Avaliação de desempenho de edifícios habitacionais da
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Avaliação de desempenho de edifícios habitacionais da
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E DE TECNOLOGIA DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA CIVIL ESTUDO COMPARATIVO ENTRE A NORMALIZAÇÃO DE DESEMPENHO E CERTIFICAÇÃO AMBIENTAL PARA EDIFÍCIOS HABITACIONAIS BRASILEIROS Fernando do Couto Rosa Almeida Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Departamento de Engenharia Civil da Universidade Federal de São Carlos como parte dos requisitos para a conclusão da graduação em Engenharia Civil Orientador: Prof. Dr. Almir Sales São Carlos 2010 DEDICATÓRIA Aos meus pais, João e Nísia. Minha base, minha força, meu espelho. AGRADECIMENTOS A Deus, Engenheiro Maior do mundo, por passar sempre à frente em todo caminho a mim preparado, muitas vezes, não merecido. A toda minha família, pelo apoio e amor incondicional. A confiança em mim depositada sempre me manteve seguro e disposto a continuar buscando novos desafios. Em especial, aos meus pais João e Nísia, e meus irmãos, Lélia e Flávio. Amo vocês! Ao professor Almir, mais que um orientador, se mostrou um amigo nos três anos de trabalho, me apoiando e incentivando para a pesquisa. Seu otimismo e paciência me motivaram a buscar novas formas de aprender e criar. Às professoras Léa e Sheyla, pela disposição e contribuição na avaliação deste trabalho. Aos amigos de Franca, pela perseverança e apoio na minha caminhada de faculdade. Obrigado por estarem ao meu lado. Em ordem alfabética, Anelisa, Carol, Paula, Tales Ronca e Thales Borissi. Aos amigos de São Carlos, que por cinco anos, tornaram-se a família a qual escolhi conviver. Os jantares, as conversas jogadas fora, os filmes até altas horas, as risadas sem motivo e os trabalhos intermináveis nunca serão esquecidos. Em ordem alfabética: Carol, Fernando, Juliana, Lucas, Luis Augusto, Luiz Eduardo, Matheus, Sofia e Tiago. Aos amigos de intercâmbio, que fizeram parte de um dos períodos mais felizes da minha vida. Em especial, Ananda, Jéssica, Luciana e Nayara que me ajudaram a descobrir um mundo gigante, porém, alcançável. Aos professores do Departamento de Engenharia Civil, pela valiosa contribuição na minha formação acadêmica. À Universidade Federal de São Carlos por toda estrutura a mim oferecida nos cinco anos de graduação. A todas as pessoas que fizeram parte desse período de faculdade, o meu muito obrigado! Minha história não teria sido tão feliz sem vocês! RESUMO O crescente número de construções para habitação nos últimos anos tem se mostrado preocupante no que diz respeito à qualidade dessas edificações. Qualidade esta que afeta diretamente a segurança, conforto e saúde de seus ocupantes, e que pode ser mensurada através de uma análise de desempenho. Além disso, é necessário considerar que o setor da construção civil é um dos mais impactantes do meio ambiente, justificado pelo alto consumo de matérias primas naturais, grande geração de resíduos e poluição, além do elevado consumo de energia necessária ao processo da cadeia construtiva. Deste modo, é requerido que o edifício tenha uma durabilidade mínima permanente em longo prazo, atendendo às condições de habitabilidade durante toda a sua vida útil. Através deste direcionamento, este trabalho teve o objetivo de desenvolver um estudo comparativo entre a normalização brasileira de desempenho e uma certificação ambiental com referencial brasileiro para edifícios habitacionais. Foram estudados a NBR 15575 (2008) e o processo AQUA de certificação de responsabilidade ambiental. Essa análise foi importante para se verificar a aderência entre esses dois documentos, considerando o desempenho mínimo requerido a uma habitação e as boas práticas ambientais do ambiente construído. Desenvolveu-se o estudo com base na comparação dos requisitos de durabilidade e manutenibilidade, além do conforto ambiental, abordando o desempenho acústico, térmico e lumínico. Foram verificadas as diferenças e semelhanças entre os dois documentos, apontando em quais exigências cada processo se mostra mais rigoroso, sugerindo, ainda, melhorias para o nível de sustentabilidade e desempenho do edifício. Palavras-chave: desempenho da edificação, certificação ambiental, habitação brasileira. ABSTRACT ABSTRACT The growing number of buildings for housing in recent years has been the focus of concern about the quality of these buildings. This quality can directly affect the safety, comfort and health of its occupants, and it can be measured through a performance analysis. Moreover, the construction industry is one of the sectors that most impact the environment, explained by high consumption of natural raw materials, large waste and pollution production, and high energy consumption required to process the chain construction. Because of this, it has been required that the building has a minimum durability guaranteed in a long-term, with housing conditions during its lifetime. Through this direction, this work aimed to develop a comparative study between the Brazilian Standard of performance and an environmental certification with Brazilian reference to residential buildings. The NBR 15575 (2008) and the AQUA process of certification of environmental responsibility have been studied. This analysis has been important to verify the adhesion between these two documents, considering the minimum performance required in housing and the environmental good practices of the built environment. The study has been developed based on comparison of the requirements of durability and maintainability, and environmental comfort, addressing the acoustic, thermal and luminous performance. It has been studied the differences and similarities between the two documents, indicating which requirement is the most rigorous, suggesting improvements to the level of sustainability and performance of the building. Key-words: building performance, environmental certification, Brazilian housing. LISTA DE FIGURAS Figura 2.1 – Desempenho ao longo do tempo de um elemento, instalação ou elemento construtivo. .................................................................................................................... 11 Figura 3.1 – Ciclo de vida dos edifícios. ............................................................................... 15 Figura 3.2 – Bank of American Tower. ................................................................................. 22 Figura 3.3 – Council House 2 (esq.) e detalhe das venezianas de madeira (dir.) ................ 22 Figura 3.4 – 30 The Bond. .................................................................................................... 23 Figura 3.5 – BMW Welt. ........................................................................................................ 24 Figura 3.6 – Clinton Presidential Library. .............................................................................. 24 Figura 3.7 – The New York Times. ....................................................................................... 25 Figura 3.8 – Aeroporto de Oslo - Gardermoen. .................................................................... 26 Figura 3.9 – Parlamento alemão Reichstag - fachada (esq.) e cúpula de vidro (dir.) ........... 27 Figura 3.10 – Commerzbank Headquarters.......................................................................... 27 Figura 3.11 – Ospedale dell´Angelo - fachada (esq.) e interior do edifício (dir.) .................. 28 Figura 4.1 – Famílias e categorias definidas pela certificação AQUA. ................................. 30 Figura 4.2 – Níveis mínimos para obtenção da certificação AQUA. ..................................... 31 Figura 9.1 – Zoneamento bioclimático brasileiro. ................................................................. 53 LISTA DE TABELAS Tabela 3.1 – Categorias de desempenho e as questões consideradas no GBTool. ............ 17 Tabela 3.2 – Categorias e créditos do LEED versão 3 - 2009. ............................................. 18 Tabela 3.3 – Categorias ambientais e práticas gerenciais do HQE. ..................................... 18 Tabela 8.1 – Vida útil de projeto para os diferentes elementos e componentes da construção habitacional. ................................................................................................................... 51 SUMÁRIO 1. 2. 3. INTRODUÇÃO................................................................................................................. 1 1.1 Apresentação do problema ................................................................................... 1 1.2 Objetivos ................................................................................................................. 2 1.3 Justificativa ............................................................................................................ 3 1.4 Estrutura do texto .................................................................................................. 4 DESEMPENHO DE EDIFICAÇÕES ................................................................................ 5 2.1 Histórico ................................................................................................................. 5 2.2 Conceitos aplicados à NBR 15575:2008 .............................................................. 7 QUESTÕES DE SUSTENTABILIDADE........................................................................ 12 3.1 Certificações ambientais ..................................................................................... 16 3.2 Exemplos de edifícios sustentáveis .................................................................. 20 3.2.1 Bank of American Tower (Estados Unidos) ....................................................... 21 3.2.2 Council House 2 (Austrália) ............................................................................... 22 3.2.3 30 The Bond (Austrália) ..................................................................................... 23 3.2.4 BMW Welt (Alemanha)....................................................................................... 23 3.2.5 Clinton Presidential Library (Estados Unidos).................................................... 24 3.2.6 The New York Times (Estados Unidos) ............................................................. 25 3.2.7 Aeroporto de Oslo (Noruega) ............................................................................. 25 3.2.8 Parlamento Alemão (Alemanha) ........................................................................ 26 3.2.9 Commerzbank Headquarters (Alemanha) ......................................................... 27 3.2.10 Ospedale dell´Angelo (Itália) .......................................................................... 28 4. CERTIFICAÇÃO AMBIENTAL AQUA .......................................................................... 29 4.1 5. Categorias a serem analisadas .......................................................................... 31 ESTUDO COMPARATIVO ............................................................................................ 33 5.1 Durabilidade e Manutenibilidade ........................................................................ 33 5.2 Conforto Ambiental ............................................................................................. 36 5.2.1 Conforto térmico................................................................................................. 37 5.2.2 Conforto acústico ............................................................................................... 38 5.2.3 Conforto lumínico ............................................................................................... 41 6. CONCLUSÕES.............................................................................................................. 44 7. REFERÊNCIAS ............................................................................................................. 46 8. ANEXO I ........................................................................................................................ 51 9. ANEXO II ....................................................................................................................... 53 1 1. INTRODUÇÃO Considerando o grande potencial de desenvolvimento passível de ser gerado pelo setor da construção civil, principalmente no que tange a sua qualidade, este trabalho foi motivado pela necessidade de elaboração de uma análise teórico-comparativa entre alguns requisitos da nova normalização de desempenho e uma certificação ambiental, destinada a edifícios habitacionais brasileiros. O estudo de um edifício residencial, sob a luz de alguns princípios ambientais, se faz necessário a fim de que seja possível reduzir o impacto ambiental dos empreendimentos, frente a um desenvolvimento sustentável, assegurando conforto, saúde e economia aos usuários. Foi utilizada a certificação ambiental AQUA para balizamento deste estudo. Utilizando a Norma Brasileira de Desempenho de Edificação de até cinco pavimentos como referência, foi possível verificar a real eficiência técnica destes requisitos ambientais propostos pela certificação. Os requisitos avaliados no estudo comparativo destes dois documentos foram durabilidade e manutenibilidade, conforto térmico, acústico e lumínico, todos aplicados a edifícios habitacionais com referencial brasileiro. 