Acessibilidade em Bibliotecas: utilizando NFC e
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Acessibilidade em Bibliotecas: utilizando NFC e
ISSN 2316-2872 T.I.S. São Carlos, v. 3, n. 2, p. 144-150, mai-ago 2014 ©Tecnologias, Infraestrutura e Software Acessibilidade em Bibliotecas: utilizando NFC e Smartphones para auxiliar Deficientes Visuais na Identificação de Livros Ederaldo de Oliveira Constantino, Vânia Paula de Almeida Neris Resumo: Este trabalho descreve a aplicação da tecnologia Near Field Communication (NFC) para transformar uma biblioteca em um ambiente pervasivo, de modo a facilitar a interação de pessoas com deficiência visual durante a busca por um livro. É apresentado um protótipo de aplicativo desenvolvido para a plataforma Android e que utiliza NFC para exibir informações sobre um determinado livro facilitando assim a tomada de decisão do usuário que está interagindo com o ambiente da biblioteca. Os resultados deste trabalho estão direcionados para a melhoria da acessibilidade de pessoas com deficiência visual, porém, também pode ser utilizado por pessoas que não tenham esse tipo de deficiência. Palavras-Chave: NFC, Android, deficiência visual. Accessibility in Libraries: using NFC and smartphones to help the visual impaired in the identification ofbooks Abstract: This paper describes the application of Near Field Communication (NFC) technology to transform a library in a pervasive environment in order to make the interaction of visually impaired people easier when they are searching a book. The work presents an application prototype developed for Android platform which uses NFC to show information about a certain book, helping the user who is interacting with the library environment to make a decision. The results ofthis work aim at improving the accessibility ofpeople. However, it can also be used by people who are not visually impaired. Keywords: NFC, Android, visual impairment. 1. INTRODUÇÃO Segundo dados do IBGE (2010), no Brasil 23,9% da população possui algum tipo de deficiência. O levantamento também ressalta que entre as pessoas com deficiência, 18,8% são deficientes visuais, 5,1% são deficientes auditivos, 7% são deficientes motores e 1,4% são deficientes mentais. Segundo dados da Organização das Nações Unidas (ONU, s.d.), 10% da população mundial tem algum tipo de deficiência e dentre esses 10%, 80% estão em países em desenvolvimento. Entre as pessoas mais pobres do mundo, 20% têm algum tipo de deficiência. Em meio a esta porcentagem um número que chama a atenção é a porcentagem de 90% das crianças que possuem algum tipo de deficiência não frequentam escolas. Diante dos dados citados acima, garantir a acessibilidade desta parcela da população ao conhecimento mostra-se como um grande desafio para todos os pesquisadores (COMPUTAÇÃO, 2009) A tecnologia pode e deve continuar sendo empregada para ajudar a contornar os obstáculos existentes na vida dessas pessoas, em particular naquilo que se refere a sua formação intelectual e apoio à educação. Nesse cenário, este trabalho descreve o desenvolvimento de uma aplicação direcionada para pessoas com deficiência visual com o objetivo de melhorar a acessibilidade em uma biblioteca. A pesquisa contou com uma etapa de levantamento de soluções de tecnologia para a acessibilidade em ambientes e serviços. Em seguida, algumas tecnologias foram estudadas e adotadas para que este trabalho pudesse ser realizado. O arcabouço tecnológico adotado incluiu o sistema operacional Android, presente em muitos dos celulares vendidos atualmente, e o recurso de comunicação Near Field Communication (NFC), uma tecnologia baseada em Radio Frequency Identification (RFID) que permite ao aparelho ler informações previamente gravadas em etiquetas por meio de campos magnéticos. A tecnologia NFC é uma tecnologia que permite a comunicação bilateral entre dispositivos e tags. Ela pode ser encontrada na maioria dos smartphones vendidos atualmente. O uso desta tecnologia em conjunto com