A inovação educativa e os desafios para a educação no
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A inovação educativa e os desafios para a educação no
A inovação educativa e os desafios para a educação no século XXI Comunicações apresentadas no 1.º Congresso em Educação, Pedagogia e Inovação 5 e 6 de junho de 2015 Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Castelo Branco A inovação educativa e os desafios para a educação no século XXI Comunicações apresentadas no 1.º Congresso em Educação, Pedagogia e Inovação 5 e 6 de junho de 2015 Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Castelo Branco Ficha Técnica Edição Instituto Politécnico de Castelo Branco Av. Pedro Álvares Cabral, nº 12 6000-084 Castelo Branco. Portugal Título A inovação educativa e os desafios para a educação no século XXI Organização Cristina Pereira e Clotilde Agostinho Fotografia de capa Paula Peres Capa, projecto gráfico e paginação Rui Tomás Monteiro ISBN: 978-989-8196-61-3 2016 © Comissão Científica António Pereira Pais, Instituto Politécnico de Castelo Branco; Ernesto Candeias Martins, Instituto Politécnico de Castelo Branco; Henrique Teixeira Gil, Instituto Politécnico de Castelo Branco; Joaquim Armando Gomes Alves Ferreira, Universidade de Coimbra; Juan de Dios González Hermossel – Universidad de Extremadura; Gabriela Correia de Castro Portugal, Universidade de Aveiro; Mª Cruz Sánchez Gómes – Universidad de Salamanca; Mª José Pinto Lopes Pereira Infante, Instituto Politécnico de Castelo Branco. Comissão Organizadora Membros da equipa de coordenação do CeADIn Ana Cristina Ferreira de Almeida, Universidade de Coimbra; Ana Rita Santos Silva Martins de Carvalho, Instituto Politécnico de Castelo Branco; Clotilde Alves Nunes Agostinho, Instituto Politécnico de Castelo Branco; Cristina Maria Gonçalves Pereira, Instituto Politécnico de Castelo Branco; Hugo Miguel Pires Ribeiro Pinto, Instituto Politécnico de Castelo Branco. Estudantes Ana Luís, Mestrado em Educação Pré-escolar e Ensino do 1º Ciclo do Ensino Básico Ania Estanislau, Mestrado em Intervenção Social Escolar; Carina Silva, Mestrado em Gerontologia Social. Elsa Antunes, Mestrado em Educação Pré-escolar e Ensino do 1º Ciclo do Ensino Básico Inês Fortunato, Mestrado em Educação Pré-escolar e Ensino do 1º Ciclo do Ensino Básico; Nuno Santos, Mestrado em Educação Pré-escolar e Ensino do 1º Ciclo do Ensino Básico; Sofia Caetano, Mestrado em Intervenção Social Escolar; Stéphanie Farinha, Mestrado em Intervenção Social Escolar. Secretariado Ana Gamas, Instituto Politécnico de Castelo Branco. Revisores científicos dos artigos Ana Cristina Ferreira de Almeida, Universidade de Coimbra; António Pereira Pais, Instituto Politécnico de Castelo Branco; Clotilde Alves Nunes Agostinho, Instituto Politécnico de Castelo Branco; Cristina Maria Gonçalves Pereira, Instituto Politécnico de Castelo Branco; Ernesto Candeias Martins, Instituto Politécnico de Castelo Branco; Gabriela Correia de Castro Portugal, Universidade de Aveiro; Henrique Teixeira Gil, Instituto Politécnico de Castelo Branco; Mª Cruz Sánchez Gómes – Universidad de Salamanca; Mª José Pinto Lopes Pereira Infante, Instituto Politécnico de Castelo Branco. Índice Nota de Abertura1 A ABORDAGEM À LINGUAGEM ESCRITA EM CONTEXTO DE EDUCAÇÃO PRÉ-ESCOLAR: UM INSTRUMENTO ORIENTADOR Maria Helena Horta 3 A MULTICULTURALIDADE NOS RELATÓRIOS DA PRÁTICA DE ENSINO SUPERVISIONADA NA FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES Maria do Carmo Vieira da Silva 15 AS TIC, AS PRÁTICAS DE ENSINO SUPERVISIONADAS, A INVESTIGAÇÃO E A INOVAÇÃO: OS BLOGUES EDUCATIVOS & A SEGURANÇA NA INTERNET Henrique Gil, Vera Caroço e Carina Félix 27 A TRAMA DA CRIAÇÃO DO JARDIM DE INFÂNCIA JOÃO DE DEUS DE BRAGANÇA EM 1915 Luís Castanheira 37 DISEÑO METODOLÓGICO PARA LA PROPUESTA DE POLÍTICAS EDUCATIVAS IGUALITARIAS CON ALLUMNADO DE PRIMER GRADO DE SECUNDARIA EN EL ESTADO DE MICHOACÁN Elva Morales Robles 49 ENSINO DO PORTUGUÊS COMO LÍNGUA NÃO MATERNA: CRUZAMENTOS DE TAREFAS COMUNICATIVAS EM DIDÁTICA DA LÍNGUA E DA LITERATURA Mª da Graça Sardinha e João Machado 61 ESTADO DA ARTE NA INVESTIGAÇÃO QUALITATIVA EM EDUCAÇÃO: O CASO DOS ESTUDOS SOBRE DIFICULDADES ESPECÍFICAS DE APRENDIZAGEM Mª Cruz Sánchez-Gómez e Mª Vitoria Martín-Cilleros 69 EU E OS OUTROS - UM ESTUDO DE CASO SOBRE AS CONCEÇÕES DAS CRIANÇAS ACERCA DA DIFERENÇA Liliane Baltazar e Cristina Pereira 79 LIGAÇÕES CRIANÇA/ESPAÇO EM EDUCAÇÃO PRÉ-ESCOLAR PARA PROMOVER APRENDIZAGENS SIGNIFICATIVAS Miguel Castro 95 MOTIVAÇÕES NA ORIGEM DO ABANDONO ESCOLAR – ESTUDO DE CASO COM JOVENS SINALIZADOS NA CPCJ DE CASTELO BRANCO Ana Raquel Lourenço 105 NOVOS MODELOS ESTÉTICOS NA EDUCAÇÃO MUSICAL DA CRIANÇA Susana Maia Porto 115 PARCERIAS EUROPEIAS DE INOVAÇÃO EM EDUCAÇÃO Margarida Morgado 127 PRÁTICAS DE ESCRITA NA AULA DE ESPANHOL LÍNGUA ESTRANGEIRA: AS COMPETÊNCIAS COMUNICATIVA E SOCIOLINGUÍSTICA André Costa, Maria da Graça Sardinha e Paulo Osório 139 SUPERVISÃO PROMOTORA DE MUDANÇA E INOVAÇÃO NA AVALIAÇÃO DO DESEMPENHO DOCENTE - ESTUDO DE CASO Graça Figueiredo Monteiro 151 (TOOLS OF MIND) FERRAMENTAS DA MENTE: PROGRAMA DE EDUCAÇÃO PRÉ-ESCOLAR, DE INSPIRAÇÃO EM VYGOTSKY Ana Paula Couceiro Figueira 161 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 1 Nota de Abertura O I Congresso em Educação, Pedagogia e Inovação (CEPI) foi organizado no âmbito das atividades do Centro de Aprendizagem e Desenvolvimento da Infância (CeADIn) que funciona na Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Castelo Branco (ESECB) desde maio de 2014. Subordinado ao tema “ A inovação educativa e os desafios da educação para o séc. XXI”, este evento teve como objetivo promover o debate e a reflexão entre investigadores, professores e outros profissionais especialistas nas áreas das ciências sociais e humanas, em torno dos desafios da educação para o séc. XXI e do papel dos agentes educativos na promoção da aprendizagem e inovação na escola e outros contextos de desenvolvimento humano. Pretendemos também que os diplomados pela ESECB, os colaboradores institucionais e os consultores da comunidade do CeADIn aceitassem o desafio e a oportunidade de apresentar evidências dos seus percursos investigativos e de boas práticas educativas. A realização do congresso assentou a sua motivação nos valores e pressupostos fundamentais que norteiam o funcionamento do CeADIn: • Construir uma comunidade de aprendizagem e de investigação na área da educação e da psicologia pedagógica. • Permitir que os nossos estudantes sejam co-construtores neste projeto. • Promover boas práticas, visando o desenvolvimento e a aprendizagem da criança e do ser humano, em geral. • Assumir a conceção da natureza global e integrada do desenvolvimento e da aprendizagem, o valor do brincar, de aprendizagens ativas e desafiadoras, a importância do desenvolvimento da expressão/comunicação, da expressão artística e o papel do Outro na co-construção da individualidade e da mudança. O programa do 1º Congresso em Educação, Pedagogia e Inovação integrou uma apreciável quantidade de contributos apresentados em formato de conferência, comunicação oral, poster e workshop, permitindo evidenciar que os pressupostos que norteiam o CeADIn estão na origem de pesquisas, experiências e reflexões pedagógicas que os participantes aceitaram partilhar a propósito deste evento. 2 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI Com este livro pretende-se reunir uma parte significativa dos trabalhos apresentados em formato de artigo, de modo a promover a sua divulgação mais alargada, contribuindo para a continuidade da reflexão sobre a temática central que o orientou o 1º Congresso em Educação, Pedagogia e Inovação. Cristina Pereira e Clotilde Agostinho A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 3 A ABORDAGEM À LINGUAGEM ESCRITA EM CONTEXTO DE EDUCAÇÃO PRÉ-ESCOLAR: UM INSTRUMENTO ORIENTADOR Maria Helena Horta ([email protected]) Escola Superior de Educação e Comunicação da Universidade do Algarve Resumo Segundo Ríos (2014) não existe consenso entre os educadores de infância no que à linguagem escrita diz respeito, quer em termos de objetivos a alcançar e de competências a promover nas crianças, como de que práticas a desenvolver. Em Portugal existem vários documentos normativos e orientadores para apoio à ação educativa do educador de infância, entre os quais desatacamos as Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar (Ministério da Educação, 1997), a Circular N.º 17/CSDC/DEPEB/2007 e o Projeto “Metas de Aprendizagem” (Ministério da Educação, 2010). Estes documentos, em termos genéricos, são apenas guias para o educador na condução da sua prática e melhor gestão que, no seu entender, deve fazer do currículo, designadamente da abordagem que faz à linguagem escrita no seu dia-a-dia e nenhum deles determina ou condiciona o modelo pedagógico a ser adotado. Foi no desenvolvimento de um estudo, desenvolvido na região do sotavento algarvio, com vista à obtenção do grau de Doutor pela Universidade de Huelva (2015), que senti a necessidade de construir uma grelha de observação com o objetivo de conhecer: • O modo como era feita a organização e a gestão do ambiente educativo nas salas de atividades dos Jardins de Infância envolvidos (7 no total), com enfoque na linguagem escrita; • A intervenção educativa da educadora relativamente à abordagem feita à linguagem escrita. 4 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI Apresento em seguida o instrumento que poderá constituir-se como uma ferramenta útil e, quiçá, orientador da prática educativa de cada educador, no que à abordagem da linguagem escrita diz respeito, em contexto de educação pré-escolar, exemplificando cada uma das partes que o constituem. Palavras-chave: Linguagem escrita; educação pré-escolar; práticas educativas; educador reflexivo. Abstract According Ríos (2014) there is no consensus among kindergarten teachers in the written language is concerned, in terms of objectives to be achieved and skills to facilitate in children, as that practice to develop. In Portugal there are several regulatory and policy documents to support the education of pre- school teacher action, including the Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar (Ministério da Educação, 1997), the Circular N.º 17/CSDC/DEPEB/2007 and the Projeto “Metas de Aprendizagem” (Ministério da Educação, 2010). These documents, in general, are only guides for the teacher in the conduct of practice and better management which, in their view, should do the curriculum, in particular the approach that makes the written language in their day- to- day and none of them determines or affects the pedagogical model to be adopted. It was in the development of a study carried out in the Eastern Algarve region, in order to obtain a PhD. from the University of Huelva (2015), which I felt the need to construct an observation grid in order to meet: • The way was made the organization and management of the educational environment in kindergartens involved (7 in total), with a focus on written language; • The educational intervention of the educator to the approach made the written language. Believing in the school as a “ learning community “ (Day, 2001), in which educators and teachers should be provided with intervention strategies to be allowed knowledge of a micro and mesosystem environment (Bronfenbrenner, 2002), so they can act accordingly, and recognize the importance of a teacher as reflective practitioner, whose capacity gives it power and provides opportunities for their own development (Oliveira e Serrazina, 2002), I believe that the application of this instrument for each educator can constitute itself as a useful tool and, perhaps, guiding their own educational practice , as the written language approach concerns in the context of pre-school education. Keywords: Written language; pre-school education; educational practice; reflective educator. Introdução Tal como Pokorny (2011), também defendo que os primeiros anos de vida são os mais importantes na formação das crianças. E é precisamente nestes primeiros anos de vida, em contexto de jardim de infância, que a criança necessita de tempo para brincar, devendo esse tempo ser considerado como a atividade mais importante que ocorre na sala de atividades (Armstrong, 2008). Armstrong (2008) explica ainda que esse tempo de brincadeira, a que designa de «processo de liberdade», juntamente com o respeito e com a atenção dos educadores pelas ideias, pelos desejos A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 5 e pelos resultados das crianças enquanto brincam, serve para promover um ambiente de aprendizagem de confiança, entusiasmo e descobertas, o que acredito ser possível através da metodologia do trabalho de projeto. Descobertas que se espera que aconteçam, de forma natural e espontânea, também em relação à linguagem escrita, através de um educador que assume o seu papel como um guia experimentado, no desenvolvimento de um ambiente comunicativamente estimulante. Contudo, essas competências, apesar de ensinadas, nem sempre são possíveis de serem adquiridas. Apenas as desenvolve quem se assume como um profissional reflexivo, que permanentemente se questiona e indaga sobre a sua própria profissionalidade, buscando incessantemente respostas às suas permanentes questões. Em contexto de jardim de infância, é fundamental que o educador seja, por um lado, um provocador e, por outro, um mediador. Um provocador, na medida em que promove situações desencadeadoras de conflito cognitivo, em que as crianças são impelidas a colocar questões, experimentar, organizar-se e reorganizar-se. Um mediador entre a criança e a linguagem escrita porque apoia as crianças na explicitação do que fazem, ajudando a clarificar as situações menos claras e a evoluir nas suas concepções precoces. É por meio da experiência, da observação e da exploração do seu ambiente que a criança constrói o seu conhecimento, modifica situações e concepções, reestrutura os seus esquemas de pensamento, interpreta e busca soluções para factos novos, desenvolvendo assim competências cognitivas. Nesse sentido, considero ser dever do educador de infância, que têm responsabilidades no processo de aprendizagem e desenvolvimento das crianças com quem trabalham, «construir paralelamente saberes didáticos e transversais bastante ricos e profundos para equipar o olhar e a reflexão sobre a realidade» (Perrenoud, 2008, p. 17). A linguagem escrita na educação pré-escolar Emília Ferreiro e Ana Teberosky (1999) explicam-nos que as crianças em idade pré-escolar possuem muitos conhecimentos sociais sobre a linguagem escrita, o que as leva a afirmar que as crianças nesta idade são letradas antes de serem alfabetizadas. A aprendizagem da linguagem escrita é alicerçada numa construção social que ocorre, no jardim de infância, em interação com crianças e com um educador que intencionalmente intervém nesse sentido. Tal como todas as outras aprendizagens do mundo social que a criança realiza, em contexto de educação pré-escolar, também a linguagem escrita deve emergir dos interesses das próprias crianças que a devem apreender como uma necessidade, devendo o educador, para isso, transmitir-lhe não apenas o gosto por aprender, mas também o interesse em querer saber mais, tomando a linguagem escrita como uma “porta aberta” para o mundo da cultura, num processo de aprendizagem que se pretende ao longo da vida. Já Vygotsky (1991) nos esclarecia no sentido de uma orientação funcional de produção de texto escrito em situação de alfabetização e que facilmente adaptamos ao contexto da educação pré-escolar, enquanto nível educativo onde apenas se desenvolve uma abordagem à linguagem escrita, tal como o descrevemos ao longo deste capítulo, tomando a metodologia de trabalho de projeto como referencial à atuação dos educadores de infância: • O processo educativo tem que ser organizado de modo a que a escrita se torne necessária à criança; 6 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI • A escrita deve ter significado para a criança, despertando nela uma necessidade intrínseca e que deve ser incorporada numa tarefa necessária e relevante para a vida; • A escrita deve ser “ensinada” naturalmente, assumida como um momento natural no desenvolvimento das crianças e não como um treino imposto de fora para dentro. Numa alusão a um estudo apresentado pelo Conselho Nacional de Educação, no final dos anos 90 do século XX, em que foi manifesto o deficiente uso que os portugueses fazem da escrita, em contextos da sua vida quotidiana, Niza (1997) sublinha «a necessidade e a urgência de conjugar esforços para o ensino e aprendizagem da linguagem escrita nos jardins de infância e nos primeiros anos da Educação Básica» (p. 341). Sabemos, tal como nos refere Day (2001, p. 293), que a academia continua a ocupar uma posição-chave determinante, a partir da qual pode (e deve) potencialmente promover, sustentar e ampliar os contextos que encerram, simultaneamente, um desafio e uma estratégia de apoio, através da investigação que está ao nosso serviço para nos informar, sendo esta inerente ao próprio desenvolvimento. Acrescenta ainda que Os formadores de professores são, de certo modo, interventores que tentam desenvolver as questões consideradas pelos professores e pelas escolas como relevantes para as suas necessidades, investigar respostas para essas questões de forma colaborativa e colocar o ónus da acção nos próprios professores e nas escolas. Todavia, tal como afirmámos ao longo do capítulo, e adotando as palavras de Perrenoud (1993), é necessário preparar os professores para funcionar no “mundo real”. Apesar de pretendermos educadores curiosos, ativos, reflexivos, investigadores e cooperantes, necessitamos, essencialmente, de educadores que centrem as suas práticas e, designadamente, o seu constructo e desenvolvimento curricular, na criança. Necessitamos de educadores que, na posse dos conhecimentos teóricos, provindos da sua formação inicial, bem como na procura constante de dados científicos e didáticos atuais oriundos da investigação, entendam que é «essencial dispor do tempo e do espaço necessários para desenvolver a atividade pedagógica (Jensen, 2013, p. 22). É desejável que, cada um no seu contexto próprio possa melhorar passo a passo a relação educativa que constitui a base das aprendizagens com e para as crianças, confiando nelas e no seu potencial e procurando alargar o mais possível as suas oportunidades de se exprimirem em múltiplas linguagens (Balaguer, 2014). As crianças precisam de tempo, do seu tempo, para fazerem descobertas, para construir as suas aprendizagens, designadamente sobre a linguagem escrita, apoiadas por um educador que lhes serve de «modelo escritor», ao mesmo tempo que se preocupa em criar, organizar e manter um ambiente «comunicativamente estimulante» na sua sala de atividades. Do ponto de vista pedagógico, não é para nós importante saber se a criança adquiriu uma determinada competência no tempo “certo”. Trata-se, essencialmente, de aproveitar esse tempo educativo para valorizar e apoiar a individualidade de cada criança, bem como os seus processos de desenvolvimento e educação (Beller, 2013). Assumimos que «a criança está no centro da ação pedagógica e é necessário ajudá-la a ir mais longe, à medida que descobre e cultiva toda e cada uma das suas capacidades» (Balaguer, 2014, p. 41). A finalidade e função pedagógica de um educador, tal como o descrevemos, é estimular a criança respeitando o seu estádio de desenvolvimento individual, tomando em consideração as suas competências e interesses, realmente observáveis e tentando descortinar os “escondidos”, nos diferentes domínios do desenvolvimento, em particular na aprendizagem da linguagem escrita. A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 7 Contextualização metodológica Inicio este ponto com as palavras de Anguera (1989, p. 19): «A ciência começa com a observação», acrescentando ainda que, no âmbito das ciências humanas, a observação consiste no mais antigo e no mais moderno método de recolha de dados. No entanto, ao longo do tempo, o sentido atribuído à observação tem vindo a ser alterado. A emergência do paradigma qualitativo-interpretativo, bem como o desenvolvimento das ciências sociais, vieram contrariar a hegemonia do paradigma positivista, em que o ato de observar significava recolher dados de forma neutra e distanciada, através da aplicação de instrumentos estruturados. O ato de observar passou a integrar o próprio observador, entendido este como o primeiro e último instrumento de observação, rejeitando-se a ambição de neutralidade e distanciamento (Rodrigues, 2001). Ainda segundo a mesma autora, foi a verificação da impossibilidade do isolamento laboratorial das variáveis que fez aceitar a inevitabilidade e a premente necessidade da intervenção, da participação, da implicação do observador na elaboração do seu modelo de análise em construção e na consequente interpretação dos dados recolhidos no processo de observação. Neste sentido, concorre também a ideia de Anguera (2003), segundo a qual esta autora nos explica que a metodologia observacional, que se desenvolve em contextos naturais ou habituais – como é o caso de uma situação educativa – consiste num procedimento científico que destaca a ocorrência de comportamentos percetíveis, para que se possa proceder ao seu registo e posterior análise – tanto qualitativa como quantitativa – mediante um instrumento adequado e parâmetros convenientes. Estes comportamentos, pela sua espontaneidade ou frequência com que acontecem, dão ênfase, de forma natural, a todos os elementos que se querem destacar como forma de alcançar os objetivos delineados. Neste estudo, constitui-se como opção a metodologia observacional, considerando que a mesma tem por objeto de estudo «o indivíduo (perspetiva ideográfica) inserido num determinado contexto» (Prudente et al., 2004, p. 51) . Uma vez que a observação nos permite registar a realidade objetivamente por forma a analisá-la, a delimitação dos objetivos torna-se necessária e tem a primordial função de delimitar a parcela da realidade que nos interessa estudar. Como tal, antes de estabelecer as categorias deste instrumento de observação, tive em conta os seguintes objetivos para esta fase da investigação: a) Conhecer o modo como era feita a organização e gestão do ambiente educativo com enfoque na linguagem escrita; b) Conhecer a intervenção educativa da educadora relativamente à abordagem feita à linguagem escrita. Como forma de alcançar os objetivos por delineados, foi eleita a observação direta, nomeadamente uma observação (considerada) participante, de envolvimento tendencialmente passivo e aberto (Spradley, 1980; Patton, 1990; Edwards & Skinner, 2009), porque, de alguma forma, houve a participação na vida do grupo estudado, e a obtenção dos dados realizou-se mediante um contacto direto com o mesmo (Bogdan e Biklen, 1994; Estrela, 1994; Anguera, 2003; Coutinho, 2011). Foi ainda uma observação ocasional e naturalista, caracterizada por ser feita de forma direta e algo distanciada (Estrela, 1994), estando consciente de que, num estudo de caso, ao longo da observação, nem sempre é possível manter-se um papel completamente constante em termos da relação observação/participação (Yin, 2005, 2010). 8 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI Construção da grelha de observação Foi após a análise de conteúdo e a categorização comparativa dos dados, obtidos através de entrevista, que foi possível construir a grelha de observação utilizada nas diferentes sessões de observação, para recolha de dados. Foi opção intencional a construção de um instrumento organizado pelo sistema de categorias. Nas palavras de Anguera (2003) trata-se de uma construção, por parte do observador, que permite dispor, em sentido figurado, de uma espécie de recetáculos ou moldes, que são elaborados a partir de duas componentes: da realidade (que se conhece) e de um quadro teórico que a suporta. Além disso, a diversidade de situações suscetíveis de serem observadas no comportamento educativo e pedagógico obriga-nos a prescindir de instrumentos estandardizados (sendo que também não tive conhecimento de nenhum que respondesse aos objetivos do estudo) e, pelo contrário, a dedicar o tempo necessário à construção de um ad hoc, de acordo com as finalidades da investigação (Prudente et al., 2004). As categorias foram cuidadosamente definidas, por forma a contemplar todas as suas matrizes. Tais categorias deram origem a diversas subcategorias correspondentes, sendo cada uma delas acompanhada de vários exemplos ilustrativos (Anguera, 2003; Coutinho, 2011). Passaremos a explicar de seguida a grelha de observação, que constitui o cerne deste artigo. Temas Categorias Organização Presença da linguagem e gestão do escrita na sala ambiente educativo Subcategorias Suportes escritos existentes na sala Introdução de novos ou a substituição dos suportes escritos existentes na sala (periodicidade) Introdução de novos ou a substituição dos suportes escritos existentes na sala (em negociação com as crianças) Utilização de suportes escritos nos espaços e períodos de brincadeira livre das crianças Formas de linguagem escrita Diversidade de funções associadas aos suportes escritos da sala presentes na sala Utilização dos suportes de escrita nas rotinas do dia-a-dia Espaços para a exploração da linguagem escrita Existência de um espaço próprio para a exploração/produção de escrita Utilização/valorização do espaço pelas crianças Locais da sala onde se explora a funcionalidade da linguagem escrita Tipos de suportes/materiais de produção escrita Suportes/modelos de escrita Materiais existentes no espaço da escrita A intervenção Atitude da educadora educativa da educadora Estratégias/ /atividades promovidas Apoio e incentivo dado às crianças nas suas explorações e tentativas de escrita Propostas de realização de atividades de registo escrito Espontaneidade do registo escrito das vivências das crianças Realização de atividades em que as crianças veem utilizar a escrita com diferentes objetivos Atividades resultantes das vivências de cada criança/grupo Tipologia das atividades Atividades direcionadas para o desenvolvimento de competências visuomotoras e visuopercetivas Atividades direcionadas para o desenvolvimento de competências metalinguísti- cas – consciência fonológica A escrita pelas crianças Participação das crianças na escolha e/ou construção dos registos escritos expostos na sala Autonomia e iniciativa das crianças para utilizarem a escrita na realização das suas tarefas Explorações e tentativas de escrita Envolvimento e participação das crianças nas atividades de escrita A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 9 Como se pode observar, pela leitura da grelha, foram definidas oito categorias, quatro para cada um dos dois temas definidos: 1. Organização e gestão do ambiente educativo, que compreende as categorias – “Presença da linguagem escrita na sala”; “Formas de linguagem escrita presentes na sala”; “Espaços para a exploração da linguagem escrita”; e “Materiais existentes no espaço da escrita”. 2. A intervenção educativa da educadora, que engloba as categorias – “Atitude da educadora”; “Estratégias/atividades promovidas”; “Tipologia das atividades”; e “A escrita pelas crianças”. Passamos agora a apresentar cada uma das categorias, de forma individualizada, com as respetivas subcategorias que lhes estão agregadas, bem como os exemplos ilustrativos para cada uma delas. Na categoria “Presença da linguagem escrita na sala”, despontaram as subcategorias: ‘Suportes escritos existentes na sala’ (localização, estado de conservação, acessibilidade à criança, qualidade do registo gráfico – tipo de letra, cor, ilustração, clareza de conteúdo – e qualidade estética); ‘Introdução de novos ou substituição dos suportes escritos’ (periodicidade – com que regularidade os registos são substituídos); ‘Introdução de novos ou substituição dos suportes escritos existentes na sala’ (em negociação com as crianças – é solicitada e valorizada a sua opinião); ‘Utilização de suportes escritos nos espaços e períodos de brincadeira livre das crianças’ (nos diferentes espaços organizados da sala: nomeadamente jogos, expressão plástica, casinha, entre outros). A categoria “Formas de presença da linguagem escrita presentes na sala” suportou duas subcategorias: ‘Diversidade de funções associadas aos suportes escritos da sala’ (registos de vivências, registos de histórias, projetos e atividades desenvolvidos/em desenvolvimento, cartazes, avisos, etiquetas de material, nomes das crianças, nomes dos espaços e títulos dos registos, entre outros); e ‘Utilização dos suportes de escrita nas rotinas do dia-a-dia’ (mapa de tarefas, mapa do tempo e mapa de presenças). A terceira categoria, “Espaços para a exploração da linguagem escrita” comportou as seguintes subcategorias: ‘Existência de um espaço próprio para a exploração/produção de escrita’ (espaço organizado e destinado à exploração de tentativas de escrita por parte das crianças); ‘Utilização/ valorização do espaço pelas crianças’ (utilização espontânea do espaço, por sugestão da educadora, frequência, rotatividade, individualmente, a pares, por exemplo); e ‘Locais da sala onde se explora a funcionalidade da linguagem escrita’ (como biblioteca, mesas e espaço da casinha). Continuando, a categoria seguinte “Materiais existentes no espaço da escrita”, deu origem às subcategorias: ‘Tipos de suportes/materiais de produção escrita (computador, impressora, máquina de escrever, quadro grande, quadros individuais, lápis, borrachas, canetas, cadernos individuais e folhas, entre outros); e ‘Suportes/modelos de escrita’ (por exemplo, ficheiros de letras, ficheiros de palavras, imagem associada à palavra, revistas, jornais, panfletos). Na categoria “Atitude da educadora”, as subcategorias definidas foram: ‘Apoio e incentivo dado às crianças nas suas explorações e tentativas de escrita’ (a educadora dirige-se à criança incentivando-a a escrever, expõe as tentativas de escrita das crianças, valoriza-as perante o grupo e dá resposta às suas solicitações, além de outros aspetos); ‘Proposta de realização de atividades de registo escrito’ (a educadora faz propostas de atividades que impliquem a escrita por parte das crianças, incentiva-as a escreverem conforme sabem, escreve à frente das crianças, lê o que escreveu e acompanha a leitura com o dedo, por exemplo); e ‘Espontaneidade do registo escrito das vivências das crianças’ (a educadora, espontaneamente, regista as vivências das crianças). Na categoria “Estratégias/atividades promovidas” foram constituídas as seguintes subcategorias: ‘Realização de atividades em que as crianças viram utilizar a escrita com diferentes objetivos’ (caso do registo das vivências do fim de semana, do registo espontâneo de vivências, do registo de 10 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI uma história, do registo de vivências de grupo e do título da atividade); e ‘Atividades resultantes das vivências de cada criança/grupo’ (os registos escritos das vivências das crianças são posteriormente explorados por estas e/ou pela educadora). À penúltima categoria “Tipologia das atividades”, pertenceram duas subcategorias: ‘Atividades direcionadas para o desenvolvimento de competências visuomotoras e visuopercetivas’ (nomeadamente treino do traço/grafismos, da escrita, de letras, cópia de frases, de palavras, de letras; e reconhecimento da grafia das letras constituintes das palavras); e ‘Atividades direcionadas para o desenvolvimento de competências metalinguísticas – consciência fonológica’ (como trava-línguas, lengalengas, som das letras, início ou terminação das palavras, rimas, adivinhas, nome das letras, consciência da palavra, consciência silábica e reconhecimento de palavras começadas pela mesma letra). Por fim, a última categoria “A escrita pelas crianças” compreendeu quatro subcategorias: ‘Participação das crianças na escolha e/ou construção dos registos expostos na sala’ (registo gráfico nos registos escritos elaborados pela educadora e imitação da escrita da educadora, por exemplo); ‘Autonomia e iniciativa das crianças para utilizarem a escrita na realização das suas tarefas’ (as crianças, espontaneamente, fazem uso da escrita nas suas diferentes atividades, livres ou orientadas); ‘Explorações e tentativas de escrita’ (tais como, tentativas de escrita de forma espontânea por parte das crianças, reconhecimento da palavra em contexto – o próprio nome, o nome dos colegas – a escrita do seu nome e/ou dos colegas – com ou sem recurso a modelo); e ‘Envolvimento das crianças nas atividades de escrita’ (interesse demonstrado pelas crianças nas atividades relacionadas com a linguagem escrita). Todas estas categorias e subcategorias foram definidas à priori, de forma exaustiva, mas construídas de forma aberta e flexível de forma a possibilitarem a inclusão de novos dados, caso tal fosse necessário no processo de observação, o que não se veio a verificar. Após a sua construção, contei com o apoio de dois ‘juízes externos’ e ainda de uma especialista na área da educação pré-escolar, como forma de validação do instrumento, cujos contributos se revestiram de especial importância e pertinência para a elaboração do mesmo. Após este processo, o instrumento foi submetido à Direção-Geral de Inovação e Desenvolvimento Curricular (Ministério da Educação), por forma a corresponder aos requisitos oportunamente explicitados. Apenas após a aprovação, por parte desta entidade, do instrumento em causa, foi combinado com as protagonistas os períodos em que iriam ser realizadas as observações. Realização das observações e recolha dos dados Se tivermos em conta o tempo que se torna necessário para realizar uma análise de conteúdo que seja “precisa e operacional” (Bardin, 1995), a somar ao período de espera entre a construção do instrumento e a sua aprovação por parte daquela entidade, facilmente se chega à compreensão de que as sessões de observação – a serem realizadas no mesmo ano letivo em que foram efetuadas as entrevistas – foram concretizadas a partir do mês de maio (do ano letivo de 2011/2012). As sessões de observação possíveis de serem concretizadas, foram duas para cada uma das protagonistas e ocorreram entre os meses de maio e julho do ano letivo de 2011/2012. À exceção de uma das protagonistas, que no seu segundo momento de observação solicitou à investigadora que o mesmo se desenvolvesse no período da tarde (dados os seus objetivos de ação educativa), todos eles ocorreram no período da manhã, altura em que se desenvolve a maioria das atividades letivas orientadas por parte dos educadores de infância – sensivelmente entre as 9h00 e as 12h00 (período entre a entrada das crianças na sala de atividades e o almoço, com um pequeno A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 11 intervalo para o recreio de, sensivelmente, quinze a vinte minutos). Tal como o descrito, a duração das sessões de observação, na sua maioria, foi de três horas cada e assenta-se a justificação para a mesma nos factos que a seguir se apresentam: • Considero que a linguagem escrita tem uma dimensão transversal no currículo e, como tal, a sua presença na sala de atividades é constante e permanente; • Uma observação reduzida poderia causar uma maior reação induzida por parte do observado – neste caso, as educadoras – enquanto se acontecesse num período mais longo (no decorrer da manhã) mais facilmente se poderia captar a naturalidade das suas atitudes e atos educativos; • A presença da investigadora durante todo o período da manhã configurou-se como mais natural do que se acontecesse apenas numa parte da mesma; • Em certa medida, crê-se que a presença da investigadora, de uma forma mais continuada, evitou que a educadora pudesse preparar a sua ação fazendo aparecer elementos e processos não usuais na sua prática, expressamente para a observação; • A observação não se baseou apenas em elementos estáticos, mas também em processos dinâmicos – estes últimos apenas visíveis em observações mais longas. Embora consciente da necessidade de treino para a arte da observação, como investigadora – na sua fase exploratória (Anguera, 2003) – bem como da importância de um pré-teste feito ao instrumento de avaliação, no sentido de perceber se o mesmo respondia aos objetivos da observação, não foi possível, por falta de tempo útil, testar o instrumento ou sequer a perspicácia em termos de observação, pelo que apenas contei com a minha experiência como supervisora, bem como com o conhecimento que detenho do contexto observado, enquanto educadora de infância. Anguera (2003) também chama a atenção para algumas tendências e dificuldades que podem advir do processo de observação, enquanto método de recolha de dados, aspetos a que tentei dar resposta, por forma a evitá-los, da melhor forma possível: i. A reatividade por parte dos observados. Neste aspeto, tentei ser o mais natural possível em todas as observações: todas as educadoras explicaram às crianças qual seria o meu papel dentro da sala de atividades e tentei sempre interagir com estas para que aceitassem a minha presença no seu quotidiano de jardim de infância. Além disso, esforcei-me por não interferir no normal desenvolvimento da atividade educativa por parte das educadoras, sendo que estas, no decorrer da sua ação, dirigiam-se-me, de forma espontânea, para elucidar acerca do que estavam a apresentar, em forma de propostas, ao grupo de crianças ou ainda para me contextualizar acerca de alguma reação por parte de alguma criança. ii. As expectativas por parte do observador. Talvez este tenha sido o conspecto mais exigente nas sessões de observação. Tínha a grelha de observação previamente construída, mas senti que este foi o aspeto em que mais me esforcei no sentido de ser o mais rigorosa e isenta possível, pois muito naturalmente se formam expectações em relação aos diferentes contextos de observação. iii.Tendências e falhas de carácter técnico. Já tive oportunidade de enunciar as limitações em termos de sessões temporais de observação, pelo que assumo que possa ter havido imperfeições e/ ou omissões no processo de recolha de dados. No entanto, investi bastante no preenchimento da grelha de observação por construída, tendo o cuidado de responder a todas as suas categorias nos diferentes momentos de recolha de dados. Os itens foram apresentados de forma clara e precisa, a mais detalhada possível, por forma a evitar erros de preenchimento (Estrela, 1994). 12 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI Conclusões É na pessoa do educador, enquanto ator social, técnico, profissional reflexivo, mestre e artesão (Paquay, 1994), que assenta o modo como vai conceber, planificar e desenvolver a sua intencionalidade educativa, numa gestão curricular, que se pretende integrada e sustentada numa reflexão na e sobre a prática. Na verdade, a diversidade das características pessoais e dos diferentes percursos pessoais, profissionais, escolares e de formação das protagonistas, veem-se refletidas no seu pensamento, discurso e modo de atuar, o que nos leva a considerar o educador como um todo, no desenvolvimento das suas práticas, porque «são os seus selfes que dão significado ao sentido do ato de ensino e aprendizagem» (Day, 2001, p. 315). É também na organização e gestão do ambiente educativo que as educadoras promovem, proporcionando um espaço apropriado para a exploração da linguagem escrita, com materiais diversificados e apresentando propostas desafiadoras e motivantes para as crianças, que as atitudes de apoio e de estímulo ganham consistência, com vista à evolução das suas concepções precoces, num ambiente que se pretende «comunicativamente estimulante». Cada educadora, como profissional que valoriza os conhecimentos das crianças nesta área, proporciona uma sensibilização à escrita para que as crianças se consciencializem de determinadas características desta forma de linguagem e que adota o papel de «modelo escritor» e de mediador entre as crianças e o escrito, incentivando-as à reflexão sobre este tipo de linguagem. Note-se, porém, que algumas delas partilham a convicção de que o tempo no jardim de infância é o tempo privilegiado para brincar, em que qualquer educador deve ter em atenção a motivação intrínseca da criança, sendo o aspeto lúdico o referencial da sua atuação (Horta, 2007). Acreditando na Escola como uma «comunidade de aprendizagem» (Day, 2001), em que os educadores e professores devem ser dotados de estratégias de intervenção para que lhes seja permitido o conhecimento de um ambiente micro e mesossistémico (Bronfenbrenner, 2002), para que possam atuar em conformidade, além de reconhecer a importância de um educador como prático reflexivo, cuja capacidade lhe confere poder e proporciona oportunidades para o seu próprio desenvolvimento (Oliveira e Serrazina, 2002), considero que a aplicação deste instrumento por cada educador poderá constituir-se como uma ferramenta útil e, quiçá, orientadora da sua própria prática educativa, no que à abordagem da linguagem escrita diz respeito, em contexto de educação pré-escolar. Referências bibliográficas Anguera, M. T. (1989). Innovaciones en la metodología de evaluación de programas. Anales de psicología, 5: 13-42. 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Ministério da Educação/ Direção-Geral de Inovação e Desenvolvimento Curricular. 14 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 15 A MULTICULTURALIDADE NOS RELATÓRIOS DA PRÁTICA DE ENSINO SUPERVISIONADA NA FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES Maria do Carmo Vieira da Silva ([email protected]) Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa Faculty of Social and Humanity Sciences of Universidade Nova de Lisboa CICS.NOVA - Centro Interdisciplinar de Ciências Sociais Interdisciplinary Centre of Social Sciences – CICS.NOVA Resumo Os problemas relacionados com as questões da multiculturalidade têm sido objeto de temáticas abordadas por estudantes universitários da formação inicial de professores da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, aquando da sua prática de ensino supervisionada nas escolas, durante o segundo ano do respetivo mestrado de ensino. A escolha desta temática poderá dever-se ao facto de, no primeiro ano dos mestrados de ensino, os estudantes frequentarem a unidade curricular de Educação, Currículo e Multiculturalismo, por nós lecionada e, de algum modo, se mostrarem mais sensibilizados para os problemas colocados pela diversidade cultural dos alunos nas escolas. Nesta comunicação propomo-nos apresentar alguns destes relatórios, elaborados sob a nossa orientação científica e por nós escolhidos por apresentarem abordagens diferentes sobre a temática, e refletir sobre as estratégias utilizadas, as inovações introduzidas e os resultados obtidos junto dos alunos. Consideramos da maior pertinência esta disseminação como forma de sensibilização e de motivação para a abordagem desta temática por outros docentes. Palavras-chave: multiculturalidade; relatórios da prática de ensino supervisionada; formação inicial de professores. 16 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI Abstract The problems related with multiculturalism have been approached by college students of the Faculty of Social and Humanity Sciences of the New University of Lisbon in their teachers’ initial training during supervised teaching practices in schools in the second year of their teaching master. Their preference for this theme may be due to the fact that, in the first year of their master, the students attend to a course named Education, Curriculum and Multiculturalism, taught by us, and also because they seem to be more aware of the problems raised by students’ cultural diversity in schools. In our communication we propose to present some of these reports, prepared under our scientific supervision and chosen by different approaches, and reflect on the strategies used, innovations introduced and results achieved. We consider the sharing of these reports of great relevance as a way to sensitize and motivate other teachers for this approach. Keywords: multiculturalism; stage reports; teachers’ initial training Introdução A abordagem às questões da multiculturalidade surge, de um modo geral, quase sempre associada a contextos sociais e educativos onde a presença de grupos com nacionalidades e ascendências étnicas diversas se faz sentir. Nestes estudos, o foco da investigação aparece muitas vezes associado a contextos escolares de segundo e terceiro ciclos do ensino básico o que, mesmo extrapolando, pode indiciar que os níveis de ensino do jardim-de-infância, primeiro ciclo e ensino secundário não apresentam problemas tão significativos a nível da relação entre pares, entre professor aluno e viceversa, e na relação escola-família-comunidade. Contudo, a realidade não é esta, sobretudo no primeiro ciclo, a que se reportam os nossos próprios estudos de investigação dos finais dos anos oitenta e da década de noventa do séc. XX, assim como os que temos supervisionado, quer a nível de dissertações de mestrado em Ciências da Educação, quer nos Relatórios da Prática de Ensino Supervisionada (PES). Na verdade, e relativamente ao ensino secundário, os estudos também não são tão numerosos dado o carácter de ensino não obrigatório, até 2012, e dado o forte carácter científico e teórico deste ciclo de estudos tendo em vista a preparação dos alunos para os exames nacionais e para o prosseguimento de estudos. De salientar, igualmente, o carácter seletivo da anterior não obrigatoriedade do ensino secundário, o que fazia com que o nono ano de escolaridade, ano terminal do ensino básico obrigatório, constituísse também, mesmo que não assumidamente, o ano da seleção de alunos porque de: finalização de estudos; entrada no mercado de trabalho; opção por cursos profissionalizantes; não continuidade de estudos. O modelo de formação inicial de professores do terceiro ciclo do ensino básico e do ensino secundário, em Portugal, é supervisionado e da responsabilidade das universidades. Constituído por dois anos de formação de segundo ciclo universitário, o primeiro ano é curricular e o segundo de prática de ensino supervisionada numa escola, sob a orientação de um ou de dois professores da respetiva escola ou escolas (dependendo da existência dessa disciplina ou disciplinas em que o estudante se profissionaliza), docentes tutelares de turma, e finaliza com a elaboração individual e a defesa pública de um Relatório, descritivo e reflexivo, do trabalho desenvolvido pelo(a) estagiário(a)/formando(a) em contexto da prática pedagógica e didática. A escolha prévia de um tema serve de fio condutor às práticas pedagógico-didáticas desenvolvidas em sala de aula. O estudante é, ainda, acompanhado por um ou dois orientadores da institui- A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 17 ção de ensino superior, mas que não se desloca(m) à(s) escola(s)os (pelo menos até à data desta comunicação). Este facto, sobretudo quando o orientador convidado pelo formando não trabalha com ele senão em gabinete, cria situações próprias, por vezes muito interessantes a nível de distanciamento, mas também acarreta e/ou pode originar dificuldades no desenvolvimento do trabalho, e na aceitação de propostas de trabalho por parte do (s) orientador(es) pedagógico(s) da(s) escola(s). Contudo, também permite nas sessões individuais de trabalho com o estagiário/formando compreender climas de escola, desmontar conflitos de natureza vária, antecipar estratégias de atuação e planificar o ciclo de supervisão pedagógica de uma forma produtiva e sem interferências. 1. Atualidade e pertinência da temática da multiculturalidade Como noutras áreas, também a Educação é contagiada por uma abordagem de temas que se articula com os interesses da sociedade, com os problemas por ela vividos, com as suas dificuldades, as falhas e as expetativas. Daí a preocupação constante em associar escola e sociedade privilegiando, por vezes, uma ou outra em função da importância que lhe é atribuída ou pela insuficiência de uma ou de outra em responderem positivamente aos desafios dos respetivos tempos históricos. Numa Europa do séc. XX terrivelmente marcada por duas grandes guerras mundiais, conflitos bélicos internos e mudanças tecnológicas vertiginosas não é de estranhar que as questões culturais assumissem um valor até então desconhecido e, inclusive, passassem a influenciar novas áreas como foi o caso da Educação. Educar para o pluricultural, o multicultural, o intercultural, a diversidade, são motes recorrentes de oposição a um monoculturalismo e a um etnocentrismo vigentes até bem entrada a segunda metade do século XX, tendo como pano de fundo a preparação de indivíduos mais capazes de viver em sociedades marcadas pela diferença e também mais cívicos (no sentido de civilidade, de bem comum) nas suas atitudes, comportamentos e modos de estar. A responsabilidade desta formação recaiu abertamente sobre a Escola, instituição considerada a melhor preparada e mais capaz de a assumir. E mesmo que as palavras e as temáticas se alterem ao sabor de modas e da interseção de vocábulos oriundos de outras áreas científicas, a diversidade, a mundialização, a rapidez com que os indivíduos, hoje, se deslocam e comunicam entre si obrigam a manter atual e pertinente a reflexão sobre o que é e como ser cidadão no mundo atual. Trata-se, pois, de uma temática que não se pode descurar, sobretudo quando, neste verão de 2015, todos os dias os meios de comunicação relatam fugas, naufrágios, mortandades de homens, mulheres e crianças, vindos de outros continentes para a Europa, em condições absolutamente inaceitáveis para um séc. XXI e para uma opinião pública conhecedora, esclarecida e crítica. A literatura científica portuguesa sobre as questões da multi/interculturalidade em contexto escolar - como sejam e citando apenas alguns pioneiros Silva (1991, 2002), Villas-Boas (1996), Cardoso (1996), Souta (1997), Stoer e Cortesão (1999), Vala (1999), Vieira (1999, 2000), Peres (2000), Carneiro (2001), Leite (2002, 2003) - tem-se mostrado produtiva e inovadora quer a nível das abordagens efetuadas, dos trabalhos empíricos desenvolvidos e das conclusões e recomendações assinaladas. Autores de referência têm, inclusive, disseminado as suas práticas investigativas a nível universitário desencadeando outras investigações, novos projetos, outros contributos científicos junto dos seus alunos. 18 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 2. Os Relatórios da Prática de Ensino Supervisionada Os exemplos de Relatórios da Prática de Ensino Supervisionada (PES) que apresentamos têm como referência temática comum a abordagem a questões de cidadania e de multi/interculturalidade. A preocupação das suas autoras por estas questões está intimamente ligada com as vivências sociais atuais e com a necessidade de preparar os alunos de terceiro ciclo e do ensino secundário para uma atuação cívica como cidadãos que já o são. Com efeito, ser cidadão aprende-se desde a mais tenra idade e é-se cidadão quando se protege a casa comum, na expressão do Papa Francisco (2015, p. 13): «O urgente desafio de proteger a nossa casa comum inclui a preocupação de unir toda a família humana na busca de um desenvolvimento sustentável e integral, pois sabemos que as coisas podem mudar». Selecionámos quatro Relatórios que foram elaborados sob a nossa orientação, sobretudo no que à temática diz respeito. Em todos eles se privilegia a componente multicultural e a cidadania no ensino-aprendizagem de diferentes disciplinas - Português, Espanhol e Geografia -, em articulação direta com os conteúdos programáticos das mesmas disciplinas, a nível do terceiro ciclo do ensino básico e do ensino secundário. A opção por esta escolha está relacionada com o facto de pretendermos demonstrar que a abordagem destas temáticas, mesmo que não explicitamente indicada nos programas curriculares das diferentes disciplinas, pode ser efetuada e articulada com os conteúdos programáticos dependendo da iniciativa do professor e da sua vontade, sensibilidade e preparação para valorizar estas temáticas. Na impossibilidade de relatarmos em pormenor o trabalho desenvolvido pelas autoras, salientamos os aspetos que considerámos mais relevantes para a temática em análise neste artigo, remetendo para a leitura integral dos respetivos Relatórios. Importa sobretudo acentuar que os temas não foram objeto de abordagens específicas, descontextualizadas dos conteúdos programáticos, mas antes complementaram objetivos de ensino e de aprendizagem e constituíram atividades articuladas e inseridas quer nas metas de aprendizagem quer nas metas curriculares. 2.1 - Relatório I - Língua e cidadania: dois conceitos em diálogo O Relatório elaborado por Joana Gomes Rodrigues, intitulado Língua e cidadania: dois conceitos em diálogo, centrou-se na questão da cidadania no ensino-aprendizagem do Português e do Latim. Especificamente na disciplina de Português, no 3º ciclo, a formanda teve como objetivo «perceber qual o entendimento por parte dos alunos do conceito de cidadão e, consequentemente, de cidadania» e como finalidade fazer com que «os alunos alargassem a sua visão acerca do conceito de cidadão/cidadania». Todo o trabalho inicial foi conduzido no sentido de serem os próprios alunos a elaborar uma ficha que lhes permitisse avaliar as diferentes etapas por que iam passando, ao longo do ano letivo, relativamente ao seu entendimento do conceito. Como atividade inicial, a autora utilizou o preenchimento por parte dos alunos de um cartão com a seguinte frase para completar: “Para mim ser cidadão é…”. Esta primeira atividade constituiu o ponto de partida para todo o trabalho do ano letivo na disciplina, complementado com a organização conjunta das atividades a desenvolver em sala de aula e com a negociação das regras de comportamento e de desempenho na mesma. Tomando sempre como referência os textos selecionados para análise e estudo na disciplina de Português, a formanda teve como denominador comum articulá-los com as questões da cidadania, apoiando o seu trabalho e o dos alunos em fichas de registo individual (auto registo para os alunos) das atitudes e dos comportamentos destes últimos, num processo contínuo, semanal e reflexivo. Esta opção de A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 19 continuidade permitiu-lhe, num momento posterior, comparar a evolução dos alunos em termos de compreensão do que é cidadania e de atitudes de cidadania desenvolvidas pelos alunos. Assim, replicando num momento posterior e quase final do ano letivo a mesma atividade inicial aos alunos da turma - “Para mim ser cidadão é…” -, na análise de conteúdo efetuada às respostas, Rodrigues (2012) verificou que os vinte e três alunos consideraram ter exercido a cidadania em contexto de sala de aula porque: cumpri deveres (n=15), respeitei professores (n=11), respeitei colegas (n=11), estive ciente dos meus direitos (n=6), participei ativamente nas atividades em sala de aula (n=5), ajudei os colegas (n=4), fui pontual (n=1), fui responsável (n=1), preparei os trabalhos a tempo (n=1), trabalhei em grupo (n=1) e, ainda, por estar informado acerca do que nos rodeia (n=1), sentir segurança com a família (n=1), ter orgulho no país (n=1), ter uma identificação (n=1), dar o exemplo (n=1). Em síntese, da primeira para a segunda atividade, os alunos passaram de uma ideia teórica sobre o conceito para um lado mais prático, sobressaindo a ideia de cumprir regras como a mais vezes mencionada na segunda atividade. De salientar, ainda, que nesta segunda atividade os alunos introduziram novos itens – tais como: propor formas de melhorar o país, valorizar os outros, pagar impostos, descontar, trabalhar muito -, o que parece atestar o grau de consciência cívica adquirido, através do aprender fazendo, desenvolvido com e pelos alunos. 2.2 – Relatório II - Utilização e criação de materiais didáticos para o ensino-aprendizagem de saberes culturais Do Relatório de Carina Estevão Freire, intitulado Utilização e criação de materiais didáticos para o ensino-aprendizagem de saberes culturais, começamos por salientar as razões enunciadas pela autora para a escolha da sua temática: «Importância e necessidade de formar futuros cidadãos ativos, numa sociedade cada vez mais multicultural e plurilingue». Sublinha a autora (Freire, 2015) que «esta perspetiva é defendida em documentos que apresentam orientações para o ensino-aprendizagem de uma língua e da cultura nela veiculada» e que «nesses documentos, os conhecimentos culturais e socioculturais surgem como base para fomentar uma consciência intercultural no aprendente e desenvolver nele competências gerais como o “saber ser” e o “saber aprender”». Desenvolvendo as suas atividades letivas no ensino-aprendizagem do Português e do Espanhol, a autora toma como fio condutor do seu trabalho a planificação da Escola e da área disciplinar, que enriquece com o recurso à elaboração pessoal de materiais e à definição de atividades de grande relevância e criatividade e com enorme rigor e enriquecimento científicos. A destacar, por exemplo, a atividade El Día de los Enamorados en el mundo hispano, desenvolvida com os alunos na aula de Espanhol, para a qual Freire (2015) definiu os seguintes objetivos: «Comparar la festividad entre la Península Ibérica y América latina; Conocer cómo se celebra esta fiesta en algunos países hispanohablantes; Conocer el nombre de algunos países hispanohablantes; Opinar sobre los hábitos y costumbres en esta fecha (símbolos, invitaciones, regalos, sentimientos, etc.)» (idem, p.101). De entre os vários materiais produzidos pela docente salientamos uma ficha sobre o modo como este dia é comemorado no mundo hispânico – Chile, Argentina, Costa Rica, Colombia, Cuba, Ecuador, Perú, República Dominicana, Porto Rico, Venezuela. Para além da informação teórica de enriquecimento (aqui entendido como conhecimento complementar) fornecida ressalta igualmente o conhecimento de outras formas de cultura, de outros modos de festejar o mesmo acontecimento. Outro exemplo a destacar foi a transcrição e análise da canção “300 KILOS” de Los Coyotes (idem, p.109): Esto es una canción que va dedicada a todos los países que entran dentro del área de lo que se ha dado en llamar la cultura latina. / Países como Perú, Guatemala, Honduras, Chile, ¡Chile! 