edição final - IMAG-DF - Instituto dos Magistrados do Distrito Federal
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edição final - IMAG-DF - Instituto dos Magistrados do Distrito Federal
2 O Magistrado O Preço da Justiça, ou, quanto vale a honra de um homem público? Montmorency, que o protegia, sobrepujaram as de Garasse. Se na França tivesse sido aprovada a sábia lei que determina estar o acusador sujeito à mesma pena do acusado, submetendose à mesma prisão, Garasse e seu confrade teriam sido mais comedidos”. “Na França, muitas vezes foi preciso que o parlamento contivesse a Sorbonne por meio de decisões judiciais. O douto Ramus, que era bom geômetra para o seu tempo e já tinha reputação na época de Francisco Desembargador Valter Xavier I, nem desconfiava então que estava preparando morte pavorosa para si ao defender uma tese contra a lógica de Aristóteles. Foi perseguido por muito tempo, citado até diante de tribunais seculares por certo Gallandius Torticolis; foi ameaçado de condenação às galés. E o que se discutia? O principal objeto da disputa era a maneira como se devia pronunciar ‘quisquis’ e ‘quamquam’. (...) Os zelosos discípulos do Estagirita grego sentiram-se tão encorajados entre os descendentes dos gauleses que, muito tempo depois de passadas a embriaguez e a fúria da Noite de São Bartolomeu4, obtiveram, em 1624, uma sentença que proibia, sob pena de morte, ter opinião contrária à de Aristóteles.”5 Valendo-nos de tais precedentes coligidos por Voltaire, permitimo-nos, nesta edição, destacar os eventos que marcaram o mês de agosto – que, principalmente neste país, se considera aziago. E, sem enfrentar o mérito das acusações ou das provas eventualmente oferecidas e apresentadas nem avalizar o conteúdo das contestações relativas a duas destacadas figuras públicas desta Capital (um membro do Parlamento e outro do Judiciário), ousamos abrir espaço para o contraditório, para a mais ampla defesa, haja vista que as imputações seriam de domínio público. Assim, facultamos aos interessados em julgá-los – absolvendo-os ou os condenando com a velocidade que reputarem conveniente –, e aos leitores em geral, que conheçam, pelo menos, o que teriam referidas personalidades a dizer. Footnotes ____________________________________ 1 Os grifos não são, necessariamente, do original. 2 op. cit., pg. 89. 3 " Essa enorme e negra máquina/ cujo corpo flexível e negro/ estende os braços até a China”, cf. op. cit., pg. 55. 4 Quando Ramud teria sido “legalmente” executado! 5 op. cit., pg. 53. O Magistrado 3 Carlos Tiburcio/O Magistrado Não! Não se preocupem os vendilhões do templo nem aqueles que os combatem! Nada pessoal. O título que encima esta mensagem se refere à obra de Voltaire (1694-1778), conforme editada pela Livraria Martins Fontes Editora Ltda., de São Paulo, em setembro de 2001. E qualquer semelhança com os excertos adiante e o que acontece nos dias de hoje não será mera coincidência. Ou será? Mas, que tal lembrar os apontamentos de Voltaire? Então, vamos à obra1: “... cabe relatar ainda a incrível porém pública aventura de La Pivardière. A sra. de Chauvelin, casada em segundas núpcias com ele, foi acusada de mandar matá-lo em seu castelo. Duas criadas foram testemunhas do crime. A própria filha ouviu os gritos e as últimas palavras do pai: ‘Meu Deus, tende piedade de mim!’ Uma das criadas, doente, correndo perigo de vida, invoca Deus, recebendo os sacramentos de sua Igreja, para afirmar que sua patroa viu quando mataram o patrão. Várias outras testemunhas viram as roupas manchadas de sangue; muitas ouviram o tiro com que se deu início ao assassinato. Sua morte é dada como certa. No entanto, nenhum tiro fora dado, não havia sangue derramado, e ninguém fora assassinado. O resto é ainda mais extraordinário. La Pivardière volta para casa; apresenta-se aos juízes da província, que intentavam reparar sua morte. Os juízes não desejam baldar os procedimentos; afirmamlhe que ele está morto, que é um impostor por dizer que ainda está vivo, que deve ser punido por mentir daquele modo para a justiça, que os autos são mais fidedignos que ele. Esse processo criminal dura dezoito meses antes que o pobre homem consiga obter a sentença certificando que está vivo.”2 “Não foram poucas as vezes que as inimizades pessoais recorreram ao braço da justiça, tentando espessar sua venda. Sabe-se que os jesuítas Cotton e Garasse quiseram atacar no conselho do rei o sábio e sapiente Pasquier, que os acusara diante do parlamento; mas finalmente, não encontrando meios de intentar empresa tão ousada, Garasse limitou-se a fazer sua prédica em público, e (..) o trecho mais eloqüente de seu libelo: ‘Pasquier é um leva-e-traz, enxurro de Paris, almofadinha fanfarrão, farsola, gentinha, vendedor de patacoadas, simples empregadinho, que não merece ser o escudeirete dos lacaios; mendigo, bandido, que arrota, peida e desengole; forte suspeito de heresia, ou mesmo herege, ou até pior; sátiro imundo e nojento, um senhor arquibesta por natureza, por bequadro, por bemol, besta na mais alta escala, besta com três tacões, besta com duas tintas, e tinta carmesim, besta de todos os tipos de bestice.’ Embora não tenha conseguido prevalecer contra um homem tão respeitável quanto Pasquier, conseguiu a perdição do infeliz Teophile, que, não sei em que poesia, enfiara estes três versos um tanto mordazes sobre os jesuítas: ‘Cette énorme et noire machine/ Dont le souple et le vaste corps/ Étend ses bras jusqu’a à la Chine etc.’3 Uma injúria tão leve, se é assim que se pode chamar, não merece a acusação de ateísmo intentada por Garasse. Esse jesuíta e um de seus confrades, chamados Voisin, aproveitando-se das credenciais da companhia, foram ao mesmo tempo acusadores e beleguins, mandando encerrar Teophile na masmorra de Ravaillac. Pediram veementemente o seu suplício durante um ano inteiro; mas as credenciais da casa de Capa (foto Ana Nascimento/ABr - Montagem: André Messias) - O presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem um agosto bastante movimentado. A história recente do Brasil e do mundo mostra que este é o mês mais tumultuado e marcado por tragédias, como as bombas atômicas no Japão, o suicídio de Getúlio Vargas, a morte de JK, entre outras. Será que o governo conseguirá aprovar as reformas, nesse clima? Lula faz balanço do governo O presidente Luiz Inácio Lula da Silva faz um balanço dos primeiros sete meses de governo. Fala, primeiramente, sobre a aprovação em primeiro turno na Câmara da reforma da Previdência, afirmando que já foi dado “um grande passo rumo a garantir o futuro das aposentadorias e pensões de todos os brasileiros, além de eliminar altos salários no serviço público “incompatíveis com a realidade brasileira”. 12 Em Tempo Novo desembargador no TJDFT O juiz de Direito Waldir Leôncio Júnior tomou posse como desembargador do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), no último dia 22 de agosto. Leôncio, que já atuava como desembargador convocado desde 1994, 4 O Magistrado ocupou a vaga deixada pelo desembargador Pedro Aurelio. Ele foi eleito pelo Pleno Administrativo do TJDFT como o mais indicado para ascender à condição de desembargador. A promoção foi baseada no critério de merecimento. Exclusivo Pedro Aurélio deixa o TJDF Depois de 38 anos de serviço público, dos quais 28 dedicados à magistratura, o desembargador Pedro Aurélio Rosa de Farias, 57 anos, despediu-se do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, no último dia 11 de agosto, com o sentimento de missão cumprida. 48 José Edmar, enfim, se defende Depois de passar 29 dias preso na carceragem da Superintendência da Polícia Federal, em Brasília, sob a acusação de envolvimento com grilagem de terras públicas, o deputado distrital José Edmar (PMDB), enfim, começou a se defender. 26 O Cabimento da oposição pela administração, como proprietária, com base no domínio, em ação possessória disputada por terceiros sobre bens públicos Jansen Fialho de Almeida Juiz de Direito do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, titular da Vara Cível de Planaltina - DF e vice-presidente do Instituto dos Magistrados do Distrito Federal – IMAG-DF. Pág. 40 O Magistrado 5 O noticiário de cada dia documenta a multiplicação dos resultados desse círculo perverso vicioso que aumenta progressivamente a corrosão do prestígio do Judiciário brasileiro Não se construirá uma democracia de verdade sem instituições judiciárias fortes Rose Brasil/ABr Divulgação/STF A credibilidade não resiste à exacerbação da justa insatisfação popular com a ineficiência, o custo e a lentidão do funcionamento do serviço da Justiça Temos de lembrar do Collor, que em 1989 foi eleito dizendo que combateria os marajás. Nós fizemos isso. Agora, o maior salário será o do ministro do STF [Supremo Tribunal Federal], que é de R$ 17 mil LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, PRESIDENTE DA REPÚBLICA SEPÚLVEDA PERTENCE PRESIDENTE DO TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL E MINISTRO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL O Brasil precisa crescer, o resto é conversa fiada Photoagência/Isaac Amorim 6 O Magistrado Jogar uma galinha na prefeita foi uma ofensa. É como se um homem estivesse falando e jogassem um veado MÁRCIO THOMAZ BASTOS, MINISTRO DA JUSTIÇA, AO COMENTAR SOBRE A GALINHA PRETA QUE UM ESTUDANTE ATIROU NA PREFEITA MARTA SUPLICY DURANTE A COMEMORAÇÃO DO 11 DE AGOSTO EM SÃO PAULO Marcelo Jr./ABr JOSÉ DIRCEU, MINISTRO-CHEFE DA CASA CIVIL, SOBRE AS DISPUTAS EM TORNO DA REFORMA TRIBUTÁRIA Anúncio TERRACAP O Magistrado 7 Wilson Dias/ABr O presidente Lula iniciou o mês com ameaças de greves e depredação do Congresso Nacional Agosto negro é desafio para Lula Agosto sempre foi o mês que marcou as maiores tragédias no Brasil e no mundo. E, neste ano, o Governo tem dias preocupantes pela frente Agosto sempre foi um mês que marcou a história do Brasil e do m u n d o. Ta m bém, não seria por menos. Foi em agosto de 1942 que o Brasil declarou guerra à Alemanha e à Itália; que os EUA detonaram bombas atômicas em Hiroshima e Nagasaki; que Getúlio Vargas cometeu suicídio; que Jânio Quadros renunciou 8 O Magistrado à presidência da República; que João Goulart, o Jango, então vice-presidente de Jânio, sofreu pressões para não ser empossado; q u e morreu Juscelino Kubistschek de Oliveira, entre outras tragédias. Os fatos históricos que marcaram o mês de agosto no Brasil começaram em 1942. O país vivia sob o regime ditatorial, quando o então presidente Getúlio Var- gas, a pedido do presidente norte-americano Roosevelt, declarou guerra à Alemanha e à Itália. Ainda nos anos 40, o mundo conheceria a mais mortífera e letal arma do século: a bomba atômica. Isso acontece em 1945, quando os EUA optam por atacar cidades japonesas com o novo tipo de arma. A primeira, lançada sobre Hiroshima, em 6 de agosto de 1945, mata 100 mil pessoas. Três dias cional. depois, uma segunda No princípio de bomba caiu sobre Naagosto, o presidente gasaki, matando mais anunciou a criação da de 70 mil. Era o fim Comissão Nacional de da 2ª Guerra Mundial. Planejamento e a preNove anos deparação do Primeiro pois, em agosto de Plano Qüinqüenal, 1954, uma tentativa que viria substituir o de assassinato contra Plano de Metas estao jornalista Carlos Labelecido na adminiscerda, no Rio de Jatração de Juscelino neiro, é atribuída à Kubitschek. guarda pessoal do enA política extertão presidente Getúlio na “independente” imVargas – de volta ao plementada pelo gopoder graças ao voto verno indicava a tenpopular. Sob forte tativa de aproximação pressão das Forças Arcomercial e cultural madas, depois de uma com os diversos blolonga reunião no Palácos do mundo póscio da Guanabara, no guerra, o que provoRio de Janeiro, Getúlio cou a desconfiança aceita afastar-se do de setores e grupos cargo e retira-se para internos que defendiseus aposentos. Hoam o alinhamento auras depois, ouve-se tomático com os Esum tiro: Getúlio cometados Unidos. Repertera suicídio com um cutiu negativamente, tiro contra o peito. também, a condecoEm 1961, Jânio ração do ministro da Getúlio Vargas suicidou-se em agosto de 1954 Quadros foi eleito preEconomia cubano Erplano foi aprovado pelo Funsidente da República, com nesto Che Guevara com a do Monetário Internacional uma esmagadora vitória soordem do Cruzeiro do Sul. (FMI), credenciando o gobre o marechal Teixeira Lott. No âmbito interno, o verno à renegociação da díJânio assumiu a presidência governo experimentava, ainvida externa brasileira. de um país com cerca de 72 da, a ausência de uma base Internamente, essa milhões de habitantes. Iniciou política de apoio: no Congrespolítica teve um alto custo, seu governo lançando um so Nacional dominavam o implicando, por exemplo, a programa antiinflacionário, PTB e o PSB, ao mesmo elevação dos preços do pão que previa a reforma do sistempo em que Jânio Quadros e dos transportes. Em martema cambial, com a desvaafastara-se da UDN, enfrenço, Jânio encaminhou o prolorização do cruzeiro em tando a oposição cerrada do jeto da lei antitruste e de 100% e a redução dos subgovernador do estado da criação da Comissão Admisídios às importações de proGuanabara, Carlos Lacerda. nistrativa de Defesa Econôdutos como trigo e gasolina. Esses são alguns dos princimica, vinculada ao MinistéPretendia incentivar as exporpais fatores que teriam lerio da Justiça, o que foi retações do país, equilibrando vado à renúncia do presidenjeitado pelo Congresso Naa balança de pagamentos. O te em 25 de agosto de 1961, O Magistrado 9 consumada através acidente automobilístide documento apreco. Com o lema de gosentado ao Congresso verno “Cinqüenta anos Nacional. em cinco”, ele fundou Com o vice-preBrasília em 21 de abril sidente João Goulart de 1960. em viagem à China, Mas, afinal de esse gesto abriu uma contas, o que tem a grave crise política, vez história com o goverque a posse de Gouno Lula? Aparentemenlart era vetada por três te nada. Porém, o goministros militares. A verno petista entrou o solução encontrada mês sob forte pressão pelo Congresso, e de magistrados e proaprovada em 3 de se- João Goulart tomou posse, mas foi impedido de governar curadores de justiça tembro de 1961, foi a que, em virtude da Reinstauração do regime parforma da Previdência, lamentarista, que seria ameaçaram fazer greve. submetido a um plebiscito A Reforma Tributária – e garantiria o mandato de cujo relatório foi apresenJoão Goulart até 31 de jatado em julho – também neiro de 1966. Jango perdeve ser votada sob presmaneceu no cargo até são. Há ainda outros ele1964, quando foi derrubamentos, como o “espetádo por um golpe militar. culo” do crescimento ecoOutra tragédia aconnômico, que nos fazem reteceu em 22 de agosto de lembrar os tempos de JK. JK morreu em um acidente de carro em 1976 1976. Foi quando morreu E agora, o que vai acontecer com o Governo Lula? Só o ex-presidente Juscelino Kuo tempo pode dizer... bistschek de Oliveira, em um Jânio Quadros renunciou em agosto 10 O Magistrado As bombas atômicas foram despejadas no Japão em agosto de 1945 O Magistrado 11 Lula faz balanço de seu governo Em pronunciamento à nação, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez um balanço dos seus primeiros sete meses Em pronunciamento feito no dia 14 peitadas. Fui eleito para realizar as mudanças em de agosto, às 20h, em cadeia nacipaz e não permitirei o confronto nem a ilegalidade”, onal, o presidente Luiz Inácio Lula afirmou. O presidente mandou um recado para ruda Silva fez um balanço dos primeiralistas e sem terra, ainda, sobre a reforma agrária ros sete meses de governo. Falou que o governo tem seu tempo e seu prazo e que a sobre a aprovação em primeiro tur“radicalização não traz benefício a ninguém.” no na Câmara da reforma da PreviCrescimento - Para que o país possa redência, afirmando que já foi dado “um grande tomar o crescimento e gerar empregos, o presipasso rumo a garantir o futuro das aposentadoridente enfatizou a importância da vitória sobre a as e pensões de todos os inflação e a recuperação brasileiros, além de elimida imagem do Brasil no nar altos salários no serviexterior. Destacou, tamO Brasil é um país que não foge ço público “incompatíveis bém, a continuidade de dos seus problemas e a com a realidade brasileira”. queda dos juros e disse aprovação, em primeiro turno, “O Brasil é um país que “não existe mágica”. da reforma foi um exemplo que não foge dos seus “O passado já nos problemas e a aprovação mostrou que não funcioem primeiro turno da rena agir com sobressaltos forma foi um exemplo. Algo que só foi possível porque o resultado ruim quem sente sempre são graças ao empenho e vontade política de prefeios mais pobres e a classe média”, destacou. tos, governadores, deputados, senadores, além Sobre o agronegócio, o presidente destada decisiva participação das centrais sindicais, mas, cou que já foram investidos R$ 27 bilhões no principalmente do apoio maciço do povo brasileisetor e R$ 5 bilhões para a agricultura familiar. ro”, ressaltou. “Nunca destinamos tanto dinheiro para o pequeO presidente destacou o processo de aprono produtor, que produz a grande maioria dos vação da reforma como sendo a “clara demonsprodutos brasileiros , além da gerar a maior parte tração do estilo do governo” que, segundo o predos empregos no campo”, ressaltou. sidente, é “determinado e não tem medo de ouFuturo - O presidente concluiu, destacanvir”. “Antes de decisões importantes este goverdo a abertura de contas na Caixa Econômica Feno conversa com todos políticos, sejam de direita deral para milhares de brasileiros, a retomada das ou de esquerda, empresários, sindicalistas e, prinobras de infra-estrutura. “Ainda temos muita coicipalmente, a população. sa a fazer. Mas, sempre, seguindo um tranqüilo Reforma agrária - Sobre o processo de processo democrático porque foi para respeitar a reforma agrária, o presidente Lula lembrou que democracia que fui eleito”, finalizou. as desigualdades sociais são enormes e antigas, Este foi o segundo pronunciamento do premas que, assim mesmo, a reforma está camisidente Lula em cadeia de rádio e TV desde que nhando. Contudo, ratificou o que vem sendo dito assumiu a Presidência da República. A gravação pelo governo em outras oportunidades: o cumdo pronunciamento foi coordenada pelo publicitáprimento irrestrito à lei. rio Duda Mendonça, responsável pela elaboração “Existem regras e leis que precisam ser resde toda a campanha eleitoral de Lula. 12 O Magistrado Anúncio LAKE SIDE O Magistrado 13 14 O Magistrado José Cruz/ABr “Não briguei briguei para para “Não ser eleito eleito e e não não ser mudar as as coisas” coisas” mudar No discurso que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez, no último dia 14 de agosto, no Palácio do Planalto, ele gabouse por saber de cor o nome de todos os ministros. Citou um a um, durante a cerimônia de apresentação do relatório de consulta pública do Plano Plurianual de Investimentos para 2004/2007, em Brasília. Por impedimento visual, esqueceuse de dois, um a sua esquerda, o outro a sua direita. Lula aproveitou a deixa para lembrar por que tornou-se presidente do Brasil. Disse, em tom de brincadeira: “não me dirijo à esquerda, nem à direita. O meu negócio é o centro”. Acelerar as reformas tem custado ao presidente, não raro, 12 horas de trabalho por dia. Rotina cansativa, mas longe de ser uma novidade para quem trabalha desde cedo. Aos sete anos de idade, Lula começou vendendo amendoim e tapioca em Santos. Não parou nunca mais. “Eu não cheguei à Presidência da República por acaso. Não fui uma figura inventada. Eu briguei para ser presidente, perdi três eleições e não desisti”, garante. O governo iniciou com uma tarefa árdua, a aprovação das reformas da Previdência e tributária. Por que começar com o mais difícil? Presidente Luiz Inácio Lula da Silva - É muito importante que o povo brasileiro saiba que, durante a campanha, nós prometemos que, no primeiro semestre de 2003, iríamos discutir com a sociedade a proposta de reforma da Previdência e tributária e que, no segundo semestre, iríamos enviála ao Congresso Nacional. Em função da necessidade de fazer as duas reformas com uma certa urgência, por conta da falência do sistema previdenciário do país, especialmente no setor público, da fragilidade dos Estados na arrecadação e da política tributária que asfixia o setor empresarial, responsável pelo in- vestimento na produção, nós resolvemos antecipar. Fizemos uma proposta de reforma discutindo com os 27 governadores. Foi uma inovação na política nacional: pela primeira vez os governadores participaram da elaboração da proposta. O segundo passo foi levar a discussão da proposta ao Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, que é uma representação da sociedade brasileira, com sindicalistas, empresários, banqueiros, sem-terra, intelectuais, organizações não governamentais, Igreja Católica, igrejas evangélicas. Quando estava pronto o projeto, com a concordância dos governadores, do conselho e do governo, nós, junto com os governadores, o enviamos ao Congresso, no dia 30 de abril, dois meses antes do que eu tinha prometido na campanha. E, para minha grata surpresa e alegria do povo brasileiro, conseguimos fazer em sete meses uma reforma que, em alguns países do mundo, demorou cinco, oito e até dez anos. O Magistrado 15 Foi um benefício enorme para o povo brasileiro. Obviamente que algumas pessoas sempre são contra - é normal. Mas, a verdade é que é a primeira vez na história do Brasil que, sem fazer discurso, nós acabamos com os marajás da vida política brasileira. Todo mundo lembra que, em 89, o Collor falou que ia acabar com os marajás, mas em 2003 ainda tinha gente ganhando R$ 53 mil, R$ 45 mil, R$ 30 mil por mês. A partir de agora, o maior salário será igual ao do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal), R$ 17 mil. Presidente, o senhor sofreu muita resistência para fazer essa reforma. O senhor acredita que a população já está se dando conta dos benefícios dessa reforma ou é algo que será sentido a médio e longo prazo? A resistência não foi da população, porque todas as pesquisas mostraram que 70% dos brasileiros são favoráveis à reforma da Previdência. Mesmo no setor do funcionalismo público, nós tínhamos uma maioria favorável, sobretudo a grande maioria que ganha os salários mais baixos. Por quê? Porque na reforma nós tratamos de proteger as pessoas que ganham menos. Quem ganha até R$ 1,2 mil por mês, se já estiver aposentado, não vai contribuir com os 11%. Quem ganha mais vai contribuir somente sobre o que excede R$ 1,2 mil. Unificamos o teto, com o regime geral. Todo mundo vai receber R$ 2,4 mil por mês 16 O Magistrado esse é o teto. Resolvemos o problema da pensão. A reforma significa a certeza de que nossos filhos e netos terão direitos verdadeiramente adquiridos. Então, a reforma da Previdência foi um sucesso? A reforma da Previdência aprovada até agora foi um sucesso extraordinário. Alguns es- Alguns especialistas acham que o que foi aprovado é até melhor do que o que nós mandamos para o Congresso pecialistas acham que o que foi aprovado é até melhor do que o que nós mandamos para o Congresso Nacional. E, passada essa situação, mais alguns dias, vamos ver a reforma tributária ser votada. Quero ver se votamos até dezembro, o mais tardar. Precisamos começar o ano de 2004 pensando em outras coisas. Quais serão os próximos passos do governo? Vamos ver primeiro o que já foi feito. Quando nós tomamos posse, todo brasileiro sabia que a economia estava numa situação difícil e que era preciso recuperar a credibilidade externa. Vamos só lembrar uma coisa: em dezembro do ano passado, a perspectiva de inflação para os próximos 12 meses era de 40%. Hoje a perspectiva é de 7%. Em dezembro do ano passado, o Brasil não tinha um dólar para financiamento das nossas exportações. Hoje, temos financiamento outra vez. Nós começamos a reduzir a taxa de juros e depois que reconquistamos a credibilidade do Brasil tanto interna como externamente, resolvemos atacar alguns setores que entendíamos necessários. Fizemos a mais importante política agrícola para este país. Liberamos, pela primeira vez, R$ 5,4 bilhões para a agricultura familiar. Liberamos dinheiro antes da época do plantio e, mais importante, agora não só o dono da terra, o homem, vai ter o financiamento. A sua mulher pode ter, o filho pode ter. Então, em uma mesma propriedade, a família pode fazer três projetos e pegar dinheiro, com uma vantagem: o Banco do Brasil efetivamente se desburocratizou, as pessoas agora vão ao banco e vão pegar o seu dinheiro. E na agricultura empresarial, que está indo muito bem no Brasil, vamos fazer tudo o que for possível para aumentar a nossa produção, as nossas exportações e para que aumentemos superávit comercial. Depois, discutimos outras coisas importantes para o Brasil: a questão do microcrédito. O problema é com o povo pobre deste país, que quer com- prar um eletrodoméstico qualquer. Se for a uma financeira, vai pagar mais de 300% de juros ao ano. Se for a um banco, vai pagar 116% ao ano. Nós então criamos, na Caixa Econômica Federal e no Banco do Brasil, políticas de microcrédito, para que a pessoa possa pegar dinheiro a 2% ao mês. É um ganho extraordinário para essas pessoas que jamais conseguiram ter acesso ao crédito. E nós vamos criar mais. A única coisa que eu peço é compreensão. Não dá para fazer tudo de uma vez. O brasileiro se orgulha por ver uma figura como o senhor, uma pessoa vinda das camadas mais populares, sobretudo do Nordeste, chegando à Presidência. O que mudou na sua vida depois do dia 1º de janeiro? Aumentou a minha responsabilidade. Eu tenho trabalhado mais do que quando trabalhava na Villares e fazia duas horas extras todo dia para ajudar nas despesas de casa. Como é o dia do presidente da República? O senhor mudou para Brasília, sua família veio? Já se acostumou com a cidade? O senhor tem tempo de fazer exercícios, natação? Como está seu dia-a-dia? Primeiro, eu não vejo Brasília. O que eu vejo é o caminho do Alvorada para o Palácio do Planalto. Demora 8 minutos de carro. Eu levanto todo santo dia, de domingo a domingo, às 6 horas da manhã. Ando todo dia uma hora, eu e a minha mulher (Marisa Letícia). Quando Palocci (o ministro da Fazenda, Antonio Palocci) pode, ele vem aqui para andar um pouco comigo. Depois, faço mais um pouco de exercício. Quando são 9 horas, o Gilberto Carvalho (chefe do gabinete pessoal da Presidência e amigo pessoal de Lula) já agendou alguma tarefa para mim. É possível garantir que as pessoas tenham a possibilidade de ter uma casinha para morar Chego ao Palácio do Planalto às 9 horas da manhã. Tem dia que tenho audiência até as 9 horas da noite, aí eu volto para casa já um bagaço para dormir, acordar no dia seguinte e levantar. Não consigo ver Brasília, só esse trajeto. Mas eu estou fazendo isso como uma profissão de fé. Nós já vimos um expresidente afirmar que é fácil governar o Brasil. Governar o Brasil é fácil? Não é difícil não. Tem muitos problemas, mas, se tudo estivesse resolvido, eu não teria ganho. Ganhei exatamente porque tem muito problema. As