COUNSELING - UMA NOVA FORMA DE FAZER TERAPIA: UMA
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COUNSELING - UMA NOVA FORMA DE FAZER TERAPIA: UMA
COUNSELING - UMA NOVA FORMA DE FAZER TERAPIA: UMA ANÁLISE À LUZ DA ABORDAGEM ROGERIANA CENTRADA NA PESSOA Patricia Carla Carvalho Sobral Orientadora: Mércia Melo Silva Resumo: A análise proposta pelo presente artigo traz à luz as diversas possibilidades da experiência humana e a capacidade de existir e conduzir as próprias escolhas diante das múltiplas exigências materialistas do mundo contemporâneo. Através de uma nova proposta de ajuda ao enfrentamento desta realidade contingente, surge o Counseling. Um novo conceito de terapia breve baseada nos fundamentos e princípios da Abordagem Centrada na Pessoa de Carl Rogers, onde toda a atenção é concentrada na pessoa, e a qualidade do encontro proporciona condições favoráveis para um desenvolvimento rumo ao autoconhecimento. Perceberemos a sutileza com que essas duas abordagens agem revelando o quanto elas estão em sintonia e como atualmente se fazem tão necessárias para o resgate dos verdadeiros valores humanos e existencialistas, tão ausentes em nossa atual sociedade. INTRODUÇÃO Diante das urgências da atual vida contemporânea o homem se percebe cada vez mais adentrando num vazio existencial e isso se agrava ainda mais pelas exigências da sociedade e pela materialidade dos valores humanos. Os princípios que permeiam as relações humanas estão se esvaindo e sendo colocados em segundo plano pelas próprias pessoas, que se tornam muitas vezes distantes do outro e de si mesmas. Rogers, a partir do desenvolvimento de sua teoria e psicoterapia centrada na pessoa nos traz à reflexão esses valores humanos tão ausentes em nossa sociedade. Orienta e alerta para os movimentos e atitudes que possam levar duas pessoas ou mais a se encontrarem, no sentido do encontro pessoal e humano, onde não são definidos papéis, mas sim o contato entre duas pessoas, numa relação de presença e autenticidade. Baseado nesse encontro descrito e orientado por Rogers surge uma nova definição 143 COM TEXTO, Ano VIII, no 1 de ajuda, que por muitos já deve ser utilizada, mas que atualmente vem se tornando formalmente uma profissão desejada e procurada por muitas dessas pessoas que vivem em meio a esse mundo coletivizado e impessoal, no qual dando-se conta do seu desconforto procura nesse profissional uma luz que possa guiá-la num novo caminho, o counseling. Um termo inglês que pode ser traduzido em nossa língua como aconselhamento, e que entre muitas definições, segundo adotou a EAC (Associação Européia de Counseling), “é o processo interativo entre o counselor e um cliente, ou mais clientes, que aborda com técnicas holísticas temas sociais, culturais, econômicos e/ou emotivos. Pode concentrar-se sobre o modo de enfrentar e resolver problemas específicos, favorecer um processo decisório, ajudar a superar uma crise, melhorar os relacionamentos com os outros, facilitar o desenvolvimento, aumentar o conhecimento, a consciência de si e permitir a elaboração de emoções e conflitos interiores”. Levando em consideração princípios, conceitos e influências da filosofia e psicologia humanista o counseling traz a proposta de um encontro centrado na pessoa, no qual o que importa é como a pessoa se vê e se coloca diante de seus mais íntimos e emergentes desejos, como ela se sente em relação ao que a sociedade exige dela, qual o nível de contato consigo mesma, como ela se escuta e como se aceita diante do mundo exteriorizado. A proposta deste artigo é mostrar como a ACP rogeriana e o counseling se unem de uma forma tão sutil que até parecem ser uma só. Os princípios, as atitudes, os objetivos, o encontro com a pessoa, a utilização de técnicas e atitudes de intervenção de forma perspicaz e empática procurando acolher, guiar, compreender e criar um ambiente cada vez mais propício para que o cliente seja o mais autêntico que ele puder estão em constante interação. Na psicoterapia, o