1.1 APRESENTAÇÃO DO PROBLEMA Em função do notável crescimento do setor da construção civil, movidos pela migração rural, mercados de trabalho, distribuição de renda, desenvolvimento industrial, importação de tecnologias entre outros, cresce, cada vez mais, a demanda por habitações nas cidades brasileiras. Neste sentido, a cadeia produtiva da construção civil apresenta grande importância na colaboração de geração de impactos ambientais justificados pela expressiva quantidade de energia e recursos naturais consumidos, geração de resíduos, perdas e desperdícios de materiais e poluição ambiental. Desta forma, muitas são as diretrizes que colocam em pauta a sustentabilidade do ambiente construído, tais como a redução do consumo de água, energia e materiais; 2 conservação das áreas naturais e da biodiversidade; redução da emissão de gases contribuintes para o efeito estufa; manutenção da qualidade do ambiente construído e gestão da salubridade do ar interior. Aliado à questão ambiental, associa-se também o conceito de desempenho das edificações que deve atender as exigências e necessidades dos usuários, respeitando as condições de durabilidade, conforto, segurança e salubridade das habitações. O trabalho foi realizado no escopo do desenvolvimento sustentável, com base em certificações ambientais para edifícios habitacionais. O estudo foi baseado em alguns indicadores da certificação ambiental AQUA, a primeira a ser desenvolvida com referenciais totalmente brasileiros, publicada em fevereiro de 2010. No Brasil, poucas são as edificações que apresentam alguma certificação desta categoria, sendo o número cada vez mais crescente. Além disso, a nova norma de desempenho, publicada em 2008 com entrada em vigor prorrogada para março de 2012, foi proposta para alavancar tecnicamente a qualidade requerida e a oferta de moradias, estabelecendo regras claras e objetivas para todos os agentes que estão ligados ao projeto, construção e ocupação de um imóvel habitacional. O trabalho, portanto, vem mostrar a real aderência daquela certificação aos requisitos propostos pela normalização de desempenho, procurando verificar qual destes documentos apresenta maior rigor quanto à qualidade do ambiente construído. 1.2 OBJETIVOS Este trabalho tem como objetivo geral o estudo comparativo da normalização brasileira de desempenho e uma certificação ambiental para edifícios habitacionais, sendo dividido nos seguintes objetivos específicos: Estudar e discriminar os parâmetros dos requisitos gerais estabelecidos pela nova norma NBR 15575:2008 de Desempenho de edifícios habitacionais de até cinco pavimentos; Estudar as principais certificações ambientais existentes e discriminar os requisitos daquela com referencial brasileiro para edifícios habitacionais; 3 Verificar a aderência de alguns requisitos desta certificação ambiental à normalização de desempenho, propondo melhorias para o nível de sustentabilidade e desempenho de uma edificação. 1.3 JUSTIFICATIVA Como necessidade básica do ser humano, a habitação deve atender a uma série de condições básicas que visem à qualidade de vida de seus ocupantes. Assim, é importante que ela reúna as exigências mínimas de segurança, saúde, higiene e bem-estar das famílias. Com o surgimento das novas tecnologias de construção cada vez mais acelerado, não é difícil de encontrar materiais e serviços com qualidade e garantia duvidosas. Com isso, o atendimento às necessidades mínimas exigidas pelos usuários das habitações pode não ser atendido. A norma de desempenho busca, portanto, orientar a avaliação da real eficiência técnica e econômica das inovações tecnológicas, propondo diretrizes e incentivos ao desenvolvimento de produtos. Neste sentido, a normalização de desempenho para habitações visa alavancar tecnicamente a qualidade requerida e a oferta de moradias, estabelecendo regras claras e objetivas para quem vai desenvolver, quem vai produzir, quem vai financiar e quem vai ocupar e manter um imóvel habitacional. A visão técnica requerida na busca da qualidade das edificações não é válida se esta não estiver de acordo com os requisitos ambientais de desenvolvimento sustentável. Muitos são as iniciativas para o desenvolvimento de indicadores de níveis de sustentabilidade relacionados ao setor da construção, sendo estes aplicados às diversas certificações de desempenho ambiental existentes para cada tipologia de edificação, referenciados no contexto do país ou região. Temas como a diminuição da poluição em canteiros de obras, uso eficiente de recursos e melhoria da eficiência energética devem ser pensados durante o projeto e execução de um edifício habitacional para que, não somente este alcance um desempenho favorável durante toda a sua vida útil, mas também colabore para a produção de um ambiente construído pautada por atitudes mais responsáveis. Esse trabalho buscou aliar essas duas preocupações, tanto a questão do desempenho como a da sustentabilidade. Desta forma, o estudo se desenvolveu em uma análise teórico-comparativa de dois documentos: a NBR 15575 (2008) e o processo de certificação ambiental AQUA, voltados para edifícios habitacionais brasileiros. A partir da análise de durabilidade e manutenibilidade, conforto térmico, acústico e lumínico, foram 4 apontados quais requisitos e critérios cada documento se mostra mais rigoroso nestas questões avaliadas. O estudo desenvolvido neste trabalho é pioneiro devido às recentes publicações dos documentos avaliados (NBR 15575 e processo AQUA). Desta forma, ele se torna uma referência a futuros estudos sobre desempenho de edificações e certificações ambientais. 1.4 ESTRUTURA DO TEXTO Além deste capítulo introdutório, este trabalho é composto também por mais oito ítens, os quais foram descritos, brevemente, a temática abordada em cada um, como segue. No Capítulo 2, foi elaborado um breve histórico e levantado os principais conceitos envolvidos sobre a abordagem de desempenho de edificações, com destaque à nova normalização brasileira NBR 15575 (2008). No Capítulo 3, apresentou-se um estudo sobre algumas questões de sustentabilidade que envolve o projeto, construção e ocupação de um edifício. Realizou-se, também, um levantamento das principais certificações ambientais disponíveis atualmente, listando alguns exemplos de edificações nacionais e internacionais que aplicaram algum processo de qualidade ambiental em sua concepção. No Capítulo 4, discriminou-se a estrutura de uma certificação ambiental com referencial brasileiro para edifícios habitacionais, a fim de validar o estudo comparativo com a norma nacional. Escolheu-se, portanto, o processo AQUA, primeira certificação considerando as variáveis do país. No Capítulo 5, desenvolveu-se o estudo comparativo entre alguns requisitos abordados na norma brasileira e na certificação ambiental AQUA. A discussão foi balizada nas questões de manutenibilidade e durabilidade, conforto térmico, acústico e lumínico da edificação habitacional. Por fim, no Capítulo 6, foi elaborada uma conclusão do trabalho, buscando verificar a aderência dos dois documentos analisados. Nos itens seguintes, foram apresentados as referências bibliográficas e os anexos citados no texto. 5 2. DESEMPENHO DE EDIFICAÇÕES Neste capítulo, procurou-se desenvolver um estudo a respeito de desempenho de edificações, buscando um levantamento da revisão da literatura sobre o assunto. 2.1 HISTÓRICO O conceito de desempenho de edificações que, de modo geral, pode ser entendido como o comportamento em uso das construções ao longo da vida útil, vem sendo estudado há mais de 40 anos no mundo todo. Até o final da década de 80, o foco das pesquisas sobre esse tema estava voltado mais ao aspecto conceitual, sendo que, a partir da década de 90, voltou-se à aplicação do conceito de desempenho na concepção e execução das construções (BORGES & SABBATINI, 2008). Gonçalves et al. (2003) citaram algumas instituições internacionais que se destacaram no desenvolvimento desse conceito, sendo elas: a Réunion Internationale de Laboratories d’Essais et de Recherches sur les Materiaux et Construtions (RILEM), a American Society for Testing and Materials (ASTM), o International Council for Research and Innovation in Building and Construction (CIB) e a International Organization for Standardization (ISO). Deve-se destacar ainda a importância da ISO na publicação de normas que consolidaram o conceito de desempenho (ISO 6240:1980, ISO 6241:1984, ISO 7162:1992), as quais se constituem em referências importantes no assunto de qualidade. Em 2000, foi desenvolvido pela Comunidade Européia a Rede Temática PeBBU (Performance Based Building), uma iniciativa mais estruturada sobre o tema de desempenho. Esse projeto consolidou todos os trabalhos anteriormente desenvolvidos sobre o assunto, dedicado à exploração do conceito de desempenho na construção e sua aplicação no setor (SZIGETI & DAVIS, 2005). No Brasil, também se verificou a mesma tendência mundial da evolução conceitual do desempenho. 6 A partir da década de 70, época do “milagre econômico”, com a necessidade de suprir o déficit habitacional brasileiro, observou-se o surgimento de novos sistemas construtivos como alternativa aos produtos e processos tradicionais, visando principalmente à racionalização e industrialização da construção. Ao mesmo tempo, foram criadas metodologias para avaliação desses sistemas, mas muitas delas apresentaram resultados desastrosos, com graves prejuízos para todos os agentes intervenientes no processo de construção, sendo transferidos aos usuários os problemas de patologia e os altos custos de manutenção e reposição advindos do uso de novos produtos, sem avaliação prévia (GONÇALVES et al., 2003). O conceito de desempenho começou a tomar corpo na década de 80, com os trabalhos realizados pelo IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas) para o Banco Nacional da Habitação e, depois para a Caixa Econômica Federal, sua sucessora, com o objetivo na elaboração de critérios capazes de avaliar os sistemas construtivos inovadores. Esse trabalho foi uma tentativa de minimizar o problema da falta de normalização técnica brasileira e reconhecendo-se a necessidade de novas soluções tecnológicas que permitissem a construção de edifícios em larga escala (GONÇALVES et al., 2003; BORGES & SABBATINI, 2008). No ano de 2000, a Caixa Econômica Federal financiou, através da FINEP (Financiadora de Estudos e Projetos), um projeto para a criação de um sistema de avaliação de sistemas construtivos inovadores, baseado no conceito de desempenho. Os objetivos do projeto inicial foram ampliados, o que resultou na publicação da Norma Brasileira de Desempenho de Edifícios até Cinco Pavimentos, em 2008, especificando também os requisitos de desempenho mínimos para vários sistemas das edificações, inovadores ou não, e definiu as incumbências dos intervenientes para a obtenção do desempenho ao longo de uma vida útil mínima obrigatória (BORGES & SABBATINI, 2008). Apesar do título da nova norma, Construção Mercado (2010b) afirmou que as regras também se aplicam a empreendimentos com mais de cinco pavimentos, em todos os requisitos que não dependam diretamente da altura. Publicada em 2008, a norma brasileira de desempenho (NBR 15575, 2008) apresentou dificuldades de ser implantada entre os seus agentes/atores. Diante das dúvidas e dos reflexos que esta poderia causar na cadeia produtiva do setor, os envolvidos alegaram que a norma precisa de mais tempo para entrar em vigor; um período para modificações, adaptações e esclarecimentos por parte de construtores, fornecedores, seguradoras, consumidores e órgãos do governo. Com a vigência prevista para maio de 2010, o documento foi prorrogado inicialmente para novembro do mesmo ano e, depois de uma 7 consulta pública, foi decidido que o período para entrada em vigor será março de 2012. (CREA-SC, 2010; SINDUSCON-DF, 2010; AROEIRA & KLAVDIANOS, 2010). 