300 kilos de pueblos 20 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI latinos, todos pueblos hermanos, todos suramericanos. / Recordamos a Cuba, Portugal, Brasil, El Salvador, México, México Distrito Federal, Nicaragua, ¡Nicaragua! 300 kilos de pueblos latinos, todos pueblos hermanos, todos suramericanos. / También queremos recordar a Puerto Rico, Venezuela, Colombia, Ecuador, Quito, a todos los centros latinos de Nueva York, al centro venezolano de Estocolmo, al centro gallego de Buenos Aires. / 300 kilos de pueblos latinos, todos pueblos hermanos, todos suramericanos. Ou, ainda, a abordagem ao tema Tiempo de vacaciones, com o objetivo de desenvolver o vocabulário sobre clima, atividades de ócio e meios de transporte e de conhecer a cultura hispo-americana, e a Postales de Hispanoamérica. De salientar, também, as múltiplas atividades desenvolvidas por Freire (ídem) no âmbito do ensino-aprendizagem do Português como sejam a visita à exposição Fernando Pessoa em Espanha, na Biblioteca Nacional de Portugal, no âmbito do evento Mostra Espanha 2013, com o intuito de complementar os conteúdos estudados em sala de aula e de atingir o seguinte objetivo do Programa de Português de 12.º ano do Ensino Secundário: desenvolver a transversalidade cultural e linguística. Como a autora afirma, «Embora muitas vezes desconhecida pelo público português, a dimensão ibérica do trabalho de Fernando Pessoa apresenta, também ela, uma importância significativa no panorama literário (editorial, intelectual, epistolar, etc.)» (idem, p.76). (Imagem da autora, p.77) De destacar a sugestão final deixada pela autora no seu Relatório ao referir que «a transversalidade de saberes culturais, sustentada e aplicada nesta PES, pode ser sugerida em contexto de reuniões de avaliação, em que os docentes envolvidos decidem construir uma prática de conhecimentos partilhados» (idem, p. 62). 2.3 – Relatório III - A multi e interculturalidade no ensino da História e da Geografia Do Relatório elaborado por Mónica Gioconda dos Santos Rôla, intitulado A multi e interculturalidade no ensino da História e da Geografia, salientamos a temática Portugal, um país multicultural, desenvolvida com alunos de duas turmas do 10º ano de escolaridade na disciplina de Geografia, para a qual Rôla (2015) definiu os objetivos seguintes: • Promover competências e atitudes para valorizar a diversidade nas sociedades. A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 21 • Desenvolver a capacidade de compreensão e de intervenção no relacionamento com outras culturas e espaços. • Aprofundar o conhecimento sobre os países em estudo, valorizando as suas especificidades. • Estimular o diálogo, a comunicação e a compreensão intercultural. • Fomentar o respeito pelos outros e a autoestima. • Reconhecer a importância da integração/acolhimento de cidadãos estrangeiros. • Desenvolver competências geográficas e competências de utilização das TIC. Optando pela valorização do saber trabalhar em grupo, Rôla (idem) desenvolveu a temática em grupos de trabalho de 3 ou 4 elementos, por forma a que cada grupo trabalhasse sobre cada um dos países de proveniência dos alunos estrangeiros/imigrantes ou de ascendência estrangeira existentes na (o) turma/Agrupamento, procurando integrar um aluno imigrante/estrangeiro ou de ascendência estrangeira em cada um dos grupos. A todos os grupos a autora lançou os seguintes questionamentos: Como lidar com esta nova e inquestionável realidade? Seremos capazes de gerir no dia-a-dia a diversidade que nos envolve? Somos capazes de apreciar estas diferenças? Este trabalho permitiu aos alunos estudarem vários países como, por exemplo, Angola, Bangladesh, Brasil, Cabo Verde, Cuba, Guiné Bissau, Guiné, Índia, Nepal, Moçambique, São Tomé e Príncipe, Ucrânia, aplicando em simultâneo conhecimentos já adquiridos na disciplina de Geografia, como se exemplifica no seguinte exemplo de atividade proposta por Rôla (2015): «- Seleciona a informação e imagens mais relevantes de cada um dos itens do PowerPoint e copia para a caixa de texto correspondente, ajustando a letra (a definir), tamanho (a definir), conforme o exemplo.» «- Copia o mapa da distribuição da população residente do país em estudo em Portugal e o gráfico de colunas correspondente e cola-os na caixa de texto, ajustando os mesmos ao espaço existente, conforme o exemplo.» 22 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI O trabalho desenvolvido por Rôla privilegiou sempre a articulação entre os conteúdos do programa da respetiva disciplina (História e Geografia) com a valorização da cultura de que os alunos eram portadores ou por nascimento ou por ascendência. Em síntese, aprendeu-se também com o conhecimento transmitido pelos próprios alunos. 2.4 – Relatório IV - Lusofonia: Língua portuguesa a muitas vozes Finalmente, uma referência ao Relatório elaborado por Fernanda Manuela Campos de Sá Couto Antunes e intitulado Lusofonia: Língua portuguesa a muitas vozes. Neste Relatório, Antunes (2012) aborda com os seus alunos a língua portuguesa em várias vertentes, das origens à atualidade, como que num crescendo do desenvolvimento da própria língua portuguesa na sua globalidade. Do powerpoint de apresentação do seu Relatório, em prova pública, retirámos os cinco pontos que se seguem e que permitem compreender não só o trabalho desenvolvido pela autora como também o modo poético como o faz. 1 - «A génese do português» - A palavra é um retrato feito a sons (Teixeira de Pascoaes). Objetivos: a) Indicar a importância do latim como origem primordial da língua portuguesa; b) Mostrar que a língua portuguesa como realidade viva, evolui e viaja; c) Salientar a contribuição da cultura clássica greco latina em especial na cultura ocidental; d) Indicar algumas obras clássicas que influenciaram as artes e as letras produzidas em português. 2 - «Português – Língua de carácter global» - Língua portuguesa, encruzilhada de quantos a falam e a escrevem, ponto de encontro onde se plasmam culturas e civilizações (Carlos Reis). Objetivos: a) Sensibilizar para a importância da língua portuguesa no mundo de hoje; b) Enquadrar o valor e a dimensão da comunidade lusófona, num vasto universo de falantes, detentores de uma língua oficial comum; c) Mostrar que se trata de uma língua global, dispersa geograficamente e de carácter pluricultural. 3 - «Português – Língua de diversidade» - Língua de muitas pátrias, dela se diz ser maleável e fraterna (Onésimo Teotónio de Almeida). Objetivos: a) Realçar a diversidade que caracteriza o universo da A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 23 língua falada em português; b) Comparar caraterísticas entre o português europeu, o português brasileiro e o português africano; c) Reconhecer a própria diversidade do português falado em Portugal. 4 - «Português – Língua de possibilidades interculturais» - Optando pelo caminho do encontro e da mestiçagem dialógica entre culturas (João Maria André). Objetivos: a) Reconhecer o multiculturalismo intrínseco na língua portuguesa; b) Consciencializar para o enriquecimento através do outro; c) Promover a prática intercultural, através do respeito mútuo, da cooperação e da partilha de saberes; d) Alargar “janelas”, numa perspetiva moderna de cidadania, através do instrumento LÍNGUA, elo precioso de ligação entre os diferentes países, povos e comunidades que de alguma forma utilizam o português nas suas vidas. 5 - «Produção literária em português» - Ler é uma forma de estar lá (José Saramago). Objetivos: a) Motivar para a leitura de textos lusófonos; b) Conhecer autores e a sua criação literária escrita em português; c) Perceber o seu destaque no âmbito da literatura do mundo; d) Trabalhar a intertextualidade de textos de autores de língua portuguesa. A apresentação em prova pública deste Relatório terminou com três citações que se reproduzem pela sua pertinência, relevância e atualidade: • Se a língua não mudasse, todos hoje estaríamos falando o latim (João Ubaldo Ribeiro). • Não há uma língua portuguesa, há línguas em português (José Saramago). • Mpurukuma, Língua, corpo quase, O que sou de sobrepostas vozes! (Luís Carlos Patraquim). Neste Relatório destacamos o encadeamento das temáticas abordadas numa articulação entre estudo da língua, literatura nacional e lusófona, multiculturalismo e interculturalismo. 2.5 - Síntese Como se verifica, em todos estes Relatórios a abordagem à diversidade cultural, à multiculturalidade, surge sempre integrada nos conteúdos programáticos das disciplinas sem necessidade de recurso a tempos letivos específicos ou a atividades extracurriculares direcionadas para o efeito. Do mesmo modo, a formação cívica de cada aluno é contemplada e aprendida num «saber fazer» de experiências de aquisição de conhecimentos e de atitudes e do desenvolvimento de capacidades que constituem as competências que se pretende fazer adquirir nos respetivos ciclos de estudos. Assim, o conceito de cidadania é ele também aprendido com os outros e através dos outros, num processo de interculturalidade que se pretende produtor de novas formas de estar e de viver em sociedade, em diálogo e em harmonia, numa educação para a paz. Em síntese, mais que o domínio da teoria importa que cada docente seja criativo nas atividades que propõe aos alunos, que saiba gerir com segurança e eficácia o currículo, que esteja atualizado(a) em termos de informação, que tenha espírito reflexivo e crítico sobre essa mesma informação, que saiba implicar os alunos nos temas em análise, que tenha vontade e disposição para se questionar a si próprio(a). 24 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI Considerações Finais O posicionamento distanciado do(a) orientador(a) do Relatório, sobretudo quando não mantém relações nem de trabalho nem de colaboração com qualquer docente cooperante/supervisor nas escolas, não deixa de ser muito particular e, por vezes mesmo, profícuo. Com efeito, acaba por deter um “poder” relevante nas decisões pedagógicas tomadas em sala de aula que, segundo a opinião que defendemos, são fundamentais para a consecução dos objetivos a atingir. Como costumamos dizer aos nossos estudantes da formação inicial de professores, podemos ter uma planificação exemplar e ser exímios nos conhecimentos científicos teóricos a transmitir e/ou a propor que os alunos apreendam, mas se não existir uma construção sólida da relação pedagógica, com tudo o que ela implica, o plano de aula exemplarmente concebido e estruturado pode tornar-se num fracasso. No nosso caso pessoal, não sendo docente de didática de uma determinada disciplina mas sim da unidade curricular de Educação, Currículo e Multiculturalismo, e portanto das Ciências da Educação, o nosso papel junto dos estudantes que acompanhamos pautou-se, muitas vezes, por sugestões “provocatórias” de estratégias e de abordagens que considerámos adequadas e inovadoras relativamente ao tema do respetivo Relatório da PES. Como consequência, em algumas situações, verificou-se que o acompanhamento feito ao estudante em situação de prática pedagógica acabou por se alargar ao próprio professor supervisor / cooperante na escola. Ou seja, o professor cooperante também beneficiou da formação inicial do “estagiário”, tendo-se tornado também ele formando mas em situação de formação contínua. Privilegiando, sobretudo, as questões temáticas relativas à multi e à interculturalidade e à cidadania, na temática dos Relatórios da Prática de Ensino Supervisionada, cremos ter contribuído para a constatação de que estas questões são transversais a qualquer disciplina do currículo escolar e podem ser abordadas dentro dos conteúdos programáticos oficialmente definidos e de acordo com as respetivas metas curriculares. O fundamental é, neste ano de prática numa escola, o estudante possuir ferramentas pedagógico-didáticas consistentes e reflexivas, adquiridas no seu primeiro ano de formação, que lhe permitam aplicar esses conhecimentos de um modo criterioso, reflexivo e inovador. Não se descarta também aqui o papel dos diferentes orientadores que, também eles, têm de possuir esses mesmos conhecimentos pedagógico-didáticos arriscando-se, se não os detiverem, a contribuir para a formação de professores que não se pautam pela qualidade que é exigida. O facto de os estudantes terem optado por temáticas relacionadas com a multi/interculturalidade e com a cidadania parecem-nos refletir a sua preocupação com estas temáticas assim como a sua preparação para ao integrá-las as articularem de modo correto com os conteúdos científicos da respetiva disciplina. Com efeito, as abordagens multi/interculturais não podem acontecer unicamente em contextos educativos de diversidade de alunos. Elas têm de acontecer em todos os contextos. Talvez mesmo a premência se situe nos contextos monoculturais para que os alunos compreendam que o mundo é constituído não unicamente pelo seu mundo mas por muitos outros mundos ricos e válidos em experiências de vida. A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 25 Referências Bibliográficas Relatórios da PES Antunes, F. M. C. de S. C. (2012). Lusofonia: língua portuguesa a muitas vozes. Relatório da Prática de Ensino Supervisionada em Ensino do Português no 3º Ciclo do Ensino Básico e no Ensino Secundário. Lisboa, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. Freire, C. E. (2015). Utilização e criação de materiais didáticos para o ensino-aprendizagem de saberes culturais. Relatório da Prática de Ensino Supervisionada em Ensino do Português e de Língua Estrangeira (Espanhol) no 3º Ciclo do Ensino Básico e no Ensino Secundário. Lisboa, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. Rodrigues, J. G. (2012). Língua e cidadania: dois conceitos em diálogo. Relatório da Prática de Ensino Supervisionada em Ensino de Português e de Línguas Clássicas no 3º Ciclo do Ensino Básico e no Ensino Secundário. Lisboa, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. Rôla, M. G. dos S. (2015). A multi e interculturalidade no ensino da História e da Geografia. Relatório da Prática de Ensino Supervisionada em Ensino da História e da Geografia no 3º Ciclo do Ensino Básico e no Ensino Secundário. Lisboa, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. Outras obras Cardoso, C. M. (1996). Educação multicultural: percursos para práticas reflexivas. Lisboa: Texto Editora. Carneiro, R. (2001). Fundamentos da educação e da aprendizagem: 21 ensaios para o século 21. Vila Nova de Gaia: Fundação Manuel Leão. Leite, C. (2003). Para uma escola curricularmente inteligente. Porto: Edições ASA. Leite, C. M. F. (2002). O currículo e o multiculturalismo no sistema educativo português. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian e Ministério da Ciência e da Tecnologia. Papa Francisco (2015). Louvado sejas. Carta Encíclica «Laudato si» sobre o cuidado da casa comum. Prior Velho: Paulinas Editora. Peres, A. N. (2000). Educação Intercultural: utopia ou realidade? Porto: Profedições. Silva, M. C. V. (1991). Contributos para uma análise de necessidades educativas de crianças pertencentes a minorias étnicas e desfavorecidas (dissertação de mestrado não publicada). Lisboa: Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Lisboa. Silva, M.C.V. (2002). «Discriminatio subtilis»: estudo de três classes multiculturais. Lisboa: Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Lisboa. (Tese de doutoramento parcialmente publicada em 2008 sob o título Diversidade cultural na escola: encontros e desencontros, Lisboa: Colibri). Stoer, S. & Cortesão, L. (1999). Levantando a pedra: da pedagogia inter/multicultural às políticas educativas numa época de transnacionalização. Porto: Edições Afrontamento. Souta, L. (1997). Multiculturalidade & educação. Porto: Profedições. Vala, J. (Org.) (1999). Novos racismos: perspectivas comparativas. Oeiras: Celta Editora. Vieira, R. (1999). Da multiculturalidade à educação intercultural: a antropologia da educação na formação de professores. Educação, Sociedade & Culturas, 12, 123-162. Vieira, R. (2000). Ser igual, ser diferente: encruzilhadas da identidade. 2ª ed., Porto: Profedições. Villas-Boas, M. A. (1996). Dificuldades dos professores nos contactos com as famílias. In Atas do 1º Congresso das Licenciaturas em Ciências da Educação: Profissões e espaços escolares. Porto: CIIE – UP. 26 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 27 AS TIC, AS PRÁTICAS DE ENSINO SUPERVISIONADAS, A INVESTIGAÇÃO E A INOVAÇÃO: OS BLOGUES EDUCATIVOS & A SEGURANÇA NA INTERNET Henrique Gil ([email protected]) Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Castelo Branco & Centro de Administração e Políticas Públicas – Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas – Universidade de Lisboa Vera Caroço e Carina Félix Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Castelo Branco Resumo Presentemente, em Portugal, estima-se que a utilização das TIC (Tecnologias da Informação e da Comunicação), pelos designados nativos digitais, corresponde a cerca de 98,5%. Considerando que os nativos digitais correspondem aos cidadãos que nasceram somente há 15 anos atrás, significa que toda a atual população escolar vive e convive rodeada de dispositivos e de ferramentas digitais no âmbito das suas rotinas diárias. Contudo, em termos gerais, não se tem verificado a mesma realidade no espaço educativo onde a presença de computadores e de uma ligação à Internet continua a ser muito escassa e incipiente. As Práticas de Ensino Supervisionadas, no âmbito do Mestrado em Educação Pré-escolar e Ensino do 1º Ciclo do Ensino Básico, têm vindo a constituir uma «janela de oportunidades» para a realização de investigações sobre a implementação das TIC no processo de ensino aprendizagem. Apesar de todos os constrangimentos, tem sido possível promover-se uma investigação que se pode considerar inovadora e exploratória pela inexistência de investigações anteriores similares. Para o efeito, é objetivo apresentarem-se os resultados de uma investigação que envolveu a utilização de blogues, no sentido destas ferramentas digitais promoverem novos contextos de aprendizagem e, ainda, com o objetivo de serem uma «ponte» que permitiu a aproximação entre a escola e a família. Um outro exemplo de investigação a apresentar diz respeito à utilização 28 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI segura da Internet. Dos resultados obtidos foi possível verificar que crianças de 7/8 anos já fazem uma utilização autónoma da internet mas, em vários casos, foi possível averiguar-se que os respetivos pais não têm noção relativamente às utilizações que os seus educandos fazem no chamado ciberespaço. Em termos globais, foi possível apurar-se que as crianças aderem muito facilmente à utilização das tecnologias digitais na sala de aula, os alunos mostraram-se sempre muito envolvidos e motivados. Para terminar, é importante referir que, apesar de todas as vantagens apuradas, quer os alunos quer os pais, continuam a afirmar que a presença dos professores é fundamental e imprescindível no processo de ensino e de aprendizagem. Palavras-Chave: TIC; Práticas de Ensino Supervisionadas; Blogues educativos; Segurança na internet; Inovação. Abstract At present, in Portugal, it is estimated that the use of ICT (Information and Communication Technologies) by the digital natives called, corresponds to about 98.5%. Whereas digital natives correspond to citizens who were born only 15 years ago, it means that all current school population lives and lives surrounded by digital devices and tools as part of their daily routines. However, in general terms, in the educational space where the presence of computers and an Internet connection is still very scarce and incipient. Supervised Teaching Practice (Master in Preschool and 1st Cycle of Basic education), they have come to constitute a ‘window of opportunity’ in order to have carried out investigations where it has privileged the use of ICT. Despite all the constraints, it has been possible to promote up an investigation that can be considered innovative and exploratory by the absence of previous similar investigations. To this end, it will be presented the results of an investigation that involved the use of blogs that to provide new ways of teaching and learning, educational blogs have managed to be a ‘bridge’ that allowed the rapprochement between the school and families. Another example of the present investigation relates to the safe use of the Internet. The results showed that children 7/8 years already do a stand-alone use of the internet but in many cases it was possible to ascertain that the respective parents have no idea about the use that their students make the so-called cyberspace. Overall, it was possible to ascertain that children adhere easily to the use of digital technologies in the classroom, students showed up always very involved and motivated. Finally, it should be noted that despite all the advantages cleared either students or parents, continue to claim that the presence of teachers is fundamental and indispensable in the process of teaching and learning. Keywords: ICT; Supervised Teaching Practice; Educational blogs; Safe internet; Innovation. As TIC e o seu enquadramento social e educativo Na atualidade, as TIC (Tecnologias da Informação e da Comunicação) são uma presença incontornável em todos os setores sociais. Neste contexto, a «Escola» não se pode alhear desta realidade onde cada vez mais as crianças fazem uma utilização diária e constante das TIC e dos dispositivos digitais associados porque já fazem parte das suas vivências e das suas rotinas diárias – Nativos Digitais. De acordo com dados recolhidos pela UMIC (2009), a utilização das TIC pelos nativos digitais (indivíduos até aos 15 anos de idade) cifrava-se em 98,5%. No mesmo sentido, o estudo A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 29 posterior da UMIC (2010) veio corroborar esta tendência ao afirmar que entre 95% e 100% dos estudantes usam, respetivamente, a Internet e o computador. Ainda de acordo esses dados recolhidos pela UMIC (2010), 91% dos jovens entre os 10 e os 15 anos utilizam Internet, no entanto, apenas 84% desses jovens fazem a sua utilização a partir das suas casas. Apesar deste valor ser mais do dobro de 2005, que apresentava apenas um valor de 32%, é importante realçar que a Escola se apresenta como um espaço que proporciona uma maior acessibilidade para uma utilização mais generalizada das TIC por parte dos alunos. Contudo, é importante realçar que este valor não tem uma relação direta com a utilização «formal» em contexto de sala de aula. Tal como se pode ler nos dados da UMIC (2010), 77% dos jovens dos 10 aos 15 anos referem utilizar diariamente o computador em diferentes atividades que são repartidas da seguinte forma: trabalhos escolares (93%), audição de música e visionamento de filmes (84%), jogos (84%) e utilização de software educativo (54%). Esta última atividade já faz uma ponte com a Escola mas parece ser mais da iniciativa pessoal e não como resultado ou como consequência de um enquadramento educacional formal. Pois, apenas 28% desses jovens afirmam que usam o computador na Escola para realizar trabalhos e para comunicar com colegas. Apesar de ter havido um acréscimo substancial no acesso e na utilização das TIC por parte dos alunos mais jovens, a real inclusão das TIC em contexto educativo ainda não foi satisfatoriamente atingida. Neste sentido, de acordo com os dados recolhidos pela European Schoolnet (2012), vieram demonstrar que Portugal tem feito grandes esforços para que haja uma maior disponibilidade no acesso às TIC. Tal como se pode observar na Figura 1, Portugal apresenta um rácio de 6 alunos por computador, muito próxima da média da União Europeia que corresponde a um rácio de 5 alunos por computador. Figura 1: Rácio de alunos por computador no seio da União Europeia no ano letivo de 2011-12. Um outro estudo realizado pela OberCom em 2014, vem corroborar a tendência quase generalizada da população mais jovem na utilização da Internet. Tal como é afirmado por Cardoso et al (2014), apesar de ser evidente o efeito em “escada” que atualmente se verifica, alerta-se para o facto de a médio/longo prazo esta tendência tender a ser eliminada pela renovação geracional que irá ter lugar (Figura 2). No entanto, em sentido oposto, é bastante clara e evidente a elevada percentagem da Internet pelas faixas mais jovens. Tendo em consideração os dados relativos à realidade dos jovens portugueses torna-se impensável não enquadrar a utilização das TIC em contexto educativo. Esta questão tem vindo a ser debatida há já alguns anos e parece existir uma certa consensualidade. Como refere Marquès (2008), a dificuldade parece residir na forma e no desafio relacionado com uma utilização das TIC que possam promover aprendizagens significativas ao invés de serem ferramentas centradas no ensino. Ou seja, deve haver uma centralização das aprendizagens, tal como afirma Ponte (2000), tornando os alunos como os verdadeiros protagonistas do processo educativo. É sob esta perspetiva que se deve referir a designação proposta por Jonassen (2007) ao entender que as TIC devem ser enten- 30 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI Figura 2: Utilização da Internet pela sociedade portuguesa por faixas etárias. didas como ferramentas cognitivas no sentido dos alunos aprenderem com as tecnologias e não através das tecnologias. Do mesmo modo, Costa (2007) é também de opinião que neste enquadramento, as TIC ao serem assumidas e utilizadas como ferramentas cognitivas, é que poderão tornar possível que seja equacionada e promovida uma aprendizagem significativa dos alunos. Para o efeito, torna-se importante criar condições para que os alunos possam promover aprendizagens ativas ao manipularem diferentes materiais e os poderem integrar nessas novas experiências de aprendizagem, no seio de uma aprendizagem que seja intencional ao articularem essas experiências com os objetivos e com os conteúdos previamente adquiridos. As TIC devem ser integradas como ferramentas que permitam a resolução de problemas reais onde a autenticidade das aprendizagens sejam percionadas e intencionais. Neste particular, de acordo com Prensky (2004), a utilização de dispositivos digitais portáteis (computadores, tablets e smartphones) vêm permitir que facilmente as TIC estejam omnipresentes em todos os espaços de ensino/aprendizagem e, como tal, mais facilmente poderão ser incluídas nos processos educativos: “when and where to use”. No presente contexto, como Wastiau et al (2013) vêm afirmar, cada vez mais a tendência observada é a de “(…) move away from fixed installations of computers in labs, classrooms or other locations towards mobile learning devices.” Uma constatação ainda referenciada por Wastiau et al (2013), tendo em consideração os dados recolhidos no «Survey of Schools: ICT in education», veio demonstrar que cerca de 95% das escolas inquiridas afirmam ter banda larga e acesso wireless o que vem permitir alterar, de forma ‘drástica’, a forma como os conhecimentos podem ser acedidos e veiculados. É agora neste contexto que Osório (2005) refere que cada vez mais se diluem as fronteiras entre os espaços formais e os espaços não formais de aprendizagem, naquilo a que o autor refere como as fronteiras tradicionais entre o «espaço-tempo de produção» e o «espaço-tempo formativo». Contudo, tal como também é referido por Osório (2005), é preciso que exista por parte dos alunos um conjunto de capacidades que lhes permitam exercer a sua autoaprendizagem. Pois, no seio desta linha de argumentação, Law, Pelgrum e Plomp (2008) são de opinião que não basta proporcionar o acesso às TIC e às ligações wireless mas a necessidade de existir uma competência digital por parte dos alunos e por parte dos professores que permita uma adequada utilização. Neste particular, importa clarificar qual o sentido de competência digital. Para o efeito, toma-se como referência a definição proposta pela Comissão Europeia (2007): “Involves the confident and critical use of Information SocietyTechnology (IST) for work, leisure and communication. It is underpinned by basic skills in ICT, i.e. the use of computers to retrieve, store, produce, present and exchange information, and to communicate and participate in A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 31 collaborative networks via the Internet.” Torna-se óbvio que a utilização das TIC deve ser realizada fomentando (mais) nos alunos e nos professores atitudes críticas e conscientes que, na opinião de Cruz (2009), se pressupõe que deva haver a mobilização, a integração e a combinação de quatro tipos de dimensões que envolvam: saberes instrumentais onde se concretiza o domínio do hardware; saberes cognitivos que tenham uma relação direta com uma utilização da informação que inclui o seu acesso, produção e posterior difusão; saberes atitudinais que incluam comportamentos sociais de empatia e de respeito mútuo; saberes axiológicos e éticos no sentido de existir uma tomada de consciência clara de que as TIC não são neutrais às quais devem estar subjacentes valores e critérios éticos. Neste âmbito, onde a relação entre as TIC e a comunicação é tão estreita, Cachapuz et al (2004) afirmam que essa utilização quer seja feita de forma presencial ou a distância, constitui uma das competências fundamentais para saber comunicar adequadamente. Em coerência com os argumentos e dados já apresentados, concorda-se com Patrocínio (2004) ao afirmar que a inclusão transversal e natural das TIC no sistema educativo português é um imperativo e uma obrigação no atual contexto social. Tal como também já se verificou a utilização e a apetência dos alunos para a utilização das TIC ser bastante notória e real. Nesta realidade, terão que ser os professores a ter que tomar iniciativas que levem ao enquadramento e à utilização mais sistemática das TIC em contexto educativo (espaços formais e/ou informais). Esta situação vem representar um desafio às instituições de formação de professores no sentido de capacitarem os futuros professores para lidarem com novos espaços, com espaços mais criativos e mais inovadores. As Práticas de Ensino Supervisionadas e os respetivos processos investigativos e inovadores através das TIC No âmbito do Curso de Mestrado em Educação Pré-Escolar e Ensino do 1º Ciclo do Ensino Básico a inclusão de áreas e unidades curriculares de «Práticas de Ensino Supervisionadas», para além de promoverem um espaço diretamente relacionado com a preparação profissional para o exercício de funções de docência prevê que, ao mesmo tempo, os mestrandos praticantes adquiram competências de investigação que possam desencadear espaços propiciadores à inovação. Quando se aborda o conceito de inovação não há propriamente uma conceção que seja unânime, dado que pode conter várias dimensões e argumentações. Uma dessas propostas é apresentada por West e Richards (1999) que entendem a inovação como sendo uma prática deliberada e intencional recaindo essa responsabilidade inovadora no professor. Nesta dimensão é o ‘professor-inovador’ que toma a iniciativa ao propor novas estratégias e novas metodologias ou, de outro modo, pode apresentar novas e diferentes formas na sequenciação e na forma de operacionalização. Esta é uma dimensão que permite ir da ‘teoria’ para a prática’ e pode ser vivida na 1ª pessoa. Numa outra dimensão, que é defendida por Renzulli (2003), encara a inovação como mudança a qual poderá ser radical ou até disruptiva. Comparativamente com a conceção anterior, neste caso não há propriamente uma intenção deliberada ou um resultado esperado. Trata-se de uma dinâmica que é criada e imprimida onde a previsibilidade pode chegar a ser inexistente pela capacidade de promover e incluir diferentes atores e, consequentemente, diferentes e novas inter-relações. Nesta comunidade inovadora a partilha é permanente porque todos ensinam a todos e todos aprendem com todos. Numa terceira dimensão que aqui se apresenta, pode considerar-se a inovação como sendo institucional e dirigida, tal como propõe Smits (2002). Esta é conceção «mais tradicional» que é imposta numa perspetiva de ‘top-down’que surge em determinados contextos políticos e sociais mas que retira toda a liberdade para realmente se poder ser inovador. É evidente que a primeira conceção parece ser aquela que, sendo mais cordata, permite envolver o professor como principal decisor 32 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI numa perspetiva onde se integra uma metodologia do tipo exploratório e de investigação ação. É neste contexto que a PES (Prática de Ensino Supervisionada) pode ser esse motor inovador. Trata-se de um momento especial e único na formação de professores, a sua formação inicial. É evidente que este professor em formação carece de experiência mas também não está preso a rotinas pelo que lhe deve ser dada a hipótese de ser ele próprio, ainda que sob uma supervisão que se deseja mas que não seja inibidora. Enquadrando as TIC com os processos de inovação, partilha-se a opinião de Kamplis, Boconi e Punie (2012) ao referirem a importância que estes recursos digitais podem vir a assumir pelo facto de se criarem condições e contextos para uma utilização mais seletiva e mais criativa da informação. Quer isto dizer que não se advoga uma utilização das TIC que sirva para replicar ou para adaptar práticas mais tradicionais. Pelo contrário, como defende Loveless (2008), as TIC devem ser promotoras e catalisadoras para a introdução de novas abordagens onde a interação entre professor e aluno sejam uma realidade e onde as atividades colaborativas venham a prevalecer. Ou ainda como referem Punie et al (2006) numa relação ‘peer-to-peer’ que inclui práticas mais flexíveis que poderão, por sua vez, promover espaços para uma melhor adaptação a diferentes ritmos de aprendizagem e que levarão a um maior envolvimento e motivação dos alunos. Para o efeito, Redecker et al (2009, 17) fazem uma referência positiva, neste contexto, para as ferramentes sociais digitais ao afirmarem: “(…) social media approaches can facilitate technological, pedagogical and organisational innovation in teaching and learning, thus contributing to the modernisation of systems and institutions to meet the challenges of the 21st century.” Para que se possa operar a inclusão das TIC em contexto educativo é necessário que os professores se sintam seguros e confortáveis na sua utilização. Por isso, há a convicção de que a PES deve promover estes espaços no sentido dos futuros professores entenderem as TIC como ferramentas pedagógicas que lhes permitem ir ao encontro das atuais necessidades e anseios dos alunos. De acordo com os dados recolhidos por Wastiau et al (2013), apenas 20-25% dos alunos utilizam as TIC em contexto de sala de aula por professores que se sentem digitalmente competentes e seguros. Wastiau et al (2013, 19) referem ainda que de acordo com os dados recolhidos: “(…) confident and supportive teachers are needed to use ICT infrastructure effectively and exploit its potential and that they are able to make the best use of relatively poor ICT learning environments.” Utilização das TIC em contexto da Prática de Ensino Supervisionada Nesta secção vão apresentar-se, de forma resumida, os principais resultados de duas investigações que foram realizadas no decorrer da PES em duas escolas do 1º Ciclo do Ensino Básico em Agrupamentos pertencentes à cidade de Castelo Branco (Portugal). As investigações envolveram a utilização de Blogues Educativos e a utilização segura da Internet É importante realçar que se tratam, apenas de dois exemplos que permitem ilustrar a importância da PES como espaço de intervenção e de investigação ao poder incluir as TIC. No primeiro caso, a utilização dos Blogues Educativos, a preocupação foi a de transformar a utilização de blogues Educativos como uma ‘ponte’ que pudesse aproximar os pais dos seus filhos, no sentido de fomentar um conhecimento e uma partilha das suas aprendizagens. Neste sentido, na opinião de Wastiau et al (2013, 16) esta opção reveste-se de grande importância e não está a ser devidamente aproveitada: “(…) the findings reveal that most have been familiar with ICT at school for a few years but still mainly use it to pepare their teaching. Only a few use it – but still to a limited extent – to work with students during lessons, and less frequentely to communicate with A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 33 parents or divide students’ work between school and home in mew ways.” Ainda neste contexto, Cruz (2009) vem reforçar a necessidade para se promoverem contextos de aprendizagem suportados por estruturas tecnológicas digitais em rede a fim de permitirem a construção de comunidades de aprendentes onde venha a prevalecer a partilha e o intercâmbio de saberes. No segundo caso, a preocupação centrou-se na utilização segura da Internet, em alertar os alunos para as potencialidades da Internet mas de uma forma a que não os pudesse expor a eventuais perigos. Tendo em conta o facto do público-alvo ser muito jovem ainda é fundamental a presença e o apoio quase constante do professor de forma a que os alunos se sintam seguros e confiantes. Neste particular, os dados recolhidos por Wastiau et al (2013, 19) permitem afirmar que: “(…) when students are taught by teachers with great confidence in their own digital competence (operational and social media skills) and in their ability to use the Internet safely and responsibly.” Este tipo de experiências e de comportamentos serão rentabilizados no futuro por estes alunos pelo facto de terem sido expostos a estas experiências, num mundo digital, poderão virem a sentiremse mais autónomos e mais confiantes por terem vindo a adquirir competências nesta área. Neste sentido, Wastiau et al (20013, 19), reportando-se aos dados recolhidos vêm também afirmar que: “Such confidence applies to students’ operational ICT skills, social media skills, ability to use the Internet responsibly, and, to a slightly lesser extent, to use the Internet safely.” a) Blogues Educativos no 1º CEB A investigação foi realizada envolvendo uma turma de alunos do 1º ano de 25 alunos com idades compreendidas entre os 6 e os 7 anos de forma a que se pudesse responder à seguinte questão: «Verificar qual o contributo dos blogues educativos como fator de aproximação entre a família e a escola.» Após várias pesquisas na Internet foi criada uma listagem contendo vários blogues educativos os quais foram, numa fase posterior, seriados e selecionados por docentes do 1º CEB e por especialistas na área das TIC. Em termos globais, os blogues tiveram em consideração os objetivos e os conteúdos contidos no programa do 1º CEB e a sua adequação à faixa etária correspondente. Por outro lado, foram verificados outros aspetos, entre os quais, a usabilidade, a acessibilidade e o rigor técnico e científico. A metodologia utilizada na investigação assentou numa perspetiva qualitativa que incluiu um estudo de caso no seio de uma investigação ação. A recolha de dados restringiu-se às 4 semanas de intervenção da investigadora onde teve um desempenho individual, onde se destacou uma observação participante, a recolha de notas de campo e a aplicação de um inquérito por questionário aos pais/encarregados de educação. Em termos gerais, as estratégias implementadas, tendo em consideração que os alunos envolvidos ainda possuíam um domínio incipiente de leitura e escrita, implicaram um apoio ‘deliberado’ dos respetivos pais/encarregados de educação nas atividades propostas. Desta forma, os pais/encarregados de educação foram ‘forçados’ a colaborar com os seus educandos na realização das diferentes tarefas que implicaram a utilização de recursos contidos nos blogues educativos. Pode afirmar-se que, numa primeira fase, a adesão não foi imediata por todos os participantes. Contudo, a ‘pressão’ dos alunos fez com que, com o decorrer do tempo, a utilização dos blogues já passasse a ser uma rotina diária. Em termos de conclusão, tendo por base a recolha de dados realizada, os blogues mostraram ser um recurso que fomentou a motivação dos alunos por ter proporcionado novos e diferentes contextos de aprendizagem. Os pais/encarregados de educação também fizeram um balanço positivo porque entenderam que puderam acompanhar mais os seus filhos nas aprendizagens que estavam a decorrer e porque também sentiram que as aprendizagens eram realizadas de uma forma muito mais ‘natural’ por parte dos seus filhos porque o suporte, agora digital, ia mais ao encontro dos seus interesses. Contudo, num 34 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI balanço final, foi possível concluir que houve uma unanimidade em encarar os blogues (suportes digitais) como um complemento, continuando a ser enfatizado e priorizado o papel fundamental do professor, mas agora com uma maior proximidade dos pais/encarregados de educação promovida pelo ‘blogue’. b) Utilização segura da Internet no 1º CEB A investigação relacionada com a utilização segura da Internet foi levada a efeito numa turma do 2º ano de escolaridade, constituída por 20 alunos com idades compreendidas entre os 7 e os 9 anos de idade. A metodologia foi de caráter qualitativo, com uma abordagem no âmbito da investigação ação. Nas sessões de intervenção, a investigadora recolheu dados através da sua observação participante, tendo ainda aplicado questionários aos alunos e aos respetivos pais com o objetivo de comparar as opiniões que pudessem corroborar ou não o tipo de utilização efetuada na Internet. Foram também realizadas entrevistas semiestruturadas junto de professores do 1º CEB do Agrupamento e a uma docente especialista (ERTE – Equipa de Recursos e Tecnologias Educativas do Ministério da Educação) com o objetivo de se poder realizar uma melhor triangulação de dados. Como seria de esperar, os alunos utilizavam a Internet com regularidade, sendo que 30% o fazia de forma autónoma e sem que tivessem qualquer tipo de controlo… Contudo, os dados recolhidos junto dos pais contradizem este dado ao afirmarem que exerciam um controlo nas atividades dos seus filhos, o que pareceu não corresponder exatamente ao verificado no decorrer da investigação. O que se verificou é que os alunos que possuíam computador em casa, com ligação à Internet, estavam, na grande parte do tempo, entregues a si próprios, tendo manifestado possuírem contas em redes sociais (Facebook) e terem ‘amigos virtuais’. Felizmente, o número de alunos ‘em risco’ era residual mas este facto não diminui a preocupação em inverter esta realidade. Dos restantes dados recolhidos foi ainda possível verificar-se que, quer os professores quer os pais, não conheciam ferramentas digitais que pudessem mitigar uma utilização insegura na Internet. Ou seja, a utilização de filtros e de sítios/programas associados eram desconhecidos para ambos. Neste particular, a investigadora teve a possibilidade de esclarecer dúvidas e de propor condutas que minorassem a exposição daqueles alunos. No que diz respeito a questões que envolveram o processo de ensino/ aprendizagem, a utilização segura de sítios da Internet, previamente verificados pela investigadora, veio a permitir que os alunos se sentissem motivados e envolvidos nas diferentes atividades propostas. Em termos globais, pode concluir-se que a utilização deste recurso foi muito gratificante para os alunos envolvidos. No entanto, tendo em consideração os aspetos comportamentais associados à utilização da Internet, a investigação veio demonstrar que ainda há muito a fazer para que sejam adotados comportamentos seguros. Para o efeito, a investigação veio demonstrar que se torna necessário promover mais sessões formativas e de esclarecimento para professores, pais e alunos no que diz respeito a uma utilização segura da Internet. Principais conclusões e considerações finais Tendo em consideração os dados apresentados na secção inicial relativamente ao potencial e às implicações das TIC no processo de ensino/aprendizagem e a relação direta com processos criativos e inovadores, associados às atividades de investigação integradas nas PES e, tendo em consideração que a população alvo corresponde a nativos digitais, não restam dúvidas que as TIC podem e são, quando devidamente integradas e utilizadas em contexto educativo (espaços formais e/ou A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 35 não formais), ferramentas e recursos educativos capazes de proporcionarem novas e diferentes abordagens que resultem em aprendizagens mais motivadoras, mais envolventes e, potencialmente, mais significativas! Houve a preocupação de serem apresentados resultados de inquéritos nacionais e internacionais (União Europeia) no sentido de poderem ser o mais isentos possíveis e o que se verificou foi uma concordância e congruência entre os mesmos. Para concluir, sem querer repetir argumentos ou diretivas já mencionadas, importa refletir acerca das seguintes dimensões que emergem das conclusões de Wastiau et al (2013): • a importância dos responsáveis diretivos das escolas em assumirem as TIC como um recurso fundamental a integrar nas práticas letivas tendo que acautelar um apoio técnico efetivo para os docentes, funcionários e alunos; • promover uma formação contínua de professores atualizada no âmbito das TIC; • fomentar a utilização de dispositivos digitais móveis; • integrar a utilização das TIC em espaços formais e em espaços não formais através de redes wireless e de banda larga; • pelo facto de alguns alunos terem referido que não dispõem de Internet nas suas casas, a Escola surge como o local de eleição onde este acesso deve ser facilitado e estimulado; • a importância cada vez maior e mais visível do poder e do impacto das redes sociais digitais! 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A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 37 A TRAMA DA CRIAÇÃO DO JARDIM DE INFÂNCIA JOÃO DE DEUS DE BRAGANÇA EM 1915 Luís Castanheira ( [email protected]) Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Bragança Resumo O trabalho que aqui se apresenta pretende trazer para o espaço público educativo português, elementos novos sobre o processo da criação de Jardins-escola João de Deus em Portugal, nomeadamente a tentativa de criação e construção de um Jardim Escola João de Deus na cidade de Bragança no ano de 1915. Com a implementação da 1ª republica em 1910, pretendia-se construir uma nova sociedade e de um homem novo assente na educação a começar no jardim-de-infância. A reforma da instrução primária em 1911 (Decreto-29/3/1911, in DG, Nº73) decretava a criação de jardins-de-infância por todo o país. Inserido neste movimento, na cidade de Bragança, surgiu a ideia de se criar o Ensino Infantil através Associação de Escolas Móveis e Jardins-Escolas João de Deus e foi nesta base que se desenvolveu todo o procedimento inicial. A trama começa aqui envolvendo figuras de destaque da cidade. O Jardim-Escola João de Deus e a Escola Infantil foram criados como sendo a mesma instituição. Só mais tarde, em março de 1916, se diferenciaram como entidades diferentes. Criou-se a Escola infantil pública inaugurada em 1917 tendo o Jardim-escola servido apenas como pretexto. A História da Educação de Infância em Portugal não regista a existência de qualquer Jardim-Escola João de Deus na cidade de Bragança nem faz qualquer referência sobre o assunto. Indagamos a possibilidade da Associação de Escolas Móveis e Jardins-Escolas João de Deus ter criado nesta data mais um Jardim-Escola no País, em Bragança, pois a ser verdade, seria digna de registo a capacidade de alargamento e difusão que teve o projeto, quando sabemos, que era de iniciativa particular e conhecedores da crise por que Bragança e o País passavam. Averiguei se de facto 38 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI se tratava do mesmo, ou se eram processos diferentes e se o poder central incentivava e apoiava a construção de Escolas Infantis através da Associação de Escolas Móveis e Jardins-Escolas João de Deus e se teria intenção em tomar como oficiais as Escolas Infantis criadas por esta Associação. Palavras-chave: História da Educação; Jardim-de-infância João de Deus; Bragança; 1ª República. Abstract The work presented here aims to bring to the public Portuguese educational space new elements about the process of creation of João de Deus kindergarten in Portugal, and in particular the attempt of creating and building a kindergarten in the city of Bragança in the year 1915. With the implementation of first Republic in 1910, it was intended to build a new society and a new man based on education, starting in kindergarten. The reform of basic education in 1911 (Decree-29/3/1911, in DG, paragraph 73) declared the creation of kindergartens throughout the country. Inserted in this movement, in the city of Bragança, it was conceived the idea of creating the children’s Education through Association of Mobile Schools and kindergartens Schools João de Deus and it was on this basis that all the initial procedure developed. The plot starts here involving prominent figures of the city. The private João de Deus Kindergarten and the official Kindergarten were created as the same institution. Only later, in March 1916, they were differentiated as different entities. The public kindergarten opened in 1917 having kindergarten served only as a pretext. The story of the Childhood Education in Portugal does not mention João de Deus Kindergarten in the city of Bragança or makes any reference on the subject. Canvassed on the possibility of Association of Mobile Schools and kindergartens Schools, João de Deus was created on this date as a kindergarten in the country, in Bragança, because to be true, it would be worthy of record to analyze the capacity and the diffusion which took the project, when we know, it was of private initiative and because of the crisis the country was going through. I have ascertained if in fact it was the same, or if they were different processes and whether the central Government encouraged and supported the construction of Kindergartens through the Association of Mobile Schools and kindergartens Schools João de Deus and had intention in taking as officers playschools created by this Association. The research paradigm that underlies the study integrates a hermeneutical perspective, using methodologies of qualitative analysis on multidimensional interpretation of the problems addressed and on a document search heuristics. Keywords: History of education; Kindergarten João de Deus; Bragança; 1st Republic. Introdução O objeto de investigação deste trabalho insere-se no seio da História da Educação de Infância, através do estudo da tentativa de criação e abertura de um Jardim Escola João de Deus na cidade de Bragança no ano de 1915. Trata-se de uma experiência em Educação de Infância influenciada pelas ideias de modernidade pedagógica que se faziam sentir no País. No ano de 1915 foi criada em Bragança uma Escola Infantil pública que começou a funcionar em janeiro de 1917 e viria a funcionar até 1934 com 3 salas para crianças dos 3 aos 6 anos de idade (Castanheira, 2006). Para compreendermos como foi o processo da criação desta Escola Infantil A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 39 de Bragança, temos de conhecer o processo de criação de um Jardim-Escola João de Deus na mesma cidade e na mesma altura. O pensamento era criar o Ensino Infantil em Bragança, através do Jardim-Escola João de Deus e foi nesta base que se desenvolveu todo o procedimento inicial. O Jardim-Escola João de Deus e a Escola Infantil foram criados como sendo a mesma instituição. Só mais tarde, em março de 1916, se diferenciaram como entidades diferentes. O paradigma de investigação que sustenta o estudo integra-se numa perspetiva hermenêutica, utilizando metodologias de análise qualitativa na interpretação multidimensional dos problemas equacionados e numa heurística de procura de documentos. O Jardim-Escola João de Deus de Bragança Quem teve a iniciativa de trazer o Ensino Infantil para Bragança foi o Advogado e Deputado Democrático no Congresso da República Dr. Artur Camacho Lopes Cardoso, que veio a ser nomeado Presidente da Comissão Auxiliar da Associação de Escolas Móveis e Jardins Escolas João de Deus de Bragança. Este envolveu o Presidente da Comissão Executiva da Câmara Municipal do Concelho de Bragança – Carlos Alberto de Lima e Almeida, e o Diretor Escolar do Círculo de Bragança – Augusto Ladeiro. Foram estas três individualidades da cidade que desencadearam todo o processo. O processo de criação do Jardim-Escola João de Deus foi iniciado: A Câmara de Bragança cedeu o terreno e comprometeu-se a ajudar financeiramente a sua construção, além de prometer ajuda no mobiliário e materiais; o projeto de construção do edifício foi realizado, mas a sua edificação nunca chegou a concretizar-se apesar das diligências efetuadas, mas serviu de base ao processo que levou à abertura, em 1917,da EIB. Esta foi criada em 6/11/1915, pensando-se que se tinha criado um Jardim-Escola João de Deus. No entanto, o processo foi assente em toda a base legal de uma escola oficial e tratado com o Ministério da Instrução Pública, como sendo, uma Escola Infantil oficial. A História da Educação de Infância em Portugal não regista a existência de qualquer Jardim-Escola João de Deus em Bragança neste período do nosso estudo, nem até aos dias de hoje. Sobre a EIB apenas encontramos referência sobre a sua existência depois de 1926/27, (Gomes, 1977:82). As investigações de Gomes, de Cardona (1997), e recentemente de Saraiva (2003) na sua tese de Mestrado, Práticas Educativas nos Jardins-Escolas João de Deus, apenas se referem à criação de quatro Jardins-Escolas João de Deus, como referimos anteriormente. Glória Saraiva refere-se à criação no ano de 1927 de mais um Jardim-Escola João de Deus em Alhadas, no Concelho da Figueira da Foz. Na região de Trás-os-Montes, segundo a mesma autora, apenas se construiu um, em Chaves, no ano de 1948. Indaguei a possibilidade da Associação de Escolas Móveis e Jardins-Escolas João de Deus ter criado nesta data mais um Jardim-Escola no País, em Bragança, pois a ser verdade, seria digna de registo a capacidade de alargamento e difusão que teve o projeto, quando sabemos, que era de iniciativa particular e conhecedores da crise por que Bragança e o País passavam. Durante a minha pesquisa, encontrei várias referências à intenção da criação de um Jardim-Escola João Deus e de uma Escola Infantil. Fiquei na dúvida se as pessoas envolvidas no processo de criação saberiam destrinçar que eram Instituições com o mesmo fim, mas de caráter diferente. Procurei averiguar se de facto se tratava do mesmo, ou se eram processos diferentes e se o poder central incentivava e apoiava a construção de Escolas Infantis através da Associação de Escolas Móveis e Jardins-Escolas João de Deus ou se teria intenção em tomar como oficiais as Escolas Infantis criadas por esta Associação. Naquele período, utilizava-se a expressão “Ensino Infantil” quando se referiam à Educação de 40 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI Infância, e “Escola Infantil” ou “Jardim-Escola”, para se referirem ao Jardim-de-Infância, (Artº.21º. do Decreto-29/3/1911, in DG, Nº73). Segundo o art. 52.