tempo a ser utilizado para o processo de cura e restruturação é desconhecido enquanto que no counseling as questões abordadas são as mais emergentes do cliente e um trabalho 144 COM TEXTO, Ano VIII, no 1 mais profundo requer um encaminhamento para um outro profissional mais adequado para continuar o processo. I-CONGRUÊNCIA E INCONGRUÊNCIA A atitude congruente é estimulada em todo o processo de counseling, assim como para a ACP rogeriana a questão é muito importante, pois demonstra o quanto a pessoa é consciente de seus desejos e anseios refletindo isso no seu discurso. Mas, para que esse ideal seja alcançado exige-se todo um caminho a ser percorrido através do guia counselor, ajudando o indivíduo a trazer gradativamente esses desejos para a sua consciência. O estado de incerteza, de desconhecimento de si mesmo, de confusões internas, tensões e ansiedades com que o cliente chega demonstram muitas vezes sua incongruência de pensamento e discurso. O terapeuta, segundo Rogers, deve atentar bem para isso e perceber qual é esse grau de incongruência apresentado pelo cliente, até que ponto seus desejos e atitudes são conscientes. De forma acolhedora e empática o terapeuta deve entrar nesse mundo subjetivo da pessoa, não para julgá-la ou encontrar uma alternativa, mas para compreendê-la melhor, em seu sofrimento e em suas angústias. As angústias vivenciadas pelas pessoas geralmente são decorrentes dos conflitos internos em relação ao que o mundo espera do indivíduo e à possibilidade ou impossibilidade que ele sente de atender a essa expectativa. Essa sensação de incapacidade é decorrente das relações humanas ignoradas e colocadas em segundo plano, tornando o ser fragmentado e coletivizado devido à necessidade de ser aceito e reconhecido como igual, dentre tantos outros, tornando-se um ser apático e desequilibrado consigo mesmo. Como conseqüência desse desequilíbrio a pessoa se afasta cada vez mais de si mesma e daí começa a ser incongruente, não expressando o que realmente está sentindo, pensando ou experienciando. Na medida em que o processo de counseling vai evoluindo e o encontro, segundo Rogers, entre duas pessoas vai criando um 145 COM TEXTO, Ano VIII, no 1 clima de confiança e autenticidade, a tomada de consciência do indivíduo de seus pensamentos e desejos se torna cada vez mais evidente e ele vai se dando conta de um terreno perigoso e ameaçador. Contudo, percebe também que só experienciando esses sentimentos conseguirá se conhecer melhor. Daí qual o processo de congruência se torna gradativo e o discurso do cliente vai entrando em acordo com seus desejos e anseios, e ele passa a aceitá-los como seus e não como algo externo a ele. Quando o cliente se percebe experienciando esses sentimentos plenamente, a imagem do Eu, do Self ,vai mudando de maneira a permitir a integração de elementos de suas experiência que haviam sido deformados ou negados. É o que a ACP conceitua como uma “gestalt organizada e consciente” proveniente do processo de construção e desconstrução, na medida em que as situações vão mudando na vida do indivíduo, reformulando o seu autoconceito, baseado em suas experiências passadas, estimulações presentes e expectativas futuras. II-AUTOCONHECIMENTO Esse caminho só é possível de ser percorrido se quem está guiando, seja o terapeuta ou o counselor, propicie um ambiente favorável de aceitação, escuta, sintonia, acolhimento e compreensão ao cliente, para que a partir das suas próprias potencialidades ele seja capaz de ajudar a si mesmo. Para tanto, é importante também um trabalho pessoal e contínuo desse profissional , no sentido de conhecer melhor seus próprios entraves para assim reconhecer em si mesmo alguma incongruência ou desconforto trazidos pelo cliente. Esse trabalho pessoal, já enfatizava Rogers, é de grande importância para que o comportamento de congruência do terapeuta seja autêntico, de forma que ele possa harmonizar e integrar a experiência e a consciência de sua comunicação. Só desta forma o counselor