2.2 CONCEITOS APLICADOS À NBR 15575:2008 No meio acadêmico, o conceito de desempenho pode ser definido como a prática de se pensar em termos de fins e não de meios, com a preocupação dos requisitos que a construção deve atender, e não com a prescrição de como essa deve ser construída (GIBSON, 1982 apud SZIGETI & DAVIS, 2005; BORGES & SABBATINI, 2008; CONSTRUÇÃO MERCADO, 2010a). O edifício é um produto que deve apresentar determinadas características que o capacitem a cumprir objetivos e funções para os quais foi projetado, quando submetido a determinadas condições de exposição e uso. Assim, ele tem comportamento adequado quando atende aos requisitos para o qual foi projetado (CONSTRUÇÃO MERCADO, 2010a). Simão (2010) aponta os avanços da aplicação de uma norma de desempenho para o setor da construção, como: abordagem diferente à do caráter prescritivo; foco no conforto e segurança do morador; incentivo à inovação e sustentabilidade; qualidade com valor agregado; co-responsabilidade dos projetistas, construtores, fabricantes e usuários pelo desempenho da habitação; e definição de ensaios para perícia. Em muitos países, inclusive o Brasil, a exigência normativa tem um foco prescritivo, descrevendo os meios para atingir o objetivo em termos de materiais e tecnologia, enquanto um requisito de desempenho descreve o fim, pensando na edificação como um produto, que, como tal, deve ter um desempenho mínimo global desejado, independentemente dos sistemas construtivos utilizados (OLESZKIEWICZ, 1994; PINIWEB, 2004, CONSTRUÇÃO MERCADO, 2010a). Oleszkiewicz (1994) fez um levantamento das diferenças que caracterizam os códigos de construção prescritivos e de desempenho. As normalizações prescritivas são elaboradas com o pressuposto de que seus usuários estão interessados nos requisitos técnicos e não nos seus fundamentos. Essas normas apresentam uma estrutura orientada na construção de elementos, sendo que sua elaboração deve abranger uma infinidade de detalhes e procedimentos construtivos. Uma normalização baseada no desempenho é criada sobre a hipótese de que o usuário precisa conhecer a razão de uma exigência específica; esse conhecimento se faz necessário para chegar à solução que atenda a intenção do requisito. A estrutura dessa 8 norma é bem definida, transparente, hierárquica e orientada por objetivos. Deve-se chegar aos objetivos dos requisitos e critérios a partir de uma exigência específica do usuário. Szigeti & Davis (2005) citaram a importância de documentos balizados a partir da abordagem de desempenho nas construções. Com esses documentos, o governo e as empresas construtoras terão uma orientação de desempenho focada nas necessidades dos usuários, possibilitando uma maior satisfação dos clientes. Além disso, esses trabalhos tendem a: facilitar a inovação tecnológica, fornecendo uma estrutura sistemática para avaliação e aceitação dessas tecnologias; facilitar o comércio internacional, por substituir as normas prescritivas que podem servir como restrição; e facilitar a comunicação de todos os envolvidos a fim de alcançar uma escolha racional de produtos e serviços. Além da questão normativa, outro desafio encontrado para a aplicação da abordagem de desempenho na construção civil, citado por Borges & Sabbatini (2008), é a tradução das necessidades dos usuários em requisitos e critérios que possam ser mensurados de maneira objetiva e não variável, dentro de determinadas condições de exposição e uso, e que sejam viáveis técnica e economicamente dentro da realidade de cada sociedade, região ou país. A normalização de desempenho procurou considerar as exigências dos usuários em tópicos como segurança, habitabilidade e sustentabilidade, traduzindo os anseios psicológicos e pouco objetivos do usuário em forma de critérios e requisitos, quantificando e qualificando suas necessidades (PINIWEB, 2004). Entretanto, o conceito de desempenho é sistêmico e probabilístico, e sempre atenderá uma parte da população numa parte do tempo (BORGES & SABBATINI, 2008). A seguir, são enumeradas as exigências dos usuários conforme apresentado pela NBR 15575 (2008): - Segurança: estrutural; contra o fogo; uso e operação; - Habitabilidade: estanqueidade à água; conforto higrotérmico, acústico e lumínico; saúde, higiene e qualidade do ar; funcionalidade e acessibilidade; conforto tátil e antropodinâmico; - Sustentabilidade: durabilidade; manutenabilidade; impacto ambiental. Entretanto, segundo Degani (2009), a norma não aprofunda, na medida necessária, alguns itens como o de durabilidade e adequação ambiental, além de não apresentar uma abrangência socioambiental e urbana, importantes na tratativa de questões de sustentabilidade. Após a identificação das exigências do usuário que se deseja satisfazer, é necessário considerar um conjunto de condições de exposição que devem ser atendidas 9 pelo produto quando submetidos às condições normais de uso, definidos qualitativa e quantitativamente. Finalmente, devem-se determinar os métodos para se avaliar se as condições estabelecidas foram atendidas. Os requisitos são expressos em termos qualitativos; os critérios, em termos quantitativos; e os métodos de avaliação para mensuração do desempenho que variam de acordo com o momento e os objetivos das avaliações, podendo ser medições in loco, ensaios de laboratório, análises de projetos, realizações de protótipos, entrevistas aos usuários, entre outros (BORGES & SABBATINI, 2008; LOURENÇO FILHO, 2009). Em termos de metodologia de avaliação, a norma de desempenho para edifícios habitacionais propõem níveis de desempenho para os diferentes elementos e partes da construção: o nível “M” é o nível mínimo que deve obrigatoriamente ser atendido e, para cada desempenho excedente às necessidades mínimas, a norma estabelece respectivamente os níveis “I” (intermediário) e “S” (superior). As condições de exposição a que as edificações estão sujeitas variam de acordo com a região em que são construídas, podendo sofrer influência por agentes mecânicos, eletromagnéticos, físicos e químicos. Os agentes mecânicos podem ser externos, como cargas de água, ou internos, como sobrecargas e ruídos. Radiação e eletricidade são exemplos de agentes eletromagnéticos, enquanto condensação, umidade do ar, dejetos de pássaros e névoas salinas são exemplos de agentes físico-químicos. Ações resultantes da ocupação também são consideradas como condições de exposição (LOURENÇO FILHO, 2009). O caráter temporal do desempenho também é um fator importante na dificuldade de tradução das exigências dos usuários. O que, em princípio, deveria se manter ao longo de toda a vida útil da edificação, muitas vezes a manutenção do desempenho esperado pode não acontecer, devido a vários fatores, como por exemplo, mudanças climáticas, mudanças de uso da edificação e falta de manutenção corretiva e preventiva por parte dos usuários (BORGES & SABBATINI, 2008). A questão temporal pode ser expressa pela vida útil e durabilidade dos sistemas, elementos e componentes. Segundo a NBR 15575 (2008), vida útil pode ser definida como o período de tempo durante o qual o produto pode ser utilizado sob condições satisfatórias de segurança, saúde e higiene e, durabilidade, como a capacidade do produto conservar ao longo do tempo propriedades compatíveis com a utilização prevista, sob condições de instalação, operação e manutenção especificadas pelo produtor e/ou fornecedor. Graziano (2005) apud Lourenço Filho (2009) mostrou que a durabilidade é resultado de esforços coordenados de todos os envolvidos nos processos de projeto, construção e 10 utilização da edificação, sendo de grande importância, a especificação pelo construtor dos materiais a serem empregados, os requisitos de uso e a elaboração de um manual de manutenção. A NBR 15575 (2008) subdivide a vida útil em vida útil de projeto e residual. Vida útil de projeto é o período estimado de tempo, em que um sistema é projetado para atender os requisitos de desempenho estabelecido, desde que cumprido o programa de manutenção previsto no manual de operação, uso e manutenção. Vida útil residual é o período de tempo, contado após a vida útil de projeto, em que o sistema apresenta decréscimo continuado de desempenho em função do uso e/ou do envelhecimento natural. Finalmente, vida total é o período de tempo que compreende a vida útil de projeto, a vida útil residual e uma sobrevida na qual passa a existir a possibilidade de que os níveis de segurança comecem a ser perigosamente afetados. A vida útil que atende às exigências do usuário, a ser estabelecida em projeto ou em especificações de desempenho, é definida como vida útil requerida (NBR 15575, 2008). Lourenço Filho (2009) afirmou que essa vida útil requerida pode ser pré estabelecida pelo usuário, influenciando, de forma decisiva, na definição da vida útil de projeto. Assim sendo, o usuário pode optar, por exemplo, por uma vida útil de projeto menor para se conseguir um custo inicial menor. No Anexo I, é mostrado os valores mínimos de vida útil exigida em cada nível da norma brasileira de desempenho. Cabe ressaltar a diferença entre o prazo de garantia e o conceito de vida útil definidos pela norma. O prazo de garantia é determinado como o período de tempo em que é elevada a probabilidade de que eventuais vícios ou defeitos em um sistema, em estado novo, venham a se manifestar, decorrentes de anomalias que repercutam no desempenho inferior àquele previsto. Espera-se que algum possível defeito de fabricação se manifeste dentro deste prazo. Lourenço Filho (2009) ainda mostra a interdependência entre desempenho, vida útil, plano de manutenção e prazo de garantia. Os desempenhos dos componentes e dos elementos determinam a vida útil da edificação, que somente será adequadamente atingida com uma manutenção eficiente. O prazo de garantia, determinado a partir da vida útil dos elementos, somente será válido se a manutenção desenrolar-se em um nível adequado, cabendo ao construtor esclarecer ao usuário quais as conseqüências do não cumprimento do plano de manutenção. Por outro lado, é concebível a idéia de que a prazo de garantia possa ser prorrogado caso o usuário assuma um nível superior de manutenção da edificação. 11 A Figura 2.1 mostra um esquema entre os elementos abrangidos pelo caráter temporal de um sistema construtivo, bem como sua interdependência. Desempenho elevação do desempenho mediante intervenções programadas de manutenção Desempenho previsto no projeto (M, I ou S) Perda de desempenho funcional, prejuízos ao conforto, etc manutenções mais dispendiosas podem prolongar a vida útil residual Risco de prejuízos à segurança prazo de garantia Tempo Vida útil de projeto Vida útil Vida útil residual Sobrevida Vida total Figura 2.1 – Desempenho ao longo do tempo de um elemento, instalação ou elemento construtivo (Fonte: NBR 15575-1, 2008). A obtenção do desempenho ao longo de uma vida útil se torna difícil devido à dependência de várias partes envolvidas no processo, que vai desde aqueles que concebem os empreendimentos até os responsáveis por sua operação e manutenção. Projetistas, fabricantes de materiais, construtores, incorporadores, administradores pósobra, entre outros agentes do setor, são “sócios” do desempenho para que este seja obtido ao longo do tempo (BORGES & SABBATINI, 2008). 12 3. QUESTÕES DE SUSTENTABILIDADE Atualmente, o Brasil vive uma notória expansão do setor da construção civil, decorrentes de fatores como o crescimento econômico e estabilização do país, a melhoria crescente dos índices macroeconômicos brasileiros e a grande capitalização do setor através da recente abertura de capital de diversas incorporadoras e construtoras (BORGES & SABBATINI, 2008). Aliado a isso, o país apresenta um elevado déficit habitacional, calculado em 6,3 milhões de domicílios, em 2007, conforme apresentado pelo Ministério das Cidades (2009). Como essa problemática está voltada, em sua quase totalidade, para as classes de baixa renda, as incorporadoras e construtoras brasileiras identificaram nesse segmento como um grande mercado a ser atendido. Frente a esse cenário, Borges & Sabbatini (2008) destacaram a importância da aplicação da norma de desempenho para esse setor. Além de ajudar a combater a variável qualidade das construções no país, essa concepção de desempenho atenderia de forma mais digna às necessidades de moradia da população de baixa renda e otimizaria a aplicação dos recursos governamentais numa visão de longo prazo, garantindo a durabilidade e manutenabilidade dessas edificações. Hino & Melhado (1998) concluíram que a qualidade do projeto é fundamental para a qualidade final da edificação, em termos de desempenho funcional e também com relação a custos e resultado financeiro. Em se tratando de empreendimentos habitacionais de interesse social, onde são empregados grandes montantes de investimentos, a preocupação com o desempenho possui ainda maior relevância, para garantir a correta aplicação dos recursos públicos. A construção civil é o setor industrial que mais causa impactos ao meio ambiente (JOHN, 2000). O macro-complexo da construção civil é uma das maiores consumidoras de matérias primas naturais, sendo estimado um consumo aproximado de 75% do total de 13 recursos naturais extraídos no planeta. A quantidade de resíduo gerado por esse setor, advindos principalmente de atividades de construção, manutenção e demolição, também assume números consideráveis. No Brasil, estima-se uma geração de resíduo de construção que varia em torno de 230 a 760 kg/hab.ano, representando entre 41% e 70% dos resíduos sólidos municipais. Além disso, o setor envolve processos intensivos em energia, geradores de poluição, dada sua dispersão espacial e transporte a grandes distâncias. Assim, a indústria da construção colabora significativamente na poluição ambiental, incluindo a liberação de gases do efeito estufa. Estima-se que cerca de 80% da energia utilizada na produção do edifício seja consumida na produção e transporte de materiais (CTE 2010; JOHN, 2000). Além disso, o setor é o maior gerador de empregos diretos e indiretos no país, sendo que, parte dos operários da construção, encontra-se na linha de pobreza e a informalidade é prática de mais de 50% das empresas do setor (CTE, 2010). Desse modo, a durabilidade da edificação deixa de ser um aspecto importante apenas do ponto de vista econômico, e passa a significar o tempo em que atividades que implicaram em determinado impacto ambiental cumpram sua função social, minimizando o consumo de recursos (SJÖSTRÖM, 1996 apud JOHN, 2000). Os autores Borges & Sabbatini (2008) afirmaram que, para uma mudança na forma de se construir, incorporando uma visão de longo prazo, o arcabouço conceitual do desempenho é a ferramenta adequada para o tratamento das questões ambientais. Para eles, a sustentabilidade tornou-se a razão filosófica e a principal motivação para todo o investimento atual em pesquisas e iniciativas para aplicação do conceito de desempenho. “O desenvolvimento sustentável não é só uma maneira de gerenciar a interação entre o ambiente físico e o crescimento econômico, mas sim uma forma de desenvolvimento que reconhece, nos limites da sustentabilidade, origens não só naturais como estruturais (sociais, políticas, culturais). Não se resume à harmonização da relação economia e meio ambiente e nem a questão técnica; é também um instrumento político que tenta ordenar a desordem global. O desenvolvimento sustentável implica no uso da informação e tecnologia em atividades de menor desperdício de matérias primas e combustíveis, uso de insumos de baixo custo ambiental e capazes de gerar poucos rejeitos” (BECKER, 1994 apud DEGANI, 2009). No âmbito do sistema construtivo, a construção sustentável é capaz de promover alterações conscientes no entorno, de forma a atender as necessidades de edificação, habitação e uso do homem moderno, preservando o meio ambiente e os recursos naturais, garantindo qualidade de vida para as gerações atuais e futuras (ARAÚJO, 2008). 