soon after birth, who developed cholestasis from the 2nd day of life.
Keywords: Hidropsis fetalis, neonatal cholestasis, jaundice
BIBLIOGRAFIA
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CORRESPONDÊNCIA
Ariana Afonso
[email protected]
Nascer e Crescer 2010; 19(3): 161-165
ciclo de pediatria inter hospitalar do norte
paediatric inter-hospitalar meeting
165
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
Caso Hematológico
Patrícia Nascimento1, Emília Costa1, Beatriz Porto2, José Barbot1
Criança do sexo feminino referenciada à consulta de Hematologia Pediátrica, aos 9 anos de idade, por trombocitopenia.
Trata-se da primeira filha de um
casal jovem, saudável e não consanguíneo. Sem história de patologias relevantes na família. Parto ocorrido por
cesariana electiva às 39 semanas com
um Índice de Apgar 9/10. Suspeita de
Restrição Crescimento Intra-uterino,
apresentando ao nascimento peso
2553g (<Percentil 5), comprimento 45
cm (<Percentil 5) e perímetro cefálico
de 31 cm (<< Percentil 5 ). Ao exame
objectivo constatada hipoplasia do polegar da mão esquerda e agenesia do
polegar da mão direita (Figura1), na
ausência de outras malformações. Ainda durante as primeiras horas de vida
Figura 1
__________
1
2
Unidade de Hematologia Pediátrica do Hospital
Maria Pia - CHPorto
Laboratório de Citogenética do Instituto de
Ciências Biomédicas de Abel Salazar - U P
166
caso hematológico
hematologic case
detectada cardiopatia congénita complexa (CIA + CIV + persistência do canal arterial + retorno pulmonar anómalo total à veia cava superior) corrigida
cirurgicamente aos 2 meses de idade.
Com o início da escolaridade notada
hipoacusia, objectivada posteriormente
em consulta de Otorrinolaringologia e
devida a malformação do ouvido médio
(tímpano esclerótico à esquerda). Aos
9 anos de idade, por apresentar atraso
do desenvolvimento com mau rendimento escolar associado a má evolução ponderal foi observada no médico
assistente onde efectuou alguns exames complementares de diagnóstico:
ecografia reno-pélvica, bioquímica
alargada, função tiroideia e cariótipo
convencional com bandas de alta resolução que eram normais (46,XX). O
hemograma revelou uma hemoglobina
de 12,6 g/dl, hematócrito 36,6%, MCV
105,2 fl; MCH 36,3 pg, MCHC 34,5 g/dl;
RDW 13,5%; 3400 leucócitos/μL (1400
N/μL; 0 E/μL; 0 B/μL; 1800 L/μL; 300
M/μL) e 55 000 plaquetas/μL. No esfregaço de sangue periférico era evidente
macrocitose com poiquilocitose ligeira e policromatofilia. Foi nessa altura
orientada para a consulta de Hematologia Pediátrica.
À data da primeira observação
na consulta, era evidente má evolução
estaturo-ponderal (peso <P5, estatura
<P5) e as malformações dos polegares
já referidas na ausência de outras alterações significativas para além do sopro sistólico na auscultação cardíaca.
Qual o seu diagnóstico?
NASCER E CRESCER
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ano 2010, vol XIX, n.º 3
COMENTÁRIOS
Perante o quadro clínico de malformação dos polegares associada a
cardiopatia congénita, surdez de transmissão, má evolução ponderal, défice
cognitivo e alterações hematológicas
(macrocitose, neutropenia ligeira e
trombocitopenia) foi colocada a hipótese de Anemia de Fanconi (AF). A
percentagem elevada de Hemoglobina fetal (9,1% para um normal para a
idade <1%) constituía factor adicional
para esta suspeita, tendo o diagnóstico
sido confirmado através da pesquisa
de quebras cromossómicas induzidas
pelo diepoxibutano (DEB) (11,1% de
células com quebras induzidas).
A Anemia de Fanconi é uma doença de hereditariedade autossómica recessiva, descrita pela primeira vez em
19271,2. Durante muitos anos foi diagnosticada apenas com base no quadro
de insuficiência medular associado a
malformações somáticas que, apesar
de diversas e com envolvimento de diferentes órgãos e sistemas, permitiam
configurar um padrão característico –
Tabela 1.
Caracteriza-se ainda por uma
susceptibilidade acrescida ao desenvolvimento de neoplasias não só de
ponto de partida medular, nomeadamente síndrome mielodisplásico e leucemia mieloblástica aguda, como tam-
bém de tumores sólidos, sobretudo
tumores epiteliais, relacionada com a
instabilidade genómica característica
da doença 2,4,5,6.
O caso apresentado constitui um
exemplo das particularidades da AF
susceptíveis de conduzirem a um subdiagnóstico/diagnóstico tardio.
Efectivamente esta criança aos 9
anos de idade, e ainda hoje com 15
anos de idade, não tem anemia. Como
tal a designação da doença é inadequada, na medida em que prejudica,
de forma clara, a acuidade diagnóstica. De facto, as citopenias periféricas são de instalação progressiva e
insidiosa, sem calendário previsível,
Tabela 1 – Anomalias Físicas da Anemia de Fanconi (Dokal, 20002)
Anomalias
Frequência (%)
Esqueléticas (rádio, anca, escoliose, costela)
Pigmentação cutânea ( café au lait, hiper e hipopigmentação)
Baixa estatura
Olhos (microftalmia)
Rim e vias urinárias
Genitais masculinos
Atraso cognitivo
Gastrointestinal (estenose anorrectal, atrésia duodenal)
Anomalias cardíacas
Surdez
Sistema nervoso central
Ausência de anomalias
71
64
63
38
34
20
16
14
13
11
8
25-30
Tabela 2 – Indicadores de suspeita de Anemia de Fanconi da FARF3
Risco médio - ponderar estudo DEB
Risco elevado - estudo DEB mandatório
Citopenia isolada
Macrocitose não explicada por défice de folato ou vitamina B12
Tumores hepáticos sem história de hepatite ou ingestão de
álcool
Falência ovárica prematura <30 anos
Diminuição da reserva ovárica <30 anos
Tumor cerebral <5 anos
Tumor de Wilms <4 anos
Aumento da Hb F sem outra explicação
Infertilidade masculina ou feminina
Adenomas hepáticos ou hepatomas sem história de hepatite
ou álcool
Irmão com AF
Anemia aplásica
Malformações congénitas, particularmente se uma ou mais anomalias rádio e/ou membros; anomalia
da estrutura renal; microftalmia; manchas café au lait; achados de VACTERL-H tal como fístula
traqueo-esofágica, ânus imperfurado ou outras
Quebras cromossómicas espontâneas
Síndrome mielodisplásico (em qualquer idade)
Leucemia mielóide aguda primária ( em qualquer idade)
Sensibilidade invulgar à quimio ou radioterapia
Neoplasia típica de Anemia de Fanconi em idade atípica, tal como HNSCC <50 anos, útero <30 anos,
anal/vulvar <40 anos
História familiar consistente com AF ou neoplasia (ex. cancro de mama)
* De salientar que a presença de mais de um factor aumenta a possibilidade diagnóstica.
caso hematológico
hematologic case
167
NASCER E CRESCER
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ano 2010, vol XIX, n.º 3
sendo geralmente a anemia a última a
manifestar-se.
Por outro lado esta criança exemplifica também o percurso prévio ao
diagnóstico de AF, com passagem por
diferentes especialidades de alguma
forma relacionadas com a sua frequente morbilidade (Cardiologia, Urologia,
Gastroenterologia, Otorrinolaringologia, Ortopedia, Cirurgia Plástica entre
outras), sem que o diagnóstico seja
equacionado. É nesse sentido que é
importante a divulgação desta patologia no seio dessas especialidades, por
vezes pouco sensibilizadas para um
diagnóstico hematológico.
A variabilidade fenotípica da AF
é grande, sendo que cerca de 25%
dos doentes, ao contrário da criança apresentada, são fenotipicamente
normais1,3,8,9. Este facto reforça ainda
mais a convicção generalizada de
que se trata de uma doença subdiagnosticada (a incidência descrita na
literatura de 3:1 000 000 estará provavelmente aquém dos verdadeiros
números de AF).
A Fanconi Anemia Research
Foundation (FARF) procurou minorar o
atraso no diagnóstico através da elaboração e divulgação de indicadores de
suspeita diagnóstica, com base em elementos de ordem clínica e laboratorial.
Define 2 índices de suspeita, médio e
alto, sendo que no primeiro é de ponderar a realização do estudo citogenético enquanto que no segundo este é
mandatório ( Tabela 2).
Como se pode ver pela análise da
Tabela 2, a presença da malformação
das mãos e a cardiopatia colocavam
esta criança, desde o nascimento e
ainda na ausência de alterações hematológicas, no grupo de risco elevado
de Anemia de Fanconi, tendo por si só
indicação para a realização do estudo citogenético, o que teria conduzido
atempadamente ao diagnóstico.
168
caso hematológico
hematologic case
O diagnóstico precoce permite uma abordagem a longo prazo da
insuficiência medular, antecipando
cuidados, como sejam a evicção de
radiações e tóxicos, e programando
a realização de cirúrgicas correctivas
prévias à instalação de uma trombocitopenia que as inviabilize1,3. Permite
também a identificação de irmãos não
afectados, assim como daqueles que,
sendo afectados se encontram em
fase pré sintomática. Fornece ainda
a possibilidade de aconselhamento
genético dos progenitores, tendo em
conta eventuais gestações futuras às
quais se poderá aplicar diagnóstico
pré-natal. Para além disso, o cordão
umbilical dos recém-nascidos não
afectados poderá ser compatível com
o do irmão doente e assim ser fonte de
células progenitoras hematopoiéticas
para um futuro transplante.
Apesar do diagnóstico tardio, a
doente tem apresentado ao longo dos
6 anos de seguimento, uma evolução
relativamente lenta e benigna, com
trombocitopenia persistente mas contagens de neutrófilos que oscilam entre
a neutropenia e a normalidade, não se
equacionando para já a possibilidade
de transplante de medula, mas tendo
já sido efectuada pesquisa de dador
compatível.
ABSTRACT
The authors present the case of a
child with complex congenital heart defect, bilateral malformation of the thumbs,
hearing loss, failure to thrive and delayed
psychomotor development, oriented to
the hematology consultation at the age of
9 years for the presence of thrombocytopenia and macrocytosis.
Nascer e Crescer 2010; 19(3): 166-168
BIBLIOGRAFIA
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NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
Caso Dermatológico
Alergia às Caneleiras
Ana Oliveira1, Iolanda Fernandes1, Inês Lobo1, Manuela Selores1
Criança de 12 anos, sexo masculino, sem antecedentes patológicos de relevo. Enviado à consulta de Dermatologia
por eritema, descamação e prurido nas
faces anteriores de ambas as pernas,
com 4 meses de evolução.
Ao exame objectivo observava-se
uma placa ovalada, eritemato-descamativa e liquenificada, na face anterior de
cada perna, do tornozelo até ao terço superior (Figura 1).
Qual o seu diagnóstico?
Qual a sua atitude?
Figura 1 – Placas ovaladas, eritemato-descamativas e liquenificadas na
face anterior de ambas as pernas
__________
1
Serviço de Dermatologia, Hospital de Santo
António / CHPorto
caso dermatológico
dermatology case
169
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
Figura 2a – Testes epicutâneos positivos para a face interna
da caneleira
COMENTÁRIOS
O quadro de eritema, descamação
e liquenificação circunscritos a uma área
bem delimitada e associados a prurido
colocaram-nos na pista de um eczema de
contacto. Após uma anamnese dirigida
pudemos averiguar que o doente jogava
futebol três vezes por semana e usava
caneleiras, cujos limites correspondiam
aos limites da dermatose. Foi submetido
a testes epicutâneos com a série standard do Grupo Português para o Estudo
das Dermatites de Contacto, com a série
de calçado e com a face interna e face
externa da caneleira. Os testes foram
aplicados no dorso durante dois dias e
a leitura ao terceiro dia mostrava positividade (++) para dicromato de potássio
(constituinte do couro), níquel, IPPD (isopropilaminodifenilamina) 1% (constituinte
das borrachas) e para a face interna das
caneleiras. (Figuras 2a, 2b)
Foi aconselhado a evitar o uso de
caneleiras e foi medicado com aceponato
de metilprednisolona a 0,1% em pomada,
associado a um emoliente.
O eczema de contacto alérgico é
uma dermatose relativamente frequente, correspondendo a cerca de 10% de
todas as doenças inflamatórias da pele
e afectando cerca de 8% da população
pediátrica. Corresponde a uma reacção
de hipersensibilidade retardada (ou do
tipo IV) a alergénios para os quais se
170
caso dermatológico
dermatology case
Figura 2b – Testes epicutâneos positivos para dicromato de
potássio, IPPD a 1% e níquel
foi previamente sensibilizado. Divide-se
em duas fases: aguda e crónica. A fase
aguda surge 24 a 48h após a exposição
e traduz-se pelo aparecimento de eritema, vesiculação e exsudação limitados à
área de contacto com o alergénio, em associação com um prurido intenso. A fase
crónica ocorre quando a exposição ao
alergénio persiste por um período longo
de tempo. Clinicamente manifesta-se por
eritema, descamação e liquenificação,
associados a prurido local.
O diagnóstico é sugerido pela anamnese e exame físico e confirmado por testes epicutâneos.
O tratamento passa pela evicção
do alergénio e pelo uso de corticosteróides tópicos, emolientes e anti-histamínicos orais.
É uma patologia frequente e benigna, na qual é necessário um elevado índice de suspeição para identificar o alergénio implicado.
sensitivity reaction that is elicited when
the skin comes in contact with a chemical to which an individual has previously
been sensitized.
The classic picture of contact dermatitis is a well-demarcated erythematous vesicular (in the acute form) and/or
scaly patch or plaque (in the chronic form)
lesion, with well-defined margins corresponding to the area of contact.
It requires an appropriate level of
suspicion for the possibility of an allergen
to elicit a contact dermatitis.
Treatment is based on avoidance of
the allergen associated with corticosteroids and antihistamines.
The authors present a case of allergic contact dermatitis to football shin
guards in a 12 year-old boy who regularly
practiced soccer.
Keywords: allergic, contact dermatitis, football shin guards
Nascer e Crescer 2010; 19(3): 169-170
ABSTRACT
Many adverse events can occur
when the skin comes in contact with external agents. Eczema is one of them.
The eczema can be either allergic or irritant in nature. Irritant contact dermatitis
(ICD) accounts for approximately 80% of
all contact dermatitis and allergic contact
dermatitis (ACD) accounts for the remaining 20%. ACD is a delayed-type hyper-
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NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
Caso Electroencefalográfico
Ana Graça Velon1, Célia Xavier2, Adriana Ribeiro3, Rui Chorão3,4
INTRODUÇÃO
As mioclonais palpebrais são um
evento clínico, cujo diagnóstico diferencial inclui diversas entidades. São várias as epilepsias que cursam com este
elemento semiológico, sejam elas idiopáticas, sintomáticas ou criptogénicas /
provavelmente sintomáticas. Por outro
lado, nas doenças do movimento as mioclonias palpebrais surgem de forma estereotipada, o que aumenta o leque dos
diagnósticos diferenciais.
CASO CLÍNICO
Menino de sete anos referenciado
à consulta de Neuropediatria por apresentar desde os seis anos episódios de
pestanejo. Estes tinham uma duração
de poucos segundos, ocorrendo várias
vezes por dia. Como factores de agravamento referiam-se o stress, a fadiga
e a sonolência. Nunca houve registo
de crises tonico-clónicas generalizadas
(TCG) ou ausências. A criança, quando
solicitada, foi incapaz de reproduzir os
movimentos e dizia não se aperceber dos
mesmos.
Os antecedentes perinatais eram irrelevantes, com normal desenvolvimento
estaturo-ponderal e psicomotor. A criança tinha bom aproveitamento escolar e
não apresentava quaisquer alterações
do comportamento. Nos antecedentes
pessoais, destacava-se a presença de
enurese primária e pieira recorrente. A
história familiar era irrelevante.
A primeira monitorização de electroencefalograma com vídeo (vídeo-EEG)
__________
1
2
3
4
S. Neurologia, CHTMADouro, H Vila Real
S. Pediatria, CHTSousa, HPAmerico
U. Neurofisiologia Pediátrica, CHP, HMPia
S. Neurologia Pediátrica, CHPorto, HMPia
revelou actividade paroxística (polipontas e pontas-ondas irregulares a 3-5
Hz) posterior bilateral ou generalizada,
na oclusão ocular (espontaneamente ou
ao comando), por vezes com os olhos
fechados, a qual se acompanhava de
mioclonias palpebrais (Figura 1). A consciência permanecia intacta (mantinha-se
a conversar), pelo menos nas situações
em que foi possível determinar este
facto. A presença de fotossensibilidade
evidenciou-se durante a estimulação fótica dos 10 aos 30 Hz.
A ressonância magnética encefálica
foi normal. Foi medicado com clobazam,
sem benefício. No segundo vídeo-EEG
persistia no traçado actividade paroxística posterior bilateral e generalizada, com
activação pela hiperpneia e sobretudo na
fotoestimulação (dos 10 aos 18 Hz), com
surtos de poliponta-onda irregular posteriores e na maioria generalizados, com os
olhos fechados, registando-se manifestações clínicas associadas (mioclonias palpebrais). A substituição por levetiracetam
revelou-se também ineficaz. Optou-se
pela associação de valproato de sódio
em dose de quase 20 mg/kg/dia. Quatro
meses depois a frequência dos episódios
havia reduzido significativamente, na ausência de efeitos laterais significativos
(apenas discreto aumento do peso). Entretanto, os pais mencionaram episódios
de movimentos súbitos dos membros na
fase inicial do sono. O vídeo-EEG nessa
altura revelou tratarem-se de mioclonias
do sono. Contudo, o traçado mantinha
alterações de tipo epileptiforme, acentuadas pela hiperpneia e fotoestimulação, com registo de algumas crises.
Verificava-se, no entanto, redução quer
das anomalias gráficas quer do número e
frequência das crises. Com o incremento
da dose de valproato de sódio para cerca
de 25 mg/kg/dia em monoterapia, houve
redução dos episódios, que permaneceram clinicamente indetectáveis por um
período de seguimento de meio ano.
DISCUSSÃO
As mioclonias palpebrais (MP) são
classificadas pela Liga Internacional contra a Epilepsia (ILAE) nas crises generalizadas, como subtipo das ausências
com características especiais.(1) São
movimentos palpebrais recorrentes em
que a consciência pode ou não estar
preservada, sendo que , a acontecer, é
subsequente ao pestanejo e por vezes
difícil de determinar, pela sua brevidade.
Assim, as MP podem ocorrer com ou sem
ausências e em várias síndromes epilépticas: idiopáticas (Síndrome de Jeavons
- não reconhecida como síndrome epiléptica pela ILAE), sintomáticas ou criptogénicas.(2)
No caso descrito as mioclonais palpebrais tiveram início aos 6 anos, surgindo na oclusão palpebral e na fotoestimulação. Não se registaram outro tipo
de crises. O registo das mioclonias palpebrais correlacionou-se com as anomalias
gráficas (actividade paroxística do tipo
poliponta-onda) e a fotoestimulação, sugerindo origem epiléptica. A resposta ao
valproato também favorece esta etiologia. A existência de auto-indução nestes
doentes é controverso(2), e neste caso,
o fenómeno parece existir: frequentes
episódios de oclusão ocular espontânea
durante o registo inicial, com indução ou
não de actividade epileptiforme.
Quanto à sua classificação, poderemos incluí-las dentro das mioclonias palpebrais com ou sem ausências (ou Síndrome de Jeavons - SJ), tendo em conta
que a característica fundamental desta
síndrome epiléptica são as mioclonias
caso electroencefalográfico
EEG case report
171
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
Figura 1 – Após a oclusão ocular, surto generalizado de polipontas bi-occipital com
registo de mioclonias palpebrais, seguido de poliponta-onda generalizada a 3-5 Hz.
palpebrais e não as ausências(2,3). Este
diagnóstico torna-se provável quando as
mioclonias se associam a fotossensibilidade, sendo praticamente patognomónico se ocorrem com a oclusão ocular.2-4 O
vídeo-EEG é típico, com surtos generalizados de pontas-ondas ou polipontas-ondas breves (geralmente 2-3’’), surgindo surgindo 0,5-2’’ após a oclusão ocular.
A resposta fotoparoxística é uma constante, como epilepsia fotossensível que
é.(2,3,5) Estes achados estão de acordo
com o registado no nosso caso (Figura
1). Em nenhum dos exames de vídeo-EEG se realizou trecho na escuridão
total; nesta situação, a oclusão ocular
172
caso electroencefalográfico
EEG case report
não induz crises ou actividade epileptiforme, o que é característico neste tipo
de epilepsia(2,3). Estão descritos casos em
que nunca se registaram ausências, mas
em que ocorreram crises TCG.(3,4) Estas
crises são raras e surgem, geralmente,
na presença de factores precipitantes
ou facilitadores (privação de sono, não
cumprimento da terapêutica, luz brilhante
ou exposição a televisão ou jogos com
vídeo).(2,3,5) Respondem ao tratamento,
pelo que se pode inferir que a sua inexistência, no nosso doente, pode dever-se à introdução de tratamento com antiepiléptico. As mioclonias palpebrais, em
contrapartida, são consideradas em geral
refractárias ao tratamento antiepiléptico. Contudo, publicações mais recentes
apresentem respostas mais favoráveis,
eventualmente por incluírem o uso de
fármacos mais recentes.(3) Este parece
ser o caso no doente que apresentamos.
O tratamento de primeira linha preconiza
o valproato de sódio em monoterapia. A
sua associação com benzodiazepinas, levetiracetam, lamotrigina ou etossuximida,
são esquemas terapêuticos possíveis.(2-5)
O tratamento modifica os achados electroclínicos e a fotossensibilidade tende a
diminuir com o avançar da idade. (2,3,5)
Em relação ao prognóstico, este é
melhor no sexo masculino, pelo que sob
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
terapêutica antiepiléptica esperamos que
não ocorram ausências ou CTCG. As
mioclonias geralmente persistem, embora tornando-se menos frequentes com a
idade.
As MP com a oclusão ocular e com
resposta fotoparoxística estão descritas
em diversas outras síndromes epilépticas
como: epilepsias generalizadas idiopáticas (epilepsia de ausências, epilepsia
mioclónica juvenil, crises reflexas, epilepsias generalizadas sintomáticas) e epilepsias focais fotossensíveis.(3,5)
A monitorização vídeo-EEG permitiu excluir uma série de potenciais diagnósticos, facto impossível apenas com
base nos achados clínicos. Particularmente difícil seria a diferenciação com
movimentos paroxísticos palpebrais, que
se associam a epilepsias generalizadas
fotossensíveis, ocorrem várias vezes por
dia, aumentam em situações de stress,
embaraço ou frustração, não há perturbação da consciência e persistem apesar da terapêutica antiepiléptica.(6) Outros diagnósticos diferenciais seriam os
tiques palpebrais (movimentos rítmicos,
mais breves, cuja contracção não é tónica), a supraversão tónica benigna da infância (de maior duração e auto-limitada),
e o blefarospasmo (espasmo do músculo
orbicular das pálpebras, franzindo o sobrolho, com aproximação das fendas palpebrais).(6)
O mecanismo fisiopatológico das
MP será o mesmo que está descrito para
as epilepsias fotossensíveis.(5) A oclusão
dos olhos e a ELI “sincronizam” os neurónios do córtex occipital (cuja activação
depende da intensidade da luz, da área
de córtex e do nível de excitabilidade –
predisposição genética). A disseminação
desta activação para o córtex frontal faz-se por vias transcorticais e subcorticais
(reticulotalâmicas). Desta activação podem resultar: resposta fotomioclónica,
actividade paroxística subclínica confinada a áreas occipitais, actividade electroclínica característica das epilepsias
occipitais, resposta fotoparoxística com
polipontas e pontas-ondas generalizadas
e mioclonias (às vezes com ausências) e
as crises TCG.(5)
CONCLUSÃO
As mioclonias palpebrais apresentam uma panóplia de diagnósticos diferenciais. Mesmo quando a sua etiologia
é claramente epiléptica, como no caso
apresentado, a sua classificação nosológica constitui um desafio.
Palavras-chave: Mioclonias palpebrais, mioclonias palpebrais com ausências, epilepsias fotossensíveis, doenças
do movimento
ABSTRACT
Introduction. Eyelid myoclonia
with or without absences may occur in
several epileptic conditions, and they are
frequently misinterpreted as movement
disorders.
Case report. A seven-year-old boy
was admitted for evaluation of eye blinking that started at age of six. He had never
had generalized tonic-clonic or absence
seizures. Video-EEG monitoring revealed
3-5 Hz irregular occipital or generalized
polyspike and polyspike-wave complexes,
precipitated by eye closure. They were accompanied by eye-lid myoclonia. Photic
stimulation induced photoparoxysmal response. Brain MRI was normal. He was
initially treated with clobazam and then
levetiracetam with no response. Valproate
was added with control of the symptoms.
Conclusion. Eyelid myoclonia without absences are often difficult to classify. Video-EEG may help to clarify these
cases.
Keywords: eyelid myoclonia, eyelid
myoclonia with absences, photosensitive
epilepsy, movement disorders
BIBLIOGRAFIA
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Nascer e Crescer 2010; 19(3): 171-173
caso electroencefalográfico
EEG case report
173
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
Caso Endoscópico
Fernando Pereira1
Uma doente de 5 anos de idade,
sexo feminino, raça caucasiana e natural
do Porto, foi observada na consulta de
Gastroenterologia por vómitos após as refeições, frequentes nos últimos 2 meses.
Tratava-se de uma criança que nasceu com boa vitalidade e peso adequado,
de parto eutócico, e foi referenciada na
nossa consulta aos 6 meses de idade por
regurgitação frequente após as mamadas, o que fez suspeitar de refluxo gastroesofágico patológico. Efectuou estudo radiológico esófago-gastro-duodenal
e pHmetria de 24h que não revelaram
qualquer alteração compatível com refluxo. Efectuou tratamento com leite ant-regurgitação e domperidone e o seu
quadro resolveu cerca de seis meses depois. Concluímos tratar-se de quadro de
refluxo fisiológico.
Figura 1
__________
1
Serviço de Gastroenterologia
Hospital Maria Pia / CHPorto
174
caso endoscópico
endoscopic case
A criança esteve sempre clinicamente bem, com bom desenvolvimento
psicomotor e crescendo de forma regular
mas sempre ligeiramente abaixo do percentil 5.
Aos 5 anos começou a ter vómitos
frequentes após as refeições, não associados a outros sintomas digestivos, nomeadamente, disfagia, odinofagia dores
abdominais ou alterações do trânsito intestinal. Não apresentava outros sintomas
e manteve a sua evolução ponderal.
O exame objectivo era normal e o
exame abdominal não evidenciava dismorfias, áreas dolorosas ou organomegalias. O estudo analítico realizado, hemograma com plaquetas, VSG e PRC,
função renal e hepáticas, CPK, amílase e
lípase, proteínas e electroforese, ionograma ureia e glicose imunoglobulinas, anti-
Figura 2
corpos para transglutaminase tecidular e
função tiroideia, não revelou alterações.
Foi realizada uma endoscopia digestiva alta durante a qual foi possível
observar as imagens que mostramos nas
figuras 1 e 2, localizadas no terço superior do esófago e das quais foram recolhidas biópsias.
Neste contexto clínico as imagens
que apresentamos sugerem-lhe:
1 – Esofagite eosinofílica
2 – Aspectos em variante do normal
3 – Mucosa gástrica ectópica
4 – Lesão cáustica do esófago.
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
COMENTÁRIOS
As imagens que observamos podem
descrever-se como duas ilhotas de mucosa de forma arredondada, com cerca de
15mm de diâmetro de bordo regular e superfície ligeiramente irregular, levemente
deprimidas, de coloração vermelha mais
viva do que a mucosa adjacente e localizadas em espelho. Deve dizer-se que o
restante exame endoscópico não evidenciou qualquer alteração, nomeadamente
compatível com doença de refluxo gastro-esofágico (DRGE). As biopsias das lesões
em causa mostraram serem constituídas
por mucosa gástrica “tipo corpo”com ligeira actividade inflamatória e sem a presença de Helicobacter pylori (HP).
Estávamos assim perante uma situação de heterotopia de mucosa gástrica
na parte alta do esófago associada a episódios de vómitos. A doente efectuou tratamento com inibidor da secreção ácida
do estômago durante 4 semanas e ficou
sem sintomas.
Não havia quadro clínico, endoscópico e histológico que permitisse suportar
as hipóteses de esofagite eosinofílica ou
lesão de cáustica.
A heterotopia da mucosa gástrica
está descrita com uma frequência variável
entre 2,8 e 10% dos exames endoscópicos altos; pode localizar-se em qualquer
ponto do esófago mas é mais comum na
parte alta próximo do esfíncter esofágico
superior pelo que se designa frequentemente por “Inlet patch”. Apresenta-se
geralmente como pequenas ilhotas isoladas arredondadas, com cerca de 1cm
de dimensão, de cor ligeiramente mais
avermelhada e que podem ser salientadas pela coloração do epitélio pavimentoso pelo lugol. Pode haver lesões múltiplas ou mesmo circunferenciais. São
geralmente achados acidentais mas há
alguns casos descritos de desconforto
faríngeo ou globus que respondem à inibição da secreção ácida e raros casos de
ulceração, hemorragia, estenose, fístula
esófago-traqueal e mesmo adenocarcinoma. O exame histológico mostra qualquer tipo de epitélio gástrico (fúndico, do
corpo ou do antro) e por vezes com a presença de HP.
Conclusão: Heterotopia gástrica
do esófago próximal
ABSTRACT
We present a case of a five-year-old girl observed for vomiting after meals
during the last two months. She had been
evaluated by the age of six months for frequent regurgitation. The upper digestive
tract X -ray and 24 hours pH monitoring
were normal, establishing the diagnosis
of physiologic gastro-esophageal reflux.
At the age of five the patient started
having post-prandial vomiting, without
other digestive or general symptoms.
She had a normal development and normal physical examination and analytical
profile. The upper digestive endoscopy
showed two islets of abnormal red mucosa, with irregular surface, slightly depressed, each measuring about 15mm in
the upper oesophagus, below the sphincter. The histological study of mucosal
biopsies concluded for ectopic gastric
mucosa. The patient became symptoms-free under treatment with PPI (protonpump inhibitiors).
Nascer e Crescer 2010; 19(3): 174-175
BIBLIOGRAFIA
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caso endoscópico
endoscopic case
175
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
Caso Estomatológico
José M. S. Amorim1
Criança de 1 mês de idade que foi
enviada à consulta de Estomatologia devido a tumefacção mandibular, na região
da crista alveolar mediana e que dificultava a amamentação.
Ao exame objectivo a criança
apresenta bom desenvolvimento estato-ponderal.
A nível oral apresentava uma lesão
no rebordo alveolar inferior anterior, com
1 cm de diâmetro, pediculado, com coloração rosada, semelhante à mucosa oral,
superfície lisa e íntegra e de consistência
endurecida (Figura1).
Antecedentes pessoais e familiares
irrelevantes.
Figura 1
__________
1
Serviço de Estomatologia Hospital Maria Pia / CH Porto
176
caso estomatológico
oral pathology case
Face ao descrito:
Qual o seu diagnóstico?
Qual a sua atitude?
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
COMENTÁRIOS
O caso clínico descrito refere-se
a uma epúlide congénita do recém-nascido.
A lesão de células granulares congénita foi descrita por Neumann em 1871,
tendo-a designado por epúlide congénita.
É uma lesão rara mas de fácil diagnóstico uma vez que surge tipicamente
no rebordo alveolar superior do recém-nascido, podendo mais raramente ainda
surgir no rebordo alveolar mandibular.
Manifesta-se como uma massa submucosa, de tamanho variável, geralmente única mas podendo surgir em 10% dos
casos lesões múltiplas, sendo mais predominante no sexo feminino (8 para 1).
O seu aparecimento é esporádico e
não apresenta tendência familiar. É uma
lesão benigna e não há relatos na literatura de recidiva.
Há diversas teorias sobre a origem
histológica desta lesão: mioblástica, neuroblástica, odontoblástica, fibroblástica
ou histiocítica. A hipótese mais consensual é que se trata de um processo degenerativo das células mesenquimais indiferenciadas, que, por sua vez, possuem
capacidade de múltiplas diferenciações.
Histologicamente a epúlide congénita é semelhante ao tumor de células
granulares.
O tratamento é a excisão cirúrgica sob anestesia geral, principalmente
quando, pelas suas dimensões, há comprometimento das funções de amamentação, deglutição e respiração.
sion revealed a congenital epulides of the
newborn.
This is an uncommon lesion, easy to
diagnose, as it has a typical appearance
and localisation. Surgical treatment is the
option, namely when it impairs feeding,
swallowing or breathing.
Keywords: congenital epulides of
the newborn, benign
ABSTRACT
A one month-old girl was referred to
our department due a neoformation of the
mandible. The excisional biopsy of the le-
Angus C Cameron, Richard P Widmer
– Handbook of Pediatric Dentistry,
2008, Mosby, pag 163-5
Nascer e Crescer 2010; 19(3): 176-177
BIBLIOGRAFIA
caso estomatológico
oral pathology case
177
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
Caso Radiológico
Ana Filipe Almeida1, Filipe Macedo2
Adolescente do sexo masculino, 16
anos, enviado ao hospital pelo Centro de
Diagnóstico Pulmonar após realização
de rastreio para tuberculose, em contexto de diagnóstico confirmado no pai.
Tem história de emagrecimento de 5 kg
nos últimos 6 meses, anorexia, astenia e
suores nocturnos há 2 meses, sem contudo referir febre, tosse ou toracalgia. À
auscultação constatou-se ausência dos
sons respiratórios nos 2/3 inferiores do
hemitórax esquerdo. Faz Rx e subsequentemente TC torácica.
Figura 1 - Rx do tórax, face
Figura 3 – TC tórax, janela mediastínica, sem contraste
Figura 2 - TC tórax, janela pulmonar,
sem contraste
__________
1
2
Interna Complementar de Pediatria – CH Alto Ave-EPE
Especialista em Radiodiagnóstico – SMIC, Porto
178
caso radiológico
radiological case
Qual o seu diagnóstico?
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
ACHADOS
O Rx mostra derrame pleural esquerdo quase sem desvio contralateral
do mediastino, devendo pois associar-se
algum componente de atelectasia do parênquima pulmonar adjacente. Sem outras alterações.
As imagens de TC confirmam o
derrame pleural, volumoso, com espessamento dos folhetos pleurais e pequena
consolidação do parênquima pulmonar
adjacente compatível com atelectasia
por compressão. Sem outras alterações
pleuropulmonares ou mediastínicas.
DIAGNÓSTICO
Tuberculose pleural (confirmado em
cultura do líquido pleural e biopsia pleural).
DISCUSSÃO
No caso apresentado, o facto de
haver um familiar com tuberculose diagnosticada com consequente rastreio dos
familiares próximos tornou fácil o diagnostico apesar da ausência de sintomatologia
respiratória. Frequentemente a tuberculose tem uma expressão imagiológica muito
inespecífica, sem a apresentação descrita
classicamente, sendo necessário um alto
grau de suspeita clínica para o diagnóstico
diferencial com outras patologias.
IMAGIOLOGIA
1 - Rx convencional
É o primeiro exame.
Os achados são variados, por vezes muito discretos(1), sendo habituais infiltrados pulmonares inespecíficos. Pode
haver adenomegalias mediastínicas. O
quadro radiográfico clássico de tuberculose está muitas vezes ausente, podendo
nomeadamente não haver diferenças entre a doença primária e a reactivação(2). O
derrame pleural é geralmente unilateral e
pode ser de grande volume, quase sem
consolidações associadas. Pode não haver cavitações visíveis.
2 - Ecografia
Exame indicado para confirmar uma
suspeita clínica ou radiográfica de derrame pleural, permitindo também guiar
toracocenteses.
3 - TC tórax
Permite caracterizar com bastante
mais detalhe os achados radiográficos
avaliando melhor a natureza e extensão
da doença e das suas complicações(3). As
adenomegalias mediastínicas e hilares
têm tipicamente baixa densidade central.
No parênquima podem observar-se consolidações bem ou mal sistematizadas,
cavitações, opacidades lineares e nódulos centrilobulares.
O derrame pleural pode ser a única
manifestação relevante da doença.
4 - RMN tórax
Dá a mesma informação da TC,
sem o inconveniente da radiação ionizante mas devido à longa duração do exame
e necessidade de imobilidade, pode ser
necessário sedação na criança. Por este
facto e pela maior disponibilidade, a TC
continua a ser mais usada.
ABSTRACT
The authors report a case of pleural
tuberculosis in a 15-year-old boy submitted to screening after his father was diagnosed with the disease.
This patient had constitutional symptoms in the last two months (such as significant weight loss, fatigue, anorexia and
night sweats) but no respiratory complains.
The thoracic X-ray complemented by
a CT scan revealed pleural effusion with
minimal pulmonary changes. Pleural fluid
analysis and pleural biopsy confirmed the
diagnosis of pleural tuberculosis.
This case highlights the non specific
clinic and imaging findings in tuberculosis
and the need for a high index of suspicion
to reach the diagnosis.
Keywords: tuberculosis, pleural
effusion
Nascer e Crescer 2010; 19(3): 178-179
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caso radiológico
radiological case
179
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
Genes, Crianças e Pediatras
Anabela Bandeira1, Esmeralda Martins2
Lactente, do sexo masculino, com
16 meses de idade, seguido em consulta
de Doenças Metabólicas no Centro Hospitalar do Porto, desde os 7 meses.
Trata-se de um primeiro filho de um
casal jovem, não consanguíneo. Mãe
com 35 anos, saudável e pai com 27 anos
de idade, saudável. Meio irmão materno
saudável. Sem doenças heredofamiliares
conhecidas.
Dos antecedentes fisiológicos: gravidez vigiada, sem intercorrências. IV G II P,
(dois abortamentos deste casal). Ecogra-
Figura 1
__________
1
2
Assistente Hospitalar de Pediatria
Assistente Hospitalar Graduada de
Pediatria. Centro Hospitalar do Porto
180
genes, crianças e pediatras
genes, children and paediatricians
fias fetais normais. Parto por cesariana
electiva ás 38 semanas. Indice de Apgar
9/10. Somatometria ao nascimento adequada à idade gestacional (peso 2985 g,
P10; comprimento 46,5 cm, P5; perímetro cefálico 33,5 cm, P10).