poderá apresentar um contínuo comportamento autêntico construindo na relação um sentimento de confiança e segurança. Segundo Rogers, esse comportamento congruente leva o terapeuta, assim como o counselor a sentir verdadeiramente a experiência, a 146 COM TEXTO, Ano VIII, no 1 perceber como está sentindo a experiência, a aceitar o que está percebendo, e por fim manifestar a experiência tal como ela é aceita, expressando como a pensa e a sente. Essa atitude do terapeuta precisa ser reconhecida pelo cliente para que, a partir do reflexo de si mesmo, no counselor ou terapeuta, o cliente possa perceber também suas incongruências e saber avaliá-las adequadamente. E, enfatizando ainda mais a questão da preparação deste profissional vale destacar que a autora (Danon, 2000) afirma que no counseling, diferentemente do que ocorre em outras profissões, a preparação pessoal é prioritária, porque, enquanto a técnica se pode sempre adquirir, modificar, aperfeiçoar, assim como se podem inventar modos novos de conduzir uma conversa, as qualidades humanas de quem está atuando são os elementos mais importantes para ativar em outra pessoa o processo de crescimento. O objetivo maior do counseling é centrar na pessoa toda a atenção do processo. Não é mais a superação do sintoma, como em algumas terapias, mas a maior independência e integração do indivíduo. E, para proporcionar ajuda a esse indivíduo em crescimento, o counselor deve estar preparado para lidar com diversas situações trazidas pelo outro, que podem lhe parecer totalmente desconhecidas como também desconhecidas por mesmo. Nesse momento surge a importância de se ter trabalhado anteriormente para que não se confunda a situação trazida pelo cliente com algo identificado ou vivido pelo próprio counselor. Rogers define esse encontro como um momento de mudança e não o preparo para uma mudança, por isso não apenas se requer um preparo profissional do counselor para tal, mas também, devem ser consideradas as suas qualidades humanas. O counselor deve desenvolver em si a habilidade de escutar, mas não simplesmente uma escuta passiva, como ocorre em algumas terapias, mas uma escuta atenta às mensagens verbais e não verbais, aos sentimentos e aos pensamentos expressos pelo cliente, compreendendo o que é dito e como é dito e ainda o não 147 COM TEXTO, Ano VIII, no 1 dito. É um escutar sincero, participativo, sem pretensão de traçar um diagnóstico ou simplesmente resolver o problema. O counselor deve se mostrar verdadeiramente ao outro para que preconceitos, temores, expectativas e estereótipos sejam quebrados e este possa entrar em sintonia com o terapeuta. Esse processo de estar com o outro num encontro, considerando sempre o interlocutor como uma pessoa, procurando entrar no seu estado de espírito e compreendendo sua posição faz com que o counselor crie um estado de empatia com o cliente. A empatia é uma característica essencial ao counselor e ao processo propriamente dito. Pois, é através do exercício da empatia trabalhada pelo counselor que este se torna capaz de acolher e compreender a experiência subjetiva do cliente, colocando-se em seus planos e olhando as coisas do seu mesmo ponto de vista, sem que com isso ele se identifique com o outro, pois desta forma o counselor poderia perder a consciência da sua própria individualidade. Ressaltemos que, por mais que a vida do cliente seja semelhante à do counselor, ele não pode querer sobrepor as duas experiências e deixar de ser objetivo. No processo de counseling, assim como na ACP, a empatia tem uma função catalisadora do processo de crescimento retomando a confiança do cliente em si mesmo. É importante também que exista, acima de tudo, por parte do counselor no desenvolvimento dos encontros, o respeito pelo indivíduo. E a consciência de que a pessoa que por ali passar deve ser considerada como única e irrepetível, e que cada situação trazida por ela é diversa e requer um acolhimento livre de preconceitos ou interpretações. Mesmo se valendo de