Clique aqui para do arquivo em pdf
Transcrição
Clique aqui para do arquivo em pdf
1 I ENCONTRO EM ANÁLISE DO DISCURSO limites e perscpectivas 02 a 05 de Maio de 2007 CADERNO DE RESUMOS E COMUNICAÇÕES 2007/2009 Publicação UNIVERSIDADE ESTADUAL DEMATO GROSSO DO SUL UNIDADE UNIVERSITÁRIA DE NOVA ANDRADINA NÚCLEO DE ESTUDOS EM ANÁLISE DO DISCURSO CURSO DE LETRAS EXPEDIENTE Web-Revista Página de Debate: questões de Linguistica e de lingauem ISSN: 1984-527 NO. 12 dezembro/2009 www.uems.br/na/linguisticaelinguagem/ UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL UNIDADE UNIVERSITÁRIA DE NOVA ANDRADINA NÚCLEO DE ESTUDOS EM ANÁLISE DO DISCURSO CURSO DE LETRAS REITOR Prof. Msc. Luiz Antônio Álvares Gonçalves VICE-REITORA Msc. Profª Eleuza Ferreira Duarte PRÓ-REITOR DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA Profª Dr.ª Vera Lúcia Lescano de Almeida PRÓ-REITOR DE ENSINO PRÓ-REITOR DE EXTENSÃO, CULTURA E ASSUNTOS COMINITÁRIOS Profª Msc. Maria José Telles de Franco Marques GERENTE DA UNIDADE Prof. Msc. Fernandes Ferreira de Souza COORDENADOR DO CURSO DE LETRAS Prof.ª Msc. Eliane Maria de Oliveira Giacon COORDENADOR DO PROJETO Marlon Leal Rodrigues COMISSÃO ORGANIZADORA COMISSÃO CIENTÍFICA Alaíde Pereira Japecanga Aredes Anaíton de Souza Gama 2 Antônio Carlos Santana de Souza Edileuza Gimenes Moralis Daniel Abrão Jauranice Rodrigues Cavalcanti Maria Conceição Alves de Lima Marina Célia Mendonça Paulo Cesar Tafarello Wedencley Alves Santana COMISSÃO EDITORIAL Anailton de Souza Gama Marlon Leal Rodrigues COMISSÃO DE APOIO Maria Francisca Valiente Adriana Cozim de Oliveira Lima Eliana Maria de Oliveira Giacon Elisa da Silva Martins Fabiana Flores da Silva Gerson Marcia da Silva Dayane Caceres da Silva I EAD Nova No. dezembro Andradina - MS 12 2009 APRESENTAÇÃO O I Encontro em Análise do Discurso: Limites e Perspectivas, realizado nos dias 02, 03 e 04 de maio de 2007, na Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, Unidade Universitária de Nova Andradina, consolida-se como o evento pioneiro na Análise do Discurso no Mato Grosso do Sul, reunindo estudantes da graduação, pós-graduação e pesquisadores de várias partes do país, bem como autores consolidados na área do discurso. Buscando dar visibilidade e consistência à Análise do Discurso que praticamos, cujos fundamentos se assentam no ISSN legado deixado pela tradição francesa e seus seguidores, o 1984-5227 encontro procurou, mais do que reiterar nossos vínculos e Rua Walter Hubacher, no. 138, Centro Nova Andradina – MS CEP 79 750-000 Tel.: (67) 3925-5192 – 3925-5188 www.umes.br filiações, que vão além da teoria, mostrar sintonia e cumplicidade com as demandas contemporâneas do discurso. Com a atenção voltada para os limites e perspectivas, o I Encontro em Análise do Discurso procurou dar visibilidade não somente ao aspecto territorial, tendo em vista a falta de uma maior tradição em estudos do discurso no estado de Mato Grosso do Sul, mas também no aspecto material, em sua 3 dimensão metodológica. Embora tomando o discurso como seu da década em que surge a Análise do Discurso onde se objeto apenas nos anos 60 do século XX, a língua já se propunha a análise, em profundidade, entre a articulação do apresentava de forma não sistemática em diferentes épocas e político\sujeito\discurso\ideologia. segundo diferentes perspectivas, situando-a no século XX, Acreditamos que esse evento cumpre um papel temos os estudos dos formalistas russos (anos 20\30), que já importantíssimo ao integrar acadêmicos da graduação, pós- pressentiam no texto uma estrutura. Z. Harris (anos 50) graduação e pesquisadores de renome nacional, bem como a propunha o seu método distribucional pocedendo a uma análise comunidade em geral, pois um dos objetivos principais do I lingüística do texto como o faz na instância da frase. ENCONTRO EM ANÁLISE DO DISCURSO é propiciar um Nos anos 60 a AD se constitui como espaço de questões debate franco e plural com todas as instituições presentes e que criadas pela relação entre três domínios disciplinares que são ao estão envolvidas nos debates e análises discursivas da inúmeras mesmo tempo uma ruptura com o século XIX: a Lingüística, o questões prementes ao nosso tempo. Marxismo e a Psicanálise. E nada melhor para discutir esses Resta-nos agradecer à toda comunidade participante limites e perspectivas do que conectá-lo, associá-lo às questões desse I ENCONTRO EM ANÁLISE DO DISCURSO: contemporâneas, às entradas do novo e do diferente na esfera LIMITES E PERSPECTIVAS, promovido pela Universidade do discurso, que nos chega pela mídia, a relação com a política Estadual de Mato Grosso do Sul – Unidade Universitária de e os movimentos sociais, abrindo um manancial infinito de Nova Andradina, este evento é a soma do trabalho profícuo de possibilidades para o trabalho teórico e analítico, acarretando profissionais que se dedicam aos estudos do discurso, desafios teóricos-metodológicos, não impondo limites e privilegiando as relações intrínsecas entre o lingüístico e o perspectivas, afinal, seu caráter intervencionista e militante é contexto social, conscientes da ação transformadora da língua mais evidente hoje, diante da Globalização e da tendência em sua relação dialética com a realidade. Essa tarefa Neoliberalista em que vivemos, contextualizada com a França dificilmente poderia caber a uma só pessoa. O fazer científico 4 PROGRAMAÇÃO DO EVENTO na Análise do Discurso no Brasil e, quiçá, em nosso Estado apresenta como uma de suas características importantes o trabalho coletivo, com resultados de altíssima qualidade que Dia 02\05\2007 tem contribuído para a formação de novos pesquisadores e para 7:00 às 10:00 hs. – Inscrições a consolidação do campo. Esse evento, assim como esse 9:00 às 9:15 hs. – Café caderno de resumos, tem orgulho de integrar essa tradição. Saudações discursivas... 13:30 às 18:30 hs. - Minicursos Tema 1 – As estratégias Lingüística-Discursivas na Produção (leitura e escrita) de texto Anailton de Souza Gama Profa. Dra. Maria Angélica Freire de Carvalho (UEZO\RJ – TV Educativa SEED/MEC)) Tema 2 – Linguagem Publicitária Profa. Dra. Jauranice Rodrigues (METROCAMP\UNICAMP) Tema 3 - Identidade, Minorias e exclusão Profa. Msc. Kassandra Muniz (UNICAMP) Cavalcanti 5 Tema 4 – Sob a Inocência do Discurso: a linguagem e seu funcionamento Tema 10 – Análise do Discurso e Educação Prof. Dr. Lauro José da Cunha (UNEMAT) Profa. Dra. Alaíde Pereira Japecanga Aredes (UEMS) Tema 5 – Discurso Além da Língua: visualidade e Tema 11 – Foucault e a História Corporeidade como objetos de análise Prof. Msc. Clementino Nogueira de Souza Prof. Dr. Wedencley Alves Santana (UNICAMP/UNEMAT) Profa. Msc. Edileuza Gimenes Moralis Tema 6 – Línguas Indígenas Profa. Msc. Valéria Faria Cardosos (UNICAMP/UNEMAT) Tema 12 - Pesquisa em Análise do Discurso: Princípios e Procedimentos Tema 7 – Pesquisas em Tradições Discursivas e Mudanças Profa. Dra. Vânia Maria Lescano Guerra (UFMS) Lingüísticas Prof. Msc. Antônio Carlos Santana Tema 13 – Poesia Brasileira Contemporânea Prof. Dr. Daniel Abrão (UEMS\UNESP) Tema 8 – aspecto Bakhtinianos no Moderno Teatro Brasileiro Prof. Dr. Wagner Enedino Corsino (UFMS) Tema 14 – O Uso das Fontes Orais nas Ciências Humanas: considerações de pesquisa Tema 9 – Aspectos Discursivos da Obra “Viva o Povo Profa. Dra. Maria Selma Borges (UFMS) Brasileiro” de João Ubaldo Ribeiro Profa. Dra. Rosimeire Aparecida de Almeida (UFMS) Profa. Msc. Eliane Maria de Oliveira Giacon 6 Tema 15 – Sociolingüística em Sala de Aula: da teoria à prática Profa. Dra. Nara Sgarbi (UNIGRAN) Tema 21 – Reflexões sobre a Leitura em LE: pondo fim a Vacuidade de sentidos nos textos didáticos Tema 16 - a Identidade Cultural de um povo nas Letras de Profa. Msc. Maria Lígia Aguiar (UEMS) Música Country Prof. Esp. Mônica Aparecida Matos (UEMS) Tema 22 – O Jogo de Imagens no Discurso: o banco e a melhor idade Tema 17 – Na Tela do Cinema, a Mulher Brasileira Profa. Msc. Adélia Maria Evangelista Azevedo (UEMS) Profa. Msc. Raquel de Oliveira Fonseca (UEMS) Tema 23 – Semiótica Narrativa e Discursiva Tema 18 – A Descoberta da Afetividade Dentro da Teoria Prof. Esp. Anailton de Souza Gama (UEMS\FINAN) Psicanalítica: formação docente e ensino significativo Profa. Msc. Sandra Albano da Silva (UEMS) Tema 24 – Interpretação Textual e Análise Crítica do Discurso: uma parceria para o ensino de língua portuguesa Tema 19 – Análise do Discurso e os Processos de Leitura em Prof. Msc. Francisco Vanderlei ferreira da Costa (UFGD) Língua Inglesa: uma perspectiva prática Prof. Msc. João Fábio Sanches Silva (UEMS) Tema 25 – O Imagético nas Capas de Livros de Literatura: uma análise discursiva Tema 20 – Filosofia Wik – A Hora e a Vez do Discurso HiperTextual Colaborativo na Web Profa. Dra. Maria Conceição Alves de Lima (UEMS) Profa. Eliza da Silva Martins Peron (UEMS/UFMS) 7 Tema 26 - – Alienação ou Emancipação: uma proposta ao Maria Conceição Alves de Lima (UEMS) projeto político pedagógico Profa. Espc. Adma Cristina Salles de Souza (UEL\UEMS) Discurso, Alteridade e Gênero – Ed. Pedro e João. Vânia Maria Lescano Guerra e Edgar Nolasco (orgs) (UFMS) Tema 27 – Atlas Lingüísticos Regionais: instrumentos de ensino de língua materna (Re) Criação do Campesinato, Identidade e Distinção - – Ed. Profa. Msc. Regiane Pereira Coelho dos Reis (UEMS) UESP Rosemeire Aparecida de Almeida (UFMS) 10:00 às 11:30 hs. MESA REDONDA: Modalidades Discursivas em Suporte 20:00 às 21:30 – Apresentação Cultural Digital Grupo Vocal Vida e Voz Profa. Dra. Maria Conceição Alves de Lima Coordenação: Prof. Msc. Fernandes Ferreira (UEMS) (UEMS\UNICAMP) 21:30 hs. – Palestra: Análise do Discurso: Limites e 11:00 às 13:30 hs. - Almoço Perspectivas Prof. Dr. Wendencley Alves Santana 19:00 às 20:00 hs. – Lançamento de Livros Textualidade e Ensino: os aspectos (UNICAMP\CAPES/UNIVERSO) lógico-semântico- Dia 03\05\2007 cognitivos da linguagem e o desempenho discursivo escolar Ed. Da UNESP 8:00 às 9:30 hs. – Mesa redonda A 8 Profa. Dra. Rosimeire Aparecida de Almeida (UFMS) Identidade, Exclusão e Minorias Prof. Dr. Vitor Wagner Neto de Oliveira (UFMS) Identidade, Exclusão e Minorias 9:15 às 11:30 hs. Mesa –Redonda Profa. Msc. Kassandra Muniz (UNICAMP) Língua e Discurso: Contribuições Bakhtinianas Esquecimento, Interpelação e Exclusão Social Profa. Dra. Marina Célia Mendonça (UNIFRAN\UNI-FACEF) Prof. Dr. José Lauro da Cunha (UNEMAT) Um debate sobre a língua na Mídia segundo a perspectiva Bakhtiniana O Discurso da Exclusão em Plínio Marcos Prof. Dr. Wagner Enedino Corsino (UFMS) Profa. Dra. Jauranice Rodrigues Cavalcanti (METROCAMP\UNICAMP) Uma Introdução à Identidade do pedófilo As Contribuições de Bakhtin para o Discurso Jornalístico Prof. Msc. Paulo César Tafarello (UFMS/UNEMAT) 13:00 às 14:00 hs: Apresentação de Posters 8:00 às 9:00 hs. – Mesa redonda B Poster 1 Movimentos Sociais em Análise do Discurso: Entre campo e a Variação Lingüística: a oral e a escrita cidade Valdira Alves de Sá Fialho (UEMS) Ariane Zaparolli Dalcico (UEMS) Profa. Dra. Maria Celma Borges (UFMS) Luciana Leal de Souza (UEMS) 9 Maria Morais (UEMS) Poster 2 Kary Angelis Miranda (UEMS) Linguagem Formal versus Linguagem oral: análise de alguns Marcelo Rodrigo da Silva (UEMS) metaplasmos Maria Francisca Valiente (UEMS) Poster 6 Maria Pastoura Benedita de Santana (UEMS) Análise Comportamental de Práticas Pedagógicas Luciene da Silva Santos Bomfim (UEMS) Luciene da Silva Santos Bomfim (UEMS) Maria Francisca Valiente (UEMS) Poster 3 Maria Pastoura Benedita de Santana (UEMS) Análise Psicológica: alguns aspectos da relação escolar Marcos Antônio cáceres esteves (UEMS) Poster 7 Alencar Jácomo dos Reis (UEMS) Total Phisycal Response Irani Fonseca Francisco (UEMS) Reinaldo Coimbra de Oliveira (UEMS) Neuza rodrigues Santana de Lima (UEMS) Poster 4 Da Língua Oral à Escrita: análise de alguns metaplasmos Poster 8 Blair Antônio de Farias (UEMS) Método Proposto por Charles A. Curran para o Aprendizado de Estela Duveza Teixeira (UEMS) Línguas Paula Juliana Rodrigues (UEMS) Poster 5 Análise de Alguns Metaplasmos: entre o oralidade e a escrita Andréia Fernanda de Souza (UEMS) 10 Poster 9 Necessidade de trabalhar o Antiracismo nas Séries Iniciais do Poster 13 Ensino Fundamental Regras mais Freqüentes Impostas aos Alunos na Sala de Aula Maria Fêlix de Carvalho (UEMS) Vera Alves de sá Sandra Albano da Silva (UEMS) Poster 10 Literatura como Expressão do Pensamento (semiótico) Poster 14 Déborah Negrine Antico (UEMS) Community Language Learning Liani da Silva Militão (UEMS) Poster 11 Daiana Francisca Zanovello (UEMS) Análise Discursiva de Teorias Psicológicas Laura Aparecida Crippa (UEMS) Poster 15 Valdira Alves de Sá Fialho (UEMS) Identificar os Rastros Trágicos na Obra “Gosta d’Agua” Luciana Leal de Souza (UEMS) Alcimar de Matos Tombini (UEMS) Ariane Zaparolli Dalcico (UEMS) Gerson Marcio da Silva (UEMS) Sônia maria de Barros Cursino Pedroso (UEMS) Poster 12 Análise do Desenvolvimento da Moral Autônoma em Alunos Poster 16 do Ensino Médio de uma Escola O Silêncio com Fator de Interação na Sala de Aula Sandra Albano da Silva (UEMS) Nádia Nalziza Lovera de Florentino (UEMS) Vera Alves de Sá Luciene Clementino Pereira Aguiar (UEMS) 11 Rozeli Conceição da Silva (UEMS) Uiliana Julia Pereira dos Santos (UEMS) Solange Pinheiro da Silva (UEMS) Poster 17 Ranulfa Correia de Matos (UEMS) A Produção Escrita e a Gramática Regiane Jacinta de Brito (UEMS) 14:00hs às 15:00hs.Comunicação Individual e Coordenada Margarida Xisto da Silva (UEMS) Regiane da Silva Macedo (UEMS) Mesa 1 Terror em São Paulo e Terror na Mídia Poster 18 Vânia Maria Guerra Lescano (UFMS) A Produção de Texto a partir da Diversidade de Gêneros Jefferson Barbosa de Souza (PG/UFMS) Textuais Luana Cândida de Carvalho (UEMS) Considerações sobre o Discurso de Garotas de Programa Romilda Meire Souza Barbosa (PG/UFMS) Poster 19 O Silêncio com Fator de Interação em Sala de Aula “A Linguagem Habita Lalangue”: O equívoco do dizer e a não- Nádia Nelziza Lovera Florentina (G/FINAN) coincidência das palavras consigo mesmas Luciene Clementino Pereira Aguaiar (G/FINAN) Carlos Magno Viana Fonseca (PG/UFC) Rozeli Conceição da Silva (G/FINAN) Questões de Identidade e Representações Sul Matogrossenses Poster 20 Uma Reflexão Racial e Social no Meio Educacional Anailton de Souza Gama (UFMS/UEMS/FINAN) 12 Mesa 2 Diálogos Bakhtinianos entre o Cinema de Spielber e o “O Uso de Genéricos e os “Apagamentos” em Saúde do Romance de Kafka. Forças Hegemônicas em Discussão Trabalhador” Ivo Di Camargo Júnior (PG/UFSc) Alessandra Moreno Maestrelli (PG/USP) Entre o Asilo e o Exílio, a Condição da Literatura no Universo “O Idoso "Excluído" no Bolsão Sul-Matogrossense: a Midiático identidade em questão” Volmir Cardoso Pereira (PG/UFMS) Yara de França Catarino Barros (PG/UFMS) A linguagem Jurídica numa Perspectiva Pragmática: análise de Gravidez na Adolescência: uma questão de efeito de sentido Texto do STF Irani Fonseca Francisco (G/UEMS) Daniel de Mello Massimino (PG/UFMS) Mesa 3 A Linguagem do Direito O Processo de Monotongação no Português Falado em Paula Abrão da Cunha (G-UEMS) Dourados-MS Elza Sabino da Silva Bueno (UEMS) Mesa 5 O Bom e o Mau Poeta: o ethos nos prólogos de Terêncio Estudo Sociogeolingüístico do Município de Iguape Nahim Santos Carvalho Silva (PG/USP) Roseli da Silveira (PG/USP) A Reciclagem de Discursos em Quarto de Desejo, de Carolina Mesa 4 Maria de Jesus 13 Letícia Pereira de Andrade (PG/UFMS/CPTL) A Fragilidade da Identidade Indígena numa Comunidade Próxima a um Centro Urbano 15:30hs. Às 17hs. Comunicação Individual e Coordenada Sandra Espíndola (UEMS) Mesa 6 Apontamentos sobre Violência, Relações de Gênero e Análise A Leitura no Ensino Fundamental Crítica do Discurso Emílio Davi Sampaio (UEMS) Tânia Regina Zimmermann (PG/UNIPAR/UEMS) História Consica da Leitura no Mundo Ocidental O Guarani e sua Relação com a Identidade Cultural da América Valter Ribeiro dos Santos Junior (G-UEMS) do Sul Nádia Nelziza Lovera de Florentino (G/FINAN) Apelo Sócio-Cultural da Leitura Rosimar Francelino da Silva (UEMS) Mesa 8 As Múltiplas Linguagens na Análise de Fontes Históricas Os Benefícios da Leitura Maria Neusa G. Gomes de Souza (CPCX/UFMS) Elizabete Maria dos Santos (G-UEMS) Uma Abordagem Semiótica do Texto da Canção “Onde Estará Mesa 7 o Meu Amor” Chico César Linguagem: arco e flecha na caça ao sentido Rosemeire de Almeida Aguero (PG/UEMS) Adilson Crepalde (UEMS) 14 “O Senhor das Armas” (Lord of War) Discurso Cínico ou Beligerante? Mesa 10 Eusvaldo Rocha Neto (CE/UEMS) A Importância de Contar História nas Escolas Alaíde Pereira Japecanga Aredes (UEMS) A Possível Exclusão das Comunidades Indígenas Ocasionada Michelle Cristianne de Souza Gonçalves (G/UEMS) pelas Diferenças Lingüísticas Rosemeiro Maziero Fernandes (G/UEMS) Michele Aparecidade Sá Mesa 11 Mesa 9 Análise da Conversação Literatura como Expressão do Sentimento (semiótica) José Amorim da Silva (G/FINAN) Geane Carla Di Benedeto (G/FINAN) Deborah Negrine Ântico (G/FINAN) Um Estudo Ideológico de Alguns Discursos Midiáticos Televisivos Rastros do Trágico na Obra “O Santo Inquérito” de Dias Olga Talita Furlan Mazzei (FAIS) Gomes Ilma Benício Tavares (G/UEMS) Discurso e Charges Priscila Mendes Daosico (G/UEMS) Cleide Pires de Moraes (G/UEMS) Gonçalo Mendes Ramires – Personagem como Metáfora na Mesa 12 Obra de Eça de Queiroz “Denis, O Pimentinha” Segundo as Teorias da Análise do Liani da Silva Militão (G-UEMS) Discurso 15 Renata Borba Fagundes (G/UEMS) A Literatura Infanto-Juvenil: despertando o prazer da leitura na Discurso e Identidade do Professor Construído pelo Aluno sala de aula Vanda Lúcia Godoi Garcia Marques (G/UEMS) Ana Paula Machado (G-UEMS) Discurso e Ideologia na Ignografia Representiva Sul- Reflexões sobre a Leitura em LE: pondo fim a Vacuidade de Matogrossense sentidos nos textos didáticos Anailton de Souza Gama (PG/UFMS/UEMS/FINAN) Maria Lígia Aguiar UEMS A Identidade Cultural de um Povo nas Letras de Música Mesa 14 Country VIda Cachoeirinha: um cenário de sonho Mônica Aparecida Matos (UEMS) Danieli Tavares (G-UEMS) Mesa 13 Uma Análise Sobre Atividade de Leitura em Língua Inglesa O Teatro como Forma de Aprendizagem Bruna Bonancin Torrecilha Lopes (G-UEMS) Claudia Alves Gomes (G-UEMS) Os Livros mais Vendidos: um estudo sobre a recepção como A Importância dos Contos de Fada na Escola Michele Cristianne Souza Gonçalves (G-UEMS) imposição às escolhas e gosto do público leitor Daniele Alves Silva (PG/UEMS) Rosemeire Mazieiro Fernandes (G-UEMS) Aláide Pereira Japecanga Aredes(UEMS) 20:00 às 21:30 hs. Mesa redonda 16 Questões de Discurso e de Gênero O Funcionamento Textual-Discursivo nos Rótulos em Artigos de Opinião O “Novo” domesticado: gênero como ritual da formulação Profa. Dra. Maria Angélica Freire de Carvalho (UEZO\RJ) diante do acontecimento discursivo no jornalismo Prof. Msc. Wedencley Alves Santana (UNICAMP\CAPES) A AD e o Discurso Mítico Indígena Profa. Dra. Nara Sgarbi (UNIGRAN) Questões de Discurso e de Gênero Publicitário Profa. Msc. Ana Lúcia Furquim de Campos (UNIFA- Discurso e metodologia: tensão na análise CEF\UNIFRAN\UNESP) Marlon Leal Rodrigues (UEMS) Questão de discurso e de Gênero de Auto-Ajuda Nas malhas da AD: Obediências e travessuras Profa. Dra. Sheila Fernandes Pimenta e Oliveira (UNI- Janaina Nicola (UFMS) FACEF\UNESP) 08:00hs às 09:30hs. Mesa redonda B 04\05\2007 Lexicologia e Lexicografia 8:00 às 9:30 hs. Mesa-redonda A O Vocabulário da Erva-Mate no cone Sul Discurso e texto: Fronteiras e Aproximações Prof. Msc. Aparecido Lázaro Justiniano (FIP) 17 Um olhar para a Toponímia Sul-Matogrossense: resultados parciais 13:00hs às 15hs. Comunicações Individual e Coordenadas Profa. Msc. Marineide Cassuci Tavares. Atlas Lingüístico de Ponta Porá-MS: notícias de um Atlas Mesa 1 Comunicação Coordenada concluído Concepções teóricas da Semântica e da AD na formação do Profa. Msc. Regiane Coelho Pereira Reis (UEMS) professor 10:00hs às 11:30hs. Mesa redonda Concepções teóricas e as relações com a formação do professor Coordenadora: Adélia Maria Evangelista Azevedo (UEMS) História, Discurso e Política A charge "Radical Chic" - a enunciação em foco Discurso Apologético da escravidão “feliz”: Da Casa grande ao Elena Rodrigues Alarcon (G/UEMS) Sobrado Profa. Dra. Maria do Carmo Brazil (UFGD) A negação na crônica "Teleantevisão" Tania Roberta Benites Carvalho (G/UEMS) Tradições Discursivas e Comunidades Quilombolas de Mato Grosso do Sul A formação do professor e a realizade do ensino Prof. Msc. Antonio Carlos Santana de Souza (UEMS\USP) Sandra Regina Alez Herter Pereira (G/UEMS) Sujeito Político e sua Constituição Mesa 2 Profa. Msc. Edileuza Gimenes Morais (UNEMAT\UNICAMP) Alguns Sentidos do Discurso sobre os Seios Femininos Caídos 18 Fernanda Aline de Andrade (PG/UFMS) Mesa 4 Sr. Trovões: polifonia e dialogismo em “O menino do dedo A Não-Coincidência das Palavras com as Coisas: o real da verde” língua a nomear Mariana Maciel dos Santos Souza (G/UEMS) Carlos Magno Viana Fonseca (PG/UFC) Reescritura e o Encontro com os Outros: uma análise desse Mesa 3 discurso Educação de Jovens e Adultos: questões de gênero Eliza da Silva Martins Peron (PG/UFMS) Márcia Regina Adão de Souza (G/UNICAMP) Entre a Crítica e o Humor: polifonia, dialogismo e Discurso e Identidade: as cotas na UEMS carnavalização em Charges Jorn Lúcia Alves Demétrio (G/UEMS) Hellen Suzana da Cruz Miranda (PG/UFMS) Discurso de Cotas na UEMS: uma questão polêmica O Discurso dos Bons Exemplos na Literatura de Cordel: uma Maria Francisca Valiente (G/UEMS) forma de entretenimento, informação e correção comportamento Racismo e Preconceito nas Séries Iniciais do Ensino Raymundo José da Silva (PG/UEMS) Fundamental Maria Fêlix de Carvalho (G-UEMS) Mesa 5 Alaíde Pereira Japecanga Aredes (UEMS) Práticas Interacionistas no Ensino de Língua Inglesa Fernandes Ferreira de Souza (UEMS) de 19 Produção Textual – uma perspectiva interacionista a partir do Memória coletiva e Construção de Identidade: aproximações e discurso relatado Considerações Geraldo José da Silva (UEMS) Ana Claudia Duarte Mendes (UEMS) O Ensino de Língua Inglesa sob Aspectos Culturais A Memória Coletiva Presente em “Minha cidade Era Assim” Bruna Bonacin Torrecilha Lopes (G/UEMS) de Emmanuel Marinho Kátia Silene Rodrigues (PG-UEMS) Total Physical Response Reinaldo Coimbra de Oliveira (UEMS) Mesa 7 Aspecto do Português em Macau: uma questão de dialeto A Escola na Visão de Foucault e Girox: um debate possível Geraldo José da Silva (UEMS) Alaíde Pereira Japecanga Aredes (UEMS) Raymundo José da Silva (UEMS) Mesa 6 A Questão da Identidade em Dorian Gray Estrangeirismos: invasão ou enriquecimento lingüístico? Mara Regina Pacheco (PG-UEMS) Thiago Teodoro Rupere (G-UEMS) Fernandes Ferreira (UEMS) Mesa 8 A Questão Étnica na Obra “Viva O Povo Brasileiro” de João Dos Diáris Íntimos Tradicionais ao Blogs Virtuais Ubaldo Ribeiro Luciane Silva Castro(G-UEMS) Rosana Pereira de Souza (G-UEMS) 20 A Construção Colaborartiva do Plano Municipal de Edcuação de Nova Andradina-MS Vocabulário de Fronteira: a influência cultural do Paraguai Sandra Albano DA SILVA (UEMS) Andréia dos Santos Fernandes (FPI) Nábia Massaroto da Silva (FIP) O Texto Escrito e a Imagem: na Obra Marcelo Marmelo Martelo e o Outras Histórias Uma Visão da Linguagem da Religião e da Crença Nilza Pires dos Santos Silva (PIBIC/UEMS) Cíntia Arce (G/FIP) Falando Através da Escrita: uma característica da linguagem Mesa 10 dos Webchats Os Quadros Sociais da memória: a poesia de Flora Egídio Juliana Ceobaniuc da Silva Michelini (UEMS) Thomé e Raquel Naveira Alaíde Pereira Japecanga Aredes (UEMS) Ana Cláudia Duarte Mendes (UEMS) Maria Conceição Alves de Lima (UEMS) O Discurso da Tríade: poder, sexo, dinheiro em Arthur de 15:00hs. Às 17:00hs. Comunicação Individual e Coordenadas Azevedo Mara Regina Pacheco (G/UEMS) Mesa 9 Comunicação Coordenada Estudos do Léxico Regional Ex-Ribeirinho: discurso e identidade Neuraci Vasconcelos Reginaldo (PG/UFMS) O Léxico na Música Regional de Mato Grosso do Sul Coordenadora: Marineide Cassuci Tavares (PIF) Mesa 11 21 O Preconceito e o Racismo nas Escolas Públicas e Particulares Alaíde Pereira Japecanga Aredes (UEMS) de Nova Andradina Michelli Fernanda de Souza Dan (G/UEMS) Leuzeni Moreira Dias (G/UEMS) Letícia de Fátima Dias Wedekin de Oliveira (G/UEMS) Alaíde Pereira Japecanga Aredes (UEMS) Mauro Eduardo de Souza (G/UEMS) O Burnout: a síndrome de desistência que pode causar a Uma Reflexão sobre Formação de Professores falência na educação Rita de Cássia Marcon (G/UEMS) Ednalva Regina Oliveira Alves (G/UEMS) Mesa 13 Coordenada A construção da Leitura e da Escrita num Adulto, Trabalhador Análise do Discurso: múltiplos objetivos Rural Regina Albano da Silva (SP) Os Múltiplos Objetos da Análise do Discurso: da ordem fixa do arquivo à oscilação do ordinário O Teatro Inserido como Apoio Pedagógico no Ensino Coordenadora: Mara Rúbia de Souza Rodrigues Morais Fundamental (PG/UNESP) Vilma Marques Dutra da Cruz Natal (UEMS) Alaíde Pereira Japecanga Aredes (UEMS) Mulher e política: limites de discursos, de poder Fernanda Fernandes Pimenta de Almeida Lima (PG/UNESP) Mesa 12 O Análise do Discurso nas Produções de Texto. O Caso da E. O discurso de resistência nas crônicas do Acre M. Efantina de quadro Marília Lima Pimentel (PG/UNESP) 22 Mesa 14 Mesa 15 Diversidade de Gêneros Textuais como Incentivar à Leitura Beatriz Aparecida Alencar As Relações de Trabalho no Cotidiano Escolar à Luz da Teoria da Ação Comunicativa de Habermas Diversidade de Gêneros Textuais como Incentivo à Leitura Alaíde Pereira Japecanga Aresdes (UEMS) Luana Cândida de Carvalho (G/UEMS) Candido Vieitez Guiraldez (UNESPE/MARÍLIA) Estela Natalina Mantovani Bertoletti (G/UEMS) Silvane Aparecida de Freitas Martins (UEMS) 20:30 às 21:30 hs. ENCERRAMENTO O Mau Uso da Língua Portuguesa Limites e Perspectivas Juliana Marques de Matos Amorim (G/UEMS) AD: Novos objetos, Novas Práticas Analíticas Aurelinho e Dicionário Ilustrado de Português: uma análise Profa. lexicográfica (UNESP\ARARAQUARA) Dra. Maria do Sandra Cristina Miotto de Gouvêa (PG/UFMS) A AD como Teoria dos Textos A Linguagem Escrita: considerações sobre a produção textual do ensino fundamental Anaísa Nantes de Araújo (G- UEMS) Elza Sabino da Silva Bueno (UEMS) Prof. Dr. Sírio Possenti (UNICAMP) Rosário Gregolin 23 RESUMOS (segue a ordem da programaçao) MINI-CURSOS Tema 1: As Estratégias Lingüística-Discursivas na Produção (leitura e escrita) de Texto Profa. Dra. Maria Angélica Freire de Carvalho (UEZO/RJ - " Salto para o Futuro" - TV Escola/SEED/MEC) Tema 2: Linguagem Publicitária Profa. Dra. Jauranice Rodrigues Cavalcanti (METROCAMP / UNICAMP) Tema 3: Identidade, Minorias e Exclusão Profa. Msc. Kassandra Muniz (UNICAMP) O que leva uma criança afro-brasileira a abandonar os bancos escolares em sua idade de grande criatividade e vivacidade jovial? Essa poderia ser minha (uma)pergunta de pesquisa. No entanto, o que procura-se não está no aqui e agora, mas sim na 24 retroatividade. Pu(o)de perceber, como educadora do ensino de Tendo em vista uma defasagem entre a evolução dos estudos jovens e adultos, um silenciar que falava (gritava) aos meus acerca do funcionamento dos processos discursivos e a ouvidos das mulheres negras moradoras na cidade de socialização Campinas. Silenciavam suas histórias. Várias atividades foram principalmente entre os cidadãos comuns, faz-se mister construídas no intuito de dar voz, através da escrita, para essas questionar o sentido habitual da palavra comunicação, e mulheres silenciadas. E no decorrer desse levantamento, possibilitar um conhecimento de pelo menos duas teorias que pudemos(pode-se)detectar que sua invisibilidade negra e vemos embasar, freqüentemente, diversos discursos em feminina estava no apagamento de sua etnicidade, na sua circulação na sociedade brasileira. Tomamos duas teorias para introdução ao ambiente escolar (por volta dos sete/oito anos) e representar, gradativamente no mercado de trabalho. Essa construção do comunicação (que representamos pelo modelo de Roman silenciamento perpassa pelos ambientes familiares e escolares e Jakobson) e um modelo moderno (que representamos por está relacionado ao processo histórico escravocrata ocorrido na reflexões de Michel Pêcheux acerca do funcionamento dos cidade de Campinas. Tal proposta de investigação, de cunho processos discursivos). Propomos o estudo e a análise de etnográfico, pretende dar visibilidades a essas mulheres, que já discursos institucionais que mostrem uma alternância no uso de foram filhas, mães e hoje são mães e avós. uma ou outra teoria, alternância essa que se reflete em efeitos desses conhecimentos respectivamente, um na modelo sociedade, clássico de de sentido distintos. Este mini-curso objetiva discutir e Tema 4: Sob a Inocência do Discurso: A Linguagem e seu explicitar processos de comunicação em curso na sociedade, Funcionamento utilizados não somente na política, e não somente por políticos, Prof. Dr. Lauro José da Cunha (UNEMAT) mas por todos nós, em variadas circunstâncias. Antes de tudo, pretende sensibilizar o público-alvo interessado para as materialidades utilizadas para a produção de efeitos de sentidos 25 em diversas produções discursivas. Objetivos específicos: - publicados pela mídia televisiva e impressa, com o objetivo de refletir sobre dois modelos lingüísticos, um representado por familiarizar e sensibilizar o público-alvo para os mecanismos Roman Jakobson e outro por Michel Pêcheux, objetivando, a que regulam o funcionamento dos processos discursivos; a partir daí, evidenciar as diferenças a que pode levar a filiação partir da identificação das materialidades que compõem o de um discurso a um modelo ou outro; - resgatar reflexões discurso, e familiarização com as mesmas, discutir os eventuais acerca de referenciais teóricos da Análise de Discurso de linha efeitos de sentido que criam nas condições de produção francesa, conforme tem se desenvolvido no Brasil, como modo específicas. de permitir para o público o acesso a um dispositivo de Palavras-chaves: Discurso, Funcionamento. interpretação do funcionamento dos processos discursivos. Como principais tópicos a serem explorados, apresentamos a Tema 5: Discurso Além da Língua: Visualidade e Corporeidade questão do sujeito, das condições de produção, o mecanismo de como Objetos de Análise antecipação, os discursos pré-construídos, as relações de Prof. Msc. Wedencley Alves Santana (UNICAMP/CAPES) sentido, as relações de força, as formações imaginárias, o poder no esquecimento (no sentido desenvolvido por Pêcheux) na Tema 6: Línguas Indígenas sobredeterminação das práticas discursivas; - sensibilizar para Profa. Msc. Valéria Faria Cardoso (UNEMAT/UNICAMP) as materialidades que compõem os mais variados discursos (relação corpo/linguagem, o silêncio, objetos, posições, Tema 7: Pesquisas em Tradições Discursivas e Mudanças movimentos, cores, foco, etc., até chegar no discurso verbal), Lingüísticas partindo de situações discursivas com as quais o público-alvo Prof. Msc. Antônio Carlos Santana de Souza (UEMS/USP) esteja familiarizado para situações mais abrangentes; - proceder a um estudo (análise) de diversos discursos institucionais Tema 8: Aspectos Bakhtinianos no Moderno Teatro Brasileiro 26 Prof. Dr. Wagner Enedino Corsino (UFMS) Tema 9: Aspectos Discursivos da Obra "Viva o Povo Brasileiro" de João Ubaldo Ribeiro Tomando como ponto de partida os critérios propostos por Profa. Msc. Eliane Maria de Oliveira Giacon (UEMS) PRADO (1987) - o que a personagem revela sobre si mesma, o que ela faz e o que os outros pensam a seu respeito -, o objetivo deste mini-curso é traçar um perfil das personagens centrais de O objetivo deste trabalho é analisar alguns aspectos três peças do moderno teatro brasileiro do dramaturgo Plínio dos discursos que constituem o discurso da obra Viva o Povo Marcos – Abajur lilás, A mancha roxa e Homens de papel -, de Brasileiro (1982) de João Ubaldo Ribeiro como um discurso modo a estabelecer homologias entre as estruturas artísticas e agenciador de outros discursos. Nesse sentido é importante as estruturas mentais dos grupos sociais marginalizados, considerar que em uma estante, mesmo que metaforicamente, ressaltando ligações entre os artifícios discursivos e a ideologia ou até mesmo amontoados em caixas nos cantos de um subjacente no objeto da análise. Além disso, trazer para o cerne cômodo, os livros despertam a nossa curiosidade pelo o que das discussões os conceitos bakhtinianos de dialogismo, pode haver dentro deles. Isso talvez se explique pelo fato de carnavalização e polifonia (Bakhtin, 1993 e 1999), para ancorar que eles foram tidos durante muitos anos como sendo uma as análises das obras. O estudo será predominantemente “forma oculta” de discurso ou discursos que não produziram intrínseco, centrado na exploração do texto como forma e um efeito de sentidos capaz de se impor, guardadora de outros estrutura, como história e discurso, sem abandonar as temáticas discursos que se constituem em segredos, entre os vivos, os (exclusão, AIDS/vida em presídios e subemprego) e seus mortos e os deuses, favorecendo assim uma relação misteriosa vínculos sociológicos, bem como o caráter de signos entre as “coisas-a-saber” do discurso ou o seu “conteúdo” e o ideológicos que ali assumem as personagens. efeito de sentido dos mesmos e a forma como eles foram constituídos e materializados em texto. Os livros, assim, se 27 ultrapassam o “poder" simbólico, inscrevendo-se em unidades pelo poder. Há aqueles que até adoecem se lhe tirarem um “individuais” e dramáticas do passado com um discurso cargo, no qual ele exerce certo poder, mesmo que seja mínimo histórico “que se produz em condições históricas determinadas em relação a também um grupo minúsculo de pessoas. As e projeta-se no futuro porque cria tradição, passado e influencia relações de trabalho nestes âmbitos se constituem em relações novos acontecimentos” de acordo com Orlandi (1990, p. 35), de poder. Geralmente predomina na escola um poder pelo efeito de sentido, que demanda sentidos na produção de centralizador. Na escola básica pelo diretor, na Universidade, uma diversidade de textos, os quais ao longo do tempo são por grupos ligados ao Reitor. Chamar Michel Foucault, de carregados de significados que “cada leitor confere de acordo maneira especial reportando às obras da década de 60 – As com certa leitura” que podem também variar de acordo com o Palavras e as coisas, A Arqueologia do saber, Microfísica do corpus teórico tomado, a fim de delimitar alguns fatores Poder, Vigiar e Punir é minha intenção. Sendo assim, pretendo relativos ao discurso materializado no texto como o da época contribuir para uma discussão em torno de algo delicado, mas histórica e da concepção filosófica discursiva de “autor” que precisa ainda ser trabalhado. (Foucault, 1997). Palavras-chaves: Poder, Educação Básica, Universidade, Discurso. Tema 10: Análise do Discurso e Educação Profa. Dra. Alaíde Pereira Japecanga Aredes (UEMS) Tema 11: Foucault e a História Prof. Msc. Clementino Nogueira de Souza Quando me propus a fazer este mini-curso o meu principal (UNEMAT/UNICAMP) objetivo era mostrar que existe na Educação de modo geral, Profa. Msc. Edileuza Gimenes Moralis tanto na Educação Básica, quanto nas Universidades, uma (UNEMAT/UNICAMP) atração muito grande por parte da maioria dos profissionais 28 Tema 12: Pesquisa em Análise do Discurso: Princípios e Procedimentos Tema 13: Poesia Brasileira Contemporânea Profa. Dra. Vânia Maria Lescano Guerra (UFMS) Prof. Msc. Daniel Abrão (UEMS/UNESP) O mini-curso procura mobilizar modos de análises sob a Tema 14: O Uso das Fontes Orais nas Ciências Humanas: perspectiva discursiva, buscando ampliar as possibilidades de Considerações de Pesquisa reflexão sobre as questõe relativas à linguagem/identidade, no Profa. Dra. Maria Selma Borges (UFMS) domínio Profa. Dra. Rosimeire Aparecida de Almeida (UFMS) aplicado. Isso implica alguns deslocamentos necessários em relação à noção de sujeito e de discurso por parte do investigador. Dessa forma, olhar para o discurso não Tema 15: Sociolingüística em Sala de Aula: Da Teoria à pode se restringir a uma análise do produto lingüistico visto Prática como uma seqüência linear, tampouco como superfície Profa. Dra. Nara Sgarbi (UNIGRAN) acabada. Assim sendo, temos a preocupação de compreender conceitos para que possamos problematizar na/pela linguagem O curso pretende discutir conceitos da Sociolinguística os dizeres que constituem a identidade na sua relação com a variacionista (Labov, 1972), expor recortes de análises linguagem. um percurso sociolinguísticas desenvolvidas em sala de aula e demonstrar a investigativo, nos deparamos com tensões e conflitos, com aplicabilidade e funcionalidade da mesma, assim como refletir ilusões e certas "pedras" no caminho. Mas é isso o que torna o sobre processo mais instigante, essa necessidade de nos enxergarmos comportamento como outros, de nos interrogarmos acerca do que nos parece comunidade de fala , possibilitando aos alunos das classes estranhamente familiar. sociais desfavorecidas o acesso à cultura letrada e, com isso, a Nessa tentativa de desenhar o papel do professor lingüístico enquanto observável mediador dentro de do uma 29 chance de lutarem pela cidadania com os mesmos instrumentos Tema 18: A Descoberta da Afetividade Dentro da Teoria disponíveis para os falantes já pertencentes às camadas sociais Psicanalítica: Formação Docente e Ensino com Significado privilegiadas . Profa. Msc. Sandra Albano da Silva (UEMS) Tema 16: A Identidade Cultural de um Povo nas Letras de Tema 19: Análise do Discurso e os Processos de Leitura em Música Country Língua Inglesa: Uma Perspectiva Prática Profa. Espec. Mônica Aparecida Matos (UEMS) Prof. Msc. João Fábio Sanches Silva (UEMS) Este workshop tem como objetivo analisar a identidade cultural Tema 20: Filosofia Wiki - A Hora e a vez do Discurso Hiper- de um povo do Sul e Oeste dos Estados Unidos através de um textual Colaborativo na Web ritmo folclórico dos colonos que ocupavam as terras nas Profa. Dra. Maria Conceição Alves de Lima montanhas Apalaches; o “country music”. A idéia é apresentar (UEMS/UNICAMP) a origem da música country; música rural, conhecida como blues pelos brancos, evidenciando o contexto histórico para Tema 21: Reflexões sobre a Leitura em L E: Pondo fim a compreendermos a formação de uma identidade constituída nos Vacuidade de Sentidos nos Textos Didáticos discursos dos compositores e cantores atuais e antigos da Profa. Msc. Maria Ligia Aguiar (UEMS) época, como Jimmie Rodgers, o pai do country. A leitura em uma língua estrangeira (LE) não trata apenas da Tema 17: Na Tela do Cinema, a Mulher Brasileira decodificação Profa. Msc. Raquel de Oliveira Fonseca (UEMS) significados. É processo dinâmico de desenvolvimento e de vocabulário, mas da construção de implementação de estratégias e deveria ser entendida como 30 ampliação de conhecimento, instrumento de reflexão crítica e embasamento teórico da AD (Análise do Discurso de linha meio de transformação da sociedade, objetivo último da francesa) o jogo de imagem que se manifesta na tessitura do educação. discurso publicitário de agências bancárias direcionado ao interlocutor da melhor idade. Conteúdo: *Conceitos de texto e Tema 22: O Jogo de Imagens no Discurso Publicitário: O discurso; Surgimento da disciplina (ciência) Análise do banco e a melhor idade Discurso (AD) de linha francesa; Principais fases da AD; As Profa. Msc. Adélia Maria Evangelista Azvedo (UEMS) condições de produção e o jogo de imagens a partir do teórico M. Pêcheux; Análise de 03(três) discursos publicitários de A Análise do Discurso é uma ciência que surgiu com o objetivo agências bancárias ao público da melhor idade brasileira. de investigar na tessitura do discurso escrito aspectos sociais e Discussões e reflexões sobre as formações discursivas que se ideológicos de uma determinada sociedade. A partir dessas mostram nas peças publicitárias. considerações iniciais escolhemos um corpus para investigarmos através do jogo de imagens e as condições de Tema 23: Semiótica Narrativa e Discursiva produção que antecedem ao discurso publicitário de agências Prof. Anaílton de Souza Gama (UEMS) bancárias direcionadas ao público da melhor idade. A análise e as reflexões do material coletado direcionam o profissional da O termo Semiótica reúne diferentes teorias. Todas têm em área de Letras a um olhar mais atento e dinâmico, porque comum a preocupação com o sentido, com a significação. concebe o uso da linguagem como processo de interação verbal Santaella e Noth afirmam que “a semiótica é a ciência da contínuo que precisa ser questionado quanto ao uso e quanto ao significação e de todos os tipos de signos”. Interessa-nos, no conhecimento dos processos discursivos que antecedem a momento, saber que existem três grandes teorias semióticas = a produção do discurso. Objetivos: Analisar a partir do doutrina dos signos elaborada pelo norte-americano Charles 31 Sanders Peirce, a Semiótica da Escola de Tártu – também Tema 24: Interpretação Textual e a Análise Crítica do conhecida como semiótica russa -, e a Semiótica francesa, Discurso: uma parceria para o ensino de língua portuguesa proposta por Greimas. A Semiótica de Greimas e a Escola de Prof. Msc. Francisco Vanderlei Ferreira da Costa (UFGD) Tártu têm uma base semelhante – os estudos de Saussure – são geralmente complementares. Greimas constrói sua teoria a A interpretação textual é encarada como o momento do ensino partir das contribuições de diversos autores, principalmente de que o professor deve mostrar ao aluno algo que não está na Ferdinand de Saussure, Louis Hjemslev, Vladimir Propp e superfície do texto, mas que caso o leitor não perceba não Claude Lévi-Strauss. Assim, a Semiótica aqui proposta tem conseguirá entender completamente os significados presentes como princípios gerais estudar a significação dos textos, ver a em tal texto. Muitas vezes, entretanto, o texto em sala de aula realidade do texto como uma construção, ser uma teoria do não consegue ultrapassar os limites da superfície textual. E, texto, entendido em seu aspecto mais global; descrever e mais grave, não consegue ultrapassar o limite do lingüístico explicar o que o texto diz e como faz para dizer o que diz, não para chegar ao contexto social. A situação de construção do se preocupando com o ato de criação ‘real’ do texto mas se significado em sala de aula precisa ser explicitada para que atendo aos efeitos que essa produção deixa apreender. O texto tanto professor quanto aluno possam lidar com o texto como o aqui entendido como uma espécie de ‘ilusão’, construindo uma produto de uma interação social. Por isso, seu significado é um imagem de autor, do que quer convencer, a criação do construto que não está somente na segmentação, está sim - simulacro. Procura-se também analisar o ‘fazer’ do sujeito para muito mais - em elementos fora do segmento lingüístico. Com o ‘ser’ do sujeito – semiótica da ação – abordando as paixões = isso a interpretação deve vislumbrar muito mais que questões “efeito de sentido passionais produzidos no discurso”. do texto, precisa mostrar questões que localizam o leitor na sua Palavras-chaves: sentido, significação, signos própria história. Objetivos: Discutir a interpretação textual dentro de um contexto discursivo. Metodologia: Selecionarei 32 músicas e textos jornalísticos atuais para trabalhar com a como incorpora elementos alheios ou os rejeita, permite-nos interpretação textual. Mostrarei em textos da música popular observar os processos de assimilação criativa desses elementos, brasileira, principalmente o Rap, e nos textos jornalísticos favorecendo não só o conhecimento da peculiaridade de cada (jornais do Estado do Mato Grosso do Sul) como o discurso texto, mas também o entendimento dos processos de produção torna a interpretação mais palpável. literária. Percebemos então nessas reescrituras que os diálogos se tornam produtos do encontro com o outro, da alteridade. O Tema 25: O Imagético nas Capas de Livros de Literatura: uma presente trabalho tem por intuito analisar como ocorre esse análise discursiva discurso, esse processo de assimilação, desse “encontro com os Profa. Eliza da Silva Martins Peron (UFMS/CEUL) outros”. Os discursos não se encerram nos limites da linguagem ou da Tema 26: Atlas Lingüísticos Regionais: instrumentos de ensino uniformização. A realidade social é estruturada por discursos, de língua materna sendo que tanto a cultura da minoria (erudita), como a de massa Profa. Msc. Regiane Coelho Pereira dos Reis (UEMS) (popular) são manifestações da sociedade e todos esses discursos convivem harmoniosamente. Nas narrativas pós- Várias ciências ocupam-se do estudo da relação entre o homem modernas pode-se dizer que as reescrituras interessam na e sua linguagem. À Lingüística cabe o papel de descrever as medida em que os diálogos, ao mesmo tempo em que se fazem línguas humanas e de demonstrar como elas se configuram no intimistas, demonstram estranhamento decorrente do encontro âmbito de uma comunidade, além de documentar a importância com as outras formas de cultura. Assim, a investigação dos que esta confere à língua que fala. Dentre os diferentes ramos elementos intertextuais, bem como o exame de como ocorre a da Lingüística situam-se a Dialetologia e a Geolingüística que absorção ou a transformação de um