CLEPUL em Revista, n.º 11
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CLEPUL em Revista, n.º 11
CL E P U L em Revista 11 Fevereiro de 2016 2 Natália Correia Em Dia de Reis Falar de Rainhas Momentos de grande lirismo marcaram a iniciativa «Em Dia de Reis Falar de Rainhas». O acontecimento, organizado pelo CLEPUL, CICS.NOVA, Centro de Estudos da Lusofonia Agostinho da Silva, AMONET e Câmara Municipal de Lisboa, teve lugar a 6 de Janeiro último no Palácio Pimenta/Museu de Lisboa (antigo Museu da Cidade) e foi dedicado a Natália Correia. Um destes momentos coube a Alex Honrado, que leu a «Ode à Paz», tão oportuna, nos tempos que correm. Vítor Sarmento e Carlos Carranca tocaram e cantaram temas de origem açoriana – a autora era natural de Fajã de Baixo, ilha de São Miguel –, alguns dos quais adaptados à canção coimbrã, tendo ambos também tocado e cantado temas de Zeca Afonso. Sob apresentação da organizadora Isabel Lousada, a sessão contou com leitura de poemas e excertos de textos a evocarem aspectos da vida, obra e pensamento da poetisa/ensaísta/activista e tão multifacetada cidadã. Entretanto, na sala «nascia» uma Natália Correia em novo e belo retrato, graças à pintura de Isabel Nunes. De facto, não faltaram referências ao activismo político de Natália Correia, opositora ao Estado Novo, que chegou a condená-la a três anos de prisão (com pena suspensa) pela publicação da Antologia da Poesia Portuguesa Erótica e Satírica. Já a partir de 1980 a escritora viria a ser deputada à Assembleia da República. Tão-pouco foi esquecido o seu papel no jornalismo e no ensaísmo, recordando-se obras de reflexão história ou acerca do pensamento sobre Feminismo. Ou, ainda, na participação televisiva e no guionismo, em programas como «Mátria». No final não faltou bolo-rei – nem bolo-rainha – e outros doces natalícios, de Portugal e do Brasil, que de lá também houve quem dissesse a voz de Natália. Com outro sotaque. A edição anterior de «Em dia de Reis falar de Rainhas», realizada um ano antes, foi dedicada à fotógrafa Ana Maria Holstein Beck, na Sala de Leitura do Arquivo Municipal de Lisboa | Fotográfico evocando a exposição Ana Maria Holstein Beck – Álbuns de Família que esteve patente naquele Arquivo durante os meses de Outubro de 2013 a Janeiro de 2014. Nair Alexandra www.clepul.eu 3 Ordem do Infante D. Henrique Presidente agraciou Alberto Carvalho O Presidente da República condecorou, no Palácio de Belém, no dia 18 de Fevereiro, um grupo de personalidades da Academia e da Cultura, bem como a Casa do Artista. Um dos agraciados foi o Professor Doutor Alberto Duarte Carvalho como Grande-Oficial da Ordem do Infante D. Henrique. A Direcção e a Comissão Coordenadora do CLEPUL e o Grupo de Investigação de Culturas e Literaturas Africanas de Língua Portuguesa, do qual foi fundador, felicitam o agraciado pelo reconhecimento público do seu trabalho na divulgação da língua portuguesa e das literaturas africanas dentro e fora de Portugal. O Professor Doutor Alberto Duarte Carvalho www.clepul.eu é natural de Moçarria, concelho de Santarém, doutorado em Literatura Cabo-Verdiana pela Universidade de Lisboa e Professor Catedrático da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, aposentado em 2007. Desde o ano lectivo de 1974/1975 foi docente do Departamento de Literaturas Românicas, da FLUL, nas áreas de Poética (Teoria Literária, Semiótica Literária, Métodos de Análise e Leitura Literária, Metodologias de Investigação) e de Literaturas Africanas de Língua Portuguesa, com especialização no domínio da Cultura e Literatura Cabo-Verdianas e de Literatura de Viagens. Nas décadas de 1980 e 1990 coordenou o protocolo entre a Universidade de Lisboa e o Instituto Superior de Educação de Cabo Verde, com docência nas cadeiras de Literatura Cabo-Verdiana e de Cultura Cabo-Verdiana (ISE, Praia). Desde 1989 coordenou e dirigiu diversas missões de docência de Programas ERASMUS entre a FLUL e uma dezena de faculdades congéneres. Foi Docente Convidado em instituições universitárias de diversos países europeus e africanos, Brasil e, nomeadamente, Cabo Verde, país com o qual mantém uma continuada relação de trabalho há várias décadas. Em 2007 foi distinguido pela Presidência da República de Cabo Verde com a 1.a Classe da Medalha “O Vulcão”. 4 Universidade da Madeira Semana da Filosofia: Do Liceu à UMa No âmbito do Conselho da Cultura, com o apoio do CLEPUL-Polo UMa, e em conjunto com a Comissão Organizadora da «Semana da Filosofia» do Liceu Jaime Moniz, realizou-se no dia 5 de Fevereiro, pelas 18H00, na Sala do Pátio do Colégio dos Jesuítas, uma sessão de conferências com a participação de: Paulo Borges — «Quem é o meu Próximo? Para uma ética da interdependência, do respeito e do cuidado por todas as formas de vida»; André Nunes — «Por que devemos rejeitar o antropocentrismo?»; Pedro Renca — exibição do filme UMBRA – «Reflexão sobre as estratégias para a promoção da saúde mental». V Encontro do Clube de Leitura «Na Companhia das Vozes dos Poetas» Ao Encontro de Bocage — Sob o Signo das Palavras No dia 18 de Fevereiro, na Sala do Senado da Universidade da Madeira, realizou-se o V Encontro do Clube de Leitura, numa iniciativa do Conselho da Cultura da Universidade da Madeira, com a organização dos jovens investigadores do CLEPULUMa e do Centro de Estudos Bocageanos, e integrado nas Comemorações dos 250 Anos do Nascimento de Bocage. Propôs-se um documentário sobre Bocage incluído na série de episódios «A Alma e a Gente», com José Hermano Saraiva, a leitura de poemas de Bocage e a divulgação da sua obra, no sentido de manter vivo um autor que, pela sua actualidade e mestria, merece um lugar nas literaturas portuguesa e europeia. Edição: Ernesto Rodrigues, Luís Pinheiro www.clepul.eu 5 Mário Martins, S.J. Apresentado livro É perigoso sintetizar a Idade Média Foi lançado no dia 5 de Fevereiro, na Biblioteca Municipal Gustavo Pinto Lopes, o livro É perigoso sintetizar a Idade Média, da autoria de Maria Isabel Morán Cabanas e de José Eduardo Franco. A obra, que tem por base os trabalhos do padre torrejano Mário Martins, foi apresentada por Guilherme d’Oliveira Martins, antigo presidente do Tribunal de Contas e atual membro do Conselho de Administração da Fundação Calouste Gulbenkian. A abertura da sessão coube ao presidente da Câmara Municipal de Torres Novas, Pedro Ferreira, que destacou o desafio colocado à autarquia de participar na publicação de uma obra que se baseia no trabalho de grande riqueza e rigor de um torrejano que, apesar de ser desconhecido para muitos, deixou um legado na área da