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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO
CENTRO DE TECNOLOGIA E GEOCIÊNCIAS
DEPARTAMENTO DE OCEANOGRAFIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM OCEANOGRAFIA
DISTRIBUIÇÃO, STATUS DE CONSERVAÇÃO E ASPECTOS
TRADICIONAIS DO PEIXE-BOI MARINHO (Trichechus
manatus manatus) NO LITORAL NORTE DO BRASIL.
FÁBIA DE OLIVEIRA LUNA
RECIFE
2001
FÁBIA DE OLIVEIRA LUNA
DISTRIBUIÇÃO, STATUS DE CONSERVAÇÃO E ASPECTOS
TRADICIONAIS DO PEIXE-BOI MARINHO (Trichechus
manatus manatus) NO LITORAL NORTE DO BRASIL.
Dissertação apresentada ao Programa
de Pós-Graduação em Oceanografia da
Universidade Federal de Pernambuco,
como requisito parcial para obtenção
do grau de Mestre em Ciências na área
de Oceanografia Biótica.
Orientador: Dr. José Zanon de Oliveira Passavante
Co-orientador: Dr. Cassiano Monteiro Neto
Recife
2001
FÁBIA DE OLIVEIRA LUNA
DISTRIBUIÇÃO, STATUS DE CONSERVAÇÃO E ASPECTOS
TRADICIONAIS DO PEIXE-BOI MARINHO (Trichechus
manatus manatus) NO LITORAL NORTE DO BRASIL.
Dissertação defendida e aprovada pela banca examinadora:
Dr. José Zanon de Oliveira Passavante (Orientador)
Ph.d. Miriam Marmontel
Dr. Fernando Antônio Nascimento Feitosa
Suplentes:
Dr. Antônio da Silva Souto
Dra. Sigrid Neumann- Leitão
Data da aprovação: 22/02/2001
Recife
2001
Luna, Fábia de Oliveira
Distribuição, status de conservação e aspectos
tradicionais do peixe-boi marinho (Trichechus
manatus manatus) / Fábia de Oliveira Luna. Recife:
O Autor, 2001.
Viii, 122 folhas: il., fig., tab., mapas.
Dissertação (mestrado) – Universidade Federal
de Pernambuco. CTG. Oceanografia Biótica, 2001.
Inclui bibliografia, anexo e glossário.
1. Peixe-boi marinho (Trichechus manatus
manatus) – Distribuição e status de conservação.
2. Peixe-boi amazônico – Ocorrência. 3. Mamíferos
Aquáticos. 4. Peixe-boi (Sirenios) – Caça e
utilização. 5. Sirenia:Mammalia. I. Título.
599.55
599.55
CDU (2.ed.)
CDU (21.ed.)
UFPE
BC2001-025
AGRADECIMENTOS
Este trabalho só foi possível devido ao incentivo, à colaboração e à participação direta ou
indireta das seguintes instituições e pessoas às quais manifesto meus sinceros agradecimentos:
•
Ao Centro Mamíferos Aquáticos/IBAMA pelo acesso ao seu banco de dados, de imagens, e
acervo bibliográfico;
•
À Fundação Mamíferos Marinhos e Fundação O Boticário de Proteção à Natureza pelo
financiamento das expedições ao longo do litoral norte;
•
Às superintendências do IBAMA nos Estados do Maranhão, Pará e Amapá, que apoiaram a
equipe técnica na realização das expedições;
•
A CAPES pelo apoio através da bolsa de mestrado;
•
A UFPE, em especial ao Departamento de Oceanografia, por me acolher durante três anos;
•
Ao Prof. Dr. José Zanon de Oliveira Passavante, pela segura e dedicada orientação, e pelo
empenho em transmitir os conhecimentos indispensáveis na elaboração da presente
dissertação, pela cordialidade, e por mais uma vez ter orientado e apoiado um trabalho em
prol dos peixes-bois;
•
Ao Prof. Dr. Cassiano Monteiro, por sua co-orientação;
•
Ao M.Sc. Régis Pinto de Lima, pela amizade, relevante colaboração, orientação e
transmissão de conhecimentos técnicos e científicos intensivamente vivenciados através do
contato com o peixe-boi no seu habitat natural e nas bases executoras do Projeto PeixeBoi/IBAMA;
•
A todos os pescadores e população ribeirinha que acolheu a equipe do Centro PeixeBoi/IBAMA na fase de pesquisa e levantamento dos dados, oferecendo informações
fidedignas de importância fundamental para conservação do peixe-boi;
•
Ao Prof. Dr. Paulo de Paula Mendes, pelas horas dedicadas à minha orientação, e à decidida
contribuição e colaboração no tratamento dos dados estatísticos, que permitiram inferências
conclusivas na presente dissertação;
•
A todos que fizeram o Centro Peixe-Boi nos anos de 1992 e 1993, que ao percorrerem o
extenso litoral norte em busca de informações sobre o peixe-boi, montaram parte do imenso
banco de dados e de imagens do atual CMA/IBAMA. Parte esta, utilizada neste trabalho;
•
A todos que fazem o CMA/IBAMA, em especial: Régis, Sóstenes, Mariá, Zé Maria,
Gerônimo, Milton, Carolina, Denise, Marcela, Aparecida, Cibele, Lenilza, Jõao, Márcio,
Miranda, que colaboraram, cada um de alguma maneira, na fase final desta dissertação;
•
À Jociery Vergara e Cristiano Parente, que me apoiaram desde o início desta dissertação, e
pela amizade;
•
A Vivyanne e Sérgio, pela amizade e apoio na fase final da dissertação;
•
Aos professores Dra. Sigrid Neumann-Leitão e Dr. Fernando Feitosa pelo incentivo, apoio, e
exemplo de vida que me deram desde o início do mestrado;
•
Aos professores Lília Santos, Paulo Santos, Maria da Glória Cunha, Lúcia Gusmão, Kátia
Muniz, Antônio Lemos, Ralf, Athiê e todos que me apoiaram na elaboração de uma
dissertação com mamíferos aquáticos;
•
À Myrna Medeiros Lins, sempre à disposição, seja para esclarecer dúvidas sobre o
regulamento do mestrado, sobre horários e disciplinas, emitir um documento, entre outros, ou
seja, auxiliando no decorrer do mestrado;
•
A todos os meus colegas de turma, com os quais passei bons momentos na fase das
disciplinas: Romero, Isabela, Ana Paula, Mauro, Enaide, Ivone, José Edson, Sonali, Iara,
Cristiane, Elizabete e Marinaldo; e de outras turmas: Janaína, Márcia, Mônica, Silvania,
Geber, Aradi, Cláudia, Gracia, Dilma, Renaldo, Flávia, Andréa, Elisângela, Fernando Porto,
Nilson, Fatinha, entre outros;
•
A Karine e Alfredo, pelo incentivo em realizar um trabalho com o peixe-boi;
•
A Nilson por ser meu porta voz no colegiado;
•
A Simone e Susmara pelo apoio e interesse;
•
A Janaína Araújo, Ana Paula Losada, Isabela Galvão, Mauro Moura, Sonali, e José Edson
pela enorme amizade que fizemos durante o curso;
•
Ao membros da banca examinadora, pelas valiosas sugestões para a melhora deste trabalho;
•
Aos professores Dr. Fernando Rosas e Dr. Fabrício Santos, pela ajuda nas correções finais;
•
A Henrique Pontual e Evaldo Altino, e respectivas famílias, pelas “mágicas” e ajudas na área
da computação, e pela elaboração dos mapas e figuras;
•
Aos meus sogros Zélia e Dionísio;
•
A Niso, Marta, Graça e Alessandro pelo apoio e acolhida durante minha estada no Maranhão;
•
A Juliana Vianna, que se “infiltrou” como irmã “quase” caçula, e me ajudou na fase final
desta dissertação;
•
Aos meus irmãos: Alexandre, Daniela e Bárbara que me acompanham nesta caminhada
desde pequenos;
•
Aos meus pais Edvaldo e Virgínia, pelo incentivo, apoio, colaboração, paciência, amor, em
fim, por tudo;
•
•
Ao meu marido Paulo Vieira, pela dedicação e amor;
A Deus.
Finalmente, rendo carinhosa homenagem e gratidão ao peixe-boi, que pelo seu dócil e
amistoso comportamento em muito pode contribuir, como exemplo, para o melhor entendimento
entre os homens.
Aos meus pais
Edvaldo e Virgínia,
pela dedicação, carinho e estímulo,
e
ao meu marido
Paulo,
pela ajuda e companheirismo
“Chegará um dia em que o homem
conhecerá o íntimo de um animal,
e neste dia todo crime contra um
animal será um crime contra a
humanidade.”
Leonardo da Vinci
RESUMO
O peixe-boi marinho (Trichechus manatus manatus) é o mamífero aquático mais ameaçado
de extinção do Brasil. A caça predatória desde os tempos da colonização, sua reprodução lenta, e a
destruição de seu habitat, tornam sua conservação mais difícil. Em 1992 e 1993, foi realizado um
levantamento no litoral dos Estados do Maranhão (MA), Pará (PA) e Amapá (AP), com o objetivo
de identificar a distribuição, a ocorrência, e a pressão de caça do peixe-boi marinho, determinando
o status de conservação da espécie no litoral norte do Brasil. Foram percorridos 3000km, visitadas
145 localidades, e realizadas 262 entrevistas. Os entrevistados foram pessoas envolvidas em
atividades de pesca, preferencialmente que já caçaram o animal. Por critérios ambientais o litoral
do MA foi considerado norte, junto com PA e AP, sendo estes, divididos em cinco regiões
ecológicas: RI - Delta do Parnaíba e Lençóis Maranhenses; RII - Golfão Maranhense; RIII Reentrâncias do MA e do PA; RIV - Golfão Amazônico; RV - Litoral do Amapá. A espécie não
ocorre na RI. A RII apresentou a maior ocorrência, com número médio de 30 peixes-bois em Porto
Grande/MA e 14 em Axuí/MA. Na RIII a espécie ocorre em muitas localidades, com maiores
médias em: Marapanim/PA 6,6 e Alcântara/MA 4,5, porém, foram encontradas descontinuidades
nesta região, descontinuidades, estas, não esperadas, devido às características das reentrâncias.
Localizada na foz dos rios Amazonas e Pará, a RIV recebe um volume imenso de água doce,
oferecendo condições mais favoráveis ao peixe-boi amazônico (Trichechus inunguis), e a
ocorrência do peixe-boi marinho foi em poucas localidades, nas margens do rio Pará, onde a água
do mar penetra. Estas localidades são as únicas do mundo que propiciam a ocorrência de duas
espécies de sirênios. Na RV, a espécie ocorre em várias localidades, com médias menores: 4,0 em
Goiabal/AP e 3,6 no Oiapoque/AP. Moradores antigos informaram que o animal já ocorreu em
localidades que não ocorrem mais, havendo indícios que a pressão de caça nestas provocou a
extinção local da espécie. A abundância estimada foi de apenas 207 peixes-bois marinhos. Foram
estabelecidas correlações do número de peixes-bois com quatro variáveis independentes: regiões;
ambientes de rio, mar e estuário; disponibilidade de alimento; e nível de degradação ambiental. RI
e RIV, são significativamente diferentes, entre si, (p≤0,05) e entre as RII, RIII e RV, que são
significativamente iguais (p≥0,05). Há diferença significativa (p≤0,05) entre o ambiente de
estuário com os de rio e mar, que são iguais (p≥0,05), com maior ocorrência nos estuários. Locais
com e sem alimento são significativamente diferentes (p≤0,05), sendo 2.200 vezes maior, a
ocorrência, aonde há alimento. Não há diferença significativa entre ambientes com degradação
baixa, média ou alta, devido à preservação deste litoral. A captura seguida de morte intencional foi
responsável por 94,07% da mortalidade, e o encalhe por 5,93%. O encalhe de filhotes representou
0,91% dos animais avistados pelos entrevistados. A captura intencional é um fator ainda muito
forte na mortalidade do peixe-boi, tendo a caça com arpão ocorrido em 86,38% das capturas
(técnica difícil, que requer paciência, habilidade, e é passada de geração em geração). O maior
número de capturas ocorreu na RV, seguida pela RIII e RII. A captura foi em 63,83% para
alimentação, e em 30,64% para alimentação e comércio, registrando-se a utilização de partes do
animal para fins diversos (remédio, fetiches, simpatias). Devido a: distribuição descontínua,
abundância pequena, e grande pressão de caça, confirma-se o status, do peixe-boi marinho, de
criticamente ameaçado à extinção neste litoral. A compreensão dos costumes das comunidades no
que tange ao animal, foi importante para proposição de estratégias de conservação da espécie, e
sugestões de alternativas de subsistência para a população. A descontinuidade de ocorrência
reforça a hipótese de que peixes-bois não realizam grandes migrações no litoral brasileiro, e
sugere isolamento de grupos remanescentes. A ocorrência de duas espécies na RIV, sugere
simpatria e existência de híbridos. Há necessidade de estudos biológicos e genéticos para
confirmar ou negar tais hipóteses.
ABSTRACT
The Antillean manatee (Trichechus manatus manatus) is now considered the most
endangered aquatic mammal of Brazil. The predatory hunting since the colonization period, its
low reproductive rate, increasing habitat destruction make more difficult its conservation. From
1992 to 1993, it was performed a coastal survey of the Maranhão (MA), Pará (PA) and Amapá
(AP) States aiming to identify the distribution, occurrence and hunting pressure on the species, to
determine its conservation status on the Brazilian north coast. We surveyed 3000 km including
145 localities and performed 262 interviews. The people interviewed were involved in fishing
activities, preferably the ones that used to hunt manatees. According to environmental criteria the
coast of MA was considered North together PA and AP States, which were further divided in
five ecological regions: RI - Parnaíba river delta and Lençóis Maranhenses; RII - Golfão
Maranhense; RIII- Reentrâncias of MA and PA; RIV - Golfão Amazônico; RV- Amapá
coastline. The species doesn’t occur in the RI region. RII showed the major occurrence
concentration, with an average number of 30 animals in Porto Grande and 14 in Axuí. RIII
shows the species occurrence in many localities, with the highest averages in: Marapanin/PA 6.6
and Alcântara/MA 4.5; however we found discontinuous areas of the species in the Reentrâncias.
These discontinuities were not expected, owing to the characteristics of Reentrâncias. Located in
the mouth of Amazonas and Pará rivers, RIV receives a great volume of freshwater, offering
more favorable conditions to the Amazonian manatee’s (Trichechus inunguis), and the
occurrence of the Antillean manatee was registered in few localities where the sea waters
penetrate on the Pará river. RIV is the only region in the world that propitiate the occurrence of
two sirenian species in simpatry. RV shows the species occurring in many visited localities, but
with lower average numbers: 4.0 in Goiabal/AP and 3.6 in Oiapoque/AP. Information from the
ancient local inhabitants indicate that these animals used to occur in localities where they are not
found anymore, so that likely the great hunting pressure caused the local species extinction. The
estimated abundance was only 207 Antillean manatees. We established correlation of the number
of manatees with four independent variables: region; river, sea and estuary environment; food
availability; and level of environment degradation. RI and RIV are significantly different
(p≤0.05) from each other, and from RII, III and V, so that the latter ones are not significantly
different (p≥0.05). There are significant differences between the estuary environment (p≤0.05)
compared to river and sea (p≥0.05), with higher occurrence in estuaries. Localities with and
without food availability displayed significant differences (p≤0.05), where the occurrence was
2,200 times higher where food was available. There are no significant differences between
environments with low, medium or high degradation, because of the habitat preservation in these
coasts. The catch followed by intentional death was responsible for 94.07% of the mortality
cases, while stranded animals on the beach represented 5.93% of the cases. The calves
represented 0.91% of animals viewed by interviewed people. The intentional catch is still a
strong factor in the manatee mortality, so that hunting with harpoon occurred in 86.38% of
catches (this is the most difficult technique, requesting patience and hability, being passed from
generation to generation). The highest number of captured animals occurred in RV, followed by
III and II. The animals’ destinations after capture were hunter’s subsistence (63.83%) and human
consumption and trading (30.64%), and the animal’s parts were used for diverse purposes
(medicine, fetish and santerias). Due to the discontinuous distribution, low estimated abundance,
and the great hunting pressure, we confirmed a critical endangered status of extinction to the
Antillean manatee on this coastline. The understanding of the communities customs concerning
to the animals was important for the proposal of the species conservation strategies, and for
suggesting alternative ways of population subsistence. The discontinuity of occurrence
intensifies the hypothesis that this species does not perform great migrations along the Brazilian
coastline and suggests the isolation of small remaining groups. The occurrence of both species in
RIV suggests simpatry and existence of hybrids. Biological and genetic studies are necessary to
confirm this hypothesis.
SUMÁRIO
PÁGINA
LISTA DE FIGURAS ...................................................................................... IV
LISTA DE TABELAS .....................................................................................
VII
1 – INTRODUÇÃO .......................................................................................... 01
1.1 Os sirênios ..................................................................................................................................... 01
1.2 Histórico do peixe-boi no Brasil .................................................................................................. 03
1.3 A conservação do peixe-boi no Brasil .......................................................................................... 07
1.4 Objetivos ....................................................................................................................................... 10
1.5 Justificativa da pesquisa ................................................................................................................ 11
1.6 Hipóteses ....................................................................................................................................... 11
1.7 Pressupostos conceituais ............................................................................................................... 12
2 - DESCRIÇÃO DA ÁREA .............................................................................. 13
2.1 – O povoamento da Zona Costeira do Brasil ............................................................................... 15
2.2 - Características físico-naturais da Planície Costeira .................................................................... 16
2.3 – Regiões estudadas ..................................................................................................................... 17
3 - MATERIAL E MÉTODOS ........................................................................... 30
4 – RESULTADOS ............................................................................... 38
4.1 – Quanto às características da investigação ................................................................................... 38
4.1.1 - Esforço de investigação ..................................................................................... 38
4.1.2 – Perfil dos entrevistados ..................................................................................... 39
4.1.3 – Quanto ao entrevistado conhecer o peixe-boi marinho .................................... 41
4.2 – Quanto à distribuição do peixe-boi ............................................................................... 48
4.2.1 - Distribuição ao longo da área investigada ......................................................... 48
4.2.2 – Distribuição em função da região, tipo de ambiente, disponibilidade de
alimento e nível de degradação ambiental ............................................................................. 55
4.3 – Quanto a aspectos relevantes do status de conservação do peixe-boi ao longo do
litoral do Maranhão, Pará e Amapá ............................................................................ 57
4.3.1 – Quanto à estimativa de abundância .................................................................. 57
4.3.2 - Quanto à captura do peixe-boi ........................................................................... 57
4.4 - Quanto à proibição de capturar o peixe-boi marinho ..................................................... 64
4.5 - Quanto ao significado tradicional do peixe-boi marinho para as comunidades
litorâneas do Maranhão, Pará e Amapá ........................................................................ 67
4.5.1 – Designação ........................................................................................................ 67
4.5.2 – A arte da captura ............................................................................................... 68
4.5.3 – A utilização do peixe-boi após sua captura ...................................................... 75
4.5.4 – Valor folclórico do peixe-boi marinho ............................................................. 78
5 – DISCUSSÃO .................................................................................. 79
Quanto ao método utilizado ................................................................................................... 79
5.1 – Quanto às características da investigação ..................................................................... 80
5.1.1 - Esforço de investigação ..................................................................................... 80
5.1.2 – Perfil dos entrevistados ..................................................................................... 81
5.1.3 – Quanto ao entrevistado conhecer o peixe-boi marinho .................................... 81
5.2 – Quanto à distribuição do peixe-boi ............................................................................... 83
5.2.1 - Distribuição ao longo da área investigada ......................................................... 83
5.2.2 – Distribuição em função da região, tipo de ambiente, disponibilidade de
alimento e nível de degradação ambiental ....................................................................
88
5.3 - Quanto a aspectos relevantes do status de conservação do peixe-boi ao longo do
litoral do Maranhão, Pará e Amapá .............................................................................. 90
5.3.1 - Quanto à estimativa de abundância ................................................................... 90
5.3.2 - Quanto à captura do peixe-boi ........................................................................... 91
5.4 - Quanto à proibição de capturar o peixe-boi marinho ..................................................... 94
5.5 – Quanto ao significado tradicional do peixe-boi marinho para as comunidades
litorâneas do Maranhão, Pará e Amapá ........................................................................ 96
5.5.1 – Designação ........................................................................................................ 96
5.5.2 – A arte da captura ............................................................................................... 96
5.5.3 – A utilização do peixe-boi após sua captura ...................................................... 98
5.5.4 – Valor folclórico do peixe-boi marinho ............................................................. 99
5.6 - A situação do peixe-boi marinho no litoral do Brasil: Litoral Norte X Litoral
Nordeste......................................................................................................................... 100
6 – CONCLUSÕES ............................................................................... 103
7 – RECOMENDAÇÕES ....................................................................... 105
8 - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................. 106
9 – GLOSSÁRIO .................................................................................. 118
10 – ANEXOS
IV
LISTA DE FIGURAS
Figura
Página
Figura 2.1 – Mapa da área estudada ......................................................................................... 14
Figura 2.2 – Ocupação litorânea no litoral norte ...................................................................... 16
Figura 2.3 – Delta do Parnaíba ................................................................................................ 19
Figura 2.4 – Lençóis Maranhenses .......................................................................................... 20
Figura 2.5 – Ilha de São Luís .................................................................................................... 21
Figura 2.6 – Baía do Tubarão .................................................................................................. 22
Figura 2.7 - Amplitude de maré (variação diurna de até 8m) .................................................. 23
Figura 2.8 – Reentrâncias Maranhenses .................................................................................. 24
Figura 2.9 – Rio Pará (PA) ...................................................................................................... 26
Figura 2.10 – Igarapé na ilha de Marajó .................................................................................. 26
Figura 2.11 – Litoral do Amapá .............................................................................................. 29
Figura 3.1 – Entrevista com ribeirinho descrevendo o peixe-boi marinho .............................. 32
Figura 3.2 – Toyota Unidade Móvel “IGARAKUE” ............................................................. 33
Figura 3.3 – Barco FLORAFAUNA – IV ................................................................................ 34
Figura 3.4 – Voadeira ............................................................................................................... 34
Figura 4.1 – Freqüência relativa das idades dos entrevistados nas cinco regiões ................... 39
V
Figura 4.2 - Freqüência relativa das atividades exercidas pelos entrevistados ....................... 40
Figura 4.3 - Freqüência relativa dos entrevistados que conhecem ou não o peixe-boi
marinho ................................................................................................................
41
Figura 4.4 – Freqüência relativa de como se encontrava o peixe-boi marinho quando os
entrevistados o conheceu ..................................................................................... 42
Figura 4.5 – Porcentagem dos entrevistados que não conhecem o peixe-boi marinho, mas já
ouviram falar dele, nunca ouviram, ou conhecem o amazônico ......................... 43
Figura 4.6 – Peixe-boi marinho (Trichechus manatus manatus) ............................................. 47
Figura 4.7 – Peixe-boi amazônico (Trichechus inunguis) ........................................................ 47
Figura 4.8 - Mapa esquemático da distribuição do peixe-boi marinho (Trichechus manatus
manatus) e do peixe-boi amazônico (Trichechus inunguis) no litoral norte do
Brasil ...................................................................................................................... 52
Figura 4.9 – Representação gráfica da distribuição das médias do número de peixes-bois
ao longo da área percorrida ................................................................................. 53
Figura 4.10 – Número médio de peixe-boi marinho, obtido no modelo, nas localidades de
cada região, onde há ou não disponibilidade de alimento, em ambiente
estuarino ............................................................................................................ 56
Figura 4.11 – Número médio de peixe-boi marinho, obtido no modelo, nas localidades de
cada região, onde há ou não disponibilidade de alimento, em ambiente de rio
56
ou de mar ...........................................................................................................
58
Figura 4.12 – Freqüência relativa da mortalidade do peixe-boi marinho, nas cinco regiões ...
Figura 4.13 – Representação gráfica da percentagem dos entrevistados que capturaram o
peixe-boi, nas cinco regiões .............................................................................. 60
VI
Figura 4.14 - Representação gráfica das médias de captura do peixe-boi marinho por
61
entrevistado em cada região ...............................................................................
Figura 4.15 - Número de peixes-bois capturados, por tipo de captura, em cada região ........... 62
Figura 4.16 - Percentagem de peixes-bois marinho capturados, por cada tipo de captura,
nos três estados .................................................................................................... 62
Figura 4.17 – Arpão, estrovo e arpoeira .................................................................................. 63
Figura 4.18 - Percentagem dos motivos pelos quais os caçadores pararam de capturar o
peixe-boi marinho, nas regiões ............................................................................ 65
Figura 4.19 - Percentagem dos entrevistados que conhecem o peixe-boi marinho e sabem
66
da proibição de captura, por região ....................................................................
Figura 4.20 - Percentagem dos meios pelos quais os entrevistados souberam da proibição
67
de captura do peixe-boi marinho, no MA, PA e AP ...........................................
Figura 4.21 – A arte de captura é passada de geração para geração ......................................... 68
Figura 4.22 – A arte de capturar o peixe-boi marinho na canoa ............................................. 70
Figura 4.23 – A arte de capturar o peixe-boi marinho no mutá ............................................... 71
Figura 4.24 – Tornos utilizados para asfixiar o peixe-boi ........................................................ 72
Figura 4.25 – Ribeirinho demonstra o rastro deixado pelo peixe-boi marinho ........................ 73
Figura 4.26 - Freqüência relativa do destino dado aos peixes-bois marinho capturados ......... 75
Figura 4.27 – Mixira (carne conservada na gordura) ............................................................... 76
Figura 4.28 – Couro de peixe-boi à venda no mercado Ver-o-Peso, Belém (PA) .................. 77
77
Figura 4.29 – Gordura de peixe-boi à venda no Ver-o-Peso (PA) ...........................................
VII
LISTA DE TABELAS
Tabela
Página
Tabela 3.1 – Regiões estudadas e cronograma das expedições ..............................................
30
Tabela 4.1 – Número de localidades visitadas por região, com os respectivos números de
entrevistas realizadas e o esforço médio por local .............................................. 38
Tabela 4.2 - Médias e intervalos
......................................................
de
idades
dos
entrevistados
por
região 39
Tabela 4.3 - Atividades exercidas pelos entrevistados em cada região .................................. 40
Tabela 4.4 – Número de entrevistados que conhecem e não conhecem o peixe-boi marinho,
por região ............................................................................................................ 41
Tabela 4.5 – Número de entrevistados que conheceram o peixe-boi marinho vivo, morto,
vivo e morto, e museu/cativeiro, por região ....................................................... 42
Tabela 4.6 - Relação das localidades visitadas com seus respectivos números de entrevistas,
número de peixe-boi citado pelos entrevistados e média de peixe- boi/entrevista 48
Tabela 4.7 – Número de localidades visitadas e não visitadas, citadas pelos entrevistados
como de ocorrência da espécie, e a confirmação ou não da ocorrência .............. 54
Tabela 4.8 – Média de peixes-bois marinho (c) ......................................................................
57
Tabela 4.9 – Abundância estimada (e) ....................................................................................
57
Tabela 4.10 - Número de encalhes de filhotes em cada região ............................................... 59
Tabela 4.11 – Número de entrevistados com captura e sem captura por região ...................... 59
VIII
Tabela 4.12 – Número de entrevistados com captura do peixe-boi marinho por região,
números de animais capturados, média de captura/entrevistado ....................... 60
Tabela 4.13 - Número de peixes-bois capturados, por tipo de captura acidental e
61
intencional, por região .............................................................................................................
Tabela 4.14 - Número de caçadores e motivo pelo qual pararam de capturar o peixe-
64
boi, por região .........................................................................................................................
Tabela 4.15 – Número e percentagem dos entrevistados que conhecem o peixe-boi marinho
65
e sabem ou não da proibição de capturá-lo, por região ......................................
Tabela 4.16 - Número de entrevistados, por meio de conhecimento da proibição, por
66
região ..............................................................................................................
74
Tabela 4.17 – Relação de alguns típicos caçadores de peixe-boi marinho da região ...............
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
1
1 – INTRODUÇÃO
1.1 - OS SIRÊNIOS
O peixe-boi marinho (Trichechus manatus Linnaeus,1758) pertence à Ordem Sirenia. Os
sirênios são os únicos mamíferos aquáticos preferencialmente herbívoros (Hartman, 1979) do
mundo, o que os difere evolutivamente dos demais mamíferos aquáticos. Habitam rios, estuários
e águas oceânicas costeiras rasas entre os trópicos de Câncer e de Capricórnio (Ronald et al.,
1978).
De Jong e Zweers (1980) sugeriram que os sirênios possuem origem monofilética com as
ordens Proboscidea e Hyracoidea, por apresentarem características bioquímicas do cristalino da
lente dos olhos similares.
A Ordem Sirenia é representada por apenas quatro espécies viventes (Marsh e Lefebvre,
1994) e apresenta duas famílias: Dugongidae e Trichechidae. A família Dugongidae possui dois
gêneros, sendo um extinto e um vivente: Hydrodamalis, com a espécie Hidrodamalis gigas
Zimmerman, 1780 (vaca marinha de Steller) extinta em 1768 e Dugong, com a espécie vivente
Dugong dugon Müller, 1776 (dugongo). A família Trichechidae, com somente um gênero,
Trichechus, possui três espécies conhecidas, sendo: Trichechus senegalensis Link, 1795 (peixeboi africano), Trichechus inunguis Natterer, 1883 (peixe-boi amazônico) e Trichechus manatus
Linnaeus, 1758 (peixe-boi marinho) (Husar 1977a, 1978a,b).
