Baixar - PPEC - Universidade Federal da Bahia
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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHA ESCOLA POLITÉCNICA MESTRADO EM ENGENHARIA AMBIENTAL URBANA GERALDO BEZERRA ARAÚJO RECOMENDAÇÕES PARA MELHORIA TECNOLÓGICA DA VEDAÇÃO VERTICAL EM TÉCNICA MISTA EM HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL: UM ESTUDO DE CASO NO BAIRRO DO ALEGRE EM SÃO SEBASTIÃO DO PASSÉ SALVADOR 2007 UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHA ESCOLA POLITÉCNICA MESTRADO EM ENGENHARIA AMBIENTAL URBANA GERALDO BEZERRA ARAÚJO RECOMENDAÇÕES PARA MELHORIA TECNOLÓGICA DA VEDAÇÃO VERTICAL EM TÉCNICA MISTA EM HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL: UM ESTUDO DE CASO NO BAIRRO DO ALEGRE EM SÃO SEBASTIÃO DO PASSÉ Dissertação apresentada ao Mestrado em Engenharia Ambiental Urbana da Escola Politécnica da Universidade Federal da Bahia, como requisito para obtenção do grau de mestre. Orientador: Prof. Dr. Emerson de Andrade Marques Ferreira Co-Orientador: Prof. Dr. Sandro Fábio César SALVADOR 2007 A663 Araújo, Geraldo Bezerra Recomendações para melhoria tecnológica da vedação vertical na técnica mista destinada em habitação de interesse social: um estudo de caso no bairro do Alegre em São Sebastião do Passé / Geraldo Bezerra Araújo – Salvador, 2007. 206 f Orientador: Prof. Dr. Emerson de Andrade Marques Ferreira Co-Orientador: Prof. Dr. Sandro Fábio César Dissertação (mestrado) – Universidade Federal da Bahia. Escola Politécnica, 2007. 1. Habitação popular – Casa de técnica mista. 2. Política habitacional. I Título CDU 728:332.83 Dedico este trabalho a minha família: aos meus filhos Chico, Dany e Lucas; a minha neta Malu; aos meus pais Francisco Assis (in memória) e Nazareth; aos meus irmão Gláucia e Beto; aos meus primos pais Antônio Ivo e Lila; e a minha nova companheira Ana Lúcia e suas filhas Aline e Daniela. Agradecimentos São muitos e todos especiais... A Deus por me fazer existir e ter permitido avançar na construção do conhecimento. A minha família: aos meus filhos Chico, Dany e Lucas; a minha neta Malu; aos meus pais Francisco Assis (in memória) e Nazareth; aos meus irmão Gláucia e Beto; aos meus primos pais Antônio Ivo e Lila; e a minha nova companheira Ana Lúcia e suas filha Aline e Daniela, pela contribuição que cada um teve e tem em minha vida. Aos professores Emerson de Andrade Marques Ferreira e Sandro Fábio César, respectivamente orientador e co-orientador, pela presença fundamental, paciência, dedicação e incentivo. Aos professores designados pelo MEAU para examinar este trabalho, pela disponibilidade e relevantes contribuições, na pessoa de Dr. Emerson de Andrade Marques Ferreira, Dr. Sandro Fábio César, Dr. Roberto Bastos Guimarães, Dr. Ricardo Fernandes de Carvalho e Dr. Almir Sales. Ao Prof. Dr. Virgolino Ferreira Jorge pela acolhida na Universidade de Évora e orientação de minha investigação em Portugal, juntamente com as arquitetas Dra. Maria Fernandes e Dra. Mariana Correia. Aos demais colegas e amigos da Universidade de Évora, pelo acolhimento, apoio e troca de experiências, nas pessoas da Profa. Dra. Marízia Menezes Ferreira, Profa. Dra.Maria do Céu Tereno, Profa. Dra. Sofia Capelo, Prof. Dr. Manuell Mascarenhas e dos técnicos administrativos António Galvoeira, Maria Elisa, Joaquina Mira, Maria da Conceição Charrua, Maria Manuela Serrano e Maria Etelvina Balsinha. Aos professores e amigos do MEAU, onde mais uma vez esteve a contribuir o Prof. Dr. Roberto Bastos Guimarães, Prof. Dr. Luiz Roberto Moraes, Prof. Dr. Luiz Aníbal de Oliveira Santos, Profa. Dra. Viviane Zanta, Prof. Dr. Sandro Lemos Machado, Prof. Dr. Wellington C. Figueredo, Profa. Dra. Ilce Marília Dantas Pinto, Prof. Dr. Juan Moreno, e Prof. Dr. Artur Caldas pela presteza em contribuir com a descoberta de novos caminhos. Aos demais professores do Mestrado em Engenharia Ambiental Urbana, pela dedicação e forma de fomentar em nós estudantes a vontade de cada vez mais aprender. Ao Laboratório de Geotecnia da Escola Politécnica da UFBA, na pessoa do Coordenador Prof. Dr. Luiz Edmundo, do Pesquisador e Mestre Paulo Burgos e de toda a equipe técnica, pelos ensaios de caracterização do solo existente na área de estudo, objeto desta pesquisa. Aos colegas e amigos, professores da UFBA, Arivaldo Leão de Amorim, Adailton Gomes, e Alberto Oliviere pelo apoio e incentivo no decorrer deste trabalho. À professora Maria Lenise Silva Guedes, Curadora do Herbácio Alexandre Costa Leal – UFBA, pela gentileza de identificar a espécie de bambu existente em São Sebastião do Passé. Aos professores Roberto Cardoso e Artur Caldas, Coordenador e Vice Coordenador do Mestrado em Engenharia Ambiental Urbana, pela forma competente de conduzir as atividades do mestrado. Aos amigos do Bureau de Serviços da FAUFBA Jorge Getúlio de Jesus, Ricardo Armando, Carlos Eduardo e Tainan Armando Conceição de Jesus pelo apoio e presteza nas horas de sufoco. Às pesquisadoras Sueli Guimarães e Célia Neves pela contribuição em informar e colaborar com as pesquisas deste trabalho. Aos colegas do mestrado José Araújo (Divino), Alzira (Princesa), Patrícia (Patepatoca), Anderson (Floquinho), Jairo (El Conquistador), Lúcia (Mãe de Pedro), Marco Antônio (O Professor), Nelson (Pãozinho da mamãe) e Virgínia (Virge) pelos momentos de estudo, lazer e de incentivo nas horas amargas. À Selma Borges de Paula pelo trabalho de revisão desta dissertação. À comunidade do bairro do Alegre, em São Sebastião do Passé pela forma sempre acolhedora durante os trabalhos de campo. RESUMO Este trabalho estuda a vedação vertical em técnica mista para habitação de interesse social, também conhecida no Brasil como pau-a-pique, taipa de mão, taipa de sopapo, ou simplesmente taipa, entre outras denominações. O trabalho foi desenvolvido apoiado na metodologia estabelecida, onde teve como base a revisão bibliográfica e o estudo de caso. A revisão bibliográfica contemplou o estudo e análise sobre a técnica mista e a técnica mista estruturada com bambu. O estudo de caso foi realizado no bairro do Alegre em São Sebastião do Passé, onde foram levantados dados sobre o perfil sócio-econômico da população da área de estudo, sobre a forma como a mesma constrói sua habitações em técnica mista e sobre os materiais utilizados. Por fim, discutiu-se, avaliou-se e foram feitas recomendações, buscando melhorias tecnológicas para o melhor desempenho da vedação vertical do atual sistema construtivo. Além das recomendações referentes às melhorias tecnológicas da vedação vertical, recomendou-se a substituição da madeira pelo bambu nas peças do entramado, visto ser o mesmo material adequado e ambientalmente mais correto. Palavras-chave: Habitação popular – Taipa; Técnica Mista; Bambu; Política habitacional ABSTRACT This study covers the vertical water sealing of the wattle and daub building technique used in low cost housing. Based on the conventional approach, it is composed of a bibliographical review and a case of study. The bibliographical review comprehends studies and analysis about the common wattle and daub and the structured on bamboo wattle and daub building techniques. The case of study was performed in Alegre, São Sebastião do Passé – Bahia – Brazil, where data concerning the social-economical BACKGROUND OF THE POPULATION, THE METHODS THEY USE IN BUILDING THEIR WATTLE AND DAUB EDIFICATIONS AND THE USED MATERIAL WAS COLLECTED. After discussing and evaluating wattle and daub as a building system, recommendations concerning technological improvements are made and it`s suggested the use of bamboo as the structure, instead of other types of wood that are conventionally used. Keywords: low cost housing; wattle and daub tecnique; bamboo; urban politics. LISTA DE FIGURAS Figura 01 – Habitação urbana em Pilar, Paraguai 30 Figura 02 – Detalhe da habitação urbana em Pilar, Paraguai 30 Figura 03 – Detalhe da habitação urbana em Pilar, Paraguai 31 Figura 04 – Técnica mista sobre o térreo na Rua do Castelo, Lamego, Portugal 34 Figura 05 – Edificações em técnica mista sobre o térreo, em Lamego, Portugal 35 Figura 06 – Técnica mista revestida com chapas de zinco em Tarouca, Portugal 36 Figura 07 – Técnica mista revestida com lousas em Guarda, Portugal 37 Figura 08 – Técnica mista revestida com lousas na Aldeia de Salzedas, Portugal 37 Figura 09 – Técnica mista sobre pavimento térreo em Covilã, Portugal 38 Figura 10 – Construção em técnica mista, marca da imigração japonesa, em Mogi das Cruzes, SP 40 Figura 11 – Técnica mista no bairro do Alegre, em São Sebastião do Passé, Bahia, Brasil 43 Figura 12 – Técnica mista sobre o solo em Salvador, Bahia, Brasil 44 Figura 13 – Técnica mista revestida e pintada, no Povoado Moreira, Palmeira dos Índios, Alagoas, Brasil 45 Figura 14 – Contraventamento do entramado em Portugal 48 Figura 15 – Vista geral do Taj Mahal 57 Figura 16 – Edificação em bambu, com painéis monolíticos argamassados, em Maceió, Alagoas 58 Figura 17 – Edificação em bambu, com painéis em microcroncreto, em Maceió, Alagoas 59 Figura 18 – Edificação em bambu, com painéis em microcroncreto, em Maceió, Alagoas 60 Figura 19 – Bambu impermeabilizado com garrafas plásticas 61 Figura 20 – Memorial da Cultura Indigena, Campo Grande - MS 61 Figura 21 – Partes e sub-partes do bambu 63 Figura 22 – Rizoma leptomorfo 63 Figura 23 – Rizomas leptomorfos, paquimorfos e metamorfo (o N° 5) 64 Figura 24 – Bambu a 1 km de São Sewbastião do Passé 66 Figura 25 – Mapa do Estado da Bahia, localizando São Sebastião do Passé 90 Figura 26 – Foto aérea de São Sebastião do Passé 91 Figura 27 – Mapa geral de São Sebastião do Passe – localização da poligonal de estudo 92 Figura 28 – Mapa da poligonal destacando as edificações 93 Figura 29 – Poligonal de estudo destacando as 96 casas em técnica mista 94 Figura 30 – Foto referente à retirada da primeira amostra de solo 98 Figura 31 – Carta de plasticidade dos 3 solos naturais da primeira etapa 102 Figura 32 – Foto referente à retirada da amostra do solo 1A 104 Figura 33 – Foto referente à retirada da segunda amostra de solo 105 Figura 34 – Foto referente à retirada da terceira amostra de solo 105 Figura 35 – Carta de plasticidade dos solos naturais das duas etapas e dos solos Misturados 107 Figura 36 – Conjunto das bolas após secagem e ampliação das bolas dos solos 1A e 2A 110 Figura 37 – Bolas ampliadas dos solos 3A, 3A.1, 3A.2 e 3A.3 111 Figura 38 – Bolas ampliadas dos solos 3A.4, 3A.5 e 3A.6 e 3A.7 Figura 39 – Bola do solos 3A.8 Figura 40 – Bambu a 1 km de São Sebastião do Passé Figura 41 – Bambu a 2 km de São Sebastião do Passé Figura 42 – Bolor na Casa 7 do bairro do Alegre, em São Sebastião do Passé Figura 43 – Técnica mista deteriorada no bairro do Alegre, em São Sebastião do Passé Figura 44 – Casas em técnica mista no bairro do Alegre, em São Sebastião do Passé Figura 45 – Técnica mista deteriorada no bairro do Alegre, em São Sebastião do Passé Figura 46 – Técnica mista deteriorada no bairro do Alegre, em São Sebastião do Passé Figura 47 – Ampliação destacando a umidade que degrada o solo de fechamento e as varas Figura 48 – Técnica mista deteriorada no bairro do Alegre, em São Sebastião do Passé Figura 49 – Paramento vertical escorado (habitação em via de tombamento) Figura 50 – Peças do enchimento com seções diferentes Figura 51 – Paramento vertical destacando a falta de modulação entre as peças Figura 52 – Paramento vertical destacando o solo da primeira amostra Figura 53 – Paramento vertical destacando o solo da segunda amostra Figura 54 – Paramento vertical destacando o solo da terceira amostra Figura 55 – Paramento vertical destacando a falta de recobrimento das varas Figura 56 – Paramento vertical destacando a falta de recobrimento das varas Figura 57 – Vedação vertical destacando a deteriorização do reboco Figura 58 – Vedação vertical destacando a deteriorização do reboco Figura 59 – Vedação vertical totalmente pintada, externa e internamente Figura 60 – Vedação vertical parcialmente pintada, apenas a fachada principal Figura 61 – Vedação vertical sem reboco e sem pintura externa e interna Figura 62 – Cobertura em telha cerâmica de olaria Figura 63 – Cobertura em telha cerâmica de olaria Figura 64 – Padrão das esquadrias na vedação vertical Figura 65 – Padrão das esquadrias na vedação vertical 112 113 128 128 133 134 135 137 138 138 140 141 142 143 145 145 146 147 147 150 150 153 154 154 156 156 158 158 LISTA DE TABELAS Tabela 01 – Total das construções na poligonal Tabela 02 – Habitantes nas construções em técnica mista Tabela 03 – Situação de ocupação dos chefes de família Tabela 04 – Renda familiar Tabela 05 – Caracterização do solo da primeira etapa Tabela 06 – Plasticidade dos solos da primeira etapa Tabela 07 – Atividades dos solos da primeira etapa Tabela 08 – Caracterização do solo da segunda etapa Tabela 09 – Plasticidade dos solos da 1ª. e 2ª. etapas Tabela 10 – Classificação dos solos segundo o USCS Tabela 11 – Atividades dos solos da 1ª. e 2ª. etapas Tabela 12 – Solos possíveis de recomendação para a taipa de mão Tabela 13 – Teste das bolas: avaliação visual das fissuras Tabela 14 – Solos possíveis de serem usados na taipa de mão, conforme os testes expeditos e os resultados do laboratório Tabela 15 – Tempo de construção das habitações Tabela 16 – Construções reformadas e ampliadas Tabela 17 – Área construída das habitações Tabela 18 – Situação de revestimento das habitações Tabela 19 – Situação da pintura das habitações Tabela 20 – Material de cobertura das habitações Tabela 21 – Número de águas das coberturas Tabela 22 – Habitações com instalação elétrica Tabela 23 – Situação de telefonia nas habitações Tabela 24 – Situação de instalação de água nas habitações Tabela 25 – Situação de instalação de esgoto nas habitações Tabela 26 – Estado de conservação das habitações Tabela 27 – Nível de satisfação dos moradores Tabela 28 – O uso do bambu no universo de amostragem 94 95 96 96 99 100 102 106 107 108 108 109 113 114 115 116 116 117 117 118 118 119 119 120 120 121 122 123 SUMÁRIO 1. 1.1 1.2 1.3 1.3.1 1.3.2 1.4 1.5 INTRODUÇÃO Contextualização Problema Objetivos Objetivo geral Objetivos específicos Justificativa Estrutura da dissertação 15 18 19 20 20 21 21 23 2. 2.1 2.1.1 2.1.2 2.1.3 2.1.4 2.1.5 2.2 2.3 2.3.1 2.3.2 2.4 TÉCNICA MISTA Algumas formas de construir a técnica mista No Japão No Equador No Paraguai Em Portugal A técnica mista no Brasil A estrutura e o entramado na técnica mista O solo par o uso na técnica mista Retirada da amostra e teste para uso do solo mais adequado Correção do solo par a técnica mista Recomendações para execução da técnica mista 25 26 26 27 29 32 39 46 48 49 51 53 3. TÉCNICA MISTA ESTRURURADA COM BAMBU 3.1 O bambu como material de construção 3.2 Bambu: classificação, distribuição geográfica e espécies 3.3 Tipos de bambu mais usados na construção 3.4 Tratamento do bambu 3.4.1 Tratamentos naturais 3.4.1.1 Cura 3.4.1.2 Secagem 3.4.2 Tratamento químico preservativo 56 57 62 65 66 68 68 69 70 4. 4.1 4.2 4.3 4.3.1 4.3.2 4.3.3 4.4 4.4.1 4.4.2 4.4.3 4.4.4 73 73 74 74 74 75 76 77 79 84 85 METODOLOGIA Delimitação da pesquisa Identificação das variáveis Estágios da pesquisa Estágio de revisão bibliográfica Estágio de investigação sobre a utilização atual da técnica mista Estágio do estudo de caso Estudo de caso Fase preparatória Coleta de evidências O método Análise das evidências 4.4.5 Construção do relatório 88 5. ESTUDO DE CASO 5.1 O bairro do Alegre 5.1.1 Casas em técnica mista e casas em alvenaria na poligonal de estudo 5.1.2 Habitantes no universo de amostra das 24 casas 5.1.3 Ocupação dos chefes de família no universo de amostragem 5.1.4 Renda familiar no universo de amostragem 5.2 Dados referentes à técnica mista atual em São Sebastião do Passé 5.2.1 O solo local 5.2.2 Informações sobre as construções 5.2.2.1 Tempo de construção das habitações 5.2.2.2 Habitações reformadas ou ampliadas 5.2.2.3 Área das habitações 5.2.2.4 Situação de revestimento das habitações 5.2.2.5 Situação da pintura das habitações 5.2.2.6 Material de cobertura 5.2.2.7 Número de águas das coberturas 5.2.2.8 Habitações com instalações elétricas 5.2.2.9 Situação de telefonia das habitações 5.2.2.10 Situação de instalação de água potável 5.2.2.11 Situação de instalação de esgoto 5.2.2.12 Estado de conservação das 96 habitações em técnica mista da área de estudo 5.2.2.13 Nível de satisfação dos moradores das casas de técnica mista 5.2.2.14 O uso do bambu no universo de amostragem 5.3 O atual sistema construtivo da técnica mista em São Sebastião do Passé 5.3.1 Subsistema de fundação e estrutura 5.3.2 Subsistema de paredes 5.3.2.1 Entramado 5.3.2.2 Barreamento 5.3.2.3 Reboco 5.3.2.4 Pintura 5.3.3 Subsistema coberturas 5.3.4 Subsistema esquadrias 5.3.5 Subsistema pisos 5.3.6 Subsistema instalações 5.3.6.1 Instalações elétricas 5.3.6.2 Instalações telefônicas 5.3.6.3 Instalações de água potável 5.3.6.4 Instalações de esgoto sanitário 5.4 O bambu existente em São Sebastião do Passé 90 91 93 94 95 96 97 97 115 115 116 116 117 117 118 118 119 119 120 120 121 122 122 123 123 124 124 125 125 126 126 127 127 127 127 127 128 128 128 6. 6.1 6.2 6.3 6.4 130 135 136 144 DISCUSSÕES, AVALIAÇÕES E RECOMENDAÇÕES Sobre a drenagem Sobre a estrutura e o entramado Sobre o solo Sobre o reboco 6.5 6.6 6.7 6.8 Sobre a pintura Sobre a cobertura Sobre as esquadrias Síntese das discussões, avaliações e recomendações 152 155 157 159 7. 7.1 CONCLUSÕES Recomendações para trabalhos futuros 161 164 REFERÊNCIAS Referências citadas Referências consultadas 165 165 170 APÊNDICE 176 ANEXOS Anexo 1: Espécies de bambu nativas do Brasil e espécies originárias de outros países e cultivadas no Brasil Anexo 2: Confirmação da espécie de bambu existente em São Sebastião do Passe Anexo 3: Resultados dos ensaios de caracterização do solo Anexo 4: Mapa da poligonal de estudo destacando as casas em técnica mista 184 184 195 197 205 15 1. INTRODUÇÃO A partir do desenvolvimento industrial, a habitação de interesse social tem sido um problema a atingir países em desenvolvimento. Habitar é para o ser humano condição básica de sobrevivência. Não apenas os grandes centros urbanos que crescem e se modernizam sem, no entanto, resolverem o problema habitacional, como também, os pequenos centros urbanos trazem em seus arredores a marca da pobreza, da precariedade de habitação e da falta de qualidade de vida no país. Os problemas relacionados com o desequilíbrio ambiental e a sustentabilidade têm sido na atualidade uma preocupação em relação ao futuro do nosso planeta e à oferta de materiais para as futuras gerações. Usar materiais que consumam menor energia no processo de produção e que garantam seu uso para as próximas gerações é meta fundamental a ser seguida na atividade de construção. Para tanto, o uso de técnicas construtivas que utilizem materiais renováveis e de pouco consumo energético na sua produção se faz necessário. As técnicas de construção, com terra, são até hoje, no mundo inteiro, uma forma de edificar de modo seguro e saudável, utilizando matérias que existem em abundância, causando os menores problemas em termos de desequilíbrio ambiental e de consumo em relação às necessidades das gerações futuras. Entre as técnicas de construção com terra, duas se destacam entre os brasileiros, com exemplares executados desde os tempos do Brasil colônia: a taipa de mão (que aqui passa a ser denominada de “técnica mista”) e a taipa de pilão. A denominação técnica mista é bastante recente. Foi adotada pelo PROTERRA, Projeto internacional e multilateral, de cooperação técnica, que enfoca a transferência de tecnologia de construção com solo aos setores produtivos e às políticas sociais dos países ibero-americanos. Na apresentação do livro “Técnicas Mixtas de Construcción com Tierra”, Neves (2003) apresenta a 16 nova denominação de técnica mista para o sistema construtivo conhecido no Brasil como taipade-sopapo, taipa de mão, pau-a-pique, barro armado, entre outros, ou simplesmente taipa. Na Argentina esta técnica recebe o nome de quincha; na Colômbia e em outros países da América do Sul é denominada de bahareque; em Portugal, de tabique; na França, de torchis; e, no meio técnico, de entramado. São Sebastião do Passé, município do Estado da Bahia, possuía segundo o IBGE, senso de 2000, 39.960 habitantes, dos quais, 29.550 (73,95%) estavam na sede e 10.410 (26,05%) na área rural. Trata-se de uma cidade de porte pequeno que, mesmo assim, possui na periferia a marca da pobreza, com habitações precárias, nível de segurança e habitabilidade a desejar. Uma parte significativa dessas habitações foram construídas com técnica mista, sistema construtivo que tem como matéria prima principal o solo e a madeira, porém, as construções com esta técnica existentes no local de estudo, não atendem às principais recomendações relativas aos cuidados necessários às construções com terra, motivo pelo qual a quase a totalidade delas está em estado de degradação. Dentro deste contexto, o que fazer para se modificar este contexto ? A técnica mista sempre esteve presente na arquitetura brasileira, no campo e nas cidades, sendo que ultimamente a maior parte está na zona rural. A baixa qualidade com que é executada atualmente esta técnica, assim como a falta de seleção dos materiais utilizados, associadas ao preconceito que se formou em relação às casas construídas com esta técnica contribui para desestimular o seu uso. Tanto assim que o status atribuído à casa de alvenaria é o de “casa pra toda vida”, enquanto que a casa de técnica mista está associada à “casa de interesse social”, à “casa de baixo custo” ou à “casa para pobre”. 17 Melhorar a casa de técnica mista do ponto de vista técnico é avançar, contribuindo com grande parcela da sociedade que poderá desfrutar de uma moradia com melhor conforto, mais segura e mais saudável. A partir destas colocações, pretende-se neste trabalho estudar a construção em técnica mista, enfocando a vedação vertical, de modo a buscar alternativas de melhoramento tecnológico e ambiental. Assim, o objeto desse estudo é a técnica mista, tendo como objetivo avaliar e fazer recomendações para melhoria tecnológica da vedação vertical da mesma, através de um estudo de caso no bairro do Alegre em São Sebastião do Passé. No bairro do Alegre, em São Sebastião do Passe, a técnica mista tem como materiais principais o solo e a madeira. Boa parte da madeira utilizada nesta técnica no bairro do Alegre em São Sebastião do Passe, apresenta, segundo informações dos usuários, tempo de vida útil de aproximadamente apenas 2 anos, devido principalmente à má qualidade das peças estruturais, o que compromete a sua durabilidade, a rigidez da construção e a vedação vertical. Isto, devido a dois fatores: primeiro, o emprego de madeira jovem, ou seja, constituída apenas de alburno que é susceptível ao ataque de fungos apodrecedores; segundo, o uso de madeira adulta, porém de baixa resistência biológica a esses agentes xilófagos. Estudar, analisar, diagnosticar e propor a melhoria tecnológica da vedação vertical da técnica mista, visando oferecer aos usuários da mesma soluções de menor custo, maior vida útil, saudável e segura, contribuindo para uma melhor qualidade de vida dos seus usuários, é a contribuição almejada neste trabalho. 18 1.1 CONTEXTUALIZAÇÃO Os atuais problemas, como pobreza e desequilíbrio do meio ambiente, são desafios que a humanidade precisa administrar. No planeta terra, já em 1992, segundo a Agenda 21 (1998, Capítulo 7, item 7.6) estimava-se que pelo menos 1 bilhão de pessoas não dispunham de habitações seguras e saudáveis. Este indicador requer ações estruturadas, envolvendo estratégias capazes de apontar para um desenvolvimento sustentável. A Agenda 21 (1998, capítulo 7, item 7.9), onde o documento global trata da “Promoção do Desenvolvimento Sustentável dos Assentamentos Humanos”, considera entre as oito áreas de programas, uma destinada ao oferecimento de habitações adequadas para todos, e, outra, destinada à promoção de atividades sustentáveis na indústria da construção civil. Nas áreas rurais, e mesmo urbanas, de todas as regiões tropicais e subtropicais do mundo, os materiais de construção mais antigos e importantes são o solo, a madeira e o bambu. Quando combinados formam a técnica mista ou taipa de pau-a-pique. Para Houben e Guillaud (1994) a “terra crua” (solo sem cozimento) é sem dúvida um dos materiais de construção mais usados no mundo. Segundo Dethier (1982) e Celestino (1994), na atualidade, um terço da população global habita construções de “terra crua”, e afirmam existirem evidências de que o solo, como material de construção, data do final do Período Neolítico. No entanto, o advento dos materiais industrializados contribuiu significativamente para o abandono das técnicas tradicionais, refletindo-se, inclusive na área de ensino, onde, apenas as construções de monumentos históricos são tratadas em nível de revitalização. Para Segawa (1988), o solo e a madeira são tratados apenas em aulas de técnicas construtivas tradicionais, ou são desprezados, como símbolo de arcaísmo e precariedade. Iglesias (1993) entende que o maior desafio para o uso das “construções com terra” é puramente subjetivo. Tratase do preconceito generalizado que associa as obras de prestígio às técnicas com materiais 19 modernos, definindo as construções com solo como precária e símbolo de baixo status social. A construção de solo sem cozimento foi muito utilizada aqui no Brasil no período colonial, porém, como em outros países, com o advento de outros materiais de construção, aos poucos foi sendo abandonada. Bardou e Arzoumanian (1979, p. 32) afirmam que na Europa após a segunda guerra mundial, com o surgimento de novos materiais de construção, também, a construção com solo foi sendo substituída. Mais recente, alguns programas internacionais, como o CYTED – Programa Ibero-americano de Ciência e Tecnologia para o Desenvolvimento, o Subprograma XIV Habitações de Interesse Social - HABYTED e o Projeto XIV.6 PROTERRA, ambos do CYTED, têm desenvolvido ações que visam divulgar, avançar tecnologicamente e aplicar o conhecimento disponível sobre o uso do solo, principalmente para habitações de interesse social. Entre outras ações, dão apoio técnico às instituições promotoras de programas de construção. Estudar esta técnica, e em particular a vedação vertical da mesma, buscando implementar melhorias através de recomendações tecnológicas, é considerado como contribuição significativa desta pesquisa. As recomendações para melhoria tecnológica buscam evitar uma vedação vertical que abrigue insetos como o barbeiro, o que acontece atualmente na maioria das habitações pesquisadas. Procura também, resolver o problema de apodrecimento da trama pela umidade, quer na parte de contato direto com o solo, quer nas partes elevadas. Busca também, outros ganhos apresentados no capítulo referente às recomendações para melhorias tecnológicas. 1.2 PROBLEMA A busca de soluções ambientalmente sustentáveis é na atualidade uma preocupação para toda a humanidade. As reservas ambientais ficam mais escassas a cada dia comprometendo o uso para as gerações futuras. A indústria da construção é responsável por significativa parcela de 20 desequilíbrio ambiental, precisando urgentemente encontrar alternativas construtivas ambientalmente sustentáveis. Faz-se necessário, analisar técnicas construtivas tradicionais executadas com a participação da comunidade, nas quais, o processo de produção dos materiais de construção e o método construtivo propiciavam um consumo energético bem menor, existindo um equilíbrio entre a forma de construir e o meio ambiente. A busca de materiais renováveis a curto, médio e longo prazos, a avaliação de problemas existentes na atual forma de se construir a vedação vertical, em especial problemas de natureza tecnológica e as recomendações para solução dos mesmos, é o que se persegue nesta dissertação. Diante do exposto, pergunta-se: a) como avaliar o modo de construção atualmente utilizado para as vedações verticais em técnica mista, no bairro do Alegre em São Sebastião do Passé ? e b) quais as melhorias tecnológicas que poderão ser introduzidas no sistema construtivo atual das vedações verticais em técnica mista, no bairro do Alegre, em São Sebastião do Passé ? 