recursos de acessibilidade do Android permite uma melhora na acessibilidade e na interatividade do usuário com o ambiente. O aplicativo foi desenvolvido na linguagem Java e utiliza os Departamento de Computação - Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) Caixa Postal 676 – 13.565-905 – São Carlos – SP – Brasil Autor para correspondência: [email protected], [email protected] Acessibilidade em Bibliotecas: utilizando NFC e Smartphones para Auxiliar Deficientes Visuais na Identificação de Livros recursos nativos de leitura de tags RFID do sistema operacional Android. Para ilustrar e permitir que testes fossem realizados, tags foram populadas com informações de alguns livros O aplicativo desenvolvido foi apresentado para professoras do Espaço Braille de São Carlos e os resultados sugerem que o emprego da tecnologia NFC pode melhorar a acessibilidade de uma biblioteca, criando um ambiente pervasivo e permitindo assim que pessoas com deficiência visual total ou parcial tenham acesso a informações sobre os livros utilizando-se apenas do dispositivo leitor. Também fruto do contato com as professoras, melhorias foram sugeridas para o aplicativo em questão. Este artigo está organizado da seguinte maneira: a seção II trata de referências bibliográficas encontradas no meio acadêmico sobre como a tecnologia NFC vem sendo utilizada para a resolução de problemas de acessibilidades e sobre alguns trabalhos já realizados com a tecnologia. Nesta mesma seção será abordada a questão da acessibilidade e casos onde ela foi empregada. A seção III apresenta a abordagem de pesquisa e detalhes a respeito das tecnologias utilizadas. A seção IV detalha o processo de desenvolvimento do software. A seção V apresenta os resultados coletados com a visita ao Espaço Braille de São Carlos e, por fim, a seção VI traz uma análise crítica e a seção VII, as conclusões sobre o estudo. II. REVISÃO B IBLIOGRÁFICA Esta seção apresenta trabalhos relacionados à aplicação da tecnologia RFID para a melhoria da acessibilidade e usabilidade de ambientes e serviços. Uma pesquisa por soluções computacionais semelhantes à apresentada neste trabalho não retornou trabalhos com enfoque em acessibilidade, e que utilizem NFC e aplicativos móveis para o auxílio de pessoas com deficiência visual no ambiente de bibliotecas. Assim, esta seção apresenta os estudos mais próximos ao tema. Estudos conduzidos por GHIRON et al. (2009) permitiram a criação de um protótipo de aplicativo onde é possível comprar um ticket a partir de um cartaz. Quando o usuário aproxima seu dispositivo móvel do cartaz a compra do ticket é iniciada. Após a compra do ticket, o dispositivo móvel é utilizado no lugar do ticket visando a melhoria da usabilidade. O sistema foi implando no Roman public transportation company ATAC. Durante os estudos um protótipo foi desenvolvido e apresentado em uma faculdade, alguns usuários utilizaram o sistema e responderam algumas questões tais como: a respeito da dificuldade do usuário e também sobre a satisfação deles ao interagirem com o sistema (GHIRON et al., 2009). Observou-se que a maioria dos usuários ficaram divididos entre baixa dificuldade e nenhuma dificuldade ao interagir com o sistema. Demonstrando uma boa aceitação dos usuários com o sistema testado. Um pequeno grupo dividido entre alta e média dificuldade para interagir com o sistema (GHIRON te al., 2009). Quando analisada a satisfação dos usuários na utilização do sistema, a maioria dos usuários ficaram divididos entre uma média ou grande satisfação ao utilizar o sistema e uma pequena parte dos usuários disseram ter uma pequena ou média satisfação ao usar o sistema (GHIRON et al., 2009). De acordo com os estudos de Liu e Xu (2009), o RFID pode ser utilizado para a localização e controle de objetos em um determinado ambiente como mostra o caso do RO-RO Terminal, um exemplo de automatização de um sistema de transportes marítimos com a tecnologia RFID, que melhora o controle geográfico e a logística do conteúdo