Realizou rastreio metabólico em D6
de vida que foi normal (TSH 4,2 μU/ml).
Nos primeiros 6 meses de vida foi
detectada má evolução estatural (comprimento no P 5) com peso acima do P95
e perímetro cefálico no P90. Ao exame físico: face em lua cheia, obesidade
Figura 2
Figura 3
troncular, deformidades das mãos e dos
pés (Figura 1-3). Sem outras dismorfias.
Desenvolvimento psico-motor adequado à idade. Analiticamente apresentava
hipotiroidismo primário (TSH 4,88 μUI/
mL; T3 livre 4,6 pg/mL), hipocalcemia
(2,18 mmol/L) e hiperfosfatasemia (2,25
mmol/L) ligeiras e aumento da paratormona (PTH 138,9 pg/mL). Radiografia do
esqueleto sem sinais de displasia óssea.
Cariótipo 46, XY.
Qual o seu diagnóstico?
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
Pseudohipoparatiroidismo tipo Ia
COMENTÁRIOS
O fenótipo descrito, osteodistrofia
hereditária de Albright (OHA) caracteriza-se por face em lua cheia, obesidade, baixa estatura, calcificações subcutâneas (e
também nos rins e cérebro), deformidades
articulares (joelho valgo, coxa vara, cubitus valgus) e braquidactilia (mais frequente nos 4º e 5º dedos). O fenótipo torna-se
cada vez mais evidente com a idade.
O pseudohipoparatiroidismo (PHP)
engloba um grupo heterogéneo de doenças caracterizadas pela resistência periférica a nível do osso e do rim à acção da
paratormona. A resistência à PTH resulta
de um défice específico da sub-unidade
α da proteína estimuladora G(1-7), por
este motivo surge também resistência a
outras hormonas, nomeadamente à hormona estimuladora da tiróide (TSH) e às
gonadotrofinas(1,4).
Analiticamente, caracteriza-se por
hipocalcemia, hiperfosfatasemia e níveis elevados de PTH e hipotiroidismo
primário.
O PHP foi classificado em vários
tipos (Ia, Ib, Ic e II) de acordo com as
manifestações clínicas, os parâmetros
bioquímicos e o mecanismo molecular
subjacente à resistência hormonal(1-4). O
tipo mais frequente é o PHP tipo Ia, transmitido com carácter autossómico dominante, com expressão variável(1-4).
O tratamento do PHP consiste na
correcção do hipotiroidismo com levotiroxina e ultrapassar a resistência periférica
à PTH com calcitriol associado à suplementação com cálcio. Tudo isto permite
a normalização da função tiroidea, a normocalcemia, normofosfatémia e valores
normais de paratormona(1,3).
A resistência à TSH é clinicamente
indistinguível do hipotiroidismo primário
e pode surgir muitos anos antes das manifestações clínicas da OHA e mesmo
da hipocalcemia, levando ao atraso no
diagnóstico, o que não aconteceu com
este caso.
Actualmente com 16 meses de idade, apresenta fenótipo menos marcado
(Figura 4), uma vez que apresenta valores de PTH normais após tratamento
farmacológico.
Realizou RMN cerebral que revelou
macrocrania benigna.
Encontra-se medicado com calcitriol,
suplementos de cálcio e levotiroxina.
ABSTRACT
A 11 month-old-year boy presented
with moon shaped face, limb shortening,
deformity of hands and feets, low stature
with weight on percentile 95, without macrocephaly. Analytically he presented with
hypocalcaemia, hyperphosphatasemia and
high parathormone. The skeleton x-ray
did not show bone dysplasia. The typical
phenotype led to the diagnosis of Osteodistrophy of Albright.
Nascer e Crescer 2010; 19(3): 180-181
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Figura 4
genes, crianças e pediatras
genes, children and paediatricians
181
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
As mães nem sempre
têm boas intenções…
Desde que começámos a especialidade ouvimos repetidamente a frase “As mães
quase sempre têm razão”. Quase …
Em Julho de 2009 o “Zacarias” (chamemos-lhe assim), de 9 anos de idade, foi enviado à Consulta de Reumatologia Pediátrica (CRP) do Hospital Pediátrico de Coimbra
por olho vermelho crónico, bilateral, refractário à medicação tópica ocular (colírios e
pomadas de corticóides e antibióticos) e à medicação oral com prednisolona.
As queixas tinham-se iniciado em Abril de 2007, com blefarite e chalázio bilaterais,
resistentes à terapêutica convencional, que exigiu abordagem cirúrgica em ambas as
pálpebras superiores. Recidivaram pouco tempo depois. Em Junho de 2007, às manifestações anteriores associou-se hiperémia conjuntival crónica, bilateral, acompanhada
de intensa fotofobia. Estas manifestações revelaram-se também refractárias às terapêuticas tópicas.
Em Fevereiro de 2009, numa fase de agravamento, foi-lhe diagnosticada “queratoconjuntivite bilateral complicada de precipitados subepiteliais com neovascularização
corneana”. A biópsia da conjuntiva, realizada em Junho de 2009, revelou “conjuntivite
crónica com exuberância de plasmócitos”. No mesmo tempo operatório, foram realizadas injecção subconjuntival com corticóide, em ambos os olhos, que viria a revelar-se
também ineficazes. Posteriormente iniciou medicação tópica com ciclosporina que viria
a ser interrompida dias depois por intolerância local (intensa fotofobia). A corticoterapia
sistémica entretanto iniciada foi igualmente ineficaz.
Em Julho de 2009, numa abordagem conjunta de Oftalmologia e de Reumatologia
Pediátricas, e na presunção de se poder tratar de “pênfigo ocular”, associou ciclosporina oral na dose de 3,5 mg/kg/dia. Finalmente assistiu-se a uma progressiva melhoria
clínica, mantendo contudo a blefarite crónica e algum grau de hiperémia ocular e de
fotofobia.
Estávamos neste impasse, sem um diagnóstico preciso e sem uma melhoria sustentada…
Em Janeiro de 2010, um dos novos doentes enviados à CRP apresentou manifestações clínicas em tudo sobreponíveis às do “Zacarias”.
A “Epifânia” (nome igualmente suposto), também com 9 anos de idade, foi referenciada à CRP por queratoconjuntivite crónica, com 15 meses de evolução, com uma
evolução crónica com agudizações frequentes e refractária à medicações tópicas instituídas. Nas fases de agravamento apresentava hiperémia ocular, geralmente sem exsudado, intensa fotofobia e já compromisso da acuidade visual (“visão a 20% no olho
direito”). A hiperémia ocular e a fotofobia melhoravam sob corticoterapia tópica, para
recorrerem de imediato após a sua suspensão. Desde o segundo ano de vida que sofria
de hordeólos e chalázios recorrentes.
Pela cronicidade e gravidade das queixas, a criança foi sujeita a uma extensa “peregrinação médica”, com recurso a múltiplas urgências, múltiplas e diferentes consultas
em oftalmologistas - “13 diferentes” (sic) -, pediatras (“vários”), clínicos gerais e um reumatologista, num total de “mais de trinta médicos diferentes” (sic).
Em Janeiro de 2010, na observação conjunta (Reumatologia e Oftalmologia) constatámos blefarite bilateral, hiperémia conjuntival bilateral, bulbar e tarsal, telangiectasias
na margem palpebral, queratite com leucoma e neovascularização inferior da córnea
direita.
182
pequenas histórias
short stories
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
“Glooglámos”. O que não fizemos com o “Zacarias”.
Dois dias depois assumimos o diagnóstico de rosácea ocular complicada de queratoconjuntivite flictenular. Iniciou eritromicina oral (para ser administrada durante muitos
meses) (1) associado ao tratamento tópico dirigido. A boa evolução veio a confirmar o
diagnóstico. Mantém as sequelas da queratite crónica com leucoma no olho direito. Actualmente é seguida exclusivamente em consultas de Oftalmologia Pediátrica.
As manifestações clínicas do “Zacarias” eram semelhantes às da”Epifânia”. Em
Fevereiro de 2010 assumiu-se o mesmo diagnóstico para o “Zacarias”. Suspendeu-se
a ciclosporina oral e iniciou eritromicina (para ser administrada durante vários meses,
quiçá anos) (1).
Inicialmente a resposta parecia ser favorável. Mas eis que volta tudo ao mesmo:
agravamento, melhoria, agravamento, vários contactos telefónicos, antecipação e multiplicação de consultas. Os avanços e recuos levaram, em Junho de 2010, a reiniciar
a prednisolona sistémica e, poucos dias depois, também a ciclosporina sistémica. Os
controlos analíticos apertados, com doseamento sérico da ciclosporina, foram os requisitos subsequentes pela potencial iatrogenia resultante da associação cicloporina e
eritromicina (ambos antibióticos macrólidos). Também sem sucesso.
Nos primeiros dias de Julho, no imediato a um novo contacto telefónico da mãe
para o Oftalmologista assistente, referindo “Está outra vez pior”, foi considerado paradoxal.
Estávamos na pausa matinal do café, num local público. Este momento de relaxe
mental deu a inspiração que faltava: a “Epifânia” fora sujeita a uma peregrinação médica; pelo contrário “Zacarias” mantinha-se fiel ao seu Oftalmologista. Outros doentes, já
teriam pedido outra(s) opinião(ões).
Qual a razão para uma confiança acrítica tão prolongada? “Não bate certo. Interna-se e vamos ver o que acontece”.
Já com o plano instituído, nesse mesmo dia, o Oftalmologista confessou que, desde há várias semanas, recebia mensagens românticas da mãe do “Zacarias” no telemóvel.
A boa evolução no internamento proporcionou que fosse suspensa a corticoterapia
e a ciclosporina sistémicas. O “Zacarias” teve alta 14 dias depois, apenas medicado
com eritromicina oral e tópicos oculares. Passou a ter um novo médico oftalmologista
assistente, agora do sexo feminino.
Em Outubro de 2010 estava assintomático e já quase sem tópicos. Para Dezembro
de 2010 está programada uma redução na dose diária de eritromicina
A descrição da orientação e da evolução deste sindroma de Munchausen-like para
a pedopsiquiatria e pediatria social fogem ao âmbito desta descrição.
Admitimos hoje que a melhoria parcial pelo uso da ciclosporina sistémica se deveu
à sua actividade como antibiótico macrólido.
Na sequência da troca de Oftalmologista, as mensagens recebidas pelo especialista do sexo masculino, inicialmente românticas passaram para um tom mais acusador à
mistura com declarações de encanto. Também aconselhado pelos colegas directamente envolvidos no caso, este colega ignorou toda e qualquer mensagem. Por precaução,
mantém-nas gravadas no seu telemóvel e vai-nos informando das mesmas.
Manuel Salgado1
BIBLIOGRAFIA
__________
1
Consulta de Reumatologia Pediátrica,
HPCoimbra
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Ophthalmol 2006;142:816-21.
pequenas histórias
short stories
183
Cuidados ConƟnuados e
PaliaƟvos
Cursos Pré-Congresso
Suporte de Vida Pediátrico
VenƟlação Não Invasiva
Doenças Infecciosas
Curso Pós-Congresso
Imagiologia Pediátrica
Ginecologia em Pediatria
Contracepção e gravidez
Grande Prematuridade
Abuso e violência sexual
Prematuridade Tardia
Cirurgia de mínimo acesso
Apoio: BIAL
Inscrições e envio de resumos em
hƩp://www.reuniao-cmin-hmp.co.cc
Data Limite - 23 de Outubro de 2010
Organização
Colaboração
Secretariado
Departamento da Infância e da Adolescência
do Centro Hospitalar do Porto
CH Alto Ave, CH Entre Douro e Vouga, CH Médio Ave,
Rua da Boavista, 827 | 4050 Porto
E-mail: [email protected]
Tel.: 925542332 | 226089900 - Ext 3188
Resumo das Intervenções
CH Nordeste, CH Póvoa de Varzim | V. Conde, CH Tâmega e
Sousa, CH Trás-os-Montes e Alto Douro, CH V. Nova de Gaia e
Espinho, Hospital de Braga | Escala Braga, Hospital de S. João,
Hospital Santa Maria Maior (Barcelos), ULS Alto Minho, ULS
Matosinhos, ACeS Gondomar, ACeS Porto Ocidental
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revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
A Nutrição
Helena Ferreira Mansilha1
INTRODUÇÃO
Também em idade pediátrica, a
esperança de vida dos portadores de
numerosas patologias complexas tem
melhorado nas últimas décadas. De facto, tem vindo a assistir-se a um grande
desenvolvimento dos Serviços de Saúde
bem como ao crescimento das estruturas
de suporte comunitário, no âmbito intra e
extra-hospitalar. Recentemente, diversas
técnicas de complexidade variável têm
vindo a ser implantadas no domicílio de
doentes crónicos: oxigenoterapia, ventilação assistida, diálise peritoneal e com
certeza a nutrição artificial.
Em idade pediátrica, a capacidade para vencer a malnutrição é limitada
porque nesta faixa etária as reservas são
escassas e as necessidades nutricionais elevadas. Assim, e ao contrário dos
adultos, as crianças e os adolescentes
necessitam de ser adequadamente nutridos para crescer e atingir o seu máximo
potencial para que estão determinados
geneticamente. Quando estes são portadores de patologia crónica complexa
associada a comprometimento de um
ou vários sistemas de órgãos, o suporte
nutricional especializado e prolongado no
tempo é muitas vezes necessário, contribuindo de forma notável para um melhor
prognóstico. De facto, nas últimas duas
décadas, desenvolvimentos técnicos na
área da nutrição como avanços no design dos tubos e acessos vasculares,
métodos de administração e fórmulas
tornaram o suporte nutricional mais seguro, económico e fácil, possibilitando o
aumento sustentado do número de crianças e adolescentes em “nutrição assis__________
1
Assistente Hospitalar Graduada de Pediatria
do Hospital Maria Pia, CHPorto
tida”, deferidos do ambiente hospitalar.
Assim, para uma vasta gama de patologias da infância e adolescência o suporte
nutricional dos seus portadores, tendo
lugar no domicílio, tem o objectivo de
tendencialmente proporcionar–lhes um
crescimento normal inserido no melhor
ambiente possível, apesar dos constrangimentos inerentes à patologia de base,
bem como a inerentes condicionalismos
familiares(1).
Segundo o Decreto-Lei nº 101/2006,
Cuidados Continuados Integrados serão
um “conjunto de intervenções de saúde
e/ou de apoio social, sequenciais, decorrentes de avaliação conjunta, centrado
na recuperação global entendida como
o processo terapêutico e de apoio social,
activo e contínuo, que visa promover a
autonomia melhorando a funcionalidade
da pessoa em situação de dependência,
através da sua reabilitação, readaptação
e reinserção familiar e social.”
É tema deste trabalho a sua aplicabilidade e pertinência em idade pediátrica, especificamente na área da Nutrição.
QUANDO?
Por um lado, a Nutrição foi considerada como um direito humano básico
expressamente reconhecido pela Convenção dos Direitos Humanos Internacionais, desde 1924(2), embora este direito
seja variavelmente interpretado, apoiado,
respeitado, protegido e promovido dependendo do contextualização política e
sócio-economico-cultural do local geográfico em questão.
Por outro lado, a alta hospitalar não
é apenas considerada quando se pensa
ter sido conseguida a recuperação completa possível do estado de saúde da
criança ou adolescente. De facto, a es-
tabilização da sua situação clínica pode
permitir ponderar a continuação da sua
recuperação e/ou a manutenção do seu
suporte clínico no ambiente familiar ou,
pelo menos, num ambiente de características mais residenciais.
Assim, quando a alta hospitalar possa estar dependente de alguma técnica
de suporte nutricional, sempre que possível, equipas hospitalares especializadas
desta área devem chamar até si a avaliação, caso a caso, da pertinência de orientar o doente para o domicílio ou ambiente
equivalente, e o seu melhor timing (1,3).
COMO?
Os Cuidados Continuados em Pediatria, e em particular na área da Nutrição, deveriam pois ter em conta a relação
e interdependência entre a criança/adolescente, a família e o ambiente que os
contem. Têm como objectivo a promoção
não só da estabilização e/ou recuperação clínicas do doente, mas também da
adaptação psicossocial do doente e família, à sua nova condição.
Assim, os Cuidados Continuados
em Pediatria deveriam ser preferencialmente, e sempre que possível, cuidados
domiciliários. Por razões diversas, estes
cuidados poderão também ser cuidados
prestados num regime especial de internamento em unidades de pequenas dimensões (4-6 camas), caracterizado pela
criação de um ambiente residencial, em
que a presença dos cuidadores a tempo
inteiro (24h/dia) é promovida e desejada.
Estas unidades deveriam estar dotadas
de todos os meios técnicos e humanos
necessários, bem como de outros serviços coadjuvantes que possam ser úteis.
Após o preenchimento dos critérios
médicos de indicação para Nutrição Assistida extra-hospitalar, a sua programa-
cuidados continuados pediátricos – abordagem multidisciplinar
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
S 185
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
ção deve começar pela avaliação prévia
cuidadosa do contexto sócio-económico
e familiar em que a criança/ adolescente
está inserido. Devem ser analisados a estrutura familiar e seu ambiente psicosocial
bem como recursos materiais e humanos,
como sejam as características da sua habitação (condições sanitárias, dimensões
e acessibilidades), fontes de rendimento,
logística da ocupação profissional dos
pais, etc. A etnia, a estrutura familiar, o
nível educacional e a localização geográfica da residência variam entre famílias e
é crucial um bom entendimento desta dinâmica familiar. Por essas necessidades
diferirem, os cuidados domiciliários devem
ser desenhados de acordo com as necessidades individuais de cada caso.
Relativamente ao enquadramento
legal em Portugal, o programa de Nutrição Artificial Domiciliária está regulamentada na Circular Normativa nº 1/2006 ARS
Norte de 24/02/2006. Esta prevê o apoio
logístico à família, bem como a articulação do Hospital com o Centro de Saúde
da área de residência, com o objectivo de
distribuir responsabilidades, tarefas e fornecimento de materiais.
A preparação técnica dos pais/
cuidadores e doentes (faixas etárias de
maior idade) deverá ser estruturada e feita em meio hospitalar. A curva de aprendizagem deve ser orientada e monitorizada
pela equipa de suporte nutricional hospitalar, em que elementos de enfermagem
experientes nesta área são uma grande
mais-valia. Contempla 3 fases:
1. Observação: familiarização com a
técnica e o material, podendo ser
usados meios audiovisuais.
2. Acção: ensino de regras de assepsia,
aquisição de skills na manipulação de
cateteres e bombas perfusoras (imprescindíveis nas crianças), reconhecimento dos problemas técnicos mais
comuns e saber como solucioná-los
e ainda o reconhecimento precoce
das complicações infecciosas (febre
e outros sinais de gravidade clínica).
Podem ser usados modelos para treinar as técnicas.
3. Simulação: todas as tarefas são
executadas pelos pais como se estivessem em casa, embora ainda em
meio hospitalar.
À data de alta deverá ser sempre
fornecido à família um dossier com informação escrita personalizada, quer de
procedimentos médicos, quer de procedimentos de enfermagem, que serão guias
de orientação para os pais. Além disso,
a criança/adolescente deve ser sempre
acompanhado de um relatório clínico pormenorizado. À família deverão ser sempre disponibilizados canais privilegiados
de comunicação, nomeadamente através
de contacto telefónico permanente médico e de enfermagem com a equipa de
suporte nutricional, bem como o acesso
directo ao Serviço de Urgência da instituição hospitalar em causa.
Devem ainda ser também agilizados
os canais e as condições ideais de transporte de produtos nutricionais e outros
materiais, de modo a assegurar o seu
fornecimento no domicílio, nas melhores
condições e atempadamente.
Não será de mais realçar que, o
investimento na formação/treino das famílias/cuidadores destas crianças que
passará pelo maior desenvolvimento do
apoio hospitalar domiciliário, bem como
a cooperação com os cuidados de saúde
primários, com as escolas e o serviço social local poderão fazer a diferença entre
a hospitalização prolongada e a integração da criança/ adolescente no seu ambiente “natural”, com todas as vantagens
que possam daí advir. Este papel cabe à
Equipa Multidisciplinar Hospitalar de Suporte Nutricional.
Assim, ainda nesta década, um documento de peritos do Conselho da Europa trouxe a público os grandes défices
nos cuidados nutricionais nos hospitais
europeus e providenciou recomendações
para melhorar a situação, que incluíram
a implementação de Equipas de Suporte
Nutricional(4). O principal objectivo destas equipas deveria ser a promoção da
optimização nutricional a todos os doentes, especialmente em casos de necessidade de nutrição enteral ou parenteral,
nomeadamente a sua planificação para
a sua realização no domicílio, quando
prolongada. Posteriormente, o comité de
Nutrição da ESPGHAN abraçou estas
recomendações, publicando sugestões
para a implementação dessas equipas
em unidades hospitalares pediátricas(3).
cuidados continuados pediátricos – abordagem multidisciplinar
S 186
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
De facto, a título de exemplo, outros
trabalhos têm documentado a influência
definitiva da experiência dos clínicos na
melhoria dos resultados obtidos em Nutrição domiciliária(3,5,6-8).
A constituição destas equipas varia
consoante o tipo de instituição, os objectivos a que se propõem e a disponibilidade
dos seus elementos(3). Podem incluir as
seguintes valências/competências:
• Pediatria – Ao(s) pediatra(s) com
experiência em nutrição pediátrica
compete a coordenação da equipa,
a apreciação e colocação da indicação de suporte nutricional no domicílio e a realização da prescrição3.
São também suas funções o seguimento clínico: avaliação clínico-analítica periódica. São ainda responsáveis pela articulação com os
serviços de saúde locais.
• Cirurgia Pediátrica - Gestão da
política de acessos vasculares centrais de longa duração: escolha do
mais adequado, colocação e manutenção. Acompanhamento clínico
de eventual patologia cirúrgica de
base.
• Pedopsiquiatria - Contributo na
avaliação e apoio continuado da família e criança/adolescente.
• Enfermagem – Enfermeiro (s) com
experiência nesta área asseguram
a formação e avaliação da competência técnica dos cuidadores (em
meio hospitalar); atestam as condições de habitabilidade e adequação
à instalação domiciliária do suporte
nutricional, em visitas ao local. São
suas funções ainda, a gestão do
fornecimento do material consumível bem como a articulação com os
serviços de saúde locais, com os
seus pares.
• Nutricionistas/Dietistas – podem
ajudar na avaliação dos aportes,
aconselhar na optimização da nutrição e participar no treino da família
para casa.
• Farmácia - Deve assegurar o fornecimento nas melhores condições
dos produtos nutricionais, nomeadamente ser responsável pela
produção das bolsas de nutrição
parentérica e seu controlo de qua-
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
lidade (estabilidade da mistura dos
nutrientes, controlo microbiológico,
cálculo das quantidades desperdiçadas decorrentes da sangria dos
sistemas). Neste grupo etário, é habitual a necessidade de fabrico de
bolsas personalizadas(9,10).
• Assistência Social - Contributo na
avaliação dos recursos económicos
e das condições de habitabilidade
da família.
• Secretariado/Coordenador de dados – possibilitam a assessoria administrativa.
PORQUÊ?
Embora o suporte nutricional não
seja a maioria das vezes o tratamento da
doença, é muitas vezes o tratamento da
complicação da doença, estando intimamente ligado a um melhor prognóstico.
Em idade pediátrica, a recuperação nutricional (autonomia nutricional) podem ser
muito mais prolongados que nos adultos,
tendo em conta as elevadas necessidades por quiilograma de peso, de uma
criança em crescimento. De facto, segundo dados recentes, a duração média
de nutrição parentérica domiciliária em
França foi de 2,6 anos e, em 22% parece
ser definitiva a necessidade desse tratamento(11).
A relação custo-benefício da nutrição enteral domiciliária avaliada por equipas de suporte nutricional parece ser indubitavelmente favorável, bem como esta
relação se parece fazer acompanhar, por
uma franca melhoria na qualidade dos
cuidados(12). O mesmo se passa relativamente à nutrição parentérica domiciliária
que, sendo uma terapia dispendiosa,
parece ter uma franca relação favorável
custo/benefício quando comparada com
a nutrição parentérica em meio hospitalar(13,14). Trabalhos publicados têm apontado para redução dos custos na ordem
dos 30-60%(11,15).
Embora possa ser perspectivado
que a incidência das complicações do
suporte nutricional realizado em meio
hospitalar seja sobreponível às complicações do suporte nutricional realizado no
domicílio, em idade pediátrica, a sépsis
relacionada com cateter nos doentes em
nutrição parentérica domiciliária é menor
que nas crianças hospitalizadas(16-18), embora, mesmo assim, esta seja a complicação mais frequente da nutrição parentérica domiciliária.
Estudos de qualidade de vida que
incluem parâmetros emocionais, sociais,
ocupacionais e físicos têm vindo a demonstrar que o apoio de peritos à criança
e família (equipas de suporte nutricional
especializadas) reduz a depressão e melhora a qualidade de vida. De facto, uma
forte auto-estima do doente bem como
um bom suporte familiar é fundamental
para a gestão de dificuldades emergentes
como a perda de emprego, perda de rendimentos e enfraquecimento das relações
sociais que ocorrem muitas vezes com o
início da nutrição domiciliária(17,19-21).
As maiores séries publicadas de
nutrição parentérica domiciliária registam
uma duração média de 2 anos com uma
duração máxima de 15 anos. Estas crianças/adolescentes têm taxas de sobrevida
melhores e maior probabilidade de conseguir o desmame para a nutrição enteral
total (cerca de 50%) que os mais velhos(9).
Assim, surge por vezes a necessidade de
realizar nutrição parentérica prolongada
para substituir um eixo digestivo ausente
ou funcionalmente insuficiente.
COMENTÁRIOS FINAIS
O sucesso do suporte nutricional
domiciliário ou equivalente, no âmbito
da prestação de cuidados continuados
em idade pediátrica, dependerá da cumplicidade entre a família/cuidadores e a
equipa multidisciplinar, sendo crucial um
programa bem organizado de formação,
um plano de alta cuidado e sobretudo o
suporte sustentado ao longo do tempo,
no sentido de assegurar uma assistência
nutricional eficaz.
De facto, a criança deve assumir o
estilo de vida mais normal possível, tendo
em conta a idade (ex: ir à escola, relação
com os pares, actividades desportivas, ir
de férias), podendo ser o suporte nutricional domiciliário indispensável à autonomia terapêutica da família.
No entanto, a interferência com a
qualidade da família é incontornável.
Será sempre necessário um reajustamento familiar em maior ou menor grau
que poderá passar pela reinserção familiar da criança, por modificação das actividades profissionais dos pais, seus estilos de vida e suas relações sociais. Mais
uma vez o apoio e assistência técnica da
equipa multidisciplinar pode ser crucial
para minimizar os danos.
Em suma, o suporte nutricional domiciliário poderá contribuir para que a
doença seja remetida para segundo plano na vida da criança/adolescente e sua
família, fazendo-a sentir-se mais normal,
pelo menos durante alguns períodos do
seu quotidiano, melhorando as expectativas da criança e da família, sob as melhores condições psicoafectivas..
Nascer e Crescer 2010; 19(3): S185-S188
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NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
Reabilitação
Rosa Amorim1
INTRODUÇÃO
A Medicina Física e de Reabilitação
(MFR) é reconhecida como especialidade médica desde há cerca de 60 anos,
tendo o seu crescimento sido impulsionado pela II Guerra Mundial, com o elevado
número de jovens mutilados a necessitar
de cuidados. O mesmo se passou em
Portugal durante a Guerra Colonial.
Trata-se de uma especialidade
com uma visão holística do indivíduo
e que tem por objectivo o desenvolvimento do seu potencial funcional e a
sua reintegração familiar, profissional e
social, tendo em conta a sua deficiência e as limitações ambientais.
Ao longo do tempo a MFR tem
vindo a evoluir de acordo com as mudanças da sociedade em que vivemos.
Assim, actualmente o seu âmbito não
se limita aos grandes traumatizados da
guerra mas estende-se a áreas mais
específicas, como a reabilitação neurológica, cardíaca, reumatológica, pneumológica e pediátrica, entre outras.
A Reabilitação Pediátrica tem como
principais objectivos a habilitação/reabilitação da criança com deficiência. A sua
actividade é efectuada por uma equipa
multidisciplinar que integra diversos profissionais e que deve ser coordenada
por um médico fisiatra. Todo o trabalho
dessa equipe é centrado na criança e na
família, e deve ter em conta as características e especificidades próprias da
criança e do seu desenvolvimento.
CUIDADOS CONTINUADOS
Definem-se como os cuidados de
convalescença, recuperação e rein__________
1
Assistente Graduada de Medicina Física e
Reabilitação, S. Fisiatria, CHPorto, HMPia
tegração de pessoas em situação de
dependência, e destinam-se a pessoas
de todas as idades com dependência
funcional, doença crónica ou doença
incurável em estado avançado (portal
da saúde www.portaldasaude.pt).
Podem ser prestados em Unidades de internamento – curta, média
e longa duração –, Unidades de ambulatório e equipas domiciliárias, e
estão organizados na Rede Nacional
de Cuidados Continuados Integrados
(RNCCI).
A necessidade de cuidados continuados na criança e no adolescente
tem vindo a aumentar na medida em
que a taxa de sobrevivência nas situações crónicas e incapacitantes, congénitas ou adquiridas, se elevou de forma
significativa. Doentes que há alguns
anos não ultrapassavam a infância,
chegam agora à adolescência e à idade
adulta colocando novas questões tanto
a nível de cuidados de saúde como de
integração sócio-familiar.
INCAPACIDADE NA CRIANÇA
Nos últimos anos a classificação
de incapacidade sofreu uma alteração
significativa – até 2002 o conceito de
incapacidade dependia apenas da deficiência do indivíduo e todo o processo de reabilitação era centrado neste;
após a aprovação da Classificação
Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF) o conceito de
incapacidade passou a depender também do impacto das barreiras do ambiente nas actividades da pessoa com
deficiência. A incapacidade na criança
é assim definida como a redução crónica na capacidade de participar nas
actividades normais das crianças com
a mesma idade.
CAUSAS MAIS FREQUENTES DE
INCAPACIDADE NA CRIANÇA E NO
ADOLESCENTE
Congénitas
Paralisia Cerebral
Spina Bífida
Doenças neuromusculares
Síndromes genéticos
Doenças metabólicas
Paralisia obstétrica do Plexo Braquial
Adquiridas
Traumatismo Craneo-encefálico (TCE)
Traumatismo Vértebro-medular (TVM)
Infecções de SNC
Patologia tumoral do SNC
AVC
Artrite Crónica Juvenil
Todas estas situações podem originar quadros com limitação funcional
a vários níveis – motor, sensorial, de
comunicação/ linguagem, cognitivo –
com repercussão nas actividades da
vida diária da criança e no seu grau de
dependência.
Embora haja necessidades específicas relacionadas com cada uma das
patologias em questão, o seguimento
da criança com deficiência grave tem
muitos pontos comuns e vários problemas idênticos podem ser encontrados
em casos com diagnósticos diversos.
PROBLEMAS COMUNS
Contracturas
A prevenção das contracturas
músculo-esqueléticas é fundamental e
básica em qualquer programa de reabilitação. Elas surgem pela imobilidade
associada à deficiência motora e levam
a alterações estruturais tanto do músculo contracturado como das articulações envolvidas, com o aparecimento
cuidados continuados pediátricos – abordagem multidisciplinar
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
S 189
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
de fibrose e dor. Podem ser mais graves em algumas patologias neurológicas, como nas doenças neuromusculares, devido ao desequilíbrio muscular
entre agonista/antagonista.
A mobilização passiva ou activa-assistida, conforme a situação do doente, e o estiramento do músculo(s) em risco de contracturar devem ser efectuados
regularmente, assim como a utilização
de ajudas técnicas como ortóteses adaptadas aos segmentos que queremos posicionar (exemplo: ortóteses para posicionamento das tíbio-társicas a 90º para
evitar a postura em equinovaro).
Espasticidade
Define-se como resistência ao estiramento dependente da velocidade
com que este é executado, ou seja, há
um aumento da resistência do músculo ao seu alongamento se elevarmos a
velocidade desse movimento de alongamento (hipertonia em”navalha de
ponta e mola”). Faz parte do síndrome
do primeiro neurónio motor e associa-se a hiperreflexia.
É frequente em várias patologias
neurológicas que condicionam deficiência motora na criança, como a paralisia
cerebral, TCE, lesões medulares ou outras patologias que envolvam o SNC.
Pode dar origem as espasmos dolorosos, contracturas e deformidades,
e interferir a nível da marcha e nos cuidados de higiene.
No entanto a espasticidade pode
trazer alguns benefícios, por exemplo,
a nível circulatório, impedindo o aparecimento de quadros de trombose venosa profunda, frequente em doentes
paralizados, diminuindo o risco de osteoporose e, em alguns casos, permitindo a marcha ou a verticalização pela
hipertonia dos membros inferiores.
Portanto todos estes factores devem ser ponderados antes de se iniciar
o tratamento.
O tratamento da espasticidade
tem várias vertentes que podem ser
utilizadas em conjunto:
• Técnicas de estiramento muscular
• Ortóteses e gessos
• Tratamento farmacológico
• Bomba de baclofeno
• Rizotomia
• Toxina botulínica
Problemas vertebrais
As deformidades do ráquis são
frequentes em crianças e adolescentes
com deficiência motora, principalmente a escoliose, quase inevitável nas
que deambulam em cadeira de rodas.
A progressão da escoliose deve-se a
vários factores, como o desequilíbrio
muscular, a postura, factores biomecânicos e estruturais.
O seu seguimento faz-se com controlo radiológico seriado, principalmente nas fases de crescimento rápido.
As ortóteses tóraco- lombares podem ser usadas criteriosamente, nas
curvas entre os 20 e os 40 graus, desde que não agravem a função pulmonar, que nestes doentes está já muitas
vezes diminuída. É importante ter a
noção de que as ortóteses de tronco,
os chamados coletes, não impedem a
progressão da escoliose mas apenas
atenuam a sua progressão.
Nas curvas acima dos 30/40 graus
é recomendado tratamento cirúrgico.
A hipercifose é também frequente
e deve ser tratada tanto com ortóteses
cérvico-toraco-lombares como, nos casos mais graves, com cirurgia.
Na prevenção destas deformidades vertebrais é fundamental o cuidado
no posicionamento dos doentes, principalmente quando a falta de mobilidade
é mais grave. Existem modelos diversos de sistemas de posicionamento
de tronco que devem ser adaptados a
cada caso e nas várias etapas do crescimento.
Úlceras de pressão
São frequentes sempre que há
diminuição da mobilidade e principalmente quando há alteração da sensibilidade, como em vários quadros
neurológicos – spina bífida ou lesão
medular traumática. Nestes últimos
surgem lesões por vezes muito graves,
com atingimento de várias camadas
até ao plano ósseo e que necessitam
de várias intervenções cirúrgicas e de
longos períodos de imobilidade para a
sua recuperação.
cuidados continuados pediátricos – abordagem multidisciplinar
S 190
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
É, então, fundamental investir na
prevenção destas lesões, evitando as
posturas prolongadas, vigiando a pele
em zonas mais susceptíveis, como proeminências ósseas, zonas de fricção
por fralda ou ortóteses, que podem não
estar adequadas devido ao crescimento da criança.
Também é importante a exposição
a produtos irritantes, como urina, fezes
ou suor, e o estado nutricional da criança. Este, por sua vez, é agravado pela
perda de nutrientes através da ferida.
No tratamento, para além da eliminação da causa da pressão na pele e
da limpeza e tratamento da ferida, promovendo a cicatrização e impedindo a
infecção, é necessário manter um bom
aporte nutricional e manter a zona da
fralda limpa, uma vez que grande parte
destas lesões surgem nas regiões sagrada e anca.
Osteoporose
A osteoporose na criança é ainda
frequentemente ignorada, principalmente se associada a deficiência motora.
A imobilidade condicionada pela
incapacidade, principalmente a incapacidade de marcha, é o principal factor
para a osteopenia na criança, muitas
vezes agravada pela própria doença
(má nutrição, fraqueza muscular, medicação anti-epiléptica, corticoesteroides).
Trata-se de uma forma de osteoporose secundária que atinge preferencialmente os ossos longos dos membros e menos as vértebras.
São frequentes as fracturas com
traumatismos minor e que muitas vezes passam despercebidas, mais nos
quadros com défice sensitivo.
Os critérios de diagnóstico da osteoporose na criança são necessariamente diferentes dos do adulto, uma
vez que na sua avaliação não podemos
falar de um pico de massa óssea, valor
de densidade mineral óssea utilizado
no score T na Densitometria Óssea. A
criança não atingiu esse pico e por isso
a avaliação é feita pelo score Z, valor de
densidade mineral óssea comparada
com indivíduos do mesmo sexo e idade.
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
No entanto as unidades utilizadas são
g/cm2, que é uma unidade de área. Na
criança seria desejável que o valor da
DMO fosse dado em função do peso.
A existência de deformidades,
principalmente a nível do colo do fémur, pode condicionar a avaliação da
DMO. Nos doentes com paralisia cerebral grave pode ser preferível medir a
DMO na extremidade distal do fémur.
Sempre que há factores de risco
de osteoporose é necessário apostar
na sua prevenção.
As medidas preventivas mais importantes são:
• Bom estado nutricional
• Aporte adequado de cálcio e vitamina D
• Diminuir a imobilidade, instituindo um programa de exercícios no
sentido de estimular a contracção
muscular activa, sempre que possível, e de preferência nos músculos antigravídicos
• Promover o ortostastismo pelo
maior período de tempo possível,
fundamental para o aumento da
DMO; existem equipamentos para
verticalização nas crianças que não
têm essa capacidade, como o plano inclinado e o standing-frame.
O tratamento farmacológico da
osteoporose está muito direccionado
para o adulto, principalmente para a
pós-menopausa. São raros os estudos
aplicados à criança com incapacidade
motora.
Os estudos sobre o uso de bifosfonatos na criança são sobretudo feitos
na Osteogénese Imperfecta, sendo o
Pamidronato o mais utilizado. Há já alguns estudos com o alendronato.
Actualmente ainda não se sabe
qual o impacto destas drogas no osso
em crescimento, uma vez que têm efeito na remodelação óssea e na cartilagem de crescimento. O seu uso baseado apenas em dados densitométricos
não está aconselhado.
