coração delator: titulo - Faculdade Alfredo Nasser

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coração delator: titulo - Faculdade Alfredo Nasser
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“O CORAÇÃO DELATOR”: a mente doentia de um narrador-personagem
Flaviana P. Silva*
Resumo: O objetivo deste artigo é fazer um estudo crítico do conto “O coração
delator” de Edgar Allan Poe, observando o comportamento obsessivo e a loucura do
narrador. No conto, há um crime a ser esclarecido cujo narrador-personagem está
entre o limite do real e o imaginário. A aparência desagradável do velho causa
espanto no narrador resultado da sua própria existência, realidade que para ele é
consequência das suas próprias imaginações. Para tanto, utilizar-se de teóricos de
linha filosófica e psicanalítica, além de outros relacionados à crítica literária, como:
Deleuze (2003), Freud (apud AGUIAR, 2005), Chevalier e Gheerbrant (1999),
Hockenbury (2003) entre outros.
Palavras-chaves: comportamento, obsessão e loucura.
INTRODUÇÃO
No conto “O coração delator”, de Edgar Allan Poe, é demonstrada a
insanidade mental de um narrador protagonista, que conta sua história com total
segurança de seus atos, o que no desenrolar do conto causa inquietação ao leitor. O
leitor pressupõe no narrador um comportamento obsessivo, ardiloso e de exaltação
aos seus feitos a fim de compreender o motivo pelo qual o narrador sente-se
ameaçado por um olho medonho.
No entanto, esse comportamento é transfigurado, pois no primeiro momento o
narrador esmera-se em sagacidade, porém esse sentimento torna-se pavoroso, no
instante que este se sente traído pelas batidas do próprio coração.
É evidente que a obsessão do narrador é submetida ao inconsciente que tem
organização própria, em que existem pensamentos caracterizados pela fantasia e
perturbação do mesmo. Predestinado a acabar com aflição, o narrador busca afastar
a insegurança, o sofrimento mental que o destrói espiritualmente, esse processo
psicológico traz satisfação ao narrador que requer condições para satisfazê-lo
interiormente na luta contra si mesmo, internalizando sentimentos apreensivos como
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Discente do 8º período de Licenciatura em Letras do Instituto Superior de Educação da Faculdade
Alfredo Nasser, sob orientação da Professora Mestranda Meire Lisboa Santos Gonçalves.
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tormenta e angústia, possibilitando a loucura, o devaneio psíquico em se desfazer
do olho maldito do velho, resultando numa ação submissa de entusiasmo e
confiança, de que tudo era reluzente aos olhos de quem o via. A loucura cotidiana
na qual o narrador se encontra pode ser caracterizada de acordo com a visão de
mundo e comportamento que se tem de cada indivíduo, passando, dessa forma, a
agir como um louco.
Portanto, pretende-se verificar se o narrador é acometido por essas ações,
transpondo-as para um comportamento conservador que o isola da própria
realidade, por isso, constitui-se o fato em se valer do olhar estranho, um símbolo
escolhido pelo narrador, que é motivado por pensamentos confusos através do
ímpeto da imaginação.
O conto “O coração delator” serve de base para várias análises críticas,
pondo em ênfase a cautelosidade do narrador ao longo deste. O mesmo manifesta
sentimentos e vontades espantosos a fim de concluir uma sina iniciada ao se
deparar com a figura de um senhor que não tinha aparência agradável, um de seus
olhos chamava atenção, especialmente, uma parte de sua face, o olho que o
perseguia durante sua convivência com o velho diariamente.
Pretende-se verificar esses anseios do narrador que, por sua vez, precisou
eliminá-lo de seu caminho. Sendo assim, as observações feitas pretendem debater a
conduta do devaneio (pensamentos fantasiosos) e a loucura do narrador, se os fatos
são reais ou passam apenas de delírios estimulados por uma mente doentia. É
importante ressaltar que o conto coloca em nossas mãos diversas opiniões que são
formadas durante as leituras, porém não é nosso intuito buscar todas as respostas
para as pistas encontradas.
1.
“O CORAÇÃO DELATOR”: observações acerca da loucura e do
comportamento obsessivo do narrador-personagem.
Edgar Allan Poe é considerado um dos autores mais conceituados da
literatura do horror. É um dos maiores expoentes da literatura, destacando-se ao
escrever histórias com fatos inéditos que provocam reações inquietantes em seus
personagens e leitores.
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Escreveu o conto “O coração delator”, em que desperta interesse e o desejo
reprimível de conhecer a angústia de um homem que não consegue explicar sua
obsessão por um olho, em específico, o olho de um velho. São muitas façanhas
realizadas pelo narrador para se livrar do velho.
O convívio presente com o velho proporciona-lhe a angústia, a culpa e o
desequilíbrio em seu comportamento de forma descontrolada em diversas ocasiões.
Por exemplo, ao se perguntar se estava louco, ele mesmo afirma que não está.
Segundo o narrador, ele não o pode ser, porque nenhum louco confessa sua
loucura, porém ele dispõe de serenidade e capacidade para considerar e entender
as coisas com grande clareza e perspicácia.
Se ainda me acha louco, não mais pensará assim quando eu descrever as
sensatas precauções que tomei para ocultar o corpo. A noite avançava, e
trabalhei depressa, mas em silêncio. Antes de tudo desmembrei o cadáver.
