ABRIGO ATEMPORAL
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casa_final.qxd 25/11/2008 17:55 Page 28 C A S A S T U D I O PA R A L E L O S Ã O F R A N C I S C O D E PA U L A , R S REFÚGIO SÃO CHICO 2006/2007 ABRIGO ATEMPORAL CASA REVESTIDA DE AÇO NO MEIO DA MATA ATLÂNTICA DESAFIA TRADIÇÕES AO REFORÇAR IMAGEM PURAMENTE ARTIFICIAL EM MEIO AO DOMÍNIO DO NATURAL 28 ARQUITETURA&URBANISMO DEZEMBRO 2008 POR SIMONE SAYEGH FOTOS EDUARDO AIGNER casa_final.qxd 25/11/2008 17:55 Page 29 O refúgio escondido na mata é tema recorrente na arquitetura. Remonta à idéia do abrigo seguro em meio à natureza selvagem, à velha casa da árvore. A vontade de estar perto do que é natural, puro e forte nos leva a incrustar casas no meio de árvores nativas, cipós, mato e terra. Mas pouca gente deseja se expor a bichos que voam e picam, ou a animais que rastejam e mordem. Em geral, esses refúgios são perfeitamente estanques, fechados e abertos na medida certa e, ao contrário do que poderíamos imaginar, não necessariamente miméticos. Simplesmente estão lá, como uma nave pousada em um mundo alienígena. É o caso da Casa Varanda, erguida na mata Atlântica com projeto de Carla Juaçaba (AU 166), ou daquela em Pouso Alto, dos arquitetos Newton Massafumi e Tânia Regina Parma, da Gesto Arquitetura, (AU 162), e também dos módulos residenciais criados pelos arquitetos Ana Vidal e Silvio Sant'Anna (AU 130),construídos no meio das árvores em Parati,bem perto da natureza e mais ainda da tecnologia. A todos O programa formado por sala, cozinha e duas suítes foi organizado em um corpo retangular apoiado sobre uma laje elevada de concreto. Simples, mas não minimalista, a construção se conforma em duas caixas retangulares de diferentes texturas – madeira e aço galvanizado – que se interceptam implantação 0 5 casa_final.qxd 25/11/2008 17:56 Page 30 C A S A S T U D I O PA R A L E L O S Ã O F R A N C I S C O D E PA U L A , R S REFÚGIO SÃO CHICO 2006/2007 esses exemplos agora podemos somar a experiência do escritório gaúcho Studio Paralelo. Foi bastante reveladora a conversa com Luciano Andrades, um dos responsáveis pelo projeto da casa no meio da mata próxima à cidade serrana de São Francisco de Paula, a 100 km de Porto Alegre. O objetivo dos arquitetos era justamente evitar qualquer referência campestre e mostrar que uma casa industrializada serve a todos os sítios naturais, como módulos de morar. O arquiteto bebeu na fonte da arquitetura moderna e de sua imparcialidade e clareza estética. Assim, o projeto é extremamente simples, ortogonal e planar. O terreno de cerca de 1,6 mil m2 é totalmente tomado de mata atlântica e araucárias. Localizado em um condomínio fechado, apresenta uma série de restrições de construção. O cliente também queria evitar ao máximo a retirada de vegetação, mas rejeitou a idéia de seguir O espaço central da construção acomoda o living e a cozinha. É marcado por movimentos que quebram a linearidade, como o revestimento de pínus autoclavado e o avanço das janelas em direção à mata. Na outra página, vista da suíte aberta para o deck 30 ARQUITETURA&URBANISMO DEZEMBRO 2008 casa_final.qxd 25/11/2008 17:56 Page 31 o modelo tradicional das residências da região, construídas com madeira escura e vermelha (pinho), com telhados de águas inclinadas. "O cliente desejava uma casa mais clara e transparente", conta o arquiteto Luciano Andrades. Optaram pela estrutura de madeira, mas os problemas relativos à umidade, somados à falta de mão-de-obra especializada, eram preocupantes. Desistiram da idéia e optaram por uma casa realmente industrializada, com garantia de qualidade técnica desde a fábrica. O aço leve, ou light steel frame, foi o escolhido para estruturar a construção de somente 82 m2. Desconsiderado o tempo necessário para a cura da laje de concreto, a obra do refúgio foi executada em pouco mais de dois meses O refúgio térreo organiza-se de maneira longitudinal, desdobrado em três volumes que englobam duas