caraterização e valorização da área de intervenção específica de
Transcrição
caraterização e valorização da área de intervenção específica de
CLUSTER DA PEDRA NATURAL CARATERIZAÇÃO E VALORIZAÇÃO DA ÁREA DE INTERVENÇÃO ESPECÍFICA DE CABEÇA VEADA CLUSTER DA PEDRA NATURAL Projeto Âncora 2 Sustentabilidade Ambiental da Indústria Extrativa Atividade 1 Exploração Sustentável de Recursos no MCE Subatividade 1.2 Caraterização e Valorização das Áreas de Intervenção Específica do PNSAC CARATERIZAÇÃO E VALORIZAÇÃO DA ÁREA DE INTERVENÇÃO ESPECÍFICA DE CABEÇA VEADA Jorge M. F. Carvalho, José Sampaio, Susana Machado, Carla Midões, Cátia Prazeres e Rui Sardinha Fevereiro 2014 Índice ÍNDICE DE FIGURAS ................................................................................................................................................................................... 5 EQUIPA TÉCNICA ........................................................................................................................................................................................ 7 1. INTRODUÇÃO .................................................................................................................................................................................. 9 2. INDICADORES DE REALIZAÇÃO..............................................................................................................................................13 3. ENQUADRAMENTO GEOLÓGICO E GEOMORFOLÓGICO ................................................................................................15 3.1. O Maciço Calcário Estremenho ........................................................................................................................16 3.1.1. Geomorfologia ...........................................................................................................................................16 3.1.2. Geologia ....................................................................................................................................................18 3.1.3. Tectónica ...................................................................................................................................................20 3.2. Enquadramento da AIE de Cabeça Veada no MCE ............................................................................................21 4. ESTUDOS ANTERIORES .............................................................................................................................................................25 5. ESTUDO GEOLÓGICO ..................................................................................................................................................................29 5.1. Metodologia....................................................................................................................................................29 5.2. Litostratigrafia Temática ..................................................................................................................................31 5.2.1. Vidraços da Base ........................................................................................................................................33 5.2.2. Calcários Ornamentais ...............................................................................................................................35 5.2.3. Vidraços do Topo .......................................................................................................................................36 5.2.4. Vidraços Escuros ........................................................................................................................................37 5.3. Estrutura Geológica .........................................................................................................................................38 5.3.1. Falhas ........................................................................................................................................................39 5.3.2. 5.3.2.1. 5.3.2.2. 5.3.2.3. Fraturação .................................................................................................................................................41 Metodologia ..............................................................................................................................................41 Resultados .................................................................................................................................................42 O problema do Espaçamento da fraturação ................................................................................................44 5.4. Sondagens.......................................................................................................................................................45 5.5. Cortes Geológicos............................................................................................................................................46 6. ÁREAS DE APTIDÃO PARA CALCÁRIOS ORNAMENTAIS E AVALIAÇÃO DE RECURSOS......................................47 6.1. Delimitação de áreas de aptidão para a exploração de calcários ornamentais ..................................................47 6.2. Cálculo de Recursos em calcários para bloco ....................................................................................................48 7. HIDROGEOLOGIA .........................................................................................................................................................................51 7.1. Introdução ......................................................................................................................................................51 7.2. Metodologia....................................................................................................................................................51 7.3. Caraterização Hidrogeológica ..........................................................................................................................53 3 7.3.1. Enquadramento geológico local .................................................................................................................53 7.3.2. 7.3.2.1. 7.3.2.2. 7.3.2.3. 7.3.2.4. Hidrogeologia local ....................................................................................................................................53 Aptidão hidrogeológica ..............................................................................................................................53 Produtividade aquífera...............................................................................................................................54 Modelo hidrodinâmico ...............................................................................................................................55 Qualidade da água subterrânea ..................................................................................................................56 7.3.3. 7.3.3.1. 7.3.3.2. 7.3.3.2.1. Vulnerabilidade à poluição .........................................................................................................................62 Introdução .................................................................................................................................................62 Metodologia EPIK .......................................................................................................................................63 Avaliação da vulnerabilidade na AIE de Cabeça Veada (método EPIK) .........................................................68 7.3.4. Sensibilidade ambiental .............................................................................................................................72 7.4. Conclusões e Recomendações .........................................................................................................................73 8. PATRIMÓNIO GEOLÓGICO ........................................................................................................................................................77 8.1. Introdução ......................................................................................................................................................77 8.2. Metodologia....................................................................................................................................................77 8.3. Resultados.......................................................................................................................................................79 9. CONCLUSÕES .................................................................................................................................................................................81 10. BIBLIOGRAFIA...............................................................................................................................................................................83 ANEXOS.........................................................................................................................................................................................................87 ANEXO 1- MAPA LITOSTRATIGRÁFICO DA AIE CABEÇA VEADA; ESCALA 1/2000 ...........................................................89 ANEXO 2- CORTES GEOLÓGICOS .................................................................................................................................91 ANEXO 3- ESTUDO PETROGRÁFICO DE LÂMINAS DELGADAS .......................................................................................93 ANEXO 4- LOGS DE SONDAGENS............................................................................................................................... 101 ANEXO 5- MAPA DE APTIDÃO PARA A PRODUÇÃO DE ROCHAS ORNAMENTAIS; ESCALA 1/2000 ............................... 107 ANEXOS EM FORMATO DIGITAL ............................................................................................................................... 109 Ortofotomapas, Levantamento Topográfico, Shapefiles ............................................................................................ 109 APÊNDICE – CLASSIFICAÇÃO DE CALCÁRIOS .............................................................................................................................. 111 4 Índice de Figuras Figura 1- Enquadramento no território nacional do PNSAC e do MCE (tracejado a preto). ............................................ 9 Figura 2- Enquadramento das Áreas de Intervenção Específica definidas no POPNSAC para a indústria extrativa. .......10 Figura 3- Enquadramento geográfico e tectónico do MCE no contexto da BL (in Carvalho, 2013 com esquema tectónico da BL adaptado de Kullberg et al., 2013 e respetivos setores de Ribeiro et al., 1996). ..................................................15 Figura 4- Modelo digital de terreno do MCE, sistema de coordenadas retangulares Hayford-Gauss, Datum 73............16 Figura 5- Vales Suspensos na encosta ocidental da Serra dos Candeeiros. ...................................................................17 Figura 6- Principais nascentes na periferia do MCE. a) Olhos de Água do Almonda, b) Nascentes de Chiqueda, c) Nascente do Lena, d) Nascente do Liz, e) Olhos de Água do Alviela. ............................................................................17 Figura 7- Mapa geológico cronostratigráfico simplificado do MCE. ..............................................................................19 Figura 8- Imagem Google Earth TM do núcleo de pedreiras de Cabeça Veada, com representação da AIE. .....................22 Figura 9- Vista da parte sul do núcleo de pedreiras de Cabeça Veada. .........................................................................22 Figura 10- Vista de norte para sul no interior do núcleo de pedreiras de Cabeça Veada. ..............................................22 Figura 11- Enquadramento litostratigráfico da AIE de Cabeça Veada na Depressão da Mendiga, MCE (adaptado de Mapa Litostratigráfico do MCE, Carvalho, 2013, a partir da cartografia 1/50000 editada pelo LNEG). ..........................23 Figura 12- Formalização da litostratigrafia do Jurássico Inferior e Médio do MCE (retirado de Azerêdo, 2007). ............25 Figura 13- Armazenamento de sondagens na litoteca do LNEG em Alfragide. ..............................................................26 Figura 14- Esquema ilustrativo da afetação dos padrões de afloramento devido à artificialização do relevo por pedreiras (A, B, C e D correspondem a 4 diferentes unidades geológicas, estando as 3 primeiras intersetadas por uma frente de exploração). ................................................................................................................................................30 Figura 15- Mapa Geológico simplificado da área de Cabeça Veada. .............................................................................32 Figura 16- Corte geológico representativo da AIE de Cabeça Veada, redimensionados para o tamanho de página. ......33 Figura 17- Amostra de wackstone oncolítico de cor creme escura, caraterístico dos Vidraços da Base. ........................34 Figura 18- Modo caraterístico de afloramento dos Vidraços da Base em bancadas decimétricas, imediatamente a leste das pedreiras da AIE de Cabeça Veada. .......................................................................................................................34 Figura 19- Microfotografia de amostra de dolomito intercalado nos Vidraços da Base (luz polarizada, nicóis paralelos). ..................................................................................................................................................................................34 Figura 20- Amostra de grainstone biolitoclástico e oolítico correspondente ao Semi Rijo de Cabeça Veada (corte "a favor"). ......................................................................................................................................................................35 Figura 21- Microfotografias de Semi Rijo de Cabeça Veada. a) oosparite de granularidade média (luz polarizada, nicóis paralelos); b) oo-biosparite mal calibrada, de grão médio a grosseiro (luz polarizada, nicóis cruzados). .......................36 Figura 22- Amostra de mudstone de cor castanha da unidade Vidraços do Topo. ........................................................37 Figura 23- Microfotografias caraterísticas dos Vidraços Escuros. a) Biomicrite (luz polarizada, nicóis cruzados); b) Micrite (luz polarizada, nicóis paralelos). ....................................................................................................................37 Figura 24- Feixes de laminações sedimentares inclinados para leste (vista de norte para sul). .....................................38 Figura 25- Vista parcial para sul do núcleo de Cabeça Veada: frentes de exploração verticais, realçando-se o forte pendor para leste por parte dos Calcários Ornamentais. .............................................................................................39 Figura 26- Expressão morfológica da Falha de Valverde. .............................................................................................40 5 Figura 27- Fina fratura com auréola de cor negra como resultado de metassomatismo. ..............................................40 Figura 28- Modelo utilizado para a correção e normalização dos dados de frequência de diaclases. Para bancadas com espessura superior a 1,5 m apenas se normalizou ao comprimento unitário (Carvalho, 2013). ....................................42 Figura 29- Mapa geológico simplificado da região de Cabeça Veada com representação das fraturas fotointerpretadas numa área alargada envolvente da AIE em estudo. Diagramas de rosa mostram os resultados respeitantes às fraturas em afloramentos nas estações de levantamento 1 e 2 indicadas no mapa. .................................................................43 Figura 30- Diaclasamento segundo WSW - ENE nas frentes das pedreiras do núcleo de Cabeça Veada. .......................44 Figura 31- Mapa de aptidão para a produção de calcários ornamentais na AIE de Cabeça Veada. ................................48 Figura 32- Localização dos pontos de água com informação de produtividade e piezometria e com amostragem para caraterização qualitativa das águas subterrâneas da AIE de Cabeça Veada (implantação sobre extrato da Folha 328 do IGeoE na escala 1:25000)............................................................................................................................................55 Figura 33- Modelo digital de terreno da área compreendida entre a AIE de Cabeça Veada e a nascente temporária Olho da Mata do Rei (Sistema de Coordenadas: PT-TM06/ETRS89). ............................................................................57 Figura 34- Representação esquemática do funcionamento de um aquífero cársico (adaptado de Doerfliger & Zwahlen, 1998). ........................................................................................................................................................................63 Figura 35- Representação esquemática do funcionamento do epicarso (adaptado de Doerfliger & Zwahlen, 1998, após Smart & Friedrich, 1986; Jeannin, 1996). ....................................................................................................................64 Figura 36- Epicarso coberto e sem cobertura. Armazenamento sub-superficial de água com escoamento lateral do fluxo em direcção a áreas com elevada condutividade hidráulica, contribuindo para o desenvolvimento de uma dolina de dissolução (adaptado de Doerfliger & Zwahlen, 1998 após Williams, 1983) ............................................................65 Figura 37- Pedreira na AIE de Cabeça Veada onde se observa a alternância entre zonas da rocha com baixa permeabilidade e zonas de infiltração concentrada. ...................................................................................................65 Figura 38- Evidência de solo incipiente na AIE de Cabeça Veada. .................................................................................66 Figura 39- Modelo Digital de Terreno (MDT) de Cabeça Veada e área envolvente. ......................................................69 Figura 40- Mapas parciais de cada um dos parâmetros E, P, I e K na AIE de Cabeça Veada e sua envolvente. ...............70 Figura 41- Representação do Índice EPIK na AIE de Cabeça Veada e sua envolvente (Sistema de Coordenadas: PTTM06/ETRS89) ...........................................................................................................................................................71 Figura 42- Ocupação do solo e Índice EPIK na AIE de Cabeça Veada (Sist. Coordenadas: PT-TM06/ETRS89). ................72 Figura 43- Áreas de maior sensibilidade hidrogeológica na AIE de Cabeça Veada (Sistema Coord.: PT-TM06/ETRS89)..74 Figura 44- Diagrama representativo do processo de valoração qualitativa do património geológico em função da atividade extrativa. ....................................................................................................................................................78 6 EQUIPA TÉCNICA LNEG Carla Midões Cátia Prazeres Cristina Isabel Carvalho Jorge M. F. Carvalho José Sampaio Rui Sardinha Susana Machado Vítor Lisboa CEVALOR Ana Machuco Filomena Cavaco Natália Saúde Nuno Bonito COLABORAÇÃO NA TEMÁTICA PATRIMÓNIO GEOLÓGICO ICNF Lia Morais Mergulhão (Parque Natural de Sintra-Cascais) Olímpio Martins (Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros) 7 8 1. INTRODUÇÃO O Maciço Calcário Estremenho (MCE), cujos limites aproximados estão representados na Figura 1, está enquadrado pelas cidades de Leiria, Ourém, Tomar, Torres Novas, Rio Maior e Alcobaça. Corresponde a uma unidade morfostrutural do território português que se individualiza das regiões circundantes pelas suas peculiaridades geológicas e geomorfológicas. Peculiaridades geológicas pelo fato de se apresentar constituído essencialmente por rochas calcárias, as quais se apresentam sobrelevadas tectonicamente, donde a peculiaridade geomorfológica. Figura 1- Enquadramento no território nacional do PNSAC e do MCE (tracejado a preto). Grande parte da área do MCE está sujeita a um regime de proteção da natureza por intermédio do Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros (PNSAC), o qual integra o Departamento de Conservação da Natureza e Florestas de Lisboa e Vale do Tejo do Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas. O PNSAC foi implementado em 1979 pelo Decreto-Lei nº 118 de 4 de maio. Na respetiva área integram-se 5 núcleos principais de pedreiras onde, desde há décadas, se desenvolve uma importante atividade extrativa de blocos de calcário que se destinam ao setor de transformação de rochas ornamentais: os núcleos de Pé da Pedreira, Codaçal, Moleanos, Cabeça Veada e Portela das Salgueiras. O Plano de Ordenamento do PNSAC (POPNSAC), publicado pela Resolução de Conselho de Ministros n.