Separei a cabeça, os braços e as pernas. (POE, 1987, p. 175)
É possível perceber a mudança do comportamento do narrador por fora e por
dentro, pela sua consciência e a sua transformação na chegada dos policiais. No
conto literário, as mudanças são decorrentes dos processos de transformação, e
esta transformação está presente no conto em análise uma vez que a cada noite o
modo de olhar do narrador interfere em suas ações, a partir do convívio do dia-a-dia
com o velho.
O diálogo apresenta-se por trás de uma única voz, primeira pessoa do
singular, que se faz predominante no conto, dissimulando as outras vozes e assim
podendo defender seus propósitos, tentando persuadir os leitores. Esta única voz é
a voz do narrador-personagem. Dessa forma, os leitores desconhecem a própria
identidade do narrador e as razões que o levaram a cometer o crime. Tudo que se
sabe é por ele, sob sua ótica e explicações.
O conto coloca, então, em nossas mãos algumas ferramentas – a própria
elaboração discursiva – para se trabalhar e alcançar a descoberta deste mundo sem
limites. Ninguém sabe informar sobre o histórico do narrador-personagem, a não ser
que era um sujeito estranho e calado. Ele detalha em formato de uma confissão aos
três policiais todo o seu proceder antes e depois do crime. Embora, em constante
afirmação, de não ser louco, exalta a sagacidade e a frieza com que executa suas
ações, demonstrando uma dupla personalidade psicanalítica que pode ser
compreendida através da teoria freudiana, que será abordada posteriormente.
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O narrador sofre de um terror avassalador, fruto de suas próprias fobias e
pesadelos, que quase sempre é o retrato de um profundo desatino que se mistura
de tal maneira á realidade que não consegue mais diferenciar o perigo, se ele é
concreto ou se trata apenas de ilusões produzidas por uma mente atormentada.
Meu coração e como minha consciência que batia todas as vezes quando
lembrava daquele homem. Pensava que ninguém descobriu a perfeição
desse ato, então meu coração saltitava juntamente com a minha
consciência trazendo para mim uma satisfação imensa e ao mesmo tempo
angústia por ver em todo lugar aquele olho horrendo e o seu coração
batendo. (POE, 1987, p. 128)
Segundo Proust (DELEUZE, 2003), os signos são interpretações de cada
ser ou objeto que nos ensina e emite signos, ato de aprender alguma coisa levando
a diferentes mundos e pensamentos.
De acordo com o teórico, os signos fornecem os meios para definir ou referir
tudo aquilo que aprendemos através dos sentidos, bem como o que pensamos
desejamos ou imaginamos. Eles permitem a formação de uma ideia sobre uma
realidade não presente, influenciam fortemente o comportamento humano bem
como a nossa percepção de mundo.
Proust (DELEUZE, 2003) frequentemente aborda situações como esta: em
dado momento o herói não conhece ainda determinado fato que virá a descobrir
muito mais tarde, quando se desfizer da ilusão em que vivia. Daí o movimento de
decepções e revelações que dá ritmo ao conto, o narrador trata-se de um signo
malvado, que demonstra ódio, raiva um rancor desprezível e profundo. A voracidade
excessiva do narrador é motivada por sua mente doentia que não se restringe aos
sentimentos rancorosos que inclui até mesmo a aflição de desejos que remetem a
suas lembranças durante o ato cometido.
Essas conotações destrutivas estão bem nítidas no consciente/inconsciente
do narrador de modo que seus atos refletem a violência e a consciência, que são
caracterizadas pelas emoções vividas. No calor da emoção, o narrador fica confuso
por imaginar o olho fantasma do velho.
De acordo com o dicionário de símbolos de Gheerbrant e Chevalier (1999, p.
653-656), o olho é o órgão da percepção visual, e, de modo natural e quase
universal, o símbolo da percepção intelectual. Os olhos são identificados como sol e
lua, o olho direito (sol), corresponde à atividade, ao futuro; o olho esquerdo (lua) à
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passividade e ao passado. A luz que reflete no olho esquerdo do velho, um olho
coberto por um véu branco (catarata), lembra a simbologia da lua, o que remete à
consciência do passado do narrador; é, portanto, uma exteriorização de sua alma,
ao mostrar que o mesmo possui características assustadoras.
No conto, o narrador sente-se admirado por ser capaz de descontrair através
da sua voz e do seu olhar o ódio oculto que o faz transformar neste ser alienado e
sem razão aparente. É possível que esse ressentimento pelo olho do velho e o que
ele lhe provocava o tenha deixado fora de si.
Ao entrar no quarto todas as noites, o narrador sente satisfação, prazer e
alegria por estar ali. Ele envolve-se e se aprisiona num mundo de desatinos que é
preciso decifrar. É certo que a dor e a aflição remeteram-lhe na sua consciência à
luta entre seu desejo consciente de achar que estaria fazendo a coisa certa e o
anseio inconsciente de sair vitorioso sobre o velho.
Por várias vezes, esse narrador que não possui nome próprio, afirma não
ser louco e como prova de sua verdade conta detalhes de seu crime exaltando
serenidade e lucidez.
É verdade! Tem sido e sou nervoso, muito nervoso, terrivelmente nervoso!
