Junho 2013 - Lei Geral
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Junho 2013 - Lei Geral
Junho 2013 “ APRESENTAÇÃO O trabalho é a atividade que, humanizando o mundo, inventa no Homem a sua própria humanidade”, escreveu um filósofo. Mas não basta ter um trabalho. É preciso realizar-se através dele. É preciso sonhar, criar, empreender. É preciso harmonizar os sonhos pessoais com as expectativas de bem-estar da sociedade e com um projeto de desenvolvimento do País. Este livro relata a saga da criação de um ambiente legal favorável ao crescimento e maturação dos pequenos negócios no Brasil, comemora os expressivos números obtidos nos últimos seis anos, ressalta exemplos de sucesso entre os pequenos empreendedores de todo o Brasil, e também projeta as incertezas e os desafios para o futuro. Ecumênica e suprapartidária quando se trata de homenagear os protagonistas históricos da Lei Geral e do Supersimples, esta obra também oferece tribuna e púlpito aos novos atores que abraçaram a causa das micro e pequenas empresas. Todos são unânimes em reconhecer os méritos do Sebrae como agência de desenvolvimento e como articulador de instituições, entidades de classe e forças políticas em favor dos mais elevados interesses nacionais. Márcio Metzker Editor 4 Seis anos do Supersimples Seis anos do SUPERSIMPLES 5 APRESENTAÇÃO ••• ARTIGO | Roberto Simões Um caso de absoluto sucesso “ Roberto Simões Presidente do Conselho Deliberativo Nacional do Sebrae A Constituição Federal, em seu art. 146, inciso III, alínea “d” e parágrafo único, prevê que as microempresas e empresas de pequeno porte terão tratamento diferenciado e favorecido, nos termos estabelecidos em lei complementar. 6 Seis anos do Supersimples Roberto Simões nasceu em Paraopeba (MG) em 1941. É engenheiro agrônomo e mestre pela Universidade Federal de Viçosa. Produtor rural em Curvelo (MG), já presidiu o Conselho Deliberativo do Sebrae MG. Atualmente é presidente da Faemg, do Conselho Administrativo do Senar e vice-presidente da CNA. A introdução dessa regra programática, pela Emenda Constitucional nº 42/2003, e, em seguida, o advento da legislação que a tornou aplicável, demandou enorme esforço político e técnico do Congresso Nacional, dos governos federal, estaduais e municipais e de entidades diversas. A rigor, a previsão constitucional para que se adotasse esse tratamento diferenciado foi um passo importantíssimo na direção não só de favorecer as pequenas empresas em várias áreas, como de simplificar e de racionalizar o complexo sistema tributário brasileiro. Cumpre salientar que esse propósito de simplificar e racionalizar constava – e consta ainda, como ponto capital – de todos os estudos e projetos de revisão e modernização do sistema tributário. Como consequência direta da regra programática constitucional, foi editada a Lei Complementar nº 123/2006, que instituiu o Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte, conhecida como Lei Geral, que veio a ser alterada e complementada pelas Leis Complementares nos 127/2007, 128/2008, 133/2009 e 139/2011. O Simples Nacional, nos moldes previstos nas leis em referência, com abrangência federativa ampla, congrega hoje cerca de 4,4 milhões de pequenas empresas e mais de 2,9 milhões de empreendedores individuais. Registre-se que as pequenas empresas empregam 15 milhões, o que representa 52% dos trabalhadores. Nesse contexto comparativo, que já demonstra a importância social e econômica desse segmento, vale destacar que 25% do total de empregos formais são gerados pelas empresas e empreendedores individuais que aderiram ao Simples Nacional. E esse número ponderável vem crescendo acima da oferta de empregos gerados pelas pequenas empresas em geral. Tudo isso evidencia, no contexto da Lei Geral, que o Simples Nacional e a sistemática do empreendedor individual configuram no Brasil, acima de qualquer dúvida, um caso de absoluto sucesso. E não é demais ressaltar a relevância e amplitude do papel desempenhado pelo Sistema Sebrae nesse processo, subsidiando os estudos técnicos necessários e apoiando decisivamente sua implantação. É certo que remanescem pontos que carecem de aperfeiçoamento. Os problemas advindos da sistemática de substituição tributária, larga e crescentemente utilizada pelos entes federativos, mormente no tocante ao ICMS, assim como uma relativa timidez na simplificação das obrigações trabalhistas, constituem temas que demandam uma melhor reflexão. Este livro reúne depoimentos ilustres, que avaliam os impactos positivos dessas medidas e mostram os desafios que foram vencidos para que chegássemos aos números acima mencionados. Trata-se, portanto, de importante contribuição para mensurar o que já foi feito e para planejar o futuro. Futuro no qual o Sistema Sebrae seguramente será protagonista, cumprindo sua missão institucional de apoiar as micro e pequenas empresas. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 7 APRESENTAÇÃO ••• ARTIGO | Luiz Barretto O debate sobre formalidade e informalidade – que era determinante para a competitividade da economia brasileira – foi vencido e estamos avançando. A geração de empregos hoje no Brasil não pode se basear na expectativa de que o mercado formal vai absorver a todos. Uma parte vigorosa da força produtiva brasileira estará sempre vinculada ao empreendedorismo. Orientação decisiva dos tribunais “ fundamental Brasil O Supersimples é para o Luiz Barretto Presidente do Sebrae Nacional Estamos comemorando seis anos extremamente positivos, desde a criação do Supersimples no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O Brasil, enfim, conquistou uma legislação que incentiva o empreendedorismo, dá um tratamento diferenciado aos pequenos negócios e estimula o crescimento deles. Prova disso é que o número de optantes do Simples Nacional passou de 2 milhões para mais de 7 milhões de empresas, incluindo 3 milhões de microempreendedores individuais. Desconheço qualquer outro movimento tão expressivo de formalização da economia. 8 Seis anos do Supersimples Luiz Eduardo Pereira Barretto Filho, nascido em São Paulo em 1962, é sociólogo formado pela PUC-SP, com mestrado em Ciência Política pela USP. Foi secretário-adjunto da SNAI do Diretório Nacional do PT. Exerceu funções de direção nas prefeituras de São Paulo e São Vicente (SP). Foi secretário de Indústria, Comércio e Abastecimento de Osasco (SP). Tornou-se secretário executivo do Ministério do Turismo de 2007 a 2008, e ministro do Turismo de 2008 a 2010. Graças ao Supersimples, o país arrecadou – seja nos impostos e taxas federais, seja no ICMS e no ISS – valores bem superiores à inflação do período. Essas empresas já somaram mais de R$ 200 bilhões em arrecadação de tributos para a União, estados e municípios. A Previdência Social arrecadou mais, incluiu novos contribuintes no sistema, agilizou o atendimento. Com a orientação decisiva dos tribunais de Contas, as compras governamentais estão sendo induzidas a estimular a distribuição de renda e o desenvolvimento local. Em 2011, a presidenta Dilma Rousseff aumentou os limites e dobrou o teto de adesão para as pequenas empresas exportadoras, sempre pensando em melhorar o ambiente de negócios. Ela também diminuiu os encargos dos microempreendedores individuais com a Previdência, reduzindo a contribuição mensal de 11% do salário mínimo para 5%. Sementes de desenvolvimento Evidentemente, desafios novos vão aparecer e temos que ter espírito construtivo para resolvê-los. Faz-se necessário que a Lei Geral das Micro e Pequenas Empresas, que gerou o Supersimples, evolua junto às novas conjunturas e às novas agendas do país. E agora, com a criação da Secretaria da Micro e Pequena Empresa no Governo Federal, temos mais motivos para somar esforços com o ministro Guilherme Afif Domingos em torno de projetos que impulsionem a atividade empreendedora no Brasil. Um dos temas mais importantes para uma agenda futura é a ampliação da adesão ao Supersimples para as áreas de Serviços. Outro diz respeito à inclusão das posturas municipais na Lei Geral. Os pequenos negócios não podem ser vistos como fonte de tributos ou penalizados com aumento do IPTU com base numa legislação ultrapassada. Ao contrário, devem ser cultivados pelo gestor municipal como sementes de desenvolvimento. É preciso cuidar, adubar, regar constantemente para que germinem e floresçam. Outro tema prioritário para a sociedade brasileira é a reforma tributária. O Supersimples iniciou essa tarefa para um segmento da economia, mas a substituição tributária praticada pelos estados coloca as entidades empresariais e as autoridades fazendárias estaduais em campos opostos. É preciso compreender que neste cenário não há bandidos e mocinhos. Os interesses de ambas as partes são legítimos. Os Estados têm o direito de aperfeiçoar sua arrecadação, de fazer uma política tributária condizente com os interesses regionais, mas é preciso dosar a aplicação desse mecanismo, chegar a um consenso que preserve os ganhos dos estados sem desconstruir os direitos das micro e pequenas empresas. Inovação e tecnologia Não basta construir um ambiente legal favorável. Temos que enfrentar os desafios na área da inovação, capacitando o novo empresário brasileiro para suprir nosso mercado de mais de 100 milhões de consumidores e competir no cenário internacional. Uma grande tarefa do Governo, do Sebrae e dos centros produtores de tecnologia é criar mecanismos que aumentem a competitividade, a produtividade, a sustentabilidade dos segmentos de pequeno porte. O trabalho do Sebrae consiste em atuar em duas frentes: uma como agência de desenvolvimento, trabalhando em regiões de baixa densidade empresarial, que demandam o poder indutor do Estado, e outra nas Seis anos do SUPERSIMPLES 9 APRESENTAÇÃO ARTIGO | Luiz Barretto questões eminentemente empresariais, oferecendo assistência técnica e construindo a inovação. Somos especialistas em gestão empresarial e atuamos com consultorias e cursos para ajudar o pequeno empreendedor a melhorar a administração da sua empresa. Apesar de estarmos vivendo um momento muito favorável para a abertura de negócios, prevalecerão sempre o esforço individual, a dedicação, a energia, as características da personalidade empreendedora. Além de disseminarmos conhecimentos técnicos sobre gestão, estimulamos o comportamento empreendedor por meio de cursos como o Empretec, que completa 20 anos de sucesso em 2013. 10 Seis anos do Supersimples Os fatores decisivos para o êxito de uma empresa estão dentro de suas próprias instalações. O empreendedor precisa melhorar sua gestão empresarial, seu conhecimento sobre o negócio, identificar os diferenciais competitivos, as necessidades de inovação, a incorporação de novas tecnologias. Tem que identificar novos nichos de mercado, as mudanças que estão ocorrendo. O ambiente legal é importante e os seis anos do Supersimples comprovam isso, mas não é o único fator capaz de garantir o sucesso de uma empresa. A capacitação da gestão é o melhor caminho. “ 6 anos do Supersimples A criação de um ambiente favorável aos pequenos negócios Apresentação Roberto Simões, presidente do Conselho Deliberativo do Nacional Sebrae . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6 Luiz Barretto, presidente do Sebrae Nacional . . . . . . . . . . . . . 8 Sumário . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12 Capítulo 1 – A República faz História . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14 Luiz Inácio Lula da Silva, ex-presidente da República . . . . . . .17 Senador José Sarney, ex-presidente da República . . . . . . . . . 20 Afif Domingos, ministro da Micro e Pequena Empresa . . . . . .22 Renan Calheiros, presidente do Senado . . . . . . . . . . . . . . . . . 24 Henrique Eduardo Alves, presidente da Câmara dos Deputados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26 Sumário Capítulo 2 – Articulação nacional pelos pequenos negócios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28 Ministro Augusto Nardes, presidente do Tribunal de Contas da União . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30 Senador José Pimentel, líder do Governo no Congresso Nacional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32 Deputado Carlos Melles, secretário de Transportes e Obras Públicas de MG . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34 José Tarcísio da Silva, presidente da Comicro . . . . . . . . . . . . 36 Deputado Guilherme Campos, PSD . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38 Confúcio Moura, governador de Rondônia . . . . . . . . . . . . . . . 40 Exemplos de sucesso em Rondônia . . . . . . . . . . . . . . . . . .42 Vovó Edma, Amazônia Adventure, Artesanato em madeira 12 Seis anos do Supersimples Capítulo 3 – Protagonistas do Sebrae . . . . . . . . . . . . . . . . . . 48 Sérgio Moreira, ex-presidente do Sebrae Nacional . . . . . . . . .50 Silvano Gianni, ex-presidente do Sebrae Nacional . . . . . . . . . 52 Paulo Okamotto, diretor-presidente do Instituto Lula . . . . . . .54 Alencar Burti, presidente do Conselho Deliberativo do Sebrae SP . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . 58 Hélio Cadore, ex-superintendente do Sebrae PR . . . . . . . . . . 60 Carlos Alberto dos Santos, diretor-técnico do Sebrae Nacional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . 62 José Claudio dos Santos, diretor de Administração e Finanças do Sebrae Nacional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 64 Capítulo 4 – Desafios da integração federativa . . . . . . . . . 66 Fernando Pimentel, ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. 68 Senadora Ana Amélia (PP-RS) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. 70 João Coser, ex-presidente da FNP e ex-prefeito de Vitória ES . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 72 Silas Santiago, secretário executivo do Comitê Gestor do Simples Nacional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 74 Exemplos de sucesso em Minas Gerais . . . . . . . . . . . . . 76 Maria José Haueisen, Chico do Doce, Naturale Stein, Victoria Festas, Studio Auá Capítulo 5 – Novas tecnologias para simplificar o complexo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 84 Marcos Mazoni, diretor-presidente do Serpro . . . . . . . . . . . . 86 Carlos Occaso, subsecretário de Arrecadação e Atendimento da Receita Federal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 88 Valdir Simão, secretário executivo do Ministério do Turismo . 90 Valdir Pietrobon, presidente da Fenacon . . . . . . . . . . . . . . . . .92 José Paulo Cairoli, presidente da CACB . . . . . . . . . . . . . . . . 170 Paulo Solmucci, presidente executivo da Abrasel . . . . . . . . . 172 Ignacy Sachs, diretor do Centro de Pesquisas sobre o Brasil Contemporâneo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 174 Bruno Quick, gerente de Políticas Públicas do Sebrae Nacional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 177 Roque Pellizzaro Júnior, presidente da CNDL . . . . . . . . . . . . 180 Exemplos de sucesso na Bahia . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . . 94 Gecimar Macarrão, Cerâmica João de Barro Exemplos de sucesso: MEI 1 milhão, MEI 2 milhões . . . . . 182 Pequenas Empresas & Grandes Negócios . . . . . . . . . . . . . . .184 Capítulo 6 – O Supersimples e o fenômeno do emprego . 100 Robson Andrade, presidente da CNI . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 102 Senador Roberto Requião (PMDB-PR), ex-governador do Paraná . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .104 Senador Lindbergh Farias, presidente da Comissão de Assuntos Econômicos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 106 Deputado Luiz Carlos Hauly, secretário da Fazenda do Paraná . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .108 Brizola Neto, ex-ministro do Trabalho e Emprego . . . . . . . . .110 Vagner Freitas, presidente nacional da CUT . . . . . . . . . . . . 112 Renato Meirelles, diretor do Instituto Data Popular . . . . . . . 114 Exemplos de sucesso no Paraná . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 116 André Hoffmann serralheiro, Café Kassai, Estofador Kopichiinski, Pipoqueiro Valdir, Secretária Remota, Cássia Graffi, Transporte Escolar Para além do Supersimples Capítulo 7 – O Supersimples e o microempreendedor individual . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 128 Garibaldi Alves Filho, ministro da Previdência Social . . . . . 130 Mendes Thame, deputado federal PSDB-SP . . . . . . . . . . . . 132 Adelmir Santana, presidente da Fecomércio DF . . . . . . . . . . 134 Cezar Vasquez, diretor-superintendente do Sebrae RJ . . . . . .136 Exemplos de sucesso nas comunidades pacificadas do Rio de Janeiro . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 138 Carteiro Amigo, Hostel Favela Inn, Confecção Atrevida, Videomaker, Self-service do Raul, Sorvetes Moleka, Ourives Wallace Capítulo 8 – Arrecadação de tributos . . . . . . . . . . . . . . . . . 148 Armando Monteiro Neto, senador PTB-PE . . . . . . . . . . . . . . .150 Francisco Dornelles, senador vice-presidente da FGV . . . . 152 Carlos Alberto Barreto, secretário da Receita Federal . . . . . .154 Alexandre Cialdini, presidente da Abrasf . . . . . . . . . . . . . . . .156 Celso Banazeski, ex-prefeito de Colíder MT . . . . . . . . . . . . . 158 Exemplos de sucesso em Colíder MT . . . . . . . . . . . . . . . .162 Lanchonete Ambulante, Tornearia Frasson, D’Buyos, Funilaria Iguatemi Capítulo 9 – Os novos desafios do Supersimples . . . . . . . 166 Pedro Eugênio, deputado PT-PE . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 168 Capítulo 10 – Compras governamentais . . . . . . . . . . . . . . . 190 Pepe Vargas, ministro do Desenvolvimento Agrário . . . . . . . 194 Miriam Belchior, ministra do Planejamento, Orçamento e Gestão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 196 Antônio Joaquim, presidente da Atricon . . . . . . . . . . . . . . . . 198 Severiano Costandrade, presidente do Instituto Rui Barbosa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 200 Loreni Foresti, secretária de Logística e Tecnologia da Informação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .202 Sebastião Helvécio, vice-presidente do TCE-MG . . . . . . . . . 204 Vitor Koch, presidente do Sebrae RS . . . . . . . . . . . . . . . . . . .206 Exemplo de sucesso . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 208 Programa Fornecer do Governo do Rio Grande do Sul Capítulo 11 – Os avanços da Redesim . . . . . . . . . . . . . . . . 210 Izabella Teixeira, ministra do Meio Ambiente . . . . . . . . . . . . 212 Regina Miki, secretária nacional de Segurança Pública . . . . .214 Dirceu Barbano, diretor-presidente da Anvisa . . . . . . . . . . . .216 Angela Pace, presidente da Jucemg . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 218 Helder Salomão, secretário de Assistência Social e Direitos Humanos do Espírito Santo . . . . . . . . . . . . . . . . . . .220 Exemplos de sucesso no Espírito Santo . . . . . . . . . . . . 223 Armarinho Alto Astral, Fotógrafo Postay, Doucher, Papel Recriado, Frozen Ginga, Conrad & Favoretti Capítulo 12 – Municipalização da Lei Geral . . . . . . . . . . . .234 Rosalba Ciarlini, governadora do Rio Grande do Norte . . . . .240 Paulo Ziulkoski, presidente da CNM . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .242 Eduardo Tadeu Pereira, presidente da ABM . . . . . . . . . . . . . .244 Eduardo Cury, ex-prefeito de São José dos Campos (SP) . . .246 José Guilherme Ribeiro, diretor-superintendente do Sebrae MT . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .250 Alci Porto, presidente da Abase . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .252 José Ferreira de Melo Neto, diretor-superintendente do Sebrae RN . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .254 Exemplos de sucesso do Rio Grande do Norte . . . . . . . 256 Pharman, Studio Playbacks, Surfista Minnemann, Papo de Calçada, Dom Geandro Dolcci Ficha técnica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 270 Seis anos do SUPERSIMPLES 13 Capítulo 1 A república faz História É bom ser importante. Mais importante é ser bom. Nas lutas em favor das micro e pequenas empresas, qualquer combatente tem valor. Mas as adesões mais valiosas são das pessoas que chegaram aos mais altos cargos da República, não só pelo poder de sua caneta, como pela repercussão de suas palavras e ações. Poucas causas na jovem democracia brasileira chegaram a empolgar ao mesmo tempo tanta gente, sejam representantes de variados setores da economia, sejam expoentes dos governos, sejam políticos de todas as cores do leque partidário. Nas próximas páginas, veremos como os detentores do poder político encaram o potencial dos pequenos negócios e o que fizeram para desenvolvê-los. O ex-presidente Lula, que nasceu no interior de Pernambuco e atravessou o Brasil ainda menino para fixar-se em São Paulo, ampliou essa caminhada pelos agrestes e pelos sertões brasileiros nas caravanas da Cidadania que 14 Seis anos do Supersimples LULA: “MPEs são o primeiro degrau para o trabalho, a ascensão social e plataforma para novos voos”. SARNEY: “Autoridades sustentavam, impropriamente, que a nova lei não possuía nenhum efeito tributário”. realizou a partir de 1989. Viu a miséria, as injustiças, a estagnação econômica, a falta de alternativas de emprego e renda, mas também constatou a fibra do povo brasileiro, sua criatividade, sua garra para sobreviver em condições adversas. Os sonhos, aspirações e esperanças que recolheu deram origem a sólidos compromissos, moldaram sua atuação política e formataram aspectos importantes do seu plano de Governo. A mobilização nacional em favor das micro e pequenas empresas ganhou sua atenção graças aos informes do companheiro Paulo Okamotto, que presidia o Sebrae. Em dezembro de 2006, Lula sancionou a LC 123, a Lei Geral das MPEs. No ano seguinte, outra lei complementar sancionada por ele ampliaria a inclusão de categorias. Mas foi a LC 128, que cria o microempreendedor individual, a que mais emocionou o presidente, por tirar da informalidade e dar proteção previdenciária a tantos batalhadores das classes mais humildes. Lula ainda sancionaria a LC 133, que incluiu o setor cultural no Supersimples. José Sarney, com quase 60 anos de vida pública, já ocupou os mais altos cargos da República. Governou o Maranhão, elegeu-se senador cinco vezes, presidiu o Senado por quatro vezes, foi presidente da República Seis anos do SUPERSIMPLES 15 Capítulo 1 Afif: “A criação do MEI restabelece o primado do indivíduo e do trabalho como base do desenvolvimento”. CALHEIROS: “Estímulos tributários às MPEs são importantes instrumentos na geração de emprego e renda”. ALVES: “O Simples nos apresenta um caminho para um ambiente econômico mais saudável”. 16 Seis anos do Supersimples • • • A República faz História ARTIGO | Luiz Inácio Lula da Silva com a morte de Tancredo Neves. Seu governo teve como prioridades a condução do processo de redemocratização após o período militar, e o combate à inflação que chegara a patamares insuportáveis. Quando regressou ao Senado após deixar a Presidência, tomou as primeiras iniciativas para proteger as pequenas empresas. É dele o projeto de lei criando o Estatuto da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte, em 1996. Sarney lembra um ditado chinês: “Toda vez que formos beber água num poço, não devemos esquecer quem o abriu.” Afif Domingos não chegou a conquistar a Presidência da República, mas defendeu uma plataforma de ideias arejadas e inovadoras no pleito de 1989 e desde antes vinha acumulando um volumoso currículo de defensor dos pequenos negócios. A presidenta Dilma Rousseff o escolheu para o cargo de ministro da Micro e Pequena Empresa não só por sua familiaridade com o Sistema Sebrae, cujo Conselho Deliberativo presidiu na época da aprovação do primeiro Simples. Ao lhe dar posse, Dilma disse que “ele tem tido papel relevante em todos os processos que, nos últimos anos, resultaram no estímulo e na valorização das micro e pequenas empresas no País”. Afif Domingos prometeu empenhar-se para estimular a abertura de empresas, e principalmente facilitar o fechamento delas, hoje uma via-crucis para o empreendedor que viu frustrada sua iniciativa. Renan Calheiros é o presidente do Senado, cargo que ocupava também em dezembro de 2006, na época da aprovação da Lei Geral, esse que foi um dos grandes momentos cívicos da história recente do Congresso. Participou ativamente das discussões com o ministro Mantega para demonstrar que não haveria perdas de arrecadação com a Lei Geral. Ao contrário, estava seguro de que o bolo tributário iria crescer e a economia deslanchar, como de fato aconteceu. Calheiros também apresentou um projeto de criação de facilidades de acesso ao crédito para os microempreendedores individuais, que acabou dando origem ao programa Crescer do governo Dilma Rousseff. Um homem com onze mandatos sucessivos de deputado federal, façanha que se equipara à de Ulysses Guimarães, é o responsável pela condução da Câmara dos Deputados e dos interesses das micro e pequenas empresas na Casa. Em seu artigo, Henrique Eduardo Alves enumera todos os motivos que tem para simpatizar com a causa das MPEs, e considera o exemplo da mobilização para aprovar a Lei Geral e seus aperfeiçoamentos um caminho para outras reformas de que o Brasil necessita: uma reforma tributária capaz de desonerar o aparato produtivo e um novo pacto federativo em que os municípios possam receber recursos próprios à altura de suas responsabilidades e atribuições constitucionais. grande país se faz APOIANDO OS PEQUENOS um “ Luiz Inácio Lula da Silva Ex-presidente da República U ma das maiores alegrias que tive, como presidente do Brasil, foi ter sancionado, no dia 19 de dezembro de 2008, a Lei Complementar 128, que aperfeiçoou o Simples e criou o Microempreendedor Individual. Foi o coroamento de um esforço conjunto, que envolveu o Governo Federal, Estados e Municípios, o Congresso Nacional, as organizações da indústria e do comércio e os movimentos das pequenas empresas. Luiz Inácio da Silva nasceu em 1945 em Garanhuns, Pernambuco. Aos 7 anos, migrou com a família para o Guarujá, no litoral paulista. Aos 12 anos, conseguiu seu primeiro emprego. Foi engraxate, mensageiro e trabalhou em armazém. Tornou-se torneiro mecânico num curso do Senai. Na metalúrgica Villares, tomou contato com o movimento sindical. Em 1975, tornou-se presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo e Diadema. Em 1980, fundou o Partido dos Trabalhadores. Foi deputado federal constituinte. Concorreu três vezes à Presidência da República, em 1989, 1994 e 1998, sem sucesso. Saiu vitorioso em 2002 e foi reeleito em 2006. Seis anos do SUPERSIMPLES 17 Capítulo 1 • • • A República faz História ARTIGO | Luiz Inácio Lula da Silva acordo com o faturamento, tornando mais justa e equilibrada a tributação das empresas. A redução de impostos para as empresas de menor faturamento chegou a 67%. A carga sobre a folha de pagamentos foi reduzida e simplificada. Com menos burocracia, estimulamos a formalização de empresas, que passaram a ter acesso ao crédito e aos programas de qualificação e incentivo à inovação. A Lei Geral inovou também ao estabelecer preferência para as microempresas e empresas de pequeno porte, optantes pelo Simples, nas compras governamentais de bens e serviços. Esses batalhadores invisíveis Momento histórico: no Palácio do Planalto, Lula sanciona a Lei Geral das Micro e Pequenas Empresas em dezembro de 2006. Foi um grande passo no sentido de fazer com que as empresas de pequeno e médio porte passassem a receber, por parte do Estado brasileiro, tratamento jurídico e fiscal à altura do papel que desempenham na vida do país. Hoje podemos afirmar que valeu o esforço para alcançar esta conquista, que beneficia não apenas um setor, mas o Brasil como um todo. O pequeno empreendimento é vital para disseminar o desenvolvimento, ampliar a oferta de oportunidades e a geração de emprego e renda. Nenhum país será verdadeiramente grande sem contar com uma sólida rede de pequenas e médias empresas. Elas são o primeiro degrau para o trabalho, a ascensão social e, muitas vezes, a plataforma para voos mais altos, premiando a iniciativa e a inovação. A pequena empresa é, muitas vezes, o primeiro contato dos jovens com o mundo do trabalho, onde eles 18 Seis anos do Supersimples aprendem uma profissão; mas também absorve a experiência do aposentado e oferece uma chance ao estudante ou a quem não pode trabalhar longe de casa. Ela está na base do tecido social e participa das reivindicações de sua comunidade. A pequena empresa é essencial para a democracia, em todos os sentidos. É dever do Estado, portanto, estimular, apoiar e proteger o empreendedor dos pequenos negócios. Não apenas como estratégia de crescimento econômico, mas também como instrumento de justiça social. Foi com este espírito que sancionamos, em 2003, a Emenda Constitucional 42, conferindo “tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresas de pequeno porte”. A Emenda 42 abriu caminho para a Lei Geral da Micro e Pequena Empresa, que sancionamos em dezembro 2006. A Lei Geral instituiu a primeira etapa do Simples, com um escalonamento da carga de impostos de A instituição da figura do Microempreendedor Individual (MEI), dois anos mais tarde, foi o passo que tirou milhões de brasileiros da invisibilidade social e econômica. Estes batalhadores passaram a existir perante o Estado e foram reconhecidos como pessoas jurídicas, com os mesmos direitos das pequenas e microempresas. Conquistaram também direitos básicos como a cobertura da Previdência Social, para os empreendedores individuais e suas famílias – extensiva a um empregado; aposentadoria por idade ou invalidez, auxílio-doença, salário-maternidade e pensão por morte. Nesse sentido, podemos dizer que a legislação sobre pequenos negócios fez mais do que impulsionar a formalização da atividade econômica e do emprego em nosso país. Ela se constitui num avanço em direção à cidadania para milhões de brasileiros. Recente estudo do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea) informa que, no primeiro trimestre de 2013, o Brasil contava com 22 milhões de pequenos empreendedores, responsáveis pela criação de 15 milhões de empregos formais. Empreendedores e seus empregados representavam, portanto, 40% dos 92 milhões de postos de trabalho no Brasil. O mesmo estudo informa que o trabalho nos pequenos negócios – como empreendedor, por conta própria ou como empregado – responde por 39% das remunerações no país, uma massa equivalente a R$ 500 bilhões de reais ao ano. Redução das desigualdades Isto significa que o empreendedorismo brasileiro está respondendo com vigor aos estímulos recebidos. Está contribuindo efetivamente para o desenvolvimento e para a redução das desigualdades no país. Os pequenos nos fazem maiores e mais fortes. Este é o resultado de um esforço conjunto, como já disse, no qual o Sebrae teve um papel-chave, como articulador e formulador de propostas. Sou testemunha do trabalho incansável do companheiro Paulo Okamotto e de sua diretoria, para construir os consensos que resultaram na Lei Geral da Micro e Pequena Empresa e na instituição do Empreendedor Individual. O Sebrae continua exercendo sua função estratégica, sob a direção do presidente Luiz Barretto. Os empreendedores individuais e as micro e pequenas empresas têm sido fundamentais para as grandes conquistas econômicas e sociais que o Brasil alcançou nos últimos anos. Tiramos 33 milhões de pessoas da linha de miséria; criamos mais de 19 milhões de empregos; elevamos mais de 40 milhões à classe média; estamos a caminho de nos tornar a quinta maior economia do mundo. Esta transformação ocorre dentro de um modelo de desenvolvimento que privilegia a geração de empregos e de renda para impulsionar a economia, em benefício de todos. Há muito por fazer, mas criamos as bases para milhões de empreendedores participarem ativamente do processo de crescimento do Brasil. Vamos continuar crescendo e incluindo novos cidadãos na economia, porque o nosso maior patrimônio é o povo trabalhador deste país. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 19 Capítulo 1 • • • A República faz História ARTIGO | José Sarney defesa da micro e PEQUENa empresa em Senador José Sarney Ex-presidente da República “ Passados 17 anos e várias transformações legisla- tivas no regime das micro e pequenas empresas, evoco um ditado chinês: “Toda vez que formos beber água num poço, não devemos esquecer quem o abriu.” Em 1996 apresentei, no Senado Federal, projeto de lei criando o Estatuto da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte. Tratava-se de regulamentar, no âmbito da União, o artigo 179 da Constituição Federal, segundo o qual “a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios dispensarão às microempresas e às empresas de pequeno porte, assim definidas em lei, tratamento jurídico diferenciado, visando a incentivá-las pela simplificação de suas obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e creditícias, ou pela eliminação ou redução destas por meio de lei.” 20 Seis anos do Supersimples Político e escritor, José Sarney é maranhense de Pinheiros, nascido em abril de 1930. Bacharel em Direito, foi líder estudantil e elegeu-se deputado federal em 1955. Conquistou mais dois mandatos na Câmara e o Governo do Maranhão em 1965. Em 1971, tornouse senador pelo Maranhão, sendo reeleito em 1978. Em 1985, com a morte de Tancredo Neves, assumiu a Presidência da República por cinco anos. Em 1990, elegeuse senador pelo Amapá, sendo reeleito em 1998 e 2006. É inegável a importância das empresas de pequena expressão econômica em qualquer cenário da economia mundial. Por isso todos os países desenvolvidos reservam-lhes incentivos específicos destinados a garantir seu crescimento e sobrevivência, mesmo em épocas adversas. No Brasil, contudo, até o advento da atual Constituição, apenas as microempresas eram objeto de tratamento diferenciado através da redução e desoneração de suas obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e trabalhistas e dos incentivos creditícios e o fomento ao desenvolvimento empresarial. A matéria estava regulada pela Lei nº 7.256, de 1984, e pela Lei nº 8.864, de 1994. Infelizmente, muitos dispositivos da Lei 8.864/94 foram modificados pelo Congresso Nacional ou vetados pelo Executivo, resultando num texto que levou as autoridades fazendárias a sustentarem, impropriamente, que a nova lei não possuía nenhum efeito tributário. Com isso, o mandamento constitucional continuou ignorado e os pequenos empresários continuaram prejudicados, à míngua de lei que lhes concedesse o direito garantido na Constituição. três níveis de administração pública representaram uma verdadeira revolução socioeconômica no País. A maior virtude do Estatuto da Micro e Pequena Empresa foi o fomento à geração de novos empregos em enormes quantidades. O Sebrae tem realizado um trabalho notável de suporte às mais diversas necessidades do setor, dentre as quais se destacam a qualificação dos empreendedores e a divulgação de técnicas empresariais. Hoje, as micro e pequenas empresas, juntamente com o empreendedor individual, são responsáveis por uma enorme parcela da economia brasileira, e é com muito orgulho que tenho meu nome ligado a sua história. “ Autoridades defendem arrecadação Devido à divulgação pela imprensa da tramitação do projeto, cresceu a discussão sobre o tema. A grande maioria da população era, como é, francamente favorável à concessão de tratamento especial aos pequenos. Manifestaram-se contra a iniciativa unicamente os agentes de uma ou outra forma ligados aos estamentos tributários. Pode-se entender a eterna posição de autoridades e técnicos em defesa do Erário e da otimização dos níveis de arrecadação. O tempo mostrou a importância dos regimes tributários especiais e isenções para a própria receita da União. Com o ingresso na formalidade das micro e pequenas empresas informais, as implicações sociais, previdenciárias, econômicas e de arrecadação tributária para os Seis anos do SUPERSIMPLES 21 Capítulo 1 • • • A República faz História ARTIGO | Afif Domingos A revolução Libertadora “ Afif Domingos Ministro da Micro e Pequena Empresa Tratamento diferenciado para a MPE Quando presidente do Badesp e diretor da Asso- ciação Comercial de São Paulo, presidi também a Comissão Organizadora do Primeiro Congresso Brasileiro da Pequena e Média Empresa, que reuniu cerca de 3 mil participantes em sua sessão de abertura, em novembro de 1979, no Anhembi. Constatei pela abrangência dos pronunciamentos e debates que se realizaram durante três dias, que não estávamos discutindo apenas o futuro dos empreendimentos de menor porte no Brasil, mas um tema muito mais profundo, por suas implicações políticas, econômicas e sociais. Isto porque a livre iniciativa somente se justifica quando o mercado apresenta a igualdade de oportunidades para todos aqueles que – pelo seu trabalho, disposição de correr riscos e criatividade para desenvolver suas vocações – dão vida a um empreendimento. Do ponto de vista econômico, a existência de milhares de empresas de micro, pequeno e médio portes é fundamental para garantir equilíbrio à economia, não apenas descentralizando as decisões e atuando em segmentos de mercado que somente empresas menores podem atender, como assegurando maior racionalidade 22 Seis anos do Supersimples ao sistema e garantindo a concorrência, que é o melhor mecanismo de defesa do consumidor. Uma economia baseada apenas nos grandes empreendimentos, públicos ou privados, tende a se tornar mais corporativa do que competitiva, com os efeitos indesejáveis da concentração do poder econômico e, em consequência, do controle político. Guilherme Afif Domingos nasceu em São Paulo em 1943. Formou-se em Economia em 1967, foi presidente do Banco de Desenvolvimento do Estado de São Paulo, dirigiu a Associação Comercial de São Paulo e a Facesp. Presidiu o Sebrae entre 1990-94. Foi deputado federal constituinte e candidato à Presidência da República em 1989. É vice-governador de São Paulo. Isto me levou a apresentar, na Constituinte, proposta de um item reconhecendo expressamente o tratamento diferenciado às micro e pequenas empresas, que foi aprovada como o artigo 170 da Constituição de 1988. Embora esse tratamento tenha sido suprimido na área trabalhista devido às pressões contrárias, esse dispositivo possibilitou a adoção gradativa de medidas de incentivo aos micro e pequenos empreendimentos, começando pelo Simples, aprovado quando fui presidente do Sebrae, até chegar à atual Lei Geral que, embora comporte aprimoramento, representa um grande avanço desde a aprovação do Estatuto, em 1984. Tivemos oportunidade de levar ao presidente Lula proposta no sentido de permitir a criação da figura do Empreendedor Pessoa Física, visando facilitar a formalização de muitas atividades econômicas e estimular o surgimento de novos empreendimentos, ampliando as oportunidades de geração de renda e emprego. Resultado dessa proposta foi a Lei que criou o Microempreendedor Individual (MEI). Estima-se em cerca de 10 milhões o número de pessoas que mantêm algum tipo de negócio ou atividade informal no País, dos quais cerca de 2,8 milhões já se registraram. É preciso regularizar as habitações Com a formalização de milhões de empreendimentos e o estímulo ao surgimento de novas iniciativas, passamos não apenas a reconhecer uma realidade, mas também a proporcionar a inclusão de um imenso contingente da população como contribuinte e consumidor, o que favorece o aumento da arrecadação da Previdência e de impostos. O mais importante, contudo, é oferecer a possibilidade para que tais empreendimentos possam se desenvolver por meio do acesso ao crédito e ao mercado das empresas formais, ampliando os postos de trabalho e a geração de renda. Para complementar essa legislação, é importante acelerar o processo de regularização de habitações. Dessa forma os pequenos empreendedores passariam a ter garantia real de acesso ao crédito, além dos comprovantes de renda e de endereço, que somados à sua condição de contribuinte e consumidor, reforçam a autoestima e a cidadania. A criação do MEI dá plena validade ao dispositivo constitucional que assegura a todos o livre exercício de qualquer atividade, restabelecendo o primado do indivíduo e do trabalho como base do desenvolvimento econômico e social. Por uma questão de justiça, devo ressaltar que em todas essas iniciativas houve sempre a participação do Sebrae, cujo Conselho Nacional tive a honra de presidir quando elaboramos a regulamentação do Artigo 179 da Constituição com a criação do Simples e também do projeto do Fundo de Aval. O Sebrae tem atuado não apenas como um órgão de apoio técnico e gerencial aos empreendimentos de menor porte, mas também como formulador de políticas de apoio e até de mobilização desse segmento empresarial. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 23 Capítulo 1 • • • A República faz História ARTIGO | Renan Calheiros “ Um BRASIL MAIS FÁCIL criamos o Simples Nacional, sistema que unificou a arrecadação de tributos, facilitando a vida dos micro e pequenos empreendedores. Eliminamos, também, um amontoado de empecilhos burocráticos que dificultavam a vida dessas pessoas e, mais importante, demos um passo fundamental para que milhões de empresas saíssem da informalidade. Renan Calheiros Presidente do Senado Simplificações importantes Um dos grandes desafios do Brasil na atualidade é avançar na melhoria do ambiente institucional e de negócios, aspecto essencial para uma economia que pretende ampliar os seus investimentos e alavancar o crescimento econômico com justiça social. Em razão disso, são fundamentais as políticas públicas do Estado brasileiro que se voltam à simplificação dos marcos regulatórios que regem esse ambiente, a exemplo da Lei Complementar nº 123, de 2006, mais conhecida como Lei Geral das Micro e Pequenas Empresas. À época da aprovação dessa importante norma jurídica, em dezembro de 2006, estávamos à frente da Presidência do Senado Federal e do Congresso Nacional, tendo, assim, participado de todos os debates e tratativas políticas com vistas a produzir uma lei equilibrada e que, de fato, gerasse estímulos para o desenvolvimento dos pequenos empreendedores. Aliás, naquela ocasião discutimos exaustivamente esse tema com o presidente Lula e o ministro da Fazenda, Guido Mantega, no sentido de demonstrar à área econômica do Governo os benefícios econômicos e sociais do projeto de lei que então tramitava no Congresso. Cabe salientar, portanto, que a aprovação dessa matéria pelo Legislativo implica o reconhecimento parlamentar de que estímulos tributários e creditícios aos micro e pequenos empreendedores brasileiros são importantes instrumentos no processo de geração de emprego e renda, o que é central para a redução das desigualdades regionais. Foi graças a essa Lei Geral que 24 Seis anos do Supersimples Nascido em Murici (AL) em 1955, José Renan Vasconcelos Calheiros formou-se em Direito pela Universidade de Alagoas. Líder estudantil, elegeu-se deputado estadual pelo MDB em 1978. Na eleição seguinte, em 1982, conquistou um mandato de deputado federal pelo PMDB, sendo reeleito em 1986. Está em seu terceiro mandato consecutivo de senador, tendo sido presidente do Senado também entre 2005 e 2007. Em suma, a aprovação da Lei Complementar nº 123, de 2006, operou simplificações importantes para os pequenos negócios no Brasil. Assim, no campo administrativo, houve a unificação do registro empresarial e a integração do sistema de órgãos envolvidos na inscrição e encerramento da empresa, eliminando redundâncias documentais, por exemplo. Já na parte tributária, destaca-se a simplificação no recolhimento dos impostos e contribuições federais, com redução de tempo e de custos para o funcionamento desses pequenos empreendimentos. Tendo em vista essa participação verdadeiramente ativa do Senado e do Congresso nas deliberações sobre a Lei Geral das Micro e Pequenas Empresas, senti-me motivado a apresentar, em março de 2010, o projeto de lei do Senado nº 59, no sentido de que os microempreendedores individuais (costureiras, pintores de parede, marceneiros, mecânicos, borracheiros, verdureiros, e tantos outros profissionais) pudessem ter acesso a financiamentos com recursos do FNE, FNO, FCO, FAT e também do Programa Nacional de Microcrédito Produtivo Orientado (PNMPO). E a razão foi simples. Esses microempreendedores individuais, que já contavam com os benefícios tributários e previdenciários da lei aprovada em 2006, precisavam ter acesso ao mercado de crédito, na perspectiva de expansão dos seus empreendimentos. Quando apresentei esse projeto de lei, dados do IBGE indicavam que cerca de 90% dos microempreendedores individuais nunca tinham obtido qualquer tipo de financiamento bancário. Microcrédito atenderá 3,5 milhões Fiz questão de informar a presidente Dilma Rousseff sobre esse nosso projeto, com vistas a ampliar ainda mais o apoio político para sua aprovação no Congresso Nacional. E, conforme desejávamos, a matéria foi aprovada no Senado e seguiu para a Câmara dos Deputados. A própria presidente Dilma Rousseff lançou, em 2011, o Programa Crescer que, na verdade, tem a mesma essência desse nosso projeto de lei. O Programa Crescer permite que os microempreendedores individuais possam obter financiamentos do Programa Nacional de Microcrédito Produtivo Orientado (PNMPO). A previsão do Programa, até o final de 2013, é destinar R$ 3 bilhões, a título de crédito, para beneficiar uma faixa de 3,5 milhões de microempreendedores individuais. É certo que temos ainda de avançar. E, no que depender do Presidente do Senado Federal e do Congresso Nacional, o aperfeiçoamento das normas para melhorar continuamente o ambiente dos negócios, principalmente dos pequenos empreendedores, é tema prioritário da agenda parlamentar, agenda que temos denominado de Brasil Mais Fácil. “ Seis anos do SIMPLES NACIONAL 25 Capítulo 1 • • • A República faz História ARTIGO | Henrique Eduardo Alves Desenvolvimento e justiça social Henrique Eduardo Alves (PMDB) Presidente da Câmara dos Deputados “ Henrique Eduardo Lyra Alves nasceu no Rio de Janeiro em 1948. Cursou Direito na CEUB em Brasília e transferiu-se para a Universidade Federal do Rio de Janeiro, onde concluiu o curso. É empresário do setor de telecomunicações. Desde 1970 vem se elegendo deputado federal pelo Rio Grande do Norte, com onze mandatos consecutivos. No contexto de transformações socioeconômicas que o Brasil vem experimentando nos últimos 20 anos – no qual se sobressaem a diminuição da miséria, o aumento da massa salarial e da formalização do emprego, bem como um crescimento mais acentuado das regiões Norte e Nordeste - a adoção do Simples, regime tributário diferenciado e simplificado, aplicado às micro e pequenas empresas e a microempreendedores individuais, exerce papel preponderante. Desde a sua introdução no sistema tributário nacional, em 2006, o Simples apresenta números significativos e incontestáveis do acerto da inovação legislativa. São hoje mais de 7 milhões de contribuintes que fizeram a sua opção, entre os quais 4,5 milhões de empresas e 2,9 milhões de microempreendedores individuais. Essa inegável pujança contribuiu para que a formalização do emprego crescesse de 48% em 2007 para mais de 60% no fim de 2012. 26 Seis anos do Supersimples Deve-se ressaltar ainda, no escopo de transformações das quais o Simples faz parte, que a adoção de um sistema tributário simplificado para empresas de pequeno porte e microempreendedores individuais contribuiu sensivelmente para a desconcentração econômica que vem ocorrendo no nosso país. Centros antes menos desenvolvidos viram crescer vertiginosamente o número de pequenas empresas e de empreendedores, conferindo mais dinamismo a economias locais e mais geração de empregos. Resultado disso é que, de 2007 para cá, a taxa de desemprego no País diminuiu de um índice superior a 9% para apenas 6%. Falta uma reforma tributária mais ampla O Simples dá um caminho Temos muito a comemorar, principalmente levando em consideração os ganhos que a crescente formalização do emprego trouxe para a classe trabalhadora, mas são enormes os desafios presentes e futuros. Se inovações legislativas como o Simples significaram avanços no campo tributário, o Brasil ainda se ressente de uma reforma tributária mais ampla, que possa simplificar o sistema, diminuir a sonegação e reduzir o custo do trabalhador para as empresas. Este é um clamor constante da nossa classe produtiva, corroborado obviamente pelos trabalhadores, que almejam salários melhores. Outro desafio premente é o da redefinição do pacto federativo. Hoje, o bolo tributário não é bem distribuído entre os entes que compõem a Federação, restando, principalmente no que se refere aos municípios brasileiros, diversas atribuições constitucionais a cumprir e um orçamento insuficiente para fazer frente às crescentes responsabilidades. Afinal, dos entes que constituem o Estado brasileiro, o município é o mais próximo do cidadão. São de sua responsabilidade o calçamento, o transporte público, a saúde básica, a educação infantil e outros serviços essenciais que não encontram respostas satisfatórias dos nossos gestores. Para todos esses desafios que rapidamente expus, o Simples nos apresenta um caminho a trilhar. Um caminho de valorização do empreendedorismo e da livre iniciativa. Um caminho de respeito integral aos direitos dos trabalhadores que só têm a ganhar com um ambiente econômico mais saudável e um sistema tributário mais racional. Um caminho que valorize o cidadão nas suas necessidades mais básicas, afinal, para que ele possa viver em cidades onde exerça os seus direitos na plenitude. Na condição de presidente da Câmara dos Deputados e de parlamentar com mais de 40 anos de experiência legislativa, constato que a nossa jovem democracia vive um momento singular. Nossas instituições se fortaleceram e funcionam. Há respeito e diálogo entre os poderes constituídos. Temos um ambiente econômico competitivo, propício ao crescimento econômico com justiça social. Os programas sociais governamentais contribuem para que a miséria diminua cada vez mais, ao ponto de aproximar-se a sua erradicação. E o Congresso Nacional está atento a todas essas transformações, sendo palco legítimo para onde confluem os atores da sociedade brasileira. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 27 Capítulo 2 ARTICULAÇÃO NACIONAL pelos pequenos negócios A campanha pela elaboração e aprovação da Lei Nardes: “Resolvemos dar voz a estes empreendedores já roucos de gritar sozinhos suas dificuldades”. Pimentel: “A inadimplência é fator de exclusão da Previdência. É muito importante que o MEI recolha”. Melles: “Trabalhador rural deveria ter acesso aos benefícios do microempreendedor individual”. 28 Seis anos do Supersimples Geral das Micro e Pequenas Empresas (Lei Complementar 123/2006) começou na década de 90, com o lançamento da Frente Parlamentar de Apoio às MPEs, que recebeu 250 adesões no Congresso Nacional, resultando na criação do Simples Federal em 1996. O tema empolgou os pequenos empresários nos primeiros anos do novo século e se alastrou por todo o território nacional, com debates, manifestações, carreatas, marchas sobre Brasília, exigindo tratamento diferenciado para os pequenos empresários que geram a maioria dos empregos no país. Os protagonistas históricos da Lei Geral relembram aqui os lances épicos da discussão e da aprovação do Estatuto das MPEs. O ministro Augusto Nardes, presidente do TCU, relata as primeiras lutas. Na época deputado federal, o gaúcho estava sempre disposto a empunhar o megafone como arauto e defensor dos interesses das pequenas empresas. O deputado mineiro Carlos Melles, hoje secretário de Transportes e Obras Públicas do Governo de Minas Gerais, lança um repto pela criação de um Simples Rural, que tiraria 17 milhões de brasileiros do limbo trabalhista em que se encontram. Tarcísio: “Substituição tributária vai provocar fechamento de MPEs ou retorno à informalidade”. Campos: “Meu mantra pessoal é de que empresa de qualquer ramo possa ser enquadrada na Lei Geral”. Confúcio: “Trouxe para Rondônia muitos sonhos e uma fome de trabalho que ainda não saciei”. O senador cearense José Pimentel, à época deputado federal, foi um valioso interlocutor com áreas pouco permeáveis do Governo, fazendo avançar as negociações. Logo após a aprovação do Supersimples, tornou-se ministro da Previdência, praticando no Ministério o que pregava no Congresso. José Tarcísio da Silva, presidente da Comicro, foi uma das primeiras vozes a se levantar contra a injustiça da substituição tributária, que iguala grandes e pequenos e pode dizimar as micro e pequenas empresas de todo o país. O deputado Guilherme Campos (PSD-SP) quer a inclusão de qualquer ramo de atividade no Supersimples e considera que não é um degrau que separa as pequenas empresas das médias: “É um abismo. O empresário sai de um tratamento simplificado, de uma guia, e cai numa selva tributária”, compara. O governador de Rondônia, Confúcio Moura, migrante como grande parte dos empreendedores do Estado, saiu de Tocantins para se tornar o primeiro médico de Ariquemes. Ele considera a substituição tributária uma “espada de Dâmocles”. Se os governadores não a utilizam, não fecham as contas. Se a praticam, enfrentam aborrecimentos com a sociedade. Seis anos do SUPERSIMPLES 29 Capítulo 2 • • • articulação nacional pelos pequenos negócios ARTIGO | Augusto Nardes “ O despertar dos gigantes Ministro Augusto Nardes Presidente do Tribunal de Contas da União João Augusto Nardes nasceu em Santo Ângelo (RS) em 1952. Formou-se em Administração de Empresas pela Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões, pós-graduou-se e fez mestrado em Genebra (Suíça). Foi vereador, deputado estadual por dois mandatos, e deputado federal também por dois mandatos. Foi presidente da Frente Parlamentar das MPEs. Tornou-se ministro do TCU em 2005. 30 Seis anos do Supersimples Durante os quase doze anos que permaneci no Congresso Nacional como deputado federal, trabalhei lado a lado com os micro e pequenos empresários e com as entidades representativas do setor. Meu encontro com esses empreendedores e seus problemas deu-se por acaso e consolidou-se através dos anos a tal ponto que, quando percebi, já era a principal bandeira de todos os meus mandatos. Com os micro e pequenos empresários aprendi muitas e valiosas lições que serviram e servem de inspiração e motivação para a minha vida pessoal e profissional. Com esses empresários aprendi que a perseverança é o caminho para o sucesso, que o trabalho nos dignifica e engrandece, que os sonhos não devem acabar jamais e que juntos somos imbatíveis. Recebi deles muitíssimo mais do que dei. Fiz grandes e verdadeiros amigos e cresci como político e como pessoa. Lutamos lado a lado para que os micro e pequenos empresários fossem reconhecidos e respeitados como os responsáveis pelo crescimento do nosso país. Foram dias e noites de discussões, de reuniões, de seminários, viagens, avanços e retrocessos. Cada vitória que obtínhamos nos impulsionava a continuar e avançar ainda mais. Diante desse cenário, marquei uma audiência com o então ministro da Fazenda Pedro Malan, convidei 25 parlamentares para acompanhar-me e propus a renegociação das dívidas dos pequenos empresários. A receptividade do ministro Malan não foi a esperada, mas a audiência e seus desdobramentos fizeram com que percebêssemos a necessidade de abraçar esta causa no Poder Legislativo. Roucos de gritar sozinhos Convite de FHC Todos os avanços do setor das micro e pequenas empresas começaram efetivamente a tornar-se realidade quando entidades representativas da categoria, empresários e políticos resolveram unir forças e dar voz a estes empreendedores já roucos de gritar sozinhos suas dificuldades aos ouvidos moucos dos gestores da economia. Faz-se necessário ressaltar que, embora os números demonstrassem a grandiosidade do setor e a sua extrema importância econômica, não havia nenhuma representatividade no Congresso Nacional que se dispusesse exclusivamente a analisar os problemas enfrentados pelo setor. Ao chegar ao Congresso Nacional para meu primeiro mandato fui procurado por um grupo de micro e pequenos empresários gaúchos acossados pelas dificuldades que o setor vinha enfrentando em virtude do momento econômico do país e da falta do cumprimento da legislação protecionista em vigor. Na época, a inadimplência das pequenas empresas junto aos bancos era de cerca de R$ 8 bilhões. O montante da dívida dos pequenos empresários gerou um descompasso significativo entre o que era devido e as garantias dadas pelos devedores aos estabelecimentos bancários na hora da contratação do crédito. A falta de capital de giro e a estabilização dos preços em função do plano econômico em vigor na época (1996) agravaram a situação dos pequenos empresários que, endividados e sem saída, não tinham mais garantias para oferecer aos bancos, pois as dívidas cresciam em progressão geométrica. O então presidente Fernando Henrique Cardoso me telefonou e me convocou a ir até o Palácio do Planalto a fim de propor que eu coordenasse os parlamentares num grupo de trabalho formado por seis ministros de Estado, dentre eles Francisco Dornelles, que na época respondia pela Pasta da Indústria, do Comércio e do Turismo, e Pedro Parente, então ministro do Planejamento, Orçamento e Gestão. Depois de três meses de trabalho, conseguimos fechar um acordo que não era o que desejávamos, mas que foi o pontapé inicial, o nascimento da Lei do Simples, em dezembro de 1996. Essa data ficará marcada na história do sistema tributário brasileiro como o dia em que os esforços envidados pela Frente Parlamentar da Micro e Pequena Empresa surtiram efeito e o acordo em torno da simplificação de tributos – o Simples, foi fechado com o Governo Federal. Muito já se fez mas muito ainda há que se fazer. E será feito, tenho certeza, por pessoas que acreditam neste país e que acreditam, sobretudo, no sonho destes homens e mulheres empreendedores, esses gigantes que labutam de sol a sol, persistindo apesar das adversidades e fazendo de nosso Brasil um país em franco desenvolvimento. “ “Você nunca sabe que resultados virão da sua ação. Mas se você não fizer nada, não haverá resultados.” Mahatma Gandhi Seis anos do SUPERSIMPLES 31 Capítulo 2 • • • articulação nacional pelos pequenos negócios ENTREVISTA | senador José Pimentel MPEs precisam sair da substituição tributária Senador josé pimentel (PT-CE) Líder do Governo no Congresso Nacional O senador José Pimentel, nascido em Picos, Piauí, formado em Direito e bancário por profissão, não é líder do Governo no Congresso por acaso. Contrastando com seus modos tranquilos e trato suave, é um dos mais persistentes e sagazes congressistas. Quando deputado federal, foi um valioso interlocutor para fazer avançar a negociação da Lei Geral das MPEs em áreas intransigentes do Governo. Como ministro da Previdência Social, implantou o que pregava nas reuniões de discussão da Lei Geral. Conhece como poucos a saga da materialização desse ideário e está credenciado a fazer projeções para o seu aperfeiçoamento e evolução futura. 32 Seis anos do Supersimples Sebrae – O Sr. é considerado um dos três congressistas mais atuantes para a aprovação da Lei Geral. Como adquiriu essa determinação? Pimentel – Eu trabalho há mais de 15 anos com o tema das micro e pequenas empresas. Na década de 1990, estive em outros países para conhecer suas experiências no campo do empreendedorismo. Durante o governo do presidente Lula, começamos a construir a Lei Geral das Micro e Pequenas Empresas, aprovada em 2006. Atualmente, o Brasil possui uma das legislações mais avançadas do mundo no campo do empreendedorismo. Eu entrei nessa luta por convicção. Sebrae – Dentro do Ministério da Previdência, qual foi o resultado da sua iniciativa de realizar licitações individuais para a construção das novas agências? Pimentel – Quando exerci o cargo de ministro da Previdência Social, tive a oportunidade de criar o maior plano de expansão da rede de agências do INSS. Projetamos 720 novas agências, distribuídas nas cinco regiões do país. Todas as cidades brasileiras com mais de 20 mil habitantes receberam uma autorização minha para a construção de uma agência da Previdência Social. Ao definir o plano, tive de optar entre fazer uma única licitação para a construção de todas as agências ou realizar uma licitação para cada unidade a ser construída. A primeira opção reduziria muito o trabalho burocrático. No entanto, decidi pelo caminho mais trabalhoso para gerar 720 oportunidades para construtoras menores que puderam concorrer para construir unidades do INSS. Sebrae – A presidenta Dilma Rousseff vem manifestando preocupação com a inadimplência dos empreendedores individuais quanto ao recolhimento para a Previdência. Qual é a sua sugestão para reduzi-la? Pimentel – A inadimplência é fator de exclusão do sistema. Portanto, é muito importante que eles recolham. Talvez esteja faltando informação para uma parcela desses empreendedores. Devemos utilizar todos os nossos canais de comunicação para esclarecer esse público, num esforço conjunto dos órgãos governamentais, Sebrae e agentes públicos envolvidos nesse processo. Sebrae – O Sr. pode dar exemplos de MPEs que passaram a fornecer produtos e serviços nas compras governamentais? Pimentel – Segundo o Ministério do Planejamento, o governo federal comprou R$ 72,6 bilhões em 2012, sendo R$ 15,4 bilhões adquiridos das micro e pequenas empresas. Nas compras regionais até R$ 80 mil, as micro e pequenas empresas responderam por 75%, exercendo a liderança. De 2007 ao primeiro semestre de 2012, houve um crescimento de 120% na participação do setor nas compras regionais. O Norte e o Nordeste se destacaram. Juntas, as micro e pequenas empresas dessas regiões conquistaram 74% das compras governamentais de até R$ 80 mil. Sebrae – Quais os aperfeiçoamentos que o Sr. destacaria como necessários para o Simples e para a Lei Geral? Pimentel – Nós criamos o Simples Nacional em dezembro de 2006 e, de lá para cá, já aprovamos quatro leis complementares que aperfeiçoam a legislação para fortalecer as micro e pequenas empresas. Agora, estamos trabalhando no Congresso pela aprovação do Projeto de Lei do Senado 467/08, de autoria da senadora Ideli Salvatti, hoje ministra-chefe da Secretaria de Relações Institucionais. Sou relator da proposta que prevê a inclusão de novos setores no Simples Nacional, entre eles, empresas do ramo da advocacia, engenharia, medicina, odontologia, nutrição e psicologia. Queremos também que em breve as empresas no Brasil possam ser criadas em apenas 30 minutos, como ocorre com a concessão de benefícios nas agências da Previdência Social. Sebrae – O mecanismo da substituição tributária adotado por vários estados é considerado pernicioso à implantação completa da Lei Geral. Como contornar ou vencer esse obstáculo? Pimentel – A arrecadação de estados e municípios só fez crescer com o fortalecimento das micro e pequenas empresas, e com a formalização dos empreendedores individuais. A substituição tributária é uma forma de burlar parte dos benefícios da Lei Geral. No entanto, essa questão tem relação direta com o ICMS, que é de competência dos estados. É muito importante que as associações de classe, juntamente com o Sebrae local, realizem um movimento de sensibilização para que essa prática seja encerrada. Devem se articular com as assembleias legislativas para convencer o governo estadual a excluir as micro e pequenas empresas da substituição tributária. Sebrae – O Sr. conseguiu colher vitórias na implantação da Lei Geral em seu Estado, o Ceará? Que bons exemplos poderia citar, entre prefeituras que adotaram a LG e tiveram ganhos de arrecadação? Pimentel – O Estado do Ceará tem muitos exemplos de sucesso. Dos 184 municípios, 143 já regulamentaram a Lei Geral. São 244 mil micro e pequenas empresas no Simples Nacional em todo o Ceará e 95 mil empreendedores individuais. Fortaleza se destaca nas iniciativas. A Câmara Municipal foi a primeira instituição local a criar o Balcão do Empreendedor, com uma unidade móvel para formalização de empreendedores individuais nos bairros da cidade. Fortaleza possui hoje 101.800 micro e pequenas empresas no Simples Nacional e 42 mil empreendedores individuais. Depois se destacam Juazeiro do Norte, Caucaia, Maracanaú e Sobral, em números de formalização. O que importa é saber que estamos reduzindo a informalidade, gerando oportunidades de negócios, emprego e renda. Sebrae – O Sr. está entre os que consideram o Simples uma minirreforma tributária? Pimentel – Sim, o Simples Nacional foi uma verdadeira reforma tributária. Tudo foi possível devido à sensibilidade social do presidente Lula, ao trabalho do Sebrae e da Frente Parlamentar da Micro e Pequena Empresa no Congresso Nacional. Agora, continuamos com o seu aperfeiçoamento porque encontramos na presidenta Dilma Rousseff uma grande defensora do empreendedorismo para que o Brasil continue crescendo e gerando empregos. Seis anos do SUPERSIMPLES 33 Capítulo 2 • • • articulação nacional pelos pequenos negócios ARTIGO | CARLOS MELLES A Lei Geral foi propulsora do desenvolvimento e também trouxe novos problemas, que são muito mais fáceis de solucionar do que o imenso passivo social que envergonhava o Brasil. Entre os novos problemas está o da substituição tributária. O Estado tem uma certa miopia na arrecadação do ICMS. Se fizer a conta, verá que não está perdendo, porque ninguém perde o que não tinha. Se espremer os micro e pequenos empresários, vai tirar-lhes a competitividade. Redenção para o homem do campo “ Deputado CARLOS MELLES (DEM-MG) Secretário de Transportes e Obras Públicas de Minas Gerais Meu envolvimento mais intenso com a Lei Geral começou pela atuação na Frente Parlamentar de Apoio às MPEs, depois de retornar à Câmara após deixar o Ministério dos Esportes. Fui indicado para presidir a Comissão Especial pelo ex-ministro Palocci, que respeito muito, e pude escolher o deputado Luiz Carlos Hauly, do Paraná, como relator, e o cearense José Pimentel como interlocutor com o Governo Lula. É preciso honrar o papel do Congresso na construção dessa lei que teve origem externa, nas entidades de classe e no Sebrae, porque ali ganhou os aperfeiçoamentos necessários e viabilidade política. Ali se transformou numa reforma fiscal, trabalhista e previdenciária sem traumas. Foi uma lei bendita, porque todos saíram ganhando, e santa, porque realizou o milagre da maior inclusão de todos os tempos. 34 Seis anos do Supersimples O Simples Rural Carlos do Carmo Andrade Melles nasceu em São Sebastião do Paraíso (MG) em 1947, formou-se engenheiro agrônomo pela Universidade Federal de Viçosa, preside a cooperativa de café Cooparaíso. Deputado federal por cinco mandatos consecutivos, foi Ministro dos Esportes no Governo FHC. Foi presidente da Comissão Especial para discutir a Lei Geral. A carga tributária diminuiu, os pequenos negócios floresceram, a arrecadação aumentou e a sonegação praticamente desapareceu no campo da MPE. O Simples dignificou o cidadão, fez com que passasse a acreditar no governo e o governo, por sua vez, comprovou que, cobrando menos, arrecada mais. Mesmo os ganhos de arrecadação chegam a ser insignificantes se comparados à inclusão social, à geração de empregos, e ao aumento do consumo. Aprendi muito nas intensas negociações da Comissão Especial da Lei Geral. Como sou produtor rural, comecei a idealizar como aquelas grandes transformações poderiam ser estendidas ao trabalhador do campo, e estou convencido de que a criação de um Simples Rural seria ótima para o Brasil. Na construção civil houve espaço para a formalização do pedreiro, do carpinteiro, do pintor, do encanador, de todo mundo. A Lei Geral é perfeita para comércio, indústria e serviços, com seu potencial para tirar 15 milhões de brasileiros da informalidade. Mas os brasileiros que trabalham no campo chegam a 17 milhões de trabalhadores que estão excluídos. Seria ideal se pudessem trabalhar por produtividade, melhorando seus rendimentos. O homem que tiver a liberdade de prestar serviços como autônomo no meio rural pode capinar com máquina, colher com máquina, podar, usar da máquina para aumentar sua produtividade e renda. Precisa receber também formação e treinamento, e crédito para comprar equipamentos. Poderia constituir também uma microempresa rural na área de prestação de serviços. Com a tecnologia e o conhecimento adequados, os miniprodutores poderiam prestar serviços para os pequenos, os médios e os grandes. Acreditamos que o pequeno produtor poderia ser optante ou não do Simples, como microempresário, beneficiando sua produção e oferecendo produtos prontos para o consumidor, seja farinha de mandioca, doce de abóbora, queijo, doce de leite ou derivados. Poderia transformá-la em microindústria própria, levar ao mercado, emitir a nota fiscal normalmente. Microempreendedor rural está alienado Este é o caminho e não tem outro. Trabalhar com as mãos é só para quem faz artesanato. O trabalho manual na agricultura significa muito sacrifício. Hoje há máquinas manuais para colher e podar o café. O microempreendedor rural pode se especializar na cafeicultura, na fruticultura, para fazer tratos culturais e na colheita. Hoje esse potencial microempreendedor rural está alienado do processo, porque a CUT e os sindicatos receiam que ele perca a segurança trabalhista. Mas do jeito que as coisas estão, ele perde mais do que isso. Perde a própria garantia de emprego, se não puder se modernizar. A legislação trabalhista é uma das causas do atraso brasileiro. As organizações sindicais estão condenando o trabalhador rural a uma inferioridade injusta, à luz da inclusão propiciada pela Lei Geral. O trabalho de organização de base no meio rural já tem bons exemplos em muitos municípios brasileiros. E procura evitar distorções, como o passeio da produção de hortigranjeiros pelo país. A verdura do Sul de Minas é produzida em São Paulo. A do cinturão de Belo Horizonte vem de fora. Isso é um desperdício, e desperdício é pecado. O trânsito da produção pode ser menor e baixar os custos se houver incentivo às organizações municipais de produtores. Precisamos pensar também num programa de certificação ligado às compras governamentais de alimentos. Defendo que os produtores que cumprem os preceitos de qualidade, de preservação ambiental, de sustentabilidade econômica, devam ter preferência nas compras do Poder Público. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 35 Capítulo 2 • • • articulação nacional pelos pequenos negócios ARTIGO | José Tarcísio da Silva Uma reivindicação permanente da Comicro foi pelo acesso ao crédito. Sempre nos manifestamos contra a exigência de garantias que inviabilizavam esse acesso. As microempresas não tinham condições de contrair financiamentos por causa das exigências burocráticas. Conseguimos uma importante redução da papelada para o cadastro e também para a garantia real. Os grandes têm o MDIC “ Ministério toda força ao das mpes José Tarcísio da Silva Presidente da Comicro José Tarcísio da Silva nasceu em Surubim (PE), em 1955. Fez curso de Técnico em Comércio em nível de 2º grau. Sua empresa é um mercadinho em Recife, chamado Pirâmide Hortigranja e Cereais. Presidiu a Conempec, que deu origem à Confederação Nacional das Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Comicro). 36 Seis anos do Supersimples Depois de vencermos as lutas pela aprovação da Lei Geral no Congresso, em 2006, continuamos a lutar regionalmente. O limite nacional de faturamento da microempresa é de R$ 360 mil, e da pequena empresa de R$ 3,6 milhões. Porém, os estados do Nordeste adotavam um subteto de R$ 240 mil e R$ 1,8 milhão. Em Pernambuco, conseguimos sair para o limite pleno, mas em alguns estados, como Paraíba e Alagoas, o subteto continua vigorando. Regressamos a Brasília para unir esforços com o Sebrae e a Frente Parlamentar pela inclusão de outros segmentos e a aprovação do microempreendedor individual. Saímos vitoriosos e tivemos a satisfação de presenciar, no Palácio do Planalto, a presidenta Dilma Rousseff anunciar a redução da contribuição dos MEIs de 11% para 5% do salário mínimo. São os avanços que nos animam a prosseguir na luta. O ideal seria que houvesse um fundo garantidor, por parte do Governo Federal, onde as MPEs não precisassem nem de aval, nem de hipotecar seus bens pessoais. Esse fundo ficaria dentro do novo Ministério. Os recursos seriam oriundos do próprio segmento. Fizemos uma campanha pesada junto com as federações estaduais das MPEs, nas audiências da Frente Parlamentar, pela criação do Ministério da Micro e Pequena Empresa. O Ministério deverá regular o segmento e fomentar o desenvolvimento, um poder que o Sebrae, por ser órgão de apoio, não tem. Os grandes têm o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, além de seus próprios defensores dentro do Governo, e os pequenos não tinham nada. Exemplo disso foi quando a presidenta Dilma Rousseff, para agradar a indústria, anunciou uma redução na tarifa de energia em 28%. A MPE ficou incluída na faixa do consumidor domiciliar, com uma redução tarifária de apenas 16%. Somos favoráveis à desoneração de alguns segmentos da Previdência Social, para colocar mais dinheiro no bolso do trabalhador e circulando na economia. Em vez de um funcionário ganhar R$ 1.000,00 e gerar encargos de FGTS, férias, 13º, ele se inscreve como MEI naquela profissão e passa a ganhar até R$ 5 mil, mantendo a proteção da Previdência, a legalidade com o CNPJ e a chance de fazer seu pé-de-meia. Um pacote de maldades A legislação trabalhista vem dos anos Vargas e nunca foi modificada. Reformá-la é enfrentar uma resistência muito grande. Mas, com ela, o custo da produção acaba se tornando proibitivo. A solução que encontramos ainda não é uma maravilha, mas quebrou-se um paradigma com o Fisco. O país não faliu, o Estado não faliu, a Receita admite que está arrecadando bilhões. É preciso reconhecer, admitir e corrigir algumas distorções que estão asfixiando alguns setores. É o caso dos mercadinhos e quitandas, que têm margem de lucro bruto de até 12%, bem abaixo de quem vende eletrodomésticos, por exemplo, com margem de 30 a 40%, com a vantagem de seus produtos não serem perecíveis. Muitos estados dão diferencial de ICMS aos produtos da cesta básica. Hortigranjeiros da agricultura familiar são isentos de impostos. Porém, a máquina emissora de cupom fiscal acumula todos os dados do que o comerciante vende. Quando o Simples é informado, a guia inclui ICMS em média de 17%, e o comerciante continua pagando PIS-Cofins, ICMS, tudo. É preciso rever isso, porque senão os mercadinhos vão fechar e só vão ficar os grandes. A solução que a Comicro defende é uma redução pura e simples de 50% para o comércio de alimentos. Outra saída é a abertura de uma janela para o comerciante, quando informar o faturamento, descontar na íntegra a isenção do ICMS que o Estado dá. Todos os dias recebo queixas de donos de mercadinhos e quitandas ameaçando fechar as portas e voltar para a informalidade. Isso aí contraria tudo o que idealizamos com a instituição do Simples. É um retrocesso que ninguém pode aceitar. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 37 Capítulo 2 • • • articulação nacional pelos pequenos negócios ARTIGO | Guilherme Campos Selva tributária fora do Simples Deputado federal Guilherme Campos (PSD) “ O Simples não está pronto, como nenhuma lei Guilherme Campos nasceu em Campinas (SP) em 1962. Formou-se em Engenharia Civil pela Politécnica de São Paulo. É empresário do ramo de cama, mesa, banho, utilidades e presentes. Foi dirigente da Câmara de Dirigentes Lojistas e da Associação Comercial de Campinas. Está em seu segundo mandato na Câmara dos Deputados. 38 Seis anos do Supersimples está. Precisa ser aperfeiçoado para incorporar todos os ramos de atividade nos benefícios da Lei Geral. Meu “mantra” pessoal é que qualquer empresa, independentemente do ramo de atividade, possa ser enquadrada na Lei Geral. Observo que no Conselho Gestor diversos órgãos participam dizendo o que pode e o que não pode fazer. Existe uma tabela de enquadramento segundo sua atividade. Defendo que todos os ramos possam ser enquadrados tendo o faturamento como norteador desse enquadramento. Isso incluiria todas as categorias profissionais, advogados, fisioterapeutas, jornalistas... Estamos buscando incluir na próxima etapa algumas categorias que ficaram de fora, os representantes comerciais, os corretores de seguros, de imóveis, as clínicas de fisioterapia e as academias, que estão mais maduras para ser enquadradas. Só não foram ainda porque não havia acordo. Sou favorável à substituição tributária, porque a considero uma maneira inteligente de cobrar imposto na fonte e não no varejo. No entanto, esse mecanismo, ao dar isonomia para todos os setores, tira aquilo que era reconhecidamente uma atenção especial para a micro e pequena empresa. É preciso encontrar dentro da Lei Geral um antídoto para a substituição tributária, mas isso não depende da vontade da Câmara, nem do Governo Federal, mas dos governos estaduais representados no Confaz. É preciso encontrar uma equação para a coexistência da substituição tributária com o tratamento diferenciado previsto no Simples. Junto com a substituição tributária há outro ponto que é a tributação de ICMS nas operações interestaduais, com diferença de alíquotas acentuada pela guerra fiscal. A diferença entre São Paulo e os estados vizinhos pode ser de até seis pontos percentuais. Isso precisa ser resolvido com um acordo de abrangência nacional. Cartão de débito é mais caro para MPE Não é preciso consultar nenhum professor universitário para chegar à conclusão de que a boa vontade e a compreensão mútua das necessidades é que dará o caminho para chegar a uma solução. Os secretários de Fazenda hoje não querem nem ouvir falar em eliminar a substituição, mas a verdade é que o tratamento diferenciado às MPEs foi por água abaixo. Há outro ponto para o qual devo alertar, que é o advento do cartão de crédito e de débito. Os custos das operadoras de cartões são maiores para as MPEs. As grandes empresas, por causa da escala, não pagam tanto, mas as pequenas têm que repassar ao consumidor, perdendo competitividade. No Congresso tramitam iniciativas nossas para o aperfeiçoamento da Lei Geral. A primeira delas é para que haja um tratamento de transição quando a empresa deixa de ser pequena, para se tornar média ou grande. Hoje não há um degrau. Há um abismo, porque o empresário sai de um tratamento simplificado, de uma única guia, e cai na selva tributária brasileira, num manancial de impostos e obrigações acessórias. Sugerimos uma transição ao longo de três anos. Caso contrário as empresas vão se policiar para não extrapolar os limites. A Lei Geral não pode inibir que o pequeno se torne grande. Outra sugestão nossa é que a cobrança dos impostos das empresas enquadradas no Simples tenha a sistemática do imposto de renda, que tem uma faixa contínua, e se paga apenas a diferença sobre o que extrapolar. Seria como óculos bifocal, comparado ao conforto do multifocal. A terceira sugestão é de uma legislação trabalhista diferenciada para as MPEs, simplificando a contratação de funcionários. A CLT está desatualizada, mas falar em mudanças, mesmo depois de 70 anos, é algo que deixa meio mundo arrepiado. O populismo ainda é muito grande. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 39 Capítulo 2 • • • articulação nacional pelos pequenos negócios ARTIGO | Confúcio Moura RONDÔNIA É O PARAÍSO DO EMPREENDEDORISMO “ Confúcio Moura Governador de Rondônia Sou dos que acreditam que menos sobre mais é Confúcio Aires Moura, nascido em Dianópolis (TO) em 1948, chegou em Rondônia em 1975, radicando-se no município de Ariquemes, onde foi o primeiro médico residente, formado pela UFGO. Foi secretário de Estado da Saúde, deputado federal eleito por três mandatos. Em 2004, elegeu-se prefeito de Ariquemes, sendo reeleito em 2008. Venceu o prêmio Prefeito Empreendedor do Sebrae em 2010, graças ao projeto de microcrédito que desenvolveu com o Banco do Povo. 40 Seis anos do Supersimples mais. Assim como acredito na força da mente criativa e na atitude laboral como instrumentos de desenvolvimento. Rondônia se insere como uma luva nesse conceito, por ser dos mais novos estados da federação e constituído, majoritariamente, por migrantes de todas as partes do Brasil que trouxeram, como capital, a criatividade e a disposição de concretizar sonhos. Essa foi a regra geral dos que aportaram nestas terras do extremo Oeste do Brasil nas décadas de 1970 e 80. Faço a afirmativa com a segurança de quem foi testemunha e partícipe dessa epopeia. Fui um destes migrantes que trouxeram somente uma mala cheia de sonhos. E uma fome de trabalho que ainda não saciei. Em pouco mais de três décadas, saímos da condição de território com pouco mais de 100 mil pessoas espalhadas nas imensidões de nossas florestas, para mais de 1,5 milhão de habitantes em 52 municípios. Essa expansão comprova a força do trabalho criativo de um povo que começou grande na atitude, mas igualitariamente pequeno nos negócios empreendidos. Os grandes de hoje vieram dali. Cresceram junto com o Estado. O Simples foi o estímulo necessário Rondônia é o paraíso do empreendedorismo. O espaço é amplo e aberto aos de casa e aos de fora que queiram começar um negócio. O nosso Estado já praticava políticas públicas de incentivo à microempresa desde 1998, no governo do hoje senador Valdir Raupp. A chegada do Simples Nacional em 2006 veio diretamente ao encontro dos interesses dos novos empresários e das jovens empresas de Rondônia. A desoneração, a queda de barreiras burocráticas e, sobretudo, a redução tributária, ofereceram o estímulo necessário que faltava à consolidação formal da atividade empresarial e à segurança de uma base de arrecadação tributária para o novo Estado. Acompanhei atento e participei de perto das ações e articulações no Congresso Nacional pela aprovação da Lei 123/2006. Eu era deputado federal da bancada do PMDB, meu partido de sempre. Embora tenha sido um grande e importante passo para a consolidação de um segmento que responde por 80% dos empregos formais do País, faltava ainda buscar o amparo e a inclusão para milhões de trabalhadores por conta própria sem nenhuma segurança trabalhista ou previdenciária. Só a formalização e a personalidade jurídica poderiam lhes assegurar a inclusão no guarda-chuva da proteção do Estado. E lhes garantir a cidadania e resgatar a dignidade. E foi o que o Sebrae e as lideranças pioneiras do Simples fizeram junto com o Governo Federal. Rondônia aplaudiu a LC 128 Esse segundo passo veio com a Lei Complementar 128/2008, criando a figura do Microempreendedor Individual. Esse ato, somado ao primeiro, constituiu-se em verdadeira reforma tributária tão reclamada pelas classes empresariais e pela sociedade. Nós, em Rondônia, aplaudimos a medida e tínhamos razões para isso. Não é à toa que, neste 5 de maio de 2013, em que escrevo esse artigo, atingimos a marca de 54.703 micro-empresas ativas e microempreendedores individuais devidamente cadastrados e ativos no Estado. Uma coisa formidável. Dos 4,4 milhões de micro e pequenas empresas e 3 milhões de MEIs cadastrados no País, nós demos a nossa parcela. Mas para isso, várias ações indutivas do Governo estão em execução e estimulando os pequenos empreendedores e os trabalhadores individuais, dando-lhes condições de tocar seus micronegócios, gerando empregos para si e para outros. Entre estas ações está o nosso Banco do Povo, presente em mais da metade dos municípios, levando o microcrédito desburocratizado e subsidiado ao simples trabalhador excluído do sistema financeiro convencional; as agroindústrias rurais familiares e a piscicultura de cultivo entre pequenos produtores, que saiu de 12 mil toneladas em 2010 para uma produção de 40 mil em 2012. E, em dois anos, chegará a 100 mil. E abrimos nosso governo para as pequenas empresas através do pregão eletrônico. Estender o Simples à área rural Mas precisamos avançar. É necessário ampliar a base do Simples, incluir novas categorias profissionais e levar esses benefícios para os empreendimentos rurais. Discutir a possibilidade de se estabelecer um percentual, nos grandes contratos do Estado, para incluir a subcontratação da pequena empresa e até mesmo algumas atividades do microempreendedor individual. Universalizar as atividades individuais, as categorias profissionais e até as novas profissões. Criar um fundo garantidor que desonere a micro e pequena empresa do aval ou de ter que ofertar sua própria casa numa atividade de risco como é todo negócio. Cabe-nos, governos estaduais, municipais e federal e as representações da sociedade, buscar fórmulas de continuarmos abrindo fronteiras que possibilitem a proteção e a expansão da atividade produtiva que garanta o emprego. O resto é consequência. Mas precisamos, também, abrir uma boa discussão sobre meios de proteção e compensação aos estados de menor população e menor base tributária durante essa travessia. Provisoriamente, lógico. Senão, ficamos como o pai a quem o filho pede o pão e este o nega Seis anos do SUPERSIMPLES 41 Capítulo 2 • • • articulação nacional pelos pequenos negócios ARTIGO | Confúcio Moura EXEMPLOS DE SUCESSO | rondônia por não poder dar. A substituição tributária, criticada por retirar vantagens sobre categorias amparadas pelo Simples, é uma espada de Dâmocles. Se não a fazemos, não fechamos as contas. Se a praticamos, ficamos com a cara feia da sociedade. Eu quero o pouco sobre muitos, mas preciso de apoio para saltar o abismo. Esses são nossos urgentes desafios. A resolutividade destas questões transformarão o Brasil num bom exemplo para o mundo, num momento em que todas as fórmulas estão sendo postas à prova em todos os continentes. “ Exemplos de sucesso Os exemplos colhidos em Rondônia mostram a garra empreendedora dos migrantes do Sul do País que se fixaram na Amazônia, e também o espírito criativo de pessoas que constroem sua empresa a partir de uma ideia. 42 Seis anos do Supersimples bombons regionais Delícias da Vovó Edma Vovó Edma, como é hoje conhecida em Porto Velho, nasceu em São Paulo, mas foi no Paraná que conheceu o gaúcho Igídio. Casaram-se e migraram para Rondônia em 1983. Quem prova seus saborosos bombons regionais e os biscoitos, compotas e conservas que os dois produzem, não é capaz de imaginar os dramas já enfrentados pelo casal. Tiveram que viver lambuzados de graxa debaixo de caminhões, criar gado confinado, vender lasanha e tremer de malária nos garimpos. Quando se casaram, há mais de três décadas, Edma Maria Sperandio e Igídio Golin, hoje com 59 e 65 anos, adquiriram uma oficina mecânica. Em 1983, surge uma oportunidade de mudança para Vilhena, sul de Rondônia, e eles, sem pestanejar, decidem agarrá-la. Em poucos anos, o negócio afunda e eles decidem retornar ao Paraná. Ali, perdem o pouco que tinham. Voltam em seguida para Rondônia, instalando-se em Ariquemes, que, na época, era apelidada “cidade da malária”. Edma foi acometida pela doença apenas uma vez, mas Igídio perdeu a conta dos contágios que sofreu tanto na oficina que montaram na cidade, como no garimpo onde também fora ganhar a vida, extraindo cassiterita e topázio. Seis anos do SUPERSIMPLES 43 Capítulo 2 • • • articulação nacional pelos pequenos negócios EXEMPLOS DE SUCESSO | rondônia turismo ecológico “Tudo o que fazíamos era para pagar as contas de hospitais e dos tratamentos. Sem falar que a produção foi lá pra baixo”, conta Vovó Edma. Com o marido constantemente doente, ela assumiu pessoalmente o garimpo, durante quatro meses, até perceber que essa não era a saída. A situação se agravou progressivamente, até que decidiram tentar a sorte na cozinha. Lasanha, empadão e alguns doces substituíram, então, o trabalho na oficina e no garimpo. A vida ficou mais doce Exauridos pela experiência adversa em Ariquemes, a paulista e o gaúcho decidiram se mudar, em 2006, para Porto Velho. Queriam deixar o sofrimento para trás e começar vida nova. Trocaram a casa do interior por outra na capital, onde organizaram seu empreendimento culinário, agora priorizando os docinhos, como o pé de moleque de castanha e a barrinha de cupuaçu, os bolos recheados, os panetones e as conservas, sobretudo as de quiabo, cebola e batatinha. Os dotes culinários de Vovó Edma e a capacidade de trabalho de Igídio foram dedicados ao novo negócio de bombons regionais. A incansável vovó transformou sua cozinha em um verdadeiro laboratório de bombons. Acertava algumas vezes, errava outras, queimava as mãos, até dominar não apenas a técnica, mas o sabor das frutas e das misturas com o doce de leite e o cacau, atingindo um grau de qualidade que lhe granjeou admiração e prestígio. Nos três primeiros anos em Porto Velho, o casal trabalhou por conta própria. Seus produtos – cujo carro-chefe passou a ser o bombom regional – eram divulgados através do boca a boca. Até que Edma e Igídio decidiram ousar e testar a receptividade dos frequentadores do “Espaço Alternativo”, local da cidade em que centenas de pessoas se reúnem para praticar exercícios físicos e, especialmente, fazer caminhadas. “Muita gente falava que ali era lugar para as pessoas entrarem em forma, não para comer guloseimas”, conta 44 Seis anos do Supersimples Amazônia Adventure a já experiente doceira, que teimava: “Quem caminha é saudável e tem vontade de comer”. A máquina de rechear bombons O certo é que a iniciativa vingou, aliada à crescente exposição dos produtos do casal nas feiras promovidas pelo Sebrae. A consequência inevitável era a formalização, que passou a ser cobrada pelo próprio Sebrae, muito embora a experiência pretérita gerasse, sobretudo em Edma, um grande receio. Percebendo que não podiam mais recuar, abriram, em 2009, a “Vovó Edma Delícias”. Igídio resolveu exercer seu talento de mecânico e construir uma máquina capaz de rechear os bombons. Por indicação do Sebrae, recebeu a visita de engenheiros do Senai, que se encarregaram de viabilizar a ideia com recursos da Finep. Os recursos estão em vias de liberação e a patente será assegurada a Igídio. A produção atual da “Vovó Edma Delícias” é de quase 10 mil bombons mensais – cada qual vendido a R$ 2,00, além das compotas, dos doces, dos biscoitos e dos licores, que também passou a comercializar. Os bombons são feitos com cacau puro ou doce de leite, nunca com chocolate, o que aumenta consideravelmente sua durabilidade. Podem, assim, permanecer até 30 dias em ambiente natural, sem qualquer prejuízo. Com a máquina, a produção passará de 800 bombons diários para dois mil por hora. Desde muito jovem, o maranhense Saulo Giordane Lopes Serra, hoje com 30 anos e radicado em Porto Velho há 29, começou a pensar em trabalhar na área de turismo. Na adolescência, fabricou refrescos e pipas de papel para vender aos colegas, e ajudou numa cantina de escola. Sem contar que em dezembro e janeiro, cuidava de uma banca de revistas, onde aproveitava para ler bastante. E sonhar com viagens e aventuras. A sorte veio ajudá-lo quando concluiu o 2º grau. Naquele momento, Porto Velho ganhava uma faculdade de Turismo, onde ingressou. Sua vocação para empreendedor de turismo de aventuras revelou-se no curso. Quando se formou, conseguiu patrocínio para viajar pelo Amazonas e Roraima. Começou descendo o rio Madeira de barco até Manaus e pegou muita carona, durante quase quatro meses. Antes mesmo de se formar, já empreendia enduros, numa empresa chamada “Raízes da Aventura”. Depois criou a “Amazônia Adventure”, um projeto mais ambicioso de turismo de aventura na região. As incursões da empresa pelos trajetos históricos de Rondônia deram origem, depois, a um programa de TV de meia hora, exibido toda semana. Trabalho e renda para 25 pessoas A “Amazônia Adventure” tem um faturamento bruto anual de R$ 180 mil, concentrando a maior rentabilidade nos dois últimos anos. É administrada apenas por Saulo e seu sócio Felipe e não mantém nenhum funcionário contratado, mas os eventos que organiza geram ocupação e renda para cerca de 25 pessoas, de abril a dezembro. Saulo utiliza ferramentas modernas de marketing e as redes sociais para divulgar seus produtos, e não descuida da reciclagem. Faz todos os cursos do Sebrae que tenham ligação com sua atividade e gosta de mencionar Seis anos do SUPERSIMPLES 45 Capítulo 2 • • • articulação nacional pelos pequenos negócios EXEMPLOS DE SUCESSO | rondônia que, em 2004, foi patrocinado pelo Serviço numa viagem a São Paulo, para participar do Salão do Turismo. “Esta oportunidade fez crescer minha visão de negócios, abrindo-a em 360 graus”, admite. Projetos novos e inovadores são sempre uma motivação para a Adventure. Neste ano, pretende investir ainda mais nas feiras, consolidando sua participação no segmento. O ano da Copa também já está em seu horizonte, considerando, sobretudo, que Cuiabá e Manaus, as capitais mais próximas de Porto velho, sediarão jogos internacionais. A especialização interna e a efetivação de um staff permanente também estão nos planos. Explorar a localização privilegiada de Porto Velho, inclusive no que diz respeito à Bolívia e ao Peru, está entre as prioridades para o futuro. Isso permitirá que expanda suas atividades para turistas de outras regiões e até mesmo do exterior. O estímulo à sustentabilidade ambiental integra as preocupações de Saulo desde que ingressou no ramo. Já no primeiro evento que organizou, em 2004, promoveu o plantio de mudas de árvores. 46 Seis anos do Supersimples artesanato Peixes e frutas de madeira Ezequiel Candioto, 45 anos, descendente de italianos, integra a grande colônia de paranaenses radicados em Rondônia. Deixou o Sul do país ainda garoto, para acompanhar os pais, que foram tentar a sorte na região, em 1978. Os estudos ficaram para trás, no Paraná. Em Rolim de Moura, onde a família se instalou, o garoto logo foi ajudar os pais na roça. Depois disso, conseguiu um emprego na Prefeitura da cidade, onde, durante três anos, tomou conta do almoxarifado. Foi quando seu futuro profissional começou a se moldar. Ezequiel teve a oportunidade de acompanhar uma licitação para compra de cadeiras em uma marcenaria. “Fiquei invocado, vendo os caras trabalhar. Achei bonito, gostei muito de ver aquele pessoal lidando com a madeira tão abundante”, recorda. Naquele momento descobriu sua vocação e não titubeou: largou a Prefeitura e pediu emprego ao dono da marcenaria, como aprendiz. Com três meses, já estava trabalhando na produção, como marceneiro, produzindo cadeiras e móveis em geral. O jovem paranaense continuou exercendo a profissão de marceneiro, passando em seguida a entalhar móveis. No total, entre a marcenaria e o entalhe, Ezequiel laborou por aproximadamente 16, 17 anos. Foi em 2001, contudo, quando já morava em Ariquemes, que seu talento despontou para o artesanato, buscando algo que incorporasse à madeira ainda mais beleza e valor estético. A carreira de artesão Um dia, passeando pelas ruas da cidade, Ezequiel viu uma faixa afixada em frente à sede do Sebrae: “Curso de pequenos objetos em madeira”. Inscreveu-se e fez o curso. A princípio detestou o instrutor, um designer de renome, que lhe exigia o desenvolvimento de peças nas quais não estava interessado. Só muito tempo depois percebeu a filosofia de trabalho do mestre, seu propósito de estimular a criatividade dos alunos. “Se não fosse isso, eu não teria condições de fazer tantos tipos diferentes de peças, como faço hoje”, admite. Com o incentivo do Sebrae, passou a participar de diversas feiras, apresentando e desenvolvendo seus produtos, inicialmente como pessoa física e, a partir de 2010, como empreendedor individual. A formali- zação, aliás, ressalta o artesão, foi exigência do cliente, que, via de regra, necessita da emissão da nota fiscal. O faturamento médio mensal bruto da Picapau Artesanatos é da ordem de R$ 2,8 mil, sendo o líquido em torno de R$ 2 mil. Cerca de 90% de suas peças são vendidas para presente nos meses de férias. Peixes e frutas predominam no trabalho, destacando-se o tucunaré, o tambaqui, o cacau, o cupuaçu, o caju e a banana. Mais de 80% da madeira que utiliza é a teca, de origem asiática, usada em embarcações e obtida de reflorestamento. Seis anos do SUPERSIMPLES 47 Capítulo MOREIRA: “Ousamos mudar radicalmente a estratégia de ação com a Reinvenção do Sebrae”. Gianni: “Substituição tributária é direito dos Estados. O verdadeiro inimigo é a imobilidade”. Okamotto: “Toda vez que a negociação na Receita emperrava, o presidente Lula interferia”. Burti: “Contrariando os pessimistas de plantão, a arrecadação aumentou em mais de 300%, desde julho de 2007”. Cadore: “Não podemos esmorecer, nem ensarilhar as armas. Os pequenos querem mais. A luta não terminou”. 48 Seis anos do Supersimples 3 Protagonistas A evolução do Sebrae nos últimos 25 anos se fez com profundas reformulações e insights institucionais revolucionários. A inquietude e o dinamismo que estão inscritos no DNA do Serviço provocaram ciclos marcantes, acrescentando a sua função original de apoiar e treinar um caráter mais completo de agência de desenvolvimento, de articulação interinstitucional e formulação de políticas públicas. Momentos de grande lucidez e coragem sacudiram as gestões de Sérgio Moreira, Silvano Gianni e Paulo Okamotto e são relatados por esses autores. A visão do papel atual e futuro do Sebrae foi projetada pelo presidente Luiz Barretto nas primeiras páginas deste livro. Passado, presente e futuro do Sebrae são abordados por ex-dirigentes e atuais diretores. Os depoimentos de outros dirigentes estaduais de grande dedicação à luta das MPEs estão disseminados pelos capítulos ilustrados com reportagens em seus estados. O presidente do Sebrae na virada do milênio foi Sérgio Moreira. Ele enaltece dois nomes da galeria dos combatentes em favor das MPEs: o ex-ministro Paulo Lustosa, que lutou para incluir o tratamento diferenciado na Constituição de 1988, e Gerson Gabrielli, protagonista da aprovação do primeiro Estatuto da MPE. Silvano Gianni, que sucedeu a Moreira, desafiou o corpo técnico do Sebrae a diagnosticar e corrigir as causas da mortalidade precoce das pequenas empresas. do sebrae CARLOS SANTOS: “No Congresso Nacional, o tema encontra grande simpatia dos deputados e senadores”. Claudio SANTOS: “Rio Grande do Sul usa compras governamentais para melhorar a distribuição de renda”. Chegaram à conclusão de que era preciso desonerá-las da carga tributária excessiva, e isso criava tremendos impasses institucionais. Gianni sabia que não seria possível ousar um projeto desses contra a vontade do Ministério da Fazenda, e decidiu empreender uma grande mobilização nacional, articulando representantes políticos e parceiros capazes e resolutos. Paulo Okamotto foi um desses parceiros. Com firmeza e determinação, antes mesmo de assumir a Presidência do Serviço, começou a remover obstáculos e contratar consultorias de altíssimo nível. Quando a negociação com as autoridades tributárias emperrava, ele recorria ao presidente Lula para que todos voltassem à mesa de discussão. Aprovada a Lei Geral, Okamotto aponta a substituição tributária como uma grande ameaça para neutralizar seus efeitos. Alencar Burti, presidente do Conselho do Sebrae SP, é um veterano das lutas em favor dos pequenos negócios na área do comércio. Ele lembra que os pessimistas de plantão profetizaram queda na arrecadação com o Supersimples, mas essa aumentou mais de 300% desde 2007. Burti lista cinco frentes de batalha para o próximo biênio, de modo a consolidar São Paulo como um ótimo lugar para se empreender. Hélio Cadore, com 33 anos de dedicação ao Sebrae Paraná e à Abase, relembra as primeiras lutas do Movimento Nacional das MPEs, liderado por José Tarcísio e Ercílio Santinoni, e a elaboração do documento “Pequena Empresa e Desenvolvimento”, que se tornaria o primeiro esboço da Lei Geral. Entre outros parceiros, ele destaca a implantação pioneira da Lei Geral no Paraná, graças à vontade política do governador Roberto Requião. O diretor técnico do Sebrae Nacional, Carlos Alberto dos Santos, afirma que o Supersimples veio ao encontro da necessidade dos pequenos negócios, e por isso é um sucesso. Recorda que o Sebrae subsidiou tecnicamente todo o processo, além de apoiar a mobilização nacional de 100 mil participantes de seminários, oficinas e discussões em todo o país. Para ele, o processo foi republicano, moderno, atual e transparente. Já o diretor de Administração e Finanças do Sebrae Nacional, José Claudio dos Santos, prefere destacar o trabalho intenso de conscientização do empresariado brasileiro realizado por mais de 5 mil colaboradores do Sistema Sebrae em todo o Brasil. Ele acredita que o Supersimples poderá servir de modelo para a reforma tributária de que o País necessita. Seis anos do SUPERSIMPLES 49 Capítulo 3 • • • Protagonistas do Sebrae ARTIGO | Sérgio Moreira uma construção permanente “ Sérgio Moreira Ex-presidente do Sebrae Nacional Os seis anos do Simples Nacional consolidam um Julio Sérgio de Maya Pedrosa Moreira nasceu em Alagoas em 1960 e graduou-se bacharel em Direito pela UFAL. Foi deputado federal por Alagoas (1983-87), presidente da Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (Chesf), secretário executivo do Ministério do Meio Ambiente e Amazônia Legal, e superintendente da Sudene. Atualmente é diretor-adjunto do Senai-DN e diretor adjunto da CNI. 50 Seis anos do Supersimples longo, difícil e tenaz processo de fortalecimento dos pequenos negócios que remonta à Constituição de 1988, na qual os artigos 170 e 179 determinam tratamento favorecido às micro e pequenas empresas. De lá para cá foram 25 anos de avanços – uma geração – até chegar à legislação em vigor, a Lei Geral das MPEs. Foram muitos os atores que contribuíram para se atingir o Simples Nacional. Podemos começar por Paulo Lustosa, que no governo Sarney atuou para que a Constituinte consagrasse o tratamento diferenciado aos pequenos negócios. Com o Sebrae renascido das cinzas após ser extinto como órgão público no governo Collor, já a partir do governo Itamar Franco inicia-se seu protagonismo na formulação, articulação e mobilização de políticas públicas de apoio às MPEs. No primeiro mandato do governo Fernando Henrique Cardoso é criado o Simples Federal, embrião do Simples Nacional, resultado de mobilização nacional liderada por Guilherme Afif Domingos, então presidente do Conselho Deliberativo Nacional do Sebrae, cuja diretoria executiva era presidida por Mauro Durante. Tive a honra de ser diretor presidente do Sebrae entre 1999 e 2002, por dois mandatos, no segundo governo FHC, com Maria Delith Balaban e Vinícius Lummertz ao meu lado na diretoria e Pio Guerra e Carlos Eduardo Moreira Ferreira, sucessivamente, como presidentes do Conselho Deliberativo Nacional. Em 1999, com a destacada ajuda dos deputados Augusto Nardes, Luiz Carlos Hauly e Gerson Gabrielli, entre vários outros parlamentares, foi aprovado no Congresso Nacional, após cinco anos de tramitação, o Estatuto da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte. Não menos importantes foram a ampliação dos limites de faturamento das MPEs para enquadramento no Simples e o REFIS, que, pela primeira vez, refinanciou a longo prazo o total das dívidas tributárias e previdenciárias das empresas. Emprego, emprego e emprego Logo em seguida à minha eleição para o Sebrae, perguntei ao presidente Fernando Henrique qual a principal contribuição a ser prestada para o desenvolvimento do País pelo Sebrae e ele me respondeu de imediato: gerar empregos! Não por coincidência, tivemos como um dos principais mentores da formulação da nossa estratégia o mestre Ignacy Sachs, pioneiro e referência mundial em ecodesenvolvimento que nos ensinava que o Sebrae deveria ter três grandes prioridades: emprego, emprego e emprego. Com essa visão, logo no início da gestão, ousamos mudar radicalmente a estratégia de ação com a Reinvenção do Sebrae. Passamos a atender dos milhares aos milhões e acrescentamos o articular ao fazer. E a partir daí foram eleitas sete prioridades: reduzir e simplificar tributos e desburocratizar; desenvolver arranjos produtivos locais; potencializar e difundir experiências de sucesso; educação empreendedora para milhões; fomentar a cultura da cooperação, disseminar o crédito e a capitalização; e articular uma rede de apoio às MPEs. São fruto da Reinvenção do Sebrae iniciativas até então inéditas. O programa Brasil Empreendedor capacitou, com conteúdo básico em mercado, finanças e gestão, cerca de 1,4 milhão de empreendedores, permitindo-lhes acesso ao crédito. Deflagrou-se um amplo programa de apoio ao microcrédito. Venture Capital para as Start-ups O Sebrae não descuidou, também, das pequenas empresas inovadoras, tendo criado, em parceria com o BNDES e o BID-FUMIN, os primeiros fundos de venture capital destinados às hoje conhecidas start-ups. Criamos o Desafio Sebrae para os universitários e espalhamos em grande escala a educação empreendedora com os primeiros programas de Educação à Distância na internet e na televisão, além de resgatar o rádio para chegar aos brasileiros nos recantos mais distantes do País. O Programa Sebrae de Design procurou dar uma cara brasileira aos produtos das MPEs, enquanto o Programa Sebrae de Artesanato adotou do Artesanato Solidário, o resgate dos saberes e fazeres de raízes históricas como um dos seus focos, ao lado do artesanato utilitário como um negócio. Em parceria com o Comunidade Solidária liderado pela Professora Ruth Cardoso, mobilizamos mais de mil municípios com o Programa Desenvolvimento Local Integrado e Sustentável (DLIS) que fomentava a organização das comunidades para o protagonismo social e econômico. Em síntese, estas são algumas das iniciativas nesse rico período de transformações em que tive o privilégio de liderar a Rede Sebrae em conjunto com os seus dirigentes estaduais e seu comprometido corpo técnico em todo o País. E fica a esperança de que o processo continue evoluindo com aperfeiçoamentos como a incorporação de mais segmentos no regime tributário diferenciado e a adoção do Simples Trabalhista, por exemplo. Como se vê, o processo de fortalecimento dos pequenos negócios é uma construção permanente. Não podemos nunca nos dar por satisfeitos, porque aprimorar os mecanismos de apoio às micro e pequenas empresas, razão de ser do Sebrae, é construir um Brasil melhor e socialmente mais justo. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 51 Capítulo 3 • • • Protagonistas do Sebrae ARTIGO | Silvano Gianni Simples versus substituição tributária Trabalhamos como uma orquestra, os músicos tocando afinados e eu na honrosa posição de maestro. Grandes solistas foram o José Pimentel, o Okamotto, Augusto Nardes, Luiz Carlos Hauly e Carlos Melles, que entenderam logo a partitura. Além dos superintendentes dos Sebraes estaduais, músicos competentes. Outra personalidade solícita foi o Armando Monteiro. Era deputado, presidente da CNI e do Conselho do Sebrae. Comprou a ideia, embora representasse a grande empresa, e tinha poder de veto no Sebrae. Fizemos contratações que tiveram um custo. Se o Armando fosse contra, poderia travar tudo. Mas ele adotou o projeto com o espírito generoso de homem público: “Se é bom para o país, vamos fazer”, disse. “ Silvano Gianni Ex-presidente do Sebrae Nacional A ameaça da substituição tributária Quando assumi a Presidência do Sebrae, a cons- tatação que me deixou mais alarmado foi a alta taxa de mortalidade das micro e pequenas empresas. Ninguém abre uma empresa para fechá-la no ano seguinte, mas sonha mantê-la a vida inteira. Tratamos de diagnosticar as razões e passamos a orientar os esforços do Sebrae na direção de dar-lhes longa vida. Tivemos grandes parceiros nessa luta. Paulo Okamotto era muito mais Governo do que Sebrae, e nos ajudava removendo obstáculos. Não fosse ele, provavelmente não teríamos o sucesso que obtivemos. Não é possível ousar um projeto desses contra a vontade do Ministério da Fazenda, se não houver muita articulação. Temos que ter parceiros capazes e resolutos em todas as áreas, e alguém para capitanear. É preciso grande mobilização, ir ao Brasil todo, falar com governadores, vender nosso peixe e avançar. 52 Seis anos do Supersimples silvano Gianni nasceu em São Paulo em 1945, filho de italianos da Toscana. Estudou Física na USP e foi cuidar da empresa familiar no ramo de autopeças. No governo Fernando Henrique Cardoso, foi diretor do Serpro, montou a Secretaria do Tesouro Nacional e foi secretário-executivo da Casa Civil. Foi designado presidente do Sebrae Nacional no final de 2002. Não tenho hoje os instrumentos de avaliação que tinha quando era presidente do Sebrae, mas, em minhas conversas com o segmento, adquiri a convicção de que o presidente do Sebrae tem a missão de ajustar a Lei Geral e o Simples, tendo em vista o advento do mecanismo da substituição tributária, que neutraliza os efeitos positivos da Lei Geral. Faz sentido esse mecanismo, porque facilita a fiscalização e promove justiça fiscal. Ao criar proteção em lei para um grupo de empresas, o Estado tem que ficar atento às demais. Se houver sonegação, estraga-se o próprio Simples. A substituição tributária evita a sonegação porque tributa na origem, com menor custo fiscal, simplificando o trabalho da fiscalização. Não há como se opor a isso. Só que esse mecanismo neutraliza os efeitos benéficos da Lei Geral, ao aplicar o imposto de maneira igual para todas as empresas. Fizemos uma lei que, naquele momento, teve uma eficácia muito grande, porque abrangia as pequenas empresas, tributando-as de forma diferenciada das grandes. Com a substituição tributária isso vai se perdendo no tempo. Minha preocupação é buscar uma so- lução para isso – e a solução não é impedir a substituição tributária. Precisamos usar a criatividade para tornar possível uma diferença a favor dos pequenos sem bater de frente com a substituição tributária, que vai continuar acontecendo. O inimigo é o tempo A sugestão que posso dar ao Sebrae é constituir um grupo de notáveis, estudiosos, especialistas, e encontrar um caminho fiscal possível, mas tem que começar já. Precisamos fazer como na década passada: chamar o José Pastore, o Márcio Pochmann, o Everardo Maciel, o José Roberto Afonso, o Luiz Carlos Hauly, reunir novos talentos, e pensar como fazer. A substituição tributária não é nossa inimiga. Nosso inimigo é parar no tempo. A Lei Geral foi concebida em 2004. Desde então, mudou tudo no mundo. Devemos pensar também na passagem de pequena para média empresa. Do ponto de vista do custo tributário, acreditamos que o degrau seja suave, mas a burocracia e as exigências legais aumentam drasticamente. A Lei Geral não foi feita para impedir o crescimento das empresas. Volto a alertar: não se vive de glórias passadas. Daqui a três anos acaba o Simples se o problema não for enfrentado. A Lei Geral está velha e precisa ser atualizada. Para aumentar arrecadação em cima de microempresa é fácil. Basta fazer uma substituição tributária que elas viram de novo galinha poedeira. Os governos precisam entender que os pequenos negócios não são adequados para render imposto como os grandes empreendimentos. Os pequenos têm a função de distribuir riqueza e gerar empregos. Esse é o papel deles. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 53 Capítulo 3 • • • Protagonistas do Sebrae ARTIGO | Paulo Okamotto Sebrae precisa ir ao cliente, como o médico de família “ Paulo Okamotto Diretor-presidente do Instituto Lula Após sua primeira eleição, o presidente Lula disse Paulo Tarciso Okamotto nasceu em Mauá (SP) em 1956. Foi metalúrgico, diretor do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, fundador da CUT, diretor do Departamento Intersindical de Estudos e Estatísticas Sócio-Econômicas (Dieese), e presidente do PT-SP. Foi presidente do Sebrae Nacional 54 Seis anos do Supersimples que gostaria que eu participasse de seu governo. Fiquei bastante lisonjeado e respondi que aceitaria o desafio. Falei ao presidente que gostaria de trabalhar em algo que ajudasse mais efetivamente no desenvolvimento do país. Mais tarde, durante uma escala para abastecimento do avião numa viagem aos Estados Unidos, creio que em Boa Vista (RR), ele ligou e me convidou para assumir uma diretoria do Sebrae. Eu tinha alguma experiência e sabia como era difícil a vida dos empresários de pequenos negócios. Na minha vida de sindicalista, ao encaminhar as reivindicações dos trabalhadores, deparava-me também com as dificuldades dos empresários em atendê-las. Tinham que enfrentar a concorrência, cumprir a legislação e pagar melhores salários para manter bons profissionais. Posteriormente, tive minha própria experiência quando fui empresário no setor de e-commerce, e também como gerente comercial de uma gráfica e de um centro cultural. Ou seja, acredito que a vivência prática também tinha me servido como uma boa escola. Aceitei de imediato o desafio proposto pelo presidente, porque conhecia o Sebrae e sabia que era uma instituição útil para o Brasil, acreditando que dali era possível impulsionar projetos importantes. Após dois anos na Diretoria, fui convidado a assumir a Presidência. Compartilhei com os demais dirigentes minha convicção de que, para aumentar o apoio aos nossos empreendedores, era preciso sermos mais proativos. Isso significaria buscar os clientes, aqueles que de fato necessitavam dos nossos serviços, mas que, pelos mais variados motivos, não saíam à procura deles. Cultura interna do atendimento No Brasil sempre se falou muito de uma alta “taxa de mortalidade” das pequenas empresas. Para enfrentar esse grave problema, concluímos que o Sebrae deveria facilitar ao máximo o acesso aos seus serviços e conhecimentos para os empresários dos pequenos negócios. Todas as tecnologias de atendimento deveriam ser usadas para atingir esse objetivo. Era preciso agir como uma espécie de “médico de família”, que é bem diferente do médico de consultório, pois vai atender o paciente em sua residência. Ao mesmo tempo, percebemos também que precisávamos desenvolver e valorizar a cultura interna do atendimento. Antes de tudo, era imprescindível conhecer cada vez mais as necessidades e as expectativas dos nossos clientes. Para supri-las deveríamos funcionar como uma instituição nacional, tornando o Sebrae um verdadeiro sistema, capaz de se aproveitar das melhores práticas e assim agilizar a produção de conhecimento, aumentando a sinergia e fortalecendo uma visão sistêmica. A adoção dessa orientação nos permitiu fazer planejamento e orçamento de longo prazo, assim como executar uma nova política de recursos humanos e colocar em funcionamento a universidade corporativa, dando uma identidade nacional ao sistema. Essa politica possibilitou ao Sebrae oferecer aos clientes mais produtos de excelente qualidade, desenvolvidos pelos Sebraes estaduais. Através de uma propaganda centralizada, tornaram-se mais visíveis e, assim, se transformaram em produtos nacionais. Boas ideias precisam ter um patrono O Sebrae tinha um excelente diagnóstico do ambiente hostil para o desenvolvimento dos pequenos negócios. Abrir uma empresa era algo muito difícil e desanimador. Fazê-la sobreviver durante o primeiro ano era um desafio. Começamos a indagar o que precisaríamos fazer para mudar esse quadro. Nosso superintendente de Pernambuco disse à época que uma ideia dessas, para vingar, precisaria de um patrono. Caso contrário, nada mudaria. Ficou claro que o Sebrae precisaria assumir essa causa ou nada aconteceria. Ampliamos a discussão, envolvendo entidades de classe e vários setores do Legislativo e do Executivo. Percebemos que seria preciso levar o debate a toda sociedade, porque, se a iniciativa fosse apenas de uma parte interessada, não daria certo.Todos Seis anos do SUPERSIMPLES 55 Capítulo 3 • • • Protagonistas do Sebrae ARTIGO | Paulo Okamotto LINHA DO TEMPO concordavam que era preciso mudar, mas sabíamos que ninguém abriria mão de receita ou poder, e por causa disso a tarefa não seria nada fácil. Era preciso também conseguir fortes aliados no Congresso. Tivemos êxito com quase todos os deputados e senadores, destacando-se os deputados Augusto Nardes, Luiz Carlos Hauly, Carlos Melles e José Pimentel. O deputado Virgílio Guimarães, que conduzia uma tentativa de reforma tributária, nos ajudou com uma emenda à Constituição, abrindo caminho para a Lei Geral. Nossa estratégia era envolver todos os parlamentares, da situação e da oposição, em defesa dos pequenos negócios. Quando a coisa travava, Lula ajudava Havia muita resistência por parte da Receita. Seus responsáveis tinham receio de evasão fiscal, da criação de microempresas fantasmas para burlar o pagamento de impostos. Nesse processo, o presidente Lula teve um papel fundamental. Ele acompanhava a evolução dos debates, nós sempre lhe reportávamos as dificuldades e quando a coisa travava, ele interferia. Primeiro com o ministro Antônio Palocci, da Fazenda, depois com Guido Mantega, que o substituiu. E assim íamos removendo obstáculos. Foi preciso superar a visão idealista para destravar os impasses com a Receita. Sem paternalismos, nós entendíamos que deveriam ser dados mais estímulos aos empresários dos pequenos negócios. Mas, também era preciso que esses assumissem responsabilidades maiores a partir do momento que começassem a crescer. Para ajudar, nós contratamos os serviços de um consultor altamente qualificado, que entendia o pensamento da Receita e poderia colaborar para desbloquear caminhos e remover os maiores obstáculos. Nossa ideia básica era: quanto mais crescimento, mais responsabilidades. Finalmente, em dezembro de 2006, a Lei Geral foi aprovada, quase por unanimidade. O presidente Lula 56 Seis anos do Supersimples a sancionou com alguns vetos. Várias perdas daquela época foram recuperadas posteriormente com novas leis complementares que vieram melhorar a Lei Geral. Hoje ainda restam alguns problemas específicos a resolver. Talvez o principal deles seja a substituição tributária de ICMS, que penaliza as MPEs. Quando o ICMS é cobrado na indústria, o empresário dos pequenos negócios está comprando o imposto junto com o produto. Acredito que nossa experiência em quase oito anos de Sebrae revelou-se positiva. Eu pude testemunhar a enorme dedicação, disposição e competência de todos os colaboradores do Sebrae. Sua equipe de trabalho nunca mediu esforços para avançar no aperfeiçoamento dos seus serviços. É exatamente por isso que é uma instituição cada vez mais reconhecida no apoio às micro e pequenas empresas em todos os seus aspectos e necessidades. Ao suprir nossos clientes de informações e ter capacidade para ir até o empresário dos pequenos negócios, o Sebrae leva os conhecimentos adquiridos, sem ficar imobilizado à espera. Ajudando a gerar mais empregos de qualidade, tornamos o Brasil um país mais competitivo e justo. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 57 3 SIMPLES para Todos Capítulo • • • Protagonistas do Sebrae ARTIGO | Alencar Burti “ Alencar Burti Presidente do Conselho Deliberativo do Sebrae SP No Brasil de hoje, cerca de 7,4 milhões de peque- nos negócios pagam impostos, taxas e tributos de acordo com seu fôlego, por meio do Simples Nacional – em São Paulo são quase 2 milhões. São 6,027 milhões a mais de empreendimentos beneficiados que em julho de 2007, quando o regime tributário diferenciado entrou em vigor. Na média, houve uma redução tributária de 75% dos encargos incidentes sobre as pequenas empresas. A projeção para 2015 é de que 10 milhões de empreendedores devem usufruir destes benefícios. 58 Seis anos do Supersimples Alencar Burti é paulistano, nascido em 1930. É empresário do setor automobilístico, foi presidente da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), da Federação das Associações Comerciais do Estado de São Paulo (FACESP), da Confederação das Associações Comerciais e Empresariais do Brasil (CACB) e da Fenabrave. Contrariando o que os pessimistas de plantão profetizaram quando começamos o movimento em prol da simplificação tributária, a arrecadação aumentou em mais de 300%, desde julho de 2007. Para se ter a dimensão deste incremento, em julho de 2007 a soma da arrecadação da União, dos estados e dos municípios foi de R$ 8,3 bilhões. Em 2012 a arrecadação total foi de R$ 46,5 bilhões. Segundo dados da Receita Federal, no período de janeiro a março de 2013, já se computou um aumento de 12,9% no valor arrecadado das empresas optantes pelo Simples Nacional, em comparação ao mesmo período do ano passado. Trata-se de prova contundente de que, ao tratar de acordo com seu porte e fôlego os milhões de homens e mulheres que optaram pelo caminho do empreender, toda a sociedade ganha. Milagres não existem Sabemos que os números são expressivos; porém, acreditamos que o processo de criação e implementação do Simples Nacional trouxe um ganho ainda maior: a sociedade entendeu que não há milagres quando se fala em reformas estruturais; é vital que todos os elos desta cadeia participem ativamente, levando seus conhecimentos, suas necessidades, sua vontade de construir. Quando a sociedade tem certeza do que quer e precisa, e se organiza e trabalha junto com seus representantes da esfera pública, não há obstáculos que não possam ser removidos. Ao comemorarmos as vitórias em prol de um ambiente empreendedor mais saudável e propício à criação, ao fortalecimento e à consolidação dos empreendimentos de pequeno porte, queremos utilizar as lições aprendidas para dar mais um salto significativo no efetivo apoio aos pequenos negócios. É chegada a hora de avançarmos a passos ainda mais largos no respeito à capacidade contributiva dos empreendimentos de pequeno porte. É o momento de a sociedade organizar-se novamente e aprimorar os direitos de tratamento diferenciado que são garantidos pela Constituição Federal. Desafios para o próximo biênio Nos próximos dois anos, nossos esforços, conhecimentos e recursos estarão voltados para o aprimoramento do Simples Nacional, o Simples para todos. Serão nossos principais desafios: • Incluir o faturamento como único critério de enquadramento (e não o ramo de atividade econômica, como é hoje). • Calibrar a Sistemática da Substituição Tributária, que no modelo atual elimina os benefícios obtidos por meio do Simples Nacional. • Instituir como base de cálculo do Simples Nacional o faturamento mensal, respeitando, assim, a sazonalidade das atividades econômicas. • Ampliar o prazo de pagamento do Simples Nacional. Esta medida garantirá maior fôlego aos empresários, pois de um modo geral as vendas são a prazo e o pagamento do tributo tem como base a emissão da nota fiscal. • Estabelecer uma faixa de transição para os microempreendedores individuais que ultrapassarem o valor de faturamento máximo no ano, hoje R$ 60 mil. O MEI que ultrapassar o limite de faturamento em até 20% ao permitido no ano, isto é entre R$ 60 mil e R$ 72 mil, não perderia a condição de MEI no ano seguinte, mas pagaria seus encargos dentro de duas novas faixas, que prevêem a majoração da contribuição previdenciária. Contratação e terceirização Também para garantir que o tratamento diferenciado chegue de forma mais contundente a outros âmbitos da gestão da pequena empresa, vamos trabalhar firmemente para obter as mudanças essenciais na legislação trabalhista, que envolvem a revisão e adoção de formas modernas de contratação de empregados, a regulamentação da figura da terceirização de mão de obra, tão importante para as pequenas empresas, e a flexibilização legal das formas de pagamento dos benefícios trabalhistas aos empregados das micro e pequenas empresas, respeitando a vontade das partes e a realidade dos pequenos negócios. Desta forma, no final de 2014 teremos não só números ainda mais positivos; teremos feito do Estado de São Paulo e do Brasil lugares dos melhores para aqueles que escolheram o ato de empreender como forma de realização pessoal e profissional. Teremos, enfim, uma nação voltada para o ciclo virtuoso do crescimento. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 59 Capítulo 3 • • • Protagonistas do Sebrae ARTIGO | Hélio Cadore Agulhas tesouras e na construção da Hélio Cadore Ex-superintendente do Sebrae PR e da Associação Brasileira dos Sebraes Estaduais (Abase) Lei Geral “ Superintendente do Sebrae PR por 17 anos, Hélio Cadore dedicou ao todo 33 anos ao Serviço. Foi presidente da Associação Brasileira dos Sebraes Estaduais (Abase). Possui uma empresa de sucos naturais, a Vitafrut, e atua no terceiro setor, como presidente da Associação Serpiá, uma ONG que trabalha com crianças e adolescentes com transtornos psíquicos. 60 Seis anos do Supersimples Para mim, que dediquei 33 anos de minha vida à causa dos pequenos negócios, a conquista da Lei Geral foi o resultado da vitória da confluência de interesses diversos em torno de um propósito maior. Foi a comprovação de que as “agulhas” que costuram alianças estratégicas resultam mais do que as “tesouras” que desfazem as pontes do entendimento. Pessoas e instituições colocaram o interesse do Brasil acima de resistências infundadas e visões estreitas. Mas essa construção exigiu uma longa caminhada. Vale lembrar que por muito tempo o significado desse segmento era difuso e sua importância nada valorizada, apesar de ser ele o maior gerador de postos de trabalho, o que mais distribui renda e o que se faz presente até nos mais longínquos rincões desse nosso imenso Brasil. Por isso, logo após a mudança do Cebrae com C para Sebrae com S, foi lançada a campanha “Pequena Empresa. Valorize essa ideia!”. Com certeza, se a Lei Geral hoje é realidade, isso se deve a atores que se posicionaram decisivamente naquele contexto. No Sebrae Nacional destaque-se a ação dos presidentes Sergio Moreira – que se irmanou à Associação Brasileira dos Sebraes Estaduais (Abase), à época honrosamente por mim presidida, no esforço de distender as relações entre o Sistema Sebrae e o Movimento Nacional das MPEs liderado por José Tarcisio e Ercílio Santinoni. Fruto dessa articulação foi o documento “Pequena Empresa e Desenvolvimento” redigido a quatro mãos, em 2001, sob coordenação da Abase e Sebrae Nacional, com a participação do movimento Nacional das MPEs e do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade (IETS), cuja síntese das reivindicações desse segmento foi entregue aos candidatos à Presidência da República, na eleição em que Lula saiu vitorioso. Esse foi o primeiro esboço do que viria a ser o conteúdo final da Lei Geral. E todos compreendemos que se sozinhos poderíamos ir mais rápido, juntos iríamos mais longe. Homens comprometidos com a causa Esse esforço foi continuado com muito ânimo por Silvano Gianni, que abraçou a causa, a intitulou de Lei Geral e junto com a Abase, articulou com resultados o meio político de Brasília e do Brasil. Paulo Okamotto, que o sucedeu, também foi um batalhador que participou das caravanas nacionais pela aprovação da Lei Geral. Neste ponto, destaque-se a presença do Senador Armando Monteiro Neto, então presidente da CNI, um líder empresarial com visibilidade que deu sua chancela pessoal a essa luta, defendendo-a inclusive junto aos seus pares de outras federações, e com intensas articulações com o Executivo e o Legislativo nacionais. No Congresso Nacional, foi fundamental a Frente Parlamentar da Micro e Pequena Empresa, liderada pelo atual ministro do TCU, Augusto Nardes, que repercutiu no Congresso essa legítima reivindicação dos milhares de empreendedores brasileiros e mostrou sua capacidade de negociação na aprovação da Lei. Uma vez aprovada, era fundamental sua implantação nos estados e municípios. O Paraná foi vanguarda nisso, graças ao esforço do Sebrae no Estado e à vontade política do Governo Requião, ancorada no Programa Líderes Públicos, idealizado e implementado pelo Sebrae Paraná e Governo Estadual. Dessa forma, atualmente a regulamentação da Lei Geral está implantada em 357 dos 399 municípios paranaenses e atinge 93% de sua população e 95% das MPEs. Sistema de monitoramento Missão cumprida? Ainda não. É necessário que se acelerem os programas de ajuda aos municípios para implementar a Lei na sua totalidade, com um sistema de monitoramento que a institucionalize. O programa “Cidade Empreendedora” em execução no Paraná e alguns estados, com a criação de um Grupo Gestor Misto, significa que a discussão da MPE no município não diz respeito só ao prefeito, mas também à sociedade civil organizada, que deve dela participar de forma permanente. Enquanto existir um estado ou município no Brasil sem essa legislação regulamentada; enquanto não for assegurado aos milhares de empreendedores desse imenso Brasil o efetivo acesso ao mercado, às compras governamentais, ao crédito suficiente e à tecnologia adequada, não podemos esmorecer, nem ensarilhar as armas. A luta não terminou. O Brasil dos pequenos negócios quer mais! “ Seis anos do SUPERSIMPLES 61 Capítulo 3 • • • Protagonistas do Sebrae ARTIGO | Carlos Alberto dos Santos a reforma tributária bem-sucedida Carlos Alberto dos Santos Diretor-técnico do Sebrae Nacional Tivemos cerca de cem mil participantes em seminários, oficinas e reuniões de discussão do projeto de lei. Esse processo inovador contou com a sensibilidade do Poder Executivo, uma vez que o governo federal liderou a interlocução com os estados e municípios. Ele foi responsável pela mudança ao atuar como apoiador direto dessa minirreforma tributária. E até hoje, desde o Governo Lula, o Palácio do Planalto se posiciona como grande apoiador do Supersimples. Processo republicano e transparente Carlos Alberto dos Santos é economista com doutorado pela Freie Universitaet Berlin, na Alemanha. Está no Sistema Sebrae desde 2003. Foi diretor de Administração e Finanças do Sebrae Nacional de 2007 a 2009. “ O Supersimples é a reforma tributária mais bem-sucedida no Brasil nos últimos anos. O grande mérito desse sistema simplificado e diferenciado de tributação foi vir ao encontro da realidade e da necessidade dos pequenos negócios. Isso não é por acaso nem trivial. Houve uma convergência nacional, com a participação efetiva de diversos atores sociais, que resultou em nova perspectiva para os pequenos negócios no Brasil. O Sebrae teve papel importante ao promover o debate, por meio de seminários, estudos e pesquisas com empresários e experiências no exterior, além de apoiar a mobilização para legitimar a mudança em 2008. Do ponto de vista técnico, o Sebrae subsidiou todo o processo, de modo a qualificar as discussões e gerar propostas factíveis, realistas e modernas. Ao apoiar a mobilização nacional, garantiu a participação efetiva dos empresários. 62 Seis anos do Supersimples As resistências iniciais a sua criação foram superadas no Congresso Nacional, onde o tema encontra grande simpatia dos deputados e senadores. A Frente Parlamentar Mista da Micro e Pequena Empresa, ampla e atuante, com aproximadamente 300 parlamentares, levantou essa bandeira e enfrentou todos os desafios até então. As entidades de classe e o Sebrae, por sua vez, realizaram um diálogo muito intenso em busca de compreensão e apoio à reforma. Participaram também o Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), a Associação Brasileira das Secretarias de Finanças das Capitais (Abrasf) e as confederações de municípios, num processo republicano, moderno, atual e bastante transparente. Assim, tornou-se viável a construção de um estatuto – um novo marco regulatório, com total legitimidade. Hoje, o Comitê Gestor do Simples Nacional tem a União, estados e municípios trabalhando com muita harmonia, no sentido de fazer todo o sistema funcionar satisfatoriamente. O processo é tão eficaz que esse Comitê é exemplo de como o pacto federativo deve atuar, com instâncias de gestão e de diálogo político. Mas a grande pergunta é: o Supersimples veio ao encontro do fomento do empreendedorismo e da competitividade das empresas? A resposta é sim, porque a adesão e a receita das empresas cresceram muito nesse curto espaço de tempo. Salários cresceram Esse sistema é bom para as empresas à medida que cresce o número de optantes em todo o país, há mais receita dentro desse sistema de tributação e observa-se a evolução das empresas, que estão migrando de faixa de faturamento. No âmbito do estado, observa-se o crescimento da arrecadação. É bom também para a sociedade, pois fez crescer o número de empregos e melhorou os salários. Em 2008, o Supersimples registrou 2,9 milhões de empresas de pequeno porte optantes, sem considerar a migração de 1,3 milhão do regime anterior. Hoje são cerca de 4,4 milhões de micro e pequenas empresas e 3 milhões de empreendedores individuais, que faturam até R$ 60 mil por ano. Quanto aos empregos, as empresas do Simples respondiam, em 2008, por 8,9% e as não-optantes, 7,2%. Já em 2010 representavam, respectivamente, 11,1% e 6,6%. Os salários também apresentaram elevação, uma vez que em 2008 a variação nas empresas optantes alcançou 9,6% e nas não-optantes, 8,4%, chegando em 2010 com respectivos 10% e 8,7% de aumento. O Supersimples, então, é um exemplo marcante de ganha-ganha. E mostra que é uma solução eficiente à medida que o Brasil fomenta o empreendedorismo e oferece as condições necessárias, do ponto de vista sistêmico, para que as empresas sejam competitivas, proporcionando-lhes um bom ambiente de negócios. É bom para as empresas, os trabalhadores, a sociedade e o Estado, que aumenta a sua receita fiscal. Com o Supersimples fica evidente que quando o Estado possibilita as condições adequadas às micro e pequenas empresas, elas rapidamente dão resposta a si próprias, ao Estado brasileiro e à sociedade. Portanto, investir num bom ambiente de negócios é garantia de retorno seguro, capaz de contribuir para o desenvolvimento sustentável e uma nação mais justa. Estamos no rumo certo. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 63 Capítulo 3 • • • Protagonistas do Sebrae ARTIGO | José ClAudio dos Santos O Sebrae atuou como um agente ativo de todo esse processo, seja por articulação de políticas públicas, com estudos direcionados, debates, sensibilização de líderes políticos e conscientização do empresariado brasileiro. Tivemos a convergência dos mais de cinco mil colaboradores de todo o Sistema Sebrae em prol deste trabalho. A consolidação de uma rede de parceiros, por meio da Frente Empresarial pela Lei Geral da Micro e Pequena Empresa, e o engajamento das lideranças do Sebrae e dos colaboradores da instituição foram fundamentais para alcançarmos o marco de mais de cem mil participantes em seminários de disseminação de informação. Conscientização que também passou pelo Governo Federal, ao qual foi possível apresentar propostas e anseios do segmento dos pequenos negócios. Vestimos a camisa da Lei Geral Trabalho intenso de conscientização “ José ClAudio dos Santos Diretor de Administração e Finanças do Sebrae JOSÉ CLAUDIO DOS SANTOS é bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela Unisinos. Tem especialização em Direito Coletivo do Trabalho e MBA em Gestão Empresarial pela FGV. Foi diretor da Fiergs e preside o Conselho do Sebrae Previdência. 64 Seis anos do Supersimples O Supersimples é um exemplo bem-sucedido no sistema tributário do Brasil e um orgulho para todos que fizeram parte deste processo de forma tão intensa como o Sebrae. A Lei Geral da Micro e Pequena Empresa assegura o crescimento contínuo dos micro e pequenos negócios, significa a criação de um ambiente legal, com redução de custos e melhoria das condições de competição das empresas. Participamos ativamente de uma grande mobilização estendida por todo o país, uma movimentação suprapartidária que contou com a contribuição de atores sociais convencidos de que o futuro do Brasil passa pelo fortalecimento das pequenas empresas. Não só acreditamos e levantamos essa bandeira, como também vestimos a camisa e saímos às ruas em passeatas, carreatas, com debates e discussões em praças públicas, declarando ao país que era hora de enfrentar novos desafios. Foi um trabalho intenso de conscientização para chegarmos a esse novo modelo tributário. A mobilização articulada pelo Sebrae por meio da Frente Empresarial reuniu empresários, líderes do governo e representantes de todo segmento das micro e pequenas empresas. Tivemos a oportunidade de vivenciar o engajamento de milhares de pessoas na luta que representou um novo momento de valorização da cidadania empresarial. A Lei Geral abriu inúmeras frentes, como o estímulo e fomento às compras governamentais e mais recentemente com a criação da figura jurídica do microempreendedor individual. O trabalho agora é para a efetiva implementação da lei nos municípios, ampliação das compras governamentais e formalização dos empreendimentos. Um caminho extenso a ser percorrido. Programa Fornecer é exemplar Apesar de não termos ainda um modelo ideal, arregimentamos bons exemplos em todo o país. É o caso do Programa Fornecer, implantado no Rio Grande do Sul, que tem o intuito de fazer uso do poder das compras governamentais como política de desenvolvimento econômico regional, de forma sustentável, promovendo melhoria na distribuição de renda. O Supersimples poderá até vir a servir de modelo para a reforma tributária no país. Temos a consciência de que essa luta continua e que muito deve ser feito para garantir, cada vez mais, a inclusão de novas categorias e estender o benefício para milhões de empreendedores. Seis anos depois, comemoramos essa conquista de forma expressiva, com 7,35 milhões de optantes pelo Supersimples. Com a oxigenação proporcionada por essa diferenciação tributária, o próximo passo é estimular e apoiar as empresas para o desenvolvimento da gestão, por meio da qualificação profissional. É preciso criar mecanismos para que os empresários reflitam sobre como obter melhores resultados, com inovação e o alcance de novos mercados. Devemos lembrar que os benefícios do Simples vão além do sistema de desoneração tributária. Temos convicção, enquanto uma casa de conhecimento, que significa um estímulo a mais para que estes empresários busquem capacitação e qualidade na gestão das suas empresas, o que pode proporcionar um ambiente ainda melhor de crescimento, com aumento da qualidade, da produtividade e da competitividade. Medidas como estas nos fazem acreditar na construção de um país melhor. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 65 Capítulo 4 Desafios da integração federativa ável com a criação de um Comitê Gestor formado paritariamente por representantes federais, estaduais e municipais, uma ideia que hoje se expande de maneira salutar por outras áreas de conflito. O ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Fernando Pimentel, classifica o Supersimples como um caso notável de cooperação institucional visando ao tratamento diferenciado e favorecido dos Pimentel: “A regularização dos pequenos negócios elimina um fator de erosão de legalidade do ambiente”. Uma das maiores dificuldades de se empreender pequenos negócios. Comemora também a disposição no Brasil era o relacionamento com os três níveis de Go- centes êxitos das pequenas empresas na capacidade de verno. O candidato a empresário tinha que enfrentar as exigências federais dos ministérios, apresentar dezenas de documentos aos órgãos fazendários, ambientais, sanitários e de segurança dos estados, e também às instâncias municipais. Depois de aberta a empresa, o em- ao empreendedorismo da população brasileira e os re- Coser: “A crise financeira mundial não impediu o crescimento acima da média do PIB brasileiro”. presário enfrentava mensalmente uma penosa via-crucis 66 Seis anos do Supersimples Por sua vez, a senadora gaúcha Ana Amélia (PP-RS) considera que as dificuldades para alcançar consensos entre União, estados e municípios no complexo sistema tributário nacional não comprometem o alcance da Lei Geral das Micro e Pequenas Empresas. para quitar impostos e taxas das três esferas. Ana Amélia: “Um complexo emaranhado normativo e administrativo envolve a confusa lógica tributária nacional”. gerar tecnologia e inovação. João Coser, ex-prefeito de Vitória (ES) e ex-presidente Se aos olhos do contribuinte, a imagem era de um da Frente Nacional de Prefeitos, trabalhou intensamente Estado repressor e hostil, a desconfiança era mútua en- para convencer seus pares da honestidade da proposta, tre as três esferas. Estados e municípios sempre viram evitando a paralisação das negociações. Em sua avalia- com animosidade a concentração de tributos na esfera ção, centenas de cidades já se beneficiam da plena im- federal, o repasse de atribuições sem o repasse de re- plantação da Lei Geral e milhares passaram a enxergar cursos e as ameaças a sua autonomia. Entre os próprios estados, os ressentimentos pelas perdas inflingidas pela guerra fiscal dificultavam o entendimento. Esse clima adverso dá a dimensão do desafio colo- Santiago: “O tratamento jurídico diferenciado estava totalmente fragmentado nos três níveis da Federação”. as micro e pequenas empresas e os empreendedores individuais como peças fundamentais no processo de desenvolvimento local. O guardião da idoneidade dessa revolucionária pro- cado para os idealizadores do Supersimples: integrar posta é o secretário executivo do Comitê Gestor do os tributos num único fluxo, num único procedimento, Simples Nacional, Silas Santiago, que lida com 5.598 como num consórcio de tributos. Isso só se tornou vi- entes federados, todos ciosos de sua autonomia. Seis anos do SUPERSIMPLES 67 Capítulo 4 • • • Desafios da integração federativa ARTIGO | FERNANDO PIMENTEL SEIS anos de desenvolvimento inclusivo Fernando Pimentel Ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior “ A promoção de um ambiente de negócios favorável ao empreendedorismo constitui, em síntese, a missão primordial do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC). Segundo pesquisas internacionais, os indicativos da disposição ao empreendedorismo da população brasileira são superiores aos da média das vinte maiores economias do mundo, o G20. Não obstante, o ecossistema de negócios brasileiro não é suficientemente favorável à expansão e mesmo à sobrevi68 Seis anos do Supersimples Fernando Damata Pimentel nasceu em 1951 em Belo Horizonte. Formou-se em Economia pela PUC Minas e tornou-se mestre em Ciência Política pela UFMG. Ocupou vários cargos na administração municipal de Belo Horizonte, até tornar-se vice-prefeito e depois prefeito eleito de 2002 a 2008. vência de longo prazo das iniciativas empreendedoras, particularmente dos pequenos negócios, em decorrência de uma série de fatores, muitos dos quais exigindo políticas duradouras e articuladas entre a União, Estados e Municípios e instituições como o Sebrae, principal parceiro do MDIC na consecução daquele objetivo. O Simples Nacional é um caso notável de cooperação institucional visando ao tratamento diferenciado e favorecido dos pequenos negócios. Entre outras vantagens, permite às empresas reduzir substancialmente a carga fiscal e custos administrativos relativos a tributos federais, estaduais e municipais. O Simples Nacional beneficia empreendedores individuais, micro e pequenas empresas e até mesmo médias empresas exportadoras, que representam mais de seis milhões de empreendimentos, em sua maioria concentrados nos setores de atividade econômica industrial e de serviços. Os resultados positivos manifestam-se em termos de crescimento econômico (os pequenos negócios, particularmente os de Serviços, são o segmento empresarial mais dinâmico), social (em proporção ao capital investido, os pequenos negócios são o segmento que mais emprega), e tecnológico (nos últimos anos, observa-se forte expansão das pequenas empresas inovadoras). Fator de erosão de legalidade Há também resultados positivos indiretos e intangíveis. Por exemplo, ao incentivar a formalização da atividade empresarial, o Simples Nacional permite à União, Estados e Municípios a apuração de estatísticas econômicas que viabilizam o desenvolvimento e a aplicação de políticas públicas de forma mais efetiva. Aos agentes de mercado, o Simples permite a tomada de decisões mais informadas. A regularização dos pequenos negócios (cerca de 99% do total de empresas brasileiras) elimina um fator de erosão de legalidade nos ambientes empresarial e institucional, resultando em benefícios para o setor produtivo e a sociedade como um todo. O Simples Nacional, ao lado de outras iniciativas em prol dos pequenos negócios, é parte do empenho do governo e da sociedade por um modelo de desenvolvimento inclusivo – um dos pré-requisitos para que o Brasil possa avançar rumo a patamares superiores de desenvolvimento empresarial, social e tecnológico. Essa, a lógica que guiou a atenção dada no Plano Brasil Maior (PBM) à política industrial, tecnológica e de comércio exterior em vigor, à questão da inovação e do empreendedorismo como fatores cruciais para o desenvolvimento. As economias desenvolvidas são fortemente focadas na inovação de produtos e processos. A inovação e sua aplicação aos negócios – o empreendedorismo – dizem respeito a empresas de todo porte. Não obstante, as micro e pequenas empresas e os negócios incipientes (start-ups), estruturas organizacionais mais enxutas, ágeis e reativas ao espírito empreendedor de seus proprietários e dirigentes, estão na origem de muitas das inovações que resultam em transformações radicais no cotidiano de pessoas e empresas em escala global. Nesse contexto, como parte do processo de imprimir ao PBM plena eficácia, o MDIC – em parceria com outros órgãos e entidades, entre as quais destaca-se o Sebrae – tem reforçado ações já existentes para a inclusão competitiva dos pequenos negócios em cadeias de produção e distribuição nacionais e globais. Destacam-se o Programa de Arranjos Produtivos Locais (APLs) e a extensão do Simples Nacional às empresas exportadoras: além do limite de R$ 3,6 milhões de receita com vendas no mercado doméstico, concede-se limite adicional de desoneração do mesmo valor para receitas com exportações. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 69 Capítulo 4 • • • Desafios da integração federativa ARTIGO | Ana AméliA Na Rota Pequenos dos Senadora Ana Amélia (PP-RS) “ As dificuldades para alcançar consensos entre União, Estados e Mu- A gaúcha Ana Amélia Lemos nasceu em Lagoa Vermelha em 1945. Foi jornalista de rádio, jornal e TV durante 40 anos, em Porto Alegre e Brasília, atuando nas editorias de Política e Economia. Elegeu-se senadora em 2010 pelo PP-RS. 70 Seis anos do Supersimples nicípios no complexo sistema tributário nacional não comprometem o alcance da Lei Geral das Micro e Pequenas Empresas. A Lei Complementar 123/2006 tem sido alternativa relevante e promissora no estímulo dos negócios e à competitividade das empresas brasileiras. Independentemente das enormes resistências técnicas e até políticas para a adoção de parte da “cartilha básica” da sonhada e necessária reforma tributária – como a unificação das alíquotas do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) – as chances de melhoria dos incentivos fiscais e de mais estímulos ao desenvolvimento regional têm se ampliado para aqueles empreendedores que vislumbram a criação ou a manutenção do próprio negócio, nessa vasta categoria empresarial. Desde 2007, quando esse marco legal para as empresas de pequeno porte começou a vigorar, senadores, deputados federais, lideranças estaduais, governadores, secretários estaduais de Fazenda e representantes dos ministérios da Fazenda e da Previdência Social passaram a aprofundar os estudos sobre o complexo emaranhado normativo e administrativo que envolve a confusa lógica tributária nacional e outras barreiras à competitividade das pequenas empresas. O movimento político em busca de entendimento tem sido uma tentativa para diminuir as dificuldades que afastam muitas dessas empresas do caminho do crescimento sustentável. Algumas soluções conjuntas e inovadoras já surtiram efeito. Para tentar diminuir o índice de mortalidade de parte dessas empresas (representam atualmente 99% no comércio, indústria e serviços do País), a Lei Geral foi atualizada, com ajustes no Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte, o Simples Nacional. Em vez de R$ 36 mil ou R$ 2,4 milhões – os limites de faturamento anual para enquadramento e acesso ao Simples – esses valores foram ampliados para R$ 60 mil e R$ 3,6 milhões, respectivamente. Isso significou avanços no campo da justiça tributária tanto aos empreendedores individuais quanto às pequenas empresas, permitindo a continuidade das suas atividades e incentivando a busca por novos negócios, melhorias de gestão, acesso ao crédito e, consequentemente, contribuindo para o aumento da arrecadação, do número de contribuintes e da oferta de empregos. Substituição: um peso insuportável Ainda que essas mudanças tenham possibilitado a construção de um caminho mais favorável ao aumento da competitividade e das boas práticas empreendedoras, faltam outros ajustes na lei. A substituição tributária, mecanismo que atribui ao contribuinte a responsabilidade pelo pagamento devido pelo cliente – uma espécie de antecipação de cobrança do tributo repassado aos governos federal e estaduais – ainda é um peso insuportável, oneroso e de difícil aplicação para as empresas menores. A inclusão de novas categorias e serviços no Simples – como médicos, dentistas, psicólogos, advogados, representantes comerciais, produtores rurais e agricultores familiares – também é uma urgente necessidade. Precisamos de mais incentivo às exportações, redução dos custos para criar uma micro ou pequena empresa, emissão via internet de notas fiscais para os empreendedores individuais e outras facilidades com foco na redução de custo e no aumento da eficiência empresarial. São providências inadiáveis para a construção de um verdadeiro desenvolvimento econômico sustentável. Quando adotadas, poderão tirar o Brasil da 39ª posição do ranking mundial de competitividade e alçar nosso país a uma situação mais confortável ante as melhores atitudes globais, focadas no empreendedorismo como meta para o desenvolvimento econômico e social. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 71 Capítulo 4 • • • Desafios da integração federativa ARTIGO | João Coser Avanços desafios e após SEIS anos do Simples João Coser Ex-presidente da FNP “ Exemplo de Cabaceiras e Cariacica Nos últimos anos, o Brasil saiu da condição de país emergente para o posto de sexta economia do mundo. Além disso, a crise financeira mundial, iniciada em 2008 e que persiste até hoje em alguns países, não impediu o crescimento acima da média do Produto Interno Bruto brasileiro. Nesta trajetória ascendente, as micro e pequenas empresas e os empreendedores individuais têm desempenhado um papel fundamental. A sua atuação no fomento da economia local e na geração de emprego e renda confere estabilidade à economia brasileira e sucesso ao desenvolvimento social. Há que se destacar também a atuação conjunta da Frente Nacional de Prefeitos (FNP) com o Sebrae no sentido de sensibilizar os gestores públicos municipais para 72 a necessidade de implantação da Lei. Juntas, as duas instituições prestaram apoio técnico à regulamentação e aplicação da Lei do Simples Nacional e à formalização de empreendedores individuais. Além disso, promoveram capacitações de compradores governamentais, de agentes de desenvolvimento local e de estimulo à inovação e acesso a tecnologias. Essa parceria firmada entre a FNP e o Sebrae contribuiu para que o empreendedorismo entrasse de vez na agenda dos prefeitos, que hoje compreendem a Lei Geral da Micro e Pequena Empresa como uma forte aliada. Ao incentivar a formalização por meio de benefícios como redução tributária e burocrática, a lei impacta positivamente as cidades. Dessa forma, os prefeitos passaram a enxergar as micro e pequenas empresas e os empreendedores individuais como peças fundamentais no processo de desenvolvimento local. São os pequenos negócios que geram mais empregos, fixam pessoas nos municípios, dinamizam a economia e promovem a distribuição de renda. Seis anos do Supersimples João Carlos Coser nasceu em Santa Teresa (ES) em 1956. É graduado em Direito e pós-graduado em Direito Público e Processual. Ingressou na atividade política pelas comunidades eclesiais de base, fundou o PT no Estado, foi eleito deputado estadual duas vezes, e federal também por dois mandatos. Foi prefeito de Vitória (ES) por dois mandatos. Desde 2007, o Simples Nacional já gerou mais de R$ 196 bilhões em arrecadação, dos quais mais de R$ 15 bilhões são tributos municipais. As MPEs são, também, responsáveis por um em cada quatro empregos com carteira assinada no Brasil. A ação e o trabalho dos prefeitos, feitos de forma dialogada com as MPEs têm resultado em experiências extraordinárias. Cabaceiras (PB) e Cariacica (ES) são exemplos emblemáticos de como é possível criar novas cadeias produtivas a partir da organização das prefeituras, do setor econômico e da sociedade. Foi com base nessas experiências bem sucedidas e no potencial das MPEs e dos MEIs para a erradicação da miséria que a Frente Nacional de Prefeitos em parceria com o Sebrae realizou, em março de 2012, em Brasília, o Encontro dos Municípios com o Desenvolvimento Sustentável. O foco principal desse Encontro foi a importância do pequeno negócio para o desenvolvimento sustentável das cidades. Mais de 2,3 mil pessoas participaram dos debates. Os resultados obtidos foram tão positivos que uma segunda edição do encontro foi realizada em abril de 2013. Não basta aprovar a lei Hoje, seis anos após a implantação do Simples Nacional, vemos o quanto avançamos no estímulo às MPEs e aos MEIs. Ele representa mais do que o reconhecimento da importância do segmento econômico para o país. Representa a determinação de mecanismos capazes de proporcionar às empresas um tratamento diferenciado que beneficie o setor. Contudo, também reconhecemos que ainda temos um árduo trabalho a ser realizado. Se antes a atuação da FNP e do Sebrae era focada na implantação da Lei Geral nos municípios, o desafio posto neste momento é garantir a eficácia da legislação. E, para que isso aconteça, é necessário que haja uma importante mudança na cultura da gestão pública, incluindo desde a adoção de novos procedimentos para abertura e fechamento de micro empresas até a adequação dos critérios adotados para a realização das compras públicas. Até o momento, empreendedores, governos e sociedade mostraram-se abertos às mudanças. E, com certeza, permanecerão assim. Afinal, fortalecendo as micro e pequenas empresas e os empreendedores individuais estamos gerando renda e qualidade de vida local e, consequentemente, promovendo o desenvolvimento do Brasil. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 73 Capítulo 4 • • • Desafios da integração federativa ARTIGO | Silas Santiago Simples Nacional Panorama e Horizonte Silas Santiago Secretário executivo do Comitê Gestor do Simples Nacional “ A Constituição Federal de 1988, ao tratar dos “Prin- cípios Gerais da Atividade Econômica”, determinou, nos artigos 170 e 179, que à microempresa e à empresa de pequeno porte deveria ser dispensado tratamento jurídico diferenciado e favorecido. Esses mandamentos constitucionais propiciaram a criação, em nível federal, do “Simples Federal”, por meio da Lei nº 9.317, de 1996, bem como dos regimes simplificados de tributação criados pelos Estados e Municípios destinados a dar tratamento diferenciado e favo- recido às microempresas e empresas de pequeno porte. Tendo em vista que o referido tratamento jurídico diferenciado e favorecido encontrava-se totalmente fragmentado nos três níveis da federação, fazia-se necessária alteração constitucional que trouxesse sistematização e uniformização à matéria. 74 Seis anos do Supersimples Silas Santiago é graduado em Ciências Contábeis pela Fafi Cornélio Procópio/PR e em Direito pela UEL de Londrina/PR. Especialista em Contabilidade Geral e Auditoria e em Direito Civil e Direito Processual Civil. É auditor fiscal da Receita Federal do Brasil. Com esses objetivos, e também visando a dar suporte constitucional à integração federativa no âmbito tributário, a Emenda Constitucional 42 foi aprovada em 2003, alterando o artigo 146 da Constituição Federal. Em atendimento aos ditames da EC 42/2003 foi publicada a Lei Complementar 123, em 14 de dezembro de 2006. Referida lei representou um marco na história das microempresas e empresas de pequeno porte no Brasil, pois promoveu a unificação de toda a legislação relativa ao segmento. Com isso, deixou de ser uma lei apenas tributária – que criou o Simples Nacional, tornando-se a lei que consolidou as políticas públicas determinadas pela Constituição Federal. Um Exemplo de Integração Federativa Características do Simples Nacional Conclusões e Perspectivas O Simples Nacional, regime jurídico-tributário unificado destinado às microempresas e às empresas de pequeno porte, foi instituído com as seguintes características: unificação da arrecadação, da fiscalização e da cobrança dos seguintes tributos: seis federais (IRPJ, IPI, CSLL, Cofins, PIS/Pasep e Contribuição Patronal Previdenciária); ICMS, de competência estadual; ISS, de com- O Simples Nacional é o grande exemplo de integração federativa no Brasil e a verdadeira reforma tributária voltada para as microempresas e empresas de pequeno porte. Com seis anos de existência, podemos registrar grandes desafios e conquistas, destacando-se a criação de suporte jurídico que fundamenta o regime, o mecanismo de gestão compartilhada, o respeito à autonomia dos entes federados e a utilização intensiva de tecnologia da informação, com plataforma democrática e ao alcance de todos, pela internet. Os resultados têm-se mostrado excelentes – para as empresas e para as administrações tributárias. Essa, sim, é a verdadeira revolução tributária em nosso país. petência municipal. A gestão desse regime é compartilhada por meio do Comitê Gestor do Simples Nacional, órgão colegiado vinculado ao Ministério da Fazenda, com poderes de regulação, com oito integrantes, dos quais quatro membros da União, dois membros representantes dos Estados, indicados pelo Confaz, e dois membros representantes dos Municípios, indicados pela Associação Brasileira de Secretários de Finanças das Capitais (Abrasf) e pela Confederação Nacional de Municípios (CNM). O Brasil é uma federação, mas com uma formação muito peculiar. A República Federativa do Brasil é composta pela União, pelo Distrito Federal, pelos 26 estados e pelos 5.570 municípios. Portanto, temos uma federação com 5.598 membros. Qualquer processo de integração entre administrações tributárias de origens distintas – nacionais e subnacionais – enfrenta desafios de naturezas distintas. No caso brasileiro, o principal desafio foi o de preservar a autonomia dos entes federados, por meio da gestão compartilhada e da independência na atuação da União, Estados e Municípios junto aos contribuintes. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 75 Capítulo 4 • • • Desafios da integração federativa EXEMPLOS DE SUCESSO | minas gerais Cadastro gratuito e microcrédito Exemplos de sucesso Minas oferece exemplos sempre diversificados de criatividade e sucesso dos pequenos negócios, como a confecção Auá, que faz roupas com design premiado, mas também traz um caso de insucesso: a lapidação Naturale Stein, que não pôde ingressar no Simples por dívidas com a Previdência. Haueisen apagava pessoalmente as luzes da Prefeitura teófilo otoni Mais simples e mais digno A despeito dos seus 82 anos, a ex-prefeita petista de Teófilo Otoni (MG), Maria José Haueisen, costumava trabalhar até tarde da noite. Com o rigor dos antepassados alemães, lia todos os documentos que colocavam em sua mesa antes de assinar. Quando fechava o gabinete, apenas alguns seguranças estavam no prédio, e ela saía apagando todas as luzes desnecessárias. “Às vezes eles se esqueciam e as luzes ficavam acesas a noite inteira. A conta vinha muito alta”, explica. Esse zelo com o dinheiro público e com os interesses superiores do município foi o mesmo desde o primeiro dos seus oito anos de mandato. Maria José encerrou sua gestão à frente da Prefeitura deixando uma situação bem melhor do que encontrou. 76 Seis anos do Supersimples “Apesar da fama de ser um centro mundial de comércio de pedras preciosas, o dinheiro que movimentava a economia de Teófilo Otoni vinha principalmente dos soldos do 19º Batalhão da PM e das aposentadorias e pensões do INSS. Agora nossa principal fonte de renda é o Setor Serviços. Não temos mais mendigos pelas ruas, embora ainda sejamos uma cidade pobre, onde 10 mil lares recebem o reforço do Bolsa-Família”, revela. 409 MPEs em um ano Teófilo Otoni, com 134.700 habitantes, foi uma das primeiras cidades do Nordeste de Minas a adotar os princípios da Lei Geral e aderir ao Supersimples. Primeiro por decreto, em 2008, e em 2011 pela Lei 6.253. Os números começaram a mudar. A arrecadação, que foi de R$ 127 milhões em 2009, saltou para R$ 159 milhões em 2010 e R$ 217 milhões em 2011, ou seja, praticamente dobrou em dois anos. Segundo a Junta Comercial de Minas Gerais, de janeiro de 2011 a janeiro de 2012 foram abertas no município 409 novas micro e pequenas empresas, e apenas 10 pediram fechamento. Esse crescimento teve estímulo direto da Prefeitura. No primeiro semestre de 2012, a Prefeitura comprou R$ 24 milhões. Desse volume, R$ 19,2 milhões foram adquiridos das MPEs, sendo 90% através de pregão presencial. Segundo o ex-secretário de Indústria e Comércio, Bruno Balarini, a construção civil cresceu 210% nos últimos três anos, e só não está mais acelerada por causa da especulação imobiliária que eleva o preço do metro quadrado a valores comparáveis aos de Belo Horizonte. “Os loteamentos estão oferecendo milhares de lotes e redes hoteleiras importantes estudam investimentos na cidade”, informa. Teófilo Otoni tem grande número de ambulantes e uma profissão que é típica de lá: os cambalacheiros, que ficam na Praça Tiradentes oferecendo pedras preciosas de baixo valor aos visitantes e aos turistas. Dentro dos princípios da Lei Complementar 123, Maria José Haueisen criou os projetos Mais Simples e o Mais Digno, visando organizar cambalacheiros, vendedores ambulantes de cocos e alimentos, moto-taxistas e ex-camelôs dos shoppings populares. Outra iniciativa foi a de divulgar as linhas de microcrédito dos bancos públicos, como o Banco do Nordeste. “A legislação do Simples nos ofereceu oportunidades de enfrentar nosso imenso passivo social. Quando surgiu o microempreendedor individual, vários contadores da cidade começaram a cobrar para inscrevê-los. Imediatamente montamos um serviço de inscrição gratuita, semelhante à Sala do Empreendedor do Sebrae. Também estimulamos a formação de associações dos ambulantes para se protegerem, e tratamos de identificar os que trabalham na rua por meio de jalecos”, acrescenta Haueisen. São exatamente 178 os ambulantes registrados pela Prefeitura. Na praça Tiradentes podem ficar apenas 24 cambalacheiros, que conquistaram esse direito por idade ou antiguidade nesse trabalho. O grande trunfo da administração de Maria José Haueisen, no entanto, foi o de transformar a cidade num polo educacional. Graças ao seu relacionamento pessoal com o ex-presidente Lula, ela conquistou para sua cidade um campus avançado da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, e outro da Universidade Aberta do Brasil, ligada à UFMG. Somadas às particulares Fenord, Unipac e Doctum, essas escolas oferecem 8 mil vagas para universitários de dezenas de cidades da região. Como a oferta de habitações ainda não atende a demanda, 54 vans e microônibus levam e trazem diariamente alunos de até 150 km de distância. Seis anos do SUPERSIMPLES 77 Capítulo 4 • • • Desafios da integração federativa exemplos de sucesso | minas gerais minha família estava em Teófilo Otoni, decidi regressar para vender meus doces, alugar uma casa e ser arrimo para meus dois irmãos”, prossegue. O inventor do “doce aranha” Quando se casou com Laura Saldanha, aos 26 anos, Francisco já tinha o apelido de Chico do Doce e uma freguesia sólida que convocava pela cidade afora com sua voz poderosa. Ele desenvolveu um tipo de cocada com coco desfiado chamada “doce aranha”, em formato retangular, que facilita para abastecer o balaio e para comer. Apesar de ser conhecido por toda parte e ter prestígio junto à comunidade, o trabalho na rua não era fácil. Chico do Doce enfrentou perseguição de algumas administrações municipais, que o proibiam de vender nos melhores pontos, e chegou a passar dificuldades. “Eu nunca tive carteira assinada. Há dois anos, meu filho, que é contador formado, me convenceu a entrar no microempreendedor individual. E foi uma sorte, porque logo depois, de tanto virar tachadas de doce, rompi os ligamentos do ombro, tive que operar e fiquei uns meses parado, recebendo o auxílio-doença do INSS”, reconhece o doceiro. Com a ajuda dos filhos e genros, Chico do Doce finalmente saiu da rua. Montou a lanchonete Garapinha perto da feira livre de Teófilo Otoni, onde vende caldo de cana e guloseimas. Os pastéis, quibes e coxinhas são feitos por sua esposa Laura, uma elogiada quituteira que ele pretende registrar como empregada, para que também tenha a proteção previdenciária. fora do simples O brilho da Naturale Stein Cocadas e garapa Chico do Doce Quem nasceu em Itamunheque, perdeu a mãe aos 8 anos e estudou apenas o primário em Potonzinho, não parece ser capaz de ir muito longe. Mas José Francisco de Melo, o Chico do Doce – sem jamais ter trabalhado de carteira assinada – chega perto dos 60 anos com os filhos formados e bem empregados, e com uma segurança que não podia imaginar quando era adolescente e resolveu trabalhar num circo mambembe que passou por Teófilo Otoni, Minas Gerais. “Minha vida toda foi vendendo coisas na rua, desde meus 12 anos, quando meu pai me mandou morar com os padrinhos em Teófilo Otoni, e eu vendia picolés. De78 Seis anos do Supersimples pois passei um tempo trabalhando dentro da fábrica de picolés, até que, aos 17 anos, agradei de um circo que passou pela cidade e resolvi acompanhá-lo, como vendedor de balas”, relembra Francisco. Era o Las Vegas Circo Show, que levou Chico para conhecer o mundo, ou seja, oitenta cidades do Norte de Minas, Sul da Bahia, interior do Rio e do Espírito Santo. O proprietário era o Palhaço Ripulim, que reparou na voz bonita do rapaz e o colocou para fazer propaganda volante como locutor no carro de som. Mas Francisco ganhava dinheiro era vendendo as balas industrializadas do circo e suas próprias cocadas. “Depois de cinco anos, a gente estava em Vitória e o dono resolveu embarcar o circo num navio para ir pro estrangeiro. Eu decidi ficar em Guarapari, vendendo pipoca e cocada que eu mesmo fazia. Quando soube que Nas recepções dos hotéis de Teófilo Otoni há sempre bem-abastecidas vitrines com jóias reluzentes ou pedras preciosas lapidadas de todas as formas e cores: águas-marinhas, turmalinas, topázios, berilos, ônix, safiras, esmeraldas... Também nas capangas e pochetes dos cambalacheiros da Praça Tiradentes brilham pedras menos conhecidas: green-golds, rutilos, jadeítas, amazonitas, quartzos goiaba, quartzos negros, muriões, todas extraídas de jazidas nos municípios vizinhos. A cidade ganhou o pomposo título de Capital Mundial das Pedras Preciosas no final dos anos 80, quando chegou a ter 5 mil lapidários. Um dos mais famosos designers de lapidação do Brasil está instalado na periferia da cidade, no bairro São Jacinto. É Carlos Roberto Torres Ferreira, da Naturale Stein Ltda, empresa de pe- Seis anos do SUPERSIMPLES 79 Capítulo 4 • • • Desafios da integração federativa exemplos de sucesso | minas gerais Lapidando jóias até para os chineses queno porte que fundou em 1993 junto com a esposa Valdenice Soares Meira. “Eu tenho 50 anos de idade e 38 de profissão. Comecei a aprender com meu tio Raul aos 12 anos. Antes da Naturale, já possuí uma lapidação não registrada, trabalhando para uma empresa alemã, como a maioria das pessoas daqui”, revela. A Naturale Stein mantém hoje 16 lapidários que trabalham em suas instalações e utilizam suas máquinas, mas são microempreendedores individuais. Foi um acordo feito entre o casal de proprietários e os lapidários no final do ano passado, que resultou na simplificação dos encargos administrativos e em grande melhoria de ganhos para os lapidários, que evoluíram de R$ 1,6 mil para até R$ 3,2 mil por mês, conforme a produtividade. 80 Seis anos do Supersimples A empresa recebe 80% de suas encomendas de joalheiros de vários países, como Alemanha, Itália, Suíça, Estados Unidos e até da China, e exporta pelo FedEx americano com valor declarado, recebendo de forma legalizada através do Banco do Brasil. Apesar de desejarem as facilidades do Supersimples, Carlos Roberto e Valdenice não puderam aderir, porque têm dívidas com o INSS. “A crise econômica mundial de 2008 atingiu em cheio nossa atividade, que é baseada na exportação. Ficamos em dificuldades para pagar funcionários e acumulamos dívidas com a Previdência, que precisamos quitar para entrar no Simples”, revela Valdenice. A equação das dívidas foi facilitada pelo surgimento do MEI, em que os próprios lapidários recolhem para a Previdência e trabalham nas máquinas da empresa como terceirizados. Mesmo com esse alívio, Carlos Roberto receia pelo futuro da atividade. “Dos cinco mil lapidários que havia aqui há 20 anos, talvez não restem mil. A habilidade que desenvolvi a partir dos 12 anos hoje seria ilegal, por causa da proibição do trabalho do menor. Também a profissão de garimpeiro está em extinção por causa da repressão ambiental”, reclama o mestre. victoria festas Sem medo da vizinhança Numa roça chamada Capim de Cheiro, arredores de Diamantina (MG), nasceu Maria José de Fátima Fernandes Moreira, ou simplesmente Fátima. Família pobre, pai agricultor, Fátima foi enviada aos 5 anos de idade para a casa de uma família em Belo Horizonte, onde trabalhou como doméstica. Aos 12 anos já tinha carteira assinada. Aos 16 anos Fátima já estava casada, e foi mãe aos 18. Aos 22 já tinha quatro filhas e foi abandonada pelo marido. Sem poder pagar aluguel, teve que voltar para Diamantina, contando com o suporte da mãe para criar as meninas. “Fui me candidatar a um emprego na cozinha da Pousada do Garimpo. O chef era o famoso Wandeca. Sua parede era forrada de diplomas, prêmios e recortes de jornal. Meu teste foi matar 50 galinhas, depenar, limpar e fazer molho pardo para um grande jantar. Passei e fui contratada”, relembra. A vida de Fátima em Diamantina não era só trabalho e cuidar das filhas. Ela também jogava futebol num time amador. Entre uma canelada e um pênalti, conheceu Cleber, filho do treinador. Apaixonaram-se, casaram-se e retornaram a Belo Horizonte, ela trabalhando de cozinheira em grandes restaurantes e ele de garçom. Quando nasceu sua filha Victoria, Fátima começou a pensar numa atividade que lhe desse renda sem precisar sair de casa. Escolheu fazer salgados, que o Cleber saía Seis anos do SUPERSIMPLES 81 Capítulo 4 • • • Desafios da integração federativa exemplos de sucesso | minas gerais vendendo numa cesta, na rua e na fila dos Correios. O negócio foi crescendo e ela passou a fornecer quantidades maiores para as padarias. Tudo na informalidade. “Eu morria de medo de ser denunciada pelos vizinhos e ter meu pequeno negócio fechado pelas autoridades. Na época havia uma perseguição às atividades chamadas de fundo de quintal”, relata. Soma de talentos: a receita do sucesso A habilidade de Fátima nos salgados era insuperável, seu marido era um garçom requisitado, sua filha Flávia fazia bolos caprichosamente bordados em glacê. O caminho era começar a fornecer produtos e mão de obra para festas. “Neste ramo o que conta é a indicação, o boca a boca. Nunca precisei fazer folhetos de propaganda, nem colocar placa na porta. Um cliente satisfeito sempre indica outro, e assim temos atividade o tempo todo. Tem dias que eu enfrento o fogão por 14 horas seguidas, mas compensa”, revela, abrindo um sorriso. Há dois anos, a filha Flávia a convenceu a registrar-se no site do microempreendedor individual. Tirou o CNPJ, recebeu o alvará provisório e registrou o marido Cleber como empregado. Surgiu assim o embrião da Victoria Festas. Já compraram uma perua Fiat Doblò para as entregas e planejam alugar um galpão para instalar uma lanchonete na frente e a produção de comestíveis nos fundos. O formato já é de microempresa. O salto para uma organização de festas é só uma questão de tempo. 82 Seis anos do Supersimples trajes para a humanidade Studio Auá Patrícia Guerra, seu marido Paulo Coelho e as filhas Clarissa e Laura compõem uma família de artistas da moda. Puderam dedicar-se inteiramente à criação e ao trabalho de divulgação e venda de roupas depois que o Simples surgiu para descomplicar as tarefas empresariais. O facilitador é o contador José Irilo Martins, da Marcon Contabilidade. “Nem sentimos a passagem de micro para pequenos empresários. Confiamos inteiramente no critério do Irilo, e só sei que com o Simples as coisas ficaram mais fáceis para nós”, confessa Paulo Coelho. Patrícia nasceu em Acesita (MG), mas foi para Belo Horizonte estudar na UEMG, e lá conheceu Paulo, ambos no curso de Design Gráfico. Paulo já tinha experiência artística por trabalhar 17 anos com o famoso escultor Amílcar de Castro. Sua experiência empre- sarial foi de dirigir uma papelaria e durante um ano uma galeria de arte. Patrícia era novata, mas logo emplacou um design de estamparia para o estilista Renato Loureiro e foi convocada por ele para agregar o design gráfico à moda. “Era uma grande confecção com quase 200 funcionários. Eu não tinha experiência de moda, mas levei meu olhar de designer e cartelas de cores nacionais, em oposição aos padrões que vigoravam, vindos da Itália e da França”, lembra Patrícia. Era a época da ascensão do Grupo Mineiro de Moda, um polo importante de confecção em Belo Horizonte, com griffes que adquiriram fama internacional, como Patachou, Eliana Queiroz, Graça Otoni e Sônia Pinto. Já casada com Paulo, Patrícia deixou o Loureiro e foi para a Patachou, onde trabalhou de 1997 a 2003. Levou parcerias com a história da cultura brasileira e desenvolveu uma coleção “corte e fenda” a partir dos desenhos de Amílcar de Castro, com grande sucesso. Estampas indígenas Anos depois, em parceria com um indigenista, começaram a buscar estampas indígenas nas tribos zorós, krenaks, suruís e maxacalis. Surgiu então o Studio Auá, que em tupi significa homem, mulher, todas as pessoas. Ampliaram a confecção para fazer vestidos, pareôs, lenços, coleções inteiras com temas indígenas. “Decidimos usar fibras naturais de algodão, de madeira, de seda e linho. Os tecidos naturais são mais elegantes, estéticos, aceitam bem a modelagem e a estamparia”, explica Patrícia Guerra. Hoje a etiqueta Auá mantém 15 funcionários, fora a família, e produz de 300 a 500 peças por mês, além de lançar cinco coleções por ano. Está presente em 40 pontos de venda multimarcas em dez estados. Recentemente Patrícia e Paulo decidiram abrir uma loja em Belo Horizonte para ter um feedback da clientela. Eles sempre experimentam novos caminhos no instável mundo da moda. “Ainda não estamos bem estabilizados. Investimos muito para colher mais adiante”, conclui Paulo Coelho. Seis anos do SUPERSIMPLES 83 Capítulo 5 Novas tecno logias para simplificar o complexo A complexidade do modelo federativo brasileiMazoni: “Inúmeras bases de dados hospedadas no Serpro são acessadas em mainframes e Plataforma Baixa”. Occaso: “Aplicativos modernos e inovadores facilitam o cumprimento das obrigações principais e acessórias”. 84 Seis anos do Supersimples ro e do sistema tributário colocou desafios inéditos para a administração fazendária e para as assessorias contábeis dentro do Simples. Ficou evidente que, para simplificar as obrigações tributárias das MPEs, a tarefa dos agentes públicos seria muito complexa. É senso comum que, sem a internet e a sofisticação da tecnologia da informação, o Supersimples seria inviável. Foi preciso integrar centenas de bases de dados e a rede nacional de compensação bancária para criar um sistema confiável, em que o tributo pago pelo contribuinte seja repassado diretamente para o ente federado ao qual se destina. Houve uma colaboração intensa entre peritos de informática de diversas origens para construir os sistemas adequados. Vários aplicativos foram criados pela própria equipe do Serpro, com os requisitos de confiabilidade, sigilo e segurança necessários. Simão: “Os estabelecimentos turísticos legalizados tiveram incentivo para gerar serviços de maior qualidade”. Pietrobon: “Certificado Digital é assinatura eletrônica que atesta a identidade de alguém na internet”. Marcos Mazoni, diretor presidente do Serpro, revela que os maiores desafios dos governos ao redor do mundo é fazer com que os sistemas de Governo Eletrônico atinjam um maior número de indivíduos e empresas, daí o esforço crescente feito pelas administrações na criação de novas interfaces, por exemplo, para tablets e smartphones. Carlos Roberto Occaso, subsecretário de Arrecadação e Atendimento da Receita Federal, antecipa os novos desafios: a implantação do Sistema Integrado de Fiscalização (Sefisc), em fase final de construção, e a implantação das rotinas que viabilizarão a compensação de débitos e créditos no âmbito do Supersimples. Valdir Simão, secretário executivo do Ministério do Turismo, traz sua diversificada experiência profissional como auditor fiscal da Receita que já presidiu o INSS por dois períodos e hoje empresta sua competência ao Ministério do Turismo. Ele analisa os resultados do Supersimples nas áreas onde atuou e atua, e faz considerações para diminuir os obstáculos da passagem de pequena para média empresa. Do lado dos contadores, Valdir Pietrobon, presidente da Fenacon, defende as bandeiras da entidade, que são lutar pela simplificação de processos, pela diminuição da carga tributária e agilizar a prestação de serviços. Quer também a simplificação das obrigações acessórias, que atualmente são mais de oitenta. Seis anos do SUPERSIMPLES 85 Capítulo 5 • • • Novas tecnologias para simplificar o complexo ARTIGO | Marcos Mazoni Tecnologias novas gerações para Marcos Mazoni Diretor-presidente do Serpro “ Gaúcho nascido em 1960, Marcos Vinicius Ferreira Mazoni é formado em Administração de Empresas, pós-graduado em Tecnologia da Informação pela Fundação Getúlio Vargas e em Gestão Empresarial pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Foi dirigente de entidades de classe e de empresas de informática no Paraná e no Rio Grande do Sul e trabalhou no gabinete de Planejamento da Prefeitura de Porto Alegre. 86 Seis anos do Supersimples O Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro), desenvolvedor do sistema do Simples Nacional, é também o responsável pela manutenção, envio e registro dos dados. O Simples Nacional é um sistema único de recolhimento de impostos para micro, pequenas e médias empresas que optam pelo pagamento integrado de impostos e contribuições das três esferas da Federação (municipal, estadual e federal). Inúmeras bases de dados que estão hospedadas no Serpro são acessadas em ambientes como mainframe e Plataforma Baixa. Ademais, existem canais de comunicação com outros órgãos, como o Banco do Brasil e a Dataprev, sendo que as informações de impostos relativos às esferas municipal e estadual ficam disponíveis para envio imediatamente posterior. Sistemas como o Simples Nacional são chamados sistemas de Governo Eletrônico para Empresas (G2E). Além disto, o Serpro desenvolve, mantêm e produz sistemas de Governo Eletrônico para Cidadãos (G2C), tais como o Microempreendedor Individual (MEI), e também Governo Eletrônico para Governo (G2G), tais como os Sistemas Estruturadores do Governo Federal. Um dos grandes desafios dos governos ao redor do mundo é fazer com que os sistemas de Governo Eletrônico atinjam um maior número de indivíduos e empresas, daí o esforço crescente feito pelos governos na criação de novas interfaces, por exemplo, para tablets e smartphones. vernamentais com a disponibilização organizada de serviços web com mecanismos eficientes para grandes volumes de dados (big data) os quais podem, inclusive, estar no formato de dados abertos. Na dimensão técnica, os desafios terão relação com grandes sistemas distribuídos com acesso por milhares ou milhões de dispositivos computacionais (móveis e fixos na chamada era da Internet das coisas). Estes acessos deverão garantir segurança e ter interfaces humano-computador que sejam mais apropriadas para as novas gerações de indivíduos que acessam importantes sistemas de Governo Eletrônico, como o Simples Nacional. “ Ferramentas otimizadas A produção do Portal do Simples Nacional no Serpro conta com um conjunto de servidores web para balanceamento de carga por meio de switches inteligentes em um modelo de web farm. Estes servidores acessam a própria base do Simples Nacional e diversas bases como CPF, CNPJ, Microempreendedor Individual (MEI), Sistema Integrado de Informações Econômico-Fiscais (SIEF) entre outras. É importante destacar que a maioria das comunicações micro-mainframe ocorrem por meio de ferramentas desenvolvidas pelo próprio Serpro que, por isto, estão personalizadas para extrair o que há de melhor no desempenho e otimização de recursos entre as plataformas. Os grandes desafios do Serpro para o futuro dos sistemas de Governo Eletrônico têm duas dimensões: Aplicação e Técnica. Na dimensão aplicação, os desafios estarão na criação de uma engenharia de aplicações go- Seis anos do SUPERSIMPLES 87 Capítulo 5 • • • Novas tecnologias para simplificar o complexo ARTIGO | Carlos Occaso Aplicativos modernos para o Simples Nacional “ Carlos Occaso Subsecretário de Arrecadação e Atendimento da Secretaria da Receita Federal O Simples Nacional constitui-se em um marco de simplificação tributária no Brasil para micros e pequenos empresários e um grande desafio para a Receita Federal, tanto pela necessidade de desenvolver integrações com as administrações tributárias de Estados e Municípios, quanto pela construção dos aplicativos modernos, em sua maioria disponíveis na internet, que viabilizam o funcionamento desse grande sistema. A começar pela opção por esse regime simplificado, que é feita diretamente no sítio da RFB, todo mês de janeiro: por meio do sistema de opção, o contribuinte manifesta a sua opção de se enquadrar no Simples Nacional e o sistema realiza, então, de forma automática e online, verificações cadastrais e fiscais, tais como a CNAE da empresa, se há débitos tributários em aberto nos sistemas, etc. Não havendo pendências, o resultado da opção é informado no mesmo momento ao contribuinte. 88 Seis anos do Supersimples Com a publicação da Lei Complementar 123, de 14 de dezembro de 2006, o maior desafio enfrentado pela RFB, nos meses seguintes, certamente se concentrou na necessidade de construção de um aplicativo, posteriormente denominado de PGDAS, que pudesse, de maneira simples, realizar o cálculo do valor devido pela empresa e gerar o documento de arrecadação (DAS). As equipes técnicas da RFB e do Serpro se debruçaram sobre as dezenas de artigos e incisos da Lei Complementar que regulamentam o cálculo e foram capazes de, em um prazo recorde de aproximadamente sete meses após a publicação da Lei, especificar, desenvolver, testar e homologar o sistema. Em curtíssimo prazo, portanto, o programa foi disponibilizado, em agosto de 2007, na internet, para acesso por milhões de empresas. Ao mesmo tempo em que se preparava o sistema para realizar o cálculo do valor devido e a geração do DAS, foram criadas as regras e adaptadas as rotinas que permitiram a distribuição diária dos valores arrecadados às contas da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Campos já preenchidos Carlos Roberto Occaso, nascido em 1959 na cidade paulista de Bebedouro, é graduado em Ciências e Matemática e Direito, e mestre em Administração Tributária e Fazenda Pública pelo Instituto de Estudios Fiscales, de Madri, Espanha. Foi Chefe da Divisão de Arrecadação da Superintendência Regional da Receita Federal em São Paulo. Os dados informados no PGDAS, quando da apuração do valor devido, não constituíam, até a publicação da Lei Complementar nº 139, de 10 de novembro de 2011, confissão de dívida. Para tanto, se fazia necessária a entrega da declaração anual, conforme previsto no art. 25 da LC nº 123/2006. Deu-se início, então, ainda no ano de 2007, à construção da Declaração Anual do Simples Nacional (DASN), utilizando um processo inovador na Receita Federal. O aplicativo da declaração importava os dados já informados e calculados pelo PGDAS e apresentava a declaração com a grande maioria dos campos já preenchidos. Esse aplicativo também foi rapidamente construído e entrou em produção no primeiro semestre de 2008. O crédito tributário do Simples Nacional, por conter, em sua composição, parcelas referentes ao ICMS e ao ISS, também demandou adaptação dos sistemas de conta-corrente da RFB para que pudessem controlar esses tributos e viabilizar a cobrança administrativa. Atualmente, o desafio se concentra na implantação do Sistema Integrado de Fiscalização (Sefisc), em fase final de construção, e nas rotinas que viabilizarão a compensação de débitos e créditos no âmbito do Simples Nacional. Enfim, foram muitos os desafios para a construção de um regime tributário simplificado, com aplicativos modernos e inovadores, que facilitam o cumprimento das obrigações principais e acessórias pelas microempresas e empresas de pequeno porte e, ao mesmo tempo, permitem a integração e o compartilhamento de informações entre as administrações tributárias dos entes federados. O sucesso obtido nestes seis anos de vigência do Simples Nacional deve ser atribuído ao empenho e esforço conjunto da RFB e de todos os órgãos e entidades que acreditaram e investiram em soluções tecnológicas que integram a estrutura logística moderna desse regime simplificado de tributação. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 89 Capítulo 5 • • • Novas tecnologias para simplificar o complexo ARTIGO | Valdir Simão Parâmetro desenvolvimento para o Valdir Simão Secretário executivo do Ministério do Turismo “ O Brasil deu um passo fundamental para o de- senvolvimento socioeconômico ao estabelecer um tratamento especial para os pequenos negócios. A implantação do Simples Nacional permitiu que um grande número de microempresários pudesse chegar à formalidade. Com uma abordagem tributária simplificada, que alcançou também os estados e os municípios, a ação é hoje reconhecida como uma experiência de sucesso. Toda a estratégia desenhada para o Simples foi focada na racionalidade da administração dos negócios. Utilizando meios tecnológicos mais avançados, o relacionamento com o Fisco passou a ser feito de forma eletrônica. Com uma única base de cálculo, um único documento de arrecadação, e uma alíquota subsidiada e progressiva em função do faturamento, o empresário deixou para trás um ambiente desafiador e burocrático, envolto em um arcabouço de legislações que muitas vezes inibiam a abertura de um negócio. 90 Seis anos do Supersimples Valdir Moyses Simão é auditor fiscal da Receita Federal do Brasil desde 1987. Graduado em Direito, possui especialização em Gestão de Arrecadação da Seguridade Social, Direito Empresarial e em Direção e Gestão de Sistemas de Seguridade Social. Foi presidente do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) por dois períodos, secretário-adjunto da Receita Federal do Brasil e secretário da Fazenda do Distrito Federal. No turismo, o Simples gerou qualidade Diminuir o gap para a média empresa Na cadeia produtiva do turismo, os benefícios são representativos e têm participação direta na trajetória de crescimento da atividade nos últimos anos. A grande maioria dos hotéis, agências de viagens, bares e restaurantes está enquadrada nessa modalidade. Com o Simples, os estabelecimentos devidamente legalizados tiveram um incentivo para gerar serviços de maior qualidade. Este é um fator preponderante, na medida em que este receptivo tem grande influência na percepção que o turista terá do destino visitado. No setor turístico, já são mais de 200 mil pessoas trabalhando oficialmente por conta própria como empreendedores individuais. O avanço foi possível devido à plena integração e empenho de todos os órgãos envolvidos, como as juntas comerciais, os fiscos federal, estaduais e municipais e dos órgãos de licenciamento. O governo federal soube organizar o caminho por meio do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Ministério da Fazenda, Ministério da Previdência Social, Instituto Nacional do Seguro Social, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Serpro, Dataprev, entre outros. Ao lado do Sebrae e da iniciativa privada, mobilizou seu corpo técnico para transformar o que era utopia em grande parte dos países. Hoje, no Brasil, é possível formalizar um negócio na condição de empreendedor individual em poucos minutos. Houve ainda um esforço adicional para uma iniciativa importante, a de integrar este novo sistema de arrecadação à base de dados da Previdência Social. Os resultados já têm impacto imediato. No momento em que o cidadão busca um benefício, como auxílio-doença ou aposentadoria, a informação já está certificada, sem qualquer risco deste direito não ser reconhecido. Novamente, a participação da internet foi decisiva, mais ainda se considerarmos a facilidade para milhões de brasileiros se inscreverem e, em pouco tempo, formalizar seu negócio. Na mesma medida, a adaptação de legislações ultrapassadas freou a distorção que colocava uma empresa de pequeno porte em concorrência direta com grandes empresas do mesmo ramo. Não havia privilégios, por exemplo, na contratação com a administração pública. Com modernizações capitaneadas em conjunto entre o setor público e o privado, os micronegócios são hoje os que mais geram empregos no Brasil. Alguns desafios se impõem para o futuro. Ultrapassar a situação de microempresário e formar uma empresa que não mais se enquadra no Simples é um deles. A legislação é muito mais complexa e a discussão atual é como diminuir o gap existente entre um modelo e outro. Novamente, a experiência bem-sucedida do Simples é o referencial para essas discussões. Outro passo necessário é envolver e criar facilitações legais para os empreendedores que atuam no meio rural, para que possam também se formalizar sem perder a condição de segurados especiais da Previdência Social. Neste caso, estamos também atendendo o setor turístico, já que muitos estabelecimentos na área rural se dedicam à produção associada ao turismo e são experiências de sucesso no turismo rural. Se entrarem na formalidade, terão impacto direto na situação previdenciária de milhões de agricultores familiares e farão parte das ações construídas pelo Ministério do Turismo especificamente para este segmento. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 91 Capítulo 5 • • • Novas tecnologias para simplificar o complexo ARTIGO | VALDIR PIETROBON Evolução desafios tecnológicos e Valdir Pietrobon Presidente da Fenacon Gaúcho de Erechim, Valdir Pietrobon foi criado em Matelândia (PR) e transferiu-se em 1972 para Curitiba, onde concluiu o 2º grau e começou a trabalhar no ramo da Contabilidade. É bacharel em Ciências Contábeis e pósgraduado pelo International Business Institute. Empresário contábil há 40 anos, preside a Federação Nacional das Empresas de Serviços Contábeis e das Empresas de Assessoramento, Perícias, Informações e Pesquisas (Fenacon), que representa 400 mil empresas brasileiras. 92 Seis anos do Supersimples “ No ensejo dos seis anos de existência do Simples Nacional, os micro e pequenos empresários brasileiros têm muito o que comemorar: além de facilitar o dia a dia desse setor, a legislação instituída pela Lei Complementar nº 123/ 2006 e alterações posteriores, trouxe significativos avanços na prestação de serviços nesses últimos anos. Entretanto, uma das mais importantes mudanças que essa legislação trouxe para a sociedade foi a necessidade de buscar novas tecnologias que pudessem melhorar a vida desses empresários, para além de sua luta contra os velhos e conhecidos problemas, como o peso da carga tributária, a informalidade, a burocracia. O uso da tecnologia é visto como importante aliado na busca da eficiência e ganho de tempo. A cada ano, essa mentalidade é mais aplicada no cotidiano do governo e das empresas. Prova disso é a exigência da Receita Federal em praticamente aposentar a modalidade de entrega da declaração do Imposto de Renda Pessoa Física por meio de papel. O uso cada vez maior da Certificação Digital, além da implementação de novas tecnologias, facilitou, e muito, a vida dos empresários brasileiros. O Certificado Digital é uma assinatura eletrônica que atesta a identidade de uma pessoa ou instituição na internet por meio de um arquivo eletrônico. Com o uso da criptografia – tecnologia que assegura o sigilo e a autenticidade de informações – é possível garantir a confiabilidade, privacidade, integridade e inviolabilidade das transações realizadas pela rede. Seu objetivo é atribuir nível maior de segurança nas transações eletrônicas, permitindo a identificação inequívoca das partes envolvidas, bem como a integridade e a confidencialidade dos documentos e dados da transação. Essa novidade tecnológica tem reduzido a burocracia e simplificado as rotinas de trabalho de empresas, órgãos e sociedade. Assessoria contábil é vital Não só a tecnologia merece destaque nesse contexto. O papel do empresário contábil também é vital, por ser visto como aliado do micro e pequeno empresário. Observa-se, assim, a importância desse segmento que processa toda a arrecadação tributária do país, em todas as esferas de governo, orienta as empresas e atende a toda a malha de fiscalização existente no país. No Brasil, diferentemente da grande maioria, são as organizações contábeis, de fato, as responsáveis pelo processo de abertura, legalização e encerramento de todas as empresas. A Federação Nacional das Empresas de Serviços Contábeis e das Empresas de Assessoramento, Perícias, Informações e Pesquisas (Fenacon) tem como finalidade o estudo, a coordenação, a proteção e a representação legal residual das categorias econômicas “empresas de serviços contábeis” e “empresas de assessoramento, perícias, informações e pesquisas”. A Federação está presente em todo território nacional e representa mais de 400 mil empresas do segmento de serviços em todo o país. Dentre os segmentos representados, encontram-se cerca de 80 mil empresas de serviços contábeis. Passa pelas organizações contábeis toda operacionalização e controle das obrigações principais e acessórias exigidas pelos governos federal, estaduais e municipais, do empresariado brasileiro. As bandeiras da entidade são lutar pela simplificação de processos e defender a diminuição da carga tributária. A agilidade na prestação de serviços, a modernização, a informatização, são tudo o que sempre defendemos e acreditamos como saída para diminuir a vasta burocracia que ainda impera no país. Ultimamente, um dos temas que mais temos levado ao conhecimento dos órgãos públicos é o da necessidade de simplificar as obrigações acessórias. Para se ter uma ideia, atualmente são mais de 80 as obrigações que as empresas devem prestar em prazos que variam de semanal a anual. Enfim, são exigências burocráticas que deixam o ambiente corporativo muito aquém do ideal. Cremos que medidas como essa farão com que, passo a passo, a tão sonhada simplificação comece a tomar corpo. Ficamos muito felizes em saber que empresários, representantes de classe e governo estão trabalhando por esse objetivo. E quem ganha com isso é o país. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 93 Capítulo 5 • • • Novas tecnologias para simplificar o complexo EXEMPLOS DE SUCESSO | BAHIA Exemplos de sucesso A Bahia é terra de oportunidades para empreendedores migrantes. Os dois pequenos empresários escolhidos para representar o Estado não nasceram lá. O capixaba Cecimar, mais conhecido como Macarrão, nasceu e se criou em Colatina, mas teve sucesso como fornecedor de material de construção em Nova Viçosa. O pernambucano Fernando França Paes, descendente de uma estirpe de oleiros, veio descendo pelo mapa do Brasil em busca de jazidas de barro, e encontrou as melhores no Sul do Estado. areia e brita Macarrão à baiana Em Nova Viçosa, no Sul da Bahia, ninguém sabe quem é Gecimar Luiz Tineli, mas se alguém perguntar por Macarrão, todo mundo conhece. Seu caminhão amarelo é visto várias vezes por dia fazendo entregas de areia e brita, com uma pontualidade sem rival naquelas praias baianas. Macarrão é um exemplo de quem trabalhou arduamente a vida inteira, e só veio ter sucesso e tranquilidade depois do Simples. Nascido há 54 anos em Colatina, Tineli é descendente de italianos e alemães que colonizaram o Espírito Santo. O apelido de Macarrão vem desde os tempos de menino, e não foi por causa do sobrenome italiano, mas porque era muito alto, muito magro e muito branco, como um espaguete, esclarece sua esposa, Inês. Ele estudou só até concluir o primeiro grau e aos 17 anos caiu no mundo, indo trabalhar numa fábrica de balanças de pesar gado. Lá mesmo aprendeu a dirigir caminhão e nunca mais saiu da boleia. Quando beirava 94 Seis anos do Supersimples os 30 anos, conseguiu adquirir seu primeiro caminhão, com ajuda do pai e dos amigos. Ao fazer uma entrega de material de construção em Nova Viçosa, gostou do lugar e decidiu mudar-se para lá em 1991. Em 92, Tineli abriu sua primeira empresa, a Belém Madeiras, que vendia material para obras, em especial madeira para telhado vinda do Pará. Chegou a ter sete empregados fixos, mas anos depois teve que dispensá-los porque a cidade estagnou e as obras pararam. Seis anos do SUPERSIMPLES 95 Capítulo 5 • • • Novas tecnologias para simplificar o complexo EXEMPLOS DE SUCESSO | BAHIA Uma empresa finada e outra ativada “A partir de 2000, o faturamento diminuiu, as despesas cresceram, e o Governo, em vez de deixar a gente tomar fôlego, aumentou os encargos, a burocracia e as exigências ambientais. Resisti até 2004, mas depois não tive como continuar. Vivi durante uns dois anos trabalhando como autônomo, na semi-clandestinidade”, relembra. O desconforto por estar irregular e o espírito empreendedor prevaleceram e, em 2005, Macarrão adquiriu uma empresa paralisada, e passou a dedicar-se à extração de areia, terra, cascalho e aluguel de máquinas para construção civil. “No início não era fácil manter a contabilidade e as obrigações em dia. Os impostos eram todos separados, tinha guias com bancos determinados, o Banco do Brasil não aceitava cheques da própria empresa para quitar impostos e eu era obrigado a ir pagar em dinheiro vivo na agência de Posto da Mata, a 90 km de distância, enfrentando filas enormes”, reclama. Em 2007, seu contador lhe explicou as vantagens do Simples, dizendo que seria bom para ambos: “Ele estava tão entusiasmado que nem precisei ouvir até o final para autorizá-lo a aderir. No início fiquei meio descrente, mas hoje tenho que admitir que o Simples nos facilitou tudo, desde o pagamento unificado, até o acesso ao crédito e à assistência técnica para investimentos”. Hoje Macarrão tem dois caminhões para entrega de material e duas retroescavadeiras/pás-carregadeiras novinhas da New Holland. Uma fica no areal e a outra no depósito que mantém numa ampla propriedade de cinco hectares nos limites da cidade. É tão habilidoso para operar as New Holland que é capaz de embarcá-las sozinho no caminhão, usando apenas os braços hidráulicos para elevá-las. Burocracia ambiental ainda é pesada Os lucros ele investe numa estrutura de lazer e pesca baseada na criação de peixes fluviais: pintados, pirarucus, tambaquis e carpas ocupam vários tanques. É seu 96 Seis anos do Supersimples projeto de aposentadoria, quando não se sentir mais em condições de operar suas máquinas e dirigir caminhão. Recentemente, Macarrão conseguiu regularizar as jazidas que explora. Tem autorização do DNPM para extrair 50 mil metros cúbicos de areia por ano de uma área de 20 hectares que adquiriu. A área em fase em pesquisa totaliza 717 hectares. A cidade de Nova Viçosa é construída sobre um antigo leito de rio, sobre areia, portanto. Terra lá é difícil, e Macarrão busca numa jazida de 50 hectares bem distante. “Se as obrigações tributárias foram muito facilitadas, o licenciamento ambiental continua lento, burocrático e cheio de exigências absurdas. Fui obrigado a fazer reflorestamento externo, nas áreas fora das que exploro, e me exigiram até colocar lixeiras junto aos portões de entrada do areal e do barreiro, como se produzíssemos lixo lá”, relata. A queixa do empreendedor tem como pano de fundo a transferência de responsabilidades de fiscalização ambiental da União e dos Estados para os municípios. “Além do menor conhecimento e da incapacidade dos técnicos, agora ficamos mais sujeitos a divergências políticas. Se você é do partido do prefeito, é bem atendido. Se votou na oposição, eles se vingam atrasando o licenciamento ou fazendo exigências descabidas”, denuncia. fornadas de criatividade Cerâmica João de Barro O pernambucano Fernando José de França Paes, de 51 anos, descende de pelo menos três gerações de oleiros. Sua avó veio de Portugal, casou-se com um índio que também gostava de fazer potes, e ambos montaram uma cerâmica em Cabo de Santo Agostinho. Fernando era criança quando o pai levou a família para Camaçari, na Bahia, onde ficou por sete anos até descobrir uma boa jazida de barro em Medeiros Neto. Ali Fernando desenvolveu a habilidade ancestral de trabalhar e queimar o barro, e aos 18 anos já tinha sua própria fábrica. Também em Medeiros Neto conheceu sua esposa, Darlene Araújo Paes, baiana de Itanhém, e tiveram uma fornada de filhos: Rudimiller (22), Jéssica (20), e Saulo (17). >>> Seis anos do SUPERSIMPLES 97 Capítulo 5 • • • Novas tecnologias para simplificar o complexo EXEMPLOS DE SUCESSO | BAHIA Adão Rocha confirma o arranjo feito com o patrão e a melhoria de renda dos oleiros. Os jarros da Cerâmica João de Barro são colocados em 80 pontos de venda de três estados. >>> 98 Mas o barro acabou e eles tiveram que se mudar para Teixeira de Freitas, uma cidade baiana em rápido crescimento. Num bairro de periferia quase desabitado eles montaram a Cerâmica João de Barro, mas nos primeiros anos passaram muitas dificuldades. “A gente se mudou exatamente no início do Plano Real, e enfrentamos a crise brava da conversão da URV até 1996, quando o dinheiro sumiu e ninguém queria gastar”, relembra com desgosto o microempresário. Seis anos do Supersimples Jarrões e porquinhos A partir do ano 2000 o negócio engrenou, e nos últimos cinco anos, após a adesão ao Simples, só vem se expandindo. Podendo dedicar ao trabalho o tempo que perdia na burocracia pública e na escrituração fiscal da empresa, Fernando criou 30 modelos de peças de cerâmica. As mais vistosas são jarrões de 1,2 metro de altura, mas há também um sortimento de vasos de chão e de parede, e esses cofres de moedas em forma de porquinhos, feitos por várias artesãs associadas. “Hoje eu gero trabalho e renda para 20 pessoas, incluindo meus dois filhos, que são torneiros, e minha filha, que dá acabamento e pintura nas peças. No final do ano passado fizemos uma reunião com todos e se- lamos um acordo. Eles deixariam de ser empregados e se tornariam empreendedores individuais associados. Para uma peça que eu vendo por R$ 15,00, eles ganhavam R$ 3,00. Passaram a ganhar R$ 7,50, e o risco de quebra no forno continua sendo meu. Para mim foi uma tranquilidade e para eles grande vantagem, porque passaram a ganhar três vezes mais”, relata o pequeno empresário. Um dos melhores torneiros da Cerâmica João de Barro é Adão Pedro da Rocha, 36 anos, mineiro de Palmópolis. Trabalhava na roça, no plantio de eucalipto, e há 13 anos está no ramo da cerâmica. Adão confirma o acordo e informa que todos os artesãos com dedicação exclusiva estão ganhando por volta de R$ 2 mil por mês, adquiriram casa própria e até motocicletas. Fernando Paes está cheio de planos para o futuro, e o mais imediato deles é procurar orientação do Sebrae para diversas demandas. Ele precisa colocar placas na rodovia para que os clientes encontrem a cerâmica com facilidade, precisa criar um site para que os potenciais compradores possam conhecer os modelos. Precisa sobretudo de treinamento para fazer a escrita, porque se confunde com os recebimentos divididos em 30, 60 e 90 dias. Também quer comprar um caminhão para fazer entregas nos 80 pontos de venda que já conquistou, desde Ilhéus, na Bahia, até Ouro Preto, em Minas, passando por todo o Espírito Santo. Quando tiver todo o fluxo organizado, vai saltar de micro para pequeno empresário. Seis anos do SUPERSIMPLES 99 Capítulo Andrade: “A CNI teve a honra de participar ao lado do Sebrae, eterno e competente parceiro”. Requião: “Dilma deveria derrubar os juros para valer, porque no mundo todo os juros estão negativos”. 6 O Supersimples e o Fenômeno do Emprego A realidade comprova o êxito do conjunto de me- didas adotadas para incentivar os pequenos negócios. Mesmo com o mundo imerso no purgatório do subprime norteamericano, a economia brasileira continuou crescendo e gerando empregos. As grandes empre- Lindbergh: “A trajetória de regresso ao subdesenvolvimento foi invertida a partir de 2004 e 2005”. sas demitiram, mas as MPEs supriram essa lacuna, 100 Seis anos do Supersimples a 2010, Acre, Rondônia e Tocantins cresceram em torno de 7% ao ano. O secretário da Fazenda do Paraná, Luiz Carlos Hauly, um dos artífices da Lei Geral, comemora os avanços na geração de empregos, revelando que as MPEs contrataram 3,7 milhões de novos trabalhadores formais de Freitas: “É inegável que caminhamos em direção a uma situação mais favorável que a dos anos 90”. 2008 a 2012. O setor fechou 2011 com 15,6 milhões de contratados. O ex-ministro Brizola Neto, com base em uma avaliação externa encomendada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, chama atenção para o papel da oferta de microcrédito, pois os empreendimentos apoiados efetiva- sua participação percentual no número de empregos mente geraram mais postos de trabalho, tiveram aumen- formais criados no Brasil. Os autores convidados a analisar esse fenômeno são ta. Do ponto de vista da criação de empregos e resgate Brizola: “O crescimento do MEI demonstra o anseio dos pequenos empreendedores em buscar novas oportunidades”. dito e a redução dos juros. Farias sustenta que de 2003 aumentaram os postos de trabalho e incrementaram das mais variadas origens – técnica, política e sindicalis- Hauly: “O que colhemos com os incentivos do Simples Nacional? Colhemos mais empregos”. elas a valorização do salário mínimo, a ampliação do cré- Meirelles: “Nova classe média brasileira consome mais de R$ 1 trilhão em produtos e serviços ao ano”. social, seus depoimentos são francamente favoráveis. to no número de horas trabalhadas e nos dias ocupados. O presidente da CUT, Vagner Freitas, alerta para a necessidade de evitar distorções no conceito de microempreendedor individual. Defende que o MEI, ao contratar, também cumpra a legislação trabalhista, sem incorrer na Robson Andrade, presidente da CNI, relembra as lu- precarização das relações de trabalho. tas pela criação do Supersimples e pede empenho para Renato Meirelles, do Instituto Data Popular, é espe- a instituição de um Simples Trabalhista, uma antiga ban- ples. Requião elogia a atuação do ex-presidente Lula cialista em estudar a nova classe média brasileira. Sem- deira do empresariado. Considera a legislação trabalhista ao tirar 40 milhões de brasileiros da linha da miséria, e pre que o seu instituto pesquisa esse público, depara-se “ultrapassada, rígida, burocrática e de alto custo”, obri- aproveita para cobrar uma redução drástica dos juros com o desafio do empreendedorismo. O sonho de ser gando as empresas a manter verdadeiros aparatos de re- para dar competitividade à economia brasileira. dono do próprio negócio está inteiramente enraizado cursos humanos e de consultoria legal. O presidente da Comissão de Assuntos Econômicos nesse público. Quando são indagados se preferem ter O senador Roberto Requião reivindica precedência do Senado, Lindbergh Farias (PT-RJ) acrescenta ao Sim- empregos com carteira assinada ou passar em concurso nos princípios da Lei Geral, pelas medidas de incentivo ples um elenco de medidas tomadas pelos governos do público, a maioria dos integrantes da classe C responde que implantou no Paraná antes mesmo do Supersim- PT para melhorar a vida da população brasileira, entre que prefere empreender um negócio próprio. Seis anos do SUPERSIMPLES 101 Capítulo 6 • • • O Supersimples e o fenômeno do emprego ARTIGO | Robson Andrade é preciso ir além Robson Andrade Presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI) “ As micro e pequenas empresas são cruciais para o ROBSON BRAGA DE ANDRADE nasceu em São João Del Rei (MG) em 1949. Engenheiro mecânico pela UFMG, é presidente do Grupo Ortemg, conglomerado originário do fornecimento de equipamentos elétricos e eletromecânicos para os mercados de energia e mineração. Presidiu a Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg) por dois mandatos, de 2002 a 2010. 