Sindicato dos Laboratórios de Minas Gerais
Transcrição
Sindicato dos Laboratórios de Minas Gerais
Sindicato dos Laboratórios de Minas Gerais Nº : 240 Data: 02/07/2015 Fale conosco: (31) 3213-2738 - Fax (31) 3213-0814 - [email protected] - www.sindlab.org.br Sangue novo Prezado colega Segue para ciência, matéria publicada no jornal O Estado de São Paulo, de 30 de junho de 2015, intitulada “Sangue novo”. Theranos, uma ambiciosa companhia do Vale do Silício, quer sacudir o segmento de medicina diagnóstica No Arizona, o dia da Independência dos EUA virá mais cedo neste ano. A partir de 3 de julho, graças a uma nova lei, qualquer pessoa poderá solicitar um exame laboratorial sem antes ter de consultar um médico. Estarão disponíveis exames para doenças sexualmente transmissíveis, prédiabetes, níveis de vitamina e fertilidade. Um exame de colesterol sairá por US$ 2,99. A empresa que pressionou pela mudança na lei e que espera ser a maior favorecida por ela é a Theranos, uma jovem e ambiciosa companhia de análise de sangue de Palo Alto, no Vale do Silício. A Theranos já oferece exames baratos, rápidos e simples - em alguns casos os resultados ficam prontos em três horas - em unidades abertas no interior de lojas da rede de drogaria Walgreens. As primeiras unidades funcionam em Phoenix, no Arizona, e na própria Palo Alto em que a companhia está sediada, no Estado da Califórnia. Muitos dos exames são realizados com uma única gota de sangue, obtida com um furinho no dedo. O restante utiliza uma pequena agulha pediátrica e, mais uma vez, a quantidade de sangue necessária é reduzida. Liderada pela carismática Elizabeth Holmes, uma jovem que aos 19 anos abandonou o curso de engenharia química, a Theranos acredita que dispõe de tecnologia para provocar uma revolução global no segmento de diagnósticos, um ramo importante da medicina, ainda que não muito glamouroso. A companhia tem despertado muito interesse, em parte por valer, supostamente, US$ 9 bilhões, número baseado em notícias de que a empresa, cujo capital permanece fechado, captou mais de US$ 400 milhões vendendo participações a investidores. Debbie Wang, analista da empresa de pesquisa de investimento Morningstar, diz que "não se sabe ao certo a partir de que suposições se chegou a esse valor". A suposição mais importante é, evidentemente, a de que a Theranos está pronta para pôr um enorme segmento de negócios de pernas para o ar. Nos Estados Unidos, são realizados exames no valor de US$ 60 bilhões todos os anos, a maioria deles nos laboratórios dos próprios hospitais ou em laboratórios independentes; e os fabricantes de equipamentos laboratoriais faturam US$ 25 bilhões (num mercado global que movimenta anualmente US$ 56 bilhões). A Theranos fabrica os kits e realiza os exames. Por ora, detém apenas uma fatia muito pequena do segmento de exames e não vende os kits. Mais da metade do mercado mundial de equipamentos laboratoriais é controlada por poucas empresas, lideradas pela Roche e pela Abbott. Nos Estados Unidos e na Europa esse mercado parece maduro, diz Mickel Phung, da empresa de análise de dados Decision Resources, mas há muito potencial de crescimento nos mercados emergentes, onde população e gastos com saúde estão em crescimento. Quanto ao mercado de exames, uma questão relevante é determinar até que ponto a Theranos representa uma ameaça para os laboratórios "de referência", a que hospitais e médicos recorrem para a realização de inúmeros exames. Nos Estados Unidos, a situação é de quase duopólio, com o mercado sendo dividido entre o LabCorp, da Carolina do Norte, e o Quest Diagnostics, de Nova Jersey. Os dois laboratórios realizam ampla gama de exames - entre 3 mil e 4 mil, talvez -, mas ambos dependem sobremaneira da tecnologia que adquirem dos fabricantes de equipamentos laboratoriais. Até o momento, a Theranos oferece apenas cerca de 250 exames - e pretende chegar a 1 mil. Mas sua tecnologia é toda desenvolvida internamente. Além da grande variedade de exames que oferecem, o LabCorb e o Quest, ambos listados em bolsa, com valor de mercado de US$ 12 bilhões e US$ 10 bilhões, respectivamente, têm outras vantagens. Estão bem estabelecidos no ecossistema de saúde dos Estados Unidos e dispõem de redes nacionais de laboratórios e serviços de coleta. A capacidade do laboratório central da Therano é muito pequena: corresponde a cerca de 5% da capacidade do LabCorp, calcula a Morningstar. E, se outras empresas do Vale do Silício baseadas em tecnologia digital, como o Facebook e o Uber, podem adquirir escala global rapidamente, o crescimento da Therano depende da criação de uma rede de laboratórios e da inauguração de novas unidades para a realização de exames - em outras palavras, a empresa tem que ganhar escala como se fazia antigamente. As parcerias que a Theranos começou a formar com grandes empresas de outras áreas do sistema de saúde devem causar alguma preocupação os atuais donos do mercado. A Pfizer e a GlaxoSmithKline já usaram a Theranos para realizar