º do Decreto-lei nº 2887, (DG, de 23/12/1916), as Câmaras Municipais e o Governo podiam subsidiar as escolas de iniciativa particular, quando reconhecidamente úteis, desde que funcionassem em localidades onde não houvesse escolas oficiais do mesmo nível de ensino, e em especial se destinassem ao Ensino Infantil. O Jardim-Escola João de Deus reunia todas estas condições, bem como a cidade de Bragança, onde não havia nenhuma Escola Infantil. No entanto, na altura em que se iniciou o processo da sua criação nesta cidade, esta legislação ainda não tinha sido publicada. O processo iniciou-se em julho de 1915 e este Decreto foi publicado em dezembro de 1916. Na sessão da Comissão Executiva da Câmara Municipal de Bragança (CECMB), de 22/7/1915 iniciou-se o processo para se criar em Bragança o Ensino Infantil. O Presidente deste órgão depois de se pronunciar sobre as suas vantagens propôs a criação de um Jardim-Escola que se designaria João de Deus, nos seguintes termos: O Sr. Presidente que pôs em relevo as vantagens que para as crianças de Bragança adviriam da criação de um Jardim-Escola onde elas, por meio de exercícios e jogos próprios da sua idade, possam desenvolver-se fisicamente, condição essencial e indispensável para o robustecimento da raça portuguesa. Que para tal fim carecíamos de um edifício adequado e não podemos esperar tudo do poder central; necessário é pois, que a iniciativa particular ou, na falta desta, a das Corporações Administrativas desse também um impulso e prestasse a sua cooperação e, neste sentido, enviou para a mesa a seguinte proposta: Sendo de reconhecida e indiscutível vantagem a criação de um Jardim-Escola nesta cidade, mas atendendo a que este Município não está, infelizmente, em condições de poder levar a efeito a construção do respectivo edifício, proponho que a Câmara ofereça ao Exmº. Ministro da Instrução a quantia de 1.200$00 destinada a auxiliar a mesma construção e o terreno preciso para aquele fim de modo que a escola que será denominada João de Deus, comporte um número de crianças não inferior a 50 (AHCMB, Lv.19, 1915:119f e v). A Câmara deliberou sobre a criação da Ensino Infantil em Bragança no dia 28/8/1915, tomou a responsabilidade pelo fornecimento de material e mobiliário e disponibilizou o edifício onde funcionaria a escola provisoriamente enquanto não se construísse edifício próprio, para o efeito. A escola era criada nos termos do Decreto nº134, de 15/9/1913, que atribuía competências às Câmaras Municipais para organizar os processos de criação, conversão ou supressão e transferência de escolas de instrução primária, tornando-se necessário determinar as condições em que deviam ter lugar. (AHCMB, Lv. 19, 1915:128f e v). Nesta altura, ainda se pensava que a Escola Infantil a instalar era o Jardim-Escola João de Deus, como se deduz da referência feita na Ata da sessão de 22 de julho, “escola que será denominada João de Deus”. O Inspetor Escolar fez, como lhe competia, as diligências com a Câmara e com o Ministério para avançar com o processo. Na tentativa de resolver tudo da melhor forma possível, envia em 26 de agosto do mesmo ano ofício à Câmara a pedir a planta da casa onde ia ser instalada provisoriamente a Escola Infantil, (AHCMB, Lv. 19, 1915:130v). O Inspetor Escolar Augusto Ladeiro tratou de organizar todo o processo de criação da escola para enviar ao Ministério da Instrução. Alegando ordens superiores pediu à Câmara, uma declaração dos compromissos que esta se obrigou a cumprir. O processo que o Inspetor estava a desenvolver revelou-se ser para uma Escola Infantil oficial e não para um Jardim-Escola João de Deus. Estava a A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 41 ser criado pela Câmara e respeitava a legislação do Regulamento da Reforma da Instrução Primária de 23/8/1911, ao referir-se explicitamente aos artigos 6º., 7º. 8º.,9º.,10º.,11º.,12º., e 13º., que são precisamente aqueles respeitantes às condições das dependências da escola e respetivo equipamento. Apareceu também um dado novo: as despesas com os professores e demais funcionários eram pagas pela Câmara. No entanto, continuava evidente a referência à sessão de 22 de julho. …em cumprimento de ordens superiores e a fim de dar andamento ao processo da criação da Escola Infantil nesta cidade, que esta Câmara se digne declarar que se responsabiliza por todos os encargos provenientes da criação da referida escola, casa, mobília e material escolar, vencimentos dos professores e mais pessoal, etc, etc,; e que relativamente à instalação provisória da escola, enquanto se não adquirir casa que satisfaça todas as condições regulamentares, esta corporação se responsabiliza na - mesma Ata - por uma preparação da proposta, bem como pela aquisição do respetivo mobiliário e utensílios escolares, tão completo quanto necessário para que tudo se aproxime o mais possível das condições impostas pelos artigos 6º., 7º. 8º.,9º.,10º.,11º.,12º., e 13º., do Decreto regulamentar de 23 de Agosto de 1911. A Comissão deliberou responsabilizar-se por todos os encargos resultantes da criação da Escola Infantil nesta cidade, tais como mobília e material escolar, e vencimentos de todo o pessoal; e quanto à casa, enquanto não se construir um edifício próprio, para o qual esta corporação se prontificou a contribuir com a quantia de 1.200$00, como consta na Acta da sessão de 22 de Julho do ano corrente, se compromete também a fazer as necessárias obras e adaptações na que esta Câmara possui para tal fim, bem como para adquirir o respectivo mobiliário e utensílios escolares, em quantidade suficiente para o seu regular funcionamento (AHCMB, Lv.19, 1915:145f e v). O Presidente da CECMB, enviou ofício ao Inspetor Escolar com todos os dados pedidos, (Correspondência expedida da CMB, 21/10/1915:fls.197). Mantinha os compromissos assumidos e continuou a referir-se à deliberação tomada em 22 de julho, relativa à criação “Escola Infantil João de Deus”. Entretanto, o Presidente da CECMB, oficiou também ao Ministro da Instrução a pedir subsídio para a construção do edifício nos seguintes termos: …seja concedido um subsidio que baste para ocorrer às despesas com a construção do edifício destinado à instalação de um Jardim-Escola nesta cidade que dele tanto carece. Esta corporação está possuída do melhor desejo de impulsionar e desenvolver a instrução popular e disto dá exuberantes provas oferecendo para tal fim a quantia de 1.200$00, e lastima não poder por si só custear todas as despesas, mas é-lhe isso vedado pelo estado do seu cofre (AHCMB, Lv. Correspondência expedida 1914-1935:197). Encontrei uma referência ao Jardim-Escola na troca de correspondência entre o Presidente da CECMB e a Associação de Escolas Móveis e Jardins Escolas João de Deus, informando esta instituição sobre o desenvolvimento do processo, das intenções e responsabilidades assumidas pela Câmara em criar o Jardim-Escola João de Deus (AHCMB, Lv. Correspondência expedida, 1914-1935, nº503, e nº506, de 1915). Esta correspondência tornou o processo mais claro para a CECMB, porque ficou ciente de que se tratava de duas Instituições diferentes. O Presidente informou a Associação que a Escola Infantil funcionaria em edifício adaptado enquanto não se construísse o edifício novo do Jardim-Escola João de Deus, para o qual se transferiria, depois, o mobiliário e material escolar existente. 42 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI Em 18/11/1915 um Jornal local noticiou num artigo denominado “Escola Infantil ou Jardim-Escola” que, tinha sido criada uma Escola Infantil em Bragança no dia 6 de novembro, (Notícias de Bragança, Ano IV, Nº 196, 18/11/1915:2). Não se tratava efetivamente do Jardim-Escola João de Deus mas sim da EIB. Posteriormente iniciaram-se as obras de adaptação na casa onde veio a funcionar (AHCMB, Lv. 19, 1915:194f). Entretanto o processo de construção do edifício do Jardim-Escola João de Deus continuou. Em dezembro de 1915, ficou acordado o local onde iria ser implantado. Seria no largo contíguo ao Hospital Civil que fora recentemente construído (AHCMB, Lv. 19, 1915:184v). Em março de 1916 instalou-se em Bragança a Comissão Auxiliar da Associação de Escolas Móveis e Jardins-Escolas João de Deus, formada pelas individualidades atrás referidas. O Jornal Noticias de Bragança (Ano V, Nº. 212, 9/3/1916:2) noticiava o assunto, fazendo referência num artigo com título bem expressivo, “Jardim-Escola João de Deus”, à criação do Jardim-Escola e ao apoio da Câmara para a sua construção. Está definitivamente estabelecido a fundação nesta cidade de um Jardim-Escola filiado àquela associação para educação de crianças de 4 a 7 anos. A Já se acha instalada a Comissão Auxiliar da Associação nesta cidade. A Câmara Municipal deste concelho oferece o terreno, um subsidio de 1.200$00 e a mobília e material escolar quando o edifício estiver concluído, tomando a Associação a seu cargo todas as restantes despesas de construção que estão calculadas em 7 contos aproximadamente, e bem assim o custeio da escola. O Inspetor Escolar Augusto Ladeiro referiu-se às intenções da criação deste Jardim-Escola, diferenciando-o da Escola Infantil. Referiu explicitamente que o Jardim-Escola era de iniciativa particular e pertencente à Associação de Escolas Móveis e Jardins-Escolas João de Deus, onde a Câmara e o Estado não tinham interferência, ao contrário da escola oficial infantil. Mercê da iniciativa particular, uma comissão auxiliar, por intermédio da benemérita associação das escolas moveis e Jardins- Escola – João de Deus, com o generoso impulso da Câmara, projecta a construção de um edifício e criação do Jardim-Escola João de Deus que particular e independentemente da escola oficial infantil, com carácter diferente desta, embora tendente ao mesmo fim, devera também funcionar naquele edifício que será construído nesta cidade admitindo crianças dos 4 ate aos 9 anos de idade.[…], Pertence à associação das escolas móveis João de Deus, onde não tem interferência nem a Câmara nem o estado (Ladeiro, AHCMB, Lv. 20, 1917:156 f e v). Ladeiro esclarecia que era frequente haver quem confundisse creche com asilo, mas o que era mais grave era confundir Escola Infantil com Jardim-Escola João de Deus (Ibid. 152v). A divisão do processo, surgiu, em nosso entender, quando a Câmara se apercebeu que não tinha qualquer tipo de interferência na gestão do Jardim-Escola João de Deus por ser de iniciativa particular. A partir daqui, os processos seguiram caminhos diferentes. A EIB seguiu o percurso de preparação para a sua abertura que veio a acontecer em janeiro de 1917. O Jardim-Escola João de Deus continuou com o objetivo claro de construir um edifício próprio. Acabamos por encontrar referência a duas Instituições de Educação de Infância em Bragança no período da primeira República. A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 43 Projeto do Jardim-Escola João de Deus em Bragança João de Deus Ramos sabia que não era fácil abrir uma escola numa altura de crise no País como a que se vivia, muito mais espinhoso seria abrir um Jardim-Escola. Seria essencial a ajuda da iniciativa particular e das Corporações Administrativas, além do Poder Central. Por isso, colocou na Comissão Auxiliar as principais figuras da cidade. A Associação procurou nomear para a Direção da Comissão Auxiliar, pessoas ilustres e com poder, pertencentes à elite da cidade, conscientes que isto facilitaria o processo. Já se acha instalada a Comissão Auxiliar da Associação nesta cidade, que é constituída pelos Exmos. Srs. Dr. Lopes Cardoso, Presidente, Dr. Henrique Paz Júnior, secretário, Alberto Franco, tesoureiro, e vogais Olímpio Dias, engenheiro e Augusto Ladeiro, Inspector Escolar e antigo pensionista do Estado para o estudo do método Froebel, em que se tornou uma verdadeira competência. Esta comissão agregou os Srs. Carlos Alberto Almeida, Presidente da Comissão executiva da Câmara e José António Rodrigues de Paula, conceituado negociante (“Jardim-Escola João de Deus”, in Notícias de Bragança, Ano V, Nº. 212, 9/3/1916:2). Surpreendido fiquei também, por saber que João de Deus Ramos teve participação direta no projeto da criação deste Jardim-Escola. Não menos digno de louvor e da nossa gratidão é o ilustre deputado João de Deus Ramos, filho do emérito Educador João de Deus e que tanto se tem empenhado pela vulgarização do seu método e que tem hoje um lugar de destaque na orientação da instrução publica pela simpatia com que acolheu a iniciativa da criação do Jardim-Escola de Bragança e pela boa vontade com que auxiliou a sua realização (“Jardim-Escola João de Deus”, in Notícias de Bragança, Ano V, Nº212, 9/3/1916:2). João de Deus Ramos poderia ter sido influenciado por alguém com contactos em Bragança ou foi ele próprio que moveu influências para alargar o campo de ação da sua Associação. Essa influência, em nosso entender, foi exercida por Artur Lopes Cardoso, deputado no Congresso pelo Partido Democrático e muito ligado às causas da educação, que viria a ser o Presidente da Comissão Auxiliar da Associação de Escolas Moveis e Jardins-Escolas João de Deus de Bragança. Lopes Cardoso chegou mesmo a deslocar-se a Coimbra para tratar diretamente com João de Deus Ramos sobre aspetos do processo, como podemos constatar através da troca de correspondência entre a CECMB e a Associação de Escolas Móveis e Jardins-Escolas João de Deus (AHCMB, Lv. Correspondência expedida, 1914-1935, Nº. 503, 1915). O Jardim-Escola reunia todas as condições para ser um sucesso. A Associação desempenhou, entretanto, um papel importantíssimo de divulgação do Ensino Infantil. Nas primeiras páginas de alguns jornais apareciam alusões à sua importância, prestando dessa forma um importante contributo de divulgação. João de Deus Ramos deve ter dado instruções à Comissão da Associação para a divulgação da importância e das vantagens da educação das crianças dos quatro aos sete anos de idade, como ia fazendo pelo País. Começava a tomar-se consciência da importância de prestar o máximo de esclarecimentos sobre esta nova forma de estar na educação e de estar na escola, procurando assim divulgar e aumentar a rede de Jardins-Escolas João de Deus. Sobre o assunto um periódico local noticiava: 44 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI A Escola Infantil ou Jardim-Escola, recebe as crianças de ambos os sexos dos 4 aos 7 anos de idade. É neste período de tempo que a criança recebe as primeiras impressões da vida banhadas pelos primeiros lampejos da realidade. E essas primeiras impressões ficam sempre, jamais são esquecidas. São a base do seu futuro carácter como cidadão, a origem ou causa do seu destino como homem! È portanto o período mais difícil da sua vida, o mais complexo da sua educação. Pestalozzi, o grande pedagogo que impôs leis no seu tempo, dizia: confiai-me a educação das crianças dum povo que eu farei a felicidade desse povo” (“Jardim-Escola João de Deus, in Notícias de Bragança, Ano V, Nº. 212, 9/3/1916). Nas reuniões da CECMB também se discutiu a importância do Ensino Infantil, e a formação do Homem Novo. O Presidente pôs em relevo as vantagens da criação de um Jardim-Escola, “as crianças por meio de exercícios e jogos próprios da sua idade, podiam desenvolver-se fisicamente, condição essencial e indispensável para o robustecimento da raça portuguesa”, (AHCMB, Lv. 19, 1915:119f), A educação que as mães davam em casa não era suficiente para formar o Homem que os Republicanos ansiavam, uma vez que estas não se encontravam preparadas e a grande maioria nem ler e escrever sabiam. …A origem da nossa crise está no lar. E dizemos que está no lar, porque, sendo a mãe a verdadeira educadora, a educadora por excelência, nas tenras idades, a lógica dos factos, insofismável e fria na sua expressão, diz-nos muito claramente que a mulher entre nós não está preparada para a nobre tarefa de esposa e mãe (“Jardim-Escola João de Deus”, in Notícias de Bragança, Ano V, Nº 212, 9/3/1916:2). A imprensa local desempenhou um importante papel de sensibilização da população sobre os benefícios das crianças em frequentarem o Ensino Infantil, como preparação para a entrada na Escola Primária e o combate ao analfabetismo, A Escola Primária, recebendo crianças dos 7 aos 14 anos de idade, viciadas e com um carácter verdadeiramente formado pelo influxo educativo do meio em que vive, dificilmente pode corrigi-las em absoluto. É portanto à Escola Infantil, a esse jardim da escola, termo este que tão bem simboliza a sua missão, que está confiada a nobre tarefa, o sublime meio de chegar a fins aproveitáveis e úteis (Ibid.). Na época, realçava-se o facto de Bragança ser a primeira cidade da província a ter Ensino Infantil. Depois da Comissão da Associação de Escolas Móveis e Jardins-Escolas João de Deus estar instalada, efetuou as diligências necessárias para a abertura do Jardim-Escola. Em 22/3/1916, a pedido desta entidade, a CECMB disponibilizou a verba prometida de ajuda para a edificação do edifício. Em dezembro do mesmo ano, a Comissão ainda não tinha recebido a quantia destinada e pedia à Câmara novamente para que lhe fosse entregue. Solicitou também mais apoio uma vez que a crise do País e da cidade era grande e nesse ano os preços subiram 50%, tanto em materiais de construção como em mão-de-obra. A Câmara concordou em ajudar no aumento do dispêndio da obra e comprometeu-se também a custear as despesas com o mobiliário e o material escolar, tudo orçamentado em oitocentos escudos (AHCMB. Lv. 20, 1916:109 f e v). A população ficou na expectativa dos resultados, para obter melhores conclusões sobre a EIB. A este propósito noticiava-se: A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 45 Bem merecem todos os encómios os promotores de tão importante melhoramento para Bragança, e de esperar é que a Comissão Auxiliar empenhe todo o seu zelo para que ele se torne em breve uma realidade” (“Jardim-Escola João de Deus, in Notícias de Bragança, Ano V, Nº. 212, 9/3/1916:2). Muitas pessoas da sociedade bragançana queriam estar ligadas a este feito de inovação para a cidade. Para evitar que, a propósito de tão útil melhoramento, os conhecidos intrigantes estendam suas redes, que até agora tem recolhido sem peixe, aqui fica esclarecido que ele se deve unicamente aos esforços da Comissão Auxiliar dos Jardins e Escolas Móveis «João de Deus» nesta cidade” (“Jardim-Escola João de Deus”, in Notícias de Bragança, Ano V, Nº.255:1). O Arquiteto Raul Lino foi o autor do projecto do Jardim-Escola João de Deus de Bragança, à semelhança do que acontecia no resto do País Tivemos o ensejo de ver a planta elaborada pelo distinto arquitecto Raul Lino, que é um verdadeiro primor, e assim a construção do edifício, além dos inestimáveis serviços que vai prestar à infância brigantina, muito contribuirá a embelezar o local que lhe for destinado e que parece estar já definitivamente escolhido (“Jardim-Escola João de Deus”, in Notícias de Bragança, Ano V, Nº. 212, 9/3/1916:2). Faço referência ao projeto do Jardim-Escola João de Deus de Coimbra em 1911 por pensar ser a sua traça foi igual ao projetado para Bragança. O projecto deste primeiro Jardim-Escola João de Deus resultou do trabalho conjunto de João de Deus Ramos e Raul Lino. Da autoria do primeiro são as bases pedagógicas, as exigências funcionais e de programação e alguns conceitos de estética e inserção urbanística; Raul Lino pertence a concepção arquitectónica, o desenvolvimento do projecto e o desenho do mobiliário. Desta experiência conjunta resultaram os edifícios de outros Jardins – Escola como os da Figueira da Foz e Alcobaça (inaugurados em 1914) e o da Av. Pedro Alvares Cabral em Lisboa (aberto em Junho de 1915) (Beja et al., 1985: 86). A Comissão Auxiliar da Associação depois de ter o Processo e Caderno de Encargos organizado, procedeu à marcação da data de arrematação da obra, cuja base de licitação foi de 7490$00. Depois de ir a concurso por três vezes, por falta de propostas, apenas foi adjudicada a obra de pedreiro cuja base de licitação mínima foi de 2770$00, no dia 29/5/1917. Encontrei referências aos anúncios da arrematação publicados no Jornal Notícias de Bragança (Ano VI- Nº.259, de 8/2/1917:3, nº 269, de 19/4/1917:3 e nº 270, 26/4/1917:2). O Inspetor Escolar do Círculo de Bragança Augusto Ladeiro era o vogal da Associação e responsável do processo da obra, e de toda a logística. No dia 2/5/1917 enviou um ofício à CECMB (AHCMB, Lv. de correspondência, nº.1050, nº.6, fls.934), pedindo os 800$00 que a Câmara havia prometido, tendo dado conhecimento da adjudicação da obra de pedreiro, e que esta, deveria começar ainda no mesmo mês, como os serviços de terraplanagem e abertura dos caboucos, para construção de um muro e outros serviços indispensáveis (AHCMB, Lv. 20, 1917:187f). Realizada a arrematação das obras de pedreiro pretendia-se a seguir efetuar a arrematação da obra de carpinteiro 46 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI (Jardim-Escola João de Deus, in Notícias de Bragança, Ano V, Nº 271, 3/5/1917:2), que não chegou a efetuar-se. Não encontrei qualquer registo ou documento que provasse que as obras de construção do Jardim-Escola João de Deus tivessem sido iniciadas. As diversas diligências efetuadas para o conseguir não foram suficientes para materializar a sua construção e abertura. Considerações finais Em meu entender, várias poderão ter sido as causas da não abertura do Jardim-Escola João de Deus em Bragança. Numa análise superficial, concluo que a causa mais provável, terá sido de ordem financeira devido à crise geral que se desenhava no País, que não possibilitou que o projeto de João de Deus tivesse sido mais que um pequeno eco em Bragança. O facto de o Jardim-Escola ser particular, acarretaria uma maior despesa para as famílias, o que também terá contribuído para o seu insucesso. Terá sido também por este motivo que até 1927 não foi criado qualquer Jardim-Escola João de Deus em Portugal, continuando a existir somente os quatro anteriormente referidos. A Comissão da Associação de Escolas e Jardins-Escolas João de Deus de Bragança, talvez por conselho de João de Deus Ramos, terá mandado parar a obra como teria feito noutros pontos do País, devido precisamente à falta de apoio do Governo que não conseguiu cumprir os compromissos por falta de verba e também que os apoios municipais não bastavam. A intenção do Governo em subsidiar a construção de escolas de iniciativa particular, em especial as que se destinavam ao Ensino Infantil que foi regulada pelo Decreto nº 3551, (DG, Nº. 199, de 15/11/1917), ainda não teve aplicação por falta de financiamento estatal, devido às inevitáveis consequências da crise económica do País. O facto de João de Barros ser o Secretário-geral do Ministério da Instrução Pública, em 1915 e adepto confesso dos Jardins-Escolas João de Deus, terá contribuído para a tentativa de tornar oficiais os Jardins-Escolas João de Deus. O Governo terá perdido este interesse com a saída do Ministério de João de Barros em 1916, afetando assim irremediavelmente a construção do Jardim-Escola em Bragança. Neste sentido, temos de perceber o enorme esforço feito por João de Deus Ramos, bem como dos membros da CECMB e da Comissão da Instalação da Associação, na tentativa de criação do Jardim-Escola em Bragança, devendo entender-se esta questão de uma forma mais alargada, num contexto nacional, e ter-se em linha de conta a quase inexistência e criação de Escolas Infantis em Portugal durante esse período. Porém, a explicação mais plausível e aquela em que mais acredito parece-me que vai mais além e que está diretamente relacionada com o objeto do nosso estudo que é a EIB, aliada às hipóteses anteriores: Seria ambicioso demais para uma cidade pequena como Bragança promover a coexistência das duas Instituições, uma particular e outra oficial. A particularidade de um dos vogais da associação ser também o Inspetor Escolar de Bragança também poderá ter exercido alguma influência, uma vez que este, ao mesmo tempo, fazia diligências para se abrir a Escola Infantil oficial. Conjeturo que se o Jardim-Escola se tivesse construído e aberto ao público, a Escola Infantil teria deixado de existir em favor deste. Ao mesmo tempo que se valorizava o Jardim-Escola, valorizava-se também a Escola Infantil que estava a ser criada pela Câmara Municipal. Não posso deixar de concordar que o Jardim-Escola João de Deus contribuiu de forma indireta para a criação da EIB., através da divulgação feita nos jornais da importância e vantagens do Ensino Infantil, e do agitar das consciências das autoridades locais. Todavia, este projeto não foi em vão pois teve um papel importantíssimo na divulgação da importância do Ensino Infantil em Bragança, e desencadeou o processo que levou à abertura da EIB, dan- A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 47 do, assim, oportunidade às crianças Bragançanas de frequentarem esta nova e moderna escola. Fica assim merecidamente com o seu lugar na História da Educação de Infância e esclarecida toda a trama! Bibliografia e Fontes Cardona, Maria João (1991). Para a História da Educação de Infância emPortugal: O discurso oficial 1834.1990). Porto: Porto Editora. Carvalho, Isabel de Lemos (1996). A Educação Pré-escolar em Portugal.Lisboa: Ministério da Educação. Castanheira, Luís (2006). 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Fontes Impressas Legislação: Decreto – (DG Nº 25, 3/11/1910); Decreto – (DG Nº 73, 29/3/1911); Programa – (DG Nº 198, 25/8/1911); Regulamento – (DG Nº 198, 25/8/1911); Diário do Governo Nº 116 – 18/5/1912; Decreto nº 134 – (DG Nº 216, 15/9/1913); Lei 233 – (DG Nº 11, 7/7/1914); Decreto nº 1843 – 20/8/1915; Decreto nº 1843 – 30/8/1915; Lei 410 – (DG Nº 181, 9/9/1915); Lei 449 – 18/9/1915; Decreto nº 1927 -2/10/1915; Decreto nº 2858 – 29/11/1916; Decreto nº 2213 – 10/12/1916; Decreto nº 2387 – 12/5/1916; Lei 489 – 18/9/1916; Decreto nº 2887 – (DG Nº 255, 23/12/1916); Decreto nº 2947 – (DG Nº 11, 20/1/1917); Decreto nº 3551 – 15/11/1917; Decreto nº 3756 – 16/1/1918; Decreto nº 4594 – 13/7/1918; Decreto nº 6137 – 29/8/1919 Jornais e revistas A Madrugada (1920) – Biblioteca Pública Municipal do Porto (BPMP) -XI-3-21; Concelho de Bragança – (1911) Escola Transmontana – (1912) Jornal de Bragança – (1911) 48 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI Leste Transmontano – (1920) Notícias de Bragança – (1912-1917) Notícias do Nordeste – (1910-1911) O Bragançano – (1919) – BPMP O Legionário Transmontano – (1914-1917) O Montanhês do Norte – (1912-1913) O Transmontano – (1915-1917) Pátria Nova – (1908-1915) Saboreano – (1922) Terras de Bragança – (1921) O Transmontano – (1915-1917) Fontes Manuscritas Arquivo Histórico da Câmara Municipal de Bragança (AHCMB): Atas do Senado da Câmara Municipal de Bragança -Livro nº1 de 7-08-1913 a 30-11-1921); Atas da Comissão Executiva da Câmara Municipal de Bragança: Livros nº 19 a nº31 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 49 DISEÑO METODOLÓGICO PARA LA PROPUESTA DE POLÍTICAS EDUCATIVAS IGUALITARIAS CON ALLUMNADO DE PRIMER GRADO DE SECUNDARIA EN EL ESTADO DE MICHOACÁN Elva Morales Robles ([email protected]) Universidad de Salamanca Resumen En este trabajo se presenta una estrategia metodológica mixta, con la finalidad de mostrar el empleo que se hace respecto al método combinado y que ha permitido abordar la temática sobre igualdad y educación sexual con alumnado de primer grado de secundaría en el Estado de Michoacán. Así pues en este artículo se exponen los criterios empleados en cuanto a la metodología seguida, la muestra retomada, los instrumentos aplicados, los procedimientos, y la estrategia seguida para elaborar el análisis e interpretación de la información. A partir de la combinación de análisis cualitativo y cuantitativo se pretende tener una visión más amplia sobre la temática estudiada para realizar propuestas de políticas educativas que se ajusten a la realidad del alumnado en cuestiones de educación sexual y equidad de género. Palabras clave: educación sexual, género, adolescencia, percepciones, políticas educativas. Abstract This paper presents a mixed methodological strategy, with the goal to show the use it made at of employment the combined method and that has allowed the thematic deal with regarding sexual 50 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI education and gender equality by the students of first grade of secondary education in the State of Michoacan. So in this article it provides a detailed explanation the criteria set forth in terms of the methodology followed, the selected samples, the instruments applied, procedures, and the strategy to develop the analysis and interpretation of information. As of the combination of qualitative and quantitative analysis expected have a broader view of the subject studied with respect to for educational policy proposals that conform to the reality of students in issues of sex education and gender equity. Keywords: sexual education, gender, adolescence, perceptions, educational policie Introducción En México los estudios sobre género en educación constituyen una línea de reciente creación, ya que solo en la década de los noventa surgen los ejes transversales1 en educación, los cuales contemplan la incorporación al sistema educativo de los derechos humanos, la perspectiva de género, el desarrollo humano, el medio ambiente, la construcción de ciudadanía, y la no violencia, entre otros (Delgado, 2003, p. 485). Las reformas educativas establecidas con posterioridad tienen siempre en cuenta estos ejes trasversales. Así, entre los años 2007-2012, la Secretaria de Educación Pública de México (SEP) establece el Programa Sectorial, verdadero mapa rector de la política nacional de igualdad. Dentro este Programa, la estrategia 3.5 del Eje Rector “Igualdad de Oportunidades” manifiesta el compromiso de promover acciones para, mediante la transversalidad de la perspectiva de género, fomentar una vida sin violencia ni discriminación y una auténtica cultura de la igualdad. Estas estrategias políticas muestran el esfuerzo que a nivel institucional se está realizando con la intención de mejorar las situaciones de desigualdad que aquejan a México. Sin embargo, tales estrategias no han respondido eficazmente a los nuevos retos educativos, políticos y socioeconómicos. Para conseguir enfrentar estos desafíos resulta necesario, en primer lugar, identificar cuáles son las percepciones, opiniones, valores, etc. que permiten que los y las adolescentes legitimen la desigualdad entre hombres y mujeres, y, en segundo lugar, examinar en qué medida los libros de texto promueven/dificultan la sexualidad responsable y la equidad de género. El abordaje de estas dos cuestiones nos lleva a proponer en este artículo un diseño metodológico mixto2. El articular la perspectiva de equidad de género con la educación es una de las condiciones necesarias para lograr la justicia social y un instrumento real y cotidiano de democracia, como diversos estudios demuestran (Delgado, 2003; González & Villaseñor, 2010; Guzmán, 1997; Tarabini & Bonal, 2012; Valdés, 2013). El presente artículo se organiza en cuatro apartados. En el primero se aclaran las definiciones de las temáticas abordadas y se efectúa una breve descripción sobre la situación política y social del Estado de Michoacán. El segundo apartado contiene información sobre la metodología empleada: los objetivos, las hipótesis y el diseño metodológico. En el tercero se presenta el diseño sobre el análisis y la interpretación de resultados, y en el último apartado se señalan las conclusiones más relevantes de este artículo. 1 2 Ruiz (2012, p. 52) refiere que en el año 1993 se incluyen unas directrices en el marco de una política educativa que tenga mayor alcance en el país (Acuerdo Nacional para la Modernización de la Educación Básica, ANMEB). Este tipo de metodologías tiene un reconocimiento creciente, puesto que han sido identificadas como elementos clave para mejorar la investigación de las Ciencias Sociales, (Faber & Scheper, 2003; Gorard & Taylor, 2004). A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 51 Contextualización Teórica En esta investigación el género es considerado como una categoría de estudio que hace referencia a las construcciones socioculturales elaboradas alrededor de los sexos hombre y mujer, para atribuirles ciertos rasgos, valores y patrones de comportamiento propios de cada género (femenino/masculino). Estas construcciones socioculturales se traducen en la mayor parte de los países en desventajas sociales para uno y otro sexo (Barberá, 2004; Blanco, 2006; Chávez, 2004; Checa, 2005; Delgado, 2003; González & Villaseñor , 2010; Lamas, 1995; Szasz, 1998). Por su parte, la perspectiva de género implica reconocer que un aspecto es la diferencia sexual, y otro las atribuciones, ideas, representaciones y prescripciones sociales que se construyen tomando como referencia la diferencia sexual (González & Villaseñor, 2010). Así, la perspectiva de género se convierte en una herramienta social que permite identificar situaciones de inequidad, y, además, proponer alternativas y soluciones para deconstruir y reconstruir los paradigmas teóricos existentes. La investigación realizada por Delgado (2003), que analiza una gran variedad de estudios existentes en México sobre género y educación, evidencia la necesidad de seguir contribuyendo a la generación de estudios con perspectiva de género desde el ámbito académico. Los 257 estudios sobre género y educación realizados en el periodo 1992-2002, divididos por Delgado en seis campos3, reflejan que existe una tendencia a que el sistema escolar reproduzca patrones de comportamiento estereotipados, donde el género masculino recibe mayor valor que el femenino. Delgado (2003) también revela en su estudio la escasez de investigaciones que analicen los libros de texto y los discursos que tienen las y los adolescentes sobre esta temática a nivel de secundaria y de bachillerato. En España se han encontrado diversos estudios sobre el análisis de los libros de texto con perspectiva de género (Blanco, 2000, 2003; s/f; Espigado, 2004; Garreta & Careaga, 1987; Lomas, 2002; López-Navajas, 2012; Mínguez & Beas, 1995; Sánchez, 2012; Subirats, 1991). En México solo se ha podido acceder a dos artículos en los que se hace referencia a este tipo de estudios: SEP, 2001 de telesecundaria y Vázquez, 2001 a nivel pre-escolar. Descripción breve de la situación política y económica del Estado Michoacán de Ocampo es un Estado caracterizado por un tejido social en el que han existido y existen tendencias muy contrapuestas: ha sido cuna de corrientes político-ideológicas reivindicativas, y a su vez escenario de movimientos con tendencias conservadoras y religiosas (movimiento cristero) debido a que la mayor parte de la población es católica (Nava, 1987; Pérez, 1995). Otro aspecto que caracteriza a este Estado mexicano es la diversidad de culturas que lo conforman, con presencia de grupos étnicos con costumbres e incluso lenguas diferentes (purhépecha, náhuatl, otomí-mazahuas). Todos estos componentes asociados a una política económica neoliberal y a las estrategias de desarrollo que se han llevado a cabo, tanto en todo México como en Michoacán, están siendo determinantes en los conflictos y problemáticas que se vienen arrastrando desde hace varias décadas, recrudeciéndose en la actualidad con un nivel de violencia que ha puesto en tela de juicio la actuación de las instituciones públicas, fracturando así nuestra democracia (Guerrero, 2014; Maldonado, 2012; Nava, 1987; Pereyra, 2012; Pérez, 1995)4. 3 4 Políticas públicas, sujetos, currículo, acceso y permanencia en los diferentes niveles del sistema educativo, nuevas tecnologías y otros campos. Las problemáticas relacionadas con el narcotráfico se recrudecieron durante el periodo de transición política y las estrategias empleadas por el gobierno federal fueron combatir al narcotráfico militarizando algunos Estados entre ellos Michoacán. 52 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI Contextualización Metodológica Pregunta de investigación, objetivos e hipótesis La brecha de género entre hombres y mujeres en el Estado de Michoacán de Ocampo ha hecho que el Gobierno —en particular la Secretaría de La Mujer y la Secretaria de Educación Pública— ponga en marcha una serie de estrategias para intentar contrarrestar las relaciones de subordinación y desigualdad. Derivada de estas estrategias nace la presente investigación, que se centra en dos cuestiones de investigación básicas: ¿Cuáles son las percepciones, creencias y valores que permiten que los y las adolescentes legitimen la desigualdad entre hombres y mujeres? ¿Fomenta/obstaculiza la educación secundaria en el Estado de Michaocán la igualdad de oportunidades, derechos, recursos, etc. entre hombres y mujeres a través de los libros de texto? Con la finalidad de responder a estos dos fundamentales interrogantes establecemos los siguientes objetivos generales y específicos. Objetivos generales: • Describir y analizar las percepciones que legitiman la desigualdad entre hombres y mujeres con el alumnado de primer grado de secundaria. • Analizar si los libros de texto de primer grado de secundaria promueven o no la educación sexual y la igualdad de género. Objetivos específicos: 1. Describir y examinar las opiniones y conocimientos que tiene la población juvenil del Estado de Michoacán sobre la condición y posición de las mujeres en la trama de las relaciones y jerarquías de género. 2. Describir y analizar las diferencias que existen en el discurso sobre la sexualidad y la equidad de género entre el alumnado que vive en zonas urbanas, rurales e indígenas. 3. Describir las diferencias entre hombres y mujeres respecto a la percepción sobre educación sexual y equidad de género. 4. Describir y examinar los contenidos, el texto y las imágenes/ilustraciones de los libros de texto de primer grado de secundaria, que entrega el estado de manera gratuita a los centros educativos. Hipótesis Con el fin de establecer algunas conjeturas o supuestos iniciales a las preguntas de investigación se formulan las siguientes hipótesis: • A mayor información/formación, menor legitimidad de la desigualdad basada en la diferencia sexual entre hombres y mujeres. • El alumnado de los centros educativos que se encuentran en zonas urbanas promueven prácticas sociales más igualitarias. • El sexo del alumnado determina la percepción sobre sexualidad y equidad de género. • La información e imágenes que se promueven en los libros de texto de primer grado de se- A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 53 cundaria favorecen/promueven que el alumnado sea crítico y reflexivo sobre las situaciones de desigualdad por razón de sexo. Diseño metodológico Existe un reconocimiento creciente en la comunidad científica acerca de la necesidad de utilizar métodos combinados en investigación, puesto que han sido identificados como elementos claves para mejorar la investigación tanto en Ciencias Sociales como en Educación (Gorard & Taylor, 2004). Así mismo, y dado que los fenómenos sociales suelen ser multifacéticos, el uso de perspectivas mixtas aquí adoptado es realmente apropiado para evitar fragmentaciones innecesarias (Faber & Scheper, 2003; Sánchez, 2015). La combinación metodológica consiste, pues, en utilizar varios tipos y fuentes de datos, lo que fortalece las conclusiones y a su vez nos permite plantear nuevas líneas de investigación (Bericat, 1998). En consecuencia con estas premisas, y teniendo en cuenta los objetivos generales y específicos que se plantean en este estudio, se ha optado por un diseño que contempla un modelo mixto, combinando así estrategias metodológicas cuantitativas y cualitativas, lo que nos permitirá obtener una visión más amplia sobre la temática estudiada. Por ello se realiza en esta investigación una combinación de datos derivados de las entrevistas realizadas a los grupos de discusión, de las autodescripciones breves y del análisis de los libros de textos. La estrategia seguida en un primer momento es de corte cuantitativo, empleando para ello técnicas de análisis de tipo descriptivo5, mediante las cuales se realiza una codificación de los datos obtenidos —a través del programa informático ATLAS.ti y el programa estadístico SPSS versión 18 para Windows—. De este modo podremos explorar el contenido expresado acerca de cada uno de los aspectos a investigar, (Gil, 1992, p. 203). Posteriormente se emplearon estrategias de carácter cualitativo, con un diseño analítico-explicativo, mediante la presentación de citas textuales que contienen las ideas claves del discurso-contenido (Bardin, 1991; Gil, 1992; Mena & Murillo, 2006; Porta & Silva, 2003; Valles, 1999). Los resultados obtenidos desde ambas perspectivas, cuantitativa y cualitativa, se integrarán para obtener una visión más amplia sobre las percepciones del alumnado en lo que concierne a la equidad de género y la educación sexual, así como en lo referido a la promoción que se realiza en los libros de textos acerca de estos aspectos (Bericat, 1998; Hernández y otros, 2006; Sánchez, 2015) Variables En esta investigación se establecen algunas variables. Sin embargo cabe destacar que al emplear un método deductivo/inductivo estás no pueden ser definidas en su totalidad, puesto que surgen a partir de las categorías de análisis derivadas de la reducción de datos. Entendemos, pues, por variables independientes aquellas que describen las características de la muestra (Hernández y otros, 2006). En este trabajo se plantean las siguientes: •Sexo • La zona territorial • Libro de texto 5 Se emplea la técnica de análisis de contenido descrita por Bardin (1991) 54 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI Las variables dependientes, como su nombre indica, son las que dependen de otras para ser explicadas. Se tuvieron en cuenta variables dependientes que se plantean en las hipótesis. • Percepciones sobre la sexualidad. • Percepciones sobre la equidad de género. • Información sobre personajes representativos Muestra En la recogida de información de grupos de discusión y de auto-descripciones breves, se organizaron diez grupos de 6 estudiantes cada uno, de los centros educativos de secundaria ubicados en distintos municipios del Estado de Michoacán, en sus dos modalidades: técnicas y generales. Participaron en total 60 adolescentes de primer grado de secundaria, 30 hombres y 30 mujeres. La muestra correspondiente a los libros de texto es de 4. Para la elección de la muestra de grupos de discusión y auto-descripciones breves se toman en cuenta los criterios de homogeneidad-heterogeneidad, de accesibilidad, y de economía descritos por Valles (1999). La homogeneidad se traduce en la selección de personas de primer grado de secundaria de centros educativos incorporados a la reforma educativa 2006. Por su parte, la heterogeneidad se observa en varios sentidos: en primer lugar se seleccionan centros educativos de secundaria, en sus dos modalidades, que se encuentran en contextos geográficos distintos (urbano, rural, indígena); en segundo lugar, la composición de cada uno de los grupos de discusión se realiza por cuota de sexo, 3 hombres y 3 mujeres; por último, las personas son seleccionadas de distintos grupos de primer grado de secundaria. La elección de los centros educativos se llevo a cabo con el apoyo económico y la información facilitados por la SEP seleccionando aquellos que ofrecían mejores condiciones de seguridad y accesibilidad. Respecto a los libros de textos, se solicitaron a la SEP los manuales que se entregan de manera gratuita al alumnado de primer grado de educación secundaria en el Estado. La institución proporcionó un total de cuatro ejemplares: Ciencias 1, con énfasis en biología; Geografía de México y el mundo; Español 1, y Matemáticas 1. Instrumentos Se emplearon tres instrumentos para la recolección de información: los grupos de discusión, las auto-descripciones breves y el análisis de libros de texto. Con los grupos de discusión se recaba información sobre la percepción, opinión, y actitudes que tienen las y los adolescentes en relación a la sexualidad y la igualdad de género. La auto-descripción breve es un instrumento con el cual se pretende que ellos y ellas expresen sentimientos y opiniones respecto a los cambios por los que están atravesando, así como sus aspiraciones. Finalmente, con los libros de texto se recaba, describe y analiza información relacionada con la sexualidad y la equidad de género plasmada en las imágenes, en el texto y en el contenido de los manuales que proporciona gratuitamente el Estado de Michoacán al alumnado de primer grado de secundaria. De los tres instrumentos de recogida de datos, dos fueron diseñados de la siguiente manera: A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 55 a) Los grupos de discusión: A partir de varios autores (Flick, 2004; Gil, 1992; Kruger, 1991; Mena & Murillo, 2006; Valles, 1999) se tomaron las siguientes decisiones en lo referido al diseño de los grupos de discusión: • Construcción de un guión previo. Las preguntas y/o temáticas incluidas en el guión previo elaborado para los grupos de discusión, pretenden identificar las percepciones y las experiencias que tiene el alumnado de primer grado de secundaria sobre la sexualidad y la equidad de género. El guión contempla así seis rubros en los que se abordan cuestiones sobre la sexualidad y la equidad/desigualdad de género: 1) Conceptos, 2) Información, 3) Experiencias, 4) Costumbres, 5) Precepción y 6) Promoción6. • El tiempo de duración de cada sesión es de 40 a 90 minutos. • Se optó por establecer grupos de seis participantes. Flick (2004), citando a Lunt y Livingstone (1996), hace referencia a algunos de los beneficios de trabajar con esta herramienta, los grupos de discusión. Por una parte, se genera un debate en el cual se revelan significados y percepciones que las personas participantes tienen respecto al tema a discutir. Por otra, la diversidad de opiniones en los grupos de discusión produce representaciones o conocimientos sociales que pueden servir para dar fundamento a este estudio. b) La auto-descripción breve: Se trata de dos hojas, entregadas a los participantes y que deben ser rellenadas por estos antes de iniciar los grupos de discusión, que contienen la siguiente instrucción: “en un máximo de dos cuartillas haz una descripción sobre ti mismo/a, cómo eras en la infancia, cómo eres ahora (cambios que observas, motivaciones, entretenimientos o diversiones, ilusiones, desilusiones, dificultades o conflictos que atraviesa) y lo que deseas ser”. Tabla 1. Resumen de la recolección de datos Instrumento Muestra Tipo de información recabada Grupos de discusión Análisis de contenido 30 alumnas 30 alumnos Percepciones, creencias, opiniones en cuanto a la sexualidad y la equidad de género Auto-descripciones breve Análisis de contenido 30 alumnas 30 alumnos Sentimientos, percepción de sí mismos/as. Libros de texto Técnica de análisis Análisis de imagen 4 libros de texto Análisis de texto Análisis de contenido Promoción o no de la sexualidad y la equidad de género. Fuente: Adaptado de Álvarez (2015, p. 111) Procedimientos Para llevar a cabo la aplicación de los dos instrumentos diseñados primero se solicitó apoyo a la SEP. En segundo lugar se programaron reuniones con los jefes de estudios de las distintas zonas de los centros educativos de secundaria en el Estado. En tercer lugar los jefes de estudio indicaron los centros educativos que tenían mejores condiciones en cuanto a accesibilidad y a seguridad y 6 El guión fue revisado y corregido por elementos de SEP y de la SMUJER, siendo concedida la aprobación del mismo para su posterior la aplicación las dos secretarías. 56 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI finalmente se encargaron de los trámites tanto administrativos como financieros para facilitar la recogida de datos. Los prefectos/as7 tenían la tarea de llevar a los/as participantes al punto de encuentro (despacho o gabinete cedido por las autoridades de la escuela secundaria). Antes de iniciar con la discusión se explicó a los y las participantes la temática sobre la que iban a dialogar, se les preguntó si quería participar, se les informó respecto a la grabación de la sesión y a la confidencialidad de los datos proporcionados. Diseño de Análisis e Interpretación de Resultados La combinación de metodología cuantitativa y cualitativa nos permite realizar un análisis estadístico descriptivo y análisis de contenido, para ello se realiza el procesamiento y el análisis sugerido por Porta & Silva (2003), en el cual se plantean tres momentos: En un primer momento se realiza un análisis descriptivo, a través del software ATLAS.ti, versión 7.5 para Windows y del programa estadístico SPSS versión 18 para Windows. Mediante estos dos programas se numeran las características de la información obtenida en relación a la frecuencia de aparición de las distintas categorías. Con el primer programa, el software ATLAS.ti versión 7.5 para Windows, se analizan los datos recabados en los grupos de discusión y en las auto-descripciones breves. Nueve de las diez entrevistas (un grupo de discusión se negó a ser grabado) fueron grabadas en formato de audio y posteriormente transcritas. Las transcripciones se incorporaron al software para realizar la reducción de los datos, que se llevó a cabo siguiendo un método deductivo/inductivo, en donde dos categorías, sexualidad y género8, son establecidas previamente, mientras que el resto de categorías se establecieron en base a la información obtenida (método inductivo). Con el segundo programa, SPSS versión 18 para Windows, se analiza la información contenida en los libros de texto (se codifica todo ser humano en texto e imagen bajo tres aspectos generales hombre, mujer, genérico/plural). En segundo lugar, se elabora un contraste entre los datos, midiendo el grado de asociación y relación entre las variables (tablas de contingencia y coeficiente de correlación de Pearson y prueba de chi-cuadrado). Finalmente se realiza el análisis, la interpretación y la integración de los resultados, con el objetivo de, primero, obtener una perspectiva más amplia tanto sobre las percepciones que tiene el alumnado acerca de la temática abordada, y, además, comprobar si desde la sociedad (a través de los libros de texto) se contribuye o no a reforzar la equidad entre los sexos y la educación sexual. Son docentes encargados de gestionar cada nivel académico. En la categoría de análisis sobre sexualidad se hace referencia a las tres esferas de interacción inseparables del ser humano: la biológica (cuerpo), la psicológica (sentimientos/emociones) y la social (contexto sociocultural). Si bien es cierto que cada persona tiene una manera de expresar/ ejercer su sexualidad, esta se rige por un contexto social determinado por condiciones culturales, políticas, ideológicas, económicas, religiosas etc. que se regulan y reglamentan a través de prohibiciones y sanciones en la forma de vivir y expresar la sexualidad (Grajales, 2004; Monroy, 2002; Vance, 1989). En el caso de los y las adolescentes, la sexualidad cobra crucial importancia, pues la experiencia sexual adquiere una gran significación vinculada a diversos aspectos como son las transformaciones físicas y hormonales que obran sobre el cuerpo, los deseos, las fantasías, el erotismo, el placer, sin olvidar los condicionamientos sociales, culturales, religiosos, etc. que operan de manera decisiva en la iniciación, asunción y expresión de la sexualidad (Checa, 2005). En cuanto al género se analizan el conjunto de percepciones y patrones de comportamiento que el alumnado identifica como propias de lo masculino y lo femenino —identidad y roles/estereotipos de género— y cómo estas influyen —afectan/benefician—. Se examinarán las posiciones que toman los y las adolescentes con respecto a las situaciones de discriminación de género. Finalmente se considerará la información que tienen sobre los derechos de igualdad que existen tanto a nivel nacional como estatal, y las consideraciones que ellos y ellas tienen respecto a lo establecido por ley. 7 8 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 57 Conclusiones El diseño metodológico aquí propuesto constituye una herramienta útil para la elaboración de políticas educativas con perspectiva de género, puesto que, además de recoger la información relacionada con la construcción sociocultural que tienen las y los adolescentes respecto a la igualdad/ desigualdad y la educación sexual, examina la información que sobre estos aspectos se trasmite a través de los libros de texto al alumnado de primer grado de secundaria. Se considera pues, que el diseño metodológico adoptado en nuestra investigación se presenta como idóneo para mejorar, mediante las propuestas de educativas que fomenten una sexualidad plena, sin desigualdades por razón de sexo, la calidad de la enseñanza en pro de la igualdad y la democracia. Bibliografia Álvarez Olivas, V. C. (2015). Aprendizaje colaborativo mediado por TIC en la enseñanza universitaria: un acercamiento a las percepciones y experiencias de profesores y alumnos de la Universidad Autónoma de Chihuahua (Tesis doctoral). Universidad de Salamanca, Salamanca. Amorós, C. (2010). Feminismo y filosofía. Barberá Heredia, E. (2004). Diversidad emprendedora y perspectiva de género en la investigación psicológica. En The entrepreneur and starting up new R&D&I businesses: El emrendedor innovador y la creaacion de empresas I+D+I (pp. 921-934). Universitat de València. Bardin, L. (1991). Análisis de contenido. Ediciones AKAL. Bericat Alastuey, E. (1998). 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Archivos hispanoamericanos de sexología, 6, 153-168. 60 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 61 ENSINO DO PORTUGUÊS COMO LÍNGUA NÃO MATERNA: CRUZAMENTOS DE TAREFAS COMUNICATIVAS EM DIDÁTICA DA LÍNGUA E DA LITERATURA Mª da Graça Sardinha ([email protected]) Universidade da Beira Interior João Machado ([email protected]) Instituto Politécnico de Castelo Branco Resumo O ensino do Português como língua não materna deve assentar em princípios orientadores subjacentes a tarefas comunicativas que, por sua vez, apresentam uma caraterização muito particular. Enquadrando, nesta perspetiva, os estudos de Prabhu (1987), Pattison (1987) e Richards (2001), propomo-nos apresentar a planificação da obra Robinson Crusoe, de Daniel Defoe, onde cruzamos a didática da língua com a didática da literatura, no sentido de contribuirmos para o desenvolvimento da competência dos falantes, quer em língua, quer em cultura. Palavras-chave: língua não materna, didática, literatura, cultura Abstract The teaching of Portuguese as a second language must be based on guiding principles underlying the communicative tasks that, in turn, have a very particular characterization. Fitting, in this 62 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI perspective, the study Prabhu (1987), Pattison (1987) and Richards (2001), we propose to present the planning of Robinson Crusoe work of Daniel Defoe, which crossed the teaching of the language with the teaching of literature, in order to contribute to the development of competence of the speakers, both in language either in culture. Keywords: second language, teaching, literature, culture Introdução A importância da “competência comunicativa”, plasmada no QECR (Conselho da Europa, 2001: 34)1, presente no programa do ensino-aprendizagem de qualquer língua, abarca três componentes: competência linguística (que remete para o conhecimento formal da língua – lexical, fonológico e sintático – e concomitantemente organização cognitiva desse conhecimento, ou seja, armazenamento e acesso); competência sociolinguística (que engloba condições culturais e sociais de uso dessa língua); competência pragmática (relacionada com a capacidade de uso em situação dos recursos linguísticos). O Quadro Comum de Referência considera ainda indispensável o conhecimento do mundo, que, por sua vez, inclui o conhecimento sociocultural derivado da consciência intercultural. Ora, em contexto de ensino-aprendizagem, as competências enumeradas exigem práticas transformadas, exigindo igualmente ensino explícito2 assente em alguns modelos que permitam, não só a polissemia da palavra, mas também que se abram em questões sobre a sociedade: modelos conducentes ao desenvolvimento da linguagem, assentes nos sistemas semióticos que promovam a literacia, assentes em caminhos que promovam a tolerância e a diversidade. Selecionamos para reflexão o modelo de Luke e Freebody, cit. Pereira (2009), que veicula práticas de participação textual, práticas de utilização textual, práticas de descodificação e práticas de análise crítica do texto. Assenta igualmente em alguns princípios que passamos a enumerar: histórias sobre si mesmo; histórias de família; histórias da cultura; cultura é rede e tecelagem; interculturalidade como prática corrente; textos considerados da literatura dita de margem ou fronteira; cultura de proximidade3. Em suma, a competência comunicativa é hoje um conceito-chave no ensino-aprendizagem de qualquer língua, cabendo aos mediadores de ensino o desenvolvimento das várias dimensões que aquela engloba, sejam de caráter pragmático, linguístico ou discursivo. Porém, o processo de ensino-aprendizagem implica um saber fazer da parte do professor, mas igualmente um querer da parte do aluno, onde a motivação se torna fundamental. Igualmente, é pertinente definir o perfil do aprendente de uma língua. Para o efeito, baseámonos em Chamot (2008) e Cohen (2011). Dizem os autores que o bom aprendente de línguas adota estratégias favoráveis à aprendizagem, procedendo à monotorização do seu desempenho, demonstrando um motivo para aprender, uma atitude positiva face à nova língua e uma atitude positiva face à cultura dessa língua. Mais tarde, em 2013, Grenfell e Harris alertaram para um ensino capaz de levar o aprendente a transpor a sua ação individual, passando os limites da dimensão cognitiva para uma dimensão sociocultural. Neste âmbito, comunicar é fundamental. O Quadro Europeu Comum de Referência para as línguas foi definido pelo Conselho da Europa com o objetivo de harmonizar o ensino aprendizagem das línguas no espaço europeu. Este quadro define todos os tipos de utilizadores e as respetivas competências. 2 A título de exemplo, explicamos alguns procedimentos de ensino explícito: - Explicar que vai ser realizado um determinado tipo de atividade - Mostrar slides (ou outros materiais) por forma a ativar conhecimentos relacionados com a atividade 3 Tradução nossa 1 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 63 Assim, entendemos ensino comunicativo da seguinte forma: assenta em tarefas comunicativas baseadas em práticas sociais de referência; recorre a abordagens que privilegiam tarefas comunicativas; opõe-se ao estudo mecânico e repetitivo das estruturas de uma língua. Nesta perspetiva, urge construir novos ambientes de aprendizagem, proporcionadores de conhecimentos autónomos e criativos, onde cada aluno deverá ter a oportunidade de construir aprendizagens significativas, potenciando os conhecimentos de que já é portador. Autores, como Maria García Armendáriz, Ana Martinez Mongay e Carolina Matellanes Marcos (2003: 75) asseguram que: La tarea permite la programación de la enseñanza-aprendizaje de la lengua en contexto escolar en procesos de comunicación reales, con una intención y un contexto definidos, de forma que el alumno se concentre prioritariamente en el significado de lo que está comunicando. (…) permite la integración significativa de todos los componentes necesarios para la práctica comunicativa y el aprendizaje autónomo. Aquí reside la potencialidad educativa de la tarea en el contexto escolar (…) ya que están expuestos a un uso más global de la lengua. Este uso tiene una doble vertiente en la tarea: la del desarrollo de las capacidades de los alumnos y de la adquisición de unas competencias que les permiten aprender el idioma. O nosso estudo irradia da exploração do texto “Diário de Robinson”, de Jonathan Swift4, tendo por base um conjunto de tarefas comunicativas que passamos a anunciar, baseando-nos em autores que adiante citaremos. Igualmente, teremos a preocupação de mostrar que, na aprendizagem da língua (do português como língua não materna, neste caso), se observou uma evolução no que às perspetivas de ensino aprendizagem baseadas em tarefas comunicativas diz respeito. Para uma economia do tempo, não apresentaremos o desenvolvimento da planificação no seu todo. Investimos apenas na classificação das tarefas comunicativas dos autores referenciados. 