14 Degani (2009) citou os principais elementos elaborados para o desenvolvimento sustentável da construção civil, elaborados pela Agenda 21 do CIB (International Council for Research and Innovation in Building and Construction), em 1999: (a) Redução do consumo energético e da extração dos recursos minerais; (b) Conservação das áreas naturais e da biodiversidade; (c) A manutenção da qualidade do ambiente construído e gestão da salubridade do ar interior. Entretanto, esse conceito de construção sustentável é variável de acordo com as necessidades de cada país e está relacionada com as especificidades de seu clima, tradições construtivas, estágio de desenvolvimento industrial, cultura, natureza das edificações existentes e características dos diversos agentes envolvidos (DEGANI, 2009). Sendo assim, John et al. (2000) desenvolveram uma Agenda Sustentável para o setor da construção civil no Brasil, frente às necessidades e peculiaridades econômicas, sociais e ambientais do país, sendo abordados os temas: (a) Redução de perdas e desperdícios de materiais de construção; (b) Reciclagem de resíduos da indústria da construção civil como materiais de construção; (c) Eficiência energética das edificações; (d) Conservação da água; (e) Melhoria da qualidade do ar interior; (f) Durabilidade e manutenção; (g) Tratamento do déficit em habitação, infra-estrutura e saneamento; (h) Melhoria da qualidade do processo construtivo. Araújo (2008) afirma que, quanto mais sustentável uma obra, mais responsável ela será por tudo o que consome, gera, processa e elimina (descarta). Deve-se considerar a capacidade de planejar e prever todos os impactos que pode provocar, antes, durante e depois do fim de sua vida útil. Visando a sustentabilidade do ambiente construído, bem como a garantia da qualidade e desempenho de uma edificação, Degani (2009) afirma que se devem considerar todas as etapas do ciclo de vida dos edifícios, como mostrado na Figura 3.1. 15 Figura 3.1 – Ciclo de vida dos edifícios (Fonte: DEGANI, 2009). Várias são as soluções e diretrizes apresentadas para a indústria da construção civil, através de pesquisas acadêmicas, a fim de que o setor consiga alcançar as metas propostas para o desenvolvimento sustentável, com base na realidade atual do cenário brasileiro, podendo destacar: - NA PRODUÇÃO DOS EDIFÍCIOS: reduzir desperdícios de materiais, água e energia; identificar e viabilizar a utilização de materiais alternativos; reaproveitar materiais (com práticas de reuso e reciclagem); orientar a implantação de centrais de reciclagem de RCD (resíduo de construção e demolição); disponibilizar informações a respeito de análises de ciclo de vida (ACV) de materiais e componentes construtivos. - NO PRODUTO (EDIFÍCIOS): durabilidade e qualidade; eficiência energética; eficiência no uso da água; conforto e saúde dos usuários. Nota-se que, para a obtenção de um edifício que, durante seu funcionamento garanta aplicação dos conceitos de sustentabilidade, a abordagem de desempenho é de fundamental validade, pois esta visa o produto final, e não a forma com que este é construído. Degani (2009) elaborou indicadores de desempenho relevantes para a avaliação da sustentabilidade de edifícios em uso, voltadas para a realidade brasileira, podendo se organizar nos seguintes temas: integração do edifício ao seu entorno; materiais, sistemas e processos construtivos; energia; água; resíduos; dispositivos técnicos; conforto e saúde. 16 Silva (2007) citou que os indicadores de sustentabilidade descrevem os impactos ambientais, econômicos e sociais de edifícios para os proprietários, usuários dos edifícios e demais parte interessadas da indústria de construção. Tais métricas são necessárias para capturar tendências e informar os agentes de decisão, orientar o desenvolvimento e o monitoramento de políticas e estratégias, e facilitar o relato das medidas adotadas para implementação do desenvolvimento sustentável. Um indicador não é um número – apesar de esta ser uma acepção frequentemente utilizada –, e sim uma variável para a qual pode ser medido ou atribuído um valor, que pode ser qualitativo ou quantitativo. A mesma autora concluiu que, tanto os indicadores de desempenho como os de sustentabilidade fornecem aos seus usuários a retroalimentação necessária ao fazer benchmark de desempenho (desempenho de referência) e ilustrar a taxa e extensão do progresso, auxiliando na conscientização dos problemas ambientais e seus reflexos sociais e econômicos (ou vice-versa), e nivelando uma base para comparação entre tomada de decisões e planejamento estratégico. Mesmo assim, a autora reconhece a dificuldade em relacionar informações obtidas na escala do edifício com o progresso do setor ou do país em dimensões da sustentabilidade. Entretanto, defende-se a validade de se extraírem indicadores relevantes para os edifícios que, ainda que não possam ser imediatamente agregados para formar uma medida global da sociedade, indiquem o caminho para cooperação no cumprimento de metas setoriais e nacionais e a produção de um ambiente construído pautada por atitudes mais responsáveis, com base na reflexão sobre seus efeitos no longo prazo. 3.1 CERTIFICAÇÕES AMBIENTAIS Considerando uma adequada avaliação da qualidade e desempenho ambiental das edificações, Kim et al. (2005) e Degani (2009) apresentaram um breve levantamento dos principais modelos de avaliação existentes, definidos a partir de indicadores próprios, destacando o GBTool, BREEAM, LEED e HQE. O GBTool é uma ferramenta computacional de avaliação do desempenho ambiental da edificação desenvolvida como parte do projeto internacional Green Building Challenge. Essa ferramenta ajuda a avaliar e analisar a energia e desempenho ambiental de três tipos de construções: escolas, residências multi-familiares e edifícios comerciais de pequeno porte. O software pode ser usado internacionalmente, levando em consideração as condições regionais e nacionais. Diferentemente dos outros, esta é uma metodologia voltada à pesquisa, sem caráter comercial. A Tabela 3.1 mostra as categorias de avaliação de desempenho e as questões consideradas nesta metodologia. 17 Tabela 3.1 – Categorias de desempenho e as questões consideradas no GBTool (Fonte: BUENO, 2010). Categorias de Avaliação Questões consideradas Consumo de recursos Energia/ Terra/ Água/ Novos materiais/ Reutilização do edifício Cargas ambientais Gases com Efeito Estufa/ Substâncias que afetam a camada de ozônio, gases acidificantes, gases foto-oxidantes, resíduos sólidos, efluentes líquidos, impactos locais Qualidade ambiental interna Qualidade do ar/ conforto térmico/ Iluminação, ruído e acústica/ Campos eletromagnéticos Qualidade do serviço Adaptabilidade, controlabilidade, manutenção do desempenho, visibilidade, comodidades, impactos Economia Ênfase no ciclo de vida Manutenção e operações prévias Medidas de controle na construção, desempenho, planejamento das operações Transportes diários Transporte Com a finalidade de avaliação para certificação, o BREEAM (Building Research Establishment Environmental Assessment Method), desenvolvido no Reino Unido, serviu de base para os subsequentes sistemas de avaliação orientados para o mercado. É uma certificação comercial com valor de norma, disponível para diversas tipologias: escritórios, comércio, escolas, indústrias, residências, tribunais, presídios e um referencial para aplicação fora da Grã Bretanha. O sistema de avaliação LEED (Leadership in Energy and Environmental Design), desenvolvido nos Estados Unidos em 1998, sendo a versão mais recente apresentada em 2009, é o sistema comercial mais divulgado e aplicado internacionalmente. Esse método compreende os seguintes referenciais para: estrutura e fachada; construções novas; interiores comerciais; escolas, comércio e hospitais, residências; edifícios em uso; e desenvolvimento de bairros. Bueno (2010) mostrou que o sistema LEED certifica edifícios a partir de uma lista de pré-requisitos e atribui créditos baseado em uma lista de objetivos préselecionados. Quatro diferentes níveis de certificação de edifícios verdes são concedidos (Certificado, Prata, Ouro e Platina), baseados em um total de pontos obtidos em sete categorias, como apresentado na Tabela 3.2. 18 Tabela 3.2 – Categorias e créditos do LEED versão 3 - 2009 (Fonte: BUENO, 2010). Pontos Categorias de Avaliação disponíveis Sítios sustentáveis 26 Eficiência de água 10 Energia e atmosfera 35 Materiais e recursos 14 Qualidade do ar interno 15 Inovação em projeto 6 Prioridade regional 4 Totais de projeto 100 Certificado 40-49 pontos Ouro 60-79 pontos – – Prata 50-59 pontos Platina 80 pontos e acima Kim et al. (2005) aponta que esses três modelos fornecem um quadro completo de avaliação de desempenho ambiental das construções e reunião das metas de sustentabilidade, e fornecem uma classificação oficial para moradias novas ou renovadas. Na França, os referenciais disponíveis para a certificação de edifícios estão apresentados pelo Démarche HQE (Haute Qualité Environnementale du Bâtiment), firmado em 1996, disponíveis para tipologias como: edifícios de escritório e escolas; hotéis; hospitais; centros de distribuição; comércio; indústrias; esportivos; rodovias; desenvolvimento de bairros; edifícios existentes; residências multifamiliares e residências unifamiliares. Nesse referencial francês, o edifício é avaliado em função do nível de desempenho alcançado em cada uma das 14 categorias e nas 7 práticas gerenciais (Tabela 3.3), sendo possível o alcance dos níveis Bom, Superior ou Excelente. Configuram-se dois perfis de desempenho do edifício, sendo a certificação obtida em termos de qualidade ambiental e em termos de boas práticas presentes. Tabela 3.3 – Categorias ambientais e práticas gerenciais do HQE. Escolha integrada de produtos, sistemas e processos construtivos/ Canteiro de baixo impacto ambiental/ Gestão da energia/ Gestão da água/ Gestão dos resíduos de uso/ Manutenção- permanência dos desempenhos Categorias ambientais ambientais/ Conforto higrotérmico/ Conforto acústico/ Conforto visual/ Conforto olfativo/ Qualidade sanitária dos espaços/ Qualidade sanitária do ar/ Qualidade sanitária da água Práticas gerenciais Redução do consumo de energia/ Redução do consumo de água/ Redução na produção de resíduos de uso/ Política de compras em respeito ao meio ambiente e á saúde/ Otimização das condições sanitárias e de conforto/ Otimização dos deslocamentos dos usuários/ Boas práticas gerenciais 19 Desenvolvido na Holanda, o Eco-Quantum traz uma abordagem de desempenho ambiental do edifício, com base em uma avaliação do ciclo de vida (LCA) onde efeitos ambientais específicos são pontuados e convertidos em indicadores ambientais (BUENO, 2010). Degani (2009) ainda cita outros tipos de cerificações de edifícios e metodologias de avaliação ambiental. O CASBEE (Comprehensive Assessment System for Building Environmental Efficiency), uma metodologia japonesa composto de um único referencial aplicado a diversas tipologias (escritório, escolas, comércio, restaurantes, espaços comunitários, hospitais, hotéis, residências não unifamiliares). Na Austrália há três metodologias de avaliação e certificação: o sistema de avaliação do governo, NSW Government, denominada NABERS; o referencial Green Star e também o derivado do LEED para a realidade australiana. Na China, o HK-BEAM; na Suíça, o Minergie; na Dinamarca, o Passiv Haus; na África do Sul, o SBAT; dentre outros. No Brasil, as primeiras iniciativas para a certificação ambiental de edifícios partiram da aplicação do referencial americano LEED. Em 2008, o Green Building Council Brasil (GBC) (organismo representante do USGBC no Brasil) iniciou uma tentativa de adequação de alguns parâmetros do referencial original para a realidade brasileira. Segundo O Estado de São Paulo (2010) apud ADEMI (2010), desde 2007 o GBC já certificou 19 empresas brasileiras com o selo LEED. Isso coloca o Brasil no sexto lugar no ranking quantitativo de empreendimentos sustentáveis, atrás dos Estados Unidos, Emirados Árabes, Índia, Canadá e China. A expectativa do órgão para o fim de 2010 é estar com 250 prédios em processo de certificação. A Fundação Vanzolini (FCAV), em 2008, lançou o processo AQUA, o primeiro referencial brasileiro para avaliação e certificação do desempenho ambiental de edifícios, voltado ao mercado. Esse referencial foi destinado, primeiramente, a edificações comerciais (escritórios) e escolares, sendo elaborado, em fevereiro de 2010, um referencial para edificações habitacionais. Esse projeto partiu de uma parceria com a instituição detentora do referencial e dos processos certificatórios da metodologia francesa NF Bâtiments Tertiaires – Démarche HQE. Assim, o processo AQUA é uma versão brasileira do referencial francês, com parâmetros mais adequados ao contexto e necessidades de desenvolvimento do Brasil. Entretanto, algumas questões ainda dificultam o processo de avaliação do desempenho sócio-ambiental de edifícios no país, destacando a ausência de critérios nacionais formais ou normalizações para o estabelecimento dos benchmarks (referências) brasileiros, e também a articulação insuficiente da cadeia produtiva do setor (DEGANI, 2009). 