Título do Sub-projeto
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Título do Sub-projeto
Universidade Federal do Espírito Santo Programa Institucional de Iniciação Científica Jornada de Iniciação Científica 2007/2008 Ciências da Saúde As relações econômicas na Web na lógica P2P Identificação: Grande área do CNPq.: Ciências Sociais Aplicadas Área do CNPq: Comunicação Título do Projeto: Nós, a mídia: conflitos e clivagens entre o universo dos blogues e o jornalismo profissional Professor Orientador: Fabio Luiz Malini de Lima Estudante PIBIC/PIVIC: Thalles Gomes Waichert Santos Costa Resumo: O formato blog assume um papel cada vez mais importante na produção de informação na contemporaneidade. A crescente popularização que o formato alcança desde os atentados de 11 de setembro de 2001, o legitima como uma mídia alternativa para se consumir e produzir informação. Isso gera um turbilhão de mensagens que circulam pelo ciberespaço construindo opiniões e interferindo na agenda midiática. Contudo, à medida que o blog se dissemina, sua linguagem se modifica – passando de um filtro da Internet até micro-coberturas de eventos globais. E também se profissionaliza objetivando lucros financeiros com anúncios publicitários. Esse caminho é atravessado por permutas de códigos e valores com o jornalismo, que institui um regime de concorrência com a nova mídia emergente. Palavras chave: cibercultura, blog, Internet, jornalismo 1 – Introdução Negri e Hardt (2001) defendem que vivemos hoje um processo de pós-modernização ou informatização, no qual deixamos uma economia moldada pela produção fabril e entramos em outra moldada pela prestação de serviços e produção de informação. Nesse sentido, “o novo imperativo administrativo é ‘trate o fabril como se fosse um serviço’” (HARDT & NEGRI, 2001, p. 307). Essa mudança implica transformações em nossa sociedade, especialmente na qualidade e natureza do trabalho, cuja forma que se assume como determinante na nova economia é o trabalho imaterial, “ou seja, trabalho que produz um bem imaterial, como serviço, produto cultural, conhecimento ou comunicação” (Ibid., p. 311). Nesse contexto, a produção industrial de informação, característica dominante na estrutura vigente da comunicação moderna, entra em colapso. Ocorre então a descentralização dessa produção midiática, na qual a rede é o principal suporte. Logo, “no auge da produção contemporânea, a informação e a comunicação são as verdadeiras mercadorias produzidas; a rede, em si, é o lugar tanto da produção quanto da circulação” (Ibid., p. 319). Essa estrutura é regida por uma economia política diferenciada, nomeada por Bauwens (online) de economia política da produção entre pares (ou peer to peer), “acompanhado por uma nova ética do trabalho (a Ética Hacker de Pekka Himanen), por novas práticas culturais, [...] por um novo movimento social e político”. (BAUWENS, online, p.8). Universidade Federal do Espírito Santo Programa Institucional de Iniciação Científica Jornada de Iniciação Científica 2007/2008 Ciências da Saúde Nessa transição político-econômica, a emergência dos blogs – como um veículo próprio da Internet e de seus usuários – provoca um curto-circuito com certas práticas e conceitos tradicionais, como os de opinião pública, informação, audiência e gosto. Tendo em vista que dentre as propostas do projeto de pesquisa a qual esse sub-projeto encontrase vinculado está o estudo das influências que o universo dos blogs provocam na narrativa jornalística, e também que o objetivo inicial do referido sub-projeto consistia em investigar os novos arranjos econômicos no cenário midiático provocados pela Internet e redes de compartilhamento peer to peer, debruçamo-nos, portanto, sobre o universo dos blogs a fim de investigar as mutações no circuito midiático provocado pela inserção de anúncios publicitários nos diários virtuais. 