texto ou de um sistema e de voltam seus estudos para a descrição das diferenças regionais 33 da modalidade oral da língua, mapeando-as em cartas forma sutil, em culturas e sociedades diversas. Neste trabalho, lingüísticas que integram os atlas lingüísticos, resultados finais intentamos revelar algumas dessas “fotografias” lingüísticas das pesquisas geolingüísticas. A importância dos atlas, retiradas de atlas Lingüísticos regionais brasileiros com o enquanto “álbum de fotografias’ de redutos lingüísticos intuito de demostrar sua aplicação e eficácia no ensino de investigados numa dada época, tem sido divulgada e língua materna. Entre os atlas analisados estarão o EALMG, demonstrada APFB, ALS II, ALiPP, entre outros. por estudiosos brasileiros dessa área, especialmente, na última década. Sobre o assunto, assim se pronunciaram FERREIRA et al (1996, p. 488): um Atlas Temas 27: Um discurso de emancipação ou alienação?:Uma lingüístico vale, assim, como registro documental da língua proposta de projeto pedagógico viva e como produto de uma reflexão sobre ela. Porém, como Profa. Adma Cristhina Salles de Oliveira (UEL/UEMS) instrumento de trabalho, ele pode ser ponto de partida para novas investigações, multiplicando-se, assim, o seu valor. É O presente trabalho discute os indicadores que permeiam a fato inegável, que os atlas lingüísticos têm servido como construção do projeto pedagógico, através do exercício das “fotografias” de práticas sociais no âmbito escolar. Ao afirmar que as reflexões comunidades de falantes espalhadas pelo Brasil, as já e ações executadas no dia – dia devem ir além dos discursos investigadas e mapeadas constituem-se em fontes inesgotáveis conteudistas, em que os trabalhos e as práticas produtivas de estudos. A análise do vocabulário de um grupo humano, ocupam lugar central abrindo as portas do diálogo, da reflexão especialmente num recorte regional, proporciona a recolha de e da responsabilidade para a formação humana, a escola deve formas lingüísticas que denotam as influências socioculturais ocupar um lugar neutro para os embates diversos, mas com sofridas por esse grupo. Assim, podemos falar da força criadora parcialidade ideológica, onde as diversidades e adversidades da linguagem que, por vezes, atravessa fronteiras, infiltra-se, de comunguem com suas verdades respeitando o espaço coletivo. reveladores da realidade lingüística 34 Como muito bem afirma Arroyo (1991), a escola é lugar de para pensar e fazer educação levando em conta os elementos de conhecimento de causa.Lembrando que o efeito deste fator é formação humana, que são contraditórios em tempos modernos, condição essencial na execução das práxis pedagógicas. mas que se articulam no movimento, tendo o trabalho como Acreditamos que o sujeito só faz as circunstâncias quando príncípio educativo, pois a dinâmica do bloco histórico imbuí- transcende o conhecimento específico para um conhecimento se de ação e reestruturação, demonstrando as adversidades e político, quando ele acorda para as circunstâncias neoliberais já flexibilizações que o trabalho educativo possui. Partindo desse postas e apregoadas pelo sistema do dia-a-dia e mascarada princípio o trabalho educativo pode ou não estar dentro de uma como soluções imediatistas e paliativas, dificultando o instituição educativa. Ela é condição cultural produzida pela entendimento e enfrentamento de ações que liberem e sociedade que ocorre sem fronteiras nas relações sociais, pois transformem o sujeito emancipador em que o conhecimento quando proposto pela escola deve transcender a produção colabore para uma sociedade igualitária e menos votátil e os procurando encontrar sua identidade, que possui o caráter valores não sejam vistos como peças descartáveis ou obsoletas formador. Olhar a escola com seus sujeitos educativos significa do processo de produção. romper com a ignorância de que quem ensina, é só o professor, Palavras-chave: Discurso, Emancipação, Alienação. significa co-responsabilizar a gestão e seus membros sobre a responsabilidade social que cada um tem na construção e interação dos direitos e deveres do cidadão, tendo uma visão crítica do macro das estruturas e sub-estruturas do capital, bem como o envolvimento de ação e limitação que a escola tem sobre o bloco ideológico, histórico, e político que pulsa dentro dela. Procurar entender as raízes orçamentárias para depois ir o embate argumentativo sem ingenuidade, com 35 RESUMO POSTERS Poster 1 Variação Lingüística: a oral e a escrita Valdira Alves de Sá Fialho (UEMS) Ariane Zaparolli Dalcico (UEMS) Luciana Leal de Souza (UEMS) No desenvolvimento desse projeto analisamos a diferença entre a língua oral e a língua escrita, e também os metaplasmos escritos das narrativas a partir das entrevistas, onde vários informantes de diferentes faixas etária, sexo, escolaridade, profissão e região forma entrevistados. Esses informantes relataram fatos importantes de sua vida, sendo que esses relatos foram gravados e posteriormente transcritos observando a forma de falar de cada informante. Foi realizado o contato com os informantes, na qual não há nenhum parentesco com o entrevistador, são apenas conhecidos. A princípio foi elaborado um questionário sócio-lingüístico contendo nome, local, sexo, idade, escolaridade, profissão e região, sendo que o mesmo foi 36 aplicado a três informantes em forma de entrevista por meio de gravação, onde foi selecionada uma entrevista e transcrita de Poster 2 acordo com o falar regional do informante, e logo após foi Linguagem Formal versus Linguagem oral: análise de alguns efetuado a transcrição fonética e análise dos metaplasmos. metaplasmos Descobrimos com essa entrevista que os informantes têm Maria Francisca Valiente (UEMS) muitas histórias interessantes e importantes para nos contar, Maria Pastoura Benedita de Santana (UEMS) mas quando o assunto é gravar, os informantes nem sempre Luciene da Silva Santos Bomfim (UEMS) querem falar. Esse trabalho foi uma experiência única, devido o contato que tivemos com os informantes, sendo que foi A proposta deste trabalho é analisar alguns confrontos entre necessário muita insistência para que os informantes falassem língua oral e língua formal mesmo considerando que ambas com o gravador ligado, pois, todos ficavam constrangidos pertencem a instâncias distintas de realização social, outro porque estavam sendo observados e gravados, mas no decorrer aspecto importante é que os falantes normalmente não têm da entrevista eles ficaram mais a vontade e com a simplicidade consciência de que a língua está em constante mudança e de cada um obtivemos uma boa entrevista. Enfim, o mais transformação, importante em nosso trabalho foi a participação de todos os transformações. De forma geral as transformações no senso membros e a experiência foi muito gratificante e interessante, comum são percebidas como realização do “certo” e “errado” a pois percebemos a variação da língua e dos sotaques que partir da Gramática Normativa que via de regra é considerada mudam de acordo com a idade, região escolaridade e profissão como sendo o “certo” da língua e sua única referência. Para tal de cada informante, e dessa forma apreciamos melhor a cultura análise de alguns metaplasmos, foi feito gravações de e a linguagem deixando de lado o preconceito lingüístico que narrativas com alguns falantes de onde foram selecionadas existe em nosso meio. algumas marcas lingüísticas da língua oral e confrontada com a não há uma percepção “pontual” das 37 norma padrão. O corpus se constitui de narrativas em que foi aluno-professor vista pelo aluno; relação entre professor-aluno considerado sexo, idade, escolaridade, profissão, tempo que vista pelo professor, relação entre professor-administração mora na região e classe social. As etapas da pesquisa foram: escolar vista pelo professor, relação administração escolar- elaboração de uma ficha, seleção dos falantes, gravação de professor vista pela administração escolar. Para tal trabalho fatos significativos do informante que em média durou trinta utilizamos de duas modalidades metodológicas de entrevistas, minutos, transcrição grafonemática das entrevistas, transcrição uma oral, a partir de um roteiro, e a outra com aplicação de um fonética, seleção de palavras para análise para confronto com a questionário. As entrevistas tiveram como roteiro algumas norma padrão e depois análise do tipo de confrontação, ou seja, questões: ética, dificuldades gerais encontradas na escola, o que que tipo de transformação e/ou diferença “metaplasmática” há seria possível melhorar no ambiente escolar, como é o tipo de entre a oralidade e norma padrão. Foi possível perceber que os relação entre os segmentos que compõem a escola (alunos, metaplasmos analisados estão em confronto constante com a professores e administração escolar). Este trabalho teve como norma padrão. referencial teórico para nortear não apenas as entrevistas mas sobretudo as análises, algumas teorias comportamentalistas, Poster 3 tais como a teoria psicanalítica de Freud, a comportamentalista Análise Psicológica: alguns aspectos da relação escolar de Skinner, sócio-interacionista de Vigotsky e a construtivista Marcos Antônio Cáceres Esteves (UEMS) de Jean Piaget. Um dos objetivos das análises foi “classificar” e Alencar Jácomo dos Reis (UEMS) “enquadrar” os discursos das entrevistas nessas correntes da Irani Fonseca Francisco (UEMS) psicologia de forma que foi possível compreender e analisar alguns dos aspectos da situação do quadro escolar a partir das O objetivo deste trabalho foi analisar alguns aspectos do quadro linhas teóricas. Algumas de nossas conclusões indicam que, da relação escolar a partir de diversas óticas: a relação entre independente da análise da linha comportamentalista, a relação 38 escolar se constitui de um quadro complexo de perspectivas, falada, foi necessário entender alguns aspectos das variações histórias de vida e objetivos diferentes, alguns mais lingüísticas sem perder de vista a língua como um conjunto comprometidos, outros menos comprometidos e ainda alguns heterogêneo tanto quanto os seus usuários. De certa forma, o indiferentes. falante “adapta” sua fala à situação contextual, por exemplo, se ele está falando com pessoas íntimas, numa situação informal, a Poster 4 variedade usada é diferente daquela que seria usada se o Da Língua Oral à Escrita: análise de alguns metaplasmos mesmo falante estivesse falando com pessoas estranhas, numa Blair Antônio de Farias (UEMS) situação formal. A língua também fica diferente quando é Estela Duveza Teixeira (UEMS) falada por um homem ou por uma mulher, por uma criança ou por um adulto, por uma pessoa alfabetizada ou por uma não- A proposta nesta pesquisa foi analisar algumas características alfabetizada, por uma pessoa de classe alta ou por uma pessoa entre a norma padrão e a norma oral a partir das análises de de classe média ou baixa, por um morador da cidade e por um alguns metaplasmos, mesmo considerando que ambas possuem morador do campo e assim por diante. Temos, então, ao lado uma ordem própria. A análise de alguns metaplasmos das variedades geográficas, outros tipos de variedades: de demonstra, além da ordem própria de cada norma, o gênero, socioeconômicas, etárias, de nível de instrução, distanciamento entre elas. Entre os fatores que corroboram para urbanas, rurais etc. Somente com esses conceitos saberemos isto estão o cultural, o econômico, o social, o regional sem como funciona a estrutura e transformação da nossa língua. considerar que um dos próprios da língua é a “capacidade plástica” de transformação dado as condições históricas. Para Poster 5 desenvolver o trabalho nos valemos de alguns conceitos de Análise de Alguns Metaplasmos: entre o oralidade e a escrita língua que nos nortearam a diferença ente língua escrita e Maria Morais (UEMS) 39 Kary Angelis Miranda (UEMS) narrativas. Nas entrevistas foi abordado questões como sexo, Marcelo Rodrigo da Silva (UEMS) idade, profissão, aspecto da vida pessoal, o conceito de ética etc. considerando a contribuição da psicologia na formação Poster 6 profissional. As etapas da pesquisa foram: elaboração de uma Análise Comportamental de Práticas Pedagógicas ficha, seleção dos falantes, gravação das respostas dos falantes Luciene da Silva Santos Bomfim (UEMS) de acordo com as questões contidas na ficha, e depois foi feito Maria Francisca Valiente (UEMS) uma análise das respostas de acordo com as teorias do Maria Pastoura Benedita de Santana (UEMS) desenvolvimento, ou seja, foi verificado em que linha teórica da psicologia do desenvolvimento se enquadra o perfil dos A proposta deste trabalho é analisar o discurso da prática entrevistados. A partir deste trabalho pudemos analisar alguns escolar de professores, alunos e técnico-administrativos a partir aspectos comportamentais a partir de algumas teorias de algumas teorias comportamentais do desenvolvimento, tais psicológicas do desenvolvimento. como a psicanalítica, a construtivista, a behaviorista e a sóciointeracionista considerando o contexto de práticas pedagógicas. Poster 7 Para isso, tivemos como proposta entrevistar membros da Total Phisycal Response comunidade Reinaldo Coimbra de Oliveira (UEMS) escolar (professores, alunos e técnico- administrativos), a respeito das relações e interações pessoais Neuza rodrigues Santana de Lima (UEMS) no ambiente escolar. Para tal proposta foi feito gravações na forma de narrativas com um técnico-administrativo, um aluno e Poster 8 um professor da Escola Municipal Brás Sinigáglia situada no Método Proposta por Charles A. Curran para o Aprendizado de município de Batayporã. O corpus se constitui dessas Línguas 40 Paula Juliana Rodrigues (UEMS) discussões e promove uma verdadeira interação, devido ao fato Andréia Fernanda de Souza (UEMS) de não haver barreiras entre o professor e os alunos, mantendo um relacionamento de respeito e confiança, que favorece o Charles A. Curran desenvolveu o Método Comunitário de processo de aquisição da segunda língua sem o sentimento de Ensino de se da metáfora do medo sempre presente nas aulas de língua estrangeira. Portanto, aconselhamento para redefinir as regras entre professor e aluno, o aluno internaliza mais rapidamente o conteúdo discutido, e onde o professor é comparado ao papel de conselheiro e o este método exige também a participação ativa e consciente do aluno ao de cliente. Os procedimentos básicos do Método aluno e do professor desenvolvendo todas as habilidades Comunitário são os seguintes: um grupo de alunos senta-se em relacionadas à linguagem. Línguas utilizando - círculos enquanto que o professor permanece circulando fora do círculo. Quando alguém deseja se comunicar, o professor se Poster 9 aproxima, o aluno sussurra a mensagem que deseja transmitir Necessidade de trabalhar o Antiracismo nas Séries Iniciais do em língua nativa (L1) e o professor traduz a mensagem em Ensino Fundamental língua estrangeira (L2). O aluno repete em voz alta a Maria Fêlix de Carvalho (UEMS) mensagem em língua estrangeira e o professor grava esta mensagem com um gravador de voz e assim sucessivamente. Este é um projeto de pesquisa que está sendo realizado nas No fim da sessão, a gravação das mensagens em L2 é escolas públicas de Nova Andradina e consiste em demonstrar reproduzida e transcrita para comentários e observações, que o problema do preconceito racial surge nas escolas desde incluindo reações dos alunos ao processo de aprendizagem da as séries iniciais. Nossas pesquisas acusam que ele é grande em língua. Os alunos refletem sobre os sentimentos e pensamentos meio às crianças e que infelizmente tanto professores como deles. Esse método estimula todos os alunos a participarem das demais funcionários não têm a consciência da necessidade de 41 abordar este assunto em sala de aula. Afirmam não saber como familiarizado com escrita, posteriormente, o aluno sentirá trabalhá-lo.Aplicamos um questionário para alguns professores maior interesse em ler. e os resultados são preocupantes. Até o momento pudemos confirmar que o problema existe e o pior, os professores não Poster 11 estão preparados para trabalhá-lo, pois é visto como algo Análise Discursiva de Teorias Psicológicas delicado muito complicado, o que exigira Laura Aparecida Crippa (UEMS) deles um compromisso político e ético. Embora tenha se tornado lei,o Valdira Alves de Sá Fialho (UEMS) trabalho interdisciplinar nas escolas,podemos notar que o fato Luciana Leal de Souza (UEMS) não acontece e a lei fica só no papel. Ariane Zaparolli Dalcico (UEMS) Poster 10 A Proposta da pesquisa é analisar a partir de algumas teorias, Literatura como Expressão do Pensamento (semiótico) tais como, Psicanálise, Behaviorismo, Construtivismo e Déborah Negrine Antico (UEMS) Sociointeracionismo fundamentais nos pensadores Sigmund Freud, Skinner, Jean peaget e Vygotsky, que caracterizam um Este projeto está direcionado para Ensino Fundamental, conjunto de conhecimentos sobre o funcinamento psíquico e visando e comportamental das pessoas entrevistadas, onde a finalidade conseqüentemente, em ler, através do estímulo visual. As das análises era entender o mundo psíquico, sócio-cultural, figuras expostas servirão como instrumentos para emergir tais construtivo e, o comportamento do indivíduo. O objetivo da sentimentos, nova pesquisa é analisar alguns aspectos da realção afetiva escolar, experiência desencadeará no aluno o desejo de externizar seus tais como, relação entre professores, alunos e técnicos sentimentos, para isso ele se utilizará a escrita. Quando administrativos. Para a realização do trabalho foi efetuado uma o despertar nunca do antes interesse em escrever experimentados.Essa 42 coleta de dados a partir de uma entrevista realizada com Vera Alves de Sá (UEMS) integrantes de cada setor. As etapas de pesquisa foram: confecções de uma ficha, elaboração de questionários e seleção A sociedade atual enfrenta vários problemas: violência, dos entrevistados, sendo que as entrevistas com os informantes ausência de ética nas relações, agressividade, individualismo tiveram em média duração de 30 minutos. E, posteriormente, etc.; que não são novos, mas se agravam a cada dia, diante foram analisadas várias questões de todos os segmentos desse quadro, a escola pouco participa para transformar essa podendo constatar que não existe um consenso entre eles, realidade, tornando-se muitas vezes passiva e indiferente frente devido o histórico de vida e de construção social de cada às intempéries que o meio social apresenta. O presente estudo uniforme, também foi levado em consideração a idade objetivou observar a realidade do cotidiano dos alunos e cronológica e o tempo na construção da relação professor, professores do ensino médio e questionar os alunos sobre aluno e administrativo, com a finalidade de colocar em questões epígrafe qual teoria a pessoa esta sujeita, analisando o que está autonomia. Para a realização desta pesquisa, observou-se no por trás de cada discurso e distingüindo qual teoria está mais período de agosto de 2005 a setembro de 2006 o próxima de cada informante, porém após a análise concluiu-se comportamento de 95 alunos com faixa etária entre 15 e 20 que predominou a teoria sociointeracionista em todos os anos de idade e 12 professores, em uma escola pública do setores. município de que envolvam o desenvolvimento Ivinhema-MS. Os dados moral da obtidos foram relacionados às teorias de BZUNECK (1975), KANT (1974), Poster 12 KOHLBERG (1966) e PIAGET (1977), para mostrar que a Análise do Desenvolvimento da Moral Autônoma em Alunos moralidade é resultado da construção interna, que só se alcança do Ensino Médio de uma Escola com o equilíbrio que somente se tem com a moral que a Sandra Albano da Silva (UEMS) autonomia pode proporcionar. Verificou-se que a escola 43 pesquisada não proporciona aos educandos a elaboração e A educação, pode ser compreendida como ato ou efeito de discussão das regras, os alunos não vêem as regras exteriores educar, pois se trata de um processo de desenvolvimento da como arbitrárias, ao contrário, acatam-nas, durante sua vida capacidade física, moral e intelectual do indivíduo. Dessa escolar o aluno é visto pela maioria dos professores como forma o processo educativo precisa favorecer a formação de um incapaz de realizar algum ato responsável por conta própria. sujeito que valorize seu corpo e sua saúde e que seja reflexivo Concluiu-se que a escola é composta de regras para os alunos, diante da realidade, mostrando-se capaz de buscar soluções porém, o restante da comunidade escolar, na maioria dos casos, para os desafios do cotidiano e para os problemas vivenciados não tem regras, sendo que é freqüente, o desrespeito por parte pela coletividade. Dentro deste contexto o presente trabalho dos professores e funcionários sempre tendo uma relação de objetivou saber se existem e quais são as regras impostas superioridade para com os educandos. Cabe ressaltar que já dentro da sala de aula, se a escola pede sugestões de regras e se existe uma minoria de professores, que busca colocar os alunos os alunos obedecem às tais regras. A pesquisa foi realizada em no contexto atual, provocando um pensamento próprio e setembro de 2006, através de um questionário semi-estruturado autônomo, porém, muitas vezes são desmotivados pela grande sendo entrevistados 30 alunos do ensino médio de uma escola maioria conservadora. pública do município de Ivinhema - MS. Verificou-se que as regras são impostas dentro da sala de aula, sendo que as mais Poster 13 citadas quando questionados se existem regras para se Regras mais Freqüentes Impostas aos Alunos na Sala de Aula comportar dentro da sala de aula foram: deve-se respeitar os Vera Alves de sá professores (43,35%), não pode conversar durante a aula Sandra Albano da Silva (UEMS) (30%), só pode tomar água e ir ao banheiro na 2ª e 5ª aula (10%), necessita sentar em fileiras (3,33%), não pode discutir os exercícios na hora da prova (3,33%), não pode chegar 44 atrasado (3,33%), é proibido colar (3,33%) e não pode sair do lugar sem pedir (3,33%). Os alunos disseram que a escola não Poster 14 pede as suas opiniões, ou seja, ela cria as suas normas, regras e Community Language Learning leis sem a participação dos alunos, sendo que eles só Liani da Silva Militão (UEMS) necessitam acatá-las, sem saber porque as estão cumprindo, Daiana Francisca Zanovello (UEMS) como diz uma aluna: “Não, temos apenas que cumprir.” Através do que foi exposto anteriormente, percebe-se que a O ensino de línguas estrangeiras, de Inglês especificamente, escola impõe suas regras prontas para os alunos, sendo que elas oferece muitos métodos de ensino importantes e que têm sido são revestidas de “autoridade” através da ameaça de punição a usados com sucesso ao longo deste século. Sendo que nenhum quem se propor a desobedecê-las. Mas, quando questionados se método é definitivo e as práticas atuais de ensino podem ser obedecem às regras que são impostas pela escola e se acreditam melhoradas e adaptadas; para tanto é necessário observar o se elas são necessárias, 76,67% disseram que obedecem as perfil do aluno de hoje, a metodologia aplicada e conferir se regras e pensam que elas são necessárias e 23,33% que não estão adequados uns aos outros. O objetivo do nosso trabalho é obedecem às regras e acreditam que elas não são importantes. apresentar uma metodologia de ensino de uma segunda língua, Concluiu-se que as regras existem dentro da sala de aula, através do método Community Language Learning, método no mesmo a maioria dos alunos acreditando que seja importante, qual os alunos são membros de uma comunidade e aprendem durante o seu processo de elaboração não existe a participação por meio da interação com outros membros da comunidade. do corpo discente, o que dificulta a construção de sujeitos Curran considera os professores como conselheiros, cujas decididos, reflexivos, que possam usar de todo o seu potencial funções são a de dar suporte e ajuda aos alunos para que no desenvolvimento de uma sociedade mais humana e entendam melhores seus problemas, aplicando ordem e análise. solidária, porque, mais autônoma. Isso acontece sempre que um grupo de pessoas decide aprender 45 uma segunda língua. A aprendizagem não é vista como ensino de Língua Inglesa, que os alunos desenvolvem várias realização individual, mas como algo que é conseguido habilidades cognitivas, e que há uma perfeita interação entre os colaborativamente. A aquisição da segunda Língua não é alunos, e esses com o professor, de quem eles dependem e resultado de acúmulo de informações e conhecimento a confiam muito. Assim tornando a sala de aula um ambiente respeito de regras gramaticais. Levando-nos à conclusão de que bem próximo ao ambiente doméstico, o que leva os alunos ao línguas são difíceis de serem ensinadas, mas serão aprendidas maior interesse e participação. Cabendo ao professor a tarefa de se houver o ambiente apropriado, uma vez que o aprendizado proporcionar essa atmosfera familiar, para que os alunos não de um idioma se dá pela assimilação subconsciente de seus desistam jamais de aprender uma segunda língua. elementos pronúncia, vocabulário e gramática em contextos sociais. Tendo em vista que o ensino de línguas eficaz não é Poster 15 aquele que depende de receitas didáticas em pacote, de prática Identificar so Rastros Trágicos no Obra “Gota d’Agua” oral repetitiva, buscando apoio de equipamentos eletrônicos e Alcimar de Matos Tombini (UEMS) tecnologia, mas sim aquele que explora a habilidade do Gerson Marcio da Silva (UEMS) instrutor em criar situações de comunicação autêntica, Sônia maria de Barros Cursino Pedroso (UEMS) naturalmente voltadas aos interesses e necessidades de cada grupo e cada aluno. E que funciona não necessariamente dentro Através de referências teóricas ao gênero literário da tragédia de uma sala de aula, mas sim estimulando o intercâmbio entre feita por Aristóteles, que dão vida a Tragédia, buscou-se pessoas de diferentes culturas, e que dissocia as atividades de identificar os Rastros Trágicos na obra “Gota D'água”, de ensino e aprendizado do plano técnico-didático, colocando-as Chico Buarque e Paulo Pontes, considerada uma tragédia num plano pessoal-psicológico. Portanto, podemos perceber brasileira lida e assistida pelos palcos brasileiros, tendo como que a Aprendizagem Comunitária da Língua é um método de 46 base os problemas sociais vivenciados pelo povo brasileiro, questão do funcionalismo da língua e não conseguem aplicar as principalmente nas periferias das grandes cidades. regras na produção escrita, é necessário assim aplicar exercícios que tenham um significado para o aluno e nada Poster 16 melhor do que usar suas próprias produções para isso. O Silêncio como Fator de Interação na Sala de Aula Trabalharemos Nádia Nalziza Lovera de Florentino (UEMS) concordâncias nominais e verbais, pontuação, emprego dos Luciene Clementino Pereira Aguiar (UEMS) tempos verbais e explicando-os dentro dos próprios textos dos Rozeli Conceição da Silva (UEMS) alunos, produzindo assim uma aprendizagem significativa e aspectos problemáticos tais como: contextualizada. Poster 17 A Produção Escrita e a Gramática Poster 18 Regiane Jacinta de Brito (UEMS) A Produção de Texto a partir da Diversidade de Gêneros Margarida Xisto da Silva (UEMS) Textuais Regiane da Silva Macedo (UEMS) Luana Cândida de Carvalho (UEMS) Apresentaremos um trabalho referente a obra "A produção O texto deve ser o ponto de partida e chegada em todo o escrita aspectos processo de ensino/aprendizagem, porque está presente em problemáticos no emprego da língua escrita, a partir de todas as situações cotidianas e também porque somente a redações desenvolvidas por alunos e sugerir métodos ou leitura não garante a escrita, mas sim o trabalho desenvolvido exercícios para os professores trabalharem com os alunos a fim com interação entre as práticas de ensino juntamente com a de sanar essas deficiências. Os alunos não compreendem a diversidade de gêneros textuais, pois amplia a competência e a gramática",que trata de alguns 47 comunicativa fazendo com que se aumente também a Poster 19 criticidade. Por isso, é importante que o professor ao orientar O Silêncio com Fator de Interação em Sala de Aula seu aluno na produção textual forneça-lhe antes, modelos de Nádia Nelziza Lovera Florentina (G/FINAN) leitura, já que para aprendermos a escrever, é necessário Luciene Clementino Pereira Aguaiar (G/FINAN) conhecermos previamente a estrutura textual que será Rozeli Conceição da Silva (G/FINAN) trabalhada, a funcionalidade do texto. Nesse sentido, os PCNs (1998) apontam que os projetos é recurso muito útil, pois Segundo Laplane, “onde há linguagem, há também o silêncio”. contextualizam as atividades, mas para isso as produções Esse silêncio não deve ser entendido como exclusão, textuais não podem ser vistas meramente como objeto de resistência, opressão e também não é sinônimo de falta de avaliação do professor, e sim um meio de divulgação de idéias, interação, faz parte da construção de sentido. Quando as é necessário dar um destino às produções textuais dos alunos crianças se silenciam por algum motivo, elas estão devolvendo para que amplie sua consciência lingüística, ative estratégias aos adultos uma contra-imagem de si mesmos, suas mais inventivas no uso dos signos verbais. Sendo assim, temos impotências, impossibilidades, limites e incompetências. Esse as seguintes questões de pesquisa: Será que os professores de assunto se torna ainda mais relevante quando se trata do língua materna do ensino fundamental (4ª série) estão sabendo diálogo professor-aluno/aluno-professor na sala de aula. Para criar as condições adequadas para a efetivação da produção de analisar este aspecto, convém dividir esse diálogo em três textos, enfatizando a diversidade de gêneros textuais? Como se categorias: A fala do professor, a fala do aluno e o silêncio. dá o processo ensino/aprendizagem de produção de textos nessa série? Como se dá a relação entre conhecimento da Poster 20 palavra escrita e a escolarização? Uma Reflexão Racial e Social no Meio Educacional Uiliana Julia Pereira dos Santos (UEMS) 48 Solange Pinheiro da Silva (UEMS) terreno fértil que possibilitou a aplicação prática aos alunos do Ranulfa Correia de Matos (UEMS) ensino fundamental. A realização prática da presente pesquisa foi possível para nós, acadêmicas do Curso de Letras – O presente trabalho focalizou uma aplicação prática de Unidade de Jardim a partir de duas vertentes: a primeira de temáticas de combate ao preconceito racial e social, na 5ª série leituras teóricas centradas na Análise do Discurso com: do ensino fundamental, da rede municipal de Jardim-MS. Para Cardoso (1999), Maingueneau (2002) e outros teóricos da isso, realizamos uma avaliação diagnóstica sobre a temática a Literatura Infanto-Juvenil, tais como: Abramovich (2001) e da ser discutida e depois abordamos temas de igualdade social e psicanálise Bettelhein (1980) e da Prática de Leitura e racial através de textos literários da Literatura Infanto-Juvenil. Produção Textual; e a segunda vertente a partir da vivência no Com isso, houve discussões e após isso houve a produção de Programa Brasil Afroatitude através da bolsa de monitoria que discursos/textos como forma de manifestação de idéias dos proporcionou uma reflexão teórica, uma vivência interna com alunos. E o resultado revelou que as crianças e/ou adolescentes os demais acadêmicos do Curso de Letras; Unidade de Jardim e foram autênticos nas manifestações de idéias, porque foram uma aplicação prática na comunidade externa, alvo desta capazes de discutir temas velados socialmente e pertinentes ao apresentação. Com isso, percebemos o quanto a fundamentação momento de mudanças físicas e psicológicas, próprias da pré- teórica e a avaliação diagnóstica são importantes para prática adolescência e da adolescência. Outro aspecto é que tais pedagógica. temáticas não configuram foco de estudo nas aulas de Português da rede pública, pois tanto a coordenação quanto a professora titular da sala receberam a proposta de forma positiva e constataram que tais assuntos ainda não tinham sido trabalhados no 3º bimestre de 2006. E isso configurou um 49 RESUMO MESA REDONDA Modalidade Discursiva e Suporte Digital Profa. Dra. Maria Conceição Alves de Lima (UEMS/UNICAMP) PALESTRA Análise do Discurso: limites e perspectivas Prof. Dr. Wedencley Alves Santana (UNICAMP/CAPES/UNIVERSO) MESA REDONDA INDENTIDADE, EXCLUSÃO E MINORIAS Identidade, Exclusão e Minorias. Profa. Msc. Kassandra Muniz (UNICAMP) Esquecimento, Interpelação e Exclusão Social 50 Prof. Dr. José Lauro da Cunha (UNEMAT) serviços de três prostitutas. Ali, o foco da análise são as significativas relações entre história e ficção, na época O Discurso da Exclusão em Plínio Marcos metaforizada na peça: a ditadura militar pós-1964. Em seguida, Prof. Dr. Wagner Enedino Corsino (UFMS) trataremos da obra A mancha roxa (1988), que tem por tema a contaminação pelo vírus da Aids em um presídio feminino, que O objetivo desta conferência é demonstrar, por meio da análise discute questões de gênero, identidade e poder. Constata-se e interpretação de contornos identitários, sociais, ideológicos e que, nas três peças, ficam latentes as contradições entre o poder histórico-culturais delineados nas peças Homens de papel e o não-poder; entre as aspirações e as frustrações individuais, (1967), O abajur lilás (1969) e A mancha roxa (1988), de em decorrência da situação histórico-social das personagens. Plínio Marcos, a existência de invariantes que estruturam o projeto estético-político do autor. Abordam-se questões de Uma Introdução à Identidade do Pedófilo gênero, identidade, poder e representação social, acrescidas de Prof. Msc. Paulo Cesar Tafarello (UNEMAT/UFMS) discussões sobre esquecimento, interpelação e exclusão social. Em primeira instância, trataremos das representações sociais e MESA REDONDA relações de poder em Homens de papel (1967), que relata o drama dos catadores de papel na cidade grande, provocado pelo MOVIMENTOS SOCIAIS E ANÁLISE DO DISCURSO: desemprego e pela exploração do homem no sistema ENTRE O CAMPO E A CIDADE capitalista. Num segundo momento, toma lugar a análise O abajur lilás (1969), que põe em cena os temas interditados da Profa Dra. Maria Celma Borges (UFMS) prostituição e da homossexualidade, ambientados num bordel Profa. Dra. Rosimeire Aparecida de Almeida (UFMS) em que um homossexual, auxiliado por um sádico, explora os Prof. Dr. Vitor Wagner Neto de Oliveira (UFMS) 51 do interdiscurso e propor uma análise da semântica global do MESA REDONDA discurso. O autor coloca o interdiscurso como o lugar da gênese/da produção do discurso. Nesse caso, heterogeneidade LÍNGUA E DISCURSO: CONTRIBUIÇÕES discursiva – no caso, a constitutiva – e interdiscurso são BAKHTINIANAS conceitos que razoavelmente se recobrem. Proponho, nesta apresentação, retomar o conceito de dialogia e de enunciado em Um Debate sobre Língua na Mídia: segundo a perspectiva Bakhtin e ressignificá-los à luz dos estudos de pesquisadores bakhtiniana que também partiram das idéias do autor russo. Assim, Profa. Dra. Marina Célia Mendonça (UNIFRAN/UNIFA-CEF) retomarei os conceitos de heterogeneidade constitutiva, de interdiscurso e de memória discursiva para pensar o diálogo A perspectiva de linguagem proposta pelo Círculo de Bakhtin discursivo na grande temporalidade. Analisarei discursos sobre centra-se em duas questões fundamentais: a subjetividade e a língua na mídia tendo em mente o diálogo constitutivo que se dialogia, da qual tratarei nesta apresentação. Uma aplicação da estabelece com a tradição gramatical purista e com as pesquisas dialogia aos estudos do discurso foi feita no interior da AD desenvolvidas no interior das ciências da linguagem. Pode-se francesa por J. Authier-Revuz, nas análises daquilo que a afirmar que a tradição gramatical purista, com poder de dizer autora chamou de heterogeneidade discursiva. A lingüista no país (poder de longa data), está na constituição de grande distingue a heterogeneidade constitutiva do discurso (a que parte dos discursos sobre língua produzidos hoje na mídia; no advém da produção do discurso na sua relação necessária com entanto, também ajudam a constituir esses discursos as recentes outros mostradas. (e nem tanto) propostas de abordagem da língua feitas por Maingueneau também partiu da reflexão sobre a linguagem lingüistas. No entrecruzamento discursivo que percebemos na proposta pelo referido círculo para defender a tese do primado constituição desses discursos, não se pode pensar em uma discursos) das heterogeneidades 52 relação discursiva “bipolar” (ou seja: há um diálogo com duas circular esses gêneros. De acordo com as reflexões de Bakhtin instâncias, e o discurso purista recente é uma paráfrase do (1997), seriam esses os aspectos a priorizar no estudo dos discurso da tradição gramatical, mas com interferências do gêneros, e não apenas a descrição de suas características discurso da lingüística). Enfim, o que proponho é uma estruturais. Partindo das contribuições do filósofo russo, reafirmação do interesse teórico da categoria da dialogia procuramos bakhtiniana aplicada aos estudos do discurso, este pensado composicional e estilo dos gêneros notícia e reportagem, sempre na sua relação com o interdiscurso. observando principalmente o estilo. Essa noção está ligada à de analisar o conteúdo temático, construção escolha (cf. Possenti, 1988, 2002), que supõe um sujeito As Contribuições de Bakhtin para o Discurso Jornalístico (locutor nos termos de Bakhtin), a instância enunciativa que Profa. Dra. Jauranice Rodrigues Cavalcanti opera com/sobre os recursos da língua para construir seu dizer. (METROCAMP/UNICAMP) Essa instância, em termos bakhtinianos, não pode ser pensada fora do social, dos gêneros que circulam nesse espaço, o que Esta comunicação discute aspectos dos gêneros notícia e implica afastar a idéia de uma escolha individual, independente reportagem. Nas classificações que circulam na comunidade das coerções do discurso jornalístico. Interessa-nos investigar jornalística eles aparecem situados na mesma categoria: a de que escolhas seriam essas, como elas se mostrariam, o que jornalismo informativo. Isso quer dizer que são concebidos desvelariam da instância enunciativa. Em outros termos: como tendo por função observar a realidade e descrevê-la, e procuraremos apreender indícios de autoria, marcas da não analisá-la ou avaliá-la, como nos gêneros da categoria presença de um autor nos textos selecionados. opinativa. Os critérios usados para estudá-los acabam não levando em conta aspectos discursivos, como as condições e finalidades da esfera da atividade jornalística que produz e faz MESA RESDONDA 53 QUESTÕES DE DISCURSO E DE GÊNERO Profa. Dra. Maria Angélica Freire de Carvalho (UEZO/RJ – TV Educativa) O “Novo” Domesticado: gênero como ritual da formulações diante do acontecimento discursivo no jornalismo A AD e o Discuso Mítico Indígena Prof. Dr. Wedencley Alves Santana Profa. Dra. Nara sgarbi (UNIGRAN) (UNNICAMP/CAPES/UNIVERSO) O texto “A AD e o discurso mítico indígena” pretende fazer a Questões de Discurso e de Gênero Publicitário análise discursiva que perpassa o mito da criação da primeira Profa. Msc. Ana Lúcia Furquim de Campos (UNIFA- terra CEF/UNIFRAN/UNESP) originalidade da palavra indígena, com a intenção de apontar ,apresentado por Clastres (1990), observando a uma forma de desvelamento dos elementos constitutivos da Questões de Discurso e de Gênero de Auto-Ajuda brasilidade do índio Guarani, a partir da argumentação, dos Profa. Dra. Sheila Fernandes Pimenta de Oliveira (UNIFA- aspectos coesivos caracterizadores desse mesmo discurso e de CEF/UNESP) elementos inerentes aos níveis semânticos , pragmático e da manifestação (AD), tomando como bases teóricas as idéias de: MESA REDONDA Pêcheux (1990), Foucault (1969), Brandão (1986), Habermas (1990), entre outros. Sociolingüística em sala de aula: da teoria DISCURSO E TEXTO: FRONTEIRAS E APROXIMAÇÕES à prática. O Funcionamento Textual-Discursivo nos Rótulos em Artigos Discurso e Metodologia: tensão na análise de Opinião Prof. Dr. Marlon Leal Rodrigues (UEMS) 54 Um Olhar para a Toponímia Sul-Matogrossense: resultados Nas Malhas da AD: obediência e travessuras parciais Prof. Janaína Nicola (UFMS) Profa. Msc. Marineide Cassuci Tavares É preciso continuar. São as palavras de Michel Foucault a Atlas Lingüístico de Ponta Porâ-MS: notícias de um atlas encaminhar-nos ao encontro com os entornos do discurso. O concluído ensejo que esse trabalho pretende construir, com respeito à Profa. Msc. Regiane Coelho Pereira Reis (UEMS) teoria da Análise de Discurso de linha francesa, destina-se a explorar os viézes entrecruzados desse objeto contrário a si MESA REDONDA mesmo, além de recuperar um pouco da história (e historicidade) do referido campo investigativo que a ele se HISTÓRIA, DISCURSO E POLÍTICA dedica especialmente. O Discurso Apologético da Escravidão “Feliz”: Da Casa MESA REDONDA Grande ao Sobrado Profa. Dra. Maria do Carmo Brazil (UFGD) LEXICOLOGIA E LEXICOGRAFIA Tradições Discursivas e Comunidades Quilombolas de Mato O Vocabulário da Erva-Mate no Cone Sul Grosso do sul Prof. Msc. Aparecido Lázaro Justiniano (FIP) Prof. Msc. Antônio Carlos Santana de Souza (UEMS/USP) Sujeito Político e sua Constituição 55 Profa. Msc. Edileuza Gimenes de Moralis análises estão ausentes, os protocolos de leitura não são (UNEMAT/UNICAMP) explicitados. Este trabalho tem o objetivo de recuperar algumas posições da “memória” da AD que caracterizaram esta MESA REDONDA disciplina como a que mantinha com a língua uma relação fundamental. Uma segunda questão, decorrente da primeira, ANÁLISE DO DISCURSO: LIMITES E PERSPECTIVAS trata da questão da relação da AD com os textos, dado que a passagem da língua ao texto não se faz por simples extensão. Ad: Novos Objetos, Novas Práticas Analíticas Serão mencionados exemplos de análises e hipóteses de Profa. Dra. Maria do Rosário Gregolin trabalho. (UNESP/ARARAQUARA) Palavras-chave: discurso, língua, texto, análise. A AD como Teoria dos Textos Prof. Dr. Sírio Possenti (UNICAMP) Uma das características de muitos trabalhos em AD é a repetição mais ou menos sem conseqüência de algumas posições clássicas em relação ao sentido. Um sub-tema de tais declarações consiste em uma crítica à posição da lingüística, que defenderia o sentido “dado”. No entanto, com muita freqüência, os trabalhos não mostram como se constitui o sentido dos textos analisados, segundo a AD. Ou seja, as 56 RESUMO COMUNICAÇÕES INDIVIDUAIS E COORDENADAS Mesa 1 Terror em São Paulo e Terror na Mídia Vânia Maria Guerra Lescano (UFMS) Jefferson Barbosa de Souza (PG/UFMS) Este trabalho faz parte de uma pesquisa de escopo maior, intitulada “Discursos midiáticos no fogo cruzado entre grupos criminais organizados e equipes de segurança nacional” em desenvolvimento no programa de pós-graduação da UFMS, câmpus de Três Lagoas. Em decorrência da extensão do projeto e de sua prematuridade, delimitamos para este debate determinados aspectos referentes à acontecimentalização do discurso da mídia, em especial, sobre os ataques promovidos pelo Primeiro Comando da Capital (PCC) à capital paulista em maio deste ano. Para tanto, selecionamos matérias divulgadas pela imprensa on line como objetos de nosso estudo, ou seja, as revistas Época, IstoÉ e o jornal Folha de São Paulo, por meio dos quais a análise realizar-se-á a partir de contribuições da 57 escola francesa de Análise de Discurso e dos Estudos Culturais. divulgação da notícia, se se trata de uma atitude de Trata-se de um estudo de cunho político, tendo em vista que responsabilidade ética (LIPOVETSKY, 2004) ou simplesmente “as lutas para emancipar os grupos oprimidos podem ajudar a de manobra de recortes de enunciados sob a luz de um libertar os outros, ao promover atitudes de tolerância mútua que horizonte no limite beneficiarão a todos” (GUIDDENS, 2002). Para o evidenciam que o trabalho de jornalistas com a linguagem autor, podemos “preparar a cena” para uma política caminha paralelamente ao dos cientistas e aparenta sempre emancipatória. Nessa visão, acima de tudo, há a preocupação estar permeada por necessidades que regulam sua credulidade: em liberar os indivíduos e grupos de limitações que afetam citação de discurso alheio, argumento de autoridade, juízos de negativamente suas oportunidades de vida: os homens são valores, elevação de posições em relação a outros, depoimentos capazes de, reflexivamente, “usar a história para fazer história” (principalmente de familiares de civis e policiais que perderam (p. 194). Interessa-nos, ainda, nesta fase preliminar de estudo, suas vidas em prol da segurança do Estado). O efeito de sentido saber como a imprensa, independentemente do canal que dessas regularidades parece confirmar a parcialidade da mídia utiliza, procede à circulação de discursos (FOUCAULT 2003, no que tange à veiculação de informação em que há, nesse 2004) e como é o processo de discursivização no tocante às sentido, espetacularidade e jamais neutralidade no discurso da formações discursivas; sob que regras seus textos pretendem mídia. Por isso, a hipótese sobre a qual trabalhamos concentra- veicular verdade e que estratégias de poder e imaginário são se no fato de que no texto da mídia, apesar da heterogeneidade articuladas (PÊCHEUX 1975, 1990), já que, segundo Gregolin discursiva, nenhuma delas executa a prática social da (2003, p. 97), a mídia age como construtora de imagens imparcialidade, provocando sempre a sua dispersão em direção simbólicas, em que os indivíduos percebem a si mesmos e aos a sustentação de uma posição em detrimento de outras outros, gerando um efeito de subjetividade coletivizada. Uma possíveis. das questões a serem debatidas refere-se ao modo de infinito de discursos? Análises preliminares 58 Considerações sobre o Discurso de Garotas de Programa prostituta, dada a saturação de valores de uma nova classe Romilda Meire Souza Barbosa (PG/UFMS) social, cuja conjuntura econômica excede na valoração de um tipo de garota submetida às tecnologias do corpo? Tais Segundo Foucault (2001), assiste-se nos dois últimos séculos a inquietações uma proliferação de discursos sobre a sexualidade. Oferecendo discursivo de garotas de programa, numa perspectiva crítica, uma explicação para o lugar que o sexo ocupa na cultura histórica e social que contribua para a elucidação das relações ocidental e o porquê de tanta curiosidade sobre o assunto, entre sujeito, história e ideologia, em que o lingüístico e o Foucault (1978) afirmou que no fundo do sexo está a verdade: é social se relacionam na construção dos sentidos. Para tanto, nele que o indivíduo pode melhor descobrir-se, visto ser o sexo essa aquilo que o determina. Se para cada indivíduo constitui uma conceitos e procedimentos da corrente francesa da Análise do problemática conhecer-se através do sexo, representa também Discurso: Pêcheux (1988,1990); Foucault (2001,2004). O uma preocupação saber o discurso de pessoas por meio desse córpus domínio, em particular, as que vivenciam o sexo de maneira veiculados diferente, tal como as garotas de programa. Qual seria o Metrópole (2003) e Caros Amigos (2006). Pretende-se, discurso dessas mulheres que se relacionam sexualmente com mediante a seleção desses enunciados, discutir questões vários homens/mulheres estranhos por dia, nos tempos atuais referentes em que o corpo está coisificado, em que há toda uma indústria observando-se aspectos atinentes às representações discursivas, em torno da produção de corpos e de desejos sobre eles, em que à questão de gênero e de identidade do referido sujeito o dinheiro é instrumento perfeito para qualquer troca? Por ser a constituído nesse discurso. prostituição uma constituição histórica, estariam, nesse PALAVRAS-CHAVES: discurso, acontecimento, garotas de discurso, se ressignificando os sentidos, os conceitos de programa. dimensionam pesquisa(comunicação) a análise tem, do como acontecimento aporte constitui-se de enunciados recortados de teórico, artigos na mídia impressa, sobretudo, nas revistas à irrupção desse acontecimento discursivo, 59 do dizer (cf. AUTHIER-REVUZ, 1998) classificando esses “A Linguagem Habita Lalangue”: O equívoco do dizer e a não- eventos em quatro tipos distintos: a) as não-coincidências coincidência das palavras consigo mesmas interlocutivas; b) as não-coincidências interdiscursivas; c) as Carlos Magno Viana Fonseca (PG/UFC) não-coincidências das palavras com as coisas e d) as nãocoincidências das palavras consigo mesmas. Como já nos Este trabalho faz parte de um conjunto de investigações que ocupamos estamos desenvolvendo no curso de Pós-graduação em interlocutivas (FONSECA, 2006) e das não-coincidências Lingüística da Universidade Federal do Ceará, cujo objetivo interdiscursivas imediato das ocuparemos das não-coincidências das palavras consigo natureza mesmas e no futuro nos debruçaremos sobre as não- é verificar heterogeneidades acadêmica. a presença enunciativas chamada de 2006) não-coincidências neste trabalho nos objetivos imediatos analisaremos o inventário, já disponível na enunciado concreto, nas mais variadas perspectivas, isto é, literatura desde o “aparelho formal da enunciação” de Benveniste (1995), materializam o fenômeno, interpretando os efeitos de sentido passando pela perspectiva polifônica de Bakhtin (1992; 2000), que sua incidência provoca no discurso acadêmico levando em considerando as noções de arquivo e enunciado em Foucault conta uma análise que considera as formas em níveis; das mais (1997; 2004; 2005), levando em conta a interdiscursividade de explícitas, lingüisticamente marcadas com o verbo ‘dizer’ às Pêcheux (2004; 2006) até chegar ao tipo de discurso batizado mais por Authier-Revuz (1990; 1998; 2004) de metaenunciação. heterogeneidade constitutiva do sistema lingüístico, proposta já Esta heterogeneidades amplamente aceita no Brasil (cf. TEIXEIRA, 2005). Esta enunciativas a partir do que ela designa de não-coincidências análise está pautada no atravessamento do discurso da formas de Lingüística (FONSECA, das Enunciação (FLORES E TEIXEIRA, 2005) partimos do as a textos efeitos momento coincidências das palavras com as coisas. Para atender a nossos descreve sob os outro da autora Abrigados em e em especializada, interpretativas, que das formas remetem lingüísticas ao fenômeno que da 60 Lingüística e da Análise do Discurso pelo discurso da enunciação, as relações entre o ‘eu’ que enuncia, o ‘outro’, Psicanálise lacaniana, posto que para cunhar o conceito do interlocutor que participa ativamente da comunicação de duas fenômeno, Authier-Revuz recorre ao conceito de lalangue (cf. formas, por um lado, como o lugar de onde o sujeito- LACAN, 1985; 2003) reconhecendo o jogo do equívoco enunciador espera uma atitude responsiva e, por outro, como o constitutivo da linguagem humana. Nosso corpus é composto elemento da comunicação que desencadeia o processo das de trinta artigos acadêmicos de lingüística de publicação on formações imaginárias no sujeito-enunciador de se dirigir ao line, sendo dez da revista D.E.L.T.