A vaca marinha de Steller foi descoberta em 1741 pela expedição Vitus Bering, que
naufragou na região do Mar de Bering entre o Alasca (EUA) e a Ásia (Rússia). Na época
deveriam existir cerca de 2000 animais que, segundo Walker (1975), tinham a distribuição
confinada a águas ao redor da ilha de Bering, das ilhas Commander no mar de Bering e águas da
cadeia aleutiana, no Pacífico Norte. Com a presença em uma área restrita, sua caça pela
tripulação náufraga, e a ocupação humana no século XVIII, a espécie foi extinta em 1768, apenas
27 anos após sua descoberta (Husar, 1978c; Reynolds e Odell, 1991). Eram os maiores sirênios
conhecidos, com quase 8 metros de comprimento e até 4 toneladas de peso, única espécie recente
da Ordem Sirenia adaptada a águas frias (Domning, 1972).
Os dugongos são semelhantes aos peixes-bois na aparência, mas possuem uma diferença
bem visível na nadadeira caudal, que é parecida com a de golfinhos e baleias (Marsh et al.,
1986). Diferenças menos aparentes são que machos adultos retêm dentes incisivos e o rostro é
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curvado ventralmente (Eisenberg, 1981). São os únicos sirênios estritamente de águas marinhas,
e segundo Marsh e Lefebvre (1994) ocorrem em pântanos costeiros da região tropical e
subtropical e águas costeiras de ilhas dos oceanos Índico e Pacífico, entre 27°N e 27° S.
O peixe-boi africano é semelhante ao peixe-boi marinho, não só em tamanho e peso,
como também na exploração de recursos fluviais e estuarinos. Segundo Reeves et al. (1992),
habita águas costeiras, estuários, rios, pântanos e lagoas costeiras. É a espécie menos conhecida
dentre os sirênios.
O peixe-boi amazônico é a única espécie de sirênio exclusiva de água doce e a menor em
tamanho (Coimbra-Filho, 1972), podendo atingir até três metros de comprimento e pesar 300kg.
Segundo Domning (1981), distribui-se por toda bacia amazônica, e, Best (1984a), afirma que sua
distribuição é determinada, principalmente, pela disponibilidade de alimento, não ocorrendo em
águas turbulentas e com correnteza. Ao contrário dos outros Trichechidae não possuem unhas
nas nadadeiras peitorais, o couro é liso e sua coloração é negra escura. Na região peitoral e
abdominal observa-se campo irregular com mancha branca distinta (Marsh et al., 1986), porém
nem todos os animais da espécie a apresentam, podendo ter apenas uma área um pouco mais
clara que preto nesta região (Rosas, 1994; Observação pessoal).
O peixe-boi marinho adulto pode medir entre 2,5 e 4,0 metros e pesar de 200 a 600kg
(Husar, 1977b). A coloração do corpo é acinzentada e o couro é áspero (Husar, 1978b), apresenta
unhas nas nadadeiras peitorais (Hartman, 1979) e alimenta-se principalmente de algas
(Gracilaria cornea, Soliera sp. e Hypnea musciformes), capim marinho (Halodule wrightii)
(Paludo, 1997), folhas de mangue sendo as espécies Avicennia nitida, Rhizophora mangle e
Laguncularia racemosa, aninga (Montrichardia arborescens), paturá (Spartina brasiliensis),
mururé (Eichhornia crassipes) e junco (Eleocharis interstincta) (Best e Teixeira, 1982).
Segundo Marsh et al. (1986), o peixe-boi marinho ocorre em águas costeiras e em rios da
região do Atlântico, do norte do Estado da Flórida (EUA), a cerca de 12° de latitude Sul, na costa
leste do México e da América Central e norte da América do Sul até o nordeste do Brasil. Vive
também em águas costeiras e estuários do Caribe e das Antilhas. São descritas duas subespécies:
Trichechus manatus manatus (Linnaeus, 1758) para os que ocorrem na América Central e do
Sul, e Trichechus manatus latirostris (Harlam, 1824) para os que ocorrem na América do Norte.
Esta divisão foi proposta por Hatt em 1934, baseado em algumas evidências anatômicas, porém a
existência de duas subespécies foi questionada por Husar (1978b), que julgava as características
de distinção das subespécies como não suficientes para tal separação. No entanto, Domning e
Hayek (1986) através de análise craniométrica, confirmaram a separação das subespécies.
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Trichechus manatus é a espécie mais conhecida entre os sirênios, principalmente os que
habitam as águas da Flórida (Trichechus manatus latirostris) (Reynolds e Odell, 1991). Em
estudo de determinação da idade do peixe-boi marinho, para a subespécie T. m. latirostris,
baseado na contagem de crescimento do osso timpano-periótico, o animal mais velho teve sua
idade estimada como maior que 50 anos (Marmontel et al., 1990). O intervalo médio entre
nascimento de filhotes para T. m. latirostris é de 3 anos, e os neonatos medem entre 0,80 e 1,60m
(Marmontel, 1995). A fêmea permanece com o filhote em média 1,2 a 2,0 anos (Rathbun et al.,
1995).
Por serem herbívoros os peixes-bois precisam ingerir grande quantidade de alimento,
comendo todo dia 8 a 13% do seu peso corporal (Best, 1981), por isso os animais passam de seis
a oito horas diárias se alimentando (Betram e Betram, 1964 apud Husar, 1977b), como as plantas
apresentam alto conteúdo de sílica, além do animal ingerir junto grãos de areia, os peixes-bois
possuem uma substituição cíclica da dentição (Domning e Magor, 1978; Starck, 1995).
Segundo a IUCN “The World Conservation Union” (2000) todas as quatro espécies de
sirênios viventes estão vulneráveis à extinção.
1.2 - HISTÓRICO DO PEIXE-BOI NO BRASIL
No Brasil ocorrem duas das quatro espécies viventes da Ordem Sirenia: o peixe-boi
marinho (Trichechus manatus manatus) e o peixe-boi amazônico (Trichechus inunguis).
Best (1982), relata que Padre José de Anchieta, em 1560, fez uma das descrições mais
antigas do peixe-boi no Brasil, onde relaciona muito bem algumas características particulares da
espécie de peixe-boi marinho na costa brasileira: “... é de compleição maior do que um boi,
coberto por uma pele dura, de cor semelhante à do elefante; ...”.
Whitehead (1978), realizou um importante trabalho de revisão documental sobre os
sirênios no Brasil e percebeu que a espécie é observada no país desde 1500, com o relato de um
autor anônimo pertencente à expedição de Cabral, que dizia que o único aspecto anômalo era:
“orelhas do tamanho de braços”. Whitehead (op. cit.), verifica ainda que a espécie foi observada
durante o período da colonização, quando cita o relatório de Souza (1587), que refere-se ao
peixe-boi de águas salgadas e estuários, que bebe água doce e come um tipo de grama muito
pequena, parecida com milho, que ocorre nas margens dos rios; e ainda descreve a caça do
animal com arpões pelos índios, assim como as propriedades medicinais dos ossos do ouvido.
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Whitehead (1978), afirma que a distribuição do peixe-boi marinho era da foz do rio Doce,
no Estado do Espírito Santo (20º23’S) a São Luís, no Estado do Maranhão (2°34’S), mas
também se refere a Goeldi (1898), que encontrou a espécie no Oiapoque (4º 25’N), Estado do
Amapá, extremo norte da costa brasileira. Verificou ainda que na época havia uma notável
abundância destes animais nos Estados do Espírito Santo, Bahia e Maranhão.
Whitehead (op. cit..), encontrou um registro para o litoral do Maranhão, de Frei Cristóvão
de Lisboa, 1624-1632, que observou e descreveu, em um relatório ilustrado, inúmeros aspectos
bioecológicos da espécie, tais como acasalamento no mar perto da praia, e o deslocamento para
dentro de rios de água doce, onde bandos de trezentos foram vistos.
Historicamente, os peixes-bois marinho e amazônico têm sido explorados, no Brasil,
através da caça tradicional e predatória (exploratória) desde os século XVI. Veríssimo (1970),
relata: “O peixe-boi parece ter sido desde o começo do século XVII objeto do comércio dos
holandeses ...”. E afirma que “do peixe-boi se aproveita a carne e a gordura, sendo o mesmo de
bom tamanho produz 40 a 60kg de carne e 8 a 9 potes de 22 a 30kg de gordura, esta
transformada em banha ou manteiga serve na iluminação doméstica e na cozinha dos menos
civilizados”. Este autor verificou ainda que no Maranhão e no Pará, entre 1618 e 1624 o peixeboi era comido assado e cozido com couves, imitando uma comida de Lisboa chamada vaca e
arroz, e os índios do Alto Amazonas moqueavam a carne do peixe-boi sobre “parrilas de palo”.
O autor não menciona qual a espécie de peixe-boi, tornando-se difícil a distinção da mesma, já
que a região citada abrange a ocorrência das duas espécies. Provavelmente ambas eram utilizadas
para os mesmos fins.
Segundo Orico (1972), a carne do peixe-boi amazônico foi muito saboreada não só por
índios e primeiros viajantes e naturalistas, como também pelos colonizadores. Sua carne, sua
banha, seu couro e seus ossos obtiveram, durante mais de dois séculos, senão ótimos preços,
excelente reputação, como alimento, como produto para iluminação, como material para fazer
objetos que necessitassem de resistência maior que a da sola, etc. No entanto, Veríssimo (1970),
verificou que os produtos do peixe-boi, como a carne salgada, a mixira, a linguiça e a banha,
eram muito valiosos em meados do século XVIII. A carne era vendida de 500 a 640 réis a arroba
nos povoados, chegando o valor até 1.000 réis na cidade do Pará, onde o pote da mixira valia
2.000 réis e o da manteiga de 1.900 a 3.000 réis.
Veríssimo (op. cit..), menciona, em seu livro, registros antigos, de europeus, padres e
bispos, que descreveram a utilização do peixe-boi, tanto doméstica como comercial: padre
Antônio Vieira, em 1658 “... carregavam os holandeses mais de vinte navios de peixe-boi todos
os anos”, o padre também informa que novelos de algodão eram a moeda do Maranhão, assim
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como sal, peixes, tartarugas e peixes-bois (provavelmente o marinho), que eram utilizados para
pagamento de propinas e ordenados; Heriarte, em 1661 cita “... ao contrato assim de madeiras
como de um pescado que chamamos peixe-boi, levam a vender à ilha de São Cristóvão” (nas
Antilhas); bispo do Pará, D. João de S. José Queirós, em 1762 afirma “...há peixe-boi que quase
se reduz a manteiga, e dá quarenta potes dela (...). A pele é boa para palmatórias” e “As grandes
pescas e salgas, (...) faziam-se então do peixe-boi, e em três meses se costumava fazer dêle cento
e cinqüenta arrobas. Os pesqueiros reais se estabeleceram especialmente para a pesca dêle”; o
padre Noronha, 1768 “... se acham e pescam peixes-bois chamados de azeite, os quais se diferem
dos ordinários em terem maior altura, e tanto toucinho e gordura que quase se lhe não percebe
carne alguma. Há peixes-bois destes, que rendem vinte e mais almudes de azeite”.
Ferreira (1903), relata que em 1786 o peixe-boi era utilizado como alimento “para a gente
de trabalho”, pois salgado era levado pelos ribeirinhos para o trabalho, como uma marmita. E
ainda refere-se a utilização da banha do peixe-boi misturada com breu para calafetar as canoas.
Ferreira (op. cit..), ressalta que o pesqueiro Vila Franca, na Amazônia, em dois anos
(1776 – 1778) rendeu 59 toneladas (3.873 arrobas) de carne de peixe-boi seca e 260 toneladas
(1.863 potes) de gordura (manteiga), tendo sido mortos para isso 8.500 peixes-bois, havendo na
época outros pesqueiros de peixe-boi.
A caça continuou no século XX, segundo Best (1982, 1984b), entre 1935 e 1954
aproximadamente 10.000 peixes-bois amazônicos eram mortos por ano. Nunes Pereira (1954),
acrescenta ainda que o ano de 1935 foi o início de uma época de alta exploração do couro e
durante doze anos um total de 240.000 a 250.000 couros foram utilizados nas indústrias, devido
sua resistência ser seis vezes maior que a do couro do boi. Segundo Best (1984a), a indústria do
couro desmoronou rapidamente em 1954, com a introdução de produtos sintéticos no mercado, e
a caça do peixe-boi amazônico foi novamente pela carne.
Veríssimo (1970), observou que a quantidade de animais diminuiu: “No derradeiro lustro
século ainda o peixe-boi habitava as águas amazônicas (...) arpoavam-os no rio Arari e outros de
Marajó e na foz do Tocantins. Em tais paragens não há mais encontrá-los hoje em dia”, e
conclui: “Na Amazônia não há certamente quem não reconheça e lastime a extinção que ali está
dando o pescado, que nenhuma providência protege. A continuarem as cousas referentes à pesca
como vão, dentro em século, senão antes, a tartaruga, o peixe-boi, o próprio pirarucu terão
desaparecido das águas amazônicas e serão apenas uma tradição, como já começaram a ser em
certas porções dela”. Na ilha de Marajó torna-se novamente difícil a definição da espécie de
peixe-boi utilizada, já que nesta região ocorrem as duas espécies. O mais provável é que a caça
nesta região era das duas espécies.
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Para o peixe-boi marinho, Domning (1982) descreve que em 1959, duas toneladas de
carne foi produzida no Estado de Alagoas, e em 1964, uma tonelada foi produzida no Estado da
Bahia. Esta representaria aproximadamente vinte e cinco peixes-bois, podendo ter causado um
impacto severo na pequena população que existia mais ao sul do Brasil, tendo diminuído o limite
meridional de ocorrência da espécie no país (Domning, op. cit.).
Borobia (1991), relata que a caça do peixe-boi amazônico ainda continua, e que o anuário
Estatístico do Brasil mostra nas estatísticas de produções pesqueiras 7 toneladas de peixe-boi
para o ano de 1985, 2 toneladas para o de 1986 e mais 2 toneladas para 1987. Em 1996 e 1997
foram registrados 655 peixes-bois amazônicos mortos, já em 1998 o registro é de 475 animais, e
em 1999 é de 199, sendo a caça maior no verão, quando os animais estão mais vulneráveis
(Lazzarini et al., 1998, 2000a, 2000b).
Lima (1997), afirma que a caça do peixe-boi marinho no litoral nordestino foi um hábito
descendente de indígenas, desde antes da colonização, e que nesta região praticamente não existe
mais a caça predatória. O último registro de caça do peixe-boi marinho com arpão no litoral
nordestino ocorreu no ano de 1987, em Barra de Mamanguape (Paludo, 1997).
Na revisão documental realizada por Whitehead (1978), houve poucas informações
recentes sobre a ocorrência do peixe-boi marinho (T. m. manatus), o que poderia indicar a
ausência ou raridade da espécie em áreas onde vivia no passado. Os autores Whitehead (1977),
Domning (1981) e O’Shea (1994), citam que a distribuição e abundância desta espécie foi
severamente diminuída no Brasil.
No litoral nordeste os raros registros nos Estados de Sergipe, Alagoas, Pernambuco e
Paraíba são descritos como Trichechus manatus latirostris (Banks da Rocha, 1971 a, b). No
litoral norte os registros são mais raros ainda, havendo alguns trabalhos na década de oitenta,
(Domning, 1981; Best e Teixeira, 1982) que indicam a presença de T. m. manatus na costa do
Amapá e Maranhão, e sugerem a ausência da espécie na costa do Pará. A presença de T. inunguis
na ilha de Marajó é relatada por Domning (1981). Segundo Best e Teixeira (op. cit..) os únicos
registros, antigos, para o litoral do Amapá são os de Goeldi (1898) e de Rego (1944).
Após extenso levantamento realizado na costa brasileira, Albuquerque e Marcovaldi
(1982) apontaram desaparecimento da espécie no litoral do Espírito Santo e da Bahia. Em um
levantamento mais recente Lima et al. (1992), constataram que a área de ocorrência e o número
de animais desta espécie vêm diminuindo, e apontaram o desaparecimento da espécie também no
Estado de Sergipe. Pontal do Peba, no Estado de Alagoas, passou a ser, portanto, o local de
ocorrência mais meridional da espécie.
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Além da caça indiscriminada do peixe-boi marinho desde os tempos da colonização, a
morte acidental em redes de pesca (Oliveira et al., 1990); a intensa degradação do meio ambiente
onde vivem; o assoreamento dos estuários e a grande concentração de barcos, que impede o
acesso dos peixes-bois a locais importantes para alimentação, reprodução e suprimento de água
doce; e, sua reprodução lenta, onde a fêmea gera apenas um filhote a cada três anos, são
responsáveis pela iminente ameaça de extinção desse mamífero aquático.
Lima (1997), registra encalhes de filhotes de peixes-bois marinhos no litoral nordeste,
principalmente nos Estados do Rio Grande do Norte e Ceará, e sugere que a falta de acesso das
fêmeas prenhas ao interior dos estuários, que servem de abrigo, seria a causa de nascimento dos
filhotes em locais sujeitos ao constante batimento de ondas, causando o desgarre da mãe e o
encalhe nas praias. Considerando a reprodução lenta da espécie, estes encalhes, que geram
filhotes - órfãos sem condições de sobreviverem sem suas mães, aumentam drasticamente a
ameaça de extinção para a espécie marinha.
As duas espécies encontradas no Brasil constam na Lista Oficial de Espécies da Fauna
Brasileira Ameaçada de Extinção (IBAMA, 1989), e do Apêndice I da CITES (2000)
(Convenção sobre o Comércio Internacional das Espécies da Flora e Fauna Selvagens em Perigo
de Extinção). Encontra-se na categoria “vulnerável” à extinção na classificação da IUCN (2000),
ou seja, apresentam alto risco de extinção na natureza a médio prazo. Porém, no Plano de Ação
para Mamíferos Aquáticos do Brasil (IBAMA, 1997), elaborado pelo GTEMA (Grupo de
Trabalho Especial de Mamíferos Aquáticos), que assessora o IBAMA sobre assuntos
relacionados com mamíferos aquáticos, e que adota como critério de classificação do grau de
ameaça às espécies o divulgado na publicação IUCN Red List Categories (IUCN, 1994), o peixeboi marinho (Trichechus manatus) é citado como uma espécie em perigo crítico de extinção, ou
seja, corre risco extremamente alto de extinção na natureza em futuro imediato.
1.3 - A CONSERVAÇÃO DO PEIXE-BOI NO BRASIL
Os sirênios estão protegidos no país desde 1967, através da Lei Federal de Proteção à
Fauna (Lei nº 5.197, de 03-01-1967), pela alteração da Lei de Proteção à Fauna, (Lei nº 7.653, de
18-12-1987) (IBAMA,1997), e pela Lei de Crimes Ambientais (Lei n° 9.605/98, de 12-02-98)
(Brasil,2000).
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Os peixes-bois no Brasil também são protegidos por: Atos Internacionais de Acordo de
Conservação dos Recursos Naturais do Atlântico Sul (Brasil e Argentina) - (Ratificação: Dec.
Lei 454, de 05-02-1969), Convenção sobre o Comércio Internacional das Espécies da Flora e da
Fauna Selvagens em Perigo de Extinção (CITES, 2000) - (Ratificação: Dec. Leg 54, de 24-061975), Acordo de Conservação da Flora e Fauna dos Territórios Amazônicos (Brasil e
Colômbia) – (Ratificação: Dec Leg. 72, de 03-12-1973), Acordo de Conservação da Flora e
Fauna dos Territórios Amazônicos (Brasil e Peru) – (Ratificação: Dec Leg. 39, de 17-05-1976),
Tratado de Cooperação Amazônica (Bolívia, Brasil, Colômbia, Guiana, Peru, Suriname e
Venezuela) – (Ratificação: Dec Leg. 69, de 18-11-1978), Convenção das Nações Unidas sobre o
Direito do Mar. (Ratificação: Dec Leg. 05, de 09-11-1987) (IBAMA, 1997); Portaria do IBAMA
nº 1.552, de 19-12-1989 (IBAMA, 1989), e através de leis municipais e decretos federais que
criaram Unidades de Conservação em áreas de ocorrência do peixe-boi marinho (IBAMA,
1997).
Em 1980 o Governo Federal se preocupou com o peixe-boi, e através do IBDF (atual
IBAMA) criou o Projeto Peixe-Boi marinho, quando designou o oceanólogo Catuêtê
Albuquerque para levantar informações sobre a situação da espécie, que era conhecida no litoral
pelos pescadores.
Albuquerque e Marcovaldi (1982) realizaram um levantamento através de cartas,
questionários e expedições a campo, desde o Rio de Janeiro até o Amapá. Constataram o
desaparecimento da espécie no litoral do Espírito Santo e da Bahia, e indicaram o estuário do rio
Fundo, na divisa entre os Estados da Bahia e Sergipe, como o ponto meridional da distribuição
atual da espécie; reuniram indícios de que a espécie se encontra em fase de desaparecimento ao
longo da costa nordeste, com duas centenas de animais na região, e provavelmente encontrava-se
em melhores condições na costa norte (MA, PA, AP). Recomendaram, então, uma seqüência das
investigações científicas e sobretudo uma intensificação das ações que protegessem a espécie.
Na foz do rio Mamanguape, município de Rio Tinto (PB) foi implantada a primeira Base
de Proteção e Pesquisa do Projeto Peixe-Boi (IBDF), devido a ocorrência neste local de grupos
de até quinze indivíduos (Albuquerque e Marcovaldi, 1982). Através das informações sobre a
espécie registradas nesta Base (Borobia e Lodi, 1992; Silva et al., 1992), verificou-se a
importância de se obter mais informações sobre a mesma, como a distribuição em outros
ecossistemas e suas necessidades ecológicas, além da implantação de um trabalho de educação
ambiental junto às comunidades litorâneas.
Devido aos resultados alcançados pelo Projeto Peixe-Boi Marinho/IBAMA e em virtude
da necessidade de ampliação dos esforços para conservação dos sirênios, onde era preciso a
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existência de estruturas físicas para reabilitar os filhotes-órfãos que encalham nas praias
nordestinas, em 1990 foi criado, em Itamaracá – PE, o Centro Nacional de Conservação e
Manejo de Sirênios “Centro Peixe-Boi”, do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), que expandiu seus trabalhos à espécie amazônica
(Trichechus inunguis Natterer, 1883). Os técnicos do Centro Peixe-Boi/IBAMA elaboraram
então um Plano Geral de Trabalho, e, para suprir as áreas consideradas sem informação por
Albuquerque e Marcovaldi (1982) decidiram investigar todas as vilas e comunidades costeiras,
através de uma “Unidade Móvel”.
Os técnicos do Centro prepararam uma caminhonete Bandeirante Toyota 4x4 e criaram,
então, a Unidade Móvel “IGARAKUE” que teve como objetivo específico realizar um
levantamento detalhado sobre a atual distribuição e status de conservação do peixe-boi marinho
no litoral brasileiro, bem como levar às comunidades uma campanha de conscientização visando
sua conservação.
As duas primeiras etapas do Plano foram realizadas entre os anos de 1990 e 1991, através
da Unidade Móvel “IGARAKUE”, quando foram percorridos 07 Estados (SE, AL, PE, PB, RN,
CE, PI), abrangendo aproximadamente 2000km de litoral, visitadas 182 localidades e realizadas
538 entrevistas com as comunidades ribeirinhas (Lima, 1997). Após este levantamento foram
apontadas áreas importantes para conservação da espécie, resultando na criação de mais duas
unidades do projeto, nos Estados de Alagoas e Piauí.
Dando continuidade aos trabalhos realizados no litoral nordeste, os técnicos do Centro
Peixe-Boi/IBAMA, com o apoio da Fundação O Boticário de Proteção à Natureza e da Fundação
Mamíferos Marinhos, e através da Unidade Móvel “IGARAKUE”, em 1992 e 1993, percorreram
o litoral dos Estados do Maranhão, Pará e Amapá, e realizaram o levantamento e a campanha de
conscientização na região norte do país. O Estado do Maranhão, por critérios ambientais e
oceanográficos, teve seu litoral considerado pelos técnicos do Centro Peixe-Boi/IBAMA como
litoral norte, juntamente com Pará e Amapá, apesar de suas características de transição.
O Centro Peixe-boi, atual Centro Mamíferos Aquáticos (CMA/IBAMA), resgatou 30
filhotes-órfãos no litoral nordeste do Brasil, entre 1989 e janeiro de 2001. Em 1994 o Centro
iniciou a atividade de reintroduzir no ambiente natural os peixes-bois marinhos já reabilitados,
quando no dia 10/10/94, devolveu ao mar “Astro” e “Lua”, no litoral de Alagoas. Até o momento
foram reintroduzidos sete animais, dos quais dois vieram a óbito e um desapareceu. Os quatro
animais viventes são monitorados pelo CMA/IBAMA através de radio-telemetria (Lima et al.,
2000a).
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Em 2000, os técnicos do CMA/IBAMA, partindo da mesma metodologia utilizada no
litoral brasileiro, e com o apoio do Fundo Nacional do Meio Ambiente e da Fundação Mamíferos
Marinhos, através de uma Unidade Móvel, percorreram os rios do Estado do Amazonas
realizando a primeira etapa do levantamento sobre a atual distribuição e status de conservação do
peixe-boi amazônico na bacia amazônica, bem como levou às comunidades uma campanha de
conscientização visando sua preservação.
Em fevereiro de 2000 o Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá reintroduziu
ao ambiente natural o primeiro filhote de peixe-boi amazônico resgatado e reabilitado, sendo
monitorado por rádio transmissor VHS (Marmontel e Petta, 2000).
As informações sobre a distribuição e o status de conservação do peixe-boi, registradas
durante o trabalho que abrangeu toda a região norte e nordeste do Brasil, através da Unidade
Móvel “IGARAKUE”, assim como registros fotográficos, e audio-visuais, utilizados nesta
dissertação, fazem parte do banco de dados do Centro de Mamíferos Aquáticos/IBAMA, criado
em 1998 a partir do Centro Peixe-Boi/ IBAMA.
1.4 - OBJETIVOS
1) Geral
•
Registrar informações e avaliar o status de conservação do peixe-boi marinho (Trichechus
manatus manatus) no litoral norte do Brasil.
2) Específicos
•
Identificar a distribuição do peixe-boi marinho no litoral norte do Brasil;
•
estimar a abundância do peixe-boi marinho neste litoral;
•
registrar a pressão de caça sobre a espécie;
•
registrar o significado tradicional do peixe-boi marinho junto às comunidades litorâneas
visitadas.
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1.5 - JUSTIFICATIVA DA PESQUISA
No Plano de Ação para Mamíferos Aquáticos do Brasil (IBAMA, 1997), em Medidas de
Conservação, uma das providências consideradas necessárias para incrementar a conservação
dos mamíferos aquáticos é: “Maximizar esforços, com alta prioridade, para proteção do
Trichechus manatus, o mamífero aquático mais ameaçado da fauna brasileira, que ainda se
encontra sob pressão de captura intencional. Nesses esforços devem ser consideradas a criação,
implantação e fiscalização de novas áreas protegidas onde houver maior concentração da
espécie, e amplas campanhas de educação ambiental”.
Portanto a definição de habitats preferenciais de ocorrência do peixe-boi marinho no
litoral norte do Brasil, uma área ampla, com número de animais reduzido, é muito importante,
pois a partir de então se poderá recomendar a criação e implantação de bases logísticas para
pesquisa e de Unidades de Conservação para este litoral, garantindo proteção ecossistêmica e
para a espécie.
As bases de proteção e pesquisa, situadas em locais estratégicos, são pólos que mobilizam
pesquisadores e pessoas das comunidades, em atividades que visam a conservação do peixe-boi,
na área aonde estão implantadas.
A compreensão das relações e costumes das comunidades tradicionais do litoral em
relação ao peixe-boi servirão como base de campanhas de educação ambiental, para que haja um
convívio harmônico entre ambos.
1.6 - HIPÓTESE
A hipótese substantiva do estudo pretenderá verificar como se comporta a distribuição da
espécie ao longo do litoral norte do Brasil.
As hipóteses estatísticas (H0 e H1), que derivarão da hipótese substantiva, pretenderão
verificar se há, ou não, influência de variáveis independentes na ocorrência e distribuição do
peixe-boi marinho no litoral norte do país:
LUNA, F. O.
•
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
12
H0: Não há diferença significativa entre as médias do número de peixes-boi em cada região
estudada, em função da presença de alimento, do nível de degradação ambiental e do tipo de
ambiente;
•
H1: Há diferença significativa entre as médias do número de peixes-boi em cada região
estudada, em função da disponibilidade de alimento, do nível de degradação ambiental e do
tipo de ambiente.