2 – Objetivos Tendo definido o campo empírico sobre o qual a pesquisa atuaria – o universo dos blogs –, foram traçadas metas para alcançar: a) os objetivos almejados pelo subprojeto de forma que contemplasse as (b) propostas do projeto do orientador. a) Entendemos por objetivos do subprojeto: - A realização de um mapeamento das relações econômicas na Internet sob o viés da colaboração peer to peer; - E a investigação da viabilidade de uma produção de opinião independente sendo sustentável e até lucrativa. b) Destacamos como objetivos do projeto do orientador: - A realização de uma revisão bibliográfica sobre a emergência das novas mídias da Internet, que são construídas e atualizadas pelos próprios usuários – muitas vezes em um regime de colaboração1. - A análise da influência dessas novas mídias na construção da narrativa jornalística; - E a comparação entre a narrativa blogueira e jornalística a fim de identificar clivagens e conflitos entre essas duas formas de linguagem. Nesse sentido, empreendemos esforço para direcionar a abordagem inicial do subprojeto de cunho mais empirista para uma abordagem mais sociológica. Essa mudança teve como conseqüência o seguinte encaminhamento dos dois objetivos inicias do subprojeto: 1° Objetivo – o mapeamento econômico: Antes de qualquer passo teve-se claro a restrição empírica de abordagem circunscrita no universo dos blogs brasileiros. Ademais, nos debruçamos na prática conhecida no meio blogueiro como “monetização”, que consiste em acrescentar anúncios publicitários nos blogs com o intuito de obter lucros financeiros com a página virtual. Essa orientação teve como desdobramentos na organização da pesquisa as seguintes preocupações: 1 Basta observar as ferramentas (conhecidas no meio blogueiro como plugins) que são construídas e disponibilizadas gratuitamente em código aberto. Universidade Federal do Espírito Santo Programa Institucional de Iniciação Científica Jornada de Iniciação Científica 2007/2008 Ciências da Saúde - Quais são as características do público que serve de audiência a essas mídias? Ou seja, de que maneira a interação do usuário da Internet com anúncios publicitários configura novas estratégias na busca por audiência? - Quais as implicações dessa nova configuração no perfil do emissor de informação no cenário das novas mídias? O que por conseqüência resulta questionar: - Quais são os valores éticos do blogueiro e qual sua relação (se existe) com os valores jornalísticos? 2° Objetivo – a viabilidade da produção de opinião independente: Esse objetivo assume um papel coadjuvante às preocupações supra mencionadas, de forma que acompanha como uma espécie de olhar crítico todo o desenvolvimento da pesquisa. 3 – Metodologia Ao longo do ano dedicado ao desenvolvimento da pesquisa realizamos reuniões regulares para discussão bibliográfica, leituras orientadas e busca do material empírico na Internet (através de acompanhamento de blogs e buscas). Entendendo como material empírico publicações de blogs sobre os comportamentos dos blogueiros, assim como sua conduta ética, opiniões a respeito do imbricamento da narrativa jornalística e da produção blogueira e relatos sobre processo jurídicos contra blogueiros. Ainda dentro do material empírico encontra-se também o acompanhamento da lista de discussões chamada “Blogosfera”, hospedada no Yahoo Grupos. Assim o itinerário metodológico partirá de quatro operações fundamentais: 1. pesquisa bibliográfica: nesse momento, buscou-se a realização de leituras sobre cibercultura, blogs e jornalismo, em particular, uma revisão teórica sobre conceitos como redes, informação e campo, fundamentais para o entendimento dos regimes comunicacionais que o jornalismo e a blogosfera estão imersos. 2. pesquisa documental em blogs: nessa segunda operação, o objetivo foi realizar a pesquisa de campo, através da coleta de dados em blogs que tratam de assuntos relacionados ao campo jornalístico, bem como sobre o próprio campo blogueiro. A pesquisa então coletou: - publicações de blogs que discutem a própria atividade, a fim de procurar uma definição do universo brasileiro de blogs através da visão dos próprios blogueiros; - publicações de blogs cuja temática gire em torno da comparação entre blog e jornalismo; - publicações de blogs contendo relatos de processos jurídicos contra blogueiros com acusações baseadas em preceitos jornalísticos, tal como calúnia e difamação. Universidade Federal do Espírito Santo Programa Institucional de Iniciação Científica Jornada de Iniciação Científica 2007/2008 Ciências da Saúde 3. tratamento e análise dos dados. Quando o conjunto de dados coletados foi categorizado a partir dos conceitos teóricos e variáveis empíricas surgidas da pesquisa de campo. Nessa fase, o objetivo foi realizar um relatório parcial de descrição de quadros que detalham as características dos blogs enquanto novos emissores de informação. Realizou-se também a elaboração de um artigo científico submetido ao XIII Congresso de Ciências da Comunicação na Região Sudeste, que ocorreu em São Paulo – SP entre os dias 7 e 10 de Maio de 2008. 