Dor
É hoje consensual que a dor, principalmente a dor crónica, em idade pediátrica é subdiagnosticada e por isso
não tratada em muitas situações. Na
criança com incapacidade esta realidade torna-se mais grave.
Existem ainda vários mitos sobre
a dor na criança:
• O SNC do recém-nascido ou na
criança com deficiência cognitiva
é demasiado imaturo para sentir
dor
• As crianças com deficiência não
têm uma percepção de dor igual à
das crianças “normais”
• Se a criança não se queixa é porque não tem dor
• As crianças exageram nas queixas para chamar a atenção
• As drogas utilizadas no tratamento da dor têm efeitos secundários
irreversíveis no cérebro imaturo
Estes mitos têm sido desmentidos
pela investigação recente.
Existem estudos que mostram
que quanto mais imaturo é o SNC mais
intensa é a sensação dolorosa e de
que a criança com deficiência de causa
neurológica tem maior sensibilidade à
dor do que outra criança sem patologia
neurológica, pela imaturidade e desorganização do seu SNC.
Sabemos que, tanto na criança
pequena como naquela com deficiência profunda, a verbalização da dor
não é possível, sendo necessário estar
atento a sinais fisiológicos (frequência
cardíaca e respiratória, tensão arterial),
expressão motora (expressão facial,
motricidade grosseira), alterações do
comportamento (agitação, irritabilidade) e da participação nas actividades
diárias. Existem diversas escalas para
avaliação da intensidade da dor nestes
doentes.
O tratamento deve ser multidisciplinar, efectuado por equipas com formação específica em dor pediátrica. Uma
das principais dificuldades actuais reside
no facto de muitas das terapêuticas utilizadas serem extrapoladas do adulto.
São necessários mais estudos
orientados para a investigação da dor
crónica pediátrica.
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Nascer e Crescer 2010; 19(3): S189-S191
cuidados continuados pediátricos – abordagem multidisciplinar
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
S 191
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
O Papel da Comunidade
Maria José Ribas1, Carla Ferraz1
INTRODUÇÃO
A doença crónica e a morte de uma
criança constituem dois dos maiores desafios que a família e os profissionais de
saúde podem enfrentar e podem causar
um efeito devastador.
A descoberta de uma doença crónica na criança provoca um abalo muito
maior do que no adulto, já que é na criança que a família projecta muitos dos seus
sonhos e expectativas. Com a descoberta da doença crónica ou terminal, nasce
o sentimento de fragilidade, preocupação
constante, culpa e mesmo medo de não
deixar marcas para o futuro, seguidos
da sobrecarga gerada pela dependência
contínua de atenção para a viabilização
dos cuidados à criança doente.(1) A doença crónica impõe modificações na vida do
doente e da família, exigindo readaptações frente à nova situação e estratégias
para a combater. Esse processo depende
da complexidade e gravidade da doença
e, além disso, da fase em que a família
se encontra e das estruturas disponíveis
para satisfazer as suas necessidades e
readquirir o equilíbrio.
O aumento do número de crianças
que sobrevivem com problemas de saúde que requerem cuidados continuados
e/ou paliativos obriga-nos a uma reflexão
sobre o papel dos cuidados que podem
ser prestados na comunidade, fora do
hospital, se possível na casa e com a família da criança.
No entanto, e apesar da importância crescente deste problema, os cuidados paliativos e continuados pediátricos
na comunidade não têm sido tidos como
uma prioridade nas políticas da saúde. O
termo cuidados paliativos nasceu dos cuidados oncológicos a doentes terminais
e este viés reflecte-se na ausência de
oferta desses cuidados de forma generalizada e consistente a crianças não necessariamente do foro oncológico. Com
__________
1
Conselho Clínico do ACES Porto Ocidental
demasiada frequência, estas crianças e
suas famílias não chegam a ter cuidados
consistentes e continuados que incluam
as suas necessidades físicas, psicológicas e espirituais.(2,3)
O acesso a cuidados paliativos está
amplamente reconhecido como um direito para os adultos e idosos, mas em
idades pediátricas o reconhecimento e
proliferação de cuidados paliativos específicos está ainda numa fase incipiente e
os serviços actualmente disponíveis estão fragmentados.(4) Independentemente
da sua idade, estas crianças, que não
são “pequenos adultos”, sofrem de todos
os aspectos clínicos, psicológicos, emocionais e espirituais da doença crónica e
incurável, seja a morte um acontecimento
a curto, médio ou longo prazo.(5)
O PESO DO PROBLEMA
A programação de cuidados na comunidade requer a identificação rigorosa
do número de crianças que deles necessitam, bem como a caracterização das
patologias e necessidades.
Uma condição essencial para o planeamento de estratégias para os cuidados no domicílio é a clarificação dos conceitos de “condições limitadoras da vida”
e “condições ameaçadoras da vida”.
“Condições que limitam a vida” são
aquelas para as quais não há razoável
esperança de cura e em consequência
das quais as crianças ou jovens morrerão. Algumas destas condições causam
progressiva deterioração, levando a
criança a dependência importante dos
pais e cuidadores.
“Condições que ameaçam a vida”
são aquelas para as quais há tratamento curativo disponível, mas que pode falhar, tais como para crianças com cancro.
Crianças em remissão por longos períodos, ou com tratamento curativo bem sucedido não são incluídas neste grupo.(6)
A Association for Children with Life-threatening or Terminal Conditions and
their Families e o Royal College of Pae-
cuidados paliativos e continuados pediátricos – presente e futuro
S 192
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
diatrics and Child Health inglês identificaram quatro grandes grupos de doentes
que em algum momento virão a manifestar necessidade de cuidados paliativos
(Quadro 1).(7) Este agrupamento é uma
ferramenta útil para a antecipação das necessidades e programação dos cuidados.
OS CUIDADOS NA COMUNIDADE
Os cuidados continuados e paliativos pediátricos exigem uma abordagem
multidisciplinar e transversal a várias áreas, incluindo a saúde, o serviço social e
a educação, o nível de cuidados hospitalares e da comunidade, a intervenção
de cuidados altamente tecnológicos ou
de suporte.
Este processo deve ser integrado
desde o momento do diagnóstico até à
morte da criança, numa rede de alta acessibilidade, intercomunicação e cooperação entre os profissionais envolvidos.
Como os cuidados são prestados
muitas vezes e em paralelo por várias
especialidades é necessária uma coordenação nas visitas programadas,
testes e procedimentos, bem como nos
tratamentos. Por vezes são necessários
cuidados especiais como aspiração, posicionamento, medicação, técnicas de
alimentação, tratamentos respiratórios,
fisioterapia e reabilitação. O equipamento
necessário, habitualmente usado apenas
em meio hospitalar, passa a ser lugar-comum em casa, como os monitores,
oxigénio, ventiladores, dispositivos para
posicionamento ou marcha, bombas infusoras, aspiradores de secreções, etc.
Por outro lado, as necessidades de
uma família com uma criança cronicamente doente não são as esperadas numa
família sem doença. Questões como a
educação, a vida social, os cuidados aos
irmãos, o relacionamento do casal, a organização espacial da casa ou os horários
têm de ser reorganizadas em torno das
necessidades da criança, esvaziando por
vezes os restantes elementos da família
do seu espaço e tempo privados.(8)
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
Uma das especificidades que diferencia os cuidados continuados e paliativos pediátricos dos adultos é a intensa
participação e dependência da família
nesses cuidados e o tempo de relacionamento desta com a equipa, que pode
ser de muitos anos. A avaliação da família
torna-se, pois, um instrumento essencial
para a programação dos cuidados e deve
incluir a sua composição, capacidades,
funcionamento, relacionamentos, padrões
de comunicação e recursos (Quadro 2).
Mas, quem deve prestar estes cuidados, e quando, como e onde devem
ser prestados?
A importância da família tem como
consequência frequente a transferência
de competências técnicas dos serviços
de saúde para os familiares, para as
quais estes não tiveram formação. Mesmo quando o cuidador é um profissional
de saúde, deve ser encarado como um
elemento da família, mas não deve ser
um elemento técnico na equipa de cuidados.
Temos a responsabilidade de estabelecer políticas e programas nacionais
de cuidados paliativos e continuados pediátricos que incluam uma abordagem
abrangente e baseada na comunidade,
sempre que possível. Estas políticas devem assegurar:
- que o programa de cuidados paliativos pediátricos faz parte do Plano
Nacional de Saúde;
- que o programa inclui o tratamento
e controle de sintomas, o apoio psicológico, social, educacional, físico
e emocional à criança e família;
- que as equipas de cuidados têm os
meios humanos e materiais necessários para o exercício destes programas;
- que os profissionais de saúde têm
um treino adequado e actualização
constante em cuidados paliativos e
controle da dor;
- que os programas incluem suporte
hospitalar especializado em situações que dele necessitam;
- que existem meios de controle da
dor eficazes à disposição dos profissionais e famílias, não sendo aceitável que haja doentes abaixo do nível
de controle de dor.
A reconfiguração dos Cuidados de
Saúde Primários com a criação dos Agrupamentos de Centros de Saúde (ACES)
veio trazer uma mais-valia importante aos
cuidados na comunidade, com a criação
Quadro 1 – Categorias de doentes com condições limitadoras da vida
Grupo 1
Crianças que apresentam condições potencialmente curativas e que podem beneficiar bastante
com o tratamento, mas a evolução dessas doenças pode solicitar intervenções paliativas em
paralelo ou, dependendo do estadio da doença, estas podem tornar-se a necessidade principal.
São exemplo crianças com insuficiência cardíaca, hepática ou renal.
Não são incluídas aqui as crianças em seguimento por longos períodos (remissão de cancro) ou
em recuperação de tratamento bem-sucedido (septicemia).
Grupo 2
Crianças com condições crónicas de carácter progressivo para as quais o uso de tecnologia
como, por exemplo, o uso de suporte ventilatório, pode prolongar as suas vidas por longos
períodos. Neste grupo inserem-se as doenças neurológicas, as doenças pulmonares crónicas e
a SIDA. Para crianças com estas doenças pode-se construir um modelo misto de intervenções,
ora com maior ênfase no modelo curativo, ora com maior ênfase no modelo paliativo, o qual
tende a ser prolongado, muitas vezes durante anos.
Grupo 3
Crianças com condições que limitam a vida por muitos anos e para as quais não há tratamento
curativo, pelo menos até ao presente estadio de desenvolvimento médico científico. São exemplos as mucopolissacaridoses, a distrofia muscular e as doenças neurodegenerativas, como a
doença de Batten. Para tais crianças, o objectivo primário deveria ser o de oferecer cuidados
paliativos.
Grupo 4
Crianças com condições severas, irreversíveis e não progressivas como, por exemplo, paralisia
cerebral e sequelas por lesões medulares, e que, não apresentando uma condição terminal
podem apresentar complicações que as levem rapidamente à morte. Em tais situações, o tratamento com tecnologia pode ser benéfico, mas muitas vezes pode ser necessária a implementação de tratamento paliativo. O uso de uma ou de outra estratégia vai depender das expectativas
da família e da construção com a família do melhor modelo para aquele caso específico.
Association for Children with Life-threatening or Terminal Conditions and their Families / Royal College of Paediatrics and Child Health, 2003.
da Unidades de Cuidados na Comunidade e as Unidades de Recursos Assistenciais Partilhados.
As Unidades de Cuidados na Comunidade (UCC) têm como função prestar
cuidados de saúde e apoio psicológico e
social de âmbito domiciliário e comunitário, especialmente às pessoas, famílias
e grupos mais vulneráveis, em situação
de maior risco ou dependência física e
funcional ou doença que requeira acompanhamento próximo, e actuar ainda na
educação para a saúde, na integração em
redes de apoio à família e na implementação de unidades móveis de intervenção(9).
A equipa é composta por enfermeiros,
assistentes sociais, médicos, psicólogos,
nutricionistas, fisioterapeutas, terapeutas
da fala e outros profissionais, consoante as necessidades e a disponibilidade
de recursos. O ACES participa, através
da UCC, na Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados, integrando a equipa coordenadora local. À UCC
compete constituir a equipa de cuidados
continuados integrados, prevista no Decreto–Lei n.º 101/2006, de 6 de Junho. No
entanto, estas equipas não incluem cuidados continuados a crianças nem sequer a
possibilidade de referenciação.
Quadro 2 – Componentes da Avaliação
Familiar
Composição da família
Membros
Papéis
Crenças e valores
Capacidades parentais
História dos pais, experiências de infância
Capacidades para cuidar (físicas e psicossociais)
Disciplina
Mecanismos de funcionamento
Tomada de decisão
Distribuição de responsabilidades
Relacionamento emocional
Disponibilidade de recursos
Recursos económicos
Suporte social
Suporte emocional
Padrões de comunicação
Padrões de coping: resposta a crise/stress
Ambiente
Segurança estrutural
Adequação da estimulação
As Unidades de Recursos Assistenciais Partilhados prestam serviços de
consultoria e assistenciais às restantes
unidades funcionais dos ACES e organizam ligações funcionais aos serviços
cuidados paliativos e continuados pediátricos – presente e futuro
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
S 193
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
hospitalares. A equipa é composta por
médicos de várias especialidades, que
não de medicina geral e familiar e de saúde pública, bem como assistentes sociais,
psicólogos, nutricionistas, fisioterapeutas, técnicos de saúde oral e outros profissionais não afectos totalmente a outras
unidades funcionais. Nestas Unidades, a
presença de Pediatras da Comunidade
seria uma mais-valia importante para a
implementação de cuidados continuados
e paliativos pediátricos.
Estas Unidades podem complementar, na comunidade, a intervenção das
equipas de família e as equipas de cuidados hospitalares e articular os cuidados
prestados pelos diversos intervenientes.
Em conclusão, um modelo possível
será a existência de equipas multidisciplinares centralizadas nas Unidades de
Cuidados na Comunidade, que servem
como gestoras da informação e dos cuidados e de centro de comunicação e articulação aberta e sem barreiras entre os
vários intervenientes no processo: família, equipa de saúde e hospital.
É fundamental colocar os cuidados
continuados e paliativos pediátricos na
agenda da organização dos cuidados na
comunidade, com o pressuposto de que
o processo não pode ter falhas entre os
diferentes níveis de actuação. A responsabilidade primeira de aliviar o sofrimento não está completa sem que se atribua
aos cuidados paliativos e continuados
pediátricos o estatuto de prioridade na
programação dos cuidados de saúde.
Na presença de escassez de recursos,
esta programação deve beneficiar o alívio e controle de sintomas à maioria dos
doentes com doença avançada optimizando todos os recursos existentes na
comunidade.
Nascer e Crescer 2010; 19(3): S192-S194
BIBLIOGRAFIA
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Decreto-Lei nº 28/2008, de 22 de
Fevereiro.
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
Experiência do Serviço de Pediatria do IPO
Ana Maia Ferreira1
INTRODUÇÃO
A OMS define Cuidados Paliativos
como os cuidados activos e totais a crianças ou adolescentes afectados por doenças potencialmente fatais. Englobam
aspectos médicos, emocionais, sociais
e espirituais, centrados na qualidade de
vida da criança e da sua família e incluem
o tratamento de sintomas perturbadores,
provisão de descanso, e apoio após a
morte e no luto.(1)
Analisando o ano de 2008, para 70
novos casos de doentes oncológicos, e
portanto com doença potencialmente
fatal, houve no Serviço de Pediatria do
IPO-Porto 14 óbitos. Limitar os Cuidados
Paliativos aos doentes terminais é, à luz
dos conhecimentos actuais, uma visão
redutora correndo-se o risco de actuação
tardia e menos eficaz.(2,3)
Neste sentido, a abordagem de
qualquer doente oncológico admitido
no Serviço de Pediatria do IPO-Porto
programa-se, desde o diagnóstico, de
forma personalizada, multidisciplinar e
holística. Apesar de, na fase inicial da doença, os aspectos médicos terem maior
relevo, é também efectuada avaliação
de outras necessidades da criança ou
adolescente e família e disponibilizadas
condições para a sua adequada integração e garantia da melhor qualidade de
vida possível. Nas primeiras semanas
__________
1
Em representação da Equipa de Cuidados
Paliativos em Oncologia Pediátrica:
Sónia Lara Helenoa, Maria José Ratoa,
Odete Ferreiraa, Cristina Martinsb,
Susana Almeidac, Laura Ribeirod,
Filomena Maiae, Ana Maia Ferreiraf.
Enfermeira, b Assistente Social, c Psicóloga,
Nutricionista, e Educadora de Infância,
f
Pediatra.
Serviço de Pediatria do IPOPFG
a
d
após admissão desenrola-se a abordagem, avaliação e orientação pelo Médico
Assistente, bem como por vários outros
profissionais: Enfermeira, Nutricionista,
Psicóloga, Assistente Social, Educadora
de Infância/Professora. O plano de acção
posteriormente definido tem em conta
estas várias vertentes e é partilhado e regularmente aferido sob coordenação do
Médico.
Do ponto de vista hoteleiro o Serviço dispõe de 23 camas, 11 em quartos
individuais, e 12 em enfermarias de duas
camas. Todas as enfermarias têm quarto
de banho com chuveiro e em 3 adaptação
para cadeira de rodas. Cada doente tem
direito à presença de um acompanhante
24h. Todas as enfermarias têm camas
recolhíveis para o descanso nocturno do
acompanhante que pode almoçar e jantar gratuitamente no refeitório. Existem
instalações sanitárias próprias para os
acompanhantes. Pode haver um segundo acompanhante presente entre as 8
e as 22h. Existe ainda horário de visitas
alargado das 14 às 20h (máximo de 3
pessoas junto de cada doente).
Do ponto de vista lúdico todas as enfermarias estão equipadas com televisor,
com vários canais TVcabo e leitor DVD e
consola de jogos em todos os isolamentos. Existe ainda possibilidade de emprestar computadores portáteis com acesso
à Internet. Podem ser solicitados DVD’s,
jogos ou livros do acervo do Serviço.
Existem ainda outros espaços de
actividades em conjunto como a Sala de
Televisão e Refeições, Sala de Apoio Pedagógico e Sala de Actividades Lúdicas.
O desenvolvimento de «actividades
da vida diária» está a cargo da Equipa
Lúdico/Pedagógica e conta com a colaboração de equipas de Voluntariado especialmente da Liga Portuguesa contra
o Cancro e da ACREDITAR. É dado especial ênfase à manutenção da ligação à
escola e do rendimento escolar.
Em relação às necessidades espirituais existe um Capelão católico no IPO
e é permitida a visita por ministro da religião professada pela família.
O controlo sintomático beneficia do
investimento em formação dos profissionais do Serviço, da instituição da dor
como 5º sinal vital e da colaboração com
outros serviços do IPO como o Serviço
de Cuidados Paliativos, a Consulta da
Dor e o Serviço de Radioterapia.
Apesar do exposto, era sentida pela
equipa de profissionais a necessidade de
uma abordagem diferente, mais centrada
no controlo sintomático e no conforto, nos
casos de doença incurável e progressiva.
No sentido de responder a esta necessidade foi criada em 2009 a Equipa de
Cuidados Paliativos em Oncologia Pediátrica (ECPOP).
OBJECTIVOS
Organização do projecto ECPOP,
definição dos seus objectivos, avaliação
de resultados.
MATERIAL E MÉTODOS
Determinou-se que a equipa seria constituída por um médico Pediatra,
designado pelo Director do Serviço de
Pediatria, três enfermeiras, designadas
pela Enfermeira Chefe do Serviço de Pediatria, a Assistente Social, a Psicóloga e
a Nutricionista que dão apoio ao Serviço
de Pediatria, e um elemento da Equipa
Lúdico Pedagógica. Estabeleceu-se que
estariam incluídos como colaboradores
permanentes dois representantes de
cada uma das organizações de voluntariado - Liga Portuguesa Contra o Cancro
e ACREDITAR.
cuidados paliativos e continuados pediátricos – presente e futuro
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
S 195
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
Definiram-se como objectivos principais da ECPOP: desenvolver a cooperação entre os vários profissionais, incluindo voluntários, de modo multidisciplinar,
tendo em vista a prestação de Cuidados
Paliativos de qualidade, de modo consistente e universal, à população Pediátrica
seguida no Serviço de Pediatria do IPOPFG, EPE; fomentar o enriquecimento
em conhecimentos nesta área; investigar,
recolher e catalogar os recursos existentes na comunidade/sociedade civil passíveis de ser utilizados em complementaridade com a orientação dos profissionais
do Serviço; ser catalisador da comunicação entre os profissionais do Serviço e os
recursos de proximidade (por exemplo
Centros de Saúde, Serviços de Apoio
Domiciliário), no sentido de possibilitar
a permanência destes doentes em casa,
sempre que o desejem e seja possível;
interagir em estreita cooperação com os
outros profissionais do Serviço evitando
sobreposição de funções, responsabilidades ou acções; prosseguir esforços no
sentido da criação de um Programa de
Apoio no Luto; colaborar na comunidade
em acções de formação, sensibilização
e/ou divulgação em Cuidados Paliativos
Pediátricos; fomentar a investigação em
Cuidados Paliativos Pediátricos; participar em Reuniões/Congressos Científicos
sobre Cuidados Paliativos Pediátricos
em representação do Serviço; estimular
a criação de oportunidades de gestão do
stress e do luto dirigidas aos profissionais
e colaboradores do Serviço; proceder à
avaliação anual das actividades da equipa e sua divulgação.
RESULTADOS
Por considerarmos que, por motivos
deontológicos, a avaliação de situações
particulares não deveria ser discutida com
toda a equipa, optou-se por distinguir no
calendário de reuniões a equipa alargada
(constituída por todos os elementos) e a
equipa nuclear (a equipa hospitalar). Foi
possível reunir quinzenalmente a equipa
nuclear e, cada 2 meses, juntarmos todos
os colaboradores. Foi efectuado o registo
em acta das reuniões alargadas.
Foi elaborada, aprovada e posta em
funcionamento folha de colheita de dados, com lista de problemas e plano de
acção individual para cada doente orientado pela ECPOP.
Avaliámos, orientámos e seguimos
18 doentes e famílias em 2009, dos quais
12 faleceram nesse ano. Em 2010 seguimos até agora 27 doentes, 14 dos quais
faleceram. As intervenções foram sempre feitas em colaboração com o médico
assistente da criança. O tempo de internamento em final de vida foi reduzido.
Criámos um arquivo/portfólio de organizações que possam colaborar com
o Serviço. Nesse arquivo consta o nome
das organizações e instituições públicas
ou privadas, o contacto, os objectivos e
a área de actuação; contactos de Centros de Saúde, Misericórdias com apoio
ao domicílio, etc. Canalizámos apoios
materiais de ONG (especialmente LPCC
e ACREDITAR) para apoio a situações
problemáticas concretas detectadas. Obtivemos apoio material da Fundação do
Gil com entrega ao IPO, para uso exclusivo de doentes pediátricos, de uma cama
articulada com colchão anti-escara, uma
mesa-de-cabeceira rolante e um cadeirão ortopédico.
Procedemos à criação de um ficheiro dos doentes pediátricos do IPO falecidos nos últimos 10 anos no qual consta
nome, data de nascimento, data de falecimento e contacto dos familiares. Este
permitiu-nos levar a bom termo um evento em memória das crianças falecidas.
Consistiu num encontro e piquenique de
famílias e profissionais, no Parque Biológico de Gaia, em 10/06/2010. Seguiu-se
visita guiada ao parque e plantou-se uma
árvore evocativa do evento.
Incentivámos a verbalização de
sentimentos pelos pais e crianças, através da criação no Serviço de um caderno
de registo escrito do seu testemunho.
Reunimos uma pequena biblioteca
com temáticas relacionadas com o cancro, o seu tratamento e efeitos laterais e
com a morte, que serve de instrumento
auxiliar à comunicação com as famílias
ou com a escola.
Participámos em Reuniões Nacionais sobre o tema dos Cuidados Paliativos Pediátricos (I Congresso de Cuidados Paliativos Pediátricos - Universidade
Católica Portuguesa, Maio 2009, e Encontro de Enfermagem de Saúde Infantil
cuidados paliativos e continuados pediátricos – presente e futuro
S 196
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
do ISAVE, Póvoa de Lanhoso, Setembro
2009).
Colaborámos como formadoras
em cursos da Liga Portuguesa contra o
Cancro sobre Cuidados Paliativos Pediátricos.
Organizámos acção formativa realizada pelo Prof. Doutor Filipe Almeida
aberta à comunidade do IPO-Porto em
2009.
Foi realizado um estágio de um mês
pelo Pediatra da ECPOP no Serviço de
Cuidados Paliativos do IPO-Porto, em
Fevereiro 2010, para actualização de conhecimentos e melhoria da cooperação
entre as duas equipas.
Procedeu-se à divulgação da Equipa institucionalmente através da Directora do Serviço na Apresentação do Relatório Anual de Actividades de 2009.
PLANOS PARA O FUTURO
O grande desafio é conseguir manter a ECPOP em funcionamento regular
e envolver cada vez mais toda a equipa
de profissionais do Serviço. Pretendemos investir na formação dos elementos
da equipa, na divulgação do nosso trabalho, na criação de protocolos de actuação
para algumas situações problemáticas e
na melhoria da assistência no domicílio.
CONCLUSÕES
A criação de Equipas de Cuidados
Paliativos em Pediatria é um processo
longo, que requer disponibilidade e vocação para esta esfera de acção em Saúde.
Têm sido criadas equipas que realizem a
sua actividade profissional exclusivamente nesta área. Estas requerem pessoal
próprio e um investimento económico importante. Geralmente torna-se necessário alargar o seu espectro de intervenção
à colaboração com vários hospitais com
Pediatria, numa determinada área geográfica alargada.
A solução encontrada no IPO surge
como um conceito diferente do anterior.
É uma equipa no sentido funcional, mas
formada por profissionais que não se dedicam exclusivamente a esta área. Por
isso o investimento é sobretudo do ponto
de vista organizacional e o seu objecto
centra-se exclusivamente nas crianças
e adolescentes com doença oncológica,
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
seguidas numa instituição, neste caso o
IPO. Pretende-se que seja uma equipa
prestadora de cuidados directos, mas
sobretudo catalizadora de um crescimento conjunto dos profissionais do Serviço
de Pediatria no seu desempenho nesta
área. A sua eficácia, em termos de apoio
domiciliário, pressupõe a articulação com
equipas de Saúde de proximidade e está
dependente do seu desenvolvimento.
Esse é um esforço repartido por inúmeras
iniciativas em curso no Sistema Nacional
de Saúde e fora dele. Cabe-nos saber
encontrar os meios de comunicação eficazes de modo a conseguirmos trabalhar
verdadeiramente «em rede», para benefício dos doentes e das suas famílias.
Nascer e Crescer 2010; 19(3): S195-S197
BIBLIOGRAFIA
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definition of palliative care. [Accessed April 5, 2007]. Available at: http://
www.who.int/cancer/palliative/definition/en/
2. Michelson KN, Steinhorn DM. Pediatric End-of-Life Issues and Palliative
Care. Clin Pediatr Emerg Med 2007
September;8(3):212–219.
3. Baker JN, Hinds PS, Sheri L Spunt
SL, Raymond C, Barfield RC, Allen C,
Powell BC, Anderson LH, Kane JR. Integration of Palliative Care Principles
into the Ongoing Care of Children with
Cancer: Individualized Care Planning
and Coordination. Pediatr Clin North
Am. 2008 February; 55(1): 223–xii
AGRADECIMENTO
À Liga Portuguesa contra o Cancro e
à ACREDITAR pela colaboração permanente.
cuidados paliativos e continuados pediátricos – presente e futuro
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
S 197
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
Puberdade Tardia. Amenorreia Primária.
Márcia Barreira1
INTRODUÇÃO
A puberdade define-se como o período de transição entre a infância e a idade adulta, em que se obtém a maturação
sexual completa. Neste período têm lugar
importantes alterações físicas (desenvolvimento das características sexuais
secundárias, aparecimento da menarca nas raparigas, atingimento da altura
adulta…), psicológicas (que modelam a
personalidade do sujeito) e psicossociais,
adquirindo-se a capacidade reprodutora.
A idade em que a puberdade se inicia é muito variável e, em condições normais, está influenciada por factores genéticos, ambientais e metabólicos. A sua
apresentação, precoce ou tardia, pode
ser uma simples variação extrema da
normalidade ou o reflexo de alguma das
múltiplas patologias que podem condicionar o momento do seu aparecimento.
Amenorreia primária define-se como
a ausência de menstruação aos 14 anos,
na ausência das características sexuais
secundárias (desenvolvimento mamário, pelo axilar e púbico) ou, ausência de
menstruação aos 16 anos, com desenvolvimento normal das características
sexuais secundárias.
Não existe total acordo, mas em
geral considera-se puberdade tardia
quando não há desenvolvimento mamário evidente aos 13 anos de idade, pelo
púbico ausente aos 14 anos e quando a
menarca não apareceu até aos 16 anos
de idade. Geralmente, estas pacientes
apresentam amenorreia primária; de
facto, não convém confundir ambos os
conceitos, uma vez que a puberdade tardia implica necessariamente a ausência
__________
1
Centro Hospitalar do Porto
do desenvolvimento das características
sexuais secundárias, ou o atraso no desenvolvimento das mesmas em relação
à idade cronológica. O atraso pubertário
pode associar-se ou não ao atraso no desenvolvimento estaturo-ponderal.
ETIOPATOGENIA
O atraso no aparecimento das alterações pubertárias é pouco frequente nas
raparigas, aproximadamente cerca de
3%, e quando se observa pode-se suspeitar da existência de alterações genéticas ou da função hipotalamo-hipofisária.
O atraso pubertário pode ser constitucional (idiopático), associado a patologia crónica, secundário a distúrbios
hipotalamo-hipofisários que causam hipogonadismo hipogonadotrófico e secundário a alterações gonadais que causam
hipogonadismo hipergonadotrófico.
O atraso constitucional do crescimento e da puberdade é a causa mais frequente de puberdade tardia. Considera-se
uma variante da normalidade, podendo-se
apresentar de forma esporádica ou, mais
habitualmente, dentro de um contexto familiar de maturação tardia.
A imensa maioria das doenças crónicas, se suficientemente importantes,
podem ocasionar um atraso no crescimento e maturação. O grau deste está
intimamente relacionado com o tipo de
doença, idade de início, duração e gravidade da mesma, assim como factores
intrínsecos ao próprio indivíduo.
O hipogonadismo hipogonadotrófico
caracteriza-se por níveis muito diminuídos ou ausentes de gonadotrofinas circulantes, FSH e LH. As causas podem ser
devidas a patologia congénita/genética,
que altere o desenvolvimento da unidade
hipotalamo-hipofisária ou a síntese-acção
das gonadotrofinas ou, a patologias ad-
ginecologia em pediatria
S 198
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
quiridas como consequência de doenças
intracranianas, traumatismos cranianos,
cirurgia ou radioterapia.
O hipogonadismo hipergonadotrófico deve-se a uma insuficiência gonadal
primária, existindo níveis séricos elevados de gonadotrofinas com esteróides
sexuais diminuídos ou ausentes e é quase sempre permanente. As causas mais
frequentes são as cromossomopatias
congénitas, sendo a síndrome de Turner
a mais comum nas mulheres.
ORIENTAÇÃO DIAGNÓSTICA
As causas de puberdade tardia são
múltiplas, pelo que é importante perante
uma primeira avaliação, uma história clínica detalhada, tanto pessoal como familiar, uma exploração física completa e, em
função de ambas, uma série de exames
complementares. Na anamnese, será
importante avaliar os seguintes aspectos: velocidade de crescimento e peso,
indícios de doenças actuais ou prévias,
tratamentos actuais ou prévios, incluindo
cirurgias, radioterapia e quimioterapia, alterações no olfacto, excesso de exercício
físico ou distúrbios da conduta alimentar.
Não esquecer de questionar acerca dos
antecedentes familiares pubertários, pois
estão presentes na grande maioria dos casos de atraso constitucional pubertário. A
exploração física deve ser completa, mas
centrando-se no desenvolvimento pubertário, altura, relação entre os segmentos
inferior e superior do corpo e nos achados
gerais (estigmas de síndrome de Turner
ou de outros síndromes) e neurológicos.
Quanto aos exames complementares, se
a história e/ou exame físico sugerem uma
patologia crónica subjacente, os exames
têm de ser orientados de acordo com a
suspeita clínica individual. A suspeita de
uma deficiência de GH pode obrigar à
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
realização de testes de GH precedidos
da administração de esteróides sexuais
para diferenciar uma deficiência real de
GH de uma deficiência transitória associada a atraso constitucional pubertário.
Em caso de suspeita de uma patologia
craniana deve-se realizar uma RMN. A
ecografia pélvica deve realizar-se em raparigas com suspeita de resistência periférica aos androgénios ou no decorrer
da avaliação de uma amenorreia primária
para detectar anomalias vaginais, ausência de útero ou alterações do tamanho
ovárico. A determinação do cariótipo está
indicada perante a presença de estigmas
sindrómicos, na ausência de útero para
descartar um síndrome de insensibilidade aos androgénios, no caso de gonadotrofinas elevadas ou raparigas com altura
baixa de etiologia incerta. Os níveis séricos de esteróides sexuais (testosterona
e estradiol) são de escassa utilidade nas
fases iniciais da puberdade, uma vez que
os seus níveis se situam com frequência
abaixo do limite de detecção da maioria
das análises. Quanto à determinação das
gonadotrofinas, se são baixas e existe
um antecedente claro que o possa provocar (stress emocional, exercício físico
de alta competição, má nutrição ou sinais
de doença sistémica), as investigações
devem ser encaminhadas nesse sentido.
É importante na avaliação global realizar
uma determinação da idade óssea; se
esta é inferior ao começo da puberdade
(10-11 anos) é impossível determinar se
o hipogonadismo hipogonagotrófico é de
causa permanente ou transitória mas, se
existe uma clara discrepância entre a idade óssea e a cronológica com concentrações baixas de gonadotrofinas, deve-se
descartar um defeito permanente e avaliar outras hormonas hipofisárias.
TRATAMENTO
O atraso constitucional do crescimento e da puberdade considera-se uma
variante da normalidade, portanto, na
maioria dos casos uma explicação clara
aos pais e pacientes, junto com um seguimento e adequado apoio psicológico
são suficientes. Nos casos em que existe
um atraso severo com graves repercussões psicológicas e sociais (fracasso
escolar, baixa auto estima, depressão…)
estará indicado tratamento.
Na patologia crónica é fundamental o tratamento adequado e precoce da
doença de base associado a uma adequada nutrição, para prevenir na medida
do possível o atraso pubertário nestas
pacientes.
O tratamento dos casos de hipogonadismo deve ser etiológico, quando
possível. Quando isso não é possível,
será necessário induzir ou completar
o desenvolvimento das características
sexuais secundárias e, posteriormente,
estabelecer um programa de terapêutica
hormonal de substituição. A escolha do
melhor tratamento tem de ser individualizada, mas em geral o ideal é mimetizar
uma puberdade normal, evitando sobretudo comprometer a altura adulta.
Nascer e Crescer 2010; 19(3): S198-S199
BIBLIOGRAFIA
1. ASRM. Practice Committee of the
American Society for Reproductive
Medicine. Current evaluation of amenorrhea. Fertil Steril. 2006;86, Suppl
4:S148-55.
2. Pletcher JR, Slap GB. Menstrual disorders. Amenorrhea. Pediatr Clin
North Am. 1999;46(3):505-18.
3. Speroff L, Fritz MA. Clinical Gynecologic Endocrinology and Infertility.
7th edition. Philadelphia: Lippincott
Williams & Wilkins, 2005: 384-87.
4. Busiah K, Belien V, Dallot N, Fila M,
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Epub 2007 Jul 19.
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Arch Pediatr. 2010 Feb;17(2):195-200.
Epub 2009 Nov 4.
ginecologia em pediatria
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
S 199
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST)
na Adolescência
Manuel Jorge Rodrigues1
Adolescência (10 a 19 anos - OMS)
é a fase do desenvolvimento humano que
marca a transição entre a infância e a idade adulta. Caracteriza-se por alterações
a nível físico, psíquico e social. É um
período de distanciamento de comportamentos e privilégios típicos da infância,
maturação psicológica com estruturação
da personalidade e busca de identidade
e de aquisição de características do adulto (independência económica e saída de
casa dos pais).
É durante a adolescência que se
verifica maior incidência de DST: atinge
25% dos jovens com menos de 25 anos;
65% dos casos de SIDA manifestam-se
entre os 20 e 39 anos e reflectem situações de aquisição de infecção por VIH
durante a adolescência(período assintomático da doença – 10/15 anos). A incidência de DST na população em geral
não variou muito ao longo dos últimos
anos. Assistimos mesmo a uma recrudescência da gonococia e da sífilis em
todos os países desenvolvidos. As principais causas referidas são de ordem
biológica, psíquica e social.
A OMS preconizou, em 2001, a
substituição do termo DST por Infecções
Sexualmente Transmissíveis (IST), com
o objectivo de enfatizar as infecções assintomáticas. São mais de 20 os agentes
infecciosos susceptíveis de transmissão
durante as relações sexuais (bactérias,
parasitas, fungos ou leveduras e vírus).
As DST ser curáveis - Sífilis, Cancro
mole, Granuloma inguinal, Linfogranuloma venéreo, vaginose bacteriana, Candidíase, Gonorreia, Chlamydia, Trichomonas – e não curáveis – HSV2, HPV,
__________
1
HBV, HIV 1/2. A OMS constatou um
aumento das DST curáveis, num período de 10 anos (1990-1999), de 240 para
340 milhões, assim distribuídas: Sífilis
– 12 milhões; Chlamydia – 92 milhões;
Gonococia – 62 milhões; Trichomonas –
174 milhões, a que se associam 25 a 35
milhões de casos de SIDA. Estes valores
não incluem os casos de HPV e Hepatites víricas.
Os principais factores de risco englobam: idade, parceiros sexuais, uso ou
não de preservativo, inclusão em grupos
de risco e antecedentes de DST. Os principais modos de transmissão são: sexual,
sanguínea, vertical e outros.
Os quadros clínicos têm evoluído
em função da prevalência de certos agentes patogénicos, da resistência acrescida
aos antibióticos e do predomínio de infecções assintomáticas com consequente
aumento das complicações. As principais
manifestações clínicas são: leucorreia,
prurido, dispareunia, lesões genitais ou
ano-genitais (úlceras, verrugas), sintomas urinários, dor pélvica aguda ou
crónica. As complicações incluem: esterilidade, gravidez ectópica, abortamentos
de repetição, complicações e mortalidade perinatal, cancros genitais e outras.
