Arquitetura do ciclo da Borracha en Belém do Pará
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Arquitetura do ciclo da Borracha en Belém do Pará
XI CONGRESO INTERNACIONAL DE REHABILITACIÓN DEL PATRIMONIO ARQUITECTÓNICO Y EDIFICACIÓN 792 MODULO 2 Arquitetura do ciclo da Borracha en Belém do Pará- Brasil. Guia temático e roteiros culturais. R. Verbicaro (1), C. Nóbrega (2) Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) - Programa de Pós Graduação em Arquitetura (PROARQ) – Av. Pedro Calmon, 550/sl. 433 – Prédio da Reitoria, Ilha do Fundão, Rio de Janeiro – Brasil. [email protected] (1) [email protected] (2) RESUMO paraense naquela época. No final do século XIX e início do século XX, a cidade de Belém, capital do estado do Pará, fez parte do período conhecido como Ciclo da Borracha, quando a exportação deste bem e o estreito contato com a Europa possibilitaram o enriquecimento e desenvolvimento da cidade. Neste período, ostentando a riqueza adquirida, a burguesia patrocinou arquitetos e engenheiros, que puderam projetar edificações suntuosas, influenciadas pelo ecletismo e pelas inovações tecnológicas trazidas pela industrialização. No âmbito governamental, parques, praças, edificações públicas e bairros inteiros foram remodelados aos moldes ecléticos, para condizer com a riqueza da sociedade Hoje, estas edificações, parques e praças encontram-se inseridos no contexto urbano contemporâneo, sendo que enquanto alguns estão bastante conservados, outros estão descaracterizados ou demolidos. Visando valorizar e manter este patrimônio, bem como estimular a conservação da identidade e memória da cidade perante as novas gerações, foram elaborados o guia e os quatro roteiros apresentados neste artigo. Eles estão divididos nas categorias “Edificações” e “Praças e Parques”, sendo que cada uma delas possui dois roteiros, nos quais os bens foram agrupados, de acordo com sua localização nos bairros e sua proximidade. Ainda, os roteiros estão 793 XI CONGRESO INTERNACIONAL DE REHABILITACIÓN DEL PATRIMONIO ARQUITECTÓNICO Y EDIFICACIÓN MODULO 2 baseados na Carta dos itinerários Culturais de 2008, elaborada pelo Comitê Científico Internacional dos Itinerários Culturais (CIIC) no ICOMOS. Portanto, este projeto se faz relevante ainda por estimular do turismo arquitetônico na região, além de divulgar as riquezas históricas da cidade de Belém promovendo assim, a conservação deste patrimônio tão importante para sociedade paraense e para a história da arquitetura brasileira. PALAVRAS CHAVES: Guia temático; Roteiros culturais; Belém do Pará; Ciclo da Borracha; Patrimônio histórico; Preservação; Turismo. INTRODUÇÃO: A Cidade de Belém, capital do estado do Pará, localiza-se na região Norte do Brasil e durante o final do século XIX e início do século XX, juntamente com outras capitais nortistas, fez parte do chamado Ciclo da Borracha. Nesta época de intensa comercialização deste bem com países europeus, a cidade iniciou um período de intenso desenvolvimento e uma relação que iria além do comércio. Belém se modernizou e a sua arquitetura mudou totalmente. A classe chamada de burguesia da borracha requisitava edificações mais “modernas”, que demonstrassem seus novos hábitos sociais e, claro, sua riqueza vinculada à extração da borracha. Ainda, os governos estadual e municipal investiram na urbanização da cidade, reformando edificações públicas, parques e praças; modernizando o abastecimento de água, a distribuição de energia elétrica e esgoto; e asfaltando e arborizando ruas. Os palacetes, igrejas, escolas e praças construídos ou reformados neste período demonstram o desenvolvimento e a riqueza da cidade, bem como a influência do Ecletismo, adotado pelos arquitetos da época. Atualmente, todo esse patrimônio encontra-se incorporado à cidade. Algumas edificações ainda possuem o destaque que merecem, enquanto outras exercem uma função diferente daquela para a qual foram construídas; ou pior, muitas já foram demolidas ou