Simulação de Propriedades Estruturais e Eletrônicas de Agregados
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Simulação de Propriedades Estruturais e Eletrônicas de Agregados
Universidade de São Paulo Instituto de Física Simulação de Propriedades Estruturais e Eletrônicas de Agregados, Líquidos Regulares e Supercríticos. Rafael Carvalho Barreto Orientador: Prof. Dr. Sylvio R A Canuto Tese de doutorado apresentada ao Instituto de Física para a obtenção do título de doutor em ciências. São Paulo 2010 (contra capa) (espaço reservado para o registro da biblioteca) (vazio) A ciência é o que nós compreendemos suficientemente bem para explicar a um computador. A arte é tudo mais. Donald Knuth Ciência da computação tem tanto a ver com o computador como a Astronomia com o telescópio, a Biologia com o microscópio, ou a Química com os tubos de ensaio. A Ciência não estuda ferramentas, mas o que fazemos e o que descobrimos com elas. Edsger Dijkstra Não existe física computacional sem computador. Rafael Barreto (vazio) Sumário Agradecimentos ................................................................................................................ 8 Resumo ............................................................................................................................. 9 Abstract........................................................................................................................... 10 Capítulo 1 : Introdução ................................................................................................... 11 Capítulo 2 : Métodos de modelagem molecular em líquidos ......................................... 14 Capítulo 3 : Solvatocromismo do fenol .......................................................................... 16 3.1 Agregados de fenol e água.............................................................................. 19 3.2 Agregados de fenol e etanol ........................................................................... 24 3.3 Fase líquida: Simulação do fenol em água ..................................................... 41 3.4 Fase líquida: Simulação do fenol em etanol ................................................... 50 Capítulo 4 : Água supercrítica ........................................................................................ 57 4.1 Determinação do Ponto Crítico da Água usando o Modelo AMOEBA......... 62 Capítulo 5 : Retrospectiva, Conclusões e Perspectivas .................................................. 70 Apêndice A: Realizações no Doutorado......................................................................... 73 Apêndice B: Mecânica Molecular - Líquidos................................................................. 75 Apêndice C: Mecânica Quântica - Métodos Aproximativos .......................................... 83 Apêndice D: Campos de Força ....................................................................................... 89 Apêndice E: Aspectos Técnicos da Física Computacional............................................. 95 Referências ................................................................................................................... 101 8 Agradecimentos Agradeço a todos, sem exceção. Agradeço especialmente a FAPESP pelo apoio financeiro. 9 Resumo Esta tese de doutorado investiga as propriedades espectroscópicas e termodinâmicas de líquidos moleculares. Para este fim utilizam-se técnicas de química quântica e modelagem na simulação computacional. Para simular as propriedades termodinâmicas e flexibilidade molecular foi utilizada Simulação Clássica (Monte Carlo e Dinâmica Molecular). Já para reproduzir as propriedades eletrônicas, valeu-se de métodos de Química Quântica (post-HF e DFT). O efeito de polarização foi introduzido pelo Método Seqüencial Monte Carlo/Mecânica Quântica (S-MC/QM) e também via campo de força polarizáveis. Apresenta-se uma visão geral destas técnicas no apêndice. Este trabalho se divide em três partes. Na primeira parte são obtidas as propriedades estruturais e espectroscópicas de agregados de fenol e água (1+1 e 1+2) e fenol e etanol (1+1). Os modos vibracionais (inter e intramoleculares) e a energia de ligação são calculados. Os resultados estruturais e o desvio solvatocrômico são coerentes com dados experimentais e expectativas teóricas (para os diferentes agregados). Na segunda parte é realizada a simulação do fenol em água utilizando o protocolo S-MC/QM, com o respectivo cálculo do espectro eletrônico. É apresentado o estudo das pontes de hidrogênio e as diferentes contribuições que determinam o desvio solvatocrômico em solução. Em seguida é feita a simulação do fenol em etanol utilizando dinâmica molecular e o campo de força flexível e polarizável AMOEBA. As propriedades termodinâmicas da simulação estão em excelente concordância com as expectativas teóricas e experimentais. Isso é surpreendente dado o fato que o modelo não é parametrizado empiricamente. Por fim, é detalhado o trabalho realizado com a água supercrítica. Foram executadas centenas de simulações a fim de se obter o ponto crítico do modelo AMOEBA. São apresentadas as isotermas e os parâmetros da equação de estado que determinam o comportamento do modelo nessa região. Este documento amostra o conhecimento adquirido pelo aluno em diferentes aspectos da física computacional, desde a parte técnica, os diversos modelos e aproximações teóricas utilizadas em simulação e a capacidade de aplicação deste conhecimento em problemas de interesse físico, os quais resultaram em dois artigos publicados [12,22] e mais dois trabalhos em preparação. 10 Abstract This thesis investigates the spectroscopic and thermodynamic properties of molecular liquids. To this end, we use techniques of quantum chemistry and modeling to do computational simulation. To simulate the thermodynamic properties and molecular flexibility it was used Classical Simulation (Monte Carlo and Molecular Dynamics). To reproduce the electronic properties it was used Quantum Chemistry methods (post-HF and DFT). The polarization effect was introduced through the Sequential Monte Carlo / Quantum Mechanics Method and polarizable force fields. It is presented an overview of these techniques in the appendix. This work is divided into three parts. In the first part is obtained spectroscopic and structural properties of phenol and water (1+1 and 1+2) and phenol and ethanol (1+1) clusters. The vibrational modes (intra and intermolecular) and binding energies are calculated. The structural results and the solvatochromic deviations are consistent with experimental data and theoretical expectations (for different clusters). In the second part is performed the simulation of phenol in water using the S-MC/QM protocol, followed by the calculation of the electronic spectrum. It is presented the study of hydrogen bonding and the different contributions which determine the solvatochromic deviation in solution. So, it is made the simulation of phenol in ethanol using molecular dynamics and the polarizable and flexible force field AMOEBA. The thermodynamic properties of the simulation are in excellent agreement with theoretical expectations and experimental data. This is surprising given the fact that the model is not parameterized empirically. Finally, it is detailed the work on supercritical water. It has been performed hundreds of simulations in order to obtain the critical point of the model AMOEBA. Isotherms are presented as well as the parameters of the equation of state which determine the behavior of the model in that region. This document samples the acquired knowledge of the student in different aspects of computational physics, from the technical side, the various models and theoretical approaches used in simulation and the ability to apply this knowledge to problems of physical interest, which resulted in two published articles [12,22] and other two are in preparation. 11 Capítulo 1: Introdução O estudo teórico das propriedades moleculares em líquidos não é simples. O líquido tem densidade similar ao sólido, mas suas partículas fluem sem ter posição definida. As forças de atração e repulsão impõem restrições de como suas partículas podem se movimentar. Dado o grande número de possíveis conformações é necessária cautela quando se tenta construir modelos teóricos. O problema é ainda mais complexo já que não existe uma equação simples para descrever as forças intermoleculares. O surgimento da mecânica quântica estabeleceu um novo paradigma para o estudo teórico das propriedades microscópicas dos líquidos [1]. Expressões analíticas para as forças intermoleculares puderam ser obtidas para sistemas simples, como gases nobres. Mas foi apenas com o surgimento do computador que se pode avançar sobre sistemas mais complexos. Técnicas numéricas foram aplicadas a problemas cuja abordagem analítica era impossível devido à grande quantidade de vínculos e restrições. Mesmo com o avanço contínuo e acelerado guiado pelo desenvolvimento computacional, a maioria dos problemas em meio solvente ainda é complicada o suficiente para desafiar as soluções numéricas do tipo "força bruta". Inevitavelmente, foram desenvolvidos modelos simplificados para descrever as forças intermoleculares (chamados de campos de força), já que os cálculos quânticos (ainda) são inaplicáveis para a maioria dos sistemas de interesse devido ao seu alto custo computacional. Quando se trata de líquidos polares [2], uma boa descrição dos momentos de multipolo é crucial. Tais interações são fundamentais para a conformação de complexos moleculares, membranas e micelas, determinação do número médio de pontes de hidrogênio, cálculo da constante dielétrica e típicas propriedades anômalas. Moléculas apolares, como sistemas aromáticos e solventes utilizados em processos químicos, ou moléculas complexas com regiões apolares, tais como lipídios e proteínas, necessitam de tratamento diferenciado. Em tais moléculas é necessário utilizar campos de força que descrevam bem os efeitos de indução, dispersão e termos superiores da expansão multipolar. Para líquidos homogêneos, quando se utiliza modelos simplificados para descrever as interações moleculares, a qualidade do campo de força pode facilmente ser verificada pelas propriedades termodinâmicas calculadas. Mas não existe a mesma facilidade quando se deseja estudar moléculas em meio heterogêneo. Compreender o efeito do solvente sobre o soluto é a chave para 12 explicar resultados experimentais, desvendar interações específicas, entender mudanças conformacionais e solvatocromismo. Potenciais que descrevem bem as propriedades termodinâmicas do sistema podem não descrever corretamente a interação específica soluto-solvete, e assim são necessários métodos mais avançados e maior cuidado para avançar nesta área. Ao fim do capítulo 2, são apresentadas algumas das técnicas utilizadas para melhorar os campos de força tradicionais e incluir parte dos efeitos de polarização do soluto causado pelo solvente. Este trabalho dá atenção especial ao fenol. Fenóis são compostos orgânicos em que um grupo álcool está diretamente ligado a um grupo aromático de hidrocarbonetos. É um importante grupo funcional, encontrado em diversas reações químicas e biológicas. Sua forma mais simples é o C6H5OH (Figura 1), conhecido como fenol, benzenol, ácido carbólico, hidroxibenzeno, entre outros nomes. É mais ácido que os alcoóis, podendo ser convertido quando em solução aquosa em fenolato ou fenóxido. Estudar a interação dos fenóis com o meio solvente possui imensa importância, tal como a compreensão de mecanismos de reação química e interpretação do espectro de compostos complexos, interação de moléculas de interesse biológico com o solvente, dentre outras aplicações tanto na indústria quanto em laboratório. No capítulo 3 é apresentado parte do estudo feito com o fenol. Nesta parte, destacam-se a influência das diferentes contribuições (bulk e pontes de hidrogênio) para o desvio solvatocrômico do fenol em meio. Figura 1: Molécula de fenol. 13 Na segunda parte deste trabalho, é apresentado o estudo da água em condições supercríticas. O objetivo desta parte foi desenvolver o conhecimento e as ferramentas necessárias para futuros estudos de solvatação molecular nessas condições. Fluidos supercríticos (SCF), por definição, são todas as substâncias cuja temperatura e pressão estão além do ponto crítico. Ao contrário do que se pode pensar, simular em condições supercríticas não é tão simples quanto se simular em condições normais. No ponto crítico, a descontinuidade nas propriedades físicas, a qual diferencia a fase líquida da gasosa, desaparece. Na região supercrítica, o fluido exibe propriedades completamente novas, as quais vêm despertando crescente interesse na última década [3]. Dentre as mais intrigantes, se encontra a mudança drástica nas propriedades de solvatação de fluidos comuns [4]. Nessa nova condição, algumas dessas substâncias são chamadas de solventes verdes, pois são capazes de substituir solventes orgânicos pesados prejudiciais ao ambiente. A água, em especial, com pressão crítica de 217 atm e temperatura crítica de 647 K, na região supercrítica apresenta baixa polaridade e alta acidez [5]. A correta descrição e compreensão das propriedades físicas de moléculas solvatadas a condições normais é um desafio por si só. Repetir esse estudo em altas temperaturas e pressões, caso da água supercrítica, é um desafio ainda maior. No capítulo 4 apresenta-se o estudo feito com simulação de água em condições supercríticas. O resultado mais importante deste trabalho é a determinação do ponto crítico da água utilizando o modelo polarizável AMOEBA. ************************* Todas as variáveis (escalares, vetores ou tensores) utilizadas nas equações e tabelas deste trabalho foram colocadas em itálico (q0, x…). Os vetores foram escritos em negrito (µ, r…). Os tensores de segunda ordem, mesmo sendo variáveis, estão apenas em negrito (Θ). Os operadores têm circunflexos (Â, Ĥ…). Em alguns momentos do texto, alguns termos-chave foram destacados em negrito a primeira vez que apareceram. Alguns termos utilizados na literatura, nomes de métodos, ou de constantes foram colocados em itálico. Foi utilizado ponto (.) como separador decimal, contrariando o padrão nacional. Todas as equações serão chamadas no meio do texto pelo seu número entre parênteses, ou seja, (53) deve ser lido como "equação 53". Os usos do hífen e do trema estão de acordo com a gramática antiga, antes da reforma ortográfica que uniu a gramática dos países de língua portuguesa. 14 Capítulo 2: Métodos de modelagem molecular em líquidos Estudar as propriedades físicas de sistemas líquidos requer conhecimento abrangente. Um líquido é um condensado de moléculas, as quais se guiam pela força de interação de cada uma com todas as outras. Condensado implica que a força é em média atrativa, e que a velocidade de seus constituintes não é em média suficiente para que estes se dispersem. Porém, esta força não é grande o bastante para confinar os movimentos das moléculas em torno de alguma posição de equilíbrio. E por mais relevante que seja sua descrição microscópica, o estudo dos líquidos inicia-se realmente por suas propriedades macroscópicas (termodinâmica). Seu formalismo torna possível reconhecer as equações de estado de um sistema em equilíbrio, independente de sua constituição microscópica. A partir de um pequeno conjunto de princípios, como a conservação da energia e a maximização da entropia, é possível relacionar quantidades extensivas (entropia e volume) com intensivas (temperatura e pressão), e encontrar características inerentes da matéria tais como o calor específico e a compressibilidade. A conexão entre as propriedades termodinâmicas e sua origem microscópica é feita através da mecânica estatística. Como não há interesse em saber a localização exata de cada molécula no espaço a cada instante, procura-se obter o efeito médio desta multidão em cada propriedade observada. O efeito conjunto dessa multidão de possíveis configurações é chamado de ensemble1. Encontrar uma equação de estado de um líquido em equilíbrio através da mecânica estatística enfrenta dois problemas fundamentais. Como calcular a energia de uma determinada configuração e como ponderar sobre um número aparentemente infinito de configurações. Isto poderia ser feito por meios analíticos, integrando-se sobre o "espaço de configurações" acessíveis ao sistema. Infelizmente, mesmo conhecendo a forma analítica da energia, o número de variáveis e vínculos dos sistemas físicos de interesse torna tal procedimento quase sempre inviável. Portanto são utilizados métodos numéricos (simulação computacional). E para se obter a energia de uma configuração é necessário compreender a natureza das forças moleculares. Estas possuem suas origens no eletromagnetismo. Classicamente, caso fosse possível saber a exata distribuição de cargas, posições e velocidades de cada um dos constituintes do sistema, saber-se-ia também a energia total de cada configuração. 1 Ensemble: Unidade ou grupo de partes complementares que contribuem para um efeito único. [Francês, do Francês Antigo, do Latim Tardio īnsimul, "ao mesmo tempo".] 15 Entretanto a distribuição de cargas e a própria conformação molecular só pode ser conhecida através da mecânica quântica, elevando o problema a um novo grau de complexidade. O estado do sistema pode ser representado por uma função de onda, e os observáveis físicos por operadores que atuam nesta função. Entende-se por observável aquilo que é passível de medição, como energia, posição, e momento, por exemplo. Problemas simples como o oscilador harmônico e o átomo de hidrogênio são resolvidos analiticamente com o uso da álgebra destes operadores. Problemas mais elaborados, como o problema de três corpos, requerem métodos aproximativos, pois recaem em equações diferenciais das quais não se conhece a solução. Assim o cálculo da energia demanda uma série de aproximações e o extensivo uso de cálculo numérico. Os métodos de simulação computacional de líquidos, cálculo da energia de cada configuração, os métodos quânticos utilizados e seus respectivos graus de aproximação, assim como os campos de força derivados deste conhecimento estão nos apêndices. No apêndice B são apresentados os métodos de Monte Carlo e o de Dinâmica Molecular, utilizados neste trabalho para gerar configurações de líquidos. No apêndice C são apresentados alguns métodos quânticos utilizados para obter as propriedades eletrônicas dessas configurações. No apêndice D são apresentadas algumas características dos campos de força utilizados nas simulações computacionais. No apêndice E são apresentados alguns aspectos importantes da tecnicalidade necessária para a realização da simulação computacional. 16 Capítulo 3: Solvatocromismo do fenol Neste capítulo é apresentado o estudo do deslocamento espectral do fenol em solvente. O solvente de principal interesse neste trabalho é a água. Entretanto, resultados experimentais [6] para o deslocamento espectral do fenol em etanol mostram que seu valor é contrário àquele obtido para água. É interessante notar que ambos os solventes são polares, e ambos são capazes de fazer pontes de hidrogênio. Este resultado levanta a questão sobre a origem do solvatocromismo do fenol em função das pontes de hidrogênio formadas em solução. Desta maneira, foi realizada simulação tanto de fenol em água quanto de fenol em etanol. Inicialmente realizou-se a otimização de geometria da molécula de fenol isolada, com o método perturbativo MP2 [96] e a base aug-cc-pVDZ [7]. A Tabela 1 mostra os resultados desta otimização. A posição de mínimo é garantida pelo fato de todas as freqüências vibracionais serem reais. Nota-se que as distâncias CO e HO são um pouco superestimadas (1%) em relação aos valores obtidos com espectroscopia de microondas [53]. O valor para o momento de dipolo, que é função da distribuição de cargas e da geometria, também é superestimado (4.5%). Os valores obtidos para as constantes rotacionais, que são função inversa da geometria, são levemente subestimados (2%). Tabela 1: Resultados do cálculo da otimização da molécula de fenol isolada. A energia foi obtida com o método MP2/aug-cc-pVDZ. A energia de ponto zero (ZPE) é calculada dentro da aproximação harmônica. As freqüências vibracionais são típicas para torção e estiramento OH. RCO (Å) RHO (Å) ΘHOC (º) ΘHOCC (º) µ (Debye) I (GHz) A B C E(hartree) ZPE(kcal/mol) τHOCC (cm-1) νHO (cm-1) Teórico 1.382 0.968 108.6 0.0 1.28 5.560 2.577 1.761 -306.61069 65.09 330 3808 Experimental [53] 1.364 0.956 109.0 0.0 1.224 ± 0.008 5.650 [8] 2.619 1.789 — — 310 [18] 3656 17 A energia total é dada pela energia eletrônica E (incluindo a repulsão nuclear) mais a energia de ponto zero (ZPE) associada com o movimento vibracional dos núcleos (que por conveniência foi escrita separadamente). Na tabela se destacam os dois modos vibracionais que são mais afetados pelas pontes de hidrogênio que o fenol é capaz de realizar. O movimento de torção (HOCC) e o movimento de estiramento (OH) da hidroxila desviam respectivamente 7% e 5% do valor obtido experimentalmente por Bist et al.