áreas básicas: privada e social. O espaço central, mais defasado, funciona como centro aglutinador das atividades sociais e abriga estar e cozinha. É marcado por movimentos que quebram a linearidade proposta, como o revestimento total de pínus autoclavado, por dentro e por fora, (madeira usada inclusive no mobiliário) e o avanço das janelas de vidro laminado duplo em direção à mata. Em cada extremidade da planta são dispostos os blocos dos dormitórios, somente dois, inteiramente revestidos com telhas metálicas, em uma clara alusão à idéia de vagão ou contêiner. O contato dos quartos com a paisagem externa é feito por fita transparente e um pequeno terraço que quase toca os troncos das árvores. O conjunto retangular da construção eleva-se tímido em meio às árvores, mas o fato de não se camuflar destaca-o como somente um corpo estranho poderia. A casa coexiste com o denso verde, mas dele não tira partido, e vice-versa. A característica de bunker hermético é finalmente quebrada pelo ar: uma estratégica varanda entre a sala e um dos quartos, que projeta um deck de madeira em balanço sob o solo.A luz é filtrada por uma cobertura de acrílico alveolar translúcido, e o espaço configurase como o meio caminho, a transição possível entre a casa de aço e a mata fechada lá fora. DEZEMBRO 2008 ARQUITETURA&URBANISMO 31 casa_final.qxd 25/11/2008 17:56 Page 32 C A S A S T U D I O PA R A L E L O S Ã O F R A N C I S C O D E PA U L A , R S REFÚGIO SÃO CHICO corte longitudinal 2006/2007 0 2 3 subsolo 1 4 5 6 7 8 9 10 11 térreo 0 3 12 1 capeamento em chapa galvanizada 2 telha ondulada galvalume 3 gárgula em tubo metálico 4 chapa de gesso acortonado 5 lambri de madeira autoclavada 90 x 30 mm 6 isolante térmico – lã de rocha 60 mm 7 esquadria em madeira maxiar com vidro duplo 8 montante em aço “C” 90 x 0,85 mm 9 assoalho de madeira autoclavada 90 x 25 mm 10 guia em aço “U” 92 x 0,85 mm 11 laje em concreto armado 12 telha ondulada 3 casa_final.qxd 25/11/2008 17:56 Page 33 corte transversal A casa foi pensada a partir de uma lógica estrutural rígida, com módulos de 1,20 x 1,20 m estruturados por perfis metálicos de aço galvanizado. Para o crítico Carlos Comas, o Studio Paralelo revive o velho vínculo entre a arquitetura moderna e a casa mínima para lazer casa_final.qxd 25/11/2008 17:56 Page 34 C A S A S T U D I O PA R A L E L O S Ã O F R A N C I S C O D E PA U L A , R S REFÚGIO SÃO CHICO 2006/2007 PASSO A PASSO DA OBRA fotos divulgação Studio Paralelo A construção casa seguiu os procedimentos básicos do sistema light steel frame, e foi modulada em 1,20 m x 1,20 m. A primeira etapa consistiu na execução da base para receber as estruturas de steel frame. 1a ETAPA A fundação poderia ser feita com sapatas, radier ou embasamento. Foi escolhido o embasamento, executado com pedra grés e blocos de concreto, por permitir a elevação do volume do solo e evitar contato com a umidade, insetos e pequenos animais. Depois se iniciaram os trabalhos de execução da laje de concreto armado, procedimento que levou cinco dias para ser concluído. Após um período de 20 dias o concreto estava pronto para receber os painéis. SEMANAS 1 E 2 Preparados na fábrica com estrutura de perfis de aço galvanizado e placas de OSB, os painéis são transportados até o local para serem montados sobre a laje de concreto. Cada painel recebe uma fita de neoprene (banda acústica) na soleira inferior, de modo a evitar o contato direto da estrutura com a laje e compensar imperfeições do concreto, além de conferir estanqueidade às paredes. SEMANA 3 Os módulos são posicionados sobre a laje e fixados a pólvora com pinos. A união entre cada painel é feita por parafusos autobrocantes que conferem rigidez e resistência à estrutura. Por fim, chumbadores e cantoneiras de aço complementam a ancoragem das paredes. 