º 57/2010, de 12 de Agosto, 9 define a área ocupada por esses núcleos como Áreas de Intervenção Específica (AIE), de acordo com a sua representação na Figura 2. O POPNSAC preconiza que as AIEs sejam alvo de Planos Municipais de Ordenamento do Território que visem a implementação de medidas de compatibilização entre a gestão racional dos recursos e a conservação dos valores ambientais, salvaguardando que essas AIEs poderão ser abrangidas por projetos integrados de exploração (artº 24, RCM 57/2010). Figura 2- Enquadramento das Áreas de Intervenção Específica definidas no POPNSAC para a indústria extrativa. No âmbito do Programa Operacional Fatores de Competitividade (COMPETE) do Quadro de Referência Estratégico Nacional 2007 – 2013 (QREN), foi formalmente reconhecido o Cluster da Pedra Natural por despacho conjunto do Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e Desenvolvimento Regional e do Ministro da Economia e Inovação em 15 de Julho de 2009. Este Cluster, através da Atividade 1 – Exploração Sustentável de Recursos no MCE, do seu Projeto Âncora 2 - Sustentabilidade Ambiental da Indústria Extrativa, propôs-se a realizar as ações preconizadas para as AIEs do PNSAC no respetivo Plano de Ordenamento, através de subatividades para as quais foram lançados concursos públicos por parte da ASSIMAGRA – Associação Portuguesa dos Industriais de Mármores, Granitos e Ramos Afins, nomeadamente: ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ Subatividade 1.1 - Caracterização da Situação de Referência do MCE; Subatividade 1.2 - Caracterização e Valorização das Áreas de Intervenção Específica do PNSAC; Subatividade 1.3 - Desenvolvimento do Modelo de Gestão de Resíduos; Subatividade 1.4 - Proposta de Ordenamento e Gestão Territorial dos Núcleos Extrativos; Subatividade 1.5 - Comunicação e Sensibilização. 10 A Subactividade 1.2 - Caracterização e Valorização das Áreas de Intervenção Específica do PNSAC foi adjudicada em 12 de Setembro de 2009 a uma parceria estabelecida entre o LNEG - Laboratório Nacional de Energia e Geologia, IP e o CEVALOR – Centro Tecnológico para a Valorização das Rochas Ornamentais e Industriais através de um Acordo de Cooperação celebrado em 20 de Dezembro de 2011. O presente relatório pretende dar conta dos trabalhos realizados no âmbito da parceria LNEG - CEVALOR para a caraterização e valorização da Área de Intervenção Específica de Cabeça Veada cuja área é de 29 hectares. Esses trabalhos compreendem estudos geológicos, estudos hidrogeológicos e estudos sobre o património geológico. Os dados e resultados obtidos constituem suporte ao desenvolvimento dos trabalhos inerentes às subactividade 1.3 e 1.4 mencionadas anteriormente, as quais foram adjudicadas pela ASSIMAGRA à empresa Visa Consultores, SA., e que integram a execução de: ‐ Desenvolvimento de um modelo de gestão dos resíduos das explorações articulado com as restrições de natureza ambiental existentes; ‐ Proposta de Ordenamento e Gestão Territorial dos Núcleos Extrativos que inclui os Planos de Intervenção em Espaço Rural e respetiva Avaliação Ambiental Estratégica e os Projetos Integrados e respetiva Avaliação de Impacte Ambiental. A execução de ambas as subactividades decorreu de modo paralelo, em estreita colaboração, pelo que aqui se integram alguns dos resultados da Subatividade 1.4, nomeadamente os respeitantes à definição de áreas de aptidão geológica e mineira e cálculo de reservas para a AIE de Cabeça Veada. Os estudos geológicos realizados envolveram cartografia geológica à escala 1/2000, caraterização dos litotipos aflorantes, sondagens e levantamento da fraturação do maciço rochoso da área de Cabeça Veada, tendo em vista a caraterização dos respetivos recursos minerais em rochas ornamentais e a delimitação das áreas de aptidão mais favoráveis à sua exploração. Os estudos hidrogeológicos visaram caraterizar e modelar os recursos hídricos subterrâneos na área de Cabeça Veada, com particular destaque no que respeita à avaliação da sua vulnerabilidade. Os estudos patrimoniais visaram inventariar, caraterizar e valorizar os eventuais sítios com interesse patrimonial de âmbito geológico, mineiro e geomorfológico existentes na AIE de Cabeça Veada. Foram realizados com a colaboração ativa por parte do PNSAC. Os resultados obtidos, para além de suporte às subactividades 1.3 e 1.4, visam integrar uma Carta Geológica Simplificada do PNSAC que, por seu lado, está integrada na Subatividade 1.1 e suporta a Subatividade 1.5. 11 12 2. INDICADORES DE REALIZAÇÃO Os estudos levados a cabo na AIE de Cabeça Veada integram-se no Projeto Âncora 2 do Cluster da Pedra Natural formalizado junto do COMPETE, designadamente nas Estratégias de Eficiência Coletiva, a quem interessa a especificação dos indicadores de realização das atividades preconizadas. Assim, dos estudos geológicos da AIE de Cabeça Veada resultam os seguintes Indicadores de Realização: ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ Área total cartografada: 74,5 hectares; área da AIE: 29 hectares; 1 mapa geológico à escala 1/2000 (Anexo 1); 4 cortes geológicos elucidativos do modelo geológico tridimensional (Anexo 2); 6 estudos petrológicos em lâmina delgada (Anexo 3); 1 mapa de aptidão para a produção de rochas ornamentais à escala 1/2000 (Anexo 5); 1 mapa de vulnerabilidade à poluição (Figura 41); 1 mapa de sensibilidade hidrogeológica (Figura 43). 13 14 3. ENQUADRAMENTO GEOLÓGICO E GEOMORFOLÓGICO O MCE é parte integrante da região central da Bacia Lusitaniana (Figura 3), a qual corresponde a uma bacia intracratónica, no bordo Oeste da microplaca Ibérica. Estruturalmente a Bacia Lusitaniana (BL) corresponde a um graben alongado segundo NNE-SSW no qual se depositaram sedimentos mesozoicos cuja espessura máxima ronda os 4 a 5 km (Ribeiro et al., 1979; Wilson, 1988). A origem da BL está associada aos episódios distensivos que levaram à abertura do Oceano Atlântico durante o Mesozoico. Está limitada por acidentes longitudinais herdados da orogenia varisca e apresentase compartimentada transversalmente por acidentes orientados NE-SW e W-E, também eles de herança varisca e cuja atuação se reflete ao nível da distribuição e espessura das fácies sedimentares (Kullberg et al., 2013). Após esse período distensivo a BL ficou sujeita a um regime tectónico compressivo, desde o final do Cretácico até à atualidade, por efeito da colisão entre a microplaca ibérica com as placas africana e euroasiática. Conduziu à inversão das principais estruturas tectónicas e à exposição subaérea da sequência de rochas carbonatadas mesozoicas, tendo-se depositado sobre estas uma sequência descontínua de sedimentos maioritariamente siliciclásticos (Kullberg et al., 2013). Figura 3- Enquadramento geográfico e tectónico do MCE no contexto da BL (in Carvalho, 2013 com esquema tectónico da BL adaptado de Kullberg et al., 2013 e respetivos setores de Ribeiro et al., 1996). 15 3.1. O Maciço Calcário Estremenho 3.1.1. Geomorfologia O MCE foi definido enquanto unidade geomorfológica constituída essencialmente por rochas calcárias que se elevam acima da Bacia Terciária do Tejo, da Plataforma Litoral e da Bacia de Ourém, por A. Fernando Martins na sua Tese de Doutoramento (Martins, 1949). Esta constitui, ainda, um trabalho de referência atual sobre a geomorfologia deste maciço. Trabalhos mais recentes incidiram, sobretudo, em áreas específicas do MCE ou abordaram aspetos particulares da sua evolução geomorfológica, nomeadamente Ferreira et al., 1988; Rodrigues, 1991; Crispim, 1995; Rodrigues, 1998. Figura 4- Modelo digital de terreno do MCE, sistema de coordenadas retangulares Hayford-Gauss, Datum 73. A morfologia do MCE está condicionada pela natureza calcária das rochas que o compõem, refletindo o desenvolvimento de uma morfologia cársica bem característica. De acordo com Rodrigues, 1998, a sua arquitetura é resultado, fundamentalmente, da movimentação tectónica das diversas falhas que o afetam. Essa arquitetura assenta em 3 regiões elevadas distintas separadas por duas depressões alongadas (Figura 4): ‐ ‐ A ocidente, a Serra dos Candeeiros, orientada NNE-SSW, encontra-se separada do Planalto de Santo António, a oriente, pela Depressão da Mendiga. Esta também se apresenta orientada segundo NNESSW e está associada à Falha da Mendiga. Ao longo da Serra dos Candeeiros, truncando o seu bordo oriental, distingue-se o alinhamento tectónico diapírico de Rio Maior – Porto de Mós – Batalha. O Planalto de Sto. António está separado do Planalto de S. Mamede e Serra de Aire por um alinhamento NW-SE denunciado pelas depressões de Alvados e Minde, as quais estão condicionadas 16 pelo sistema de falhas escalonadas com o mesmo nome (Carvalho, 2013). A Serra de Aire apresenta uma orientação NE-SW e constitui a região mais elevada de todo o MCE. Dada a natureza carbonatada do maciço, a morfologia cársica caracteriza-o de modo marcante, com uma grande diversidade de estruturas. As formas de exocarso mais frequentes e notórias são as depressões fechadas de tipo dolina ou uvala, os poljes, dos quais o de Minde é o mais representativo, os vales secos e os extensos campos de lapiás. De realçar, também, formas que testemunham paleorelevos resultantes de períodos de erosão normal no MCE, como sejam os Vales Suspensos da Serra dos Candeeiros (Martins, 1949), conforme a fotografia da Figura 5 ilustra. Figura 5- Vales Suspensos na encosta ocidental da Serra dos Candeeiros. Figura 6- Principais nascentes na periferia do MCE. a) Olhos de Água do Almonda, b) Nascentes de Chiqueda, c) Nascente do Lena, d) Nascente do Liz, e) Olhos de Água do Alviela. A rede de drenagem superficial é praticamente inexistente, pois predomina a drenagem subterrânea. Esta realiza-se por uma também grande diversidade de formas, desde pequenas fissuras a largas galerias subterrâneas. As conhecidas grutas que ocorrem neste maciço são o testemunho de antigas galerias de 17 escoamento. Atualmente, esse escoamento subterrâneo dá lugar a um reduzido número de principais nascentes na periferia do MCE, das quais se destaca os Olhos de Água do Alviela e do Almonda, as nascentes dos rios Lena e Liz e ainda as nascentes de Chiqueda (Figura 6). 3.1.2. Geologia O MCE compreende rochas datadas desde o Jurássico Inferior (Hetangiano) ao Pliocénico. Porém, a grande maioria é do Jurássico Médio e Superior. A sua distribuição espacial está representada no mapa cronostratigráfico simplificado que se apresenta na Figura 7, o qual resulta de adaptação, por simplificação, da Carta Geológica de Portugal à escala 1/50000, nomeadamente das folhas que abrangem o Maciço (Folha 27 A – Vila Nova de Ourém e Folha 27 C – Torres Novas). Ao Hetangiano correspondem depósitos de natureza evaporítica constituídos por argilas, margas, salgema e gesso. Afloram de modo descontínuo e condicionado por falhas ao longo duma estreita faixa NNE-SSW entre Rio Maior e Porto de Mós. Esta estrutura corresponde a uma "parede de sal" (Ribeiro et al., 1996; Kullberg, 2000), ou seja, acidente tectónico ao longo do qual se deu a ascensão dos depósitos evaporíticos. Junto às cidades mencionadas verifica-se o alargamento dessa estrutura. O Jurássico Médio-Inferior ocupa a maior parte da área do MCE e aflora nas unidades morfoestruturais soerguidas tectonicamente. Esses afloramentos datam, sobretudo, do Jurássico Médio, pois os do Jurássico Inferior afloram unicamente numa estreita faixa limitada pelo Sistema de Falhas de Alvados – Minde a sul de Porto de Mós, razão pela qual no mapa geológico da Figura 7 não se procedeu à sua individualização. É constituído por rochas dolomíticas, calcárias e margosas. Quanto ao Jurássico Médio, é constituído por calcários de natureza diversa, desde mudstones a rudstones bastante grosseiros, mas que no conjunto partilham o fato de apresentarem cores bastante claras, traduzindo um elevado grau de pureza em termos de conteúdo em óxido de cálcio. Quanto ao Jurássico Superior, genericamente aflora nas regiões deprimidas que separam as regiões elevadas, onde aflora o Jurássico Médio. Aflora ainda na depressão de Alcobaça que se desenvolve para ocidente da Serra dos Candeeiros e na parte oriental do Planalto de S. Mamede, na região de Fátima. Esta série integra sobretudo margas e calcários de diversa natureza que apresentam cores acastanhadas e acinzentadas. Porém, na Depressão de Alcobaça, os afloramentos correspondem maioritariamente a depósitos arenoargilosos. No que respeita aos depósitos pós-Jurássicos representados no mapa da Figura 7, eles integram maioritariamente rochas de natureza siliciclástica que datam, descontinuamente, do Cretácico Inferior ao Pliocénico e ainda aluviões e depósitos de terraços quaternários. Afloram marginalmente ao MCE, com particular destaque na Bacia Terciária do Tejo, entre Rio Maior e Torres Novas, e nas chamadas bacias de Alpedriz e Ourém. 18 Figura 7- Mapa geológico cronostratigráfico simplificado do MCE. No MCE ocorrem também rochas ígneas. São pouco abundantes e estão dispersas por todo o Maciço, à exceção da Serra de Aire e Planalto de São Mamede. Podem-se subdividir em três grupos principais, consoante o tipo de estruturas a que se encontram associados (Carvalho, 2013): - Corpos instalados em falhas de orientação NW – SE a WNW – ESE; Corpos associados às estruturas diapíricas; Corpos isolados com correspondência a aparelhos vulcânicos Os correspondentes ao primeiro grupo afetam todo o Jurássico. As datações radiométricas disponíveis (Ferreira & Macedo, 1983; 1987; Willis, 1988) apontam idades para a sua instalação que variam entre os 154 Ma e os 93 Ma. Os corpos ígneos associados às estruturas diapíricas são pequenas intrusões dispersas que ocorrem no interior do Diapiro das Caldas da Rainha (já fora do MCE), afetando o Hetangiano, e os que afloram ao longo do acidente de Rio Maior – Porto de Mós, cortando as formações jurássicas. As datações disponíveis (Ferreira & Macedo, 1983; Willis, 1988) variam entre os 136 Ma e os 103 Ma. Neste grupo destaca-se o extenso filão-camada de Teira, a Norte de Rio Maior (Figura 7). Nos aparelhos vulcânicos incluem-se a brecha vulcânica de Abrã (a leste de Alcanede, Figura 7) que afeta rochas do Cretácico e o corpo de Alqueidão da Serra (a sudeste da Batalha) que afeta o Jurássico Superior e 19 que parece associado a um acidente de orientação NW-SE. A instalação deste último terá ocorrido aos 140 Ma (Ferreira & Macedo, 1983) ou aos 136 Ma (Willis, 1988). Quanto à sua natureza, estas rochas ígneas compreendem doleritos e gabro-dioritos alcalinos e subalcalinos que integram um ciclo de natureza transicional da BL (Martins, 1991; Martins et al., 2010). Pese embora alguma diversidade de idades radiométricas, elas têm sido genericamente apontadas como representativas de um episódio de magmatismo na passagem do Jurássico ao Cretácico (Terrinha et al., 1995; Kullberg, 2000; Kullberg et al., 2013). 3.1.3. Tectónica O estilo tectónico patenteado pelo MCE é, em grande parte, herdado das estruturas originadas no decorrer da Orogenia Varisca que afetou o território nacional durante o Paleozoico. Está muito influenciado pelo facto de, no decorrer do Hetangiano, se ter depositado uma espessa sequência de depósitos evaporíticos (Formação de Dagorda) que funcionou como base de descolamento entre as rochas do soco e as mesozoicas durante os episódios extensivos da deformação Alpina. Assim, nos locais onde esses depósitos evaporíticos apresentavam espessura reduzida, a reativação dos acidentes variscos levou-os a cortar toda a sequência mesozoica como falhas normais. Nos locais em que esses depósitos apresentavam espessura elevada, os acidentes variscos não se prolongaram para a superfície. Antes surgiram novas falhas normais acima da sequência evaporítica, a mimetizar as subjacentes. Portanto e como referido por Kullberg et al., 2013, verifica-se a conjugação de tectónica de soco com tectónica pelicular (thick and thin skin tectonics). Durante os episódios de compressão Alpina as estruturas terão voltado a movimentar-se, mas agora de modo inverso e desligante, conduzindo à inversão geral da BL. Os principais acidentes tectónicos que dominam o MCE correspondem a falhas orientadas segundo três direções principais: NNE-SSW, NW-SE e NE-SW. Os acidentes NNE-SSW são os mais frequentes e integram 4 grandes falhas (Figura 7): a Falha dos Candeeiros que limita, a Oeste, a Serra com o mesmo nome, a Falha de Rio Maior – Porto de Mós que trunca essa serra do lado oriental, e o sistema constituído pela Falha da Mendiga (no bordo ocidental do Planalto de Sto. António) e pela Falha de Reguengo do Fetal (no bordo ocidental do Planalto de São Mamede). Estes acidentes terão funcionado como falhas normais durante as fases extensionais mesozoicas e, pelo menos algumas delas, terão sofrido inversão durante o Cenozoico. No que respeita aos acidentes NW-SE, eles estão fundamentalmente representados pelo sistema de falhas escalonadas de Alvados e Minde as quais estão interligadas na região de Alvados, limitando uma zona deprimida. À semelhança das anteriores, terão funcionado como falhas normais durante o período distensivo Mesozoico. Conforme o mapa da Figura 7 elucida, este sistema terá sido reativado posteriormente como rampa lateral dextrogira do Cavalgamento do Arrife, durante o período de inversão (Manuppella et al., 2000; Carvalho, 2013). A direção NW-SE está ainda representada por acidentes que compartimentam transversalmente o MCE. Excetuando os que afetam o Planalto de S. Mamede, muitos dos restantes apresentam-se intruídos parcialmente por rochas ígneas de natureza dolerítica. Estes acidentes, a par com outros de grandes dimensões que afetam sobretudo a Depressão de Alcobaça e se prolongam para a Bacia Terciária do Tejo, 20 constituem um dos traços distintivos do MCE. Wilson et al., 1989, associam-nos às fases distensivas mesozoicas. Contudo, Carvalho, 2013, associa-os a episódio compressivo precoce na passagem do Jurássico para o Cretácico. Quanto à direção NE-SW, ela está sobretudo representada pela Falha do Arrife, a qual limita o MCE a sudeste. Durante as fases de compressão Alpina foi reativada como cavalgamento vergente para sudeste. Quanto à disposição estrutural dos estratos das diferentes unidades litostratigráficas do MCE, eles apresentam-se sub-horizontais, embora, no geral, associados a dobramentos de grande raio de curvatura. De entre eles destaca-se a estruturação anticlinal do Planalto de S. Mamede, a qual tem correspondência com um roll-over a teto do sistema de Falhas de Alvados-Minde e a estruturação anticlinal do Jurássico Superior da Depressão de Alqueidão, truncada por depósitos cretácicos (Carvalho, 2013). Também a Serra dos Candeeiros e a Serra de Aire correspondem a estruturas anticlinais, mas estas provavelmente induzidas por movimentações ascensionais de depósitos salíferos (Kullberg, 2000; Carvalho, 2013; Kullberg et al., 2013). De modo localizado ocorrem, também, dobramentos apertados que acompanham algumas das principais falhas, sendo indicativos da sua reativação sob efeito de campo tectónico compressivo. É o caso particular dos dobramentos na Depressão da Mendiga, entre a falha com o mesmo nome e a Falha de Rio Maior – Porto de Mós, e os que ocorrem nas imediações do Cavalgamento do Arrife, paralelamente a esse acidente. 