Α dez da ReVel e dez Outro, termo lacaniano para designar “o Grande Outro da da Linguagem em (dis)curso coletados com base no critério de linguagem, o lugar da Lei” (MILLER, 2002, p. 30) que que o artigo acadêmico deveria tratar, preferencialmente, de entendemos como o lugar das ‘Leis da Linguagem’ com as análise de discurso. Os eventos analisados são selecionados a quais partir da configuração da metaenunciação, procedimento desencadeando o processo das não-coincidências do dizer. enunciativo na qual o sujeito-enunciador se distancia de seu Disto, concluímos que o fenômeno circunscreve o sujeito não dizer, e de uma posição avaliativa, realiza um comentário, uma apenas como entidade empírica (como na psicanálise) nem avaliação ou uma crítica sobre o próprio dizer, os itens lexicais assujeitado pela história e ideologia como na primeira fase da empregados ou a maneira que o dizer foi enunciado, análise de discurso, nem também entre ambos, mas um sujeito consistindo no que Authier-Revuz chama de ‘desdobramento visto sob uma nova ótica o sujeito-efeito de sentido, marcado metaenunciativo da modalização autonímica’, ou seja, um pelo não-um constitutivo da enunciado dentro de outro, o que ocasiona momentaneamente a inconsciente, pela história, pela ideologia e pelo imaginário. opacificação do signo lingüístico. Os resultados alcançados Sujeito este que faz de seu dizer, oral ou escrito, um momento apontam para uma negociação obrigatória empreendida pelo único de embate de vozes sociais nas quais há sempre o sujeito-enunciador que coloca em jogo, no ato efetivo da despertar do poder. uma enunciação efetiva nem sempre linguagem, coincide clivado pelo 61 PALAVRAS-CHAVE: psicanálise, lalangue, análise de discurso, não-coincidências do dizer de uma cultura iconizada que nos nega historicidade, considerando o sujeito sul matogrossense a-histórico. Assim, procura-se fazer essas reflexões levando em conta a Análise do Questões de Identidade e Representações Sul Matogrossenses Discurso que se inscreve num terreno em que intervém Anailton de Souza Gama (UFMS/UEMS/FINAN) questões teóricas relativas à ideologia e ao sujeito, concebendo o discurso como uma manifestação, uma materialização da Considerando-se uma das tendências da atualidade no que ideologia decorrente dos modos de produção social. tange aos estudos lingüísticos, nota-se a inclinação pautada nos estudos da recepção para tomar foco central o processo de Mesa 2 produção textual, a prática de leitura e o leitor. A atividade “O Uso de Genéricos e os “Apagamentos” em Saúde do crítica, oscilando entre autor, obra e leitor, tem apresentado ao Trabalhador” longo do tempo diferentes teorias que, entrelaçando-se, Alessandra Moreno Maestrelli (PG/USP) anteciparam ou negaram questões enfocadas no percurso marcado pelos diferentes pólos dessa proposição, culminando Este trabalho é resultado do esforço de investigação sobre o com postulações da Análise do Discurso. A presente funcionamento da conexão entre ideologia e inconsciente. comunicação propõe analisar o processo de produção textual, a Trata-se, portanto, de uma das possibilidades de interface entre forma como o discurso científico/político toma o lugar do análise de discurso de filiação francesa e Psicanálise. Como se discurso histórico no processo divisionista do estado de Mato sabe inconsciente é um dos conceitos fundantes da psicanálise Grosso, conferindo ao sul matogrossense o estatuto de sujeito- desde Freud, relido por Lacan que adiciona a noção de cultural e negando-lhe o direito de sujeito-histórico, produtor Progresso aos avanços da Psicanálise na compreensão dos de sua própria identidade e representação através da imposição novos modos de subjetivação. Ideologia, por sua vez, é um 62 conceito que Pêcheux empresta do marxismo e acaba por mais em menos tempo etc. Além de todas as perdas mais perpetrar a alienação ao desejo do Outro, função política da relevantes a maior importância é dada ao título, ao certificado e noção de Ideologia em Análise do Discurso. A questão do enfim à garantia de conhecimento ampliado. Essa investigação trabalho, para mim, tem sido motivo de inquietação em dar– se– á a partir da análise dos modos de produção do múltiplos sentidos, talvez o maior e mais forte deles seja a conhecimento de trabalhadores da área da saúde, que, por sua atualização do trabalho na atualidade, entre os quais vez, refletem no seu processo de adoecimento. Nos últimos 15 consideramos a geração de renda, de riqueza, motivo pelo qual anos esses trabalhadores estiveram envolvidos com sua própria o sujeito se entende e se reconhece como cidadão, a crença na capacitação profissional, além de sua manutenção nos serviços superação de déficits econômicos e por fim a ascensão social. públicos de saúde em função das novas diretrizes para a Esse discurso em torno do trabalho e de seus significados nos consolidação do Sistema Único de Saúde, o SUS. As tentativas leva a crer que é o discurso hegemônico mantido pelos de construção do sistema público de saúde têm passado por empresários e patrões, para os explorados e oprimidos, ou várias reformas, entre elas, a criação dos Programas de Saúde ainda, os socialmente prejudicados. Por outro lado o discurso da Família. Nota – se que, ao se inserir o profissional de saúde que faz ecoar a propagação da exploração vem de encontro à da família no contexto da saúde da comunidade, espera – se demanda social e trabalhista, não por melhorias nas condições que, este, seja a redenção das esferas governamentais; postas à exploração da mão de obra existente, mas, sim, na assegurando a saúde pública, e a manutenção de um sistema melhoria da própria mão de obra, e, assim, nascem as eficiente de atenção à saúde. No entanto, o que se tem é um capacitações e as demandas por salvo condutos especializados crescimento de frustrações e sobrecarga de trabalho, o que em títulos. O curso que o sujeito realiza tem a função de salvo- acaba por produzir os mais diferentes sentidos sobre o sujeito, conduto mesmo que provisório para trabalhar melhor, uma vez sobre o trabalho e o si mesmo. Aparentemente importa para o capacitado o funcionário colaborador irá render mais, fazer sistema (SUS), que, os trabalhadores tenham envolvimento 63 pessoal e compromisso com o trabalho e com os usuários dos Psicanálise francesa, a superfície lingüística é opaca, o que se serviços. A esse respeito, é válido, no entanto, lembrar o que vê, são marcas, pistas, que, para serem interpretadas, requerem LACAN (1985, p.41) aponta sobre as relações pessoais. Para que se atinjam seus modos de funcionamento. O ponto de ele, trata-se de considerar laços sociais e, portanto, políticos, partida é sempre considerar que existe uma heterogeneidade de que, ao se estreitarem para consolidar uma política que se diz formações discursivas, que, são determinadas por formações apartidária, produzem outros sentidos que não exclusivamente ideológicas, as quais, por sua vez, estão embebidas em uma os esperados. Com o amparo da noção de ideologia em formação social. O sujeito do discurso é considerado como Pêcheux, podemos supor a delegação das responsabilidades efeito, que emerge em alguma posição que lhe permita produzir governamentais para com a Saúde aos Pólos de Educação alguns sentidos, enquanto está assujeitado à interdição de Permanente em Saúde, trabalhadores e usuários dos serviços, outros. Temos assim uma conexão entre o inconsciente como “desculpabilização” ou isenção. Na seqüência desta psicanalítico e o inconsciente da ideologia; encontramos atos análise inicial do corpus, a noção de Transferência em LACAN falhos, metáforas, metonímias e outras formações, que poderão (1995) compõe o arcabouço teórico inicial de análise como nos indiciar o apagamento da condição social dos sujeitos uma tentativa de ouvir as diferentes vozes do discurso trabalhadores da saúde, na luta de classes. Os vários corpora hegemônico e as várias posições sujeito ocupadas e alternadas deste trabalho irão favorecer as análises discursivas que nos na relação de poder. Somado a isto, o conceito Posição sujeito permitirão capturar um “naco” de Real no discurso produzido norteia a compreensão das convergências discursivas e pelos sujeitos envolvidos e o contra - ponto com as leis e o dissonâncias nas formações sociais, e, portanto, ideológicas, discurso hegemônico vigente; fazem parte deles alguns bem como o mecanismo do discurso pedagógico. Como documentos oficiais públicos, tais como a portaria nº 198 de sabemos, este último esconde, apaga as polissemias inerentes à Março de 1993, as Diretrizes do Sistema único de Saúde, linguagem. Tanto para a Análise de Discurso quanto para a redigido pelo Ministério da Saúde, além da produção textual de 64 16 alunos do curso de facilitadores em educação permanente análise discursiva seguirá em busca dos em saúde dos quais fui tutora no período de Março de 2005 a lingüísticos, percorrendo as formações ideológicas nos Janeiro de 2006; o curso foi promovido pelo Ministério da discursos dos sujeitos até que, os encontremos nas várias Saúde e realizado pela FIOCRUZ em parceria com os posições sujeito que ocupam em seus discursos e em seus municípios e os pólos de educação permanente em saúde. A papéis. Ao estabelecerem relações distribuídas ideologicamente análise indiciária, à qual nos filiamos, faz-se a partir de gestos de modo a suprimir as situações de classes, poderemos fazer os de interpretação por parte do analista, dos quais se fará possível destaques e recortes no discurso hegemônico no que concerne à atingir algumas das peculiaridades nas manifestações da formação pedagógica e ao desenvolvimento de “habilidades ideologia e do inconsciente, que, a qualquer momento, necessárias ao trabalhador da saúde” associadas ao seu emergem como falta. O conhecimento não vem da observação processo de adoecimento mental, acidentes de trabalho, direta da língua ou da linguagem, e, sim, da junção de aspectos doenças ocupacionais e óbitos. apagamentos teóricos da internalização da história e da cultura por parte dos sujeitos. Há, portanto, uma mudança no modelo de análise que “O Idoso "Excluído" no Bolsão Sul-Matogrossense: a não responde pela ideologia institucional, indicando um identidade em questão” imbricamento do analista com seu corpus de análise, o que nos Yara de França Catarino Barros (PG/UFMS) remete novamente aos conceitos de inconsciente, ideologia e transferência. (TFOUNI, L. V, 1992). A partir da determinação Tendo em vista os programas de reintegração social aplaudidos histórica dos processos de significação, reconhecemos o pelo Estatuto do Idoso (2001) esta pesquisa objetiva descrever “apagamento” de sentidos, próprio do discurso político, e interpretar como o idoso constrói sua identidade na condição definido por PÊCHEUX (1990), como sendo da ordem do de "excluído". Como procedimentos metodológicos adotamos mecanismo do funcionamento da memória discursiva. A entrevistas com idosos, com idade a partir de 65 anos, que 65 residem em asilos situados em algumas cidades do bolsão-sul- programas sociais e de saúde para os anciãos, particularmente matogrossense, tais como: Três Lagoas, Inocência, Brasilândia, para os de baixa renda. Objetivamos com esta pesquisa, Paranaíba, Cassilândia e Chapadão do Sul.Tendo como base investigar aspectos relativos à (des)construção de identidades e teórica os Estudos Culturais na pós-modernidade (Hall, 2005) e à representação social, tomando como objeto de análise a voz formação discursiva com base nos princípios teóricos da dos "excluídos" (idosos que vivem nos asilos) e o Estatuto do Análise do discurso de linha francesa (Foucault,2005 e Idoso. Essa investigação teve como procedimentos básicos a Pêcheux, 2006) analisamos as diferentes identidades dos pesquisa bibliográfica e documental, e de campo, cuja coleta e idosos. O idoso tem sido um assunto de extrema repercussão análise/discussão em nosso meio social, o qual desperta vários questionamentos, procedimentos: 1) pesquisa no documento: Estatuto do Idoso; o que na verdade não deixa de ser mais uma questão social que 2) realização de entrevistas; 3) transcrição de fitas; 4)seleção necessita ser tratada com mais atenção e respeito seja pela dos dados para análise; 5) análise dos dados propriamente família, pelo poder público, pela iniciativa privada ou até ditos. Na entrevista foram abordados os seguintes temas: mesmo pela universidade. Enquanto proliferam práticas, direitos do idoso, acesso à escola e justiça. Os dados foram discursos e representações sociais sobre a marginalidade, o coletados na Vila Vicentina, sito à rua Paranaíba, 1299 na sistema carcerário, a exclusão social, direitos humanos e sobre cidade de Três Lagoas - MS, a qual mantém-se por meio de o indivíduo marginal ou desviante, a voz desse sujeito doações e promoções, recebe ajuda de custo proporcionada pela submetido a sanções sociais e penais (e de seus familiares) Prefeitura Municipal de Três Lagoas - MS. O estabelecimento pouco se faz ouvir, favorecendo assim, a construção de um abriga pessoas de ambos os sexos, com a finalidade de socorrer imaginário individual ou coletivo) parcial, ou caracterizado por pessoas carentes de todas as faixas de idade, sem discriminação representações falsas ou enviesadas. Assim, o abandono do de cor e raça, tem como finalidade o exercício da prática da idoso no Brasil se evidencia na precariedade dos serviços e caridade no que concerne à assistência social e a auto-estima. dos dados utilizaram os seguintes 66 Quanto à assistência material eles recebem donativos tais discurso sobre prevenção circula nos mais variados espaços como: alimentos, vestuários. Há uma igreja interna, onde sociais, então porque os levantamentos de gravidez na ocorre a reza do terço duas vezes por semana e missas todas as adolescência tem aumentado gradativamente? Uma das sextas-feiras à noite. questões seria pensar que os discursos de prevenção, neste caso, não surtem seu efeito de sentido “esperado” ou a questão Gravidez na Adolescência: uma questão de efeito de sentido da gravidez na adolescência seria uma questão de outra ordem. Irani Fonseca Francisco (G/UEMS) A proposta é analisar nos discursos da posição sujeito adolescentes grávidas qual o “nível” de informatividade Temos por objetivo analisar neste trabalho o discurso de discursiva, se antes da posição sujeito gravidez havia um algumas adolescentes grávidas do município de Nova espaço discursivo preventivo? Assim, a pesquisa pretende Andradina que se constituem em sujeito discursivo. Buscamos caracterizar alguns discurso que revelem em sua constituição nos discursos das adolescentes saber por que o discurso da do efeito de sentido dos discursos preventivos de gravidez na prevenção não constituiu seu efeito de sentido, uma vez que a adolescência. circulação de discursos preventivos de gravidez na adolescência faz parte de grande maioria dos programas Mesa 3 escolares de ensino médio e fundamental, postos de saúde, O Processo de Monotongação no Português Falado em programa vinculada nos meios de comunicação de massa, e até Dourados-MS telenovelas exploram esses discursos, ainda sem considerar que Elza Sabino da Silva Bueno (UEMS) esses discursos não se constituem em um discurso de “novidade” ou tabu discursivo, como “coisas-a-saber” das O princípio da variação supõe que os falantes recorram a quais ninguém ousaria enunciar em certos espaços. Se o elementos lingüísticos distintos para expressar conteúdos 67 distintos, uma vez que, se podem usar elementos lingüísticos estudo é detectar a influência exercida por fatores lingüísticos e diferentes para dizer a mesma coisa. O uso alternativo de sociais sobre o fenômeno em estudo. Para tanto, adotamos os formas diferentes de se dizer o mesmo é encontrado em todos pressupostos teórico-metodológicos da teoria da variação os níveis da língua, desde o mais concreto (fonético- lingüística, propostos por Labov (1972) e Cedergreen & fonológico) ao mais amplo (discurso), passando pela gramática Sankoff (1974), em que se analisou a fala de doze informantes e pelo sistema lexical. Para explicar o funcionamento destes da região acima mencionada, sendo seis homens e seis usos, pode-se prestar a atenção à forma como exercem sua mulheres com idade entre quinze a vinte e cinco, vinte e seis a influência os fatores lingüísticos e à forma como atuam os cinqüenta e acima de cinqüenta e um anos de idade. Quanto ao fatores extralingüísticos, isto é, os históricos, geográficos, grau de instrução, trabalhamos com falantes do ensino contextuais e sociais. Entre esses fatores sociais está, fundamental e do ensino médio, para verificar a freqüência de naturalmente, a profissão, a idade, o sexo do falante e sua monotongação entre os dois grupos. Através da análise dos ocupação. Tratando-se, porém, das variedades lingüísticas, dados obtidos pudemos concluir que os ditongos [ay], [ey] e encontramos dentre as várias ciências que tratam desse tema, a [ow] sofrem variação nos diferentes contextos de uso da língua. sociolingüística, que estuda a língua em uso no seio da O ditongo [ay] é condicionado pela presença de uma fricativa comunidade de fala. Portanto, o presente trabalho analisa o palato-alveolar; o ditongo [ey], quando seguido por fricativa fenômeno variável da monotongação, que consiste em reduzir palato-alveolar. Nesses contextos o condicionamento fonético é um ditongo a um monotongo, conforme podemos observar nos categórico para ambos os ditongos. Com relação ao ditongo exemplos: baixo> baxo; dinheiro>dinhero; roubo>robo. Os [ow], observamos que não há condicionamento algum ditongos orais relacionado a sua variação, ou seja, a redução deste ditongo decrescentes existentes no português falado na cidade e na pode ocorrer em qualquer contexto lingüístico de uso da língua por nós estudados restringem-se aos região da grande Dourados-MS. O objetivo principal do nosso 68 portuguesa falada no Brasil e, de modo especial, no português importância no período colonial, com certeza depositária de falado na região selecionada para este estudo. diferenças diatópicas que revelariam aspectos comuns se PALAVRAS-CHAVE: Monotongação; teoria da variação coligidos em uma série de atos lingüísticos, portanto, normais, lingüística; ditongos orais. e, ao mesmo tempo, funcionais, constituindo um sistema de isoglossas. Para que elaborar a carta lingüística de Iguape? Esse Estudo Sociogeolingüístico do Município de Iguape material deve trazer à luz um valioso inventário de formas, em Roseli da Silveira (PG/USP) primeiro lugar. Além disso, deve se prestar a observações de caráter geral sobre o funcionamento da linguagem como meio A partir de 1996, intensificam-se os esforços para a elaboração de intercomunicação social, revelandoa espaço a conexão entre de um atlas lingüístico nacional, o ALiB. Passados trinta anos, a história lingüística e os fatores geográficos ou geopolíticos. a pesquisa dialetal no Brasil avançou. Abortada a idéia de um atlas nacional, dadas as dificuldades de um país de dimensões Mesa 4 continentais, partimos para a elaboração de atlas regionais: Diálogos Bakhtinianos entre o Cinema de Spielber e o nosso primeiro atlas, datado de 1963, é o Atlas Prévio dos Romance de Kafka. Forças Hegemônicas em Discussão Falares Baianos, depois seguem-se o Esboço de Atlas Ivo Di Camargo Júnior (PG/UFSc) Lingüístico de Minas Gerais, o Atlas Lingüístico da Paraíba, o Atlas Lingüístico de Sergipe, o Atlas lingüístico do Paraná, o O dialogismo bakhtiniano, corrente do pensamento lingüístico Atlas Lingüístico Etnográfico da Região Sul, entre outros que surgido no início século XX, vem nos ajudando a melhor já foram ou estão sendo elaborados. Iguape, campo de pesquisa trabalhar com assuntos vários e temas que antes ou eram de nosso projeto de estudo sociogeolingüístico tem grande tratados distintamente ou eram estudados separadamente e que interesse por ser uma cidade histórica que teve muita agora, podem ser analisados como material intertextual e 69 referencial. Neste trabalho, esperamos apresentar aos nossos Entre o Asilo e o Exílio, a Condição da Literatura no Universo destinatários, uma forma de se recuperar o intertexto numa obra Midiático fílmica, dentro de uma determinada ótica, utilizando os Volmir Cardoso Pereira (PG/UFMS) conhecimentos deste grande pensador das ciências humanas, Mikhail Bakhtin. O discurso será aqui analisado com vistas a Esta comunicação tem por objetivo efetivar uma reflexão interligar as obras analisadas, demonstrar seus potenciais crítica sobre a situação da literatura no mundo contemporâneo e dialógicos e explicá-las sob o mesmo ponto de vista. Ao o seu lugar dentro do universo midiático. Na era do áudio- mesmo tempo esperamos levantar os possíveis diálogos entre o visual, da reprodução em escala planetária das imagens pop, filme de Steven Spielberg, Encurralado, e os estilos do romance dos mitos de consumo globalizados, a “indústria cultural” Kafkiano moderno para assim mostrar aos interessados na (Adorno) sustenta seu poderio através do bombardeio constante Filosofia da Linguagem e na Dialogia de Bakhtin, um trabalho de informações fragmentárias e de espetáculos efêmeros, que levante discussões a respeito dos diálogos entre artes destituídos de qualquer sentido histórico. Por isso, os tempos distintas, cinema e literatura, mas que se completam hodiernos se caracterizam pela perda da capacidade de se perfeitamente quando traspassadas de uma ótica a outra. Por contar histórias, ou seja, diante do vertiginoso mosaico non outro lado discutiremos as forças hegemônicas filosóficas e sense de informações gerado pela mídia, toda e qualquer discursivas apresentadas no filme, à maneira como Bakhtin as narrativa se decompõe em fragmentos, ficando sujeita à mera trabalhou. Sem mais, esperamos que este trabalho enriqueça condição de produto descartável. Nesse sentido, questionar a ainda mais os estudos bakhtinianos e que ajude a compor uma condição da arte literária dentro da indústria cultural fatalmente bibliografia mais completa nos estudos de cinema, literatura e nos leva a reconhecer que o seu espaço se encontra cada vez filosofia da linguagem mais restrito e, sobretudo, sujeito à lógica consumista que, por não ver nela um mercado promissor (a não ser o reino dos best 70 sellers), marginaliza-a. Vista como uma expressão da cultura sem a necessidade de passar pela seleção rigorosa (quando não, que se arcaizou ante a emancipação do cinema e da televisão, a um jogo de cartas marcadas) das grandes editoras. Hoje, um literatura parece se encontrar asilada dentro da indústria escritor iniciante pode começar publicando em sites e blogs, cultural, como se fosse um puro anacronismo. Nesta condição pode inclusive criar, junto com alguns amigos, sua própria de asilo, ela se restringe ao interesse de alguns poucos revista literária ou, de forma mais ambiciosa, sua própria acadêmicos, a pequenas comunidades virtuais (blogs, revistas editora. Todas essas possibilidades nos levam portanto, a uma eletrônicas) e a outros poucos indivíduos soturnos. Contudo, há conclusão que é, no mínimo, paradoxal: embora sejam certamente um movimento por parte de escritores e leitores fenômenos recentes – os sites, os blogs, as pequenas editoras – para impedir que o “asilo” da literatura se transforme em um cremos que pelo menos de uma coisa se pode ter certeza: os completo “exílio” dos meios de comunicação atuais, o que nos meios de produção literária estão mais democráticos, embora dá alguma esperança. Nesse sentido, é preciso dizer também isso não tenha tornado a literatura democrática em si mesma, que, além do público escasso, outro problema que o escritor visto que ainda atinge um ínfimo número de pessoas no Brasil. contemporâneo enfrenta é justamente o descaso da própria Mesmo diante dessa situação conflituosa, percebe-se também crítica universitária, sempre mais preocupada com figuras que os escritores se valem da mídia, da tecnologia, das técnicas canônicas e não disposta a se arriscar no estudo de obras e de publicidade, enfim, dos suportes ideológicos do capitalismo autores recentes. Mas, se por um lado é visível essa má-vontade para expressar sua voz e seu descontentamento com o mundo. com relação à literatura contemporânea, temos visto também, Ao narrar, eles também desdizem, desconcertam ideologias e desde os anos 90, uma facilitação no que tange às publicações e confrontam o leitor com novas formas de apreensão da à divulgação das obras lançadas. Com a ascensão dos meios de realidade, fazendo com que este se torne novamente capaz de comunicação virtuais e a disseminação de pequenas editoras, imaginar, pensar e agir mais livremente. Creio ser com essa qualquer pessoa pode atualmente publicar seu próprio trabalho consciência que grande parte de nossos escritores atuais tem se 71 dedicado a trabalhar. As obras instigantes de muitos autores da progressão de regime de cumprimento de pena, mesmo tendo geração 90, por exemplo, são fontes inexauríveis de cometido um crime hediondo (atentado violento ao pudor). Tal questionamento quanto a problemas como violência, miséria, corpus tem por finalidade, por ser um voto do relator do consumismo, solidão, insatisfação, falta de esperança, enfim, processo, direcionar o entendimento dos outros Ministros esses temas que permeiam toda a realidade brasileira atual. A acerca da matéria questionada. Portanto, diversas são as literatura contemporânea tem muito a dizer e, como os fins estratégias argumentativas passíveis de serem utilizadas para a justificam os meios, ela tem se valida dos mais variados consecução desse objetivo primaz, e tais estratégias são os recursos para reivindicar seu lugar dentro da cultura capitalista, focos principais da pesquisa, principalmente o entendimento de reivindicar o seu lugar ao sol e não ter sua voz calada. como tais estratégias surtem efeitos nos receptores da mensagem, no caso, do voto. Por ser um assunto envolvido A linguagem Jurídica numa Perspectiva Pragmática: análise de numa aura de comoção popular, pois a sociedade repudia Texto do STF veementemente crimes de tal natureza (hediondos), o objeto Daniel de Mello Massimino (PG/UFMS) adquire uma importância ainda maior, pois a aceitação ou não dos argumentos do relator pode gerar uma convulsão social, O trabalho tem por escopo analisar questões pragmáticas no tendo em vista que o que ocorre nesse caso é a aceitação dos discurso, lançando um olhar sistematizado sobre o sistema argumentos do paciente do habeas corpus pelo relator. Ou seja, lógico-argumentativo que permeia as construções textuais o relator deferiu um pedido que contraria frontalmente os jurídicas, utilizando-se para esse mister de um voto do Ministro anseios da sociedade, que cada vez mais quer os criminosos Marco Aurélio de Mello, relator do habeas corpus 82.959, atrás das grades e, em alguns casos, mortos. A atitude do impetrado junto ao Supremo Tribunal Federal por Oséas de relator em pronunciar-se contra uma vontade praticamente Campos, presidiário que objetivava para si ver garantida a geral da sociedade foi embasada em argumentos contundentes, 72 o que pode ser configurado por, ao final, ter conduzido de fato vocabulário textual utilizado. A integração do componente o julgamento da matéria que houve por proporcionar ao pragmático na investigação lingüística é sustentada pelas obras condenado a progressão de regime de cumprimento de pena, de Oswald Ducrot (1987) e seus seguidores. Por seu turno, os mesmo tendo ele cometido um crime hediondo. A metodologia grandes filósofos gregos são base para a interpretação da lógica da pesquisa nesse trabalho baseou-se primeiramente na jurídica em suas mais variadas vertentes. Justifica-se tal lócus realização de recortes teóricos que subsidiassem a delimitação de pesquisa principalmente pela desconstrução das barreiras das áreas abrangidas, levantando-se, em seguida os enunciados disciplinares advindas da pós-modernidade contemporânea textuais que permitissem a aplicação das referências teóricas e (JAMESON, 2004). A vivência eminentemente disciplinar caiu conseqüente verificação do pressuposto de base da pesquisa, por terra, dando lugar a um espaço de multiculturalidade e que é o posicionamento das construções lógico-argumentativas transdisciplinaridade, em que o entendimento das questões como necessárias à produção do discurso jurídico plenamente transcende a órbita centrista das teorias isoladas. Para persuasivo. Segue-se uma leitura crítico-analítica do objeto do entendermos um corpus como o apresentado nessa pesquisa, trabalho, confrontando-o, primeiramente, com a bibliografia, e, tem-se que haver a convergência de diversas disciplinas que, a em segunda análise, com os dados sobre o pensamento social. um primeiro olhar, quem sabe oblíquo e dissimulado, nada Tais operações teóricas tiveram como suporte principal as detém em comum, mas que acuradamente percebido, obras de Michel Foucault (2006), principalmente na questão da consubstancia-se numa impossibilidade de dissociação e não- verificação das relações entre os poderes e as verdades contidas intervenção de disciplinas deveras distintas, como filosofia, no discurso-objeto de análise. A microfísica do poder latente no lingüística, sociologia e direito, mas ao mesmo tempo Pretório Excelso é pressuposto de qualquer análise efetuada em indissociáveis. seus textos. As formas de exclusão do receptor do discurso somam-se às análises, em particular no entendimento do A Linguagem do Direito 73 Paula Abrão da Cunha (G-UEMS) Quintus Terentius Afer foi um comediógrafo latino do século II a.C.Sua vida foi breve (morreu aos trinta anos, provavelmente Este trabalho tem como objetivo o estudo da linguagem jurídica vítima de um naufrágio) e sua obra pequena (apenas seis na sua forma mais expressiva: a argumentação. Desde a Grécia comédias). Contudo é considerado um dos maiores poetas de antiga este assunto vem sendo abordado, porém, por ser uma seu século por causa de sua técnica. Sua obra, assim como toda discussão do campo filosófico, toma corpo atualmente. O a comédia romana, remete a comédia nova grega, tipo de drama estudo em questão aborda o ato de argumentar e seus principais desenvolvido a partir do final do séc. III a.C. em Atenas. Seus pilares: o locucionario, o ilocucionario e perlocucionário. O principais modelos foram as Comédias de Menandro e estudo torna-se relevante, por discorrer sobre a argumentação Apolodoro de Caristo. Nossa pesquisa consiste na análise do nas ethos ciências jurídicas demonstrando construções discursivo nos prólogos de suas comédias. argumentativas empregadas através de jogos de palavras, sem Diferentemente dos poetas de até então, que usavam o prólogo esquecer da questão da verdade que vai ter valor diferenciado para introduzir o argumento da peça para espectador, Terêncio quando falamos em Linguagem e em Justiça. E conclui-se usa-o para defender-se de acusações de um poeta rival, levando em conta o poder que o bom operador da língua pode evocando uma cenografia do tribunal. Fiando-se na figura do exercer em vários momentos do profissional das ciências velho advogado, o enunciador instaura no discurso o ethos do jurídicas no júri, bem como no cotidiano do falante comum. poeta que agrada ao povo, que versa boas comédias em latim a partir de modelos de boas comédias gregas. Mesa 5 O Bom e o Mau Poeta: o ethos nos prólogos de Terêncio A Reciclagem de Discursos em Quarto de Desejo, de Carolina Nahim Santos Carvalho Silva (PG/USP) Maria de Jesus Letícia Pereira de Andrade (PG/UFMS/CPTL) 74 trabalho, analisar e descrever a realidade da leitura no ensino A finalidade dessa comunicação é discutir a problemática fundamental em escolas de Dourados (MS). A discussão é acerca da tensão produzida por variações de discursos, que ampla e necessária e se faz presente, principalmente, na cedem forma à experiência narrativa do “poeta trapeira”, da realidade escolar, pois entre tantas funções atribuídas à escola, “poeta do lixo” Carolina Maria de Jesus em seu diário “Quarto esta se apresenta, necessariamente, como fundamental. de Despejo” (1960). A escritora reciclava lixo para comer, assim como reciclava discursos em sua poética dos resíduos. História Concisa da Leitura no Mundo Ocidental Dessa forma, renova, por tentar administrar, e reestrutura um Valter Ribeiro dos Santos Junior (G-UEMS) novo sentido para nosso sistema social no campo da arte escrita. Nosso trabalho visa apresentar uma visão geral sobre a história da leitura e sua evolução. Para a realização de tal tarefa Mesa 6 procuramos fazer um pequeno resumo das condições de leitura A Leitura no Ensino Fundamental desde a Grécia antiga até os tempos atuais. Nesse caminho, Emílio Davi Sampaio (UEMS) procuramos mostrar não só a questão da leitura, mas também, o contexto cultural de cada período, a situação dos escritores, do Ler, sem dúvida alguma, é um ato de profunda solidão. Mas, livro em si, ou seja, buscamos dar uma visão mais geral do que uma solidão de encontro consigo mesmo. A leitura é reveladora simplesmente falar sobre leitura. Assim, o presente trabalho na medida em que se estabelece um diálogo silencioso com o focaliza de modo amplo sobre como a leitura veio se texto. Sabe-se que não se pode questionar a importância da desenvolvendo desde os seus primórdios, buscando, com isso, leitura para a formação humanística de um cidadão. E por onde criar um contraponto para que seja possível uma melhor e como começar? Em razão disso, pretende-se, com este comparação com a situação da leitura nos tempos atuais. 75 A leitura é um dos maiores bens da humanidade. Ela é quem Apelo Sócio-Cultural da Leitura determina e possibilita que um indivíduo se torne um cidadão Rosimar Francelino da Silva (UEMS) apto a desenvolver habilidades como: ler, escrever, falar, entender. A prática de leitura proporciona ampliação de Este trabalho tem por objetivo investigar e demonstrar a horizontes, apropriação de conhecimentos, além disso, ela realidade da leitura no ensino fundamental, em escola de também pode ser vista como lazer e diversão, como um objeto periferia da cidade de Dourados. Pesquisamos o que os alunos de distração, prazer e mais que isso, de enriquecimento lêem, para quê e com que freqüência e, ainda, o nível de cultural. No entanto, há circunstâncias em que a leitura não é importância que os alunos atribuem a este ato. Antes de ser um vista como objeto de prazer e sim como requisito necessário meio de proporcionar prazer, a leitura é um importante para aquisição de “um bom lugar ao sol”, ou seja, um meio instrumento de ação social e cultural para todas as pessoas. A para se conseguir um bom emprego e uma melhor condição de leitura cumpre papel político importante na formação de um vida. Diante disso, esta pesquisa pretende analisar e descrever a cidadão competente, crítico e participativo. O resultado de realidade da leitura no ensino fundamental, em escola pública nossa pesquisa aponta que os alunos, na sua maioria, gostam de da cidade de Dourados (MS). ler; não o fazem por falta de incentivo, apesar de acreditarem que a leitura é realmente importante para a vida social de cada Mesa 7 indivíduo. Linguagem: arco e flecha na caça ao sentido Adilson Crepalde (UEMS) Os Benefícios da Leitura Elizabete Maria dos Santos (G-UEMS) Este trabalho consiste em uma reflexão sobre o discurso indígena Kaiowá e Ñandeva, elaborados e pronunciados nas aty 76 guasu, assembléias indígenas, objetivando chamar a atenção amigavelmente dentro de duas Aldeias: a Bororó e a Jaguapiru. para algumas Trata-se de três etnias, os Kayowá, os Guarani e os Terena, considerações sobre possibilidades interpretativas e sobre cada uma com sua língua nativa. Partindo de estudiosos da aplicação de categorias e constructos analíticos na análise desse formação da identidade como Stuart Hall, este trabalho esboça discurso. As reflexões enfatizam a importância do olhar algumas reflexões acerca da constituição da identidade étnica etnográfico, de conhecimentos históricos e antropológicos para indígena dessa comunidade. Esse tema torna-se polêmico por si a análise do discurso indígena. Chamam a atenção para a só, uma vez que o indígena que convive de forma muito estreita política indígena como base para a construção dos modos de com os não-índios, muitas vezes até na dependência econômica ser dos referidos grupos étnicos bem como a importância de se destes, acaba por ver diluída sua identidade de “ ser índio”, pois compreender a dinâmica dessa política em qualquer análise. sua cultura, seus costumes e até sua língua vão sendo Este trabalho destaca, ainda, as transformações históricas pelas paulatinamente substituídas pelos dos não índios, resultando quais passaram esses grupos étnicos e a utilização da num povo sem referências firmes, contundentes. A linha que linguagem como instrumento de luta na construção e separa o índio do não-índio vai se atenuando sem que se manutenção de seus modos de ser. perceba em que momento a etnia vai cedendo lugar a a complexidade desse discurso, fazer conveniência. Após pesquisa de campo, através de entrevistas A Fragilidade da Identidade Indígena numa Comunidade com os indígenas in loco percebe-se que os próprios índios Próxima a um Centro Urbano carregam muitas dúvidas com relação a essa questão: em que Sandra Espíndola (UEMS) situação eles devem resgatar sua identidade e em quais essa identidade deve ser esquecida, em favor de se ter alguma Os índios da Reserva Francisco Horta Barbosa, localizada no Mato Grosso do Sul, próxima à cidade de Dourados, convivem vantagem ou não disso. 