34 ARQUITETURA&URBANISMO DEZEMBRO 2008 SEMANA 4 Após a finalização das paredes, a equipe iniciou a montagem das vigas de bordo e colocação das tesouras. As vigas de 15 m x 0,55 m foram fixadas sobre as paredes, de uma lateral à outra, unindo o corpo principal da casa com a suíte. Além da função estrutural, as vigas formam a platibanda que irá ocultar a cobertura. As tesouras são, então, fixadas em intervalos de 1,20 m seguindo a modulação do projeto. Com a colocação dos painéis de OSB completa, já se tinha a idéia aproximada da volumetria final da casa. casa_final.qxd 25/11/2008 17:56 Page 35 SEMANA 5 SEMANA 6 A membrana impermeabilizante assegura a estanqueidade da estrutura, além de permitir a passagem do vapor gerado dentro da casa para fora, evitando umidade nas paredes internas. Junto com a colocação da membrana foram executadas as instalações hidráulicas e elétricas. A cobertura, também feita de estrutura metálica, foi recoberta com telhas trapezoidais do tipo sanduíche com miolo de EPS. SEMANA 7 SEMANA 9 Com a casa toda envelopada, inicia-se a colocação dos lambris de pinus autoclavado e da telha ondulada nas fachadas. Para arremate da telha junto à cobertura instalou-se em todo perímetro um capeamento em chapa Galvalume dobrada. O mesmo tipo de acabamento foi aplicado sobre o volume de madeira permitindo o escoamento da chuva (pingadeira). Após os serviços de montagem de estrutura e revestimentos externos, partiu-se para a finalização das paredes internas com a instalação da lã de rocha e placas de drywall. SEMANA 8 No encontro da telha e nas arestas do volume, fixaram-se cantoneiras em chapa dobrada para vedação e melhor acabamento. Foram instaladas as esquadrias das janelas e montada a estrutura metálica de sustentação do deck de madeira. Por fim, foram executados os revestimentos internos, acabamentos e colocado o mobiliário. DEZEMBRO 2008 ARQUITETURA&URBANISMO 35 casa_final.qxd 25/11/2008 17:56 Page 36 C A S A S T U D I O PA R A L E L O S Ã O F R A N C I S C O D E PA U L A , R S REFÚGIO SÃO CHICO 2006/2007 UM REFÚGIO PRA SÃO CHICO POR CARLOS EDUARDO COMAS DADOS TECNICOS Obra: Refúgio São Chico Localização: São Francisco de Paula, RS Ano do projeto: 2006 Ano da conclusão: 2007 Área do terreno: 1.610 m² Área construída: 82 m² FICHA TÉCNICA Arquitetura: Studio Paralelo – Luciano Andrades Cálculo das fundações e laje: Multiprojetos – Norberto e Camila Bedin Cálculo do steel frame: Formac Brasil – Mônica Montané Instalações sanitárias: JC Hidro – Julio Cesar Troleis Instalações elétricas: Eficientysul – Marcelo Alves Execução das fundações e laje: PP Construções e Reformas Execução: Sull Frame Engenharia – Luciano Zardo FORNECEDORES Steel frame: Formac Brasil; gesso acartonado e lã de rocha: Placo Center; OSB: Masisa; telha ondulada: Eurotelhas; pínus autoclavado: Durapine; esquadrias de alumínio: Kadesc; vidros: Lapividros; estrutura metálica: Safra; calefator: Amesti; mobiliário: Cometa Design; móvel e bancada da cozinha: Móveis São Chico 36 ARQUITETURA&URBANISMO DEZEMBRO 2008 TIMELESS SHELTER The hidden in the woods refuge is a recurring theme in architecture. It goes back to the safe shelter idea amidst the wild nature, to the old tree house. Located in the middle of a wooded area near the hilly city of São Francisco de Paula, 100 km from Porto Alegre, the small house designed by the young gaucho office, Studio Paralelo, avoids any "country" reference. It sits just like an alien craft in the 1.6 thousand m2 lot, totally covered by the Atlantic forest and araucarias (Brazilian pine trees). The architects drank from the modern architecture fountain and from its impartiality and aesthetic clarity. The project is, thus, extremely simple, orthogonal and planar. The industrialized constructive system, with a factory technical quality guarantee, was the architects' option to execute the project. The light steel frame presented itself as the best solution to structure the barely 82 m2 construction. Apart from the time needed to cure the concrete slab, the building was accomplished in a little over two months. *Veja endereços no