investigação histórica que merece ser valorizado. Francisco Abreu, da editora Esfera do Caos, destacou que este livro cumpre a mais importante www.clepul.eu função de uma editora: «colocar ao dispor dos leitores textos que farão escola e que resistirão à passagem do tempo.» Afirmando que este é um livro publicado com grande convicção, que engrandece o catálogo da editora, dando-lhe solidez e prestigiando-o com o contributo destes dois autores, Francisco Abreu agradeceu ao Município de Torres Novas pela participação no processo de publicação da obra e pelo acolhimento. Guilherme d’Oliveira Martins destacou que esta é «uma obra singular sobre um homem singular, extraordinário pela sua curiosidade, capacidade de conhecimento, de investigação e de intuição. Encontramos nas obras de Mário Martins muitas chaves inesperadas para a compreensão de alguns fenómenos da cultura. Esta é uma obra muito clara, muito pedagógica e o Município de Torres Novas está de parabéns por ter apoiado esta edição. Quem ler esta obra encontrará elementos de enorme riqueza.» Maria Isabel Morán Cabanas manifestou-se muito contente por estar na terra natal de Mário Martins que «toda a sua vida se empenhou na elaboração de uma história da cultura e da espiritualidade de Portugal na Idade Média. O seu conhecimento, curiosidade e intuição permitiram-lhe abrir caminhos novos». Também José Eduardo Franco agradeceu ao Município de Torres Novas por ter apoiado esta homenagem a Mário Martins, «responsável por uma revolução silenciosa dos estudos medievais em Portugal». Considerando-o «um homem generoso, de investigação, dos arquivos, que trouxe as provas, que distribuiu o seu conhecimento através dos seus escritos mas também acompanhando diversas pessoas nos seus trabalhos», afirmou que Torres Novas tem razão para se orgulhar desta grande figura que é Mário Martins. 6 A obra convida o leitor a navegar com o insigne jesuíta através dos séculos, partindo dos textos de Mário Martins, sobre a Idade Média em Portugal, devoções e vivências religiosas, heróis e façanhas cavaleirescas, mitos que se sobrepõem à realidade e todo um leque de comportamentos humanos descritos na época, ora João do Rio / João de Barros num registo sério ora humorístico. Qualidade e caráter precursor definem a vasta obra publicada por Mário Martins sobre a Idade Média em Portugal. Ainda hoje a consulta dos seus trabalhos se nos apresenta como incontornável perante qualquer aproximação à história medieval das mentalidades e da espiritualidade. [excerto do sítio do Município de Torres Novas] A união entre Brasil e Portugal nas cartas de João do Rio a João de Barros. Textos traçam panorama das relações entre os dois países no início do século XX «Cito-te em todos os jornais, em todas as conferências, em todos os lugares. Tenho a preocupação permanente do meu querido João. Não é mais amizade: é um escandaloso amor.» O trecho da carta enviada pelo escritor e jornalista Paulo Barreto, mais conhecido pelo pseudónimo João do Rio, ao poeta português João de Barros exemplifica a relação de amizade estabelecida entre os dois lados do Atlântico. Para além dos laços pessoais, a correspondência dos dois traça um painel da pro- dução cultural e literária no Brasil e em Portugal nas primeiras décadas do século XX, assim como um projeto conjunto de aproximar os dois países. As missivas de João do Rio, a maior parte guardada no acervo de João de Barros depositado na Biblioteca Nacional de Portugal, em Lisboa, são publicadas agora no livro Muito d’alma: Cartas de Paulo Barreto (João do Rio) a João de Barros – 1909-1921 (Academia Brasileira de Letras/Garamond), organizado pelas professoras Claudia Poncioni e Virginia Camilotti, com rica iconografia e centenas de notas explicativas. As cartas recebidas pelo brasileiro foram perdidas após a sua morte. Os dois literatos se conheceram durante a primeira viagem de João do Rio à Europa, em 1909. Ao longo da estadia do escritor em Portugal, ficaram amigos e começaram a fazer planos. Na época, João do Rio era já reconhecido. No ano seguinte, lançaria seu livro mais famoso, A alma encantadora das ruas. A www.clepul.eu João do Rio / João de Barros principal empreitada da dupla foi Atlântida, publicação mensal sobre temas artísticos e políticos que circulou entre 1915 e 1920, reunindo colaboradores brasileiros e portugueses. João do Rio passa um grande período em Portugal, e o projeto da revista surge quase que imediatamente. O que dispara a correspondência é essa iniciativa. Logo nas primeiras cartas há discussões sobre o nome, o financiamento, o envolvimento de ambos – afirma Virginia, professora da Universidade Metodista de Piracicaba (Unimep) e da Universidade Estadual Paulista (Unesp), em Franca. Virginia explica que, na época, havia uma animosidade crescente contra portugueses, o que dividiu os círculos literários: Essas cartas dão um mapa muito significativo de como os homens de letras nesse momento se dividem e os nichos onde eles se encontram. João do Rio situa para João de Barros onde estão os inimigos, quem são esses homens de letras, a que www.clepul.eu jornais e revistas eles se associam. Sonho de uma Confederação Ao mesmo tempo, Claudia ressalta, havia uma indústria cultural luso-brasileira que marcava o teatro e a literatura. É interessante que esse exacerbado nacionalismo antilusitano existia num contexto em que havia uma indústria cultural que unia os dois países. Era difícil escapar disso. Autores portugueses vendiam no Brasil, escritores brasileiros vendiam em Portugal. Havia um espaço comum de leitores – aponta a professora, catedrática em Literatura e Civilização Brasileiras na Universidade Sorbonne Nouvelle-Paris 3. Claudia afirma que havia uma utopia política comum que atravessava a amizade. Para João de Barros, a jovem república brasileira servia de exemplo para a ainda mais jovem república portuguesa, proclamada apenas em 1910. Líder republicano, o poeta ocupou diversos cargos políticos, chegando a minis- 7 tro de Negócios Estrangeiros na década de 1920. Apesar de não constar na correspondência, a dupla alimentava o sonho de uma confederação reunindo Brasil e Portugal. Seria uma forma de defesa da latinidade contra a influência anglo-saxã. Encontro entre João de Barros (o segundo, sentado, a partir da esquerda) e João do Rio (o quarto, em pé, a partir da esquerda) em São Paulo, na viagem do poeta português ao Brasil em 1912 – Acervo António de Barros/Divulgação João do Rio foi muitas vezes acusado pelos seus detratores de trabalhar a favor dos interesses lusitanos. Contudo, nas cartas fica