Construindo uma comunidade leitora
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Construindo uma comunidade leitora
Construindo uma comunidade leitora Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 131 2 Projeto Comunidade Educadora Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 3 © CARE Brasil, 2015 Gerente Geral Tatiana Bertolucci Presidência do Conselho Deliberativo Herbert Steinberg Coordenador do Processo de Sistematização e Texto José Cláudio Barros Revisão Ana Navarrete Cláudia Maria Monteiro de Freitas Erika Saez Henrique Gasparino Layout e Design Guilherme Colugnatti, Guizo Design Fotografias Anderson Alimoe Diego Rinaldi Rafaela Celano Este documento foi produzido com apoio financeiro da Lei Rouanet, Marco Polo e Carrefour. As opiniões expressadas aqui não devem ser usadas, de maneira alguma, para refletir a opinião oficial dessas instituições. Realização: Financiamento: Parceiros: 4 Projeto Comunidade Educadora introduÇÃO E sta publicação tem como objetivo oferecer para profissionais da educação e educadores sociais conceitos, aprendizagens e ferramentas que os auxiliem na implantação, em suas escolas e organizações, de um projeto de incentivo à leitura literária que tenha o jovem estudante como o principal ator do processo. cas tendo como mediadores adolescentes e jovens estudantes formados pelo projeto. Os jovens atuavam de forma voluntária no contraturno de suas aulas lendo livros de literatura para outros alunos e alunas dentro das próprias escolas onde estudavam ou em escolas e creches próximas de sua comunidade. Nos capítulos e anexos, aqui organizados, estão as reflexões e processos vividos pelo projeto Comunidade Educadora. implantado pela parceria entre o Colégio Estadual Guadalajara, a ONG CARE Brasil e o Instituto C&A no período de março de 2006 a fevereiro de 2012 no município de Duque de Caxias, no estado do Rio. As rodas são organizadas seguindo um passo a passo e técnicas de mediação que são repassadas para os jovens durante encontro de formação organizado pela escola. Após este encontro, a escola organiza com os jovens um calendário de rodas para suas turmas. O projeto implantou rodas de leitura literária em escolas e creches públi- Nos diferentes capítulos desta publicação organizamos todo este processo de forma que seja possível para Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 5 cada escola, organização ou rede de ensino dar início a sua própria experiência adaptando-a da forma que considerar mais adequada. dos jovens mediadores, nestes capítulos também estão instrumentos para registro e avaliação participativa da implantação das rodas. O capítulo 1 traz a percepção dos participantes do projeto Comunidade Educadora sobre o que é uma roda de leitura e quais impactos produz em quem dela participa. É um texto sobre a relevância e pertinência da roda dentro da escola e sobre o quanto ela deve ser entendida como uma estratégia do projeto político pedagógico da escola. Para concluir, o capítulo 11, partindo da história “Quando a escola é de vidro”, de Ruth Rocha, traz aprendizagens levantadas junto aos jovens, professores, responsáveis e equipe técnica do projeto sobre o acesso ao livro literário e a importância deste acesso para processos de transformação social. O capítulo 2 faz uma descrição dos diferentes atores envolvidos na implantação do projeto. Sem organização, distribuição de tarefas e, principalmente, comprometimento destes atores será impossível implantar a ação. Fechando, como Autores do Conhecimento desta publicação, apresentamos o grupo de jovens mediadores e profissionais que se envolveram no levantamento dos conteúdos aqui apresentados e vivenciaram a experiência Comunidade Educadora. Os capítulos 3 e 4 trazem os elementos necessários para preparar e organizar a formação dos jovens como mediadores tendo como conteúdos desta formação os capítulos 5, 6 e 7. Nos anexos estão ainda disponibilizados alguns instrumentos e dinâmicas que podem ser utilizados na formação dos jovens. Nos anexos completamos a publicação com importantes textos para auxiliar nos processos formativos e compreensão dos princípios do projeto, com sugestões de atividades e dinâmicas para as formações e com instrumentos de registro e avaliação para um bom acompanhamento do projeto e identificação de resultados. O capítulo 7 traz critérios e princípios para a compra e uso do acervo nas rodas. Nos anexos ainda há uma lista com sugestão de acervo. Já o capítulo 8 foca na implantação da roda, sobre como planejá-la e organizá-la com os jovens. Lembramos que todo material aqui apresentado não deve ser compreendido como uma camisa de força, mas sim como ferramentas que devem ser adequadas à realidade de cada escola, rede de ensino ou organização. Os capítulos 9 e 10 enfatizam a importância de um bom acompanhamento e avaliação da ação das rodas na escola com ênfase na mobilização continuada dos jovens mediadores. Além de dicas para organização de encontros de formação continuada 6 Projeto Comunidade Educadora Esperamos, enfim, que possamos inspirar e contribuir para novas comunidades leitoras e para a construção de um mundo literário mais inclusivo. Boa leitura. Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 7 índice Apresentação – Construindo uma comunidade leitora . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11 1. A roda de leitura . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14 1.1. a roda de leitura na visão do jovem 1.2. a roda como espaço de leituras literárias e leituras de vida 1.3. a roda como espaço participativo e estimulador para leitura 1.4. a roda como espaço de estímulo à criatividade e ampliação do universo cultural 2. Os atores do processo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18 2.1. o profissional referência da escola 2.2. os jovens 2.3. a coordenação pedagógica e direção 2.4. o profissional de sala de leitura e/ou biblioteca 3. A identificação dos jovens mediadores . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21 3.1.estratégias 3.2. critérios para escolha dos jovens 3.3. o convite e comunicação aos responsáveis 4. A formação dos jovens mediadores . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24 4.1. a mobilização dos jovens para o encontro 4.2. o planejamento 4.3. o local 4.4. a pauta 4.5. detalhamento das ações 5. A técnica da mediação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34 5.1. a voz 5.2. a leitura 5.3. o livro 5.4. a posição na roda e o olhar 5.5. a paciência 6. O passo a passo da roda de leitura . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38 6.1. a arrumação do espaço 6.2. a acolhida 6.3. as mediações 6.4. o convite à leitura 6.5. a despedida e o estímulo ao empréstimo 6.6. avaliação conjunta e registro 7. O acervo para rodas e empréstimos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41 7.1. mapeando o acervo disponível para rodas 7.2. combinar o acesso aos livros 7.3. o medo dos livros serem rasgados ou roubados 8 Projeto Comunidade Educadora 8. O calendário e o planejamento das rodas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 44 8.1. quantidade ideal de participantes por roda 8.2. o intervalo de tempo entre as rodas 8.3. o planejamento da roda 9. A mobilização continuada dos mediadores . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 46 9.1. os encontros de formação continuada 9.2. a atuação multiplicadora do jovem 10. Avaliação e monitoramento . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 48 10.1.avaliação do encontro de formação 10.2.acompanhamento e avaliação das rodas de leitura 10.3.o empréstimo de livros 11. Quebrando escolas de vidro: Aprendizagens de uma Comunidade Educadora . . 51 11.1.O vidro do limitado acesso público ao livro e à cultura 11.2.O vidro que separa a escola da comunidade 11.3.O vidro que separa o jovem da escola 11.4.O vidro que separa o jovem do jovem 11.5.O vidro que estigmatiza o jovem na comunidade e na família 12. Os autores do conhecimento . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 56 (relação de todas as pessoas da equipe técnica e jovens que participaram do processo de sistematização com fotos de todos) 13. Anexos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 58 13.1. Critérios para aquisição de livros – Elizabeth Brose 13.2. A ecopedagogia da palavra – Claudia M.ª Monteiro de Freitas 13.3. A história da escrita – INEP 13.4. Havia uma régua no meio do caminho – Claudia M.ª Monteiro de Freitas 13.5. Dinâmicas para encontros de formação e formação continuada 13.6. Atividade de formação: Escultura no biscoito 13.7. Atividade de formação: A prova 13.8. Atividade de formação: A escola dos sonhos 13.9. Atividade de formação: Música “Estudo Errado”, Gabriel Pensador 13.10. Atividade de formação: Remédios para os problemas de leitura 13.11. Atividade de formação: Caça ao tesouro 13.12. Atividade de formação: Organizando rodas de leitura 13.13. Atividade de formação: Mímica sobre o texto “Mil Desculpas para não ler” 13.14. Ficha para contagem de empréstimos 13.15. Modelo de ficha de inscrição para Encontro de Formação de Mediadores 13.16. Modelo de carta-convite para encontro de mediadores 13.17. Modelo de ficha de avaliação do encontro de mediadores 13.18. Modelo de ficha de registro de roda 13.19. Passo a passo para montar um Pufe com garrafas PET – Varner Simas Filho 13.20. Modelo questionário para linha de base empréstimos 13.21. A realidade da leitura no Brasil 13.22.Listagem de acervo do projeto Comunidade Educadora (clique no item e obtenha a listagem completa!) Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 9 10 Projeto Comunidade Educadora APRESENTAÇÃO Construindo uma comunidade leitora “O menino quer um burrinho que saiba inventar histórias bonitas com pessoas e bichos e com barquinhos no mar. E os dois sairão pelo mundo que é como um jardim apenas mais largo e talvez mais comprido e que não tenha fim.” MEIRELES, Cecília. Ou isto ou aquilo. Ed. 9ª: Nova Fronteira, 2002, p.56 Q uando Cecília Meireles imaginou o “Menino Azul”, que queria um burrinho manso para passear e que soubesse inventar histórias com todo tipo de belezas para contar, provavelmente ela pensou na imensa alegria que este animal traria para traduzir o mundo aos que não sabem ler. O Menino queria um burrinho que nomeasse os rios e soubesse dizer “das montanhas, das flores, – de tudo o que aparecer”. O Menino não sabia ler... Sair com esse burrinho pelo mundo sem fim, conversando sobre tudo que é visível e imaginável, seria para o Menino Azul a possibilidade mais linda de conhecer a vida, descrita como um jardim, “apenas mais largo, e talvez mais comprido, e que não tenha fim.” Este mundo “mais largo” e infinito é que sugerimos através de ações protagônicas aqui relatadas e realizadas pelos Jovens Mediadores de Leitura do Projeto Comunidade Educadora. São jovens que também traduzem o mundo e vão com a simplicidade e com a leveza do “burrinho azul” de Cecília Meireles nos levar a possíveis caminhos, novos e repletos de descobertas! Quantos meninos e meninas azuis estão por aí, esperando por uma boa história para poder viajar e nela encontrar seu burrinho falante? Uma história onde conheçam outros mundos, vivam perigos e aventuras, alegrias e tristezas. Onde se emocionem com o sacrifício de uma Árvore Generosa ou se inspirem na determinação da Cambaxirra que não deixou sua árvore ser cortada. Ou se divir- Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 11 tam com uma cama caindo dentro de uma Casa Sonolenta se impressionando com o estrago que uma pequena pulga pode causar. Quantos e quantas que não são apenas azuis, mas amarelos, negras, brancos. Todos e todas marcados. Alguns por uma vida repleta de direitos e outros por uma vida tão sem direitos. Direito à alimentação, à moradia, ao carinho, à brincadeira, à arte, ao livro, à leitura. O acesso à leitura literária é mais do que um processo que se relaciona ao letramento. É um processo que se relaciona ao exercício do direito de cidadania. Sem a leitura, não aprimoramos nossa capacidade de compreensão de signos, palavras e mensa- 12 Projeto Comunidade Educadora gens. Sem compreender mensagens, dificultamos a criação de entendimentos e a construção de opiniões. Sem boas opiniões não conseguimos plenamente estabelecer nossa presença, lançar nossa voz, exercer nossa cidadania. E para além da cidadania, o processo da leitura literária se relaciona à vida e à construção de sonhos. É o estímulo criativo que nos motiva a assumir desafios, aceitar o diferente e a perceber que há muito mais coisas para além das barreiras que a vida nos impõe. Todos estes processos ficam evidentes quando decidimos criar uma Comunidade Leitora. Nesta publicação, temos a experiência fascinante de construir esta comunidade a partir da ação de jovens estudantes de comunidades pobres que, de forma voluntária, se tornam mediadores de leitura para outras crianças e adolescentes de suas escolas e comunidades. possível implantar na escola um processo de incentivo à leitura que seja prazeroso e que, além de ampliar o acesso ao livro literário, ainda aproxima a escola dos seus alunos e de sua comunidade. Apresentamos nesta publicação a experiência do projeto Comunidade Educadora iniciado em 2006 a partir da parceria entre o Colégio Estadual Guadalajara, a ONG CARE Brasil e o Instituto C&A junto a escolas e creches públicas do município de Duque de Caxias, no estado do Rio de Janeiro. A ação que começou tímida em apenas 4 escolas tomou corpo e, no decorrer de 6 anos, já se expandiu para mais de 50 escolas e creches, atingindo mais de 20 mil crianças e adolescentes com rodas de leitura promovidas por jovens mediadores formados pelo projeto. Além do passo a passo necessário para implantação das rodas e formar os jovens como mediadores, apresentamos os conceitos utilizados e as aprendizagens que servirão para que os leitores tenham uma reflexão crítica deste processo e utilizem este material não como uma receita de bolo, mas como um instrumental a ser adequado e reformulado conforme o contexto e possibilidades de cada um. E os resultados não são meramente quantitativos, são, principalmente, qualitativos. Percebidos pelo olhar de professores e professoras que reconhecem o melhor desempenho de alunos e alunas que participam regularmente das rodas em detrimento dos que não participam. Percebidos pelos jovens mediadores que reconhecem se sentirem mais valorizados em suas comunidades e mais críticos em relação às suas vidas, ao seu futuro e em relação à sua cidade. Percebidos também pelas crianças que reconhecem o prazer de ir para a roda, de folhear um livro, de imaginar o significado das palavras e de criar suas próprias histórias a partir de palavras, imagens e aconchegos de almofadas e lençóis coloridos. A decisão de sistematizar esta experiência visa tornar público que é Da mesma forma que partimos de outras experiências1, que generosamente socializaram seus achados, consideramos um dever ético também partilharmos nossos aprendizados. Assim, o desejo de muitos meninos e meninas azuis de encontrarem seus burrinhos falantes poderá se tornar realidade. Boa leitura e junte-se a nós nesta maravilhosa e prazerosa jornada na construção de muitas e muitas comunidades leitoras. 1 Destacamos aqui as experiências do Biblioteca Viva em Hospitais e projeto Mudando a História, ambos executados pela parceria entre A Cor da Letra e a Fundação Abrinq cuja sistematização nos inspirou e auxiliou no desenho das primeiras ações em nosso eixo de leitura. Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 13 CAPÍTULO 1 A roda de leitura 1.1. A roda de leitura na visão do jovem As rodas de leitura tiveram início no projeto Comunidade Educadora, em 2006, motivadas pela parceria com o Programa Prazer em Ler do Instituto C&A. Inicialmente, foram desenvolvidas por funcionários voluntários das lojas C&A que atuavam como mediadores. Aos poucos, os jovens alunos das escolas participantes do projeto começaram a assumir a condução das rodas, primeiro em suas próprias escolas e depois, levando-as para outras escolas da comunidade, além de creches, associação de moradores, posto de saúde, igrejas, orfanatos, asilo e praça pública. Foi um processo rico de aprendizagens, em especial para os jovens que desenvolveram uma série de percepções tanto sobre a leitura quanto sobre a ação na escola e na comunidade. Entre estas percepções destacamos a seguir algumas definições dadas pelos próprios mediadores sobre o que é uma roda de leitura. “É um espaço aconchegante onde as pessoas se juntam para viajar no fantástico e maravilhoso mundo dos livros.” (Ingrid da Silva Guimarães Pereira, 17 anos) 14 Projeto Comunidade Educadora “É um espaço onde um pequeno grupo se encontra para compartilhar diferentes tipos de leitura. É um momento mágico, onde as pessoas viajam sem pagar passagem para diversos lugares e tempos.” (Thaís Mendes, 17 anos) “É um encontro com a imaginação.” (Lucas Marques da Fonseca Diniz, 16 anos) “Além de prazerosa, a roda é um momento para refletir um pouco e renovar o seu vocabulário, aprender a lidar com as diferenças culturais, sociais, religiosas.” (Luana Guilherme da Silva, 20 anos) “É um local onde as pessoas têm um acervo diversificado fazendo dali um bom momento para relaxar e aprender.” Kleber Vinicius Lacerda Costa, 16 anos “A roda é um momento de encontro dos jovens com o livro, proporcionando a ele algo diferente da sala de aula, o prazer de pegar em um livro sem se preocupar em mostrar o que aprendeu.” (Laio Ferreira de Souza, 20 anos) “Muitas vezes, a roda de leitura funciona como válvula de escape quando, depois de ouvirem determinadas histórias, as crianças e jovens falam de seus problemas cotidianos trazendo para nós histórias de suas vidas que ali viram dentro do livro.” (Varner Simas, 20 anos) “É um espaço onde procuramos levar a leitura para diferentes tipos de públicos. Pretende-se que sejam momentos de prazer, que envolvam mediadores e ouvintes.” (Indaiara da Silva, 16 anos) 1.2. A roda como espaço de leituras literárias e leituras de vida “Nelas pode-se ter acesso a variedade de obras da literatura brasileira e traduções da literatura estrangeira. Também tem como objetivo aproximar o objeto livro da vida de quem participa delas.” (Natalia Santos da Silva, 17 anos) As definições que lemos há pouco são percepções que os jovens mediadores construíram no decorrer de sua prática nos três anos do projeto Comunidade Educadora. Descobriram que a roda, apesar de ser totalmente voltada para o prazer da leitura Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 15 literária, acaba sendo, independente da vontade do mediador, um espaço onde crianças e jovens, a partir das viagens literárias, trazem também suas histórias de vida, com suas tristezas, alegrias e sonhos. É um momento cujo mediador assume a função de ouvinte e também se dá ao prazer de ouvir histórias não lidas, mas vividas. De forma nenhuma devemos confundir a função da roda e considerá-la como espaço de reflexão e debate sobre a vida das pessoas e sobre os problemas da comunidade, mas é importante termos a sensibilidade da escuta. Saber ouvir e valorizar as histórias pessoais e comunitárias também se constitui em momento de valorização do livro já que foi a partir dele que a partilha foi motivada. 16 Projeto Comunidade Educadora 1.3. A roda como espaço participativo e estimulador para leitura Outra característica importante da roda é o seu caráter participativo quando os alunos são convidados não apenas para ouvir histórias lidas pelos mediadores mas também para ler histórias seja particularmente se acomodando com um livro em uma das almofadas, seja em voz alta para os demais. A frequência da roda em algumas escolas demonstrou que muitas crianças das quais, nas primeiras rodas, preferiam ficar quietas apenas ouvindo histórias, com o tempo passaram a manifestar o desejo de também ler para as demais. Até crianças de creche que ainda não sabem ler participam contando histórias a partir das ilustrações e a partir do que se lembravam das histórias lidas pelos mediadores. Este caráter participativo, sem pressões e cobranças, funciona como um grande estimulador para a integração da criança e do jovem com o livro. 1.4. A roda como espaço de estímulo à criatividade e ampliação do universo cultural Outro aspecto é sobre o quanto a criatividade é estimulada à medida que os leitores, a partir das leituras, criam suas próprias histórias e viajam por entre diferentes mundos e culturas. Considerando que grande parte das crianças e jovens pobres de periferias urbanas e rurais possuem trânsitos e acessos limitados, tanto pelas dificuldades de renda da família quanto pela falta de segurança pública na comunidade, a leitura contribui para ampliar sua visão de mundo e romper com as barreiras de espaço, tempo e cultura. Esta característica da roda é acentuada quando a escola possui um acervo diversificado que traz além de histórias universais, histórias com lugares, fatos, símbolos, aspectos culturais e sociais que se referem à realidade da comunidade e do público da roda. Histórias africanas e brasileiras indígenas, por exemplo, aguçam o sentido histórico e de memória do leitor e o sentido de descoberta e compreensão de que o mundo é constituído de hábitos e culturas diferentes. Vantagens da roda de leitura na escola segundo jovens mediadores Enriquece o vocabulário do aluno, mostrando novas possibilidades de leitura de mundo; Valoriza os espaços extraclasse com vida, com colorido, explorando novas possibilidades; Mostra ao professor novas possibilidades de trabalhar; Leva a leitura para os alunos como prazer e não como obrigação; Estimula outros jovens dentro da escola a seguir o exemplo; Auxilia na revitalização e criação de espaços de leitura; Fomenta o bom uso do acervo literário das escolas; Melhora a convivência do aluno no ambiente escolar; Modifica o olhar do estudante na parte cognitiva, de atenção, ortografia, vocabulário; A escola se integra mais à comunidade; Estimula a leitura e a escrita do aluno além de melhorar sua expressão oral. Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 17 CAPÍTULO 2 Os atores do processo 2.1. O profissional referência da escola Para garantir que a ação dos jovens tenha resultado, destacamos a importância de um profissional da escola responsável pelo acompanhamento e apoio ao trabalho de mediação. Sugerimos que este professor ou um coordenador pedagógico: 1. identifique um grupo de jovens interessados em atuar como mediadores 2. apoie os jovens em sua formação como mediadores 3. organize o calendário de rodas 4. apoie os jovens nos encontros de formação continuada Talvez o papel deste profissional seja estratégico, pois além de ser a referência dos jovens dentro da escola supõe-se que sensibilizará os colegas e direção para a importância do trabalho e para o apoio coletivo aos jovens. Devemos ter clareza que o jovem aluno é um voluntário e que sua ação dentro da escola possui um caráter solidário. De forma nenhuma, e por mais que ele receba uma capacitação, ele poderá substituir o papel do professor. Por isso, sempre precisará do apoio de um profissional que o auxilie na relação com a estrutura da escola e também na relação com os demais alunos. Mais à frente conversaremos melhor sobre as atribuições sugeridas para este profissional. 2.2. Os jovens Os jovens são os principais atores deste processo, pois são eles que organizam e implementam as rodas de leitura. Acreditamos que sendo alunos da própria unidade possam cultivar uma relação diferente com o espaço escolar sentindo-se valorizados por sua ação e mais integrados. Entretanto, como em grande parte das escolas, especialmente as municipais, os alunos são muito novos, nada impe- 18 Projeto Comunidade Educadora Além de prazerosa, a roda é um momento para refletir um pouco e renovar o seu vocabulário, aprender a lidar com as diferenças culturais, sociais, religiosas. Luana Guilherme da Silva, 20 anos de que possam ser adolescentes e jovens que tenham algum tipo de relação com a escola e comunidade tais como: p arentes de alunos como irmãos mais velhos e primos; p arentes de profissionais da escola como filhos, sobrinhos e irmãos; e x-alunos; e studantes universitários ou de outras escolas que moram perto da escola. O importante é que sejam jovens que tenham alguma relação com a escola e que demonstrem um compromisso para a ação. Talvez caiba a eles toda a organização da roda, desde a arrumação do local e seleção dos livros até a realização das mediações. 