1. Objetivos - Conhecer a cultura portuguesa - Conhecer autores da literatura portuguesa - Desenvolver a competência comunicativa - Desenvolver a intercompreensão - Adquirir vocabulário - Desencadear emoções - Compreender linguagens simbólicas - Utilizar linguagens simbólicas 2. Motivação inicial Projeção da capa do Diário de Anne Frank. Questões acerca da autora e da obra. 4 In Língua Portuguesa, Olga Castro e Manuela Russo (coord.), Ed. Asa, 1995, pp.170-171 64 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI Audição do poema “Santo e senha”5, de Miguel Torga, cantado por Frei Hermano da Câmara6. Deixem passar quem vai na sua estrada. Deixem passar Quem vai cheio de noite e de luar. Deixem passar e não lhe digam nada. Deixem, que vai apenas Beber água de Sonho a qualquer fonte; Ou colher açucenas A um jardim que ele lá sabe, ali defronte. Vem da terra de todos, onde mora E onde volta depois de amanhecer. Deixem-no pois passar, agora Que vai cheio de noite e solidão. Que vai ser Uma estrela no chão. (Miguel Torga) Apoiamo-nos em Pattinson (1987), convidando o aluno a fazer adivinhações, a partilhar experiências pessoais e a usar a sua imaginação. Projeção de algumas imagens relativas ao texto Diário de Robinson. Procedemos, na ótica do autor supracitado, a matching activities, communication strategies, pictures and picture stories, discussions and decisions. Recorremos, igualmente, àquilo que é entendido como pré-leitura do texto (Yopp e Yopp, 2006), visando um ambiente mais democrático, onde os aprendentes têm oportunidade de adivinhação acerca do conteúdo da obra, ativando os seus esquemas mentais e os seus próprios conhecimentos7. Estes procedimentos permitem respostas pessoais, pela correlação com a bagagem cultural de que cada um é portador. Esta perspetiva permite fazer previsões, construir imagens mentais, estabelecer ligações entre os conhecimentos do presente e do passado. Exemplos: pensar em ilhas desertas, na fauna e flora, o que levar para sobreviver, etc.. Igualmente, pedir-se-á aos alunos que produzam um texto cujo tema é a liberdade8. Extraído de Diário: Volumes I a VIII, de Miguel Torga. Lisboa: Dom Quixote, 1999, 920 pp. Tavares (2007: 31) propõe este tipo de aulas na sequência do desenvolvimento dos seguintes parâmetros: influência positiva, criatividade, desenvolvimento das emoções,… A autora supracitada, recorrendo a Lozanov, refere que esta didática é uma abordagem holística para descobrir e mobilizar reservas complexas no cérebro, sendo que não se limitam a o desenvolvimento da memória, fazendo também apelo à criatividade. A sustentar esta didática, frequentemente questionada, sugere alguns pontos a ter em conta: diversidade de documentos e suportes, recurso à multiplicidade de questões, apresentação dos diálogos com música de fundo, simulação de diálogos entre línguas e culturas diferentes, progressão dos conteúdos em espiral. 7 Yopp e Yopp, já referidas, na obra Literature Based Reading Activities (2006), referem a importância da pré-leitura de qualquer obra, antes de se iniciar a leitura da mesma, como já afirmámos. Este tipo de atividade pode ser apelidado de Book Talk. 8 Tentamos inserir a planificação numa unidade didática, cujo tema integrador será a liberdade e que terá como elemento integrador o diário e sua importância. Pais (2013: 74) refere que, do ponto de vista técnico-didático, uma unidade didática se carateriza por: “- Ser a base motivacional, preparando a atenção do aluno: - Permitir a ativação do conhecimento prévio e a verificação dos pré-requisitos subjacentes a uma determinada aprendizagem; - Estimular a comunicação multilateral; - Desencadear a coerência temática e a coesão metodológica no interior dos percursos de ensino e aprendizagem e da própria Unidade.” 5 6 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 65 3. Leitura e exploração do texto Após audição da leitura do texto, procede-se à exploração do mesmo. Desconstruímos os conceitos encontrados em Prabhu (1987), Pattinson (1987) e em Richards (2001), citados por Panzo (2013). Nos três autores, encontramos uma sequência que vai do desenvolvimento do desempenho linguístico, ao desempenho cultural e finalmente para o sociocultural. Sai-se, assim, de um ensino-aprendizagem cujo enfoque aposta apenas no trabalho individual de crescimento cognitivo e linguístico, para um crescimento do foro sociocultural. Do primeiro autor, desconstruímos conceitos, tais como, reasoning gap (que remete para a compreensão e produção oral ou escrita de textos) e opinion gap (que engloba o uso da informação real articulada com preferências pessoais, sentimentos ou atitudes). Em Pattinson (1987), servimo-nos das questions and answers; puzzles and problems; discussions and decisions. Parece-nos poder afirmar que a preocupação com o desempenho mais individual ainda continua em foco neste autor. Quanto a Richards (2001)9, este privilegia trabalho de pares ou grupo, envolvendo produção e partilha da informação, discussão, resolução de problemas em ambientes descontraídos, com a preocupação de não encontrar apenas uma solução. 3.1 Questões10 - Alguém mantem um diário? - Por que se mantem um diário? - O que se escreve neste tipo de registo? - Por que será que a este tipo de registo se dá o nome de diário? - Durante quanto tempo manteve Robinson este registo? - Através deste texto, temos acesso a todo o registo? Justifica por palavras tuas. - Onde se encontrava Robinson na época em que escreveu este diário? - Que aspetos são caraterísticos de todas as ilhas? - Qual o tipo de embarcação em que Robinson chegou à ilha? - Conheces outros tipos de barcos? Refere alguns. - No rio Douro, navegam os “rabelos”; no rio Tejo, as “fragatas”… (o professor mostra imagens destes e de outros barcos, levando os alunos à descoberta de outras embarcações de distintos países). Em seguida, o docente distribui uma ficha com informação em falta sobre a utilização de cada barco das imagens que deve ser preenchida em trabalho de pares - Documenta com o texto o que aconteceu às restantes pessoas do barco durante o naufrágio. - Que sentimentos experimentou Robinson quando se viu sozinho? Retira do texto as expressões que justifiquem a resposta. - Por que razão se sentiu amedrontado e triste? - A resposta a esta questão remete para a solidão tantas vezes sentida em ambientes vistos como hostis. De Richards, extraímos referências, tais como, jigsawtasks; information-gap tasks; problem solvingtasks; opinion exchange tasks. A título de exemplo, retomamos algumas questões e enquadramo-las nas respetivas classificações: - Alguém mantem um diário? opinion gap - Por que se mantem um diário? reasoning gap - O que se escreve neste tipo de registo? reasoning gap - Por que será que a este tipo de registo se dá o nome de diário? opinion gap - Durante quanto tempo manteve Robinson este registo? problem solvingtasks - Através deste texto, temos acesso a todo o registo? Justifica por palavras tuas. opinion gap 9 10 66 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI - Que sentimentos estão ligados ao facto de se estar longe de casa? E quando se está perto dos amigos? E quando se está perto da pessoa amada? - Ao cair da noite, Robinson decidiu dormir. Como foi esse sono? Justifica com o texto. -… Nesta fase da leitura e exploração do texto, cujo objetivo é fundamentalmente o de estimular respostas pessoais, são ainda realizadas atividades, tais como: Feelings Charts (mapa de emoções), de Yopp & Yopp Graphic Organizers, de Yopp & Yopp Estas atividades realizam-se simultaneamente com a exploração do texto, ajudando a analisar personagens, a reconhecer e a despoletar sentimentos e a expandir o conhecimento do vocabulário. 4. Pós-leitura Dando sequência ao programa de leitura fundamentado na literatura, procedeu-se à pós-leitura do texto (Yopp e Yopp, 2006). As atividades integradas na pós-leitura ajudam o aluno a monitorizar o essencial, a desenvolver a capacidade de síntese, a apreender o sentido global do texto, a distinguir as diversas teias que o compõem. Para o efeito, utilizam-se “textos em leque”, que, na opinião das autoras citadas, promovem a leitura lúdica e recreativa relacionada com o texto em questão. Evidentemente, os textos em leque têm entre eles um fio condutor. No final, pede-se aos aprendentes que produzam um texto simulando um diário. Considerações finais Na proposta de ideias apresentadas, conducentes a uma proposta de planificação, torna-se evidente a prevalência de estratégias de antecipação do texto em estudo, com a visualização de imagens relativas à obra, com audição de poemas onde a intertextualidade pode ser trabalhada, com preenchimento de mapas, esquemas/diagramas, da produção de texto/escrita criativa, do trabalho de grupo, etc.. A nossa proposta assenta naquilo que é atualmente entendido como didáticas não-convencionais, enquadradas no estudo da língua e da literatura, baseado em elementos integradores e integrados numa espiral à volta do tema liberdade, tendo os diários como polo libertador. Em todas as atividades, tentamos desenvolver múltiplas sensibilidades: a imaginação e a criatividade dos aprendentes, o encadeamento de ideias, a partilha de experiências, a expressão escrita. Concomitantemente, tivemos a preocupação de educar para a cidadania. Quanto aos materiais, devem utilizar-se documentos autênticos, recorrendo, sempre que possível, ao uso de gravações e vídeos com comunicações reais, de falantes reais, em contextos reais de comunicação. Bibliografia Chamot, Anna (2008). “Strategy instructions and good language learners”. In Carol Griffiths (ed.), Lessons from good language learners. Cambridge: Cambridge University Press, pp. 266-281 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 67 Cohen, Andrew (2011). “Second language learners strategies”. In E. Hinkle (ed.), Research in second language teaching and learning (vol. II, Cap. 41 – Parte V). Abingdon: Routledge, pp. 681-698) García Armendáriz, Maria, Martinez Mongay, Ana e Matellanes Marcos, Carolina (2003). Español como segunda lengua (E/L2) para alumnos inmigrantes. Propuesta curricular para la escolarización obrigatoria. Pamplona: Departamento de Educación - Gobierno de Navarra. Disponível em www.http://pnte.cfnanavarra.es (acedido em 08.05.2015) Grenfell, Michael e Harris, Vee (2013). “Making a difference in language learning: the role of sociocultural factors and of learner strategy instruction”. In The Curriculum Journal, 24 (1), pp. 121-152 Pais, António (2013). “A unidade didática como instrumento e elemento integrador de desenvolvimento da competência leitora”. In Fernando Azevedo e Mª da Graça Sardinha (coord.), Didática e Práticas – A língua e a educação literária. Lisboa: Lidel, pp.65-86 Panzo, João (2013). As representações dos professores sobre o Português língua segunda: linhas de atuação. Programa de formação contínua para professores do ensino primário em Angola. Tese de doutoramento apresentada à Universidade da Beira Interior (não publicada) Pattinson (1987). Developing communication skills. Cambridge: Cambridge University Press Pereira, Íris (2009). “Literacia crítica: conceções teóricas e práticas pedagógicas nos níveis iniciais de escolaridade”. In Fernando Azevedo e Mª da Graça Sardinha (coord.), Modelos e Práticas em Literacia. Lisboa: Lidel, pp.17-34 Tavares, Clara (2007). Didáctica do português língua não materna no ensino básico. Porto: Porto Editora Yopp, Ruth e Yopp, Hallie (2006). Literature Based Reading Activities. Boston: Pearson Outros documentos Quadro Europeu Comum de Referência para as Línguas – Aprendizagem, ensino, avaliação. Porto Edições ASA, 2001. 68 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 69 ESTADO DA ARTE NA INVESTIGAÇÃO QUALITATIVA EM EDUCAÇÃO: O CASO DOS ESTUDOS SOBRE DIFICULDADES ESPECÍFICAS DE APRENDIZAGEM Mª Cruz Sánchez-Gómez ([email protected]) Mª Vitoria Martín-Cilleros ([email protected]) Universidad de Salamanca Resumo En el capítulo se pone de manifiesto que actualmente existe una amplia producción científica de carácter cualitativo con perfil social. En la mayoría de las investigaciones predomina el uso de investigación cualitativa como acercamiento metodológico preferente. En otras muchas, especialmente en las más recientes, abunda una metodología mixta (mixed method approach). Sólo en unos pocos campos de conocimiento existe preferencia por la investigación cuantitativa. Además en el documento se describe el proceso del método científico que debe llevarse a cabo en la investigación, haciendo hincapié en los estudios de carácter interpretativo. Se indica los elementos, criterios de demarcación y situaciones epistemológicas que deben tenerse en cuenta en un campo de conocimiento. Posteriormente se hace un recorrido sobre las tendencias en investigación educativa haciendo énfasis en los estudios cualitativos en el ámbito de las dificultades específicas de aprendizaje. Palavras-chave: Dificuldades de aprendizagem específicas; investigação em educação; estudos qualitativos; design de metodologia mista. 70 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI Abstract The chapter shows that there is now a broad scientific production with qualitative social profile. In most investigations predominant use of qualitative research as a preferred methodological approach. In many others, especially the most recent, abounds a mixed methodology (mixed method approach). Only in a few fields of knowledge there is preference for quantitative research. Also in the document the process of the scientific method to be carried out in the investigation, emphasizing interpretive studies described. Elements, demarcation criteria and epistemological situations should be taken into account in a field of knowledge is indicated. Later, a tour on trends in educational research with emphasis on qualitative studies in the field of specific learning difficulties. Keywords: Learning disabilities; educational research; qualitative studies; mixed method approach. Introducción La investigación como proceso de construcción de conocimiento es considerarla como proceso de producción del conocimiento científico. El hecho de que existan otras fuentes de conocimiento (la experiencia personal, la tradición, las autoridades) ( (Cardona, 2002) no permite calificarlas como ciencia o equipararlas a la investigación, sin que de ello se derive un rango inferior o superior, sino diferente, como lo son el conocimiento científico y el cotidiano o vulgar. McMillan y Schumacher (2001: 9) definen la investigación, de manera sencilla y breve, como un proceso sistemático de recolección y análisis lógico de la información y le asignan como características básicas la objetividad, la precisión, la verificabilidad, la preferencia por las explicaciones simples, la naturaleza empírica de los datos, el empleo del razonamiento lógico y el carácter condicional de las conclusiones. También Kerlinger (1985: 7) hace referencia a algunas de estas características cuando, al definir la investigación científica, le asocia sistematicidad, control, carácter empírico y sentido crítico al proceso de indagación de las relaciones existentes entre fenómenos. La investigación, y el conocimiento obtenido a través de ella, se oponen a las opiniones, las creencias, la introspección, la experiencia personal o las fuentes de autoridad. Esta característica se relaciona con el carácter empírico al que hacían referencia McMillany Schumacher (2001). La eliminación de lo personal se orienta exclusivamente a la evitación de interferencias por parte del investigador en el proceso, si bien, como comentaremos más adelante, es imposible desprenderse de los valores y hasta en los enfoques de investigación presuntamente más asépticos prevalecen unos determinados valores personales, profesionales y sociales. Por otra parte, lo personal incide directamente en fases de la investigación como la selección de los problemas a investigar, la determinación de los fines y objetivos de la misma, la utilización de los resultados, etc. De igual forma, también subyacen valores básicos al seleccionar métodos y, evidentemente, al suscribir un enfoque o paradigma determinado. Además, la investigación científica ha seguido, lo que se denomina el método científico. Este proceso comienza con la identificación de un problema específico sobre el que se va a investigar. La determinación del problema puede venir dada por varias necesidades: por la existencia de lagunas en el conocimiento científico sobre la materia, como derivación de teorías enunciadas que precisan de validación empírica, por la emergencia de situaciones nuevas o desconocidas hasta el momento, como fruto de investigaciones precedentes que abren nuevas vías de indagación e incluso desde la experiencia personal del investigador o investigadora. A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 71 Los problemas de investigación han de ser planteados bajo criterios de relevancia, claridad, operatividad, precisión y viabilidad. Estos criterios convierten al problema detectado en cuestión investigable, puesto que lo definen en los términos requeridos por la actividad científica. McMillan (1996, en Cardona, 2002) se refiere a seis criterios útiles para la valoración de problemas de investigación: • El problema planteado ha de tener la posibilidad de ser resuelto a través de la recogida y análisis de datos. • El problema debe ser relevante para la situación actual del conocimiento en el campo disciplinar correspondiente. • El problema debe indicar u orientar acerca del tipo de investigación que se va a realizar para su resolución (experimental, descriptiva, correlacional, comparativa...). • El problema debe hacer referencia, en su enunciado, a la población a la que se refiere y que va a ser investigada. • El enunciado del problema debe explicitar también las variables objeto de estudio, aunque no necesariamente con un nivel de especificidad elevado en esta fase. • El problema, por último, ha de ser planteado de forma clara, evitando la ambigüedad en su formulación. Ary, Jacobs y Razavieh (1982) aporta a lo anterior la necesidad de que el problema a investigar se ajuste al investigador y la conveniencia de que la investigación del problema conduzca, a su vez, a la detección de nuevos problemas. Cuando sucede esto, se dice que investigación ha sido fértil. Es usual proceder, en la fase siguiente, a una primera revisión de la literatura existente sobre el problema en cuestión y sobre otros aspectos más generales o relacionados directamente con él, de forma que se obtenga una primera idea general sobre el tema y su estado actual. Conocido el problema y el estado actual de la cuestión, se procede al planteamiento de la investigación que se va a realizar sobre él, especificando los objetivos que guiarán el proceso y que se constituyen en fines o propósitos a alcanzar durante el mismo. Cardona (2002) distingue dos tipos de objetivos: a) Exploratorios o descriptivos, que son útiles para aproximarnos a problemas poco conocidos y permiten identificar o describir atributos o características ignorados hasta el momento, cuantificar la frecuencia de algún fenómeno o seleccionar áreas específicas o problemas de interés. b) Analíticos, explicativos o predictivos, que se orientan al estudio de las relaciones entre posibles causas y efectos. Este tipo de objetivos permite contrastar o verificar hipótesis, confirmar determinadas relaciones entre variables, comparar la eficacia de dos o más acciones, comprender factores subyacentes a los fenómenos estudiados e incluso prever y anticipar acontecimientos. La especificación de objetivos se acompaña, si procede (en función de la naturaleza de la investigación y, particularmente, si los objetivos son de tipo analítico), del enunciado de una o varias hipótesis de investigación. En relación con las estrategias metodológicas, Buendía y Carmona (1984, en Buendía, 1992) reducían a tres las posibilidades existentes: los métodos de observación, los métodos de encuesta y los métodos de medición. Los primeros son más propios de la investigación cualitativa de corte naturalista y utiliza preferentemente datos cualitativos, mientras que los últimos exigen de la cuantificación y son propios de la metodología experimental. Evidentemente, la selección de métodos y técnicas específicas de recogida de datos se relaciona con la naturaleza de la investigación, con los objetivos propuestos, con las hipótesis planteadas (en 72 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI su caso), con la cantidad de participantes, con la naturaleza del objeto y de los sujetos de la investigación, etc. La selección de participantes (sean personas, instituciones, objetos, domicilios, clases...) se realiza de forma distinta en función del tipo de investigación. La de tipo cuantitativo emplea normalmente técnicas de muestreo. En la cualitativa, se prefiere hablar de técnicas de selección. Las primeras anteponen la representatividad como cualidad esencial de los participantes en la investigación; es decir, su isomorfismo con el conjunto de la población de la que ha sido extraída. Por el contrario, en la investigación cualitativa se antepone la significatividad de los participantes. Esta diferencia se asocia a una finalidad básica de uno y otro tipo de investigación: así, mientras que la primera pretende la generalización de los resultados y, por tanto, se preocupa de la búsqueda de lo común o lo compartido, la segunda prefiere la caracterización de la singularidad, focalizando entonces lo específico. En la selección de participantes en procesos de investigación cualitativa existen también diversas técnicas, alguna de las cuales coinciden con otras empleadas en los estudios cuantitativos. Al igual que sucede con la selección de técnicas de recogida de datos y de participantes, también el análisis de datos, que constituye la fase posterior a la recogida, presenta especificidades en función de la naturaleza de la investigación. El carácter numérico de los datos cuantitativos permite la aplicación de técnicas estadísticas más o menos complejas, mientras que los datos cualitativos (con los que también se han empleado algunas técnicas de cuantificación) son más apropiados para el análisis de significados o de contenido. El análisis precede a la ordenación de los resultados de la investigación y a la elaboración de las conclusiones, que suelen organizarse en función de los objetivos e hipótesis definidas al inicio. La finalización de las fases comentadas posibilita la redacción del informe de investigación y la difusión de los resultados de la misma. Pero, además de la necesaria difusión de los hallazgos, la investigación ha de servir para abrir nuevos caminos de indagación, poniendo al descubierto o reformulando nuevos problemas que permiten reiniciar el proceso investigador. La investigación alcanza así su plenitud a través de la fertilidad, una cualidad deseable en todos los procesos de construcción del conocimiento Elementos de un campo de conocimiento Un campo de conocimiento no se compone únicamente de un conjunto de proposiciones ni se sostiene únicamente en el campo de las “ideas”, sino que en él pueden distinguirse una serie de elementos que lo componen: a) Una sociedad y un contexto en el que cobra sentido la conversión de la realidad educativa. En nuestro caso, en objeto de consideración científica, en el que los investigadores y teóricos de este campo de conocimiento hacen su actividad pertinente y adquieren una posición y un estatus. b) Objetos de estudio y dominios de discurso, que implican la reconstrucción de los objetos reales en objetos de conocimientos, en cuya constitución tiene parte y cometido el observador y sus puntos de vista. Los dominios de discurso y los objetos de estudio parten de interrogantes acerca de la realidad, fundamentalmente en la forma de qué y cómo. La constitución de un objeto de estudio no significa que sus límites sean precisos. Aunque los investigadores y teóricos de la educación identifican el ámbito de significación del concepto, sus límites son siempre en algún modo difusos. Desde la posición de cada observador adquieren relevancia elementos y caracteres diferentes a partir de los cuales se construyen discursos coherentes, con más o menos puntos de coincidencia. Las dificultades en la delimitación del objeto han sido especialmente importantes A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 73 en el ámbito de la educación. Como el campo de conocimiento es al mismo tiempo actividad y producto de la actividad, en un momento dado la descripción del campo puede representarse como la integración de las líneas de investigación de sus investigadores (Bunge, 1985). c) Criterios, supuestos y concepciones generales, a partir de las cuales se delimita el campo de conocimiento. Todo campo de conocimiento se plantea unos límites y señala el alcance de sus predicados: pretende delimitar el ámbito de significación de conceptos relacionados con la educación y esto no en general, para todo tiempo y lugar, sino dentro de espacios de significación determinados, por un grupo humano, un espacio concreto y preferentemente en el momento de la observación. d) Problemática característica o modo característico de formular problemas. A lo largo de la historia de la investigación en Educación, los estudiosos se han planteado de manera prioritaria el cómo resolver los problemas educativos del día a día: cómo organizar un sistema educativo eficaz, cómo perfeccionar el proceso de enseñanza-aprendizaje, cómo llevar a cabo reformas educativas de envergadura, cómo llevar a buen término programas innovadores, cómo aumentar el sentido de la responsabilidad y la motivación de los docentes, cómo fomentar la formación del profesorado, cómo controlar los conflictos en el aula, etc. Todos estos problemas en conjunto han ido determinando los objetivos de la Investigación Educativa. Hacia la década de 1960, la Investigación Educativa comenzó a mostrar una inclinación hacia un planteamiento de los problemas radicalmente diferente al mostrado anteriormente. La comprensión adquirió prioridad lógica y cronológica sobre los esfuerzos prematuros para la elaboración de programas educativos. Para poder ofrecer recomendaciones dignas de confianza para la mejora y la reforma de los sistemas educativos, comenzó a pensarse en la necesidad de partir de un conocimiento en profundidad de los principios de su funcionamiento, sin tener en cuenta inicialmente los fines para los que podría utilizarse ulteriormente este conocimiento ( (Eaton, 1974). e) Objetivos característicos de la actividad dominante, por qué y para qué se estudia ese campo. En el caso de la Educación, aparecen dos categorías de objetivos: el primero, como en todo campo de conocimiento, conseguir mediante el análisis científico, las posibles generalizaciones sobre los fenómenos educativos objeto de estudio; y el segundo, tiene un carácter práxico, que globalmente considerado, podría expresarse como el fomento y la profundización en la comprensión de dichos fenómenos dentro del contexto donde se producen. f) Metódica o conjunto de procedimientos para la actividad de desarrollo del campo de conocimientos. La Educación no tiene –y mucho menos puede definirse en términos de- un gran mecanismo metodológico propio tal como el que poseen otras disciplinas. Criterios de demarcación en los campos de conocimiento Pudiera parecer que los campos de conocimiento se encuentran perfectamente delimitados y sus límites se imponen por sí mismos. En ese criterio ingenuo se apoyan las críticas que reciben quienes se atreven a transgredirlos “invadiendo” otros campos de actividad gremial como si de un intruso sin legitimidad se tratara. Es fácil rastrear las dificultades para la constitución de un campo autónomo para la Investigación en Educación dentro de las instituciones académicas; al analizarlas se puede entrever, en muchas ocasiones, que se trata de cuestiones de sociología de la ciencia o de relaciones entre gremiales próximos. La demarcación de campos de conocimiento tiene que ver con varias categorías de criterios cualitativamente diferentes (Bunge, 1985). a) Criterios de demarcación epistemológicos, que demarcan formas de pensamiento diferentes en la racionalidad y en la comprensión de los fenómenos educativos. 74 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI Los campos de conocimiento se demarcan ante todo por la forma de pensamiento. La forma de pensamiento o manera de pensar hace referencia, ante todo, al método o procedimiento mediante el cual se elaboran y se validan o corroboran los sistemas de proposiciones que se tejen dentro de tal forma de proceder mental. El estudio de las formas de pensamiento, el análisis de los criterios de actividad racional y de validación-corroboración proporciona contenido a un ámbito de pensamiento que se denomina epistemología; en concreto, este criterio alude a la valoración del status epistemológico de un campo de conocimiento. Aunque los criterios que se definan puedan no ser totalmente compartidos y los límites que se establezcan sean difusos, el producto de la aplicación de criterios de demarcación epistemológicos produce la segregación de rango mayor en los productos de conocimiento: entre ciencia y no ciencia. Esta distinción adquiere especial relevancia para la formación en disciplinas relacionadas con la educación porque muestra la distinción entre un campo de conocimiento y una praxis social. No es lo mismo investigar fenómenos educativos que elaborar una opinión sobre un hecho educativo y cultura educativa. La opinión y la cultura son responsabilidades de ciudadanos comprometidos y críticos, mientras que la investigación en educación se entiende como dedicación racional sometida a las reglas del método científico. b) Criterios de demarcación pragmática: aquellos que demarcan dentro de un campo de conocimiento grandes cuerpos de problemas capaces de orientar especialización (subdisciplinas según el criterio de tal), e incluso de constituir criterio para la organización de un programa de formación en el que se implican especialistas y dentro de los cuales se formulan programas diferenciados de investigación. Situaciones epistemológicas generales en un campo de conocimiento El término paradigma ya fue empleado por Platón y Aristóteles para referirse, respectivamente a modelo y ejemplo (Corbetta, 2003) y en la actualidad su uso está tan extendido que ha provocado una diversificación de las acepciones, con el consiguiente riesgo de confusión. Así, los paradigmas son, a veces, equiparados a teorías o formas de articulación interna de éstas, sistemas de ideas, corrientes de pensamiento, escuelas, procedimientos, ejemplar de investigación, métodos, etc. Desde la aparición de las revoluciones científicas de Khun (1962) se introduce como término fundamental dentro de los análisis epistemológicos de los campos de conocimiento el concepto de paradigma, y lo define “como realizaciones científicas, universalmente reconocidas, que durante cierto tiempo proporcionan modelos de problemas y soluciones a una comunidad científica”. Este concepto alude a los caracteres epistemológicos de un campo de conocimiento que comparte unidad en cuanto a supuestos generales, metodología de investigación, identificación de problemas ejemplares e identificación de soluciones a problemas específicos del campo. La expresión paradigmática del campo suele contenerse en los denominados textos o tratados generales del campo (manuales). El concepto de paradigma, muy discutido, se amplía y precisa con la idea de Lakatos (1970) de programa de investigación. Cuando el programa de investigación es compartido por la totalidad del campo, tanto Khun como Lakatos aluden a lo que se denomina “ciencia normal”. Cuando el paradigma se revisa o se hace insostenible como consecuencia de la investigación, se entra en el estadio denominado de ciencia revolucionaria o de cambio de paradigma o de cambio de programa de investigación. A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 75 Desde este punto de vista, podría estimarse que cuando en un campo de conocimiento no existe un paradigma comúnmente aceptado o un programa de investigación propiamente dicho, la situación del campo es pre-paradigmática. Se denomina a esta situación pre-paradigmática revelándose así la inexistencia de supuestos ontológicos compartidos, metodologías consensuadas y tradiciones de lecturas concurrentes. Esta adquiere una importancia crucial desde el momento en que las teorías científicas funcionan como instrumentos para el análisis, la interpretación, la comprensión y la explicación de los fenómenos educativos complejos. Además, Larry Laudan aporta, en su estudio sobre la evolución de la ciencia, el concepto de tradición de investigación. Sus fundamentos básicos son dos: por un lado, evidención que los criterios de cientificidad son variables y dependen de circunstancias históricas; y por otro, puso de manifiesto que los científicos no trabajan de forma aislada, sino dentro de una determinada tradición de investigación que puede integrar teorías y programas diversos. El criterio de cientificidad preferente es, para Laudan, el de utilidad al progreso. Una aportación será tanto más científica cuanto mayor sea su utilidad para el progreso, al resolver una mayor cantidad de problemas. Será ese sentido de utilidad el que predomine cuando la comunidad científica opte por una tradición de investigación, convirtiéndola en hegemónica. Estado actual de la investigación cualitativa en el campo de dificultades específicas de aprendizaje Se ha experimentado un aumento de la producción científica en ciencias sociales y de la salud, tanto en el número de artículos, como universidades que lo trabajan y áreas de conocimiento. Observando la base de datos Scopus se aprecia no sólo lo comentado anteriormente sino también el auge de los estudios cualitativos tanto en España como en Portugal. Ocupando lugares destacados en cuanto a producciones de artículos científicos publicados durante el 2015 en esta base de datos internacional como puede verse en la figura 1. Con el fin de conocer la situación en el ámbito de las dificultades específicas de aprendizaje se comenzó por delimitar el concepto. La primera dificultad que nos encontramos es la definición de dificultad específica de aprendizaje, siendo la más aceptada la empleada por Kirl (1963) que nos lo define como: “una alteración o retraso en el desarrollo en uno o más de los procesos del lenguaje, habla, deletreo, escritura, o aritmética que se produce por una disfunción cerebral y/o trastorno emocional o conductual, no por un retraso mental, depravación sensorial o factores culturales o instruccionales”. Se establecieron como criterios de selección aquellos artículos que estuvieran publicados en inglés, entre 1994 y 2015, abarcando de ese modo los últimos 20 años de investigación. El criterio para la selección de participantes debía ser niños con dificultades específicas de aprendizaje entre los 0 y 12 años, siendo esta franja la coincidente con el periodo escolar. El tema de interés que se debía abordar tendría que ser la intervención educativa. Se excluirían aquellos artículos que fueran revisiones de la literatura o meta análisis así como aquellos que abordaran otro tipo de necesidad educativa como autismo, síndrome de Down, TDAH, etc... 76 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI De acuerdo a estos criterios se obtuvieron los resultados que pueden observarse en las siguientes figuras (Fig 2,3 y 4): A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 77 78 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI Conclusión En la actualidad la tendencia en la investigación en Educación pasa por considerar la voz de las personas implicadas. No basta quedarnos en el mundo de los tópicos cuantitativos sino que los agentes educativos demandan investigar el mundo de los significados, es decir pasar de la idea del cuánto existe de un fenómeno educativo a la idea del por qué existe ese fenómeno (Martín-Cilleros & Sánchez-Gómez, 2016). La afirmación anterior se pone de manifiesto, en las producciones de la base de datos de prestigio internacionales, como por ejemplo la europea SCOPUS, en la que de las casi 50.000 producciones existentes entre 1990 y 2015 en ciencias sociales, casi 20.000 son estudios cualitativos en diferentes formatos: artículos (86,20%), revisiones (6,19%), conferencias (3%); seguidos de 8.500 estudios cuantitativos y más de 5.000 con modelos mixtos (Sánchez-Gómez, 2015a, 2015b y 2015c). Si nos centramos en el ámbito específico abordado, las dificultades específicas del aprendizaje, por países Estados Unidos lidera la producción en este ámbito, seguido de Reino Unido y Alemania. Realizando un análisis de contenido de los artículos que cumplen los criterios de publicación en inglés, entre 1994 y 2015 en intervención educativa para niños de 0 a 12 años, vemos que las temáticas más representativas están ligadas a efectividad de los programas desarrollados y demanda por el diseño de nuevas propuestas de mejora. Referências bibliográficas Ary, D., Jacobs, L., & Razavieh, A. (1982). Introducción a la investigación pedagógica. México: Interamericana. Buendía, L. (1992). El proceso de investigación. En P. Colás, & L. Buendía, Investigación educativa (págs. 69-107). Sevilla: Alfar. Bunge, M. (1985). Racionalidad y realismo. Madrid: Alianza. Cardona, M. (2002). Introducción a los métodos de investigación en educación. Madrid: EOS. Corbetta, P. (2003). Metodología y técnicas de investigación social. Madrid: McGraw-Hill. Eaton, D. (1974). Analyse du système politique. París: Colin. Kerlinger, F. (1985). Investigación del comportamiento. Técnica y metodología. 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Pedagogía social. Revista interuniversitaria, 21-34. A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 79 EU E OS OUTROS - UM ESTUDO DE CASO SOBRE AS CONCEÇÕES DAS CRIANÇAS ACERCA DA DIFERENÇA Liliane Baltazar ([email protected]) Cristina Pereira ([email protected]) Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Castelo Branco Resumo A literatura infantil tem assumido um lugar de destaque na análise que diferentes autores têm realizado sobre a sua relação com o desenvolvimento da criança. De acordo com diferentes estudos, as histórias para crianças, para além de promoverem as competências linguísticas, são um instrumento privilegiado para o desenvolvimento da imaginação, estimulam a capacidade crítica acerca de temas sociais e pessoais e contribuem para a compreensão e a resolução de conflitos interpessoais nas crianças. Nesse sentido e partindo do pressuposto de que livro infantil pode assumir um papel importante na construção das conceções das crianças, escolhemo-lo como um dos instrumentos privilegiados para a elaboração deste estudo. O estudo que apresentamos teve como objetivos: conhecer as conceções das crianças com e sem Necessidades Educativas Especiais (NEE) relativamente à sua (com)vivência com a diferença e analisar o contributo das histórias infantis na construção das conceções das crianças acerca da diferença, ou mais concretamente, das conceções das crianças em relação à interação com a diferença, em contexto escolar. A intervenção junto das crianças organizou-se em várias sessões, todas elas dirigidas para a análise e exploração de livros infantis, previamente escolhidos segundo a temática em análise. A metodologia utilizada foi de cariz qualitativo e organizou-se como um estudo de caso descritivo. Como instrumento de análise das preferências interativas das crianças que integraram a amostra do estudo utilizamos o teste sociométrico. Foram realizadas atividades escritas, em que as crianças foram convidadas a escrever os finais das histórias anteriormente lidas. Para aprofundar o conhecimento sobre as conceções que as 80 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI crianças da nossa amostra têm acerca da diferença, foram também realizadas entrevistas individuais que se organizaram como uma análise às histórias anteriormente narradas. Os resultados permitiram-nos constatar que as atividades desenvolvidas não potenciaram uma mudança nas escolhas sobre as preferências interpessoais identificadas através do teste sociométrico, mas confirmou-se que o livro é um potencial meio para (des)construir as conceções sobre a diversidade e a discriminação nas relações interpessoais. Palavras-chave: literatura infantil; desenvolvimento social; aceitação da diferença nas interações sociais; conceções. Abstract Children’s literature has assumed a prominent place in the analysis that different authors have performed on their relationship with the child’s development. According to different studies, stories for children, in addition to promoting language skills, are a privileged instrument for the development of imagination, stimulate critical capacity about social and personal issues and contribute to the understanding and resolving interpersonal conflict on children. It is with this thought and on the assumption that children’s book can play an important role in the construction of conceptions of children, that we choose them as one of the privileged instruments for the preparation of this study. The study that we present have as main objectives: know the conceptions of children with and without Special Educational Needs (SEN) regarding their experience with difference living and analyze the contribution of children´s stories in the construction of children´s conceptions about the difference, or more precisely the conceptions of children in relation to the interaction with the difference in the school context. The intervention with children was organized in several sessions, all geared towards the analysis and the exploration of children´s books, previously chosen according to the theme in question. The methodology used was a qualitative nature and was organized as a descriptive case study. As an analysis tool of interactive preferences of children who participated the study sample we used the sociometric test. Were performed written activities, in which children were asked to write the end of the stories previously read. To deepen the knowledge about the conceptions that children in our sample have about the difference, were also conducted individual interviews that were organized as an analysis of the stories narrated earlier.The results allowed us to conclude that the activities developed not potentiate a change in the choices on interpersonal preferences identified through the sociometric test, but it was confirmed that the book is a potential means to (de)construct the conceptions of diversity and discrimination in interpersonal relationships. Keywords: children’s literature; social development; acceptance of difference in social interactions; conceptions Introdução A inclusão de crianças com necessidades educativas especiais na escola tem dominado muitos dos debates e da pesquisa educacional nas últimas décadas, contudo, os estudos sobre essa problemática têm-se centrado maioritariamente na análise das estratégias e práticas pedagógicas implementadas na escola e na sala de aula. A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 81 A realização do presente estudo perspetiva a importância de analisar as relações entre as crianças com e sem necessidades educativas especiais (NEE) em contexto escolar e as conceções destas acerca do “viver com a diferença”, pela importância que essas conceções podem assumir nas interações que estabelecem entre si. A escola tem um papel preponderante na transmissão de valores e conceções que valorizam a importância da diversidade e do multiculturalismo. Na perspetiva de Fonseca (2000), educar para a cidadania é também educar para o reconhecimento e o respeito pela diferença. Para as crianças com e sem necessidades educativas especiais as competências sócio-morais desenvolvem-se e operacionalizam-se através da troca de saberes e de experiências com os adultos significativos, nomeadamente pais e educadores, mas também nas interações com o seu grupo de pares. Nesses contextos interativos, os valores morais e éticos são postos à prova e a criança revela o modo como pensa em determinada situação e resolve-a de acordo com as suas conceções. Deste modo, a criança é conduzida a resolver dilemas e a revelar se aceita o outro, mesmo quando este é diferente. Tivemos como base da nossa pesquisa o pressuposto de que a construção de conceções e o modo como a criança atua perante determinada realidade podem ser “modelados” através da literatura infantil. Assumimos que o livro infantil não é apenas um suporte lúdico, organizando-se essencialmente como um transmissor de informações, atitudes, conceções e fantasias, com implicações na análise da realidade. Nesse sentido, pode ser um instrumento valioso na educação de seres humanos mais completos e capazes de viver e interagir numa sociedade heterogénea. De acordo com estes pressupostos, a pesquisa que descrevemos foi norteada pelos seguintes objetivos: 1. Conhecer as conceções das crianças com e sem Necessidades Educativas Especiais (NEE) relativamente à sua (com)vivência com a diferença. 2. Analisar o contributo das histórias infantis na construção das conceções das crianças acerca da diferença, ou mais concretamente, das conceções das crianças em relação à interacção com a diferença, em contexto escolar. Para o presente estudo foi utilizada uma amostra composta por seis crianças, três crianças ditas normais e três crianças com necessidades educativas especiais, apresentando dificuldades de aprendizagem. Estas crianças, com idades compreendidas entre os nove e os dez anos, frequentavam o 3º ano de escolaridade de uma escola localizada numa vila da Beira Interior de Portugal. De acordo com os objetivos da pesquisa, foi utilizado o teste sociométrico, numa primeira e última sessão, de forma a aferir as escolhas e afinidades relacionais em diferentes contextos e atividades. Na segunda fase de realização do estudo, desenvolvemos atividades que visaram a exploração dos livros infantis “A Estrelinha Pálida” de Pedro Seromenho, “ Menina Gigante” de Jorge Marmelo e Maria Miguel Marmelo e “O aquário” de João Pedro Mésseder. A seleção destas histórias teve em consideração a sua adequação ao nível etário e características das crianças, bem como à temática transversal “ experiências à volta da diferença”. Foram realizadas seis sessões em grupo onde procedemos à leitura até determinada parte da história e, de seguida, cada criança foi convidada a escrever numa folha o final que ela achava mais adequado para a história que tinha acabado de ouvir. Foram também efectuadas quatro sessões individuais onde foram feitas entrevistas acerca das histórias. Todas as sessões realizadas tiveram o propósito de analisar as intervenções e respostas dos alunos no que diz respeito à aceitação da diferença do outro, de acordo com os objetivos do estudo. 82 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI Enquadramento Concetual 1. O desenvolvimento sociomoral no contexto das interações no grupo de pares A relação entre os pares permite o desenvolvimento social e intelectual da criança (Schaffer, 2005), ao mesmo tempo que progressivamente adquirem “ (…) independência, autonomia o sentido da reciprocidade, da solidariedade, da justiça (…)” (Rivier, 1983, p.73), características cruciais para a sua vivência em grupo. Segundo Carvalho (1999) o desenvolvimento infantil só pode ser analisado no contexto de uma rede de interações: 1. as relações são o contexto primordial em que a criança ao mesmo tempo que socializa adquire competências como a comunicação e a regulação das emoções; 2. a criança ao estar inserida num grupo adquire autonomia e segurança; 3. as relações vividas e observadas vão contribuir para a construção de relações futuras. Por sua vez, Rivier (1983, p.73) defende que “a aprendizagem da vida em comum está longe de se fazer sem os outros”, pois, ao longo do tempo, as crianças formam relações, cada vez mais fortes e diversificadas, muito importantes para as suas vidas, nomeadamente se estas acontecerem com crianças com a mesma idade (Schaffer, 2005). A ideia de que apenas a presença dos pais, essencialmente da mãe, são importantes para o desenvolvimento psicológico, já não pode ser defendida, pois as crianças passam grande parte do seu tempo junto dos seus pares. Assim a relação entre os pares tem grande influência nas formas de conduta e pensamento. (Schaffer,2005, p.129). A criança começa a desenvolver o seu processo de interacção com a família e depois gradualmente com os seus pares. Na escola ela tem oportunidade de conhecer outros papéis, uma vez que, se cada criança tem uma “história”distinta, estas vão ter comportamentos também diferentes (Papalia, Olds & Feldman, 2001). Howew & Mercer (2007) consideram a sala de aula um meio importante para o desenvolvimento socio-moral uma vez que, neste espaço a criança colabora com outras em diversas atividades, contrapondo-se à visão tradicional que considera a conversa e a interação social perturbadoras e irrelevantes no seu desenvolvimento. A aprendizagem em grupo está cada vez mais valorizada pois esta permite às crianças trabalhar por objetivos comuns, explicar as suas ideias e expor os seus pontos de vista até chegarem a um consenso. Para Lawrence Kohlberg a moralidade centra-se essencialmente no sentido de justiça em detrimento do respeito pelas normas sociais e morais (Lourenço, 1998). Segundo a abordagem cognitivo-desenvolvimentista, a moralidade desenvolve-se na criança quando ela cresce e começa a interagir com os adultos e com os seus pares e a distinguir entre o bem e o mal, o justo e o injusto, os direitos e os deveres, conseguindo, assim, demonstrar os seus pontos de vista perante um problema moral (Lourenço, 2002). De acordo com esta abordagem a criança pode-se desenvolver não pelo sentido da culpa e de outras emoções morais mas sim por comportamentos corretos nas suas atmosferas morais. Os ambientes em que vive são importantes para se descentralizar da sociedade, de modo a colocar-se nos pontos de vista do outro e assim desenvolver o seu raciocínio moral (Lourenço,1995;Power, Higgins& Kohlberg, 1989, referido por Lourenço, 2002). A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 83 Kohlberg (1984) assentou a construção do seu modelo nas respostas dos sujeitos a dilemas morais por ele criados, defendendo que o desenvolvimento moral ocorre ao longo de 3 níveis, de acordo com as características sintetizadas no quadro que a seguir apresentamos. Tabela 1- Níveis e estádios de raciocínio moral segundo Kohlberg (1984) - Retirado integralmente de Lourenço (2002, p.76) Nível Estádio Orientação Perspetiva sócio – moral Pré - Convencional 1 2 Castigo e Obediência Troca de interesses Egocêntrica Instrumental e de segunda pessoa Convencional 3 4 Bom menino e aprovação social Lei e ordem Racional e de terceira pessoa Legal e de um outro generalizado Pós – Convencional 5 6 Maior bem do maior número Princípios éticos Relativista e de um outro qualquer De um outro moral, racional e universal Considerando o nível etário das crianças envolvidas no presente estudo, segue-se, de um modo mais pormenorizado, a caracterização dos três primeiros estádios identificados por Kohlberg, referindo as suas características e o que os distingue. Nível I: Moralidade pré – convencional (4 a 10 anos) – Neste nível as crianças atuam consoante o seu meio externo, agindo de forma a receber recompensas ou a evitar castigos (Papalia, Olds & Feldman, 2007). 1º Estádio - orientação para a punição e a obediência. As crianças obedecem às regras para evitar castigos aceitando a vontade dos outros e das autoridades (Lourenço, 2002). Neste estádio as crianças ignoram os motivos de uma ação e concentram-se na sua forma física ou nas consequências que podem sofrer fisicamente (Papalia, Olds & Feldman, 2007) e por isso, predominam nesta fase, “ideias de castigo automático, responsabilidade objetiva, sanções expiatórias e justiça imanente” (Lourenço, 2002, p.77). 2º Estádio - Interesses e trocas instrumentais. A criança aceita as regras por interesse pessoal (Papalia, Olds & Feldman, 2007). Ela considera que uma ação é positiva se tiver de acordo com as suas necessidades ou de outro semelhante a ela que atua por interesses e favores (Lourenço, 2002). Este estádio rege-se por uma orientação moral pragmática, hedonista e egoísta (Lourenço, 2002). Tal como o estádio 1 também este lembra a moralidade heterónoma de Piaget. Mas, no estádio 2 a criança pode conter dois pontos de vista, envolvendo “mais ações externas do que sentimentos internos, e considerados em sucessão (farei mal a quem me fizer mal; e bem a quem me fizer bem), não simultaneamente (não me vingo de quem me faz mal porque também não gosto que se vinguem de mim quando procedo de modo menos correcto)” (Lourenço, 2002, p.78). Nível II: Moralidade Convencional (10 a 13 anos) – Os indivíduos preocupam-se em serem corretos nos seus atos e em manter a ordem social (Papalia, Olds & Feldman, 2007), ou seja, assumem-se como pertencentes a uma sociedade e por isso todos os seus atos têm em vista o ponto de vista dos outros (Lourenço, 2002) 3º Estádio -Afeto e aprovação interpessoal. As crianças querem agradar e ajudar os outros, sabem julgar intenções e desenvolvem as suas próprias ideias do que é uma boa pessoa. A criança colocase na “pele” do outro fazendo de tudo para que resolva os problemas não de modo individualista como acontecia no estádio anterior, mas sim de modo, a que todos se sintam bem ao que Kohlberg 84 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI chamou regra de ouro (Lourenço, 2002). Avaliam uma ação de acordo com o motivo que há por de trás dela ou segundo a pessoa que a pratica e também levam em consideração as circunstâncias (Papalia, Olds & Feldman, 2007). 2. A importância das histórias infantis no (des) envolvimento das crianças Vários investigadores têm destacado o papel da literatura infantil no desenvolvimento da criança permitindo-lhe o acesso a diferentes realidades, sendo, ao mesmo tempo, um suporte na construção da sua identidade e no desenvolvimento socio-moral. Segundo Saraiva (2001, referido por Rodrigues & Oliveira, 2009), a literatura infantil permite a auto compreensão, o estabelecimento de relações interpessoais, a integração no meio social e a consciencialização de si e da realidade, além de promover o desenvolvimento das competências sociocognitivas. Bastos (1999) partilha também a opinião que os livros infantis permitem à criança o enriquecimento da sua formação intelectual, da sensibilidade, da reflexão e da estruturação da imaginação. Assim sendo, é necessário destacar a importância da literatura infantil, pois esta poderá permitir, através de discussões dirigidas, o desenvolvimento da criança, nomeadamente o seu desenvolvimento social e das competências de interação social (Rodrigues & Oliveira, 2009). Teglasi & Rothman (2001 referido por Rodrigues & Oliveira, 2009) referem seis perguntas que podem ser utilizadas na exploração dos livros com o objetivo de promover o desenvolvimento social: O que está acontecer?; O que é que as personagens estão a pensar e a sentir?; Quais são as intenções e metas das personagens?; Como as personagens executam e monitorizam o seu comportamento? e Quais as lições aprendidas? No que diz respeito às crianças com necessidades educativas especiais, os mesmos autores referem que as narrativas podem ser utilizadas como meio para ajudar a processar a informação, baseando-se nas suas experiências prévias, como também em informações de situações atuais (Teglasi & Rothman, 2001 citado por Rodrigues & Oliveira, 2009). Reforçando as ideias anteriormente referidas, Bettelheim (2004, p.20) refere que uma história infantil: “Enquanto diverte a criança, esclarece sobre ci mesma, e favorece o desenvolvimento da sua personalidade. Oferece significado em tantos níveis diferentes e enriquece a existência da criança de tantos modos que nenhum livro pode fazer justiça à multidão e diversidade de contribuições que esses contos dão à vida da criança.” Considerando esta citação podemos referir que o livro além de poder ser considerado um objeto lúdico é, também, um meio de crescimento individual, uma vez que ajuda a criança a compreender diversas situações que ocorrem ao seu redor com as quais precisa de aprender a lidar. Tal como refere Margaret Mead (1968, citado por Coelho, 2008, p.215), “Chegamos ao ponto em que temos de educar as pessoas naquilo em que ninguém sabia ontem, e prepará-las para aquilo que ninguém sabe ainda, mas que terão que saber amanhã”. Para Coelho (2008) a leitura de histórias influi em todos os aspetos da educação da criança: na afetividade: desperta a sensibilidade e o amor à leitura; na compreensão: desenvolve o automatismo da leitura rápida e a compreensão do texto; na inteligência: desenvolve a aprendizagem de termos e conceitos e a aprendizagem intelectual. Pires & Morgado (2010) referem outros contributos da literatura infantil que passam pela edu- A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 85 cação/formação da criança enquanto tecnologia normalizadora, alfabetizadora e humanista; os seus textos podem também promover o caráter ao nível intelectual do leitor além das capacidades de empatia, formação política, estética e ética. Em relação à última, as temáticas podem ser várias como a educação, a religião, a família. Além do ouvinte (criança), é também essencial procurar saber a importância daquele que conta as histórias, o pedagogo. Para Abramovich (1997, referido por Sales, 2011) o professor necessita de adotar alguns procedimentos enquanto lê para que a mensagem da história seja transmitida, como a modificação de voz por exemplo (sussurrar quando o momento leva o personagem a falar baixinho, ou quando está a pensar em alguma coisa extremamente importante para a condução do foco narrativo). Também nos momentos de dúvida e de reflexão a entoação de voz deve acompanhar o movimento da história, assim como é importante o uso das onomatopeias, os espantos, o susto, a expressão facial que acompanha o relato; tudo deve ser feito para levar a criança ao encontro da magia que está expressa. 