1.7 - PRESSUPOSTOS CONCEITUAIS
Ficarão subentendidos na execução do estudo os seguintes pressupostos:
•
Uma das formas de diagnosticar o status de conservação de uma espécie ameaçada, cujo
número de animais é reduzido, que tem uma ampla área de distribuição, é exclusivamente
aquática e costeira, de difícil estudo e observação, e com carência de informações básicas, é
buscar o conhecimento empírico existente nas comunidades que interagem com a espécie ou
com seu nicho ecológico (Lima, 1997);
•
os levantamentos ao longo do litoral norte realizados através de entrevistas direcionadas às
comunidades visitadas, objeto deste estudo, juntamente com as observações e registros dos
pesquisadores envolvidos, constituem um método viável para definir áreas de ocorrência e
distribuição, além do diagnóstico preliminar sobre o status de conservação do peixe-boi
marinho na região (Lima, op. cit.).
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
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2 – DESCRIÇÃO DA ÁREA
O presente estudo foi realizado no litoral dos Estados do Maranhão, Pará e Amapá, com
limite meridional na ilha das Canárias no Delta do rio Parnaíba/MA (03°00´S e 041°55´W) e
limite setentrional no rio Oiapoque/AP (04°00´N e 051°50W) (Fig. 2.1).
Conforme Ministério do Meio Ambiente (MMA, 1996a), o litoral brasileiro apresenta 19
compartimentos mais ou menos homogêneos, sendo denominados macrocompartimentos, que
são identificados a partir de variáveis oceanográficas associadas com aspectos morfométricos,
fluviográficos, climáticos e de feições geomorfológicas. Segundo MMA (op. cit..) os Estados do
Maranhão, Pará e Amapá apresentam quatro macrocompartimentos:
•
Costa Semi-árida Norte - compreende a faixa litorânea da Ponta dos Mangues
Secos (CE) à leste da baía do Tuburão (MA), incluindo a Região I deste estudo,
que abrange o Delta do Parnaíba e os Lençóis Maranhenses;
•
Litoral das Reentrâncias Maranhão-Pará - se estende do Golfão Maranhense (MA)
à leste da baía de Marajó (PA), para melhor análise dos dados do presente estudo
este macrocompartimento foi dividido nas Regiões II (Golfão Maranhense) e III
(Reentrâncias do Maranhão e do Pará);
•
Golfão Amazônico - compreende a foz do Amazonas, formada pelos estuários do
Amazonas e do Pará-Tocantins, separados pela ilha de Marajó (PA) e inúmeras
ilhas à oeste desta, pertencentes aos Estados do Pará e do Amapá, correspondendo
a Região IV;
•
Amapá - compreende a parte do litoral do Amapá voltado para o Oceano
Atlântico e corresponde a Região V deste trabalho.
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
Figura 2.1 – Mapa da área estudada.
14
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
15
2.1 – O POVOAMENTO DA ZONA COSTEIRA DO BRASIL
Em todas as áreas coloniais americanas o colonizador chegou nas novas terras por via
marítima, com isso as zonas litorâneas foram as primeiras a possuírem núcleos de povoamento.
Os núcleos de povoamento da zona costeira do Brasil, no período colonial, concentrou-se
nos seguintes pontos: litoral oriental da zona da mata nordestina, área polarizada por Olinda e
Recife; recôncavo bahiano, área polarizada por Salvador (sede do governo geral a maior parte do
período colonial, até 1763); litoral fluminense, área polarizada pelo Rio de Janeiro, que abrigou a
corte portuguesa no início do século XIX; litoral paulista, área polarizada por Santos e São
Vicente. O limite sul deste sistema seria Santa Catarina (MMA,1996a).
Durante o período colonial não houve um assentamento permanente de população na área
estudada, as incursões foram bem mais exploratórias e de conquista, e não de povoamento.
Somente no fim do período colonial é que cidades portuárias relativamente isoladas, como
Belém e São Luís, constituíram-se em centros de uma produção local ou em pontos terminais de
sistemas produtivos. Belém, como a porta de entrada e saída do Vale Amazônico, e São Luís
promovendo a circulação de pequenas áreas em seu entorno (MMA, op. cit.).
Os Estados do Maranhão, Pará e Amapá apresentavam vastas extensões de litoral isoladas
ou pouco ocupadas, prestando-se para refúgio de tribos indígenas e escravos foragidos, voltadas
para o gênero de vida rudimentar, produzindo para o autoconsumo e para a subsistência.
No decorrer do século XIX as localidades povoadas no período colonial perenizaram-se e
fundamentaram suas relações com o exterior na exportação de produtos primários,
permanecendo os Estados do Maranhão ao Amapá a salvo de maior exploração ou agressão ao
meio ambiente. Assim, chegando ao fim do século XIX, o Rio de Janeiro já possui 700 mil
habitantes, São Paulo possui 240 mil, Salvador possui 206 mil, Recife 113 mil e Fortaleza 48 mil
(MMA, op. cit.).
Os perfis atuais de ocupação litorânea da região norte (Fig. 2.2) oscilam entre 2hab/km2
na costa do Amapá, 12hab/km2 no Pará e 29hab/km2 no Maranhão, enquanto que em
Pernambuco, pólo de ocupação no período colonial, a densidade ocupacional atinge 913hab/km2
(MMA, op. cit.), o que dá dimensão à preservação ambiental da região norte até os dias de hoje.
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
Figura 2.2 – Ocupação litorânea no litoral norte.
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Foto: Arquivo CMA/IBAMA
2.2 - Características físico-naturais da Planície Costeira.
A costa dos Estados do Maranhão, Pará e Amapá demonstra aspecto de litoral afogado.
As planícies aí existentes são extremamente inundáveis, apresentando com freqüência inúmeras
lagoas, ilhas, e uma hidrografia divagante (MMA, 1996a).
A Planície Costeira na foz do Amazonas, que compreende o litoral dos Estados do Pará e
do Amapá, apresenta um aspecto peculiar devido ao aporte de volumosa quantidade de água e
sedimentos transportados e depositados pelos rios (Amazonas e Pará-Tocantins) ao atingir o
oceano. Prevalecem os processos morfogenéticos fluviais que são responsáveis pela gênese de
inúmeras ilhas, destacando-se com maior extensão as de Marajó, Caviana e Gurupá. Constituemse de sedimentos Quaternários fluviais, e secundariamente marinhos. São áreas sujeitas a
inundações periódicas, onde prevalece a vegetação de gramíneas. Constituem terrenos
extremamente frágeis, pois além das freqüentes inundações fluviais e dos efeitos das invasões
das águas pelos efeitos das marés de grande amplitude, os sedimentos são totalmente não
consolidados e o lençól freático é aflorante, em praticamente toda a superfície do terreno. São,
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
17
portanto, áreas totalmente inadequadas para qualquer tipo de assentamento de atividades urbanoindustriais (MMA, 1996a).
A Planície Costeira no Golfão Maranhense, guardando as devidas proporções, tem
aspectos dinâmicos semelhantes ao estuário amazônico devido ao grande volume de água que os
rios da região (Pindaré, Itapecuru, Mearim e Munim) debitam no oceano Atlântico. Estes rios
apresentam vastas planícies de construção fluvial com forte influência marinha, em face do
afogamento do litoral e das elevadas amplitudes de maré. Nesta área é extremamente abundante
a formação vegetal de mangue, que se associa às Planícies de Mangue. Estas planícies são
encontradas na costa do litoral brasileiro, desde a foz do rio Oiapoque (AP) até Laguna (SC); no
entanto apresenta-se com maior exuberância, continuidade e intensidade na costa do litoral norte,
nos Estados do Maranhão, Pará e Amapá (MMA, op. cit.).
Na planície deltaica do rio Parnaíba, também construída por predominância de
sedimentos fluviais, mas com forte influência marinha, observa-se remanejamento de depósitos
arenosos na faixa costeira em função da intensa atividade eólica, criando depósitos dunares e
cordões arenosos marinhos na foz dos rios, formando freqüentemente barragens naturais que
geram lagoas costeiras. O remanejamento permanente de sedimentos arenosos finos cria
extensos Campos de Dunas, que progressivamente invadem Planícies Fluviais e extensas áreas
de Tabuleiros Litorâneos, como ocorre nos Lençóis Maranhenses (MMA, op. cit.).
2.3 – REGIÕES ESTUDADAS
• REGIÃO I (DELTA DO PARNAÍBA E LENÇÓIS MARANHENSES)
Nesta faixa do litoral dominam os depósitos sedimentares do Grupo Barreiras, à frente
dos quais se desenvolvem numerosos campos de dunas, alimentados pelos sedimentos oriundos
da plataforma continental interna, esta, bem como a plataforma continental, é estreita e rasa. Sua
largura, até a isóbata de 50m, é da ordem de 70km, não muito distante da quebra da plataforma,
que ocorre a uma distância da ordem de 80km, em profundidades de apenas 70 a 80m (Palma,
1979 apud MMA, 1996a).
Segundo Lins (1972, apud MMA, op. cit.), o clima nesta região é quente com chuvas de
verão e outono totalizando 1.000 a 1.250mm anuais, associadas ao deslocamento sazonal da
Zona de Convergência Intertropical (ZCIT). As precipitações se concentram principalmente de
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
18
janeiro a maio, onde representam 80% das médias totais anuais, e de agosto a novembro
registram-se os menores índices pluviométricos (IBAMA, 1998).
As condições de temperatura se caracterizam pela pequena amplitude anual e valores
médios que variam entre 25° e 27°C (IBAMA, op. cit.). O percentual de umidade atmosférica
chega a 60% no período chuvoso e a 45% no período seco (Feitosa, 1996).
O Delta do Parnaíba é um tipo de desembocadura múltipla, ramificada em um
arquipélago com cerca de setenta ilhas de variadas dimensões, separadas por canais fluviais
labirínticos, sendo a única feição deltaica das Américas localizada em mar aberto (IBAMA, op.
cit.). Do ponto de vista geomorfológico o Delta se constitui numa das feições mais conspícuas
deste trecho costeiro, reunindo um conjunto de ilhas, ilhotas, cordões litorâneos, restingas e
barras que ocupam uma área de cerca de 2.700km2 (LABOHIDRO, 1999).
O rio Parnaíba chega ao oceano Atlântico através de cinco grandes bocas, quatro destas
situadas no Maranhão (baía de Tutóia, Melancieira, Caju e Canárias) e uma no Piauí (baía de
Igaraçú) (IBAMA, 1998). Na faixa litorânea a planície deltaica é caracterizada pela presença de
bancos arenosos e numerosos canais que delimitam ilhas e ilhotas, onde a salinidade varia de
22ups a 33,8ups (LABOHIDRO, 1999). O rio Parnaíba é um rio não piscoso e suas águas são
barrentas, devido a grande quantidade de material sólido oriundo da erosão que vem sofrendo
nas suas margens, formando numerosos bancos de areia (Brasil, 1991).
Em alguns locais do Delta os campos de dunas atingem uma largura entre 5 e 10km,
estando presentes na periferia norte da maioria das ilhas (lado voltado para o mar); no interior do
Delta são típicas áreas de planícies fluvio-marinhas recobertas por manguezais, sofrendo
influência direta do fluxo da maré (IBAMA, op. cit.) (Fig. 2.3).
Em 1986 o Delta do Parnaíba foi transformado em uma Área de Proteção Ambiental
(APA), através do Decreto Lei n° 98.897 de 28/08/1996 (IBAMA, op. cit.).
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
Figura 2.3 – Delta do Parnaíba.
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Foto: Arquivo CMA/IBAMA
Os Lençóis Maranhenses (Fig. 2.4) são extensos campos de dunas móveis formados pela
ação dos ventos alísios sobre sedimentos arenosos finos que remobilizam constantemente, sendo
um abundante estoque de areia que progressivamente invadem as planícies fluviais e extensas
áreas de tabuleiros litorâneos, constituindo o maior campo de dunas do litoral brasileiro, com
uma extensão de 155 mil hectares (IBAMA, op. cit.).
O reduzido índice pluviométrico (máximo de 1200mm/ano) e a ausência de grandes
cursos d´água acessando este litoral, e as altas taxas de evaporação favorecem a migração dos
sedimentos, além da dificuldade de haver uma cobertura vegetal permanente no solo resulta
nestas grandes extensões de dunas móveis (Feitosa, 1996). Estas estão sempre em deslocamento,
avançando sobre o mangue, assoreando rio e soterrando casas na mesma velocidade com que
abrem espaços em outras áreas.
As dunas dos Lençóis Maranhenses avançam até 50km da costa em direção ao
continente, e formariam um grande deserto, se não fossem as chuvas. No período chuvoso o
local se transforma em oásis natural, quando surgem incontáveis lagoas verdes e azuis entre as
dunas. Durante boa parte do ano estas lagoas de água doce são ricas em peixes e camarões que
migram para os rios e lagos quando as lagoas evaporam, no período da seca que dura entre
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
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quatro e cinco meses. A salinidade nesta parte do litoral é 36ups, sendo característica de água do
mar.
Em 1981, através do Decreto Lei n° 86.060 de 02/06/1981, foi criado o Parque Nacional
Lençóis Maranhenses, uma Unidade de Conservação Federal da Zona Costeira que se estende do
leste da Baía do Tubarão até a foz do rio Preguiças, praticamente o único recurso hídrico desta
área (MMA, 1996a). Dentro dos limites do Parque, há apenas duas "ilhas" de vegetação, com
características de restinga, onde existem dois pequenos povoados de famílias camponesas.
Figura 2.4 – Lençóis Maranhenses.
Foto: Arquivo CMA/IBAMA
• REGIÃO II (GOLFÃO MARANHENSE)
O Golfão Maranhense é basicamente formado pela ilha de São Luís, e pela região
rebaixada e alagadiça dos estuários afogados das baías de São José a leste e São Marcos a oeste,
ocupando uma superfície de 4.000km2. A ilha de São Luís, com uma superfície de 950km2, é um
grande retalho dos antigos tabuleiros costeiros do Maranhão que, vista no conjunto da grande
reentrância do Golfão Maranhense, é uma espécie de larga península interestuarina, mal separada
do continente (SMEMA, 1978).
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
21
O Golfão Maranhense recebe as principais bacias maranhenses, com grande aporte de
águas fluviais (Feitosa, 1996). As águas do Golfão são caracteristicamente estuarinas, resultantes
da mistura das massas de água salgada do Oceano Atlântico Sul, com águas continentais
lançadas pelos rios de maior vazão: Pindaré, Mearim, Itapecuru e Munim, que formam
respectivamente as baías de São Marcos e de São José, fazendo surgir vastas extensões
exuberantes de manguezais (Cutrim et al., 1993). No entanto, na ilha de São Luís predominam
praias arenosas, principalmente no lado leste (Correia, 1987) (Fig. 2.5).
Figura 2.5 – Ilha de São Luís.
Foto: Arquivo CMA/IBAMA
À leste da baía de São José encontra-se a baía do Tubarão (Fig.2.6) - incluída no presente
estudo na região do Golfão Maranhense, formada por diversas ilhas, canais, baías, golfos e
enseadas (SUDEPE, 1975). As ilhas ali existentes, de origem aluvial recente, são recobertas por
vegetação de mangue que penetra nos baixos cursos fluviais, nas quais deságuam vários rios,
destacando-se o Axuí e o Mapari. A presença de canais que permite comunicação da água
oceânica com a plataforma continental interna dá a característica dominante de água salgada à
baía, cuja salinidade varia de 24ups a 32ups. O principal canal encontra-se entre a ilha de
Carrapatal (maior ilha da baía) e a ilha de Macunandiba (MMA, 1996a).
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
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A penetração de ondas de maré, que na preamar inunda grandes áreas no interior da baía
gera correntes de elevada velocidade que, por efeito da turbulência, são responsáveis pelos
elevados teores de material em suspensão (MMA, 1996a).
Figura 2.6 – Baía do Tubarão.
Foto: Arquivo CMA/IBAMA
O clima da região é quente, com temperatura média em torno de 25°C e a estação seca
ocorre na primavera e a chuvosa ocorre no fim do verão (MMA, op. cit.). As águas apresentam
alta turbidez, devido ao constante aporte de sedimentos finos em suspensão trazidos pelos rios,
sendo mais turvo nos meses chuvosos, quando há maior descarga dos rios (SUDEPE, 1975).
Nesta região ocorre uma grande amplitude de maré com variação diurna com cerca de 8m
(Fig. 2.7). Na ilha de São Luís, devido a esta amplitude, associada à fraca declividade dos rios
ocorre, durante a preamar, a penetração da água do mar em quase toda extensão dos rios,
afigurando-os mais como braços de mar (Feitosa, 1996). Isto acarreta a diminuição da velocidade
da corrente fluvial, que perde a capacidade de transporte e termina depositando parte de sua
carga sólida, formando bancos de sedimentos e ilhas de pequena altitude como a dos
Caranguejos (Brasil, 1991).
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
Figura 2.7 - Amplitude de maré (variação diurna de até 8m).
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Foto: Arquivo CMA/IBAMA
• REGIÃO III (REENTRÂNCIAS MARANHÃO-PARÁ)
O litoral das reentrâncias, também denominada costa de “rias”, é formado por terras
baixas com inúmeras reentrâncias correspondentes à desembocadura dos rios e às diversas ilhas
aí existentes (SUDEPE, 1975), formando uma sucessão de pequenos estuários (MMA, 1996a).
Compreende parte dos Estados do Maranhão e do Pará, se estende da borda oeste do Golfão
Maranhense até a borda leste do Golfão Amazônico.
É caracterizada por um clima quente, com temperatura média em torno de 25°C.
Apresenta uma estação seca bem marcada na primavera e a chuvosa no final do verão,
principalmente no mês de março. O vento predominante é do leste, mas no verão predomina o
nordeste (MMA, op. cit.). A umidade atmosférica pode ultrapassar 90% no período chuvoso,
caindo para 60% no período seco (Feitosa, 1996).
Os altos índices pluviométricos anuais (média de 2.000mm) desta região favorecem o
acesso dos rios ao litoral, e a cobertura vegetal permanente do solo reduz os processos erosivos
de origem climática. Com a última transgressão marinha, os vales dos rios foram afogados e a
linha da costa assumiu o caráter recortado que ainda possui, delineando-se as reentrâncias
(Feitosa, 1996).
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
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A plataforma continental é larga, com cerca de 180km, e entrecortada de ilhas, bancos ou
coroas arenosas que são periodicamente inundadas pelo mar, onde a amplitude de maré,
juntamente com a do Golfão Maranhense é a maior do Brasil (8 metros). Desta forma, sempre há
renovação da água no interior das baías e dos golfos, cuja salinidade varia de 13ups a 35ups
dependendo da baía e do período do ano (SUDEPE, 1975).
O recobrimento vegetal desta área é predominantemente de mangues (Fig. 2.8), que
forma um cinturão de até 30km de largura (Góes Filho et.al., 1973, apud MMA, 1996a) e ao
longo das margens de alguns rios maiores penetra até 40km para o interior (MMA, 2001).
A plataforma está sob a influência das correntes das Guianas, que resulta da bifurcação da
corrente Sul-equatorial, na altura do Cabo de São Roque, e apresenta correntes com velocidade
de 4 a 7 nós, bastante importantes na morfologia e distribuição dos sedimentos das baías. Estes
sedimentos são arenosos e de granulação fina e muito fina, e a transparência da água fica entre
0,30m e 0,50m (SUDEPE, op. cit.).
Figura 2.8 – Reentrâncias Maranhenses.
Foto: Arquivo CMA/IBAMA
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
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• REGIÃO IV (GOLFÃO AMAZÔNICO)
A foz do rio Amazonas é formada pelos estuários do Amazonas e do Pará-Tocantins,
separados pela ilha de Marajó. Inúmeras ilhas se localizam entre esta ilha e o litoral do Amapá,
diversos furos e igarapés caracterizam toda a faixa oeste da ilha de Marajó e a área continental
adjacente (MMA, 1996a). Esta região compreende parte do litoral dos Estados do Pará e do
Amapá.
O rio Amazonas se caracteriza pelo enorme volume de descarga e pela variabilidade
sazonal desse volume, refletindo o período de chuvas e o degelo na Cordilheira dos Andes
(MMA, 1996a). Este rio possui uma descarga da ordem de 220.000m3.s-1 (MMA, 1996a), ou de
1 trilhão m3.ano-1 de acordo com Nittrouer et al. (1991), sendo responsável pelo
desenvolvimento de um meio altamente dinâmico na sua foz, propiciando o estabelecimento da
maior zona estuarina do mundo. O volume de sua descarga apresenta grande variabilidade, sendo
a máxima entre os meses de maio e junho, e a mínima entre outubro e novembro (Meade et al.,
1985). O segundo rio do sistema amazônico de drenagem é o Pará (Fig. 2.9), formado pela
confluência de um ramo do rio Amazonas com o rio Tocantins, com a vazão estimada em cerca
de 10.000m3.s-1 (Oltman, 1968 apud Santos, 2000).
A grande descarga na foz do rio Amazonas ocasiona inundações em extensas áreas e
fenômenos erosivos em suas margens com grande freqüência e intensidade, modificando-as,
construindo e destruindo sem cessar (MMA, 1996a). Diégues (1972) relata, para o os primeiros
70 anos do século XX, a ocorrência de 16 enchentes com cotas entre 28 e pouco mais de 29m
acima do nível do mar, sendo que a maior, ocorrida em 1953, atingiu a altura de 29,69m.
A pororoca é outro fenômeno que modifica esta região, ocorrendo no encontro da maré
alta com a enchente dos rios amazônicos, quando a força do mar vence o ímpeto das águas
fluviais, durando dois a três dias. Este fenômeno tem começo nas imediações de Marajó
envolvendo depois o arquipélago de Bailique (Miranda Neto, 1993). A ilha Caviana foi bipartida
com um canal pela pororoca (Marajó, 1895).
A ilha de Marajó é a maior ilha fluvial do mundo, possui 50.000km2 e apresenta tesos e
igapós (Fig. 2.10). Seu litoral possui relevo plano e muito baixo, e apresenta praias, campos e
mangues (Miranda Neto, 1993). As ilhas Caviana, Mexiana e Gurupá também são importantes
dentro do conjunto de ilhas da foz do Amazonas, além do arquipélago de Bailique, pertencente
ao Estado do Amapá.
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
Figura 2.9 – Rio Pará (PA).
Foto: Luna, F. O.
Figura 2.10 – Igarapé na ilha de Marajó (PA).
Foto: Luna, F.O.
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LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
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O clima é equatorial úmido, a temperatura média anual é de 27°C, e sua variação anual é
insignificante. A pluviosidade é de 2.500mm.ano-1 (Miranda Neto, 1993).
As águas do Golfão Amazônico são turvas, com uma grande quantidade de material em
suspensão, o rio Amazonas descarrega 11-13x108 ton.ano-1, cerca de 10% dos sedimentos
lançados anualmente nas águas do Oceano Atlântico (Muller-Karger et al., 1986), variando o
volume de acordo com o fluxo das águas.
Santos (2000), em estudo nos rios Amazonas e Pará, encontrou uma salinidade de
2,49ups nas águas oriundas do rio Amazonas, e observou a presença da pluma do rio Amazonas
(salinidades menores que 33ups) em toda plataforma continental, alcançando na superfície
147km a partir da linha da costa em direção ao mar aberto. Na zona costeira a salinidade varia de
16,74ups a 34,88ups, e na área oceânica varia entre 35,83ups e 36,11ups. A grande variabilidade
na área costeira se deve a maior ou menor influência dos rios amazônicos (Santos, 2000).
• REGIÃO V (LITORAL DO AMAPÁ)
A plataforma continental e o litoral do Amapá (Fig. 2.11) são diretamente influenciados
pelo enorme aporte de sedimentos finos trazidos pelo Amazonas, parcialmente redirecionados
para o norte por ação da circulação oceânica. Depositados na plataforma continental interna,
estes sedimentos são remobilizados pelas ondas, aumentando significativamente a concentração
de sedimentos em suspensão. Apesar desta disponibilidade de sedimentos, trechos significativos
do litoral se apresentam sob erosão acelerada (Nittrouer e DeMaster, 1996) ao passo que outros,
em parte devido ao aporte localizado de sedimentos fluviais da rede hidrográfica local,
apresentam progradação.
O clima é quente, megatérmico, com temperaturas médias anuais oscilando entre 26°C e
28°C. A precipitação é elevada, com totais anuais entre 1500 e 3500mm. A estação chuvosa vai
de janeiro a julho, quando ocorre cerca de 70% da precipitação anual, apresentando excedentes
hídricos entre 900 e 1.700mm, associados a intenso escoamento superficial, cheia dos rios e
inundação (MMA, 1996a). De agosto a dezembro chove menos, ocorrendo déficits hídricos entre
100 e 500mm (IBGE, 1990 apud MMA, 1996a). Os ventos predominantes são de nordeste no
verão e de leste no inverno e na primavera.
A região costeira emersa é formada por uma planície holocênica, de baixa altitude e
largura variando entre 10 e 100km, e que passa no interior para depósitos de planície mais
antigos e rochas de escudo Pré-Cambriano das Guianas, de altitude inferior a 500m (MMA,
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
28
1996a). Essas áreas constituem fontes de parte da rede hidrográfica costeira (Nittrouer e
DeMaster, 1996).
A cobertura vegetal na franja costeira é caracterizada por uma vegetação pioneira, em
fase de sucessão, estabelecida sobre o substrato sedimentar recente. Predominantemente formada
por vegetação de mangue, nas áreas de influência marítima (Leite et al., apud MMA, 1996a), é
seguida para o interior por uma vegetação de campo de gramíneas, em áreas de solos aluviais
hidromórficos, submetidos a inundações periódicas (MMA, op. cit.).
A plataforma continental interna se alarga progressivamente do Cabo Orange ao Cabo
Norte, passando à isóbata de 50m, de uma distância de 28 para 140km (MMA, op. cit.). A
circulação oceânica na plataforma continental interna e ao longo da linha da costa é
predominantemente dirigida para noroeste, em função da Corrente Norte do Brasil, que
transporta as águas oriundas dos rios Amazonas e Pará para o litoral do Amapá (Santos, 2000). A
velocidade de fluxo desta corrente é superior a 100cm/s (MMA, op. cit.), que apresentam altura
média de 1,5m com períodos entre 6s e 7s (Mendes, 1993 apud MMA, op. cit.).
Os ventos alísios, de sudeste, paralelos ao litoral, mudam de direção durante os meses
janeiro a março, quando passam a soprar com maior intensidade de nordeste, perpendicularmente
ao litoral. As ondas geradas por esses ventos são maiores que as geradas pelos alísios de sudeste,
e em vez de estimularem a erosão, trazem sedimentos finos da plataforma em direção à costa, na
forma de lamas fluidas (Kineke e Sternberg, 1995 apud MMA, 1996a). A amplitude da maré, ao
sul do Cabo Norte é elevada, do tipo macromaré, superior a 4m. Ao norte a amplitude decresce
para valores inferiores a 4m, passando para o tipo de mesomaré. Os esforços de cisalhamento
provocados
pela
elevada
velocidade
de
fluxo
das
correntes
de
maré,
dirigidas
predominantemente no sentido perpendicular à linha da costa, parecem ser os principais
responsáveis pela erosão costeira (Nittrouer e DeMaster, 1996). Sua influência faz sentir-se com
especial intensidade nos baixos cursos fluviais, onde a penetração da maré gera o efeito da
pororoca, e exerce significativa influência sobre a navegação costeira, fortemente dependente das
fases da maré (Mendes, 1993 apud MMA, 1996a).
A planície fluviomarinha, entre os lagos e linha da costa, apresenta áreas
permanentemente alagadas, recobertas por vegetação de mangue que se torna mais densa na área
de ocorrência das restingas a norte e sul da foz do rio Sucuriju (Boaventura e Narita, 1974 apud
MMA, 1996a). Estas áreas apresentam características semelhantes à ilha de Marajó, constituindo
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
29
um ambiente tipo pantanal (PROVAM, 1995). No cabo Norte, imediações de Sucuriju, também
ocorre o fenômeno da pororoca, que alcança até as imediações da ilha de Marajó (Marajó, 1895).
Figura 2.11 – Litoral do Amapá.
Foto: Arquivo CMA/IBAMA
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
30
3- MATERIAL E MÉTODOS
O levantamento sobre a distribuição, o status de conservação e os aspectos tradicionais do
peixe-boi marinho no litoral dos Estados do Maranhão, Pará e Amapá, foi executado por técnicos
do Centro Peixe-Boi/IBAMA, que, com o apoio da Fundação O Boticário de Proteção à
Natureza e da Fundação Mamíferos Marinhos, realizaram expedições ao longo destes litorais,
através da Unidade Móvel “IGARAKUE”, em 1992 e 1993, de acordo com o seguinte
cronograma:
Tabela 3.1 – Regiões estudadas e cronograma das expedições.
REGIÃO
PERÍODO
REGIÃO I – Delta do Parnaíba e Lençóis Maranhenses Setembro de 1992
REGIÃO II – Golfão Maranhense
Maio/Junho de 1992
REGIÃO III – Reentrâncias (Maranhão e Pará)
Julho/Agosto de 1992; Junho de1993
REGIÃO IV – Golfão Amazônico
Junho/ Julho/ Agosto de 1993
REGIÃO V – Litoral do Amapá
Agosto de 1993
As localidades visitadas tiveram início na ilha das Canárias, no Delta do Parnaíba, sendo
esta a primeira ilha do lado maranhense do Delta, e percorrendo-se aproximadamente 3.000km,
incluindo baías, golfos e reentrâncias, e terminaram no município do Oiapoque, no Estado do
Amapá.