transportado pelo porto. No gerenciamento do RO-RO Terminal, três processos são identificados como principais: o armazenamento, envio e a pilhagem. No armazenamento, encontramos os procedimentos de recebimento e armazenagem das cargas. No envio temos a coleta e a remessa das cargas que estão no armazenamento. A pilhagem é um processo especial feito pelos portos para melhorar a eficiência dos recursos que inclui o manejo das cargas de forma a posicioná-las na ordem preferêncial de saída (Liu; Xu, 2009). Um sistema de informação é o responsável pela melhora da eficácia na reorganização das cargas por meio de algoritmos de logistica aliados a tags RFID anexadas nas cargas. De acordo com Liu e Xu (apud IBM, 2002) o recebimento apresenta um alto custo de mão de obra, pois é parecido com um inventário, tags RFID podem reduzir o tempo de inventário entre 60% e 90%. A busca entre os produtos armazenados ocupa cerca de 50% da mão de obra e não garante a eficiência do procedimento. Com a utilização de tags RFID esse custo pode diminuir em torno de 36%. Na expedição são procedimentos fundamentais a verificação e a notificação, procedimentos parecidos com um inventário e com o uso do RFID pode ser melhorado em até 90% (Liu; Xu, 2009). De acordo com Liu e Xu (2009), o RFID em conjunto com uma reengenharia de processos de negócios permitiu uma melhora na qualidade do processo e da informação que é gerida pelo sistema de informação dos portos. Estudo apresentado por Sidén et al. (2011), explora a aplicação da tecnologia RFID em conjunto com sensores para o desenvolvimento de componentes onde seja possível a criação de um ambiente de cuidados médicos. Durante os estudos, foram utilizados chips passivos de NFC com saída para sensores que se comunicam através do padrão ISO 15693. Para fazer a leitura dos chips acoplados aos sensores foi utilizado um smartphone Google S Nexus. Vale ressaltar que qualquer dispositivo com Android e NFC pode ser utilizado para a leitura. Um servidor web foi utilizado para armazenar e exibir os dados coletados da leitura (SIDÉN et al., 2011). Anexando transmissores NFC e sensores em meio as bandagens permitiu a monitoração de algumas variáveis do campo médico. Um sensor anexo ao corpo do paciente permite a leitura da temperatura corporal apenas aproximando o leitor do sensor. Também é possível medir o nível do sangramento decorrente de uma cirurgia ou mesmo de um machucado com outro tipo de sensor. Um último tipo de sensor utilizado permitiu que a detecção de urina em fraldas 145 T.I.S. 2014; 3 (2): 144-150 Ederaldo de Oliveira Constantino, Vânia Paula de Almeida Neris muito utilizadas em hospitais e asilos (SIDÉN et al., 2011). O trabalho de Sidén mostra que a tecnologia NFC empregada no ambiente médico pode ajudar e auxiliar o controle do prontuário do paciente registrando todas as informações de acordo com um sensor específico em um servidor web (SIDÉN et al., 2011). Acessibilidade Segundo Broll et al. (2009), diferentes estudos mostram que a tecnologia NFC pode facilitar a interação entre dispositivos móveis e objetos físicos. No entanto, por ser um novo tipo de tecnologia os usuários necessitam de ajuda para compreender melhor o funcionamento. Os autores apresentam um estudo de caso sobre a capacidade de aprendizado e interação do usuário com a tecnologia NFC. Dois cartazes com soluções de design baseados em RFID foram montados e dispostos para testes (BROLL et al., 2009). No cartaz existem várias tags agrupadas por categorias, ou seja, existem tags que permitem selecionar o filme, tags para consultar o horário, tags para ver em quais cinemas o filme está passando e também o número de visitantes que já viram o filme (BROLL et al., 2009). Para testar a orientação dos objetos (tags) no cartaz foram criados dois cartazes com soluções de design diferentes. Ambos os cartazes possuem no canto superior direito uma tag chamada de "start-tag". A "start-tag" é utilizada para iniciar a aplicação no mobile. Quando acionada a