Estas apresentam custos financeiros,
sociais, sexuais e psicológicos constituindo um problema prioritário de saúde
pública já que todas as DST são evitáveis
investindo na prevenção. Os prestadores
de cuidados de saúde podem desempenhar um papel importante na educação
e aconselhamento sobre mudanças de
comportamentos sexuais de risco através da promoção do uso do preservativo
(prevenção primária), como método mais
eficaz na redução do risco de transmissão das DST. A prevenção secundária
Chefe de Serviço Hospitalar de Ginecologia
contracepção e gravidez na adolescência
S 200
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
assenta no diagnóstico e tratamento da
DST e na divulgação de informação para
reconhecimento de sinais e sintomas
que orientem na procura precoce de assistência. É fundamental a convocação
dos parceiros sexuais (indivíduos com os
quais se relacionou nos últimos 90 dias).
A assistência ao doente infectado
deve ser imediata, em ambiente de privacidade, sem pressas, evitando discriminações e/ou faltas de confidencialidade
com o propósito de identificar os portadores assintomáticos, interrompendo
a cadeia de disseminação da doença e
as suas complicações. A consulta inclui
diagnóstico, tratamento, aconselhamento e estudo analítico. Na ausência de
imunidade deve ser feita vacinação para
hepatites A e B e HPV. O adiamento da
consulta pode levar ao desaparecimento dos sintomas, desmotivando a busca
de tratamento e favorecendo a evolução
para formas crónicas. Assim, a chave estratégica da prevenção das DST envolve
o rastreio, o diagnóstico e o tratamento
do paciente e seus parceiros de forma a
interromper a cadeia de transmissão.
Nascer e Crescer 2010; 19(3): S200
BIBLIOGRAFIA
1. CDC, Sexual Transmitted Diseases,
Treatment Guidelines,2006; vol.55/
RR-11
2. Serfaty D; Contracepção; 2002; 2ª edição; pags:333-42;
3. Manual de Controle das Doenças
sexualmente transmissíveis; Ministério da Saúde; Brasília, DF; 2006;
4ª edição;
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
Gravidez na Adolescência
Rosa Maria Rodrigues1
INTRODUÇÃO
Habitualmente pouco pacífica, a
adolescência constitui uma fase de desenvolvimento caracterizada por profundas transformações a nível físico, psicológico, afectivo, social e familiar.
A progressiva maturação fisiológica é normalmente acompanhada pela
súbita descoberta de novas relações e
experiências, de ordem afectiva e sexual, muitas vezes geradoras de intensos
conflitos. Estes sentimentos devem-se
frequentemente a uma desarmonia entre o desenvolvimento corporal, sexual e
mesmo intelectual e a aquisição de maturidade emocional.
Preocupada com a imagem corporal e o estabelecimento de relações cada
vez mais projectadas para o exterior da
família a adolescente manifesta importantes carências informativas relativamente à sexualidade, contracepção e
risco de gravidez.
INCIDÊNCIA
A gravidez na adolescência é um fenómeno universal, tendo as suas origens
no passado, existe connosco no presente e, se não for prevenida, continuará no
futuro.
A incidência da gravidez na adolescência é variável consoante os países e
as épocas.
A verdadeira incidência deste fenómeno é difícil de conhecer porque em termos estatísticos unicamente são contabilizadas as taxas de natalidade que, como
sabemos, só representam uma pequena
parte do número de gravidezes.
Portugal é o segundo país da Europa Ocidental a registar maior número de
grávidas adolescentes, muito embora na
última década se verifique um decréscimo. Todos os dias doze adolescentes
dão à luz em Portugal.
FACTORES DE RISCO
A gravidez na adolescência não
é um fenómeno novo. Encontram-se
grávidas adolescentes em todos os estratos sociais, contudo parece ser mais
prevalente nas classes mais desfavorecidas.
Constituem factores de risco o
abandono escolar, o baixo nível de escolaridade da adolescente, companheiro e
família, a ausência de planos futuros, e
a repetição de modelo familiar (mãe também adolescente).
Outras características são também
associadas com a maternidade na adolescência como o início precoce da actividade sexual, a baixa auto-estima, o
abuso de álcool e drogas, a falta de conhecimento a respeito da sexualidade e o
uso inadequado da contracepção.
A gravidez na adolescência é sempre uma situação que motiva angústias
e incertezas. Contudo muitas vezes a
adolescente tem orgulho em ter o filho, funcionando a maternidade como
auto-gratificação e auto-compensação
afectiva.
Dependendo do contexto social em
que está inserida a adolescente, a gravidez pode ser encarada como evento normal, não problemático, aceite dentro das
suas normas e costumes.
CONSEQUÊNCIAS
A gravidez na adolescência, habitualmente mal vigiada, tem sido associada
á maior morbilidade materna e fetal podendo interferir negativamente no desenvolvimento pessoal e social sendo considerada um problema de saúde pública.
As complicações mais associadas
com a gravidez na adolescência são a
pré-eclampsia, a anemia, as infecções, o
parto pré-termo, as complicações no parto e puerpério e perturbações emocionais
bem como as consequências associadas
à decisão de abortar.
A maior incidência de recém-nascidos prematuros e de baixo peso
ao nascer está relacionada com factores
biológicos (imaturidade e ganho de peso
inadequado) e factores socioculturais
como pobreza e estilos de vida adoptados pelas adolescentes.
Alguns estudos, contudo, não encontram diferenças significativas relativamente à gravidez e parto quando se
compara a adolescente com a população
geral.
Embora o número de gravidezes
na adolescência tenha diminuído na última década, torna-se necessária a promoção de programas que respeitem os
direitos sexuais e reprodutivos dos adolescentes, contribuindo desta forma para
a redução da incidência de abortamento
e a reincidência da gravidez nesta faixa
etária.
No futuro que começa agora, compete à Família, à Escola e às Instituições
de Saúde contribuir para a formação dos
adolescentes.
Nascer e Crescer 2010; 19(3): S201
__________
1
Centro Hospitalar do porto
contracepção e gravidez na adolescência
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
S 201
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
Grande Prematuridade: Nutrição e Crescimento
Maria Luísa Carreira1
RESUMO
Introdução – A melhoria das taxas
de sobrevivência de pré-termos de muito
baixo peso (MBP) e extremo baixo peso
(EBP) coloca-nos perante a responsabilidade de lhes assegurar, após a alta, o
melhor crescimento e desenvolvimento
possíveis.
Trata-se de recém-nascidos (RN)
que foram privados de um período critíco
de crescimento intrauterino acelerado, o
3.º trimestre de gestação, e que depois
acumulam défices nutricionais durante o
internamento, causados por altas necessidades metabólicas, reservas nutricionais inadequadas, imaturidade dos sistemas fisiológicos e elevada morbilidade.
A dinâmica do crescimento no período
neonatal caracteriza-se por perda inicial
de peso, seguida da recuperação do
peso do nascimento, sendo a duração
destas fases inversamente relacionada
com a idade gestacional (IG), o peso ao
nascimento (PN) e a gravidade da condição do RN.
A expectativa de crescimento de RN
pré-termos é de acelaração máxima entre as 36-40 semanas de idade pós concepcional, apresentando a maioria catch
up até aos 2-3 anos de idade e atingindo o seu canal de crescimento entre os
percentis de normalidade nas curvas de
referência.
Os PT de EBP recuperam o PN mais
lenta e tardiamente, por volta da 3.ª semana de vida e depois evoluem com uma
velocidade de crescimento semelhante à
da vida intrauterina, o que não lhes permite atingir a composição corporal de um
feto da mesma idade pós concepcional.
Assim, na altura da alta, apresentam
__________
1
Serviço de Neonatologia - MJD/CHP
parâmetros antropométricos aquém do
percentil mínimo normal nas curvas de
crescimento intrauterino.
Avaliação do crescimento e dados da literatura – O crescimento de RN
pré-termos deve ser avaliado mediante
as medidas antropométricas peso(P),
comprimento(C)e perímetro cefálico(PC),
periodicamente, numa prespectiva dinâmica.
É discutível qual a melhor maneira
de avaliar o crescimento. As curvas mais
utilizadas são as curvas padrão CDC/
NCHS-2000, usando a idade corrigida
até aos 2-2,5 anos. Existem curvas próprias para RN pré-termos, como as tabelas IHDP, que podem identificar mais correctamente os problemas de crescimento
no subgrupo dos RN EBP nos primeiros
2 anos.
A avaliação dinâmica do crescimento permite obter a velocidade de crescimento e verificar se as curvas estão
paralelas ou em recuperação progressiva para o normal, ou, pelo contrário, em
achatamento ou padrão descendente.
É também importante a relação
peso/comprimento nos primeiros 3 anos,
e o IMC (indíce de massa corporal) a
partir dessa idade, para concluir se há
proporcionalidade e harmonia do crescimento.
O catch up do crescimento de pré-termos varia com a antropometria ao
nascer, a IG e o tamanho parental. Os
primeiros 3 meses após o termo representam um período critíco para a ocorrência de catch up, cuja sequência é PC,
C e P. É de esperar que o PC recupere
para o anormal aos 12-18 meses e que
o P e o C pelos 30-36 meses, excepto
para os pré-termos EBP, de recuperação
mais tardia.
grande prematuridade
S 202
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
Têm surgido variados estudos longitudinais que acompanham o crescimento
dos RN pré-termos nos primeiros anos
de vida, idade escolar, adolescência e,
recentemente, até jovens adultos.
No grupo de pré-termos EBP a velocidade de crescimento diminui até aos 3
meses de idade corrigida e sofre depois
um aumento gradual até à adolescência.
Assim, durante a infância, geralmente
permanecem menores em P e C relativamente às crianças de termo, podendo
experimentar depois uma recuperação
entre os 8 e 14 anos e completar o seu
crescimento compensatório até ao início
da idade adulta.
Os dados disponíveis a este respeito não são concordantes. Nalguns
trabalhos verificou-se que estes jovens
adultos mantinham antropometria bastante abaixo da de indíviduos com PN
normal e uma altura final significativamente menor que a previsível pela altura
parental. Noutros estudos os resultados
foram mais animadores, com atingimento, a partir dos 14 anos, de uma estatura
na faixa da normalidade e em correlação
com a estatura dos pais, embora em média mantenham estatura e peso abaixo
dos grupos controle.
De entre os pré-termos de maior risco para falência do crescimento contam-se aqueles que evoluem para displasia
broncopulmonar (DBP), por vários motivos: aumento do trabalho respiratório,
hipoxemia, eventual uso de corticoides
pósnatal, restrição hídrica e dificuldades
na alimentação e elevada morbilidade
com frequentes reInternamentos. Curiosamente, muitos estudos, após controlo
das variáveis de confusão, não evidenciam diferenças no crescimento de pré-termos com e sem DBP nas idades pré-escolar e escolar.
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
No caso particular de RN MBP leves para a idade gestacional (LIG) a evolução varia segundo a etiologia da restrição de crescimento intrauterino (RCIU),
e é maior a probabilidade de nunca se
alcançar um crescimento normal para a
idade cronológica, independentemente
das complicações perinatais. O prognóstico é ainda pior nos LIG simétricos,
sobretudo se a recuperação não ocorrer
nos primeiros 2 anos de vida.
Estratégias nutricionais – De entre os factores que influenciam o crescimento, o padrão nutricional após a alta é
fundamental, já que é passível da nossa
intervenção.
As necessidades nutricionais de
lactentes pré-termos nos primeiros meses de vida, excedem as do RN de termo,
o que pode manter-se ao longo de todo o
primeiro ano de vida.
O leite materno fortificado é a opção
acertada, com os conhecidos benefícios
para a saúde e cognição. Em alternativa
podem usar-se fórmulas adequadas a
pré-termos ou ainda fórmulas especiais
pós alta.
A ingestão calórica deve ser aumentada, conforme a tolerância, até o ganho
ponderal ser satisfatório. Pode ser necessário o aumento da concentração calórica em grupos de especial risco, através
da suplementação com carbohidratos e
gorduras.
Recentemente, vários estudos têm
alertado para a associação de um rápido
e excessivo ganho ponderal pósnatal dos
pré-termos com um maior risco de obesidade na infância e na idade adulta, bem
como de HTA, resistência à insulina e de
doença cardiovascular.
O programa nutricional deve pois
fornecer o teor calórico que permita optimizar o crescimento, mantendo, no
entanto, uma relação peso/comprimento
dentro dos limites normais.
Nascer e Crescer 2010; 19(3): S202-S203
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grande prematuridade
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
S 203
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
Prematuridade Tardia: a Nova Epidemia
Gilberta Fontes Neves Santos1
INTRODUÇÃO
Em Neonatologia os pré-termos tardios (LPT) emergiram como um grupo em
crescimento, com morbilidade crescente,
requerendo especial atenção nos primeiros dias de vida e provavelmente para lá
do período neonatal A comunidade de
saúde deve ser sensibilizada para as necessidades especiais destes doentes.(1)
Apesar da unanimidade em definir pré-termos, há menos unanimidade
em definir subgrupos, nomeadamente
os LPT. Em Julho de 2005 um grupo de
trabalho do NICHD (National Institute of
Child Health and Human Development)
define pré-termo tardio (LPT) entre 34
0/7 semanas (dia 239) ou 36 6/7 semanas (dia 259). Esta sugestão foi baseada no reconhecimento de que as 34 semanas são um marco obstétrico a partir
do qual os corticoides pré-natais já não
são administrados e ao facto dos LPT terem um mais alto risco de morbilidade e
mortalidade comparando com os recém-nascidos de termo. (7)
Os LPT têm um grande impacto em
termos de saúde pública, devido ao seu
elevado número, cerca de 75% de todos
os pré-termos, contribuindo para um aumento da morbilidade, do tempo de internamento numa Unidade Neonatal e dos
custos de saúde, sendo referidos nos
últimos anos como “nova epidemia” em
Neonatologia. É necessária uma melhor
sistematização das suas necessidades
e um protocolo efectivo para lidar com
estas situações bem como o estabelecimento de normas práticas de orientação
para prevenir a morbilidade evitável. (5,6)
__________
1
Serviço de Neonatologia - MJD/CHP
O número crescente de pré-termos
tardios parece dever-se ao número crescente de intervenções obstétricas, especialmente nascidos por cesariana. A
pré-eclampsia e a ruptura prematura de
membranas estão entre as principais
causas de trabalho de parto pré-termo.
Deverá ser pesado o risco benefício de
prolongar a gravidez na fase da prematuridade tardia. (7) Os nascimentos não devem ser programados durante o período
da prematuridade tardia (34-37 semanas)
sem indicações clínicas precisas. (5)
Os factores que têm contribuído para
o aumento da prematuridade tardia parecem ser: o aumento da taxa das mulheres
que decidiram ter filhos mais tarde, o aumento da taxa de reprodução medicamente assistida, o aumento da taxa de gémeos, trigémios e gestações múltiplas. (7)
CARACTERÍSTICAS QUE DISTINGUEM
OS LPT DOS RN DE TERMO
Existem poucos estudos publicados
na literatura comparando a morbilidade
deste grupo com a dos R.N. de termo.
Alguns estudos revelam um aumento dos
problemas no período neonatal imediato:
termorregulação, S.D.R e insuficiência
respiratória, hiperbilirrubinemia, dificuldades alimentares, risco infeccioso, aumento da taxa de reinternamento. (2)
Dificuldades alimentares: As funções gastrointestinais tais como deglutição, peristaltismo e controle de esfincteres são mais imaturas do que no R.N.
de termo conduzindo a dificuldades de
sucção, deglutição e digestão. As dificuldades alimentares, a perda de peso,
a desidratação e (o risco aumentado de
icterícia problemática) conduzem a uma
mais alta incidência de reinternamentos,
durante a 1ª semana de vida comparando com os recém-nascidos de termo.
prematuridade tardia
S 204
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
Dificuldades relativas ao Aleitamento materno: Existem mais problemas com
os LPT com o sucesso do inicio do Aleitamento Materno. A perda de peso pode
ser excessiva (»8-10%) necessitando de
várias intervenções. Devem ser encorajadas mamadas frequentes sob supervisão
de pessoal treinado. Os suplementos de
leite artificial só deverão ser dados sob
prescrição médica. Deve ser efectuada
uma consulta sobre lactação à data da
alta. As mães dos LPT devem receber
ensino sobre a expressão do leite materno dez minutos após a amamentação
no segundo dia de vida. A extracção de
leite deve ser parada quando os R.N.
mostram aumento de peso consistente
sem suplementos, geralmente ao fim da
primeira semana de vida.
Hiperbilirrubinemia: A icterícia problemática é mais comum neste grupo do
que nos R.N. de termo. O pico de icterícia
aparece mais tarde, quatro a seis dias, e
persiste por mais tempo.
Instabilidade metabólica: A hipoglicemia é mais frequente no primeiro dia de
vida do que nos R.N. de termo. As causas
prováveis são a diminuição dos depósitos
de glicogénio, o stress e as dificuldades
de termorregulação e alimentação.
Hipotermia: Os LPT têm um risco
aumentado de hipotermia durante as 1ªs
horas de vida requerendo monitorização
contínua da temperatura corporal.
Sindroma de dificuldade respiratória: O SDR e a taquipneia transitória do
recém-nascido são mais frequentes nos
LPT. Estes R.N devendo ser monitorizados nas primeiras 24h, pois têm maior risco de instabilidade respiratória, podendo
resultar em apneia, bradicardia e respiração periódica. Os LPT têm um risco duas
vezes superior de sindroma da morte
súbita relativamente aos R.N. de termo
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
(1,4/1000 às 33-36 s, comparado com
0,7/1000 às 37s). Por isso deverão ser
aconselhadas a posição supina. (5)
Reinternamentos e consultas médicas: Os LPT têm taxas aumentadas de
consultas e reinternamentos hospitalares. Os principais diagnósticos de reinternamento são: icterícia, dificuldades
alimentares e possível sepsis.
Desenvolvimento Neurocomportamental: Às 34 semanas o volume do cérebro é cerca de 65% do do R.N de termo.
Entre as 35 e as 41 semanas há um aumento na substância branca de cerca de
cinco vezes. Apesar dos LPT serem mais
maduros que os grandes prematuros o seu
cérebro ainda é imaturo e pode ser lesado
por condições adversas. A incidência de
LPV não é conhecida nos LPT. (8) Um estudo controlado, (Chyi e col., J. Pediatrics
2008), revelou que os LPT tiveram piores
resultados no score de leitura, uma maior
probabilidade de necessitarem de ensino
especial e não tiveram pior desempenho
na Matemática. Nos itens em que tiveram
piores resultados houve uma tendência a
melhoria com o tempo. (2) Estudos efectuados revelaram um risco aumentado de
paralisia cerebral e atraso de desenvolvimento em R.N. 34-36s comparando com o
grupo controle. (2)
Sepsis: Os LPT tem um maior número de sepsis documentadas, devido ao
risco aumentado de infecções como causa de trabalho de parto prematuro. (3)
PROTOCOLO DE SEGUIMENTO E
TRATAMENTO
Existem diferenças importantes de
necessidades de cuidados a estes R.N.
tanto a curto como a longo prazo. Devem
ter um protocolo de seguimento e tratamento diferente dos R.N. de termo. Cada
centro de cuidados perinatais deverá ter
o seu próprio plano tendo em conta os
seguintes princípios:
Ensino e educação pré-natal: Previamente ao parto deve ser dada informação aos pais respeitante ao que esperam
no período neonatal imediato, devendo
ser abordada a possibilidade dum internamento prolongado. O R.N. deve ser referenciado como LPT em vez de “almost
term” pois isto reflecte o alto risco de morbilidade e mortalidade. Os pais requerem
conselhos e ensino acerca das necessidades especiais dos LPT.
Identificação do R.N.: Datar a gravidez através do registo hospitalar de
forma cuidadosa e consistente. Registar
como LPT no BSI. Documentar a idade gestacional com recurso a escalas
(Ballard, Dubowitz) se houver incerteza
relativamente à I.G.
Internamento: Os LPT podem ficar
internados em cuidados normais, intermédios ou intensivos neonatais. Deve
ser instituída uma média mínima de internamento de 72h (340/7-346/7) e 48h
(350/7-366/7). Os médicos e enfermeiros
deverão estar treinados para observação
e tratamento destes R.N. tanto no trabalho
de parto como no período neonatal imediato. Deve ser registado o peso diário e
a percentagem de perda de peso. Perdas
superiores a 7% devem ter um seguimento em internamento nas 24h seguintes. A
avaliação da amamentação deve ser diária e o plano de alimentação actualizado.
Nas primeiras 24h devem ter uma consulta de amamentação. Deverá ser feita uma
monitorização dos sinais vitais de quatro
em quatro horas nas primeiras 24h e depois de oito em oito horas até o R.N estar
estável. Deverá ser utilizado equipamento
que respeite as necessidades destes R.N.
em termos de termorregulação. Deverá
ser facultado o contacto pele a pele com a
mãe o mais cedo possível. O banho inicial
deverá ser adiado para reduzir o risco de
hipotermia. (3)
A determinação de glicemia deverá ser feita na primeira-segunda hora de
vida. Os níveis de glicose deverão ser superiores a 40mg/dl antes das mamadas
em duas determinações nas primeiras
oito horas de vida. A determinação da glicemia capilar deverá ser feita até obter
um valor »50 mg/dl em dois testes.
A determinação de bilirrubinas está
indicada nestes R.N. nas primeiras 24 h
e deverá ser repetida se necessário as 36
e 72h. Existem tabelas que contemplam
estes R.N. – risco intermédio.
CRITÉRIOS PARA ALTA
Deverão ser estabelecidos os seguintes critérios para alta:
– Aporte oral adequado e consistente.
– Peso estabilizado ou a aumentar.
– Valor de bilirrubina estável
– Aleitamento materno estabelecido
e meios de lactação pós-alta disponíveis
– Fornecer aos pais antes de alta informação escrita que reforcem as
necessidades especiais dos LPT.
– Consulta agendada 24-48h após a
alta. Uma visita domiciliária seria
uma alternativa aceitável. Este seguimento deverá incluir: padrões de
alimentação, avaliação de peso e
grau de icterícia.
– Seguimento pediátrico antes das
duas semanas. Seguimento adicional de vigilância de alterações de
Desenvolvimento psicomotor.
– Ecografia transfontanelar à data da
alta e às 40 semanas de idade corrigida. (3)
CONCLUSÃO
Os LPT representam uma população de risco e requerem diferentes vias
de cuidados comparativamente aos R.N.
de termo. São necessários mais dados
empíricos para desenvolver um guia de
tratamento baseado na evidência. O conhecimento do grau de risco e a informação acerca das causas de morbilidade
pode ser útil para o desenvolvimento de
recomendações para a avaliação inicial,
monitorização e actuação para com este
grupo de R.N. Devemos tentar identificar
os principais factores de risco de forma
a prevenir e minimizar a incidência de
nascimento de LPT. Investigação adicional deverá ser dirigida a este grupo no
futuro.
Para o tratamento destes LPT com
sucesso é necessária uma equipa multidisciplinar constituída por médicos, enfermeiros, consultores amamentação e
fisioterapeutas.
Tentando actuar a nível preventivo
era importante saber: O que é que conduz a um aumento da taxa de cesarianas
e de indução precoce na gravidez? Será
que há um aumento do número de R.N.
pré-termo porque as mães estão a ficar
mais doentes? Ou será que os factores
de intervenção estão a mudar? Deveremos tentar parar o trabalho de parto
em idades gestacionais mais tardias
(33-35s)?
prematuridade tardia
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
S 205
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
São necessárias estimativas apuradas acerca dos riscos de morbilidade e
morte associados aos nascimentos dos
LPT, de forma a ajudar os obstetras e
neonatologistas a tomarem decisões informadas.
Nascer e Crescer 2010; 19(3): S204-S206
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NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
Prematuridade Tardia:
Experiência da Maternidade Júlio Dinis
Cristina Godinho1
INTRODUÇÃO
A definição de prematuridade tardia
(LPT) diz respeito aos recém-nascidos
(RN) com uma idade gestacional entre
as 34 e as 36 semanas e 6 dias. O total de nascimentos destes RN pré-termo
em relação ao número de nados vivos
tem vindo a aumentar progressivamente.
(Tomashek, J. Pediatr, 2007). Há quem
se tenha referido a este aumento como
uma “nova epidemia”, porque este grupo
é fisiológica e metabólicamente imaturo e
tem uma grande morbilidade e mortalidade (quatro vezes superior à apresentada
pelos RN de termo). Daí que seja importante conhecer as suas particularidades e
alertar toda a comunidade (médica e não
só), a fim de prevenir as suas consequências e diminuir a sua incidência.
Sendo a Maternidade Júlio Dinis
(MJD) um Hospital de Apoio Perinatal
Diferenciado, referência a nível da região Norte–no tratamento dos RN pré-termo, consideramos importante saber
o que se passa com este grupo específico. Este interesse pela prematuridade
tardia não é novo, a MJD apresentou no
ano passado na XXI Reunião do H. de
Crianças Maria Pia, um trabalho de revisão dos prematuros tardios nascidos na
Instituição em 2008.
OBJECTIVOS
Conhecer a população de LPT nascidos no CHP-MJD, durante o ano de
2009 relativamente à sua prevalência,
características e morbilidade e comparar
estes resultados com o estudo efectuado
no ano anterior. Verificar se o conhecimento de algumas particularidades des-
__________
1
Maternidade Júlio Dinis - MJD/CHP
te grupo e a implementação de algumas
propostas de trabalho, influenciou de alguma forma a nossa abordagem a estes
RNs de risco.
MATERIAL E MÉTODOS
População alvo: RN nascidos na
MJD no ano de 2009, com a idade gestacional compreendida entre as 34s+0d
e36s+6d. Estudo retrospectivo, com consulta dos processos clínicos.
RESULTADOS
Num total de 3050 RN nados vivos,
a taxa de prematuridade (IG inferior a 37
semanas) foi de 10,5%, o que correspondeu a 309 RN, dos quais 196 (61,4%)
eram LPT. O número de RN estudados
foi de 190 (em 6, não foi possível consultar o processo clínico), 99 (52%) eram
do sexo masculino. Em relação à idade
gestacional constatou-se que 21% tinham 34s, 26% 35s e 53% 36s; O peso
médio ao nascimento foi de 2479gr (min
= 1530 gr e max = 4110 gr) e em 95% dos
casos era adequado à idade gestacional.
O parto foi eutócico em 82 casos (43%).
A cesariana ocorreu em 99 casos (52%),
a maioria delas 47 (47%), em grávidas de
36 semanas. Os motivos apresentados
para a sua realização, por ordem decrescente foram: apresentação pélvica–18%,
pré-eclampsia–12,1%, descolamento da
placenta/placenta prévia total–10%, sofrimento fetal agudo–9%, oligoâmnios–8%
e RCIU–6%. De referir que em 11,1% dos
casos, o motivo da cesariana não estava
registado.
A gravidez foi vigiada na maioria dos
casos (96,8%) e relativamente aos antecedentes maternos, apenas a referir hipertensão arterial em 5,2% das grávidas.
Em relação às intercorrências durante a
gravidez, observou-se que 10% tiveram
diabetes gestacional, 8,4% história de
ITU, 6,8% metrorragias e em 11% dos
casos havia história prévia de ameaça
de parto prematuro. Em 19% dos casos
tinha sido efectuada corticoterapia profiláctica pré-natal.
O tempo de internamento dos RN
foi em média de 6,8 dias, com uma mediana de 4 dias. Metade, permaneceram
junto da mãe e uma pequena percentagem (13%) necessitou de uma vigilância
especial no berçário, os restantes 71
(37,4%) foram internados na Unidade de
Neonatologia, 18 (9,5%) por necessidade
de apoio ventilatório (2 deles com ventilação mecânica). Fizeram nutrição parentérica 17 (8,9%).
Os diagnósticos mais frequentes foram a icterícia neonatal–82,1%,
dificuldades alimentares–53,7%, hipoglicemia–12,4 % e dificuldade respiratória–30,5% (gemido, TTRN ou DMH).
Efectuaram rastreio infeccioso 98 (52%),
mas apenas em 3 casos (1,6%) este foi
positivo. Fizeram antibioterapia 23 (12%).
De salientar que, dos LPT de 34s, 92,5%
fizeram rastreio.
À data de alta, houve registo do
peso em 166 (87%). A perda ponderal
média foi de 7% (0-21,8%).
A ecografia transfontanelar foi realizada em 101 casos (53,2%). Em 62 casos
a ecografia foi efectuada ainda no internamento e repetida em 42 casos às 40
semanas de idade pós menstrual. Em 39
casos só foi efectuada às 40 semanas de
idade pós menstrual. A alteração mais frequentemente descrita foi “hiperecogenicidade periventricular” em 24 casos; destes,
15 normalizaram às 40 semanas. Assim,
do total de LPT que efectuaram ecografia transfontanelar, apenas 18 mostraram
alterações às 40 semanas de idade pós-menstrual. As alterações descritas foram:
prematuridade tardia
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
S 207
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
dilatação ventricular (4 casos), vasculopatia lenticulo-estriada (3 casos), hemorragia ventricular (2 casos), quisto–periventricular/coroideu (2 casos), alargamento
da cisura inter hemisférica (2 casos), assimetria ventricular (2 casos), agenesia do
corpo caloso (1 caso), hiperecogenicidade
dos núcleos da base (1 caso) e alargamento da cisterna magna (1 caso).
O reinternamento ocorreu em 44
(23,2%) dos LPT. O motivo principal foi a
icterícia (86%) associada ou não a dificuldades alimentares e perda ponderal. Em
3 casos (7%), o motivo foi ALTE. A idade
à data do reinternamento foi em 57% dos
casos entre quatro a sete dias de vida.
A primeira consulta ocorreu em média aos 20 dias de vida, sendo que 53%
dos RNs estavam com leite materno exclusivo.
CONCLUSÕES
A incidência de prematuridade tardia na MJD é inferior à referida na literatura–71%, o que pode ser justificado pela
MJD ser um Hospital de Apoio Perinatal
Diferenciado. No entanto a incidência aumentou nos últimos dois anos–56% em
2008 para 61,4% em 2009. Este aumento da incidência da prematuridade tardia
também tem sido observado noutros países, não se conhecendo a verdadeira
etiologia do fenómeno. Há quem refira
que se deve bastante à intervenção médica nos factores obstétricos maternos,
embora os dados sejam limitados. Na
nossa casuística, podemos verificar que
um dos motivos para cesariana foi apresentação pélvica em 18%. A incidência de
gemelaridade nesta amostra foi de 18%.
Relativamente ao grupo de LPT,
constatou-se que em 2009 o grupo das 36
semanas foi maior, 53% versus 46,2% em
2008. A média da idade gestacional foi de
35,3 semanas, sobreponível à de 2008.
Na apresentação da casuística dos
LPT de 2008 no nosso Serviço de Neonatologia, foi elaborada uma proposta de
trabalho de abordagem destes RN, para
uma melhor vigilância e detecção precoce
das co-morbilidades deste grupo específico. Uma das propostas era aumentar o
tempo do internamento para um mínimo
de 3 dias. Desta forma, certos problemas
como a icterícia poderiam ser rastreados
e tratados mais precocemente. Esta prática aumentou o tempo médio de internamento de 5,9 dias em 2008 para 6,4 dias
em 2009.
Em 2009 tivemos de facto mais icterícias (82,1% versus 66,3% em 2008),
67,4% com critérios para fototerapia.
Outra das propostas foi fazer a determinação das glicemias nas primeiras
2h de vida a fim de detectar precocemente uma hipoglicemia e tratá-la de forma
adequada. Obtivemos 84,7% de registos
e foi detectada hipoglicemia em 12,4%
dos LPT versus 11,2% em 2008, o que
justifica a manutenção deste procedimento.
Outra orientação foi a avaliação da
lactação nas primeiras 24h, estabelecendo um plano alimentar para o internamento e para o domicílio, com documentação da percentagem de peso perdida e
reavaliação em 24h, caso se justificasse.
Deste modo tivemos um registo de peso
à data de alta em 87% dos casos (versus
49% em 2008). A perda ponderal média
foi de 7% com um mínimo de 0 e um máximo de 21,8%. Os dias em que se verificaram uma maior perda ponderal foram
em D3 e D4 (46%).
A taxa de reinternamento foi de
23,2% (44 casos), versus 14,2% (24 casos) em 2008. O motivo principal do internamento foi a icterícia em 86% dos RNs,
associada ou não a dificuldades alimentares com perda ponderal. Este aumento
poderá ser justificado pelo maior número
de RN com idade gestacional de 36 semanas, nesta casuística. Como é referido na literatura o reinternamento nos
LPT é mais frequente quanto maior for a
idade gestacional uma vez que estes RN
têm habitualmente um maior peso e há
tendência a terem altas mais precoces.
Neste estudo se analisarmos os reinternamentos relativamente à idade gestacional verificamos que apenas 11% dos
RN de 34 semanas foram reinternados
versus 59% dos RN com 36 semanas.
Outro dos motivos será provavelmente a
reavaliação que é feita 24 a 48h após a
alta naqueles RNs que por qualquer motivo (icterícia sem critérios para fototerapia
à data da alta ou por dificuldades alimentares) necessitam de uma maior vigilância. Como se pode constatar a idade do
prematuridade tardia
S 208
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
reinternamento foi em 57% dos casos na
primeira semana de vida (D4-D7), o período de maior fragilidade. O ideal seria a
vigilância domiciliar.
Uma outra proposta surgiu do conhecimento de que estes RN são mais
susceptíveis pela sua imaturidade a lesões cerebrais. Neste trabalho verificou-se que de facto houve um esforço no
sentido de efectuar ecografia transfontanelar ao maior número de LPT (53,2%
versus 33,7% em 2008). Dos que realizaram ecografia, 45,2% apresentaram alterações, a mais frequentemente descrita
foi a “hiperecogenicidade periventricular”
com 21 (33,9%) casos. Do total de LPT
que efectuaram ecografia transfontanelar às 40 sem de idade pós-menstrual
18 (17,8%) mostraram alterações. Nesta
altura o prognóstico das lesões apresentadas é bem diferente do mostrado no internamento, pois como se verificou, 24%
destas lesões desaparecem.
Estes trabalhos de revisão, mostram-nos que há sempre procedimentos que
podemos melhorar e aperfeiçoar e não
nos devemos esquecer que é com a avaliação dos resultados de todo um trabalho
em equipa que podemos validar os nossos conhecimentos, implementar as estratégias mais adequadas, reforçando a
vontade de trabalhar cada vez melhor.
Nascer e Crescer 2010; 19(3): S207-S209
BIBLIOGRAFIA
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Preterm Birth. Rev Obstet Gynecol.
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Infants-2008”. In Hot Topics, California, April 2008, Pag 222-6.
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Wallman. “Late-Preterm” Infants: A
population at risk. Pediatrics. 2007;
120/6: 1390-401
4. Position Statement of the Canadian
Paediatric Society. Guidelines for detection, management and prevention
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
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preterm newborn infants (35 or more
weeks’ gestation)–Summary. Paediatr
Child Heath. 2007. 12/5:401-7
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Stark, Kenneth Leveno. Optimizing
care and outcome for late-preterm
(near term) infants: A summary of
the workshop sponsored by the National Institute of Child Health and
Human Development. Pediatrics.
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Shapiro-Mendonza
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6. Carrie
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and Maternal Medical Conditions on Newborn Morbidity risk.
Pediatrics.2008;121/2:e223-32
7. www.pediatriccareonline.org/pco/ub/
pview/AAP -Textbook -of -Pediatric-Care/
AGRADECIMENTO
O Autor agradece a colaboração da
interna complementar de pediatria do
H. de Viseu, Joana Ramos Pereira,
na colheita destes dados.
prematuridade tardia
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
S 209
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
Resumo das Comunicações Orais
INTERNAMENTOS POR GRIPE A EM
CRIANÇAS COM DOENÇA CRÓNICA
Helena M.Silva1, Carla Teixeira1, Laura
Marques1, Virgílio Senra1
1
CHPorto, UHMPia
Introdução: A infecção pelo vírus
influenza A (H1N1) foi declarada pela
OMS como a primeira pandemia de influenza do século XXI. As séries publicadas documentam uma baixa morbilidade
e mortalidade. Contudo, existem poucos
estudos que avaliem o impacto desta infecção nas crianças com doença crónica,
nomeadamente nas que necessitaram de
admissão hospitalar.
Objectivos: Caracterizar os internamentos por Gripe A em crianças com
doença crónica.
Material e métodos: Estudo retrospectivo dos pacientes com doença crónica internados por Gripe A no período de
1 de Novembro de 2009 a 31 de Janeiro
de 2010. Avaliaram-se dados epidemiológicos, apresentação clínica, exames
complementares realizados, tratamento
efectuado e evolução.
Resultados: Necessitaram de internamento 14 crianças com doença
crónica, correspondendo a 82% do total
de internamentos por Gripe A. A maioria
dos casos (57%) verificou-se na segunda
quinzena de Novembro. Sete (50%) eram
do sexo feminino, com mediana de idade
de 8,5 anos (3 meses-18 anos). Das patologias associadas, destaca-se a imunodepressão (4): imunodeficiência primária,
transplante renal, ataxia-telangiectasia,
anemia de Fanconi; a asma (3), e as doenças metabólicas (2). Os sintomas mais
frequentes foram: febre (100%), tosse
(57%), rinorreia (43%), vómitos (43%),
pieira (21%). Em 50% a duração de sintomas antes do internamento foi =24 horas.
Na admissão, a maioria (86%) apresentava gravidade clínica ligeira. O motivo de
internamento mais frequente foi intolerância alimentar (50%) e hipoxemia (28,5%).
Doze (86%) realizaram estudo analítico:
leucócitos7360/ul (3250-17710); neutrófilos 67,5% (33-88); linfócitos 27,0% (6-59); PCR 13,9mg/L (1-156). A radiografia
de tórax foi realizada em 9 (64%): em 7
(78%) apresentava infiltrado intersticial
bilateral e 2 (22%) eram normais. Foi
instituída antibioterapia em 2 crianças
por sobreinfecção bacteriana. A duração
mediana do internamento foi 7 dias (2-30). Não houve admissão na unidade de
cuidados intensivos e não foi registado
nenhum óbito.
Conclusão: A infecção pelo vírus
influenza H1N1 neste grupo de crianças
com patologia crónica apresentou uma
epidemiologia semelhante à descrita em
séries que englobam maioritariamente
crianças saudáveis. As manifestações
clínicas e analíticas foram ligeiras. Em
nenhum caso houve descompensação
da patologia de base e a evolução clínica
foi favorável.