claro que o jornalista contava com muito menos apoio da colónia lusa do que clamavam os seus adversários. Ao amigo português, o jornalista lamentou diversas vezes as dificuldades financeiras que encontrava 8 para tocar os seus projetos, em especial o jornal A Pátria, fundado em 1920. Um ano após criar a publicação, afogado em dívidas, João do Rio sofreu um ataque do coração no Largo do Machado, na Zona Sul do Rio, e morreu. O projeto de A Pátria acabou com ele, foi o responsável pela sua morte. É curioso observar porque boa parte da historiografia diz o quanto ele foi vendido à colônia portuguesa, fez tudo para ganhar benesses, mas as cartas retificam completamente a compreensão dessa relação. A colónia portuguesa virou as costas para ele – diz Virginia. Cronologia decifrada O trabalho das duas professores levou quatro anos. Todas as cartas eram manuscritas, com a caligrafia miúda e nervosa característica de João do Rio. O maior desafio, entretanto, não foi decifrá-las, mas identificar quando foram escritas, já que poucas estavam datadas. Para montar a cronologia das missivas, foi preciso recorrer a marcadores tempo- João do Rio / João de Barros rais, como notícias de jornal e nomes de personagens citados. Até o caso de duas pessoas com o mesmo nome, um português e outro brasileiro, foi encontrado. Um verdadeiro trabalho de detetive. Vivemos em países diferentes, com fusos horários diferentes, mas nos divertimos nessa pesquisa. Editar sem a ordem cronológica não faria sentido – conclui Claudia. Trecho «‘A Pátria’ é o maior êxito jornalístico do Brasil em todos os tempos. Circulação formidável (maior q. a do ‘Correio da Manhã’), autoridade, descomponendas, autora já de duas ou três greves. Como previa – a campanha contra o jacobinismo chegou a tempo. Tenho neutralizado tudo e estabelecido o desvairo [sic] nas hostes desses patetas. Partindo o Afonso Celso – a pilhéria dos malandros e dos matoides murchará. Mas esse enorme esforço patriótico traz-me a ruína e a agonia. Com o papel a 600 mil réis a bobina podes imaginar o prejuízo diário q. a grande tiragem me dá. Não durmo com a preocupação de arranjar dinheiro. Já hipotequei as casas. Ando a pedir. O poeta e líder republicano português João de Barros – Acervo António de Barros/Divulgação Apesar do êxito retumbante, é o êxito catastrófico, porque os viscondes da colônia, o Banco da Financial, e outros não só não me dão, como nem letras me aceitam.» Carta de João do Rio a João de Barros, 1921. Leonardo Cazes [O Globo, 6 de Fevereiro de 2016] A publicação do livro Muito d’alma: Cartas de Paulo Barreto (João do Rio) a João de Barros. 1909-1921, enquadra-se www.clepul.eu Ciclo de Estudos Televisivos no trabalho desenvolvido pelas investigadoras Virginia Camilotti e Claudia Poncioni no âmbito do Grupo de Investigação 6 do CLEPUL. As 66 cartas, anotadas e comentadas, reunidas neste livro permitem-nos, não só, delinear um retrato multifacetado do carioca Paulo Barreto/João do Rio e do seu amigo português João de Barros, como reconstituir o con- texto cultural efervescente do século XX. Este livro torna-se uma referência sobre os mundos literário, jornalístico, dramatúrgico e artístico em geral, mesclando temas políticos, históricos e sociais que emergem no contexto da Primeira Guerra e da Primeira República. O CLEPUL conta realizar, em breve, o lançamento do livro em Portugal. 25 Frames por Segundo é o Primeiro Ciclo de Estudos dedicado exclusivamente à criação audiovisual para televisão. Nesta sua primeira edição tem como premissas os conceitos de identidade e registo. Organizado pelo Gabinete de Estudos de Cultura em Artes Performativas e Audiovisuais, área de investigação do Centro de Literaturas e Culturas Lusófonas e Europeias da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, em parceria com a Rádio e Televisão de Portugal, pre- tende ser um espaço de reflexão multidisciplinar. O ciclo decorrerá entre os meses de Março e Novembro de 2016. Encontra-se dividido, na sua primeira edição, em cinco áreas temáticas: 1) Teatro – Março; 2) Entretenimento – Abril; 3) Música e Dança – Maio; 4) Humor – Outubro; 5) Ficção - Novembro. Cada uma destas áreas será suportada pela apresentação de três criações audiovisuais, apresentadas individualmente www.clepul.eu 9 nas primeiras segundas-feiras do mês. Na última quinta-feira haverá uma sessão debate, com a presença de um painel de convidados, que desenvolverá o tema em destaque. Em 2017 prevemos a edição crítica das obras audiovisuais seleccionadas, entrecruzando a sua análise crítica com a identificação de áreas, figuras e temas, emblemáticos das Artes Audiovisuais. BILIÕES DE FRAMES DE CULTURA 10 David Mourão-Ferreira Teresa Martins Marques lança obra-chave sobre David Mourão-Ferreira A Biblioteca Nacional de Portugal celebrou, com casa cheia, em 24 de Fevereiro, o lançamento de Clave de Sol – Chave de Sombra. Memória e Inquietude em David Mourão-Ferreira (Âncora Editora), mais de 800 páginas em edição cuidada e elegante que nos aproximam, como nunca antes se fizera, quem, nesse dia, faria 89 anos. Após saudações da directora-geral da BNP, Inês Cordeiro, e do editor, António Baptista Lopes, Eugénio Lisboa, que arguira a tese de doutoramento (2011) donde sai este volume – agora muito acrescentado –, relevou a declinação da infância davidiana enfim tratada por quem, durante sete anos, dirigiu a organização do espólio do artista poliédrico, e nele perfilou angústias que o lugar-comum crítico só lia em clave solar. Fernando Pinto do Amaral, que orientara a tese, corroborou o fundo entendimento da estudiosa 1 sobre obra parcialmente inédita, onde se nos noticia um conjunto de peças inéditas e se faz a translação de romances tãosó esboçados para ficções éditas, num quadro histórico e de biografia pessoal (nunca privada, conhecesse ela embora os cadernos e diários íntimos do autor) que ilumina a futura reflexão sobre o poeta, contista, novelista, romancista, dramaturgo, crítico, ensaísta e tradutor – além de diseur, divulgador e professor universitário. Das palavras da autora, extractamos: «O meu primeiro contacto com a Obra de David Mourão-Ferreira ocorreu há 45 anos, em 1971, através da 2a edição da pequena antologia Lira de Bolso inserta na prestigiosa colecção Cadernos de Poesia, das Publicações Dom Quixote. Chamou a minha atenção, na contracapa, a citação de João Rui de Sousa: «. . . a coexistência do clássico e do moderno é uma das constantes da poesia de David Mourão-Ferreira.» Reparo agora que alguns dos poemas que mais me surpreendem na obra davidiana estavam já contidos na