77 PALAVRAS-CHAVE: Identidade Lingüística. Cultura e elite encarregaram-se de elaborar e reproduzir via práticas Identidade. discursivas às regras de convívio social. Apontamentos sobre Violência, Relações de Gênero e Análise O Guarani e sua Relação com a Identidade Cultural da América Crítica do Discurso do Sul Tânia Regina Zimmermann (PG/UNIPAR/UEMS) Nádia Nelziza Lovera de Florentino (G/FINAN) Nas décadas de 1960 a 1990 percebe-se na imprensa do Oeste Mesa 8 do Paraná uma ênfase em enaltecer os municípios através da As Múltiplas Linguagens na Análise de Fontes Históricas imagem de cidades progressistas, associadas ao caráter ordeiro, Maria Neusa G. Gomes de Souza (CPCX/UFMS) harmônico, pacífico e trabalhador de seus habitantes. O processo de urbanização e de adensamento populacional Este trabalho faz parte de um projeto de pesquisa maior, contribuiu para o crescimento de tensões no cotidiano da cidade desenvolvido na UFMS; intitulado: Multiculturalismo e e nas áreas rurais. Tensões estas também presentes nas relações identidade cultural; da linha de pesquisa; educação, psicologia de gênero e que nos são percebidas em jornais, revistas, e prática docente do Mestrado e Doutorado em Educação. Este boletins de ocorrência e nos processos crimes que envolveram ramo do projeto se preocupa com a constituição da identidade mulheres e homens nas suas tramas.Comportamentos vistos dos educandos Coxinenses, questionando sobre o papel da como desviantes da ordem instituída poderiam destruir a riqueza cultural existente no município e a aplicação desta na imagem das belas, ordeiras e civilizadas cidades do interior do formação da identidade individual. Este Estado é caracterizado Paraná. Para esta tarefa o judiciário, a imprensa e os grupos da por suas fronteiras com 5 Estados brasileiros, São Paulo, Minas Gerais, Mato Grosso, Goiás, Paraná; e duas fronteiras com 78 países da América latina; Paraguai e Bolívia; então já se história com uma lógica própria de interpretação como diz imagina a magnitude cultural, as tradições, os costumes, as Thompson, e com a História Nova, Le Goff esclarece sobre o músicas, alimentos, artes, vestuários, linguagem, sotaques, campo da historia cultural e das mentalidades; as artes e lendas e muito mais; que influenciam na educação e formação literatura como novas abordagens, novos problemas, novos dos jovens estudantes, nosso alvo na pesquisa. Nos preocupa a objetos de estudo. As artes e literatura se transformam em possibilidade da negação de tais influências,para uma educação documentos históricos que trazem um discurso, um sentido e única, que trata os alunos como iguais, como têm ocorrido em significados próprios da sociedade a ser desvelada, produzidos muitos lugares. Objetivamente a pesquisa se desenvolve com como expressão de uma época; que resgatada, e inserida na uma metodologia de trabalho, visando a história social das contemporaneidade representações. O local, o Centro de documentação histórica e identidades cristalizadas na ignorância da riqueza cultural de Memorial Henrique Spengler em Coxim; que preserva objetos uma região como esta. contribui para a metamorfose de antigos da região pantaneira, obras de arte na temática Kadiwéu, esculturas, jornais, livros e outras representações da Uma Abordagem Semiótica do Texto da Canção “Onde Estará cultura. Pesquisamos o papel da cultura, limitada a arte, história o Meu Amor” Chico César e literatura; como a manifestação da arte kadiwéu de Henrique Rosemeire de Almeida Aguero (PG/UEMS) Spengler, na história da participação dos índios Guaicurus na guerra do Paraguai, o resgate dos objetos pantaneiros Este estudo trata da análise semiótica das paixões expressas na preservados e as perspectivas analíticas da literatura regional. letra da canção ‘Onde estará o meu amor’, do compositor Chico Iniciaremos selecionando o material elencado analisando a sua César. A análise utiliza como opção teórica os estudos representação social e questionando professores sobre a semióticos desenvolvidos por A.J.Greimas e seus seguidores, reflexão deste material no cotidiano escolar. Conceituamos a por se constituir em um instrumento teórico que privilegia a 79 investigação de textos escritos. Partindo desse princípio, a investigação busca identificar a estrutura mais profunda do investigação considera os três níveis de complexidade do texto, no sentido de explicitar as categorias de natureza percurso gerativo de sentidos proposto por Greimas: a estrutura existencial, antonímicas, a partir das quais se constrói o sentido fundamental, a estrutura narrativa e a estrutura discursiva do do texto analisado. Reconhece-se a oposição semântica entre texto, que correspondem, respectivamente, à passagem do nível duas categorias que podem ser representadas por meio das mais abstrato (estrutura fundamental) ao mais concreto expressões solidão versus comunhão, fundamentadas nos (estrutura discursiva). No nível das estruturas narrativas são valores do amor romântico. Dentre essas categorias a solidão consideradas as relações entre o sujeito e o objeto, analisadas apresenta natureza disfórica e o desejo do sujeito passional por sob o enfoque da semiótica das paixões, que se caracterizam um retorno ao estado de comunhão,por conseguinte, natureza pelo desejo do primeiro em relação ao segundo. Essa relação no eufórica. No texto reconhece-se, ainda, que embora manifeste o texto se manifesta por meio de um sujeito passional que se desejo de passar do estado de disforia para o de euforia o encontra em estado de disjunção em relação ao seu objeto sujeito passional permanece em um estado de espera, de amoroso e anseia pelo objeto-valor, representado pela plenitude inércia. Quanto à estrutura discursiva, última etapa da análise - amorosa. O texto não apresenta a seqüência canônica completa identificada ao patamar mais superficial do texto - nela são do percurso gerativo de sentidos, representada pelas fases de investigados manipulação, competência, performance e sanção, propostas figurativização, por Greimas. A letra se restringe à fase de manipulação onde o interdiscursividade e polifonia. Percebe-se a existência de um sujeito passional assume o papel actancial de destinatário, narrador implícito que, por meio de estratégias discursivas achando-se modalizado por um querer-ser. Falta-lhe, todavia, o constrói um efeito de debreagem enunciativa entre o narrador e poder-ser e o poder-te o que gera a paixão da angústia e da os intranqüilidade presentes no texto. No nível fundamental a proximidade e de intimidade compartilhado entre ambos. processos como os de temporalização, leitores-narratários, caracterizado tematização, espacialização, pela sensação de 80 Observa-se, ainda, a reiteração de certos simbolismos visuais personagem principal do filme “O Senhor das Armas (Lord of interpretados como conectores de isotopias, representados pela War redundância de traços figurativos presentes na letra da canção. interdiscursivas entre o que é dito pelo protagonista e o que O discurso dominante na letra é o do romantismo e nele se deprendemos de alguns outros discursos bem marcados percebe a tecitura dialógica de várias vozes culturais, entre o (literários, filosóficos) que à princípio parecem construir uma discurso do narrador e outros textos românticos, expressos mesma formação discursiva, ou, pelo menos assemelham-se em tanto na temática escolhida quanto na imagística adotada. Essa superfície. Se para um dos ramos da Análise do discurso, a AD- opção afirma o primado do intertextual sobre o textual, 2, o sujeito constitui-se enquanto uma função e ele pode estar presente na letra. O estudo está limitado apenas ao plano de em mais de uma, atentamos para o fato de que os indivíduos conteúdo, que se reflete na linguagem escrita, descurando de deixam transparecer em seus discursos aquilo que fazem no outras substâncias de expressão passíveis de serem analisadas mundo de suas práticas cotidianas. Desse modo, o discurso do na canção. A escolha do corpus se justifica por ser um texto personagem (Iuri Orlov) traz as marcas de sua profissão que possibilita investigar o ser do sujeito e os efeitos passionais (traficante de armas) mescladas às outras que o significam produzidos em seu discurso. enquanto um homem ambicioso, de negócios etc. Ao longo do 2005) com o intüito de estabelecer relações filme assiste-se as conseqüências das reflexões e práticas “O Senhor das Armas” (Lord of War) Discurso Cínico ou individualistas que caracterizam tal personagem. Ao pensarmos Beligerante? que a noção atual que temos de individualidade pode estar Eusvaldo Rocha Neto (CE/UEMS) relacionada “à quebra de alguns valores de ordem social, econômica e religiosa medievais”, pode-se conjectuar que o “O Senhor das Armas (Lord of War) – Discurso Cínico ou individualismo Beligerante?” Este trabalho propõe-se a estudar o discurso do caracterizam uma deflação dos elementos expostos acima. extremado e anti-ético do protagonista 81 Assim, quando da sua opção pelo mundo do crime, fica patente aos membros de seu grupo social. Podendo ser ela um fator a recusa de um modelo moral e a adoção de um outro que nos extremamente importante na identificação de grupos, em sua seus limites deixa transparecer os fatores reativos do seu configuração, como também uma possível maneira de demarcar comportamento, que ao tentar enunciar a sua “verdade” acaba diferenças sociais no seio de uma comunidade. Sendo a língua por fazê-la como um jogo de palavras ou um simulacro. falada o veículo lingüístico de comunicação usado em situações Atentando-se ao fato de que o referindo filme tenta fazer uma naturais de interação social do tipo comunicação face a face, o denúncia da sociedade capitalista no que ela tem de mais cruel: presente trabalho pretende colaborar para que os indígenas da a venda de um meio com o qual os poderosos silenciam os ou etnia Guarani e kaiowá da aldeia Jaguapirú de Dourados MS eliminam os mais fracos. Percebe-se que o discurso de seu aprendam a língua portuguesa formal, uma vez que a ausência personagem central, apesar de denunciar e provocar reflexões desta está ocasionando a exclusão desses indígenas que estão traz à tona a sua contraparte, ou seja, a noção pré-concebida de tentando uma vaga na Universidade Estadual de Mato Grosso que a guerra é inerente à espécie humana. Assim, ele nada faz de Sul (UEMS), também cabe ressaltar aqui as dificuldades de para impedi-la ou evitá-la e, até dá a sua contribuição para o comunicação que os estudantes indígenas que já estão ingressos estado de caos mundial. na universidade estão sofrendo, uma vez que seus colegas de sala e professores são falantes da língua portuguesa. Fato este A Possível Exclusão das Comunidades Indígenas Ocasionada que dificulta sobremaneira a entrada e permanência dos alunos pelas Diferenças Lingüísticas indígenas, pois um bom número deles recebeu as primeiras Michele Aparecidade Sá instruções em guarani, sua língua mãe, ficando o português como segunda língua, a qual usam para negociar com os não- A aprendizagem lingüística sendo ela a aprendizagem de um índios em situações específicas. Além disso, o português falado discurso, cria uma consciência verbal que une cada individuo por eles é uma variação da língua padrão que recebeu 82 influência da língua guarani. Esses e outros fatores fazem com seguida serão analisadas as redações do vestibular da que surjam dificuldades no domínio do português formal que Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS) do ano vêm contribuindo para a exclusão de indígenas do ensino de de 2006, para verificar as dificuldades recorrentes que muitas terceiro grau por várias razões, destacando-se entre elas os vezes podem ser explicadas pelas diferenças gramaticais das motivos em decorrência da exclusão lingüística. O vestibular, línguas, como questões de diferença de gênero (típico da língua porta de entrada na universidade, só permite que passe por ela portuguesa, aqueles que dominam o código lingüístico padrão da língua evidenciado em estudos anteriores), conjugação verbal e outras, portuguesa. Em decorrência desse fato o objetivo maior desse que por sua vez dificultam o aprendizado da língua portuguesa projeto é o de propor a aplicar conhecimentos lingüísticos para formal. Dessa forma as dificuldades das redações serão compreender e ajudar a solucionar um problema de ordem analisadas para posteriormente começar a elaboração de social que consiste na inclusão e permanência de indígenas na materiais universidade, ou seja, disponibilizar conhecimentos lingüísticos recorrentes para que os indígenas tanto da aldeia Jaguapirú sobre as diferenças entre a língua guarani e a língua portuguesa como universitários indígenas da UEMS possam ter acesso à para a confecção de material didático como instrumento esse material para compreenderem a língua portuguesa e facilitador da aprendizagem formal de língua portuguesa, incluir-se destinado aos atores sociais desses grupos étnicos, falantes da consequentemente, aumentar sua participação nas atividades língua guarani. Para a execução desse projeto será analisada a acadêmicas sem que percam sua identidade lingüística e gramática das duas línguas, ou seja, a da língua portuguesa e cultural. porém didáticos, de ausente que forma na língua enfatizarão satisfatória, guarani, essas para como dificuldades que guarani, para que se torne possível uma compreensão da estrutura gramatical de ambas as línguas, isto é, verificar os Mesa 9 fatores que distanciam e aproximam uma da outra. Logo em Literatura como Expressão do Sentimento (semiótica) possam 83 Geane Carla Di Benedeto (G/FINAN) Tendo por base as narrativas orais do interior nordestino nos Deborah Negrine Ântico (G/FINAN) idos de 1750, a tragédia de Dias Gomes intitulada “O Santo Inquérito” traz como temática as torturas praticadas pela Igreja Este projeto está direcionado ao Ensino Fundamental, visando católica no século XVIII. Este foi o recurso utilizado por Dias despertar e, Gomes para denunciar a censura pelo qual passaram muitos consequentemente, ao hábito de leitura, através do estímulo brasileiros durante o período militar iniciado na década de 60 visual; estímulo este que emergirá sentimentos que antes se vindo a perdurar por mais de vinte anos. Trazendo como encontravam em estado de torpor. A prática da leitura visual personagem principal Branca Dias, o enredo da peça é marcado servirá como instrumentos para emergir sentimentos e por um jogo de interpretação e ambigüidade (entre o que afetividade, levando o educando a externar sentimentos, Branca via como verdade e o que o Padre via como verdade) e ocasionando na produção escrita. Familiarizado com a escrita, o conflito entre a oikos e polis se estabelece, pois ela passa a o educando sentirá maior interesse em ler empregando o seu rever tudo o que conhecia como verdade a luz de uma nova potencial criativo e ativo no processo de aquisição da leitura e interpretação, daí vai surgindo-lhe o reconhecimento. Branca produção textual, que são tarefas essenciais e principais no então é acusada de heresia e seu pai e noivo presos pelo Santo processo de educação. Ofício. Mas a acusação e o acusador lhe são desconhecidos. o interesse dos educandos pela escrita Sendo submetida a um inquérito, vai percebendo as razões de Rastros do Trágico na Obra “O Santo Inquérito” de Dias ser acusada mesmo, que de maneira ambígua, e não se Gomes considera culpada. A origem judaica que possui e a ação de Ilma Benício Tavares (G/UEMS) salvamento de Padre Bernardo a condenam. Neste ínterim seu Priscila Mendes Daosico (G/UEMS) noivo, não suportando a tortura é morto. Seu pai condenado a carregar uma cruz e ela segue para fogueira. Nesse sentido, o 84 presente trabalho visa apontar os aspectos trágicos encontrados restaurar a consciência heróica de Portugal escrevendo nos na referida obra de Dias Gomes, a partir da definições da Anais da Literatura a estória da Torre de um de seus avos, Professora Adelaide Caramuru César em “O trágico enquanto Trutesinho Ramires, comprovando na sua narrativa o objetivo marca do texto literário”. deste trabalho. Gonçalo Mendes Ramires – Personagem com Metáfora na Mesa 10 Obra de Eça de Queiroz A Importância de Contar História nas Escolas Liane da Silva Militão (G-UEMS) Alaíde Pereira Japecanga Aredes (UEMS) Michelle Cristianne de Souza Gonçalves (G/UEMS) O presente trabalho teve como objetivo a analise do Rosemeiro Maziero Fernandes (G/UEMS) personagem principal do livro A Ilustre Casa de Ramires, Gonçalo Mendes Ramires, da obra A Ilustre Casa de Ramires, O ato de contar histórias ou estórias é de suma importância para do romancista e prosador Eça de Queiroz numa perspectiva o desenvolvimento integral das pessoas. Inclusive vale salientar histórica social da trajetória do personagem, que se espelha a que se trata de um processo onde a alma é tranqüilizada. A mesma de seu pais, Portugal. No romance ha o melhor estilo criança tem a oportunidade de desenvolver sua capacidade de queirosiano em todas as suas oscilações, fruto do desejo sincero atenção e de compreensão das palavras faladas, por isso é de compreensão profunda do destino português e das fundamental que o contador de história seja alguém bem possibilidades de superação do sentimento decadente de sua humorado, que se identifique com as crianças e sua classe pátria. Nas representações das tenções ideológicas do Realismo social, que tenha realmente a intenção de ajudá-las a construir Português, pela ânsia de intervir na realidade, o autor apresenta sua personalidade e caráter. Estes elementos são importantes no um personagem, Gonçalo um jovem fidalgo que deseja desenvolvimento da escrita e da leitura. Desta forma, o projeto 85 ora apresentado pretende unir-se à escola, bem como ao projeto validade a sentimentos importantes, promoverão percepções com o qual estará conectado no alcance destes objetivos, ou internas, alimentarão esperanças, reduzirão ansiedades e com seja, propiciar de fato o gosto pelos livros. Para contar uma isto enriquecerão a vida da criança no momento, e daí para história, é bom saber como se faz. Nela se descobrem palavras sempre. Os contos de fadas, à diferença de qualquer outra novas, se entra em contato com a música e com a sonoridade forma de leitura, dirigem a criança para a descoberta de sua das frases, dos nomes, contar histórias é uma arte, pois encanta identidade e comunicação, e também sugerem as experiências criança de todas as idades. Contar histórias é trabalhar com a que são necessárias para desenvolver ainda mais o seu caráter. imaginação da criança, pois a partir do momento que essa Porque os contos de fadas declaram que uma vida criança começa a ouvir as historias, sua mente está voltada para compensadora e boa está ao alcance da pessoa, mas apenas se os problemas dos personagens dessa história, e como esses ela não se intimidar com as lutas do destino, sem as quais personagens enfrentam esses problemas, então, a criança nunca se adquire verdadeira identidade. começa a perceber que todas as pessoas encontram obstáculos em suas vidas e que ela não está sozinha, podendo assim Mesa 11 superar suas dificuldades em se relacionar com outras pessoas e Análise da Conversação tentar encontrar o caminho para se tornar um sujeito mais feliz. José Amorim da Silva (G/FINAN) Ouvir histórias e incorporar as imagens que ela apresenta pode ser comparado a espalhar sementes, onde só algumas ficarão As pesquisas mais recentes na área de interação verbal definem implantadas na mente da criança. Algumas ficarão trabalhando a linguagem como ação conjunta, na qual as pessoas interagem na sua mente de imediato; outras estimularão processos no seu realizando ações individuais e coordenadas entre si. Usar a inconsciente. Mas as sementes que caíram no solo certo se linguagem é, portanto, realizar ações individuais e sociais. A transformarão em lindas flores e árvores robustas, isto é, darão conversação é um exemplo de uso da linguagem ao qual 86 estamos adaptados desde as primeiras falas, na inffincia; é por meio da conversa, de fazer associações, de assimilar meio dela que podemos interagir com outras pessoas no meio informações, e mesmo de obter conhecimento. A Análise da social, convidar para conversar, comentar fatos, dar notícias. Conversação baseia-se em conversas que são gravadas e depois Os outros meios de comunicação / interação que surgiram, transcritas, para então serem analisadas. Estas transcrições como e-mail, telefone, mensagens via SMS e chats na Internet, devem ser totalmente fiéis ao áudio que foi gravado, sem sofrer por mais eficientes e rápidas que sejam, ainda não superaram qualquer alteração por parte da pessoa que o irá analisar. Além em preferência e relevância a conversação. Devido à dos aspectos referentes a palavras, também devem ser anotados importância que tem na vida social do ser humano, a nas transcrições gestos e/ou expressões que possam contribuir conversação mereceu um estudo específico dentro da para a construção de sentido de determinada frase. Conversas lingüística moderna, sendo a Análise da Conversação a cotidianas são repletas da mistura do verbal ao não-verbal. responsável por tal estudo. No Brasil, o primeiro autor a Nesta análise, são evidenciados os mínimos detalhes da abordar a Análise da Conversação dentro da Lingüística foi o conversação, como mudança de tom de voz, superposição de professor Luis Antonio Marcuschi, na década de 80, com seu vozes, livro Análise da Conversação. Segundo o autor, “ela interrogação, entre outros. Estes segmentos são identificados na [conversação] é o exercício prático das potencialidades transcrição por meio de sinais estabelecidos por uma norma cognitivas do ser humano em suas relações interpessoais, padrão, característica da Análise da Conversação. O objetivo da tomando-se assim um dos melhores testes para a organização e análise é descobrir como a conversa se organiza, como se funcionamento da cognição na complexa atividade da organizam as seqüências da conversação, são analisados os comunicação humana”. Ou seja, no ato da conversação, o ser marcadores conversacionais e o porquê da existência deles no humano tem a chance de explorar o seu potencial cognitivo, de diálogo, e descobre-se como se constrói a compreensão no organizar as idéias de acordo com as informações trocadas por texto falado, esta última dividida em cinco etapas: negociação, simultaneidade de vozes, citações, silabação, 87 construção de um foco comum, demonstração de (des)interesse inovação na área midiática, constata-se que o veículo e (não)partilhamento, existência e diversidade de expectativas e comunicativo marcas de atenção. Logo, o objetivo desta comunicação será atualmente é a televisão. Seria imprudente definir uma única esclarecer ao público sobre os meandros da Análise da forma que sobrepusesse as demais quanto à difusão de Conversação, e mostrar a eles que a simples conversa do dia-a- ideologia, mas com certeza , a propaganda é uma delas. Com dia é também um interessante objeto de estudo, e que portanto tamanha audiência a televisão passou a visar principalmente o não poderia passar despercebida pela Lingüística. mercado consumidor, tendo como objetivo sua sustentação mais acessado pela população brasileira empresarial e a lucratividade. Fica evidente a conseqüência da Um Estudo Ideológico de Alguns Discursos Midiáticos amplitude que tomou a mídia televisiva. Ela atinge várias classes sociais e acarreta numa alienação associada ao desejo Televisivos consumista; influi tão fortemente nas pessoas fazendo com que Olga Talita Furlan Mazzei (FAIS) elas fiquem envolvidas, mudem de opinião, de gosto, de O mundo está entrelaçado pela comunicação moderna. Temos o sujeito a serviço da linguagem e esta a serviço do sujeito. Tivemos muitas mudanças em relação a informação e interação comunicativa: a distância diminuída, as pessoas aproximadas, imagens e notícias em tempo real e a linguagem passou a ser estudada como ciência. A mídia se tornou organizadora e divulgadora de discursos. Cabe a ela propagar ideologia, enriquecer conhecimento, produzir, reproduzir, inventar situações e mundos imaginários. Apesar de tanta tecnologia e comportamento, exercendo assim sua função social. A linguagem usada nos discursos midiáticos de cunho publicitário, é uma linguagem sedutora que manipula os receptores. Em se tratando de mídia televisiva, conta-se ainda com imagens e sonoridade, que com certeza envolvem os telespectadores de acordo com os objetivos dos anunciantes. Essa transmissão tende na maioria das vezes a persuadir o ouvinte através do convencimento porém, esse processo pode ter efeitos deturpados. Ao proporcionar a circulação de uma 88 propaganda a determinado público alvo, o discurso pode, além descontrole diante de um “sonho de consumo”. Numa de convencer algumas pessoas, indignar tantas outras. É o que sociedade que busca a reabilitação de pessoas que foram acontece quando percebemos a existência de um discurso excluídas socialmente, como presidiários neste caso, a discriminatório, ou que incite a violência, ou que ainda explora propaganda contribui para a ampliação das idéias de determinada proposta discriminação. Dessa forma, propõe-se neste trabalho analisar publicitária. Pode ser que o anúncio consiga atingir até que ponto esta sedução pode ser considerada apenas como positivamente alguns consumidores, que se mantém passivos e um recurso persuasivo, visto que muitas propagandas trazem ingênuos diante da publicidade veiculada, todavia, deve-se ter a ideologias implícitas e algumas delas podem ser consideradas pretensão de se tornar telespectadores críticos e capazes de como prejudiciais à sociedade, uma vez que promovem identificar os fatores históricos, sociais e econômicos desrespeito, submissão e injustiça. responsáveis pela produção do discurso. Nesta comunicação Palavras-Chave: Discurso, Mídia, Ideologia. classe social, em determinada realizamos uma possível leitura, baseada na perspectiva francesa de Análise do Discurso, de um texto veiculado na Discurso e Charges mídia, mais especificamente de uma das propagandas da Cleide Pires de Moraes (G/UEMS) Fábrica de automóveis Fiat. Tratava-se de uma campanha publicitária do veículo Pálio. A propaganda televisiva mostrava A linguagem é um elemento distinto do ser humano em relação um ex-presidiário saindo da cadeia e deparando-se com um aos outros seres vivos. Pálio estacionado na rua. A imagem então ficava escura e interpretar em seu meio, seja através da fala, da escrita ou escutava-se o barulho de quebra de vidro e aparecia a frase através da arte, tornando-se capaz de construir críticas e “ninguém resiste ao novo Pálio”. Os resultados dessas análises, expressar-se ideologicamente. Desde períodos pré-históricos, até o momento, apontam para uma visão de obsessão e sem a invenção da escrita, o homem interpretava a realidade O homem possui a capacidade de 89 produzindo um discurso relacionado num determinado contexto Mesa 12 histórico. A comparação desses fatos faz-se por meio das “Denis, O Pimentinha” Segundo as Teorias da Análise do pinturas rupestres encontradas em cavernas. “ Cada época e Discurso cada grupo social têm seu repertório de forma de discurso que Renata Borba Fagundes (G/UEMS) funciona como um espelho que reflete e retrata o cotidiano.” (Cardoso 1999, página 25). Assim o homem torna-se cada vez No presente artigo nos propomos a analisar um texto mais criativo fazendo uso dos diferentes discursos como pertencente ao gênero tira. A escolha de uma das tiras instrumento de comunicação entre os diferentes seguimentos entituladas “Dênis, o pimentinha” tem como justificativa a sociais. Portanto desenvolveremos um trabalho no qual se fará popularidade desse personagem, o que, conseqüentemente, nos uma análise de alguns discursos das charges de jornais, tendo permitiu um conhecimento prévio acerca de características como objetivo de estudo um tipo de linguagem contida nas comportamentais de Dênis. Objetivamos fazer uma análise com charges, considerando os recursos da linguagem não-verbal, base nas teorias de alguns autores da Análise do Discurso (AD) relacionando efeitos de sentido, épocas, descrições de cenários, de linha francesa; sendo que esses autores nos nortearão ao objetos, sujeitos e “fatos” que compõe o contexto discursivo verificarmos aspectos ideológicos, de efeitos de sentido; das charges. Utilizaremos como corpus para este trabalho as enunciação e de condições de produção do texto escolhido. charges dos jornais: - Folha de São Paulo, 31 de janeiro de Como exemplo, citemos Cardoso (1999, p.51) que afirma que 2007, folha 02. “O Fertão: Deputados Usados.” - Folha de São as palavras, expressões, proposições mudam de sentido Paulo 05 de fevereiro de 2007 folha 02. “Adivinha quantos segundo posições sustentadas por aqueles que as empregam, o Deputados eu tenho na mão?” -Folha de São Paulo 29 de março que significa que elas tomam seu sentido em referência a essas de 2007 folha 02. “Segundo Escalão.” posições, isto é, em referência às formações ideológicas nas quais essas posições se inscrevem. Dessa forma, e posto que os 90 dois sujeitos principais da tira são a mãe e seu filho Dênis, como compreendem a realidade política e social na qual estão consideraremos tanto os aspectos da formação ideológica (FI) inseridos. A propósito, a comicidade contida na tira é gerada da mãe, que lhe determina o que pode e deve ser dito; bem pela locução prepositiva “em frente”, presente no seguinte como sua formação discursiva (FD), que determina o que ela trecho da fala de Dênis: “... tenho passado muito tempo em deve pensar. Verificaremos as condições de produção de seu frente à televisão”. Desse modo, percebemos também ser discurso materno dentro da sociedade brasileira- que lugar ela pertinente uma análise lingüística dessa locução, segundo as ocupa dentro dessa sociedade? Ou seja; para quem ela diz? propostas de Geraldi (2000). Visto que ao refletirmos língua Quem é ela para dizer o que diz? Quem é ele para que ela lhe também refletimos seus recursos gramaticais, buscaremos fale assim? Pois, segundo Mussalim (2001, p.123), a AD constatar como funciona essa locução, primeiramente dentro do considera como parte constitutiva do sentido o contexto discurso da mãe, e posteriormente, dentro do discurso do filho. histórico-social, ou seja, as condições em que o texto foi Que sentido cada um deles atribui a “em frente”? O sentido produzido. Já, com relação ao filho, partindo do nosso dado pela mãe é o mesmo dado pelo filho e vice-versa? Se não, conhecimento a respeito das peraltices do personagem Dênis, quais foram as conseqüências dessa atribuição de sentidos verificaremos os efeitos de sentido que o garoto dá à ordem que diferentes? ele recebe de sua mãe; analisaremos suas FD E FI e as comparar os funcionamentos da locução prepositiva em cada condições de produção do discurso do menino em seu lugar de um dos discursos a fim de compreendermos os processos de filho. Diante disso, responderemos à indagação: quais são as significação do item comicidade. Respondidas essas indagações, poderemos condições de produção que o levam a dar determinado sentido e não outro ao discurso de sua mãe? Uma vez que, para Fernandes (2005, p.22), os sentidos são produzidos em decorrência da ideologia dos sujeitos em questão, da forma Discurso e Identidade do Professor Construído pelo Aluno Vanda Lúcia Godoi Garcia Marques (G/UEMS) 91 Considerando a importância que o professor tem historicamente anglo-saxã, a Análise da Conversação, a Linguística Textual e a na construção e divulgação do conhecimento de diversas áreas Semiótica Narrativa e Discursiva. Não se pretende estabelecer do conhecimento. Considerando ainda os aspectos da história as diferenças entre as distintas teorias discursivas e textuais, de professores e sua influencia na aprendizagem de seus mas buscar estabelecer, de maneira prática e crítica, o percurso alunos, analisaremos nesta pesquisa o discurso de construção de uma delas = a Semiótica Narrativa e Discursiva, aplicando-a da identidade do professor de Letras pelos alunos. Desde a na análise da iconografia representativa sul-matogrossense, antiguidade, os relatos da influência/importância do professor buscando estabelecer um significado para esses signos, sobre seus alunos, nos leva a refletir como o aluno identifica o relacionados ao processo de identidade do sul-matogrossense. professor. Quais características? Quais discursos? Quais Nas imagens (iconografia), as evidências explicitam uma sentidos? Assim o objetivo e analisar como o aluno “vê o ideologia, ocorrendo aí a isotopia que, para Greimas, define os professor hoje”, a construção da imagem sua representação da mecanismos reguladores para fazer de um enunciado ‘uma identificação construída na interação histórica entre aluno e totalidade de significações’. Pretende-se estabelecer uma professor no espaço acadêmico. relação da Semiótica com a Análise do Discurso. Ambas, partem de uma ciência maior, a linguística, na busca do Discurso e Ideologia na Iconografia Representiva Sul- significado Matogrossense representativa sul-matogrossense. Esculpidas como um objeto- Anailton de Souza Gama (PG/UFMS/UEMS/FINAN) símbolo, criados a partir do Governo Popular Zeca do PT, e das ideologias presentes na iconografia instaladas nos espaços das cidades, canteiros centrais e placas Em relação às teorias do discurso e do texto, cinco têm sido as indicativas, os signos (esculturas pantaneiras) inauguram uma orientações teóricas mais praticadas no Brasil = a Análise do nova temporalidade – da expectativa indeterminada – do Discurso de linha francesa, a Análise do Discurso de extração espetáculo. Como objeto cultural, a iconografia sintetiza, na 92 mídia, a recuperação do imaginário que a TV (mídia) tece na compreendermos a formação de uma identidade constituída nos preparação do acontecimento = ESTADO DO PANTANAL. A discursos dos compositores e cantores atuais e antigos da análise dessa rede de discursos pode desvelar mecanismos de época, como Jimmie Rodgers, o pai do country. representação da identidade por meio dos quais a História e a Memória são investidas e reconfiguradas em objetos da mídia. Mesa 13 Fazendo circular essas figuras, a mídia constrói uma ‘história O Teatro como Forma de Aprendizagem do presente’. O que os textos da mídia oferecem não é uma Claudia Alves Gomes (G-UEMS) realidade, mas uma construção que permite ao leitor produzir formas simbólicas de representação de sua relação com a realidade concreta. O teatro é uma arte envolvente que cativa pessoas de diferentes idades e tem como objetivo à representação com o caráter de lazer e diversão, entretanto, ele não oferece apenas isto, pois ele A Identidade Cultural de um Povo nas Letras de Música Country Mônica Aparecida Matos (UEMS) diverte, adverte, ensina, documenta e instrui. Com temas corriqueiros podemos atingir inúmeros pontos positivos, tais como: despertar e educar a observação, organizar idéias e pensamentos, desenvolver a criação, criar hábitos sociais e Este trabalho tem como objetivo analisar a identidade cultural de um povo do Sul e Oeste dos Estados Unidos através de um ritmo folclórico dos colonos que ocupavam as terras nas montanhas Apalaches; o ?country music?. A idéia é apresentar a origem da música country; música rural, conhecida como blues pelos brancos, evidenciando o contexto histórico para entre outros. Trabalhando temas da realidade, podemos lembrar a concepção do educador Paulo Freire que propôs uma pedagogia que trabalhasse o conhecimento da realidade do aluno, do qual o educador pudesse partir para desenvolver suas atividades, e a arte teatral cumpre esse papel, abrindo caminhos também para o diálogo além de colocar os alunos de frente a 93 problemas sociais. Diante disso, podemos dizer que o teatro é e ameaças que sente a sua volta. O trabalho que ora importante para o crescimento do indivíduo e para o seu desenvolvemos visa auxiliar na formação das crianças, comportamento de cidadão do mundo e no mundo. utilizando os principais contos de fada. A Importância dos Contos de Fada na Escola Michele Cristianne Souza Gonçalves (G-UEMS) Rosemeire Mazieiro Fernandes (G-UEMS) A Literatura Infanto-Juvenil: despertando o prazer da leitura na sala de aula Ana Paula Machado (G-UEMS) Aláide Pereira Japecanga Aredes(UEMS) Em busca de uma resposta aos constantes desafios e questões Os contos de fada podem ser decisivos para a formação da criança em relação a si mesma e ao mundo à sua volta, é possível observar a influencia positiva que estes proporcionam na vida do leitor, pois os personagens que às vezes são bons ou maus, belos ou feios, poderosos ou fracos, facilitam o leitor na compreensão de certos valores básicos da conduta humana ou no convívio social. A psicanálise lembra, que a criança é levada a se identificar com o herói bom e belo, não devido a sua bondade ou beleza, mas por sentir nele a própria personificação de seus problemas infantis, seu inconsciente deseja a bondade e a beleza, principalmente, sua necessidade de segurança e proteção, podendo assim superar o medo e enfrentar os perigos sugeridas quanto à superação da Literatura Infanto- Juvenil e às práticas de leitura e produção de textos em sala de aula, pensou-se no projeto de extensão: “ A Literatura InfantoJuvenil: despertando o prazer da leitura na sala de aula”, que se destina ao incentivo da leitura em séries iniciais, como forma de se garantir o aprendizado da capacidade de ler e refletir sobre o mundo, propiciando o prazer, de forma a aproveitar o caráter instrutivo do texto, construindo um espaço privilegiado entre os leitores infantis. Deste modo, a proposta é de trabalhar a Literatura de forma lúdica, a fim de formar público leitor. O projeto foi implantando na quarta série da Escola Estadual Abigail Borralho, em Dourados. Os diversos recursos utilizados 94 têm sido ferramentas importantes paras aulas de leitura, que desse pressuposto é que a obra Vida Cachoeirinha, de Nicanor despertam o interesse dos alunos pelo ato de ler. Coelho, será apresentada. Poeta, jornalista, fundador da Academia Douradense de Letras e sócio da ANE (Associação Reflexões sobre a Leitura em LE: pondo fim a Vacuidade de de Novos Escritores de Mato Grosso do Sul), Nicanor leva aos sentidos nos textos didáticos leitores uma visão poética de um bairro pobre de Dourados, Maria Lígia Aguiar UEMS onde, segundo o autor, residem mais de mil e quinhentas famílias vindas de toda parte do Brasil em busca de um sonho. A leitura em uma língua estrangeira (LE) não trata apenas da A obra está constituída em quatro partes: “Estações”, decodificação de “Canções”, “Viagens”, “Vôos”. Com o intuito de apresentá-la significados. É processo dinâmico de desenvolvimento e ao público, tecerei comentários acerca de uma poesia da implementação de estratégias e deveria ser entendida como respectiva obra, complementando com teorias que a sustentam: ampliação de conhecimento, instrumento de reflexão crítica e a plasticidade (na construção do cenário) e o social (a meio de transformação da sociedade, objetivo último da perspectiva do homem neste cenário). de vocabulário, mas da construção educação. UMA ANÁLISE SOBRE ATIVIDADES DE LEITURA EM LÍNGUA Mesa 14 INGLESA VIda Cachoeirinha: um cenário de sonho BRUNA BONANCIN TORRECILHA LOPES (G-UEMS) Danieli Tavares (G-UEMS) As atividades de leitura têm sido muito pesquisadas nas últimas Muitas análises de poesia são realizadas em torno das grandes décadas e tornou-se uma preocupação tanto por parte de estrelas. O valor de uma obra está em sua revelação. Partindo pesquisadores na área da educação como professores de Língua 95 Inglesa, isso porque, tanto em provas, vestibulares, concursos e propiciando ao leitor uma melhor compreensão, uma visão de atividades em sala de aula, mostra-se um baixo desempenho mundo crítica e realista. Quando a leitura é vinculada como por parte dos alunos com relação a essa questão. Quais são os agente descobridor de sentidos, os leitores rompem as barreiras fatores que influenciam no processo de ensino-aprendizagem impostas à compreensão e valorizam o conhecimento crítico, de línguas, tanto materna quanto estrangeiras? A compreensão podendo descobrir novas idéias através da comparação do texto desses fatores nesse processo de aprendizagem, é essencial para com o seu próprio conhecimento de mundo. Desvendar o papel analisar a forma como vem sendo trabalhada a leitura em sala do leitor em meio a uma verdadeira “guerra” editorial significa de aula e os resultados a que se pretende chegar no que se perceber que em se tratando da leitura, toda escolha possível refere ao ensino de línguas, principalmente à Língua Inglesa. não passa de uma atitude previamente arbitrária. Os Livros mais Vendidos: um estudo sobre a recepção como Dia 05/05/2009 imposição às escolhas e gosto do público leitor Mesa 01 Daniele Alves Silva (PG/UEMS) Concepções teóricas da Semântica e da AD na formação do professor Esta proposta de comunicação tem a finalidade de observar a influência que o mercado editorial brasileiro exerce nos Concepções teóricas e as relações com a formação do professor leitores. Neste sentido, destaca-se as contribuições de Jauss Coordenadora: Adélia Maria Evangelista Azevedo (UEMS) quanto a problemática da leitura e sua produção, há também recorrência à História da Literatura e a Teoria Literária. A idéia Como resultado positivo nos cursos de Letras, cada vez mais, de que a leitura que procura produzir sentido opõe-se àquela são inseridas leituras de semanticistas brasileiros como: Ilari vista como técnica, fortalece os sentidos ocultos no texto, (2001), Geraldi (2000); teóricos da Análise do Discurso (AD) 96 tais como: Orlandi (1987), Maingueneau (1997) e outros fundamental e médio, cujo objetivo é reverter os baixos índices filósofos da linguagem. Essas inserções de leituras têm de desempenho dos alunos do ensino fundamental e médio em contribuído para discussões e possíveis mudanças na prática pesquisas brasileiras, tais como o SAEB. As reflexões pedagógica do futuro profissional.Vale lembrar que tais leituras presentes nas pesquisas surgiram e foram realizadas ao longo teóricas aliadas às construções de estratégias pedagógicas, de da disciplina de Língua Portuguesa III por acadêmicos do 3º e certa forma, é algo recente e não tão simples para acadêmicos 4º anos de Letras/UEMS – Unidade Universitária de Jardim, no do 3º e 4º anos de Letras. Desse modo, a presente comunicação ano de 2006, e com a participação em Projetos de Extensão coordenada tem por objetivo discutir aspectos teóricos da intitulados: “Introdução à Análise do Discurso”e “Aspectos da Semântica e da AD na formação do acadêmico de Letras e teoria da Análise do Discurso aplicados à reflexão do papel da apresentar contribuições/reeleituras de alguns gêneros que mulher e da criança na sociedade.” circulam socialmente. Assim, o gênero humorístico, charge: “Radical Chic”, de Miguel Paiva, será investigado nas A charge "Radical Chic" - a enunciação em foco condições de produção e nos principais enunciados que se Elena Rodrigues Alarcon (G/UEMS) mostram. Outro gênero, a ser abordado, será a crônica, “Teleantevisão”, de Millôr Fernandes, em que se discutirá A negação na crônica "Teleantevisão" sobre a negação e as inúmeras possibilidades argumentativas. Tania Roberta Benites Carvalho (G/UEMS) Com isso, amplia-se à concepção cristalizada pela gramática normativa sobre a negação centralizada no advérbio “não”. E A formação do professor e a realizade do ensino por último, focalizaremos a necessidade da abordagem dos Sandra Regina Alez Herter Pereira (G/UEMS) conceitos teóricos aliados à concepção de análise e a reelaboração de diferentes atividades discursivas para o ensino Mesa 02 97 Alguns Sentidos do Discurso sobre os Seios Femininos Caídos produto do “poder” que gera divisões sociais, uma vez que Fernanda Aline de Andrade (PG/UFMS) permite organizar sistemas de classificação, social, cultural, política ou econômica, instituindo a cada um dos sujeitos uma Numa pesquisa de campo realizada no ano de 2006, que tinha “posição” a ocupar nas representações sociais que estão em como objetivo verificar o efeito de sentido do discurso sobre os jogo. As condições de produção serão o suporte fundamental na seios na formação imaginária social que se faz da mulher, foi atividade detectado com uma certa freqüência, nas marcas discursivas consideração que no momento atual o “implante de silicone” dos informantes-sujeitos ou sujeitos-informantes, tanto nos tem se tornado um discurso de modismo na sociedade discursos dos sujeitos homens quanto nos discursos dos sujeitos brasileira, abrindo-se a partir dos discursos veiculados pela mulheres, um certo sentido de aversão aos seios caídos. O mídia a (re) construção de “novos” sentidos sobre o feminino, presente trabalho busca analisar, pelo viés da Análise do ao mesmo tempo que se fecha a outros sentidos que não Discurso de orientação francesa, a partir de um pequeno encontram prestígio na ordem do discurso vigente, já que cada recorte, alguns sentidos sobre o feminino evocados a partir do época investe diferentemente sobre os corpos, construindo e discurso dos seios caídos que levaram esses sujeitos – sociais e (re)construindo corpos e sentidos sempre provisórios. analítica desses discursos, levando-se em históricos - a considerá-los com o sentido de “feios” ou “indesejáveis”. Tendo em vista a opacidade e a “obscuridade” A Não-Coincidência das Palavras com as Coisas: o real da dos discursos, buscar-se-á responder, em certa medida, quais língua a nomear são as formações imaginárias femininas, que permeiam o Carlos Magno Viana Fonseca (PG/UFC) imaginário social, rejeitadas nesses discursos. Para iniciar tal discussão, torna-se mais ter a concepção corpo cunhada por O objetivo deste trabalho é investigar o fenômeno constitutivo Foucault: como um “lugar” de inscrição dos discursos, um da enunciação chamado de não-coincidência das palavras com 98 as coisas (ARTHIER-REVUZ, 1998) verificando sua ênfase às questões do sujeito-enunciador no que se refere às incidência em artigos acadêmicos de lingüística. Definido a perguntas: (i) o que é ser sujeito na psicanálise e na análise do partir da noção de referente, excluída do escopo saussuriano e discurso?; (ii) Como um enunciador se torna sujeito?; e (iii) reabilitada por Benveniste, uma não-coincidência das palavras Quais são as condições responsáveis por um fracasso no com as coisas se materializa textualmente quando o enunciador, processo de tornar-se sujeito?. No que se refere às questões no curso da enunciação, interrompe a cadeia linear do psicanalíticas a base teórica adotada é Fink (1998) que faz um enunciado e reenvia um item lexical ao contexto redefinindo-o, trabalho de análise do sujeito lacaniano, Dor (2003) e Porge avaliando-o, estendendo ou delimitando o seu sentido, (2006) que explicam da forma mais didática possível o reduzindo ou ampliando o contexto no qual o item se insere. É pensamento hermético de Lacan; no que se refere à balizagem um caso de metaenunciação de desdobramento enunciativo da teórica da análise de discurso, optamos pelos trabalhos de modalização autonímica. O conceito mobiliza determinadas Pêcheux (2006), Navarro (2006), Indursky e Ferreira (2005) e operacionalizações que colocam em jogo analítico questões Gregolin (2004). Nosso corpus de análise é composto