Mas, por que ireis dizer que sou louco? A enfermidade me aguçou os
sentidos, não os destruiu, não os entorpeceu. Era penetrante, acima de
tudo, o sentido da audição. Eu ouvia todas as coisas, no céu e na terra.
Muitas coisas do inferno ouvia. Como, então, sou louco? Prestai atenção! E
observai quão lucidamente, quão calmamente vos posso contar toda a
história. (POE, 1987, p. 123)
Para Proust (DELEUZE, 2003, p.11), no início, “tudo isso é uma intensa
alegria de tal modo que essa loucura já se desfaz dos procedentes da paz e da
tranquilidade”. Após passar esse sentimento de obrigação e necessidade, o narrador
procura apontar os problemas; entretanto, depara-se com a incapacidade de ação
diante da possibilidade dos fracassos. Porém, não existe nada e nem ninguém que
dissesse que tudo que tinha feito era um sucesso, o seu comportamento era insólito,
extraordinário.
O comportamento do narrador para com o velho é de extremo desprezo.
Por ter um de seus olhos parecido com o de um abutre, o que o deixa perturbado e
inseguro, pois representa uma ameaça que inibe o comportamento natural do
narrador. De acordo com Proust ( DELEUZE, 2003), o narrador, por mais cruel que
seja, é sensível, a loucura no geral constitui diferentes faces de signos mundanos
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como vazios sofrimentos, dor e mentiras sobre o próprio narrador na sua
consciência.
Assim, a simbologia do abutre remete a isto, a este sofrimento imposto pelo
próprio narrador ao que aquele olho de abutre lhe causa. Segundo a definição de
abutre de Chevalier e Gheerbrant (1999, p. 9), ele é o real devorador de entranhas,
é considerado um símbolo de morte que se alimenta de corpos em decomposições e
imundícies. Pode ser considerado um ser regenerador das forças vitais contidas na
decomposição purificadora de um mago que garante o ciclo da renovação,
transmutando a morte em nova vida, cuja sabedoria aos olhos dos profanos se
reveste com aspecto da loucura e da inocência.
Dessa forma, o olhar de abutre do velho representa aquilo que contém no
inconsciente do narrador e é vivido com uma grande intensidade de emoção,
atribuindo sua influência ao oculto, ao pecado e à penitência.
Proust (DELEUZE, 2003) acredita que o homem só procura fazer as coisas
em função de uma realidade, de algo que possa sentir através da busca do seu
interior, no entanto, é preciso ter conhecimento que transmite sabedoria e
experiência para o que se está buscando. O narrador-personagem, muitas vezes,
busca em si o dizer a verdade, em insistir que tudo é real, porém é produto de um
querer resultante de um impulso para agir a capacidade de prever signos futuros.
Ainda segundo o teórico, a profunda modificação da realidade é motivada
não só pelo caso do coração ser o delator no referido conto, mas também pela
violência, a possibilidade de loucura e crime. É interessante lembrar que o coração é
o órgão central do indivíduo e corresponde de maneira muito geral à noção de
centro, por isso, ele é tomado como símbolo e não certamente como sede efetiva.
Mas, sobretudo, ele é comparado à consciência. É no coração que se encontra o
princípio do mal. O homem arrisca-se sempre a seguir o seu coração maldoso. A
perversão do coração provém da carne e do sangue. (CHEVALIER; GHEERBRANT,
1999, p. 280-283)
São nas lembranças que o narrador demonstra as fases do seu
comportamento, tanto no sentimento de raiva quanto no crime cometido, pois são
nelas que o sentimento reflete a morte, a culpa que o sente em relação ao olho, que
é o próprio signo sensível, no qual encontra a ambivalência, o estado de quem
vivencia sentimentos opostos, dor e alegria, ao mesmo tempo.
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O fato de o narrador confessar o crime aos policiais dá apenas a sensação
de uma certeza e põe em evidência o crime contra o velho, a felicidade é substituída
pela convicção da morte e do nada. Para o narrador, a morte do velho é sua alegria,
a destruição e o desaparecimento do olho asqueroso o que de fato incomodava.
“Nada havia a lavar, nem mancha de espécie alguma, nem marca de sangue. Fora
demasiado prudente no evitá-las. Uma tina tinha recolhido tudo... ah! ah! ah!” (POE,
1987, p. 126)
Verifica-se no conto o predomínio de uma força de pensamento, a loucura,
que tem formas diferentes como desejo e a imaginação que estão sempre ligadas
umas às outras. O desejo por vontade de acabar com o olho do velho e a
imaginação em aceitar que estava realmente louco.
O narrador acredita que nem mesmo a sensibilidade pode lhe causar
diferença, tanto que não mostra sentimento de culpa aparentemente. Entretanto, sua
vida torna-se um martírio, pois ele sente a dor de perder o olho e isso traz emoção
para sua consciência, há um coração que o delata.
Por outro lado, a obsessão fixa associada em ideias no intuito de aprisionar
um dos olhos parecido a de um abutre, cuja aparência o incomodava, causava
espanto, era simplesmente assustador olhar para ele, era como se fosse um
fantasma que assombrava todas as noites. Logo, a vontade insaciável de acabar
com esse medo que existe como algo ameaçador, sobretudo com aparência nada
agradável.