1.3 OBJETIVOS 1.3.1 Objetivo geral Avaliar o modo atualmente empregado para construção da vedação vertical em técnica mista destinada a habitações de interesse social em São Sebastião do Passé, considerando-se o perfil econômico da população, o tipo de solo, o uso e condições da madeira, o acabamento e a proteção contra umidade e propor recomendações para melhoria tecnológica da mesma. 21 1.3.2 Objetivos específicos definir uma área na malha urbana de São Sebastião do Passé, onde existam construções em técnica mista e avaliar o modo de se construir atualmente as vedações verticais das mesmas; estudar e diagnosticar o perfil econômico da população, o tipo de solo, o uso e condições da madeira usada e a proteção contra a umidade; e recomendar melhorias tecnológicas para o método construtivo das atuais vedações verticais em técnica mista, a partir do estudo de caso realizado na área definida. 1.4 JUSTIFICATIVA Várias são as razões que justificam a escolha do tema e do local de realização do estudo de caso: o tema refere-se à habitação de interesse social, cuja demanda tende a aumentar a cada dia, em cada munícipio, em cada estado e em cada país. Já em 1992 estimava-se um déficit de habitação de interesse socal para 1 bilhão de pessoas. A técnica construtiva estudada sobrevive em nosso país desde a colonização, utilizando o “saber fazer” dos usuários, precisando no entanto de atualizações tecnológicas para sua melhoria. A escolha da cidade de São Sebastião do Passé deuse devido à existência de técnica mista em sua área urbana e à relativa proximidade de Salvador, sendo o bairro do Alegre eleito em função da grande quantidade de construções existentes em técnica mista. Outras razões motivaram a escolha do tema e sua problemática, destacando-se: a) Um dos principais problemas vividos pela comunidade do bairro do Alegre em São Sebastião do Passé, conforme constatado “in loco” pelo pesquisador, é a presença do “barbeiro”, vetor transmissor da doença de Chagas que faz sua moradia nas fendas da vedação vertical, provocadas pela desagregação do solo. Evitar a possibilidade de instalação do inseto na habitação é prestar um grande bem à saude dessa população. 22 b) A falta de moradia, principalmente de habitações de interesse social, no Brasil, é um problema que estimula o desenvolvimento desta pesquisa, buscando recomendações de melhoria tecnólogica para a vedação vertical de casas em técnica mista, de modo a melhorar o desempenho técnico das mesmas. c) Através de novos estudos voltados para a vedação vertical deste tipo de hanbitação, busca- se contribuir para a mudança do atual modo de ver e conceituar a casa de técnica mista. d) O custo baixo e a rapidez de execução das casas de técnica mista estimulam estudos voltados para agregar melhorias na vedação vertical. O custo baixo deve-se principalmente ao fato de que a mão-de-obra não é qualificada e os materias básicos são da própria região e) A escolha do bairro do Alegre em São Sebastião do Passé, para realização do estudo de caso, deve-se ao fato de ser uma área urbana com aproximadamente 50% de casas em técnica mista, executadas e em execução, cujo “saber fazer” da comunidade local e condições de aquisição dos materiais são os principais motivos do uso desta técnica. f) A atual técnica mista praticada no bairro do Alegre é em solo e madeira. A madeira é extraída das matas vizinhas e vem diminuindo sua oferta paulatinamente. Estudar outro material que possa, vir a substituir a madeira na confecção da vedação vertical poderá contribuir tanto para a diminuição da devastação das matas, quanto para um novo tipo de vedação, com nova tecnologia, trazendo melhorias tecnológicas e ambientais. g) A possibilidade de substutuir a madeira pelo bambu será uma alternativa a mais para a utilização do material vegetal presente nesta técnica. Para Ghavami (1995, p.4), o bambu é o material que requer menor consumo de energia de produção. Enquanto o aço apresenta consumo de 1500 MJ/m³, o concreto, 240 MJ/m³ e a madeira, 80 MJ/m³, o bambu consome apenas 30 MJ/m³. 23 h) A construção que usa o solo como principal material apresenta um custo menor que o daquelas executadas com materiais industrializados. Uma análise entre custo e benefício feita por ARINI (1995, p. 89), comparando um sistema construtivo tradicional e um que utiliza tijolos de solo prensado, apresentou uma redução de 35% sobre o custo final das obras construídas com arquitetura usando o solo, em relação às de arquitetura convencional. 1.5 ESTRUTURA DA DISSERTAÇÃO A pesquisa foi estruturada em 7 capítulos, referindo-se o primeiro, à introdução, contemplando a contextualização do tema, o problema, os objetivos do trabalho, as justificativas para a escolha do tema e a estrutura da dissertação. O capítulo 2 estuda e analisa a técnica mista, estabelecendo uma base teórica sobre: o uso desta técnica em alguns países como o Japão, o Equador, o Paraguai, Portugal e Brasil; a estrutura e o entramado; o solo; e as recomendações para execução da mesma. O capítulo 3 trata da técnica mista estruturada com bambu, introduzindo o assunto e apresentando as suas diversas aplicações; destaca o bambu como material de construção; classifica, apresenta a distribuição geográfica e mostra a quantidade de gêneros e espécies existentes; estabelece os bambus mais utilizados na construção civil; fala sobre o tratamento do bambu; e finaliza estabelecendo a espécie de bambu existente em São Sebastião do Passe, com base em laudo técnico. O capítulo 4 refere-se à metodologia do trabalho e é composto pela classificação da pesquisa, delimitação, identificação das variáveis, estágios da pesquisa e estudo de caso. O capítulo 5 destina-se ao Estudo de Caso. Apresenta a cidade de São Sebastião do Passé e o bairro do Alegre como local do Estudo de Caso. Define a poligonal de estudo (unidade de análise), quantifica as habitações da poligonal, define o universo de amostragem, levanta dados 24 sobre a população do universo de amostragem e, principalmente, sobre aspectos construtivos das habitações. O capítulo 6 discute, avalia e faz recomendações para melhorias tecnológicas da vedação vertical da técnica mista a partir das análises com base nos trabalhos referenciais sobre técnica mista e técnica mista estruturada com bambu, relacionando-os com os dados do estudo de caso. As discussões, análises e recomendações se referem a elementos da vedação vertical da técnica mista, ou a elementos cuja performance tem relação com a mesma. Os elementos objeto de discussão, análise e recomendações foram: a drenagem, a estrutura, o entramado, o solo, o reboco, a pintura, a cobertura e as esquadrias O capítulo 7 conclui o trabalho, referindo-se ao cumprimento dos objetivos da pesquisa, tanto o objetivo geral quanto os específicos, encerrando o mesmo com recomendações para novas pesquisas sobre o tema 25 2. TÉCNICA MISTA Este capítulo realiza uma revisão bibliográfica sobre técnica mista, referindo-se a origem deste processo construtivo, ao uso do mesmo em alguns países, de modo especial no Brasil. Aborda aspectos construtivos sobre a técnica de execução da estrutura e do entramado, estabelece parâmetros para a escolha e correção do solo e propõem recomendações para a execução da citada técnica. Considerada como sendo um dos processos construtivos mais antigos da humanidade, a técnica mista teve como berço a Arábia, onde se desenvolveu e aprimorou seu uso. Sua facilidade de apreensão e praticidade de execução, a disponibilidade de materiais construtivos, as possibilidades de efeitos plásticos oferecidos pelo solo moldável e as condições de conforto térmico motivaram a mesma a ultrapassa fronteiras e se expandir muito além dos oceanos, sendo disseminada para todos os continentes, atendendo a necessidade de habitar de muitos povos. De forma simplificada, a técnica mista consiste em uma construção estruturada normalmente em esteios e vigas de madeira para suporte da edificação como um todo, esteios para fixação das esquadrias, uma trama denominada de entramado, executada com madeira ou bambu para receber o solo de fechamento que é aplicado em estado plástico e uma cobertura em palha ou telha. A denominação técnica mista é recente e visa unificar como termo internacional, evitando-se a pluralidade de nomes usados em diferentes países, sendo que em alguns, a citada técnica recebe mais de um nome. Por exemplo, o Brasil a conhece como taipa de mão, taipa de sopapo, pau-a-pique, pescoção, barro armado, taipa de sebe, ou simplesmente taipa. 26 2.1 ALGUMAS FORMAS DE CONSTRUIR A TÉCNICA MISTA Embora o processo de se construir a técnica mista seja caracterizado por uma estrutura em madeira ou bambu, onde as vedações são constituídas por um entramado que recebe o solo de fechamento em estado plástico, cada povo adaptou a forma de construir à sua cultura e disponibilidade de materiais de sua região. Para ter-se uma idéia sobre a maneira como alguns povos utilizam a técnica mista, apresenta-se a seguir, o modo de execução da mesma no Japão, em Portugal e em alguns países da América Latina. 2.1.1 No Japão No Japão esta técnica é constituída, em geral, tendo como estrutura a madeira e como trama o bambu. Segundo Lopez (1974, p. 222 a 225), são fixados os elementos de madeira que servem como estrutura principal (colunas ou pilares, vigas, soleiras e caixões para as esquadrias) e para a vedação vertical é construído um entramado de madeira e bambu. Um marco formado por elementos de madeira que recebe uma trama de bambu com varas verticais e horizontais com diâmetro entre 8 e 13mm, distanciadas entre si de aproximadamente 30 cm. Recobrindo esta trama principal de bambu é confeccionado uma nova trama, com peças afastadas entre si de 2,5 a 4 cm, sendo amarrada com uma espécie de cipó. Para preenchimento da trama é preparada uma massa plástica a base de solo argiloso, usando-se entre 3 e 5 camadas para fechamento, geralmente aplica-se 3 camadas. A camada final apresenta uma composição diferenciada, que depende da tradição local, pois, é esta camada que irá destacar a aparência da parede em relação à cor e textura. 27 A primeira camada é aplicada por um taipeiro em um dos lados da trama, enquanto do lado oposto outro taipeiro dá o acabamento, ficando a mesma com espessura de 9 a 18 mm,. Esta camada é composta na relação de 100 partes de argila, por 300 partes de areia fina e 3 partes de fibras vegetais (palha cortada) com comprimento de 3 a 9 cm. A segunda camada, com espessura entre 3 e 6 mm deve ser aplicada entre 2 e 4 semanas após a primeira. A composição é a mesma da camada anterior, porém, as fibras devem ter um comprimento entre 1,8 e 2,1 cm. A camada final, a depender do costume local, poderá ser composta por argila de solo colorido, areia, cola, cal, conchas marinhas e fibras vegetais. 2.1.2 No Equador Segundo Salas (2003, p.39), a técnica mista (bahareque) no Equador é uma das técnicas de construção com terra de boa aceitação. Conforme o autor, ela se constitui numa construção mista de madeira e solo muito utilizada nas províncias do sul do Equador e no resto da serra daquela região, enquanto que, na costa, é muito comum a técnica mista ser construída com bambu “Guadua” e solo, o que também, acontece na costa central do Pacífico Sul, em terras da Venezuela, Colômbia e Peru. Referindo-se a abalos sísmicos, Sala (2003, p.40) salienta que o abalo de 1949 que destruiu a cidade de Ambato, na serra central do Equador, grande parte das habitações que não sofreram colapso foram as de técnica mista, se constituindo como técnica mais confiável por seus usuários. Salas (2003, p.43), referindo-se a esta capacidade de suporte a abalos sísmicos pela técnica mista afirma que observações pessoais realizadas nos sismos que aconteceram no Equador em 1987 (El Rventador), em 1996 (Pujili) e 1997 (Bahia de Caráquez) mostraram que 28 não houve colapso das habitações em técnica mista. As habitações, embora deformadas, não desabaram, salvaguardando a vida de seus habitantes, que segundo Salas, é a função mais importante do comportamento de uma habitação. Para Salas, a técnica mista no Equador, como em toda a América do Sul, é usada desde tempos remotos. O autor anteriormente citado, fala sobre vestígios de técnica mista encontrados na província de El Oro, no litoral equatoriano, lugar onde a aproximadamente 4.000 anos A. C. se desenvolveu a cultura Narrio. Segue-se a descrição de 3 formas de se construir a técnica mista no Equador, segundo Salas (2003, p.40 a 42). Primeiro, o bahareque (técnica mista) tradicional Tem base numa estrutura de madeira sobre a qual se coloca um recobrimento de peças de caniço ou de madeira roliça com 3 a 4 cm de diâmetro. Dentro dessa trama coloca-se o solo com palha e pedaços de pedra ou ladrilho, dependendo da região onde se constrói. Segundo, o bahareque (técnica mista) parado Usado de maneira especial pela comunidade indígena de Saraguro na península de Loja. Inicia-se a construção nivelando o terreno. Em seguida procede-se as escavações de aproximadamente 60 cm de profundidade onde são colocadas as bases em pedra talhada que sobressaem entre 20 e 40 cm do nível natural do terreno. Sobre a base de pedra, em furo previamente executado são colocados os pilares principais, com afastamento em torno de 3,80 m (4 varas). Depois são colocadas peças verticais denominadas de “parentes”, em madeira roliça, com diâmetro entre 10 e 15 cm, afastadas entre si de aproximadamente 40 cm. Sobre os pilares, no nível do pé direito são colocadas vigas de madeira com seção de mais ou menos 3,5 x 7,5 cm e na altura média das paredes são fixadas outras vigas, de mesma seção, para evitar a deformação dos “parentes”. Nesta altura se procede a montagem das peças da cobertura e depois a armação para receber as 29 portas e janelas. O próximo passo é a colocação das varas de ambos os lados da parede, com afastamento máximo de 20 cm, fixadas com fibras naturais. Finalmente procede-se o “barreamento” de terra com palha. Terceiro, o bahareque (técnica mista) gualluchaqui Trata-se de uma mistura entre o bahareque parado e o bahareque tradicional. É usado em lugares úmidos, onde os pilares são reforçados com madeiras colocadas na diagonal e os “parentes” são colocados a 45°, propiciando uma melhor resposta à solicitação de abalos sísmicos. Este tipo de bahareque vem sendo usado de 30 a 40 anos para cá em planta de 2 pavimentos. O térreo é construído em adobe ou outro material e o pavimento superior em bahareque gualluchaqui. Esta técnica é usada em Loja, Murona Santiago e Zamorna Chichique. Em nenhum dos casos se costuma dar um acabamento a parede, ela fica com a textura do “barreamento” de lodo e fibra. 2.1.3 No Paraguai O Paraguai, segundo Rios e Nessi (2003, p.90), apresenta 2 tipos de técnica mista: o “estaqueo”, também conhecido como parede francesa; e a “palha com barro” (paja embarrada). Os autores citam referências históricas que revelam uma habitação construída com muros de “estaqueo” no ano de 1792. Rios e Nessi apresentam uma casa urbana na cidade de Pilar cujo exemplo é similar à construção de 1792. Esta última sofreu danos com a última inundação que afetou a cidade, onde a água atingiu a marca de aproximadamente 80 cm acima do piso. A Figura 1 é de uma casa degradada pela enchente, enquanto as Figuras 2 e 3 destacam as rupturas das vedações verticais e elementos das mesmas. 30 FIGURA 1 – HABITAÇÃO URBANA EM PILAR - PARAGUAI Fonte: (RIOS e NASSI, 2003, P.95) Olhando-se as figuras 1, 2 e 3, percebe-se que a técnica de “estaqueo” é bastante semelhante à técnica mista executada no Brasil FIGURA 2 – DETALHE DA HABITAÇÃO URBANA EM PILAR - PARAGUAI Fonte: (RIOS e NASSI, 2003, P.96) As figuras 2 e 3 destacam a vedação vertical da habitação, onde são vistas peças de bambu substituindo as varas, estando as mesmas amarradas com couro nas peças do “enchimento” e o solo de fechamento do entramado. 31 FIGURA 3 – DETALHE DA HABITAÇÃO URBANA EM PILAR - PARAGUAI Fonte: (RIOS e NASSI, 2003, P.97) O sistema construtivo é bastante semelhante ao usado no Brasil. Uma estrutura principal em esteios de madeira, vigas de madeira, um trama de peças verticais (enchimento) e ao invés das varas, ripas horizontais de bambu, em ambos os lados, amarradas com fibras vegetais. E finalizando, o fechamento da trama com solo argiloso. Sobre a “palha embarrada”, Rios e Nessi não descrevem muito. Os autores afirmam que a mesma é disposta sobre peças de madeira, tipo varas que são suportadas pelos pilares, sendo a palha amarrada nas varas com couro ou arame, formando assim uma superfície de ambos os lados, interno e externo. Em seguida a palha é embebida em solo argiloso em estado plástico, quase líquido. Os autores informam que exemplares antigos desta técnica podem ser encontrados na zona serrana da rota Transchaco a uns 150 km de Assunção, como também o quartel de Islã Poí, a altura de Porto Casado a uns 140 km do rio Paraguai. 32 Rios e Nesi apresentam outras formas de se construir usando a técnica mista, onde as principais diferenças estão nas peças da estrutura e entramado, onde são usados os materiais encontrados na região em que se constrói, englobando a madeira, o bambu, a taquara e o solo local. 2.1.4 Em Portugal Para Galhano e Oliveira (1992, p.281), o tabique (técnica mista) em Portugal é anterior ao Século XVII. Segundo os autores, constitui-se em uma técnica barata e fácil, com origens e manifestações provincianas, subsistindo até os dias atuais. Em Portugal, conforme caracterização feita pelo autor, o processo da técnica mista (tabique) compõe-se de uma estrutura principal, formada por esteios e vigas de madeira, com seção quase sempre quadrada em torno de 10 a 12 cm, e uma estrutura secundária, também de madeira, porém, de peças com menor seção. A estrutura secundária é composta de peças verticais, com seção quadrada ou roliça de aproximadamente 8 cm, travadas por peças em diagonal de mesma seção, sendo complementada por uma trama de ripas de seção retangular em torno de 1,5 por 4 cm, também em madeira, de ambos os lados, fixadas por pregos, formando uma trama destinada a receber a massa plástica de solo sem cozimento, água e, na maioria das vezes, palha. Após a secagem da massa plástica é aplicado o reboco e depois da secagem deste a pintura. Segundo Galhano e Oliveira (1992), o tabique é encontrado no território português até os dias atuais como acréscimos, trapeiras, e outras formas de andares suplementares, principalmente no Douro, Trás-os-Montes e entre o Douro e o Minho. Outra característica apontada pelos autores é que as vedações verticais trazem seus paramentos externos revestidos com telhas, lousas ou chapas de zinco. Uma forma de proteger os paramentos verticais externos das intempéries. 33 No norte de Portugal, nas localidades de Alpedrina, Fundão, Covilã, Guarda, Muxagata, Vila Nova de Foz Côa, Lamêgo, Tarouca, Ucânia e Salzedas, conforme investigação feita pelo autor em maio de 2004, é bastante comum, ainda nos dias atuais encontrar tabiques sobre a forma de acréscimos e principalmente sobre o pavimento térreo (rés-do-chão), este quase sempre em pedra. As figuras de 4 a 9, a seguir, ilustram as características citadas pelos autores referenciados, e mostram exemplares de técnica mista em varias localidades visitadas. A técnica mista tem mostrado em vários locais, sua capacidade de resistir a abalos sísmicos sem colapso total. Em Portugal, segundo Galhano e Oliveira (1992), as construções em tabique (técnica mista) foram as que melhor resistiram ao terremoto de 1755. A Figura 4 é de uma construção na cidade de Lamego, na Rua do Castelo, em Portugal, onde o pavimento térreo é construído em pedra e sobre o mesmo foi erguido o restante da construção em técnica mista. Essa maneira de se construir é bastante utilizada no norte de Portugal e devese ao fato da grande quantidade de pedras existente na região e também, por ser uma forma de evitar que a umidade do solo atinja a vedação vertical da técnica mista. A construção da Figura 4, adiante, é uma habitação centenária, onde o estado de degradação do revestimento é visível. Outra diferença em relação à técnica mista no Brasil é o uso de ripas substituindo as varas. 34 FIGURA 4 – TÉCNICA MISTA SOBRE O PAVIMENTO TÉRREO NA RUA DO CASTELO, LAMEGO, PORTUGAL Foto do autor - maio de 2004 35 Lamego é uma das cidades portuguesas que possui na atualidade uma quantidade expressiva de edificações em técnica mista (tabique). A Figura 5 é de um conjunto de edificações na cidade de Lamego, cujas construções são todas em técnica mista e estão construídos sobre o pavimento térreo FIGURA 5 – TÉCNICA MISTA SOBRE O PAVIMENTO TÉRREO EM LAMEGO, PORTUGAL Foto do autor - maio de 2004 Para proteger os paramentos externos mais afetados pelos ventos e chuvas, os mesmos recebem, além do reboco, um segundo revestimento, cujo material depende da existência do mesmo no mercado local, do poder aquisitivo e gosto do proprietário. A Figura 6 destaca a vedação vertical da lateral de uma edificação, na cidade de Tarouca, revestida com chapas de zinco. Tarouca, embora próxima a Lamego, tem uma quantidade bem inferior de habitações em técnica mista, mesmo assim, de qualidade expressiva, guardando a mesma forma de se construir. 36 FIGURA 6 – TÉCNICA MISTA REVESTIDA COM CHAPAS DE ZINCO EM TAROUCA, PORTUGAL Foto do autor - 2004 As figuras 7 e 8 são construções em técnica mista. A Figura 7 é na cidade da Guarda, em Portugal, construída sobre o pavimento térreo, tendo a fachada frontal e lateral revestidas com ardósia. A Figura 8 é na aldeia de Salzedas, destacando todo o paramento frontal revestido, também, com ardósia. O revestimento das vedações verticais é de fundamental importância para proteção contra as intempéries, principalmente as águas de chuvas. E, quanto melhor for o revestimento, maior proteção o mesmo irá propiciar à vedação vertical, estabelecendo uma durabilidade maior para a edificação 37 FIGURA 7 - TÉCNICA MISTA REVESTIDA COM LOUSAS EM GUARDA, PORTUGAL Foto do autor - maio de 2004 FIGURA 8 - TÉCNICA MISTA REVESTIDA COM LOUSAS NA ALDEIA DE SALZEDAS, PORTUGAL Foto do autor - maio de 2004 38 A Figura 9 é de um edifício na cidade de Covilã que caracteriza bem a construção da técnica mista (tabique) em Portugal. Trata-se de um prédio de três pavimentos, onde o pavimento térreo é construído com pedras e os dois pavimentos superiores executados em técnica mista FIGURA 9 - TÉCNICA MISTA SOBRE PAVIMENTO TÉRREO EM COVILÃ, PORTUGAL Foto do autor - maio de 2004 39 Portugal, embora na atualidade quase não mais se construa usando-se a técnica mista, principalmente, em função do elevado custo da madeira, é um país que guarda uma quantidade significativa de exemplares desta técnica construtiva, principalmente nas regiões do Douro, Trásos-Montes e entre o Douro e o Minho. As características marcantes do uso desta técnica no território português são: o cuidado com a umidade, onde a maioria das construções em técnica mista são executadas sobre o pavimento térreo, quase sempre em pedra; o uso de contraventamento da construção; a preocupação em revestir as vedações verticais; e quando o revestimento se constitui apenas do reboco o mesmo recebe a proteção da pintura. 2.1.5 A técnica mista no Brasil Segundo Milanez (1958), antes da chegada dos portugueses os habitantes nativos do Brasil, nossos antepassados, os índios, não usavam o solo para construir. Seus abrigos eram edificados com estruturas de paus roliços e vedações de palha e folhagens. Sabe-se que os africanos, trazidos como escravos, contribuíram para o uso da técnica mista, principalmente os descendentes da Guiné que vieram para o Brasil, pois em sua pátria construíam suas casas de pau-a-pique, com enchimento de lama e cobertura da palha. Para Milanez (1958), nossas casas “barreadas” parecem se originar de costumes africanos. A Figura 10 é um exemplar de construção em técnica mista representativa da imigração japonesa no Brasil, cujo edifício foi projetado por Kazuo Hanaoka, em 1942, para abrigar uma fábrica de chá. O edifício foi construído na cidade de Mogi das Cruzes, em São Paulo, conforme http://www.uns.arq.br/comphap/bens.htm (em 11/10/2006). 40 FIGURA 10 – CONSTRUÇÃO EM TÉCNICA MISTA, MARCA DA IMIGRAÇÃO JAPONESA, EM MOGI DAS CRUZES - SP Fonte: http://www.uns.arq.br/comphap/bens.htm (em 11/10/2006) Brasileiro (2002) destaca como construções em taipa de mão no Brasil o primeiro muro na cidade de Salvador, para defesa contra os índios; a cidade de Olinda em Pernambuco, construída inicialmente em taipa de mão e de pilão; as cidades mineiras de Ouro Preto e Diamantina; Vassouras no Rio de Janeiro; e tantas outras nos estados de São Paulo, Goiás e Mato Grosso assim como, construções modernas, apresentadas na exposição “Arquitetura de Terra no Brasil”, na década de 1980. Na região nordeste do Brasil, principalmente nos estados de Pernambuco, Alagoas, Sergipe e Bahia, como é do conhecimento do autor deste trabalho, a construção da técnica mista, via de regra, começa pelo nivelamento do terreno, sendo em seguida executada a estrutura principal (os esteios), que convencionalmente é feita com madeira roliça, exceto as peças de apoio para portas e janelas. Os esteios são fixados no solo de fundação a uma profundidade média de 80 cm. Nesse 41 ponto a estrutura recebe uma trama com peças roliças de aproximadamente 8 cm de diâmetro, colocadas na vertical, afastadas umas das outras mais ou menos 25 cm e fincadas no solo a uma profundidade em torno de 30 cm. Apoiadas nas peças verticais são colocadas na horizontal, de ambos os lados as varas, amarradas normalmente com cipó ou arame, distanciadas entre si em torno de 10 cm. Sobre a estrutura é colocada a cobertura, que dependendo da região e poder aquisitivo, é feita com telha cerâmica, normalmente de fabricação artesanal ou de palha. A fase de tapagem da trama promove um verdadeiro trabalho em mutirão. Os vizinhos se reúnem, fazem um barreiro próximo à construção, onde misturam o barro com água, às vezes, adicionam fibras, e quando a mistura pisoteada adquire a consistência ideal para o uso em questão, é transportada com as mãos para o preenchimento da trama, até recobrir a face externa da estrutura. Quando o poder aquisitivo permite, após a secagem do solo, é aplicado o reboco e, posteriormente a pintura. Para Silveira e Gama (1982), a taipa de pau-a-pique, que é um processo construtivo dos mais antigos de nossa cultura, vem sendo conservada pela tradição oral e é conhecida de quase toda família de baixa renda, ou seja, mais da metade da população brasileira, porém é desconhecida nas comunidades abastadas e nos meios universitários Lopes (2002) afirma que no Brasil, da mesma forma que em Portugal, as técnicas mais utilizadas foram o adobe, a taipa de pilão e a taipa de mão ou pau-a-pique, encontrando-se exemplares em praticamente quase todo o território brasileiro. Sobre a taipa de mão, a autora afirma ser uma técnica construtiva que utiliza materiais fornecidos pela natureza e que é facilmente assimilada, sendo uma constante nas construções da zona rural e de cidades do interior do Nordeste do Brasil, embora, se perceba que a mesma necessita da implementação de melhoramentos técnicos, e a população usa a referida técnica apenas por não ter acesso a outra maneira de construir. Para Souza (1996), o que ocorre é que a antiga forma de construir com 42 técnica mista tem sido substituída e adulterada e o que resta hoje é só um arremedo do que outrora se praticava. Para Lopes e Ino (2003), o processo básico comumente empregado consiste em levantar toda a estrutura das paredes, colocar o madeiramento do telhado, a cobertura e efetuar o enchimento dos vãos. Para as autoras, a versatilidade da técnica mista está na grande adaptabilidade às condições locais, utilizando-se materiais naturais da região. Alguns autores destacam os motivos que levaram a técnica mista a ser empregada de forma generalizada, principalmente no Brasil, onde desde a colonização ela se faz presente em todo o país. Para Vasconcellos (1979), um dos motivos que levou esta técnica construtiva a ser uma das mais difundidas foi a facilidade como se constrói. Já Schmidt (1946) afirma que ela foi amplamente utilizada, pois, comparada com a taipa de pilão que precisa de taipeiros especializados, ela dispensa a mão-de-obra especifica dos taipeiros, é durável e de grande resistência as intempéries, desde que sejam adotados cuidados específicos, principalmente em relação à umidade, além de propiciar menor custo. Alvarenga (1984), apresenta a rapidez da execução como uma das principais vantagens desta técnica. Para Souza (1996), a taipa de mão teve nas terras de Minas Gerais total preferência sobre a taipa de pilão, por ser mais fácil sua execução, mais rápida, econômica, além de ser leve e de facilmente adaptar-se às topografias acidentadas. Costa e Mesquita (1978) desatacam no interior de Minas Gerais, uma casa velha de fazenda, construída no tempo do império, com paredes de pau-a-pique, sem apresentar qualquer tipo de rachadura. As paredes foram feitas com solo, areia e estrume de gado. Para os autores o esterco de gado possibilita maior firmeza ao reboco. Os mesmos observaram que a casa do joãode-barro também possui estrume de gado na sua composição. 