Lira de Bolso, nomeadamente o introdutório «Memória», que inconscientemente deve ter pesado na própria escolha do veio temático do presente livro. Malhas que a memória tece. [. . . ] O título intertextualiza os versos do poema In Memoriam Memoriae1 , com eles pretendendo mostrar a dupla face – celebrativa e agónica – da Obra poética davidiana, revelada como memória e inquietude: «És a clave do sol, és a chave da sombra, / És a pomba e o corvo. És a capa na fuga, / O encontro na rua, o tumulto no sono.» (p. 187) A Memória é considerada na poesia como profecia do futuro, missão, vocação, predestinação, destino, com origens na platónica noção de conhecimento poético como forma In Memoriam Memoriae, Lisboa, Edições Minotauro, 1962. www.clepul.eu 11 David Mourão-Ferreira de reconhecimento. O destino do sujeito será reviver um percurso-mapa que lhe é anterior, como na reminiscência platónica, como forma de fugir à tirania do tempo linear, destruindo a noção de limite, criando, em seu lugar, uma circularidade, um eterno retorno, que em vão pretende anular as noções de princípio e de fim. A função catártica da memória produz o olvido, consistindo a felicidade, não apenas na arte de lembrar o que deu prazer, mas essencialmente na arte de esquecer o que gerou sofrimento. O não esquecimento funciona como indutor de angústia pela insistente presentificação do vivido como remorso, bem visível nos três «Epigramas para uma Despedida» de A Secreta Viagem, como confitência expiatória («Confissão»), como arrependimento ou perdão. O ressentimento e o ciúme serão espinhos cravados na memória de quem não conseguiu esquecer. Outra face do espinho da memória é a melancolia, mesclada de saudade, www.clepul.eu nostalgia, fruto da majoração do passado, que tem como objectivo a plenitude da recordação, linha do horizonte sempre mais longe. Em 4 de Janeiro de 1946, o jovem David deixa registada num caderno de bolso o seguinte desiderato: «Se pudesse talhar a vida à minha maneira, haveria de ser um coleccionador de experiências.» É dessa colecção de experiências que a minha própria experiência de trabalho se talhou. Partindo da selecção dos textos passíveis de produção de unidades de sentido, procedi à aferição da coerência comunicante entre materiais éditos e inéditos. Por isso, o corpus deste estudo funciona como mosaico citacional dialogando em diversos registos nos vários géneros que configuram a obra davidiana e entre os materiais nãoliterários que nos permitem mapear um trabalho arqueológico com raízes na infância e adolescência. Não esquecendo que é o estudo intrínseco da obra da maturidade que fundamentalmente me in- teressa, entendi como meu dever, como incentivo para futuros trabalhos, dar a conhecer amostras de esboços de textos com razoável grau de finalização, fazendo anotações em rodapé de variantes, e também cartas, entrevistas, notas à margem de livros, sublinhados, com o célebre lápis grosso azul (que não era o da censura), bem como excertos de cadernos de bolso, respeitando princípios éticos e salvaguardando em absoluto a privacidade do autor e de todos os que com ele conviveram. Estuda-se a memória em clave de sol de celebração e testemunho no encontro das raízes, da tradição, da pertença a uma tribo. Estuda-se igualmente a memória em chave de sombra, nas suas múltiplas perdas: perda de confiança no outro, revelada no ciúme e na vingança; perda da estima de si, revelada na culpa e no remorso; perda de confiança em si, revelada no medo, na hesitação, na deriva. A memória é a clave que sinaliza na pauta poética davidiana a escala de tes- 12 situra de múltiplas vozes claras, umas, estridentes, outras, agudíssimas, todas. A memória é também a chave-mestra que abre várias portas de sentido da obra: na poesia, a celebração das raízes familiares e de alguns momentos de amor; o ciúme, de componente edipiana, em Um Amor Feliz; ciúme em versão paranóica na peça de teatro inédita O Crime; o ressentimento na primeira das novelas de Gaivotas em Terra, Tal e Qual o Que Era, e em alguns fragmentos do inconcluso romance Passagem do Purgatório; o remorso em O Viúvo; a vingança em Aos Costumes Disse Nada; a melancolia em diversos poemas e na peça de teatro Isolda; a morte como experiência-limite e forma de conhecimento, assim manifestada na peça de teatro inédita O Sétimo Dia da Criação; no conto Os Amantes, como visão panorâmica no limiar da morte, ainda como forma-limite de afirmação do Eu. A escrita decorre do próprio vaivém inter-obras como processo fundamen- David Mourão-Ferreira tal que permite dar conta da coerência e do trânsito entre temas e motivos, em processo de construção de uma memória interna mostrando alguns aspectos do processo de criação literária nomeadamente através de textos reciclados. Foi meu objectivo específico a focalização na análise da obra poética, ficcional e dramatúrgica, propondo algumas reflexões de leitura de sombra diferentes da leitura standard em clave de sol. A análise não se confina ao close reading, mas privilegia-o fundamentalmente no estudo da poesia. Chamo a atenção para as condições de produção dos textos, nomeadamente indicando datas da escrita poética que não constam da obra publicada, mas que traçam linhas de sentido entre os textos, reforçando a clareza da leitura. O conjunto de projectos que encontrei em suspenso formam uma constelação de fragmentos que labirinticamente se enredam uns nos outros, muitas vezes através de personagens comuns, outras vezes utilizando os mesmos nomes sem que a personagem pareça ser a mesma, funcionado como vasos comunicantes, que provêm da mesma fonte desaguando no mare magnum das formas gestantes, que nos revelam a oficina em plena laboração. Pretende-se ampliar o leque temático com novas linhas de leitura, dando relevo às polarizações da memória e da inquietude, manifestadas sob a forma de melancolia, indecisão, deriva, angústia, medo, suspeita, ciúme, traição, culpa, remorso, ameaça, vingança, agressão sexual, suicídio, e até mesmo assassínio, estes últimos particularmente evidenciados no teatro inédito guardado no espólio. Justamente o espólio é o lugar por excelência da íntima convivência entre o autor empírico e o autor textual, pois é aqui que a relação de implicação entre ambos sobremaneira se impõe. [. . . ] Defini como objectivo geral do meu livro a realização de um trabalho integrador da obra do autor, nas suas condições de produção e raízes motivacionais. Pretende- www.clepul.eu 13 David Mourão-Ferreira -se abrir novas linhas de leitura colocando o autor num patamar ainda mais alto, mostrando com a