4. redação dos dados. Fase final da pesquisa, quando os dados já analisados ganham última análise, mais interpretativa, rumo à construção do relatório final da pesquisa e de um segundo artigo científico a ser enviado para o XXXI Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação, que ocorrerá em Natal – RN entre os dias 2 e 6 de Setembro de 2008. 4 – Resultados e Discussões Para chegarmos a resultados satisfatórios foi necessário estar constantemente atento à metodologia empregada para se fazer o recorte do material empírico (o universo dos blogs ou blogosfera) e em seguida sua análise. É importante aqui ressaltar – pois consideramos como um dos resultados alcançados que poderá influenciar futuros estudos – que a nossa dedicação de análise fora aos posts dos blogs. Referimos-nos, pois, a posts tratados individualmente, sem a preocupação de que aquele conteúdo é componente de um blog e que este blog pertence a um autor. Caso nosso esforço de análise fosse voltado para os blogs enquanto unidade de pesquisa seria preciso também se preocupar com a subjetividade pessoal empregada naquela produção e com os modos de produção aos quais o blogueiro está submetido. Ou seja, cada autor – cada blogueiro – detém o potencial de uma empresa de mídia para os nossos olhos. A saída para essa problemática encontrou-se em entender o conjunto de blogs – conhecido como blogosfera – como um único espaço. Um espaço por onde trafegam informações na forma de posts, não na forma de blogs. E esse é ponto a qual chegamos para daí desenvolver a pesquisa e chegar aos demais resultados: na blogosfera não circulam blogs, mas posts. Pela lógica, portanto, devemos (e assim o fizemos) nos debruçar sobre os posts enquanto material de análise. Chris Anderson, autor do livro A Cauda Longa, demonstra também entender os blogs de forma semelhante: “a blogosfera é um empreendimento coletivo – não 12 milhões de empreendimentos isolados, mas um único empreendimento com 12 milhões de repórteres, articulista e editorialistas”.(ANDERSON, 2006, p.185). Deixando esse importante ponto devidamente esclarecido vamos aos resultados da pesquisa. É possível dividir o estudo em dois momentos: o primeiro momento é quando nossa preocupação foi compreender as características culturais do blogueiro para posteriormente, num segundo momento da pesquisa direcionar nosso olhar para o blogueiro profissional, ou seja, o blogueiro que obtém lucro financeiro com seu blog. Para compreender as características culturais do blogueiro coletamos posts que objetivavam discutir a ética blogueira, o comportamento do blogueiro na Internet. Ao mesmo tempo organizamos uma revisão bibliográfica reunindo autores como Manuel Castells, Dan Gillmor e Rebecca Blood, além da importante contribuição dos artigos científicos de Raquel Recuero. Com esse arsenal bibliográfico foi Universidade Federal do Espírito Santo Programa Institucional de Iniciação Científica Jornada de Iniciação Científica 2007/2008 Ciências da Saúde possível, primeiramente, compreender o papel dos blogueiros na construção da Internet. Castells afirma que a Internet é fruto de quatro camadas culturais: a comunidade acadêmica – que Castells chama de tecnomeritocrática –, os hackers, as comunidades virtuais2 e o empresariado. Ainda que o autor não mencione os blogs em seu estudo, foi possível concluir que os blogs contribuem para essa construção formando comunidades virtuais. Mas antes de classificar o blogueiro numa dentre as camadas culturais de Castells, podemos pensar simplesmente que tipo de usuário da Internet é o blogueiro. E nesse ponto é crucial o entendimento de dois tipos de usuários: Por produtores/usuários refiro-me àqueles cuja prática da Internet é diretamente reintroduzida no sistema tecnológico; os consumidores/usuários, por outro lado, são aqueles beneficiários de aplicações e sistemas que não interagem diretamente com o desenvolvimento da Internet, embora seus usos tenham certamente um efeito agregado sobre a evolução do sistema. (CASTELLS, 2003, p. 34). Considerando que a ação dos blogueiros colaboram tanto de maneira direta – desenvolvendo