pessoas acreditaram ao meu partido. Eu não cheguei à Presidência da República por acaso. Não fui uma figura inventada, “ah, vamos escolher fulano para ser presidente”. Não, eu briguei para ser presidente da República, perdi três eleições e não desisti. Eu queria provar que é possível melhorar a vida desse povo, é possível garantir que as pessoas tomem café da manhã, almocem e jantem todo o dia. É possível garantir que as pessoas tenham a possibilidade de ter uma casinha para morar. É possível fazer uma reforma agrária tranqüila e pacífica neste País. Ninguém vai fazer ela na marra. Quem vai fazer é o governo. E vai fazer de acordo com as suas possibilidades. A reforma agrária é muito importante para nós, mas ela não pode ser feita como era até então, jogando os trabalhadores pobres no meio do mato e deixando por conta de Deus. É preciso dar terra, infraestrutura, ter estrada para escoar a produção, ter financiamento, formar agroindústria, agrovila. Não um morador a dez quilômetros do outro. Constrói uma agrovila, ali você coloca uma escola, um posto médico, faz uma praça para as crianças brincarem. Você transforma essa reforma agrária numa coisa civilizada, humana. Temos que pensar em um outro jeito de fazer as coisas neste País. E vamos fazer, porque eu acredito nisso, o governo é todo de gente comprometida com isso. Sabemos que temos que fazer. O Magistrado 17 “O Governo não aprovaria a reforma” ACM Neto diz que o apoio não será “moeda de troca” com o governo, mas que espera do presidente Luiz Inácio Lula da Silva “atenção” ao Estado da Bahia Neto do senador Antonio Carlos Magalhães (PFLBA) e terceiro deputado federal mais jovem do país, Antonio Carlos Peixoto Magalhães Neto (PFL-BA), 24, é categórico ao dizer que, sem o seu partido, o governo não aprovaria a reforma da Previdência. No mês passado, 33 dos 69 integrantes da bancada votaram com o governo. Na polêmica questão dos inativos, 31. Depois, após acordo, 64 deram aval à emenda que alterou novamente o texto. “Se o governo não tivesse nos dois dias [de votação da reforma] a garantia dos nossos votos, não colocaria sequer a proposta em votação. Sabia que, sem o apoio do PFL, não aprovaria a reforma, principalmente a cobrança dos inativos”, afirma o filho do ex-senador Antonio Carlos Magalhães Júnior e sobrinho do ex-presidente da Câmara Luís Eduardo Magalhães (morto em 1998). Formado em Direito pela UFBA (Universidade Federal da Bahia), solteiro, torcedor do Bahia e apreciador de “toda a culinária baiana”, ACM Neto foi o deputado federal mais votado da história do PFL e do Nordeste, com 400.275 votos 18 O Magistrado ACM Neto diz que o apoio não será “moeda de troca” (6,72% dos votos válidos). ACM Neto diz que o apoio não será “moeda de troca” com o governo, mas que espera do presidente Luiz Inácio Lula da Silva “atenção ao Estado da Bahia, onde teve mais de 80% dos votos válidos”. Criticou a atuação do líder do PFL na Câmara, José Carlos Aleluia (BA), por encaminhar voto contra o governo “sem ouvir a bancada”, e disse que irá se realizar “como político se governar a Bahia”. O Magistrado - Durante a votação dos destaques da reforma da Previdência o sr. disse que o PFL daria entre 26 e 28 votos e o PFL acabou dando um pouco mais... Antonio Carlos Magalhães Neto - No primeiro dia, disse que o PFL daria de 28 a 30, sendo 19 da Bahia. Deu 33 votos e 19 da Bahia. No destaque dos inativos, disse que o PFL daria de 28 a 30 e 18 seriam baianos. O PFL deu 31 votos e 18 foram baianos. É uma capacidade enorme de adivinhação? Não, mantivemos contato permanente com os deputados, conversamos durante toda a semana, a reforma interessa ao Estado da Bahia e ao governador Paulo Souto (PFL). Esse número foi exatamente o que o governo precisava em alguns pontos, como a taxação dos inativos. O sr. diria que foi fundamental ao governo? Anúncio SECOM GDF O Magistrado 19 Diria mais. Se o governo não tivesse, nos dois dias, a garantia dos nossos votos, não colocaria sequer a proposta em votação. Sabia que sem o apoio do PFL não aprovaria a reforma, principalmente a cobrança dos inativos. A matemática era muito clara, as contas do governo estavam muito precisas. Na política isso é difícil de acontecer. Em algum momento a fatura será cobrada... Em Qualquer relacionaem mento político tem de ser marcado pela decência. Não houve nenhum pedido ao governo de nossa parte. Mas você me pergunta “deputado, enquanto cidadão, o que o sr. espera?” Que o presidente da República tenha atenção ao meu Estado. Ele teve mais de 80% dos votos válidos na Bahia. Mesmo com essa garantia de votos, o PFL se dividiu. O próprio líder do partido na Câmara, José Carlos Aleluia (BA), votou contra o governo. Como fica essa divisão dentro do partido? O líder cometeu um erro, precisava ter ouvido a bancada e não ouviu. Seguiu à risca a determinação da Executiva Nacional, que recomendou encaminhamento contrário à reforma, o que não quer dizer que sua posição, sua autoridade, esteja comprometida. A reforma da Previdência não é alvo de consenso no partido. O PFL do sr. e do senador ACM é governo ou oposição? Oposição. Em momento algum pensamos em ade20 O Magistrado de vida. Vim com humildade, procurando aprender, escutando os mais experientes, estudando o regimento. Hoje acho que estou em um ritmo bom para quem começou agora. Claro que não quero imprimir uma velocidade a mais, não gosto jamais de dar passo em falso. Se pudesse fazer uma avaliação geral, diria que estou muito satisfeito e a própria Casa já reconhece meu trabalho e tem respeito pelo mandato que esmomento algum pensamos tou exercendo. aderir ao governo. O PFL é Por que começar a oposição carreira política concorrendo a uma vaga à Câmara? Primeiro, tive experiência lhor aos pensionistas, temo pregressa de atividade política que algumas injustiças sejam dentro do meu partido. Seguncometidas, porque além de do, minha candidatura fez paraplicarmos um redutor de te de uma estratégia de meu 50% [ponto que foi reduzido grupo político na Bahia, precipara 30% em votação] ainda sávamos ocupar o espaço da vamos taxar em 11% o que oposição e para isto precisáexceder os R$ 2.400. Discutivamos de candidatos jovens ria melhor agora os fundos com propostas novas. Terceicomplementares, que serão ro, havia um sentimento geral discutidos nas leis infraconstide que eu já estava preparatucionais. Talvez melhorasse do para vir à Câmara, já tinha um pouco as regras de trancondições de realizar um trasição, para evitar que haja balho em uma esfera mais eleuma corrida por aposentadovada de discussões, participanrias. E pensar na inclusão de do dos debates nacionais. milhares de trabalhadores, O sr. vem de uma faque, quando contribuírem, semília com figuras de destarão decisivos para o equilíbrio que na política nacional e atuarial do sistema, e em um perfis bem diferentes. Qual mecanismo de punição efetidelas é a sua maior inspiva dos sonegadores. ração: o seu avô, senador Como está sendo a Antonio Carlos Magalhães experiência de primeiro (PFL-BA), seu tio, ex-presimandato? dente da Câmara Luís Considero que esteja Eduardo Magalhães, ou seu sendo a melhor possível, porpai, ex-senador Antonio que sempre tive vontade de Carlos Magalhães Júnior? exercer mandato de parlaNa verdade, procuro me mentar. Aqui é a Casa não só espelhar nos exemplos do sede ensinamento político, mas rir ao governo. A reforma da Previdência como um todo é do seu agrado? O que o sr. mudaria? A reforma refletiu o que era possível dentro de uma Casa bastante diversa. Não havia reforma ideal, seria impossível. O governo apresentou a reforma possível. Eu talvez desse um tratamento me- nador Antonio Carlos e do deputado Luís Eduardo Magalhães. O senador é e o deputado foi figura pública respeitadíssima no nosso país. O deputado se foi, mas seus exemplos ficaram para essa nova geração de políticos que está surgindo. O senador continua sendo um grande orientador meu em especial. Seu principal conselheiro político, seu avô Antonio Carlos Magalhães, é muito admirado na Bahia, mas também tem muitos desafetos. Essas críticas e ressalvas interferem na sua carreira política? São quase oito meses de Congresso Nacional. Durante esse tempo só fiz amigos, as pessoas que se aproximaram de mim sempre o fizeram guardando um carinho e respeito muito grande pelo senador Antonio Carlos, inclusive muita gente que hoje é do governo e anteriormente era oposição. Acho que houve no início curiosidade muito grande das pes- soas em saber se eu vim para cá só por ser neto de ACM ou se tinha valor próprio. Mas como lidar com o lado negativo da figura de seu avô? Digo sempre que tenho uma balança com dois pesos: o do bônus e o do ônus. Ninguém pode apenas ter o bônus. Só que nessa balança, os bônus pesam muito mais Se eu dissesse que não tenho o sonho de governar a Bahia estaria mentindo que os ônus e sempre foram o que me abriram as portas e me permitiram aos 24 anos estar aqui. O sr. tem pela frente uma longa carreira política. Qual seu projeto de maior ambição? Sonhar, todos nós sonhamos. Se eu dissesse que não tenho o sonho de governar a Bahia estaria mentindo, mas o meu momento é de exercer o mandato como deputado federal. O próximo passo vai ser dado no momento certo, mas vou me realizar como político se governar meu Estado. Qual a nota para o governo Lula nesses oito primeiros meses? Tenho cuidado ao avaliar o governo. Acho que, por enquanto, não está bem. A máquina pública não está funcionando, existem recursos que não estão sendo aplicados, o que mostra ineficiência por parte dos gestores. Qual a nota para a oposição? Não dou nota máxima para a oposição, porque acho que ela foi alcançada pelo problema da necessidade de se acomodar nessa nova veste. Está havendo alguns excessos e isso não pode acontecer. Dou nota oito, porque a oposição está sendo bem mais competente que o governo. O Magistrado 21 Ana Nascimento/ABr 22 O Magistrado Genoino acredita em acordo Genoino critica a tentativa de greve no judiciário e diz que a reforma da Previdência tem que ser para todos, com piso e teto, com uma única regra O presidente nacional do PT, José Genoino, diz que está confiante na possibilidade de um entendimento entre governo federal e governadores sobre a reforma Tributária. Em entrevista, Genoino criticou a tentativa de uma greve no judiciário e disse que um teto de R$ 17 mil para as aposentadorias do Poder Judiciário é mais do que razoável num país com as condições de vida como as do Brasil. É possível um acordo com os governadores sobre a reforma tributária? A coisa está caminhando para um acordo. Reformas são difíceis. Se fossem fáceis, já teriam sido feitas há muito tempo, principalmente a da Previdência e a Tributária. Estou confiante. Negociação é isso: cada um cede um pouco. Até porque, no caso da Cide (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico), é razoável que vá um pouco para os Estados. No caso da CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira), já está indo uma parcela, com as verbas para a Saúde. Dá para atender as várias reivindicações de Estados e Municípios na reforma tributária? O país está vivendo um momento de reformas. Tem reclamação, tem crítica, mas temos de chegar a um bom senso. As reivindicações são legítimas, mas temos de pensar no país. Se cada ente federado esticar a corda, ela pode arrebentar. O Judiciário tem de ter um tratamento especial? Não. A reforma da Previdência tem que ser para todos, com piso e teto, tem que ser para todos os servidores públicos, com uma única regra. Tem de ter a integralidade, com 60 anos de idade para homens, 55 anos para mulheres, 35 anos de contribuição para os homens e 30 para mulheres, 20 anos de serviço público e 10 na mesma função. Esses são critérios para todos os servidores. Para o futuro, temos de garantir para os trabalhadores um regime único de aposentadoria. A tentativa de greve do Judiciário era inconstitucional. Quando servidor do Judiciário faz greve, é uma coisa. Mas a greve do Judiciário seria uma afronta à democracia e à Constituição. As reivindicações do Judiciário são exageradas. Um teto de R$ 17 mil garante aos juízes condições mais do que razoáveis. E o subteto de R$ 13 mil, para os juízes estaduais, para um país como o Brasil, é mais do que razoável. A greve dos servidores, apesar do direito de greve, tem um objetivo incorreto, que é de inviabilizar a reforma da Previdência. Os ruralistas são uma ameaça quando estão armados? A reforma agrária tem de ser feita de maneira pacífica, ampla e tem que viabilizar a produção dos assentados, melhorar a situação dos acampados e viabilizar as pequenas e as médias propriedades. No Brasil, é possível a convivência entre as grandes, as médias e as pequenas propriedades. Mas ações armadas são inaceitáveis, sejam de ruralistas, sejam de trabalhadores sem terra. Fernando Henrique Cardoso disse que a figura do ex-presidente precisa ser mais valorizada. É preciso criar uma função específica para o presidente que deixa o cargo? O ex-presidente tem que ser mais cauteloso, tem de ser mais humilde. FHC está entendendo mal a conjuntura. Espero que ele tenha mais cautela e que suas intervenções sejam mais de estadista do que de oposicionista. Sempre respeitarei a opinião de FHC, mas o ex-presidente ainda não entendeu seu novo papel. O Magistrado 23 José Genoino A aprovação da reforma da Previdência, em primeiro turno de votação na Câmara, traduziu-se numa importante vitória do governo, que consolidou sua credibilidade política, fator que será essencial para a retomada do desenvolvimento, para o crescimento da economia e do emprego. Sua base parlamentar, apesar de algumas defecções, mostrou-se sólida e capaz de garantir a sustentabilidade política. É preciso reconhecer também que parcela da oposição portou-se como parceira, consignando votos importantes para aprovar a reforma. A sociedade ganhou, segundo especialistas, porque os três objetivos fundamentais da reforma foram preservados: a justiça social, o equilíbrio orçamentário e a moralização relativa aos privilégios dos altos salários. No terreno da justiça social, a maior conquista foi o estabelecimento de uma aposentadoria pública universal, igualando o funcionalismo público com os trabalhadores da iniciativa privada. Como se sabe, a Previdência seria responsável pelo maior déficit estrutural. A aprovação da reforma reduziria significativamente esse déficit e diminuiria a trans24 O Magistrado ferência de recursos tributários advindos dos trabalhadores do setor privado para cobrir as aposentadorias do setor público. E na medida em que o texto aprovado define o teto de vencimentos para o funcionalismo federal e subtetos para os Estados, a reforma introduz um elemento moralizador acabando com as altas aposentadorias dos servidores atuais. Mesmo que nos Estados o subteto do Judiciário seje 90,25% dos vencimentos dos membros do Supremo Tribunal Federal, a redução das altas aposentadorias será significativa. Os excessos na atribuição de adicionais aos funcionários públicos serão eliminados. Outro aspecto relevante da vitória consiste na rapidez com que a reforma foi aprovada. Aprovar reformas da Previdência é algo difícil para os governos de qualquer país. Protelações, confrontos e desgastes políticos têm sido a regra nesses processos. Desde o envio da reforma ao Congresso pelo presidente Lula até a sua aprovação em primeiro turno na Câmara, passaram-se apenas quatro meses. Agora será preciso manter o rumo certo e o pulso firme para aprová-la em segundo turno na Câmara e, depois, no Senado. O governo do PT e os partidos aliados fo- Marcello Casal Junior/ABr A vitória na reforma da previdência ram decisivo na defesa dos aspectos essenciais da reforma, mas ao mesmo tempo souberam negociar para melhorar a proposta ou para atender demandas legítimas. O PT, ao contrário do que se vaticinava, não recuou ante a pressão de setores contrariados pela reforma. As bancadas do PT e da base aliada cumpriram um papel importante para aumentar a proteção dos setores do funcionalismo que recebem salários mais baixos. No caso das pensões, por exemplo, aqueles que recebem até R$ 2.400 seriam isentos de descontos. Os que recebem acima desse valor teriam desconto de 50% na parte que exceder o teto. O piso de cobrança de contribuição sobre os vencimentos dos inativos subiu de R$ 1.058 para R$ 1.200. Neste caso, cabe lembrar que, até agora, muitos Estados e municípios cobravam contribuições dos inativos sem nenhum piso. Emendas parlamentares melhoraram também o sistema de transição dos atuais funcionários, permitindo a integralidade dos vencimentos em troca de um tempo maior de permanência no serviço. Ressalte-se, também, que a reforma estabelece que lei complementar definirá me- canismos para que as pessoas ingressem nele a partir de uma contribuição mais baixa. Essa lei beneficiará cerca de 20 milhões de trabalhadores, hoje na informalidade. A sociedade apoiaria a reforma da Previdência porque as distorções contidas no sistema impõem sacrifícios a todos pela transferência de impostos e impedem que o Estado defina melhor suas prioridades, por ter que cobrir pesados déficits orçamentários. A continuidade do apoio da opinião pública seria fundamental para que a Câmara e o Senado concluíssem com êxito a tarefa que lhes está confiada. A reforma da Previdência não acaba com todos os males. Inclusive, essa reforma deverá ser aperfeiçoada no futuro. Nenhum país conseguiu realizar uma reforma da Previdência em um só ato. Mas da atual reforma da Previdência emergirá, esperase, um Brasil melhor e um pouco mais justo. A aprovação definitiva da reforma abrirá caminhos para que outras mudanças necessárias ao país e à sociedade se consolidem. José Genoino é presidente nacional do PT O Magistrado 25 Carlos Tiburcio/O Magistrado 26 O Magistrado Deputado sai da prisão e pede justiça Parlamentar diz que sua prisão foi ilegal e que vai provar sua inocência nos tribunais. Ele prometeu, ainda, denunciar outros deputados D epois de passar 29 dias preso na carceragem da Superintendência da Polícia Federal, em Brasília, sob a acusação de envolvimento com grilagem de terras públicas, o deputado distrital José Edmar (PMDB), enfim, começou a se defender. “Desde o dia 10 de junho, quando fui privado da liberdade, passei dias que jamais esquecerei. Foram dias e mais dias esperando acordar de um terrível pesadelo, que durou quase um mês”, discursou o parlamentar, na tribuna da Câmara Legislativa do Distrito Federal, no último dia 13 de agosto, quando voltou às suas atividades parlamentares. O deputado começou seu pronunciamento afirmando que era sua primeira oportunidade de esclarecer os parlamentares sobre as acusações imputadas a ele e passou a relatar os 29 dias em que esteve na carceragem da Polícia Federal. O deputado chamou a prisão de “pesadelo” que não acabava nunca e confessou que ficou mais tempo na prisão do que o esperado. “Não se deve temer a justiça, mas comecei a temer a injustiça”, afirmou José Edmar, que chegou a pensar que seria usado como bode expiatório para dar uma satisfação à sociedade. José Edmar passou a usar seu tempo para responder às acusações de formação de qua- drilha, parcelamento irregular do solo e lavagem de dinheiro, e acusou a Polícia Federal de haver esperado pelo recesso parlamentar e pela viagem do presidente da Casa para proceder à sua prisão, nove dias depois de o mandado ter sido expedido. “Além de ser um equívoco, minha prisão foi ilegal, irregular e uma fraude”, protestou José Edmar, referindo-se à inconstitucionalidade de sua prisão preventiva, que segundo ele, inexiste na Constituição Federal para parlamentares. Edmar também refutou a figura da prisão em flagrante, dizendo que foi preso às 7h da manhã, em sua fazenda, logo após acordar, sem configurar prática de ato criminoso. Edmar contestou todas as acusações: “Que quadrilha é essa, se eu só conheço um dos oito que foram presos junto comigo?”, reclamou. Em seguida falou sobre o parcelamento do condomínio Porto Rico e voltou a afirmar inocência, dizendo que se limitou a propor sua legalização na Câmara em 2002, em prol da moradia para os mais humildes. “Isso não tem nada a ver com grilagem de terras, que é feita com objetivo de lucro”, adiantou Edmar. O deputado se prontificou a autorizar a Corregedoria da Câmara a investigar todas as suas contas, quando classificou a denúncia de lavagem de dinheiro como “ridícula”. José Edmar surpreendeu a todos quando disse que trazia um presente “muito carinhoso” para os deputados Chico Vigilante (PT), Paulo Tadeu (PT), Chico Leite (PCdoB), e Augusto Carvalho (PPS): eram quatro garrafas de detergente, segundo ele, para “limpar as bocas mentirosas e as línguas ferinas que o atacavam e condenavam sem provas”. José Edmar cobrou dos colegas que se aproveitaram politicamente de sua situação e agradeceu a “grandeza” da atitude do deputado Benício Tavares, que se comportou com isenção, como “um verdadeiro presidente”. O deputado finalizou seu discurso afirmando que confia plenamente na justiça e na oportunidade de provar sua inocência. Denúncia – Edmar informou que tem provas de irregularidades cometidas por três deputados da oposição e que, se for convidado, comparecerá à Comissão de Ética e Decoro Parlamentar, para confirmar as denúncias. No final de seu pronunciamento, o deputado anunciou que entraria de licença médica para realizar tratamento de saúde em São Paulo. “Mas, estarei de volta e pronto para apresentar as provas contra os deputados de oposição em breve”, concluiu. O Magistrado 27 Conflitos agrários merecem atenção Presidente completou a narrativa de suas preocupações mandando um recado às autoridades do Poder Executivo O 28 O Magistrado Divulgação/STF presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Maurício Corrêa, foi agraciado com o título de Acadêmico Honoris Causa da Academia Paulista de Magistrados. A solenidade de entrega da honraria, que ocorreu no Salão Branco do STF, antecedeu ao lançamento da cartilha intitulada “Ao Encontro da Lei - o novo Código Civil ao alcance de todos”, apresentada pelo ator Lima Duarte e ilustrada pelo cartunista Paulo Caruso. Maurício Corrêa dedicou boa parte de seu discurso para abordar os conflitos no campo e as lutas contra as imperfeições das propostas feitas às reforma do Judiciário e da Previdência. Sobre esta, afirmou que “injustiças que até agora foram praticadas, foram corrigidas. Espero até que no Senado Federal consigamos ainda outros aperfeiçoamentos”. Sobre os conflitos no campo, Maurício Corrêa afirmou: “O que tem me preocupado ultimamente, e espero que isto seja corrigido devidamente, é aquilo que poderá, em face de alguma tolerância, redobrar em conflitos sociais, provocados exatamente pela necessidade de se fazer reforma agrária de um lado, e resistências que são Maurício Corrêa recebe condecoração na Academia Paulista de Magistrados postas de outro, e ao mesmo tempo, atuações que são desenvolvidas em excessos, tanto de um lado quanto do outro”. O presidente completou a narrativa de suas preocupações mandando um recado às autoridades do Poder Executivo: “Impõe-se, pois, que o Poder competente, contenha, o mais rápido possível, aquilo que um dia poderá se transformar em algo in- controlável. Por isso esperamos, sinceramente, das autoridades, do Executivo, que haja essa tranqüilidade para o povo brasileiro, que haja uma pacificação e que isso não seja nada mais e nada menos do que uma simples preocupação de nossa parte”. Em seu discurso de agradecimento ao título “Honoris Causa”, o presidente do Supremo disse: “Procurarei honrar esse galardão que aca- bo de receber”. Ele lembrou da importância do Judiciário como Poder de Estado e fez referências à Justiça como mediadora de conflitos: “O Poder Judiciário é convocado, atua e devolve a prestação jurisdicional ao povo. Pouco importa se, de um lado, esteja o Estado e, de outro, estejam apenas partes do povo (A brigando com B). O que importa dizer é que o juiz, ao exercitar esta atuação jurisdicional, ele é o Estado personificado”. Corrêa lembrou que a cartilha traduz exatamente a importância da magistratura e fez elogios à iniciativa e acabamento da publicação. A obra, para o presidente do Supremo, “leva ao povo brasileiro minúcias do que o cidadão tem direito, tendo em vista o novo Código Civil. É como a própria cartilha intitula: ‘Código Civil ao alcance de todos’”, Maurício Corrêa salientou que qualquer cidadão do povo pode ter acesso à sua leitura fácil. DEPOIMENTOS Durante a solenidade de lançamento da cartilha, o advogado-Geral da União, Álvaro Ribeiro da Costa, considerou o livro “uma iniciativa que deveria ser seguida em muitas outras leis fundamentais de interesse imediato do cidadão”. Para o presidente da Academia Paulista de Magistrados - entidade que produziu a publicação-, Carlos Renato de Azevedo Ferreira, “a cartilha é importante porque cumpre um preceito constitucional de perfeito acesso da cidadania à Justiça”. “Eu fiz a criação de personagens fictícios. Nesta cartilha, contamos a história de uma família que ensina, aos brasileiros, mais sobre o novo Código Civil por meio de situações cotidianas”, explicou o cartunista Paulo Caruso, responsável pelas ilustrações da cartilha. O ator Lima Duarte também teve participação no processo de publicação do livro tendo gravado vídeos de curta duração com explicações dos possíveis casos em que se pode utilizar o Novo Código Civil. “A importância é intrínseca é necessário fazer com que essas mudanças cheguem ao povo que é o destinatário. O povo precisa aprender a admirar essa verdadeira novela que é o Código Civil”, afirmou. O Magistrado 29 Celso de Mello eleito para novo mandato no TSE E Celso de Mello: mais dois anos no TSE TV Justiça completa um ano com nova programação Desde o último dia 11 de agosto, quando a TV Justiça comemorou um ano de existência, está no ar a sua nova programação, estreando o Jornal da Justiça 1ª edição. De segunda a sexta-feira, a jornalista Teresa Carneiro apresenta o telejornal, com meia hora de duração. Matérias de serviço, utilidade pública, curiosidades, comportamento e a agenda do Poder Judiciário são algumas novidades do novo telejornal. No quadro “Direto da Redação”, ainda dentro do Jornal da Justiça, a jornalista Geórgia de Oliveira mostra no30 O Magistrado tícias dos tribunais em todo o país. A consultora Odete Rocha, em uma coluna às sextas-feiras, esclarece dúvidas de telespectadores. Cleusa Vasconcelos faz um breve resumo da programação do dia na TV Justiça. Com novo formato e mais inserções na programação da TV, os boletins “Justiça Agora” vão ao ar de hora em hora também pela manhã, com início às 9h. A duração do programa “Justiça em Ação” aumenta de 2 horas para 4 horas. Às quartas e quintas-feiras vai ao ar, ao vivo, a íntegra dos jul- gamentos do Plenário do Supremo Tribunal Federal. Ainda na nova grade, o “Programa Fórum” terá edições diárias. Mais flexível, entrevistas e debates se misturarão durante o programa - e nos fins de semana ocorre a reprise dos programas de maior repercussão. Segundo a editora-chefe da TV Justiça, jornalista Ana Tereza