VENTILAÇÃO NÃO INVASIVA COM
nCPAP NO TRATAMENTO DA
BRONQUIOLITE AGUDA
Helena M. Silva1, Telma Barbosa1,
Carlos Duarte1, Ana Ramos1
1
CHPorto, UHMPia
Introdução: A bronquiolite aguda é
uma forma de infecção respiratória frequente no primeiro ano de vida, e uma
causa de morbilidade e mortalidade infantil. A Ventilação Não Invasiva (VNI) é um
modo de ventilação cada vez mais utilizado pela sua baixa agressividade, grande
eficácia e escassas complicações.
resumo das comunicações orais
S 210
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
Objectivos: Analisar as características, evolução e eficácia da VNI com
nCPAP em crianças com bronquiolite
aguda.
População e métodos: Estudo retrospectivo dos internamentos por bronquiolite aguda em crianças<12meses de
idade, durante 6 períodos epidémicos
consecutivos: Outubro 2004 a Março
2010. Foram analisados dados sociodemográficos, analíticos, imagiológicos, e
dados clínicos prévios ao início da VNI
e às horas 6, 12, 24 e 48 desde o início
da VNI. Análise estatística através do
programa SPSS®v.17, nível de significância 0,05.
Resultados: No período referido,
34 crianças foram internadas por bronquiolite aguda com necessidade de apoio
ventilatório com VNI; 24 (70,6%) do sexo
masculino, idade mediana de 44 dias
(10-300). Dos factores de risco de evolução grave destaca-se: 17 (50%) antecedentes de prematuridade; 29 (85,3%)
idade<3meses, dos quais 10 (29,4%)
eram recém-nascidos; 15 (44,1%) com
doença subjacente, das quais 10 (55,5%)
com cardiopatia congénita. O agente
mais frequentemente implicado foi o VSR
(73,5%). Na admissão, o score Wood-Downes (WD) teve um valor mediano de
6 (3-8); 25 (73,5%) apresentou radiografia
de tórax compatível com bronquiolite não
complicada (hiperinsuflação ou infiltrado
intersticial). A mediana de tempo até iniciar VNI foi de 24 horas (2-94), coincidente com agravamento clínico e radiológico: WD mediano de 9; 61,7% apresentou
alterações radiográficas de novo: 47%
apresentaram atelectasia do lobo superior direito. A principal indicação foi SDR
grave (41,2%), seguida de apneia (29,4%)
e Insuficiência Respiratória Aguda hipercápnica (29,4%). Observou-se melhoria
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
clínica nas primeiras 6 horas após o início de VNI, com diminuição da frequência
cardíaca (163vs152;p=0,005), frequência respiratória (65vs.55;p=0,005), pCo2
(53,0vs.43,9;p=0,013) e pH (7,33vs7,39;
p=0,001). Um total de 3 crianças necessitou de Ventilação Mecânica (VM).
Conclusão: Salientamos que a grande maioria (91%) destes pacientes apresentava pelo menos um factor de risco
de evolução grave, podendo ocorrer uma
rápida deterioração clínico-laboratorial,
num período mediano de 24 horas.A VNI
introduzida numa fase precoce parece
estar associada a uma melhor evolução
clínica e gasimétrica desde as primeiras
horas, evitando o recurso à VM.
TUBERCULOSE PULMONAR EM
ADOLESCENTE - CASO CLÍNICO
Sofia Águeda1, Leonilde Machado2,
Eunice Moreira2, Luísa Vaz1
1
2
HSJoão
CHTâmega e Sousa, HPAmérico
Introdução: A tuberculose constitui
um grave problema de saúde pública.
As medidas para conter o avanço da doença passam pelo diagnóstico precoce
e instituição atempada do tratamento.
Nas crianças assume características
particulares, dado o quadro clínico ser
inespecífico e o diagnóstico difícil. Nos
adolescentes as manifestações clínicas
aproximam-se das descritas em adultos.
Caso clínico: Adolescente de 15
anos, previamente saudável. Sem história de contacto com conviventes doentes.
Admitida para estudo de febre, odinofagia e tosse produtiva com menos de uma
semana de evolução. Apresentava radiografia torácica realizada em ambulatório
com hipotransparência no lobo superior
direito. História de hemoptise isolada 6
meses antes da admissão. Na altura realizou radiografia de tórax, estudo analítico
e baciloscopia, sem alterações. Na semana prévia à admissão teve novo episódio
de hemoptise, sem outras queixas. À observação sem alterações excepto crepitações bibasais na auscultação pulmonar. A
tomografia computorizada de tórax revelou lesões cavitadas no lobo superior do
pulmão direito, consolidação nos lobos su-
perior e médio do pulmão direito, opacidades centrilobulares configurando aspecto
de “árvore em botão” – tuberculose pós-primária com disseminação endobrônquica - e gânglios no mediastino. Analiticamente com anemia microcítica, elevação
dos marcadores inflamatórios e da adenosina deaminase sérica. Após confirmação
do diagnóstico de tuberculose pulmonar
iniciou rifampicina, isoniazida, pirazinamida, etambutol e piridoxina. Dos restantes
exames salienta-se exame directo e cultural para Mycobacterium tuberculosis positivo nas secreções em D1, sensível aos
anti-tuberculosos testados e negativo em
D17. Manteve-se assintomática durante o
internamento, com melhoria progressiva
do quadro clínico. O exame oftalmológico
revelou lesões compatíveis com tubérculos coroideus em cicatrização, tendo efectuado punção lombar, não se verificando
disseminação meníngea.
Conclusão: Dada esta faixa etária
diferir da população infantil em termos de
factores de risco e manifestações clínicas
são necessárias recomendações específicas. A apresentação clínica frustre e a
ausência de história epidemiológica mostra a importância da vigilância e rastreio
da doença em populações de risco ou
em zonas cuja incidência de tuberculose
é elevada. O rastreio de formas de tuberculose extra-pulmonar é importante e o
seguimento em ambulatório é parte fundamental na minimização das sequelas.
QUANDO A TEMPESTADE COMEÇA
COM UM CHUVISCO…
Joana Monteiro1, Sónia Aires1,
Susana Tavares1, Helena Sousa2, M.
Guilhermina Reis2, Paula Ferreira2,
Virgínia Monteiro1
1
2
CHEDVouga
CHPorto
Introdução: As celulites peri-orbitária
e orbitária ocorrem com frequência na
idade pediátrica podendo apresentar-se
com dor ocular e edema palpebral, sendo
difícil a sua distinção clínica. No entanto,
dado a última apresentar maior gravidade
e risco de complicações, torna-se imperativo o diagnóstico atempado e monitorização clínica próxima.
Caso clínico: Adolescente de 13
anos, sexo masculino, sem antecedentes
pessoais ou familiares de relevo, recorre ao SU por febre e edema da pálpebra
direita com 48h de evolução. Salienta-se
no exame objectivo edema com rubor e
calor peri-orbitários exuberantes, sem dor
à mobilização ocular ou oftalmoplegia,
sem quaisquer outras alterações relevantes. No contexto da avaliação por ORL
e oftalmologia realizou TAC, revelando
pansinusite aguda e celulite peri-orbitária
com eventual extensão pós-septal. Cerca de 6h após admissão observou-se
agravamento clínico com prostração e
sonolência marcadas, cefaleias intensas
com fono e fotofobia. Ao exame objectivo mostrava-se pouco reactivo, ECG 9,
má perfusão periférica, sinais meníngeos positivos e olho direito em abdução.
Efectuou punção lombar que revelou meningite de provável etiologia bacteriana,
motivo pelo qual inicia ceftriaxone, vancomicina e dexametasona EV; analiticamente denotou-se leucocitose com neutrofilia, tempo de protrombina prolongado
e PCR aumentada. Apesar da antibioterapia instituída, apresentou nas primeiras
24h, agravamento clínico progressivo,
com tendência para atingimento multi-órgão, pelo que é transferido para SCIN
Pediátricos do CHP. Após se constatar
presença de edema cerebral difuso, iniciou ventilação mecânica com monitor
de PIC, manitol e soro hipertónico, com
evolução clínica favorável. Na hemocultura e bacteriológico de LCR isolou-se S.
pyogenes sensível à Penicilina, após o
que, ao 11.º dia, foi alterada antibioterapia para Penicilina G e Clindamicina. Ao
15.º dia de doença realizou RMN-CE que
revelou presença de pús intra-ventricular,
motivo pelo qual cumpriu 6 semanas de
antibioterapia. A sua recuperação clínica
foi completa e sem lesões sequelares.
Conclusão: Com este caso clínico
os autores pretendem chamar a atenção para a importância e dificuldade na
distinção clínica entre celulite orbitária e
pré-septal, dado o risco elevado de rápido desenvolvimento de complicações
graves. De salientar também que 11%
dos casos podem resultar em cegueira
permanente, apresentado uma mortalidade de 1-2%.
resumo das comunicações orais
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
S 211
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
URTICÁRIA AO FRIO EM IDADE
PEDIÁTRICA – SÉRIE DE CASOS
Mónica Tavares1, Leonor Cunha2, Eva
Gomes2, Fernanda Teixeira1, Helena
Falcão2
1
CHPorto, HMPia
2
Serviço de Imunoalergologia, CHPorto
Introdução: A urticária ao frio ou a
urticária de contacto ao frio é um subtipo
das urticárias físicas com uma incidência
estimada de 0.05%. Caracteriza-se pelo
aparecimento de lesões maculopapulares pruriginosas e ou angioedema após
a exposição ao frio.
Material e métodos: Estudo retrospectivo dos processos clínicos de
crianças e adolescentes até aos 18 anos
com clínica sugestiva de urticária ao frio.
Variáveis analisadas: idade, sexo, idade
de início dos sintomas, caracterização,
história familiar de urticária ao frio, exames complementares de diagnóstico, tratamento, tempo de seguimento.
Resultados: Foram estudadas 8
crianças e adolescentes com idades
compreendidas entre os 8 e os 18 anos
(média de 12,8 anos) com idade de
início dos sintomas que variou entre o
ano e os 14 anos (média de 7,3 anos).
A urticária generalizada foi o sintoma de
apresentação em sete doentes, associado em quatro destes a angioedema localizado e em três a anafilaxia. Seguindo
os critérios de classificação de Wonderer encontramos um caso de urticária
tipo 1, com urticária localizada e/ou angioedema; quatro casos de urticária tipo
2, com urticária generalizada e/ou angioedema sem hipotensão ou sintomas
respiratórios e três casos de urticária de
tipo 3, com reacção sistémica severa. O
teste do cubo de gelo foi realizado em
sete destes doentes, sendo positivo em
todos os casos, com reacção local, na
maioria com positividade após 3 minutos
de exposição com tamanho da reacção
urticarifome que variou entre os 3 e os
8 cm de diâmetro. As crioglobulinas e
o estudo do complemento foram normais, incluindo a função e doseamento
do C1 inibidor. O estudo etiológico das
urticárias crónicas não revelou em nenhum dos casos evidência de infecção
recente (CMV, EBV, Herpes, Parvoví-
rus, Toxoplasmose, HIV, VDRL, Varicela, Rubéola, Hepatite, Micoplasma, HP)
potencialmente responsável pelo início
da urticária. Os factores desencadeantes da urticária foram: em sete nadar em
água fria e exposição a temperaturas
baixas no exterior, e em seis tocar objectos frios. Os doentes foram tratados
com anti-histamínico diário, associado
em dois casos a um inibidor dos leucotrienos. Quando indicado foi prescrita
adrenalina para auto-administração. Em
seis crianças verificou-se uma melhoria significativa dos sintomas. Nenhum
doente apresentou reacção anafilática
após seguimento em consulta. Todos
estes doentes mantêm seguimento.
Conclusão: Apesar de ser uma patologia pouco frequente parece-nos muito
importante estar atento à sua existência,
dado que pode apresentar-se como uma
reacção anafilática grave. A medicação
e principalmente as medidas de evicção
tornam-se fundamentais no seguimento
destes doentes. A prescrição de adrenalina auto-administrada deve ser sempre
ponderada.
ADOLESCENTES NO SERVIÇO DE
URGÊNCIA DE PEDIATRIA, UMA
NOVA REALIDADE
Tânia Monteiro1, Nilza Ferreira2, Eurico
Gaspar2
1
2
CH Barlavento Algarvio
CH Trás-os-Montes e Alto Douro
Introdução: A Pediatria tem como
objectivo prestar cuidados apropriados
aos lactentes, crianças e adolescentes.
Nesse âmbito, o Serviço de Pediatria do
Centro Hospitalar de Trás-os-Montes e
Alto Douro (CHTMAD) desde 1 Janeiro
de 2010 concluiu o processo de alargamento de atendimento, no Serviço de
Urgência (SU) de Pediatria, até aos 17
anos e 364 dias. Os adolescentes em
geral são saudáveis, mas as especificidades do seu desenvolvimento associadas a necessidades e morbilidades
próprias, colocam novos desafios ao
pediatra.
Objectivos: Caracterizar as necessidades de saúde dos adolescentes entre
os 15 e 17 anos e 364 dias, observados
resumo das comunicações orais
S 212
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
no SU de Pediatria do CHTMAD, no primeiro semestre de 2010 e avaliar o impacto do alargamento da idade de atendimento pediátrico, no funcionamento do
serviço.
Material e métodos: Análise retrospectiva descritiva, através da consulta
dos episódios de urgência no programa
SAM e / ou respectivas folhas de registo
do episódio de urgência.
Resultados: De um total de 4903
episódios, 296 corresponderam ao grupo
etário estudado (6,0%), com uma média
de 49,3 episódios/mês. A idade que predominou foi os 16 anos (n=102; 34,5%)
e a maioria pertencia ao sexo feminino
(n=180; 60,8%). 51,0% (n=151) foram
atendidos entre as 8-16h00. Recorreram
ao SU sem referenciação 65,5% casos
(n=194). Em 28 episódios (9,5%) foram
observados por outras especialidades.
Foram realizados exames complementares de diagnóstico em 52,0% dos casos
(154), sendo os exames laboratoriais os
mais utilizados. Foram internados 20 doentes e 60 (20,3%) foram orientados para
a Consulta Externa, sendo a maioria para
a Pediatria (n=51; 17,2%). Os principais
motivos de admissão foram: sintomas
gastrointestinais (n=68;23,0%), com predomínio da dor abdominal (36); seguido
de queixas respiratórias (n=34; 11,5%);
cefaleias 7,4% (22), toracalgia 6,1%
(18) e lipotimia 5,7% (17). Os diagnósticos mais frequentes foram: patologia
gastrointestinal com 58 casos (19,6%),
seguido da infecciosa (n=48; 16,2%). De
salientar os 8 casos de intoxicação alcoólica e os 22 casos de perturbações da
ansiedade.
Comentários: O alargamento da
idade pediátrica,veio fazer com que o pediatra se depare com problemas novos,
tais como as intoxicações e perturbações
da ansiedade. Estas situações obrigam a
novas abordagens de diagnóstico e terapêutica, sendo fundamental a formação
específica e trabalho multidisciplinar. E
por fim, é necessário criar condições logísticas adequadas a este acréscimo de
urgências.
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
NEUROBLASTOMA –
APRESENTAÇÃO CERVICAL EM RN
António Salgado1, Ana Caldeira1,
Eduarda Sousa1, José Guimarães1
1
CHLOcidental, HSFXavier
Caso Clínico: Recém-nascido do
sexo masculino, 23 dias de vida, com
antecedentes pessoais irrelevantes, que
5 dias antes do internamento evidencia
uma tumefacção latero-cervical direita,
de crescimento progressivo, sem sinais
inflamatórios locais ou outra sintomatologia. À entrada, com bom estado geral,
estridor, sem outros sinais de dificuldade
respiratória, Sat O2 100% a ar ambiente,
massa latero-cervical direita com 3cm de
maior diâmetro, consistência petrea, bem
delimitada, sem sinais inflamatórios, não
aderente aos planos e sem limitação da
mobilidade do pescoço. Analiticamente
sem alterações relevantes.
Ecografia cervical de parte moles: massa sem relação com o esternocleidomastoideu, postero-externa ao eixo
jugulo-carotideo, 40x30x20mm,bem delimitada, sólida, ecoestrutura heterogénea.
Algumas formações ganglionares jugulo-carotideas. Pelo risco de agravamento
do quadro de obstrucção respiratória
alta, foi internado. Durante o internamento verificou-se aumento das dimensões
da massa e agravamento do estridor,
sem condicionar dificuldade respiratória.
Foi observado no IPO Lisboa, onde realizou RMN, cintigrafia com MIBG, citologia
aspirativa por agulha fina e marcadores
AHV e AVM compatíveis com o diagnóstico de Neuroblastoma.
Conclusão: O Neuroblastoma é
uma patologia em que o diagnóstico, estadiamento e terapia precoce influenciam
o prognóstico, assim a apresentação
deste caso destina-se a alertar para a necessidade de o considerar no diagnóstico
diferencial de massa cervical em recém-nascido. Os Neuroblastomas constituem
a 3ª neoplasia e o tumor sólido extracraneano mais comum em crianças. Podem
surgir ao longo de todo o sistema nervoso
simpático, por ordem de frequência nas
supra-renais (40%), cadeias ganglionares abdominais (25%), torácicas (15%),
pélvicas (5%) e cervicais (5%); 40% são
diagnosticados no primeiro ano de vida.
WHAT YOU SEE IS NOT WHAT YOU
GET
Rita Jorge1, Maria Inês Monteiro1, Joana
Monteiro1, Catarina Carvalho1, Ana
Luísa Pinto1, Elizabeth Marques1, Miguel
Costa1, Lúcia Gomes1
1
S. Pediatria Médica, CHEDV, UOAzeméis
Introdução: A obesidade em jovens
tem aumentado drasticamente nas últimas duas décadas, nos países ocidentais. Além das complicações médicas,
a obesidade em adolescentes tem importantes consequências psicossociais.
Estudos recentes mostram uma tendência crescente para subestimar o próprio
peso, provavelmente resultado da incidência cada vez maior de excesso de
peso na população geral, \”normalizando\” esse estado.
Objectivos: Avaliar a percepção
que as crianças/adolescentes com excesso de peso/obesidade têm da sua
imagem corporal, determinar o tipo de
imagem corporal que estes jovens desejam alcançar e se essa imagem desejada
corresponde aos seus padrões de normalidade.
População e métodos: Foram avaliadas 114 crianças seguidas na consulta
de Nutrição Pediátrica desta instituição
por excesso de peso/obesidade, através
da aplicação de um questionário associado a uma escala de silhuetas para crianças (Kakeshita, 2008). O questionário
pretendia avaliar a auto-imagem (\”Qual
a silhueta mais parecida contigo?\”), a
imagem desejada (\”Qual a silhueta que
gostavas de ter?\”) e a imagem considerada normal/saudável (\”Qual a silhueta
que as crianças da tua idade deveriam
ter para serem saudáveis?\”).
Resultados: Os jovens avaliados tinham entre 6 e 17 anos (média: 12), sendo 56,1% do sexo masculino. Em relação
à auto-imagem, apenas 20,2% escolheram uma imagem correspondente ao IMC
real, tendo a maioria (65,8%) seleccionado imagens com IMC inferior. Embora
53,5% das crianças apresentassem IMC
superior ao P95, apenas 29,8% escolheram silhuetas que representavam obesidade. Relativamente à imagem desejada,
a maioria (83,3%) escolheu uma imagem
correspondente a um IMC normal, cor-
respondendo essa imagem, geralmente
(94,7%), a um IMC inferior ao da auto-imagem. Em cerca de metade dos casos
(54,4%) a silhueta que desejavam ter correspondia à imagem escolhida como sendo \”normal\” e em 32,5% correspondia a
imagens com IMC superior.
Discussão: Grande parte dos jovens com excesso de peso/obesidade
não têm uma percepção real do seu problema, embora manifestem vontade de
melhorar a sua imagem. Muitos têm baixas expectativas em relação à perda de
peso, uma vez que a imagem que pretendem obter nem sempre corresponde à que consideram mais saudável. O
acompanhamento psicológico destes jovens é fundamental, podendo contribuir
para que compreendam a importância
e dimensão do seu problema de saúde
e aumentar o optimismo e, consequentemente, a motivação, relativamente à
perda de peso.
IMPORTÂNCIA DA DETERMINAÇÃO
DA TENSÃO ARTERIAL EM
PEDIATRIA
Isabel Pinto Pais1, Daniel Gonçalves1,
Ana Novo1, Margarida Figueiredo1, Clara
Vieira1, Rafael Bindi1, Paulo Teixeira1,
Maria Conceição Mota2
1
2
Serviços de Pediatria, CHMA/F
S. Nefrologia Pediátrica, CHP, HMPia
Introdução: Na população pediátrica a prevalência de hipertensão arterial
(HTA) é de 3% e a de HTA grave de 0,1%.
Quando não controlada é causa de morbilidade e mortalidade significativa. Em
pediatria é habitualmente secundária,
sendo a etiologia renal a mais frequente.
A Glomeruloesclerose Segmental Focal
(GESF) manifesta-se em qualquer idade
com proteinúria, habitualmente nefrótica.
O diagnóstico é histológico pelo que a sua
verdadeira incidência é desconhecida. É
classificada como GESF primária ou idiopática quando não se identifica uma etiologia. A GESF secundária tem por base
um factor infeccioso, inflamatório, tóxico
ou hemodinâmico. A GESF familiar deve
ser considerada em crianças com história
sugestiva. O prognóstico é habitualmente
reservado.
resumo das comunicações orais
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
S 213
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
Caso clínico: Adolescente internada por HTA grave. Apresentava
cefaleias recorrentes, com vómitos esporádicos, com 1 mês de evolução e
de agravamento súbito nas 48 horas
prévias ao internamento. Sem outros sinais de alarme ou outra sintomatologia
associada. Negava consumo de tabaco/
álcool/outras drogas de abuso, assim
como de medicamentos/suplementos
nutricionais. Antecedentes pessoais de
albuminúria 3+, não valorizada. Familiar falecido por IRC com inicio em idade pediátrica. À admissão no SU apresentava TA MSE=200/147mmHg (> P99
+ 5mmHg), sem diferencial entre os 4
membros. Glasgow 15, pupilas isocóricas e fotoreactivas, sem défices focais.
Edemas maleolares discretos, restante
exame objectivo sem alterações. Tanner
M2/P3. IMC <P5. Perante o diagnóstico
de emergência hipertensiva foi internada
para tratamento, investigação etiológica,
das repercussões nos órgãos-alvo e estratificação do risco cardiovascular. Esta
investigação revelou Síndrome nefrótico
com HTA estadio 2 secundários a GESF,
com insuficiência renal, retinopatia hipertensiva e cardiomiopatia hipertrófica
ligeiras. Pesquisa de mutação no gene
NPHS2 em curso. TA e função renal estáveis com IECA, ARA e Bloqueador dos
canais de cálcio bem como normalização do perfil lipídico com medidas dietéticas e Estatina.
Conclusão: A desvalorização da
albuminúria e dos antecedentes familiares associados à ausência de pesquisa
prévia de um valor tensional, levaram a
um atraso no diagnóstico desta criança.
Os autores alertam para a importância
de uma anamnese cuidada e reafirmam
a pertinência da avaliação de rotina da
tensão arterial na medida em que a detecção em tempo útil de HTA subclínica
pode reduzir a morbilidade e a mortalidade inerentes a formas de HTA graves em
idade pediátrica.
DERRAMES PLEURAIS
PARAPNEUMÓNICOS COMPLICADOS
– AVALIAÇÃO DE UM PROTOCOLO
DE ABORDAGEM COM ALTEPLASE
INTRA-PLEURAL
Vasco Lavrador1, João Moreira-Pinto2,3,
Joana Pereira2, Berta Bonet2, Fátima
Carvalho2, Lurdes Morais1, Ana Ramos1,
Virgílio Senra1
CHPorto, UHMPia
Serviço de Cirurgia Pediátrica, CHP,
UHMPia
3
Domínio Ciências Cirúrgicas, IICVS, UMinho
1
2
Enquadramento: A incidência dos
derrames parapneumónicos complicados
tem vindo a aumentar nas últimas décadas. Embora a sua abordagem permaneça controversa, a instilação de agentes
fibrinolíticos intra-pleurais tem demonstrado resultados equivalentes aos métodos cirúrgicos.
Objectivos: O presente estudo tem
por objectivo avaliar os resultados do
protocolo de utilização de alteplase intrapleural implementado em 2005 no Hospital Maria Pia.
Material e métodos: Estudo retrospectivo dos doentes internados com diagnóstico de derrame pleural parapneumónico complicado submetidos a colocação
de dreno torácico e instilação intrapleural
de alteplase entre Janeiro de 2005 e Dezembro de 2009.
Resultados: Foram identificados
21 doentes, 11 do sexo masculino, com
idade média de 64 meses (16 – 197). À
admissão apresentavam doença com
evolução média de 6.1 dias e 81.0% já
tinham iniciado antibioterapia, 58.8%
dos quais em regime de internamento.
Na abordagem inicial, a radiografia de
tórax era compatível com derrame pleural em 95.2% dos casos, confirmado por
ecografia torácica em 90.5%; o derrame
apresentava septação em 81.0% dos
doentes.
Após colocação de dreno torácico
todos os doentes iniciaram instilação de
fibrinolítico, com 95.2% a completar os
três dias de tratamento preconizados.
O tempo de drenagem torácica foi de 6
dias (3 – 9) verificando-se, como complicações, pneumotórax (3) e enfisema
subcutâneo (1). Houve necessidade de
resumo das comunicações orais
S 214
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
recolocação do dreno em quatro doentes.
Não houve complicações major associadas à instilação de fibrinolítico.
A antibioterapia mais frequentemente instituída à admissão foi cefuroxima
(14.3%) e a associação de ceftriaxone e
clindamicina (14.3%), tendo sido alterada
em 6 doentes por resposta clínica desfavorável. A duração média da antibioterapia endovenosa foi de 18 dias (9-28).
O agente etiológico foi identificado
em 33.3% dos casos: S. pneumoniae (4),
S. beta-hemolítico (1), M. tuberculosis (1)
e S. aureus (1).
Apenas um doente necessitou de
admissão em unidade de cuidados intensivos sob ventilação não invasiva; um
doente teve alta contra parecer médico e
verificou-se um reinternamento mas sem
recidiva do derrame. Nenhum doente necessitou de toracoscopia ou toractomia
e não se registaram óbitos na amostra
avaliada.
Conclusão: A utilização precoce
protocolada de alteplase na abordagem
da pneumonia complicada por derrame
pleural demonstrou ser um método eficaz, sem complicações major associadas
ou necessidade de abordagem cirúrgica
posterior.
ASMA NA ADOLESCÊNCIA:
PERCEPÇÃO DO IMPACTO
NAS FUTURAS ESCOLHAS
PROFISSIONAIS
Gisela Silva1, Eva R. Gomes2
1
2
S. Pediatria Médica, CHPorto
S. Imunoalergologia Pediátrica, CHPorto
Introdução: A asma brônquica é
uma das doenças crónicas mais prevalentes na adolescência. Os jovens asmáticos devem saber que a sua condição
pode sofrer agravamento por exposição
profissional a alergénios ou irritantes e,
portanto, deve ser tida em conta aquando
da escolha profissional.
Objectivos: Avaliar o conhecimento
de uma amostra de adolescentes asmáticos sobre o potencial risco para a asma
de algumas escolhas profissionais e analisar a sua percepção sobre a limitação
de escolhas imposta pela doença. Analisar o controlo da doença e correlação
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
entre os resultados dos 2 instrumentos
utilizados.
Material e métodos: Amostra de 25
adolescentes seguidos em consulta de
Imunoalergologia Pediátrica com diagnóstico de asma brônquica. Foram aplicados questionários para avaliação de
possíveis escolhas profissionais, conhecimento dos riscos de exposição profissional e recolha de dados para avaliação
do controlo da asma através do questionário CARAT 10.
Resultados: A idade média foi de
15,68 anos (14-18) e 52% eram do sexo
masculino. Todos os doentes tinham um
bom controlo da doença com valores
iguais ou superiores a 16 no questionário CARAT 10. 60% dos doentes conseguiu identificar ocupações profissionais
que poderiam causar um agravamento
da sua patologia, mas a maior parte não
considera a sua condição de asmático
um factor importante a ter em conta nos
seus possíveis planos profissionais. Os
rapazes parecem ser mais conhecedores da eventual influência da asma na
escolha profissional com 10 dos 16 doentes do sexo masculino a considerar
que a asma pode afectar a sua escolha,
enquanto apenas 5 dos 12 do sexo feminino manifesta esta preocupação.
64% da amostra referiu que a possível
influência da doença na escolha profissional já foi discutida em família e 40%
com amigos. Só 36% referiu ter abordado esse assunto com profissionais de
sáude, nomeadamente o seu médico
assistente.
Conclusão: Todos os doentes asmáticos avaliados estavam bem controlados. Apesar do reduzido tamanho
da amostra, verificámos que o conhecimento dos possíveis condicionalismos
que esta patologia acarreta em termos
de escolhas profissionais e os riscos associados a certas ocupações não está
optimizado sendo esta uma vertente a
melhorar no acompanhamento dos jovens asmáticos.
FENÓMENO DE RAYNAUD EM IDADE
PEDIÁTRICA
Mónica Tavares1, Ana Novo1, Helena
Sofia1, Ivone Silva2, Isabel Almeida3,
Margarida Guedes1
CHPorto, UHMPia
Serviço de Cirurgia Vascular, CHPorto
3
Serviço de Medicina Interna, CHPorto
1
2
Introdução: O fenómeno de Raynaud (FR), caracterizado por alterações
da cor das extremidades, de palidez a
cianose e eritema, tem uma prevalência
que varia na idade adulta entre os 3 e os
20%. Em idade pediátrica, os estudos são
limitados. A presença de FR em crianças
com menos de 12 anos ou em rapazes
parece estar mais associado à forma secundária, implicando exclusão de doença
do tecido conjuntivo. A capilaroscopia é
um exame fundamental nestes doentes
uma vez que a presença de alterações
capilaroscopicas sugere a presença de
uma doença reumática subjacente.
Objectivo: Caracterização do fenómeno de Raynaud nas crianças e adolescentes orientadas para o Centro Hospitalar do Porto – Hospital de Santo António,
de 01/01/2000 a 31/08/2010.
Métodos: Estudo retrospectivo dos
processos clínicos das crianças e adolescentes orientadas por Fenómeno de Raynaud. Avaliação da história clínica, duração dos sintomas, idade, história familiar,
pesquisa de anticorpos antinucleares e
capilaroscopia. Critérios de inclusão: menores que 18 anos à data de referenciação, com FR como motivo de consulta.
Critérios de exclusão: jovens com idade
superior a 18 anos ou que apresentavam
outro motivo de referenciação.
Resultados: Foram seleccionados
60 processos clínicos que cumpriam os
critérios de inclusão. Idade média de aparecimento dos sintomas 12,6 anos, actualmente com uma média de idades de
16,3 anos, sendo 72% do sexo feminino.
Mais de metade (53%) destas crianças
ou jovens encontrava-se em seguimento
em consulta de Reumatologia Pediátrica, quatro em Medicina Interna, 18 em
Cirurgia Vascular e seis nas outras sub-especialidades pediátricas. Todas as
crianças apresentavam fenómeno de
Raynaud, associada em 31,7% dos casos
a eritema pérnio, 26,7% com edema das
mãos e a mesma percentagem com dor
ao nível das articulações inter-falângicas
proximais, 21,7% com acrocianose, 10%
com alterações tróficas das polpas ungueais e 8,3% apresentavam hipersudorese.
Oitenta e oito por cento referiam o frio
como factor agravante, sendo que 50%
referiam ter sintomas apenas no Inverno.
Em 15% dos casos havia história familiar positiva de Fenómeno de Raynaud
e 23,3% tinham história familiar positiva
para doenças do tecido conjuntivo. Os anticorpos anti-nucleares foram pesquisados
em 58 doentes (97%), sendo positivos em
15,5%: 1:160 (4); 1: 320 (1); 1: 640 (4). A
capilaroscopia foi efectuada em 40 (67%)
casos, tendo 30 (75%) alterações ligeiras
(tortuosidade dos capilares, alargamento
segmentar), três (7,5%) alterações significativas com megacapilares, áreas de
hemorragias, áreas avasculares/padrão
esclerodérmico e sete (17,5%) sido considerados normais. Destes quarenta doentes com estudo completo, quatro (10%)
foram considerados com FR secundário,
diagnosticando-se dois casos de Esclerodermia Sistémica Juvenil, um caso de provável doença mista do tecido conjuntivo e
um outro caso em caracterização.
Conclusão: O FR pode ocorrer em
idade pediátrica e, tal como nos adultos,
é na maioria dos casos um FR primário. A
positividade dos anticorpos antinucleares
e as alterações na capilaroscopia foram,
neste estudo, factores preditivos de FR
secundário, estando de acordo com o referido na literatura.
ANEMIA NUM PEQUENO LACTENTE
Emília Costa1, Judite Marques2, Manuela
Ferreira2, Esmeralda Cleto1, Inês
Freitas1, José Barbot1
1
2
Unidade Hematologia Pediátrica, CHPorto
Serviço Pediatria, CHNordeste, UHBragança
Introdução: Uma anemia num pequeno lactente coloca questões diagnosticas que são exclusivas desta faixa
etária. Causas relacionadas com a interacção recente entre as circulações materna e fetal devem ser ponderadas para
além de outras de natureza adquirida/
hereditária.
resumo das comunicações orais
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
S 215
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
Caso clínico: Os autores apresentam o caso clínico de um lactente actualmente com 15 meses de idade, que surge aos 2 meses de vida com uma anemia
grave (Hb: 6,2g/dl) normocítica e normocromica. A anemia tinha um carácter arregenerativo (Retic: 19.000/mm3) apesar
de níveis de eritropoietina elevados. Clinicamente apresentava bom estado geral, sem dismorfias e com exame normal
à excepção de palidez cutâneo-mucosa.
Os diagnósticos diferenciais inicialmente evocados foram a eritroblastopenia transitória da infância e a anemia de
Blackfan-Diamond, sendo que a idade
da criança era mais compatível com o
segundo.
O aparecimento de neutropenia
significativa (valor mínimo de 490/mm3)
durante o internamento, e a visualização
de proeritroblastos gigantes na medula
óssea direccionaram o diagnóstico no
sentido de uma infecção por Parvovirus
B19. Este diagnóstico foi confirmado tanto serologicamente (IgM positiva) como
molecularmente (DNA viral com título
740000 UI/ml). A detecção de DNA do
Parvovirus B19 em sangue do cartão de
Guthrie apontou para uma infecção ocorrida durante o desenvolvimento fetal.
Do ponto de vista terapêutico, por
agravamento da anemia (Hb:5,9g/dl)
com aparecimento de sopro sistólico realizou transfusão de CE em D3 internamento (5ml/kg). Efectuou imunoglobulina G em D10 e D11 numa perspectiva
de contrariar a evolução da infecção
para cronicidade. A contagem de neutrófilos normalizou imediatamente após
a terapêutica e a reticulocitose verificou-se ao 10º dia de internamento. A situação evoluiu para uma normalização do
quadro hematológico. Aos 9 meses de
vida, embora ainda detectável, o DNA
viral era residual.
Conclusão: A descrição clássica de
infecção por Parvovirus B19 na vida intra-uterina permanece associada a hidropsia
fetal e abortamento. Existem, no entanto,
raras descrições de anemias congénitas
sem repercussão hemodinamica que mimetizam outras formas de anemia hipoplasica congénita colocando dificuldades
diagnosticas que podem condicionar o
tratamento e o seguimento.
IRIDA – UMA ENTIDADE CLÍNICA DE
DESCRIÇÃO E CARACTERIZAÇÃO
MOLECULAR RECENTES
Marco Pereira1, Emília Costa2,
Esmeralda Cleto2, Teresa Melo3, Inês
Freitas2, Graça Porto4, José Barbot2
1
2
3
4
Dep. da Mulher, da Criança e do Jovem,
ULSMatosinhos, HPHispano
U. Hematologia Pediátrica, CHPorto
Serviço de Hematologia, HSJoão
Dep. de Patologia e Imunologia Molecular,
ICBASalazar
Introdução: IRIDA (Iron-Refractory,
Iron-Defi-ciency Anemia) é uma entidade clínica de descrição e caracterização
molecular recentes que veio elucidar situações raras de anemia ferripriva, de
etiologia obscura e refractária à terapêutica com ferro oral e endovenoso. A sua
hereditariedade é autossómica recessiva
e a sua fisiopatologia caracteriza-se por
um excesso de hepcidina, resultado de
mutações no gene da matriptase-2 (TMPRSS6), seu regulador negativo.
Caso clínico: Apresentámos os
casos clínicos de duas crianças do sexo
feminino, primas em 2º grau. A primeira, actualmente com 17 anos, é seguida
em consulta desde os nove meses por
anemia moderada/grave (Hb: 7,3 g/dl),
microcítica e hipocrómica (MCV: 55,8fL,
MCH:12,9pg). Os parâmetros de ferro
eram de algum modo discrepantes. A
saturação da transferrina assim como o
doseamento da protoporfirina eritrocitária
livre e do receptor solúvel da transferrina
eram indicativos de eritropoiese ferripriva, enquanto que a ferritina sérica revelava um valor limiar. A terapêutica com
ferro endovenoso acentuava esta discrepância, na medida em que a ferritina
sérica subia para valores preocupantes
enquanto que os outros parâmetros permaneciam inalterados, com excepção da
hemoglobina que revelava ligeiro acréscimo (média de 1,3 g/dl). Com o decorrer
dos meses (média de 11,6 meses) estes
parâmetros regressavam aos valores iniciais.
A convicção de tratar-se de um erro
do metabolismo de carácter hereditário
foi reforçada quando, dez anos mais tarde, nos foi enviada a segunda criança, na
altura com treze meses de idade, e com
resumo das comunicações orais
S 216
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
um quadro clínico similar. Adicionalmente, a descrição da molécula de hepcidina
como principal reguladora humoral do
metabolismo de ferro, em meados da
presente década, sugeria que esse erro
do metabolismo fosse consequência do
seu excesso de produção.
O esclarecimento definitivo desta
situação só foi possível a partir de Abril
de 2008, data da primeira publicação
descrevendo esta entidade clínica, que
denominou de IRIDA.
Conclusão: As duas primas
revelaram-se homozigoticas para a mutação cDNA 1795 C>T no exon 15 do
gene TMPRSS6. Ambas apresentam
desenvolvimento normal e toleram razoavelmente bem a anemia, recebendo de
forma intermitente pequenas doses de
ferro endovenoso.