20 Outra certificação foi desenvolvida no país, visando apenas a eficiência energética das edificações brasileiras. Em 2009, foi iniciado o processo de etiquetagem de edifícios comerciais, de serviços e públicos, de acordo com as exigências do Programa Brasileiro de Etiquetagem do Inmetro para obtenção da ENCE – Etiqueta nacional de Conservação de Energia. Em 2010, este processo foi ampliado para edificações residenciais unifamiliares e multifamiliares, abordado pelo Regulamento Técnico da Qualidade para o Nível de Eficiência Energética de Edificações Residenciais (RTQ-R) (PROCEL EDIFICA, 2010). Degani (2009) que as metodologias de avaliação e certificação de edifícios podem ser vistas como mecanismos indutores do aperfeiçoamento do desempenho das edificações. O reconhecimento das soluções de sustentabilidade aplicadas nos edifícios submetidos à avaliação é capaz de aumentar a demanda por empreendimentos mais sustentáveis. A simples aplicação das avaliações já disponibiliza informações aos investidores e usuários, permitindo a diferenciação entre empreendimentos com níveis de desempenho variáveis, interferindo no valor de mercado destes produtos. 3.2 EXEMPLOS DE EDIFÍCIOS SUSTENTÁVEIS Alguns edifícios construídos nas duas últimas décadas em diversos países tornaram- se ícones em sustentabilidade. No Brasil, esse período é ainda mais recente. A primeira edificação a receber um selo de construção sustentável foi em 2007, na cidade de Cotia (SP). A agência bancária Granja Viana do Banco Real foi a primeira construção da América Latina a receber o selo LEED (ITAMBÉ, 2010). Além dos 75% do terreno ser ocupado por áreas verdes, a construção conta com um telhado verde com base em espécies nativas que precisam de pouca água, melhorando o isolamento térmico e acústico do edifício. A água da chuva é captada e reaproveitada nas descargas de vasos sanitários, sendo que o esgoto é tratado e a água aproveitada para irrigação do telhado e área verde, reduzindo o consumo de água em 85%. Cerca de 80% dos ambientes têm acesso à iluminação natural, além do prédio utilizar energia solar fotovoltaica e sensores de presença em todos os ambientes. Além deste, outros edifícios brasileiros já receberam a certificação ambiental LEED, os quais estão listados a seguir, bem como as suas respectivas datas de operação (ITAMBÉ, 2010): - Rochaverá Corporate Towers – Torre B (São Paulo – SP, 2008); - Ventura Corporate Towers – Torre Leste (Rio de Janeiro – RJ, 2009); - Eldorado Business Tower (São Paulo – SP, 2008); 21 - Morgan Stanley (São Paulo – SP, 2008); - Delboni Auriemo – Dumont Villares (São Paulo – SP, 2008); - Centro de Distribuição Bomi Matec (Itapevi – SP, 2008); - Edifício Cidade Nova – Bracor (Rio de Janeiro – RJ, 2008); - WTorre Nações Unidas 1 e 2 (São Paulo – SP, 2009); - Centro de Cultura Max Feffer (Pardinho – SP, 2008); - Torre Vargas 914 (Rio de Janeiro – RJ, 2008); - Escritório Brasken (São Paulo – SP, 2009); - Pão de Açúcar – Loja Indaiatuba (Indaiatuba – SP, 2008); - Mc Donald´s – Riviera São Lourenço (Bertioga – SP, 2008); - Fleury Medicina e Saúde – Rochaverá Corporate Towers (São Paulo – SP, 2008); - Laboratório Boehringer Ingelheim (São Paulo – SP, 2008). Casado & John (2010) destacaram as dez obras mais sustentáveis do mundo, por apresentarem, entre outras características, projetos com sistemas eficientes e construção com matérias-primas renováveis. Estas obras estão listadas nos itens subsequentes. 3.2.1 BANK OF AMERICAN TOWER (ESTADOS UNIDOS) O Bank of America Tower (Figura 3.2) foi o primeiro edifício a receber a certificação LEED Platina dos Estados Unidos (Green Building Council). Ele foi construído em One Bryant Park, Manhattan, Nova York, e concluído em 2009. O projeto da torre de escritórios tem 54 andares, 365 metros de altura e 196 mil metros quadrados de área. A maior parte das matérias-primas utilizadas em sua construção foi proveniente de fontes renováveis e recicláveis, obtidas até 500 km de Nova York. Durante a construção do edifício, a construtora responsável treinou e orientou os subcontratados sobre os métodos de seleção de materiais e construção adequados. Além disso, ela implementou, durante a obra, a qualidade do ar interior, a fim de garantir ar fresco e ventilação no edifício em todas as etapas da obra, e para os usuários do prédio finalizado. O concreto foi composto por 45% de escória (subproduto dos altos fornos), e 55% de cimento, eliminando parte do CO2 emitido na produção do cimento. Além disso, o edifício contemplou o reuso das águas pluviais e a maximização da energia do sol e da luz natural para iluminar os interiores, devido à transparência do vidro e de seu isolamento, possibilitando a redução dos custos com energia elétrica. 22 Figura 3.2 – Bank of American Tower (Fonte: <www.metaefficient.com>, 2010). 3.2.2 COUNCIL HOUSE 2 (AUSTRÁLIA) O Council House 2 (Figura 3.3) foi o primeiro edifício de escritórios australiano a receber a classificação Six Green Stars pelo Green Building Council da Austrália. Ele foi construído em Melbourne, capital do estado de Victória, e finalizado em 2006. O edifício possui 12.536 metros quadrados e 10 pavimentos, e recebeu a certificação por possuir arrefecimento de massa térmica, células fotovoltaicas, turbinas eólicas, reciclagem de esgoto, tetos refrigerados e venezianas de madeira reciclada. Figura 3.3 – Council House 2 (esq.) e detalhe das venezianas de madeira (dir.) (Fonte: <http://www.melbourne.vic.gov.au>, 2010). 23 3.2.3 30 THE BOND (AUSTRÁLIA) Sede da construtora Lend Lease (Figura 3.4), em Sydney, esse edifício foi projetado visando a qualidade o ambiente interno, a melhor gestão da água, de resíduos e 20% menos de emissões de poluentes. A obra foi certificada com cinco estrelas do Green Star e Australian Building Greenhouse Rating Scheme (ABGR) por utilizar ventilação natural, feixes de refrigeração passiva, fachadas sombreáveis, cobertura ajardinada com plantas resistentes à seca, e propiciar vistas a 60% de seus ocupantes. Figura 3.4 – 30 The Bond (Fonte: CASADO & JOHN, 2010). 3.2.4 BMW WELT (ALEMANHA) O edifício do Grupo BMW (Figura 3.5), localizado em Munique (Alemanha), foi finalizado em 2007. Ele apresenta 73 mil metros quadrados e 47,9 m de largura, com forma de duplo cone, o qual suporta a cobertura. No telhado, foram posicionados um conjunto de placas fotovoltaicas que abastece o edifício com 824 kWp de energia. Além disso, a rede de painéis de aço capta o calor e o conduz para a fachada de aço e vidro, ajudando no condicionamento do ar interno do edifício. No interior do cone, uma forma de túnel espiralado promove a ventilação natural, através de aberturas que são controladas automaticamente. 24 Figura 3.5 – BMW Welt (Fonte: CASADO & JOHN, 2010). 3.2.5 CLINTON PRESIDENTIAL LIBRARY (ESTADOS UNIDOS) O edifício Clinton Presidential Library, certificado pelo LEED no nível Platina, foi concluído em 2004 e abriga um museu e biblioteca de 1.900 metros quadrados. O edifício construído em Little Rock (Figura 3.6), capital do estado americano de Arkansas, foi concebido com uma cobertura verde – onde também posicionaram painéis solares – a fim de absorver teores de carbono, reduzir escoamento pluvial e regular a temperatura, além da maior capacidade de reciclagem, limpeza verde, redução do desperdício através do abastecimento local e compensação de carbono de toda a energia não renovável utilizada. O piso do edifício foi feito de pneu reciclado. Figura 3.6 – Clinton Presidential Library (Fonte: CASADO & JOHN, 2010). 25 3.2.6 THE NEW YORK TIMES (ESTADOS UNIDOS) O edifício do The New York Times (Figura 3.7), em Nova York, com 148.644 metros quadrados e 52 pavimentos, é promovido como uma estrutura verde, embora não seja certificado pelo LEED. Este foi o primeiro edifício construído nos Estados Unidos em cortina de vidro ultra-clear Low-e1 e tubos de cerâmica solar que funcionam como um brise. Foram colocadas máscaras mecanizadas, controladas por sensores, para reduzir o ofuscamento da luz solar, enquanto mais de 18 mil luminárias fluorescentes dimerizáveis individualmente suplementam a luz natural, proporcionando uma economia de energia real de 30%. O prédio também incorporou resfriamento de ar-livre, trazendo ar externo (mais fresco) para o interior do edifício, o que economiza energia adicional. Foi utilizado mais de 95% de aço estrutural reciclado. A planta de cogeração de gás natural fornece 40% da energia elétrica consumida no interior do edifício com aquecimento e refrigeração. Os pisos foram elevados para permitir a distribuição de ar por baixo, exigindo menos energia do que um sistema de refrigeração convencional canalizado. Além disso, não foi projetado um estacionamento no local, incentivando a maioria dos funcionários a utilizar o transporte público. Figura 3.7 – The New York Times (Fonte: CASADO & JOHN, 2010). 3.2.7 AEROPORTO DE OSLO (NORUEGA) O terminal aeroportuário de Gardermoen (Figura 3.8), inaugurado em 1995, foi projetado em vários tipos de materiais estruturais, aproveitando a função que cada um 1 Low-e (low emittance) é o nome dado ao material com baixa emitância. Camadas microscopicamente finas depositadas sobre superfícies de vidro para reduzir o fator-U do fluxo de calor radioativo. Um revestimento Low-e é transparente para o espectro solar (luz visível e ondas curtas de radiação infra-vermelha) e reflexivo para ondas longas da radiação infra-vermelha (THE EFFICIENT WINDOWS COLLABORATIVE, 2010). 26 desempenha melhor, como concreto armado, madeira laminada e treliças espaciais de aço. Além disso, a construção foi otimizada para o aquecimento solar passivo (com uso da madeira) e máximo penetração de luz natural. O aeroporto possui 140 mil metros quadrados o qual produz o seu próprio calor e eletricidade de reserva em uma planta de cogeração de biomassa alimentada no local (SIERRA BUSINESS COUNCIL, 2010). Figura 3.8 – Aeroporto de Oslo - Gardermoen (Fonte: CASADO & JOHN, 2010). 3.2.8 PARLAMENTO ALEMÃO (ALEMANHA) O antigo Reichstag foi reformado em 1999, para abrigar o parlamento alemão que se transferiu de Bonn para Berlim (Figura 3.9). O prédio tem ênfase na claridade e transparência, refletidas pelo uso intensivo de painéis de vidro conjugados a refletores com espelhos que auxiliam a entrada da luz desde a cúpula até a parte inferior onde ficam os parlamentares e as arquibancadas públicas das plenárias. Devido à eficiência da iluminação natural, através dos vidros e espelhos, a sala do parlamento (subsolo) necessita de pouca iluminação artificial, mesmo no inverno. A obra se destaca pelo uso intensivo de energias primárias renováveis, como biodiesel, produzido nas imediações do edifício. Um total de 3.600 metros quadrados de elementos fotovoltaicos foi instalado na cobertura do prédio, alimentando a rede in-house. O calor que excede das usinas de cogeração é utilizado para o aquecimento do edifício, através de um aquífero em frente ao prédio. A água é aquecida por meio do calor excedente e bombeada de volta para o prédio. Com relação ao resfriamento do edifício, é aproveitada a água resfriada no inverno. Na cúpula de vidro, aberta na parte superior, tem-se a captação de água de chuva que é tratada e usada em todas as instalações (CASADO & JOHN, 2010; CONSTRUA VERDE, 2010). 27 Figura 3.9 – Parlamento alemão Reichstag - fachada (esq.) e cúpula de vidro (dir.) (Fonte: arquivo pessoal). 3.2.9 COMMERZBANK HEADQUARTERS (ALEMANHA) Com 56 andares e 121 mil metros quadrados, a torre do Commerzbank (Figura 3.10) em Frankfurt, inaugurada em 1997, é considerada o primeiro edifício de escritório ecológico do mundo. Um sky garden que desce pelo átrio central traz luz e ar fresco e é foco visual e social dos grupos de trabalho, recurso utilizado para reduzir a necessidade de luz artificial e energia para aquecimento e refrigeração. Seu projeto foi concebido para que os escritórios tivessem vista para a cidade ou para o jardim. Figura 3.10 – Commerzbank Headquarters (Fonte: arquivo pessoal). 28 3.2.10 OSPEDALE DELL´ANGELO (ITÁLIA) Projetado em 2008, este prédio hospitalar com 117 mil metros quadrados, o primeiro verde do mundo, é localizado em área rural (situado na região de Veneto), mas que pode ser acessado por rodovia ou trem. O Ospedale Dell’Angelo (Figura 3.11) foi idealizado de acordo com os princípios da humanização de forma a auxiliar na cura do paciente. Os blocos são unidos por jardins, protegidos com cobertura de vidro. Com isso, possibilita a entrada de luz natural e a renovação do ar interno, criando um microclima no interior do hospital, com médias de temperatura e umidade constantes ao longo das estações. Figura 3.11 – Ospedale dell´Angelo - fachada (esq.) e interior do edifício (dir.) (Fonte: <http://www.archinnovations.com>, 2010). O número de edifícios que buscam uma certificação ambiental tem se mostrado em expansão. Visando a qualidade dos espaços construídos, as empresas do setor da construção podem investir na sustentabilidade corporativa, promovendo uma visão de longo prazo, que incorpore as dimensões socioambientais à estratégia e aos objetivos econômicos da empresa, além de agregar valor aos seus empreendimentos (CTE, 2010). 