43 Aditar estrume de gado na composição do solo a ser aplicado para preenchimento da trama na técnica mista é um procedimento conhecido, se não de todos, pelo menos da maioria dos construtores que utilizam esta técnica, assim como da maioria dos pesquisadores sobre o assunto. Entende-se que são as fibras vegetais contidas no esterco do gado que vai propiciar uma menor retração ao solo quando seco. No Brasil, o revestimento das paredes tem muito a ver com a condição econômica de seus moradores, onde a grande maioria possui renda baixa ou muito baixa e suas habitações não recebem reboco, na maioria das vezes sequer conseguem concluir suas moradias, ficando meses e até anos habitando uma casa inacabada. Esta situação é encontrada em todo o país, demonstrando as péssimas condições de habitação, a falta de emprego e renda para suprir não apenas à necessidade básica de moradia, mas também a falta de alimentação, assistência à saúde, educação e lazer. A Figura 11ilustra esse quadro FIGURA 11 – TÉCNICA MISTA NO BAIRRO DO ALEGER, EM SÃO SEBASTIÃO DO PASSÉ, BAHIA, BRASIL Foto do autor - outubro de 2004 44 A habitação em técnica mista inacabada, pertencente a uma família de baixa renda, situada à Rua Emílio Albino Abraão, no bairro do Alegre (Alegre de cima), em São Sebastião do Passé, Bahia, Brasil, localidade onde foi realizado o estudo de caso. A parte habitada não possui revestimento, propiciando ninhos de insetos, como o vetor transmissor da doença de Chagas, o “barbeiro” e outros mais A figura 12 é de outra casa em técnica mista na Rua Candeal Pequeno, no bairro de Brotas cidade de Salvador, Bahia, Brasil. A casa tem aproximadamente 50 anos de construída e mesmo nas condições precárias em que se encontra, continua sendo habitada. FIGURA 12 – TÉCNICA MISTA SOBRE O SOLO EM SALVADOR, BAHIA, BRASIL Foto do autor - agosto de 2004 A Figura 13 é de mais uma casa de técnica mista, no povoado do Moreira, no município de Palmeira dos Índios, Alagoas, Brasil, onde o revestimento das vedações verticais internas e externas é rebocado e pintado. A construção, com aproximadamente 20 anos de construída está 45 em perfeitas condições de habitabilidade, sem fissuras, sem bolor e, sem marcas de umidade. A mesma foi construída sobre alicerce que se eleva do nível do terreno, em torno de aproximadamente 50 cm, o que protege a vedação do solo, minimizando a penetração de águas pluviais Este procedimento, além de ser recomendado para a técnica mista por vários autores, coloca a habitação em destaque. FIGURA 13 - TÉCNICA MISTA REVESTIDA E PINTADA, NO POVOADO MOREIRA, PALMEIRA DOS ÍNDIOS, ALAGOAS, BRASIL Foto do autor - agosto de 2004 Nestes poucos exemplos apresentados da técnica mista no Brasil, os tipos e padrões de acabamento das construções, variam, desde as de aspectos de pobreza, às vezes de miséria, até as de padrões de qualidade e estado de conservação muito bons, a depender do poder aquisitivo de seus proprietários ou do conhecimento dos riscos a que se expõem não revestindo corretamente as vedações verticais 46 2.2 A ESTRUTURA E O ENTRAMADO NA TÉCNICA MISTA Lopes (1998) constata em construções de taipa no Brasil, o uso de pilares de bambu, de carnaúba (Copernicia cerifera), de alvenaria de tijolo cerâmico, de madeira serrada ou roliça e de estrutura metálica, além do uso de painéis autoportantes, que dispensam o uso de pilares. Segundo Lopes (2002), o bambu, espécie vegetal resistente é outro material bastante indicado para a ossatura interna da taipa Faltam no entanto recomendações referentes ao tratamento que as diferentes alternativas necessitam, a fim de terem uma vida útil duradoura. Quanto à indicação do uso do bambu na composição da ossatura que compõe a vedação vertical, uma das qualidades que estimula o uso do mesmo é a possibilidade de se colher este material a partir do quarto ano de plantado. Para Lopes e Ino (2003) o entramado ou malha interna funciona como suporte para sustentação do solo e, geralmente é produzido no próprio local. O tipo mais comum consiste no uso de paus roliços, no sentido vertical, e de varas flexíveis horizontais, fixadas dos dois lados e amarradas através de fibras vegetais, como cipó-imbé (Phyllodendrum imbé), buriti (Mauritia flexuosa), tucum (Bactris glaucescens), sisal (Agave sisalana), tiras de couro, arame, ou ainda presas por pregos. As autoras falam ainda em entramado onde as varas formam um trançado em xadrez, citam o uso de arame em substituição às varas, citam o entramado com bambu e o uso de painéis pré-fabricados em madeira serrada, cada uso a depender da facilidade e do custo de cada região. Na abordagem das autoras sobre o entramado, falta serem definidos parâmetros como o diâmetro e afastamento entre as peças verticais de madeira roliça e das varas horizontais. Quando citam o uso de arame em substituição às varas, não estabelecem o tipo, o diâmetro e o afastamento entre os mesmos. Da mesma forma, quando usa o entramado de bambu, ou painéis 47 pré-fabricados não especificam o tipo, a seção e o afastamento das peças de bambu ou de madeira. Para Di Marco (1984), a técnica mista, conhecida aqui no Brasil como taipa de sopapo ou taipa de mão, consiste em um entramado de madeira ou bambu, formado por ripas horizontais e verticais amarradas com tiras de couro, cipó, barbante, prego ou arame, preenchido com uma mistura de solo, água e fibras. Este conjunto, juntamente com peças portantes verticais de madeira, forma a parede da edificação. A mistura denominada “barro”, é lançada com as mãos nos dois lados ao mesmo tempo, e apertada sobre a trama da parede. Após a secagem do “barro”, é aplicado o reboco e, posteriormente, a pintura. O autor descreve os componentes de uma construção em técnica mista, diz ser o entramado formado por ripas de madeira ou de bambu, o que não é o normal. Geralmente as peças verticais da trama possuem diâmetro superior ao de uma ripa, em torno de 8 cm. Continuando, Di Marco diz que as peças da estrutura são de madeira, porém, não define os diâmetros. A recomendação que Di Marco faz, sugerindo apertar a mistura sobre a trama, ajuda no adensamento do solo, o que minimiza os vazios, evitando maiores fissuras. Inclusive, recomenda-se que ao invés de jogar o barro aos sopapos, o correto é colocar o mesmo na trama com as mãos e depois adensá-lo Contraventar a estrutura e o entramado com peças em diagonal é uma forma antiga de tornar os paramentos verticais estanques, assim como a construção como um todo, o que na atualidade não está sendo praticado aqui no Brasil. A Figura 14 é da vedação vertical de uma construção na Rua do Cale, na cidade portuguesa do Fundão e ilustra a forma usada pelos portugueses para contraventar as citadas vedações das construções em técnica mista, propiciando às mesmas sua estanqueidade 48 FIGURA 14 – CONTRAVENTAMENTO DO ENTRAMADO EM PORTUGAL Foto do autor - 2004 2.3 O SOLO PARA USO NA TÉCNICA MISTA Apresenta-se a seguir a definição do pesquisador Milton Vargas sobre o termo terra ou solo, a saber: “o termo terra ou solo é aplicado a todo material da crosta terrestre que não oferece resistência à escavação mecânica e que perde totalmente a resistência quando em contato prolongado com água. A origem do solo seja imediata ou remota, se dá a partir de processos físicos químicos de fragmentação e decomposição das rochas, pela ação das intempéries”. (VARGAS, 1977) A seguir será apresentada uma série de procedimentos empíricos para escolha do solo ideal a ser usado em construções de técnica mista. O procedimento empírico,embora não tenha 49 caráter científico, ele fornece alguns parâmetros para a tomada de decisão da escolha do solo mais adequado. Esses métodos são instrumentos porque eles auxiliam a população de baixo poder aquisitivo para a escolha da melhor opção de solo a ser usado na vedação vertical da técnica mista. Outro aspecto positivo desses métodos empíricos é a facilidade de transferência de conhecimentos para uma população que em geral tem pouca escolaridade. 2.3.1 Retirada da amostra e teste para uso do solo mais adequado Lengen (2002, p.298), referindo-se ao solo como material de construção diz que quase todos os tipos de solo servem para construir muros utilizando-se blocos de adobe, taipa de pilão ou técnica mista. Como em sua composição entram diferentes tipos de solo, às vezes precisa-se misturar solo de vários pontos do mesmo terreno, mesmo em lotes pequenos. Este procedimento para escolha do solo é muito vago por não apresentar de uma forma mais concreta parâmetros para a escolha do solo mais adequado para construções com técnica mista. É um tanto parecido com a visão de Frota e Le Roy (1978) que simplesmente recomendam o uso de solo argiloso para fechamento da trama da técnica mista. Para Mitidieri e outros (1987), assim como para Milanez (1958), a escolha do solo deve ser feita através de amostras retiradas a uma profundidade de 40 cm. Mitidieri e outros (1987) também recomendam um teste rápido para escolha do melhor solo. Este teste consiste em retirar quatro amostras de diferentes pontos de um mesmo terreno, umedecê-las com água e fazer bolas com as mãos. Ao secar, a bola que apresentar menor número de fissuras indicará de modo prático, o solo mais adequado para a taipa. Estes autores apresentam um procedimento empírico, porém ele procura estabelecer parâmetros que possibilitam comparação entre diferentes amostras auxiliando dessa forma o usuário na tomada de decisão. Todavia, eles ainda deixam vago a quantidade de água a ser 50 utilizada para umedecer o solo e confeccionar as bolas de teste. Também não deixam claro o tempo que levará para secar esses corpos de prova, uma vez que a secagem mal conduzida das bolas de solo pode mascarar o resultado dos testes. Gieth e outros (1994) recomendam o teste da pressão dos dedos. Consiste em colocar um pouco de amostra de solo na palma da mão, adicionar água até obter uma mistura coesa sem que prenda à mão e formar uma bola. Ao se aplicar uma leve pressão com os dedos, verifica-se o comportamento da amostra: a) caso a bola se esfarele, o teor de areia é muito alto; b) caso não se rompa após uma forte pressão dos dedos, há predominância de argila em sua composição; e c) se ocorrer rompimento após uma forte pressão, o solo apresenta-se com teor de areia e argila convenientes para o uso da taipa. Este autor, comparado aos citados anteriormente, em relação à confecção dos corpos de prova acrescenta um parâmetro mais objetivo quanto à quantidade da água a ser misturada com o solo. Também auxilia, de forma comparativa, a escolha do melhor solo para o uso em técnica mista, que, não deve ser composto pela predominância de areia ou de argila, e sim uma amostra equilibrada dos dois componentes. Com relação à escolha do solo para a técnica mista, Neves e outros (2005) apresentam o teste do rolo (verificação do solo adequado para a taipa), que consiste em tomar uma porção de solo umedecido e amassado, rolar sobre uma superfície plana até a obtenção de um cordão com 200 mm de comprimento e diâmetro de 25 mm, deslizar o cordão suavemente sobre a superfície, de forma a ficar em balanço além de sua borda, até que ocorra a ruptura do segmento em balanço. Em função do comprimento do segmento rompido, tem-se um indicativo da quantidade de argila ideal para a taipa: se romper o cordão com menos de 80 mm, não há argila suficiente; se a ruptura ocorrer com comprimento entre 80 mm e 120 mm, tem-se a quantidade ideal de argila; e comprimentos acima de 120 mm indicam argila em excesso. 51 Embora Neves e outros (2005) não deixem claro os procedimentos para coleta de solos, conforme Mitidieri e outros (1987) e Milanez (1958), a autora aponta um outro processo para análise empírica do solo que ajuda de forma objetiva a escolha do solo mais apropriado para a construção de vedações verticais da técnica mista. Também não faz referência à quantidade de água a ser misturada à quantidade de solo, conforme Gieth e outros (1994). Os autores supracitados forneceram parâmetros, embora empíricos, para escolha do solo mais adequado para a construção da vedação vertical da técnica mista. Adotando o critério empírico apresentado por esses autores visando à população a que se destina essa técnica, recomenda-se a retirada do solo a uma profundidade de 40 cm, conforme recomenda Mitidieri e outros (1978) e Milanez (1958). Optou-se por coletar a amostra a 40 cm abaixo da superfície do terreno natural por ser uma situação que possibilita a extração de um solo sem resíduos orgânicos e mais limpo de impurezas, como entulho, etc. A presença de impurezas prejudica a confecção do corpo de prova e mascara o resultado. Para escolha do melhor solo, entre os testes apresentados recomenda-se o teste do rolo (NEVES e outros, 2000) ou o da bola (GIETH e outros, 1994). A escolha de um dos dois testes é recomendada devido à simplicidade de execução de ambos e à resposta em relação à plasticidade ideal da mistura. Uma vez apresentados os parâmetros para escolha do solo, serão relacionadas, a seguir, as sugestões dos autores que procuram melhorar o solo do ponto de vista de retração e aumento de resistência. Essas recomendações apresentadas, visando à correção do solo, também são feitas de forma empírica. 2.3.2 Correção do solo para a técnica mista Para Lopes e Ino (2003), em algumas regiões a preparação do solo é feita com solo e água, ou ainda com adição de fibras vegetais, como: fibras de sisal, de coco, de piaçava, bagaço de cana, 52 palhas, esterco de gado, entre outros, ou ainda com adição de minerais como a cal ou o cimento. Esses aditivos funcionam como estabilizantes do solo, diminuindo a retração e aumentando a resistência. As autoras chamam a atenção de que o solo pode ter suas características de estabilidade e aumento de resistência quando se introduz fibras vegetais ou minerais. Da forma como foi colocado faltou definir proporções para compor a mistura a ser aplicada na vedação vertical de técnica mista. Milanez (1958), tratando sobre a mistura para o “barreamento”, chama a atenção para a quantidade adequada de água, pois o excesso aumenta a possibilidade de fissuras por secagem. Afirma ainda que a adição de palha picada na mistura permite a evaporação de água na massa toda por igual, inclusive de dentro para fora. O autor recomenda que o solo seja colocado com as mãos entre as varas do entramado e não aos “sopapos” como normalmente é feito. Segundo o autor, este cuidado ajuda a propiciar uma obra bem acabada No entanto, Milanez não define quais são os parâmetros que subsidiam a afirmação bem acabada, apenas chama a atenção para uma nova forma de aplicação do solo na trama, alerta para a importância da quantidade de água com o volume de solo, levando em conta fissuras que podem vir a surgir posteriormente com a mistura do solo já aplicado. Faltou apresentar uma relação em forma de volume ou peso, de quanto se deve colocar de quantidade de água para a quantidade de solo, ficando em aberto esta relação. Faltou indicar o volume da palha a ser introduzido na massa. Quanto ao adensamento do solo com as mãos na trama, esta forma possibilita uma maior compactação do mesmo, se comparado com o procedimento na forma de sopapo. O adensamento possibilita maior resistência mecânica à vedação vertical, por ter menor quantidade de vazios, se comparado com o arremesso de sopapo. Outra observação, para melhorar o solo a ser aplicado na trama, é feita por Gieth e outros (1994), recomendando deixar a 53 mistura em repouso, por um período de doze horas, de preferência durante a noite. Para Gieth e outros, este procedimento garante ao solo um melhor estado plástico para a aplicação. Essa recomendação também é de caráter empírico, porém procede, pois, para solos argilosos esse tempo possibilita a uniformidade da umidade Conforme a DAM (1988), a aplicação do solo deverá ser feita em três fases. A primeira consiste em se aplicar uma camada com as mãos, sem cobrir as ripas. Espera-se de quinze a trinta dias, tempo necessário para a parede secar e aplica-se a segunda camada, que deve preencher todas as trincas e cobrir as ripas. Aguarda-se novamente a parede secar e aplica-se a terceira camada ou reboco, constituído de uma argamassa fina de cimento ou cal, mais areia e saibro, no traço em volume de 1:3:5. O acabamento do reboco é dado alisando a argamassa com colher de pedreiro. Os procedimentos apresentados pela DAM (1988) são os que instruem o usuário desta técnica a fazer de uma forma metódica, tanto as etapas ou fases de aplicação do solo sobre a trama, como também a definição do traço em volume para o reboco final da vedação vertical em técnica mista 2.4 RECOMENDAÇÕES PARA EXECUÇÃO DA TÉCNICA MISTA Para Lopes e Ino (2003), o uso de instrumentos simples como o esquadro, o prumo e o nível são importantíssimos, pois quando relegados contribuem para prejudicar a aparência e a rigidez da construção, tornando a estrutura desequilibrada e as paredes desalinhadas É relevante a recomendação das autoras, pois o uso do esquadro é fundamental na locação dos esteios, o uso de um prumo na fixação dos esteios, da ossatura e do enchimento da vedação vertical vai propiciar uma edificação equilibrada, com paramentos alinhados e o nível estabelecerá um plano de base, referencial para as medidas verticais. 54 Para Pinto (1993) e Souza (1996) os principais agentes causadores dos danos na vedação vertical de solo são as infiltrações de água, seja por capilaridade do solo, seja por falta de proteção adequada, devido a rebocos mal executados. Os autores recomendam proteger a edificação do contato com a umidade do solo, elevando-se a construção do chão ou utilizando alicerces com a devida impermeabilização. Mitidieri e outros (1987) e PROAFA (1979) sugerem o uso de cinta de concreto magro para evitar umidade nas paredes. A Fundação DAM(1988) e Gietg e outros (1994) recomendam o uso de sapata corrida de pedra e tijolos cerâmicos, protegida no coroamento com camada impermeabilizante. Para Ferraz (1992), além de ser necessário evitar o contato da construção com a umidade do solo, a pintura melhora a salubridade e conservação da habitação, além de torná-la agradável visualmente. Segundo Lopes (1998), as construções recentes em taipa usam geralmente materiais impermeabilizantes, como pintura asfáltica, betume, resina, sacos plásticos e base de concreto, de acordo com a disponibilidade local, para proteção contra danos causados pela incidência de água nas peças verticais de madeira. As recomendações citadas anteriormente são convenientes para impedir a ascensão de água por capilaridade que vem do solo, como também águas de chuvas que incidem direta ou indiretamente na vedação vertical, ficando a cargo do executor decidir o tipo de proteção que caiba melhor no orçamento do usuário. Para Alvarenga (1984), a falta de revestimento é um dos maiores problemas da habitação em técnica mista, pois ele evita o alojamento de insetos nas gretas e protege as paredes contra a ação da água. A autora destaca o reboco usado na zona rural de Minas Gerais que é feito com o próprio solo misturado com maior quantidade de areia e aplicado em duas camadas. A primeira mais áspera usa o cascalho misturado com o solo, estrume e água. A segunda difere apenas com o tipo de areia, que é mais fina. Alvarenga não especifica o traço para a composição do reboco, 55 não define a granulometria da areia e do cascalho para execução do reboco, ficando vagas e subjetivas essas recomendações. Para Gieth e outros (1994) a mistura do reboco deve ter uma parte de cal e oito de saibro, ser aplicada sobre as paredes levemente umedecidas, em forma de bolas, usando-se as mãos. Coberta toda a superfície, pressiona-se levemente a mistura para uma perfeita aderência. A regularização é feita por pressão com a colher de pedreiro, para agregar os componentes e aflorar a água da mistura. A seguir, se passa a desempenadeira e, depois a esponja de camurça. Neste ponto, a superfície precisa apenas secar para receber a pintura, que pode ser à base de cal As recomendações dos autores citados anteriormente aponta para uma composição em volume para a massa de reboco, além de estabelecer o preparo da vedação vertical e a forma de aplicação da mesma, visando uma boa aderência entre o reboco e a superfície de aplicação. Segundo Lopes e Ino (2003), no protótipo do PROAFA (1979), em Fortaleza, Ceará, usouse um chapisco impermeabilizante nas paredes internas e externas até a altura de 50 cm, para evitar infiltrações de água em ambos os lados Faltou definir qual o traço usado no chapisco, qual o aditivo impermeabilizante e sua quantidade na mistura Deve-se fazer o contraventamento do entramado, fixando as peças em diagonal entre os pilares, propiciando uma amarração completa da edificação. Também, é importante ser feito um contraventamento no plano horizontal da cobertura sobre as vigas que definem o pé direito da edificação. Este último deverá ser executado com peças em diagonal, formando um triângulo com os vértices externos, sendo as mesmas paralelas ao plano das vigas dos frechais, propiciando, desta forma, uma estanquidade não apenas às vedações verticais, mas à edificação como um todo. 56 3. A TÉCNICA MISTA ESTRUTURADA COM BAMBU O bambu é um material de construção que apresenta baixíssimo consumo energético no processo de produção e existente na região do estudo de caso, sem, no entanto ser utilizado na técnica mista local. Aqui, aborda-se o bambu como material de construção, estabelece-se a classificação, os gêneros e espécies do bambu, a distribuição geográfica, citam-se as espécies mais usadas na construção e apresenta-se os tipos de tratamento do mesmo. Para Barbosa e Mattone (2002), empregar produtos que envolvem baixo consumo de energia no seu processo de obtenção, que geram menor quantidade de rejeitos e que apresentam baixa emissão de poluentes é de interesse para toda humanidade Incentivar a retomada do uso do solo para construir utilizando o bambu como elemento de vedação vertical da técnica mista é opção viável, que poderá oferecer uma edificação de custo baixo, em condições de segurança, conforto térmico, durabilidade e harmonia com o meio ambiente Lopez (1974) referindo-se à “parede de argila reforçada com bambu”, a técnica mista, nos fala dos motivos pelo qual o Japão, um dos países mais industrializados da Ásia, onde se constrói com as mais modernas técnicas, continua nos dias atuais a construir casas de “argila estruturada com bambu”. Segundo o autor, o colorido e a beleza de sua textura, aliados ao conforto térmico são as razões pelas quais os japoneses as preferem. Na Índia, o grande número de templos budistas, cujas cúpulas foram construídas com bambu e solo, são exemplos de uso da técnica mista, tendo como referência maior a 7a maravilha do mundo, o conjunto arquitetônico de Taj Mahal, cuja estrutura é toda montada com bambu e revestida com argamassa especial. A figura 15 retrata o templo que foi construído na cidade de Agra, Estado de Uttar Pradesh, em 1631 pelo imperador Shah Jahan, onde foi edificada a tumba para sua esposa favorita, Mumtaz Mahal. 57 FIGURA 15 – VISTA GERAL DO TAJ MAHAL Fonte: http://www.taj-mahal.net/ Em 25/07/2006 Referindo-se às aplicações do bambu GRAÇA (1988) e LOPEZ (1974) apresentam algumas, como o uso para a construção, paisagismo, álcool etílico, celulose e papel, alimentação e medicamentos, entre outras. 