3.2. Enquadramento da AIE de Cabeça Veada no MCE A AIE de Cabeça Veada localiza-se imediatamente a ocidente da povoação com o mesmo nome, na freguesia da Mendiga, concelho de Porto de Mós e distrito de Leiria (Figura 8). A razão subjacente à implementação da AIE de Cabeça Veada no POPNSAC prende-se com a intensa atividade extrativa de calcários ornamentais que aí ocorre. As pedreiras desenvolveram-se inicialmente em flanco de encosta (Figura 9), na vertente oriental da Serra da Lua, a qual corresponde a relevo de dureza mas também de natureza tectónica, como mais à frente se abordará. Atualmente, pelo grande desenvolvimento que as pedreiras tiveram em profundidade, alcançando os 60 m, a sua forma é em poço (Figura 10). O acesso principal faz-se por caminho que parte da EN362 na povoação de Cabeça Veada (Figura 8). Em termos de enquadramento geológico, a AIE de Cabeça Veada localiza-se na Depressão da Mendiga do Maciço Calcário Estremenho. Esta é uma depressão de origem tectónica onde afloram rochas do Jurássico Superior que contatam com rochas do Jurássico Médio por intermédio de duas falhas principais orientadas NNE - SSW (Figura 7): a ocidente a Falha de Rio Maior – Porto de Mós e a oriente a Falha da Mendiga. Estas falhas terão tido uma movimentação normal durante as fases distensivas mesozoicas. Posteriormente, durante o Cenozoico, foram reativadas em desligamento esquerdo. A Figura 11 corresponde a um extrato do mapa litostratigráfico simplificado do MCE, centrado na Depressão da Mendiga e onde está representada a AIE de Cabeça Veada. Verifica-se que os afloramentos do Jurássico Superior nesta depressão correspondem a afloramentos das formações de Cabaços e Montejunto indiferenciados. Estes afloramentos apresentam-se com atitudes diversas como resultado de 21 basculamentos e dobramentos induzidos pela movimentação das falhas mencionadas, particularmente durante as fases de compressão alpinas. Figura 8- Imagem Google EarthTM do núcleo de pedreiras de Cabeça Veada, com representação da AIE. Figura 9- Vista da parte sul do núcleo de pedreiras de Cabeça Veada. Figura 10- Vista de norte para sul no interior do núcleo de pedreiras de Cabeça Veada. A AIE de Cabeça Veada localiza num estreito afloramento de calcários do Jurássico Médio com uma orientação subparalela a essas falhas. A oeste contata com os afloramentos do Jurássico Superior por intermédio de uma falha com a mesma orientação, conhecida por Falha de Valverde e cuja movimentação mais recente terá sido em desligamento esquerdo com componente inversa. Conduziu a cavalgamento do Jurássico Médio sobre o Superior o que, associado ao fato dos calcários do Jurássico Médio serem mais duros que os do Superior, explica que a faixa de afloramentos referida se apresente sobrelevada na depressão da Mendiga. A leste o contato com as rochas do Jurássico Superior corresponde a uma desconformidade de âmbito regional: as rochas do Oxfordiano médio – superior (Figura 11) assentam diretamente sobre as rochas do Batoniano (calcários micríticos da Formação de Serra de Aire), verificandose a ausência das rochas do Caloviano (Membro de Moleanos da Formação de Sto. António – Candeeiros). 22 Para além das falhas principais referidas, estes calcários estão também afetados por rochas filonianas de natureza dolerítica que se apresentam orientadas transversalmente, ou seja segundo WNW – ESE, subverticais. Figura 11- Enquadramento litostratigráfico da AIE de Cabeça Veada na Depressão da Mendiga, MCE (adaptado de Mapa Litostratigráfico do MCE, Carvalho, 2013, a partir da cartografia 1/50000 editada pelo LNEG). Os afloramentos do Jurássico Médio onde se localiza a AIE de Cabeça Veada abrangem a Formação de Serra de Aire e o Membro de Pé da Pedreira da Formação de Sto. António – Candeeiros. Estas unidades apresentam-se basculadas cerca de 400 para leste. A Formação de Serra de Aire (Azerêdo, 2007), ou Calcários Micríticos de Serra de Aire (Manupella et al., 1999) é de idade Batoniano e tem uma espessura na ordem dos 350 m a 400 m. É constituída sobretudo por calcários micríticos de cores claras que integram mudstones, wackstones e floatstones mais ou menos pelóidicos, bioclásticos e oncolíticos, em bancadas de espessura centimétrica a decimétrica, raramente métrica. 23 Os calcários explorados na AIE de Cabeça Veada, estão referenciados por Calcários de Pé da Pedreira na Folha 27-C da Carta Geológica de Portugal à escala 1/50000 (Manupella et al., 1999). Formalização recente da litostratigrafia do Maciço Calcário Estremenho (Azerêdo, 2007) considera que estes calcários constituem o Membro de Pé da Pedreira de uma unidade maior: A Formação de Santo António – Candeeiros. Esta é equivalente lateral da Formação de Serra de Aire mas cuja idade abrange não só o Batoniano mas também o Caloviano. Os calcários do Membro de Pé da Pedreira têm idade Batoniano superior. São calcários calciclásticos sparíticos diversos, de cor creme claro e granulometria grosseira que integram grainstones e rudstones em corpos lenticulares maciços com espessura bastante elevada, em que raramente se distinguem descontinuidades correspondentes a superfícies de estratificação. Distinguem-se, sim, macro feixes de laminações sedimentares diversas, em geral paralelas ou oblíquas, com espessura na ordem de 2 a 3 metros. É também comum a ocorrência de biostromas ricos em organismos coraliários que se intercalam e interdigitam com as restantes litofácies A espessura total do Membro de Pé da Pedreira é variável consoante a região de afloramento. Na faixa de afloramentos onde se integra a AIE de Cabeça Veada alcança os 130 m de espessura. Tendo em atenção o mapa da Figura 11, é notório que os calcários deste Membro de Pé da Pedreira se encontram intercalados nos da Formação de Serra de Aire, comprovando a já mencionada equivalência lateral de fácies. Ambas as unidades estão truncadas a ocidente, a sul e a norte pela também já mencionada Falha de Valverde. 24 4. ESTUDOS ANTERIORES Nos estudos geológicos que têm abarcado a região de Cabeça Veada há a considerar os decorrentes de trabalhos de geologia regional da área abrangida pelo MCE e outros, menos abrangentes, de temática vocacionada para o apoio à indústria, todos eles realizados pelas entidades percursoras do LNEG que desempenharam a função de serviço geológico nacional. Entre os primeiros há sobretudo que ter em atenção a cartografia geológica regional à escala 1/25000 que conduziu à elaboração da Folha 27-C (Torres Novas) à escala 1/50000, na suas primeira e segunda edições (Zbyszewski et al., 1969 e Manupella et al., 1999, respetivamente). Entre a publicação desses dois mapas e suas Notícias Explicativas, foi publicado em 1985 um outro trabalho de geologia regional de âmbito particular para o MCE com o título Calcários e Dolomitos do Maciço Calcário Estremenho, o qual inclui um primeiro mapa litostratigráfico do MCE (Manuppella et al., 1985). A revisão dessa litostratigrafia durante a década de 90 do século passado, a par com trabalhos geológicos de pormenor sobre os locais de exploração de rochas ornamentais (Carvalho, 1996; 1997; 1998; Quartau, 1998; 2000), constituiu o suporte para a elaboração da 2ª edição da Folha 27-C que se encontra em vigor. Nesta, pela primeira vez, os calcários caraterísticos da área de Cabeça Veada são individualizados, integrando uma unidade que se denominou Calcários de Pé da Pedreira (cf. Figura 11; Membro de Pé da Pedreira). Figura 12- Formalização da litostratigrafia do Jurássico Inferior e Médio do MCE (retirado de Azerêdo, 2007). Ainda numa perspetiva regional merece referência a Tese de Doutoramento apresentada por Cristina Azerêdo à Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa em 1993. Essa tese (Azerêdo, 1993) centra-se no estudo sedimentológico e paleogeográfico dos calcários do Jurássico Médio do MCE, abarcando, portanto, também os que afloram na região de Cabeça Veada. Da mesma autora importa referir a formalização mais recente das unidades litostratigráficas do Jurássico Inferior e Médio do Maciço Calcário Estremenho (Azerêdo, 2007). Neste trabalho, a unidade Calcários de Pé da Pedreira (Manupella et al., 25 1999; 2006) passou a ser considerada um membro (Membro de Pé da Pedreira) da Formação de Santo António – Candeeiros (Figura 12). No que respeita aos trabalhos vocacionados para o apoio à indústria extrativa há a registar a obra publicada em 1988 sob o título Calcários Ornamentais do Maciço Calcário Estremenho (Costa et al., 1988) que dá conta de uma campanha de sondagens realizadas especificamente para avaliação deste tipo de recursos. Os diversos núcleos de produção de calcários ornamentais do MCE, incluindo o de Cabeça Veada, são apresentados por intermédio de uma abordagem muito sumária aos litotipos explorados e sistema de fraturas que os afeta. Figura 13- Armazenamento de sondagens na litoteca do LNEG em Alfragide. No decorrer do ano de 1998 realizou-se o primeiro estudo geológico de detalhe sobre o núcleo de Cabeça Veada, tendo como objetivo a caraterização e avaliação dos recursos em rochas ornamentais: Calcários Ornamentais do Maciço Calcário Estremenho - A variedade Semi-Rijo de Cabeça Veada (Quartau, 1998). Este trabalho centra-se na cartografia geológica, à escala 1/2000, das litofácies presentes, bem como na caraterização genérica das principais direções de fraturação. É também apresentada a primeira estimativa de recursos disponíveis em calcários para blocos: 4,5 milhões de metros cúbicos, tendo em conta um fator de precisão de 80% e um rendimento de exploração de 50%. Os trabalhos realizados por Quartau, 1998, serviram de suporte aos que agora são apresentados neste relatório. Conhecimento específico sobre as litologias que ocorrem em Cabeça Veada foi também obtido através da realização de sondagens, nomeadamente as que foram mencionadas anteriormente, cujos dados são de 26 domínio público e os respetivos testemunhos físicos estão disponíveis para consulta na Litoteca do LNEG em Alfragide (Figura 13). Relativamente a estudos anteriores importa ainda registar os estudos petrográficos e de caraterização tecnológica realizados sobre a variedade Semi Rijo de Cabeça Veada no âmbito do Catálogo das Rochas Ornamentais Portuguesas editado pelo LNEG. 27 28 5. ESTUDO GEOLÓGICO 5.1. Metodologia A metodologia adotada para o estudo geológico realizado visou suportar o planeamento da lavra mineira através de um projeto integrado e o planeamento do uso do território em função da aptidão do substrato geológico para a produção blocos de calcários ornamentais na AIE de Cabeça Veada. Seguiram-se as linhas gerais propostas por Carvalho et al., 2008 que aponta a homogeneidade litológica, a dimensão e a fraturação que afeta o maciço rochoso como os critérios decisivos para o estabelecimento da aptidão ornamental desse maciço e que esses critérios podem ser devidamente determinados por intermédio de cartografia geológica detalhada e levantamento da fraturação. Porém, perante os condicionalismos impostos ao estudo da fraturação que afeta as litologias exploradas nesta AIE e que mais à frente serão devidamente apontados (cf. 5.3.2.3), a metodologia seguida assentou, sobretudo, na execução de cartografia geológica detalhada à escala 1/2000, prestando especial atenção aos seguintes aspetos: ‐ ‐ ‐ ‐ Distinção das litofácies presentes em função da sua aptidão ornamental, tendo presente a sua caraterização nos aspetos que influenciam a sua homogeneidade textural e cromática. Verificação da disposição espacial e da dimensão das bancadas sedimentares. Atribuição de nomenclatura às litofácies identificadas de acordo com a terminologia comum no meio industrial dos calcários ornamentais da região. Integração das litofácies identificadas em unidades litostratigráficas com representatividade, pelo menos, ao nível da área em estudo e sua denominação também de acordo com a terminologia em uso na região. Para apoio à caraterização das litofácies da AIE de Cabeça Veada foram realizados estudos petrográficos em lâmina delgada, os quais são apresentados em anexo. A cartografia teve como ponto de partida a anteriormente executada por Quartau, 1998 e foi realizada sobre cartas topográficas, também à escala 1/2000. Estas foram elaboradas especificamente para este objetivo a partir de levantamento aerofotogramétrico efetuado em Agosto de 2011. Como apoio à orientação no terreno, foram utilizados também ortofotomapas resultantes do mesmo levantamento. A elaboração da base topográfica teve em atenção as particularidades da região no que respeita aos aspetos mineiros, nomeadamente a distinção de escarpados artificiais como correspondentes a frentes de exploração de pedreiras, e a distinção de locais de acumulação de resíduos dessas explorações (escombreiras). Durante o processo de cartografia geológica foram atualizados alguns dos limites dessas pedreiras e escombreiras. Dadas as especificidades do relevo nas AIEs, designadamente o fato de se apresentar artificializado pela existência de pedreiras, a cartografia geológica realizada apresenta alguns aspetos particulares que merecem ser aqui abordados, pois têm consequências ao nível da interpretação. 29 Assim, em primeiro lugar, há a considerar que no mapa topográfico utilizado a representação dos diferentes pisos das pedreiras é feita por intermédio de dois tipos de linhas: “limite superior de escarpado artificial” e “limite inferior de escarpado artificial”. Correspondem, respetivamente, ao limite superior e inferior de cada piso de desmonte. Como norma, apenas se considerou a linha correspondente ao limite superior de cada um dos pisos. Em segundo lugar, correspondendo essas linhas à interseção das frentes de desmonte com a superfície, há a considerar que elas acabam por interromper as linhas representativas dos limites geológicos. Esses limites geológicos deixam de ter representação no mapa pois, sendo apenas observáveis nas frentes de exploração, coincidem com a linha limite dessas mesmas frentes. Noutros casos, como as linhas representativas das pedreiras correspondem a escarpados verticais, em projeção planar elas estabelecem contatos artificiais entre unidades litológicas que não estão em contato real. A Figura 14 pretende elucidar de modo esquemático estas situações. Figura 14- Esquema ilustrativo da afetação dos padrões de afloramento devido à artificialização do relevo por pedreiras (A, B, C e D correspondem a 4 diferentes unidades geológicas, estando as 3 primeiras intersetadas por uma frente de exploração). Ainda como resultado da artificialização do relevo por pedreiras, ocorrem situações em que as frentes de desmonte intersetam mais do que uma unidade litológica. Para esses casos resulta a impossibilidade de avaliar variações de espessura nessas unidades por leitura direta do mapa. Para obviar esse constrangimento procedeu-se sistematicamente à realização de logs sintéticos das frentes de exploração, representando-os nos mapas geológicos por um código composto por um número (altura em metros) e um conjunto de letras (abreviatura da unidade litológica a que respeita a altura intersetada na frente de exploração). Na Figura 14 está também representada uma exemplificação deste método. A cartografia geológica não se limitou ao espaço territorial correspondente à AIE de Cabeça Veada, ou seja, 29 hectares. Com efeito, tendo como objetivo uma adequada interpretação geológica, foi necessário proceder a um alargamento substancial da área total cartografada para fora dos limites da AIE. Essa área cartografada geologicamente foi de 74,5 hectares, ou seja, quase 2.5 vezes superior à da AIE e apresenta-se no Anexo 1 à escala 1/2000. A interpretação geológica, com estabelecimento de correlações entre as diferentes unidades litostratigráficas, foi auxiliada pela realização de 4 cortes geológicos (Anexo 2). Perante as particularidades antes apontadas, no que concerne à existência de escarpados verticais (frentes de desmonte das pedreiras) e seus efeitos na cartografia geológica, para a realização dos cortes geológicos houve necessidade de recorrer, durante a execução dessa cartografia, à elaboração de colunas litológicas sintéticas em pontoschave de muitas das frentes de desmonte. 30 O modelo geológico tridimensional idealizado para a AIE e traduzido pelos cortes geológicos foi corrigido e validado por intermédio do estudo dos testemunhos das sondagens mecânicas realizadas em campanhas de prospeção anteriores. Não foi necessário recorrer à execução de novas sondagens. Os logs das 3 sondagens estudadas são apresentados no Anexo 4. No que respeita à fraturação que afeta o maciço rochoso, foi realizado um estudo de fotointerpretação sobre fotografias aéreas à escala aproximada 1/26000 datadas de 1958. A opção por fotografias tão antigas prende-se com a possibilidade de poder observar as estruturas existentes na área de Cabeça Veada que hoje se encontram mascaradas por efeito da atividade extrativa. Tendo por objetivo a validação dos resultados da fotointerpretação e o conhecimento da natureza das fraturas presentes, foi realizado um levantamento de campo de fraturas nas frentes de pedreira. Contudo e como anteriormente referido, para além dos condicionalismos que se apontam no subcapítulo 5.3.2, esse levantamento foi também condicionado pela reduzida acessibilidade à maioria das frentes de exploração. 5.2. Litostratigrafia Temática Decorrente dos aspetos mencionados anteriormente, no que respeita aos critérios que presidiram à caraterização das litofácies presentes na área de Cabeça Veada e à definição das diferentes unidades litológicas, resulta que a cartografia geológica realizada foi de âmbito litostratigráfico mas com uma temática apropriada à indústria extrativa de calcários ornamentais. Assim, na AIE de Cabeça Veada afloram as seguintes unidades litostratigráficas temáticas, da base para o topo: ‐ ‐ ‐ ‐ Vidraços da Base Calcários Ornamentais Vidraços do Topo Vidraços Escuros Como se verá mais à frente, estas unidades temáticas integram unidades litostratigráficas formais do Jurássico Médio. Os Vidraços da Base e os Vidraços do Topo integram uma mesma unidade litostratigráfica formal conhecida por Formação de Serra de Aire. Os Calcários Ornamentais correspondem ao Membro de Pé da Pedreira da Formação de Santo António – Candeeiros. Tal como referido anteriormente, esta é equivalente lateral da Formação de Serra de Aire. Assim se compreende que o Membro de Pé da Pedreira surja intercalado nos calcários micríticos da Formação de Serra de Aire, tal como ilustrado na Figura 12. No interior dos Vidraços da Base surgem intercalações de calcários dolomíticos mais ou menos espessas. Sobre estas unidades afloram ainda rochas do Jurássico Superior às quais foi atribuída a designação de Vidraços Escuros. 31 Figura 15- Mapa Geológico simplificado da área de Cabeça Veada. 32 Apresenta-se, de seguida, a caraterização das diferentes unidades, sua correlação com as unidades litostratigráficas regionais que se encontram definidas para o MCE e sua distribuição espacial. Para o efeito, apresenta-se na Figura 15 o mapa geológico de Cabeça Veada simplificado a partir da versão à escala 1/2000 que se encontra no Anexo 1. Na Figura 16 apresenta-se o corte geológico E-F representativo do modelo geológico da AIE, redimensionado a partir do que consta no Anexo 2. Figura 16- Corte geológico representativo da AIE de Cabeça Veada, redimensionados para o tamanho de página. 5.2.1. Vidraços da Base Esta unidade integra a Formação de Serra de Aire de idade Jurássico Médio, mais concretamente do Batoniano. Está referenciada na Folha 27-C (Torres Novas) e na respetiva Notícia Explicativa por Calcários Micríticos de Serra de Aire (Manupella et al., 1999 e Manupella et al., 2006, respetivamente). A designação local de Vidraços deriva do fato de muitos dos calcários que constituem esta unidade tenderem a estilhaçar como vidro quando percutidos. Conforme observável no mapa da Figura 15, os Vidraços da Base afloram unicamente na região sudoeste da área cartografada, estando apenas parcialmente abrangidos pela AIE de Cabeça Veada. Contatam a ocidente com os calcários do Jurássico Superior por intermédio de uma falha orientada NNE-SSW e, a leste, contatam com os Calcários Ornamentais que se lhe sobrepõem. Os Vidraços da base são constituídos por calcários micríticos (mudstones, wackstones e floatstones) mais ou menos pelóidicos, bioclásticos e oncolíticos, de cor creme e cinzenta, de tons claros a escuros (Figura 17). As bancadas têm espessura centimétrica a decimétrica (Figura 18), sendo que a possança total desta unidade é bastante elevada, na ordem dos 350 m a 400 m (Manupella et al., 2006 e Azerêdo, 2007). Contudo, como referido, estão truncados por uma falha, pelo que a espessura total não é apreciável nesta região. 33 Nesta unidade diferenciaram-se também níveis lenticulares de calcários mais ou menos dolomitizados. Por se encontrarem nas imediações de vários acidentes que recortam a região, deverão ser o resultado da circulação de fluídos ricos em magnésio ao longo de calcários mais suscetíveis a este tipo de alteração. A espessura de alguns destes níveis de calcários dolomitizados poderá alcançar os 20 m. Observações microscópicas em lâmina delgada de amostra destes calcários dolomitizados revelam uma textura em mosaico representativa da substituição total da calcite por dolomite (Figura 19). Figura 17- Amostra de wackstone oncolítico de cor creme escura, caraterístico dos Vidraços da Base. Figura 18- Modo caraterístico de afloramento dos Vidraços da Base em bancadas decimétricas, imediatamente a leste das pedreiras da AIE de Cabeça Veada. Figura 19- Microfotografia de amostra de dolomito intercalado nos Vidraços da Base (luz polarizada, nicóis paralelos). 