aplicação uma tela com os nomes das categorias é apresentada em branco para ser preenchida de acordo com os dados do cartaz. (BROLL et al., 2009). A primeira solução "a" como é chamada, é composta por uma sequência numérica para direcionar a ordem das interações com o cartaz. Na solução "b" as categorias são organizadas na horizontal, da esquerda para a direita. No dispositivo móvel a aplicação utilizada para os testes foi a mesma nos dois casos (BROLL et al., 2009). Um grupo de quarenta pessoas testaram as soluções de design diferentes com o mesmo aplicativo mobile. Durante o teste foi avaliado o tempo para acionar a aplicação pela "starttag", o número de erros cometidos pelo usuário durante a interação (BROLL et al., 2009). Foram testadas soluções de design que tornassem a interação dos usuários com a aplicação mais fácil. As aplicações mobile aliadas com a tecnologia NFC podem causar algumas dúvidas sobre como interagir com a aplicação. O estudo realizado por Broll et al. (2009) testou algumas soluções de design para facilitar a interação do usuário com o NFC. Analisou o posicionamento da tag no cartaz junto de uma sinalização dos passos a serem seguidos para a utilização da aplicação. O emprego das tecnologias da informação e comunicação (TICs) na criação de ambientes que permitam o acesso de todas as pessoas vem a contemplar o que é registrado na legislação brasileira (BRASIL, 2003) que “dispõe sobre requisitos de acessibilidade de pessoas portadoras de deficiências, para instruir processos de autorização e de T.I.S. 2014; 3 (2): 144-150 reconhecimento de cursos, e descredenciamento de instituições”. O uso das TICs são ferramentas que superam as dificuldades garantindo o acesso de pessoas com deficiência aos materiais existentes na biblioteca da universidade (PUPO; BONILHA; CARVALHO, 2004). Como fruto do trabalho descrito por Pupo, Bonilha e Carvalho (2004), adequações foram feitas nos espaços de pesquisa universitária. O laboratório de Acessibilidade (Lab) foi inaugurado oficialmente em 2002, e é composto que vários grupos de pesquisadores da Unicamp. O laboratório é composto por dois ambientes, o primeiro é o ambiente de apoio didático composto por uma pedagoga e o segundo é composto por uma bibliotecária e uma sala de acesso a informação. Este ambiente foi pensado para promover acessibilidade, disponibilizar equipamentos, apoio didático, criar e disseminar novas ferramentas que contemplem a educação de usuários com necessidades especiais (PUPO; BONILHA; CARVALHO, 2004) Toda a infraestrutura do laboratório permitiu que fosse criado o projeto de Musicografia Braille. Este projeto foi desenvolvido dentro do programa de mestrado em música do instituto de artes da Unicamp. O objetivo do projeto é criar e implementar procedimentos que melhorem a transcrição de partituras para o Braille (PUPO; BONILHA; CARVALHO, 2004). Um ambiente adequado para receber a pesquisa contribuiu para a melhoria das experiências com ambientes inclusivos. As tecnologias da informação e comunicação permitiram a criação e divulgação de projetos para melhorar a acessibilidade das pessoas com as partituras (PUPO; BONILHA; CARVALHO, 2004) Com a análise dos trabalhos apresentados foi desenvolvido um aplicativo para auxiliar na identificação dos livros escritos em tinta para os deficientes visuais e dos livros em Braille para as pessoas que não têm deficiência visual. A questão da localização espacial da biblioteca também foi tratada neste aplicativo, para permitir que o usuário consiga localizar os livros e as estantes dentro da biblioteca. III. ABORDAGEM DE PESQUISA E TECNOLOGIAS UTILIZADAS A pesquisa foi dividida em duas etapas, o desenvolvimento de um aplicativo para o sistema operacional Android explorando seus recursos de NFC para a leitura das tags e iniciar a aplicação. Na segunda etapa o aplicativo foi apresentado e testado por duas professoras do Espaço Braille de São Carlos. O aplicativo desenvolvido utilizando a linguagem Java foi executado sobre o