2.3. A coordenação pedagógica e direção Por mais dedicado e comprometido que seja o profissional da escola na implantação das rodas, sua ação não terá efeito sem o apoio da direção da instituição e de outros profissionais. Para realização das rodas, nossa experiência aponta para alguns fatores imprescindíveis: iberação de espaço físico na escola L onde possam ocorrer as rodas; iberação do acervo de livros da L escola; Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 19 L iberação das turmas para participar das rodas; A rticulação com professores para que a ação da roda esteja alinhada à prática pedagógica de sala de aula. Neste caso, a ação da coordenação pedagógica na mobilização e articulação dos professores e no apoio para organização do calendário das rodas é fundamental. Da mesma forma, o apoio da direção ao liberar espaços, acervo e criar mecanismos pode facilitar a ação do jovem dentro da escola. 2.4. O profissional de sala de leitura e/ou biblioteca Caso a escola tenha um profissional responsável pela sala de leitura cuja função também é incentivar o ato de ler, ressaltamos o valor de sua articulação com as rodas, o que pode contri- 20 Projeto Comunidade Educadora buir, inclusive, na formação dos jovens como mediadores e na indicação do acervo a ser utilizado. Da mesma forma, o profissional da biblioteca poderá ser um importante suporte para garantir o acervo necessário para as rodas e para acolher crianças, adolescentes e jovens. Quem sabe este público seja em potencial composto por futuros frequentadores e requisitantes de empréstimos de obras, já resultantes do incentivo das rodas de leitura? É fundamental a articulação de todos os atores envolvidos com a implantação das rodas. Reunindo-se de forma coletiva podem combinar os passos e assumir tal ação como um projeto coletivo da escola. CAPÍTULO 3 A identificação dos jovens mediadores Existem diferentes possibilidades para identificar os jovens que atuarão como mediadores. Cabe à escola escolher a que for mais adequada à sua realidade institucional. Mas o importante é que esta escolha parta dos próprios jovens e seja uma decisão plenamente assumida por eles. Quando o próprio profissional inicia algumas rodas dentro da escola para que os jovens possam ver na prática o que é uma roda de leitura, esta ação torna-se interessante e complementar. 3.2. Critérios para escolha dos jovens 3.1. Estratégias Entre as diferentes estratégias que podem ser adotadas estão: S olicitação aos professores para indicação de alunos e alunas; P ercurso pelas salas, explicando o projeto para os adolescentes e jovens e convidando-os para o encontro de formação de mediadores; F ixação de alguns cartazes convidando jovens interessados em participar do encontro de formação de mediadores. Nos anexos, colocamos um modelo de cartaz que pode ser utilizado e adaptado pela escola. Não há critérios muito rígidos para esta escolha e cada escola pode adequar à sua realidade sempre tomando o cuidado de não criar um processo muito complexo e rigoroso que deixe de fora quem poderia aproveitar a oportunidade para desenvolver competências e habilidades. Entretanto, destacamos alguns critérios importantes a serem observados: 1. Participar de livre e espontânea vontade – O jovem deve realmente participar por vontade própria e não estar ali obrigado ou para agradar alguém. Não é recomendado, por exemplo, que a atividade seja utilizada pelos professores para dar pontos extras para os alunos; Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 21 2. Participar do encontro de formação – O encontro é o momento em que o jovem conhece a roda, todos os passos para sua organização e a técnica de mediação. É imprescindível sua participação. Até mesmo porque é no encontro que ele se integra ao grupo; 3. Ter disponibilidade para atuar de forma voluntária no horário extra-classe – As rodas não podem atrapalhar o rendimento do aluno em sala de aula. Neste caso se ele ou ela estudam na parte da manhã, sugerimos que a roda na qual atuará seja na parte da tarde. Para isso, ele precisará pelo menos, de uma manhã, ou uma tarde ou uma noite livre para dinamizar as rodas; 4. Saber ler – É importante que o jovem saiba ler para atuar como mediador, entretanto não há necessidade que ele seja um exímio leitor. Mesmo com dificuldades de leitura ele pode fazer parte da equipe de mediadores. Neste caso, ele apenas terá que treinar bem as leituras escolhidas para mediar antes da roda e estar sempre acompanhado de outros jovens que o apoiem no processo de mediação. Isto será um bom exercício para que ele desenvolva sua competência de leitura e se sinta estimulado para ler mais. Um critério que poderia estar relacionado acima é ter jovens que “gostem de ler”. Entretanto, pela nossa experiência, a maior parte dos jovens que se tornaram exímios mediadores não tinha o hábito de ler e muito menos este “gosto” desenvolvido pela leitura. A motivação inicial para grande parte foi participar de algum projeto junto com outros jovens. Foi no decorrer da ação que eles foram, de fato, se aproximando do hábito e de- 22 Projeto Comunidade Educadora senvolvendo o gosto pela leitura. Por isso, não recomendamos este como um critério de exclusão. 3.3. O convite e comunicação aos responsáveis Uma ação importante após a identificação dos jovens interessados em se tornar mediadores pode ser a entrega de uma carta direcionada ao jovem e ao seu responsável, formalizando o convite para participar do encontro de formação de mediadores, informando o local, a data e horário do encontro além de conscientizar os responsáveis sobre a importância da ação solidária que seu filho ou filha irá desempenhar dentro da escola. Acreditamos que a formalização do processo faça com que o jovem se sinta valorizado e evite informações truncadas. Nos anexos, apresentamos um modelo de carta convite que pode ser adequada e adaptada conforme o desejo da escola. Muitas vezes, a roda de leitura funciona como válvula de escape quando, depois de ouvirem determinadas histórias, as crianças e jovens falam de seus problemas cotidianos trazendo para nós histórias de suas vidas que ali viram dentro do livro. Varner Simas, 20 anos Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 23 CAPÍTULO 4 A formação dos jovens mediadores Após a escolha dos jovens, o profissional referência poderá organizar o encontro que os formará como mediadores e os preparará para a organização das rodas de leitura. Para isso, é importante contar com o apoio de outros profissionais da escola e até mesmo de algum jovem que aceite integrar a Equipe de Organização do Encontro. Também pode ser parceiro nesta ação e fazer parte da equipe algum pai ou responsável interessado no assunto. O encontro é um momento de integração do grupo e de motivação para a ação. Os seus objetivos são: S ensibilizar os jovens para importância da leitura; M otivar os jovens para o prazer da leitura; O rientar os jovens sobre como organizar uma roda de leitura; C apacitar os jovens nas técnicas de mediação; Integrar o grupo de jovens criando o sentimento de equipe. Para dar conta destes objetivos é importante estar atento ao total de participantes do encontro. Para que seja um momento realmente participativo e dinâmico, recomendamos que não ul- 24 Projeto Comunidade Educadora trapasse o total de 30 jovens. Caso a demanda seja muito grande, a equipe pode optar por realizar dois encontros com um intervalo de dois ou três meses para que o segundo encontro seja revisto com as aprendizagens do primeiro. 4.1. A mobilização dos jovens para o encontro Já falamos no capítulo 3 sobre a identificação dos jovens para participar do encontro. Lá demos várias ideias para a mobilização dos jovens, incluindo o cartaz que possui modelo entre os anexos. Mas junto com a mobilização é necessário organizar um processo de inscrição dos participantes. Para isso, sugerimos uma ficha de inscrição cujo modelo também está entre os anexos e que deve ficar disponível com alguém em local de fácil acesso. Uma boa opção é a secretaria da escola onde sempre há alguém ou a sala da coordenação pedagógica. Com a ficha, a equipe poderá organizar um perfil dos jovens participantes verificando as faixas etárias, sexo, série, entre outras informações. Com base nas fichas e endereços dos jovens, caso seja possível, recomendamos o envio pelo correio, na semana anterior ao encontro, de uma carta-convite relembrando ao jovem o endereço correto, dia e horário. Este envio pelo correio, geralmente, possui um bom efeito considerando que os jovens não costumam receber correspondências em seu nome. Além de fazer com que se sintam valorizados, a carta ainda permitirá aos familiares tomar ciência da ação. Como muitos são menores de idade, é importante ainda uma declaração do responsável autorizando a participação do jovem no encontro. Esta declaração pode seguir o modelo que a escola já utiliza para levar os alunos para atividades extraclasses. 4.2. O planejamento do encontro Como falamos acima, sugerimos a criação de uma equipe de organização do encontro. Esta equipe poderá se reunir com antecedência para iniciar o processo de mobilização dos jovens e também para organizar e se preparar para o encontro. Sugerimos a divisão de tarefas previamente acordadas nos encontros de planejamento: Q uem irá distribuir cartazes e percorrer as salas de aula para anunciar o encontro; Q uem ficará responsável pelas fichas de inscrição; Q uem ficará responsável pelo envio da carta-convite; Q uem ficará responsável pela arrumação do local do encontro; Q uem ficará responsável pela alimentação; Q uem ficará responsável pelas dinâmicas e orientações; Q uem providenciará os materiais necessários; Q uem irá cronometrar o tempo de cada tarefa sinalizando que o tempo está acabando; Q uem fará o registro da atividade para posteriormente partilhar um relatório com o grupo. Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 25 4.3. O local do encontro O encontro de formação é um dos principais elementos de sensibilização e motivação dos jovens para atuarem nas rodas de leitura. Para isso, destacamos a importância de que o local: T enha espaços amplos que facilitem a realização de dinâmicas e atividades lúdicas; S eja silencioso o suficiente para que todos escutem quando uma mediação for feita ou quando houver a orientação para algum procedimento; S eja seguro para que não se coloque em risco a integridade dos participantes; S eja limpo. Um momento importante é a arrumação do espaço para que de fato seja estimulador e mostre desde a chegada do jovem que a atividade será algo diferente do que ele está acostumado. Neste sentido, é necessário: Arrumar as cadeiras em roda – Quando sentamos em roda nos sentimos iguais, rompemos com a hierarquia. Todos podem ver a todos. A ideia do encontro é fortalecer o sentimento dos jovens enquanto parceiros da ação, estimulando sua participação ativa em todos os momentos do encontro. Criar o ambiente das rodas de leitura – As rodas ocorrem em locais onde as crianças e jovens sentam sobre emborrachados ou lençóis velhos coloridos com almofadas ou pufes. Para baratear este custo, podem ser solicitados a professores, funcionários e alunos alguns lençóis velhos que po- 26 Projeto Comunidade Educadora dem ser enfeitados com remendos de tecidos coloridos retirados de roupas usadas ou retalhos de chita. Os pufes podem ser feitos de garrafa pet conforme orientado nos anexos. Tornar o livro o principal objeto do espaço – Se o encontro possui entre seus objetivos motivar os jovens para o prazer da leitura é fundamental que o livro esteja destacado em todos os momentos e locais do encontro. Para isso, deve se espalhar livros por todos os espaços disponíveis. Sobre o parapeito das janelas, em cestas pelo chão, cantos de salas e nos banheiros, amarrados com barbantes em galhos de árvores, em estantes improvisadas com mesas e cadeiras, tijolos e madeiras, ou outras formas possíveis e criativas. Utilizar o texto literário no processo de acolhida - Espalhar cartazes e painéis com trechos de livros, versos de poesia e frases de saudação e acolhida aos jovens no encontro. Pequenos versos e poemas podem ser postos em teias feitas com barbante e colocadas em locais onde os jovens irão passar. Todas estas ideias podem ser modificadas conforme a realidade e as condições do espaço físico que o grupo terá para realizar a atividade. Dependendo da localização da escola é importante também trazer elementos da realidade cultural e histórica da comunidade. No caso do projeto Comunidade Educadora, que entre seus eixos está a educação ambiental, um pressuposto importante é a promoção de um encontro comprometido com a redução de lixo e a reutilização de materiais. Neste sentido, evitar copos descartáveis, utilizar papel rascunho, o verso de cartazes já utilizados, além de garantir lixeiras em todos os espaços é sempre desejável. Caso na comunidade tenha coleta seletiva ou catadores também é bom garantir, ao término do encontro, a separação seletiva dos materiais utilizados. Horário 4.4. A pauta do encontro Aqui apresentamos uma proposta de encontro de formação de dois dias inteiros geralmente realizados em um final de semana começando às 08h: 30min e indo até às 18horas. Este formato pode ser mudado e adaptado às condições de cada grupo e realidade institucional. Abaixo segue um modelo de pauta. Ao clicar em cada item da pauta, há um detalhamento sobre sua realização. Atividade 08:30 Café da manhã e credenciamento 09:00 Dinâmica de apresentação dos participantes 10:00 Apresentação dos objetivos do encontro 10:15 Apresentação: A História da Escrita 10:35 Atividade: “Escultura no biscoito” 11:00 Atividade: “A prova” 11:50 Dinâmica de descontração 12:00 Almoço 13:00 Dinâmica de descontração 13:15 Atividade: “A escola dos sonhos” 13:35 Mediação: Escola de Vidro, de Ruth Rocha 13:40 Roda de conversa: Na atividade “A Prova” nos sentimos dentro do vidro ? Em quais outras situações nos sentimos dentro do vidro na escola ? Como podemos fazer para sair do vidro ? A leitura nos ajuda a sair do vidro ? De que maneira ? 14:20 Atividade: Canto da música “Estudo Errado”, Gabriel Pensador 14:25 Apresentação: A realidade da leitura no Brasil e na comunidade 15:25 Mediação: O que os olhos não veem, de Ruth Rocha Roda de conversa: Quais as razões para as pessoas lerem tão pouco no Brasil ? Quais espaços de leitura temos em nossa comunidade ? É fácil o acesso ao livro em nossa comunidade ? Como é o acesso ao livro em nossas escolas ? O que poderia ser feito para que a leitura fosse mais valorizada em nossa comunidade ? 16:10 Atividade: “Remédios para os problemas da leitura na comunidade” 16:30 Lanche 16:45 Apresentação dos grupos com os cartazes dos remédios 17:15 Sarau 17:45 Encerramento com breve avaliação do dia Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 27 Horário Atividade 08:30 Café e acolhida 09:00 Dinâmica de acolhida 09:40 Roda de leitura 10:20 Declamação 10:25 Contação de histórias 10:30 Roda de conversa: O que acharam da roda de leitura ? Que diferentes práticas de leitura assistimos aqui ? Qual a diferença da mediação para a contação de histórias ? A mediação contribui para incentivar a leitura ? Por quê ? Como foi a roda de leitura ? Como estava organizado o espaço da roda ? Como foi que o mediador agiu ? 11:10 Apresentação: O passo a passo da roda de leitura 11:30 Apresentação: Como escolher acervo para roda 11:45 Apresentação: A organização do espaço para roda de leitura 12:00 Apresentação: A postura do mediador na roda 12:30 Almoço 13:30 Atividade: “Caça ao Tesouro” 13:50 Atividade: “Organizando rodas de leitura” 14:05 Início das rodas 15:05 Roda de conversa: Algum grupo teve dificuldade na realização das rodas ? Qual dificuldade ? Como se sentiu quem realizou a mediação ? Como foi a reação do público com as mediações escolhidas ? Teve alguma mediação que não cativou tanto a atenção do público ? Por quê ? O que destacamos que é muito importante não esquecer quando realizamos uma roda de leitura ? 16:35 Lanche 16:50 Dinâmica de entretenimento 17:00 Atividade: Mímica sobre o texto: Mil Desculpas para não ler 17:10 Apresentação grupos 17:30 Mediação de encerramento: cambaxirra 17:35 Entrega de símbolo do mediador e Próximos passos 17:50 Avaliação do Encontro 18:00 Encerramento 4.5. Detalhamento das ações Café da manhã, lanche e almoço – Os momentos de alimentação são importantes para descontração e entrosamento do grupo. Caso a escola consiga realizar a compra dos alimentos, é possível solicitar o apoio de alguns responsáveis como voluntários para preparar a comida e o lanche dos jo- 28 Projeto Comunidade Educadora vens. A escola pode também negociar com alguma merendeira. Mas, se não for possível ter alimentação, os horários das atividades deverão ser revistos. A duração do almoço, por exemplo, deverá ser maior para que os jovens possam ir em casa e retornar. Entretanto, ao optar por não ter alimentação no espaço, corre-se o risco de gerar uma desmobilização em es- pecial na hora do almoço, tanto pelo atraso dos jovens ao retornar de casa quanto pelo não retorno de alguns. Nossa experiência demonstra que os jovens, ao serem recebidos com um café da manhã, percebem uma valorização do seu bem-estar e a atividade passa a ser diferente das que estão acostumados causando assim um bom efeito de acolhida e de expectativa sobre o encontro. Credenciamento – Momento em que os jovens assinam a lista de presença e recebem o material do encontro. Neste material pode estar um crachá que facilitará a memorização dos nomes e uma apostila com os textos que serão utilizados no decorrer dos dois dias. Uma dica é preparar o crachá com papéis rascunhos e barbante. Cada jovem pode decorá-lo com ca- netas coloridas. No verso pode ainda constar uma poesia a ser lida pelo jovem em algum momento do encontro. Dinâmicas de acolhida e entretenimento – As dinâmicas podem fortalecer de forma lúdica o entrosamento do grupo. Possuem o papel importante de tornar o encontro mais leve e dinâmico. Existem várias possibilidades que podem ser escolhidas pelo grupo. Nos anexos, sugerimos algumas. Apresentação dos objetivos do encontro – Esta apresentação pode ser feita em transparência, power point ou utilizando um cartaz. No início do capítulo 5 estão listados os objetivos sugeridos para o encontro de formação. Cada equipe pode rever os objetivos e adequá-los à sua realidade e formato de encontro. O importante é que, des- Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 29 de o início, os jovens se acostumem a compreender a razão de estar ali e onde se deseja chegar com a atividade. Apresentações – Todas as apresentações são expositivas com base nos conteúdos listados e detalhados nos capítulos da sistematização. Para cada apresentação, uma pessoa responsável pode preparar-se previamente lendo o material da sistematização e/ou pesquisando outras fontes. A forma da exposição pode ser em power point, transparência, cartazes ou tarjetas de cartolina. Sugerimos sempre que haja algum material visual destacando os principais pontos da exposição para melhor fixação dos conceitos expostos. Uma forma interessante para quem não dispõe de equipamentos como o 30 Projeto Comunidade Educadora retroprojetor ou datashow é o uso de tarjetas. São retângulos grandes de cartolina nos quais se pode anotar os principais itens da exposição. As tarjetas podem ser fixadas em uma parede ou quadro, com fita adesiva, à medida que o expositor for falando. Assim, a fala fica mais dinâmica e não cansativa. De qualquer forma, a escolha de cada expositor determina a forma mais segura de apresentar-se. Lembramos sempre que tal apresentação deve ser a mais dinâmica e participativa possível. Uma dica é colocar algumas perguntas no meio da exposição, preferencialmente relacionando o conteúdo ao contexto dos jovens. O sentido das apresentações é a sensibilização e orientação do grupo e não uma aula densa cheia de con- teúdos. Por isso, sugerimos que as apresentações tenham o tempo médio ideal de 15 minutos chegando, no máximo, a 20 minutos. Atividades – As atividades sugeridas estão relacionadas nos anexos. São práticas que podem ser realizadas pelos jovens, geralmente utilizando desenho, pintura, representações teatrais dentre outras técnicas com o objetivo de facilitar a compreensão e, principalmente, relacionar o conteúdo ao cotidiano dos participantes e da comunidade. Em grande parte são realizadas coletivamente. Para isso, recomendamos que a equipe opte pela melhor forma para esta divisão. Pode se utilizar alguma dinâmica ou sistema de cores ou o tradicional 1,2,3, no qual cada número corresponde a um grupo. Sugerimos diversificar para cada atividade a distribuição dos jovens pelos grupos para promover o entrosamento. Caso algum jovem se mantenha muito resistente em participar de um grupo no qual seu amigo não esteja, sugerimos não insistir pela separação, principalmente nas primeiras atividades, pois isto poderá servir para afastá-lo e criar uma possível desmotivação. Com o decorrer do encontro, a resistência tende a diminuir. Uma recomendação é que se observe a duração das tarefas para não correr-se o risco de ultrapassar o tempo uma vez que são atividades agradáveis e muito envolventes. Para isso, o cronometrista do encontro terá um papel muito importante. Rodas de conversa – Constituem o momento de partilha cuja fala do jovem é a privilegiada. Podem ocorrer logo após alguma apresentação ou conjunto de atividades visando frisar algum conteúdo e principalmente verificar como os jovens compreenderam a informação e a relacionam com o seu cotidiano. É também o momento sugerido para que o próprio jovem partilhe com o grupo suas ideias sobre determinados assuntos. As perguntas servem como roteiro para o responsável na condução da conversa, mas podem e devem ser modificadas conforme a necessidade. Vale aqui tomar cuidado com os que falam demais e com os que falam de menos ou quase nada. A habilidade do responsável promove estímulo à participação de todos sem reprimir a fala de ninguém. Uma dica importante, dada pela Professora Claudia Maria Monteiro de Freitas, é quando percebemos que um jovem está se excedendo na fala, gentilmente nos aproximamos dele e com um leve toque em seu braço ou cabeça, com um gesto de carinho, cortamos sua fala de forma sutil reiterando algo que ele disse e imediatamente perguntando para outro jovem mais calado se ele concorda com o que o outro disse ou se ele já vivenciou algo semelhante também. É importante frisar que nossa experiência aponta esta situação como um dos momentos mais importantes do encontro quando o jovem se manifesta e fala sobre o quanto aquele conteúdo faz sentido para ele. Mediações – É o momento em que os jovens muitas vezes percebem na prática como deve ser feita uma mediação. Podem observar a postura do mediador, seus gestos, a entonação da voz, a forma de mostrar as gravuras, a posição de segurar o livro e tudo mais. Na proposta de pauta, sugerimos mediações que se relacionam com os conteúdos das apresentações e atividades. A última mediação, do livro “Ah, Cambaxirra, Se Eu Pudesse”, de Ana Maria Machado, é indicada para fechar o encontro pois trata justamente da perseverança em atingir um objetivo. Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 31 Esta e as outras sugestões de mediações estão na listagem de acervo de livros apresentada nos anexos. É critério da equipe seguir as sugestões ou escolher outras obras que já componham seus acervos e sejam adequadas aos momentos da formação. Sarau – É o momento de partilhar, com diferentes linguagens, a riqueza literária. Pode ocorrer em outra sala com uma decoração temática toda especial. Emborrachados ou lençóis e almofadas pelo chão. Bexigas de gás, fotos de autores, trechos de música, versos e prosas em cartazes pelas paredes. O grupo pode ainda escolher um tema para o sarau conforme o perfil dos jovens. Um Sarau romântico, por exemplo, espalhando corações pela sala com um fundo musical romântico com o grupo partilhando, entre si, poesias românticas e trechos de livros de romance. No Sarau, os jovens são convidados a ler em voz alta os versos que estão espalhados pela sala em cartazes ou em pequenos papéis pendurados no teto com barbantes. Caso alguém seja autor de poesias ou de músicas, pode ser convidado a apresentar. É sempre bom ter um violão no momento, para o caso de algum dos jovens saber tocar e desejar apresentar algo. É possível também apenas ler as letras de músicas românticas. Da mesma forma, pode se organizar um Sarau de Terror com velas espalhadas pela sala e a leitura de contos horripilantes ou outros temas que o grupo considere interessante e mobilizador. Encerramento e avaliação do primeiro dia – Geralmente, este é um momento rápido, pela aproximação do término do primeiro dia do encontro. É bom não atrasar o retorno respeitando o horário combinado com os responsáveis. Sugerimos que sejam dados al- 32 Projeto Comunidade Educadora guns informes curtos como relembrar o horário de início da atividade no dia seguinte e uma breve avaliação do dia que pode ser feita pedindo que cada um o sintetize em uma única palavra. Outra opção é colocar três cartazes na saída com várias canetas em um pote. Em um dos cartazes haverá o desenho de uma carinha sorridente, em outro uma triste e no terceiro uma com uma lâmpada sobre a cabeça. De acordo com cada carinha, o jovem escreve nos cartazes algo que o(a) deixou feliz no dia, algo que não gostou ou uma sugestão para o segundo dia. Roda de Leitura, declamação e contação de histórias – O objetivo desta sequência é permitir aos jovens compreender as diferentes práticas de leitura. Na roda, irão vivenciar as mediações feitas com livros, já na declamação ouvirão um poema falado com intensidade e na contação de histórias um texto decorado sem a utilização do livro. É importante frisar que para o projeto Comunidade Educadora todas estas práticas são importantes. Entretanto, optamos por enfatizar e focar na mediação tanto por ser a prática mais fácil para o jovem aprender quanto por considerarmos a mais indicada para incentivar a leitura já que utiliza o tempo inteiro o objeto livro na mão do leitor. Entrega de símbolo do mediador – Após todo o encontro, pode-se perguntar aos participantes se realmente confirmam o desejo de se tornarem Mediadores de Leitura. Com base neste compromisso firmado, sugerimos um rito de passagem com a entrega de algo que fortaleça no(a) jovem o sentimento de que se tornou um Mediador de Leitura. Pode ser a entrega de uma camiseta com o título de Mediador de Leitura ou um crachá ou algum outro tipo de vestimenta que proporcione um destaque para o jovem durante sua atuação e que também o identifique na escola. Além disso, pode ser entregue um certificado de participação, o que, para a família do jovem, geralmente é muito valorizado. Próximos passos – Neste momento sugerimos o consenso de alguns acordos com os jovens. O primeiro é sobre a disponibilidade deles para atuar nas rodas e o agendamento do início das atividades. O profissional referência poderá agendar na escola as rodas com a equipe pedagógica e demais professores. Outro acordo é com que regularidade o grupo continuará a se encontrar para avaliar como está o andamento das rodas conforme orientado no capítulo 10. Avaliação do encontro – É importante desenvolver nos jovens o sen- so crítico sobre o que está sendo oferecido para eles. O momento da avaliação tanto vale para levantar o que precisamos melhorar em outros encontros quanto para desenvolver este senso nos jovens que comumente não são estimulados a avaliar as ações das quais participam. Na própria escola são raros os momentos em que o jovem é convidado a avaliar a prática escolar. Sempre ele é o avaliado. Neste sentido, falamos da importância em se criar uma cultura de avaliação. Isto contribui para constituição de cidadãos mais críticos que cobram seus direitos. Para a avaliação do encontro sugerimos uma roda de conversa, na qual os jovens possam se manifestar de forma aberta ou o preenchimento de uma ficha de avaliação, cujo modelo está nos anexos. Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 33 CAPÍTULO 5 A técnica da mediação Entre as diferentes práticas de leitura existentes, o projeto Comunidade Educadora optou pela técnica da mediação por dois motivos. Primeiro por ser uma técnica simples que qualquer pessoa que saiba ler pode dominar rapidamente. Segundo por destacar o papel do livro contribuindo de forma mais efetiva para o objetivo de incentivar a leitura literária. Neste sentido, a mediação permite: Q ue jovens pobres, de baixa escolaridade e que dominam a leitura possam atuar dentro de suas comunidades sem grandes requintes técnicos; Q ue a formação dos jovens seja simples, de baixo custo e prática de ser realizada; Q ue a formação possa, com o passar do tempo, ser realizada pelo próprio jovem mediador que passa a atuar como multiplicador; Q ue o incentivo à leitura seja real e contagiante. A técnica da mediação é simples e consiste na leitura em voz alta de um livro para outra pessoa ou para um conjunto de pessoas. Enquanto técnica para roda de leitura possui alguns procedimentos a serem observados e que veremos a seguir. 34 Projeto Comunidade Educadora 5.1. A voz Ao lermos para outras pessoas, devemos ter o cuidado de usar um tom que todos possam escutar. Isto não significa gritar, pois uma fala muito alta retira do texto todas as nuances e emoções que possui. Fora que agredirá suas cordas vocais e, em breve, o mediador estará rouco e com problemas na garganta. Por isso, se o público da roda for muito numeroso é sempre bom contar com vários mediadores que podem se espalhar e realizar pequenas rodas simultâneas. Uma dica importante é o cuidado com a garganta, dentre os quais evitar o fumo e bebidas excessivamente geladas, além de beber bastante água, em especial antes da mediação. Outra dica são os exercícios de voz que podem ser feitos pelo grupo alguns minutos antes da roda tanto para ajudar a aquecer a fala quanto para não “tropeçar” nas palavras. Um deles é repetir em voz alta o BLA, BLE, BLI, BLO, BLU e o TRA, TRE, TRI, TRO, TRU várias vezes. Outro é passar a língua por dentro da boca forçando seus beiços em movimentos de círculo. Além disso, fazer várias caretas com os lábios e mexendo a boca. Pode parecer para os outros uma cena cômica, mas tudo isso ajudará a soltar melhor a voz e a articular melhor as palavras. 5.2. A leitura 5.3. O livro Sabemos que, pela falta de hábito, muita gente tem dificuldade de ler, principalmente em voz alta. Mas, nada disso impede que uma pessoa se torne mediadora. Com o passar do tempo e com o treino qualquer pessoa poderá se desenvolver e perceber sua própria mudança. Como dicas a serem observadas estão: Nunca podemos esquecer que o principal ator na mediação é o livro. Ele é o objeto das atenções. Por isso, deve estar sempre na mão do mediador, mesmo quando este já decorou toda a história. Suas páginas devem ser passadas à medida que a história for avançando e todas as ilustrações devem ser mostradas para o público. As ilustrações são mostradas com o livro aberto. L er de forma pausada, com calma. Nunca ler correndo; P ronunciar bem cada palavra. Tomar o cuidado para não comer sílabas e letras, em especial o “s” do plural e o “r” das palavras no infinitivo; O bservar a pontuação das frases. Respeitar vírgulas e pontos, dando a entonação correta para as perguntas e frases com ponto de exclamação; T ransmitir, mas sem exageros, as emoções das falas. Alegria, tristeza, raiva, medo, entre outras. Uma boa leitura é fruto de treino. Por isso, é fundamental que os mediadores se preparem bem antes da roda. Peguem os livros que serão mediados com antecedência e treinem em casa. Leiam para si mesmos de frente para o espelho. E se ainda assim, na hora bater aquele nervosismo e tropeçarem em algumas palavras, não ter medo: respirar fundo e retomar a leitura. 5.4. A posição na roda e o olhar O livro está na altura dos olhos delas. Especialmente se tratando de crianças pequenas a curiosidade sobre as ilustrações é sempre muito grande. É importante permitir que elas vejam. “Quando mediamos para crianças de creche sempre tem aquela pequenininha que vem se sentar em nosso colo para ver melhor as ilustrações e estar mais perto do livro. Neste momento, devemos ter muita habilidade para não afastar a criança e, ao mesmo tempo, não atrapalhar que as outras ouçam a mediação e vejam o livro também. O jeitinho e o carinho são fundamentais nesta hora.” Comenta Kenner Vieira, monitora de leitura do projeto Comunidade Educadora. Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 35 O mediador deve sempre estar em uma posição em que todas as crianças possam vê-lo, ouvi-lo e ver as ilustrações que serão mostradas. Por isso, estar sentado na roda é importante para que nenhuma criança tenha que ficar com o pescoço duro de tanto olhar para cima. Outro ponto é não ficar o tempo inteiro de cabeça baixa durante a mediação, apenas olhando para o livro. É importante que o olhar se divida entre o livro e as crianças, procurando sempre um olhar para se fixar. Este gesto cria conexões entre mediador e público e segura mais a atenção da criança. Como o mediador atua sentado na roda, junto com as crianças, é bom tomar cuidado com a roupa que será utilizada. Saias muito curtas acabarão deixando a mediadora desconfortável e com movimentos limitados. Oura dica é não utilizar brincos grandes e chamativos. As crianças muito pequenas, especialmente as de creche, costumam ficar atraídas e se estiverem próximo de você podem querer pegar no brinco para brincar e te machucar sem querer. 5.5. A paciência É comum também que, durante a roda, as crianças interrompam várias vezes a leitura com perguntas, comentários ou até mesmo se levantando porque perdeu o interesse na história. O mediador, neste momento, deverá ter muita calma e não tomar nenhuma atitude brusca que intimide a criança e a faça se desinteressar em continuar na roda. Uma dica é responder as perguntas com outra que traga a criança de volta para a mediação como “Será ? Vamos ver o que acontece na história ?” ou “Que situação que este personagem se meteu, né? Vamos ver como ele se safa disso ?”, entre outras. A postura do mediador segundo os jovens do Projeto Comunidade Educadora Ser um bom ouvinte Ser paciente, gentil, educado e generoso Usar roupas adequadas para mediar. Evite saias curtas Ter disposição para o trabalho voluntário Ter compromisso com o seu crescimento pessoal Gostar do que faz Ter prazer em ler 36 Projeto Comunidade Educadora Ser responsável e pontual Estar disposto a enfrentar obstáculos e superar as dificuldades que surgirem Ter autoavaliação Enfatizar a interpretação do texto Treinar a boa pronúncia lendo o texto antes Impostar a voz quando necessário Ter entusiasmo Não reforçar posturas preconceituosas Interagir com o público Ter coragem Manter o foco no grupo Associar discurso com a prática Conhecer o acervo Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 37 CAPÍTULO 6 O passo a passo da roda 6.1. A arrumação do espaço O primeiro passo da roda é a arrumação do espaço. Para isso, os jovens mediadores deverão chegar com antecedência à escola para pegar os materiais necessários além dos livros que serão utilizados. Um ponto importante é que o local escolhido seja espaçoso, o mais silencioso possível, iluminado, arejado e limpo. O espaço da roda deve ser arrumado com o que a escola tiver disponível para criar um ambiente agradável para leitura. Para facilitar a movimentação das crianças e sua interação com os livros, a roda ocorre com os participantes sentados no chão forrado com lençóis velhos, emborrachados ou esteiras ou outro tipo de cobertura que seja fácil de limpar e não acumule muita poeira. Como muitas crianças são alérgicas, não recomendamos carpetes ou tapetes felpudos. Sobre a cobertura são dispostas almofadas para dar um pouco mais de conforto ao sentar no chão. Também podem ser utilizados travesseiros velhos cobertos com tecido de chita ou retalhos de pano colorido. Além das almofadas, também serão espalhados livros de literatura para que as crianças além de ouvirem as histórias mediadas também peguem em livros e escolham suas leituras. 38 Projeto Comunidade Educadora Uma dica importante no caso de crianças pequenas é espalhar os livros apenas quando terminarem as mediações, pois a ansiedade delas é tão grande que os livros conseguem dispersá-las tirando-lhes a atenção da mediação. Veja a seguir uma foto com um espaço de roda arrumado com emborrachados, almofadas e livros: Um cuidado importante é que os mediadores cheguem ao espaço com, pelo menos, 30 minutos de antecedência para pegar os materiais (junto ao responsável da escola) e arrumar o local. Muitas vezes, devido ao acúmulo de ações dentro da escola, o processo de encontrar o profissional, este pegar as chaves de onde se encontra guardado o material e conseguir pegar o material é mais demorado do que se imagina. Outra razão para se chegar com antecedência é que muitas vezes o local da roda (que pode ser uma sala de aula ou um canto do pátio) está com algum material como carteiras e mesas ou está sujo. O ideal é que o profissional referência, já sabendo do calendário de rodas, garanta antes da chegada dos jovens que tanto o material quanto a limpeza do espaço esteja garantida. 6.2. A acolhida Arrumado o espaço, o próximo passo é acolher os estudantes que serão levados pelos seus professores para o local da roda. Esta acolhida ocorre com os mediadores saudando quem chega e solicitando que sentem junto às almofadas. É importante que cada criança, adolescente ou jovem que chegue à roda seja recebido de forma que se sinta especial. Na acolhida também devem estar presente o olhar, o sorriso e o gesto de carinho. Para se sentirem mais à vontade, aqueles que desejarem podem tirar os calçados. Além de facilitar o relaxamento do grupo ainda ajuda a não sujar muito o material utilizado para forrar o chão. Entretanto, não pode ser uma obrigação, especialmente com adolescentes e jovens que podem se sentir intimidados seja por estarem com uma meia furada ou por causa do suor dos pés – comum na adolescência – que poderá trazer o famoso “chulé” para roda, po- dendo causar mais estragos do que um emborrachado ou lençol sujo. Estando todos sentados, o grupo de mediadores se apresenta falando seus nomes e escolas onde estudam. “Muitas crianças quando nos veem com a camisa de mediador pensam que somos professores. Quando nos apresentamos, fica claro que somos estudantes como eles e que moramos na mesma comunidade.” Conta Dariel Rego, 17 anos, aluno do 3° ano do ensino médio e há três anos atuando como mediador de leitura. 6.3. As mediações Após a acolhida, os jovens sentam junto aos estudantes e anunciam que, a partir daquele momento, querem muita atenção deles para as histórias que serão contadas. Então, conforme combinado, cada mediador inicia a sua leitura. Ao tér- Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 39 mino de cada mediação é possível uma conversa rápida para estimular a participação das crianças perguntando se elas gostaram ou não da história, sobre o que elas fariam caso estivessem na pele de algum dos personagens, se alguma já viveu situações como a da história. Mas, muito cuidado. Nunca faça perguntas de interpretação do texto de modo que a criança ache que está sendo testada ou participando de uma prova. Isto apenas tem sentido se for uma conversa rápida, informal e descontraída sobre o texto e que valorize toda e qualquer forma criativa da criança perceber o texto. Lembre-se de que, para um tempo médio de 40 minutos de roda de leitura, recomendamos até 4 mediações. 6.4. O convite à leitura Ao termino das mediações, a equipe convida o grupo a olhar e folhear os livros que começam a ser espalhados no espaço da roda. Neste momento, os mediadores circulam pelo espaço observando as crianças que estão mais deslocadas e lhes oferecem livros ou se oferecem para ler alguma história para elas. Caso as crianças saibam ler, o mediador pode perguntar se alguma gostaria de ler uma história para o grupo ou apenas para ele. É um momento livre, descontraído, no qual as crianças criam sua relação com os livros espalhados, seja escolhendo um para ler, seja ouvindo a leitura de um colega ou seja apenas folheando o livro para olhar as ilustrações. Um ponto importante ao começar a espalhar os livros pelo espaço é chamar a atenção das crianças para o cuidado que devemos ter 40 Projeto Comunidade Educadora com o livro ao manuseá-lo para que ele não seja rasgado ou amassado. Dessa forma, todos irão contribuir para que aquele livro continue levando boas histórias para muitas e muitas outras crianças. 6.5. A despedida e o estímulo ao empréstimo de livros Faltando alguns minutos para encerrar a roda, os mediadores devem fazer sua despedida perguntando para as crianças se gostaram da roda e se gostariam de participar outras vezes. Caso já saibam de outras rodas programadas, os mediadores podem avisar as crianças que em determinado dia eles irão se reencontrar para uma nova roda com novas histórias legais. Um ponto fundamental neste momento é comunicar para as crianças os locais onde elas ou seus responsáveis poderão pegar livros emprestados para que em casa também possam saborear as histórias. Para isso, a equipe deve já ter de antemão todas as informações dos locais com seus horários de funcionamento. 6.6. Avaliação conjunta e registro Com a saída das crianças, levadas pela professora ou professor, os jovens mediadores deverão rearrumar o espaço para a próxima turma e rapidamente preencherem uma ficha de registro da roda (cujo modelo está nos anexos) que será entregue ao profissional referência da escola. Na ficha, o grupo relata os principais acontecimentos da roda e avaliam sua execução. capítulo 7 O acervo para rodas e empréstimos Ter um acervo mínimo com livros de literatura é condição para a realização das rodas de leitura. Caso a escola tenha biblioteca, será mais fácil atender esta condição. Entretanto, considerando que grande parte das escolas não possui biblioteca, é necessário verificar que tipo de acervo a escola dispõe e, se não possui, onde os livros para as rodas poderão ser adquiridos. Muitas vezes a escola possui guardados em algum armário livros de literatura que foram enviados pelas secretarias municipal e estadual de educação ou diretamente do MEC, mas como não possui biblioteca ou sala de leitura acabam esquecidos sem chegar ao conhecimento do professor. É preciso verificar com a direção a existência ou não destes livros. Um caminho é identificar na comunidade locais onde é possível pegar livros emprestados, seja a biblioteca de outra escola ou uma biblioteca comunitária. Também é possível solicitar a compra de acervo para a Secretaria Municipal de Educação que tem como responsabilidade garantir a aquisição de livros para as unidades escolares. Neste caso, o envolvimento da direção da escola é fundamental. Outra ação proveitosa é a organização de uma campanha de doação de livros de literatura para escola mobilizando não apenas alunos e responsáveis, mas os próprios professores e funcionários da unidade, comércio, associação de moradores e outros atores comunitários. Também é possível solicitar doações, através de ofício às bibliotecas maiores, além de realizar bingos, rifas e outras estratégias de levantamento de recursos para aquisição de acervo. 7.1. Mapeando o acervo disponível para rodas Definido o acervo disponível para as rodas, outro passo é promover a integração dos jovens mediadores com o acervo, organizando o mapeamento dos livros. Esta ação poderá ser realizada de forma participativa em uma reunião envolvendo o profissional referência, o profissional do espaço de leitura (biblioteca e sala de leitura, caso tenha) e os jovens que participarão das rodas. Este encontro é um ótimo momento para que os jovens mediadores comecem a se relacionar com os livros, folheando, olhando as gravuras e capas, iniciando um contato cada vez mais íntimo com as obras literárias. O grupo deverá fazer uma relação dos livros que podem ser Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 41 utilizados nas rodas. Neste caso, deve se observar livros de literatura que: P ossam ser lidos em mediações de curta duração; S ejam ricos em ilustrações que atraiam a atenção e interesse dos leitores, em especial as crianças menores; T enham histórias que se relacionem de forma interessante e criativa com o cotidiano das crianças e dos jovens da comunidade; A mpliem o universo cultural das crianças e jovens, com histórias de outros povos, outros países e continentes, outras culturas e costumes; V alorizem a memória da comunidade com histórias locais; A presentem uma variedade de estilos e formas narrativas, tais como romances, contos, poesias, prosas, entre outros. É importante frisar que para a roda é necessário separar livros tanto para serem mediados pelos jovens quanto para ficarem à disposição das crianças que podem manusear, folhear e fazer sua própria leitura. rão mediados para que possam treinar a leitura. Para isso é necessário alguns acordos com o responsável pelo acervo. Deve ser combinado o dia, a hora e onde pegar os livros. Se na escola existe uma biblioteca ou sala de leitura, isto se torna mais fácil. Mas se não houver, o jovem deverá acertar previamente com o profissional em qual local da escola os livros ficarão guardados e quem será o responsável por eles. É importante deixar claro aqui o grau de responsabilidade do profissional da escola que será o responsável pelo acervo. Como as rodas ocorrem com turmas que possuem horários específicos, o atraso ou a não entrega do acervo por algum motivo comprometerá não apenas a implantação da roda, mas todo o planejamento feito com os professores. Caso a escola tenha biblioteca, este também é o momento para os jovens mediadores conhecerem como funciona a dinâmica da biblioteca. Quais livros podem ser emprestados, para quem, se apenas para alunos ou também para comunidade, como é o processo de empréstimo, se é necessário um documento para cadastro ou não, além dos horários de funcionamento da biblioteca. Estas e outras informações importantes deverão ser repassadas pelos jovens no momento das rodas para incentivar os alunos e alunas a frequentar a biblioteca e realizar empréstimos. 7.2. Combinar o acesso aos livros para as rodas Os jovens mediadores não podem deixar para pegar os livros somente momentos antes do início das rodas. É importante que selecionem com antecedência os livros, em especial os que se- 42 Projeto Comunidade Educadora 7.3. O medo dos livros serem rasgados ou roubados É comum ouvir de alguns profissionais o temor com relação ao cuidado com os livros. O medo é de que sejam rasgados e até mesmo roubados. Com certeza isto irá acontecer, mas de forma nenhuma será algo frequente e com tanta intensidade que justifique dificultar o acesso da criança ao livro. O contato da criança com o livro, o folhear é fundamental para que ela crie uma relação de cuidado e de estímulo para leitura. “Quando percebemos que uma criança está maltratando o livro ou disputando o livro com outra a ponto de rasgálo, nos aproximamos com carinho e conversamos sobre como o livro é frágil e precisa de cuidado para continuar nos brindando com suas belas histórias. Se houver alguma disputa, oferecemos outros livros que sejam tão interessantes quanto aqueles. Por isso é importante que o mediador conheça bem o acervo”. Kenner Vieira, monitora de leitura do projeto Comunidade Educadora. Muitas crianças vivenciarão na roda momentos dos quais não estão acostumadas em suas casas e escola. Estarão desenvolvendo com o livro uma relação que não tinham antes. Por isso, a paciência pedagógica que Paulo Freire nos ensina é fundamental para que não tomemos uma atitude que ao invés de incentivar uma postura leitora na criança, a afaste de vez dos livros. Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 43 CAPÍTULO 8 O calendário e o planejamento das rodas Logo após o Encontro de Formação de Mediadores, é importante montar o calendário de rodas dentro da escola. Para isso, o profissional referência deverá estar articulado com a coordenação pedagógica da escola e também com os demais professores. Dependendo do número de mediadores formados e interessados em atuar (pode ocorrer que após o encontro alguns jovens decidam que não desejam ser mediadores), o profissional negociará com o grupo e com a escola quantas rodas poderão ocorrer e com qual frequência na escola. Mediadores Roberta e Sandro Mauro e Jaqueline segunda hora turma 8:00 hora turma quarta hora turma 201 9:00 304 10:00 305 quinta hora turma 9:00 202 10:00 203 14:00 602 14:00 702 15:00 603 15:00 703 16:00 704 Josiane, Roberta e Sandra 44 terça Pode ser que no grupo de jovens tenham dois ou mais que possam realizar uma roda por semana, outros poderão apenas de quinze em quinze dias ou terão aqueles que podem mais de uma vez por semana. Mapeada esta disponibilidade dos jovens, o profissional combinará com a escola quais turmas poderão, durante a semana, participar das rodas organizadas pelos alunos. A seguir um quadro que serve de exemplo como calendário de rodas. Projeto Comunidade Educadora 8:00 101 9:00 102 10:00 103 sexta hora turma 8.1. Quantidade ideal de participantes por roda O número ideal de crianças em uma roda fica em uma média de 15 a 20 participantes. No Projeto Comunidade Educadora, os jovens mediadores já realizaram rodas com mais de 30 crianças, mas o esforço para o grupo é muito grande e, neste caso, é bom que haja mais do que dois jovens mediadores por roda. Uma alternativa para as turmas muito grandes é combinar com o professor que a turma seja dividida em duas. Enquanto metade participa da roda, a outra metade assiste à aula e depois invertem-se as turmas. 