Senna, “as modificações da grade têm por objetivo ampliar a cobertura jornalística a fim de oferecer aos telespectadores maior agilidade e imediatismo da notícia”. Divulgação/STF m votação realizada na sessão plenária, no último dia 13 de agosto, os ministros do Supremo Tribunal Federal, atendendo aos ofícios encaminhados pelo presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Sepúlveda Pertence, decidiram, por unanimidade, reconduzir o ministro Celso de Mello a mais um mandato de dois anos como ministro-substituto do TSE. Também ficou acertado, em outra votação, que Luiz Carlos Lopes Madeira, Carlos Eduardo Caputo Bastos e José Gerardo Grossi serão os candidatos que comporão a lista tríplice dirigida ao TSE. O Magistrado 31 Jorge Campos/AIP STJ 32 O Magistrado STJ se despede de Ruy Rosado Ministro Ari Pargendler destaca a serenidade e o brilhantismo de Ruy Rosado e afirma que o Judiciário brasileiro empobrece com a sua saída O ministro Ruy Rosado de Aguiar participou, no último dia 6 de agosto, pela última vez de sessão de julgamentos do Superior Tribunal de Justiça. Na homenagem prestada pela Corte Especial, foram destacadas a criação dos Juizados Especiais Federais e a utilização de videoconferência em sessões da Turma de Uniformização como grandes contribuições do ministro para o aperfeiçoamento do aparelho judiciário nacional. “A videoconferência é um marco na prestação jurisdicional”, salientou o ministro Ari Pargendler, ao discursar. Escolhido para falar também pelos colegas, Ari Pargendler destacou a serenidade e o brilhantismo de Ruy Rosado, afirmando que o Judiciário brasileiro empobrece com a sua saída. “É um grande amigo e um grande juiz que se despede do STJ, com o pesar de todos nós”, asseverou, ao ressaltar os “certeiros votos, principalmente em matéria penal”. O último gesto de Ruy Rosado como coordenador-geral da Justiça Federal foi encaminhar ofício ao Colegiado do Conselho da Justiça Federal (CJF), propondo a ampliação da atual estrutura das corregedorias nos cinco Tribunais Regionais Federais (TRFs). O subprocurador-geral da República Edinaldo de Holanda Borges lembrou a relevância dos serviços prestados pelo ministro à nação. “Quem distribui Justiça cumpre a mais alta função do Estado. Um homem que julga outro homem torna-se um ser superior”, afirmou. Apesar de dizer que não era hora para despedidas, mas para exaltações, o discurso terminou em tom emocionado. “Receba de seus pares e de toda a sociedade as honras que brotam de seu próprio trabalho edificante”, finalizou. Ao discursar pela classe, o advogado Eduardo Ferrão agradeceu a honra de ter sido agraciado pela escolha de seu nome. Lembrou a origem simples em comum com a do ministro. “Se a elegância não me conhece, trago aqui a franqueza dos rudes e a sinceridade atávica dos ousados”, afirmou ao falar da postura ereta, serena e altiva de Ruy Rosado e da vastidão da sua cultura. “Sempre semeou, transformou e desbravou horizontes, como promotor, juiz, professor e assim tem sido como ministro. Onde estiver, senhor ministro Ruy Rosado, será sempre um homem imprescindível”, enfatizou. “Num mundo de homens de espíritos farisaicos, Vossa Excelência estará sempre compondo a Resistência”, finalizou. Além de promotor, juiz, desembargador e professor, o ministro exerceu, ainda, os cargos de Diretor da Escola Superior da Magistratura - RS, 1986/ 1987 e da Escola Nacional da Magistratura, 1988/1989. Foi, também, presidente do Conselho Estadual dos Juizados Especiais e de Pequenas Causas - RS, 1989/1992, CorregedorGeral da Justiça-RS, 1992/ 1993, 2º Vice-Presidente do Tribunal de Justiça (RS), em 1994. No STJ, presidiu a Quarta Turma Turma do STJ no biênio 1998/1999. Por último, exerceu o cargo de coordenador-geral da Justiça Federal, diretor do Centro de Estudos Jurídicos do Conselho da Justiça Federal, além de presidir a Turma de Uniformização dos Juizados Especiais Federais. O ministro agradeceu a homenagem de modo modesto, pedindo que todos fixassem a memória apenas no que ele fez de bom. “Recebi mais do que mereci: a honra de integrar um Tribunal com a importância do STJ “, ressaltou. Apesar de não serem comuns manifestações do público nas sessões de julgamento, o ministro foi bastante aplaudido ao encerrar o discurso de agradecimento. O Magistrado 33 Carlos Tiburcio/O Magistrado O universo notarial e registral Luiz Gustavo Leão Ribeiro Q uando se nasce, registra-se em cartório. O último suspiro também perpetua-se nos livros e registros do cartório. Entre eles, a autenticação do diploma para matrícula na faculdade, o contrato de financiamento do primeiro carro, o casamento, a compra da casa própria, o registro dos filhos, a separação, o divórcio, o novo casamento, os novos filhos, a casa nova, o testamento para evitar a briga dos herdeiros; em suma, as grandes conquistas da vida se fazem diante de um notário ou regis- 34 O Magistrado trador. É o cartório o palco para o grande teatro da vida civil. O curioso é que passamos nossa vida inteira nos relacionando diretamente com a atividade notarial e registral e, ainda assim, permanece esta sendo um mundo quase que totalmente desconhecido da população, até mesmo das pessoas mais informadas. Quando se pensa em cartório hoje no Brasil, fala-se de um universo de cerca de 20.000 serviços notariais e de registro, espalhados por todos os municípios nacionais. Universo habitado por centenas de milhares de empregados diretos, e outras centenas de milhares de inditabeliães ainda se tornam, nesta atividade, deveretos. Pode-se afirmar, com segurança, que mais dores solidários dos tributos que porventura deide um milhão de pessoas se sustentam da atixarem de fiscalizar o devido recolhimento. Além vidade notarial e de registro, dos cartórios. de contar com o serviço gratuito destes “Fiscais”, Os cartórios são hoje a mais extraordináas Fazendas Públicas ainda multiplicam sua caparia e eficiente máquina de fiscalização tributária cidade de arrecadação, com fundamento na RESdo país. Ninguém compra ou vende um imóvel PONSABILIDADE do notário ou registrador. sem que esta transação seja imediatamente A responsabilidade é um dos pilares do informada à Receita Federal, seja pelo Notário sistema registral brasileiro, que é exemplo e ou pelo Registramodelo para o dor, para se verimundo. Os notáficar a compatibirios e registradoEsta responsabilidade, que garante lidade das declares, além de resrações de renda efetivamente a segurança jurídica e econômica ponderem pessocom o patrimônio. dos atos praticados em cartório, é decorrência almente e solidaNenhuma escrituriamente pelos tridireta e imediata da autonomia e ra é lavrada se butos que têm independência dos notários e registradores não for apresenobrigação de fistada a certidão de calizar, são resregularidade com ponsáveis diretos o IPTU, além do pagamento do imposto de por todos os atos praticados no cartório. Quantransmissão – ITBI. Se for feito por instrumendo se reconhece uma firma, autentica-se um to particular, este não será registrado sem esdocumento, lavra-se uma escritura, registra-se tas comprovações. Nenhuma construção é um imóvel, notifica-se uma pessoa, protestaaverbada sem a comprovação do recolhimento se um título, outorga-se uma procuração públidas contribuições previdenciárias dos operários ca, em todos estes atos, muito além do carimque trabalharam na respectiva obra, com a bo do cartório, agrega-se a este documento apresentação no Registro de Imóveis da CND uma espécie de seguro, baseado na responsa– Certidão Negativa de Débitos do INSS. bilidade e fé pública do Tabelião. Graças aos Registradores Civis, que inforE esta responsabilidade, que garante efemam gratuitamente ao INSS todos os óbitos tivamente a segurança jurídica e econômica dos ocorridos no mês, o sistema previdenciário braatos praticados em cartório, é decorrência diresileiro economiza milhões de reais com a susta e imediata da autonomia e independência pensão imediata do pagamento de benefícios dos notários e registradores, que exercem a que, sem esta informação, continuariam a ser atividade em caráter privado, por delegação do pagos indevidamente. Poder Público. Somente a manutenção do moQual o custo para o Estado deste exércidelo atual, do exercício privado da atividade, to de fiscalização? Absolutamente nenhum. garante a eficiência dos serviços e a garantia Quanto custaria trocar esta eficientíssima esda responsabilidade do Tabelião. Além do mais, trutura por contigentes de milhares de fiscais assegura ao Estado a mais eficiente e segura tributários – vale acrescentar que para cada estrutura de fiscalização, sem nenhum custo Tabelião seriam necessários, no mínimo, 1 fispara os cofres públicos. Por estes motivos, pacal da Receita Federal, 1 fiscal da Fazenda Esíses como Portugal querem seguir o modelo bratadual, 1 fiscal da Fazenda Municipal e 1 fiscal sileiro, espanhol e chileno, entre outros, e por da Previdência Social, além dos técnicos e de isto é cada vez mais forte o movimento de todo o corpo administrativo necessário para privatização dos cartórios portugueses. movimentar a máquina estatal. Luiz Gustavo Leão Ribeiro é presidente da AsAcrescente-se que além de funcionarem sociação dos Notários e Registradores do DF como fiscais gratuitos para o Poder Público, os O Magistrado 35 Celulares com câmaras ameaçam a privacidade Demócrito Reinaldo Filho U 36 O Magistrado Arquivo m informe publicitário tem sido repetido na televisão brasileira nos últimos dias, fazendo propaganda do mais novo modelo de telefone celular da Siemens equipado com câmera digital. O anúncio não tem o pudor de esconder que o equipamento pode ser usado como ferramenta para perturbar a privacidade alheia; ao contrário, faz apologia disso. Nele, um “paparazzi” consegue adentrar numa festa privada portando esse tipo de celular, depois de revistado pelos seguranças. Permanece durante a festa fingindo estar falando ao celular e, assim, consegue fotografar o beijo de um casal de celebridades que se pretendia anônimo. Ao ser despertado pelo sinal do flash, o casal aciona os seguranças, que correm para tomar o aparelho, sem sucesso, pois o “paparazzi” já havia conseguido enviar a foto através de uma conexão com a Internet – o celular também tem esta função. A foto do casal se beijando é estampada na edição de uma revista logo em seguida. Essa propaganda pode parecer uma simples brincadeira, mas na verdade é o que vai acontecer daqui por diante. A questão da privacidade individual sempre esteve atrelada dramaticamente aos avanços tecnológicos. Semelhantes fenômenos aconteceram com o aparecimento das câmeras fotográficas, depois com os equipamentos de gravação, com as câmeras de vídeo, passando pelos computadores e, finalmente, com as redes de computadores (que tornaram a informação pessoal disponível através do mundo). Todos esses foram inventos que permitiram observar momentos pessoais, coletar informações armazenar fatos. Em razão da funcionalidade que permitem, existe uma domi- nante tendência da tecnologia ser utilizada para eliminar a privacidade individual. Mas na verdade, não é a tecnologia em si que ameaça a privacidade. São as pessoas que se utilizam da tecnologia e as condutas que elas adotam que criam as violações à nossa privacidade. O caso da propaganda do celular da Siemens é exemplar. O celular com câmera pode ser utilizado para inúmeros outros fins, que trazem comodidade para o usuário sem interferir com a privacidade de terceiros. Mas também pode ser utilizado para espreitar a privacidade alheia, como a própria publicidade fez questão de propagar (não se preocupando com a etiqueta do politicamente correto). Portanto, é o uso irrestrito da tecnologia que elimina a privaci- dade. Em sendo assim, a questão resume-se a identificar que condutas são permitidas em relação ao uso desses novos aparelhos. E nisso os governos têm um papel decisivo. O Ministro da Informação e Comunicação (MOIC) do Japão já manifestou sua intenção de regular o uso de telefones celulares que têm câmeras instaladas (“câmeraphones”). Pretende enviar em breve à Assembléia Nacional uma lei restringindo o uso desse tipo de telefone. O plano é submeter uma lei determinando que os “câmeraphones” funcionem emitindo um som toda vez que uma foto é tirada. O barulho do sinal sonoro serve como alerta às pessoas nos locais públicos onde a foto for tirada. A lei imporá essa obriga- ção aos fabricantes desses celulares, de forma a prevenir “violações a direitos humanos” e espionagem empresarial, diz um deputado do partido democrático. O Governo Koreano também está ponderando proibir o uso de celulares com câmera em alguns lugares, como piscinas públicas, pois a preocupação com a privacidade tem aumentado nos últimos dias (segundo comunicado oficial publicado no site do Ministério da Informação e Comunicação). O uso de tais telefones também parece ameaçar o sigilo industrial. Para se resguardar contra furto de tecnologia, a Samsung Eletronics, a gigante koreana fabricante de equipamentos eletrônicos e possivelmente o maior fabricante de O Magistrado 37 chips do mundo, proibiu, desde o dia 14 deste mês, seus empregados de usar telefones celulares equipados com câmeras no interior das suas fábricas. Os empregados serão autorizados a portar exclusivamente os telefones que declararem para registro nos locais de trabalho e, mesmo assim, terão que cobrir as lentes dos aparelhos enquanto estiverem no interior das fábricas. A retirada dos adesivos antes de deixar o local do trabalho será considerada infração trabalhista. Ironicamente, a Samsung é um dos líderes mundiais na fabricação de telefones celulares com câmeras. A proibição foi adotada pelo simples motivo de que a Samsung quer proteger sua tecnologia de ponta contra espionagem industrial. Alguns dos seus executivos expressaram preocupação quanto ao impacto que essa medida possa trazer nas vendas de telefones equipados com câmeras digitais. Mas ela parece não ter escolha, pois a disseminação de celulares cada vez mais potentes e aperfeiçoados constitui uma ameaça ao vazamento de informações corporativas e know-how industrial. Outras empresas koreanas como LG Eletronics, a Hyundai e a Kia Motors também planejam fazer o mesmo (segundo reportagem publicada no Chusun.com) 38 O Magistrado O Ministro da Informação e Comunicação da Korea disse que a proibição não infringe nenhum direito individual, desde que se dê conhecimento ao proprietário da câmera. A tendência é esse tipo de restrição se espalhar por todas as indústrias. A tensão não acaba por aí. Os donos de livrarias no Japão anunciaram que vão lançar uma campanha contra uma nova modalidade de shoplifters – pessoas que visitam as lojas para fotografar páginas de revistas e livros sem comprá-los, valendo-se dos tais telefones celulares. A partir de hoje, os donos de livrarias irão colocar avisos em seus estabelecimentos advertindo os leitores para a proibição do uso de telefones celulares equipados com câmeras. O shoplifting, como é conhecido o tipo de crime em que uma pessoa furta alguma coisa de uma loja fingindo ser um consumidor, sempre foi um grande problema para os livreiros. O shoplifting digital está se tornando uma dor de cabeça ainda maior, na medida em que os telefones celulares equipados com câmera estão se massificando e sua qualidade também está aumentando. Um complicador para conter esse tipo de conduta está na falta de previsão expressa nas leis de proteção autoral. Existe dúvida se o ato de fotografar páginas dos livros expostos constitui um crime semelhante aos nelas previstos, pois em geral c o í b e m apenas a reprodução de uma obra com fins comerciais. Além do mais, a prática do “digital shoplifter” é difícil de coibir, pois os empregados da loja não podem distinguir se o cliente está tirando uma foto ou simplesmente fazendo uma ligação. O uso de aparelhos celulares com função fotográfica está disseminado no Japão, país líder nesse tipo de tecnologia. Esses aparelhos portáteis englobam também a função de acesso à Internet, com a possibilidade de a pessoa enviar e receber e-mails com as fotos nele tiradas. Os provedores dos serviços de telecomunicações estão atentos a esse problema, e já advogam a necessidade de reorientar a conduta dos proprietários desses aparelhos. Demócrito Reinaldo Filho é membro do IBDI - Instituto Brasileiro de Política e Direito da Informática O Magistrado 39 40 O Magistrado Carlos Tiburcio/O Magistrado Jansen Fialho de Almeida O cabimento da oposição pela administração como proprietária, com base no domínio, em ação possessória disputada por terceiros sobre bens públicos T ema relevante que ainda vem encontrando certa resistência na jurisprudência e parte da doutrina, diz respeito ao cabimento da denominada oposição, modalidade de intervenção de terceiros, prevista no art. 56 do Código de Processo Civil, no que tange ao proprietário, ente da Administração Pública, com fundamento no domínio, adentrar na lide em que particulares disputam a posse de bem público. Nesse descortino, a jurisprudência admite que esses particulares discutam a posse sobre área pública, sem a intervenção da Administração, no caso, o proprietário, mesmo que não exista qualquer autorização dessa ocupação, fundamentando-se no entendimento de que posse e domínio são institutos diversos . Outra corrente respeitável entende que os bens públicos dominicais podem ser objeto de posse e conseqüentemente usucapião, por serem afetos à desafetação, integrando o patrimônio disponível do Estado, submetido, por isso, às regras do direito privado . A jurisprudência dominante, contudo, tem entendimento pela impossibilidade jurídica de pedido possessório em área pública, quando deduzido por particular sobre bem público contra o órgão de- tentor da propriedade, pois não podendo ser objeto de usucapião, a ocupação é mera detenção, tolerada ou permitida, portanto à precariedade . Os Tribunais têm entendido também que nas ações possessórias disputadas entre particulares, o ente público não pode adentrar na lide sequer como opoente, porque estaria intervindo como proprietário (reivindicante) e não como possuidor. Sendo institutos diversos, calcam-se ainda no que dispõem o art. 923 do CPC e o §2º do art. 1.210 do Código Civil que vedam, na pendência de processo possessório ao autor ou réu, estendendo-se ao terceiro, intentar ação de reconhecimento do domínio, porquanto a oposição teria em verdade esse objetivo. Outro fundamento dessa corrente defende que a sentença nenhum efeito teria contra o ente público, porque não sendo parte lhe é ineficaz, podendo oportunamente ajuizar a competente ação reivindicatória, que tutela especificadamente o domínio. Esse modo de pensar que atualmente ainda tem prevalecido e já adotei em outras decisões de minha lavra, advém de decisões do extinto TFR, quando a questão fundiária no Distrito Federal não tinha os contornos de hoje, e vem sendo seguida pelo eg. TRF - 1ª Região e pelo eg. TJDFT, na grande parte de seus julgados . Data venia, essa respeitável argumentação sobreleva o direito processual, meramente instrumental, em relação ao que realmente interessa, ou seja, a correta aplicação do direito material, com plena efetividade e celeridade. Entendemos, ao reverso, que quando se trate de um bem público é perfeitamente possível o ingresso do ente representativo, como terceiro, opoente, proprietário, fundado na alegação do domínio, para buscar a coisa ou o direito sobre que controvertem autor e réu. Cabe registrar de plano, que nas ações possessórias, em regra, apesar de não se perquirir sobre a dominialidade do bem , a discussão em relevo ressalta os limites das regras previstas pelas normas de direito privado, haja vista que se trata de posse sobre área pública, diferenciando-se da posse civil. Por conseqüência, o tratamento jurídico não pode ser o mesmo, merecendo ponderações, em razão de várias peculiaridades que passo a demonstrar. De conhecimento geral que no Distrito Federal a situação das terras públicas, quanto à propriedade, posse, O Magistrado 41 uso, é de extrema complexidade. Muitas áreas são ditas como desapropriadas, mas não são discriminadas, outras, sequer foram pagas aos legítimos proprietários, ainda, não se sabe ao certo quais áreas foram efetivamente transferidas pela União a TERRACAP ou fazem parte do próprio Distrito Federal. Muitas outras têm escrituras fraudulentas. E por aí vai. O certo é que, ao se rejeitar o interesse jurídico na demanda, seja da União, do Distrito Federal, da TERRACAP, ou de seus órgãos da Administração, nas ações possessórias, no Distrito Federal, poderá ocasionar sérios riscos à sociedade. E porque? Simplesmente porque numa área onde a União, o DF ou a TERRACAP diz ter o domínio, será o Juiz praticamente obrigado a deferir a posse (cuja ação tem natureza dúplice) da área, manifestamente pública, a terceiros que poderão, munidos de uma sentença judicial, alienar livremente tal direito (art. 42 do CPC) e até, clandestinamente fracionar, nascendo mais um condomínio irregular, fruto da “grilagem”, disfarçado sob o manto da JUSTIÇA. Assim, corre-se o risco de consubstanciar-se em situações irreversíveis, resultando na prevalência da manutenção da situação de fato, mesmo manifestamente contrária à situação de direito. Não se olvide da possibilidade de as partes entabularem em conluio para obter esse fim. Note-se, insisto, por exemplo, se numa ação de reintegração de posse o ma42 O Magistrado gistrado julgar improcedente o pedido, estará, regra geral, mantendo e reconhecendo a licitude da posse do réu, com julgamento do mérito, perfazendo-se a coisa julgada material e formal, em virtude, cumpre repetir, da natureza dúplice das possessórias. Mesmo que se opere somente entre as partes os efeitos e limites subjetivos da coisa julgada, nos termos do art. 472 do CPC, sabemos que na prática, os incautos, ou até talvez não mais tão incautos como antigamente, poderão fazer disso uma moeda de compra e venda. Outro ponto que merece destaque se refere do ônus ao erário se for concedido o direito possessório a particulares em área pública, sem a intervenção de seus órgãos na própria ação. Pode gerar, mesmo que se ajuíze a ação reivindicatória a posteriori, o direito a indenização por benfeitorias ao possuidor, munido legalmente de um título judicial, quiçá se não já transformado em condomínio irreversível, como os inúmeros existentes no DF . Raciocínio diverso se aplica na posse civil, afeta a particulares, relação jurídica de direito disponível, onde pode gerar o usucapião, forma de prescrição aquisitiva de um bem, resultando no título de propriedade, mas inaplicável aos bens públicos, onde é vedado constitucionalmente (arts. 183 §3° e 191, parágrafo único da Constituição Federal). Mesmo na vigência do Código Civil anterior o STF já havia editado a Súmula 340, verbis: “Desde a vigência do Código Civil, os bens dominicais, como os demais bens públicos, não podem ser adquiridos por usucapião”. Acresça-se por oportuno, que o novo Código Civil no art. 102, proibiu genericamente o usucapião dos bens públicos, repetindo o texto constitucional. E se não é possível o usucapião, não podemos aceitar ou interpretar, mesmo por via reflexa, a viabilidade da posse sobre esses bens, salvo previamente autorizada pelo Poder Público, nos termos e limites da lei autorizativa. No mais é mera tolerância, detenção, em realidade invasão, pois se revela precária (art. 1.208 do Código Civil). E se não há posse sobre os bens públicos, como proibir o ente representativo de intervir na lide onde litigam particulares, que aliás, estariam no uso, gozo e fruição de um bem coletivo, sem ao menos ressarcir ao erário? Como se depreende, ao interpretarmos as regras de direito público frente ao direito privado, penso eu, jamais devemos chegar a ponto de viabilizar qualquer prejuízo, mesmo em tese, para a sociedade. Uma coisa é interpretarmos, por exemplo, regras de direito bancário em que o Estado participa efetivamente da atividade financeira, sujeitando-se ao regime próprio das empresas privadas, não podendo gozar de quaisquer privilégios, por determinação constitucional expressa, sendo de fato, uma atividade exploradora, de risco, embora vise a política social (art. 173 da CF). No tema em apreço, nada disso ocorre e o legislador não fez ressalvas, simplesmente proibiu o usucapião em todos os bens públicos, por conseqüência a posse, indistintamente, e não podemos estender essa interpretação concernente a direito indisponível, pena de se quebrar toda a harmonia de um sistema jurídico adotado. Acrescente-se que segundo a jurisprudência supracitada, além do ente público estar obstado de como terceiro, intervir como opoente, sequer poderá ajuizar a ação reivindicatória porque pendente a possessória, mesmo ainda que não seja parte nesta, o que definitivamente obstaculiza o seu próprio direito de ação, defesa do patrimônio público. E se a demanda possessória entre esses particulares perdurar por dez, vinte ou trinta anos, como de costume em ações desse naipe, decorrente também dos inúmeros recursos processuais cabíveis? Não me parece lógico que a interpretação moderna do direito público em face das regras pertinentes ao instituto da posse, tenha o condão de manter esse raciocínio jurídico, mormente diante da peculiaridade das terras que compõem o quadrilátero do Distrito Federal . Mas tudo isso pode ser obstado se os operadores do direito mudarem, ao menos adequarem a interpretação sobre as normas de direito público, analisando-as sistematicamente, concernente às ações possessórias em áreas públicas, especialmente no DF, repito, onde a “grilagem” se faz presente, no propósito de que acolham a intervenção do ente público nessas ações, como opoente, pois ao mesmo tempo em que negar a posse aos outros dois litigantes, o reintegrará no imóvel, seja pelo cunho possessório ou mesmo petitório. No julgado do eg. TJDFT, na APC39736/96, da 3ª Turma Cível, o culto Desembargador NÍVIO GONÇALVES, proferiu voto que trago a conhecimento pelo brilhantismo e lucidez do assunto, “in verbis”: “(...) Por oposição, entende-se o instituto pelo qual a pessoa que pretender, no todo ou em parte, a coisa ou direito sobre que pende demanda entre outras pessoas, vem propor sua ação contra elas, para fazer valer o direito próprio incompatível com o direito das partes ou uma delas, na lição de CELSO AGRÍCOLA BARBI (Comentários ao CPC, Forense, 3ª ed., vol. I, pág. 307). ARRUDA ALVIM preceitua que ‘o instituto da oposição, disciplinado nos arts. 56 e 61, regula o ingresso de terceiro, em processo pendente entre outras partes, no caso em que a esfera jurídica deste terceiro seja afetada, precisamente no mesmo direito ou coisa, objeto do litígio’ (Código de Processo Civil Comentado, vol. III, pág. 107 e 107 v). A lição de ADROALDO FURTADO sobre a possessória é a seguinte: Vimos que, se o domí- nio subjaz à querela possessória, a exceptio proprietatis é admissível. E exatamente por ser admissível ampliar-se o objeto lógico do processo, a controvérsia travada já não se limita ao fato da posse, mas aprofunda-se à investigação do domínio, ainda