3.1 O BAMBU COMO MATERIAL DE CONSTRUÇÃO Para Cordero (1989, p.12), a baixa densidade, a forma circular oca e as excelentes características físicas e mecânicas fazem com que esta planta seja empregada na construção como elemento estrutural, painéis de vedação e outros usos. Afirma o autor que além da Índia, Indonésia e Filipinas, que usam bastante o bambu como material de construção, na Colômbia, em função da abundância e do baixo custo, a construção de casas de bambu e madeira ganhou popularidade. Devido às propriedades físicas apresentadas pelo bambu, principalmente, aos elevados números relacionados à capacidade de suporte aos vários esforços, este material tem sido usado para diversos fins, desde a construção de pequenos muros, casas, abóbadas de grandes templos, pontes e aquedutos, entre outros. Lopez (1974) apresenta as propriedades físicas do bambu destacando a capacidade de resistência do mesmo aos diversos esforços, relacionando um bom número de espécies. A boa performance deste material vem motivando o uso do mesmo como elemento estrutural, inclusive 58 como reforço do concreto, substituindo o uso convencional do ferro em estruturas de pequeno porte. No capítulo destinado à arquitetura, Lopez (1974), destaca, entre outros pontos, os sistemas de construção em bambu empregados na Colômbia, o uso e a influência do bambu na arquitetura hindu, o bambu na arquitetura japonesa, as espécies de bambu de maior uso na construção, o uso do bambu nos jardins japoneses, a deformação artificial do bambu, os materiais de construção obtidos do bambu, das estruturas espaciais de bambu, o uso do bambu na construção de elementos de concreto, e as vantagens e desvantagens do emprego do bambu na construção. Iniciativas têm sido tomadas para a utilização do bambu na construção, visando diminuir o custo final e utilizar materiais ambientalmente corretos, conforme Figura 16. FIGURA 16 – EDIFICAÇÃO EM BAMBU, COM PAINÉIS MONOLÍTICOS ARGAMASSADOS, EM MACEIÓ, ALAGOAS Foto do autor - dezembro de 2004 A construção da foto é uma moradia de interesse social com 38 m², construída no bairro de Bebedouro, em Maceió doada no dia 14/11/03 a uma família carente, como resultado de uma 59 parceria entre o Instituto do Bambu, a Universidade Federal de Alagoas e o Serviço Brasileiro de Apoio as Pequenas e Médias Empresas – SEBRAE, visando disseminar o uso do bambu na construção civil em áreas urbanas A habitação, onde mora uma família de 4 pessoas, foi visitada pelo autor deste trabalho em 2004 e em 2005. Nesta obra, a vedação vertical foi feita com painéis de bambu do tipo “esterilha”, de ambos os lados e revestida com uma argamassa convencional. Em maio de 2005, o Instituo inovou construindo uma casa usando o “sistema pré-fabricado de bambu com microconcreto”, conforme Figura 17. A casa serve de oficina para artesões que fabricam instrumentos musicais, tendo como matéria prima básica o bambu e está na área da Universidade Federal de Alagoas, onde funciona a sede do Instituto FIGURA 17 – EDIFICAÇÃO EM BAMBU, COM PAINÉIS EM MICROCONCRETO, EM MACEIÓ, ALAGOAS Foto do autor - janeiro de 2005 Considerando ser o Instituto do Bambu o órgão mais próximo de Salvador, cujo objetivo é pesquisar e desenvolver a tecnologia do uso do bambu, principalmente, como material de construção, durante o desenvolvimento deste trabalho o autor visitou o mesmo, fazendo contato com o corpo técnico, buscando informações sobre os tipos de bambus por ele utilizado, a origem 60 dos mesmos e o de trabalho que estava sendo desenvolvido. Para abrigar a sede do Instituto mais uma casa foi construída, usando-se o sistema pré-fabricado com painéis de microconcrteto, conforme Figura 18 FIGURA 18 – EDIFICAÇÕES EM BAMBU, COM PAINÉIS EM MICROCONCRETO, EM MACEIÓ, ALAGOAS Foto do autor - janeiro de 2005 Segundo o Instituto, a construção apresentou um custo 40% inferior ao das casas convencionais, inovando o sistema anterior que aplicou o reboco no local sobre painéis de bambu, caracterizando painéis monolíticos. Agora, a nova construção inova com fechamento de painéis pré-fabricados, em placas confeccionadas em forma metálica, com encaixes macho e fêmea, usando uma argamassa denominada de “microconcreto”. O novo material é composto por uma mistura de cimento, areia, cal, borracha moída (resíduo de pneus) e bambu triturado. Entre as atividades desenvolvidas pelo Instituto do Bambu está a fabricação de viveiros marinhos. A estrutura dos viveiros é de bambu, sendo as peças impermeabilizas de forma simples e a custo baixo. A técnica utiliza garrafas plásticas já descartadas, que são cortadas na parte superior e na inferior, sendo introduzidas nas peças de bambu de modo a ficarem sobrepostas. Em seguida, as garrafas são aquecidas com um secador de cabelos até atingirem o ponto de fusão do plástico que adere à superfície do bambu, conforme Figura 19. Pode-se aplicar 61 esta solução na técnica mista para impermeabilizar as partes dos esteios e das peças verticais do entramado em contato com o solo FIGURA19 – BAMBU IMPERMEABILIZADO COM GARRAFAS PLÁSTICAS Foto do autor – janeiro de 2005 Entre ourtras construções com bambu, no Brasil, tem-se o atelier do artista José Joaquim Sansano, em Pindorama, São Paulo, edificado em 1993 e o Memorial da Cultura Indígena, com 365 m², do arquiteto David Rees Dias, construído em Campo Grande, Mato Grosso do Sul, conforme Figura 20, estruturado com bambu e coberto com piaçava. FIGURA 20 – MEMORIAL DA CULTURA INDIGENA, CAMPO GRANDE-MS Fonte: http://www.uniderp.br/Atlas/indig3.jpg Em 25/07/06 62 3.2 BAMBU: CLASSIFICAÇÃO, DISTRIBUIÇÃO GEOGRÁFICA, GENEROS E ESPÉCIES Lopez (1974, p.6), estabelece que botanicamente o bambu está classificado como “bambuseae”, um grupo da extensa família Graminae. Devido às características do seu caule, Gaion, Paschoarelli e Pereira (2006, p.2) classificam o bambu como planta lenhosa, monocotilédone, e pertencente às angiospermas, tendo como denominação científica “bambusae” e subfamília das “gramínae”. Para Graça (1988) essa gigantesca gramínea é largamente utilizada em várias regiões do mundo, fazendo parte da cultura de chineses, japoneses, filipinos, indianos e latino-americanos, entre outros. Falando sobre o campo de utilização do bambu, Graça (1988) afirma que o mesmo pode ser consumido como saborosa iguaria, transformado em matéria-prima para papel e celulose, amido, álcool, instrumento musical, móveis, etc. Ainda segundo Graça (1988), o bambu tem aplicação no campo da tecnologia aeroespacial, sendo utilizado pela NASA como isolante de naves espaciais. Geograficamente a distribuição natural do bambu é bastante heterogênea, tanto em quantidade como em variedade de espécies. No mundo, o sul da Ásia e ilhas vizinhas são as regiões de maior concentração do bambu e onde seu emprego está mais desenvolvido. A quantidade de gêneros e espécies de bambu varia a depender das fontes de pesquisa. Para Makino e Nemoto, segundo Lopez (1974), existem no mundo 47 gêneros e 1.250 espécies. A variação decorre em função da classificação botânica de um vegetal considerar, geralmente, a morfologia de suas flores e frutos, e certas espécies de bambu florescem apenas uma vez durante sua existência e desaparecem em seguida. A Figura 21 ilustra as partes do bambu que é formado pelo rizoma, parte subterrânea, e pelo colmo, galhos e folhas, parte aérea. 63 COLMO, GALHOS E FOLHAS RIZOMA FIGURA 21 – PARTES E SUBPARTES DO BAMBU Fonte: http://www.bambubrasileiro.com/info/plantio Em 25/07/06 Os rizomas podem ser classificados como leptomorfo, paquimorfo ou metamorfo. O rizoma leptomorfo é predominante de climas temperados e apresenta usualmente diâmetro menor que do colmo correspondente, tem forma cilíndrica, sendo a seção interrompida nos nós por um diafragma. A Figura 22 representa a configuração de um rizoma leptomorfo. FIGURA 22 – RIZOMA LEPTOMORFO Fonte: http://www.bambubrasileiro.com/info/plantio Em 10/10/06 O rizoma paquimorfo cresce em touceiras, é curto e grosso, de forma curva, raramente esférica e com espessura máxima usualmente maior do que a do colmo, abrangendo bambus de clima tropical. Temos como exemplo de paquimorfo os bambus do gênero Bambusa e Dendrocalamus, conforme configurado na Figura 21. 64 O rizoma metamorfo ou intermediário não se adapta nem ao leptomorfo nem ao paquimorfo, sendo a transformação de um em outro. A ilustração da Figura 23 apresenta o n° 5 como rizoma metamorfo, uma mescla entre o leptomorfo e o paquimorfo. FIGURA 23 – RIZOMAS LEPTOMORFOS, PAQUIMORFOS E METAMORFO (O N° 5) Fonte: http://www.bambubrasileiro.com/info/plantio Em 10/10/06 A propagação do bambu acontece principalmente de forma assexuadamente pela ramificação dos rizomas (sistema radicular do bambuzal), dos colmos ou galhos. Os colmos são a parte que mais facilmente distingue uma espécie de outra por terem tamanhos, diâmetros, cores e texturas diferenciadas. Segundo Lopez (1974), o bambu tem origem que remonta o final do período Cretáceo e início do período Terciário, ou seja, em torno de 65 milhões de anos atrás. Geograficamente essas espécies são encontradas nas áreas tropicais, sub-tropicais e temperadas, com exceção da Europa, onde não existe espécies nativas. A distribuição aproximada de bambus nos continentes é de 3% na África, 30% nas Américas e 67% na Ásia e Oceania. Cerca de 440 espécies de bambu, divididas em 41 gêneros existem nas Américas, distribuídas desde a América do Sul, entre Argentina e Chile, até o México e sul dos Estados Unidos. No Brasil, aproximadamente 200 dessas espécies são nativas, existindo muitas espécies a serem identificadas. Os anexos 1 e 2 relacionam os bambus existentes no Brasil, sendo que o 65 anexo 1 apresenta as espécies nativas no Brasil, com destaque para as da Bahia e no anexo 2 as espécies originárias de outros países e cultivadas no Brasil. No Brasil, em função do quase abandono do uso da taipa de mão na atualidade, e do desconhecimento generalizado sobre as propriedades do bambu como material de construção, temos pouco registro do uso deste material em construções de técnica mista. 3.3 TIPOS DE BAMBU MAIS USADOS NA CONSTRUÇÃO CIVIL Para Graça (1988), os bambus mais utilizados na construção são o Phyllostachys, o Guadua, o Bambusa tuldoides, o Dendrocalamus giganteus, o Bambusa tulda e o Dendrocalamus asper. Para Lopez (1974), as espécies nativas e cultivadas nas Américas de maior uso na construção são: o Chusquea spp, o Bambusa aculatea (Guadua aculatea), o Bambusa amplexifólia (Guadua amplexfolia), o Bambusa superba (Guadua superba) e o Bambusa guadua (Guadua angustifólia). O Guadua superba é encontrado no Brasil. Lopez cita ainda outras espécies usadas na construção originarias da Ásia e cultivadas nas Américas, a saber: Bambusa textilis, Bambusa tuldoides e Bambusa vulgaris. Quanto ao Bambusa vulgaris, Lopez chama a atenção para o fato de que o mesmo é propício ao ataque de insetos. . Cultivado inicialmente para atender à fabrica de celulose instalada no município de Santo Amaro da Purificação, o Bambusa vulgaris, em função da facilidade de propagação da gramínea que é, expandiu-se por toda a área de São Sebastião do Passé e dos municípios vizinhos. Falta, no entanto, o uso da cultura do bambu como material de construção, obedecendo-se os cuidados referentes ao cultivo, à colheita, à cura e ao tratamento de forma correta, para evitar-se o apodrecimento precoce do mesmo. Na entrada de São Sebastião do Passe, na via principal de ligação com a BR-324, a aproximadamente 1 km do centro da cidade, já é encontrado bambu da espécie vulgaris, conforme Figura 24. 66 FIGURA 24 – BAMBU A 1 Km DE SÃO SEBASTIÃO DO PASSÉ Foto do autor – 2006 3.4 TRATAMENTO DO BAMBU O bambu, apesar de sua alta resistência, não está imune ao ataque de pragas e doenças. Quanto mais sua seiva é rica em amido, como é o caso do bambu da espécie vulgaris, mais atrativo ele oferece aos insetos. Dos insetos que atacam o bambu, dois são os mais comuns a broca do bambu (Dinoderus minutus) e o cartucho do bambu (Rhinastus lastistermus). São insetos minúsculos, que atacam transformando a parte lenhosa do bambu em pó. Os maiores inconvenientes para o uso do bambu e da madeira como materiais de construção são os ataques pelos insetos destruidores, por fungos e pelo fogo. Enquanto elementos de bambu ou de madeira não tratados exigem ser trocados aproximadamente a cada 67 dois ou três anos, os que recebem tratamento com substâncias de preservação aumentam a vida útil para quinze anos ou mais Para Graça (1988), ainda durante o período de cultivo faz-se necessário a preservação contra o aparecimento de pragas e doenças, evitando-se sérios prejuízos para toda a plantação. Para tanto, pode-se fazer o controle através da remoção manual dos insetos adultos e da destruição das larvas novas (processo natural) ou sob a orientação de técnico especializado, agrônomo de confiança, ou de órgão agrícola usando método de aplicação de inseticida. Vários são os métodos de tratamento do bambu com a finalidade de, após o corte, aumentar a durabilidade do mesmo, sem perda de suas qualidades mecânicas e estéticas. Os métodos são divididos em dois tipos: métodos químicos e naturais ou não químicos Cada vez mais pesquisadores buscam métodos naturais para o tratamento do bambu, usando substâncias como o Neem, tiririca, eucalipto e tantino da acácia negra. Entre os produtos químicos mais usados na atualidade, destacam-se o CCA (cobre, cromo e arcênico), o Pentox, o Bórax (com ácido bórico), solução de cal e octaborato. Por propiciarem boa retenção e possuírem baixa toxidade os preservativos à base de boro são os mais recomendados. Com base em Lopez (1974), Antunes (1983), Cardoso Junior (2002), Legen (2002), e Graça (1988), apresenta-se a seguir os modos de tratamento do bambu mais aplicados. Os métodos naturais são muito utilizados, apresentam custo baixo e fácil execução, podendo ser empregados pelos próprios usuários, porém, não têm eficácia reconhecida cientificamente. Entre os métodos naturais mais utilizados podemos citar o método de tratamento na mata, o esfumaciar, a lixiviação com água e o tratamento com calor. Fazer corretamente uma relação entre os métodos e técnicas é fundamental para o tratamento do bambu. Existem métodos de tratamento em que o bambu deve estar verde, como 68 os métodos de tratamento por osmoses, por capilaridade e por difusão. Outros métodos, ao contrário, exigem que o bambu esteja seco, como os tratamentos por imersão, por vácuo e por pressão. 3.4.1 Tratamentos naturais 3.4.1.1 Cura Segundo Antunes (1983), a cura é um processo de eliminação da seiva e redução do amido que, se não removido, serve de atrativo para os insetos xilógafos que, com estes componentes e mais a umidade encontram ambiente propício para sua propagação. Segue-se os principais métodos de cura do bambu, conforme Lopez (1974), a saber: a. Cura na mata A cura na mata é uma maneira de obter a redução do amido pela simples transpiração das folhas. O processo consiste em se cortar o colmo e deixá-lo na touceira encostado nos colmos não cortados e apoiado sobre uma pedra, para não ter contato com o solo, devendo ficar na vertical. O colmo cortado fica assim durante um período entre quatro e oito semanas, a depender das condições climáticas. É aconselhável a aplicação de uma solução inseticida na área de corte para evitar o ataque de brocas. Um dos indicativos que a cura está chegando é a queda de suas folhas. Esta é a cura mais recomendada por preservar mais a cor e não sofrer ataques de fungos. b. Cura por imersão Método que consiste em manter os colmos submersos em água num tanque ou rio durante no mínimo quatro semanas ou no máximo oito semanas. Após retirados da água, os colmos são colocados para secar ao ar livre em locais abertos e ventilados. Este não é dos mais eficientes métodos, pois, caso o colmo permaneça submerso mais tempo que o necessário, as peças ficam quebradiças, com rachaduras e podem aparecer manchas. 69 c. Cura com calor Faz-se a cura com calor sobre um braseiro, onde a aproximadamente 40 cm acima das brasas são colocados os colmos e estes deverão ficar em movimento giratório em torno de seu próprio eixo, de modo a evitar a queima da peça. Também, pode ser feito com o uso de um maçarico, sendo que com o maçarico, a cura é feita peça por peça. Durante o tratamento a seiva sai pelos extremos dos colmos em forma de vapor ou bolhas. O banho de calor torna as paredes duras, dificultando o ataque de insetos. O inconveniente desse tratamento é que o calor pode produzir contrações e rachar o bambu. 3.4.1.2 Secagem Para evitar rachar e trazer inconvenientes para o uso do bambu, faz-se necessário, após a cura, promover-se a secagem do mesmo. É uma operação que deve ser realizada com cuidado, pois o bambu racha com muita facilidade se não forem tomados os devidos cuidados. De modo geral, a secagem conduz a uma melhora em todas as propriedades de resistência mecânica e pode ser realizada de várias maneiras. Lopez (1974) apresenta 3 formas de secagem: a. Secagem ao ar Em local abrigado da chuva, do sol, bem ventilado e seco, os colmos são empilhados sobre suportes acima do solo de pelo menos 30 cm. O empilhamento deverá ser feito em camadas, sendo colocadas peças perpendiculares, de apoio sobre cada camada para empilhamento da camada seguinte. Nas pilhas, os colmos devem ficar, entre si, no mínimo metade de seu diâmetro, de modo a garantir ventilação. Ao ar livre, não se tem um tempo exato a ser prescrito para secagem das peças. Estima-se entre seis e doze semanas o tempo para secar, adquirir resistência e evitar fissuras. 70 b. Secagem ao fogo Processo semelhante à cura com calor. Recomenda-se que antes do processo a umidade da peça seja reduzida a 50%. Esse processo, além de eliminar os resíduos do bambu, serve para alinhar peças que tiveram uma má formação. c. Secagem em estufas É semelhante ao processo de secagem em estufa utilizado para madeiras. Oferece maior controle sobre a umidade e é mais rápido. Numa estufa convencional o tempo de secagem é de duas a três semanas. 3.4.2. Tratamento químico preservativo Assim como a madeira, algumas espécies de bambu são mais propensas que outras ao ataque de fungos e insetos, devendo, portanto, ser tratadas com produtos inseticidas e fungicidas. Quando para determinada espécie de bambu o tratamento natural não gera resultado satisfatório, via de regra, produtos químicos são usados para impedir a vida e o desenvolvimento de micoorganismos que atacam o bambu. Esses produtos químicos não devem alterar as características físicas e mecânicas do bambu; devem ser dissolvidos em água; ser líquido, de modo a facilitar as aplicações; ser inodoro e não expelir substâncias tóxicas após aplicação; e produzir o mínimo possível de resíduo tóxico no meio ambiente. Entre as formas de impregnação desses produtos, as principais são: a. Fervura Consiste em ferver o bambu em água pura ou com solvente de outros produtos. Para cada grupo de fervura deve-se manter um período de 15 a 60 minutos. Antes da fervura recomenda-se passar um pano ou estopa molhada de óleo diesel no bambu. Um dos produtos usados na solução 71 é a soda cáustica misturada com água, na proporção de 10 litros de água para 1 litro de soda cáustica, tendo como tempo de fervura 15 minutos. b. Substituição da seiva Método simples que deve ser efetuado logo após o corte e sem retirada das folhas. Corta-se o colmo e encosta-o na moita o mais vertical possível e, ao cessar o gotejamento da seiva na região do corte, coloca-se, na base do colmo, um recipiente com solução preservativa. A solução é absorvida até as parte mais altas devido à transpiração das folhas. A duração do tratamento depende das dimensões do colmo. c. Difusão por encharcamento vertical Para efetuar o tratamento as peças devem ser cortadas com tamanho superior ao tamanho final a ser utilizado. Em seguida, com uma verga de ferro comprida, fura-se os nós (diafragmas), com exceção do último que servira como tampão da peça. Derrama-se a solução preservativa (normalmente um borato) dentro de cada peça, enchendo-a por inteiro. Doze dias após, completa-se cada peça com a solução. Três dias depois de completada a solução, ou seja, quinze dias após o primeiro enchimento da peça, o último nó é rompido e deixa-se a solução escorrer por um filtro para dentro de um recipiente. A solução do recipiente pode ser reutilizada, desde que se corrija a quantidade de boro na solução. d. Impregnação por imersão Para realizar o processo faz-se necessário um tanque para imersão das peças de bambu. Uma forma prática e muito utilizada para se construir o recipiente de imersão é serrar barris de chapa de ferro, de 200 litros, ao meio e soldá-los. Coloca-se no recipiente uma solução preservativa onde as peças ficam por um período maior ou igual a 5 semanas. Esse tempo depende do estado em que se encontram as peças. Segundo Cardoso (2000), o tempo de imersão para as peças rachadas pode ser reduzido em um terço ou até metade do tempo normal, 72 conseguindo-se ótimo resultado. Chama-se a atenção para esse método, pois não foram encontradas soluções adequadas ecologicamente, o que torna o processo inviável. e. Pressão hidrostática Este método é aplicado a bambus recém cortados, cuja seiva está em movimento. Baseado no princípio físico da gravidade, a seiva corre de um recipiente posicionado superior ao bambu e é retirada pela outra extremidade da peça, durando o tratamento entre 5 e 6 dias. Segundo Lopez (1974, p. 100), Boucherie em 1873 idealizou este método, sendo o mesmo aprimorado em 1953 por Purushotham, Sudam y Sagar que desenvolveram o Método de Pressão Hidrostática de Boucherie, dando origem ao Tratamento a Pressão pelo Método de Boucherie Modificado. f. Tratamento a Pressão pelo Método de Boucherie modificado O tratamento é feito de forma pressurizada de modo a fazer passar a solução química através dos colmos e fibras do bambu. Utiliza-se uma bomba de ar comprimido que pressuriza um tanque com saídas de canalizações para mangueiras adaptadas às extremidades do bambu. Peças de bambu recém cortadas e com alto teor de umidade facilitam o tratamento por substituição da seiva. Cuidados especiais devem ser tomados quando do manuseio dessas substâncias químicas que são tóxicas e podem, se não devidamente manipuladas, afetar a saúde do operador, contaminar o solo e a água. g. Injeção pelos colmos A substância preservativa é injetada em cada entrenó com seringa ou outro dispositivo que possibilite a aplicação. Para tanto são feitos furos em ziguezague, um em cada nó. 73 4. METODOLOGIA 4.1 DELIMITAÇÃO DA PESQUISA Resolveu-se por pesquisar o aspecto tecnológico do tema casa de técnica mista, juntamente com aspectos sócio-econômicos relevantes para o estudo em questão. Extensa, é a amplitude de questões a serem pesquisadas cientificamente abordando a técnica. Poder-se-ia pesquisar sobre a segurança estrutural, intrusão, conforto térmico, acústico, lumínico, sobre os materiais a serem empregados no interior e exterior da construção. Em vista do exposto, optou-se por pesquisar o aspecto tecnológico referente a vedação vertical da técnica mista, por ser o seu principal subsistema. Também é relevante a diversidade de funções que a vedação vertical desempenha no sistema construtivo de técnica mista, podendo ser apenas de vedação, de vedação estrutural, ou de elemento visual, como pano de fundo, ressaltado pela cor e textura. Neste trabalho, resolveu-se pesquisar melhorias tecnológicas referentes à vedação vertical da habitação em técnica mista, levando-se em consideração aspectos como: segurança estrutural, estanqueidade aos ventos e chuvas e à propagação de doenças, materiais alternativos para a trama que recebe o solo e melhoria do processo construtivo. Grande é a gama de informações relacionadas aos aspectos sócio-econômicos, porém, neste trabalho foi pesquisado, no contexto da área de estudo, apenas informações referentes à população que ocupa a área, à ocupação dos chefes de família e à renda familiar, para caracterizar o tipo de usuário e saber se de fato trata-se de comunidade de interesse social, além de informações sobre a existência de insetos, principalmente do “barbeiro”, vetor transmissor da doença de Chagas. 74 4.2 IDENTIFICAÇÃO DAS VARIÁVEIS Esta pesquisa levantou como variáveis de estudo: 4.3 ● o perfil de usuários das habitações de técnica mista no bairro do Alegre; ● o material adotado na trama de vedação vertical; ● o tipo de solo adotado para enchimento da trama; e ● o tipo de revestimento das vedações verticais. ESTÁGIOS DA PESQUISA Este trabalho foi desenvolvido envolvendo os seguintes estágios: estágio da pesquisa bibliográfica; estágio de investigação sobre a utilização atual da técnica mista; e o estudo de caso 4.3.1 Estágio da revisão bibliográfica A revisão bibliográfica acompanhou todo o período deste trabalho, desde a concepção do projeto de pesquisa até a entrega para a defesa da dissertação. Foi realizada com base na produção existente na área, constituída de livros, artigos, dissertações e teses, disponibilizadas em formato papel e Internet. Para concretização dos objetivos deste trabalho foram desenvolvidas duas fontes de pesquisa bibliográfica: a primeira apoiada na revisão bibliográfica sobre técnica mista, com revisão da literatura, análise e interpretação do conteúdo relacionado ao tema construções com o material solo e técnica mista; e a segunda, também embasada na revisão bibliográfica, contemplando o estudo da técnica mista estruturada com bambu. 75 4.3.2 Estágio de investigação sobre a utilização atual de técnica mista Considerando ter sido Portugal o país que trouxe para o Brasil a técnica mista, no período compreendido entre dezembro de 2003 e maio de 2004, foi realizada uma investigação no território português sobre a forma atual de execução da técnica mista naquele país. Neste período, a parte de estudos bibliográficos foi desenvolvida na Universidade de Évora, junto ao Departamento de Planeamento Biofísico e Paisagismo, sob a orientação do Professor Dr. Virgolino Ferreira Jorge, tendo como colaboradoras as arquitetas Mariana Correia e Maria Fernandes, ambas integrantes do PROTERRA Na oportunidade, foi realizada uma visita, em dezembro de 2003, a uma exposição de trabalhos referentes à “construção com terra crua” na Escola Superior Gallaecia, em Vila Nova de Cerveira; uma conferência sobre “arquitetura em terra, herança e futuro”, em 18 de abril de 2004, na Câmara Municipal da cidade de Moura, onde aconteceu também, uma exposição sobre “terra na arquitetura Ibero-Americana”; outra conferência, em 8 de maio de 2003, no Salão Nobre da Câmara Municipal da cidade de Évora; uma exposição sobre “a terra na arquitetura”, em 9 de maio de 2003, na Galeria do INATEL em Évora; e uma visita a campo no norte de Portugal, onde se encontram bastantes exemplares de técnica mista (tabiques), incluindo as localidades de Alpedrina, Fundão, Covilã, Guarda, Muxagata, Vila Nova de Foz Côa, Lamego, Tarouca, Ucanha e Salzedas. Entrevista com setores técnicos e pessoas das localidades, levantamento fotográfico e levantamento cadastral de edificação em técnica mista foram realizados procurando-se criar um paralelo entre a técnica mista existente na atualidade nos dois países No Brasil, fazendo parte das investigações de campo durante o período que antecedeu a preparação para coleta das evidências até a etapa de elaboração do relatório sobre o estudo de caso, foram realizadas investigações sobre a técnica mista. Isto aconteceu no Município 76 alagoano de Palmeira dos Índios, contemplando exemplares existentes na sede e na localidade do Moreira, assim como na cidade de Salvador, Estado da Bahia, no bairro de Brotas. Assim como na pesquisa de campo em Portugal, as fontes de evidência utilizadas foram entrevistas com pessoas das localidades que habitam casa em técnica mista e com mestres taipeiros, assim como, levantamento fotográfico e, levantamento cadastral de edificações. 4.3.3 Estágio do estudo de caso O estudo de caso ocorreu entre agosto de 2005 e novembro de 2006. Contemplou a fase preparatória: a coleta de evidências, a análise das evidências e o relatório. Na fase preparatória foram defendidas as questões a serem aplicadas junto à comunidade a ser investigada, foi delimitada a poligonal da área de estudo e foram incorporadas ao mapa do IBGE (que continha apenas a via principal) as construções existentes na poligonal. A fase de coleta das evidências compreendeu o trabalho das entrevistas, dos croquis referentes às plantas e corte das edificações, da observação direta e das fotografias, além da retirada de amostras para caracterização do solo e para reconhecimento da espécie de bambu existente nas imediações da área. A análise das evidências foi realizada com base na estratégia lógica de descrição do caso, onde se procurou primeiro examinar os dados, categorizar e classificar para em seguida desenvolver a análise dos mesmos usando a técnica de construção da explanação. A estrutura adotada foi a analítica linear, tendo como meta conduzir as constatações e resultados do caso para a conclusão do mesmo. 