prática da leitura que a consabida frase – David, o poeta do amor e da mulher - é tão verdadeira como dizer que Paris é a Torre Eiffel. É preciso deixar a torre do erotismo e descer aos subterrâneos habitados pela inquietude, pela angústia, pelo medo da morte, que desenham a «súmula autobiográfica-lírica», confirme David designou em 1988 a Obra Poética, deixando bem clara a sua distanciação relativamente à redução da leitura à vertente erótica. A biografia profunda começa na infância, enquanto aspirante a escritor. Esses primeiros tentames no teatro revelam-se decisivos, como factores de auto-motivação na construção do futuro escritor. A biografia profunda de um escritor é uma realidade muito mais complexa do que a biografia factual. É factícia e fictícia, pois se constrói a partir do acontecido, do experienciado, do renegado mas também do desejado e nunca aconwww.clepul.eu tecido. É factícia, presa aos factos e fictícia como constructo da imaginação. Quando David afirma que tem perante a vida uma «atitude permanentemente literária», mostra uma verdade do domínio da ficcionalidade identitária, e situa-se ao nível de uma biografia profunda, ou seja institui o Sujeito que se revela na obra. Este Sujeito não é independente do homem, como a hera não é independente do tronco que a segura e de que se alimenta. Mas a hera não é o tronco da árvore, nem o Sujeito é David Mourão-Ferreira. Não estamos já no domínio do homem e da obra, mas numa translação entre ambos: o homem na obra e a obra no homem. Quem como Ulisses inicia uma incerta viagem está condenado à deriva antes de chegar a Ítaca. Por isso, encontrei uma linha unificadora do livro como viagem do Sujeito. Tomando como base o rendilhado de textos, que em muitos dias sofreu o destino da tapeçaria de Penélope, estabilizou-se à sombra de Ulisses que David elegeu como seu herói em resposta a um inquérito de 1962 incluído no volume de crónicas Discurso Directo (1969), cuja leitura o autor aconselhava como pórtico de leitura para o seu conhecimento. Esta eleição davidiana é já um aviso à ulissificação das relações sob o signo da persona, feita disfarce. E tudo o que é disfarce pressupõe de imediato um texto e um subtexto, uma superfície e uma profundidade. É, pois, sob o signo de Ulisses que se percorrem as dez etapas que simbolizam os dez anos que durou o cerco de Tróia, os dez anos que durou a viagem de Ulisses de regresso a Ítaca.» 14 Recensões Carlos Carranca, Casticismo em Unamuno e Torga, Lisboa, MinervaCoimbra, 2012 ISBN: 978-972-798-325-4 «O estudo que me proponho desenvolver, porque centrado na obra literária de dois dos mais significativos escritores ibéricos Miguel de Unamuno e Miguel Torga, tenderá para o entendimento da ideia de casticismo na obra do primeiro e consequentemente influência deste no poeta de S. Martinho de Anta, assim como na originalidade, alheia a qualquer influência do escrito basco. Não é, pois, propósito deste estudo fazer uma aproximação sistematizada do casticismo a nível histórico, social, regional e pessoal, mas tão-só descobrir, a partir da obra En torno al casticismo, de Miguel de Unamuno – sem deixar de visitar outros textos do autor que justifiquem e sirvam de fundamento ao desenvolvimento da tese –, a sua evolução no pensamento do Reitor de Salamanca, assim como as similitudes e diferenças que há na obra do escritor português que adoptou o pseudónimo de Miguel, rou- bado confessadamente a Unamuno e a Cervantes. Porque é sempre difícil, senão impossível, definir um povo, uma nação, seguiremos os passos destes dois caminheiros, peregrinos das respectivas pátrias, em busca da eternidade de ambas. Dessa peregrinação ficou-me a ideia de uma originalidade tecida no cruzamento de diversas influências culturais geradoras da tradição a que Unamuno chamou eterna. Unamuno e Torga reflectiram com tenacidade heróica sobre os problemas das suas pátrias e, sobretudo, sobre o que nelas muitos não tinham a coragem de discutir publicamente. Eles foram visionários, se não, mesmo profetas dos respectivos países, ao mesmo tempo que denunciavam as misérias e as falsas riquezas dos seus tempos. Formados ambos num catolicismo absolutista, dele se afastaram carregados de dúvidas, mas, sem prescindirem da sua presença tutelar, viveram agonica- mente. Unamuno afirmava preferir falar de Deus com gente simples. Torga era num cristianismo popular que encontrava sentido religioso. Há, em ambos, na atitude perante a vida, algumas semelhanças, ideias coincidentes, inclusive nas disposições mentais típicas da geração a que cada um pertenceu: Unamuno, membro da geração de 98 espanhol; Torga, da geração da revista Presença, a do 2.o Modernismo Português. [. . . ] Ambos são profundos sentidores. Daí o seu casticismo estar preso ao sentimento, que guardam pela pátria, trazida da infância. [Excerto da Introdução, p. 17-19] www.clepul.eu 15 Recensões Jacinto Jardim (coordenação), Brincadores de Sonhos – Roteiro para Docentes e Formadores, Lisboa, Theya, 2016 ISBN: 978-989-8814-23-4 «Educar para a participação plena na sociedade digital constitui o desafio maior para a Escola no tempo presente. É um desafio que se afirma, em particular, nas conceções e abordagens pedagógicas da educação para a mudança e a inovação e, deste modo, na valorização da cultura do empreendedorismo nas crianças. É assim, um desafio para construirmos a educação e a Escola do Futuro, a educação na sociedade da aprendizagem e do conhecimento em rede. Foi este o pensamento orientador do Projeto Empreende, para alunos dos 6 aos 12 anos, cujos resultados conduziram à elaboração da presente obra, Brincadores de Sonhos – Roteiro para Docentes e Formadores, coordenada por Jacinto Jardim. A obra apresenta-se como um roteiro de casos constituído por um conjunto de atividades dirigidas para a formação das crianças, www.clepul.eu os quais estão organizados a partir de três grupos de competências transversais orientadas para a valorização da cultura do empreendedorismo e, igualmente, da mudança e da inovação, nomeadamente nos domínios pessoal, social e profissional. Entre elas, salientamos a atenção dedicada ao autoconhecimento, à valorização do suporte social, à criatividade, à cooperação e à liderança. Para a construção das aprendizagens e do conhecimento em rede na sociedade digital é fundamental promover a sustentabilidade da educação em contextos e práticas sociais de cooperação e colaboração. E é esta a abordagem seguida pelos autores, ao estabelecerem um roteiro de casos e atividades que valoriza a criação da comunidade empreendedora. Tendo como ponto