sistema operacional Android, presente no dispositivo utilizado para testes um Motorola razr d3 xt920. Segundo Graça (2012), a tecnologia NFC surgiu como um projeto para dispositivos móveis e foi criado pelas empresas Philips, Nokia e Sony, que unidas fundaram uma associação sem fins lucrativos chamada de NFC fórum. O NFC Fórum reúne hoje mais de 150 empresas dentre elas Google, PayPal, RIM, LG, American Express, Nokia, Samsung, Intel, NEC, Visa, Huawei e Qualcomm (INFOWESTER ,s.d.). O NFC é uma tecnologia de comunicação sem fios de alta 146 Acessibilidade em Bibliotecas: utilizando NFC e Smartphones para Auxiliar Deficientes Visuais na Identificação de Livros frequência com baixo alcance, que permite trocar informação entre dispositivos com a distância máxima 10 teórica de 10 centímetros, embora na realidade uma distância bastante mais curta seja necessária. É uma extensão à tecnologia de identificação de radio frequência (RFID), que implementa as 12 normas de cartões de proximidade ISO/IEC 14443 1e FeliCa 2” (GRAÇA, 2012, p. 25). De acordo com Graça (2012), as principais vantagens na utilização do NFC é o baixo alcance o que dificulta a interceptação, uma melhor percepção do usuário durante a interação, o usuário precisa apenas aproximar o dispositivo para que a interação ocorra e suas implementações suportam algoritmos de segurança. A Figura 1 apresenta um diagrama de funcionamento do NFC. São suportados três modos de funcionamento: emulação de cartão, Peer to Peer (P2P) e leitura/escrita utilizado na aplicação Eyelib. Os modos de funcionamento não funcionam juntos, cabendo ao sistema operacional do dispositivo a responsabilidade da troca pelo modulo necessário na interação. (GRAÇA, 2012). Figura 1. Arquitetura de alto nível de um dispositivo NFC (GRAÇA, 2012. P.26) No modo de funcionamento emulação de cartão, o dispositivo emula um cartão e permite a leitura de forma transparente pelo dispositivo leitor sem que ele perceba que o cartão não existe fisicamente. No modo de leitura/escrita seguindo as normas descritas no NFC Fórum é possível fazer a gravação de dados em tags passivas (sem bateria). No modo de funcionamento P2P, dois dispositivos estabelecem uma conexão e trocam informações entre si (GRAÇA, 2012). O cenário para o qual a aplicação foi desenhada é composto por uma biblioteca preparada para atender pessoas com deficiência visual. Nessa biblioteca, o piso foi pensado de modo a facilitar a locomoção dos usuários, uma professora especializada em auxiliar os usuários na questão geográfica da biblioteca está pronta para auxiliá-los na busca de algum item. Os livros estão todos em Braille e alguns computadores estão adaptados para serem utilizados contando inclusive com o auxílio de uma professora de informática especializada no atendimento de pessoas com deficiência. 1k 13.56mhz lc card. O desenvolvimento do aplicativo mobile é composto por seis activities, nome dado a uma classe Java no Android e elas são responsáveis pela navegação entre as telas, leitura das tags e interação do aplicativo. Uma classe modelo contendo os atributos do objeto livro e uma classe conversora responsável pela conversão dos dados que estão gravados na etiqueta para um objeto de domínio do aplicativo. A modelagem do aplicativo pode ser observada na Figura 2. IV. O APLICATIVO EYELIB Com o objetivo de auxiliar deficientes visuais foi desenvolvido um aplicativo mobile capaz de ler as tags RFID com informações tais como International Standard Book Number (ISBN), Título, Editora, País, Autor e Gênero de cada livro apresentando durante os testes. Fazem parte desta pesquisa também, além do software, um smartphone Motorola Razr D3 XT 920 com o sistema operacional Android 4.1.2 Jelly Bean onde o aplicativo foi instalado para os testes e um conjunto de tags RFID do modelo Mifare S50 Figura 2. Diagrama de classes A activity DetalheLivro é a principal activity e cabe a ela 147 T.I.S. 2014; 3 (2): 144-150 Ederaldo de Oliveira Constantino, Vânia Paula de Almeida