[18]. Nota-se que estas freqüências foram calculadas na aproximação harmônica, e incluir correções anarmônicas fariam com que estas freqüências diminuíssem em direção ao resultado experimental. Obtida a geometria, calculou-se o espectro de absorção em fase gasosa. Os métodos utilizados foram TDDFT [9] com o funcional B3LYP (TDB3LYP) [10], TDHF [9], e CIS(D) [97]. Como o CISD não é um método extensivo, ele não deve ser usado para estudar efeitos de solvente onde o número de moléculas explicitamente consideradas muda [95]. Assim optou-se pelo método CIS (que é extensivo) e as excitações duplas são incluídas de forma perturbativa com o cuidado de se preservar a extensividade (veja apêndice C). Os cálculos para o espectro eletrônico foram realizados utilizando-se a base aug-cc-pVDZ, a mesma das otimizações de geometria. Os resultados são apresentados na Tabela 2. Os resultados obtidos são típicos. O método CIS produz valores muito altos para a transição, o mesmo ocorrendo para TDHF. Os métodos TDB3LYP e CIS(D) fornecem resultados melhores, entretanto ainda superiores ao resultado experimental obtido por Baba e Suzuki [11]. Tabela 2: Resultados do cálculo da transição eletrônica para a molécula de fenol isolada. π → π* 1º exc (cm ) 2º exc (cm-1) 46350 48770 39810 51030 44530 46290 39800 — 36070 45400 -1 CIS CIS(D) TDHF TDDFT Experimental [11] Os métodos CIS, CIS(D) e TDHF resultaram em transição de natureza π → π* para a primeira e segunda excitação (Figura 2). O método TDDFT possui resultado equivalente ao método CIS(D) para o valor da primeira transição, entretanto nas quatro excitações subseqüentes não houve mais nenhuma transição π → π*. 18 Figura 2: Caráter dos orbitais moleculares dominantes da primeira transição π → π* do fenol. O orbital da esquerda é associado ao estado fundamental, e o da direita ao estado excitado. Adicionalmente estudou-se a variação do momento de dipolo no nível CIS/aug-cc-pVDZ. Isto foi feito para inferir qual estado eletrônico do fenol (fundamental ou excitado) interage mais com o solvente polar. Nota-se aqui que o primeiro termo não nulo da expansão multipolar para moléculas polares neutras é o momento de dipolo. Observou-se um decréscimo de 0.1 D do estado fundamental para o estado excitado, o que sugeriria um sutil desvio para o azul em solvente polar. Este raciocínio desconsidera completamente o efeito das pontes de hidrogênio, situação a qual a proximidade entre os centros de carga impossibilita que se trunque a expansão multipolar em seus primeiros termos. 19 3.1 Agregados de fenol e água Antes de simular o fenol em água para obter seu solvatocromismo, faz-se necessário estudar os possíveis agregados em fase gasosa [12]. De antemão, é crucial compreender como esse desvio se comporta em relação à formação de pontes de hidrogênio entre fenol e água. Portanto, estudou-se o complexo de fenol com uma molécula de água em duas possíveis conformações para ponte de hidrogênio: água doadora (W:Ph) e água aceitadora (Ph:W), como pode ser visto na Figura 3. As geometrias foram otimizadas no nível de cálculo MP2/aug-cc-pVDZ, o mesmo nível utilizado para o monômero. Figura 3: Complexos otimizados de fenol com uma água em nível MP2/aug-cc-pVDZ. Tabela 3: Resultados para a energia total eletrônica mais repulsão nuclear (hartrees), e as energias de ligação (kcal/mol), para os complexos com uma água em nível MP2/aug-cc-pVDZ. Água Fenol W:Ph Ph:W a b Energia (hartrees) Energia de Ligação (kcal/mol) ∆E ∆E+ZPEa -76.26091 -306.61069 -382.88005 -382.88385 — — 5.30 7.68 — — 3.82 5.91 ∆E+ZPE +BSSEb — — 2.63 4.50 ZPE: Inclusão da energia de ponto zero devido ao movimento nuclear. BSSE: Correção do erro de superposição de base [13]. Os resultados obtidos para a energia total e de ligação são mostrados na Tabela 3, em nível MP2/aug-cc-pVDZ. Nota-se que a energia de ligação é dada por 20 ∆E = EA + EB - EAB. As três últimas colunas apresentam esta energia, considerando-se primeiro apenas ∆E, depois ∆E corrigido em relação à energia de ponto zero (ZPE), e finalmente corrigindo também o erro de superposição de base (BSSE). Esta última coluna é a melhor estimativa da energia de ligação. Em concordância com a literatura, a configuração de água aceitadora é mais estável e mais abundante [14,15]. Nota-se que os experimentos de jet cooling reportados na literatura para obtenção de espectro e geometria são realizados em temperaturas abaixo de 50K (kT ~ 0.1kcal/mol). Considerando-se que o fator de Boltzmann, exp(-U/kT), determina as populações de cada uma das possíveis conformações (onde U = EAB - (EA + EB) = -∆E). Estima-se que os complexos de água aceitadora são oito ordens de grandeza2 mais prováveis que os complexos de água doadora de ponte de hidrogênio, nas condições em que o experimento foi realizado (~50K). Todos os resultados obtidos para as geometrias foram submetidos ao cálculo de freqüências para conferir se eram mesmo conformações de mínima energia (Tabela 4). Os valores de 161 para Ph:W e 137 para W:Ph correspondem ao modo de estiramento intermolecular na ponte de hidrogênio, cujo resultado experimental reportado para Ph:W é de 156 cm-1 [16]. Nota-se que há uma fortuita concordância, já que este cálculo é feito dentro da aproximação harmônica, e portanto esperava-se um valor superestimado. Tabela 4: Resultado do cálculo das freqüências intermoleculares dos complexos de fenol e água, no nível MP2/aug-cc-pVDZ. Entre parênteses, o valor experimental obtidos da ref. [16]. νINTER (cm-1) Ph:W W:Ph 38 18 62 46 108 100 161 (156) 137 217 222 236 271 Os resultados para os modos de vibração intramoleculares do grupo OH do fenol são apresentados na Tabela 5. Tais resultados para a fase gasosa são equivalentes aos obtidos em nível CASSCF por Schumm et al.[17]. Ambos os resultados para os complexos estão de acordo com o esperado. A freqüência do modo 2 p(Ph:W)/p(W:Ph) = exp((4.50-2.63)/0.1) ≈ exp(19) ≈ 108 21 de torção do grupo OH aumenta e o modo de estiramento diminui para o fenol doando a ponte (Ph:W). Tabela 5: Resultado do cálculo das freqüências intramoleculares do fenol (estiramento e torção do OH). Primeira linha para fase gasosa e depois para os complexos de fenol e água, no nível MP2/aug-cc-pVDZ. Entre parênteses, os valores experimentais obtidos da ref [18]. Fenol W:Ph Ph:W Torção (cm-1) 328 (310) 290 761 Estiramento (cm-1) 3808 (3656) 3808 3628 Figura 4: Complexos do fenol com duas águas. Ambas apresentam energias equivalentes (ver Tabela 6). Em seguida, motivados pelo trabalho experimental de Fuke e Kaya [21], adicionou-se mais uma água a essas geometrias. Encontraram-se duas conformações mostradas na Figura 4. Ambas as conformações estão de acordo com a literatura [19,20]. Dado os erros dos métodos e nível de cálculo utilizados, as conformações Ph:W:W1 e Ph:W:W2 apresentam a mesma energia de ligação (com diferença de 0.2kcal/mol em favor de Ph:W:W2), como visto na Tabela 6. Fato interessante é que a segunda água na conformação Ph:W:W2 aparenta fazer um ponte do tipo H-pi, com uma distância de 2.29Å do C1 (veja Figura 1 no Capítulo 1). Adicionalmente procurou-se orientar esta ponte de hidrogênio (desta segunda água) sobre o C2 (o qual 22 faz ligação com o oxigênio do fenol). Entretanto esta conformação se mostrou instável, recaindo a otimização nas conformações Ph:W:W1 ou Ph:W:W2, dependendo das condições iniciais. Tabela 6: Resultados para a energia total eletrônica (hartrees), e as energias de ligação (kcal/mol), para os complexos com duas águas no nível MP2/aug-cc-pVDZ. Tabela 3 apresenta estes mesmos resultados para apenas uma molécula de água. Ph:W:W1 Ph:W:W2 Energia (hartrees) Energia de Ligação (kcal/mol) ∆E ∆E+ZPE -459.16257 -459.16291 18.86 19.08 14.30 14.75 ∆E+ZPE +BSSE 10.84 11.31 Estas estruturas, com uma e duas águas, foram então submetidas ao cálculo do espectro eletrônico, nos mesmos níveis de cálculo utilizados para o monômero. Tais resultados são apresentados na Tabela 7. O resultado do TDB3LYP para o Ph:W se refere à segunda transição calculada, sendo que na primeira há transferência de carga para a água. Nota-se a boa concordância entre o resultado experimental e os métodos post-HF, para uma molécula de água. Para duas águas, a discordância dos valores calculados com o experimental é explicado por Schemmel [20] como havendo uma intersecção cônica próxima às geometrias obtidas, fazendo com que a banda se alargue e a meia vida do estado excitado seja curto. O método mais confiável aqui é o CIS(D), entretanto os métodos post-HF fornecem resultados similares. Há um sistemático desvio para o vermelho na conformação Ph:W, e o desvio contrário na conformação W:Ph. A conformação Ph:W:W1 sugere um efeito cooperativo (e mútuo cancelamento) dos desvios. Tal cancelamento não é observado para Ph:W:W2, o qual apresenta desvio similar a Ph:W. Tabela 7: Resultado para o desvio no espectro eletrônico dos complexos de fenol e água em relação à fase gasosa em cm-1. CIS CIS(D) TDB3LYP TDHF Exp. Ph:W W:Ph -390 -390 -540 -400 -350 [21] 340 370 520 380 — Ph:W:W 1 2 10 -310 20 -380 -50 -790 20 -350 -140 – -90 23 Conclusões parciais Foram analisadas as conformações de fenol e água (1+1 e 1+2) que realizavam pontes de hidrogênio, a fim de compreender suas características estruturais, energéticas e espectroscópicas. A conformação em que o fenol doa a ponte de hidrogênio (Ph:W) mostrou-se ser a mais estável em 2.0 kcal/mol que a conformação em que a água doa a ponte (W:Ph). Os modos vibracionais na aproximação harmônica apresentam-se em excelente concordância com os resultados experimentais (diferença da ordem de 5%). A primeira excitação eletrônica destas configurações (caráter π→π*) apresenta desvio para o azul de 370m-1 quando a água é doadora de ponte (W:Ph) e desvio para o vermelho de 390cm-1 quando o fenol é doador (Ph:W). Este último está em excelente concordância com o resultado experimental de 350cm-1 para o vermelho. Adicionalmente obtiveram-se conformações com duas águas, em que ao mesmo tempo o fenol é doador e aceitador de ponte de hidrogênio. Observou-se que neste caso existe um cancelamento parcial das duas contribuições, fornecendo um desvio total de 20cm-1 para o azul. 24 3.2 Agregados de fenol e etanol Nesta seção é apresentado o estudo dos agregados de fenol e etanol, sua energia de ligação, e seu espectro vibracional e eletrônico [22]. A motivação principal desta parte do trabalho é a comparação direta com o trabalho feito para os clusters de fenol e água. Entretanto o trabalho com o etanol é muito menos simples que com a água, e por isso se tornou muito mais extenso e detalhado. Há duas conformações possíveis para o etanol: anticlinal e synclinal (Figura 5). Nota-se que a conformação synclinal é quiral [23], e apresenta duas possibilidades equivalentes de posição do H1. Figura 5: Conformações possíveis do etanol. À esquerda o synclinal (ou gauche) e à direita anticlinal (ou trans). A conformação synclinal é quiral. Tabela 8: Resultados da otimização de geometria do etanol em nível MP2/aug-cc-pVDZ e comparação com resultados experimentais. RCC (Å) RCO (Å) RHO (Å) ΘOCC (º) ΘHOC (º) ΘHOCC (º) µ (Debye) I (GHz) A B C E(hartree) ZPE(kcal/mol) τHOCC (cm-1) νHO (cm-1) Synclinal 1.525 1.438 0.967 112.6 107.6 ±60.8 1.76 33.920 9.095 8.032 -154.61341 50.39 285 3820 Anticlinal 1.519 1.440 0.966 107.2 108.2 180.0 1.62 34.413 9.327 8.096 -154.61381 50.42 305 3830 * As conformações synclinal e anticlinal são acopladas nesse modo [26]. Experimental [53] 1.512 1.431 0.971 107.8 105 — 1.68 / 1.44 34.194 / 34.891 [24] 9.189 / 9.350 8.099 / 8.135 — — * 3689 [25] 25 Inicialmente foram otimizadas as geometrias de ambos os monômeros de etanol, com o mesmo nível de cálculo utilizado para o fenol (MP2/aug-cc-pVDZ). Na Tabela 8, apresenta-se os resultados obtidos dessa otimização. Os resultados experimentais para o momento de dipolo, reportados no Handbook of Chemistry and Physics [53], são 1.68 ± 0.03 D (synclinal) e 1.44 ± 0.03 D (anticlinal). Estes valores diferem respectivamente 5% e 12% do resultado calculado. Os desvios quadráticos médios de cada geometria calculada em relação aos resultados advindos de espectroscopia de microondas em fase gasosa [53] sugerem que a conformação mais estável é a anticlinal. Este resultado é corroborado por outros trabalhos teóricos e experimentais [23,27,28,24,26]. A diferença de energia calculada das duas conformações em nível MP2/aug-cc-pVDZ (~0.25kcal/mol) é 100% maior que a obtida via espectro rotacional de microondas (~0.12kcal/mol) [26,29]. Embora ambos sejam muito pequenos, este valor deve ser usado com critério, notando-se que kbT para 300K é aproximadamente 0.6kcal/mol. Dada esta pequena diferença de energia entre as duas conformações (em relação à kbT), e do fato da conformação synclinal ser duplamente degenerada, a abundância relativa em temperatura ambiente é de 6:4 em favor da synclinal [23,28]. Ainda na Tabela 8, a distância calculada da ligação OH no etanol é subestimada em relação ao resultado reportado experimentalmente, enquanto que para o fenol esse valor é superestimado (veja Tabela 1). As geometrias de equilíbrio reportadas neste trabalho são garantidas pelo cálculo das freqüências vibracionais (em torno dos pontos de mínimo da superfície de energia potencial). Verifica-se que o modo de torção τHOCC acopla as conformações synclinal e anticlinal, e também a torção do metil em C2 [26], não sendo trivial sua análise. O modo de estiramento νHO é aproximadamente 10cm-1 superior para a conformação anticlinal, fato conhecido na literatura e relacionado com a interação dos lonepairs do oxigênio com o hidrogênio do grupo metil [30]. Com o objetivo de se estudar o espectro eletrônico dos heterodímeros fenoletanol, procurou-se inicialmente quais conformações poderiam ser de mais baixa energia. Para o caso do fenol doando a ponte de hidrogênio (Ph:Et), intuiu-se que os lonepairs do oxigênio do etanol deveriam estar na direção do hidrogênio do fenol. Dessa forma foram propostas seis conformações possíveis como esquematizado na Figura 6. Nesse esquema, a bola vermelha representa o oxigênio, a cinza claro o hidrogênio e a cinza escura os carbonos (esses representados apenas no fenol). A linha saindo do oxigênio representa a cadeia carbônica do etanol. A nomenclatura de cada 26 uma delas segue o esquema Ph:Et(X-N-P), onde X é a conformação do etanol (S synclinal e A anticlinal), N a direção relativa entre OH do etanol e o CO do fenol (1 paralela e 2 perpendicular), e P a posição da cadeia carbônica do etanol em relação ao fenol (in para perto, out para longe ou nada para a conformação anticlinal). Figura 6: Conformações esperadas para o dímero Ph:Et. Cada uma das seis conformações do heterodímero Ph:Et foi submetida à otimização de geometria no mesmo nível que foi usado nos monômeros. Realizou-se diversas tentativas com condições iniciais diferentes para se testar a estabilidade da posição de mínimo de cada uma dessas seis propostas. Observou-se que a conformação S-2-out não é estável, colapsando na conformação S-1-in para todas as condições iniciais testadas nesse trabalho. Obteve-se ainda quatro conformações em que o etanol doa a ponte de hidrogênio (Et:Ph), entretanto com energia de ligação bem menor. Alguns trabalhos experimentais de jet cooling com agregados de fenol e etanol já foram realizados, trazendo certa controvérsia sobre a existência ou não de mais de um isômero rotacional. Abe et al. [15,31], através do espectro de fluorescência do complexo fenol-etanol, pela primeira vez sugeriram haver isômeros rotacionais intramoleculares e/ou intermoleculares em torno da ponte de hidrogênio. Lipert e Coulson [32], através da técnica de spectral hole burning UV-UV, contradisseram a hipótese de Abe et al., e afirmaram que o estado fundamental das transições 27 observadas era devido a apenas um isômero. Cordes et al. [33], estudando o espectro de ionização, apoiaram a interpretação de Lipert e Coulson. Eles procuraram explicar o complexo espectro vibracional como uma combinação de modos intermoleculares de um único confórmero. Spangenberg et al. [34], através de spectral hole burning IR-UV e cálculos ab initio, contestaram as interpretações anteriores. Em apoio a Abe et al., afirmaram que espectro era produzido por pelo menos dois isômeros rotacionais com energias de excitação quase degeneradas. Spangenberg et al. apresenta 3 isômeros, os quais ele denomina anti, gauche(1) e gauche(2), que na notação deste trabalho equivaleriam respectivamente à Ph:Et(A-1), Ph:Et(S-1-out) e Ph:Et(S-1-in). As três geometrias apresentadas por Spangenberg et al., quando submetidas à otimização em nível MP2/aug-cc-pVDZ, recaem nas mesmas geometrias apresentadas neste trabalho. Tais otimizações de geometria podem ser encontradas na referência 42. Figura 7: Conformações encontradas para Ph:Et(A-1) (esquerda) e Ph:Et(A-2) (direita). A Figura 7 apresenta duas conformações encontradas para Ph:Et(A). O heterodímero Ph:Et(A-1) possui energia de ligação (BE) de 6.36kcal/mol, enquanto que Ph:Et(A-2) possui 6.14kcal/mol. Tais cálculos corrigem a energia de ponto zero (ZPE), BSSE [13] e também o efeito de distorção na geometria dos monômeros. Em cálculo similar, mas em nível HF/6-31G(d,p), Spangenberg et al. [34] reporta 4.49kcal/mol para o complexo Ph:Et(A-1). Está razoavelmente estabelecido na literatura que MP2 fornece resultados equivalentes a CCSD(T) para a energia de ligação em sistemas com pontes de hidrogênio [35], enquanto que HF fornece valores subestimados [36]. Também é sabido que MP2 superestima a energia de ligação em sistemas aromáticos onde os termos de dispersão são dominantes [37]. Por isso espera-se que as energias e freqüências vibracionais calculadas neste trabalho estejam 28 levemente superestimadas em relação aos resultados experimentais, mas ainda comparáveis a CCSD(T). Fenol Etanol Tabela 9: Principais resultados da otimização para Ph:Et(A-1) e Ph:Et(A-2) em nível MP2/augcc-pVDZ. Subscrito, entre parênteses, a variação da geometria em relação ao monômero calculado (veja Tabela 1 e Tabela 8). RCC (Å) RCO (Å) RHO (Å) ΘOCC (º) ΘHOC (º) ΘHOCC (º) RCO (Å) RHO (Å) ΘHOC (º) ΘHOCC (º) RH…O (Å) ΘOH…O (º) µ (Debye) BE(kcal/mol) Ph:Et(A-1) 1.519 (0.000) 1.456 (0.016) 0.968 (0.002) 107.6 (0.4) 108.2 (0.0) 173.5 (-6.5) 1.374 (-0.008) 0.982 (0.014) 108.6 (0.0) 7.8 (7.8) 1.803 166.6 3.33 6.36 Ph:Et(A-2) 1.519 (0.000) 1.452 (0.012) 0.967 (0.001) 107.8 (0.6) 108.8 (0.6) 177.8 (-2.2) 1.371 (-0.011) 0.980 (0.012) 108.8 (0.2) 13.7 (13.7) 1.821 168.6 3.59 6.14 Ainda no agregado Ph:Et(A-1), pela Tabela 9, nota-se que há maior mudança no diedro ΘHOCC do etanol (-6.5º) em relação ao monômero. Já a conformação Ph:Et(A-2) apresenta maior mudança no diedro ΘHOCC do fenol (13.7º). A distância da ponte de hidrogênio RH…O no complexo Ph:Et(A-1) é 0.018Å mais próxima do que em Ph:Et(A-2). Além da distância da ponte de hidrogênio, é relevante também notar a distância do grupo metil do etanol ao oxigênio do fenol. O complexo Ph:Et(A-1), em relação ao Ph:Et(A-2), apresenta o hidrogênio do metil mais próximo 0.016Å do oxigênio fenólico. Isto reforça o resultado do complexo Ph:Et(A-1) ser mais estável (maior energia de ligação) em relação ao Ph:Et(A-2). Entretanto a diferença de energia é muito pequena, e deve-se ter cautela ao se utilizar esse resultado. O complexo Ph:Et(A-2) possui momento de dipolo maior (em 8%) que Ph:Et(A-1), e portanto espera-se que se estabilize mais em um ambiente polar. A Figura 8 apresenta as conformações com etanol synclinal aceitando a ponte de hidrogênio do fenol. Dentre elas, a conformação mais estável é a Ph:Et(S-1-in) com 6.49kcal/mol de energia de ligação (Tabela 10). Ph:Et(S-1-in) é a conformação com a maior energia de ligação de todos os complexos estudados (veja Tabela 9 e Tabela 12), e é a que possui o metil do etanol mais próximo do oxigênio do fenol 29 (2.70Å). O complexo Ph:Et(S-2-in) possui a distância da ponte de hidrogênio menor 0.008Å em relação a Ph:Et(S-1-in). Entretanto seu metil é 0.179Å mais distante do oxigênio fenólico e sua energia de ligação aproximadamente 0.5kcal/mol menor que a conformação Ph:Et(S-1-in). As conformações Ph:Et(S-1-in) e Ph:Et(S-2-in) deformam-se de maneira equivalente em relação aos monômeros, sendo maior a deformação no fenol e menor no etanol. Figura 8: Conformações encontradas para Ph:Et(S-1-in) (esquerda), Ph:Et(S-1-out) (direita) e Ph:Et(S-2-in) (acima). A conformação Ph:Et(S-2-out) não é estável e colapsa em Ph:Et(S-1-in). A conformação Ph:Et(S-1-out) é a única com a cadeia carbônica do etanol longe do anel fenólico. Em comparação com as outras duas conformações, ela apresenta maior deformação no etanol e menor no fenol (veja Tabela 10). Esta conformação também possui o maior momento de dipolo (3.62D). Spangenberg et al. [34] encontra um isômero equivalente a este como o mais estável, com 4.85kcal/mol de energia de ligação em nível HF/6-31G(d,p). Com o nível de cálculo MP2/aug-ccpVDZ, a conformação Ph:Et(S-1-out) tem energia de ligação intermediária dentre as três synclinais aceitadoras. Esta conformação possui um hidrogênio do carbono C1 0.073Å mais próximo em comparação com a distância metil etanólico e oxigênio fenólico do complexo Ph:Et(S-2-in) (veja Figura 5 e Figura 8). Note que Ph:Et(S-2in) tem energia de ligação menor que Ph:Et(S-1-out) (Tabela 10). 