exames de sangue em pacientes que participam de testes com medicações novas, já que os exames podem ser feitos várias vezes por semana. Em março, a empresa de Palo Alto anunciou uma parceria em que se encarregará da realização de exames para a Cleveland Clinic, uma rede de hospitais e centros de saúde. No tocante a realização de exames por encomenda direta dos pacientes, a Theranos, por ora, tem unidades em apenas 40 lojas da Walgreens. E Nimesh Jhaveri, um executivo da rede, enfatiza que a parceria ainda está em fase "experimental". Embora a legislação do Arizona tenha sido liberalizada, no restante dos Estados Unidos as normas variam muito. Há lugares que permitem que os consumidores solicitem exames laboratoriais por conta própria, ou pelo menos não proíbem expressamente a prática. Em outros lugares, a permissão é concedida em determinadas condições. E há Estados em que o procedimento é interditado, ainda que às vezes os laboratórios consigam contornar a proibição, contratando um médico para autorizar as solicitações. É possível que boa parte do crescimento da Theranos venha da expansão do segmento de exames, e não de sua entrada em fatias de mercado de empresas já estabelecidas. Isso pode acontecer tanto porque os consumidores se sentirão estimulados a realizar exames por iniciativa própria, como também porque deve aumentar a probabilidade de que eles obedeçam quando os médicos pedem que façam exames. Em razão do custo, do medo de agulhas grandes e da demora em receber os resultados, é comum que as pessoas deixem de realizar os exames que os médicos lhes pedem. Apesar do receio de tirar das mãos dos médicos a decisão quanto à necessidade ou não da realização de determinado exame, a experiência com kits que permitem à pessoa aplicar o exame em si mesma, em especial no caso dos exames de HIV, mostra que a ampliação do acesso encoraja a realização de exames com mais frequência. Pacientes que apresentam resultados positivos tendem a consultar um médico e a começar seu tratamento antes do que o fariam se o processo tivesse de ser iniciado com uma consulta médica. E estão se abrindo novas áreas para a realização de exames, às quais a Theranos poderia, em princípio, aplicar sua tecnologia. Nos "diagnósticos complementares", por exemplo, uma amostra de sangue é examinada para determinar se um paciente pode se beneficiar de um medicamento específico. Os "diagnósticos moleculares" buscam coisas como sequências genéticas, que indiquem a presença de um câncer ou de uma infecção. No entanto, quanto mais atraente parecer o segmento de medicina diagnóstica, e quanto maiores forem os incentivos para que ele se modernize, maior será a concorrência que a Theranos vai enfrentar - de empresas antigas e novas. O LabCorp anunciou recentemente que permitirá que os consumidores solicitem pela internet a realização de exames, sem necessidade de pedido médico. A HealthTell, uma startup do Arizona, está desenvolvendo exames que, como os da Theranos, usam apenas uma gota de sangue. Para alguns tipos de exame, vai haver competição entre fabricantes de kits domésticos cada vez mais sofisticados. Não se sabe ao certo até que ponto a Theranos tem como usar patentes para se proteger da competição. Holmes detém, pessoalmente, diversas patentes, mas a empresa divulga poucas informações a respeito da tecnologia incorporada a seus exames. Até o momento, as disputas judiciais relacionadas com questões de propriedade intelectual são menos comuns no segmento de medicina diagnóstica do que em outros setores que fazem uso intensivo de tecnologia: geralmente as empresas acham mais fácil descobrir uma nova maneira de realizar determinado exame do que questionar a patente de um concorrente na Justiça. No entanto, à medida que a Theranos for se tornando um incômodo cada vez maior para empresas já estabelecidas, é possível que seus executivos comecem a passar mais tempo na companhia de advogados especializados na área de patentes. No ano passado, a empresa ganhou a primeira ação em que foi acusada de violação de propriedade intelectual. Os autores abandonaram a ação e concordaram em não entrar com novas ações nos próximos cinco anos. Os investidores que injetaram dinheiro na Theranos provavelmente têm uma noção mais clara do que quem está de fora sobre detalhes como o grau de proteção de que a empresa dispõe na área de patentes e a aplicabilidade de sua tecnologia a novos tipos de exames. É evidente que há muito potencial para a realização de uma gama mais ampla de exames, com mais frequência, a um custo menor e com menos tripanofobia (medo de injeções). Mas há muito chão a ser percorrido para se chegar ao futuro que a Theranos enxerga para a medicina diagnóstica. E é pouco provável que ela chegue lá sozinha. © 2015 THE ECONOMIST NEWSPAPER LIMITED. DIREITOS RESERVADOS. TRADUZIDO POR ALEXANDRE HUBNER, PUBLICADO SOB LICENÇA. O TEXTO ORIGINAL EM INGLÊS ESTÁ EM WWW.ECONOMIST.COM. Atenciosamente, Humberto Marques Tibúrcio SindLab Presidente Eu fiz minha parte!®