3. Procedimentos metodológicos A presente investigação comporta um estudo descritivo que se organiza como um estudo de caso em que a investigadora fez uso da observação participante. Este tipo de observação permitiulhe estar diretamente envolvida no contexto e intervir junto do grupo alvo a ser observado (Carmo & Ferreira, 2008), procedimento que foi considerado o mais adequado à análise do problema subjacente ao estudo, bem como à prossecução dos seus objetivos. Como foi referido na introdução, os objetivos que nortearam a nossa intervenção foram os seguintes: • Conhecer as conceções das crianças com e sem Necessidades Educativas Especiais (NEE) relativamente à sua (com)vivência com a diferença. • Analisar o contributo das histórias infantis na construção das conceções das crianças acerca da diferença, ou mais concretamente, das conceções das crianças em relação à interacção com a diferença, em contexto escolar. Apesar de todas as sessões ficarem registadas em vídeo, a investigadora utilizou como auxiliar de registo e organização de dados notas de campo onde anotou detalhadamente tudo o que ocorreu nas sessões. Este registo foi feito em suporte informático, que segundo Carmo & Ferreira, (2008) tem vantagens, pois, proporciona a recuperação fácil do texto construído, permite uma maior segurança e organização do mesmo e por fim permite pesquisar de forma mais rápida a informação anotada através do processador de texto. Relativamente aos instrumentos utilizados, optou-se pelo teste sociométrico, numa primeira e última sessão. Segundo Moreno (1962, citado por Knappe & Barbera, 1997, p.92) este instrumento “serve para medir a importância da organização dos grupos sociais. Consiste expressamente em pedir que alguém escolha, no grupo a que pertence, ou ao que poderia pertencer, os indivíduos que gostaria de ter como companheiros”. A intervenção que realizamos junto das crianças foi dividida em dez sessões em que a organização se centrou na exploração de um livro infantil e nos finais das histórias construídas pelas crianças. Seis sessões foram realizadas em grupo e quatro foram individuais, mas todas elas tiveram o propósito de analisar as intervenções e respostas dos alunos no que diz respeito à aceitação da diferença do outro, para uma posterior análise e conclusão. Assim sendo, a partir dos finais dados pelas crianças e das respostas às questões colocadas pela investigadora foi possível identificar a conceção das mesmas perante a diferença e o envolvimento com esta. 86 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI Os livros selecionados - A Estrelinha Pálida (Seromenho, 2011), A Menina Gigante (Marmelo & Marmelo, 2003) e “O aquário” (Mésseder, 2010) - foram previamente analisados, pois todos eles teriam de transmitir a mensagem “saber viver com a diferença”, para além de terem que cumprir o critério de adequação ao nível etário e desenvolvimental das crianças da amostra. Na quinta sessão os alunos leram os finais das histórias que inventaram. Posteriormente, a investigadora fez algumas perguntas acerca dos finais escritos para esclarecer algumas dúvidas e para ajudar à interpretação dos mesmos, de forma também a perceber o porquê da escolha daquele final. Seguidamente, cada um dos alunos disse qual foi, para ele, o final da história preferido, referindo o porquê da sua eleição. Na sessão seguinte, os alunos, foram, novamente, sujeitos a um encontro individual com a investigadora. Esta colocou questões de modo a que o aluno se colocasse “na pele” das personagens, para que ele referisse quais as atitudes que tomaria em determinadas situações ocorridas na história. As sessões realizadas permitiram promover, ainda que indiretamente, o desenvolvimento sócio – moral. Durante as atividades propostas proporcionámos às crianças a oportunidade de descentração social, uma vez que para concretizarem as tarefas sugeridas e responder às questões levantas eram “obrigadas” a colocarem-se no ponto de vista do outro. 4. Amostra A amostra integrou seis crianças, três crianças ditas normais e três crianças com necessidades educativas especiais, apresentando dificuldades de aprendizagem. Todos os alunos frequentavam o 3º ano de escolaridade. Esta amostra era constituída por três elementos do sexo masculino que vamos identificar com nomes fictícios Daniel, Lucas, Rui e três crianças do sexo feminino, Margarida, Joana e Eva. Houve necessidade de selecionar uma aluna (Joana) integrada numa turma diferente, pois não existiam três crianças com NEE pertencentes à mesma turma. Contudo, evidenciamos que esta criança tem apoio ao estudo com as outras duas crianças com NEE (Daniel e Eva). 5. Apresentação e Análise de Resultados No que respeita aos resultados obtidos junto da nossa amostra nos dois momentos de aplicação do teste sociométrico verificamos que os alunos sem NEE não tendem a selecionar os alunos com NEE como parceiros para diferentes actividades. Pensamos que o processo de identificação está na base da construção de relações de proximidade e de cumplicidade inerentes à partilha e à interação social. Nesse sentido, a identificação de características diferenciadoras em crianças com NEE, pode estar na base dos resultados encontrados que não indiciam alterações nas preferências seletivas das crianças entre a primeira e a última sessão. O fato de não estarem integrados na mesma turma também pode ter influenciado o menor número de vezes que aluna Joana foi selecionada, pois se uma criança não conhece bem a outra não tem tendência a escolhe-la para realizar uma atividade. Se não há uma ligação próxima que permita o conhecimento da mesma, ao escolhê-la não sabe o que pode esperar dela e se lhe trará boas influências. Se o presente estudo permitiu evidenciar que as atividades de exploração dos livros selecionados não contribuiu para a modificação das escolhas relacionais dos alunos, evidenciou, no entanto, a sua importância para a análise das conceções que as crianças tinham acerca da diferença, a partir da A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 87 atividade escrita e das várias conversas, individuais e em grupo. Destacamos o caso da aluna Margarida pelo facto de esta aluna revelar um bom desenvolvimento cognitivo, evidenciado nas atividades realizadas durante o estudo e nas suas manifestações nas sessões individuais e em grupo (Anexo A). Demonstrou ser uma criança capaz de lidar com um outro ser diferente, interagir com ele e estimular a aceitação e integração do mesmo, principalmente através do diálogo. Essas características terão contribuído para ser a criança mais escolhida como parceiro nas diferentes atividades no teste sociométrico. Pudemos também apurar através das observações realizadas, que esta aluna é querida pelos colegas, mostrando em todas as sessões (coletivas e individuais) uma atitude compenetrada, meiga, compreensiva e responsável. Verificámos também que esta aluna demonstra um desenvolvimento moral correspondente à sua idade mas acima da generalidade das outras crianças da amostra. A criança na exploração do livro O aquário faz referência à importância de fazer bem ao “outro” pois se assim não for podem existir castigos. Menciona ainda que “quando fazemos o mal recebemos o mal e quando fazemos o bem recebemos o bem” (Anexo A). Como podemos verificar, as respostas da aluna vão ao encontro das características que Kohlberg considerava serem próprias do Nível I – moralidade pré convencional, onde ocorrem dois estádios (orientação para a punição e a obediência; interesses e trocas instrumentais), manifestando, no entanto e em alguns momentos, comportamentos característicos do início do nível II Moralidade – Convencional, pois, como já foi referido, a aluna assume uma preocupação pelo outro e pelo seu bem-estar. Verificámos que a criança Eva, sendo uma das crianças com NEE, é a aluna que dá respostas mais discriminatórias acerca da diferença, como foi no caso da terceira questão acerca da história A Menina Gigante em que diz que se fosse colega desta personagem iria gozar com ela. Também no caso da terceira questão da história O aquário, a aluna menciona que se fosse um dos peixinhos azuis não deixava comer o peixinho vermelho porque este era egoísta pois só queria a comida para ele. Destacamos que, contrariamente à Margarida, a Eva revela algumas dificuldades de integração e relacionamento com os colegas de turma associados às suas dificuldades de aprendizagem. Estes dois casos, merecedores de uma análise mais detalhada e profunda não contemplada no presente estudo, permitem-nos reforçar a relevância da perspetiva socio-construtivista na compreensão da relação entre o desenvolvimento cognitivo e o desenvolvimento socio-moral. Quando, na última entrevista individual, perguntámos as características que as personagens dos livros abordados tinham em comum, todos os alunos focaram a discriminação que estas sentiam e que por isso não tinham amigos. Propondo que pensassem no que poderia acontecer se existisse um encontro entre as três personagens, os alunos Lucas, Joana, Eva e Daniel referiram que estes podiam juntar-se e serem amigos. Podemos referir que para estes alunos as três personagens juntas podiam combater a discriminação, formando um elo de amizade entre elas, transmitindo assim a mensagem “A união faz a força”. A Margarida, mais uma vez, propõe o recurso ao diálogo e à comunicação, bem como o direito da igualdade entre todos. Para o Rui as personagens “podiam vencer” consciencializando os outros que todos possuem defeitos, através de um póster. Quando questionada a moral dos livros, as alunas Joana e Eva tiveram mais dificuldade em responder à questão pois não compreenderam o que se pretendia. Os restantes alunos não tiveram dificuldade em responder, referindo que devemos ser amigos de todos, independentemente das suas diferenças. Deste modo, concluímos que entenderam a mensagem que as histórias utilizadas pretendiam transmitir. Os alunos Rui, Lucas e Margarida, nas respostas dadas quanto à moralidade da história pro- 88 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI nunciam, respetivamente, a expressão “Devemos ser (…)”, “Devemos ser (…)”, “Devíamos perceber(…)”, permitindo-nos aferir que para estes o dever incide sobre “direitos e deveres, justiça e bem – estar dos outros” (Lourenço, 2002). Um dos objetivos que vimos cumpridos neste trabalho foi a possibilidade que as atividades propostas tiveram em promover a competência das crianças em se descentrarem do seu ponto de vista. Todas elas tiveram a capacidade de “saírem de si” e colocarem-se no lugar do outro (discriminado ou discriminatório). Neste sentido, focamos a resposta da aluna Margarida no que diz respeito à moralidade das histórias trabalhadas, em que a mesma exterioriza o que se pode sentir quando se é discriminado “Aprendi que se nós formos desprezados não ficamos bem, ficamos com uma dor no coração”. 6. Considerações Finais Concluindo o presente trabalho de projeto podemos referir que aceitar o desafio de analisar o contributo da literatura infantil na formação de representações e conceções sobre o mundo e, particularmente, sobre a diversidade e a diferença do ser humano, se organizou como uma tarefa complexa mas potenciadora de estratégias e atividades importantes na promoção de interações entre crianças com e sem necessidades educativas especiais. Como referem Leite & Rodrigues (2000), a literatura infantil é um instrumento potencialmente enriquecedor porque “pode ajudar a resolver dilemas emocionais, estimula o desenvolvimento do imaginário, de competências de literacia e de reflexão crítica sobre questões sociais e pessoais entre outras” (p.25). Na organização da pesquisa e de forma a tentar dar resposta aos objetivos delineados, foi fundamental conceber estratégias sócio – construtivistas, nomeadamente a criação de debates e a oportunidade de promover aprendizagens em grupo, permitir o confronto das várias perspetivas individuais, desafiar a construção de possíveis finais das histórias, promover a compreensão de múltiplas possibilidades de analisar e vivenciar os conflitos individuais, bem como relacionar as competências cognitivas com as competências relacionais e sociais. Um dos objetivos que vimos cumpridos neste trabalho foi a possibilidade que as atividades propostas tiveram em promover a competência das crianças em se descentrarem do seu ponto de vista. Todas elas tiveram a capacidade de “saírem de si” e colocarem-se no lugar do outro (discriminado ou discriminatório). Através dos livros, além de podermos analisar as conceções das crianças no que diz respeito à diferença, verificámos que através das atividades exploratórias dos mesmos permitimos “um recreio” que lhe estimulou a imaginação (Chaves, 1949 citado por Pires s/d). As crianças, nomeadamente as sem NEE, na escrita dos finais não se limitaram a dar um final à personagem, estas tiveram o cuidado de ir mais além, dando vida a outras personagens humanas ou animais, criando outros espaços e fantasiando situações criativas. Aferimos que as crianças quando colocadas no lugar de uma personagem discriminada optariam pelo isolamento, acatando a decisão de quem discrimina, ou então, iam para junto de outros também discriminados pois seria mais fácil conviver e não eram julgados. Neste sentido, a partir da análise da escrita das histórias e das entrevistas individuais podemos referir que apesar de algumas crianças terem demonstrado mais dificuldades concetuais que outras, todas direcionam as personagens discriminadas para junto de outras também com limitações (Anexo A). Por último, é importante referir que o estudo descrito apresenta limitações inerentes às condições reais da sua operacionalização mas que evidenciam o seu carácter exploratório e descritivo. A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 89 Uma das grandes limitações deste estudo encontra-se na sua reduzida amostra de seis alunos. Assim sendo, as conclusões circunscrevem-se às crianças observadas. Por outro lado, tal como já tinha sido referido, de entre as seis crianças que servem de amostra uma delas está inserida numa turma diferente. Este fato pode ter introduzido algum enviesamento nos resultados, nomeadamente os obtidos no teste sociométrico. O número de livros explorados, associado ao tempo disponível para a implementação das atividades, também podem ser apontados como limitações do estudo, pois sabemos que a construção/ mudança de conceções, bem como o estabelecimento de relações interpessoais positivas são processos complexos e associados a uma multiplicidade de variáveis pessoais e contextuais. Para que a consciencialização perante a diferença seja promovida e para que todos se sintam integrados num determinado meio não basta estarem juntos numa escola mas sim construir uma escola para todos. Referências Bibliográficas Bastos, G. (1999). Literatura Infantil e Juvenil. Lisboa: Universidade Aberta. Bettelheim, B. (2004). A psicanálise dos contos de fadas. Lisboa: Bertrand Editora. Carmo H., Ferreira. M. (2008). Metodologia da Investigação: Guia para a auto-aprendizagem. Lisboa: Universidade Aberta. Carvalho, A. (Org, 1999). Interações pró-sociais entre crianças e seus contextos de emergência. (capítulo 4). 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A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI Anexo A 91 92 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 93 94 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 95 LIGAÇÕES CRIANÇA/ESPAÇO EM EDUCAÇÃO PRÉ-ESCOLAR PARA PROMOVER APRENDIZAGENS SIGNIFICATIVAS Miguel Castro ([email protected]) Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Portalegre Resumo No artigo defende-se a importância de proporcionar experiências significativas para a apropriação de conhecimentos, sendo a noção de “espaço” apreendida através de jogos e atividades que envolvam a criança e o contexto espacial onde decorrem. O ambiente onde a criança se move ganha significado pela forma positiva como ela se pode relacionar com o espaço. Criando-se um contexto propício para a realização de experiências de aprendizagem, “humaniza-se” o espaço, deixando este de ser apenas o suporte estrutural para a atividade e, passando a constituir-se como lugar com significado no universo fantástico das crianças. Apresentam-se as experiências levadas a cabo em Jardins-de-infância da cidade de Portalegre, onde através da preparação das crianças para o ambiente que iriam conhecer, e de atividades lúdicas muito concretas, que decorreram no local, observou-se ter sido facilitada a apropriação do espaço, i. e., a Geografia, com base na empatia e na relação que as crianças estabeleceram com o novo ambiente. Concluímos que as condições de aprendizagem e disponibilidade das crianças para novos conhecimentos, aumenta em espaços com significado para a criança e com os quais ela estabelece uma relação afetiva. Palavras-chave: Apropriação do espaço; Educação Pré-escolar; Atividades Lúdicas; Geografia 96 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI Abstract This Paper is about the importance of providing meaningful experiences for the children to transmit them knowledge and the general notion of “space” and geography. This can occur through games and activities involving the child in the spatial context where the activities happen. The environment where the child moves becomes meaningful in a positive way, so that they can relate with the space. Creating an enabling environment for the performance of learning experiences “humanizes” the space, thus leading them to include it in a significant way in their own fantastic universe. We present experiments carried out in Portalegre’s kindergartens. Through groundwork about the places they would visit, and recreational and very concrete activities, which took place on the sites, the children were able to claim the space much more easily, based on the empathy they established with the new places. We conclude that the learning conditions and children’s availability to absorb knowledge increases in spaces with meaning and to which they have a friendly connection. Keywords: Appropriation of space; Kindergarten; Playful activities; Geography. I – Introdução O suporte especial onde nos movemos está de tal forma presente nas nossas vidas que tendemos a não o valorizar, nem a responsabilizar o contexto por aspetos ou fenómenos de comportamento que atribuímos a outros fatores, de ordem social, económica, política ou cultural. A organização do território, dos centros urbanos ou de fenómenos sociais localizados tendem a ser explicados por diversas ciências, sendo que a Geografia nem sempre é realçada como área de conhecimento fundamental em etapas precoces da educação. A atenção ao espaço, à qualidade da organização, à sua construção social e vivência individual ou coletiva estão diretamente ligadas à qualidade de vida de que usufruímos. Assim, a atenção aos aspetos geográficos deve ser iniciada o mais cedo possível com o objetivo de formarmos cidadãos ativos e interativos relativamente ao suporte espacial onde se inserem. Para tal, teremos que proporcionar experiências e vivências significativas para que o espaço adquira importância, simbolismo e pertença à formação identitária. O espaço é vivido, e é através da sua vivência que este adquire significado, “reducing the world to a spaceless abstration…[has] very lilited utiliy” (Hubbard et al; 2002, pp. 39) A interiorização do espaço, a nível pessoal e coletivo, é adquirida a partir das experiências significativas que nele vivenciamos. Positiva ou negativamente, as experiências que vivemos ficam ligadas ao espaço onde ocorreram. O conhecimento do espaço, da realidade geográfica, ficam sempre incompletos sem o contacto físico, concreto. Conhecer uma cidade não passa, apenas, por realizar os passeios turísticos, visitar os monumentos, ou participar em outras atrações. A luz, o cheiro, os sons e fundamentalmente as experiências e as vivências, positivas ou negativas, que ocorrem a cada indivíduo num espaço específico, são os verdadeiros responsáveis por esse conhecimento. Perante uma praça pública, cada um de nós pode ter uma experiência sensorial e humana diferente, que nos liga aos espaço de forma particular, o modo como cada um se sente, o que come, o espetáculo a que assiste, o assalto que sofreu, os sons que registou… auxiliam a construir a memória do momento. Para a criança, a Geografia e o espaço, sendo realidades concretas, afiguram-se como abstrações. A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 97 Se o pai está em Paris e a mãe em Berlim, a criança sabe apenas que estão longe. As distâncias absolutas são irrelevantes. O pai não está mais perto do que a mãe, nem o contrário. A distância é completamente incompreensível; ou seja, uma realidade abstrata. O espaço é uma noção complexa e o seu conhecimento só é possível se a criança o for conhecendo e se for apercebendo da sua importância através de vivências e experiências integradoras, que posteriormente vão tornando a noção de espaço inteligível. Ela conhece o espaço pela atividade física que lhe permite compreender a função, a história, os aspetos naturais e sociais presentes numa determinada área ou local. Embora concreta, a realidade geográfica pode constituir-se como abstrata para a criança em idade pré-escolar, pela dimensão do espaço e a incapacidade de entender uma realidade fora do seu “Eu”. No entanto, a experienciação de algo significativo que nele ocorra, conduz a criança a estabelecer uma empatia com o local e a conseguir entendê-lo. Para tal, necessita de o vivenciar, de sentir alguma emoção que a leve a apropriar-se do espaço, tal como se apropria e se integra no enredo de uma história e se identifica com as personagens. Esta perspetiva está bem espelhada em vários trabalhos de Kieran Egan (1990, 1992, 1994) onde as narrativas estruturadas de acordo com o estádio de desenvolvimento cognitivo das crianças são utilizadas para transmitir conceitos de tempo histórico. O que permite esta perceção é a forma como a criança se envolve e se identifica com os personagens e se integra na ação. Também Yi-Fu-Tuan (1983). Essencialmente nos capítulos 3 e 10 do seu livro “Espaço e Lugar”, marca a necessidade de vivências e experienciação pelos humanos em geral e também pelas crianças para adquirimos a noção de espaço, e direta ou indiretamente da Geografia. Ao interiorizar o local onde uma experiência significativa que lhe provocou emoções (positivas) ocorreu, a criança entende-o, compreende-o e fica com maior conhecimento sobre o que nele decorre ou decorria. O que apresentamos é o relato de uma experiência de integração de aspetos cognitivos e motores através da atividade de exploração do espaço. Envolveu-se a criança, no sentido de tornar concreto o aparentemente ou realmente abstrato, indo ao encontro do imaginário infantil, e apresentando conceitos passíveis de serem interiorizados pelas crianças quando realizadas atividades em contextos significativos e com uma componente lúdica. Esta abordagem consubstanciou as Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar, bem como as Metas Curriculares definidas pela Tutela, que se mostrou eficaz e com uma avaliação positiva e evidente sucesso II – Contextualização Teórica Como atrás referimos, defendemos que o espaço, principalmente, quando estamos a trabalhar com classes etárias baixas se conhece pela sua experienciação e vivência. Yi-Fu Tuan (1980; 1983) em Topofilia, mas essencialmente em Espaço e Lugar advoga que o conhecimento do espaço é pessoal e advém da vivência de experiências que ocorrem nos locais e em contextos culturais específicos que influenciam a forma como conhecemos e nos apropriamos das geografias que nos envolvem. Os geógrafos ligados às correntes culturalistas não olham o espaço como uma construção social que provém da forma como se organiza a sociedade e como esta o constrói e produz. Não são as relações de produção ou a estrutura da sociedade que nos dão a conhecer o espaço mas sim o que vamos apreendendo do nosso ambiente próximo pela experiência individual, embora de alguma forma filtrada pelo contexto cultural a que pertencemos. A população infantil ainda não possui a capacidade reflexiva para conhecer o espaço senão pela experimentação e contacto físico com o mesmo. Em idade pré-escolar a criança é essencialmente 98 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI concreta. As teorias do desenvolvimento cognitivo que informam a educação privilegiam os aspetos lógico-dedutivos, capacidade de compreensão dos fenómenos e manipulação de conceitos concretos e abstratos. Piaget (1968) enfatiza a capacidade lógico-matemática e a capacidade de abstração estabelecendo, ainda que com flexibilidade, grupos etários para compreender e manipular conceitos, mais abstratos ou mais concretos. Segundo este autor, apenas a partir dos sete anos de idade a criança começa a conseguir manipular conceitos mais abstratos. Não pondo em causa Piaget, Kieran Egan (1992) advoga que a criança, desde cedo, consegue manipular conceitos abstratos e interpretar a realidade, se esta lhe for introduzida de acordo com a sua “cosmologia e cosmogonia mítica“. Por exemplo, o bem e o mal ou o amor e o ódio, sendo conceitos altamente abstratos, não são impedimento para que a criança os manipule ou os compreenda. Nos “Estádios da Compreensão Histórica” (1990) e principalmente no “Desenvolvimento Educacional” (1992), Egan define quatro estádios do desenvolvimento cognitivo: o Mítico (4/5 anos aos 9/10), o Romântico (8/9 anos aos 14/15); o Filosófico (14/15 anos aos 19/20) e por último o Irónico. O primeiro corresponde à etapa pré-escolar e é aquele que nos interessa nesta experiência que concretizámos. Para que a criança esteja desperta e com capacidade de integrar conhecimentos no seu universo teremos que abordá-la dentro das características do seu estádio cognitivo (o Mítico), que, segundo Egan, possui quatro caraterísticas fundamentais. A primeira caraterística do pensamento “mítico” é a sua necessidade de segurança intelectual; se apresentarmos a realidade de forma mítica esta estará ao alcance da compreensão infantil. O Mito fornece “explicações exaustivas do porquê de as coisas serem como são, e fixando o significado dos acontecimentos através da sua relação com modelos sagrados” (Egan, 1992, p.23). A falta de sentido da diversidade espácio-temporal e da causalidade lógica dentro do contexto espacial - “o facto de as crianças não possuírem o sentido da diversidade das coisas pode ser explicado simplesmente como falta de experiência e de conhecimento da mudança e da causalidade à escala histórica e num determinado espaço geográfico. (…) A terceira marca do pensamento infantil “é a falta de um sentido do mundo como algo de autónomo e objetivo. (…) O mundo da criança está cheio de entidades que adquirem significado através das coisas que a criança conhece melhor: o amor, o ódio, a alegria, o medo, o bem, o mal. (idem, p. 24). A última caraterística, por ventura a que melhor explica o pensamento infantil na sua interpretação da realidade, é a articulação do real a partir de oposições binárias bem vincadas – “as crianças começam a dar sentido às coisas em termos binários” (idem, p. 25). É a partir destes dois quadros teóricos que estruturamos a nossa experiência de introduzir conceitos geográficos, espaciais, e igualmente históricos. Por um lado, as atividades devem proporcionar um conhecimento e apropriação do espaço pela sua vivência e experimentação; por outro, as atividades deverão também estar estruturadas de acordo com as caraterísticas do estádio de desenvolvimento cognitivo das crianças, o Mítico, segundo Kieran Egan. III - Contextualização metodológica No âmbito da unidade curricular de História e Geografia para a Infância, abordámos com os alunos a forma de introduzir conceitos geográficos. Concluímos que as atividades lúdicas que estimulem o desenvolvimento integral, motor e cognitivo, seriam a forma mais eficaz de conseguir o objetivo principal desta etapa do processo educativo – o desenvolvimento harmonioso da criança. O conhecimento e apropriação do espaço pela criança só são atingidos através da vivência de A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 99 experiências significativas que ocorram no local. Se esse local for um contexto de aprendizagem tornado explícito, conseguimos que a criança o entenda e o interiorize, bem como as aprendizagens que nele decorram deixem uma marca que permita a associação do conceito ao espaço e vice-versa. A abordagem deste projeto foi realizada numa perspetiva de investigação-ação. Este tipo de perspetiva pedagógica permite uma flexibilidade no processo de investigação que se vai adaptando ao decorrer das experiências e permite ajustar o rumo de acordo com as crianças, individual e coletivamente. A investigação-ação “é uma intervenção em pequena escala no funcionamento do mundo real e um exame próximo dos efeitos de tal intervenção” (Máximo-Esteves; 2008, p. 19). O mesmo autor na página seguinte (citando J. Mckerman, 1998) chama a atenção para a flexibilidade desta postura face à intervenção em contexto, geral e particularmente, em educação pré-escolar: “ (…) investigação-ação é um processo reflexivo que carateriza uma investigação numa determinada área problemática cuja prática se deseja aperfeiçoar ou aumentar a sua compreensão pessoal (…) é uma investigação científica sistemática e auto-reflexiva levada a cabo por práticas para melhorar a prática.” Não se pretendia realizar uma investigação extensiva, mas apenas realizar uma experiência encarada como um Caso de Estudo. Pensámos que esta metodologia seria a mais adequada para conseguir testar o nosso objetivo principal: verificar se existe uma maior facilidade de apreensão de conceitos e conteúdos, pela criança, quando apresentados através de jogos que integrem capacidades cognitivas e motoras, num contexto espacial significativo. Embora os resultados não pudessem ser extrapolados, as conclusões permitem apontar caminhos e pistas de reflexão e intervenção em contexto de jardim-de-infância. Também o aperfeiçoamento de práticas específicas relativas à introdução de conceitos geográficos em educação pré-escolar poderiam ser enriquecidos e refletidos. “A investigação qualitativa é uma forma de estudo da sociedade que se centra no modo como as pessoas interpretam e dão sentido às suas experiências e ao mundo em que elas vivem (Vilela, 2009, p.105). Com dois pares pedagógicos (conjunto de duas alunas em estágio), em duas salas de jardinsde-infância de Portalegre, com 21 e 19 crianças respetivamente, prepararam-se dois jogos com conceitos de História, Geografia, coordenação motora e atividade física. A comparação e validação dos resultados foram efetuadas com outros dois grupos de controlo, constituídos por dois pares pedagógicos colocados em outro jardim-de-infância, introduzindo os mesmos conceitos de forma mais tradicional. Os conceitos estavam relacionados com a vida quotidiana no tempo do Império Romano e na Idade Média. Estes temas são tratados com frequência em Portalegre, devido ao património regional muito rico em vestígios destas épocas, em concreto a cidade Romana da Ammaia e a vila de Marvão, com um castelo medieval com potencialidades educativas inesgotáveis. Neste castelo, encenou-se um torneio medieval; na Ammaia, a partir de algumas caraterísticas do próprio espaço, realizou-se um jogo que simulava o apagar de um incêndio numa cidade romana. IV - Apresentação, análise e discussão dos resultados Este projeto pretendeu proporcionar às crianças atividades que as ligassem ao espaço e, concomitantemente, facilitassem a aquisição de conceitos de História e de Geografia (a organização do espaço e as suas funcionalidades) de forma lúdica, e facultando vivências e experiências significativas in loco. Para que tal acontecesse, em equipa com as alunas em Prática Pedagógica envolvidas juntamente com as educadoras responsáveis pelas salas da educação pré-escolar, elaboramos os planos de ação e as estratégias pedagógicas a utilizar desde o início até ao final, num período de 100 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI aproximadamente um mês, onde se tentaria, através do feedback das crianças, da observação da Educadora (que já trabalhava com o grupo desde o ano letivo transato), e dos trabalhos e jogos realizados posteriormente na sala de atividades perceber até que ponto a estratégia tinha tido sucesso. A avaliação baseou-se essencialmente em dados qualitativos. Teve-se em conta a resposta dada pelas crianças quando questionadas sobre os temas em causa, feitas a partir da leitura de histórias que se situavam nas épocas históricas em causa, na facilidade e rapidez na resolução de atividades alusivas aos conceitos apresentados, como ordenar e/ou agrupar cartões representativos de tarefas realizadas nos tempos históricos em causa, ou pequenas dramatizações, avaliando desta forma a eficácia dos resultados da experiência. Previamente, prepararam-se as crianças para os temas. Através de histórias, lendas locais, livros com ilustrações e pequenos excertos de vídeos, sobre as realidades que iriam visitar, incutiu-se o espírito de aventura que as personagens das histórias e dos filmes viviam nessas épocas. Os fortes e corajosos cavaleiros, que se preparavam para as liças e outros jogos de guerra, foram vistos em filmes da Disney - Robin Hood e A Espada era a Lei - e as aventuras de Astérix e Obélix. Esta preparação criou ambiente e expectativa nas crianças, relativamente à visita de estudo aos locais onde, no seu imaginário infantil, tinham ocorrido cenas semelhantes às apresentadas na sala de atividades. A par deste trabalho, as alunas construíram alguns adereços baratos e seguros para a manipulação infantil - roupas e utensílios, cavalos de pau, espadas de plástico e escudos de cartão. O grupo de 40 crianças, com idades compreendidas entre os 4 e 6 anos, acompanhadas por quatro alunas, duas educadoras e duas auxiliares de educação, visitou a cidade da Ammaia, depois de ter realizado uma visita às ruínas, executou o jogo: “Apagar o fogo no tempo dos Romanos”. A excitação das crianças começou logo no vestir dos adereços. Os capacetes de cartão e os fatos feitos com sacos de plástico de grandes dimensões, cintados com uma corda, levaram as crianças a assumir os seus papéis de romanos e outras personagens marcantes que tinham ‘conhecido’ nos filmes apresentados na sala do Jardim de Infância. Separadas em duas filas, a primeira criança de cada grupo estava perto de uma levada de água e a última ao lado de um balde. Todas mantinham o posto (desde a água até ao balde) e cada uma tinha um copo de plástico na mão. O objetivo final era encher o balde e despejá-lo num determinado ponto nas ruínas da cidade, onde ‘ardia’ um suposto fogo. A primeira criança enchia o copo e recebia do colega mais próximo um já vazio. O copo teria que se manter cheio, passando por todas elas, até à última que o despejava no balde. Finda esta tarefa em equipa tinham que transportar o balde para apagar o ’fogo’. No castelo de Marvão, a atividade consistiu na simulação de um torneio. Num dos espaços mais amplos do exterior do castelo dividiram-se as crianças em vários grupos. De espada e escudo, duas crianças posicionavam-se em dois extremos de um terreno marcado. No centro desse espaço, uma outra criança ficava em pé, com argolas penduradas nos braços abertos. O objetivo era retirar as argolas com a espada de plástico, indo a correr de uma extremidade à outra. O primeiro que conseguisse retirar todas as argolas do seu lado, ganhava e passava-se a vez a outro grupo de crianças. Para além de desenvolver a coordenação motora, estes jogos fomentam o espírito de equipa, entreajuda e organização do grupo, bem como o cumprimento de regras, como requisitos imprescindíveis para atingir um objetivo/bem comum. Pela sua vivência, o espaço é apropriado e interiorizado, proporcionando o desenvolvimento de aspetos pedagógicos importantes que se enquadram na forma de estar e pensar da criança. A aprendizagem depende de múltiplos fatores, objetivos e subjetivos. Fatores físicos e espaciais como conforto, qualidade dos materiais pedagógicos, acesso a tecnologias, etc…são fundamentais para o processo educativo. Porém, existem fatores intangíveis sem os quais não se consegue atingir objetivos pedagógicos definidos - afetos, bem-estar consigo mesmo e com o outro, mas também e essencialmente, a relação com o espaço. A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 101 Se a criança cria empatia com o espaço onde se encontra fica mais predisposta a aprender e, fundamentalmente, a falhar nas suas tentativas de aprendizagem, sem se sentir fracassada ou ficar “envergonhada” consigo mesma, de tal forma que não se sinta “à vontade” para experienciar e vivenciar, quer com os seus pares, quer com adultos. Proporcionando experiências facilitadoras do acesso ao conhecimento e apropriação do espaço e possibilitando a maior proximidade com o mesmo, constroem-se quadros facilitadores de aprendizagens e introduzem-se conceitos da Geografia - a observação do ambiente, as funções espaciais e as características físicas e humanas do espaço. Os jogos e atividades ajudam na criação de um espírito de equipa, entreajuda, bem como o cumprimento de regras, como requisitos. Desenvolve-se, concomitantemente, a interdependência, o sentido de grupo, a responsabilidade e a valorização da autoestima, oferecendo à criança oportunidade de ativar um conjunto de competências sociais para a descoberta e aprendizagem. O objetivo final deste projeto foi apetrechar as crianças de dados da História e Geografia, relacionados com os locais. Os resultados desta experiência (por ser única e limitada no seu significado experiencial) não podem ser linearmente extrapoladas para outras realidades e contextos. Apontam, no entanto, caminhos possíveis e permitem reflexões para algumas transformações das práticas pedagógicas no jardim-de-infância, onde a importância do espaço e da Geografia possa passar a ocupar maior relevo na formação das crianças. Os resultados do projeto foram, quanto a nós, muito positivos e encorajadores relativamente à abordagem que levámos a cabo. No entanto, em contexto de educação pré-escolar é sempre difícil quantificá-los e medir com objetividade. Para além deste aspeto, a metodologia de investigação-ação tende a valorizar o qualitativo e muitas vezes intangível, mais do que valores normativos, na prática de educação pré-escolar, a utilização de instrumentos com vista ao alcance de resultados quantificáveis e objetivamente mensuráveis é algo que ainda suscita muitas questões, além das dúvidas que lemos de diferentes escolas de pensamento didático que se debruçam sobre esta classe etária. A avaliação dos resultados foi, desta forma, qualitativa e construída a partir das opiniões das crianças registadas e sistematizadas. Foram foco de atenção dos registos, os conhecimentos sobre as épocas, através de pequenos questionários posteriores e realizados (na sala de atividades) a partir de narrativas que abordavam os temas considerados. Foram também analisados trabalhos de desenho, e resolução de pequenos problemas de ordenação e agrupamento de cartões, bem como “role-plays”. Para além destes dados, a opinião e observação da Educadora, partilhada com as observações das alunas foi um fator de avaliação dos resultados. A comparação com os grupos de controlo permitiu uma validação empírica dos resultados e a sua comparação com as respostas e opiniões dos outros meninos. O desempenho das crianças implicadas evidenciou que o projeto proporcionou não só a aprendizagem e interiorização de conceitos básicos com facilidade e eficazmente, como desenvolveram competências sociais interpares e com os adultos. Resultados positivos? Sem dúvida, mas o empenho das crianças foi Indicador mais saliente. As crianças ‘transportaram-se’ para as épocas, vivendo o espaço e a vida há muito ocorrida naquelas ruínas. V- Considerações finais Nas Orientações Curriculares para a Educação Pré-escolar, o espaço, e portanto a Geografia, apresentam-se como temas acessórios. A Geografia não se individualiza, fica subalternizada ou complementar ao “grande grupo” temático representado pelas Ciências Naturais, ou como “muleta” da História. O exíguo espaço de destaque que lhe resta é para estabelecer alguns conceitos como campo/cidade ou os meios de transporte; mesmo assim, estes conceitos são sempre subor- 102 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI dinados às perspetivas diacrónicas ficando a Geografia com um nível de sensibilização e explicação mínimo e quase irrelevante. Uma das mais eficazes ferramentas para interpretar e compreender as diferentes paisagens e os fenómenos que nela ocorrem é a Geografia. Estamos constantemente a lidar com problemas espaciais, desde os nossos espaços quotidianos (em casa, no trabalho), a espaços mais amplos como as cidades ou países e regiões. A compreensão geográfica dos fenómenos torna a nossa atitude mais interventiva; incentivá-la, desde a mais tenra idade deverá ser um dos objetivos essenciais dos educadores, na formação das crianças próativas e curiosas. Recorrer aos recursos locais, para que progressivamente se possam preparar os alunos para realidades mais vastas, parece evidente e adequado, principalmente quando estamos a lidar com grupos etários baixos. George Benko (1999, p. 145) refere: “Pensar global para agir de forma local”. A ideia é exatamente permitir às nossas crianças a preparação necessária, para que de uma forma prática lidem com a realidade. Através de intervenções didático-pedagógicas que possibilitem aos futuros profissionais da educação utilizar os recursos locais para passar uma mensagem de vivência global através também da educação espacial deve ser um dos objetivos da formação, quer dos Educadores de Infância, quer dos alunos que pretendem seguir este caminho. Educadores tentam vencer os obstáculos e dificuldades burocráticas e económicas que se lhes deparam na sua prática pedagógica, levando as crianças ao encontro das paisagens e locais com interesse pedagógico, que sejam símbolos regionais, locais ou nacionais e, portanto, identitários. Muitas vezes, a visita de estudo não está estruturada e planeada de forma a proporcionar experiências e vivências significativas para as crianças. O que se pretende com a introdução da Geografia em educação pré-escolar é que seja significativa e divertida para as crianças. A principal dimensão presente no projeto foi a ligação ao regional e ao local, enfatizando a visão geográfica. A Geografia é propícia à compreensão de processos diversificados e complexos; estudando o espaço tem necessidade de perceber todas as dimensões que ai se expressam; à instituição escolar cabe potencializar recursos mesmo aqueles que, sendo exteriores, podem e devem ser utilizados nos processos de ensino/aprendizagem. As experiências que vivemos num determinado local vão fazer parte da nossa história pessoal. Estabelecemos relações de afetividade ou repulsa com um espaço onde ocorreram vivências. Viajamos, conhecemos lugares, pessoas, hábitos, costumes, cheiros e ambientes; aqueles que nos ficam impressos correspondem aos espaços onde algo significativo nos surpreendeu, ou qualquer pequeno ou grande facto lhes deu sentido. Criamos empatia com os locais - pertencem-nos, e nós pertencemos-lhes. As sensações levam-nos a gostar dos lugares e, por extensão, da Geografia. A introdução a esta ciência precocemente através de experiências e práticas pedagógicas que conduzam ao gosto pela observação da paisagem e da sua explicação, imprime na memória vivências espaciais e o gosto pelo suporte espacial, isto é, pela Geografia. Se as crianças compreenderem a paisagem, a funcionalidade dos espaços e as razões que levam (ou levaram) à organização de uma determinada forma, terão mais probabilidades de o compreender e de se ligar a ele. Serão, sem dúvida, crianças mais capazes de lidar com a realidade e a novidade; aspeto essencial para a sobrevivência num mundo a onde a inovação e o ritmo da mudança (também, a espacial) se faz a uma velocidade que desafia todos os padrões até hoje conhecidos. Este projeto teve como principal objetivo que as crianças entendessem uma realidade por uma concretização do real. Os jogos nos espaços históricos permitem à criança captar o abstrato, lidando com o concreto. Permitem-lhe perceber a importância do suporte físico para as atividades humanas. Através destas vivências marcantes, as crianças ligam-se afetivamente aos espaços, humanizam-nos, compreendem-nos e apropriam-se deles, transformando-os em lugares com significado e entendendo conceitos e conteúdos essenciais para a sua educação. Cremos, pois, que conseguimos concretizar o nosso objtetivo fulcral. A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI Referências bibliográficas Benko, G. (1999). A Ciência Regional. Oeiras. Celta. Carvalho, G. S. de; Freitas, Mª L. (2010). Metodologia do Estudo do Meio. Porto. Plural Editores. Castro, Miguel (2003). Reflexões sobre a introdução da Geografia na Educação de Infância. Aprender. Nº 27. Portalegre. ESEP. Egan, Kieran (1990). Estádios da Compreensão Histórica. Portalegre. ESEP. Egan, Kieran (1992). O desenvolvimento educacional. Lisboa. D. Quixote. Egan, Kieran (1994). O Uso da Narrativa como Técnica de Ensino. Lisboa. D. Quixote. Ferreira, C. (2000). As finalidades da educação geográfica no Ensino Básico. Lisboa..GeoINova, Nº 1. Hubbard, P.; Kitchin, R.; Bartley, B.; Fuller, D. (2002). Thinking Geographically. London: Continuum. Máximo-Esteves, L. (2008). Visão panorâmica da Investigação-Ação. Porto Editora. Porto. Piaget, Jean (1931). Children’s Philosophies. Worcester. C. Murchinson. Piaget, Jean (1968). Six Psycological Studies. Nova Iorque. Random House. Plans, P. (1996). Didática da Geografia. Porto. Livraria Civilização. Silva, Maria Isabel (1997). Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar. Lisboa. Ministério da Educação. Tuan, Yi-Fu (1980). Topofilia. São Paulo. Difel. Tuan, Yi-Fu (1983). Espaço e lugar: a perspetiva da experiência. São Paulo. Difel. Vilelas,J. (2009). Investigação. O processo de construção do conhecimento. Lisboa. Sílabo. 103 104 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 105 MOTIVAÇÕES NA ORIGEM DO ABANDONO ESCOLAR – ESTUDO DE CASO COM JOVENS SINALIZADOS NA CPCJ DE CASTELO BRANCO Ana Raquel Lourenço ([email protected]) Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Castelo Branco Resumo Em Portugal o ensino obrigatório e gratuito é, simultaneamente, direito e dever das crianças e jovens em idade escolar. Num país em que a escola vive entre a dicotomia da promessa de mobilidade social e democratização, e a massificação e um crescente número de funções/solicitações à instituição escolar, o absentismo/abandono escolar apresenta valores alarmantes que importa perceber. Considerado situação de perigo o absentismo/abandono escolar deve ser sinalizado e alvo de intervenção das Comissões de Proteção de Crianças e Jovens. O objetivo do estudo foi perceber as motivações que estão na origem do absentismo/abandono escolar dos jovens acompanhados na CPCJ de Castelo Branco. Para tal foi utilizada uma amostra de nove jovens e dos respetivos cuidadores acompanhados na CPCJ de Castelo Branco. Foi possível concluir que as razões na génese do absentismo/abandono escolar se prendem não apenas com características dos jovens mas, sobretudo, com as suas características familiares/ contextuais e com a capacidade ou incapacidade da instituição escolar em responder a um público cada vez mais diversificado, em necessidades e aspirações. Palavras-chave: Abandono Escolar; Comissões de Proteção de Crianças e Jovens; Crianças e Jovens; Cuidadores; Intervenção Social 106 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI Abstract In Portugal the compulsory and free education is both a right and duty of children and young people of school age. In a country where school lives the dichotomy between both the promise of social mobility and democratization, and the massification and a growing number of functions / requests to a school, dropout presents alarming values that matter realize. Considered dangerous situation school dropout should be flagged and targeted intervention of Commissions for the Protection of Children and Youth. The project purpose was to understand the motivations underlying school dropout among the students followed by the CPCJ of Castelo Branco. For this we used a sample of nine young people and their carers, followed by the CPCJ of Castelo Branco. It was concluded that the reasons on the genesis of dropout relate not only with the characteristics of young people, but especially with their family and contextual characteristics, and the ability or inability of school to respond to a constantly growing more diverse public in both needs and aspirations. Keywords: School Dropout; Comissões de Proteção de Crianças e Jovens; Children and Young People; Caregivers; Social Intervention. Introdução Ainda que muito já se tenha feito no sentido de combater o Abandono Escolar (AE), este fenómeno continua a marcar gravemente o sistema de ensino português. Na sua origem parece estar a dificuldade de alguns alunos em atribuir um sentido/finalidade à escola e ao trabalho escolar. Esta dificuldade é, segundo autores com Rumberger (2001), motivada pelas características individuais dos alunos, das suas famílias e da escola. Presentemente as sinalizações por abandono (AE) ou absentismo escolar (AEG) representam um grande número de processos acompanhados nas CPCJ. Tratam-se efetivamente de situações que colocam em perigo a educação, formação e pleno desenvolvimento das crianças e jovens, em última análise, por condicionarem as hipóteses futuras e possibilidades de sucesso destes jovens quando adultos a nível pessoal, social e profissional. Neste sentido, importa conhecer melhor as motivações dos alunos para deixar a escola e, também, os seus contextos familiares e socioculturais, de forma a planear intervenções mais adaptativas e eficazes no contexto da CPCJ. O presente estudo centra-se na análise do discurso (através da realização de entrevistas semiestruturadas e da sua análise de conteúdo) dos jovens sinalizados na CPCJ de Castelo Branco (CPCJCB) por AE/AEG e, também, na entrevista a um dos seus cuidadores (pai, mãe ou representante legal). Tem como objetivos: conhecer as razões que levam os jovens alunos do ensino obrigatório sinalizados na CPCJ-CB ao AE/AEG; conhecer o contexto familiar, socioeconómico e cultural dos jovens alunos em AE/AEG; conhecer a conceção dos alunos em AE/AEG sobre a educação e a escola; conhecer a posição da escola face à situação de AE/AEG através do discurso dos alunos em situação de AE/AEG. A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 107 Contextualização Teórica Sobre o AE importa saber que se trata efetivamente do abandono das atividades escolares sem que o aluno tenha completado o percurso escolar obrigatório (…) e/ou atingido a idade legal (…) para o fazer. Benavente et al (1994) citada por Melo (2008, p. 11) Verdadeiramente, implica uma rutura com a escola por parte de alunos que desistem de usufruir do seu direito à escola e educação, consequência de um processo de afastamento da instituição escolar alimentado pelas dificuldades de entendimento e articulação entre uma cultura escolar específica e a realidade dos contextos familiares e socioculturais dos alunos. Em Portugal o AE revela-se em números alarmantes, que alertam para a necessidade de uma mais ampla compreensão e intervenção nesta problemática. O problema do abandono é universal. Muito vincado no nosso país como todos sabemos. Grave porque o nosso país tem desfrutado de condições invejáveis para minorar a sua expressão e os seus efeitos (fundos comunitários para educação, formação e fins sociais, por exemplo), o que revela ineficiência. Mais grave ainda porque é um problema que, mesmo ressalvando que não há determinismos em educação, pode comprometer o desenvolvimento das pessoas, das comunidades e do país. (Canavarro, 2007, p. 69) Benavente et al, (1999), citada por Melo (2008, p.16) defende que esta problemática ocorre repetidamente, no quadro de assimetrias e desigualdades sociais de uma instituição escolar cujos conteúdos e práticas não se adequam à diversidade de quem hoje as frequenta. Tal facto, reforça o argumento de uma escola reprodutora de desigualdades sociais, incapaz de se oferecer de forma homogénea a todos os que a ela têm direito. Uma escola incapaz de promover igualitariamente as oportunidades e a mobilidade social proporcionando situações de exclusão escolar (e exclusão social) e que sintomaticamente acabam, quando não devidamente intervencionadas, em situações de AE. Students drop out of school, schools discharge students. (Riehl, 1999 citado por Rrumberger, 2001, pp. 16-17) Causas e Consequências Para um melhor entendimento do AE importa refletir sobre as causas que estão na sua origem. Yet identifying the causes of dropping out is extremely difficult to do because, like other forms of educational achievement (e.g., test scores), it is influenced by an array of proximal and distal factors related to both the individual student and to the family, school, and community settings in which the student lives. (Rumberger, 2001, p. 9) Analisadas as principais abordagens teóricas acerca do AE, é possível perceber que autores como Benavente (1994), citada por Dias (2010); Mata (2000), citado por Vicêncio et al (2004); ou ainda, L.W. Barber, M.C. McClellan (1987), citados por Dias (2010), identificam para este fenómeno causas sobretudo de ordem: pessoal (características pessoais do aluno – cognitivas, sociais, emocionais, problemas disciplinares, etc.); familiar (contexto socioeconómico e cultural da família, cultura/história escolar da mesma, estilos parentais, vida familiar disfuncional, etc.); e de ordem escolar (dificuldades de integração, inadaptação das famílias e alunos à linguagem especifica da instituição escolar e vice versa, etc.) A maioria dos autores parece concordar que são sobretudo os alunos com dificuldades de integração na escola e com contextos familiares e socioculturais caracterizados por vários tipos de adversidades estruturais, a abandonar precocemente a escola. Sobre o AE importa, ainda, ter em mente que não se trata apenas de um problema da escola e de indivíduos em particular, mas também, de um problema social com consequências para o desenvolvimento do país (tratar-se-ão de indivíduos civicamente menos participativos, assim como, menos qualificados/preparados para um mundo crescentemente mais competitivo). 108 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI Muitos dos estudos disponíveis têm documentado que o AE tem sobretudo consequências ao nível do futuro e do campo de possibilidades dos indivíduos que, por falta de escolarização, se encontra francamente diminuído. Estas contrariedades no futuro prendem-se com uma maior dificuldade de acesso ao mundo do trabalho, acesso a empregos pouco qualificados e precários, geralmente mal remunerados, tornando-se estes indivíduos pessoal e socialmente mais vulneráveis. Numa comunicação da Comissão Europeia ao Parlamento Europeu sobre o combate ao AE (Comissão Europeia, 2011, pp. 3-4) é dado relevo às consequências deste fenómeno. Estas consequências são concebidas a nível individual indo ao encontro do já referido (menor participação social, maior risco de desemprego, desvantagem educativa dos descendentes, etc.), mas também, como consequências a nível económico e da sociedade em geral sendo referidos efeitos a longo prazo no desenvolvimento da sociedade e no crescimento económico, devido a uma menor participação dos cidadãos nos processos democráticos e a um comprometimento da inovação e do crescimento que dependem de uma força de trabalho qualificada. Por outro lado, o fracasso na experiência de escolarização constitui uma memória de frustração que pode vir a influenciar as gerações que se seguirem, na medida em que a má experiência dos pais pode significar um menor envolvimento na escolarização dos filhos. Contextualização Metodológica Como foi referido na introdução, os objetivos que nortearam o estudo foram os seguintes: conhecer as razões que levam os jovens alunos do ensino obrigatório sinalizados na CPCJ-CB ao AE/AEG; conhecer o contexto familiar, socioeconómico e cultural dos jovens alunos em AE/AEG; conhecer a conceção dos alunos em AE/AEG sobre a educação e a escola; conhecer a posição da escola face à situação de AE/AEG através do discurso dos alunos em situação de AE/AEG. De acordo com estes objetivos utiliza-se uma metodologia qualitativa, sendo caraterizado como um Estudo de Caso na medida em que analisa apenas os casos de AE/AEG sinalizados na CPCJ-CB. Para a recolha de dados foi utilizada a entrevista semi-estruturada, realizada a uma amostra intencional composta por nove jovens sinalizados com idades entre os 14 e os 17 anos e nove cuidadores correspondentes a cada jovem (ver tabela 1). Para as entrevistas foi construído um guião de entrevista semidiretiva organizado em sete blocos temáticos (relacionados com os objetivos e as questões de investigação do estudo), referindo objetivos específicos para cada bloco, assim como, propostas de questões e tópicos a abordar e/ou ter em atenção aquando da entrevista. Depois de integralmente transcritas, as entrevistas foram trabalhadas através de análise de conteúdo. Para a análise das entrevistas foram definidas categorias (mistas) e indicadores organizados numa tabela, estabelecidos a priori partindo do guião e da revisão bibliográfica do estudo e a posteriori depois de lidas todas as entrevistas individuais. Desta primeira tabela (Tabela para Análise de Conteúdo) com categorias, questões, subcategorias e indicadores (citados do discurso dos entrevistados) derivou uma segunda tabela (Tabela para Análise de Frequência) com categorias, subcategorias, indicadores (estabelecidos a posteriori – depois de lidas as entrevistas) e a frequência com que tais indicadores se verificam no discurso dos entrevistados (exemplo: x em 9 ou x/9). A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 109 Tabela 1: Constituição da Amostra utilizada. Constituição da Amostra Utilizada Entrevista Idade E1 E2 E3 E4 E5 E6 E7 E8 E9 Género Ano Escolar M F Ensino Regular Outro Cuidador Entrevistado 15X 8.