ANEMIA DE FANCONI: ACUIDADE
PARA O DIAGNÓSTICO
Patrícia Nascimento1, Emília Costa1,
íris Maia1, Cláudia Neto1, Beatriz Porto2,
José Barbot1
1
2
U. Hematologia, S. Pediatria, CHP, HMPia
Laboratório de Citogenética, ICBAS, UP
Introdução: A Anemia de Fanconi
(AF) foi durante muitos anos diagnosticada
com base na insuficiência medular e nas
malformações somáticas que permitiam
configurar um padrão característico. Actualmente sabe-se que apresenta grande
variabilidade fenotípica, podendo as manifestações hematológicas estar ausentes
durante vários anos. A Fanconi Anemia
Research Foundation (FARF) procurou
minorar o atraso no diagnóstico elaborando indicadores de suspeita, com base em
elementos clínicos e laboratoriais. Define
2 índices de suspeita, médio e alto, sendo
o estudo citogenético mandatório no secundo e de ponderar no primeiro.
Objectivos: Avaliar o percurso clínico prévio ao diagnóstico dos doentes
com AF e a evolução clínica posterior.
Métodos: Análise retrospectiva dos
processos das crianças com AF seguidos
na consulta de hematologia pediátrica
nos últimos 17 anos.
Resultados: Foram seguidas 17
crianças com mediana de idade ao diag-
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
nóstico de 6 anos. A maioria das crianças foi orientada de consultas de pediatria, tendo 12 sido previamente seguidas
por 2 especialidades e 10 submetidas a
cirurgias correctoras de anomalias fenotípicas. Duas foram orientadas para a
hematologia por suspeita clínica de AF,
4 foram-no por história familiar positiva
e os restantes por alterações hematológicas de 1 ou mais linhas celulares. De
acordo com os indicadores de suspeita
da FARF, 14/17 crianças apresentavam
elevado grau de suspeição, tendo indicação para avaliação citogenética para
AF desde os 1ºs dias de vida. Três crianças atingiram idade adulta e 3 faleceram
ainda em idade pediátrica (1 por complicação infecciosa após transplante de
medula óssea (TMO) e 2 por hemorragia
SNC), permanecendo actualmente em
seguimento 11. Destas, por pancitopenia grave foi instituída terapêutica em 4:
1 fez TMO e 3, por ausência de dador
compatível, iniciaram tratamento com
androgeneos. Os restantes 7 mantêm-se em vigilância.
Conclusões: A análise dos dados
permite concluir da baixa acuidade diagnóstica para esta patologia, suportando a
opinião de que é uma doença subdiagnosticada. Os autores consideram importante a divulgação da AF entre todas as
especialidades que com ela contactam
através das suas co-morbilidades, de
modo a atingir um diagnóstico cada vez
mais precoce, essencial para uma abordagem a longo prazo da insuficiência
medular, antecipando cuidados, e programando atitudes.
ANEMIA FERRIPRIVA REFRACTÁRIA
DE ETIOLOGIA OBSCURA EM IDADE
PEDIÁTRICA – NOVAS ABORDAGENS
TERAPÊUTICAS
N. Miguel1, E. Costa2, M. Binni2, R. Lima
3
, F. Pereira3, R. Vizcaíno4, J. Barbot2
S. Pediatria, CHTMAD, Unid. Vila Real
Unidade de Hematologia, CHPorto, HCMPia
3
S. Gastroenterologia, CHPorto, HCMPia
4
S. Anatomo-Patologia, CHPorto, HSAntónio
1
2
Objectivo: O objectivo do nosso
trabalho foi o de pesquisar patologia
não hemorrágica, outra que não a do-
ença Celíaca, interferindo na absorção
do ferro em doentes em idade pediátrica, com anemia ferropénica (AF) refractária ao ferro (Fe) oral e de etiologia
obscura.
Métodos: Em nove doentes com AF
refractária foi investigada, de forma não
invasiva, a Gastrite Atrófica Auto-imune
(GAAI) e a infecção a Helicobacter Pilory
(HP). Testes efectuados: gastrina sérica,
anticorpos anti-célula parietal gástrica,
teste respiratório c-urease e ou serolologia para HP.
Em segunda linha foi realizada
biopsia gástrica. As alterações anatomo-patológicas foram graduadas, de 0 a 3
(critérios de Sydney).
Resultados: Todos (n=9), apresentavam hipergastrinemia. Sete deles,
revelaram critérios serológicos de GAAI
(GAAI+). Destes sete, três eram GAAI+/
HP+ e quatro GAAI+ /HP-. Dois doentes
revelaram-se GAAI-/HP+.
Todos (n=9), apresentaram critérios
anatomo-patológicos de atrofia gástrica.
Em dois, (um GAAI-/HP+ e outro GAAI +
/HP-) associava-se metaplasia intestinal
na mucosa antral, revertida no primeiro,
com terapêutica tripla para erradicação
do HP. No segundo não foi efectuada terapêutica.
Todos mostraram resposta a terapêutica com Fe alternativo. Quatro com
Fe Ev e cinco com sulfato de glicina ferroso.
Conclusões: À luz dos novos desenvolvimentos da fisiopatologia da AF
refractária, torna-se mandatório o estudo
protocolado de patologia da absorção,
nomeadamente nos casos de etiologia
obscura. A hipergastrinemia constitui um
indicador indirecto de acloridria, resultado
de atrofia gástrica. A GAAI é reconhecida,
nos dias de hoje, como patologia podendo atingir grupos etários pediátricos. A
interferência do HP, na etiopatogenia da
GAAI e da AF refractaria é esclarecimento mais difícil.
ALTERAÇÕES HEMATOLÓGICAS E
ERROS INATOS DO METABOLISMO
Patrícia Nascimento1, Anabela
Bandeira1, Emília Costa2, José Barbot2,
Esmeralda Martins1
1
2
U. Metabolismo, S. Pediatria, CHP, HMPia
U. Hematologia, S. Pediatria, CHP, HMPia
Introdução: Uma grande variedade de erros inatos do metabolismo (EIM)
pode causar alterações hematológicas,
que podem atingir uma ou mais linhas
celulares ou determinar alterações na
coagulação. Os mecanismos subjacentes são variados podendo as alterações
hematológicas constituir a primeira pista
para o diagnóstico de um EIM.
Objectivos: Determinar a prevalência de alterações hematológicas nos
doentes com EIM; Caracterizar essas
alterações e comparar com os dados da
literatura; Estabelecer protocolo de seguimento hematológico destes doentes
Material e métodos: Estudo retrospectivo. Consulta do processo clínico de
todos os doentes com EIM seguidos na
consulta de doenças metabólicas, com
doença metabólica nas quais estão descritas alterações hematológicas associadas. Foram excluídas as crianças com
doença metabólica cuja manifestação é
puramente hematológica bem como as
crianças com alterações hematológicas
em contexto de doença aguda ou associadas a ingestão de fármacos.
Resultados: Foram identificados
71 doentes com susceptibilidade de ter
alteração hematológica pela doença metabólica de base, tendo sido detectada
alguma alteração em 28 deles (39,4%);
em 1 caso como primeira manifestação
da doença de base. As alterações da série rubra foram as mais frequentemente
identificadas: 9 crianças com anemia normocitica e normocromica, 5 com anemia
microcitica e hipocromica e 1 com anemia macrocitica. Quatro doentes apresentavam alterações da linha branca: 3
casos de neutropenia em doentes com
aciduria metilmalónica e 1 caso de linfopenia numa criança com aciduria propiónica. Foi detectada trombocitopenia
em 5 doentes e alterações no estudo da
coagulação em 4. O esfregaço de sangue
periférico mostrou alterações em 5 ca-
resumo das comunicações orais
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
S 217
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
sos, sendo que em 4 deles foi uma pista
importante para o diagnóstico da doença
metabólica de base.
Conclusões: Existem poucos dados relativos à incidência de alterações
hematológicas nos doentes com EIM. Na
nossa amostra cerca de 1/3 dos doentes
apresentavam algum tipo de alteração,
pelo que é importante estar atento para
esta co-morbilidade, que pode condicionar o prognóstico da doença de base.
HEMOGLOBINÚRIA PAROXÍSTICA AO
FRIO: QUANDO SUSPEITAR?
Catarina Matos1, Sandra Teixeira1,
Susana Lira1, Cristiana Ribeiro2, Emília
Costa3, José Barbot3
Serviço de Pediatria, CHTâmega e Sousa
Serviço de Pediatria, ULSAlto Minho
3
Serviço de Hematologia, CHPorto, HMPia
1
2
Introdução: A Hemoglobinúria
paroxística ao frio (HPF) é uma forma
rara de anemia hemolítica auto-imune.
Caracteriza-se por hemólise intravascular, anemia e hemoglobinúria, minutos
ou horas após exposição ao frio. A maioria dos episódios são auto-limitados e
associam-se a infecções viricas inespecíficas. O diagnóstico é confirmado pelo
Teste de Donath-Landsteiner.
Caso clínico: Criança, sexo masculino, 23 meses de idade, previamente
saudável, que recorre ao serviço de urgência em Dezembro/2009, com quadro
de icterícia, anoxeria e irritabilidade com
24 horas de evolução a que posteriormente se associou urina muito escura.
Referencia a infecção das vias respiratórias superiores. Sem história aparente
de exposição ao frio. Os exames complementares revelaram: hemoglobina- 6.9g/
dL, reticulócitos- 125.000/mm3, bilirru-
bina total- 2.7mg/dL (directa-0.6mg/dL),
AST-64U/L, ALT-18U/L, DHL- 2.290UI/L.
O esfregaço de sangue periférico não
apresentava alterações. A tira teste urinária era reactiva para hemoglobinúria/
hematúria apesar do sedimento urinário
não apresentar eritrocitúria. O teste anti-globulina directo era positivo, selectivamente para anticorpos monoespecíficos
anti-C3d. As serologias víricas foram negativas. O teste de Donath-Landsteiner
foi positivo confirmando a suspeita de
HPF. Foi internado em ambiente aquecido, e iniciou reforço hídrico com registo
da diurese. Constatou-se normalização
progressiva da hemoglobina e marcadores de hemólise. Teve alta com indicação
de evicção de frio.
Conclusão: Os autores pretendem
realçar a importância do reconhecimento desta patologia que passa pela identificação do carácter intravascular do
processo hemolítico. A tríade clássica
de hemólise estava presente. O aspecto fortemente colúrico da urina- “urina
cor coca-cola”- cuja causa se provou
ser hemoglobinúria e não hematúria e
a significativa elevação de DHL em contraste com o carácter ligeiro da hiperbilirrubinemia sugeriam um mecanismo de
hemólise intra-vascular. A elevação da
AST contrastando com uma normalidade da ALT reforçavam essa sugestão. O
teste de Coombs positivo sugeria uma
etiologia auto-imune e a sua positividade selectiva para anticorpos monoespecíficos C3d sugeria o diagnóstico de
HPF. O teste de Donath-Landsteiner, ao
demonstrar o carácter bifásico do anticorpo em causa, confirmou o diagnóstico. A evicção do frio e a fluidoterapia
foram atitudes suficientes para a que o
processo hemolítico resolve-se espontaneamente sem lesão renal.
resumo das comunicações orais
S 218
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
NEFRECTOMIA LAPAROSCÓPICA
RETROPERITONEAL EM CRIANÇAS:
ESTADO DA ARTE
João Moreira-Pinto1,3, Angélica Osório1,
Joana Pereira1, Carlos Enes1, João
Ribeiro de Castro1,2, Armando Reis2
Serviço de Cirurgia Pediátrica, CHPorto
Serviço de Urologia Pediátrica, CHPorto
3
Domínio Ciências Cirúrgicas, ICSV, UMinho
1
2
Introdução e objectivos: Em Portugal, a experiência em retroperitoneoscopia pediátrica é escassa. Os autores apresentam a primeira série portuguesa de
nefrectomias realizadas por esta via, em
crianças com idade inferior a nove anos, e
uma revisão da literatura sobre o tema.
Material e métodos: Análise retrospectiva dos processos das crianças
submetidas a nefrectomia laparoscópica
retroperitoneal (NLR), de Janeiro de 2009
e Dezembro de 2009, num Departamento
de Cirurgia Pediátrica. A revisão da literatura foi realizada através de uma pesquisa na base de dados Medline.
Resultados: Foram realizadas oito
NLR. A média de idades dos doentes operados foi 4,5 anos (mínimo = 11 meses,
máximo = 8,6 anos). As indicações cirúrgicas encontradas foram: quatro rins multiquísticos, três nefropatias de refluxo, uma
nefropatia obstructiva. Quatro NLR foram
realizadas à esquerda. O tempo cirúrgico
médio foi 99 minutos (mínimo = 50 minutos, máximo 180 minutos), notando-se um
encurtamento do mesmo à medida que
aumenta a experiência da equipa. Não
houve nenhuma conversão para lombotomia. A média de tempo de internamento
foi 1,5 dias (mínimo = 1 dia, máximo = 2
dias). Não se registaram complicações
intra-operatórias nem pós-operatórias.
Conclusão: A NLR é exequível em
crianças de idade inferior a nove anos e
deve ser considerado como tratamento
de eleição na idade pediátrica.
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
Resumo dos Posters
TRISSOMIA 12P PARCIAL:
A PROPÓSITO DE UM CASO
C. Candeias1, N. Oliva Teles1, M. Mota
Freitas1, M. P. Barradas2, M. L. Fonseca
e Silva1, H. Correia1
1
2
U. Citogenética, CGMJMagalhães,INSA, IP
U. Pediatria, HSLuzia
Introdução: A trissomia 12p é uma
anomalia cromossómica rara com uma
frequência estimada de 1/50.000 nascimentos. Até à data foram descritos cerca
de 30 casos com diferentes duplicações
do braço curto deste cromossoma. A
trissomia 12p completa é rara, estando
publicados apenas doze casos desde a
descrição inicial do Síndrome da Trissomia 12p por Lechida e Lin em 1973 (Zumkeller et al, 2004).
Material e métodos: Os autores
apresentam o caso de uma criança de
3 anos de idade com dismorfias faciais
(bossas frontais, pavilhões auriculares
pequenos e baixos, palato acentuadamente em ogiva) e atraso de linguagem
tendo sido solicitado a realização de cariótipo. Realizaram-se culturas sincronizadas de linfócitos de sangue periférico e
bandeamento GTG, e estudos de Hibridação in situ por Fluorescência (FISH).
Resultados: A análise citogenética
convencional revelou um cromossoma
12 anormal com material adicional no
seu braço curto. A análise posterior por
FISH (pintura cromossómica e regiões
subteloméricas do cromossoma 12) permitiu concluir que todo o material era do
cromossoma 12, estabelecendo-se o cariótipo como:
46,XY,dup(12)(p11.2p13)dn.
Discussão: A maioria dos casos
descritos com trissomia 12p resulta de
translocações equilibradas num dos pro-
genitores, em que o fenótipo é influenciado pela ocorrência, em simultâneo, de
monossomia e trissomia parciais herdadas. O nosso caso é relevante, por ser
uma trissomia quase completa e pura, de
novo. Os autores salientam a importância da conjugação de uma alta resolução
de padrão de bandas a nível citogenético com uma descrição clínica detalhada,
para o estabelecimento de uma boa correlação genótipo/fenótipo.
“NÃO ERAM SÓ…DORES NOS PÉS”
Diana Baptista1, Joana Macedo1, Ana
Filipe Almeida1, Ana Luísa Lobo1,
Cláudia Neto1, Teresa Borges2, Carla
Meireles1
1
2
Serviço de Pediatria, CHAlto Ave
U. Endocrinologia Pediátrica, CHPorto
Introdução: A detecção e valorização das anomalias congénitas ditas “minor” são importantes não só porque podem constituir um ponto de partida para
a procura de anomalias mais graves, mas
também porque poderão desencadear um
papel importante na construção do padrão
característico de um síndrome dismórfico.
Caso clínico: Os autores apresentam o caso clínico de uma criança de 7
anos, do sexo feminino, fruto de gestação
vigiada, sem intercorrências; filha de pais
jovens, saudáveis e não consanguíneos
que apresenta um crescimento ponderal no P90 e crescimento estatural <P5.
Recorreu ao Serviço de Urgência por
quadro de poliartralgias migratórias com
envolvimento das grandes e pequenas
articulações (ombro, joelhos e metacarpofalângicas) com resolução espontânea
e sem sinais inflamatórios associados.
Duas semanas antes esteve medicada
com antibiótico para amigdalite aguda.
Ao exame objectivo apresentava
obesidade, baixa estatura desproporcionada, fácies peculiar, pálpebras rasgadas,
pescoço curto, palato ogival, sindactilia
dos 2ºs e 3ºs dedos dos pés, encurtamento do 4º dedo do pé direito, estádio de Tanner I, discreto edema do dorso dos pés e
dor à mobilização activa das articulações
do punho e MCF’s bilaterais. Por incapacidade na marcha foi decidido o internamento para investigação.
Realizou hemograma com VS (37
mm/1ª), análise bioquímica e estudo imunológico sem alterações; TASO e FR normais e ANA e ANCAS negativos. As serologias efectuadas revelaram infecção aguda
por Mycoplasma pneumoniae. No segundo
dia de internamento ficou assintomática.
Efectuado Rx do esqueleto (“encurvamento isolado do 4º metatarsiano
à direita…epífises em cone nas falanges proximais dos 2ºs, 3ºs e 4ºs metatarsianos bilaterais”); Rx da idade óssea
(TW3), que revelou IO de 6 anos e 11 meses para uma IC de 7 anos e 11 meses
e função tiroideia (normal). O cariótipo
de sangue periférico revelou uma delecção no braço longo do cromossoma X:
46,X,del(X)(q13.1).
Posto o diagnóstico de S. de Turner,
procedeu-se ao rastreio das malformações associadas: ecocardiograma (sem
alterações) e ecografia renopélvica (“útero de configuração neonatal e ovários de
dimensões normais), tendo sido orientada
para consulta de Endocrinologia Pediátrica, estando actualmente sob terapêutica
com Hormona de crescimento.
Conclusão: Este caso é apresentado
como exemplo de uma criança cujas características dismórficas não foram valorizadas
até à idade escolar; este diagnóstico possui
implicações futuras no seu crescimento e
desenvolvimento biopsicosocial.
resumo dos posters
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
S 219
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
SÍNDROME DE BECWITH-WIEDEMANN APRESENTANDO-SE COM ENCERRAMENTO
TARDIO DA PAREDE ABDOMINAL
E INVAGINAÇÃO INTESTINAL
NEONATAL
Joana Pereira1, João Moreira-Pinto1,
Angélica Osorio1, Carlos Enes1, Maria do
Céu Mota1
1
CHPorto, HMPia
Introdução: Apresentamos o caso
extremamente raro de um recém-nascido
do sexo masculino com Síndrome de
Becwith-Wiedemann
manifestando-se
com encerramento tardio da parede abdominal e invaginação intestinal neonatal
Caso clínico: Trata-se de um
recém-nascido de 38 semanas de gestação, com peso ao nascer de 3720 g.
A ecografia pré-natal realizada as 12
semanas revelou onfalocelo, tendo-se
verificado encerramento espontâneo do
mesmo em ecografia subsequente realizada às 15 semanas. Não foi identificado
polihidrâmnios no decorrer da gestação.
Os índices Apgar foram 9,10,10 aos 1,5
e 10 minutos.
Após o início da alimentação o
recém-nascido apresentou vários episódios de vómitos, inicialmente alimentares
e posteriormente biliares. Foi efectuada
radiografia abdominal simples que revelou
sinais de obstrução intestinal alta. O doente foi transferido para o nosso hospital
e submetido a laparotomia de emergência
na qual foi identificada invaginação jejunal.
Foi efectuada enterectomia segmentar e
anastomose jejuno-jejunal primária.
No período pós-operatório alguns
achados físicos subtis tornaram-se proeminentes, nomeadamente a presença de
um hemangioma plano da região frontal,
indentações da helix posterior, um facies
característico e macroglossia. O diagnóstico de Sindroma de Beckwith-Wiedemann
foi considerado e exames suplementares
requisitados. O ecocardiograma revelou
foramen oval patente com um pequeno
shunt E-D e a ecografia abdominal revelou hiperplasia renal. O estudo genético
mostrou hipometilação da região DMR2
(KCNQ10T1) do cromossoma 11p15,
consistente com o diagnostico de Sindroma de Beckwith-Wiedemann.
Conclusão: Efectuámos uma revisão da literatura, não se encontrando
nenhum relato de invaginação intestinal
num doente com Sindroma de Beckwith-Wiedemann, nem de encerramento espontâneo de onfalocelo no mesmo caso,
pelo que consideramos que este é o primeiro caso relatado de ambos.
SÍNDROME DE NIJMEGEN E
ANOMALIA CROMOSSÓMICA
COMPLEXA RARA:
CARACTERIZAÇÃO DE UMA
DELECÇÃO INTERSTICIAL 6Q23
POR TÉCNICAS DE CITOGENÉTICA
MOLECULAR (CGH)
Natália Oliva Teles1, Bárbara Marques1,
Joaquim Aguiar1, Maximina Pinto1, José
Barbot2, Laura Marques2, Hildeberto
Correia1, Ana Fortuna1
1
2
CGMJMagalhães, DG - INSA, IP
CHPorto, HMPia
Introdução: As anomalias cromossómicas que envolvem translocações
aparentemente equilibradas podem ser
actualmente estudadas ou investigadas
por técnicas moleculares, nomeadamente por técnicas de Comparative Genomic
Hybridization (CGH), para exclusão de
delecções ou duplicações de dimensões
submicroscópicas, particularmente nos
casos em que o fenótipo é variável e
apresenta uma anomalia cromossómica
pouco comum.
Caso clínico: Os autores apresentam um caso de uma adolescente de 15
anos com atraso mental ligeiro a moderado (IQ 58), dismorfias faciais com microcefalia, estrabismo e microftalmia, surdez
neurosensorial, infecções respiratórias
recorrentes, imunodeficiência, anemia
hemolítica e problemas ortopédicos. Em
1999, perante a suspeita clínica de síndrome de Síndrome de Nijmegen (NBS),
foram realizados estudos para quebras
cromossómicas e para o gene da nibrina, que foram negativos. Os estudos cromossómicos então realizados revelaram
uma anomalia estrutural complexa e rara,
composta por três translocações aparentemente equilibradas envolvendo três
pares de cromossomas, das quais uma
tinha origem paterna t(2;13)pat e duas
resumo dos posters
S 220
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
eram de novo t(6;10) e t(7;11). Os estudos de citogenética molecular por CGH
realizados em 2010 permitiram detectar
uma delecção intersticial no cromossoma
6, em 6q23.1-6q23.3.
Discussão e conclusões: Os autores apresentam este caso raro, não
só pela clínica como pela anomalia em
si. A utilização de técnicas de citogenética molecular é da máxima importância
para este tipo de investigações em doentes com características fenotípicas pouco específicas, especialmente quando
apresentam rearranjos cromossómicos
de novo. Apesar da negatividade do estudo das quebras cromossómicas, assim
como do resultado molecular para o gene
da nibrina, pode afirmar-se que estamos
perante um diagnóstico clínico de NBS. A
doente tem actualmente 27 anos de idade e tem tido o acompanhamento clínico
adequado, consoante os problemas que
tem vindo a desenvolver.
SÍNDROME DE SMITH-MAGENIS:
CARACTERIZAÇÃO DE DOIS CASOS
POR TÉCNICAS DE CITOGENÉTICA
CLÁSSICA E MOLECULAR
Carla Valongo1, Isabel Marques1,
Manuela Mota Freitas1, Natália Oliva
Teles1, Joana Ribeiro1, Joaquim Aguiar1,
Jorge Pinto Basto1, Gabriela Soares1,
Hildeberto Correia1, Maria da Luz
Fonseca e Silva
1
CGMJMagalhães, DG- INSA, IP
Introdução: O Síndrome de Smith-Magenis (SMS; OMIM#182290,*607642),
que apresenta uma prevalência de 1:15
000-25 000, é uma anomalia complexa
caracterizada por atraso mental, moderado a profundo, dismorfia craniofacial
e alterações de comportamento características, incluindo auto-agressividade. Os
indivíduos afectados apresentam uma
delecção intersticial no braço curto do
cromossoma 17, na banda 17p11.2, nem
sempre detectada pelas técnicas de citogenética clássica. Nas delecções sub-microscópicas, o diagnóstico só pode
ser feito por técnicas de citogenética molecular (FISH).
Caso clínico: Os autores descrevem duas doentes do sexo feminino, com
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
5 e 20 anos, que apresentam atraso de
desenvolvimento psico-motor e dismorfia
facial; na criança foi ainda referida uma
baixa estatura. Em ambos os casos, os
estudos cromossómicos revelaram uma
delecção intersticial no cromossoma 17,
na banda 17p11.2, e foram concordantes
com os resultados obtidos pela técnica
de citogenética molecular (FISH).
Discussão e conclusões: Os autores apresentam estes casos, evidenciando o facto de, devido a não se observarem habitualmente malformações major,
a sobrevida ser alargada à fase adulta; a
grande diferença na idade de diagnóstico destes casos pode ser justificada pela
grande variabilidade nas características
fenotípicas que caracteriza este síndrome. Salienta-se ainda a vantagem de
uma boa colaboração entre o médico e
o laboratório, no estudo de casos como
estes, em que é fundamental uma informação clínica detalhada combinada com
testes citogenéticos adequados.
LEISHMANIOSE VISCERAL – UM
CASO CLÍNICO
Liliana Franco1, Alexandra Costa1,
Eduarda Sousa1
1
Serviço Pediatria, CHLOcidental, HSFXavier
Introdução: A Leishmaniose visceral é uma doença causada por protozoários do género Leishmania, endémica
e com declaração obrigatória em Portugal. Anualmente registam-se cerca de
15 novos casos a nível nacional, com
maior prevalência nos países em desenvolvimento. O seu período de incubação
é variável, assim como o quadro clínico-laboratorial. O diagnóstico é confirmado
pela identificação do agente no exame
directo e cultural da medula óssea. Na
ausência de tratamento a mortalidade da
doença pode atingir 90%.
Caso clínico: Criança de 2 anos,
sexo feminino, com antecedentes familiares e pessoais irrelevantes, com quadro
de febre, astenia e diarreia com três semanas de evolução. No exame objectivo
salientava-se palidez cutânea, hepatomegália (4cm abaixo do rebordo costal
direito) e esplenomegália (8cm abaixo
do rebordo costal esquerdo). Analitica-
mente a destacar anemia (Hb 7,9 g/dl),
trombocitopénia (121x109/L plaquetas),
hipoalbuminémia (3,0 g/dl) e hipergamaglobulinémia (22,3 g/L). Os testes serológicos para Leishmania foram positivos
(titulação 1:16), tendo sido obtido o diagnóstico definitivo após identificação do
parasita no mielograma. Iniciou tratamento com antimoniato de meglumina, com
boa evolução.
Conclusão: Perante um quadro
de febre prolongada na criança, o diagnóstico nem sempre é fácil. A hipótese
diagnóstica de Leishmaniose visceral é
frequentemente “esquecida” nos países
desenvolvidos. Trata-se de uma doença
curável mas com elevada taxa de mortalidade se não tratada atempadamente. A
apresentação deste caso visa realçar dados característicos, como a hepatoesplenomegália e a hipergamaglobulinémia,
que devem levar à suspeição da doença.
PROCURAR UM DIAGNÓSTICO,
OPTIMIZAR CUIDADOS
Joana Macedo1, Manuela Santos2,
Esmeralda Martins3, Fernando Pereira4,
Armandina Silva1
Serviço Pediatria, CHAlto Ave
Neuropediatria, CHPorto
3
Doenças Metabólicas, CHPorto
4
Gastroenterologia, CHPorto
1
2
As crianças com patologias crónicas graves, com múltiplas dependências,
necessitam de hospitalizações prolongadas e recorrentes que interferem com a
organização e estabilidade das famílias.
Embora existam programas de apoio domiciliário, os cuidados continuados em
ambulatório deparam-se com muitas dificuldades.
Apresenta-se o caso clínico de uma
criança do sexo masculino, 1ºfilho de pais
jovens e não consanguíneos, actualmente com 34 meses de idade. Esteve internado desde o nascimento até 22 meses
de vida por hipotonia generalizada e múltiplas dependências. Com necessidade
de ventilação assistida por traqueostomia
e alimentação enteral por gastrostomia.
Apesar dos múltiplos exames auxiliares
de diagnóstico efectuados e das avaliações sucessivas por diversas especia-
lidades, ainda não foi possível obter o
diagnóstico definitivo desta criança. De
salientar que a procura exaustiva deste
diagnóstico é de especial interesse, dada
a importância de um aconselhamento genético nesta família.
Após um processo longo, que envolveu uma equipa multidisciplinar e cooperação entre instituições, procedeu-se
à transição entre o hospital e o domicílio,
mantendo o suporte ventilatório e nutricional. As dificuldades deparadas com a
continuidade destes cuidados no domicílio prolongaram, para além do desejável,
o tempo de internamento.
Este caso demonstra a necessidade
de uma equipa multidisciplinar e cooperação interinstitucional, a fim de proporcionar todo o suporte e apoios adequados à
criança e à família.
ERUPÇÃO VARICELIFORME DE
KAPOSI
Conceição Costa1, Tiago Torres2, Susana
Machado2, Manuela Selores2
1
2
Serviço de Pediatria, CHTS, HPAmérico
Serviço de Dermatologia, CHP, HSAntónio
Introdução: Erupção variceliforme
de Kaposi ou eczema herpético é uma
infecção viral potencialmente fatal, que
surge em pacientes com patologia dermatológica prévia. A vasta maioria dos
casos é causada por vírus Herpes simplex e ocorre concomitantemente com
dermatite atópica.
Reportamos o caso de uma adolescente de 14 anos, com antecedentes
de dermatite atópica, que apresentava
uma erupção vesicular extensa na face
e pescoço com 3 dias de evolução. Analiticamente destacavam-se apenas uma
PCR elevada e e ligeira leucocitose. O
diagnóstico de erupção variceliforme de
Kaposi (eczema herpético) foi feito com
base na clínica, PCR do conteúdo da vesícula (DNA de VHS1) e teste de tzanck
compatível com infecção por vírus herpes. A paciente respondeu adequadamente ao tratamento com aciclovir oral
sem complicações.
Caso clínico: Erupção variceliforme
de Kaposi é uma condição rara, variando
a sua gravidade de doença transitória
resumo dos posters
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
S 221
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
leve a patologia potencialmente fatal com
atingimento multiorgânico. A mortalidade
é de 1 a 9%, sendo que antes do aparecimento de drogas antivirais eficazes esta
atingia taxas de 75%. O tratamento antiviral é muito eficaz e deve ser instituído
sem demora.
Em crianças com dermatite atópica
que apresentem uma erupção vesicular,
é altamente suspeito o diagnóstico de
Erupção variceliforme de Kaposi.
PARALISIA FACIAL CONGÉNITA NÃO
TRAUMÁTICA – CASO CLÍNICO
Cláudia Melo1, Rita Santos Silva1, Ana
Novo1, Janine Coelho1, Cecília Martins1,
Sónia Carvalho1
1
Serviço de Pediatria, CHMA, UFamalicão
Introdução: A paralisia facial congénita (PFC) ocorre em 0,25 a 6,5% dos
recém-nascidos, sendo que 90% dos
casos se devem a traumatismo durante
o parto. A PFC não traumática pode ter
etiologia inflamatória/infecciosa ou, mais
raramente, dever-se a defeitos do desenvolvimento do nervo facial. O diagnóstico
da PFC é clínico, havendo uma variabilidade de apresentações, desde a perda
completa de função até uma discreta assimetria do terço inferior da face. A recuperação, integral ou parcial, habitualmente é a regra, no entanto, a situação pode
ser permanente, principalmente quando
a PFC está associada a defeitos do desenvolvimento.
Caso clínico: Criança do sexo
masculino, referenciada aos 3 anos à
consulta de Pediatria pelo médico assistente por apresentar, desde o nascimento, desvio da comissura labial para
a esquerda. Antecedentes perinatais
irrelevantes, tendo sido uma gestação
de termo, sem intercorrências, parto por
cesariana sem complicações, com somatometria ao nascimento adequada à
idade gestacional. Sem história pessoal
de doenças neurológicas, otológicas ou
traumatismos e cirurgias faciais. Evolução estaturo-ponderal e desenvolvimento
psico-motor adequados. Antecedentes
familiares irrelevantes. Ao exame objectivo apresentava assimetria facial com
desvio da comissura labial para a esquer-
da, diminuição da prega nasolabial direita
e encerramento incompleto da pálpebra
direita, não havendo noção temporal de
melhoria ou agravamento clínico. Restante exame objectivo sem alterações.
Realizou estudo analítico, serologia para
o vírus Herpes simplex, ecocardiograma
e ecografia abdominal que não revelaram alterações. A ressonância magnética
(RM) encefálica evidenciou acentuada
atrofia ponto-mesencefálica direita e do
nervo facial direito, relacionada com malformação vascular identificada a esse
nível. Avaliação inicial por Otorrinolaringologia sem alterações. A criança foi
orientada para Consultas de Neurologia
Pediátrica, Neurocirurgia, Fisiatria e Oftalmologia.
Conclusão: Apesar do diagnóstico de PFC ser um diagnóstico clínico, a
RM encefálica assume um papel fulcral
no estudo de paralisias persistentes. Os
autores apresentam um caso de PFC
que tem como etiologia uma malformação vascular com efeito de sequestro do
suprimento arterial do nervo facial, que é
uma causa rara de paralisia deste nervo.
Está indicado o tratamento de suporte,
sendo a opção de tratamento cirúrgico
controversa.
OSTEOMIELITE INFECCIOSA EM
IDADE PEDIÁTRICA:
ÚLTIMOS 20 ANOS
Teresa Almeida Campos1, Ricardo São
Simão2, Herculano Nascimento2, Gilberto
Costa2,3
Serviço de Pediatria, HSJoão
Serviço de Ortopedia, HSJoão
3
Faculdade de Medicina da UPorto
1
2
Introdução: A osteomielite é um
processo infeccioso do osso que, nas
crianças, deriva principalmente da disseminação hematogénea. A bactéria mais
comummente implicada é o Staphylococcus aureus (> 50%). Em mais de 80% dos
casos estão atingidas as metáfises férteis
dos ossos longos, preferencialmente as
dos membros inferiores. As manifestações clínicas mais comuns são: limitação
da mobilidade, febre, dor e sinais inflamatórios locais. Nas crianças mais pequenas, a infecção propaga-se facilmente,
resumo dos posters
S 222
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
podendo atingir os tecidos adjacentes.
O tratamento implica uso prolongado de
antibióticos e, por vezes, cirurgia.
Objectivo e Métodos: Estudo descritivo retrospectivo que tem por objectivo
caracterizar a população infantil internada por osteomielite infecciosa nos últimos
20 anos.
Resultados: Foram incluídos 26
doentes, 16 (61,5%) com idade igual ou
inferior a 3 anos (10 no primeiro ano de
vida). Não se verificou predominância
quanto ao sexo. A duração média dos
sintomas foi de 4,6 (+ 4,2) dias, embora alguns tivessem uma evolução mais
insidiosa. A manifestação clínica mais
frequente foi a dor (77%), seguida da febre (57%). A pseudoparésia e os sinais
inflamatórios ocorreram em metade dos
doentes. Constatou-se atingimento preferencial dos ossos longos do membro
inferior (predominância da tíbia - 38,5%).
Em 31% dos casos havia história de traumatismo prévio e, destes, salientam-se
dois casos de osteomielite do calcâneo
aparentemente relacionados com a manobra de punção do calcanhar para a realização do rastreio metabólico precoce.
O agente microbiológico mais comum foi
o Staphylococcus aureus (50%). As alterações radiográficas só estavam patentes
em metade dos doentes, o que motivou o
recurso a outros exames. Foram efectuados múltiplos esquemas de antibioterapia, com uma duração média de 20,8 (+
10,7) dias, dos quais 16,5 (+ 5,6) por via
endovenosa. A cirurgia foi necessária em
cerca de um terço dos doentes e metade
destes já no decorrer do tratamento antibacteriano.
Conclusão: Nos últimos vinte anos,
não se verificou significativa variação no
número de casos e nas medidas de diagnóstico e terapêutica. A nossa população
apresentou um elevado número de eventos traumáticos a preceder a infecção.
Por outro lado, a duração média de três
semanas de tratamento antimicrobiano,
sem aumento do número de complicações, sugere que esquemas de tratamento mais curtos do que os actualmente recomendados possam ser suficientes.
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
GASTROENTERITE AGUDA POR
SALMONELLA: PORTADOR ATÉ
QUANDO?
Maria Inês Monteiro1, Cristina Rocha1,
Lúcia Gomes1, Miguel Costa1
1
Serviço de Pediatria, CHEDV, HSSebastião
Introdução: A Salmonella é um patogénio bacteriano da maior importância
para a saúde humana e para a economia.
A gastroenterite aguda representa a salmonelose mais frequente.
Objectivos: Caracterizar uma
amostra de doentes com gastroenterite
aguda por Salmonella seguidos em consulta num hospital distrital e conhecer a
duração do estado de portador assintomático.
Material e métodos: Efectuou-se
um estudo retrospectivo, dos processos
clínicos de 70 doentes (33 sexo feminino, 37 sexo masculino), enviados para
consulta de Patologia Digestiva Infantil
do Hospital de Oliveira de Azeméis, por
terem apresentado episódio de urgência/
internamento com o diagnóstico de gastroenterite aguda (GEA) por Salmonella.
Foram avaliados os seguintes parâmetros: sexo, idade, tempo entre o início
dos sintomas e procura de cuidados de
saúde, tipo e duração da sintomatologia,
dias de internamento, coproculturas efectuadas, tempo de portador assintomático,
terapêutica efectuada e estirpe de Salmonella isolada.
Resultados: Verificou-se que a idade média de aquisição de infecção por
Salmonella foi aos 68 meses (5 anos e
meio). O tempo médio de doença/sintomatolgia até ao doente recorrer ao serviço de saúde foi de 52 horas, enquanto
que o tempo médio de duração total dos
sintomas foi de 6 dias e meio. A duração
do internamento em média, foi de 3 dias.
Relativamente às estirpes de Salmonella
isoladas, a Salmonella Enteritidis foi a
mais prevalente (47,1% dos casos), seguida da Salmonella grupo d. No total foram identificados 9 tipos diferentes desta
bactéria. O tempo de portador assintomático foi 2,75 meses (mínimo 1 mês, máximo 13 meses).