8.2. O intervalo de tempo entre as rodas A roda dura o tempo médio de 40 minutos. Entretanto, é bom marcar as rodas com uma diferença de, pelo menos, 15 minutos de intervalo entre uma e outra para que os jovens possam rearrumar o espaço da roda, beber água, ir ao banheiro e fazer as anotações de registro da roda anteriormente realizada. Sobre este registro, conversaremos melhor no capítulo 9. 8.3. O planejamento da roda Com o calendário de rodas montado e as equipes de mediadores constituídas é necessário planejar cada roda. Para isso, a equipe de mediadores responsável deverá se reunir para: C onversar sobre o público de cada roda, verificando a faixa etária, escolaridade do grupo e quantidade de crianças em cada turma; E scolher as obras que serão mediadas por cada jovem, de acordo com a característica do público; V erificar onde estão guardados os lençóis, almofadas e livros que serão utilizados nas rodas e com quem pegar este material. É importante lembrar que em uma roda de 40 minutos são realizadas uma média de 2 a 4 mediações. Portanto, se forem dois jovens os responsáveis, cada um terá que escolher de uma a duas obras para serem mediadas. Outra observação importante é que além dos livros que serão mediados, a equipe deverá levar outros livros que serão espalhados no espaço da roda para que as crianças possam folhear e ler. Ao montar o calendário devemos tomar cuidado para não ocupar em excesso o tempo do jovem durante a semana. Ele também estuda e a participação nas rodas não pode prejudicar suas tarefas escolares e de casa. Pelo contrário, a ação nas rodas deve ajudá-lo a ter um melhor desempenho na escola, especialmente no seu desenvolvimento como leitor. Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 45 CAPÍTULO 9 A mobilização continuada dos mediadores Apesar da atuação nas rodas ser, de forma geral, cativante e estimuladora para os jovens, é importante que eles tenham um momento de parada para refletir sobre sua prática e se manterem mobilizados na ação. Duas ações são importantes para isso: os encontros de formação continuada e a atuação multiplicadora do jovem. 9.1. Os encontros de formação continuada Os objetivos destes encontros são: A valiar as rodas, refletir sobre dificuldades enfrentadas e acordar soluções; F ortalecer a integração do grupo; F ortalecer a formação dos jovens como mediadores. Os encontros devem ser combinados dentro da disponibilidade do grupo e podem ter regularidade quinzenal ou mensal. Mais do que isso, corre-se o risco de desmobilizar o grupo. Sugerimos encontros com duração média de três horas. A coordenação dos primeiros encon- 46 Projeto Comunidade Educadora tros pode ficar a cargo do profissional referência, mas sendo possível, os próprios jovens podem assumir esta coordenação a partir de uma divisão constante de tarefas. A seguir, sugerimos uma pauta para o encontro que pode ser modificada conforme a avaliação do grupo. 1. Início com a mediação de uma leitura escolhida por um dos jovens; 2. Partilha das dificuldades e alegrias vividas pelos mediadores com as últimas rodas; 3. Leitura de texto de livro, jornal, revista ou vídeo que trate de um tema relevante sobre a leitura ou outro tema relacionado à prática do jovem como mediador; 4. Avaliação do dia e divisão de tarefas para o próximo encontro; 5. Dinâmica de encerramento. É interessante que cada ponto de pauta fique sobre responsabilidade de um jovem diferente. Esta divisão de tarefas pode ocorrer sempre ao término de cada encontro já programando o próximo. O local do encontro preferencialmente pode ser a própria escola. Caso haja dificuldade para isso, os jovens podem utilizar um outro espaço da comunidade como uma associação de moradores ou até mesmo a própria casa de algum dos jovens. Dependendo da possibilidade do grupo, em alguns encontros podem ainda ocorrer: T roca de experiência com a vinda de outros grupos de mediadores; V isita a outra escola ou instituição para conhecer a prática deles de incentivo à leitura; C onvidar autores de livros que os jovens costumam ler para as crianças e autores existentes na comunidade; C onvidar outros profissionais que lidam com o texto literário: ilustradores, editores, diretores de teatro e tv, críticos literários, redatores, etc. o espírito do encontro sejam da juventude. Representa uma grande demarcação, estabelecendo uma diferença entre a prática do encontro e a prática de sala de aula. Os demais jovens sentem esta diferença e se sentem mais à vontade para interagir com os conteúdos e reflexões do encontro. A construção de laços entre os jovens na comunidade – Outro resultado motivador é a integração entre os jovens da comunidade que passam a constituir grupos de amigos. A convivência solidária na comunidade ainda faz com que uns passem a se preocupar cada vez mais eles com os outros. Fortalecimento de um discurso sobre a importância da ação protagônica do jovem na sociedade – Ao abrir espaço para que os jovens participem de forma ativa na comunidade, tanto conduzindo processos quanto tomando decisões, estimula-se, entre eles, uma reflexão crítica sobre o papel do jovem na sociedade. Além de fortalecer o espírito participativo do jovem, ainda é um passo importante para a formação de novas lideranças sociais. 9.2. A atuação multiplicadora do jovem Outra ação que fortalece a mobilização dos jovens é a participação deles na formação de outros mediadores. A prática multiplicadora do jovem com outro jovem revelou-se para o projeto capaz de produzir diferentes resultados dentre os quais: O incentivo e conquista de outros jovens para ingressarem no mundo da mediação – A participação dos jovens como formadores nos encontros de formação garante que a linguagem e Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 47 CAPÍTULO 10 Avaliação e monitoramento Todo processo que visa atingir determinados objetivos precisa ter um método de avaliação. Caso contrário, o grupo pode perder tempo com ações que não geram resultados e ainda abrir mãos de atividades importantes por não visualizar efeitos produzidos na comunidade. Considerando o excesso de ações de uma escola é importante ainda pensar um processo de avaliação que seja simples e que não requeira procedimentos muito complexos. A roda de conversa – A roda pode ocorrer ao final do encontro, antes do preenchimento da ficha. Neste momento, os jovens são convidados a falar espontaneamente sobre O que foi bom no encontro Consideramos que a avaliação deve focar em três situações específicas: A formação dos jovens como mediadores; A s rodas de leituras; O que poderia ter sido melhor O empréstimo de livros. 10.1. Avaliação do encontro de formação Como já adiantamos no capítulo 6, o encontro de formação pode ser avaliado utilizando duas técnicas: a roda de conversa e a ficha de avaliação. 48 Projeto Comunidade Educadora Outra alternativa, caso haja tempo, é dividir os jovens em três ou quatro grupos para, coletivamente, refletirem sobre as duas questões acima e realizarem uma apresentação com cartazes. A ficha de avaliação – Logo após a roda de conversa, os jovens são convidados a preencher a ficha de avaliação, cujo modelo encontra-se nos anexos. A ficha é simples e deve ser lida por um membro da equipe antes que todos a preencham para garantir que todas as questões sejam perfeitamente compreendidas. forme o grupo avaliar que facilitará a compreensão dos jovens. É importante que uma pessoa da equipe fique responsável pelas fichas que forem preenchidas para organizar e sistematizar a informação, preparando para o grupo algumas tabelas com as respostas. Informando, por exemplo, quais atividades do encontro foram mais bem aceitas, quais mais da metade do grupo fez uma avaliação ruim e que precisam ser modificadas, entre outras. Na ficha não é necessário que os jovens coloquem seus nomes para que se sintam à vontade para comentar o que quiserem. Está estruturada com questões que irão levantar a opinião dos jovens sobre o local e alimentação do encontro e sobre as atividades, dinâmicas e apresentações. 10.2. Acompanhamento e avaliação das rodas de leitura A ficha está com uma linguagem simples, mas pode ser modificada con- As rodas possuem como objetivo incentivar crianças, adolescentes e Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 49 jovens para a leitura. Neste sentido, precisam ser acompanhadas e avaliadas para verificar o quanto, de fato, estão contribuindo para este objetivo. Além do mais, é necessário ainda verificar como estão sendo organizadas já que sua condução está por conta de jovens voluntários que não são profissionais e que, pela primeira vez, estarão conduzindo uma atividade de grupo. Neste sentido sugerimos tanto o momento dos encontros de formação continuada conforme já descrevemos no capítulo anterior quanto o preenchimento da ficha de registro de roda que se encontra nos anexos. A ficha é de fácil e rápido preenchimento. Ela deverá ser preenchida ao final da roda de leitura coletivamente pelos mediadores. Na ficha os jovens irão descrever quem foi o público da roda (crianças, adolescentes, adultos, alunos de CA, creche, EJA, Classe Especial, etc); como foi a reação das crianças em relação às mediações (depoimentos com comentários interessantes, alegres, tristes, zangados, entre outros) e situações que dificultaram a mediação. Na ficha ainda há um quadro para serem relacionadas todas as obras lidas e se a leitura realizada estava planejada ou se foi feita para atender ao pedido de alguma criança. Esta ficha deve ser entregue ao profissional referência que deverá monitorar o acompanhamento das rodas e verificar se alguns problemas ocorrem sempre ou apenas em alguns casos. Cabe ao profissional, junto com os mediadores, refletir nos encontros de formação continuada a solução para as dificuldades enfrentadas e partilhar algumas observações interessantes registradas nas fichas. 50 Projeto Comunidade Educadora 10.3. O empréstimo de livros Dois indicadores importantes de que a roda está, de fato, incentivando a leitura são o aumento do número de empréstimos na escola e o aumento da visita à biblioteca. Para o caso das escolas que possuem biblioteca ou sala de leitura onde é possível realizar empréstimo de livros, apresentamos nos anexos um simples instrumento para contagem mensal dos empréstimos da escola. A idéia é avaliar se, a partir do início das rodas na unidade escolar, houve aumento ou não do número de empréstimos na biblioteca. Outra ação possível é uma entrevista com professores para verificar com eles se as crianças comentam a roda de leitura ou não. Os depoimentos podem ser utilizados pelo profissional referência para ilustrar o avanço do projeto na escola tanto na reunião com os jovens mediadores quanto nas reuniões pedagógicas da escola. É muito importante compreender que a avaliação permite identificar o que necessita ser aprimorado na prática da roda além dos avanços e resultados que devem ser divulgados para toda comunidade escolar como forma de motivar os jovens a continuar com a ação e de reiterar junto à direção da unidade e demais profissionais a importância do trabalho. capítulo 11 Quebrando escolas de vidro: Aprendizagens de uma comunidade educadora “Eu ia pra escola todos os dias de manhã e quando chegava, logo, logo, eu tinha que me meter no vidro. (...) Se você estava no primeiro ano ganhava um vidro de um tamanho. Se você fosse do segundo ano seu vidro era um pouquinho maior. E assim, os vidros iam crescendo à medida que você ia passando de ano. Se não passasse de ano era um horror. Você tinha que usar o mesmo vidro do ano passado. Coubesse ou não coubesse. Aliás nunca ninguém se preocupou em saber se a gente cabia nos vidros. E pra falar a verdade, ninguém cabia direito.” (Quando a escola é de vidro. In: Este admirável mundo Novo, Ruth Rocha. Editora Salamandra: 2003) L eitura, vida, caminho, aprendizagens.... Quantas palavras, quantos sentidos e quantas visões construímos e desenvolvemos a partir da leitura que nos permite romper fronteiras e quebrar muros ou até vidros que nos enclausuram. Na história de Ruth Rocha, Firuli é um aluno que provoca uma revolução na escola onde todas as crianças estudavam dentro de potes de vidro. Em dado momento, os potes são quebrados e quem não se mexia passa a se expandir, quem não falava direito passa a se expressar. Surge uma nova escola. Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 51 Surge um novo aluno e uma nova aluna. Nos encontros de formação de mediadores, após a leitura do texto de Ruth Rocha, é comum ouvir os jovens utilizarem a expressão “você está me colocando no vidro” para qualquer situação em que se sentissem reprimidos. Esta fala, que não fazia parte das intenções do encontro, é um indicador importante de como a leitura, independente da vontade do autor, pode contribuir na consolidação de entendimentos e visões de mundo que interferem nas posturas e práticas do leitor. Esta situação ilustra um conjunto de aprendizagens que, ao longo destes três anos, a experiência de Comunidade Educadora nos permitiu construir. Foram inúmeras vivências e reflexões sobre nosso público, metodologia de trabalho e sobre a causa que abraçamos e que foram organizadas no decorrer dos capítulos lidos nesta publicação. Também foi uma trajetória de identificar e quebrar diferentes potes de vidros que dificultavam e impediam que nossos resultados fossem atingidos. Dentre os quais destacamos. 11.1. O vidro do limitado acesso público ao livro e à cultura Incentivar a ler significa ampliar visões e fomentar inovações que permitem repensar a realidade local e promover o seu desenvolvimento. Permitir e facilitar que crianças, jovens e comunidade tenham acesso ao livro literário, criar neles a cultura do contato, do folheamento mais do que uma prática pedagógica é uma prática de cidadania. A criação e revitalização de espaços de leitura fazem parte do direito 52 Projeto Comunidade Educadora à cultura e devem garantir acesso democrático e ampliado para o maior número de leitores possíveis. “Como em muitas escolas não existem bibliotecas, a criança fica sem acesso ao livro. Os poucos livros que a escola possui acabam trancados e também apenas alguns professores e profissionais possuem acesso a eles.” Marta Lidice, professora da sala de leitura da Escola Municipal Darcy Vargas. Infelizmente, nas comunidades de periferia há uma carência de equipamentos públicos de acesso à arte e à cultura, em especial locais públicos de fácil acesso ao livro de qualidade. Percebemos que as poucas bibliotecas comunitárias ou escolares que promovem este acesso estão se constituindo em importantes centros de troca e circulação do saber. Quando estes espaços são criativos e se preocupam em atender de forma especializada o público infanto-juvenil eles se tornam ainda um intenso local de convivência e descobertas para crianças do bairro auxiliando na construção de um novo habitus1 na vivência da comunidade. Onde ler passa a ser uma nova prática social e cultural. 1 O conceito de habitus conforme definido por Pierre Bourdieu refere-se ao conjunto de práticas sociais e coletivas que um determinado grupo assume no seu cotidiano demandadas não por regras explícitas mas subjetivas e que foram desenhadas no decorrer da história cultural daquela comunidade. Muitas vezes se referem ao conhecimento tácito, isto é, aquele que não está escrito em lugar algum mas está vivo na consciência das pessoas como, por exemplo, a mulher que prepara bolos de cabeça seguindo uma receita que aprendeu na prática com sua mãe e que há anos vem sendo passada de geração para geração dentro de sua família. Neste sentido, o desejo de que a leitura se torne um habitus dentro da comunidade significa desejar que ela se torne uma prática natural das pessoas independente de normas, regras ou imposições legais ou didáticas. 11.2. O vidro que separa a escola da comunidade 11.3. O vidro que separa o jovem da escola Inúmeros estudos e pesquisas comprovam a contribuição significativa da integração entre escola e comunidade para a melhoria da qualidade de ensino. Ao permitir que, além da integração, os contextos em que os alunos estão inseridos sejam referenciais para a prática escolar novos sentidos estarão sendo construídos para alunos, profissionais e comunidade. Ao colocar o jovem na posição de parceiro promotor da leitura dentro da escola, rompe-se com a posição comum do aluno como sujeito passivo do conhecimento. Posição combatida por Paulo Freire que via no aluno e na aluna os reais sujeitos de um processo coletivo de construção do conhecimento. Neste sentido e considerando os bons resultados e estratégias utilizadas pelas escolas do Projeto Comunidade Educadora, a leitura se revelou um ótimo elo de integração com a comunidade. Seja abrindo o espaço da escola para atuação de jovens moradores e estudantes como mediadores, seja abrindo a biblioteca para a comunidade realizar empréstimos e consultas. Outras estratégias como cestas literárias2 também aproximam a escola das famílias como conta a professora Marta. “Antes de participar do projeto, eu me sentia um nada dentro da escola. Me sentia como um vaso. As pessoas passavam por mim como se eu não existisse. Hoje, a diretora sabe o meu nome. Os funcionários quando me veem, sorriem e me dão bom dia.” Thais Mendes, 17 anos, mediadora de leitura e aluna do Instituto de Educação Roberto Silveira. “Para nós a experiência da cesta foi uma surpresa muito agradável. O retorno das famílias foi excelente e a participação deles anotando coisas no caderno, inclusive receitas superou completamente nossas expectativas. Para nós que não temos espaço físico para uma sala de leitura ou uma biblioteca esta foi uma ótima estratégia de promover o acesso ao livro e nos aproximarmos das famílias”, conta Marta Lidice, professora da Escola Municipal Darcy Vargas. 2 As cestas foram introduzidas na Escola Municipal Darcy Vargas pela equipe de sala de leitura da escola. Consistem em encaminhar pela criança uma cesta que permanecerá uma semana na casa da família contendo 5 livros diversos incluindo romances, poesias, livros infanto-juvenis entre outros, 1 pirulito e 1 caixinha de chá. Na cesta ainda há um caderno onde a família pode anotar poemas e contos de sua autoria, além de receitas que deseja partilhar. Da mesma forma que a escola passa a descobrir posturas, sensibilidades e valores que antes não via no jovem, este também desenvolve novos olhares em relação à escola criando com ela uma postura de respeito e compromisso que antes não tinha. Por outro lado, esta participação também possui impacto junto aos demais alunos que se surpreendem com a atuação de colegas dentro de um campo onde apenas imaginam o professor atuando. “As crianças sempre ficavam surpresas quando descobriam que, na verdade, eu não era um professor, mas era aluno como eles e estudava na escola deles. Eu via que eles gostavam disso e isso animava que eles também desejassem fazer mediações”. Laio Ferreira de Souza, 20 anos, mediador de leitura e aluno do Colégio Setembro. Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 53 11.4. O vidro que separa o jovem do jovem Em nossa experiência, os jovens são os melhores multiplicadores junto a própria juventude influenciando hábitos e práticas não apenas de amigos, mas de familiares e da própria comunidade. Quando estimulamos sua ação protagônica na escola e comunidade, permitimos ao jovem construir uma consciência de grupo e a refletir mais sobre as questões específicas da juventude. “Um valor do projeto é esta participação do jovem. Somos nós que estamos à frente das ações. E aqui percebemos a nossa força e vemos o quanto podemos realizar quando estamos juntos.” Marvim Silva da Paz, 17 anos, mediador de leitura e aluno do Colégio Estadual Fidélis de Medeiros. A integração, além de ideológica, também é afetiva, fortalecendo laços de amizade entre jovens de diferentes comunidades atendidas pela escola, contribuindo para romper com guetos e rixas de territórios que promovem a violência em muitas comunidades escolares. 11.5. O vidro que estigmatiza o jovem na comunidade e na família Esta atuação voluntária na roda representa para o jovem um processo de valorização e de autoestima que estabelece também novas relações entre jovens e comunidade. “É muito bom quando andamos pela rua e as crianças nos reconhecem e vêm ao nosso encontro perguntar quando será a próxima roda, quando 54 Projeto Comunidade Educadora iremos ler histórias para elas novamente. Sinto que estou realizando algo útil que está dando resultado e que todo este esforço servirá para o futuro delas”. Natália Santos da Silva, 17 anos, mediadora de leitura e aluna do Colégio Estadual São Bento. Por outro lado, este reconhecimento desenvolve no jovem um respeito e um compromisso com a comunidade que ajuda a romper com o estigma de que o jovem “não quer nada com nada”, é irresponsável e não se preocupa com o que ocorre em seu entorno. “Antes eu não tinha a consciência que tenho hoje. Me incomoda ver lixo nas ruas, ver alguém jogando lixo no chão ao invés da lixeira. As pessoas devem cuidar mais da comunidade onde vivem.” Kleber Vinicius Lacerda Costa, 15 anos, mediador de leitura e aluno do Colégio Estadual Guadalajara. Também na família abre-se espaço para participação do jovem e reconhecimento de sua ação. “Hoje eu e minha mãe, por conta do projeto, conversamos mais. O projeto nos aproximou. Até com meu irmão mais velho sinto que ele me respeita mais.” Natália Santos da Silva, 17 anos, mediadora de leitura e aluna do Colégio Estadual São Bento. “Depois que entrou no projeto, Lucas passou a ler em casa também para família. Ele sempre aparece com um livro diferente para gente. Eu sinto que ele gosta muito disso e nós também.” Jorge Luiz Alves Diniz, pai do mediador Lucas Marques, 13 anos, aluno do Colégio Estadual Guadalajara. Apesar dos muitos potes de vidro que aprisionavam desejos, sentimentos e sonhos terem sido quebrados no decorrer do Projeto Comunidade Educadora, muitos ainda existem e precisam ser rompidos. Grande parte será quebrado ainda pelos próprios jovens, mas muitos para serem rompidos é necessário o envolvimento da escola, da comunidade, da família e também do estado. Aqui, deixamos que nossas contribuições para como alguns destes potes, especialmente os que dificultam o acesso à leitura na escola e na comunidade, sejam quebrados. Esperamos que este material seja realmente instrumento de fácil entendimento e fácil aplicabilidade. De novo reiteramos que toda a metodologia aqui detalhada deve ser adequada ao contexto de cada comunidade. Esperamos que com este material estejamos contribuindo para que muitos Firulis estejam livres de seus vidros e prontos para alçar muitos e muitos voos literários. Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 55 CAPÍTULO 12 Os autores do conhecimento Dariel dos Reis Ferreira Rego, 17 anos, aluno do 2° ano do ensino médio do Colégio Estadual Jardim Meriti. Kleber Vinicius Lacerda Costa, 15 anos, aluno do 2° ano do ensino médio do Colégio Estadual Guadalajara. Lucas Marques da Fonseca Diniz, 13 anos, aluno do 7º ano do ensino fundamental do Colégio Estadual Guadalajara. Indaiara da Silva, 14 anos, aluna do 9° ano do ensino fundamental do Colégio Estadual Guadalajara. Laio Ferreira de Souza, 20 anos, aluno do 9° ano do ensino fundamental do Colégio Setembro. Marvim Silva da Paz, 17 anos, aluno do 2° ano do ensino médio do Colégio Estadual Fidélis Medeiros. Luana Guilherme da Silva, 20 anos, aluna do 3° ano do ensino médio do Colégio Estadual Guadalajara. Mauricio Silva de Souza, 16 anos, aluno do 2° ano do ensino médio do Colégio Estadual Guadalajara. Ingrid da Silva Guimarães Pereira, 17 anos, aluna do 3° ano do ensino médio do Colégio Estadual Guadalajara. 56 Projeto Comunidade Educadora Natália Santos da Silva, 17 anos, aluna do 3° ano do ensino médio do Colégio Estadual São Bento. José Claudio Barros, jornalista, mestre e doutor em ciência da informação, gerente de programas da CARE Brasil. Claudia Maria Monteiro de Freitas, Mestre em literatura, professora da rede estadual de ensino e consultora de leitura do projeto Comunidade Educadora. Varner Simas, 20 anos, aluno do 2° ano do ensino médio do Colégio Estadual Guadalajara. Kenner Vieira, monitora de leitura do projeto Comunidade Educadora. Helenita Beserra, coordenadora do projeto Lixo Urbano, professora de História do Colégio Estadual Guadalajara e membro da coordenação do projeto Comunidade Educadora. Thaís Mendes, 17 anos, aluna do 1° ano do ensino médio do Instituto de Educação Governador Roberto Silveira. Nilcinéa Soares, professora da rede estadual de ensino e supervisora de espaços de leitura do projeto Comunidade Educadora. Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 57 ANEXOS 58 Projeto Comunidade Educadora Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 59 Anexo 13.1 Critérios para aquisição de livros o leitor, a leitura e a literatura Escolher os livros que comporão um acervo não é tarefa fácil. Ao contrário, é um grande desafio a professores, pais, mães, avós, bibliotecários e educadores em geral. A má escolha dos livros provoca constrangimento: Declamar um poema ruim é uma experiência constrangedora, ler em voz alta uma história mais-ou-menos é tão ruim quanto. Mas é surpreendente como uma história ou um poema excelentes de repente se expandem num cosmo de iluminação absoluta quando se escuta a declamação. (BLOOM, 2004, 22) Ler sozinho um livro, ler em voz alta, decorar, declamar, refletir e conversar sobre a leitura escolhida são atividades literárias que, além do prazer, provocam insights e ampliações do repertório de visões de mundo do ser humano que o acompanharão pela vida inteira. Como tudo na vida se aprende aos poucos e passando de um nível ao outro, também a leitura é uma prática que precisa de orientação e critérios para as escolhas de livros. Escrever é um ofício e o ofício se aprende com quem já o exerce antes de nós: há o mestre, há o aprendiz – termos aqui utilizados num sentido que pouco tem a ver com escola na acepção comum da palavra (…) Aqui a relação mestre-aprendiz está sendo tomada no sentido de arte, artesanato. No sentido em que leitura é a oficina básica do escrever. Atividade produtiva, aquisição de capital. (MORICONI, 2008, p. 266) 60 Projeto Comunidade Educadora Dra. Elizabeth R. Z. Brose Ponto de partida: a principal escolha de livro em famílias brasileiras é a Bíblia Em Retratos da Leitura no Brasil, o Pró-livro discute os resultados da pesquisa realizada pelo IBOPE inteligência sobre os hábitos dos leitores em território nacional. A conclusão indica que as mães ainda são as principais estimuladoras do gosto da leitura na infância de seus filhos. Pelo visto, é na idade mais tenra que um leitor aprende a gostar de ouvir histórias, de pegar um livro, de brincar com a capa e as ilustrações. Também é a Bíblia a principal leitura do público brasileiro. Imagina-se que não deva ser rara a cena doméstica da mãe que lê a Bíblia a seus filhos, ou pelo menos, que conta as histórias cristãs. Os espaços públicos de incentivo à leitura como as creches, as escolas e os projetos de Ongs, além de reproduzirem em parte esse ambiente familiar, contribuem para a ampliação desse repertório de livros e de histórias para as crianças. Para tanto, os projetos procuram suprir necessidades como: acervos de livros de reconhecida qualidade literária, orientação adequada por profissionais capacitados para responder aos diferentes níveis de leitura, espaço seguro e próprio para as rodas se realizarem com tranquilidade, além do apoio de escolas, professores e familiares. As etapas aprendidas com leitores assíduos, sejam eles mães, pais, educadores ou profissionais da leitura, são necessárias para o desenvolvimento do leitor vida afora e vão determinar seu gosto pela leitura em qualquer área até a vida adulta, como concluiu-se dos dados da pesquisa sobre o perfil do nosso leitor em Retratos da Leitura no Brasil. Ana Paula Charão, uma das coordenadoras do projeto de fomento à leitura Cancioneiros da Literatura, escreve que comumente o trânsito do livro nas escolas – escolas que são o espaço a que se atribui maior responsabilidade na formação de leitores - precisa, antes de chegar às mãos dos leitores, “satisfazer a critérios de ordem econômica, promover valores ético-estéticos e fomentar o diálogo entre editoras e o projeto político-pedagógico de cada escola” (CHARÃO, 2008). Esse é o trajeto que o livro percorre, transpondo obstáculos diversos, para ser disponibilizado aos leitores. “Quando o livro literário chega às mãos do aluno, ele já representa uma escolha de valores em que interagem gestores, direção pedagógica e coordenadores da área de leitura” (idem). Para que o trabalho de formação de leitores seja bem-sucedido, os adultos que promovem essas escolhas de livros devem, em primeiro lugar, ser leitores assíduos. Sem leitura, não há êxito no incentivo da leitura. Quando esse trabalho de oferta de livros obtém bom resultado, ou seja, quando o livro circula entre as crianças e adolescentes, ele “completa um ciclo em que o aluno percebe, enfim, o livro não apenas como um objeto de valor material ou como um bem simbólico valorizado pela sociedade, mas inacessível ao jovem; e sim como um bem cultural ao qual todos têm direito” (CHARÃO, 2008). Algumas ofertas comerciais e o desencanto pela leitura Na introdução de sua antologia Contos e poemas para crianças extremamente inteligentes de todas as idades, Harold Bloom afirma que “a maior parte do que se oferece comercialmente como literatura para crianças seria um cardápio inadequado para qualquer leitor de qualquer idade em qualquer época” (BLOOM, 2004, 13). Um dos motivos desse desatino da cultura da leitura seria a ausência de estratégias adequadas na escrita de livros dirigidos às crianças. O que seria inadequado? 1. o texto simplório e inverossímil. Em Como e por que ler literatura infantil brasileira, Zilberman alerta para os riscos de se produzir um texto simplório ou inverossímil quando o texto tem como destinatário a criança: Não é fácil escrever em primeira pessoa, principalmente quando o autor é um adulto, e o leitor, uma criança. Corre-se o risco de tentar imitar a linguagem infantil e abusar da puerilidade. O risco aumenta, quando o narrador apresenta-se como uma criança, cujos vocabulário e domínio da sintaxe são ainda relativamente reduzidos. O resultado pode ser um texto simplório, se o escritor quiser facilitar demais; ou inverossímil, se o narrador revelar um conhecimento linguístico impróprio para a idade. (ZILBERMAN, 2005, p. 36) Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 61 2. assimetria entre texto e etapas de leitura Se o leitor se encontra nas primeiras etapas de leitura, Richard Bamberger em Como incentivar o hábito da leitura1, afirma que o desencanto se origina: • na inexistencia de uma extensão média em frases e palavras e da inexistencia de repetições frequentes – aspectos formais; • na inadequação do assunto à faixa escolar do leitor, provocando excesso de incompreensão – aspecto relativo ao conteúdo; • na falta de relação entre o texto e o leitor, não provocando atração emocional ou identidade entre o sujeito que lê e o texto – aspecto relativo ao efeito. Critérios para escolha dos livros: as idades de leitura A facilidade ou dificuldade de um texto está relacionada com a idade de leitura do sujeito, da mais simples à mais complexa. São etapas que não correspondem à faixa etária, mas que se manifestam em épocas diferentes da vida de cada leitor. Todo leitor passa por essas etapas e volta a cada uma delas, quando sente vontade. São elas: a pré-leitura; a leitura compreensiva, leitura interpretativa, iniciação à leitura crítica; leitura crítica. Em Era uma vez... na escola2 1 BAMBERGER, Richard. Como incentivar o hábito da leitura. São Paulo: Cultrix/Brasília: INL,1977. 2 Os primeiros resultados da pesquisa realizada pelo IBOPE para o Indicador Nacional de Alfabetismo funcional – um diagnóstico para inclusão social pela 62 Projeto Comunidade Educadora formando educadores para formar leitores, as autoras afirmam que a pré-leitura corresponde à época preparatória para a alfabetização. Nessa faixa, o interesse do leitor volta-se, de um lado, aos livros com rimas, livros com muitas gravuras e pouca escrita, e, de outro lado, manifesta interesse por histórias longas contadas por um outro leitor experiente. A leitura compreensiva corresponde ao começo da alfabetização, em que o leitor realiza uma leitura silábica e de palavras. Esse leitor se interessa pelos mesmos livros da época anterior, mas agora ele mesmo consegue decifrar o código. A facilidade da decodificação, porém, é contrabalançada com intensa fantasia, grande criatividade e estímulo ao raciocínio. A leitura interpretativa ocorre quando o leitor adquire fluência no ato de ler. O leitor vai se voltar a textos mais educação (2001), foram organizados de acordo com os critérios: analfabetismo e três níveis de alfabetismo. Com três graus diferentes de práticas de leitura e de escrita, procuraram mapear a população brasileira. Em Pisa 2000 – relatório nacional (2000), os diferentes níveis de proficiência de leitura são cinco: nível um localizar informações explícitas, apreender o tema ou proposta, conectar o texto a uma situação cotidiana; nível dois - inferir informações, reconhecer o tema, elaborar várias conexões entre o texto e outros conhecimentos pessoais; nível três - localizar e reconhecer relações entre as informações do texto; “integrar várias partes de um texto em uma ordem para identificar a idéia principal, compreendendo uma relação ou construindo o sentido de uma palavra ou frase; construir conexões, comparações ou explicações ou avaliar uma característica do texto” (59); nível quatro - além de localizar e reconhecer relações entre as informações, interpretar os vários sentidos da linguagem de uma parte, considerando a totalidade do texto; usar o conhecimento formal ou público para formular hipóteses ou criticas ao texto; nível cinco além de todos os itens do nível quatro, extrair do texto determinado conhecimento, apesar da linguagem ou do conteúdo não serem familiares ao leitor. complexos e, através dessa literatura, ele vai compreender melhor o mundo que o cerca. Se for uma criança do 4ª. ao 6ª. série, a compreensão das noções de causa e efeito, tempo e espaço, vão permitir que ela se procure textos diferentes das fases anteriores. Agora ela vai se ocupar não só dos contos maravilhosos e mágicos, mas daqueles livros que mesclem fantasia e realidade, cotidiano e magia. A fase da iniciação à leitura crítica é aquela em que o leitor, além de interpretar os textos lidos, se posiciona diante do conteúdo apresentado. Nessa etapa o leitor organiza seus valores éticos e morais e questiona seu cotidiano a partir das leituras feitas. A quinta etapa, a leitura crítica, o leitor percebe o texto esteticamente e, ainda, elabora juízos de valor acerca da sociedade em que vive. O leitor assume uma postura crítica ao comparar ideias, concluir e se posicionar. Nessa faixa, o leitor procura livros que incitem a reflexão e a proposição de um mundo mais justo. A pobreza, que acentua a vulnerabilidade, parece resultar da negação do direito de acesso à educação pública de qualidade, ou seja, da negação de acesso aos níveis mais altos de proficiência da leitura3. Em “Era uma vez.. 3 Além da negação do direito de acesso a ativos produtivos, para que os grupos produzam seu próprio sustento. Esses dois itens – o acesso à educação de qualidade e aos ativos produtivos - são considerados por Pierre Bordieu entraves para o acesso ao capital simbólico. Para ele, trata-se de uma violência o caráter arbitrário das regras que possibilitam a dominação consentida, que teria sido construída no Brasil ao longo de sua história. Segundo Jorge Werthein, “ao tempo da colônia, o governante proibia a leitura e a difusão do conhecimento. O propósito era não formar cidadãos, privilégio admitido apenas aos membros da elite” (WERTHEIN, 2008, p. 43). na escola”4, as autoras entendem esse ato de ler como um processo que, uma vez desencadeado, avança no sentido da descoberta de novos modos de ver o mundo e com ele interagir, experimentando vários papéis” (AGUIAR, p.141). Critérios gerais para escolhas em qualquer faixa de leitura: textos e leitor Essa boa leitura que avança nas descobertas e insere o leitor na sociedade acontece quando o leitor se reconhece nas personagens; quando ele lê uma história que considera as suas referências; quando a literatura joga com a temporalidade dentro de limites de aceitabilidade do leitor; quando o leitor percebe coerência na ação. Essa boa leitura provoca o leitor a passar por níveis diferentes de leitura, ou seja, lemos apaixonadamente livros que nos suscitam a passar de um nível ao outro. Essa transição não precisa ser apenas progressiva, mas acontece de modo não sucessivo, em outras palavras, também gostamos de voltar e reler histórias que nos encantaram há anos atrás. Lemos e relemos. Passamos de um nível ao outro e, desejamos às vezes, voltar a níveis anteriores. Harold Bloom confessa que a cada três anos, por exemplo, sente prazer de ler como criança novamente: ler repetidas vezes sem parar, ler até decorar e, por fim, declamar. 4 Em Pisa 2000 – relatório nacional, a leitura é considerada uma proficiência definida como uso, compreensão e reflexão sobre os textos escritos, com o objetivo de desenvolver o indivíduo e auxiliá-lo a alcançar plena participação na sociedade. Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 63 Critérios históricos para as escolhas que estimulam O texto literário, ou seja, aquele que preenche essas peculiaridades formais, de conteúdo e de efeito, no Brasil, deriva historicamente de obras para adultos. A literatura infantil brasileira começa a ser inventada a partir da necessidade do Brasil do século 19 em produzir literatura às crianças da classe média urbana ascendente. Tendo como modelo a Europa que adaptou mais que traduziu, nosso país começa com essas duas modalidades, a adaptação e a tradução: A literatura infantil brasileira, seguindo o exemplo da literatura infantil européia, foi inventada a partir da tradução de obras estrangeiras, da adaptação de obras para adultos e da tradição popular. (ZILBERMAN, p. 17) O mercado exigia produção de escritores brasileiros para crianças, mas o país ainda não tinha tradição na área para dar continuidade. Por isso, adaptar e traduzir foram as duas ações que inauguraram a literatura infantil no Brasil. Os dois pioneiros são: Carl Jansen (1823 ou 1829 – 1889), traduzindo clássicos; e Figueiredo Pimentel (1869-1914), misturando contos do irmãos Grimm com histórias populares brasileiras em Contos da Carochinha. Seguindo o raciocínio da autora, adaptar para o universo infantil significa escolher o assunto de acordo com a capacidade de compreensão do leitor e com seus interesses; escrever com uma linguagem acessível desde a sonoridade, até imagens e raciocínios; escolher formas - narrativa, dramática ou lírica, considerando o leitor; optar por meios (suportes de leitura) que o leitor tenha acesso. Zilberman cita duas obras exemplares adaptadas para crianças: Robinson Cru- 64 Projeto Comunidade Educadora soé, de Daniel Defoe, e Viagens de Gulliver, de Jonathan Swift, “dois romances britânicos que aparecem nos textos memorialísticos de Carlos Drummond de Andrade e Jorge Amado” (ZILBERMAN, p. 16). Esses dois livros do século 18 foram “abreviados e simplificados para a leitura dos meninos ingleses, e até hoje circulam pelo mundo com mais facilidade nesse formato reduzido que na versão original” (idem). Também a ilustração de um livro e as noções de literatura infantil e infanto-juvenil brasileiras derivam historicamente das obras literárias dirigidas aos adultos europeus, sendo que esses primeiros escritores e leitores seriam falantes da uma língua comum. Essa prática literária primeira entre adultos de mesma língua estabelece o padrão de qualidade estética. Esse padrão de qualidade, segundo Zilberman, determina critérios para a escolha de ilustrações, de adaptações, de traduções e de livros de literatura infantil e infanto-juvenil. Esses critérios originam-se da obra literária em geral, somando-se ainda peculiaridades como: • considerar as sonoridades; • a sintaxe adequada à idade; • imagens que se relacionam com o texto de modo a pontuar, expandir o texto, explicar, concorrer com o texto ao contar uma história paralela; suprimir ou ampliar partes; • técnicas de ilustração à altura da obra que é o texto; • perspectiva da criança, se considerada, também pode resultar em um texto de alta qualidade; • cuidados com a simetria entre adulto-criador e crianças-leitoras - item que vale para a ilustração, para o texto original e para adaptações. Ao observar tais critérios para a aquisição dos livros, disponibiliza-se um acervo de qualidade para o fomento do prazer da leitura, permitindo a circulação de livros, facilitando a superação dos obstáculos da leitura e a passagem de níveis de leitura. Pela falta dessa complexidade nos textos oferecidos comercialmente aos infantes, Harold Bloom, pesquisador de literatura de Yale, não concorda com a categoria literatura para crianças ou literatura infantil. Para ele, a expressão já foi útil há um século atrás, mas hoje mascara textos que conduzem ao emburrecimento. São textos construídos na onda de modismos e que repetem à exaustão estratégias conhecidas. Texto de compreensão não imediata e o leitor Importa à ampliação de repertório a leitura de textos cujas estratégias sejam inovadoras. A cultura literária nem sempre se compõe de textos fáceis ou se presta ao consumo imediato, mas, frequentemente, exige o exercício da perseverança do leitor. Mesmo que se trate de um leitor iniciante, perseverar é a chave. Se um texto não é de compreensão imediata, é porque está avançando as fronteiras estabelecidas pelo campo de leitura daquele sujeito. A ampliação de seus horizontes torna-se um exercício que capacita o leitor a alcançar o melhor de si mesmo e a exercer melhor a cidadania. As escolhas de livros e o prazer de ler: tensão entre o conhecido e o desconhecido Combatendo esses obstáculos da leitura, o leitor, se tiver sorte e/ou boa orientação, vai se deparar com o encantamento. Esse é um estado de atração que, para Bloom, assemelha-se ao do apaixonamento entre duas pessoas: “o que conhecemos totalmente não nos levará a nos apaixonarmos” (BLOOM, 2004, 18), dependemos de uma “capacidade em potencial” e não do conhecimento completo. O texto literário, que nos encanta é o que tentamos nos apropriar ao mesmo tempo em que ele nos escapa. Nós nos identificamos com uma parte dele e supomos que nos encante também o restante, o desconhecido. Como tão bem escreveu Marília Papaléo Fichtner acerca da criança leitora, o texto literário por sua complexidade e organização interna, permite ao leitor se encantar com o texto e com o mundo, que ele conhece potencialmente, mas não completamente: A poesia acompanha o ser humano desde a sua infância através das cantigas de ninar, dos jogos de palavras e fonemas e das canções folclóricas. A criança também gosta do folclore porque também pensa através de jogos de palavras e analogias, vendo o mundo por um viés afetivo e sincrético. Nesse sentido um poema como o “Canção Mínima” (…), ao apresentar um universo que se equilibra e se desequilibra, quase em um brinquedo de ‘balança, mas não cai’, fala mais ao coração de uma criança do que as imagens fotográficas e ilustrações esquemáticas do planeta Terra. (FICHTNER, 2004, p. 260) Desse modo meio lúcido e meio inebriado, o leitor sentirá prazer ao ler analogias de múltiplas leituras, ex- Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 65 pressões mais claras e mais inovadoras para se referir a situações conhecidas; prazer ao ler raciocínios bem conduzidos, ironias bem construídas, imagens bem elaboradas, sonoridades peculiares, sintaxe narrativa bem amarrada. Prazer que decorre da estética, da identificação cultural, do jogo das palavras e de toda a teia de relações entre personagens, ações e tempo. Embora escape ao leitor parte da obra, ele se entrega às suas exigências de superação, de releitura, de alargamento de idéias. Essa ampliação apaixonada, potencial de um texto de qualidade literária, transforma a leitura em prática prazerosa. Para aqueles que tiverem interesse: Nesse contexto de planejamento e alargamento dos objetivos das práticas de leituras, o Ministério da Educação, através do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – Secretaria de Educação Básica, enumerou critérios para a avaliação e seleção de obras, explicados no anexo III do edital de convocação para inscrição de obras de literatura no Programa Nacional Biblioteca da Escola para o ano de 2009, PNBE - 2009. Em Critérios de Seleção, o documento do Ministério da Educação afirma que os acervos serão compostos: por obras de diferentes gêneros literários, de forma a proporcionar aos leitores o panorama da literatura brasileira e estrangeira. A qualidade do texto, a adequação dos temas aos interesses do público-alvo, a representatividade das obras e a qualidade dos aspectos gráfico-editoriais serão considerados critérios para a seleção de uma determinada obra. (Edital PNBE, 2008) 66 Projeto Comunidade Educadora A avaliação considera a qualidade do texto, a adequação temática e o projeto gráfico. 1. A qualidade do texto observa a ampliação do repertório cultural e a fruição estética em todos os gêneros literários. As qualidades estéticas são diferenciadas dependendo do gênero, portanto: • os textos em prosa serão avaliados de acordo com a consistência narrativa, “a ambientação, a construção e a caracterização das personagens, a adequação do discurso das personagens as variáveis de natureza situacional e dialetal bem como o cuidado com a correção. • os textos em verso serão avaliados, segundo a adequação da linguagem ao público a que se destina, tendo em vista os diferentes princípios que, historicamente, vêm orientando a produção e a recepção literária” (idem). Além disso, são consideradas as questões éticas, ou seja, os textos deverão evitar preconceitos, moralismos e estereótipos. A qualidade das traduções e das histórias em quadrinhos: sobre as traduções, o documento avisa apenas ser “importante que sejam mantidas as qualidades literárias da obra original” (idem); sobre as histórias em quadrinhos, “será considerada como critério preponderante a relação entre texto e imagem e o tratamento estético das narrativas visuais, adequadas aos jovens das séries finais do fundamental e do ensino médio” (idem). 2. No item “adequação temática”, afirma-se que serão selecionadas as obras com temáticas diversificadas, que contemplem contextos sociais, culturais e históricos; serão observadas “a capacidade de ativar o interesse pela leitura, o potencial para incitar outras leituras, a adequação às expectativas do público alvo, as possibilidades de ampliação do repertório dos jovens para além do que já conhecem e o desenvolvimento da percepção estética dos leitores” (idem). 3. Quanto ao projeto gráfico, o edital detalha suas exigências, por isso cito os principais itens abaixo: • apresentação de capa apropriada ao projeto estético-literário da obra; • uso de fonte e espaçamento adequados à leitura; • distribuição equilibrada de texto e imagens; • ilustrações, se houver, artisticamente elaboradas; • uso de papel e cola (se for o caso) que favoreçam a boa leitura e que resistam ao manuseio por muitos leitores; • a presença de erros de revisão e/ou de impressão comprometerá a avaliação da obra; • a qualidade das ilustrações e das imagens se houver, também será objeto de avaliação. Elas devem ser enriquecedoras da leitura dos textos e devem compor um conjunto agradável e adequado à intenção expressiva da obra; • a biografia do(s) autor (es) deverá ser apresentada de forma a enriquecer o projeto gráfico-editorial. Ela deve promover a contextualiza- ção do autor e da obra no universo literário; • igualmente, outras informações devem ter por objetivo a ampliação das possibilidades de leitura, em uma linguagem adequada aos jovens, e com informações relevantes e consistentes. Os critérios para compra, como se pode concluir, são regidos, em primeiro lugar, pelo que venha a ser a leitura de um texto literário. Essa leitura é entendida como decodificação da complexidade textual de uma obra de arte, ou seja, da recepção de poemas, narrativas e peças criados por um escritor a partir de seu imaginário, de contos populares que ouviu, de suas experiências, de sua memória, de sua habilidade e técnica de escrita, de suas leituras anteriores, de seus desejos e de seus contextos estético, ético, social, cultural e, consequentemente, editorial. No momento em que se escreve esse artigo, maio de 2009, o projeto Comunidade Educadora observa seus resultados animadores: mais de 100 pessoas formadas como mediadores de leitura, rodas de leituras em várias escolas, o entusiasmo das crianças e jovens no manuseio dos livros, na organização dos procedimentos nas salas de leitura. Além disso, há ainda “efeitos colaterais” como o encaminhamento profissional de vários jovens - jovens que passaram por todos os níveis da experiência, ou seja, que cresceram em vários níveis de leitura, e estão se organizando para um futuro promissor. Por conta desses resultados, a CARE-Brasil amplia o projeto Comunidade Educadora, expandindo-o a outros projetos em outros estados do país, como a ampliação já realizada em Goiás. Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 67 Anexo 13.2 Comunidade Educadora: Ecologia rima com pedagogia – uma proposta da palavra Cláudia Maria Monteiro de Freitas “Só uma palavra me devora Aquela que o meu coração não diz...” Apesar de grandes avanços no processo de ensino-aprendizagem, o texto, oral e escrito, permanece circulando nas escolas de forma circunstancial, pouco dinâmica e não-dialógica. Para Tardelli & Azevedo (2002), a oralidade que revela uma predominância na prática escolar sofre reduções gradativas: a pluralidade de vozes dos alunos que emerge em sala de aula acaba por ser apagada pelos conteúdos preestabelecido no currículo escolar. Também as atividades escritas se caracterizam, em sua maioria, por episódios de reprodução que, ora priorizam exercícios gramaticais, ora registram meramente o conteúdo previsto pela escola. Nunca foi tão discutida, em meios acadêmicos e mesmo fora deles, a importância da produção escrita, da leitura e da oralidade como sendo imprescindíveis na formação plena do Homem. Os Parâmetros Curriculares Nacionais, em sua introdução, já predizem que o ensino da Língua Portuguesa “pode constituir-se em fonte efetiva de autonomia para o sujeito, condição para a participação social responsável”, apontando para a necessidade de expandir práticas que tomem o texto, seja oral ou escrito, em toda sua diversidade, como uma unidade básica de trabalho. Desta forma, as atividades 68 Projeto Comunidade Educadora planejadas tornam possível a análise crítica dos discursos e o aluno expõe diferentes pontos de vista, valores e preconceitos porventura existentes. O novo perfil de sociedade, pautado em tendências psico-pedagógicas mais recentes, requer que as palavras, as frases, as falas e os textos sejam entendidos em suas entrelinhas, naquilo que não está em evidência, nas idéias que despertam e não apenas nas que transmitem. Neste sentido, a Escola precisa voltar-se para o fazer pedagógico que visa uma formação mais plena, indo muito além da simples aquisição de conteúdos. Sabemos que o Brasil ainda vive índices alarmantes de deficiência na leitura-escrita (Kaufman, 1995), mesmo em sujeitos considerados “alfabetizados” que não conseguem, entretanto, ir além do decifrado, realizando uma leitura mecânica e pouco produtiva, em dissonância com a cidadania, que se pretende integradora, questionadora e transformadora (Freire, 1980). O atual cenário educacional do país não poderia ser menos cruel e antagônico de tal formação, uma vez que a escola vive uma crise de paradigmas, de caráter competitivo e excludente, especialmente na Rede Pública do Rio de Janeiro, onde políticas educacionais promovem a valorização de resultados, sem considerar o processo de aquisição dos mesmos, inclusive premiando as unidades escolares “melhor sucedidas”, independente do modelo pedagógico que adotam. No que diz respeito à produção textual e à leitura, vinculada à construção e/ou reflexões de conceitos ambientais, tornou-se bastante comum por parte dos professores a solicitação de textos para atender unicamente a uma demanda externa, como concursos de redação onde o tema é a Ecologia ou em datas comemorativas vinculadas ao ecossistema: Dia da Árvore, Dia dos Animais, Dia do Meio Ambiente. Pouco ou nada se propõe para ampliação do conceito de meio ambiente, ao tipo de convivência que mantemos com nós mesmos, com os outros e com a natureza (in A Carta da Terra na Perspectiva da Educação 1999). No entanto, o texto pode ser o elo entre os processos educativos formais e as demais atividades sociais de luta pela qualidade de vida. Para Loureiro (2002), são prioritários projetos que busquem o conhecimento, a reflexão, a ação concreta sobre o ambiente em que se vive. Conceber o texto como unidade de ensino-aprendizagem é entendê-lo como um lugar de entrada para o diálogo com outros textos, que remetem a textos passados e farão surgir textos futuros. São os sentidos socialmente construídos os verdadeiros e principais objetos do processo ensino-aprendizagem (Geraldi, 2002). Sob a ótica da rima entre questões do meio ambiente e o campo da educação, Ruscheinsky (2002) entende que já é possível visualizar os primeiros contornos de uma ecopedagogia, cuja finalidade é a reeducação do olhar, desenvolvendo atitudes de observa- ção e a tomada de decisão na preservação do meio ambiente e da vida saudável dos seres que nele atuam. Na relação meio ambiente-consciência faz-se necessário definir esta última como “um atributo pelo qual o homem pode conhecer e julgar sua própria realidade, estabelecendo julgamento dos atos realizados, conhecendo e percebendo os acontecimentos”. (Aurélio, 2000). O poeta Carlos Drummond de Andrade (apud Bonatelli, 2002, p. 170) legava à palavra o poder de “historiar” nosso íntimo e, também, o mar social que se alonga além de nós. Por isso, Bonatelli (2002, p. 170) afirma que: as palavras estão na origem da construção dos saberes, e o professor de Língua e Literatura, no contexto da escola, não é um ser isolado em sua área de atuação, mas está o tempo todo relacionando-se com as outras disciplinas e com a história de seus alunos. Radicalizemos: a competência linguística do aluno não se constrói somente nas aulas de língua portuguesa. Suas compreensões do mundo e das gentes dependem crucialmente das categorias postas em circulação pela escola como um todo. A partir da problemática ambiental vivida cotidianamente pelas pessoas nos grupos e espaços de convivência e na busca de harmonia pelo ser humano, processa-se a consciência ecológica e opera-se a mudança de mentalidade. Nesse panorama delineado, o Projeto Comunidade Educadora, atuando nos eixos de incentivo à leitura, educação ambiental e memória, tenta responder às seguintes perguntas: que espaço o texto (oral e escrito) tem ocupado na construção de conceitos ambientais? Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 69 Em que medida a ecopedagogia da palavra pode interferir na construção destes conceitos? A leitura não pode fazer tudo; mas está fazendo tudo que pode? Tais inquietações justificam esse projeto, numa perspectiva intervencionista, cuja proposta é ultrapassar a mera constatação e surgir como um convite para que o texto seja o pretexto na construção da cidadania ambiental. O próprio conceito de texto depende da maneira como são concebidos os conceitos de língua e de sujeito. Para Beaugrande (1997), o texto deve ser pensado como um lugar de constituição e de interação de sujeitos sociais, como evento, portanto, que sintetiza ações linguísticas, cognitivas e sociais. Ingedore Villaça Koch (2002, p. 9) afirma O texto é um construto extremamente complexo e multifacetado, cujos segredos (quase ia dizendo mistérios) é preciso desvendar para compreender melhor este “milagre” que se repete a cada nova interlocução - a interação pela linguagem... 70 Projeto Comunidade Educadora Como professora de Língua Portuguesa do Ensino Médio na rede pública estadual e do ensino superior, ministrando aulas de Literatura, Gramática, Produção Textual e Filologia Românica, interessa-nos provocar educadores para analisar o espaço que o texto tem ocupado e/ou que espaço pode ocupar na construção de uma consciência ambiental, tornando possível não só que conhecimentos sejam assimilados, mas também que ocorram transformações positivas na vida pessoal e em sociedade de cada um dos atores. A leitura e escrita como exercício de cidadania exigem um leitor privilegiado, de aguçada criticidade, que, num movimento cooperativo, mobilizando seus conhecimentos prévios: linguísticos, sociais e de mundo (Freire, 1979), seja capaz de ultrapassar os limites pontuais de um texto e incorporá-lo reflexivamente no seu universo de conhecimento de forma a levá-lo a compreender melhor seu semelhante. Conjugar a rima ecologia&pedagogia através da palavra dita, escrita, lida, falada, dentre outras ações, é um convite para construção de um mundo mais justo que todos nós queremos, merecemos e sabemos ser possível. Anexo 13.3 A História da Escrita - INEP Para os antigos egípcios, uma das primeiras civilizações a adotar a escrita como disciplina escolar, o aprendizado da escritura estava impregnado de magia. Thot, o deus da sabedoria da mitologia egípcia, havia criado o sistema de língua escrita e presenteado os homens com esse novo saber. Naquela época, aprender a ler e a escrever equivalia, de certo modo, a descobrir uma arte encantatória exercida por poucos eleitos e que atribuía ao seu aprendiz poderes supremos. Era a época da crença na magia da palavra, em encantamentos secretos cuja eficácia não era jamais posta em discussão. Os escribas, detentores deste conhecimento e responsáveis por ensiná-lo aos jovens formavam a casta mais poderosa da comunidade e exerciam grande influência sobre os faraós e a sociedade como um todo. Foi graças ao seu rigor que os antigos egípcios puderam registrar sua história, sua medicina, gastronomia, astronomia, mitologia e literatura. O sistema gráfico por eles utilizado era, realmente, uma escrita dos deuses – a palavra hieróglifo significa grafia sagrada – e era composta de magníficos desenhos admiravelmente estilizadas formando belíssimos poemas visuais que, tantos séculos depois, permanecem extasiantes. A originalidade e complexidade dessa escritura contém três tipos de signos: os pictogramas (desenhos representando coisas ou seres, aliados a uma combinação de signos para exprimir idéias), os fonogramas (desenhos representando sons) e os determinativos ( os signos que permitem saber a que categoria pertencem as coisas e os seres em questão). Os egípcios foram também os inventores do papel em sua forma mais arcaica, o papiro. Como o trabalho no papiro exigia muita minúcia e paciência, criou-se a escrita cursiva, mais fácil de ser aplicada sobre esse suporte e que contribuiu para a popularização da escrita. Para uma criança egípcia era um tanto árduo. “O melhor ouvido da criança são suas costas”, rezava um provérbio da época, justificando a prática de bater com varas nas costas da criança que porventura dessem um pequeno sinal de distração durante as aulas. Ingressando na escola aos dez anos de idade, as crianças custavam alguns anos para alfabetizar-se. Os alunos com mais facilidade de aprender eram escolhidos pelos escribas para que prosseguissem com os estudos até a idade adulta. O método utilizado pelos mestres egípcios consistia em exercícios de memorização, leitura, cópias e ditados. Como se vê, suas estragégias ainda frequentam muitas salas de aula contemporâneas. Em meados de VIII a. C., quando os egípcios ainda traçavam hieróglifos e na Palestina ainda se utilizava escritas alfabéticas, na Grécia se falava uma língua muito diferente e que não Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 71 era capaz de transcrever os alfabetos existentes. os alunos traçavam as letras com um estilete e depois podiam apagar. Foi nesta época que os gregos tiveram uma idéia simples e genial: para anotar suas vogais, tomaram emprestado do alfabeto aramaico diversos signos que representavam caracteres inexistentes na língua grega. Assim nasceram o Aalfa, E- epsilon, O- omicron, Y- ipsilon. Com a invenção do alfabeto grego, surge nos séculos V e VI a. C. uma das mais ricas literaturas de todos os tempos, representada por todos os gêneros: poesia, teatro, história e filosofia. No século V a. C., o alfabeto grego já existia, contendo vinte quatro signos ou letras, dezessete consoantes e sete vogais. Sabe-se também que este alfabeto podia ser escrito com letras maiúsculas e minúsculas. As letras maiúsculas eram utilizadas para gravar em pedras enquanto as minúsculas eram utilizadas para escrever sobre o papiro. Os gregos haviam inventado as “ardósias”, tabuletas cobertas de cera, sobre as quais 72 Projeto Comunidade Educadora É desse alfabeto que nasce nosso alfabeto latino que se distingue de outros sitemas de escrita por permitir escrever tudo que se desejar com uma pequena quantidade de signos. _____________ In Viagens de Leitura – INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anexo 13.4 Minha História de vida e sua relação com o Projeto Comunidade Educadora: havia uma régua no meio do caminho... Cláudia Maria Monteiro de Freitas As considerações a que agora me remeto forçam-me a voltar à infância.1 Paty do Alferes, lugar de nascença, clima frio, cidade rural de costumes e tradição agrícola. Hoje Paty é sinônimo de Festa do Tomate, amplamente divulgada pela mídia e que atrai milhares de turistas todos os anos, exatamente em junho, um dos meses mais frios, se é que em Paty exista um mês menos frio do que outro... Gostosa viagem esta que fazemos de nós mesmos para dentro de nossa infância. Como dizia Drummond (1988, p. 34) “...é só um retrato na parede, mas como dói!”. Lembro-me da charrete que às vezes conduzia-me com meus irmãos, ao catecismo ou à escola. Minha escola na infância na verdade foram duas: O Grupo Escolar Laudelina Bernardes e a Escola Típica Rural, esta última atualmente chamada de Colégio Estadual Paty do Alferes. Na primeira cursei as séries iniciais do Ensino Fundamental. Lembro-me com saudades da Tia Eni Petindá Canedo. Ela me alfabetizou. Ela me despertou o prazer e a possibilidade da leitura. A metodologia tradicional permeada pela competência do discurso e das ações da querida “tia” nunca saíram do arquivo de minha memória. 1 Texto original sob o título Minha História de Vida e sua relação com a Pesquisa, parte integrante da Dissertação de Mestrado de mesma autoria. A sala era pequena, de mesas de madeira para sentarmos em dupla. Havia sempre uma farpa que espetava o dedo e um “lápis de escrever” que teimava em escorregar do pequeno vão esculpido na mesa para acomodá-lo. O espaço do lápis era pequeno. Nunca dava para colocar os lápis de cor quando usávamos. A mesa era inclinada. Caía tudo. Não dava mesmo. Mas o compartimento para guardar os livros debaixo da carteira era grande. Sobrava espaço. Eu quase posso ver o vão escuro da madeira manchada. O lugar daria para pôr muitos livros, mas os livros não passavam da cartilha. Sempre me perguntava por que não reservavam um espaço maior para os lápis que eram treze, doze lápis de cor de tamanho pequeno e um de escrever ao invés de deixarem um enorme lugar para os livros que não passavam de um único... Talvez por isso aquele vão debaixo da carteira fosse tão escuro, quase um mistério, um espaço ocioso, quase adormecido. No quadro negro, muitíssimo negro, as palavras se desenhavam em letra cursiva bem redonda. A Tia Eni costumava “tomar a leitura” de forma peculiar, passando o giz em forma de concha, com uma linha curva abaixo de cada sílaba, com uma régua de espessa madeira apontando as letras. Ninguém podia ler antes dela passar o giz sob a sílaba, nem falar em voz alta sem que ela desse o sinal com a régua. As vozes tinham que fazer coro no mesmo ritmo e compasso. Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 73 E foi assim, aos sete anos, franzina e constantemente atacada pela asma, com cabelos muito crespos e respostas na ponta da língua que aprendi que a leitura de um texto não precisava obedecer tanto aos olhos quanto eu pensava. Como teria sido diferente minha história se meus lábios tivessem seguido o desenho monótono do giz e atendido ao ritmo daquela régua. Ou talvez se minha primeira professora tivesse me repreendido pela pressa ou tivesse me forçado a diminuir o ritmo. Aos sete anos de idade descobri que aquela concha desenhada com capricho sob a sílaba era lenta demais para minha vontade de ler. Percebi que aquela régua era pesada para a ânsia dos meus olhos. E, em pouco tempo, quando a Tia iniciava a leitura eu já estava em outra sequência de palavras ou de frases, seguindo meu ritmo acelerado e ávida por descobrir novas palavras escritas no quadro, impaciente para compor o sentido do texto, entender a história. Até hoje tento repetir o brilho nos olhos que a Tia me deu de presente a cada vez que um aluno comenta sobre uma leitura feita. Mas sei que aquele brilho é só dela, da minha Tia Eni, que em silêncio me incentivou sorrindo. Minha boca ia fingindo pronunciar as sílabas que a professora exigia. Eu não destoava do coro. Mas minha mente era rápida demais e minha vontade de ler nunca conseguiu se aprisionar aos comandos da minha adorável “Tia” e sua régua adestrada. Um dia, numa manhã muito fria, percebi que ela me olhava na hora da leitura. Ela descobriu que eu fingia ler uma sílaba mas lia muito à frente. Já estava quase de pé, tamanha ansiedade em desvendar as demais palavras. E foi neste dia que aprendi a ler, a ler de verdade, porque a Tia Eni, por alguns eternos segundos, aprovou-me em silêncio e sorriu com olhos brilhantes. Ah, tia Eni! Como seu olhar brilha até hoje no meu pensamento dizendo-me: “Leia sempre! Não espere que ninguém mande você ler. Siga em frente! Leia livre...” Quantas coisas eu li a partir daquele olhar brilhante... 74 Projeto Comunidade Educadora Foi assim que meus olhos apressados e desobedientes aprenderam a ler sem o auxílio da boca e meu pensamento aprendeu a voar através da leitura. Tanto que, aos sete anos de idade, iniciei a leitura dos livros da capa vermelha que ficavam impecavelmente enfileirados numa estante na casa da Tia Gilda, minha amada tia “de verdade”. Monteiro Lobato entrou na minha existência sem cerimônia e acho que ninguém entendia direito como uma menininha magrela e tão espevitada conseguia ficar tanto tempo deitada de bruços, com a cabeça apoiada entre as mãos e as pernas balançando no ar, lendo uns livros tão grossos, “que nem tinham figuras”. Como era bom ler daquele jeito! Sem um giz embaixo de cada sílaba, sem uma régua de madeira freando os olhos. Como era gostoso achar uma ilustração rara, remetendo a uma parte da história que já tinha ficado para trás e que, com a figura, era toda refeita, num passe de mágica. Quantas vezes eu “guardava” o fim de um volume para o dia seguinte para “não acabar rápido”. No entanto, nunca quis levar uma vez sequer, qualquer um destes livros para a Escola. Espaço tinha de sobra para guardar debaixo da mesa, mas talvez eu já soubesse que aquele vão era demais escuro para volumes tão plenos de luz quanto aqueles. Durante longos e felizes anos de minha infância os livros fizeram-me companhia nas enormes crises de asma que sempre chegavam com o frio intenso e teimavam em ficar, me deixando ofegante e, por vezes, sem posição para ler. Agradeço até hoje ter descoberto Monteiro Lobato e o amor da Tia Gilda. Agradeço o travesseiro sob as costas que minha adorada mãe colocava para facilitar minha respiração e permitir a leitura. Como doíam as costas! Como era difícil entender que só eu tinha que tomar banho frio. Que só eu não podia dormir no travesseiro de paina feito pela vó Alzira para todos os netos. Que só eu não podia tantas coisas... Mas ler eu podia. Muito. Tanto quanto eu quisesse. E isso me fazia diferente. Diferente e feliz. Feliz e agradecida... Agradeço sobretudo o brilho dos olhos da Tia Eni, que de pé ao meu lado, por todos os livros que continuei lendo e até os dias hoje, permanece me dizendo: “leia mesmo, não espere o giz debaixo da sílaba... Seus olhos podem encontrar muito mais do que eu estou mostrando...” Todo este passeio pela minha infância tenta responder à seguinte indagação: quem está conduzindo o giz sob as sílabas para os alunos da Escolas da Baixada Fluminense, cujos olhos continuam em ritmo tão lento para a leitura? Qual é a régua que lhes trava o “seguir em frente” na busca de novas possibilidades e descoberta dos livros? Que tipo de textos, qual sua incidência e que desdobramentos de leitura se dão neles/a partir deles? Ou ainda, o que falta no brilho dos nossos olhos, enquanto mediadores e multiplicadores de leitura, para que eles sintam-se animados a realizar novas experiências com os livros, independente do ritmo que a escola lhes impõe? Para Geraldi (2002, p. 41) “a linguagem é uma forma de interação: mais do que possibilitar uma transmissão de informações de um emissor a um receptor, a linguagem é vista como um lugar de interação humana” da qual o texto deveria dispor para promoção de leituras de mundo significativas que sempre remetessem a novos desafios de leitura. Eis aqui meu desejo de educadora, elucidado pela minha história de vida e pela atuação envolvente na coordenação do eixo de incentivo à leitura do Projeto Comunidade Educadora: contribuir para leituras significativas do mundo e sua intervenção no ambiente dos espaços onde atuamos. Ainda que haja uma régua no meio do caminho, espero que este trabalho seja como o brilho nos olhos de quem acredita nas mudanças. O brilho que tantas vezes cintila no olhar dos jovens MULTIPLE, que superam as adversidades dos conflitos violentos, da falta de recursos, do difícill acesso à cultura, e partem para as rodas de leitura com simplidade e alegria. Ainda que no meio do caminho tenha uma régua, proponho a ousadia de se manter o brilho no olhar que incentiva, emociona e transforma. Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 75 Anexo 13.5 Dinâmicas para Encontro de Formação de Mediadores Dinâmicas de apresentação 1. Construção do personagem Material necessário: cartolina ou papel pardo, pilot colorido e giz de cera. Nesta dinâmica os participantes são divididos em grupos de 5 componentes. Cada grupo deverá ir para um espaço reservado onde cada componente irá se apresentar falando NOME, uma CARACTERÍSTICA MARCANTE e um SONHO NA VIDA. Quando o último componente se apresentar, o grupo deverá em uma folha de cartolina desenhar um personagem que representará os 5 componentes do grupo. Sobre o desenho, eles deverão anotar o nome do personagem que deverá ser formado com a união de pedaços dos nomes dos 5 componentes do grupo. E o grupo deverá criar uma história sobre o personagem que deverá envolver todas as características e sonhos do grupo. Ao final, cada grupo se apresenta e os cartazes com os personagens são fixados nas paredes ou em varais. 2. Roda com peteca Material necessário: peteca Nesta dinâmica os participantes devem ficar em uma grande roda, todos de pé. O facilitador deverá ir para o meio com a peteca e jogar para algum participante que deverá ir para o centro da roda e se apresentar falando o nome, a idade, onde estuda e sua ex- 76 Projeto Comunidade Educadora pectativa para o encontro. Logo após o participante joga a peteca para outro participante e retorna para o seu lugar. Quem recebeu a peteca vai para o centro da roda e se apresenta como o anterior. E assim, vai até que todos se apresentem. 3. Roda com gestos Material necessário: nenhum Nesta dinâmica os participantes ficam em uma grande roda todos de pé. O facilitador inicia falando o seu nome e fazendo um gesto que represente algo que ele goste de fazer. Em seguida, a pessoa que está do lado direito dele repete o nome do facilitador e o gesto feito por ele. Em seguida se apresenta e faz o gesto representando o que gosta. A pessoa a seguir deve repetir os nomes dos dois anteriores e os gestos dos dois para logo após se apresentar também com seu gesto. E assim por diante. A última pessoa, que deverá estar do lado esquerdo do facilitador, deverá repetir o nome de todas as pessoas da roda com todos os gestos e finalizar com a sua apresentação. 4. Roda com fotos Material necessário: fotos diversas recortadas de jornais e revistas Os participantes podem ficar sentados em um círculo. No centro do círculo espalhadas no chão deverão estar as fotos. Os participantes são convidados pelo facilitador a levantarem e escolherem uma foto com a qual se identifiquem. Logo após todos escolherem se inicia a apresentação de forma espontânea com a pessoa falando seu nome, idade, serie que cursa e o motivo de ter escolhido aquela foto. Nesta dinâmica pode-se ainda substituir as fotos por diferentes livros de forma que os participantes escolham livros cujos títulos ou ilustrações de capa tenham algo com o qual se identifiquem. nam seu inquilino e vão escolher outro inquilino para abraçar. Neste caso, os inquilinos não devem se mexer e permanecer parados. As paredes, por sua vez, não devem andar juntas e podem formar novas casas misturando-se com as outras paredes. Se o facilitador falar INQUILINO quem fica parado agora são as paredes e o inquilino sai de dentro da casa e procura outra casa para se enfiar. Se o facilitador falar TERREMOTO, então, todo mundo sai dos seus lugares para formar novas casas. Neste caso, quem era parede pode virar inquilino e quem era inquilino pode virar parede. Quando o facilitador escolher a palavra-chave e der o comando, ele deverá formar uma nova casa no lugar de alguém. Assim, sempre ficará uma pessoa de fora que deverá assumir o comando do jogo escolhendo qual comando irá dar. Dinâmicas de entretenimento e descontração 2. Sansão, Dalila e Leão 1. Terremoto Material necessário: nenhum Monte trios com os participantes. No trio, duas pessoas serão as PAREDES que deverão ficar uma de frente para a outra de mãos dadas formando uma casa. E a terceira pessoa será o INQUILINO que deverá ficar entre as paredes dentro da casa. O facilitador deverá ficar de fora e dirá uma palavra chave que pode ser PAREDE ou INQUILINO ou TERREMOTO. Se o facilitador falar PAREDE, as duas paredes soltam suas mãos, abando- Nesta dinâmica o facilitador separa os participantes em dois grupos. Cada grupo deverá escolher em segredo qual personagem será: Sansão, Dalila ou o Leão. Os dois grupos deverão ficar um de costa para o outro, com os participantes de um mesmo grupo enfileirados lado a lado. Quando o facilitador der o sinal, todos os participantes dos dois grupos deverão se virar ao mesmo tempo e fazer o sinal representando o personagem que escolheu. Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 77 Sansão: Seu sinal deve ser um símbolo de força, geralmente os braços levantados mostrando os músculos. Ganha sobre o Leão mas perde para Dalila. Ao termino da dinâmica, o facilitador faz uma roda de conversa com as seguintes questões: Leão: Seu sinal é um rugido com as unhas em formato de garra. Ganha da Dalila mas perde para Sansão • Como se sentiu ao ser conduzida ? Dalila: Seu sinal é um símbolo de beleza ou delicadeza. Pode ser um gesto delicado com as mãos ou um beijo. Ganha do Sansão mas perde para o Leão. • A pessoa que conduziu se preocupou com a segurança do outro ? A brincadeira pode ser repetida por quanto tempo houver disponível. 3. Dinâmica da condução Material: Nenhum Os participantes deverão ficar em duplas com uma pessoa de frente para outra. A dinâmica começa com um dos membros da dupla com o braço extendido e com a palma da mão aberta na frente do rosto do outro membro da dupla. Quem está com o braço extendido começará a se movimentar levantando e abaixando o braço e andando pelo espaço. A outra pessoa deverá acompanhar todo o movimento do braço mantendo seu rosto sempre de frente para a palma da mão do companheiro de dupla. O facilitador permite que a ação continue por um ou dois minutos e depois troca os lugares. Quem foi conduzido passa a conduzir e quem conduziu passa a ser conduzido. 78 Projeto Comunidade Educadora • Qual a sensação da brincadeira ? • E como se sentiu ao conduzir ? • Quando a pessoa mudou de posição, qual sentimento tomou conta dela ? • Quantas vezes nos sentimos conduzidos na sociedade ? • Quantas vezes nos sentimos donos da situação na sociedade ? O facilitador pode concluir a conversa associando a brincadeira à situação do jovem na sociedade quando muitas vezes ele é conduzido seja na escola, na família ou no trabalho ou pela política de forma que não tenha espaço para falar como se sente e participar da decisão sobre o que está fazendo. Pode ainda associar a brincadeira ao papel que assumirão como mediadores quando terão a condição de conduzir um processo e deverão ter cuidado com a postura que assumirão. Será de escuta e participação ou será a condução autoritária de imposição de vontades sobre o outro. 5. Comunicação Material: roupas extravagantes e coloridas, chapéus e outros adereços e enfeites. Uma câmera digital ou máquina filmadora. O facilitador pede que 5 pessoas sejam voluntárias para a atividade. Estas pessoas deverão sair da sala e aguardar em um local mais afastado. Logo após pede-se mais 5 voluntários que devem com as roupas, chapéus e adereços se enfeitarem da forma mais estapafúrdia possível e deverão criar uma cena teatral rápida. Quando o grupo estiver pronto, o facilitador chama apenas um dos voluntários que estão fora da sala e pede para que ele observe atentamente toda a situação nos mínimos detalhes. Enquanto o grupo se apresenta, alguém registra todos os momentos com a câmera digital ou com a filmadora. Quando o grupo termina a apresentação, os componentes devem rapidamente tirar as roupas, esconder tudo e se sentar com os demais participantes. Terminados os dois minutos o primeiro voluntário deverá se sentar e mais uma pessoa de fora é convocada. O segundo voluntário deverá repetir para o terceiro tudo o que lhe foi contado. Mesmo que ele se confunda e fale coisas erradas, os participantes não podem falar nada e nem ajudar. E assim, segue até que o penúltimo relate para o quinto voluntário tudo o que lhe foi contado. Por final o quinto devera repetir mais uma vez tudo o que ouviu. O facilitador, então, pergunta para o público se o ultimo relato foi preciso em relação ao que aconteceu. Se algum fato foi modificado. Se faltou alguma informação. E por fim, mostra para o grupo por meio da câmera digital ou filmadora o que realmente aconteceu. Logo após, o facilitador reflete com o grupo como aquela situação se relaciona com o nosso dia a dia. Se é comum as notícias chegarem imprecisas e os fatos serem distorcidos. Esta dinâmica também pode ser realizada utilizando uma foto com muitos detalhes ao invés da encenação. O facilitador então chama uma segunda pessoa que está fora da sala e pede ao primeiro voluntário que observou toda a cena que a descreva para a pessoa em até dois minutos. Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 79 Anexo 13.6 Atividade: Escultura no biscoito Material • Biscoito maisena (dois biscoitos para cada participante) • Palitos de dente Cada participante recebe um ou dois biscoitos e um palito de dente com o qual deverá fazer um desenho no biscoito maisena, agindo como os antigos faziam para esculpir na pedra. Após cada um fazer seu desenho, os biscoitos deverão ser postos sobre uma mesa em exposição para que todos vejam os desenhos feitos. 80 Projeto Comunidade Educadora Anexo 13.7 Atividade: A prova Nesta atividade o responsável deverá informar aos participantes que, como eles atuarão como mediadores de leitura é importante uma boa capacidade de interpretação de texto. Por isso, deverão fazer uma PROVA. Para isso, eles deverão ser levados para uma outra sala que, diferente do local onde estavam, será uma sala sem nenhuma graça, com as cadeiras enfileiradas uma arás da outra como uma sala de aula normal. ram ser mediadores sem conseguir fazer a interpretação do texto. Neste momento, informa que era uma brincadeira com todos e pergunta se alguém percebeu que o texto estava sem título e informa para todos o título do texto: A ENCHENTE. O responsável deverá assumir uma postura rígida como um professor severo informando sempre de cara emburrada que naquele momento de prova ninguém deverá falar, nem olhar para os lados e que todos possuem apenas 5 minutos para realizar a prova. Ele distribui a cópia do texto que está na próxima página e dá o sinal para início. Começa a andar freneticamente entre as fileiras de cadeiras chamando a atenção de quem olha para o lado, mandando todos se concentrarem. • Como se sentiram na prova; Quando finaliza os 5 minutos manda todos encerrarem o teste e com a equipe começa a olhar rapidamente as questões e dar zero para todo mundo. Depois começa a ler as perguntas em voz alta e pede respostas. Mostra impaciência quando as pessoas erram e reclama dizendo como eles espe- A partir daí, fica fácil achar as respostas para as perguntas. Depois retorna para a sala anterior onde faz uma rápida conversa com o grupo perguntando: • Se alguém se sentiu dentro do vidro como na história de Ruth Rocha; • Se alguém se sentiu intimidado pela ação do professor; • Se é este tipo de postura que queremos para o nosso projeto ou outro que garanta mais liberdade e poder de expressão ao outro. O responsável pode concluir falando sobre como em uma roda de leitura é importante que as crianças se sintam muito à vontade e que o mediador deve sempre estimular a todos para leitura e não reprimir como fez o professor na atividade da prova. Na próxima página está o texto que deve ser reproduzido e entregue para os participantes. Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 81 • Leia com atenção o texto a seguir: “Quando percebi, tudo já havia acontecido. O rádio ficou, e, apesar de mais pessoas estarem por perto, lá estava eu, sozinho com os meus pensamentos... O frio que eu sentia era diferente. Entrava pela pele e doía nos ossos, fazendo meu corpo todo tremer. Desapertei a gravata e tirei o paletó. Tentei manter a calma e abri lentamente a janela. Com muito esforço saí, mas não conseguia perceber exatamente onde eu estava. Meus movimentos eram lentos e dasajeitados... Já não me importava com coisas materiais... meus documentos, dinheiro, meu carro ou qualquer coisa assim. Consegui tirar os sapatos que me incomodavam muito e tentei me dirigir para a única direção onde provavelmente encontraria um poste. Foi quando vi a mulher tentando pegar o cachorro: comecei a rir sem parar e apoiei meu corpo cansado em cima do muro. Passou por mim um garoto assustado puxado por seu pai, um guarda com uma velhinha e um rapaz tranquilo que aparentemente me conhecia, pois disse um “oi, tudo sob controle aí?” e foi embora. Nesse momento comecei a entender como o trágico mora perto do cômico! Aos poucos consegui chegar a uma padaria que recebia quase todo mundo que escapava. Tomei um conhaque e, como bom brasileiro, fiquei trocando idéias e procurando soluções para os problemas do mundo com meus novos amigos...” Cocco e hair, 1994 – p. 82 In Didática de Português – Naspolini – FTD 1-Utilizando como referência o que está escrito no texto, responda: a) Por que o rádio ficou mudo? b)Por que o personagem tirou o paletó, desapertou a gravata e abriu a janela se sentia frio? c) Por que os sapatos o incomodavam? d) Por que ele se dirigiu a um poste? e) Por que ele se apoiou em cima do muro e não no muro? 82 Projeto Comunidade Educadora Anexo 13.8 Atividade: A Escola dos Sonhos Material • folhas de papel pardo • pilot colorido • giz de cera • 1 pote de vidro do tipo maionese de 250 gramas O responsável divide os participantes em grupos de 5 pessoas e entrega para cada grupo uma folha de papel pardo com pilot e giz de cera. Solicita a todos que reflitam em cada grupo como deveria ser a escola dos sonhos e a representem nas folhas de papel pardo com desenhos. Cada grupo, ao final, deverá apresentar para os demais seus cartazes. Quando o último grupo terminar, o responsável pegará o pote de vidro, virá para o centro e pedirá aos grupos que dobrem seus painéis com suas escolas do sonho e tentem colocá-los dentro do vidro. O responsável deixará eles tentarem por algum tempo. Passados 5 minutos e verificando que não é possível, o responsável pede então que todos retornem aos seus lugares e inicia a mediação do texto “Quando a Escola é de Vidro”, do livro Este Admirável Mundo Louco, de Ruth Rocha. É importantíssimo que todas as leituras sejam feitas diretamente nos livros originais. Afinal, lembrem-se que este projeto é de incentivo à leitura. Livro: (ESTE) ADMIRÁVEL MUNDO LOUCO Ruth Rocha Ilustrações: Walter Ono Editora: Salamandra Ano: 2003 Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 83 Anexo 13.9 Estudo Errado – Gabriel Pensador Composição: Gabriel, O Pensador Eu tô aqui pra quê? Será que é pra aprender? Ou será que é pra sentar, me acomodar e obedecer? Tô tentando passar de ano pro meu pai não me bater Sem recreio de saco cheio porque eu não fiz o dever A professora já tá de marcação porque sempre me pega Disfarçando, espiando, colando toda prova dos colegas E ela esfrega na minha cara um zero bem redondo E quando chega o boletim lá em casa eu me escondo Eu quero jogar botão, vídeo-game, bola de gude Mas meus pais só querem que eu “vá pra aula!” e “estude!” Então dessa vez eu vou estudar até decorar cumpádi Pra me dar bem e minha mãe deixar ficar acordado até mais tarde Ou quem sabe aumentar minha mesada Pra eu comprar mais revistinha (do Cascão?) Não. De mulher pelada A diversão é limitada e o meu pai não tem tempo pra nada E a entrada no cinema é censurada (vai pra casa pirralhada!) A rua é perigosa então eu vejo televisão (Tá lá mais um corpo estendido no chão) Na hora do jornal eu desligo porque eu nem sei nem o que é inflação - Ué não te ensinaram? - Não. A maioria das matérias que eles dão eu acho inútil Em vão, pouco interessantes, eu fico pu.. Tô cansado de estudar, de madrugar, que sacrilégio (Vai pro colégio!!) Então eu fui relendo tudo até a prova começar Voltei louco pra contar: Manhê! Tirei um dez na prova Me dei bem tirei um cem e eu quero ver quem me reprova Decorei toda lição Não errei nenhuma questão Não aprendi nada de bom Mas tirei dez (boa filhão!) Quase tudo que aprendi, amanhã eu já esqueci Decorei, copiei, memorizei, mas não entendi Quase tudo que aprendi, amanhã eu já esqueci Decorei, copiei, memorizei, mas não entendi 84 Projeto Comunidade Educadora Decoreba: esse é o método de ensino Eles me tratam como ameba e assim eu não raciocino Não aprendo as causas e consequências só decoro os fatos Desse jeito até história fica chato Mas os velhos me disseram que o “porque” é o segredo Então quando eu num entendo nada, eu levanto o dedo Porque eu quero usar a mente pra ficar inteligente Eu sei que ainda não sou gente grande, mas eu já sou gente E sei que o estudo é uma coisa boa O problema é que sem motivação a gente enjoa O sistema bota um monte de abobrinha no programa Mas pra aprender a ser um ingonorante (...) Ah, um ignorante, por mim eu nem saía da minha cama (Ah, deixa eu dormir) Eu gosto dos professores e eu preciso de um mestre Mas eu prefiro que eles me ensinem alguma coisa que preste - O que é corrupção? Pra que serve um deputado? Não me diga que o Brasil foi descoberto por acaso! Ou que a minhoca é hermafrodita Ou sobre a tênia solitária. Não me faça decorar as capitanias hereditárias!! (...) Vamos fugir dessa jaula! “Hoje eu tô feliz” (matou o presidente?) Não. A aula Matei a aula porque num dava Eu não aguentava mais E fui escutar o Pensador escondido dos meus pais Mas se eles fossem da minha idade eles entenderiam (Esse num é o valor que um aluno merecia!) Íííh... Sujô (Hein?) O inspetor! (Acabou a farra, já pra sala do coordenador!) Achei que ia ser suspenso mas era só pra conversar E me disseram que a escola era meu segundo lar E é verdade, eu aprendo muita coisa realmente Faço amigos, conheço gente, mas não quero estudar pra sempre! Então eu vou passar de ano Não tenho outra saída Mas o ideal é que a escola me prepare pra vida Discutindo e ensinando os problemas atuais E não me dando as mesmas aulas que eles deram pros meus pais Com matérias das quais eles não lembram mais nada E quando eu tiro dez é sempre a mesma palhaçada Refrão Encarem as crianças com mais seriedade Pois na escola é onde formamos nossa personalidade Vocês tratam a educação como um negócio onde a ganância, a exploração, e a indi- Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 85 ferença são sócios Quem devia lucrar só é prejudicado Assim vocês vão criar uma geração de revoltados Tá tudo errado e eu já tou de saco cheio Agora me dá minha bola e deixa eu ir embora pro recreio... Juquinha você tá falando demais assim eu vou ter que lhe deixar sem recreio! Mas é só a verdade professora! Eu sei, mas colabora se não eu perco o meu emprego. 86 Projeto Comunidade Educadora Anexo 13.10 Atividade: Remédios para os problemas de leitura Material • Papel pardo ou cartolina • Pilot colorido • Giz de cera • Fita crepe O responsável dividirá os participantes em grupos de 5 pessoas. Cada grupo recebe uma folha de papel pardo, pilot e giz de cera para criar no cartaz um remédio para combater os problemas da leitura. Cada grupo, além do nome do remédio, deverá informar quais são os componentes da fórmula dos remédios e como devem ser administrados. Anexo 13.11 Atividade: Caça ao Tesouro Material • Cesta grande ou caixa de papelão ou pequeno baú • Livros diversos de literatura • Bombons O responsável deverá arrumar dentro da cesta os livros e os bombons como tesouro e esconder em algum lugar do espaço. Os participantes deverão ser divididos em grupos de 5 que receberão pistas para encontrar o tesouro. Quando um grupo encontrar, todos devem retornar à sala onde o grupo que encontrou irá partilhar o tesouro distribuindo os bombons e mediando as obras da cesta. Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 87 Anexo 13.12 Atividade: Organizando rodas de leitura Material • Lençóis ou emborrachados ou esteiras • Almofadas coloridas • Livros de literatura diversos Os participantes deverão ser divididos em grupos de 5. Cada grupo deverá pegar na sala alguns lençóis ou emborrachados ou esteiras, almofadas e um conjunto de livros e deverá escolher um local do espaço para arrumar uma roda de leitura. Os participantes terão 15 minutos para arrumar o local da roda e escolher duas obras para serem mediadas e os responsáveis pelas mediações. Passados os 15 minutos, todos retornam à sala para irem de espaço em espaço ouvir as mediações promovidas por cada grupo. Caso o número de participantes seja muito grande, é possível reduzir para apenas uma mediação por grupo ao invés de duas. Outra opção é solicitar que algum dos grupos organize uma roda específica para adultos e outro uma específica para crianças de creche. O responsável pela atividade deverá observar cada roda e anotar observações para comentar posteriormente no grupão. 88 Projeto Comunidade Educadora Anexo 13.13 Atividade: Mímica sobre o texto Os participantes deverão ser divididos em 5 grupos. Cada grupo ficará com três desculpas para não ler da lista abaixo para representar para os demais utilizando mímica. Cada grupo deverá tentar adivinhar a desculpa que o outro grupo está apresentando. Mil Desculpas Para Não Ler Gabriel Perissé Desculpas multiformes não nos faltam quando já tomamos a decisão de evitar o compromisso da leitura. É preciso, porém, analisar essas desculpas e constatar o quanto e por que são esfarrapadas. “Sempre que estou lendo vem alguém e me interrompe.” O cemitério, à noite, é uma ótima alternativa para lermos livros de terror. Os fantasmas respeitarão nossa sede de solidão literária. “Os livros são caríssimos.” “Não tenho tempo para ler.” O tempo nasce de dentro para fora. O tempo da leitura é aquele que extraímos de nós mesmos, e o encaixamos em algum momento das 24 horas diárias. “Estou precisando fazer óculos novos.” Existem formas baratas ou gratuitas de ler. Existem bibliotecas (poucas, mas existem), existem sebos (às vezes nem tão barateiros, mas existem), existem amigos generosos que emprestam livros (alguns até nos dão livos de presente!), existe material a ser lido na internet (nem sempre fácil encontrar, mas existe), e existem grandes livrarias em que você pode sentar-se e ler vários livros sem precisar adquiri-los. Fique tranquilo: a leitura amplia a nossa visão. “As editoras só publicam porcaria.” “Ler me dá sono.” Uma bela desculpa, mas quem já leu muito sabe que há muitas pérolas a serem descobertas. A boa leitura desperta, tira desse estado de sono, de apatia e de desinteresse que alguém possa sentir diante de um livro. Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 89 “Já li tudo o que tinha de ler.” Os grandes leitores pensam e dizem exatamente o contrário. “As letras do livro são muito pequenas.” “Não quero ler para não ser influenciado.” A leitura inteligente é a melhor das influências. “Só vou ler depois que fizer um curso de leitura dinâmica.” As lentes de aumento da curiosidade são imprescindíveis nesses casos. Toda boa leitura dinamiza nossa vida. “Ler à noite estraga a vista.” “Amanhã eu começo a ler.” O dia é uma criança... Mas amanhã pode chover, pode ser que falte luz, pode ser que cheguem visitas inesperadas, pode ser que você sinta dor de cabeça... “Conheço um cara que vive lendo e só fala bobagem.” Esse cara deve ser eu... “Livro não ensina nada. O que ensina mesmo é frequentar a escola da vida.” E na escola da leitura reencontramos a vida, fonte de inspiração para os bons livros. “Quem lê muito fica doido.” E quem nada lê fica mudo. 90 Projeto Comunidade Educadora Gabriel Perissé é Mestre em Literatura Brasileira pela FFLCH-USP e doutor em Filosofia da Educação e doutorando em Pedagogia pela USP; é autor dos livros: “Ler, pensar e escrever” (Ed. Arte e Ciência); “ O leitor Criativo (Omega Editora); “Palavra e Origens” (Editora Mandruvá); “O professor do Futuro” (the Editora). É fundador da ONG Projeto Literário Mosaico; é editor da Revista Internacional Videlur – Letras (www. Hottopos.com/vdletras3/index. htm); é professor universitário, coordenador geral da ong literária Projeto Literário Mosaico: www.escoladeescritores.org.br Anexo 13.14 Ficha de contagem de empréstimos de livros Nome da Unidade Escolar: ____________________________________________________________ Nome do respondente: ______________________________________ Tel: ___________________ 1. Informe o total de livros emprestados ao longo do ano Mês Total de livros JANEIRO FEVEREIRO MARÇO ABRIL MAIO JUNHO JULHO AGOSTO SETEMBRO OUTUBRO NOVEMBRO DEZEMBRO Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 91 Anexo 13.15 FICHA DE inscriÇÃO ENCONTRO DE FORMAÇÃO DE MEDIADORES DE LEITURA NOME: _______________________________________________________________________________ DATA NASCIMENTO: _________________________________________________________________ ( ) FEMININO SEXO: ( ) MASCULINO ENDEREÇO DE CORRESPONDÊNCIA: ________________________________________________ _____________________________________________________________________________________ E-MAIL: _________________________ TEL: _____________________ CELULAR: _______________________ ESCOLA: ________________________ SÉRIE QUE CURSA: ____________________________ ( ) SIM ( ) NÃO TRABALHA EM QUÊ: ____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________________ JÁ REALIZOU OUTROS CURSOS DE FORMAÇÃO DE MEDIADORES ? ( ) SIM ( ) NÃO SE SIM, QUAIS: ______________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________________ EXISTE BIBLIOTECA OU SALA DE LEITURA EM SUA ESCOLA ? ( ) SIM ( ) NÃO ( ) NÃO SEI SE SIM, VOCÊ FREQUENTA A BIBLIOTECA OU SALA DE LEITURA DE SUA ESCOLA ? ( ) SIM ( ) NÃO EM GERAL, VOCÊ FREQUENTA A BIBLIOTECA OU SALA DE LEITURA PARA: ( ) PEGAR LIVRO A MANDO DO PROFESSOR ( ) FAZER TRABALHO PARA ESCOLA ( ) PEGAR LIVRO EMPRESTADO POR CONTA PRÓPRIA ( ) OUTRO MOTIVO, QUAL:__________________________________________________________ QUANTOS LIVROS VOCÊ LEU NO ANO PASSADO POR CONTA PRÓPRIA ? ( QUANTOS LIVROS VOCÊ JÁ LEU NESTE ANO POR CONTA PRÓPRIA ? ( 92 Projeto Comunidade Educadora ) ) Anexo 13.16 modelo carta convite “Os poemas são pássaros que chegam não se sabe de onde e pousam no livro que lês. Quando fechas o livro, eles alçam vôo como de um alçapão. Eles não têm pouso nem porto alimentam-se um instante em cada par de mãos e partem. E olhas, então, essas tuas mãos vazias, no maravilhado espanto de saberes que o alimento deles já estava em ti...” Os Poemas (Mário Quintana) Prezad@ amig@ É com grande prazer que comunicamos nossa satisfação em ter você no Encontro de Formação de Mediadores de Leitura que a Escola _______________________________ organizará nos dias ______________ do mês ______________ das ______às________ horas. Nossa intenção é lhe proporcionar dois dias alegres, dinâmicos e de intensa troca visando sua formação como mediador capaz de promover rodas e outras atividades de incentivo à leitura em escolas, creches e outras instituições de sua comunidade. O local de nosso encontro será na _________________________________________, situada na Rua __________________________________________________________________________. Telefones _________________________________________. Caso você ou seu responsável tenham alguma dúvida, por favor, entrem em contato conosco pelos telefones _____________________________________________ (falar com _______________) ou ____________________________ (falar com ________________________). Um forte abraço e até o encontro, p/ coordenação do encontro Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 93 Anexo 13.17 FICHA DE AVALIAÇÃO ENCONTRO DE FORMAÇÃO DE MEDIADORES DE LEITURA Data: _____________________ 1. Dados para construção de perfil Idade: _________ sexo: _______________ bairro onde mora: _________________________________________ Escola: _______________ série: _______________ 2. Como avalia o espaço do encontro (salas, banheiros, refeitório) ? ( ) Muito bom ( ) razoável ( ) Bom ( ) ruim Comentário: ________________________________________________________________________________________ 3. Como avalia a alimentação (café da manhã, almoço e lanche) ? ( ) Muito boa ( ) razoável ( ) Boa ( ) ruim Comentário: ________________________________________________________________________________________ 4. Como avalia as atividades e dinâmicas realizadas ? ( ) Muito boas ( ) razoáveis ( ) Boas ( ) ruins Comentário: ________________________________________________________________________________________ 5. Qual atividade ou parte da formação que foi mais legal ? ______________________________________________________________________________________________________ Por quê ? ____________________________________________________________________________________________ ( ) Marque aqui, caso ache que não teve nenhuma atividade legal no encontro. 