que só para se poder decidir da posse. Certo, essa ocorrência não subtrai à ação seu caráter possessório, porque a sentença vista em seu conteúdo autorizativo só poderá decidir sobre posse; a resolução sobre domínio necessária a concluir sobre a posse é resolução “incidenter tantum”. Contudo, ainda sem integrar o “thema judicandum”, mas entrando no processo como objeto necessário do exame judicial sob o ponto de vista lógico, a questão de domínio fica submetida, nos próprios autos da ação possessória à “cognitio”, embora não ao “judicium”. Em tais condições, seria desnecessária e perturbadora a propositura paralela da ação petitória, em que se agitaria, ao fim e ao cabo, a mesma questão’ (Comentários ao Código de Processo Civil, vol. VIII, págs. 512 e 513, n° 345, ao art. 923). Como é sabido, existem dois fundamentos para que alguém proponha ação possessória contra outrem: a posse ou o domínio. O fato posse ou “jus possessionis” decorre do exercício de um dos elementos da propriedade, sua parte visível ou sensível, material, defluente da exploração da coisa, auferindo-lhe as vantagens que a sua destinação propicia. Ao lado da posse como O Magistrado 43 fato, existe o direito à posse que decorre do jus iure, da propriedade sobre a coisa. Esse é o jus possidendi que emana do domínio. É o caso da TERRACAP. Em tese, portanto, sendo as terras disputadas do domínio público, a posse dos particulares se apresentaria como simples poder de fato revelado pelo exercício aparente de algum poder inerente ao domínio, não menos exato e que não induzem posse os atos de mera permissão ou tolerância, como textualmente ressalva o art. 497 do Código Civil . Assim, fica claro não constituir a oposição providência vedada pelo art. 923 do Código de Processo Civil, que destina a coibir a propositura da reivindicação. A oposição é admitida nas ações possessórias (Comentários ao Código de Processo Civil, de CELSO AGRIÍCOLA BARBI, vol. I, pág. 315, tomo II). Diante do exposto, dou provimento ao apelo para afastar a carência da ação, devendo a oposição ter regular tramitação (...)” . frisei Corroborando, o saudoso mestre J.M. DE CARVALHO SANTOS, ao comentar o art. 504 do antigo Código Civil, reproduzido na primeira parte pelo novo estatuto (art. 1.210, §2°), no tocante à alegação de domínio enquanto pendente ação possessória, vedada pelo dispositivo legal, ensina que esse regramento comporta exceções, a meu ver, perfeitamente aplicável na espécie, “ipsis litteris”: “... O que é preciso ter presente por outro lado, é que o temor de confundir no mes44 O Magistrado mo juízo petitório o possessório não deve impedir o juiz de pesquisar a índole da posse, da qual se reclama a manutenção ou a reintegração. Ele tem, pois, o dever de averiguar, se na posse concorrem os requisitos que a lei requer para que o autor possa nela ser manutenido ou reintegrado. Com tal escopo lhe será lícito examinar os títulos produzidos, não para decidir sobre o direito, mas para ‘colaborare’, como dizem os práticos, a posse: vale dizer, para conhecer dos caracteres da mesma e deduzir se ela se ajusta ao espírito da lei, se é ou não manutenível ou reintegrável (...) Nem outra interpretação se pode dar ao texto legal, desde que é uma verdade que o Código nele nada mais fez do que reproduzir o assento de fevereiro de 1876, que visava evitar o absurdo de se julgar, em casos tais, a posse àquele mesmo a que, pelo processo e evidência notória dos autos, se depreende não lhe deve ser julgada a propriedade. O que o assento julgava absurdo, e com ele julgará toda pessoa de bom senso, é ver o juiz mandar entregar a uma pessoa, que não é dono, uma coisa que o outro provou exuberante e satisfatoriamente que lhe pertence de fato e de direito, a ponto de convencer o juiz, e este por motivos inexplicáveis, decidir que sabe que aquilo não é do que se diz possuidor, mas ainda assim manda lhe entregar. Obrigando o réu, que perdeu a ação possessória, a vir depois, armado dos mesmos documentos, perante o mesmo juiz por meio da ação de reivindicação pedir aquilo justamente que o juiz então lhe negou, mas que noutra sentença vai lhe dar, somente porque agora o pedido veio por meio de outra ação, que não a possessória. Ora, isso é inconcebível, é absurdo, como bem se qualificou no referido assento, não mais podendo ser tolerado em face das normas processuais modernas, que tendem a simplificar todas essas formalidades e sutilezas inúteis, que, sem significação, só servem para protelar a distribuição da justiça.”( Código Civil Brasileiro Interpretado, 16ª Ed., Livraria Freitas Bastos, vol. VII, 1984, pp. 159/160) o destaque é meu Observe-se que o reconhecido doutrinador civilista, que em sua obra comentou exaustivamente todos os artigos do Código Civil, faleceu em 1956 e já tinha esse posicionamento moderno. Naquela época, Brasília sequer existia no mapa. Imagine-se hoje o que escreveria o mestre sobre o tema “sub judice”. A jurisprudência recente do eg. TJDFT, entretanto, já começa a admitir a oposição em ação possessória, debatendo-se a propriedade: “PROCESSO CIVIL. OPOSIÇÃO. DEBATE SOBRE PROPRIEDADE. CABIMENTO. CONDIÇÕES DA AÇÃO. POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. 1. SENDO A POSSE A VISIBILIDADE DO DOMÍNIO, NADA IMPEDE QUE SE DISCUTA PROPRIEDADE EM FEITO DE OPOSIÇÃO ASSENTADO EM AÇÃO POSSESSÓRIA. 2. ANALISAM-SE AS CONDIÇÕES DA AÇÃO PELOS FATOS NARRADOS, NÃO PELOS PROVADOS. A IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO, AUTORIZADORA DA EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM EXAME DO MÉRITO, CORRESPONDE À VEDAÇÃO ABSOLUTA, PELA ORDEM JURÍDICA, DE ACOLHIMENTO AO PLEITEADO PELO AUTOR. A EVENTUAL INVIABILIDADE DE ACATAR-SE O PLEITO, MERCÊ DE FALHA DE PRESSUPOSTOS DE NATUREZA FÁTICA E ISOLADA, IMPLICA IMPROCEDÊNCIA DA PRETENSÃO. APELO PROVIDO. UNÂNIME”. (TJDFT, 1ª TURMA CÍVEL, APC20020110627654, RELATOR DES. VALTER XAVIER, PUBLICADO NO DJ 3 DE 04.06.2003) Transcrevo o voto do percuciente relator do v. Acórdão, Desembargador VALTER XAVIER, o qual foi acompanhado pelos seus eminentes pares, sem discrepância: “(...) Dentre os pedidos elencados, analiso o seguinte: ‘c) que, ao final, julgar procedente a presente Oposição e reconhecer à Opoente a posse e o domínio de que é titular sobre o imóvel, dignando-se, ainda, determinar a restituição da gleba à dita Opoente;’ (fls. 10). O pleito em destaque não afronta ordenação jurídica vigente, tampouco traduz fato impróprio à apreciação jurisdicional. Se procedente ou não, cuida-se de questão a ser apreciada no mérito, não analisado até o momento (...). (...) Merece o tema breve incursão. O estudo da posse, conquanto intrigante, comparece como um dos mais árduos de todo o Direito Civil. Como bem observa Washington de Barros Monteiro, citando Clóvis Beviláqua, ‘dificilmente se encontrará tema que mais tenha cativado a imaginação dos juristas. Em compensação, dificilmente se encontrará outro que mais haja resistido à penetração da análise e às elucidações da doutrina’. Inúmeras teorias surgiram com o escopo de formular um conceito para posse. Todavia, prevaleceram duas: uma subjetiva, outra, objetiva. Conduzindo a primeira delas, encontra-se Savigny, que afirma ser a posse ‘o poder que tem a pessoa de dispor fisicamente de uma coisa, com intenção de tê-la para si e de defendê-la contra a intervenção de outrem. São dois, portanto, no seu entender, os elementos constitutivos da posse: o poder físico sobre a coisa, o fato material de ter esta à sua disposição, numa palavra, a detenção da coisa (corpus) e a intenção de tê-la como sua, a intenção de exercer sobre ela o direito de propriedade (animus).’ À frente da segunda teoria, tem-se Ihering, cuja concepção de posse assim se explica: ‘(...) corpus é a relação exterior que há normalmente entre o proprietário e a coisa, ou a aparência da propriedade. O elemento material da posse é a conduta externa da pessoa, que se apresenta numa relação semelhante ao procedimento normal de proprietário. Não há necessidade de que exerça a pessoa o poder físico sobre a coisa, pois que nem sempre este poder é presente sem que com isto se destrua a posse. O elemento psíquico, animus, na teoria objetivista de Ihering não se situa na intenção do dono, mas tão-somente na vontade de proceder como procede habitualmente o proprietário - “affectio tenendi” - independentemente de querer ser dono.’ Adotou o Código Civil Brasileiro a teoria objetiva, na medida em que considera posse a visibilidade do domínio. Neste momento, pertinente recordarmos o conceito do instituto da oposição: ‘Segundo o art. 56 do Código de Processo Civil, ‘quem pretender, no todo ou em parte, a coisa ou o direito sobre que controvertem autor e réu poderá, até ser proferida a sentença, oferecer oposição contra ambos.’ Consiste a oposição, portanto, na ‘ação de terceiro para excluir tanto o autor como o réu.’ Com essa intervenção no processo alheio, o terceiro visa a defender o que é seu e está sendo disputado em juízo por outrem. É medida de livre iniciativa do terceiro, simples faculdade sua, visto que nenhum prejuízo jurídico pode lhe causar a sentença a ser proferida num processo em que não figura como parte. Mas, sem dúvida, pode o processo alheio acarretar-lhe dano de fato, que exigirá, mais tarde, uma outra ação para obter a respectiva reparação’. Compulsando a peça vestibular da presente oposição, infere-se objetivar a Companhia Imobiliária de Brasília o O Magistrado 45 reconhecimento da propriedade do imóvel disputado no feito de manutenção de posse (...) Confira-se: ‘c) que, ao final, julgar procedente a presente Oposição e reconhecer à Opoente a posse e o domínio de que é titular sobre o imóvel, dignando-se, ainda, determinar a restituição da gleba à dita Opoente;” (fls. 10). (...) Constato, ainda, a juntada de certidão de registro de imóveis (fls.12), comparecendo prematuro descartar-se, de plano, a possibilidade de a aludida Companhia ser a titular do direito invocado. Forçoso concluir que, indubitavelmente, pode a citada manutenção acarretar à Opoente, ora Apelante, efetivo dano, que exigirá, mais tarde, uma outra demanda para obter o respectivo ressarcimento. Ademais, não se olvide que a posse é a visibilidade do domínio, nada impedindo que, a meu aviso, por meio de oposição, a TERRACAP persiga, desde já, o reconhecimento da propriedade do imóvel em litígio, antes de um suposto prejuízo a demandar reparação, homenageando-se, inclusive, o princípio da celeridade processual. Essas as razões por que DOU PROVIMENTO ao recurso, a fim de que o feito retorne ao juízo monocrático, para regular prosseguimento. É o meu voto (...)”. negritei. Os fundamentos doutrinários contrários a esse entendimento, outrossim, repousam nas lides em que as áreas são privadas e bens disponíveis que podem ser objeto de usucapião. Assim preleciona HUMBERTO THEODORO JÚNIOR, 46 O Magistrado ao afirmar que “(...) como tutela de mero fato, o interdito possessório representa prestação jurisdicional provisória, destinada apenas a manter a paz social, através da preservação de um estado fático, enquanto se aguarda, no processo e tempo adequados, a eventual composição, definitiva e de direito, a respeito do direito real envolvido no dissídio (...)” . Como se vê, ao preponderar tais reflexões em se cuidando de bens públicos, ao contrário, estaríamos colaborando para a quebra da paz social, citando-se como exemplo as recentes invasões em áreas rurais e urbanas – públicas e privadas – por membros de movimentos de pessoas intituladas como “SEM TERRA” e “SEM TETO”. THEOTÔNIO NEGRÃO, ao comentar o art. 923 do CPC, lembre-se, o dispositivo que veda na pendência do processo possessório intentar ação reivindicatória, pondera: “(...) A conseqüência prática desta disposição será que o possuidor não proprietário, desde que ajuíze ação possessória, poderá impedir a recuperação da coisa pelo seu legítimo dono; ficará este impedido de recorrer à reivindicação, enquanto a possessória não estiver definitivamente julgada. Como essa conclusão parece absurda, embora fundada na letra clara da lei, a doutrina e jurisprudência têm reagido contra ela (...)”. o destaque é meu E quando estará definitivamente julgada a ação possessória? Ficará o proprietário à espera, sofrendo não somente a indisponibilidade de seu patrimônio, mas a própria indisponibilidade do direito de ação, de oposição, condicionado a resolução de demanda, envolvendo somente terceiros, já que não é parte? A análise jurídica e o bom senso nos levam à teratologia da interpretação a ser dada, máxime em sede de direito público, sobre bem imprescritível, indisponível, inalienável, insuscetível de posse e vedado o usucapião. Mais: se não induzem posse os atos de mera permissão ou tolerância, nos exatos termos do art. 1.208 do Código Civil, como obstar ao ente público o direito de ação, condicionando-o, a um evento futuro e incerto? Este dispositivo, assim interpretado nesta seara, fere frontalmente o direito de ação previsto no art. 5°, XXXV e os arts. 183 §3° e 191, parágrafo único que vedam o usucapião em bens públicos, todos da CF. A questão ao que parece, transcende as normas de direito privado puro, e ainda não foi apreciada pelos Tribunais diante da nova ordem constitucional e mudanças do Código Civil, somados ao fator social. Em conclusão, perfeitamente cabível e admissível o ente público intervir como opoente em ação possessória onde litigam particulares, desautorizados, com fundamento no domínio, quando se tratar de bem público. Jansen Fialho de Almeida é juiz de Direito do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, titular da Vara Cível de Planaltina - DF e vice-presidente do Instituto dos Magistrados do Distrito Federal – IMAG-DF. O Magistrado 47 48 O Magistrado Carlos Tiburcio/O Magistrado Pedro Aurelio deixa o TJDF Desembargador continua dando aulas e pretende voltar a estudar francês, inglês e aprender tocar violão e cavaquinho D epois de 38 anos de serviço público, dos quais 28 dedicados à magistratura, o desembargador Pedro Aurélio Rosa de Farias, 57 anos, se despediu do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, no último dia 11 de agosto, com o sentimento de missão cumprida. “Quem assumir o meu lugar, não encontrará nenhum processo ou acórdão”. Ele sai decepcionado com alguns membros do Judiciário local e com saudades de outros. Agora, Pedro Aurélio pretende advogar nos tribunais superiores e em outros estados, dar aulas e se dedicar mais à família. “Agora vou viver minha vida com tranqüilidade”, afirma. Acusado de vender habeas corpus ao traficante Alexandre de Lima e Silva, conhecido como Chaves, Pedro Aurélio está decepcionado com o TJDF por causa dos procedimentos que envolvem o seu nome. “Há colegas que preferiram acreditar em um bandido e isso não me deixou muito confortável. Além disso, não permitiram que eu fizesse minha defesa. Esse foi um dos principais motivos para que eu pedisse minha aposentadoria, apesar de já estar pensando nessa hipótese há alguns anos”, esclarece o desembargador. Outro ponto que pesou na decisão foi a Reforma da Previdência, em votação na Câmara dos Deputados, que pode até reduzir os vencimentos dos magistrados. “Quando ingressei na magistratura, eu sabia dos meus direitos. Tinha a segurança. Hoje, as regras não estão definidas, o que prejudica muito quem pensa em ingressar no serviço público. O cortador de cana, aquele bóiafria, até que tem mais direitos que um juiz. Ele tem tempo de usufruir de sua família, de seu lar, da sua vida. O juiz não, pois o Estado pode convocá-lo a qualquer momento e ele tem que estar pronto. A situação está tão grave que os juízes, pela primeira vez na história, cogitaram uma greve. Isso é um absurdo”, exemplifica. Agora, afastado temporariamente dos tribunais – “Pretendo pedir meu registro na OAB para advogar nos tribunais superiores e em outros estados, principalmente no meu Rio de Janeiro” – o desembargador quer continuar sua vida acadêmica. “Toda minha família é formada por professores. Está no DNA”, explica o mestre, formado pela antiga Universidade do Brasil, hoje Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), que é diretor nas Faculdades Planalto e professor no UniCeub. Além disso, Pedro Aurélio vai realizar um antigo sonho: aprender a tocar violão e cavaquinho. “Já fiz minha inscrição no Clube do Choro”, revela. “Também quero voltar a estudar francês, inglês, jogar tênis, ir ao teatro, ao cinema... Enfim, vou voltar a viver como qualquer pessoa. Quero viver sossegado”. O desembargador lembra ainda que deixa amigos de longa data no TJDF. Sobre as denúncias de vendas de habeas corpus, Pedro Aurélio diz que vai provar sua inocência, que nunca perseguiu ninguém e que não guarda mágoas dos colegas que o investigam. “Fui um bom juiz. Só deixei preso quem merecia. Quem não merecia e cumpria os preceitos da lei, ficava em liberdade, que é a coisa mais valiosa para o homem. Só quero dizer que o ódio leva ao câncer e as pessoas que quiseram me crucificar, não vão colocar a cabeça no travesseiro e dormir com a consciência tranqüila, como eu, que saiu com o dever cumprido”. Com relação à Reforma da Previdência, o desembargador teme que os políticos prejudiquem o Poder Judiciário, inclusive o Ministério Público. “Os políticos já desmontaram as Forças Armadas, querem acabar com o Banco do Brasil e assim por diante. Pensei que o governo Lula mudaria isso. Porém, o que vemos, é o Brasil se tornar uma colônia dos Estados Unidos, como quer o Fundo Monetário Internacional (FMI). Temo que a Reforma da Previdência torne a carreira de juiz sem atrativos. Assim sendo, só ingressará na carreira os maus profissionais do Direito. Será melhor ser advogado”, conclui. O Magistrado 49 Carlos Tiburcio/O Magistrado O desembargador Pedro Aurélio pediu aposentadoria do TJDF, mas continua lecionando Direito A defesa do desembargador O Magistrado em Revista publica, com exclusividade, a defesa do desembargador Pedro Aurelio E XMO. SENHOR DESEMBARGADOR ASDRÚBAL NASCIMENTO LIMA DD. RELATOR DO PAD. 1219/2003 PEDRO AURELIO ROSA DE FARIAS, brasileiro, casado, Desembargador do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, residente e domiciliado nesta capital, portador da Carteira de Identidade nº 046/TJDF e do CPF nº 060.807.747/04, nos autos do processo em epígrafe, por seu advogado devidamente constituído, vem à presença de V. Excia., em atendimento ao respeitável despacho de fls., para ofertar sua 50 O Magistrado DEFESA Aduzindo os fatos e razões de direito que passa a expor e elucidar devidamente: 1. É imperativo que inicialmente a defesa externe a sua inconformidade pela maneira com que o defendente foi exposto à execração pública pela mídia enodoando sua vida de juiz probo que sempre procurou pautar sua judicatura por uma célere e criteriosa prestação jurisdicional, despontando como um dos mais operosos juizes da Corte que, por não temer qualquer tipo de investigação, não pode concordar com a forma que está sendo conduzido este processo administrativo. Em última análise o açodamento com que a mídia está a impelir o andamento do procedimento procura, sem dúvida alguma, atingir em cheio a dignidade da própria justiça desmoralizando os seus juízes de forma inclemente sem que lhes seja dado o direito sequer de verem atendidos os seus direitos constitucionais mais elementares como se demonstrará. 2. A democracia não pode sobreviver sem a independência dos seus juízes e nem pode ela abstrairse do princípio basilar do estado de direito democrático segundo o qual devem os juízes julgar baseando suas decisões fundamentadas unicamente no seu livre convencimento e nos rigores da lei. Se a lei está errada que se as mudem. Não compete aos juízes discutir as leis, mas sim lhes dar a garantia do seu efetivo cumprimento, como membros que são de um dos mais nobres e fundamentais Poderes do Estado. 3. Apesar de reconhecer-se que as investigações levadas a efeito pelo Ministério Público do Distrito Federal não têm qualquer valor jurídico, conforme recentíssima decisão da e. 2a. Turma do Excelso Pretório, o que é absolutamente estranhável é o notório interesse do Parquet em querer, a qualquer custo, ingressar no Procedimento Administrativo a ponto de impetrar dois Mandados de Segurança contra o Relator do presente; um para ter vista dos autos, e outro para fazer com que o defendente seja levado açodadamente a julgamento, apesar do Ministério Público local não ter qualquer legitimidade para ingressar no presente processo como custos legis, dominus litis, ou mesmo como interessado (docs. 1 e 2). 4. A se admitir - ad argumentandum tantum - o exercício do interesse do Parquet no caso, quem poderia ingressar no feito, ainda assim com reservas nessa fase incipiente seria o Ministério Público Federal qualificado para funcionar junto ao Superior Tribunal de Justiça, único foro competente para o julgamento do defendente quanto à parte criminal. 5. Aliás, contra decisão liminar concedida indevidamente no Mandado de Segurança nº 2003.00.2.004377-0 manejou o ora defendente igualmente o Mandado de Segurança nº 2003.00.2.004895-4 do qual é Relator o eminente Desembargador Valter Xavier, que concedeu medida liminar que possibilitou o acesso da defesa aos presentes autos, bem como a retomada da condução do processo a V. Excia. conforme determina a lei vigente (docs. 3 e 4). Inconformado com a concessão da medida liminar concedida no writ pelo MM. Desembargador Valter Xavier, o Ministério Público do Distrito Federal requereu suspensão da segurança perante o colendo Supremo Tribunal Federal e teve o seu pleito rechaçado ex abrupto pelo Exmo. Sr. Presidente da Suprema Corte (doc. 5). 6. Por outro lado, é estranho que diante de indícios tão tênues e levando-se em conta que nas conversações telefônicas gravadas que constam dos autos, nas quais nenhuma pessoa se refere nominalmente ao ora defendente, limitando-se a afirmar por ouvir dizer que ocorrera pagamento em seu favor para que fosse concedida uma liminar em pedido de habeas corpus, se possa dar crédito à palavra de pessoas inidôneas que, mesmo assim, não tiveram condições de afirmar o envolvimento direto do defendente com nenhuma das pessoas que foram ouvidas pela Comissão. 7. Embora seja absolutamente estranha a conclusão da Comissão Sindicante no sentido de concluir pela ocorrência de crime em tese contra o defendente, muito embora não tenham sido esgotadas as oitivas de pessoas envolvidas ou a análise da prova que poderia ter sido produzida pelo defendente se lhe tivesse sido permitido o acesso aos autos na fase inquisitorial, a defesa vai procurar contrapor aos depoimentos produzidos - em homenagem à busca da verdade real - os fatos que devem ser elucidados de maneira isenta, esclarecendo que a ninguém interessa mais a elucidação dos fatos do que ao ora defendente que está com a sua honra conspurcada de forma tão vil e a carreira decepada pela incúria de alguns e a desonestidade de outros. RESUMO DOS FATOS E DAS PEÇAS DOS AUTOS DEPOIMENTO DO MM. JUIZ GILMAR TADEU SORIANO 8. Constam das declarações prestadas pelo MM. Juiz Gilmar Tadeu Soriano às fls. 12: " ( ... ) que na semana do recebimento da denúncia e decretação da prisão preventiva, bem como nos outros dias seguintes, recebeu a procura de alguns Magistrados; que além da procura do Desembargador Wellington também recebeu algumas ligações do Gabinete do Desembargador Pedro Aurelio, mas em virtude do acúmulo de serviços e do atendimento a partes interessadas do feito em questão não teve oportunidade de atender ... que os telefonemas vinham do Gabinete do Desembargador Pedro Aurelio, mas não do próprio Desembargador Pedro Aurelio; que quer esclarecer que tais telefonemas foram contemporâneos aos do Desembargador Wellington; que não teve contato nenhum com o Desembargador Pedro Aurelio, não sabendo qual a razão dos telefonemas .... " (os destaques são nossos). 9. Posteriormente, perante V. Excia., eminente Relator do presente, esclareceu o MM. Juiz Gilmar Tadeu Soriano (fls. 334/5): "( ... ) que, inicialmente, confirma integralmente suas declarações de fls. 12/4, as quais teve oportunidade de fazer uma releitura neste ato; que se recorda que na oportunidade informou que não chegou a ter contato com o Desembargador Pedro Aurelio, que nem mesmo se as ligações, que foram do gabinete do Desembargador Pedro Aurelio, foram produzidas pelo próprio Desembargador ou por qualquer outro funcionário; que realmente no mês de janeiro ou fevereiro desse ano foi procurado através do telefone pelo Desembargador Pedro Aurelio, que pretendia que o Declarante o substituísse em algumas Turmas, na regência de aula, no CEUB, na disciplina de processo civil; que informou ao Desembargador que estava muito ocupado e não poderia atender o seu pedido, pois está realizando obras em casa; que pode afirmar que nos idos de setembro de 2.002, por ocasião dos O Magistrado 51 procedimentos de interceptação telefônica não teve qualquer contato com o Desembargador Pedro Aurelio; que somente mantiveram contato nos meses de janeiro ou fevereiro de 2003; que em data que não se recorda, encontrou-se com o Desembargador Pedro Aurelio, casualmente, na garagem do Tribunal, quando ele comentou que pretendia lhe fazer um convite, não chegando a entrar em detalhes ... ". 10. É necessário que se esclareça que o MM. Juiz Gilmar Tadeu Soriano foi adjunto do defendente por dois ou três semestres, na cadeira de Processo Civil II, e como este havia sido convidado para assumir a Chefia do Departamento de Direito do IESPLAN, era necessário arranjar um substituto para as duas turmas do curso matutino. Como o Dr. Gilmar havia demonstrado grande aptidão para o magistério superior, foram efetuadas ligações para o seu gabinete em meados de dezembro de 2002 para convidá-lo a assumir as duas turmas do curso matutino. Calhou que esses telefonemas se deram no mesmo período em que o Juiz da 1a. Vara Criminal estava recebendo a denúncia e decidindo o pedido de prisão preventiva dos irmãos Passos, algo que o defendente desconhecia por absoluto. Talvez por esse motivo o MM. Juiz Gilmar Tadeu Soriano ter falado que os telefonemas originados do Gabinete do ora defendente foram contemporâneos com os do Desembargador Wellington Medeiros. Foi pura coincidência os telefonemas se realizarem na mesma época. Mas de qualquer forma restou consignado pelo próprio Juiz que os telefonemas em verdade se referiam apenas a um convite que lhe foi feito para assumir as suas duas turmas do curso matutino no UniCEUB. Em nenhum momento foi mencionado pelo MM. Juiz depoente que qualquer pedido lhe tenha sido dirigido pelo ora defendente e, portanto, nada havendo relativamente a tráfico de influência. DEPOIMENTO DO MM. JUIZ PEDRO DE ARAÚJO YUNG-TAI NETO 11. O MM. Juiz Pedro de Araújo Yung-Tai Neto, às fls. 15 afirmou: "(...) que o MM. Juiz de Direito Substituto, Dr. Carlos Eduardo Batista dos Santos também chegou a comentar com o depoente que teria sido chamado pelo Desembargador Pedro Aurelio Rosa de Farias para comparecer até o gabinete deste, o qual teria conversado acerca do processo de parcelamento irregular de solo urbano em trâmite da 1a. Vara Criminal de Brasília/DF, não sabendo maiores detalhes do encontro ..." 