técnicas e teorias anteriores, o counselor nunca deve se esquecer da unicidade de cada caso e sempre acolher o outro com toda a dignidade que lhe é devida. O counselor deve também atentar para duas atitudes: uma é ver o cliente como ele é, respeitando e aceitando o seu sofrimento, a sua depressão, o seu desconforto, o seu modo de se perceber e de 148 COM TEXTO, Ano VIII, no 1 perceber o mundo, sem desvalorizá-lo. Através desse procedimento o counselor passa a perceber e sentir que não é obrigado a fazê-lo sair o mais rápido possível de um determinado estado de espírito que o incomoda, respeitando também os limites e os tempos, observando se o cliente está preparado para seguir um atalho, ou se ele ainda necessita de uma preparação para enfrentar certas situações. Assim também o counselor deve deixar crescer dentro de si a visão do que o cliente poderia vir a ser, se removidos os principais obstáculos. Esta atitude permite que o counselor acredite verdadeiramente nas possibilidades do cliente, propiciando um clima positivo na relação, o que Rogers conceituou de consideração positiva. O trabalho de autoconhecimento do counselor é necessário e essencial para que, antes de guiar pessoas nos estranhos e misteriosos caminhos do autoconhecimento, ele também já esteja há um bom tempo familiarizado com esses caminhos, assim como com seus possíveis obstáculos e dificuldades. O treinamento e a exploração de seu próprio mundo interior são o que o torna capaz de guiar outros nesse percurso. Mas, que fique claro que esse crescimento pessoal do counselor não deve necessariamente chegar a uma perfeição, isto porque ele não é um super-homem, ao contrário, antes de qualquer coisa ele é uma pessoa como outra qualquer atenta aos relacionamentos humanos, pois é sensível à complexidade da própria interioridade. O mais importante neste processo é que ele se conheça cada vez mais e que tenha a possibilidade de identificar suas áreas de vulnerabilidade, para a partir daí poder distinguir as suas situações pessoais das do cliente, e até mesmo saber o momento certo de encaminhá-lo para outro profissional. III-LIBERDADE EXPERIENCIAL Através de um ambiente seguro e acolhedor criado pelo counselor na relação de ajuda, o cliente começa a experienciar momentos de liberdade em que ele pode ser autêntico e pode 149 COM TEXTO, Ano VIII, no 1 expressar com palavras, gestos e mímicas tudo o que pensa e sente, sem repressões ou julgamentos. É percebendo essa liberdade que o indivíduo se torna capaz de entrar num processo de exploração de sua personalidade, reconhecendo em si mesmo suas incongruências, de forma que possa avaliá-las e reelaborá-las, representando suas experiências na consciência adequadamente. É primordial que no início do processo de counseling, a liberdade seja a primeira qualidade a ser despertada no indivíduo, para que só a partir daí ele possa crescer. E, sendo ainda mais claro, todo o processo de counseling deve ter como base de concepção e aplicação, a liberdade do indivíduo de autodeterminar-se, de compreender suas convicções, atitudes e comportamentos que modelam os acontecimentos de sua vida e assim modificá-los quando necessário. Quando a liberdade se torna plena de pensamento, de expressão e de ação, desperta a capacidade de criatividade do indivíduo, ativando em conjunto a sua imaginação e daí sua atitude de elaborar novas possibilidades. O cliente passa a agregar ao seu crescimento uma capacidade cada vez maior de perceber ao seu redor uma realidade não só por aquilo que é, mas também por aquilo que poderia vir a ser. A partir daí despertar para uma criatividade de cada dia, ativar novos modos de responder à realidade contingente, aprendendo a não generalizar e automatizar o pensamento, e a ser livre valorizando a unicidade de cada experiência. Só a partir dessa liberdade e criatividade conscientes o indivíduo é capaz de assumir a responsabilidade de suas escolhas, tornando-se consciente de que é responsável pelo próprio destino e que