77 4.4 ESTUDO DE CASO Como e por que estabelecer recomendações para melhoria tecnológica da vedação vertical na técnica mista em habitações de interesse social no bairro do Alegre em São Sebastião do Passe? As duas perguntas apontam para um enquadramento da pesquisa usando como estratégia preferida o estudo de caso, ou seja, uma investigação empírica onde o foco se encontra em fenômenos contemporâneos inseridos em contexto da vida real, conforme estabelece, YIN (p.19 e 32) Segundo Yin (1994), nos últimos anos, a avaliar pelo crescente número de projetos de investigação que utilizam como método o estudo de caso, o mesmo tem ganho elevada popularidade como método investigativo. O tópico das “decisões” como foco principal dos estudos de caso pode ser evidenciado da seguinte forma, A essência de um estudo de caso, a principal tendência em todos os tipos de estudo de caso, é que ela tenta esclarecer uma decisão ou um conjunto de decisões: o motivo pelo qual foram tomadas, como foram implementadas e com quais resultados (SCHRAMM, 1971 apud YIN, 2005, p.31) Esta pesquisa procura esclarecer as decisões tomadas com vistas a estabelecer recomendações de melhoria tecnológica da vedação vertical da técnica mista em habitação de interesse social, e usa como meio de implementação uma cartilha a ser distribuída em formato papel para a comunidade estudada e disponibilizada em meio digital, via Internet. As características tecnicamente importantes para a lógica do planejamento de um estudo de caso podem ser expostas segundo duas definições. Na primeira, a definição técnica começa com o escopo de um estudo de caso: Um estudo de caso é uma investigação empírica que investiga um fenômeno contemporâneo dentro de seu contexto da vida real, especialmente quando os limites entre o fenômeno e o contexto não estão claramente definidos. (YIN, 2005, p.32) 78 Neste trabalho o fenômeno de investigação é a técnica mista, com o foco voltado para as vedações verticais, tendo como contexto da vida real o bairro do Alegre em São Sebastião do Passe. Como nem sempre fenômeno e contexto são discerníveis em situações da vida real, um conjunto inteiro de outras características técnicas, como a coleta de dados e as estratégias de análise de dados, exigem a segunda definição técnica: A investigação de um estudo de caso enfrenta uma situação tecnicamente única em que haverá muito mais variáveis de interesse do que pontos de dados, e, como resultado, baseia-se em várias fontes de evidências, com os dados precisando convergir em um formato de triângulo, e, como outro resultado, beneficia-se do desenvolvimento prévio de proposições teóricas para conduzir a coleta e a análise de dados. (YIN, 2005 p.33) Neste estudo de caso as proposições teóricas para condução da coleta e análise dos dados tiveram como referência os estudos bibliográficos, a observação direta e o conhecimento prévio do pesquisador sobre os elementos tecnológicos da técnica mista e em particular a tecnologia de se construir as vedações verticais. Com relação aos propósitos básicos de um estudo de caso, Yin (1994) afirma que o mesmo pode ser conduzido com o propósito de: explorar, descrever ou explicar. Para o autor, unir a teoria sobre o objeto de estudo facilita a resolução dos projetos de estudo de caso e ajuda a deixá-los mais explícitos. Este estudo de caso teve como propósito descrever a situação sócioeconômica dos moradores que habitam casas em técnica mista no bairro do Alegre em São Sebastião do Passe, e os problemas tecnológicos da técnica mista, em particular os problemas da vedação vertical, buscando recomendar as melhorias para problemas diagnosticados, dentro das condições sócio-econômicas. Assim como os experimentos, os estudos de caso são passíveis de serem ampliados por proposições teóricas. Segundo Yin (2005, p.30), “o estudo de caso como experimento, não 79 representa uma “amostragem”, e, ao fazer isso, seu objetivo é expandir e generalizar teorias (generalização analítica) e não enumerar freqüências (generalização estatística)”. 4.4.1 Fase preparatória Para Philliber, Schwab & Samsloss (1988) apud Yin (2005, p.41), uma maneira de se pensar em um trabalho de pesquisa exige, pelo menos responder a quatro problemas: “quais questões estudar, quais dados são relevantes, quais dados a coletar e como analisar os resultados”. Neste estudo de caso foram levantadas as questões relacionadas à técnica mista e em particular à vedação vertical da técnica mista praticada no bairro do Alegre. Foram considerados relevantes dados referentes ao perfil sócio-econômico da população do estudo de caso, dados referentes às construções em técnica mista e dados referentes ao subsistema vedação vertical. Dentro das questões a serem estudadas e com base nos dados considerados relevantes foram enumerados os dados a serem coletados, conforme apresentado no Apêndice A As questões deste trabalho estão relacionadas com a pergunta: como e por que estabelecer recomendações para melhoria tecnológica da vedação vertical na técnica mista em habitação de interesse social, no bairro do Alegre, em São Sebastião do Passé? Para responder a pergunta foco do trabalho foram verificadas questões sobre: o perfil sócio-econômico dos habitantes das edificações em técnica mista referente à área de estudo; os elementos das construções, como área construída, número de pavimentos, cômodos existentes, tempo de construção e construtor; o sistema construtivo, envolvendo os subsistemas fundação e estrutura das edificações, vedação vertical, cobertura, piso e instalações; as patologias das construções; e outras informações sobre ampliação e reforma, orientação das construções, 80 impermeabilização entre piso e paredes, nível de satisfação dos usuários das moradias e uso do bambu na técnica mista. A partir das respostas sobre as questões estabelecidas, proposições foram feitas visando uma análise das mesmas no sentido de verificar se cada proposição estava voltada para o objeto de estudo, ou não. A unidade de análise é a componente relacionada com o problema fundamental de se definir o que é um “caso”. Yin (2005, p.44) estabelece, “como orientação geral, sua tentativa de definição da unidade de análise (e, portanto, do caso) está relacionada à maneira como você definiu as questões iniciais da pesquisa”. Neste trabalho, as questões iniciais da pesquisa dizem respeito a melhorias da vedação vertical em técnica mista para habitações de interesse social, sendo eleita como unidade de análise a poligonal estabelecida para investigação no bairro do Alegre, em São Sebastião do Passé. O estudo de caso foi desenvolvido entre agosto de 2005 e novembro de 2006, tendo como foco a população que habita as casas de técnica mista, as características da técnica mista no Alegre, o método construtivo e a possibilidade de uso do bambu. Referente à população, pesquisou-se a quantidade da mesma, as faixas etárias, sua renda familiar e a ocupação dos chefes de família. Quanto às características da técnica mista, verificou-se o tipo de solo local, tipo de madeira, o tempo de construção das habitações, as reformas e ampliações, as áreas das habitações, a situação dos revestimentos, da pintura, os materiais de cobertura, o número de águas da cobertura, as instalações elétricas, telefônicas, de água potável e de esgoto, o estado de conservação das habitações e o nível de satisfação dos usuários. Sobre o método construtivo, indagou-se sobre o preparo do terreno, a locação e fixação dos esteios, a execução da vedação vertical, da cobertura, do piso, das instalações elétricas, da água potável e do esgotamento sanitário. A respeito da possibilidade de uso do bambu foi perguntado quem já usou, se conhece alguém que já usou e se usaria em sua casa. 81 Num estudo de caso existe uma etapa que prenuncia a análise de dados na pesquisa, devendo haver um projeto de pesquisa dando base a essa análise. Yin (2005, p.47), afirma que “uma abordagem promissora para os estudos de caso é a idéia da “adequação ao padrão” descrita por Donald Campbell (1975), por meio da qual várias partes da informação do mesmo caso podem ser relacionadas à mesma proposição teórica”. A primeira estratégia relacionada à lógica que une os dados às proposições neste estudo de caso foi seguir as proposições teóricas que motivaram o estudo. A partir da questão principal (como e por que estabelecer recomendações para a melhoria tecnológica da vedação vertical da técnica mista?) foram estabelecidas proposições, como: estudar a situação sócio-econômica da população; estudar as características da técnica mista no Alegre; estudar o método construtivo e a possibilidade de uso do bambu na técnica mista. A segunda estratégia foi ter o cuidado de se certificar de que os dados que seriam coletados poderiam ser analisáveis. Como critério para interpretar as constatações, o estudo de caso em questão usou a recombinação das evidências quantitativas e qualitativas, a base teórica pesquisada e o desenvolvimento da descrição do caso. Como teoria para o trabalho de planejamento desta dissertação, foram desenvolvidos componentes de pesquisa vistos anteriormente. Segundo Yin (2005, p.49), “forçará efetivamente a iniciar uma formulação de uma teoria preliminar relacionada ao seu tópico de estudo”. Neste trabalho foi realizada uma base teórica sobre a técnica mista e a técnica mista estruturada com bambu visando à formulação de uma teoria preliminar relacionada com as recomendações para melhoria tecnológica da vedação vertical em técnica mista em habitação de interesse social. Segundo Yin (2005, p.49), “para os estudos de caso, o desenvolvimento da teoria como parte da fase de projeto é essencial, saber se o propósito decorrente do estudo de caso é desenvolver ou tratar a teoria”. 82 O objetivo da base teórica foi estabelecer uma direção suficientemente forte para determinar quais os dados deveriam ser coletados e a estratégias de análise desses dados. Nesta dissertação, os trabalhos existentes pesquisados foram suficientes para oferecer uma boa estrutura teórica facilitando projetar o estudo de caso. Estando o estudo de caso em questão apoiado na teoria descritiva, o seu interesse, segundo Yin (2005, p.50), deve se voltar a questões sobre: “o propósito do trabalho descritivo; a ampla, porém realista, variedade de tópicos que podem ser considerados uma descrição “completa” do que está sendo estudado; e o provável (is) tópico (s) que será (ão) a essência da dissertação”. Continuando, Yin (2005, p.51) afirma que “boas respostas a essas questões, incluindo o fundamento lógico subjacente às respostas, o ajudarão a percorrer um longo caminho rumo ao desenvolvimento da teoria necessária”. Os critérios para julgar a qualidade de qualquer pesquisa social empírica, segundo Yin (2005, p.55-56), são quatro testes que vêm sendo utilizados: a validade do constructo; a validade interna; a validade externa; e a confiabilidade. A validade do constructo tem por finalidade adotar técnicas voltadas para validar os dados coletados, a seqüência da narrativa e o resultado do estudo. Conforme Yin (2005, p.57), o usa de fontes múltiplas de evidência, o encadeamento das evidências e a revisão do rascunho do relatório de estudo por acompanhantes do estudo, são medidas necessárias. Este estudo de caso usou fontes múltiplas de evidência (entrevista, observação direta e fotografia), estabeleceu um encadeamento de evidências e usou o orientador, o co-orientador e outros pesquisadores especialistas nos diversos temas abordados para revisar o rascunho do mesmo. A validade externa visa saber se as descobertas do estudo de caso são generalizáveis além do estudo de caso imediato, logo, se faz necessário testar uma teoria e utilizar a lógica da replicação em estudos de casos múltiplos. 83 A confiabilidade tem como objetivo minimizar os erros e os vieses de um estudo de caso. Para o estudo de caso em questão foi desenvolvido um questionário contendo as evidências relativas ao caso e elaborado um banco de dados com os elementos significativos. Segundo Yin (2005, p.60), no passado, os procedimentos da pesquisa do estudo de caso foram escassamente documentados, para tanto, como tática específica para superar essas deficiências recomenda-se o uso de um “protocolo de estudo de caso” para dar conta da documentação e o desenvolvimento de um “banco de dados” para o estudo em questão. Os projetos sobre estudos de caso podem ser definidos como estudo de caso único ou estudo de casos múltiplos. Porém, projetos referentes a estudos de caso único ou de casos múltiplos podem refletir situações de projetos diferentes e dentro desses dois tipos pode haver unidades unitárias ou múltiplas de análise, transformando os dois em quatro tipos de projetos. Segundo Yin (2005, p.61), “os quatro tipos resultantes de projeto para estudo de caso são projetos (holísticos) de caso único (Tipo 1), projetos (incorporados) de caso único (Tipo 2), projetos (holísticos) de casos múltiplos (Tipo 3) e projetos (incorporados) de casos múltiplos (Tipo 4)”. Yin (2005, p.62-63) recomenda utilizar o estudo de caso único quando o mesmo representa um dos fundamentos lógicos: o caso decisivo; um caso raro ou extremo; o caso representativo ou típico; o caso revelador; e o caso longitudinal. Este projeto trata de estudo de caso único, cujo fundamento lógico é o caso representativo ou típico, no qual, o objetivo é capturar as circunstancias e condições de uma situação lugar-comum, ou seja, investigar melhorias tecnológicas para a vedação vertical da técnica mista. Alguns atributos são necessários para o pesquisador de caso. Yin (2005, p.83) estabelece cinco pré-requisitos para um pesquisador de estudo de caso: ser capaz de fazer boas perguntas e interpretar as respostas; ser um bom ouvinte e não ser enganado pelas próprias ideologias e 84 preconceitos; ser adaptável e flexível às situações encontradas, vendo-as como oportunidades e não como ameaças; ter uma noção clara das questões que estão sendo estudadas; e ser imparcial em relação a noções preconcebidas. Para este estudo de caso foram desenvolvidos alguns modelos de questionário até chegar ao formulário definitivo. Em toda a pesquisa de campo, assim como na pesquisa bibliográfica e na coleta de dados, o pesquisador esteve sempre atento, tanto a ouvir como a verificar evidências, o que aconteceu também durante a observação direta. O trabalho foi desenvolvido sempre com o foco direcionado para o propósito inicial da investigação, sem necessidade de adaptabilidade e flexibilidade para condução do estudo. A compreensão das questões estudadas foi um pré-requisito fácil, tendo-se em vista o apoio da base teórica. Finalmente, o pesquisador procurou estar atento a descobertas contrárias ao que comumente se esperaria. 4.4.2 Coleta das evidências As evidências são os elementos básicos de um caso. Neste estudo, as entrevistas seguiram a linha de investigação do pesquisador, refletindo o objetivo proposto e foram apoiadas em questões reais de forma não tendenciosa. Todas as entrevistas foram realizadas em função da disponibilidade dos respondentes, transcorreram espontaneamente, sendo usadas sempre questões “amigáveis” e “não ameaçadoras”. A observação direta contribuiu com a coleta de evidências, complementando informações não contidas no formulário de entrevista, como o comportamento das vedações verticais em dias de chuva, nos quais, a umidade e a falta de drenagem atingem de forma direta a casa de técnica mista, principalmente a vedação vertical. Como artefato físico utilizou-se a fotografia que em muito ajudou a esclarecer e confirmar evidências detectadas nas entrevistas e na observação direta, assim como contribuiu com novas evidências. 85 A coleta dos dados, segundo Yin, (2005, p.124), deve atender a três princípios básicos: “utilizar várias fontes de evidência; criar um banco de dados para o estudo de caso; e manter o encadeamento das evidências”. Este estudo utilizou os três princípios. Trabalhou com três fontes de evidências, ajudando o pesquisador a fazer frente ao problema de estabelecer a validade do constructo e a confiabilidade do estudo; criou um banco de dados representativo das evidências coletadas; e, por fim, procurou manter o encadeamento das evidências, de modo a permitir ao leitor do estudo de caso acompanhar o mesmo, das questões iniciais à conclusão, dentro de uma seqüência lógica 4.4.3 O método O estudo de caso foi realizado em São Sebastião do Passé por ser uma cidade relativamente próxima a Salvador (em torno de 60 km) e por contar com habitações de interesse social, onde aproximadamente 50% das habitações são de técnica mista. Para definição da poligonal de estudo em São Sebastião do Passé, o pesquisador investigou os bairros da cidade e constatou “in loco” que o bairro do Alegre é o que tem o maior número de casas construídas com técnica mista. Diante disto, foi determinada a escolha deste bairro como recorte na malha urbana. Para a coleta de evidências foi estabelecida uma poligonal de 80.203 m², que abriga 233 construções, sendo 96 em técnica mista e 137 em alvenaria de bloco cerâmico. O questionário foi aplicado de forma aleatória, em 24 habitações de técnica mista, sendo pesquisadas as habitações que no momento tivessem um respondente Para Pattou (1980), a pesquisa qualitativa é associada a dados qualitativos, abordagem interpretativa e análise do caso ou conteúdo. Para Myers (2000), a pesquisa qualitativa busca compreender os fenômenos a partir dos próprios dados, das referências fornecidas pela população estudada e pelos significados atribuídos aos fenômenos. Estas definições reforçam a 86 importância dos dados na pesquisa qualitativa, exigindo a escolha adequada das fontes de evidência e dos princípios para a coleta dos dados. As questões levantadas através das entrevistas com os moradores contemplaram a. Dados gerais sobre os habitantes Nome do proprietário, endereço, número de habitantes do sexo masculino, número de habitantes do sexo feminino, idade dos moradores, renda familiar e fonte de renda. b. Dados gerais sobre a construção: Área construída, número de pavimentos, cômodos, tempo de construção e construtor. c. Dados gerais sobre o sistema construtivo: Sobre os subsistemas fundação e estrutura, paredes, cobertura, piso e instalações. d. Dados sobre patologias: Sobre umidade, trincas, bolor,fendas e insetos. e. Outras informações: Sobre reforma e, ou ampliação da habitação, orientação da fachada, impermeabilização entre piso e parede, nível de satisfação dos usuários das moradias e se já usou, se conhece quem usa e se usaria em sua habitação o bambu como material de construção Os dados obtidos através de observação direta do pesquisador informaram a situação de infra-estrutura da área de estudo e forneceram elementos para cadastrar o estado de conservação das habitações contidas na poligonal. Como elementos de infra-estrutura anotou-se a existência ou não de passeio, drenagem, rede de esgoto, de água, rede elétrica e telefonia. Como estado de conservação foram observadas as 96 habitações da poligonal, adotando-se os referenciais a seguir: 87 ▪ casa em ruína: : ▪ casa em tombamento: edificação parcialmente desmoronada; edificação que não desmoronou, porém está escorada para não desabar; ▪ casa em estado ruim: edificação sem reboco e sem pintura; ▪ casa em estado regular: edificação com reboco e com pintura apenas na parede frontal; e ▪ casa em estado bom: : edificação totalmente rebocada, pintada e no prumo, sem escoramento de qualquer natureza. Os dados fotográficos retrataram trechos da poligonal, conjunto de edificações, detalhes de patologias e os habitantes das 24 habitações que foram objeto de entrevista, inclusive as habitações. Como parte do estudo de campo foram retiradas amostras de solo na poligonal de estudo com a finalidade de caracterização do mesmo, assim como amostras de bambu fora da poligonal nas imediações da cidade, também com a finalidade de caracterização da espécie de bambu. 4.4.4 Análise das evidências Este estudo procurou, na fase de análise dos dados, examinar, categorizar, classificar em tabelas e recombinar as evidências, quando necessário, para tratar as proposições iniciais do estudo. Para Yin (2005, p.143), “a melhor preparação para conduzir a análise de estudo de caso é ter uma estratégia analítica geral”. O autor estabelece três estratégias baseando-se em: proposições teóricas, explanações concorrentes e descrições do caso. Este estudo adotou como estratégia analítica geral de análise das evidências uma estrutura descritiva visando estabelecer um encadeamento das evidências. 88 O caráter descritivo apoiou-se em descrições compactas do caso, buscando um alcance analítico e investigativo da situação, visando sempre detectar problemas e buscar soluções a serem recomendadas. “É aqui que o estudo de caso ultrapassa a mera função descritiva e atinge um nível analítico que pode ajudar a gerar teorias e novas questões para a futura investigação” (PONTE, 1994, apud COUTINHO e CHAVES, 2002) Interpretar e avaliar a descrição dos fatos foi o que exigiu maior dedicação do tempo, principalmente para os dados da maior significância. Buscou-se sempre o foco do trabalho, pois o ponto crítico de uma investigação qualitativa não é o fato de se acumular dados e sim, o de filtrar a grande parte dos dados acumulados e revelar essências que tenham a ver com o contexto, de modo a propiciar um juízo consistente acerca das conclusões do estudo Os resultados das entrevistas foram sistematizados e apresentados sob a forma de tabelas apresentadas no escopo do trabalho, as anotações sobre observações diretas foram armazenadas no banco de dados, assim como as fotografias, das quais, parte está no escopo do trabalho acompanhando a narrativa e parte foi armazenada. No final da análise foi feita uma checagem para verificar se todas as evidências foram analisadas e se a análise teve como foco as questões mais importantes. 4.4.5 Construção do relatório Para a construção do relatório foi adotada a estrutura analítica linear que é a mais vantajosa para o público alvo em questão, por representar a abordagem padrão em relatórios de pesquisa e é aplicável a estudos de casos descritivos. A estrutura analítica linear consiste seqüencialmente em um tema (problema), a revisão da literatura, a análise dos métodos 89 analisados, as descobertas feitas a partir dos dados coletados e analisados, e as conclusões e implicações feitas a partir das descobertas. Definido o público alvo, formado por grupos especiais interessados no tema, líderes comunitários, colegas acadêmicos, profissionais da área e a banca examinadora, assim como a estrutura de composição, foram adotados vários procedimentos de apoio junto ao orientador, coorientador, professores do mestrado e colegas mestrandos, que disponibilizaram seu tempo e conhecimentos para discutir e contribuir com o andamento do trabalho. O relatório situa o local destinado ao estudo, estabelece a unidade de análise, descreve e avalia a situação sócio-econômica da população, as características da técnica mista do Alegre, o método construtivo da mesma e a investiga sobre a possibilidade de uso do bambu na técnica mista no Alegre. A seguir, discute, avalia e estabelece recomendações para a melhoria tecnológica da vedação vertical da técnica mista. 90 5. ESTUDO DE CASO Este capítulo trata sobre o Estudo de Caso realizado no bairro do Alegre na Cidade de São Sebastião do Passé, local possuidor de habitações de interesse social em técnica mista. O estudo buscou detectar as patologias da vedação vertical executada com a técnica em pesquisa e seus agentes causadores, visando-se estabelecer recomendações para a anulação das mesmas. O estudo começa com o estabelecimento da unidade de análise, faz-se a avaliação sócio-econômica da população, apresenta-se dados sobre as características da técnica mista local, descreve-se o processo construtivo da mesma e avalia-se a possibilidade da utilização do uso do bambu em substituição à madeira. Em função do objetivo da investigação, tornou-se como requisito encontrar o mais próximo de Salvador, para facilitar o desenvolvimento da mesma, uma localidade com habitações de interesse social executadas em terra crua e com uso da técnica objeto de estudo. Desta forma, o bairro do Alegre, situado na periferia da cidade de São Sebastião do Passé, foi escolhido. São Sebastião do Passé está localizada nas coordenadas geográficas 12° 30´ 46” S e 38° 29´48” O, conforme indica a Figura 25, encontra-se numa altitude de 37m e dista aproximadamente 60 km da Capital do estado, Salvador. FIGURA 25– MAPA DO ESTADO DA BAHIA, LOCALIZANDO SÃO SEBASTIÃO DO PASSÉ Fonte: IBGE 91 O clima de São Sebastião do Passé é quente e úmido, seu território possui 553,4 km², limitando-se com os municípios de Terra Nova, Catu, Pojuca, Mata de São João, Dias Dávila, Candeias, São Francisco do Conde e Santo Amaro. Segundo o IBGE, censo de 1999, tem uma população de 38.422 habitantes, sendo 19.258 homens e 19.164 mulheres. São Sebastião do Passé, possui segundo o AGRITEMPO (2008), solo argiloso e arenoso, além de contar com uma pequena reserva de mata, o que justifica a existência de habitações em técnica mista, tanto na zona rural quanto na zona urbana. Na sede municipal a área que dispõe de um maior número de habitações em técnica mista é o bairro do Alegre. FIGURA 26– FOTO AÉREA DE SÃO SEBASTIÃO DO PASSÉ Fonte: PREFEITURA DE SÃO SEBASTIÃO DO PASSÉ 5.1 O bairro do Alegre O bairro do Alegre, um dos mais pobres da cidade, está situado na parte sul da sede municipal e apresenta uma quantidade significativa de habitações erguidas com trama de madeira e fechada com barro argiloso, o sistema construtivo de técnica mista, denominado localmente de 92 “taipa”. Para efeito de desenvolvimento do trabalho foi definida uma poligonal, onde se realizou o estudo de caso, conforme mapas a seguir. FIGURA 27 – MAPA GERAL DE SÃO SEBASTIÃO DO PASSÉ - LOCALIZAÇÃO DA POLIGONAL DE ESTUDO Fonte: IBGE A poligonal foi definida ao longo da Rua Emílio Albino Abraão e tem como referência no mapa a Central de Abastecimento de São Sebastião do Passé. A área total da poligonal é de 80.203 m². Os pontos vermelhos dentro da poligonal indicam construções em técnica mista e os demais, construções em alvenaria de bloco cerâmico. 93 FIGURA 28 – MAPA DA POLIGONAL DESTACANDO AS EDIFICAÇÕES Lançamento das edificações: O AUTOR Base cartográfica: IBGE 5.1.1 Casas em técnica mista e casas em alvenaria na poligonal de estudo A poligonal engloba 233 habitações, sendo 96 em técnica mista e 137 em alvenaria de bloco cerâmico, conforme dados da tabela 1. 94 Tabela 1 – TOTAL DAS CONSTRUÇÕES NA POLIGONAL SISTEMA CONSTRUTIVO QUANTIDADE % TÉCNICA MISTA 96 41,20 ALVENARIA DE BLOCOCERÂMICO 137 58,80 TOTAL 233 100,00 FIGURA 29 – POLIGONAL DE ESTUDO DESTACANDO AS 96 CASAS EM TÉCNICA MISTA Indicação das casas: O AUTOR Base cartográfica: IBGE 5.1.2 Habitantes no universo de amostra das 24 casas Das 96 casas em técnica mista, foi realizada investigação em 24 casas, sendo as mesmas escolhidas em função da disponibilidade de seus moradores quando do cadastramento das edificações para lançamento no mapa do IBGE. O universo de amostragem, 24 casas, possui uma população de 95 habitantes, sendo 53 do sexo masculino e 42 do sexo feminino, com 95 predominância da faixa etária compreendida entre 6 e 10 anos, (com 21,05% do total), seguida da população de faixa etária entre 21 e 30 anos (17,89%), conforme tabela 2 a seguir. Tabela 2 – HABITANTES NAS CONSTRUÇÕES EM TÉCNICA MISTA FAIXA ETÁRIA SEXO MASC. % SEXO FEM % TOTAL % DE 0 A 5 ANOS 6 11,32 4 9,52 10 10,53 DE 6 A 10 ANOS 11 20,75 9 21,43 20 21,05 DE 11 A 15 ANOS 8 15,09 2 4,76 10 10,53 DE 16 A 20 ANOS 6 11,32 4 9,52 10 10,53 DE 21 A 30 ANOS 7 13,21 10 23,81 17 17,89 DE 31 A 40 ANOS 4 7,55 7 16,67 11 11,58 DE 4 A 50 ANOS 1 1,89 2 4,76 3 3,16 DE 51 A 60 ANOS 3 5,66 4 9,33 7 7,37 DE 61 A 70 ANOS 6 11,32 - - 6 6,31 ACIMA DE 70 ANOS 1 1,89 - - 1 1,05 TOTAL 53 100,00 42 100,00 95 100,00 UNIVERSO DE AMOSTRAGEM: 24 CASAS 5.1.3 Ocupação dos chefes de família no universo de amostragem A situação de ocupação dos chefes de família apresenta o “biscate” como sendo a principal fonte de renda, prevalecendo sobre as demais com 50%, seguida dos aposentados/pensionistas com 29,16%, sendo 16,67 empregados e 4,17% autônomos, conforme tabela 3. 