102 Seis anos do Supersimples crescimento econômico e social de qualquer país. Em nações em desenvolvimento, como a nossa, os pequenos negócios são ainda mais importantes. Recente pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) revelou que 39% da renda do trabalho no Brasil vem das MPEs. Essa participação equivale a R$ 500 bilhões por ano, um número maior do que todo o Produto Interno Bruto (PIB) do Chile. Segundo o estudo, dos 15 milhões de empregos criados no país entre 2001 e 2011, 6 milhões se originaram dos pequenos negócios. Mais importante, 95% dessas vagas são formais. A valorização das MPEs, que nos Estados Unidos remonta à década de 1950, poderia ser mais rápida no Brasil. Na prática, o movimento começou em 1988, com a promulgação da Constituição Federal, que estabeleceu tratamento favorecido e diferenciado às MPEs. De lá até a adoção do Simples Nacional, um marco cuja vigência completa agora seis anos, houve avanços. Avanços contínuos Em 1996, criou-se o Simples Federal; em 1999, houve a instituição do Estatuto Federal da MPE; em 2003, uma emenda constitucional estabeleceu a base legal para se elaborar a Lei Geral das Micro e Pequenas Empresas. Enfim aprovada três anos depois, a Lei Geral trouxe o principal instrumento de apoio aos pequenos negócios, a instituição do Simples Nacional, que passou a vigorar em julho de 2007. O Simples Nacional é um marco histórico. Ele é fruto de uma mobilização do empresariado de todo o País, da qual a Confederação Nacional da Indústria (CNI) teve a honra de participar ativamente, ao lado do Sebrae, eterno e competente parceiro. Esse regime facilitado desburocratizou e reduziu a carga tributária sobre os pequenos negócios, diminuindo a informalidade na economia e possibilitando a criação de empregos de qualidade, como comprova a pesquisa do Ipea. Ele não é um marco pronto e acabado. Ao contrário, requer mudanças. Até porque a globalização da economia, aliada à crise econômica internacional, tornou ainda mais feroz a concorrência no mundo. Nesse cenário, os pequenos negócios são a ponta mais frágil. Vale comemorar, sim, como faz esta primorosa publicação, os seis anos do início do Simples Nacional. É motivo de festa. O mundo dos pequenos negócios está muito melhor depois dele. Mas é preciso ir além. Ainda há muito o que fazer. tante. Permitiria que todas as MPEs fossem beneficiadas pelo regime tributário simplificado, independentemente do setor em que atuem. Usar exclusivamente o critério do faturamento é o caminho indicado. Poderíamos, igualmente, rever a proibição de incentivos fiscais para quem é optante do Simples. É uma contradição inexplicável dificultar o acesso de micro e pequenas empresas à inovação. A “punição” para quem cresce, tornando-se empresa média, também é um problema a ser resolvido. É necessário criar um período de carência ou um sistema de amortecimento na transição do Simples para a tributação regular. A Lei Geral foi criada para estimular o crescimento das micro e pequenas empresas. Se um dos seus objetivos é justamente permitir que elas se desenvolvam e sobrevivam fora do regime facilitado, não faz nenhum sentido uma taxação que dificulte sua expansão. Queremos que o Simples Nacional multiplique esses seis anos. O regime é benéfico aos pequenos negócios, aos cidadãos brasileiros e ao desenvolvimento do País. “ Um Simples trabalhista Faz-se necessário, por exemplo, instituir o Simples Trabalhista, uma bandeira antiga do empresariado. Se a legislação para o trabalho é ultrapassada, rígida, burocrática e de alto custo para as grandes empresas, obrigadas a manter verdadeiros aparatos de recursos humanos e de consultoria legal, imagine-se para as de pequeno porte. A eliminação das restrições ao enquadramento no Simples Nacional por atividade seria uma medida imporSeis anos do SUPERSIMPLES 103 Capítulo 6 • • • O Supersimples e o fenômeno do emprego ARTIGO | Roberto Requião Trocamos imposto por emprego Senador Roberto Requião (PMDB-PR) “ Roberto Requião de Mello e Silva nasceu em Curitiba, no ano de 1941. É advogado pela UFPR, jornalista pela PUC Paraná e cursou Urbanismo na FGV. Foi deputado estadual, prefeito de Curitiba, senador a partir de 1994 e governador por três mandatos. Retornou ao Senado em 2010. Adotamos no Paraná a opção de colocar mais di- nheiro nas áreas que geram mais empregos, que são as micro e pequenas empresas, e compensar as perdas tributárias com as tarifas de combustíveis e lubrificantes. Não foi preciso aumentar as tarifas de energia, que ficaram congeladas por sete anos. Demos o aumento autorizado pela Aneel como desconto para pagamento em dia, o que eliminou a inadimplência do setor. Com essas medidas, pudemos reduzir o imposto sobre 100 mil itens de consumo popular. A vantagem disso pode ser vista no crescimento econômico e industrial do Paraná. 104 O Paraná cresceu pela base. O slogan desse sistema era “troca de imposto por emprego”. Ao mesmo tempo que zeramos o imposto das MPEs, aumentamos o salário mínimo regional e baixamos os preços nos mercados. O aumento do consumo impulsionou as MPEs. O conjunto de medidas de apoio à micro e pequena empresa do nosso governo antecede a Lei Geral, e foi muito mais generoso do que esta prevê, porque desoneramos de verdade. As faixas para as microempresas são maiores. As confecções foram inteiramente liberadas. Nosso modelo serviu de inspiração para a Lei Complementar 123. Seis anos do Supersimples Caminhamos numa lâmina Zeramos o ICMS para a microempresa e estabelecemos uma média de 2% para as médias empresas, com um sistema de suaves degraus para não penalizar o empresário e induzi-lo à tentação de sonegar. O sucesso foi absolutamente incrível, com uma queda vertiginosa na mortalidade das pequenas empresas. O Centro Expandido, que havia décadas envergonhava a administração pelo baixo IDH, passou por uma mudança completa em apenas um ano. Quem passava, via as lojinhas economizando até a luz. Hoje estão plenamente iluminadas, com as prateleiras cheias, movimentadas. Apesar de haver motivos para comemorar, não vejo o futuro com tanto otimismo. Foi positiva a saída desses 40 milhões de brasileiros da faixa da miséria, uma magnífica realização do ex-presidente Lula, que aproveitou o benefício das commodities com a expansão da China para melhorar a vida do povo através das políticas compensatórias, mas faltou estimular o desenvolvimento industrial do Brasil. O mundo inteiro está em crise. Os países da Europa e os Estados Unidos estão tentando aumentar impostos internos para garantir a liquidez do Estado e pagar as dívidas com a banca que está mandando nos governos. Querem exportar o desemprego para os outros países. O Brasil evitou a crise porque a China continuou comprando muito e expandindo sua economia interna. Mas parece que com a recente mudança de comando, eles estão no mesmo jogo dos EUA, da Inglaterra e da Europa. Se apostarem na exportação, nós vamos entrar na crise. O plano deles é manter o Brasil como produtor de matéria prima, economia primarizada, para que exportem o desemprego deles para nós, e comprem aqui no Brasil e no mundo produtos primários baratos. Em 1980, nós produzíamos industrialmente mais do que a Tailândia, a Coreia, a China e a Malásia. Hoje não chegamos a 15% do que eles produzem. A economia agrícola não gera empregos, e nenhum país será soberano com ela. Estamos num regime ainda de quase pleno emprego, principalmente no setor de Serviços, mas caminhamos em cima de uma lâmina. Todos os países estão jogando para que o Brasil não se constitua num bloco. O tratado do Pacífico incorpora o México e os países litorâneos, para negar o acesso do Brasil ao oceano Pacífico, salvaguardando seus mercados. Barack Obama quer desesperadamente recuperar os empregos que perdeu para a Ásia. Para isso baixou o dólar, aumentou a exportação e recriou empregos. Entramos num conflito de interesses muito sério. Dilma deveria jogar com mais força, derrubar os juros para valer, porque no mundo todo os juros estão negativos. Estamos adotando as medidas certas, mas tímidas e atrasadas. Se houver uma débâcle da Zona do Euro, aqueles países vão atacar o Brasil monetariamente, e nossas reservas não serão suficientes. O momento não é fácil, mas toda a crise oferece oportunidades. Os chineses usam o mesmo ideograma para expressar crise e oportunidade. Toda crise oferece espaço para a mudança. A crise é a parteira da História. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 105 Capítulo 6 • • • O Supersimples e o fenômeno do emprego ARTIGO | Lindbergh Farias desenvolvimento força das MPEs o brasileiro e a Senador Lindbergh Farias (PT-RJ) Presidente da Comissão de Assuntos Econômicos do Senado “ Luiz Lindbergh Farias Filho, 43 anos, nasceu em 1969, em João Pessoa (PB). Ex-presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), foi eleito deputado federal por dois mandatos, entre 1995 e 2003. Liderou os estudantes “caras-pintadas” que exigiam a renúncia de Fernando Collor. Pertenceu ao PCdoB e ao PSTU, antes de ingressar no PT. Em 2004, elegeu-se para a Prefeitura de Nova Iguaçu (RJ), sendo reeleito com 65% dos votos. A economia brasileira estava semiestagnada. Sua taxa de desemprego era elevada, a massa salarial se reduzia e não havia diminuição das desigualdades regionais. Essa trajetória de regresso ao subdesenvolvimento foi invertida a partir de 2004-5. Um novo ambiente geral para os negócios ocupou o lugar do desânimo, da desesperança. Políticas econômicas pontuais, reformas institucionais e ações macroeconô106 Seis anos do Supersimples micas foram as responsáveis pela constituição desse novo e favorável ambiente para os negócios. A valorização do salário mínimo, a Lei Geral das Micro e Pequenas Empresas, o Simples Nacional, a ampliação do crédito e a redução dos juros são exemplos de mudanças que explicam o crescimento dos negócios e dos investimentos no Brasil. O Brasil crescia a um taxa em torno 2%. A partir de 2004, excetuando os anos de crises ou turbulências internacionais (2009 e 2011-2), o país cresceu a uma taxa média superior a 4,5%. E nos anos em que a economia cresceu, o investimento cresceu num ritmo maior que o dobro do ritmo de crescimento de toda a economia. O desemprego, que estava na casa dos dois dígitos, hoje está entre 5 e 6%. Em 2013, o desemprego se mantém baixo e os rendimentos do trabalho aumentam de forma contínua. Alguns tiveram crescimento “chinês” As desigualdades regionais vão sendo reduzidas. As regiões Norte e Nordeste mudaram para melhor numa velocidade muito superior à de outras regiões. No período que vai de 2003 a 2010, o Nordeste cresceu 5%, em média anual, e o Norte, 5,6%. No mesmo período, a região Sudeste cresceu 4,5% ao ano. Estados como Rondônia, Acre e Tocantins tiveram crescimento quase chinês durante o período 2003-2010, com média em torno de 7% ao ano. Provavelmente, as desigualdades regionais continuaram a se reduzir depois de 2010. Contudo, os dados referentes aos PIBs estaduais e regionais ainda não estão disponíveis. Mais da metade do esforço e dos bons resultados obtidos pela economia brasileira resultam do empreendedorismo de milhões de brasileiros. Mais da metade de todo o emprego formal gerado na indústria, comércio, serviços e construção civil se deve ao empreendedorismo. Excluindo a agricultura e o serviço público, o Brasil tem 30,2 milhões de trabalhadores formais. Desse total, 15,6 milhões trabalham nas micros e pequenas empresas, segundo a Rais de 2011, que é a fonte de todos os demais dados mencionados a seguir. Na crise de 2009, a reação do Governo Federal evitou um mal maior. Diferentemente de muitos países, no Brasil houve crescimento do número de postos formais de trabalho. Podia-se esperar que os mais afetados fossem os pequenos negócios, já que o tamanho da empresa é importante em momentos de grandes dificuldades. Surpreendentemente, as MPEs criaram mais empregos formais que as médias e grandes no ano de 2009. Enquanto as médias e grandes criaram 533 mil novos postos, as MPEs geraram 593 mil. Este é o caso onde a vontade empreendedora supera as vantagens de escala. Emprego formal cresceu mais no Nordeste As MPEs também têm tido papel muito importante na redução das desigualdades regionais. O crescimento mais veloz do Nordeste em relação ao Sudes- te tem, como esperado, uma importante contribuição das micros e pequenas empresas. Entre 2005 e 2011, enquanto o emprego formal nas MPEs teve um crescimento no Sudeste de 18,7%, no Nordeste tal crescimento foi de 33%. As MPEs têm uma grande participação no setor do comércio. Em 2011, do total de empregos formais nesse setor, 72% estavam nas micro e pequenas empresas. As MPEs foram beneficiadas e, ao mesmo tempo, contribuíram com a maior transformação econômica estrutural da economia brasileira dos últimos dez anos: a criação de um grande mercado de consumo de massas. Em 2002, as MPEs empregavam no setor do comércio 3,8 milhões de pessoas; em 2011, esse número saltou para 6,4 milhões – um crescimento de 68,4%. Nesse mesmo período, o volume de vendas do comércio varejista cresceu 87%. Um crescimento que não seria possível sem a participação decisiva do empreendedorismo. No movimento nacional de redução das desigualdades de renda, a força do emprego gerado nas MPEs também tem mostrado a sua relevância. Enquanto o rendimento médio real do trabalhador cresceu 35,4%, entre 2005 e 2011, o rendimento dos trabalhadores nas MPEs cresceu 63,9% nesse mesmo período. Os números relativos às MPEs são reveladores da força do empreendedorismo no Brasil. Certamente, as características do povo brasileiro contribuem para o sucesso do nosso empreendedorismo. Somos um povo que “sua a camisa”, não desiste, inova e é criativo. Além disso, a legislação relativa às MPEs foi aperfeiçoada. Como resultado, as nossas micros e pequenas empresas são competitivas, geradoras de emprego e redutoras de desigualdades sociais e regionais. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 107 Capítulo 6 • • • O Supersimples e o fenômeno do emprego ARTIGO | Luiz Carlos Hauly O Simples Arrecadação de Tributos todos ganham e a Luiz Carlos Hauly Secretário da Fazenda do Paraná estabelecimentos privados não-agrícolas entre 2000 e 2011. Mais ainda, este setor que, em 2000, empregava 8,6 milhões de pessoas, fechou 2011 com 15,6 milhões de contratados. Esse resultado, lógico, acompanhou a abertura de empresas num ritmo de 4,5% ao ano, o que representou o surgimento de mais 2,1 milhão de novas unidades, fechando 2011 com 6,3 milhões de micro e pequenas empresas no país. E esse ritmo tem se mantido consistente. É preciso atentar que o Simples Nacional, instituído a partir de 2006, nos momentos mais difíceis da economia nacional em decorrência de severas crises internacionais, garantiu a manutenção dessas empresas e, principalmente, dos empregos. Crescimento de 148% das MPEs “ Luiz Carlos Hauly nasceu em 1950 em Cambé, no norte paranaense, onde foi vereador e prefeito. Sua primeira gestão como secretário da Fazenda do Paraná foi entre 1987 e 1990. Eleito deputado federal por seis mandatos sucessivos desde 1991, foi relator e protagonista da aprovação da Lei Complementar 123, o Estatuto Nacional das Micro Empresas e Empresas de Pequeno Porte. Nos seis anos da Lei Geral da Micro e Pequena Em- presa (LC 123/2006), que inclui o microempreendor individual, tivemos o maior movimento de fomalizações da História do Brasil, com a regularização da atividade de milhões de trabalhadores, ao mesmo tempo em que milhões de negócios obtiveram acentuados e consistentes benefícios fiscais. E, em alguns estados, esses incentivos foram até maiores que o previsto pela legislação. É o caso do Paraná. 108 Seis anos do Supersimples E o que colhemos com isso? Colhemos mais empregos. Basta ver que, entre 2005 e 2011, o setor contratou 4,6 milhões de trabalhadores com carteira assinada no país, o que representou crescimento médio anual de 6,9% nesse período. E abrindo um pouco mais este leque, segundo dados do Anuário do Trabalho na Micro e Pequena Empresa 2010/2011, elaborado pelo Dieese e Sebrae, as micro e pequenas responderam por sete milhões dos 7,3 milhões de vagas formais abertas pelos Tivemos uma redução expressiva da taxa de mortalidade das empresas, que era de 50% antes da edição da Lei Geral, para uma taxa de sucesso de 70% no Paraná nos últimos cinco anos. E a consolidação dos micro e pequenos empreendimentos era um dos objetivos desta lei, que contemplava também o crescimento e a prosperidade das empresas. Portanto, os objetivos propostos estão sendo alcançados. Ainda no Paraná, temos a destacar que das 290.215 empresas ativas, 240.025 são micro e pequenas. Isso representa um salto de 56,45% na comparação com os 153.411 empreendimentos desse porte que existiam em 2007 no Estado. E é mais surpreendente se somarmos a este universo a formalização de 155.480 microempreendedores individuais (MEIs), entre 2009 e abril de 2013, resultando em 488 mil empreendimentos, o que significa crescimento de 218% se tomarmos como base o número de MPEs de seis anos atrás. O Sebrae, o Sistema S, as entidades confederativas e federativas têm dado muito incentivo às micro e pequenas empresas. O governo federal, por meio do Banco do Brasil, Caixa Econômica e o BNDES, o governo do Paraná, por intermédio da Agência de Fomento e de diversas secretarias de estado, igualmente tem proporcionado incentivos a estes empreendimentos. Bem no Brasil, melhor no Paraná Acredito que estamos contribuindo decisivamente para a construção de uma classe média forte, consistente e duradoura, uma necessidade premente no Brasil. E a Lei Geral, por tudo o que estabelece, desde a capacitação, garantia de crédito, incentivo fiscal, facilidade na abertura e fechamento das micro e pequenas empresas, tem possibilitado um grande ganho para todos. Por isso, podemos garantir que a microempresa vai bem no Brasil e está ainda melhor no Paraná, porque tem colaborado com o crescimento e desenvolvimento do nosso Estado. E com uma particularidade relevante: o aumento do salário dos trabalhadores. Isso é resultado de um círculo virtuoso que conseguimos impor nestes dois últimos anos, por meio do Paraná Competitivo e outros programas, em benefício de toda a cadeia produtiva, com incentivos às micro, médias e grandes empresas. Lembro ainda que a Lei Geral contém a Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios (Redesim), que, agora, por força de lei especial, está sendo implantada no Brasil, incluindo a adesão do Paraná. Isso trará a integração dos cadastros de pessoas físicas e jurídicas através da Junta Comercial do Paraná e das juntas comerciais do Brasil, garantindo o patrimônio das empresas e seus negócios, além de representar garantia aos Fiscos. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 109 Capítulo 6 ARTIGO | Brizola Neto Medidas para Brizola Neto Ex-ministro do Trabalho e Emprego “ fomentar novos empregos A iniciativa do Governo Federal em investir num modelo de inclusão e distribuição de renda a partir de medidas econômicas e sociais no campo da desburocratização fiscal, tributária e de apoio creditício, pode ser observada a partir dos bons resultados dos programas destinados aos pequenos empreendedores. A política de criação de oportunidades e melhoria na renda focada em ações continuadas de incremento e criação de boas oportunidades para os pequenos empresários – que são responsáveis pela maioria dos empregos gerados na economia brasileira – vem proporcionando aumento dos percentuais de formalização e criação de pequenos negócios. Estas medidas têm fortalecido o crescimento econômico e incentivado o empreendedorismo. Empregos e acesso ao microcrédito Nascido em Porto Alegre (RS) em 1978, mas vivendo desde 1982 no Rio de Janeiro, Carlos Daudt Brizola foi secretário particular do avô Leonel Brizola, presidente da Juventude Socialista do PDT, vereador no Rio de Janeiro e deputado federal por dois mandatos. 110 Seis anos do Supersimples • • • O Supersimples e o fenômeno do emprego Além desses benefícios, o Governo procura disponibilizar crédito com taxas de juros diferenciadas para o segmento, a exemplo do Programa de Geração de Emprego e Renda do Fundo de Amparo ao Trabalhador, o Proger. Avaliação Externa realizada pelo Ministério do Trabalho e Emprego no Programa demonstra que tal apoio produz relevantes resultados, pois os empreendimentos apoiados efetivamente geraram mais postos de trabalho, tiveram aumento no número de horas trabalhadas e nos dias ocupados. Destaca-se ainda que, para um expressivo número de beneficiários, os recursos recebidos do Proger foram sua primeira experiência de crédito, indicando que o Programa tem contribuído favoravelmente para a democratização do acesso ao crédito para os micro e pequenos empreendedores brasileiros, para o aumento do faturamento real das empresas financiadas e para a redução da informalidade e do trabalho precário. Seguindo esse objetivo, no ano de 2005, o Governo criou o Programa Nacional de Microcrédito Produtivo Orientado (PNMPO), vinculado ao Ministério do Trabalho e Emprego, segundo um modelo em que uma ampla e diversificada rede de instituições operadoras possa diretamente aproximar-se do público-alvo – o microempreendedor individual formal ou informal. Ações indutoras ao crédito no âmbito do programa foram adotadas a partir da concessão de subvenção econômica pelo Programa Crescer, que reduziu consideravelmente as taxas de juros para o segmento, fortalecendo assim a concessão de microcrédito pelas instituições bancárias, incentivando o talento nato que o povo brasileiro tem para empreender. O crescimento do Microempreendedor Individual com condições especiais para que o trabalhador informal se legalize como pequeno empresário, com acesso a diversos benefícios sociais como a cobertura previdenciária, contratação de funcionários a custos reduzidos, processo de formalização gratuito, e acesso a serviços bancários, inclusive crédito, principalmente pelos ban- cos oficiais federais com taxas de juros mais acessíveis, demonstra o anseio dos pequenos empreendedores em buscar novas oportunidades. Nota-se no gráfico o aumento considerável nos índices de formalização dos trabalhadores, tendo por base os que contribuem para a Previdência Social, os estatutários e militares, demonstrando a importância das medidas de incentivo adotadas pelo governo. De forma a melhorar a empregabilidade do trabalhador, merecem destaque ainda os investimentos nas políticas de qualificação profissional a cargo do Ministério do Trabalho e Emprego, que tem concentrado sua atuação no aperfeiçoamento dos programas de formação profissional. Um dos primeiros passos foi a aprovação, pelo Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador – Codefat, do aumento do valor da hora-aula, que passou de R$ 4,50 para R$ 10, podendo, em determinados casos, atingir R$ 20. Com a elevação dos valores da hora-aula, o Ministério espera que entidades de reconhecida capacidade na formação profissional participem nas próximas licitações, como é o caso das escolas técnicas federais, estaduais e o Sistema S. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 111 Capítulo 6 • • • O Supersimples e o fenômeno do emprego ARTIGO | Vagner Freitas Justiça social distribuição de renda e Vagner Freitas Presidente Nacional da CUT interfaces que ocorrem no mercado de trabalho brasileiro é o intenso trânsito dos trabalhadores entre o emprego assalariado e o trabalho (quase sempre informal) como autônomo, a depender das condições, favoráveis ou não em relação à obtenção da renda, de cada situação. Para o movimento sindical, a busca pelo aumento da formalização do emprego é objetivo permanente. Por outro lado, há de se reconhecer o contingente cada vez maior de trabalhadores que passaram a ser microempreendedores, donos de pequenos negócios que, da mesma forma que empregados assalariados (e sem semelhança alguma com os donos de grandes negócios), encontram grandes dificuldades em sobreviver com seus empreendimentos e, informais em sua grande maioria, sem qualquer perspectiva de cobertura social, em especial a previdenciária. CUT lutou pela aprovação do MEI Vagner Freitas de Moraes nasceu em 1966, em São Paulo. Foi entregador do Café do Ponto e carregador de frutas na Ceagesp, sempre estudando no período noturno. Entrou na faculdade e cursou História durante dois anos. Passou em uma seleção do Bradesco e começou a trabalhar como caixa em 1987. Iniciou-se na carreira sindical em 1991, nas organizações de bancários. Foi secretário de Administração e Finanças da CUT na gestão 2009-2012 e assumiu a Presidência Nacional no período vigente. 112 Seis anos do Supersimples “ Talvez um dos principais desafios para os gover- nos, empresários e o movimento sindical seja o combate à informalidade. No caso do Brasil, ainda que em queda, o contingente total de ocupados sem qualquer formalização é considerável e inclui trabalhadores sem registro e os donos de pequenos negócios e/ou estabelecimentos informais. Uma das principais A criação da figura do Microempreendedor Individual em 2008, no âmbito da Lei Geral, foi fundamental para dar maior amparo a este tipo de trabalhador, já que reconhece que possui uma natureza completamente diversa do empresário “típico”, e lhe concede possibilidade de formalizar seu negócio junto ao governo. Há que se salientar a luta da Central Única dos Trabalhadores para a aprovação desta política, tendo como foco principalmente a busca por fazê-la beneficiar realmente quem precisava dela (os microempreendedores) e não somente se transformar em uma lei que favorecesse empresários que buscam subterfúgios para reduzir seus pagamentos de impostos. Os avanços no aumento da formalização dos MEIs são evidentes: segundo pesquisa do Sebrae, somente entre julho de 2008 (quando teve início) e abril de 2013, mais de 2,9 milhões de microempreendedores se formalizaram. Dentre os benefícios mais evidentes da formalização, foram citados pelos MEIs (agora formalizados) o aumento do faturamento (sendo que para a maioria dos microempreendedores o seu negócio é sua fonte única de renda) e do acesso ao crédito (em especial através de microcrédito), o que melhora substancialmente as possibilidades de sobrevivência de sua fonte de sustento. Precarização das relações de trabalho É necessário que se avance na abrangência da assessoria técnica a estes microempreendedores (em especial do Sebrae, fundamental para gestão e consolidação destes negócios) e também que as instituições financeiras (públicas e privadas) possibilitem o acesso ao crédito a estes trabalhadores em condições, prazos e principalmente em quantidade suficiente. Ambas as medidas são essenciais para a perenização de seus negócios. Fundamental atenção também deve ser dada a evitar uma “distorção” do conceito de microempreendedor individual. E que este microempreendedor, ao contratar, também cumpra a legislação trabalhista, não podendo a implementação da lei que os favorece se constituir em mais uma fonte de relações de trabalho precárias. A formalização destes microempreendedores individuais, mais do que gerar benefícios tanto a quem se formaliza quanto ao governo, também gera benefícios à sociedade como um todo. E desta forma, favorece ainda mais a consolidação do país que todos desejamos: mais justo socialmente, com melhor distribuição de renda e com oportunidades a todos, sem qualquer tipo de distinção. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 113 Capítulo 6 • • • O Supersimples e o fenômeno do emprego ARTIGO | Renato Meirelles Celeiro de empreendedores Renato Meirelles Diretor do Instituto Data Popular “ Renato Meirelles, 35 anos, nasceu em São Paulo, capital. É sócio diretor do Data Popular, instituto que completou dez anos de atuação em pesquisa e consultoria voltadas para as classes C, D e E. Formado em Publicidade e Propaganda, tem MBA em gestão de negócios. É colunista de diversas revistas. No Data Popular, conduziu mais de 200 estudos sobre o comportamento do consumidor de baixa renda no Brasil. Fazendo uso de uma expressão popular, diria que já é “chover no molhado” afirmar que a Nova Classe Média Brasileira deixou de ser nicho de mercado para se tornar o verdadeiro mercado de consumo no país. Hoje, ela consome mais de R$ 1 trilhão em produtos e serviços ao ano. 114 Seis anos do Supersimples Na última década, boa parte das grandes corporações identificou a relevância do público emergente para o sucesso dos negócios. Os executivos de importantes empresas brasileiras e multinacionais passaram a estudar o comportamento e os hábitos de consumo das pessoas integrantes da chamada classe C, constatando tanto na teoria como na prática o que pensam, o que querem e como podem ou como preferem pagar por produtos e serviços. Foi a partir desse processo que começaram a surgir no mercado artigos de consumo mais adequados às necessidades desses novos consumidores. O sistema financeiro nacional também vitaminou a economia com linhas de crédito e financiamento acessíveis à Nova Classe Média. Portanto, o sucesso nos negócios não acontece sem passar pela realidade desse importante contingente de pessoas, calculado em mais de 100 milhões de brasileiros. Para as empresas, não há como traçar planos de expansão sem antes atenderem bem esse público. Maioria prefere empreender O que pouco se tem comentado ainda é sobre a proliferação de pequenas e médias empresas Brasil afora, comandadas por empreendedores oriundos dessa parcela da sociedade. Toda vez que vamos estudar esse público, nos deparamos com o desafio do empreendedorismo. O sonho de ser dono do próprio negócio está inteiramente enraizado na Nova Classe Média. Em pesquisas recentes, quando perguntamos para os integrantes da classe C, o que eles prefeririam na vida: ser donos do próprio negócio, ter empregos com carteira assinada ou passarem em concursos públicos, mais da metade responde querer ser empreendedora. Esse número é fantástico, pois evidencia que a importância da Nova Classe Média vai além do aspecto consumidor. Ela também é a grande fornecedora de empreendedores para o Brasil. Estou falando daquele dono de mercearia que vem acompanhando o crescimento do comércio no bairro onde mora e hoje já pensa em abrir uma nova unidade em bairro vizinho. Ou daquele empresário que levantou uma sala na frente da sua casa e montou uma distribuidora de água e bebidas para toda a favela. Também do casal de cabeleireiros que, cansados de trabalhar nos salões dos bairros chiques da cidade, alugaram um imóvel em área típica do público emergente para iniciar o próprio negócio. Ou ainda, da universitária que para se manter financeiramente durante o seu curso começou a vender, nos horários livres, pacotes de turismo para colegas, familiares e conhecidos de agência de turismo que disponibilizou o sistema de franquia para empreendedores individuais. Os exemplos são inúmeros. Além disso, entre as pessoas de classe C empreendedoras há uma quantidade imensa de mulheres. Elas querem, ao se dedicarem à administração de um negócio, ser reconhecidas como vencedoras, da mesma forma que já o são entre os familiares e amigos, na chefia dos seus lares. Agora, começam a se firmar como as verdadeiras “poderosas da Nova Classe Média”. Se por um lado esses empreendedores conhecem especificidades do mercado, já que nasceram e cresceram no convívio de seus potenciais consumidores, por outro são indivíduos carentes em informação e em técnicas de gerenciamento. É nesse contexto que o Sebrae se posiciona como relevante aos empreendedores da Nova Classe Média. O Sebrae ajuda as pessoas a serem donas do próprio nariz, serem donas do próprio negócio. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 115 Capítulo 6 • • • O Supersimples e o fenômeno do emprego exemplos de sucesso | paraná Exemplos de sucesso As MPEs do Paraná tiveram extraordinário impulso nos últimos anos. Confecções, serralherias, estofadores e vários exemplos da área de Serviços ilustram as medidas revitalizadoras adotadas nesse Estado. da Prefeitura, num total de R$ 30 mil. “Quem disse que eu o mei que já é microempresa André Hoffmann, o serralheiro de Toledo André Thiago Hoffmann Dillig, 23 anos, viu chegar o segundo semestre de 2012 com um problema inesperado para resolver. Apenas cinco meses após se formalizar como microempreendedor individual (MEI), ele percebeu que o faturamento de sua serralheria iria ultrapassar o limite permitido aos MEIs – R$ 60 mil por ano. “Não vou recusar os serviços que aparecem e também faço questão de trabalhar rigorosamente de acordo com a lei, por isso vou mudar o enquadramento para microempresa”, decidiu. O crescimento do negócio foi muito mais rápido do que esperava. Além de vencer, em meados daquele mês, uma licitação no valor de R$ 3,2 mil aberta pela Prefeitura de Toledo-PR, para a produção de corrimões de uma passarela sobre a BR-277, no Oeste do Paraná, André participou de uma licitação por tomada de preços para fabricar guarda-corpos em uma unidade de conservação, obra orçada em R$ 53 mil. Antes disso, vencera quatro outras licitações 116 Seis anos do Supersimples quero continuar MEI?”, provoca. Neto de alemães, nascido na zona rural de Toledo, André passou a infância e parte da adolescência ao lado dos pais agricultores e de vários irmãos, trabalhando na lavoura e sonhando com um futuro melhor. Aos 18 anos, decidiu mudar-se para a sede do município. O ano de 2009 foi encontrá-lo trabalhando como empregado, exatamente no mesmo galpão onde, hoje, investe em sua própria empresa. Ali, após um ano dominando perfeitamente o ofício de serralheiro, ainda se sentia insatisfeito. Foi quando o diretor de uma empresa concorrente o contratou com uma proposta de melhor salário. Aprendeu mais ainda e voltou ao antigo emprego oito meses depois, já como sócio de seu ex-patrão. Rapidamente a situação voltou a mudar. O ex-patrão lhe ofereceu sua parte no negócio e André aceitou. “Eu já trabalhava sozinho e repartia o lucro com ele. Vi ali a oportunidade de melhorar de vida. Topei e logo estava me dividindo entre a busca de clientes e o trabalho na serralheria”, recorda o rapaz. André Dillig deixara de ser empregado para tornar-se dono de seu próprio negócio. Mas trabalhava na informalidade e por essa razão não podia participar de licitações. Seu mercado era restrito, como suas oportunidades de crescer. Frequentando um curso no Sebrae, soube da possibilidade de tornar-se um MEI e tirar o CNPJ. “Não pensei duas vezes. Poderia ter faturamento mensal de R$ 5 mil, e anual de R$ 60 mil, emitir nota fiscal e ainda contratar um empregado!”. Hoje, André Dillig consolida sua independência produzindo portões, grades, containers, serralheria em geral, preparando a documentação para a próxima licitação, sem medo de crescer. Seus sonhos não têm limites, seus horizontes são abertos como os do oeste do Paraná. Seis anos do SUPERSIMPLES 117 Capítulo 6 • • • O Supersimples e o fenômeno do emprego exemplos de sucesso | paraná Café Kassai O orgulho de quem vende qualidade Filho de japoneses que vieram para o Brasil trabalhar na agricultura, Jorge Liniti Kassai começou sua própria plantação de café em 2003 em São José dos Pinhais, a sete quilômetros de Curitiba, Paraná. Em cada muda e com a disciplina e determinação dos orientais, Kassai tinha como ideal a quebra de um paradigma: que os melhores cafés não eram para ser consumidos no país, mas sim, exportados. Partindo desse ideal e com o foco na qualidade, surge em 2004 a Kassai Café, microempresa familiar que produz café gourmet, cafés de alta qualidade, para abastecer cafeterias em todo o Brasil e exportar para Alemanha, França e Japão. A empresa começou com cinco funcionários e hoje conta com cerca de vinte, além da parceria com os pequenos produtores. E não cuida apenas do café, desde a germinação da semente até os blends mais apreciados. Fornece também máquinas para as cafeterias, domiciliares, em empresas, em paradas de ônibus, em escolas. Enfim, qualquer lugar onde se queira aproveitar o melhor de um café gourmet. Com cafeterias em alguns pontos de Curitiba, a empresa presta assistência a outros empreendimentos e oferece o curso de barista, que é para a formação do profissional especializado em cafés de alta qualidade. Qualidade em primeiro lugar Da plantação do café à xícara, a empresa comandada por Jorge Liniti Kassai faz um exercício permanente de busca da excelência em todo o processo. Aliás, segundo o proprietário, todo o trabalho é feito no “pico da qualidade”, ou seja, a exigência para que tudo saia perfeito sempre é sua marca. “Pode haver produtos do mesmo nível, mas a gente não admite que haja produto melhor. Eu falo isso porque uma pessoa pode atingir o pico de qualidade como nós estamos fazendo, mas melhor não. Não estamos preocupados em ganhar dinheiro só. O resultado financeiro também faz parte do nosso planejamento, mas não é o essencial. O lucro vem como consequência do trabalho que estamos fazendo”, destaca o nissei. 118 Seis anos do Supersimples O emblema de qualidade do Café Kassai atrai visitantes de diversos países para aprender as melhores técnicas. “A gente é defensor do café do Brasil. Particularmente, o café do Paraná. A gente defende pela qualidade, por isso não temos receio”, destaca o proprietário. A empresa não possui contratos formais com clientes. Kassai explica que isso se deve ao fato de que o cliente “não deve estar vinculado com a gente por causa de contrato, mas sim, pelo que nosso produto agrega para ele”. A vantagem do acesso aos mercados Quando se fala em crescimento, Jorge Liniti Kassai reconhece as vantagens que são oferecidas para as MPEs. “Sem dúvida, hoje o microempresário está mais instrumentalizado para competir com qualquer tipo de empresa. As facilidades são boas porque temos acesso a mercados que antes não teríamos”, afirma Kassai. Rinaldo Hayashi, gerente operacional da empresa, associa o sucesso às mudanças introduzidas pela Lei Geral. “O fato de sermos microempresa nos permite comprar com muito mais força de outras microempresas. Isso é uma cadeia de benefícios. A gente dá preferência também para as outras microempresas”, diz Hayashi. Os benefícios em licitações e nos tributos também são destacados pelo gerente. “O fato de ser uma microempresa faz com que a carga tributária da folha de pagamento caia muito, o ônus vai de 27,5 % sobre a folha para o percentual próximo a 1% sobre o faturamento bruto”, informa Hayashi. Para manter contínua a linha do crescimento, a Kassai busca a profissionalização do pessoal e consultorias. Recentemente, os administradores procuraram o Sebrae para avaliar a oportunidade da abertura de franquias. Seis anos do SUPERSIMPLES 119 Capítulo 6 • • • O Supersimples e o fenômeno do emprego exemplos de sucesso | paraná Cascavel As encomendas de sofás a Kopichiinski A empresa de estofamentos de Marcos André Kopichiinski funciona em um galpão cedido pela Prefeitura dentro do projeto Casulo, no município de Cascavel, Oeste do Paraná. O cascavelense de 37 anos, em apenas dois anos, subiu de empregado a empreendedor individual e migrou para microempresário. Sua trajetória foi semelhante a de inúmeros empreendedores natos sem capital para investir, mas dotados de grande determinação. Iniciou trabalhando como empregado, aprendeu tudo o que havia para aprender na confecção e revitalização de estofados e, um dia, decidiu que já era tempo de cuidar de seu próprio negócio. No começo, a oficina de trabalho foi a garagem de sua própria casa. Mais adiante, construiu um barracão nos fundos e continuou crescendo. Foram oito meses atendendo a vizinhos e conhecidos que, por sua vez, o indicavam a outras pessoas. Então ouviu falar do projeto do Governo Federal, da Lei Geral, do Supersimples, do MEI. Foi a força de que precisava para progredir. 120 Seis anos do Supersimples Em Cascavel, além de basear-se na Lei Complementar, a Prefeitura, em parceria com entidades como a Associação Comercial e Industrial e o Sebrae, deu valioso suporte aos interessados, oferecendo cursos de capacitação, assessoramento contábil e palestras. Com isso, o município conseguiu formalizar 3.480 microempreendedores individuais que continuam no mercado até hoje. Marcos André foi o MEI de número 34. Encomendas até dezembro No início de 2012, a Topqualitti tornou-se micro. “Crescemos e passamos a necessitar de mais um funcionário. Como MEI, só teria direito a contratar um, hoje tenho dois e, além disso, tive o meu limite de faturamento ampliado”, explica. Fazendo uma análise descompromissada da Lei Geral, o rapaz reconhece que a proposta é muito boa, mas, para funcionar, necessita de suporte. “Sem um assessoramento técnico, sem profissionais competentes para orientar o trabalhador que pensa em beneficiar-se da Lei Geral, de nada adiantaria que ela fosse criada”, avalia. Com uma carteira de encomendas de dez a doze estofados novos, fora as restaurações, a Topqualitti necessita trabalhar com pré-agendamentos. No início do segundo semestre de 2012, por exemplo, já era impossível aceitar qualquer tipo de serviço de restauração. Para estofados novos, havia entrega programada até dezembro em Curitiba, e em várias outras cidades do Paraná e de Santa Catarina. Animado com o andamento dos negócios, o estofador, que estudou apenas o Ensino Médio, já planeja voo mais alto. Seu próximo projeto é cursar uma faculdade de Arquitetura. Há mais de 20 anos no ramo, gosta de decoração, de design de interiores e sonha realizar projetos de sua autoria. A empresa de Marcos André Kopichiinski mantém uma página na internet onde o cliente pode conhecer os modelos oferecidos e os tipos de revestimento usados em seus móveis. pipoca do valdir Pipocas e ideias estouram em Curitiba Trajando jaleco, calças, sapatos e touca de um branco impecável, Valdir Novak, 41, recebe clientes e amigos em torno do seu carrinho de pipocas estacionado na Praça Tiradentes, no Centro Histórico de Curitiba. Nascido em São Mateus do Sul, casado, pai de um único filho, Valdir é dos mais extraordinários exemplos de sucesso como empreendedor individual. Vende pipocas. E ideias. Com a média diária de 200 saquinhos de pipoca vendidos a R$ 3,00 cada, Valdir paga a faculdade do filho e garante o conforto da família. Filho de lavradores, vindo de uma família de 12 irmãos, Valdir mal completou a 4ª série do Ensino Fundamental. Trabalhando de boia-fria durante a adolescên- Seis anos do SUPERSIMPLES 121 Capítulo 4 • • • O Supersimples e o fenômeno do emprego exemplos de sucesso | paraná cia, sonhava ir para a capital, já que São Mateus do Sul, a 140 quilômetros de Curitiba, era muito pequena e não oferecia nenhuma opção a não ser trabalhar na roça. Em 1988, aos 18 anos, desembarcou em Curitiba e foi trabalhar como lavador de carros e manobrista em um estacionamento. Em 1992 solicitou um ponto à Prefeitura para vender pipoca e teve que esperar 14 anos. Em 2006, afinal, saiu a licença. “Hoje, sete anos depois, a Pipoca do Valdir é conhecida no Brasil inteiro”, comemora. Alvo de várias entrevistas nos mais variados meios de comunicação, festeja o fato de o produto Pipoca do Valdir ser sucesso comercial, exemplo de modelo de gestão. “Oferecemos três tipos de pipoca. Além da tradicional, a de chocolate com coco em pedaços; a salgada com bacon e a pipoca de canjica quase sem gordura, feita no tacho, que é o nosso carro-chefe”, conta com o sotaque forte dos paranaenses, carregando nos erres. Até no Marrocos querem franquia Embora a Praça Tiradentes tenha pelo menos mais três pipoqueiros, um em cada esquina, é no carrinho do Valdir que se registra movimento intenso e constante. Novos e antigos clientes se revezam em um ritual que inclui a compra de pipoca e um dedinho de prosa. Empreendedor individual, ele já alinhava um projeto de expansão. “Até de Marrocos nos chegam pedidos de franquia!”, comemora. Valdir lança mão de uma série de estratégias de marketing comprovadamente eficazes, no seu caso. Oferece álcool em gel para a higienização das mãos; um kit higiene composto de guardanapo, fio dental personalizado e uma bala de menta. Também criou o cartão fidelidade, que a cada cinco pacotes de pipoca dá ao freguês o direito de levar um sexto, e ainda o cartão da promoção batizada “Oba, a dúzia de dez!”, em que o freguês paga dez e leva doze pacotes. Além disso, investe no figurino. “Somos os únicos pipoqueiros que trabalham uniformizados: calça, jalecos, sapatos, tudo branco”, diz ele. 122 Seis anos do Supersimples dez clientes A supersecretária remota Deisiane Kuckia Antes de começar a atuar como secretária remota e assistente administrativa virtual, a empreendedora individual Deisiane Zortéa Kuckia, 34 anos, graduada em Administração de Empresas, com pós-graduação em Pedagogia Empresarial, trabalhou como secretária e assistente administrativa em uma empresa de Curitiba. Casada, com uma filha pequena, após 12 anos de serviços prestados em uma mesma empresa, tomou a decisão de demitir-se para dedicar mais tempo à família e buscar uma atividade que lhe trouxesse autonomia. No segundo semestre de 2010, passou a prestar serviços a profissionais liberais de micro e pequenas empresas, sem vínculo empregatício. Antes de formalizar-se, ele tinha dificuldade em comprar insumos diretamente dos fornecedores. Milho, bacon, óleo, manteiga, achocolatado, produtos indispensáveis ao seu negócio, eram comprados no varejo, já que não possuía recursos para fazer estoque. Hoje, na condição de MEI, com CNPJ, pode efetuar suas compras com desconto pelo atacado e prazo para pagar. “As portas se abriram. Se eu precisar de um empréstimo para reinvestir, melhorar meu próprio negócio, por exemplo, já tenho o crédito aprovado. Ser um empreendedor individual foi a melhor coisa que aconteceu nas nossas vidas, minha e da minha família”, afirma. A ideia de trabalhar dessa maneira surgiu com base na observação de que os pequenos empresários tinham carência de apoio administrativo. “Percebi que eles ficavam um pouco perdidos com as questões burocráticas e administrativas. Comecei a fazer uma pesquisa de mercado, a elaborar um plano de negócios e busquei o apoio do Sebrae. Entendi tratar-se de uma proposta diferente. Resolvi investir”, explica. Trabalhando virtualmente, dispensa a estrutura fixa de um escritório. Notebook, skype, um telefone fixo e um móvel são suas ferramentas de trabalho. Já as reuniões presenciais com clientes, tanto podem acontecer à mesa de um Café, no centro da cidade, quanto em uma mesa de lanchonete. “Eu tenho uma rotina muito dinâmica, entretanto, com flexibilidade de horário. Ao mesmo tempo em que agendo uma reunião, posso estar comprando uma passagem para um cliente”, ressalta. dez empresários simultaneamente Além de comprar passagens e agendar reuniões, Deisiane Zórtea cuida das contas a pagar e de todo o controle financeiro das empresas para as quais presta serviço. Responde e-mails, cuida da agenda, faz prospecção de clientes, digitação de documentos, formatação, enfim, todo trabalho que uma secretária deve assumir dentro de uma empresa, a partir de um contrato mensal sem qualquer vínculo empregatício. Atende a clientes fixos e também aos temporários – aqueles que a contratam por dois ou três meses para um trabalho específico, e clientes eventuais que a convocam uma vez por mês ou esporadicamente, com um número determinado de horas, para serviço de digitação de documentos, por exemplo. >>> Seis anos do SUPERSIMPLES 123 Capítulo 4 • • • O Supersimples e o fenômeno do emprego exemplos de sucesso | paraná >>> A clientela é composta de consultores, arquitetos, microempresários e lojistas do Paraná e de outros estados, como Minas Gerais. Atendendo até a dez clientes no mesmo mês, ela garante que consegue um faturamento até cinco vezes maior que o valor de mercado para uma profissional dessa área trabalhando regularmente. Por outro lado, tem um custo operacional alto, já que utiliza bastante o telefone. Em razão disso, ao fechar um pacote de serviços, inclui uma parcela para cobrir despesas telefônicas. A divulgação de seus serviços acontece, atualmente, por meio das redes sociais, mas a própria Deisiane reconhece que a indicação dos clientes vem contribuindo para que ela mantenha uma boa carteira de contratos. “Quando iniciei meu plano de negócios e minha pesquisa de mercado, automaticamente comecei a divulgação do meu trabalho. Fiz prospecção e divulgação simultaneamente, mas, nos últimos meses, estou contando muito com a divulgação boca a boca, feita pelos próprios clientes”, afirma. Deisiane não imagina que vai ficar rica com este formato de trabalho. Admite que aumentar o faturamento é pensar no futuro, mas destaca que mais importante que tudo é a qualidade de vida. “Fazer o que se gosta, da maneira que se quer é uma coisa que não tem preço”, finaliza. Dando a volta por cima Cássia Graffi e a ‘Dentro d’Água’ Ao retornar de uma viagem internacional, a microempresária Rita de Cássia Graffi levou um choque. Sua empresa de materiais esportivos aquáticos em Curitiba, a Dentro d’Água, tinha sido assaltada e saqueada. “Só não levaram as máquinas pesadas, mas desapareceram as peças prontas, estoques da loja, produtos de natação, óculos, computadores, perdemos praticamente tudo”, suspira a empresária. Os dados da empresa também foram perdidos. Não havia back-up dos computadores. “No primeiro momento, eu pensei em desistir. Perdi o chão, não tinha mais o meu trabalho, não tinha nada”, relata. Nessa época, Rita Graffi estava em contato com o Sebrae, que lhe dava consultoria de competitividade e outra voltada para o varejo. Relatou seu drama aos 124 Seis anos do Supersimples consultores, que a orientaram a disparar e-mails para o comércio e indústria relatando o roubo. Com isso, conseguiu reaver vários objetos furtados de sua empresa. Sua maré de azar começou a refluir. “Tudo o que aconteceu de ruim parece ter trazido uma motivação para darmos a volta por cima, para superar e chegar ao ponto em que estamos”, afirma Graffi. Nos anos que se seguiram, a empresária buscou um novo local para sua empresa e recomeçou seu negócio. “Recebi uma força essencial dos meus consultores. Eles trabalharam comigo o negócio, os dados comerciais, a gestão, o processo de produção e a imagem da loja, para que tivéssemos um espaço com cara de loja e não com cara de fábrica”, destaca. A Dentro d’Água está maior, mais consistente e conquista novos mercados. Mergulhando na piscina “Quando os meus filhos eram pequenos e faziam esportes na escola, eu confeccionava collants de ginástica, roupa esportiva para jogar vôlei, para natação, uma série de peças. Acabei entrando na área da natação”, relata. As roupas destinadas aos esportes aquáticos abriram as portas para a empresa atender a atletas, grupos personalizados e academias. Os trajes para triatlo, modalidade esportiva que reúne corrida, natação e ciclismo em uma mesma prova, também interessaram a Rita Graffi. “Nos últimos três anos começamos a atender também às necessidades desses atletas”, acrescenta. Com o crescimento, a Dentro d’Água mudou seu posicionamento. Passou a fornecer para as maiores academias de Curitiba e atender outros estabelecimentos fora da cidade. Valorização do fornecedor nacional A empresa agrega hoje 18 funcionários, incluindo vendedores, equipe de produção e os terceirizados, e mantém uma política de valorização dos fornecedores nacionais, sem receio da forte concorrência dos produtos chineses e da alta tributação dos produtos brasileiros. Quando dá palestra no Sindicato do Vestuário de Curitiba, Rita Graffi repassa a necessidade de trabalhar com produtos nacionais, movimentando toda a cadeia produtiva local. “Eu faço isso para ajudar os novos empresários e também para conscientizá-los de que é importante ter a visão de cooperativismo. Se estivermos juntos, unidos, poderemos fazer melhor. Além do mais, estamos empregando pessoas daqui”, pontua. Seis anos do SUPERSIMPLES 125 Capítulo 4 • • • O Supersimples e o fenômeno do emprego exemplos de sucesso | paraná Entre as dificuldades apontadas pela empresária está a falta de mão de obra qualificada. Entre os desafios, a sempre necessária atualização e renovação. “Não é um mar de rosas. Temos de estar sempre vigilantes, buscando melhorar, capacitar, mas nos sobrou mais tempo depois do Supersimples. Tenho o prazer de estar perto da família. Meus filhos trabalham comigo, e meu marido almoça todo dia em casa. Preparamos o almoço juntos”, conclui. transporte escolar Sansão faz força no volante R$ 16 mil foi quanto Sansão Piano, 37 anos, necessitou investir para dar início ao seu negócio de transporte escolar no município paranaense de Guaraniaçu. Era uma quantia que não possuía, mas valeu-se do crédito bancário franqueado aos microempreendedores individuais para adquirir uma van. Terminou de pagar em fevereiro último. Graças a uma licitação vencida há quatro anos, resultando num contrato que vem sendo renovado anualmente com a Prefeitura, conduz crianças da zona rural, que frequentam uma escola municipal no quilômetro 490 da BR-277. O dia começa muito cedo na casa da família Piano. As 4h40, Sansão se levanta da cama, faz o desjejum, monta na motocicleta e vai pegar a van, que fica guardada a um quilômetro de casa. Cumprindo o roteiro habitual, vai recolhendo 12 crianças pelo caminho, confere se estão afivelando os cintos de segurança e as deixa na porta da escola antes das 7 horas. No trajeto, Sansão já percorreu 100 quilômetros. 126 Seis anos do Supersimples Mais tarde, será a vez de sua esposa. A bordo do segundo veículo adquirido pelo marido, ela leva a filha de oito anos, que também estuda na escola. Segue outro roteiro para buscar uma turma que estuda no período da tarde. A rotina de todos os dias se repete em três turnos, já que, à noite, a escola funciona para os adultos. Segurança é fundamental Nascido na região, Sansão Piano trabalhou desde muito cedo na agricultura, até ser contratado para guiar kombis de transporte escolar na zona rural. Algum tempo depois foi cuidar de fazenda em Mato Grosso do Sul e por lá ficou durante um par de anos. Ao retornar a Guaraniaçu, ele comprou uma kombi ano 1996 e foi fazer aquilo que já sabia. Passou meses trabalhando na informalidade, até que um contador lhe falou do enquadramento no Simples e alertou-o para uma licitação da Prefeitura. Prontamente se animou e se formalizou. Dias depois, Sansão viu no Diário Oficial o edital de licitação. Inscreveu-se, participou e saiu vitorioso. No início, fazia todo o serviço com a Kombi, pela qual pagara R$ 8 mil. O veículo foi reformado e equipado de acordo com as determinações da Prefeitura, mas não era o veículo ideal para o conforto e a segurança dos estudantes. Informado das linhas de microcrédito para os MEIs, partiu para o financiamento de sua primeira van. “O contrato com a Prefeitura é bem rigoroso. Transportando crianças, é preciso muito cuidado. Meus carros têm cintos de segurança, extintores, pneus novos e passam por vistoria três vezes por ano. Nunca sofri acidente. Imprudência não cabe nesse negócio. É preciso muita responsabilidade”, ressalta. O plano de aumentar a Frota Atualmente, a empresa de Sansão recebe da Prefeitura R$ 2.100,00 mensais por carro. O contrato é renovado anualmente, mas o prazo máximo é de cinco anos. “Depois da eleição, vai depender do novo prefeito renovar ou não o contrato”, reconhece o microempreendedor. Ele não é o único a trabalhar na condição de MEI. A região tem vários microempreendedores. No transporte escolar, existem outros dois que só têm elogios para a Lei Geral. “Uma benção esse negócio para o trabalhador brasileiro. Já imaginou se eu tivesse de pagar 6% do que eu ganho de impostos? Em um período de 12 meses eu perderia um mês. Tenho outras despesas, impostos da van, manutenção...”, avalia. Piano prossegue dizendo que seu faturamento melhorou muito após a formalização, já que pode participar de licitação. Mas ele reconhece que, se não pudesse ser enquadrado como MEI, não seria interessante. “Trabalho a R$1,85 o quilômetro, se tirassem 6%, seria inviável trabalhar”, considera. Com a segunda van, conduzida pela esposa, Sansão vai acalentando o sonho de ter uma frota. Ele sabe que terá que se tornar microempresa se ultrapassar os R$ 60 mil anuais. É mais um sonho a realizar. Seis anos do SUPERSIMPLES 127 Capítulo 7 O Supersimples e o microempreendedor Garibaldi: “O MEI é uma política de formalização, inclusão previdenciária e cidadania empresarial”. Thame: “Muitos trabalhavam honestamente e estavam excluídos dos benefícios previdenciários”. Santana: “A Lei Geral foi um golpe duro contra a informalidade e a favor do desenvolvimento”. Vasquez: “A maioria dos empreendedores das comunidades pacificadas se enquadra no perfil de MEI”. 128 Seis anos do Supersimples Um dos capítulos mais importantes da Lei Geral das MPEs é o que cria a figura do microempreendedor individual, um sucesso imediato que já empolga três milhões de trabalhadores brasileiros. O ideal de formalizar, dar personalidade jurídica e proteção previdenciária aos trabalhadores por conta própria foi concretizado pela Lei Complementar 128 de 2008. Uma imensa faixa da força produtiva brasileira, até então invisível para a formulação de políticas públicas, passou a ser reconhecida na economia, alçando o país a novos patamares de civilização e desenvolvimento social. No entanto, não são todos os microempreendedores que cumprem sua parte nas obrigações da formalização. A presidenta Dilma Rousseff manifestou sua preocupação com o alto índice de inadimplência dos MEIs no recolhimento de sua obrigação previdenciária. O ministro Garibaldi Alves Filho, alerta que a interrupção do pagamento acarreta a perda do direito de segurado e lançou uma ampla campanha publicitária de educação previdenciária. O Sebrae fez a sugestão complementar da emissão de carnês para recolhimento da contribuição, tendo em vista que a cultura do carnê está enraizada nas camadas populares, e que os MEIs nem sempre têm acesso a computador e impressora para emitir a guia de recolhimento. individual O deputado do PSDB-SP Mendes Thame é um dos pioneiros na criação do Microempreendedor Individual. Um antigo projeto de sua autoria previa o benefício previdenciário para o trabalhador por conta própria. Dezenas de projetos posteriores foram agregados ao dele e deram origem à LC 128/08. Adelmir Santana, presidente da Fecomércio do Distrito Federal, aborda a luta do empresariado por justiça fiscal. Se para eles a elevada carga tributária, o excesso de burocracia, a dificuldade de acesso ao crédito continuam postergando a criação de uma cultura empreendedora no Brasil, pelo menos para os pequenos a situação melhorou com o Supersimples. Por sua vez, o superintendente do Sebrae RJ, Cezar Vasquez, comemora o sucesso da intervenção da Polícia Pacificadora nas favelas cariocas e a instituição de um ambiente seguro para que o Sebrae possa trabalhar com a formalização e o apoio aos microempreendimentos locais, que já apresentam números expressivos. Seis anos do SUPERSIMPLES 129 Capítulo 7 • • • O Supersimples e o microempreendedor individual ARTIGO | Garibaldi Alves Filho Informalidade é sinônimo de desproteção “ Garibaldi Alves Filho Ministro da Previdência Social O Simples Nacional é uma política de extremo su- cesso, não apenas no tocante ao crescimento e ao fortalecimento das micro e pequenas empresas no Brasil, como também tem propiciado impactos positivos sobre a formalização. Em função desse efeito, o Simples acaba sendo um importante instrumento de ampliação da proteção previdenciária no país, tendo em vista que a informalidade é sinônimo de desproteção social. O impacto positivo do Simples sobre a formalização foi substancialmente ampliado com a instituição da figura do microempreendedor individual (MEI) no final de 2008, na base da pirâmide de faturamento. Em menos de cinco anos de funcionamento efetivo a nível nacional, a referida política já contabiliza a formalização de 2,98 milhões de microempreendedores individuais, mui- O ministro Garibaldi Alves Filho nasceu em Natal (RN), em 1947. Cursou Direito na Universidade Federal do Rio Grande do Norte e também tem registro como jornalista profissional. Garibaldi foi deputado estadual por quatro mandatos consecutivos, prefeito de Natal, senador da República por três mandatos, governador do Rio Grande do Norte por dois mandatos. Foi presidente do Senado a partir de 2008. 130 Seis anos do Supersimples tos dos quais se encontravam há muito tempo exercendo atividade informal, à margem do Estado brasileiro e sem proteção social. Conforme pesquisa realizada pelo Sebrae, daqueles que se encontravam na informalidade antes da inscrição no MEI, 71% estavam nessa situação há mais de 5 anos e 86% em período superior a dois anos. Portanto, o MEI é uma política de formalização, inclusão previdenciária e cidadania empresarial, mas acima de tudo de reconhecimento do Estado brasileiro a esses milhões de autônomos ou trabalhadores por conta própria que vivem de forma precária na informalidade. Inscrição não garante benefícios Graças ao MEI, que permite um tratamento tributário ainda mais favorecido do que aquele atribuído às microempresas do Simples, esses empreendedores de baixa renda agora têm a oportunidade de contar com acesso à proteção previdenciária pagando apenas 5% do salário mínimo (R$ 33,90 em 2013). Com as possíveis contribuições adicionais de ICMS e ISS, o MEI paga, no máximo, R$ 39,90 mensais para se manter na formalidade e com cobertura junto à Previdência Social. Cabe enfatizar que a mera inscrição por meio do Portal do Empreendedor não garante o acesso aos benefícios previdenciários. Para ter direito aos referidos benefícios, como, por exemplo, aposentadoria por idade, auxílio-doença, salário-maternidade e pensão por morte, é necessário ter cumprido os requisitos, entre eles, o tempo de contribuição mínimo exigido ou carência. Nesse contexto, é fundamental o pagamento contínuo e regular das contribuições mensais. A redução da inadimplência passa, entre outras ações, por uma estratégia de disseminação de informações, inclusive campanhas publicitárias, educação previdenciária e financeira, implementação de formas para facilitar e simplificar o pagamento e pela simplificação das obrigações acessórias do MEI, em especial, para aqueles que têm empregado. Instituições simbióticas Portanto, o MEI é, acima de tudo, uma política de desenvolvimento que combina: a) ampliação da proteção social ou previdenciária; b) redução da informalidade pela adoção de tratamento tributário compatível com a baixa capacidade contributiva dos nossos microempreendedores do setor informal; c) simplificação e racionalização da burocracia e das obrigações acessórias; d) apoio às microempresas por meio de ampliação do acesso a crédito e mercados; e) ações de qualificação profissional. Um fator importante da referida política é seu caráter transversal, que engloba vários ministérios, como Previdência Social, Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Secretaria da Receita Federal do Brasil, Comitê Gestor do Simples Nacional, bem como outras instituições, em especial o Sebrae. Todas essas instituições têm trabalhado de forma simbiótica e integrada para o sucesso do MEI, uma ação em que todos ganham: a) o empreendedor, que passa a trabalhar no mercado formal e com os direitos assegurados – segundo pesquisa do Sebrae, mais da metade dos MEIs tiveram aumento de faturamento, os investimentos foram ampliados e a gestão foi aperfeiçoada. Ademais, 94% dos formalizados recomendam a inscrição no MEI; b) a Previdência, que passa a contar com contribuição de trabalhadores que estavam na informalidade e sem cobertura previdenciária. Trata-se de um exemplo de que a melhoria do ambiente legal e tributário gera benefícios para a sociedade como um todo. O Governo Federal e o Sebrae vão continuar trabalhando para a formalização, a proteção social e o crescimento dos nossos microempreendedores, com a certeza de que o sucesso do MEI é sinônimo de desenvolvimento inclusivo para o Brasil. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 131 Capítulo 7 • • • O Supersimples e o microempreendedor individual ARTIGO | Mendes Thame o mEI inclusão “crescimento NA ESTEIRA DA E DO Mendes Thame Deputado federal pelo PSDB Antonio Carlos Mendes Thame nasceu em Piracicaba (SP) no ano de 1946. Engenheiro agrônomo formado pela USP e advogado pela PUC Campinas, foi prefeito de Piracicaba (1993-1996) e secretário de Estado de Recursos Hídricos, Saneamento e Obras de São Paulo (1999-2000). Deputado federal no sexto mandato, foi autor da proposta que deu origem à Lei Complementar 128/2008, que criou a figura do microempreendedor individual. 132 Seis anos do Supersimples Recente balanço sobre a adesão ao MEI (Microem- preendedor Individual), até o mês de abril de 2013, mostra que quase 3 milhões de pessoas já se beneficiam do programa. Destas, 690 mil no Estado de São Paulo. De forma geral, caminhamos de forma satisfatória na direção da proposta de chegar a um patamar projetado de 11 milhões de pessoas atendidas. Porém, entendo que um detalhe simples pode acelerar o processo: a mobilização das prefeituras. Isto porque, apesar da simplicidade do programa e de seu excepcional alcance, ainda há uma multidão de pessoas excluídas, impossibilitadas de fazer parte do MEI por diversas razões. Em primeiro lugar, é preciso que o município onde o profissional atua faça sua adesão à Lei Nacional do Simples e à Lei do Microempreendedor Individual. Se não houver essa adesão, ele está alijado, ou seja, não pode aderir ao Simples nem ao Microempreendedor Individual. No Estado de São Paulo, justamente onde tivemos recorde de adesões no ano passado, mais de 300 municípios ainda não aderiram, ou seja, não aprovaram lei municipal para tanto. Em segundo lugar, há casos em que a lei municipal já foi aprovada, mas não há uma compreensão sobre a importância do MEI. É o caso de municípios onde se montam feiras de artesanato nas praças aos domingos, e uma das exigências para o profissional participar é de que seja pessoa física. Na hora em que adere ao MEI, o artesão passa a ser pessoa jurídica, a ter CNPJ e fica, por isso, proibido de exibir os seus produtos, o que não tem o menor cabimento e precisa ser corrigido. Indignação e revolta Um terceiro ponto mostra que, em outros municípios, a situação é ainda mais dramática. No momento em que o trabalhador faz sua adesão e coloca a residência como sendo seu endereço profissional, ele passa a pagar IPTU comercial e não residencial. Precisa arcar com um valor que pode chegar a até três vezes o valor do IPTU que pagava como residencial, o que lhe traz profunda indignação e revolta. Em quarto lugar, há inúmeras categorias profissionais que ainda não foram contempladas na Lei do Microempreendedor Individual. Por último, a lei não prevê a possibilidade de o microempreendedor ter um aprendiz. A legislação só permite um empregado. Com uma mudança na lei, seria aberto um campo imenso para formar futuros profissionais. O ideal seria que o microempreendedor pudesse ter um empregado e um ou mais aprendizes. Nos últimos 20 anos, a Lei das Micro e Pequenas Empresas e a Lei complementar 128/08, que criou o Microempreendedor Individual, representaram as únicas e verdadeiras reformas tributárias no País. Projeto original da criação do MEI Tive o privilégio de ser o primeiro deputado a apresentar projeto de lei que, aprovada, criou a figura do MEI. Aliás, apresentei o projeto com base nas reclamações daqueles que desempenhavam honestamente suas funções e que estavam excluídos dos benefícios previdenciários. Pessoas que não podiam emitir nota fiscal exigida por um supermercado, uma multinacional, ou por qualquer empresa ou estabelecimento que não aceitasse um mero recibo. Juntando tais pedidos, estudamos com cuidado muitos casos e apresentamos o projeto, ao qual foram agregados dezenas de projetos posteriormente apresentados por outros deputados. Aprovado, deu origem à Lei Complementar 128/08, que cria a figura do Microempreendedor Individual, o chamado “trabalhador por conta própria”. A lei beneficia quase 500 ocupações, como costureiras, sapateiros, manicures, mecânicos, ambulantes, que passam a ter oportunidade de entrar para o mercado formal, com cobertura da Seguridade Social. Com isso, esses profissionais passam a ter direito à aposentadoria, pensão, licença médica, cobertura em caso de acidente de trabalho, salário-maternidade e demais benefícios. Ao se formalizar, o empreendedor individual passa a ter CNPJ, pode emitir nota fiscal, participar de licitações públicas e ter acesso a juros bancários menores. É preciso, no entanto, aperfeiçoar esses instrumentos, para possibilitar a criação de mais empregos formais, gerar renda e oferecer tranquilidade para milhares de famílias e ampliar o universo de atendimento. Alguns Estados estão imbuídos dessa proposta. Alckmin lança onze medidas A Política Estadual de Estímulo ao Empreendedorismo e Favorecimento às Micro e Pequenas Empresas, lançada pelo governador Geraldo Alckmin em 2012, contempla um conjunto de 11 medidas para fomentar o desenvolvimento do MEI no Estado. É um exemplo de compromisso com o empreendedorismo. Um dos destaques do programa é o convênio com a Receita Federal para concessão simultânea do Número de Inscrição no Registro de Empresas (NIRE) e da inscrição na Receita Federal (CNPJ) pela Junta Comercial do Estado de São Paulo (Jucesp). Esse convênio objetiva reduzir o tempo atual de 20 dias a 30 dias para menos de uma semana na abertura de empresa. O mesmo programa traz outras ferramentas para desburocratizar a vida dos empresários, reduzir custos e fortalecer as micro e pequenas empresas. Afinal, são elas a verdadeira força silenciosa que tanto ajuda girar a economia brasileira. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 133 Capítulo 7 • • • O Supersimples e o microempreendedor individual ARTIGO | Adelmir Santana Lei Geral A “ Adelmir Santana Presidente da Fecomércio DF mudou o ter relatado, por mais de uma vez, algumas modificações que aperfeiçoaram a Lei. A cada alteração promovemos melhorias no dispositivo: incluímos novos setores no Simples e criamos a figura do microempreendedor individual (MEI), que é a pessoa que trabalha por conta própria e ganha até R$ 60 mil por ano. Maior ganho foi cidadania Brasil Os empresários brasileiros lutam diariamente por Justiça fiscal. A elevada carga tributária, o excesso de burocracia, a dificuldade de acesso ao mercado e ao crédito sempre foram obstáculos para criação de uma cultura empreendedora no País. Ainda hoje esses desafios existem, mas pelo menos para os pequenos a situação mudou. E mudou para melhor. Graças a um conjunto de dispositivos legais instituídos a partir dos anos 90, conseguimos criar condições favoráveis para o surgimento e consolidação de novos negócios. Com a Lei Geral da Micro e Pequena Empresa, instituída em 14 de dezembro de 2006, o Brasil finalmente fez a verdadeira reforma tributária. Aquela que também é necessária para outros setores da economia e nunca foi feita. A Lei Geral foi um golpe duro contra a informalidade e a favor do desenvolvimento. Por meio dessa legislação foi instituído um regime tributário específico para as micro e pequenas empresas, com a redução da carga de impostos e a simplificação dos processos de cálculo e recolhimento, o chamado Simples Nacional. Como senador da República pelo DF, entre 2007 e 2011, tive a grata satisfação de ter presenciado esses avanços e de 134 Seis anos do Supersimples Nascido em 1945 no município maranhense de Nova Iorque, Adelmir Santana formou-se em Administração de Empresas pelo CEUB em Brasília. Especializou-se em Gestão Estratégica para Dirigentes Empresariais na Insead, em Fontainebleau, França. Empresário do ramo farmacêutico, foi senador pelo Distrito Federal e presidente do Conselho Nacional do Sebrae. É também vice-presidente da Confederação Nacional do Comércio. Em viagens ao redor do Brasil, pude ver a transformação real ocorrida na vida de milhares de cidadãos após o surgimento da figura do microempreendedor individual. Pessoas que antes eram discriminadas em seus municípios por não terem profissões regulamentadas, mas que trabalhavam de sol a sol como vendedores de cachorro-quente, pipoqueiros, sapateiros, costureiras e etc, passaram a ser reconhecidas. Esses brasileiros ganharam, sobretudo, cidadania. Mais de 400 ocupações foram incluídas na lista de atividades permitidas. Foram criadas condições para as pessoas saírem da informalidade, além de acesso a vários benefícios da Previdência Social. Entre eles: aposentadoria por idade, aposentadoria por invalidez, auxílio-doença, salário-maternidade, pensão por morte e auxílio-reclusão. Atualmente, existem em torno de 3 milhões de trabalhadores por conta própria cadastrados como microempreendedores no Brasil, número que ainda não está nem perto do teto. O País tem potencial para ter mais de 15 milhões de microempreendedores individuais. Tenho certeza que gradativamente esses números subirão, principalmente em função do trabalho didático realizado pelo Sebrae. Aliás, essa é uma instituição que merece os nossos aplausos. Paralelo a minha atuação no Senado, fui por duas vezes presidente do Conselho Deliberativo do Sebrae Nacional, pelos biênios 2007 e 2008 e 2009 e 2010. Acompanhei um trabalho sério de estímulo ao empreendedorismo e pude dar a minha contribuição com programas e projetos de apoio a inovação, ampliando a competitividade das micro e pequenas empresas. A busca de reconhecimento Hoje, temos 7,4 milhões de empresas formalizadas no Brasil. Não por acaso, elas representam 99% do total e são responsáveis por 11 milhões de empregos. É um avanço indiscutível, traduzido em ganhos econômicos, sociais e de autoestima. Justamente por isso, não pode parar por aí. Como presidente da Fecomércio-DF e vice-presidente da Confederação Nacional do Comércio (CNC) luto agora para que a cultura do empreendedorismo se consolide e mais pessoas tenham condições de empreender. Ter o próprio negócio ainda é um sonho para milhares de brasileiros. Mais do que virar senhores do próprio destino, o que eles buscam é reconhecimento. Não é um desejo qualquer, pelo contrário. Precisamos capacitar esses cidadãos para que o sonho se torne realidade e ampliar as reformas estruturais capazes de eliminar outros entraves burocráticos, trabalhistas e tributários. Quando isso ocorrer, teremos transformado o Brasil num país altamente desenvolvido. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 135 Capítulo 7 • • • O Supersimples e o microempreendedor individual ARTIGO | Cezar Vasquez Pacificação democratiza oportunidades São construções totalmente fora do padrão da cidade, questões entre vizinhos que têm que ser solucionadas, ligações clandestinas de energia elétrica e de TV a cabo, necessidade de implementação de transporte com segurança, dificuldades de recolhimento de lixo em áreas de difícil acesso por razões topográficas, dificuldades de adaptação dos estabelecimentos às exigências em relação ao estado físico e às condições sanitárias, entre outros pontos. Enfim, o Estado se defronta com aspectos dos quais passava ao largo, como se não fizessem parte da cidade formal. E como proceder a partir de agora? Todas as normas e posturas terão automaticamente que ser aplicadas a essa realidade? Haverá regras de transição? É uma questão que tem que ser solucionada o quanto antes. “ Cezar Vasquez Diretor-superintendente do Sebrae RJ Tentativa de formalização fracassada Há cerca de quatro anos, o Rio de Janeiro deu um passo importante que acabou se transformando num dos elementos emblemáticos do reerguimento e da mudança de imagem da cidade: foi instalada no Morro Dona Marta, na Zona Sul do Rio, a primeira Unidade de Polícia Pacificadora (UPP). De lá para cá, a iniciativa se espalhou, acabou com o controle armado dos territórios e a cartelização da venda varejista de drogas em diversas outras comunidades – uma situação única no país –, e tornou-se uma referência nacional de política de segurança bem-sucedida. Mas, com as UPPs e o território livre, foi apresentada uma realidade incompatível com o sistema legal vigente, o que se traduz em inúmeros novos desafios. A presença e vigilância constante do Estado acaba revelando e cobrando soluções para problemas que surgiram no decorrer dos anos – seja pelo abandono por parte do próprio Estado, seja pelo domínio dos traficantes. 136 Seis anos do Supersimples Nascido no Rio de Janeiro em 1958, Cezar Rogelio Vasquez é engenheiro de produção formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, fez mestrado na mesma área pela Coppe e MBA Executivo em Finanças pelo IBMEC do Rio de Janeiro. Foi diretor-superintendente do Sebrae ES, em 2003 e 2004. Ocupou também a vice-presidência do Proderj (Centro de Processamento de Dados do Estado do Rio de Janeiro). Em relação ao ambiente de negócios e à formalização empresarial, há uma importante vantagem para os empreendedores. A existência da Lei Geral cria inúmeras facilidades. Uma delas foi o Simples Nacional, que unificou impostos e reduziu a carga tributária. A outra foi a instituição da figura do microempreendedor individual (MEI), o que permitiu que milhares de trabalhadores por conta própria pudessem se formalizar de maneira rápida e sem custo. Sem dúvida, um avanço e uma oportunidade para as comunidades, já que a maioria dos empreendedores locais se enquadra no perfil de MEI. Antes das UPPs, esses empreendedores não tinham acesso fácil à informação e à formalização, o que era uma limitação para o desenvolvimento. Nós mesmos, do Sebrae RJ, fizemos uma tentativa de incentivar a formalização em comunidades antes da pacificação e não tivemos sucesso. O ambiente institucional favorável e seguro cria um clima propício à legalização. Agora, nesta nova etapa, os resultados têm sido animadores. Trabalhamos com capacitações, consultorias e ações de apoio à formação de redes e já temos identificado inúmeros avanços. Temos polos comerciais e de turismo em funcionamento em diversas comunidades e histórias de empreendedores que aproveitaram a oportunidade, se formalizaram e cresceram – não apenas fornecendo para a comunidade, mas também ampliando a clientela no asfalto. Além disso, acompanhamos o surgimento de negócios a partir das peculiaridades e necessidades da favela, como o Carteiro Amigo, primeira franquia numa comunidade fluminense, que entrega nas residências cartas que ficavam concentradas nas associações de moradores. Exemplos de senso de oportunidade e espírito empreendedor é que não faltam, como o hostel Favela Inn, que usa como diferenciais a sustentabilidade e a linda vista do Chapéu Mangueira, na Zona Sul do Rio. É importante que fique claro que a pacificação abre caminho para soluções inovadoras não apenas nos negócios, mas também para a discussão das novas normas de convivência e do próprio desenvolvimento local. Além da formalização e do acesso a serviços públicos, essas comunidades precisam repensar o papel de suas lideranças e a sua governança. É necessário apoiar essas comunidades na redefinição de seu papel, menos dependente do clientelismo político e do paternalismo estatal. A pacificação é a oportunidade. Não é promessa nem garantia de solução de todos os problemas. É hora de mostrar que o morro tem vez. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 137 Capítulo 7 • • • O Supersimples e o microempreendedor individual exemplos de sucesso | comunidades pacificadas do rio de janeiro Comunidades Pacificadas Jazidas de empreendimentos Enquanto o Brasil todo se preocupava em combater a mortalidade das micro e pequenas empresas, o Rio de Janeiro se empenhava numa luta muito mais séria: recuperar o controle das favelas, estabelecendo um ambiente saudável onde a mortalidade das próprias pessoas pudesse ser evitada. Ao impor o poder do Estado onde as pessoas viviam subjugadas pelo terror dos criminosos, o Governo do Rio de Janeiro criou condições para que o Sebrae entrasse nas comunidades pacificadas e começasse a colher êxitos. O Serviço está presente em 28 comunidades, já realizou 14 mil atendimentos, contribuiu para a formalização de 1.800 empreendedores e ofereceu cursos e oficinas para 750 participantes. Agentes culturais oferecem chá londrino e colhem histórias de vida dos moradores da Cidade de Deus. 138 Seis anos do Supersimples Seis anos do SUPERSIMPLES 139 Capítulo 7 • • • O Supersimples e o microempreendedor individual exemplos de sucesso | comunidades pacificadas do rio de janeiro correspondência entregue em casa o visual das gordinhas Grupo Carteiro Amigo Confecção Atrevida Dois exemplos são emblemáticos do novo espírito empreendedor que se instalou nas comunidades: a Rocinha, com mais de 100 mil habitantes, é a maior favela da América Latina em extensão e a maior do mundo em população. Seu intrincado de becos, escadarias e passagens desestimulavam a entrada dos Correios tanto quanto os fuzis dos traficantes. Ali funciona uma pequena empresa de entrega de correspondência que se chama Carteiro Amigo. Há treze anos, três jovens da comunidade tiveram a ideia de montar o serviço, depois de trabalhar no Censo 2000. “Víamos que as pessoas não sabiam o próprio endereço, e por isso não recebiam correspondência, nem tinham como comprovar residência”, conta Carlos Pedro da Silva, hoje com 41 anos. Os outros são Sila Vieira da Silva e Elaine Ramos Vieira da Silva. Juntos criaram uma metodologia e uma logística para entrega de correspondência, levando em conta a descontinuidade dos becos e a numeração aleatória. Com a pacificação, e treinados pelo Sebrae, os sócios expandiram seus horizontes. O serviço conta hoje com cerca de 12 mil assinantes, que pagam R$ 13,00 por mês para receber correspondência em casa. Tam- Por 30 anos, a técnica de enfermagem Edna Goulart, 54 anos, vendeu roupas informalmente para aumentar sua renda. No final do ano passado, com a aposentadoria, decidiu montar o próprio negócio e hoje é costureira registrada como microempreendedora individual. “É a realização de um sonho antigo. Já estou me preparando para ampliar o espaço e montar uma loja para vender minhas próprias peças”, comemora. Edna conta que sempre gostou de costurar, mas revendia roupas de fábrica. “Com o tempo percebi que minhas amigas estavam engordando e estava ficando difícil encontrar roupas para elas”, confidencia entre turismo alternativo Hostel Favela Inn Aproveitando a esplêndida vista do Chapéu Mangueira, Cristiane de Oliveira e seu cunhado Vitor Hugo Medina criaram o Hostel Favela Inn, uma hospedaria que recebe principalmente turistas estrangeiros sem condições de enfrentar os altos preços da hotelaria carioca, e interessados em comparti- 140 Seis anos do Supersimples gargalhadas. “Aí resolvi começar a vender peças feitas por mim mesma”. Em 2010, começou a produzir roupas de ginástica e foi ampliando a oferta com o aumento dos pedidos de outros estilos. Moradora do Engenho de Dentro, Edna tem muitos parentes e amigos na Cidade de Deus, comunidade que lhe abriu as perspectivas para montar o negócio próprio. “Antes minha venda era induzida. Eu levava as peças e vendia para meus clientes no Centro do Rio. Agora os clientes é que vêm a mim. Já não preciso carregar tanto peso e nem sofrer com a inadimplência, que era alta”, afirma. Decotes para despistar a barriga A princípio, a ideia de Edna era abrir uma loja para consertos de roupas, mas o negócio deu tão certo que bém recebem caixas de produtos encomendados à Avon, Natura, DeMillus, Shoptime, etc, e aviso para buscar eletrodomésticos e móveis entregues pelas lojas na sede do Carteiro Amigo. Oito funcionários com carteira assinada, uniformizados, percorrem os becos com agilidade, para levar as boas notícias aos moradores. lhar a vida da comunidade. A imagem de violência das favelas vai se dissipando em favor da realidade de convivência pacífica, festas e alegria tradicionais do povo carioca. Como chamariz para os turistas ecológicos, o Favela Inn ostenta o brasão da sustentabilidade, ao separar o lixo e reaproveitar a água. Seus funcionários foram capacitados pelo Sebrae também nos treinamentos de higiene e manipulação de alimentos. Seis anos do SUPERSIMPLES 141 Capítulo 7 • • • O Supersimples e o microempreendedor individual exemplos de sucesso | comunidades pacificadas do rio de janeiro ela, com menos de um ano em atividade, já começa a produzir as próprias peças. Está investindo em tamanhos maiores, a partir do manequim 44, e num estilo próprio. “Eu exploro o decote para despistar a barriga, calças de cós mais alto e blusas mais soltinhas para melhorar o vi- anos depois, a acirrada concorrência na capital da arte brasileira o levou a trocar o Rio de Janeiro por São Luís do Maranhão. Foram quatro dias de van atravessando o Brasil. Mas a expectativa de fazer dinheiro transportando turistas na van e de conquistar espaço para seu talento na cena artística maranhense esbarrou, um ano depois, na repressão à informalidade do negócio, que resultou na apreensão da van pela Polícia Rodoviária. Ainda assim, Murilo conseguiu concluir o curso superior de Teatro na Universidade Federal do Maranhão, em 2009, e realizou muitos trabalhos na cidade. Foi também em São Luís que ele começou a produzir seus próprios curta-metragens, hoje disponíveis na internet e que concorrem a prêmios ou projetos governamentais. E ministrou aulas gratuitas de Teatro para comunidades carentes. Já em 2010, de volta ao Rio de Janeiro, fez o curso de Cinema na Central Única de Favelas (Cufa) e montou um pequeno estúdio no próprio barracão, na Cidade de Deus, comunidade que o acolhera desde os 5 anos. sual das gordinhas”, explica a bem-humorada estilista. “Quando comecei, eu não tinha dinheiro, só força de vontade. Mas agora já tenho umas economias para ampliar meu comércio e com a formalização posso até arrumar algum empréstimo para investir”, comemora. O plano de Edna é abrir uma loja ainda este ano, para vender suas produções. Vai alugar o barracão ao fundo de seu ateliê e instalar ali sua fábrica, deixando a parte da frente para a exposição e venda das peças de sua marca. A griffe de Edna se chama Atrevida, adjetivo que combina bem com o espírito da empreendedora. videomaker na cidade de deus O sonho de ver o nome em neon O sonho de brilhar nos palcos e nas telas de cinema teria se transformado em pesadelo, se Murilo Melo, 50 anos, não tivesse veia artística e persistência. Sua história, iniciada no bairro carioca de São Cristóvão e consolidada na Cidade de Deus, é recheada de momentos dramáticos. Foi publicitário, agente de turismo e multiprofissional das artes cênicas – ator, produtor, diretor, iluminador, cenógrafo e escritor. Agora é microempreendedor individual rumando para microempresário, com sua produtora de vídeo. Murilo começou na vida artística pela publicidade, em 1978. Primeiro trabalhou na house Casa Propaganda, uma sociedade entre a agência MPM e a Casa Sendas. Foram dois anos aprendendo diferentes ofícios, mas com a atenção voltada especialmente para a produção de anúncios publicitários. O progresso foi rápido. Sempre aberto a novos conhecimentos, Murilo se aprimorou e passou por outras duas grandes agências antes de ir trabalhar numa fábrica de neon, transferindo para o luminoso as propagandas demandadas por clientes. Fez neon para o primeiro 142 Seis anos do Supersimples show do cantor espanhol Julio Iglesias no Brasil e para o primeiro Rock in Rio. “Uma de minhas frustrações é que fiz o luminoso, mas não tive dinheiro para assistir o maior show de rock da história”, lamenta o artista. Penetra no Grupo Tablado A proximidade com o mundo artístico alimentou, em Murilo, o desejo de se tornar protagonista deste universo. Paralelamente à sua luta diária pelo sustento, o garoto começou a lutar pela carreira de ator. Cansado do estresse das agências, em 1983 tentou entrar no grupo Tablado. Barrado por falta de vagas, não desistiu e ia todos os dias à escola assistir às aulas escondido, com a conivência do porteiro. Até que um dia foi convocado na lista de espera. Mas o sonho da formação como ator ainda teria que esperar. Tão logo ele se casou, foi forçado a abandonar o curso para garantir o pagamento das contas. A essa altura, deixava o mundo da propaganda para abrir uma locadora de vídeo no Vilar dos Teles, distrito de São João do Meriti, negócio que fracassaria em pouco tempo, junto com o declínio do polo comercial local. Entre esta e outras tentativas de empreender, ele conseguiu retomar o estudo do teatro logo após o nascimento do primeiro filho, Igor. Durante três anos fez aulas na Escola de Teatro Martins Pena e na Casa das Artes das Laranjeiras (CAL). O que lhe deu segurança para atuar, depois, na Companhia Ensaio Aberto, formada em 1992 por artistas e intelectuais ligados aos movimentos sociais. Bye-bye, Brazil Murilo também participou de festivais e trabalhou com grandes nomes do teatro brasileiro, até fundar, em 2000, o próprio grupo, a Companhia Camaleões. Três Um dilúvio levou tudo Mas o destino lhe armava outra crueldade: um temporal destruiu o barracão, levando todos os equipamentos. Murilo perdeu tudo, só conservou a fé e a coragem. Com a esposa Márcia Cristina grávida, foi pra rua vender salada de frutas e recuperar o prejuízo. Partiu para Curitiba levando na mala sua peça “Escritos de um louco” sem equipamento adequado. Lá conheceu um rapaz que lhe ofereceu pousada e emprestou o som para apresentação da peça. E desde então, o ator vem perseguindo a meta de se tornar microempresário. Pretende retomar as atividades da Svídeo, que agora será transformada em produtora. Ele já está montando o projeto Curta a CDD, com o qual pretende formar novos profissionais de cinema e teatro na Cidade de Deus e até criar um Festival de Cinema próprio da comunidade. O projeto foi aprovado pelo Ministério da Cultura, que liberou R$ 10 mil para sua realização. Seis anos do SUPERSIMPLES 143 Capítulo 7 • • • O Supersimples e o microempreendedor individual exemplos de sucesso | comunidades pacificadas do rio de janeiro distribuidora na cidade de deus Sorvetes Moleka comida a quilo O self-service do Raul Depois de trabalhar 13 anos sem registro, Raul Guimarães da Rocha Júnior, 57 anos, passou a respirar aliviado nos últimos dois anos com a legalização de seu restaurante, o Self-Service do Raul, muito popular na Cidade de Deus. “Agora eu estou de cabeça erguida, sou mais respeitado e posso tocar meu negócio sem medo ou vergonha. O grande ganho foi a minha dignidade”, afirma. Raul lembra que antes da pacificação da Cidade de Deus não se sentia o verdadeiro dono do negócio, pois era limitado pelo isolamento da comunidade. “Ninguém entrava aqui. Para comprar minhas mercadorias, eu que tinha que buscar, pois o fornecedor não entregava”, exemplifica. Outra dificuldade eram os altos encargos que eram exigidos para a formalização das empresas. Hoje, como microempresário, ele paga seus impostos em uma única guia e ainda usufrui de todas as vantagens de ter um negócio formal. “Até os bancos agora me dão mais atenção e oferecem juros menores. Se você não é formalizado, é um joão-ninguém”. 144 Seis anos do Supersimples Desde os 16 anos, Raul trabalha atendendo o público. Começou numa sorveteria, depois foi bancário por 11 anos no extinto Unibanco. Em 1986, deixou o emprego para trabalhar como gerente na Kambalas Casa Noturna, onde permaneceu por mais dez anos até o fechamento do local. Um ano depois abriu seu próprio negócio. “Eu gosto de lidar com o público e gosto de cozinhar. Então o restaurante uniu o útil ao agradável”, diz Raul. Seu restaurante é um dos mais populares da Cidade de Deus e ele é um dos comerciantes mais queridos. “Eu não tenho clientes, tenho amigos”, define. Casado há 34 anos com a psicóloga Tânia Monteiro da Rocha, Raul tem dois filhos que seguem caminhos diferentes: Rafael, 32 anos, é também comerciante; e Felipe, 30, é designer gráfico. Ele administra sozinho o self-service. Vende cerca de cem pratos por dia no almoço, mas já planeja ampliar o negócio. Raul vislumbra essa possibilidade, especialmente após a comunidade ter sido inserida no programa de polos comerciais, da Prefeitura carioca. “Agora eu posso sonhar”. Nascido e criado em Nilópolis, Sérgio Luís Ribas, 49 anos, há dez anos escolheu a Cidade de Deus como moradia e local de trabalho. A troca ocorreu por acaso. Na festa de São Sebastião, Sérgio teve a ideia de montar um estande de sorvetes para ganhar mais uns trocados. Apoiado pela empresa Sorvetes Moleka, que lhe emprestou o freezer, conseguiu muito mais do que almejava durante os quatro dias de homenagens ao padroeiro do Rio de Janeiro. “Foi um sucesso, uma experiência muito positiva”, conta ele. A opção pela Cidade de Deus surgiu dias depois, quando Sérgio experimentou vender sorvete na praia da Barra da Tijuca. “Enchi meu Fiorino de picolés e fui pra praia. Rapidamente vendi tudo, até para os ambulantes que revendiam no isopor”. Como a comunidade é próxima da Barra, a Cidade de Deus era estratégica para ele abrir uma distribuidora da fábrica. Desde então, Sérgio fornece os produtos Moleka para ambulantes e pequenos revendedores da região. “Tem gente que compra comigo e vende na própria casa. Meu negócio gera emprego e renda”, afirma o comerciante. Mas a formalização do negócio só foi possível há dois anos, com as facilidades trazidas pelo Supersimples para o registro de microempresário e a pacificação da comunidade. “Antes tinha perdido quatro funcionários para o tráfico”, lamenta. “Mas com o apoio do poder público, agora despertei para uma nova realidade. Tenho garantia, facilidade de acesso a crédito e segurança, sem medo de trabalhar”. Sérgio Ribas foi educador social por 18 anos, prestando serviços para a Prefeitura do Rio, para o Estado e para a Arquidiocese. Por dois anos e meio, ele se dividiu entre trabalhos noturnos na Prefeitura e na Igreja e, durante o dia, na sorveteria. O sucesso do negócio o levou a abandonar os dois empregos. O gosto pela educação social, no entanto, ele mantém no trato com a comunidade e com os empregados. Sérgio estimulou dois funcionários, o sobrinho Bruno Reis e Israel Corrêa Souza, a abrirem seus próprios negócios. Os dois constituíram uma empresa de entregas e fazem o serviço para o próprio Sérgio. “Só assim, com uma sociedade melhor, é que podemos desenvolver o comércio e melhorar a vida na Cidade de Deus”, ensina o comerciante-educador. Seis anos do SUPERSIMPLES 145 Capítulo 7 • • • O Supersimples e o microempreendedor individual exemplos de sucesso | comunidades pacificadas do rio de janeiro wallace e vanderlúcia Joias reluzindo no Sambódromo O ofício de joalheiro ele aprendeu com o velho Augusto, que morreu pouco depois de lhe repassar todos os conhecimentos, mas só em 2007 Wallace Diniz, 41 anos, conseguiu legalizar sua profissão e tornar-se microempresário. Três anos depois, associou-se à esposa Vanderlúcia Nunes, 43, e abriu sua própria loja, a Topázio Joias. “Legalizar meu negócio abriu muitas portas para mim. Agora eu tenho crédito, confiabilidade e compro melhor”, analisa Wallace. Ele explica que consegue comprar o grama de ouro – produto básico em sua atividade – por metade do preço, apenas por ter CNPJ. “Todos os importados caem de preço quando é para uma empresa”, revela. Wallace Diniz começou a aprender ourivesaria num curso do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai). Mas foi um encontro com sua prima Luísa que mudou sua vida. Esposa de um joalheiro, Luísa propôs a Wallace que passasse por um estágio na fábrica do marido. Foi aí que conheceu Augusto, o mestre das joias, com quem aprendeu os segredos da profissão. Foram apenas seis meses de experiência, pois o marido de Luísa queria se aposentar e fechou a fábrica. Wallace, então, começou a trabalhar na própria casa, no bairro Araújo, onde ainda mora. Em 2006, casou-se com Vanderlúcia, sua grande incentivadora. Um ano depois, abriu, na Cidade de Deus, comunidade onde nasceu, a ourivesaria à qual deu o nome de Christopher Serviços Joalheiros, em homenagem ao filho que também trabalha ali. A pacificação da comunidade e a facilidade para a formalização do negócio, segundo ele, foram fundamentais para sua decisão. Assaltado em quase dois quilos de ouro Wallace domina todos os passos da linha de produção: é modelista, designer, cravador de pedras e produz o próprio banho de ouro para as peças. Com a ajuda de Christopher e do aprendiz Raian, atende clientes por todo o Brasil, fornecendo os mais diferentes produtos como medalhas, brincos, anéis e colares em ouro, prata ou banhados. É fornecedor exclusivo da Maçonaria do Brasil e tem clientes nas escolas de samba Beija-Flor, Salgueiro e Mocidade Independente. Também fornece para estabelecimentos na Barra da Tijuca, Taquara e Pe- 146 Seis anos do Supersimples nha, além de abastecer sua própria loja, administrada por Vanderlúcia. O plano de Wallace, no entanto, é se especializar na fabricação de correntes. Esse sonho foi interrompido em 2009, quando sofreu um assalto e perdeu 1,8 kg de ouro em peças prontas. Aos poucos, o joalheiro foi ressarcindo os clientes e hoje deve apenas 250 gramas, mas teve que suspender o investimento que previa fazer. A correntaria significará a consolidação da empresa de Wallace. Atualmente ele leva três dias para produzir uma corrente de prata de 80 centímetros no processo manual. Se adquirir as cinco máquinas necessárias para a industrialização, vai conseguir reduzir este tempo para um minuto. “Vou aumentar minha capacidade de produção e gerar mais empregos”, aposta Wallace. Seis anos do SUPERSIMPLES 147 Capítulo Monteiro: “É essencial desonerar exportações, investimentos e folha de pagamentos”. Dornelles: “A maior virtude foi aliviar a carga das extensas obrigações acessórias”. Barreto: “Muita desconfiança quanto aos ganhos que a medida traria à economia”. Cialdini: “Os micro e os macrofundamentos teóricos justificam o êxito do Simples”. 148 Seis anos do Supersimples 8 Arrecadação de Tributos O Supersimples veio mudar o paradigma da es- cassez que imperava no Brasil. Acreditava-se que, para que as pequenas empresas ganhassem fôlego e criassem empregos, a Receita teria que perder. No entanto, a convicção que orientou a elaboração da Lei Geral foi o paradigma da prosperidade, segundo o qual a redução na carga tributária provocaria uma expansão da base tributária e o aumento da arrecadação. Foi o que aconteceu. Os números de arrecadação dentro do Supersimples crescem ano a ano bem acima dos patamares da inflação. Os pequenos negócios tiveram alívio em suas obrigações e a arrecadação melhorou. Todos saíram ganhando. Armando Monteiro Neto teve tripla participação na aprovação da Lei Geral, como deputado federal atuante na Comissão Especial, como presidente da Confederação Nacional da Indústria e como presidente do Conselho Deliberativo do Sebrae. O senador Francisco Dornelles, altamente qualificado para analisar a evolução dos tributos por sua esplêndida biografia e por ser vice-presidente da Fundação Getúlio Vargas, revela que, sob todos os aspectos e ângulos, o desempenho das empresas optantes pelo Supersimples foi superior: no número de empre- gos gerados, no incremento da renda dos empregados, no número de unidades e no recolhimento das obrigações previdenciárias. O secretário da Receita Federal, Carlos Alberto Barreto, observa que os índices de desemprego no Brasil caíram de 9,6% para 6% exatamente nos anos de implantação do Supersimples, e que o regime contribuiu para que o Brasil estivesse mais preparado para enfrentar as recentes crises internacionais, em virtude da importân- cia das microempresas e empresas de pequeno porte no fortalecimento do mercado interno e nas cadeias produtivas locais e regionais. Alexandre Cialdini, ex-presidente da Abrasf, faz um apanhado dos fundamentos teóricos que amparam a construção do Supersimples e explicam seu sucesso. Busca justificativas em autores internacionais para o êxito da cooperação entre as três esferas obtido no Comitê Gestor do Simples Nacional. Seis anos do SUPERSIMPLES 149 Capítulo 8 • • • Arrecadação de tributos ARTIGO | Armando Monteiro Uma minirreforma tributária “ Senador Armando Monteiro (PTB-PE) A ameaça da substituição tributária H á muito se luta por um novo sistema tributário, mais racional e de classe mundial para o País. Felizmente, o debate está mais maduro e mais viável para a busca de soluções, afastando do horizonte modelos exóticos e ingenuamente simplificadores. Quem pode discordar ser essencial desonerar as exportações, os investimentos e a folha de pagamentos? Ou que é necessário eliminar a cumulatividade e harmonizar a caótica legislação do ICMS? Busca-se também a desoneração da produção, que possibilite a isonomia competitiva com os concorrentes internacionais, dentre outros aspectos. No momento em que o Congresso Nacional, em particular o Senado Federal, discute reformas fundamentais para o País, como a redução das alíquotas interestaduais do ICMS, a ampliação da desoneração da folha de pagamentos para diversos setores da economia e a compensação aos exportadores de resíduos tributários ao longo da cadeia produtiva, o chamado Reintegra, é inspirador o modelo de sucesso da Lei Geral das Micro e Pequenas, que foi acolhido e aplaudido por todo País. Os princípios da Lei Geral são norteadores e estão em linha com o que existe de mais moderno e eficiente em termos de sistema tributário: a simplificação – quando se unifica o recolhimento de oito impostos, seis federais e mais o ICMS (estadual) e o ISS (municipal); a progressividade – alíquotas diretamente proporcionais 150 Seis anos do Supersimples tiu o aumento da formalização e o crescimento das receitas. Entre 2011 e 2008, as receitas oriundas do Simples cresceram quase 50%, quando alcançaram a marca de 42 bilhões de reais. O número de empregados aumentou em 17% nesse mesmo período e, atualmente, os optantes do Simples são responsáveis por um em cada quatro empregos com carteira assinada no Brasil. Armando de Queiroz Monteiro Neto nasceu no Recife em 1952. Formou-se em Administração de Empresas pela FGV e em Direito pela UFPE. Exerceu três mandatos sucessivos como deputado federal e foi eleito senador em 2010. Presidiu a Confederação Nacional da Indústria e o Conselho Deliberativo do Sebrae Nacional. às faixas de receitas, e a economicidade – decorrente da exigência de menores obrigações acessórias e facilidade de administrar a vida tributária da empresa. Os bons resultados desse sistema são incontestáveis. Hoje temos cerca de 4,3 milhões de empresas no Simples, além dos 3 milhões de microempreendedores individuais. O alargamento da base de arrecadação, incentivada pela menor carga tributária e a simplicidade do sistema, garan- A despeito de toda essa evolução positiva e do reconhecimento que o País tem sobre o marco que é o Simples, as atuais disfunções do nosso sistema tributário também já ameaçam as conquistas do Simples. A opção pela produtividade fiscal e a facilidade em arrecadar estão fazendo com que os fiscos estaduais usem de forma indiscriminada e abusiva o instrumento da substituição tributária no ICMS, o que está anulando os benefícios proporcionados pelo Simples. Assim, a antecipação e substituição do recolhimento dos impostos só desfavorecem a expansão dos pequenos negócios. Isso porque reduz o capital de giro das empresas, atinge os empregos, inibe os investimentos, o clima de confiança e a concorrência, além de incentivar a informalidade. Ou seja, todos os efeitos vão na contramão do que foi preconizado, idealizado e posto em prática pelo modelo do Simples. O Sebrae produziu uma pesquisa destacando os efeitos danosos que a substituição tributária está causando aos optantes do Simples Nacional. Segundo a pesquisa, entre 2011 e 2008, o valor total do recolhimento da substituição tributária no âmbito das pequenas empresas alcançou R$ 4 bilhões, um crescimento de 75%, bem acima da expansão do número de empresas, da receita gerada no Simples e do número de empregos. Com isso, a carga tributária sobre os pequenos empreendedores tem crescido significativamente, dado que a alíquota do recolhimento pela substituição tributária no ICMS é expressivamente maior do que a alíquota do Simples. Há Estados em que essa diferença atinge em média mais de 220%. Menos tributos, mais empregos A pesquisa também mostra que essa política é irracional dado que dos seis Estados com menor carga tributária sobre as micro e pequenas empresas, cinco deles estão na liderança na geração de empregos, com resultados superiores à média nacional. E o contrário também é válido: dos seis estados com maior carga tributária sobre os pequenos negócios, quatro deles estão nas últimas colocações na geração de empregos, situando-se abaixo da média nacional. A substituição é um instrumento por excelência seletivo, mas que infelizmente está se disseminando e hoje se tornou de caráter geral, atingindo duramente as micro e pequenas empresas. Eu já apresentei emendas a projetos que tramitam no Senado em que se disciplina o uso da substituição tributária. Já levei a proposta ao Ministério da Fazenda, que também tem a compreensão da necessidade de se buscar um entendimento com os estados sobre essa questão. Existem caminhos que podem ser trilhados. O fundo de compensação de perdas pelas mudanças no ICMS poderia prever recursos orçamentários para essa finalidade. Existem também exemplos de sistemas de modernização das administrações tributárias, que permitem de forma eficiente a fiscalização e o controle dos recolhimentos de ICMS sobre micro e pequenas empresas, prescindindo assim da substituição tributária. É possível também dar flexibilidade aos estados para definir uma pauta de produtos em função do que o Governo Federal adota como modelo de substituição tributária. Soluções viáveis existem e creio que o momento para construir este entendimento é extremamente oportuno. O Brasil precisa avançar na melhoria do ambiente tributário, e o Simples é um marco nesse processo. Não podemos abrir mão dos seus ganhos, sob pena de estarmos penalizando e sufocando a força empreendedora desse país, que nasce nos pequenos negócios. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 151 Capítulo 8 • • • Arrecadação de tributos ARTIGO | Francisco Dornelles Todos os números são positivos Senador Francisco Dornelles (PP-RJ) vice-presidente da Fundação Getúlio Vargas “ 152 Seis anos do Supersimples contra 166% fora dele. Nesse período de sete anos, todas as estatísticas, sobre emprego, salário, unidades e recolhimentos previdenciários, mostram que o desempenho sempre foi melhor no segmento das micro e pequenas empresas do que nos outros contribuintes, o que atesta como o segmento tem sido decisivo para o tão comemorado crescimento da economia e redução do desemprego no Brasil. arrecadação de tributos federais foi de 62,2% no Simples contra apenas um terço nos demais contribuintes durante o período citado. A desconcentração regional é outro sucesso do Simples Nacional que tem sido ignorado nas análises. O montante arrecadado pelo segmento em 2008 na maior cidade do País, São Paulo, equivaleu a 1,02% do seu PIB, mas em duas cidades muito pequenas, aleatoriamente escolhidas, como Tapes (RS) e Pontalina (GO), chegou a 1,33% e 1,61%. Ou seja, o regime simplificado ainda arrecada proporcionalmente mais nas pequenas cidades do interior, nas quais predominam os pequenos negócios. Efeitos colaterais fáceis de corrigir Um padrão de sistema tributário O tratamento tributário diferenciado e simplifica- do para micro e pequenos contribuintes (o regime Simples) representou um grande avanço no sistema tributário brasileiro. A maior virtude do regime é aliviar a carga tributária para tais contribuintes ao reduzir a chamada carga indireta, constituída por custosas e extensas obrigações acessórias – esta medida é muito mais importante que eventuais diferenças de alíquotas. O seu maior resultado foi a expansão do emprego, que ocorreu de forma muito mais acelerada entre aqueles empregadores que aderiram ao sistema do que nas empresas de maior porte. Estatísticas oficiais da Previdência Social são eloquentes sobre como o segmento cresceu mais do que o das demais empresas: entre 2003 e 2010, o total de vínculos de empregados no Simples aumentou 69% (chegou a 9,2 milhões de optantes) contra 55% nas de- mais empresas; o montante das remunerações cresceu 205% (para R$ 7,6 bilhões) contra 157%; o número de estabelecimentos optantes subiu 50% (para 7,6 milhões) contra 36%. O valor devido declarado no segmento teve incremento de 192% (para R$ 814 milhões) Francisco Oswaldo Neves Dornelles nasceu em Belo Horizonte em 1935. É bacharel em Direito, mestre e doutor pela UFRJ. Estudou Finanças Públicas na França, e Tributação Internacional em Cambridge e Harvard. Foi deputado federal pelo Rio de Janeiro por cinco mandatos consecutivos, secretário da Receita e ministro em três pastas: Fazenda, Indústria e Comércio, e Trabalho e Emprego. A formalização do emprego e mesmo a geração de novos postos de trabalho compensam e talvez até anulem qualquer cálculo de renúncia de receita. Um em cada quatro trabalhadores com carteira assinada no País trabalha em empresas optantes do Simples. O regime não constitui um incentivo, um privilégio ou uma benesse, mas sim a restauração de um princípio clássico da tributação – a simplificação. Uma tributação de forma simples e sem exigir pesados ônus adicionais para pagar os tributos deveria ser o padrão de um sistema tributário. O Simples deve ser considerado dentro desse contexto. Há tempos, a arrecadação do Simples Nacional deixou de ser algo residual: alcançou R$ 46,5 bilhões em 2012, uma cifra próxima ao que era arrecadado pelo antigo “imposto sobre cheque” (CPMF). O que mais surpreende é que, nos últimos anos, em que turbulências sacudiram a economia, a arrecadação pelo segmento teve um desempenho muito melhor que o do resto dos contribuintes: a relação entre o recolhido (anualizado) pelo regime e os outros da Receita Federal subiu de 12,8% em julho de 2008, antes da crise global, para 15,6% em dezembro de 2011. Isto porque o aumento da Entendo que ainda existem muitos setores que não são beneficiados pelo regime e muitas empresas com faturamento não muito distante de uma média empresa que também não conseguem se enquadrar. As possibilidades de enquadramento no Simples Nacional devem ser ampliadas. É preciso também corrigir o efeito colateral da recente desoneração da folha salarial que faz com que empresas dos setores selecionados hoje contribuam sobre o faturamento bruto para a previdência social com alíquotas inferiores àquelas aplicadas as microempresas dos mesmos setores. Enfim, são mudanças simples, que podem ser aprovadas rapidamente pelo Congresso, se houver uma vontade mais firme na área econômica. Afinal, nunca faltou vontade parlamentar em relação à matéria. Simplificar o sistema tributário brasileiro é uma unanimidade no Congresso Nacional. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 153 Capítulo 8 • • • Arrecadação de tributos ARTIGO | Carlos Alberto Barreto Benefícios economia brasileira à Carlos Alberto Barreto Secretário da Receita Federal O 154 Seis anos do Supersimples Índice de desemprego caiu Outro aspecto importante a considerar é o da geração de empregos e de renda. O Brasil está vivendo há alguns anos uma excelente fase de criação e manutenção de empregos formais. O índice de desemprego caiu de 9,6% para 6% entre os anos de 2006 a 2011. Essa queda significativa coincide justamente com a implementação do Simples Nacional, a partir de julho de 2007. Modelo está sendo adotado no ITR “ Carlos Alberto Freitas Barreto nasceu em Biritingas (BA) em 1952. É economista e bacharel em Direito pela Universidade Federal da Bahia, onde também especializou-se em Direito Tributário e Gestão Contemporânea. Ingressou na Receita como auditor fiscal em 1978, chefiou serviços em Belém e Salvador. Foi secretário adjunto da Receita Federal de 2002 a 2009. O compartilhamento da administração do novo regime tributário, por meio do Comitê Gestor do Simples Nacional (CGSN) enfrentou, desde o início, as dificuldades inerentes à busca de soluções de consenso. No CGSN todos os entes federados têm representação e efetiva participação nas decisões relativas à regulamentação e à construção das soluções – administrativas, legislativas, tecnológicas, etc – voltadas à gestão do Simples Nacional. Simples Nacional, regime de administração compartilhada da arrecadação, cobrança e fiscalização dos tributos devidos pela microempresa (ME) e pela empresa de pequeno porte (EPP), foi criado pela Lei Complementar nº 123, de 2006, em obediência à Emenda Constitucional nº 42, de 2003. Pela originalidade e inovação, em face da abordagem de unificação de tributos da União, dos Estados e dos Municípios, no início houve muita desconfiança sobre a sua implementação e muito mais quanto aos ganhos que a medida traria à economia do País. A nova metodologia de gestão colegiada e tripartite revolucionou os conceitos relativos à regulamentação em nível federativo, pois foi criada uma nova instância deliberativa na qual os três níveis de governo têm assento e poder decisório. Esse modelo está sendo utilizado no Comitê Gestor do Imposto Territorial Rural, integrado pela União e os municípios e, mais recentemente, pelo Comitê Gestor da Redesim, que trata do registro e funcionamento de empresas, servindo de exemplo e modelo para outros setores e atividades da economia. O sucesso do Simples Nacional pode ser medido por seus números expressivos, reveladores do crescimento da quantidade de empresas optantes pelo regime. Após fechar o ano de 2007 com 2,83 milhões de inscritos, atualmente o regime conta com cerca de 7,37 milhões de empresas optantes. Desse total, 2,98 milhões são microempreendedores individuais (MEIs), figura jurídica criada pela Lei Complementar nº 128, de 2008, e que representa o maior programa de formalização empresarial e estímulo ao empreendedorismo em todo o mundo. A formalização de empresas proporcionada pelo Simples Nacional também tem sido significativa em números e resultados. O ritmo de pedidos de opção de microempresas e de empresas de pequeno porte manteve-se crescente mesmo após a criação do Microempreendedor Individual (MEI), em julho de 2008. Como podemos notar pelo quadro de variação na quantidade de empregos formais na economia brasileira, entre os anos de 2008 a 2011 a geração de empregos nas empresas optantes pelo Simples Nacional foi maior do que entre as médias e grandes empresas. É inconteste que o Simples Nacional contribuiu para que o Brasil estivesse mais preparado para enfrentar as recentes crises internacionais, em virtude da importância das microempresas e empresas de pequeno porte no fortalecimento do mercado interno e nas cadeias produtivas locais e regionais. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 155 Capítulo 8 • • • Arrecadação de tributos ARTIGO | Alexandre Cialdini Micro macrofundamentos teóricos do Simples e “ Alexandre Cialdini Ex-presidente da Associação Brasileira dos Secretários de Finanças (Abrasf) A relevância das micro, pequenas e médias empre- Alexandre Sobreira Cialdini nasceu em Sobral (CE) em 1964. Formou-se em Economia pela Universidade de Fortaleza, fez mestrado na Universidade Federal do Ceará e o curso DEA em Barcelona (Espanha). É secretário de Finanças de Fortaleza (CE). 156 Seis anos do Supersimples sas em diversos segmentos econômicos tem despertado o reconhecimento da literatura especializada nacional e internacional sobre o assunto. No início do século XX o economista austríaco Joseph Schumpeter afirmava que os processos inovativos surgiam devido às crises. No entanto, estas inovações geravam uma desordem que, inicialmente instaurada, obrigava os outros empresários a se adequarem conforme estes novos parâmetros, ocorrendo assim uma organização que aos poucos se transformava em ordem novamente. O Prof. Jeffry Timmons, considerado o pioneiro na educação empreendedora nos Estados Unidos, escreveu “New Venture Creation”. Trata-se de um best-seller e o mais clássico livro americano sobre empreendedorismo. Ele propôs outra forma de analisar o processo empreendedor, através de três fatores fundamentais: oportunidade, equipe empreendedora e recursos. Conforme Timmons, as micro e pequenas empresas são consideradas um dos principais agentes do desenvolvimento econômico, sendo que, dentre suas mais significativas contribuições, encontram-se a geração de empregos estáveis e inovações tecnológicas. Segundo esse autor, desde a II Guerra Mundial, 50% das inovações e 95% das inovações radicais – aquelas que rompem com a tradição anterior – têm sido originadas em pequenas empresas. Segundo Timmons, nas últimas duas décadas do século XX mais de 90% dos novos postos de trabalho criados nos Estados Unidos tiveram origem na criação de novas empresas e na expansão de pequenas empresas. Se pensarmos nestes números, corroborados por outros estudos similares, ninguém pode duvidar da importância que, nos próximos anos, vai ter a iniciativa empresarial e a criação de novas empresas para a manutenção e a melhoria dos níveis de desenvolvimento econômico e social. No âmbito internacional, cabe destaque aos trabalhos de Meghana Ayyaagari, da Universidade de George Washington, que tem relevada pesquisa sobre a importância da formalização e o papel que as MPEs desempenham na recuperação econômica, bem como nos países pobres e em vias de desenvolvimento. Importante mencionar o grande pensador indiano Coimbatore Prahalad, que demonstrou todo o potencial dos mercados de baixa renda, situados em países pobres e de grande população. Para Prahalad é possível criar, a partir de ações do setor privado, meios para reduzir os problemas crônicos da pobreza e da desigualdade social, sem necessariamente esquecer os objetivos corporativos da obtenção de resultados e de sobrevivência empresarial. O aumento da competitividade faria aumentar a necessidade por utilização de modelos e ferramentas de gestão de melhoria. Os trabalhos de Jair do Amaral Filho, da Universidade Federal do Ceará, associam a importância das microempresas e o desenvolvimento endógeno, bem como a construção de um modelo de mercado atomizado. Trabalhos dos pesquisadores Helena Maria Lastres e José Eduardo Cassiolato, que integram a RedeSist (Rede de Sistemas Produtivo e Inovativos Locais) defendem a necessidade de ampliar a interação entre os arranjos produtivos locais, estimulando a integração entre a oferta e a demanda das MPEs. Os trabalhos de Fernando Fuga, do BNDES, exploram a pesquisa sobre arranjos produtivos das MPEs e seus impactos na geração de emprego e renda. Em seu Traité de Science Politique, Pierre Bureau definiu a organização federal do Estado por dois princípios básicos: autonomia e participação. O primeiro refere-se à autogestão garantida institucionalmente pela Constituição. O segundo pode ser entendido como uma cooperação pactuada entre as unidades federadas. Nesse sentido, a cooperação e participação tem sido garantida e aprimorada na integração estabelecida nas seguintes instâncias: 1) Comitê Gestor do Simples Nacional; 2) Fórum Permanente das Microempresas e Empresas de Pequeno Porte e; 3) Comitê para Gestão da Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios. Todas elas têm representantes da União, Estados e Municípios, considerando suas específicas responsabilidades. Com efeito, os micro e macrofundamentos justificam o êxito do Simples Nacional. Por sermos um país federativo, devemos compreender que as mudanças precisam romper com o unitarismo e a verticalidade das normas e processos. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 157 Capítulo 8 • • • Arrecadação de tributos exemplos de sucesso | colíder, mt Colíder Uma capital nacional do Supersimples Colíder, cidade de 40 mil habitantes do Norte do Mato Grosso surgida de um projeto de colonização dos anos 70, é um nicho de prosperidade que adota os princípios desenvolvimentistas preconizados pela Lei Geral. Em oito anos, a Prefeitura quintuplicou a receita, revertendo os recursos em melhorias urbanas, educação, saúde e apoio aos pequenos empreendimentos. O sucesso da cidade tem que ser atribuído à capacidade de seu último prefeito, Celso Banazeski, e à competência do secretariado eminentemente técnico que teve a oportunidade de escolher. Não por acaso, Banazeski tem o perfil exato do empreendedor que saiu do zero e abriu caminho com intuição e energia, trabalho duro e perseverança, e que, depois de assegurar o bem-estar de sua família, colocou essas qualidades a serviço da comunidade que o acolheu. Nasceu em Seara, Santa Catarina, e aprendeu a ler e escrever com a mãe, porque lá não havia escola. Aos 13 anos saiu para estudar, trabalhou de frentista, lavador de carro e pedreiro. Acreditando ter vocação religiosa, foi aceito num seminário, onde ficou até os 17 anos, saindo antes de receber as ordens. Banazeski perambulou pelas cidades do Rio Grande do Sul e conseguiu se formar num curso de desenhista de Arquitetura em nível de 2º grau. Depois cursou Ciências Sociais em Erechim, trabalhou em imobiliária até entrar para o Banco Mercantil de São Paulo em 1983. >>> 158 Seis anos do Supersimples Seis anos do SUPERSIMPLES 159 Capítulo 8 • • • Arrecadação de tributos exemplos de sucesso | colíder, mt >>> Sua personalidade era muito inquieta para a rotina bancária, de modo que aceitou a aventura de ser gerente comercial numa agência que o banco estava abrindo em Colíder, em 1986. No ano seguinte fez concurso para o Banco do Brasil e passou, aceitando um salário menor em troca de segurança para a família que acabara de constituir. Ficou oito anos no Banco do Brasil, dedicando-se de tal forma a Colíder que, em 1992, foi eleito vereador, e dois anos depois conquistou 71% dos votos da cidade numa eleição para deputado estadual. Paralelamente à atividade política, dedicou-se a implantar e desenvolver, com apoio do Sebrae, uma indústria moveleira, a Global Wood, que vende móveis para a rede Tok Stok. Também com o Sebrae idealizou a criação de um núcleo industrial da pequena empresa, para compartilhar seus ideais de desenvolvimento. Banazeski se dedica a sua empresa moveleira após oito anos na Prefeitura. Renda per capita mais baixa Celso Banazeski não demorou a perceber que o futuro de seu próprio empreendimento estava ligado ao futuro da cidade, e tratou de filiarse à Associação Comercial em 1999, para discutir os interesses coletivos. Ali tornou-se líder e no ano seguinte presidente, reeleito em 2002. “Durante minha carreira de bancário, eu não apenas atendia o cliente, mas observava e discutia seus problemas. Isso me deu uma percepção bem acertada dos desafios a enfrentar”, explica. Colíder vivia um caos administrativo e marchava rapidamente para a decadência. Nada funcionava, o descrédito do Poder Público era evidente e o desânimo era geral. A renda per capita era a mais baixa do Estado. A Prefeitura não tinha sequer 160 Seis anos do Supersimples um computador funcionando. Casas comerciais no melhor ponto da cidade foram colocadas à venda por R$ 20 mil, sem que ninguém se interessasse. Era preciso reagir, e Celso assumiu a tarefa de capitanear, em 2003, um fórum de desenvolvimento municipal, convocando todos os segmentos da sociedade para se manifestarem. Deste fórum saiu um diagnóstico que passou a orientar todos os planos de revitalização da cidade. “Quando tomou conhecimento das nossas iniciativas, o governador Blairo Maggi me telefonou. Disse que não queria nem saber a qual partido eu pertencia, mas que me apoiaria para disputar a Prefeitura. Aceitei. Na primeira pesquisa, eu tinha 4% e o adversário 73%. Mas ganhamos com folga”, recorda. Pioneiro na Lei Geral A primeira exigência que Celso fez à coligação de partidos que o apoiava era a composição de um secretariado técnico, sem vaidades ou injunções políticas. Nos primeiros anos esse grupo conduziu uma recuperação econômica da cidade. No segundo mandato, Celso já podia contar com a Lei Geral das MPEs, que implantou em Colíder antes mesmo de ser aprovada no Congresso. “Quando assumimos em 2005, a receita de Colíder era de R$ 11 milhões anuais. Hoje estamos com O ex-prefeito de Colíder se orgulha dos prêmios que recebeu do Sebrae. R$ 56 milhões. Só na Educação investimos R$ 14 milhões, pagando salários de R$ 1.600 e R$ 4.500 aos professores. Criamos oito equipes do Programa de Saúde da Família, incluindo dentistas, e cobrimos 100% do município. E fizemos tudo isso reduzindo o IPTU de 1% para 0,6% e o ISS de 5% para 3%”, comemora. Essa afinidade com a aplicação dos princípios desenvolvimentistas pregados pelo Sebrae rendeu a Celso Banazeski onze prêmios de Prefeito Empreendedor, que ele ostenta com muito orgulho em sua parede. Ele deixou a Prefeitura com a sensação de dever cumprido para com a sua comunidade. “As casas comerciais que ninguém queria comprar por R$ 20 mil agora valem R$ 800 mil. A cidade, que tinha sua economia baseada em 1.600 propriedades rurais dedicadas à pecuária de corte e leite, hoje tornou-se um pólo educacional, ofertando 28 cursos superiores a 3 mil universitários. Só lamento não ter tido tempo para completar a pavimentação da área central de Colíder”, avaliou o ex-prefeito. Seis anos do SUPERSIMPLES 161 Capítulo 8 • • • Arrecadação de tributos exemplos de sucesso | colíder, mt a towner do valdir tornearia Frasson Uma lanchonete ambulante O metalúrgico que veio do Paraná Na avenida Marechal Cândido Rondon, uma reluzente perua Towner Coach é aguardada com ansiedade pelas comerciárias, pelos estudantes e pessoas da periferia que tiveram que ir ao centro. É a perua do Valdir, um microempreendedor individual que vem prosperando nos últimos anos com o fornecimento de lanches na área central de Colíder. Em pouco tempo o veículo é cercado por dezenas de fregueses. Poucos pagam na hora. A caderneta do Valdir tem mais de R$ 10 mil a receber. Valdir da Silva, 47 anos, nasceu em Terra Roxa, no Paraná, e veio menino com os pais para trabalhar na roça em Colíder. Depois de casado, resolveu mudar de atividade, e passou a vender na rua os saborosos salgados 162 Seis anos do Supersimples feitos por sua esposa Lourdes: coxinhas, pastéis, espetinhos, torta de pizza, bolinho de carne e pamonha. “Primeiro vendia com um balaio, depois comprei uma bicicleta, depois uma moto com carretinha, até chegar a esta van”, relata. Estimulado pela agente de desenvolvimento municipal Margarida Gaona, Valdir registrou-se como MEI e agora faz compras como pessoa jurídica. Valdir percorre oito pontos fixos na avenida Rondon durante os cinco dias úteis da semana. No sábado trata de abastecer a cozinha de Lourdes. Seu plano é terminar de pagar a Towner e partir para um veículo com maior capacidade de atendimento, e contratar alguém para ajudar. Outro paranaense que saiu de Terra Roxa para ser bem-sucedido em Colíder é o torneiro mecânico Edson Lúcio Frasson, instalado num galpão próprio que construiu no Setor Industrial de Colíder, em terreno de 720 m2 doado pela Prefeitura. Frasson começou a trabalhar em 1983 como aprendiz em uma borracharia no Paraná. Aprendeu também a tornear peças de metal e trabalhou solitário muitos anos, até sofrer um acidente de motocicleta que limitou seus movimentos. Hoje, aos 40 anos, divide a administração da Tornearia Frasson com sua esposa Rosivani Oliveira. Já tem sete funcionários para dar conta das encomendas da tornearia, sem abandonar o servi- ço de borracharia que já foi seu ganha-pão. Ao abrir seus horizontes com o curso Empretec do Sebrae, Frasson decidiu recorrer ao Fundeic matogrossense para construir sua sede própria. “Tirei R$ 70 mil para pagar em seis anos, uma prestação de R$ 1.340,00. Pago tão fácil que nem vejo”, explica. Quando pagava aluguel, seu faturamento era de R$ 8 mil mensais. Hoje saltou para R$ 38 mil. Faz serviços para Colíder e para as cidades vizinhas de Nova Santa Helena e Nova Canaã do Norte. “Graças a Deus serviço não falta. Por enquanto nós estamos reinvestindo o que ganhamos. Dentro de dois ou três anos vamos aproveitar o dinheiro”, planeja. Seis anos do SUPERSIMPLES 163 Capítulo 8 • • • Arrecadação de tributos exemplos de sucesso | colíder, mt Funilaria Iguatemi Três MEIs no Centro de Colíder Num endereço bem central de Colíder, funciona um cluster de microempreendedores individuais com atividades distintas em espaço compartilhado: são os irmãos Ismael e Israel de Lima Madeira, e o cunhado Robson Luiz Baks. Ismael é funileiro, Israel aplica insulfilm em vidros de automóveis e Robson dobra chapas e faz calhas, rufos e pingadeiras. Os irmãos Madeira vieram de Pérola, no Paraná, há 20 anos e arrendaram a oficina. A habilidade de Ismael lhe trouxe uma boa clientela de particulares, mas foi a agente de desenvolvimento Margarida Gaona que lhe fez ver as vantagens de registrar-se como MEI e obter o CNPJ para comprar mais barato e conquistar grandes clientes. Hoje atende os Correios, a Cerâmica Nortão e a Comercial Santos e dá nota fiscal. Como paga R$ 727 de aluguel, Ismael planeja mudar-se para um galpão próprio. Já levantou as pare- um autodidata do corel draw des e recorreu ao secretário de Indústria e Comércio, Lourenço Marani, para conseguir um empréstimo dos fundos de desenvolvimento e fazer a cobertura. No novo endereço, planeja contratar e treinar um funcionário. Depois disso, tornar-se microempresa e continuar progredindo. D’Buyos Comunicação Visual Quem passava pela rua e via Buiú pintando letreiros caprichosos nos muros não tinha a menor ideia de que seu nome de batismo é Aldenício Marçal da Silva. Com 34 anos de idade, ele só não nasceu em Colíder porque a cidade ainda não existia. Veio criança de colo de Cruzeiro do Oeste (PR), e desde os 15 anos começou a trabalhar por conta própria. O serviço de pintura a pincel foi rareando e Colíder estava entrando em decadência. Buiú mudou-se para Juara, terra de sua esposa Alcione, a 300 km. Com a chegada da tecnologia, teve que se reciclar. Autodidata por natureza, comprou um computador equipado com Corel Draw e aprendeu sozinho o complexo programa. Depois adquiriu por R$ 5 mil um plotter de recorte e começou a ganhar a vida fazendo outdoors, faixas, banners, 164 Seis anos do Supersimples painéis e adesivos. Fez uma dívida de R$ 50 mil para adquirir uma impressora digital com dois metros de saída, de cuja manutenção ele aprendeu a cuidar sozinho. “Vim passear em Colíder em 2007 e tive a surpresa de ver que estava tudo mudado e havia espaço para empreender. Decidimos voltar, primeiro pagando aluguel, depois construindo neste terreno que ganhamos da Prefeitura”, relata. A construção começou em 2010 e ocupa a parte dianteira do lote de 12 x 45 metros. Embaixo fica a empresa e em cima a casa do casal com seus dois filhos. Ainda não está pronta, mas Buiú a fez com recursos próprios e design original. Hoje deve apenas R$ 10 mil da impressora digital, emprega cinco funcionários que ele mesmo treinou, e pretende reinvestir o lucro em maquinário novo. Seis anos do SUPERSIMPLES 165 Capítulo Os novos 9 desafios O Pedro Eugênio: “A razão do êxito está na unidade política obtida em torno desta bandeira”. Cairoli: “Importante é garantir que haja apenas uma faixa de tributação, sem exceção ou anexos”. Solmucci: “Os empreendedores sonham com a previsibilidade tributária na gestão de seus negócios”. 166 Seis anos do Supersimples do Supersimples criou mais postos de trabalho, melhores salários, inclusão social e permitiu governança sobre setores antes invisíveis e refratários às políticas públicas. Mas como toda legislação de âmbito nacional, deu origem a distorções. Algumas pontuais em vários municípios, mas outras abrangentes e preocupantes, adotadas na política fazendária dos estados. Vem do Ceará a notícia de aplicação de substituição tributária sobre o comércio de caranguejos, e do Sul do Brasil a cobrança sobre os bolinhos e os sabonetes artesanais feitos pelas avós italianas. Vários municípios que não implantaram a Lei Geral aplicam uma postura urbana arcaica para dobrar o IPTU do microempreendedor individual que faz pastéis em casa para vender no ponto de ônibus. Evidentemente, esses tipos de atividade são imponderáveis do ponto de vista da arrecadação. Agir assim só gera desgaste para a imagem do Poder Público. O mecanismo da substituição tributária adotado pela maioria dos estados foi criado para combater a sonegação do ICMS e facilitar a fiscalização, mas teve o efeito perverso de corroer o tratamento diferenciado às MPEs previsto na Constituição e detalhado na Lei Geral. A substituição tributária é severamente criticada pelos representantes de classe neste capítulo, mas também perpassa as preocupações de vários outros autores ao longo deste livro. SUPERSimples SACHS: “Schumacher diz que small is beautiful, mas não posso esquecer que large is powerful”. Quick: “Substituição tributária é seletiva. Seu uso indiscriminado vai acabar por desmoralizá-la”. Pellizzaro: “Sem alternativa, empresas que eram viáveis sob o Simples terão que fechar as portas”. O Sebrae encara o problema da substituição tributária como um desafio prioritário a ser solucionado em curto prazo. Reconhece as intenções legítimas dos estados na adoção desse mecanismo, mas busca o diálogo e o consenso para corrigir as distorções e preservar os ganhos construídos pela Lei Geral. Em meio aos impasses institucionais e à perplexidade dos diversos atores, o Sebrae procura formular saídas e colocá-las em debate, até alcançar uma solução pactuada. E não só para a substituição tributária, mas para outros gargalos do crescimento das pequenas empresas, como a passagem para a faixa média, o emaranhado das obrigações acessórias que exige milhares de horas das assessorias contábeis, o vazio de políticas que desestimula a passagem para a média empresa, enquanto as grandes recebem todo tipo de incentivos. A atividade empresarial não é feita apenas de passos seguros e prudência. Ao perseguir sua visão, o empresário corre o risco de fracassar. Um país que quer estimular o empreendedorismo não pode punir a assunção de risco. Tem que punir é a desonestidade. No Brasil de hoje o fracasso de uma iniciativa, que é inerente ao negócio, é punido pelo Estado, que em algumas situações já não respeita a separação patrimonial entre a empresa e o empreendedor. As execuções fiscais não são precedidas de uma análise para apurar se houve desvio ou fraude. Não separam o mal-intencionado do empresário que cumpriu todas as suas obrigações e o negócio não deu certo. Seis anos do SUPERSIMPLES 167 Capítulo 9 • • • Os novos desafios do Supersimples ARTIGO | Pedro Eugênio Seis anos fortalecendo a democracia “ Deputado Pedro Eugênio (PT-PE) Presidente da Frente Parlamentar das MPEs O processo de construção de subsistemas nacio- Pedro Eugênio DE CASTRO TOLEDO CABRAL nasceu no Recife (PE) em 1949. É mestre em Economia pela Universidade Federal de Pernambuco e professor do Departamento de Economia da UFPE. Foi secretário de Agricultura, Planejamento e Fazenda nos governos de Miguel Arraes, e diretor de Gestão do Desenvolvimento do Banco do Nordeste. Foi deputado estadual e está em seu terceiro mandato na Câmara. 168 Seis anos do Supersimples nais de execução descentralizada e coordenada é obra ciclópica, do tamanho do Brasil. O Sistema Único de Saúde é o melhor exemplo dessa modelagem. Nosso sistema tributário sofre de um grande mal, que é o conflito entre as unidades federadas, União, estados e municípios, na gestão de uma política tributária que deveria ser nacional, unificada em suas normas e em sua execução. Temos número excessivo de impostos e regras conflitantes a se sobreporem em emaranhado que complica a vida dos contribuintes e onera a produção de bens e serviços. Contrapondo-se a esse quadro geral, o Simples Nacional tem sido exemplo eloquente do grande avanço que o País vem tendo no plano tributário. Não é correto dizer que não fizemos ainda a reforma tributária. Enquanto os projetos de uma reforma tributária global tem invariavelmente caído em impasses políticos que refletem conflitos de interesses entre os entes federados, o Simples avança como reforma tributária concreta. Testemunho e participo deste esforço desde meu primeiro mandato. Em 2002 fui vice-presidente do Núcleo Parlamentar de Estudos Tributários e Contábeis, presidido na ocasião pelo então deputado federal Germano Rigotto. À época, não conseguimos avançar em uma legislação diferenciada a favor da MPE. Mas no governo Lula, finalmente foi criado o Simples Nacional. Lei Geral é viva e pulsante Desde sua promulgação, a Lei Geral já sofreu quatro revisões. Este processo é algo inédito no Parlamento Brasileiro. Não conheço nada igual. Isso garante que a lei seja viva, pulsante, que permanentemente vai sendo aprimorada à luz dos problemas que sua execução vai revelando, e das novas necessidades que o desenvolvimento social e econômico do país vai apresentando. Ao final de 2012, apresentamos a nova proposta de revisão, assinada por todos que fazem a Frente Parlamentar Mista das MPEs no Congresso Nacional. Trata-se do PLP 237/2012, analisado em uma comissão especial criada pela Mesa Diretora da Câmara. Pretendemos remover entraves ao desenvolvimento do microempreendedor Individual (MEI), nas compras governamentais e nas exportações das MPEs. Estamos trabalhando para criar o Simples Rural e ampliar as atividades passíveis de enquadramento no Simples. Procuramos também neutralizar os efeitos perversos da substituição tributária sobre as vantagens do Simples. A razão deste êxito está na unidade política obtida em torno desta bandeira. Temos tido, desde Lula, administrações federais que têm como centro estratégico de ação o desenvolvimento includente, que entendem que a MPE é elemento central neste processo de democratização. Temos uma Frente Parlamentar onde todos os partidos têm representação atuante e onde todos os parlamentares, independentemente de serem da base do governo ou da oposição, agem em torno de iniciativas que fortaleçam a MPE, reconhecendo a necessidade de construir consensos com o governo federal e demais parceiros. Democracia mais forte E finalmente, ressalto o papel aglutinador e dinamizador das entidades civis que representam os interesses da MPE. É o caso do Sebrae, que dá suporte técnico permanente à MPE e à própria Frente. Há também a Fenacon e o Conselho Federal de Contabilistas, que colaboram com seu conhecimento técnico. Também a Comicro, que representa diretamente a MPE. Vale ressaltar, no plano governamental, parceiros fundamentais e permanentes. São eles os ministérios da Previdência, da Indústria e Comércio e da Fazenda. E por fim, o Conselho Gestor do Simples e o Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz). Este conjunto de instituições compõe o tripé sociedade-parlamento-governo que opera permanentemente todo o processo, dando-lhe forma e movimento. Então, é assim que tem sido. Tenho convicção de que este continuará a ser o processo de fortalecimento da MPE, que hoje conta com quase 7,4 milhões de empresas inscritas no Simples Nacional, sendo 2,9 milhões de MEIs. Esta força empreendedora, formada por 15,6 milhões de trabalhadores, a cada avanço torna nossa democracia mais forte, pois amplia mais e mais a capilaridade de um sistema que tenderia à concentração econômica, caso não existisse a participação ativa e consciente de todos que integram o universo da MPE. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 169 Capítulo 9 • • • Os novos desafios do Supersimples ARTIGO | José Paulo Cairoli Simples fórmula do sucesso A José Paulo Cairoli Presidente da Confederação das Associações Comerciais e Empresariais do Brasil (CACB) “ Lei Complementar 123 de 2006. Foram 7,3 milhões de adesões, equivalendo a mais que o dobro de empresas inscritas no antigo Simples. A arrecadação aumentou mais de 400%. Passou de R$ 8,3 bilhões em 2007 para R$ 46,5 bilhões em 2012 – muito superior ao crescimento do PIB, de 26% no período. A grandiosidade dos números mostra que, quanto mais simplificado e justo for o sistema tributário, menor será a sonegação. Foi exa170 Seis anos do Supersimples Substituição pede solução urgente A tecnologia e a inovação poderiam ganhar novo incremento a partir da definição da aplicação de um percentual do valor dos recursos que financiam as MPEs. Estamos também, através da Confederação das Associações Comerciais e Empresariais do Brasil (CACB), trabalhando junto ao Fórum da MPE para incluir nas estatísticas os dados segundo a Lei Geral. Hoje, alguns levantamentos usam a definição do Mercosul e outros, a definição que leva em conta o número de funcionários, como é o caso, por exemplo, do IBGE. Outro ponto que nos preocupa é a questão da substituição tributária, que retira da condição do Simples Nacional os benefícios propostos. O assunto pede uma solução de urgência. A amplitude e os benefícios do Simples, que já comprovaram sua eficácia, poderiam ir além e permitir a inclusão de novas categorias. Como as dos profissionais cujas atividades são regulamentadas por Conselhos, como é o caso de advogados, dentistas, engenheiros, administradores, e outros tantos. Com a economia estável, aumenta a quantidade de profissionais interessados em trabalhar por conta própria. Gaúcho nascido em Porto Alegre, José Paulo Dornelles Cairoli é formado em Engenharia Civil, com experiência na iniciativa privada. Foi presidente do Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul. Membro do Conselho do Sebrae e dirigente de diversas organizações, Cairoli foi presidente da Federasul e da Associação Comercial de Porto Alegre. É inegável o sucesso do Simples Nacional após a para o governo, usufruindo dos benefícios, pela falta de implementação. Requer ajustes ainda de regulamentação o dispositivo que permite a criação de empresas de propósito específico. Por meio dele, podem viabilizar-se as Centrais de Compra, as Centrais de Venda e o Marketing Coletivo, reduzindo os custos das empresas. tamente o que aconteceu com o novo Simples Nacional que, entre outros benefícios, simplificou os tributos e desburocratizou os processos de abertura e fechamento das empresas. Ainda que agregue uma série de benefícios, qualquer sistema sempre necessita ser aperfeiçoado. A universalização da Lei Geral, por exemplo, beneficiaria a parte de compras governamentais. As MPEs de muitos municípios não podem ainda vender seus produtos ou serviços Prefeituras aumentam 200% no IPTU O governo, quando faz uma concessão que implica na redução dos tributos, jamais acredita no aumento da arrecadação pela ampliação da base de empresas pagantes. É o que vimos na lei 123/2006, cuja intenção é compensar a eventual perda de arrecadação com a inserção de dispositivos que limitam os beneficiários ou aumentam os tributos em outras áreas. Importante, na nossa visão, é garantir que uma lei, como a do Simples Nacional, tenha apenas uma faixa de tributação, sem qualquer exceção ou anexos. Por último, nos chama a atenção o fato dos micro e pequenos empresários estarem vulneráveis a interpretação contraditória nos municípios onde a Lei Geral ainda não está em vigor. Temos conhecimento que a senhora que produz pastéis em sua casa e resolve aderir ao MEI, ganha como “benefício” um aumento de mais de 200% no IPTU, que passa de residencial para comercial. Isto sem falar na obrigatoriedade de seguir uma série de procedimentos na área da Vigilância Sanitária para conseguir o alvará de funcionamento. Nossa sugestão: para que uma legislação tão amistosa seja mais abrangente, sugerimos que as necessidades do setor privado, onde brotam as MPEs, possam ser supridas através de incentivos na área de educação, para que a produtividade e a competitividade garantam uma longa vida de crescimento sustentável. Ganha o Brasil, ganham os trabalhadores, os empreendedores e, finalmente, o povo brasileiro, com mais igualdade. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 171 Capítulo 9 • • • Os novos desafios do Supersimples ARTIGO | Paulo Solmucci Um desafio social “ Paulo Solmucci Presidente executivo da Abrasel É inequívoco que o advento do Simples Nacional representou um grande avanço na longa e extenuante jornada que se empreende no país em busca de uma condição fiscal mais justa para os pequenos negócios. Ao facilitar o pagamento de tributos, mediante o recolhimento em guia única, e proporcionar a redução da carga tributária das micro e pequenas empresas, o sistema firmou-se como o limiar de um novo tempo para imensas legiões de empreendedores. Todavia, ainda há grandes batalhas a serem vencidas. O caminho foi descortinado, mas o percurso até a consolidação de uma legislação unificada, no âmbito dos governos estaduais, mostra-se desafiador. É preciso que os estados adotem uma regulamentação fundamentada nas melhores bases do Simples Nacional. A Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), como principal porta-voz do setor de alimentação fora do lar, constituído em sua grande maioria por micro e pequenas empresas, vem trabalhando no sentido de demonstrar ao poder público e à sociedade que o aperfeiçoamento do Simples Nacional pode dar uma significativa contribuição para o progresso do País e o bem-estar social. 172 Seis anos do Supersimples Paulo Solmucci Júnior nasceu em Belo Horizonte no ano de 1960. É empresário do setor de Alimentação e presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes. Engenheiro mecânico com MBA em Administração pela UFRJ, é também membro do Fórum Permanente de Micro e Pequenas Empresas, do Conselho Nacional de Turismo (Mtur) e do Conselho de Competitividade do Comércio do Plano Brasil Maior, do Governo Federal. Fechou um mês para não sair do Simples Redução tributária gera riqueza O ponto de partida deve ser, sem nenhuma dúvida, a eliminação dos variados degraus de tributação estabelecidos pelas legislações estaduais e a justa correção dos valores limites de enquadramento. É necessário corrigir anomalias que levam a absurdos como o que foi registrado pela secional da Abrasel em Santa Catarina na cidade de Florianópolis, onde, há bem pouco tempo, um proprietário de restaurante tomou uma decisão drástica: a duas semanas do final de dezembro, o empresário fez as contas e concluiu ser vantajoso suspender as atividades de sua casa, a fim de reduzir o faturamento e, com isso, evitar que a empresa deixasse de ser enquadrada no Simples. Torna-se imperativa, portanto, a permanente correção dos valores limites de enquadramento, tendo como base os indicadores de inflação, além de uma equânime regulamentação da matéria nos estados e municípios. Assim, os empreendedores passariam a contar com a sonhada previsibilidade, em termos tributários, na gestão de seus negócios. Tão ou mais importante do que a fixação dos parâmetros financeiros condizentes com a realidade econômica é a necessidade de extirpar do arcabouço legal dos estados o nefasto instituto da substituição tributária. Entre os especialistas e estudiosos que se debruçam sobre os aspectos regulatórios do sistema há uma unanimidade: a substituição tributária é perversa e não pode conviver com o Simples. Sua aplicação representa um retrocesso, na medida em que os estados a utilizam como mecanismo de aumento de arrecadação, fazendo recair sobre as empresas o malefício da elevação da carga tributária. Bares, lanchonetes e restaurantes estão entre os ramos de negócio mais penalizados pela bitributação decorrente da substituição tributária, pois já pagam o ICMS embutido na alíquota única do Simples Nacional. Tal contrassenso decorre da visão de curto prazo da maioria dos gestores públicos, que, na sanha de obter mais receita para fazer frente às suas despesas em alta quase sempre descontrolada, optam pelo caminho mais fácil, o de penalizar os setores produtivos. Esses administradores desprezam toda uma argumentação fundamentada na premissa de que a redução de impostos pode, no médio prazo, proporcionar aos cofres públicos o reforço que tanto perseguem. Preferem fazer ouvidos de mercador diante da obviedade de que quanto menor a carga tributária maior é a atração de investimentos e, por conseguinte, a geração de riqueza, a ampliação da oferta de emprego, o combate à informalidade na atividade econômica, o desenvolvimento social em todos os níveis, tudo resultando em bônus, sobretudo de ordem tributária, para o Estado. Beneficiados por uma legislação tributária mais racional, setores como o de alimentação fora do lar poderão, por exemplo, promover a qualificação profissional dentro do ambiente de trabalho, contribuindo principalmente para o aumento da empregabilidade nos extremos do mercado de trabalho, ou seja, dando oportunidade de ocupação formal a jovens e idosos. A Abrasel entende que a transposição desses desafios permitirá ao Simples Nacional fixar-se como importante indutor de justiça social. O país que todos querem não pode prescindir do equilíbrio econômico, condição inarredável para a distribuição de renda e conquista do progresso. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 173 Capítulo 9 • • • Os novos desafios do Supersimples ENTREVISTA | Ignacy Sachs dESENVOLVIMENTO SUSTENTABILIDADE E ignacy sachs Diretor honorário do Centre de Récherches sur le Brésil Contemporain – Paris O professor Ignacy Sachs nasceu em 1927, na Polônia. Sua família emigrou para o Brasil fugindo do nazismo. Aqui Sachs estudou, trabalhou e se casou. Regressou a Varsóvia para contribuir na construção da experiência do socialismo real, e foi enviado à Índia em 1957, e ali passou três anos. De volta à Polônia, trabalhou com um dos maiores intelectuais poloneses, Michal Kalecki, cuja obra inspirou as teorias de John Maynard Keynes. Sachs mudou-se para a França em 1968 para fugir ao antissemitismo que varreu os países sob a influência soviética após a Guerra dos Seis Dias. Em Paris teve liberdade para compor sua teoria do ecodesenvolvimento, que atualmente foi rebatizada como desenvolvimento sustentável. Professor honorário da École des Hautes Études Sociales, onde fundou sucessivamente o Centro Internacional de Pesquisas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (CIRED) e o Centro de Pesquisas sobre o Brasil Contemporâneo. Participou da Estocolmo 72, da Rio-92 e da Rio+20. Seu trabalho inspirou a criação dos Sebrae – Há poucos anos, no Brasil ainda predominava uma mentalidade colonial de privilegiar grandes empreendimentos e sufocar pequenas iniciativas. Ainda hoje os prefeitos de cidades médias sonham com uma grande indústria em seu município como o eldorado capaz de solucionar os problemas de geração de emprego e de arrecadação de impostos. O que o senhor poderia aconselhar a esses prefeitos? Sachs – O desenvolvimento não se fará unicamente pelo apoio às micro e pequenas empresas, por importante que seja este tema. É normal que prefeitos de cidades médias sonhem com a implantação de uma grande indústria, a qual por si só tampouco vai resolver os problemas múltiplos e complexos de desenvolvimento local. O desenvolvimento é um conceito pluridimensional e a melhor maneira de contribuir à sua organização passa pela instituição do planejamento. Precisamos de empresas grandes, médias e pequenas, privadas e públicas, algumas delas estrangeiras. Tampouco podemos prescindir de uma agricultura familiar e, no caso do Brasil, de uma reforma agrária ainda por fazer, com feições diferentes região por região. O meu conselho para os prefeitos: organizem um grande debate popular para elaborar coletivamente um plano de desenvolvimento local e insistir junto às autoridades estaduais e nacionais para que ponham em marcha políticas públicas suscetíveis de ajudar na implementação do plano. Territórios da Cidadania. Sebrae – Os estímulos da Lei Geral contribuíram para fortalecer o mercado interno, permitindo ao Brasil sair mais rápido da crise econômica mundial deflagrada em 2009. O senhor encaixaria essas iniciativas de maneira positiva dentro do seu ideário de desenvolvimento inclusivo? Acredita que essa possa ser a porta de saída para o Bolsa-Família e demais subsídios criados no Governo Lula? 174 Seis anos do Supersimples Sachs – Numa economia mista público-privada em desenvolvimento como a do Brasil, justifica-se o tratamento diferenciado das micro e pequenas empresas, já que elas teriam muita dificuldade de sobreviver na ausência de políticas públicas de apoio a elas expressamente voltadas. Não vejo, no entanto, por que renunciar ao Bolsa-Família, que a meu ver constitui uma política social que veio para ficar. Sebrae – Os Estados Unidos têm exemplos de apoio à criatividade e ao avanço tecnológico a partir de pequenos empreendimentos. A Nasa compra 30% de seus insumos de pequenos fornecedores. A Itália deslanchou nos anos 60 com uma política voltada para a pequena produção. O senhor poderia nos dar outros bons exemplos internacionais de apoio aos pequenos negócios e de respeito à cidadania? Sachs – Há exemplos de políticas bem-sucedidas de apoio às micro e pequenas empresas em vários países e outros de discriminação dessas empresas em benefício “Há muito espaço para envolver as micro e pequenas empresas na política energética”. dos grandes players privados. Podemos aprender muito com a observação e avaliação crítica das experiências alheias. A academia tem aí uma tarefa importante a desempenhar. Mas já sabemos o suficiente para não protelarmos reformas e políticas urgentes. Sebrae – A legislação de proteção e estímulo às micro e pequenas empresas tem dado bons resultados na criação de oportunidades, no incremento à renda das famílias e no fortalecimento do mercado interno. Mas é preciso admitir que não é voltada especificamente para criar ou aumentar as obrigações ambientais. Para chegar aos ideais que o senhor defende, qual seria o melhor caminho para o Brasil? Legislar com rigor ou trabalhar com educação? Sachs – A introdução das políticas ambientais no conjunto das políticas de desenvolvimento constitui uma tarefa indispensável que requer um esforço conjugado tanto na legislação quanto na educação do público. Esta última deve começar bem cedo. Se dependesse de mim, os alunos das escolas, inclusive as primárias, deveriam ser sistematicamente associados à implementação de políticas ambientais de nível local. Sebrae – Há algum tempo o senhor disse que a utilização de biomassa como fonte de energia e o uso de energias renováveis é saudável para o planeta, mas que isso não resultaria necessariamente num mundo socialmente mais justo, a depender de quem se apropriaria desses recursos e de quem se beneficiaria do seu aproveitamento. Seis anos do SUPERSIMPLES 175 Capítulo 9 • • • Os novos desafios do Supersimples ARTIGO | Bruno Quick ENTREVISTA | Ignacy Sachs “Schumacher diz que small is beautiful, mas não posso esquecer que large is powerful.” Sachs – Acho difícil reservar a utilização energética da biomassa exclusivamente às micro e pequenas empresas. Dito isto, há muito espaço para envolver as micro e pequenas empresas na política energética, inclusive no aproveitamento das energias renováveis. Sebrae – A Lei Geral das Micro e Pequenas Empresas já recebeu quatro modificações a partir de novas leis complementares, seja incluindo categorias ou ampliando os limites de faturamento para os benefícios. Há espaço para incluir privilégios para uma economia verde. Nesse sentido, o que o senhor poderia sugerir ao legislador brasileiro? Sachs – O conceito de economia verde me parece genérico demais. Concordo com a ideia de que temos chão pela frente na formulação de propostas concretas de melhor aproveitamento do conjunto das energias renováveis, sobretudo no Brasil. Lembro que o principal objetivo de estratégias de desenvolvimento deve ser a geração de oportunidades de emprego e melhor distribuição de renda. O aproveitamento das energias renováveis enseja muitas oportunidades neste respeito. Sebrae – É tentador comparar suas propostas de desenvolvimento sustentável e ecologicamente prudente com as ideias de Schumacher, expostas no best-seller “Small is Beautiful”. A filosofia de Schumacher é a de promover o máximo de bem-estar com o mínimo de consumo. O senhor pede prudência no uso de recursos não-renováveis e vultosos investimentos no desenvolvimento de tecnologias alternativas para a proteção do planeta. Como convencer a nova classe média brasileira surgida nos últimos dez anos a reduzir suas aspirações de consumo? 176 Seis anos do Supersimples Sachs – Reconheço a contribuição de Schumacher quando diz que small is beautiful, mas não posso esquecer que large is powerful. Não podemos nos omitir de tratar o desenvolvimento em toda a sua complexidade. Todos nós e não só Schumacher devemos nos esforçar em promover o máximo de bem-estar com o mínimo de consumo. Em outras palavras, eliminar na medida do possível o desperdício de recursos materiais. Fácil de dizer, mas difícil de aplicar no cotidiano ao redor de cada um de nós. Em sociedades tão desiguais como a brasileira, não podemos nos omitir de colocar no centro do debate sobre o desenvolvimento a questão de uma distribuição menos desigual da renda. Esperemos que a classe média brasileira entenda os perigos associados a uma distribuição fortemente assimétrica da renda e aceite, portanto, um sistema tributário capaz de reduzir essas desigualdades. Ao mesmo tempo, precisamos diminuir os impactos ambientais que põem em perigo a integridade do patrimônio natural do qual a humanidade depende em última instância. “O principal objetivo das estratégias de desenvolvimento deve ser a geração de oportunidades de emprego e melhor distribuição de renda”. O desafio é avançar e inovar para desenvolver “ Bruno Quick Gerente de Políticas Públicas do Sebrae Nacional O sucesso do Supersimples como política já se BRUNO QUICK LOURENÇO DE LIMA nasceu em Belo Horizonte no ano de 1960. Formou-se em Engenharia Civil pela Escola Kennedy. Tem especialização em Políticas Públicas pela Unicamp. Atuou no setor de indústria e comércio de vestuário e tecnologia da informação. Foi dirigente da CDL BH e da ACMinas, e diretor do Sebrae MG. apresentou nos números crescentes de empresas formalizadas, receita declarada, empregos gerados, massa salarial paga e tributos arrecadados, comprovando a tese de que se trata de uma medida onde todos os envolvidos ganham, em especial a sociedade brasileira. Vale destacar que quem não pode optar ainda luta por fazê-lo, pleiteando alterações junto ao Congresso Nacional e esforçando-se para quitar suas dívidas com a Receita ou a Previdência para se beneficiar do tratamento especial. Por outro lado, o maior sucesso do Supersimples está no crescimento das empresas e suas repercussões sobre a economia e a sociedade. Este universo de milhões de micro e pequenas empresas não deve ter seu crescimento estancado pela falta de políticas para a média empresa. Lançando o olhar para o futuro, é preciso conceber um sistema fora do Supersimples para acolher as empresas que progridem e não frear o seu crescimento. As empresas intensivas em mão de obra, como restaurantes, manufaturas, alguns tipos de comércio, escolas, ainda sentem muito a saída do Supersimples. Nossa recomendação é construir uma política baseada nesses princípios, um regime de tributação integrado e simplificado que continue a trajetória do Supersimples, em especial na desoneração da produção e empregos. Seis anos do SUPERSIMPLES 177 Capítulo 9 • • • Os novos desafios do Supersimples ARTIGO | Bruno Quick “As empresas intensivas em mão de obra, como restaurantes, manufaturas, alguns tipos de comércio, escolas, ainda sentem muito a saída do Supersimples.” É justo, como princípio, que na medida em que as empresas cresçam, assumam gradativamente a carga tributária padrão, respeitada a capacidade contributiva das mesmas. Daí as tabelas de alíquotas progressivas do Supersimples. Só que os degraus, por menores que sejam, causam uma percepção de perda de benefícios. A melhor forma de solucionar esse problema é adotar a progressão plena, que é o mesmo sistema do Imposto de Renda Pessoa Física. Nesta linha, a média empresa poderia, inclusive, continuar usufruindo dos benefícios do Supersimples sobre os primeiros 3,6 milhões. O impacto tributário disso seria pouco relevante. Na medida em que a empresa vai crescendo, o benefício vai se tornando residual. A tecnologia da informação permite que o sistema calcule isso com facilidade. O empresário nunca vai perder o benefício original. Com isso, ele é incentivado a crescer. Por outro lado, tornar-se médio empresário implica cumprir também uma gama de obrigações acessórias. A controversa pesquisa Doing Business calcula em 2.600 horas por ano o tempo que a empresa brasileira gasta para cumprir obrigações tributárias e é válida como indicativo. Ainda que esse cálculo possa estar superestimado, no Brasil é muito caro cumprir obrigações acessórias do ponto de vista do pagamento de tributos e prestação de informações. Isso apesar das novas tecnologias da informação, porque no Brasil as novas tecnologias oferecem facilidades, mas a multiplicidade dos controles permanece. Hoje há empresas que pagam duas contabilidades: a da folha de pagamentos e dos lançamentos normais, outra para o atendimento ao Sistema de Escrituração Eletrônica (Sped), que não é um sistema convergente. 178 Seis anos do Supersimples MPE sobretaxada em R$ 4 bilhões Apesar dos excelentes números de geração de empregos e arrecadação propiciados pelo Supersimples, a prática indiscriminada da substituição tributária pelos Estados pode inviabilizá-lo. Segundo estudo da Fundação Getúlio Vargas encomendado pelo Sebrae, no ano de 2011, as MPEs pagaram aos fiscos estaduais R$ 4 bilhões de ICMS acima do que deveriam recolher pelas alíquotas do Supersimples. Ou seja, drenaram-se esses bilhões de um setor fundamental para manter a dinâmica econômica do mercado interno e sustentar a geração de postos de trabalho. Com certeza essa não é uma ação intencional dos estados. Não existe um interlocutor sequer da área fazendária que admita a intenção de prejudicar os pequenos negócios. O que há é uma grande compressão fiscal dos estados, em função do endividamento e do custo dos serviços públicos, mas a solução não pode ser empurrar a conta para o menor. A substituição tributária foi concebida segundo alguns princípios. O primeiro deles é a seletividade, que funcionou bem no início, cobrando o imposto na indústria para itens como cigarros, bebidas e combustíveis, que têm relevância na arrecadação e grupos econômicos capazes de arcar com a antecipação. Quando começou a ser utilizada indiscriminadamente, ela deixou de ser seletiva e começou a se desmoralizar, tornando mais injusto e regressivo o “sistema” tributário brasileiro. Soluções para isso são urgentes e já começam a ser discutidas por grupos técnicos dentro do Confaz. Com uma boa articulação no Congresso Nacional através da Frente Parlamentar das MPEs, a pressão das lideranças empresariais nos Estados, um bom diálogo com os governadores e a atuação do Governo Federal, na posição de mediador e presidente do Colegiado do Confaz, teremos que encontrar um caminho para retornar à seletividade e preservar o tratamento diferenciado para as MPEs. “Por que não utilizar os equipamentos de cartão de débito para cobrar o imposto do pequeno varejo, em vez de aplicar substituição tributária?” Mecanismos inovadores e eficazes precisam ser usados, como, por exemplo, a sugestão feita pela Secretaria de Fazenda do DF, há algum tempo, de cobrança do tributo já no cartão de crédito ou débito. Isso não teria custo de arrecadação nenhum, não demandaria novas máquinas, sistemas e softwares e pouparia custos para os pequenos negócios, trazendo assim eficácia na arrecadação. Cada vez mais a população usa meios eletrônicos de pagamento. Por que não pensar nisso para o pequeno varejo, ao invés de distorcer o mecanismo da substituição e prejudicar os pequenos contribuintes? Ou seja, além dos desafios da educação e infraestrutura para construirmos um Brasil próspero e de oportunidades para sua população é preciso avançar no apoio aos pequenos negócios, e o Estado, assim como as empresas, precisa inovar para encontrar soluções criativas e eficazes que conciliem a necessidade de arrecadar com a atribuição de fomentar a economia e promover a justiça, inclusive a tributária. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 179 Capítulo 9 • • • Os novos desafios do Supersimples ARTIGO | Roque Pellizzaro Junior O Varejo eo Simples Nacional “ Roque Pellizzaro JuniOR Presidente da Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) Recentemente, a Confederação Nacional de Diri- gentes Lojistas (CNDL) realizou uma pesquisa, em parceria com a Universidade Federal de Minas Gerais, na qual buscava identificar o perfil da atividade varejista em nosso país. Um de seus principais focos foi conhecer o percentual de micro e pequenas empresas que compõem este segmento. O resultado, pelas mais diversas óticas possíveis (enquadramento no Simples Nacional, número de funcionários ou ainda número de filiais), apontou que mais de 80% deste segmento é composto por MPEs. Associado a esta constatação, vemos no setor varejista o responsável pelo maior número de empregos diretos no Brasil e o maior fixador de renda nas comunidades onde está situado. Esses motivos, dentre outros, devem levar nossos governantes a trabalhar pela manutenção e ampliação deste modelo, ou seja, varejo operado por MPEs. Uma forma de tributação justa e simples, capaz de manter a competitividade das MPEs no varejo nacional, é condição básica de sustentabilidade do modelo hoje existente e que, há seis anos, vem acontecendo através do Simples Nacional. 180 Seis anos do Supersimples Roque Pellizzaro Junior nasceu em 1965 em Curitibanos (SC). Graduado em Economia pela Universidade Federal do Paraná e em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR), ocupou vários cargos nas entidades de dirigentes lojistas e foi conselheiro do Sebrae SC. Está em seu segundo período como presidente da CNDL. Estados estão rasgando a Lei Geral Quando criado, o Simples Nacional veio como a salvação de centenas de milhares de MPEs varejistas e ainda como um alento ao crescente processo de concentração neste setor, aos moldes do que ocorrera em outros países com características similares às nossas; tudo gerado pelo aumento de competitividade por parte dos pequenos, com consequente crescimento no número de empresas, no número de empregos gerados e na arrecadação de impostos. Contudo, decorridos seis anos da histórica data da sanção da Lei Geral que instituiu o Simples Nacional, a realidade tributária oriunda dos Estados, responsáveis pelo tributo de maior impacto no setor varejista, o ICMS, mudou muito, ao ponto de rasgar praticamente todos os benefícios gerados por esta legislação que dava vida ao setor. A substituição tributária, forma de recolhimento antecipado e na origem do ICMS, que já existia para alguns segmentos, está sendo levada de forma indiscriminada para tantos outros, como o do comércio varejista. Isso atinge pesadamente empresas que eram viáveis sob o regime tributário do Simples Nacional, e não lhes dá outra alternativa senão a de fechar suas portas. Respondendo aos apelos de entidades de classe como as câmaras de dirigentes lojistas, alguns Estados adotaram medidas pontuais e paliativas, como é o caso de Santa Catariana, que aplica uma fórmula de redução do MVA de 70% para empresas optantes pelo Simples Nacional. No entanto, medidas pontuais não são suficientes. Empresas varejistas condenadas à morte É preciso que o Congresso Nacional e o Poder Executivo se posicionem, fazendo com que, através de alterações na Lei Geral da Micro e Pequena Empresa, se retome a competitividade dos pequenos negócios e, com isso, possamos manter e até ampliar os atuais níveis de emprego e renda gerados pelo comércio varejista bra- sileiro. É preciso reconhecer que o comércio varejista é responsável pela manutenção da demanda interna, esta que vem sendo a locomotiva a puxar o crescimento do Brasil. A cada dia que demoramos em promover estas adequações à Lei Geral, a cada dia em que os efeitos positivos e benéficos gerados há seis anos são reduzidos, centenas de micro e pequenas empresas varejistas são condenadas a morte pela incapacidade de competir com o grande negócio, aumentando a concentração do mercado. É isto que queremos para o Brasil? Não é o que eu quero e tenho a certeza de que também não é o desejo de entidades como o Sebrae ou dos parlamentares que compõem a Frente Parlamentar da Micro e Pequena Empresa. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 181 Capítulo 9 • • • Os novos desafios do Supersimples EXEMPLOS DE SUCESSO Isabelle Todt Flashes e cores de cinema Além dos pincéis e do talento, Isabelle Cordeiro Todt, 34 anos, nascida em Curitiba (PR), tem estrela. Sua inscrição como empreendedora individual é nº 1.000.000, com toda a magia e o simbolismo do número. A meta do primeiro milhão foi comemorada em abril de 2011 pelo Governo Federal e Isabelle foi à Brasília para receber das mãos da presidenta Dilma Rousseff um certificado comemorativo. Formada em Belas Artes, Isabelle Todt deixou de lado telas, cavaletes e palheta e tornou-se referência no mercado publicitário. Ela trabalha com maquiagem para comerciais filmados em película e para o cinema. Pela natureza do trabalho, não mantém um salão. Desloca-se para atender os modelos nos camarins e no próprio set de filmagem. Foi em uma sessão de maquiagem que viu a necessidade de se formalizar. O cliente exigia nota fiscal para o pagamento do serviço. 182 Seis anos do Supersimples Edson Pereira Pancrepe e sacolé de biscoito Edson Pereira é um homem religioso e determinado. Nas horas de folga do seu trabalho de jardineiro, construiu com suas próprias mãos um prédio de 70 m2, no bairro Jardim Peró, em Cabo Frio (RJ). Instalou ali seu sonho dos últimos cinco anos: a lanchonete Gabinete Lanches e Petiscos. Ao registrá-la no Portal do Empreendedor, teve a surpresa de ver o número redondo: tornava-se o microempreendedor individual nº 2 milhões. Com a mulher Marta Nunes de Sousa Pereira, ele inventou o pancrepe, um salgado com massa de panqueca e formato de crepe. Para a criançada, criou o sacolé de biscoito. Sua criatividade não para aí. Aproveitando a promoção de uma empresa de telefonia celular, manda mensagens de texto promocionais a 120 clientes cadastrados, e já usa o Facebook para apoiar a realização de eventos em datas especiais, como os rodízios de lasanha e o Festival de Música Gospel. Assim o Gabinete sobrevive na baixa temporada, de abril a novembro. No verão, ele espera faturar R$ 5 mil por mês. Seis anos do SUPERSIMPLES 183 Capítulo 9 • • • Os novos desafios do Supersimples ‘pequenas empresas & grandes negócios’ Milhares de reportagens em todo o Brasil Neusa Rocha Diretora do programa “Pequenas Empresas & Grandes Negócios” A mineira Adriana só tinha R$ 3 no bolso... Era o começo de 2010 e ela precisava trabalhar. Comprou seis cabeças de alho e foi buscar, de graça, ervas na Secretaria de Agricultura de Betim, em Minas Gerais. Juntou tudo e começou a fazer temperos. Da mãe, conseguiu R$ 5 emprestados e comprou potes para distribuir o produto. Adriana Cristina dos Santos, com as três moedinhas e muita força de vontade, começou a descobrir os segredos do alecrim, da salsinha, do manjericão e do alho... E aos poucos a cuidadosa mistura se tornou um bom negócio. Ela não demorou a sair do fundo do quintal e se legalizar como microempreendedora individual. Hoje, Adriana distribui cinco tipos de temperos para mais de 90 sacolões e 50 restaurantes de Betim, Contagem e Belo Horizonte. A formalização trouxe segurança para Adriana, que agora tem direitos previdenciários, facilidade para conseguir crédito, vende com nota fiscal, recolhe impostos, além de favorecer a criação de empregos e a geração de renda. Histórias como a de Adriana são apresentadas pela Rede Globo todo domingo, pela manhã, no programa “Pequenas Empresas e Grandes Negócios”. O programa apresenta os desafios de quem monta uma pequena empresa, as oportunidades e as dicas para o sucesso de um negócio. Em suas edições, a grande preocupação é a prestação de serviços ao empresariado de pequeno porte. Consultores de todas as áreas da economia participam do programa, com orientações e esclarecimentos. Marcelo Baccarini, repórter do PEGN há 20 anos, faz reportagem numa empresa de Guarulhos que fabrica embalagens para presentes. >>> Esther Jablonski apresenta o programa há 23 anos 184 Seis anos do Supersimples Seis anos do SUPERSIMPLES 185 Capítulo 9 • • • Os novos desafios do Supersimples ‘pequenas empresas & grandes negócios’ >>> Cobertura nacional No ar há 25 anos A cobertura jornalística do “Pequenas Empresas e Grandes Negócios” acompanha o desenvolvimento do empreendedorismo no Brasil há 25 anos. O programa estreou em 7 de fevereiro de 1988, a partir de um projeto elaborado pelos jornalistas Thereza Walcacer e Geneton Morais Neto, e era produzido no Rio de Janeiro, com o objetivo de atender às necessidades do mercado. Uma pesquisa realizada na época, em São Paulo e no Rio de Janeiro, revelou que 60% dos entrevistados tinham o sonho de ter um negócio próprio. O programa ficou algum tempo fora do ar e retornou em 1990, com apresentação de Esther Jablonski, que continua diante da câmera até hoje. Desde 15 de março de 1992, a produção do “Pequenas Empresas” passou a ser feita em São Paulo. O “Pequenas Empresas e Grandes Negócios”, em mais de mil edições, sempre acompanhou as grandes mudanças na economia do país. Uma das mais marcantes foi o advento da Lei Geral das Micro e Pequenas Empresas e seu capítulo tributário, o Simples Nacional, que completa seis anos. A produção de reportagens para o programa passou a ter uma parceria com o Sebrae. A lei aumentou o número de contribuintes, a arrecadação de impostos e beneficiou milhares de negócios. As medidas em vigor desde 2007 diminuíram a informalidade, simplificaram as obrigações, reduziram a carga tributária e facilitaram o acesso ao crédito. As reportagens preparadas pelo programa, em todas as regiões do Brasil, em cada um dos estados do país, mostram exemplos de brasileiros idealistas que venceram desafios em suas micro, pequenas e médias empresas. Os entrevistados do programa são empresários vitoriosos, criativos, inovadores, persistentes e organizados. A cada domingo, o “Pequenas Empresas e Grandes Negócios” mostra ideias e exemplos de negócios que refletem a força e a vocação empreendedora dos brasileiros. Neusa Rocha dirige as gravações no estúdio. Os câmeras trabalham no estúdio e saem para fazer reportagens. A coordenadora de produção Adriana Morais troca ideias com os câmeras e os editores. 186 Seis anos do Supersimples Seis anos do SUPERSIMPLES 187 Para 188 Seis anos do Supersimples além do S upersimples Seis anos do SUPERSIMPLES 189 Capítulo 10 COMPRAS Go vernamentais U Vargas: “As compras diretas de agricultores familiares com dispensa de licitação se expandirão muito”. Belchior: “Compras governamentais em segmentos estratégicos fortalecem o mercado interno brasileiro”. 190 Seis anos do Supersimples m dos capítulos da Lei Geral das MPEs que melhor se desenvolveram nos últimos anos foi o que estabelece o acesso das micro e pequenas empresas às compras governamentais. Apesar da evidente vantagem para as prefeituras de comprar localmente de pequenos fornecedores, fazendo o dinheiro girar na comunidade, muitas resistências precisaram ser vencidas. As licitações das municipalidades obedeciam ao figurino restritivo da Lei 8.666, de 1993, que estabelecia a compra pelo menor preço. Ponto. A Lei Geral veio estabelecer o melhor preço, criando novos paradigmas para políticas de desenvolvimento local, sustentabilidade e compras “verdes”. Mesmo assim, os administradores relutavam em adotar tais princípios, por receio de ter suas contas reprovadas nos órgãos de controle. Do ponto de vista da administração federal, a adoção do poder de compra do Governo para induzir desenvolvimento local foi imediata, mas a disseminação desse benefício pelo território nacional foi problemática, demandando a busca de novas estratégias de persuasão e parcerias com autoridades de controle externo. O Sebrae abriu recentemente uma parceria com os tribunais de Contas, com o objetivo de criar, entre os conselheiros e auditores das cortes de contas do País, um vínculo com os princípios da Lei Geral. Não por acaso, um dos maiores entusiastas dos princípios da Lei Joaquim: “Quando fiscalizamos se os órgãos públicos observam a Lei, estamos estimulando o controle social”. Costandrade: “Nos últimos anos ocorreu uma revolução silenciosa no sistema de Controle Externo brasileiro”. Geral – e um de seus autores – é o ex-deputado gaúcho Augusto Nardes, hoje ministro presidente do Tribunal de Contas da União. Neste capítulo, o ministro do Desenvolvimento Agrário, Pepe Vargas, aborda a política de compras do Governo Federal para o abastecimento dos programas de Merenda Escolar e do Programa de Aquisição de Alimentos, que socorrem não apenas o agricultor familiar como a população de baixa renda. Para ele, o Supersimples pode se transformar em incentivo à criação e formalização de agroindústrias, favorecendo a agregação de valor aos produtos primários e a elevação da renda deste segmento. Em 2012, o orçamento da União alocou cerca de R$ 2,4 bilhões para o PAA e para o PNAE, que permitem compras de gêneros alimentícios diretamente de agricultores familiares em processos com dispensa de licitação. A previsão é de que esse potencial de compras se expanda nos próximos anos. O foco do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão é contribuir para a redução das desigualdades sociais e para o alcance de condições favoráveis ao desenvolvimento local sustentável, segundo a ministra Miriam Belchior. Entre os indutores dessa transformação, que são plurais, ela destaca o Supersimples, mas sem esquecer outras políticas de disseminação da cultura de inovação e de empreendedorismo, da capacitação emSeis anos do SUPERSIMPLES 191 10 • • • Compras governamentais Capítulo Foresti: “É sabido que os pequenos empresários são o sustentáculo das economias do mundo”. Helvecio: “O exercício do federalismo trino é típico da nossa organização governamental”. Koch: “Empresários acreditam que é difícil vender para o governo e que o pagamento é demorado e incerto”. 192 Seis anos do Supersimples presarial e do uso do poder de compra governamental para promover desenvolvimento. A autoridade dos conselheiros dos tribunais de Contas dará segurança às prefeituras para aplicar essa política, e também induzirá a regulamentação da LG nos municípios que ainda não a adotaram. A chancela essencial para essa parceria com os tribunais de Contas veio do presidente da Atricon, conselheiro Antônio Joaquim, do Mato Grosso, que nos traz sua visão de controle social sobre a administração pública. Severiano Costandrade, que preside o Tribunal de Contas de Tocantins e o Instituto Rui Barbosa, revela como se processou o intercâmbio entre tribunais de Contas e o investimento em tecnologia e novas ferramentas de controle. Ele se refere à parceria com o Sebrae como algo que se presumia improvável e ineficaz, mas que se mostrou profícua, e trouxe como resultado a disseminação dos princípios da Lei Geral. Isso se deu especialmente do capítulo de Compras Governamentais, mediante o treinamento de técnicos e auditores e também de servidores municipais quanto à aplicação dos novos paradigmas. A secretária de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento, Loreni Foresti, informa que a modalidade de licitação com cota reservada, ou seja, a exclusividade de fornecimento pelas MPEs nas compras públicas até R$ 80 mil, gerou negócios da ordem de R$ 3,7 bilhões, segundo os dados do Comprasnet. A participação das micro e pequenas empresas variou de 19% para 44% nos seis anos de vigência do Supersimples. Ela só vê vantagens no estímulo aos pequenos negócios nas compras governamentais. Seu desenvolvimento impede a migração de mão de obra especializada para os grandes centros, ao mesmo tem- po que fomenta o desenvolvimento regional e traz uma base sólida para a economia brasileira. Para ela, o empoderamento das MPEs é uma política de Estado, e prova disso é a criação da Secretaria da Micro e Pequena Empresa confiada pela presidenta Dilma Rousseff ao vice-governador de São Paulo, Afif Domingos. Sebastião Helvecio, um médico que também é bacharel em Direito e vice-presidente do Tribunal de Contas de Minas Gerais, faz um apanhado dos mandamentos constitucionais que protegem os pequenos empreendimentos, e lembra que, como o Brasil é uma república federativa, são necessárias legislações nas esferas municipal, estadual e da União para completar o arcabouço legal de determinado assunto. O próximo passo para a evolução das compras governamentais é fazer valer a subcontratação. O tributarista Hélio Saul Mileski, ex-conselheiro do Tribunal de Contas do Rio Grande do Sul, vê como altamente promissor o dispositivo previsto na Lei Geral para a destinação de até 25% dos recursos dos grandes contratos em subcontratação de MPEs, outro estímulo para a economia local e para os talentos individuais. Vitor Koch, presidente do Sebrae RS, relata o sucesso do Programa Fornecer, lançado pelo governador Tarso Genro no Rio Grande do Sul, para comprar alimentos de micro e pequenos fornecedores para os presídios do Estado, fazendo grande economia para o Erário e promovendo o desenvolvimento local. A iniciativa do governador gaúcho é a maior iniciativa em âmbito estadual dentro dos princípios da Lei Geral. O Sebrae é parceiro do Governo nesse sistema que já comprou mais de R$ 66 milhões, beneficiou 80 municípios e permitiu uma economia para os cofres públicos da ordem de R$ 26 milhões. Seis anos do SUPERSIMPLES 193 Capítulo 10 • • • Compras governamentais ARTIGO | Pepe Vargas Simples Assim Tal prioridade decorre de consenso sobre a importância dos pequenos negócios na vida nacional. Hoje, são cerca de quatro milhões de micro e pequenas empresas aderentes ao Simples e 2,6 milhões de MEIs. E tendem a crescer, uma vez que a atual dinâmica da economia brasileira favorece o empreendedorismo, principalmente aquele mais viável, no qual a abertura do negócio não é ação defensiva frente à ausência de trabalho, mas oportunidade precedida de avaliação mais criteriosa do mercado. A redução da carga tributária e a desburocratização do sistema foram importantes para atingir o patamar atual. Da mesma forma o acesso facilitado e diferenciado às compras governamentais. Tal regra permitiu participação seis vezes maior das micro e pequenas empresas nas compras do governo federal nos primeiros quatro anos da vigência da Lei Complementar 123/2006. “ Pepe Vargas Ministro do Desenvolvimento Agrário A Lei Complementar 123, que criou o novo Sim- ples, trouxe benefícios extraordinários para o desenvolvimento econômico e social do país. Trata-se da mais ampla e profunda reforma tributária da nossa história recente. Ela simplificou e modernizou o sistema tributário nacional em favor de 77% das pessoas jurídicas cadastradas na Receita Federal do Brasil. É a reforma tributária que deu certo, com o mérito de contribuir para superar velhas desconfianças dos entes federados em relação à União, criando um ambiente favorável para outras soluções tributárias inovadoras. A construção do Simples tem sido um rico processo envolvendo os três níveis de governo, o Congresso Nacional e as entidades de apoio e representação das micro e pequenas empresas. Trata-se de processo em constante aperfeiçoamento, cuja prioridade legislativa fica patente ao constatarmos que, entre 2006 e 2011, foram aprovados cinco projetos de lei complementar tratando da matéria. Tal priorização nos dá a convicção de que novos aperfeiçoamentos surgirão a partir do amadurecimento sobre soluções para temas como o da substituição tributária ou da inclusão de segmentos ainda excluídos do Simples, notadamente no setor de serviços. 194 Seis anos do Supersimples R$ 2,4 bilhões da agricultura familiar Gilberto José Spier Vargas, mais conhecido como Pepe Vargas, nasceu em Nova Petrópolis (RS), em 1958. Médico homeopata, foi vereador, deputado estadual e prefeito de Caxias do Sul por dois mandatos. Como deputado federal, foi presidente da Comissão de Finanças e Tributação e da Frente Parlamentar da Micro e Pequena Empresa. No caso dos agricultores familiares (pequenos proprietários que produzem em imóveis rurais com área até quatro módulos fiscais), o Simples pode se transformar em incentivo à criação e formalização de agroindústrias, favorecendo a agregação de valor aos produtos primários e a elevação da renda deste segmento, que representa 84% dos estabelecimentos rurais e responde por 74% da mão de obra ocupada no nosso meio rural, segundo o último Censo Agropecuário. A formalização é condição para o acesso aos mercados privados e aos programas de compras públicas da agricultura familiar, a exemplo do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) e do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). Para tanto, serão necessários ajustes na legislação, com regras que estabeleçam as situações em que a adesão ao Simples não implique a perda da condição de segurado especial do Regime Geral de Previdência Social a que têm direito os agricultores familiares. Em 2012, o orçamento da União alocou cerca de R$ 2,4 bilhões para o PAA e para o PNAE, que permitem compras de gêneros alimentícios diretamente de agricultores familiares em processos com dispensa de licitação. Este potencial de compras se expandirá muito nos próximos anos, uma vez que recém regulamentamos nova modalidade dentro do PAA, que permitirá a todos os órgãos públicos, da administração direta ou indireta, federal, estadual ou municipal, adquirir alimentos para todas as suas necessidades dentro das regras deste programa. Isto significa que restaurantes universitários, zoológicos, quartéis policiais e das Forças Armadas, hospitais, presídios, entre outros, poderão comprar alimentos nesta modalidade. Priorizar os pequenos negócios, urbanos ou rurais, não é favor, mas preceito previsto na Constituição Federal, só alcançável mediante o exercício do papel regulador do Estado na economia, para diminuir as assimetrias do mercado em favor dos grandes. É isto que a Lei Complementar 123 inaugurou com eficiência e com ganhos para o conjunto da sociedade. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 195 Capítulo 10 • • • Compras governamentais ARTIGO | Miriam Belchior Convergências entre o SIMPLES Nacional e a Política de Contratações Públicas “ Miriam Belchior Ministra do Planejamento, Orçamento e Gestão Ao longo dos seis anos de existência do Simples Nacional temos assistido ao crescimento vigoroso e sustentado da participação das Micro e Pequenas Empresas (MPEs) na economia brasileira, fenômeno essencial para que o Brasil tenha alcançado a sétima posição entre as maiores economias do mundo. Pela natureza da atuação deste segmento empresarial, esse crescimento traz efeitos benéficos ao País também em termos de contribuição para a necessária redução das desigualdades sociais e para o alcance de condições favoráveis ao desenvolvimento local sustentável. Importante destacar que os indutores desta transformação são plurais: em articulação com a constituição de um ambiente tributário mais favorável ao fortalecimento da atividade das MPEs – sintetizada pelo Simples Nacional – estão em curso políticas de disseminação da cultura de inovação e de empreendedorismo, da capacitação empresarial e do uso do poder de compra governamental nas contratações públicas, de forma a aumentar a participação de micro e pequenas empresas nas licitações. 196 Seis anos do Supersimples Miriam Belchior tem mestrado em Administração Pública e Governo pela Fundação Getúlio Vargas (SP). De 1997 a 2002 foi secretária de Administração e Modernização Administrativa – e posteriormente secretária de Inclusão Social e Habitação – da Prefeitura Municipal de Santo André. Foi professora da Universidade de São Marcos de 1999 a 2002 e da Fundação de Pesquisa e Desenvolvimento de Administração, Contabilidade e Economia, de 2001 a 2008. Foi secretária -executiva e coordenadora geral do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Cultura de inovação e empreendedorismo Novas oportunidades de avanço Assim, pouco antes da entrada em vigor do Simples Nacional, a edição da LC 123/06 propiciou verdadeira mudança de paradigma das compras governamentais realizadas pelo Governo Federal. Preferência em desempate, licitação exclusiva, subcontratação e licitação com cota reservada para participação das MPEs no fornecimento de bens e serviços para a administração pública federal, além do estímulo à regularização fiscal, são alguns dos benefícios diretos dessa Lei Complementar. Com as novas regras, a administração pública passou a comprar de MPEs em segmentos estratégicos, fortalecendo o mercado interno brasileiro. Os benefícios da legislação também se estendem às cooperativas, aos empreendedores e microempreendedores individuais e aos produtores rurais. Para melhor contextualizar este quadro, cabe registrar que, em 2012, essas empresas foram responsáveis por 29% do fornecimento de bens e serviços para órgãos da administração direta, autárquica e fundacional. Isso corresponde a um montante da ordem de R$ 14,1 bilhões pagos a cerca de 150 mil diferentes micro e pequenas empresas, mais da metade do total dos fornecedores cadastrados no Sistema de Cadastramento de Fornecedores (Sicaf). O Governo Federal está certo de que as políticas já implantadas contribuíram efetivamente para criar mais e melhores oportunidades para essas empresas, mas tem consciência de que é possível fazer muito mais. Assim, no campo das compras governamentais – área cuja regulamentação compete ao Ministério do Planejamento – a intensificação do trabalho em regime de colaboração com estados e municípios pode contribuir sobremaneira para que as MPEs efetivamente alcancem igualdade de condições para fornecimento ao setor público em todas as esferas. Especialmente quando, em parceria com o Sebrae Nacional, o Ministério atua no desenvolvimento e oferta de programas de capacitação empresarial que alcançam todo o país. Nesta publicação são apresentadas reflexões acerca dos efeitos do Simples Nacional, produzidas por diferentes atores – públicos, privados e de organizações não governamentais. O sentido geral das reflexões parece estar nesta dupla satisfação: por um lado reconhecer o fortalecimento consistente, duradouro e expressivo da participação das MPEs na economia nacional; por outro a perspectiva de novas oportunidades de avanço. Tais oportunidades, no caso do Ministério do Planejamento, vêm sendo construídas por meio da ampliação e do aprofundamento da disseminação de conhecimentos entre empreendedores quanto ao ambiente favorável, criado pela Lei Geral das MPEs, para sua participação em licitações públicas. Além disso, há uma interação qualificada e contínua com gestores públicos municipais no sentido de potencializar a segurança jurídica necessária para que, no seu âmbito de atuação, regulamentem e implementem ações correlatas à Lei Geral das MPEs. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 197 Capítulo 10 • • • Compras governamentais ARTIGO | Antônio Joaquim Os tribunais e o desenvolvimento econômico Conselheiro Antônio Joaquim Presidente da Atricon Antônio Joaquim Moraes Rodrigues Neto nasceu em Goiânia (GO) no ano de 1956. Graduou-se em Administração de Empresas pela UFMT, pós-graduado em Direito do Estado e Administração Pública pela FGV e acadêmico de Direito na Universidade de Cuiabá. Foi deputado estadual por dois mandatos, e federal também duas vezes. Foi secretário de Infra-Estrutura e de Educação no governo matogrossense. Ingressou no TCE-MT como conselheiro em 2000, tornou-se presidente do Tribunal em 2008. “ Tenho assumido posição diametralmente opos- ta àqueles que entendem que os tribunais de Contas devem restringir sua atuação apenas à observância da legalidade e conformidade dos atos praticados pela gestão pública. Meu discurso tem sido no sentido de que os órgãos de controle externo também devem focar suas lentes sobre os resultados dos investimentos em políticas públicas, tendo como predicados a eficiência e a economicidade dos gastos públicos. 198 Seis anos do Supersimples 123/2006 e não apenas e tão-somente a Lei 8.666/93, a Lei de Licitações. Ao fiscalizar se o poder público está observando a Lei Geral em suas compras, os tribunais de Contas atuam de forma moderna, ampliando a auditoria do âmbito da legalidade para também o de fiscalização de resultados de políticas públicas. Atuam ainda, de forma secundária, porém objetiva, em prol do desenvolvimento econômico. Faço coro com a visão esposada pelo vice-presidente do Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco, conselheiro Valdecir Pascoal – um estudioso no assunto. Pascoal diz, em um dos seus textos, que “resta inconteste que o favorecimento legal e legítimo às micro e pequenas empresas locais implicará redução dos custos dos produtos e serviços adquiridos pelo poder público, dinamizará a economia local, trazendo a reboque o aumento do nível de emprego, da renda e da arrecadação de tributos, proporcionando o aumento sustentável de fontes de recursos para financiar novas políticas públicas”. Instrumentos de promoção da cidadania Esse entendimento está lastreado na própria Constituição Federal de 1988 e nos textos infraconstitucionais. É o caso da fiscalização da aplicação de preceitos assentados na Lei Complementar 123/2006, que trata da Lei Geral da Micro e Pequena Empresa, notadamente no que concerne às compras governamentais. Essas vantagens especiais ocorrem justamente quando dos procedimentos licitatórios, que devem ser realizados também contemplando as determinações da LC A lucidez desse entendimento ajusta-se perfeitamente à minha compreensão do papel dos tribunais de Contas e sua relação com o desenvolvimento econômico. Os órgãos de controle externo têm essa particularidade. O cumprimento de suas obrigações institucionais têm ampla ressonância, pois a fiscalização também tem a capacidade de promover, de induzir, de fomentar. No caso macroeconômico, a simples fiscalização de preceitos estabelecidos na Lei Complementar 123/2006 gera redução de custos em compras governamentais, estimula a economia, ajuda a gerar empregos e distribuir renda. É com essa retina, também como efeito de impacto positivo, que vejo a atuação dos tribunais de Contas na fiscalização do cumprimento da Lei 12.527/2011, a Lei de Acesso à Informação. Quando fiscalizamos se os órgãos públicos observam a Lei estamos estimulando o controle social, já que a informação é a matéria-prima de qualquer controle. Quando fornecemos para a so- ciedade, em linguagem de fácil entendimento, todas as informações sobre a tutela dos tribunais de Contas (que recebem dados sobre a gestão dos recursos públicos de todos os órgãos do Estado), potencializamos nosso papel de instrumentos de promoção da cidadania, pois estamos democratizando o acesso à informação pública – um direito legitimamente social. Foi com essa determinação que organizamos, em praticamente todas as capitais brasileiras, no dia 13 de março último, os encontros “Os Tribunais de Contas e o Desenvolvimento Econômico”. A atividade foi uma parceria da nossa Associação dos Membros de Tribunais de Contas do Brasil (Atricon) com o Sebrae, o Instituto Rui Barbosa e os tribunais de Contas dos estados, com o objetivo de falar diretamente aos gestores públicos sobre a importância e a obrigação de dar executoriedade à Lei Geral da Micro e Pequena Empresa. Ilhas isoladas num mosaico O desenvolvimento econômico passa obrigatoriamente pelas micro e pequenas empresas, que finalmente despertaram a atenção do poder público – que ao longo da história nacional sempre direcionou políticas para os grandes complexos empresariais. É como se se ignorasse que o Brasil tem sua base empresarial alicerçada em cerca de 90% de empresas de pequeno porte. São elas que geram a maioria dos empregos. É nelas que florescem e se sustentam as famílias brasileiras. É preciso, finalmente, observar que os tribunais de Contas deixaram de ser ilhas isoladas no mosaico da administração pública e buscam integrar-se à nova realidade nacional, cujo caminho é o do compartilhamento de ações entre as instituições. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 199 Capítulo 10 • • • Compras governamentais ARTIGO | Severiano Costandrade Tribunais de Contas e Sebrae: “ união inédita e transversal Severiano Costandrade Presidente do Instituto Rui Barbosa Há 40 anos, conselheiros de todo o Brasil, frente à multidisciplinaridade peculiar aos tribunais de Contas, observaram a necessidade da criação de uma instituição que especializasse no aprimoramento de seu corpo técnico. Era criado o Instituto Rui Barbosa, a associação de estudos e pesquisas que congrega todas as cortes de Contas do País. Foi nos últimos anos, todavia, que ocorreu uma revolução silenciosa no sistema de Controle Externo Brasileiro. Maciços investimentos em capacitação, tecnologia e planejamento proporcionaram significativos avanços. Estes resultados, em grande parte, devem-se ao Programa de Modernização do Sistema de Controle Externo nos Estados, Distrito Federal e Municípios Brasileiros (Promoex), um convênio entre o Governo Federal, por meio do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e com os tribunais de Contas. Foram mais de US$ 60 milhões aplicados em quase todas as unidades da Federação, com resultados impressionantes, que credenciam o Brasil como exemplo de sucesso do BID em outros países. 200 Seis anos do Supersimples Natural de Teresina (PI), o conselheiro Severiano José Costandrade de Aguiar é bacharel em Direito pela Universidade Federal do Piauí, com três pós-graduações. Atualmente cursa doutorado em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad del Museo Social Argentino. Em Tocantins, foi secretário de Desenvolvimento Comunitário de Palmas, procurador do Estado e secretário estadual do Trabalho e Ação Social. Além de presidir o IRB, também é presidente do TCE/TO. Ao Instituto Rui Barbosa coube a honrosa missão de coordenação dos trabalhos para o alcance das metas estabelecidas no Programa. Foram anos a fio de muita dedicação com o excepcional propósito de aperfeiçoar o trabalho desenvolvido por membros e técnicos dessas instituições que são verdadeiros guardiões do bem público. Uma evolução exponencial Um dos componentes deste ambicioso convênio foi justamente o fortalecimento das relações interinstitucionais. Destarte, os tribunais de Contas passaram a investir em comunicação e atingir resultados jamais imaginados. Ao compartilhar entre si seus próprios problemas e suas próprias soluções, técnicos dos tribunais de Contas conseguiram desencadear uma evolução exponencial. Ao abrir as portas, ao investir em ferramentas que garantiram a transparência e proporcionaram visibilidade, conselheiros mostraram ao País a imensa abrangência e capilaridade singular aos tribunais de Contas. Por conseguinte, não somente a sociedade, mas as demais instituições, começaram a compreender a real importância desses órgãos de controle e orientação. Sem todo esse processo, não seria possível firmar e nem mesmo vislumbrar a parceria inédita que possibilitou a reunião simultânea de milhares de gestores públicos, estaduais e municipais, para debater uma legislação extraordinária, benéfica, mas, infelizmente, ignorada pela maioria: a Lei Complementar no 123/2006, também denominada Lei Geral da Micro e Pequena Empresa. As instituições experimentaram, nos últimos anos, o amadurecimento necessário para a formalização de uma parceria entre entidades representativas de tribunais de Contas – IRB e Atricon – e o Sebrae, união que antes, talvez, seria improvável e ineficaz, presumível ledo engano. Capacitação de técnicos e servidores públicos Esta união de esforços realizada pelos tribunais de Contas e unidades estaduais do Sebrae, como acima citado, permitiu uma sensibilização coletiva no histórico dia 13/03/2013, destacando a importância e a inegável proficuidade da LC 123 para a gestão pública, bem como para a economia local. A posteriori, sob responsabilidade do Instituto Rui Barbosa, um seminário capacitará técnicos dos tribunais de Contas de Estados, Distrito Federal e de municípios para auditar governos e prefeituras especificamente neste quesito. Por fim, será organizada uma série de eventos locais, desta vez direcionados a servidores públicos e técnicos de estados e municípios. Esses cursos servirão para ilustrar os delineies da referida legislação e a sua forma correta de utilização. Essas capacitações serão possíveis graças à articulação, coordenada pelo Instituto Rui Barbosa e pelos tribunais de Contas por meio das suas respectivas escolas de Contas ou similares. No caso particular da LC 123, versamos sobre a economicidade: ao deixar de utilizar-se de um mecanismo legal que promova o desenvolvimento local, com bônus para os cofres públicos, preservando a livre concorrência, o gestor público pode eventualmente estar cometendo um ato antieconômico. Como associação de estudos e pesquisas dos tribunais de Contas do Brasil, o Instituto Rui Barbosa sublinha sua satisfação em ser parceiro deste projeto benéfico e inédito, orgulha-se de poder estar inserido em uma iniciativa que apoia o desenvolvimento local e certamente potencializa as possibilidades de giro em micro e pequenas empresas, que empregam a imensa maioria dos brasileiros. Consideramos que estamos inseridos em uma ação transversal, cujos resultados poderão ser, inequivocamente, benéficos para a promoção de uma sociedade mais igualitária em nosso País. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 201 Capítulo 10 • • • Compras governamentais ARTIGO | Loreni Foresti dESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DEPENDE DAS MPEs “ Loreni Foresti Secretária de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento Dar tratamento diferenciado às micro e pequenas empresas (MPEs) nas contratações públicas incentiva o desenvolvimento regional sustentável, o aumento do número de empregos, amplia a competitividade e traz melhorias na distribuição de renda. É impossível alavancar o desenvolvimento regional sem incentivos aos pequenos empresários localizados Brasil afora. O Governo Federal já reconheceu este fato e propõe, há mais de 6 anos, políticas públicas de inclusão das MPEs. Estabeleceu-se uma via sem volta quanto à importância destas empresas na economia nacional. Uma das estratégias adotadas pelo Governo Federal para alavancar segmentos considerados estratégicos para o desenvolvimento econômico, social e sustentável é utilizar seu poder de compra. Assim, desde 2006, com a edição da Lei Complementar nº 123, houve uma mudança no paradigma das compras governamentais realizadas pelo Executivo Federal. A participação das MPEs no fornecimento de bens e serviços para a administração passou a ter tratamento diferenciado, em especial no que se refere à regularidade fiscal, preferência para desempate, licitação exclusiva e subcontratação. 202 Seis anos do Supersimples Loreni Foresti nasceu em Nova Prata (RS) em 1956. Graduou-se em Administração de Empresas pela Faculdade São Judas Tadeu de Porto Alegre, em 1980. Exerceu vários cargos na Prefeitura de Porto Alegre até 2001. Foi diretora financeira da Telebrás e gerente do escritório da FGV no Rio Grande do Sul. Entre 2003 e 2010 foi diretora e secretária-adjunta da Secretaria que agora dirige. Comprasnet é o portal de compras do GF Sustentáculo das economias mundiais Desde então, por meio de normatizações específicas, tem sido possível efetivar a participação dessas empresas nas contratações realizadas, com impactos muito expressivos nas receitas do setor. Prova disto pode ser obtida quando analisamos os dados do Portal de Compras do Governo Federal, o Comprasnet, em relação aos impactos da definição de licitação com cota reservada, ou seja, do caráter de exclusividade de MPEs em compras públicas de até R$ 80 mil. Os dados relativos a esta modalidade de licitação apontam que o fornecimento de bens e serviços por MPEs movimentou R$ 3,7 bilhões. A intenção é traçar cada vez mais métodos de fomento e apoio às micro e pequenas empresas. O impacto desta diretriz resultou num crescimento de 45% do segmento empresarial nas licitações públicas do Governo Federal, se compararmos os anos de 2007 e 2012. No histórico dos últimos 6 anos, a participação das MPEs nas compras governamentais variou entre R$ 9,7 bilhões e R$ 15 bilhões. Proporcionalmente, essa participação oscilou entre 19% e 44% nesse mesmo período. Em 2012, as negociações entre o Governo Federal e as MPEs movimentaram R$ 15,4 bilhões. Outra medida que dispensa elogios é a adoção do Simples Nacional, regime tributário diferenciado, simplificado e favorecido previsto na Lei Complementar nº 123, de dezembro de 2006. Os contribuintes que optaram pelo Simples têm mais facilidade no atendimento da legislação tributária, previdenciária e trabalhista e simplificação no pagamento de diversos tributos abrangidos pelo sistema. Além disso, as microempresas e as empresas de pequeno porte que se encontrem sem movimento há mais de três anos adquiriram o benefício de dar baixa nos registros dos órgãos públicos federais, estaduais e municipais, independentemente do pagamento de débitos tributários, taxas ou multas devidas pelo atraso na entrega das respectivas declarações nesses períodos. É sabido que os pequenos empresários são o sustentáculo de grande parte das economias do mundo. Só há ganhos em incentivar o crescimento desse setor. Pudemos observar, nos últimos anos, que as micro e pequenas empresas desempenham papel fundamental na distribuição de renda e no combate à desigualdade social. O próximo passo para garantir às MPEs o seu papel dentro do panorama econômico brasileiro é fazer com que os estados e municípios repliquem as estratégias adotadas pelo Governo Federal. Adotar estratégias para que as MPEs se desenvolvam é, em última instância, impedir que haja a migração de mão de obra especializada para os grandes centros. É garantir que as pessoas possam se especializar e trabalhar em suas cidades, é fomentar o desenvolvimento regional e trazer uma base sólida para a economia brasileira. Somadas às conquistas já existentes, as novas iniciativas apontam para um novo paradigma da economia brasileira. No momento em que o País se coloca, pela primeira vez na história, entre as dez maiores potências econômicas mundiais, todos os setores demandam novas atenções. É tempo de inovar e de rever estratégias. A intenção é que os micro e pequenos empresários cresçam, que essa injeção de recursos proporcionada pelo crescimento econômico transborde em todos os setores econômicos brasileiros. O empoderamento das MPEs é uma política de Estado. Exemplo disso é a criação da Secretaria da Micro e Pequena Empresa. O Ministério do Planejamento, por sua vez, não medirá esforços no sentido de garantir a capacitação e participação do segmento tanto em licitações públicas quanto nas novas políticas que serão implementadas daqui por diante. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 203 Capítulo 10 • • • Compras governamentais ARTIGO | Sebastião HelveciO Controle externo, Federação e Desenvolvimento Conselheiro Sebastião HelveciO vice-presidente do TCE-MG “ Aprioristicamente destaco que somos uma Repú- blica Federativa, por determinação do comando constitucional insculpido no art. 1º da nossa Carta Magna. No mundo, além do Brasil, outras 24 nações são federações, onde vivem 40% da população mundial. Os valores republicanos são frequentemente destacados em trabalhos acadêmicos e no discurso político, mas o mesmo tratamento não é dado ao princípio federativo. A palavra “federal”, conforme leciona Daniel Elazar, tem sua origem no latim “phoedus” e significa “pacto”. No caso brasileiro, o pacto está referendado pela Constituição Federal, constituições estaduais e Distrital e leis orgânicas. Dessa forma, conforme a competência de le204 Seis anos do Supersimples Sebastião Helvecio Ramos de Castro nasceu em 1946 na cidade mineira de Juiz de Fora. Médico graduado pela Universidade Federal de Juiz de Fora, também é bacharel em Direito pela Faculdade Vianna Júnior, e doutor em Saúde Coletiva pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Foi deputado estadual por seis legislaturas em Minas, secretário de Estado da Saúde em 1989/90, vice-prefeito de Juiz de Fora em 2001/02. É vice-presidente do Instituto Rui Barbosa. gislar, é necessário lei federal, estadual e municipal para completar o arcabouço legal de determinado assunto. É o exercício do federalismo trino, típico da nossa organização governamental. Constatamos que a nossa Constituição, em seu art. 3º, elenca entre os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil a garantia do desenvolvimento nacional (inciso II) e a erradicação da pobreza e da marginalização, com a redução das desigualdades sociais e regionais (inciso III). Várias constituições estaduais também se preocupam com as disparidades intraterritoriais e, no caso mineiro, a Constituição do Estado de 1989 determina, em seu art. 51, que o Estado instituirá autarquias territoriais para planejamento e orientação da execução articulada de funções e serviços públicos com a finalidade de desenvolvimento global em favor da população do mesmo complexo geoeconômico e social. Mesmo algumas leis orgânicas municipais reconhecem tratamento diferenciado para áreas especiais de interesse social. Artigo 37 dá a senha A Constituição Federal, no seu Capítulo VII, lista as disposições gerais da Administração Pública, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 19 de 1988, reconhecendo entre seus princípios, no art. 37, a eficiência na mesma estatura da legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade. Esta é, sem dúvida, a senha para que a análise das prestações de contas inclua também o parecer sobre o desempenho das políticas públicas, com suas metas e resultados, especialmente na melhoria da qualidade de vida do cidadão, verdadeiro estuário do gasto público. Hora de revisitar, mesmo que perfunctoriamente, o conceito de política pública e sua dicotomia. Na Europa, a política pública nasce como desdobramento dos trabalhos que explicam o papel do Estado e a função de governo, enquanto nos Estados Unidos a origem é diferente. É o mundo acadêmico que lança luzes, sem estabelecer relações com a teoria do papel do Estado, e centra seu foco nos estudos sobre a ação governamental. Faço essas breves considerações para inferir que não existe uma melhor definição do que seja política pública, mas abraço e realço duas citações: “quem ganha o quê, por quê e que diferença faz” (Laswell, 1963) e “o que o governo escolhe fazer ou não fazer” (Dye, 1984). Nessa esteira, o controlador externo, neste terceiro milênio, deve estar afinado com esta máxima: “omitir-se é também política pública”. No caso do desenvolvimento nacional, ela se consolida com o desenvolvimento das regiões e das cidades. O constituinte, ao insculpir o ideário rawlsiano de equidade no art. 179 – “A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios dispensa- rão às microempresas e às empresas de pequeno porte, assim definidas em lei, tratamento jurídico diferenciado, visando a incentivá-las pela simplificação de suas obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e creditícias, ou pela eliminação ou redução destas por meio de lei” − assinalou claramente a opção pelo desenvolvimento a partir das potencialidades locais. A Lei Complementar 123 de 14 de dezembro de 2006, que institui o Estatuto Nacional de Microempresas e da Empresa de Pequeno Porte, especialmente em seu Capítulo V, que trata do acesso aos mercados e das aquisições públicas, delimita o recorte legal para atender o comando constitucional. Compras municipais de R$ 6,9 bilhões O tema é relevante: são mais de 7,3 milhões de microempresas e empresas de pequeno porte no Brasil, acolhendo mais de 14,5 milhões de trabalhadores com carteira assinada e movimentando cerca de 25% do Produto Interno Brasileiro. Neste cenário é de se louvar a iniciativa do Sebrae e do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comercio Exterior, apoiada pela Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon), com o seu presidente, conselheiro Antônio Joaquim e pelo Instituto Rui Barbosa (IRB) com o seu presidente, conselheiro Severiano Costandrade, articulando movimento nacional para dar efetividade ao comando constitucional e legislação infraconstitucional. Encerrando, o TCEMG, através da Fiscalização Integrada – Suricato, verificou que em 2012 a compra pública realizada pelos 853 municípios mineiros de ME EPP foi no valor de R$ 6,9 bilhões, enquanto apenas 407 prefeituras dispunham de legislação específica no âmbito municipal. Portanto, é hora de viver o encantamento da possibilidade de termos o ideário da justiça e da cidadania se concretizando em cada aquisição pública praticada no território brasileiro. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 205 Capítulo 10 • • • Compras governamentais ARTIGO | Vitor Koch Fornecer MPEs gaúchas Programa beneficia “ Vitor Koch Presidente do Sebrae RS Vitor Augusto Koch tem 49 anos, formou-se em Administração de Empresas pela Faculdade de Taquara. É empresário do ramo de móveis, eletrodomésticos e ferragens. Também é presidente da Federação das CDLs do Rio Grande do Sul e 1º vice-presidente da CNDL. 206 Seis anos do Supersimples Com a sua intensa mobilização em prol da regula- mentação e da implementação da Lei Geral das Micro Pequenas Empresas ao nível dos municípios gaúchos, o Sebrae RS atua decisivamente no fomento da economia do Rio Grande do Sul. A importância desta iniciativa é que as micro e pequenas empresas passam a ter capacidade de participar das licitações públicas para venda de bens e serviços. Por exemplo, quando a regulamentação estiver efetivada, uma microempresa de alimentação passa a ter a possibilidade de fornecer diretamente merenda escolar para as escolas municipais e estaduais; e uma firma de manutenção predial pode ganhar contratos de conservação de prédios públicos. Nesses casos de licitações públicas, a grande vantagem das MPEs sobre as médias e grandes é a versatilidade de adaptação da prestação de serviços, pela facilidade de modulação da organização de produção às necessidades do cliente. O acesso a esse rico mercado está condicionado à aprovação da legislação e sua devida regulamentação nos municípios. Quanto antes essa etapa for vencida, mais cedo os empreendimentos de pequeno porte terão acesso aos certames licitatórios. E é nesse processo que o Programa Fornecer, ação inédita da Secretaria da Administração e dos Recursos Humanos (SARH) do Governo do Estado do Rio Grande do Sul, em parceria com o Sebrae RS, surge, trazendo uma nova perspectiva para os pequenos negócios rio-grandenses. Possibilitar que as MPEs gaúchas tenham a oportunidade de participar das licitações públicas para a venda de bens e serviços foi um dos grandes benefícios criados pelo Programa Fornecer. Injeção de recursos e economia O Programa Fornecer confirmou a capacidade das MPEs de atenderem a grandes demandas. Esse sucesso se baseia fortemente na qualidade dos produtos e serviços e no bom preço ofertado pelos empreendimentos de pequeno porte. Iniciado no segundo semestre de 2011, o programa injetou até meados de abril de 2013 recursos da ordem de R$ 66,1 milhões em negócios nos 80 municípios que realizaram os pregões, sendo R$ 27,9 milhões diretamente nas MPEs. A iniciativa também fez o Governo economizar cerca de R$ 25,8 milhões na compra de alimentos para os presídios do Estado. Esta sistemática de contratação é mais econômica, pois comprando de MPEs locais, são eliminados os custos de transporte, armazenamento e logística na entrega dos alimentos. Como o fornecedor encontra-se sediado na região de fornecimento, ele consegue ofertar preços mais baixos para o Estado, fazendo com que a riqueza fique e circule no próprio município. Um dos principais gargalos deste projeto é a mudança de cultura. Em geral, os empresários acreditam que é difícil vender para o governo e que o pagamento é demorado e incerto, entre outros pontos. Por isso, a tarefa do Sebrae RS consiste em reverter essa desconfiança, realizando palestras sobre os pregões, mobilizando os empresários e prestando assessoria na documentação necessária para participação no pregão. Assim, cooperamos para que esses empreendedores visualizem essa oportunidade de crescimento e busquem se qualificar para tomar parte dela. Os resultados obtidos comprovam que o Sebrae RS está no caminho certo. O projeto cresce a cada semestre, gerando economia para o Estado e injetando recursos diretamente na micro e pequena empresa. Isso mostra que a chave para o sucesso das micro e pequenas empresas gaúchas é, cada vez mais, acreditar no seu potencial. Como o Sebrae RS faz há 40 anos. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 207 Capítulo 10 • • • Compras governamentais exemplos de sucesso | rio grande do sul programa Fornecer Desempenho do programa Compras do Governo Tarso Genro A primeira e mais abrangente política de compras em nível estadual estabelecida dentro dos princípios da Lei Geral foi a do Programa Fornecer, do Governo do Rio Grande do Sul. O governador Tarso Genro sancionou em abril de • Economia para o Estado em seis meses (novembro de 2011 a abril de 2012): R$ 648.300,60. Em percentual, a economia chega a 42,18% em relação aos preços registrados entre maio/11 e outubro/11. 2011 uma lei estadual criando esse programa e foi pessoalmente a Santana do Livramento inaugurar as rodadas de licitações com pregão presencial de compra de alimentos para o presídio local. Isso foi no final de julho de 2011. • O Estado capilarizou recursos na ordem de R$ 888.738,60, regionalmente, na compra de pão e leite durante a vigência do registro de preços. Tarso Genro, governador do Rio Grande do Sul. • Nas licitações que passaram a ser descentralizadas nessa fase, o número de fornecedores passou de dois para 35. D esde então, o programa Fornecer vem se expandindo rapidamente e servindo como referência para outros estados. A constatação foi a de que as licitações para abastecimento das casas correcionais eram vencidas sistematicamente por grandes empresas que subcontratavam pequenos fornecedores locais, pagando preços muito inferiores ao que seria justo. Ou seja, agiam como atravessadores, ficando com o lucro das operações. O governo gaúcho decidiu aplicar os princípios da Lei Geral, licitando exclusivamente entre as MPEs com sede nos municípios as compras até R$ 80 mil. Com isso estimulou a economia local e fez economia superior a 42% nas compras. Os pãezinhos pelos quais pagava R$ 0,33 em Santana do Livramento foram adquiridos por R$ 0,16 dos pequenos fornecedores locais. O Estado foi dividido em quatro regiões para a implantação progressiva do Programa Fornecer, e a prioridade foi atribuída aos municípios da Região 2, a de mais baixo índice de desenvolvimento socioeconômico. Foram 22 as cidades abrangidas: Agudo, Alegrete, Bagé, Caçapava do Sul, Cacequi, Cachoeira do Sul, Cruz Alta, Dom Pedrito, Itaqui, Jaguari, Júlio de Castilhos, Lavras do Sul, Quarai, Rosário do Sul, Santa Maria, Santana do Livramento, Santiago, São Francisco de Assis, São Gabriel, São Sepé, São Vicente do Sul e Uruguaiana (ver mapa). 208 Seis anos do Supersimples >> O Programa Fornecer foi montado na Secretaria de Administração e Recursos Humanos, em torno da Central de Licitações, dirigida por Nizani Torres, servidora do Tribunal de Contas do Estado. O Sebrae RS prestou apoio fundamental através do gerente de Políticas Públicas, Lourenço Mayer Neto. Seis anos do SUPERSIMPLES 209 Capítulo 11 Os teixeira: “Atividades consideradas de baixo impacto ambiental poderão ser objeto de licenciamento simplificado”. miki: “Segurança pública não se resume a operações repressivas, mas diz respeito também à prevenção”. BARBANO: “A Anvisa quer implementar o projeto de inclusão produtiva com segurança sanitária”. 210 Seis anos do Supersimples avanços da Redesim A Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócio (Redesim) foi criada pela Lei 11.598 de 2007. Em 2009, um decreto instituiu o Comitê para Gestão da Redesim, composto por dez membros, cinco do Governo Federal (MDIC, DNRC, Receita, INSS e Planejamento), um do Confaz, um da Abrasf, um das juntas comerciais, um da CNM e um do Fórum Permanente das MPEs. O primeiro desafio foi promover o diálogo entre esses órgãos e conseguir que abrissem mão de estabelecer regras próprias. No Brasil há 20 mil órgãos públicos, todos com o poder de emitir portarias e resoluções muitas vezes conflitantes com a legislação superior. As juntas comerciais reagiram positivamente à necessidade de modernização de seus serviços, com destaque para a de Minas Gerais. O segundo desafio foi implantar o Microempreendedor Individual, criado pela Lei Complementar 128, de 2008. A proposta é confiar na honestidade do cidadão e renunciar à maior parte das exigências burocráticas, permitindo a inscrição pela internet. Basta abrir uma pá- pace: “Mostrando agilidade e atualização de serviços, a Jucemg busca obter o selo da Qualidade Total”. salomão: “Desde 2009 podemos entregar um alvará em 48 horas ou em cinco minutos pela internet.” gina no Portal do Empreendedor para adquirir personalidade jurídica. A criação dessa página simplificada por si só foi um grande desafio para as equipes de informática. O sucesso absoluto do MEI – que surpreendeu pela rapidez com que a formalização foi desburocratizada – colocou o terceiro e atual desafio: promover a simplificação do registro do licenciamento e do alvará de funcionamento, tendo em vista que restam entraves nas legislações estaduais e municipais. O primeiro entrave diz respeito aos corpos de Bombeiros, que adotam em cada Estado uma legislação diferente. A Secretaria Nacional de Segurança Pública do Ministério da Justiça formou um grupo de trabalho para elaborar uma diretriz nacional que possa padronizar o licenciamento, eliminando exigências absurdas. O mesmo caminho é buscado para a Vigilância Sanitária. A Anvisa não pode abrir mão de deveres que lhe são estritamente atribuídos em lei, mas prepara um projeto de inclusão produtiva com segurança sanitária, educando, conscientizando e capacitando os microempreendedores individuais, especialmente os que lidam com alimentos. O meio ambiente é o próximo desafio. A LC 140, de 2011, abre caminho para agilizar e desburocratizar o licenciamento ambiental. Programas de sustentabilidade e consciência ambiental devem ser levados aos MEIs, fechando o ciclo das exigências. Depois de liberar ao máximo as amarras dos negócios individuais, chegará o momento de avançar para as microempresas e as de pequeno porte. Seis anos do SUPERSIMPLES 211 Capítulo 11 • • • Os avanços da Redesim ARTIGO | Izabella Teixeira MPEs Licenciamento Ambiental As eo Izabella Teixeira Ministra do Meio Ambiente Izabella Mônica Vieira Teixeira nasceu em Brasília (DF) e formou-se em Biologia pela UnB. É mestre em Planejamento Energético e doutora em Planejamento Ambiental pela COPPE-UFRJ. Exerceu cargos de direção no Ibama e no Governo do Rio de Janeiro. “ Todas as empresas têm um relacionamento com o meio ambiente, de maneira direta ou indireta, que gera impactos. Algumas das atividades econômicas relacionadas às MPEs podem necessitar de licenciamento ambiental. No contexto da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei nº 6.938/1981), o licenciamento ambiental possibilita o início ou continuidade das atividades, além de direcionar o empresário sobre os impactos que podem ser gerados e como devem ser evitados. A recente Lei complementar 140/2011 que regulamentou o Art. 23 da Constituição fortalece o conceito de descentralização no âmbito do Sisnama e abre uma oportunidade para agilizar e desburocratizar o licenciamento ambiental de MPEs. 212 Seis anos do Supersimples O licenciamento ambiental é o procedimento administrativo pelo qual o órgão ambiental competente avalia a localização, a instalação, a ampliação e a operação de empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais considerados efetiva ou potencialmente poluidores, ou que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental. Esse procedimento se dá conforme disposições legais e regulamentares, observando também as normas técnicas aplicáveis. Desse modo, o licenciamento ambiental é um instrumento estatal preventivo, de responsabilidade dos órgãos ambientais licenciadores no âmbito da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios. A obtenção das licenças ambientais de empreendimentos e atividades de uma empresa, aliada ao cumprimento das exigências legais e técnicas, é fundamental para sua conformidade ambiental. Licenciamento é feito em três etapas Em geral, o licenciamento ambiental é realizado em etapas correspondentes às de implantação do empreendimento. Nesse contexto, são expedidas Licença Prévia – LP, Licença de Instalação – LI e Licença de Operação – LO. A Licença Prévia é concedida na fase do planejamento do empreendimento ou atividade e aprova sua localização e concepção, atestando a viabilidade ambiental do empreendimento ou atividade, bem como estabelecendo os requisitos e exigências técnicas a serem atendidos ou observados nas próximas fases. A Licença de Instalação, por sua vez, autoriza a instalação do empreendimento ou de uma determinada atividade de acordo com as especificações constantes dos planos, programas e projetos aprovados, incluindo as medidas de controle ambiental e demais exigências aplicáveis. Por fim, a Licença de Operação atesta o cumprimento das exigências técnicas e legais pertinentes, conforme estabelecido nas etapas anteriores, estabelece as condições e autoriza o funcionamento da atividade ou empreendimento. A legislação permite que as atividades consideradas de baixo impacto ambiental poderão ser objeto de licenciamento ambiental simplificado, desonerando o investimento e agilizando o licenciamento ambiental. A responsabilidade pelo licenciamento ambiental é compartilhada pelos órgãos estaduais e municipais de Meio Ambiente e o Ibama, cada esfera com suas atribuições. Uma empresa cuja atividade ou empreendimento for passível de licenciamento só é legalmente autorizada a desenvolver suas atividades após realizar o licenciamento ambiental perante o órgão competente do Sisnama. Licença facilita aprovação de crédito Mediante o processo de licenciamento, a empresa conhece seus direitos e obrigações e a licença ambiental torna-se referência para o relacionamento com o órgão ambiental e a sociedade. O licenciamento reduz os riscos da atividade e, atualmente, tem relevância crescente como um parâmetro de avaliação de riscos para as instituições financeiras na concessão de financiamentos, bem como para aprovação da empresa como fornecedora em determinada cadeia produtiva e para a certificação de produtos para os mercados interno e externo. Diante disso e, em decorrência dos efeitos econômicos de uma adequada gestão ambiental – redução de custos e ou geração de receitas decorrentes da redução do consumo de água, energia ou matérias-primas e insumos, aproveitamento de resíduos etc. –, as empresas ambientalmente regulares aumentam sua competitividade e credibilidade no mercado. Por outro lado, a maior implementação dos sistemas de licenciamento nos municípios e sua articulação com outros instrumentos como o Plano Diretor e os códigos de Obras, de Posturas e de Saúde, podem ajudar a simplificar e agilizar o licenciamento ambiental, desburocratizando o ambiente de negócios e facilitando a inserção da dimensão ambiental nas MPEs. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 213 Capítulo 11 • • • Os avanços da Redesim ARTIGO | Regina Miki Simplificação do licenciamento de segurança Regina Miki Secretária Nacional de Segurança Pública “ O caso com que se ocupa a Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp) é um exemplo: simplificação do licenciamento para estabelecimentos comerciais de microempresas, empresas de pequeno porte e microempreendedores individuais. A legislação brasileira exige que os estabelecimentos comerciais, independentemente da natureza, porte, arrecadação ou número de empregados, sejam vistoriados pelo Corpo de Bombeiros e dele recebam laudo técnico atestando conformidade com os padrões de segurança para desempenhar suas atividades comerciais. 214 Seis anos do Supersimples Regina Maria Filomena de Luca Miki é advogada, mestre em Direito Constitucional pela PUC/SP, especialista em Direito de Família e Fundiário e em Políticas de Segurança Pública pela PUC/RS. Foi secretária de Defesa Social de Diadema (SP) entre 2001 e 2008. Deixou a Secretaria-Executiva do Conasp para assumir a Senasp. Em estrita observância ao pacto federativo, o governo federal possui como atribuição o auxílio e a indução de políticas públicas. Nesse sentido, em 2011, o Sebrae Nacional, a Senasp e o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC) realizaram reuniões regionais em todo o país para coleta de subsídios e realização de diagnóstico sobre o processo de licenciamento empresarial junto aos corpos de Bombeiros. As oficinas aconteceram nas cinco regiões brasileiras. Foram diversos os assuntos diretamente afetos à simplificação do processo de licenciamento, dentre os quais constaram a cobrança de taxas ou emolumentos, prática de uma fiscalização orientadora (e não de caráter unicamente punitivo), necessidade de sistemas de informação integrados, regularização de áreas de difícil ajuste e ampliação de campanhas de orientação contra incêndio. Em todos eles, técnicos e gestores acordaram sobre a necessidade de atualizar a legislação e padronizar procedimentos, ambos expressos em normas gerais que orientem os procedimentos nos quatro cantos do país. A partir do quadro evidenciado, em 18 de outubro de 2011, foi publicada a Portaria 039/Senasp/MJ, que instituiu Grupo de Trabalho para tratar da matéria e propor diretrizes nacionais para simplificação do licenciamento. O colegiado é composto por representantes dos diversos segmentos envolvidos, e o principal resultado dessas reuniões foi a conclusão de minuta de norma técnica para regular o tema. Submetida posteriormente ao Comitê para Gestão da Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios (CGSIM), instituído no âmbito do MDIC, a proposta foi aprovada e, atualmente, aguarda publicação. No papel de indutora de políticas, a Senasp entende que segurança pública não se resume a operações repressivas, mas, antes de tudo, diz respeito também à prevenção. Estamos diante da dupla tarefa de resguardar a segurança dos cidadãos e, simultaneamente, viabilizar, com a maior rapidez possível, o início das atividades empresariais e impulsionar o desenvolvimento social e econômico do país. Na tarefa de levar adiante a orientação constitucional de ser a segurança pública direito e dever individual e coletivo, de todos e de cada um, a Senasp trabalha em articulação permanente com a sociedade civil, entidades privadas e órgãos do governo, objetivando a consolidação do Brasil enquanto país que preconiza pela justiça, redução da desigualdade social e dinamismo nas suas atividades econômicas. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 215 Capítulo 11 • • • Os avanços da Redesim ARTIGO | Dirceu Barbano Empreender segurança sanitária com “ Dirceu Barbano Diretor-Presidente da Anvisa Irrenunciáveis prerrogativas Ao celebrar o aniversário do Simples Nacional e da Lei Geral das Micro e Pequenas Empresas, é preciso de pronto ressaltar o incontestável sucesso desses aparatos legais, enquanto bem-sucedidas políticas de inclusão social implementadas nos últimos anos. Vislumbramos assim o notável contexto referente à caracterização e articulação das políticas sociais no Brasil. Os órgãos governamentais e outras instituições públicas, como o Sebrae, operam hoje num grau de integração sem precedentes, agindo pontual e estrategicamente em múltiplas frentes, rumo à construção de um duradouro e eficiente arcabouço social e institucional capaz de amparar e estimular as camadas mais vulneráveis da sociedade. Assistimos hoje a uma estratégica e generalizada reformulação no modus operandi dos diferentes órgãos públicos, onde se inclui a Anvisa, no sentido de aproveitar as oportunidades ocasionadas por um crescimento econômico consistente, com possibilidade de inaugurar um virtuoso ciclo, convertendo o desenvolvimento em inclusão social e inversamente, inclusão em desenvolvimento econômico. 216 Seis anos do Supersimples Órgãos e autarquias cujas competências antes eram reconhecidas pelo funcionamento quase que estritamente técnico e tutelar, começam a assumir metas e compromissos sociais consoantes aos propostos pelo Governo, gerando um ambiente de veemente sinergia entre os entes que integram os núcleos de ação das macropolíticas sociais orientadas para a erradicação da pobreza extrema e para o avanço da formalização do mercado de trabalho, ou seja, para a consolidação de um corolário maciço que viabilize um desenvolvimento seguro. Dirceu Brás Aparecido Barbano nasceu em 1966 na cidade paulista de Ibaté. Graduado em Farmácia pela PUC Campinas, tornou-se professor da mesma universidade. Foi dirigente sindical dos farmacêuticos e secretário municipal de Saúde em Ibaté e São Carlos. No Ministério da Saúde, coordenou o programa Farmácia Popular. Adotando a mesma postura e na condição de articulador principal no escopo sanitário, a Anvisa assumiu para a sua gestão um compromisso estratégico com o expediente programático das políticas sociais do governo. Aliou suas irrenunciáveis prerrogativas normativas, imprescindíveis à preservação e aprimoramento da saúde pública no Brasil, com a garantia de aderir ao programa nacional Brasil sem Miséria, através do projeto inclusão produtiva, mais especificamente na área de “Segurança Sanitária”, como lhe foi outorgado. Assim, a Anvisa, buscando reforçar a promissora relação de simbiose firmada entre os atores institucionais compromissados com o desenvolvimento social associado à inclusão econômica, está empenhada em fornecer ensejo para desenvolver ações estratégicas com o propósito claro de criar um suporte mais amplo para a construção do diálogo com os demais órgãos governamentais e instituições que encabeçam as políticas públicas de desenvolvimento e, por conseguinte, prover o robustecimento das capacidades e das medidas do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária (SNVS). As propostas adotadas pela Anvisa têm como orientação, portanto, instituir o mutualismo eficaz entre suas parcerias, visando implementar o projeto de inclusão produtiva com segurança sanitária, a fim de inserir no circuito de oportunidades alcançadas pelo avanço econômico brasileiro a parcela menos favorecida da população. Isso engloba uma série de medidas a serem sistematicamente desenvolvidas, entre elas a instrumentalização legal específica por meio da elaboração de um Marco Regulatório Sanitário que definirá os parâmetros e garantias necessárias ao amparo institucional, sobretudo nas dificuldades legais e burocráticas, para os empreendimentos individuais e empreendimentos da Economia Solidária. A sensibilização e o fornecimento de materiais com conteúdo didático também serão fundamentais para capacitar o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária, os setores envolvidos e fortalecer a interação com os demais órgãos do governo ou da sociedade civil, com a finalidade de tornar indissociáveis os conceitos de “empreendedorismo” e “segurança sanitária”. Resta claro que a Anvisa pretende abraçar a senda inaugurada pelo Simples Nacional para reiterar parcerias que têm demonstrado alto nível de competência com aquelas entidades já reconhecidamente eficientes, como é o Sebrae. Aproveitamos para comemorar a LC 123 pelos resultados extraordinários e pelo caminho que nos permitiu trilhar rumo a um Brasil com equidade. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 217 Capítulo 11 • • • Os avanços da Redesim ARTIGO | angela Pace INTEGRAÇÃO, o caminho para simplificar “ angela Pace Presidente da Junta Comercial de Minas Gerais Seis anos do Supersimples Quase tudo pela internet Exportando know-how Cada vez mais presente nas cidades mineiras, a Jucemg contava em 2010 com 31 unidades, incluindo a sede. Para ampliar e agilizar a formação de novos negócios em Minas, a atual gestão, a partir de 2011, expandiu a presença da Junta pelo serviço Minas Fácil para mais 60 municípios, garantindo assim maiores facilidades para a abertura de empresas: sem burocracia, com todos os procedimentos feitos em um mesmo local e pela internet. Apenas a última das quatro etapas para abertura de A autarquia mineira ultrapassa as fronteiras de Minas para compartilhar suas inovações. Pelo projeto Integrar, a Jucemg repassa sua metodologia referente à abertura de empresas a oito estados e o Distrito Federal. A assinatura do projeto, em convênio com o Sebrae Nacional e parceria com o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC) e o Departamento Nacional de Registro do Comércio (DNRC), – abre as portas para a efetivação da Rede Nacional para Simplificação do Registro e Legalização de Empresas e Negócios (Re- de Planejamento e Gestão (Seplag). A fim de criar condições para promover e ampliar conhecimento, a atual gestão inovou mais uma vez e criou, em 2011, sua Escola Permanente. Instância oficial de capacitação e aprimoramento constante de servidores, colaboradores e usuários dos serviços da autarquia, a EPJ lançou cursos de educação a distância, proporcionando para a comunidade acadêmica e empresarial a abertura de empresas de forma fácil, ágil e pela internet são avanços e inovações da Junta Comercial de Minas Gerais, cujas ações têm impactado diretamente na geração de riqueza e trabalho no Estado. A Jucemg é referência nacional no registro mercantil, por concluir o processo de abertura de uma empresa em Minas em até 9 dias, prazo bem inferior à média nacional de 119 dias apurados pela pesquisa Doing Business, do Banco Mun- 218 cial. As atividades de capacitação começaram em 2011 e já percorreram mais de 65 municípios mineiros, capacitando mais de 3,3 mil empreendedores. empresas é realizada presencialmente. A projeção é que a Junta Comercial amplie ainda mais sua presença no interior, num acréscimo total de 477% entre 2011 a 2014. O Minas Fácil foi criado pelo Governo Estadual, por intermédio do Projeto Estruturador Descomplicar, implantado pela Secretaria de Estado Fomentar a atração de novos investimentos com dial, em 2011. Em Minas Gerais, a Junta Comercial criou um ambiente favorável para abrir novos empreendimentos. Diariamente, são registradas em média 205 empresas. No ano de 2012, 50.997 empresas foram formalizadas, com uma média de 4.250 novos negócios abertos por mês, com destaque para o comércio varejista de vestuários e acessórios. Ao todo, 701.420 empresas estão ativas no Estado. No primeiro trimestre de 2013, 12.176 empresas foram formalizadas, totalizando 709.190 empresas ativas no Estado. Natural de Belo Horizonte (MG), angela Maria Prata Pace Silva de Assis graduou-se em Direito e em Letras pela PUC Minas, onde também lecionou. É pós-graduada em Redação pela PUC Minas e em Problemas de Desenvolvimento Econômico por Harvard. Advogada e empresária, foi secretária de Justiça e Direitos Humanos no Governo de Minas e vice-presidente da Associação Comercial de Minas. novas formas de aprendizagem pela internet. Para capacitar os empreendedores, contadores e usuários em geral sobre os serviços de registro e gestão de empresas, a Junta Comercial promove os Arranjos Produtivos de Capacitação, em parceria com o Sebrae MG. Os APCs contam com orientação técnica, palestras e material de apoio composto de cartilhas com informações para quem pretende abrir ou melhorar a gestão de seus negócios. O objetivo é aproximar os profissionais usuários dos serviços da autarquia, fomentar o espírito empreendedor e socializar os trabalhos da Junta Comer- desim), criada pela Lei 11.598 de 2007. Dessa forma, os empresários dos Estados beneficiados poderão acessar o sistema de registro de empresas pela internet e só entregar os documentos na Junta Comercial, que se comunicará com os demais órgãos envolvidos. Isso evitará que os empreendedores tenham que percorrer diversas repartições, reduzirá custos com taxas e cópias de documentação e diminuirá o tempo para registro do negócio. O Distrito Federal já opera a tecnologia da Jucemg. Os estados do Paraná e Sergipe iniciaram o processo. Em breve, Ceará, Pará, Paraíba, Rondônia, Roraima e Tocantins estarão adotando nossa tecnologia. Com essas mostras de agilidade e atualização de seus serviços, a autarquia mineira busca obter o selo da Qualidade Total. Prova disso, é o empenho pela certificação da norma ISO 9001/2008, que garantirá, além da padronização de processos, a integração de ações em favor da abertura, alteração e extinção de empresas. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 219 Capítulo 11 • • • Os avanços da Redesim ENTREVISTA | Helder Salomão governar sonhos em realidade é transformar HELDER SALOMÃO Ex-prefeito de Cariacica (ES) Cariacica, na região me- tropolitana de Vitória, é a terceira cidade do Estado, mais populosa do que a própria capital. No entanto, na lista dos maiores municípios capixabas, é o que detinha o menor PIB per capita. Em 2005, era de R$ 6.783. O ex-prefeito Helder Salomão, professor de Filosofia com especialização em Planejamento Educacional, revolucionou a economia da cidade ao implantar e aplicar os princípios da Lei Geral das Micro e Pequenas Empresas, acumulando prêmios de Prefeito Empreendedor. HELDER SALOMÃO, 49 anos, natural de Colatina, é ex-prefeito de Cariacica (ES) pelo PT. Foi vereador, deputado estadual, e está concluindo dois mandatos sucessivos como prefeito. Foi premiado nacionalmente como Prefeito Empreendedor. É autor do livro “A Força dos Pequenos Negócios”, com prefácio do ex-presidente Lula. Atualmente é secretário de Estado da Assistência Social e Direitos Humanos do Espírito Santo. 220 Seis anos do Supersimples Sebrae – O senhor finalizou o seu segundo mandato à frente da prefeitura de Cariacica. Como recebeu o município e como o deixou para o seu sucessor? Helder Salomão – Cariacica não tinha crédito, sua máquina administrativa completamente estagnada, sem nenhuma capacidade de resposta, uma situação bem difícil. A cidade viveu 30 anos de instabilidade política. Fui o 18º prefeito em 30 anos, quando deveriam ter sido apenas oito. No plano de governo que apresentei, coloquei duas prioridades que depois acabaram se consolidando, que são desenvolvimento econômico com foco na micro e pequena empresa, e educação com foco na educação básica e na qualificação profissional. Hoje Cariacica é a cidade do Estado que mais oferece cursos técnicos de nível médio. Nossa vocação é muito forte para a logística, porque temos duas rodovias federais que cortam o município e duas ferrovias. Em 2005 implantamos o planejamento estratégico e começamos a resgatar a credibilidade do poder público dentro de uma visão empreendedora. Sebrae – O senhor é uma das maiores referências na implantação da Lei Geral da Micro e Pequena Empresa, inclusive foi eleito Prefeito Empreendedor pelo Sebrae em 2010. Sua especialização em Planejamento Educacional ajudou? Helder Salomão – Nós acreditamos muito na força da educação. Qualquer cidade, estado ou nação que queira se desenvolver tem que dar oportunidade para que as pessoas tenham acesso à educação. A educação possibilita o conhecimento das mais variadas tecnologias disponíveis para que as pessoas empreendam. Junto com isto vem um desenvolvimento econômico focado nos pequenos negócios. Alguns gestores públicos ainda não entenderam que é melhor apostar nas pequenas atividades econômicas em vez de ficar quatro anos sonhando em atrair uma grande empresa. Por isto, acompanhamos desde o início a discussão que estava sendo travada no Congresso em relação à Lei Geral da Micro e “Só em 2011 foram abertas mais de duas mil empresas em Cariacica. Por isto estamos liderando a taxa de emprego na Grande Vitória há mais de dois anos”. Pequena Empresa. Fomos construindo aqui uma sinergia com o setor empresarial e preparando o caminho para ter a nossa Lei Municipal. Quando o presidente Lula sancionou a Lei em 2006, Cariacica já tinha o seu projeto de lei pronto. Por isto mesmo, em dezembro de 2006, fomos o primeiro município brasileiro a aprovar uma Lei Geral municipal. Sebrae – Do ponto de vista econômico, o que significou para a arrecadação do município a saída da informalidade? Helder Salomão – Mais de três mil municípios regulamentaram a Lei, mas poucos conseguiram implementar. Este, aliás, tem sido o grande desafio colocado para o Sebrae e para todas as entidades que trabalham com as micro e pequenas empresas: transformar a lei num instrumento efetivo da economia municipal. O que nós destacamos é que não dá para fazer o que todo mundo faz. Tem que ter ousadia, criatividade, ineditismo, apostar na mudança. Lancei para minha equipe o desafio de formular projetos de alto impacto para a sociedade, mas de baixo custo, porque o município tinha dificuldades orçamentárias. E aí os resultados começaram a aparecer. Montamos a Casa do Empreendedor, onde o empresário resolve tudo. Microempreendedor individual, micro ou pequeno empresário se registra em pouco mais de cinco minutos, abre empresa, faz operação de crédito, etc. Quando eu assumi, eram 150 dias para se entregar um alvará. Desde 2009 podemos entregar um alvará de Seis anos do SUPERSIMPLES 221 Capítulo 11 • • • Os avanços da Redesim exemplos de sucesso | espírito santo ENTREVISTA | Helder Salomão funcionamento em 48 horas ou em cinco minutos pela internet. Outra coisa importante: em 2006, de cada cem empresas abertas no Espírito Santo, apenas seis eram de Cariacica. Hoje são 15. Portanto, não só estamos regularizando como estamos atraindo empresas. Só em 2011 foram abertas mais de duas mil empresas em Cariacica. Por isto lideramos a taxa de emprego na Grande Vitória há mais de dois anos. Sebrae – Em termos de números para o caixa do município, dá para quantificar? Helder Salomão – Houve um aumento de 13% da arrecadação do ISS das micro e pequenas empresas, isso lembrando que reduzimos a carga tributária de 37 segmentos. Na medida em que você apóia a micro e pequena empresa e faz desburocratização, há uma ampliação da formação de empresas. Quando você aumenta o número de empresas formais, você aumenta a arrecadação. Temos, portanto uma carga tributária menor, mas uma base tributária maior. Sebrae – Entra governo, sai governo e todo mundo discute uma reforma tributária que não acontece nunca. Será este o caminho? Helder Salomão – O Simples é uma mini-reforma tributária, voltada para os pequenos negócios. É um exemplo de que é possível fazer esta reforma, reduzir a carga tributária e estimular setores que são vitais para a economia. É óbvio que temos que ter todo o cuidado porque precisamos respeitar a Lei de Responsabilidade Fiscal, que não nos permite renunciar a receita. Então, tem que fazer com uma mão a política de incentivo aos pequenos negócios e com a outra garantir a atração de novos investimentos como a formalização dos empreendimentos já existentes. Só de empreendedores individuais em Cariacica nós já temos mais de oito mil cadastrados. Outro detalhe relevante é a questão das compras públicas pelas quais fomos até premiados nacionalmente. Começamos a implantar este programa em 2008, quan222 Seis anos do Supersimples Exemplos de sucesso “Só de empreendedores individuais em Cariacica nós já temos mais de oito mil cadastrados”. do apenas 14% do que era comprado pela Prefeitura tinha origem nas micro e pequenas empresas. Nós passamos para 54% e – considerando o pregão eletrônico – sobe para 70% o que a gente compra das micro e pequenas empresas. Como efeitos colaterais, tivemos uma redução enorme da inadimplência do IPTU, um aumento significativo de nossa arrecadação do ICMS do Estado. Enfim, um grande salto da autoestima do cidadão. Sebrae – O Sr. encerrou sua administração com a sensação de dever cumprido? Helder Salomão – O que me deixa mais feliz é saber que uma cidade desacreditada até oito anos atrás, como a nossa, ganhou vários prêmios e virou uma referência para o Brasil, um modelo de implementação da Lei Geral das Micro e Pequenas Empresas. Sou um defensor do Simples Nacional e do trabalho desenvolvido pelo Sebrae. Acredito que as cidades possam ficar muito melhores e mais sustentáveis dando oportunidades para o cidadão e para o empreendedor local. Governar é transformar sonhos em realidade e empreender é transformar boas ideias em projetos que tragam resultados para a vida das pessoas. O ex-prefeito de Cariacica, Helder Salomão, criou uma Casa do Empreendedor para dar apoio a quem desejava abrir um pequeno negócio. O Espírito Santo foi o primeiro Estado a ter a Lei Geral aprovada em 100% dos municípios, mérito de seus governadores e do presidente da FNP, João Coser. zíperes e novelos Armarinho Alto Astral Cleidimar Eliseu Miguel parece nome de homem, mas é de mulher, e bonita. E dedica-se a uma atividade tipicamente feminina, uma loja de armarinho que enfeita de cores a região do Mercado Central de Vitória. Cleidimar tem 37 anos e vem de um pequeno município capixaba chamado Água Doce do Norte, com apenas 12 mil habitantes. “O comércio está no sangue da minha família. Somos sete irmãos, cada um num ramo diferente. Quando vim para Vitória, aos 9 anos, senti muita falta dos armarinhos, porque a gente no interior costurava muito. Dessa saudade me veio a ideia de entrar no mercado”, relembra Cleidimar. Há 12 anos ela luta para melhorar seu empreendimento. Diz que não foi fácil chegar onde chegou, que é uma pequena loja com depósito no segundo pavimento. Mas seu acervo de aviamentos com centenas de cores e formas é de fazer a alegria de qualquer costureira, estilista ou mesmo dos fotógrafos. São centenas de escolhas entre peças de tecido, linhas, novelos, agulhas, retrós, fitas, elásticos, brocados, botões, zíperes, colchetes, viés, sianinhas, etc. “Microempresário que quiser entrar para o ramo de armarinho deve ter na cabeça que neste mercado não se ganha dinheiro fácil e rápido. No começo foi muito difícil, era só para sobreviver. O surgimento do SupersimSeis anos do SUPERSIMPLES 223 Capítulo 9 • • • Os avanços da Redesim exemplos de sucesso | espírito santo ples foi um impulso importante. Além da formalização e das facilidades fiscais, os cursos oferecidos pelo Sebrae são essenciais. Eles vêm até nós, então aprendemos fazendo, aqui dentro da loja mesmo”, reconhece. O Armarinho Alto Astral tem duas funcionárias, mas a própria Cleidimar afirma que trabalhou como uma espécie de funcionária durante cinco longos anos, até poder fazer a primeira retirada a título de lucro. “Antes era só comprar e pagar, até compor o estoque que tenho hoje para oferecer. Agora é crescer. Só preciso de mais espaço, e estou procurando uma loja maior”, planeja. Com um sorriso confiante, ela não tem dúvida de que vai chegar onde deseja. Enquanto isso, deixa um conselho para quem tiver um sonho parecido: “Pesquise o seu mercado, busque ajuda. O Sebrae é o melhor caminho. Faça o seu melhor e prepare-se para investir com a consciência de que vai levar tempo para você ganhar dinheiro”. 224 Seis anos do Supersimples FORMALIZAÇÃO “Fique Legal” sempre com dias melhores”. O atendimento é rápido, coisa de dez minutos e ele sai de lá com o pedido já encaminhado. A próxima atendida é a revendedora de prata Bárbara Silva Ferreira, de 18 anos, que se anuncia como a mais nova empreendedora de Cariacica. “Fiz o meu registro como microempreendedora na Prefeitura e vim aqui hoje pegar o meu certificado para dar entrada com o pedido de um microcrédito. Minha revenda aumentou muito e por isto eu preciso comprar mais mercadoria. As coisas melhoraram e o objetivo é virar uma microempresária o mais rápido possível”. Não leva muito tempo o encaminhamento do pedido de Bárbara. Heleninha Lúcia Ordenes já estava sendo atendida e logo explica a sua trajetória: “Olha, na verdade eu não era nada. Hoje tenho um pequeno salão, sou manicure e pedicure. A vida melhorou bastante e eu estou muito feliz com este projeto do Sebrae e da Prefeitura. O plano para o futuro é crescer e esta é a grande oportunidade que a gente tem”. O próximo atendido é o pedreiro Eliseu Borges, já inscrito há mais de dois anos como MEI. Faltam dentes no seu sorriso de satisfação. Está ali para “pular de andar” e virar microempresário. “Minha vida mudou muito. Antes, a gente não podia pegar serviços maiores, porque os clientes exigiam uma nota fiscal”. Eliseu informa que está em busca de um comprovante para abrir uma conta em nome da sua empresa. “Já estou subindo o andaime da obra para virar microempresário. A autoestima está lá em cima, no topo da obra”, complementa, recebendo a resposta de sua demanda e agradecendo aos atendentes do programa. O comando do projeto é da coordenadora de Projetos Estruturantes da Prefeitura, Wanderléia Lúcio Mendes. O sol abrasador não lhe diminuía o entusiasmo e a cortesia. Ela explicou que o projeto “Fique Legal” não se resume a estar ali na praça oferecendo a formalização para as pessoas. “Nós trazemos junto outros projetos, como o Comércio Total, que visa garantir a sustentabilidade destas empresas para evitar a sua mortalidade precoce. Em síntese, estamos promovendo a inclusão social. Isto gera emprego, gera renda, é muito gratificante. É muito bom ver as pessoas se sentirem incluídas na sociedade, podendo bater no peito e afirmar ‘eu sou um empresário, eu tenho poder de negociação”, conclui Wanderléia. Sol de 37 graus ao meio-dia na avenida Expedito Garcia, centro comercial do bairro do Campo Grande, de Cariacica (ES), conhecido como o maior shopping a céu aberto do Estado. A kombi e o pessoal do programa “Fique Legal” da Prefeitura já está lá desde as nove da manhã e já atendeu 68 pessoas, cada um com uma demanda diferente. À frente na fila está o vendedor ambulante de alimentos José da Conceição Taveira, inscrito há tempos como MEI e que busca um financiamento para ampliar o seu negócio. Com largo sorriso, ele explica seu objetivo: “Eu sou ambulante, já saí da informalidade e o objetivo agora é o de virar um microempresário. Afinal, depois deste apoio do Sebrae e da Prefeitura, a gente sonha Seis anos do SUPERSIMPLES 225 Capítulo 11 • • • Os avanços da Redesim exemplos de sucesso | espírito santo Com o foco no futuro O fotógrafo contratado pela própria Prefeitura Cláudio Postay era fotógrafo free-lancer na Grande Vitória. Foi um dos primeiros a perceber as oportunidades que se abriam para ele quando a Prefeitura de Cariacica começou a estimular a formalização de empreendedores individuais. Inscreveu-se pelo Portal do Empreendedor e com o CNPJ participou e venceu uma licitação da própria Prefeitura. Esse contrato já terminou, mas lhe abriu a porta para vários outros trabalhos que não conseguiria como pessoa física. “Nessa profissão você nunca tem nada garantido. Tirando o pessoal do jornalismo e os artistas, o fotógrafo trabalha quase sempre sozinho. Você tem que estar sempre correndo para conquistar alguma coisa. O fotógrafo é um cara que não pode parar. Tem que estar sempre estudando, se atualizando. Tem a ver com isto mesmo, empreendedorismo”, desabafa. Ele começou aos 15 anos como ajudante de fotógrafo, carregando equipamento e segurando o flash auxiliar. Mesmo depois de se tornar profissional, os trabalhos eram sempre temporários para os estúdios que ganhavam as concorrências das grandes empresas. “Eles ficavam com a parte do leão e eu com as migalhas”, compara. O trabalho com fotografia ia virando um bico para complementar o orçamento. Postay se pergunta de quem era a culpa e bate no peito: “Era minha mesma. Eu morria de medo da burocracia. Tinha pavor de pagar um contador, ter um monte de documento. Daí que, quando era preciso, eu comprava uma nota de alguém legalizado e tinha que pagar o imposto e a comissão”. Com o CNPJ, as portas se abriram Ao tomar conhecimento da Lei Geral e do Supersimples, ele entendeu que a solução era aderir. “Fui à Casa do Empreendedor e me registrei como MEI. Eles me deram todas as informações e eu já sai de lá com o meu CNPJ na mão. Na outra semana eu já tinha também o meu alvará de funcionamento. Comecei a disparar e-mails e telefonemas para todo mundo que eu conhecia avisando: olha, eu agora estou legal, tenho CNPJ. Se precisarem é só ligar”. Não demoraram a surgir os primeiros clientes. Um mês depois, veio a licitação da própria Prefeitura, ele ganhou e essa abriu outras portas. “Acabaram os esque- 226 Seis anos do Supersimples minhas para sobreviver. Hoje sou profissional da fotografia em tempo integral. Ainda pequeno, mas sou empresário. Tenho o material que preciso ter. Posso investir até em publicidade”, conclui Cláudio, com um enorme sorriso no rosto. Com vários contratos com sindicatos e empresas, além de alguns na área pública, o faturamento de Postay já está batendo no limite do MEI. Por isto mesmo, a ideia é pular de nível para a microempresa. “Eu e outros na mesma situação temos uma ideia muito legal de criar uma cooperativa. Juntar todo mundo. Fotógrafos, jornalistas e publicitários num negócio maior. Tudo jun- to, num lugar só, onde possamos atender integralmente aos clientes em todo o espectro das comunicações”. O conselho que ele dá a quem ainda está na informalidade é só um: “Não fique pensando muito. Vá lá, registre-se e comece a fazer cursos para incrementar o seu negócio. O curso de Compras Governamentais do Sebrae me abriu os olhos e me tirou o medo de trabalhar para uma prefeitura e não receber. Hoje eu sou empresário e tenho a legislação para me defender. Não sou mais empregado de ninguém. Trabalho para mim, faço meus horários e defino meu faturamento”, conclui. Doucher Comércio e Indústria Ltda. Uma ducha mais higiênica Quem poderia imaginar uma associação entre válvulas hidráulicas e cosméticos, ainda mais feita por um engenheiro florestal? Pois a ideia de misturar os dois produtos ocorreu a Carlos Oliveira no início da faculdade, quando assistia a palestra de um médico sobre a ineficiência do papel higiênico para a assepsia corporal. Há anos esse inventor começou a aperfeiçoar um produto que pode revolucionar a higiene corporal e ainda ajudar na manutenção de um meio ambiente mais saudável dentro dos banheiros. O produto já está sendo comercializado em três estados: Pará, Rio Grande do Sul e no Espírito Santo e está prestes a entrar em São Paulo. “Descobri o óbvio com aquela palestra”, afirma o engenheiro: “Não se limpa nada direito sem água e sabão. Então comecei a pensar em alguma coisa que pudesse acoplar às já tradicionais duchinhas sanitá- rias dos banheiros que, convenhamos, pela forma de uso e manuseio, têm muito pouco de higiênicas e/ou ecológicas”. A partir desta ideia, Carlos Oliveira começou a projetar um compartimento cilíndrico (de vidro e com uma tampa removível para reabastecimento) para ser adaptado às tradicionais duchas de banheiro. O cilindro é abastecido por um tipo de sabão especial (produzido por uma das empresas da área mais conhecidas no país). Além do dispositivo para acoplamento na saída de água das duchas, o cilindro conta também com uma pequena alavanca que, acionada antes do uso da ducha, libera uma pequena quantidade do produto. Na sequência, ela volta a esguichar apenas água, finalizando o processo de limpeza. O sabão líquido forma também uma camada de superfície no vaso sanitário que impede, dada a descarga, a contaminação do banheiro com a aspersão, por exemplo, de coliformes fecais. Simples, fácil, barato e eficiente. Seis anos do SUPERSIMPLES 227 Capítulo 11 • • • Os avanços da Redesim exemplos de sucesso | espírito santo O risco do roubo de patentes Como o jogo da grande indústria é pesado e a invenção podia alertar outros segmentos do ramo, Carlos explica que foi preciso tomar todo o cuidado. O primeiro deles foi o sigilo na hora de patentear o produto. “O processo de patentes no Brasil é muito frágil e arriscado. Quase 90% de nossas grandes ideias são roubadas por firmas inescrupulosas que recebem o seu pedido e o seu dinheiro, registram a invenção em nome de ‘laran228 Seis anos do Supersimples jas’, às vezes no exterior, e te deixam a ver navios. Eu estava prestes a contratar uma delas quando o Sistema Firjan (que reúne órgãos de defesa da indústria fluminense) mandou um e-mail sobre um curso de patentes. Comprei uma passagem na hora e fui para lá fazer o tal curso. Vieram especialistas do mundo todo para explicar os riscos de roubo de patentes. Por isto mesmo, fiz tudo sozinho e no maior sigilo”, conclui o empresário. Carlos explica ainda que no início (as pesquisas começaram em 2009) não tinha nenhum apoio e precisou vender duas casas e um automóvel da família para começar a produção. “Só começamos a comercializar em 2011 e o Sebrae foi muito importante para nos dar confiança. Por quê? Você acredita no seu filho, tem um produto bonito e eficiente nas mãos. Mas será que os outros também vão achar bonito? Eles vieram à minha empresa, estudaram o produto, apostaram na viabilidade dele e montaram um plano de negócios. Depois, solicitei ajuda para desenvolver um plano de marketing”. Este resultado pode ser explicado pelos testes de campo, feitos numa escola pública, longe do ambiente de laboratório, com o produto nas mãos de usuários que fogem totalmente ao ambiente de teste. “Além de uma melhor higienização, os testes apontaram uma redução de 95% da contaminação do ambiente”, explica o empresário. O caminho para os inventores brasileiros é sempre longo e difícil. No começo, ninguém sabe que o produto existe. É preciso estudar a viabilidade da ideia, para evitar desilusões. “O Sebrae me deu o único suporte eficaz, mas bem que o Governo podia ser mais generoso e abrir programas específicos para os pequenos inventores. Se eu estivesse num país que apóia a criatividade, como os Estados Unidos, tudo isto seria bancado pelo Governo. No Brasil, não. A gente tem que bancar tudo no começo e, se bobear, ainda paga coisas que não teria que pagar. A guerra fiscal entre os estados, por exemplo, é um grande entrave para o crescimento do meu produto e da minha empresa”, alfineta o microempresário da higiene. caixas artesanais para presentes Recriando o papel e criando embalagens Não seria um exagero afirmar que os hippies e seus produtos artesanais, quase sempre reutilizando e reciclando materiais, foram os pais do que hoje constitui o “ecologicamente correto”. Juliana Nunes Riguette e sua irmã Emanuelle, com dez anos de mercado, poderiam ser qualificadas como herdeiras destes pioneiros. “Na verdade, começamos com um trabalho caseiro de artesanato de jóias que, modestamente, era muito bem aceito. Mas tínhamos um problema: ter uma embalagem bacana para acondicionar nossas peças. Aí a Emanuelle descobriu um curso que ensinava a fazer papel reciclado de maneira simples, dentro de casa mesmo, com um velho e resistente liquidificador doméstico. Ficou bacana, o negócio melhorou”, relembra Juliana. Depois a irmã entrou para a faculdade, ficou grávida e deram um stop na atividade. Só retomaram anos depois, quando se encantaram com um álbum de fotos feito de papel reciclado e a empolgação ressurgiu. “Voltamos ao mercado trabalhando com fotógrafos profissionais e algumas encomendas particulares. Tudo ainda na informalidade. Já morávamos aqui no alto, neste lugar lindo, bem na entrada do Convento da Penha. Um dia surgiu uma encomenda muito grande e foi preciso ampliar tudo. O volume de material, o tamanho das fôrmas, estas coisas”, prossegue Juliana. No meio da enorme confusão do que hoje já não é casa, mas um grande ateliê com uma simpática loja anexa, ela explica que a qualidade do produto e o volume Seis anos do SUPERSIMPLES 229 Capítulo 11 • • • Os avanços da Redesim exemplos de sucesso | espírito santo de venda cresceram e já era hora de contratar mais gente para atender a demanda, além de separar as coisas. “Morar e produzir no mesmo lugar significava trabalhar 24 horas por dia. Então abrimos uma lojinha no centro de Vila Velha. Tudo ainda na ‘cara dura’, sem registro e sem empresa, apenas como artesãs”. De artesãs a microempresárias Foi justamente a carteirinha de artesãs que as aproximou do Sebrae, primeiro ao participarem de feiras fora do Espírito Santo, como a Mãos de Minas. “Descobrimos que as coisas profissionais começavam se misturar com as pessoais – as contas de casa, por exemplo. Resolvemos nos inscrever como MEI, e contratar pelo menos um funcionário. Ficamos por aí uns quatro anos, 230 Seis anos do Supersimples até que o negócio cresceu e acabamos pulando para a microempresa”, conta Juliana. Para ela, o apoio do Sebrae fez a diferença. Principalmente as consultorias financeiras. “Quando a gente vira empresa não dá mais para ficar naquela de anotar as coisas num papelzinho, mesmo que seja reciclado, e jogar na gaveta. O Sebrae nos ajudou também na divulgação, por exemplo, para criar o nosso site que ampliou o conhecimento de nossos produtos para o grande público. Eles vieram aqui dezenas de vezes para nos explicar como fazer a coisa direito. Aprendemos, mas ainda falta muito. Hoje a gente ainda paga para trabalhar, mas o faturamento só faz crescer”. Entre um telefonema e outro para receber pedidos, Juliana explica que elas evitam a terceirização para manter a qualidade: “Se a gente pega uma encomenda grande e não tem, por exemplo, uma máquina de corte fino, é melhor comprar uma do que terceirizar, o que implicaria em problemas de custos, qualidade e prazos”. Para superar este e outros entraves, elas começaram a trabalhar com a Associação das Lavradoras de Caparaó, hoje responsável pela produção de quase todo o papel reciclado que utilizam. “Aposentamos o velho liquidificador e ainda geramos emprego e renda para essas mulheres que não tinham recursos e trabalhavam somente nas roças de café dos maridos. Agora elas se sentem mais felizes e independentes. Fazem uma verdadeira festa para a gente quando vamos buscar o produto”, sorri Juliana. Apesar dos dez anos de atividade, por enquanto a palavra de ordem é reinvestir. “Mesmo como microempresárias, ainda nos sentimos empregadas e trabalhamos muito mais do que nossos funcionários. Mas tudo isto mudou a nossa visão do negócio. A gente sabe o tamanho e a importância que tem e, certamente, vamos continuar crescendo. Só um conselho: a gente fazia arte e só entendia de arte e não de negócios. Então, buscar informações e formação foi essencial. Ter uma consultoria como a do Sebrae oferecendo um suporte é essencial”. Iogurtes e saladas da Ginga O empresário que veio do frio O jovem microempresário Júnior Garcia, que produz frozen (um sorvete à base de iogurte) e complementos como salada de fruta e creme de açaí que viraram febre na capital do Espírito Santo, afirma estar vivendo uma crise de adolescência, e explica: “É quando a pessoa não é mais criança, mas também ainda não é adulto. Ainda não está preparada para isto. Mas por não sermos mais criança – temos seis anos de atividade – temos que ser profissionais. É hora de crescer”. Questionado se já nasceu sorveteiro ou empreendedor, Júnior não tem dúvidas: “É um histórico de família. Meus pais e meus tios nunca trabalharam como empregados. A ideia de iniciar a Ginga veio de um amigo que comentou esta tendência do mercado mundial da alimentação saudável. Apostei e deu certo. Já temos hoje quatro pontos de venda próprios e nove franqueados, inclusive dois em Belo Horizonte. São pessoas que estiveram aqui e enxergaram a viabilidade do negócio. Além disto, estamos sempre mapeando a construção de shoppings pelo País. Garcia informa que hoje, depois de seis anos, uma franquia de sua empresa já atinge R$ 45 mil e que a montagem de uma loja fica em torno de R$ 150 mil, com todos os equipamentos já incluídos. “A gente criou uma estrutura de montagem e distribuição que atende hoje a todos os postos de venda com tudo que eles precisam para trabalhar. Do detergente até a pilha da impressora, passando, é claro, por um produto de primeira qualidade”. Geração que não come hamburguer Iogurtes gelados parecem destinados a alto consumo no verão, mas o microempresário afirma que está tentando fugir deste foco do frozen, que está na moda, porque o objetivo central é melhorar a vida e a saúde das pessoas, incentivando hábitos saudáveis. “A gente vende frutas onde você, geralmente, só encontra porcaria. Afinal, fala-se e discute-se tanto sobre alimentação saudável que acabamos tendo mídia de graça. Há toda uma geração que está sendo formada para não comer mais hamburguer nem tomar refrigerante. Aí está o nosso mercado”, posiciona. Todavia, complementa o empreendedor, não adianta ter uma grande ideia e andar junto com as tendências Seis anos do SUPERSIMPLES 231 Capítulo 11 • • • Os avanços da Redesim exemplos de sucesso | espírito santo se você não tiver um apoio correto. “Este apoio eu encontrei no Sebrae. Curioso é que no primeiro momento foi uma surpresa desagradável. Eu queria fazer frozen de iogurte e a pessoa que me atendeu lá disse que isto não existia. Como sou administrador de empresas, virei a mesa. Provei que existia sim. Propus, fui atendido, e participei de vários cursos de administração de projetos estratégicos. Vieram até aqui, avaliaram o meu negócio e disseram onde eu estava acertando ou errando. Eles também aprenderam, tanto que a minha empresa virou um projeto-piloto. Hoje, quem quer ser um franqueado nosso tem todas as informações no site do Sebrae. Eles abriram um caminho para mim e eu acho que abri um caminho para eles. Parceria é isto aí”. Garcia Júnior não perde de vista a expansão do seu negócio. “Estou há seis anos sem fazer retiradas de lucro. Tudo que entra é reinvestido, por isto tivemos um crescimento tão rápido. O faturamento pulou de R$ 1 milhão em um ano para R$ 3 milhões no outro. Todavia, ainda sou um empregado de mim mesmo. Estou fortalecendo a base da empresa para depois desfrutar disto. Aliás, fica um conselho para os pequenos empresários: não misturem as coisas. Logo quando a empresa começa a dar algum lucro os caras vão lá e compram um carro ou um apartamento novo. Só que aquilo é dinheiro da empresa, não é dinheiro deles. Saber separar isto é essencial para evitar que a empresa quebre”, ensina. conrad & favoretti De mascates a empreendedores Jaime Favoretti, hoje com 30 anos, começou a vida numa das mais antigas profissões do mundo: mascateando, vendendo roupas de porta em porta. Para usar um termo bem brasileiro, era o popular “sacoleiro”. Com lenço, mas sem documento. Grávida de seis meses, Rosângela Conrad explica como ela e o marido conseguiram realizar o objetivo de ter sua própria loja: “As coisas até que iam funcionando, mas não tínhamos apoio nenhum, nem direitos nem amparo legal. Na informalidade, vivíamos sempre com medo da fiscalização. Quando descobrimos a Lei Geral, nos perguntamos: porque é que a gente não legaliza o nosso negócio, abre uma pequena loja e tenta melhorar de vida?” Segundo Favoretti, o primeiro passo foi procurar o Centro Integrado de Apoio à Micro e Pequena Empresa (Ciampe) – hoje conhecido como Casa do Empreendedor de Cariacica – para a formalização. “Investimos tudo que tínhamos na montagem desta pequena loja aqui no 232 Seis anos anos do do SIMPLES Supersimples NACIONAL bairro de Bela Aurora, mas não paramos de pesquisar. Queríamos aperfeiçoar o atendimento, o visual e a administração da loja. Foi quando os técnicos do Sebrae apareceram aqui no bairro, oferecendo um curso chamado Comércio Total. Mergulhamos de cabeça”, relata Favoretti. Loja começou a ‘bombar’ “Foi um achado”, comemora Rosângela. “Além do curso, eles ainda ofereceram duas consultorias essenciais, uma sobre o visual da loja e outra de controle financeiro. Vieram até a nossa porta. Mostraram todas as nossas necessidades e como supri-las. Tudo com a maior boa vontade e gratuitamente. Foi aí que a loja começou a ‘bombar’ mesmo”. Família feliz e crescendo, confiantes no sucesso do seu comércio que já comemora dois anos, os dois microempreendedores individuais já sonham mais alto. Para eles, atualmente a coisa ainda funciona como se um fosse empregado do outro, mas a ideia é evoluir. “Temos que persistir. O MEI é ótimo, mas ainda vai chegar o dia em que vamos virar microempresários e nos sentir patrões”, afirma Favoretti com a maior convicção. Para complementar a mensagem de confiança, Rosângela ensina os primeiros passos para quem quer crescer: “Primeiro, é pesquisar o seu mercado e se formalizar. Procurar os órgãos responsáveis que, no nosso caso aqui em Cariacica, é a Casa do Empreendedor, onde todos estão reunidos. O segundo passo é buscar a ajuda, os cursos e as consultorias do Sebrae”. Seis Seis anosanos do SIMPLES do SUPERSIMPLES NACIONAL 233 Capítulo ciarlini: “Mossoró é desejada por quem procura qualidade de vida e oportunidades de ascensão ”. Ziulkoski: “A ‘evangelização’ para o tratamento diferenciado às MPEs se intensificou em 2005”. 12 Municipalização O universo de atuação das micro e pequenas empresas é composto pela totalidade dos municípios brasileiros, mas a resposta das municipalidades em termos de implantação da Lei Geral ainda não é a adequada. As leis municipais de adesão já foram aprovadas em 3.951 Cury: “Nenhuma política pública será efetiva se não tiver eficácia em nível municipal”. RIBEIRO: “Fomos o segundo estado brasileiro a implantar a LG em 100% dos municípios”. 234 Seis anos do Supersimples Lei Geral são os de Cariacica (ES), de Colíder (MT) e de São José dos Campos (SP). Não por acaso, seus prefeitos são assíduos no pódio das premiações do Sebrae. São prefeitos que lidam com realidades muito dife- ções às prefeituras para incluir os preceitos da Lei Geral em seus planos diretores, e se incumbiu de treinar oito centenas de agentes de desenvolvimento para atuarem como dínamos da pequena economia local. O professor Eduardo Tadeu Pereira, presidente da porto: “No Ceará, 142 municípios regulamentaram a LG, mas 42 não se sentem estimulados”. Associação Brasileira de Municípios, é um intelectual de esquerda do PT. Ele trouxe a ABM para o esforço do Sebrae com as entidades municipalistas de disseminar a Lei Geral por todo o território brasileiro. Pereira assinala as políticas de incentivo que inúmeras prefeituras estão adotando e propõe empresas autogestionárias pauta- municípios, mas na prática apenas 860 a implementaram efetivamente. Três exemplos que saltam aos olhos Pereira: “Pela primeira vez na História, o Brasil cresce com inclusão social e distribuição de renda”. da liderada por Ziulkoski. Desde 2005, a CNM leva orienta- Melo: “A passagem para média empresa não tem degraus muito altos, mas o ideal seria uma rampa”. das nos valores da Economia Solidária. Outro reforço considerável no trabalho de persuasão dos prefeitos para a superação do marasmo socioeconômico em que seus municípios se encontram será dado pelos conselheiros e auditores dos tribunais de Contas rentes. São José dos Campos abriga um parque tecnoló- estaduais, que recentemente acertaram uma parceria gico voltado para a indústria aeronáutica que é admira- com o Sebrae para levar às prefeituras, com sua indiscu- do em todo o Brasil. O ex-prefeito Eduardo Cury revela ra quando dirigia Mossoró. Seus esforços no governo que algumas das empresas ali incubadas já foram gradu- tem sido voltados para um resgate cultural importante adas e colocam no mercado produtos de alta tecnolo- para a autoestima da população potiguar. tível autoridade, as boas práticas nas compras públicas. Os Sebraes estaduais, embora irmanados pelo mesmo propósito, também lidam com realidades regionais gia. Todas são de pequeno porte e de grande potencial. Os resultados concretos da implantação da Lei nos diferentes. Enquanto o superintendente José Guilherme Um novo espaço está sendo aberto para mais 50 em- municípios abordados neste livro são ricos exemplos de comemora no Mato Grosso a adesão de 100% dos mu- preendimentos desse tipo, e logo virá outra fantástica uma nova mentalidade que deve inspirar os prefeitos nicípios, Alci Porto informa que no Ceará 42 prefeituras novidade: um centro para desenvolver sistemas e tec- eleitos em 2012. A estratégia proposta pelo Sebrae para ainda não se convenceram das virtudes da Lei Geral. nologias voltados para a criação de cidades digitais, em levar essa “evangelização” – como diz o presidente da Zeca Melo fala do trabalho de desenvolvimento de cul- parceria com a Ericsson, da Suécia. CNM, Paulo Ziulkoski – a todos os rincões do Brasil con- tura empreendedorista nos territórios da cidadania e in- A governadora do Rio Grande do Norte, Rosalba ta com o espírito missionário das lideranças das entida- forma que a metodologia do Sebrae potiguar está sendo Ciarlini, foi premiadíssima como prefeita empreendedo- des municipalistas, com destaque para a própria CNM, exportada para países africanos. Seis anos do SUPERSIMPLES 235 Capítulo 12 • • • Municipalização da Lei Geral Municípios com a Lei Geral regulamentada 236 Seis anos do Supersimples Seis anos do SUPERSIMPLES 237 12 Capítulo • • • Municipalização da Lei Geral Municípios com a Lei Geral implementada 238 Seis anos do Supersimples Seis anos do SUPERSIMPLES 239 12 • • • Municipalização da Lei Geral Capítulo artigo | Rosalba Ciarlini PROJETOS transformam vidas que “ Rosalba Ciarlini Governadora do Rio Grande do Norte Sinergia entre o público e o privado Era uma vez uma mulher que sustentava a família lavando no tanque de casa as roupas de outras famílias. Um serviço pesado, uma rotina diária estafante. Um belo dia, ela soube da existência de políticas públicas de incentivo a microempreendedores, com a concessão de crédito e apoio técnico. A mulher foi ao Balcão do Trabalhador da Prefeitura de Mossoró (RN) e pegou um empréstimo para comprar uma máquina de lavar. Com o equipamento, melhorou o rendimento profissional, conseguiu novos clientes e aumentou o faturamento. Pagou o empréstimo, pegou outro, comprou a segunda máquina e continuou prosperando. Hoje é dona de uma grande lavanderia em Mossoró, a maior e mais desenvolvida cidade do interior do Rio Grande do Norte. Apesar do tom de fábula, a história acima é inteiramente verdadeira. Mais que isso: é o resumo de uma das milhares de vidas transformadas pelas políticas públicas desenvolvidas ao longo dos meus três mandatos de prefeita e nesses dois primeiros anos como governadora do Rio Grande do Norte, e que culminaram após a criação da Lei Geral das Micro e Pequenas Empresas. Vidas como a do jovem desempregado que um dia procurou 240 Seis anos do Supersimples a prefeita Rosalba Ciarlini sugerindo que a Prefeitura de Mossoró organizasse um curso de técnico em ótica, foi atendido e, com a ajuda do Balcão do Trabalhador, prosperou e agora é dono de óticas na cidade. Ou como a do fotógrafo que, com o empréstimo tomado no Balcão do Trabalhador, comprou uma câmera e um computador e hoje tem empresa especializada na cobertura de casamentos e outros eventos. Rosalba Ciarlini Rosado nasceu em Mossoró (RN). Formou-se em Medicina, na especialidade de Pediatria, pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Foi prefeita de Mossoró por três mandatos, com um trabalho três vezes premiado pelo Sebrae. Também foi senadora pelo Rio Grande do Norte. Elegeu-se governadora pelo DEM em 2010. Tenho orgulho de haver sido, quando prefeita de Mossoró, parceira do Sebrae e dessas pessoas na construção de histórias de vida que emocionam a qualquer um e comprovam o sucesso do modelo de governança baseado na sinergia entre o setor público e o privado. E tenho ainda mais orgulho porque essas histórias não são exemplos isolados ou esporádicos; ao contrário, elas traduzem uma opção minha, como gestora, e política, de privilegiar ideias e programas capazes de transformar vidas, abrindo novos caminhos para as pessoas e para o lugar em que elas vivem. Mossoró obteve, nas quatro últimas gestões, taxas de crescimento econômico e índices de desenvolvimento social que fazem da cidade um dos lugares mais desejados por quem procura qualidade de vida, oportunidades de ascensão profissional e possibilidades de investimento com retorno certo. Fui prefeita nas três primeiras gestões em que se iniciou esse desabrochar da cidade no contexto local e nacional. O próprio Sebrae nos honrou com o prêmio de prefeito e/ou município empreendedor em três ocasiões. Uma delas por causa da lei municipal reservando 50% das compras do programa de merenda escolar à produção dos criadores locais de cabras e ovelhas. Um programa simples, mas tão eficiente na geração de trabalho e renda no semiárido, que foi adotado por vários municípios da região. Também executamos programas de desenvolvimento do campo, estimulando a apicultura, a agricultura familiar e a criação de caprinos e ovinos. Ainda fomos premiados pela criação do programa “Água Viva/Luz do Sol”, que estimulou a utilização de energia solar por pequenos agricultores na irrigação de suas lavouras. O Sebrae participou decisivamente do programa, treinando os produtores para o uso da energia solar. Primeira cidade a abolir a escravidão O terceiro prêmio – o de “Empreendedor Cultural” – reconheceu nacionalmente o acerto do grande investimento que fizemos para transformar Mossoró em polo regional e nacional do turismo cultural e de eventos, com ênfase na valorização da história e da arte. O projeto incluiu a criação do Mossoró Cidade Junina, que durante todo o mês de junho reúne milhares de pessoas em torno da música, dança, culinária e outras formas da cultura popular nordestina. Também criamos o “Auto da Liberdade”, um grande espetáculo ao ar livre, encenando episódios que retratam o caráter libertário e pioneiro dos mossoroenses: a abolição da escravatura antes do restante do país, o motim das mulheres contra a convocação dos homens para a Guerra do Paraguai, a primeira eleitora inscrita no país e a vitória sobre o bando do cangaceiro Lampião. Além de criar o calendário de eventos, implantamos o corredor cultural, com vários espaços públicos de arte e lazer, entre eles o Teatro Dix-Huit Rosado, um dos mais bonitos e modernos do Nordeste. Esses programas, obras e investimentos sacudiram a economia da região, dotando Mossoró de um nicho de negócios – o turismo – até então inimaginável numa cidade sem recursos naturais capazes de ancorar a atividade. E o melhor de tudo é que o emprego e a renda gerados beneficiaram principalmente os pequenos negócios. O apoio do Sebrae, através da realização de cursos de formação de gestores, proporcionou o surgimento de dois mil duzentos e vinte e seis pequenos empreendedores somente nessa área do turismo cultural. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 241 12 • • • Municipalização da Lei Geral Capítulo artigo | Paulo Ziulkoski A caminhada do desenvolvimento “ Paulo Ziulkoski Presidente da Confederação Nacional de Municípios (CNM) Paulo Roberto Ziulkoski nasceu em Mariana Pimentel (RS). Formou-se advogado e iniciou sua vida pública presidindo a Juventude Gaúcha do MDB. Foi eleito prefeito de sua cidade natal em 1993 e reeleito em 2000. Sua administração contou com 90% de aprovação pela população. Ritual mais sagrado do Movimento Municipalista, a Marcha dos Prefei- tos protagonizou em sua 13ª edição, em 2010, um ato histórico para o empreendedorismo no Brasil. Naquele 20 de maio, como presidente da Confederação Nacional de Municípios (CNM), assinei com o então presidente do Sebrae, Paulo Okamotto, um convênio destinado a expandir as ações da Lei Geral da Micro e Pequena Empresa (Lei Complementar 123/06) para pequenas e médias cidades. O acordo reforçava uma crença: o endereço do crescimento se encontra além das regiões metropolitanas, até então o foco principal das ações estratégicas. 242 Seis anos do Supersimples O pacto previa a implantação da legislação em 500 municípios num prazo de dois anos. Graças ao trabalho em conjunto com associações regionais e microrregionais, ultrapassamos as cinco centenas. Chegamos a 5 de outubro de 2012 com motivos extras para comemorar o Dia do Empreendedor. Celebramos no Portal da CNM dados revigorantes: fruto da Lei Geral, o sistema simplificado e reduzido de tributação para as micro e pequenas empresas – o Simples Nacional – já havia sido adotado por 7,3 milhões de empresas em abril de 2013. Em parceria com o Sebrae, a CNM promove atividades de incentivo à formalização nos municípios, principalmente dos microempreendedores individuais. Dos 7,3 milhões de negócios, conforme levantamento do Sebrae, 2,98 milhões são MEIs. São cabeleireiros, eletricistas, costureiros, artesãos e outros trabalhadores por conta própria. A meta agora é chegar a 2015 com 10 milhões de empreendimentos, dos quais 4 milhões de microempreendedores. Seminários ‘Novos Gestores’ A escalada dos números é o saldo de uma profícua aliança entre as duas instituições. O Sebrae entrou na vida da CNM há quase uma década, quando patrocinou pela primeira vez a Marcha, em 2003. Tão perfeita a simbiose, no ano seguinte o evento, novamente sob seu patrocínio, teve sincronizada a entrega do Prêmio Sebrae Prefeito Empreendedor – hoje incorporada à programação oficial. No mesmo 2004, o Sebrae firmou a parceria com a CNM para a primeira série de seminários “Novos Gestores”. A evangelização dos municípios para a importância de um tratamento diferenciado às micro e pequenas empresas se intensificou em 2005. A fim de evitar a exclusão das MPEs nos processos de pregão eletrônico em implantação, levamos a todos os estados orientações sobre o que poderia ser incluído no Plano Diretor para fomentar o desenvolvimento delas em seus terri- tórios, bem como usar os mecanismos de compras públicas de forma transparente, sem deixar de favorecer os pequenos empreendedores. 786 agentes de desenvolvimento No segundo semestre de 2010, 40 seminários sensibilizaram os prefeitos sobre a importância de regulamentar a lei em seus municípios e as oportunidades de geração de emprego e renda. Mais de 1.500 gestores municipais participaram dessas etapas. No passo seguinte, 26 seminários de capacitação de servidores municipais, em cursos de 32 horas presenciais, formaram 786 agentes de desenvolvimento local. Estes profissionais estão se popularizando como um símbolo da Lei Geral. Ao serem treinados, os solícitos “ADs” agregam conhecimento e visão capazes de conduzir milhões de empreendedores ao caminho da formalização, com ganhos amplos para a sociedade. Ajudam os prefeitos a formularem políticas públicas de incentivo aos pequenos negócios e os empresários a dominarem as ferramentas legais. As centenas de ADs formados no país inteiro estão conectados em uma rede, consolidada em conferência nacional em março de 2012. Para completar, cerca de 870 servidores municipais foram capacitados a elaborar editais e contemplar os benefícios para as micro e pequenas empresas. Esse cuidado com o treinamento é acompanhado da avaliação do processo. Pesquisa levantou casos onde a Lei Geral está sendo bem implementada, para servir como exemplo para os demais. O estudo, inclusive apontando as dificuldades de implementar a legislação, produziu um livro distribuído a todos os municípios. Todas essas pegadas deixadas pela caminhada conjunta com o Sebrae expressam a filosofia da CNM, centrada na busca de municípios fortes, com autonomia, eficiência na gestão e espírito empreendedor. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 243 Capítulo 12 • • • Municipalização da Lei Geral artigo | Eduardo Tadeu Pereira Cooperação para o desenvolvimento sustentável “ Eduardo Tadeu Pereira Presidente da Associação Brasileira de Municípios (ABM) O Brasil vive um momento único de sua história: Eduardo Tadeu Pereira nasceu em São Paulo, em 1964. Graduou-se em História, com Mestrado e Doutorado em História da Educação pela Unicamp. Foi prefeito de Várzea Paulista (SP) por dois mandatos, de 2005 a 2012. Foi vice-presidente da FNP. Atualmente, leciona na Faculdade de Educação da Unianchieta, em Jundiaí/SP. 244 Seis anos do Supersimples uma fase de transformação e pleno crescimento, pautado pela inclusão social e distribuição de renda. Esse novo cenário é resultado da política adotada pelo Governo Federal na última década, que investiu na consolidação do desenvolvimento baseado na ampliação das oportunidades de trabalho, fortalecimento do mercado interno e do poder de consumo dos brasileiros de baixa renda, bem como da melhoria da qualidade e do acesso aos serviços públicos. Essa linha de atuação do Governo foi fundamental para impulsionar a economia do País em um momento em que sucessivas crises econômicas colocaram grandes potências mundiais em situação de vulnerabilidade. Mas é importante ressaltar que a União contou com grandes aliados na superação das crises, também responsáveis por manter a nossa economia pulsante, entre eles as micro e pequenas empresas e os governos locais. As micro e pequenas empresas têm sido indispensáveis para a movimentação econômica do País, já que representam, segundo dados do IBGE, 95% das empresas brasileiras e são responsáveis por mais de 50% do emprego formal. Esses números demonstram a importância desse setor da economia para o desenvolvimento do Brasil. MPEs movimentam mercado interno Como presidente da Associação Brasileira de Municípios, considero pertinente destacar que o fortalecimento da economia brasileira está condicionado ao desempenho interno de cada município, que, por sua vez, é influenciado pelas políticas públicas adotadas pelos governos municipais e inúmeros outros fatores, como, por exemplo, a atuação das micro e pequenas empresas, que têm papel fundamental nesse cenário, pois empregam uma parte significativa da mão de obra e movimentam o mercado interno, absorvendo uma grande parcela da riqueza produzida nas cidades. Reconhecendo esse importante papel, muitas prefeituras estão fomentando políticas de incentivo às atividades das micro e pequenas empresas, criando ambiente favorável ao pequeno empresário, como uma forma de fortalecimento da economia local e consequente contribuição para manter o Brasil nos trilhos do desenvolvimento e da estabilidade. A adesão à Lei Geral da Micro e Pequena Empresa, assinada pelo presidente Lula em 2006 e que completa seis anos, tem sido uma importante ferramenta de incentivo do poder público municipal aos microempresários, assegurando, entre outros benefícios, a sua participação nas licitações públicas. As MPEs na Economia Solidária Muitas cidades têm apostado no estímulo à formação de empresas autogestionárias, pautadas pelos valores da Economia Solidária, como cooperativas, associações e clubes de troca. Como prefeito de Várzea Paulista/SP durante dois mandatos (2005-2012), incentivei a abertura de empresas nesse campo, com o objetivo de criar um novo mercado, a partir dos trabalhadores e trabalhadoras que estavam à margem do mercado formal, por não se enquadrarem nos padrões definidos pelo sistema capitalista. Criamos um sistema de Economia Solidária que se tornou referência para governos progressistas do Brasil e de outros países, com a instituição de uma moeda social própria, o ‘Saber’; a inauguração de uma incubadora pública municipal, que abriga cooperativas nas áreas da beleza, confeitaria, panificação e artesanato; e o Banco Comunitário Orquídea, instalado em parceria com o Núcleo de Economia Solidária da USP. Dessa forma, assim como o incentivo às micro e pequenas empresas, garantimos novas formas de fazer a economia girar, inserindo pessoas que antes, por falta de instrumentos, não participavam da movimentação do mercado local. Os municípios também têm sido grandes protagonistas na execução dos programas fundamentais para o desenvolvimento sustentável, estruturando-os a partir das gestões locais, como é o caso do Bolsa Família, Minha Casa Minha Vida, PAC, Brasil sem Miséria entre outros, fazendo com que as políticas públicas tenham efeitos significativos nacionalmente. Problema do pequeno é estar sozinho Para reforçar ainda mais esse papel das cidades, a Associação Brasileira de Municípios (ABM) tem como diretriz construir uma rede de apoio às administrações municipais que possibilite às cidades maior capacidade de gestão, através da orientação e apoio na elaboração e apresentação de projetos; e da formulação de políticas que visem ao desenvolvimento sustentável. O Sebrae assumiu um importante papel nesse contexto, a exemplo da Lei Geral. A cooperação entre municípios, Governo Federal e atores como o Sebrae tem sido uma importante fórmula para garantir o desenvolvimento do Brasil e é fundamental que essa parceria se fortaleça e evolua ao longo dos anos, para que nosso país continue semeando oportunidades para todos e todas, mostrando que ‘o problema não é ser pequeno, é estar sozinho’. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 245 Capítulo 12 • • • Municipalização da Lei Geral artigo | Eduardo Cury A responsabilidade do administrador municipal, a par de um grande esforço para superar a limitação de recursos e as restrições burocráticas, é promover políticas públicas capazes de criar oportunidades e de distribuir os benefícios sociais gerados pela economia local. A força do município reside na própria capacidade de inovar, de antecipar soluções e de incentivar as iniciativas locais e regionais, em parceria com os empreendedores. No caso da minha cidade, São José dos Campos tem peculiar vocação para o empreendedorismo e compromisso com a prosperidade. Ela proporciona excelente qualidade de vida e abriga alguns dos maiores centros de pesquisas e de desenvolvimento de tecnologias, além de um poderoso polo industrial, comercial e de serviços. Esses fatores fazem com que a cidade gere competências e ambientes propícios à inovação, graças ao seu capital humano de alta qualificação. O Era natural, portanto, que o município se tornasse um poderoso agente de desenvolvimento local. Para isso, foram fundamentais as iniciativas do poder público nos últimos 15 anos, para as quais sempre pudemos contar com a parceria dos técnicos e consultores do Sebrae. O aparato institucional tem por base a Secretaria de Desenvolvimento Econômico e da Ciência e Tecnologia, que atua fortemente no fomento, atração de investimentos e no apoio ao empreendedorismo – especialmente aquele proveniente das micro e pequenas empresas. O Parque Tecnológico de São José dos Campos, criado pela Prefeitura em parceria com o Governo de São Paulo, é um exemplo para o Brasil. É o berço de centros de desenvolvimento de produtos e tecnologias nos campos de aeronáutica, espaço, energia, materiais e saneamento, e abriga os campi da Universidade Federal de São Paulo e “ município e as microempresas Eduardo Cury Ex-prefeito de São José dos Campos (SP) Eduardo Pedrosa Cury, 49 anos, é engenheiro industrial e empresário. Foi prefeito de São José dos Campos eleito em 2004 e reeleito em 2008. Recebeu o Prêmio Sebrae Prefeito Empreendedor, nas etapas estadual e nacional, em 2008 e em 2010. 246 Parque tecnológico é exemplar Seis anos do Supersimples Ninguém vive no Estado, nem na Nação; todos vi- vemos no município. Ou seja, nenhuma política pública será efetiva se não tiver eficácia em nível municipal. Esta evidência aponta para um grande desafio e uma imensa responsabilidade. O desafio é romper o círculo vicioso das desigualdades regionais representadas, de um lado, por municípios de grande poder econômico e político e profundas diferenças sociais, e, de outro, por governos locais cada vez mais dependentes de recursos estaduais e federais, ou seja, carentes de sustentabilidade. A indústria aeronáutica impulsionou o desenvolvimento de São José dos Campos. Seis anos do SUPERSIMPLES 247 12 • • • Municipalização da Lei Geral Capítulo artigo | Eduardo Cury Mais de R$ 100 milhões por ano O Parque Tecnológico vai abrigar mais 50 empresas de pequeno porte. da Faculdade de Tecnologia (estadual), e logo terá uma unidade do Senai dedicada ao setor aeroespacial. Várias das empresas ali incubadas já foram graduadas e colocam no mercado produtos de alta tecnologia, alguns deles já patenteados. Todas são de pequeno porte e de grande potencial. Um novo espaço está sendo aberto para mais 50 empreendimentos desse tipo, e logo virão mais duas novidades: um condomínio industrial com 91 lotes e um novo centro para desenvolver sistemas e tecnologias voltados para a criação de cidades digitais, em parceria com a Ericsson, da Suécia. Além do apoio do município, as empresas nascentes são beneficiadas por um conjunto de ações desenvolvidas pelo Centro de Competitividade e Inovação do Cone Leste Paulista, o Cecompi, organização social que capacita empreendedores, busca oportunidades de negócios no País e no exterior e orienta na montagem de arranjos produtivos locais; sempre com o apoio de agências de fomento como a Fapesp, a Finep e o CNPq, e de agentes financeiros como o BNDES. 248 Seis anos do Supersimples Cinco galerias do Empreendedor A entidade também prepara microempresários e microempreendedores individuais para atuar nas galerias do Empreendedor construídas em bairros distantes do centro da cidade. Pessoas que vivem nessas regiões foram selecionadas em chamada pública, receberam treinamento no Sebrae, aprenderam a elaborar planos e a gerir seus negócios, e poderão explorar o espaço comercial por três anos – findo esse prazo, estarão graduadas e cederão o espaço para novos empreendedores. A Prefeitura planejou cinco galerias, das quais duas funcionam plenamente e uma está em fase final de construção. A Sala do Empreendedor, criada em 1998, é o braço do governo municipal que apoia e orienta a abertura de negócios e a formalização de atividades produtivas. Ali, quem quer se tornar empresário recebe orientações jurídicas e tributárias, é informado sobre o mercado e a viabilidade do negócio pretendido. Em pouco tempo, pode buscar apoio financeiro do Banco do Empreendedor Joseense (BEJ) e do Banco do Povo Paulista. Em 2007, foi instituído o regime único de recolhimento do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza pelas microempresas e empresas de pequeno porte – modalidade que abrange também o empresário individual. Trata-se da Lei Complementar 234, que permite aos optantes pelo Simples Nacional recolher em documento único o ISS e os demais tributos das esferas estadual e federal. Esse processo de simplificação da vida das empresas teve, em todos os níveis, a presença marcante do Sebrae, fortalecendo o empreendedorismo, a iniciativa privada e a gestão pública. O município tem um orçamento expressivo – quase R$ 1,9 bilhão em 2013 – e vem utilizando esse poder de compra como instrumento de fomento. O primeiro passo foi reduzir a carga burocrática para as EPPs e facilitar a participação delas no fornecimento de bens e serviços para a administração pública. O pregão eletrônico e o pregão presencial deram grande mobilidade aos processos licitatórios e promovem crescente economia de recursos públicos, além de dar transparência às operações. O passo seguinte foi a Lei Complementar 411/2009, que criou um regime especial para contratação de bens e serviços, até o valor de R$ 80 mil, por meio de licitações destinadas exclusivamente a pequenas e microempresas. Além disso, os editais dos processos licitatórios de maior valor também estimulam o futuro fornecedor a subcontratar micro e pequenas empresas até o limite de 30% do total licitado, tendo em vista ampliar as oportunidades de negócios, reduzir custos e promover a boa aplicação do dinheiro público. As requisições no âmbito do regime especial, mais as compras diretas, de valor até R$ 8 mil, vêm crescendo de forma consistente. Nos últimos quatro anos, foram firmados pela administração municipal 3.304 contratos com micro e pequenas empresas, a maioria delas instaladas em São José dos Campos e nas cidades vizinhas, gerando negócios que, nesse período, somaram cerca de R$ 290 milhões e já alcançaram a cifra de R$ 100 milhões por ano. Empreendedores desse porte já representam 37% do total de fornecedores de bens e serviços à Prefeitura e aos órgãos da administração indireta, autarquias, fundações e companhia de economia mista. Essa política de incentivos vem sendo intensificada, mas não representa nenhum favor aos empreendedores em geral, nem é de conteúdo paternalista. Ela é resultado do reconhecimento do papel que esse segmento empresarial exerce nos cenários local e regional, como gerador de milhares de empregos e como parte do mecanismo de distribuição de renda. Estimular o empreendedorismo e ter as MPEs como parceiras é, portanto, uma forma eficiente de mobilizar políticas públicas sintonizadas com o desenvolvimento local, de forma a incrementar a economia regional, promover avanços tecnológicos e estimular a competitividade, sem descuidar da transparência pública e da parcimônia na aplicação do dinheiro que é de todos. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 249 12 • • • Municipalização da Lei Geral Capítulo artigo | josé Guilherme Agente de Desenvolvimento A importância do “ Esforços para implementação de fato Para continuidade do processo, todos os parceiros foram mantidos, tendo sido então traçados novos desafios e estamos, desde 2011, implementando ações diversas que possam contribuir de fato com a implementação das leis gerais municipais, fazer com que a legislação saia do papel e se transforme em benefícios reais e duradouros para os pequenos negócios, promovendo o desenvolvimento local. Nossas realizações e índices alcançados nos garantem que estamos no caminho certo, quando observamos os seguintes resultados: José Guilherme Barbosa Ribeiro Diretor-superintendente do Sebrae MT A minha experiência de trabalho prestado para o Sistema Sebrae nos últimos 30 anos me faz concluir que a promulgação da Lei Complementar 123, em dezembro de 2006, é um grande divisor de águas no ambiente dos pequenos negócios. Toda atuação anterior na busca de ações que pudessem contribuir de forma significativa para a sobrevivência e desenvolvimento de micro e pequenas empresas resultou incompleta e até mesmo sem grande efetividade, uma vez que não havia respaldo de políticas públicas eficazes e eficientes para todo suporte legal necessário. O marco legal conquistado é o início de uma nova era para o Sebrae e, principalmente, uma grande oportunidade para seu público-alvo (os pequenos negócios), que adquire benefícios consolidados, uma vez que têm garantia de lei. Entendemos a grandiosidade dessa vitória quando avaliamos todo corpo da Lei Complementar 123 e podemos verificar que está fundamentada em três pilares: desoneração, desburocratização e desenvolvimento, que somados conseguem potencializar os resultados. 250 Seis anos do Supersimples Diante da importância do tema, o Sebrae MT buscou alianças estratégicas com todas as organizações que representam a classe empresarial. No primeiro momento lutamos para que 100% dos municípios do Estado aprovassem suas próprias legislações de apoio às micro e pequenas empresas, tendo sido o Mato Grosso o segundo Estado brasileiro a cumprir esta etapa, ainda no exercício de 2010. • 100% dos municípios têm sua própria lei geral das micro e pequenas empresas regulamentada; • 42 municípios contam com o Centro de Atendimento ao Empreendedor – CAE, em funcionamento, sendo a gestão desempenhada por servidores da prefeitura, devidamente habilitados e capacitados nas questões pertinentes; • realização de 17 Seminários sobre Compras Governamentais (2008 a 2012); • mais de 250 agentes de desenvolvimento devidamente capacitados; José Guilherme Barbosa Ribeiro nasceu no Rio de Janeiro. Graduou-se em Administração de Empresas pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro e pós-graduou-se em Gestão e Marketing, em 2000. Trabalhou em instituições financeiras, em comercialização de café, na Arthur Andersen e empresas de Engenharia. Foi presidente da Associação Brasileira dos Sebraes Estaduais (Abase) entre 1991 e 1993. • 31 municípios em fase adiantada na prática de compras governamentais, realizando licitações através do edital exclusivo para micro e pequenas empresas e ainda expressivo volume de compras; • Grupo Gestor de implantação da Redesim, devidamente instituído por decreto estadual, com par- ticipação de todos os órgãos incluídos no referido processo para implantação do cadastro único e compartilhado de registro de empresas. Dentre os fatos citados, vamos evidenciar que o papel dos agentes de desenvolvimento é a garantia da ampliação da ação do Sistema Sebrae, porque estamos preparando pessoas em todas as prefeituras para atuarem em prol do desenvolvimento local e territorial para serem a nossa extensão na busca de melhorias e benefícios para nosso alvo: os pequenos negócios, representados pelos empreendedores individuais, produtores rurais, pescadores, micro e pequenas empresas e também os potenciais empresários. Formar agentes de desenvolvimento é transformar nosso país, é promover uma revolução empreendedora, é contribuir com o desenvolvimento em primeira instância das pessoas como seres humanos, como cidadãos que podem realizar seus sonhos, abrir seus negócios de forma legal para sustentar sua família e ainda contribuir com o desenvolvimento de sua cidade. Assumir a função de agente de desenvolvimento pressupõe agir como líder, articular e influenciar pessoas, ser capaz de estruturar planejamento estratégico, trabalhar com desafios, metas. Enfim, conduzir o processo de desenvolvimento, respeitando as características, potencialidades, cultura de cada município e ao mesmo tempo, impulsionando para o novo, garantindo o cumprimento das premissas da nossa Constituição, que garante tratamento diferenciado e favorecido às micro e pequenas empresas. Somente o cidadão consciente e preparado pode gerar as mudanças necessárias nos municípios, contribuindo para o desenvolvimento local e sustentável, interferindo de forma positiva na qualidade de vida das pessoas. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 251 Capítulo 12 • • • Municipalização da Lei Geral artigo | alci porto Um marco legal dos pequenos negócios Alci Porto Diretor-técnico do Sebrae CE ALCI PORTO GURGEL JÚNIOR é economistra graduado pela Universidade Federal do Ceará. Tem várias especializações. Foi estagiário do Sebrae, passou a consultor técnico em 1988 e dirigiu o Escritório Regional em Sobral. Em 1999, tornou-se diretor técnico do Sebrae CE. Foi presidente da Abase. Há gestores que discordam “ As histórias em Fortaleza são muitas. Maria das Dores Barroso Batista, que há anos ganhava algum dinheiro vendendo “dindin” – um sorvete caseiro muito comum no Ceará –, hoje é dona de um mercadinho no bairro José Walter. Adilson Gomes dos Santos, que teve de deixar a profissão de motorista de caminhão depois de um acidente, atualmente administra o próprio petshop no bairro Jóquei Clube. Daniele Saraiva Lima, que passou a vida como cabeleireira autônoma e, apesar do talento, era impedida de crescer por causa da informalidade, hoje expande o salão de beleza que ocupa um espaço cada vez maior no bairro Joaquim Távora. As transformações na vida de Maria, Adilson, Daniele e um número cada vez maior de autônomos cearenses possuem um ponto em comum: a adesão ao Empreendedor Individual, nova figura jurídica criada a partir da Lei Geral das Micro e Pequenas Empresas. 252 Seis anos do Supersimples Para entender melhor esse cenário que se desenha tão favorável e onde o sucesso da Lei Geral pode ser medido pela adesão ao Simples Nacional que, entre 2008 e 2010, fez a arrecadação de impostos do País saltar de R$ 24 bilhões para R$ 35 bilhões, é preciso voltar no tempo. Regredir até antes mesmo de primeiro de julho de 2007, quando a nova legislação entrou em vigor. No Ceará, somava décadas um sentimento de urgência quanto à necessidade de medidas efetivas para apoiar os pequenos negócios que, no Estado, sempre foram responsáveis pela maioria dos postos de trabalho formais e informais. Daí, o rápido engajamento e a mobilização política, empresarial e popular em torno da causa. Desde a primeira hora, as lideranças cearenses engrossaram fileiras nas caravanas a Brasília, ajudando a reforçar a pressão na Frente Parlamentar da Micro e Pequena Empresa e as entidades representativas dos setores produtivos se uniram em favor dos pequenos negócios. Seis anos se passaram desde então. A adesão ao Simples Nacional só aumentou, mas ainda há muito para ser feito. O desafio, agora, é ampliar o número de municípios onde a legislação foi regulamentada e o número de agentes de desenvolvimento treinados e em atuação. A Lei Geral está longe de ser unanimidade entre os gestores municipais, embora os números sejam altamente favoráveis às cidades onde foi regulamentada. Segundo pesquisa, 75% dos negócios do Brasil estão em municípios que regulamentaram a lei. No Ceará, até setembro de 2012, um total de 142 municípios, ou seja, 77% das cidades cearenses, regulamentaram a Lei Geral, enquanto 42 não se sentem estimulados a regulamentar a legislação. Isto, mesmo sabendo que 62% dos empregos no Brasil são gerados por micro ou pequenas empresas, e 56% das vagas de trabalho são oriundas de empresas com até quatro funcionários. Qualidade de vida da população Mentor estratégico da Lei Geral e um dos articuladores pela sua aprovação, o Sistema Sebrae avalia que a sua implementação contribuiu para o desenvolvimento socioeconômico dos municípios. Estabeleceu-se uma nova política fiscal, incentivando o empreendedorismo e a formalização dos pequenos empreendimentos, a circulação de riquezas e a conquista de novos mercados, inclusive o governamental, com a participação em licitações. A meu ver, outros benefícios podem ser historiados com a implementação dessa legislação: a melhoria da qualidade de vida da população, pois são os pequenos empreendimentos que oferecem os produtos e serviços como restaurantes, supermercados, salões de beleza, farmácias, clínicas, livrarias e hotéis; maior desenvolvimento local e segurança jurídica necessária para os gestores municipais, evitando problemas futuros com os órgãos de controles. Além disso, a Lei Geral assegurou a desburocratização da atividade empresarial de pequeno porte, que necessita de pequenos investimentos para sua criação e permanece no município por longos períodos, uma vez que é constituída de pequenos capitais locais. Com a Lei Geral, as pequenas e as microempresas podem contribuir de forma mais decisiva para que os municípios cearenses atinjam um novo patamar de desenvolvimento, assegurando mais progresso, favorecendo a construção de uma realidade com maior justiça social. “ Seis anos do SUPERSIMPLES 253 Capítulo 12 • • • Municipalização da Lei Geral artigo | zeca melo Cinquenta formalizações por dia José Ferreira de Melo Neto Diretor-superintendente do Sebrae RN José Ferreira de Melo Neto, economista, diretor-superintendente do Sebrae RN, ex-presidente da Associação Brasileira de Sebraes Estaduais. “ E stou no Sebrae desde 1978, fui superintendente nos anos 90 e reassumi em 2003. Assim, participei de todas as lutas e mobilizações capitaneadas pelo Sebrae pela aprovação da Lei Geral, um tema que desde o início foi suprapartidário. Fizemos uma discussão intensa com a sociedade, com a universidade e a classe política em torno de uma pauta. Nas audiências públicas definimos nossas necessidades para incorporar ao projeto nacional. Tivemos impasses e dificuldades com a área de tributação do Estado, cujo titular veio a assumir a coordenação do Confaz. Mas foi fundamental o apoio da então governadora Wilma Faria. No Rio Grande do Norte tivemos imediata passagem para a faixa mediana do Simples. O governador Iberê Paiva Ferreira de Souza passou o teto da pequena empresa para R$ 2,4 milhões, e depois sua sucessora, Rosalba Ciarlini Rosado, aumentou para R$ 3,6 milhões, o que dá uma competitividade muito grande para os empresários do Estado. 254 Seis anos do SIMPLES NACIONAL O MEI também está sendo um grande sucesso. O Rio Grande do Norte é um pequeno estado com apenas 0,9% do PIB, mas todo dia quase 50 pessoas saem da informalidade e se tornam empreendedores individuais. Hoje são mais de 83 mil os optantes pelo Simples, dos quais mais de 40 mil MEIs. Avançamos muito e precisamos avançar mais, seja na incorporação de novos segmentos, seja na discussão dos problemas gerados pela substituição tributária, seja na construção de um Simples trabalhista. Uma pequena empresa não pode ter os mesmos custos e encargos de uma multinacional. Não pode uma queijeira de Caicó ser comparada com a Nestlé. O ideal seria uma rampa A passagem para média empresa não tem degraus muito altos, mas mesmo assim são degraus. Precisaríamos ter uma rampa na faixa de faturamento. Mas as exigências burocráticas e contábeis são o que pesa mais. A questão do licenciamento ambiental é outro problema a ser encarado. Não se pode tratar uma empresa de risco zero, como uma butique no shopping, como se fosse uma clínica que vai disparar Raios-X ou um laboratório que vai lidar com material perigoso. É preciso facilitar o licenciamento. Precisamos do mesmo entusiasmo e da mesma competência do passado para avançar. O Simples mostra que é possível fazer reforma tributária neste país. Temos que caminhar para aumentar a produtividade, reduzir o custo Brasil, facilitar o comércio exterior. Trabalhamos muito para implantar uma cultura empreendedora no povo potiguar, através das oficinas de empreendedorismo e da conexão com os territórios da Cidadania. Damos até assessoria a alguns países africanos que querem fazer a mesma coisa. O foco do trabalho do Sebrae no Estado é sua vinculação com o desenvolvimento econômico do RN e com suas potencialidades. Temos um forte projeto de agronegócios, petróleo e gás e agora estamos traba- lhando a energia eólica, que está ganhando espaço. Procuramos estar em sintonia com as vocações econômicas do Estado. Projetos do Sebrae RN O Projeto Despertar completa nove anos de atividades, através de uma parceria entre o Sebrae e a Secretaria Estadual da Educação e Cultura do RN. O objetivo é disseminar a educação empreendedora no âmbito das escolas públicas do RN através de estímulos pedagógicos que aumentem a predisposição para empreender dos alunos do ensino médio. De 2003 a 2011 já foram capacitados 23.200 alunos de 188 escolas públicas em 148 municípios do Rio Grande do Norte. As oficinas Sebrae de empreendedorismo funcionam em pequenas cidades em que não se justifica a existência de uma estrutura formal e definitiva. São realizados seminários à noite, no ginásio das cidades. Participam 300 pessoas, divididas em 10 turmas de 30, com 10 consultores, de segunda a sexta. Os consultores visitam as empresas da região durante o dia, dando orientação. O projeto de melhoramento apícola busca melhorar a qualidade e agregar valor a essa atividade que tem grande potencial, devido à vegetação com grande diversidade de floradas e condições climáticas favoráveis. Inúmeras casas de mel são atendidas pelo Sebrae RN. A caprinocultura, com um rebanho de 400 mil animais e produção de 11 mil litros de leite por dia, excetuando o consumo familiar, também é incentivada. Também a ovinocultura, com 570 mil ovelhas, recebe apoio do projeto Aprisco, implantado pelo Sebraetec. “ Seis anos do SIMPLES NACIONAL 255 Capítulo 12 • • • Municipalização da Lei Geral exemplos de sucesso | rio grande do norte Exemplos de sucesso Os casos colhidos no Rio Grande do Norte um pizzaiolo contam como saíram do zero para são exemplos de talento, criatividade e deter- uma situação confortável. O filho de um médico minação. Um autodidata de Assu cria jingles e tornou-se um gênio da bioquímica, e um carioca playbacks para todo o Brasil. Um confeiteiro e ganha a vida surfando e fabricando pranchas. PHARMAN FARMÁCIA DE MANIPULAÇÃO Gênio científico e espírito empreendedor O desejo de fazer os seus próprios medicamentos acompanhava Frederico Augusto Bezerra de Morais desde a infância. Acometido por uma doença genética, a ictiose, que produz o ressecamento da pele, ele cresceu usando fortes hidratantes e ouvindo o pai, médico da Fundação Nacional de Saúde (Funasa), reclamar do preço dos produtos, que, aliás, nunca lhe faltaram. 256 Seis anos do Supersimples Frederico sabia que o problema o seguiria por toda a vida, já que a ictiose não tem cura, embora possa ser controlada. Pouco a pouco, foi consolidando a ideia de se tornar o próprio fabricante dos hidratantes de que necessitava. Mais ainda: sabia que, com o domínio científico da doença, o conhecimento de como ela age e os meios para produzir os medicamentos para combatê-la, não haveria, no mercado nacional, ninguém mais adequado que ele para ter sucesso na empreitada. Com a intuição correta, tratou de preparar-se e fundou em Assú, no Oeste do Rio Grande do Norte, a Pharman, uma farmácia de manipulação várias vezes premiada. A história de vida de Bezerra de Morais explica, com certeza, o sucesso que tem hoje a Pharman. O reconhecimento que já tinha da população local, de 54 mil habitantes, ultrapassou, em 2011, os limites do município, quando a Pharman conquistou o Prêmio Estadual MPE na categoria Comércio. Trata-se de importante distinção atribuída por uma parceria entre o Sebrae e a Siderúrgica Gerdau, para as pequenas e médias empresas que se destaquem no país por sua alta competitividade. Para chegar lá, contudo, Frederico percorreu uma longa estrada. Nascido em Natal, em 1979, mudou-se aos 15 anos para Assú, para onde o pai tinha sido transferido pela Funasa. Voltou para a capital em 1995, junto com o irmão mais velho, para concluir o ensino médio e fazer, em 1998, o vestibular para Farmácia. Na faculdade, já pensando no estabelecimento que pretendia abrir, Frederico foi monitor da disciplina de Farmacotécnica, associada à área de manipulação. Ainda antes de se formar, associou-se a dois farmacêuticos da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, onde estudava, e abriram uma farmácia de manipulação. Por razões comerciais, a sociedade durou não mais que um ano. Com o pai exercendo a Medicina em Assú, não hesitou em voltar para a cidade e reiniciar a conquista de seu sonho. Logo que chegou, recém-formado, o jovem abriu uma franquia de uma grande empresa regional de manipulação, ficando à frente do empreendimento por cinco anos, até 2007. Uma franquia, no entanto, não lhe bastava. Sabia que tinha potencial para ir muito além e abrir seu próprio negócio. De mais a mais, havia concluído, em 2007, um curso de especialização em Manipulação Magistral Alopática, que iniciara em 2005, em João Pessoa. Sabia que a hora era aquela, e não estava disposto a deixar passar a oportunidade. Seis anos do SUPERSIMPLES 257 12 Capítulo • • • Municipalização da Lei Geral exemplos de sucesso | rio grande do norte MBA na Fundação Getúlio Vargas Tão logo expirou o contrato da franquia, no fim de 2007, Frederico fundou a Pharman. De lá para cá, vem acumulando sucessos e aprimorando seus conhecimentos, através de parcerias e cursos de qualificação. Associou-se ao Instituto Racine, conveniado com a Universidade Federal da Paraíba, o maior instituto de formação na área de manipulação do país. Em 2009, iniciou MBA em gestão empresarial pela Fundação Getúlio Vargas, curso que concluiu em 2012. Além de se conceder o justo crédito por sua determinação, Frederico atribui ao apoio do Sebrae grande parte de suas vitórias. O Sebrae entrou em sua vida ainda no período da franquia, em 2004, quando fez o Seminário Empretec, para estimular seu lado empreendedor. Com uma semana de franquia, percebeu que queria alçar voos mais altos, e que a experiência não passava de um meio para cumprir seu objetivo. Simultaneamente ao MBA da FGV, no qual também ingressou estimulado pelo Sebrae, realizou aquele que, a seu juízo, foi o mais importante de todos os cursos de formação de sua trajetória empresarial: o curso de Planejamento Estratégico do Sebrae. “Eu tinha muitas ideias, mas só então aprendi a organizá-las e a trabalhar com programação de médio e longo prazos. Ou eu me capacitava para gerir a empresa de forma planejada, ou iria sucumbir. Só na legislação são cerca de mil itens a cumprir, e é preciso estar preparado para enfrentar as dificuldades e os desafios. O curso me deu a sensação de tirar um enorme peso das costas”, afirma o farmacêutico. 258 Seis anos do Supersimples Linha de cosméticos Delicata Brasilis Paralelamente à consolidação da farmácia, Frederico Bezerra de Morais decidiu montar sua linha própria de cosméticos, a Delicata Brasilis. Ingressou, assim, no ramo industrial, sem abrir mão da manipulação, cuja prática é condicionada à prescrição médica. Para facilitar as coisas, a Delicata nasceu como marca da Pharman, mas isto vai mudar até o fim de 2012, quando se transformará em uma empresa autônoma, com associação de outro farmacêutico. O faturamento médio da Pharman é de R$ 30 mil por mês. Curioso perceber que a conquista do Prêmio MPE produziu uma queda de cerca de 10% neste faturamento, a despeito do enorme prestígio que a empresa adquiriu e do trabalho de marketing realizado, incluindo a colocação de outdoors em Assú e em Natal. A explicação é simples: o prêmio do MPE implica a adoção de critérios de qualidade bastante rigorosos, e a adaptação a eles impõe a reorganização de fluxos e procedimentos. Em curto prazo, isto gera um impacto negativo, mas prepara a empresa para novos saltos no futuro, o que já começa a se mostrar realidade. Tanto assim que a Pharman foi convidada a participar, este ano, do Prêmio Nacional de Inovação, na categoria Agente Local de Inovação, na área da indústria. Mas os planos de Frederico não param por aí. Ele quer mais. Até o fim de 2013, pretende ter 200 consultores da Delicata distribuídos pelo Rio Grande do Norte, o que significaria um faturamento, só da linha de cosmé- ticos, da ordem de R$ 100 mil por mês. Suas projeções baseiam-se em um crescimento de 49% da indústria de cosméticos no Brasil em 2011, cujo mercado consumidor fica atrás apenas dos Estados Unidos e do Japão. A receita de Frederico para o sucesso inclui ainda rigoroso respeito aos direitos trabalhistas de seus funcionários, a prática de salários de mercado e o estímulo aos funcionários mais antigos. Ainda assim, considera que o principal desafio a ser enfrentado é o de assegurar mão de obra qualificada para a expansão de seus negócios, dificuldade que procura superar com iniciativas próprias, como a articulação de programas de treinamento de colaboradores, e a ajuda do Sebrae. Assim Frederico Augusto vai levando a vida: procurando se esmerar na busca de soluções sempre mais eficazes para combater a ictiose, para si e para todos os que possuem a doença, e expandindo seus empreendimentos, gerando empregos e aumentando seus lucros. Alex-Sandro Medeiros Um criador de playbacks em pleno sertão Alex-Sandro Ferreira de Medeiros cresceu caçando preás e correndo atrás de passarinhos nos matos ao redor de Janduís, uma pequena cidade do sertão do Rio Grande do Norte, perto da divisa com a Paraíba. Perseguia assum-preto, jandaia, graúna, azulão, sabiá-laranjeira, zabelê, pixarro, uns de canto melodioso, outros estridentes. Por cima deles todos, o voo dos acauãs e carcarás. Talvez tenha vindo do canto dos pássaros o gosto desse potiguar de 31 anos pela música. Adolescente, pegou emprestado um teclado, aprendeu sozinho e formou, com cinco amigos, uma banda de pagode. Duran- te mais de dois anos, tocaram nos bares da redondeza, quase sempre a convite da Prefeitura. A banda se desfez, mas Alex-Sandro partiu para outra formação, criando a “Swing Brasil”. Já naquela época, contudo, tinha decidido montar seu próprio negócio. “Desde 2000 tinha o sonho de construir meu estúdio de som. Logo percebi que o primeiro passo era aprender a mexer com computadores. Como não tinha um, comecei a observar máquinas de outras pessoas. Sempre que tinha oportunidade estava estudando, aprendendo a operar. Até que, em 2008, enfim, adquiri o meu próprio.” Seis anos do SUPERSIMPLES 259 Capítulo 12 • • • Municipalização da Lei Geral exemplos de sucesso | rio grande do norte Encomendas até do interior de Minas Mas o computador era apenas o primeiro passo. Para chegar onde queria, ter um verdadeiro estúdio, fazer playbacks, arranjos inéditos, jingles, etc, Alex-Sandro precisava de muito mais. Obstinado, foi se virando, como pôde, enquanto não conseguia comprar seus equipamentos, com muito esforço e criatividade. “Nos primeiros passos para fazer uma gravação eu não usava teclado, já que tinha devolvido o que peguei emprestado. Usava só o mouse, fazendo nota por nota. Dava um trabalho danado e gastava um tempo enorme. Depois, conseguindo um dinheirinho aqui, outro ali, comprei uma mesa de som e uma placa, finalmente adquiri meu próprio teclado. Aí as coisas começaram a acontecer”. Mas o “pulo do gato” de Alex-Sandro aconteceu há cerca de quatro anos, quando estourou a banda Djavú. Aproveitando a onda, ele teve a ideia de fazer playback da banda para disponibilizar na internet, gratuitamente, e mostrar o seu serviço. Colocava o nome da música e o endereço eletrônico dele. Valeu-se, para tanto, de diferentes comunidades, como o Orkut, até fixar-se no YouTube. A estratégia de formação de clientela começou a dar certo. As pessoas baixavam as músicas e passaram a procurar Alex-Sandro, que cobra preços módicos: cada playback de forró, por exemplo, custa R$ 70,00; no caso de uma música sertaneja, o valor sobe para R$ 100,00 a R$ 120,00, já que o trabalho aumenta e implica a contratação de alguém para tocar violão. Surge o Studio AF Produções O negócio foi crescendo e chamando a atenção da comunidade local, onde praticamente todo mundo se conhece. O agente de desenvolvimento local da Prefeitura, Plínio Almeida, propôs a ele formalizar seu negócio. “Quando o Plínio me disse que não custaria nada, além de uma pequena taxa previdenciária mensal, não pensei duas vezes: sem lenga-lenga, aceitei a proposta.” 260 Seis anos do Supersimples Faturando alto em período eleitoral Em períodos normais, o playback é o carro-chefe da atividade de Alex-Sandro. Mas ele oferece também jingles, vinhetas, produção de CDs, arranjos inéditos, spots e gravação de peças de teatro. Seu faturamento mensal médio é de R$ 1 mil. Contudo, em período eleitoral, como no segundo semestre de 2012, o faturamento disparou, passando para a casa de R$ 15 a R$ 20 mil mensais. Isto somando as propagandas em carros de som (R$ 40,00 a R$ 50,00 cada), os jingles, em que o cliente manda o guia, ele desenvolve a letra e faz os arranjos (R$ 250,00), as vinhetas para FM (R$ 25,00) e outros instrumentos, como os próprios playbacks. Os clientes estão, em sua grande maioria, fora de Janduís, já que o município praticamente não oferece mercado para seus serviços. Como a captação, a encomenda e a entrega do serviço são feitos, quase sempre, através da internet, ele não tem fronteiras geográficas a obedecer. “Tenho clientes no Ceará, no Maranhão, em São Paulo e até em cidades que não sei onde ficam”. Ele cita Nanuque, sem saber que fica no Nordeste de Minas. “Já quiseram me levar até para a Suíça, pra tocar lá com uma brasileira”, espanta-se. Alex-Sandro disse que se surpreendeu com a facilidade que encontrou: “antigamente, para abrir uma empresa, era a maior burocracia do mundo. Hoje é tudo mais fácil. Muita gente na cidade reclama, mas é porque é acomodada, não corre atrás. Cheguei lá com os documentos que me pediram e com uma hora já tinha minha empresa, a Studio AF Produções. Logo percebi que, com o CNPJ e a possibilidade de emitir nota fiscal, a clientela aumenta”. A empresa foi aberta há um ano, mas só agora está caindo a ficha de que é empresário. “Com o Supersimples, deixo de pagar 16% de imposto, às vezes mais, e ganho muito. Pago R$ 31,10 por mês de INSS, mais R$ 5,00 de ISS, tudo na mesma guia, e posso trabalhar à vontade, legalizado.” Talento e determinação fizeram melhorar sua qualidade de vida. Já adquiriu casa própria, que está ampliando e também aumentando o espaço do estúdio. Quando tiver capital, planeja ingressar na área de vídeo. Tem raízes em Janduís, ainda que não descarte sair de lá um dia para voar alto como os acauãs, talvez em Natal ou Mossoró. Neste caso, levaria a esposa e parceira Célia, que ajuda no trabalho fazendo as vezes de cantora, a filha Alessandra e o filho Francisco Gabriel. Minnemann Surfboards ‘Eu sou o surfe’ A vida do surfista carioca Paulo Roberto Alves Minnemann, 31 anos, residente em Natal (RS) desde 1992, de fato se confunde com a prancha. Tudo começou quando ganhou da mãe uma prancha de quatro quilhas para passar as férias em Búzios (RJ). O presente foi o caminho que a mãe encontrou para ficar se bronzeando tranquila, sem se estressar com sua segurança, já que Paulo era uma criança hiperativa. “Ela ficava me olhando da areia, sossegada, enquanto eu ficava brincando com a prancha”. Aos 11 anos, Paulo mudou-se do Rio para Natal, onde a mãe já se encontrava havia três anos, casada com um austríaco naturalizado alemão, campeão mundial de windsurf em 1976. Sua sina estava mesmo trilhada. O mundo conspirava a seu favor. A identificação foi imediata com o padrasto, que pegava as pranchas dele e sempre desejava a companhia do enteado para velejarem juntos. Paulo, contudo, tinha sido acostumado pela avó a batalhar para adquirir suas próprias coisas. Consciente de que as pranchas, além Seis anos do SUPERSIMPLES 261 Capítulo 12 • • • Municipalização da Lei Geral exemplos de sucesso | rio grande do norte de caras, são personalizadas, adequadas para quem vai usá-las, e cada vez mais sentindo a necessidade de equipamentos de alta performance, percebeu, rapidamente, que o caminho era produzir seu próprio equipamento. Nessa altura, o garoto carioca, com 12 anos, já havia se transformado em um surfista, participava dos Jogos Interescolares, ganhava uma ou outra bateria. Paradoxalmente, contudo, havia perdido o apoio da mãe, que preocupava-se agora não com sua segurança física, como quando tinha quatro anos, mas com o futuro profissional que queria ver o filho construir. 262 Seis anos do Supersimples Consertando suas próprias pranchas Sem jamais admitir rejeitar sua paixão, Paulo se empenhou em convencer a mãe que podia viver do surfe. Facilitavam sua tarefa o fato de ter retomado os estudos quando mudou-se para Natal e a disposição de continuar frequentando as aulas. O “moleque” de cabelos compridos começou fazendo a manutenção das próprias pranchas, ofício que aprendeu observando o padrasto consertar as suas, de windsurf. Como europeu típico, o padrasto também sabia dar valor ao trabalho. Para estimular Paulo, vez ou outra colocava R$ 10,00 em suas mãos e lhe dizia: “vai dar uma lixada nas minhas pranchas e toma aqui para ir ao shopping”. A vida, no entanto, reservou uma ingrata surpresa para Paulo. Quando tinha 17 anos, o padrasto morreu em seus braços, vítima de infarto fulminante. Traumatizado, foi mandado de volta ao Rio pela mãe, que queria tirá-lo do mundo do surfe. Na Ilha da Conceição, Niterói, para onde Paulo retornou, havia algumas fábricas de prancha, oportunidade que agarrou para aprender a arte da laminação e para adquirir intimidade com a resina. Para se sustentar, trabalhava durante a madrugada, descarregando toneladas de peixe todas as noites, em troca de R$ 40,00. Esperto e disposto, multiplicava o dinheiro, comprando e revendendo um pouco do próprio peixe que descarregava. Acabava faturando entre R$ 100,00 e R$ 120,00 por dia. Assim, ajudando nas despesas da casa da avó, Paulo não precisou abdicar das ondas e pôde, não sem sacrifício, continuar comprando suas pranchas. Contou também com a sorte de ter ficado amigo de um shaper profissional, pagando a ele apenas o custo dos equipamentos que adquiria. Quatro anos se passaram, até que Paulo regressasse em definitivo para Natal. Não lhe satisfazia a condição de surfista de férias e de fim de semana. Voltou para realizar seu sonho, de viver do surfe. Aulas pagas com um shaper de Recife Aprender a arte do design e a hidrodinâmica da prancha eram seus novos desafios. Descobriu um shaper que trabalhava em Recife, combinou de passar uma temporada na casa dele, pegou um ônibus na rodoviária, colocou os R$ 2.500,00 que tinha no bolso e desembarcou na capital pernambucana. Lá chegando, entregou ao hospedeiro R$ 300,00, a título de aluguel, reservou algum dinheiro para alimentação e a passagem de volta e, com o resto, foram comprar material para que pudesse fazer seu “estágio”. Foram 15 dias de trabalho manual, totalmente artesanal, sem uso de qualquer tecnologia já disponível na época. Quando regressou a Natal, Paulo esperava encontrar um quartinho da casa, com um cavalete, para que pu- desse trabalhar quando de seu retorno. Muito mais que isto, encontrou todo um ambiente, especialmente montado pela mãe, para que pudesse seguir o seu caminho. Em 2011, finalmente, Paulo se formalizou, tornando-se empreendedor individual. Criou sua própria marca, a “Minnemann Surfboards”. Como empresário, não tem ainda a mesma desenvoltura que adquiriu em cima da prancha. Está apenas engatinhando, mas sabe que este é o primeiro passo para se firmar. Altas ondas, altos planos Fabrica cerca de cinco pranchas por mês, todas sob encomenda. Vende também algumas de segunda mão e disponibiliza outras em troca de serviço dos interessados em sua oficina. Mas faz quase tudo sozinho, da Seis anos do SUPERSIMPLES 263 12 • • • Municipalização da Lei Geral Capítulo exemplos de sucesso | rio grande do norte captação à confecção. O preço varia entre R$ 650,00 e R$ 1.200,00. Seu faturamento bruto anual é da ordem de R$ 40 mil. O novo empresário tem muita consciência de que só um ótimo trabalho de marketing pode permitir a ele dar “o pulo do gato”. É para isto, para aplicar os conhecimentos acadêmicos em seu próprio negócio, que está no segundo ano de Publicidade e Propaganda. Paulo é ambicioso. Sonha em ficar surfando no Taiti e dando palestras como empresário do ramo, enquanto sua marca percorre o mundo. Mas ele quer ir além. Pretende, com a cumplicidade da mãe, transformar a enor- me casa em que moram, bem ao pé do Morro do Careca, na Praia de Ponta Negra, em uma surf house. Quer ali, aproveitando as onze suítes, receber turistas e dar a eles a oportunidade de conhecerem o processo de fabricação artesanal de pranchas. Mais ainda: quer criar uma escola para formar cidadãos através da inserção no mundo do surfe, priorizando os garotos da Vila de Ponta Negra, que fica a poucos metros de sua residência/oficina. Paulo quer que muitos outros jovens busquem no surfe aquilo que encontrou desde criança: uma cultura, um estilo de vida. Pizzaria Papo de Calçada Quinze anos com a mão na massa Na força dos seus 30 anos, o microempresário Wylammy Dantas de Andrade já traz no rosto as marcas de uma vida de altos e baixos e no currículo uma incrível capacidade de trabalhar, empreender e superar dificuldades. Nascido em Mossoró, foi criado pelos avós em Assú, cidade do Rio Grande do Norte a 265 km de Natal. Aos 15 anos, já buscava seu primeiro emprego. Inscreveu-se num curso de garçom com 30 alunos oferecido pelo Senac na cidade, já sabendo que o restaurante local contrataria dois. Determinado a conseguir uma das vagas, esmerou-se nas aulas e tratou de fazer seu nome conhecido. Acabou contratado como commis, nome que se dá ao auxiliar de cozinha. Suas funções principais eram de limpar as mesas e recolher os pratos, o que fazia com tanta disposição e boa-vontade que logo o patrão afeiçoou-se a ele, passando a inscrevê-lo em vários cursos de profissionalização. Qualificou-se como barman, garçom, em qualidade de atendimento e gestão de restaurante. 264 Seis anos do Supersimples Sabendo aproveitar as chances que lhe eram oferecidas, Willammy trabalhou nos mais diferentes setores da empresa, inclusive como entregador. Com pouco menos de dois anos de casa, passou a subgerente e logo depois foi promovido a gerente. Foi também responsável pela abertura de mais um restaurante e de um fast-food do mesmo proprietário. Mas foi em 2003, quando completou 21 anos, que surgiu a grande oportunidade de sua vida, ao ser indicado pelo patrão para fazer o Empretec, curso de formação de empreendedores do Sebrae. “Nenhum dos outros muitos cursos que fiz teve a mesma importância pra mim. Quando terminei, estava doido pra montar meu próprio negócio”, afirma, com brilho nos olhos. Parque infantil e sanduicheria Logo em seguida, Willammy, com a cumplicidade do patrão, formalizou-se e montou um parque infantil ao lado do restaurante, antiga demanda da clientela e um chamariz a mais para o estabelecimento. Sem deixar a gerência do restaurante, contratou três pessoas para cuidar do parque, que inclusive se deslocava para ani- mar festas de aniversário. Com o CNPJ de microempresário, adquiriu os brinquedos no Ceará, através de um plano de negócios orientado pelo Sebrae. Entrou com cerca de R$ 22 mil que havia poupado e os 80% restantes viabilizou através de financiamento bancário. Em meados de 2006, depois de abrir sua própria sorveteria, Willammy e o patrão chegaram juntos à conclusão de que não era mais possível que continuasse na empresa, dada a sobrecarga de atividades. Mantendo o parque, agregou à sorveteria uma sanduicheria. Aí a maré refluiu e o jovem empresário sofreu derrotas. Ele supõe ter ido com sede demais ao pote, sem as cautelas e a programação necessárias. A sanduicheria não vingou, mesmo porque a cidade estava saturada delas. Chamado pelo antigo patrão para abrir um novo restaurante em Mossoró, por lá ficou durante seis meses. Quando voltou, o parque e a sorveteria estavam em crise. Vendeu o parque, mas o dinheiro não deu para saldar todas as dívidas. O nome que havia construído com tanto trabalho ficou sujo no mercado, e 27 cheques que emitiu foram devolvidos por falta de fundos. Seis anos do SUPERSIMPLES 265 Capítulo 12 • • • Municipalização da Lei Geral exemplos de sucesso | rio grande do norte Willammy chegou a desconfiar de sua capacidade de limpar o nome e reerguer-se, mas não desistiu. Tinha a opção de ir para São Paulo, trabalhar numa rede de um tio, mas preferiu ficar em Assú e tentar dar a volta por cima. Com a cooperação de amigos e a confiança de fornecedores que havia conhecido quando trabalhava no restaurante, transformou a antiga sanduicheria em um barzinho, cujo carro-chefe eram os espetinhos. Recomeço com tudo fiado O recomeço de Willammy não foi fácil. Conseguiu 10 grades de cerveja vazias com um amigo e comprou o líquido fiado em um depósito. E todo o resto foi no mesmo esquema. “Estou abrindo um barzinho amanhã e preciso de cerveja, carne, etc. Amanhã mesmo pago”, dizia a todos a quem ia pedir ajuda. E conseguiu. Comprou a churrasqueira em duas vezes e arrumou patrocínio no comércio para uma banda de pagode tocar na inauguração. Pagou de imediato a metade das dívidas contraídas para a inauguração, rolou a outra metade e foi viabilizando mais fornecimento. O negócio foi rapidamente se ampliando. Willammy instalou equipamento de som e decidiu adquirir um telão. Descobriu um rapaz que tinha um ocioso e que precisava de um fogão e uma geladeira. Comprou os eletrodomésticos à prestação e trocou-os pelo telão. O Espetinho & Cia começou a lotar. Isto no verão de 2008/09. Animado, Willammy aproveitou-se do aumento do faturamento e dobrou o espaço do estabelecimento, que passou de 13 para 26 mesas. Reformou a calçada em que ele ficava e mudou seu nome para Papo de Calçada. O movimento continuou crescendo e sua capacidade de expansão no local se esgotara. Ao mesmo tempo, foi se livrando das dívidas. Decidiu, então, abrir uma segunda casa, no centro da cidade. 266 Seis anos do Supersimples Diferencial de atendimento Um antigo projeto de abrir uma pizzaria começou a se tornar realidade. Alugou o imóvel em maio de 2011 e ficou três meses por conta de montar a casa de massas. Pensando em atender públicos diferenciados, manteve o espetinho e deu uniformidade ao nome de suas duas casas: Papo de Calçada Espetinho & Bar e Papo de Calçada Pizzaria & Restaurante. O primeiro continuaria a atender uma clientela mais jovem e o segundo estaria voltado para as famílias. Sempre atento ao mercado, Willammy percebeu que a pizzaria deveria se diferenciar dos estabelecimentos do mesmo ramo existentes na cidade. Suas massas são abertas na hora, preparadas no forno a lenha e com bordas recheadas. Contratou um pizzaiolo experiente para treinar um aprendiz e acabou ficando com os dois. Os negócios do jovem empreendedor não param de crescer. Fechou recentemente o Espetinho para reforma. Pretende sofisticar um pouco o ambiente e dar uma incrementada no cardápio. A pizzaria abre todos os dias, sempre com bom movimento, sobretudo a partir da quinta-feira. Atrás do prédio onde funciona, Willammy alugou duas casas, e nelas instalou seu escritório, almoxarifado, sala de pré-preparo de alimentos, refeitório dos funcionários, quarto do pizzaiolo e vestiário. Aparelhou-as com todo o equipamento necessário. Mirando uma filial em Mossoró Somente na pizzaria, Willammy conta hoje com 14 funcionários, entre eles seis garçons. Dois terceirizados encarregam-se do serviço de delivery, que faz uma média de 15 a 20 entregas por dia, números que chegam até 40 de sexta a domingo. No espetinho, tem três funcionários, temporariamente deslocados para o restaurante. No estabelecimento, vende entre 40 e 50 pizzas durante a semana e uma média de 100 de sexta a domingo. As 65 mesas, 40 das quais externas, estão sempre cheias nos finais de semana e com bom percentual de ocupação nos demais dias. Dois telões, um interno e outro externo, ficam ligados todos os dias, o primeiro com futebol e variedades, o segundo com shows. Às segundas e terças, dias tradicionalmente de menor movimento, Willammy colocou música ao vivo, para atrair clientes. O faturamento mensal médio do empresário é de R$ 60 mil, cerca de 20 a 30% dos quais pagos através de cartão de crédito, meio de pagamento que, depois de adotado, melhorou ainda mais o movimento. Willammy pretende, no futuro, adquirir seu próprio prédio e abrir uma casa em Mossoró. Para cumprir estes objetivos, sua receita é uma mistura de ingredientes: conhecimento das várias atividades que compõem o negócio, ele que transitou por grande parte delas; muita curiosidade e permanente observação das tendências da clientela e do mercado; evitar tomar decisões pouco amadurecidas; persistência; bom relacionamento com funcionários e clientes, procurando sempre captar o sentimento deles em relação ao negócio; mão de obra qualificada, com boas condições de trabalho, salários de mercado e rigorosamente em dia e, por fim, um bom trabalho de marketing, nas mídias convencionais e nas redes sociais. dom geandro dolci Bom gosto e faro para negócios Ainda adolescente, aos 17 anos, Geandro Lopes da Silva, rapaz da periferia de Natal, começou a trabalhar de auxiliar de padeiro. Hoje, aos 27, olha para trás e se sente um vitorioso, ao pensar na sua infância de menino pobre nascido na capital potiguar. Ao sete anos, ia com a mãe para a mata todos os dias, onde ela fazia carvão para os outros três filhos venderem na cidade. Geandro era muito pequeno e ainda não conseguia trabalhar. A mãe pegava um saco de farinha, improvisava uma rede e a amarrava em uma árvore, para o menino dormir nas horas mais quentes. >>> Seis anos do SUPERSIMPLES 267 Capítulo 12 • • • Municipalização da Lei Geral exemplos de sucesso | rio grande do norte >>> Com 12 anos, Geandro começou a cortar lenha. Dois anos depois, a mãe comprou uma carroça com um jumento e Geandro passou a entregar a lenha para panificadoras do bairro de Guarapés, onde moravam. Depois que o corte de madeira passou a ser proibido pelo Ibama, Geandro foi trabalhar numa dessas padarias, transferindo-se mais tarde para outra, na Ponta Negra, região nobre da cidade. Cinco anos depois de ingressar no ramo, Geandro viu chegar sua primeira oportunidade. O dono da padaria contratou um profissional para fazer doces e salgados, e ele pediu para auxiliá-lo. O “chefe” notou seu interesse e aptidão, e acabou por levá-lo consigo, quando foi convidado a trabalhar em um hotel cinco estrelas. “O hotel foi minha verdadeira escola”, conta Geandro. “Cheguei lá como auxiliar, virei confeiteiro e exerci a atividade durante dois anos”. O reconhecimento da competência de Geandro foi abrindo a ele novas portas. Do hotel, transferiu-se para uma loja de doces em um grande shopping da cidade, onde trabalhou dois anos como pâtissier. Logo depois receberia uma proposta que considerou irrecusável, de tornar-se consultor da Nestlé no Rio Grande do Norte. Avaliando que não podia perder a oportunidade, aceitou o convite, embora já tivesse em mente abrir seu próprio negócio. Acabou ficando apenas três meses na multinacional. Bicos para reforçar o orçamento Durante o período em que era empregado fichado, Geandro largava o serviço às 16 h e, ao invés de ir para casa, perambulava por locais e ambientes em que pudesse exercer seu ofício, faturando um pouquinho mais. Cobrava R$ 50,00 por três horas de trabalho em padarias e restaurantes. Logo conseguiu três bons clientes, que lhe cediam espaço para trabalhar e vendiam as guloseimas que fazia. 268 Seis anos do Supersimples adquiri-las. As entregas eram feitas de táxi, o que encarecia muito seu custo. Moravam na Zona Oeste da cidade, região de baixo poder aquisitivo, mas sua clientela estava concentrada nas zonas Sul e Leste, onde é bem mais alta a renda da população. Além disso, o transporte implicava riscos, já que não era possível adotar, em carro alheio, as cautelas necessárias. Como todo bom confeiteiro, Geandro encarou seu negócio como um laboratório de criação, não apenas como uma fábrica de produção em série. Para ser bem-sucedida, a profissão de confeiteiro, que tem sua origem no Império Romano, exige o dom de criar e recriar, de maneira a estimular alguns sentidos humanos, a visão, o olfato, e especialmente o paladar. As dificuldades provocadas pela falta de utensílios e equipamentos adequados nos locais em que fazia seus doces reforçaram em Geandro a ideia de que, se tivesse sua própria infraestrutura, poderia produzir mais para os clientes que já tinha e captar muitos outros. Foi então que criou coragem e pediu batedeira, fôrmas de bolo e dinheiro emprestados. Comprou outros utensílios básicos e levou pra casa. Sua esposa, Juliana, começava a preparação até ele chegar do serviço, quando ombreavam as tarefas. Percebendo a perspectiva de rápida expansão de seu negócio, Geandro se demitiu da Nestlé e decidiu apostar todas as fichas em sua capacidade empreendedora, que explica com muita simplicidade: “Estava acostumado a conquistar pessoas pra outras pessoas. Compreendi que havia chegado a hora de conquistar pra mim mesmo e pra minha casa”. Conversou então com Juliana, resolveram “pegar o boi pelo chifre” e formar sua própria clientela. O começo não foi fácil, mesmo com a ajuda que receberam. O casal sequer tinha uma bancada de trabalho ou uma geladeira. Geandro vendeu sua moto para As facilidades da formalização O lado prático do negócio rapidamente veio à tona. Todo cliente que Geandro tentava captar ia logo pedindo nota, alvará, endereço de seu estabelecimento, e ele não tinha nada disto. Depois de trabalhar informalmente por quatro meses, procurou o Sebrae, estimulado por Juliana, que lá tinha feito um curso de empreendedorismo. Tornara-se indispensável criar sua empresa e facilitar seu acesso ao mercado. A “Dom Geandro Dolci” foi aberta em novembro de 2011. O confeiteiro conta que a tarefa foi tão fácil que, “se soubesse, tinha me formalizado antes”. Mais que isto, destaca as expressivas vantagens que passou a ter: “com meu CNPJ, comecei a comprar tudo o que precisava por email e telefone. Muitas empresas só vendem para empresas. Sem falar na redução dos custos. Hoje compro chocolate a R$ 13,00 o quilo; se fosse pessoa física, teria que pagar R$ 19,00”. Três meses depois que começou a trabalhar em casa, o novo Empreendedor Individual comprou um Escort velho, e quatro meses mais tarde trocou-o por um carro mais novo. Hoje tem uma Parati, carro que considera adequado para transportar bandejas. Conta também com uma funcionária e um espaço de trabalho muito maior. Mudou-se com a esposa, com quem morava em uma casa de dois cômodos, para duas casas conjugadas em um grande terreno, onde pretende expandir ainda mais seu empreendimento. A migração para microempresário Geandro considera que seu sucesso se deve ao amor que coloca no trabalho, ao sabor e ao acabamento visual que dá aos seus produtos. Tortas de brigadeiro, morango, morango com chocolate, bolos, brownies e rocamboles são seu carro-chefe. O chocolate que usa é de boa qualidade, com pelo menos 50% de cacau. Planos para o futuro não lhe faltam. De imediato, pretende ter a própria loja e fazer venda direta de seus produtos. Ela será montada na parte da frente da casa, com financiamento bancário que está em vias de sair e que será usado também para ampliar a cozinha e adquirir novos equipamentos. Nestes planos, incluem-se a produção de salgados e a migração da condição de empreendedor individual para microempresário, já que está estourando o limite de R$ 60 mil por ano. Embora tenha aprendido seu ofício com a própria vida, sem formação acadêmica, Geandro não descuida de sua qualificação como gestor e está atento aos cursos que o Sebrae oferece, tendo feito já o “Sei Planejar”, oficina para Empreendedor Individual. Consciente da importância de um bom marketing, buscou ainda a ajuda do órgão para desenvolver a logomarca de sua empresa, bancando apenas 10% dos custos. Possui um blog e um site, instrumentos que considera vitais para a divulgação de seu negócio. Outros cursos sugeridos pelo Sebrae depois de uma visita ao seu estabelecimento estão em seus planos, ele que pretende romper as barreiras de Natal e tornar-se conhecido em todo o Nordeste. Seis anos do SUPERSIMPLES 269 Agradecimentos Reportagem Fotografias cedidas Edilma Dias (Paraná) Adenir Britto Adriana Morais – Gtec PEGN Eduardo Campos (Rio Grande do Norte e Rondônia) Agência Brasil Alberto Coutinho – Sebrae RN Luciene Ferreira (Cidade de Deus - RJ) Albino Oliveira Anderson Netto – Senado Federal Márcio Metzker (Bahia, Brasília, Mato Grosso, Minas Gerais) Alessandro Maschio Cecília Miranda – UDT Sebrae NA Ricardo Camargos (Espírito Santo) Alexandre Diniz Cleris Kussler – Sebrae RO Almir Baroni Glória Varela – ASN Fotografia Ana Volpe Helena Pojo Rego – UPP Sebrae NA Alex Schorsch (Paraná) André Corrêa Janne Macedo – Sebrae RN Francisco Valdean (Cidade de Deus) André Telles Karla Moraes Fonseca – Sebrae ES Guilherme Bergamini (Cidade de Deus e Rondônia) Andréa Farias Leandro Donatti – Sebrae PR Márcio Metzker (Bahia, Brasília, Mato Grosso, Minas Gerais) Bernardo Rebello Lorena Ortale – UMC Sebrae NA Raoni Maddalena (PEGN São Paulo) Charles Damasceno Lourenço Marani – Colíder MT Rodrigo Valente (Rio Grande do Norte) David Alves Lourenço Mayer Neto – Sebrae RS Willian Dias (Espírito Santo) Eliana Rodrigues Maura Miraglia – UPP Sebrae NA Elisa Elsie Rafael Carvalho – UPP Sebrae NA Eugênio Novaes Regina Mamede – ASN Geraldo Magela Renata Moraes – UCP Sebrae RJ Ilkenssouza Robson Schmidt – UDT Sebrae NA Inês Matos José Cruz Louis Monier Luiz Prado Miguel Ângelo CNI Miguel Aun Orlando Brito Patrícia Cruz Patrícia Stavis Ricardo Stuckert Rodolfo Buhrer Sebastião Pedra Ubirajara Carvalho MDA Valter Campanato ABr Victor Soares Waldemir Barreto Wilson Dias Demais fotos cedidas pelas assessorias Projeto gráfico e editoração Lúcia Helena de Assis Arte e capa Carla Coscarelli – Grupo de Design Gráfico Copydesk e revisão Beatriz Afonso Franzlália Melo Edição Márcio Metzker Impressão Tiragem 1.500 exemplares Coordenação Unidade de Políticas Públicas Unidade de Marketing e Comunicação Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) SGAS Quadra 605 Conjunto A 70200-904 Brasília DF www.sebrae.com.br 0800-570-0800
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