Os dias lhe parecem misteriosos, uma vez que a razão não consegue
explicar ou compreender a misteriosa corrente da vida e de morte, que faz beneficiar
de tudo, e o próprio narrador sente essa corrente, a forma de admitir e revelar diante
do velho.
É isto eu fiz durante sete longas noites... sempre precisamente a meia
noite... e sempre encontrei o olho fechado. Assim era impossível fazer
minha tarefa, porque não era o velho que me perturbava, mas seu olho
diabólico. (POE, 1987, p. 124).
No conto, o narrador é um ser individualizado, cujas escolhas o levaram
para determinado lugar dentro da história, tendo em vista que, ao mesmo tempo, ele
percebe que revelar o crime de assassinato é o essencial da loucura, porém não é
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necessário, nem desejável confessar. No entanto, é difícil a compreender a
realidade interior. Proust (DELEUZE, 2003, p. 30) afirma que a verdade não se
separa de uma conversa, pois elas começam pelas confidências no qual
decompõem um personagem ou um assunto. “Os signos da sensibilidade pondera
ao experimentar sensações afetivas que por um instante estimula o sentimento de
sua fraqueza”.
Embora sentisse prazer em ver o sofrimento do outro, o narrador nada faz
para tentar ajudá-lo a cuidar daquele olho, fazer recuperar-se da enfermidade que
sofria e se livrar da doença, pois a sua frieza, calma e serena, era maior que sua
benevolência em si. “Meu sangue se enregelava sempre que ele caía sobre mim; e
assim, pouco a pouco, bem lentamente, fui me decidindo a tirar a vida do velho e
assim libertar-me daquele olho para sempre” (POE, 1987, p. 123).
Por fim, chegou o dia em que ele concretizou os seus desejos em tornar-se
herói e conseguir reconhecer o seu talento de que tudo estaria perfeito e que seu
instinto espiritual tinha a percepção de que a vida estava se tornando mais complexa
pelos incidentes imprevisíveis da morte, em ouvir o coração bater. O herói simboliza
a união das forças celestes e terrestres, mas não goza naturalmente da
imortalidade, diviniza-se bem que conserve até a morte em poder sobrenatural.
Assim, para o narrador, nada detém a sua alegria em apreciar e assistir tudo sem
dar nenhuma importância ao que aconteceu.
Agindo de forma bem natural, o narrador mostra-se frio diante das situações,
percebia que estava confuso, quando suas lembranças recobravam-lhe os sentidos,
fazendo com que as preocupações fossem figuras indistintas. Proust (DELEUZE,
2003) refere-se, muitas vezes, à necessidade que pesa sobre a pessoa, alguma
coisa lhe lembra ou faz imaginar outra. São os pensamentos que fazem delimitar a
imaginação e por acontecer, buscando o que não tem existência real.
A essência desse conto é a diversidade de ideias para a realidade,
independente de o narrador ter cometido o crime, o certo é que cada sujeito tem sua
diferença, a diferença interna, os conflitos que a vida o submete, é o que se chama
de mundo exterior, o quão está dentro do narrador a razão pela qual a essência do
ser humano se reduz a um estado psicológico, o lado desconhecido de um mundo
único. Proust (DELEUZE, 2003) vê nela a única prova possível da imortalidade da
alma. Na alma daquele que a desvela ou apenas a compreende. Para o narrador, a
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realidade está voltada para seu interior, buscando reconhecer seus próprios
devaneios cujos sentimentos são atribuídos pelo ódio.
Não era um gemido de dor ou de pesar, ah, não! Era o som grave e
sufocado, que se ergue do fundo da alma, quando sobrecarregada de
medo. Bem conhecia esse som. Muitas noites, ao soar a meia noite, quando
o mundo inteiro dormia, ele irrompia de meu próprio peito, aguçando, com
seu eco espantoso, os terrores que me aturdiam. Disse que bem o
conhecia, conheci também o que o velho sentia e tive pena dele, embora
abafasse um riso no coração. (POE, 1987, p 125).
A memória, por sua vez, é involuntária às razões das lembranças que
busca no narrador a parte de seus segredos, aquilo que não pode ser revelado. Em
todos os sentidos, a loucura do narrador distingue-se em consequência da maldição
que é colocada sobre o olho do velho, que provém também dos efeitos de sentidos
que causam divergências consigo mesmo ao discernir o mal, porém os sentimentos
e os sofrimentos por quais chegam ao fim pela morte.
É possível encontrar a origem dos seus anseios e devaneios, o narrador
esforça-se para compreender melhor a dor, a angústia que sente ao realizar-se, ao
apropriar-se do olho do velho a cada ameaça pela qual está em um perigo é apenas
um reflexo da manifestação da crueldade a qual transmite alegria e ódio, não é
apenas a formação descontrolada de agir que permanece no narrador, mas também
uma pessoa muito má e perversa, que revela estar em constante problema
psicológico. “Os seres mais estúpidos, próprios de quem não são inteligentes,
manifestam-se no inconsciente, usurpando da capacidade que tem de substituir os
pensamentos mais infames”. (PROUST, DELEUZE, 2003, p. 74)
Quando o narrador diz “Não sou louco” no início do conto, percebe-se que
as palavras só são elucidadas sob condição de delírios do personagem de modo
que surge e ocorre de repente. A loucura aparece e funciona da seguinte forma, no
narrador-personagem, seu olhar estranho, sua ira constante, seus medos, são de
um louco apavorado e enfurecido. Há a ideia de que o narrador é movido contra ele
mesmo, à raiva abominável por uma loucura compulsiva.