este é construído a cada momento experienciado, de acordo com o seu modo de pensar e de agir diante das situações e dos outros através de suas próprias atitudes. É importante que o counselor guie o seu cliente para o entendimento de que ele não está ligado deterministicamente à sua infância, à educação ou às 150 COM TEXTO, Ano VIII, no 1 experiências passadas, mas que tem uma margem de autonomia sobre sua própria vida. IV- CONSIDERAÇÃO POSITIVA CIONAL PARA CONSIGO INCONDI- Segundo Rogers, a qualidade das avaliações proveniente dos outros pelas quais o indivíduo passa ao longo de sua vida e principalmente durante a sua infância, influencia diretamente o distanciamento entre as experiências do organismo e as experiências do Self. Isto significa que, se essas avaliações sempre tivessem um sinal positivo, o que ele chamou de consideração positiva incondicional, esse distanciamento se tornaria inexistente e as experiências simbolizadas que constituem o Self espelhariam fielmente as experiências do organismo, e desta forma não existiria incongruência entre a tomada de consciência do indivíduo e o campo fenomenal (totalidade de experiência). Quando esse ideal é percebido, Rogers diz que a pessoa é ajustada, madura e funciona de modo completo, enquanto que a incongruência entre o Self e o organismo faz com que os indivíduos se sintam ameaçados e ansiosos. Ele diz ainda que se a experiência do indivíduo fosse apenas consideração positiva incondicional, ele não desenvolveria nenhuma condição de valor, e a auto-estima seria incondicional, e essas duas jamais discordariam da avaliação organísmica, e o indivíduo funcionaria de modo completo. Essas avaliações são provenientes dos pais e de outras pessoas que durante a infância classificam o comportamento da criança como aceitável e inaceitável. Isso provoca nela o desejo de ser aquilo que esperam dela e não o que realmente sente que deve ser. A criança tende a atender às expectativas positivas, mesmo que estas não signifiquem uma melhora organísmica. O desenvolvimento do indivíduo é construído em torno de situações e comportamentos esperados os quais muitas vezes são conflitantes com a forma como ele pensa ou elabora seus desejos. Em conseqüência, a pessoa se torna um ser incongruente e cada vez 151 COM TEXTO, Ano VIII, no 1 mais distante de si mesmo e ainda tem que lidar com as exigências e expectativas sociais que provocam ansiedades e angústias demasiadamente incompreendidas por ele mesmo, o que representa uma brecha entre o Self e o organismo. Esse desconforto existencial é que impulsiona o indivíduo a procurar ajuda. freqüentemente o counselor se depara com situações trazidas por esses organismos conflitantes. Por isso a necessidade do encontro ocorrer nas melhores condições de acolhimento e aceitação. A importância de demonstrar uma consideração positiva independente do que o outro esteja trazendo dentro de si ou do que ainda está por vir no decorrer do percurso. A consideração positiva provoca uma sensação de conforto e confiança naquele que está se propondo a ajudá-lo. Todas as condições favoráveis proporcionadas nos encontros de counseling permitem que o indivíduo gradualmente entre em contato com seus sentimentos e pensamentos antes reprimidos e incompreendidos pelos outros e por si mesmo, e que inutilmente em situações passadas, foi forçado a eliminar de sua consciência, provocando com isso conflitos interiores incompreendidos e que precisam vir à tona para serem representados adequadamente na sua consciência. Esses comportamentos e sentimentos devem ser percebidos novamente pela pessoa e analisados e avaliados em sua atual realidade, tornando-se significativo para si mesmo e assim se tornando ele uma pessoa ativa e centrada em sua própria experiência e não na dos outros, como aprendeu no passado. Daí seu cliente, à medida do seu desenvolvimento mediante o processo de counseling, passa a considerar positivamente a si mesmo e as suas experiências, diminuindo cada vez mais o