12. Necessário se faz que se confira a declaração acima com o que foi afirmado pelo próprio MM. Juiz Carlos Eduardo Batista dos Santos às fls. 17/9: " (...) - que, salvo engano, na véspera da sessão do julgamento que concedeu Habeas Corpus a Pedro Passos, o Depoente atendeu a um telefonema que lhe foi dirigido pela Assessoria do Desembargador Pedro Aurelio Rosa de Farias, pedindo ao Depoente que comparecesse ao seu Gabinete; que aproximadamente às 18h30min daquele mesmo dia o Depoente se dirigiu ao Gabinete do referido Desembargador; que em 52 O Magistrado conversa reservada no interior do Gabinete, apenas na presença do Desembargador Pedro Aurelio, este externou sua preocupação em ver o Poder Judiciário freqüentemente lançado nos jornais como pivô de uma questão política; que externou ao Depoente o seu entendimento sobre a (des)necessidade da manutenção da prisão preventiva dos denunciados; que as razões invocadas pelo Desembargador Pedro Aurelio foram as mesmas declinadas em seu voto proferido no dia seguinte; que a conversa durou aproximadamente 40 minutos, mas em nenhum momento foi solicitado ou, no entendimento do Depoente, insinuado qualquer decisão do Depoente em face dos incontáveis pedidos de revogação que continuaram sendo distribuídos àquela Vara; que ao ouvir as considerações tecidas pelo Des. Pedro Aurelio, o depoente disse: "Apesar de entender inicialmente de modo diverso, gostaria de assumir um compromisso com V. Excia. O único compromisso que eu posso assumir é o de analisar com toda atenção os pedidos que chegaram ao meu conhecimento, decidindo de forma bastante fundamen tada, seja em um sentido, seja em outro"; que como já esclareceu anteriormente, o Desembargador Pedro Aurelio antecipou o seu voto no Habeas Corpus, acrescentando que provavelmente seria voto vencido; que o depoente em contato com o Dr. Gilmar recebeu dele a informação de que estava preocupado com possíveis tentativas de influência em relação ao referido processo ... " (Os destaques não são do original). 13. O próprio Juiz Carlos Eduardo afirma categoricamente que "em nenhum momento foi solicitado ou, no entendimento do Depoente, insinuado qualquer decisão do Depoente" pelo ora defendente, portanto não se podendo vislumbrar a ocorrência de tráfico de influência. O contato feito com o MM. Juiz Carlos Eduardo teve um único objetivo para que o ora defendente pudesse tomar conhecimento dos fatos com o colega e assim sedimentar o seu entendimento da desnecessidade da preventiva contra Pedro Passos e seus irmãos, pois foi o ora defendente quem buscou com o Juiz informações sobre o que estava ocorrendo no processo, e não o contrário . O próprio Juiz afirmou que nada lhe foi pedido - o que é a mais absoluta verdade. Havia necessidade de que fossem obtidas informações dele sobre o que estava acontecendo nos autos em função da decisão que teria que ser proferida no dia seguinte, dado que o processo não parava no Cartório, tantos eram os Promotores ali intervindo e requerendo providências, o mesmo ocorrendo com os advogados das partes. Mais uma vez é fundamental que se destaque que em nenhum momento nada foi pedido ao juiz. Não houve tráfico de influência. DEPOIMENTO DO MM. JUIZ CARLOS PIRES SOARES NETO 14. Foi afirmado às fls. 22/3 pelo MM. Juiz Carlos Pires Soares Neto: (...) que no mês de fevereiro deste ano, precisamente no dia 15, (... NOTA DO AUTOR - uma sexta-feira ) ... recebeu um telefonema no Gabinete do colega da 1a. Vara de Entorpecentes e Contravenções Penais, de nome Vilmar Barreto, pedindo que fosse atendido o seu irmão Advogado Manoel Barreto; que foi dito pelo Depoente que não costumava atender advogados naquelas circunstâncias e que se o pedido fosse para analisar qualquer postulação quanto à liberdade de algum réu que fosse formulado por escrito, pois seria apreciado pelo Depoente o mais breve possível; que na terça feira seguinte (... NOTA DO AUTOR - DIA 19 DE FEVEREIRO ... ) o depoente recebeu um telefonema em sua residência na parte da manhã do Desembargador Pedro Aurelio, no qual ele fazia um pedido para que uma determinada pessoa fosse colocada em liberdade pelo fato de que o flagrante poderia ter sido forjado diante da prisão efetuada por uma equipe de repressão a roubos, segundo o Desembargador a pessoa havia sido presa era filho de um motorista do TJDF e que conhecia a família; que o Desembargador dizia que estranhava o fato da prisão ter sido realizada pela Delegacia de Repressão a Roubos e a pessoa ter sido indiciada por tráfico; que o Desembargador ponderou que a pessoa poderia aguardar julgamento em liberdade e caso viesse a ser condenado seria recolhido; que o Depoente indagou o nome da pessoa e por ele foi respondido Alexandre, dizendo o nome completo; que no mesmo dia o depoente examinou então ao chegar no Fórum o flagrante quando percebeu que já havia uma denúncia oferecida contra Alexandre, vulgo Chaves, e demais acusados, tendo então recebido a peça acusatória e designado data para os interrogatórios para a terçafeira seguinte; que na sexta-feira (... NOTA DO AUTOR - DIA 22 DE FEVEREIRO...) no período da manhã o Depoente telefonou na residência do Desembargador e informou-lhe que o flagrante estava perfeito sob o aspecto material e formal e que já havia recebido a denúncia e designado data dos interrogatórios; que o Desembargador então insistiu se o fragrante estava "redondo" e se não dava mesmo para liberar o acusado; que no dia 26 de fevereiro, data designada para os interrogatórios, o Depoente constatou que o acusado Alexandre, vulgo Chaves, foi o único que não foi apresentado pela polícia, oportunidade em que o Depoente tomou conhecimento que o referido acusado havia sido colocado em liberdade por força de concessão de uma liminar pelo Des. Pedro Aurelio, na noite de 22 de fevereiro;... que um dos advogados do co-réu Ney Silva, que se encontrava preso, fazia-se presente por ocasião daquele ato; que se tratava do advogado Mário de Almeida, que ao depoente foi revelado por intermédio do Diretor do Cartório Marcelo Bianchini que o citado Advogado declarou por várias vezes que o que valia era a "Lei do Real "; que posteriormente, o delegado da 12a. DP de Taguatinga procurou pelo depoente e representou por várias interceptações telefônicas que foram deferidas pelo Depoente, dando ensejo a uma nova ação penal da qual também constava a pessoa de Alexandre, vulgo Chaves, como o líder de uma organização criminosa de tráfico de entorpecentes, com base de atuação principalmente nas cidades-satélites de Taguatinga e Ceilândia; que nas degravações verificava-se a existência de um esquema no Tribunal de Justiça para favorecer os membros da organização criminosa mediante o pagamento de certas quantias; que nas degravações foi citado o valor de duzentos mil reais; que também nas degravações o advogado Manoel Barreto dava total garantia ao próprio Chaves e até mesmo para os seus familiares de que mantinha contato com o Desembargador e que tudo daria certo; que em outro diálogo de Chaves com terceiro comparsa, Chaves esclarecia que o seu esquema é que era bom; que segundo as degravações, o esquema consistia em procurar o Desembargador em horário noturno, após o expediente normal ...que desde que ingressou na magistratura, cerca de 8 anos, nunca recebeu outro chamado de qualquer Desembargador; que no primeiro diálogo o Des. Pedro Aurelio afirmou que havia orientado os familiares do acusado Alexandre, vulgo Chaves, a requererem relaxamento de prisão e não liberdade provisória ... que o depoente deseja esclarecer que o Advogado Manoel Barreto acompanhava em segundo grau o andamento dos processos referentes ao acusado Alexandre. Vulgo Chaves, nesta Corte, retirando-os da Secretaria sem procuração nos autos e devolvendo-os sem petição ... " (Os destaques não são do original). 15. É muito estranho o relato dos fatos pelo Juiz Carlos Pires Soares Neto, que certamente equivocouse em muito ao insinuar que lhe fora feita qualquer espécie de pressão para que o acusado Alexandre fosse solto, pois não foi assim que a conversa entre ele e o ora defendente transcorreu. 16. Primeiro porque não é hábito profissional ou pessoal do ora defendente interferir em trabalho de qualquer colega, principalmente quando este não é pessoa amiga e ou próxima. O Juiz Carlos Pires é pessoa de trato difícil e ferrenho adversário político do ora defendente, ligado intimamente ao grupo do Desembargador Mário Machado, outro seu desafeto no Tribunal, contra o qual, aliás, foi interposto Incidente de Suspeição. 17. A se admitir que houve o pedido "para que uma determinada pessoa fosse colocada em liberdade" nos termos colocados pelo Juiz, o que se admite apenas a título de argumentação, não tendo o ora defendente a menor intimidade com o citado Juiz, é no mínimo muito estranho que lhe fosse dirigir pedido de tal natureza, coisa que nunca fez mesmo em relação aos juízes com os quais mantém relacionamento de amizade. 18. Por outro lado, não é sequer compreensível que um Desembargador, hierarquicamente na condição de rever e ou modificar decisões de primeiro grau, fosse se dirigir a um Juiz com o qual não tem qualquer intimidade e ou relacionamento cordial, sendo mesmo seu desafeto, para lhe solicitar que colocasse alguém em liberdade, o que poderia fazer sem nenhuma dificuldade e dentro das normas regimentais. 19. Realmente houve o contato do ora defendente com o citado Juiz na data mencionada, e isto foi feito de forma indignada e constrangida, porque ao ora defendente fora comunicado que o mesmo se recusava terminantemente a receber um advogado para despachar um simples pedido de relaxamento de prisão. O Magistrado 53 Como é fato público e notório que citado Juiz é daqueles que não recebe partes ou advogados em seu Gabinete, o ora defendente aquiesceu a atender a uma queixa formulada por um advogado, de que o mesmo não estava lhe recebendo para simples despacho (atestado pelo documento anexo - doc. 6). 20. A Lei Orgânica da Magistratura Nacional, Lei Complementar n° 35/79, prevê em seu art. 35, IV, que o Juiz deve: "tratar com urbanidade as partes e membros do Ministério Público, os advogados, as testemunhas, os funcionários e auxiliares da Justiça, e atender aos que o procurarem, a qualquer momento, quando se trate de providência que reclame e possibilite solução de urgência ... ", 21. Deste modo, o ora defendente realmente telefonou ao Juiz solicitando-lhe tão somente que recebesse o advogado reclamante, que portava um pedido fundamentado de relaxamento de prisão de um acusado, que teria sido preso em situação anormal em uma diligência de policiais da Delegacia de Repressão a Roubos. Só isso! Em nenhum momento foi feita qualquer solicitação para que o pedido fosse deferido, ou em "flagrante redondo" ou qualquer outro termo nesse sentido. 22. Ao receber posteriormente, em retorno, a ligação do Juiz, que foi igualmente breve, oportunidade em que o mesmo afirmou que o relaxamento havia sido negado porque a denúncia fora por ele recebida, o ora defendente agradeceu a "gentileza" de haver atendido ao advogado e ao familiar do interessado, desligando o telefone. Repele-se com energia a assertiva de que tenha havido qualquer pressão sobre o Juiz para que soltasse o acusado Alexandre, tendo-lhe sido apenas solicitado que atendesse com urbanidade ao advogado e ao interessado pois o mesmo reconhecidamente não gosta de receber partes e advogados em seu gabinete, o que por sinal é um dever do juiz. 23. Ao contrário do que o juiz afirma em seu depoimento perante a Comissão de Investigação, o defendente não poderia nunca ter aconselhado a família do acusado a fazer algo, simplesmente porque não são pessoas do seu relacionamento e com eles nunca manteve qualquer contato para tratar de qualquer espécie de assunto, o que pode ser apurado e colhido nos depoimentos prestados pelo próprio traficante e de seus familiares, como se pode constatar nas peças em apenso. Em nenhuma passagem os familiares do traficante, ou mesmo o próprio, afirmam que tiveram algum contato com o ora defendente ou que tenham recebido deste qualquer orientação jurídica, pois já seria um completo absurdo o simples fato de se admitir tal hipótese. 24. O que é absolutamente censurável e que se depreende de depoimentos prestados perante a douta Comissão de Sindicância é que membros do Ministério Público (sempre os mesmos da Promotoria de Acompanhamento de Parcelamento Ilegal de Solo Urbano) prometeram ao traficante Alexandre e a seus pais todos os benefícios que a lei permite, caso envolvessem o nome do ora defendente em seus depoimentos. 25. Deve ser ainda considerado, a título de argumento e desqualificação de seu testemunho, que 54 O Magistrado este depoimento prestado pelo juiz contradiz as declarações feitas pelo próprio delegado que conduziu a interceptação dos telefones da quadrilha. Enquanto o delegado afirma que em nenhum momento falou-se no nome do juiz ou do desembargador Pedro Aurelio, o juiz em seu depoimento fala sempre "no desembargador", como se já estivesse certo e definido que este seria o juiz envolvido com a quadrilha. 26. Deve ainda ser levado em consideração que na cabeça do juiz o ora defendente já está respondendo a um procedimento por desvio de conduta, como se pode ver dos ofícios por ele remetidos ao Desembargador Corregedor e ao Presidente do Tribunal de Justiça, que estão às fls. 119 e 120. Quando o juiz prestou depoimento à Comissão de Sindicância já estava claramente impregnado pela certeza de que o ora defendente era realmente o juiz ou desembargador envolvido com o crime, convicção formada pelo íntimo contato e pela profunda amizade que mantém com o Promotor de sua Vara, e com os demais membros do Ministério Público que atuam na área de repressão ao parcelamento irregular do solo urbano, grupo esse que chega mesmo a reunir-se semanalmente no Bar Carpe Diem da 104 Sul, tanto que em um ato falho referiu-se em seu ofício a um procedimento aberto contra o ora defendente para apuração de desvio de conduta, procedimento esse absolutamente inexistente no Tribunal de Justiça. 27. O juiz adiantou-se a uma decisão, dando claramente a entender que na época do seu depoimento o mesmo já estava convicto de que o ora defendente houvera praticado um ato de desvio de conduta. O mais estranhável e, por absurdo que pareça, foi a atitude da douta Comissão Sindicante que desprezou inteiramente prova contundente contida nos autos contra "um juiz" que teria ordenado a prisão da quadrilha por pura vingança conforme se constata das gravações de fls. 1.887 (apenso nº 10) quando um homem não identificado, possivelmente um policial, conversa com uma mulher , também não identificada, afirmando, verbis: "Homem - Só que ele pagou o dinheiro e alguém deram o balão e deram o restante do dinheiro para alguém, ai ficou o juiz mais não sei quem sem receber e ai o juiz aloprou e mandou recolher o Chaves com tudo que tinha de companhia dele ta ele e todos aqui. Só a neném que foi liberada, o restante das mulher ta tudo aqui, ... (sic). (Os destaques não estão no original). Mais abaixo, no 13º apenso, às fls. 2.599/2.600, em um diálogo gravado entre alguém chamado Rubens e uma mulher, identificada por Maria, reitera-se a acusação acima literalmente, com o seguinte teor, verbis: "Rubens - Fala pra ela ... o problema foi o seguinte: é porque o negócio ... aquele negócio do Chaves, o Chaves pagou aquele dinheiro, né? Maria - Sei. Rubens - Pra sair. Só que ele pagou o dinheiro e alguém deram o balão e num deu o restante do dinheiro alguém, tá entendendo? Maria - Hunrum. Rubens - Ficou faltando um juiz mais num sei quem sem receber. Aí, o juiz aloprou e mandou recolher todo mundo. Recolheu o Chaves com tudo que tiver de companhia dele. (Os destaques não são do original). Maria - Hã? Rubens - Então pegaram todo mundo. Ta todo mundo aqui, Tem quarenta e poucos aqui. Entendeu? "... (sic). Aqui sim está contida uma denúncia séria, peremptória, indício comprometedor de envolvimento de um juiz, mencionado por duas vezes pelo menos e teria sido, segundo se depreende pela prova dos autos, o MM. Juiz Carlos Pires, o que não se acredita, entretanto, não poderia a douta Comissão Sindicante, tão zelosa se mostrara, abandonar ex abrupto essa linha de investigação e voltar-se unicamente contra a figura de um Desembargador que em nenhum momento foi identificado nominalmente de forma direta nas conversas gravadas. Ao contrário, a sua única participação concreta nos fatos foi conceder uma liminar anulando um fragrante ilegal, e após, manter a prisão do traficante por duas vezes consecutivas. As declarações do MM. Juiz Carlos Pires, ao invés de servirem para informar à Comissão dados que pudessem propiciar a formação de sua livre convicção sobre os fatos, serviram tão somente para transferir aos membros da Comissão de Sindicância sua convicção íntima já formada e sedimentada, a partir de um processo de cognição viciado pela anterior intimidade mantida com os acusadores, deturpada assim pela amizade com os promotores que estão à frente do caso dos irmãos Passos, que nada tem a ver com o ora defendente, ou que poderia conduzir à ilação de que pretende com isso desviar de si o foco investigativo. 28. Nunca deve ser esquecido que o juiz Carlos Pires é membro atuante da facção política contrária à do ora defendente na AMAGIS, fazendo parte integrante do grupo político comandado pelo Desembargador Mário Machado, seu colega de "peladas" naquela associação, e notório inimigo do ora defendente, contra o qual, aliás, já foi interposta exceção de suspeição (docs. 7 e 8). Suas declarações mais parecem uma retaliação pela vitória obtida nas últimas eleições pela chapa de oposição, encabeçada pelo MM. Juiz George Lopes Leite, que foi Vice-presidente na última gestão da AMAGIS quando a presidia o ora defendente. DEPOIMENTO DA MÃE DE ALEXANDRE PRESTADO À COMISSÃO DE INVESTIGAÇÃO DO PARCELAMENTO DO SOLO URBANO NO DISTRITO FEDERAL 29. À simples leitura deste depoimento ao qual se reporta a defesa apenas a título de ilustração dado que não foram obtidos à luz do devido processo legal sendo, portanto, nulo, verifica-se que a depoente não faz qualquer espécie de referência concreta à pessoa do ora defendente. Faz apenas menção ao seu nome por conta das insinuações mentirosas feitas pelo advogado Manoel Barreto, que afirmava, para tirar proveito próprio, ter relações de negócio com o ora defendente. 30. Com efeito, afirmou a depoente perante a COMISSÃO DE INVESTIGAÇÃO DO PARCELAMENTO DO SOLO URBANO NO DISTRITO FEDERAL sem que o defendente tivesse acesso, verbis: "...que o advogado Manoel Barreto afirmou que havia "um pessoal no tribunal que soltava", informando que seria o desembargador Pedro Aurelio; que do valor total de R$ 200.000,00 o advogado afirmou que a declarante teria que entregar-lhe R$ 40.000,00 em dinheiro o qual seria destinado "ao pessoal do Tribunal"; que não importaria o que fosse feito na primeira instância, pois ele resolveria na segunda instância; que na ocasião em que esteve na casa do advogado Manoel Barreto pela primeira vez, o advogado afirmou que sua esposa era juíza aposentada e que seu irmão era juiz da primeira vara de Entorpecentes, Vilmar Barreto, sendo que se o processo tivesse sido distribuído para tal vara o caso "seria mais fácil ... que na terça feira seguinte, por volta das 19h a declarante foi novamente a casa do advogado Manoel Barreto, acompanhado de seu esposo Vicente, entregou-lhe ao advogado toda a importância de R$ 40.000,00 em dinheiro, momento em que o advogado saiu levando tal importância que seria entregue ao desembargador Pedro Aurelio para que seu filho fosse solto; que o advogado explicou à declarante que necessitaria de dois votos favoráveis no Tribunal para que seu filho fosse solto, sendo que os desembargadores Pedro Aurelio e Lecir seriam favoráveis enquanto o desembargador Smanioto seria contra; que na visita da quinta-feira seguinte a declarante disse ao seu filho que tinha vendido a casa e tomado dinheiro emprestado para que conseguisse a sua liberdade e que quando seu filho fosse solto teria que vender a casa dela para pagar o restante de R$ 160.000,00 porque se não pagasse o advogado disse que o pessoal mandava voltar para a cadeia; que na sexta-feira da mesma semana seu filho telefonou-lhe dizendo que havia sido solto .... que o filho da declarante contou-lhe que por volta das 19hs do mesmo dia o Dr. Barreto e o Dr. Assis, advogado que subscreveu a petição de Habeas Corpus, estavam no Fórum resolvendo a situação do filho da declarante ... que chegou a indagar do Dr. Barreto a razão pela qual era o Dr. Assis quem assinava o Habeas Corpus, sendolhe dito que vários advogados assinavam pelo Dr. Barreto, sem maiores explicações ... que o filho da depoente deveria apresentar-se toda semana ao Fórum e que o advogado Manoel Barreto havia contratado a advogada Dinalva para acompanhar o filho da depoente nas audiências ... que a declarante não sabe como foi feito o pagamento do restante do valor mais tem certeza que o valor de R$ 200.000,00 foi totalmente pago ... que o advogado Manoel Barreto pediu também R$ 20.000,00 além do valor inicial por ter soltado os demais colegas do filho da declarante ... que melhor esclarecendo afirma que os três cheques foram entregues ao advogado Manoel Barreto como garantia mas que seu filho iria obter o dinheiro em espécie e fazer a troca de tais cheques; que no dia 20/05/02 o filho da declarante passou na residência da mesma O Magistrado 55 dizendo que havia obtido a importância de R$ 15.000,00 e que iria na residência do advogado Manoel Barreto "pagar os cheques", só que o cheque não foi entregue ao seu filho porque faltava R$ 1.500,00; que ao retornar da casa do advogado Manoel Barreto o filho da declarante percebeu a presença de policiais próximos ao portão da garagem do apartamento de seu filho e resolveu não entrar na garagem .... que neste exato momento o filho da declarante foi preso por policiais que possuíam mandado de prisão ... que após tomar ciência da prisão de seu filho a declarante ligou para o advogado Manoel Barreto contando-lhe o ocorrido, ocasião em que o advogado disse-lhe para arrumar dinheiro e que era para ficar tranqüila e que seu filho e companheiros, Doca e Robinho seriam soltos no mesmo esquema da primeira vez, e que "juiz nenhum de merda"... iria mantê-los presos; que a irmã de Doca levou a importância de R$ 18.000,00 em dinheiro, faltando apenas R$ 2.000,00, que a irmã de Robinho, Neide, levou a importância de R$ 40.000,00, também em dinheiro, e entregou para o advogado Manoel Barreto ... que apesar da promessa do advogado Manoel Barreto em soltar os quatro envolvidos o tempo ia passando e os mesmos continuavam presos, sendo que a declarante ao indagar ao advogado o motivo da demora, o mesmo informou que a mídia estava muito em cima do caso e que o pessoal, a equipe que soltava estava retrancada; que a declarante afirma que somente não estavam sendo soltos os nomes das pessoas que estavam na mídia, mas que outros como Chico de tal, preso no Gama, também, por tráfico de drogas, havia conseguido a liberdade; que ficou sabendo que Chico de Tal havia sido solto porque estava preso com seu filho e o próprio advogado Manoel Barreto foi quem o soltou no mesmo esquema narrado no início do depoimento ... que não teve contato com o desembargador Pedro Aurelio; que ao que sabe seu marido Vicente chegou a ouvir a conversa mantida entre o advogado e o "pessoal que soltava"; que sabe que seu filho em uma oportunidade revelou que levou dinheiro ao advogado Manoel Barreto e que este último passou o dinheiro a uma terceira pessoa que estava em um carro esperando; que ficou combinando desde o início, que o serviço do Dr. Manoel Barreto era garantido, ou seja, que se não fosse obtida a absolvição o dinheiro pago seria integralmente devolvido à declarante, razão pela qual seu filho passou a exigir de Manoel Barreto e devolução do dinheiro já que seu filho ainda se encontra preso e foi condenado; que o advogado Manoel Barreto passou a dizer que conseguiria a redução da pena, fato que a declarante não aceitou porque o combinado era a absolvição ... que em certa ocasião o advogado Manoel Barreto chegou a ameaçá-los de morte, dizendo que se Vicente o importunasse "encheria o peito dele de balas " ... e que se o Alexandre achava que estava se dando bem ele fez foi se afundar, porque o pessoal era muito grande e forte e que Pedro Aurelio tinha até primo no Supremo ... " 31. Vê-se que em verdade estamos diante de um perfeito caso de "venda de fumaça" - famoso jargão policial - que teria sido praticado pelo advogado Manoel Barreto Pinheiro que, desejando cobrar honorários mais 56 O Magistrado altos, alardeou prestígio que não tinha e jactou-se de influências as quais não detinha na realidade, fato que, sem dúvida alguma, está enquadrado na alçada profissional da OAB e de seu Código de Ética. 32. A prova de que o advogado Manoel Barreto Pinheiro era useiro e vezeiro na prática de atribuir-se grande conhecimento com pessoas da justiça está no próprio depoimento da mãe do traficante, quando ela afirma que o Dr. Barreto chegou a dizer-lhe que sua esposa era juíza aposentada, quando em verdade ela nunca foi membro da magistratura. 33. Por outro lado é de fato público e notório na família judiciária que o Dr. Manoel Barreto Pinheiro sempre se utilizou em seus relacionamentos profissionais do fato de que seu irmão é Juiz de Direito, o que, aliás, foi confirmado pela depoente, que ressalta esse procedimento comum do citado advogado. 34. Do mesmo modo é inverossímil a afirmação da depoente de que seu filho em certo dia saiu da casa do advogado para que o mesmo entregasse dinheiro ao Desembargador Pedro Aurelio, pois em nenhum momento o traficante afirmou em seu depoimento que o Dr. Manoel Barreto tenha saído para entregar qualquer valor para o ora defendente, pois se assim tivesse efetivamente procedido teria sido imediatamente preso por este. 35. Em verdade não existem nos depoimentos alusões diretas à pessoa do ora defendente. Ao contrário, existem unicamente puras especulações a respeito do dinheiro que teria sido entregue a não se sabe quem, pois o Dr. Manoel Barreto para cobrar seus honorários os quais não teve coragem ou condição de exigir no montante pretendido, sem qualquer pudor, afirmara que o dinheiro seria para "seu pessoal" no Tribunal, o que provavelmente levou a douta Comissão a tirar ilações equivocadas a respeito do ora defendente que, repita-se não teve o seu nome diretamente envolvido por nenhum dos depoentes, exceto o MM. Juiz Carlos Pires Soares Neto que por razões de ordem pessoal fê-lo de maneira incorreta. 36. A "venda de fumaça" que praticou o advogado Manoel Barreto fica tão evidente que, em certo momento a mãe do traficante Alexandre chega a afirmar que o causídico lhe dissera que necessitava de mais dinheiro porque o "pessoal" a que se referira seriam os Desembargadores Pedro Aurelio e Lecir Manoel da Luz, o que é verdadeiramente mentiroso e inconseqüente. 