por trinta fundamentais da Análise de Discurso, especialmente a escola artigos acadêmicos de lingüística publicados on line pelas fundada por Pêcheux (GADET e PÊCHEUX, 2004) que revistas D.E.L.T.A, ReVel e Linguagem em (dis)curso, sendo percebe a insuficiência do sistema lingüístico em nomear o real que dez de cada. Para selecionar os eventos buscamos amparo numa relação direta e necessária com o discurso da psicanálise na proposta de Teixeira (2005) que ordena as não-coincidências lacaniana na qual a tríade Real-Simbólico-Imaginário é parte do dizer em seis níveis: das mais explícitas ― constitutiva do esquema da comunicação. Dessa forma, lingüisticamente marcadas com o verbo ‘dizer’; às mais procuramos compreender os conceitos que estão aí implicados interpretativas; para, com base nisso, perceber os efeitos que a inserção desse constitutiva do sistema; fazendo recortes sucessivos nos textos tipo de enunciado provoca no discurso acadêmico, dando analisados para encontrar o evento específico das não- que apontam para a heterogeneidade 99 coincidências das palavras com as coisas. A hipótese básica por vontade deliberada do sujeito-enunciador, mas por coerção que orienta o trabalho é que o real é inalcançável pelo sistema das Leis do Dizer e das Leis da Linguagem que obrigam o simbólico da linguagem que como tal se confira numa enunciador a suprimir as faltas e falhas deixadas no discurso ferramenta utilizada pelo homem para uma atividade definida: pelo impossível da língua, ou seja, nomear o real, restando ao interagir com seus semelhantes. No entanto, como ferramenta, sujeito somente um processo simbólico-imaginário efetivado na a linguagem invariavelmente falha levando o sujeito- ato de discurso. enunciador a elaborar um processo de obturação da falta do PALAVRAS-CHAVE: não-coincidência, análise de discurso, sistema através de uma metaenunciação. Os resultados apontam psicanálise. para o fato de que a linguagem é o domínio do não-Um discursivo evidenciado através dos sentidos, das vozes que Mesa 03 atravessam os dizeres, da polissemia generalizada do sistema e Educação de Jovens e Adultos: questões de gênero e raça do sujeito-enunciador sempre dividido, clivado, cindido, um Márcia Regina Adão de Souza (G/UNICAMP) sujeito-efeito que está no atravessamento do sujeito da história, do sujeito da ideologia e do sujeito do inconsciente. Ainda O que leva uma criança afro-brasileira a abandonar os bancos como resultado, percebemos que o discurso acadêmico, mesmo escolares em sua idade de grande criatividade e vivacidade sendo escrito e planejado, portanto um discurso no qual a voz jovial? Essa poderia ser minha (uma)pergunta de pesquisa. No do inconsciente está amordaçado encontra espaço para se entanto, o que procura-se não está no aqui e agora, mas sim na manifestar, senão pela associação livre, processo legitimamente retroatividade. Pude perceber, como educadora do ensino de psicanalítico, mas pela falta constitutiva do sistema lingüístico. jovens e adultos, um silenciar que falava (gritava) aos meus Disso concluímos que as não-coincidências do dizer é um ouvidos das mulheres negras moradoras na cidade de efeito de discurso que aparece na linearidade enunciativa não Campinas. Silenciavam suas histórias. Várias atividades foram 100 construídos no intuito de dar voz, através da escrita, para essas que vieram para o Brasil (italianos, espanhóis, croatas, mulheres silenciadas. E no decorrer desse levantamento, chineses, japoneses, alemães, etc.), de forma geral, não é pudemos(pode-se)detectar que sua invisibilidade negra e considerada uma vez que é comum apenas considerar, a feminina estava no apagamento de sua etnicidade, na sua princípio, o índio (nativo), o português (invasor) e o escravo introdução ao ambiente escolar (por volta dos sete/oito anos) e (trazido nos navios). De acordo com Hélio Santos (2002: 31), a gradativamente no mercado de trabalho. Essa construção do respeito da representação do negro: “de um lado há um grupo silenciamento perpassa pelos ambientes familiares e escolares e que finge que não discrimina. E no outro a própria população está relacionado ao processo histórico escravocrata ocorrido na negra que finge que não é discriminada”. Pode-se considerar cidade de Campinas. Tal proposta de investigação, de cunho que o jogo de representação sobre a questão da identidade etnográfico, pretende dar visibilidades a essas mulheres, que já implica em discutir problemas situados em outra ordem, como foram filhas, mães e hoje são mães e avós. ideologia (Eagleton, 1997), problema sócio-econômico e cultural. A questão do negro no Brasil tem sido uma discussão Discurso e Identidade: as cotas na UEMS muito polêmica, principalmente em relação ao racismo e a Lúcia Alves Demétrio (G/UEMS) posição do negro na sociedade brasileira após a libertação oficial dos escravos. Sua situação foi determinada A insurgência do debate sobre as cotas contribui para discutir a historicamente através dos séculos em um regime de escravidão própria representação identitária não só do negro trazido nos e porões dos navios vindo do continente Africano, mas também marginalização, situação que perdura ainda hoje. Essas relações de outros povos, recentemente, que vieram de forma e de estão marcadas nos discursos históricos em redes de memórias. condição diversa constituir a formação da identidade do Uma questão que vem sendo muito debatida atualmente diz brasileiro. Convém ressaltar que a identidade dos outros povos respeito às políticas de reparação históricas para afro- de posteriormente de preconceito, estigmatização, 101 descendente, em particular, as cotas para negros nas A questão do negro no Brasil tem sido uma discussão muito universidades e serviços públicos, ou seja, uma reserva de polêmica, principalmente em relação ao racismo e a posição do vagas para os negros concorrerem entre si, fato que aumentaria negro na sociedade brasileira após a libertação oficial dos em número significativa a representação do negro na sociedade. escravos. Sua situação foi determinada historicamente através Essas questões, entre outras, têm sido o centro da polêmica dos séculos em um regime de escravidão e de posteriormente sobre os negros - não apenas no Brasil, mas também nos de preconceito, estigmatização, marginalização, situação que Estados Unidos da América quando a Suprema Corte perdura ainda hoje. Essas relações estão marcadas nos recentemente prorrogou por mais 30 anos as cotas nas discursos históricos em redes de memórias. Uma questão que universidades - em especial nas universidades públicas, pois as vem sendo muito debatida atualmente diz respeito às políticas cotas também promovem também um debate sobre a questão da de reparação históricas para afro-descendente, em particular, as identidade do povo brasileiro. Assim, o objetivo desse trabalho cotas para negros nas universidades e serviços públicos, ou é analisar quais os discursos e as identidades dos sujeitos que seja, uma reserva de vagas para os negros concorrerem entre si, constituem o debate e a implantação das cotas para negros na fato que aumentaria em número significativa a representação Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul desde os do negro na sociedade. Essas questões, entre outras, têm sido o discursos sobre políticas reparação histórica até a sua centro da polêmica sobre os negros - não apenas no Brasil, mas implantação. também nos Estados Unidos da América quando a Suprema Corte recentemente prorrogou por mais 30 anos as cotas nas Discurso de Cotas na UEMS: uma questão polêmica universidades - em especial nas universidades públicas, pois as Maria Francisca Valiente (G/UEMS) cotas promovem também um debate sobre a questão da identidade do povo brasileiro. Assim, o objetivo desse trabalho é analisar quais os discursos que constituem o debate e a 102 implantação das cotas para negros na Universidade Estadual de político e ético. Embora tenha se tornada lei, o trabalho Mato Grosso do Sul desde os discursos sobre políticas interdisciplinar nas escolas, podemos notar que o fato não reparação histórica até a sua implantação. acontece e a lei fica apenas no papel. Racismo e Preconceito nas Séries Iniciais do Ensino Mesa 04 Fundamental Sr. Trovões: polifonia e dialogismo em “O menino do dedo Maria Fêlix de Carvalho (G-UEMS) verde” Alaíde Pereira Japecanga Aredes (UEMS) Mariana Maciel dos Santos Souza (G/UEMS) O projeto em questão está sendo realizado nas escolas públicas Este trabalho tem por objetivo analisar e contextualizar a de Nova Andradina e consiste em demonstrar que o problema personagem Sr. Trovões da única obra infanto-juvenil do do preconceito racial surge nas escolas desde as séries iniciais. escritor francês Maurice Druon. Trata-se do passo inicial do Nossas pesquisas acusam que ele é grande em meio às crianças trabalho de conclusão de curso da acadêmica que pretende e que infelizmente tanto professores como demais funcionários estudar a polifonia e intertextualidade entre “O menino do dedo não têm a consciência de que precisam abordar este assunto em verde” (1957) e “O pequeno príncipe” (1944) de Antoine de sala de aula. Afirmam não saber como trabalhá-lo. Aplicamos Saint-Exupéry. Como referencial teórico serão utilizados os um questionário para alguns professores e os resultados são autores organizados por Diana Barros e José Luiz Fiorin no preocupantes. Até o momento pudemos perceber que o livro “Dialogismo, polifonia e intertextualidade” (1999). Na problema existe e o pior, os professores não estão preparados narrativa de “O menino do dedo verde”, cada personagem (e, para trabalhar a questão, pois ela é vista como algo delicado e em especial, a estudada) tem uma opinião acerca da educação muito complicado, o que exigirá deles um compromisso de Tistu - a personagem-título - e acredita-se que cada uma está 103 ligada a uma ideologia. Tal afirmação é possível por considerar que um enunciado é composto por duas partes, que se Reescritura e o Encontro com os Outros: uma análise desse completam, dialogam e polemizam: a percebida (com a leitura) discurso e a presumida. Para chegar à parte presumida, ou à significação Eliza da Silva Martins Peron (PG/UFMS) verdadeira, é necessário relacionar o escrito com a situação - ou contexto - da obra e do autor e observar as marcas lingüísticas Entre a Crítica e o Humor: polifonia, dialogismo e que atuam como pistas para sentido global; uma vez que são carnavalização em Charges Jornal carregadas de marcas históricas e ideológicas. Com isto em Hellen Suzana da Cruz Miranda (PG/UFMS) mente, as etapas do desenvolvimento da presente pesquisa serão o levantamento e a análise do contexto histórico e das Ancorando-se nos estudos desenvolvidos por Romualdo (1992) marcas discursivas. Por fim, cabe conceituar dialogismo como relacionados à charge jornalística, no princípio da polifonia, a multiplicidade de vozes, cada uma representando diferentes dialogismo e da carnavalização (Bakhtin, 1992, 1993 e 1999) e pontos de vista e/ou posições sociais e polifonia como o nos critérios propostos por Bremmer e Roodenburg (2000) fenômeno (ou recurso estilístico) que permite que uma delas de acerca das relações entre humor e História, o objetivo deste destaque e claramente se faça ouvir dentro do discurso. Ou trabalho é analisar marcas discursivas em charges jornalísticas seja, estudar o dialogismo e polifonia é elencar as múltiplas empregadas nas redações no Exame Nacional do Ensino Médio vozes e identificar a que se destaca. Em suma, o presente (ENEM/2000), explorando as vozes bakhtinianas, os signos estudo, pretende-se identificar as vozes que atuam sobre o lingüísticos e a enunciação humorística ali representada. discurso da personagem rígida e autoritária do Sr. Trovões e Constata-se que o chargista atualiza seus pontos de vista por qual é a ideologia por ela representada no contexto da Segunda meio do discurso do outro e no objeto da enunciação, Guerra Mundial vivido pelo autor. aproveitando a matéria histórica para produzir efeito de sentido, 104 por meio de uma linguagem carnavalizada e polifonicamente destacaram no próprio sertão do Nordeste do Brasil. Assim tecida de imagens e símbolos universalmente conhecidos. como ocorrera em Portugal, muitos séculos antes, com os jograis do Trovadorismo andando de cidade em cidade, O Discurso dos Bons Exemplos na Literatura de Cordel: uma interpretando as cantigas, e aqui no Brasil os cantadores forma ambulantes do cordel percorriam as fazendas, os arraiais e as de entretenimento, informação e correção de comportamento feiras contando suas estórias. Qualquer fato que mereça grande Raymundo José da Silva (PG/UEMS) atenção do público pode ser tema de cordel. Pode ser um cataclismo como um terremoto, uma enchente, um incêndio Sabe-se que o homem do campo no Brasil sempre gostou de num edifício, num circo, ou ainda a morte ou a renúncia de um contar e ouvir estórias, e até mesmo necessitava disso, uma vez Presidente da República. Há quem diga que, no apogeu do que, pelo menos até a década de 1960, tinha pouco ou nenhum cordel, o sertanejo só acreditava de fato na notícia, depois que a acesso aos modernos meios de comunicação, como o jornal tivesse lido no folheto ou ouvido do cantador. Isto Posto, o impresso e o rádio. Logo, as informações e entretenimentos objetivo deste trabalho é mostrar que, ao trabalhar com esses tornavam-se escassos, razão pela qual as pessoas se visitavam e personagens de origem local, ou seja, o homem comum, que se se reuniam nas varandas ou nos terreiros dos vizinhos para notabilizou de uma forma ou de outra, boa ou má, com o ouvir e contar causos. Daí o surgimento e a importância das cangaceiro famoso, o padre, o coronel, o monge, o feiticeiro ou estórias versejadas pelos repentistas algumas verídicas, mas outros personagens de origem duvidosa ou longínqua como sempre engrandecidas pela ilimitada imaginação do sertanejo; príncipes, reis e bruxas, o poeta da literatura de cordel adapta, outras deturpadas ou lendárias, cujos episódios grandiosos, de modo natural, as estórias maravilhosas ao ambiente agreste e quase épicos, tiveram sua origem na Europa, sobretudo durante ao gosto do público leitor. Valendo-se desse material e de seu a Idade Média, ou foram construídos com personagens que se talento, o repentista de cordel seduz o leitor pelo 105 entretenimento, traz informações verídicas e fantasiosas que Mesa 05 expressam fielmente as ansiedades, crenças e crendices do Práticas Interacionistas no Ensino de Língua Inglesa homem rural e aproveita para inscrever um fundo moral no Fernandes Ferreira de Souza (UEMS) final de cada estória. Por conseguinte, tornam-se freqüentes acontecimentos que enaltecem a justiça, a coragem, a bondade Este trabalho visa à demonstração de algumas práticas de e a fé com personagens destemidos, heróicos e quase sobre- cunho interacionista que em muito podem auxiliar o processo humanos. Por outro lado, também destacam-se, de forma de ensino-aprendizagem de uma língua estrangeira, no caso, a negativa, aspectos como a injustiça dos poderosos contra os Língua Inglesa. As referidas práticas rompem a estrutura humildes, a maldade, a traição e a vilania. Sabe-se ainda que o discrusiva carcterística da sala de aula, a qual é sempre de sertanejo, mormente das gerações mais antigas, é, sob certos iniciativa do professor, elicitando a resposta do aluno, seguida aspectos, profundamente moralista e religioso tendo como então pela avaliação do professor. Aqui a sala de aula, além de principal característica o sentimento de honra, sobretudo da constituir um lugar onde se desenvolve o processo de honra familiar. Assim, os ensinamentos dessas estórias e a ensino/aprendizagem, é também uma situação social, onde os forma de corrigir, quando premiam os bons e punem os maus, atores se encontram face a face e sofrem, em suas ações, satisfazem as expectativas do público leitor e ratificam o seu influências recíprocas ideal de vida. Esta pesquisa mostra que no discurso da literatura de cordel a presença marcante dos bons exemplos de vida, Produção Textual – uma perspectiva interacionista a partir do representados por atos virtuosos que, em oposição ao mal, discurso relatado sempre acabam vencendo e finalmente recompensados por bens Geraldo José da Silva (UEMS) materiais ou a felicidade na Terra ou no Além. 106 O presente trabalho objetiva apresentar as características da Assim, pretendemos analisar ainda a produção do texto produção de textos escritos de cunho midiático e o tecer do escolhido, a fim de verificar a relação autor-portador-tema- discurso relatado no periódico O Estado de S.Paulo, interlocutor, observando a articulação argumentativa, via denominado “Universidade: escola pública terá 50% das discurso relatado com ênfase ao discurso direto, que os vagas”, de Demétrio Weber e Leonêncio Nossa, verificando a articulistas utilizam para tecer o texto, vislumbrando a articulação argumentativa utilizada pelo locutor na construção interação com o interlocutor. A escolha do texto supracitado macroestrutural do texto polêmico, visando à interação com o justifica-se devido a sua construção que subsidiará a discussão interlocutor numa perspectiva bakthiniana em que se valorizem proposta e, também, pelo jogo articulatório na elaboração dos os aspectos constitutivos da enunciação como autor, portador, enunciados que constituem o discurso relatado posto em cena tema e interlocutor. A produção textual deve levar em conta pelos locutores. Inúmeras discussões têm sido travadas no que alguns aspectos relevantes como: a escolha de um determinado se refere ao sistema de cotas no Brasil e em torno das políticas gênero e isso se faz em função de para quê se escreve, para de ação afirmativa, principalmente nos movimentos sociais: quem se escreve, em que esfera e sobre que suporte deverá negros e Ongs. O debate assume proporção volumosa, pois traz circular o texto produzido. Portanto, é pertinente observarmos à tona o problema das medidas compensatórias a grupos em sua macroestrutura a bipolaridade que o objeto texto historicamente discriminados e perseguidos, como o caso das encerra, ou seja, aspectos de conteúdo e de forma em sua indenizações recentemente pagas às vítimas do Holocausto, materialidade lingüística. Isto posto, impute-nos saber que a reacendendo uma preocupação cada vez mais presente no linguagem não existe por acaso, mas imbricada numa rede de ocidente: o racismo e os seus feitos nefastos na geopolítica valores discursivos de vários níveis. Dessa forma, todo o atual. O tema em questão não é novo, pois nos Estados Unidos, universo lingüístico constrói-se, existe e funciona num universo década de 60, se instituíram as chamadas “políticas de social, coletivo, e não pode ser abstraído dessa condição. discriminação positivas” representadas por políticas públicas 107 dirigidas aos segmentos sociais afro-americanos. Naquele país, menor ou maior grau – um deslocamento posicional, o que nos as chamadas ações afirmativas foram instituídas na década de permite dizer que a objetividade total é uma ilusão. 60 pelo Presidente John Kennedy, num momento em que o país vivenciava o auge de seus conflitos raciais. Determinou-se, na O Ensino de Língua Inglesa sob Aspectos Culturais ocasião, que firmas e universidades deveriam reservar cotas ou Bruna Bonacin Torrecilha Lopes (G/UEMS) abrir vagas de forma proporcional ao peso dos negros no total da população americana, cuja fatia era 12%. É sabido que o A abordagem da Língua Inglesa sob um aspecto cultural Estado brasileiro sempre desempenhou ações que passam longe propicia ao aluno uma reflexão a respeito da própria língua de uma perspectiva eqüitativa de justiça social, quando o objeto materna e proporciona também uma reflexão sobre a própria refere-se aos direitos das minorias políticas, em especial de linguagem como um todo. Mas há que se ter cuidado para que a negros e índios. Frente a esse panorama social, a questão das aula de Língua Inglesa não se torne uma aula de História da cotas ganha força e os debates ocorrem com maior freqüência Língua Inglesa. Os aspectos culturais funcionam como no Governo atual, quando algumas iniciativas começam a ser complementos propostas e efetivadas. A mídia incumbe-se de relatar os fatos e conhecimentos e a compreender a formação dos vocábulos, o promover o debate entre os indivíduos e, com isso, dar a sua uso das expressões que geralmente não tem um significado contribuição reflexiva à sociedade ledora. O discurso literal, a estrutura da pronúncia da Língua Inglesa capacitando- jornalístico assume papel de retratação da história, como uma o como falante que compreende o que ouve e o que fala, interpretação da realidade. Diante disso, há que se levar em ajudam a desenvolver uma percepção crítico-analítica com consideração que, no discurso midiático, embora se tenha como relação a questões sociais, políticas e étnicas, e a capacidade do premissa a objetividade e a imparcialidade, sempre ocorre – em aluno de interagir com o mundo de forma respeitosa e que ajudam o aluno a ampliar seus compreensiva, entendendo as diferenças e as variedades 108 existentes em outras culturas e na própria cultura a que psíquica, social, étnica e política do indivíduo. A elucidação pertence, de com relação à origem das expressões, dos vocábulos e o porquê culturalmente da pronúncia, facilitam ao aluno a compreensão da língua alvo, determinada. O que nós percebemos acerca da língua e da destruindo a idéia de uma língua difícil ou superior, melhor que cultura de uma pessoa é o que nós temos condicionado pela a língua materna, pois, “o estudo das línguas de diferentes nossa própria cultura de ver as coisas, e os modelos culturas deixa claro, da mesma forma, que não há línguas mais estereotipados já construídos em torno de nós.” (KRAMSCH, complexas ou mais simples, mais lógicas ou menos lógicas: 2001, P. 67). Um breve retrospecto da evolução da Língua todas elas são adequadas às necessidades e características da Inglesa, por exemplo, abre campo para uma discussão bastante cultura a que servem, e igualmente válidas como instrumentos polêmica: a questão dos estrangeirismos, tanto em Língua de comunicação social.” (SOARES, 1997, p. 39). A influência Inglesa, quanto na língua materna. Essa discussão ajuda a dos negros com o Black English serve como um exemplo de evidenciar a importância dos empréstimos lingüísticos em todas variação lingüística dentro da Língua Inglesa, o que demonstra as línguas e desmistificar a idéia da existência de uma língua que as variações lingüísticas ocorrem em qualquer língua em pura. A idéia de que exista uma língua pura, que em toda a face das transformações sociais que ocorrem com os povos e história da humanidade, nunca tenha sofrido qualquer invasão que essas variações não devem ser vistas como “erradas”, mas lingüística decorrente das invasões dos territórios, e da sim como instrumentos e fenômenos de comunicação. A fala dominação dos povos ali encontrados, é um tanto quanto transforma-se no decorrer do tempo através da somatização de perigosa, os prisioneiros sobreviventes dos campos de fatores sociais, psíquicos e históricos, a língua falada possui concentração nazista que o digam. Essa idéia caracteriza-se uma construção léxico-semântica diferenciada da língua escrita, mais como uma manobra manipuladora que atenta contra a o que não quer dizer, que seja menos elaborada: “Assim sendo, natureza da linguagem e conseqüentemente contra a natureza o texto falado não é, absolutamente caótico, desestruturado, identidade principalmente, cultural de porque alguém “nossa é muito percepção 109 rudimentar. Ao contrário, ele tem uma estruturação que lhe é professor se restringia ao ensino gramatical, no qual limitava as própria, ditada pelas circunstâncias sócio-cognitivas de sua possibilidades do educando de obter uma aprendizagem produção e é à luz dela que deve ser descrito e avaliado.” significativa. (KOCH, 1997, p. 64). O professor que trabalha a Língua Inglesa considerando os aspectos culturais da língua, proporciona uma maior reflexão por parte de alunos e professores, amplia conhecimentos, desenvolve A Escola na Visão de Foucault e Girox: um debate possível Alaíde Pereira Japecanga Aredes (UEMS) outras capacidades e torna esse processo de ensino-aprendizagem algo Nesta pesquisa, desde seu início propomos a prática da real e mais próximo da realidade do aluno. pedagogia da voz do estudante (Giroux,1987). O que seria esta pedagogia? Quais são suas características principais?Que Total Physical Response pressupostos me levam a propor uma escola que utilize o Reinaldo Coimbra de Oliveira (UEMS) Dialógo como prática constante? Guimarães (1987), estudou Neuza Rodrigues Santana de Lima (UEMS) algumas escolas periféricas em Campinas, baseando-se no referencial de Focault. Segundo ela a degradação escolar, algo Com a finalidade de uma melhor atuação metodológica frente à muito frequente nas escolas públicas, de modo geral, se dá pela aquisição de uma segunda língua este trabalho tem por própria forma como é organizada a escola, ou seja, objetivo, retratar informações a despeito do método de ensino parafraseando Focault, é um espaço muito parecido com o criado por James Asher, com o propósito de fornecer aos presídio, os alunos nunca podem nada e são vigiados o tempo educadores uma nova alternativa para o ensino de línguas todo e se qualquer regra for desobedecida, são logo punidos, estrangeiras, cujo foco principal é ensinar uma segunda língua sem nenhuma oportunidade de explicação, sua voz não é conciliando fala com ações físicas, visto que, até então, o ouvida. Guimarães (1987), utilizando os trabalhos do IDAC 110 (Instituto de Ação Cultural), define assim a escola: Um mundo um se diferenciam. A preocupação maior da escola é separado da vida, de ritos imutáveis, de silêncio e imobilidade, uniformizar comportamentos, se manter distante da realidade onde os papéis de cada um já estão predeterminados: o aluno do aluno, teimar em transmitir os conhecimentos através de cala, escuta, obedece, é julgado; o professor sabe, ordena, velhas e ultrapassadas metodologias, e negar a expressão do decide, julga, anota e pune. Um mundo uniforme, de estudante. Com isso favorece o desinteresse, a apatia, enfim, ao comunicação artificial, onde só se admite falar bem. Um entendimento desta como um mundo estranho, muitas vezes mundo de punições... castigo. Um mundo desligado da rival do aluno. Ao chegar à escola o aluno se decepciona pois realidade, que não tem qualquer significação, nem qualquer os profissionais do ensino, principalmente o diretor, estão mais utilidade imediata para os alunos. Um mundo com conteúdos preocupados com o controle, em silenciar a voz do estudante compartimentados, rigidamente hierarquizados. Um mundo do que propriamente com o ato de ensinar, com o ato de comandado por adultos estranhos (p.48). Newton Ramos de transmitir o conhecimento de forma que os educandos o Oliveira (1995) amplia essa visão dizendo que a escola é um adquiram satisfatoriamente, ou seja, compreendam a realidade mundo separado, com sua lógica. Um mundo estranho (139). de forma a intervir nela. Portanto, percebe-se que os interesses Na realidade, os alunos nesta instituição são também como da escola estão em desacordo com os interesses do aluno. Mas estranhos para um espaço estranho com adultos estranhos. isso se deve a que? O que leva à alunos e professores terem Nesse sentido, ampliaríamos ainda mais essa visão, a escola é interesses diferentes dentro da escola? Na realidade, têm-se no uma instituição estranha composta por pessoas estranhas entre magistério professores-técnicos em detrimento de professores- si. Analisando o interior da escola pública percebe-se a não educadores. A diferença básica entre eles é que no primeiro identificação desta para com seus alunos e destes para com ela. caso o profissional age como se não existisse uma realidade Existem na verdade, dois mundos diferentes em permanentes que é por sua vez, dinâmica, carente de ser decifrada. Já o embates: o da escola e o do aluno, ou seja, os interesses de cada professor-educador busca entender e fazer entender esta 111 problemática realidade. Ele se envolve, acredita no potencial Este trabalho tem como objetivo estudar a questão da transformador da educação, acredita numa educação para a identidade em Dorian Gray. Analisaremos as características do emancipação. No dizer de Giroux (1987, p. 21), é o professor período Romântico onde existia um desejo de alterar o que já se assumir o seu papel de intelectual. É preciso trabalhar com o tinha concebido anteriormente em detrimento de uma princípio de que os professores podem ser "atores reflexivos". experiência nova. Essa premissa levou o indivíduo romântico a A escola deixou de ser considerada um espaço de luta, tornando ter um individualismo exacerbado, esse estigma, se deve ao um lugar onde vigiar e punir na expressão de Foucault (1975) é fato do ‘ser’ romântico ter tomado consciência da perda da sua a tarefa principal de todos, com objetivo maior de uniformizar identidade. O sentimento de revolta a esta ‘tomada de comportamentos, homogeneizar os pensamentos. Em outras consciência’ começa a ser expressado pelo afastamento da vida palavras, a escola está mais preocupada com o controle das prática e refúgio numa vida contemplativa. A evasão no tempo expressões, mesmo as mais simples e corriqueiras, do que e espaço é uma tentativa de recuperação da ‘unidade’ e propriamente com a formação de seres humanos capazes de identidade perdidas. O sentimento de rebeldia vai contra tudo intervir na realidade condicionada, isto é, de exercer o papel de aquilo que é limite ou regra. Começa aqui a complexidade na verdadeiros cidadãos. identificação das identidades, uma vez que o indivíduo romântico revela a problemática do desdobramento da Mesa 6 personalidade, caso de Dorian Gray (homem/espelho, homem A Questão da Identidade em Dorian Gray que vendeu a alma). Mara Regina Pacheco (PG-UEMS) Fernandes Ferreira (UEMS) A Questão Étnica na Obra “Viva O Povo Brasileiro” de João Ubaldo Ribeiro Rosana Pereira de Souza (G-UEMS) 112 é trabalho, a evocação do passado não é simples imagem a ser Com base na obra Viva o povo brasileiro de João Ubaldo visitada, pois envolve o processo de carregar a percepção do Ribeiro nota-se a valorização do negro como um suporte fato ocorrido na época, atualizando-o, modificando-o, para a fundamental da construção da identidade nacional, e esta atividade do presente. Condicionada, dessa forma, pela temática está inserida nos estudos pós-modernos que objetivam consciência atual do indivíduo, a lembrança, neste revisitar, resgatar as vozes de negros, índios, mulheres, homossexuais, sofrerá a interferência da visão de mundo atual. Ao tecer entre outros, que foram por muito tempo silenciados pela ótica considerações sobre a questão da memória coletiva discutimos eurocêntrica. a formação dos quadros sociais, a representação do ser e da Palavras-chave: o negro, e estudos pós-modernos. sociedade, no processo de construção e desconstrução da imagem de si, em suma da identidade. Memória coletiva e Construção de Identidade: aproximações e Considerações A Memória Coletiva Presente em “Minha cidade Era Assim” Ana Claudia Duarte Mendes (UEMS) de Emmanuel Marinho Kátia Silene Rodrigues (PG-UEMS) Estudar a memória como elemento na formulação do que se entende por identidade é estabelecer um diálogo com o que se Para trabalhar com a obra do poeta Emmanuel Marinho, considera fator importante na definição dos grupos sociais, no nascido em Dourados (MS), elege-se a perspectiva da análise processo de consolidação dos espaços coletivos e individuais. dos traços memorialísticos, e a possibilidade de estudar os Na formulação dos limites que separam as identidades poemas sob a perspectiva da formação de quadros sociais da individuais e coletivas, construídas pela necessidade de memória, observando os aspectos culturais e históricos sobrevivência das práticas sociais. Segundo Halbwachs lembrar presentes e que denunciam uma forte ligação com a nossa 113 região, mais especificamente da cidade de Dourados. Como formação de diferentes fundamentação teórica apresentaremos em largos traços a Dependendo das contingências sociais, alguns dialetos se abordagem da memória social, construída a partir da idéia de fortalecem, agigantam-se transformando-se em línguas ricas e grupos e dos quadros sociais da memória, abordados na obra influentes; ou definham, de sorte que, após alguns séculos Memória Coletiva de Maurice Halbwach (1990) que trabalha podem restar apenas fracos vestígios da língua-mãe. Nota-se aspectos da construção coletiva, como uma forma de pensar de que tal fenômeno tem ocorrido com a herança lingüística um determinado grupo social, pois o homem, junto com uma deixada pelos portugueses em sua época de maior potência sociedade, partilha e ajuda a construir a própria história. Para marítima. Por conseguinte, o intuito deste trabalho é levantar tanto escolhemos neste recorte o poema “Minha cidade era aspectos de alguns falares da Língua Portuguesa, mas, de modo assim”, no qual buscaremos perceber a construção da memória mais específico, enfocar as principais características do dialeto e do tecido poético. de Macau, que já apresenta fundas transformações. Para tanto, falares denominados dialetos. escolhemos um texto para ilustrar as mudanças fonéticoMesa 7 morfológicas no dialeto de Macau. Aspecto do Português em Macau: uma questão de dialeto Palavras-chave: Língua portuguesa; Geraldo José da Silva (UEMS) Macau; falantes. mudanças; dialeto; Raymundo José da Silva (UEMS) Estrangeirismos: Invasão ou Enriquecimento Lingüístico? Sabe-se que as línguas modificam-se naturalmente e, de acordo Thiago Teodoro Rupere (G-UEMS) com a história dos seus falantes, migram, ramificam-se. Deste modo, em contato com outros indivíduos e nova geografia, O presente trabalho tem o intuito de apresentar e discutir surgem parcialmente o projeto de lei do então deputado federal pelo mudanças mais profundas que contribuem para a 114 (PcdoB) de São Paulo, Aldo Rebelo, o qual propunha a defesa e promovendo a substituição dos tradicionais manuscritos promoção da língua portuguesa contra a suposta invasão de guardados a “sete chaves” pelos novos blogs digitais, onde, vocábulos provenientes de outras línguas, sobretudo os além de serem possíveis todas as combinações semióticas do provenientes da língua inglesa. Por final, apresentar alguns hipertexto, verifica-se uma mudança radical de comportamento exemplos de palavras estrangeiras incorporadas à língua dos locutores do enunciado, que expõem virtualmente ao portuguesa, mostrando alguns aspectos diacrônicos inerentes às “mundo mesmas, bem como refletir sobre a evolução lingüística que possibilitando a invasão de privacidade característica do mundo permeia todas as línguas e povos, muitas vezes influenciada pós-moderno. Dessa forma, analisar esse diário íntimo digital, pelos empréstimos feitos de uma língua em evidência para seu estilo e conteúdo face às intenções do locutor e aceitação outra. do alocutário, comparando-os ao do diário tradicional, constitui inteiro” os seus enunciados mais íntimos, o objeto deste estudo, que tem por objetivo pesquisar as Mesa 8 características das novas formas de expressão linguageira nesse Dos Diários Íntimos Tradicionais ao Blogs Virtuais tipo de mídia digital, incluindo as possibilidades pedagógicas Luciane Silva Castro(G-UEMS) que a mesma oferece à educação atual. Palavras-chave: O terceiro milênio caracteriza-se pelo advento da cibercultura diários tradicionais; blogs virtuais; possibilidades pedagógicas dos blogs. veiculada pela Web, cuja tecnologia digital propiciou um novo espaço de escrita, sendo que a essência dessa nova cultura é o A Construção Colaborativa do Plano Municipal de Educação hipertexto, que pode incorporar todas as outras formas de mídia de Nova Andradina-MS digital (imagens, animação, sons, simulações). Em relação à Sandra ALBANO DA SILVA (UEMS) escritura de diários íntimos, a nova linguagem digital vem 115 Esta comunicação visa expandir a experiência que tive como O Texto Escrito e a Imagem: na Obra Marcelo Marmelo coordenadora da construção colaborativa do Plano Municipal Martelo e Outras Histórias de Educação de Nova Andradina (MS). Este trabalho foi Nilza Pires dos Santos Silva (PIBIC/UEMS) eminentemente participativo pois, de início, foi convocada pelo Secretário de Educação uma reunião com representantes de O texto escrito e a ilustração apresentam contribuições todos os órgãos e instituições envolvidos com a educação do específicas para a leitura integral da história, e, portanto, têm município, do qual foi retirada uma segunda comissão que funções diferentes no conjunto. O texto escrito designa as representaria os diferentes segmentos: SEMEC, UEMS, SEE, personagens, os ambientes, os objetos, cumprindo, por sua vez, SINTED, Câmara Municipal, Escolas municipais, estaduais e a função de complementação, preenchendo lacunas e particulares através de diretores e coordenadores), pais de dissipando ambigüidades da imagem. Nesta esteira, a alunos e alunos da rede regular de ensino. Essa comissão foi a articulação entre texto e imagem, deve ser equilibrada. grande elaboradora do Plano, sendo que buscavam nas suas proposta deste trabalho é mostrar a articulação entre o texto bases opiniões e sugestões acerca das temáticas a serem escrito e a imagem na literatura para crianças a partir da obra constituídas no documento em questão. Todos tinham vez e voz Marcelo Marmelo Martelo e Outras História de Ruth Rocha. A e podiam sempre influenciar os rumos da construção do Plano justificativa se faz à medida que a imaginação e as experiências que está em trâmite para a aprovação pelo legistativo do leitor interagem para estabelecer as relações de sentido municipal. Dessa forma, seguimos a Lei de Diretrizes e Bases mediadas pelos códigos da palavra escrita associada à da Educação Nacional 93.94/96 quando em seus artigos 9º e 87 ilustração. Diante do exposto, o trabalho tem como objetivo indica a obrigatoriedade de que a União, os Estados e todos trazer à tona a relação texto/imagem em suas dicotomias e Municípios do país construam o referido documento. avaliar o impacto desta relação no processo de recepção da obra. A 116 Estudos do Léxico Regional Falando Através da Escrita: uma característica da linguagem dos Webchats O Léxico na Música Regional de Mato Grosso do Sul Juliana Ceobaniuc da Silva Michelini (UEMS) Coordenadora: Marineide Cassuci Tavares (PIF) Alaíde Pereira Japecanga Aredes (UEMS) Maria Conceição Alves de Lima (UEMS) Considerando a definição de Sapir (1969: 44) de que a língua é um complexo de símbolos que reflete o quadro físico e social O terceiro milênio caracteriza-se pelo advento da cibercultura no qual se encontra um determinado grupo, procuramos realizar veiculada pela Web, cuja tecnologia digital propiciou um novo o estudo do vocabulário presente em letras de músicas que espaço de escrita. O objetivo principal deste trabalho consiste retratam a condição sócio-cultural de moradores do Pantanal em analisar essa nova forma de enunciação utilizada nos bate- sul-mato-grossense. As letras de músicas selecionadas para papos virtuais, pautada numa oralidade escrita que pretende compor o corpus são do Grupo Acaba, reunido desde 1971, representar a conversação no ambiente virtual, através da coleta cujas músicas demonstram as alegrias e os dissabores de um corpus suficientemente extenso na Web, que permita a vivenciados no dia-a-dia pelo povo pantaneiro. Objetivamos, caracterização dessa nova maneira de falar escrevendo. Através no âmbito lexical, verificar a presença do regionalismo nas deste estudo, buscamos compreender esse novo tipo de escrita letras de músicas do Grupo, e divulgá-lo, entre os sul-mato- utilizada principalmente pelas novas gerações, o qual, grossenses, que nem sempre têm contato com informações provavelmente, terá importantes reflexos na história da língua e sobre sua própria cultura, e entre moradores de outros estados, no ensino escolar da linguagem. que, por vezes, devido às grandes extensões geográficas dos territórios são impossibilitados de conhecer. Para esta Mesa 09 comunicação selecionamos três músicas: Vaca tucura, Boi 117 pantaneiro; Ciranda pantaneira; A última cheia. As letras de ser levada para a sala de aula. Isso porque, a escolha em música retratam elementos locais como a fauna (tuiuiú, boi, analisar letras de música não se esgota facilmente. Inúmeras vaca, burro, cavalo, caititu, ariranha, piranha...), a vegetação questões poderiam ser abordadas envolvendo esse tipo de (carandá, tarumã, jenipapo, caraguatá, urucum...) o ambiente análise, como acontece com outros temas ligados ao Mato (cheiro de lodo, terra molhada, boi que passa, bule esquecido, Grosso do Sul, como a questão indígena ou a situação de águas barrentas, molhado pela cheia...) o homem (peão que fronteira Brasil/Paraguai. Muitos outros artistas “cantam o grita, de pele queimada, cheiro de camalote, gosto de tarumã, Pantanal”, ou o Mato Grosso do Sul e, nem sempre, sabemos pintar o corpo...). A letra da música Vaca tucura, boi pantaneiro utilizar as letras para (nos) ensinar/informar. A idéia do estudo recupera dois animais essenciais para a lida diária dos é unir a informação e a preservação cultural pantaneira com a moradores do Pantanal: o boi e a vaca. Para explicar a utilidade Lexicologia, fazendo com que um auxilie o outro. A análise do desses amimais os autores das letras das músicas os associam conjunto de unidades lexicais permitiu-nos a confirmação da as suas atividades diárias e, para isso, utiliza vocabulário importância do léxico como forma de registro dos costumes de pertencente à realidade pantaneira. Já na música Ciranda uma comunidade e da forma de um grupo representar a Pantaneira são retratados o homem pantaneiro e os principais realidade através da linguagem da música. É possível observar, elementos que os cerca: os animais e as plantas. Da música A por meio do estudo da linguagem, questões que refletem um última cheia, recolhemos os vocábulos que recuperam determinado meio, visto que “a língua é, antes de tudo, um elementos da fauna e da flora pantaneira, retratando a produto cultural, ou social, e assim deve ser entendida” importância dos mesmos e a tristeza do homem ao perceber que (SAPIR, 1961: 26). o seu mundo está ameaçado. A idéia inicial do trabalho foi a de encontrar caminhos para um estudo mais prático na área do Vocabulário de Fronteira: a influência cultural do Paraguai léxico, e o de fornecer uma opção de análise textual, que deverá Andréia dos Santos Fernandes (FPI) 118 Nábia Massaroto da Silva (FIP) transcrição grafemática. Para a realização das entrevistas foi utilizado um roteiro organizado com base no questionário Atlas Por meio da linguagem, podemos nos comunicar e nos Lingüístico de Mato Grosso do Sul (ALMS), com questões entender, independente da cultura, do credo religioso e da adaptadas, relacionadas aos hábitos e costumes de moradores classe social, e é o estudo do vocabulário de um grupo que de um município na região de fronteira, Brasil/Paraguai. Os possibilita o conhecimento desse universo sócio-cultual. O dados foram coletados na cidade de Coronel Sapucaia- MS, por vocabulário fornece ao homem a chave para a entrada no meio de 08 informantes, nascidos ou que residem no município mundo, já que não é possível estudar aspectos de uma há mais de 10 anos, com pouca escolaridade, ou escolaridade sociedade sem levar em consideração a linguagem utilizada. É máxima de 5ª série do Ensino Fundamental, de duas faixa etária necessário observar o léxico e analisar as lexias, porém, sempre – 17 a 25 anos, e acima de 60 anos –, sendo 4 informantes do levando em consideração o meio em que o falante vive e suas sexo masculino e 04 do sexo feminino. Os dados foram variações. Fundamentado nesse princípio, foi desenvolvido um divididos em dois campos léxicos: erva e comidas típicas. O estudo lexical que levou em consideração as variantes campo erva, foi subdividido em dois subcampos: chimarrão e lingüísticas e teve como ponto de partida a seguinte tereré, e o das comidas típicas teve a subdivisão em chipa, sopa investigação: Coronel Sapucaia (Brasil), fronteira com Capitan paraguaia, feijão poroto e mandioca. Por meio do estudo, além Bado (Paraguai), sofre influências, percebidas nas unidades de detectar aspectos culturais, observamos algumas marcas lexicais, dos hábitos e costumes do país vizinho, cidades de históricas. Cultural, por exemplo, porque o ato de tomar fronteira que se dividem apenas por uma avenida, em especial chimarrão serve para aproximar as pessoas, já que é nesse no que se refere à alimentação e a erva mate, muito comum na momento que as famílias geralmente costumam conversar os região fronteiriça. A coleta de dados ocorreu por meio de assuntos rotineiros e também assuntos pessoais restritos, dos entrevistas gravadas, e posteriormente transcritas por meio de quais crianças não participam. Históricas, como a origem do 119 hábito de tomar chimarrão, que é comum na região Sul do país. essa influência, já que não se pode conceber uma língua sem Como houve uma grande migração de gaúchos para o Mato uma sociedade e nem uma sociedade que não seja organizada Grosso do Sul, o