34 5.2.2. Calcários Ornamentais Esta unidade tem correspondência com o Membro de Pé da Pedreira da Formação de Santo António – Candeeiros, como anteriormente referido, sendo a mesma que vem designada por Calcários de Pé da Pedreira na Folha 27-C (Torres Novas). Esta unidade está limitada a oeste pelos Vidraços da Base subjacentes e pela falha já anteriormente mencionada que os coloca em contato direto com os calcários do Jurássico Superior. A sul também contata com o Jurássico Superior por intermédio de uma nova falha, esta orientada WNW – ESE. A leste contata com os Vidraços do Topo suprajacentes. Os Calcários Ornamentais são calcários biolitoclásticos pelóidicos, mais ou menos oolíticos, de granularidade fina a grosseira (grainstones e rudstones). Apresentam cor creme de tom mais ou menos claro e textura marcada por laminações paralelas e oblíquas, mais ou menos evidentes e organizadas em feixes de espessura decimétrica a métrica. A variedade comercial proveniente desta AIE toma o nome de Semi Rijo de Cabeça Veada (Figura 20). O seu corte final é normalmente realizado “a favor”, ou seja, paralelamente à laminação sedimentar porque esta mostra-se pouco regular, quer em termos das próprias laminações, quer em termos da espessura dos feixes em que se organiza. A espessura das bancadas é de difícil apreciação pela dificuldade de destrinçar, em paredes verticais a que não se tem acesso, superfícies de descontinuidade correspondentes a superfícies de estratificação. Na realidade, os Calcários Ornamentais não parecem estar estruturados em camadas sedimentares, mas sim em corpos lenticulares maciços com possanças superiores a 20 m. Em termos económicos, são os feixes de laminações sedimentares de dimensão métrica que condicionam a dimensão dos blocos. A possança total da unidade ronda os 130 m, conforme apreciável no corte geológico da Figura 16. Figura 20- Amostra de grainstone biolitoclástico e oolítico correspondente ao Semi Rijo de Cabeça Veada (corte "a favor"). Quartau, 1998, diferenciou no interior desta unidade um nível biostromático (“Sardão”) de granularidade bastante grosseira, com espessura constante próxima de 1 m. Neste trabalho optou-se por não proceder à 35 sua delimitação, por não constituir um fator condicionador da exploração e porque, dado o grande desenvolvimento que entretanto as pedreiras tiveram, só localmente é possível proceder à sua cartografia. Observações em lâmina delgada de amostras desta unidade (Figura 21) confirmam a sua heterogeneidade granulométrica. Mostram que são calcários de cimento sparítico com uma matriz oolítica, mais ou menos pelóidica. Dessa matriz sobressaem elementos mais ou menos grosseiros e em maior ou menor abundância e que correspondem a litoclastos e a bioclastos. Figura 21- Microfotografias de Semi Rijo de Cabeça Veada. a) oosparite de granularidade média (luz polarizada, nicóis paralelos); b) oo-biosparite mal calibrada, de grão médio a grosseiro (luz polarizada, nicóis cruzados). 5.2.3. Vidraços do Topo Os Vidraços do Topo são idênticos aos Vidraços da Base, fazendo parte, do ponto de vista regional, da mesma unidade litostratigráfica: a Formação de Serra de Aire. Distinguem-se aqui tematicamente por se apresentarem suprajacentes à unidade ornamental. Devido à disposição estrutural dos estratos nesta AIE, com orientação NNE-SSW e inclinando cerca de 400 para leste, os Vidraços do Topo afloram em toda a área cartografada para leste dos Calcários Ornamentais. Na Figura 22 apresenta-se uma fotografia de uma amostra colhida nesta unidade que corresponde a um calcário micríticos, mudstone, de cor castanha. O fato de tanto os Vidraços da Base, como os do Topo, apresentarem nesta região cores cremes de tons comummente escuros, ao contrário do que se verifica noutras regiões do MCE, poderá estar relacionado com metassomatismo associado à presença de estruturas filonianas nas proximidades. 36 Figura 22- Amostra de mudstone de cor castanha da unidade Vidraços do Topo. 5.2.4. Vidraços Escuros Os Vidraços Escuros integram uma unidade litostratigráfica formal conhecida por Formação de Montejunto datada do Oxfordiano Médio. Na Folha 27-C da Carta Geológica de Portugal à escala 1/50000 (Manupella et al., 1999) vem referenciada por Camadas de Montejunto. Contudo, na Figura 11 estes calcários estão representados como integrando as formações de Cabaços e Montejunto indiferenciadas. Tal deve-se ao fato de que estas formações não foram diferenciadas na Folha 27-A, imediatamente a norte. Conforme se pode observar pelo mapa geológico da AIE de Cabeça Veada (Figura 15), os Vidraços Escuros afloram nas regiões oeste e sul da área cartografada, contatando com os Calcários Ornamentais e com os Vidraços da Base por intermédio de acidentes tectónicos. Correspondem a calcários micríticos mais ou menos margosos e mais ou menos bioclásticos e calciclásticos (mudstones a packstones) de cor cinzenta tendencialmente escura. Ocorrem em bancadas de espessura centimétrica a decimétrica. Figura 23- Microfotografias caraterísticas dos Vidraços Escuros. a) Biomicrite (luz polarizada, nicóis cruzados); b) Micrite (luz polarizada, nicóis paralelos). 37 5.3. Estrutura Geológica Estruturalmente a AIE de Cabeça Veada pode-se considerar dividida em duas regiões separadas pela falha NNE – SSW que coloca em contato os calcários do Jurássico Superior (Vidraços Escuros) com os calcários do Jurássico Médio (Vidraços da Base, do Topo e Calcários Ornamentais). Essa falha é conhecida regionalmente por Falha de Valverde. Assim, para ocidente da Falha de Valverde (Figura 15), os Vidraços Escuros apresentam-se tendencialmente orientados segundo NNW – SSE com inclinações na ordem dos 250 para ENE. Porém, junto à referida falha, apresentam-se paralelos a ela e com inclinações até 700 para WNW, o que certamente tem correspondência com dobramentos de arraste pela movimentação da falha. Para leste da Falha de Valverde os calcários do Jurássico Médio apresentam-se regularmente orientados segundo NNE – SSW, paralelamente à falha, com inclinações na ordem dos 400 para ESE. Estas atitudes são verificáveis sobretudo nos Vidraços da Base e nos Vidraços do Topo. Contudo, nos Calcários Ornamentais, verifica-se esta mesma disposição estrutural para a maioria dos feixes de laminações sedimentares (Figura 24). O corte geológico que se apresenta na Figura 16 é elucidativo desta disposição em monoclinal basculado cerca de 400 para leste por parte dos Calcários Ornamentais, a qual tem grande influência no rendimento da sua exploração. Com efeito, embora os Calcários Ornamentais apresentem essas inclinações, a metodologia de exploração não acompanha tal andamento, fazendo-se regularmente por pisos direitos, conforme ilustrado na Figura 25. Tendo ainda presente o corte geológico da Figura 16, a exploração dos Calcários Ornamentais está limitada a ocidente pelos Vidraços da Base ou pela Falha de Valverde que os coloca em contato com os Vidraços Escuros. Os Vidraços da Base também limitam a sua exploração em profundidade. A oriente os Calcários Ornamentais estão limitados, superficialmente, pelos Vidraços do Topo. Figura 24- Feixes de laminações sedimentares inclinados para leste (vista de norte para sul). A norte verifica-se uma diminuição sucessiva da espessura disponível de Calcários Ornamentais devido ao truncamento pela Falha de Valverde. 38 Figura 25- Vista parcial para sul do núcleo de Cabeça Veada: frentes de exploração verticais, realçando-se o forte pendor para leste por parte dos Calcários Ornamentais. 5.3.1. Falhas A Falha de Valverde é o principal acidente tectónico na AIE de Cabeça Veada, atravessando-a longitudinalmente e colocando em contato os calcários do Jurássico Superior com os do Jurássico Médio, como tem vindo a ser referido. A sua expressão no terreno é pouco evidente, limitando-se a pequena crista em que os calcários se apresentam endurecidos e bastante mineralizados por veios de calcite (Figura 26). A sua cinemática é de difícil apreciação. Pela sua orientação admite-se que corresponda a uma falha normal associada aos episódios distensivos Jurássicos. Porém, dados indiretos, como sejam planos de estratificação cinemáticos em que se observam estrias denunciadoras de movimentação em desligamento esquerdo, bem como o fato de se apresentar cortada por estruturas filonianas fora da AIE que se julgam do início do Cretácico (Carvalho, 2013), levam a admitir que esta falha se tenha movimentado posteriormente em função de tensões compressivas no final do Jurássico. Outros dados indiretos, como sejam os já mencionados dobramentos de arraste nos calcários do Jurássico Superior, apontam que essa movimentação teve uma componente de cavalgamento do Jurássico Médio sobre o Superior, conforme ilustrado na Figura 16. Não existem evidências quanto à movimentação desta falha durante as fases compressivas da orogenia Alpina. Com efeito, esta falha encontra-se cortada por outros acidentes que se presume estarem associados a episódio compressivo precoce na passagem do Jurássico ao Cretácico e que se apresentam orientados segundo WNW – ESE, como é o caso da falha que na AIE de Cabeça Veada limita a sul os calcários ornamentais (Carvalho, 2013) e que apresenta uma movimentação aparente em desligamento esquerdo. Na zona norte da área cartografada, uma outra falha WNW – ESE rejeita a Falha de Valverde do mesmo modo. Contudo, esta pequena falha perde-se no interior dos Calcários Ornamentais dando origem, provavelmente, a ligeira flexura, conforme denunciado pela modificação no andamento do contato com os Vidraços do Topo. A estes acidentes é usual estarem associados estruturas filonianas. É também o que se passa na AIE de Cabeça Veada onde, imediatamente a norte da falha WNW – ESE mencionada, está cartografado um filão. 39 Porém, na realidade, a estrutura no terreno não corresponde a um filão. Corresponde sim a um corredor em que os calcários se apresentam fraturados, em maior ou menor grau, chegando mesmo a apresentar-se brechificados e que caracteristicamente apresentam cor negra. Não correspondendo diretamente a um filão, o fato dos calcários se apresentarem negros é o resultado de metassomatismo que deverá ter correspondência com estrutura filoniana em profundidade. Para simplificação, continua a denominar-se a estrutura em causa por filão. Figura 26- Expressão morfológica da Falha de Valverde. Evidências semelhantes referem-se ao fato de muitas das fraturas que afetam os Calcários Ornamentais apresentarem uma auréola com alguns centímetros de espessura de cor negra (Figura 27). Portanto, representam também evidências de circulação de fluídos hidrotermais. Figura 27- Fina fratura com auréola de cor negra como resultado de metassomatismo. 40 5.3.2. Fraturação 5.3.2.1. Metodologia O estudo da fraturação que afeta os calcários aflorantes na AIE De Cabeça Veada foi executado a pequena e grande escala, respetivamente por intermédio de fotointerpretação de fotografias aéreas e por levantamento sistemático de fraturas em afloramentos. Os pormenores das metodologias de trabalho aplicadas a ambos os tipos de estudo constituem capítulos específicos de trabalho de maior envergadura desenvolvido paralelamente (Carvalho, 2013), interessando aqui sublinhar apenas alguns aspetos mais relevantes. Assim, relativamente à fotointerpretação, ela foi realizada para toda a região do MCE e foram utilizadas fotografias aéreas à escala aproximada de 1/26000, as quais foram obtidas durante um voo realizado pela USAF em 1958. A pertinência da opção por fotografias tão antigas prendeu-se com a necessidade de observar os afloramentos rochosos em fase anterior à instalação da indústria extrativa que os veio a destruir. Embora em fotogeologia seja norma que as estruturas observadas sejam interpretadas genericamente como lineamentos, no presente caso foi possível a interpretação da grande maioria como sendo fraturas. Esta possibilidade decorre da existência de grandes áreas desprovidas de solos de cobertura e, consequentemente, desprovidas de vegetação. Estando as bancadas sedimentares a descoberto foi possível a identificação direta das fraturas que as afetam. É importante ter em atenção que a existência de locais nos quais não foram identificadas fraturas por este método não é sinónimo da sua inexistência. Podem corresponder a locais em que existe solo e vegetação densa, impossibilitando a sua deteção ou, ainda, a locais tão intensamente fraturados que a resolução do método não permite o discernimento individual das fraturas. Em relação ao levantamento de fraturas em afloramentos, este realizou-se pelo chamado método da scanline: linha materializada nos afloramentos por uma fita métrica ao longo da qual se medem todas as fraturas intersetadas principalmente no que respeita à sua distância à origem, atitude e natureza. O levantamento realizado foi também de âmbito regional, ou seja abrangendo todo o MCE, mas com particular incidência nos locais onde se desenvolve a indústria extrativa, não só pelos objetivos concretos de determinar como essa fraturação afeta a explorabilidade dos calcários para fins ornamentais, mas também porque as frentes e pisos de pedreiras constituem locais de excelência para obtenção deste tipo de dados. O estudo estatístico dos dados das diaclases medidas em afloramentos teve como base uma série de procedimentos sobre esses dados com dois objetivos. Um refere-se ao estabelecimento de correlações entre resultados obtidos em diferentes locais, ou seja, sobre diferentes suportes de amostragem, pelo que se procedeu à normalização dos dados a um suporte comum, quer em termos de comprimento da scanline, quer em termos de espessura da bancada em que foi realizada. Outro refere-se à correção do enviesamento das orientações (orientation bias), tendo-se para o efeito aplicado a chamada Correção de Terzaghi (Terzaghi, 1965; Hudson & Priest, 1983). A Figura 28, mostra o modelo utilizado para a sequência de procedimentos de correção e normalização mencionados. 41 Figura 28- Modelo utilizado para a correção e normalização dos dados de frequência de diaclases. Para bancadas com espessura superior a 1,5 m apenas se normalizou ao comprimento unitário (Carvalho, 2013). 5.3.2.2. Resultados Quanto à natureza das fraturas, os dados obtidos em afloramento permitiram discernir que a maioria, concretamente 80%, correspondem a diaclases subverticais, pelo que o subsequente estudo estatístico da fraturação se centrou neste tipo de estruturas. Sob esta designação incluem-se diaclases, diaclases mineralizadas (veios de calcite) e diaclases reativadas em cisalhamento. Permitiram também discernir que as fraturas fotointerpretadas correspondem a diaclases cuja grande abertura e comprimento são resultado de episódios de reativação tectónica e dos processos de alteração química próprios da fenomenologia cársica. Os dados obtidos para a AIE de Cabeça Veada, quer resultantes da fotointerpretação, quer do levantamento em afloramentos, estão expressos graficamente no mapa simplificado da AIE de Cabeça Veada que se apresenta na Figura 29. Nas rosetas que mostram a distribuição estatística das orientações das fraturas medidas nos afloramentos não consta o número de dados respetivo, o que decorre por efeito dos procedimentos de normalização mencionados anteriormente. Relativamente às fraturas fotointerpretadas é notório que prevalece uma orientação de fraturas decamétricas a hectométricas segundo WSW – ENE nos Calcários Ornamentais e nos Vidraços do Topo que se lhes sobrepõem. Nos Vidraços Escuros também prevalece essa orientação mas surge uma outra orientada WNW – ESE, paralela à falha com a mesma orientação na região sul da área e subparalela à estrutura filoneana. Quanto às fraturas medidas em afloramentos importa referir que geneticamente é possível distinguir diaclases anteriores e posteriores ao basculamento das bancadas do Jurássico Médio para leste. Contudo, tendo em atenção o objetivo do presente estudo, apenas interessa a sua disposição final. Os dados obtidos na Estação 1 (Figura 29) referem-se a diversas scanlines realizadas nas frentes de exploração dos Calcários Ornamentais ao longo de grande parte da sua área de ocorrência. Verifica-se um forte predomínio de fraturas orientadas segundo WSW – ENE, concordantemente com o observado em fotografia aérea. Conforme se pode observar na fotografia da Figura 30, estas fraturas inclinam cerca de 700 para SSE, sendo elas que condicionam em primeira ordem a exploração dos Calcários Ornamentais na AIE de Cabeça Veada. 42 Figura 29- Mapa geológico simplificado da região de Cabeça Veada com representação das fraturas fotointerpretadas numa área alargada envolvente da AIE em estudo. Diagramas de rosa mostram os resultados respeitantes às fraturas em afloramentos nas estações de levantamento 1 e 2 indicadas no mapa. Quanto aos dados da Estação 2 (Figura 29), eles foram obtidos em duas scanlines nos afloramentos dos Vidraços do Topo. Embora em número reduzido por falta de condições propícias à medição de fraturas, esses dados mostram uma prevalência de fraturas orientadas NW – SE, subparalelamente às falhas e filões anteriormente mencionados. Em suma, quanto à orientação da fraturação na AIE de Cabeça Veada, os dados de campo confirmam as observações registadas em fotografia aérea. Mostram que a principal direção de fraturação é segundo WSW – ENE e que existe uma direção secundária a afetar sobretudo os Vidraços do Topo segundo NW – SE. 43 Figura 30- Diaclasamento segundo WSW - ENE nas frentes das pedreiras do núcleo de Cabeça Veada. 5.3.2.3. O problema do Espaçamento da fraturação A lavra de calcários ornamentais não depende apenas do número de famílias de fraturas e da sua orientação mas, sobretudo, depende do espaçamento caraterístico de cada uma das famílias, sendo que o Espaçamento é a distância medida na perpendicular entre duas fraturas consecutivas da mesma família sistemática. Para efeitos de considerações geodinâmicas teóricas, uma família sistemática é constituída por diaclases planares que numa extensa área se apresentam paralelas entre si, com espaçamento regular e que resultam de um episódio de deformação tectónica preciso. Outras caraterísticas das diaclases, como a abertura e o tipo de preenchimento, são auxiliares quanto à distinção de famílias sistemáticas que partilham a mesma orientação. No caso concreto do MCE, tais situações verificam-se, ou seja, existem conjuntos de diaclases com a mesma orientação que albergam mais do que uma família sistemática, o que é resultado da sobreposição de episódios tectónicos de deformação. É o que se verifica para as famílias que caraterizam a região de Cabeça Veada que albergam diferentes tipos de diaclases. Portanto, não podem ser consideradas famílias sistemáticas com um espaçamento próprio regular, mas antes devem ser apenas consideradas como famílias direcionais sem espaçamento caraterístico. Serviram estas considerações para afirmar que para efeitos de aplicação prática à indústria extrativa de rochas ornamentais é necessário subdividir essas famílias direcionais nas famílias sistemáticas que as constituem e, então, determinar os respetivos espaçamentos. Porém, para o caso concreto da AIE de Cabeça Veada, tal não foi possível pelas razões que de seguida se expõem. 