Conclusão: A Salmonella assume
um impacto económico na saúde, nomeadamente em dias de internamento
hospitalar e estudos analíticos efectuados. Medidas de higienização, métodos
de preparação e avaliação de qualidade
dos alimentos, prevenção do contágio e
educação pública estão na base da diminuição da infecção. O perigo do portador
assintomático e o seu papel na propagação de doença devem ser reforçados e
mais esclarecidos, daí a importância do
seguimento destes doentes, podendo
assim prevenir-se novos casos. É de realçar a média encontrada de 3 meses de
portador assintomático (podendo este intervalo de tempo prolongar-se para além
do ano). A etiologia da infecção pode ser
identificada uma vez tratar-se de uma doença de transmissão através de alimentos ou água contaminados, contacto com
pessoas doentes, portadores assintomáticos, ou reptéis infectados.
STREPTOCOCCUS PNEUMONIAE –
REALIDADE ÚLTIMOS 3 ANOS NO
CHAA
Joana Macedo1, Ana Filipe Almeida2,
Diana Baptista1, Cláudia Neto1, Cristina
Ferreira1, Paula Mota3
Serviço Pediatria, CHAlto Ave
Serviço Pediatria, Hospital São João
3
Serviço de Patologia Clínica, CHAlto Ave
1
2
Introdução: O Streptococcus pneumoniae é um agente etiológico com particular pertinência na faixa etária pediátrica,
sendo a causa mais frequente de bacteriémia no período pós-neonatal. Infecções
do tracto respiratório superior (otite média,
rino-sinusite) ou doença invasiva (pneumonia, bacteriémia, meningite), perfazem
o espectro infeccioso do agente referido. A
OMS estima em cerca de 1 a 2 milhões de
óbitos anuais, que ocorrem em crianças
com idade menor que 5 anos. A doença
pneumocócica mantém um forte impacto
na saúde pública pelo aumento crescente de estirpes resistentes à penicilina e a
outros antibióticos. As progressivas modificações na imunização universal com a
vacina conjugada, contribuiu para modificar a epidemiologia do agente infeccioso,
reduzindo o número de portadores e a
prevalência da infeccção.
Objectivos: 1-Analisar os casos
clínicos do CHAA, onde houve isolamen-
to de S.pneumoniae, no triénio 2008 a
2010; 2-Caracterizar epidemiologicamente os casos de infecção pneumocócica
comprovada; 3-Relacionar quadro clínico, antecedentes, vacinação, tratamento
e evolução caso; 4-Comparar resultados
actuais com estudo retrospectivo anterior; 5-Demonstrar a continuidade da
relevância clínica do Pneumococo como
agente primordial na morbi/mortalidade
em Pediatria.
Material e métodos: 1-Estudo retrospectivo; 2-Análise dos processos clínicos, onde houve isolamento do Pneumococo em amostra biológica, no período
de Janeiro de 2008 até Outubro 2010.
Resultados: Foram analisados um
total de 17 casos clínicos, com isolamento de S.pneumoniae em 2 amostras de
liquor, 14 hemoculturas e 1 exsudado auricular. A média etária foi de 4 anos com
predomínio do sexo masculino. O pico de
frequência de infecções pneumocócicas
ocorreu no Verão de 2008, Primavera de
2009 e Inverno de 2010. A maioria das
crianças apresentou um quadro clínico
de Pneumonia, não complicada, com período de internamento médio de 7 dias.
13% crianças foram transferidas com
gravidade clínica para outra instituição,
não havendo registo de óbitos.
Conclusão: Em comparação com
estudo retrospectivo realizado na mesma
instituição, com objectivos semelhantes,
objectiva-se uma redução efectiva do número casos totais. Novamente ficou em
realce a pertinência do Pneumococo na
faixa etária pediátrica, mostrando a necessidade de haver uma actualização
constante sobre o conhecimento deste
agente e das suas repercussões.
TUFO PILOSO CERVICAL ISOLADO –
QUE SIGNIFICADO?
Marta Nascimento1, Eliana Oliveira1,
Filipa V. Espada1, Maria Manuel Lopes1,
Rui Almeida1
1
S. Pediatria, ULSMatosinhos, HPHispano
Introdução: A hipertricose caracteriza-se por crescimento excessivo de
pêlo (terminal, velo ou lanugo) em áreas corporais predominantemente não
androgénio-dependentes.
resumo dos posters
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
S 223
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
A hipertricose primária classifica-se
como congénita ou adquirida, dependendo da idade de aparecimento e, localizada ou generalizada, de acordo com a sua
extensão. Estão descritas quatro formas
de hipertricose primária congénita localizada: hipertricose cubiti, cervical anterior, cervical posterior e lombossagrada.
Trata-se de uma entidade rara e cuja
etiologia permanece desconhecida.
Caso clínico: Criança de 9 anos, do
género masculino, seguida na Consulta
Externa por perturbação específica da
linguagem, apresentando também miopia e escoliose dorsal. Dos restantes antecedentes pessoais, salienta-se apenas
pielonefrite aguda ao mês de vida com
estudo morfofuncional renal normal. Nos
antecedentes familiares realça-se epilepsia e défice intelectual maternos e história de alcoolismo paterno, não existindo
consanguinidade parental ou hipertricose
familiar. Ao exame objectivo, apresenta
múltiplos pêlos terminais na região cervical anterior (superiormente à proeminência laríngea) e escoliose dorsal, sem outras alterações no restante exame físico.
Sem história de traumatismo, inflamação
crónica ou aplicação de corticosteróides
tópicos no local.
Conclusão: O presente caso corresponde a uma hipertricose cervical
anterior, ocorrendo de forma aparentemente esporádica, ao contrário do encontrado nos poucos casos descritos (na
sua maioria de transmissão autossómica
dominante).
A sua associação com outras alterações patológicas como desordens esqueléticas ou défice intelectual apontam para
um carácter eminentemente sindromático
e sublinham a importância do seu reconhecimento.
O tratamento da hipertricose visa
um fim estético podendo ser realizada
depilação temporal ou definitiva por meio
de múltiplos métodos (depilação física/
química ou laser).
Palavras-chave: hipertricose cervical anterior; hipertricose primária localizada.
TESTE DE SUOR - EXPERIÊNCIA DO
SERVIÇO DE PEDIATRIA DO CHP-HSA
J. Magalhães1, L. Pinho1, T. Correia1,
C. Rocha1, M. J. Reis2, F. Teixeira1, M.
Guedes1, M. G. Reis1
1
CHPorto, HMPia
2
Serviço de Química Clínica, CHPorto
Introdução: A fibrose cística é uma
doença genética multissistémica frequente em caucasianos. Na suspeita clínica, o
teste de suor com determinação da concentração de cloretos é essencial para o
diagnóstico, cumprindo exigências técnicas
definidas. A avaliação da condutância do
suor pelo sistema Macroduct/Wescor® é
aceite como rastreio. No Serviço de Pediatria do Hospital de Santo António – Centro
Hospitalar do Porto utiliza-se este sistema
desde Setembro de 2003. Desde Novembro de 2006 é doseada a concentração de
cloretos no laboratório de química.
Objectivos: Avaliar resultados e
fiabilidade técnica dos testes efectuados entre Setembro de 2003 e Junho de
2010, comparando condutância e doseamento de cloretos, e caracterizar os doentes submetidos ao teste.
Métodos: Análise da ficha de registo do teste e resultados laboratoriais.
Resultados: Realizados 399 testes a 318 indivíduos. 59,4% são do sexo
masculino. Têm idades entre 23 dias e
74,4 anos, sendo 82,4% menores de 18
anos. Em 55% dos testes de crianças, o
motivo de realização foi broncospasmo,
em 1/5 associado a má evolução ponderal. O motivo foi má evolução ponderal
em 15%, sendo menos frequentes bronquectasias, tosse crónica, pansinusite,
diarreia e prolapso rectal.
Em 5,26% das amostras não foi possível a avaliação da condutância, o que
diminuiu com aquisição de experiência.
Esta foi determinada em 375 testes, com
valor superior a 90mmol/L em 13 testes
a 9 indivíduos, tendo em 5 sido excluído
o diagnóstico pelo valor de cloretos. De
acordo com o recomendado no equipamento, considerou-se 70mmol/L o limite
superior do normal, e nos indivíduos com
valores superiores foi repetido o teste e
determinada a concentração de cloretos
e/ou perfil genético.
resumo dos posters
S 224
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
Desde Novembro de 2006 foi feito
doseamento de cloretos em 180 testes.
Houve 8 testes positivos de 5 indivíduos,
2 dos quais crianças, irmãos, com mutações identificadas. Nos testes com valor
acima de 40mmol/L foi feita repetição e/
ou estudo genético.
Os valores de condutância e cloretos são significativamente diferentes, com
boa correlação linear, tal como esperado.
Classificando os valores em normal, limite ou alterado, vemos que com condutância abaixo de 50mmol/L todos os cloretos
são normais. Sendo até 70mmol/L, temos
4 doseamentos entre 40 e 60mmol/L.
Conclusão: Os resultados mostram
boa fiabilidade da técnica e apoiam o uso
da condutância como método de rastreio,
a confirmar por doseamento de cloretos
se superior a 50mmol/L, coincidindo com
as recomendações actuais.
O INIMIGO SILENCIOSO
Joana Amorim1, Rita Jorge1, Lúcia
Gomes1, Paulo Guimarães1
1
Serviço de Pediatria, CHEDVouga
Introdução: Os Acidentes Vasculares Cerebrais (AVC) em idade pediátrica
têm aumentado, devido à utilização de
métodos de neuroimagem mais sensíveis
e específicos e à maior sobrevivência de
doentes de risco, com incidência actual
de 3 a 8 por 100.000 crianças por ano.
As diferenças entre os adultos e
crianças dificultam muitas vezes o reconhecimento e tratamento desta situação.
Em 25% das crianças com AVC de tipo
embólico, as cardiopatias congénitas são
a causa.
Caso clínico: Criança do sexo masculino com 10 anos de idade, que recorreu
ao Serviço de Urgência (SU) após episódio de vertigem, com perda de força muscular dos membros inferiores (MI), predominantemente à esquerda, que motivou
queda para o lado homolateral, associada
a afasia e posteriormente a disartria. Sem
perda de consciência ou outros sintomas.
Dos antecedentes destacam-se insuficiência mitral e tricúspide e coartação
da aorta diagnosticadas aos 6 anos de
idade, com correcção cirúrgica desta última um ano depois.
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
Do exame físico à admissão no SU,
de referir pontuação de 15 na Escala de
Coma de Glasgow, assimetria da face,
com desvio da comissura labial para a
direita, ligeira ptose da pálpebra direita,
dificuldade de encerramento do olho direito e dificuldade na coordenação. Este
quadro clínico reverteu totalmente cerca
de 4 horas depois.
Foram efectuadas Tomografia Computorizada (TAC) Crânio-Encefálica (sem
alterações) e Angio-RMN cerebral onde
foram detectadas lesões isquémicas agudas fronto-opercular e lenticular posterior
direitas, com múltiplas lesões isquémicas
antigas.
Procedeu-se à transferência da
criança para um hospital central onde se
detectaram episódios de taquicardia não
sintomáticos, tendo realizado electrocardiograma (ritmo auricular ectópico com
frequentes extrassístoles juncionais) e
ecocardiograma (auriculas muito dilatadas, insuficiência mitral e aórtica mínimas, sem trombos intracardíacos).
Iniciou tratamento anticoagulante
com varfarina, estando actualmente assintomático e sem sequelas neurológicas.
Conclusão: Com este caso clínico
pretendemos salientar que apesar da
enorme extensão das lesões isquémicas,
a criança recuperou espontaneamente e
num curto período de tempo. Sendo assim, alertamos para a máxima importância da história clínica e do exame físico
que nos incitaram a investigar o caso,
apesar das alterações ao exame físico
terem sido transitórias e da TAC Crânio-Encefálica não revelar alterações.
HEMORRAGIA SUPRA-RENAL
BILATERAL NO RECÉM-NASCIDO UM ACHADO OCASIONAL...
Janine Coelho1, Ana Novo1, Cecília
Martins1, Clara Vieira1, Soraia Tomé1,
Isilda Fernandes1, Susana Gama de
Sousa1
1
S. Pediatria, CHMA, V. N. de Famalicão
Introdução: A hemorragia supra-renal (HSR) é a uma entidade relativamente comum no recém-nascido. Ocorre
mais frequentemente à direita sendo em
10% dos casos bilateral. Associa-se a
parto traumático, hipóxia, sépsis, coagulopatia ou tumor. A apresentação clínica
varia desde o estado assintomático, sendo o diagnóstico um achado ocasional,
a quadro clínico exuberante manifestado por choque, anemia, distensão abdominal. Mais raramente manifesta-se
por insuficiência adrenal. Na HSR não
complicada o tratamento é conservador,
uma vez que esta condição é geralmente
auto-limitada.
Caso clínico: Recém-nascido do
sexo masculino, internado na Unidade Neonatologia aos 3 dias de vida por
suspeita de sépsis e icterícia. Gestação
sem intercorrências, parto eutócico às 39
semanas, índice de apgar 9/10 e somatometria adequada à idade gestacional.
Ao exame objectivo, a destacar discreta hipotonia global e icterícia da pele e
mucosas. Analiticamente apresentava
hemograma, glicose, função renal e ionograma normais, sedimento urinário com
28 leucócitos/campo, PCR de 7.88 mg/
dl e bilirrubina total de 22.74 mg/dl. Por
suspeita inicial de infecção urinária realizou ecografia abdominal e renovesical
onde apresentava glândula supra-renal
com imagem cística complexa de 3.6 cm
à direita e imagem cística simples de 3,9
cm à esquerda. Realizada Ressonância
Magnética com contraste que confirmou
tratar-se de HSR bilateral. A hemocultura, urocultura, exame bacteriológico LCR
foram estéreis. O doseamento da ACTH,
renina e aldosterona estava elevado. O
cortisol sérico, a pesquisa de catecolaminas urinárias e o estudo da coagulação foram normais. Cumpriu 10 dias de
antibioticoterapia e 3 dias de fototerapia. O recém-nascido manteve-se sempre assintomático com evolução clínica
favorável.A ecografia abdominal após um
mês da alta hospitalar revelou diminuição
do tamanho das glândulas supra-renais
que apresentam aspecto heterogéneo
compatível com alterações sequelares.
Conclusão: Os autores apresentam um caso de HSR bilateral que surge
como achado ecográfico em contexto de
sépsis clínica. A insuficiência supra-renal,
apesar de rara, terá sempre de ser considerada nos casos de HSR bilateral, o
que poderá levar a um diagnóstico precoce e aumento da sobrevida. Os autores
salientam a necessidade de seguimento
ecográfico, que permite o diagnóstico diferencial de HSR com outras patologias,
nomeadamente o neuroblastoma, possibilitando uma atitude expectante.
PSIQUIÁTRICO, ADITIVO OU
ORGÂNICO: UM DESAFIO NOS
ADOLESCENTES
Maria Inês Monteiro1, Hans Peter
Grebe2, Augusto C Ferreira2, Lúcia
Gomes1, Miguel Costa1
1
2
S. Pediatria, CHEDVouga, HSSebastião
S. Neurologia, CHEDVouga, HSSebastião
Introdução: Adolescentes com alterações do comportamento são um problema crescente na Pediatria. Intoxicação,
drogas e outros comportamentos aditivos
estão no topo de lista do diagnóstico diferencial nesta faixa etária. Poderá isto
bloquear um pensamento clínico completo? O diagnóstico diferencial é o grande
desafio, devendo manter-se o alerta para
todas as hipóteses.
Caso clínico: Adolescente de 16
anos, saudável. Admitido no SU com
quadro de poucas horas de evolução
de apatia, desorientação, parestesias
no membro inferior direito, trémulo dos
membros superiores, noção de alteração
da personalidade, desajuste comportamental e défice de concentração. Sem
história de trauma, consumos de drogas/
álcool ou intoxicação medicamentosa,
referencia apenas infecção respiratória
ligeira e auto-limitada das vias aéreas
superiores, na semana anterior. No SU o
exame neurológico demonstrava um doente vigil, confuso, com aparente afasia
sensitiva, que iniciou quadro alucinatório, com desadequação comportamental,
verborreia e agressividade, semelhante a
episódio psicótico, tendo sido necessária
a administração de diazepam e haloperidol. Exame motor e sensorial normal,
sem sinais meníngeos, apirético, TA e
glicemia normal. Rx tórax, TAC-CE e
RMN cerebral normais. O EEG na admissão demonstrou disfunção do hemisfério
esquerdo. Excluiu-se etiologia tóxica ou
psiquiátrica, e os tóxicos na urina foram
ausentes. LCR com 198 células/ul, predomínio de mononucleares, proteinorraquia
resumo dos posters
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
S 225
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
e glicorraquia normais. Iniciou terapêutica empírica com aciclovir e ceftriaxone. O
líquor revelou-se amicrobiano, antigénios
capsulares e virulogia negativos e PCR
para M.Pneumonia positiva. O doente
melhorou e o estado confusional teve total regressão. EEG de controlo com características normais.
Conclusão: O M. Pneumonia é
um patogénio respiratório, com complicações extra-pulmonares raras, sendo as centrais as mais frequentes. A
patogénese destas manifestações é
desconhecida, o que dificulta a atitude
terapêutica. O prognóstico da doença
é variável, uma vez que a encefalite é
uma condição aguda complexa potencialmente devastadora. Este caso realça
a dificuldade de avaliação/observação e
de vigilância de adolescentes com desajustes comportamentais semelhantes
aos adultos na unidade de OBS/SU - Pediatria. Como gerir estas unidades, no
sentido de evitar o choque de gerações
agora existente na Pediatria, o contraste de patologias, e tão simplesmente a
quebra da tranquilidade nestes locais, é
um novo desafio.
“INTENSIDADES” PEDIÁTRICAS ...
A PROPÓSITO DO SINDROMA DE
EDWARDS
Ana Filipe Almeida1, Joana Macedo1,
Carla Meireles1, Cláudia Neto1, Maria
José Costeira2, Ana Luísa Lobo1
1
2
Serviço de Pediatria, CHAlto Ave
Unidade de Neonatologia, CHAlto Ave
Introdução: A trissomia 18 ou Síndroma de Edwards é a segunda trissomia mais frequente entre os nados-vivos.
Cursa com prognóstico muito reservado:
95% dos casos são inviáveis e a sobrevida média é de 14,5 dias. Caracteriza-se por atraso grave do crescimento e do
desenvolvimento, malformações crânio-faciais, esqueléticas, cardio-pulmonares,
gastrointestinais e genitourinárias. Os
cuidados médicos são de suporte, tendo como objectivo último o bem-estar da
criança. É fundamental envolver os pais,
através de informação esclarecida, nas
implicações e prognóstico da doença,
neste aproximar do fim da vida.
Caso clínico: Recém-nascida de
termo, fruto de gestação vigiada, com
diagnóstico pré-natal de artéria umbilical única e restrição de crescimento
intra-uterino (RCIU) às 30 semanas.
Nascida por cesariana electiva, com necessidade de oxigenação por Ambu®,
por apresentar bradicardia e apneia. A
persistência do quadro clínico implicou
a admissão na Unidade de Cuidados
Intensivos Neonatais com os diagnósticos de RCIU, baixo peso ao nascimento, dismorfia facial (microftalmia, fendas
oblíquas, epicanto; baixa implantação
do cabelo e das orelhas, microrrectrognatia e achatamento da base nasal), hipotonia global, clinodactilia dos
segundos dedos das mãos, polegares
e hálux em mola, pectus escavatum e
fosseta sagrada. O estudo efectuado
mostrou cariótipo com 47XX, + 18. Ecocardiograma com comunicação interauricular e interventricular, persistência do
canal arterial e foramen oval, pelo que
foi instituída terapêutica diurética. Por
apresentar convulsões iniciou fenobarbital. Alimentada através de sonda nasogástrica por débil reflexo de sucção,
aguardando estabilização clínica para
colocação de gastrostomia.
O quadro clínico agravou-se com
insuficiência cardíaca (fracção de ejecção de 35% e hipertensão pulmonar) e
descompensação da epilepsia (convulsões frequentes e refractárias à terapêutica). Efectuada opimização terapêutica
previamente instituída, sem resposta
favorável. Iniciadas então medidas de
suporte e conforto com oxigenoterapia,
analgesia e aspiração secreções. Faleceu 4 horas depois, em quarto particular,
junto dos pais.
Conclusão: Quadros clínicos limitadores da vida impõe-nos a reflexão sobre
o sentido da nossa intervenção terapêutica que, como aqui, pode vestir uma intensidade paliativa, brindando a criança
e a sua família com um distintivo cuidar
humano. Exercita-se a boa prática médica, denega-se a obstinação e cumpre-se
o respeito pela vida.
resumo dos posters
S 226
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
SÍNDROME DE ALAGILLE: UMA
CAUSA DE COLESTASE NEONATAL E
CARDIOPATIA CONGÉNITA
Helena M. Silva1, Teresa Caldeira2,
Teresa Andrade2, Cristina Rocha2,
Ramon Vizcaíno3, Marília Loureiro1,
Ermelinda Santos Silva1
CHPorto, HCMPia
CHEDVouga, HSSebastião
3
CHPorto, HSAntónio
1
2
Introdução: A Síndrome de Alagille (SA) é uma síndrome multissistémica
complexa, rara, de transmissão AD, com
penetração fenotípica variável,envolvendo
o fácies (fronte proeminente, mento triangular), fígado (colestase, hipoplasia biliar
intrahepática), coração (estenose pulmonar, tetralogia de Fallot), olhos (embriotoxon posterior) e esqueleto (vértebras
em asa de borboleta). Tem morbilidade
importante, e uma taxa de mortalidade
de ~10%.
Caso clínico: Recém-nascido de
sexo feminino, gestação de termo, primeira filha de pais jovens, saudáveis, não
consanguíneos. Serologias maternas negativas. Parto eutócico hospitalar, Apgar
5´-10, somatometria AIG. Aleitamento materno exclusivo com boa tolerância. Internada em D2 por icterícia colestática (BD
2,65 mg/dl, GGT 612 UI/L). Fácies peculiar.
Saturação O2 (aa) = 98%. Sopro sistólico
grau III/VI audível em todo o précordio.
Sem organomegalias palpáveis. Exame
oftalmológico normal. Funções de síntese hepática preservadas. Marcadores de
infecção bacteriana e culturas de sangue
e urina negativos. Alfa-1-antitripsina sérica
normal. Ecocardiograma: estenose infundibular e da válvula pulmonar. Colestase
de agravamento progressivo (BD 9,55
mg/dl, GGT 1131 UI/L), com acolia fecal
a partir de D10. Iniciou tratamento com
ácido ursodesoxicólico e foi transferida
para o Hospital Maria Pia. Na admissão:
BT 12,15 mg/dl, BD 11,70 mg/dl, TGO 261
UI/L, TGP 180 UI/L, GGT 1008 UI/L. Ecografia abdominal: fígado de dimensões
normais e ecoestrutura homogénea, vesícula biliar de dimensões reduzidas; vias
biliares não dilatadas. Ecocardiograma: tetralogia de Fallot com prováveis colaterais
sistémico-pulmonares. Em D30,e dada a
persistência de acolia fecal, foi efectuada
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
colangiografia per-operatória que excluiu
o diagnóstico de atrésia das vias biliares
extrahepáticas (AVBEH), e confirmou a
presença de vesícula biliar atrófica e hipoplasia das vias biliares intrahepáticas.
A histologia hepática não mostrou critérios
de ductopenia. O estudo molecular viria
a revelar-se positivo para a mutação no
gene JAG1.
Conclusão: o caso descrito apresenta actualmente três critérios clínicos
major para SA: fácies peculiar, cardiopatia, e doença hepática. Apesar de a clínica ser muito sugestiva do diagnóstico, a
acolia fecal persistente nesta faixa etária
tornou obrigatória a exclusão da AVBEH
(que pode ocorrer em concomitância com
a SA). Salientamos o facto de antes dos
4-6 meses de idade a biópsia hepática
nem sempre demonstrar a ductopenia
característica. O estudo molecular permite confirmar o diagnóstico, e em 89% dos
casos é positivo para a mutação JAG1.
Resultados: Foi realizada SB em
85 doentes (38%masc; 62%fem). Exclusão de 35 casos por ausência de dados
com 3 recorrências nos restantes. GSP
foi A em 26 casos (55,3%); B em 15 casos (31,9%); C em 3 casos (6,4%) e D
noutros 3 casos (6,4%). A observação
médica realizou-se maioritariamente uma
semana após a cirurgia. Registaram-se
complicações pós-operatórias em 4 %
dos casos, as quais foram minor.
Conclusões: Os resultados obtidos foram essencialmente subjectivos
uma vez que não foi possível quantificar
exactamente o drooling pré e pós operatoriamente. No entanto, SB revelou ser
um procedimento fácil e seguro como demonstra a baixa taxa de complicações. É
ainda eficaz: apenas 3 recorrências com
87,2% dos casos com GSP A e B significando que, no mínimo, ocorreu uma
melhoria de 50% do drooling na grande
maioria dos casos.
DROOLING EM CRIANÇAS
NEUROLOGICAMENTE
COMPROMETIDAS
Angélica Osório1,João Moreira-Pinto1,
Joana Pereira1, Catarina Sousa1,
J. A. Ferreira de Sousa1, J. A. Cidade-Rodrigues1, Luísa Oliveira1
SÍNDROME DE ABSTINÊNCIA
NEONATAL – CASUÍSTICA DE UM
SERVIÇO DE PEDIATRIA DE UM
HOSPITAL DE NÍVEL III, DE 2007 A 2009
Liliana Franco1, Duarte Malveiro1,
Mónica Marçal1, Alexandra Costa1
1
1
S. Pediatria, HSFXavier, CHLOcidental
S. Cirurgia Pediátrica, CHPorto, HMPia
Objectivo: Avaliar a eficácia da
Submandibulectomia Bilateral (SB) quanto ao grau de satisfação dos pais (GSP),
complicações e recorrência do drooling
em crianças neurologicamente comprometidas (NC).
Métodos: Estudo retrospectivo incluindo todas as crianças NC e drooling
submetidas a SB no nosso Serviço (Janeiro 1996 - Novembro 2008). O GSP foi
avaliado em 4 classes: A: 100-75% de satisfação / ausência de drooling - drooling
infrequente, pequena quantidade; B: 75-50% de satisfação / drooling infrequente,
pequena quantidade - drooling ocasional,
intermitente todo o dia; C: 50-25% de satisfação / drooling ocasional, intermitente
todo o dia - drooling frequente, mas não
profuso; D: 25-0% de satisfação / drooling frequente, mas não profuso - drooling
constante, sempre molhado.
Introdução: A toxicodependência
é uma doença crónica que atinge cada
vez mais mulheres em idade fértil. A Síndrome de Abstinência Neonatal (SAN)
define-se como o quadro clínico que os
recém-nascidos (RN) manifestam ao
nascer, após terem sido expostos in utero
a diversas substâncias consumidas pela
mãe e se terem tornado dependentes.
Em Portugal, os dados sobre SAN
são insuficientes. Globalmente, estima-se que a incidência de recém-nascidos
expostos a drogas ilícitas seja de 3 a
50%, com taxas mais elevadas nos grandes centros urbanos.
Objectivos: Conhecer a prevalência de SAN num Hospital Central de Lisboa, e avaliar: regularidade da vigilância
das gestações, idade do RN aquando do
início do quadro, terapêutica utilizada e
duração do internamento no Serviço de
Pediatria.
Material e métodos: Revisão casuística dos casos de RN que desenvolveram SAN, internados no Serviço de Pediatria do referido hospital de 1 de Janeiro
de 2007 a 31 de Dezembro de 2009.
Resultados: No período estudado
registaram-se 13 casos de SAN, num total
de 8.879 RN no mesmo período (0,15%).
Quarenta e seis por cento das gestações
foram regularmente vigiadas. Associou-se a infecção pelo vírus da Hepatite B ou
C em 8 grávidas (62%). Em nenhum caso
houve infecção VIH associada.
Quando as mães consumiram heroína 3 dos RN (60%) apresentaram sintomas de privação nas primeiras 48 horas,
enquanto no caso de consumo de metadona 6 dos RN (75%) iniciaram sintomas
a partir das 72 horas de vida.
A metadona foi a principal substância utilizada no tratamento farmacológico
da SAN, em 7 dos RN (54%). Um dos RN
não necessitou de qualquer terapêutica
farmacológica. A média de dias de terapêutica foi de 31 dias (mediana de 25
dias), com um número médio de 35 dias
de internamento (mediana de 27 dias).
Conclusões: A vigilância da gravidez de mulheres toxicodependentes
está ainda muito aquém do que seria
desejável, sendo frequente a associação
com doenças infecciosas, nomeadamente Hepatite B e C. Após o nascimento, é
fundamental manter o RN sob vigilância,
pois a grande maioria desenvolve quadros de abstinência nos primeiros dias de
vida. Os períodos de internamento são
geralmente prolongados, com um impacto substancial na dinâmica dos Serviços.
HEPATITE COLESTÁTICA –
MANIFESTAÇÃO RARA DE UMA
DOENÇA COMUM
Sofia Ferreira1, Rita Jorge1, Lúcia
Gomes1, Miguel Costa1, Cristina Rocha1
1
S. Pediatria, CHEDVouga, HSSebastião
Introdução: A mononucleose infecciosa é comum em adolescentes, sendo
o vírus Epstein-Barr o agente etiológico
mais frequente. O espectro clínico é vasto, ocorrendo hepatite em até 92% dos
casos. A colestase é rara, e o seu mecanismo não está totalmente esclarecido.
resumo dos posters
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
S 227
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
Caso clínico: Adolescente de 16
anos, sexo feminino. Antecedentes pessoais e familiares irrelevantes.
Quadro clínico com 2 semanas de
evolução de febre, odinofagia, adenopatias, posteriormente associado a astenia,
rash cutâneo, icterícia, hipocolia e colúria. Clinicamente apresentava razoável
aspecto geral, icterícia, rash cutâneo,
exsudado amigdalino, adenopatias cervicais, hepatoesplenomegalia e ascite.
O estudo analítico inicial mostrou:
leucocitose com linfocitose (12% de linfócitos atípicos), trombocitopenia, hiperbilirrubinemia com predomínio de bilirrubina directa, elevação de AST, ALT, gama
GT, fosfatase alcalina e diminuição da
albumina. PCR e VS negativas. Estudo
da coagulação sem alterações.
A Ecografia abdominal revelou hepatoesplenomegalia homogénea, ascite
moderada e múltiplas adenopatias retroperitoneais, sem alterações vesiculares.
Foi colocada como 1ª hipótese mononucleose infecciosa, tendo sido consideradas como menos prováveis outras
etiologias infecciosas, autoimune (idade e sexo), défice de alfa-1-antitripsina
(AAT) e D. Wilson.
Internada para vigilância, fluidoterapia EV e suplementação com vitaminas
lipossolúveis. Evolução clínica e analítica
favorável com apirexia em D13 de internamento; anictérica sem colestase desde
D12. Alta em D14, mantendo ligeira hepatoesplenomegalia e enzimas hepáticas
em diminuição.
Os resultados analíticos confirmaram a 1ª hipótese evocada: Monoteste
positivo. Serologias EBV VCA IgM e IgG
positivas, EBNA IgG negativa. CMV IgG
e IgM positivas (IgM negativo 12 dias
depois). Serologias negativas para Toxoplasmose, HAV, HBV e HCV. Estudo imunológico, ceruloplasmina e AAT normais.
Após 5 meses de seguimento
mantém-se clínica e analiticamente bem.
Conclusão: O reconhecimento
desta apresentação rara de uma doença
comum e o diagnóstico serológico precoce, podem evitar uma investigação mais
invasiva e dispendiosa.
BETA TALASSEMIA MINOR
Patrícia Nascimento1, Emília Costa1,
Elisabete Machado1, José Barbot1
1 U. Hematologia, S. Pediatria, CHP, HMPia
Introdução: A beta talassemia é
uma doença hereditária caracterizada por
um comprometimento quantitativo das
cadeias beta da hemoglobina, resultando
em quadros clínicos de gravidade variável. Quando em heterozigotia- beta talassemia minor (BTM)- a taxa de síntese
das cadeias beta está apenas levemente
diminuída mas o suficiente para causar
discreto grau de anemia e sobretudo microcitose e hipocromia. Esta situação é
susceptível de diagnóstico incorrecto de
anemia ferripriva, com consequentes tratamentos não adequados.
Objectivos: Avaliar a acuidade
diagnóstica para a BTM.
Material e métodos: Estudo prospectivo dos casos de BTM referenciados
à consulta de hematologia pediátrica entre 1 Junho de 2003 a 30 de Junho de
2010.
Resultados: Foram incluídas 54
crianças, com idade média ao diagnóstico de 5,68 anos. Em 17 crianças (31,5%)
havia história familiar de BTM. Nas restantes 37 (68,5%) tratou-se do primeiro
diagnóstico na família. De referir que
dentro deste grupo em 24 casos (64,9%)
existia referência a familiares com anemia cujo diagnóstico era desconhecido. O
número de crianças enviadas por médico
de família ou por pediatra assistente foi
semelhante (17 e 21 respectivamente).
O intervalo médio entre o primeiro hemograma efectuado e a data do diagnóstico
foi de 2,17 anos, com um número médio
de hemogramas efectuado neste período
de 4,4. 27 (50%) foram submetidas a tratamento com ferro oral antes do diagnóstico e 9 (16.7%) apresentavam um valor
de ferritina superior a +2 desvios padrões
(DP) para a idade.
Conclusões: A evolução da acuidade diagnóstica para a BTM é de avaliação
difícil dado a ausência de estudos prévios.
No entanto, um intervalo médio de 2,17
anos entre a primeira observação de alterações hematológicas e a identificação
de BTM parece-nos ainda reflectir algum
défice de acuidade diagnóstica. Apesar
resumo dos posters
S 228
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
disso é nossa convicção que a BTM é,
nos dias de hoje, uma entidade cada vez
mais evocada no diagnóstico diferencial
de situações de microcitose/hipocromia.
O facto de 16,5% das crianças apresentarem doseamentos de ferritina sérica superior a +2DP para a idade poderá ter algum
significado. Teoricamente será legítimo
questionar se, a perpetuar-se a ausência
de diagnóstico, estas crianças poderiam
correr o risco de sobrecarga iatrogénica
de ferro a longo prazo.
SABER OUVIR QUEM NÃO SABE
COMUNICAR: A PROPÓSITO DE UM
CASO CLÍNICO
Mariana Pinto1, Joana Monteiro1,
Ana Luísa Pinto2, Arménia Oliveira1,
Lúcia Gomes1, Miguel Costa1, Virgínia
Monteiro1, Cristina Rocha1
1
2
S. Pediatria/Neonatologia, CHEDVouga,
HSSebastião
S. Psiquiatria, CHEDVouga, HSSebastião
Introdução: A maioria dos casos
de anemia em idade pediátrica são secundários ao défice de ferro. O regime
alimentar, crescimento/desenvolvimento,
doença crónica ou perda hemorrágica
são determinantes na sua etiologia. Nas
crianças portadoras de Perturbação do
Espectro Autista (PEA), as alterações de
comportamento e os hábitos alimentares
peculiares propiciam a sua ocorrência.
Por outro lado, as manifestações clínicas atípicas, decorrentes de alterações
no processamento sensorial e na resposta à dor podem interferir no diagnóstico.
Caso clínico: Adolescente, sexo
masculino, 13 anos, trazido ao SU por
cansaço, anorexia e dor abdominal difusa com uma semana de evolução. Sem
referência a vómitos, alterações do trânsito intestinal ou perdas hemáticas visíveis. O exame objectivo revelava palidez
cutâneo-mucosa, desconforto à palpação
epigástrica/periumbilical, com restante
exame normal.
Nos antecedentes salienta-se prematuridade (32 semanas), refluxo gastro-esofágico, anemia ferropénica nos primeiros meses de vida e diagnóstico de
PEA com défice cognitivo. Nos antecedentes sociofamiliares, era filho de mãe
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
adolescente com compromisso cognitivo, o que motivou institucionalização da
criança aos 4 meses e adopção em idade
escolar. Posteriormente surgiu informação de que o cansaço/adinamia teriam
uma evolução mais arrastada e que haveria uma perda de peso não quantificada nem valorizada até então.
Os exames efectuados demonstraram uma anemia (Hb 6,9g/dL) normocítica normocrómica, ferropenia e pesquisa de sangue oculto nas fezes positivo.
Realizou endoscopia digestiva alta que
revelou gastrite hemorrágica e erosões
duodenais. A biópsia gástrica confirmou
a presença de lesões de gastrite crónica
superficial, associadas a microorganismos de tipo Helicobacter pylori(Hp).
O adolescente permaneceu sempre
hemodinamicamente estável. Efectuou
tratamento com ferro, inibidor da bomba
de protões e antibioterapia, com evolução favorável.
Discussão: Apesar da história natural da infecção por Hp em idade pediátrica não estar totalmente esclarecida, a
evolução para gastrite crónica activa de
predomínio antral associada a anemia
ferropénica é frequente.
No adolescente em questão, a patologia pedopsiquiátrica de base pode ter
sido um agente facilitador na evolução da
doença, levando a um diagnóstico mais
tardio.
As patologias do foro gastroenterológico são frequentes nas crianças com
PEA, pelo que se torna necessário dar
mais atenção às suas manifestações clínicas, muitas vezes atípicas.
AVALIAÇÃO DO CONTROLO E
DA QUALIDADE DE VIDA EM
ADOLESCENTES ASMÁTICOS
Gisela Silva1, Mónica Tavares1, Leonor
Cunha2, Eva R. Gomes2, Helena Falcão2
1
2
S. Pediatria Médica, CHPorto
S. Imunoalergologia Pediátrica, CHPorto
Introdução: A asma é uma doença
crónica em que estão preconizados diversos instrumentos que permitem a sua
avaliação e que têm em consideração
não apenas a terapêutica, mas também a
percepção do próprio paciente.
Objectivo: Avaliação do grau de
controlo e qualidade de vida (QV) dos
adolescentes asmáticos numa amostra
de doentes seguidos na consulta de um
Hospital de Cuidados Terciários.