Neris fazer a leitura da tag, e ler os cliques nos botões que disparam outras ações na aplicação. Ao iniciar o aplicativo, o que pode ser feito aproximando a tag do dispositivo, ocorre primeiro a leitura das informações gravadas na tag que são retornadas no formato de string, essa string é convertida em um objeto livro que é de domínio da aplicação e as informações são apresentadas na tela como mostra a Figura 3. O bean Livro é uma classe onde estão os atributos do livro e são isbn, título, autor, país, idioma e gênero está classe é populada com as informações que são recuperadas após a leitura da tag. A classe ConversorLivro livro trata a informação vinda da tag. Essas informações são recuperadas no formato string e estão formatadas utilizando o padrão JSON. Esta classe possui um método que é capaz de ler a string com as informações e utilizando-se da biblioteca GSON identificar os tipos de dados gravados na tag convertendo-os para um objeto livro de domínio da aplicação. No botão “Baixar áudio”, a activity AudioActivity é acionada e o download do áudio book é iniciado do servidor, onde os arquivos estão armazenados. Enquanto o download estiver em progresso, a activity não poderá ser encerrada, caso contrário, o download será cancelado no ponto até onde foi possível fazer o download do arquivo. Esta activity também pode passar pelas activities SucessoLivro no final do download ou pela ErroLivro caso o download encontre algum problema para iniciar ou ser concretizado. A terceira opção, o botão “Solicitar empréstimo”, aciona a bibliotecária para que ela prepare o empréstimo. Neste caso, o empréstimo corre pelos trâmites convencionais e pode ser utilizado por pessoas com deficiência ou não. Assim como nas activities anteriores após o sucesso da transação a activity SucessoLivro será chamada, e caso algum erro ocorra durante o processo a activity ErroLivro será exibida na tela. As informações do livro citadas acima foram gravadas nas tags utilizando-se do padrão JavaScript Object Notation (JSON). A escolha pelo padrão foi baseada na facilidade de manuseio e também por ser um padrão de fácil leitura por parte de máquinas e humanos. (JSON.org). Na Figura 4, podemos observar como as informações foram gravadas na tag. A biblioteca GSON é desenvolvida pelo Google e foi à responsável por fazer a conversão das informações do formato JSON para os tipos primitivos do Java utilizados e que posteriormente foram convertidos para um objeto de domínio da aplicação chamado livro. Figura 4. Modelo JSON utilizado nas tags Figura 3. Aplicação exibindo dados na tela Após a leitura da tela de detalhes são exibidos três botões permitindo assim que o usuário possa solicitar a versão em Braille, realizar o download o áudio do livro ou solicitar o empréstimo do livro de maneira convencional. O botão “Solicitar versão em Braille” aciona a activity BrailleActivity, onde o usuário é informado sobre a disponibilidade de empréstimo do livro. Nesta activity são possíveis dois caminhos, o SucessoLivro onde são exibidas as mensagens sobre os detalhes da retirada como data de retirada e data de devolução ou a activity ErroLivro onde será exibida uma mensagem informando que aquele livro não está disponível para empréstimo ou algum outro problema durante a transação. T.I.S. 2014; 3 (2): 144-150 Para a leitura e gravação de tags é necessário que o recurso de NFC esteja ativado no mobile, e também é necessário que tenha instalado um aplicativo especifico para fazer a gravação das tags. No caso deste trabalho o aplicativo escolhido para essa função de gravação das informações nas tags foi o Tag writter. O Tag writter é um aplicativo desenvolvido pela NXP SemiConductors capaz de ler, apagar, formatar ou gravar informações de vários tipos nas etiquetas. Para a sua instalação é necessário uma versão mínima ou superior a Android 2.3.3, e pode ser encontrado no Google Play (TAG WRITTER, s.d.). Para melhorar a acessibilidade das pessoas com deficiência e garantir o acesso ao