44 Em primeiro lugar, razões que revertem nos conceitos teóricos sobre os processos mecânicos que regem a instalação de diaclases em rochas sedimentares e de como esses processos condicionam o seu espaçamento. Importa sobretudo reter que o espaçamento duma família sistemática é diretamente proporcional à espessura de cada um dos estratos sedimentares em que se instala e que essa proporcionalidade se verifica para estratos com espessura inferior ao valor empírico de 1,5 m. Para estratos sedimentares mais espessos que 1,5 m, como é nitidamente o caso dos Calcários Ornamentais de Cabeça Veada, perde-se essa proporcionalidade e as bancadas apresentam-se intensamente fraturadas. Embora esta grande intensidade de fraturação não seja percetível numa primeira abordagem, pois é comum observar diaclases com espaçamentos na ordem dos 3 metros ou bastante mais nas frentes de exploração, na realidade esses valores correspondem, em termos de análise teórica, a grande intensidade de fraturação. Com efeito, se tomarmos como exemplo uma bancada sedimentar com 10 m de espessura afetada por diaclases espaçadas de 2 m, essa bancada está muito mais intensamente fraturada que uma outra com apenas 0,2 m de espessura em que as diaclases se apresentem espaçadas 0,4 m. A manter-se a regra da proporcionalidade e normalizando para a espessura unitária, à situação da bancada espessa corresponde um espaçamento de 0,2 m (5 fraturas por metro), ao passo que para a bancada estreita corresponderá um espaçamento de 2 m (0,5 fraturas por metro). Os mecanismos que regem o espaçamento das famílias sistemáticas de diaclases instaladas em estratos sedimentares de elevada espessura ainda não são conhecidos, o que impossibilita o estabelecimento de modelos de diaclasamento para esse tipo de estratos e, portanto, também impossibilita previsões quanto à frequência de ocorrência de diaclases duma determinada família sistemática. Em segundo lugar há a considerar razões que se prendem com a metodologia de trabalho adotada para o levantamento das diaclases. Como referido, esse levantamento foi realizado nos locais de melhor exposição, ou seja, nas frentes de desmonte das pedreiras. Mais concretamente, como em muitas situações as frentes de desmonte apresentavam raras fraturas, a fim de obter o maior número de dados para tornar relevante a sua análise estatística, a amostragem foi executada essencialmente nos locais dessas pedreiras que se apresentavam mais fraturados. Por essa razão a amostragem sofre de um enviesamento: os valores de espaçamento a obter para cada uma das famílias estarão subvalorizados. Porém, mesmo nessas condições de amostragem, a quantidade de dados obtidos não se mostrou relevante a nível estatístico, de tal modo que não foi possível a destrinça precisa de famílias sistemáticas de diaclasamento; apenas se tendo distinguido famílias direcionais (Cf. Carvalho, 2013). Assim, tanto pela impossibilidade de estabelecimento de modelos de espaçamento de diaclases adaptados a estratos sedimentares muito espessos, como pelas dificuldades na destrinça de famílias sistemáticas de diaclases, a definição das áreas de melhor aptidão para a produção de calcários ornamentais na AIE de Cabeça Veada que se abordará no Capítulo 6 não se teve em conta o critério Fraturação. 5.4. Sondagens Na região de Cabeça Veada foram realizadas sondagens em campanhas de prospeção anteriores reportadas em Costa et al., 1988 e em Quartau, 1998. Três dessas sondagens localizam-se na AIE de Cabeça Veada, nomeadamente as referenciadas como MCE-50, MCE-51 e CVeada1. Após observação dos respetivos 45 testemunhos os dados obtidos mostraram-se suficientes para a compreensão da geologia da área, razão pela qual não se procedeu à execução de novas sondagens de reconhecimento. As sondagens referidas iniciaram-se sobre a unidade dos Calcários Ornamentais. A MCE-50 e a MCE-51 terminaram ainda dentro desta unidade, tendo intersetado diferentes fácies com maior ou menor aptidão ornamental. A sondagem CVeada1 foi realizada no fundo de uma das pedreiras com uma inclinação de 45 0 para oeste. Após intersetar cerca de 47 m de calcários ornamentais, também com maior ou menor aptidão, alcançou os Vidraços da Base. Esta interseção permitiu determinar que a espessura total da unidade Calcários Ornamentais nesta região é de 130 m. Os logs respeitantes a estas sondagens constam no Anexo 4. Os testemunhos físicos encontram-se arquivados na litoteca do LNEG em Alfragide. 5.5. Cortes Geológicos Tal como referido anteriormente, tendo em vista o estabelecimento de um modelo geológico tridimensional foram realizados 4 cortes geológicos transversais à estrutura (Anexo 2). A sua elaboração teve em conta a cartografia geológica e os dados obtidos pela observação dos testemunhos das sondagens. Os principais resultados obtidos, para além da respetiva visualização gráfica, estão integrados nos anteriores capítulos 5.2 e 5.3. 46 6. ÁREAS DE APTIDÃO PARA CALCÁRIOS ORNAMENTAIS E AVALIAÇÃO DE RECURSOS 6.1. Delimitação de áreas de aptidão para a exploração de calcários ornamentais Tendo em atenção o que foi exposto anteriormente nos capítulos 5.1 e 5.3.2.3, a metodologia seguida para a determinação das áreas de melhor aptidão para calcários ornamentais na AIE de Cabeça Veada assentou na avaliação das caraterísticas respeitantes à sua homogeneidade litológica, à sua dimensão e à sua disposição espacial. A avaliação destas caraterísticas resultou da observação dos afloramentos, em particular das extensas superfícies a que correspondem as frentes de exploração existentes. Os resultados obtidos pela observação dos testemunhos das sondagens também contribuíram para essa avaliação, sobretudo pelas conclusões que permitiram obter quanto à confirmação do modelo estrutural da AIE e quanto à espessura da unidade Calcários Ornamentais. Perante as observações realizadas, optou-se por considerar com aptidão ornamental a totalidade da unidade Calcários Ornamentais. Não se atribuiu importância a locais restritos em que os afloramentos não evidenciam aptidão ornamental pois é grande a variabilidade lateral e vertical de fácies nos Calcários Ornamentais. Essa aptidão depende sobretudo da homogeneidade textural, da cor e da espessura dos feixes de laminações sedimentares cuja continuidade lateral é, por vezes bastante restrita. Só uma malha extremamente apertada de sondagens permitirá avaliar com precisão a extensão desses locais. Também não se consideraram locais restritos em que os afloramentos se apresentam bastante fraturados pela impossibilidade de implementação de metodologia adequada à modelação da fraturação. Tendo em conta os objetivos de ordenamento territorial a que se propõem os trabalhos realizados, a delimitação de áreas centrou-se no espaço territorial da AIE mas alargou-se ligeiramente para sul para espaço de imediata expansão natural da atividade. Essas áreas apresentam-se no mapa constante do Anexo 5 à escala 1/2000. São também apresentadas na Figura 31 em sobre mapa geológico simplificado e redimensionado. Assim: ‐ ‐ ‐ ‐ Os Vidraços da Base foram considerados litotipos sem aptidão ornamental pois apresentam grande variabilidade textural de bancada para bancada, sendo que a espessura destas é, maioritariamente, inferior a 1 m, rondando frequentemente os 0,4 m. Para além disso, nesta região tendem a apresentar tons acastanhados. A unidade Calcários Ornamentais é a que apresenta aptidão ornamental elevada, razão que presidiu à designação que lhes foi atribuída. Tal aptidão deriva da elevada espessura da maioria dos feixes de laminações sedimentares que se apresentam homogéneos em termos texturais e cromáticos, bem como da elevada espessura da unidade, a rondar os 130 m. Os Vidraços do Topo também não apresentam aptidão ornamental pelas mesmas razões que se apresentaram relativamente aos Vidraços da Base. Contudo, até certo ponto é viável a sua extração a fim de alcançar os Calcários Ornamentais subjacente, razão pela qual se definiu uma área de aptidão designada por “Área com recurso para blocos sob carga”. Os Vidraços Escuros não apresentam aptidão ornamental pelas mesmas razões apontadas para os da Base e para os do Topo. 47 Figura 31- Mapa de aptidão para a produção de calcários ornamentais na AIE de Cabeça Veada. 6.2. Cálculo de Recursos em calcários para bloco Como referido no capítulo introdutório, a delimitação das áreas de aptidão para calcários ornamentais, bem como a estimação dos recursos disponíveis para exploração, constituíram tarefas elaboradas em 48 colaboração com a empresa Visa Consultores, SA. Essa estimativa teve como suporte a base topográfica, a cartografia geológica, os cortes geológicos e as áreas de aptidão apresentadas nos capítulos anteriores. Para o efeito, foi elaborado um modelo tridimensional da AIE numa aplicação informática específica para o efeito (Surpac 6.5.1). Esta aplicação permitiu o cálculo automático de um volume de 22,1 milhões de metros cúbicos em calcário com aptidão ornamental para blocos. Para a exploração deste volume deverão ser tidas em conta as condicionantes mineiras, geológicas e ambientais. Particularmente associado às condicionantes mineiras está o rendimento expetável da exploração que, na AIE de Cabeça Veada se admitiu como 45 %. Ou seja, menos de metade do volume estimado apresentará valor comercial. O volume referido integra parte dos Calcários Ornamentais subjacentes aos Vidraços do Topo. Para avaliar a viabilidade económica da sua exploração foi realizada uma análise económica que permitiu concluir que essa viabilidade se verifica sempre que a espessura dos Vidraços de Topo for igual ou inferior a 1,9 vezes a espessura da formação com aptidão ornamental. Essa análise teve em conta a espessura média dessa “carga” de Vidraços de Topo, os custos associados à sua remoção e o valor comercial médio do calcário ornamental. 49 50 7. HIDROGEOLOGIA 7.1. Introdução O presente capítulo pretende dar conta dos trabalhos hidrogeológicos realizados na AIE de Cabeça Veada no que respeita à caracterização qualitativa e quantitativa das águas subterrâneas, incluindo uma avaliação da aptidão hidrogeológica, a conceptualização de um modelo hidrodinâmico, a avaliação da vulnerabilidade à poluição e da sensibilidade hidrogeológica. 7.2. Metodologia Após uma recolha prévia de informação bibliográfica sobre o Sistema Aquífero Maciço Calcário Estremenho, procedeu-se a uma análise, com o pormenor possível, dos aspectos hidrogeológicos da AIE de Cabeça Veada, visando a respectiva caracterização ambiental. Os trabalhos desenvolvidos envolveram as seguintes acções gerais: - - - Recolha de informação hidrogeológica junto de várias entidades com competências na área do Maciço Calcário Estremenho (MCE), nomeadamente, o Parque Natural da Serra de Aires e Candeeiros (PNSAC) e a Agência Portuguesa do Ambiente (APA, IP); Integração da informação constante na base de dados hidrogeológicos do LNEG, IP; Reconhecimento da área de estudo, incluindo a validação dos pontos de água provenientes das diversas fontes de informação; Verificação in situ, sempre que possível, das condições de captação de água subterrânea, nomeadamente no que se refere, à profundidade do nível de água, posição da bomba de extracção, regime de exploração e outras informações úteis; Selecção de pontos de água com vista à definição da rede de amostragem da qualidade da AIE ou sua envolvência. Na caracterização hidrogeológica da AIE de Cabeça Veada foram considerados os seguintes itens: - Enquadramento geológico local; Aptidão hidrogeológica; Produtividade aquífera; Modelo hidrodinâmico; Qualidade da água subterrânea; Vulnerabilidade à poluição; Sensibilidade ambiental. O enquadramento geológico local teve em consideração dados bibliográficos (Crispim, 1995; Manupella et al., 2006; Azerêdo, 2007), bem como o relatório da caracterização do substrato geológico da AIE de Cabeça Veada que consta dos capítulos anteriores. 51 A aptidão hidrogeológica e a produtividade aquífera foram definidas considerando dados bibliográficos (Crispim, 1995; Almeida et al., 2000a; Almeida et al., 2000b; Sampaio, 2006), relatórios de furos de captação de água e dados de monitorização do Sistema Nacional de Informação de Recursos Hídricos (http://snirh.pt). O modelo hidrodinâmico foi consubstanciado em dados bibliográficos (Crispim, 1995; Almeida et al., 2000b) e em dados piezométricos de relatórios de furos de captação de água e da rede de monitorização do Sistema Nacional de Informação de Recursos Hídricos (http://snirh.pt). A caracterização da qualidade das águas subterrâneas da AIE de Cabeça Veada baseou-se em análises de três furos de captação de água, amostrados numa época correspondente a “águas baixas” (513/Novembro/2012) e numa época de “águas altas” (Março/2013). Trata-se de dois furos situados no interior da AIE (Furo Cabeça Veada SC e Furo Cabeça Veada CP) e do furo situado a jusante e a sul da mesma AIE (Furo de Valverde). A caracterização em apreço teve como orientação, sempre que se considerou conveniente ou aplicável, os valores paramétricos (ou os valores máximos admissíveis) respeitantes a águas para consumo humano, estabelecidos pela legislação vigente (Decreto-Lei nº 236/98, de 1 de Agosto e Decreto-Lei nº 306/2007, de 27 de Agosto). Na Tabela 1 indicam-se os tipos de análises, os parâmetros determinados, bem como os laboratórios onde foram realizadas as análises. Tabela 1- Relação das análises laboratoriais realizadas Tipo de análise Parâmetros analisados Parâmetros globais – pH, condutividade eléctrica, alcalinidade, dureza total, sílica e resíduo seco; Composição maioritária – catiões (Na+, K+, Mg2+, Ca2+, NH4-) e aniões (F-, Cl-, HCO3-, S042-, H2P04-, NO3-, Análises físicoNO2-); químicas Composição vestigiária – 36 elementos (Li, Be, B, Al, completas. V, Cr, Fe, Mn, Co, Ni, Cu, Zn, 71Ga, 72Ge, As, Se, Rb, Sr, Y, Zr, Nb, Mo, Ag, Cd, Sn, Sb, Te, Cs, Ba, Ta, W, Hg, Tl, Pb, Bi, U). Laboratório Unidade de Ciência e Tecnologia Mineral do LNEG, IP. (1) Análise de substâncias perigosas. (1) Óleos e gorduras; (1) Hidrocarbonetos totais; (2) Hidrocarbonetos aromáticos policíclicos (HAPs)*. Coliformes fecais; Análises Coliformes totais; microbiológicas. Escherichia coli. Laboratório do Instituto Superior Técnico. (2) Laboratório da Agência Portuguesa do Ambiente, IP. Laboratório da Agência Portuguesa do Ambiente, IP. * NOTA: Análises realizadas apenas em “águas altas” nos pontos de água cujas amostras em “águas baixas” apresentaram hidrocarbonetos totais. A vulnerabilidade à poluição foi avaliada tendo em consideração o método EPIK (Doerfliger & Zwahlen, 1997), aplicável a sistemas aquíferos cársicos e preconizado pela legislação em vigor [Declaração de Rectificação nº 71/2012, de 30 de Novembro, Anexo da Resolução de Conselho de Ministros nº 81/2012, de 3 de Outubro, sobre as orientações estratégicas de âmbito nacional e regional para delimitação das áreas integradas na Reserva Ecológica Nacional (REN)]. 52 A sensibilidade ambiental, do ponto de vista hidrogeológico, foi analisada através da conjugação da vulnerabilidade intrínseca ao meio com o risco inerente à actividade antrópica desenvolvida na AIE. 7.3. Caraterização Hidrogeológica 7.3.1. Enquadramento geológico local A AIE de Cabeça Veada tem uma área aproximada de 0,29 km 2. Localiza-se no Maciço Calcário Estremenho, entre o Planalto de Santo António e as Serras da Lua e de Candeeiros, num estreito relevo estrutural alongado segundo N-S que integra a denominada Depressão da Mendiga. As litologias aflorantes da AIE que se encontram ladeadas pelos Calcários do Jurássico Superior da Depressão da Mendiga correspondem a calcários do Jurássico Médio dispostos em bancadas com orientação NNE-SSW e inclinações na ordem de 40o para leste. Conforme Manupella et al., 2006, do topo para a base há a considerar, sucessivamente, as formações do Jurássico Médio (Calcários de Pé da Pedreira, Calcários de Serra de Aire, Calcários de Chão de Pias e Margas e calcários margosos de Zambujal), os Calcários margosos e margas da Fórnea (transição Jurássico Médio/Inferior) e os litótipos do Jurássico Inferior (dolomitos das Camadas de Coimbra, Dolomitos em plaquetas e Margas de Dagorda). No que diz respeito à tectónica e conforme abordado em capítulo anterior, são de referir: i) a falha de Valverde com desenvolvimento regional de direcção NNE-SSW e que, localmente, a ocidente, coloca os calcários do Jurássico Médio a cavalgar sobre os calcários do Jurássico Superior; ii) falhas transversais (à Falha de Valverde) com desenvolvimento local, de direcção NW-SE a WNW-ESE e subsequentes indícios de estruturas filoneanas nelas instaladas; iv) a fracturação que está representada por duas famílias principais de fraturas, uma de orientação WSW-ENE e outra NNE-SSW. 7.3.2. Hidrogeologia local 7.3.2.1. Aptidão hidrogeológica A aptidão hidrogeológica da AIE de Cabeça Veada e sua envolvente é condicionada pela litostratigrafia local, sendo de perspetivar, do topo para a base, as seguintes considerações contextualizadas no Sistema Aquífero do Maciço Calcário Estremenho (cf. Almeida et al., 2000a): - - Os termos do Jurássico Superior respeitantes às Camadas de Alcobaça, pelo seu carácter predominantemente margoso e argiloso, não têm interesse hidrogeológico; Os termos inferiores do Jurássico Superior, isto é, as Camadas de Montejunto (calcários, calcários argilosos e argilas calcárias) e as Camadas de Cabaços (calcários, calcários argilosos e argilas e conglomerados), apresentando algum grau de carsificação, têm interesse hidrogeológico; As rochas do Jurássico Médio (Calcários de Pé da Pereira, Calcários micríticos de Serra de Aire, Calcários de Chão de Pias e Margas e os termos superiores das Margas e calcários margosos de Zambujal) são as de maior importância hidrogeológica, suportando, localmente, as unidades aquíferas; 53 - - - Os termos inferiores das Margas e calcários margosos de Zambujal e os termos superiores dos Calcários margosos e margas da Fórnea (transição Jurássico Médio/Inferior) apresentam interesse hidrogeológico reduzido; Os termos inferiores dos Calcários margosos e margas da Fórnea e os dolomitos que constituem as Camadas de Coimbra, embora pouco expressivos, apresentam-se carsificados, podendo constituir um aquífero confinado entre as formações suprajacentes e as formações subjacentes do Hetangiano (Dolomitos em plaquetas e Margas de Dagorda); As Margas de Dagorda (complexo pelítico-carbonatado-evaporítico) constituem o substrato tido como impermeável, podendo ser responsáveis por elevados valores de mineralização das águas em virtude da elevada solubilidade dos evaporitos (salgema e gesso). 7.3.2.2. Produtividade aquífera Face aos dados disponíveis, a produtividade aquífera na envolvência da AIE de Cabeça Veada é caracterizada tendo em consideração três furos de captação que se assinalam na Figura 32. Atendendo à Tabela 2, os furos são de elevada profundidade (na ordem de 400 m) e proporcionam caudais a variar entre 0,4 e 2,8 L/s. No caso dos dois furos de Cabeça Veada (situados no interior da AIE), os caudais de 0,4 e 2,2 L/s implicam, respetivamente, rebaixamentos de 140 e 60 m, pelo que os caudais específicos são muito reduzidos (0,003 e 0,037 L/s.m). Tabela 2- Características geométricas e produtividade de furos. Coordenadas Furos Datum 73 Hayford Gauss IPCC Cota do terreno Prof. do furo X (m) Y (m) (m) (m) Cabeça Veada SC -63105 -20443 410 422 Cabeça Veada CP -63240 -20930 431 Valverde -63001 -21902 295 Totalidade e posição dos drenos (m) Prof. do NHE Prof. do Caudal NHD−NHE Caudal NHD específico (m) (m) (m) (L/s) (L/s.m) 120 entre 104 e 422 220 360 140 0,4 0,003 440 40 entre 314 e 434 240 300 60 2,2 0,037 390 36 entre 276 e 366 ? ? ? 2,8 ? Na AIE, atendendo à sua altimetria (cotas compreendidas entre os 370 e 440 m), aos níveis piezométricos posicionados à cota aproximada de 190 m (cf. Figura 32) e aos elevados rebaixamentos necessários para a obtenção de caudais ainda assim reduzidos, é expectável que a captação de água apenas seja possível através de furos com profundidades superiores a 400 m. Além da apreciável profundidade dos furos, acresce salientar o elevado grau de incerteza, característico dos meios cársicos, na intersecção de condutas de água e subsequente obtenção daqueles caudais. 54 Figura 32- Localização dos pontos de água com informação de produtividade e piezometria e com amostragem para caraterização qualitativa das águas subterrâneas da AIE de Cabeça Veada (implantação sobre extrato da Folha 328 do IGeoE na escala 1:25000). 7.3.2.3. Modelo hidrodinâmico Atendendo à Figura 32, na AIE de Cabeça Veada apenas se conhecem dois furos de captação de água cujos níveis hidrostáticos, à data da sua construção, se posicionavam numa cota próxima de +190 m. 55 Não obstante a escassez de pontos de água com dados piezométricos que permitam definir uma rede local de fluxos subterrâneos, a localização da AIE, numa zona topograficamente elevada e inserida na Depressão da Mendiga (Figura 33), bem como a ocorrência de nascentes temporárias a sul e a jusante, e.g., a nascente cársica de Olho da Mata do Rei (cota +150 m), afigura-se como plausível que o escoamento subterrâneo natural, isto é, sem interferências provocadas por rebaixamentos piezométricos resultantes da exploração de furos, se processe de norte para sul. Nesta perspectiva, e ainda que sem perder de vista a complexidade tectónica, estrutural e cársica da região que certamente condicionará a circulação subterrânea, a AIE deverá integrar parte da área de recarga daquelas nascentes situadas numa zona tectonicamente conturbada, a sul do afloramento do Jurássico Médio, junto ao contacto com formações do Jurássico Superior menos permeáveis. De entre as vicissitudes e constrangimentos que impedem a definição realística de uma rede de fluxo subterrâneo, salientam-se: - - A imprevisibilidade da circulação subterrânea intrínseca do meio cársico; A compartimentação estrutural, geológica e geomorfológica da generalidade do Maciço Calcário Estremenho e, em particular, da AIE de Cabeça Veada que é intersectada por falhas injectadas com filões de direcção WNW-ESE; A escassez de informação acerca de pontos de água (furos); A dificuldade ou impossibilidade técnica de se efectuar nos furos existentes medições piezométricas com uma sonda de níveis. 