População e métodos: Aplicação
do questionário PAQLQ (S) (Questionário de qualidade de vida na asma pediátrica com actividades padronizadas) e
CARAT 10 (Teste de controlo da asma
e rinite alérgica) em adolescentes com
idade superior a 11 anos de idade com o
diagnóstico de asma, seguidos na Consulta de Imunoalergologia Pediátrica,
durante o período de 1 de Agosto a 15
de Outubro de 2010. O tratamento estatístico foi feito com aplicação do suporte
informático SPSS 16.0, considerando-se
um valor com significância estatística
Þ<0,05.
Resultados: Foram preenchidos
46 questionários (52,2% do sexo masculino). A média de idades dos doentes
foi de 14,61 (12-19 anos). A maioria dos
participantes têm formas persistentes
de asma (classificação GINA-78,3%
persistente ligeira e 10,9% persistente
moderada) e necessitam de medicação
crónica diária. A média total de pontuações no PAQLQ(S) foi de 6,26 com desvio padrão (DP) de 0,98, para um valor
máximo de 7. A média de pontuação
no domínio dos sintomas, actividades
e emoções do PAQLQ foi de 6,28; 5,8;
6,55 e DP de 1,06; 1,26 e 0,91, respectivamente. Por aplicação do CARAT 10
verificou-se que 64,7% (n=31) dos doentes se encontravam bem controlados
( =16 pontos) e em 32,6% da amostra
(n=15) o controlo da doença não estava
optimizado. No grupo dos doentes bem
controlados a média no PAQLQ(S) foi
de 6,54 e nos mal controlados de 5,05,
com diferença estatisticamente significativa (Þ=0,01,Teste Welsh). No grupo
de doentes com formas persistentes
moderadas 4/5 estão mal controlados
(Þ=0,02,Teste Qui-Quadrado) e a média
do PAQLQ(S) foi de 4,75 (Þ=0,02,Teste
One-way Anova).
Conclusões: A maioria dos doentes
têm asma controlada e não parece afectar a sua qualidade de vida. Contudo, os
que têm formas persistentes moderadas
apresentam pior controlo da doença e
pior qualidade de vida. Globalmente, o
domínio da QV mais afectado é o das
actividades. O uso destes questionários
na avaliação de adolescentes asmáticos
é muito útil e tem como vantagem a sua
rápida aplicação e interpretação.
AVALIAÇÃO DA MATURIDADE
INTELECTUAL DE CRIANÇAS NUM
CENTRO DE SAÚDE URBANO
Alexandre Fernandes1, Filipa Flor de
Lima1, Brígida Amaral1, Carla Rocha1,
Cristiana Couto1, Joana Rebelo1, Teresa
Campos1, Vanessa Mendonça1, Fátima
Pinto1
1
USACunha, URAP Pediatria, CSPOcidental
Introdução: A capacidade de perceber, abstrair e generalizar predominam
na actividade intelectual e a capacidade
de desenho da figura humana relaciona-se com o desenvolvimento cognitivo nas
crianças. À medida que as competências
cognitivas evoluem, a habilidade no desenho também progride com um aperfeiçoamento nos detalhes. O Teste do
Desenho da Figura Humana (TDFH) de
Goodenough é frequentemente utilizado
na avaliação cognitiva e do desenvolvimento infantil, tornando-se importante
na avaliação não verbal da maturidade
mental.
Objectivos: Avaliação da maturidade intelectual de crianças em idade pré-escolar.
Material e métodos: Estudo transversal realizado entre Maio e Agosto
de 2010 através da aplicação do TDFH
de Goodenough. Foram seleccionadas
aleatoriamente crianças nascidas entre
1 de Junho de 2005 e 30 de Junho de
2006, inscritas num Centro de Saúde
urbano. Foram analisados dados sócio-económico-demográficos (escala do
Censuses and Surveys), antecedentes
pessoais e familiares, desempenho no
TDFH. As crianças que apresentaram resultados inferiores à média ou com desenhos não classificáveis foram reavaliadas
com a escala Schedule of Growing Skills
II (SGS). A análise estatística foi efectuada através do programa SPSS® v.18
(teste qui-quadrado e teste exacto de Fisher), nível de significância 0,05.
resumo dos posters
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
S 229
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
Resultados: Foram contactadas
112 crianças e 62 (55.4%) foram incluídas no estudo. 35 (56,5%) eram do sexo
masculino, média de idades 55 meses
(±4,3). O valor de QI mediano foi de 113
(79-168). Cinco crianças (8%) obtiveram
resultado abaixo da média, 22 (35.5%)
médio e 33 (53.2%) superior à média.
Duas crianças (3,3%) realizaram um desenho não identificável. O QI foi menor
em crianças que apresentaram factores
de risco ambiental (p=0,032). Foram reavaliadas com SGS 7 crianças (11,3%):
3 apresentaram uma área de desempenho com 2 desvio-padrão (DP) abaixo do
esperado para a idade, 2 apresentaram
pelo menos uma área com 1 DP abaixo
do esperado para idade e 2 tiveram resultados normativos. As áreas com pior
desempenho foram a manipulação em 5
crianças (71.4%), cognição em 3 (42.9%)
e interacção social em 2 (28.6%).
Conclusões: A maioria apresentou
resultados médios no TDFH e 8% apresentaram resultados inferiores. Os autores salientam que o TDFH de Goodenough é um instrumento útil na avaliação da
maturidade intelectual das crianças que,
usado em combinação com outros testes
de rastreio, permite a avaliação do desenvolvimento cognitivo das crianças.
A CONSULTA DE GINECOLOGIA
PEDIÁTRICA E DA ADOLESCÊNCIA
NA MATERNIDADE JÚLIO DINIS
Inês Vaz1, Vânia Ferreira1, Sandra V.
Soares1, Eugénia Fernandes1, Teresa
Oliveira1, José Cidade Rodrigues2
1
2
S. Ginecologia e Obstetrícia, CHP, MJDinis
S. Cirurgia Pediátrica, CHPorto, HMPia
Introdução: A consulta de Ginecologia Pediátrica e da Adolescência (GPA)
iniciou-se na Maternidade de Júlio Dinis
(MJD) em Abril de 2007. Foi criada com
o objectivo de desenvolver uma área dedicada ao estudo da patologia ginecológica geral das crianças e adolescentes,
bem como acompanhar crianças com
malformações genitais, alterações do
desenvolvimento sexual ou doenças sistémicas com envolvimento ginecológico.
Esta é uma área médica multidisciplinar
que integra conhecimentos de diversas
especialidades como a pediatria, endocrinologia, ginecologia, cirurgia pediátrica, pedopsiquiatria, genética, entre
outras. Apresenta a particularidade de
ser realizada num espaço adaptado à
idade, com tempo de consulta apropriado e apoio de outras especialidades.
Conta actualmente com a colaboração
de duas médicas especialistas e uma
interna complementar de Ginecologia e
Obstetrícia. Inicialmente a consulta tinha
um carácter mensal (2 períodos de consulta/mês); actualmente tem uma periodicidade semanal (cerca de 7 períodos
de consulta/mês).
Objectivos: Reflexão sobre a actividade e casuística da Consulta de GPA
na MJD.
Material e métodos: Consulta dos
processos clínicos das doentes observadas na consulta de GPA
Resultados: Desde a sua implementação, foram realizadas 426 consultas de GPA na MJD, das quais 197
primeiras consultas. Foram observadas
doentes com idades compreendidas entre os 3 e os 26 anos. Noventa e seis
(49%) foram referenciadas por outras
consultas do Centro Hospitalar do Porto, nomeadamente da Pediatria, Endocrinologia e Cirurgia Pediátrica, 75
encaminhadas pelos Centros de Saúde
e 20 orientadas pelo Serviço de Urgência da MJD. Como motivos de consulta
destacam-se as hemorragias genitais,
tumefacções anexiais, vulvovaginites,
amenorreias, hiperandrogenismo, algias
pélvicas, distúrbios do desenvolvimento
sexual (intersexo) e malformações genitais congénitas.
Conclusões: A GPA é uma área da
ginecologia em franco desenvolvimento.
Apesar da sua implementação na MJD
ser recente e ainda pouco divulgada, os
casos clínicos observados justificam por
si só a sua existência. No futuro, julga-se
importante divulgar, organizar reuniões
de grupo, envolvendo diferentes especialidades do Centro Hospitalar do Porto,
e desenvolver competências formativas
nesta área da Ginecologia.
resumo dos posters
S 230
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
SÍNDROME DE TURNER - A VISÃO DO
GINECOLOGISTA
Vânia Ferreira1; Inês Vaz1; Eugénia
Fernandes1; Teresa Oliveira1
1
S. Ginecologia/Obstetrícia, CHP, MJDinis
Introdução: O Síndrome de Turner é
a anomalia cromossómica ligada ao sexo
mais frequente. A sua incidência é de cerca de 1:2500- 1:3000 recém-nascidos do
sexo feminino. A disgenesia gonadal é a
sua manifestação cardinal, consistindo os
ovários numa massa de tecido conjuntivo
(streak gonads). A insuficiência ovárica
prematura traduz-se habitualmente sob a
forma de amenorreia primária ou secundária, associada a infertilidade.
A ausência do desenvolvimento pubertário é uma das características mais
comuns e em cerca de 90% dos casos
é necessário instituir terapêutica hormonal de substituição (THS). Segundo a literatura, os regimes de THS devem ser
iniciados entre os 12-13 anos, em doses
progressivamente crescentes, preferencialmente administrados por via transdérmica, e mantidos até à menopausa.
O progestativo deverá ser iniciado um a
dois anos após a introdução dos estrogénios para minimizar o risco de hiperplasia
e de carcinoma do endométrio.
Caso clínico: Doente de 19 anos,
referenciada à consulta de Ginecologia
Pediátrica e da Adolescência da MJD
por menorragias e sintomatologia vaso-motora. Medicada com estroprogestativo oral desde os 13 anos (Drospirenona
3mg+Etinilestradiol 0,02mg).
Diagnóstico de Síndrome de Turner
(45,XO) aos 11 anos, no contexto de estudo de baixa estatura. Manteve vigilância no HMP em consultas de especialidade por múltiplas patologias associadas
ao síndrome.
Objectivamente, apresentava um
desenvolvimento pubertário e avaliação
estato-ponderal adequados à idade.
Analiticamente, ao 3º dia do ciclo,
apresentava elevação da FSH (14,3 UI/L)
e diminuição do estradiol (<5 UI/L). A densitometria óssea apresentava valores no
limite inferior da normalidade. Ecograficamente: útero de pequenas dimensões,
endométrio linear; ovário direito não visualizado; ovário esquerdo sem folículos.
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
Suspendeu estroprogestativo em
curso e iniciou estrogenoterapia transdérmica contínua (100mcg de 17 ß-estradiol/
dia) e progesterona micronizada (Progesterona 100mg) 10 dias por mês.
Na consulta de reavaliação referiu
melhoria sintomática.
Conclusões: O diagnóstico de Sindrome implica uma vigilância multidisciplinar da mulher nos seus vários estádios
de desenvolvimento.
Ao ginecologista compete a correcta
orientação clínica desde a infância à idade adulta, incluindo indução progressiva
da puberdade, abordagem sobre a função sexual e reprodutiva, aconselhamento pré-concepcional e acompanhamento
de eventual gravidez.
HIPERHIDROSE AXILAR E PALMAR
EM ADOLESCENTES
Angélica Osório1, João Moreira-Pinto1,
Joana Pereira1, Catarina Sousa1, J.A
Cidade-Rodrigues1, Fátima Carvalho1
1 S. Cirurgia Pediátrica, CHPorto, HMPia
Objectivo: A hiperhidrose axilar
e palmar (HAP) corresponde à sudorese excessiva das axilas e palmas das
mãos, em quantidades desmesuradamente maiores que as necessárias para
a normal termorregulação corporal. Afecta muitos adolescentes e a sua etiologia
ainda não foi totalmente esclarecida. A
simpaticectomia toracoscópica (ST) é
uma opção terapêutica com resultados
excelentes mas tem sido associada a
sudorese compensatória (SC). O objectivo do nosso estudo é a avaliação da
satisfação dos adolescentes e do grau
de hiperhidrose pré e pós-operatórios,
da SC e da morbilidade cirúrgica.
Material e métodos: Estudo prospectivo, incluindo 4 doentes (3?,1?;idade
média 17 anos), submetidos a ST bilateral T2-T4. A HAP foi avaliada recorrendo à “Hyperhidrosis Disease Severity
Scale”(HDSS-International Hyperhidrosis
Society®).
Resultados: Pré-operatoriamente,
todos os doentes tinham HDSS 4, todos
tinham de mudar o vestuário mais de 2
vezes/dia e todos consideraram que a
HAP interferia muito com a sua auto-
-estima. No 1ºdia pós-operatório, nenhum
apresentava HAP. Uma semana depois, 3
referiram SC no tórax/joelhos. Um doente
referiu SC gustatória. Na 1ª semana de
pós-operatório, HDSS subiu para 2 num
doente e para 1 nos outros três.
Aos 6 meses e ao 1ºano de pós-operatório, a SC diminuiu em todos
os doentes e a HDSS manteve-se no
mesmo valor que na 1ª semana de pós-operatório. Não se registaram quaisquer
complicações cirúrgicas.
Conlusões: A melhoria na HAP/satisfação dos doentes foi imediata, acentuada e mantida ao longo do tempo. Apesar
da pequena amostra de doentes, os nossos resultados enfatizam o facto de que a
HAP é uma condição dramática para os
adolescentes. Porém é facilmente tratada
e associa-se a uma SC bastante tolerável, devendo merecer mais atenção em
idade pediátrica.
LUXAÇÃO CONGÉNITA DO JOELHO:
UM CASO
Catarina Matos1, Sandra Pereira1,
Sara Domingues1, Rui Martins2, Júlio
Marinheiro2, Renata de Luca1
1
2
Serviço de Pediatria, CHTâmega e Sousa
Serviço de Ortopedia, CHTâmega e Sousa
Introdução: A Luxação Congénita
do Joelho (LCJ) é uma deformidade rara:
1-1.7/100 000 nascimentos. A sua incidência é de 1% da incidência da Luxação
Congénita da Anca (LCA). Surge mais
frequentemente no sexo feminino (2-3:1).
Descrita pela primeira vez por Chatelaine, em 1822, faz parte do grupo das
deformidades de hiperextensão do joelho
caracterizando-se por luxação anterior
da tíbia em relação ao fémur. Em 60%
dos casos associa-se a outras malformações congénitas como LCA, pé equino
varo e luxação congénita do cotovelo. A
etiologia pode ser explicada por causas
intrínsecas (genéticas ou displásicas) ou
extrínsecas (mecânicas). O diagnóstico é
clínico confirmado pelo exame radiológico. O tratamento deve basear-se no grau
de deformidade, na idade da criança e na
presença de outras deformidades. O tratamento é conservador e deve ser iniciado
o mais precocemente possível, logo após
o nascimento, com manobras de redução
imediata ou progressiva da luxação. O
tratamento cirúrgico deve ser reservado
para quando há falência do tratamento
conservador ou nas deformidades graves
e irredutíveis. Deve ser efectuado antes
do início da marcha.
Caso clínico: Recém-nascido, sexo
feminino, parto às 38 semanas de gestação, por cesariana, por apresentação pélvica, Apgar: 9/10, peso: 2400g, ecografias
pré-natais sem alterações, que apresentava ao nascimento joelho esquerdo em
hiperextensão com luxação anterior. Sem
outras deformidades. Efectuou Rx do joelho esquerdo que confirmou a LCJ. Realizou tratamento correctivo, logo após o
nascimento, com manipulação e imobilização do membro com tala gessada, em
flexão de 40º. Ao 2ºdia de vida constatou-se joelho estável, sem luxação anterior
da tíbia nem instabilidade em valgo, com
melhor flexão 70º. Efectuou gesso cruropodálico durante 1 mês com flexão completa após correcção. O seguimento em
consulta, inicialmente, de 2-2 semanas
e depois 1x/mês até à idade da marcha,
não detectou alterações da marcha ou
outras deformidades. Após os 12 meses
passou a ser observada anualmente.
Conclusão: Com este caso os autores pretendem alertar para a raridade
desta patologia e importância do seu
diagnóstico e tratamento precoces. O tratamento deve iniciar-se precocemente,
sempre pelos métodos conservadores,
reservando o tratamento cirúrgico apenas para os casos graves e irredutíveis.
A intervenção precoce, idealmente logo
após o nascimento, altura em que existe
maior elasticidade ligamentar, facilita o
tratamento e melhora o prognóstico.
HÉRNIA DO CORDÃO UMBILICAL
Catarina Sousa1, Joana Pereira1,
Angélica Osório1, João M. Pinto1,
Banquart Leitão1, Maria Luisa Oliveira1,
Cidade Rodrigues1
1
Cirurgia Pediátrica, CHPorto, HMPia
Caso clínico: Apresenta-se o caso
clínico de um prematuro de 36 semanas, do sexo masculino, 1º gémeo de
uma gravidez gemelar pós ICSI (bi-bi)
resumo dos posters
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
S 231
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
sem alterações morfológicas nas ecografias pré-natais. Realizada cesariana
electiva por discrepância ponderal, restrição de crescimento e apresentação
pélvica.
Ao nascimento verificada malformação da parede abdominal, tratando-se de uma hérnia do cordão umbilical
com cerca de 2,5cm de diâmetro. Ao
1º dia de vida, sob anestesia geral, foi
realizada exérese da membrana contendo apenas ansas de intestino delgado. Durante a exploração da cavidade
abdominal observou-se a presença de
um divertículo de Meckel conjuntamente com uma estenose duodenal condicionando distensão a montante, motivo
pelo qual foi realizada enterectomia
segmentar com anastomose manual.
Em seguida, procedeu-se ao encerramento directo da aponevrose com plastia da região umbilical. Posteriormente
foi realizado um estudo detalhado de
possíveis malformações associadas,
não tendo sido detectadas outras patologias de relevo.
A hérnia do cordão umbilical é uma
entidade rara, associada a uma falha na
embriogénese às 10-12 semanas, não
ocorrendo migração completa do intestino para o interior da cavidade peritoneal.
Este fica apenas coberto por uma membrana. Habitualmente não se encontra
associado a outras anomalias, tendo um
bom prognóstico. O onfalocelo é o seu
principal diagnóstico diferencial.
Conclusão: A particularidade deste caso clínico é de ser uma entidade
pouco frequente dentro das malformações da parede abdominal e de habitualmente não estar associada a outras
malformações digestivas; por isso, é de
realçar a presença de um divertículo
de Meckel e de uma estenose duodenal associadas a esta hérnia do cordão
umbilical.
RECORRÊNCIA DO REFLUXO
GASTRO-ESOFÁGICO APÓS
FUNDOPLICATURA: EM QUE
CRIANÇAS E PORQUÊ?
João Moreira-Pinto1,3, Angélica Osório1,
José Ferreira de Sousa1, Carlos Enes1,
Fernando Pereira2, José Cidade-Rodrigues1
Serviço de Cirurgia Pediátrica, CHPorto
S. Gastroenterologia Pediátrica, CHPorto
3
Domínio Ciências Cirúrgicas, IICSV, UMinho
1
2
Objectivo: A fundoplicatura de
Nissen é o tratamento padrão da hérnia
do hiato e da doença do refluxo gastro-esofágico resistente à terapêutica médica. A sua recorrência (rRGE) é um problema comum. O objectivo deste estudo
foi perceber em que doentes a rRGE é
mais provável e porquê.
Material e métodos: Análise retrospectiva dos processos dos doentes
submetidos a fundoplicatura de Nissen
entre Fevereiro 2000 e Março 2009, na
nossa Instituição. Foram critérios de inclusão no grupo rRGE: re-operação por
recorrência do RGE, RGE confirmado por
endoscopia alta ou outro exame auxiliar
de diagnóstico, reinstituição de terapêutica anti-refluxo por mais de 8 semanas
após a cirurgia. Foram comparados os
parâmetros: sexo, idade e percentil de
peso à data da cirurgia, presença de hérnia do hiato, outras comorbilidades, presença de compromisso neurológico grave, história de convulsões, de medicação
pulmonar crónica, de necessidade de O2
e/ou antibióticos cronicamente no período pré-operatório, técnica usada (aberta
ou laparoscópica), colocação de gatrostomia simultaneamente. Os resultados
foram avaliados usando o teste exacto
de Fischer.
Resultados: 65 doentes foram
submetidos a fundoplicatura de Nissen.
Foram incluídos no grupo rRGE 10 doentes (15,4%). 40% Dos rRGE eram no
sexo masculino (vs 55,6% no grupo controlo, p=0,287). À data da cirurgia, 40%
dos rRGE tinham idade inferior a 6 anos
(vs 31,5%, p=0,425). 40% Dos rRGE
encontravam-se abaixo do percentil 3
(vs 66,7%, p=0,108). 50% Os doentes
no grupo rRGE tinham sido submetidos
a cirurgia por hérnia do hiato (vs 44,4%,
resumo dos posters
S 232
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
p=0,505). Quanto a comorbilidades, 10%
tinha história de atrésia do esófago (vs
5,6%, p=0,502), nenhum tinha doença
muscular ou doença cardíaca, 60% tinham compromisso neurológico grave
(vs 77,8%, p=0,209), 40% tinha história
de convulsões (vs 53,7%, 0,325), 40%
fazia medicação pulmonar crónica (vs
33,3%, p=0,471), apenas 1 necessitava de O2 suplementar (vs 9,3%, 0,656)
e estava medicado cronicamente com
antibióticos no pré-opertório (vs 13%,
p=0,635). Do grupo das rRGE, 50% das
fundoplicaturas tinham sido feitas por
laparoscopia (vs 70,4%, p=0,184) e em
50% foi colocada gastrostomia prévia ou
simultaneamente (vs 13%, p=0,015)
Conclusões: A rRGE foi maior nos
doentes a quem foi colocada gastrostomia prévia ou simultaneamente. Este
pode ser um sinal indirecto de um compromisso neurológico mais grave, embora não fosse encontrado significado
estatístico para os restantes parâmetros
comparados.
APENDICECTOMIA LAPAROSCÓPICA
– DESCRIÇÃO DO PRIMEIRO ANO
DE EXPERIÊNCIA NUM SERVIÇO DE
URGÊNCIA PEDIÁTRICO.
Joana Pereira1, João Ribeiro Castro1,
João Moreira Pinto1, Angélica Osório1
1
CHPorto, HMPia
Introdução: A apendicectomia laparoscópica é cada vez mais aceite como o
tratamento de escolha da apendicite aguda na criança. O objectivo deste trabalho
foi fazer a descrição do primeiro ano de
experiência num serviço de urgência pediátrico.
Métodos: Todos os doentes submetidos a apendicectomia laparoscópica foram revistos retrospectivamente
relativamente a sexo, idade, descrição
intra-operatória e anatomopatológica do
apêndice, duração da cirurgia, antibioterapia instituída, número de dias até dieta
geral, número de dias de internamento e
complicações intra e pós-operatórias.
Resultados: No período estudado
foram propostos 36 doentes para apendicectomia laparoscópica, por dificuldades técnicas houve necessidade de 2
conversões. Dos 34 doentes restantes
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
59% eram do sexo masculino, a idade
média foi de 12 anos. 68% das apendicites foram descritas como supuradas e
a duração média da cirurgia foi de 51 minutos. Excluindo os casos em que ocorreram complicações o internamento foi
em média de 4 dias. Houve necessidade
de reintervenção em um caso e em três
doentes com apendicite aguda complicada ocorreram abcessos intra-abdominais,
que resolveram com medidas conservadoras.
Conclusões: A apendicectomia laparoscópica é um procedimento seguro e
eficaz no tratamento da apendicite aguda
na criança. Relativamente às complicações observadas é de esperar que com
a progressão na curva de aprendizagem
estas diminuam progressivamente permitindo usufruir de todas as vantagens inerentes às técnicas laparoscópicas.
ICTERÍCIA E PREMATURIDADE
TARDIA
Joana Ramos Pereira1, Cristina Godinho1
1
CHP - UMJDinis
Introdução: A prematuridade tardia
(PTT) é definida como o nascimento entre
as 34+0 e as 36+6 semanas de gestação.
Estes recém-nascidos (RN) apresentam
muitas vezes somatometria semelhante
aos RN de termo, sendo por isso muitas
vezes tratados pelos pais, cuidadores e
profissionais de saúde como RN de termo, apesar de serem fisiologicamente
mais imaturos e apresentarem maior
morbilidade e mortalidade. Uma das comorbilidades mais frequentes é a hiperbilirrubinemia, sendo mais grave e mais
prolongada neste grupo específico.
Objectivo: Avaliar as características
dos PTT que apresentaram hiperbilirrubinemia com necessidade de fototerapia,
tipo de alimentação, duração do primeiro
internamento e reinternamento.
Material e métodos: Estudo retrospectivo através da análise dos processos
clínicos dos PTT nascidos no ano de
2009 na Maternidade Júlio Dinis - CHP.
Resultados: Foram avaliados 190
PTT dos 196 nascidos em 2009; 82%
(156) apresentaram hiperbilirrubinemia,
67% com necessidade de fototerapia.
52% eram do sexo masculino; 47%
nasceram por cesariana. A idade média
materna foi de 29±6 anos e 59% eram
primíparas. A maioria (94%) dos RN
apresentou peso adequado à idade gestacional ao nascimento. Dos PTT, grandes para idade gestacional (3,8%), 83%
apresentaram critérios para fototerapia.
De acordo com a idade gestacional verificamos que realizaram fototerapia 87,5%
dos PTT com 34 semanas, 72% dos de
35 semanas e 57% dos de 36 semanas.
Foram identificados 2 casos de doença
hemolítica por incompatibilidade ABO
Nos primeiros dias de vida 60%
apresentaram dificuldades alimentares e
40%, à data de alta, tinha perdido 7% ou
mais do peso ao nascimento. A duração
média do primeiro internamento foi de
oito dias, mas 9% tiveram alta, antes das
72 horas de vida. O tratamento com fototerapia realizou-se predominantemente
ao terceiro (46%) e quarto (53%) dia de
vida. Trinta e seis (28,1%) RN foram reinternados por icterícia com necessidade
de fototerapia, três deles pela segunda
vez e um pela terceira vez. Na primeira
consulta, em média efectuada aos 21,5
dias devida, 51% estavam com aleitamento materno exclusivo.
Conclusões: A prematuridade tardia é um dos factores de risco para o desenvolvimento de hiperbilirrubinemia grave e kernicterus. Pelas particularidades
destes RN, imaturidade do seu sistema
enzimático de conjugação e dificuldades
alimentares, são mais susceptíveis a desenvolverem hiperbilirrubinemias com
valores elevados. A icterícia é mais frequente nos primeiros dias de vida embora
tenha um pico mais tardio do que nos RN
de termo, pelo que está recomendado um
internamento de pelo menos 48h a 72h
de vida e uma determinação de bilirrubina à data de alta; É com base neste valor
que se faz a previsão da reavalição às
24 ou 48h depois. O apoio ao aleitamento materno durante o internamento e na
primeira semana de vida, com vigilância
das competências da mãe e do RN (pega
e evolução ponderal) são fundamentais
para o sucesso do aleitamento materno.
Além de evitar o aparecimento de desidratações hipernatrémicas e prevenir
o aparecimento de hiperbilirrubinemias
graves por défice de aporte.
resumo dos posters
XXII reunião do hospital de crianças maria pia
S 233
PRÉMIO NASCER E CRESCER
MELHOR ARTIGO ORIGINAL 2010
A DIRECÇÃO DA REVISTA NASCER E CRESCER E A ASSOCIAÇÃO DO HOSPITAL DE CRIANÇAS MARIA PIA
INSTITUÍRAM O PRÉMIO ANUAL PARA A MELHOR ARTIGO ORIGINAL PUBLICADO NA REVISTA. ESTA INICIATIVA
VISA PROMOVER E INCENTIVAR A INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA NA ÁREA DA PEDIATRIA E PERINATOLOGIA.
REGULAMENTO
1. O Prémio será destinado aos autores do melhor Artigo Original publicado em cada ano na revista Nascer e Crescer
2. O Prémio equivalerá a um certificado e a um valor em dinheiro de 1 000,00 € (mil euros), que será entregue ao primeiro autor, caso haja mais de um.
3. Um mesmo autor pode concorrer com mais de um Artigo Original
4. Todos os Artigos Originais serão candidatos ao Prémio, salvo indicação em contrário expressa pelos Autores
5. O processo de avaliação será conduzido por um júri de selecção a ser escolhido oportunamente pelos editores da revista
6. Na avaliação dos Artigos Originais, o Júri de selecção analisará os seguintes itens:
a) Relevância e originalidade
b) Clareza e pertinência dos objectivos
c) Descrição dos métodos/ procedimentos e análise estatística adequados
d) Apresentação clara e sintética dos resultados
e) Discussão fundamentada
f) Importância para o avanço do conhecimento. Potencial de aplicabilidade e impacto dos resultados
7. Não caberá recurso contra as decisões do júri
8. A divulgação da atribuição do prémio será feita no 3º número da revista Nascer e Crescer de cada ano
9. Cabe aos editores da revista Nascer e Crescer decidir sobre eventuais omissões neste regulamento
PRÉMIO NASCER E CRESCER
MELHOR ARTIGO ORIGINAL 2009
Os Editores da Revista Nascer e Crescer, após a apreciação pelo júri de selecção dos trabalhos originais publicados no ano de 2009, atribuem o
Prémio Nascer e Crescer para o Melhor Artigo Original ao seguinte artigo:
SOARES S, BONET B, SOUSA F, ENES C, RODRIGUES C, ANTUNES MB, BARBOT J
Esferocitose hereditária. Esplenectomia e Colecistectomia. Experiência de um Hospital Pediátrico. Nascer e Crescer, 2009, XVIII (2): 73-7
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
INSTRUÇÕES AOS AUTORES
A Revista NASCER E CRESCER dirige-se
a todos os profissionais de saúde com interesse
na área da Saúde Materno Infantil e publica artigos
científicos relacionados com a Pediatria, Perinatologia, Saúde Mental da Infância e Adolescência,
Bioética e Gestão Hospitalar. Os Editoriais, os artigos de Homenagem e artigos de âmbito cultural
são publicados a pedido da Direcção da Revista. A
revista publica artigos originais, de revisão, casos
clínicos e artigos de opinião. Os artigos propostos
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– Hospital Crianças Maria Pia – Rua da Boavista,
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pela Comissão de Ética: É da responsabilidade dos autores garantir que são respeitados os
princípios éticos e deontológicos, bem como, a
legislação e as normas aplicáveis, conforme recomendado na Declaração de Helsínquia. Nos estudos experimentais, é obrigatório que os autores
mencionem a existência e aplicação de consentimento informado dos participantes, assim como a
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máximo 250 palavras e ser elaborado segundo o
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revisão devem ser estruturados da seguinte forma:
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exceder 150 palavras e deve ser estruturado em
Introdução, Caso Clínico e Discussão/Conclusões.
Abaixo do resumo deverá constar uma lista de três
a dez palavras-chave, em Português e Inglês, por
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do artigo. Os termos devem estar em concordância
com o Medical Subject Headings (MeSH).
Texto: O texto poderá ser apresentado em
português, inglês, francês ou espanhol. Os artigos
originais devem ser elaborados com a seguinte organização: Introdução; Material e Métodos; Resultados; Discussão e Conclusões. Os artigos de revisão
devem obedecer à seguinte estrutura: Introdução,
Objectivos, Desenvolvimento e Conclusões. Os
casos clínicos devem ser exemplares, devidamente
estudados e discutidos e conter uma breve introdução, a descrição do(s) caso(s) e uma discussão
sucinta que incluirá uma conclusão sumária. As
abreviaturas utilizadas devem ser objecto de especificação anterior. Não se aceitam abreviaturas
nos títulos dos trabalhos. Os parâmetros ou valores
medidos devem ser expressos em unidades internacionais (SI units, The SI for the Health Professions,
WHO, 1977), utilizando para tal as respectivas abreviaturas adoptadas em Portugal. Os números de 1 a
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Números superiores a 10 são escritos em algarismos árabes, excepto se no início da frase.
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texto, com algarismos árabes. Os números devem
seguir a ordem do texto, e ser colocados superiores à linha. Serão no máximo 40 para artigos
originais e 15 para casos clínicos. Os autores devem verificar se todas as referências estão confor-
mes aos Uniform Requirements for Manuscript
submitted to biomedical journals (www.nlm.nih.
gov/bsd/uniform_requirements.html) e se utilizam
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pelo Índex Medicus. Os autores devem consultar
a página NLM’s Citing Medicine relativamente às
recomendações de formato para os vários tipos de
referência. Seguem-se alguns exemplos:
a) Revistas: listar os primeiros seis autores,
seguidos de et al se ultrapassar 6, título
do artigo, nome da revista (utilizar as abreviaturas do Index Medicus), ano, volume e
páginas. Ex.: Haque KN, Zaidi MH SK,et al.
Intravenous Immunoglobulin for prevention
of sepsis in preterm and low birth weight infants. Pediatr Infect Dis 1986; 5:622-65.
b) Capítulos em livros: nome(s) e iniciais do(s)
autor(es) do capítulo ou da contribuição.
Nome e iniciais dos autores médicos, título
do livro, cidade e nome da casa editora, ano
de publicação, primeira e última páginas do
capítulo. Ex.: Phillips SJ, Whisnant JP. Hypertension and stroke. In: Laragh JH, Brenner
BM, editors. Hypertension: pathophysiology,
diagnosis, and management. 2nd ed. New
York: Raven Press; 1995. p. 465-78.
c) Livros: Nome(s) e iniciais do(s) autor(es).
Título do livro. Número da edição. Cidade e
nome da casa editora, ano de publicação e
número de página. Ex.: Berne E. Principles
of Group Treatment. New York: Oxford University Press, 1966:26.
Figuras e Quadros: Todas as ilustrações
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no texto, ser apresentado em página individual e
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mencionada a sua origem e autorização para a sua
utilização quando necessário. Fotografias ou exames complementares de doentes deverão impedir
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pela autorização para a sua publicação dada pelo
doente ou seu responsável legal.
O total de figuras e quadros não deve ultrapassar os oito para os artigos originais e cinco para
os casos clínicos. As figuras ou quadros coloridos,
ou os que ultrapassam os números atrás referidos,
serão publicados a expensas dos autores.
Agradecimentos e esclarecimentos: Os
agradecimentos e indicação de conflito de interesses de algum dos autores ou financiamento do
estudo devem figurar na última página.
Em destaque: Incluir duas a quatro frases
curtas que sintetizem os resultados e conclusões,
salientando a mensagem mais importante do trabalho. Estas deverão ser escritas em português e
em inglês.
Modificações e Revisões: No caso do artigo
ser aceite mas sujeito a modificações, estas devem
ser realizadas pelos autores no prazo de quinze dias.
As provas tipográficas serão enviadas aos autores
em formato electrónico, contendo a indicação do prazo de revisão em função das necessidades de publi-
normas de publicação
instructions for authors
235
NASCER E CRESCER
revista do hospital de crianças maria pia
ano 2010, vol XIX, n.º 3
cação da Revista. O não respeito do prazo desobriga
a aceitação da revisão dos autores, sendo a mesma
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Portuguese and English; 2- Authors; 3- Abstract in
Portuguese and English and key words; 4- Text;
236
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5- References; 6- Legends; 7- Figures; 8- Tables;
9- Acknowledgements; 10- Highlights.
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contain the title in Portuguese and English. The
title should be concise and revealing. A separate
page should contain name(s) degree(s), the authors’ professional affiliations, the name and the
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address, electronic address and telephone), and
the name of the Institutions where the study was
performed.
Abstract and Key-words: The abstract
should be written in the same language of the text
and always in Portuguese and English, provide on
a separate page of not more than 250 words for
original papers and a 150 words for case reports.
For original papers the abstract should consist of
four paragraphs, labelled Background, Methods,
Results and Conclusions. Review articles should
obey the following: Introduction, Past landmarks
and Present developments and Conclusions. Case
report abstracts should contain an Introduction,
Case report and Discussion/Conclusions. Do not
use abbreviations. Each abstract should be followed by the proposed key-words in Portuguese
and English in alphabetical order, minimum of three
and maximum of ten. Use terms from the Medical
Subject Headings from Index Medicus (MeSH).
Text: The text may be written in Portuguese,
English, French or Spanish. The original articles
should contain the following sections: Introduction; Material and Methods; Results; Discussion
and Conclusions. The structure of review articles
should include: Introduction, Past landmarks and
Present developments and Conclusions. The case
reports should be unique cases duly studied and
discussed. They should contain: a brief Introduction, Case description and a succinct Discussion
or Conclusion. Any abbreviation used should be
spelled out the first time they are used. Abbreviations are not accepted in the titles of papers. Parameters or values measured should be expressed
in international (SI units, The SI for the Health
Professions, WHO, 1977), using the corresponding abbreviations adopted in Portugal. Numbers 1
to 10 should be written in full, except in the case
of decimals or units of measurements. Numbers
above 10 are written as figures except at the beginning of a sentence.
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text by Arabic numerals, and in the order in which
they are mentioned in the text. They should be limited to 40 to original papers and 15 to case reports.
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titles according to the List of Journals Indexed in Index Medicus. Authors should consult NLM’s Citing
Medicine for information on its recommended formats for a variety of reference types. The following
details should be given in references to (a) journals,
(b) chapters of books by other authors, or (c) books
written or edited by the same author:
a) Journals: Names of all authors (except if there
are more than six, in which case the first three
are listed followed by “et al.”), the title of the
article, the name of the journal (using the abbreviations in Index Medicus), year, volume
and pages. Ex: Haque KN, Zaidi MH SK,et al.
Intravenous Immunoglobulin for prevention of
sepsis in preterm and low birth weight infants.
Pediatr Infect Dis 1986; 5:622-65
b) Chapters of books: Name(s) and initials of the
author(s) of the chapter or contribution cited.
Title and number of the chapter or contribution. Name and initials of the medical editors,
title of book, city and name of publisher, year
of publication, first and last page of the chapter. Ex: Phillips SJ, Whisnant JP. Hypertension and stroke. In: Laragh JH, Brenner BM,
editors. Hypertension: pathophysiology, diagnosis, and management. 2nd ed. New York:
Raven Press; 1995. p. 465-78.
c) Books: Name(s) and initials of the author(s).
Title of the book. City and name of publisher,
year of publication, page. Ex: Berne E. Principles of Group Treatment. New York: Oxford
University Press, 1966:26.
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and figure should be numbered in sequence,
in the order in which they are referenced in the
text. They should each have their own page and
bear an explanatory title and caption when necessary. All abbreviations and symbols need a
caption. If the illustration has appeared in or has
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