As visitas às regiões foram divididas desta forma em virtude da extensão do litoral
percorrido e da conseqüente disponibilidade de pessoal, tempo, logística, recursos financeiros,
entre outros, exigidos na coleta de dados in situ.
As informações foram adquiridas através de entrevistas e observações de campo, e
registradas em fichas e planilhas pré-elaboradas, fotografias, vídeos e fitas K-7, materiais que
fazem parte do banco de dados do Centro Mamíferos Aquáticos/IBAMA, os quais serão
utilizadas nesta dissertação.
A experiência adquirida no litoral nordeste, pelos técnicos do Centro Peixe-Boi/IBAMA
no “approach” (a maneira de abordar o entrevistado, que é um dos momentos mais importantes
para se obter informações confiáveis) em realizar entrevistas, conseguindo a maior quantidade de
informações possíveis, e em não induzir as respostas, foi importante na utilização desta
metodologia para o litoral norte.
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
31
As entrevistas foram realizadas através de um questionário pré-elaborado que possui duas
partes: a primeira com informações sobre a localidade e sobre o entrevistado, a segunda com
informações sobre o peixe-boi e sua significância tradicional.
Em cada localidade procurou-se as colônias de pescadores ou membros da comunidade
que desenvolviam ou já haviam desenvolvido alguma atividade relacionada à pesca, para que as
entrevistas fossem realizadas com pessoas que realmente possuíssem experiência no ambiente
litorâneo. Com isso se obteve uma seleção dos sujeitos, ocasionando uma menor variabilidade
nas respostas, maior grau de certeza do conhecimento local e posterior definição do perfil dos
entrevistados.
Para determinar a distribuição e a ocorrência do peixe-boi marinho, a partir das
entrevistas, foram utilizadas as respostas das seguintes perguntas: 1)“Você conhece o peixe-boi
marinho?” (conhece, não conhece, só ouviu falar), 2)“Conhece de onde?” (local, regional ou de
outro Estado). Se o entrevistado conhece o peixe-boi do local, indica a ocorrência do animal na
localidade visitada; se conhece ou ouviu falar que ocorre na região (regional) ou em outro
Estado, anotava-se a localidade que o entrevistado havia citado para posterior visita à mesma
(sempre que possível) com o intuito de conferir a ocorrência ou não da espécie.
A descrição correta do peixe-boi, pelo entrevistado (Fig. 3.1), após o mesmo ter afirmado
conhecer a espécie, quando o entrevistador argumentava: “Você pode descrever como é o peixeboi marinho?”, serviu como nível de confiabilidade das entrevistas. O potencial de um
entrevistado foi compreendido pela experiência do mesmo na captura, apanha, uso, comércio ou
avistagem do peixe-boi naquela localidade, além da idade e tempo de moradia. A escolha
aleatória dos entrevistados dentro de uma comunidade não seria tão eficiente, pois os jovens e os
que desempenham atividades não relacionadas com o ambiente litorâneo normalmente não
possuem o conhecimento sobre a ocorrência e o histórico da caça do peixe-boi.
O número de entrevistas por localidade dependeu da ausência ou presença da espécie. No
caso da resposta de ocorrência ter sido negativa tomou-se o cuidado de consultar outros
membros da comunidade, principalmente os mais velhos e antigos no local, para maior grau de
certeza da ausência da espécie.
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
32
Foto: Arquivo CMA/IBAMA
Figura 3.1 – Entrevista com ribeirinho descrevendo o peixe-boi marinho.
O número máximo de peixes-bois avistados vivos por cada entrevistado, independente de
época ou freqüência das avistagens/ocorrências, será a variável dependente testada para cada
região em que os três Estados foram divididos.
Em localidades onde ocorrem as duas espécies de peixe-boi, o marinho (T. m. manatus) e o
amazônico (T. inunguis), por ser uma área de condições mais favoráveis para o amazônico, o
número de peixes-boi avistados pelos entrevistados foi dividido em um indivíduo marinho e os
demais indivíduos como peixe-boi amazônico.
As observações de campo foram registradas em uma planilha, pré-elaborada, e geraram um
relatório ambiental e antrópico de cada localidade visitada. A parte ambiental indica o tipo de
ambiente, os recursos hídricos, e a vegetação disponível para alimentação do peixe-boi. Já a
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
33
parte antrópica indica as atividades humanas, econômicas, culturais e de impactos ambientais.
Através deste relatório foi possível verificar quais destes fatores influenciam na distribuição do
peixe-boi marinho ao longo da área percorrida.
A unidade móvel “IGARAKUE” foi: uma caminhonete Bandeirante Toyota 4X4,
utilizada no percurso terrestre (Fig. 3.2), barcos (como o FLORAFAUNA - IV/IBAMA–PA; Fig.
3.3), e voadeiras (Fig. 3.4), para chegar nas localidades onde não se tinha acesso por terra. Cerca
de 80% do percurso foi realizado por meio aquático (mar, estuário e rio). Adquiriu-se mapas
geopolíticos de cada Estado, cartas topográficas e cartas náuticas da região.
Figura 3.2 – Toyota Unidade Móvel “IGARAKUE”.
Foto: Arquivo CMA/IBAMA
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
Figura 3.3 – Barco FLORAFAUNA – IV.
Figura 3.4 – Voadeira.
34
Foto: Arquivo CMA/IBAMA
Foto: Lima, R. P.
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
35
No presente estudo o Estado do Maranhão foi considerado litoral norte, pois exatamente
no delta do Parnaíba (divisa com o Estado do Piauí), ocorrem as diferenças fisionômicas. Na
região nordeste do Brasil encontram-se extensas praias de areia, divididas por formações
rochosas ou por pequenos mangues, e, a partir do delta encontram-se, quase que constantemente,
manguezais, formados por Rhizophora, Avicennia e Laguncularia, com árvores tão altas e densas
que dão uma aparência de floresta costeira, e igarapés (geralmente importantes boiadouros de
peixe-boi). Segundo classificação do MMA (1996b), a costa brasileira é dividida em quatro subregiões: região norte; região nordeste e leste; região sudeste e região sul. A região norte estaria
compreendendo o litoral desde o Cabo Orange (AP) até o rio Parnaíba (MA).
Os três Estados (MA, PA e AP) foram divididos em cinco regiões ecológicas (Tab. 3.1),
permitindo-se uma melhor avaliação da ocorrência do animal, já que ambientes ecologicamente
iguais pertencem, às vezes, a dois Estados. É o caso da região de reentrâncias ou litoral em “rias”
(que pertence parte ao Maranhão e parte ao Pará), e do Golfão Amazônico, região onde ocorre
toda a descarga do rio Amazonas e Pará (abrange os Estados do Pará e do Amapá). Uma
avaliação por Estados separaria estas regiões, devido a uma divisão meramente geopolítica.
O número médio de peixe-boi marinho foi correlacionado com as regiões estudadas (Tab.
3.1) e, conforme relatório antrópico-ambiental, com os tipos de ambientes (rio, mar ou estuário),
com a disponibilidade de alimento (alimento presente ou alimento ausente) e com o nível de
degradação ambiental (alta, média e baixa).
A classificação dos níveis de degradação ambiental das localidades efetivou-se como
segue:
•
Localidades com baixa degradação -
são localidades pouco povoadas, com vilas de
pescadores, ausência ou em pequeno número e capacidade de barcos motorizados, sem ou
pouco notáveis os impactos ambientais no habitat do peixe-boi;
•
localidades com nível de degradação médio – são localidades com poucas casas de veraneio,
turismo já influenciando no comércio, pequeno tráfego marítimo, ocupação desordenada da
linha da costa começa a ser observada;
•
localidades com alta degradação – localidades próximas ou dentro de centros urbanos,
estações de veraneio e turismo acentuado, problemas de contaminação das praias e/ou
assoreamento dos recursos hídricos, e ainda, intenso uso de embarcações motorizadas no
habitat do peixe-boi.
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
36
Para correlacionar o número de peixes-bois marinho com as quatro variáveis
independentes mencionadas utilizou-se o seguinte modelo matemático:
N°PB iλ = β0 + β1RI + β2RII + β3RIII+ β4 RIV + β5RV + β6AmRio + β7AmMar +
+
β8AmEst +β9AliP +β10AliA +β11DAlta +β12DMéd +β13DB + ei
Em que: N°PB – número médio de peixe-boi marinho; λ - fator de transformação de Box
e Cox; β0, β1, β2, β3, β4, β5, β6, β7, β8, β9, β10, β11, β12, β13 – parâmetros do modelo; R –
regiões; RI-V – regiões estudadas; Am – ambiente; Rio – rio; Mar – mar; Est. – estuário; Ali alimento; P – presente; A – ausente; D – nível de degradação ambiental; Alta - alta; Méd –
média; B – baixa; e – erro associado à observação e; i – i-ésima observação.
Todas as variáveis independentes (R, Am, Ali, D) foram correlacionadas no modelo sob
a forma de variável “MUDA” (DUMMY).
Para estimar os parâmetros do modelo (β), utilizaram-se associados os processos de
transformação de Box e Cox (Box e Cox, 1964) e o STEPWISE, através do programa de
computação STATGRAPHICS Versão 7.0.
O transformador de Box e Cox foi usado objetivando minimizar a variância experimental,
ao mesmo tempo maximizar o índice determinístico (r2). Para o processo de STEPWISE
utilizou-se o “F” da análise de regressão de entrada e saída de 4.
Se forem consideradas as diferenças intrínsecas dos entrevistados, a validade do número
de peixes-bois avistados por cada pessoa pode ser prejudicada. Para minimizar esta
possibilidade, colheu-se um número suficiente de entrevistas por localidade e, devido as
semelhanças entre os entrevistados, já que os mesmos vivem em região litorânea, com hábitos,
costumes e grau de instrução parecidos, pôde-se relevar possíveis diferenças.
Embora o método por entrevista tenha a limitação acima descrita, a pesquisa é importante
por ser a única forma de se estudar a ocorrência da espécie no litoral brasileiro, além das visitas
terem resgatado o saber tradicional dos entrevistados em relação ao peixe-boi, e terem
propiciado, ainda, difusão de informações de caráter conservacionista para a espécie.
LUNA, F. O.
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37
A fim de conferir a autenticidade requerida ao presente trabalho, vocábulos e
denominações regionais, ou em desuso, utilizadas para definir fenômenos da natureza, mitos,
tradições folclóricas e culturais, denominação de objetos e seres, instrumentos de caça, assim
como o peixe-boi, seus hábitos, e relacionamento com o meio ambiente, foram incorporados ao
texto exatamente como os utilizam os “ribeirinhos”, bem como a bibliografia consultada. Face ao
que, para permitir melhor elucidação do texto, incorporou-se à presente dissertação um glossário,
fundamentado em: Miranda (1968), Best e Teixeira (1982), Colares e Colares (1992), Miranda
Neto (1993), Falabella (1994), Castro (1999), Ferreira (1999) e Martinelli (2000).
As normalizações das referências bibliográficas, das informações obtidas via links da
internet, e a numeração das Figuras e Tabelas seguiram as recomendações da Associação
Brasileira de Normas Técnicas (ABNT, 2000).
LUNA, F. O.
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38
4 - RESULTADOS
4.1 – QUANTO ÀS CARACTERÍSTICAS DA INVESTIGAÇÃO
4.1.1 - ESFORÇO DE INVESTIGAÇÃO
Considerou-se que quanto maior o número de localidades visitadas na região percorrida,
menor seria a área sem informação da ocorrência ou não da espécie, porém o litoral dos Estados
do Maranhão, Pará e Amapá é formado predominantemente por áreas de manguezais pouco
habitados e de difícil acesso, tendo-se percorrido todas as localidades onde foi possível ter
acesso, e as principais localidades pesqueiras.
O número de localidades visitadas e o número de entrevistas realizadas em cada região,
com as médias de entrevistas/localidades pode ser observado na tabela 4.1
Tabela 4.1 – Número de localidades visitadas por região, com os respectivos números de
entrevistas realizadas e o esforço médio por local.
Nº de localidades
Nº de entrevistas
Média de entrevistas
/ local
Região I
09
17
1,89
Região II
27
52
1,93
Região III
54
96
1,78
Região IV
43
65
1,51
Região V
12
32
2,66
Total
145
262
1,81
Região
Foram visitadas 145 localidades nas cinco regiões, percorrendo-se aproximadamente
3.000km do litoral norte do Brasil, o que gerou uma distância média na área amostral de 20,5km,
ou seja, a cada 20,5km uma localidade foi visitada.
LUNA, F. O.
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39
4.1.2 – PERFIL DOS ENTREVISTADOS
•
IDADE DO ENTREVISTADO
A idade dos entrevistados, nas cinco regiões percorridas, variou de 20 a 98 anos, sendo a
média de idade dos entrevistados 56 anos. O intervalo e a média das idades em cada região pode
ser observado na tabela 4.2, e a freqüência relativa das idades na figura 4.1.
Tabela 4.2 - Médias e intervalos de idades dos entrevistados por região.
Intervalo das idades
Média das idades
Região I
24 – 77
55
Região II
20 – 84
47
Região III
22 – 87
65
Região IV
25 – 98
54
Região V
25 – 78
53
Total
20 – 98
56
Região
22,9%
22,0%
15,3%
13,5%
11,2%
9,9%
5,4%
20-29
anos
30-39
anos
40-49
anos
50-59
anos
60-69
anos
70-79
anos
80 ou
mais
Figura 4.1 – Freqüência relativa das idades dos entrevistados nas cinco regiões.
LUNA, F. O.
•
40
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
ATIVIDADE EXERCIDA PELO ENTREVISTADO
A atividade exercida por 80,53% dos entrevistados é ou foi relacionada à pesca. O
número de entrevistados de cada região e as atividades desenvolvidas por eles pode ser
observado na tabela 4.3. A freqüência relativa de cada atividade encontra-se na figura 4.2.
Tabela 4.3 - Atividades exercidas pelos entrevistados em cada região.
Região I
Região II
Região III
Região IV
Região V
Total
Pescador
12
38
84
36
23
193
Ex – pescador
02
04
05
00
00
11
Comerciante
01
03
00
03
02
09
Presidente de colônia
01
00
02
03
01
07
Agricultor
00
00
01
04
02
07
Carpinteiro
00
00
00
06
00
06
Extração de palmito
00
00
00
05
00
05
Salva – vidas
00
03
00
00
00
03
Pecuarista
01
00
00
02
00
03
Político
00
00
00
01
01
02
Outros
00
04
04
05
03
16
Pescador
4 ,2
0%
Atividade
3,
40
%
Ex - pescador
73,70%
0%
2 ,7
%
2,70
2,30%
1,90%
1,15%
1,15
%
0
,70
Comerciante
Presid. Colonia
Agricultor
Carpinteiro
%
Extr. Palmito
%
10
6,
Salva-vidas
Pecuarista
Político
Outros
Figura 4.2 - Freqüência relativa das atividades exercidas pelos entrevistados, nas cinco regiões.
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
41
4.1.3 – QUANTO AO ENTREVISTADO CONHECER O PEIXE-BOI MARINHO
•
ENTREVISTADO QUE CONHECE OU NÃO O PEIXE-BOI MARINHO
Um dos aspectos observados durante as entrevistas foi que há regiões onde o número de
pessoas que conhecem o peixe-boi marinho é menor do que os que não conhecem, podendo ser
observado na tabela 4.4 e a freqüência relativa na figura 4.3.
Tabela 4.4 – Número de entrevistados que conhecem e não conhecem o peixe-boi marinho, por
região.
Região
Nº entrevista afirmativa
Nº entrevista negativa
05
12
Região II
47
05
Região III
74
22
Região IV
21
44
Região V
28
04
Total
175
87
33,20%
66,80%
67,60%
9,92%
12,50%
32,30%
22,92%
29,41%
70,59%
77,08%
87,50%
90,38%
REGIÃO I
Reg I
Reg II
Reg III
Conhece
Reg IV
Reg V
Total
Não Conhece
Figura 4.3 - Freqüência relativa dos entrevistados que conhecem ou não o peixe-boi marinho.
LUNA, F. O.
•
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
42
CONDIÇÃO BIOLÓGICA DO PEIXE-BOI QUANDO O ENTREVISTADO O CONHECEU
Os 175 entrevistados que conhecem o peixe-boi marinho, viram o animal em uma das
seguintes situações:
•
Vivo – já avistou o animal em seu ambiente natural, que não necessariamente foi aonde
mora ou aonde tenha sido entrevistado.
•
Morto – só viu o animal morto, inteiro ou alguma parte como: couro, carne, osso, banha.
•
Vivo e Morto – já avistou o animal em seu ambiente natural (que não necessariamente foi
aonde mora ou aonde foi entrevistado), e o viu morto (inteiro ou alguma parte). Podendo
o entrevistado ter caçado ou não o peixe-boi marinho.
•
Museu/ cativeiro – não avistou o animal em seu ambiente natural.
A tabela 4.5 demonstra em cada região o número de entrevistados que conheceram o
animal em cada uma das situações descritas. Na figura 4.4 pode-se observar a freqüência
relativa.
Tabela 4.5 – Número de entrevistados que conheceram o peixe-boi marinho vivo, morto, vivo e
morto, e museu/cativeiro, por região.
Região
Vivo
Morto
Vivo e Morto Museu/Cativeiro
Região I
REGIÃO II
01
30
02
00
01
17
01
00
Região III
Região IV
Região V
Total
25
03
01
60
15
00
04
21
32
14
22
86
02
04
01
08
49,14%
12,00%
4,57%
34,29%
Vivo
Vivo e Morto
Morto
Museu/ cativeiro
Figura 4.4 - Freqüência relativa de como se encontrava o peixe-boi marinho quando os
entrevistados o conheceu.
LUNA, F. O.
•
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
43
QUANDO O ENTREVISTADO NÃO CONHECE O PEIXE-BOI MARINHO
Os entrevistados podem nunca terem visto o peixe-boi marinho, mas terem ouvido falar
do mesmo, como: locais de ocorrência, aspectos folclóricos, ou que o animal existia na época de
seus pais ou avós. Podem conhecer o peixe-boi amazônico, que também ocorre na região norte
do Brasil, ou mesmo nunca terem ouvido falar sobre peixe-boi.
Dos 87 entrevistados que não conhecem o peixe-boi marinho podemos separá-los da
seguinte maneira:
•
Ouviu falar – 35 entrevistados (40,20%);
•
Nunca ouviu falar – 12 entrevistados (13,80%)
•
Conhece o peixe–boi amazônico – 40 entrevistados (46,00%)
A figura 4.5 demonstra a porcentagem dos entrevistados que não conhecem o peixe-boi
marinho, mas já ouviram falar dele, nunca ouviram, ou conhecem o amazônico, nas cinco
regiões estudadas.
13,80%
46,00%
40,20%
Ouviu falar
Nunca ouviu falar
Conhece o amazônico
Figura 4.5 – Porcentagem dos entrevistados que não conhecem o peixe-boi marinho, mas já
ouviram falar dele, nunca ouviram, ou conhecem o amazônico.
LUNA, F. O.
•
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
44
CONFIRMAÇÃO QUANTO AO ENTREVISTADO CONHECER O PEIXE-BOI MARINHO, E
DIFERENCIAR AS DUAS ESPÉCIES.
Através da pergunta: “Como é o peixe-boi marinho?”, foram obtidas descrições do
animal como observado pelos entrevistados. Tais descrições permitiram verificar se eles
conheciam de fato o peixe-boi marinho. Nos locais em que ocorriam, ou poderiam vir a ocorrer
as duas espécies (T. m. manatus e T inunguis), o entrevistador perguntou com mais detalhes
sobre a descrição do animal, para identificar qual espécie o entrevistado realmente conhecia, ou,
se conhecia as duas.
Não houve, por parte dos entrevistados que declaravam conhecer, nenhuma informação
importante com discrepância acentuada na descrição do peixe-boi marinho, bem como não
surgiu nenhum caso de confusão com outro animal, salvo com o peixe-boi amazônico, neste caso
os maiores detalhamentos elucidaram as dúvidas.
Ao entrevistado que manifestava dúvida ou dizia não conhecer o animal, eram
formuladas perguntas para conferir se ele não conhecera o peixe-boi com outra denominação ou
se não houvera, em alguma oportunidade, confundido o peixe-boi marinho com outro animal.
Como já citado anteriormente, o peixe-boi da Amazônia é bem escuro, quase sempre
possui uma mancha branca no ventre, não possui unhas nas nadadeiras e atinge tamanho menor
que o marinho (diferença esta que não pode ser levado em conta isoladamente, pois filhotes e
jovens do peixe-boi marinho são, naturalmente, menores que os adultos). Os entrevistados se
referem aos peixes-bois amazônicos destacando a mancha branca no ventre ou denominando-o
de peixe-boi manteiga.
As respostas mais citadas e comentários interessantes sobre o peixe-boi marinho (Fig.
4.6) estão relacionados a seguir:
•
“Parece um casco virado, tem cabeça de boi e corpo de peixe, tem dois metros, é preto, e
grosso, fica sempre no comedouro.”
•
“É um bicho grande, preto claro, roliço, inteiro, tem mais ou menos dois metros, come
siriúba, e a carne é boa, .”
•
“É grande, pesa uns 400kg, é preto, cabeça de búfalo sem chifre, duas nadadeiras com casco,
e tem a cauda certa.”
•
“O peixe-boi é muito grande, roliço, preto, com cauda redonda, é diferente dos outros peixes,
tem barbas e focinho igual ao do boi mesmo, é arisco e come o tempo todo.”
•
“É tipo o boto, mas tem dois braços, não tem aba nas costas, tem pelo, a cabeça é igual de
porco e fica sempre no varadouro.”
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
45
•
“Metade peixe, metade boi, cabeça de boi com focinho e braço de gente, todo preto, pesa
mais ou menos 300kg, come capim, aninga e só faz boiar.”
•
“Tem a cauda deitada como a do camarão, tem cabelo nas costas e casco nos braços.”
•
“Tem dois bracinhos curtos, com quatro unhas que eles arrastam para pegar o paturá.”
•
“Cauda chata, duas mãozinhas com 4 unhas, parece canoa alagada, ficam com o lombo no
sol no boiadouro.”
•
“Tem casco na ponta dos braços e a cabeça é igual de boi, a cauda é grande e chata e tem três
tipo de carne.”
•
“Cor escura, roliço, tem uns cabelos, três unhas nas abas, venta de boi, rabo aboliçado, come
aninga.”
•
“Tem couro como o boto, cabeça como o boi, tem munheca que anda na praia, é cinza, se
alimenta de mururé e caiseca.”
•
“É curtinho, grosso, preto, bracinho curto, cabelinho nas costas, focinho de gado e é sagaz”.
•
“Tem dois bracinhos com unhas, cauda como remo, couro grosso, uns lisos e outros
cabeludos, cor preta ou cinzenta, tem uns pequenos e uns grandes de 600kg.”
•
“Tem duas mãos com unhas, couro como búfalo com cabelo, rabo redondo diferente do peixe
e faz rebojo para cima.”
•
“Preto, tem duas abas e quando morre bota as duas abas no peito, como um cristão.”
•
“Rabo chato, ao contrário do corpo, tem dois remos, a venta e os dentes são como o do boi, o
ouvido é como agulha, mas ouve muito, tem cabelinhos no corpo, é redondo e a cor é preta.”
•
“Cor preta, meio chato, com mais ou menos três metros, a cara parece boi, cauda curta, ele só
boia e bota o focinho de fora.”
•
“Tipo um boto, mas o rabo é atravessado, ao contrário, o focinho é de boi, tem duas abinhas
pequenas e vivem de bubuia.”
•
“É grande, tem couro, tem focinho como o gado e cabelinho nas ventas. A cauda é do tipo
remo e é onde tem força, as abinhas são como remo e na lama aparece o rastro, a cor é preta
para cinza.”
•
“Ficam boiando aqui e acolá, comem capim, tem dois bracinhos como remo, o rabo é grande
e virado, tem uns três metros, a cor é preta, tem abas com unhas e cara de boi.”
•
“São grande, redondo, tem pelo no corpo, mede até três metros e tem aba como se fosse uma
bota de borracha. Aparece a cabeça para fora, as vezes meio corpo, sempre rápido, come
mururé, cipó e outras qualidades de capim.”
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
46
•
“Peixe grande, amamenta, ouve muito bem, come os matos na beira do mar.”
•
“É um peixe grosso, tipo um boto, rabo atravessado e chato, focinho de boi, couro grosso,
todo preto, abas como mãozinhas.”
•
“Peixe com nariz de porco, preto, com mais ou menos dois metros, abas na frente como
tubarão e com unhas, e aba de atras como remo.”
•
“Parece um zepelim, com abas com unhas, uma cauda que parece remo, cor escura sem
manchas, e mede uns três metros.”
Figura 4.6 – Peixe-boi marinho (Trichechus manatus manatus).
Foto: Arquivo CMA/IBAMA
Algumas respostas que citam o peixe-boi amazônico (Fig. 4.7):
•
“Preto, barriga branca, aba grande, rabo atravessado, jeito de avião, um ouvido fino, ouve
longe.”
•
“É grande, roliço, parece um canoa virada, e tem de duas águas: os dos lagos e os do mar.”
•
“Não tem buraco na cabeça como o boto, come capim, e não bóia onde tem barulho, tem de
dois tipos, o manteiga e o cinza.”
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
47
•
“É sabido, ouve e enxerga bem, fareja a pessoa no vento, só tem dois braços, é roliço, tem a
cabeça curta, é preto e alguns tem mancha branca no peito, tem de todo tamanho, a maioria
com mais ou menos 250kg.”
•
“É preto, roliço, com uns 100kg ou mais, tem dois braços, rabo grande como um remo e
alguns tem estrela no peito.”
Figura 4.7 – Peixe-boi amazônico (Trichechus inunguis).
Foto: Arquivo CMA/IBAMA
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
48
4.2 – QUANTO À DISTRIBUIÇÃO DO PEIXE-BOI
4.2.1 - DISTRIBUIÇÃO AO LONGO DA ÁREA INVESTIGADA
Tabela 4.6 - Relação das localidades visitadas com seus respectivos números de entrevistas, número
de peixe-boi citado pelos entrevistados e média de peixe-boi/entrevista.
Local / UF – Região
Ilha das Canarias/MA – I
Ilha do Cajú/MA – I
Carnaibeira/MA – I
Água Doce/MA – I
Tutóia/MA – I
Vassouras/MA – I
Barreirinhas/MA – I
Mandacaru/MA – I
Atins/MA – I
Axuí/MA – II
Gato/MA – II
Costela/MA – II
Manuma/MA – II
Porto da Rosa/MA – II
Ilha Grande/MA – II
Ilha Mucunandiba/MA – II
Ilha Carrapatal/MA – II
São José do Ribamar/MA – II
Praia Boa Viagem/MA – II
Porto Mocajituba/ MA – II
Guarapiranga/MA – II
Mato Grosso/MA – II
Quebra – Pote/MA – II
Igaraú/MA – II
Raposa/MA – II
Porto Grande/MA – II
Porto Iguaíba/MA – II
Pau Deitado/MA – II
Coqueiro/MA – II
Praia do Calhau/MA – II
Olho D'água/MA – II
São Marcos/MA – II
Ponta Araçagy/MA – II
Cumbiqui/MA – II
Panaquaira/MA – II
Tajaçuaba/MA – II
Nº Entrevistas
2
1
4
1
4
1
1
1
2
2
3
1
4
3
2
2
3
2
1
1
2
1
2
1
2
1
3
2
2
2
1
2
1
1
1
4
N° peixe – boi
marinho
0
0
0
0
0
0
0
0
0
28
20
3
38
24
6
4
30
4
2
2
7
1
11
12
5
30
5
7
0
0
0
0
0
0
0
0
Média n peixe
– boi marinho
0
0
0
0
0
0
0
0
0
14
6,66
3
9,5
8
3
2
10
2
2
2
3,5
1
5,5
12
2,5
30
1,67
3,5
0
0
0
0
0
0
0
0
N° peixe – boi
amazônico
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
Média n peixe boi amazônico
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
Continua ...
LUNA, F. O.
49
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
Tabela 4.6 - Relação das localidades visitadas com seus respectivos números de entrevistas, número
de peixe-boi citado pelos entrevistados e média de peixe-boi/entrevista (continuação).