30 Fenol Etanol Tabela 10: Principais resultados da otimização para Ph:Et(S-1-in), Ph:Et(S-1-out) e Ph:Et(S-2in) em nível MP2/aug-cc-pVDZ. Subscrito, entre parênteses, a variação da geometria em relação ao monômero calculado (veja Tabela 1 e Tabela 8). RCC (Å) RCO (Å) RHO (Å) ΘOCC (º) ΘHOC (º) ΘHOCC (º) RCO (Å) RHO (Å) ΘHOC (º) ΘHOCC (º) RH…O (Å) ΘOH…O (º) µ (Debye) BE(kcal/mol) Ph:Et(S-1-in) 1.523 (-0.002) 1.454 (0.016) 0.968 (0.001) 112.3 (-0.3) 107.8 (0.2) 59.3 (-1.5) 1.374 (-0.008) 0.981 (0.013) 108.3 (-0.3) 16.2 (16.2) 1.831 160.2 3.24 6.49 Ph:Et(S-1-out) 1.522 (-0.003) 1.452 (0.014) 0.967 (0.000) 111.7 (-0.9) 108.4 (0.8) 70.5 (9.7) 1.374 (-0.008) 0.979 (0.011) 108.7 (0.1) 12.2 (12.2) 1.836 159.6 3.62 6.25 Ph:Et(S-2-in) 1.523 (-0.002) 1.452 (0.014) 0.968 (0.001) 112.3 (-0.3) 107.8 (0.2) 58.8 (-2.0) 1.372 (-0.010) 0.981 (0.013) 108.7 (0.1) 16.2 (16.2) 1.823 157.8 3.23 6.02 Tabela 11: Correlação entre as distâncias das pontes de hidrogênio RH…O, hidrogênio da cadeia carbônica do etanol mais próximo do oxigênio do fenol XH…O, e energia de ligação para os complexos Ph:Et em nível MP2/aug-cc-pVDZ. Entre parênteses, os valores equivalentes da referência 34 em nível HF/6-31G(d,p), veja o texto. Ph:Et A-1 RH…O (Å) 1.803 XH…O (Å) 2.753 BE(kcal/mol) 6.36 (1.948) (3.030) (4.49) A-2 1.821 2.769 6.14 S-1-in S-1-out S-2-in 1.831 2.705 6.49 (1.938) (3.107) (4.82) 1.836 2.811 6.25 (1.942) (3.518) (4.85) 1.823 2.884 6.02 A correlação entre as distâncias fenol-etanol e a energia de ligação dos complexos é traçada na Tabela 11. Dado que o valor de kbT para condições normais é aproximadamente 0.6kcal/mol, qualquer um desses cinco complexos é acessível. A energia de ligação tende a ser maior para valores menores de XH…O (distância entre a cadeia carbônica do etanol e oxigênio do fenol). Entre parênteses é apresentado os resultados das geometrias equivalentes reportadas por Spangenberg et al. [34], em nível HF/6-31G(d,p). Nessas geometrias, a distância da ponte de hidrogênio (RH…O) é em média 7% maior em relação às geometrias obtidas neste trabalho em nível MP2/aug-cc-pVDZ. A diferença das distâncias da cadeia carbônica ao oxigênio 31 fenólico (XH…O) é maior ainda: 10% para Ph:Et(A-1), 15% para Ph:Et(S-1-in) e 25% para Ph:Et(S-1-out). Isto indica que a correlação eletrônica (origem da interação de dispersão) é importante para descrever a interação entre a cadeia carbônica do etanol e a anel fenólico, e conseqüentemente na determinação da geometria do complexo. Para o caso do etanol doando a ponte de hidrogênio (Et:Ph) encontrou-se apenas quatro conformações. Duas delas são pontes H-O, em que o etanol doa o próton para o oxigênio do fenol. As outras duas são pontes do tipo H-π, ou seja, o hidrogênio do etanol faz ponte com a nuvem π fenol. Estas conformações, com o etanol doador (Figura 9), diferenciam-se pela maior distância da ponte de hidrogênio em relação às configurações com etanol aceitador (diferença superior a 0.3Å). Ainda em relação ao etanol aceitador, estas conformações com etanol doador apresentam aproximadamente metade da energia de ligação (Tabela 12). Isto corrobora o caráter ácido do fenol (pKa = 9.99) em relação ao etanol (pKa = 15.5) [53], i.e., o fenol doa o próton mais facilmente (energeticamente favorável) do que o etanol. Figura 9: Conformações encontradas para Et(S):Ph (superior-esquerda), Et(A):Ph (superiordireita), Et(S):π-Ph (inferior-esquerda) e Et(S):π-Ph (inferior-direita). As linhas tracejadas sobre os átomos do anel foram colocadas apenas para facilitar a visualização. 32 Comparando a Tabela 12 com as anteriores, observa-se que o comprimento da ligação RCO da molécula doadora se encurta em relação ao monômero. A mesma ligação RCO da molécula aceitadora se alonga. Nota-se também que a ligação ROH se alonga tanto na molécula doadora quanto na aceitadora. Esta regra é quebrada para as configurações que formam ponte H-π. Como a interação da ponte não está sobre o oxigênio do fenol, a ligação CO do fenol é pouco afetada. Os momentos dipolares das conformações Et:Ph são em média menores que os das conformações Ph:Et. Isto sugere que as estruturas Ph:Et irão se estabilizar melhor em solvente polar. A energia de ligação das conformações Et:Ph também é expressivamente menor, sendo aproximadamente metade daquela encontrada para Ph:Et. Tal resultado é coerente com as energias de ligação obtidas para os cluster de fenol e água (seção anterior). Tabela 12: Principais resultados da otimização para Et(S):Ph e Et(A):Ph em nível MP2/aug-ccpVDZ. Subscrito, entre parênteses, a variação em relação ao monômero calculado (veja Tabela 1 e Tabela 8). Fenol Etanol RCC (Å) RCO (Å) RHO (Å) ΘOCC (º) ΘHOC (º) ΘHOCC (º) RCO (Å) RHO (Å) ΘHOC (º) ΘHOCC (º) RH…O (Å) ΘOH…O (º) µ (Debye) BE(kcal/mol) Et(S):Ph 1.526 (0.001) 1.436 (-0.002) 0.970 (0.003) 113.0 (0.4) 108.5 (0.9) 70.1 (9.3) 1.387 (0.005) 0.969 (0.001) 108.9 (0.3) 2.4 (2.4) 2.117 172.9 2.87 3.66 Et(A):Ph 1.520 (0.001) 1.438 (-0.002) 0.969 (0.003) 107.4 (0.2) 108.1 (-0.1) 179.6 (-0.4) 1.388 (0.006) 0.969 (0.001) 108.8 (0.2) 6.9 (6.9) 2.182 166.1 3.27 3.01 Et(S):π-Ph 1.526 (0.001) 1.435 (-0.003) 0.970 (0.003) 112.4 (-0.2) 107.6 (0.0) 74.0 (10.2) 1.379 (-0.003) 0.969 (0.001) 108.8 (0.2) 0.3 (0.3) — — 2.42 3.64 Et(A):π-Ph 1.520 (0.001) 1.435 (-0.005) 0.970 (0.004) 107.5 (0.3) 107.9 (-0.3) 178.4 (-1.6) 1.379 (-0.003) 0.968 (0.000) 108.7 (0.1) 1.2 (1.2) — — 2.33 3.36 A Tabela 13 apresenta as constantes rotacionais e a projeção do momento de dipolo nos eixos principais dos complexos estudados. As constantes rotacionais dos complexos em que o etanol doa a ponte são distintas daquelas em que o etanol aceita a ponte. A constante rotacional do eixo principal (A) varia entre 2.2 a 2.5GHz com o etanol aceitador (Ph:Et), enquanto que para o etanol doador (Et:Ph) não passa de 1.7GHz. Mesmo tendo constantes rotacionais próximas, os complexos em que o etanol é doador (Et:Ph) apresentam diferentes componentes e valor total do momento de dipolo. A mesma observação pode ser tomada sobre os complexos em que o etanol 33 recebe a ponte (Ph:Et). Destes complexos destacam-se Ph:Et(S-1-in) e Ph:Et(S-2-in), os quais possuem constantes rotacionais e momento de dipolo total muito similares, mas componentes µ A, µ B, e µ C completamente diferentes. Entre parênteses, para as conformações Ph:Et(A-1), Ph:Et(S-1-in) e Ph:Et(S-1-out) são apresentados os valores das geometrias equivalentes obtidas em nível HF/6-31G(d,p) por Spangenberg et al. [34]. O fato da constante rotacional no eixo principal (A) ser maior acusa que o etanol está mais afastado do fenol, isto é, os monômeros estão menos empacotados (como destacado pelo valor de XH…O na Tabela 11). Não é possível traçar uma comparação direta dos momentos de dipolo entre esse trabalho e o de Spangenberg et al. pelo fato de serem diferentes tanto as geometrias e quanto o nível de cálculo. Entretanto, preserva-se a relação de que Ph:Et(S-1-out) tem o maior momento de dipolo, seguido de Ph:Et(A-1) e depois Ph:Et(S-1-in). Tabela 13: Resultados para as constantes rotacionais e as respectivas componentes do momento de dipolo para os complexos fenol e etanol em nível MP2/aug-cc-pVDZ. Ph:Et(A-1) Ph:Et(A-2) Ph:Et(S-1-in) Constantes Rotacionais (GHz) A B C 2.501 0.654 0.602 Momento de dipolo (Debye) µA µB µC µ 3.25 0.75 0.14 3.33 (2.899) (0.533) (0.499) (3.41) (1.25) (0.76) (3.71) 2.305 0.701 0.636 2.56 2.50 0.38 3.59 2.313 0.683 0.636 2.82 0.99 1.26 3.24 (3.003) (0.528) (0.480) (3.33) (1.22) (0.19) (3.55) 2.205 0.682 0.580 3.36 1.23 0.54 3.62 (3.113) (0.479) (0.429) (3.86) (1.02) (0.45) (4.01) Ph:Et(S-2-in) 2.328 0.683 0.642 1.86 2.54 0.71 3.23 Et(S):Ph 1.664 0.961 0.793 1.51 1.60 1.84 2.87 Et(A):Ph 1.583 0.909 0.745 2.85 0.30 1.59 3.27 Et(S):π-Ph 1.496 1.065 0.853 0.51 1.59 1.76 2.46 Et(A):π-Ph 1.620 0.902 0.739 0.28 0.13 2.31 2.33 Ph:Et(S-1-out) A Tabela 14 apresenta o resultado calculado para as seis freqüências intermoleculares, dentro da aproximação harmônica, para cada um dos complexos obtidos para fenol e etanol. Embora os modos intermoleculares tenham uma 34 componente anarmônica mais pronunciada que os modos intramoleculares, é interessante analisá-los para obter algumas informações ainda que qualitativas. Normalmente estes valores calculados encontram-se superestimados em relação aos valores experimentais, já que a contribuição anarmônica diminui a diferença de energia entre os auto-estados vibracionais. Desta forma é comum multiplicar tais freqüências por um fator de escala empírico pouco menor que 1.0, a fim de corrigi-las em direção ao resultado experimental [38,39,40]. Entretanto, é conhecido que para modos de baixa freqüência (menores que 1000 cm-1) o MP2 contrariamente produz resultados subestimados [41], de tal forma que se recomenda o fator de escala de 1.10, quando utilizado com a base aug-cc-pVDZ. Tabela 14: Resultados das freqüências intermoleculares (cm-1) para os complexos fenol e etanol em nível MP2/aug-cc-pVDZ. Entre parênteses, as freqüências equivalentes advindas das geometrias da referência 34 em nível HF/6-31G(d,p). Ph:Et(A-1) Ph:Et(A-2) Ph:Et(S-1-in) Ph:Et(S-1-out) Ph:Et(S-2-in) ρ2 34 β2 50 τ 53 β1 89 ρ1 111 σ 182 (33) (37) (20) (77) (72) (150) 24 72 52 90 119 168 41 72 13 93 130 178 (32) (38) (14) (66) (89) (161) 34 16 61 98 122 165 (14) (21) (27) (77) (67) (136) 23 65 39 98 114 174 Dadas as incertezas geradas pelos métodos utilizados no cálculo dessas freqüências intermoleculares, optou-se por não escaloná-las. Acredita-se que o erro em tais valores é de 10% [38,41]. Tais modos normais intermoleculares podem ser visualizados na referência 42. A nomenclatura utilizada é a mesma da referência 34. Para cada complexo, há dois modos de rocking, ρ (etanol saindo do plano do anel fenólico); dois modos de wag, β (etanol circundando o eixo perpendicular ao anel fenólico); um modo de torção em torno da ponte de hidrogênio, τ; e um modo de estiramento da ponte de hidrogênio, σ. Os sub-índices 1 e 2 estão associados respectivamente a movimentos translação e rotação em relação aos monômeros. Ressalta-se que σ é um modo de translação e τ é um modo de rotação. Ainda na Tabela 14, entre parênteses encontram-se as respectivas freqüências intermoleculares da referência 34, e são colocadas apenas para comparação (já que o nível de cálculo e 35 as geometrias produzidas são diferentes). As caracterizações dos modos calculados τ, ρ2 e β2 apresentados na tabela 3 da referência 34 são interpretadas de maneira distinta neste trabalho, e podem ser conferidos na referência 43. Não foi possível também caracterizar univocamente modo por modo com os resultados experimentais como feito na referência 34. A princípio os confórmeros Ph:Et(A-1) e Ph:Et(A-2) poderiam se intercambiar através dos modos de wag (β1 e β2), mas a barreira correspondente não foi calculada. O mesmo vale para os confórmeros Ph:Et(S-1-out) e Ph:Et(S-2-in). Os modos dos complexos em que o etanol doa a ponte de hidrogênio não foram analisados. Estes se diferenciam substancialmente daquelas em que o etanol aceita, dado o posicionamento do etanol sobre o anel fenólico. Nesses complexos (Et:Ph), o etanol não interage apenas via ponte de hidrogênio, mas também com a nuvem π do fenol e a cadeia carbônica do etanol. Uma complicação adicional é o fato da energia de ligação ser menor, ou seja, o sistema é menos ligado. Isso implica que os erros nos modos vibracionais são ainda maiores. Desta maneira, é muito difícil determinar e caracterizar tais modos vibracionais. Tabela 15: Importantes freqüências intramoleculares (cm-1) de torção τHOCC, estiramentos simétricos νCH2 e νCH3, e estiramento νHO do etanol dentro dos complexos estudados em nível MP2/aug-cc-pVDZ. Respectivos desvios em relação aos monômeros, entre parênteses. Etanol νCH2 νCH3 3064 3073 Ph:Et(A-1) τHOCC 376 (72) (21) (-1) (-19) Ph:Et(A-2) 319 3057 3073 3820 (15) (14) (-1) (-10) Ph:Et(S-1-in) 348 3079 3059 (22) (-2) 3803 (63) Ph:Et(S-1-out) 297 3080 3062 3817 (12) (23) (1) (-3) Ph:Et(S-2-in) 319 3079 3058 3808 (34) (22) (-3) (-12) Et(S):Ph νHO 3811 (-17) 494 3046 3059 3794 (209) (-11) (-2) (-26) 508 3032 3068 3779 (204) (-11) (-6) (-51) Et(S):π-Ph 305 3052 3058 3773 (20) (-5) (-3) (-47) Et(A):π-Ph 348 3027 3069 3776 (44) (-16) (-5) (-54) Et(A):Ph 36 Tabela 16: Importantes freqüências intramoleculares (cm-1) de torção τHOCC, estiramento simétrico ν(CH)5, e estiramento νHO do fenol dentro dos complexos estudados em nível MP2/aug-ccpVDZ. Respectivos desvios em relação aos monômeros, entre parênteses. Ph:Et(A-1) Ph:Et(A-2) Ph:Et(S-1-in) Ph:Et(S-1-out) τHOCC 785 Fenol ν(CH)5 3232 νHO 3521 (456) (-4) (-287) 732 3233 3561 (402) (-3) (-247) 710 3232 3546 (381) (-4) (-262) 704 3232 3580 (375) (-4) (-228) 733 3233 3549 (404) (-3) (-259) Et(S):Ph 338 3237 3794 (8) (1) (-14) Et(A):Ph 337 3237 3795 (7) (1) (-13) Et(S):π-Ph 328 3239 3800 (-1) (3) (-8) Et(A):π-Ph 335 3239 3802 (6) (3) (-6) Ph:Et(S-2-in) A Tabela 15 apresenta os resultados calculados para algumas freqüências vibracionais intramoleculares do etanol para os complexos estudados, e sua variação em relação aos monômeros isolados (veja Tabela 8). A Tabela 16 faz o mesmo para o fenol (veja Tabela 1). Em relação à ponte de hidrogênio, como esperado, os modos de torção (τHOCC) desviam para o azul (valores positivos), enquanto que os modos de estiramento (νHO) desviam para o vermelho (valores negativos). Para os complexos em que o fenol doa a ponte de hidrogênio, Ph:Et(A-1) fornece o estiramento e a torção de maior desvio, tanto para o fenol quanto para o etanol. Os complexos em que o etanol doa a ponte de hidrogênio possuem desvios menores em relação àquelas em que o etanol aceita. O desvio para o vermelho dos modos de estiramento (νHO) pode ser correlacionado com a variação do comprimento OH da ligação [44] (veja Tabela 9 e Tabela 10). O maior alargamento de ligação ocorre para o Ph:Et(A-1) (0.014Å) em concordância com o maior desvio para a freqüência (-287cm-1). A boa concordância desta correlação é apresentada na Tabela 17. A Figura 10 ilustra esta boa concordância para todos os pontos. 37 Figura 10: Ilustração da correlação entre os módulos dos desvios nos modos de estiramento OH (νHO) e a variação no estiramento da distância OH, referente ao doador da ponte de hidrogênio [44]. O ajuste foi feito apenas com os dados relativos aos confórmeros Ph:Et (veja Tabela 17). Tabela 17: Correlação entre os desvios nos modos de estiramento OH (νHO) e a variação no estiramento da distância OH, referente ao doador da ponte de hidrogênio [44]. Ph:Et(A-1) Ph:Et(A-2) Ph:Et(S-1-in) Ph:Et(S-1-out) Ph:Et(S-2-in) Et(S):Ph Et(A):Ph Et(S):π-Ph Et(A):π-Ph ∆νHO (cm-1) -287 -247 -262 -228 -259 -26 -51 -47 -54 ∆RHO (Å) 0.014 0.012 0.013 0.011 0.013 0.003 0.003 0.003 0.004 Ainda na Tabela 15, as variações nas freqüências dos modos de estiramento simétricos νCH2 são maiores que νCH3, indicando a proximidade da ponte de hidrogênio. Quando o etanol doa a ponte de hidrogênio, o desvio em νCH2 inverte seu sinal. A pequena variação nas freqüências do modo ν(CH)5 indicam que a presença do etanol afeta pouco o anel fenólico (Tabela 16). Os resultados para os modos associados diretamente com as pontes de hidrogênio são diferentes daqueles reportados na referência 34 para caracterização do espectro experimental. O valor experimental do estiramento OH do fenol é reportado com o mesmo valor (3432cm-1) 38 para os complexos em que o etanol recebe a ponte (Ph:Et). Os valores calculados com MP2/aug-cc-pVDZ variam de 3521cm-1 para o Ph:Et(A-1) até 3580cm-1 para Ph:Et(S1-out). Os respectivos valores calculados por Spangenberg et al. [34] diferem apenas 4cm-1. A freqüência de estiramento OH do etanol anticlinal é em média maior do que a do etanol synclinal, nos complexos estudados (veja na Tabela 15). Tal resultado era esperado por Spangenberg et al. [34], e junto com as freqüências νCH2 e νCH2 do etanol, foi utilizado na interpretação do espectro experimental. Entretanto não é possível associar de maneira única cada um dos complexos com os espectros experimentais apresentados, como feitos na referência 34. Tabela 18: Desvio padrão das freqüências vibracionais (cm-1) utilizando o fator de escala empírico de 0.95, em relação às freqüências experimentais associadas com o etanol anticlinal (A) e synclinal (S) reportados por Spangenberg et al. [34]. Ph:Et A-1 A-2 S-1-in S-1-out S-2-in A 34 23 32 26 31 S 31 20 26 18 25 Utilizando metodologia similar a de Sinha et al. [41], procurou-se um fator de escala empírico para multiplicar as freqüências intermoleculares calculadas a fim de fornecer o menor desvio padrão em relação às freqüências experimentais intramoleculares apresentadas na referência 34. As freqüências calculadas podem ser visualizadas na referência 42. Utilizando os modos de estiramento νOH, e os modos simétricos νCH2 e νCH3 do etanol e ν(CH)5 do fenol, obteve-se um fator de 0.95 (com apenas duas casas de precisão como sugerido por Irikura et al. [38]). Este resultado é coerente com o valor de 0.96, recomendado por Sinha et al. [41] para freqüências acima de 1000cm-1, com o nível de cálculo MP2/aug-cc-pVDZ. A Tabela 18 apresenta os desvios padrão obtidos com o fator de escala de 0.95 (ver referência [41]). A conformação Ph:Et(A-1), cuja conformação equivalente é utilizada no trabalho de Spangenberg et al. [34], é a que menos combina (maior desvio padrão) com as freqüências experimentais associadas ao complexo com etanol anticlinal. O mesmo vale para a conformação Ph:Et(S-1-in). Com a informação apenas do desvio 39 padrão, poder-se-ia dizer que as conformações que melhor se ajustam às freqüências experimentais são Ph:Et(A-2) e Ph:Et(S-1-out). Finalmente, com o intuito de se comparar os resultados do espectro eletrônico obtidos para os agregados de fenol e água, submeteram-se ao cálculo quântico os nove complexos de fenol e etanol. Os resultados para o desvio em relação ao fenol isolado são apresentados na Tabela 19. Como esperado [20,21,31,32,33,34] quando o fenol doa a ponte de hidrogênio, a excitação eletrônica (de caráter π → π*) desvia para menores freqüências, apresentando-se o contrário para o caso do fenol aceitando a ponte de hidrogênio. Resultado similar, mas de menor desvio, é obtido para os agregados que formam ponte H-π. Os resultados obtidos com TDHF, CIS e CIS(D) apresentam valores similares quando o fenol doa a ponte de hidrogênio (Ph:Et). TDB3LYP tem reciprocidade com os valores obtidos para fenol e água (Tabela 7). Ele apresenta desvios maiores que os outros métodos, tanto para etanol doador quanto aceitador. Para o caso das configurações H-π, TDB3LYP fornece um resultado contrário ao esperado. É interessante notar que, para alguns agregados, a primeira excitação com TDB3LYP possui caráter de transferência de carga intermolecular, sendo que a transição π → π* aparece apenas na segunda excitação eletrônica. Os valores experimentais reportados são -405cm-1 e -395cm-1 [31] e são associados respectivamente com etanol anticlinal e synclinal por Spangenberg et al. [34]. Os confórmeros que mais combinam com estes valores são respectivamente Ph:Et(A-1) e Ph:Et(S-1-out). Não há resultado experimental para o etanol doador de ponte de hidrogênio (Et:Ph). Mas para todos os métodos e clusters (com exceção do TDB3LYP), as transições calculadas apresentam desvio para o azul. Tabela 19: Resultados dos desvios do espectro eletrônico (cm-1) da transição π → π* do fenol para os complexos fenol e etanol em relação ao monômero. Diferentes métodos utilizando a mesma base aug-cc-pVDZ. Os valores experimentais provêm das referências 31 e 34. Ph:Et(A-1) Ph:Et(A-2) Ph:Et(S-1-in) Ph:Et(S-1-out) Ph:Et(S-2-in) Et(S):Ph Et(A):Ph Et(S):π-Ph Et(A):π-Ph TDB3LYP -510 -708 -456 -548 -761 260 230 -40 -16 TDHF -377 -495 -315 -360 -425 313 337 251 203 CIS -388 -497 -320 -365 -423 296 310 247 202 CIS(D) -377 -508 -345 -359 -444 129 172 40 25 Exp. -405 -395 — — 40 Conclusões parciais Foram obtidos nove diferentes agregados fenol-etanol (1+1), dos quais seis nunca foram antes reportados. As geometrias foram otimizadas em nível MP2/aug-ccpVDZ, e sua estabilidade foi garantida através do cálculo dos modos vibracionais. As energias de ligação foram calculadas considerando-se a energia de ponto zero, correções de counterpoise da base e efeitos de deformação de geometria. A configuração mais estável encontrada foi Ph:Et(S-1-in) (veja Figura 8) com energia de ligação de 6.5 kcal/mol, condizente com as expectativas teóricas e experimentais (veja o texto). Todas as configurações em que o fenol doa a ponte de hidrogênio possuem energia de ligação calculada variando entre 6.0 e 6.5 kcal/mol. Por outro lado, quando o fenol é aceitador, a energia de ligação é menor, variando entre 3.0 e 3.7 kcal/mol. As freqüências inter e intramoleculares foram analisadas, e considerações sobre seus valores, fatores de escala e correlação com as mudanças geométricas foram feitas. Em especial foi caracterizada a transição π → π* do fenol. Observou-se que esta transição apresenta um desvio sistemático para o vermelho quando o etanol é aceitador de ponte de hidrogênio (Ph:Et), assim como um desvio para o azul quando este é doador (Et:Ph). Este resultado está em plena concordância com as expectativas experimentais e com os resultados obtidos para a água (veja a seção anterior). 