chimarrão foi trazido junto com o povo em função da linguagem. sulista. A análise demonstra também o hábito fronteiriço, as rodas de tereré que, por ser uma bebida de fácil preparo, pode Uma Visão da Linguagem da Religião e da Crença ser tomada em qualquer lugar e horário. As pessoas costumam Cíntia Arce (G/FIP) tomar tereré nos finais de semana, em rodas de amigos (principalmente os jovens) cujo costume serve para aproximá- O ser humano desde a antiguidade e principalmente nos dias los. É tomado também nos momentos de bate-papos e até atuais tem se beneficiado cada vez mais da linguagem, sendo mesmo em algumas reuniões de negócios. Dentre as comidas esta, essencial para a comunicação. É por meio dela que típicas destacam-se a chipa, a sopa paraguaia, o feijão poroto e podemos nos identificar e nos integrar em sociedade. A a mandioca. Chama atenção a forma como se preparam esses importância da linguagem para a vida das pessoas manifesta-se pratos, como a mandioca que, na região, sofre influência do tanto na fala quanto na escrita, e para a nossa pesquisa povo indígena da fronteira. O alimento é cozido sem tempero, e consideramos a língua falada pelos informantes, que possibilita acompanha todas as refeições. É uma comida tipicamente o estudo das variantes, que são justificadas na região de paraguaia, mas que influência a culinária brasileira. Através da fronteira em relação às crenças ou costumes e religião. Daí a análise dos dados examinados neste trabalho, concluímos que relação direta entre língua e sociedade. Por acreditarmos que o os hábitos e costumes alimentícios dos moradores de Coronel vocabulário revela aspectos culturais de um grupo, o trabalho Sapucaia, bem como de alguns outros habitantes de Mato visa uma investigação da relação língua, cultura e sociedade, Grosso do Sul são influenciados pela cultura paraguaia e vice- que será obtido por meio do estudo do léxico dos campos versa. E que é por meio da linguagem que podemos detectar crenças e religiões, do município de Ponta Porã- MS fronteira 120 com Pedro Juan Caballero- PY. Para a realização do trabalho povo vizinho do Paraguai e sendo o temor ao inferno maior foi coletado um corpus de dez entrevistas – cinco informantes entre os moradores de baixo nível escolar. Contrariamente à do sexo feminino e cinco do sexo masculino, com duas faixas Inferno alguns informantes acreditam que após a morte, o etárias: dezoito a vinte anos, e acima dos cinqüenta anos de homem vai para o Paraíso, já que, quem morre, pode ir também idade. O roteiro de entrevista foi adaptado do questionário do para o paraíso ao qual estão associados os vocábulos céu e ALIB – Atlas Lingüístico do Brasil - e composto de sete Deus. Do campo Encontro com Deus destacam-se as lexias questões, todas relacionadas ao tema da pesquisa “crenças e missa, igreja e cemitério. Chama a atenção, o vocábulo religiões na fronteira Brasil/Paraguai”. O campo da religião cemitério, que, segundo alguns informantes, é o local de subdividiu-se em dois sub-campos: pós-morte e encontro com acender velas, levar panos de cruz, e conversar com Deus. Há Deus; do campo da crença resultaram os subcampos coisas que na região de fronteira uma grande tradição católica ligada à dão sorte e coisas que dão azar. Esses campos e sub-campos igreja e ao cemitério. Quanto ao cemitério o laço é muito demonstram uma presença cultural muito arraigada que pode grande porque as pessoas não somente sepultam os queridos ser observada a todo momento nas falas dos informantes, que que já se foram, mas, fazem visitas semanais e passam esse demonstram ora crença muito grande na religião, em especial costume de geração a geração principalmente entre os povos do no catolicismo, ora em crenças populares. Destacamos o sub- lado paraguaio que não deixam faltar água, vela e pano de cruz campo pós-morte, ligado à religião, do qual destacamos as aos mortos.O trabalho demonstrou o poder que as palavras têm lexias inferno e paraíso. Inferno recupera um lugar que possui de transmitir informações de uma dada sociedade, ao passo que fogo segundo a crença popular. Ao inferno estão associadas as possibilitou o estudo de aspectos sociais e culturais lexias fogo, medo, coisa ruim e queima em fogo que denotam relacionados aos moradores do município de Ponta Porã-MS, lugar assustador. Detectamos o campo da religião, que na bem como as relações existentes com o povo vizinho, residente região de fronteira Brasil/Paraguai é muito forte devido ao em Pedro Juan Caballero-PY, o que torna a cultura fronteiriça 121 ainda mais rica. Isso porque o morador de uma região de Retratos, de Flora Egídio Thomé e mais dois de Via Sacra de fronteira traz consigo a miscigenação de duas ou mais culturas Raquel Naveira, na perspectiva de observar a construção do sobrecarregando assim valores sócio-culturais, regionais que discurso a partir dos fragmentos de memória, presentes no podem ser explicadas através de estudos lingüísticos. tecido poético, bem como pontuar as imagens recorrentes que Comprovou-se, assim, que o ambiente sócio-cultural influencia permeiam essa produção. Para tanto, nos aproximamos do a maneira de pensar e agir de um indivíduo em um determinado conceito de memória coletiva, de Maurice Halbwachs, a fim de grupo, sobretudo no nível lexical. discutirmos a questão da memória individual e coletiva, no processo de percepção e construção do texto poético, pois, Mesa 10 compreendemos o ato de lembrar como trabalho, e nesse labor Os Quadros Sociais da memória: a poesia de Flora Egídio o indivíduo que lembra nunca está só, dialogando com sua Thomé e Raquel Naveira consciência estão o grupo social, a tradição e a linguagem. Para Ana Cláudia Duarte Mendes (UEMS) o teórico, a seleção dos conceitos e idéias é trabalho individual, mas isso não implica que esta seja independente, pois considera Trabalhar com a memória é construir a ponte entre presente e a lembrança produto de um determinado meio, uma vez que o passado, encontrar no nosso fazer cotidiano traços de costumes indivíduo lembra daquilo que faz sentido para seu atual grupo bem anteriores, montar o mosaico que forma as imagens social. Podemos observar que as obras selecionadas estão recorrentes que nos identificam. Para compor esse trabalho permeadas de imagens recorrentes do passado, mas no processo selecionamos as obras das poetas sul-mato-grossenses – Flora de composição poética, as lembranças atendem ao chamado do Egídio Thomé e Raquel Naveira- . A fim de estudar a presente, o que atesta a presença de uma poesia que reflete a si conformação destes “quadros sociais da memória”, presentes mesma, e o mundo ao seu redor, possibilitando-nos um diálogo nesta produção poética, escolhemos dois poemas das obras: com o passado, refletido no presente. Ao considerar que as 122 poesias escolhidas nos falam das relações sociais, contam mas uma maneira de tornar-se novamente presente, por meio de histórias de lugares e pessoas, visitam mitos, e, ao mesmo narrativas, histórias, situações, atos que pela arte da narrativa tempo, realizam-se enquanto texto poético, estruturado e invadem – novamente – a consciência. Deste modo, segundo inscrito em uma linguagem demarcada, pois construída a partir Halbwachs, a consciência atual é estabelecida pelo grupo social de imagens, que abarcam formas, texturas, cores, e exploram ao ao qual pertence aquele que lembra. A própria imagem máximo a percepção dos sentidos, criando significados. suscitada só deverá fazer sentido se estiver dentro dos Estamos diante do fenômeno de narrar – representação de uma parâmetros sociais de determinado grupamento. tarefa individual – a atividade poética torna-se um ato solitário que, ao compor cenários passados, dialoga com as vozes da O Discurso da Tríade: poder, sexo, dinheiro em Arthur de “tradição”. Apesar de só, o poeta carrega em si o “outro” de Azevedo modo que a sociedade, a família, as leituras misturam-se na Mara Regina Pacheco (G/UEMS) produção dos significados. Nesta tarefa particular de seleção das lembranças realiza-se a narrativa que conta o passado, com A Capital Federal escrita em 1897 por Athur Azevedo, registra a vigilância e valores presentes do ser que lembra e escreve. um padrão de humor nacional com uma valiosa descrição dos Uma vez que ao se tentar alcançar as sensações e experiências, costumes de uma época decisiva na formação da sociedade as reduzimos e traduzimos em linguagem, alterando-as, dessa urbana brasileira. Essa maneira de escrever comicamente e com forma, as concepções e a visão de mundo do indivíduo no ironia os acontecimentos de sua época, é descrito por Orlandi momento presente passam a influenciar e atuar nas percepções (1988, p. 48) como as relações e inter-relações de sentido passadas. Então o olhar – que estrutura o poema – volta-se para dentro de um discurso. Segundo o estudioso, a significação não o passado e move-se no espaço da memória. Esta pode ser uma se desenvolve sobre uma linha reta, calculável, segmentável, os forma de atualização do que já foi; não uma volta ao passado, sentidos são dispersos, se desenvolvem em todas as direções e 123 se fazem por diferentes matérias. Arthur Azevedo usa desse onde construíram sua identidade cultural. Nestes casos, o subterfúgio ao escrever: faz uso da dualidade, da ambigüidade, responsável pela obra repassa uma indenização aos antigos da alteridade, da multiplicidade, da complexidade. Em A moradores/proprietários, que reivindicam o pagamento em terra Capital Federal podemos detectar “silêncio múltiplos”: o e o Estado, em dinheiro, decorre daí, a maioria dos conflitos. É silêncio das emoções, o da contemplação, o da introspecção, o o antagonismo da sociedade organizada em que atuam da revolta, o da resistência, o da disciplina, o do exercício do diferentes agentes sociais, cada qual age conforme seus ideais, poder, o da derrota da vontade e etc. Aqui estabelece-se a interesses e demarca território sob a égide das lutas de força. tríade: poder, sexo e dinheiro, três forças poderosas e de Tomando como objeto de estudo o discurso do ex-ribeirinho embate eterno que dão vida e engendram o discurso narrativo em confronto com o discurso do Estado (CESP – Companhia de Azevedo. Energética de São Paulo), ancorados em princípios metodológicos de Análise de Discurso de linha francesa, buscaEx-Ribeirinho: discurso e identidade se, mediante recortes de enunciados coletados em entrevistas e Neuraci Vasconcelos Reginaldo (PG/UFMS) outros documentos, desenvolver estudos que contribuam para tornar visíveis as relações discursivas entre o oleiro - na O processo brasileiro de modernização industrial, com a condição de “excluído”- em confronto com o discurso da crescente urbanização e o conseqüente aumento do consumo Estado (CESP), bem como analisar as modalidades de sentidos energético, tem levado o país a optar pela construção de Usinas possíveis, reconstruir seus processos históricos discursivos e Hidrelétricas. construção de sua Tais empreendimentos são planejados e identidade tomando como referência executados com vistas ao desenvolvimento econômico do país. empírica o caso Reassentamento Nova Porto João André no Todavia, este “desenvolvimento” ocorre, ao mesmo tempo, que município de Brasilândia – MS. centenas de famílias são desalojadas dos lugares de seu habitat 124 Mesa 11 envolvidos responderam a um questionário que versou sobre as O Preconceito e o Racismo nas Escolas Públicas e Particulares DST/AIDs. Em seguida fizemos uma avaliação do trabalho. de Nova Andradina Estes são a priori assustadores. Notamos que há entre os jovens Leuzeni Moreira Dias (G/UEMS) mais preconceitos do que imaginava. Como vivemos numa Alaíde Pereira Japecanga Aredes (UEMS) sociedade moderna, não pensei que fosse encontrar tantos conceitos racistas nesta significativa parcela da população. O referido projeto pretende contribuir para a promoção da Dentre os preconceitos, o mais destacado foi em relação aos conscientização por parte dos jovens das escolas públicas e homossexuais e se este for negro, o preconceito é ainda maior. particulares no que tange à questão do preconceito e racismo Percebemos nas faces deles expressões horríveis quando em relação ao portador das DSTs, de modo especial os indagamos se este homossexual fosse negro qual seria a reação, portadores do vírus HIV, de modo mais especial ainda, se o inclusive, vale salientar, que no grupo havia um adolescente portador algumas negro que tem um irmão que é “gay”. No último dia de nossas atividades junto aos alunos participantes deste projeto. Estas se atividades este jovem não apareceu, pois não queria mais tocar realizaram no período de 30/04 à 01/05/2006. Técnicas como no assunto. Ficamos curiosas por saber o porque daquela “Embolação”, “o boneco” e a dinâmica “chuva de palavras”, reação e onde e como construiu este preconceito, sendo ele foram trabalhados, com o intuito de abrir a discussão sobre o afrodescendente, vulnerável, portanto, ao preconceito, é assunto. Começávamos sempre com uma brincadeira para também preconceituoso. Certamente não nos contentamos por depois ir para o debate e tais brincadeiras tinham o objetivo de aqui, o trabalho continua. chamar a atenção para o tema. E depois das técnicas, assistiam Palavras-chave: a um filme. Trabalhei com os seguintes filmes: “O Animal” e adolescente é afrodescendente. Desenvolvemos “AIDs – aconteceu comigo”. No último dia os jovens Racismo, Preconceito, DST/AIDs e 125 O Burnout: a síndrome de desistência que pode causar a sentimento muito forte de tensão emocional que produz uma falência na educação sensação de esgotamento, de falta de energia e de recursos Ednalva Regina Oliveira Alves (G/UEMS) emocionais próprios para lidar com as rotinas da prática profissional e representa a dimensão individual da síndrome... A chamada Síndrome de Burnout é definida por alguns autores, Num primeiro momento é um fator de proteção, mas pode como por exemplo, Wanderley Codo (1999) como uma das representar um risco de desumanização, constituindo a conseqüências mais marcantes do stress ocupacional, que se dimensão interpessoal de Burnout. (PERNAMBUCO, 2002, p. caracteriza por profundo sentimento de frustração e exaustão 32). Diante deste quadro, ousamos afirmar que se trata de uma em relação ao trabalho desempenhado. É uma síndrome através situação que merece um olhar especial, pois de nada adianta da qual o trabalhador perde o sentido da sua relação com o apontarmos para este mesmo professor novas formas de trabalho, de forma que as coisas já não o importam mais e ensinar, novas tecnologias de ensino, novos Parâmetros qualquer esforço lhe parece ser inútil. Assim também se sente o Curriculares etc, se não consideramos esta realidade como um professor, pois: O Burnout não ocorre de repente, é um começo da ruína do Ensino Público Brasileiro, como diz processo cumulativo começando com pequenos sinais de alerta, Wanderley Codo, a Síndrome do Burnout pode levar à falência que quando não são percebidos, podem levar o professor a uma da Educação. Na verdade os professores estão tristes, cansados sensação de quase terror diante da idéia de ter que ir à escola de serem apontados pelos fracassos da escola, cansados por não (LIPP, 2003, p 65). O professor por se envolver afetivamente serem valorizados pela sociedade, enfim, cansados de serem com seus alunos, se desgasta, não agüenta a pressão, chegando maltratados por quase todos os setores da vida social. A a um extremo. Assim é fácil perceber que a Síndrome do pesquisa Fizemos um minucioso levantamento sobre as Burnout é um dos principais problemas dos profissionais de licenças médicas que têm ocorrido nos últimos anos no que educação. A exaustão emocional é caracterizada por um tange aos professores de Língua Portuguesa, bem como 126 entrevistas com professores que abandonaram a profissão escolas públicas? Responder estas questões não é fácil, mas docente, a fim de descobrir o porque do abandono, dos ignorá-las também pode ser perigoso para o futuro da Educação desapontamentos, dos conflitos com a escola e com os alunos, Pública. as exigências, os acúmulos de faltas etc; O resultado é mais grave do que parece, professores cada vez mais jovens A construção da Leitura e da Escrita num Adulto, Trabalhador queixam-se dos sintomas relacionados à síndrome do burnout, e Rural o curioso é que estes recusam a admitirem que precisem de Regina Albano da Silva (SP) ajuda. Esta síndrome causa inseguranças e medos na pessoa do professor, este se vê sozinho, abandonado e desprestigiado A linguagem e o seu papel na constituição do sujeito e das socialmente. Tudo isso colabora para o mal estar, que pode ideologias aparecem nas idéias de Vygostky e Bakhtin, que levar à desistência de ser professor. Este estudo que ora apesar de seguirem caminhos diferentes em seus estudos, levam apresentamos está em desenvolvimento, mas já é possível a um ponto essencial: a linguagem como espaço de recuperação perceber que muitos problemas afligem os professores da do sujeito como ser histórico e social. A escrita, como forma de escola pública e são estes problemas citados acima, que os linguagem, não pode ser dissociada dessa recuperação, uma vez afastam da sala de aula. E em Nova Andradina o número é que na sociedade em que vivemos atualmente a escrita e a assustador. As estatísticas mostram que cerca de 80 % destes leitura estão presentes em inúmeras situações cotidianas. já tiraram licença por motivo de saúde. Esta informação é Emília Ferreiro e Ana Teberosky, na Psicogênese da Língua grave, podemos até questionar: qual é mesmo a qualidade de Escrita, demonstram que o sujeito passa por fases ou níveis na vida do professor em seu ambiente de trabalho? Quem é construção da escrita e isso se inicia muito antes que a escola mesmo o professor da escola pública? O que estes pensam imagina, pois, o sujeito tem sua própria forma de ler e escrever. sobre si mesmos e sobre a situação em que se encontram as Paulo Freire, em seu trabalho com alfabetização de adultos, vê 127 a leitura e a escrita como formas de libertação, ou seja, grosso social, uma vez que, no caso do adulto, muito mais do que para modo, a leitura e a escrita não devem servir para legitimar a a criança, a leitura e a escrita “abrem portas”, que lhe divisão de classes, mas sim para que o sujeito tenha consciência possibilita um novo olhar para a realidade. O saber ler e dessa divisão e tente transformar sua realidade, através do escrever para o adulto tem outra dimensão, pois ele se percebe exercício da cidadania. O trabalho de alfabetização com o como cidadão, embora a leitura e a escrita não sejam essenciais adulto, trabalhador rural revelou sentimentos distintos por parte para o exercício da cidadania e nem para a conquista da dele: vergonha, no início, por não saber ler e escrever numa mesma, mas somente um componente para o exercício e sociedade que cobra a todo o momento tais competências; construção da cidadania e ao mesmo tempo a alfabetização é orgulho, por se sentir capaz de escrever o próprio nome e já instrumento na luta pela conquista da cidadania, ou seja, é uma saber o alfabeto, enquanto outros companheiros de trabalho não forma do indivíduo buscar o que lhe é negado. Dessa forma, o sabem; exultação, por já ler e escrever razoavelmente bem alfabetizar um adulto requer que o educador tenha habilidades e diversas palavras e se sentir parte do mundo. Nesse trabalho de competências para que possa atender as expectativas desse alfabetização, as palavras geradoras (Paulo Freire) nortearam o adulto, que possui outras que não são as mesmas das crianças, trabalho e o que mais chamou a atenção foi que as mesmas embora os processos pelos quais passa sejam os mesmos. A fases pelos quais as crianças passam, segundo Emília Ferreiro e cidadania também tem outra conotação que não é a mesma Ana na quando se trata da criança, isto é, no caso do adulto, alfabetização de adultos. Assim, analisando os estudiosos alfabetização e cidadania só podem estar juntas se houver citados anteriormente, houve as seguintes constatações: a clareza de ideologia e das políticas que as envolvem. Somente linguagem tem função histórica e social; os processos de assim, a alfabetização será instrumento de conquista e de construção da leitura e da escrita são os mesmos, independente exercício da cidadania. É por isso que esse trabalho de da idade; a escrita e a leitura são mecanismos de inserção alfabetização específico foi enriquecedor, pois ao alfabetizar o Teberosky encontraram, também aparecem 128 adulto em questão houve a possibilidade de perceber as com flexibilidade e aceitação das diferenças e aquisição de sua dimensões que algo tão comum (ler e escrever) para aqueles autonomia, adquirindo poder de agir e pensar, de forma a que já o fazem, pode ser complexo e fundamental para quem desenvolver a sensibilidade. Contribuindo assim para a não o faz e o quanto isso muda a forma desse sujeito se construção de um ser crítico e cidadão, com auto-estima perceber e perceber sua realidade. estruturada. Palavras-chaves: O Teatro Inserido como Apoio Pedagógico no Ensino Linguagem Jurídica, Argumentação, Discurso. Fundamental Vilma Marques Dutra da Cruz Natal (UEMS) Mesa 12 Alaíde Pereira Japecanga Aredes (UEMS) O Análise do Discurso nas Produções de Texto. O Caso da E. M. Efantina de quadros O texto inserido como apoio pedagógico, explora e elabora Alaíde Pereira Japecanga Aredes (UEMS) textos, encena a própria linguagem teatral e dá fundamentos Michelli Fernanda de Souza Dan (G/UEMS) para o desenvolvimento educacional em sala de aula, na família Letícia de Fátima Dias Wedekin de Oliveira (G/UEMS) e comunidade, articulando diversos saberes que são adquiridos Mauro Eduardo de Souza (G/UEMS) e que são necessários para fortificar esse desenvolvimento concretizando sonhos, expectativas e mais além, proporciona A Escola Municipal Efantina de Quadros situa-se em um dos sanar dúvidas de competências, fobias e seus conflitos, criando bairros mais carentes da cidade, “Morada do Sol”, A referida assim cumplicidade aluno, professor, escola e comunidade. escola é carente em todos os sentidos. Grandes autores foram Portanto, abrindo fronteiras para a busca de novos saberes, pesquisados para a viabilidade deste projeto e para alcançar as necessários para se viver de forma digna e agradável, agindo metas traçadas para a leitura e a escrita, houve um 129 aprofundamento teórico com Antônio Gil Neto, Beatriz Citelli Acordar e não poder te tocar, nem abraçar, / Medo da realidade, e Eglê Pontes Franchi. Segundo Neto (1996), a escrita é algo da saudade, / Mas nunca tive medo de gritar bem alto, / Que eu espetacular, parece poético, mas não é. Ninguém escreve só te amo muito, sentimento incomparável... / E que ser mãe é para ser aprovado na escola. Escrever é manifestar à vontade, a tudo!È / Se pudesse não daria apenas uma estrela, / Lutaria para emoção, a história, história de vida, história de um país, de um conseguir a constelação inteira. / Seu afago superior me a Estado, de uma cidade e assim através da escrita percebe-se a calma, me felicita, / Amor inigualável, flor especial, em nossas ideologia presente nos textos. O maior desafio para um docente vidas, / O coração de mãe não tem limites, / Sentimento único, é mostrar ao aluno uma maneira diferenciada de ler e escrever semblante de luz, / Jóia rara, incomparável, ser inexplicável, / através da produção de textos, como interpretar textos e diante Mãe pensamento fixo de sinceridade, / Anjo de luz, matriarca de outros textos serem capazes de criar novas histórias e que o da vida... / Ser mãe é uma dádiva de Deus, benção total, / É o mundo da poesia faça parte do cotidiano, demonstrando através resultado de todo amor e carinho do mundo. / Afinal, ser mãe é das mesmas à ideologia que está presente na sociedade. Então tudo... / História é Arte / História é arte, filosofia é cultura, / ao criar um poema a perfeição foi inédita, os alunos Esporte é a cultura que renasce. / Essa cultura que mata a perceberam que eram capazes, através daquele poema “MÃE É floresta / Que acabará com uma geração... / Se as atitudes TUDO” acreditaram que poderiam escrever qualquer texto. humanas não mudarem, / Matas, animais e até mesmo pessoas Seguem os poemas produzidos por eles. MÃE É TUDO / A tudo pErecerá. / Consciência, amor e respeito essência que minha vida não é vida, / Sem a tua vida querida mamãe... / Ser falta, / Sonhos que se destroem e se desmaterializam. / Porque mãe não é gerar filhos! / E sim saber amar, é compreender, é não guardar com carinho, o passado... / A memória um dia se querer, / Viver sonhos, realidades, é ter saudades... / Mas eu perderá no tempo / Ser velho, antigo é ser e ter história. / Cada tive medo mãe, / De não ser o que sou hoje. / Mãe eu tenho ser, objeto ou pessoa tem passado, / Sentimentos manifestados medo de te perder, / Medo te de esquecer, jamais te ver... / e concedidos / Seja presente, para ter um glorioso passado. 130 (Ana Paula) / Visita ao Museu de Nova Andradina / Se você Muito se tem discutido acerca da Educação, mas o que chama a nunca viu uma onça empalhada? / Não fique nervosa... / Vá ao atenção é o fato de que o professor é normalmente considerado museu de Nova Andradina / E lá estar exposta! / Você já viu como maior responsável pelos problemas educacionais que um jacaré empalhado? / Isso não é nada não... / No museu de vem ocorrendo no Brasil e no mundo afora. Infelizmente o Nova Andradina / Tem um que é bem grandão. / Talvez você educador ainda não é reconhecido como deveria e existem não era nascido, / Mas o museu de Nova Andradina tem / muitos estudiosos que defendem o professor como profissional Aqueles telefones antigos, / Que rodam com a mão também... / que é. Segundo Borges-Unesco/Brasil, os professores são os Talvez é de sua época, Talvez não, / Aqueles dinheiros antigos, trabalhadores mais qualificados, “mais de metade dos / Lá tem de Montão. / E para finalizar / Algo que antigamente trabalhadores com ensino superior trabalha em educação”, no tinha de montão, / O querido “PAU BRASIL” / Que hoje está entanto, os professores estão sofrendo com a grande em extinção... (Itamara) / Amor / O amor é a união; / O amor é responsabilidade que está sobre seus ombros. Deve-se a loucura; / O amor é o coração; / O amor é a doçura / O amor é reconhecer a vida , / È a luz... / O amor é a importância, responsabilidade, e que seu trabalho é claro depende de muita Da vida, o amor é a importância de tudo de bom. / O amor é um competência e qualidade, mas não se pode generalizar a sentimento, / Reduzido em uma simples / Palavra que é paixão. situação colocando-o como único responsável pela “bagunça” / O amor é o mais / Puro sentimento. / Que se resulta na vida.. em que se encontra o ensino. No que diz respeito aos (Vanilda). professores a muito que ser dito e estudado, mas é interessante que ao professor é dada uma grande apontar aqui, que a educação em geral vive em constantes Uma Reflexão sobre Formação de Professores transformações e mudanças. Ao fazer uma retrospectiva Rita de Cássia Marcon (G/UEMS) histórica do sistema educacional brasileiro percebemos que sempre existiram problemas relacionados ao ensino e a escola, 131 pois a cada época ou período político a culpa era dada a um politicamente e coloca a educação a serviço do que nomeou sujeito diferente. Segundo Veiga (1996), no período de 1549 a desenvolvimento” (Pietri: 37). Com isso foi preciso aumentar o 1930 o sistema de ensino brasileiro era catequético (religioso), número de professores e por falta de profissionais, o que ouve oferecido pelos padres Jesuítas aos índios e escravos, sua ação foi a diminuição do grau de exigência na seleção de pedagógica ia “contra o pensamento crítico”. Após 1930 foi profissionais para esse cargo, e é claro, acabou por diminuir a implantada a escola técnica, a ênfase recai no ensinar bem, qualidade de ensino. A partir dos anos 80 surgem diversas mesmo que a uma minoria. Já em 1945 a educação brasileira mudanças na educação. O fim da ditadura militar abre começou a receber influência norte-americana para o ensino caminhos aos primeiros estudos e a filosofia da educação, elementar, é claro que sob a implantação de novos métodos tendo por função os problemas educacionais. A década de 90 além do processo de ensino não considerar o contexto político foi marcada pelo crescimento acelerado da educação, com a social. As décadas de 60 e 70 do século XX foram marcadas reforma educacional criou-se os PCNs, as diretrizes e pela articulação da tendência tecnicista assumida pelo grupo referenciais curriculares e as avaliações do ensino através do militar e tecnocrata, que em acordos com EUA passaram a ENEM e do ENC-provão. Essas novas tendências fizeram com influenciar também o ensino superior, implantando aí, a que os indivíduos, economias e sociedades recorressem à técnica. O professor torna-se mero executor de objetos profissionalização que o mercado de trabalho exigia. Isso instrucionais, de estratégias de ensino e de avaliação, com isso acarretou as pessoas não tinham conscientização política e ideológica. aprendizagem envolvendo pessoas de todas as idades, sem a Por outro lado, segundo Pietri (2005), este período denominado preocupação de tempo e de lugar” (Borges: 110). De acordo “democratização do ensino” proporcionou acesso às pessoas com Borges foi neste contexto, que o direito de todos à que até então não tinham tido oportunidade de freqüentar educação uniu-se a necessidade da profissionalização “e os bancos escolares. “Nesse período, a ditadura militar intervém sistemas educativos expandiram-se”, tornando-se intensa a em um desenvolvimento de “atividades de 132 necessidade de professores qualificados para atender todos os e epistemológicos, pelo encontro das idéias de Pêcheux com o níveis de educação. Com isso teve-se que desenvolver programa arquegenealógico de Michel Foucault. Entre as programas de especialização rápida, aos docentes atuantes no questões a serem discutidas, destacam-se: 1) a revisão da ensino, denominadas por Marzola como reciclagens, que concepção de corpus em AD (uma vez que esse campo teórico seriam simplesmente um rápido aperfeiçoamento a fim se passa a se interessar pela análise da singularidade dos suprir as exigências determinadas pelo sistema, enfatizou-se acontecimentos somente a prática, e a formação critica necessária para a objetos – literários, midiáticos, entre outros – da ordem do não- atuação política e reflexiva do docente foi deixada de lado. logicamente estabilizado); e 2) a postulação do batimento Assim, podemos notar que por trás da “culpa dos docentes” há descrição/interpretação como a ordem teórico-analítica capaz uma ideologia política que rege o país democrático. Enfim, esta de resguardar a análise das interpretações sem margens – pesquisa, não tira do professor a culpa, mas também não a construídas à revelia das redes de memória e das condições de atribui somente a ele, é preciso ouvir os educadores, saber produção que participam da construção dos discursos –, assim desses profissionais o que realmente estão enfrentando em suas como de uma sobreinterpretação antecipadora das séries salas de aula, e em seus cursos profissionalizantes. discursivas. Mesa 13 Os Múltiplos Objetos da Análise do Discurso: da ordem fixa do Análise do Discurso: múltiplos objetivos arquivo à oscilação do ordinário discursivos, constituídos, sobretudo, Coordenadora: Mara Rúbia de Souza Rodrigues Morais O objetivo geral deste trabalho é refletir sobre algumas redefinições teórico-metodológicas do projeto pecheuxtiano de Análise do Discurso, ocasionadas, entre outros fatores políticos (PG/UNESP) em 133 O presente trabalho tem por objetivo apresentar um projeto de “despretensiosos de veicular” o discurso oficial, representando pesquisa em andamento. Esse estudo mostra a existência de um um espaço de “tensão” no discurso jornalístico. discurso de resistência, na crônica publicada em jornal impresso no Acre, especialmente, as de Francisco Dandão, à Mulher e Política: limites de discursos, de poder luz da análise do discurso, propondo pensarmos sobre a prática Fernanda Fernandes Pimenta de Almeida Lima (PG/UNESP) discursiva da crônica rompendo, em certa medida, com o discurso da mídia local, por, simplesmente, ignorá-lo. Além Este trabalho resulta da elaboração de um projeto a ser disso, buscaremos compreender como se organiza o discurso desenvolvido no Doutorado em Lingüística da Universidade oficial, para que possamos evidenciar as estratégias de Estadual Paulista (UNESP-CAr). O estudo tem como objetivo construção do discurso de resistência nas crônicas estudadas. analisar discursos sobre as mulheres políticas, especificamente, Observamos que os veículos de comunicação no estado do candidatas nordestinas às eleições de 2006. São discursos Acre, especialmente, nos últimos oito anos, tornaram-se, veiculados em revistas, que circulam nos diversos estados principal e importante via de acesso de uma certa ideologia de nordestinos e que, presumidamente, identificam a mulher como resgate a um ufanismo e nacionalismo, que ora se dizia perdida um efeito de construções sociais e culturais modeladas por ou esquecida e que, por isso o governo deveria promover o diferentes práticas discursivas. Assim, a mulher política resgate cultural e histórico. Ao mesmo tempo, no entanto, em nordestina não designa uma identidade estável, mas se define a que há uma mídia impressa no Acre que parece articular o partir de interesses, objetivos e legitimidades presentes nos discurso da floresta pautado no resgate de uma “falsa” história, discursos que (re)significam a subjetividade feminina e que a ou seja, na construção de identidades, existem textos constituem enquanto sujeito político. produzidos e publicados nos jornais locais, nessa mesma mídia, O discurso de resistência nas crônicas do Acre 134 Marília Lima Pimentel (PG/UNESP) comprovou que a professora X trabalha com os gêneros mais circulados socialmente, porém, falta fundamentação teórica Mesa 14 para alcançar o principal objetivo, que é fazer o aluno gostar de Diversidade de Gêneros Textuais como Incentivar à Leitura ler. A professora Y, ao contrário, desenvolve projetos de Beatriz Aparecida Alencar leitura, rodas de leitura, leitura em voz alta e colaborativa, dentre outras atividades que propicia criticidade e melhor Diversidade de Gêneros Textuais como Incentivo à Leitura desenvolvimento nas produções orais e escritas. Luana Cândida de Carvalho (G/UEMS) Estela Natalina Mantovani Bertoletti (G/UEMS) O Mau Uso da Língua Portuguesa Silvane Aparecida de Freitas Martins (UEMS) Juliana Marques de Matos Amorim (G/UEMS) É por meio da leitura que o educando desenvolve inúmeras Os futuros professores e mesmo aqueles que já são gramáticos habilidades, comunicativas e cognitivas além de ampliar sua conceituados vivem atualmente em um impasse: o mau uso da competência comunicativa, sendo assim, na presente pesquisa Língua Portuguesa deve ser corrigido como erro ou aceito de Iniciação Cientifica foram analisadas a 4° série (atual 5° como diferença? De acordo com os PCNs de Língua ano) de duas escolas públicas uma municipal e outra estadual, Portuguesa, o ensino deve ser contextualizado; ou seja, para identificar se as práticas pedagógicas utilizadas e os adequado à realidade da pessoa. O que significa aceitar o que gêneros textuais escolhidos despertam o prazer de ler nos classificaríamos de “erros” como características naturais no que alunos,a análise dos dados foi feita com base na abordagem conceme ao nosso idioma. O fato de algumas pessoas não se sócio-interacionista e da análise do discurso de linha francesa expressarem na norma culta da língua não quer dizer para interpretação do questionário semi-estruturado, que nos exatamente que não possuam conhecimento, capacidade 135 intelectual, ou mesmo que seus professores não tenham tido ou ocasiões impróprios: o verbo “acontecer”, por exemplo, é competência para tanto. O que ocorre, geralmente, é a usado em larga escala pela mídia para divulgar eventos com interferência da variedade linguística não-padrão, que afeta a hora e local marcados: “No dia 7 de junho de 2006, às concordância, e também o uso de grafias iguais para sons iguais l7h3Omin. acontece no hotel tal, número tal, palestra do (tão comum em alunos nos primeiros anos escolares), que afeta empresário Antonio Ermírio de Moraes”. Ora, o verbo a ortografia. Mas não é sobre os equívocos nos primeiros anos “acontecer”, sendo derivado do latim contigescere, que escolares que falaremos. O que será discutido aqui não serão significa “acontecimento fortuito ou fora do combinado”, propriamente erros, mas sim o mau uso que algumas pessoas deveria ser usado justamente só para isso: “Aconteceu a queda fazem da Língua Portuguesa. Só para citar um exemplo, a do avião da Gol, no vôo 1907”; ou seja, a queda “aconteceu”, Língua Portuguesa é atualmente devastada pela “praga” do nada havia sido “combinado” previamente. Outro lapso gerundismo, que se espalhou dos departamentos de televendas bastante comum é o uso de expressões que caíram, há muito para os mais inusitados lugares. As pessoas parecem não mais tempo, em desuso: é o caso da expressão “a nível de”. Ou então “passar”, “pagar”, “falar”, “conversar”, etc, mas sim “estar verbos que são usados impropriamente em lugar de outros: passando”, “estar “nada haver” ao invés de “nada a ver”. Estes são apenas alguns conversando”. Analisando gramáticas da Língua inglesa, dos exemplos que poderemos citar. O objetivo desta podemos perceber que este vício de linguagem é uma herança comunicação não é estimular a discriminação àqueles que se da Língua Inglesa, que freqüentemente alia o verbo copulativo expressam pela norma não-padrão da língua, e tampouco “to be” (ser, estar) às mais diversas formas verbais, isso sem defender a idéia purista de preservar a Língua Portuguesa tal e falar nos verbos terminados em -ing, que por sinal nem sempre qual ela está, menosprezando empréstimos lingtiísticos e expressam gerúndio. Outro exemplo que poderíamos citar são neologismos. pois, ao contrário do que a maioria das pessoas as palavras que são utilizadas (escritas ou faladas) em contextos pensam, essas características colaboram para o enriquecimento “estar pagando”, “estar falando”, 136 da língua. O que se busca é evidenciar vícios de linguagem e fim, Nunes (2006, p. 20) afirma que um dicionário nunca é escrita que possam prejudicar a compreensão correta da Língua completo e nem reflete diretamente a realidade, pois ele Portuguesa, e fazer com que as pessoas passem a se corresponde a uma projeção imaginária do real: de um público expressarem de modo que possam ser compreendidas leitor, de uma concepção de língua e de sociedade. E é por adequadamente em qualquer meio em que estiverem. conta desse aspecto abordado por Nunes que se optou, nessa pesquisa, pela análise lexicográfica de dois dicionários Aurelinho e Dicionário Ilustrado de Português: uma análise escolares infantis ilustrados: a) Dicionário Ilustrado de Português. b) Aurelinho – Dicionário Infantil Ilustrado da lexicográfica Língua Portuguesa. O trabalho de pesquisa refere-se à análise Sandra Cristina Miotto de Gouvêa (PG/UFMS) lexicográfica desses dicionários com base em toda estrutura O dicionário é um instrumento de referência que a maioria das pessoas conhece desde a infância. No Brasil, em geral, os primeiros contatos com essa obra ocorrem na fase de alfabetização, pois ele é utilizado como meio de verificação da ortografia das palavras, dos diferentes significados apresentados, dos sinônimos que podem ser encontrados, da separação silábica e até das ilustrações. No entanto, a consulta ao dicionário nem sempre se torna fácil, pois os alunos acabam por apresentar certo grau de dificuldade em compreender ou encontrar as informações pretendidas. Partindo do pressuposto de que o dicionário é um discurso produzido para determinado apresentada por cada um deles, partindo da análise do seu material anteposto, interposto e posposto. O interesse pelos dicionários escolares infantis selecionados surgiu de uma inquietação em relação ao uso ou não desses dicionários nas escolas da rede pública e particular e também pelo fato de considerar esse tipo de dicionário como o alicerce fundamental em todo processo de alfabetização e escolarização. Com base numa análise superficial questiona-se se tais obras poderiam ser consideradas como instrumentos de apoio à alfabetização e às séries iniciais. E ainda se teriam sido elaboradas segundo as necessidades de seu público-alvo, considerando as condições 137 de produção do discurso: quem produz, o que produz, para estudo e a relevante contribuição dada pela Lexicografia a todo quem produz e em que situação é produzido. Essa observação usuário da língua, bem como considerar a definição do objeto, inicial das obras resultou em dois questionamentos que que é o dicionário como uma forma de discurso. Como segunda serviram de base para questionamentos posteriores: O etapa, há a apresentação de um perfil do usuário ideal do dicionário escolar infantil, enquanto objeto pedagógico e dicionário escolar infantil, já que a discussão do objeto de discursivo possui pesquisa não é possível sem considerar a perspectiva, as características que permitem distingui-lo como tal? Quais são necessidades e habilidades do usuário. Há ainda a preocupação os critérios de elaboração e/ou redação desses dicionários? em apresentar, propor e discutir um modelo de descrição, bem Diante desses questionamentos pertinentes, a pesquisa busca como de análise dos aspectos observáveis dos dicionários contribuir para uma necessária crítica lexicográfica desse tipo selecionados. de dicionário, com a finalidade de explicitar como esses identificar as características do tipo de dicionário pesquisado, dicionários se apresentam e se eles correspondem às perpassando e discutindo a apresentação da estrutura de cada necessidades do usuário, que é o público infantil, e às objeto e verificando se há ou não a adequação dessas obras aos definições impostas pela Lexicografia. Expostos os principais critérios do modelo proposto. A pesquisa preocupou-se ainda objetivos do trabalho, cabe salientar que a pesquisa possui em traçar um panorama geral do desempenho de cada um dos como estrutura geral algumas etapas assim distribuídas: numa dicionários analisados, com a finalidade de retomar alguns primeira etapa há uma coleta de dados sobre a história do objetivos propostos, algumas hipóteses, algumas considerações dicionário, ou seja, para que melhor se possam definir o e conclusões. destinado a um público específico, Posteriormente, há uma preocupação em dicionário como discurso, faz-se necessário estabelecer e identificar as bases históricas de sua constituição. Essa revisão A Linguagem Escrita: considerações sobre a produção textual bibliográfica permite identificar a importância desse tipo de do ensino fundamental 138 Anaísa Nantes de Araújo (G- UEMS) Elza Sabino da Silva Bueno (UEMS) Um dos obstáculos que a educação brasileira enfrenta, é à dificuldade que os alunos têm ao escrever e interpretar um texto, por mais simples que seja. Neste sentido, quando o professor se propõe a trabalhar produção de textos em sala de aula sabe que ouvirá depoimentos sobre as reais dificuldades de escritura dos alunos, apesar destes, na maioria das vezes, exporem oralmente suas idéias com clareza e coerência. Se o aluno tem alguma dificuldade de aprendizado que não é solucionada, pode carregá-la por toda a sua vida, prejudicando seu desenvolvimento lingüístico e cultural. Por isso, a interferência do professor é imprescindível no sentido de apoiálo na realização de suas produções textuais. Com o propósito de aprimorar a linguagem escrita, e desenvolver a capacidade de utilizar essa linguagem na produção de diferentes tipos de textos, buscamos apontar algumas características do processo de elaboração de textos escritos por alunos do Ensino Fundamental, visando verificar o uso de alguns elementos básicos de textualidade presentes nos referidos textos. PALAVRAS-CHAVE: Produção textual, linguagem escrita. 