final da revista A 112 km de Porto Alegre, São Francisco de Paula é o município mais meridional da região da Serra Geral no Rio Grande do Sul, com 907 m de altitude medidos na sede da prefeitura e uma população bruta de 20 mil habitantes. Os verões são brandos e úmidos e os invernos relativamente úmidos e frios, com eventuais nevadas. Carinhosamente conhecido por São Chico, o município integra dois circuitos turísticos importantes. É um dos 13 municípios de colonização alemã no começo do século 19 que constituem a Rota Romântica. Junto com Nova Petrópolis, Gramado e Canela. Integra a chamada Região das Hortênsias, popular no País inteiro em função do clima e paisagem de conotações européias, incluindo uma arquitetura pitoresca de estilo bávaro modernoso que é simplesmente "bavorosa". O "refúgio" de fim de semana projetado pelo Studio Paralelo para um publicitário jovem e solteiro se ergue dentro de condomínio de pequenos sítios em reserva de Mata Atlântica, no começo da floresta de araucárias, na periferia da sede do município. O programa previa salão, cozinha e duas suítes, uma das quais com acesso autônomo. Implantada no centro do lote de 1.610 m2 com um mínimo de árvores cortadas, a casa de 82 m2 vence suave declive sem modificar seu perfil natural. Apóia-se sobre a laje de concreto armado que se eleva do solo e, assim, se livra de umidade ascendente. Uma caixa retangular em blocos de concreto, semienterrada, recuada em relação à laje, conforma as fundações e abriga um depósito no maior desnível. A casa foi pensada a partir de uma lógica estrutural rígida, com módulos de 1,20 m x 1,20 m estruturados por perfis metálicos de aço galvanizado, fornecidos por uma casa_final.qxd 25/11/2008 17:56 Page 37 empresa chilena. A estrutura externa é complementada por painéis de madeira (OSB) forrados por membrana permeável que repele a umidade e permite transpiração do material. No interior, placas de drywall cobrem as paredes e forro, seguidas pela lã de rocha que ocupa o vazio entre as superfícies para isolamento térmico. Nas paredes exteriores, placas de lascas de madeira prensada se alternam com chapas onduladas de aço galvanizado. As mesmas chapas foram usadas no telhado de uma água, com calha embutida. A construção a seco se efetuou em prazo bastante curto. A composição arquitetônica é relativamente simples, mas não minimalista. As duas suítes praticamente iguais se dividem em três faixas transversais, com as extremas comportando banheiro a sul, para os fundos do lote, e sacada mais armário a norte, grosso modo paralelamente à rua. Dispostas com recuo mínimo nas pontas da caixa de blocos de concreto, as suítes flanqueiam dois elementos de maior profundidade, diferente largura e balanços desiguais, o salão e cozinha conjugados e uma galeria transversal aberta que serve de vestíbulo e varanda. O primeiro elemento se dispõe simétrico em relação ao eixo transversal das suítes e ao eixo longitudinal da composição. Mais curta ao sul, a galeria aí se articula com a rampa de entrada. Avançando ao norte, constitui plataforma suspensa sem guardacorpo, tão bela quanto perigosa. O tratamento volumétrico ajuda a subverter a simetria de base. Desde fora, o efeito desejado é o de duas caixas retangulares de diferentes texturas que se interceptam. A maior e mais estreita se reveste com telha ondulada metálica e inclui o vazio correspondente da galeria, tanto quanto a cobertura translúcida que o protege. A segunda, em madeira, mais transparente e baixa, é na verdade virtual, constituída pelas faixas avançadas correspondentes à bancada extrema da cozinha e um banco corrido no salão. A ortogonalidade não exclui a ambigüidade. A rejeição do sentimentalismo do chalé alpino ou similar prevalente na região é mais que óbvia. Em contrapartida, o Studio Paralelo revive o velho vínculo entre a arquitetura moderna e a casa mínima para o lazer. A linhagem invocada é ilustre. Dos mestres europeus da primeira geração