novos aplicativos de publicação ou aperfeiçoando os já existentes – como indireta para o desenvolvimento da Internet, consideramos os blogueiros como produtores/usuários. Interessa-nos nessa pesquisa a contribuição indireta do blogueiro. Essa contribuição se dá através dos debates e discussões que a blogosfera alimenta, servindo tanto como um espaço para se discutir a mídia quanto para se produzir uma mídia alternativa e independente. É nesse ponto onde a proposta da pesquisa se cruza com esses primeiros resultados e formulamos a seguinte questão: quais as influências que a profissionalização dos blogueiros através da inserção de material publicitários nos blogs proporciona para a informação, até então dita independente, dos blogs? Essa pergunta nos leva ao segundo momento da pesquisa, no qual direcionamos nossa análise para os blogueiros profissionais. Foi realizada uma análise de conteúdo de diversos posts coletados na Internet através de motores de busca e pelos redirecionamentos (links) de tráfego feitos pelos próprios blogs3. Essa análise resultou em duas hipóteses: 1ª hipótese – a autonomização do campo blogueiro: A primeira coisa a ser feita, antes mesmo da análise de conteúdo dos posts, foi estudar o funcionamento dos mecanismos publicitários utilizados nos blogs para traçar as semelhanças e diferenças da publicidade de massa. Pois bem, esse momento foi crucial do ponto de vista metodológico, uma vez que percebemos que o capital publicitário não vê os blogs como várias micro-empresas de mídia, mas como um único e grande empreendimento de 12 milhões de repórteres, como bem descreve Chris Anderson. Essa é, pois, a primeira das diferenças entre publicidade de Internet e publicidade de massa. A segunda diferença é conseqüência da primeira. O conteúdo dos blogs não é afetado pelo conteúdo publicitário. O que implica dizer que não importa se o blog ostenta um anúncio do Mercado Livre e o blogueiro faz diversos posts prejudicando a imagem do Mercado Livre. Esse ponto é 2 Entendendo aqui comunidades virtuais no conceito de Wellman: “redes de laços interpessoais que proporcionam sociabilidade, apoio, informação, um senso de integração e identidade social” (Castells, 2003, p. 106). 3 Todo o material coletado se encontro nos anexos desse relatório. Universidade Federal do Espírito Santo Programa Institucional de Iniciação Científica Jornada de Iniciação Científica 2007/2008 Ciências da Saúde fundamental: a regra disciplinar imposta às redações tradicionais não tem valor na blogosfera, ou seja, publicar conteúdo contrário às opiniões de grandes patrocinadores não resulta numa sanção do patrocinador. Por conseguinte nos ocupamos para melhor compreender essa nova publicidade que se configura na Internet, chegando ao resultado de que os anúncios se aperfeiçoam no sentido de se misturarem às mensagens. Há um salto de análise aqui. Deixamos de lado a analogia com a publicidade de massa e nos dedicamos a entender a publicidade de Internet especificamente. Elaboramos a seguinte tabela para facilitar a compreensão: Publicidade 1.0 Os banners são o principal meio Publicidade 2.0 Anúncios contextuais de anunciar na Internet, assim buscam se relacionar com o meme intencionado em divulgar como os floating ads , e as conteúdo da página. Exemplo: uma marca ou produto. janelas pop-up, que se destacam Google em uma janela à parte. Mercado Livre entre outros. 4 Adsense, que Publicidade 3.0 Publicidade viral. Exemplo: Hotwords, Tabela 1: Evolução das formas de publicidade na Internet. A Publicidade 1.0 é baseada nas experiências anteriores de anúncios nos meios de massa, procurando inovar apenas no visual. Insere alguns movimentos nos anúncios e proporciona alguma interatividade. A Publicidade 2.0 se permite certo refinamento no que diz respeito ao público alvo a ser atingido. Os anúncios contextuais buscam relacionar o conteúdo da página ao anunciante. Dessa forma, ao entrar num blog sobre música será possível encontrar anúncios de instrumentos musicais, por exemplo. Ou então quando se trata de um blog sobre literatura, será possível encontrar anúncios de livros. Outro diferencial dos anúncios contextuais é que eles podem produzir resultados por demanda, ou seja, apenas quando um leitor clicar no anúncio exibido o blogueiro irá lucrar com ele, o que se torna vantajoso para quem anuncia. Entre os