O narrador sente dentro de si o ser perverso que se torna, desafiando os
policiais, sobretudo ele mesmo, pois a responsabilidade prova a situação em que se
encontrava, na sua consciência vinham-lhe os medos e também a necessidade de
admitir que tivesse matado o velho. Além da condição daquele que tem consciência
em assumir seus atos, o narrador desde o início é louco, pois era um ser inquietante
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seus gestos e suas palavras já demonstravam uma espécie de loucura. Uma
natureza inocente que causa inquietação ao ocupar sua mente doentia que leva à
convicção do crime.
Este se apresenta imediatamente como uma forte personalidade, uma
individualidade imperial. Justamente essa individualidade é um império, uma
nebulosa que oculta e contém várias coisas, desconhecidas. A nebulosa se
forma em torno de dois pontos singulares brilhantes: El Os olhos e a voz.
Os olhos ora são transpassados por clarões dominadores, ora percorridos
por movimentos bisbilhoteiros, ora com melancólica indiferença. A voz
mistura ao conteúdo visível do discurso com o maneirismo efeminado da
expressão. (PROUST, DELEUZE, 2003, p.164).
O narrador apresenta uma personalidade forte, é um indivíduo que envolve
mistérios ocultos; ainda o olho é um mistério a ser desvendado pelo narrador, um
olhar de pressentimentos, enigmático, o que pode levar à loucura. É o fato de não
lidar com seu próprio devaneio, de transcender os signos que se serve, apesar da
afronta que coloca em risco a própria vida.
Todavia, o narrador evidencia sua própria loucura, o fantasma e o gesto de
demência o fazem imaginar a pessoa cruel que se torna, criando o universo mais
profundo da loucura que são os que se entrelaçam à mente; o crime e o silêncio,
porém, estão relacionados, já que tudo para ele é maquiavélico, não mede esforços
para se concretizar.
No conto, o que chama atenção é a neurose do personagem, sofrimentos
marcados por angústia, maldição e obsessão que constituem na loucura. A
perturbação do narrador diz respeito à individualidade oculta, ao desejo em
manifestar o que acontece consigo mesmo, à paranóia e aos delírios que lhe são
prudentes caracterizados pelo aparecimento de ideias que evoluem para
perseguição ao olho do velho, mas a uma ilusão delirante do personagem.
É apenas nesse sentido que se pode indagar o que narrador é capaz de
fazer para compreender a si mesmo. Na realidade, um ser vazio, extraído pelas
sensibilidades dos sentidos que possui diversas naturezas entre elas a loucura. É
importante considerar que a obsessão é uma parte complexa do comportamento do
narrador, o desenvolvimento mental é a compreensão de como engloba esse
processo recorrente de perseguição dos sentimentos mentais que variam na sua
consciência.
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Segundo Freud (apud HOCKENBURY, 2003), a psicanálise enfatiza os
conflitos inconscientes, para determinar o comportamento e a personalidade do
indivíduo em suas ações. De acordo com ele, os impulsos são revelados no
cotidiano, quando as ideias estão em conflito, influenciam na personalidade,
causando distúrbios psicológicos como a loucura e a obsessão.
No conto, o pensamento do narrador pode ser percebido pelas apreensões
de sentidos, atitudes que demonstram sua voracidade, evidenciando os fatos. A
imaginação, concentração e a memória ficam confusas diante da loucura realizada
por ele. Por isso, Freud aponta que as motivações nas ações dos seres humanos
não são todas conscientes, muitas vezes são impulsionadas pelo inconsciente.
Entretanto (Freud) não acredita que as motivações das ações humanas
sejam todas conscientes. Ao relacionar a motivação do comportamento
humano com os instintos, ele mostra que nem sempre as pessoas estão
conscientes da motivação de suas ações, muitas vezes comandadas pela
necessidade de satisfação dos instintos. (Apud HOCKENBURY, 2003, p.
553).
A
personalidade
do
narrador
é
definida
como
padrão
único
de
pressentimentos e fantasias de um individuo que enfatiza o caráter humano. Para o
referido teórico, o transtorno está relacionado com a sua conduta de satisfazer o
complexo, em deixar transparecer a sua agonia. A vingança do narrador está
inconscientemente ativa, a maldade não se desfaz nem mesmo no seu inconsciente,
ao contrário, ela é perversa e cruel. Freud (apud HOCKENBURY, 2003, p. 372)
acredita que “o inconsciente pode também ser revelado em ações não intencionais
que parecem ser acidentais ou não, que são determinadas por motivos
inconscientes”.
Na teoria de Freud (apud HOCKENBURY, 2003), o instinto da morte,
thánatos, é refletido em ações agressivas, destrutivas e autodestrutivas. A morte
designa o fim absoluto de qualquer coisa de positivo em um ser humano. Enquanto
símbolo, a morte é o aspecto perecível e destrutível da existência, ela indica aquilo
que desaparece na evolução irreversível das coisas.