7.3.2.4. Qualidade da água subterrânea Na Figura 32 assinalam-se os pontos de água utilizados para a caracterização da qualidade das águas subterrâneas da AIE de Cabeça Veada e sua envolvência. Para o efeito, analisaram-se amostras de água colhidas em três furos (Cabeça Veada SC, Cabeça Veada CP e Valverde). As colheitas decorreram de 5 a 13 de Novembro de 2012 no final de uma época de estio (“águas baixas”) e de 5 a 21 de Março de 2013 em época de chuvas avançada (“águas altas”). Na Tabela 3, Tabela 4, Tabela 5, Tabela 6 e Tabela 7 apresentamse, respetivamente, resultados analíticos referentes a parâmetros físico-químicos globais, à composição iónica maioritária, à composição vestigiária, aos hidrocarbonetos, óleos e gorduras e à componente microbiológica. Conforme a Tabela 3 e Tabela 4, as águas amostradas apresentam as espectáveis características de circulação em meio carbonatado, isto é, têm carácter alcalino (7,18 ≤ pH ≤ 7,91), são águas duras (159 ≤ dureza total ≤ 328 mg/L CaCO3) e evidenciam fácies bicarbonatada-cálcica. Os valores de condutividade eléctrica compreendidos entre 287 e 591 µS/cm reflectem valores de mineralização total a variar de 265 a 541 mg/L. Os valores de pH, condutividade eléctrica e dureza total observados nas amostras dos três furos, nas duas épocas de amostragem, são inferiores ou balizados pelos respectivos valores paramétricos preconizados pelo Decreto-Lei nº 306/2007, de 27 de Agosto, no que diz respeito a águas para consumo humano. 56 Figura 33- Modelo digital de terreno da área compreendida entre a AIE de Cabeça Veada e a nascente temporária Olho da Mata do Rei (Sistema de Coordenadas: PT-TM06/ETRS89). 57 Tabela 3- Parâmetros físico-químicos de caracterização global. Características globais Época de Amostragem Furo Cabeça Veada SC Furo Cabeça Veada CP Furo Valverde Valor paramétrico * pH AB AA 7,55 7,91 7,57 7,57 7,18 7,20 [6,5-9,0] Condutividade eléctrica a o 20,0 C (µS/cm) AB AA 320 287 350 348 591 585 2500 Mineralização total (mg/L) AB AA 294 265 319 315 539 541 −− Sílica (SiO2) (mg/L) AB AA 2,8 2,9 2,8 2,9 5,0 5,5 −− Dureza total (mg/L CaCO3) AB AA 177 159 202 209 298 328 [150-500] AB: Águas Baixas (Novembro/2012); AA: Águas Altas (Março/2013). * cf. DL nº 306/2007, de 27 Agosto. As amostras de água do furo Valverde situado a sul e a jusante da AIE apresentam valores de mineralização significativamente superiores aos valores de cada um dos furos do interior da AIE, sendo as concentrações dos iões HCO3-, Cl-, SO42-, NO3- e Na+ as que mais contribuem para essa diferença na mineralização. É também no furo de Valverde que se observam as variações mais significativas, entre amostras de “águas baixas” e de “águas altas”, destacando-se, a diminuição das concentrações de NO3-, Na+ e Cl- em consequência do efeito de diluição na época das chuvas. As concentrações do ião nitrato são muito pequenas ou praticamente nulas (0,95 > NO3- ≤ 2,3 mg/L) nas amostras dos furos situados no interior da AIE. No entanto, no furo de Valverde observam-se valores de 35,9 mg/L e de 11,5 mg/L, respectivamente nas “águas baixas” e nas “águas altas”. Considerando que as concentrações naturais do ião nitrato raramente atingem os 8-10 mg/L, no furo de Valverde constata-se, ainda que sem se atingir o valor paramétrico máximo admissível de 50 mg/L, alguma contaminação por compostos de azoto de origem antrópica, possivelmente relacionada com a aplicação de fertilizantes nos terrenos agricultados adjacentes e/ou com efluentes domésticos, bem como com as características construtivas da cabeça do furo, a qual, posicionada no fundo de uma caixa, abaixo da cota do terreno, permite a entrada de águas de escorrência superficial. No furo de Valverde, constata-se que ambas as amostras evidenciam concentrações de ião Ca2+ superiores ao valor limite aconselhável (100 mg/L). 58 Tabela 4- Resultados analíticos da componente iónica maioritária. Época de Amostragem Furo Cabeça Veada SC Furo Cabeça Veada CP Furo Valverde Valor paramétrico * AB AA 10,0 8,7 9,3 8,9 20,9 16,7 250 AB AA 204 182 217 219 301 343 −− Sulfato (SO4 ) AB AA 4,9 6,5 15,3 14,8 33,2 31,6 250 Nitrato (NO3-) AB AA 1,7 2,3 < 1,00 < 0,95 35,9 11,5 50 Nitrito (NO2 ) AB AA < 0,01 < 0,01 < 0,01 < 0,01 < 0,01 < 0,01 0,5 Fosfato (H2PO4-) AB AA < 1,45 < 1,20 < 1,45 < 1,20 < 1,45 < 1,20 −− Fluoreto (F-) AB AA < 0,55 < 0,50 < 0,55 < 0,50 < 0,55 < 0,50 1,5 Sódio (Na+) AB AA 4,9 5,0 5,1 5,1 17,7 9,1 200 Potássio (K+) AB AA 0,25 0,29 0,39 0,36 2,4 1,4 −− Magnésio (Mg2+) AB AA 7,0 12,8 13,8 13,3 2,9 2,8 50 Cálcio (Ca2+) AB AA 58,9 44,1 55,3 50,6 119 119 100 Amónio (NH4+) AB AA < 0,10 < 0,10 < 0,10 < 0,10 < 0,10 < 0,10 0,5 Iões predominantes AB AA HCO3- > Ca2+ HCO3- > Ca2+ Ca2+ > HCO3- Composição Iónica Cloreto (Cl-) - Bicarbonato (HCO3 ) Catiões (mg/L) Aniões (mg/L) 2- - AB: Águas Baixas (Novembro/2012); AA: Águas Altas (Março/2013). * cf. DL nº 306/2007, de 27 Agosto. Os valores apresentados como "< XXX" são Quantidades Analíticas Mínimas Doseáveis (QAMD), obtidas através da expressão: QAMD = Limite de Quantificação x Factor de Diluição Praticado. Nos elementos vestigiários, atendendo à Tabela 5, sobressaem, comummente aos três furos, as concentrações de Estrôncio (70 ≤ Sr ≤ 130 µg/L) e de Bário (8,0 ≤ Ba ≤ 128 µg/L). No caso do Sr a sua ocorrência está associada à substituição do ião Ca2+ característico das águas com circulação em meios carbonatados. No furo Cabeça Veada SC, é de salientar a concentração de Alumínio (Al: 229 µg/L) superior ao respectivo valor paramétrico legal (200 µg/L), bem como a concentração de Ferro nas “águas baixas” (Fe: 191 µg/L), ligeiramente inferior ao seu valor paramétrico (também de 200 µg/L). No que diz respeito aos óleos e gorduras, hidrocarbonetos totais e hidrocarbonetos aromáticos policíclicos (HAPs), atendendo à Tabela 6, é de referir: i) Nas “águas baixas”, a amostra do furo Cabeça Veada SC evidenciou a presença de óleos e gorduras (32 µg/L) e de hidrocarbonetos totais (16 µg/L), sendo neste último parâmetro o valor máximo admissível de 10 µg/L; 59 ii) Nas “águas altas” todas as amostras evidenciaram valores de hidrocarbonetos totais < 10 µg/L; o despiste de HAPs na água do furo Cabeça Veada SC revelou a presença de naftaleno; relativamente aos óleos e gorduras constata-se um aumento na amostra do furo de Valverde e uma diminuição na amostra do furo Cabeça Veada SC. Tabela 5- Resultados analíticos de componentes vestigiários. Composição vestigiária (µg/L) Época de Amostragem Furo Cabeça Veada SC Furo Cabeça Veada CP Furo Valverde Valor paramétrico * Alumínio (Al) AB AA n.d. 229 2,5 < 16,7 16,8 < 16,7 200 Antimónio (Sb) AB AA 0,09 < 0,04 0,06 < 0,04 < 0,03 < 0,04 5 Arsénio (As) AB AA < 0,38 < 3,2 0,42 < 3,2 0,42 < 3,2 10 Boro (B) AB AA 6,9 < 19,4 7,2 < 19,4 21,0 < 19,4 1000 Cádmio (Cd) AB AA < 0,04 < 0,10 < 0,04 < 0,10 < 0,04 1,2 5 Crómio (Cr) AB AA 1,0 < 1,2 0,83 < 1,2 0,4 < 1,2 50 Cobre (Cu) AB AA 1,9 < 1,3 1,5 < 1,3 2,0 < 1,3 2000 Chumbo (Pb) AB AA 0,43 0,16 0,03 < 0,05 0,08 0,12 25 Ferro (Fe) AB AA 191 101 < 77,8 < 79,0 < 77,8 < 79,0 200 Manganês (Mn) AB AA 5,7 2,2 0,51 < 1,4 0,34 1,6 50 Mercúrio (Hg) AB AA < 0,02 < 0,10 < 0,02 < 0,10 < 0,02 < 0,10 1 Níquel (Ni) AB AA < 0,83 < 21,9 0,83 < 21,9 < 0,83 < 21,9 20 Selénio (Se) AB AA < 0,59 < 3,0 < 0,59 < 3,0 0,67 < 3,0 10 Zinco (Zn) AB AA 3,5 < 2,5 2,7 3,1 13,4 4,9 −− Bário (Ba) AB AA 10,3 8,0 128 117 13,5 69,8 −− Estrôncio (Sr) AB AA 88,5 80 86,1 70 130 113 −− AB: Águas Baixas (Novembro/2012); AA: Águas Altas (Março/2013). * cf. DL nº 306/2007, de 27 Agosto. n.d. - Parâmetro não determinado. Os valores apresentados como "< XXX" são Quantidades Analíticas Mínimas Doseáveis (QAMD), obtidas através da expressão: QAMD = Limite de Quantificação x Factor de Diluição Praticado. 60 Tabela 6- Resultados analíticos de óleos e gorduras, hidrocarbonetos totais e hidrocarbonetos aromáticos policíclicos. Época de Amostragem Furo Cabeça Veada SC Furo Cabeça Veada CP Furo Valverde (µg/L) AB AA 32 < 10 < 10 < 10 < 10 17 −− Hidrocarbonetos totais (µg/L) AB AA 16 < 10 < 10 < 10 < 10 < 10 10 * AA Naftaleno: 15 Acenaftlineno: < 5 Acenafteno: < 5 Fluoreno: < 5 Fenantreno: < 5 Antraceno: < 5 Fluoranteno: < 5 Pireno: < 5 Benzo(a)antraceno: < 5 Criseno: < 5 Benzo(b)fluoranteno: < 5 Benzo(k)fluoranteno: < 5 Benzo(a)pireno: < 5 Dibenzo(a,h)antraceno: < 5 Benzo(g,h,i)perileno: < 5 Indeno(1,2,3-c,d)pireno: < 5 −− −− 0,1 ** Óleos e Gorduras Hidrocarbonetos Aromáticos Policíclicos (ng/L) [1 ng/L = 0,001 µg/L] Valor paramétrico (µg/L) AB: Águas Baixas (Novembro/2012); AA: Águas Altas (Março/2013). * cf. DL nº 236/1998, de 1 Agosto. ** cf. DL nº 306/2007, de 27 de Agosto [soma das concentrações dos compostos indicados nas alíneas a), b), c) e d)]. Do ponto de vista microbiológico, conforme a Tabela 7, é de referir: i) Nas “águas baixas”, além do destaque da contaminação patente nas amostras do furo de Valverde relativamente aos três parâmetros analisados, constata-se ainda alguma contaminação por coliformes totais na amostra do furo Cabeça Veada SC, sendo ultrapassado o valor de referência 0 (zero) UFC/100mL vigente para o consumo humano. ii) Nas “águas altas” constata-se uma apreciável diminuição da contaminação detectada no furo de Valverde na época de “águas baixas”, bem como, em oposição a esta melhoria, um caso de contaminação por Escherichia coli na amostra do furo Cabeça Veada SC. Tabela 7- Resultados da componente microbiológica analisada. Coliformes totais (UFC/100mL) Coliformes fecais (UFC/100mL) Escherichia coli (UFC/100mL) Época de Amostragem Furo Cabeça Veada SC Furo Cabeça Veada CP Furo Valverde AB AA 4 2 0 0 230 80 0 AB AA 0 2 0 0 50 8 0 AB AA 0 2 0 0 50 8 0 AB: Águas Baixas (Novembro/2012); AA: Águas Altas (Março/2013). * cf. DL nº 236/1998, de 1 Agosto. 61 Valor paramétrico * (UFC/100mL) 7.3.3. Vulnerabilidade à poluição 7.3.3.1. Introdução A avaliação da vulnerabilidade à poluição das águas subterrâneas na AIE em estudo representa um contributo para uma gestão ambiental mais sustentada do respetivo plano de exploração. Simplificadamente, entende-se por “vulnerabilidade”, a maior ou menor capacidade que as camadas superiores de um aquífero têm para atenuar a passagem de contaminantes. Trata-se, portanto, de uma propriedade intrínseca ao meio. Os sistemas aquíferos cársicos, tal como o do Maciço Calcário Estremenho, são muito sensíveis aos impactes antropogénicos, pelo que são geralmente considerados como vulneráveis. Esta vulnerabilidade deve-se a dois fatores principais: - - A heterogeneidade dos sistemas cársicos, que proporciona processos de recarga que tanto podem ser difusos (através de camadas ou blocos de rocha) ou concentrados (através das estruturas cársicas importantes); A permeabilidade que é muito variável: de muito elevada, como acontece no caso das condutas cársicas subterrâneas, a muito baixa, como se verifica nos blocos de rocha mais compacta. Na Figura 34 representa-se esquematicamente um modelo conceptual de um aquífero cársico, evidenciando-se os processos de circulação subterrânea que nele ocorrem. Nos modelos cársicos, para efeito da avaliação da vulnerabilidade, importa atender às diferenças do seu funcionamento hidráulico, nomeadamente nas épocas de estio e de chuva. Nas épocas de chuva (“águas altas”), quando ocorrem episódios de pluviosidade intensa, as condutas epicársicas como sumidouros e dolinas concentram grande parte da infiltração e conduzem rapidamente a água até à zona saturada, alimentando nascentes temporárias e incrementando fortemente os caudais das nascentes permanentes. Nestas condições, a vulnerabilidade é muito elevada pois a capacidade de depuração do meio é muito baixa, podendo as cargas poluentes atingir rapidamente a zona saturada do aquífero. Nas épocas de estio (período de “águas baixas”), uma vez esgotada a circulação através das condutas cársicas, a água circula muito lentamente através dos blocos e camadas com alguma permeabilidade intersticial, sendo os períodos de residência no aquífero, suficientemente longos para sustentar os caudais de estio das principais nascentes. Nestas épocas, sendo a circulação epicársica irrelevante, o aumento do tempo de chegada da carga poluente à zona saturada confere ao aquífero uma vulnerabilidade menor. Pelo exposto, a vulnerabilidade, podendo variar sazonalmente, depende das condições de infiltração, da variação espacial da condutividade hidráulica e do coeficiente de armazenamento do aquífero. A representação da vulnerabilidade dos aquíferos é relativamente complexa, não sendo fácil apresentar num único mapa, sobretudo se a uma pequena escala, todas as variáveis do meio que exercem controlo sobre o comportamento dos diversos contaminantes em diferentes cenários. Efetivamente, cada tipo de contaminante é afetado de diferente forma, por diversos fatores, e.g., espessura de solo, litologia, espessura da zona não saturada, velocidade de recarga, etc. 62 Recarga difusa e concentrada Escoamento rápido Escoamento lento Dolina Dolina Solo Lapiás Sumidouro Epicarso Zona não saturada Nascente cársica Zona saturada Formação "impermeável" Figura 34- Representação esquemática do funcionamento de um aquífero cársico (adaptado de Doerfliger & Zwahlen, 1998). Um dos métodos para avaliar a vulnerabilidade consiste na utilização de índices que sintetizam, num único valor, a influência de vários fatores, sendo depois este índice representado cartograficamente, permitindo a identificação de áreas com diferentes graus de vulnerabilidade (Ribeiro, 2001). Atenta a legislação nacional vigente, em conformidade com a Declaração de Retificação nº 71/2012, de 30 de Novembro, Anexo da Resolução de Conselho de Ministros nº 81/2012, de 3 de Outubro, sobre as orientações estratégicas de âmbito nacional e regional para delimitação das áreas integradas na Reserva Ecológica Nacional (REN), no que diz respeito à avaliação das áreas vulneráveis à poluição, aplicou-se, com a subsequente representação cartográfica recorrendo a SIG, o método considerado para sistemas cársicos, isto é, o método EPIK (Doerfliger & Zwahlen, 1997), que a seguir se descreve. 7.3.3.2. Metodologia EPIK O método EPIK baseia-se na geologia cársica dos aquíferos, na geomorfologia e nas características hidrogeológicas, sendo os índices de vulnerabilidade definidos a partir de quatro parâmetros: - Epicarso (E); Cobertura de protecção (P); Condições de infiltração (I); Grau de desenvolvimento da rede cársica (K). 63 A construção do índice é feita atribuindo-se um valor a cada parâmetro segundo uma classificação que tem em conta o impacte potencial da poluição (cf. Tabela 8, Tabela 9, Tabela 10 e Tabela 11). Epicarso (E) Conforme a Tabela 8, o parâmetro E é avaliado por três indicadores (E1, E2 e E3), cujos valores respetivos (1, 3 e 4) correspondem, sucessivamente pela mesma ordem, ao decréscimo da vulnerabilidade. Epicarso Aspectos da geomorfologia cársica Classificação E1 Sumidouros, dolinas, afloramentos muito fraturados. 1 E2 Zonas intermédias no alinhamento de dolinas, vales secos, afloramentos com fracturação média. 3 E3 Ausência. 4 Vulnerabilidade decrescente Tabela 8- Parâmetro E. A caracterização do epicarso baseia-se principalmente no estudo das formas cársicas de superfície, ou seja, nos aspetos da geomorfologia cársica. A análise deste parâmetro é complexa e deve atender ao desenvolvimento e grau de ligação à rede cársica. O epicarso pode encontrar-se coberto ou à vista e ter maior ou menor continuidade lateral, sendo tanto mais difícil a sua caracterização quando existe solo de cobertura (Figura 36). Tendencialmente, existe acumulação e circulação de água na zona de passagem entre o nível de epicarso muito fraturado e os blocos de rocha com fraturas afastadas (Figura 35). Solo Epicarso (permeabilidade elevada) Zona saturada do epicarso Bloco de rocha pouco permeável em zona não saturada Zona saturada do aquífero cársico com conduta de escoamento rápido Escoamento rápido Escoamento lento Figura 35- Representação esquemática do funcionamento do epicarso (adaptado de Doerfliger & Zwahlen, 1998, após Smart & Friedrich, 1986; Jeannin, 1996). 64 Carso coberto Solo Infiltração rápida através de fissuras abertas Zona de acumulação de água Barreira capilar atenuante da percolação rápida Diminuição da permeabilidade com a profundidade Carso sem cobertura Infiltração condicionada pela presença ou ausência de solo Superfície piezométrica sub-superficial Percolação lenta nas fissuras estreitas Percolação rápida nas fissuras alargadas Escoamento rápido Escoamento lento Figura 36- Epicarso coberto e sem cobertura. Armazenamento sub-superficial de água com escoamento lateral do fluxo em direcção a áreas com elevada condutividade hidráulica, contribuindo para o desenvolvimento de uma dolina de dissolução (adaptado de Doerfliger & Zwahlen, 1998 após Williams, 1983) Figura 37- Pedreira na AIE de Cabeça Veada onde se observa a alternância entre zonas da rocha com baixa permeabilidade e zonas de infiltração concentrada. Na Figura 37 pode-se observar a alternância entre zonas da rocha com baixa permeabilidade e zonas de infiltração mais concentrada. 65 Cobertura de protecção (P) Conforme a Tabela 9, o parâmetro P é avaliado por quatro indicadores (P1, P2, P3 e P4), cujos valores respectivos (1, 2, 3 e 4) correspondem, sucessivamente pela mesma ordem, ao decréscimo da vulnerabilidade. Cobertura de protecção Espessura de solo acima do aquífero cársico Classificação P1 0 - 20 cm 1 P2 20 - 100 cm 2 P3 1-8m 3 P4 >8m 4 Vulnerabilidade decrescente Tabela 9- Parâmetro P. A cobertura de proteção do aquífero cársico pode corresponder a solo ou a material de alteração da formação carbonatada, ou ainda a formações detríticas que se depositaram sobre os calcários. As características destes materiais, nomeadamente a textura/granulometria, e a concentração de matéria orgânica, sendo espacialmente variáveis, conferem-lhes diferentes condutividades hidráulicas e, por conseguinte, diferentes graus de proteção ao aquífero cársico subjacente. Dada a grande dificuldade em incluir todas as características dos materiais de cobertura neste tipo de metodologias, o parâmetro P apenas reflete a espessura de solo existente. No caso em estudo, a espessura de cobertura de proteção (solo) é de um modo geral reduzida e corresponde a solos de alteração das formações carbonatadas jurássicas (Figura 38). Figura 38- Evidência de solo incipiente na AIE de Cabeça Veada. 66 Condições de infiltração (I) Conforme a Tabela 10, o parâmetro I é avaliado por quatro indicadores (I1, I2, I3 e I4), cujos valores respetivos (1, 2, 3 e 4) correspondem, sucessivamente pela mesma ordem, ao decréscimo da vulnerabilidade. Condições de infiltração Tipo Classificação I1 Cursos de água de carácter permanente ou temporário que alimentam sumidouros ou dolinas. 1 I2 Áreas em bacias hidrográficas com inclinação > 10 % em áreas cultivadas e > 25 % em prados e pastagens. 2 I3 Áreas em bacias hidrográficas com inclinação < 10 % em áreas cultivadas e < 25 % em prados e pastagens. 3 I4 A restante área da bacia hidrográfica. 