de partida o Castelo dos Sonhos, esta comunidade irá explorar, ao longo das atividades previstas para cada caso, os espaços deste Castelo, como a Sala dos Espelhos, a Fábrica dos Brinquedos, a Escada da Amizade, a Mesa da Partilha, o Farol e a Cave. É, deste modo, uma proposta inovadora para a aprendizagem partilhada, realizada no âmbito da comunidade, que assim se transforma numa comunidade empreendedora e criadora de conhecimento. Esta é uma obra inovadora pela proposta de trabalho que apresenta e que merece a maior divulgação junto das escolas pelo seu contributo para a mudança no pensamento e nas práticas da educação para a sociedade digital, nomeadamente através da promoção da aprendizagem partilhada e do conhecimento em rede enquanto meios para o desenvolvimento da cultura da inovação e do empreendedorismo nas crianças.» [Prefácio de Paulo Maria Bastos da Silva Dias] 16 Recensões Fernando Augusto de Figueiredo, Timor. A Presença Portuguesa (1769-1945), Lisboa, Centro de Estudos Históricos – Universidade Nova de Lisboa, 2011 ISBN: 978-989-97689-0-1 «Este estudo baseia-se numa dissertação de doutoramento com o mesmo título, apresentada à Faculdade de Letras da Universidade do Porto em 2004. Para efeitos de publicação, foi-lhe retirada a Parte I – Timor Timorense: A Terra e os Habitantes de Timor –, onde se fazia uma síntese acerca do espaço e das gentes que o habitavam. Foram-lhe também efectuadas as alterações julgadas convenientes, resultantes da opção por uma apresentação numa perspectiva de longa duração, e de uma reflexão posterior. Como o título sugere, este trabalho, visa, essencialmente, tratar os principais aspectos da presença portuguesa naquele território, e só indirectamente o que se relacione com Timor e os Timorenses. O interesse pela temática surgiu após a participação na História dos Portugueses no Extremo Oriente, tendo-me então apercebido de que, entre finais do século XVIII e o século XX havia ainda muito para fazer acerca da história da presença portuguesa em Timor. Dar um contributo nesse sentido tornou-se o objecto do presente estudo, delimitado cronologicamente entre 1769 e 1945, ou seja: desde a fixação da capital em Díli até ao final da ocupação estrangeira que teve lugar naquele território durante a Segunda Guerra Mundial. [. . . ] No Capítulo I – ‘Evolução Geopolítica’, procurar-se-á evidenciar: por um lado, como a Coroa portuguesa, face à ascensão do poderio holandês, já vinha dando mais atenção às possessões da Oceânia, tendo nomeado para aquele protectorado longínquo um governador civil no princípio do século XVIII, apesar de, nessa altura, todo o Estado da Índia se encontrar secundari- zado face ao Brasil; por outro, como, naquele território, tão periférico em termos geográficos e de interesse, 1769 encerrará um período da presença portuguesa na Oceânia, culminando uma perda de influência local, ante o avanço da principal rival colonial na região pelo último reduto: a ilha de Timor. [. . . ] No Capítulo II – ‘Administração e Justiça’, passar-se-ão em sequência as várias etapas em que se subdividiu a presença portuguesa, de modo a assinalar como a evolução do estatuto político-administrativo do território dependeu mais das modalidades de subordinação a que esteve sujeito do que das mudanças de regime ocorridas em Portugal continental, sobretudo enquanto àquele não for conferida autonomia. [. . . ] No Capítulo III – ‘Economia’, ver-se-á como o aproveitamento dos recurwww.clepul.eu 17 Recensões sos naturais sobretudo do sândalo e da cera davam importantes contributos para a vida das populações e a manutenção do território, principalmente até ao fim da primeira metade do século XIX. [. . . ] No capítulo IV – ’Finanças Públicas’, atender-se-á ao facto de este sector se mostrar sempre muito melindroso, a começar pelo uso da moeda e pela circulação no território de espécies nacionais e estrangeiras até ao es- tabelecimento de uma moeda única, nacional já nos alvores do século XX. [. . . ] No Capítulo V abordar-se-ão ‘Obras Públicas, Transportes e Comunicações’. [. . . ] A abordagem da complexa questão social, no Capítulo VI – ‘Sociedade’, considerará, naturalmente, os indígenas que constituíam a comunidade mais numerosa, e cuja organização se manterá praticamente intacta até ao princípio do século XX, embora tivesse que relacionar-se com a administração portuguesa e daí decorressem várias adaptações e um crescente assimilação. [. . . ] No Capítulo VII – ‘Missionação e Instrução Pública’, será abordada a complexa problemática religiosa, assim como a sua interligação com a instrução pública. [. . . ] No Capítulo VIII, tratar-se-á do sector da ‘Saúde e Assistência’.» [excerto da Introdução, p. 23-29] Pássaros de Asas Abertas. Antologia de Contos Angolanos, Margarida Gil dos Reis e António Quino (selecção), Lisboa, União dos Escritores Angolanos, Centro de Estudos Comparatistas – Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, A.23 Edições, 2016 «A iniciativa da União dos Escritores Angolanos de querer publicar uma antologia que reunisse alguns dos nomes de destaque da literatura angolana foi, desde logo, uma proposta que acolhemos com entusiasmo. Para além de poder ser importante no campo do ensino, havia ainda o desafio de que a selecção dos contos se pautasse quer em critérios académicos quer em crité- www.clepul.eu rios de gosto e qualidade. Para quem como nós está tão próximo da universidade, o desafio tornava-se assim ainda mais aliciante. É certo que academicamente o conceito de ‘qualidade’ é sempre relativo, mas como leitores que somos esta selecção de textos teve um prazer acrescido. Caberá ao leitor avaliar se nos saímos bem nesta tarefa. Como um pássaro de asas abertas, o enorme acervo literário levou-nos a sobrevoar textos de trinta e seis escritores, todos eles maioritariamente vivos, que contribuíram também com vários textos inéditos. Por isso, a antologia segue um critério alfabético, dando espaço a cada um dos textos não por se terem revelado numa determinada baliza temporal mas por, na nossa opinião, serem 18 determinantes para conhecer a escrita e o estilo de cada autor. Para além da ideia de construção de uma Nação literária, com pontos de transformação e de ruptura, a literatura angolana exprime, tal como o voo de um pássaro de asas abertas, um pensamento em transformação, multi-cultural, repleto de novas opções estéticas. Essa riqueza está presente desde logo na obra de Agostinho Neto um dos mais importantes intelectuais ligados ao movimento de Mensagem que abre esta antologia, ou a Uanhenga Xitu que, mesmo se