estão descaracterizadas. Visando a manutenção e preservação destes bens culturais, bem como o resgate e a divulgação da história, memória e identidade da cidade, surgiu a ideia da criação de um guia acompanhado de roteiros culturais, cujo projeto apresenta-se neste artigo. Aplicando o método indutivo, ou seja: a partir da observação direta dos imóveis em estudo e de um XI CONGRESO INTERNACIONAL DE REHABILITACIÓN DEL PATRIMONIO ARQUITECTÓNICO Y EDIFICACIÓN 794 MODULO 2 levantamento bibliográfico preliminar a partir de livros que descrevem o período, bem como a sua arquitetura, foi possível identificar exemplares de edificações construídas no período do Ciclo da Borracha em Belém, durante o final do século XIX e início do século XX que receberam algum tipo de proteção por parte das instâncias federal, estadual ou municipal. Uma vez que as edificações em questão fazem parte da paisagem construída historicamente, e com isso do acervo cultural da cidade, são passiveis de preservação para a manutenção da história da cidade, pois, segundo Marc Bloch (In: ARGAN, 2005, p.16): “Não se faz história, a não ser dos fenômenos que continuam”. Foram selecionadas 27 edificações protegidas na cidade de Belém, constituindo 8 grupos tipológicos distintos. São eles: edifícios residenciais, edifícios comerciais, mercados, teatros, caixas d’água, praças e parques, igrejas e escolas. As diferentes tipologias serão, portanto, organizadas em roteiros, levando em consideração a proximidades dos bairros, as melhores rotas de visitação e a relação entre as próprias edificações. Em virtude da importância deste período histórico, bem como das edificações nele construídas para a cidade de Belém, faz-se de extrema importância a sua divulgação através dos roteiros aqui propostos, para estimular a preservação e manutenção destes bens, enaltecendo a sua importância arquitetônica, histórica, turística e cultural para que a identidade e memória da cidade de Belém se transmitida às gerações futuras. Afinal, segundo Choay (2001, p.216) “a transmissão de um saber histórico, deriva principalmente da valorização do patrimônio”. 2. ITINERÁRIOS CULTURAIS A Carta dos itinerários Culturais de 2008, elaborada pelo Comitê Científico Internacional dos Itinenários Culturais (CIIC) do ICOMOS1 evidencia que o patrimônio cultural tem com objetivo incentivar a identificação e valorização de itinerários culturais – inclusive no meio turístico – que resultem em uma via de integração da cultura regional. Assim, Verificar documentos do International Council on Monuments and Sites (ICOMOS). Textos disponíveis em http://www.icomos.org.br “O Itinerário Cultural enriquece a mensagem espiritual do passado de todos os que compõem como peças pertencentes a um conjunto que reforça o seu sentido. Ilustra igualmente a concepção contemporânea dos valores 795 XI CONGRESO INTERNACIONAL DE REHABILITACIÓN DEL PATRIMONIO ARQUITECTÓNICO Y EDIFICACIÓN MODULO 2 do patrimônio para a sociedade, enquanto recursos para um desenvolvimento social e econômico viável”. (CARTA DOS ITINERÁRIOS CULTURAIS, 2008). Dessa forma, a definição de Itinerário Cultural identificada na carta, vislumbra uma via de comunicação terrestre, aquática, ou mista ou outra, determinada materialmente, com uma dinâmica e funções próprias, a serviço de um objeto concreto e determinado. Ainda, deve existir um caráter inovador envolvendo as relações do itinerário. O contexto, conteúdo, valor de conjunto partilhado, caráter dinâmico, meio, entorno, e outros aspectos que envolvem diretamente as pesquisas científicas a um plano multidisciplinar. (NOBREGA, 2010, p. 4). Portanto, a busca por divulgar e reviver os caminhos do período da borracha, e redescobrir, através de elementos inseridos no contexto da cidade atual, os remanescentes de uma época de riqueza e desenvolvimento, justifica o desenvolvimento dos roteiros aqui propostos, visando obter, além de uma fonte dinâmica de pesquisas, a valorização e manutenção da história arquitetônica da cidade de Belém. 