139 ARTIGOS (segue ordem da programação) MESA REDONDA: Modalidades Discursivas em Suporte Digital Profa. Dra. Maria Conceição Alves de Lima (UEMS\UNICAMP) 11:00 às 13:30 hs. - Almoço 19:00 às 20:00 hs. – Lançamento de Livros Textualidade e Ensino: os aspectos lógico-semântico- cognitivos da linguagem e o desempenho discursivo escolar Ed. Da UNESP Maria Conceição Alves de Lima (UEMS) Discurso, Alteridade e Gênero – Ed. Pedro e João Vânia Maria Lescano Guerra e Edgar Nolasco (orgs) (UFMS) 140 (Re) Criação do Campesinato, Identidade e Distinção - – Ed. UNESP Esquecimento, Interpelação e Exclusão Social Rosemeire Aparecida de Almeida (UFMS) Prof. Dr. José Lauro da Cunha (UNEMAT) 20:00 às 21:30 – Apresentação Cultural O Discurso da Exclusão em Plínio Marcos Grupo Vocal Vida e Voz Prof. Dr. Wagner Enedino Corsino (UFMS) Coordenação: Prof. Msc. Fernandes Ferreira (UEMS) Uma Introdução à Identidade do pedófilo 21:30 hs. – Palestra: Análise do Discurso: Limites e Prof. Msc. Paulo César Tafarello (UFMS/UNEMAT) Perspectivas Prof. Dr. Wendencley Alves Santana 8:00 às 9:00 hs. – Mesa redonda B (UNICAMP/CAPES/UNIVERSO) Movimentos Sociais em Análise do Discurso: Entre campo e Dia 03\05\2007 cidade 8:00 às 9:30 hs. – Mesa redonda A Profa. Dra. Maria Celma Borges (UFMS) Profa. Dra. Rosimeire Aparecida de Almeida (UFMS) Identidade, Exclusão e Minorias Prof. Dr. Vitor Wagner Neto de Oliveira (UFMS) Identidade, Exclusão e Minorias 9:15 às 11:30 hs. Mesa –Redonda Profa. Msc. Kassandra Muniz (UNICAMP) 141 Língua e Discurso: Contribuições Bakhtinianas Carlos Magno Viana Fonseca (PG/UFC) Profa. Dra. Marina Célia Mendonça (UNIFRAN\UNI-FACEF) Um debate sobre a língua na Mídia segundo a perspectiva Questões de Identidade e Representações Sul Matogrossenses Bakhtiniana Anailton de Souza Gama (UFMS/UEMS/FINAN) Profa. Dra. Jauranice Rodrigues Cavalcanti Mesa 2 (METROCAMP\UNICAMP) “O Uso de Genéricos e os “Apagamentos” em Saúde do As Contribuições de Bakhtin para o Discurso Trabalhador” Alessandra Moreno Maestrelli (PG/USP) 14:00hs às 15:00hs.Comunicação Individual e Coordenada “O Idoso "Excluído" no Bolsão Sul-Matogrossense: a Mesa 1 identidade em questão” Terror em São Paulo e Terror na Mídia Yara de França Catarino Barros (PG/UFMS) Vânia Maria Guerra Lescano (UFMS) Jefferson Barbosa de Souza (PG/UFMS) Gravidez na Adolescência: uma questão de efeito de sentido Irani Fonseca Francisco (G/UEMS) Considerações sobre o Discurso de Garotas de Programa Romilda Meire Souza Barbosa (PG/UFMS) Mesa 3 O Processo de Monotongação no Português Falado em “A Linguagem Habita Lalangue”: O equívoco do dizer e a não- Dourados-MS coincidência das palavras consigo mesmas Elza Sabino da Silva Bueno (UEMS) 142 O Bom e o Mau Poeta: o ethos nos prólogos de Terêncio Estudo Sociogeolingüístico do Município de Iguape Nahim Santos Carvalho Silva (PG/USP) Roseli da Silveira (PG/USP) A Reciclagem de Discursos em Quarto de Desejo, de Carolina Mesa 4 Maria de Jesus Diálogos Bakhtinianos entre o Cinema de Spielber e o Letícia Pereira de Andrade (PG/UFMS/CPTL) Romance de Kafka. Forças Hegemônicas em Discussão Ivo Di Camargo Júnior (PG/UFSc) Entre o Asilo e o Exílio, a Condição da Literatura no Universo Midiático Volmir Cardoso Pereira (PG/UFMS) A linguagem Jurídica numa Perspectiva Pragmática: análise de Texto do STF Daniel de Mello Massimino (PG/UFMS) A Linguagem do Direito Paula Abrão da Cunha (G-UEMS) Mesa 5 143 A RECICLAGEM DE DISCURSOS EM QUARTO DE DESPEJO, DE CAROLINA MARIA DE JESUS Letícia Pereira de Andrade (PG/UFMS/CPTL) RESUMO: A finalidade deste trabalho é discutir a problemática acerca da tensão produzida por variações de discursos, que cedem forma à experiência narrativa da “poeta do lixo” Carolina Maria de Jesus em seu diário Quarto de despejo (1960). A escritora reciclava lixo para comer, assim como reciclava discursos em sua poética dos resíduos. Dessa forma, pela reciclagem, reestrutura um novo sentido para nosso sistema social no campo da arte escrita. PALAVRAS-CHAVE: reciclagem de discursos; Quarto de despejo. ABSTRACT: The purpose of this work is to discuss the problem concerning the tension produced by variations of speeches, that give up form to the narrative experience of the 144 "garbage's poet" Carolina Maria de Jesus in her diary Quarto intuito de denunciar a miserabilidade da vida favelada e de Despejo (1960). The writer recycled garbage to eat, as well ascender socialmente vendendo sua literatura, Carolina escreve as recycled speeches in her poetic of the residues. In that way, seu diário. for the recycling, it restructures a new sense for our social Diante da visão de que a maioria dos pobres de nosso system in the field of the written art. país não possui acesso à escritura e que literatura para os KEYWORDS: recycling of speeches; Quarto de despejo. pobres constitui-se como um trabalho quase impossível, procuramos compreender como a “catadora” de lixo Carolina 1. Carolina Maria de Jesus: catadora de lixo e de palavras Maria de Jesus realizou sua escrita. Notamos que, assim como Carolina de Jesus reciclava lixo para comer, reciclava discursos Os poetas encontram numa poética de resíduos. o lixo da sociedade Para nós, a narrativa caroliniana se vale de uma nas ruas e no próprio reciclagem de linguagens e de idéias que consome vorazmente lixo o seu assunto em sua ânsia de escrever. Carolina é tomada por uma grande heróico. ansiedade descritiva, uma ansiedade de transcrever, de (BENJAMIN) fotografar pela escrita o mundo que a rodeia. A necessidade de reproduzir todas as falas, colocar o nome completo das pessoas, Carolina Maria de Jesus, autora de Quarto de despejo: o endereço, onde trabalham etc., decorre da encenação do pacto diário de uma favelada, como o próprio subtítulo sugere: foi autobiográfico e de referência (LEJEUNE, 1998), um modo de moradora de uma favela, especificamente, da favela do conferir veracidade ao que relata. Canindé em São Paulo, na década de 50 do século XX. Para Nessa ânsia, ocorre o que Bakhtin (1993) denominava sobreviver com os seus três filhos catava lixo nas ruas. Com o dialogismo: a voz do eu dessa narrativa desabrocha como um 145 desdobramento das demais, pois a narradora se preocupa em letrados. Assim Carolina de Jesus situa-se entre dois grupos discutir, refletir e julgar a partir de comentários (quando se culturais, entre dois conjuntos semânticos com base em dois refere a alguma circunstância vivida) ou textos alheios que estilos de escrita: a norma culta da língua portuguesa que possam vir a “explicar” sua condição social: procura seguir e o desvio lingüístico da fala marginal. Nessa engrenagem surgem a imitação da forma romanesca e a 14 de setembro: ...Hoje é o dia da páscoa de oralidade (linguagem falada na favela), ou seja, o preciosismo Moysés. O Deus dos judeus. Que libertou os da escrita clássica misturado com o desvio lingüístico da fala judeus até hoje. O preto é perseguido porque marginal, os provérbios, os ditados populares e até passagens a sua pele é da cor da noite. E o judeu porque bíblicas: um tipo de bricolagem discursiva. é inteligente. Moysés quando via os judeus descalços e rotos orava pedindo a Deus para 2. Bricolagem discursiva dar-lhe conforto e riquesas. É por isso que os judeus todos são ricos. Já nós os pobre não tivemos um profeta para orar por nós. (JESUS, 2005: 107-108). O espaço da literatura caroliniana está limitado a sua O bricoleur é aquele que trabalha com suas próprias mãos. (LÉVI-STRAUSS) parca formação escolar e as leituras que pôde fazer com jornais e livros encontrados nos lixos (em Quarto de despejo cita Castro Alves e Casimiro de Abreu). Carolina cursou apenas o segundo ano primário, contudo tinha em mente escrever para os O trabalho literário de Carolina de Jesus se compara a de uma bricoleur, que usa o material lingüístico 146 que dispõe, para a construção de uma narrativa de resíduos e bricoleur põe-lhe sempre algo de si mesmo de sua identidade, numa irrestrita imbricação de códigos. (1970: 42). Segundo Lévi-Strauss (1970), a poesia da bricolagem é própria de organizações sociais que, diferentes de uma lógica científica, estão mais próximas de uma configuração de significados palpáveis, pois decodificam os sentidos no dia-a-dia. São criações que emergem de novos arranjos de fragmentos formalizados. Em Carolina, as sucatas literárias já enferrujadas, que transforma em nova literatura, constituem uma força intelectual que imprime um sentido para sua vida. Vale lembrar a importância da ressignificação, que esse tipo de poesia libera, segundo o antropólogo francês: A narrativa de Carolina de Jesus não fixa moradia em nenhum local, pois não segue nenhum modelo dado, mas recria seu cotidiano, no qual a favela é a metáfora da cidade decadente. Toda a desordem da economia capitalista é reciclada culturalmente pela escritora. E, em seu cruzamento interdiscursivo, renova práticas culturais na forçosa aliança que faz com antigos códigos. No que tange ao universo vocabular em Quarto de despejo, as palavras ali empregadas vão desde reproduções de modelos jornalísticos, da década de 1950, aos clichês de best-sellers de bolso, vendidos em bancas. Ela capta, (...) não se limita a cumprir ou executar; fala também, o português mais formal de grandes literaturas - não somente das coisas, (...), como também inhospitos, leito, abluir-me, jantar...-, incorrendo, por meio das coisas: contando, pelas freqüentemente, a erros gramaticais. escolhas que faz entre possibilidades limitadas, o caráter e a vida de seu autor. Sem jamais completar seu projeto, o Assim, essa obra possibilitou a transmissão de um novo tipo de mensagem, porque quando aliou códigos dominantes e de oralidade, passando-os para a escrita, sua 147 expressão se tornou significativa para a história de nossa polifônica linguagem e literatura, dando voz aos favelados. Este rumor (LEJEUNE). arranha e machuca os ouvidos “bem educados” e delicados da elite, mas por outro lado aguça a curiosidade daqueles O diário de Carolina Maria de Jesus tem uma que se reconhecem em suas palavras. A narrativa de composição, uma tessitura discursiva muito rica. Nas narrativas Carolina nos faz mergulhar no mundo imediato, na ação em do gênero memorialístico, o discurso predominante é o do si de um favelado. autor-narrador, pautado sobre as reminiscências e reflexões A narrativa de Carolina fragmenta-se em várias vozes de acordo com as situações que se seguem no desenrolar do cotidiano. Todo conflito ocorre porque uma favelada inusitadamente se dispõe a ler e a escrever. Assim essa literatura pode ser definida como híbrida, complexa e dialogizada por modificações, assimilações e imitação de discurso de outrem, nas capturas que faz em seu cotidiano. sobre o passado, às vezes com inserções no presente e antecipação do futuro, feitas em primeira pessoa, e com rara ou total ausência de discurso direto. O diário de Carolina, ao contrário, por privilegiar a forma discursiva fragmentada do diário íntimo, alavancada no presente vivido pelo autornarrador, é composto em grande parte de diálogos sob forma de “discurso citado”, ou seja, de reprodução do discurso direto, deslocado no espaço e diferido no tempo. É importante observar que a presença maciça do 3. Orquestração de vozes discurso direto em Quarto de despejo corrobora o caráter da Os diversos textos da escrita pessoal são vozes numa partitura obra como marcada pelo seu tempo. Daí sua importância como testemunho e sua força de denunciação política. Os diálogos reportados pela autora-narradora reafirmam sua vinculação ao contexto histórico da época, suas inserções no destino dos 148 favelados e as conseqüências disso. Por outro lado, reafirma a literária, um verbo escrito que tivesse o poder de representar a autoridade dessas outras vozes (contestadoras, discordantes, diversidade e a mobilidade dos diálogos orais. passivas, conformistas, sentimentais, íntimas, racistas e Ecléa Bosi, em Cultura de massa e cultura popular: agressivas), usando-as como sustentáculo para a avaliação do leitura de operárias, diz que a transcrição da fala popular é momento em que vive. Assim, não basta para a autora- problemática, pois através da escrita se dá de “imediato a narradora apenas comentar o preço da passagem, diretamente diferença com relação à que chamamos fala culta”, mas no diário, ativando a instância de interlocução. Carolina acrescenta que esta se não se realiza no abstrato da escrita, se precisa, na verdade, reportar a opinião de outros moradores que realiza perfeitamente no concreto, pelos gestos, atitudes, exercem, nesse caso, a função de testemunha ocular do fato. entonações que a acompanham. Por outro lado, Ecléa Bosi Desse modo, ela reativa o pacto de autenticidade (LEJEUNE, também descreve nossa atitude de pesquisador diante dessa 1998) ao citar o emissor do discurso citado, seu nome ou linguagem, de nossa posição de classe da qual é impossível profissão, e muitas vezes até o endereço. sair: Os outros grupos sociais – os trabalhadores da fábrica de doces, os funcionários púbicos, a imprensa, os transeuntes, (...) que diremos de nós mesmos como os passageiros do coletivo, Dona Julita, Seu Manoel, ou seus interlocutores? Nós, cuja razão nega, mas vizinhos racistas de Santana – são personagens cuja força só cuja vida de todo dia aceita a divisão de pode ser definida pela função que exercem no texto: caixas de classes? Esse não da razão é acompanhado ressonância, repetidores e fornecedores de matéria verbal, pelo conjunto de nossas atitudes que dizem matéria viva que compõe o universo de criação literária de sim, sim, sim, ao sistema. (BOSI, 1981: 15). Carolina de Jesus. Ela criou uma estética capaz de retrabalhar esse material, ou seja, capaz de constituir uma linguagem 149 Carolina cria, pois, uma orquestração discursiva que saber do mundo. Este é o universo das máximas, das falas e representa a complexidade em que vive: o mundo da oralidade, ditos populares, dos provérbios que ela adorava (“recordei o dos encontros e desencontros da favela (brigas, histórias: “... meu provérbio: não há coisa pior na vida do que a própria Na favela tudo circula num minuto. E a notícia já circulou que vida” – JESUS, 2005: 145), das quadrinhas satíricas contra os a D. Maria José faleceu” – JESUS, 2005: 29) em contradição políticos (“Político quando candidato/ Promete que dá com as notícias veiculadas pela imprensa escrita, com as aumento/ E o povo vê que de fato/ Aumenta o seu sofrimento!” leituras dos livros de poesia. - JESUS, 2005: 118), e das infâmias do cotidiano do final dos Essa trama discursiva é constituída de um discurso anos 50, no Brasil, como o aumento de preços, o desemprego, o híbrido, por sua vez, de discurso direto, citado na forma de sofrimento do pobre etc. Mas também é a esfera da construção representação dos diálogos, e do discurso narrativo em primeira estilística das metáforas, da ironia e comparações (“vida do pessoa (o discurso do autor-narrador é diferente do discurso das brasileiro, é como roupa que rompe-se, que não tem conserto, e personagens). Ou seja, o discurso é híbrido porque apresenta a gente precisa dela”). A escrita de Carolina é irônica, apesar marcas de discurso direto (travessões, dois pontos, aspas) e de do tom de tristeza que muitas vezes toma conta de sua discurso indireto (frase subordinada, verbo declarativo, como narrativa: no exemplo “ele disse-me que”). Muitas vezes, Carolina servese de recurso estilístico característico do romance: a reprodução (...) Nós somos pobres, viemos para as do diálogo com o uso do travessão, marcas típicas do discurso margens do rio. As margens do rio são os direto citado, para cada fala, sem verbo declarativo; porém, às lugares do lixo e dos marginais. Gente da vezes descarta o uso do travessão. favela é considerado marginais. Não mais se A esfera do discurso do autor-narrador é de longe a mais interessante, pois é aqui que Carolina desvenda o seu vê os corvos voando a beira do rio, perto dos 150 lixos, os homens desempregados substituíram os corvos. (JESUS, 2005: 48). É importante ressaltar que o diário Quarto de despejo fala de um eu, com vida extratextual comprovada, que morava na favela do Canindé, o qual anota periodicamente, com o Na favela é tão duro que “Já se foi o tempo que a amparo de datas e de uma maneira fracionada, um conteúdo gente engordava” (JESUS, 2005: 113). Mas na favela, apesar muito variável, “as lambanças dos favelados”, mas que das dificuldades, das tristezas, do esforço e do cansaço singulariza e revela esse eu-narrador. cotidianos, ouve-se a voz satírica da narradora: “O senhor Ao nível do discursivo há diferenças entre as próprias Sampaio quando era vereador em 1953 passava os domingos na vozes carolinianas. Quarto de despejo é escrito, narrado e vivido favela. Tomava nosso café, bebia nas nossas xícaras. Ele nos por três diferentes figuras: a autora, a narradora e a protagonista, dirigia as suas frase de viludo (...) e quando candidatou-se a todas chamadas Carolina Maria de Jesus. A autora, em primeira deputado venceu. Não nos visitou mais” (JESUS, 2005: 16– instância, é dona do discurso que constrói uma narradora séria, grifo nosso para mostrar Carolina se incluindo como favelada). digna de credibilidade, em contraponto à protagonista “irreal”, Há um desequilíbrio, pois ao mesmo tempo em que volúvel. No texto, misturam-se as percepções da autora (que Carolina se inclui neste grupo tem a vontade de denunciar a deseja denunciar a realidade circundante), da narradora (que realidade circundante, por isso a narradora se vê às vezes como conta sentindo-se “despertencida” da favela) e da personagem fora da favela: “O que eu observo é que os que vivem aqui na (que vive como favelada). favela não podem esperar boa coisa deste ambiente [...] todas É interessante observar como Carolina narradora, em as pessoas que residem na favela, não aprecia o lugar” (JESUS, momento centrado, reflete e trai Carolina personagem de 2005: 79– grifo nosso para mostrar a auto-exclusão da poucas páginas antes, que divaga poeticamente sobre sua narradora). realidade. As mulheres da favela e os episódios (até pitorescos) em que estão envolvidas são apresentados por meio dos olhares 151 da autora (que assiste e cria), da narradora (que conta) e da na favela, para que os moradores fossem buscar um prêmio personagem (que vive) e constituem uma grande fonte de surpresa para seus filhos numa festa, a festa de Zuza, na rua contradições. (cf. ARAGÃO, 2005: 108) A narradora se Javaés 771. Observa-se que, apesar de condenar as mulheres encarrega de salvar a protagonista das características faveladas, no excerto acima, por se submeterem ao “sustento lamentáveis das mulheres com quem compartilha o ambiente indigno” oferecido por associações de caridade, Carolina da favela. A personagem, por sua vez, mostra que é mais uma favelada, agora confusamente narradora e personagem, rende- dessas mulheres, que inevitavelmente é parte do grupo. No se ao “ganho fácil” do assistencialismo: trecho abaixo, observa-se a primeira faceta dessa contradição: Devido eu ter bajulado inconcientemente o As mulheres que eu vejo passar vão nas senhor Zuza, ele deu-me varios pães. Contei igrejas buscar pães para os filhos. (JESUS, até seis. 2005: 34). (JESUS, 2005: 62). Meus filhos não são sustentados Na igreja eu ganhei dois quilos de macarrão, com pão de igreja. Eu enfrento balas e biscoito. (JESUS, 2005: 67) qualquer espécie de trabalho para mantê-los. E elas tem que mendigar. (JESUS, 2005: 14) Verifica-se que existem passagens do livro que mostram posicionamentos, relatos, diferentes discursos que levam o leitor de maneira fragmentada ao universo ambíguo do Carolina Maria de Jesus sai da condição de favelada dependente para se dizer mulher responsável pelo seu próprio sustento e de seus filhos. Adiante, narra uma entrega de cartões texto caroliniano. A oralidade na obra de Carolina está, pois, no seu desdobramento da personagem. A circulação da personagem 152 Carolina por diversos locais na favela ou na cidade traz para o De acordo com Bakhtin (1993), o plurilingüismo diário tudo o que se estava falando em São Paulo e no Brasil – social – as diversidades das linguagens do mundo e da e também no mundo – naquele momento. É por meio das sociedade – é representado no romance de forma impessoal andanças que Carolina se inteira sobre os temas da vida (através do diálogo com os gêneros literários ou extraliterários), nacional da época para depois retratá-los no diário. Trata-se de ou de forma direta por intermédio das falas das personagens, do demissões em massa, congelamento de preços, inflação, discurso do narrador ou ainda do autor, que juntos geram um inauguração de Brasília e mais uma série de notícias que são diálogo permanente entre todas as instâncias da narrativa. veiculadas pela mídia e que ela lê diretamente na banca de jornal: Assim, no romance, não há uma linguagem única, mas uma “instabilidade dialógica” que é a própria representação do funcionamento da linguagem no mundo, com 8 de agosto relação a sua diversidade e à tensão que é gerada entre todos os Saí de casa as 8 horas. Parei na banca de seus tipos: “o plurilingüismo, desta forma, penetra no romance, jornais para ler as noticias principais. por assim dizer, em pessoa, e se materializa nele nas figuras das (JESUS, 2005: 95) pessoas que falam, ou, então, servindo como um fundo ao diálogo, determina a ressonância especial do discurso direto do A teoria bakhtiniana da linguagem romanesca pode romance”. Ou seja, “o principal objeto do gênero romanesco, nos servir de embasamento para a análise da orquestração de aquele que o caracteriza, que cria sua originalidade estilística é vozes retratada pela autora em seu diário. Apesar de não tratar o homem que fala e sua palavra” (BAKHTIN, 1993: 134). de romance, o diário, ao reproduzir as falas de outros Todavia, não podemos esquecer que esse homem que personagens, o faz de acordo com a prática romanesca da fala no romance é um ser social e que, portanto, seu discurso é reprodução do discurso. feito em uma linguagem social e não em um dialeto individual, 153 o que equivale dizer que o “sujeito que fala no romance é – É que eu tinha fé no kubstchek. sempre, em certo grau, um ideólogo, e suas palavras uma (JESUS, 2005: 35) ideologia” (BAKHTIN, 1993: 134). Conforme Bakhtin, uma das características intrínsecas Em 1958, fala-se, sobretudo, do Prefeito de São ao romance é o emprego da linguagem enquanto representação Paulo, Ademar de Barros, e do Presidente da República, JK: de estilos, de linguagens dos diversos meios sociais, e, “Juscelino esfola!/Adhemar rouba!/Jânio mata!/A Câmara sobretudo, enquanto linguagem representada, metalinguagem, apóia!/E o povo paga!” (JESUS, 2005: 116). A imagem do propriedade esta que lhe confere seu valor artístico, uma vez governo é representada, pela autora-narradora, por um cachorro que todo romance “é um sistema dialógico de imagens das que morde o próprio rabo, o que é uma metáfora clara da linguagens, de estilos, de concepções concretas e inseparáveis política nacional sempre às voltas com a questão social e com da língua” (BAKHTIN, 1993: 371). dificuldades sérias em seguir adiante com os projetos: “Você já O diário de Carolina de Jesus é, pois, um burburinho viu um cão quando quer segurar a cauda com a boca e fica de vozes que opinam contra a favela e os favelados, como os rodando sem pegá-la? É igual o governo do Jucelino!” (JESUS, morados do bairro mais próximo (Santana), e outras que 2005: 118). reclamam das mazelas que sofrem em conseqüência da má condução da política brasileira: A voz da autora-narradora está sempre sobreposta às outras vozes reportadas no diário (de transeuntes, passageiros do bonde, do ônibus, pessoas que, como ela, aguardam nas filas – Pois é. A senhora disse-me que não ia mais de doações de diversos lugares, como açougue, matadouro, comer as coisas do lixo. fábricas de salsicha e bolachas etc.). Por meio desse mosaico de Foi a primeira vez que vi minha palavra vozes, são desenhadas a opinião e a recepção que se tinha na falhar. Eu disse: época dos fatos políticos nacionais. Ainda que Carolina 154 defenda ou ataque nomes de políticos da época, essa visão é Embora o relato de Carolina fosse interessado, porque sempre contrabalançada por outras opiniões que ela retrata no ela tinha um projeto de ascensão social pela literatura (“estou diário. Assim, o leitor sempre tem vários comentários de vozes escrevendo um livro para vendê-lo. Viso com esse dinheiro diferentes: comprar um terreno para eu sair da favela” – JESUS, 2005: 25), de qualquer forma, isso não compromete o fato de que ela – Senhor Germano, esta faixa é de que reflete a opinião da maioria pobre. Ninguém dá ouvidos às partido? queixas da pobreza. Aliás, os moradores da favela do Canindé e – Do Jânio! da periferia da capital paulistana já conhecem o traçado: “os Ela rejubilou-se e começou a dizer que o Dr. políticos só aparecem em época de eleições”. Essa afirmativa é Ademar de Barros é um ladrão. Que só as repetida incansavelmente no diário. Ainda confirma a pessoas que não presta é que aprecia e acata incapacidade dos políticos de resolverem o problema da fome: o Dr. Adhemar. Eu, e D. Maria Puerta, uma espanhola muito boa, defendiamos o Dr. Quando um político diz nos seus discursos Adhemar. D. Maria disse: que está ao lado do povo, que visa inclui-se – Eu, sempre fui ademarista. Gosto muito na política para melhorar as nossas condições dele, e de D. Leonor. de vida pedindo o nosso voto prometendo A Florentina perguntou: congelar os preços, já está ciente que – Ele já deu esmola a senhora? abordando este grave problema ele vence nas – Já, deu o Hospital das Clínicas. (JESUS, urnas. Depois divorcia-se do povo. Olha o 2005: 85) povo com os olhos semi-cerrados. Com um 155 orgulho que fere a nossa sensibilidade. seu diário, como um registro de fatos, um livro denúncia. Por (JESUS, 2005: 34) meio das outras vozes, Carolina busca legitimação para seu discurso. Por meio das diferentes vozes pode-se também medir É interessante ver a mescla do discurso de Carolina a popularidade do Prefeito e do Presidente. As vozes são uma com o de pessoas de outras profissões e, sobretudo, como é caixa de ressonância das notícias veiculadas pela mídia (rádio e que, por meio desses diálogos na rua, entram no diário os jornais). Carolina tem o refinamento de saber resumir as discursos de outras esferas sociais, o jurídico, o legal, o político diversas opiniões e de ressaltar aquelas que despertaram nela etc., como é o caso da conversa com o guarda da prefeitura algum tipo de reação: concordância, discordância, revolta etc. quando reproduz um vocabulário técnico, próprio daquela área As vozes que têm mais opinião sobre política não são de trabalho: “inquilino”, “lei do inquilinato”, “rendas das as da favela. Os moradores da favela são retratados por propriedades municipais”. O poder público está presente por Carolina quase sempre em relação às questões internas do meio dos funcionários que circulam pelas imediações da favela: Canindé: brigas, prostituição, disputas por espaço, querelas fiscais municipais, funcionários dos correios, da Light, da com os filhos da autora, comentários sobre outras questões Polícia, da Rádio Patrulha, da imprensa (As Folhas da Manhã e ligadas à promiscuidade da vida na favela, com relação à falta daTarde, O Cruzeiro, Seleções do Rider´s Digest). d’água, ao preço da luz, à sujeira, enfim, com relação às Há um retrato do mundo do trabalho, dos proletários, misérias do cotidiano na favela. É quando ela faz o percurso da no diário. São vozes dos trabalhadores: o homem da salsicharia, catação do lixo na “cidade jardim” que ela conversa sobre o livreiro, Seu Manoel do empório, as lavadeiras do Rio Tietê, política com várias pessoas que encontra. Ela instiga a o guarda da prefeitura, policiais, os trabalhadores da Light, os conversa, solicita o comentário, torna-se ouvinte. Essa atitude operários da Prefeitura, empregado da livraria Saraiva. Esses deliberada de Carolina tem a ver com o modo como ela encara encontros representam uma ocasião de exibir seu conhecimento 156 – seu português “clássico”, seus modos “refinados”, como: “E Eram sacos de arroz que estavam nos exaltaram tanto que o Armim acabou premiando os designados armazens e apodreceram. Mandaram jogar pelas mulheres atrabiliarias que predominam”; “As pessoas de fora. Fiquei horrorizada vendo o arroz podre. espírito jocoso dizem que a favela é a cidade náutica”; “Ablui Contemplei as traças que circulavam, as as crianças, aleitei-as e ablui-me e aleitei-me”. Em algumas baratas e os ratos que corriam de um lado ocasiões, a utilização de palavras inusuais, para ela, provoca para outro. Pensei: porque é que o homem deslocamento de sentido: “A Dona Domingas recebe uma branco é tão perverso assim? Êle tem pensão do extinto esposo”. Por aí Carolina autora-narradora dinheiro, compra e põe nos armazens. Fica também justifica que merece um lugar melhor para viver, que brincando com o povo igual gato com rato. ela é diferente, especial, não é da favela. Ela não quer se incluir (JESUS, 2005: 130). no grupo dos não letrados, pelo fato de escrever se sente superior, melhor do que as mulheres da favela do Canindé, “usuárias das palavras de baixo calão”. Percebe-se que a intelectual Carolina Maria de Jesus usa as palavras como arma: “não tenho força física, mas as Enfim, a partir da narrativa em forma de diário, a minhas palavras ferem mais do que espada. E as feridas são narradora passa a gerenciar tudo o que lhe acontece e como incicatrisaveis” (JESUS, 2005: 43). Assim o livro seria o ponto quer. Carolina, negra, catadora de papel e favelada, sentia-se de estranhamento entre Carolina e os favelados e vice-versa. diferente dos demais, porque dispunha da linguagem como uma Escrevê-lo foi a “fuga quixotesca” que encontrou para tentar arma de denúncia, apontando todos os aspectos negativos da romper o fechamento do mundo em que vivia. Paradoxalmente, vida na favela e as injustiças cometidas contra os miseráveis: por meio das vozes carolinianas, percebemos que a favelada sentia-se “despertencida” da favelada do Canindé, por isso foi preciso, segundo a autora, arquitetar o “quarto”: “criar este 157 ambiente de fantasia, para esquecer que estou na favela [...] repressão do governo, as formas de exclusão, a falta de justiça, Como é horrivel pisar na lama [...] O único perfume que exala as falhas na “democracia” e divagações poéticas de uma voz à na favela é a lama podre, os excrementos e a pinga.” (JESUS, contramão da história oficial, hegemônica. Dessa forma, pela 2005: 52). reciclagem, Carolina reestrutura um novo sentido para nosso sistema social no campo da arte escrita. 4. À Guisa de conclusão: a reciclagem arquiteta Quarto de 5. Referências Bibliográficas despejo A reciclagem de discursos em Quarto de despejo ARAGÃO, Liana. Carolina Quer A Construção Intencional Do exibe a memória de netos e bisnetos de ex-escravos, de Discurso Pelo Uso Da Ambigüidade Em Quarto De Despejo. migrantes nordestinos e de toda população brasileira de vida In: Revista Querubim – revista eletrônica de trabalhos pobre e, também, mostra o como vivem os da “cidade jardim”. científicos - Letras, Ciências Humanas e Ciências Sociais. Rio Assim Carolina, ao optar por descrever o que o leitor espera de de Janeiro: Querubim Digital. Ano I, Vol. 01, Nº 01, ago/dez- um diário de uma favelada, atende às expectativas, mas trai 2005. ISSN 1809-3264. quando se posiciona no texto revelando ao leitor não um espelho da favela, mas o reflexo bizarro de toda a sociedade BAKHTIN, Mikhail. Questões de Literatura e de estética (A brasileira. teoria do romance). São Paulo: Hucitec/Unesp. 1993. Carolina de Jesus, catadora, bricoleur, recicla falas de tantos outros, como também usa a sua imaginação na construção de um “quarto” onde o leitor é capaz de descobrir não somente a linguagem marginal da favela, mas também a BOSI, Ecléa. Cultura de massa e cultura popular: leituras de operárias. Petrópolis: Vozes, 1981. 158 JESUS, Carolina Maria de. Quarto de despejo: diário de uma 15:30hs. Às 17hs. Comunicação Individual e Coordenada favelada. 8ª ed. São Paulo: Ática, 2005. Mesa 6 LEJEUNE, Philippe. El pacto autobiográfico y otros estudios. A Leitura no Ensino Fundamental El mundo iluminado. Ciudad del México: Lumen, 1998. Emílio Davi Sampaio (UEMS) LÉVI-STRAUSS, C. O pensamento selvagem. São Paulo: Ed. História Consica da Leitura no Mundo Ocidental Nacional e Universidade de São Paulo, 1970. Valter Ribeiro dos Santos Junior (G-UEMS) Apelo Sócio-Cultural da Leitura Rosimar Francelino da Silva (UEMS) Os Benefícios da Leitura Elizabete Maria dos Santos (G-UEMS) Mesa 7 Linguagem: arco e flecha na caça ao sentido Adilson Crepalde (UEMS) 159 LINGUAGEM: O ARCO E A FLECHA NA CAÇA AO SENTIDO Adilson Crepaldi (UEMS) Resumo: Este trabalho consiste em uma reflexão sobre o discurso indígena pronunciados nas Kaiowá aty e Ñandeva, guasu, elaborados assembléias e indígenas, objetivando chamar a atenção para a complexidade desse discurso, fazer algumas considerações sobre possibilidades interpretativas e sobre aplicação de categorias e constructos analíticos na análise desse discurso. As reflexões enfatizam a importância do olhar etnográfico, de conhecimentos históricos e antropológicos para a análise do discurso indígena. Chamam a atenção para a política indígena como base para a construção dos modos de ser dos referidos grupos étnicos bem como a importância de se compreender a dinâmica dessa política em qualquer análise. Este trabalho destaca, ainda, as transformações históricas pelas quais passaram esses grupos étnicos e a utilização da linguagem como instrumento de luta na construção e manutenção de seus modos de ser. 160 Palavras-chave: discurso indígena, categorias éticas, constructos analíticos, olhar etnográfico, política, linguagem. Introdução Abstract: This work consists of a reflection on the indigenous Por ocasião da feitura de minha dissertação de people Kaiowá and Ñandeva discourse, elaborated and mestrado e de outros trabalhos de pesquisa, realizei trabalhos pronounced in big assemblies named by them aty guasu. The etnográficos com os grupos étnicos Kaiowá e Ñandeva1 do objective of this work is to highlight the complex indigenous Mato Grosso do Sul, objetivando compreender o modo de ser discourse and reflect on the interpretative possibilities as well desses indígenas e a maneira como constroem sentido e usam a as on the possibilities of applying categories and analytical linguagem. Estes trabalhos possibilitaram-me identificar a constructs in the analysis of the indigenous discourse. The construção de um discurso realizado em assembléias indígenas reflections emphasize the importance of ethnographic works cujo tema era a retomada das terras tradicionais. Chamou-me a and historical and anthropological knowledge on the cited atenção a habilidade dos oradores e a maneira ritualística de indigenous groups. This work also stresses the indigenous elaborar e pronunciar esse discurso na construção e defesa da politics as basis for the construction of their way of being as tese da retomada das terras tradicionais. Depois de ter well as the importance of one comprehend the dynamic of this detectado a recorrência do tema e a caracterização de uma politics for any kind of analysis. This work underlines the forma de produzir o discurso, percebi que não poderia me ater historical transformation through which these indigenous have somente à superfície lingüística nem simplesmente aplicar been through and the use of language as fight instrument in the conceitos e métodos da análise do discurso para refletir sobre construction and maintenance of their ways of being. ele. Percebi que para compreender a dinâmica da construção Key words: indigenous discourse, ethical categories, analytical constructs ethnographic works, politics,language. 1 Neste trabalho, grafam-se os nomes de grupos étnicos no singular em consonância com a convenção antropológica. 161 daquele discurso e consequentemente dos efeitos de sentido, simbólicas entre os referidos grupos étnicos e entre eles e os teria de levar em consideração conhecimentos construídos a não-índios, sobre as transformações históricas e sobre as partir da Antropologia, da Sociologia e da História. Uma estratégias desses indígenas face ao contato com os não-índios. Antropologia, uma História e uma Sociologia que tentam captar Além disso, tomei como base teórica as considerações de a dinâmica da construção da vida social, dando ênfase ao Maingueneau (1977, 2007), de Foucault (1985, 2005, 2000) e processo e não a modelos analíticos pré-elaborados. Desta de Derrida (1997, 2006). Na medida em que aplicava conceitos maneira, para refletir sobre o objeto de estudo deste trabalho, e reflexões dos referidos autores e baseava-me em trabalhos lancei mão de conhecimentos adquiridos por meio de leituras historiográficos, antropológicos e sociológicos sobre esses etnográficas e historiográficas sobre os referidos grupos e do indígenas, fui percebendo a importância de se refletir sobre o referencial teórico utilizado por ocasião da feitura da minha discurso indígena a partir do ponto de vista político. Para tanto, dissertação de mestrado. Lancei mão das considerações de segui as reflexões de Foucault (2005) sobre política como Barth (1993) sobre fronteiras étnicas, de Bhabha (1998) sobre maneira de se realizar as relações de poder que perpassam por trocas simbólicas, culturas em contato e entre-lugar, de todo o corpo social. Na medida em que refletia sobre o discurso Bourdieu (1996) sobre a ritualização do discurso e voz de indígena do ponto de vista político, percebia que corria menos autoridade, de Maffesoli (1996) sobre pertença e construção da risco em fazer análises superficiais que ajudam a cristalizar no identidade, de Dixon (1997) sobre o contato entre línguas e de imaginário brasileiro uma idéia genérica de indígenas como Oliveira (1999) sobre a adaptação dos mitos às demandas seres fossilizados, incapazes, indolentes, ingênuos e apolíticos. históricas. As reflexões sobre o discurso, neste trabalho, não As leituras etnográficas, historiográficas e esse visam a refletir detalhadamente sobre as leis do discurso e referencial teórico ajudaram-me a refletir sobre a construção da classificá-lo nesse ou naquele gênero nem identificar as vozes identidade, das fronteiras étnicas, das trocas lingüísticas e do discurso e demonstrar sua heterogeneidade, nem dar ênfase 162 pressupostos, Os Kaiowá e os Ñandeva2 do Mato Grosso do Sul, intencionalidades e interdiscursividade. Visam, antes de tudo, a grupos étnicos falantes da língua guarani, reconheçam salientar a maneira desses indígenas de manipular a linguagem semelhanças lingüísticas, culturais, sociais, religiosas e como instrumento de luta e construir sentido, chamando econômicas atenção para a complexidade dessa maneira de construir diferenças que marcam suas fronteiras étnicas (Barth, 1987). sentido e para as condições de possibilidade para construir Tais diferenças, contudo, não impedem que se reúnam em aty sentido, considerando a prática discursiva, mas também a guasu3, aty, reunião, e guasu, grande, nas quais discutem prática social. Muito embora, este trabalho não vise a uma problemas comuns como saúde, educação e principalmente análise detalhada do discurso indígena, a título de exemplo, problemas referentes à retomada de suas terras. a marcadores discursivos e determinar entre si; entretanto, reconhecem, também, será feita a análise de uma carta, escrita pelos indígenas em A luta pela terra tem sido organizada nas aty guasu, março de 2005, objetivando demonstrar a importância de uma cenário político onde se inscrevem atores sociais para visão multidisciplinar para se refletir sobre o discurso indígena. 2 Aty guasu: o lugar do discurso Ñandeva é o termo que tem sido utilizado por alguns antropólogos e historiadores. Os indígenas desse grupo étnico se autodenominam Guarani. A opção pelo termo Ñandeva, nesse trabalho, tem a intenção de evitar remissões aos Guarani de maneira genérica e marcar a diferença entre os Ñandeva e os Kaiowá, tidos pela literatura como descendentes dos Guarani. Alguns autores aceitam a tese de que estes grupos étnicos são descendentes dos antigos Guarani e referem-se a eles como Guarani/Ñandeva e Guarani/Kaiowá. Assunto polêmico que não cabe na extensão desse trabalho. Basta aqui reafirmar que embora sejam falantes da língua guarani e tenham semelhas culturais são grupos étnicos que se percebem enquanto diferentes. 3 A aty guasu é uma assembléia que reúne indígenas dos dois grupos étnicos e começou a ser organizada a partir da identificação de problemas comuns entre eles. Almeida (2001) sugere que essas grandes reuniões começaram a ser realizadas a partir da década de 1970 em decorrência da implantação do Projeto Kaiowá e Ñanceva (PKN) que objetivava buscar alternativas de sobrevivência para esses indígenas. 