Dessa forma, o narrador sofre com autocensura e, até mesmo, de impulsos
sucedidos de sentimentos malévolos. “A essência da natureza humana é destrutiva.
O controle desses instintos destrutivos é necessário para pessoas neuróticas e
infelizes”. (FREUD, apud HOCKENBURY, 2003, p. 385)
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Segundo o teórico, o comportamento é fortemente influenciado pelo
inconsciente, pois a maneira de pensar é negativa, as emoções, o desespero e a
raiva extrema proporcionam rancor para os sentimentos e isso faz com que o
narrador sinta-se deplorável, incapaz de controlar ou lidar com a situação. Há um
momento no conto em que o narrador anda de um lado para o outro sem parar, esse
fato é importante já que caracteriza a exaustão, o cansaço do narrador, isso
contribui para dificultar, confundindo-se os sentimentos de raiva e ódio.
Andava pelo quarto acima e abaixo, com largas e pesadas passadas, como
se excitado, até a fúria pela vigilância dos homens... mas o som aumentava
constantemente. Oh! Deus! Que poderia eu fazer? Espumei... enraivecime... praguejei! (POE, 1987, p. 128)
O narrador, como ser abstrato, com características definidas aparentemente
de um louco que não muda, tem na disputa das condições sociais a que está
submetido à determinação pelas condições ilusórias que o cercam. Na verdade, este
é um problema enfrentado pelo narrador, pois os valores sociais permitem que
várias concepções de um homem mudem, o que não ocorre com a personagem em
questão, pois a subjetividade e o mundo de ideias com significados e emoções são
construídas internamente por este, a partir de suas manifestações comportamentais,
e não vinculadas às sociais e à inserção em uma determinada sociedade.
O narrador age e pensa da sua maneira, porque existe um dado momento
da sua consciência vivendo em determinadas relações que revelam o processo da
realidade a ser desvendada, que é atribuído à essência da sua transformação, a
partir das suas contradições entendida como um princípio de realidades vividas.
O caráter singular e repetitivo do narrador explica, dentro da loucura que
abarca, um processo de ilusões imaginárias. O narrador não se desfaz do
pensamento negativo de vingança e nem da emoção e prazer em fazer o mal,
moldando bem todos os passos do velho, apenas para satisfazer o desejo do seu
coração, mas que era também o de sua consciência, arrancar o olho dali.
Nos detalhes da sagacidade, o narrador não se contenta com os efeitos, a
ironia e o contraste da habilidade misturam-se com sua estratégia de ser um
poderoso herói da situação, o que o leva finalmente a defrontar com a sua própria
consciência de realidade e imaginação. Num gesto de ira e arrogância, o narrador
mata o velho, numa série de cenas tensas e angustiantes, o narrador transforma-se
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pela reconstrução de seu próprio e desconhecido passado, quando começa a
pensar no olho maldiçoado que o atormentava.
Ele estava aberto; todo, plenamente aberto. E ao contemplá-lo, minha fúria
cresceu. Vi-o, com perfeita clareza; todo de um azul desbotado, com uma
horrível película a cobri-lo, o que me enregelava até a medula dos ossos.
Mas não podia ver nada mais da face, ou do corpo do velho, pois dirigira a
luz, como por instinto, sobre o maldito lugar. (POE, 1.987, p.125).
A razão e a obsessão voltam ao passado na memória do narrador a uma
vida que jamais teve, porque a vida lembrada é outra, diferente da vida vivida, o que
ele afinal recupera é o sentimento impresso em seu subconsciente por toda sua vida
pregressa e não os fatos, este como sempre pouco ou nada lhe importa, mesmo
porque não se pode ter muita certeza deles. Os sentimentos desaparecem e só fica
sua lembrança na memória e essa lembrança é sua representação, um símbolo
ainda que se é preciso juntar em se tratando de uma loucura.
De qualquer modo, o narrador só possui como certeza da sua vida, as
imagens guardadas, em sua minoria, o ódio profundo. A imaginação predomina
desgarrada do seu mundo real, operando em possíveis pensamentos perigosos,
porque é múltipla a visão da realidade enquanto transforma seu inconsciente.
Portanto, o narrador vive o mais profundo desatino, cujo delírio mistura-se
com a realidade, não conseguindo mais diferenciar o perigo, se ele é concreto ou se
trata apenas de ilusões e obsessões produzidas por uma mente atormentada.
Segundo Rotterdam (1972, p. 31), “sábio é aquele que vive de acordo com as regras
da razão, e louco ao contrario é o que se deixa arrastar ao sabor de suas paixões”.
As verdades do conto se fixam sobre o narrador-personagem que, no
entanto, não parece estranhar os fatos, direcionando sua história para vários
interlocutores identificados pelo pronome pessoal vocês. Como em um depoimento,
ele explica como e porque cometeu o crime. Tal situação faz com que os
expectadores assumam o papel de testemunhas de sua história.