º X 16 X 2.º CEF1 14X 8.º X 17X 10.º X 17 X 1.º CP2 16 X 7.º X 16 X 1.º CP 14 X 7.º X 16 X 11.º X Mãe Mãe Mãe Pai Mãe Mãe Madrasta Mãe Mãe Apresentação, análise e discussão dos resultados Tendo analisado as entrevistas a jovens e cuidadores, importa referir os seguintes aspetos. As entrevistas aos jovens e cuidadores que compõem a amostra do estudo foram iniciadas com o questionamento acerca da pertinência do mesmo. Todos os entrevistados revelam interesse em participar, considerando o estudo interessante, ainda que, não atribuam importância aos seus objetivos. Acerca da conceção de escola e escolarização os jovens referem sobretudo um espaço para o desenvolvimento das aprendizagens e a convivência com colegas, tendendo a encarar a escola como um dever, um trabalho a cumprir. Os cuidadores identificam a escola como algo importante, valorizando sobretudo as aprendizagens e também o contacto social. Também os cuidadores entendem a frequência da escola como uma obrigação. Jovens e cuidadores estabelecem uma forte ligação entre o sentido da escola e o futuro, sobretudo com um valor instrumentalizado da escolarização como forma de garantir um futuro promissor a nível profissional, afirmando todos que o trabalho e esforço nas atividades escolares é fundamental. Acerca da importância atribuída pelos cuidadores à escola/escolarização, todos os jovens afirmam que os cuidadores consideram a frequência da escola fundamental para o seu futuro. Mais uma vez, refletindo uma lógica de dever a cumprir e não de genuína ligação com a escolarização. Assim, pode verificar-se alguma discrepância entre atitudes e comportamentos sendo que, os jovens dizem percecionar a escola como importante assim como dizem ser essa a opinião dos seus cuidadores, mas revelam comportamentos (faltas) contraditórios a esta importância. Sobre a reação dos cuidadores perante os elevados números de faltas e resultados escolares, tanto jovens como cuidadores referem essencialmente a atitude atenta dos cuidadores, as reações negativas perante a descoberta do absentismo e as punições que se seguiram. Referindo alguns cuidadores a ineficácia destas atitudes na medida em que os jovens continuaram a faltar. Acerca do papel preventivo e corretivo da escola foi destacada, a figura essencial do Diretor de Turma no contacto com alunos e cuidadores e o confronto com a sinalização à CPCJ. Os cuidadores referiram, maioritariamente, conversas rápidas em tom de alerta, e a transmissão (pela escola) da situação aos encarregados de educação e à CPCJ. Com os jovens e cuidadores entrevistados foi ainda explorado o futuro, no sentido de aferir acerca das suas expectativas e ambições. Sobre conceções, perspetivas e objetivos de futuro foi dado espaço, sobretudo, à opção pelo ingresso no mercado de trabalho ou pela continuação do 1 2 CEF –Curso de Educação e Formação CP –Curso Profissional 110 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI percurso formativo/académico. A maioria dos jovens referem uma clara preferência pelo trabalho em detrimento da escola, ainda que refiram a importância de concluírem os estudos obrigatórios antes de se dedicarem a uma profissão. De salientar a dificuldade de alguns jovens em perspetivarem o seu futuro, assim como, as suas ambições e expectativas irrealistas, tendo em conta o seu percurso escolar. É de realçar que neste ponto da entrevista, como noutros, foi necessário colocar questões mais diretas orientando o discurso dos entrevistados no sentido de ser possível obter alguns dados que se pretendiam analisar e que não estavam a ser naturalmente integrados nas respostas dos jovens e cuidadores. Tal, deve ter-se em conta quando verificadas respostas ‘politicamente corretas’ e mais de encontro ao socialmente desejado, mas que soam contraditórias quando tendo presente que se tratam de jovens e cuidadores acompanhados na sequência de situações de AE/AEG. Os jovens com mais dificuldade em perspetivar o futuro, centram o seu discurso (à semelhança das suas atitudes) no ‘agora’. Na rápida/imediata satisfação dos seus impulsos, normalmente, sem ponderar as consequências ou efeitos a médio e longo prazo. Sobre o papel da escola e a sua importância tendo em conta o seu futuro profissional, são unânimes em considerar a escola importante e até determinante. Tais respostas são, em tudo, contraditórias com a atitude desinteressada e desmotivada que assumem perante a escola e a frequência da mesma. A maioria dos cuidadores assume que os jovens se encontram dentro dos limites da escolaridade obrigatória e que têm, por isso, de estudar pelo menos até à conclusão do 12.º ano ou até atingirem a maioridade. Assumem considerar como possível a mudança dos jovens para vias de ensino mais adaptadas/condizentes com as suas aspirações e capacidades, ainda que alguns dos jovens já tenham feito essa mudança e continuem a faltar às aulas. Durante as entrevistas, foi também abordada a experiência escolar dos cuidadores, no sentido de perceber como esta podia influenciar a relação dos jovens com a escola. Apenas dois dos cuidadores entrevistados têm habilitações académicas acima do 12.º, tratando-se de um curso profissional e de uma licenciatura, mas todos frequentaram a escola. A maioria relaciona a sua experiência de AE com dificuldades económicas e com um crescente interesse pelo trabalho em detrimento da frequência escolar. Tendo em conta estas suas experiências escolares atribuem alguma importância à escola e ao trabalho escolar, mais uma vez, relacionando sobretudo com as aprendizagens escolares e sociais e com o futuro profissional. Questionados sobre a possibilidade de os jovens terem começado a faltar às aulas para ingressarem no mercado de trabalho, os cuidadores e jovens foram unânimes na resposta negativa. Sendo o principal objetivo da presente investigação aferir sobre as motivações na origem do AE/AEG dos alunos sinalizados, os sujeitos da amostra foram naturalmente inquiridos acerca das razões que os levaram a faltar às aulas. Jovens e cuidadores referiram sobretudo desmotivação e desinteresse perante a escola e o trabalho escolar, assim como dificuldades de integração e a influência de colegas e amigos. Tais resultados vão ao encontro do aferido na revisão de literatura do estudo em que a desmotivação é apontada como uma das principais razões para o AE/AEG, ainda que motivada por variáveis do contexto do aluno. Os cuidadores referiram, ainda, a influência dos pares, inadaptação aos docentes, e problemas familiares (como a perda de familiares próximos) numa atitude de desculpabilização/desresponsabilização dos jovens. Um dos cuidadores refere, ainda, características da personalidade da jovem que considera determinantes. Junto dos jovens e cuidadores foi ainda aferida a possibilidade da influência de terceiros (pares, familiares, etc.) na decisão destes de começarem a faltar a aulas. A maioria negou a possibilidade de influências. Os que admitiram esta possibilidade referiram colegas e amigos e nunca familiares ou outros. Importa, no entanto, alertar para algumas incoerências no discurso dos jovens entrevistados mas, também, para a efetiva influência dos pares (colegas e amigos) na motivação/decisão dos jovens aquando de faltar. De realçar que são estes pares que muitas vezes acompanham os jovens A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 111 durante o tempo em que estão a faltar. Tendo em conta a possibilidade de influência de cuidadores os jovens não identificam os cuidadores como possíveis influências para o AE/AEG. No entanto, merece ser considerado que possivelmente a influência dos cuidadores não passa por uma ação direta de oposição à escola, mas antes de algumas lacunas na orientação/supervisão do percurso educativo dos jovens (insuficiente ou inadequada), revelando desinteresse pelo trabalho escolar dos filhos, fraco envolvimento/participação na vida escolar e fracas expectativas relativamente ao sucesso escolar destes. Questionados sobre a possibilidade de, enquanto cuidadores, terem influenciado os jovens na questão do AE/AEG, a grande maioria negou ter sido uma influência. Questionados acerca da sua proximidade com algum docente em especial com quem se sentissem mais à vontade para desabafar e colocar questões, a maioria dos jovens identificou a figura do Diretor de Turma, ainda que fossem também referidos outros docentes. Foram também os Diretores de Turma os identificados quando questionados acerca de quem os esclareceu acerca do AE. Tais resultados revelam, mais uma vez, algum cuidado e preocupação dos estabelecimentos de ensino em informarem os alunos sobre o AE/AEG e sobre as possíveis consequências de um número excessivo de faltas. É possível, no entanto, aferir que este diálogo se centra muito num carácter meramente informativo, tarefa geralmente assumida pelo Diretor de Turma. É dado relevo, sobretudo, a consequências como a retenção no ano escolar e a sinalização à CPCJ, não sendo exploradas junto dos jovens alunos (e/ou encarregados de educação) as razões para o AE/AEG e as consequências que este poderá ter a médio e longo prazo. Também os cuidadores foram questionados acerca da sua proximidade com algum docente em particular, assim como, a proximidade do jovem com algum docente específico. Novamente, foi maioritariamente referida a figura do Diretor de Turma, elemento central na experiência escolar do aluno e no estabelecimento de relação entre a escola e a família. Ainda assim, quando colocada a ênfase na relação entre os alunos e os docentes são referidos pelos cuidadores relações de proximidade entre os alunos e outros docentes que não apenas o Diretor de Turma. Os cuidadores identificam também os Diretores de Turma como os principais intervenientes na altura de informar e consciencializar jovens e cuidadores acerca do AE. Aqui deve ser realçada a discrepância relativa ao diálogo da escola com jovens e com cuidadores. Deve, por isso, refletir-se sobre o que poderá estar na origem deste distanciamento verificado entre escola e cuidadores, considerando as possíveis pistas dadas pela revisão de literatura que passam pela dificuldade de comunicação entre escola e família; pela existência de ‘códigos linguísticos’ muito diferentes que dificultam o diálogo entre ambos os sistemas; crenças disfuncionais das famílias acerca do funcionamento, importância e utilidade da escola; assim como, a dificuldade da instituição escolar em flexibilizar regras e procedimentos para se aproximar dos cuidadores/famílias dos jovens alunos. Sobre a relação dos alunos sinalizados com os seus pares (colegas e amigos) foi ainda explorada a influência destes no comportamento e desempenho académico dos jovens e a existência de pares próximos do aluno também em situação de AE/AEG. A maioria dos jovens demonstrou alguma dificuldade em assumir que se importam/interessam pela opinião que os seus pares têm acerca de si e do seu desempenho académico. Também não é abertamente que assumem que moldam o seu comportamento (sobretudo em contexto escolar) em função desta opinião dos seus pares. A maioria dos cuidadores, no entanto, consideram existir esta influência. Foi colocada também a questão acerca da convivência estreita dos jovens com pares também em situação de AE/AEG. Ainda que poucos não tivessem essa informação, a maioria dos cuidadores respondeu afirmativamente. Aos cuidadores foi, também, questionado se primam por conhecer os pares próximos dos jovens. A grande maioria respondeu que sim. No final da entrevista foi dado espaço a todos os jovens e cuidadores para comentar as questões abordadas e acrescentarem o que desejassem à entrevista. Apenas um dos jovens se revelou inte- 112 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI ressado em se pronunciar tendo, sobretudo, refletido sobre a intervenção da CPCJ que considera excessiva e desnecessária em situações como a sua, sinalizadas por AE/AEG. Das respostas obtidas junto dos cuidadores, importa destacar o contributo de uma cuidadora que refere a necessidade de uma relação de maior proximidade entre os docentes e os alunos e, também, entre docentes e cuidadores. Defende a existência de um trabalho conjunto no sentido de procurar soluções adaptadas ao aluno. Outros cuidadores defendem, igualmente, a necessidade de mais acompanhamento na escola no sentido de motivar os alunos e de também na CPCJ existir um esforço para os levar a perceber a importância da escolarização no seu futuro. É, também, referida a importância de trabalhar esta problemática no sentido de a perceber e lhe saber dar uma resposta adequada. Conclusões Apresentada a investigação acerca das motivações na origem do AE/AEG realizada com jovens acompanhados na CPCJ-CB, assim como, a revisão de literatura, importa ressalvar algumas conclusões e recomendações. Partindo dos resultados da investigação realizada e colocando-a em diálogo com a revisão de literatura analisada é possível obter algumas respostas às questões de investigação previamente delineadas, ainda que, levantando novas e urgentes interrogações. São respostas que se podem resumir no seguinte: existe efetivamente uma grande falta de motivação e apego à escola por parte dos alunos em situação de AE/AEG; verifica-se uma conceção desadequada das famílias acerca da influência do envolvimento parental na relação dos jovens com a escola e as aprendizagens, assim como, grande dificuldade de resposta adaptativa das famílias e escolas perante crenças disfuncionais sobre o valor da escola/escolaridade. Tratam-se, efetivamente, de famílias com uma fraca ligação à instituição escolar, com uma visível dificuldade em atribuir um sentido à escolarização que ultrapasse o instrumentalizado valor para o futuro profissional. Instituição escolar esta, que se pode concluir ser pouco aberta e capaz de dialogar com alunos e famílias, não adaptando a sua linguagem e centrando-se numa atitude paliativa e centrada sobretudo nas consequências (sobretudo legais/ formais) quando confrontada com o fenómeno do AE/AEG. Ao mesmo tempo é possível concluir que os jovens entrevistados revelam grande dificuldade em perspetivar o seu futuro e, sobretudo, de o fazer de forma realista e consciente do significado da sua situação escolar. Deve, no entanto, atentar-se sobre alguns aspetos do presente trabalho a reconsiderar em futuras investigações de objetivos semelhantes. É de ser ressalvado que as entrevistas com jovens e cuidadores foram realizadas no espaço físico da CPCJ por um entrevistador (investigador) reconhecido pelos entrevistados como técnico da instituição. Tal pode, em alguns momentos, ter condicionado o discurso dos jovens e dos cuidadores, preocupados e atentos às funções da CPCJ e ao facto de por esta instituição serem acompanhados. Ao mesmo tempo deve sublinhar-se sobre o fato de a investigação se basear apenas no discurso/ perceção dos entrevistados sobre a sua situação, sendo analisados sobretudo aspetos relacionados com as motivações para o AE/AEG, sobre relação e posição dos cuidadores e do estabelecimento de ensino, assim como, possíveis influências na base das motivações identificadas. Assim, é possível ter em conta que os resultados da investigação poderiam beneficiar se considerados na análise aspetos relacionados com caraterísticas pessoais/individuais dos jovens alunos como os referidos por Miguel, Rijo e Lima (2012) numa investigação centrada na relevância de variáveis psicológicas e comportamentais dos alunos para o risco de insucesso e consequentemente de AE/AEG. São eles: o autoconceito escolar; a autoeficácia escolar; a autorregulação comporta- A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 113 mental; o valor da tarefa; a ansiedade de desempenho; a ausência de rotinas de estudo; a atribuição de sucesso e insucesso e; as relações interpessoais e integração social. Finalmente é, sobretudo, possível concluir da extrema necessidade de continuar a investigar a problemática do AE sempre com o objetivo de intervir de forma mais adequada (na escola e nas CPCJ) nos casos existentes e na prevenção da ocorrência deste fenómeno. Importa, questionar de forma crítica e assertiva os casos diagnosticados de forma a entender claramente a origem do desapego destes jovens alunos à escola e aprendizagens, as suas características e contextos de vida. Devem, ainda, ser tidas em conta as especificidades que levam ao fracasso das intervenções com estes jovens, intervindo de forma informada e consciente sobre a dimensão deste fenómeno. Referências Bibliográficas Canavarro, J.M. (2007). Para a compreensão do abandono escolar. Lisboa: Texto Editores Comissão Europeia. (2011). Combater o Abandono Escolar Precoce: Um Contributo Essencial para a Estratégia «Europa 2020». Bruxelas: Comissão Europeia. (consultado a 25.09.2012 em: http://ec.europa.eu/education/school-education/doc/earlycom_pt.pdf ) Dias, A.M. (2010). ‘Eu não desisto de aprender’ – Abandono Escolar nos jovens. Beja: Escola Superior de Educação de Beja (consultado a 15.11.2011 em: http://www.cpihts.com/PDF05/Ana%20Margarida%20Dias.pdf) Melo, C.F. (2008). 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Lisboa: Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa (consultado a 15.11.2011 em: http://pessoa.fct.unl.pt/amv10999/ interesses/SocioEdu/TrabFinal.pdf) 114 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 115 NOVOS MODELOS ESTÉTICOS NA EDUCAÇÃO MUSICAL DA CRIANÇA Susana Maia Porto ([email protected]) Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Portalegre Resumo De modo a facilitar a inclusão da música erudita contemporânea na educação musical da criança, a presente investigação-ação teve como objetivo a procura de hodiernas abordagens metodológicas na formação inicial de futuros agentes da educação - professores do ensino básico, educadores de infância, educadores artísticos e animadores socioculturais. Pretendeu-se, numa 1.ª fase do estudo, investigar sobre a perceção musical da criança e dos futuros professores/educadores e animadores socioculturais face à música erudita dos séculos XX e XXI. Na 2.ª e 3.ª fases da investigação-ação procurou-se desenvolver estratégias e métodos educacionais em sessões letivas de diversas unidades curriculares dos cursos em análise, que culminaram com a criação de performances/projetos musicais - 2.ª fase do estudo - e em workshops, liderados pelos futuros professores/educadores, dirigidos a crianças da Educação Pré-Escolar e do 1.º Ciclo do Ensino Básico, de acordo com premissas da contemporaneidade - 3.ª fase do estudo. De entre as conclusões da investigação destacam-se: a clara aceitação da criança perante a referida tipologia musical; a urgente introdução de um tipo de ensino instigador, reflexivo – pensar e agir sobre o som – e, consequentemente, criativo; a mais-valia de um trabalho performativo e transversal às expressões artísticas na construção e criação musical e na compreensão de novos modelos estéticos. Palavras-chave: educação musical da criança; música erudita contemporânea; formação inicial de professores/educadores e animadores socioculturais; investigação-ação; ensino musical criativo. 116 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI Abstract In order to facilitate the inclusion of contemporary classical music in child’s music education, this action research aimed to develop today's methodological approaches in the initial training of future agents of education - primary school teachers, early childhood educators, arts educators and sociocultural animators. It was intended, in a 1st phase of the study, research on musical perception of the child, of the future teacher/educator and sociocultural animator face to classical music of 20th and 21st centuries. In the 2nd and 3rd phases of action research was aimed to develop strategies and educational methods in teaching sessions of various curricular units of the courses under review, which culminated in the creation of performances/musical projects - 2nd phase of the study - and workshops, led by future teachers/educators, aimed at children of pre-school education and primary school, according to assumptions of contemporaneity - 3rd phase of the study. Among the study's findings it stands out: the child clearly accepts and understands contemporary classical music; the music education today must embrace a kind of investigative teaching, reflective - think and act on the sound – and consequently, creative; the transdisciplinarity and the performative work encourage musical construction/creation as well the understanding of new aesthetic models. Keywords: child's musical education; contemporary classical music; initial training of teachers/ educators and sociocultural animators; action research; creative musical teaching. Introdução A importância da inclusão da música erudita contemporânea na educação musical da criança tem vindo a ser discutida desde a década de sessenta do século XX. Podemos encontrar vários investigadores, em distintos países, que trabalharam a educação musical explorando as premissas da música contemporânea, assinalam-se como exemplos: Barbara Thompson, Brian Dennis, John Paynter e Samuel Miller em Inglaterra; Marian Demand nos Estados Unidos; Murray Schafer no Canadá; Claire Renard, Angélique Fulin, François Delaland em França; Bernadete Zagonel no Brasil; Lucía Frega e Hemsy de Gainza na Argentina; Luisa Muñoz Cortés, Salomé Diaz, Enrique Muñoz Rubio, Martínez Aguilera e Gómez Valcárcel em Espanha. Não obstante, apesar da defesa de pedagogos e investigadores relativamente à inclusão de novas abordagens de ensino da música, muito ainda há por investigar de modo a facilitar a introdução da música erudita contemporânea na educação musical da criança, em particular no ensino generalista. De facto, a complexa estrutura musical que dificulta o trabalho de análise, a inerente dissonância, a estranheza face às sonoridades que não são familiares e a sua difícil acessibilidade, são fatores determinantes para a não aceitação da referida tipologia musical por parte de muitos adultos e, consequentemente, por parte de docentes, educadores de infância e animadores socioculturais. Dalla Bella, Peretz, Rousseau e Gosselin (2001) reforçam essa dificuldade afirmando que o reportório do século XX é inapropriado para a educação musical da criança. Contrariando esta última teoria, a presente investigação pretende demonstrar que a música erudita contemporânea, de acordo com alguns dos seus princípios de produção/perceção sonora e criatividade, pode ser implementada no ensino da música para crianças e por educadores/professores generalistas e animadores socioculturais, de forma lúdica e eficaz. Deste modo, recorrendo a uma investigação-ação (modelo de Kemmis), procurou-se dar resposta à questão “Como incluir a música erudita contemporânea no ensino generalista?” investigando, para o efeito, abordagens metodológicas na formação inicial de A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 117 futuros agentes da educação – professores do 1.º Ciclo do Ensino Básico, Educadores de Infância, Educadores Artísticos e Animadores Socioculturais. A Música Erudita Contemporânea e o Ensino da Música São escassos os estudos sobre música erudita contemporânea e a educação musical da criança, particularmente no que concerne ao ensino generalista da música. Contudo, podemos destacar algumas investigações que tiveram o seu início nos anos sessenta do século XX e, por conseguinte, deram origem a outras investigações um pouco mais recentes. Em “Twentieth Century Music for Elementary School Children” (1962), Barbara Thompson defendeu a inclusão da música erudita contemporânea na educação musical e apresentou algumas sugestões para o trabalho com crianças em idade escolar. Também na década de sessenta, foram elaborados projetos de investigação com aplicação prática e direta na educação musical, como por exemplo Contemporary Music Project (Mark, 1996), que teve por objetivo integrar compositores de música erudita contemporânea em escolas públicas dos Estados Unidos da América e nos seus programas, em jeito de residência artística. Através do projeto foi notória a falta de preparação para lidar com a música contemporânea por parte dos professores do ensino generalista e, consequentemente, por parte dos seus alunos. Apesar disso, tanto os professores como os alunos que participaram no projeto mostraram-se recetivos às novas tendências estéticas e, observado pelos professores, o crescimento musical revelou-se bastante positivo nas crianças que tiveram contacto com essa tipologia musical. “Aesthetics and Twentieth-Century Music in Music Education”, de Marian Demand (1972), é considerado também um estudo pioneiro sobre orientações estéticas contemporâneas e as suas implicações na educação musical. A investigação concluiu que os professores devem ter alguma familiaridade com a música erudita contemporânea, no que respeita ao conhecimento de obras musicais e à sua significação estética. Objetivando-se o encontro de estratégias de aprendizagem face à tipologia musical em análise, a autora enfatizou a necessidade de novos estudos sobre o tema. Outros investigadores, como Murray Schafer (1998), John Paynter (2000) e François Delalande (2001) - este último trabalhou com crianças de creche - pretenderam na sua prática letiva estimular a criatividade nos seus alunos, através da exploração e da ação sobre o som. Todos eles defendem os sons do meio ambiente como objetos sonoros integrantes de uma composição musical, os grafismos não convencionais e a construção musical por meio do jogo. Valorizam, por conseguinte, um ensino criativo cujas situações de aprendizagem possam partir de propostas, ideias musicais e situações sonoras produzidas pelos alunos. Sintetizando, são pedagogos/investigadores que recorreram a estratégias de experimentação de vanguarda, aquilo a que comummente se designa por experimentação criativa. Comprovando a eficácia da tipologia musical para o desenvolvimento musical da criança, outras investigações (apesar de em número reduzido) se seguiram, até aos nossos dias, sobre a música erudita contemporânea e o ensino da música, indicando recursos didáticos e estratégias a aplicar na prática letiva. Dado o valor didático de recursos utilizados em pedagogias baseadas na música contemporânea, Daniel Mateos Moreno (2007) decidiu investigar sobre o grau de familiaridade que os futuros professores de música têm em relação a essa tipologia musical. Segundo o autor, os resultados da investigação foram desanimadores, demonstrando as dimensões reais do problema, isto é, se assumimos o valor da música contemporânea para a educação musical da criança, também devemos preparar os futuros agentes da ação educativa, uma vez que é impossível ensinar ou manusear aquilo que se desconhece (Mateos Moreno, 2007). De facto, enquanto professores de 118 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI música teremos que refletir profundamente sobre este problema e encontrar soluções que facilitem a inclusão da música erudita contemporânea e das suas premissas na formação inicial de professores, não só de professores especialistas mas também de professores generalistas, de forma a possibilitar o contacto das crianças com recursos e ferramentas que essa tipologia musical nos pode oferecer e que são extremamente importantes para o desenvolvimento musical da criança, nomeadamente o desenvolvimento da criatividade (Dennis, 1970; Meyer-Denkmann, 1977; Paynter, 2000; Schafer, 1998). Metodologia e Participantes A metodologia utilizada foi investigação-ação, metodologia que permite melhorar práticas, desenvolver estratégias/métodos educacionais e proceder a mudanças de comportamento - atitudes e valores (Cohen e Manion, 1994). Tendo como objeto de estudo os cursos do 1.º Ciclo de Estudos: Educação Básica (EB), Animação Sociocultural (ASC) e Educação Artística (EA) - cursos que contemplam a educação cultural/ artística e a educação/formação da criança, entre outros -, a amostra contou, no total, com 136 estudantes da Escola Superior de Educação de Portalegre e 343 crianças de várias instituições de ensino da Educação Pré-Escolar e do 1.º Ciclo do Ensino Básico. Na 1.ª fase da investigação-ação contribuíram para o estudo 62 alunos - 41 formandos do curso de EB e 21 formandos do curso de ASC -, através da resposta a um inquérito. Também, foram alvo de estudo 110 crianças (6 grupos de crianças), entre os 3 e os 11 anos de idade, que participaram em atividades de reflexão musical. A amostra, relativamente ao número de formandos, resultou de amostragem estratificada de acordo com os cursos vocacionados para a educação e para a animação. Por conseguinte, o estudo incidiu sobre 18% da população, num universo de 340 alunos - população dos cursos em que a unidade curricular de Expressão e Educação Musical consta do plano de estudos -, sendo o número de inquiridos (41 formandos de EB e 21 formandos de ASC) um número representativo da percentagem total de alunos por cursos, sendo a proporção próxima dos 66% (EB) e 34% (ASC)1. A 2.ª fase da investigação-ação contou com a participação de 64 estudantes de EB, entre os quais 20 participantes da 1.ª fase, 13 estudantes de ASC e 17 estudantes de EA, que elaboraram projetos artísticos, em sala de aula, conforme princípios da música erudita contemporânea e de acordo com os conhecimentos adquiridos nas várias sessões letivas. O número de formandos participantes resultou do número de alunos inscritos nas unidades curriculares direcionadas para a criação/produção artística (laboratórios e oficinas). Os formandos que participaram na 3.ª fase da investigação são parte integrante do grupo de formandos da 2.ª fase - 17 estudantes de EB e 5 estudantes de EA, amostra representativa. Os mesmos lideraram atividades musicais com crianças - 159 crianças do 1.º Ciclo EB e 74 crianças da Educação Pré-Escolar -, desenvolvendo ideias e experiências vivenciadas em sala de aula na 2.ª fase da investigação. Sintetizando, de modo faseado - de acordo com os ciclos de estudo de uma investigação-ação - o estudo empírico contou com: uma fase exploratória - 1.ª fase - sobre a perceção musical das crianças e dos futuros professores/educadores e animadores socioculturais perante a música erudita contemporânea (onde reside efetivamente o problema? O que deve ser feito para solucionar o problema?); uma fase de desenvolvimento de abordagens facilitadoras da inclusão da tipologia em análise na formação inicial dos futuros agentes da ação educativa, auxiliada por grupos de discussão com os formandos - 2.ª fase -, que resultou da análise e reflexão da fase precedente; e uma última fase - 3.ª fase - que pretendeu "validar" a fase anterior, na medida em que os estudantes repercuti1 Informação relativa ao ano letivo de 2007-2008 (período em que decorreu a 1.ª fase da investigação-ação). A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 119 ram o conhecimento e a experiência adquiridos na 2.ª fase para a prática pedagógica, liderando atividades, que se aproximaram das premissas da contemporaneidade musical, dirigidas a crianças em idade pré-escolar e escolar. Não obstante os métodos e estratégias diferenciadas, cada fase/ciclo do estudo desenvolveu-se de forma contínua e resumiu-se a uma sequência: planificação, ação, observação (avaliação) e reflexão (teorização). Ou seja, este conjunto de procedimentos em movimento circular, inerente a um ciclo, deu início a um novo ciclo/fase que, por sua vez, desencadeou novas espirais de experiências de ação reflexiva, como referido em Coutinho et al. (2009). 1.ª Fase da Investigação-Ação Partindo da hipótese, fundamentada pela contextualização teórica acima descrita, que a música erudita contemporânea é essencial para o desenvolvimento da audição e da criatividade da criança, questionou-se: que perceção têm as crianças e os futuros professores/educadores e animadores socioculturais da música erudita contemporânea? Para obtenção dos resultados foram aplicados inquéritos aos futuros professores do ensino básico, educadores de infância e animadores socioculturais - 41 estudantes do curso de EB e 21 formandos do curso de ASC – e observadas atividades de reflexão musical com 6 grupos de crianças (distribuídos por cinco escolas EB1/JI). No que concerne às atividades de reflexão musical, objetivou-se recolher dados, através da audição e do diálogo com as crianças, sobre vários exemplos/excertos musicais, de compositores e estilos composicionais de música erudita contemporânea (Quadro 1). Quadro 1- Atividades de reflexão musical referentes à 1.ª fase da investigação-ação Grupo Idade Excertos Auditivos Grupo A 3-4 - Suite da Ópera Três Vinténs, Kurt Weill. (21 crianças) (80% 3) - Children’s Corner, Debussy. - Solo Pictórico, Carlos Barreto. - Suite Cítica op. 20, Sergei Prokofiev. Grupo B 3-4 - Pacific 231 e Rugby, Honegger. (20 crianças) - Concerto Campestre, Francis Poulenc. - Children’s Corner, Debussy. - Solo Pictórico, Carlos Barreto. - Suite Cítica op. 20, Sergei Prokofiev. Grupo C 4-6 - Serenata op. 31, Benjamim Britten. (19 crianças) - Sonatas Piano Preparado, John Cage. - Concerto Grosso, Vaughan Williams. - Morte e Nascimento de uma Flor, Paulo Rodrigues. - Sinfonia Câmara n.º 2 op.38, Schönberg. Grupo D 6-7 - Serenata op. 31, Britten. (18 crianças) - Morte e Nascimento de uma Flor, Paulo Rodrigues. Grupo E 7-9 - Suite da Ópera Três Vinténs, Kurt Weill. (21 crianças) - Pacific 231 e Rugby, Honegger. - Concerto Campestre, Francis Poulenc. Grupo F 10-11 - Sonatas Piano Preparado, John Cage. (11 crianças) - Concerto Grosso, Vaughan Williams. - Sinfonia Câmara n.º 2 op.38, Schönberg. - Atmosphères, György Ligeti. - Variations. Aldous Huxley in Memoriam, Igor Stravinsky. - Contrappunto dialettico alla mente, Luigi Nono. - Cinco Peças Orquestra op. 10, Webern. - Amen para uma Ausência e ...In Somno Pacis (One for Nothing), Capdeville. - Notations, Pierre Boulez. 120 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI A 1.ª fase do estudo concluiu uma clara aceitação, assim como um certo entendimento, da música erudita contemporânea por parte da criança. No que diz respeito à perceção estética e à intrínseca relação simbólica, entendeu-se que a compreensão que a criança manifesta sobre uma determinada obra formula-se por si só através de uma escuta ativa e das referências fantasiosas inerentes ao seu próprio mundo. A título de exemplo, no Noturno de Benjamin Britten, as cordas surgem, em determinados momentos, com movimentos melódicos ondulantes, semelhantes ao movimento das ondas do mar, ao que as crianças associaram ao Pirata das Caraíbas, ao Capitão Gancho, à guerra/luta de piratas e aos canhões dos barcos do Capitão Gancho. Também numa das Sonatas e Interlúdios para Piano Preparado de John Cage, “Sonata V”, foi associado o ritmo irregular a uma dança descoordenada e ao discurso de um gago. Para as crianças mais velhas não só a abordagem expressionista referencialista2 (Reimer, 1989) é importante, mas, também, a perceção ligada à educação formal e analítica da obra. De facto, as referências “programáticas” e expressivas podem ser pertinentes para o entendimento das obras musicais (como constatado na análise das atividades de reflexão musical com as crianças), no entanto, enfatiza-se a necessidade de encontrar processos metodológicos e abordagens curriculares, na formação do 1.º Ciclo de Estudos de professores e animadores, que possibilitem uma análise mais precisa em termos de construção musical e aplicável não só ao desenvolvimento da criança mas também à formação globalizante e não específica dos formandos. Também, a importância que os estudantes dos cursos em análise atribuem à inserção não só da música erudita como de novas sonoridades na educação da criança (Quadro 2) aliada à falta de conhecimento expressa nos inquéritos, conduzem a uma concreta necessidade de introduzir nos programas das unidades curriculares dos referidos cursos conteúdos e metodologias que permitam um trabalho em aula sobre distintas tipologias musicais, nomeadamente, e neste caso concreto, a música erudita contemporânea. Quadro 2- Importância atribuída à inclusão da música erudita e de novas sonoridades que fujam à noção de belo na educação da criança, total de inquiridos (Frequência, Moda e Média) Muito Importante Importante Pouco Importante Sem Importância Sem Opinião A)40 22 0 0 0 B)31 31 0 0 0 C)8 44 9 01 D)31 31 0 0 0 E)24 33 2 1 2 Moda31 31 0 0 0 Média 26,8 32,2 2,2 0,2 0,6 (A) A expressão/educação musical no desenvolvimento global da criança; (B) A utilização de distintos tipos de música na educação musical da criança; (C) A música erudita no desenvolvimento auditivo da criança; (D) O trabalho tímbrico e de exploração sonora na educação musical da criança; (E) A inclusão, na educação musical da criança, de novas sonoridades que possam fugir à noção de belo. Acredita-se, fundamentado pelos resultados obtidos nos inquéritos aos futuros professores/ educadores e animadores socioculturais e pelos diálogos reflexivos com as crianças, que a música do século XX, que muitos adultos rejeitam por falta de entendimento estético ou simplesmente por ser uma sonoridade estranha - precisamente porque não lhes é familiar -, ao ser incluída nos programas curriculares de futuros professores e futuros animadores, não só irá incrementar a cultura musical dos formandos, assim como, possibilitar a sua transmissão às crianças de forma lúdica, criativa e eficaz. Uma vez que a criança não tem ideias pré-concebidas e culturalmente formadas 2 Os expressionistas referencialistas defendem que a expressão inerente à obra depende de um entendimento do conteúdo referencial da música.2 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 121 pelo contexto integrado de uma sociedade influenciada pelos media, facilmente aceita o tipo de sonoridade que para muitos adultos é entendido como exótico e consequentemente “perigoso”. 2.ª Fase da Investigação-Ação De acordo com as conclusões da 1.ª fase da investigação-ação e partindo da hipótese que os estudantes dos cursos de EB, EA e ASC – cursos cujo perfil formativo integra a educação artística/ cultural e a educação/formação da criança - são capazes de abraçar a estética musical contemporânea, questionou-se: que abordagens metodológicas podem ser levadas a cabo na formação inicial de professores/educadores e animadores, que facilitem a inclusão da música erudita contemporânea na educação musical da criança, de modo eficaz e criativo? Objetivando-se encontrar resposta à questão que inicia um novo ciclo de estudo, procedeu-se à implementação de vários projetos (Quadro 3) em unidades curriculares que contemplam oficinas e laboratórios, a um workshop e a grupos de discussão. Quadro 3 - Projetos musicais desenvolvidos na 2.ª fase da investigação-ação Designação do Projeto Ano Letivo (semestre) Curso Unidade Curricular N.º de Alunos Produção Artística e Criatividade: Performance Musical A Performance Musical B Performance Musical C 2008-2009 EB (1.º Semestre) Laboratório de Produção Artística e Criatividade 20 Da Tradição à Inovação: Experimentação e Recriação Musical A Experimentação e Recriação Musical B 2008-2009 ASC (1.º Semestre) Oficina Etnográfica da Tradição à Inovação 13 O Impressionismo e a Recriação: Construção Musical Impressionista 2009-2010 (1.º Semestre) EA Oficina de Projeto Musical 4 O Gesto, o Som e o Espaço: Oficina Transdisciplinar A Oficina Transdisciplinar B Oficina Transdisciplinar C 2009-2010 (2.º Semestre) EB Oficina das Expressões 14 Bilinguismo Musical em Laboratório: Mito - Performance Interdisciplinar 2010-2011 EA (1.º Semestre) Laboratório de Produção Transdisciplinar II 4 Workshop: Experimentação Musical 2010-2011EBEA (1.º Semestre) Felix - April Maze 2011-12 (1.º Semestre) Aleatoriedade, Som e Cor 2011-12 EA (2.º Semestre) EA ------------------- 6 Oficina de Projeto Musical 5 Laboratório de Produção Transdisciplinar I 5 A Composição Sonora e o Jogo Infantil 2011-12 (2.º Semestre) EB Oficina das Expressões 27 Séquence 2011-12 (2.º Semestre) EA Laboratório de Produção Transdisciplinar I 5 Multimédia e Contemporaneidade 2012-13 (1.º Semestre) EA Oficina de Projeto Musical 7 A Voz e a Construção Musical 2012-13 (1.º Semestre) EA Laboratório de Produção Transdisciplinar II 3 122 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI Pretendeu-se, efetivamente, nesta fase do estudo, encontrar estratégias de ensino/aprendizagem face à música erudita contemporânea através de um trabalho em aula com os futuros educadores/ professores generalistas de modo a facilitar a aquisição de conhecimento sobre a tipologia em estudo, assim como a sua aplicação prática em atividades de criação e de improvisação musical. Indo ao encontro de modelos estéticos musicais contemporâneos, desenvolveram-se abordagens metodológicas na formação do 1.º Ciclo de Estudos de educadores, professores e animadores, atendendo ao desenvolvimento da criança e à formação globalizante e não específica dos formandos. Todos os projetos foram precedidos por sessões expositivas sobre compositores e obras de música erudita contemporânea e de sessões reflexivas acerca da construção musical dessas obras e os seus princípios estéticos. A construção musical que resultou do trabalho criativo elaborado pelos alunos, sob orientação da docente das unidades curriculares, conseguiu abraçar várias premissas da música contemporânea. Por exemplo, nos projetos Produção Artística e Criatividade, Da Tradição à Inovação e Impressionismo e Recriação foram trabalhadas as correntes musicais do século XX (antes e pós-guerra), na medida em que os alunos se inspiraram em uma ou mais correntes para a composição musical. Isto é, o objetivo primordial foi o entendimento das tendências estéticas, a perceção de características fundamentais de cada corrente e o estímulo/gosto pela criação contemporânea. Vamos encontrar, por exemplo: sonoridades próximas das impressões sensoriais do movimento impressionista quando surge a produção sonora provocada pela fricção das unhas no xilofone ou a agitação de areia num recipiente, ou mesmo a abusiva ressonância no piano através do uso do pedal de sustentação; sussurros, risos, gritos, sons vocais produzidos por respirações lentas, canto falado e fonemas livres sem qualquer tipo de obstrução, tudo isto na tentativa de levar ao extremo as potencialidades da voz, própria do expressionismo; a inclusão do ruído inerente ao futurismo; estruturas cíclicas e repetitivas próprias do minimalismo; entre outras sonoridades não convencionais que resultaram da utilização de objetos sonoros como cartas de jogo, paus do jogo do mikado e brincadeiras sonoras com a água. A atonalidade também foi um dos elementos a ser trabalhado nos projetos nomeadamente em Bilinguismo Musical em Laboratório e A Voz e a Construção Musical, assim como a manipulação do som por meios informáticos. Também a manipulação dos sons do meio ambiente foi uma constante nos projetos Séquence, Multimédia e Contemporaneidade e Felix – April Maze, este último que resultou na sonorização do filme com o mesmo nome, de 1930. A construção musical através do jogo e da composição automatizada foi também uma das premissas da contemporaneidade musical trabalhada pelos formandos, desta vez em Aleatoriedade, Som e Cor e Composição Sonora e Jogo Musical. Ainda, em todos os projetos pretendeu-se valorizar o som, o objeto sonoro, o silêncio, o movimento sonoro, o espaço, a improvisação e a representação gráfica não convencional. No quadro que se segue (Quadro 4) estão registadas analogias entre partituras de obras contemporâneas e as partituras elaboradas pelos estudantes: Quadro 4 - Analogias visuais entre partituras de obras contemporâneas e as partituras elaboradas na 2.ª fase da investigação-ação Bussoti, XIV Piano Piece for David Tudor 4 Séquence A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 123 Cardew, Treatise Séquence Cage, New River Watercolor Series II O Medo, O Drama e a Verdade do Artista Cage, Fontana Mix Felix - April Maze Concluiu-se que a performance artística e transversal às expressões é a melhor abordagem para a construção musical contemporânea, uma vez que o som resulta de um gesto, de um movimento, de uma imagem visual ou de uma cor. Consequentemente, também o som é gerador de outros movimentos, traços, palavras e imagens visuais (Esquema 1). Esquema 1 – Elementos basilares da construção/criação musical 124 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI Dado que se trata de uma tipologia musical com um enorme leque de possibilidades no que concerne à exploração e criação sonora, a música contemporânea permitiu aos futuros educadores/professores e animadores socioculturais construir musicalmente de modo eficaz e criativo, sem a necessidade de recorrer a tecnicismos ou especificidades próprias de um tipo de ensino tradicional da música. 3.ª Fase da Investigação-Ação A 3.ª e última fase da investigação-ação, surgindo na sequência da 2.ª fase do estudo, desencadeou a questão: de que forma a música erudita contemporânea pode desenvolver a criatividade das crianças e conduzir a uma prática ligada à construção/improvisação musical, com maior confiança, por parte dos futuros educadores e professores generalistas? Partiu-se, portanto, da hipótese que a música erudita contemporânea desenvolve a criatividade da criança e que os futuros educadores/ professores do ensino generalista são capazes de planificar/implementar atividades de criação baseadas na estética contemporânea. Deste modo, elaboraram-se workshops em cinco escolas EB1/JI onde os alunos dos cursos em análise trabalharam determinadas premissas da contemporaneidade musical com crianças da Educação Pré-Escolar e do 1.º Ciclo do Ensino Básico (Quadro 5): Quadro 5 – Projetos/workshops musicais da 3.ª fase da investigação-ação Designação do Projeto/Atividade Formandos ESEP Nível de Ensino A Construção Sonora e a Imagem Visual Alunos do curso de Educação Artística 1.º CEB - 3.º e 4.º Anos Criação livre - Atividade para Crianças Alunos do curso de Educação Básica 1.º CEB - 4.º Ano As Onomatopeias e o Universo Infantil Aluna do curso de Mestrado em Educação Pré-Escolar Pré-Escolar Brincar com o Som Alunos do curso de Educação Básica Pré-Escolar 1.º CEB - 2.º e 3.º Anos Em todos os projetos implementados, nesta fase do estudo, existiu a pretensão de trabalhar premissas da música erudita contemporânea por meio da exploração/experimentação sonora e da procura/descoberta do novo – novas sonoridades - onde a fusão das várias linguagens artísticas foi uma constante. Por exemplo, à semelhança do projeto Felix – April Maze da 2.ª fase da investigação, as crianças foram convidadas a sonorizar um outro filme mudo de 1925, Felix – Follows The Swallows, utilizando a voz de variadíssimas formas - utilizando sons onomatopaicos, fricativas, sussurros, assobios -, para além de folhas de jornal. Não obstante alguma improvisação, foi proposto às crianças seguirem as indicações dos formandos que lideraram a atividade com o propósito de aproveitar a massa sonora (coro vocal) das 128 crianças participantes neste projeto. Para além da imagem como elemento inspirador e como resultado da criação musical – através de partituras não convencionais -, também o movimento e a comunicação foram cruciais para estas novas abordagens de ensino. Assim, mais uma vez, foi possível observar dados favoráveis à introdução da música erudita contemporânea na educação musical da criança e, no caso da presente investigação, no ensino generalista. As conclusões desta última fase indicam que: os formandos estão aptos a trabalhar com as crianças atendendo às premissas da contemporaneidade musical; é possível estimular, por parte das crianças uma atitude formalista (Reimer, 1989), ou seja, uma atitude reflexiva sobre os elementos per se de uma obra musical; o interesse, a aceitabilidade e a seriedade acerca da notação contemporânea faz-se sentir em qualquer faixa etária. Reforça-se, ainda, a teoria de que as crianças aceitam A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 125 claramente obras musicais que envolvem sonoridades diferentes e divertem-se com a própria exploração sonora. Considerações Finais Como podemos educar uma criança auditivamente se lhe oferecemos apenas a melodia bonita e tonal? Não estaremos a limitar culturalmente a sua aprendizagem e o seu vocabulário musical? A presente investigação pretendeu, fundamentalmente, alterar práticas educativas, contribuindo, deste modo, para um ensino criativo da música e, consequentemente, para a organização e construção dos programas curriculares de futuros professores de educação básica, educadores de infância, educadores artísticos e animadores socioculturais. Concluiu-se que a inclusão da música erudita contemporânea e das suas premissas de abstração, experimentação/exploração e procura do novo - novas sonoridades e novas formas compositivas -, na educação musical da criança, pode resultar num processo de ensino-aprendizagem fundamentado na criatividade e na valorização do pensamento/reflexão, por meio de distintas abordagens, exequível ao desenvolvimento da criança e ajustável ao ensino generalista. Os futuros professores/educadores e animadores socioculturais, assim como as crianças da Educação Pré-escolar e do 1.º Ciclo do Ensino Básico conseguiram construir musicalmente de forma criativa e inovadora e fora dos parâmetros tradicionais a que estão habituados a trabalhar, agarrando diferentes aspetos inerentes à composição contemporânea. Encontramos, deste modo, palavras-chave ao longo do decurso da investigação, particularmente na 2.ª e 3.ª fase como: criatividade, imaginação, exploração, reflexão, seleção, espontaneidade, naturalidade e procura. As mesmas palavras-chave são, indubitavelmente, cruciais para o desenvolvimento da expressão/educação musical em todas as suas vertentes - criativa, interpretativa e reflexiva. Acredita-se, por conseguinte, que o papel do professor/educador e animador sociocultural, no que concerne à educação musical da criança, prende-se com a competência para proporcionar distintas abordagens, equilibrando a sua prática entre várias linguagens artístico-musicais, garantindo, assim, uma verdadeira educação estética. Bibliografia Cohen, L. & Manion, L. (1994). Research Methods in Education. London: Routledge. Coutinho, C., Sousa, A., Dias, A., Bessa, F., Ferreira, M. J. & Vieira, S. (2009). Investigação-Acção: Metodologia Preferencial nas Práticas Educativas. Revista Psicologia, Educação e Cultura, vol. 13, n.º 2, pp. 355-379. Dalla Bella, S., Peretz, I., Rousseau, L. & Gosselin, N. (2001). A Developmental Study of the Affective Value of Tempo and Mode in Music. Cognition, n.º 80, vol. 3, pp. B1-B10. Delalande, F. (2001). La Música es un Juego de Niños. Buenos Aires: Ricordi Americana. Demand, M. (1972). Aesthetics and Twentieth-Century Music in Music Education (tese de Doutoramento). Ann Arbor, Mich.: University Microfilms. Dennis, B. (1970). Experimental Music in Schools. Londres: Oxford University Press. Mark, M. (1996). Contemporary Music Education. New York: Schimer Books. Mateos Moreno, D. (2007). La Música Contemporánea y los Futuros Maestros de Educación Musical (tese de Doutoramento). Málaga: Universidad de Málaga. Meyer-Denkmann, G. (1977). Experiments in Sound. Londres: Universal Edition. Paynter, J. (2000). Making Progress With Composing. British Journal of Music Education, March 17 (1), Cambridge: Cambridge University Press. Reimer, B. (1989). A Philosophy of Music Education (2nd edition). New Jersey: Prentice Hall. Schafer, M. (1998). El Nuevo Paisaje Sonoro, Un Manual Para El Maestro de Musica Moderno, Buenos Aires: Ricordi Americana. Thompson, B. (1962). Twentieth Century Music for Elementary School Children. Missouri Journal of Research in Music Education, volume I, n.º 2. 