3. ACERVO A recém enriquecida burguesia, com suas ideias de modernidade e ostentação, foi a grande incentivadora, juntamente com os governos municipal e estadual, do desenvolvimento arquitetônico na sociedade paraense durante o Ciclo da Borracha. O alto poder aquisitivo adquirido pelo Estado e pela burguesia neste período lhes permitia escolher os produtos europeus mais sofisticados e de maior qualidade. Ainda, as relações sociais, a preocupação com higiene e conforto, a busca por mais privacidade e funcionalidade nas residências características essas trazidas do contato com a Europa permitiu e estimulou o desenvolvimento de novos programas de necessidade e a utilização das novidades tecnológicas nos projetos de suas residências e outras edificações, que deveriam demonstrar a sua riqueza, seus valores e os novos hábitos europeus de uma vida social mais ativa, em relação aos antigos hábitos portugueses mais reclusos. (MATOS, 2003). As residências urbanas são a vitrine da riqueza da burguesia do Ciclo da Borracha, sendo que a maioria configuram exemplares do ecletismo em Belém. Nelas, pode-se notar a mudança nas técnicas construtivas desenvolvidas no período. Um exemplo dessas residências é o Palacete Zaira Passarinho (figuras 01). XI CONGRESO INTERNACIONAL DE REHABILITACIÓN DEL PATRIMONIO ARQUITECTÓNICO Y EDIFICACIÓN 796 MODULO 2 Por muito tempo, os parques e praças de Belém foram áreas descampadas apenas com pequena parcela ajardinada, ainda com influência colonial. Durante o Ciclo da Borracha, o trabalho de recomposição das áreas verdes permitiu a criação de áreas com melhor estrutura, reformadas nas bases do paisagismo inglês, com elementos ecléticos da arquitetura do período, produzindo bosques com grandes árvores, colunatas, riachos, cascatas, e grutas, imitando elementos reais. Eram bastante utilizados ainda elementos em ferro, como relógios e coretos. Nessa linha, foram reformadas as áreas das praças Batista Campos, Dom Pedro II, Visconde do Rio Branco, o entorno do Teatro da Paz e o Bosque Municipal (figura 02). Alguns nomes importantes estão diretamente relacionados com a arquitetura do Ciclo da Borracha em Belém, como o engenheiro Francisco Bolonha2, o engenheiro-arquiteto Filinto Santoro 2 (1872-1938) Empresário e engenheiro formado pela Escola Politécnica do Rio de Janeiro, autor de diversas obras importantes no período do Ciclo da Borracha. (DERENJI, 1987 p. 155) 797 XI CONGRESO INTERNACIONAL DE REHABILITACIÓN DEL PATRIMONIO ARQUITECTÓNICO Y EDIFICACIÓN MODULO 2 4 (1881 – 1969) Arquiteto cearense com formação na Escola Livre de Engenharia do Rio de Janeiro, teve destaque na arquitetura paraense no Ciclo da Borracha. (MATOS, 2003.). 4. PLANO DE TRABALHO PRELIMINAR No panorama da arquitetura do Ciclo da Borracha em Belém, constata-se uma grande diversidade de categorias tipológicas e programas arquitetônicos. Tais exemplares correspondem a um rico patrimônio sustentado pelas instâncias federal, estadual e municipal que, no seu conjunto, representa grande parte da história arquitetônica do município. Uma vez que este trabalho encontra-se em etapa inicial de execução, algumas prioridades foram estabelecidas para o desenvolvimento em uma primeira etapa. São elas: - realizar a identificação dos edifícios que farão parte do roteiro, - desenvolver a relação das categorias tipológicas das edificações, - desenvolver uma tabela com localização (endereço) das edificações selecionadas, - realizar o mapeamento do acervo, Na tentativa de realizar uma análise do conjunto, e conectá-los na forma de um roteiro, demonstrando a relação existente entre eles, torna-se necessário a criação de um instrumental de trabalho. Esse instrumental constará de fichas de inventários elaboradas, com o objetivo de sistematizar os dados dessas edificações. Essas fichas serão elaboradas a partir de visitas de campo e dados bibliográficos. Tais fichas servirão de aportes para a configuração dos roteiros da paisagem construída durante o Ciclo da Borracha em Belém, no final do século XIX e início do XX. - desenvolver a produção do roteiro, com a criação das fichas referentes a cada edificação. XI CONGRESO INTERNACIONAL DE REHABILITACIÓN DEL PATRIMONIO ARQUITECTÓNICO Y EDIFICACIÓN MODULO 2 5. ROTEIROS Para melhor viabilização dos roteiros e melhor entendimento das edificações, serão criados inicialmente quatro roteiros principais, divididos inicialmente entre edificações e parques e praças, e posteriormente subdivididos por grupos de bairros, de acordo com a sua proximidade. 