Todavia, para entender os pensamentos complexos do narrador é
necessário compreender suas atividades mentais, bem como as diferentes formas
da sua realidade, “estabelecer a forma de pensar de acordo com a mudança de
cada momento de um individuo”. (MORIN, 1990, p. 23). No paradigma do
pensamento complexo, como acentua Morin (1990, p. 34), “o conflito, a contradição
e o indeterminado não são elementos a serem eliminados por meio de explicações,
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mas o contrário, são elementos que devem fazer parte da concepção e percepção
da realidade. Um exemplo dado por Morin é o da paranóia, que é uma forma
clássica chamada de racionalização delirante. O paranóico vê as pessoas sempre
com o pensamento de que querem destruí-lo
Para Freud (apud AGUIAR, 2005, p.159), “os instintos são conservadores
por natureza, instintos de vida e instintos de morte”. Freud julga que muito de nossa
herança cultural mais valorizada foi adquirida à custa de repressão e da inibição dos
instintos. A autodestruição tende à morte do interior, manifestando-se sob a forma
destrutiva.
A psicanálise considera o desejo, a defesa do comportamento perturbador
de seu caráter, por isso o narrador é confrontado com o perigo de tensas
frustrações. De acordo com o autor, é no inconsciente que vagam pensamentos,
desejos
e
ações
que
são
controladas
inconscientemente.
Porém,
é
no
subconsciente que os instintos e emoções complexas, como a obsessão, que se
aflora, relacionam-se a sentimentos egoístas.
Segundo Freud (apud AGUIAR, 2005), o complexo também pode estar
relacionado ao seu comportamento, pois tem efeito destrutivo, como os sentimentos
de vingança que refletem na vida do narrador, as predisposições e o ódio que são
característicos dos maus complexos sofridos por ele. Os instintos, as emoções e os
desejos ali vividos pelo narrador-personagem podem ser considerados intensos e
que estão dentro dele para serem manifestados.
No entusiasmo de minha confiança, trouxe cadeiras para o quarto e mostrei
desejos de que eles ficassem ali para descansar de suas fadigas, enquanto
eu mesmo, na desenfreada audácia de meu perfeito triunfo, colocava minha
própria cadeira, precisamente sobre o lugar onde repousava o cadáver da
vitima. (POE, 1987, p.127).
Ao sentir-se ameaçado pelo olho assustador, o narrador pensa em como
desfazer desse mau que o atormenta demonstrando inquietação. Na maioria dos
atos ousados do narrador, a satisfação é realizada frequentemente por suas ações,
não demonstrando nenhum tipo de arrependimento, sua covardia é maior que seus
próprios anseios, porém é o que determina sua coragem.
Jamais, antes daquela noite, sentira eu tanto a extensão de meus próprios
poderes, de minha sagacidade. Mal conseguia conter meus sentimentos de
triunfos. Pensar que ali estava eu, abrindo a porta, pouco a pouco, e que ele
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nem sequer sonhava com meus atos ou pensamentos secretos... (POE,
1987, p.124).
O ódio pelo olho do velho perturba sua tranquilidade diante dos policiais que
é ameaçada e destruída por si mesmo. Para o narrador, o êxito e a felicidade são
obstruídos de sua vida, impedindo sua liberdade de consciência. Sob este ponto de
vista, o fato importante para livrar-se do velho é o de fazer desaparecer qualquer
vestígio que lembre seu olho, uma vez que a razão consente o impulso de matar, de
alcançar êxito e segurança.
Essa obsessão, no entanto, leva o narrador a destruir a si próprio como se
dominasse no interior a necessidade de privações e sofrimentos. O narrador
enfrenta o conflito da imaginação e da realidade, pois encontra na sua mente
dificuldades como a inquietação e a perturbação que provocam insensatas decisões,
sucessivamente.
No âmbito psicológico, o imaginário possui uma realidade, de onde vêm
fantasias do próprio pensamento de maneira que a consciência ramifica sua
personalidade. De certo modo, o narrador nega-se a aceitar o comportamento
inconsequente de sua mente, a personalidade que age em si. No conto, percebe-se
que o narrador vive isolado, subtraído as suas lembranças desagradáveis e
neuróticas. Por muitas vezes, o narrador dedica-se somente aos passos do velho, à
insônia e aos tremores noturnos que eram sua companhia.
Quando algo se relaciona com as emoções e os sentimentos, as conclusões
a que se chegam é que tudo está em perigo. Compreende-se que determinadas
ideias apoderam-se da mente, fazendo com que se torne em atos, isto acontece por
persuasão lógica da razão e da consciência, são pelas ideias que as emoções
transformam-se em resultados. Verifica-se que cada uma das formas de receber as
sensações está intimamente ligada ao consciente, produzindo emoções e
experiências em razão do ser existencial.
A consciência pode ser definida como a função pela qual conhecemos a
nossa vida interior, isto é, os fenômenos A psíquicos que a todo o momento
se passa em nós, e para o mundo interior, o que os sentidos são para o
mundo exterior. (MONTALVÃO, 1987,p. 173)
Segundo Montalvão (1987), os instintos são reflexos que ignoram os
objetivos, atuam apenas quando o estímulo o excita. Chega-se, portanto, à
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conclusão de que o equilíbrio, a estabilidade e a normalidade são antes de tudo,
uma luta do individuo contra a doença mental. A normalidade conservada à força é
permeada pelo sofrimento. O sofrimento é, então, espaço de luta entre a sociedade
e a loucura. E isto é o que pode ser verificado no narrador-personagem do conto em
análise.