mais famosos exemplos estão o Google Adsense , Hotwords e Mercado Sócio . Na Publicidade 3.0, o próprio receptor do anúncio o transmite, fazendo com que a publicidade assuma um caráter viral. Atingindo a fusão da publicidade com o conteúdo. Já não existe um anúncio propriamente dito, pois os elementos utilizados na estrutura da publicidade já estão difusos na informação. Essas comparações e análises nos levaram a concluir que a publicidade assume um papel de motor de autonomia na blogosfera, fazendo com que ela possua um sentido próprio de produção e seja autosuficiente e lucrativa. É auto-suficiente porque possuiu um público que a consome e a alimenta de informações e é lucrativa porque a partir de mecanismos de publicidade conseguiu uma forma de obter retorno financeiro com sua atividade. E aqui entra a necessidade de uma teoria que ampare esse movimento de autonomização, encontrado em Pierre Bourdieu. O autor descreve que para a autonomização do campo de produção de bens-simbólicos foram necessárias três mudanças: 4 Anúncios que surgem sobre o conteúdo normal da página web, flutuando livremente sobre ela. Universidade Federal do Espírito Santo Programa Institucional de Iniciação Científica Jornada de Iniciação Científica 2007/2008 Ciências da Saúde (a) a constituição de um público de consumidores virtuais cada vez mais extenso, socialmente diversificado, e capaz de propiciar aos produtores de bens simbólicos não somente as condições minimais de independência econômica mas concedendo-lhes também um princípio de legitimação paralelo; b) a constituição de um corpo cada vez mais numeroso e diferenciado de produtores e empresários de bens simbólicos cuja profissionalização faz com que passem a reconhecer exlusivamente um certo tipo de determinações como por exemplo os imperativos técnicos e as normas que definem as condições de acesso à profissão e de participação no meio; c) a multiplicação e a diversificação das instâncias de consagração competindo pela legitimidade cultural […] e das instâncias de difusão”. (Bourdieu, 1930, p. 100). Traçando um paralelo ao pensamento de Bourdieu é possível afirmar que o processo de autosustentabilidade gerado pelo financiamento das verbas publicitárias nos blogs é oriundo do alargamento da comunidade de blogueiros (decorrente da popularização das ferramentas de edição) que, conseqüentemente, alargaram o público consumidor dessa produção, uma vez que os próprios produtores são também consumidores. Soma-se a isso o restante do público não produtor. Resultado: busca por profissionalização e uma audiência cada vez maior em uma mídia caracterizada pelo amadorismo e pequenas audiências. 2ª hipótese – os novos regimes de dependência: Através de um olhar mais atento, maior dedicação empregada nas análises de conteúdos e uma ampliação da bibliografia consultada foi possível problematizar o processo de autonomização desvendado pela primeira hipótese. Ao coletar posts que se dedicam a dar dicas de como melhorar o faturamento dos blogs através dos mecanismos publicitários e diversos outros posts que dialogam de alguma forma com essa temática, percebemos que o discurso ali enunciado girava em torno de quatro eixos: (a) mudanças na linha editorial do blog, (b) mudanças de público e estratégias para conquista de audiência, (c) resistências ao modelo de monetização e (d) elaboração de modelos alternativos de monetização. Por mudanças na linha editorial do blog compreende-se a inclinação dos autores em tratarem mais de assuntos generalistas do que íntimos, privados ou específicos. Essa mudança se faz necessário para se alcançar uma parcela maior de audiência. Portanto, nota-se aqui o princípio da preocupação em alargar seu público-alvo de maneira que torne possível maior faturamento com os mecanismos de publicidade. A segunda mudança toca exatamente na distinção que se começa a fazer de audiência. Notamos que para os blogueiros existe a audiência qualitativa, caracterizada por grande interatividade e participação do leitor com o blogueiro; e a audiência quantitativa, marcado por um tipo de leitor – apelidado pelos blogueiros de “pára-quedista”, que acessa o blog rapidamente à procura de uma informação específica, tendo mais chance, portanto de clicar em um anúncio. O terceiro eixo do discurso é uma reação às mudanças até então suscitadas. Um movimento de resistência