distanciamento entre o seu Self e o organismo, resultando na congruência de seu discurso. Para que o counselor propicie esse ambiente positivo é preciso que ele acolha a presente situação existencial do outro que se apresenta diante de si para, a partir daí, a pessoa em questão se 152 COM TEXTO, Ano VIII, no 1 sinta aceita em sua totalidade e apreenda também a importância de se aceitar incondicionalmente dentro de suas possibilidades e reconhecendo os seus próprios limites. Segundo Rogers, na segurança do relacionamento terapêutico, o cliente pode ir assimilando à auto-estrutura aqueles sentimentos antes ameaçadores, e muitas vezes isso pode exigir uma drástica reorganização do autoconceito pessoal para que então fique de acordo com a realidade da experiência organísmica. “Ele será, de modo mais unificado, aquilo que ele organicamente é, e essa parece ser a essência da terapia” (Rogers, 1955, p. 269). V-CRESCIMENTO MÚTUO É necessário que no processo da ACP o terapeuta esteja presente na relação, valendo-se desta premissa. O counseling tem como objetivo maior levar o indivíduo de uma situação de rara intimidade consigo a uma sempre maior consciência das suas motivações mais profundas e da possibilidade de diversificar as respostas habituais, tendo por base as exigências contingentes. Para tal o counselor deve, através de suas habilidades inerentes e aprendidas, como a compreensão empática, o acolhimento, o respeito pelo indivíduo, a escuta ativa, a autenticidade, entre outros traços distintivos propiciar uma relação de confiança tão pessoal com o cliente que ele possa tê-lo a princípio como uma referência para posteriormente descobrir que ele mesmo é o centro de suas experiências. E isso não seria pleno se o ajudador não se colocasse também na relação, preservando sua individualidade e ponderando suas experiências quando necessário. Na medida em que o cliente percebe que não está sozinho em seu sofrimento, em suas dúvidas e angústias, ele se sente amparado e confiante em seu percurso de autoconhecimento. Essa motivação é importante para que o processo de counseling tenha sucesso pois, quando o terapeuta ou o counselor se coloca em sua essência, como uma pessoa diante de outra, todas as barreiras e dificuldades são postas abaixo, diferentemente quando o cliente está diante do médico ou terapeuta, 153 COM TEXTO, Ano VIII, no 1 que se coloca a uma distância segura e impessoal, na tentativa de elaborar ou desenvolver um psicodiagnóstico, e não no intuito de conhecer e acolher aquele ser em sofrimento, que o procura suplicando ajuda, mesmo quando isto não é verbalmente colocado. A sensibilidade de percepção e a concentração no interlocutor proporciona ao counselor uma compreensão total do indivíduo, seja pelo que é dito nas entrelinhas, seja pelos gestos e comportamentos, seja até mesmo pelo que ainda não foi verbalizado, mas que, a partir de sua perspicaz observação, pode ser identificado através de sinais que demonstram um sentimento outrora reprimido ou desconhecido. Quando o counselor se coloca como participante da relação, essa presença desencadeia o processo de desenvolvimento, e é através dessa coparticipação que o cliente começa a entrar em contato consigo mesmo e a experienciar sentimentos outrora esquecidos ou recalcados. E ele passa a entrar em contato com seus pensamentos, desejos, com seu próprio corpo, compreendendo melhor comportamentos e posturas, assim como com suas emoções, antes reprimidas. Esse momento de descobertas, e aceitação de si mesmo propicia ao indivíduo encontrar a congruência ente essas três instâncias vivenciais mente, corpo e emoções para só assim tornar-se um organismo em sua função plena. Para que o counselor conduza o indivíduo ao seu autoconhecimento é preciso que este esteja confiante e tenha propriedade experiencial desse percurso, ou pelo menos de parte dele, até porque no início dos encontros não se tem certeza de quais serão os caminhos a serem seguidos. É através da presença, autenticidade e das