96 Tabela 3 – SITUAÇÃO DE OCUPAÇÃO DOS CHEFES DE FAMÍLIA OCUPAÇÃO QUANTIDADE % AUTONOMO 1 4,17 BISCATEIRO 12 50,00 EMPREGADO 4 16,67 APOSENTADO/PENSIONISTA 7 29,16 24 100,00 TOTAL UNIVERSO DE AMOSTRAGEM: 24 CASAS 5.1.4 Renda familiar no universo de amostragem A renda mensal familiar no universo da amostragem varia entre R$ 30,00 (trinta reais) e R$ 600,00 (seiscentos reais), sendo que 91,66% têm renda igual ou inferior a 1 S. M., 25% com renda menor que 1/2 S. M. e apenas 8,34% têm renda entre 1 e 1/2 S. M. O valor da renda média das 24 famílias é de R$ 257,79 (duzentos e cinqüenta e sete reais e setenta e nove centavos). A tabela 4 traz detalhada a situação da renda familiar. Tabela 4 – RENDA FAMILIAR RENDA FAMILIAR QUANTIDADE % % ACUMULADO (-) DE ½ S. M. 6 25,00 25,00 DE ½ A (-) DE 1 S. M. 11 45,83 70,83 1 S. M. 5 20,83 91,66 (+) DE 1 E (-) DE 2 S. M. 2 8,34 100,00 TOTAL 24 100,00 UNIVERSO DE AMOSTRAGEM: 24 CASAS 97 5.2 DADOS REFERENTES À TÉCNICA MISTA ATUAL EM SÃO SEBASTIÃO DO PASSÉ Usando a terra crua, ou seja, a terra natural, sem processo de queima, e a madeira, local, vinda das mata existente no município, boa parte dos moradores do Alegre, em torno de 42%, construíram suas casas em técnica mista. Mostra-se a seguir dados referentes à caracterização do solo local, ao tempo de vida das atuais habitações em técnica mista, as construções reformadas e ou ampliadas, às áreas construídas e aos demais elementos relativos às construções atuais. 5.2.1 O solo local Para conhecimento do solo local foram realizados ensaios de laboratório e testes expeditos de campo, elaborados em duas etapas, conforme apresentado a seguir: Primeira etapa – Apenas caracterização do solo local Caracterização realizada pelo Laboratório de Geotecnia da Escola Politécnica da Universidade Federal da Bahia. Visando conhecer e caracterizar o solo da área de estudo, foram coletadas três amostras de solos em pontos distintos localizados no início da poligonal que engloba a área de estudo, próximo ao meio e no final da mesma. A primeira amostra foi retirada próximo ao meio da poligonal, no fundo da habitação de número 40, indicada na figura 29, página 99, uma casa situada ao “pé da ladeira”, ponto que separa o Alegre de Cima do Alegre de Baixo. A figura 30 registra a retirada da primeira amostra de solo, no mesmo local do barreiro onde foi preparado o solo para a construção. 98 FIGURA 30 – FOTO REFERENTE À RETIRADA DA PRIMEIRA AMOSTRA DE SOLO FOTO DO AUTOR (2005) Para a segunda amostra retirou-se o solo no início da poligonal, na parte posterior da casa 1 do mapa referente a figura 29, no Alegre de Baixo, a aproximadamente, 4 m da parede de fundo da citada residência; e finalmente, a terceira amostra foi coletada do lado direito (olhando da rua para a habitação) da casa 87, do mapa referenciado anteriormente, próximo ao final da poligonal, no Alegre de cima. O anexo 2 contem os ensaios de caracterização realizados pelo Laboratório de Geotecnia da Escola Politécnica da Universidade Federal da Bahia, realizados de acordo com a NBR-7181 Análise granulométrica, NBR-6459 Limite de liquidez, NBR-7180 Limite de plasticidade e NBR-6508 Densidade real dos grãos, todas, normas da ABNT. . Os dados de caracterização do solo feitos na primeira etapa pelo Laboratório de Geotecnia da Escola Politécnica estão na Tabela 5. 99 Tabela 5 – CARACTERIZAÇÃO DO SOLO DA PRIMEIRA ETAPA LIMITES AMOSTRA 1 AMOSTRA 2 AMOSTRA 3 WL 55% 32% 69% WP 29% 21% 34% IP 26% 11% 35% GRANULOMETRIA SEGUNDO A NBR-7181 DA ABNT PEDREGULHO 3% 5% 0% AREIA GROSSA 1% 7% 1% AREIA MÉDIA 1% 16% 2% AREIA FINA SILTE 21% 21% 0% 36% 31% 36% ARGILA 38% 20% AVERMELHADA - - TEXTURA ORIGEM 51% DE ARGILA - - SEDIMENTAR - - COR Segundo o PROTERRA (2003, p.221), para o uso do solo em na taipa de mão, caso o mesmo seja composto de partículas granulares mais finas, deverá apresentar uma composição granulométrica em torno de 0% de pedregulho; 1% de areia grossa; 49% de areia fina; 31% de silte e 19% de argila. Caso o solo seja composto de partículas granulares mais grossas, deverá possuir uma composição granulométrica em torno de 5% de pedregulho; 19% de areia grossa; 52% de areia fina; 17% de silte e 7% de argila. Avaliando-se os dados granulométricos dos 3 solos e comparando-os com a recomendação do PROTERRA, o mais próximo para o uso em técnica mista seria o da amostra 2. O critério do PROTERRA, como visto anteriormente, não especifica uma faixa de valores para as frações do solo, apenas cita como referência “em torno de um determinado percentual”, 100 deixando em aberto os limites inferiores e superiores do percentual. Deixa também de referenciar o percentual de areia fina em ambas as composições granulométricas. Com base na análise do laboratório, faz-se adiante uma avaliação dos dados representativos das três amostras e uma comparação entre os dados granulométricos apresentados e os dados granulométricos considerados pelo PROTERRA (2003) como sendo os de melhor composição para a técnica mista. Os índices de plasticidade que, segundo a NBR-7180, correspondem aos respectivos limites de liquidez (WL) menos os limites de plasticidade (WP), indicam, a depender do seu valor, a plasticidade dos solos. Ainda segundo a citada norma, solos com índice de plasticidade (IP) igual a 0 (zero), correspondem a solos não plásticos; solos com IP maior que 1 e menor que 7, correspondem a solos pouco plásticos; solos com IP maior que 7 e menor que 15, correspondem a solos de média plasticidade; e, solos com IP maior que 15, correspondem a solos muito plásticos. Desta forma, os solos das amostras 1 e 3 são de muita plasticidade e o solo da amostra 2, de plasticidade média. A tabela 6, a seguir, apresenta cada solo e sua respectiva plasticidade. Tabela 6 – PLASTICIDADE DOS SOLOS DA PRIMEIRA ETAPA CLASSIFICAÇÃO: SOLOS NÃO PLÁSTICO POUCO PLÁSTICO - - MEDIANAMENTE PLÁSTICO 2 MUITO PLASTICO 1e3 Fonte: Laboratório de Geotecnia da Escola Politécnica da UFBA Tratamento de dados: O autor Ano: 2005, 2006 e 2007 Porém, apenas o IP não é suficiente para se julgar a plasticidade de um solo. Casagrande (1948), propôs a conhecida carta de plasticidade, em função do IP e do WL. O laboratório de geotecnia da Escola Politécnica da UFBA trabalha com a carta de plasticidade onde divide o grau de compressividade dos solos em três áreas e não em duas, como era feito convencionalmente, e usa a classificação segundo o Sistema Unificado de Classificação dos Solos - USCS. A carta é 101 representada por um gráfico onde o eixo das abscissas representa os valores do limite de liquidez (WL) e o eixo das ordenadas o IP. Duas retas horizontais definidas pelos Ip = 4 e IP = 7, e uma reta inclinada que separa os solos com tendência a solos argilosos, os situados acima da reta e os com tendência a solos siltosos, os que estão abaixo da mesma, definem a área dos solos com tendência a SC-SM (argilosos e siltosos de baixa compressividade). Duas retas verticais situadas nas abscissas 30 (WL = 30) e 50 (WL = 50), separam as áreas correspondentes à compresividade dos solos. Os solos à esquerda da abscissa 30, acima da ordenada de IP = 7 e da reta inclinada têm tendência a serem solos CL (argilosos de baixa compressividade). Os solos à esquerda da abscissa 30, abaixo da ordenada de IP = 4 e da reta inclinada têm tendência a serem solos ML (siltosos de baixa compressividade). Os solos compreendidos entre as abscissas 30 e 50 e acima da reta inclinada, têm tendência a solos CI (argiloso de média compressividade), sendo os abaixo da reta inclinada, com tendência a solos MI (siltoso de média compressividade). Os solos à direita da abscissa 50 e acima da reta inclinada têm tendência a solos CH (argiloso de alta compressividade) e os situados abaixo, de solos MH (siltoso de alta compressividade). A figura 31 mostra a carta de plasticidade com os 3 solos caracterizados, onde o solo 1 está na área CH (solo argiloso de alta compressividade), o 2 na área CI (solo argiloso de média compressividade) e o solo 3 na área MH (solo siltoso de alta compressividade). 102 FIGURA 31 – CARTA DE PLASTICIDADE DOS 3 SOLOS NATURAIS DA PRIMEIRA ETAPA Fonte: Laboratório de Geotecnia da Escola Politécnica da UFBA Tratamento de dados: O autor Ano: 2007 Outro elemento a ser considerado é a atividade (A) do solo, caracterizada pela carga elétrica negativa existente na superfície das partículas do argilo-mineral. As atividades físicas oriundas da carga superficial são denominadas de “atividade de superfície do argilo-mineral”. A intensidade da atividade depende principalmente das características do argilo-mineral contido no solo, sendo a atividade, segundo Skempton (1953), o valor do IP dividido pelo percentual de argila do solo (% < 0,002mm). Ainda, segundo Skempton, caso o resultado desta relação seja menor que 0,75 o solo é considerado inativo; caso seja maior que 0,75 e menor que 1,25 o solo é medianamente ativo; e, se for maior que 1,25 o solo é ativo. Com base na classificação do solo, segundo Skempton e nos ensaios de laboratório, a mostra 1 possui A= 0,68, a amostra 2 possui A= 0,55 e a amostra 3 possui A= 0,69, ou seja, os solos das 3 amostras são solos inativos. A tabela 7 mostra a classificação dos 3 solos em relação à atividade dos mesmos. Tabela 7 – ATIVIDADE DOS SOLOS DA PRIMEIRA ETAPA CLASSIFICAÇÃO: SOLOS INATIVO MEDIANAMENTE ATIVO ATIVO 1, 2 e 3 - - Fonte: Laboratório de Geotecnia da Escola Politécnica da UFBA Tratamento de dados: O autor Ano: 2005 e 2006 103 Entre os solos argilo-minerais, o grupo caulinita, o ilita e o montmoronilita são considerados como principais. A caulinita possui 0,3 <A< 0,5, logo , são solos inativos; a ilita, 0,5 <A< 1,5, sendo parte inativo, parte medianamente ativo e parte ativo; e a montmorilonita, 4 <A< 8, sendo todos altamente ativos. Quanto maior a atividade do argilo-mineral, maior será a compressibilidade do solo e maior será a deformabilidade do mesmo em presença da água. Dessa forma, os solos do grupo caulinita são os mais indicados para o uso na taipa de mão, assim como, os do grupo ilita com A< 0,75. Com base nas análises apresentadas e nos resultados de laboratório, a princípio, o solo mais apropriado para uso na taipa de mão é o solo 2, classificado pela carta de plasticidade, segundo o USCS, como CI (solo argiloso de média compressividade), sendo descartados os solos 1 e 3, por serem altamente compressivos. Para uso dos mesmos, é recomendável o aditamento de solo arenoso, e ou, siltoso de baixa compressividade, ou ainda, o aditamento de fibras vegetais e outros materiais recomendados pelo estudiosos de solos para o uso em pauta. Tal aditamento ajudará a reduzir o fenômeno de retração da massa plástica a ser usada. Segunda etapa – Caracterização e testes expeditos de campo do solo natural e das misturas Numa segunda etapa foram realizados novos ensaios com amostras retiradas dos mesmos terrenos da primeira etapa. A nova caracterização visou comparar os resultados dos solos naturais da primeira etapa, com as novas amostras da segunda etapa, e caracterizar novos solos obtidos a partir da mistura com adição de areia de um dos solos da segunda etapa. Também, foram realizados testes expeditos recomendados por autores citados neste trabalho, com o propósito de comparar os resultados das leituras de cada teste com os resultados da caracterização obtidos em laboratório. 104 Os solos da segunda etapa foram destacados dos da primeira com a inserção da letra A. Assim, as amostras dos solos naturais receberam a denominação de 1A, 2A e 3A. Os solos misturados foram obtidos a partir do solo natural 3A, e as denominações estabelecidas acrescentando-se um numeral, na ordem crescente, de 1 a 8. Ou seja, o primeiro solo misturado é o solo 3A.1, o segundo 3A.2 e assim sucessivamente, até o solo 3A.8. A amostra do solo natural 1A foi retirada no terreno livre, ao fundo da casa 40 e no mesmo local da amostra anterior, conforme mostra a figura 32. FIGURA 32 – FOTO REFERENTE A RETIRADA DA PRIMEIRA AMOSTRA DE SOLO FOTO DO AUTOR (2007) A amostra do solo natural 2A, ao invés de ser coletada a 10 cm da cota superficial do terreno e a 4 m do fundo da casa 1 como aconteceu na primeira coleta, foi retirada ao pé da parede dos fundos, onde estava acumulada boa parte de solo proveniente da deteriorização da citada parede. Antes da coleta, foi descartada a camada superficial de vegetação, mostra a figura 33. conforme 105 FIGURA 33 – FOTO REFERENTE A RETIRADA DA SEGUNDA AMOSTRA DE SOLO FOTO DO AUTOR (2007) A amostra 3A foi retirada no mesmo local da anterior, ao lado direito da casa 87 em técnica mista. A figura 34 mostra a foto do local da retirada da amostra.. FIGURA 34 – FOTO REFERENTE A RETIRADA DA TERCEIRA AMOSTRA DE SOLO FOTO DO AUTOR (2007) Onze amostras de solos foram enviadas para o Laboratório de Geotecnia da Escola Politécnica da UFBA para efeito de caracterização dos 3 solos naturais e dos 8 solos misturados. Outras onze amostras foram utilizadas para a realização de testes expeditos, como o teste das bolas, de Mitidieri e outros (1987), citado no capítulo 3, página 62; o teste da pressão dos dedos, 106 de Gieth e outros (1994), citado no capítulo 3, página 62; o teste do rolo, de Neves e outros (2005), citado no capítulo 3, página 63; e o teste de contração de Lengen (2002). O último autor estabelece fazer-se uma mistura maleável do solo e colocar numa caixa de 4 x 4 x 40 cm, deixando a mesma secar a sombra. Seca a mistura procede-se a medição de quanto a mesma encolheu no sentido longitudinal da caixa. A medida não deve ser maior que 10% do comprimento da caixa, ou seja, 4 cm. Caracterização A tabela 8 apresenta a caracterização dos solos da segunda etapa, também realizada pelo Laboratório de Geotecnia da Escola politécnica da UFBA, conforme ensaios contidos no anexo 2. Tabela 8 – CARACTERIZAÇÃO DOS SOLOS DA SEGUNDA ETAPA LIMITES 1A 2A 3A 3A.1 3A.2 3A.3 3A.4 3A5 3A6 3A7 3A8 WL 52% 48% 65% 37% 31% 24% 21% 22% 20% 22% NL% WP 29% 26% 33% 22% 19% 15% 15% 15% 14% 14% NP% IP 2 3% 22% 32% 15% 12% 9% 6% 7% 6% 8% NP% GRANULOMETRIA SEGUNDO A NBR-7181 DABNT PEDREGULHO 1% 1% 0% 1% 1% 2% 1% 1% 1% 0% 0% AREIA GROSSA 4% 3% 1% 11% 12% 13% 12% 14% 13% 14% 15% AREIA MÉDIA 6% 6% 2% 26% 26% 34% 35% 42% 41% 42% 45% AREIA FINA 11% 17% 10% 13% 13% 15% 20% 19% 17% 16% 18% SILTE 40% 32% 34% 21% 20% 18% 17% 8% 11% 9% 11% ARGILA 38% 41% 53% 28% 28% 18% 15% 16% 17% 19% 11% Comparando-se os dados das 3 amostras da primeira etapa (amostras 1, 2 e 3) com as 3 primeiras amostras da segunda etapa (amostras 1A, 2A e 3 A), tem-se: 107 Quanto à plasticidade, o solo 3A.8 é não plástico, o 3A.4, 3A.5 e 3A.6 são pouco plásticos (1 <IP < 7), o 2, 3A.1, 3A.2, 3A.3 e 3A.7 são medianamente plásticos (7 < IP < 15), os demais, o 1, 3, 1A, 2A e 3A são muito plásticos (IP > 15). A tabela 9 apresenta a plasticidade dos solos da primeira e segunda etapa, oferecendo de forma simplificada uma leitura sobre a classificação dos mesmos. Tabela 9 – PLASTICIDADE DOS SOLOS DAS 1ª E 2ª ETAPAS CLASSIFICAÇÃO: SOLOS NÃO PLÁSTICO 3A.8 POUCO PLÁSTICO MEDIANAMENTE PLÁSTICO MUITO PLASTICO 3A.4, 3A.5 e 3A.6 2, 3A.1, 3A.2, 3A.3 e 3A.7 1, 3, 1A, 2A e 3A Fonte: Laboratório de Geotecnia da Escola Politécnica da UFBA Tratamento de dados: O autor Ano: 2005, 2006 e 2007 Como visto antes, apenas o IP não basta para se julgar a plasticidade de um solo. A carta de plasticidade apresentada na figura 35 mostra a posição de cada solo, conforme os resultados do laboratório. FIGURA 35 – CARTA DE PLASTICIDADE DOS SOLOS NATURAIS DAS DUAS ETAPAS E DOS SOLOS MISTURADOS Fonte: Laboratório de Geotecnia da Escola Politécnica da UFBA Tratamento de dados: O autor Ano: 2007 Conforme a carta e segundo o USCS, são classificados como CH (solo argiloso de alta compressividade) os solos 1 e 2; CI (solo argiloso de média compressividade) os solos 2A, 3A.1 e 3A.2 ; MH (solo siltoso de alta compressividade) os solos 3, 1A e 3A; SC (solo arenoso bem 108 graduado com argila) os solos 3A.3 e 3A.7; e SC-MC (solo arenoso bem graduado, com argila e com silte) os solos 3A.4, 3A.5 e 3A.6. A tabela 10 mostra à classificação dos solos ensaiados em laboratório referentes as duas etapas, com base na carta de plasticidade e segundo o sistema USCS. Tabela 10 – CLASSIFICAÇÃO DOS SOLOS SEGUNDO O USCS CLASSIFICAÇÃO: CH SOLOS: 1e2 CI 2A, 3A.1 e 3A.2 CL MH SC - 3, 1A e 3A 3A.3 e 3A.7 SC – SM NP 3A.4, 3A.5 e 3A.6 3A.8 Fonte: Laboratório de Geotecnia, Escola Politécnica - UFBA Tratamento de dados: O autor Ano: 2005, 2006 e 2007 Com relação à atividade, exceto o solo 3A.8 que é não plástico, tanto os solos da primeira etapa, quanto os da segunda são inativos (A < 0,75). A tabela 11 apresenta a atividade dos solos ensaiados na primeira e segunda etapa, oferecendo, de forma simplificada, uma leitura sobre carga elétrica superficial de cada solo. Tabela 11 – ATIVIDADE DOS SOLOS DA 1ª E 2ª ETAPAS CLASSIFICAÇÃO: SOLOS INATIVO MEDIANAMENTE ATIVO 1, 2, 3, 1A, 2A, 3A,3A.1, 3A.2, 3A.3, 3A.4, 3A.5, 3A.6 e 3A.7 Fonte: Laboratório de Geotecnia da Escola Politécnica da UFBA - Tratamento de dados: O autor ATIVO - Ano: 2005 e 2006 Comparando-se a granulometria do solo da amostra 1 com o da 1A: o primeiro apresenta 2% a mais de pedregulho; 3% a menos de areia grossa; 5% a menos de areia média; 10% a mais de areia fina; 4% a menos de silte; e o percentual de argila é igual para ambos, ou seja, 38%. O solo da amostra 2 em relação ao 2A apresenta 4% a mais de pedregulho e de areia grossa; 10% a mais de areia média; 4% a mais de areia fina; 1% a menos de silte; e 21% a menos de argila. A amostra 2 foi retirada a aproximadamente 4 m da parede de fundo da casa, enquanto a amostra 2A foi retirada ao pé da citada parede. A amostra 3, da primeira fase, comparada com a amostra 3A tem granulometria bastante similar, com os mesmos percentuais de pedregulho, areia grossa e 109 areia média; o solo 3 tem 0% de areia fina e o 3A 10%; o 3 tem 2% a mais de silte; e 2% a menos de argila que o 3A. Comparando-se as frações de cada solo com as recomendadas pelo PROTERRA, os solos mais próximos são os das amostras 3A.3 a 3A.7. Com base nos resultados de laboratório e nas análises realizadas, os solos mais indicados para a taipa de mão são os da tabela 12 (solos de 3A.3 a 3A.7), por serem plásticos de baixa compressividade, e ou, arenosos bem graduados com silte e argila. Tabela 12 – SOLOS POSSÍVEIS DE RECOMENDAÇÃO PARA A TAIPA DE MÃO COMPRESSIVIDADE: SC (solo arenoso bem graduado, com argila) SOLOS 3A.3 e 3A.7 Fonte: Laboratório de Geotecnia da Escola Politécnica da UFBA SC-CM (solo arenoso bem graduado, com argila e silte) 3A.4, 3A.5 e 3A.6 Tratamento de dados: O autor Ano: 2005 e 2006 Testes empíricos Como anunciado anteriormente, a seguir apresenta-se os elementos referentes aos 4 testes expeditos anunciados, realizados com os solos da segunda etapa, ensaiados em laboratório, com vistas a uma análise sobre a execução de cada teste e a comparação entre os resultados apresentados pelos mesmos e os resultados obtidos em laboratório. Teste das bolas – de Mitidieri e outros (Capítulo 3, página 62) Foram confeccionadas as bolas referentes a cada amostra de solo, e após secagem das bolas foi feita a avaliação visual para verificação do solo ou solos que apresentassem o menor número de fissuras, conforme recomendações dos autores do teste. 110 A figura 36 apresenta, após a secagem, o conjunto das bolas dos solos amostrados na segunda etapa, e a ampliação das bolas do solo 1A e 2A. CONJUNTO DAS BOLAS JÁ SECAS BOLA DO SOLO 1A BOLA DO SOLO 2A FIGURA 36 – CONJUNTO DAS BOLAS APÓS SECAGEM E AMPLIAÇÃO DAS BOLAS DOS SOLOS 1A E 2A FOTO DO AUTOR (2007) A figura 37 mostra, individualmente, as bolas ampliadas, referentes aos solos 3A, 3A.1, 3A.2 e 3A.3, depois de secas. 111 BOLA DO SOLO 3A BOLA DO SOLO 3A.2 BOLA DO SOLO 3A.1 BOLA DO SOLO 3A.3 FIGURA 37 – BOLAS AMPLIADAS DOS SOLOS 3A, 3A.1, 3A.2 E 3A.3 FOTO DO AUTOR (2007) A figura 38 mostra, individualmente, as bolas ampliadas, referentes aos solos de 3A.4, 3A.5, 3A.6 e 3A.7. 112 BOLA DO SOLO 3A.4 BOLA DO SOLO 3A.6 BOLA DO SOLO 3A.5 BOLA DO SOLO 3A.7 FIGURA 38 – BOLAS AMPLIADAS DOS SOLOS 3A.4, 3A.5, 3A.6 E 3A.7 FOTO DO AUTOR (2007) 113 A figura 39 mostra, a bola ampliada referente ao solo 3A.8. BOLA DO SOLO 3A.8 FIGURA 39 – BOLA APÓS SECAGEM, REFERENTE AO SOLO 3A.8. FOTO DO AUTOR (2007) A tabela 13 apresenta os indicadores referentes às leituras visuais de cada amostra. Tabela 13 – TESTE DAS BOLAS: AVALIAÇÃO VISUAL DAS FISSURAS AMOSTRA LEIRURA VISUAL APÓS A SECAGEM DAS BOLAS 1A Terceiro solo classificado com maior número de fissuras 2A Quinto solo classificado apresentando poucas fissuras, quase imperceptíveis 3A Primeiro solo classificado com maior número de fissuras 3A.1 Segundo solo classificado com maior número de fissuras 3A.2 Quarto solo classificado com maior número de fissuras 3A.3 Solo sem aparentes fissuras 3A.4 Solo sem aparentes fissuras 3A.5 Solo sem aparentes fissuras 3A.6 Solo sem aparentes fissuras 3A.7 Solo sem aparentes fissuras 3A.8 Solo sem aparentes fissuras Ensaios realizados pelo pesquisador Ano: 2007 114 Conforme a leitura visual, entre os solos naturais, o solo 2A é o que apresenta o menor número de fissuras. Ele, juntamente com os solos misturados 3A.3, 3A.4, 3A.5, 3A.6, 3A.7 e 3A.8 não apresentaram fissuras, sendo segundo os autores do teste os mais indicados para o uso na taipa de mão. Porém, considerando os ensaios de laboratório, o solo 3A.8 é não plástico, não sendo recomendado para uso na técnica em questão. Também, o 2A foi classificado quanto ao IP como muito plástico, e a carta de plasticidade classificou como solo CI (argiloso de media compressividade), estando o mesmo próximo ao limite de CH (argiloso de alta compressividade), o que não o recomenda a ser usado. Esta foi a análise realizada para o teste das bolas, com base nos resultados obtidos através da leitura visual dos mesmos e dos apresentados nos ensaios de laboratório. Com relação ao teste, vale ressaltar que o método não controla a umidade de moldagem, ou seja, a depender da umidade com que o solo é moldado o comportamento das fissuras apresentará leituras diferentes para um mesmo solo. A tabela 14 apresenta os solos, possíveis de serem usados na taipa de mão segundo os autores do teste e segundo os ensaios de laboratório. Tabela 14 – SOLOS POSSÍVEIS DE SEREM USADOS NA TAIPA DE MÃO, CONFORME OS TESTES EXPEDITOS E OS RESULTADOS DO LABORATÓRIO SOLOS 1A TESTE 2A 3A 3A.1 X 3A.3 X LABORATÓRIO Ensaios realizados pelo pesquisador 3A.2 X 3A.4 X X 3A.5 3A.6 3A.7 3A.8 X X X X X X X Ano: 2007 A tabela acima mostra que apenas 2 solos do teste das bolas considerados, segundo os parâmetros estabelecidos pelos autores do mesmo, aptos a serem usados na taipa de mão, não estão incluídos, segundo os resultados do laboratório. O 2A por ser medianamente compressivo, o 3A.8, por não ser plástico. 115 5.2.2 Informações sobre as construções A seguir são registradas informações referentes ao tempo de construção, às reformas e ampliações, à área construída, à situação dos revestimentos e da pintura, ao material e ao número de águas das cobertura, às instalações de água, esgoto, eletricidade e telefonia e, ao nível de satisfação dos usuários das habitações 5.2.2.1 Tempo de construção das habitações A maior parte das habitações tem entre 6 e 10 anos de construídas, totalizando 37,50% do universo de amostragem, seguidas das que possuem tempo de construção entre 0 e 5 anos (33,33%), depois, as construídas entre 11 e 15 anos (12,50%), as construídas entre 31 e 35 anos )8,33%) e, finalmente, as com tempo de construção entre 16 e 25 anos que representam 8,34%. A tabela 15, mostrada a seguir, registra as quantidades e percentuais relativo ao tempo de construção das habitações em intervalos de 5 anos. Tabela 15 - TEMPO DE CONSTRUÇÃO DAS HABITAÇÕES TEMPO DE CONSTUÇÃO QUANTIDADE % DE 0 A 5 ANOS 8 33,33 DE 6 A 10 ANOS 9 37,50 DE 11 A 15 ANOS 3 12,50 DE 16 A 20 ANOS 1 4,17 DE 21 A 25 ANOS 1 4,17 DE 26 A 30 ANOS - - DE 31 A 35 ANOS 2 8,33 TOTAL UNIVERSO DE AMOSTRAGEM: 24 CASAS 24 100,00 116 5.2.2.2 Habitações reformadas ou ampliadas Das 24 habitações do universo de amostragem, apenas 1 foi reformada e 1 ampliada as 22 restantes não sofreram ampliação nem reforma. A tabela 16 apresenta os números e os percentuais desta informação. Tabela 16 – CONSTRUÇÕES REFORMADAS E AMPLIADAS SITUAÇÃO QUANTIDADE % REFORMADA 1 4,17 AMPLIADA 1 4,17 REFORMADA E AMPLIADA - - NEM REFORMADA, NEM AMPLIADA 22 91,66 TOTAL 24 100,00 UNIVERSO DE AMOSTRAGEM: 24 CASAS 5.2.2.3 Áreas das habitações A área construída das edificações contidas nas 24 habitações amostradas varia entre 15 e 58m², sendo a média de 37,58m². A tabela 17 nos apresenta as faixas das áreas construídas das 24 edificações e o percentual em relação ao número de casas amostradas. Tabela 17 – ÁREA CONSTRUÍDA DAS HABITAÇÕES ÁREA CONSTRUÍDA QUANTIDADE DE CASAS % DE 15 A 24m2 2 8,33 DE 25 A 34m2 3 12,50 DE 35 A 44m2 17 70,83 DE 45 A 54m2 1 4,17 DE 55 A 64m2 1 4,17 24 100,00 TOTAL UNIVERSO DE AMOSTRAGEM: 24 CASAS 117 5.2.2.4 Situação de revestimento das habitações A maioria das habitações, cerca de 67%, tem apenas revestimento parcial, preferencialmente a fachada principal é revestida, ficando o restante sem revestimento. Aproximadamente 21% não apresentam qualquer revestimento e o restante, em torno de 12% são totalmente revestidas. A tabela 18 apresenta em números a situação de revestimentos das habitações. Tabela 18 – SITUAÇÃO DE REVESTIMENTO DAS HABITAÇÕES SITUAÇÃO DE REVESTIMENTO QUANTIDADE DE CASAS % 5 20,83 16 66,67 TOTALMENTE REVESTIDA 3 12,50 TOTAL 24 100,00 SEM REVESTIMENTO PARCIALMENTE REVESTIDA UNIVERSO DE AMOSTRAGEM: 24 CASAS 5.2.2.5 Situação da pintura nas habitações A maioria das habitações, cerca de 50%, tem pintura parcial, sempre na fachada principal, 42% não receberam qualquer tipo de pintura e apenas 8% são totalmente pintadas. Tabela 19 – SITUAÇÃO DA PINTURA NAS HABITAÇÕES SITUAÇÃO DA PINTURA QUANTIDADE DE CASAS % SEM PINTURA 10 41,67 PARCIALMENTE PINTADA 12 50,00 2 8,33 24 100,00 TOTALMENTE PINTADA TOTAL UNIVERSO DE AMOSTRAGEM: 24 CASAS 118 5.2.2.6 Material de cobertura A maioria das habitações, cerca de 71%, tem cobertura em telha cerâmica de olaria, confeccionada artesanalmente, aproximadamente 21% são em fibrocimento, 4% em telha cerâmica industrializada e 4% são cobertas com os três tipos citados, ou seja, a cobertura foi feita com aproveitamento de telhas Tabela 20 – MATERIAL DE COBERTURA DAS HABITAÇÕES MATERIAL DE COBERTURA QUANTIDADE DE CASAS % 17 70,83 TELHA CERÂMICA INDUSTRIALIZADA 1 4,17 TELHA DE FIBROCIMENTO 5 20,83 TELHA DE OLARIA + CER. IND. + FIBROCIM. 