emerge através de alguns blogueiros contra a monetização dos blogs – Ad-free blogs, afirmando que essa prática desvirtua os princípios blogueiros, como a interatividade, a participação e a construção coletiva da informação. E como resposta ao movimento de resistência identificamos o quarto eixo do discurso que se propõe a pensar alternativas a monetização, através da criação de novos modelos de mecanismos Universidade Federal do Espírito Santo Programa Institucional de Iniciação Científica Jornada de Iniciação Científica 2007/2008 Ciências da Saúde publicitários. Visto, portanto, que não há uma exaltação unicamente otimista da utilização de publicidade em blogs a pesquisa se encaminhou, finalmente, para estudar os pontos de conflito observados. É indispensável ressaltar que a profissionalização dos blogueiros não tardou a entrar em conflito com as práticas jornalísticas, ou seja, surge um debate no âmbito da comunicação online que contrapõe jornalistas e blogueiros como concorrentes um do outro. Destacamos em nossa pesquisa a campanha lançada pelo jornal Estado de São Paulo como ponto alto desse embate. Uma das peças da campanha é um vídeo publicitário no qual blogueiros são comparados a macacos que copiam o conteúdo dos jornais e colam nos blogs. Mas é preciso observar que não se trata de ataque fortuito do jornal. O caráter válido para se destacar nesse estudo é o embate de concorrência que o Estadão demarca entre profissionais da informação (jornalistas) e amadores da informação (blogueiros). Figura 1. Peça da campanha publicitária do Estadão. Esse ponto alça uma investigação do caráter da informação produzida pelos blogueiros atualmente. O objetivo da pesquisa não é fazer da blogosfera um objeto de sentença, condenando ou absolvendo o uso de publicidade nos blogs, mas estudar as implicações que a monetização implica na narrativa blogueira. E nesse quesito concluímos que se a monetização dos blogs não impulsiona um Universidade Federal do Espírito Santo Programa Institucional de Iniciação Científica Jornada de Iniciação Científica 2007/2008 Ciências da Saúde processo de autonomização do campo blogueiro, ao menos podemos considerar que ela põe em movimento a potencialidade informativa e noticiosa dos blogs. Tal potencialidade já deu mostras através dos atentados de 11 de Setembro, a prévia democrata norte-americana de 2004 (o caso Howard Dean), o furacão Katrina e etc. Tendo isso em vista, decidimos remontar o percurso histórico da blogosfera através de consultas bibliográficas utilizando Rebecca Blood, Giuseppe Granieri, Juan Varela e a tese de doutorado do professor orientador deste projeto, Fábio Malini. Através desse levantamento percebemos que os autores reconhecem, de forma geral, três momentos da blogosfera: (a) a fase filtro, no qual se limitava a indicar sites interessantes pela Internet; (b) a fase diário, marcada pela popularização de ferramentas de publicação de blogs e uma escrita voltada para a vida privada; (c) e a fase informativa, que marca a emergência do jornalismo cidadão e da utilização dos blogs para micro-coberturas de eventos, ocasionando eventuais furos na mídia tradicional – vide o caso do 11 de Setembro. Mas em nossa pesquisa descobrimos um quarto momento da blogosfera, responsável pela consolidação da fase informativa. Esse quarto momento é a fase profissional, marcada pela inserção dos anúncios publicitários, lucros e dedicação exclusiva do blogueiro. Essa fase gera um curto-circuito no cenário midiático, visto que a produção amadora emerge como concorrente direta da produção profissional de informações. Novamente aqui as noções de Pierre Bourdieu nos é útil para compreender de que maneira o blog se comporta diante da mídia. Ou seja, o desafio aqui é entender se o blog consolida sua autonomia em relação ao campo da mídia através da fase profissional ou marca sua entrada como componente do campo midiático. Para melhor compreender essa problemática é preciso ter claro que um campo é o espaço onde as posições dos agentes se encontram a priori fixadas. O campo se define como o locus onde se trava uma luta concorrencial entre os atores em torno de interesses específicos que caracterizam a área em questão. (ORTIZ, 1983 p. 19). A reflexão, portanto, se dá no sentido de compreender a blogosfera como um novo ator social que força sua entrada no campo da mídia