Local / UF – Região
Alcântara/MA – III
Ponta de Areia/MA – III
Canelatiua/MA – III
Giz/MA – III
Iguaíba/MA – III
Cojupe/MA – III
São João do Cortês/MA – III
Cedral/MA – III
Rasgado/MA – III
Cururupu/MA – III
Tapera/MA – III
Guajaritiua/MA – III
São Lucas/MA – III
Peru/MA – III
Vale-me-Deus/MA – III
Ilha Lençóis/MA – III
Cachoeirinha/MA – III
Itererê/MA – III
Acipicum-Açu/MA – III
Bacuri/MA – III
São José/MA – III
Ilha Pau e Faca/MA – III
Boa Vista de São João/MA –
III
Canhacuema/MA – III
Miramar/MA – III
Turiaçu/MA – III
Santa Bárbara/MA – III
Furo do Escuta/MA – III
Espera Bela Vista/MA – III
Espanha/MA – III
Estandarte/MA – III
Cândido Mendes/MA – III
Aurizona/MA – III
Barreira/MA – III
Caratupera/MA – III
Vizeu/PA – III
Bragança/PA – III
Ajuruteua/PA – III
Quatipuru/PA – III
São João de Pirabas/PA – III
Nº Entrevistas
2
1
1
1
1
1
2
3
3
2
3
2
2
1
1
2
1
1
2
4
2
1
3
N° peixe – boi
marinho
9
1
2
2
3
1
2
0
4
1
11
12
4
2
0
7
0
0
0
2
1
0
0
Média n peixe boi marinho
4,5
1
2
2
3
1
1
0
1,33
0,5
3,66
6
2
2
0
3,5
0
0
0
0,5
0,5
0
0
N° peixe – boi
amazônico
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
Média n peixe boi amazônico
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
3
4
1
2
1
1
1
1
2
1
1
4
5
1
1
3
1
0
0
0
0
0
0
10
1
16
0
0
2
24
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
10
1
8
0
0
0,5
4,8
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
Continua ...
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
50
Tabela 4.6 - Relação das localidades visitadas com seus respectivos números de entrevistas, número
de peixe-boi citado pelos entrevistados e média de peixe-boi/entrevista (continuação).
Local / UF – Região
Salinópolis/PA – III
Timbuteua Velho/PA – III
Furo da Mocooca/PA – III
Quarenta do Mocooca/PA – III
Aricuru/PA – III
Quarenta/PA – III
Maracanã/PA – III
Ponta do Algodoal/PA – III
Marapanim/PA – III
Arrombado/PA – III
Abade/PA – III
Curuça/PA – III
Ilha Romana/PA – III
S. Caetano Odivelas/ PA – III
Vigia/PA – IV*
Colares/PA – IV*
Mosqueiro/PA – VI*
Joanes/PA – IV*
Salvaterra/PA – IV*
Soure/PA – IV*
Ilha dos Camaleões/PA – IV*
Ilha Mexiana/PA – IV*
Chaves/PA – IV**
Vila do Cajuuna/PA – IV**
Afuá/PA – IV**
Ilha do Vieirinha/PA – IV**
Ilha Salvador/PA – IV**
Ilha dos Porcos/PA – IV**
Curumu/PA – IV**
Bela vista/PA – IV**
Vista Alegre/PA – IV**
São Sebastião/PA – IV**
Rio Jaburu PA – IV**
Jaburuzunho/PA – IV**
Sutera/ PA – IV**
Guaiúba/PA – IV**
Juliana/PA – IV**
Beriuçú/PA – IV**
Três Bocas/PA – IV**
Dias/PA – IV**
Nº Entrevistas
3
2
1
1
1
1
1
1
3
1
1
2
2
1
2
2
1
3
2
2
3
1
2
1
3
1
1
2
3
1
1
1
1
2
1
1
1
1
1
1
N° peixe – boi
marinho
0
0
0
0
0
0
1
2
20
0
0
0
0
0
2
2
1
3
2
2
3
1
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
Média n peixe boi marinho
0
0
0
0
0
0
1
2
6,66
0
0
0
0
0
1
1
1
1
1
1
1
1
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
N° peixe – boi
amazônico
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
8
2
1
3
2
16
4
1
2
3
11
3
2
1
3
0
0
0
2
0
1
1
1
1
4
0
Média n peixe boi amazônico
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
4
1
1
1
1
8
1,33
1
1
3
3,66
3
2
0,5
1
0
0
0
2
0
1
1
1
1
4
0
Continua ...
LUNA, F. O.
51
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
Tabela 4.6 - Relação das localidades visitadas com seus respectivos números de entrevistas, número
de peixe-boi citado pelos entrevistados e média de peixe-boi/entrevista (continuação).
Local / UF – Região
Ponta Negra/PA – IV**
Serraria Amazônia/PA – IV**
Breves/PA – IV**
Bagre/PA – IV**
Curralinho/PA – IV**
Ilha São Pedro/PA – IV**
São Sebastião da Boa
Vista/PA – IV**
Ilha de Santa Cruz /PA – IV**
São Francisco da Jararaca/ PA
– IV**
Ilha Grande do Curuá/AP –
Nº Entrevistas
1
1
1
1
1
1
3
N° peixe – boi
marinho
0
0
0
0
0
0
0
Média n peixe boi marinho
0
0
0
0
0
0
0
N° peixe – boi
amazônico
1
0
2
2
2
1
6
Média n peixe boi amazônico
1
0
2
2
2
1
2
1
1
0
0
0
0
2
0
2
0
2
0
0
0
0
1
0
0
0
0
1
0
0
0
0
1
1
3
2
2
4
5
3
2
3
2
1
5
1
1
2
3
0
0
0
0
0
0
9
12
4
3
0
0
2
1
2
0
11
0
0
0
0
0
0
1,8
4
2
1
0
0
0,4
1
2
0
3,66
3
4
24
40
20
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
3
4
8
20
10
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
IV**
Ilha do Faustino/AP – IV**
Retiro do Coqueiro/AP – IV**
Vila Progresso/AP – IV**
Macedônia/AP – IV**
Ilha de Brique/AP – IV**
Bailique/AP – IV**
Região dos Lagos/AP – IV**
Sucuriju/AP – V
Amapá/AP – V
Goiabal/AP – V
Calçoene/AP – V
Ponta do Caciporé/AP – V
Cachoeira de Caciporé/AP – V
Vila Velha/AP – V
Taperebá/AP – V
Cabo Orange/AP – V
Vila Nova/AP – V
Aldeia Galibi/AP – V
Oiapoque/AP – V
* Localidades visitadas que ocorrem duas espécies de peixe-boi, o peixe-boi marinho (Trichechus manatus manatus) e o
peixe-boi amazônico (Trichechus inunguis); ** Localidades visitadas que não ocorre o peixe-boi marinho (T. m.
manatus), mas ocorre o peixe-boi amazônico (T. inunguis).
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
Figura 4.8 - Mapa esquemático da distribuição do peixe-boi marinho (Trichechus manatus manatus) e do
peixe-boi amazônico (Trichechus inunguis) no litoral norte do Brasil.
52
LUNA, F. O.
53
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
A figura 4.9 representa a distribuição das médias de peixe-boi ao longo da área percorrida.
40
30
20
Peixe-boi da Amazônia
Peixe-boi marinho
Vila Velha AP - V
Goiabal AP - V
Ilha de Brique AP - IV
Curralinho PA - IV
Ilha Grande do Curuá AP - IV
Dias PA - IV
Sutera PA - IV
Afuá PA - IV
Bela vista PA - IV
Vigia PA - IV
Soure PA - IV
Arrombado PA - III
Aricuru PA - III
São João de Pirabas PA - III
Espanha MA - III
Caratupera MA - III
Bacuri MA - III
Miramar MA - III
Cururupu MA - III
Vale - me - Deus MA - III
Iguaíba MA - III
Tajaçuaba MA - II
Raposa MA - II
Praia do Calhau MA - II
Guarapiranga MA - II
Ilha Mucunandiba MA - II
Gato MA - II
0
Vassouras MA - I
10
Ilha do Cajú MA - I
MÉDIA DE PEIXE-BOI
DISTRIBUIÇÃO DO PEIXE-BOI NO LITORAL NORTE
LOCALIDADES
Figura 4.9 – Representação gráfica da distribuição das médias do número de peixes-bois ao
longo da área percorrida.
•
CITAÇÕES DE OCORRÊNCIA DO PEIXE-BOI MARINHO EM OUTRAS LOCALIDADES.
O entrevistado pode conhecer vivo e/ou morto o peixe-boi marinho do próprio lugar onde
foi entrevistado, quando registrou-se a ocorrência para a localidade da entrevista, ou de outros
lugares, quando anotou-se o mesmo para posterior confirmação. O entrevistado que só ouviu
falar do animal também pode ter ouvido falar que ele ocorre onde foi entrevistado, quando
realizou-se outras entrevistas para confirmação, ou em outros lugares, anotando-se também para
posterior confirmação. Através da pergunta: “De onde você conhece o peixe-boi marinho?” foi
possível identificar se a espécie ocorria ou não nos locais das entrevistas, e outros possíveis
locais que poderiam ocorrer. As respostas foram divididas das seguintes formas:
•
Local - se conhece (ou ouviu falar) do próprio lugar onde foi entrevistado; 55,24% dos
entrevistados responderam que a espécie ocorre aonde estava sendo entrevistado.
•
Regional - se conhece (ou ouviu falar) de outro lugar no mesmo Estado; com 35,24% das
respostas.
LUNA, F. O.
•
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
54
Outro Estado - se conhece (ou ouviu falar) de outro Estado, não sabendo da ocorrência no
Estado onde a entrevista foi realizada; 5,71% dos entrevistados sabiam da ocorrência em
outros Estados
•
Museu – se só conhece o peixe-boi do museu. Somente sete entrevistados (3,33%) viram
o peixe-boi apenas no museu, não sabendo de alguma localidade de ocorrência da
espécie.
•
Cativeiro – quando o entrevistado só viu o animal em cativeiro. Somente uma pessoa
(0,48%) conhecia o animal apenas no cativeiro. Sr. Lorival, zelador de uma fazenda que
possuía peixe-boi marinho em cativeiro, no Oiapoque (AP).
Na Região I e em grande parte da Região IV os entrevistados não conheciam a ocorrência
do peixe-boi marinho no local aonde foram entrevistados. Procurou-se visitar todas as
localidades citadas como de ocorrência para uma confirmação da mesma, porém algumas não
puderam ser visitadas. O número de localidades citadas foi 40, das quais 07 não foram visitadas.
Tendo-se obtido as seguintes informações:
Tabela 4.7 – Número de localidades visitadas e não visitadas, citadas pelos entrevistados como
de ocorrência da espécie, e a confirmação ou não da ocorrência.
Ocorrência
Confirma
Não confirma
Localidades visitadas
26
Localidades não visitadas
03
07
04
Nas sete localidades citadas e visitadas em que não houve confirmação da ocorrência, a
referência de ocorrência para a localidade foi feita por apenas um entrevistado. Nas demais 26
localidades visitadas e confirmadas, mais de um entrevistado referiu a ocorrência. O que permite
inferir que uma localidade citada por mais de um entrevistado oferece maior possibilidade de
confirmar a ocorrência. Das sete localidades citadas e não visitadas, quatro foram citadas por
apenas um entrevistado, por isso consideradas localidades de ocorrência não confirmada, e três
foram mencionadas por vários entrevistados, sendo por isso consideradas localidades de
ocorrência: Ilha dos Caranguejos (no Golfão Maranhense), Marrecal e Macarry (no litoral do
Amapá).
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
55
4.2.2 - DISTRIBUIÇÃO EM FUNÇÃO DA REGIÃO, TIPO DE AMBIENTE, DISPONIBILIDADE DE
ALIMENTO E NÍVEL DE DEGRADAÇÃO AMBIENTAL.
Ao se correlacionar o número médio de peixes-bois (N°PB) com as quatro variáveis
independentes: região (R), tipo de ambiente (Am), disponibilidade de alimento (Ali) e nível de
degradação ambiental (D), obteve-se a seguinte função matemática:
N°PB = (-1,09RI – 0,52RIV + 0,38AmEst + 0,37AliA + 0,80AliP)10
r2 = 82,39%
De acordo com o modelo acima, verifica-se que na variável “região (R)”, as Regiões II,
III e V foram consideradas iguais estatisticamente (p ≥ 0,05) e as Regiões I e IV são
significativamente diferentes entre si e entre as Regiões II, III e V (p ≤ 0,05). A ausência das
variáveis regiões II, III e V no referido modelo evidencia que, a priori, estas regiões não
influenciam no número de peixes-bois. Já as regiões I e IV apresentam um valor negativo no
modelo, o que evidencia que estas regiões influenciam na ocorrência de um menor número de
peixes-bois.
Em relação à variável “tipo de ambientes (Am)”, o referido modelo indica que apenas o
ambiente de estuário influencia no número de peixes-bois, aumentando o número de animais
neste ambiente. Entre os ambientes de rio e mar não há diferença significativa (p ≥ 0,05), estes
não influenciam no número de peixes-bois, sendo significativamente diferente do ambiente de
estuário (p≤0,05).
Quanto à disponibilidade de alimento o modelo evidencia que tanto os locais que
apresentam alimento para o peixe-boi marinho como os que não apresentam alimento
influenciam positivamente no número de peixes-bois, porém ambos são significativamente
diferentes (p ≤ 0,05). O modelo indica que onde há alimento o número de peixes-bois é à priori
2.200 vezes maior que onde não há alimento.
A ausência da variável “nível de degradação ambiental” no referido modelo indica que no
litoral estudado o nível de degradação em que se encontram os ambientes não influencia no
número de peixes-bois marinhos. Os ambientes de baixa, média e alta degradação foram
considerados estatisticamente iguais pelo modelo (p ≥ 0,05).
A partir do presente modelo matemático obteve-se os gráficos do número médio de
peixes-boi marinhos nas localidades pertencentes a cada região, correlacionado com o tipo de
ambiente da localidade, e se nela há ou não disponibilidade de alimento. Foram gerados dois
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
56
gráficos, onde um demonstra o ambiente de estuário (Fig. 4.10) e o outro demonstra os
ambientes de rio e de mar, já que são estatisticamente iguais (Fig. 4.11).
Reg I
Reg II
Alimento Ausente
5,23
0,02
0,00
Reg III
0,06
5,23
0,06
0,00
0,00
0,06
5,23
ESTUÁRIO
Reg IV
Reg V
Alimento Presente
Figura 4.10 – Número médio de peixe-boi marinho, obtido no modelo, nas localidades de cada
região, onde há ou não disponibilidade de alimento, em ambiente estuarino.
Reg I
Reg II
Alimento Ausente
Reg III
0,11
Reg IV
0,00
0,00
0,00
0,11
0,00
0,00
0,00
0,00
0,11
RIO ou MAR
Reg V
Alimento Presente
Figura 4.11 – Número médio de peixe-boi marinho, obtido no modelo, nas localidades de cada
região, onde há ou não disponibilidade de alimento, em ambiente de rio ou de mar.
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
57
4.3 - QUANTO A ASPECTOS RELEVANTES DO STATUS DE CONSERVAÇÃO DO PEIXE-BOI AO
LONGO DO LITORAL DO
MARANHÃO, PARÁ E AMAPÁ
4.3.1 - QUANTO À ESTIMATIVA DE ABUNDÂNCIA
Para calcular a estimativa de abundância (e) de peixes-bois marinho foi adotado o
seguinte esquema: 1 - determina-se a média (c) de peixe-boi marinho por entrevista afirmativa,
através da divisão do número de peixes-bois marinho avistados pelos entrevistados (a) pelo
número de entrevistas afirmativas (b) conforme tabela 4.8; 2 - multiplica-se a média encontrada
(c) pelo número de localidades visitadas com ocorrência da espécie (d), tabela 4.9.
Tabela 4.8 – Média de peixes-bois marinho (c).
Nº de peixes-bois
marinho (a)
439
Nº de entrevistas afirmativas
(b)
125
Média de peixe-boi marinho por
entrevista afirmativa (c)
3,51
Tabela 4.9 – Abundância estimada (e).
Média de peixe-boi marinho das
entrevistas afirmativas (c)
3,51
Nº de locais visitados com
ocorrência da espécie (d)
59
Abundância estimada (e)
207,09
A sistemática utilizada para o cálculo da abundância estimada não inclui animais
capturados.
4.3.2 - QUANTO À CAPTURA DO PEIXE-BOI
•
MORTALIDADE DO PEIXE-BOI MARINHO
Como o peixe-boi não possui outro predador além do homem, sua mortalidade se deve a
fatores naturais como: velhice, doença, ou encalhes do adulto ou do filhote por algum motivo e
ao próprio homem, que além de caçar o animal (captura intencional), também causa a morte de
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
58
animais por captura acidental (quando se emaranham em redes como as de camarão, ou caem em
currais), sendo raramente liberados.
Durante as entrevistas foi possível identificar quantos animais foram capturados pelos
entrevistados caçadores ao longo de suas vidas, o destino dos mesmos, e quantos encalhes de
filhotes e de adultos já foram observados:
•
Nº de peixes-bois capturados - 235
•
Nº de encalhes de adultos registrados - 10
•
Nº de encalhes de filhotes registrados - 04
Dos 235 peixes-bois capturados, 11 foram liberados e 2 foram levados para cativeiro, ou
seja, 222 foram mortos. Considerando que também os 14 encalhados resultaram mortos, o
número total de óbitos passa a 236. O que significa dizer que as capturas são responsáveis por
94,07% da mortalidade do peixe-boi marinho, contra 5,93% do encalhe de adultos e filhotes
juntos (Fig. 4.12).
5,93%
94,07%
Encalhe
Captura
Figura 4.12 – Freqüência relativa da mortalidade do peixe-boi marinho, nas cinco regiões.
LUNA, F. O.
•
59
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
ENCALHES DE FILHOTES DE PEIXE-BOI MARINHO
Tabela 4.10 - Número de encalhes de filhotes em cada região.
Região
Região I
Nº peixes-bois avistados
pelos entrevistados
0
Nº de encalhes de
filhotes
-
% de encalhes de
filhotes
-
Região II
239
03
1,25
Região III
140
01
0,71
Região IV
16
-
-
Região V
44
-
-
Total
439
04
0,91
Dos 439 peixes-bois avistados pelos entrevistados, encalharam 10 adultos (2,27%) e 4
filhotes (0,91%). O número de animais mortos foi 236, destes, quatro foram filhotes que
encalharam, o que representa 1,69% das mortes.
•
ENTREVISTADOS COM CAPTURA E SEM CAPTURA DE PEIXE-BOI MARINHO POR REGIÃO
Tabela 4.11 – Número de entrevistados com captura e sem captura por região (participação
absoluta e relativa).
Região
Total de
Entrevistados com
%
Entrevistados sem
%
entrevistados
captura
Região I
17
00
0,00
17
100,00
REGIÃO II
52
10
19,23
42
80,77
Região III
96
26
27,09
70
72,91
Região IV
65
05
7,46
62
92,54
Região V
32
04
13,33
26
86,67
Total
262
45
17,18
217
82,82
captura
Das 262 pessoas entrevistadas, nas cinco regiões, 45, ou seja 17,18%, dos entrevistados
já capturaram o peixe-boi marinho (Tab. 4.11, Fig. 4.13).
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
60
17,18%
82,82%
Capturou
Não capturou
Figura 4.13 – Representação gráfica da percentagem dos entrevistados que capturaram o peixeboi, nas cinco regiões.
Das 262 pessoas entrevistadas nos três Estados, 86 (32,82% dos entrevistados)
conheceram o animal vivo e morto; destes 45 já capturaram o peixe-boi marinho, ou seja,
50,32% das pessoas que conhecem o peixe-boi vivo e morto já capturaram pelo menos um
animal.
•
CAPTURA DO PEIXE-BOI MARINHO NAS REGIÕES
Tabela 4.12 - Número de entrevistados com captura do peixe-boi marinho por região, números
de animais capturados, média de captura/entrevistado.
Região
Nº de entrevistados com
captura/região
Nº de peixe-boi marinho
capturado
Média
captura/entrevistado
Região I
Região II
Região III
Região IV
Região V
Total
00
10
26
05
04
45
00
45
62
16
112
235
0,00
4,50
2,38
3,20
28,00
5,22
61
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
5,22
3,2
2,4
0,0
4,5
28,00
LUNA, F. O.
Reg I
Reg II
Reg III
Reg IV
Reg V
Total
Figura 4.14 - Representação gráfica das médias de captura do peixe-boi marinho por
entrevistado em cada região.
•
TIPOS DE CAPTURA DO PEIXE-BOI MARINHO
A tabela 4.13 e a figura 4.15 demonstram o número de peixes-bois capturados por cada
método de captura em cada região.
Tabela 4.13 - Número de peixes-bois capturados, por tipo de captura acidental e intencional, por
região.
Tipo de captura
Região I
Número de peixe – boi capturado
Região Região III Região
Região V
II
IV
Total
Arpão + canoa
-
36
35
-
30
101
Arpão + mutá
-
-
13
13
76
102
Sub-total Arpão
-
36
48
13
106
203
Rede malhadeira/ de
espera
Curral/ Rede de zangaria
-
01
02
01
06
10
-
05
02
02
-
09
Rede de tapagem + pau
-
-
06
-
-
06
Rede de camarão
-
03
02
-
-
05
Tarrafa
-
-
02
-
-
02
Total geral
-
45
62
16
112
235
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
62
Número de peixes-bois capturados
Tipos de captura por região
80
70
60
50
40
30
20
10
0
Região I
Arpão + canoa
Curral/ Rede de zangaria
Tarrafa
Região II
Região III
Arpão + mutá
Rede de tapagem + pau
Região IV
Região V
Rede malhadeira/ de espera
Rede de camarão
2,55
%
2,1
3%
0,
85
%
3,83%
4,26%
Figura 4.15 - Número de peixes-bois capturados, por tipo de captura, em cada região.
86,38%
Arpão
Curral/ rede de zangaria
Rede de camarão
Rede de malhadeira/ espera
Rede de tapagem
Tarrafa
Figura 4.16 - Percentagem de peixes-bois capturados, por cada tipo de captura, nos três
Estados.
O arpão (Fig. 4.17) foi utilizado em 86,38% dos peixes-bois capturados. O pescador pode
esperar o peixe-boi, para arpoá-lo, em uma canoa (Fig. 4.22) (permanecendo no local que o
animal freqüenta até observá-lo) ou em um mutá (Fig. 4.23) (jirau colocado em locais de
alimentação do peixe-boi), onde o caçador espera que o mesmo suba à superfície para respirar,
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
63
quando então é arpoado, nadando velozmente até cansar. O conjunto que compõe o arpão (arpão,
estrovo, haste, arpoeira e bóia) (Fig. 4.17) tem uma bóia que indica aonde o animal se encontra
(cansado), após arpoado. Ao encontrá-lo o pescador o mata com pauladas na cabeça, podendo ser
as vezes com machadadas ou facadas.
Figura 4.17 – Arpão, estrovo e arpoeira.
Foto: Arquivo CMA/IBAMA
No caso da utilização de canoas há dois métodos de perseguição do animal após arpoado:
1°) com a bóia, parecido com o do mutá, quando o animal é arpoado solta-se a corda e depois
procura-se a bóia, matando-o também com pauladas, machadadas ou facadas, depois amarramno na canoa e rebocam-no para o local aonde o tratam. 2°) o caçador arpoa o animal e não solta
corda, segurando-a com muita força, neste caso a canoa é levada pelo animal até que o mesmo se
canse e pare de nadar, quando isso ocorre o caçador o mata da mesma forma que no outro
método.
O peixe-boi pode ser capturado também acidentalmente, em redes como puçás, ou em
currais, e quando o pescador chega o animal pode já ter morrido, ou estar ainda vivo podendo o
pescador liberá-lo ou matá-lo, sendo a última alternativa a mais utilizada.
LUNA, F. O.
64
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
4.4 - QUANTO À PROIBIÇÃO DE CAPTURAR O PEIXE-BOI MARINHO
•
PORQUE PAROU DE CAPTURAR (INTENCIONALMENTE)
Muitos pescadores já capturaram o peixe-boi, mas não capturam mais. Na tabela 4.14
pode ser observado o motivo pelos quais eles pararam a captura.
Tabela 4.14 - Número de caçadores e motivo pelo qual pararam de capturar o peixe-boi, por
região:
Motivo pelo qual
parou de capturar
Região I
Região II Região III Região IV Região V
Total
É proibido
-
02
05
05
03
13
Não respondeu
-
02
06
-
-
08
Está velho
-
01
06
-
-
07
Sentiu pena do animal
-
02
02
-
-
04
Não vende a carne
-
-
02
-
01
03
Escassez de animais
-
-
02
-
-
02
Quis parar
-
01
01
-
-
02
Dá azar na pescaria
-
01
-
-
-
01
Amigo morreu capturando
-
01
-
-
-
01
Não parou
-
-
02
-
-
02
Alguns pescadores acreditam que capturar o peixe-boi, ou até mesmo pronunciar o nome
dá azar na pescaria, e não consegue pescar nada durante vários dias ou meses; um pescador
comentou que seu irmão, depois de capturar o peixe-boi, nunca mais conseguiu pescar mais
nada.
Um caçador de peixe-boi parou de caçar depois que dois amigos foram levados para o
mar pelo peixe-boi arpoado por eles, a canoa virou e eles morreram afogados. Quando arpoado o
peixe-boi nada rapidamente e com muita força em direção ao mar, entrando inclusive em área
oceânica, e quando o método de caça é arpoando sem soltar a corda, a canoa vai junto.
Apenas duas pessoas pararam de caçar por haver poucos animais, sendo difícil avistá-los
para capturá-los. Estes entrevistados acham que realmente haviam mais peixes-bois antigamente,
e que barcos com motor é que tem afastado os animais, não tendo a captura sido responsável pela
diminuição da quantidade de animais (Fig. 4.18).
O comércio da carne do peixe-boi é difícil de ocorrer, geralmente o caçador fica com uma
parte da carne e distribui o resto.
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
65
15,56%
8,8
9%
6,68%
17,78%
4,44%
4,44%
2 ,2
2%
2,2
2%
33,33%
4,4
Proibido caçar
Velhice
Não vende a carne
Quis parar
Amigo morreu capturando
4%
Não respondeu
Pena do animal
Escassez de animais
Dá azar na pescaria
Não parou
Figura 4.18 - Percentagem dos motivos pelos quais os caçadores pararam de capturar o peixe-boi
marinho, nas regiões.
•
ENTREVISTADOS QUE SABEM DA PROIBIÇÃO DE CAPTURAR O PEIXE-BOI
Vários entrevistados, inclusive caçadores, sabem da lei que proíbe a captura do peixe-boi
marinho (Tab. 4.15).
Tabela 4.15 – Número e percentagem dos entrevistados que conhecem o peixe-boi marinho e
sabem ou não da proibição de capturá-lo, por região.
Região
Nº resposta
afirmativa
%
Nº resposta
negativa
%
05
100
00
0
33
70,21
14
29,79
Região III
40
54,05
34
45,95
Região IV
12
57,14
09
42,86
Região V
18
64,29
10
35,71
Total
108
61,71
67
38,29
Região I
Região II
66
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
Reg IV
61,71%
Reg III
64,29%
Reg II
57,14%
Reg I
54,05%
70,21%
100,00%
LUNA, F. O.
Reg V
TOTAL
Figura 4.19 - Percentagem dos entrevistados que conhecem o peixe-boi marinho e sabem da
proibição de captura, por região.
Algumas pessoas entrevistadas que não conhecem o peixe-boi marinho, mas já ouviram
falar dele, ou conhecem o peixe-boi amazônico, também sabem da proibição de matar o animal.
Dos 75 entrevistados que não conhecem o animal pessoalmente ou conhecem o amazônico, 33
sabem da Lei (Tab. 4.15, fig.4.19).
•
VEÍCULOS DE DIVULGAÇÃO DA PROIBIÇÃO
Os 141 entrevistados que demonstraram saber da proibição, incluídos os que ouviram
falar da existência do peixe-boi marinho ou conhecem o peixe-boi amazônico, obtiveram o
conhecimento da Lei por um dos meios abaixo relacionados (Tab. 4.16):
Tabela 4.16 - Número de entrevistados, por meio de conhecimento da proibição, por região.
Região I
04
Região II
07
02
13
13
Televisão
03
07
Colônia de pesca
01
Capitania
Rádio
Meio de informação
Projeto Peixe-Boi/IBAMA/
SUDEPE
Comentários
Região III Região IV
17
13
Região V
13
Total
54
07
03
38
06
06
02
24
-
07
04
-
12
-
07
-
01
-
08
-
01
-
03
01
05
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
67
26,95%
17,02%
8,51%
5,67%
3,55%
38,30%
Projeto Peixe-boi/ BAMA/SUDPE
Comentários
Televisão
Colônia de pesca
Capitania
Rádio
Figura 4.20 - Percentagem dos meios pelos quais os entrevistados souberam da proibição de
capturar do peixe-boi marinho, no MA, PA e AP (incluindo os que não conhecem
o peixe-boi marinho).
4.5 - QUANTO AO SIGNIFICADO TRADICIONAL DO PEIXE-BOI MARINHO PARA AS
COMUNIDADES LITORÂNEAS DO
MARANHÃO, PARÁ E AMAPÁ
O trabalho desenvolvido no campo procurou investigar e registrar todos os comentários
e opiniões dos entrevistados sobre a importância, peculiaridades, usos e quaisquer tipos de
manifestações tradicionais em relação ao peixe-boi nas regiões percorridas.
Para um melhor ordenamento e explicitação das informações e averiguações coletadas,
os assuntos foram subdivididos em:
4.5.1 – DESIGNAÇÃO
Durante as entrevistas procurou-se verificar se eram utilizadas diferentes denominações
para designar o peixe-boi marinho. Tal fato ficou descartado, uma vez que todos os entrevistados
que informaram conhecer o peixe-boi marinho usavam simplesmente a denominação peixe-boi.