6. Qual atividade não foi legal ? ______________________________________________________________________________________________________ Por quê ? ___________________________________________________________________________________________ ( ) Marque aqui, caso ache que não teve nenhuma atividade que não foi legal no encontro. 7. Considera que o encontro atingiu o objetivo de capacitar os jovens para organizarem rodas de leitura nas suas escolas ? Você se sente capacitado ? ( ) Sim ( ) em parte ( ) não Comentário: ________________________________________________________________________________________ 8. Como avalia cada apresentação do encontro de formação ? Muito boa boa Razoável ruim A história da escrita (dado por ______________________________) A realidade da leitura no Brasil (dado por ________________) O passo a passo da roda de leitura (dado por ______________) Como escolher o acervo (dado por _________________________) A organização do espaço para roda (dado por _____________) A postura do mediador (dado por ___________________________) 9. Quais sugestões possui para outros encontros ? ______________________________________________________________________________________________________ 10. Que outros comentários gostaria de fazer ? ______________________________________________________________________________________________________ 94 Projeto Comunidade Educadora ANEXO 13.18 FICHA DE REGISTRO DE RODA Data: ________________________________ Turno: Manhã ( ) Tarde ( ) Noite ( ) Anote abaixo O NOME de todos os mediadores que participaram da roda ________________________________________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________________________________________ Local da roda: ____________________________________________________________________________________________ Tipo de público: __________________________________________________________________________________________ Se a mediação for com turma de alunos, informe o número da turma: ______________________________________ Contagem aproximada de participantes por sexo Masculino Feminino crianças até 6 anos crianças entre 7 e 14 anos adolescentes entre 15 e 17 anos jovens entre 18 e 25 anos adultos acima dos 26 anos Relacione abaixo as obras lidas Título da Obra Autor Marque X para as obras lidas a pedido Marque M quando lida por mediador ou P por alguém do público Descreva a reação do público para as mediações feitas ________________________________________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________________________________________ Relacione as dificuldades que surgiram para realização da roda ________________________________________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________________________________________ Que outros comentários gostaria de fazer ? ________________________________________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________________________________________ Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 95 Anexo 13.19 Passo a passo para produzir pufes de garrafa pet Varner Simas Filho* Monitor de Educação Ambiental do projeto Comunidade Educadora Materiais necessários • 32 garrafas PET • Uma serrinha ou faca capaz de cortar sem estragar a garrafa PET • Fita gomada • Cola de sapateiro • Um quadrado de papelão 40 cm x 40 cm • Um quadrado de espuma 40 cm x 40 cm • Tecido colorido para forrar o pufe Processo • Cortar 16 garrafas numa medida de 15 cm deixando a parte de baixo intacta. • M ontar 16 jogos colocando uma garrafa não cortada de cabeça pra baixo dentro de uma garrafa cortada. Envolver as duas garrafas com fita gomada. • Formar duplas com cada jogo de garrafas com fita gomada. • Formar quartetos juntando as duplas já unidas. • J untar um quarteto com outro, sempre passando bastante fita gomada para ficar bem firme. • A o final, restarão 2 conjuntos de 8 jogos cada que deverão ser unidos com fita gomada. • P egue o papelão para fazer o assento. Coloque cola de sapateiro no papelão para colá-lo na parte de cima do pufe. • Coloque a espuma sobre o papelão. • Espere secar e forre o pufe com o tecido escolhido. 96 Projeto Comunidade Educadora Anexo 13.20 DIAGNÓSTICO SOBRE ESPAÇOS DE LEITURA 1. Data: _____________ 2. NOME ENTREVISTADORA: ____________________________________________________ 3. INSTITUIÇÃO: _________________________ 4. BAIRRO: ________________________________________________ 5. RESPONSÁVEL PELAS INFORMAÇÕES: ____________________________________________________________________ 6. CARGO: __________________________________________________________________________________________________ 7. TELEFONE CONTATO: _________________________8. E-MAIL: _________________________________________________ 9. TOTAL ALUNOS(AS)/ATENDIDOS(AS): _________ 10. TOTAL PROFESSORES(AS) / EDUCADORES(AS): _________ 11. TOTAL TURMAS: ______________ 12. TOTAL DE TURMAS POR SEGMENTO E TURNO EM 2008: _______________ TURNOS: ESPECIFICAR HORÁRIOS 1º TURNO 2º TURNO 3º TURNO 4º TURNO EDUCAÇÃO INFANTIL 0 A 3 EDUCAÇÃO INFANTIL 4 A 6 ENSINO FUNDAMENTAL 1ª a 4ª ENSINO FUNDAMENTAL 5ª a 8ª ENSINO MÉDIO EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS OUTRO, QUAL 13. ESPAÇOS DE LEITURA EXISTENTES E HORÁRIO DE FUNCIONAMENTO SIM 1º TURNO ( ) BIBLIOTECA ( ) SALA DE LEITURA ( ) OUTRO, QUAL 2º TURNO 3º TURNO 4º TURNO OBSERVAÇÕES 14. ASSINALE DO QUE É COMPOSTO O ACERVO DA INSTITUIÇÃO ( ) LITERATURA ( ) FITAS VHS E DVD ( ) DICIONÁRIOS ( ) ENCICLOPÉDIAS ( ) GIBIS ( ) MAPAS ( ) LIVROS DIDÁTICOS ( ) JORNAIS E REVISTAS ( ) LITERATURA DE CORDEL ( ) OUTROS, QUAIS 15. O ACERVO É CATALOGADO ? ( ) SIM ( ) NÃO SE SIM, EXPLIQUE COMO É FEITA A CATALOGAÇÃO: _________________________________________________________ ____________________________________________________________________________________________________________ 16. TOTAL APROXIMADO DE LIVROS DE LITERATURA EXISTENTES NO ACERVO TOTAL _____________________________________________________________________________________________________ 17. QUAL A PRINCIPAL CARÊNCIA DO ACERVO EM RELAÇÃO AO PÚBLICO ?__________________________________ ___________________________________________________________________________________________________________ ___ Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 97 18. PARA O CASO DE ATENDER CRIANÇAS DE 0 a 6, HÁ LITERATURA ESPECÍFICA PARA ESTA FAIXA ETÁRIA ? ( ) SIM ( ) NÃO SE SIM, DO QUE É COMPOSTO ? ____________________________________________________________________________ COMENTE SOBRE A SUFICIÊNCIA E QUALIDADE DESTE ACERVO DE 0 A 6: ____________________________________ ____________________________________________________________________________________________________________ 19. PARA O CASO DE ATENDER ADOLESCENTES E JOVENS, HÁ LITERATURA ESPECÍFICA PARA ESTES GRUPOS ? ( ) SIM ( ) NÃO SE SIM, DO QUE É COMPOSTO ? ____________________________________________________________________________ ____________________________________________________________________________________________________________ COMENTE SOBRE A SUFICIÊNCIA E QUALIDADE DESTE ACERVO MAIS VOLTADO PARA ADOLESCENTES E JOVENS: ___________________________________________________________________________________________________ ____________________________________________________________________________________________________________ 20. O ACESSO AO ACERVO É ABERTO PARA ( ) CRIANÇAS E JOVENS ATENDIDOS/ALUNOS ( ) PROFISSIONAIS DA INSTITUIÇÃO ( ) COMUNIDADE ( ) OUTROS, QUAIS 21. O ACESSO É MEDIANTE ( ) CONSULTA NA INSTITUIÇÃO ( ) EMPRÉSTIMO ( ) OUTRO, QUAL 22. NO ESPAÇO DE LEITURA ( ) O USUÁRIO PODE ACESSAR AO LIVRO DIRETAMENTE NAS PRATELEIRAS ( ) O USUÁRIO APENAS ACESSA AO LIVRO SOLICITANDO AO PROFISSIONAL DO ESPAÇO ( ) OUTRO, QUAL 23. NO CASO DE HAVER EMPRÉSTIMOS, HÁ REGISTROS ? ( ) SIM ( ) NÃO SE SIM, EXPLIQUE COMO É FEITO O REGISTRO: ______________________________________________________________ 24. INFORME O TOTAL DE LIVROS EMPRESTADOS POR MÊS DE 2006 (apenas para novas instituições) 2007 e primeiro semestre 2008 2006 (Apenas novas) 2006 (Apenas novas) 2007 JANEIRO JULHO JANEIRO JULHO FEVEREIRO AGOSTO FEVEREIRO AGOSTO MARÇO SETEMBRO MARÇO SETEMBRO ABRIL OUTUBRO ABRIL OUTUBRO MAIO NOVEMBRO MAIO NOVEMBRO JUNHO DEZEMBRO JUNHO DEZEMBRO 25. ANOTE “SIM” OU “NÃO” CONFORME AS CARACTERÍSTICAS DE CADA ESPAÇO DE LEITURA AREJADO BEM / BOA ILUMINADO CIRCULAÇÃO DE AR BIBLIOTECA SALA DE LEITURA OUTRO, QUAL OBSERVAÇÕES 98 Projeto Comunidade Educadora ESPAÇOSO (CONFORME NECESSIDADE DO PUBLICO) SEM BARULHOS EXTERNOS EM EXCESSO POSSUI POSSUI EMBORRACHADOS, CADEIRAS E PUFFS OU MESAS PARA ALMOFADAS CONSULTA 26. ANOTE “SIM” OU “NÃO” CONFORME OS EQUIPAMENTOS EXISTENTES EM CADA ESPAÇO DE LEITURA TV VIDEO CASSETE DVD COMPUTADOR OUTRO, QUAL: BIBLIOTECA SALA DE LEITURA OUTRO, QUAL 27. EXPLIQUE O USO DE CADA EQUIPAMENTO NOS ESPAÇOS DE LEITURA ________________________________________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________________________________________ 28. ANOTE TODOS OS RECURSOS DE CRIATIVIDADE UTIIZADOS NO ESPAÇO PARA ESTIMULAR O ACESSO DE CRIANÇAS, JOVENS E PROFISSIONAIS DA CASA (CARTAZES, DISPOSIÇÃO DO ACERVO E MOVEIS, PINTURAS, GRAVURAS, ETC...) ________________________________________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________________________________________ 29.RELACIONE AS ATIVIDADES DE INCENTIVO À LEITURA QUE OCORREM NA INSTITUIÇÃO, SUA FREQUÊNCIA, ESPAÇO ONDE OCORRE, PÚBLICO QUE PARTICIPA E TURNO. ATIVIDADE (MEDIAÇÃO, CONTAÇÃO, SARAU, CONVERSA COM AUTORES, ETC.) FREQUÊNCIA (DIÁRIA,SEMANAL, QUINZENAL,MENSAL, ESPORADICAMENTE) ESPAÇOS (BIBLIOTECA, SALA DE LEITURA, SALA DE AULA, ETC..) PÚBLICO TURNO (MANHÃ, TARDE, NOITE) OBS 30. INFORME QUANTOS PROFISSIONAIS ESTÃO LOTADOS NOS ESPAÇOS ESPECÍFICOS DE INCENTIVO À LEITURA, SE POSSUEM FORMAÇÃO ESPECÍFICA E QUAIS SUAS ATRIBUIÇÕES. TOTAL DE PROFISSIONAIS QTOS COM FORMAÇÃO ESPECÍFICA ATRIBUIÇÕES BIBLIOTECA SALA DE LEITURA OUTRO, QUAL 31. QUAIS PRINCIPAIS DIFICULDADES SUA INSTITUIÇÃO ENFRENTA PARA INCENTIVAR A LEITURA JUNTO AO SEU PÚBLICO ? ________________________________________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________________________________________ 32. QUE OUTROS COMENTÁRIOS GOSTARIA DE FAZER SOBRE O ACERVO, ATIVIDADES E ESPAÇOS DE LEITURA DE SUA INSTITUIÇÃO ? ________________________________________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________________________________________ Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 99 Anexo 13.21 Seminário de Formação de Mediadores de Leitura – Agosto 2008- Panorama da Leitura no Brasil Texto base para Apresentação sobre Realidade da Leitura no Brasil e na comunidade O Brasil chega ao século XXI, momento em que a difusão do audiovisual assume imensas proporções, ainda com enorme déficit no que diz respeito às práticas leitoras dos textos escritos. Nossos índices de alfabetização (stricto e lato sensu) e de consumo de livros são ainda muito baixos, na comparação com parâmetros de países mais ricos e desenvolvidos e mesmo com alguns dos países em desenvolvimento da América Latina e da Ásia. Como têm apontado alguns de nossos mais expressivos pensadores no campo das Ciências Humanas, entre eles Nelson Werneck Sodré, o Brasil passou abruptamente de um estágio de oralidade para a cultura do audiovisual, já desde meados do século XX, quando a indústria cultural se fez onipresente entre nós, sem que houvesse efetiva mediação dos livros e materiais de leitura uma vez que esta nunca chegou a alcançar largas faixas da população, restringindo-se a pequenos e localizados grupos sociais. As consequências desse hiato fazem-se sentir até hoje, com desdobramentos nefastos que se espraiam não apenas no âmbito do universo da cultura e da educação, mas, naturalmente, de nossa economia, de nossas práticas políticas e de nosso potencial de desenvolvimento. Diversas pesquisas, realizadas nos últimos anos, têm-se empenhado em apresentar contornos mais nítidos do cenário em que se insere a questão da leitura e do livro 100 Projeto Comunidade Educadora no país, permitindo maior consciência das mazelas que afligem o setor e oferecendo dados concretos para que se possa buscar sua superação. É o caso, por exemplo, do Mapa do Alfabetismo no Brasil (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – INEP/ MEC, 2003), do Indicador Nacional do Alfabetismo Funcional – INAF (2001 e 2005), do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica – SAEB (2001 e 2003), do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes – PISA (2000) e do Retrato da Leitura no Brasil – CBL/ Snel (2001). De acordo com o Mapa do Alfabetismo no Brasil (INEP, 2003), a evolução da taxa de analfabetismo da população de 15 anos ou mais, no País, diminuiu de 65,3%, em 1900, para 13,6%, em 2000, realizando grande avanço neste campo ao longo do século passado. Apesar desse avanço, entretanto, o Brasil ainda possuía, em 2000, cerca de 16 milhões de analfabetos absolutos (pessoas que se declararam incapazes de ler e escrever um bilhete simples) e 30 milhões de analfabetos funcionais (pessoas de 15 anos ou mais, com menos de quatro séries de estudos concluídas). Com base nesses dados, o INEP concluiu que, se foi possível reverter o crescimento constante do número de analfabetos a partir de década de 1980, o número absoluto de analfabetos em 2000 ultrapassou o dobro do que havia em 1900. E o dado mais estarrecedor, talvez, apontado pela pesquisa, é o de que 35% dos analfabetos brasileiros já frequentaram a escola. Com outra abordagem sobre o analfabetismo, os dados de uma das mais relevantes pesquisas sobre o assunto, denominada Indicador Nacional de Alfabetismo Funcional – INAF-2001, realizada pelo Instituto Paulo Montenegro (Ibope pela Educação), definiu três níveis de alfabetismo de acordo com as habilidades demonstradas pelos entrevistados no teste aplicado. O resultado do INAF 2001 classificou 9% dos entrevistados como analfabetos absolutos; 31% foram classificados no nível 1 (rudimentar) de alfabetismo, pois conseguem apenas ler títulos ou frases, localizando informações bem explícitas; 34% foram classificados no nível 2 (básico) de alfabetismo, pois são aqueles que conseguem ler textos curtos, localizando informações explícitas ou que exijam pequena inferência; e 26% foram classificados no nível 3 (pleno) de alfabetismo, correspondendo àquelas pessoas capazes de ler textos mais longos, localizar e relacionar mais de uma informação, comparar vários textos, identificar fontes. O INAF 2005 atualiza a pesquisa realizada quatro anos antes e demonstra que, ainda que se verifique tendência de diminuição do nível 1 (analfabetismo absoluto) e aumento dos que atingem o nível 2 de alfabetismo (básico), a situação dos entrevistados que atingem o nível 3 (pleno) de habilidade não teve evolução significativa, mantendo-se próximo a um quarto da população estudada. Ou seja, apenas um em cada quatro jovens e adultos brasileiros consegue compreender totalmente as informações contidas em um texto e relacioná-las com outros dados. Configura-se, assim, um quadro perverso de exclusão social, que deixa à margem do efetivo letramento cerca de três quartos da população brasileira. Deve-se enfatizar que, de acordo com os especialistas, uma das principais causas do elevado índice de alfabetismo funcional e das dificuldades generalizadas para a compreensão vertical da informação escrita se localiza na crônica falta de contato com a leitura, sobretudo entre as populações mais pobres. Como os investimentos para combater o analfabetismo têm sido crescentes nos últimos anos, isso equivale a dizer que ao mesmo tempo em que milhões de brasileiros ingressam a cada ano na categoria de leitores em potencial, outros milhões saem pela porta dos fundos – a do alfabetismo funcional. Assim, um formidável conjunto de esforços, energia e investimentos públicos e privados não se realizam plenamente, não atingindo suas finalidades. É importante observar que, embora nas sociedades atuais a leitura seja imprescindível para o ingresso no mercado de trabalho e para o exercício da cidadania, no Brasil as pesquisas e as avaliações educacionais apontam para a precária formação de um público leitor e revelam as imensas dificuldades para o sucesso das ações envolvidas na solução do problema. Se, por um lado, o sistema educacional brasileiro incluiu os estudantes que estavam fora da escola, por outro, essa inclusão não foi plena, do Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 101 ponto de vista qualitativo, porque o desempenho dos alunos, revelado em instrumentos de avaliação como o SAEB ou o PISA, tem sido baixo, demonstrando sérios problemas no domínio da leitura e da escrita e o aprofundamento das desigualdades. O Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica – SAEB, desenvolvido pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP/MEC) a partir de 1990, aplica, a cada biênio, exames de proficiência em Matemática e em Língua Portuguesa (leitura) em uma amostra de estudantes de 4ª e 8ª séries do Ensino Fundamental e de 3ª série do Ensino Médio, nas redes de ensino pública e privada, em todas as regiões do país. No geral, os resultados da avaliação têm mostrado sistemática queda no desempenho dos estudantes em quase todas as regiões, revelando sérios impasses da escola brasileira. O SAEB-2001 revela que 59% dos estudantes da 4ª série do Ensino Fundamental ainda não desenvolveram as competências básicas de leitura, ou seja, não conseguem compreender os níveis mais elementares de um texto. Sob outro prisma, a mesma avaliação aponta um desempenho superior de 20% nas escolas em que a prática da leitura é mais constante entre os alunos. Tais dados do SAEB-2001 são também reforçados pela avaliação das habilidades de leitura dos alunos de 8ª série do Ensino Fundamental realizada no SAEB-2003: 4,8% classificam-se em um estágio muito crítico, 20,1% em um estágio crítico e 64,8% em um estágio intermediário. Também o Relatório do PISA-2000, Programa Internacional de Avaliação de Estudantes da Organização para a 102 Projeto Comunidade Educadora Cooperação e Desenvolvimento Econômicos, reitera os dados mostrados pelo SAEB. O Brasil foi o último colocado na avaliação sobre o letramento em leitura obtido por jovens de 15 anos de 32 países industrializados naquele Relatório nessa pesquisa em que o conceito de leitura em pauta não se resume à noção muito frequente de mera decodificação e compreensão literal de textos escritos, mas à capacidade de o jovem compreender e utilizar textos de variada natureza para alcançar seus objetivos, desenvolvendo conhecimentos e participando ativamente da sociedade. Daí porque a expressão letramento foi escolhida para refletir a complexidade das variáveis em jogo, a amplitude de conhecimentos, habilidades e competências em causa, procurando-se verificar a operacionalização de esquemas cognitivos em termos de: conteúdos ou estruturas do conhecimento que os alunos precisam adquirir em cada domínio; processos a serem executados; contextos em que esses conhecimentos e habilidades são aplicados. Em uma avaliação sofisticada como o PISA, destaca-se ainda mais o péssimo desempenho dos alunos brasileiros, próximos do final da escolaridade obrigatória, revelando que não estão preparados para enfrentar os desafios do conhecimento nas complexas sociedades contemporâneas. Uma performance dessa natureza acarreta prejuízos de toda ordem. A baixa competência de leitura não apenas influi no desenvolvimento pessoal e profissional dos estudantes como também, e até por isso, contribui decisivamente para ampliar o gigantesco fosso social existente em países como o Brasil, promovendo mais exclusão e menos cidadania. Na pesquisa Retrato da leitura no Brasil, ainda precária e insuficiente, mas a maior investigação já feita no Brasil sobre leitura fora de uma perspectiva prioritariamente “escolar” (com leitores com idade igual ou superior a 14 anos e o mínimo de três anos de escolaridade), realizada em 2001 pela Câmara Brasileira do Livro (CBL), Sindicato Nacional dos Editores de Livros (Snel) e Associação Brasileira dos Editores de Livros (Abrelivros), outros tópicos significativos sobre a situação da leitura no país são enfatizados. Um aspecto capital apontado pela pesquisa é o de que o brasileiro lê em média 1,8 livro por ano, índice muito baixo, se comparado ao de países como a França (7,0), os Estados Unidos (5,1), a Inglaterra (4,9) ou a Colômbia (2,4). E esse índice se revela ainda mais crítico quando a pesquisa demonstra que a penetração do livro no país e o acesso a esse objeto cultural são ainda bastante restritos, concentrando-se o mercado comprador de livros nas mãos de 20% da população alfabetizada com 14 anos ou mais, na Região Sudeste, nas grandes cidades e metrópoles, nos estratos de renda mais elevada (classe A) e com instrução superior. Outro dado dos mais preocupantes, apontado pela pesquisa, é o que mostra que apenas 50% dos livros de leitura corrente foram comprados, em contraposição a 8% pertencentes às bibliotecas e 4% dados pela escola. Ora, o raso acesso a livros em escolas e bibliotecas somadas ao baixo poder aquisitivo da absoluta maior parte dos leitores, propicia efetivamente alternativas escassas para que se concretize a leitura. E é preciso sublinhar que o acesso às bibliotecas é pequeno, não apenas por uma questão cultural que remonta a nossa longa história de iletramento, mas porque a rede de bibliotecas no país é reduzida, seja em termos quantitativos, seja em um plano qualitativo. Ainda assim, conforme o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), na Munic 2003, a biblioteca é um dos equipamentos culturais mais importantes do Brasil, presente em cerca de 85% das cidades brasileiras, em suas modalidades de bibliotecas públicas municipais, escolares e comunitárias. Mesmo assim, cerca de 630 municípios brasileiros ainda não têm biblioteca pública e grande parte das existentes possui equipamentos precários, acervos ínfimos e/ou muito defasados e recursos humanos despreparados para um processo de mediação eficiente na formação de leitores. Não se pode deixar de lembrar, ainda, que, associado à forte concentração do público consumidor de livros segundo critérios geográficos, de classe social e de nível educacional – como apontou a pesquisa –, há um déficit considerável de livrarias no país. Existem pouco mais de 2.400 livrarias no Brasil, quando o ideal, segundo, os especialistas, seria por volta de 10.000 para nosso contingente populacional. Além disso, a distribuição das livrarias é extremamente desigual, se considerarmos que 89% dos municípios não possuem nenhuma livraria. E, paradoxalmente, deve ser frisado que esse cenário desolador se insere no contexto de um país que é o oitavo produtor de livros do mundo, com um poderoso e atualizado mercado editorial, que conta com mais de 2.000 editoras e movimentam mais de 12.000 títulos e 300 milhões de exemplares publicados anualmente. Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 103 Sobre a CARE Brasil – A CARE Brasil é uma ONG brasileira, com título de OSCIP (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público), que iniciou suas operações em 2001. A CARE Brasil se concentra no combate à pobreza, abordando as suas causas estruturais por meio de projetos de desenvolvimento urbano e rural. Para este fim, opera atualmente em nove estados, incluindo duas áreas urbanas (Rio de Janeiro e São Paulo) e sete regiões rurais (Bahia, Piauí, Maranhão, Ceará e Goiás). Atua, ainda, na resposta e redução de risco de desastres, com projetos na Região Serrana do Rio de Janeiro. A CARE Brasil faz parte da rede CARE Internacional. Com atuação em 87 países, a CARE apoiou, em 2013, mais de 97 milhões de pessoas, melhorando a saúde básica e a educação, combatendo a fome, desenvolvendo o acesso à água potável e saneamento, expandindo oportunidades econômicas, combatendo as mudanças climáticas e atuando na recuperação de desastres. Para mais informações, acesse: www.care.org.br 104 Projeto Comunidade Educadora Sistematização da metodologia de formação de mediadores e implantação de rodas de leitura 105 130 projeto comunidade educadora