37. O próprio advogado Manoel Barreto, em seu interrogatório prestado perante o MM. Juiz da 3ª Vara de Entorpecentes (doc. 9), afirma expressamente que nunca teve qualquer relacionamento espúrio com o ora defendente, que nunca lhe deu dinheiro algum e que nunca lhe foi solicitado nada acerca desses fatos pelo ora defendente, afirma tão somente que este foi seu professor na Faculdade e na escola da Magistratura, mas que nunca teve qualquer intimidade maior com o ora defendente. 38. Deve ainda ser ressaltado que o traficante Alexandre de Lima Silva em favor de quem foi impetrado o Habeas Corpus de nº 2002.00.2.000805-8 pelo advogado JOSÉ LEOPOLDO DE ASSIS PEREIRA, e não por MANOEL BARRETO PINHEIRO, e no qual o ora defendente concedeu liminar (doc. 10), e para a qual teria recebido uma importância em dinheiro, que, aliás, nem se apurou o quanto, não teve sequer a participação do advogado Manoel Barreto, conforme se constata pelo próprio processo anexo. 39. Por outro lado, posteriormente, em períodos de tempo inferiores a cinqüenta dias aproximadamente, duas outras ordens de Habeas Corpus foram negadas à unanimidade pela e. 1ª Turma Criminal com o voto do ora defendente, o que demonstra sua isenção em relação aos fatos e que não existiu qualquer acordo para favorecer o referido traficante (docs. 11 e 12). Curiosamente, por ocasião do julgamento de um desses Habeas Corpus pela e. 1ª Turma Criminal, o de nº 2002.00.2.004046-8, no qual foi denegada a ordem, participou o eminente Desembargador Lecir Manoel da Luz, que foi injustamente envolvido no depoimento da mãe do bandido. 40. No primeiro Habeas Corpus o defendente concedeu a ordem porque o flagrante era absolutamente nulo, por ter sido visivelmente montado, o que posteriormente ficou esclarecido pelos depoimentos colhidos dos policiais Anaeno dos Santos Xavier (fls. 336/8) e Carlos Alberto Fortuna Lourenço (fls. 339/41) que participaram daquela diligência, que confirmaram a V. Excia., eminente relator deste PA, que montaram aquela estória de perseguição a um veículo furtado apenas para proteger um informante que mantinham na quadrilha e que poderia ser morto caso descoberto. 41. É cediço que o auto de prisão em flagrante deve conter com exatidão todos os fatos do momento da sua ocorrência, nos exatos termos do que dispõe o artigo 304 do Código de Processo Penal. Qualquer alteração da realidade dos fatos detectada na lavratura do flagrante acarreta a sua nulidade. 42. Nas entrelinhas de seu depoimento a mãe do traficante, Maria Gorete de Lima Silva (fls. 261/66), demonstra claramente que foi enganada pelo advogado Manoel Barreto Pinheiro, e que o seu interesse na questão cinge-se apenas na devolução dos honorários indevidamente pagos, pois referido advogado sequer impetrou o Habeas Corpus em favor do seu filho, mas sim o advogado José Leopoldo de Assis Pereira, conforme demonstrado pela documentação ora acostada aos autos. 43. Afinal, seria no mínimo risível, não fora a crueldade das maldosas insinuações, que a pessoa que segundo a mãe do traficante, o advogado Manoel Barreto afirmou haver pago, fosse o mesmo Desembargador que acabou por mandar seu filho para a prisão por duas outras vezes. DEPOIMENTO DO PAI DE ALEXANDRE PRESTADO À COMISSÃO DE INVESTIGAÇÃO DO PARCELAMENTO DO SOLO URBANO NO DISTRITO FEDERAL 44. Também deste depoimento se vale a defesa apenas a título de referência dado que o mesmo está eivado de nulidade, pois foi obtido fora do devido processo legal, sendo, portanto, nulo de pleno direito, dado que o ora defendente sequer teve acesso ao seu depoimento colhido pela douta Comissão de Sindicância. 45. Afirmou o pai do traficante perante a Comissão de Investigação do Solo Urbano no Distrito Federal (fls. 267/70), verbis: "... que o declarante e sua esposa foram à residência do advogado Manoel Barreto e o mesmo ofereceu seus serviços profissionais dando-lhes garantia de 99% de que seu filho seria solto, sendo que para tanto deveria ser paga a importância de R$ 200.000,00 ... que durante a negociação o declarante chegou a presenciar e ouvir o telefonema entre o advogado Manoel Barreto e a pessoa que aquele dizia ser o desembargador Pedro Aurelio; que após o pagamento de R$ 40.000,00 seu filho foi solto em uma sexta-feira à noite, não sabendo quem decidiu pela liberdade de Alexandre ... que após a liberdade de Alexandre, seu filho passou a ser pressionado pelo advogado Manoel Barreto para que pagasse o restante da importância contratada; que o declarante se recorda que certa vez Manoel Barreto exigiu a importância de R$ 50.000,00 para que fosse depositado na conta do desembargador Pedro Aurelio que estava saindo de viagem para o Rio de Janeiro; que se recorda também que Alexandre disse-lhe que chegou a ir juntamente com o advogado Manoel Barreto à casa de Pedro Aurelio entregar a este parte do dinheiro devido, que no entanto Manoel Barreto não teria permitido que Alexandre descesse do carro ... que conforme era afirmado pelo advogado Manoel Barreto o dinheiro se destinava ao pessoal do Tribunal que iria garantir a liberdade do filho do declarante, sendo que a favor de seu filho teriam os votos dos desembargadores Lecir e Pedro Aurelio, enquanto o desembargador Smaniotto o voto seria contra; que segundo o advogado o dinheiro destinado ao pessoal do Tribunal era entregue ao desembargador Pedro Aurelio e que não chegou a ficar sabendo o que o mesmo faria com tal importância; que o filho do depoente chegou a ser preso novamente junto com outros indivíduos, ocasião em que em contato com Manoel Barreto, o advogado garantiu que todos poderiam ser soltos através do mesmo esquema, ou seja, o mesmo pessoal dele, pela importância também de R$ 200.000,00; que familiares de tais pessoas juntamente com o depoente e sua esposa foram à residência de Manoel Barreto e entregaram a importância em espécie de R$ 65.000,00; que dessa segunda vez nenhuma das pessoas presas obteve liberdade, razão pela qual Manoel Barreto chegou a devolver R$ 40.000,00 à irmã de Robinho, Neide, dandolhe uma casa nesse valor; que como justificativa pela não obtenção da liberdade, o advogado Manoel Barreto apenas ficava enrolando e dizendo para esperar chegar no Tribunal na turma dele ... que o advogado Manoel Barreto chegou a afirmar ao declarante que o desembargador Pedro Aurelio era sócio do advogado na fazenda ...". 46. Esse depoimento do pai do traficante Alexandre também não traz qualquer elemento de prova contra o ora defendente, apenas repete o anterior, da mãe do bandido, afirmando por ouvir dizer, as estripulias do advogado Manoel Barreto Pinheiro, que para auferir bons honorários de seus clientes afirmava que tinha um esquema no Tribunal, e que parte do dinheiro arrecadado seria a ele destinado, sendo que o próprio O Magistrado 57 advogado em seu depoimento prestado ao MM. Juiz da 3ª Vara de Entorpecentes afirma inexistir, e que seria fruto de "pura bazófia", praticada com o intuito de demonstrar a seus potenciais clientes que era um homem poderoso, conhecido e com muitos amigos na justiça, e, portanto, capaz de fazer o que outros advogados não conseguiriam. 47. Também as afirmações do pai do traficante são visivelmente plantadas no procedimento com o intuito claro de incriminar o ora defendente e de tentar obter vantagens e benefícios para seu filho, estando em flagrante contradição com o próprio depoimento do traficante Alexandre que nunca afirmou ter acompanhado o advogado Manoel Barreto à casa do ora defendente, tal como erroneamente afirmado por seu pai perante a Comissão do acompanhamento do solo urbano. 48. Do mesmo modo é gratuita e sem fundamento a referência de que algum valor supostamente deveria ser entregue ao advogado Manoel Barreto a fim de que fosse depositada na conta bancária do ora defendente. Outra afirmação por ouvir dizer que nada tem de verdadeiro e que faz parte de uma trama urdida pelo advogado Manoel Barreto para valorizar honorários que pretendia receber. Pura "venda de fumaça"! 49. O pai do traficante fala que depois que recebeu o dinheiro o advogado ficou enrolando por conta da manutenção da prisão de seu filho. Desconhece o depoente, por certo, que o Desembargador Pedro Aurelio, ora defendente, conforme documentos ora acostados aos autos, em outras duas oportunidades, participando do quorum de julgamento de seu filho, denegou também as ordens, conforme se constata dos Habeas Corpus nºs 4.046-8 e 7.238-7 em anexo. 50. A estória contada pelo pai do traficante foi visivelmente orientada para incriminar o ora defendente com o objetivo de obter facilidades para seu filho e para tentar reaver o dinheiro pago ao advogado, porque o pai do traficante nunca teve qualquer contato com o ora defendente e ao menos sabe onde este reside e muito menos os números de seus telefones. DEPOIMENTO DE SÉRGIO HENRIQUE DE ARAÚJO MORAES - DELEGADO DA 12a. DELEGACIA DE POLÍCIA. 51. O Delegado Sérgio Henrique de Araújo Moraes, lotado na 12ª Delegacia de Polícia, afirmou perante a douta Comissão de Sindicância (fls. 67/8): "... que existe entre os agentes um comentário de que o referido Chaves teria obtido sua liberdade por meios escusos; que por ocasião da interceptação de ligações telefônicas houve referências à existência de um esquema na 2a. instância do Tribunal de Justiça; que inclusive referido advogado, em tom de zombaria, dizia que não havia necessidade de se preocuparem com juizinhos e promotorezinhos, porque havia um esquema em 2a. instância; que não houve a citação de nenhum nome especificadamente, mas houve a citação do cargo de Desembargador ... sabendo por ouvir dizer que essa petição de Habeas Corpus teria sido apresentada ao Desembargador em um sextafeira à noite ...." 52. A demonstração mais visível da trama urdida pelos Promotores do Meio Ambiente contra o ora 58 O Magistrado defendente está no presente depoimento colhido da autoridade da 12ª DP, que procedeu à interceptação telefônica, ao que se afirma, com autorização judicial, quando ressalta que nas fitas colhidas não há uma única menção ao nome do ora defendente, mas apenas em uma única oportunidade a menção a um desembargador que, segundo o depoimento prestado pelo advogado Manoel Barreto em seu interrogatório prestado ao MM. Juiz da 3ª Vara de Entorpecentes (cópia anexa), seria o juiz aposentado Ronaldo Pinheiro Rocha, seu colega de escritório e que assim agia para demonstrar prestígio para com os clientes. 53. O advogado Manoel Barreto apresentava indevidamente aos seus clientes em potencial pessoas de seu relacionamento, como o fez com o seu colega de escritório o ex-juiz Ronaldo Pinheiro Rocha como sendo desembargador, tudo com o objetivo de mostrarse bem relacionado e poderoso no Tribunal, conforme confessa em seu interrogatório citado acima, com o objetivo claro de captar clientela e de cobrar honorários mais elevados, em alguns casos valendo-se até mesmo de decisões corretas calcadas em nulidades ocorridas em peças policiais, como neste caso presente, surgido com uma decisão correta que reconheceu a completa inutilidade de um flagrante visivelmente montado pela autoridade com o intuito de proteger um informante, conforme se deflui dos depoimentos dos policiais Anaeno dos Santos Xavier e Carlos Alberto Fortuna Lourenço colhidos frente a V. Excia. Eminente Relator do presente PA, já citados. DEPOIMENTO DE MARCELO BIANCHINI, ESCRIVÃO DA 4A. VARA DE ENTORPECENTES. 54. Afirmou o Dr. Marcelo Bianchini às fls. 69/ 70 perante a douta Comissão de Sindicância, verbis: "... que no mês de fevereiro deste ano na data designada para interrogatório, os réus em processo crime perante a 4a. Vara de Entorpecentes o acusado de nome Alexandre de Lima Silva, vulgo Chaves, deixou de comparecer ao ato processual, sendo que este fato provocou certa indignação dos outros réus e especialmente do adv. Dr. Mário Almeida Costa Filho, patrono do réu Ney Silva no mesmo processo, tendo esse causídico se manifestado para o declarante nos seguintes termos: em tom de deboche disse que a leizinha do depoente não valia nada, o que valia era a "lei do real"; que o referido adv . disse essas palavras sem qualquer comedimento na voz "em alto e bom som" para quem quisesse ouvir; que com essas palavras o adv. insinuava que a concessão do Habeas Corpus teria tido suporte na "lei do real"; que uma semana antes da data designada para o interrogatório houve um pedido de relaxamento de prisão do referido acusado Alexandre; que o depoente se recorda de que o Dr. Carlos, Juiz da Vara, comentou com ele ter recebido um telefonema do desembargador Pedro Aurelio a respeito desse relaxamento, intercedendo e pedindo que analisasse o flagrante .... que o desembargador Pedro Aurelio concedeu liminar para o referido Habeas Corpus, na sexta feira; que quer acrescentar que o referido Habeas Corpus só foi distribuído na 2a. feira; que inclusive não pôde identificar o número do Habeas Corpus, primeiramente junto ao Núcleo de Custódia ... que ... os policiais que compareciam ao Cartório ... comentavam que teria havido um pagamento para a soltura do acusado Chaves, ora se referindo a duzentos mil reais, ora falando em quatrocentos mil reais ... que se recorda que na oportunidade em que foi pedido o relaxamento de prisão do acusado Chaves para o Juiz da 4a. Vara de Entorpecentes, o adv. Manoel Barreto esteve no balcão interessado no mesmo processo de Chaves; que na época o Dr. Barreto sempre andava na companhia do adv. Mário de Almeida ... que no início os advs. Mário e Barreto atuavam de comum acordo, sendo que o Dr. Barreto não tinha procuração de ninguém ... que o depoente tomou conhecimento de que houve um desentendimento a certa altura entre os advs. Mário de Almeida e Barreto, que Mário dizia "que não atuava daquele modo" ... que tomou conhecimento por ouvir dizer, que em um processo em trâmite na circunscrição judiciária do Gama houve a concessão de liminar em Habeas Corpus nas mesmas condições em que ocorreu com o réu Chaves; que segundo veio a saber, o nome do beneficiário dessa liminar referida seria Wescley, por alcunha Chico; que a liberação teria sido conseguida pelo adv. Barreto e deferida pelo desembargador Pedro Aurelio ... que em outro processo que corre na mesma Vara sob o no. 40.704-3 de 2002 também há referência à existência de um esquema para soltura de acusados mediante Habeas Corpus com pedido liminar em dia de sexta feira, depois do encerramento do expediente...". 54. Esse depoimento, prestado para atender a interesses desconhecidos do ora defendente, parece fazer parte da estratégia montada pelo MM. Juiz Carlos Pires, chefe do depoente e pelo Ministério Público, para lançar dúvidas sobre a jurisdição do ora defendente, pois não têm qualquer sustentação em provas ou dados materiais, já que para justificar sua convicção perante a douta Comissão de Sindicância apenas se refere a "ouvi dizer", "escutei falar", "comentaram", e "não sei quem falou". Nenhuma afirmação direta ao ora defendente foi feita pelo depoente. 55. E o que é pior, o depoente afirma que ouviu dizer, mas sabe indicar com precisão até mesmo o número do processo e o nome das partes, chegando mesmo a falar que no processo indicado ocorreu o mesmo esquema de obter liminar depois do expediente, sendo que o ora defendente somente despachou o processo do traficante Alexandre, vulgo Chaves, depois da hora porque sendo o único Desembargador criminal presente àquela hora no Tribunal o processo lhe foi levado em caráter de urgência. Por outro lado, o flagrante era tão veementemente nulo à primeira vista, fato confirmado posteriormente pelos policiais Carlos Alberto Fortuna Lourenço e Anaeno dos Santos Xavier, ouvidos por V. Excia., que era forçoso declarar sua nulidade de pronto para evitar que uma pessoa, aparentemente inocente, ficasse mais um fim de semana no cárcere. 56. Tanto isso é verdadeiro que, conforme determinou o ora defendente em seu despacho concessório da liminar (documento nos autos), o Relator natural do Habeas Corpus nº 2002.00.2.000.805-8, Desembargador Natanael Caetano, reapreciando o pedido confirmou a liminar concedida, pois não a revogou, por certo também convencido das irregularidades contidas no flagrante. 57. O advogado Mário de Almeida, mencionado neste depoimento do Chefe de Secretaria, tomando conhecimento das declarações prestadas pelo Escrivão Bianchini procurou o Cartório do 1º Ofício de Notas e Protesto e, na presença do escrevente Carlos Roberto Martins esclareceu devidamente a afirmação que havia feito quanto "à força do Real" dando a entender com ela que "a seu entender significa a possibilidade do cliente ter bastante dinheiro para pagar excelentes advogados". Negou peremptoriamente as insinuações maldosas que foram feitas nas ilações tiradas pelo Escrivão a respeito do seu depoimento. Esta prova está sendo juntada agora porque não haverá possibilidade da defesa trazer o seu depoimento pessoal nesta fase processual (doc. 13). 58. A prova mais evidente das mentirosas referências feitas pelo Escrivão Bianchini diz respeito às suas afirmações quanto ao final do seu depoimento quando este afirma, verbis: "que tomou conhecimento por ouvir dizer, que em um processo em trâmite na circunscrição judiciária do Gama houve a concessão de liminar em Habeas Corpus nas mesmas condições em que ocorreu com o réu Chaves; que segundo veio a saber, o nome do beneficiário dessa liminar referida seria Wesley, por alcunha Chico; que a liberação teria sido conseguida pelo adv. Barreto e deferida pelo desembargador Pedro Aurelio ... que em outro processo que corre na mesma Vara sob o no. 40.704-3 de 2002 também há referência a existência de um esquema para soltura de acusados mediante Habeas Corpus com pedido liminar em dia de sexta feira, depois do encerramento do expediente ...." (Os destaques não estão no original). Consoante se depreende das certidões anexas o primeiro processo a que se refere o Escrivão Bianchini é a Apelação Criminal nº 46.355-4/01 na qual é apelante Wesley Pinto Fonseca, da qual foi Relator o Desembargador ora defendente, sendo o recurso, por seu voto, conhecido e improvido à unanimidade (doc. 14); quanto ao segundo processo, a Apelação Criminal de número 40.704-3, na qual afirma o depoente que "há referência a existência de um esquema para soltura de acusados mediante Habeas Corpus com pedido liminar em dia de sexta feira, depois do encerramento do expediente", em verdade trata-se de processo oriundo da 4ª Vara de Entorpecentes e distribuído à 1ª Turma Criminal, sendo seu Relator o eminente Desembargador Edson Smaniotto e após o parecer do Ministério Público está concluso ao Relator desde 09 de abril do corrente ano, portanto ainda não julgado (doc. 15). Está, portanto evidente, que o Escrivão Bianchini, cria situações e faz referências indevidas sobre fatos inexistentes procurando envolver indevidamente o ora defendente, parecendo até, concessa maxima venia, dada a sua condição de Chefe da Secretaria do MM. Juiz Carlos Pires, que suas declarações visam obnublar a elucidação real dos fatos. 59. Esse serventuário afirma sempre que ouviu dizer coisas contra o ora defendente, mas o interessante é que ele informa com precisão os nomes das partes, particularidades íntimas do processo, e até mesmo os O Magistrado 59 seus números e origem, dando a nítida impressão que ele próprio é quem divulgava essas versões envolvendo o ora defendente, ou até quem sabe divulgava as versões montadas no gabinete de seu chefe, o juiz Carlos Pires, inimigo do defendente, que somente recebe em seu gabinete policiais e membros do Ministério Público. Curiosamente, esse personagem foi o mesmo que expediu a certidão na qual afirma que o juiz Carlos Pires não recebe partes e advogados em seu gabinete, esquecendo-se todavia de lançar que o juiz recebe apenas em seu gabinete policiais e promotores de justiça. DEPOIMENTO DO POLICIAL WELLINGTON TORRES ANTUNES 60. Às fls. 83/4 o policial Wellington Torres Antunes afirmou, verbis: "... antes das interceptações telefônicas serem utilizadas, já havia comentários dentro da comunidade em que era freqüentada por Chaves de que o mesmo havia sido liberado mediante pagamento de uma quantia entre duzentos e sessenta mil reais a trezentos mil reais; que tais comentários eram veiculados na localidade chamada de Chaparral; que inclusive o comentário era que pessoa de nome Robinho, integrante da quadrilha de Chaves e também Cirlan, outro integrante, tinham sido as pessoas que começaram a fazer a colheita do numerário para liberar Chaves; que não sabe informar se quando houve o movimento para arrecadar o numerário, Chaves estava preso ou já havia sido liberado; que nesta altura já havia o comentário do envolvimento de um advogado e de um juiz, a quem se destinaria o dinheiro ... que este comentário se estendeu pela cidade, chegando inclusive aos corredores da Polícia Civil; que neste período Chaves já havia sido liberado ... que o nome do juiz não apareceu em nenhum momento nas interceptações, mas o adv. Barreto dizia a Chaves em alguns diálogos gravados que o esquema através do qual Chaves havia sido liberado contava com o apoio de um Desembargador ... que nesta conversa Chaves dá a entender que estava intermediando a liberação de outro traficante por nome Chico, utilizando o mesmo esquema que o liberou, ou seja, através do adv. Barreto ... que o indivíduo por apelido Chico tem o nome de Wesley de tal ... que nessa conversa eles chegavam a fazer referência à pessoa do adv. Barreto e somente se referiam a um cargo de juiz que o cargo de desembargador só veio à tona por ocasião da interceptação telefônica .. que Cirlan também esclareceu que o dinheiro arrecadado foi entregue à mãe de Chaves e compareceu uma pessoa na residência dela, trajando terno, a quem foi repassado o dinheiro ...". 61. Embora excessivamente genéricas as afirmações do policial Wellington trazem uma notícia séria, a de que em nenhum momento antes das interceptações telefônicas os meliantes falaram na existência de um desembargador. A menção a um desembargador somente passou a circular na comunidade do crime e na polícia após a interceptação das ligações telefônicas, quando o advogado Barreto menciona a figura de um desembargador, sem detalhar a qual desembargador se refere e, segundo sua própria 60 O Magistrado confissão perante o MM. Juiz da 3ª Vara de Entorpecentes já mencionada trata-se de um seu colega de escritório e ex-juiz ao qual chama de desembargador para demonstrar prestígio junto aos outros marginais. Por outro lado, é gritante a omissão da douta Comissão Sindicante, quando deixa de levar em consideração trechos da gravação efetuada na qual se verifica que Wellington Torres Antunes tem relações de intimidade com a quadrilha e segundo consta teria cobrado até a importância de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais) para fazer desaparecer a gravação que teria sido feita por ele próprio, verbis: "Apenso nº 10 - pag. 1889: Dr. - Aquela prisão não tem como prosperar não, a prisão ali, foi só uma resposta porque o Alexandre interpelou um policialzinho, que falou que ele tinha 20 imóvel. Ele pode prender ele, esfolar, ele não vai provar que ele tem 20 imóvel, ele mentiu. M - Ele foi lá em casa. Dr. - Quem? M - Este. Dr. - Fazer o que? M - Nos dias que prenderam ele, ele foi lá com Mandato de Busca. Dr. - Ferraz né? M - Ferraz e Wellington. Dr. - Wellington e Ferraz queria dinheiro, e esse Wellington é bandido, esse Wellington é bandido, nos já tamos com o nome dele la com desembargadores e com alta cúpula do judiciário, inclusive do Procurador Geral né? M - Hum! Hum! Dr. - Eles estão. com os promotores da 1ª Instância, eles não resolvem nada, quem dá a última palavra é a 2ª Instância, já tá no nome das autoridades judiciárias que ele queria dinheiro para fazer acordo e o pessoal não quis dar o dinheiro, então o pessoal tá se vingando ... agora ele fez o relatório falso dizendo que o Alexandre tinha não sei quantas casas, eles não podem prender o Alexandre então eles estão tentando cavar prova que fizeram flagrante, fizeram isso, fizeram aquilo, eles não vão provar, eles não vão provar... (sic) (Os destaques não são do original). Apenso 13º - fls. 2596: Rubens - Mandado de Prisão, aliás. Num é de busca. De busca tá tudo certo. Aí, aqui a gente vai ver o que pode fazer aqui ... O advogado tá aqui tá aqui pra gente ver o que é. Agora, tem que esperar né? Porque ... (foi preso) todo mundo. Tá todo mundo. Caiu todo mundo! Maria - Hã? Rubens - Entendeu? Aí, o problema que tem uma fita aqui ... os cara gravaram aqui, essa Polícia Civil gravou ... ainda falei pra ele ... tem uns quinze dia que eu falei pra ele. Os cara tavam gravando. É ... aí, o cara tá cobrando vinte e cinco mil reais para quebrar essa fita. Apenso 14º - fls. 2660: Débora - Nos dia que prenderam ele, ele foi lá mandato de busca. Barreto - O Ferraz, né? Débora - O Ferraz e o Wellinton. Barreto - Pois é. O Welington e o Ferraz são dois ... O Wellington queria dinheiro ... É bandido sabe? Débora - Hunrum. Barreto - E ... E eles tão macumunado com uns promotorezinho ai 1ª Instância. Eles não resolvem nada porque na primeira instância ... quem dá a palavra ... a última ... quem dá a última palavra é segunda instância. Nós já levamos esse ... já ta o nome do ... do ... das autoridades judiciárias que ele queria dinheiro ... o Mário inclusive é testemunha que ele queria dinheiro para fazer um acordo e o pessoal quis dar dinheiro pra ele, então eles tão se vingando. Débora - Certo. Barreto - Agora, esse Ferraz, ele fez um relatório falso ... 