conversas que o counselor vai percebendo como aquele sujeito pode ser guiado, levando em consideração a maturidade das suas emoções, a aceitação de suas incongruências, o desejo de auto-realização e as representações conscientes e inconscientes de seus pensamentos e da realidade contingente. É imprescindível também que o counselor se utilize de algumas 154 COM TEXTO, Ano VIII, no 1 técnicas e recursos para auxiliá-lo nesta condução, contudo, ele não deve se prender às teorias ou práticas generalistas, mas concentrarse acima de tudo no que está sendo trazido pelo cliente, centrando todo o processo nas questões existenciais da pessoa. As técnicas são usadas como ferramentas auxiliares que em alguns momentos se fazem necessárias, mas que precisam ser conhecidas e se tornaram primeiramente para terapeuta, para só assim serem aplicadas no processo de counseling. A confiança e a autenticidade não devem ser abaladas, pois através de uma demonstração de insegurança todo o processo terapêutico pode vir por água abaixo. A utilização das técnicas é muito importante para que mentalmente o counselor possa, de forma sutil e respeitando o outro, traçar um mapa mental a ser percorrido com o objetivo de facilitar o crescimento do indivíduo. Contudo, ele deve ser flexível e não se deixar levar por modelos inadequados. Essas intervenções são necessárias ao processo e só através da experiência o counselor ou terapeuta saberá o momento exato de pontuar uma questão ou utilizar-se de ferramentas aceleradoras do processo, sem fugir do objetivo maior que é primeiramente trabalhar a pessoa e depois o problema. O crescimento desta relação de ajuda requer que o counselor, munido de suas habilidades e qualidades atue na relação enfatizando os pontos de força do cliente, centrando-se em suas qualidades e realizações positivas, sem focar na problemática trazida por ele. Ele deve permitir que o cliente se veja sob uma nova perspectiva, destacando o que está dando certo em sua vida e como ele se projeta em seu futuro, planos, sonhos e realizações. O counselor deve acompanhar o cliente nesse crescimento, objetivando o contato maior com a realidade, com a sua vida cotidiana e as possibilidades concretas, não motivar fantasias e ilusões irreais, pois o counseling precisa proporcionar a aceitação da realidade e como ela pode ser representada positivamente na consciência do indivíduo. Um outro momento muito importante no counseling é 155 COM TEXTO, Ano VIII, no 1 quando o problema é trazido à luz e o counselor procura, por meio de intervenções e estratégias, conduzir o cliente a encontrar a melhor resolução possível. Para que isto seja possível, é preciso que a atitude em relação ao problema seja modificada, diminuindo a ansiedade. O counselor deve concentrar-se no que o indivíduo é agora, nas suas experiências passadas, e dirigir toda a energia para o futuro, questionando o que possa estar querendo emergir com essa dificuldade. Deve permitir que o cliente reflita sobre seus anseios e perspectivas futuras. É necessário que o counselor não apenas guie, mas esteja ao lado do cliente, crescendo junto com ele no percurso do seu autoconhecimento, exercitando a sua vontade e despertando a propriedade de suas escolhas, e de ser ele mesmo diante das cobranças e expectativas do mundo exterior. E, quando na relação o cliente vai se percebendo como independente e protagonista de suas escolhas, sendo congruente no que pensa e expressa e se aceitando como é e não mais como esperam que ele seja, a autonomia e a autenticidade passam a ser internalizadas e o indivíduo sente a sua verdadeira liberdade humana, tornando-se capaz de enfrentar e decidir situações e eventos trazidos pela vida. Neste momento, percebe-se que sua segurança em si mesmo e sua independência de atitudes e comportamentos em episódios da vida cotidiana, revelam as condições favoráveis para uma separação do apoio do counselor. Ao aproximar-se a conclusão do processo, percebe-se a qualidade do trabalho desempenhado juntos. Os sinais vão sendo percebidos e as máscaras vão sendo desfeitas ao longo do processo e por fim a pessoa se apresenta como ela é. Esse fechamento deve ser experienciado tanto pelo counselor como pelo cliente, pois o luto da separação deve ser vivido em conjunto, entendendo-se a importância também deste momento para ambas as partes, como crescimento humano de pessoas que estão em processo de desenvolvimento. 