Nas localidades onde ocorrem as duas espécies de sirênios (T. m. manatus e T. inunguis)
os entrevistados realçam existir dois tipos de peixe-boi e fazem a diferenciação das espécies,
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
68
pelo acréscimo de um substantivo ou uma frase ao nome do peixe-boi amazônico, sendo usual o
denominarem de peixe-boi manteiga, peixe-boi da barriga branca, peixe-boi de estrela no peito,
peixe-boi preto, etc.
4.5.2 – A ARTE DA CAPTURA
A arte da captura, nestes três Estados, é realizada em 86,38% dos casos com o arpão, uma
técnica passada de pai para filho (Fig. 4.21), em que o caçador fica sozinho à espera do peixeboi, requerendo muita paciência, pois com qualquer barulho o animal foge, tornando-se uma
caça específica e solitária.
Foto: Lima, R. P.
Figura 4.21 – A arte de captura é passada de geração para geração.
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
69
O caçador, quando sai disposto a caçar peixe-boi com arpão, fica horas a fio (às vezes,
oito horas ou mais) à espera do animal, podendo caçá-lo de dentro da canoa ou de cima do mutá,
pontos de onde ele lança o arpão.
Na canoa (Fig. 4.22), o caçador tem mobilidade para se posicionar mais estrategicamente
para estabelecer a sua tocaia. A técnica consiste em escolher o local mais adequado e postar-se
em silêncio à espera da aproximação do peixe-boi para arpoá-lo. Ferido, o animal tenta se afastar
rapidamente, o então caçador libera a arpoeira, para que ele não arraste-a descontroladamente a
canoa na fuga empreendida. Para evitar que o peixe-boi seja perdido de vista, uma bóia acoplada
na ponta da arpoeira sinaliza onde o animal se encontra, após a exaustiva e infrutífera tentativa
de escape. Encontrado, o animal, ferido e exausto, recebe pauladas nas narinas, que sangram e
incham obstruindo a respiração, levando-o à morte por asfixia. Por vezes, utiliza-se faca e
machado para abater o animal, neste caso, a morte se dá por hemorragia e exaustão. Após o que
o peixe-boi é colocado na canoa, operação esta que exige boa maneabilidade pois há o risco da
canoa encher d’água e afundar em vista do porte e peso do animal. Nos casos em que a canoa
não pode levá-lo internamente, o transporte é feito a reboque. Geralmente o transporte é feito até
a comunidade do caçador, onde o peixe-boi é retalhado.
Na técnica do mutá (4.23), por se tratar de um jirau fixo, perde-se a vantagem da
mobilidade, mas ganha-se em estabilidade. O caçador se posta em cima do mutá (assim chamado
porque vem da palavra montar), e espera a aproximação do peixe-boi até a distância do alcance
do arpão, o que limita, até certo ponto, a ação do mesmo. A escolha do local para armar o mutá
fica definida taticamente perto do comedouro, que é aonde o peixe-boi vem se alimentar. Alguns
caçadores fazem iscas e armadilhas colocando, perto do mutá, bastante alimento ou estrume de
gado queimado (o cheiro atrairia o peixe-boi mais facilmente). Após arpoar o peixe-boi, a caçada
fica semelhante à da canoa, solta-se o arpão com uma bóia na ponta da arpoeira, e, de canoa, se
sai à procura da bóia. Encontrado o animal, os passos seguintes são idênticos aos da modalidade
de caça por canoa.
Em várias regiões onde ocorre o peixe-boi amazônico (ilha de Marajó e adjacência) foi
registrada a utilização de tornos. Neste caso o animal, também depois de arpoado e cansado, não
morre por paulada, mas asfixiado com os tornos (Fig. 4.25) que são enfiados em suas narinas
pelos caçadores. Um torno é colocado em uma narina quando o animal sobe à superfície para
respirar, ele mergulha tentando escapar, quando volta à tona recebe o segundo torno na outra
narina. Como o peixe-boi não respira pela boca, morre asfixiado.
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
Figura 4.22 – A arte de capturar o peixe-boi marinho na canoa.
70
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
Figura 4.23 – A arte de capturar o peixe-boi marinho no mutá.
71
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
72
Foto: Luna, F. O.
Figura 4.24 – Tornos utilizados para asfixiar o peixe-boi.
Caçadores que encontram mãe com filhote os capturam mais facilmente, devido ao fato
do filhote ter necessidade de mais vezes subir à superfície para respirar, sendo por isso mais
visualizado e mais vulnerável à caça. Em decorrência é arpoado primeiramente e, quando ferido,
“berra”. A mãe tenta salvá-lo, sendo também visualizada e, consequentemente, arpoada.
Outra arte de captura é a rede de tapagem mais pau, técnica denominada em alguns
lugares de batição. Consiste em fechar a boca de rios, igarapés e entrada de lagos, para reter e
encurralar o animal para depois matá-lo a pauladas, podendo, por vezes, ocorrer captura de mais
de um animal.
Alguns caçadores relataram usar o recurso de procurar na lama, durante a maré baixa,
marcas das duas nadadeiras peitorais e da caudal, deixadas pelo peixe-boi marinho quando se
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
73
deslocam em locais rasos para se alimentarem (Fig.4.25). Encontradas as marcas, se põem na
espera da subida da maré e do retorno do animal para capturá-lo.
Foto: Arquivo CMA/IBAMA
Figura 4.25 – Ribeirinho demonstra o rastro deixado pelo peixe-boi marinho.
LUNA, F. O.
•
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
74
ALGUNS TÍPICOS CAÇADORES DO PEIXE-BOI MARINHO ENTREVISTADOS NO MA, PA E
AP
Tabela 4.17 – Relação de alguns típicos caçadores de peixe-boi marinho da região.
Região/ UF
Nome*
Idade
Parou de
Quantidade
capturar/anos
que capturou
Região II /MA
Região II /MA
Região II /MA
Região III /MA
Região III /PA
Pedro Silveira
José da Penha
Ribamar da Conceição
João de Souza
Manoel Pereira
80
84
84
87
75
30 anos
10 anos
20 anos
30 anos
10 anos
10
10
10
20
11
Região III /PA
Região IV /PA
Edmilson da Silva
Carlos Melo
70
55
8 anos
7 anos
05
06
Região V /AP
Região V /AP
Região V /AP
Raimundo dos Santos
Luiz Ferreira
Francisco Brito
63
65
60
6 anos
3 anos
10 anos
30
40
40
Método de captura
Canoa + Arpão
Canoa + Arpão
Canoa + Arpão
Canoa + Arpão
Mutá + Arpão/Canoa
+ Arpão
Mutá + Arpão/ Rede
Mutá + Arpão/
Rede/Curral
Canoa + Arpão
Mutá + Arpão
Mutá + Arpão
*Os nomes dos típicos caçadores são fictícios objetivando preservar a identidade e a privacidade dos entrevistados.
A média de idade dos típicos caçadores de peixe-boi marinho foi de 72 anos. Estes foram
responsáveis pela captura de 182 animais, ou seja, 77,45% dos peixes-bois capturados.
Alguns relatos sobre as capturas (nome do caçador/ UF / Região estudada):
• Pedro Silveira/ MA/ II – “Ficava na canoa em silêncio, quando o peixe-boi chegava perto
arpoava, e prendia a corda na canoa, ele corria muito com a canoa junto, e não era qualquer linha
que agüentava, quando ele cansava matava com um pau”.
• João de Souza/ MA/ III – “Ficava em silêncio, porque ele é muito sabido, quando iam respirar
perto da canoa arpoava, ele corria muito, uma hora ou mais, mas depois desiste cansado, amarra
a canoa no mangue para não ir embora e bate com o pau no bicho até ele morrer, depois o coloca
na canoa, tem que ter prática senão a canoa alaga, e se não coubesse na canoa amarrava e
rebocava”. “Se arpoar a mãe ou o filhote o outro fica perto, não larga e aí arpoa os dois.” “Já
peguei fêmea prenha umas três vezes, com filho de 5 palmos dentro da barriga”.
• Manoel Pereira/ PA/ III – “Ficava no mutá, (pode queimar esterco de boi seco para fazer
fumaça e atrai o peixe-boi) quando ele chegava perto arpoava, o arpão tinha uma bóia, deixava
ele ir embora soltando a linha, quando cansava era fácil achar, aí matava com machado.”
• Luiz Ferreira/ AP/ V – “Fazia o mutá com isca (comida fácil, o peixe-boi vem), quando o
animal chegava bem perto o arpoava, o arpão tinha bóia porque não consegue segurar o animal e
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
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se amarrar no pau ele quebra, mata depois com paulada”. “Matava para dar de comer à
comunidade”.
• Francisco Brito/ AP/ V – “Fazia mutá com isca, esperava 6 a 8 horas, quando ele chegava
pertinho arpoava e largava a bóia, ele fugia para o mar, quando cansava era fácil matar com
pau”.
4.5.3 – A UTILIZAÇÃO DO PEIXE-BOI APÓS SUA CAPTURA
30,64%
4,68
0,85
63,83%
%
%
Alimento
Alimento + Comércio
Liberados
Figura 4.26 - Freqüência relativa do destino dado aos peixes-bois marinho capturados.
Embora o ribeirinho utilize derivados do peixe-boi de várias maneiras, não foram
registradas capturas do peixe-boi marinho com a finalidade específica de utilizar como remédio,
ou para comercialização.
O caçador geralmente captura o animal para sua alimentação e de sua família (63,83%
das capturas). Devido a grande quantidade de carne que o animal possui, o caçador acaba dando
parte da carne e derivados do animal e, às vezes, até vendendo para vizinhos e conhecidos
(30,64% dos animais capturados).
Como na maioria das localidades visitadas não havia energia elétrica que possibilitasse a
utilização de geladeiras para conservar a carne, muitos ribeirinhos salgam parte da carne, ou
fazem a mixira (Fig. 4.27) (em poucas localidades do litoral) para preservá-la.
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
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Foto: Luna, F. O.
Figura 4.27 – Mixira (carne conservada na gordura).
Algumas pessoas jogavam fora couro, gordura e ossos do animal, mas a maioria das
pessoas utilizavam pelo menos uma destas partes do animal. O couro (Fig. 4.28) é grosso e é
utilizado como remédio (emplastro) em cortes e inchações, e como chá. A gordura (Fig. 4.29) é
utilizada como remédio para inchações, reumatismo e congestão, para fritar não só a carne do
peixe-boi, bem como, de outros animais e frutas, como a banana, e para conservar carne de
diversos animais.
A carne é citada por praticamente todos entrevistados como sendo de três tipos:
•
Carne de boi: parte de cima (dorso) do animal, cor vermelha escuro;
•
Carne de porco: meio do animal, cor rósea, e segundo consumidores a mais gostosa;
•
Carne de peixe: região da cauda do animal, de cor esbranquiçada.
Dois animais capturados foram mantidos em cativeiro, em uma fazenda no Oiapoque
(AP). Um dos animais morreu na fazenda e o outro foi transferido para a Unidade de
Reabilitação do CMA/IBAMA, na Ilha de Itamaracá (PE), no dia 06/12/1993, onde encontra-se
até hoje.
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
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Foto: Lima, R.P.
Figura 4.28 – Couro de peixe-boi à venda no mercado Ver-o-Peso, Belém (PA).
Figura 4.29 – Gordura de peixe-boi à venda no Ver-o-Peso (PA).
Foto: Luna, F. O.
LUNA, F. O.
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4.5.4 – VALOR FOLCLÓRICO DO PEIXE-BOI MARINHO
Algumas crendices foram registradas na região norte, não só de caçadores/pescadores,
como de outras pessoas entrevistadas:
•
Capturar o peixe-boi dá azar para pescaria, e a pessoa não consegue pegar mais nada
durante meses, tendo até que mudar de profissão;
•
pronunciar o nome peixe-boi dá azar na pescaria, não pode falar o nome, só chamar de
peixe grande;
•
se observar o peixe-boi na água não pode comentar com os outros pescadores que viu,
porque dá azar na pescaria;
•
enterrando um pedaço do osso (principalmente costela) no fundo de um poço a água
nunca seca, não acaba;
•
pintando o casco do barco com o óleo do peixe-boi, não dá turu, nem caraca;
•
quando alguém se machuca e o local do machucado incha, ou quando a pessoa tem
rendidura, passa-se óleo de peixe-boi em cima que melhora;
•
quando alguém se machuca e há rasgadura na pele não se passa o óleo para não penetrar
no machucado, mas se faz um emplastro com o couro do peixe-boi. Quando o couro solta
do corte, é porque o mesmo ficou bom;
•
com o chá do couro de peixe-boi torrado e ralado, são curadas doenças pulmonares e
congestões;
•
em épocas de festas faz-se perfumes com pedaço do couro do peixe-boi dentro. Este
perfume protege quem o utiliza e ainda se a pessoa gosta de outra consegue conquistá-la;
•
o olho do peixe-boi serve para conquistar a pessoa amada. Escreve-se o nome da pessoa
amada em um papel e o envolve no olho, carrega-se o olho para onde for, e quando
encontrar a pessoa amada esfrega-se o olho do peixe-boi enquanto conversa com a
mesma, assim esta pessoa vai se interessar pela outra;
•
os peixes-bois foram originados de índios. Um índio e uma índia que queriam viver
juntos e se jogaram no rio, quando “deus” os abençoou com uma folha de canarana e os
transformou nos dois primeiros peixes-bois, por isso que eles se alimentam de canarana.
Os demais peixes-bois existentes seriam descendentes destes dois;
•
a banha do peixe-boi serve como conservante de carne, podendo conservá-la por até seis
meses.
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
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5- Discussão
Quanto ao método utilizado
Na Flórida, a maioria dos censos para a subespécie T. m. latirostris, se baseia em
levantamentos aéreos. O’Shea e Ackerman (1995) estimaram a população desta subespécie em
aproximadamente 2000 indivíduos, utilizando este método censitário. Porém o levantamento
aéreo possui limitações, como: a turbidez da água, que impede a visualização em alguns locais;
as condições de clima, que nunca são iguais em todas as áreas, e, a dificuldade de contar os
animais quando se encontram agregados. Além disso, não é possível identificar os aspectos
tradicionais das comunidades que convivem com o peixe-boi em relação ao mesmo.
Nos Estados do Maranhão, Pará e Amapá, cujo litoral é extenso, muito recortado e as
águas são escuras, há uma incompatibilidade em se fazer o levantamento da distribuição da
espécie através de censo aéreo. Best e Teixeira (1982) sobrevoaram muitos habitats potenciais de
peixes-bois no litoral do Amapá, enquanto contavam aves, no entanto foi impossível a contagem
dos peixes-bois, devido a grande descarga de sedimentos do rio Amazonas. A solução para estes
autores identificarem a distribuição do peixe-boi neste litoral foi alugar uma lancha e percorrer
as localidades realizando entrevistas.
Domning (1981) também percorreu o litoral em busca de informações sobre a
distribuição do peixe-boi, realizando excursões para entrevistar pescadores e coletar amostras de
ossos destes animais.
Na presente dissertação, o levantamento foi realizado através de entrevistas com
questionários, direcionadas à população ribeirinha, que é um dos métodos mais utilizados em
levantamentos de distribuição de sirênios (Hartman, 1979; Albuquerque e Marcovaldi, 1982;
Albuquerque e Duarte, 1983; Colmenero – Rolon, 1986; O´Shea, et al., 1988; Colmenero –
Rolon e Zárate, 1989; Mou Sue Luís e Chen Davi, 1990; Lima, 1997), principalmente quando
outros métodos não podem ser utilizados.
O método utilizado para a cobertura de uma extensa costa litorânea, de difícil acesso,
associado à baixa densidade do peixe-boi marinho (T. m. manatus ), não obstante ser mais
demorado e exigir mais esforço para a efetivação da pesquisa, oferece resultados seguros e
importantes para orientar programas e ações no sentido de conservar a espécie, conforme se pode
verificar no corpo deste trabalho.
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
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5.1 – QUANTO ÀS CARACTERÍSTICAS DA INVESTIGAÇÃO:
5.1.1 - ESFORÇO DE INVESTIGAÇÃO
O presente estudo teve seu limite meridional na ilha das Canárias, no Delta do
Parnaíba/MA, já que foi realizado em continuidade ao trabalho de investigação sobre a
distribuição do peixe-boi marinho realizado por Lima (1997), que abrangeu o litoral do Estado
de Sergipe ao ponto extremo de divisa entre os Estados do Piauí e do Maranhão, no Delta do
Parnaíba, na localidade denominada Tatus.
O limite ao norte foi no Oiapoque/AP, extremo setentrional geográfico do Brasil e
fronteira da ocorrência do peixe-boi marinho no país, segundo registros anteriores de Best e
Teixeira (1982) e Albuquerque e Duarte (1983).
A costa litorânea dos Estados do Maranhão, Pará e Amapá, área alcançada pela presente
pesquisa, possui uma extensão de 1800km, sem contar as reentrâncias, e respondem por 85% dos
manguezais brasileiros, decorrentes da presença de extensas planícies associadas às marés de até
8m, seguindo os cursos dos rios. Cabe realçar que só o Estado do Maranhão possui cerca de
500.000ha de manguezais, praticamente a metade do que tem todo o país (MMA, 2001), por
outro lado, toda região apresenta a menor densidade demográfica da costa brasileira, o que
tornou muito maior o desafio de alcançar o número de entrevistas requerido à confiabilidade e à
representatividade da pesquisa. Algumas vilas e localidades programadas para visita não foram
possíveis alcançar, sendo substituídas por outras de mais fácil acesso, mantidos, no entanto, os
requisitos técnicos da coleta. Além do mais, os principais locais de pesca foram alcançados. No
total foram 145 as localidades visitadas e cerca de 3000Km percorridos (considerando todas as
reentrâncias e o contorno da ilha de Marajó e adjacentes) na costa litorânea norte, estabelecendo
uma média de uma localidade visitada a cada 20km.
Tais fatos refletem bem o sucesso do esforço de amostragem empreendido, considerando
que pesquisa semelhante levada a efeito por Lima (op. cit.), no litoral nordeste brasileiro, onde o
acesso e a ocupação da linha de costa são bem maiores, apresenta a relação de uma localidade
visitada a cada 9,52km.
A ligação entre os pontos amostrais ocorreu naturalmente, quando nas localidades
citavam-se outras próximas e indicavam-se maneiras de se chegar às mesmas.
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
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A média de 1,81 entrevistas por localidade indica que as mesmas representam uma
amostra fidedigna do conhecimento empírico das populações ribeirinhas tradicionais do litoral
norte em relação ao peixe-boi, já que a amostragem foi dirigida, pois se entrevistou pessoas que
realmente tinham conhecimento sobre a espécie e/ou sobre o meio ambiente percorrido.
5.1.2 – PERFIL DOS ENTREVISTADOS
A idade dos entrevistados (Tab. 4.2 e fig. 4.1) variou de 20 a 98 anos, nas cinco regiões,
sendo a média etária de 56 anos. A menor média etária foi de 47 anos na Região II e a maior foi
65 anos, na Região III. Portanto, mesmo na Região II onde se encontrou a menor média etária,
pode-se afirmar que o público alvo foi alcançado, no tocante às atividades laborais exercidas
pelos entrevistados, já que 80,53% deles exercem ou exerceram atividades relacionadas à pesca
(Tab. 4.3 e fig. 4.2).
5.2.3 – QUANTO AO ENTREVISTADO CONHECER O PEIXE-BOI MARINHO
•
ENTREVISTADO QUE CONHECE OU NÃO O PEIXE-BOI MARINHO
Através das respostas à pergunta: “Como é o peixe-boi marinho?”, foi possível verificar
que os entrevistados que afirmavam conhecer o peixe-boi marinho, realmente o conheciam,
tendo sido possível também, identificar quando o entrevistado se referia ao peixe-boi amazônico
e quando conhecia as duas espécies. Os que tinham dúvida ou revelavam insegurança na resposta
à pergunta, eram entrevistados com maior detalhamento.
Nas Regiões II, III e V, o número de entrevistados que afirmaram conhecer o peixe-boi
marinho foi acima de 75% (Tab. 4.4 e fig. 4.3), obtendo-se, por isso, muitas informações sobre a
ecologia da espécie, sua caça e sua utilização. Já nas Regiões I e IV, o número de entrevistados
que revelou conhecer o peixe-boi marinho foi bem menor, 29,41% e 32,31%, respectivamente
(Tab. 4.4 e fig. 4.3). Tal fato se deve à não ocorrência do animal na Região I; os entrevistados
que já viram o peixe-boi marinho, o conheceram (vivo ou morto) em outra região. Na Região IV,
verifica-se a ocorrência do peixe-boi amazônico na maioria das localidades visitadas, sendo que
em algumas localidades observa-se a ocorrência das duas espécies.
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
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CONDIÇÃO BIOLÓGICA DO PEIXE-BOI MARINHO QUANDO O ENTREVISTADO O CONHECEU
•
Oitenta e três porcento (83%) dos entrevistados conheceram o peixe-boi marinho vivo no
seu ambiente natural; 4,7% o conheceram no cativeiro, e 12% o conheceram morto (Fig. 4.4).
Fato altamente relevante, porque os 88% que conheceram animal vivo, ofereceram informações
ricas, relevantes e coerentes sobre o peixe-boi marinho, garantindo consistência e confiabilidade
à pesquisa.
•
QUANDO O ENTREVISTADO NÃO CONHECE O PEIXE-BOI MARINHO
Oitenta e sete entrevistados revelaram desconhecer o peixe-boi marinho, dos quais
40,20% já tinham ouvido falar da espécie, sabendo ao menos a existência do animal; 46%
afirmaram não conhecer o peixe-boi marinho, mas sim o amazônico, fato relevante porque
empresta maior confiabilidade à pesquisa, uma vez que estes entrevistados tinham real noção do
que estavam falando, oferecendo, inclusive informações bioecológicas daqueles animais; e,
apenas 13,80% não tinham ouvido falar até então de nenhuma das espécies (Fig. 4.5).
O fato de 46% dos entrevistados que não conhecem o peixe-boi marinho conhecerem o
peixe-boi amazônico é importante porque atenua o desconhecimento relativo ao primeiro animal,
visto que, para os entrevistados são pequenos os detalhes físicos e biológicos que os diferenciam,
não exigindo para o público leigo cuidados e atenção diferenciada à conservação das espécies,
além do mais, apesar da ameaça maior de extinção do peixe-boi marinho, ambos têm
importância destacada para a manutenção da biodiversidade.
O conhecimento do peixe-boi amazônico em muito facilita as campanhas de
conscientização para conservação do peixe-boi marinho, pela similaridade entre os dois.
Adicionalmente, a oportunidade de reforçar as informações sobre a existência do peixe-boi
marinho para os 42,20% dos entrevistados, que dele já tinham ouvido falar, bem como informar
a existência do peixe-boi para 13,80% dos entrevistados que o desconhecia plenamente, assim
como a divulgação da legislação de proteção, destaca-se como uma importante oportunidade de
enfatizar a defesa da espécie, principalmente por se tratar de um público que pode se deparar
com o animal no seu habitat.
LUNA, F. O.
•
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
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CONFIRMAÇÃO QUANTO AO ENTREVISTADO CONHECER O PEIXE-BOI MARINHO, E
DIFERENCIAR AS DUAS ESPÉCIES.
Com o detalhamento da descrição obtida na entrevista a partir da pergunta “como é o
peixe-boi marinho?”, pôde-se certificar o conhecimento do entrevistado sobre o animal, e
confirmar a denominação popular dada à espécie nas comunidades. Ficou, assim, clara a
diferenciação das duas espécies de peixe-boi (T. m. manatus e T inunguis) entre si e, deles,
relativamente a outros animais, numa demonstração da operacionalidade e eficácia do método
adotado. Ademais, foram identificadas e destacadas as localidades com ocorrência das duas
espécies de sirênios.
5.2 – QUANTO À DISTRIBUIÇÃO DO PEIXE-BOI
5.2.1 - DISTRIBUIÇÃO AO LONGO DA ÁREA INVESTIGADA
A tabela 4.6 e as figuras 4.8 e 4.9, refletem que a ocorrência e a distribuição do peixe-boi
marinho ao longo do litoral norte do Brasil não é contínua e permitem as seguintes constatações:
• Região I (Delta do Parnaíba e Lençóis Maranhenses) - não há ocorrência de peixe-boi
marinho, constatação também levada em efeito por Lima (1993) e Lima et al. (2000b):
Na área do Delta do Parnaíba, a faixa litorânea da planície é caracterizada pela existência
de bancos arenosos na periferia norte da maioria das ilhas (lado voltado para o mar) que podem
funcionar como barreira geográfica natural à presença do peixe-boi. No entanto, o interior do
Delta apresenta planícies fluvio-marinhas recobertas por manguezais onde existem condições
favoráveis para ocorrência do peixe-boi, o que não acontece, podendo a área ser ou ter sido uma
zona de deslocamento do peixe-boi, o qual não permaneceria no local por muito tempo, ou,
ainda, se atribuir tal fato à caça intensiva em período remoto, que possivelmente extinguiu a
população, uma vez que há indícios de caça no local, décadas atrás.
Os Lençóis Maranhenses, maior campo de dunas do litoral brasileiro, com uma extensão
de 155 mil hectares, invadem as planícies fluviais e extensas áreas de tabuleiros litorâneos,
formando praias arenosas com contínuo batimento de ondas, não permitindo a existência de
vegetação e de abrigos junto à costa, que seriam importantes para alimentar e acomodar o peixeboi, restringindo a possibilidade de ocorrência nesta área, e atuando como uma barreira
geográfica.
LUNA, F. O.
•
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
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Região II (Golfão Maranhense - MA) - constata-se a ocorrência do peixe-boi
marinho na maioria das localidades visitadas:
No Golfão Maranhense, a maior média do número de peixes-bois foi constatada em Porto
Grande (30 animais) e Igaraú (12). A distribuição é contínua no lado leste da ilha de São Luís e
na parte interna da baía de São José, onde existem manguezais (habitat preferencial dos peixesbois marinho). Na costa oeste dessa ilha, mesmo com manguezais, a distribuição não é contínua.
Já na costa norte/noroeste verifica-se a não ocorrência do animal, possivelmente pela
inexistência de manguezais e de outras condições favoráveis.
A ilha dos Caranguejos, localizada na parte interna da baía de São Marcos, lado oeste do
Golfão, apesar da impossibilidade de visita “in loco” teve considerada a ocorrência.
Na baía do Tubarão, em todos os locais visitados registra-se ocorrência da espécie, sendo
maior o número médio nas localidades de Axuí (14); Ilha do Carrapatal (10); Manuma (9,5); e
Porto Rosa (08) tendo em vista as condições privilegiadas da baía, decorrentes da existência de
um verdadeiro entremeado de ilhas e igarapés, com extensos manguezais, fornecendo habitat
para o peixe-boi marinho (abundância de alimento, abrigos, numerosos boiadouros e berçários).
•
Região III (reentrâncias dos litorais maranhense e paraense) - apresenta média do
número de peixes-bois inferior à da Região II, tendo se verificado as maiores médias nas
localidades: Espanha/MA (10); Cândido Mendes/MA (08); Alcântara/MA (4,5); Marapanim/PA
(6,6); e Viseu/PA (4,8). Chama a atenção a presença de várias descontinuidades de distribuição
ao longo deste litoral, sem manifestação de diferenças ecológicas marcantes, na medida em que
toda a faixa litorânea possui idêntica conformação com uma sucessão de estuários com
recobrimento vegetal de mangue que formam cinturões de até 30km de largura, propiciando um
extenso habitat para o peixe-boi marinho.
Ademais, a região é periodicamente inundada pelo mar, devido à amplitude de maré
chegar até 8 metros, promovendo constante renovação da água no interior das baías e dos golfos
e a penetração do mangue em até 40km para o interior das margens de rios maiores (MMA,
2001). Isto faz supor que a descontinuidade da distribuição verificada não decorre de condições
ambientais desfavoráveis, que pudessem servir como barreira geográfica à espécie, mas sim pela
grande pressão de caça que levou à extinção os grupos de peixes-bois que teriam ocorrido nessas
áreas de descontinuidade. A ocorrência de grupos isolados diminui a variabilidade genética da
espécie, tornando-a mais susceptível à variações ambientais e doenças, e, conseqüentemente à
extinção.
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
85
• Região IV (Golfão Amazônico) - das 43 localidades visitadas, o peixe-boi marinho
ocorre em apenas 08, localizadas na costa leste da ilha de Marajó e na parte interna da Baía de
Marajó, nestas, segundo as descrições dos entrevistados, há simultaneidade de ocorrência do
peixe-boi marinho (Trichechus manatus manatus) e do peixe-boi amazônico (Trichechus
inunguis), sendo o único lugar do mundo que possibilita a ocorrência de duas espécies de
sirênios. Em outras 25 localidades, situadas mais ao interior do Golfão, costa oeste da ilha de
Marajó (PA) e arquipélago de Bailique (AP) ocorrem somente o peixe-boi amazônico; e, nas 10
restantes não há ocorrência de peixe-boi.