tendo apenas revelado como escritor em 1974, teve um importante papel na divulgação polifónica das ‘vozes da sanzala’. Por isso, vários são os voos destes pássaros de asas abertas, transformados em temas que encontramos nesta antologia, significativos também da diversidade temática da literatura angolana: o imaginário mítico e a reelaboração do fantástico, o permanente diálogo entre as estórias e a História (António Fonseca, Arnaldo Santos, Boaventura Car- Recensões doso, Dya Kasembe, Fragata de Morais, Henrique Guerra, João Melo, Pepetela, Zethro Cunha Gonçalves); a cidade, espaço de tessituras tão diversas que denuncia assimetrias na própria sociedade, e o seu quotidiano (Albino Carlos, Henrique Abranches, Jacques dos Santos, José Luís Mendonça, Luís Fernando, Ondjaki, Roderick Nehone); a memória individual e colectiva (Carmo Neto, Décio Bettencourt Mateus, Isaquiel Cori, José Eduardo Agualusa, Luandino Vieira, Raul David); os laços de família, a mulher (Chó do Guri, Dario de Melo, Eduardo Bettencourt Pinto. F. Tchikondo, Gociante Patisssa, Ismael Mateus, Jofre Rocha, Marta Santos, Namibiano Ferreira, Paula Tavares, Sónia Gomes) ou o ímpar apego telúrico de Ruy Duarte de Carvalho. Esperamos, assim, que esta antologia leve o leitor a viajar, como um pássaro planando de asas abertas sobre o seu ficcionado mundo; que seja um instrumento valioso para o estudo do conto e da literatura angolana, sobretudo no que diz respeito às instituições de ensino dentro e fora de Angola que utilizam a língua portuguesa como veículo. Porque a língua portuguesa é também isso mesmo: um pássaro de asas abertas. Na baliza de um imaginário voo, os escritores transpuseram limites da língua para a enriquecer sem a macular. As asas abertas de um pássaro atraem tudo o que pode simbolizar a liberdade. E a liberdade convoca tudo o que pode simbolizar a literatura. NAMUTU VIU OS GRANDES PÁSSAROS de asas abertas passarem o cabo que abrigava a baía [excerto do Prefácio de Margarida Gil dos Reis e António Quino] www.clepul.eu 19 Recensões Ernesto Rodrigues (selecção e fixação do texto), Os Noivos, Lisboa, Âncora Editora, 2016 ISBN: 978-972-780-534-1 Trinta e um poemas de 26 autores nascidos entre 1392 e 1956 compõem a antologia Os Noivos, com selecção e fixação do texto de Ernesto Rodrigues. Não se trata somente de poemas de amor, que todos são; mas, desde o século XVII, encontramos a figuração do casal futuro, seja em nota disfórica, senão humorística, ou em reunião de vontades felizes. O interesse pelo tema recresce no século XIX, com larga cópia na Imprensa periódica (também aqui representada), embora a qualidade do verso nem sempre atinja altura lírica. Artistas maiores, todavia, resgatam, e eternizam, o estado noival. Ana Paula Tavares, Manuel Jorge Marmelo, Ondjaki, Paulinho Assunção, Verbetes para Um Dicionário Afetivo, Lisboa, Caminho, 2016 ISBN: 978-972-21-2787-51 AFAZERES Ana Paula Tavares Sempre que olhava as mãos da avó, pequenas, magras, nodosas, cheias das marcas do tempo, tudo me parecia bem, uma calma tranquila descia sobre mim, porque sabia que nada ia mudar: os dias e as noites, as fases da lua e os ciclos do milho. Havia uma relação direta www.clepul.eu entre as mãos da avó e o verbo fazer, tão diligentes eram essas mãos, na sua capacidade de multiplicar as coisas para depois as dividir rigorosamente, em partes iguais, por todos os membros da família. Ninguém como ela, quando a madrugada chegava pé ante pé, fazia o pão, deixando voar as mãos pela massa entretanto lêveda (durante a noite e depois da avó ter feito o milagre de misturar água e farinha com fermento, operações dos deuses tinham feito a massa branca transbordar do alguidar de barro). A avó fazia o pão, que, uma vez cozido no forno de lenha, espalhava pelo quintal e pela aldeia os mil sabores da abundância, o conforto do pão quente logo de manhã. A avó usava as mãos para dar existência às nossas vidas fazendo com que as 20 Seminários feridas se curassem bem como as febres, as dores e todos os males em geral. A avó fazia a vida todos os dias, inventando comida, transformando a roupa velha dos grandes em roupa nova dos pequenos (um vestido grande, dois pequenos, golas velhas depois de viradas ficavam novas, bordados a disfarçar remendos). De uma coisa tenho a certeza: avó fazia a terra, porque só ela conseguia amansar terra seca, vermelha e pobre em chão de batata e mandioca, gimboa e capim. Não sei como era, mas que tudo estava ligado às mãos da avó e ao verbo fazer estava. MINI-CURSO 8 e 9 de Março Fernanda Santos, «O Brasil na obra de Ruy Duarte de Carvalho Des- medida, Luanda-São Paulo-São Francisco e Volta: relatos de viagem», no âmbito da II Feira Li- terária Brasil-África de Vitória (Brasil) SEMINÁRIOS À HORA DE ALMOÇO 20 de Janeiro Sessão LXXV: Maria Eunice Moreira, «Nos limites do impossível: contos gardelianos de Aldyr G. Schlee» 12 de Fevereiro Sessão LXXVIII: Maria Lêda Oliveira, «A autobiografia de um baiano de Setecentos que queria ser papa» 9 de Março Sessão LXXXI: Luciana Deplagne, «Christine de Pizan e Olympe de Gouges: duas escritoras feministas avant la lettre» 3 de Fevereiro Sessão LXXVI: Alvaro Santos Simões Junior, «O decadentismo português na óptica do periodismo carioca» 25 de Fevereiro Sessão LXXIX: Carlos Alves, «Angola: política e relações externas» 23 de Março Sessão LXXXII: Márcia Jardim Rodrigues e Marcelino da Costa Alves Júnior 29 de Fevereiro Sessão LXXX: Stephen Croucher, «Development, state of and future of intercultural communication» 30 de Março Sessão LXXXIII: Gabriela Silva, «A literatura contemporânea portuguesa: novas identidades de escrita» 10 de Fevereiro Sessão LXXVII: Diamantino Antunes, «O processo de missionação cristã e as relações Europa-África» www.clepul.eu 21 Congressos CONGRESSOS 3 e 4 de Fevereiro FLUL: Colóquio Internacional 1916-2016: 100 / Exílio & Centauro – Modernismo em Revista(s) 18 de Fevereiro Sala do Senado, Campus Universitário da Penteada (Universidade da Madeira): V Encontro do Clube de Leitura «Na companhia das vozes dos poetas – Ao Encontro de Bocage» 18 e 19 de Fevereiro FLUL: I Jornadas de Investigação Artística Transdisciplinar e Arts-Based Research 18, 19 e 22 de Fevereiro Academia Mineira de Letras, Faculdade de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais e Real Gabinete Português de Leitura: IV Encontro Luso-Afro-Brasileiro As Mulheres e a Imprensa Periódica 22, 23 e 24 de Fevereiro Colégio do Espírito Santo (Universidade de Évora), Palácio da Independência e Faculdade de Letras da Universidade do Porto: «O Pensamento»: Simpósio de