15º Apenso - fls. 2944: Robinho - Com'é que o cara era? Cocó - Tipo assim ... o cara é ... tipo de ... de barbicha, entendeu? Cavanhaque assim, e bigode. Robinho - Num é Wellington, não. Ele usa barba, (é um) cara ... ele parece com tu, pó, o cara! 15º Apenso - fls. 2964: Robinho - Hum? H12 - Porque o Noberto é advogado dele. Robinho - Daquele Wellington, né? H12 - Daquele pilantra. É. Daquele (...) Robinho - Que ele ... ele num tava impindurado, doutor/ H12 - Tava. O Norberto que é o advogado dele. ..." E é esse bandido, Wellington Torres Antunes, que vem ao Tribunal, chamado pela douta Comissão de Sindicância, com toda a sua "idoneidade" reconhecida pelo mundo do crime, sem a presença do ora defendente ou de seu advogado, fazer acusações, com foro de credibilidade, contra um "Desembargador" sem, contudo, identificá-lo. Pior agiu a douta Comissão quando entendeu que o marginal se referia ao ora defendente cujo nome nunca foi mencionado por ele nem por nenhum outro depoente, exceto o seu reconhecido inimigo pessoal e político o MM. Juiz Carlos Pires, citado por via transversa como suspeito nos mesmos depoimentos. DEPOIMENTO DO TRAFICANTE ALEXANDRE DE LIMA SILVA 62. Embora sem a presença do ora defendente e de seus advogados de então, Alexandre de Lima Silva prestou perante a douta Comissão de Sindicância, às fls. 110/3 depoimento do seguinte teor, verbis: " ( ... ) que conheceu o adv. Dr. Barreto, o qual disse que poderia tirar o depoente da prisão, mas que cobraria caro e teria que primeiro conversar com o "pessoal dele"; que o Dr. Barreto só declarou o valor que teria de ser pago, ou seja, trezentos mil reais, após conversar com "o pessoal dele"; que o Dr. Barreto disse para o depoente que após receber o sinal (cinqüenta mil reais ), tiraria o depoente em 15 dias; que a essa altura o Dr. Barreto já havia negociado o preço final, que foi ajustado em duzentos mil reais ... que o pagamento de cinqüenta mil reais foi feito ao Dr. Barreto ...que embora tenha dado a procuração, sabe que o Habeas Corpus foi impetrado por outro advogado; que o pagamento foi numa Segunda feira e a outorga da procuração no dia seguinte; que na mesma semana, Sexta-feira, sem muita certeza dia 22 de fevereiro, à noite, cerca de onze horas, o depoente foi realmente libertado; que então o depoente, no Sábado e Domingo seguinte à sua liberação, foi atrás de conseguir os cinqüenta mil que o Dr. Barreto lhe disse que não podia falhar porque não era para ele; que efetivamente na Segunda feira, à noite, o depoente levou os cinqüenta mil reais combinados num pacote até a casa do Dr. Barreto, no Lago Norte, lá o dinheiro foi conferido e após o Dr. Barreto ter recebido um telefonema, ou feito uma ligação, dirigiram-se a um comércio próximo e, nesse local, o Dr. Barreto passou o pacote com os cinqüenta mil reais para uma outra pessoa que chegara ao local num Mercedes de cor prata, mas novo, com faróis ovais; esclarece melhor o depoente que o pacote estava no console da Pajero, e Barreto se dirigiu a essa pessoa e quando o depoente voltou o pacote já não estava mais no local em que se encontrava, e quando voltou o Dr. Barreto disse: agora está tudo certo; que o depoente tudo presenciou, mas de uma banca de jornal próxima; que a pessoa a quem o Dr. Barreto se dirigiu era uma pessoa moreno claro, de cabelos grisalhos, do sexo masculino e vestindo terno escuro; que o Dr. Barreto não disse o nome da pessoa; que um dia, na casa do depoente, o Dr. Barreto mostrou a foto de uma pessoa, num jornal, disse que era um desembargador, e disse que tinha ajudado a gente; que o depoente acha que, se vir a foto dessa pessoa outra vez, poderá reconhecer; que o jornal que foi mostrado ao depoente no mês de março; que melhor dizendo, a expressão ajudou a gente foi dita no sentido de que contribuiu para a liberdade do depoente e para o benefício do advogado; que a matéria no jornal dizia respeito ao Desembargador Pedro Aurelio; ...que quer acrescentar que o Dr. Barreto dizia que esses cheques ia trocar em agiota para fazer o pagamento ao "pessoal dele"; que dos três cheques, dois foram descontados e o último não foi descontado porque o depoente foi preso; que os cheques eram de familiares do depoente; que o depoente não se lembra do banco em que foram descontados os cheques, mas isso pode ser verificado, se for necessário; que o cheque apresentado e devolvido pelo banco encontra-se em poder de familiares do depoente ... que o Dr. Barreto disse para o depoente que precisava de mais quarenta mil reais, porque só tinha um voto favorável para o julgamento do mérito, e então o depoente pagou mais dezoito mil, que foi o valor que conseguiu arrumar; que no julgamento de mérito o resultado foi favorável para o depoente e para os outros rapazes; que não tem certeza se os rapazes que foram beneficiados pelo mérito juntamente com o depoente pagaram os vinte e dois mil reais restantes; que após a segunda prisão do depoente, a família deste procurou o Dr. Barreto e o Dr. Barreto disse que tornaria a tirar o depoente e mais quatro rapazes, mas pelo preço de mais duzentos mil reais; que dos sessenta e cinco mil reais entregues desta feita ao Dr. Barreto, vinte e cinco mil reais foram por este devolvidos aos familiares dos quatro rapazes que também estavam O Magistrado 61 presos, já que o Dr. Barreto chegou a ser pressionado; que o Dr. Barreto tem dado a seguinte explicação para o não êxito da soltura do depoente; que é necessário esperar a "poeira abaixar", dizendo: você não está vendo o que está acontecendo na mídia?; que o Dr. Barreto se referia a essa bagunça do Judiciário, dando a entender que o pessoal dele sabia que o momento não era oportuno; que o depoente sabe que esse esquema existente na Justiça beneficiou outras pessoas, em outros casos, mas o depoente não quer informar sobre isso por temer pela sua segurança pessoal, porque vários beneficiados pertencem ao "mundo do crime" ... que o Dr. Barreto disse que o "pessoal dele" era do Tribunal, e que, portanto, em primeira instância podia deixar o juiz fazer o que quisesse; que o Dr. Barreto acrescentava que fora do horário de expediente normal era melhor para as pretensões do depoente ...que quer acrescentar que do começo ao fim desse depoimento corresponde a verdade do que aconteceu ...". 63. Conquanto nenhuma referência direta tenha sido feita à pessoa do ora defendente, limitando-se o depoente a afirmar que o advogado Manoel Barreto se referia ao desembargador, há que se esclarecer alguns pontos que ficaram obscuros e ou incompletos e que necessitam melhor elucidação. 64. Com efeito, o traficante afirma que entregou certa importância na casa do advogado Manoel Barreto e, posteriormente presenciou a entrega do pacote a uma pessoa morena, de cabelos grisalhos, que estava em uma Mercedes prata, nova, com os faróis redondos. 65. A douta Comissão de Sindicância ao analisar os fatos, concluiu que essa "pessoa" referida pelo traficante seria o ora defendente que, sendo moreno, tem os cabelos grisalhos marcados pelo tempo. Por outro lado, possui um veículo de marca Mercedes Benz, ano 1999 e que tem faróis redondos. 66. Mas acontece que apesar de ser moreno, de cabelos grisalhos, o defendente esclarece que o veículo Mercedes Benz que possui, embora novo e com faróis redondos, é da cor negra esmeralda (doc. 16 e fotos às fls. 311/17), quando o traficante afirma que o veículo que viu era de cor prata. 67. Ademais, no horário e dia referidos pelo traficante Alexandre, consoante provam as pautas de chamada e declaração da Faculdade (docs. 17 a 26), o ora defendente estava em sala de aula na Faculdade de Direito do UniCEUB, ministrando aulas de Processo Civil II, na turma B, do curso noturno, das 19:00 às 21:00 horas. Como não tem o dom da ubiqüidade para estar em vários locais ao mesmo tempo, pela análise das provas colhidas e juntadas aos autos só se pode concluir que não era o ora defendente a pessoa observada pelo traficante como sendo o receptor do dinheiro que teria sido entregue pelo advogado Manoel Barreto, pois além da evidente diferença das cores dos veículos, no horário indicado o ora defendente estava em plena sala de aula. 68. Por outro lado, como o mencionado advogado Manoel Barreto é conhecido no meio jurídico de Brasília como sendo um verdadeiro "boquirroto", pode-se facilmente concluir que o falastrão utilizou-se 62 O Magistrado indevidamente do fato de haver sido aluno em duas oportunidades do ora defendente, para vender aos marginais uma imagem de quem tem prestígio e condições de influir junto a juízes, tudo para melhorar as suas propostas de polpudos honorários. Por sinal referido advogado já fizera a mesma coisa envolvendo o seu próprio irmão, o MM. Juiz Vilmar Barreto, que, inclusive, respondeu a um procedimento administrativo por idênticos fatos, o que por certo é do conhecimento de V. Excia. e dos demais colegas Desembargadores. 69. Pessoas ligadas ao mundo do crime, no presente processo, afirmaram em seus depoimentos que um cliente do advogado Manoel Barreto, de nome Geraldo Vaz da Silva, fora beneficiado anteriormente pelo mesmo esquema, e isso é repetido até pelo Ministério Público. Ocorre que nesse processo mencionado, o de nº 3.307-8, cuja cópia vai em anexo (doc. 27), a ordem foi concedida, por maioria, votando favoralmente à concessão da ordem, como vogal, o Des. Edson Smaniotto, insigne membro da douta Comissão de Sindicância, inclusive com parecer favorável do Ministério Público, da lavra do eminente Procurador Dr. José de Oliveira. 70. Acresça-se ainda que, no julgamento da Apelação Criminal de nº 3.031-5 (doc. 28), cujo apelante foi o mesmo Geraldo Vaz da Silva, o recurso foi julgado parcialmente procedente pela Egrégia Turma, à unanimidade, com mais um parecer favorável da sempre zelosa Procuradoria de Justiça, da lavra do eminente Procurador Petrônio Calmon Mendes, que opinou pelo provimento parcial do recurso. DEPOIMENTO DO POLICIAL ANAENO DOS SANTOS XAVIER 71. O policial Anaeno dos Santos Xavier que participou da farsa da montagem do flagrante para a prisão do agora conhecido Alexandre, confirmando todas as suspeitas que levaram o ora defendente a conceder a medida liminar em caráter de urgência, afirmou perante V. Excia., às fls.336, verbis: "... que participou como testemunha da prisão de Alexandre de tal, conhecido pelo vulgo de Chaves; que estavam investigando o roubo ocorrido na agência do BRB ... que receberam informações que Chaves teria dado apoio logístico ao pessoal que vem de fora para a prática da atividade criminosa ... que através de informantes ficou sabendo que Chaves estaria "mexendo com laboratório de drogas na Ceilândia; que como a atividade policial depende muito da participação de informantes, o que impulsiona todo um cuidado para que se possa proteger o informante, não só contra o sigilo, mas quanto à sua segurança de vida, sempre tem-se o cuidado de evitar deixar que as partes percebam que a polícia chegou em determinado lugar em que está ocorrendo uma prática criminosa em decorrência de uma informação privilegiada; que receberam a notícia do informante que Chaves tinha recebido uma certa quantia de pasta de base de cocaína numa casa que alugava para fazer um laboratório na Ceilândia, e que, também, a droga teria chegado num Gol vermelho e, no interior, teria um Vectra branco, com placa do Rio de Janeiro; que procurando preservar o informante, aproveitaram a notícia do CEPOL, através de rádio, que tinha um carro de cor branca, com as características de placas clonadas, que teria sido roubado no Rio de Janeiro; que, com essa informação da CEPOL, chegaram no local dizendo que estavam atrás de um automóvel roubado, mas na realidade, a intenção maior era dar o flagrante na empreitada criminosa envolvendo entorpecentes naquela localidade; que apresentaram a ocorrência da delegacia dizendo ao delegado que, quando procediam uma apuração de carro roubado, encontraram um tráfico envolvendo Alexandre (Chaves); que tinha esperança de encontrar naquele local assaltantes de outros estados; que o indivíduo oriundo de outro estado, encontrado no local, era envolvido em tráfico de drogas; que foi uma questão de honra que motivou o declarante a se interessar por interromper a atividade criminosa de Alexandre (Chaves), pois o mesmo, quando ouvido na Delegacia procurou se gabar que, apesar de ter agência de automóveis, o seu negócio era drogas; que exatamente por isso procuraram aprofundar as investigações para acabar com a atividade criminosa de Chaves, inclusive passando informações para a Delegacia de Entorpecentes; ... que Alexandre, depois de preso, chegou a indagar para o declarante de quem seria a informação que levou à sua prisão, pois não acreditava naquela estória que estavam perseguindo um carro roubado; que o informante também comentou que Chaves, mesmo preso, estava disposto a recompensar a qualquer um que lhe dissesse quem era o informante, pois ele pretendia matá-lo ... ". DEPOIMENTO DO POLICIAL CARLOS ALBERTO FORTUNA LOURENÇO 72. Do mesmo modo, às fls. 339, o policial Carlos Alberto Fortuna Lourenço esclarece e confirma os fatos relacionados à montagem do flagrante contra o traficante Alexandre, chegando mesmo a destacar a sua condição de criminoso primário e de bons antecedentes, fato que impressionava a própria marginalidade, verbis: " ... que ocorreu um grande roubo no BRB de Brasília no ed. Trade Center; que através dos informantes, ficaram sabendo que Chaves teria dado apoio logístico aos assaltantes que teriam vindo de outro Estado ... que os informantes noticiaram que Chaves estava montando um laboratório de merla no Setor O; que o informante contou que Chaves fabricava merla no entorno e que, para atender uma grande entrega de merla, ele estava montando um laboratório no Setor O; que se a polícia não chegar a tempo não consegue dar flagrante porque a fabricação da pasta base para merla é muito rápida e logo a seguir eles abandonam o local, levando as latinhas cheias; que logo que Chaves chegou ao local, o informante avisou aos policiais que para ali se deslocaram de imediato; que sabiam que Chaves estava em um Vectra de cor branca que era do Beredê, outro traficante de sua quadrilha; que, por coincidência, nesse mesmo dia, chegaram (sic) uma mensagem de rádio comunicando que estava transitando na área de Ceilândia um Vectra de cor branca de placa de outro Estado, possivelmente Rio ou São Paulo, e que o veículo era produto de furto ou roubo; que logo que chegaram ao lote, sentiram forte odor da droga; que olharam pela janela e viram um indivíduo manuseando a droga em um balde grande; que invadiram o local dando voz de prisão para todos; que pediram apoio policial, sendo o local periciado ... que tinha também no local um Gol de cor vermelha pertencente a Ney Silva, que informou que era ele quem trazia pasta de cocaína de Mato Grosso ... que não contaram a origem das informações que levaram à prisão de Chaves, quando chegaram à delegacia, pois certamente Chaves iria procurar matar quem tivesse feito o papel de delator; que, no flagrante, procuraram proteger o informante dizendo que receberam a mensagem de rádio sobre o carro roubado, e logo que o encontraram se aproximaram da residência com o intuito de falar com o motorista do veículo, contudo, como sentiram forte cheiro de tóxico, resolveram invadir a residência para efetuar o flagrante; que esclarece que o portão que dá acesso à residência se encontrava aberto; que também procuraram fazer crer que o flagrante se deu por acaso; que, na Delegacia, Chaves chegou a perguntar ao Declarante qual era a pessoa que o teria delatado para a polícia; que Chaves disse para o declarante que não acreditou na estória de carro roubado; que depois que Chaves foi solto, saiu um forte comentário na Ceilândia que ele estava procurando saber quem o denunciara à polícia, acreditando que, até hoje, se ele souber, ele mata ou mesmo qualquer outro componente de sua quadrilha; que, no flagrante, não comentaram que Chaves já era bastante conhecido no meio da criminalidade em que também chamava atenção que era réu primário, não tinha nenhuma passagem pela polícia ..." 73. Está claro que os policiais para protegerem seu informante simplesmente montaram uma farsa, que por não ter sido comunicada ao ora defendente, levouo ao entendimento de que o flagrante era absolutamente nulo porque eivado de vícios, tais como a invasão de uma residência em horário noturno, a não justificativa de que o traficante Alexandre, embora não tivesse qualquer passagem anterior pela polícia, era uma pessoa de há muito investigada pelo tráfico de drogas, sua atuação criminosa, etc. 74. Tivessem esses dados sido esclarecidos, na peça policial, certamente o ora defendente, bem como o Relator natural do Habeas Corpus, o Eminente Desembargador Natanael Caetano Fernandes não teriam sido levados ao equívoco em que foram lançados, o primeiro porque impressionado com os vícios da medida acabou por considerar inocente um verdadeiro bandido, e o segundo quando instado a se pronunciar sobre a manutenção da liminar ou não, não a modificou, concordando portanto. 75. É cediço que o flagrante necessariamente deve conter materialmente todos os elementos que fazem parte do contexto em que o ato fora praticado, isso porque, como se diz em doutrina, é a primeira demonstração efetiva de que no processo penal sempre se busca de modo incessante a verdade real. 76. O processo penal não pode ter início, no estrito respeito à legalidade, com uma mentira, uma bem urdida farsa, mesmo que tenha sido com boa intenção como no caso presente, onde os policiais O Magistrado 63 interromperam a vida criminosa de um traficante, mas escoraram-se em uma fantasiosa versão de que a sua prisão ocorreu por puro acaso, quando em verdade os agentes da lei já sabiam que o traficante estaria naquele cenário, no carro indicado previamente com placas do Rio de Janeiro, e que naquele endereço ele faria a destilação de tal quantidade de merla com o objetivo de pagar uma remessa de cocaína que estava para chegar pela fronteira. 77. Ao preferir preservar a figura de um informante optaram erroneamente por adulterar a verdade dos fatos e mascarar um flagrante que, em razão disso ficou desfigurado e eivado de ilegalidade o que obrigou o ora defendente a quebrá-lo para cumprir a lei. De qualquer forma os policiais ao assim agirem validaram a decisão do ora defendente que naquela oportunidade não teve outra alternativa senão a de combater a odiosa ilegalidade dado que o flagrante, por não corresponder com a verdade, era nulo. 78. Ora, pela prova precariamente colhida nesta fase instrutória, constata-se que o advogado Manoel Barreto até então não sabia que o flagrante seria anulado pelo ora defendente e fez então um verdadeiro contrato de risco com o traficante e seus familiares, como provam os autos, recebendo um valor a título de honorários advocatícios na lavratura do contrato e o restante condicionado a que ele fosse solto. Tendo o ora defendente concedido a ordem, o desonesto advogado passou a exigir o restante de seus honorários a pretexto de entregar a parte do "desembargador", conforme se constata pela simples oitiva das fitas gravadas. 79. Como o traficante, após o julgamento do mérito do pedido voltou a ser preso posteriormente, e mantido na prisão agora, inclusive com o voto do ora defendente, a família passou a exigir do advogado a devolução do que havia sido pago, e como não conseguiram o pretendido passaram para o escândalo que acabou por desaguar no presente. DO DIREITO 80. O presente procedimento, desde o seu início, tem sido incompreensivelmente conturbado com indevidas interferências tanto do Ministério Público do Distrito Federal já considerado como parte ilegítima para figurar no feito pelo e. Conselho Especial do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, entretanto inconformado, tudo tenta fazer para subverter o devido processo legal fazendo crer que tem amparo legislativo para sua inconformidade, sem, contudo, atentar para a legislação que deve incidir na espécie. 81. Com efeito, o ora defendente, por não poder se conformar com o teor da decisão do eminente Relator do Mandado de Segurança impetrado pelo Ministério Público do Distrito Federal, Desembargador Edson Smaniotto, que foi no sentido de conceder parcialmente o pedido de liminar requerido pelo autor, foi obrigado a impetrar Mandado de Segurança, dado que não poderia ser o mesmo atacado por via do Agravo Regimental, embora estivesse configurada agressão a direito líquido e certo do ora impetrante a uma jurisdição isenta e imparcial, e aos seus mais legítimos direitos garantidos pelo inciso LV, do art. 5°, da Constituição Federal. 64 O Magistrado 82. Por outro lado, como se tratava de decisão judicial¸ concessa maxima venia, teratológica a única via admitida pela jurisprudência pátria, seria, portanto, a via do mandado de segurança, que, aliás, foi inteiramente admitida pelo MM. Sr. Desembargador Valter Xavier, digno Relator da medida interposta, que, concedeu a liminar requerida para devolver o processo administrativo para a relatoria do seu relator natural que é V. Excia. 83. Com efeito, o zeloso órgão ministerial, em trabalho da lavra do ilustre Promotor de Justiça Dr. Andrelino Bento Santos Filho, da Assessoria Criminal do Exmo. Sr. Procurador-Geral de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, adotado pelo Doutor José Eduardo Sabo Paes, embora não seja parte legítima para intervir em procedimentos administrativos interna corporis da alçada do Tribunal de Justiça do Distrito Federal conforme decisão já tomada pelo e. Conselho Especial, a pretexto de ser o fiscal da lei e defensor da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, procura intervir de modo direto - e agora transverso - em procedimento para apuração de possível falta administrativa praticada pelo magistrado litisconsorte naquela medida, ora impetrante. 84. Por ocasião da impetração do Mandado de Segurança n° 4.076-2, o zeloso órgão ministerial requeria a V. Excia. lhe fosse deferida a vista dos autos administrativos, face a notícias de que V. Excia. estava a permitir a produção de provas sem que o Ministério Público atuasse como custos legis. 85. Apreciando o pedido V. Excia. indeferiu a liminar pleiteada à seguinte fundamentação: "... Com a devida vênia, não vejo, por ora, neste instante liminar, a plausibilidade do pedido deduzido na via mandamental, consistente na exigência do Ministério Público intervir, ainda como custos legis, na fase preambular, incipiente, da sindicância que tramita neste Tribunal para a apuração de falta administrativa, em tese cometida pelo em. Desembargador Pedro Aurelio Rosa de Farias. O disposto no § 4°, do art. 27, da LOMAN, não permite interpretação diversa: O MP somente será chamado a intervir, para o desempenho do seu relevantíssimo mister, após a instauração do processo disciplinar. ... Acrescente-se o disposto no art. 5°, inciso LV, da Constituição Federal, que assegura o contraditório nos processos judiciais e administrativos, não em procedimentos preparatórios de sindicância, tal como se dá no caso em julgamento. É compreensível a apreensão do Órgão Ministerial, quando o tema sindicado parece ter caído no domínio público. O fato administrativo investigado é sabidamente por demais relevante. Todavia, antes que o Tribunal delibere a respeito da instauração do processo administrativo disciplinar, a quaestio ainda se situa no ambiente interna corporis, com os resguardos necessários para a tutela do prestígio do magistrado investigado, seja ele quem for, não importando, ainda, a gravidade das imputações que pesem sobre ele. Competirá ao Relator do processo administrativo que eventualmente vier a ser inaugurado por ordem do Tribunal, permitir a produção de provas cabais e definitivas para o eventual julgamento, colhidas, aí sim, com a imprescindível interveniência do MP. Por ora, qualquer açodamento se mostra desaconselhável e certamente não suficiente para a entrega da prestação jurisdicional que se busca sob o argumento de direito líquido e certo. Falta, ao pedido, o fumus boni juris. Indefiro a liminar. ..." 86. Não satisfeito com a decisão proferida, o zeloso órgão ministerial ajuizou Agravo Regimental que foi julgado e não provido pelo e. Conselho Especial, por unanimidade. 87. De outra feita, volta-se o zeloso órgão ministerial contra a respeitável decisão de V. Excia., eminente Relator do Processo Administrativo n° 1.219/ 2003, de permitir à defesa fazer uma mínima prova acerca da existência ou não do fato imputado ao ora impetrante, aos seguintes e irrespondíveis argumentos, todos voltados para a formação do seu livre convencimento de julgador, como se constata das próprias informações que foram prestadas por V. Excia. no writ às fls. 27/7.: "... Notando o interesse manifestado pelo magistrado requerido de aduzir suas declarações, singular na busca da verdade real e na formação da convicção acerca da admissibilidade do processo administrativo disciplinar, bem como, o singelo fato de que a nobre Comissão de Sindicância não havia colhido tal declaração, não vi qualquer prejuízo, senão uma óbvia necessidade, nos limites do normativo interno, oportunizá-las, assim como de algumas outras pessoas que também não foram, anteriormente, ouvidas em moldes a complementar o que fora colhido na Sindicância e assim arregimentar os mínimos elementos, como peça de informação, que entendi indispensáveis para a formação de meu convencimento acerca da instauração ou não, o que será amadurecido após a última providência solicitada, que foi abrir ao Requerido, no prazo de 5 dias, para que caso queira, adite sua manifestação anterior. ..." 88. Para buscar um imediato e ilegal desfecho, argumenta o zeloso órgão ministerial que a LOMAN, em seu art. 27, § 1° e § 2º não permite, nessa fase incipiente de admissibilidade ou não da abertura do procedimento, qualquer dilação probatória, ao estipular que: "§ 1º - Em qualquer hipótese, a instauração do processo preceder-se-á da defesa prévia do magistrado, no prazo de quinze dias, contado da entrega da cópia do teor da acusação e das provas existentes, que lhe remeterá o Presidente do Tribunal, mediante ofício, nas quarenta e oito horas imediatamente seguintes à apresentação da acusação". "§ 2º - Findo o prazo da defesa prévia, haja ou não sido apresentada, o Presidente, no dia útil imediato, convocará o Tribunal ou o seu Órgão Especial para que, em sessão secreta, decida sobre a instauração do processo, e, caso determinada esta, no mesmo dia distribuirá o feito e fará entregá-lo ao relator". 89. Como justificativa para a sua injustificada pretensão, alega ainda o zeloso órgão ministerial que o Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios não poderia de modo algum contrariar a regra inserta na Lei Complementar n° 35, de 14 de março de 1979, que, segundo suas palavras: "... assegurou um procedimento uniforme como garantia a todo magistrado acusado de falta administrativa, para ter vigência uniforme em todo o território nacional". 90. Com essas toscas alegações de mérito o zeloso órgão ministerial requereu, em sede de liminar, que: "a) cesse imediatamente qualquer atividade probatória levada a efeito no procedimento administrativo instaurado para apurar eventual falta administrativa praticada pelo Senhor Desembargador PEDRO AURELIO ROSA DE FARIAS; b) conclua, imediatamente, o procedimento administrativo e peça dia para que o Tribunal delibere sobre a instauração do processo disciplinar; c) e, definitivamente, que se conceda a ordem, mantendo-se a liminar deferida nos termos acima propostos, como também para declarar nulos todos os atos instrutórios realizados na primeira fase do procedimento, como oitiva de testemunhas. ..." 91. O eminente Desembargador Edson Smaniotto apontado como autoridade coatora naquele writ ao conceder o pedido, inaudita altera pars, formulado pelo zeloso órgão ministerial, equivocadamente, partiu do pressuposto de que o ora impetrante já teria apresentado sua defesa no âmbito da AVERIGUAÇÃO PRELIMINAR o que teria que dar como concluída a instrução do feito para que fosse levado a julgamento pelo Colendo Pleno Administrativo acerca da ocorrência ou não dos fatos que, se positivos, em conseqüência, provocariam o afastamento imediato e compulsório do Magistrado investigado. 92. Ocorre que o procedimento administrativo, desde o seu início, está maculado pelo vício de nulidade insanável motivada pelo descumprimento frontal, tanto no tocante à discutível Lei Complementar nº 35 (artigo nº 27, § 1º, já citado), como no particular ao que prescreve o Regimento Interno do Tribunal (artigo 329, § 1º e 2º), além de haver sido iniciado sem a competente Representação de quem quer que seja, o que igualmente viola o que dispõe o artigo 329 caput do Regimento Interno. 