ou de compreender a blogosfera como um novo campo no qual são produzidos sentidos e informações. Essa segunda prerrogativa corresponde à primeira hipótese lançada nessa pesquisa. A primeira prerrogativa, por sua vez, vai de encontro a essa primeira hipótese. Nota-se, então, que a blogosfera é campo e ator. É campo no momento inicial de sua história, instaura uma linguagem própria de orientação pela Internet (advinda da cultura hacker e de excelência acadêmica). Mas à medida que se profissionaliza e entra na lógica de produção de informação e micro-coberturas, se constitui, então, como um ator social do campo da mídia. Assim sendo, a blogosfera se coloca em um novo regime de dependência. Não depende de um patrocinador para sancionar o que é pode e o que não pode ser dito, mas por outro lado, depende cada vez mais dos fluxos de audiência na rede, é preciso capturar a audiência. Isso é feito através de agendamentos editoriais visando assuntos que chamem maior atenção nos motores de busca, podendo dessa forma, alcançar uma parcela maior de audiência. Universidade Federal do Espírito Santo Programa Institucional de Iniciação Científica Jornada de Iniciação Científica 2007/2008 Ciências da Saúde 5 – Conclusões “Há uma tecnologia humana, antes de haver uma tecnologia material”. Gilles Deleuze Dando seguimento à estruturada montada na seção “Resultados e Discussões”, as últimas considerações da pesquisa realizada terá início nas dificuldades metodológicas para o estudo da cibercultura. A dificuldade se encontra na semelhança que a blogosfera possui com o que Deleuze e Guattari chamam de rizoma. A analogia pode ser feita na medida em que “o rizoma nele mesmo tem formas muito diversas, desde sua extensão superficial ramificada em todos os sentidos até suas concreções em bulbos e tubérculos” (DELEUZE & GUATTARI, 1995, p. 15). Os blogs surgem e desaparecem a todo instante, criando novas conexões e desfazendo outras, logo, da mesma forma que “qualquer ponto de um rizoma pode ser conectado a qualquer outro e deve sê-lo” (Ibid., p. 15), tais conexões podem ser rompidas, quebradas, desfeitas sem que o universo dos blogs perca sentido ou força. Do mesmo modo “um rizoma pode ser rompido, quebrado em um lugar qualquer, e também retoma segundo uma ou outra de suas linhas e segundo outras linhas” (Ibid., p. 18). Destacamos, então, que a multiplicidade que os blogs formam “não tem nem sujeito nem objeto, mas somente determinações, grandezas, dimensões que não podem crescer sem que mude de natureza” (Ibid., p. 16). Destarte, a atividade blogueira constitui um agenciamento, que “é precisamente este crescimento das dimensões numa multiplicidade que muda necessariamente de natureza à medida que ela aumenta suas conexões” (Ibid., p. 17). Portanto, os blogs por si só formam uma multiplicidade difícil de se recortar. Para além disso, é preciso ter claro que “se é tão difícil mapear a cibercultura, é porque estamos inteiramente em seu interior” (FELINTO, 2007, p. 55). Às dificuldades metodológicas ainda se somam as limitações do estudo realizado. Mediante análise de conteúdo de diversos posts, concentramos nossa atenção no que está sendo construído coletivamente na blogosfera brasileira, nossa análise, portanto, não abrange ao modo como esse novo modelo opera. Seria um erro fatal ler esse estudo esperando uma abordagem dos modos de produção da informação na cibercultura. Não é esse o objetivo aqui. O que por um lado é uma limitação, por outro abre margem para continuidade de estudos, aprofundando passo a passo nossa compreensão de cibercultura e informação. Não obstante, chegamos lucidamente a duas hipóteses a respeito das implicações da monetização dos blogs nas características da informação blogueira e, também, na blogosfera em si. Ressaltadas na seção dos resultados e devidamente explicados, são elas: (a) a autonomização de produção de sentidos em relação ao campo do jornalismo; e (b) a subjeção a novos regimes de dependência no campo da mídia. É preciso, então, refletir esses resultados alcançados dentro de um contexto abrangente, à luz das teorias estudadas durante a pesquisa. A primeira hipótese se mostrou insuficiente a partir do momento que julgamos a segunda como mais realista. Esse julgamento não é feito sem embasamento, pois os dados analisados indicam que a blogosfera se submete a um regime de