aplicativo também foi instalado um software chamado Talkback, responsável pela leitura da tela e dos menus. O aplicativo vem configurado para a leitura de palavras e textos na língua inglesa deixando um sotaque durante a leitura. O TalkBack é um aplicativo desenvolvido pela Google Inc. e permite comentários falados para ajudar usuários com 148 Acessibilidade em Bibliotecas: utilizando NFC e Smartphones para Auxiliar Deficientes Visuais na Identificação de Livros deficiência visual ou dificuldades de leitura os requisitos mínimos variam de acordo com o dispositivo conforme informações da fabricante(TALKBACK, s.d.). A aplicação desenvolvida é acionada quando uma etiqueta que contenha dados é aproximada do dispositivo. Após a leitura ela carrega na tela as informações recuperadas da tag e fica a espera de um toque na tela para que a leitura seja feita. Ao tocar a tela do dispositivo ocorre a leitura do local tocado permitindo assim que o usuário identifique a funcionalidade. Caso o usuário deseje ouvir novamente um simples toque sobre a tela dispara a função de leitura que irá ler o conteúdo naquela área tocada, portanto, caso tenha interesse é só tocar na tela novamente que o dispositivo irá ler as informações quantas vezes for solicitado. Todas as funções apresentadas pelo aplicativo “Versão em Braille”, “Baixar o Áudio” e “Solicitar empréstimo” estão simuladas no próprio aplicativo mobile, ou seja, elas permitem uma simulação de um ambiente real onde o usuário teria uma comunicação com outro sistema no qual estariam armazenadas o áudio do livro e outras informações sobre os empréstimos e localização de cada livro na biblioteca. Alguns livros não possuem informações sobre eles escritas em outro formato (impresso em tinta), que não o Braille, na capa ou mesmo dentro do livro. E, de acordo com as professoras, com o aplicativo uma pessoa que não domine a leitura em Braille poderia facilmente consultar informações sobre o autor ou mesmo sobre o título da obra. Por meio do aplicativo, pessoas que não possuem deficiência visual nem o conhecimento sobre o Braille podem identificar os livros mesmo que esses estejam totalmente em Braille simplesmente aproximando o dispositivo dos livros. Com essa nova visão para o uso do aplicativo, uma nova função pode ser adicionada a sua documentação inicial. O aplicativo pode também auxiliar na questão da orientação espacial da biblioteca, que hoje é feita com marcações no chão para facilitar a locomoção dos deficientes, mas nenhuma marcação é feita nas estantes onde estão os livros. Por este motivo foi sugerido por parte das professoras uma nova funcionalidade para o aplicativo, onde o usuário pode identificar a estante e os gêneros literários que estão expostos naquela determinada estante além de poder identificar sua posição na biblioteca. V. AVALIAÇÃO POR ESPECIALISTAS Após o desenvolvimento do software foram gravadas três tags com as informações de livros para testes. Após os testes de mesa, uma das etapas abordadas na pesquisa foi a apresentação do aplicativo EyeLib no Espaço Braille de São Carlos que esta localizado junto da biblioteca pública municipal Amadeu Amaral. O Espaço Braille e é um espaço especializado para atender a pessoas com dificuldades visuais. A visita que foi realizada no dia 02 de Outubro de 2013, no período da manhã, e contou com a presença de duas professoras do Espaço Braille. No Espaço Braille, o aplicativo foi apresentado e ficou a disposição para testes por parte das duas professoras. Elas trabalham com deficientes visuais e são responsáveis por ajudá-los com orientações nas áreas de orientação geográfica, mobilidade, aulas de Braille e de informática. Logo após a apresentação e dos testes, as professoras e os pesquisadores conversaram livremente para a coleta de opiniões sobre a utilidade do aplicativo e sugestões de melhorias. De acordo com relatos das professoras, esta foi a primeira iniciativa que chegou ao conhecimento delas para facilitar o ambiente de uma biblioteca