inclui a casa em La Celle Saint-Cloud (1933) de Le Corbusier e a cabana do arquiteto em Cap Saint Martin (1951-52), assim como a casa Farnsworth (1946-51) de Mies van der Rohe em terra americana. De brasileiros, não se poderiam esquecer nem a casa Oswald de Andrade (1939) de Niemeyer e a casa de fim de semana do ar-quiteto em Mendes (1949), nem a casa de fim de semana em Nova Friburgo de Carlos Frederico Ferreira (1949) ou aquela que Reidy projetou para si e Carmen Portinho em Itaipava (1959). Mais recentes, mas também notáveis, são a casa Bonham (1961) de Charles Moore e a sua residência em Orinda (1961), e mesmo a cabana de esqui em Vail (1975) e a casa de praia em Block Island (1979) de Venturi, já comprometidas com uma figuração em sua hora dita pós-moderna. Em geral, esses exemplos são térreos, têm planta retangular compacta, cobertura inclinada e/ou abobadada. As exceções são a casa de La Celle Saint Cloud, de planta escalonada, a casa Farnsworth, de teto plano, além das casas Reidy, Bonham e as de Venturi, todas de dois andares. No refúgio de São Chico, a cornija plana abstrata e a elevação do solo remetem à casa Farnsworth, e mesmo às casas da escola paulista, ainda que a estrutura gaúcha esteja mais para "balloon frame" que para estrutura independente. A planta movimentada tendendo ao pitoresco resgata algo da exuberância e da porosidade cariocas em antecedentes que não são domésticos, a interpenetração de bloco alto e baixo ou o acesso por vazio central com portas de entrada laterais no Ministério da Educação, a seqüência restaurante-salão-varanda-sala de jogos que Lucio Costa articula no Park Hotel de Friburgo. O nexo com Friburgo se estende ao encaminhamento feliz de chegada, quando a fachada norte transparente se mostra plena e depois desaparece no giro que leva à Comente e veja o passo a passo da construção em www.revistaau.com.br entrada na fachada oposta opaca, mas animada por rasgos que enquadram dentro, na altura do olhar, o bosque circundante. De outro lado, a chapa ondulada galvanizada e as placas de madeira prensada cooperam para assinalar a contemporaneidade sem deixar de evocar o uso de materiais similares nas velhas casas de imigrantes da região, como os arquitetos bem registram. Do ponto de vista dos cheios e vazios, a caixa de planos perfurados coexiste com a caixa-sanduíche, composição de planos verticais entre os planos horizontais de piso e forro, ora membrana e outras vezes armário, cubículo, alcova, galeria equipada, dispositivo que empresta espessura às fachadas maiores como em muito projeto de Louis Kahn. O resultado não persegue a elegância, ao contrário do caso similar e relativamente recente da Casa D'Alessandro em Carapicuíba, dos paulistas Andrade e Morettin (1997). Como nos melhores momentos de Lucio Costa, o desajeitado é uma parte do pacote. Se a hibridização nem sempre convence visualmente e parece excessiva a diversidade de soluções formais para um mesmo problema de detalhe ou, ao contrário, não suficientemente diferenciada a madeira da cobertura translúcida da madeira da parede, pode-se retrucar que a perfeição não é coisa deste mundo. A obra não provoca menos que a congênere paulistana. Contribui da mesma forma para o enriquecimento de uma tradição disciplinar demonstrando a vitalidade de outro filão. E repropõe questões incômodas mas pertinentes e prementes, entre as quais as da responsabilidade da própria classe na reprodução de uma paisagem onde a cafonice impera. Afinal, arquitetura de autor tem mais é que fazer pensar, venha vestida de gala ou de roupa esporte. Carlos Eduardo Comas é arquiteto pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, mestre pela University of Pennsylvania e doutor pela Universite de Paris VIII. Leciona na UFRGS. Tem publicado extensamente sobre a arquitetura e o urbanismo modernos brasileiros e elaborado um número significativo de projetos de arquitetura e urbanismo. DEZEMBRO 2008 ARQUITETURA&URBANISMO 37