concorrência por atenção na rede com o jornalismo. Portanto, do que se trata esse novo regime de dependência? Acreditamos que as reflexões de Negri, Deleuze e Foucault podem nos ser de extrema utilidade para compreender esse regime. Universidade Federal do Espírito Santo Programa Institucional de Iniciação Científica Jornada de Iniciação Científica 2007/2008 Ciências da Saúde A transição da sociedade disciplinar para a sociedade do controle oferece uma saída para localizarmos o eixo no qual esse movimento da blogosfera se localiza. Entendemos por sociedade disciplinar Aquela na qual o comando social é construído mediante uma rede difusa de dispositivos que produzem e regulam os costumes, os hábitos e as práticas produtivas. Consegue-se pôr para funcionar essa sociedade, e assegurar obediência a suas regras e mecanismos de inclusão e/ou de exclusão, por meio de instituições disciplinares (a prisão, a fábrica, o asilo, o hospital, a universidade, a escola e assim por diante) [...]. (HARDT & NEGRI, 2001, p. 42). Já a sociedade do controle é caracterizada pela difusão desses dispositivos de controle nos próprios indivíduos, dessa forma, o poder agora é exercido mediante máquinas que organizam diretamente o cérebro (em sistemas de comunicação, redes de informação etc.) e os corpos (em sistemas de bem-estar, atividades monitoradas etc.) no objetivo de um estado de alienação independente do sentido da vida e do desejo de criatividade. (Ibid.) “A disciplinaridade fixou indivíduos dentro de instituições mas não teve êxito em consumi-los completamente no ritmo das praticas produtivas e da socialização produtiva” (Ibid., p. 43), êxito tal, alcançado através da plenitude do controle. É como ilustra o filme Matrix; Morpheus alerta Neo: todo cidadão é um potencial agente. Deleuze esclarece que “longe de se exercer numa esfera geral ou apropriada, a relação de poder se insere em todo lugar onde existem singularidades” (DELEUZE, 2006, p. 37). Hardt e Negri situam o trabalho nesse contexto: “Marx reconheceu algo familiar no que chamou de passagem da subordinação formal para a subordinação real do trabalho ao capital”. (HARDT & NEGRI, 2001. p. 44). O que queremos destacar aqui é que os dados observados nos encaminham a dizer que o trabalho aplicado na produção de informação é atravessado por um novo diagrama de poder. Aplicamos a concepção de Deleuze sobre diagrama: algo que “nunca age para representar um mundo preexistente, ele produz um novo tipo de realidade, um novo modelo de verdade”. (DELEUZE, 2006, p. 45). As diferenças e semelhanças entre essas duas formas de produção, entre esses dois modos de produção, não foram levantas nesse estudo. Contudo, vemos nas Olimpíadas de Pequim um evento global através do qual serão destacados com clareza a potência dos dois modos de produção da informação: o amador, através do jornalismo cidadão nos blogs e portais5; e o profissional, através da tradicional cobertura midiática oficial. 6 – Referências Bibliográficas ANDERSON, Chris. A Cauda Longa: do mercado de massa para o mercado de nicho. Rio de Janeiro: Editora Campus/Elsevier, 2006. 2ª edição. BAUWENS, Michel. A Economia Política da Produção entre Pares. Disponível na Internet: http://www.p2pfoundation.net/A_Economia_Pol%C3%ADtica_da_Produ %C3%A7%C3%A3o_entre_Pares. Acessado em 24 de abril de 2007. 5 Eu, Repórter do jornal O Globo; Yo Periodista, do jornal El Pais; I Report, da CNN; entre outros. Universidade Federal do Espírito Santo Programa Institucional de Iniciação Científica Jornada de Iniciação Científica 2007/2008 Ciências da Saúde BOURDIEU, Pierre. A Economia das Trocas. 6ª edição. São Paulo: Ed. Perspectiva. 2005. CASTELLS, Manuel. A Galáxia da Internet. 1ª edição. Rio de Janeiro: Ed. Jorge Zahar. 2003 DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Mil Platôs Capitalismo e Esquizofrenia vol. 1. Editora 34, 1995. DELEUZE, Gilles. Foucault. São Paulo: Ed. Brasiliense. 2006. FELINTO, Erick. Sem mapas para esses territórios: a cibercultura como campo de conhecimento. In: HERSCHMANN, Micael (Org.); FILHO, João Freire (Org.). Novos Rumos da Cultura da Mídia. Rio de Janeiro: Ed. Mauad, 2007. P. 45-58. HARDT, Michael e NEGRI, Antonio. Império. São Paulo: Ed. Record, 2001. ORTIZ, Renato (org.). Pierre Bourdieu: Sociologia. São Paulo: Ed. Ática, 1983.
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