4 Vulnerabilidade decrescente Tabela 10- Parâmetro I. A avaliação das condições de infiltração é feita através da identificação das zonas de infiltração concentrada (e.g., linhas de água influentes, sumidouros, dolinas) e das zonas de infiltração difusa. No caso das zonas de infiltração difusa, as condições de infiltração são inferidas pelo coeficiente de escoamento que depende da inclinação do terreno e da ocupação do solo (florestas, pastagens e campos de cultivo). A delimitação das áreas é feita a partir da informação topográfica, sendo esta operação simplificada pela utilização de um modelo digital de terreno obtido num sistema de informação geográfica. O modelo digital de terreno da área de Cabeça Veada é apresentado na Figura 39. Rede cársica (K) Conforme a Tabela 11, o parâmetro K é avaliado por três indicadores (K1, K2 e K3), cujos valores respetivos (1, 2 e 3) corresponde, sucessivamente pela mesma ordem, ao decréscimo da vulnerabilidade. Rede cársica Grau de desenvolvimento Classificação K1 Moderado a muito desenvolvido 1 K2 Fraco 2 K3 Aquífero sem carsificação 3 Vulnerabilidade decrescente Tabela 11- Parâmetro K. O parâmetro K é avaliado com base na presença ou ausência de uma rede cársica e do seu grau de desenvolvimento. Para avaliar a importância da rede cársica em relação ao volume da rocha pouco permeável circundante (fissurada ou não), devem ser considerados indicadores, tais como a presença de grutas, poços verticais e espeleologia ativa. Caso não seja possível observar estes aspetos da geomorfologia cársica, poder-se-á recorrer a métodos indiretos como os ensaios de traçadores, hidrogramas de cheia, análise da variabilidade 67 do quimismo da água subterrânea. O número de nascentes e o seu carácter permanente ou temporário são indicadores de grande importância na suposição da existência de uma hierarquia num sistema cársico (Mangin, 1975 in Doerfliger & Zwahlen, 1998): por regra, uma única nascente ou um número reduzido de nascentes principais de carácter permanente indica uma rede cársica bem desenvolvida, enquanto um número elevado de nascentes caracteriza uma rede pouco desenvolvida. Após a classificação dos quatro parâmetros (E, P, I, K), passa-se à construção do índice que é dado pelo valor do fator de proteção F. Para tal, recorre-se à utilização de um sistema de informação geográfica que processa e cruza todos os dados tendo em conta a expressão seguinte: F = αEi + βPj + ϒIk + δKi O valor de F resulta portanto de uma soma ponderada onde os coeficientes de ponderação atribuídos a cada parâmetro são: α = 3; β = 1; ϒ = 3 δ=2 Os coeficientes de ponderação considerados pretendem refletir a importância que os autores do método quiseram dar a cada parâmetro na definição da vulnerabilidade do meio. Sendo assim, os parâmetros E e I são considerados os mais importantes, o parâmetro P é o que menos condiciona o fator de proteção e o K corresponde ao parâmetro com um peso intermédio. Da expressão que determina o valor de F (índice EPIK) resulta que este pode assumir valores entre 9 e 34, correspondendo os valores menores às áreas mais vulneráveis à poluição. 9 ≤ F (Índice EPIK) ≤ 34 Por fim, conforme a Tabela 12, os valores de F são agrupados em três classes às quais se fazem corresponder as áreas com vulnerabilidades “muito alta”, “alta” ou “moderada a baixa”. De acordo a legislação vigente, para efeitos de delimitação da REN consideram-se as áreas mais vulneráveis à poluição dos aquíferos cársicos, aquelas cujos valores de EPIK correspondem às classes de vulnerabilidade “muito alta” a “alta”. Tabela 12- Classificação da Vulnerabilidade. 7.3.3.2.1. Índice EPIK (F ) Vulnerabilidade ≤ 19 Muito alta 19 < F < 25 Alta ≥ 25 Moderada a baixa Avaliação da vulnerabilidade na AIE de Cabeça Veada (método EPIK) O cálculo do índice EPIK apoiou-se em informação obtida no âmbito do projecto, designadamente o Mapa Geológico à escala 1:2 000 (Anexo 1; Figura 15) e respetivos elementos topográficos. Estes dados foram complementados com observações de campo, tais como observação da variação do caudal e parâmetros hidroquímicos das nascentes principais em períodos de estio e após períodos de chuva intensa e 68 persistente. Paralelamente, foram observadas estruturas da geomorfologia cársica com interesse hidrogeológico. Estas observações foram efetuadas na superfície do terreno e nos cortes das pedreiras que permitem amiúde a observação da dinâmica cársica da região e da relação entre as águas subterrâneas e superficiais. Os parâmetros E, P, e K foram obtidos a partir da classificação das diferentes litologias presentes na cartografia geológica, sendo posteriormente representados em mapas parciais (Figura 40). A representação espacial do parâmetro I (Figura 40) foi obtida a partir da informação altimétrica (pontos cotados e curvas de nível) que permitiu a elaboração do modelo digital de terreno (Figura 39) e subsequente cálculo do declive. Posteriormente, os declives foram agrupados em duas classes tendo em conta os critérios do EPIK que melhor refletem a área em estudo. No caso presente, independentemente da ocupação de solo, considerou-se que na AIE de Cabeça Veada existem duas situações: i) inclinações do terreno superiores a 25% (I2) e ii) inclinações do terreno inferiores a 25% (I3). Figura 39- Modelo Digital de Terreno (MDT) de Cabeça Veada e área envolvente. 69 Figura 40- Mapas parciais de cada um dos parâmetros E, P, I e K na AIE de Cabeça Veada e sua envolvente. Do cruzamento dos quatro mapas parciais referentes a cada um dos parâmetros E, P, I e K resulta o mapa final do Índice de Vulnerabilidade que se apresenta na Figura 41. No interior da AIE de Cabeça Veada, os índices obtidos distribuem-se pelas classes de vulnerabilidade “muito alta” e “alta”, em percentagens de área de 62% e 38 %, respetivamente. As áreas com vulnerabilidade “muito alta” distribuem-se por toda a AIE e abrangem todas a formações descritas na cartografia geológica de pormenor, cujas idades vão desde o Jurássico Médio ao Jurássico Superior. 70 A mancha de vulnerabilidade “alta” localiza-se na zona central da AIE. Litologicamente, está associada aos Calcários de Pé da Pedreira, classificados do ponto de vista da cartografia geológica de pormenor (escala 1:2 000) como “Calcários Ornamentais”. Refira-se que estes calcários integram as formações do Jurássico Médio com elevado interesse hidrogeológico. Figura 41- Representação do Índice EPIK na AIE de Cabeça Veada e sua envolvente (Sistema de Coordenadas: PT-TM06/ETRS89) Para finalizar, salienta-se que a metodologia utilizada apresenta um certo grau de incerteza, seja por alguma subjetividade na valorização de cada um dos parâmetros (EPIK), seja pela imprevisibilidade resultante da elevada heterogeneidade própria do meio cársico. 71 7.3.4. Sensibilidade ambiental Para além das questões intrínsecas ao sistema aquífero que condicionam a vulnerabilidade à contaminação, a análise de fatores externos que se relacionam com a ocupação do solo e com as atividades antrópicas, assume importância na gestão e preservação dos recursos hídricos subterrâneos e, por conseguinte na manutenção do equilíbrio dos ecossistemas deles dependentes. Dependendo do tipo de ocupação do solo e do modo de intervenção dos vários intervenientes na gestão territorial da área em estudo e sua envolvente, as atividades antrópicas que aí se desenvolvem podem gerar impactes ambientais importantes. Os maiores ou menores impactos negativos associados a essas atividades e à vulnerabilidade intrínseca de um aquífero, traduzem de modo simplificado o conceito de “sensibilidade ambiental hidrogeológica”. Atendendo às actividades dominantes no interior da AIE de Cabeça Veada, a avaliação da sensibilidade fundamentou-se, conforme a Figura 42, na projecção das áreas de pedreiras e escombreiras sobre o mapa de Vulnerabilidade obtido pelo método EPIK atrás descrito. Figura 42- Ocupação do solo e Índice EPIK na AIE de Cabeça Veada (Sist. Coordenadas: PT-TM06/ETRS89). As áreas ocupadas pelas pedreiras e pelas escombreiras correspondem, respetivamente, a 25% e a 26% da área total da AIE. A restante área encontra-se preenchida por vegetação predominantemente rasteira, como é apreciável nas imagens presentes na Figura 8, na Figura 18 ou, ainda, na Figura 37. Da atividade de exploração de pedreiras de blocos (calcários ornamentais) na AIE de Cabeça Veada poderão resultar impactes negativos sobre a quantidade e qualidade dos recursos hídricos subterrâneos. 72 Relativamente aos possíveis impactes sobre a quantidade das águas subterrâneas, destaca-se: A interferência na recarga do aquífero e na circulação subterrânea por destruição do epicarso e de outras estruturas cársicas (dolinas, algares, grutas, condutas, etc.), em particular aquelas que tenham continuidade lateral relativamente às áreas de exploração e conexão à zona saturada. No que respeita aos riscos e possíveis impactes sobre a qualidade das águas subterrâneas, salienta-se: - A diminuição da filtração e da capacidade de atenuação natural do meio por remoção do solo de cobertura, ainda que este tenha espessuras reduzidas; O acréscimo das partículas em suspensão nas águas subterrâneas através da infiltração de águas/lamas com pó de serragem de blocos de rocha ornamental; A eventual contaminação do aquífero por substâncias (lubrificantes, óleos e combustíveis) relacionadas com a maquinaria de extração, corte e transporte de blocos de rocha. Atendendo ao exposto, considera-se que na AIE de Cabeça Veada, as áreas de implantação das pedreiras serão aquelas que apresentam um maior grau de sensibilidade hidrogeológica (Figura 43). Conforme referido em subcapítulo anterior, foram efetuadas colheitas de água em furos associados ao núcleo de extração, para avaliar a presença de algum vestígio de contaminação diretamente associada à atividade extrativa. Foram pesquisadas substâncias tóxicas e indesejáveis, tendo-se verificado na amostragem de água de um furos, a presença de contaminação microbiológica, óleos, gorduras e hidrocarbonetos. Perante estes resultados e as observações efetuadas, considera-se plausível que a contaminação verificada possa estar associada à falta de cuidado no manuseamento de substâncias tóxicas e ao sistema de saneamento das instalações locais. Estas ilações carecem no entanto de confirmação, dado que a contaminação pode ter origem em locais exteriores ao perímetro da AIE em estudo. 7.4. Conclusões e Recomendações A informação relacionada com a hidrogeologia local permite estabelecer o diagnóstico respeitante aos impactes da AIE sobre os recursos hídricos subterrâneos, que se passa a detalhar. Vulnerabilidade Segundo o método EPIK, utilizado na avaliação da vulnerabilidade à poluição, a AIE de Cabeça Veada apresenta vulnerabilidade “muito alta” e “alta”, em percentagens de área de 62% e 38 %, respetivamente. Conjugando a vulnerabilidade intrínseca do meio e o risco inerente à atividade antrópica aí desenvolvida, as áreas de implantação das pedreiras serão aquelas que apresentam um maior grau de sensibilidade hidrogeológica. 73 Figura 43- Áreas de maior sensibilidade hidrogeológica na AIE de Cabeça Veada (Sistema Coord.: PT-TM06/ETRS89). Impactes Do ponto de vista da afetação quantitativa das águas subterrâneas é de referir o seguinte: - Não se prevê que as profundidades de desmonte das pedreiras intersectem a superfície piezométrica estimada; - A exploração dos dois furos de captação conhecidos e diretamente relacionados com a atividade extrativa da AIE, apesar dos rebaixamentos de nível compreendidos entre 60 e 140 m necessários à obtenção de caudais diminutos, respetivamente de cerca de 2 e 0,5 L/s, não deverá, apenas per si, causar interferência significativa nas reservas hídricas subterrâneas e na produtividade de outras captações, em particular das nascentes temporárias situadas a jusante; - Haverá sempre alguma interferência na recarga do aquífero e na circulação subterrânea por destruição do epicarso e de eventuais estruturas cársicas com conexão à zona saturado do aquífero. 74 Do ponto de vista da afetação qualitativa das águas subterrâneas, salienta-se: - As amostras colhidas nos furos de captação situados no interior da AIE, além das características físico-químicas típicas de circulação em meio carbonatado, evidenciaram, no caso do furo SC, alguma contaminação por óleos e gorduras, bem como por hidrocarbonetos totais e ainda por colónias microbiológicas (Coliformes totais e Escherichia coli). A amostra relativa a “águas altas” do mesmo furo (Cabeça Veada SC) evidencia ainda uma concentração de Alumínio (Al) superior ao valor paramétrico legal; - Os casos de contaminação (óleos e gorduras, hidrocarbonetos totais e colónias microbiológicas) resultam, muito plausivelmente, de práticas ou descuidos relacionados com atividade extrativa ou com a construção/manutenção do furo e respetivo equipamento e tubagem. A concentração “anómala” de Al acompanhado de uma concentração de Ferro (Fe) relativamente elevada poderá ser devida a alguma influência das tubagens e equipamento do furo; - Em caso de derrame acidental de quantidades apreciáveis de substâncias poluentes no interior da AIE que atinjam o meio hídrico subterrâneo, a propagação da contaminação deverá ocorrer segundo as tendências do sentido de escoamento subterrâneo, isto é, plausivelmente de N para S, não obstante outras direções preferenciais decorrentes de condicionalismos do meio cársico e estruturais; - A diminuição da filtração e da capacidade de atenuação natural do meio de episódios de contaminação em consequência da remoção do solo de cobertura, ainda que este tenha espessuras reduzidas; De um modo geral, é sempre possível que possa ocorrer: - O acréscimo das partículas em suspensão nas águas subterrâneas através da infiltração de águas/lamas com pó de serragem de blocos de rocha ornamental; - A contaminação do aquífero por substâncias (lubrificantes, óleos e combustíveis) relacionadas com a maquinaria de extração, corte e transporte de blocos de rocha, além de contaminação microbiológica resultante do saneamento das instalações locais. Medidas de Mitigação No âmbito das medidas de mitigação de potenciais impactes negativos sobre a qualidade das águas subterrâneas, considerando as classes de vulnerabilidade à poluição do sistema cársico “muito alta” a “alta”, afigura-se necessária a implementação de planos de gestão dos resíduos, integrados nos planos de pedreira, que garantam o cumprimento generalizado das boas práticas respeitantes ao manuseamento e armazenamento de resíduos e efluentes produzidos, nomeadamente óleos e combustíveis, resíduos sólidos e águas residuais, através da sua recolha e condução a destinos finais apropriados. De entre outras medidas, destacam-se: - Não efetuar qualquer tipo de manutenção de equipamentos que implique a produção de resíduos no interior das pedreiras; 75 - Os locais de armazenamento temporário de resíduos devem ser cobertos e impermeabilizados; - As operações de abastecimento e de reposição de níveis de óleo da maquinaria afeta à exploração devem ser sempre efetuadas sobre tabuleiros metálicos de modo a evitar qualquer derrame; - Aquando da interceção de estruturas cársicas ou respeitantes a planos de fratura durante o avanço da exploração, dever-se-ão implementar as seguintes medidas específicas: i) garantir que substâncias tóxicas como os hidrocarbonetos e os óleos (novos ou usados) se encontrem devidamente armazenados, em locais distantes de tais estruturas; ii) garantir a proteção física do acesso às estruturas cársicas, impedindo a introdução de resíduos ou objetos estranhos no seu interior; iii) desviar as águas industriais com elevado teor de sólidos em suspensão resultantes do corte de blocos de calcário, impedindo a sua infiltração através daquelas estruturas; - Garantir que os efluentes de infraestruturas, tais como balneários e WCs, não atinjam quaisquer zonas ou estruturas de infiltração preferencial. No que respeita à mitigação do impacte negativo sobre a quantidade dos recursos hídricos disponíveis, e atendendo à grande variação sazonal da produtividade dos aquíferos cársicos, os planos de gestão das pedreiras deverão contemplar a seguinte medida: - Reutilizar, sempre que possível, a água necessária aos diferentes processos de extração e corte de blocos de calcário, de modo a minimizar os impactes sobre os volumes de água a captar e subsequentes rebaixamentos piezométricos. Plano de Monitorização No que respeita à necessidade de implementar um plano de monitorização é de referir que, idealmente, seria desejável a construção de dois furos destinados exclusivamente à monitorização quantitativa e qualitativa dos recursos hídricos subterrâneos, isto é, que servissem de piezómetros e de pontos de amostragem com vista ao controlo sistemático, com periodicidade semestral (“águas baixas” e “águas altas”), da variação dos níveis piezométricos e dos parâmetros de qualidade da água. Numa primeira análise e considerando o modelo de fluxos conceptualizado no subcapítulo 7.3.2.3, um dos furos de monitorização deveria localizar-se junto do limite norte e o outro junto ao limite sul da AIE. 76 8. PATRIMÓNIO GEOLÓGICO 8.1. Introdução A singularidade do património natural e da paisagem do MCE resultam da conjugação da natureza calcária da maioria das rochas que o constituem com a sua sobrelevação e posição geográfica na Bacia Lusitaniana. Neste Maciço encontram-se séries sedimentares completas de vários períodos do Jurássico e acidentes tectónicos que testemunham sobretudo as fases distensivas da abertura da Bacia Lusitaniana, associadas ao processo global de abertura do Oceano Atlântico. Porém, séries sedimentares incompletas do Cenozoico e a reativação dos antigos acidentes tectónicos, constituem testemunhos dos episódios compressivos associados à orogenia alpina que tiveram lugar a partir do final do Cretácico. Graças às excelentes condições de exposição originadas pela sobrelevação tectónica e ausência de cobertura vegetal densa, esta por ausência de escorrência superficial, é grande a diversidade de fenómenos geológicos exibidos em numerosos locais de fácil acessibilidade que merecem ser alvo de valorização como património geológico. Os locais com interesse geológico patrimonial (ou geossítios) só assumem esse interesse se devidamente caraterizados e avaliados. Assim, no presente capítulo apresentam-se os resultados dos trabalhos realizados na AIE de Cabeça Veada acerca do património geológico. Tiveram como objetivos específicos a sua inventariação, caraterização e avaliação à luz dos objetivos gerais da Estratégia Nacional de Conservação da Natureza e da Biodiversidade, designadamente no que respeita à conservação e promoção da utilização sustentável dos valores naturais. Ainda à luz dessa Estratégia, mas dos seus objetivos estratégicos, os trabalhos realizados visaram a integração dos resultados obtidos nos instrumentos de ordenamento do território em curso para a presente a AIE. 8.2. Metodologia A inventariação realizada na AIE de Cabeça Veada visou não só o património geológico no seu sentido restrito, mas também o geomorfológico e o geomineiro. Teve como base informação dispersa em diversas publicações e relatórios de âmbito mais lato e a recolha de informação oral junto dos técnicos do PNSAC. Relativamente à informação escrita destaca-se a produzida por Martins, 1949; Rodrigues, 1991; 1998; Azerêdo & Crispim, 1999; 2000; Coelho, 2003; Rodrigues & Fonseca, 2010 e a constante do Anexo I do Plano de Ordenamento do PNSAC (RCM .º 57/2010, de 12 de agosto). A esta recolha de informação seguiuse uma etapa de reconhecimento no terreno, acompanhada da pesquisa de eventuais novos sítios com interesse geomorfológico, geológico ou geomineiro. A caraterização e avaliação dos geossítios inventariados tiveram por base Fichas Tipo especificamente elaboradas para aplicação ao PNSAC no âmbito do presente projeto. Reproduzem o atual estado de conhecimentos respeitantes à caraterização e avaliação de património geológico. Neste âmbito destacamse os trabalhos de Brilha, 2005; 2006; Brilha & al., 2010. 77 A Ficha de caraterização é de caráter descritivo. Nela registam-se os diversos aspetos que caraterizam o geossítio, desde a sua localização, enquadramento e especificidades geológicas, até à sua documentação fotográfica. Quanto à avaliação dos geossítios, pretendeu-se uma abordagem baseada em critérios claros e fundamentados e daí a elaboração de uma Ficha Tipo de avaliação quantitativa onde cada geossítio é avaliado em função da quantificação dos seguintes Valores: Valor Científico, Vulnerabilidade e Uso Potencial. Essa quantificação é o resultado duma avaliação também quantitativa, mas também ponderada, de um conjunto de critérios específicos a cada um dos Valores considerados. Assim, esta metodologia conduz à obtenção de resultados quantitativos, permitindo a sistematização dos geossítios inventariados. Por sua vez, essa sistematização constitui a base para a seleção dos que merecem medidas de preservação, seja pela sua importância científica, seja pela sua vulnerabilidade. Figura 44- Diagrama representativo do processo de valoração qualitativa do património geológico em função da atividade extrativa. Tendo em conta que os resultados a alcançar por este tipo de metodologia se destinam a ser incorporados no processo de ordenamento territorial em curso para a AIE de Cabeça Veada, numa perspetiva de compatibilização da atividade económica de extração de rochas ornamentais com a conservação dos valores naturais, a seleção dos geossítios foi alvo de um novo processo metodológico. Este assentou no relacionamento do valor patrimonial atribuído a cada geossítio com a presença de pedreiras licenciadas e com a aptidão económica dos recursos minerais, de acordo com o diagrama que se apresenta na Figura 44, no qual se sistematiza o património geológico em 3 classes de valor qualitativo: valor excecional, alto e médio/baixo. 