As localidades a leste do Golfão Amazônico, foz do rio Pará, com descarga 10.000m3s-1
de água (Oltman, 1968, apud Barreto, 1991), sofrem maior influência de água oceânica, pois as
águas do mar penetram rio adentro nos períodos de seca, o que não ocorre no lado oeste do
Golfão. Segundo Gibbs (1970, 1972), a grande descarga do rio Amazonas (100.000 a
220.000m3s-1) não permite a entrada de água do mar na foz do rio (mesmo durante o período de
descarga mínima). A parte costeira do lado leste do Golfão, próximo à desembocadura do rio
Pará, é guarnecida por descontínuas vegetações de mangues, o que possivelmente justifica a
ocorrência do peixe-boi marinho numa área de ocorrência do peixe-boi amazônico, visto ser uma
área de condições mais favoráveis à segunda espécie.
As 25 localidades em que ocorre o peixe-boi amazônico estão situadas em partes mais
internas do Golfão e no lado oeste do mesmo, onde a salinidade da água é zero, e encontra-se
matupás e outros alimentos do peixe-boi amazônico. A média do número de animais por
entrevista na ilha de Brique/AP foi 08 e na ilha de Bailique/AP 20.
O nível limitado de penetração do peixe-boi marinho no rio Pará pode estar sendo
estabelecido por competição com o peixe-boi amazônico, por alimento, abrigo, áreas de
remansos e boiadouros, por condições hidrológicas adversas ou até por ausência de alimento
adequado para a espécie. Futuras investigações poderão responder a tais questões.
Lima (comunicação pessoal) sugere a possibilidade de reprodução entre o Trichechus
manatus manatus e o Trichechus inunguis, gerando híbridos, nas localidades onde ocorrem as
duas espécies. A ocorrência de híbridos não é interessante para perpetuação de nenhuma das
duas espécies.
•
Região V (litoral do Amapá) - apresenta médias baixas do número de peixes-bois
marinhos por entrevista, sendo as maiores: Goiabal (4,0); Oiapoque (3,6); e Calçoene (2,0). Em
08 localidades das 12 visitadas ocorre o peixe-boi marinho. Sucurijú - localidade mais ao sul da
Região V, onde a água, já totalmente salgada, e a cobertura vegetal de mangue, geram condições
adequadas para a ocorrência do peixe-boi marinho, o que não acontece devido ao fenômeno da
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
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pororoca, que transforma a área em zona de transição. Mais ao norte, em localidades livres da
pororoca ocorre o peixe-boi marinho. As outras três localidades visitadas em que não ocorreram
peixes-bois marinho, foram: Cachoeira de Caciporé, Vila Velha e Aldeia Galibi, estando as duas
primeiras localizadas no rio Caciporé, rio que apresenta corredeiras e cachoeiras, as quais não
favorecem a ocorrência da espécie. Pode-se, então, concluir que nas localidades cujo litoral
encontra-se no Oceano Atlântico há ocorrência do peixe-boi marinho. As ilhas Marrecal e
Macarry, embora não visitadas, tiveram suas ocorrências consideradas, por terem sido muito
citadas durante as entrevistas. Registra-se a ocorrência de peixe-boi marinho no Oiapoque, limite
setentrional do Brasil, confirmando Best e Teixeira (1982) e Albuquerque e Duarte (1983). A
baixa densidade populacional (a menor de todo litoral brasileiro), os poucos impactos de
atividades humanas, e a presença de preservados manguezais ao longo da costa são fatores
propícios à ocorrência de peixes-bois marinhos; o fato de uma média baixa do número de
animais observado pelos entrevistados sugere que a caça intensiva reduziu acentuadamente a
população. Tal constatação indica o grau de agravamento, por motivo de caça, da situação de
risco de extinção da espécie nesta faixa do litoral, uma vez que Best e Teixeira (1982)
afirmavam, à época, que a espécie não estava próximo a qualquer risco imediato em termos de
caça.
A ausência de ocorrência do peixe-boi em algumas localidades e a descontinuidade da
distribuição no litoral norte reforçam a hipótese de que os peixes-bois não realizam grandes
migrações no litoral brasileiro (Lima et al., 1992). Estudos com animais reintroduzidos ao mar e
monitorados por radiotelemetria indicam que estes animais percorreram uma distância máxima
de 190km no primeiro ano de liberdade (Lima et al., 1996; Lima e Castro, 1996). Na Flórida
estudos com radiotelemetria (Reid e O´Shea, 1989 e Reid, et al., 1991) demonstram que T.
manatus latirostris percorrem distâncias de até 1.700km numa migração anual.
Segundo (Reid et al., 1991) os T. manatus latirostris realizam uma migração sazonal em
buscas de águas mais quentes devido à queda da temperatura no inverno, que na Flórida cai de
30°C para 10°C. No litoral norte do Brasil a variação térmica é muito pequena, ficando entre
25°C e 28°C, situando-se, portanto, dentro da faixa de temperatura adequada para o peixe-boi
marinho. Whitehead (1978), propôs o limite de temperatura para T. m. manatus entre as
isotermias de 24°C e Irvine (1983), aponta o limite de temperatura mínimo tolerável de 20°C.
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
87
Isto implica que a temperatura não parece atuar como fator limitante para ocorrência do peixeboi marinho no litoral norte do Brasil.
A distribuição descontínua ao longo do litoral norte do Brasil sugere a hipótese de haver
isolamento de pequenos grupos de peixes-bois marinhos remanescentes. O´Shea et al. (1988)
encontraram uma população remanescente de peixe-boi no lago Maracaibo na Venezuela, com
escassez total de animais ao longo de 1500km de linha de costa caribenha. Para confirmação
desta hipótese para a área do presente estudos fazem-se necessários estudos genéticos.
•
CITAÇÕES DE OCORRÊNCIA DO PEIXE-BOI MARINHO EM OUTRAS LOCALIDADES.
As localidades citadas foram importantes para o prosseguimento da pesquisa, já que a
ligação entre os pontos amostrais ocorreu naturalmente, quando os entrevistados citavam
localidades próximas e indicavam a maneira de se chegar às mesmas, podendo-se confirmar ou
não a presença da espécie para a localidade citada (Tab. 4.7).
Apenas sete localidades citadas não puderam ser visitadas, mas três delas foram citadas
por vários entrevistados, sendo portanto consideradas como locais de ocorrência do peixe-boi
marinho. As outras quatro foram citadas por apenas um entrevistado, não sendo o suficiente para
considerá-las como ocorrência da espécie, principalmente quando sete localidades citadas por
apenas um entrevistado, como de ocorrência da espécie, foram visitadas e não foi confirmada a
ocorrência, quando foram realizadas entrevistas com moradores antigos das mesmas.
Vinte e seis localidades citadas como de ocorrência da espécie foram visitadas, havendo
resposta afirmativa de ocorrência, o que demonstra a importância das citações de ocorrência em
outras localidades.
Entrevistados que apenas conheciam o animal em museu (3,33%) ou em cativeiro (0,48%)
são importantes quando se realiza a campanha de conscientização da espécie, pois sabem como é
o animal, o que é bem diferente dos que nunca o conheceram.
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
88
5.2.2 - DISTRIBUIÇÃO EM FUNÇÃO DA REGIÃO, TIPO DE AMBIENTE, DISPONIBILIDADE DE
ALIMENTO E NÍVEL DE DEGRADAÇÃO AMBIENTAL.
A função matemática, decorrente do modelo utilizado no presente trabalho, identificou, na
análise da variável R (região), que as Regiões II, III e V são significativamente iguais (p ≥ 0,05),
e que as regiões I e IV diferem significativamente entre si e entre as três anteriores (p ≤ 0,05). As
Regiões II, III e V são significativamente iguais provavelmente devido a apresentarem
características ambientais semelhantes: muitos igarapés, diversos estuários, e manguezais
preservados e exuberantes, ao longo do litoral, onde se encontram importantes habitats para o
peixe-boi marinho. As águas dos estuários são permanentemente renovadas pelo contínuo fluxo
de águas do mar, mantendo salinidade similar, que varia de 13 a 35 ups. Nestas regiões registrase ocorrência marcante do peixe-boi marinho, em algumas localidades.
Na Região I, o Delta do Parnaíba é formado por diversas ilhas que apresentam bancos de
areia na face voltada para o mar, o que pode inibir a ocorrência de peixes-bois marinho, embora
possuam manguezais na face das ilhas voltadas para o continente; já nos Lençóis Maranhenses as
dunas são constantes em toda extensão com praias de intensa dinâmica, fatores desfavoráveis à
ocorrência do peixe-boi marinho.
A Região IV, por receber a descarga de enorme volume d’água doce da bacia amazônica,
tem a salinidade das águas reduzida a até zero, dependendo do lugar e da época do ano. O tipo de
vegetação encontrada não é mais mangues, a não ser em pequenos trechos a leste da ilha de
Marajó e na desembocadura do rio Pará, na faixa onde há penetração de águas oceânicas. Nesta
região as condições ambientais são mais favoráveis para a ocorrência do peixe-boi amazônico.
A ausência de condições mais favoráveis nas duas regiões acima enfocadas, respondem
pelo fato da não ocorrência do peixe-boi marinho numa delas (Região I) e pela modesta
ocorrência na outra (Região IV).
A mesma função matemática mostrou em relação à variável Am (tipos de ambientes) que o
ambiente de estuário é significativamente diferente (p ≤ 0,05) dos ambientes de rio e mar, que
entre si, são significativavente iguais (p ≥ 0,05).
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
89
O ambiente de estuário influencia positivamente na ocorrência de peixes-bois marinho,
cuja média de animais por localidade, que possui disponibilidade de alimento, é de 5,23 animais
(Fig. 4.10). Dentre os ambientes que compõem o ecossistema costeiro, os estuários são os que
apresentam melhores condições ecológicas para abrigar a espécie (Lima, 1997). Foram
registradas ocorrências de peixe-boi marinho em ambientes de mar, mas a média de animais foi
de apenas 0,11, em localidades que apresentam alimento disponível. Não obstante os peixes-bois
serem animais marinhos, eles preferem águas turvas e estuarinas para permanecerem (Paludo,
1997), pois ambiente de mar apresenta muita dinâmica, sendo menos favorável para o animal.
Ambientes de rio, com disponibilidade de alimento, apresentaram a mesma média de animais de
que ambientes de mar (0,11), não ocorrendo onde não há alimento (Fig. 4.11). Os peixes-bois
marinhos procuram fontes de água doce para beber, como desembocaduras de rios e olhos
d´água (Lima et al., 1992).
Os estuários do litoral norte são ideais para ocorrência do peixe-boi marinho, pois neles se
encontram extensos e preservados manguezais que formam habitats para a espécie (com
importantes boiadouros, abrigos, disponibilidade de alimento, e berçário).
A função matemática mostrou em relação à variável Ali (disponibilidade de alimento), que
locais com disponibilidade de alimento apresentam diferença significativa em relação a locais
sem alimento (p ≤ 0,05), e que o peixe-boi ocorre em ambos locais, sendo que onde tem alimento
a ocorrência é, a priori, 2.200 vezes maior que onde não se encontra alimento. Segundo Hartman
(1979), animais de grande porte, com baixa taxa metabólica, têm na atividade de alimentação sua
principal ocupação, o que justificaria a constatação, através do presente estudo, da ocorrência tão
maior de animais nas áreas onde há alimento. Paludo (1997) constatou que a presença de peixesbois na região costeira do Sagi (RN) encontra-se diretamente relacionada à cobertura de algas
dos arrecifes.
No litoral norte do Brasil, devido à turbidez da água, não foi encontrado capim agulha, que
cresce em função da transparência da água. Segundo Paludo (1997), este é o principal alimento
do peixe-boi marinho no litoral nordeste brasileiro. No litoral norte os principais alimentos da
espécie são: folhas de mangue (Avicennia nitida, Rhizophora mangle e Laguncularia racemosa);
aninga (Montrichardia arborescens); paturá (Spartina brasiliensis); mururé (Eichhornia crassipes)
e junco (Eleocharis interstincta) (Best e Teixeira, 1982). Husar (1978a) observou que peixes-bois
africanos Trichechus senegalensis se alimentam de vegetação de mangue.
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
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A função matemática mostrou, em relação à variável D (nível de degradação ambiental),
que no litoral norte não há diferença significativa (p ≥ 0,05) entre os níveis de degradação baixa,
média e alta. O que se deve ao fato do ambiente litorâneo se encontrar praticamente intacto e
bem conservado, com as menores densidades de ocupação humana na costa de todo litoral do
Brasil. Na Flórida, a degradação ambiental decorrente dos impactos das atividades humanas nos
ambientes costeiros, matam e ferem peixes-bois (Reynolds III, 1993).
Portanto a hipótese nula (H0) foi rejeitada, há diferença significativa entre as médias do
número de peixes-boi em cada região estudada, em função da disponibilidade de alimento e do
tipo de ambiente (Fig. 4.10 e 4.11). Apenas a variável nível de degradação ambiental não
apresenta diferença significativa.
5.3 - QUANTO A ASPECTOS RELEVANTES DO STATUS DE CONSERVAÇÃO DO PEIXE-BOI AO
LONGO DO LITORAL DO
MARANHÃO, PARÁ E AMAPÁ
5.3.1 - QUANTO À ESTIMATIVA DE ABUNDÂNCIA
A sistemática adotada para o cálculo da estimativa de abundância (Tab. 4.8 e 4.9)
considera que um mesmo peixe-boi pode ter sido visto por mais de um entrevistado em cada
localidade visitada. Para reduzir o risco de dupla contagem, o que poderia ocorrer caso fossem
computados todos os entrevistados (125) que avistaram o animal, foram tomados apenas 59
entrevistados (um por local de ocorrência) e multiplicados pela média de peixe-boi avistado por
entrevista afirmativa, 3,51. Tal sistemática associa que o número de 439 peixes-bois avistados
corresponde a uma estimativa de abundância de 207.
Devido às condições favoráveis para ocorrência do peixe-boi marinho no litoral norte, bem
como o histórico da região reportar bandos de até trezentos peixes-bois no Maranhão
(Whitehead, 1978), o número da estimativa de abundância atual (207) é muito pequeno, o que
indica o ritmo acentuado de decréscimo da população. Adicionalmente tal constatação confirma
o risco de extinção da espécie (IBAMA, 1997).
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
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5.3.2 - QUANTO À CAPTURA DO PEIXE-BOI
•
MORTALIDADE DO PEIXE-BOI MARINHO
Dos 235 peixes-bois capturados, 11 foram liberados e 2 foram levados para cativeiro, ou
seja, 222 dos capturados foram mortos. O total de animais mortos, considerando-se que os que
encalharam morreram, é 236. Então as capturas são responsáveis por 94,07% da mortalidade do
peixe-boi marinho, contra 5,93% do encalhe de adultos e filhotes juntos (Fig. 4.12). No total
ocorreram o encalhe de 10 adultos e 04 filhotes.
A mortalidade “natural” (animais encalhados) apresentou um valor pequeno (5,93%) em
relação a mortalidade causada pelo homem. No entanto, é um valor que preocupa, por se tratar
de uma espécie com abundância estimada tão baixa.
O elevado percentual (94,07%) de morte do peixe-boi marinho por ação direta do homem,
não admite dúvida residual acerca da necessidade de convergir todos os recursos e esforços para
educar e conscientizar o agressor do dano por ele provocado à natureza. A conservação da
espécie depende diretamente do sucesso que se possa alcançar neste objetivo sócio-educativo.
O desafio é de tamanha dimensão, que não se pode atribuí-lo a apenas às comunidades
litorâneas, exige a mobilização e o envolvimento de significativas parcelas da sociedade civil
(ONG´s, Instituições de Ensino e Pesquisa, Órgãos de Classe, etc.) apoiadas pelo governo nos
níveis federal, estadual e municipal nas esferas do executivo, legislativo e judiciário.
Há que se cogitar alternativas de subsistência para as populações que ainda utilizam o
peixe-boi como fonte de alimento, pois esta é atualmente a principal motivação encontrada para
a caça do animal.
•
ENCALHES DE FILHOTES DE PEIXE-BOI MARINHO
O número de encalhes de filhotes de peixes-bois marinho nas cinco regiões foi quatro
animais (Tab. 4.10), número relativamente pequeno, podendo ser considerado uma ocorrência
suportável de mortalidade para a espécie, representando 0,91% dos 439 peixes-bois avistados
pelos entrevistados, e 1,69% da mortalidade. Bonde, et al. (1983) reportam que, na Flórida
(EUA), mortes de filhotes de até 1,50m são classificadas como mortes por causas naturais e
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
92
denominadas morte perinatal, mortes de animais próximos do nascimento ou com poucos meses
de vida.
Comparativamente com a região nordeste do Brasil, onde o encalhe de filhotes representa
25% dos animais capturados (Lima, 1997), o percentual acima referido (1,69%) configura-se
pouco relevante. Tal fato pode estar suportado nas condições mais favoráveis do litoral norte,
devido a maior preservação dos ambientes que os peixes-boi habitam, principalmente os
estuários que servem como berçários (onde as fêmeas parem e cuidam de seus filhotes).
•
ENTREVISTADOS COM CAPTURA E SEM CAPTURA DE PEIXE-BOI MARINHO POR REGIÃO
Do grupo de 262 pessoas entrevistadas, 86 afirmaram ter avistado o peixe-boi marinho
“vivo e morto” (Tab. 4.5), e, 45 já o haver capturado (Tab. 4.11), correspondendo a 17,18% do
total de entrevistados (Fig. 4.13). No entanto, o importante a destacar é que apenas os 86
entrevistados que viram o peixe-boi marinho “vivo e morto”, é que tiveram chances reais de o
capturar, e destes, 45 fizeram a captura, ou seja, 52,33% de quem teve oportunidade de captura a
exerceu. Tal fato evidencia a real dimensão e gravidade da situação.
•
CAPTURA DO PEIXE-BOI MARINHO NAS REGIÕES
Conforme demonstrado na tabela 4.12, o número de peixes-bois marinho capturados foi de
235, número este superior à abundância atual estimada, o que permite concluir que o risco de
extinção da espécie no litoral norte do Brasil é iminente, fato que exige providências imediatas
das entidades comprometidas com a conservação da espécie.
Tal constatação contraria frontalmente as expectativas do status da espécie, devido ao fato
da região norte atender a todos requisitos para se tornar um santuário para o peixe-boi marinho,
assim como acontece com milhares de outras espécies.
Na tabela 4.12 verifica-se em todas as regiões, exceto na Região I, onde não há ocorrência
de peixe-boi, um número relevante de capturas que, associado ao número de ocorrência, revela a
gravidade da situação por região: Reg. V – de uma população total de 156 peixes-bois (animais
avistados pelos entrevistados + animais capturados) 112 foram capturados; Reg. IV – de 32 (nas
mesmas condições da Reg. V) 16 foram capturados; Reg. III – de 202 (idem Reg. V) 62 foram
capturados; e na Reg. II de 284 (idem Reg. V) 45 foram capturados. Tais números são
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
93
indicativos de quanto é intensiva a caça em cada região, e guardam correlação direta com a
possibilidade de extinção da espécie em cada localidade.
Cabe realçar que para cada região foi calculada a média de captura por entrevistado que
capturou (Fig. 4.15), tendo a Região V apresentado a mais alta média, 28 animais capturados por
entrevistado caçador, revelando coerência com os números e a gravidade acima apontados. O
que demonstra a determinação e a perseverança dos caçadores desta região. Best e Texeira
(1982) se depararam, durante entrevistas que efetivaram entre o Oiapoque e Taperebá
(localidades dentro da Região V do presente estudo), com dois caçadores; um deles afirmou ter
matado 250 peixes-bois e o outro 35; houve ainda um deles que disse ter um irmão, também
caçador, que matou mais de 380 animais. Nas demais regiões as médias apresentadas foram mais
baixas, mas, nem por isso, irrelevantes: Reg. II - 4,5; Reg. IV - 3,2 e Reg. III – 2,38.
•
TIPOS DE CAPTURA DO PEIXE-BOI MARINHO
De acordo com a figura 4.16, a captura é realizada em 86,38% dos casos com arpão, o que
indica que a mortalidade do peixe-boi marinho no litoral norte do Brasil é causada
intencionalmente, sendo um hábito arraigado à tradição e à cultura do ribeirinho, transmitido de
pai para filho. Alguns caçadores planejam e programam a caçada em associação com as fases
da lua ou em determinadas épocas do ano, quando há maior ocorrência do animal e se preparam
psicológica e materialmente para a operação de captura.
A técnica da captura com o uso do arpão é praticada de duas maneiras, no mutá e na canoa.
Ambas as maneiras apresentaram resultados semelhantes quando somadas as cinco regiões (Tab.
4.13). A que utiliza o mutá atingiu 43,40% das capturas, e ocorreu nas Regiões III, IV e V, sendo
nesta última predominante (Fig. 4.15). A técnica que utiliza a canoa atingiu 42,98% das capturas,
e ocorreu nas Regiões II, III e IV, sendo também utilizada no litoral nordeste (Lima, 1997) e nos
principais rios da bacia amazônica, para a caça do peixe-boi amazônico (Observação pessoal).
Outra modalidade de captura intencional é a rede de tapagem e pau, também denominada
batição, apresentou na pesquisa resultados modestos de captura (2,55%) tendo sido utilizada
exclusivamente na Região III (Fig. 4.15). A captura intencional é um fator ainda muito forte na
mortalidade do peixe-boi marinho no litoral norte do Brasil (Luna, et al., 2000).
Capturas acidentais do peixe-boi representando 11,07% do total de capturas, ocorreram
com o aprisionamento do animal em currais e diversos tipos de redes destinadas à pesca de
peixes e camarões. Nestes casos, por vezes, o peixe-boi já é encontrado morto por afogamento;
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
94
quando encontrado vivo, geralmente é morto, propositalmente, pelos pescadores, tal como
ocorrências relatadas no litoral nordeste (Paludo, 1997); casos raros, há, em que o animal é
liberado ileso.
O bom nível de conservação da natureza no litoral norte, associado ao baixo tráfego
costeiro de grandes embarcações, assim como a quase inexistência de tráfego de lanchas e barcos
esportivos e turísticos, permitiu que não se registrasse acidentes com embarcações com peixesbois, ao contrário do que ocorre na Flórida (EUA) onde atropelamentos de peixes-bois por
embarcações motorizadas são a 2ª maior causa de mortalidade dos mesmos (Flórida Departament
of Environmental Protection, 1997).
5.4 - QUANTO À PROIBIÇÃO DE CAPTURAR O PEIXE-BOI MARINHO
•
PORQUE PAROU DE CAPTURAR (INTENCIONALMENTE)
Os resultados apresentados na tabela 4.14 e na figura 4.18 são determinantes para a
conclusão de que a Lei de proteção do peixe-boi não está sendo respeitada, pois somente 1/3 dos
caçadores interromperam a captura do animal por força legal, donde se deduz que a maioria de
2/3 poderia ainda estar praticando a caça, não fossem motivos alheios à política preservacionista,
revelando, portanto, o pequeno resultado alcançado com a atuação das autoridades do executivo
e do judiciário diretamente envolvidas no assunto.
Os entrevistados que deixaram de responder sobre motivos pelos quais interromperam a
captura (17,78%), podem, na verdade, no todo ou em parte, estarem ainda praticando a captura, o
que é um agravante da situação.
Nenhum entrevistado informou ter interrompido o hábito da captura do peixe-boi por
motivo cultural, o que indica a necessidade de maior ênfase sobre as razões bioecológicas da
conservação da espécie, em campanhas de divulgação.
Outros motivos alegados para a interrupção da captura são de ordem sentimental ou de
crenças e preconceitos, que não asseguram a perseverança da decisão de não capturar. Há
alegações de motivos de interrupção da captura devido a diminuição do número de animais, no
entanto, não é pela preocupação com o risco de extinção que a captura foi interrompida, mas sim
pelo esforço maior exigido para executá-la.
LUNA, F. O.
•
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
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ENTREVISTADOS QUE SABEM DA PROIBIÇÃO DE CAPTURAR O PEIXE-BOI
Conforme a tabela 4.15 e a figura 4.19, 38,29% dos entrevistados que conhecem o peixeboi marinho, desconhecem a proibição de captura, representando um número suficientemente
alto para impedir que se consiga o objetivo de conservação da espécie. Em vista do que, fica
evidente a gravidade da situação e a urgência de se incrementar campanhas de divulgação,
através de veículos de comunicação de massa, bem como a necessidade de se intensificar as
pesquisas e os estudos científicos sobre o animal, no seu habitat natural e nos cativeiros dos
centros de manejo.
Algumas pessoas entrevistadas que não conhecem o peixe-boi marinho, mas que já
ouviram dele falar, ou que conhecem o peixe-boi amazônico, e sabem da proibição de matar o
animal, podem servir como multiplicadores da disseminação da cultura conservacionista do
peixe-boi, ou atuar pessoalmente impedindo ou inibindo a sua captura. Dos 75 entrevistados
nestas condições, nas cinco regiões, 33 sabem da lei.
•
VEÍCULOS DE DIVULGAÇÃO DA PROIBIÇÃO
A tabela 4.16 e a figura 4.20 revelam que o meio de comunicação mais efetivo na
divulgação aos entrevistados (38,30%) sobre a proibição de capturar o peixe-boi marinho foi a
ação dos próprios agentes do governo (IBAMA, Projeto Peixe-Boi/IBAMA ou SUDEPE), em
seguida (26,95%) pela multiplicação das informações através de comentários entre a
população ribeirinha, e ainda a televisão com um alcance de 17,02%.
O fato de ter sido o governo o veículo de informação mais relevante e ostensivo na divulgação
da proibição da captura do peixe-boi demonstra o esforço despendido nas campanhas de
conscientização e fiscalizações, com reconhecido nível de divulgação, ainda que os resultados
de restrição à caça se revelem modestos.
Para alcançar maior conscientização da população através das campanhas de conservação do
peixe-boi há que se intensificar a divulgação com o uso de meios de comunicação de massa,
através da programação televisiva, que poderá ampliar o seu índice de disseminação da
proibição de captura do peixe-boi.
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
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5.5 - QUANTO AO SIGNIFICADO TRADICIONAL DO PEIXE BOI MARINHO PARA AS
COMUNIDADES LITORÂNEAS DO
MARANHÃO, PARÁ E AMAPÁ
5.5.1 – DESIGNAÇÃO
Apesar da literatura fazer várias referências para designar o peixe-boi: juarauhá, (Ferreira,
1903); vaca marina, manati, yauárauá e ipupiára (Orico, 1972); guarabá (Sousa, 1851 apud
Lima, 1997); e como encontrado por Whitehead (1978), em revisão bibliográfica – boi marinho e
iguarágua (S. Vicente, 1560), guaraná (Gabriel Sousa, 1540-1591), homês marinhos e igpupi ara
(Francisco Soares, 1580), ouãraouã e guaragua (Claude d´Abbeville, 1612), iupipiápre e peixemulher (Piso, 1658), guaragua e varagua (Walter, 1967), nas entrevistas para o presente trabalho
não foi citada nenhuma das designações supra referidas.
5.5.2 – A ARTE DA CAPTURA
No litoral norte foi possível observar diferentes modalidades e recursos táticos e
estratégicos para a captura intencional do peixe-boi marinho, o que reflete transferência
hereditária de tecnologia (Fig. 4.21), pois alguns artifícios usados na caça do animal passam de
pai para filho, e o aprimoramento das técnicas de caça, experimentado pela utilização de novos
instrumentos, e exigido pela diminuição do número de animais.
O mutá (Fig. 4.23) é uma técnica de uso intensivo em parte da Região III, e nas Regiões
IV e V do presente estudo, não foi observado seu uso na Região II, e nas reentrâncias
maranhenses (parte da Região III), bem como no litoral nordeste em estudos realizado por Lima
et al. (1992 e 1994), Lima (1997) e Paludo (1997).
Utilizações de iscas e armadilhas foram encontradas em localidades onde o caçador
utilizava o mutá, para provocar a aproximação do animal ao alcance de seu arpão. Best e Texeira
(1982) encontraram caçadores que enterravam nas margens dos rios, enquanto a maré se
encontrava baixa, folhas jovens de aninga e de mureru, e se posicionavam em pontos mais
altos, em cima de árvores, à espera da subida da maré, já preparados para arpoar os peixes-bois
que vinham à margem comer as folhas por eles deixadas.
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
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Foi observada na Região IV a utilização de tornos (Fig. 4.24) para obstrução das narinas
do animal, recurso instrumental intensivamente utilizado na bacia amazônica (Best e Teixeira,
1982; Lima, et al.2001), causando uma morte sofrida, por asfixia, bem como a utilização de
pauladas, sendo esta mais agressiva pois o animal ainda sofre muito traumatismo.
Alguns caçadores relatam a tática de capturar primeiro o filhote para atrair a mãe e
capturá-la também. Tática cruel, pois se utilizam perversamente do instinto materno do animal,
muitas vezes sacrificando os filhotes ou deixando-os em liberdade para uma morte posterior,
pois os mesmos não sobrevivem sem as mães. Segundo estes caçadores “o filhote berra pedindo
ajuda à mãe, que permanece ao seu lado tentando ajudá-lo”. Em estudo sobre comunicação
acústica em peixes-bois Sousa Lima (1999) relata que a função básica das vocalizações destes
animais é a localização, atração e manutenção da proximidade entre indivíduos específicos,
marcadamente entre mãe e filhote. Esta tática ameaça gravemente a espécie, pois o caçador não
mata apenas dois animais, mas elimina uma fêmea da natureza, que provavelmente teria mais
filhotes, e um indivíduo que ainda não procriou.