Quando surge a loucura, o narrador é acometido de delírio, depressão falsa,
inibição, excitação, que se originam mais da organização de sua personalidade, da
história e do passado deste. A psicanálise entende que os traços mais estáveis da
personalidade enraízam-se na infância, na teoria psicanalítica a organização mental
passa por etapas de relações que definem as linhas de personalidade (FREUD,
apud AGUIAR, 2005)
Os valores pessoais, os sentimentos, as emoções, os medos, os desejos
inconscientes, a experiência passada são fatores psíquicos que influenciam no
processo perceptivo do narrador. Isso significa que existem mecanismos internos
que impedem ou destorcem a percepção de determinados fatos. A barreira à
percepção é ocasionada pela rejeição ao desfazer, isso se dá pela fuga, pela
negativa inconsciente do narrador de perceber sua realidade interna e externa. Em
situações ameaçadoras, de abandono, de medo da morte física e psíquica, o
narrador traz consigo o ódio e um rancor desprezível e profundo de raiva, estes
signos de maldade.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Trabalhar o conto “O coração delator” de Edgar Allan Poe foi algo fantástico
e incentivador, pois se pôde perceber o suspense e a obsessão de um narrador
atormentado por um olho medonho.
Ao desenvolver este artigo, foi percebido que alguns fatores se contradizem
entre a realidade e a loucura. O olhar abominável do velho é para o narrador a
realidade da sua consciência e imaginação, pois ali estavam contidos todos os seus
pensamentos de repulsa e indignação de um olhar vil, comparando a sua realidade.
No calor enlouquecedor do narrador-personagem foi possível compreender
que os delírios, os devaneios, o comportamento obsessivo são elementos que levam
a crer que o narrador estava louco ao cometer os atos decorrentes no conto. O
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narrador demonstra sua sagacidade em acabar com velho, mais precisamente com
o olho que tanto o incomodava.
Constatou-se no conto que o narrador-personagem, em decorrência dos
fatos acontecidos, coloca em evidência, o desvario e a loucura de um espírito insano
que conturba sua consciência numa incessante e incansável aflição por um olho que
o perseguia, dando início ao planejamento do crime e sua execução. É certo que fica
feliz ao satisfazer essa vontade, porém essa satisfação não permanece por muito
tempo, uma vez que após executar o velho, ainda sente-o pelo o pulsar do coração.
Verificou-se que esse sentimento permanece, pois a solução que é buscada
para os seus problemas com o crime cometido, apenas o satisfaz por um
determinado tempo; novamente, ele não se sente feliz, sente-se ameaçado, pois não
consegue resolver o problema maior, que está nele mesmo.
Portanto, pôde-se verificar o pensamento assassino que procede na vida de
um homem e os medos constantes que sempre o atormenta. Ao cometer essa
loucura, o narrador sofre por tentar fugir da dor causada em si mesmo e, com isso,
as lembranças vagam na sua mente. A ação do narrador traz um tema polêmico que
dispõe na literatura uma possível realidade de um crime, aflições e condições
psicológicas que o condicionaram a tal ato.
Pretende-se que este artigo sirva de base para posteriores pesquisas a
respeito da temática abordada, que é tão recorrente nos contos de Edgar Allan Poe,
trazendo uma interpretação do conto em uma visão que possibilite a comparação
com outros artigos do mesmo autor em trabalhos posteriores.
Abstract: The aim of this paper is to make a critical study of the short story "The
Tell-Tale Heart" written by Edgar Allan Poe, observing the obsessive behavior and
madness of the narrator. In the tale, there is a crime to be explained whose narratorcharacter is the boundary between real and imaginary. The uncomfortable
appearance of the old surprises the narrator as a result of his own existence, a reality
which to him is caused by his own imagination. So, it will be used theorics of
philosophical and psychoanalytic lines, as well others related to literary criticism, as
Deleuze (2003), Freud (cited by AGUIAR, 2005), Chevalier and Gheerbrant (1999),
Hockenbury (2003) and others .
Key words: behavior, obsession and madness.
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REFERÊNCIAS
AGUIAR, Maria Aparecida Ferreira. Psicologia Aplicada a Administração: uma
abordagem Interdisciplinar. São Paulo: Saraiva, 2005.
CHEVALIER, Jean; GHEERBRANT, Alain. Dicionário de Símbolos. Rio de Janeiro:
José Olympio, 1999.
DELEUZE, Gilles. Proust e os signos. Tradução de Antônio Piquet e Roberto
Machado. Rio de Janeiro: Forense, 2003.
HOCKENBURY, Sandra. Descobrindo a Psicologia. Barueri-SP: Ed. Manole, 2003.
MASSAUD, Moisés. A analise literária - o conto. São Paulo: Cultrix, 1983.
MONTALVÃO, Alberto. Psicologia e Relações Humanas. Vol 2. São Paulo: Editora
Brasileira, 1987.
MORIN, Edgar. Introdução ao Pensamento Complexo. 2. ed. Lisboa: Instituto
Piaget, 1990.
ROTTERDAM, Erasmo de. Elogio da Loucura. 1 ed. São Paulo: Ed. Atenas, 1972.
ROUANET, Sérgio Paulo. A Razão Cativa. São Paulo: Brasiliense, 1985.
POE, Edgar Allan. Histórias Extraordinárias. Rio de Janeiro: Globo, 1987.