Homenagem a Manuel Ferreira Patrício 22 a 27 de Fevereiro Fundação O Século: 2.o Encontro de Literatura Infanto-Juvenil da Lusofonia 25 de Fevereiro Cinema São Jorge: apresentação do I Ciclo de Estudos Televisivos «25 Frames por Segundo» COMUNICAÇÕES E CONFERÊNCIAS 28 de Janeiro Sala Adriano Moreira da Sociedade de Geografia de Lisboa: Augusto Moutinho Borges, «Assistência na Universidade de Évora: O Hospital dos Estudantes», numa iniciativa promovida pela Secção de História da Medicina da SGL 12 de Fevereiro Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa: Rui Costa Pinto, «Ceuta: da Primeira República ao Estado Novo. Aspectos www.clepul.eu iconográficos e historiográficos», no âmbito do Workshop «A propósito de Ceuta» 13 de Fevereiro Casa-Museu Doutor Anastácio Gonçalves, Lisboa: Ernesto Rodrigues, «Alexandre Herculano: a primeira tarde da nacionalidade» Galeria Cultural do Banco de Portugal, Setúbal: Ernesto Rodrigues, «Elmano e Bocage» 17 de Fevereiro Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa: Sofia A. Carvalho, «O terrível mistério de Diotima: considerações sobre ascese e imaginação em Agostinho da Silva e Friedrich Hölderlin»; Manuel Gandra, «A Terceira Revelação»; Pedro Vistas, «’Antes teor que teorema’: do amor pela sabedoria à Sabedoria do Amor» e Miguel Real, «Agostinho da Silva e o Providencialismo Português do Século XX» no âmbito do Congresso Internacional «Agostinho da Silva: 22 Pensador Universal do Tempo Presente» 18 de Fevereiro Academia Mineira de Letras: Ana Maria Lisboa de Mello, «A presença de Cecília Meireles na imprensa periódica», no âmbito do IV Encontro Luso-Afro-Brasileiro As Mulheres e a Imprensa Periódica Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa: Beatriz Portugal, «Teoria e Prática da Performance — para uma experiência da História»; Alicia Soto, «La dramaturgia en la creación transdisciplinar», no âmbito das I Jornadas de Investigação Artística Transdisciplinar e Arts-Based Research 18 e 25 de Fevereiro Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa: José Pedro Serra abordou o pensamento e a obra de George Steiner no âmbito do Curso Livre Marcos do Pensamento no Século XX – II Série 19 de Fevereiro Faculdade de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais: Bernardette Capelo-Pereira, «Guiomar Torresão» e Congressos Vania Chaves e Isabel Lousada, «As Senhoras do Almanaque: coleção, volumes e formatos», no âmbito do IV Encontro Luso-Afro-Brasileiro As Mulheres e a Imprensa Periódica Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa: Lara Pires, «Sobre o fazer e o ver: outras relações de uma investigação baseada na prática artística»; Sezen Tonguz, «Pratica de transdisciplinaridade na criação artística — exemplo de projeto coletivo ’Holding it together’ (performance/instalação)»; Júlio Martín da Fonseca, «‘Apéro Dada’ 100 anos de ‘O imperador da China’ de Georges Ribemont-Dessaignes e do Movimento Dada»; Pedro Sena Nunes, «Abordagem ao território de cruzamento da imagem videográfica com a do corpo com e sem deficiência — a experiência de ‘Mergulho’», no âmbito das I Jornadas de Investigação Artística Transdisciplinar e Arts-Based Research 22 de Fevereiro Real Gabinete Português de Leitura: Gilda Santos, «A recepção do Pro- jeto ‘Senhoras do Almanaque’»; Vania Chaves e Isabel Lousada, «As Senhoras do Almanaque: coleção, volumes e formatos»; Maria Eunice Moreira, «Escritora Cândida Fortes»; Constância Lima Duarte, «As senhoras mineiras no Almanaque: descobertas e impasses de uma pesquisa», no âmbito do IV Encontro Luso-Afro-Brasileiro As Mulheres e a Imprensa Periódica 24 de Fevereiro Sala Antão de Almada (Palácio da Independência): Sofia A. Carvalho, «Detonação espantosa da gramática: considerações sobre o estado musical em Teixeira de Pascoaes», no âmbito do Simpósio de Homenagem a Manuel Ferreira Patrício: «O Pensamento» 25 de Fevereiro Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa: Maria da Conceição Neto, «A memória como matéria inflamável: a propósito do filme angolano Independência, produzido pela Associação Tchiweka de Documentação e a Geração 80, e realizado por Mário Bastos» www.clepul.eu 23 Apresentação de livros FNAC Colombo: «Grandes Obras de 2015», com António Castro Henriques, José Eduardo Franco, Pedro Calafate e Susana Alves Jesus, iniciativa integrada no ciclo Academia(s) em Interface 27 de Fevereiro Casa do Povo de Cabrela: Leonor Dias e Só- nia Bombico, «Cabrela no tempo de D. Manuel I: História de um Foral» 3 a 10 de Março Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa: José Miranda Justo aborda o pensamento e a obra de Gilles Deleuze no âmbito do Curso Livre Marcos do Pensamento no Século XX – II Série 17 e 31 de Março Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa: Teresa Seruya aborda o pensamento e a obra de Zygmunt Bauman no âmbito do Curso Livre Marcos do Pensamento no Século XX – II Série APRESENTAÇÃO DE LIVROS 5 de Fevereiro Biblioteca Municipal Gustavo Pinto Lopes (Torres Novas): É perigoso sintetizar a Idade Média – Literatura Medieval e Interfaces Europeias na Obra de Mário Martins, de Maria Isabel Morán Cabanas e José Eduardo Franco, apresentado por Guilherme d’Oliveira Martins 8 de Fevereiro Paulus Livraria de Fátima: Caminhos de vida consagrada, de Aires Gameiro, apresentado por D. Serafim Ferreira e Silva e Pe. Alberto Mendes 11 de Fevereiro Atelier Museu Júlio Pomar: Álvaro Siza: Anotações à Margem, de Nuno www.clepul.eu Higino, apresentado por João Oliveira Duarte 24 de Fevereiro Biblioteca Nacional de Portugal: Memória e Inquietude em David Mourão-Ferreira, Clave de Sol — Chave de Sombra, de Teresa Martins Marques, apresentado por Eugénio Lisboa e Fernando Pinto do Amaral e leitura de poemas de David Mourão-Ferreira por Maria Paula Mendes 25 de Fevereiro Correntes d’Escrita, Póvoa de Varzim: Memória e Inquietude em David Mourão-Ferreira, Clave de Sol — Chave de Sombra, de Teresa Martins Marques, apresentado por José Carlos Vasconcelos 6 de Março Salão Nobre da Câmara Municipal da Póvoa de Varzim: Obra Selecta, tomo II, volume II – Religião, Política e Sociedade, de João Francisco Marques, apresentado por José Eduardo Franco 7 de Março Escola do Serviço de Saúde Militar: Azulejaria de S. João de Deus em Portugal, História e Arte, de Augusto Moutinho Borges, apresentado por Barros Veloso 9 de Março FNAC do Oeiras Parque: Chorei de Véspera, de Isabel Nery, apresentado por Eugénio Lisboa, com leitura dramatizada de Maria de Almeida 24 GECAPA I Jornadas de Investigação Artística Transdisciplinar e Arts-Based Research www.clepul.eu