Outra técnica de captura do peixe-boi marinho, encontrada na Região III, de uso não
disseminado nas demais regiões, denomina-se batição, técnica esta mais agressiva que as
anteriormente citadas, porque pode resultar na captura simultânea de mais de um animal. Esta
substituiu a técnica do pari, utilizada há muitos anos na bacia amazônica, que também podia
capturar mais de um peixe-boi por vez (Lima, et al.2001).
O peixe-boi se apóia nas nadadeiras peitorais quando se desloca em locais rasos, as quais
deixam marcas da sua passagem na lama, os caçadores observando tais marcas aguardam o
retorno do animal para caçá-lo (Fig. 4.25). Best e Teixeira (1982) constataram a utilização do
mesmo recurso no litoral do Amapá.
•
TÍPICOS CAÇADORES DO PEIXE-BOI MARINHO ENTREVISTADOS NO MA, PA E AP
Os típicos caçadores de peixe-boi (tabela 4.17) são pessoas com mais idade (média de
idade = 72 anos) e, embora tenham sido responsáveis pela captura de 182 animais (ou seja,
77,45% do total caçado), há algum tempo pararam de caçar. Alguns pescadores mais jovens
entrevistados dizem não ter paciência para caçar o peixe-boi, pois a caça é demorada - às vezes a
espera exige muitos dias de tocaia; requer paciência – o caçador tem que evitar qualquer
movimento brusco ou ruído para que o animal possa se aproximar da canoa ou do mutá; e muita
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
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habilidade, pois caso não faça uma boa arpoada, o peixe-boi, ainda que ferido, foge, deixando de
voltar àquele lugar por longo período.
A captura intencional do peixe-boi ainda é grande, e a extinção da mesma poderá
promover a reversão do status de conservação da espécie no litoral norte, pois apesar da
reprodução lenta para repor o estoque, a população tenderá a crescer porque não se verifica
importante número de óbitos por outros motivos, ocorrendo mortes tão somente por doença ou
velhice, o que é natural e em número reduzido. Além disso, seus habitats encontram-se bastante
conservados neste litoral.
5.5.3 – A UTILIZAÇÃO DO PEIXE-BOI APÓS SUA CAPTURA
Conforme a figura 4.26, a venda de carne e derivados (Fig. 4.28 e 4.29) do animal foi
realizada em 30,64% das capturas, não se constituindo, entretanto, numa venda em escala
comercial, pois, além da quantidade disponível para oferta ser pequena, não existe mercado nem
preços relativos definidos. As pessoas que compram a carne do peixe-boi estabelecem uma
comparação de preço e alimento substitutivo com a carne de gado, e concluem que a carne do
peixe-boi deveria ser mais barata, por se tratar de um comércio ilegal e de mercado restrito à
vizinhança do caçador. A depreciação da carne do peixe-boi, o conhecimento, ainda que não
suficientemente difundido, da ilegalidade da caça e da comercialização da carne, e a pequena
dimensão do mercado consumidor, são fatores que contribuem para a conservação do animal,
pois não fossem eles a caça exploratória seria intensificada.
O grande porte do animal - que permite abastecimento a um bom número de pessoas; o
hábito de consumo da carne do peixe-boi passado de geração para geração; a possibilidade de
conservar parte da carne na própria gordura (Fig. 4.27) – existem localidades onde há
impossibilidade do uso de outra forma de conserva; e a grande quantidade de carne vermelha –
difícil de constar da dieta do ribeirinho, que habitualmente consome peixe (carne branca); são
fatores que contribuem para a intensificação da captura do peixe-boi. Problema que seria
provavelmente resolvido, houvesse regularização da oferta de carne de gado, pelo mercado,
sendo a mesma oferecida a um valor compatível com a realidade destas comunidades.
A presença de animais em cativeiro incentiva a captura e o comércio ilegal. Há alguns
anos foram descobertos dois peixes-bois mantidos em cativeiro ilegal numa fazenda do
Oiapoque/AP, encomendados que foram a um caçador pelo próprio dono da fazenda, onde um
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Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
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dos animais morreu, tendo o outro sido salvo e transferido para a Unidade de Reabilitação do
CMA/IBAMA em Itamaracá/PE. Não se sabe quantos animais este caçador capturara para
conseguir levar dois vivos para a fazenda. Tal prática, infelizmente, ainda pode estar ocorrendo
nos dias de hoje, na medida em que existem pessoas menos esclarecidas que mantém o péssimo e
ilegal hábito de criar animais silvestres em cativeiro.
A quantidade de animais capturados acidentalmente que são liberados é muito pequena,
geralmente, já que o animal ficou preso em seu instrumento de pesca, o pescador o mata, mesmo
que não faça nenhum aproveitamento material do mesmo. Acredita-se que com campanha de
conscientização efetiva com as comunidades ribeirinhas, as capturas acidentais seguidas de
morte do animal diminuirão, pois, em não se tratando de caçadores de peixe-boi, será mais fácil
discipliná-los e orientá-los para liberar o animal vivo.
5.5.4 – VALOR FOLCLÓRICO DO PEIXE-BOI MARINHO
Algumas crendices dos ribeirinhos ajudam na conservação do peixe-boi, quando
acreditam que capturá-lo ou ao menos mencionar seu nome dá azar na pescaria, pois a maioria
das pessoas que convivem no dia-a-dia com o animal tem a pesca como fonte de renda. Outros
acham que partes do animal servem como remédio, simpatias, fetiche, conservantes, entre outros,
embora não haja relatos de captura do animal exclusivamente para tais fins, no entanto tais
propósitos podem se prestar como mais um argumento para captura do animal, comprometendo a
conservação da espécie.
A identificação destes fatos no presente trabalho se presta como um importante subsídio
para elaboração dos programas das futuras campanhas de conscientização sócio-educativas com
ênfase na dissipação de tais crendices e indicações de recursos substitutivos para algumas das
aplicações de caráter doméstico, comercial ou industrial, alegadas.
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5.6 – A SITUAÇÃO DO PEIXE-BOI MARINHO NO LITORAL DO BRASIL: LITORAL NORTE X
LITORAL NORDESTE.
O presente trabalho em complemento ao estudo realizado por Lima (1997) permite um
diagnóstico da situação do peixe-boi no litoral do Brasil, já que os mesmos cobrem toda a área
de ocorrência da espécie no país. Podendo se prestar como subsídio nas tomadas de decisão e na
definição de estratégias e programas de conservação do peixe-boi marinho no Brasil.
A costa do litoral norte, acima do rio Parnaíba, apresenta características fisionômicas
extremamente diferentes da costa do nordeste, que possui extensas praias de areia, divididas por
formações rochosas ou por pequenos mangues, enquanto que a primeira é formada quase que
constantemente por manguezais (Rhizophora, Avicennia e Laguncularia) com árvores tão altas e
densas que dão uma aparência de floresta costeira; inúmeros igarapés; baías, golfos e estuários
ricos em diversidade; com abundância de alimento, abrigo, áreas de remanso e locais de
descanso (formando vários habitats para o peixe-boi marinho).
A distribuição do peixe-boi marinho ao longo do litoral brasileiro não é contínua. No
litoral nordeste foram encontradas duas descontinuidades: a primeira localizada entre Barra de
Camaragibe (AL) e Recife (PE), ambiente que possui condições de satisfação às necessidades
ecológicas do peixe-boi marinho; a segunda entre Iguape (CE) e Jericoacoara (CE), faixa do
litoral composta de praias muito dinâmicas, que não apresenta registros antigos de ocorrência,
esta descontinuidade teria sido devido a condições ecológicas desfavoráveis à permanência do
animal.
O litoral norte, dividido, no presente estudo, em cinco regiões ecológicas (I, II, III, IV e
V), apresenta a não ocorrência do peixe-boi marinho na Região I, sendo que numa parte ela
apresenta condições favoráveis para ocorrência e na outra não. Na Região IV, a ocorrência se
verificou em poucas localidades, sendo a região mais favorável à ocorrência do peixe-boi
amazônico (Trichechus inunguis). Nas Regiões II e V o animal não ocorre nas localidades onde
as condições não são das mais favoráveis para a espécie. A Região III apresenta grandes
alternâncias de ocorrência, não obstante toda esta região apresentar condições muito favoráveis
para ocorrência da espécie.
Sugere-se que nas áreas onde há condições de satisfação das necessidades ecológicas do
peixe-boi marinho, e não há atualmente ocorrência, em tempos mais remotos ocorriam grupos de
peixes-bois, tendo sido os mesmos, eventualmente, exterminados pela caça. As áreas onde as
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condições não são favoráveis à ocorrência do peixe-boi marinho, configuram-se como barreiras
geográficas para a espécie.
Enquanto na região nordeste os ambientes de rio, mar e estuário não apresentam
diferença significativa entre eles (p ≥ 0,05), no número médio de peixe-boi marinho, na região
norte o ambiente de estuário, onde o número médio de animais é maior, apresenta diferença
significativa (p ≤ 0,05) em relação aos ambientes de rio e mar, que entre si não diferem
significativamente (p ≥ 0,05). Tal fato se deve à grande quantidade de estuários no litoral norte e
às dificuldades de acesso oferecidas aos animais nos poucos existentes no litoral nordeste,
devido a problemas de tráfego marítimo e assoreamento.
A disponibilidade de alimento foi um fator de grande importância para ocorrência do
peixe-boi marinho ao longo do litoral brasileiro. Tanto no litoral norte, como no litoral nordeste,
há diferença significativa (p ≤ 0,05) de ocorrência de peixe-boi nas localidades aonde existe ou
não disponibilidade de alimento. No litoral norte a diferença de ocorrência aonde existe
disponibilidade de alimento pode ser 2.200 maior, em comparação com os locais aonde não
existe. O que se deve ao fato de animais com baixa taxa metabólica e herbívoros, terem na
atividade de alimentação sua principal ocupação (Hartmann, 1979).
Os tipos de alimento disponíveis para o peixe-boi marinho são no litoral norte: folhas de
mangue
(Avicennia
nitida,
Rhizophora
mangle
e
Laguncularia
racemosa);
aninga
(Montrichardia arborescens); paturá (Spartina brasiliensis); mururé (Eichhornia crassipes) e
junco (Eleocharis interstincta) (Best e Teixeira, 1982); e, no litoral nordeste o capim agulha
(Halodule wrightii); e algas (Gracilaria cornea, Soliera sp. e Hypnea musciformes).
O nível de degradação foi uma variável que teve muita influência na ocorrência de peixeboi marinho no litoral nordeste. Foram poucas as ocorrências e pequeno o número de animais
avistados nas localidades com elevado nível de degradação. Em oposição, no litoral norte esta
variável não influenciou na distribuição do peixe-boi marinho, já que os ambientes não se
encontram degradados.
Um fator relevante na manutenção do baixo nível de degradação no litoral norte é o
perfil atual de ocupação humana na zona litorânea da região, cuja densidade média é de
2hab/km2 na costa do Amapá, 12hab/km2 no Pará e 29hab/km2 no Maranhão, enquanto que
Estados da região nordeste apresentam taxas de ocupação bem superiores, como por exemplo:
252hab/km2 no Ceará, 373hab/km2 na Paraíba, e 913hab/km2 em Pernambuco (MMA, 1996a).
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Causou surpresa o valor da abundância estimada na região norte (207 animais) ser menor
que abundância estimada no nordeste (278 animais), visto todas vantagens ambientais que o
litoral norte apresenta comparativamente ao litoral do nordeste.
No nordeste a captura intencional foi eliminada, ocorrendo capturas acidentais seguidas
de morte; já no litoral norte, embora ocorram poucas capturas acidentais, a pressão de caça ainda
é grande, sendo a captura intencional efetuada, principalmente com arpão (86,38% dos casos),
por caçadores tradicionais, com aprimoramento de técnicas de caça, e novas táticas e recursos
para capturar o animal, como por exemplo, a elaboração de armadilhas.
Se a situação no nordeste é atenuada pela menor pressão de caça, por outro ela fica
agravada pelo grande número de encalhes de filhotes órfãos, correspondendo a 25% da
mortalidade de peixes-bois neste litoral. O percentual de encalhes de filhotes no litoral norte
corresponde a apenas 1,69% da mortalidade. A elevada diferença contra o litoral nordeste se
deve, possivelmente, à dificuldade de acesso das fêmeas prenhas ao interior dos estuários, e, por
não haver outros ambientes na costa que lhes forneçam abrigo, fazendo com que os nascimentos
aconteçam em locais sujeitos a constantes batimentos de ondas, causando o desgarre do filhote.
Isto não acontece no litoral norte devido às características e à preservação ambiental do mesmo.
Fato relevante na Região IV do litoral norte é a ocorrência de duas espécies de sirênios,
sendo o único lugar do mundo que possibilita tal fato.
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6- Conclusões
•
A distribuição no litoral norte não é contínua, fato que se deve não só pela existência de
barreiras geográficas, como também pela provável extinção da espécie devido à caça intensiva,
em algumas localidades de grande ocorrência no passado, tendo sido exterminada algumas
populações inteiras, o que pode ter provocado isolamento dos animais em pequenos grupos
remanescentes;
•
A distribuição do peixe-boi em pontos descontínuos reforçam a hipótese que os mesmos não
realizam grandes migrações no litoral brasileiro;
•
No litoral norte existe área de ocorrência de duas espécies de sirênios, sendo o único local do
mundo que possibilita tal fato. Estes podem estar vivendo em simpatria, e, inclusive gerando
híbridos (o que não é interessante para perpetuação de ambas espécies);
•
A temperatura não é um fator limitante para distribuição do peixe-boi marinho no litoral
norte do Brasil;
•
As investigações permitiram identificar e mapear as localidades preferenciais do peixe-boi
marinho no litoral norte;
•
A disponibilidade de alimento e os ambientes de estuário influenciam na ocorrência e no
maior número de peixe-boi marinho, nas localidades com estas características, ao longo do litoral
norte;
•
A abundância estimada do peixe-boi marinho atingiu um valor muito baixo (apenas 207
animais), bem como a pressão de caça do animal ainda é grande neste litoral, o que confirma que
seu status de conservação é de: criticamente ameaçado de extinção;
•
A caça do peixe-boi no litoral norte é tradicional, utilizando o arpão, e as técnicas de captura
passam de geração em geração;
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•
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A utilização do peixe-boi pela população ribeirinha é extensa, devido usufruir não só da
carne, como também de várias outras partes do animal;
•
O fim da captura intencional e de captura acidental seguida de morte intencional do peixe-boi
marinho, embora a reprodução seja lenta, permitirá aumento da população, com gradativa
reposição do estoque, neste litoral, podendo inclusive haver repovoamento de locais com
ocorrência histórica, respeitando-se o tempo de recuperação da espécie;
•
Há necessidade urgente de instalação de Unidades Executoras do CMA/IBAMA no litoral
norte para atuar na conservação das duas espécies de peixe-boi e manutenção ecossistêmica;
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7 – RECOMENDAÇÕES
•
Realização de campanhas de conscientização contínuas nas comunidades litorâneas, em
articulação com o Ministérios da Educação, da Cultura e da Saúde, priorizando:
−
Campanhas esclarecedoras sobre a importância da biodiversidade, enfocando os
prejuízos de eventual extinção de uma espécie;
Campanhas esclarecedoras sobre as fontes protéicas e alimentícias disponíveis no
−
meio ambiente;
−
Campanhas de desmistificação de simpatias sobre o peixe-boi, e de que partes do
animal possuam propriedades medicinais e afrodisíacas;
−
Apresentação e disponibilização de medicamentos sucedâneos e eficazes para os
males que a população litorânea pretende combater com a utilização de partes do peixe-boi;
•
Intensificação de fiscalização para inibir a caça;
•
Desenvolver e implantar alternativas viáveis de subsistência para as comunidades litorâneas,
onde o meio ambiente deixará de ser percebido apenas como restrição e passará a ser
utilizado no desenvolvimento sustentável da região. Para tanto, recomenda-se que o
Ministério do Meio Ambiente:
−
Em articulação com o Ministério da Integração Nacional promova políticas
econômicas locais para a implantação de atividades auto-sustentáveis nas micro-regiões em
harmonia e conservação do meio ambiente;
−
Articule com o Ministério da Cultura o desenvolvimento de atividades artesanais
e culturais locais, e o estímulo e apoio às existentes;
−
Desenvolva articulações com o Ministério da Agricultura para fornecer suporte
técnico e financeiro à extração, produção, beneficiamento e comercialização de produtos da
floresta, praticado por castanheiros, seringueiros, ribeirinhos e pequenos agricultores, com
incentivo ao uso múltiplo e sustentável da floresta, e à produção de alimentos básicos;
−
Em conjunto com o Ministério da Indústria, do Comércio e do Turismo
impulsione
atividades
de
ecoturismo.
Atividade
econômica
importante
para
o
desenvolvimento sustentável da região, compreendendo capacitação de pessoal e implantação
de infra-estrutura pública e privada, com prévios estudos e planejamentos;
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•
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Realização de programas de recuperação de carcaças para estudos biológicos e genéticos a
fim de elucidar aspectos fisiológicos e ecológicos sobre a espécie, bem como as hipóteses
levantadas no presente trabalho;
•
Realização de estudos genéticos em animais vivos para que se possa verificar a existência de
diferentes populações; de área e época de simpatria; e de híbridos;
•
Implantação de Unidades Executoras do CMA/IBAMA nos três Estados pesquisados,
permitindo apoio logístico para as campanhas de conscientização, fiscalização mais presente
e realização de pesquisas. Preferencialmente devem ser implantadas: duas na Região do
Golfão Maranhense, uma no lado leste da ilha de São Luís (municípios como São José do
Ribamar ou Raposa), e na baía do Tubarão (município como Humberto de Campos); ao
menos uma na Região das reentrâncias do Maranhão e do Pará (municípios como Alcântara,
Cândido Mendes ou Vizeu); outra no Golfão Amazônico, no lado leste da ilha de Marajó (em
Soure ou Salvaterra), ou na parte interna da baía de Marajó (municípios como Vigia ou
Colares); e ainda outra, no litoral do Amapá (municípios como Calçoene ou Goiabal).
•
Criar mais Unidades de Conservação no litoral norte do Brasil, como, por exemplo, Reservas
Extrativistas (Resex), e implantar as UC’s já existentes.
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9 – Glossário
Aba. Denominação dada pelos ribeirinhos à nadadeira peitoral do peixe-boi, ou à nadadeira
dorsal de golfinhos ou botos.
Aboliçado. Gordo; de formas arredondadas.
Acolá (Lá). Lugar afastado da pessoa que fala e da pessoa com quem se fala.
Almude. Antiga unidade de medida de capacidade para líquidos, equivalente a 31,94 litros.
Aninga. Fruto da aningueira. Planta frutescente dos terrenos aluviais alagados e atoladiços. Ou
segundo Best e Teixeira (1982) Montrichardia arborescens.
Arpão. Conjunto formado por um ferro em feitio de seta fixado a um cabo, usado para a caça do
peixe-boi, peixes de grande porte e cetáceos.
Arpoeira. Corda que se prende ao estrovo que se prende ao arpão.
Arroba. Antiga unidade de medida de peso, equivalente a 14,7 kg.
Batição. Modo de encurralar peixes, peixes-bois, tartarugas em rios, igarapés e lagos, no caso
do peixe-boi mata-se posteriormente o animal com pauladas nas narinas.
Boiadouro. Trecho de rio, em geral remansoso, ou estuário onde emergem e bóiam os peixesbois (lugar onde o peixe-boi escolhe habitualmente para descansar e pegar sol).
Breu. Substância obtida pela evaporação ou destilação parcial da hulha.
Bubuia. Ação de bubuiar. Boiar no sentido e ao sabor da corrente; flutuar; sobrenadar.
Caiseca. Vegetal que o peixe-boi come. (Rhabdadenia biflora)
Calafetar. Vedar com estopa embebida em breu e banha do peixe-boi fendas ou buracos em
uma embarcação.
Canarana. Denominação atribuída a diversas gramíneas, utilizadas pelo peixe-boi como
alimento fundamental, ou segundo Colares e Colares (1992) Echinochloa
polystachia.
Caraca. Crustáceos cirrípedes sésseis, possuem carapaça calcária contínua, fechada por
opérculo composto de quatro peças também calcárias, vivem incrustados em rochedos
marinhos, madeiras de cais, cascos de navios, ou sobre o corpo de outros animais
marinhos.
Casco. Denominação da unha do peixe-boi marinho.
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
120
Comedouro. Lugar onde o peixe-boi normalmente se alimenta.
Curral. Cercado de forma especial destinado a reter ou guardar animais.
Estrovo. Barbante que prende o arpão na arpoeira.
Furo. Comunicação natural entre dois rios ou entre um rio e um lago.
Haste. Pau de direto, longo e pesado na ponta do qual se encrava a seta do arpão.
Igarapé (Caminho da canoa). Pequeno rio que nasce dentro da mata, é um rio pequeno que tem
as mesmas características dos grandes e que é geralmente navegável.
Igapó. Trecho de floresta onde a água, após a enchente dos rios, fica por algum tempo
estagnada.
Macaréu. Onda de arrebentação que, próximo à foz pouco profunda de certos rios, por ocasião
da maré montante, irrompe de súbito em sentido oposto ao fluxo das águas do rio.
Manteiga (ou óleo de peixe-boi). Substância gorda e alimentícia que se extrai da gordura do
peixe-boi, presta-se para simples consumo ou para conservar peças de carne do
animal abatido, para consumo posterior.
Matupá. Massa considerável de capim aquático, que forma ilhas flutuantes que descem rios e
lagos, presta-se para alimentação básica do peixe-boi amazônico, os quais descem os
rios “escondidos” nas mesmas.
Mixira. Denominação popular às peças do peixe-boi fritas e conservadas na gordura do
próprio. Nome também dado á conserva nas mesmas condições de tambaqui e
tartaruga.
Moquear (ou Moquiar). Assar lentamente a certa altura das chamas, sobre o moquém
produzindo um pouco de fumaça. É uma operação diferente da de assar, que é feita
ao calor das brasas, sem chamas nem fumaça.
Moquém. Pequeno jirau de madeira, a 30 ou 45 centímetros do solo, sobre o qual se coloca o
peixe ou a caça a moquear.
Munheca. Denominação dada à nadadeira peitoral do peixe-boi.
Mururé. Nome pelo qual se designam diversas plantas natantes, que flutuem somente durante a
cheia, radicando no solo do verão, ainda que possuam apenas raízes aquáticas.
Mutá. Estrado alto ou assento feito no mato ou à beira da água, no tronco de árvores para a
espera da caça ou da pesca.
Palmo. Antiga unidade de medida de comprimento, equivalente a oito polegadas.
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
121
Pari. Conjunto de talas (varas finas, ou juçaras de cerca de 1,50 m a 3,0 m de comprimento)
com o qual se fazem diferentes tapagens para capturar o peixe-boi. Quando as varas se
abrem o caçador percebe aonde o peixe-boi se encontra e o arpoa mesmo sem vê-lo.
“Parrilas de palo” - Grelha de madeira, usada para moquear o peixe-boi e o tambaqui.
Paturá. Tipo de gramínea que serve de alimento ao peixe-boi, (Spartina brasiliensis)
Pororoca. Grande onda que com estrondo percorre os trechos rasos de certos rios no começo da
enchente de águas vivas, sobretudo nas marés sizígias; macaréu, rabo de maré.
Rasgadura. Corte promovendo abertura na pele e na carne.
Rebojo. Movimento da água, em forma circular, provocado pela imersão do peixe-boi.
Rede malhadeira (ou de espera). Rede de dimensões variáveis 14m a 52m, tamanho da malha
de 10 a 300mm em nós opostos, altura de até 5m, mas a média é entre 2 e 3m.
Rede de tapagem. Rede tecida com náilon, disposta de uma margem à outra, para fecha a boca
do igarapé, furo, rio ou lago.
Rede de camarão. Rede de malha fina, com chumbadas na parte inferior (que fica em contato
com substrato). É arrastada no fundo do mar ou rio.
Rendidura. Hérnia.
Rias. Conjunto de canais de água do mar formado por assoreamento e nos quais poderão vir a
lançar-se pequenos cursos de água doce.
Ribeirinho. Habitante das margens dos lagos e rios da região amazônica. Possuem hábitos e
costumes de sobrevivência e relações com a natureza diferenciados dos demais
habitantes da região.
Siriúba (ou Sereíba). Designação de vegetação de mangue, da família das verbenáceas.
(Avicennia sp.).
Tarrafa. Rede pequena em forma de disco, dotada de um cordel no centro, que fica preso à mão
esquerda do tarrafeador, utilizada em pesca lançada com as mãos.
Tesos. Parte elevada do campo que não alaga durante as cheias.
Torno. Tarugo de madeira em forma de cone, com cerca de 10 cm de tamanho e 2,5 de
diâmetro na base, utilizado pelos caçadores para obstruir as narinas do peixe-boi,
impedindo sua respiração.
Turu. Animal com aspecto vermiforme, que tem numa das extremidades duas pequenas valvas
com sulcos providos de dentes, com eles, em movimento rotatório, cava galerias em
madeira submersa , com a qual se alimenta, causando prejuízos às embarcações de
madeira, aos embarcadouros e cais.
Varadouro. Lugar baixo de pouca água, à beira mar ou à margem de um rio, onde o peixe-boi
repousa.
LUNA, F. O.
Distribuição, Status de Conservação e Aspectos tradicionais do Peixe-boi marinho ...
122
Várzea. Zona baixa de terra junto à margem de um rio, que fica coberta pela água nas épocas de
cheias, solo aluvial.
Voadeira. Barco de alumínio, provido de motor de popa, com baixa capacidade de transporte,
que desenvolve alta velocidade.
10 – ANEXOS
CENTRO PEIXE-BOI/IBAMA
UNIDADE MÓVEL "IGARAKUE"
FICHA DE ENTREVISTA
No.___________ DATA:_______________ LOCAL: _____________________ UF:___
NOME: __________________________________________________________________
PROFISSÃO: _________________________ TEMPO DE MORADIA: ______________
1) Você conhece o peixe-boi? Não ( ); SIM ( ): VIVO ( ) e/ou MORTO ( )
2) De onde você conhece o peixe-boi?
LOCAL: ___________________________ PERÍODO:_____________________________
REGIONAL:________________________ PERÍODO:_____________________________
OUTRO:___________________________ PERÍODO:_____________________________
3) Você pode descrever como é o peixe-boi? _____________________________________
_________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________
4) Quais são os lugares onde mais freqüentemente os peixes-bois são avistados? ( RIO,
ESTUÁRIO, MAR, OUTROS )
_________________________________________________________________________
5) Qual é a época mais freqüente em que os peixes-bois são avistados? (VERÃO,
INVERNO, ANUAL) _______________________________________________________
6) Normalmente, quantos peixes-bois são avistados?
_________________________________________________________________________
7) Qual foi o maior e o menor número de peixes-bois avistados?
_________________________________________________________________________
8) São avistados fêmeas com filhotes? ____________ Qual a época? __________________
9) Há registros de encalhes de peixes-bois? ______________________________________
10) Você já participou ou matou algum peixe-boi? ________________________________
_________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________
11) Você sabia da proibição de matar peixe-boi?__________________________________
Como? ___________________________________________________________________
12) O que você acha dessa proibição? __________________________________________
CENTRO PEIXE-BOI/IBAMA
PROGRAMA “IGARAKUE” NORTE
RELATÓRIO MEIO ANTRÓPICO
LOCAL DATA REC. HIDRICO HABITAÇÃO
(A) - 50
(B) 50-500
(C) + 500
ACESSO
(A) CARRO
(B) BARCO
(C) AVIÃO
(D) ANIM.
INFRA ESTR.
(A) ÁGUA
(B) LUZ
(C) SANEAMENTO
(D) P. SAÚDE
(E) ESCOLA
ECONOM.
(A) TURIS.
(B) COMER.
(C) PESCA
(D) INDUS.
(E) MINER.
(F) SALINA
DISTURBIOS AMB.
(A) EROSÃO
(B) ASSOREAMENTO
(C) CORTE MANGUE
(D) CORTE MATA
(E) POL. QUIMICA
(F) POL. ORGANICA
(G) LIXO
(H) DRAGAGEM
ARTES DE PESCA
(A) LINHA
(B) TARRAFA
(C) ARRASTO PRAIA
(D) EMALHE
(E) CURRAL
(F) ARRASTO BARCO
NAUTICA
(A) POPA
(B) CENTRO
(C) VELA
(D) REMO
(E) VARA
RELATÓRIO MEIO FÍSICO
LOCAL DATA
TIPO PRAIA
(A) EXPOSTA
(B) PROTEGIDA
(C) FALESIA
(D) DUNAS
(E) ROCHOSA
(F) DELTA
(G) ILHA
(H) ESTUARIAL
(I) FLUVIAL
VEGETAÇÃO
MARÉ
(A) MANGUE
(B) RESTINGA
(C) AMAZONIA
(D) BANHADO
ARRECIFE
(A) FRANJA
(B) BARREIRA
(C) CORAL
SALINI.
ALIMENTO P. BOI RECURSO HIDRIC.
(A) ALGAS
(B) C. AGULHA
(C) MANGUE
(D) F. SUBMERSA
(E) F. FLUTUANTE
(F) F.EMERGENTE
OBSERV.

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