41 3.3 Fase líquida: Simulação do fenol em água Concluído o estudo dos agregados, fez-se a simulação computacional do fenol em água [12]. Com o mesmo nível de cálculo usado para a otimização de geometria da molécula isolada (MP2/aug-cc-pVDZ), utilizou-se o método CHELPG [45] para ajustar cargas clássicas sobre os sítios atômicos que melhor descrevessem os momentos de multipolo quânticos (de fase gasosa). Com a geometria da molécula isolada, as cargas CHELPG e parâmetros Lennard-Jones estabelecidos na literatura para o cálculo de fenol em água [46], construiu-se um modelo não polarizado para se realizar a simulação clássica. Este modelo foi submetido à simulação em condições normais no ensemble NpT (298K, 1atm), com 500 moléculas de água. Os parâmetros utilizados para a água são os do modelo SPC de Berendsen [47]. Este modelo de fenol foi polarizado através do processo iterativo utilizado em trabalhos anteriores pelo grupo. Nesta metodologia, realiza-se uma simulação clássica, da qual é retirado um número reduzido de configurações estatisticamente descorrelacionadas. Tais configurações são submetidas ao cálculo quântico, sendo o fenol colocado explicitamente e as camadas de solvatação descritas por cargas pontuais. Os resultados deste método carregam toda a informação estatística do ensemble, e é capaz de polarizar eficientemente o soluto. A novidade deste procedimento introduzida por Coutinho et al. [48] e adaptada dos trabalhos de Aguilar e colaboradores [49], é que ao invés de se fazer N cálculos quânticos para se fazer a média, realiza-se apenas um único cálculo quântico com a média das configurações. Isto só é possível porque o solvente é descrito por cargas pontuais e o soluto não é flexível (ou seja, rígido) durante a simulação. Após a primeira iteração, novamente as cargas no fenol são re-obtidas via CHELPG, mas que agora contempla polarização. Para que o efeito desta polarização do soluto afete a estrutura do solvente a sua volta, o processo de simulação é repetido iterativamente até que a variação do momento de dipolo da molécula de referência flutue em torno de uma média (dentro de um desvio aceitável). Neste ponto, considera-se que o soluto e o solvente estão em equilíbrio eletrostático. 42 2.6 Dipole moment (D) 2.4 2.2 2.0 1.8 1.6 1.4 1.2 0 1 2 3 4 Iteration number Figura 11: Convergência do momento de dipolo do fenol utilizando processo iterativo e o ASEC [48] Cada ponto é resultado de uma simulação de MC, seguido de um único cálculo quântico utilizando a "configuração média". Na Figura 11 apresenta-se a convergência do momento de dipolo para as duas condições termodinâmicas. A curva de convergência dos gráficos é um ajuste exponencial, µi = µ[1 – A.exp(–Bi)], sobre o valor calculado do momento de dipolo. O momento de dipolo calculado do fenol em água (último ponto) é dado por 2.25 D. Tal valor é 75% maior que o valor calculado de fase gasosa (1.28 D). Nota-se que a tendência do ajuste exponencial (i → ∞) é de 2.26 ± 0.02 D, atestando a convergência do cálculo com quatro iterações. Na Tabela 20, os valores obtidos para as cargas utilizadas na simulação são apresentados (fase gasosa e valor convergido para quarta iteração). Para a simulação com o modelo polarizado de fenol foram utilizados 50000 passos para o processo de termalização e mais 300000 de passos de trabalho. Separouse 100 configurações com uma correlação estatística menor que 10%. Para o cálculo do espectro em meio líquido, primeiramente definiu-se as camadas de solvatação para selecionar quantas moléculas de água são necessárias para a submissão aos cálculos quânticos. Na Figura 12, a função de distribuição radial de centro de massa é apresentada. Nota-se que a primeira camada possui um "ombro" em 4.0Å, referente às 43 pontes de hidrogênio. Com esta função de distribuição definiu-se que a primeira camada possui de 25 a 35 moléculas de água. Tabela 20: Valores obtidos para as cargas nos sítios atômicos do fenol, via CHELPG. Átomo Carga (e) Fase gasosa Convergido -0.2661 -0.2794 0.3629 0.4222 -0.1690 -0.2031 -0.0774 -0.0832 -0.1573 -0.1685 -0.0248 -0.0406 -0.5820 -0.7711 0.1174 0.1484 0.0803 0.1001 0.1005 0.1064 0.0870 0.1017 0.1353 0.1432 0.3933 0.5239 1.28 2.25 C1 C2 C3 C4 C5 C6 O H1 H2 H3 H4 H5 H6 µ (D) 1.4 1.2 1.0 gcm(r) 0.8 1º camada 30 moleculas 0.6 0.4 0.2 0.0 2 4 6 8 10 12 r (Å) Figura 12: RDF dos centros de massa soluto-solvente da simulação com fenol polarizado iterativamente. Apenas a primeira camada é bem definida. 44 O cálculo quântico do espectro é bastante custoso devido à necessidade do uso de moléculas explícitas de solvente (com o conseqüente aumento de elétrons e funções base). Tendo em mente que este custo tem um fator maior que N4, optou-se por se fazer o cálculo das 100 configurações descorrelacionadas com diferentes quantidades de moléculas de água explícitas, iniciando-se em zero e aumentado de cinco em cinco até se obter a convergência. Optou-se também por se utilizar uma base menor (6-31G) do que a utilizada no soluto (aug-cc-pVDZ). Isto pode ser feito apenas porque a excitação é localizada no fenol. O método quântico utilizado foi o TDHF, que forneceu resultados para o desvio equivalentes ao CIS(D). Outro fator que pesou pela escolha desse método foi que seu custo é quase igual ao CIS, mas com resultado um pouco melhor para o valor absoluto (veja seções anteriores). -1 Desvio solvatocrômico (cm ) 800 Águas explícitas + cargas pontuais ASEC 700 600 500 400 300 0 5 10 15 20 25 Número de moléculas de água explícitas Figura 13: Convergência do espectro calculado com aug-cc-pVDZ no fenol e 6-31G no solvente, aumentando-se o número de moléculas de água explícitas sistematicamente. A Figura 13 mostra a convergência do cálculo do espectro aumentando-se o número de moléculas explícitas. O número total de moléculas de água (considerando implícitas e explícitas) utilizadas para esses cálculos foram 200 (representando 11.5Å de solvente). As moléculas não colocadas explicitamente foram descritas por cargas pontuais. Assim, o resultado do desvio solvatocrômico com 25 moléculas de água explícitas mais 175 descritas por cargas pontuais foi igual a 580 ± 35 cm-1. Tal valor é quase o mesmo que o obtido com 20 moléculas de água explícitas mais 180 descritas 45 por cargas pontuais, 570 ± 34 cm-1, e que é coincidentemente similar ao resultado do ASEC (565 cm-1). Destaca-se aqui que o ASEC deveria corresponder ao resultado da média de cargas pontuais (485 ± 27 cm-1). Entretanto, Aguilar e colaboradores [49] mostram que o método de carga média tende a fornecer maiores energias do que a média dos cálculos de cada configuração descrita por cargas pontuais. Este argumento é calcado na polarizabilidade (já que a configuração média suprime a polarização para diferentes direções). Quanto maior a polarizabilidade, maior o erro na energia. É de se esperar, portanto que o estado excitado resulte em energia maior ainda, aumentandose o desvio para o azul. Esta diferença é destacada na Figura 14. Nota-se que a diferença é 80 cm-1, ou seja, 0.01 eV. -1 Desvio solvatocrômico (cm ) 700 600 500 400 300 200 -1 ASEC (565 cm ) -1 Cargas pontuais (485 ± 25 cm ) 0 20 40 60 80 100 Número de configurações Figura 14: Diferença entre o ASEC (configuração média) e a média sobre o cálculo de cada configuração descrita por cargas pontais. 46 Horas de CPU por configuração 8 6 4 2 0 0 5 10 15 20 25 Número de moléculas de água explícitas Figura 15: Custo computacional do cálculo do espectro do fenol com base aug-cc-pVDZ em água descrita por 6-31G (mais cargas pontuais), com o método TDHF. Na Figura 15 é apresentada o custo computacional dos cálculos do espectro do fenol em água. Destaca-se a grande diferença dos tempos de CPU em se utilizar 20 e 25 águas explícitas (55% maior para 25 águas). Entretanto, dada a pequena diferença no resultado de seus desvios solvatocrômicos (menor que 2%), decidiu-se por continuar este trabalho com a análise das configurações de 20 moléculas explícitas de água mais 180 descritas por cargas pontuais. Prosseguiu-se assim com a análise das pontes de hidrogênio, a fim de identificar a contribuição destas para o desvio solvatocrômico do fenol em água. Na Figura 16 é feito o histograma da energia de pares, a fim de se identificar a energia característica das pontes de hidrogênio utilizando-se o campo de força clássico. Nota-se que a energia é majorada em relação ao valor obtido quanticamente para a energia de ligação dos complexos otimizados (Tabela 3). Destas distribuições define-se uma energia de corte de -3.5kcal/mol para as pontes de hidrogênio. 47 Figura 16: Histograma da energia de pares fenol-água. À esquerda, varredura em torno do fenol doado a ponte para a água (sítios H do fenol e O da água). À direita, varredura em torno do fenol aceitando a ponte para a água (sítios O do fenol e H da água). Em seguida é analisada a função de distribuição radial OO. Esta define uma distância OO de 3.25Å para as pontes. Utilizando-se ainda o critério de 40º para o ângulo O-OH, obteve-se uma média de 1.4 pontes para a água doadora de ponte e 1.0 pontes para água aceitadora. A Figura 18 ilustra, via sobreposição de configurações, as pontes de hidrogênio formadas em solução. Figura 17: Função de distribuição radial OO (fenol-água) para a definição das pontes de hidrogênio. 48 Figura 18: Sobreposição das configurações de líquido contemplando apenas as pontes de hidrogênio. À esquerda, pontes com água aceitadora (média de 1.0 pontes por configuração). À direita, pontes com água doadora (média de 1.4 pontes por configuração). Assim, foi submetido ao cálculo quântico apenas as águas formadoras de ponte de hidrogênio, excluindo-se das configurações do líquido todas as outras moléculas de água. O desvio calculado apenas com as águas aceitadoras de pontes de hidrogênio resultou em uma média de -435 ± 15 cm-1. O desvio com as águas doadoras, 480 ± 20 cm-1. Assim como obtido para os complexos otimizados, seus valores absolutos efetivamente se anulam. Dado o fato que o desvio do fenol em água vai para o azul da mesma forma que a configuração otimizada W-Ph (Tabela 7), criase a expectativa que em solução as água doadoras de ponte de hidrogênio dêem a maior contribuição para o desvio total. Entretanto, ao se realizar o cálculo com ambos os tipos de água (doadora e aceitadora), obtém-se somente 135 ± 25 cm-1 (25% do valor obtido para o líquido, isto é com 20 moléculas de água explícitas e mais 180 descritas por cargas pontuais). De fato, ao se fazer o cálculo das configurações do líquido, mas agora excluindo as moléculas de água que fazem as pontes, obtém-se 415 ± 35 cm-1 (73% do valor obtido para o líquido). Conclui-se deste resultado que a contribuição majoritária para o para o desvio do espectro do fenol em água não é dado pelas pontes de hidrogênio, mas sim pelo efeito do bulk. Tabela 21: Resultados para o espectro do fenol em água, analisando as diferentes contribuições. TD-HF Pontes Ph-W Pontes W-Ph -435 ± 15 480 ± 20 Pontes Ph-W+ W-Ph 135 ± 25 Líquido sem pontes 415 ± 35 Líquido Exp. [6] 570 ± 35 460 49 Conclusões parciais Realizou-se simulação de fenol em água (1+500) no ensemble NpT (1 atm, 298K) a fim de verificar a origem do desvio solvatocrômico do fenol. A água foi descrita por um campo de força simples (SPC/E) e o fenol foi polarizado de acordo com o protocolo Iterativo S-MC/MQ, utilizando o ASEC. Verificou-se que o ASEC é um método eficiente e econômico para produzir a polarização no soluto, e que também fornece uma boa estimativa para o desvio solvatocrômico. A função de distribuição radial apontou que a primeira camada de solvatação do fenol é composta por 30 moléculas de água. Verificou-se que utilizar todas as moléculas de água da primeira camada para realização do cálculo de excitação eletrônica teria um alto custo computacional. Foi então feita uma abordagem alternativa, onde se aumentou sistematicamente o número de moléculas explícitas consideradas no cálculo, até se obter a convergência. O valor calculado (570±35cm-1) está em bom acordo com o resultado experimental (460cm-1). Adicionalmente foram identificadas as contribuições para este desvio solvatocrômico. Verificou-se que o desvio do espectro do fenol para o azul quando solvatado em água é causado basicamente pelo efeito do bulk em torno do fenol, e não pelas pontes de hidrogênio como se pensava inicialmente. 50 3.4 Fase líquida: Simulação do fenol em etanol Nesta parte do trabalho são apresentados os resultados da simulação de fenol em etanol, com o intuito de se comparar com o trabalho realizado do fenol em água. Dada a flexibilidade da torção HOOC em líquido, optou-se primeiramente por investigar a superfície de energia potencial ligada a esta coordenada, para verificar se as energias de excitação dos modos de torção são menores que kbT. O cálculo da superfície foi feito em nível MP2/aug-cc-pVDZ, variando-se o ângulo de torção em intervalos de 10º, deixando o resto da molécula se adaptar. Desta forma foi possível obter a barreira de transição entre as três conformações (Figura 19). Nota-se em um giro completo há três mínimos, um em torno de 60º (synclinal), outro em torno de 180º (anticlinal) e outro em torno de 300º (synclinal). A energia de todos os pontos foi subtraída da energia calculada para a conformação anticlinal (Tabela 8), de tal forma que em 180º a energia é zero. Considerando-se o diedro independente dos outros graus de liberdade do sistema, é factível resolver numericamente a equação de Schrödinger para este potencial e encontrar a energia do estado fundamental para esta coordenada. Figura 19: Energia potencial e estado fundamental da torção HOCC do etanol. Os valores das energias dos três primeiros estados são apresentados na Figura 19, cujas duas primeiras energias de excitação são 171cm-1 e 186cm-1. Dado que kbT = 210cm-1 para 300K, qualquer um desses estados é acessível à temperatura ambiente. Portanto se faz necessário considerar a flexibilidade da torção HOOC na simulação do fenol em etanol. 51 Este trabalho foi realizado como o programa TINKER [50], e com o campo de força flexível e polarizável AMOEBA [51]. Foi realizada dinâmica molecular no ensemble NpT, em condições normais de pressão e temperatura (1 atm, 300K). O algoritmo de integração utilizado foi o de Verlet, em conjunto com o termostato e barostato de Berendsen. O passo de integração utilizado foi de 0.5ps, suficiente para simulação com modelo flexível em condições normais. Foi utilizado o protocolo padrão do AMOEBA, o qual não restringe os graus de liberdade internos das moléculas. Também foi utilizado a correção de Ewald cujo efeito principal é corrigir a interação coulombiana de longa distância. Foram utilizadas duas etapas de termalização: uma de 100ns, e outra de 50ns. Na Figura 20 são apresentados os valores da energia potencial intermolecular por molécula em cada passo. Espera-se que tal valor seja coerente com a energia potencial do etanol puro. Vale lembrar que o AMOEBA utiliza um potencial polarizável que depende da vizinhança, e não é possível escrever esse potencial como uma soma de interação de pares. Portanto não há como saber exatamente a contribuição do fenol para esta energia. Figura 20: Energia potencial das configurações geradas durante o processo de termalização (últimos 50ns). A flutuação em torno de -9.6 kcal/mol indica que o sistema está próximo do equilíbrio térmico. 52 Figura 21: Densidade durante o processo de termalização (últimos 50ns). A flutuação (sobe e desce) característica do uso do barostato indica que o sistema está próximo do equilíbrio térmico. Na Figura 21 são apresentados os valores da densidade durante a segunda parte do processo de termalização. Nota-se que a densidade inicialmente próxima a 0.785 g/cm3, diminui gradualmente até 0.775 g/cm3, para então subir novamente. Esta flutuação (em torno de 0.78 g/cm3) serve de indicativo de que o sistema está termalizado. Garantida a termalização, efetuou-se a simulação. O passo de integração utilizado foi o mesmo da termalização (0.5fs), entretanto efetuou-se 150ns de simulação (300 mil passos). Na Figura 22 é apresentada a convergência do valor médio da energia potencial por partícula. O erro apresentado é o erro estatístico (desvio padrão dividido pela raiz do número de configurações descorrelacionadas). Observa-se que o valor médio está muito bem convergido ao final da simulação. O número total de configurações descorrelacionadas é obtido com o auxílio da função de autocorrelação da energia (Figura 23). O número total de configurações descorrelacionadas é 30 (tomando o 15% de correção entre as configurações, em um intervalo de tempo de 5000ps). Desta forma, será necessário realizar pelo menos outra simulação do mesmo tamanho, antes de realizar cálculos quânticos sobre essas configurações. É conhecido que as propriedades quânticas calculadas convergem a partir de 60 configurações descorrelacionadas. No trabalho realizado com a água, procurou-se produzir 100 configurações descorrelacionadas. 53 Figura 22: Convergência do valor médio da energia potencial durante a simulação (150ns). O erro apresentado é o erro estatístico. Destaca-se o valor convergido (-9.548 kcal/mol). Figura 23: Autocorrelação da energia potencial intermolecular. Com um intervalo de aproximadamente 5ns obtém-se menos de 15% de correlação. A Figura 24 apresenta o histograma da energia potencial da simulação. Observa-se que a distribuição é simétrica e se ajusta bem a curva teórica (gaussiana). Este é um bom indicativo (mas não garante) que as configurações produzidas estão de acordo com uma distribuição de Boltzmann (coerente com o ensemble NpT). Ressalta-se que o termostato de Berendsen (utilizado na dinâmica molecular) não garante a mesma distribuição do ensemble. 