78 8.3. Resultados A consulta realizada às fontes de informação referidas anteriormente não forneceu dados relativos à existência de elementos geológicos, geomorfológicos ou geomineiros com valor patrimonial. Do mesmo modo, pelos trabalhos de reconhecimento de campo efetuados nesta AIE verificou-se não existir património geológico com valor assinalável. Excetuam-se elementos de caráter sedimentológico observáveis nas frentes de exploração das pedreiras de rocha ornamental. Contudo, estando essas frentes de exploração em constante desenvolvimento e não se podendo considerar esses elementos como detentores de caráter excecional e único, não foram considerados. 79 80 9. CONCLUSÕES A cartografia geológica de detalhe realizada na região de Cabeça Veada permitiu destrinçar e cartografar 4 unidades litostratigráfica temáticas que, da base para o topo, se denominaram Vidraços da Base, Calcários Ornamentais, Vidraços do Topo e Vidraços Escuros. Os Vidraços da Base e os do Topo são calcários essencialmente micríticos que texturalmente se apresentam como mudstones e wackstones. Em termos litostratigráficos formais integram a Formação de Serra de Aire datada do Jurássico Médio, mais concretamente, do Batoniano. Essa Formação é, parcialmente, equivalente lateral de uma outra datada do Batoniano ao Caloviano e que se designa por Formação de Santo António – Candeeiros, a qual é composta por vários membros. Os Calcários Ornamentais de Cabeça Veada correspondem a um desses membros, nomeadamente o Membro de Pé da Pedreira que está datado do Batoniano superior. Assim, se em termos regionais os Calcários Ornamentais são equivalentes laterais dos Vidraços da Base e dos do Topo, em termos locais estão intercalados entre essas duas unidades. Na AIE de Cabeça Veada estas unidades litológicas apresentam-se orientadas segundo NNE - SSW e inclinadas 400 para leste. Estão truncadas a oeste por falha com a mesma orientação, a qual as coloca em contato tectónico com uma outra unidade que estratigraficamente se situa acima, designadamente os Vidraços Escuros. Estes fazem parte da unidade formal conhecida por Formação de Montejunto que está datada do Oxfordiano médio. Correspondem, na Cabeça Veada, a calcários micríticos mais ou menos margosos e mais ou menos bioclásticos e calciclásticos (mudstones a packstones) de cor cinzenta escura, em bancadas de espessura centimétrica a decimétrica. Estes calcários estão orientados NNW – SSE com inclinações na ordem dos 250 para ENE. Na região sul da área cartografada os Calcários Ornamentais, bem como os Vidraços da Base e os do Topo, encontram-se também truncados por uma outra falha, esta com orientação WNW – ESE. A cartografia realizada centrou-se no estabelecimento dos limites dos Calcários Ornamentais e na sua caraterização. Trata-se de uma unidade constituída por calcários biolitoclásticos pelóidicos, mais ou menos oolíticos, de granularidade fina a grosseira (grainstones e rudstones) e cimento sparítico. Apresentam cor creme. Não estão organizados em estratos tabulares mas sim em corpos maciços lenticulares marcados por laminações paralelas e oblíquas, mais ou menos evidentes e organizadas em feixes de espessura decimétrica a métrica. A espessura total dos Calcários Ornamentais é de 130 m. A variedade comercial proveniente desta AIE toma o nome de Semi Rijo de Cabeça Veada. O seu corte final é normalmente realizado “a favor”, ou seja, paralelamente à laminação sedimentar. A elevada aptidão ornamental destes calcários, para além da elevada espessura total, deriva da sua homogeneidade textural e cromática quando cortados “a favor”. Não o será tanto se cortados ao contra, devido a variações texturais e cromáticas induzidas pelas laminações sedimentares. 81 Em termos de disponibilidade de recursos em Calcários Ornamentais na AIE de Cabeça Veada, estimaramse 22,1 milhões de metros cúbicos. As reservas a calcular deverão ter em conta as condicionantes mineiras e ambientais de cada uma das pedreiras, bem como a espessura da carga estéril correspondente aos Vidraços do Topo. O rendimento médio expectável para a AIE de Cabeça Veada é de 45%. Quanto aos estudos hidrogeológicos realizados, eles permitiram determinar a produtividade aquífera da AIE, o respetivo sentido de fluxo das águas subterrâneas e a caraterização química dessas águas, tendo em vista a avaliação da sua qualidade. No que respeita à produtividade, os dados obtidos por medições nos furos disponíveis mostram que ela é reduzida, com valores de caudais específicos diminutos (de 0,003 a 0,037 L/s.m). Atendendo à altimetria da AIE, é expectável que a captação de água apenas seja possível através de furos com profundidades superiores a 400 m, a que acresce o elevado grau de incerteza, característico dos meios cársicos, na intersecção de condutas de água. Os dados para a caraterização do hidrodinamismo subterrâneo são escassos. Porém, apresenta-se a hipótese de que o sentido de fluxo subterrâneo ocorra de norte para sul. Quimicamente as águas subterrâneas na AIE Cabeça Veada são águas duras, alcalinas, evidenciando fácies bicarbonatada-cálcica. Apresentam mineralização que varia de. 265 a 541 mg/L. Em termos de contaminação por substâncias como óleos e gorduras, hidrocarbonetos totais e hidrocarbonetos aromáticos policíclicos (HAPs), os valores registados em época de ´”aguas baixas” mostram a presença de hidrocarbonetos em valores superiores ao valor máximo admissível (10 µg/L). Em “águas altas” não se regista contaminação superior ao valor máximo admissível. Já do ponto de vista microbiológico constata-se a existência de alguma contaminação por coliformes fecais. Por aplicação da metodologia EPIK avaliou-se a vulnerabilidade das águas subterrâneas à poluição na AIE de Cabeça Veada. Concluiu-se que essa vulnerabilidade é “muito alta” e “alta” em percentagens de área de 62% e 38 %, respetivamente. As manchas correspondentes à vulnerabilidade “muito alta” distribuem-se por toda a AIE, ao passo que as correspondentes a vulnerabilidade “alta” localizam-se na zona central, estando associadas às caraterísticas dos Calcários Ornamentais (Membro de Pé da Pedreira). A vulnerabilidade à contaminação por parte das águas subterrâneas depende diretamente das caraterísticas do sistema aquífero. Da conjugação dos resultados obtidos quanto à vulnerabilidade com o modo de ocupação do território e atividades nele desenvolvidas, concluiu-se que as áreas de implantação das pedreiras são aquelas que apresentam um maior grau de sensibilidade hidrogeológica. Perante a contaminação revelada pela água dos furos que foram estudados, é plausível considerar ela resulte da falta de cuidado no manuseamento de substâncias tóxicas e das caraterísticas do sistema de saneamento das instalações locais. Relativamente aos trabalhos de inventariação de património geológico na AIE de Cabeça Veada verificou-se não existirem elementos geológicos, geomorfológicos ou geomineiros com valor patrimonial. 82 10. BIBLIOGRAFIA Almeida, C.; Crispim, J. A.; Silva, M. L. & Paralta, E., 2000a. Hidrogeologia. In: Manuppella, G. et al. (Editors), Notícia Explicativa da Folha 27-A, Vila Nova de Ourém, Carta Geológica de Portugal, Escala 1:50 000, 2ª edição. Instituto Geológico e Mineiro, Lisboa, pp. 156 Almeida, C.; Mendonça, J. J. L.; Jesus, M. R. & Gomes, A. J., 2000b. Sistemas Aquíferos de Portugal Continental. INAG/CGUL, Lisboa, 661 p. Azerêdo, A. C., 1993. Jurássico Médio do Maciço Calcário Estremenho, Bacia Lusitânica : análise de fácies, micropaleontologia, paleogeografia. Tese de Doutoramento, Departamento de Geologia da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, Lisboa, 360 p. Azerêdo, A. C. & Crispim, J., 1999. Principais locais de interesse geológico do Maciço Calcário Estremenho, Simpósio sobre o Património Geológico, Instituto Geológico e Mineiro, Alfragide. Azerêdo, A. C. & Crispim, J., 2000. Principais locais de interesse geológico do Maciço Calcário Estremenho. In: Manupella, G. (Editor), Notícia Explicativa da Carta Geológica de Portugal na escala 1:50 000, folha 27-A Vila Nova de Ourém. Instituto Geológico e Mineiro, Lisboa. Azerêdo, A. C., 2007. Formalização da litoestratigrafia do Jurássico Inferior e Médio do Maciço Calcário Estremenho (Bacia Lusitânica). Comunicações Geológicas 94, 29-51. Brilha, J., 2005. Património geológico e geoconservação: a conservação da natureza na sua vertente geológica. Palimage Editores, Viseu, 190 p. Brilha, J., 2006. Proposta metodológica para a estratégia de geoconservação, VII Congresso Nacional de Geologia, Pólo de Estremoz da Universidade de Évora, pp. 925-927. Brilha, J. & al., 2010. O inventário nacional do património geológico: abordagem metodológica e resultados, VIII Congresso Nacional de Geologia. e-Terra : Revista Electrónica de Ciências da Terra, Braga. Carvalho, J. M. F., 1996. Área de Moleanos (Maciço Calcário Estremenho): Litologia temática e sondagens. Instituto Geológico e Mineiro, Lisboa. Carvalho, J. M. F., 1997. Calcários Ornamentais e Industriais da Área de Pé da Pedreira (Maciço Calcário Estremenho) - Carta de Aptidão. Estudos, Notas e Trabalhos do Instituto Geológico e Mineiro 39, 71 - 89. Carvalho, J. M. F., 1998. O Alpinina: Variedade de Calcário Ornamental da Região de Alvados (Maciço Calcário Estremenho - Portugal). Estudos, Notas e Trabalhos do Instituto Geológico e Mineiro 40, 51 - 57. Carvalho, J. M. F.; Henriques, P.; Falé, P. & Luís, G., 2008. Decision criteria for the exploration of ornamental-stone deposits: Application to the marbles of the Portuguese Estremoz Anticline. International Journal of Rock Mechanics & Mining Sciences 45, 1306–1319. Carvalho, J. M. F., 2013. Tectónica e caraterização da fraturação do Maciço Calcário Estremenho, Bacia Lusitaniana. Contributo para a prospeção de rochas ornamentais e ordenamento da atividade extrativa. Tese de Doutoramento, Universidade de Lisboa, 884 p. Coelho, R. J., 2003. Aspectos geológicos do Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros e sua divulgação multimédia - um contributo para o ensino das Ciências da Terra. Tese de Mestrado em Geociências, Universidade de Coimbra, Coimbra. Costa, J. G.; Moreira, J. B. & Manupella, G., 1988. Calcários Ornamentais do Maciço Calcário Estremenho. Estudos, Notas e Trabalhos do Serviço de Fomento Mineiro 30, 51-88. Crispim, J., 1995. Dinâmica cársica e implicações ambientais nas depressões de Alvados e Minde. Tese de doutoramento, Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, Lisboa, 394 p. Doerfliger, N. & Zwahlen, F., 1997. EPIK. A new method for outlining of protection areas in karstic envioronment. In: Gunnay, G. & Johnson, A. (Editors), International Symposium and Field seminar on karst waters and environmental impacts. Balkema, Rotterdam, Antalya, Turkey, pp. 117-123. Doerfliger, N. & Zwahlen, F., 1998. Cartographie de vulnerabilité en regions karstiques (EPIK). Guide Pratique. Office fédéral de l`environnement, des forêts et du paysage (OFEPP), Berne, 56 p. 83 Ferreira, A. B.; Rodrigues, M. L. & Zêzere, J. L., 1988. Problemas da evolução geomorfológica do Maciço Calcário Estremenho. Finisterra XXIII (45), 5-28. Ferreira, M. P. & Macedo, C. R., 1983. Igneous rocks in the diapiric areas of the western portuguese border: the K-Ar ages and settings of the Upper Jurassic suite. Memórias e Notícias do Museu e Laboratório Mineralógico e Geológico da Universidade de Coimbra 96, 159-181. Ferreira, M. P. & Macedo, C. R., 1987. Idade radiométrica K- do filão das Gaeiras (Óbidos), VII Semana Geoquímica, Universidade de Aveiro. Hudson, J. A. & Priest, S. D., 1983. Discontinuity frequency in rock masses. International journal of rock mechanics and mining sciences 20 (2), 73-89. Jeannin, P. Y., 1996. Structure et comportement hydraulique des aquifers karstiques. Thèse, Centre d` Hydrogeologie, Université de Neuchâtel. Kullberg, J. C., 2000. Evolução Tectónica Mesozóica da Bacia Lusitaniana. Tese de Doutoramento, Universidade Nova de Lisboa, Lisboa, 361 p. Kullberg, J. C.; Rocha, R. B.; Soares, A. F.; Rey, J.; Terrinha, P.; Azerêdo, A. C.; Callapez, P.; Duarte, L. V.; Kullberg, M. C.; Martins, L.; Miranda, J. R.; Alves, C.; Mata, J.; Madeira, J.; Mateus, O.; Moreira, M. & Nogueira, C. R., 2013. A Bacia Lusitaniana: Estratigrafia, Paleogeografia e Tectónica. In: Dias, R. et al. (Editors), Geologia de Portugal, Vol. II - Geologia Meso-cenozóica de Portugal. Escolar Editora, Lisboa, pp. 798. Manupella, G.; Barbosa, B.; Azerêdo, A. C.; Carvalho, J.; Crispim, J.; Machado, S. & Sampaio, J., 1999. Folha 27 C - Torres Novas. Carta Geológica de Portugal, Escala 1:50000, 2ª ed. Instituto Geológico e Mineiro, Lisboa. Manupella, G.; Barbosa, B.; Azerêdo, A. C.; Carvalho, J.; Crispim, J.; Machado, S. & Sampaio, J., 2006. Notícia Explicativa da Folha 27-C, Torres Novas, 2ª edição ed. Instituto Nacional de Engenharia, Tecnologia e Inovação, Lisboa, 79 p. Manuppella, G.; Moreira, J. C. B.; Costa, J. R. G. & Crispim, J. A., 1985. Calcários e Dolomitos do Maciço Calcário Estremenho. Estudos, Notas e Trabalhos do Laboratório e Serviço de Fomento Mineiro 27, 3-48. Manuppella, G.; Antunes, M. T.; Almeida, C.; Azerêdo, A. C.; Barbosa, B.; Cardoso, J. L.; Crispim, J. A.; Duarte, L. V.; Martins, L. T.; Ramalho, M. M.; Santos, V. F. & Terrinha, P., 2000. Notícia Explicativa da Folha 27-A (Vila Nova de Ourém), 2ª ed. Instituto Geológico e Mineiro, Lisboa, 155 p. Martins, A. F., 1949. Maciço Calcário Estremenho. Contribuição para um Estudo de Geografia Física. Tese de Doutoramento em Ciências Geográficas, Universidade de Coimbra, 249 p. Martins, L., 1991. Actividade ígnea mesozóica em Portugal: contribuição petrológica e geoquímica. Tese de Doutoramento, Universidade de Lisboa, Lisboa, 418 p. Martins, L.; Miranda, R.; Alves, C.; Mata, J.; Madeira, J.; Munhá, J.; Terrinha, P.; Youbi, N. & Bensalah, K., 2010. Mesozoic magmatism at the West Iberian Margins: timing and geochemistry, II Central & North Atlantic Conjugate Margins Conference, Lisbon, pp. 172-175. Quartau, R., 1998. Calcários Ornamentais e Industriais do Maciço Calcário Estremenho - A variedade Semi Rijo de Cabeça Veada. Estudos, Notas e Trabalhos do Instituto Geológico e Mineiro 40, 81 - 88. Quartau, R., 2000. Calcários ornamentais do Maciço Calcário Estremenho - A variedade Semi-Rijo do Codaçal. Instituto Geológico e Mineiro, Lisboa. Ribeiro, A.; Antunes, M. T.; Ferreira, M. P.; Rocha, R. B.; Soares, A. F.; Zbyszewski, G.; Moitinho de Almeida, F.; Carvalho, D. & Monteiro, J. H., 1979. Introduction à la géologie générale du Portugal. Serviços Geológicos de Portugal, 114 p. Ribeiro, A.; Silva, J. B.; Cabral, J.; Dias, R.; Fonseca, P.; Kullberg, M. C.; Terrinha, P. & Kullberg, J. C., 1996. Tectonics of the Lusitanian Basin. Final Report. ICTE/GG/GeoFCUL, Proj. MILUPOBAS, Contract No. JOU2-CT94-0348, Lisboa. Rodrigues, M. L., 1991. Depósitos e Evolução Quaternária das Vertentes nas Depressões de Minde e de Alvados, Maciço Calcário Estremenho, Portugal. Finisterra XXVI (51), 5-26. 84 Rodrigues, M. L., 1998. Evolução geomorfológica quaternária e dinâmica actual - Aplicações ao ordenamento do território. Exemplos no Maciço Calcário Estremenho. Dissertação de Doutoramento em Geografia Física, Fac. Letras da Univ. Lisboa, Lisboa, 868 p. Rodrigues, M. L. & Fonseca, A., 2010. Geoheritage assessment based on large-scale geomorphological mapping: contributes from a Portuguese limestone massif example. Geomorphologie-Relief Processus Environnement (2), 189-198. Sampaio, J., 2006. Hidrogeologia. In: Manuppella, G. et al. (Editors), Notícia Explicativa da Folha 27 C Torres Novas, Carta Geológica de Portugal na escala 1:50 000. Instituto Geológico e Mineiro, Lisboa. Smart, P. & Friedrich, H., 1986. Water movement and storage in the unsaturated zone of a maturely karstified carbonated aquifer, Mendip Hills, England, Proc. Conference on Environm. Problems of Karst Terranes and their Solutions. National Water Well Association, Dublin, Ohio, pp. 59-87. Terrinha, P.; Ribeiro, A.; Silva, J. B.; Dias, R.; Fonseca, P.; Kullberg, J. C. & Moita, C., 1995. Tectonic evolution of the Lusitanian Basin: Variscan heritage and early inversion, EUG VII. Terra Abstracts, Strasbourg, pp. 278. Terzaghi, R., 1965. Sources of error in joint surveys. Geotechnique 15 (3), 287-304. Williams, P. W., 1983. The role of subcutaneous zone in karts hydrology. Journal of Hydrology 61, 45-67. Willis, M. G., 1988. The tectonic history of the Lusitanian Basin of Portugal. PhD Thesis, Open University. Wilson, R. C. L., 1988. Mesozoic development of the Lusitanian Basin, Portugal. Revista de la Sociedad Geologica de España 1 (3-4), 395-406. Wilson, R. C. L.; Hiscott, R. N.; Willis, M. G. & Gradstein, F. M., 1989. The Lusitanian Basin of west-central Portugal: Mesozoic and Tertiary tectonic, stratigraphic, and subsidence history. In: Tankard, A. J. & Balkwill, H. R. (Editors), Extensional tectonics and stratigraphy of the North Atlantic margins. AAPG Memoir, pp. 341-361. Zbyszewski, G.; Manupella, G. & Ferreira, O. V., 1969. Folha 27-C (Torres Novas). Carta Geológica de Portugal, Escala 1/50000, 1ª ed. Serviços Geológicos de Portugal, Lisboa. 85 86 ANEXOS 87 88 ANEXO 1- MAPA LITOSTRATIGRÁFICO DA AIE CABEÇA VEADA; ESCALA 1/2000 (Anexo de grande formato; junta-se em separado) 89 90 ANEXO 2- CORTES GEOLÓGICOS (Anexo de grande formato; junta-se em separado) 91 92 ANEXO 3- ESTUDO PETROGRÁFICO DE LÂMINAS DELGADAS 93 94 UNIDADE: REFª AMOSTRA CARATERIZAÇÃO: CLASSIFICAÇÃO DUNHAM FOLK Calcários Ornamentais (Membro de Pé da Pedreira, Formação de Santo António – Candeeiros) CV1 Calcário constituído essencialmente por oóides, ligeiramente pelóidico e bioclástico, em cimento sparítico. Os oóides apresentam diâmetro médio de 0,6 mm Localmente existe uma matriz de pelóides muito finos (0,1 mm de diâmetro). Grainstone Oosparite Luz polarizada, nicóis // 95 UNIDADE: REFª AMOSTRA: CARATERIZAÇÃO: CLASSIFICAÇÃO DUNHAM FOLK Vidraços Escuros (Formação de Montejunto) CV2 Calcário essencialmente constituído por micrite onde ocorrem de modo disperso fina microfauna Mudstone - wackstone biomicrite Luz polarizada, nicóis // Luz polarizada, nicóis X 96 UNIDADE: REFª AMOSTRA: CARATERIZAÇÃO: CLASSIFICAÇÃO DUNHAM FOLK Vidraços Escuros (Formação de Montejunto) CV3 Calcário essencialmente constituído por micrite onde ocorrem de modo disperso e pouco frequente bioclastos grosseiros Mudstone Micrite Luz polarizada, nicóis // Luz polarizada, nicóis X 97 UNIDADE: REFª AMOSTRA: CARATERIZAÇÃO: Calcários dolomíticos; Vidraços da Base (Formação de Serra de Aire) CV4 Mosaico de cristais anédricos de dolomite representativo de substituição total da calcite. Elevada porosidade, conforme observável em nicóis cruzados. CLASSIFICAÇÃO Dolomito Luz polarizada, nicóis // Luz polarizada, nicóis X 98 UNIDADE: REFª AMOSTRA CARATERIZAÇÃO: CLASSIFICAÇÃO DUNHAM FOLK Calcários Ornamentais (Membro de Pé da Pedreira, Formação de Santo António – Candeeiros) CV5 Oóides bem calibrados em cimento sparítico. Bioclastos bastante grosseiros dispersos. Grainstone Oobiosparite Luz polarizada, nicóis X 99 UNIDADE: REFª AMOSTRA: CARATERIZAÇÃO: CLASSIFICAÇÃO DUNHAM FOLK Calcários Ornamentais (Membro de Pé da Pedreira, Formação de Santo António – Candeeiros) – Amostra refere-se a variedade de cor “Azul” CV7 Calcário constituído essencialmente por uma matriz pelóidica muito fina em cimento sparítico onde sobressaem intraclastos, bioclastos e oóides de maior dimensão. Laminação sedimentar denunciada por maior ou menor abundância de cimento sparítico. Porosidade intergranular relativamente frequente. Grainstone Pelintrabiosparite Luz polarizada, nicóis // Luz polarizada, nicóis X 100 ANEXO 4- LOGS DE SONDAGENS 101 102 103 104 105 106 ANEXO 5- MAPA DE APTIDÃO PARA A PRODUÇÃO DE ROCHAS ORNAMENTAIS; ESCALA 1/2000 (Anexo de grande formato; junta-se em separado) 107 108 ANEXOS EM FORMATO DIGITAL Ortofotomapas, Levantamento Topográfico, Shapefiles 109 110 APÊNDICE – Classificação de Calcários BASE DE CLASSIFICAÇÃO MACROSCÓPICA BASE DE CLASSIFICAÇÃO MICROSCÓPICA 111