798 799 XI CONGRESO INTERNACIONAL DE REHABILITACIÓN DEL PATRIMONIO ARQUITECTÓNICO Y EDIFICACIÓN MODULO 2 CONCLUSÃO. “A paisagem cultural urbana é de fundamental importância para a compreensão e atribuição de valor e autenticidade para a história da cidade” (NOBREGA, 2010). No caso de Belém, a história arquitetônica da cidade, materializada nos palacetes, praças e parques que fazem partes dos roteiros propostos neste artigo, são testemunhas vivas de um período de desenvolvimento e riqueza sem igual, que permitiu à sociedade atual conviver diariamente com uma herança arquitetônica significativa. Resta apenas buscar, na percepção desses monumentos, verdadeiros elementos culturais da paisagem construída, “a abertura de oportunidades de recuperação e construção de novas narrativas servindo de passaporte para o conhecimento sobre o patrimônio, ampliando a descoberta do sentido de pertencimento”. (CHOAY In: NOBREGA, 2010). Assim, esperamos que, através dos roteiros aqui propostos, a sociedade tenha a oportunidade de (re)conhecer suas origens, cultura e memória, para que, no futuro, a preservação e manutenção dos bens aqui inclusos, e de vários outros, seja parte da consciência da população e do dia-a-dia da sociedade, como forma também, de preservar a identidade histórico-cultural da sociedade, permitindo, através do incentivo ao turismo, o contínuo desenvolvimento da cidade. REFERÊNCIAS. [1] ARGAN, Giulio Carlo. História da Arte como História da Cidade. 4. ed. E 5. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998, 2005. [2] CARTAS DOS ITINERÁRIOS CULTURAIS, 2008. Disponível em: http://www.iconos.org.br/Cartas_Itinerarios_Culturais_2008. pdf. Acesso em: 25/05/2012. [3] CHOAY, Françoise. A alegoria do patrimônio. São Paulo: Estação Liberdade: Ed. UNESP, 2001. [4] DERENJI, Jussara da Silveira. A Arquitetura Eclética no Pará no Período Correspondente ao Ciclo Econômico da Borracha: 1870 a 1912. In FABRIS, Anna Teresa (org.) Ecletismo na Arquitetura Brasileira. São Paulo, Nobel, Editora da Universidade de São Paulo, 1887, XI CONGRESO INTERNACIONAL DE REHABILITACIÓN DEL PATRIMONIO ARQUITECTÓNICO Y EDIFICACIÓN MODULO 2 p. 147 a 175. [5] LIMA, Alexandre Martins de; LIMA, Ana Carolina Soares Ferreira de. Legitimando a Modernidade, a arquitetura eclética de Filinto Santoro. Anais do XX Encontro Nacional de História: História e Liberdade. ANPUH/SP, Franca-SP. 2010. Disponível em: < http://www.anpuhsp.org.br/downloads/CD%20XX%20Enco ntro/PDF/Autores%20e%20Artigos/Ana%20Carolina%20So ares%20Ferreira%20de%20Lima.pdf> Acesso em 15 nov. 2011. [6] MARCONI, Marina de Andrade; LAKATOS, Eva Maria. Metodologia Científica. 3. Ed. São Paulo: Atlas, 2000. [7] MATOS, Ana Léa Nassar. O Ecletismo na Arquitetura Residencial de José Sidrim: Uma Análise da Formação Intelectual deste Engenheiro-Arquiteto e suas Obras Residenciais. Tese de Defesa de Mestrado. UFPa. Belém, 2003. [8] NOBREGA, Claudia Carvalho Leme; SOBRAL FILHA, Doralice Duque; RODRIGUES, Ana Rachel Dias. Roteiros da Paisagem Construída do Século XIX no Rio de Janeiro. In: 1º COLÓQUIO IBERO-AMERICANO PAISAGEM CULTURAL, PATRIMÔNIO E PROJETO Desafios e Perspectivas, 2010, Belo Horizonte. Anais do 1º Colóquio Ibero-Americano – Paisagem Cultural, Patrimônio e Projeto – Desafios e Perspectivas. Belo Horizonte, 2010. ISSN 21785430. 800
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