54 Figura 24: Distribuição da energia potencial intermolecular por partícula. A ocorrência é normalizada por um fator de 1000. A curva gaussiana foi feita utilizando-se o valor médio e o desvio padrão da distribuição. A Figura 25 apresenta a convergência da média da densidade durante a simulação. A média acumulada flutuou em torno do valor médio total durante todo o processo. Isso garante que a simulação foi iniciada de uma configuração termalizada. O valor convergido 0.779 g/cm3 está em bom acordo com o resultado experimental (0.789g/cm3). Esse é um bom indicativo da qualidade do campo de força (que não é ajustado empiricamente). Já a Figura 26 apresenta a convergência da média da pressão durante a simulação. Nos primeiros 50ns é clara a forte flutuação (algumas configurações apresentam valores extremos de pressão, de -1000atm até 1000atm). É conhecido que a pressão é uma propriedade de difícil convergência e que é necessário um longo tempo de simulação para obter seu valor propriamente convergido. O uso do termostato+barostato de Berendsen torna o cálculo da pressão muito instável. A cada passo de integração é feita uma pequena mudança na energia cinética do sistema, a fim manter a temperatura flutuando em torno do valor pré-fixado. Essa mudança artificial na temperatura indiretamente muda o valor da pressão (veja Apêndice B). Considerando-se essas dificuldades, o valor obtido (6 ± 8 atm) está condizente com as expectativas. Nota-se aqui que a qualidade deste valor não depende do campo de força, mas apenas do termostato/barostato utilizado, do tamanho do sistema, e do tempo de simulação. 55 Figura 25: Convergência da média da densidade durante a simulação (150ns). O valor convergido é destacado pela linha verde (0.779 g/cm3). A convergência é obtida a partir de 100ns. A escala do gráfico é a mesma da Figura 21. O erro estatístico é utilizado. Figura 26: Convergência da pressão durante a simulação (150ns). Verifica-se que a convergência (dentro do erro estatístico) é obtida a partir de 60ns. Nota-se entretanto que as flutuações são muito grandes. 56 Conclusões parciais Realizou-se a simulação do fenol em etanol com o modelo flexível e polarizável AMOEBA, utilizando o ensemble NpT. As propriedades termodinâmicas calculadas são coerentes com os resultados esperados para esse sistema. A energia potencial por molécula é -9.548 ± 0.016 kcal/mol, e está em excelente acordo com simulações realizas com o potencial empírico OPLS (-9.69 kcal/mol) [52]. A densidade calculada aqui 0.779 g/cm3 também se compara muito bem com o valor experimental (0.789g/cm3) e com o resultado do OPLS (0.787 g/cm3) [52]. É interessante notar que o AMOEBA não é parametrizado para reproduzir os resultados experimentais, e portanto essa boa concordância é um forte indicativo de que este modelo produz estruturas confiáveis. 57 Capítulo 4: Água supercrítica Neste capítulo será apresentado o trabalho relacionado com a simulação da água em torno de seu ponto crítico. O objetivo fundamental é compreender as propriedades microscópicas e termodinâmicas da água nessas condições, e determinação do ponto crítico do campo de força AMOEBA. O ponto crítico é definido como o valor de pressão e temperatura para os quais as diferenças entre os estados líquido e gasoso desaparecem. Na Figura 27, o diagrama de fase de uma substância típica é apresentado. Nesta, observa-se que a fase gasosa se encontra na região de menor pressão e maior temperatura, oposta à fase sólida. A fase líquida surge no entremeio, a partir do ponto triplo. Do ponto triplo ao ponto crítico, para a maioria das substâncias, as propriedades físicas da fase gasosa e líquida diferem por ordens de grandeza e de maneira descontinua (linha azul). Esta descontinuidade diminui gradativamente à medida que se aproxima do ponto crítico. A partir deste ponto, conhecida como região supercrítica, a transição entre as fases líquida e gasosa não é mais perceptível. Nesta região as propriedades passam a variar continuamente, entretanto nas proximidades do ponto crítico esta variação ainda é brusca. Figura 27: Diagrama de fase de uma substância típica. 58 Ordenados pela massa, nas figuras abaixo é apresentada a pressão e a temperatura crítica de uma série de substâncias [53]. Alcanos Alcenos Ciclo-alcanos Álcoois Gases nobres H2O 6 10 36 38 H H 18 17 C 32 H 34 C H 15 C 16 28 30 H H 13 14 C 24 26 H 12 C C H H 11 10 10 C C 22 18 20 H 8 H 9 C C 14 16 H 7 6 C C H 12 4 H 5 C C H 8 H 3 C pc(atm) C H C4 2H O CH 4 O C 2H 6 H 8O O Xe C3 Kr 0 Ar C 4H 1 H 12O O C5 4 O O O C 6H 1 H 16 8 C7 C 8H 1 C 9H 20 H 22O O Ne C 10 C 11H 24 C 100 He 1 0 50 100 150 200 250 m(g/mol) 900 H 28 C 13 H 26 C 12 H 24 C 11 H 22 C 10 H 20 C9 Kr H 38 C 18 H 36 C 17 H 34 C 16 H 32 C 15 H 30 C 14 O H 18 C8 H 16 C7 Tc(K) O H 24 C 11 O H 22 C 10 O 0 O 8 C 8H 1 O 4 H 14 C6 Xe Ar H4 C 100 H 10 C4 H6 C2 200 H 12 C5 H8 C3 300 6 O 500 400 C 7H 1 C 6H 1 O 2 0 O C 3H 8 O C 2H 6 O CH 4 600 C 4H 1 H2O C 5H 1 700 C 9H 2 800 Alcanos Alcenos Ciclo-alcanos Álcoois Gases nobres Ne 0 He 0 50 100 150 200 250 m(g/mol) Figura 28: Pressão (acima) e temperatura crítica (abaixo) de algumas substâncias. 59 O ponto crítico é ao mesmo tempo um ponto de mínimo e inflexão, ou seja, 2 ∂pT = ∂ p2T = 0. Desta forma é possível associar a pressão e a temperatura crítica (1) ∂υ ∂υ aos coeficientes a e b da equação de van der Waals [66]. Portanto os valores de pressão e temperatura crítica são sensíveis ao volume médio e à força de coesão molecular. Este fato ajuda a compreender porque os alcoóis possuem valores de pressão e temperatura crítica superiores aos dos alcanos e inferiores aos da água. 8a Tc = 27bk b (1) a pc = 27b2 A água em especial possui pressão e temperaturas críticas elevadas (216 atm e 647 K). A Figura 29 mostra o ponto crítico da água (em rosa) ao fim da linha de coexistência líquido-gás. Qualitativamente é possível associar a “fase líquida” com a 2 ∂ρ região laranja da figura, e a “fase gasosa” com a região azul. Observa-se que ∂T2p < 0 2 2 2 ∂ρ ∂ρ ∂ρ e ∂p2T < 0 para a fase líquida, ∂T2p > 0 e ∂p2T > 0 para a fase gasosa. O ponto crítico marca a região de inflexão, a qual se entende dentro da região supercrítica. Figura 29: Diagrama de fase da água. Densidade em função da pressão e temperatura. 60 Ainda na Figura 29 observa-se que a densidade em torno do ponto crítico dobra em uma ou duas unidades de pressão e temperatura. Da mesma forma, outras propriedades físicas como a energia e o calor específico também sofrem imensas flutuações nesta região. Realizar simulações computacionais em tais condições é um grande desafio teórico que vem sendo realizado desde o final dos anos 80 [54]. Experimentalmente sabe-se que a rede de pontes de hidrogênio característica da água em condições normais é parcialmente desfeita. Em seu lugar formam-se agregados de diferentes tamanhos, formando regiões descontínuas [55]. Isto implica um maior tempo de simulação (ou quantidade de partículas) para se obter as mesmas propriedades termodinâmicas calculadas em condições normais. Os métodos de cálculo de primeiros princípios ainda são demasiadamente caros e pouco eficientes para serem utilizados nessas condições. É sabido que as propriedades termodinâmicas, como densidade e pressão, não são bem descritas por cálculos DFT [56]. Isso se deve ao fato de que tais propriedades são muito sensíveis a pequenas imprecisões na energia de troca e correlação, mesmo em condições normais [56]. Desta forma tais simulações, quando realizadas, são feitas com densidade constante, ignorando-se completamente algumas propriedades como pressão e entalpia de vaporização [57]. Mesmo com o grande avanço computacional dado pelo processamento distribuído nos últimos anos, as simulações ab initio ainda utilizam um número muito reduzido de moléculas [58]. Por outro lado, os modelos clássicos rígidos podem não descrever corretamente as grandes flutuações que surgem no ambiente supercrítico. É sabido que os modelos polarizáveis costumam não propiciar resultados melhores para a pressão e temperatura crítica do que os modelos não-polarizáveis [56]. A explicação desta aparente falha reside no fato de que tais modelos costumam ser parametrizados para descrever as propriedades termodinâmicas em condições normais. Outro aspecto importante é que a polarizabilidade usada em tais modelos normalmente é a de fase gasosa [56]. Desta maneira costuma-se fazer um balanço entre o custo computacional, capacidade de reproduzir bem o ambiente complexo e descontínuo da região supercrítica, e as propriedades termodinâmicas em torno de dessa região. Surpreendentemente um dos modelos de água mais utilizado é o SPC/E [47, 59]. Estabelecido para este tipo de simulação em um importante trabalho de Guissani e Guillot [60], o SPC/E subestima um pouco a pressão crítica (186atm calculado contra 217atm experimental) e concorda muito bem com a densidade crítica (0.326g/cm3 61 calculado contra 0.322g/cm3 experimental) e a temperatura crítica (651.7K calculado contra 647.1K experimental). Não se deve esquecer, entretanto, que nesta região as moléculas de água estão sujeitas a um ambiente extremamente inomogêneo, e que o SPC/E é um modelo rígido e não polarizável. Isto implica que mesmo fornecendo boa concordância para algumas propriedades termodinâmicas, este modelo deve perder detalhes importantes da interação na vizinhança molecular. Após investigar a literatura, decidiu-se investigar a estrutura microscópica e as propriedades termodinâmicas da água em torno da região supercrítica utilizando um modelo flexível e polarizável. O modelo escolhido foi o AMOEBA [51], proposto por Ren e Ponder em 2002. Desde então, tal modelo se mostrou eficiente para reproduzir propriedades termodinâmicas e estruturais de diversos sistemas, tanto para sistemas moleculares [61, 62] quanto iônicos [63]. 62 4.1 Determinação do Ponto Crítico da Água usando o Modelo AMOEBA Obter informações termodinâmicas de uma simulação em condições supercríticas não é uma tarefa trivial. Dadas as imensas flutuações e esperada inomogeneidade desse sistema, é necessário fazer alguns testes para verificar se os resultados das simulações serão aceitáveis. Primeiramente investigou-se o efeito do número de moléculas de água na densidade. Para esse fim, um modelo mais simples foi usado: o SPC/E [47]. O ensemble utilizado foi o NpT (217atm, 647K). Foram feitas simulações de dinâmica molecular com respectivamente 128, 256, 512, 1024, 2048, e 4096 moléculas de água. Foi utilizado o algoritmo de Verlet para a integração das equações de movimento e o termostato/barostato de Berendsen para fixar a pressão e temperatura [75]. Estas simulações foram feitas com intervalo de femtosegundo com 100 mil passos, totalizando uma dinâmica de 100 nano-segundos. Adicionalmente investigou-se a influência da soma de Ewald nas simulações, notando aqui que o SPC/E não foi parametrizado com esta correção. O objetivo principal desta etapa foi descobrir a viabilidade de se produzir estruturas em condições supercríticas com uma caixa pequena (128 ou 256 moléculas de água). Figura 30: Estudo da variação da densidade utilizando o modelo SPC/E (com e sem correção de Ewald) em função do número de partículas, no ensemble NpT, utilizando pressão e temperatura do ponto crítico experimental. O erro apresentado é o erro estatístico (desvio padrão dividido pela raiz do número de configurações descorrelacionadas). 63 Figura 31: À esquerda: Configuração aleatória com 256 moléculas de água (SPC/E, NpT, utilizando o ponto crítico experimental). As moléculas são representadas pelo método de "superfície" (união das superfícies de van der Waals de cada molécula). É visível regiões sem nenhuma molécula de água, criando buracos na estrutura que atravessam a caixa de simulação. À direita: Configuração aleatória com 500 moléculas de água (SPC/E, NpT, utilizando as condições normais de pressão e temperatura, proveniente da simulação de fenol em água). Não há descontinuidades visíveis na estrutura. A Figura 30 apresenta o valor da densidade para o SPC/E, com e sem a correção de Ewald, para os diferentes tamanhos de caixa (número de moléculas). Originalmente o TINKER (programa utilizado para fazer as simulações com o AMOEBA) não possibilitava que se definisse a fronteira da caixa como raio de corte (isso é necessário no ensemble NpT, já que o tamanho da caixa muda durante a simulação). Desta forma o TINKER foi modificado para que o raio de corte das interações fosse sempre igual à metade do tamanho da caixa. Com menos de 256 moléculas de água a utilização ou não da soma de Ewald muda consideravelmente o resultado da simulação. Portanto o uso desta correção é relevante nestas condições se o número de partículas é reduzido. A densidade obtida para valores superiores a 512 moléculas de água (aproximadamente 0.45g/cm3) é razoavelmente boa comparada com a experimental (0.3g/cm3), e corrobora o fato do SPC/E ser amplamente utilizado em simulações na região supercrítica. A Figura 31 apresenta uma das configurações com 256 moléculas de água. Sua estrutura é formada de agregados e "vacâncias", de tal forma que em cada direção é possível contar um ou dois agregados, cada um com poucas moléculas de água. Desta forma, deve-se imaginar que a simulação não é realizada com moléculas de água, mas sim com agregados formados por estas moléculas. Tais agregados interagem e trocam partículas entre si. Isso implica que as 64 condições periódicas de contorno criam um vínculo artificial quando há poucas moléculas de água no sistema. Este é um bom indicativo do porque há tanta variação na densidade quando se simula com um número reduzido de partículas (Figura 30). A única maneira de contornar este problema é utilizar o máximo número possível de partículas nas simulações. Entretanto o custo computacional escalona no mínimo com N2 (dado que o raio de corte utilizado aqui é sempre metade da caixa). Há também o fato que o campo de força AMOEBA [51] utiliza um processo autoconsistente para gerar os multipolos induzidos em cada sítio atômico, fazendo dele pelo menos 40 vezes mais dispendioso computacionalmente que o SPC/E. Uma simulação com 100 nano-segundos leva cinco dias com 256 moléculas de água3, e são necessárias algumas centenas de simulações para se determinar o ponto crítico com alguma precisão. Após compreender o que seria enfrentado, foi realizada a busca pelo ponto crítico da água utilizando o modelo AMOEBA (aparentemente não reportado na literatura). Sabendo-se que 128 moléculas de água não descreveriam adequadamente a estrutura da água supercrítica, e devido aos limitantes custos computacionais, optouse por utilizar 256 moléculas de água. Esta é a mesma quantidade de moléculas utilizadas nas simulações de Guissani e Guillot para a determinação do ponto crítico do SPC/E em 1993 [60]. Realizou-se uma primeira simulação em torno do ponto crítico experimental, no ensemble NpT, e se percebeu que o resultado para a densidade era surpreendentemente subestimado (em torno de 0.13 g/cm3). Foi utilizada a correção de Ewald (dado o protocolo do AMOEBA), com ewald-fraction igual a 0.25 (utilizando 7 vetores k, o que produziu uma diminuição do tempo de cálculo sem afetar a precisão do potencial). Da mesma forma que nos testes iniciais com o SPC/E, foi utilizado o algoritmo de integração de Verlet e o termostato/barostato de Berendsen [75]. A geometria da água foi mantida fixa através do algoritmo rattle [64]. Em seguida, foram feitas aproximadamente 200 simulações a partir deste ponto, diminuindo-se a temperatura e aumentando-se a pressão, em busca da transição de fase líquido/gás (Figura 32). 3 Valor aproximado considerando-se o cálculo serial em processador 64bits com 2.4GHz e 4MB de cache, sem a utilização de instruções específicas. 65 Figura 32: Varredura da superfície (T,p,ρ). Destacado (fora da superfície) em roxo, o ponto crítico experimental. Quanto mais perto da transição líquido-gás (região avermelhada na Figura 32), maiores se tornam as flutuações na densidade. Este resultado era obviamente esperado. Tais simulações serviram como um indicativo de que o ponto crítico do AMOEBA estava entre de 570-600K, 180-220atm e 0.25-0.35g/cm3. Entretanto verificou-se que a utilização do ensemble NpT, mesmo sendo uma boa alternativa para indicar a pressão e temperatura críticas do modelo, é ineficaz para sua correta determinação. Desta forma decidiu-se realizar uma extensa série de simulações no ensemble NVT em torno da região indicada pelas simulações anteriores. Foram 130 simulações, variando de 530 até 620K, e 0.194 até 0.760g/cm3. A fim de obter o valor do ponto crítico, utilizou-se a mesma equação de estado (2) utilizada por Guissani e Guillot no estudo do ponto crítico do SPC/E [60]. Nesta equação, x = (ρ*/T*1/4), onde ρ* é a densidade reduzida (ρ/ρc) e T* é a temperatura reduzida (T/Tc), sendo o ponto crítico dado por (ρc, Tc, pc). p 1/2 ρkbT = F(x) – (1/T*) G(x) F(x) = 1 + B1 x + B2 x2 + B3 x3 + B4 x4 + B10 x10 G(x) = C1 x + 2C2 x2 + 3C3 x3 + 4C4 x4 + 5C5 x5 (2) 66 Cada uma das simulações NVT consistiu de 100 nano-segundos de termalização (procurando-se partir de simulações realizadas em pontos próximos) e 100 nano-segundos de simulação (passos de integração de 0.5 femto-segundo com 200 mil passos). A Figura 33 ilustra a convergência estatística de uma dessas simulações. O trabalho intensivo para assegurar que todas as simulações partiram de configurações adequadamente termalizadas levou meses, e utilizou algumas ferramentas de software desenvolvidas durante esse doutorado. Figura 33: Convergência da energia total (esquerda) e da pressão (direita) da simulação em temperatura de 620K e densidade de 0.30g/cm3. O erro apresentado é o erro estatístico (desvio padrão dividido pela raiz do número de configurações descorrelacionadas). Em ambas as figuras é clara a convergência a simulação em 60ns. Figura 34: Reprodução da figura 2 da referência 60. 67 Executar as simulações e conferir seus resultados é uma tarefa hercúlea. Porém encontrar os coeficientes B e C (e também o ponto crítico) é uma tarefa ainda mais complexa. A equação de estado utilizada para ajustar os pontos possui 12 parâmetros livres. Para encontrar estes parâmetros utilizou-se o método de mínimos quadrados implementado no programa gnuplot [65]. Os valores iniciais para estes coeficientes foram os mesmos reportados na referência 60 para os coeficientes da água real. Aparentemente os coeficientes encontrados para a água com modelo AMOEBA produzem isotermas que se ajustam melhor aos dados da simulação do que às curvas e dados apresentados na referência 60 para a água com o modelo SPC/E (reproduzido aqui na Figura 34). Na Tabela 22 é apresentado o resultado desse ajuste. Com exceção dos coeficientes B10 e C5 (que determinam o comportamento da equação nas condições subcríticas e normais) os parâmetros obtidos para o AMOEBA são mais próximos daqueles ajustados para os dados experimentais do que os obtidos para o SPC/E. Isso implica que em torno do ponto crítico, o AMOEBA apresenta uma variação nas propriedades termodinâmicas que é mais próxima da água real do que o modelo SPC/E. O ponto crítico para o AMOEBA (575K, 0.33g/cm3, 205atm) apresenta a pressão crítica mais próxima do valor experimental (217.7atm). Por outro lado, o ponto crítico do SPC/E (651.7K, 0.326g/cm3, 186.5atm) possui uma melhor temperatura crítica quando comparada com o valor experimental (647.1K). Ambos os campos de força fornecem uma excelente densidade crítica considerando-se a imprecisão do ajuste. Tabela 22: Parâmetros ajustados para a equação de estado (2). Os valores para SPC/E e Experimental foram retirados da referência 60. Nota-se que o ponto crítico experimental é 647.1K, 0.322g/cm3 e 217.7atm, e que os valores para "Experimental" apresentados na tabela mostram que a equação de estado não é exata. Tc(K) ρ(g/cm3) p(atm) B1 B2 B3 B4 B10 C1 C2 C3 C4 C5 SPC/E 651.7 0.326 186.5 8.480 -13.45 8.795 -1.810 2.297(10-4) 11.32 -9.127 4.440 -0.9888 7.831(10-2) AMOEBA 575 0.33 205 6.414 -6.120 2.395 -0.2227 10-5 8.004 -3.652 0.936 -0.06623 -2.2(10-3) Experimental 652.3 0.299 229.5 6.630 -5.849 2.099 -0.1672 2.87(10-17) 8.151 -3.492 0.835 -0.0514 2.178(10-3) 68 Figura 35: Isotermas obtidas para o campo de força AMOEBA. Cada ponto representa uma simulação. O erro apresentado é o erro estatístico. A Figura 35 apresenta as isotermas calculadas com a equação (2) e os parâmetros da Tabela 22. Os pontos são aqueles obtidos das 130 simulações. A Figura 36 apresenta os mesmos pontos, mas agora representados por uma superfície (gerado pelo programa gnuplot). Tal superfície é basicamente a mesma produzida pelos dados experimentais, porém deslocada na temperatura (em 70K). Figura 36: Diagrama de fase da pressão pela densidade e temperatura (NVT). Determinação do ponto crítico do AMOEBA. 