1 4,17 24 100,00 TELHA DE OLARIA TOTAL UNIVERSO DE AMOSTRAGEM: 24 CASAS 5.2.2.7 Número de águas das coberturas A maioria das habitações, cerca de 92%, tem cobertura em duas águas, e o restante, em torno de 8% possuem apenas uma água. Tabela 21 – NÚMERO DE ÁGUAS DAS COBERTURA NÚMERO DE ÁGUAS QUANTIDADE DE CASAS % 1 ÁGUA 5 20,83 2 ÁGUAS 1 4,17 24 100,00 TOTAL UNIVERSO DE AMOSTRAGEM: 24 CASAS 119 5.2.2.8 Habitações com instalações elétricas A maioria das habitações, cerca de 96%, possui instalações elétricas do tipo aparente. Apenas aproximadamente 4% não possuem instalações elétricas, embora a rede da concessionária passe em frente da residência. Tabela 22 – HABITAÇÕES COM INSTALAÇÃO ELÉTRICA INSTALAÇÕES ELÉTRICAS QUANTIDADE DE CASAS % COM INSTALAÇÃO 23 95,83 SEM INSTALAÇÃO 1 4,17 24 100,00 TOTAL UNIVERSO DE AMOSTRAGEM: 24 CASAS 5.2.2.9 Situação de telefonia nas habitações A maioria das habitações, cerca de 88%, não possui qualquer tipo de telefone, apenas, em torno de 12% dispõem de telefone móvel. Tabela 23 – SITUAÇÃO DE TELEFONIA NAS HABITAÇÕES TIPO DE TELEFONE QUANTIDADE DE CASAS % FIXO - - MÓVEL 3 12,50 SEM TELEFONE 21 87,50 TOTAL 24 100,00 UNIVERSO DE AMOSTRAGEM: 24 CASAS 120 5.2.2.10 Situação de instalação de água potável A maioria das habitações, cerca de 63%, não possui instalação de água, embora a rede da concessionária passe em frente das habitações. Aproximadamente 37% possuem instalações de água, sendo abastecida pela concessionária. A maioria tem instalado apenas um ponto. Tabela 24 – SITUAÇÃO DE INSTALAÇÃO DE ÁGUA NAS HABITAÇÕES SITUAÇÃO QUANTIDADE DE CASAS % COM ÁGUA INSTALADA 9 37,50 SEM ÁGUA INSTALADA 15 62,50 24 100,00 TOTAL UNIVERSO DE AMOSTRAGEM: 24 CASAS 5.2.2.11 Situação de instalação de esgoto A maioria das habitações, cerca de 79%, não possui instalação de esgoto. Apenas um percentual em torno de 21% contam com instalação de esgoto, cujo destino final é um buraco fundo, vedado com laje de concreto, que eles chamam de fossa. Tabela 25 – SITUAÇÃO DE INSTALAÇÃO DE ESGOTO NAS HABITAÇÕES SITUAÇÃO QUANTIDADE DE CASAS % COM ESGOTO 5 20,83 SEM ESGOTO 19 79,17 TOTAL 24 100,00 UNIVERSO DE AMOSTRAGEM: 24 CASAS 121 5.2.2.12 Estado de conservação das 96 habitações em técnica mista da área de estudo Para oferecer uma avaliação sobre o estado de conservação das habitações existentes na área de estudo foi realizado um levantamento considerando a situação de cada uma a saber: Habitação em ruína - habitação deteriorada, parcialmente destruída; Habitação em tombamento - habitação escorada, em situação de desbamento; Habitação ruim - habitação parcialmente deteriorada; Habitação regular - habitação não deteriorada, sem reboco e sem pintura; e Habitação boa - habitação rebocada e pintada total ou parcialmente. Das 96 habitações em técnica mista existentes na poligonal de estudo, a grande maioria encontra-se em estado de conservação ruim, com aproximadamente 69%, cerca de 11% estão em estado regular em torno de 7% o estado de conservação é bom; 8% estão em vias de tombamento, encontram-se escoradas, e 5% estão em estado de ruína. Tabela 26 – ESTADO DE CONSERVAÇÃO DAS HABITAÇÕES ESTADO DE CONSERVAÇÃO QUANTIDADE DE CASAS % EM RUÍNA 5 5,21 EM TOMBAMENTO 8 8,33 RUIM 66 68,75 REGULAR 10 10,42 7 7,29 96 100,00 BOM TOTAL UNIVERSO DE AMOSTRAGEM: 96 CASAS 122 5.2.2.13 Nível de satisfação dos moradores das casas de técnica mista Entre as famílias entrevistadas no universo das 24 habitações, nenhuma delas elegeu como ótimo o nível de satisfação pela moradia. 50% acham a habitação em técnica mista regular, em torno de 17% consideram boa e cerca de 33% acham ruim. Tabela 27 – NÍVEL DE SATISFAÇÃO DOS MORADORES NÍVEL DE SATISFAÇÃO QUANTIDADE DE CASAS % ÓTIMO - - BOM 4 16,67 12 50,00 8 33,33 24 100,00 REGULAR RUIM TOTAL UNIVERSO DE AMOSTRAGEM: 24 CASAS 5.2.2.14 O uso do bambu no universo de amostragem Tendo em vista a existência de bambu nas proximidades da área de estudo, foi feito uma enquete entre as famílias que responderam ao questionário, sobre o uso de bambu em construção, principalmente sobre seu conhecimento a respeito deste material e sua intenção em usar o mesmo. Perguntados se já usaram bambu na técnica mista, no universo das 24 casas que serviu de amostragem, apenas cerca de 4% dos habitantes responderam afirmativamnete, e os 96% restantes nunca usaram. Perguntados se conhecia alguém que já usou o bambu, aproximadamente 46% dos habitantes afirmaram conhecer, enquanto que os 54% negaram conhecer. Finalmente, indagados se usariam em suas residências o bambu, 29% responderam que sim, e os restantes, cerca de 71% responderam que não usariam. 123 Tabela 28 – O USO DO BAMBU NO UNIVERSO DE AMOSTRAGEM QUEM JÁ USOU QUANTIDADE DE CASAS % SIM 1 4,17 NÃO 23 95,83 TOTAL 24 100,00 CONHECE QUEM JÁ USOU QUANTIDADE DE CASAS % SIM 11 45,83 NÃO 13 54,17 TOTAL 24 100,00 USARIA EM SUA CASA QUANTIDADE DE CASAS % SIM 7 29,17 NÃO 17 70,83 TOTAL 24 100,00 UNIVERSO DE AMOSTRAGEM: 24 CASAS 5.3 O ATUAL SISTEMA CONSTRUTIVO DA TÉCNICA MISTA EM SÃO SEBASTIÃO DO PASSÉ Descreve-se a seguir o atual sistema construtivo da técnica mista em São Sebastião do Passe a partir dos subsistemas básicos, a saber: 5.3.1 Subsistema de fundação e estrutura Foram englobadas, fundação e estrutura em um único subsistema, em função da técnica mista possuir como elemento estrutural os pilares (esteios), que funcionam também como 124 elemento de fundação. Para preparação do terreno de fundação, normalmente, é feita uma limpa da vegetação existente no terreno e em seguida uma raspagem da camada superficial de modo a retirar todo o vestígio de vegetação, inclusive raízes. Preparado o terreno, é feita a colocação dos piquetes com o auxílio de linha de pedreiro e esquadro, para locação dos buracos, onde ficarão os esteios principais. No local dos piquetes são executados furos com uma profundidade média de 80cm e diâmetro de aproximadamente 20cm. Em seguida os esteios de madeira, com diâmetro médio entre 12 e 15cm, são colocados nas cavas e apiloados com o material de escavação, pedaços de pedra e metralha de construção até ficarem o mais vertical e firmes possível Fixados os esteios, os mesmos são cortados nas alturas previstas e recebem uma viga horizontal de madeira na altura do pé-direito mínimo. Essa viga tem a função de amarração e acompanha todo o perímetro, tanto das paredes externas, quanto das paredes internas. Em 95% dos casos, os esteios não recebem nenhum tratamento para proteção contra umidade, fungos, insetos, etc. Quando roliços, na maioria dos casos é apenas retirada a casca. 5.3.2 Subsistemas paredes O subsistema paredes engloba o entramado, o barreamento (enchimento da trama com barro argiloso), o reboco e a pintura, como mostrado a seguir 5.3.2.1 Entramado O entramado é feito com peças verticais de madeira, chamadas “enchimento” e peças horizontais denominadas “varas”. As peças de enchimento possuem diâmetro de aproximadamente 5 cm, são colocadas entre esteios, afastadas destes e entre si cerca de 12 cm e 125 fixadas no solo em torno de 30 cm. As varas são colocadas afastadas do solo mais ou menos 10 cm, duas a duas, uma de cada lado do enchimento e ambas na mesma altura, sendo cada par de varas distantes entre si aproximadamente 10 cm. As varas são fixadas nas peças de enchimento por meio de arame fino galvanizado. 5.3.2.2 Barreamento Concluída a trama, a mesma deverá ser preenchida com barro argiloso. Esta etapa é conhecida como “tapagem da casa”. No caso da área de estudo, toda a área possui solo argiloso, logo, a escolha do local do barreiro é sempre o mais perto possível do entramado. Escolhido o local, uma área de mais ou menos 2 m de diâmetro, é feita uma limpa superficial para retirada da vegetação existente e, em seguida, retirado o material superficial com resíduos de raízes e qualquer outro material que não seja o solo argiloso. Em seguida o barro é cortado em camadas e destorroado. Cada camada é umedecida com água e pisoteada até o mestre taipeiro definir o ponto ideal do barro. Dado o ponto do barro o mesmo é transportado de mão em mão até o local de fechamento do entramado, onde uma pessoa se coloca de um lado para aparar com as mão o barro jogado pela pessoa que se encontra do lado oposto. Dessa forma, de mão em mão e de sopapo em sopapo o entramado é preenchido e a parede, vedada. No estudo de caso, como já visto anteriormente, a minoria das habitações recebeu reboco e pintura, a grande maioria ficou sem reboco ou teve, apenas o paramento da fachada rebocada. 5.3.2.3 Reboco Quando rebocadas, a aplicação do reboco é feita após o barreamento estar seco, em torno de 4 semanas após a tapagem da casa. Normalmente, o reboco na área de estudo é constituído de uma massa única, composta de cimento e areia no traço 1: 4 respectivamente. Via de regra, a 126 superfície acabada acompanha o plano da parede, sem que haja uma preocupação com o perfeito nivelamento vertical. 5.3.2.4 Pintura Sobre o revestimento (reboco), e quando o mesmo já está curado, é aplicada a pintura, sempre a base de cal, como acabamento final da parede. 5.3.3 Subsistema coberturas A maioria das habitações em técnica mista tem como material de cobertura a telha cerâmica de olaria, em torno de 70%, aproximadamente 4% são em telha cerâmica industrializada, outras 4% são cobertas com uma mistura de telha cerâmica industrializada, telha cerâmica de olaria e telha de fibrocimento, sendo o restante, em torno de 22% cobertas com telhas de fibrocimento. A estrutura para suporte das telhas cerâmicas é composta de frechais, terças e cumeeira (quando de 2 águas). Peças em madeira, quando roliças, com diâmetro de mais ou menos 12 cm, quando retangular (aparelhadas com machado) com seção de 8 x 13 cm, aproximadamente. A trama para sustentação das telhas são de caibros roliços de mais ou menos 7 cm de diâmetro e ripas serradas de seção em torno de 1,5 x 3,5 cm, ou varas de aproximadamente 2 e 3 cm de diâmetro. Para a estrutura das telhas de fibrocimento foram usadas peças roliças em torno de 12 cm de diâmetro. 127 5.3.4 Subsistema esquadrias A maioria das esquadrias é em madeira maciça, algumas fabricadas em carpintarias e outras executadas artesanalmente. A fixação das esquadrias é feita, em esteios pré-fixados para o fim específico, onde são fixadas as dobradiças para receber as folhas das esquadrias. Para fechamento das mesmas são usados os mais diversos tipos de fechos, como fechaduras, cadeados, ferrolhos, travessas e tramelas. 5.3.5 Subsistema pisos Boa parte das habitações tem como pavimentação o chão batido, as demais são pavimentadas com cimentado. O cimentado quase sempre apresenta rachaduras ou, em alguns casos, deformações oriundas da acomodação do terreno 5.3.6 Subsistema instalações 5.3.6.1 Instalações elétricas Mesmo contando com infra-estrutura de rede elétrica em baixa tensão, passando em frente às habitações, aproximadamente 4% das habitações não possuem instalação elétrica em seus domicílios, por seus habitantes não poderem arcar com o pagamento da conta. Todo o restante das habitações tem instalação aparente de rede elétrica. 5.3.6.2 Instalações telefônicas Nenhum dos moradores da área de estudo tem telefone fixo. Apenas 15,5% das habitações usam telefone móvel e o restante não possui telefones. 128 5.3.6.3 Instalações de água potável Toda a poligonal de estudo é dotada de rede de água da concessionária, a EMBASA. Mesmo assim, 62,5% das habitações não dispõem de instalações de água, por não poderem arcar com o pagamento da contar. 5.3.6.4 Instalações de esgoto sanitário O bairro do Alegre não dispõe de rede de esgoto, sendo feito individualmente o lançamento final do esgoto. Na poligonal do estudo, apenas 20,83% das habitações possuem instalação de esgoto e fazem seu lançamento num buraco profundo coberto por laje de concreto, que os moradores chamam fossa. O restante das habitações, 79,17% não tem instalações de esgotamento sanitário. 5.4 O BAMBU EXISTENTE EM SÃO SEBASTIÃO DO PASSÉ Foram retiradas duas amostras do bambu existente em São Sebastião do Passé para análise da espécie, pelo setor competente da Escola de Biologia da Universidade Federal da Bahia, que identificou ambas como sendo da espécie Bambusa vulgaris. As amostras foram retiradas de moitas existentes na BR-110, que liga São Sebastião do Passé à BR-324, já próximas à entrada da cidade, uma a 2 Km, e a outra, a 1 Km da entrada. FIGURA 40 – BAMBU A 1 Km DE SÃO SEBASTIÃO DO PASSÉ FOTO DO AUTOR (2006) FIGURA 41 – BAMBU A 2 Km DE SÃO SEBASTIÃO DO PASSÉ FOTO DO AUTOR (2006) 129 Tanto no município de São Sebastião do Passé, quanto nos municípios vizinhos, principalmente Candeias, São Francisco do Conde e Santo Amaro a existência de bambu é bastante significativa, de modo especial o município de Santo Amaro é o que mais cultiva essa gramínea, pois lá foi instalada uma fábrica de papel. Para este autor, todos de características semelhantes às amostras identificadas pela UFBA como Bambusa vulgaris. Na área urbana de São Sebastião do Passé e arredores, são muitas as cercas que dividem terrenos executadas com bambu. Porém, a falta de conhecimento sobre a necessidade de tratamento do bambu, sobre as espécies mais apropriadas para cada fim e sobre a forma de melhor utilizar o bambu, fazem com que o mesmo seja utilizado de forma inadequada, comprometendo a utilização para o fim desejado 130 6. DISCUSSÕES, AVALIAÇÕES E RECOMENDAÇÕES Neste capítulo pretende-se discutir, avaliar e fazer recomendações sobre melhorias tecnológicas da vedação vertical em técnica mista utilizada em habitações de interesse social. Para tanto, serão questionadas e avaliadas as recomendações abordadas na base teórica, assim como, situações apresentadas no estudo de caso. O perfil sócio-econômico da população que vive na unidade de análise, referente ao estudo de caso demonstrou tratar-se de uma área de habitação de interesse social, onde as construções são em técnica mista, atendendo desta forma aos requisitos exigidos pelo tema em questão. A área apresenta os subsídios para estudar os problemas técnicos das vedações verticais da técnica objeto de estudo, restando ao pesquisador detectar os problemas, discutir, avaliar e fazer recomendações para as melhorias tecnológicas referentes às patologias das citadas vedações. O mais importante porém, é que as recomendações possam ser viabilizadas pela população estudada, ou populações similares, nas quais, o fator renda familiar e renda per capta apresentam valores muito baixos O capítulo 5, na página 101, apresenta a situação de renda e uma síntese do perfil sócioeconômico da população que ocupa a área do estudo de caso. As discussões, avaliações e recomendações a seguir estarão ancoradas no tripé formado pelos problemas detectados no estudo de caso, pelas recomendações levantadas na revisão da literatura e pela adequação das recomendações à famílias com perfil sócio-econômico equivalentes ao da área de estudo. Diante do exposto, a seguir, serão levantados os principais agentes de degradação da habitação em técnica mista, em especial os responsáveis em degradar a vedação vertical e em seguida serão estabelecidas as disposições construtivas referentes às recomendações de melhorias tecnológicas para as mesmas. A análise das patologias das vedações verticais permitirá distinguir os principais agentes de degradação, exigindo conhecer as conseqüências e efeitos para 131 entender os processos pelos quais se manifestaram, e assim, poder recomendar procedimentos de forma mais eficaz. Entre os principais agentes de degradação, temos: as ações mecânicas, a erosão, a infiltração e absorção de água, e a condensação de vapor de água. As ações mecânicas Ações mecânicas podem provocar danos estruturais na vedação vertical das construções em técnica mista, como a acomodação da construção ao terreno natural, podendo provocar fendas e conseqüente abertura de caminhos de preferência para o acesso de água, podendo chegar a provocar rupturas ou mesmo colapso da construção. Normalmente, a deficiência de contraventamento é o principal fator responsável. A erosão A ação de impacto dos seres vivos, da chuva, do vento com elementos em suspensão e principalmente de sais solúveis higroscópicos pode provocar erosão na vedação vertical das construções em “terra crua”. Os seres vivos provocam pontualmente choques acidentais que podem ser responsáveis por patologias de umidade. O impacto da chuva, repetido e direto, vai alterando a superfície dos elementos externos das vedações verticais, provocando desgaste. As ocorrências de água de chuva sobre uma superfície contribuem para o desgaste e a erosão dessa superfície. Os salpicos da chuva ao baterem no solo ou em outros elementos, produzem erosão nas superfícies das vedações verticais afetadas pelos mesmos. O vento produz uma ação mecânica, diretamente proporcional ao tamanho das partículas em suspensão. Se houver contato com a água a ação poderá ser ainda mais forte. Os sais solúveis higroscópicos existem em maior ou menor quantidade em grande parte dos materiais de construção e também no solo. Eles existem com maior quantidade próximo da 132 orla marítima, devido aos cloretos, em zonas com elevada poluição atmosférica em virtude dos sulfatos ou onde tenha havido contaminação por dejetos de animais por causa dos nitratos. Estes sais são transportados pela água e cristalizam-se quando a água evapora-se. Quando esta cristalização se dá na superfície provoca eflorescência, ocorrendo uma erosão superficial do paramento, principalmente por degradação do revestimento, da caiação ou pintura. Os sais quando cristalizados na superfície podem ser eliminados escovando-se, o que evita provocar danos na superfície atingida. Quando a cristalização se dá no interior da vedação vertical provoca criptoflorescência. Isto acontece quando a água atingiu sua migração de secagem no interior do material ou na interface entre o solo de suporte e o revestimento. Quando cristalizam, os sais aumentam de tamanho e essa expansão, na maioria das vezes, provoca a ruptura e a degradação do material envolvente ou o afastamento entre camadas de materiais caso o tamanho de seus poros não seja suficiente para suportar a expansão dos sais. Na área de estudo, em função de não se tratar de área próxima à orla marítima e possuir uma atmosfera interiorana, sem elevada poluição atmosférica, os possíveis sais solúveis higroscópicos que podem atacar as vedações verticais seriam os oriundos de nitratos. As principais conseqüências da erosão são a degradação de superfície, o destacamento do revestimento, a degradação da camada superficial que suporta o revestimento e a acumulação de vias de penetração de água e infiltração por absorção capilar. A infiltração e absorção de água. A água em contato com os elementos da vedação vertical, caso a vedação não esteja devidamente estanque à presença de água, a tendência é que a mesma seja parcialmente absorvida por infiltração via fendas existentes no paramento da vedação, por ascensão ou difusão 133 capilar. A água pode ter origem na chuva, no solo ou em acidentes, quando de vazamentos da tubulação. A infiltração e absorção de água pela vedação vertical provocam uma diminuição da resistência mecânica e do isolamento térmico, o transporte dos sais solúveis higroscópicos, a dilatação/retração do material, provocando novas fendas, as quais provocam maiores infiltrações criando condições para o desenvolvimento de vegetação parasitária. A condensação de vapor de água O vapor de água em excesso e a ocorrência de situação propícia a que esse vapor condense à superfície ou no interior da vedação vertical podem provocar o umedecimento do material, geralmente colocado na superfície interior do elemento em contato com o exterior ou na face interna entre materiais diferentes, ou, ainda, na espessura de um material. Como conseqüência, a condensação traz o risco de degradação por desenvolvimento de fungos e bolores conforme mostra a Figura 42, a redução do isolamento térmico, a diminuição local da resistência mecânica e o risco de deslocamento do acabamento ou do revestimento pela ação da hidratação/cristalização dos sais solúveis higroscópicos IGURA 42 – BOLOR NA CASA 7 NO BAIRRO DO ALEGRE, EM SÃO SEBASTIÃO DO PASSÉ Foto do autor - em 2004 Em construções com “terra crua”, cuidados devem ser tomados visando proteger ao máximo os elementos da construção da umidade e presença de água. Em termos de disposições construtivas precisa-se garantir um eficiente corte de capilaridade relativamente ao solo e uma 134 boa proteção da vedação vertical através de uma cobertura estanque e com beirais longos. Precisa-se, também de um revestimento adequado e compatível com o material que constitui seu suporte e de uma pintura a base de cal, por ser de menor custo e eficaz para este tipo de vedação. Direcionar a água de superfície, procurando afastar o mais possível da construção, ou seja, definir um bom sistema de drenagem é fundamental. Na área de estudo, as habitações foram construídas sem preocupação maior em relação aos problemas e às disposições construtivas acima mencionadas. Quando muito, o proprietário, reveste a fachada frontal ou faz uma pequena varanda frontal com largura entre 0,60 m e 1,20 m, o que já minimiza e muito o desgaste do paramento protegido. A figura 43 apresenta uma das construções que possui varanda. FIGURA 43 - TÉCNICA MISTA DETERIORADA NO BAIRRO DO ALEGRE, EM SÃO SEBASTIÃO DO PASSÉ Foto do autor - em 2004 Com relação à degradação causada por ações mecânicas, aconselha-se a executar o contraventamento, tanto no plano das vedações verticais, quanto no plano de apoio da cobertura. 135 A qualidade da técnica mista executada na área do estudo de caso, conforme a figura 44, é baixa e está longe de ser considerada uma construção segura e saudável pelo contrário, deixa muito a desejar no que se refere a acabamento, durabilidade, aparência e salubridade FIGURA 44 - CASAS EM TÉCNICA MISTA NO BAIRRO DO ALEGRE, EM SÃO SEBASTIÃO DO PASSÉ Foto do autor - em 2004 A seguir, será abordada cada disposição construtiva que mereça ser discutida, avaliada e recomendada, sempre com base na abordagem anterior, na revisão da literatura, nos dados contidos no estudo de caso e nas condições de execução pelas famílias que habitam a área de estudo e similares. Ou seja, sempre levando em conta a condição de baixa renda da população a que se destina este trabalho. 6.1 Sobre a drenagem No período de chuvas a situação é ainda pior, por falta de drenagem adequada, de reboco, de pintura e muitas vezes de uma cobertura estanque e de beirais longos. Neste período, as construções sem revestimento sofrem mais degradação na vedação vertical, principalmente na vedação externa, que está exposta e a umidade se infiltra até a parte interna. Outro fator degradador é a água proveniente do terreno úmido da fundação que por capilaridade atinge o piso, o que deteriora mais e mais a construção. 136 Recomendações para drenagem do terreno Para evitar a permanência e a aproximação da água em relação à construção, é importante, quando da escolha do terreno onde será situada a construção, o seguinte Recomendação 1 Estabelecer, sempre que possível a cota de implantação do piso da habitação acima do nível do terreno natural, em torno de 20 a 30 cm, no mínimo. Recomendação 2 Executar calhas a céu aberto para direcionamento das águas de chuva, o mais afastado possível das vedações externas Recomendação 3 Estabelecer planos de escoamento entre o pé das vedações verticais e as citadas calhas. 6.2 Sobre a estrutura e o entramado A madeira usada costuma apodrecer precocemente, devido à falta de tratamento adequado e por ser uma madeira não apropriada para trabalhar em contato direto com ambiente úmido. Sofrem, mais são as peças em contato direto com o solo, os esteios e as peças de “enchimento”, conforme figura 45. Pode-se observar, na figura indicada, que as “varas”, peças horizontais do entramado, não foram atacadas pela umidade e se encontram em condições normais de uso, enquanto que o “esteio” de canto e as peças de “enchimento” em contato com a umidade estão todas totalmente deterioradas. O acúmulo de água nas proximidades das vedações é sempre um fator degradador, daí a necessidade da drenagem. 137 FIGURA 45 - TÉCNICA MISTA DETERIORADA NO BAIRRO DO ALEGRE, EM SÃO SEBASTIÃO DO PASSÉ Foto do autor - em 2004 A foto anterior ilustra o estado de degradação das peças de madeira em contato com o solo. Peças que segundo os habitantes e pessoas que participaram da construção, não receberam qualquer tratamento para subsistir ao meio onde foram colocadas A água do solo, por capilaridade ou a água do beiral que bate no solo e respinga na vedação vertical, conforme figura 46, se constitui elemento degradador tanto do solo que constitui a vedação vertical, como das peças de madeira que constituem os esteios e o entramado. A Figura 47, ampliada da figura anterior, visualiza a degradação da vedação vertical causada pelos salpicos da água de chuvas e pelos ventos, que com impactos contínuos aos poucos minam a resistência da camada superficial até o colapso total. 138 FIGURA 46 - TÉCNICA MISTA DETERIORADA NO BAIRRO DO ALEGRE, EM SÃO SEBASTIÃO DO PASSÉ Foto do autor - em 2004 FIGURA 47 – AMPLIAÇÃO DESTACANDO A UMIDADA QUE DEGRADA O SOLO DE FECHAMENTO E AS VARAS Foto do autor - em 2004 Como constatado no estudo de caso, a técnica mista atualmente praticada na área utiliza a madeira como elemento de estrutura e entramado, onde a mesma não é mais adquirida 139 gratuitamente, como acontecia no passado sua qualidade baixou de padrão, em função da grande demanda e do extermínio das matas e seu preço sobe a cada dia. Diante do quadro atual, a utilização do bambu poderá ser uma possibilidade a ser experimentada, tendo em vista a existência do mesmo na região. A utilização do bambu em construção de técnica mista e em outras técnicas, embora usada de forma tímida no Brasil, é feita em grande escala por povos de outros países, destacando-se a América do Sul, a Colômbia, o Peru e a Venezuela. Para tanto, entre nós será necessário criar uma cultura sobre o cultivo, tratamento e uso adequado do bambu para os diversos fins, em especial para a construção, de modo a explorar as vantagens de uso deste material. A capacidade do bambu aos esforços mecânicos, sua baixa densidade, seu baixo consumo energético de produção, sua facilidade de reprodução, sua precoce idade de utilização (a partir do 3° ou 4° ano) e a compatibilidade do nosso solo são fatores que propiciam seu uso, principalmente quando o planeta mais precisa da prática de materiais com maior sustentabilidade e que menos degradem o meio ambiente. Uma forma de investir na tecnologia do bambu na atual conjuntura seria uma articulação entre entidades tipo ONGs, prefeituras, governos estaduais, Ministério das Cidades, universidades e instituições de pesquisas. Para a área de estudo, importante, também, será a importação de outras espécies de bambu, mais apropriadas para o uso em questão, como o Guadua e o Phylostachis edulis. Primeiro, porque é recomendável que se trabalhe com mais de uma espécie segundo, porque podem ser tratados naturalmente, sem uso de produtos químicos e, ainda, pelas várias possibilidades de uso destas duas espécies. As peças da estrutura principal e do entramado, quer sejam de madeira ou de bambu, deverão receber tratamento adequado para evitar a degradação por insetos ou pela umidade, conforme mostra a Figura 48. As partes das peças em contato com o solo de fundação deverão ser impermeabilizadas 140 FIGURA 48 - TÉCNICA MISTA DETERIORADA,NO BAIRRO DO ALEGRE, EM SÃO SEBASTIÃO DO PASSÉ Foto do autor - em 2004 A figura anterior ilustra o estado de degradação de uma vedação vertical da área de estudo, por falta de tratamento e impermeabilização das peças e do cuidado em afastar as águas de chuva da vedação. Importante também é o contraventamento da construção, devendo o mesmo ser feito com peças em diagonal, conforme referência da Figura 14, Capítulo 2, página 36. A figura citada ilustra a peça de contraventamento passando pelo entramado, numa construção de técnica mista (tabique) em Portugal, onde esta prática é comum, diferentemente do que acontece na área estudada. Também, deve-se contraventar as vigas de travamento ao nível do pé direito mínimo, travando-se os vértices com peças, também em diagonal, formando triângulos no plano de base das vigas. Este procedimento oferece uma rigidez maior a toda a construção, evitando desestabilização da construção como a da Figura 49, referente à casa 96 do mapa da Figura 29, Capítulo 5, página 99. 