29 4. CERTIFICAÇÃO AMBIENTAL AQUA Dentre os sistemas de certificação de desempenho ambiental de edifícios verificados no capítulo anterior, foi escolhido o sistema AQUA para estudo e análise da sua aplicação em tipologias habitacionais brasileiras. Essa escolha é justificada pelo fato desta certificação apresentar um referencial técnico brasileiro para edifícios habitacionais, implementado recentemente pela Fundação Vanzolini (2010), o que não é verificado em outras metodologias de desempenho ambiental, desenvolvidos para aplicação no contexto de cada país. Além disso, ela aborda questões gerais de indicadores de sustentabilidade na edificação, não ficando restrita apenas às questões de eficiência energética, como é o caso do RTQ-R (Regulamento Técnico da Qualidade para o Nível de Eficiência Energética de Edificações Residenciais) (PROCEL EDIFICA, 2010). A metodologia AQUA merece destaque por ser a primeira metodologia oficialmente adaptada para o contexto brasileiro. Por se tratar de um sistema novo e ainda pouco difundido, ainda não se pode contar com um número significativo de edifícios certificados. A dificuldade na obtenção de informações e os altos custos do processo de certificação (de R$ 17.500,00 para edifícios de até 1.500m2 a R$ 87.500,00 para edifícios acima de 45.000m2) constituem empecilhos para sua aplicação (BUENO, 2010). A Alta Qualidade Ambiental (AQUA) é definida como sendo um processo de gestão de projeto visando controlar os impactos de um empreendimento novo ou de reabilitação no ambiente externo assim como no conforto e na saúde dos usuários, assegurando os processos operacionais, relacionados às fases de programa, concepção e realização. Segundo esse processo, a obtenção do desempenho ambiental de uma construção envolve tanto uma vertente de gestão ambiental como uma de natureza arquitetônica e técnica. Os dois elementos que estruturam a certificação AQUA são o referencial do Sistema de Gestão do Empreendimento (SGE), para avaliar o sistema de gestão ambiental 30 implementado pelo empreendedor, e o referencial da Qualidade Ambiental do Edifício (QAE), para avaliar o desempenho arquitetônico e técnico da construção. A implementação do Sistema de Gestão do Empreendimento permite definir a Qualidade Ambiental visada para o edifício e organizar o empreendimento para atingi-la, ao mesmo tempo em que permite controlar o conjunto dos processos operacionais relacionados às fases de programa, concepção e realização da construção. O SGE alinhase com as ferramentas da qualidade e é um instrumento a serviço da obtenção do desempenho ambiental do empreendimento, dando suporte às três fases essenciais da avaliação da Qualidade Ambiental do edifício. A Qualidade Ambiental do Edifício estrutura-se em 14 categorias (conjuntos de preocupações), que se pode reunir em quatro famílias (sítio e construção, gestão, conforto e saúde), conforme mostrado na Figura 4.1. Figura 4.1 – Famílias e categorias definidas pela certificação AQUA (Fonte: FUNDAÇÃO VERZOLINI, 2010). O desempenho associado às categorias da Qualidade Ambiental do Edifício pode ser expresso segundo três níveis: - Bom (B): nível correspondendo ao desempenho mínimo aceitável para um empreendimento de Alta Qualidade Ambiental. Isso pode corresponder à regulamentação, se esta é suficientemente exigente quanto aos desempenhos de um empreendimento, ou, na ausência desta, à prática corrente. - Superior (S): nível correspondendo ao das boas práticas. 31 - Excelente (E): nível calibrado em função dos desempenhos máximos constatados em empreendimentos de Alta Qualidade Ambiental, mas se assegurando que estes possam ser atingíveis. Para verificação da categoria 1 (relação do edifício com seu entorno), a certificação apenas prevê o nível S - Superior, e as categorias 11 (conforto olfativo) e 12 (qualidade sanitária dos ambientes), somente o nível B - Bom. Para obter a certificação, devem ser satisfeitas as exigências do referencial de modo que pelo menos três das 14 categorias atinjam o nível “Excelente” e no máximo sete estejam no nível “Bom” (Figura 4.2). A certificação é concedida ao final de cada fase (concepção/projeto, realização/obra e operação/uso), mediante verificação do atendimento ao referencial técnico. Figura 4.2 – Níveis mínimos para obtenção da certificação AQUA (Fonte: FUNDAÇÃO VERZOLINI, 2010). 4.1 CATEGORIAS A SEREM ANALISADAS Foram escolhidas algumas das categorias definidas pela certificação AQUA para análise sob a luz das recomendações da normalização de desempenho. Procurou-se definir as categorias a partir de uma possível aderência destas com a NBR 15575 (ABNT, 2008), permitindo uma comparação teórica da certificação ambiental com a normalização de desempenho, ambas voltadas para o cenário de habitações brasileiras. Buscou-se, portanto, balizar a escolha das categorias que fossem possíveis destas serem verificadas em fase de projeto e/ou construção do edifício habitacional, cujos critérios analisados poderão influenciar no desempenho da edificação, visando à necessidade, exigência e conforto do usuário. Deste modo, foram escolhidas as seguintes categorias da certificação AQUA para serem analisadas no estudo comparativo: - Categoria 2: Escolha integrada de produtos, sistemas e processos construtivos - Categoria 7: Gestão da manutenção 32 - Categoria 8: Conforto higrotérmico - Categoria 9: Conforto acústico - Categoria 10: Conforto visual Essas categorias podem estar aderentes à norma de desempenho NBR 15575 (ABNT, 2008), nas exigências de Habitabilidade, segundo os critérios de conforto térmico, acústico e lumínico, além dos critérios de manutenabilidade e durabilidade das edificações abordadas no conjunto de Sustentabilidade da norma. Em especial, a análise da Categoria 2 será possível verificar se os produtos, sistemas e processos construtivos sustentáveis considerados (certificados ambientalmente) atendem às necessidades do usuário no pósobra (frente aos requisitos de desempenho). Outras normas também foram utilizadas para consulta como complementação do estudo comparativo, sendo referenciadas também pela própria NBR 15575 (2008). São elas: NBR 5674 (1999) e NBR 14037 (1998), para questões de durabilidade e manutenibilidade; NBR 15220-3 (2003), para conforto térmico; NBR 10152 (1987), para conforto acústico; e NBR 15215-3 (2005) para conforto lumínico. 33 5. ESTUDO COMPARATIVO A seguir, procurou-se desenvolver um estudo comparativo de alguns requisitos abordados tanto na certificação ambiental AQUA quanto na Norma Brasileira de Desempenho de Edifícios de até Cinco Pavimentos. 5.1 DURABILIDADE E MANUTENIBILIDADE Tal requisito implica na manutenção da capacidade funcional de um edifício a fim de manter a vida útil prevista no projeto, bem como os níveis ambientais propostos pela certificação, desde que atendido o manual de uso e ocupação fornecidos pelo empreendedor. A NBR 15575 (2008) se mostra clara quanto aos valores de vida útil e prazos de garantia estipulados para cada elemento, componente ou instalações das edificações. Esses prazos são válidos desde que utilizados sob condições normais e submetidos a programas de manutenção preventiva estabelecidos pelos seus fornecedores e/ou construtores. No Anexo I é apresentado a Tabela 8.1 com os valores de vida útil de projeto para os diferentes elementos e componentes da construção habitacional, variando de acordo com o nível de desempenho requerido. Além disso, são estipulados os prazos de garantia mínimos exigidos para cada elemento. Os prazos de garantia são considerados no nível mínimo de desempenho da edificação. Para os níveis Intermediário (“I”) e Superior (“S”), os prazos indicados pelo fornecedor do produto devem superar os prazos mínimos em 20% e 50%, respectivamente. A norma ainda destaca que, em caso de ocorrência de patologias, os reparos ou substituições de elementos, componentes e instalações apenas estarão a cargo do construtor/incorporador se ainda estiverem durante a vigência do prazo de garantia e não for comprovado o mau uso e/ou desobediência ao Manual de Operação, Uso e Manutenção. Entretanto, é aceito que no máximo 5% dos componentes, dos elementos ou das unidades habitacionais integrantes de um mesmo empreendimento apresentem nível de 34 desempenho ou vida útil de projeto inferior às expectativas do fornecedor do produto, sem reparo ou reposição por parte deste. Isso é justificado pelas dificuldades intrínsecas de estimar a durabilidade de um produto, sujeito a diferentes níveis de exposição, a diferentes agentes e a diferentes processos degenerativos que ainda não são totalmente explicados cientificamente. Visando os métodos de avaliação para verificação do atendimento dos critérios exigidos de durabilidade dos sistemas, a NBR15575 integra outros documentos que compõe o conjunto normativo definidos pelas partes de 2 a 6, específicas para sistemas como estrutura, pisos internos, fachadas e paredes internas, coberturas e sistemas hidrossanitários. Quanto aos critérios de vida útil desejada na edificação, a certificação ambiental AQUA faz referência às escolhas construtivas a serem adaptadas (Categoria 2). O empreendedor deve fazer suas escolhas considerando as vidas úteis dos produtos, sistemas e processos da obra bruta2 e limpa3 em função de seu uso no edifício, de forma a adequá-las à vida útil desejada. Essas escolhas devem ser baseadas, dentre outras normas – como European Commission (Guidance Paper F) e International Organization for Standardization (ISO 15686) –, na NBR 15575-1 (2008). Desta forma, este requisito ambiental está aderente à normalização brasileira, além de propor outras normalizações internacionais como apoio. Pode-se dizer que, neste quesito a norma brasileira de desempenho não apenas está de acordo com a questão de sustentabilidade da edificação quanto à proposição de vida útil da construção, como também serve de referência a uma certificação ambiental, comprovando a sua efetividade. Além de estipular vida útil e prazos de garantia, a norma também apresenta outros requisitos referentes à manutenção e durabilidade das edificações, como: interações da cobertura com o corpo principal da construção, durabilidade dos materiais e componentes e limpeza e manutenção. Os requisitos das interações da cobertura com o corpo principal da edificação ficam restritos apenas à verificação de ocorrência de danos nos elementos que interagem, sendo sugerido, para métodos de avaliação, análise de projeto, cálculo estrutural, cálculos de 2 Famílias da obra bruta: estrutura portante vertical: alvenarias estruturais, paredes maciças e pilares; estrutura portante horizontal: lajes, vigas; fachadas pesadas não portantes; fundações; estruturas de coberturas; contrapiso; revestimentos de argamassa. 3 Famílias da obra limpa: cobertura (telhamento, impermeabilização); divisórias de separação/distribuição; fachadas leves e elementos de fachadas; isolantes térmicos; outros revestimentos de piso, forros falsos; esquadrias exterioires. 35 fluxos de calor e movimentações térmicas. Isso pouco terá influência numa análise ambiental, sendo este requisito não verificado neste trabalho. Quanto à durabilidade dos materiais e componentes empregados, a norma estabelece que esses elementos devem apresentar durabilidade compatível com os períodos especificados na Tabela 8.1 do Anexo I e com as exigências relacionadas nos documentos que compõem o conjunto normativo da norma em estudo (partes 2 a 6). A NBR15575 aborda critérios para proteção contra corrosão de armaduras em concreto armado e protendido, durabilidade de madeira frente à ação de fungos e insetos xilófagos, durabilidade de componentes em aço, alumínio anodizado e plástico. Além disso, para avaliação dos materiais, também podem ser tomados como referência os critérios estabelecidos em documento específico4. Na certificação ambiental AQUA, o critério de durabilidade dos materiais é abordado na Categoria 2, sobre a escolha integrada de produtos, sistemas e processos construtivos. O edifício não só deve ter vida útil superior às especificadas no projeto, como também apresentar uma quantidade mínima de elementos construtivos com possibilidade de reuso ou reciclagem ao final da vida útil da construção. Apesar disso, a certificação não aponta critérios ou métodos que permitam a promoção e a garantia da durabilidade dos materiais ou elementos utilizados, como é verificado na norma brasileira (exceto para a escolha dos revestimentos de pisos, que é exigido níveis mínimos de desempenho na certificação). Ainda na análise da Categoria 2 da certificação, uma das preocupações refere-se às escolhas construtivas considerando a facilidade de conservação da construção. O empreendedor deve escolher produtos e construção de fácil conservação e assegurar a facilidade de acesso para a conservação dos elementos construtivos dos produtos de fachadas, telhados, revestimentos internos (piso, parede, teto), janelas, esquadrias, vidraças, proteções solares, divisórias interiores e forros. A norma brasileira também estabelece critérios relacionados à limpeza e manutenção, os quais podem ser avaliados a partir de análises de projeto e inspeção de protótipos. Os critérios são especificados como: manutenção de todas as partes expostas de componentes ou elementos, sem prejuízo à segurança ou postura ergonômica. Devem estar estabelecidos de acordo com o “Manual de Operação, Uso e Manutenção das Edificações”, especificando materiais, processos e freqüências das manutenções. Para esse manual, a NBR15575 (2008) faz referência às normas NBR 5674 (1999) e NBR 14037 (1998). 