93. Por outro lado, continua a gama de erros do procedimento administrativo, em frontal descumprimento ao Regimento Interno no seu artigo 329 § 2º que, literalmente estabelece: "Acompanhará a notificação cópia integral da Representação e dos documentos que a instruírem." 94. Outro não é o comando contido na própria Lei Complementar nº 35: "§ 1º Em qualquer hipótese, a instauração do processo preceder-se-á da defesa prévia do magistrado, no prazo de quinze dias, contado da entrega da cópia do teor da acusação e das provas existentes, que lhe remeterá o Presidente do Tribunal, mediante ofício, nas quarenta e oito horas imediatamente seguintes à apresentação da acusação." (Os destaques não são do original) 95. Pela singela leitura dos dois dispositivos acima citados verifica-se que acompanhando a notificação para a apresentação de defesa devem vir primeiro a cópia do inteiro teor da acusação, O Magistrado 65 acompanhada da cópia dos documentos que a instruírem. Ocorre que com a notificação apresentada ao ora impetrante não foi encaminhada cópia de nenhum documento que tenha sido acostado aos autos pela douta Comissão, o que provocava uma absoluta impossibilidade de que o impetrante pudesse, pelo menos, entender o teor exato da acusação e formular a defesa, fato que foi parcialmente contornado pela concessão da liminar pleiteada pelo ora defendente pelo eminente Desembargador Valter Xavier. 96. Prova da estreita colaboração da defesa para com o devido processo legal, bem como para com a celeridade do andamento do processo administrativo foi que esta deu-se por notificada do respeitável despacho de V. Excia., eminente relator, requerendo vista dos autos para elaboração da defesa, o que não pode ser atendido, por despacho indeferitório, por certo cheio de constrangimento, no qual V. Excia. afirma não poder atender ao requerimento de forma taxativa: "Quanto à pretensão formulada, de vista dos autos e seus apensos para o oferecimento da defesa, tal pleito, em face da ordem judicial exarada no Mandado de Segurança 2003.00.2.004377-0, fica este Relator impedido de acolher o requerimento, conforme liminar concedida pelo Exmo. Des. Edson Smaniotto ..." (Os destaques não são do original). 97. Consoante se depreende da simples leitura do respeitável despacho acima V. Excia., visivelmente constrangido, sentia-se manietado em sua digna função judicante dada a irregular usurpação da sua competência decisória que seguramente agride a lei e a Carta Magna. 98. Também a defesa, anteriormente, não pôde em nenhum momento apresentar suas razões porque sequer conhecia o inteiro teor da acusação, bem como ignorava inteiramente em quais provas se baseou a douta Comissão para concluir os seus trabalhos, pois ela mesma no seu Relatório Complementar havia sugerido a oitiva de outras testemunhas e agora nos autos originais nem se encontra a página na qual constava essa indicação conforme se pode conferir às fls. 114/5 dos autos nas quais, percebe-se, no relatório complementar falta a segunda folha, de nº 113 desaparecida na renumeração que foi efetuada pela Secretaria (doc. 29). 99. Ninguém ignora que na fase preliminar do procedimento instaurado para apurar fato delituoso imputado a Magistrado, segundo a jurisprudência pátria, pode-se colher prova sem a participação do acusado, desde que seja esta submetida ao crivo do contraditório - jurisdicionalizada - quando esta possa vir a produzir qualquer efeito prejudicial ao envolvido. Estão claras as demonstrações do prejuízo que impingem ao ora impetrante visando o seu afastamento compulsório com o açodamento e a precipitação impostas ao procedimento de forma absolutamente irregular. 100. Ocorrera equívoco lamentável no despacho proferido pelo eminente Desembargador Edson Smaniotto, pois a digna autoridade estava entendendo que o ora defendente já apresentara sua defesa e que nenhuma outra prova seria necessária para a formação da convicção de V. Excia., digno Relator, tanto que negava acesso da defesa aos autos, o que 66 O Magistrado impossibilitava o requerimento de provas e, em conseqüência ocorrendo sérios prejuízos à sua defesa em razão do cerceamento que vinha continuadamente sofrendo. 101. Com efeito, entendia o digno Desembargador Edson Smaniotto que ocorrera apresentação da defesa visto que o patrono anterior do defendente, em 19 de fevereiro de 2003, apresentara uma petição que foi por ele equivocadamente intitulada de ALEGAÇÕES PRELIMINARES e que consta dos autos, sendo que nesta, nem por negativa geral os fatos foram analisados pelo defensor, que limitou-se a protestar pela produção de prova testemunhal e ofertou o ROL DE TESTEMUNHAS cuja oitiva requeria, "em homenagem ao princípio da verdade real". Poder-seia, no máximo, afirmar que a defesa teria apresentado a defesa prévia nos moldes estabelecidos pelo artigo 395 do Código de Processo Penal, o que seria, no mínimo, uma aberração de ordem jurídica e não atenderia aos ditames constitucionais e regimentais. 102. Entender-se que ocorrera a apresentação de defesa é acreditar que é possível alguém ser processado sem o direito de ser ouvido e de poder exercer o contraditório o que viola frontalmente a Constituição Federal, além de ferir de morte os direitos do advogado conferidos por lei de ter acesso aos autos e às provas para que possa formular a competente defesa. 103. O equívoco cometido pelo Desembargador que concedera a ordem liminar traz irreparáveis prejuízos à defesa e agridem direitos inalienáveis assegurados, tanto ao ora defendente, como ao seu advogado, que no seu exercício profissional, não pode sofrer coação e violências de tal ordem, muito menos o constrangimento a que foi irregularmente submetido V. Excia., eminente relator do procedimento administrativo pelo Exmo. Sr. Desembargador Edson Smaniotto, com a usurpação da sua competência, com visíveis e inalienáveis prejuízos aos interesses do ora defendente. 104. Torna-se necessário um pequeno escorço histórico acerca dos instrumentos legais em análise: a Lei Complementar n° 35, de 14 de março de 1979 e o Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, que está atualizado de acordo com a Constituição Federal de 1988. Enquanto a citada Lei Complementar foi editada em 14 de março de 1979, o Regimento Interno deste Tribunal foi elaborado de modo a assimilar os novos instrumentos democráticos trazidos pela Constituinte da Carta de 1988 ao curso de memorável jornada cívica que até hoje está em nossas lembranças e memória. 105. A regra adotada por V. Excia., eminente Desembargador Relator do procedimento administrativo, está inteiramente acorde com o que estabelece o Regimento Interno em vigor atinente ao caso em debate, obediente ao que está disciplinado no inciso LV, do art. 5°, da Carta Magna, que prevê: "aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;" 107. Portanto, o § 1°, do art. 329, do Regimento Interno, ao possibilitar nesta fase incipiente de admissibilidade a produção de provas, apenas se amoldou à regra geral estatuída pelo inciso LV, do art. 5°, da Constituição Federal, que impõe a todo devido processo legal, judicial ou mesmo administrativo, os democráticos e inafastáveis princípios do contraditório e a ampla defesa, que constituem-se como direitos inalienáveis do cidadão em um estado democrático de direito, a ponto de Canotilho tê-los incluído entre as cláusulas pétreas da Constituição. 108. Sendo o direito ao contraditório e à ampla defesa consagrados na Carta Magna e admitidos pela boa doutrina como sendo cláusulas pétreas da Constituição de 1988, portanto em pleno vigor entre nós, não é compreensível a tentativa de voltar-se à época do regime militar e aplicar um instrumento, que no Pacote de Abril, baixado pelo Presidente Geisel, era conhecido como o Código Penal da Magistratura, e negar ao ora defendente o mínimo direito à defesa. Obviamente, a nova ordem constitucional surgida após 1988 não foi inspirada por tais princípios. 109. Efetivamente, tem V. Excia. o direito inalienável de conduzir o processo de forma a realizar todo o indispensável para a formação do seu livre convencimento, que foi sendo visivelmente restringido na formação de sua livre convicção de Juiz, não pela fúria escandalosa e condenatória exigida e imposta por um jornal local, mas exatamente pelo órgão que deveria zelar pelo respeito à lei, defensor da ordem jurídica que é, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. 110. Na busca de uma punição sumária para um Magistrado que nada fez de errado ao deferir uma liminar em Habeas Corpus, que desfez um auto de prisão em flagrante posteriormente confirmado como sendo montado pelos próprios policiais que participaram da diligência, portanto nulo de pleno direito, pretende o zeloso órgão ministerial imprimir um ritmo frenético de julgamento ao presente feito, nem que para isso seja necessário rasgar e violar princípios basilares do estado democrático de direito estabelecidos pela Constituição Cidadã, como a denominava o Deputado Ulysses Guimarães, para tanto exigindo que no caso em análise se aplique a Lei Complementar n° 35, que em 14 de março de 1979 regulamentou a Emenda n° 1, da Constituição Federal de 1945 e sequer foi recepcionada no particular pela atual Constituição Federal. 111. Ora, vigente o princípio do contraditório em nosso ordenamento jurídico, não pode ser tolhido o exercício da Defesa, pois, agindo em contrário estaríamos subvertendo o devido processo legal estabelecido pela Constituição Federal. Se à acusação foi permitido tudo, pois presos foram requisitados para audiências perante a Comissão, no Presídio e na Corre gedoria; se os pais do traficante foram ouvidos por mais de uma vez na Corregedoria e na Comissão de Investigação do Parcelamento Ilegal do Solo Urbano; se Juízes foram ouvidos na Corregedoria na calada da noite; se documentos necessários à acusação foram acostados aos autos, que se avolumam em mais de 20 (vinte) volumes, porque não permitir ao menos que o Magistrado indiciado seja minimamente ouvido, já que a Comissão de Sindicância não se dignou a fazêlo em nome de um inquisitorial sigilo? Não permitir que ele peça a re-inquirição de testemunhas já ouvidas pela Comissão? Por que não permitir a juntada de documentos que comprovem a mais completa inexistência do fato a ele imputado? Por que não permitir a juntada de fotos e de provas que desmancham por completo esse simulacro de escândalo forjado nos corredores do Ministério Publico, interessado em alcançar pessoas outras que estão inclusive fora da relação processual? 112. Pois bem, Sr. Desembargador Relator, o Ministério Público que, reconhecidamente, não foi admitido nesta relação processual administrativa por decisão do eminente Relator Edson Smaniotto mantida pelo Egrégio Conselho Especial - com o v. despacho que parcialmente concedeu a liminar conseguiu, por incrível que pareça, ao mesmo tempo não só imprimir um ritmo inconstitucional ao julgamento do Processo Administrativo sub examen, ferindo de morte o devido processo legal que deve ser amoldado à espessura ínfima do procedimento nessa fase, tal qual ocorre com o procedimento sumário ou sumaríssimo no campo do Direito Processual Civil, como ainda limitar de modo insuportável o legítimo direito à ampla defesa do impetrante. 113. Perceba excelência, eminente Desembargador Relator, o absurdo do procedimento que pretende o Ministério Público indevidamente imprimir ao processo em exame, pois conforme o respeitável despacho de fls. foi anteriormente concedido o prazo de cinco dias para que o ora defendente complementasse sua Defesa, em face do seu anterior advogado, Dr. Raul Livino, ter sido obrigado por dever de consciência a sair da causa, e o fez porque, como presidente da Comissão de Ética do Conselho Secional da Ordem dos Advogados do Brasil, teria que abrir procedimento administrativo contra o advogado Manoel Barreto, conforme foi noticiado pelo próprio órgão impetrante da inicial do MS n° 4.076-2. Contra isso se insurgiu o Ministério Público. É no mínimo razoável? 114. Ora, modificada a representação judicial do impetrante, é evidente que ao não se conceder ao novo patrono da defesa um prazo razoável para que o mesmo tome conhecimento da causa e de sua completa extensão, está-se limitando de forma insuportável o legítimo direito do acusado, ou indiciado, de se defender com os meios adequados, produzindo prova do que alega. 115. A tese da defesa é justamente a da inexistência absoluta do fato apontado como violador da norma administrativa, pois tudo o que se pretende agora demonstrar é que o fato mencionado - o de que o traficante Alexandre obteve mediante paga sua liberdade - inexiste por completo, pois o mesmo após ter sido colocado em liberdade pela Egrégia 1a. Turma Criminal, em decisão por maioria, sendo relator o Desembargador João Timóteo, teve a sua prisão confirmada posteriormente pela Egrégia 1a. Turma Criminal por unanimidade, portanto com o voto do ora recorrente, em face da denegação de dois pedidos de Habeas Corpus por ele impetrados (cópias em anexo). 116. A decisão, felizmente contornada pela concessão da liminar pelo eminente Desembargador Valter Xavier, inquestionavelmente limitava drasticamente o direito do ora defendente em se ver defendido por seu novo advogado, subscritor da presente, que nunca tivera acesso aos autos e ao que nele contém. O Magistrado 67 117. O referido despacho, incomum e arbitrário, além de inconstitucional, data venia, pois simplesmente foi determinado a V. Excia., Relator natural do processo, que parasse de produzir novas provas no procedimento, acatando tese do Ministério Público que não tem legitimidade para ingressar e participar da relação processual administrativa por enquanto, conforme julgado pelo e. Conselho Especial. 118. Não foi levado em conta que tais provas pudessem ser indispensáveis à formação do livre convencimento do juiz natural da causa, sendo-lhe determinado que levasse o feito imediatamente a julgamento, mais parecendo, data venia, que pouco importava o abalizado voto e convencimento de V. Excia., pois o resultado condenatório já estaria previamente tomado. 119. Felizmente, a lúcida, coerente e abalizada decisão do eminente Desembargador Valter Xavier, restabeleceu o devido processo legal e pôde V. Excia. em acertado despacho, abrir vista à defesa do ora defendente para que esta pudesse ser apresentada e apreciada por V. Excia., no prazo de dez dias, o que é usual em procedimentos que tais. DO PEDIDO 120. Por todo o exposto e oportuno, requer a V. Excia. se digne de determinar, em correição, a oitiva das testemunhas já arroladas pela defesa do ora defendente, bem como a oitiva de todas as testemunhas que foram ouvidas durante o procedimento administrativo apuratório sem a presença do ora defendente e ou do seu defensor. 121. Por outro lado, embora reconheça que o artigo 330 do Regimento Interno determine que o processo em exame terá caráter confidencial, para garantia exclusiva do sigilo em relação ao magistrado investigado, abrindo mão desse caráter sigiloso do procedimento e levando-se em conta que a Constituição Federal estabelece no seu artigo 93, IX, verbis: "todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e, fundamentadas todas as suas decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei, se o interesse público o exigir, limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes;" (Os destaques não são do original). Vem requerer, para maior transparência e satisfação à opinião pública, bem como para que não se alegue amanhã qualquer nulidade frente à não observância da letra expressa da Constituição Federal, se entender V. Excia. não seja o caso do arquivamento sumário, o que se admite apenas a título de argumentação, após findar a instrução com a oitiva das testemunhas já arroladas e o que foi requerido na presente, que seja convocada sessão pública do Tribunal Pleno Administrativo, nos termos do que estabelece o artigo 330, § 3º para decidir sobre a instauração do processo disciplinar. 122. Restabelecido o devido processo legal e restaurado o procedimento correto ao presente feito e expostas as razões que demonstram inequivocamente que os fatos não se deram conforme 68 O Magistrado pretendeu a douta Comissão de Sindicância e que foram exaustivamente esclarecidos, requer, liminarmente, que proceda V. Excia. segundo o que preceitua o artigo 329, § 4º do Regimento Interno do Tribunal, determinando liminarmente o arquivamento do feito, tendo em vista que existem precedentes no Tribunal. Confira-se o julgamento do processo administrativo instaurado a pedido do Ministério Público contra o MM. Juiz Sebastião Coelho da Silva, arquivado sumariamente pelo Desembargador Paulo Guilherme Vaz de Melo. " Art. 329 - ... § 4º - Caberá ao Relator, se convencido, propor o arquivamento do processo". 123. Requer ainda, se digne V. Excia. de determinar seja instaurado procedimento investigatório para apuração das denúncias e insinuações contidas nas gravações descritas no item 27 da presente, em relação ao MM. Juiz da 3ª Vara de Entorpecentes e Contravenções Penais, Doutor Carlos Pires Soares Neto. 124. Requer mais que se digne V. Excia. de determinar sejam remetidas peças ao Ministério Público do Distrito Federal para apurar as responsabilidades criminais e administrativas dos policiais Wellington e Ferraz conforme gravações mencionadas no item 61 da presente. 125. Requer, outrossim, se digne V. Excia. de determinar sejam remetidas peças ao Ministério Público do Distrito Federal e à e. Corregedoria do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios para que sejam apuradas as responsabilidades criminais e administrativas do Sr. Chefe de Secretaria da 3ª Vara de Entorpecentes e Contravenções Penais, Dr. Marcelo Bianchini face às inverdades contidas no seu depoimento e o seu procedimento em relação ao ora defendente. Antes de encerrar e em respeito à Justiça à qual, ininterruptamente, vem servindo durante os últimos vinte e oito anos, manifesta sua inconformidade com a atual fase negra que atravessa o Poder Judiciário local, acreditando firmemente que, V. Excia. como relator, enfrentando tão constrangedora situação criada por parte da mídia sensacionalista desta cidade e pelo Ministério Público do Distrito Federal, determine o arquivamento do feito pela total inexistência de provas e ou mesmo indícios da materialidade do fato, restabelecendo a verdade das denúncias infundadas que vêm enodoando a honra e a judicatura de um magistrado que por ter se portado com a independência e dignidade que lhe exige a Constituição Federal, foi enchovalhado e colocado aos olhos da opinião pública como um marginal, entretanto tem absoluta consciência que somente agiu nos limites da lei e de acordo com o juramento que prestou perante a Corte quando da sua posse, de respeito à lei, à Constituição e à sua consciência. Pede Deferimento. Brasília, 26 de junho de 2003. AMAURI SERRALVO OAB/DF 760 Diretoria Presidente - Desembargador Valter Ferreira Xavier Filho (TJDF) Vice-Presidente - Juiz de Direito Jansen Fialho de Almeida (TJDF) Diretor Cultural - Juiz de Direito Roberval Casemiro Belinatti (TJDF) Tesoureiro - Juiz de Direito Jesuíno Aparecido Rissato (TJDF) Secretário-Geral - Juiz de Direito Paulo Rogério Santos Giordano (TJDF) Conselho Fiscal Presidente - Juíza Federal Adverci Rates Mendes de Abreu (TRF) Conselheiros Juiz Federal Antônio Corrêa (TRF); Juiz de Direito Evandro Neiva Amorim (TJDF); Juiz de Direito João Egmont Leôncio Lopes (TJDF); Juiz de Direito Jonas Modesto da Cruz (TJDF) Diretoria Adjunta Secretário Geral Adjunto - Juiz Federal Francisco Neves da Cunha (TRF) Tesoureiro Adjunto - Juiz de Direito Mário Motoyama (TJDF) Diretor Cultural Adjunto - Juiz de Direito Arnoldo Camanho de Assis (TJDF) Assessoria da Presidência Juiz de Direito Agnaldo Siqueira Lima (TJDF); Juiz de Direito Antoninho Lopes (TJDF); Juiz de Direito Carlos Bismarck Piske de Azevedo Barbosa (TJDF); Juiz de Direito Clóvis Moura de Souza (TJDF); Juiz de Direito Gilberto de Souza Sá (TJDF); Juiz de Direito Irineu de Oliveira Filho (TJDF); Desembargador José Wellington Medeiros de Araújo (TJDF); Juiz de Direito Leandro Borges de Figueiredo (TJDF); Juiz de Direito Manoel Franklin Fonseca Carneiro (TJDF); Juíza de Direito Maria Leonor Leiko Aguena (TJDF); Desembargador Pedro Aurelio Rosa de Farias (TJDF); Juiz de Direito Ronan Acácio Jacó (TJDF) Instituto dos Magistrados do Distrito Federal - IMAG-DF SEPN - Quadra 513 - Bloco D - Edifício Imperador - Nº 38 Sala 120 - CEP 70760-524 - Tel. (61) 274-3110 Brasília - Distrito Federal www.imag-df.org.br O Magistrado em revista é uma publicação do IMAG-DF. As opiniões emitidas em artigos assinados são de inteira responsabilidade de seus autores e não refletem, necessariamente, a posição da revista. Conselho Editorial Toda a diretoria do IMAG-DF Diretor-geral Desembargador Valter Ferreira Xavier Filho Coordenadora Administrativa Neide de Castro Editor Executivo André Messias e-mail: [email protected] Criação e Projeto Gráfico André Messias Colaboração Felipe Andrade de Alencar (Web Designer) Caroline de Moura Xavier (Revisão) Fotografia Assessorias de Imprensa do TJDF, Jorge Campos (AIP/STJ), STF, Agências Brasil (ABr), Senado, Câmara e Carlos Tiburcio Impressão Gráfica Terra Redação SEPN - Quadra 513 - Bloco D - Edifício Imperador - Nº 38 Sala 120 - CEP 70760-524 - Tel. (61) 274-3110 Brasília - Distrito Federal Artigos e Teses, com no máximo 60 linhas, podem ser enviados para o E-mail: [email protected] É permitida a reprodução das matérias desde que citada a fonte O Magistrado 69 Castigo Eu tinha onze ou doze anos quando o conheci: era um moreno alto e forte, com cerca de vinte e cinco anos e, se cheguei a saber algo mais a seu respeito, é que se chamava Orlando e era filho de uma viúva, com quem morava, numa ladeira nas proximidades da Venda das Mulatas, no bairro do Cubango. Eu estava no bonde, com um de meus tios, quando ele subiu e ficou no estribo, no rumo de nosso banco. Os dois conversaram e eu apenas o cumprimentei. Voltei a vê-lo várias vezes e nunca fomos além de uma saudação formal. Viajava sempre no estribo, mesmo que houvesse lugares à vontade. Alguns anos depois, na década dos quarenta, Niterói pouco tinha mudado e era ainda uma cidade relativamente pacata, em que quase todo o transporte de passageiros se fazia sobre trilhos. Mal terminei o ginásio, vim a saber do grave acidente que ele acabara de sofrer: escorregara do estribo com o bonde em movimento e tivera as pernas esmagadas acima dos joelhos. Esteve hospitalizado e não houve como evitar a amputação. Eu nunca soube em que circunstâncias se deu a queda, mas ele teve ganho de causa na ação movida contra a velha Cantareira, concessionária do serviço dos bondes, que acabou condenada a indenizá-lo. Vi-o diversas vezes em cadeira de rodas, e era penoso admitir que aquele homem forte e saudável estivesse irremediavelmente reduzido a tal situação. Uma tarde, tomei o bonde para o Cubango, a fim de visitar uma de minhas tias, que morava naquele bairro. Encontrei-a tratando um serviço de carpintaria com um senhor a quem chamava de seu Manduca, que tomava medidas e fazia anotações. Depois, sentamos os três na varanda à espera de um café e — conversa vai, conversa vem — falou-se de um acidente a que os jornais estavam dando destaque, porque envolvia pessoas importantes da cidade. Depois, minha tia comentou com o carpinteiro o caso de Orlando e arriscou: — O senhor talvez o conheça; é filho de dona Sebastiana, da Venda das Mulatas. O homem se benzeu, como se o assunto lhe causasse assombro: — Conheço muito, minha Senhora. Fui vizinho da família durante nove anos. Ele foi amigo de meu filho mais velho, mas eu desgostei daquela amizade, quando soube de certas coisas. Creia que não gosto de falar nisso. Até hoje me dá uma sensação esquisita. E ficando de pé: — A Senhora acredita em castigo do céu? Ante a resposta afirmativa, prosseguiu: — Eu também acredito, com a Graça Divina. Não digo que toda pessoa tenha de ser santa. A gente erra demais, faz coisas que não deve, e eu tenho cá comigo que Deus perdoa muita falta de seus filhos. Mas a perversidade que o homem faz, e volta a fazer, sem mostrar arrependimento, isso talvez não tenha perdão, não Senhora! Aqui se faz, aqui se paga! Se não for nesta vida, será na próxima, ou em 70 O Magistrado outra mais adiante, isso eu aprendi e acho que está muito certo! O inferno é aqui mesmo! E voltando-se para mim: — O amigo crê na volta do espírito, para acertar as contas atrasadas, que não foram saldadas em outra vida, e para habitar em seres humanos cada vez mais evoluídos? Eu creio e penso que é uma demonstração da justiça de Deus: em vez de mandar muita gente para o fogo de Satanás, como os padres e pastores ensinam, determina que o espírito volte, para se redimir. O amigo crê? Eu respondi afirmativamente, embora sem saber onde o homem queria chegar, e ele continuou: — Desde o tempo em que Orlando tinha vinte anos, ou talvez um pouco mais, eu sabia que ele pegava passarinhos e até aves maiores, para vender. Armava arapucas pelos matos para os sabiás, nhambus e juritis; fazia esparrelas para os pássaros comedores de frutas, e não faltava sanhaço e tiê-sangue que naquilo se envolvesse; e quando o capim se cobria de sementes, ia atrás dos coleiros e outros passarinhos miúdos, que apanhava em varas de visgo colocadas perto das gaiolas dos chamarizes, usados para atrair os bandos com seu canto. Minha tia quis saber que relação havia entre os passarinhos e o acidente. — A Senhora já vai entender. Orlando costumava deixar dois ou três pássaros no botequim de um amigo seu, que fica perto de casa, porque era um bom ponto para atrair os interessados. Numa tarde de sábado, depois de acertar a venda de um sabiá-laranjeira, ele se retirou, e os fregueses que bebiam cerveja na mesa que dava para a esquina, inclusive eu, ficamos comentando sua habilidade de pegador de pássaros. Foi quando um rapaz alto, que acabava de deixar a mesa de sinuca, entrou na conversa para dizer que não aprovava os métodos empregados por ele. — Por que não aprova? — Porque ele faz muita perversidade com os bichos. Ai dos passarinhos que não lhe interessem e caiam em suas armadilhas ou varas de visgo! Só leva para casa os machos, que são cantadores e podem dar um bom dinheiro depois de mansos. O resto, quer dizer, as fêmeas e os tipos que ninguém compra, inutiliza, para não lhe darem mais trabalho, conforme ele mesmo diz. — Inutiliza como? — Cortando as pernas, com uma tesoura que carrega só para isso. E seu Manduca, voltando-se para mim: — Eu, que na hora pensei que era coisa inventada, fiquei sabendo depois que aquilo era a mais pura verdade! E agora lhe pergunto se o que aconteceu com ele não parece castigo do céu? José Geraldo Pires de Mello é poeta, cronista, contista e ensaísta O Magistrado 71 72 O Magistrado