69 Conclusões parciais Foram realizadas centenas de simulações da água em torno do ponto crítico experimental, utilizando diferentes modelos e diferentes números de partículas. Observou-se que as propriedades termodinâmicas (e por conseqüência as estruturais) são sensíveis ao número de moléculas na simulação quando esta é menor que 256. Portanto conclui-se que este número é o mínimo aceitável para reproduzir com alguma fidelidade as propriedades da água em torno do ponto crítico e na região supercrítica. Adicionalmente foi determinado o ponto crítico do campo de força polarizável AMOEBA. Seu ponto crítico (575K, 0.33g/cm3, 205atm) se compara surpreendentemente bem com o resultado experimental (647K, 0.322g/cm3, 217.7atm) dado o fato que ele não foi parametrizado para isso. Dado que este campo de força apresenta polarização e flexibilidade, ele se torna uma alternativa mais confiável para realização de simulações nesta região do que os modelos não flexíveis e não polarizáveis comumente utilizados. 70 Capítulo 5: Retrospectiva, Conclusões e Perspectivas Este projeto de doutorado foi iniciado no início de 2007 com o objetivo de estudar as propriedades espectroscópicas do fenol em agregados, soluções e em condições supercríticas. A simulação do fenol em condições normais, utilizando diferentes solventes, campos de força e métodos de química quântica, foi realizada com sucesso. O aluno desenvolveu os conhecimentos necessários para simular e analisar não apenas propriedades termodinâmicas e eletrônicas em solução, mas também interpretar mudanças conformacionais e desvios no espectro vibracional, estimativas de energia de ligação, efeitos de polarização e deconvoluir suas diferentes contribuições. Devido a limitações computacionais, não foi possível completar o estudo da solvatação do fenol em água supercrítica (e não há perspectiva realista para a realização dessa parte). Entretanto, foi realizado um estudo sistemático das propriedades termodinâmicas e estruturais em condições supercríticas, incluindo a determinação do ponto crítico do modelo polarizável AMOEBA. Conclusões parciais de cada parte do trabalho apresentado nesta tese estão presentes no final de cada seção. Durante o último ano e meio, foi investido um enorme esforço para adquirir conhecimentos relativos à programação em C/C++ (em especial otimização de código e programação eficiente orientada a objeto), programação em paralelo (com o uso de threads de processamento e comunicação inter-processual via sockets), e manutenção de grandes projetos colaborativos com o uso de software do tipo subversion. Este estágio se iniciou com a necessidade de desenvolver um programa para separar as configurações da simulação de dinâmica molecular (principalmente relativo às simulações em condições supercríticas) e fazer uma análise adequada sobre eles. Partindo de scripts básicos em shell para uma implementação amadora em C, o programa começou a ser escrito na virada de 2008 para 2009 como uma ampla ferramenta de separação de configurações de acordo com as mais diversas opções possíveis (distância, energia, ângulo de ligação, vetor definido pelo usuário, multiseleção, lista reversa, negativa, produção de distribuição radial, angular, vetorial, energética...). Batizado de magno, logo se tornou um enorme bloco de difícil manutenção, e se percebeu a necessidade de melhorar a técnica de programação e a abordagem sobre ele. Após adquirir o conhecimento necessário para executar esta 71 tarefa, iniciou-se o processo de reescrita, executando isso de maneira modular e organizada. Utilizando programação orientada a objeto, foram criadas classes de uso universal para operar de maneira simples e eficiente sobre arquivos, buffers de texto, listas, e variáveis dinâmicas. Ao mesmo tempo, foram criadas classes específicas para operar sobre átomos, moléculas, campos de força, vetores e matrizes. Tais ferramentas (classes) são otimizadas e eficientes, e obviamente não são restritas "separação de configurações". Toda a dificuldade da otimização de algoritmos básicos, operações de input/output e programação em paralelo são incluídas nessas classes, facilitando e aumentando a flexibilidade do programador. Tais ferramentas podem ser utilizadas em qualquer programa que execute operações sobre átomos e moléculas. Isto implica que elas não estão restritas ao magno, mas podem se manifestar em um projeto maior. Desta maneira foi iniciado o projeto OpenQMMM, onde estas ferramentas de software podem ser desenvolvidas em alto nível de código e organização, em colaboração aberta. A maior vantagem da "colaboração aberta" é a minimização do tempo de programação e detecção de falhas (bugs), já que diferentes programadores têm acesso ao mesmo código e desfrutam do trabalho em conjunto. O exemplo mais simples do sucesso desse tipo de abordagem é o sistema operacional linux. Há outras dezenas de projetos nesse mesmo princípio, entretanto não há nenhum projeto nacional nesta área (mecânica molecular e mecânica quântica). A pretensão principal após o término do doutorado é investir em tempo integral neste projeto, aprimorando os programas existentes e desenvolvendo novos programas. Na parte condizente à solvatação do fenol em etanol, simulações com modelo flexível e polarizável foram realizadas, e aprimoramentos no programa magno estão sendo feitas para a separação das configurações e sucessiva submissão destas ao cálculo quântico. Este trabalho será fundamental para explicar a origem do desvio solvatocrômico para o vermelho do fenol em etanol. A próxima etapa da simulação da água supercrítica é produzir a contagem das pontes de hidrogênio e tamanho dos agregados. Este resultado é fundamental na comparação com o modelo rígido SPC/E, largamente utilizado na literatura. Adicionalmente pretende-se realizar o cálculo da constante dielétrica e do espectro eletrônico para comparação de tais propriedades com resultados experimentais. 72 Pretende-se executar a simulação do fenol em água supercrítica com pelo menos 256 moléculas de água. Inicialmente pretendia-se realizar simulação clássica com modelo polarizável e flexível. Entretanto, dada a provável desprotonação do fenol (levando-o a fenoxi) em tais condições, é necessário realizar dinâmica ab initio. O programa escolhido para este fim é o CP2K, com DFT, funcional PBE e base mDZVP. Infelizmente, dado o alto custo computacional e a falta de máquinas, não há perspectiva para o início dessas simulações. Para se ter uma comparação realista do custo dos métodos utilizados neste trabalho, a simulação ab initio com 64 moléculas é aproximadamente 30 vezes mais lenta do que a realizada com o AMOEBA com 256 moléculas, e 600 vezes mais lenta que com o SPC/E, também com 256 moléculas. 73 Apêndice A: Realizações no Doutorado • Disciplinas obrigatórias o Mecânica Quântica II; o Teoria de Grupos e Simetrias em Física do Estado Sólido e Física Molecular. • Artigos publicados: o R.C. Barreto, K. Coutinho, H.C. Georg, S. Canuto, "Combined Monte Carlo and quantum mechanics study of the solvatochromism of phenol in water. The origin of the blue shift of the lowest pi-pi* transition", Phys. Chem. Chem. Phys. 11 (2009) 1388. o R.C. Barreto, S. Canuto, "Characterization and spectroscopy analysis of phenol-ethanol hydrogen bonded clusters", Chem. Phys. Lett. 496 (2010) 236 • Participação em eventos: o XIV Simpósio Brasileiro de Química Teórica (Poços de Caldas/MG 2007) com apresentação de pôster: "Espectro do Fenol em Água em Condições Normais e Supercríticas, incluindo polarização do soluto"; o II Escola de Computação de Alto Desempenho (São Carlos/SP 2007) com apresentação de pôster: "Montando um Sistema Integrado de Desktops"; o II Encontro Anual da Rede Theo-Nano (São Paulo/SP 2007) com apresentação oral: "Espectro do Fenol em Água"; o II Simpósio de Estrutura Eletrônica e Dinâmica Molecular (Brasília/DF 2008) com apresentação do pôster: "Análise do espectro eletrônico do fenol em água, separação de diferentes contribuições". • Estágio: o Estada de 4 meses (setembro a dezembro de 2008) dentro do programa CAPES/GRICES-FCT de cooperação com o grupo do Prof. Benedito José Costa Cabral na Universidade de Lisboa, Portugal, desenvolvendo conhecimentos de dinâmica molecular. • Conhecimentos acadêmicos extraordinários: 74 o Montagem, instalação, configuração e manutenção do cluster do Grupo Física Molecular e Modelagem. Parte deste trabalho pode ser encontrada em http://ac.if.usp.br/~barreto/cluster.htm o Criação e manutenção do projeto de software livre OpenQMMM, cujo objetivo primário é desenvolver e aprimorar ferramentas de software utilizadas nos trabalhos relacionados com simulação molecular e cálculo quântico. O objetivo secundário é criar um projeto sólido de colaboração open source entre desenvolvedores no país (algo inexistente até o momento). A página do projeto e informações podem ser encontradas em https://sourceforge.net/projects/openqmm. 75 Apêndice B: Mecânica Molecular - Líquidos Cada propriedade termodinâmica é obtida através da média desta sobre todas as configurações acessíveis ao sistema. Como as coordenadas moleculares variam continuamente, a soma torna-se uma integral, a qual deve ser efetuada sobre uma determinada região desse espaço de configurações. Cada ponto deste espaço representa uma diferente configuração de posição e velocidade de cada partícula. Isto implica em 6 coordenadas por partícula (x, y, z, vx, vy, vz) e portanto qualquer função relacionada a este espaço possui 6N variáveis (onde N é o número de partículas). O método numérico mais simples de integração consiste em dividir certo intervalo x em n porções de tamanho dx, e somar a função n vezes. Desta forma a integração numérica de uma função com 6N variáveis necessita, a princípio, da ordem de n6N operações para ser realizada. Considerando-se que um processador moderno realiza da ordem de 1010 operações por segundo, a integração numérica de um sistema com algumas dezenas de partículas é completamente impraticável. Uma das soluções mais inteligentes para se evitar a integração numérica sobre todo o espaço consiste em avaliar apenas uma ínfima, mas representativa, parte do ensemble. Mais precisamente, isso significa fazer uma amostragem. Pressupondo-se que se conheça a distribuição das configurações, poder-se-ia sorteá-las em quantidade suficiente para se obter o valor convergido da propriedade física que se tem interesse em calcular. Desta forma é utilizada a simulação computacional para gerar configurações segundo as condições de contorno e os vínculos que determinam o ensemble. Há duas maneiras de se realizar esta tarefa: determinista e estocástico. O determinista consiste em gerar uma configuração a partir de outra de maneira dinâmica; utilizando-se das forças de interação para atualizar as coordenadas do sistema, através de incrementos da variável temporal. Este método é conhecido por dinâmica molecular. O método estocástico consiste em produzir configurações por meios aleatórios, sorteando-as segundo a distribuição característica do ensemble. Este método de amostragem estocástica é conhecido como Monte Carlo. Monte Carlo O método de Monte Carlo (MC) consiste em sortear pontos do espaço das configurações. Cada ponto é representado por Γk = Γ{R,P}, onde k numera a configuração, R se refere ao conjunto de coordenadas de posição e P de momento, de 76 todas as partículas. O valor médio de uma função ƒ(R,P) é definido pela (3). Nesta, w(Γk) é a probabilidade de o sistema ser encontrado na configuração Γk, e M é o número total de pontos utilizados no cálculo da média [66]. M 〈ƒ(R,P)〉 = ∑ ƒ(R,P) w(Γk) k=1 M (3) ∑ w(Γk) k=1 Se todas as configurações sorteadas forem equiprováveis, w(Γk) = 1. Esse é o caso do ensemble microcanônico (NVE). Como a energia potencial é dependente das distâncias intermoleculares e a cinética pode assumir apenas valores positivos, apenas uma complicada e descontínua superfície do espaço das configurações é acessível neste ensemble. A alternativa direta é o uso do ensemble canônico, cujas condições de contorno são NVT. Desta forma o número de configurações acessíveis aumenta, já que a energia flutua em torno de um valor médio. O ensemble canônico é caracterizado pela distribuição de probabilidades w(Γk) = exp(–βEk), onde Ek é a energia da configuração Γk e β = 1/kbT (onde kb é a constante de Boltzmann e T é a temperatura). Com isto, utiliza-se o teorema da eqüipartição da energia, no qual cada coordenada quadrática na equação da energia (x2, y2, z2, px2, py2, pz2) produz uma contribuição de ½kbT para a energia interna do sistema. A energia cinética total é dada por (3/2)NkbT. Portanto para obter a energia total do sistema utilizando o método de MC no ensemble canônico basta sortear configurações de posição R e utilizá-las na (4), generalizandose este procedimento a qualquer propriedade estrutural. M ∑ Uk(R) exp(– β Uk(R)) 3 k=1 〈E〉 = 2 NkbT + M ∑ exp(– β Uk(R)) (4) k=1 Método de Metropolis O uso do ensemble canônico reduz a dificuldade de se sortear as configurações. Porém uma análise atenta da função energia potencial em um condensado mostra que esta pode aumentar algumas ordens de grandeza com pequenas diminuições das distâncias intermoleculares [67]. Tal constatação implica 77 que a maior parte do espaço das configurações possui peso estatístico quase nulo, como se as partículas tendessem a se localizar centradas em pequenas células individuais definidas pelo seu volume livre, υf* = ∫dυ exp(– β U(R)) [1]. Portanto sortear com a mesma probabilidade qualquer configuração Γ{R} ainda é um método muito ineficiente. Metropolis et al., em 1953, apresentou uma forma de contornar esta ineficiência [68]. Ao invés de escolher configurações aleatoriamente e depois executar uma média ponderada, faz-se um MC modificado, em que se escolhem as configurações Γ{R} segundo seu peso estatístico para então realizar uma média simples. Isto é feito com a ajuda de uma cadeia de Markov [69,70]. Nesta, uma configuração Γj é obtida a partir de outra Γk fazendo-se {xj = xk + αξk}, onde x contempla todas as 3N coordenadas de posição, α é o deslocamento máximo (arbitrário) na direção x, e ξ é um número aleatório entre –1 e 1. Feito isto, calcula-se a energia da nova configuração. Se ∆U = Uj – Uk ≤ 0, o movimento é aceito e a nova configuração é registrada. Se ∆U > 0, o movimento é aceito com probabilidade w(Γk → Γj) = exp(– β ∆U); ou seja, sorteia-se um número ξ entre 0 e 1; se ξ ≤ w(Γk → Γj), o movimento é aceito e a configuração Γj é registrada; se ξ > w(Γk → Γj), o movimento é rejeitado, registrando-se novamente a configuração Γk. As configurações obtidas com tal procedimento reproduzem a distribuição canônica, e qualquer propriedade 〈ƒ(R)〉 pode ser calculada através de uma média simples sobre o valor ƒk(R) referente a cada ponto Γk selecionado (5). 1 M 〈ƒ(R)〉 = M ∑ ƒk(R) k=1 (5) Para a utilização deste método no ensemble isotérmico-isobárico (NpT), devese incluir o termo relacionado ao trabalho mecânico (pV) associado à variação do volume. Como a soma sobre as coordenadas de posição R é vinculada ao volume V do sistema, o número de pontos acessíveis à variável R é proporcional ao hiper-volume VN do espaço das configurações. Para eliminar este vínculo, faz-se a transformação {xi = L qi}; onde L é proporcional à raiz cúbica do volume, de forma que dR = VN dQ, onde Q é a nova coordenada de posição adimensional, independente do volume do sistema. Como conseqüência o teste de Metropolis se modifica: se [∆U + p∆V – (N/β)ln(Vj/Vk)] ≤ 0, o movimento é aceito e a nova configuração é registrada; caso contrário, ele é aceito com probabilidade w(Γk → Γj) = exp[– β(∆U + p∆V) + N ln(Vj/Vk)]. 78 Dinâmica Molecular Outra forma de se amostrar o espaço das configurações de um líquido é através da evolução temporal do sistema. Isto é feito partindo-se de um conjunto inicial de posições e velocidades (Γ(t) = Γ{R,P}) e tendo em mãos uma expressão para a energia potencial do sistema (U(R)). Com isto é possível calcular as forças entre as partículas (F(r) = -∇ ∇rU(R)), e finalmente utilizar as leis de Newton para atualizar suas posições e velocidades, (Γ(t+δt)). Isso foi realizado pela primeira vez em 1956 por Alder e Wainwright [71], para estudar a transição de fase em um sistema de esferas rígidas. Em 1964, Rahman foi o primeiro a simular um líquido real (argônio) [72]. Os métodos de integração mais utilizados para resolver as equações de movimento e obter Γ(t+δt) a partir de Γ(t) são aqueles conhecidos por diferenças finitas [75]. Há dezenas de possíveis algoritmos que utilizam diferentes aproximações. A escolha do algoritmo depende de certos requisitos básicos. É desejável que o passo de integração (δt) seja o maior possível, de tal forma que se economize tempo de computação e que se produza o maior número possível de configurações descorrelacionadas (como será explicado nas próximas seções). É também desejável que o algoritmo seja o mais rápido (simples) possível ao mesmo tempo em que reproduza fielmente a trajetória clássica e satisfaça as leis de conservação. Desta forma, o algoritmo de integração pode variar com o sistema a ser simulado e o ensemble (as propriedades que se deseje manter constante). Em especial, os graus de liberdade moleculares afetam a escolha do método de integração. O passo de integração utilizado para atualizar os movimentos intermoleculares pode não ser (e comumente não é) adequado para os intramoleculares. Algoritmo de Integração Provavelmente o algoritmo de integração mais utilizado em dinâmica molecular seja o de Verlet [73]. Isto se deve apenas a sua simplicidade, rapidez e eficiência. Tal método parte da expansão de Taylor da posição em torno de t, avançado e atrasado por δt, r(t+δt) e r(t–δt) (6). r(t+δt) = r(t) + r'(t) δt + ½ r''(t) δt2 +… r(t–δt) = r(t) – r'(t) δt + ½ r''(t) δt2 –… (6) 79 Somando as expressões (6) e desprezando os termos de quarta ordem e superiores, é possível obter a posição r(t+δt) utilizando apenas a posição atual e a anterior, e a aceleração atual (7). Ao se subtrair as expressões (6) e desprezando os termos superiores a segunda ordem, obtém-se a velocidade r'(t) (8). r(t+δt) = 2 r(t) – r(t–δt) + r''(t) δt2 r'(t) = r(t+δt) – r(t–δt) 2 δt (7) (8) Desta forma, a integração da trajetória utilizando o algoritmo de Verlet produz um erro da ordem de δt4 para as posições e δt2 para as velocidades. Deve-se ressaltar que apenas o erro nas posições é cumulativo durante o processo de integração, e apenas esse erro afeta a qualidade da trajetória obtida em relação ao resultado exato. Considerando-se aqui como "resultado exato" aquele que seria obtido utilizando-se δt→0, e precisão computacional infinita. Outra característica notável do algoritmo de Verlet é que ele é centrado, isto é, r(t+δt) e r(t–δt) participam de maneira igual nas equações e podem ser invertidos. Isto faz do algoritmo reversível no tempo. Isto implica que ao utilizar forças conservativas, é garantida a conservação do momento linear [75]. Há dois algoritmos algebricamente equivalentes ao algoritmo de Verlet: leapfrog e Verlet velocidade. O algoritmo conhecido por leap-frog utiliza passos intermediários da velocidade, r'(t+δt/2) [75]. Ele pode ser compreendido a partir das expansões da posição em torno de t e t+δt (9). r(t+δt) = r(t) + r'(t) δt + ½ r''(t) δt2 +… r(t) = r(t+δt) – r'(t+δt) δt + ½ r''(t+δt) δt2 –… (9) Subtraindo as expressões (9), obtém-se a posição r(t+δt) (10). A velocidade no passo intermediário é dada pela aproximação r'(t+½δt) = ½ [ r'(t+δt) + r'(t) ], e o termo de segunda ordem é na verdade de terceira ordem, já que em primeira aproximação r'''(t+½δt) δt = [ r''(t+δt) – r''(t) ]. r(t+δt) = r(t) + ½ [ r'(t+δt) + r'(t) ] δt + – ¼ [ r''(t+δt) – r''(t) ] δt2 +… (10) Desprezando os termos superiores à segunda ordem da equação (10), e tomando sua derivada temporal (atrasado em meio passo de integração), obtêm-se as 80 expressões para o algoritmo leap-frog (11). O uso dessas expressões elimina parte do erro de truncamento presente em (7). r(t+δt) = r(t) + r'(t+½δt) δt r'(t+½δt) = r'(t–½δt) + r''(t) δt (11) O algoritmo mais moderno, chamado de Verlet velocidade, melhora a precisão da velocidade em relação aos algoritmos anteriores [75]. Dado por (12), a velocidade em t+δt é deduzida da mesma forma que a posição é obtida para o leap-frog, isto é, a velocidade é obtida com a derivada da expressão (10). r(t+δt) = r(t) + r'(t) δt + ½ r''(t) δt2 r'(t+δt) = r'(t) + ½ [ r''(t+δt) + r''(t) ] δt (12) Termostato e Barostato Uma vez que a técnica de dinâmica molecular evolui no tempo as posições das partículas em um dado volume, conservando assim o momento e a energia total do sistema, o ensemble natural deste tipo de simulação é NVE. Desta forma, para se simular em outros ensembles é necessária a utilização de termostatos e barostatos, para fixar a temperatura e a pressão. Isto é feito imaginando-se que o sistema está conectado a um reservatório. É possível também fixar o potencial químico, mas isso foge do escopo deste trabalho. Há muitas propostas de como acoplar o reservatório à caixa de simulação. Nenhuma delas é exata, e cada uma parte de conjuntos diferentes de princípios para justificar o acoplamento. Antes de apresentar as utilizadas neste trabalho, é necessário compreender como se calcula temperatura e pressão. Como ilustração, para um sistema atômico, a temperatura e pressão instantâneas são dadas respectivamente por (13) e (14), onde T = 〈T(t)〉, p = 〈P(t)〉 e V = 〈V(t)〉 [75]. O termo de virial W(t) é dado por (15), onde rij(t) é a distância interatômica, e u(rij) o respectivo potencial de interação. 