4 Ítem referente à “Durabilidade”, Apêndices I a VI do documento “Critérios mínimos de desempenho para habitações térreas de interesse social” (Instituto de Pesquisas Tecnológicas – IPT, 1998). 36 Tanto a normalização brasileira quanto a certificação ambiental AQUA fazem exigência à elaboração de um manual por parte do empreendedor fornecido aos ocupantes e responsáveis pela operação e manutenção do edifício. A certificação ambiental ainda é mais rigorosa quanto à elaboração deste documento, pois é através dele que o ocupante e os agentes envolvidos tomarão ciência das precauções e ações a seres realizadas, próprias ao empreendimento, a fim de manter o nível ambiental certificado pelo sistema. Enquanto a normalização brasileira define apenas no âmbito da edificação, a certificação AQUA vai além das informações sobre características construtivas e boas práticas de seus envolvidos; ela também define boas práticas comportamentais e relativas aos elementos do empreendimento não relacionados ao ambiente construído (por exemplo, o uso de lâmpadas e eletrodomésticos de baixo consumo, redução de fontes ruidosas em horários específicos, uso racional da água, etc). Além disso, a certificação define um manual de orientação para finalizações e futuras reformas. A certificação apresenta, em uma das suas categorias de avaliação (Categoria 7), uma verificação da gestão de manutenção do nível ambiental do edifício. Essa avaliação remete-se apenas às boas práticas dos ocupantes necessárias à qualidade ambiental da construção, como facilidade de acesso para atividades de gestão da água e resíduos e implementação de sistemas de automação para controle de água e iluminação; e não apresenta critérios consistentes para uma análise de desempenho da edificação. Contudo, nesta categoria é apontada uma preocupação quanto às informações destinadas aos futuros ocupantes e gestores, fazendo exigência, novamente, ao Manual do proprietário com as informações para o uso, operação e manutenção do empreendimento. Portanto, a questão da durabilidade e manutenabilidade da edificação são tratadas em ambos os documentos estudados, sendo que a primeira é melhor especificada na norma de desempenho, servindo até como referência para a certificação, e, a segunda questão, nota-se uma abordagem mais rigorosa dos critérios na certificação ambiental, sendo ambas partidárias ao manual de uso, ocupação e manutenção da edificação. 5.2 CONFORTO AMBIENTAL Alguns parâmetros de conforto foram definidos a fim de se procurar mensurar o bem estar do usuário, buscando adequar suas características físicas e psicológicas em cada espaço nele encontrado. Segundo Kowaltowski et al. (2001), o conforto ambiental é uma parceria entre ambiente físico, características do local e da arquitetura da edificação. Neste item, serão discutidas as questões de conforto térmico, acústico e lumínico. 37 5.2.1 CONFORTO TÉRMICO A norma brasileira de desempenho propõe três procedimentos alternativos para a avaliação da adequação das habitações a diferentes regiões do país, considerando oito diferentes zonas bioclimáticas definidas na NBR 15220-3 (2003), apresentada no Anexo II (Figura 9.1). Esses procedimentos podem ser o simplificado, que consiste no atendimento dos requisitos e critérios estabelecidos por norma em fachadas e coberturas; o de simulação, por meio de simulação computacional do edifício; e o de medição, com a realização de medições em edifícios ou protótipos construídos. Além disso, a norma também faz diferenciação das condições de conforto no verão e no inverno. O processo de certificação AQUA aborda esse tema na Categoria 8 – Conforto Higrotérmico. Assim como a normalização de desempenho, este documento também faz referência à NBR 15220-3 (2003) para implementação de medidas arquitetônicas para otimização do conforto higrotérmico de verão e inverno. Essa certificação ainda faz uma exigência de assegurar o resfriamento do edifício, no verão, sem o uso de ar-condicionado (por exemplo, por meio de ventilação noturna, resfriamento do ar pelo solo, etc). É importante destacar que a própria certificação AQUA baseia seus valores de conforto térmico na norma brasileira de desempenho, porém com critérios mais rigorosos. Segundo a norma de desempenho NBR 15575 (2008), no verão, as condições térmicas no interior da edificação devem ser melhores ou iguais às do ambiente externo, à sombra. Ou seja, para o mínimo de exigência da norma, o valor máximo diário da temperatura do ar interior de ambiente de permanência prolongada (como salas, dormitórios), sem a presença de fontes internas de calor, no dia típico, deve ser menor ou igual à temperatura do ar exterior (Ti,max ≤ Te,max). Já a certificação ambiental propõe valores mínimos (nível Bom) em diferentes zonas bioclimáticas brasileiras (Anexo II). Em dias típicos de verão, nas zonas de 1 a 7, a máxima temperatura diária do ar interior da edificação deve ser menor ou igual a temperatura máxima diária do ar exterior decrescido de duas unidades (Ti,max ≤ Te,max - 2ºC). Para a zona 8, esse decréscimo de dá em apenas uma unidade (Ti,max ≤ Te,max - 1ºC). O nível máximo de desempenho térmico da edificação definido pela norma corresponde ao nível intermediário da certificação ambiental (nível Superior). Já para o critério máximo da certificação (nível Excelente), o processo AQUA não especifica os limites, apresentando apenas como “a ser definido posteriormente”. Em condições de conforto no inverno, a norma de desempenho define valores mínimos para as zonas bioclimáticas de 1 a 5 de 12ºC no interior do ambiente de 38 permanência prolongada. Para o nível intermediário e superior da norma, esses limites mínimos são aumentados para 15 e 17ºC, respectivamente. Nas zonas de 6 a 8 este critério não precisa ser verificado. Na certificação AQUA os valores exigidos são com base na temperatura do ar exterior. O valor mínimo diário da temperatura do ar interior exigido por esse processo é um valor maior ou igual à temperatura exterior acrescido de 3 unidades (Ti,max ≥ Te,Max + 3ºC). Esse acréscimo se dá em 5 e 7 unidades para os níveis superior e excelente, respectivamente. Assim como a norma brasileira, a certificação dispensa a verificação do conforto térmico no inverno para as zonas bioclimáticas 6, 7 e 8. Os documentos em estudo ainda precisam de incrementos em suas considerações sobre o desempenho térmico da habitação. GEPAD (2010) afirmou que há a necessidade de elaborar uma matriz térmica para diferentes tipos de parede convencional e respectivas combinações com forro e telha para verificação do conforto térmico no ambiente. Quanto ao conforto térmico da edificação, nota-se, portanto, que a certificação ambiental AQUA apresenta critérios baseados nas normalizações brasileiras – fazendo referência também à norma em estudo – com valores mais rigorosos do que a norma de desempenho. Entretanto, alguns valores ainda precisam ser definidos pela certificação, deixando em aberto critérios como condição de conforto no verão para níveis de excelência, além de outras variáveis não discutidas em ambos os documentos. 5.2.2 CONFORTO ACÚSTICO O edifício deve proporcionar isolamento adequado entre o meio externo e o interno, entre as unidades distintas e entre as dependências de uma mesma unidade, quando destinadas ao repouso noturno, ao lazer doméstico e ao trabalho intelectual. O isolamento acústico é projetado a partir do desempenho acústico dos materiais, componentes e elementos construtivos de modo a garantir o conforto e privacidade acústica. A NBR 15575-1 (2008) faz referência aos critérios e requisitos a serem atendidos para desempenho acústico a partir da NBR 10152 (1987), além das partes 3, 4 e 5 da norma de desempenho, referentes a pisos internos, fachadas e paredes internas e cobertura, respectivamente. A certificação ambiental AQUA trata a questão de conforto acústico na Categoria 9 do processo. Suas preocupações estão ligadas ao conforto acústico entre a unidade habitacional e outros locais de uma mesma edificação, além do conforto entre os cômodos 39 principais e o exterior de uma mesma construção e também entre os ambientes de uma mesma unidade habitacional. A NBR 15575-3 (2008) define os limites aceitáveis para ruído de impacto em pisos através do Nível de Pressão Sonora de Impacto Padronizado Ponderado (L’nT,w). Esse parâmetro é o número único do isolamento de ruído de impacto em edificações, derivado dos valores em bandas de oitava do Nível de Pressão Sonora de Impacto Padronizado (L’nT). A exigência mínima da norma para lajes e outros elementos portantes, com ou sem contrapiso, sem tratamento acústico é de, no máximo, 80 dB. Para níveis de exigências maiores, esse limite máximo aceitável cai para 65 dB (com tratamento acústico) e 55 dB (com tratamento acústico especial), respectivamente para nível intermediário e superior. A norma ainda espera que esses valores sejam menores, pois os valores exigidos são representativos de ensaios realizados em edifícios habitacionais brasileiros, em lajes maciças de concreto armado, sem acabamento superficial, com espessura entre 10 e 12 cm. Na prática, considera-se a colocação de acabamentos como carpetes, pisos cerâmicos, tacos ou assoalhos de madeira que contribuem para a redução dos valores apresentados. A certificação ambiental também limita o nível de pressão ponderado do ruído de impacto (L’nT,w). A exigência mínima, para o nível Bom, coincide com o requerido pela norma, com valores abaixo de 80 dB. Entretanto, a norma se mostra mais rigorosa nos valores de exigências maiores, pois para o nível Superior da certificação, o parâmetro (L’nT,w) deve ser inferior à 70 dB (e não 65 dB como exigido pela NBR 15575-3 para o nível I) e, para o nível Excelente, o limite máximo é de 60 dB (e não 55 dB segundo a NBR 15575-3 para o nível S). Em relação aos valores de isolamento de ruído aéreo, o conforto é verificado pela diferença de percepção do som de um ambiente, quando a fonte está posicionada em outro local. Ou seja, quanto maior o rigor e maior a exigência de conforto e privacidade acústica, maior será o valor da diferença exigida, em decibéis (dB). A norma e a certificação apresentam as mesmas exigências quanto aos níveis aceitáveis entre uma unidade habitacional e os outros locais de uma mesma edificação (ambientes internos). Os critérios são expressos pela Diferença Padronizada de Nível Ponderada (DnT,w), em ensaios de campo; e Índice de Redução Sonora Ponderado (Rw), em ensaios de laboratório, ambos medidos em decibéis, de acordo com o nível de exigência correspondente: mínimo, intermediário e superior, para a norma brasileira; e bom, superior e excelente, para a certificação ambiental. O processo AQUA faz referência a todos os valores considerados no conforto acústico às respectivas partes da NBR 15575 (2008), não diferindo em nenhum dos limites para isolamento de ruído aéreo. 40 Além disso, tanto a norma quanto a certificação apresentam valores de conforto acústico entre cômodos principais e ambientes externos, expressos em dB, pela Diferença Padronizada de Nível Ponderada da vedação externa (D2m,nT,w), para ensaios de campo, e Índice de Redução Sonora Ponderado da fachada (Rw), para ensaios de laboratório. Neste caso de verificação do conforto frente a ruídos externos, a normalização se mostrou mais rigorosa nos valores dos critérios. Enquanto a norma faz distinção entre a localização da edificação, exigindo um isolamento acústico maior (valores acrescidos de 5 dB – indicados por D2m,nT,w+5 e Rw+5) para construções localizadas junto a vias de tráfego intenso (rodoviário, ferroviário e aéreo), a certificação AQUA aplica as diferenças mínimas para todos os tipos de habitação, independentemente da localização. Segundo a norma, o mínimo exigido pela edificação é um isolamento entre 30 e 34 dB para medições in loco, sem a presença de ruído intenso. Caso a habitação esteja exposta a vias de tráfego intenso, essa exigência sobe para 35 a 39 dB. Para a certificação, essa distinção não existe, sendo que o mínimo de isolamento, para o menor nível de exigência (bom), é entre 30 e 34 dB, para dormitórios, com medições em campo (localizados em ambientes ruidosos ou não). Outro fator que mostra a menor exigência da certificação em relação à norma de desempenho a respeito do isolamento acústico da edificação frente a ruídos externos se dá na diferenciação de dormitórios e outros ambientes de permanência prolongada. A norma brasileira trata todos os ambientes de forma igual, colocando os mesmos critérios para isolamento de elementos de vedação externa de dormitórios e salas. A certificação AQUA faz distinção dos dois ambientes. Para dormitórios, o limite exigido é o mesmo do estipulado pela norma para ambientes não ruidosos. Para ambientes de permanência prolongada (como salas, por exemplo), esses limites são ainda menores, com exigência de valores de 5 dB a menos do que a norma estabelece, se mostrando, por consequência, menos rigorosa para esses ambientes. Em casos de habitações com salas expostas a ruído intenso, o mínimo de isolamento exigido pela da norma é de 35 dB, enquanto, para a certificação AQUA, para o nível bom, esse isolamento deve ser de, no mínimo, 25 dB. A certificação ambiental apresenta uma preocupação de conforto acústico entre ambientes de uma mesma unidade habitacional que pouco é exigido pela norma. A NBR 15575 exige que as paredes entre recintos de uma mesma unidade habitacional deva apresentar uma diferença padronizada de nível ponderada (DnT,w), medida in loco, de, no mínimo, 25 dB. Esse valor é aumentado para 30 e 35 dB para os níveis I e S da norma, respectivamente. Já a certificação faz uma exigência do isolamento dos dormitórios contíguos em relação à cozinha e sala de estar, com valor mínimo de 33 dB medidos em campo (esse valor apenas é aplicado aos níveis superior e excelente). 