126 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 127 PARCERIAS EUROPEIAS DE INOVAÇÃO EM EDUCAÇÃO Margarida Morgado ([email protected]) Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Castelo Branco Resumo Um dos desafios da pós-modernidade é o trabalho em rede para uma educação do futuro com um desenvolvimento sustentável, assente na articulação do conhecimento do passado com os desafios do futuro. O financiamento europeu tem promovido a constituição de parcerias estratégicas em educação que interligam organizações de diversos tipos, tamanhos, vocação e áreas de especialização aos seus contextos específicos mas também ao contexto europeu. O seu objetivo é divulgar experiências educativas de qualidade a partir de recursos gratuitos e aplicar a inovação a um número de contextos cada vez mais alargados. Emergem destas parcerias estratégicas financiadas pela EU novas perspetivas sobre a educação que podem ajudar a definir rumos para o século XXI, tendo por base o multilinguismo, a equidade e a inclusão, bem como o desenvolvimento de competências básicas transversais, o robustecimento dos apoios educativos, a literacia digital e a inovação na área do combate à discriminação. O artigo (originalmente apresentado sob a forma de poster) apresenta um conjunto de projetos desenvolvidos pelo IPCB, terminados e em curso, no quadro destas parcerias estratégicas, salientando a sua mais-valia para a definição de rumos da educação do século XXI. A educação intercultural proposta pelo projeto EUMOF; a educação plurilingue promovida pelo projeto ALPHAEU no jardim-de-infância; a formação de atores sociais para prevenir o abandono escolar e a constituição de comunidades europeias de prática do projeto SSN; a promoção da leitura entre jovens que a rejeitam no projeto BOYS’ READING; a promoção de competências narrativas básicas na era do digital em AQUA NARRABILIS; e a promoção da cidadania ativa e participativa no projeto WE ARE EUROPE. Palavras-chave: Parcerias estratégicas em educação; educação intercultural; educação para a cidadania multicultural; educação social; educação para o século XXI. 128 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI Abstract The post-modern era is often characterized as challenging due to its requirements of networking and sustainable development and its connections between past knowledge and experience with the demands of the future. European funding has been consistently promoting strategic partnerships in education that connect several types of organizations (different in size, expertise, aims) to local and European contexts. Their aim is to disseminate and explore quality educational approaches through free open-source resources and to apply dissemination to ever wider contexts. New perspectives on education for the 21st century emerge from these EU-funded strategic partnerships which highlight multilingualism, equity and inclusion, basic transversal competence development, quality educational support, digital literacy and innovative anti-discriminatory approaches. The present paper (presented as a poster at the conference) shows projects that were (and are still being) developed at IPCB within these strategic partnerships for education and highlights how they engage with the 21st challenges for education, namely through: the intercultural education proposed through EUMOF; plurilingual education in pre-primary in the ALPHAEU project; the education and training of social actors in education to prevent early school dropout and the constitution of European communities of practice through the SSN project; promoting reading among reluctant boy readers in BOYS’ READING; the development of transversal narrative competences in the digital era in AQUA NARRABILIS; and the promotion of active and participatory citizenship in the WE ARE EUROPE project. Keywords: Strategic partnerships in education; intercultural education; multicultural citizenship education; social education; education for the 21st century. Introdução Um dos desafios da pós-modernidade é o trabalho em rede para uma educação do futuro com um desenvolvimento sustentável, assente na articulação do conhecimento do passado com os desafios do futuro (Castells, 2005; Cardoso, 2005). O financiamento europeu (programa LLP e Erasmus+, por exemplo) tem promovido a constituição de parcerias estratégicas em educação que interligam organizações de diversos tipos, tamanhos, vocação e áreas de especialização aos seus contextos específicos mas também ao contexto europeu (ação-chave 2 (KA2) de Cooperação para a inovação e o intercâmbio de boas práticas, em particular Parcerias estratégicas nos domínios da educação, formação e juventude (CE, 2014)). O seu objetivo é divulgar experiências educativas de qualidade a partir de recursos gratuitos e aplicar a inovação a um número de contextos cada vez mais alargados. Emergem destas parcerias estratégicas financiadas pela UE novas perspetivas sobre a educação e a gestão do conhecimento, que podem ajudar a definir rumos para o século XXI, tendo por base o multilinguismo, a equidade e a inclusão, bem como o desenvolvimento de competências básicas transversais, o robustecimento dos apoios educativos, a literacia digital e a inovação na área do combate à discriminação. A experiência de ligação à rede europeia, nestes termos, tem ajudado as instituições a posicionarem as suas práticas e investigação aplicada (no caso do ensino superior politécnico) em relação ao conhecimento, a temas e perspetivas que, de outro modo, teriam dificuldade em interligar com as suas práticas estabelecidas, uma vez que o financiamento e o espaço atribuídos à investigação é escasso. Conseguem, deste modo, uma mais eficaz gestão do conhecimento a partir de interações que combinam, recombinam e reformulam o que é importante investigar (Glasser, 1998/9). Perry A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 129 Glasser (1997) define a organização que aprende como aquela que inova e que é capaz de responder às mudanças do que a rodeia O presente artigo configura e sistematiza os aportes para as áreas acima referidas de um conjunto de projetos europeus desenvolvidos na Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Castelo Branco no quadro de três eixos de investigação aplicada, a saber: Educação para uma Cidadania Multicultural Crítica (Europeia e Global), no sentido de exploração de identidades e identificações culturais e competências interculturais e plurilingues, curiosidade pelas outras culturas, línguas, patrimónios materiais e imateriais e participação social ativa, responsável e sustentável. O segundo eixo concerne o desenvolvimento de Competências de Vida Ativa num Mundo Globalizado Inclusivo. Os projetos desenvolvidos nesta área têm por objetivos aprender a viver e a partilhar informação na era da globalização, o desenvolvimento de novas relações de aprendizagem com os ambientes e as culturas digitais, a definição e operacionalização de competências interculturais e aprendizagem precoce de línguas estrangeiras, bem como a promoção do plurilinguismo e domínio das línguas da globalização para uma comunicação eficaz, para além de uma ação inclusiva em prol da justiça social e da aceitação e reconhecimento da diferença. O terceiro eixo é de Ligação Reticular do Ensino Superior aos Territórios Envolventes, que se carateriza pela eficácia e a sustentabilidade da intervenção na ligação entre teoria, práticas académicas e intervenção social, pela criação de comunidades de prática e de aprendizagem, por estudos sobre realidades sociais e educativas contemporâneas incluindo a mobilidade, pela prevenção do abandono escolar, do bullying e da exclusão devido à multiculturalidade e pertença a minorias étnicas. No presente artigo faremos uma pequena descrição desse conjunto de projetos europeus em função destes 3 eixos, procurando enquadrá-los criticamente com a investigação aplicada nas áreas científicas em que se desenrolam. Todos os projetos configuram parcerias estratégias com outras escolas e instituições de ensino superior europeu e desenvolveram recursos e materiais pedagógicos de livre acesso, publicados em linha; incluem estratégias e iniciativas de motivação dos alunos; promovem e disponibilizam materiais de leitura; de desenvolvimento de competências narrativas e interculturais; Disponibilizam materiais e recursos para pais, professores, jovens e dirigentes de escola no âmbito da prevenção do abandono escolar, bem como estratégias lúdicas de ensino-aprendizagem; materiais e recursos educativos atualizados e práticos; recursos e materiais digitais e em papel, integrados em cursos de formação inicial e em serviço de professores, bibliotecários e outros formadores (presenciais e mistos com formação a distância), guias de orientação para formadores, pais, educadores e professores; disponibilizam igualmente bases de dados com recursos sobre prevenção do abandono escolar; desenvolvimento de competências narrativas no contexto educativo; estratégias de promoção da cidadania europeia. Na descrição que se segue, evidencia-se em cada projeto desenvolvido e em desenvolvimento, os modos da sua ligação aos três eixos definidos. O objetivo é não apenas divulgar estes projetos, fazendo o convite à sua utilização por professores e investigadores, mas igualmente situá-los no quadro da investigação aplicada a desenvolver pelo ensino superior politécnico. A educação intercultural proposta pelo projeto EUMOF EUMOF (European Mobility Folktales) é uma Parceria Multilateral Comenius, financiada pela UE para o biénio 2010-2012, cujos produtos estão disponíveis em linha no endereço http://www.eumof.unic.ac.cy/. Os objetivos do projeto EUMOF são reforçar o sentido de cidadania democrática entre os professores e alunos europeus, tendo por base uma atitude e um valor de res- 130 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI peito pelos povos, línguas e culturas europeias pela promoção, no espaço educativo, de uma nova consciência sobre a importância da diversidade cultural e linguística da Europa, bem como o combate ao racismo, preconceitos e atitudes xenófobas, temas muito atuais na Europa “fortaleza” que defende ferozmente as suas fronteiras e que agora se encontra em crise para encontrar resposta aos refugiados que nela procuram abrigo. De um modo geral, a abordagem do projeto ao tema da multiculturalidade e interculturalidade configura entendimentos recentes, como os de Kymlicka (2004, p.19), de um projeto de cidadania multicultural assente nas múltiplas e heterogéneas afiliações identitárias de grupos de pessoas num determinado espaço/tempo, bem como de Banks (2009) quando define a evolução da noção de educação multicultural para a de educação para a cidadania multicultural. Um dos principais produtos EUMOF é uma coletânea de contos tradicionais sobre mobilidade dos países europeus envolvidos no projeto, acompanhado de um Guia do Professor EUMOF, um conjunto de Atividades Pedagógicas e Educativas (organizadas em três grandes áreas: Cultura, Diferença e Língua, cada uma com um conjunto de objetivos educativos que são abordados em cada atividade pedagógica) e de módulos de Formação de Formadores EUMOF. A linearidade de construção destes materiais, - que radicam na seleção de um conjunto de contos tradicionais ou lendas, curtos (cuja narração oral não ultrapassa os 10 minutos) sobre o tema da mobilidade, de viagens para outras terras, onde se encontram pessoas diferentes das que conhecemos ou se representam locais, povos, culturas e tradições – não obriga os utilizadores a esta lógica de utilização, dado o ambiente multimédia e as diversas perspetivas de acesso aos materiais disponibilizadas. As viagens, as aventuras, as experiências de imigração voluntária ou forçada, as fugas da guerra, configuradas nas histórias da coletânea EUMOF são uma excelente oportunidade para os educadores explorarem com os alunos, a partir dos contos, experiências de deslocação forçada daqueles que deixam de ter de comer nas zonas rurais em que vivem e que são levados até às cidades ou a tentar a sorte noutras paragens ou dos que se encontram às portas da Europa e são rejeitados: “Era uma vez um pobre camponês sem sorte que decidiu abandonar a sua terra” (de “O Camponês Pobre e São Pedro”, um conto grego). Na configuração da escolha dos contos a partir da ideia da mobilidade e da viagem, do encontro e confronto com outras ideias, culturas, tradições e costumes reconhecemos uma ênfase na representação intercultural, de negociação entre culturas, e de construção de um ‘multiculturalismo cosmopolita’ na definição de Kymlicka (1995, p. xiii): um multiculturalismo construído a partir do conhecimento de culturas mundiais influentes com vista à obtenção de melhores condições de trabalho num mundo globalizado. Contudo, pela reunião em coletânea de contos de diversas tradições culturais e linguísticas encontramos uma outra preocupação, multicultural já que encontramos exemplos dos muitos usos pedagógicos dados aos contos em contextos culturais, espacial e nacionalmente diferentes (Morgado, 2012, p.38). Nos produtos EUMOF lidamos também com entendimentos diversos do que é um conto, um valor ou uma estratégia de promoção da interculturalidade. Neste sentido, estaremos mais próximos do conceito de cosmopolitismo cultural definido por Appiah (2006), de recetividade de cada indivíduo, a seu modo, a outras culturas, de reconhecimento e aceitação da sua diferença e da de outros na sua multiplicidade e heterogeneidade, num esforço de encontro a meio caminho entre o relativismo e o universalismo num processo de identificação cultural profundamente individualizado e híbrido (Morgado e Pires, 2010, pp.63-64). A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 131 A educação plurilingue promovida pelo projeto ALPHAEU no jardim-de-infância As perspetivas multiculturais e pós-coloniais do projeto EUMOF (desenvolvido em 2013 e 2014), legíveis enquanto projetos de comprometimento social e político com a transformação da sociedade, dão lugar no projeto ALPHAEU (http:// alphaeu.org/) a ideias de cidadania democrática à escala global (Joppke e Morawska, 2003), que sublinham a integração de pessoas na sua diversidade por intermédio de medidas de maior assimilação cultural, dentro do respeito pela multiculturalidade. Uma das bases desta multiculturalidade é o plurilinguismo cultivado desde a mais tenra idade, um conceito defendido pela OCDE desde o início do milénio (OECD, 2000) e trabalhado pela EU em documentos estratégicos (EU, 2011). Desenvolvido com base num levantamento de práticas de abordagem precoce às línguas estrangeiras dos países do consórcio e, naturalmente também, de Portugal (Cruz, Ferraz, et al, s/d; Gil, s/d; Granada, C. e Infante, M. J., 1999; Nobre, s/d; Oliveira, s/d; Oliveira, Lopes et al, 2005; Pellier, 2011, Silva, 2007) e de boas práticas internacionais (Enever e Moon 2009; Mourão, 2001; Mourão e Gamboa, 2009; Reilly and Ward, 1997), ALPHAEU construiu um conjunto de alfabetos digitais interativos, em seis línguas europeias, de sensibilização às línguas estrangeiras (português, italiano, romeno, alemão, grego e inglês) no jardim-de-infância. Esta sensibilização tem por finalidade e objetivos promover a abertura a diferentes culturas/línguas e desenvolver desde tenra idade a competência intercultural, como a curiosidade pela língua e cultura do ‘outro’, comparar e contrastar culturas, línguas, palavras e sons para encontrar o que é comum e mesmo treinar a capacidade metalinguística de reflexão sobre como se pensa numa determinada língua/cultura. O projeto ALPHAEU é inovador em muitos aspetos: pelo acesso a tecnologias mediadas por computador (o que não é frequente neste escalão etário) que preconiza: os alfabetos são digitais e interativos; pela perspetiva multilingue e pela oferta de recursos em línguas europeias minoritárias; pela disponibilização de dois alfabetos: o romano e o grego; pela ligação que permite entre som, imagem e grafema; pela perspetiva comparada que configura: comparar fonemas e grafemas entre línguas promove a interatividade cultural, estimula a curiosidade e encoraja as crianças a procurar semelhanças e diferenças entre línguas e culturas, colocando-as, desse modo, no caminho certo para formular teorias genéricas sobre o funcionamento das línguas. Para além dos alfabetos digitais, o projeto ALPHAEU disponibiliza um conjunto de atividades pedagógicas, um curso de formação mista (presencial e a distância) para educadores com os objetivos de objetivos de formação seguintes: 1. Conhecer e manusear os materiais pedagógicos do projeto AlphaEU; 2. Participar em projeto multinacional financiado pela EU na área da educação; 3. Conhecer estratégias pedagógicas de multilinguismo e adequá-las a atividades de jardins-de-infância locais; 4. Implementar os materiais AlphaEU em jardim-de-infância; 5. Divulgar os materiais e os planos da sua utilização ao ambiente educativo. Estes objetivos são conjugados com objetivos de implementação em contextos de jardim-de-infância para monitorizar e refletir sobre os materiais do projeto AlphaEU (alfabetos, atividades, manual para adultos), sugerir melhorias dos materiais do projeto AlphaEU (alfabetos, atividades, manual para adultos), acompanhar as atividades dos pais e identificar as melhores práticas. AlphaEU apresenta ainda e estudos de caso baseados em experiências concretas levadas a cabo em jardins-de-infância 132 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI pelos educadores que receberam formação, nos países europeus da parceria. Neste sentido, o projeto responde a recém-reformulados princípios-chave de educação pré-escolar enunciados (European Commission, 2014), de respeito pelos interesses e pela diversidade cultural das crianças, de pedagogias centradas nos seus interesses e no seu desenvolvimento cognitivo, social, emocional e físico integrado. A formação de atores sociais para prevenir o abandono escolar e a constituição de comunidades europeias de prática do projeto SSN O projeto SCHOOL SAFETY NET (SSN), disponível no portal eletrónico http:// schoolsafetynet.pixel-online.org, é um projeto financiado pela União Europeia para 2013 e 2014 e promovido por um conjunto de países europeus (Itália, Portugal, Espanha, Bélgica, Roménia, Grécia e Turquia) sobre a prevenção do abandono escolar precoce a partir de 4 núcleos: deteção de alunos em risco de abandono, integração de alunos imigrantes, acompanhamento de alunos com dificuldades de aprendizagem e prevenção de episódios de violência e de bullying. O projeto SSN visa responder à necessidade dos sistemas educativos europeus de lidarem com questões de abandono escolar precoce, atuando ao nível da sua prevenção, disponibilizando para o efeito um conjunto de recursos, organizados numa base de dados, que pode ser usado por escolas, instituições de formação e investigação e também por professores, diretores, alunos, pais e encarregados de educação, decisores políticos e trabalhadores sociais no setor educativo. Aborda um tema-chave da educação contemporânea de encontrar respostas para crianças e jovens de grupos em risco ou desfavorecidos. O projeto identifica problemas e oferece soluções integradas e conjugadas entre todos os parceiros educativos para responder a situações de saúde precária, mobilidade forçada, pobreza e exclusão. O portal, com a base de dados – disponível em http://schoolsafetynet.pixel-online.org/info/ index.php – (que colige histórias de sucesso no âmbito da prevenção do abandono escolar precoce, recursos científicos e materiais pedagógicos, experiências de professores, linhas de orientação, construção de cenários, estudos de caso, módulos de formação) foi intensamente usado pela rede de instituições da ESE de Castelo Branco e de Portalegre e por outras comunidades nacional no âmbito de um protocolo de formação de agentes sociais e comunitários com o Alto Comissariado para as Migrações (ACIDI, agora ACM). A usabilidade do portal reflete uma boa organização dos recursos, aprazibilidade dos mesmos, fácil acesso à informação, estrutura e organização claras e clareza na ligação entre os recursos, bem como qualidade dos materiais e recursos disponibilizados em português e noutras línguas. As linhas de orientação consistem em 10 passos ou medidas a adotar com o objetivo de ajudar cada grupo alvo a compreender melhor cada uma das 4 áreas temáticas, interligando os recursos da base de dados do projeto SSN com recursos de outros portais web, nomeadamente: Portal School Inclusion (http://schoolinclusion.pixel-online.org/) para a área temática “Identificação de alunos em risco”; Portal Routes (http://routes.pixel-online.org/index.php) para a área temática “Integração de alunos imigrantes”; Portal EMBED (http://www.embeddyslexia.eu/) para a área temática “Alunos com dificuldades de aprendizagem”; Portal I Am Not Scared (http://iamnotscared.pixel-online. org/) para a área temática “Prevenção de bullying escolar”. São 20 conjuntos de linhas de orientação, 5 por cada área temática, específicas para cada grupo alvo: diretores, professores, pais ou encarregados de educação, alunos e decisores políticos, com referências aos recursos do portal SSN e de outros portais A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 133 O projeto SSN é essencialmente um projeto de disseminação de recursos e de partilha deles de uma perspetiva de comparabilidade europeia, bem como de uma exploração cruzada e mutuamente fertilizada entre os atores: alunos, pais (ou encarregados de educação), professores, diretores de escola e decisores políticos. Conceptualmente, o projeto assenta numa abordagem ‘bottom-up’, das práticas e experiências recolhidas no terreno (em escolas e entre os atores já mencionados) para a reflexão e disseminação das melhores práticas, e visa integrar, num todo, várias causas identificadas do abandono escolar precoce e trata-las de forma transnacional, nomeadamente: deteção atempada de alunos em risco de abandono; integração de alunos imigrantes; apoio às dificuldades de aprendizagem dos alunos; e apoio aos alunos que são vítimas de violência e de bullying na escola. As linhas de orientação são complementadas com a recolha de experiências, em cada uma das áreas do projeto, de 10 professores, em cada país, e a sua participação num fórum transnacional para comentar e comparar essas experiências. O portal disponibiliza 165 experiências de professores e comentários. As histórias compiladas e as experiências narradas por professores dão origem à criação de cenários, criados pelas equipas de parceiros do projeto, debatidos transnacionalmente e posteriormente apresentados como estudos de caso, a resolver de forma cooperativa por consórcios de escolas pela apresentação de estratégias a implementar. Nesta fase cada parceiro conduziu uma sessão de debate do cenário em linha e com professores de países parceiros de forma a chegar a uma estratégia consensual do cenário proposto baseada no material disponibilizado no portal SSN. A base de dados SSN constitui um repositório de boas práticas, com diversos mecanismos de exploração das mesmas por professores, como é o caso dos fóruns constituídos para recolha dos seus testemunhos e para criação de estratégias para responder aos cenários propostos. No entanto, importa ao projeto SSN que todos os atores educativos possam utilizar os recursos disponibilizados de forma customizada, de modo a experimentar trabalhar com eles a partir dos seus contextos de atuação específicos, no sentido de os integrar eficazmente nas suas práticas de atuação. A existência de plataformas dinamizadoras de projetos, como a do projeto “School Safety Net”, permite à investigação e à ação educativa uma maior estruturação e uma base tecnológica de disseminação do processo de investigação e da experiência acumulada nas escolas a todas as partes interessadas e à comunidade em geral, que neste caso é europeia. A extensão da plataforma informática à escala europeia constitui também uma oportunidade para demonstrar no plano internacional conhecimento e capacidade científica no domínio da prevenção do abandono escolar precoce. A promoção da leitura entre jovens que a rejeitam no projeto BOYS’ READING O projeto BOYS READING parte de surpreendentes dados que começam a emergir: Em 1/5 dos países da UE, os rapazes de quinze anos possuem baixas competências de leitura (OECD 2011; 2012) e a maioria dos leitores renitentes e não–leitores e eventualmente também a maioria dos alunos que acabam por abandonar a escola são rapazes. Junte-se a estes dados o facto de ler ser uma das competências básicas do século XXI com impacto sobre a aprendizagem e desenvolvimento intelectual individuais. A Comissão Europeia (2012) salienta que quanto mais desenvolvida a literacia, maior a inovação, a prosperidade e a coesão sociais, bem como o bem-estar, a participação social e a empregabilidade dos cidadãos. Resultados do PISA 2000, 2003 e 2006 para os 15 anos e do PIRLS (Progress in International Reading Literacy Study) para os alunos com 10 anos: em todos os países as raparigas atingem níveis 134 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI mais altos nos testes de leitura do que os rapazes (Lynn & Mikk, 2009). As raparigas adquirem competências verbais e gramaticais complexas e competências de leitura acima dos rapazes e estes apoiam-se mais na comunicação não-verbal e incluem menor variedade discursiva ou de expressões que utilizam, comenta Gurian (2010, p.25-6). Os rapazes revelam atitudes negativas em relação à leitura (atividade obrigatória, autoridade dos professores, política educativa), comenta Senn (2012, p.215). Os estilos de aprendizagem e as preferências dos rapazes são diferentes dos que são promovidos na escola (Senn, 2012, p.216). Os livros da escola são olhados como ‘livros de meninas’ pelos rapazes, que preferem não se envolver na análise das personagens ou das relações entre elas (Bolzt, 2007). Nas suas relações informais surge a ideia que a leitura não se liga ao papel de um homem na sociedade (Forsthuber, Horvath & Motiejunaite, 2010, p.26). Os rapazes, mais do que as raparigas, criam fronteiras de género em torno da leitura e gostam de escolher livros ‘masculinos’. Com base neste conjunto de dados reunidos pela parceria, recorrendo a uma pesquisa para identificar tendências atuais de investigação e iniciativas ligadas ao tema do projeto em cada um dos países parceiros, incluindo o envolvimento direto de professores, pais, bibliotecários e rapazes, o projeto procura integrar a leitura nas rotinas dos rapazes com idades compreendidas entre os 11 e os 15 anos. Para o conseguir, é preciso que os rapazes adolescentes possam selecionar quais os livros que mais apelam às suas necessidades e interesses, que exista diálogo com eles e que todos os agentes educativos (incluindo pais e membros da comunidade) se envolvam com esse objetivo. Todos eles são o público-alvo do projeto, embora exista um enfoque no pessoal educativo e na possibilidade que este tem de criar experiências de sala de aula, capazes de responder aos interesses, necessidades e estilos de aprendizagem dos rapazes e de envolver tanto raparigas como rapazes em práticas de leitura e de escrita. Os objetivos do projeto são: Aumentar a motivação e o interesse dos rapazes pela leitura e pela escrita de modo a diminuir o fosso existente entre rapazes e raparigas; Abrir as escolas a materiais de leitura mais apelativos, incluindo recursos digitais, para satisfazer as preferências individuais de leitura e escrita dos rapazes; Facilitar o contacto com modelos masculinos envolvidos na literacia; e promover iniciativas que tornem a leitura e o desenvolvimento linguístico divertido e apelativo para rapazes. Todos estes objetivos encontram sugestões concretas num Guia de Recursos Pedagógicos, que apresenta orientações e ideias sobre como os professores podem estimular o interesse pela leitura e sobre como integrar textos para rapazes nos currículos escolares. Os dados recolhidos permitem sintetizar que as preferências de leitura de rapazes incluem as seguintes categorias: ficção científica, romance gráfico, humor, fantasia e mistério, ligação entre livro e filme ou série televisiva e livros sobre desporto. Dão especial atenção aos seguintes aspetos: capa, desenhos, livros digitais e letras de tamanho grande. O Guia apresenta sugestões de leitura e Sugestões de integração das novas tecnologias, como, por exemplo, Conversas sobre livros num sítio eletrónico ou blog; Trailers de livros; Página de Facebook para certos livros/personagens; Promoção da leitura de e-books selecionados; Vídeos de recensão de livros; Representações visuais sobre as melhores cenas/partes de livros; Realizar filmes sobre o enredo de livros; Usar o twitter com citações de livros; Usar o correio eletrónico para trocar comentários. A promoção de competências narrativas básicas na era do digital em AQUA NARRABILIS Mais latas e fundamentais no desenvolvimento da literacia estão as competências narrativas básicas que são o objeto do projeto AQUA NARRABILIS. As competências narrativas e a capacidade de descrever coisas e acontecimentos, bem como de contra uma história, são essenciais para o desenvolvimento da escrita e da leitura, A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 135 da aprendizagem de uma segunda língua ou de uma língua estrangeira, para o desenvolvimento de uma cidadania participativa democrática no modo como se aprende a ser ouvido. Estas são também competências cruciais para uma efetiva comunicação em qualquer área do saber. O projeto AQUA NARRABILIS, a partir de um tema central como é o da Água, explora metodologias de desenvolvimento das competências acima descritas por intermédio de métodos convencionais de contra histórias (a partir de livros), de leituras em voz alta de livros, de apresentações visuais de álbuns de imagens, de teatros japoneses Kamishibai, de dramatizações, fantoches, teatros de sombras e outros métodos essencialmente performativos. Estas metodologias são coligidas e ilustradas com exemplos práticos, materiais exemplificativos, propostas didáticas e recursos pedagógicos de acesso livre em diversas línguas europeias para utilização em escolas e bibliotecas com crianças do pré-escolar ao 2º ciclo. A promoção da cidadania ativa e participativa no projeto WE ARE EUROPE. O projeto WE ARE EUROPE (Conhece-te a ti próprio e aceita a diferença dos outros), de caráter interdisciplinar e destinado a alunos da faixa etária dos 10 aos 14 anos, visa a criação e desenvolvimento de módulos de ensino-aprendizagem inovadores, interdisciplinares e respeitadores de valores e práticas das comunidades envolvidas e assume como eixo enquadrador os princípios-chave definidos pela Comissão Europeia (2014) para uma Educação Básica de qualidade. Assumindo uma perspetiva centrada na criança, nos seus interesses e nos seus modos preferidos de aprender, organiza-se a aprendizagem, em torno de temas específicos interculturais, tais como o de ‘a minha terra’ em termos de identidade nacional, regional e local, tradições musicais, moda, culinária, desporto, a educação do futuro e as competências para o futuro, com vista à troca de informação com crianças dos países parceiros. A ideia é suscitar o interesse dos alunos pela Europa em geral e pelos países europeus envolvidos no projeto, mais especificamente, bem como despertar ou aprofundar o seu interesse pela Europa e pela União Europeia enquanto espaço inclusivo de aprendizagem ao longo da vida e de trabalho, ao mesmo tempo que se configuram as crianças como participantes ativos nas sociedades, na aprendizagem e na definição dos cuidados de que necessitam. As crianças não são apenas recipientes de educação, mas merecem ter um papel ativo na definição da sua aprendizagem (European Commision, 2014, p. 7). Este objetivo é concretizado em temas, recursos e atividades transdisciplinares concebidos a partir de interesses identificados junto das crianças para complementarem os currículos escolares, testados em escolas (educação formal) e em bibliotecas (educação informal). Estas atividades visam igualmente ajudar os alunos envolvidos no desenvolvimento das suas personalidades, na identificação das suas competências e no aperfeiçoamento das suas capacidades sociais para um mundo multicultural e globalizado. A estrutura do projeto pretende oferecer a professores, bibliotecários e estudantes a oportunidade de se familiarizarem com novos métodos e percursos educativos e profissionais e com condições de trabalho emergentes na Europa unificada e no mundo globalizado. Metodologicamente, o projeto promove o envolvimento localizado de alunos e professores de acordo com os contextos em que mais sentido faz desenvolverem as atividades de ensino/aprendizagem, isto é, terão oportunidade de escolher temas, atividades e recursos que considerem mais motivadores, entre os que lhe são propostos, de encontrar estratégias para dar voz às crianças enquanto co-criadores de conhecimento em interação com outras crianças e com adultos (p.7). O projeto encoraja o trabalho em equipa e o ensino/aprendizagem em diferentes fóruns e visa expandir as competências dos alunos para usar os media. 136 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI Conclusões A educação intercultural proposta pelo projeto EUMOF; a educação plurilingue promovida pelo projeto ALPHAEU no contexto de jardim-de-infância; a formação de atores sociais para prevenir o abandono escolar a partir da identificação das causas mais óbvias do mal-estar escolar e a constituição de comunidades europeias de prática do projeto SCHOOL SAFETY NET; a promoção da leitura entre jovens que a rejeitam e a capacitação de professores para lidarem com essa atitude de rejeição, no projeto BOYS’ READING; a promoção de competências narrativas básicas na era do digital, com ênfase em modos performativos de leitura a introduzir desde as mais tenras idades, no projeto AQUA NARRABILIS; e a promoção da cidadania ativa e participativa de crianças colocadas no centro do processo educativo, presente no projeto WE ARE EUROPE; todas estas formas de aplicar o conhecimento e a investigação, que resultam de parcerias estratégicas, fazem justiça e acompanham dinâmicas de adequação da educação e da escola às pressões globalizantes da era digital e da economia mundial e a práticas situadas localmente, que coexistem em tensão. O que procurámos demonstrar foi como os conceitos teóricos de ‘educação multicultural e intercultural’, de ‘educação plurilingue’, de ‘abandono escolar precoce’, de ‘cidadania ativa multicultural e participativa’, bem como de ‘competências básicas’ para a educação do século XXI encontram expressão aplicada diversa - e negociada estrategicamente entre parceiros europeus, neste tipo de projetos – da que é teorizada na investigação fundamental, transformando-se em práticas educativas específicas em contextos diversificados. Nestes projetos de investigação aplicada o elemento humano é realçado pelo modo como se registam, de forma comparativa ou paralela, os processos de interação de alunos e formadores com os recursos e materiais desenvolvidos pelas parcerias. Eles contribuem igualmente para uma boa gestão da informação disponível sobre cada assunto/tema pela forma como a disponibilizam gratuitamente e de acesso livre online e documentam a história de constituição do acervo. Mais importante ainda do que estes aspetos, é o facto de os projetos potenciaram a passagem do conhecimento à ação, uma vez que, ao implementarem e avaliarem criticamente a implementação de recursos e materiais, os projetos asseguram que existe sentido e relevância para cada organização em particular e que aquilo que eventualmente alterou as suas práticas pode influenciar outros ou foi influenciado por outros atores dentro da parceria. As parcerias estratégicas em educação não representarão cabalmente uma mudança organizacional dos sistemas educativos ou das filosofias educativas de cada um, mas constituem sem dúvida um passo certo nesse sentido. Referências bibliográficas Appiah, K. A. (2006). Cosmopolitanism: Ethics in a world of strangers. New York: Norton. Banks, J. A. (2009). Human Rights, Diversity and Citizenship Education. Paper prepared for presentation as keynote address at the International Association for Intercultural Education. Athens 22nd-26th June 2009. 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Lista de autores ALPHAEU: Charalambos Vrasidas, Petros Panaou, Valentina Tomba, Francesca Granieri, Sarah Land, Emma Land, Margarida Morgado, Maria José Infante, Yolanda Frangou, Martha Vasiliadou, Katerina Theodosiadou, Raymond Laverty; Adriana Lazar Oprea. Lista de autores SSN:Christine Cloes, Julien Keutgen, Spiros Sirmakessis, Giuseppe Italiano, Domingos Santos, Margarida Morgado, Mihaela Cornelia, Rosario del Rey, Murat Demirbaş, Mustafa Bayrakcı. Lista de autores BOYS’ READING: Christiana Aravi, Helen Bonanou, Panos Papoutsis, Yiannis Kotsanis, Petra Kampf, Georg Muellner, Ivana Batarelo Kokić, Jadranka Nemeth-Jajić, Andreja Bubić, Tonća Jukić, Vesna Kostović-Vranješ, Ivanka Buzov, Snježana Dimzov, Anita MandarićVukušić, Maria da Natividade Pires, Margarida Morgado, Manuela Abrantes, Karolina Tomczyk, Jaroslaw Pluciennik, Michal Woblewski, Ionel Didea, Georgeta Chirselan, Adina Elena Dumitru, Charalambos Vrasidas. Lista de autores AQUA NARRABILIS: Wolfang Moser, Verena Gangl, Malgorzata Kolodziejczyk, Margarida Morgado, Maria da Natividade Pires, Teresa Gonçalves, António Pais, Elisabeth Zehetmeier, reinhart Ehgartner, Panayiotis Angelides, Radka Kalcheva, Emilia Milkova. Lista de autores WE ARE EUROPE: Lilia Ratcheva-Stratieva, Katharina Reindl, Karin Veit, Malgorzata Kolodziejczyk, Margarida Morgado, Gertrudes Amaro, Ana Cravo, Mare Muursepp, Liisa Karlsson, Branwen Bingle. A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 139 PRÁTICAS DE ESCRITA NA AULA DE ESPANHOL LÍNGUA ESTRANGEIRA: AS COMPETÊNCIAS COMUNICATIVA E SOCIOLINGUÍSTICA André Costa ([email protected]) Escola Superior de Gestão do Instituto Politécnico de Castelo Branco Maria da Graça Sardinha ([email protected]) Paulo Osório ([email protected]) Universidade da Beira Interior Resumo A competência de comunicação, elemento chave elencado pelo Quadro Europeu Comum de Referência para as Línguas: Aprendizagem, Ensino, Avaliação, cumpre um papel preponderante nas aulas de espanhol língua estrangeira, seja em termos de expressão ou compreensão, oral ou escrita. Ao falarmos em competência de comunicação, devemos também centrar-nos na competência sociolinguística, isto é, da ativação de um conjunto de conhecimentos que facilita o uso da língua, por veicular eficácia e adequação aos atos comunicativos em que o usuário interage. Referimo-nos, então, a questões geográficas, económicas, sociológicas, históricas e religiosas, enfim, culturais que englobam crenças, tradições e atuações, elencadas pela componente sociocultural, e que caracterizam de forma indelével os utilizadores de determinada língua. Nesta comunicação, procura-se analisar de que forma a competência sociolinguística concorre para a constituição da competência comunicativa no que concerne à ativação de competências de escrita que cumpram esse objetivo. Este estudo visa, assim, analisar que modelos e práticas de ensino-aprendizagem são utilizados no ensino do espanhol para a consecução de um texto escrito adequado à situação de comunicação contando, para tal, com o recurso a entrevistas de professores de espanhol língua estrangeira que, com a sua opinião, nos darão luz sobre a problemática propos- 140 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI ta, esclarecendo-nos sobre a importância que o texto escrito possui, hoje em dia, nas aulas de espanhol língua estrangeira e qual o papel que, no seio dessa competência, desempenha a adequação à situação de comunicação. Palavras-chave: Escrita; língua estrangeira;; competência comunicativa; competência sociolinguística. Abstract Communicative competence key part listed by the Common European Framework of Reference for Languages: Learning, Teaching, Assessment, plays a leading role in Spanish lessons foreign language, both in terms of expression or understanding, oral or written. When we talk about communication competence, we must also focus on the sociolinguistic competence, ie the activation of a body of knowledge that facilitates the use of language, for vehicular effectiveness and suitability to communicative acts in which the user interacts. We refer then to geographical, economic, sociological, historical and religious, in short, that include cultural beliefs, traditions and performances, listed by social and cultural components, and featuring indelibly specific language of the users. In this communication, we try to analyze how the sociolinguistic competence contributes to the creation of communicative competence with respect to the activation of writing skills that meet this objective. This study therefore aims to analyze which models and teaching-learning practices are used in teaching Spanish to the achievement of a written text appropriate to the situation of communication counting, to this end, with the use of Spanish foreign language teacher interviews with your opinion, give us light on the problematic proposal, explaining us about the importance of the written text has, today, in the classes of Spanish foreign language and what role, within that jurisdiction, plays the adequacy the communication situation. Keywords: Writing; foreign language; communicative competence; sociolinguistic competence. Introdução A escrita encontra-se presente, em termos sociais, na grande maioria das nossas necessidades linguísticas. O primado da internet e a sua importância crescente na vida não apenas dos jovens, como também na dos adultos, faz com que na atualidade se olhe de uma outra forma para a escrita e para as implicações das aplicações práticas que dela se fazem (Barbeiro, 2003; Carvalho, 1999; Cassany, 2005). Estes autores defendem a necessidade de uma adequada aprendizagem da escrita que, sendo ativada em língua materna, poderá mais facilmente ser desenvolvida aquando da aprendizagem de uma língua estrangeira (Cassany, 2005). A situação que se tem vivido em termos de docência de língua estrangeira desde 2001, com a implementação do Quadro Europeu Comum de Referência para as Línguas (QECRL), faz com que os professores possam, com cada vez maior facilidade e proficiência, compaginar as expectativas dos alunos com uma crescente autonomia, que é expectável de parte a parte; para além disso, denota-se, ainda, um possível aumento da aplicação da criatividade ao processo de ensino-aprendizagem da língua, assim como uma maior flexibilidade do curriculum, algo que permite a melhoria generalizada das condições de aprendizagem, valorizando o essencial da atividade docente: o alcançar dos objetivos propostos para cada um dos níveis de proficiência definidos pelo QECRL A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 141 e a consequente obtenção do conjunto enunciado de competências linguísticas, sociolinguísticas e pragmáticas, assim como de capacidades comunicativas e socioculturais. Deverá, então, a atividade docente centrar-se na preparação e aplicação de atividades facilitadoras da sua consecução levando os alunos de língua estrangeira a desenvolver, de uma forma holística, todas as competências orais e escritas necessárias a um adequado uso da língua-alvo em contexto real. Contextualização teórica No que diz respeito à produção do texto escrito e mesmo ao nível da expressão oral, a aprendizagem de uma língua estrangeira requer dinâmicas socioculturais que exigem, concomitantemente, o desenvolvimento da competência sociocultural não apenas de quem aprende esse idioma, como também de quem o ensina, porquanto a volatilidade deste tipo de conhecimento impõe que o mesmo seja atualizado, adaptado e modernizado, fruto do devir da(s) sociedade(s). Para a consecução desse objetivo contribuem quatro sub-competências que conformam essa mesma competência comunicativa, de acordo com Canale & Swain (1980), a saber, a competência gramatical que implica o domínio do código linguístico da língua alvo; a competência sociolinguística que pressupõe a adequação da mensagem ao contexto da sua produção e/ou receção; a competência discursiva presidida pela coerência e coesão e, por fim, a competência estratégica que antevê potenciais obstáculos comunicativos. Contudo, todo e qualquer estudo sobre o ensino/aprendizagem de idiomas deverá pressupor o QECRL (2001) que nos oferece uma base comum que possibilita e potencia a elaboração de diferentes programas na área das línguas. No referido texto, a competência comunicativa surge enunciada como uma aptidão que resulta grandemente de três elementos constituintes, os saberes linguísticos, sociolinguísticos e os pragmáticos (op.cit.:34). Considerando que o QECRL coloca a ênfase em determinados parâmetros socioculturais, parece-nos, com Van Ek (1984), que deverá postular-se a existência de uma competência sociocultural que possa regular as produções linguísticas, adaptando-as aos contextos nos quais são produzidas, ao invés de que haja uma preocupação exclusiva com os conhecimentos linguísticos aí aplicados, até porque a competência comunicativa é composta por várias camadas, como refere Niño (2008). Estamos, portanto, perante uma visão holística da competência comunicativa, também partilhada por Romeú (2005), que a define como uma configuração psicológica integradora de capacidades que lhe permitem interagir em diferentes ambientes socioculturais, perseguindo diferentes fins e objetivos, incluindo na competência de comunicação quer a componente cognitiva, quer a componente sociocultural, abarcando, assim, os saberes culturais, conhecimentos, valores, necessidades, emoções e motivações, num processo constante de retroalimentação, como refere, aliás, Bardovi-Harling (2001). Parece-nos, na prática, que um desvio no que concerne à competência linguística refletirá apenas um desconhecimento gramatical; contudo, os equívocos socioculturais poderão originar a um comprometimento ou embaraço por parte dos interlocutores. Este possível entrave na comunicação pode ser facilmente justificado pelo facto de ter, permanentemente, como ponto de partida uma visão enraizada na sua própria cultura pelo que o filtro aplicado a todas as situações de comunicação será o do ponto de partida e nunca o do ponto de chegada, ao estar sempre mais próximo da língua materna do que da língua alvo. Contudo, Cook (2003) coloca algumas reticências, associadas à componente sociocultural, em virtude da ausência desta dos manuais escolares que acabam por centrar-se quase exclusivamente 142 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI na língua, ou seja, nas competências puramente linguísticas, acrescentando, ainda, Bardovi-Harling (2001) que os diálogos presentes em muitos dos manuais são pouco reais, algo que acaba por provocar desmotivação e frustração. Dever-se-á, então, garantir a integração da componente sociocultural na componente comunicativa, facultando ao aluno as ferramentas necessárias para uma comunicação plena com os falantes nativos. Pressupõe-se, então, uma adequação do processo de ensino-aprendizagem aos padrões da língua estrangeira, sejam eles contextuais ou culturais, para além de uma abordagem direcionada para aspetos culturais que não apenas a história, o sistema político, mas primordialmente as crenças, as suposições e as opiniões que conformam o pensamento dos falantes da língua-alvo, para que o próprio aluno consiga (man)ter a consciência dos contextos culturais que envolvem os processos comunicativos, evitando um potencial choque cultural. Assim, e como defende o QECRL (2001:150), “O conhecimento, a consciência e a compreensão da relação (semelhanças e diferenças distintivas) entre “o mundo de onde se vem” e “o mundo da comunidade-alvo” produzem uma tomada de consciência intercultural.” que contribui para relativizar as situações comunicativas em ambas as línguas; contudo, não raras vezes esta mesma competência sociocultural acaba por ser confundida por professores e alunos com alguns “estereótipos nacionais” (idem, ibidem) ao invés de se optar por uma abordagem que inclua o tratamento de elementos que conformem comunicação não-verbal, como o caso dos gestos, da proximidade entre indivíduos ou dos hábitos e costumes ou de elementos diferenciadores dos atos de fala típicos da língua-alvo1. Contextualização Metodológica Optámos, neste estudo, por uma abordagem direta ao corpo docente, por forma a evidenciar não os resultados finais apresentados pelos alunos mas antes refletir sobre a forma como os professores encaram o ensino da escrita e a forma como ponderam os resultados dos alunos. A estratégia de investigação seguida neste trabalho é de tipo intensiva-qualitativa. Este tipo de estratégia de investigação caracteriza-se pela intensidade da abordagem ligada à multiplicidade de facetas a estudar (Greenwood, 1965). Trata-se de analisar em profundidade as dimensões que caracterizam este singular processo de ensino-aprendizagem da escrita, associado ao ensino do espanhol como língua estrangeira. Esta orientação metodológica procura contrariar os tradicionais métodos positivistas, opondo à generalização pela quantidade e pela uniformização, a generalização pela qualidade e pela exemplaridade (Estanque, 2000:104). As qualidades explicitadas a partir de uma perspetiva disciplinar, conferem representatividade ao caso. Esta representatividade não decorre da estatística, à qual ela é muitas vezes reduzida nas ciências, mas de uma representatividade que se pode qualificar de teórica (Hamel, 1997:99-100). O tipo de entrevista privilegiado foi a semi-diretiva, cujo guião-base se encontra em anexo. A ambiguidade é menor, na medida em que o esquema da entrevista estrutura o indivíduo e, consequentemente, impõe-lhe um quadro de referência. Para delimitação do número de entrevistas utiliza-se o critério de ‘exaustão’ ou ‘saturação’ segundo o qual o investigador efetua entrevistas em número suficiente para permitir certa reincidência das informações, garantindo um máximo de diversificação e abrangência (Minayo, 1999), tendo, o nosso estudo, ficado limitado a onze entrevistas. 1 Para mais informação sobre este tema e uma consulta mais aprofundada sobre as variáveis que podem interferir nos aspetos comunicacionais, vejase o QECRL (2001:148-149) onde se elencam diferentes aspetos distintivos que conformam potenciais especificidades culturais, dentro de sete áreas-chave, a saber: 1. Vida quotidiana, 2. Condições de vida, 3. Relações interpessoais, 4. Valores, crenças e atitudes, 5. Linguagem corporal, 6. Convenções sociais e, 7. Comportamentos rituais. A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 143 Apresentação, análise e discussão dos resultados a. Prevalência de uma competência A maioria dos entrevistados começava por garantir o equilíbrio oferecido ao conjunto de competências apesar de que, a posteriori, dois professores acabavam por descrever uma aposta um pouco mais forte numa das quatro destrezas. Este equilíbrio encontra sustentação no facto de que “o que se pretende é que eles saibam um conjunto de conhecimentos que lhes permitam usar a língua em várias circunstâncias”, como refere O_cb. É também esta a opinião veiculada por Amor (2003), defendendo a autora que a escrita é tão relevante como as outras competências associadas ao ensino-aprendizagem de uma língua, o que pressupõe o recurso a um ensino levado a cabo de forma faseada e equilibrada, comparativamente às restantes destrezas, posição também preconizada pelos diferentes programas do Ministério da Educação (Fernández S., 2002). A única opinião díspar, relativamente aos restantes entrevistados foi a do professor L_cb que privilegia a expressão, seja “à expressão escrita e à expressão oral” porque “a compreensão é muito mais fácil para alunos portugueses”. b. Proporcionalidade dos resultados evidenciados pelos alunos nas diferentes componentes Os objetivos por detrás desta segunda categoria passam por evidenciar se os resultados que os alunos alcançam sofrem divergências relativamente à oralidade e à escrita, mas também tentar perceber se é possível identificar uma relação direta entre o investimento feito em sala de aula e os resultados que os alunos alcançam. Conclui-se, como refere A_cb, que os alunos são “melhores na escrita do que na oralidade porque não têm segurança”, até porque, e como expõe o professor A_lx, “o facto de ser tão parecido com o português, leva-os a cometer demasiados erros e isso na oralidade reflete-se ainda mais” até porque “na escrita conseguem contornar um pouco essa questão”, em virtude da maior reflexividade inerente à atividade e à gestão que os alunos podem fazer do tempo disponível para a atividade, como defende, aliás, Sim-Sim (1998) que aponta para a metacognição que, por refletir o “controlo dos processos e produtos cognitivos”, como a definiu Flavell (1976), implica e pressupõe essa mesma reflexividade como algo inerente ao processo de escrita. c. Reação dos alunos perante exercícios de expressão escrita e de expressão oral Procura-se, aqui, confirmar se o ponto de vista dos docentes é, de alguma forma, coincidente com as reações que os alunos demonstram, quando confrontados com as diferentes atividades de expressão oral e escrita. Uma reação positiva à expressão oral colhe unanimidade na medida em que “apesar de tudo, eles encaram uma atividade de expressão oral como algo mais motivador”, como nos indica o professor A_lx. É certo que alguns dos entrevistados asseguram que “eles acabam por gostar mais da oralidade quando sentem segurança”, refere A_cb. Há ainda uma outra linha de argumentação, partilhada por três professores, que remete para a necessidade de “procurar assuntos que a eles lhes interessem”, como refere L_cb, porque “o que eles vão usar é mais a oralidade do que a escrita”, 144 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI pelo que “lhe reconhece mais utilidade”, no entender de O_cb, aludindo assim às bases da metodologia de ensino por tarefas, como defende Nunan (2002) apontando para a necessidade de que os alunos se impliquem na compreensão, manipulação, produção e interação em L2, aproximando as práticas pedagógicas de ações da vida quotidiana. d. Objetivos predominantes à consecução de uma produção escrita Optou-se, aqui, por direcionar a entrevista para o campo da expressão escrita e para a forma como professores e alunos agem relativamente a práticas de escrita. Após uma análise aos dados extraídos das entrevistas, verificou-se que raramente se perspetiva apenas a consecução de um único objetivo, algo a que não é estranha, naturalmente, a própria natureza do texto escrito que permite a avaliação de diferentes parâmetros, como refere, aliás, o professor R_prt “a maior parte das vezes estão todas em jogo, agora dependerá sempre dos objetivos do professor” pois, como defende Bronckart (1995), devemos entender a textualização como um conjunto de ferramentas que acaba por poder levar à constituição de um saber linguístico e não apenas úteis à consecussão desse mesmo texto. e. Competências predominantes à consecução de uma produção escrita Procurava-se aferir do destaque dado à componente sociocultural, considerando que a sociolinguística, apesar de abarcar aspetos bastante diversificados e, amiúde, avançados do estudo de uma língua, inclui também referências à adequação de um texto à situação de comunicação, pela importância que deve à atenção aos registos e usos da língua-alvo, de acordo com QECRL (2001). Contudo, no decorrer da entrevista, sempre que se pedia algum exemplo, algum caso concreto, não raras vezes os entrevistados fugiam ao tema, como os casos dos docentes O_cb e R_prt, derivando para a descrição dos seus métodos de trabalho em termos de avaliação de textos escritos; outros casos houve em que foram recebidas apenas respostas curtas, sem qualquer desenvolvimento por parte dos entrevistados pese embora a insistência; houve ainda indecisões na resposta e até uma justificação com base nos critérios emanados pela escola ou pelo ministério; estas ocorrências parecem ficar a dever-se à falta de análise das produções escritas em função das competências que os alunos podem, ou não, alcançar, mas antes dos objetivos que se planificaram para a atividade, como tinha já ficado exposto na questão anterior. f. Receção, por parte do aluno-escrevente, das correções dos textos produzidos A natureza desta questão poderá entender-se sob duas perspetivas díspares e que, na sua substância, nos levam por dois caminhos de análise diferentes; para além dos alunos receberem as correções dos seus textos, poderemos ver também quais as competências que foram avaliadas, cotejando essa informação com as respostas que se obtiveram na questão anterior. Nesse sentido, levantaram-se as expressões, dos entrevistados, associadas às estratégias de remediação e que, apesar dos objetivos que se espera que os alunos alcancem e das competências que se espera que sejam avaliadas, acabam por passar maioritariamente por aspetos lexicais e/ou gramaticais e não tanto por questões de sociolinguística – ao invés do aludido na questão anterior – apesar da importância e relevância de que esta competência se reveste na expressão escrita, tal como defendido por Canale & Swain (1980) e Ançã (1999), que refere que “a perspetiva a considerar aqui, assentando em critérios sociolinguísticos, define língua como sendo um conjunto de subsistemas e variantes linguísticas com certas especificidades” (1999:1). A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 145 g. Preponderância da adequação de um texto escrito à situação de comunicação, por oposição aos restantes critérios de textualidade Visa-se, aqui, confrontar todos os critérios de textualidade, tal como foram enunciados por Beaugrande & Dressler (1981), Beaugrande (1997) e Simon (2008) de forma a tentar perceber qual a relevância da adequação à situação de comunicação, no entender dos entrevistados, na forma final em que é apresentada uma produção escrita. Assim, a maioria dos professores entrevistados consideram, num primeiro momento, que “o texto deve ser sempre enquadrado a nível contextual” porquanto se “o texto é escrito mas que não é significativo naquele contexto discursivo, é meio caminho andado, senão mais, para haver desmotivação”, como refere o professor R_cb, apoiado por Fernández-Ulloa (2005). O professor S_prt acaba por oferecer uma explicação para esta potencial desmotivação, no sentido em que “se o texto não for adequado, nesse sentido, todo o enunciado não tem, digamos, não é que não tenha valor, mas o objetivo comunicativo não é cumprido” e quando um texto acaba por não cumprir o seu desígnio, acrescenta L_cb, “se falha a adequação, falha toda a carta, falha toda a estrutura, falha toda a expressão escrita”, na medida em que importa, como refere Halliday (1973) perceber quais os princípios que forçam a variação linguística em contexto, para que se possam, com maior acuidade, entender os fatores situacionais que levam ao recurso a determinadas escolhas linguísticas. Parece-nos, ainda, de todo o interesse centrar-nos num aspeto identificado na entrevista com o professor O_cb quem, no âmbito desta questão, acabou por referir-se a um parâmetro de avaliação com alguma relevância e que foi associado à adequação à situação de comunicação, “um dos parâmetros que nós temos dentro das avaliações escritas é fuga ao tema”; afigurar-se-nos de suma importância destrinçar estes dois caminhos porquanto a fuga ao tema, digamos, a falta de adequação ao tema pedido não tem necessariamente que estar dependente de uma possível – ou potencial – falta de adequação do texto à situação de comunicação. Num outro patamar, prolongando a confusão entre adequação e adequação à situação de comunicação, o professor A_cb explana sobre o facto dos textos apresentados pelos seus alunos se adequarem à realidade económico-social, como se isso significasse o cumprimento da adequação à situação de comunicação, desvio que o professor foi mantendo apesar da insistência. h. Acuidade da proximidade entre Portugal e Espanha no que se refere à aquisição de competências socioculturais Tentámos perceber, junto dos entrevistados, qual o seu ponto de vista sobre a proximidade cultural existente entre ambos os países e se a mesma funcionaria como um desafio ou como um entrave para uma mais capaz apropriação de princípios como “o conhecimento, a consciência e a compreensão da relação (semelhanças e diferenças distintivas) entre “o mundo de onde se vem” e “o mundo da comunidade-alvo” [e que] produzem uma tomada de consciência intercultural.” QECRL (2001:150). Das opiniões manifestadas pelos entrevistados, a larga maioria expressou a convicção de que a proximidade cultural entre Portugal e Espanha funciona, em termos de aquisição da competência sociocultural, como um desafio; o professor R_cb, apesar de considerar que “a partilha de elementos a nível cultural verifica-se, em muitos aspetos, mas noutros distancia-se completamente”, analisa os ganhos provenientes de “uma aprendizagem informal [que] tem aspetos que a formal não consegue ter”, elencando assim as vantagens que advêm dos intercâmbios entre alunos de ambos os países, na medida em que “isso acaba por ser um motivo de curiosidade, de estudo, de interesse, de questionar quem os acompanha”. 