141 FIGURA 49 – PARAMENTO VERTICAL ESCORADO (HABITAÇÃO EM VIA DE TOMBAMENTO) Foto do autor - 2004 Importante, também, é a uniformidade da seção das peças verticais do entramado, denominadas pela comunidade local de “enchimento”. Na área de estudo, além das mesmas terem seções variadas conforme a Figura 50, na maioria das construções a seção máxima é de 5 cm, quando o ideal seria de aproximadamente 8 cm. Na unidade de análise percebe-se uma falta de procedimentos importantes para propiciar uma vida útil bem maior das habitações. A madeira utilizada apresenta uma verdadeira mistura de tipos, sem nenhum cuidado quanto à capacidade maior ou menor de resistência aos esforços, considerando-se para todas a mesma capacidade de carga e de vida útil, o, que acaba por comprometer a estanquidade do conjunto e a vida útil da construção. Visualmente percebe-se que a “vara” do entramado possui quase que a mesma seção da peça de enchimento. 142 FIGURA 50 – PEÇAS DO ENCHIMENTO COM SEÇÕES DIFERENTES Foto do autor - 2004 Outro aspecto diz respeito ao afastamento máximo, que deve ser constante, cujo valor deverá estar relacionado à seção das peças. A maior parte das construções, na área referente à unidade de análise, não apresenta este cuidado. Destaca-se na Figura 51 o diâmetro das peças de “enchimento”, que é bastante reduzido e a falta de modulação entre os espaços, tanto das peças verticais, quanto das varas (peças horizontais), o que demonstra uma falta de critério na execução do entramado. 143 FIGURA 51 – PARAMENTO VERTICAL DESTACANDO A FALTA DE MODULAÇÃO ENTRE AS PEÇAS Foto do autor - 2004 Recomendações para a estrutura e o entramado Recomendação 1 As peças de mesma função deverão possuir seção equivalente, devendo receber tratamento a base de carbolinio ou qualquer outro preservante de baixo risco ambiental, os denominados “preservantes da nova geração” Recomendação 2 As peças em contato direto com o solo, além de serem tratadas, deverão ser impermeabilizadas com o uso de garrafas plásticas usadas, como foi abordado no Capítulo 3, página 63 e ilustrado na Figura 19, página 64, ou serem implantadas em bases impermeáveis, envolvendo toda a parte enterrada dos esteios com concreto impermeável, e as peças de 144 “enchimento”, fixadas em sapata corrida, também em concreto impermeável, recobrindo-as até o nível do piso interno. Recomendação 3 Executar a estrutura principal com madeira, enquanto não se domine a cultura do bambu. Recomendação 4 Executar o entramado com madeira ou com bambu, pois a técnica de fazer o entramado é a mesma para qualquer dos dois materiais. A escolha ficará por conta do menor custo. Recomendação 5 Manter o espaçamento uniforme entre as peças do entramado, tanto entre as peças de “enchimento”, quanto das “varas”, de forma a estabelecer um módulo o mais uniforme possível para receber o solo de fechamento. Recomendação 6 Executar o contraventamento da construção, referente aos paramentos verticais, com peças em diagonais, conforme Figura 14, Capítulo 2, página 48, como do plano horizontal da cobertura, no nível do pé direito (vigas do frechal). 6.3 Sobre o solo Conforme visto anteriormente, o solo local possui argila em quantidade superior ao recomendado para uso em técnica mista, necessitando ser corrigido, de modo a evitar o atual elevado nível de retração. As figuras 52, 53 e 54 ilustram imagens das vedações verticais preenchidas com os três tipos de solo amostrados na área de estudo. 145 FIGURA 52 – PARAMENTO VERTICAL DESTACANDO O SOLO DA PRIMEIRA AMOSTRA Foto do autor - 2004 Visualmente o solo da amostra 1 apresenta uma retração acentuada nas linhas demarcadas pela estrutura e entramado, apresentando menos fissuras no bloco de solo que fecha cada módulo do entramado. FIGURA 53 – PARAMENTO VERTICAL DESTACANDO O SOLOLO DA SEGUNDA AMOSTRA Foto do autor – 2004 146 O solo da amostra 2 apresenta visualmente uma retração nas linhas demarcadas pela estrutura e entramado aparentemente menor que o da amostra 1, e no bloco do solo que fecha cada módulo do entramado, apresenta-se um desgaste causado pelo intemperismo FIGURA 54 – PARAMENTO VERTICAL DESTACANDO O SOLO DA TERCEIRA AMOSTRA Foto do autor - 2004 O solo da amostra 3, no nível visual é o que apresenta uma retração maior, tanto nas linhas demarcadas pela estrutura e entramado, quanto no bloco de solo que fecha cada módulo do entramado O comportamento dos solos retratou, com base em uma análise visual, o resultado esperado, se comparados com as análises resultantes dos ensaios de laboratório apresentados antes. Na área de estudo o “barreamento”, via de regra, consiste apenas em uma fase, referente à camada de fechamento da trama que constitui o entramado, sem preocupação em recobrir as varas, conforme as Figuras 55 e 56. Esta prática possibilita, junto com outros agentes de 147 degradação, a penetração da água entre o solo de fechamento e as peças de estrutura e entramado e dificulta a aderência do reboco à superfície de suporte. FIGURA 55 – PARAMENTO VERTICAL DESTACANDO A FALTA DE RECOBRIMENTO DAS VARAS Foto do autor – 2004 FIGURA 56 – PARAMENTO VERTICAL DESTACANDO A FALTA DE RECOBRIMENTO DAS VARAS Foto do autor - 2004 148 O ideal, para se obter o solo perfeito para, ser usado na técnica mista, assim como em outras técnicas, é realizar exames laboratoriais de caracterização do solo e, a partir dos resultados, proceder à devida correção, se necessária. Porém, em se tratando de habitação de interesse social, onde qualquer custo a mais, mesmo que seja para melhoria de sua habitação, torna-se oneroso, a melhor opção é recomendar o uso de testes empíricos, como os tratados no capítulo 5, páginas 114 a 119 Recomendações para o uso do solo Recomendação 1 Para escolha do melhor solo, a primeira recomendação é que a amostra seja retirada a uma profundidade de 40 cm abaixo do terreno natura e em 4 pontos diferentes do terreno, conforme Miditieri e outros (1987) e Milanez (1958), Capítulo 2, página 37. Recomendação 2 Usar pelo menos 2 testes empíricos entre os indicados por Miditieri e outros (1987) teste das bolas, que estabelece como melhor solo os das bolas de menor retração; o de |Gieth e outros, teste da pressão dos dedos; o desenvolvido por Neves e outros (2005), teste do rolo; e os recomendados por Lengen (2002), teste da cor, teste do odor, teste da mordedura, teste da sedimentação, teste de sedimentação e teste de contração, também denominado como teste da caixa, capítulo 2 páginas 37 a 40. Recomendação 3 Evitar o excesso de água na mistura, ou seja, trabalhar com a mistura o mais seca possível para evitar fissuras por secagem e usar palha picada na mistura para permitir a evaporação da água na massa toda por igual, conforme Milanez (1958), capítulo 2, página 40. 149 Recomendação 4 Deixar a mistura em repouso, preferencialmente à noite, por um período de 12 horas, conforme Gieth e outros (1994), Capítulo 2, página 41. Recomendação 5 Colocar o solo com as mãos entre as varas do entramado, adensando o mesmo, conforme Milanez (1985), Capítulo 2, página 40. Recomendação 6 Fixar sobre as peças da estrutura e presas no entramado, uma tela plástica com trama de aproximadamente ½ polegada para propiciar melhor aderência do solo de cobertura das peças. A tela deverá ultrapassar, pelo menos, 20 cm além da peça de recobrimento. Recomendação 7 Aplicar o solo em 3 fases (camadas), conforme recomenda DAM (1988), Capítulo 2, página 41, tendo o cuidado para que a última de solo, que serve de suporte para o reboco, cubra a superfície de todas as peças, tanto da estrutura, quanto do entramado. 6.4 Sobre o reboco O revestimento (reboco) tem a função primordial de proteger a vedação vertical do intemperismo, evitando a degradação do solo pela chuva e ventos fortes, além de vedar as suas fissuras, propiciando um paramento uniforme, evitando ninhos de insetos como, o transmissor da doença de Chagas, o “barbeiro”, e outros. Um revestimento bem executado e aplicado sobre suporte adequado, é o principal responsável pela estanquidade da vedação vertical e proteção, propiciando uma durabilidade maior da habitação e protegendo a mesma de doenças causadas por insetos, que quando não revestida funciona como ninhos acolhedores dos mesmos. Não é por menos que os estudiosos de técnica mista consideram o revestimento como um dos elementos 150 essenciais para a proteção das vedações verticais e saúde dos habitantes. Este cuidado não é notado na área de estudo, onde apenas 12,5% das habitações são totalmente revestidas, 66,67% possuem revestimento apenas na fachada frontal e as 20,83 restantes não são revestidas. Para uma boa aplicação do reboco é necessário que a base de suporte possua as características de aderência ao mesmo. Se a base para suporte do reboco não for executada com material apropriado, o reboco acaba por desgarrar-se do paramento por falta de aderência, conforme Figuras 57 e 58, inutilizando o trabalho executado, ou, no mínimo, diminuindo a vida útil do reboco. FIGURA 57 – VEDAÇÃO VERTICAL DESTACANDO A DETERIORIZÇÃO DO REBOCO Foto do autor – 2004 FIGURA 58 – VEDAÇÃO VERTICAL DESTACANDO A DETERIORIZÇÃO DO REBOCO Foto do autor - 2004 151 As figuras 57 e 58 ilustram como a falta de recobrimento da trama pela camada de enchimento da mesma é responsável pela fissuração e degradação do reboco. A função do reboco é proteger a vedação vertical do intemperismo, evitando a degradação do solo pela chuva e ventos fortes e preencher as fissuras decorrentes da retração do solo, propiciando um paramento uniforme e pronto para receber a pintura. Seguem as recomendações consideradas pertinentes e necessárias para a aplicação do reboco, de modo a propiciar uma proteção adequada da vedação vertical. Recomendações para o reboco Recomendação 1 Executar um perfeito nivelamento da superfície de suporte e que esta cubra todas as peças, tanto do entramado, quanto da estrutura. Recomendação 2 Usar um chapisco de impermeabilização nas paredes externas e internas até a altura de 50 cm do piso, conforme destacaram Lopes e Ino (2003) referindo-se ao PROAFA (1979), Capítulo 2, página 44. Recomendação 3 Adotar os procedimentos DAM (1988), conforme Capítulo 2, página 41 ou os de Gith e outros, também no Capítulo 2, página 43. Recomendação 4 Fazer uma amostra com os 2 tipos de traço indicados anteriormente, por DAM e por Gieth e outros, usando-se o que apresentar menos fissuras. 152 6.5 Sobre a pintura Para Guimarães (1978), “apesar de vários exemplos de construções com terra que resistiram a séculos, mesmo sem revestimento, é conveniente dar às paredes de solo-cimento, uma proteção contra o desgaste, transmissão de calor e umidade”. A pesquisadora realizou uma experiência para pintura em solo-cimento utilizando corpos de prova sem pintura, pintados com Têmpera, com Hidracor, com Cimento Branco e Areia, com Conservado P e com Látex. Segundo Guimarães, a pesquisa realizada demonstrou que entre as pinturas aplicadas, o Conservado P e a tinta à base de Látex foram as que melhor apresentaram resultados, sendo que a pintura à base de Látex exige um paramento com superfície bem acabada, sem furos ou trincas. A pintura complementa a função do revestimento, de modo a oferecer ao mesmo uma capacidade maior de impermeabilidade. Esta, além de contribuir com a impermeabilização da vedação vertical, propiciará uma boa qualidade de higiene e um maior ou menor índice de iluminação natural, a depender da cor adotada. Para habitação de interesse social, construída em técnica mista, a pintura mais adequada, em função da melhor aderência e do custo é à base de cal. Segundo Rodrigues (2006, p.11), nas pinturas tradicionais à base de cal, “a solidificação ocorre na seqüência da cristalização dos constituintes, originando uma camada que atua como consolidante do próprio reboco”. Para Rodrigues, a cor da pintura pode ser obtida com a mistura de corantes orgânicos ou inorgânicos, naturais ou artificiais que além de conferir a cor, podem ter importante papel na durabilidade do filme. Conforme os dados obtidos no estudo de caso, apenas 8,33% das habitações receberam pintura em toda a vedação vertical interna e externa e uma delas é mostrada na figura 59. 153 FIGURA 59 – VEDAÇÃO VERTICAL TOTALMENTE PINTADA, EXTERNA E INTERNAMENTE Foto do autor – 2004 A casa da Figura 59 é pintada com tinta à base de Cal, com pigmento denominado no comércio local “xadrez”, na cor azul. Este tipo de pintura foi bastante utilizado nas construções coloniais brasileiras, e ainda hoje em casas de técnica mista (tabique), em Portugal. A pintura à base de Cal tem a vantagem de encorpar a superfície da vedação vertical da técnica mista, preenchendo todos os vazios, inclusive furos e fissuras, de modo a impermeabilizar toda a área pintada. A pintura à base de Látex forma um filme, tornando-se vulnerável nos pontos de fissuras e furos do paramento. Metade das construções da área de estudo recebe pintura apenas na fachada principal, conforme a Figura 60. 154 FIGURA 60 – VEDAÇÃO VERTICAL PARCIALMENTE PINTADA, APENAS A FACHADA PRINCIPAL Foto do autor – 2004 A falta de reboco nas construções propicia uma má condição de higienização, a deteriorização e o abrigo de insetos, conforme a Figura 61. FIGURA 61 – VEDAÇÃO VERTICAL SEM REBOCO E SEM PINTURA EXTERNA E INTERNA Foto do autor – 2004 155 Recomendações para a pintura Recomendação 1 Pintar as vedações verticais com tinta à base de Cal, em função do baixo custo, aditando à mesma cola plástica ou produto similar, encarregado de possibilitar uma melhor aderência entre a pintura e a superfície de suporte, o reboco. Recomendação 2 Usar cores claras, de preferência o branco ou o bege claro, de modo a propiciar um melhor aproveitamento, tanto da luz natural, quanto da artificial. 6.6 Sobre a cobertura 6omo elemento que faz interface com a vedação vertical, a cobertura deverá, além de vedar o interior da habitação, proteger parcialmente a vedação vertical. Portanto deverá ser executada com bastante cuidado, de forma a se tornar uma vedação estanque ao intemperismo, principalmente às águas de chuva, conduzindo as mesmas de forma eficaz e o mais longe que puder da habitação. Por isso, é recomendável, sempre que possível, prolongar ao máximo os beirais sobre a vedação vertical, de modo a propiciar uma área maior de proteção da mesma em relação á chuva e lançar a água do beiral o mais longe possível da construção. Uma forma de evitar o salpico da água de chuva da sobre a parte inferior da vedação vertical é usar uma calha no beiral da cobertura, podendo ainda coletar a água para uso dos habitantes. Na área de estudo mais de 70% das coberturas são em telha cerâmica de olaria, conforme os dados da tabela 20, no capítulo 5 e as figuras 62 e 63. Esta telha, fabricada artesanalmente é relativamente pequena, em torno de 35 cm de comprimento, de custo compatível com a população amostrada, conforme demonstra o percentual de usuários, e juntamente com o solo de fechamento da vedação vertical propicia uma temperatura ambiente agradável. 156 FIGURA 62 – COBERTURA EM TELHA CERÂMICA DE OLARIA Foto do autor – 2004 FIGURA 63 – COBERTURA EM TELHA CERÂMICA DE OLARIA Foto do autor – 2004 157 Recomendações para a cobertura Recomendação 1 Travar a cobertura no nível da viga de frechal (pé direito mínimo), com peças horizontais fazendo um triângulo em cada vértice externo da construção, de modo a dar mais rigidez à vedação vertical. Recomendação 2 Avançar com o balanço dos beirais o mais possível, de modo a propiciar uma melhor proteção à vedação vertical. Recomendação 3 Usar telhas cerâmicas de olaria, por propiciar um custo menor e um bom desempenho térmico. Recomendação 4 Usar varandas sempre que possível, e de preferência em todos os lados da construção, protegendo desta forma, os paramentos verticais externos. 6.7 Sobre as esquadrias Faz parte das vedações verticais as esquadrias as esquadrias cuja finalidade é possibilitar o acesso à habitação, garantir a iluminação natural, permitir contemplar a paisagem exterior e permitir a ventilação dos ambientes, sem perder as funções de estanquidade, principalmente das águas de chuva, além de responder pela segurança da habitação contra intrusos. Na área de estudo a maioria das esquadrias, em torno de 80% são fabricadas artesanalmente e o restante em carpintarias da localidade. Na maioria são em madeira e não dispõem de aberturas em vidro, o que torna os ambientes sombrios, quando fechadas. Quando muito, em alguns casos de esquadrias executadas nas carpintarias, usam-se paramentos em veneziana. As 2 casas à direita 158 da Figura 64 são edificações em técnica mista, assim com, as 2 à esquerda da Figura 65, onde se vêm o padrão das esquadrias utilizados na técnica mista da área de estudo. FIGURA 64 – PADRÃO DAS ESQUADRIAS NA VEDÇÃO VERTICAL Foto do autor – 2004 As esquadrias observadas são todas em madeira, sem condição de iluminação natural em tempo de chuva, exceto na habitação que possui uma pequena varanda, a qual protege a janela e a vedação vertical. Entende-se que este padrão de esquadria representa o padrão do “saber fazer” da população, onde, muitas vezes, as tábuas compradas na madeireira são apenas juntadas e presas com pregos a travessas horizontais, colocadas na parte de dentro. FIGURA 65 – PADRÃO DAS ESQUADRIAS NA VEDDÇÃO VERTICAL Foto do autor – 2004 159 A casa da direita apresenta uma janela em veneziana, o que permite uma permanente condição de ventilação do ambiente; falta, porém, elemento que conduza a iluminação natural para o interior da habitação. Recomendações para as esquadrias Recomendação 1 As esquadrias deverão possibilitar a penetração da ventilação, assim como da iluminação natural nos ambientes, sempre que necessário. Recomendação 2 As esquadrias deverão garantir a segurança da habitação contra intrusos e contra as intempéries. 6.8 Síntese das discussões, avaliações e recomendações Os estudos apresentados demonstraram o valor da construção executada em técnica mista, principalmente para habitações de interesse social, nas quais, o poder de compra é baixo, sendo esta técnica a que melhor se enquadra para a aquisição de sua moradia. Quando FLORES (1989), afirma que a técnica mista é um sistema construtivo usado atualmente nos setores de escassos recursos econômicos visando oferecer ao homem um teto, dando-lhe a esperança de no futuro construir uma habitação mais durável, faltou analisar e recomendar melhorias no uso desta técnica, visando estabelecer uma vida útil maior e condições de habitabilidade mais saudáveis. Temos pelo mundo centenas de exemplos de construções erguidas em técnica mista, muitas delas centenárias, que estão a demonstrar sua capacidade de segurança, durabilidade e de ambiente saudável. Foram construções erguidas com materiais duráveis, executados de modo tecnicamente correto, cujos espaços foram devidamente enquadrados em benefício da função, da orientação e da forma de viver das famílias. Portugal tem, na cidade de Lamego um imenso 160 patrimônio de casas centenárias em técnica mista. Não apenas em Lamego, mas em Tarouca, Guarda, Covilã, Fundão, Alpedrinha e tantas outras localidades, principalmente no norte de Portugal. Com relação ao estudo de caso, os dados, as fotos e os contatos dão um diagnóstico de um povo financeiramente pobre, mas muito acolhedor. Ninguém se negou a responder o questionário, que foi bastante amplo, com perguntas não apenas voltadas para a forma de se construir, mas também referente a dados pessoais. O Alegre é uma área de periferia, mas lá não existe a figura do invasor; cada um, dentro das suas minguadas possibilidades, conseguiu comprar seu terreno e erguer sua moradia, ou já comprou a moradia pronta. Em termos ambientais o problema maior é a falta de esgotamento sanitário, do uso de água potável e de drenagem pluvial. Aproximadamente 80% dos moradores das casas em técnica mista não têm vaso sanitário e os 20% que possuem banheiro com vaso sanitário fazem o lançamento do vaso em fossa negra (sem tratamento). A instalação de água domiciliar é outro problema, já que apenas, 37% das habitações possuem água instalada. A drenagem pluvial não é satisfatória sequer na via principal. 161 7. CONCLUSÕES Esta pesquisa atingiu os objetivos estabelecidos para o trabalho, onde avaliou o modo de se construir com técnica mista em São Sebastião do Passé, estudou e diagnosticou o perfil econômico da população alvo, o tipo de solo local, o uso e condições da madeira aplicada e, estabeleceu recomendações para melhoria tecnológica das vedações verticais na técnica em questão. O trabalho fez uma introdução sobre a necessidade urgente que os países, principalmente os em desenvolvimento, estão passando para atender a demanda, cada vez maior, de habitações destinadas à famílias de baixa renda. Fez também, uma abordagem sobre a necessidade de utilização de materiais renováveis, que consumam o mínimo de energia em seu processo produtivo e que não venham a comprometer o uso pelas gerações futuras. No trabalho buscou-se resgatar o uso de construções com terra crua, em especial as que utilizam a técnica mista, sendo desenvolvido uma pesquisa sobre o uso da citada técnica em países como o Japão, Equador, Paraguai, Portugal e Brasil. Na pesquisa bibliográfica foram estudados e analisados os principais elementos que compõem a vedação vertical da técnica mista, como a estrutura, o entramado, o solo e as recomendações de diversos pesquisadores sobre a melhor forma de execução e proteção da mesma. Realizou-se um Estudo de Caso no bairro do Alegre, em São Sebastião do Passe, Bahia, onde foram pesquisadas 24 (vinte e quatro) habitações. Os dados levantados na pesquisa propiciaram o estudo, a análise e o diagnóstico, que, juntamente com a pesquisa bibliográfica propiciaram o estabelecimento de recomendações para melhoria tecnológica da vedação vertical em habitações de interesse social. No Estudo de Caso foi avaliada a condição sócio-econômica da população, da qual, 62,5% têm uma renda média per capta mensal de R$ 40,00 (quarenta reais), correspondente a R$ 1,33 (um real e trinta e três centavos) de gasto diário por pessoa, caracterizando a população como de baixa renda. Foram avaliados ainda, os principais materiais usados, o tempo de 162 construção das habitações e as patologias das construções. Descreveu-se a forma com que as construções foram executadas, sendo em seguida discutidos e avaliados os elementos contidos na investigação. Por se tratar de população de interesse social, as recomendações foram estabelecidas visando o menor custo e a possibilidade de serem executadas pela comunidade local. No entanto, a análise sócio-econômica demonstra que se faz necessária uma política pública de emprego e renda, visto que 50% da população é desempregada. Os estudos apresentados demonstraram o valor da construção executada em técnica mista, principalmente para habitações de interesse social, onde, mesmo com recursos econômicos escassos, o homem pode construir um teto. As recomendações feitas no trabalho contribuirão para a elaboração de uma habitação mais duradoura e mais saudável. O trabalho mostrou exemplos de construções erguidas em técnica mista em várias partes do mundo, muitas delas centenárias, e que estão a demonstrar sua capacidade de segurança, durabilidade e de ambiente saudável. São construções erguidas com materiais duráveis, executadas de modo tecnicamente correto, cujos espaços foram devidamente enquadrados em benefício da função, da orientação e da forma de viver das famílias. Entre os países que utilizaram a técnica mista, conforme consta no capítulo 2, Portugal se destaca, abrigando na cidade de Lamego um imenso patrimônio de casas centenárias construídas com esta técnica. Não apenas Lamego, mas Tarouca, Guarda, Covilã, Fundão, Alpedrinha e tantas outras localidades, principalmente no norte daquele país. Na atualidade, o grande vilão da técnica mista para habitação de interesse social é a madeira. A cada dia a madeira de lei convencional (Pau d´arco, Maçaranduba, Sucupira, etc.) se torna mais escassa e seu preço mais elevado. Diante desse quadro, duas alternativas surgem como substituto da madeira convencional: a madeira reflorestada, da qual, o eucalipto se apresenta como o mais indicado, pelo curto tempo entre o plantio e o corte para utilização; e o 163 bambu, tão bom quanto a madeira, para o uso em questão. Acontece que o custo para o tratamento do eucalipto é significativo e realizado com produtos químicos nocivos. Quanto ao bambu, existe a necessidade de importação de pelo menos 3 espécies apropriadas para o uso em construção civil cujo tratamento seja efetuado por processos não tóxicos, como o Phyllostacys, o Guadua e o Dendrocalamus giganteus. As 3 espécies podem, além do uso na construção civil, ser utilizadas para a fabricação de peças musicais, mobiliário, cercas, reflorestamento e irrigação, sendo que a espécie Phyllostacys também é usada como alimento para o homem. Outra grande vantagem é que a partir do quarto ano o bambu já pode ser cortado e tratado para ser usado na construção civil. Com relação ao estudo de caso, os dados, as fotos e os contatos mostraram a face de um povo simples, financeiramente pobre e muito acolhedor. Ninguém se negou a responder o questionário, que diga-se de passagem, é bastante amplo, com perguntas não apenas voltadas para a forma de se construir, mas também, para a obtenção de dados pessoais. O Alegre é uma área de periferia, mas lá não existe a figura do invasor. Cada um, dentro das suas minguadas possibilidades conseguiu comprar seu terreno e erguer sua moradia, ou já comprou a moradia pronta. Em termos ambientais o problema maior é a falta de esgotamento sanitário. Aproximadamente 80% dos moradores das casas em técnica mista não têm vaso sanitário e os 20% que possuem banheiro com vaso sanitário fazem o lançamento do vaso em fossa negra (sem tratamento). Outro problema é a instalação de água domiciliar, já que apenas 37% das habitações possuem água encanada. No mais, o dano ambiental maior é decorrente do uso da madeira para a construção, que a cada dia contribui para a diminuição das poucas matas que restam. Com a substituição da madeira pelo bambu, esse mal será sanado, ganhando-se ainda o reflorestamento com o plantio do bambu, trazendo imediata melhoria ao meio ambiente. A retirada do barro para 164 a “tapagem da casa” é tão insignificante que não chega a comprometer seu uso para as gerações futuras. Normalmente o barreiro é fechado logo após o final do barreamento. Uma forma mais apropriada é a de fazer o barreiro no local da futura fossa e/ ou do poço sumidouro. 7.1 RECOMENDAÇÕES PARA TRABALHOS FUTUROS O significado da moradia para o ser humano vai muito além de ser apenas um local de abrigo. A moradia reúne a primeira das células sociais, a família. Ela é um símbolo de identificação social e cultural e isso torna a análise da questão mais complexa. Neste trabalho, além de se procurar identificar os problemas tecnológicos e ambientais, buscou-se avaliar e encontrar formas para a moradia de interesse social. Nos estudos, avaliações e discussões foram abordados pontos que poderão ser desenvolvidos em trabalhos futuros, assim como, deverá se buscar uma forma capaz de transmitir as recomendações do trabalho para a população de interesse social, através de: sistematização de um processo construtivo adequado ao uso do bambu na técnica mista; estudo de formas compatíveis com o uso do bambu na técnica mista, visando estabelecer novas tipologias; estudos sobre a durabilidade das construções em técnica mista; estudos sobre as patologias das vedações em técnica mista; e elaboração de uma cartilha com as recomendações aqui propostas. 165 REFERENCIAS REFERENCIAS CITADAS AGENDA 21, Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, 1992 - Rio de Janeiro. Brasília: Senado Federal, 1998, 585 p. ALVARENGA, M. A. A. Arquitetura de terra - Técnicas Construtivas. Belo Horizonte, 1984. ANTUNES, Maria Del Carmen. O bambu na Construção. Escola de Engenharia de São Carlos USP, EBAMEN, 1983. 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