41 Além disso, assim como o desempenho térmico, algumas questões ainda precisam ser mais bem definidas. A redução sonora propiciada por fachadas e coberturas (via aérea) tem a necessidade de verificação através ensaios em paredes cegas, em caixilhos, em forros e telhas, para, posteriormente, gerar combinações entre os diferentes elementos, formando uma matriz acústica. Essa matriz também precisa ser elaborada para pisos entre unidades habitacionais, considerando ensaios em lajes nas diferentes combinações (maciças, com camadas de cerâmica, isopor, etc) (GEPAD, 2010). Em suma, pode-se dizer que, em alguns casos a norma brasileira apresentou valores de conforto acústico mais severos do que a certificação AQUA, em se tratando de ruídos de impactos e isolamento aéreo de ruídos externos. Por outro lado, a certificação apresentou maiores exigências quanto ao conforto acústico entre ambientes da mesma unidade habitacional. Quando a verificação se dá em ambientes internos (entre a unidade habitacional e outros locais de uma mesma edificação), os valores exigidos são os mesmos nos dois documentos. Ainda assim, se faz necessário o incremento de variáveis nos dois documentos, como, por exemplo, a elaboração de matrizes acústicas. 5.2.3 CONFORTO LUMÍNICO O conforto lumínico é requerido pelo máximo aproveitamento de luz natural obtido a partir da disposição dos cômodos (arquitetura), correta orientação geográfica da edificação, dimensionamento e posição das aberturas, tipos de janelas e envidraçamentos, rugosidade e cores dos elementos (pisos, paredes, tetos), inserção de poços de ventilação/iluminação, eventual introdução de domus de iluminação, etc. Quanto à iluminação artificial, essa deve ser usada para propiciar segurança e conforto nas diversas atividades realizadas no período noturno. A norma brasileira define que todas as dependências da edificação habitacional devem receber iluminação natural conveniente, durante o dia, e iluminação artificial satisfatória no período noturno. A certificação ambiental faz exigência ao conforto lumínico na Categoria 10 Conforto visual. Neste requisito, o processo AQUA aborda as preocupações com o aproveitamento dos benefícios da luz natural, além de uma iluminação artificial confortável para áreas interior e exterior à edificação de uso comum. A iluminação natural recebida pela habitação durante o dia deve ser oriunda diretamente do exterior ou indiretamente através de recintos adjacentes, obedecendo aos níveis mínimos de iluminamento geral (lux) para as diferentes exigências. Segundo a norma, o mínimo necessário para as dependências de uma unidade habitacional é de 60 lux, 42 aumentando esse limite para 90 e 120 lux, para a exigência Intermediária e Superior, respectivamente. Em ambiente de uso comum à edificação (corredor, escadas, garagem), a NBR não exige um iluminamento natural para o nível Mínimo, apenas para o nível Intermediário (maior que 30 lux) e Superior (maior que 45 lux). A norma ainda aponta que, para qualquer dependência situada no térreo ou pavimentos abaixo da cota da rua, esses limites podem sofrer um decréscimo de uma diferença de até 20% dos valores citados. É válido citar que esses valores limites devem atender às condições de dias com cobertura de nuvens maior que 50%, iluminação artificial desativada, a presença de qualquer obstáculo que obstrua a passagem de luz natural (taludes, muros, coberturas, vizinhança), além dos próprios elementos e aberturas presentes nos ambientes. As correções das medições realizadas in loco devem atender à NBR 15215-3 (2005). Diferentemente da norma que apresenta níveis de iluminamento geral para os cômodos da residência, a certificação ambiental propõe uma exigência em índice de aberturas no ambiente. Esse índice é a relação entre a superfície do vão da esquadria, que corresponde à área visual de entrada de iluminação natural, e a superfície habitável do cômodo. O mínimo exigido pela certificação é de índices de abertura superiores a 10% (para cozinhas) e 15% (para salas de estar e dormitórios). Apenas para o nível de Excelência da certificação, em unidades habitacionais situadas no térreo ou no 1º andar, deve-se considerar o Fator de luz do dia médio (FLD), determinado a partir da relação (%) entre a iluminância natural recebida num dado ponto interno do cômodo da unidade habitacional (Eint) e a iluminação exterior (Eext), consideradas sobre uma superfície horizontal (plano de trabalho), levando em conta a presença de obstáculos, na condição de céu uniformemente encoberto. Essa relação deve ser maior que 1,5% para dormitórios e 2,0% para sala de estar. Nesta questão do aproveitamento da iluminação natural em ambientes residenciais, a norma brasileira se mostra mais preocupada com o conforto lumínico do que a certificação ambiental. Isso se justifica pela forma com que cada um dos documentos aborda tal questão. A NBR trata de forma objetiva, baseando seus critérios no desempenho, segundo as necessidades exigidas pelo usuário. Ela determina níveis de iluminância mínimos, considerando qualquer fator ou obstáculo que influencie no conforto do ambiente. Já a certificação ambiental trata essa questão de forma prescritiva, exigindo apenas uma abertura de iluminação natural compatível com a superfície do cômodo, não garantindo, portanto, que o tamanho da abertura requerida atenda aos níveis de conforto lumínico. Por exemplo, a certificação não leva em consideração a possibilidade de haver uma edificação vizinha a qual poderia diminuir a parcela de luz natural chegada ao cômodo analisado; ou cores e rugosidades de paredes e posicionamento de elementos presentes nos ambientes 43 que podem diminuir a capacidade de iluminamento no recinto. Uma análise para unidades habitacionais situadas no térreo ou 1º andar é exigida pela certificação, mas apenas para atender ao maior nível considerado por esse documento (Excelente). A norma brasileira também estabelece critérios mínimos para iluminação artificial, considerando a ocupação dos recintos e circulação nos ambientes com conforto e segurança. Para as dependências do interior da unidade habitacional, exige-se um nível mínimo de iluminamento geral maior que 100 lux, subindo para 150 e 200 lux para nível de exigência Intermediário e Superior, respectivamente. Em ambientes comuns (corredor, escadas, garagem), o nível de iluminância mínimo para luz artificial é de 50 lux. As medições devem ser realizadas no período noturno, sem nenhuma entrada de luz externa, com luz artificial totalmente ativada. A certificação aborda a preocupação com a luz artificial apenas para ambientes externos à unidade habitacional, de uso comum à edificação, como hall de entrada, circulações horizontais, escadas e estacionamentos cobertos. Os critérios mínimos são definidos através do nível de iluminância médio, com valores mais rigorosos do que a norma brasileira: acima de 80 lux para estacionamentos (isso equivale ao nível de exigência Intermediário da NBR em estudo) e acima de 100 lux para os demais recintos (equivalente ao nível Superior da NBR 15575). Neste quesito, a norma traz uma questão interessante ligada à minimização de luz artificial, através de comandos de iluminação por detector de presença (exigidos para todos os níveis) e/ou associados a sensor fotoelétrico dia/noite (exigido para o nível Excelente). Algo interessante a se avaliar é a questão do nível de iluminância máximo, que não é tratado em nenhum dos documentos. Sabe-se que, para a realização de certas atividades em ambientes muito iluminados, o alto nível de iluminamento pode-se tornar desconfortável ao usuário e, assim, prejudicá-lo na elaboração da tarefa. A partir da análise apresentada, pode-se constatar que a norma de desempenho apresenta uma abordagem mais completa do conforto lumínico requerido para edificações habitacionais, comparada à certificação ambiental AQUA. Além de a norma ter uma abordagem não prescritiva para condições de iluminação natural, considerando toda e qualquer situação presente nos recintos em todos os níveis de exigência, a certificação apenas considera o conforto da iluminação artificial em ambientes externos à residência. Entretanto, a certificação levanta pontos para otimização desta iluminação artificial importantes para a questão da sustentabilidade, através da redução do consumo de energia elétrica. Além disso, questão como nível de iluminância máximo poderia ser discutido em ambos os documentos. 44 6. CONCLUSÕES Neste trabalho, procurou-se desenvolver uma comparação de alguns requisitos propostos pela NBR 15575 (2008) e a certificação ambiental AQUA. Este estudo visou um processo de análise, no escopo da sustentabilidade, sob a luz do desempenho e as boas práticas ambientais de uma edificação habitacional com referencial brasileiro. Com base na estrutura geral dos dois documentos analisados, percebeu-se que ambos se completam nos requisitos que não são abordados em algum deles. A questão de segurança do usuário (estrutural, incêndio, uso e ocupação) é tratada na norma, mas não na certificação. Questões como o entorno da construção e a gestão do edifício quanto às preocupações ambientais (uso racional de energia e água, por exemplo) são exigidas na certificação, e não na normalização. Os documentos poderiam ser melhorados caso abordassem, também, tais questões. Já nos requisitos analisados que possuem o mesmo foco, passíveis de comparação, notou-se que a maioria deles se mostrou mais exigente na certificação ambiental do que na norma brasileira. Além de a certificação fazer referência a muitos critérios da norma, aquela ainda apresentou níveis superiores de exigência comparadas com a NBR 15575. As questões de durabilidade e manutenibilidade apresentaram maior rigor na certificação AQUA, pois esta aborda também a questão comportamental dos usuários e a preocupação com o reuso e reciclagem de componentes ao final da vida útil do empreendimento. A exigência do manual de uso, ocupação e manutenção do edifício com vida útil mínima é requeria nos dois documentos. Os níveis de conforto térmico são claramente notados com maior rigor na certificação do que na norma. Além de o processo AQUA fazer referência à própria NBR 15575, justificando seus critérios, ela ainda apresenta valores mais elevados do que a normalização. Além disso, a certificação apresenta exigências de soluções sustentáveis para o conforto térmico, como, por exemplo, a não utilização de resfriamento do ambiente com uso do ar-condicionado. Na questão acústica, a norma e a certificação apresentaram exigências variáveis. Os valores permitidos para ruídos de impacto e para ruídos externos à edificação tiveram maior 45 cobrança por parte da norma. Em relação a ruídos entre ambientes de uma mesma unidade habitacional, a certificação apresentou maior rigor. Ambos os documentos tiveram a mesma exigência quanto ao desempenho acústico entre a unidade habitacional e outros locais de uma mesma edificação. Quanto ao desempenho lumínico, a norma brasileira se mostrou mais efetiva na forma de exigência do conforto do que a certificação. A maneira de abordar o critério em nível de iluminância traz uma análise mais abrangente, com base no desempenho; diferente da consideração prescritiva apresentada pelo processo AQUA. Portanto, para um nível confiável de conforto, segurança, saúde e higiene e durabilidade de uma edificação, é aconselhável que seja adotado os valores mais rigorosos apresentados em cada um dos documentos analisados, garantindo um desempenho mínimo na edificação, considerando, também, as questões sustentáveis do ambiente construído. 46 7. REFERÊNCIAS ABREU, J. M. M. Análise dos requisitos de desempenho de edificações residenciais sob a luz da nova norma NBR 15575:2008 de desempenho para edifícios habitacionais de até cinco pavimentos. 2009. 53 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação) Curso de Engenharia Civil, Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2009. ASSOCIAÇÃO DE DIRIGENTES DE EMPRESAS DO MERCADO IMOBILIÁRIO (ADEMI). O Brasil é o sexto no ranking de prédios sustentáveis. [26/08/2010]. Disponível em: <http://ademi.webtexto.com.br/article.php3?id_article=38349>. Acesso em: 25 set. 2010. ALWAER, H., CLEMENTS-CROOME, D. J. 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