156 COM TEXTO, Ano VIII, no 1 CONSIDERAÇÕES FINAIS Para Rogers, uma terapia centrada no cliente bemsucedida, realizada em condições ótimas, “... significa que o terapeuta foi capaz de estabelecer um relacionamento intensamente pessoal e subjetivo com o cliente, como uma pessoa com outra pessoa. Significa que o terapeuta acha que o cliente é uma pessoa de autovalor incondicional; de valor independente de sua condição, comportamento ou sentimentos. Significa que o terapeuta é autêntico, não se escondendo atrás de uma fachada defensiva, mas encontrando o cliente com os sentimentos que ele, o terapeuta, está experienciando. Significa que o terapeuta é capaz de soltar-se ao entender o cliente,; que nenhuma barreira interna o impede de sentir como é ser este cliente em cada momento do relacionamento; e que ele consegue transmitir parte de seu entendimento empático ao cliente. Significa que o terapeuta fica à vontade ao entrar inteiramente nesse relacionamento, sem saber cognitivamente aonde ele vai levar, satisfeito por criar um clima que permitirá ao cliente a maior liberdade possível para ser ele mesmo”(Rogers,1961, p.185). Basicamente fundamentado nos princípios da ACP rogeriana, o counseling traz uma proposta moderna e pontual de uma psicoterapia que tem a pessoa como centro do processo e objetiva o seu desenvolvimento pessoal e de autoconhecimento. Surgindo em meio a mudanças de valores sociais e ao distanciamento do indivíduo de si mesmo, em troca de aceitações distorcidas da sociedade e exigências cotidianas, o counseling se apresenta como uma tendência em crescimento, tendo como influências principais os fundamentos humanistas e existencialistas, assim como o universo da experiência humana trazido pela psicologia transpessoal, que concebe a realidade em níveis ampliados de consciência. Diante das angústias e ansiedades decorrentes das urgências sociais, onde o homem cada vez mais desconhece o seu próprio ser, tornando-se coletivizado e impessoal em suas relações, 157 COM TEXTO, Ano VIII, no 1 criando uma sensação de vazio, o counseling com sua proposta de acolhimento e aceitação incondicional, oferece a esse público uma forma diferente de se reconstruir e se descobrir no mundo. Sem ilusões ou soluções mágicas, apenas através de técnicas, trabalho pessoal de autoconhecimento, habilidades inerentes e aprendidas e, acima de tudo, com a disposição de entrar numa relação de crescimento e descobertas essenciais para o desenvolvimento existencial do indivíduo. Pode-se dizer que se trata de uma nova forma de fazer terapia e de trazer à tona os verdadeiros valores humanos esquecidos em meio a valorização exacerbada do materialismo. O counseling adaptou a psicoterapia rogeriana para ser aplicada em situações e locais diversos, com o objetivo de atender,de forma precisa e breve, indivíduos que se encontram em conflitos e desacordos internos. Seja no ambiente de uma empresa, onde a motivação e o espírito solidário devem ser estimulados, seja nas clínicas e hospitais, no atendimento a clientes portadores de sofrimentos físicos e psíquicos, seja no enfrentamento de uma situação emergencial. O counseling pode ser praticado por diversos profissionais que têm como intenção o resgate dos valores e das relações humanas saudáveis. REFERÊNCIAS HALL, Calvin S.; LINDZEY, Gardner; CAMPBELL, John B. Teorias da Personalidade. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 2000. 591p. DANON, Marcella. Counseling: Uma nova profissão de ajuda. Curitiba: Sociedade Educacional e Editora IATES, 2003. 232p. 158 COM TEXTO, Ano VIII, no 1