1 N T(t) = 3N ∑ mi |r'i(t)|2 (13) P(t) = [ NkbT(t) + W(t) ] / V(t) (14) i N N W(t) = – ⅓ ∑ ∑ rij(t) · ∇u(rij) i j>i (15) 81 A idéia mais simples de termostato é multiplicar as velocidades por (T0/T(t))½ a cada passo da simulação, onde T0 é a temperatura do reservatório. A mesma idéia poderia ser aplicada para a pressão, mas para isso seria necessário um processo iterativo já que a variação do volume afeta o resultado do virial (15). De qualquer forma, tal mudança abrupta nas coordenadas a cada passo de simulação para manter fixa a temperatura e/ou pressão não é desejável. Isto perturbaria de forma artificial e imprevisível a dinâmica do sistema. A proposta mais simples para evitar essa abrupta descontinuidade é dada pelo termostato/barostato de Berendsen [74]. Para o termostato, considera-se que a cada passo de simulação o sistema esteja sujeito a um fluxo de temperatura instantânea dado por T'(t) = [ T0 - T(t) ] / τT, onde τT é uma constante de acoplamento maior que o passo de integração (τT > δt). Desta forma, a variação da temperatura pode ser realizada de maneira arbitrariamente suave. O efeito deste fluxo é transformar as velocidades: r'(t) → λ(t) r'(t), onde λ(t) é dado por (16). λ(t) = 2 T'(t) 1 + δt T(t) (16) Para o barostato de Berendsen, o fluxo de pressão instantânea tem a mesma forma, P'(t) = [ p0 - P(t) ] / τp. Entretanto, como não se sabe a priori como o termo de virial muda com o volume do sistema, utiliza-se uma aproximação relacionada com a compressibilidade isotérmica (17). Nesta, βT é um parâmetro característico do campo de força que está sendo utilizado. Com o auxílio de (17), o efeito da pressão externa sobre o sistema se manifesta na transformação das posições: r(t) → µ(t) r(t), sendo que µ(t) é dado por (18). V'(t) P'(t) = – β V(t) T (17) µ(t) = [ 1 – δt βT P'(t) ]⅓ (18) Não há garantia de que o termostato/barostato de Berendsen reproduza corretamente o ensemble canônico ou o das pressões [75]. Os valores de τT e τp devem ser os maiores possíveis para perturbar o mínimo possível a dinâmica do sistema. Em especial, o barostato de Berendsen produz resultados equivocados à medida que o valor de βT diferencia da verdadeira compressibilidade isotérmica do sistema em estudo. Entretanto, tomando as devidas precauções, o termostato/barostato de 82 Berendsen é bastante eficiente, e dada a sua simplicidade, justifica-se o fato de ser amplamente utilizado. Correlação Estatística O método de Monte Carlo Metropolis (MCM) e o de Dinâmica Molecular possuem o inconveniente de produzir configurações correlacionadas. Configurações correlacionadas fornecem pouca, quando nenhuma, informação sobre o ensemble. Isto se deve ao fato que tais configurações estão muito próximas no espaço das configurações acessíveis ao sistema, o qual se quer amostrar. A correlação entre duas configurações separadas por um grande número de passos é pequena, e diminui cada vez mais à medida que o número de passos aumenta. O intervalo de passos necessário para obter a descorrelação estatística é conhecido através da função de autocorrelação [75]. A função de correlação entre dois conjuntos ordenados, {xj} e {yj}, é definida pela (19). Nesta, ∆x = xj – 〈x〉 é o desvio da média, enquanto que σx = 〈∆x2〉½ é o desvio padrão. Se ∆x = ∆y, para todo j, então C(x,y) = 1; caso contrário -1 < C(x,y) < 1. Quanto mais próximo de zero, é dito que mais descorrelacionados são os conjuntos x e y. 〈∆x∆y〉 C(x,y) = σ σ x y (19) A função de autocorrelação da energia é obtida se fazendo xj = Uj e yj = Uj+k, de forma que C(x,y) = C(k); onde k é um determinado número de passos. Portanto C(k) fornece a correlação da energia entre configurações separadas por k passos. Nos sistemas utilizados neste trabalho, o intervalo típico de descorrelação (definido como C(k) < 15%) para um líquido a pressão e temperatura normais é da ordem de 103 passos. Tomando K como o número de configurações descorrelacionadas obtidas, o erro estatístico associado à média de uma propriedade ƒ(R) é igual a σƒ/K½, onde σƒ é o desvio padrão da distribuição da propriedade. O erro estatístico, também chamado de erro padrão, está associado com o tamanho da amostragem (distribuição) e fornece a incerteza sobre uma medida. 83 Apêndice C: Mecânica Quântica - Métodos Aproximativos Em 1926, Erwin Schrödinger demonstrou que a quantização poderia ser compreendida como um problema de autovalores, e forneceu a solução analítica (não relativística) para o espectro do átomo de hidrogênio utilizando o formalismo hamiltoniano [76], reconhecendo-o como um problema de autovalores Ĥψ(r) = Eψ(r). A equação de Schrödinger para uma partícula é dada por (20); onde ψ(r) é a função de onda associada a uma partícula de massa m sujeita a um potencial U(r), com energia E. Esta é convenientemente escrita como. ħ2 2 – 2m ∇ ψ(r) + U(r) ψ(r) = E ψ(r) (20) ⌠dr ⌡ ψ*(r)ψ(r) = 1 (21) No mesmo ano, Max Born postulou que a probabilidade de encontrar a partícula entre r e r + dr descrita pela função de onda ψ(r), é w(r) = ψ*(r)ψ(r) [77], onde ψ*(r) é o conjugado complexo de ψ(r), em analogia à chance de encontrar o fóton em uma onda eletromagnética. Portanto, o valor médio de qualquer observável A representado pelo operador  pode ser obtida segundo a (22), notando que r^ = r e p^ = – iħ∇ ∇. A integral da (22) convenientemente escrita como 〈A〉 = 〈ψ|Â|ψ〉. 〈A〉 = ⌠dr ⌡ ψ*(r)Âψ(r) (22) "As leis fundamentais necessárias para o tratamento matemático de grande parte da física e de toda a química estão plenamente conhecidas, e a dificuldade reside apenas no fato de que a aplicação dessas leis leva a equações que são muito complexas para serem resolvidas" [78]. Os problemas envolvendo muitos corpos costumam recair em um conjunto de equações acopladas cuja solução analítica não se conhece. A solução do problema de vários corpos interagentes, tanto em mecânica clássica quanto em mecânica quântica, pode ser obtida com métodos de integração numérica [79]. Dado que o custo destes métodos cresce muito rapidamente com o número de partículas, tal procedimento é impraticável. Uma alternativa viável para a solução do problema de vários corpos se encontra nos métodos aproximativos. Isto é feito alterando-se a forma da interação, U(r) → U'(r), ou equivalentemente, o tipo de solução Ψ(r) → Ψ'(r). Sendo que estas alterações podem ter origem empírica 84 (utilizando ajustes experimentais), teórica (desprezando termos pouco influentes) ou híbrida. As aproximações são aplicadas de acordo com o sistema, as propriedades que se queira estudar, e o erro que elas acarretam. Aproximação de Born-Oppenheimer Uma aproximação comumente utilizada é a de Born-Oppenheimer [80], em que é feita a separação das funções de onda nuclear e eletrônica. Parte-se do princípio de que a energia cinética nuclear pode ser tratada como uma pequena perturbação sobre o movimento eletrônico. Toma-se a partição: Ĥ = Ĥ0(R̂e,R̂n,P̂e) + V̂(P̂n), onde n e e se referem respectivamente aos núcleos e elétrons, R̂ e P̂ aos operadores de posição e momento. O sistema não perturbado Ĥ0 ψσ(Re;Rn) = εσ(Rn) ψσ(Re;Rn) é a solução da parte eletrônica e depende parametricamente das posições nucleares (Rn). Expande-se então a solução exata em termos dessas autofunções (23). Ψ(Re,Rn) = ∑ χσ(Rn) ψσ(Re;Rn) σ (23) Integrando-se Ĥ Ψ(Re,Rn) = E Ψ(Re,Rn) apenas nas coordenadas eletrônicas, obtém-se um conjunto de equações acopladas que pode ser escrito na forma matricial: [ Hn(Rn) + He(Rn) ] χ(Rn) = E χ(Rn). Sendo (Hn(Rn))νσ = 〈ψν|V̂(Pn)|ψσ〉 e (He)νσ = εσ(Rn)δνσ. A aproximação toma apenas os termos diagonais de Hn(Rn), e portanto também implica na aproximação adiabática, ou seja, o movimento nuclear não altera o estado eletrônico. Os termos não diagonais de Hn(Rn) são chamados de acoplamento vibrônico e estão além da aproximação de Born-Oppenheimer. Hartree e Hartree-Fock Uma das primeiras abordagens para encontrar a função de onda eletrônica foi desenvolvida em 1928 por Douglas Hartree [81,82]. Nesta aproximação imagina-se que cada elétron se move no campo médio de todos os outros. Isto implica que o potencial inter-eletrônico pode ser escrito como uma soma de potenciais de um elétron, U'e(Re) = ∑ u(i). A função multi-eletrônica ψσ(Re;Rn) é então escrita como um único produto de funções de um elétron (produto de Hartree), ψ'σ(Re;Rn) = ∏ φi(i). O índice subscrito i caracteriza o orbital de cada elétron i (na posição ri). Em 1929, John Clark Slater reconheceu a necessidade de escrever o produto de Hartree ψ'σ(Re;Rn) como um determinante |[φn(i)]|. Ele propôs também que a função 85 de spin deveria ser incluída no orbital φn(i), obtendo notável sucesso em prever o espectro de diversos átomos [83]. A fundamentação teórica das equações foi obtida de maneira independente por Vladimir Fock, em 1930 [84], e historicamente o método passou a ser chamado de Hartree-Fock (HF). O operador de Fock F̂(i) é a soma da energia cinética e do potencial médio sobre o elétron i. Ao atuar sobre o orbital φn(i) fornece o autovalor εn: F̂(i) φn(i) = εn φn(i). Combinação Linear de Orbitais Atômicos (LCAO) e as funções base A maneira comumente usada para escrever os orbitais moleculares φn(i) em é através de uma combinação de orbitais localizados nos átomos {αk}. A idéia de combinar orbitais atômicos para descrever orbitais moleculares é anterior ao seu uso em HF [85,86,87]. De um modo geral, o método LCAO escreve φ'n(i) = ∑ cknαk com uma base fixa de orbitais atômicos αk. Em 1932, Slater propôs uma forma analítica simples para descrever o spin-orbital de sistemas atômicos, φ'n(i) = ∑ crbexp(-ar), onde c, b e a variam em cada termo [88]. Em 1950, Samuel Boys demonstrou que se fosse escolhida uma base de gaussianas, as integrais poderiam ser analiticamente resolvidas [89]. Em 1951, independentemente, Clemens Roothaan [90] e George Hall [91] formalizaram o método HF via LCAO para obtenção de orbitais moleculares. Estas equações são escritas em forma matricial (F – ε'nS)cn = 0; nesta, F é a matriz de Fock (Fmn = 〈φm(i)|F̂(i)|φn(i)〉), S é a matriz de sobreposição (Smn = 〈φm(i)|φn(i)〉), cn é o vetor dos coeficientes das funções base, e ε'n são as raízes, cujo número é igual ao número de funções base utilizadas. O uso de funções base para descrever os orbitais moleculares introduz o erro de base finita, já que é impossível tratar um conjunto infinito de funções base computacionalmente. Portanto, de acordo com o princípio variacional, a energia do orbital LCAO é maior ou igual à energia exata do orbital de Fock, εn ≤ ε'n. Teoria do Funcional da Densidade (DFT) Em 1964, Pierre Hohenberg e Walter Kohn [92] propuseram dois teoremas que estabeleceram a idéia de que a energia do sistema quântico está conectada biunivocamente com a densidade eletrônica (24). O primeiro teorema: "O potencial externo V(Re) é um funcional único de ρ(r)" estabelece que a energia do estado 86 fundamental também seja um funcional único da densidade. O segundo teorema é uma extensão do método variacional para a densidade. Portanto, basta conhecer a forma funcional exata da energia E[ρ] para encontrar a energia do estado fundamental de um sistema quântico. Desta forma: E[ρ] = T[ρ] + U[ρ] + V[ρ], onde T[ρ] é a energia cinética eletrônica, U[ρ] é o potencial inter-eletrônico e V[ρ] é o potencial dos elétrons com os núcleos. Apenas este último termo possui expressão analítica: V[ρ] = ∫dr V(r) ρ(r). A principal vantagem deste modelo é que substitui uma complicada função de 3N coordenadas ψ(Re;Rn), pela densidade eletrônica que depende apenas de 3. N ∏ ⌠ 3 ρ(r1) = N ⌡drk |ψ(Re;Rn)|2 k=2 V (24) Em 1965, Walter Kohn e Lu Jeu Sham [93] propuseram uma maneira autoconsistente de calcular E[ρ]. É utilizado um sistema fictício de "elétrons não interagentes" sujeitos a um potencial externo Vs[ρ], cuja densidade eletrônica é por definição a mesma densidade do sistema real. A energia do sistema de Kohn-Sham (KS) é obtida via uma função de onda auxiliar ψs(Re) e recai em equações de uma partícula análogas ao método de HF. Desta forma: Es[ρ] = Ts[ρ] + Vs[ρ], onde Ts[ρ] é a energia cinética do sistema fictício. O potencial Vs[ρ] é escrito como a soma de 3 termos: Vs[ρ] = V[ρ] + VH[ρ] + VXC[ρ], onde VH[ρ] é o potencial de Hartree (autointeração coulombiana da densidade eletrônica) e VXC[ρ] é o potencial de troca e correlação, e carrega todos os efeitos quânticos do sistema de muitas partículas. O método mais utilizado para VXC[ρ] é conhecido por "Aproximação de Densidade Local" (LDA). Nesta, VXC[ρ] depende apenas da densidade no ponto em que é calculada: VXC-LDA[ρ] = ∫dr εXC(ρ) ρ(r). Outra abordagem utilizada, que também é local, é a "Aproximação do Gradiente Generalizado" (GGA). Nesta considera-se o gradiente da densidade: VXC-GGA[ρ] = ∫dr εXC(ρ,∇ ∇ρ) ρ(r). Por fim, é muito utilizado em sistemas moleculares potenciais híbridos que incluem parte da energia de troca exata obtida da teoria de HF. Post-HF e a correlação eletrônica A aproximação de HF transforma um problema de N elétrons em N problemas de um elétron, ao custo de perder a correlação do movimento eletrônico; cada elétron está sujeito apenas ao campo médio produzido por todos os outros. Por esse motivo, a 87 diferença entre a energia eletrônica exata e a energia obtida com o método de HartreeFock é chamada de correlação eletrônica [94]. O método DFT-KS inclui parte da energia de correlação de maneira ad hoc. Há dezenas de propostas para o funcional de troca e correlação. Entretanto nenhum deles é exato ou pode ser sistematicamente melhorado em direção ao resultado exato. Felizmente é possível utilizar a função de onda HF como base para métodos que fornecem a solução exata. Tais métodos são conhecidos por post-HF. Método de interação de configurações (CI) O CI possui a mesma metodologia do método variacional utilizado para resolver as equações de Roothaan. Escreve-se a função de N elétrons como uma expansão de produtos anti-simétricos (25). O primeiro termo é a solução de HF, com os orbitais de mais baixa energia ocupados; o segundo termo conta sobre todas as excitações simples (isto é, um orbital ocupado n é trocado por um orbital virtual ν); o terceiro termo conta sobre todas as excitações duplas (dois orbitais n e m são trocados por orbitais virtuais ν e µ); e assim sucessivamente. Quando apenas o primeiro termo da série é computado, o método é chamado de CIS; quando o primeiro e o segundo são contados, CISD; e assim sucessivamente; quando todos os termos possíveis são incluídos, o método é chamado de Full-CI. O método CI é comumente utilizado para obter os estados excitados da função eletrônica molecular ψσ(Re;Rn). ν ν νµ νµ (25) ψσ(Re;Rn) = A0,σ|[φ]|0 + ∑ An,σ|[φ]|n + ∑ Anm,σ|[φ]|nm … Truncar (25) no segundo termo (CIS) não melhora o resultado para o estado ν fundamental. Este resultado é conhecido por teorema de Brillouin, 〈|[φ]|n|Ĥ||[φ]|0〉 = 0 [95]. Møller-Plesset de ordem 2 (MP2) Em 1934, Christian Møller e Milton Plesset aplicaram a teoria de perturbação de Rayleigh-Schrödinger utilizando uma soma de operadores de Fock como hamiltoniano não-perturbado [96], Ĥ(0) = ∑ F̂(i). A perturbação é a diferença entre o potencial exato e o potencial de uma partícula, V̂ = Ue – ∑ û(i). As funções de onda do problema não perturbado são os determinantes construídos com os orbitais de (0) ν… (0) Fock, ψ σ (Re;Rn) = |[φ]|n…, cuja energia é a soma dos autovalores, E σ = ∑ εn. A 88 (1) (0) (0) (1) (0) correção de primeira ordem para a energia (E σ = 〈ψ σ |V̂|ψ σ 〉) do estado fundamental recupera a energia de HF, ou seja, EHF = E σ + E σ (σ = 0). Conseqüentemente a correlação eletrônica é obtida a partir da correção de segunda ordem chamada de (2) (0) (1) (0) MP2: E 0 = 〈ψ 0 |V̂|ψ 0 〉. Nestas equações ψ 0 é a função de onda de HF, ou seja, |[φ]|0. A correção de primeira ordem para a função de onda (26) é então escrita (0) utilizando-se configurações ψ τ , que nada mais são do que substituições simples, (0) ν… duplas, triplas, etc., em relação à solução de HF: ψ τ = |[φ]|n…. Desta forma, apenas as substituições duplas sobrevivem em MP2, de tal forma que a correção de segunda ordem é dada em termos de orbitais de uma partícula por (27). (0) ∞ (0) 〈ψ τ |V̂|ψ 0 〉 (0) (0) τ≠0 (E 0 – E τ ) ∞ |〈nm|V̂|νµ〉 – 〈nm|V̂|µν〉|2 (2) E0 = ∑ (εn + εm – εν – εµ) n<m,ν<µ (1) |ψ 0 〉 (0) = ∑ |ψ τ 〉 (26) (27) CIS(D) MP2 é um método eficiente para incluir correlação eletrônica sobre o estado fundamental. CIS por usa vez não altera o estado fundamental, mas é o método mais simples de se obter os estados excitados. Existem técnicas híbridas capazes de incluir as correções perturbativas de MP2 sobre os estados de referência CIS [97,98]. Neste trabalho foi utilizado o CIS(D) por ser um método extensivo [95] e por ter um custo computacional igual a N5 (similar a MP2). CIS(D) é a segunda ordem da expansão perturbativa do método de coupled-cluster para estados excitados (não apresentado aqui), restrito a substituições simples e duplas, onde o termo de ordem zero é a função CIS e o termo de primeira ordem se anula [98]. Formalmente a correção CIS(D) é (0) (0) (0) (0) escrita como: ECIS(D) = 〈ψ σ |V̂|Û2ψ σ 〉 + 〈ψ σ |V̂|T̂2Û1ψ σ 〉, onde Û1 e Û2 produzem substituições simples e duplas de acordo com CI (isto é, coeficientes determinados pelo método variacional), enquanto que T̂2 produz substituições duplas de acordo com MP2 (isto é, coeficientes determinados pelo método perturbativo). Sendo que nesta (2) (0) (0) representação, a correção MP2 é E 0 = 〈ψ 0 |V̂|T̂2ψ 0 〉 enquanto que a função de onda (0) CIS é dada por |ψCIS〉 = |Û1ψ 0 〉. 89 Apêndice D: Campos de Força Mesmo conhecendo a natureza quântica da matéria e os principais métodos de solução do problema de muitos corpos, não é um processo trivial descrever um sistema com centenas de moléculas (milhares de elétrons). O custo para se calcular a energia de um sistema com muitas moléculas através de métodos quânticos é excessivamente elevado. É necessário simplificar as interações moleculares o máximo possível sem entretanto obscurecer sua conexão com a formulação quântica original. Expansão multipolar A princípio, uma molécula pode ser descrita como uma distribuição de cargas. O potencial de interação de duas distribuições (a e b) de cargas pontuais fixas é dado pela (28); onde qi é o valor de cada carga em a e qj em b; rij = |(ri + ra) – (rj + rb)| é a distância entre as cargas i e j; ra é a posição do centro das cargas i, e rb das cargas j. Escrevendo rab = rb – ra, tomando rab > ri e rab > rj é possível utilizar (29) e expandir (28) na forma (30). Tal expansão é conhecida como expansão multipolar [99]. qiqj U(r) = ∑ ∑ r i j ij (28) ∞ ∞ n m 1 1 (· ri)n(· rj)m ∑ ∑ ∇ i ∇ j = rij n = 0 m = 0 rij ri = rj = 0 n!m! (29) µb · µa qaqb µbqa – µaqb U(r) = r + · rab + + 3 3 rab rab ab Θbqa – 3µaµb + Θaqb 2 + 5 (· rab) + … r ab (30) qa = ∑ qi i µa = ∑ qiri i (31) 1 3 Θa = ∑ qi 2 riri – 2 1 i Termo de Coulomb Um método aproximado de representar a distribuição de cargas em uma molécula é utilizar um termo na forma (32), em que se escolhe um número reduzido de sítios de carga. Esse potencial é definido como a soma de todas as interações coulombianas entre os sítios de carga qi de uma molécula A e os sítios de carga qj de 90 uma molécula B. Os valores das cargas e a posição desses sítios são ajustados a fim de reproduzir o efeito médio da expansão multipolar (30). qiqj (UC)ij = r ij (32) Os efeitos de polarização instantânea devido às mudanças dinâmicas da vizinhança molecular podem ser incluídos de forma média ou como cargas flutuantes. O termo de Coulomb não contempla os efeitos quânticos de troca e correlação, de tal forma que estes são incluídos através de termos ligados às interações de van der Waals. Equação de van der Waals Em 1873, Johannes van der Waals deduziu uma equação de estado que descreve de maneira continua o estado líquido e o gasoso [100]. A equação de van der Waals (33) é uma modificação da equação de estado do gás ideal (pV = NkbT), incluindo-se o volume das moléculas (υ → υ – b) e a força de coesão (p → p + a/υ2). Os parâmetros a e b são conhecidos como constantes de van der Waals e seus valores são obtidos experimentalmente para cada substância, dentro de determinados intervalos de temperatura e pressão. a p + υ2(υ – b) = kbT (33) Em 1902, Kamerlingh Onnes [101] expressou os resultados de suas observações sobre diversos gases na forma da equação de estado empírica (34). Os coeficientes A … F foram chamados por Onnes de coeficientes de virial, sendo função da temperatura, e podendo ser relacionados às constantes de van der Waals: A = kbT e B = bkbT – a. B C D E F pυ = A + υ + υ2 + υ4 + υ6 + υ8 (34) É possível calcular o segundo virial (B) teoricamente, em sistemas cujas moléculas possam ser descritas por um potencial de pares esfericamente simétrico do tipo u(rij) [101]. Nesta expressão, (35), β = 1/kbT. 91 2π ∞ 2 B= β ⌠ ⌡dr r {1 – exp[-β u(r)]} 0 (35) Termo de Lennard-Jones Em 1924, Lennard-Jones procurou ajustar o potencial u(r) segundo o potencial empírico intermolecular (36), partindo de resultados experimentais para B. Ele estudou quais expoentes (n e m) poderiam ser utilizados para descrever sistemas reais, ao mesmo tempo procurando os melhores parâmetros que se ajustassem ao argônio [101]. Nesta equação, o termo com λn é repulsivo e o termo com λm é atrativo. Lennard-Jones não obteve resultados conclusivos, a não ser a constatação teórica que n > m ≥ 4. λn λm u(r) = rn – rm (36) Em 1927, S. C. Wang utilizando teoria de perturbação de segunda ordem mostrou que a interação entre dois átomos de hidrogênio contém um termo atrativo proporcional a 1/r6 [102,103]. No mesmo ano, Heitler e London utilizando teoria de perturbação de primeira ordem mostraram que a força repulsiva entre átomos com camadas fechadas aumenta rapidamente na medida em que a distância diminui [85]. Em 1928, Slater interpretou esta força repulsiva como um efeito de interferência, tornando-se apreciável com a interpolação das funções de onda atômicas; e portanto, caindo exponencialmente com a distância [102]. Partindo do método de Heitler e London, e dos resultados de Wang para o hidrogênio, Slater obteve uma forma analítica (em primeira aproximação) para a interação entre dois átomos de hélio (37). Nesta equação, r é dado em unidades de raio de Bohr (a0) e a energia em 10-15 J. O segundo coeficiente virial (35) calculado com o potencial (37) está em excelente acordo com a experiência [104]. 