146 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI Desse contacto poderemos extrair benefícios, seja em termos linguísticos, como refere o professor R_cb, tal como defende também Santos Gargalho (1993) pois quanto maior for a distância linguística, maiores serão as dificuldades de aprendizagem e as interferências da língua materna no processo de aquisição, enquanto que, por outro lado, sendo menor a distância linguística, mais fácil será para o aprendente o processo de aquisição do novo sistema linguístico, seja, ainda, em termos socioculturais “é uma forma de esbater alguns aspetos culturais e entrelaçar outros”, conclui o professor R_cb, apoiando-se no parecer de Fernández (2004) que defende a indissociabilidade entre língua e cultura, porquanto a língua, além de ser veículo de cultura de um país, serve para expressar toda a sua realidade. i. Papel do contexto na relevância da adequação do texto à situação de comunicação O objetivo passa por procurar tipologias textuais onde essa adequação se torne mais evidente e atividades ou percursos pedagógicos que possam fazer sobressair a necessidade de uma completa e aturada adequação de um texto ao contexto comunicacional, no sentido em que sabemos, com Niño (2008), que apenas um trabalho sistemático, explícito e intencional permitirá que a competência comunicativa seja assegurada, em termos da sua aplicação prática à expressão escrita. Apesar das propostas evidenciadas e apresentadas pelos docentes entrevistados, pudemos também descortinar algumas advertências, especialmente no que concerne à falta de materiais específicos que permitam a professores e alunos trabalhar a competência sociolinguística enquanto elemento fulcral na adequação à situação de comunicação. Num outro prisma, ainda dentro da análise a potenciais problemas que concorrem para uma potencial falta de adequação à situação de comunicação dos textos produzidos pelos alunos, encontramos a opinião do professor O_cb que aponta o facto dos alunos não terem “uma visão tão alargada que façam essa diferenciação [do destinatário do texto], isto é, ao escreverem o seu texto, muitos dos alunos não reconhecem o destinatário do texto como um elemento cuja pertinência interfira na qualidade do texto apresentado, pois “o conhecimento do outro é uma coisa que vai ser preciso ainda trabalhar, vai ser despertada e vai ter de ser trabalhada” ao longo do tempo, opinião semelhante à de Barbeiro (2003) que aponta no sentido de que as dificuldades encontradas pelos alunos, nas suas produções escritas decorrem grandemente do facto de os alunos não encontrarem outros destinatários senão o professor, nem outros contextos senão a escola, factos que acabam por limitar as atividade de escrita a um contexto concreto e único. Por outro lado, o professor V_elv começa por apontar no mesmo sentido mas confessa obter resultados mais generosos. Neste caso, o professor V_elv, que passara por escolas maioritariamente em zonas fronteiriças e, portanto, com um contacto linguístico-cultural dos alunos com Espanha substancialmente mais privilegiado, refere que “normalmente no início há alguma dificuldade, mas depois” os alunos adaptam o seu texto e adotam estratégias comunicativas ajustadas a cada uma das realidades com as quais são confrontados. Considerações Finais Considerando que o atual mundo em que vivemos, eminentemente tecnológico e vocacionado para a prevalência da comunicação mas, isso sim, uma comunicação digital, curta, concisa e escrava da velocidade vertiginosa com que os dias transcorrem, as atividades de expressão escrita que decorrem em ambiente escolar funcionam para os alunos como se de um castigo se tratasse, A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 147 porquanto não lhes encontram nenhum tipo de utilidade prática nem de aplicação clara e objetiva. Considerando, também, que a escrita mais recorrente para os nossos alunos depende, hoje em dia, do uso de plataformas digitais cuja extensão é mais do que limitada, estripando os textos nelas produzidos de qualquer noção de coerência, coesão e gramaticalidade, e cuja competência de comunicação é, mais do que nunca, apenas entendida por pequenas minorias, por estreitos grupos que, temporária e, por vezes, transitoriamente, compartem aquele mesmo código. Considerando, ainda, que uma produção escrita deve perspetivar, como um todo e de forma holística, todas as competências que para ele concorrem e que pressupõem uma aplicação de conhecimentos de índole bastante diversa, como refere, aliás, o QECRL ao elencar que um texto deve “possuir os conhecimentos e as capacidades descritas noutro local para, por um lado, identificar, compreender e interpretar o texto e, por outro lado, organizá-lo, formulá-lo e produzi-lo” (2001:137), de uma forma clara, correta, organizada, coerente e coesa e, claro está, de um modo que os interlocutores envolvidos considerem e reconheçam como adequado. Parece-nos, assim, que os escreventes têm vindo, ao longo do tempo, a desinteressar-se das atividades de escrita por considerá-las obsoletas, individuais e fechadas num mundo escolar com um decrescente critério de aplicabilidade à realidade dos alunos e à cosmovisão que os mesmos têm da realidade. Esta circunstância decorre do facto das atividades de expressão escrita se basearem, com bastante frequência, na consecução de objetivos gramaticais. Apesar da presença da vertente comunicacional, ainda é possível perceber que muitos dos textos pedidos aos alunos possuem um escasso carácter comunicativo e adentram-se por caminhos que não os que os alunos necessitam para o seu quotidiano, fator que, por si só, acaba por conduzir a uma crescente – e não raras vezes irreversível – desmotivação dos alunos para com a escrita. Esta falta de motivação pode, indubitavelmente, ser responsável pelos fracos resultados dos alunos, como pudemos verificar pelas reações dos alunos às atividades de expressão escrita. Contudo, levantaram-se outras questões que se revestem de grande importância associadas à pouca efetividade e prevalência da expressão escrita e dos modelos de ensino aprendizagem relacionados, como a latente ausência de objetivos de índole comunicativa, quando comparadas as respostas dadas pelos entrevistados relativamente à importância dos objetivos lexicais e gramaticais com que os mesmos revestem as atividades de expressão escrita, transformando a produção textual numa amálgama de conteúdos lexicais e gramaticais que funcionarão mais como um repositório cumulativo de frases e onde se vislumbra apenas uma relação meramente circunstancial como refere (Lima, 2006), do que como um texto. Assim, por forma a inverter o status quo identificado, dever-se-á apontar para o aprofundamento, em ambiente-aula, da aposta e do desenvolvimento de textos associados à criação de diálogos, reclamações, respostas a anúncios de trabalho, escrita de cartas de apresentação e respetivo CV, criação de blogs ou ao envio de correios eletrónicos, simulando sempre situações reais de imersão cultural, propensas à aplicação da competência sociocultural. Referências Bibliográficas Amor, E. (2003). Didáctica do Português – Fundamentos e Metodologia. Lisboa:Texto Editores. Ançã, M. H. (1999). Ensinar Português - Entre Mares e Continentes - Cad. Didácticos - Série Línguas N.º 2. Aveiro:Universidade de Aveiro. Barbeiro, L. (2003). Escrita: Construir a Aprendizagem. Braga:DME/Universidade do Minho. Bardovi-Harling, K. (2001). "Evaluating the empirical evidence: grounds for instruction in pragmatics". In K. K. Rose, & G. Kasper, Pragmatics in Language Teaching. Cambridge:Cambridge University Press. 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A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 149 Anexo I – Entrevista semi-diretiva a docentes de espanhol língua estrangeira - guião Considerando o trabalho de investigação que nos propomos realizar, no âmbito do doutoramento em letras na Universidade da Beira Interior, como já tínhamos referido, é necessário recolher alguns dados sobre a produção de texto escrito na aula de Espanhol Língua Estrangeira, nomeadamente ao nível dos modelos e práticas a que os professores recorrem e na adequação dos mesmos à situação de comunicação. Nesse sentido, elaborámos algumas questões que, do nosso ponto de vista, contribuirão de forma objetiva para a recolha de informação sobre o assunto em estudo. Irá, então, proceder-se à gravação da presente entrevista com o único intuito de registar todos os dados nela constantes. Valorização do texto escrito 1. Crê que podemos indicar a prevalência de uma competência que se sobreponha às restantes considerando a expressão oral e escrita ou a compreensão oral e escrita? 2. Relativamente aos resultados que os alunos de E-LE alcançam, considera que são proporcionais relativamente às componentes oral e escrita? 3. Como reagem os alunos de E-LE quando confrontados com a expressão escrita? E com a expressão oral? Competências valorizadas 1. Que objetivos presidem, com maior frequência, à planificação de uma atividade de produção escrita? 2. Exclusivamente no que diz respeito à expressão escrita, quais as competências (gramatical, discursiva ou sociolinguística) que mais são alvo de análise? 3. De que forma o aluno-escrevente recebe feedback do texto produzido? Adequação à situação de comunicação 1. Qual lhe parece ser a relevância, para um texto escrito, da adequação do mesmo à situação de comunicação, por contraste com os restantes critérios de textualidade, como coerência, coesão, intencionalidade, aceitabilidade, informatividade e intertextualidade? 2. Considera alguma da proximidade cultural existente entre Portugal e Espanha como um desafio ou entrave à aquisição efetiva da competência sociocultural? 3. Em que contexto lhe poderá parecer mais relevante o cumprimento da adequação de um texto à situação de comunicação? 150 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 151 SUPERVISÃO PROMOTORA DE MUDANÇA E INOVAÇÃO NA AVALIAÇÃO DO DESEMPENHO DOCENTE - ESTUDO DE CASO Graça Figueiredo Monteiro ([email protected]) Agrupamento de Escolas de S. Gonçalo – Torres Vedras Resumo A investigação que se apresenta teve como principal intenção, conhecer a opinião dos docentes sobre o papel da supervisão na promoção da mudança e da inovação na avaliação do desempenho docente, para que a avaliação passe a ser um impulso para o necessário desenvolvimento profissional. Resultou deste propósito um desenho metodológico que conforma um estudo exploratório e descritivo sobre o que estes profissionais afirmam sobre esta temática. Os objetivos do estudo foram: - identificar os aspetos positivos e negativos apontados pelos docentes (avaliados e avaliadores) relativamente ao atual sistema de avaliação do desempenho; - identificar quais os princípios e as características da supervisão que os docentes consideram que podem promover a mudança e a inovação na avaliação do desempenho; - analisar se um sistema de avaliação do desempenho assente na supervisão tem implicações no desenvolvimento profissional dos docentes. As fontes de evidência incluíram um questionário e seis entrevistas. Os resultados finais desta pesquisa permitem concluir que para os docentes a avaliação do desempenho docente é inevitável e necessária. Possuem uma visão clara do perfil que o supervisor/avaliador deve ter. Apontam como características fundamentais desse perfil: a experiência profissional e a competência comunicativa, a capacidade para implementar procedimentos de supervisão, a flexibilidade, a capacidade de relacionamento interpessoal, ter conhecimentos para orientar e reorientar as práticas, ser dotado da capacidade para incentivar a mudança e a inovação, ter conhecimentos científicos, pedagógicos e conhecimento da 152 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI cultura organizacional da escola, ter compreensão e formação especializada para o exercício do cargo. Consideram que a avaliação do desempenho docente que atualmente encaram como sendo essencialmente burocrática e que não introduz nenhuma mudança nas práticas docentes, através da supervisão poderá passar a desenvolver-se numa perspetiva formativa que, eventualmente, possa vir a ser transformadora da ação de educadores e de professores. Neste sentido, preconizam uma supervisão clínica, reflexiva e dialógica e sugerem como práticas supervisoras a implementar o diálogo/ação consistente com o desenvolvimento de estratégias relacionadas com os contextos, dinâmicas de trabalho colaborativo entre pares e entre supervisor/avaliador e supervisado/avaliado. Palavras-chave: avaliação; desempenho docente; inovação; mudança; supervisão. Abstract The focus of this research was to obtain the perspectives of teachers on the role of supervision in promoting change and innovation in teacher performance assessment, so that the assessment becomes an impetus for the necessary professional development. A methodological approach that shapes an exploratory and descriptive study was designed to obtain professional thinking about this subject. The objectives of the study were: to identify the positive and negative aspects pointed out by teachers (evaluated and evaluators) for the current performance evaluation system; to identify the principles and characteristics of supervision that teachers consider that can promote change and innovation in performance evaluation; to consider whether a performance evaluation system based on supervision has implications for the professional development of teachers. The sources of evidence included a questionnaire and six interviews. From the final data of this research we can conclude that for teachers the teacher performance assessment is inevitable and necessary. Teachers have a clear perspective of the profile that the supervisor / evaluator should have. They pointed out how fundamental characteristics of this role are: the professional experience and communication skills, the ability to implement supervisory procedures, flexibility, interpersonal skills, have knowledge to guide and reorient practices, be endowed with the ability to encourage change and innovation, have scientific knowledge, pedagogical knowledge and the school organizational culture, have understanding and specialized training for the post of the year. They consider that the teacher performance assessment that is currently seen in a bureaucratic perspective, has no significant effects on teaching practices so supervision needs to develop a training perspective. In this sense, a clinical, reflective and dialogic supervision is pointed out, practices to implement dialogue and supervision practices between peers, supervisors/ evaluators and supervisees/evaluated should be implemented according to contexts. Keywords: evaluation; teacher performance; innovation; change; supervision. Introdução O estudo refere-se à supervisão promotora de mudança e inovação na avaliação do desempenho docente (ADD). Abordamos esta temática porque as questões da ADD e da valorização do desenvolvimento profissional, aliadas a uma abordagem reflexiva e a um feedback do trabalho docente, têm estado, efetivamente, na agenda política nacional e internacional, porquanto se reconhece a sua pertinência A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 153 para a qualidade do ensino e para a melhoria do sucesso dos alunos. Santomé (2006) afirma que a avaliação de desempenho traz benefícios para avaliados e avaliadores: colaboradores, gestores (diretores, gerentes, chefes, coordenadores, supervisores, líderes) e organizações. Todavia as decisões sobre a educação não são meramente técnicas e neutras e por isso é necessário interrogar o que fazemos, ainda que isso implique colocar em questão as nossas crenças e práticas. Um professor que reflete sobre a sua ação pode resistir criticamente a um sistema de avaliação do desempenho a que inevitavelmente está sujeito, mas que não tem que o penalizar, porque é apontado como único responsável dos novos problemas que introduziram nas escolas novos públicos e novas desigualdades. Como refere Cosme (2009: 17), não é possível investir numa reflexão credível acerca da profissão docente dissociada da Escola e, sobretudo, do modelo de educação escolar. Na realidade, os professores são considerados agentes fulcrais e decisivos no processo de mutação (Canário, 2007), mas nem sempre com uma visão positiva do seu trabalho, porque se ignora, muitas vezes que, como alertam Tardif e Lessard (2009: 10), a carga de trabalho dos professores é mais pesada do que antes e, sobretudo, mais absorvente, mais exclusivista e mais exigente, enquanto os meios e os financiamentos encolhem. Expande-se, assim, o campo de responsabilidades docentes, com a consequente intensificação do seu trabalho (por vezes à custa da sua dedicação à sala de aula). É imprescindível que na ADD se considerem os condicionalismos da profissão docente, uns inerentes à própria instituição educativa e outros que provêm do seu exterior e que, ao constituírem o contexto em que as práticas docentes se realizam, têm que ser tidos em conta na influência que, por certo, vão ter nessas mesmas práticas (Morgado, 2005: 48). Supervisão promotora de mudança e inovação na avaliação do desempenho docente Perante a constatação da inevitabilidade da avaliação do desempenho docente reconhecida por docentes e investigadores especialistas (Hargreaves, 2003; Torrecilla, 2006; Flores, 2010; Gil, 2009; Afonso, 2009; Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico, OCDE, 2009; De Ketele, 2010; Inspeção Geral de Educação e Ciência, IGEC, 2012), esta pesquisa assenta no nosso interesse em perceber como é que a supervisão pode ajudar a transformar o processo avaliativo no sentido do desenvolvimento profissional dos docentes, para que possam passar a dar respostas inovadoras aos problemas sociais cada vez mais complexos que se enfrentam diariamente na escola. Os sistemas educativos não têm acompanhado as modificações rápidas da sociedade. A sua transformação tem sido lenta, pois, na generalidade mantém-se um sistema escolar tradicional preparado para um mundo estático e que continua imutável na sua estrutura organizacional (agrupamentos de alunos por turmas, currículos definidos centralmente, distribuição desequilibrada do tempo para professores e alunos). É, hoje, exigido ao docente que mude a sua postura profissional, aperfeiçoe as suas práticas, reflita em grupo, no sentido de criar dinâmicas pedagógicas diversificadas e diferenciadas que envolvam os alunos e as famílias na vida da escola, evitando as desistências e o abandono escolar, penalizadoras para a organização escolar, num tempo em que os alunos escasseiam e os processos de precariedade, de rutura social, económica, cultural e simbólica, afetaram os grupos populacionais, cada vez mais diferenciados e mais alargados e que ao originarem um empobrecimento dos cidadãos, confrontam, também, a escola e os seus profissionais com as suas próprias limitações e 154 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI paradoxos (Caetano, 1998; Conselho Nacional de Educação, CNE, 2012; IGEC, 2012; Preâmbulo do Decreto-Lei n.º 41/2012, de 21 de fevereiro). Pensamos que estando a supervisão presente nas múltiplas interacções sociais com os colegas, pais e directores; nas normas e os valores partilhados ou contestados (…) nas decisões e nas medidas políticas que constituem o sistema político e estrutural de acordo com o qual as escolas têm de actuar (Kelchtermans, 2009: 76), será um instrumento que fomentará nos docentes a vontade de mudar e de inovar, para que sejam ultrapassadas as suas limitações e paradoxos e contribuirá para o seu sucesso e da sua escola. Numa altura em que já está contemplado na legislação geral, que abrange todos os trabalhadores portugueses, que a avaliação do desempenho é o primeiro critério a considerar para manutenção do emprego e a literatura sustenta a inevitabilidade da avaliação do desempenho (Hargreaves, 2003; Torrecilla 2006; Flores, 2010; Gil, 2009; Afonso, 2009; OCDE, 2009; De Ketele, 2010; IGEC, 2012) motiva-nos a vontade que a nossa investigação contribua para que os docentes reflitam e consciencializem em que medida a supervisão pode favorecer o desenvolvimento profissional, ao constituir-se como instrumento de mudança e inovação na AAD. Move-nos, ainda, o desejo que a reflexividade crítica que a nossa investigação irá promover sobre que modelo (s) de avaliação do desempenho propõem os docentes, possa realmente introduzir inovação, desenvolvimento e reconhecimento profissionais, atenuar algumas das desconfianças e do desconforto que têm condicionado o processo avaliativo e, em simultâneo possa contribuir para que estes professores determinem que não querem que as suas escolas sejam medíocres e as transformem em exemplos de boas práticas. Não podemos esquecer que a competência e a dedicação do corpo docente são a condição sine qua non de um ensino de qualidade e que sem professores motivados e participativos, cujas atitudes estejam enquadradas nos processos de mudança e de inovação educativa, não pode haver uma qualidade substantiva do ensino e das aprendizagens dos alunos. (Pacheco, 1994: n. p). Nesta investigação quisemos conceder aos docentes um tempo e um espaço para que estes profissionais consolidem o conhecimento que têm sobre o sistema de ADD atualmente em vigor; encontrem respostas para que esse sistema avaliativo não seja um fator inibidor do desenvolvimento pessoal e profissional; manifestem algumas inquietações que enquadram a problemática da avaliação do seu desempenho (propostas por diversos investigadores, como Simões, 2002; Santos, 2004; Flores, 2010; Hadji, 2010): o que é avaliação do desempenho? Avalia-se o quê? O que se deve avaliar? Como se avalia? Como se deve avaliar? Quem deve avaliar? Para que serve a avaliação? Que efeitos resultam ou podem resultar de um sistema de avaliação docente? Quisemos também, proporcionar oportunidade de reflexão sobre os princípios e estratégias da supervisão que quando implementadas na ADD, podem contribuir para que o processo não seja para o profissionalismo docente o elemento gerador de conflito, ambiguidade e ambivalência (Estrela, 2010:15). Opções metodológicas A nossa pesquisa enquadra-se num estudo de caso, de natureza qualitativa e descritiva. É um estudo de caso, porque tem uma forte validade interna e uma fraca validade externa, o que impede a generalização. Neste estudo de caso a nossa finalidade é recolher o que de essencial e característico os docentes têm a salientar sobre o que pode a supervisão mudar e inovar relativamente ao atual sistema de ADD. Colocamos três questões de investigação: A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 155 1.ª Q) O que destacam os docentes (educadores de infância e professores) como positivo e negativo no atual sistema de avaliação do desempenho dos docentes da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário? 2.ª Q) Os professores consideram que este sistema de avaliação do desempenho docente promove o desenvolvimento profissional? 3.ª Q) Quais as práticas de supervisão que os docentes consideram que podem introduzir mudança e inovação no processo de avaliação do desempenho? Definimos os objetivos do estudo: - identificar os aspetos positivos e negativos apontados pelos docentes (avaliados e avaliadores) relativamente ao atual sistema de ADD; - analisar a importância e as implicações do sistema de ADD no desenvolvimento profissional; - identificar as práticas de supervisão que os docentes consideram que podem promover a mudança e a inovação na AD. Selecionamos o objeto da investigação: um Agrupamento de Escolas do concelho de Castelo Branco onde, no ano letivo 2013/2014, exerciam funções 198 docentes de todos os níveis e ciclos de ensino, desde a educação pré-escolar ao secundário, educação especial, cursos tecnológicos e profissionais. Elegemos como fontes de informação o inquérito realizado através de questionário e de entrevista com a finalidade de validar, conferir fiabilidade e credibilidade ao nosso estudo, pois, Lessard-Hébert, Goyette e Boutin (2008: 25-26), referem que é sabido que é frequentemente útil, senão mesmo necessário, recorrer a diferentes técnicas numa mesma investigação. Caracterizamos a amostra conforme mostram as tabelas 1 e 2. Na tabela 1, encontram-se inscritos os dados relativos aos seis docentes entrevistados. Na tabela 2, inserem-se as informações referentes aos sessenta sujeitos inquiridos por questionário. Tabela 1 – Caracterização dos sujeitos entrevistados N.º de Entrevistados Grupo de Cargos desempenhados Observação Código (condição fase à profissão recrutamento de aulas e ao processo de avaliação) e departamento Observou Foi observado 1 Docente avaliado, do ensino 410 - filosofia secundário, com 51 anos, com 26 anos de serviço Coordenador do ensino secundário do grupo disciplinar de filosofia e diretor de turma Não Não S1 1 Docente avaliado, do 3.º 500 - matemática ciclo e secundário, com 42 anos, com 21 anos de serviço Diretor de turma do 3º ciclo e secundário do grupo disciplinar Não Sim S2 1 Docente avaliado, 510 - físico-química Coordenador dos diretores de do 3º ciclo e secundário, turma do ensino profissional com 49 anos de idade, e diretor de turma do 3º ciclo com 20 anos de serviço e secundário do grupo disciplinar Não Não S3 1 Docente avaliado, do 2º 910 - educação ciclo do ensino básico, com especial 52 anos, com 30 anos de serviço Nenhum Não Sim S4 1 Docente avaliado, educador de infância, com 55 anos, com 36 anos de serviço Avaliador externo Sim Não S5 Avaliador externo. Coordenador do departamento de línguas do 3º ciclo e secundário do grupo disciplinar de português Sim Não S6 100 - educação pré- -escolar 1 Docente avaliado do 3º 300 - português ciclo e secundário, 54 anos, com 31 anos de serviço 156 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI Tabela 2 - Caracterização da amostra dos sujeitos inquiridos por questionário Questões Idade Género Habilitações Académicas Opções Nº sujeitos % Menos de 30 30 a 40 41 a 50 Mais de 50 0 3 29 28 0% 5% 48% 47% Masculino Feminino 1423% 4677% Bacharelato Licenciatura Mestrado Doutoramento 1 2% 42 70% 17 28% 00% Situação Profissional (2013/2014) Contratado QZP QE 3 5% 9 15% 4880% Tempo de serviço em 31 de Agosto de 2013 1 a 10 11 a 20 21 a 30 Mais de 30 4 13 34 9 Grupo de recrutamento Educação Pré-Escolar 1º Ciclo Educação Especial Línguas Matemática e Ciências Ciências S. e Humanas Expressões Cargo (s) que desempenha Nenhum Coordenador de Departamento Diretor de Turma Coordenador dos Diretores de Turma Membro da Direção da Escola Membro do Conselho Geral Supervisor de estágio Outro. Qual? 7% 22% 57% 15% 16 27% 9 15% 11 18% 7 12% 9 15% 2 3% 610% 29 10 5 2 3 1 1 9 48% 17% 8% 3% 5% 2% 2% 15% Condição, no ano letivo Docente supervisor/avaliador: Sim 2013/2014, relativamente Não ao processo de avaliação Fui avaliador interno: Sim do desempenho Não Fui supervisor/avaliador externo: Sim Não Docente avaliado: Sim Não Fui avaliado sem observação de aulas: Sim Não Fui avaliado com observação de aulas: Sim Não 9 51 9 51 0 60 34 26 29 31 2 58 15% 85% 15% 85% 0% 100% 57% 43% 48% 52% 3% 97% Circunstâncias em que ocorreu a observação de aulas 4 56 6 54 7% 93% 10% 90% Imposição legislação (docentes nos 2º e 4º escalões da carreira): Por opção: Sim Não Sim Não A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 157 Na fase de tratamento dos dados, considerando sempre os objetivos da investigação, efetuamos a categorização das informações organizando-as em dezassete categorias e em cinquenta e cinco unidades de contexto que procuramos que traduzissem o mais fielmente possível os dados obtidos no âmbito dos cinco domínios que definimos: Domínio A) caracterização do atual sistema de ADD; Domínio B) perfil do avaliador/supervisor; Domínio C) observação de aulas; Domínio D) caracterização das propostas pessoais dos docentes sobre o papel e o contributo do avaliador/ supervisor para o desenvolvimento profissional e a melhoria da prática educativa; Domínio E) práticas de supervisão mais valorizadas pelos docentes como promotoras de mudança e a inovação na ADD. Apresentação, análise e discussão dos resultados A análise reflexiva dos resultados realizou-se à luz das questões de investigação. Quanto à questão 1: o que destacam os docentes como positivo e negativo no atual sistema de avaliação do desempenho dos docentes da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário? Podemos referir que na caracterização do atual sistema de avaliação, os docentes: centraram mais as suas apreciações nos fatores relativos ao contexto do que nos fatores relativos ao professor, aos alunos e ao próprio sistema educativo/sistema de ADD. Foram referenciados pelos docentes os fatores de contexto referidos por Vieira e Moreira (2011: 13-14) cultura institucional: hierarquização de papéis, regulamentação excessiva, burocratização do trabalho do professor, prestação de contas. Os aspetos considerados positivos foram: a necessidade e a inevitabilidade da ADD (60%); a importância da avaliação no percurso profissional (43%); a implementação da ADD não perturbou, por se ter estabelecido uma boa comunicação entre os intervenientes e os instrumentos de avaliação terem sido construídos em equipa (95%); o processo avaliativo quando reflexivo promove a pesquisa e o conhecimento, a informação e a troca de experiências (72%). Foram identificados como aspetos negativos: o sistema de ADD é burocrático/ administrativo e não tem implicado alterações significativas nas práticas docentes, uma vez que 75% dos inquiridos consideram que se assiste à produção de um elevado número de documentos considerados necessários para efetivar o sistema de avaliação que se enquadra na imagem burocrática da escola que Costa (2003) intitula de obsessão pelos documentos escritos. Esta constatação é reafirmada por diversos investigadores, designadamente Barroso (2005); Simão (2007); Conselho Científico para a Avaliação de Professores (2008); Formosinho e Machado (2009); Tardif e Lessard (2009); OCDE (2009); Apple (2010). Todavia contraria o disposto no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 41/2012, de 21 de fevereiro, onde se encontra preconiza uma ADD assente na simplicidade, na desburocratização dos processos e na sua utilidade, tendo em vista a revitalização cultural das escolas e uma maior responsabilidade profissional. Verificamos que 57% dos docentes apontaram, ainda, como aspeto negativo o fato de se sentirem pouco envolvidos e esclarecidos sobre o processo e os procedimentos da ADD. Existem alguns constrangimentos face à temática da avaliação do desempenho docente, expressos em duas evidências: a grande dificuldade que tivemos em conseguir que os docentes se pronunciassem sobre o tema, apesar de afirmarem que essa é uma discussão importante; o grande número de respostas assinaladas no inquérito por questionário com o valor 0 da escala de Likert, equivalente à expressão “não concordo, nem discordo”. Quanto a estas evidências os docentes (57%) afirmam que o fato de se “discutir a implementação da avaliação docente não irá alterar nada” e que se sentem “pouco envolvidos e esclarecidos sobre o processo e os procedimentos da ADD”. Em relação à Questão 2 – Os professores consideram que este sistema de avaliação do desem- 158 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI penho docente promove o desenvolvimento profissional? A concordância não foi muito considerável (42%). Este fato indicia que, para a maioria dos docentes, ainda não é muito evidente que a ADD, tal como tem vindo a ser concretizada, contribua efetivamente para o desenvolvimento profissional. As respostas mais expressivas (64%) defendem que a formação especializada dos supervisores/ avaliadores permite fomentar o desenvolvimento profissional. Foram 68% os sujeitos que concordaram que o processo de avaliação implica procedimentos de supervisão com vista ao desenvolvimento profissional, à mudança e à inovação na prática docente. Este posicionamento dos inquiridos pode indicar que os docentes acreditam que mediante as propostas de mudança que apresentaram e que com a implementação das práticas supervisoras sugeridas o processo avaliativo pode efetivamente passar a promover o desenvolvimento profissional. Relativamente à Questão 3 – Quais as práticas de supervisão que os docentes consideram que podem introduzir mudança e inovação no processo de avaliação do desempenho docente? As práticas de supervisão propostas pelos docentes encontram eco na literatura que consultamos e referenciamos: - disponibilidade de avaliadores externos para todos os docentes sujeitos a avaliação (Duke e Stiggins, (1990); Estrela, (2010); Nisa, (2013); Pacheco, (2009); - instituir uma prática reflexiva como meio de procura de soluções (Alarcão, (1996); Nóvoa, (1995); Schön, (1995); - valorizar a formação do docente e o trabalho realizado (Alarcão e Tavares, (2007); Alarcão e Roldão, (2008); CNE, (2012); Estrela, (2010); Formosinho e Machado, (2010); Ruivo, (2009); Santos, (2004); - cooperação entre os agentes envolvidos, trabalho colaborativo, partilha de conhecimentos, experiências e saberes, planificação de atividades e definição de estratégias em conjunto com o docente que se encontra em avaliação (Alarcão, (1996); Alarcão e Tavares, (2007); Apple, (2010); Barroso, (2005); Clímaco, (2005); Flores, (2010); Formosinho, (2002); Gonçalves, (2006); Lima, (2002); Roldão, (2007); Ruivo, (2009); Santos, (2004); - fomento da autoavaliação e da regulação do processo avaliativo (Alarcão e Tavares, (2007); Bolivar, (2003); Clímaco, (2005); Correia, (2002); Formosinho, (2002); Martins, Candeias; Costa Martins, I.; Candeias, I. e Costa, N., (2010); Nóvoa, (1995); Santomé, (2006). Considerações finais O desenvolvimento desta pesquisa permitiu concluir que os inquiridos consideram a avaliação do desempenho inevitável e necessária. Identificam os aspetos positivos e negativos do atual sistema avaliativo. Classificam o processo avaliativo como burocrático, sem alterações significativas nas práticas docentes. Concordam que a rotina, os interesses de vária ordem e o comodismo ocupam as práticas educativas, impedindo o desenvolvimento profissional. A maioria dos sujeitos, 52%, não concorda com a observação de aulas realizada pelos colegas, por entenderem que não são detentores dos requisitos que devem constituir o perfil do supervisor/avaliador. Têm uma perspetiva clara sobre o perfil do supervisor/avaliador e apontam como características desse perfil: - experiência profissional e competência comunicativa; capacidade para implementar procedimentos de supervisão (95%); - capacidade de relacionamento interpessoal e flexibilidade (94%); - conhecimentos para orientar e reorientar as práticas (93%); - ser dotado da capacidade para incentivar a mudança e a inovação; conhecimentos científicos e pedagógicos; conhecimento da cultura organizacional da escola (92%); - compreensão (90%); - formação especializada para o exercício do cargo (88%). Propõem como alterações e medidas que devem ser implementadas para tornar o processo avaliativo mais formativo: - existir um maior cuidado na seleção dos pares que efetuam a observação de aulas; - implementar uma supervisão clínica, reflexiva e dialógica que possa fomentar o desen- A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 159 volvimento profissional. Apontam como fatores inibidores da implementação de práticas supervisoras: - falta de disponibilidade, de motivação e de interesse dos docentes (73%); falta de articulação nos horários (70%). Podemos concluir que os docentes reconhecem que: precisam de mudar e inovar, incluindo os profissionais mais experientes; o processo de avaliação implica procedimentos de supervisão, com vista ao desenvolvimento profissional, à mudança e à inovação na prática docente; uma cultura avaliativa da escola no que respeita ao desempenho docente implementada com o envolvimento de todos os agentes educativos e baseada na prática de supervisão reflexiva, contribuirá para o desenvolvimento profissional, para a mudança e inovação que poderão elevar a qualidade e para que avaliar signifique ser sujeito e não sujeitar-se (Alves e Machado, 2010: 8). Referências bibliográficas Afonso, A. (2009). Sobre o trabalho docente e o tema presente. Revista Elo nº 16, pp. 25 – 30. Alarcão, I. (org). (1996). 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O Tools of the Mind é um programa para crianças em idade pré-escolar, que fornece bases sólidas para o sucesso escolar, através da promoção da aprendizagem intencional e da autorregulação. As evidências revelam que o Programa tem um impacto significativo na autorregulação das crianças em idade pré-escolar, sugerindo, ainda, ganhos ao nível da execução de tarefas de leitura e escrita precoces e de matemática. A estrutura do programa baseia-se em Vygotsky, segundo o qual os seres humanos podem ser observados em termos dos seus desempenhos reais e potenciais (avaliação da zona proximal de desenvolvimento), havendo a possibilidade de estimular e alargar as suas capacidades e competências, recorrendo a ferramentas/estratégias de suporte (Scaffolding, os andaimes da aprendizagem). Estas ferramentas funcionam como auxiliares da mente e do corpo, e podem ser ensinadas através de um conjunto de atividades, as atividades principais. Nesta perspetiva, as crianças são fortemente controladas pelo ambiente até aprenderem a usar as suas ferramentas mentais; uma vez ensinadas, tornam-se capazes e responsáveis pela sua própria aprendizagem, podendo intencionalmente e objetivamente transformar o seu comportamento e os seus estados físicos, sociais e emocionais. A atividade principal é aquela que deve ocupar grande parte do tempo do indivíduo em contexto escolar, não excedendo os limites da criança. 162 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI O Tools of Mind foi premiado, pela UNESCO, em 2001, como o primeiro programa educativo americano para a primeira infância. Palavras chave: idade pré-escolar; intervenção; estratégias/ferramentas; cognição. Abstract Wants to present an intervention program, enhancing the self-regulation, of the Vygotsky inspiration - Tools of Mind, American (Bodrova & Leong, 2001), from Metropolitan State College, Denver, USA, but already project process of adapting Portuguese, from the book ferramentas da mente (Figueira, Cró & Lopes, 2014). The Tools of the Mind is a program for children in preschool, which provides a solid foundation for school success through the promotion of intentional learning and self-regulation. The evidence shows that the program has a significant impact on self-regulation of children of preschool age, suggesting also gains in implementation of reading and early writing and math tasks. The program structure is based on Vygotsky, according to which humans can be observed in terms of their actual performance and potential (evaluation of zone of proximal development), with the possibility to stimulate and extend their abilities and skills, using the tools/support strategies (Scaffolding). These tools are auxiliary to the mind and body, and can be taught through a set of activities- main activities. In this perspective, children are strongly controlled by the environment until they learn to use their mental tools; once taught, become capable and responsible for their own learning and can intentionally and objectively transform their behavior and their physical states, social and emotional. The main activity is one that must occupy much of the individual’s time in schools, not exceeding the child’s limits. The Tools of Mind was awarded by UNESCO in 2001 as the first American educational program for early childhood. Keywords: pre-school age; intervention; strategies/tools; cognition. Introdução O título, ferramentas da mente, reflete o objetivo, sensibilizando os educadores/professores para o desenvolvimento e a aprendizagem de recursos mentais nas crianças. “As ferramentas mentais são ideias que aprendemos dos e com os outros, transmitidas e modificadas por cada um de nós” (Vygotsky, 1978, p.65). Vygotsky, e os seus seguidores, proporcionam-nos fundamentos poderosos que são, posteriormente, operacionalizados e materializados num programa, por Bodrova e Leong. (data?) A obra que serve de base ao programa, com os seus materiais, atividades e tarefas, está organizada em espiral, em termos de encadeamento e grau de complexidade, em que os conteúdos se articulam progressivamente. Na secção I (capítulos de 1 a 3), introduzem-se as principais ideias de Vygotsky, comparando-as com outras perspetivas, familiares aos educadores de crianças pequenas e aos estudantes de Psicologia. O capítulo 2 contém uma secção, em que é descrita a abordagem de Vygotsky para a educação especial. A secção II do livro (capítulos 4, 5, 6 e 7) revisita os pontos referidos na primeira secção, tentado ensaiar aplicações aos processos de ensino/aprendizagem. A A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 163 secção II descreve estratégias gerais de abordagem do ensino/aprendizagem e táticas específicas que podem ser utilizadas neste processo. A secção III (capítulos 8 a 14) é, talvez, a mais detalhada, proporcionando exemplos de aplicações específicas. Esta obra cobre os aspetos específicos do desenvolvimento das crianças de várias idades, desde bebés a crianças do primeiro ciclo do ensino básico. Existem capítulos diferentes para especificar a natureza da aprendizagem e ensino que as diferentes idades desenvolvimentais requerem ou apresentam. Os exemplos de práticas de sala de aula ou de atividades, baseadas em Vygotsky, são desenvolvidas e apresentadas em três capítulos separados, de acordo com as idades das crianças. O livro termina com um capítulo especial sobre avaliação dinâmica, uma estratégia com o carimbo de Vygotsky. Os exemplos de atividades desta obra são o resultado de 15 anos de colaboração dos autores originais com infantários, jardins de infância, e professores dos primeiro e segundo ciclos de todos os Estados Unidos. Igualmente, com base em programas e projetos, desde o Head Start às escolas públicas de educação pré-escolar, programas de educação pré-K apoiados pelo Estado, escolas privadas, serviços de cuidados da infância, bem como programas federais de apoio à leitura. A grande maioria dos programas é dirigida a crianças em risco. As salas de aula ou atividades também são de vários tipos, desde grupos tradicionais a grupos de várias idades (combinando crianças de 3 e 4 anos de idade, mas também jardins de infância, primeiro e segundo ciclos), de diversas filosofias e filiações. Por exemplo, em algumas salas são utilizadas dinâmicas tradicionais de ensino da leitura e em outras a abordagem global da linguagem. Algumas das salas de aula proporcionam educação bilingue. Um dos aspetos a realçar, do trabalho direto com os educadores, é o seu feedback, relativo ao grau de satisfação com o funcionamento das propostas sob esta orientação, em todos os ambientes de sala de aula descritos. “Vygotsky ajuda-nos, fornecendo mais alternativas para a nossa ação” (Bodrova & Leong, 2001, p. 23). “Este autor ajuda a vermo-nos, enquanto parceiros das crianças na grande jornada da aprendizagem, mais do que como supervisor ou apoiante” (Bodrova & Leong, 2001, p. 57). O trabalho com os educadores/professores, nas diversas salas de aula, tem-se demonstrado estimulante, reforçador e emocionante. O livro está recheado de exemplos, tentando representar todas as faixas etárias, funcionando mesmo como um diário fundamentado. 1. Arquitetura da obra Temos, na Secção I, A abordagem de Vygotsky: a teoria histórico-cultural do desenvolvimento, com o Capítulo 1, Introdução à abordagem Vygotskiana, o Capítulo 2, Aquisição de ferramentas mentais e funções mentais superiores, e o Capítulo 3, A perspetiva de Vygotsky e outras teorias do desenvolvimento e da aprendizagem. Na Secção II, Estratégias de desenvolvimento e de aprendizagem, temos o Capítulo 4, A zona de desenvolvimento proximal, o Capítulo 5, Tática: utilização de mediadores, o Capítulo 6, Tática: utilização da linguagem, e o Capítulo 7, Tática: utilização de atividades partilhadas. A Secção III, Aplicação da abordagem Vygotskiana ao desenvolvimento e à aprendizagem, na primeira infância, apresenta o Capítulo 8, Realizações Desenvolvimentais (Developmental Accomplishments) e Atividade Principal (Leading Activity): crianças dos 0 aos 3 anos (infants e toddlers), o Capítulo 9, Suportes às Realizações Desenvolvimentais: crianças dos 0 aos 3 anos (infants e toddlers), o Capítulo 10, Realizações Desenvolvimentais (Developmental Accomplishments) e Atividade Principal (Leading Activity): crianças em idade de jardim de infância, o Capítulo 11, Suportes às Realizações Desenvolvimentais: crianças em idade de jardim de infância, o Capítulo 12, Realizações Desenvol- 164 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI vimentais (Developmental Accomplishments) e Atividade Principal (Leading Activity): crianças em idade das aprendizagens básicas (1º ciclo do ensino básico), o Capítulo 13, Suportes às Realizações Desenvolvimentais: crianças em idade das aprendizagens básicas (1º ciclo do ensino básico), e o Capítulo 14, Avaliação Dinâmica: aplicação da Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP). A obra termina com o Epílogo, um Glossário e as Referências bibliográficas. 1.1 Estrutura mais específica Na Secção I, A abordagem de Vygotsky: a teoria histórico-cultural do desenvolvimento, no Capítulo 1, Introdução à perspetiva de Vygotsky, aborda-se e concetualiza-se ferramentas mentais, apresentando-se argumentos sobre o porque é que as ferramentas da mente são importantes. Resenha-se a história da abordagem de Vygotsky, a vida de Vygotsky, os seus contemporâneos e os Pós-Vygotskianos: discípulos e seguidores russos. Ainda, equaciona-se a investigação e aplicação da teoria de Vygotsky no Ocidente, desenvolve-se os princípios da Psicologia e Educação, na perspetiva de Vygotsky, ou seja, aborda-se a construção do conhecimento, a importância do contexto social, a relação entre aprendizagem e desenvolvimento e o papel da linguagem no desenvolvimento. Existe, sempre, para cada capítulo, a indicação de leituras adicionais. No Capítulo 2, Aquisição de ferramentas mentais e funções mentais superiores, aborda-se o objetivo das ferramentas, o conceito de amplificação das capacidades mentais, o domínio comportamental, a aquisição da independência, a aquisição do nível mais elevado de desenvolvimento. Igualmente, desenvolve-se o processo linguagem, enquanto ferramenta universal, o conceito de funções mentais superiores, as caraterísticas das funções mentais inferiores e as caraterísticas das funções mentais superiores, o desenvolvimento das funções mentais superiores, tendo por base as funções mentais inferiores. É, ainda, enfatizada a influência do contexto cultural, o processo de transição das funções partilhadas para as individuais, as diferenças individuais no desenvolvimento das funções mentais, operacionalizando-se as funções mentais inferiores e as funções mentais superiores. Aborda-se, ainda, a compensação dos deficit no desenvolvimento das funções mentais superiores e inferiores: A abordagem de Vygotsky na Educação Especial, realçando-se a natureza social e cultural das incapacidades (deficiências), a mediação como forma de remediação, ou seja, a aplicação da teoria de Vygotsky à educação especial. O Capítulo 3, A perspetiva de Vygotsky e outras teorias do desenvolvimento e da aprendizagem, contempla a perspetiva construtivista Piagetiana, analisando-se as semelhanças e as diferenças, as teorias comportamentalistas, referindo-se as semelhanças e as diferenças, a teoria do processamento da informação, semelhanças e diferenças e, igualmente, a perspetiva de Montessori, bem como as semelhanças e diferenças, não se deixando de registar as críticas à abordagem Vygotskiana. Na Secção II, Estratégias de desenvolvimento e de aprendizagem, no Capítulo 4, intitulado A zona de desenvolvimento proximal, define-se, o que é marca de Vygotsky, a zona de desenvolvimento proximal (ZDP), abordando-se o desempenho independente/autónomo e o desempenho com ajudas, a dinâmica da zona de desenvolvimento proximal, a utilização da ZDP na análise do desenvolvimento, as implicações para o ensino e para a aprendizagem, o desempenho com ajudas, a avaliação das capacidades da criança (children’s abilities), concetualizando-se as práticas desenvolvimentais adequadas, a instrumentalidade da ZDP na promoção do desenvolvimento, a amplificação (amplification), o desempenho ou realização (performance) e competência (competence) e os andaimes (scaffolding). Ainda, realça-se a ideia de zona de desenvolvimento proximal enquanto zona em construção, as caraterísticas das situações estruturantes e a dinâmica dos andaimes na ZDP. No Capítulo 5, desenvolve-se a estratégia utilização de mediadores, enfatizando-se o mediador A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 165 como ferramenta mental, ou seja, a função dos mediadores, a trajetória desenvolvimental dos mediadores, a mediação de comportamentos sociais e emocionais e a mediação externa da cognição. Desenvolvem-se os processos perceção, atenção, memória e pensamento e operacionaliza-se a utilização de mediadores na sala de aula, os mediadores como andaimes ou ajudas, referindo-se o que os mediadores não são, dando-se exemplos da utilização de mediadores externos na sala de aula, aventando-se orientações para a utilização de mediadores externos. Quanto ao Capítulo 6, Tática: utilização da linguagem, analisa-se a linguagem como ferramenta cultural, as funções do discurso, focando-se a trajetória desenvolvimental do discurso e a emergência do discurso e do pensamento, concetualizando-se o discurso privado (private speech), o discurso interno (inner speech) e o pensamento verbal. Ainda, aborda-se o desenvolvimento do significado, o desenvolvimento do discurso escrito, o como a escrita promove o pensamento, a utilização da linguagem na sala de aula, enfatizando-se a necessidade de apoiar o desenvolvimento do discurso privado, de apoiar o desenvolvimento do significado e o apoiar o desenvolvimento do discurso escrito. O Capítulo 7, Tática: utilização de atividades partilhadas, desenvolve a interação nas atividades partilhadas, o como as atividades partilhadas promovem a aprendizagem, operacionalizando-se atividades partilhadas, regulação por outros (other-regulation) e autorregulação (self-regulation). Salientase a importância da regulação externa/por outros, a utilização da regulação externa para promoção da autorregulação, a função do professor/educador na atividade partilhada, o professor/educador enquanto parceiro, o professor/educador enquanto organizador/planificador e a função dos pares na atividade partilhada. Por seu turno, a Secção III, Aplicação da perspetiva Vygotskiana ao desenvolvimento e à aprendizagem, na primeira infância, no Capítulo 8, Realizações Desenvolvimentais (Developmental Accomplishments) e Atividade Principal (Leading Activity): crianças dos 0 aos 3 anos (infants e toddlers), define-se o conceito de realização desenvolvimental, realçando-se a situação social de desenvolvimento, o papel do contexto ou situação social no desenvolvimento da criança. Define-se atividade e analisa-se como as crianças começam a envolver-se na atividade principal, focando as realizações desenvolvimentais dos recém-nascidos, a vinculação, as ações sensório-motoras orientadas para o objeto, as interações emocionais com os cuidadores enquanto atividade principal dos recém-nascidos, a importância das interações ou trocas emocionais, as primeiras iniciativas da criança, as interações com os objetos, as primeiras palavras e ações e as realizações desenvolvimentais dos bebés. Ainda, carateriza-se o pensamento sensório-motor, a emergência do autoconceito, analisando-se a atividade principal dos bebés: atividade orientada para o objeto e o papel da mediação do adulto na atividade orientada para o objeto, a atividade instrumental, o papel da linguagem na atividade orientada para o objeto, a reestruturação da perceção através da atividade orientada para o objeto e a substituição simbólica. No Capítulo 9, Suportes às Realizações Desenvolvimentais: crianças dos 0 aos 3 anos (infants e toddlers), salienta-se o como auxiliar as crianças, do nascimento aos 6 meses, enfatizando-se o suporte (scaffolding) à comunicação emocional, o suporte (scaffolding) às primeiras iniciativas da criança. Igualmente, como auxiliar as crianças, dos 6 aos 12 meses de idade, enfatizando-se o suporte (scaffolding) nas interações com os objetos, o suporte (scaffolding) das primeiras ações. Ainda, como auxiliar as crianças, dos 12 aos 24 meses de idade, enfatizando-se o suporte (scaffolding) nas atividades orientadas para os objetos, o suporte da atividade instrumental, o como auxiliar o desenvolvimento de conceitos sensório-motores, como incentivar a aquisição de padrões sensoriais, como apoiar as substituições simbólicas. Por fim, existe referência a como auxiliar as crianças, dos 24 aos 36 meses de idade: transição do infantário para o jardim de infância, ao como apoiar a emergência do autoconceito dos bebés, ao como apoiar o surgimento das brincadeiras de faz-de-conta e ao como apoiar o início da autorregulação. No Capítulo 10, Realizações Desenvolvimentais (Developmental Accomplishments) e Atividade 166 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI Principal (Leading Activity): crianças em idade de jardim de infância, desenvolve-se as realizações desenvolvimentais, a função simbólica, relatando-se o início da ação no plano mental interno, caraterizando a imaginação, a integração das emoções e pensamento, o desenvolvimento da autorregulação, o jogo do faz-de-conta enquanto atividade principal. Aborda-se as conceções de jogo/ brincar em Psicologia e em Educação, realçando-se o brincar na abordagem Vygotskyana, o como o brincar/o jogo influencia o desenvolvimento, equacionando-se a criação da zona de desenvolvimento proximal. É, ainda, focado como facilitar a separação entre pensamento e ação e objetos, como facilitar o desenvolvimento da autorregulação, o impacto na motivação da criança e o como se pode facilitar a descentração cognitiva. Descreve-se a trajetória desenvolvimental do jogar, o jogo nas crianças pequenas, o jogo nas crianças em idade de jardim de infância, as atividades que não jogos, no jardim de infância, os jogos com regras, as atividades produtivas, as atividades pré académicas, as atividades motoras e a preparação escolar. No Capítulo 11, Suportes às Realizações Desenvolvimentais: crianças em idade de jardim de infância, salienta-se a necessidade de apoiar o jogo de faz-de-conta enquanto atividade principal, apresentando-se as caraterísticas do jogo maduro (mature), equacionam-se os níveis do brincar encontrados nas salas do jardim de infância. Ainda, aventam-se formas de enriquecimento do brincar/jogo e como apoiar outras atividades em salas do jardim de infância. Definem-se os jogos com regras, as atividades produtivas, os comportamentos pré académicos, as atividades motoras e o suporte à preparação escolar. O Capítulo 12, Realizações Desenvolvimentais (Developmental Accomplishments) e Atividade Principal (Leading Activity): crianças em idade das aprendizagens básicas (1º ciclo do ensino básico), analisa a escolarização formal e o desenvolvimento, na educação básica, as realizações desenvolvimentais, da criança na escola do 1º ciclo do ensino básico. Aborda-se o início do raciocínio teórico/ abstrato (theoretical), a emergência das funções mentais superiores, a motivação para aprender, a atividade de aprendizagem enquanto atividade principal, definindo-se atividade de aprendizagem, tarefa de aprendizagem, ações de aprendizagem, ação de controlo ou feedback, autorreflexão e a atividade de aprendizagem, na educação básica. No Capítulo 13, Suportes às Realizações Desenvolvimentais: crianças em idade das aprendizagens básicas (1º ciclo do ensino básico), enfatiza-se o apoiar os elementos críticos da atividade de aprendizagem, a utilização de modelos para auxiliar as crianças a compreender as ações generalizadas, as formas de auxiliar as crianças a compreender o objetivo da aprendizagem a partir da atividade, o como auxiliar as crianças a compreender o conceito de normas e a aprender como as utilizar enquanto orientadoras da aprendizagem e o como auxiliar a criar formas de promover a reflexão. Caracteriza-se a formação passo-a-passo, como forma de apoio ao desenvolvimento e à aprendizagem, enfatizando-se a importância da base de orientação da ação e a necessidade de ação materializada. Ainda, concetualiza-se a automatização das ações mentais, fazendo-se a distinção entre erros naturais e erros evitáveis. Neste capítulo, descreve-se, ainda, a escrita apoiada – a aplicação da educação passo-a-passo à escrita, aventando-se formas de auxiliar as crianças do ensino básico que não alcançaram realizações desenvolvimentais das idades de jardim de infância. Apontam-se alguns princípios como: a criança que pratica deve ganhar, o jogo deve ser autocorrigido, o jogo deve mudar à medida que mudam as capacidades da criança. Por último, o Capítulo 14, Avaliação Dinâmica: aplicação da Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP), é totalmente dedicado a um constructo que é marca da perspetiva Vygotskiana, a avaliação dinâmica, equacionando-se a avaliação tradicional v/s avaliação dinâmica, concetualizando-as e caracterizando-as. Desenvolve-se, ainda, as aplicações pós-Vygotskianas da avaliação dinâmica, exemplificando-se a avaliação dinâmica na sala de aula, enfatizando-se a avaliação dinâmica enquanto uma ferramenta para o ensino/instrução. A obra termina com um Glossário bastante clarificador de toda a perspetiva de Vygotsky. A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 167 Considerações finais O Tools of Mind pretende ser um manual didático, um orientador, fundamentado, de sugestões, ilustrativo, para educadores, professores, psicólogos, pais, educadores, em geral, sobre a educação de infância, à luz de uma grande referência, Vygotsky. É a base de fundamentação de um programa estruturado de educação de infância com vasta implementação e avaliação. Sem expressão em Portugal, o programa Tools of Mind é, tanto quanto o High Scope Curriculum, de inspiração Piagetiana, dos programas para a educação de infância mais implementados mundialmente. Ao nível dos jardins de infância da rede pública em Portugal, as orientações epistemológicas assentam numa linha claramente piagetiana, pese embora a autonomia dos educadores quanto à sua implementação. Ou seja, são orientações, não prescrições, normativos ou currículo formal, estruturado. Gaspar (1991) revela que os educadores optam, fundamentalmente, na sua ação, por uma perspetiva eclética, sem uma designação ou categorização específica. Todavia, ao nível privado, é possível encontrar no contexto português orientações pedagógicas, desenvolvimentais ou curriculares várias, desde João de Deus, Montessori, Froebel, Freinet, etc (Fenprof, sd). De facto, as Orientações Curriculares não invalidam a existência de diferentes modelos curriculares existentes na tradição pedagógica portuguesa. Não seguindo textualmente o curriculum High Scope, ou a Criança em Ação, tradução portuguesa, da fundação Calouste Gulbenkian (Hohmann, Banett, & Weikart, 1995), as Orientações Curriculares para a educação de infância, do Ministério da Educação (ME, sd), plasmam claramente esta inspiração. A orientação Vygotsiana, ou o currículo Tools of Mind (Ferramentas da Mente), seu representante, não será pensada enquanto alternativa, oposta, mas sugerida como complementar. Pode contribuir para repensar a questão da organização dos grupos, homogéneos/heterogéneos, em termos de desenvolvimento, pela sua conceção de crescimento enquanto circunstanciado pelos conflitos socio-cognitivos, e do seu corolário Zona de Desenvolvimento potencial. Ainda, contribuir para repensar uma atitude educacional mais reflexiva e promotora de ação por parte de todos os participantes das atividades educativas, sendo o desenvolvimento das funções executivas, como a planificação, a reflexão, o pensamento flexível, a avaliação, de todos a sua mais-valia. O programa, ou curriculum, fundamentado sob esta visão, orienta os educadores, permitindo-lhe uma maior disponibilidade na ação direta com as crianças. Referências Bodrova, E. (2003). Vygotsky and Montessori: One dream, two visions. Montessori Life, 15(1), 30-33. Bodrova, E., & Leong, D. J. (1995). Scaffolding the writing process: The Vygotskian approach. Colorado Reading Council Journal, 6, 27-29. Bodrova, E., & Leong, D. J. (1998). Scaffolding emergent writing in the zone of proximal development. Literacy Teaching and Learning, 3(2), 1-18. Bodrova, E., & Leong, D. J. (2001). 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A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI 169 170 A inovação educativa e os desafios para a educação do século XXI