para pessoas com deficiência visual, aumentando a independência durante a escolha do livro. As tags possuem um curto alcance de leitura sendo necessário aproximar o dispositivo para que a leitura seja feita. No cenário da biblioteca, onde os livros estão agrupados e disponibilizados em estantes, o uso de tags no formato de cartões poderia exigir a remoção parcial ou completa do livro da estante em que ele está alocado, o que não é desejado pela biblioteca. Deste modo, uma das professoras sugeriu o uso de tags menores, a serem colocadas nas dobras externas dos livros para evitar a necessidade de remoção das obras. Durante os testes, uma das professoras identificou uma nova funcionalidade para o aplicativo. VI. ANÁLISE CRÍTICA Durante as pesquisas ficou evidente que a aplicação da tecnologia na melhoria da acessibilidade de ambientes ainda é uma novidade e existe um campo muito grande de possiblidades a serem pesquisados. Os custos de implantação do produto para tornar o ambiente pervasivo é uma questão a ser considerada, devemos contar o custo do aparelho que deve possuir como requisito o recurso de NFC, e o custo das etiquetas que permitem a identificação do livro. Com o tempo, a tendência é que os custos do smartphone, em torno de R$ 650,00, e da tag, em média R$ 3,00 por unidade, diminuam e fiquem mais acessíveis. Os resultados obtidos com a pesquisa sugerem que a tecnologia desenvolvida pode auxiliar a diminuir as barreiras impostas pela deficiência. Criou-se um sistema computacional que pode ser usado por pessoas com deficiência durante a busca por um livro em uma biblioteca. A acessibilidade do usuário também pode ser melhorada permitindo que ele tenha acesso a mais detalhes sobre a obra, e sua disposição no acervo. A tecnologia aplicada a este trabalho permitiu a criação de um ambiente onde o usuário pode realizar uma busca pelo livro desejado com mais autonomia e segurança. De posse de um smartphone com os recursos de NFC e leitor de tela ativado, espera-se que o usuário possa percorrer as estantes da biblioteca e escolher o livro desejado. A pesquisa não foi testada por usuários finais com deficiência visual, mas contou com a análise de duas professoras especializadas em atender deficientes visuais no Espaço Braille de São Carlos. A colaboração delas foi essencial para a melhoria e adequação das funções do software garantindo assim que o aplicativo possa ajudar o máximo possível aos usuários. VII. CONCLUSÃO E TRABALHOS F UTUROS 149 T.I.S. 2014; 3 (2): 144-150 Ederaldo de Oliveira Constantino, Vânia Paula de Almeida Neris Este trabalho abordou o uso da tecnologia no ambiente de uma biblioteca criando um ambiente onde fosse possível a interação dos usuários com os livros visando melhorar a acessibilidade de pessoas com deficiência visual durante a busca por livros. A tecnologia avança todos os dias e é importante que ela seja empregada na melhoria da qualidade de vida dessa parcela da população que não recebe muita atenção por parte do governo. Durante a pesquisa pudemos constatar que o processo de desenvolvimento de um software para pessoas com deficiência não é diferente do processo de desenvolvimento de um software de uso geral, onde o feedback colhido com o cliente e/ou especialistas pode representar o sucesso ou fracasso do projeto. Por fim, este artigo colaborou com a demonstração de que a tecnologia NFC pode ajudar pessoas com deficiência visual a interagirem em uma biblioteca transformada em um ambiente pervasivo. Como trabalhos futuros, a aplicação da tecnologia NFC pode ser adotada em outros ambientes atendendo outras necessidades de pessoas com deficiência. Também podem ser explorados estudos sobre a disposição das tags de forma a melhorar a interação do usuário com o sistema. AGRADECIMENTOS Os autores agradecem às professoras do Espaço Braille de São Carlos que gentilmente colaboraram com a realização deste trabalho. REFERÊNCIAS BRASIL. Ministério da Fazenda. 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