0.67 u(r) = 7.7 exp(-2.43 r) – r6 (37) Em 1930, London obteve a correlação entre as polarizabilidades e o potencial atrativo entre duas moléculas [105,106], confirmando a forma obtida por Wang para dois átomos de hidrogênio. 92 De um modo geral, a parte atrativa da interação de van der Waals pode ser escrita como a soma de três termos. Considerando duas moléculas, A e B, o termo 2 2 orientacional de Keeson, (2µAµB/3kbT)/r6, é obtido via uma média orientacional do potencial dipolar, u(r) = - µA·µB/r3. A interação de Debye relaciona o momento de 2 2 dipolo permanente de uma molécula com a polarizabilidade da outra, ~ (µAαB + µB αA)/r6. O termo de dispersão de London pode ser escrito (aproximadamente) como o produto das polarizabilidades. Ambos são derivados da correção de segunda ordem da teoria da perturbação. Em 1931, Lennard-Jones corrigiu sua equação empírica (36), assumindo a origem quântica para o termo atrativo de van der Waals 1/r6 [67]. Estudou alguns expoentes da parte repulsiva, chegando na elegante forma (38). Nesta, (ULJ)ij é o potencial entre os sítios i e j da molécula; onde εij e σij são computados na forma εij = (εiεj)½ e σij = (σiσj)½. σij12 σij6 (ULJ)ij = 4εij r – r ij ij 10ε (38) Potencial Lennard-Jones 12 6 ULJ(r) = 4ε [(σ/r ) - (σ/r ) ] 8ε Potencial utilizado por Slater para o Hélio 5 6 USlt(r) = 3.7ε [1.7*10 exp(-12.0*r /σ) - (σ/r ) ] Potencial 6ε 4ε 2ε σ 0ε ε -2ε 0.8σ 1.0σ 1.2σ 1.4σ 1.6σ 1.8σ 2.0σ 2.2σ 2.4σ Distância Figura 37: Representação do potencial de Lennard-Jones. O parâmetro σ representa o ponto em que o potencial é zero, ULJ(σ) = 0, enquanto que o parâmetro ε fornece a profundidade do poço, como visto na Figura 37. 93 O potencial utilizado por Slater para o Hélio (37) obtido via teoria de perturbação, possui εi = 1.77 (kcal/mol) e σi = 2.62 (Å), e se ajusta muito bem à curva fornecida por ULJ na região do mínimo. Para átomos, o potencial de Lennard-Jones é o termo mais importante do potencial. Para moléculas que a núvem eletrônica não possui simetria esférica, os termos eletrostáticos devem ser considerados. Isto é feito através do potencial de Coulomb (32). Os termos da expansão multipolar (30) podem ser atrativos ou repulsivos, dependendo da orientação relativa do par de moléculas, e portanto definem a orientação relativa das moléculas em um líquido. Enquanto que o potencial Lennard-Jones é sempre repulsivo para rij < 21/6σij e atrativo rij > 21/6σij, e definem como e o quanto estas moléculas se empacotam. Método Seqüencial Monte Carlo/Mecânica Quântica (S-MC/MQ) A idéia do método S-MC/MQ é bastante simples [107]. Utiliza-se potenciais do tipo Coulomb e Lennard-Jones para realizar a simulação do líquido e gerar as estruturas. Usualmente são realizadas simulações da ordem de 100 mil passos de MCM ou Dinâmica Molecular (com intervalo de tempo de 1fs), para temperatura ambiente. Através da função de autocorrelação da energia, separa-se um número reduzido de configurações estatisticamente descorrelacionadas. Através da função de distribuição radial [75], determina-se a quantidade de moléculas em cada uma das camadas de solvatação em torno da molécula referência. Sobre essas configurações selecionadas, são realizados cálculos quânticos. As propriedades calculadas levam em consideração a convergência tanto com o número de partículas quanto com o número de configurações. Este protocolo tem sido usado com sucesso nos últimos anos para o estudo de diversos sistemas [108]. O potencial de pares utilizado nas simulações clássicas é normalmente ajustado para reproduzir as propriedades experimentais de fluido. Como não se conhece previamente o momento de dipolo da molécula em fase líquida, os efeitos de polarização induzida normalmente são incluídos implicitamente. Assim o momento de dipolo é majorado de 10% a 20% em relação ao seu valor em fase gasosa [109], e em seguida são ajustados os parâmetros Lennard-Jones. Porém moléculas em diferentes ambientes sofrem polarizações distintas. Estudar moléculas solvatadas em diferentes solventes, utilizando-se o mesmo conjunto de cargas pode resultar em resultados errôneos. O método S-MC/MQ pode ser utilizado iterativamente a fim de se evitar 94 esse problema e polarizar adequadamente a molécula de interesse de acordo com o solvente utilizado na simulação [110]. A polarização do soluto é feita partindo-se de cargas iniciais não polarizadas (fase gasosa) ou pré-polarizadas, e executando-se normalmente a simulação. As estruturas selecionadas (com solvente descrito por cargas pontuais) são utilizadas para recalcular as cargas nos sítios atômicos do soluto. Então este soluto é novamente levado a simulação e o processo é repetido até que as propriedades ligadas à polarização (como o momento de dipolo) convirjam. Este método foi utilizado no estudo de fenol em água apresentado neste trabalho [12]. Modelos polarizáveis Em 1981, Thole propôs uma maneira eficiente de se calcular a polarização molecular na vizinhança de cargas [111]. O método consiste em tratar cada átomo como um dipolo difuso (i.e., não pontual). Uma vez conhecida a polarizabilidade em cada átomo, seria possível calcular a polarização em um desses centros sujeito à distribuição de cargas externas. Tal procedimento é autoconsistente, e leva em consideração o efeito mutuo que as moléculas polarizadas causam umas sobre as outras. Em seguida, Stone propôs um protocolo para obter a distribuição as cargas e polarizabilidades sobre os sítios atômicos, a partir de cálculos de primeiros princípios [112]. Uma vez conhecidas as distribuições de carga e polarizabilidades as quais reproduzissem com precisão os momentos de multipólo quânticos, restaria apenas incluir as interações de van der Waals no cálculo da energia total. Existem alguns modelos que se utilizam dessa idéia de polarização de Thole [113,114]. O modelo utilizado neste trabalho é o AMOEBA [51], através do programa TINKER [50]. 95 Apêndice E: Aspectos Técnicos da Física Computacional O computador é uma máquina idealizada por matemáticos e realizada por físicos em meados da década de 1940 [115,116]. Desde então, se tornou uma ferramenta essencial para aplicação e teste de teorias cuja abordagem analítica é inviável. No princípio os físicos dominavam-na completamente, e eram capazes de criar programas específicos escritos diretamente em linguagem de máquina. Entretanto o computador evoluiu, tornou-se um produto e se popularizou. Ele deixou de ser uma ferramenta exclusiva de uso científico, para se tornar um equipamento eletrônico de múltiplas funcionalidades (tais como multimídia e internet). E à medida que a complexidade dos computadores aumentava, os físicos deixavam de lado os detalhes de seu funcionamento. O conhecimento do hardware foi delegado a engenheiros da computação, de software a cientistas da computação, e a operação em si foi delegada aos técnicos de informática e analistas de sistemas. Essa partição de funções era inevitável dada a abrangência de conhecimentos e técnicas que surgiram à medida que o computador se desenvolveu. Entretanto ignorar completamente o funcionamento desta ferramenta implica em seu uso ineficiente. Saber como aperfeiçoar um programa, e operar eficientemente e saber os limites da máquina implica em mais resultados, mais hipóteses, mais verificações, e conseqüentemente maior produção científica. Este apêndice propõe uma mudança de paradigma. O objetivo deste apêndice não é transformar a ferramenta em objeto de estudo, mas mostrar que o conhecimento desta é vital para o físico que a utiliza. E também chamar a atenção que a ignorância sobre ela pode trazer prejuízos e atrasos. Física computacional e o Computador Formalmente física computacional é uma área de pesquisa multidisciplinar que investiga problemas que fazem parte, ao mesmo tempo, da física e da ciência da computação. A ciência da computação estuda os algoritmos (seqüência de instruções), suas aplicações, formalizações matemáticas e suas implementações. Os fundamentos da ciência da computação e as "ferramentas de computação" surgiram muito antes do computador moderno, e pode-se dizer que nasceram juntamente com a matemática. Entretanto a definição formal de algoritmo e computador foi estabelecida apenas no começo do século XX [115]. Mas foi apenas com a segunda guerra mundial e a 96 necessidade de quebrar códigos de guerra que o desenvolvimento do computador se acelerou [116]. John Von Neumann e colaboradores desenvolveram as bases do computador moderno. Publicado em um trabalho de 1945 [117], tal design passou a ser conhecido por "arquitetura de von Neumann". Ele se caracteriza primariamente por guardar o programa a ser executado junto com os dados na memória física do computador. Pode-se afirmar que o uso da simulação computacional para resolver problemas físicos também se estabeleceu neste período. A solução do problema da fissão nuclear por amostragem estatística via simulação computacional foi sugerida em 1946 pelo matemático Stanislaw Ulam, que era do grupo de pesquisa de von Neumann [118]. (Nascia assim o método de Monte Carlo.) Hardware Por mais de uma década a computação científica ficou restrita a grandes instituições de pesquisa capazes de comprar ou produzir, e manter seus computadores. Eles eram caros, gigantes e consumiam muita energia. O surgimento dos semicondutores na década de 1950 possibilitou a substituição das válvulas pelos transistores. Na década de 1960, os computadores já eram menores, mais rápidos, mais confiáveis, com menor necessidade de consumo e mais baratos de se produzir. Em 1965, Gordon Moore (co-fundador da Intel) publicou um trabalho mostrando que o número de transistores dobrara a cada ano desde o surgimento dos circuitos integrados em 1958 [119]. Posteriormente a projeção foi corrigida para dois anos, e se manteve desde então. Na década de 1970, eram comuns circuitos integrados e microprocessadores, diminuindo ainda mais os custos de produção de computadores. Na década de 1980, surgiram os computadores pessoais, popularizando seu uso em casa (desktops). Os computadores pessoais se desenvolveram rapidamente, mas fazer computação científica ainda era restrito aos mainframes dos grandes centros de pesquisa até a década de 1990. Em 1994, surgiu o Beowulf, o primeiro cluster computacional formado de desktops configurado para fazer computação científica através de processamento distribuído [120]. A partir de 2000, com a popularização dos processadores de múltiplos núcleos, o conceito de processamento distribuído passou a ser dominante. Em diversos centros de pesquisa, clusters de baixo custo rapidamente substituíram caríssimos mainframes que se tornavam obsoletos. Entretanto, desde 2007 um novo paradigma vem se estabelecendo com o uso das unidades de processamento gráfico (GPU) para execução massiva de cálculos em 97 paralelo. As GPUs não se comportam como a arquitetura de von Neumann, sendo capazes de fazer centenas de operações simultâneas (enquanto que a CPU faz apenas uma operação por vez). Hoje é comum encontrar clusters híbridos, que utilizam ao mesmo tempo servidores de alta capacidade e desktops de baixo custo, ambos equipados com placas gráficas prontas para serem utilizadas por programas de investigação científica. Entretanto montar tais clusters não é uma tarefa trivial, já que isto demanda conhecimentos técnicos (de hardware e software) e noções mercadológicas (isto é, saber o valor real do hardware que se está negociando). Considerando a lei de Moore como válida, a cada dois anos os computadores dobram de capacidade. Isso implica que um computador comprado há dois anos vale agora metade do que foi pago. Com um ano de idade o computador cai a 70% do seu valor. Desta forma é vital que ao efetuar uma compra, o grupo de pesquisa coloque a máquina em funcionamento o mais rápido possível. É comum ver grupos de pesquisa gastando mais dinheiro que o necessário, e por fim obtendo menos recursos computacionais. O atraso causado pela burocracia ou pela ineficiência das pessoas encarregadas de realizar a instalação e configuração normalmente são as causas desse prejuízo. Outra consideração crucial relaciona qualidade/quantidade/preço. Existem diferentes configurações de hardware no mercado em um largo espectro de capacidades e custos para diferentes aplicações. É comum encontrar vendedores tentando fornecer configurações inadequadas, ou por má fé, ou por não compreender como a máquina será utilizada. Este problema só pode ser contornado através do conhecimento das técnicas numéricas utilizadas nos programas de simulação e das capacidades dos hardwares oferecidos. Para ilustrar estes aspectos, é apresentado abaixo o resultado obtido para o cálculo dos modos vibracionais (absorbância) da vitamina B12, utilizando 2 diferentes métodos (HF e B3LYP), onde B3LYP foi executado com pseudo potencial (LANL2DZ para o cobre) e sem pseudo potencial (6-31G* para o cobre). A base dos outros átomos foi 6-31G, com exceção do nitrogênio que teve 6-31G*. 98 Figura 38: Vitamina B12. Na parte central da molécula é visível o átomo de cobre cercado por cinco átomos de nitrogênio e um de carbono. Figura 39: Espectro de absorção (modos vibracionais) da vitamina B12, sem escala. Acima (em azul) é apresentado o resultado da geometria obtida com HF. Abaixo (em amarelo e vermelho) é apresentado o resultado para B3LYP (com e sem pseudo potencial no cobre). A molécula tem 181 átomos e levou 2 dias (por método) para ser calculada em um servidor Intel Xeon X5550 com 24GB de memória que custou 13000 reais em outubro de 2009. O mesmo cálculo levou mais de 40 dias em um desktop Core2Quad Q6600 com 8GB de memória que custou 3500 reais em janeiro de 2009. Para esse problema específico, considerando a desvalorização das máquinas, o servidor Xeon é pelo menos três vezes mais barato que o desktop Core2Quad. 99 Linguagens de programação e Compiladores Durante a década de 1940, os programas de computador eram escritos em linguagem de máquina, que são executados diretamente pela CPU. No início dos anos 50, surgiu a linguagem assembly. Esta utiliza uma representação simbólica (expressões mnemônicas) para representar endereços de memória e operações. Um utilitário chamado assembler traduz as expressões da linguagem assembly para a linguagem de máquina. Em 1954, surgiu na IBM o FORTRAN (FORmula TRANslator), a primeira linguagem abstrata e portável, e por isso chamada de "alto nível" [121]. Para transformar a linguagem de alto nível em linguagem de máquina, é necessário utilizar um compilador. O compilador diferencia-se do assembler pela capacidade de interpretar as instruções em sua forma abstrata (de alto nível), aperfeiçoá-la, e então traduzir para linguagem de máquina. O FORTRAN e os compiladores se desenvolveram junto com o computador. Ao mesmo tempo surgiram dezenas de outras linguagens de programação. Entre as décadas de 1960 e 1970 surgiram paradigmas que são utilizados até hoje (programação matricial, funcional, orientada a objeto, de sistema, lógica, estruturada...) [122]. Em especial, em 1968, Edsger Dijkstra publicou um artigo condenando o uso da operação GOTO em qualquer linguagem de alto nível [123]. Durante os anos 80, a programação orientada a objeto, de sistema e o uso extensivo de módulos consolidaram C (e depois C++) como a linguagem mais utilizada de todos os tempos. A linguagem C surgiu em 1972 para ser usada em conjunto com o sistema operacional Unix [124]. Ela é utilizada no kernel do Linux e é a base para linguagens de "altíssimo nível" como Java e linguagens interpretadas como Perl e Python. O C++ é "C com classes" (orientação a objeto), e possui também outros aprimoramentos. O C++ é projetado para produzir códigos mais curtos e organizados que C. O custo disso é que se a classe que comporta um objeto for muito complexa, o programa em C++ tende a ser menos eficiente. Evidentemente isso depende da habilidade do programador, já que um código em C é compilado normalmente pelo compilador de C++. O C ainda oferece recursos de baixo nível, como operações em bits e uso de código assembly. Isso faz do C uma linguagem extremamente eficiente e versátil. Entretanto, durante muitos anos, a linguagem C mostrou-se inferior ao FORTRAN para uso em computação científica. Isso se devia primariamente à escassez de boas bibliotecas matemáticas para C. Essa deficiência foi rapidamente eliminada com popularização do Linux e o uso de softwares livres baseados em C. Hoje, não há diferença no desempenho se um 100 programa é escrito em FORTRAN ou C. E isso é natural, já que ambos serão compilados (aperfeiçoados e transformados em linguagem de máquina). Existem inclusive programas que convertem um código em FORTRAN para C (mas não o contrário, já que FORTRAN não possui recursos de baixo nível e de sistema). Aparentemente, o compilador atual mais eficiente para códigos de computação científica na arquitetura x86(-64) é o da Intel. Há outros conhecidos no mercado como o da Portland (PGI) e o da GNU. Mas o compilador Intel se destaca mesmo em processadores AMD (a concorrente em fabricação de processadores). Obviamente os desenvolvedores do compilador conhecem muito bem a estrutura e as instruções da arquitetura, e são capazes de produzir códigos de máquina altamente eficientes. Em alguns casos, o compilador Intel produz programas duas vezes mais rápidos que os outros compiladores. 101 Referências [1] J.E. Lennard-Jones, "Liquid State", Proc.Phys.Soc.52(1940)729 [2] G.N. Lewis, "The Atom and the Molecule", J.Chem.Am.Soc.38(1916)762 [3] R. Noyori, "Supercritical Fluids: Introduction", Chem.Rev.99(1999)353 [4] J.M. De Simone, "Practical Approaches to Green Solvents", Science297(2002)799 [5] P.E. Savage, "Organic Chemical Reactions in Supercritical Water", Chem.Rev.99(1999)603 [6] Y.P. Morozova, O.N. Chaikovskaya and O.K. Bazyl, "Influence of Solvents on the Spectral and Luminescent Properties of Phenol", RussianPhys.J.46(2003)62 [7] T.H. Dunning Jr., "Gaussian basis sets for use in correlated molecular calculations. I. The atoms boron through neon and hydrogen", J.Chem.Phys.90(1989)1007 [8] N.W. Larsen, "Microwave spectra of the six mono-13C-substituted phenols and of some monodeuterated species of phenol. 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