163 produzirem suas enunciações a partir de temas determinados como manifestações em praça pública, gestões junto à sócio-historicamente da procuradoria pública, cartas a políticos, à imprensa e a eterna autoridades de vários setores. Este discurso tem função política construção/desconstrução do sentido, da estruturação de uma inter-étnica, uma vez que se dirige aos não-índios, mas tem, forma de vida, de uma maneira de pensar e de simbolizar, na também, função política intra-étnica, pois por meio dele se busca, enfim, da significação. É nesse cenário que toma forma estabelece a correlação de forças entre os dois grupos étnicos e um discurso, pronunciado segundo as orientações das a correlação de forças entre os membros do mesmo grupo formações discursivas (Foucault, 1985) Kaiowá e Ñandeva. étnico. Muito embora o discurso seja pronunciado e validado instalação da (Maingueneau, palavra e da 1977). É contra-palavra lugar na O que é dito na aty guasu não pode ser feito de qualquer maneira, deve ser pronunciado em guarani, ainda que na aty guasu, é construído no dia-dia com a possibilidade da participação de todos. não seja mais, como dizem, o guarani puro, o guarani dos O discurso da aty guasu é marcado pelo espetáculo da antigos, mas uma língua marcada pelo contato com o português heterogeneidade das vozes, manifestas nos jogos políticos, e com o espanhol falados na fronteira entre Brasil e Paraguai. motivadas pela necessidade de se encontrar respostas para os Uma língua, um rastro, (Derrida, 2006) que revela a luta e as problemas desse momento histórico. Embora todos participem estratégias dessa luta em defesa de um modo de ser; um rastro da construção do discurso, a tarefa de articulá-los é que comunica, mas que também “descomunica” por meio de incumbência de alguns, lideranças, vozes de autoridade ambigüidades e ambivalências. Os oradores combinam (Bourdieu, 1996) ou pessoas que estão se construindo como tal, símbolos lingüísticos e não-lingüísticos como gestos, adereços, o que requer habilidade em usar a palavra, ñe’e, termo que encenações, tons e ritmos de voz e usam toda sorte de recursos significa também alma. Manter-se vivo é manter a alma em argumentativos na elaboração do discurso para defenderem a equilíbrio, ou seja, viver é saber dar significado à palavra-alma tese da retomada da terra e na elaboração de estratégias de luta inscrita no corpo, é saber entrelaçá-la a outras palavras-almas 164 na tessitura do “corpo-texto” social, segundo um modo de ser. espíritos que interagem com os humanos. Esta noção de terra Nesse sentido, o simbólico e a prática social se interpenetram e demarca a diferença entre indígenas e não-índios, sugerindo ambos recebem um fechamento mítico, pois toda e qualquer que os indígenas tratam a terra com respeito, enquanto os não- ação deve, necessariamente, ainda em nossos dias, ser índios a maltratam. Ultimamente, essa noção tem sido entrelaçadas ao mundo sobrenatural. reforçada por meio de argumentos ecológicos, aprendidos junto A aty guasu não tem validade sem a presença de aos não-índios, que ajudam a construir os efeitos de sentido. líderes religiosos. E o discurso não tem eficácia se Desta maneira, enfatizam que não utilizam agrotóxicos, não desvinculado da dimensão religiosa e do ritual da aty guasu, o poluem os rios, preservam as matas e os animais, etc. que implica na presença de ouvintes como interlocutores que A essa noção de terra agregam ainda conhecimentos interferem no momento do pronunciamento e que se históricos, reafirmando que são os legítimos donos das terras posicionam por meio de votos. A terra é o tema do discurso e a brasileiras, usurpadas por portugueses e espanhóis que a premissa básica para a construção do modo de ser no plano privatizaram e a cercaram. Nesses discursos destacam também discursivo. É referida como condição sine qua non para a a história da luta e os que morreram na luta pela terra. Por fim, manutenção da vida Kaiowá e Ñandeva. Segundo esse enfatizam os direitos conquistados na constituição de 1988 e a discurso, problemas como prostituição, fome, doenças e morosidade no desenrolar dos processos referentes à terra, violência decorrem da falta da terra. Porém, não é toda e responsabilizando o poder público pelos males que afligem os qualquer terra que reivindicam, mas os antigos tekoha, terras indígenas. tradicionais, onde viveram seus avós. O termo tekoha não é usado com o significado de terra tradicional, apenas, mas com o significado de terra onde se constrói o modo de ser, dando ênfase à noção de terra como lugar sagrado povoado de Cuidados com a análise do discurso indígena 165 Esse discurso pode, à primeira vista, ser caracterizado torna-se profícuo ao se considerar as observações de Foucault como político por se referir ao futuro dos grupos indígenas, por sobre política, enquanto estratégia de jogos de poder que ser um discurso deliberativo (Aristóteles, Arte Retórica e Arte circula pelo corpo social (Foucault, 2002). Este é o ponto de Poética, s/d). Por enfatizar a diferença entre indígenas e não- partida do qual se pode refletir melhor sobre o discurso índios, estabelecendo uma tensão, uma polêmica entre uns e indígena, antes de qualquer segmentação em discurso político, outros, por defender um conjunto de valores (Bakhtin, 1992). religioso, pedagógico, de classe, etc. Por ser marcado pela heterogeneidade das vozes, por lançar Tudo está interligado no mundo indígena. Uma mão de recursos retóricos e estratégias argumentativas, enfim, simples reza e um canto, aparentemente despretensioso, podem por ser possível encontrar nele as características que definem o ter função política. É preciso pensar política como jogo na campo do discurso político. Contudo, ao se empregar a correlação de forças e na manutenção do estar juntos. Política categoria político, enquanto categoria ética genérica para como possibilidade de elaborar sentido e uma forma de viver, o classificar o discurso indígena em gêneros e melhor controlá-lo, que implica em levar em consideração as relações entre pode-se minimizar a dinâmica da construção da vida social e da indivíduos atravessados por uma forma de ser e que se prática discursiva Kaiowá e Ñandeva que se realizam por meio comportam por meio de regras implícitas, determinadas sócio- de jogos políticos que tem características próprias. O discurso historicamente que possibilitam que o jogo seja jogado. Essa indígena deve ser compreendido como um todo que se dinâmica deve ser compreendida para além do viés configura como um instrumento de luta sócio-historicamente logocêntrico que concebe o ser humano como indivíduo regido construído, por ser uma forma de construir sentido diferente de por leis apriorísticas e que conscientemente formam grupos outras, a partir das quais se configura e contra as quais se sociais; para além do viés metapsicológico que idealiza o ser afirma. Por outro lado, incluir tal discurso como político para como resultado da dialética entre pulsão de vida e pulsão de compreender o fio que tece o modo de ser Kaiowá e Ñandeva morte; para além do viés social que parte do pressuposto da luta 166 de classes, para além do viés econômico que reduz toda e interpretação pode levar à descrições a-históricas de estruturas qualquer socialização a partir da divisão do trabalho. estáticas que permanecem no tempo e que determinam a Compreender essa dinâmica é considerar que há História. O mito, ao contrário, é uma construção histórica que também um prazer sócio-historicamente construído no e pelo se modifica no tempo, uma racionalidade que parte sempre da estar juntos (Maturana, 1999); é compreender que há uma influência das forças sobrenaturais, mas que existe para criar necessidade de pertença (Maffessoli, 1996) que inclui, no caso sentido para os fazeres terrenos e partir do fazeres terrenos. dos indígenas, uma pertença em nível sobrenatural. Esses Mitos também não são estórias irracionais criados por seres movimentos de construção da vida social se entrelaçam por irracionais que se encontram ainda na “infância” do processo meio da política como condição de possibilidade de dar forma civilizatório. Por fim, mito deve ser compreendido como uma aos feixes de relações (Foucault, 1985) e conseqüentemente atividade política, que instaura uma racionalidade, uma sócio- uma formação discursiva e a possibilidade de construir sentido. cognição (Koch, 2000) cuja dinâmica e história variam de A política, nesse sentido, interconecta todos os fazeres da vida grupo étnico para grupo étnico. social, inclusive a religiosidade desses indígenas que tem sido A religiosidade indígena também não deve ser interpretada, não raro, a partir de conceitos e categorias da compreendida mitologia e do cristianismo. Do ponto de vista mitológico, há normalmente usadas para se pensar as religiões ditas cristãs. interpretações que partem do conceito de mito como uma Uma análise sem a compreensão da dinâmica do uso político da estrutura fixa que serve para interpretar toda e qualquer religiosidade mostrará apenas uma face da dimensão religiosa, sociedade denominada primitiva. mesmo porque, como dito acima, não há discurso religioso por estruturas analíticas e categorias O que teria de variação entre um mito e outro seria separado das outras faces da vida social. O olhar etnográfico apenas o conteúdo, uma vez que, para alguns mitólogos, a deve buscar entender como, em um dado momento, se pratica a estrutura mitológica é apriorística e universal. Este tipo de “mitologicidade” sem partir de formas analíticas 167 preestabelecidas. Descrever a inteligibilidade da formação Rousseau e, por fim, como vagabundos, incapazes, incultos, em discursiva e da organização sócio-econômica depende da outras palavras, seres imprestáveis para a vida capitalista. possibilidade de poder estar em contato com a dinâmica da Premissas que são aplicadas para se referir também os Kaiowá construção da organização social situada nesse momento e os Ñandeva do Mato Grosso do Sul. Além dessas histórico, o que implica em considerar as rupturas do processo representações distorcidas sobre os indígenas, há outras histórico e não determinação linear teleológica de causa e representações acadêmicas que partem de construtos teóricos efeito. A linguagem nessa dinâmica é mais que forma de que tentam compreender esses indígenas dentro de uma camisa abstração e comunicação, é também forma de não-comunicação de força teórica, o que gera representações reducionistas que e instrumento político elaborado e usado no fervor da acabam por reforçar essas representações. Contrariando o construção da história. Assim, se discurso é criado a partir da imaginário nacional e certos quadros analíticos, historicamente, prática social, por outro lado, é ele que ajuda a manter uma esses indígenas se construíram mais como políticos do que forma de ser que, e, por sua vez, determina o que deve ser feito como guerreiros, sobretudo a partir do contato mais intenso e a maneira como deve ser feito, deste modo, a prática social e com os não-índios a partir do início do século passado. As a discursiva se determinam e se imbricam. noções político e guerreiro não se excluem como noções dicotômicas e reforçam a tese de que política não é apenas a Desconstrução da idéia genérica de índio guerra continuada, mas estratégias para inclusive evitar a guerra e possibilitar outras maneiras de convívio e de resolução O imaginário nacional tem uma representação de conflito. Conflitos que os Kaiowá e os Ñandeva têm genérica de índios como sendo guerreiros que resolvem seus resolvido por meio de armas simbólicas que criam trincheiras conflitos por meios violentos e coercivos, ou ainda, nítidas, mas que também as atravessam (Bhabha, 1998) na paradoxalmente, como seres ingênuos, os bons selvagens de busca de respostas, na construção de sentido. 168 A produção de vida desses indígenas com elementos da fofoca4. Esse discurso também visa a chamar a atenção dos simbólicos e bens materiais desse momento histórico tem sido não-índios para seus problemas de maneira sutil. Interpretar muitas vezes mal-interpretadas como aculturação, perda de esses discursos literalmente pode levar à defesa da tese do identidade, pois se espera que vivam como seus ancestrais, que resgate da cultura, ou seja, a tese que defende que os indígenas falem uma língua pura, que não usem celular, que não ouçam devem resgatar seus costumes antigos, devem viver como seus música brasileira, que não comam comida de “brancos’ etc. A ancestrais. Essa tese desconsidera o fato de que cultura é algo tese de aculturação e perda de identidade é reforçada por dinâmico e construído sócio-historicamente. aqueles que analisam o discurso indígena superficialmente. É Além disso, o imaginário brasileiro ainda concebe os comum ouvir indígenas, sobretudo indígenas mais velhos, indígenas como seres fossilizados que não se transformam no fazendo discursos emocionados nos quais afirmam que os fins tempo, incapazes de apresentar soluções para os problemas que dos tempos chegaram, pois seus filhos e netos não respeitam enfrentam, lançando mão de elementos matérias e simbólicos mais a cultura e que há indígenas que não podem ser que aprenderam, ou que elaboraram na construção da história. considerados mais indígenas, pois vão a bailes de brancos, não Para participarem da aty guasu é necessário que sejam respeitam mais os mais velhos, não rezam, bebem e são indígenas desse momento histórico, o que implica em aprender violentos. Ao se tomar esse discurso literalmente não se os novos símbolos e novos saberes, colocá-los em circulação compreende a função do discurso dos mais velhos no processo por meio de novas estratégias de luta, e dentre essas estratégias de endoculturaçao e manutenção do modo de ser. está o discurso enquanto enfrentamento em nível simbólico. Esse tipo de procedimento tem sido registrado em vários momentos do século passado e são estratégias para convencer e educar os mais novos, e podem ser também estratégias políticas, uma tentativa de atingir o outro por meio 4 A fofoca entre os indígenas tem função política importante, pois, por meio dela, se educa, se reivindica e se exerce o poder. Os indígenas temem a fofoca, especialmente quando é feita por pessoas próximas em momentos inesperados. 169 A dinâmica da construção da vida social Muito embora todos busquem reconhecimento e prestígio baseado no ideal do símbolo e da religiosidade a A construção da vida social Kaiowá e Ñandeva passa validade da prática discursiva esta atrelada à aquisição de bens muito mais por ações políticas engendradas por símbolos materiais. E aqueles que são capazes de propor soluções para os lingüísticos e não lingüísticos do que por ações coercivas problemas, manter o grupo macro-familiar, denominado, tey’i, impostas pela força física e regras sociais rígidas e estruturas família extensa,5 se construindo por meio do diálogo, sociais prontas e perenes. Essa característica leva à construção administrar as relação sociais no grupo, a correlação de forças, de um modo de ser dinâmico no qual os indivíduos a transmissão de saberes e de símbolos, a formação de sub- atravessados pelo modo de ser jogam o jogo político da grupos, a relações de reciprocidade6 e a aquisição de bens inclusão-exclusão (Bourdieu, 2004), enredando-se nos feixes materiais, tornam-se líderes. São esses líderes ou pessoas das relações (Foucault, 1985), mas atuando como agentes na ligadas a esses líderes que tem representatividade para falar em construção do modo de ser. Esses indígenas aprendem desde nome do grupo macro-familiar e disputar entre si o status de muito cedo a forjar armas-simbólicas e a usá-las na cotidianidade para pertencer, para convencer, para seduzir, para denegar, para, enfim, construir sentido no sentido mais amplo do termo, ou seja, viver de certa maneira. Constroem-se como excelentes falantes, ouvintes e argumentadores, pois a vida social é tecida cotidianamente na administração dos problemas por meio de diálogos, conselhos e rezas. Incluem o mundo sobrenatural na política terrena que é uma continuidade da política do mundo invisível na busca de resultados práticos. 5 A família extensa, que ainda hoje, é a base da organização social Kaiowá e Ñandeva (Mura, 2000), tem como referência um líder, ou uma líder, chefe da família que reúne em torno de si seus filhos, netos e agregados. O líder ou a líder é o pólo de referência e pertencimento no processo de construção da identidade. O indivíduo se identifica a partir do grupo macro-familiar e em relação de alteridade a outros grupos macro-familiares. Há disputas entre as famílias extensas, sobretudo por bens materiais. A dinâmica da vida social Kaiowá e Ñandeva deve começar a ser analisada a partir da família extensa. 6 O princípio de reciprocidade é uma das características desses indígenas. É uma regra implícita de pertencimento que coloca os bens materiais e simbólicos em circulação no grupo, ou seja, os bens individuais devem estar à disposição dos membros do grupo. Quem assim não procede é acusado de não ser um indígena de teko porã, comportamento adequado, segundo os valores desses indígenas. 170 representar e falar em nome dos grupos-familiares que se unem poder, portanto é nela e com ela que se signifaz o indivíduo. em aliança para resolverem problemas comuns. São estes que Muito embora esse indivíduo desenvolva sua eticidade em mais frequentemente pronunciam o discurso indígena em relação a outros indivíduos de outras famílias extensas e ocasiões especiais, sobretudo em presença dos karai guasu, indivíduos não-índios, é no âmbito da família extensa que não-índios, que consideram importantes, e que possam vir a ser aprende como funciona o poder, é dela que faz parte antes de aliados na luta pela terra. tudo, antes de ser Kaiowá, Ñandeva, os indígenas se Esses discursos são pronunciados mais identificam a partir de suas famílias extensas. A instituição veementemente nas aty guasu, assembléias que congregam família pessoas de vários grupos macro-familiares dos dois grupos compartimentadas de especialidades de poder, de saber, de étnicos, porém, ultimamente, têm aparecido na mídia, por julgamento e de religião, antes, todas essas compartimentações ocasião de entrevistas, em palestras, mesas redondas, são uma e única instância. audiências públicas, enfim, em todas as oportunidades que os indígenas têm de se manifestar. Esse discurso tem uma função extensa não é um agregado de instituições Todo e qualquer individuo é, em potencial, agricultor, juiz, professor e rezador7. Isto, contudo, não evita política em relação aos não-índios, mas também uma função política interna. As famílias extensas disputam entre si a obtenção de bens materiais e de prestígio. Consequentemente, as lideranças se firmam como tal, por assumir compromissos junto aos membros de sua família extensa e junto aos membros das famílias aliadas, o que gera disputas entre as lideranças em todos os níveis, inclusive no nível religioso. É no âmbito da família extensa que se iniciam os conflitos e as relações de 7 Os rezadores são líderes religiosos que conquistaram esse status em decorrência de um saber que lhes permite pedir a interferência do mundo sobrenatural. Esse saber consiste em rezas e conhecimentos sobre plantas medicinais. Há especializações e níveis de saber entre os rezadores e seus conhecimentos são utilizados politicamente no jogo das relações entre as famílias. O rezador é uma figura ambígua e ambivalente no processo de construção, pois, segundo o modo de ser desses indígenas, os rezadores podem atuar tanto para fazer o bem como o mal. Por isso, são reverenciados, mas também temidos. Os males que ocorrem em determinados momentos podem ser atribuídos a eles. É muito comum ouvir discursos sobre a ineficácia das rezas dos rezadores atuais, por outro lado, os rezadores acusam seus pares de terem perdido o fervor religioso. Ao se ouvir essas acusações sem contextualizá-las corre-se o risco de entendê-las 171 especializações nem relações de poder assimétricas. Aqueles dinâmica e em permanente construção. O modo de ser é que conseguem, segundo suas habilidade, apresentar soluções resultado do cumprimento de regras, mas também da cultura de práticas, partindo das premissas do modo ser, e ter quebrar regras e reafirmá-las em contratos firmados por meio comportamento adequado podem granjear prestígio e poder. Os da linguagem, fios que entrelaçam aqueles que estão juntos nos rezadores se especializam em sua arte, os agricultores em sua e embates cotidianos da construção da vida social e com os quais assim por diante, mas nenhum deles, ainda que especialista, constroem discurso, “como atividade de sujeitos inscritos em desconhece totalmente o “ofício” do outro. Muito embora haja contextos determinados” Maingueneau, (p 43, 2006). um rezador capaz de realizar a cura, o paciente sabe como funciona o procedimento. Como “o processo em que o lingüístico e o social se articulam, objeto ao mesmo tempo social e histórico onde se O modo de ser, dessa maneira, pressupõe o confrontam sujeito e sistema” Coracini (1991a, p. 337). Visto conhecimento da totalidade do mundo e não é construído por dessa maneira, o discurso não é mera representação das ações meio de regras rígidas de comportamento. Muito embora humanas, mas também não é a determinação dessas ações. São persigam a moral do teko porã,8 e se baseiem em certos tabus, próprios do agir humano no mundo e existem para garantir vida o modo de ser é uma construção em sociedade, para manter a eterna construção de contratos. A sócio-historicamente primeira coisa a ser considerada, deste fato, é o que atravessa como aculturação e perda de identidade. Porém, ao se fazer uma revisão historiográfica, pode-se encontrar tais acusações em outros momentos históricos. Essas acusações, em nosso ponto de vista, são muito mais ações políticas do que indícios de aculturação e perda de identidade. 8 O teko porã é o comportamento adequado, segundo esses indígenas. Ter teko porã implica em ser obediente, saber ouvir, participar ativamente da vida social, saber rezar, ser recíproco, ser trabalhador, não beber, não ser violento, saber trabalhar a ñe’e, como palavra e como alma, enfim, facilitar a construção do modo de ser. Aqueles que não se comportam segundo o teko porã, são alvo de “fofocas”, uma arma de controle social bastante eficaz na construção da vida social. todos aqueles que fazem parte do contrato, o que os une. Na esteira de Barth (1985), deve-se perguntar por valores, premissas a partir das quais o grupo se constrói em quanto tal, enquanto diferente em relação a outros grupos com os quais estabelecem relações de alteridade e a partir dos quais se percebem enquanto diferentes e criam uma identidade. É 172 necessário ainda, enfatizar o caráter dinâmico da construção de irreconciliáveis, mas também como enfrentamento de teses e valores, posto que estes são adaptáveis às condições sócio- interesses opostos em relações contraditórias, exercício econômicas e ambientais impostas pela história. A construção dialético e fonte de sentido num mundo de contingências e não de valores decorre da experiência de estar vivo e de colocar em apenas de contrariedade. jogo todas as dimensões humanas, inclusive a dimensão simbólica que possibilita o afastamento e a reflexão do real e A argumentação e sentido faz surgir discursos. O discurso, dessa maneira, não deve ser compreendido somente como matéria de linguagem cuja Os Kaiowá e os Ñandeva são referidos como análise revelaria seu teor e sua complexidade, mas como um excelentes argumentadores e manipuladores de símbolos dos elementos que viabilizam o exercício da vida social. lingüísticos e não-lingüísticos (características que se pode A experiência se transforma em saberes e atitudes que confirmar nos trabalhos de campo) que usam como táticas na estão além da superfície da linguagem, mas que estão também construção do seu modo de ser. Ao se analisar o discurso encarnados na própria linguagem enquanto parte constitutiva indígena não se deve deixar de analisar a argumentação, mas dessa dinâmica. A vida social não pode ser compreendida com dentro do contexto indígena. o somatório de indivíduos que visam a um bem comum, antes, Breton (2003), Abreu (2004) e outros definem a argumentação como adverte Foucault (1985), é resultado de um intricado jogo como elemento essencial para exercício democrático e como de forças, fonte da construção de valores e da organização da atividade humana que existe desde sempre. Condição de vida social. Isto não significa desconsiderar a possibilidade de possibilidade para formação de grupos por meio de contratos. convergências significa Tais teóricos partem do conceito moderno de democracia como compreender o conflito não apenas como maneira radical de regime político construído cotidianamente por meio da negar o outro, como resultado de posições contrárias, participação ativa dos cidadãos que em condições físicas, e de momentos harmônicos, Alguns teóricos, dentro eles 173 mentais e intelectuais buscam o consenso, seguindo os defesa de teses. Argumentar é buscar sentido, respostas, preceitos éticos do seu tempo. Trata-se de uma definição útil condições que garantam as possibilidades da eterna construção para a análise do discurso indígena, mas que deve ser de contratos entre atores sociais que se constroem em aprofundada, pois a construção das teses e não só a defesa da sociedade, com o outro, por meio do exercício diário, da luta tese deve ser compreendida. Também não se pode partir da diária na dinâmica de transformação do mundo. Argumentar premissa de que as relações na atividade argumentativa sejam não simétricas e decorrem de um exercício democrático claro e reconhecidos, mas conhecer as leis implícitas que regem o previamente estabelecido. fenômeno da argumentação que variam de grupo étnico para é apenas desenvolver raciocínios universalmente A idealização de que a argumentação como resultado grupo étnico, condição que possibilita a vida social e que de raciocínios lógicos que visam ao consenso e que tem sido permite a participação no jogo. Argumentar é saber como as praticada pelas sociedades ditas civilizadas como uma maneira coisas devem ser ditas dentro de um contexto. de evitar a coerção e a violência na construção da vida social A argumentação, como elemento essencial na não considera a dinâmica da construção do exercício social. construção do sentido, tem sido amplamente debatida e Para em teorizada, e muito se tem escrito sobre o poder dos raciocínios manipulação, sedução, coerção e violência, atitudes que e das palavras na arte do convencimento. Muitos deram suas perpassam o exercício de estar juntos nas relações sociais por contribuições que tem orientado a formação de e oradores e meio da linguagem e por outros meios. Argumentar, no estudos sobre a arte de argumentar, porém é uma atividade contexto indígena significa defender um modo de ser em humana relação a outros e a construção da identidade nas relações intra- constatada em qualquer organização social. Os Kaiowá e os étnicas. Argumentar, no contexto indígena, não se refere apenas Ñandeva do MS, por exemplo, nunca leram Aristóteles, ou a além dessa idealização, argumentar embates entre oradores ou entre orador implica e auditório em construída sócio-historicamente que pode ser 174 Perelman, mas dominam com maestria a arte de argumentar correlação de forças, mas não exclusão. A argumentação no inter e intra-etnicamente. segundo caso é utilizada como meio de se buscar uma síntese, firmar um contrato e manter um modo de ser. O etnocentrismo O jeito indígena de argumentar que hoje encontra suas armas em nível simbólico já foi praticado com outras armas. Muitos grupos étnicos foram Analisar o discurso indígena a partir da correlação de exterminados em decorrência do enfrentamento de teses forças por meio da argumentação é um exercício produtivo para opostas que ocorrem em nível físico. Houve grupos étnicos se compreender a construção do sentido, mas é preciso que construíam sua realidade objetiva por meio de um conjunto compreender que, no contexto indígena, há níveis de de valores e táticas veiculadas e pensadas pela linguagem e se argumentação e que há teses contrárias e excludentes e que há constituíram como formações discursivas diferentes, como teses contraditórias, ou seja, teses que não se excluem modos de ser diferentes, como discursos diferentes. Muitos radicalmente. Em relação a isso, as reflexões de Maturana desses modos de ser não resistiram ao contato com os não- (1999) e Baudrillard (1990) e Kock (2000) ajudam a índios. Não conseguiram dar respostas a novas demandas compreender a complexidade do discurso indígena, pois, como históricas, não conseguiram dar sentido a novos problemas e dito em outro lugar neste texto, o discurso indígena tem função pereceram. política inter e intra-étnica. No primeiro caso, remete ao Os Kaiowá, os Ñandeva e outros grupos étnicos, por enfrentamento entre a tese dos indígenas e a tese dos não- outro lado, sobreviveram e mantiveram seu discurso, e sua índios, fundamentados em premissas radicalmente opostas, o formação discursiva porque conseguiram adaptar sua maneira que leva a etnocentrismos de ambos os lados, e a negação de construir sentido às novas demandas históricas. Perceberam, radical do outro, embora de maneira escamoteada. No segundo por exemplo, que o enfrentamento armado só traria caso, nas relações intra-étnicas, as teses não se excluem, há desvantagens e buscaram outras formas de enfrentamento. 175 Nesse sentido, fazer discurso é muito mais que enfileirar a aty guasu de Ñanderu Marangatu, terra indígena em litígio, palavras; é muito mais que atos de fala; é muito mais que situada na cidade de Antônio João, aproximadamente a 400 km comunicar apenas. É garantir a vida, uma maneira de produzir de Campo Grande, capital do Estado de Mato Grosso do Sul. vida. Refletir sobre o discurso, a partir desse ponto de vista, é É possível, por meio da carta, identificar a maneira considerar todas as dimensões do humano no mundo, o que Kaiowá e Ñandeva de construir discurso. Esta carta, porém, é requer é apenas uma estratégia a mais na defesa da terra que não oferece reconhecidamente fatigosa e pantanosa, mas, mais segura do elementos para se refletir sobre a complexidade do discurso que partir de constructos pré-montados. indígena, um discurso eminentemente oral composto de uma uma visão multidisciplinar. Essa tarefa diversidade de elementos expressivos que só pode ser analisado As possibilidades de Análise do discurso. Em decorrência dos limites, não será feita a análise do em lócus ou mediante filmagens. Exmo. Sr. Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva. discurso tal qual tem sido construído nas aty guasu. Primeiro, porque não é essa a proposta do trabalho. Segundo, pela “Nós lideranças, kaiowá e Guarani de várias aldeias impossibilidade de apresentar as gravações e filmagens do estado de Mato Grosso do Sul reunidos na aty guasu na terra originalmente feitas em guarani com a devida tradução e indígina Ñanderu Marangatu município de Antônio João-MS, análise dos recursos lingüísticos e não-lingüísticos utilizados na vimos por meio dessa, nos dirigir ao Senhor Presidente da construção do discurso. A título de exemplo, contudo, algumas República, Luiz Inácio Lula da Silva , para requerer a reflexões serão realizadas sobre uma representação escrita do homologação imediata da terra Ñanderu Marangatu bem como discurso indígena que podem ilustrar as reflexões feitas acima. todas as áreas (tekoha) em conflito no estado (sic). O material a ser analisado trata-se de uma carta, escrita durante 176 O tekoha ñanderu Marangatu já teve seu Até hoje no Estado do Mato Grosso do Sul somente procedimento demarcatório com Portaria Declaratória do 01( um) tekoha em processo de revisão de limites foi Ministro da Justiça, com toda a sua demarcação física homologado. Que foi o caso da terra indígena Panmbizinho concluída em 12/10/2004, somente carecendo da homologação por parte do Presidente da República. Vale destacar também, que nós povos indígenas Kaiowá Guarani do mato Grosso do Sul, nos sentimos traídos Clamamos que as medidas liminares de reintegração pela apresentação do PL 188 de autoria do senador Deelcídio de posse que foram concedidas pela Justiça Federal em favor do Amaral do PT-MS, que vem a modificar o procedimento de fazendeiro que se encontra na terra indígena ñanderu administrativo de demarcação de terras indígenas. Essas marangatu, sejam imediatamente cassadas e a fim de se evitar modificações vêm justamente a prejudicar os povos indígenas uma grande tragédia com o cumprimento de ordem de despejo do Brasil, trazendo morosidade ao procedimento, anulando com força policial que mais parece um efetivo preparado para processos já em andamento, sem contar o dinheiro público que uma Guerra! já foi gasto com os processos em andamento que serão Os casos de desnutrição que tem ocorrido nas aldeias kaiowá Guarani não são decorrentes “simplesmente” da fome e “jogados no lixo”. Portanto, clamamos que seja arquivado definitivamente esse projeto de caráter “criminoso”. da miséria do povo, pois na verdade a fome, a miséria e Pedimos empenho do Presidente da República para a também a violência, é conseqüência histórica da falta de terra. regularização das terras indígenas do Mato Grosso do Sul a fim No caso do Mato Grosso do Sul, quase que a totalidade das de se solucionar definitivamente todos o problmeas que terras indígenas precisam de revisão constitucional de limites, agridem o povo Kaiowá Guarani do MS. mas os procedimentos de demarcação se encontram totalmente paralisados ou mesmo nem sequer iniciados. Queremos lembrar que a luta pela terra do povo Kaiowá Guarani teve grandes guerreiros do tekoha Ñanderu Marangatu como Marçal de Souza que foi brutalmente 177 assassinado pelos criminosos inimigos dos povos indígenas que de luta no qual não cabem todos os recursos argumentativos jamais foram julgados e condenados por este crime, e Dom que usam no processo de construção do discurso oral. Quitito que faleceu em Coroa Vermelha-BA, quando A teatralidade, o ritual e a presença de indicadores participava da marcha e conferencia indígena 2000. Queremos, religiosos fundamentais para darem validade ao discurso, por portanto, nessa oportunidade prestar nossas homenagens a exemplo, não cabem no documento. Tive a oportunidade de todos esses guerreiros, e para os que continuarão com suas lutas ouvir o discurso em Ñanderu Marangatu e pude perceber os pela terra e vida do povo Guarani.” efeitos de sentido provocados pelos oradores. O discurso foi Ñanderu Marangatu, Antônio João-MS, 20 de março de 2005. realizado em um espaço com cobertura de sapé. Os oradores ficavam no meio do espaço, rodeados por todos os lados por Reflexões sobre a carta indígenas e vários não-índios. Em frente aos oradores, foi colocado um banco no qual se sentaram alguns não-índios, A carta acima resume o discurso da aty guasu identificados por eles como autoridades. Essa configuração do realizada em Ñanderu Marangatu e em outras aty guasu. Nela, espaço é bastante significativa, pois, para que o discurso tivesse pode-se identificar o discurso indígena de luta pela terra e validade foi necessário que não-índios o ouvissem. Estes pode-se analisá-lo à luz da teoria da análise do discurso, representavam o outro do discurso, porta-vozes da formação identificando marcadores discursivos, recursos argumentativos, discursiva “governista” que cumpriam seu papel no ritual de heterogeneidade, etc, porém, para se compreender as condições um discurso que nesse caso tinha função intra-étnica. de construção deste discurso, se faz necessário contextualizar Os oradores se revezavam, mas o tema do discurso era tal discurso histórica e antropologicamente. Além disso, deve- o mesmo diante dos não-índios que estavam lá naquele se compreender que a carta é apenas mais um recurso momento e que representavam de certa forma, o Karai Guasu, argumentativo do discurso eminentemente oral, um instrumento grande líder, Luiz Inácio Lula da Silva. Dentre os oradores, 178 uma senhora, além de reafirmar que todos os males que sofriam A insistência em pronunciar o discurso em guarani advinham da falta de terra, construiu uma representação não ocorreu somente porque alguns indígenas não conseguem mitológica de terra bastante comovente. Aquela senhora só falar português, mas como uma maneira de demarcar as falou porque tinha voz de autoridade (Bourdieu, 1996) para diferenças e de reforçar a identidade. O que pode se deduzir a fazê-lo, ou seja, havia se constituído enquanto líder por outras partir da carta é o apagamento da diferenças entre os Kaiowá e qualidades, mas também por ser exímia articuladora da Ñandeva, estes últimos referidos por Guarani. As diferenças linguagem enquanto novo instrumento de luta. Na medida em que marcam as fronteiras étnicas entre esses dois grupos são que falava, ouviam-se os sons dos mbarakas, chocalhos, apagadas pelo pronome nós e pelo substantivo povo Guarani, agitados por muitos rezadores presentes no evento. termo genericamente usado para ser referir aos Guarani, O som dos chocalhos legitimava o que a senhora indígenas que viviam em várias partes do Brasil no período dizia, representavam as vozes dos espíritos que concordam com colonial. Ultimamente, a categoria genérica índio tem sido a fala. A carta também não revela o jogo político inter-étnico. usada politicamente pelos próprios indígenas e a usam como Aquele momento serviu para a legitimação de lideranças e sinal diacrítico genérico para defender interesses comuns como demonstração de poder por parte dessas lideranças. Houve a questão da terra e os direitos indígenas garantidos na claras demonstrações de habilidade lingüísticas discursivas por Constituição de 1988. Os termos ñanderu, marangatu e tekoha parte de alguns indígenas que devem se firmar ou se construir respectivamente líder religioso, modo religioso de ser, e lugar enquanto liderança perante seus pares. Todos os discursos onde se realiza o modo de ser são empregados como efeito de foram realizados em guarani e traduzidos por um não-índio sentido para se referirem a terra como lugar vivo. Esses termos que, após alguns minutos, foi substituído por uma intérprete dão à terra uma conotação sagrada de lugar povoado de indígena. Queriam demonstrar que os indígenas dominam a espíritos com os quais devem interagir e com eles construir um língua portuguesa e outros conhecimentos. espaço onde tudo está interconectado. 179 A carta revela a ênfase que esses indígenas passaram descaso do poder público. As aspas no termo simplesmente, a dar à historia contada do ponto de vista indígena. A terra de além de dar uma conotação irônica ao termo, demonstram a Ñanderu Marangatu, segundo a história indígena, tem uma competência argumentativa e o manuseio da palavra também fundação mítica e passou a ser terra indígena quando há muito em nível da escrita. tempo atrás se fixaram nela indígenas, dentre os quais havia um Ao utilizarem o verbo traído para se referirem a ñanderu, líder religioso, que pediu permissão para os ancestrais atitude de um senador da República, demonstram o para ali se instalar. Enfatizam também as lutas para manterem envolvimento desses indígenas com partidos políticos, pois esse espaço contra os não-índios e salientam a figura histórica para ser traído é preciso ter um pacto firmado antes. Subtende- de Marçal de Souza, um indígena que morreu na luta pela se que o Senador, representante do PT (Partido dos defesa dos direitos indígenas. Marçal de Souza passou a ser Trabalhadores) traiu os povos indígenas ou por não ter uma figura histórica por morrer na luta, mas também por cumprido uma promessa clara de defesa dos direitos indígenas representar a sagacidade, a habilidade lingüística e coragem, ou por ter sido identificado como representante do discurso características de um grande líder. petista que na época das eleições pregava a defesa dos direitos O argumento central da luta pela terra: relação entre indígenas. miséria, violência e outros males que os assolam à falta de terra A carta Demonstra conhecimento da gestão da coisa também está expresso na carta. Para dar mais efeito de sentido pública ao afirmarem que a morosidade do processo traz a esse argumento, aparece o termo “simplesmente” entre aspas transtornos para os indígenas, mas também leva ao desperdício para induzir que a fome e a miséria não surgiram do nada, ou do dinheiro público que é “jogado no lixo”. Esta expressão pela falta de trabalho, como pensam os não-índios. A fome e a remete ao envolvimento político e à apropriação do discurso miséria, segundo a argumentação indígena, têm história, são político dos não-índios, já que esta expressão é amplamente conseqüências da usurpação da terra pelos não-índios e pelo usada para caracterizar má gestão de dinheiro público. 180 O pedido endereçado ao Presidente da República, reforçados pelos verbos, clamar, pedir e requerer. Nas enquanto Karai guasu, representante maior dos não-índios, entrelinhas da carta, lê-se que os indígenas são aqueles demonstra a crença na possibilidade de uma resolução política envolvidos no conflito que querem resolver a questão de para o impasse. Ao pedirem empenho do presidente, dão a maneira pacifica e democrática, enquanto o poder público é entender que o presidente é um possível aliado que tem poder caracterizado como representante de não-índios que querem para interferir no processo. Por fim, a carta narra sucintamente fomentar o conflito. Por fim, esta carta, enquanto a escrita do a história da demarcação das terras indígenas e caracteriza o discurso, processo como moroso, injusto e criminoso, responsabilizando convencimento do outro do discurso. tem função argumentativa no processo de o poder público pela miséria dos indígenas, pois se o poder Ela demonstra que os indígenas não são mais povos público não agiliza a restituição da terra já identificada e ágrafos e que sabem usar a escrita como instrumento de luta. homologada como terra indígena, o poder público é injusto por Isto tem levado a valorização de indígenas que dominam a negar um direito constitucional. Se o poder público nega o escrita da língua portuguesa e conhecimentos jurídicos, acesso à terra que aliviaria a miséria e a fome, é o poder sociológicos, antropológicos e lingüísticos discursivos. Porém, público que agrava os males dos indígenas. Se o poder público esses conhecimentos não bastam para que alguém se firme não evitar uma possível tragédia, caso não evite um possível como liderança, pois a construção da liderança entre esses confronto entre a polícia fortemente armada e os indígenas indígenas vai muito mais além de saber escrever em português movidos apenas pelo sentimento de justiça e do direito a vida, o e ter certos conhecimentos aprendidos dos não-índios. A poder público compactuará com um ato criminoso. liderança e o modo de ser desses indígenas se constrói muito O conflito ganha conotação de guerra, termo que mais pela habilidade de exercer a política por meio da palavra aparece na carta precedido de um ponto de interjeição que dá oral, uma palavra fragmentada, polissêmica e ambígua por uma conotação emocionada e apelativa ao discurso, aspectos meio da qual constroem noções de tempo e de espaço e com a 181 qual escrevem modos de ser e suas histórias. Analisar o BAUDRILLARD, Jean. A transparência do mal: ensaio sobre discurso indígena por meio dessa escrita em português é ter os fenômenos extremos. Trad. Estela dos Santos Abreu- uma visão parcial da maneira Kaiowá e Ñandeva de construir Campinas- SP: Papirus, 1990. sentido, pois quando falam em guarani e usam outros recursos não-lingüísticos criam efeitos de sentido que nem mil cartas BAKHTIN, MIKHAIL. A estética da criação verbal. São conseguiram captar. O lugar, as danças, as rodas de tereré, as Paulo: Martins Fontes, 1992. rezas, os encontros, os olhares, os adereços, enfim, tudo isso é matéria usada na construção do discurso. Um discurso que BARTH, Fredrik. Balinese worlds. The University of Chicago. precisa ser melhor analisado. 1993. BIBLIOGRAFIA _____________. Cosmology in the making: a generative approach to cultural variation in inner New Guinea. ALMEIDA, Rubem Ferreira Thomaz de. Do desenvolvimento Melbourne, Australia: Cambridge University Press, 1987. comunitário à mobilização política: projeto Kaiowa-Ñandeva como experiência antropológica. Rio de Janeiro: Contra Capa, BHABHA, Homi K. O local da cultura. Belo Horizonte: 2001. UFMG, 1998. ARISTÓTELES. Arte Retórica. Trad. Bras. SãoPaulo: BOURDIEU, Pierre. A economia das trocas lingüísticas. São Difusão Européia do Livro, 1964. Paulo: EDEUSP, 1996. 182 CORACINI, M. J. R. F. Análise do Discurso: embusca de uma FOUCAULT, Michel. A arqueologia do saber. Rio de Janeiro: metodologia. D.E.L.T.A., São Paulo, v. 7, n. 1, p. 335-335, Forense Universitário, 1985. 1991a. ___________, Michel. Em Defesa da Sociedade: Curso no DIXON, R.M.W. The rise and fall of languages.Cambridge Collège de France ( 1975-1976). Trad. Maria Ermantina University Press, 1997. Galvão. São Paulo, Martins Fontes, 2005. DERRIDA, Jacques. A Farmácia de Platão. Trad. Rogério _______, Michel. A Ordem do Discurso. Trad. Laura Fraga de Costa 2ª ed. São Paulo: Iluminuras, 1997. Almeida Sampaio. 6ª ed. São Paulo: Edições Loyola, 2000. _________, Jacques .GRAMATOLOGIA. 2ª ed. TRAD. Miriam GEERTZ, Clifford. Interpretação das culturas. Rio de Chnaiderman e Renato Janine Ribeiro. São Paulo: Perspectiva, Janeiro: Vozes, 1996. 2006. KOCH, Ingedore G. Villaça. Argumentação e Linguagem. ELIADE, Mircea. O sagrado e o profano: a essência das 6ªed. – São Paulo: Cortez, 2000. 240p. religiões. Lisboa: Livros do Brasil, 1973. MAINGUENEAU, Dominique. Novas tendências em análise FABRI, Marcelo; MORAIS, Regis (Org.) in As razões do mito. do discurso. Trado. Freda Indursky. Campinas, SP: Pontes: Campinas-SP: Papirus, 1988. Editora da Universidade Estadual de Campinas, 3ª e., 1977. 183 _______________, Dominique. Termos-chave da Análise do PERELMAN, C; TYTECA, L. O. Tratado de Argumentação: Discurso. 2ª ed. Trad. Márcio Venício Barbosa e Maria Emília a nova retórica. Trad. bras. São Amarante Torres Lima. Belo Horizonte, MG: editora UFMG, Paulo: Martins Fontes, 1996. 2006. TURNER,Victor. Dramas, Fields and metaphors: Symbolic MAFFESOLI, Michel. No fundo das aparências. Petrópolis- Action in Human Society. . Ithaca and London : Cornell R.J.: Vozes, 1996. University Press, 1985. MATURANA, humberto. Emoções e linguagem na Educação TURNER, W. Victor. O processo Ritual : A Estrutura e a e na Política. Trad. José Fernando Campos Fortes. Belo Antiestrutura. Petrópolis, Rio de Janeiro: ed. Vozes Ltda. 1974. Horizonte: UFMG, 1999 MURA, Fabio. Habitações Kaiowá: Formas propriedades técnicas e organização social. Dissertação de Mestrado. Universidade Federal do Rio de Janeiro. Museu Nacional2000. OLIVEIRA, João Pacheco de. Ensaios em antropologia histórica. Rio de Janeiro: UFRJ, 1999. 184 A Fragilidade da Identidade Indígena numa Comunidade Próxima a um Centro Urbano Sandra Espíndola (UEMS) Apontamentos sobre Violência, Relações de Gênero e Análise Crítica do Discurso Tânia Regina Zimmermann (PG/UNIPAR/UEMS) O Guarani e sua Relação com a Identidade Cultural da América do Sul Nádia Nelziza Lovera de Florentino (G/FINAN) 185 O GUARANI E SUA RELAÇÃO COM A IDENTIDADE CULTURAL DA AMÉRICA LATINA Nádia Nelziza lovera de Florentino (UEMS) EL GUARANÍ Cantar quisiera idioma indiana Todo lo grande que hay en tí Que se difunda por cerro y llano Este tesoro del Guaraní. Con filigranas inigualadas Como tejido de Ñandutí Aves y plantas están marcadas Con bellos nombres en Guaraní. Miles de puntos marcan tu huella Selvas y valles que conocí. Tienen sus nombres de luz de estrella 186 Llevan sus signos en Guaraní. considerando-o como as “características que definem um sujeito, nação ou povo”. Dessa forma, a expressão “identidade Cada palabra es como un arpegio cultural” poderia ser entendida fazendo-se a relação entre as Vibra cual arpa dentro de mí, particularidades que alguns países têm em comum quanto às Tiene el encanto de un sortilegio manifestações culturais, a língua é uma delas. No tocante à América do Sul, existe um ponto de identidade cultural no que Tiene dulzuras el Guaraní. se refere à uma língua indígena pertencente a alguns países, o Hay sin embargo, quienes no quieren Guarani. Ver la hermosura que hay en tí. Mas para entender melhor essa língua, devemos Yo que conozco lo que tú eres analisar Entono loas al Guaraní. consequentemente dos idiomas por eles falados que mudou melhor a situação dos povos indígenas e radicalmente a partir do século 15, quando começaram as Fuiste el idioma de mis abuelos Y me arrullaste cuando nací, grandes expedições européias rumo ao “novo mundo”. Dizem que em 1492 a América foi descoberta. A Y en mi partida será un consuelo verdade é que quando Colombo, Alejo, Cabral e tantos outros Oir palabras en Guaraní. europeus aqui chegaram, a terra não estava isolada, ela tinha ANTONIO ORTIZ MAYANS habitantes, tinha donos. Donos que perderam a liderança ao se deparar com uma cultura dita mais “avançada”, totalmente A palavra identidade, pode ser definida como “os caracteres próprios e exclusivos de um indivíduo”. Porém, aqui vamos nos ater a uma concepção mais abrangente deste termo, invasiva que não veio somente “colonizar” o novo mundo, mas principalmente roubar-lhe tudo o quanto podia. 187 Roubaram as riquezas minerais, roubaram os recursos nesse idioma, que foi de seus avós e que o “embalou quando naturais, mas, acima de tudo, roubaram a cultura, como prova nasceu”, terminando sua expressão de sentimentos afirmando maior desse roubo temos o total desaparecimento da maioria seu desejo de ao partir deste mundo, ser “consolado” ouvindo das línguas indígenas e algumas que tentam sobreviver, entre palavras em Guarani. estas, está o Guarani. Assim como essa voz que entoa louvores a esse Esse idioma é da família tupi-guarani, falado por verdadeiro tesouro, o Guarani, cabe a nós também resgata-lo aproximadamente quatro milhões de pessoas( dois milhões porque nele está o princípio, o meio e o fim da nossa identidade como língua materna) no Paraguai( onde é falado como língua cultural. Conhecer o Guarani é conhecer a nossa história! oficial), no noroeste da Argentina, no centro-sul do Brasil e no Chaco Boliviano. É a língua nativa dos guaranis, um povo autóctone dessa região. Na América pré-colonial, era falado Mesa 8 pelos povos que viviam ao leste da Cordilheira dos Andes, As Múltiplas Linguagens na Análise de Fontes Históricas desde o mar do caribe até o Rio Prata. Maria Neusa G. Gomes de Souza (CPCX/UFMS) Refletindo a condição atual do Guarani a partir do poema de Antonio Ortiz Mayans, podemos perceber certo Uma Abordagem Semiótica do Texto da Canção “Onde Estará sentimentalismo do eu - lírico, na medida em que ele começa o Meu Amor” Chico César louvando as belezas do Guarani, comparando-o ao “Ñanduti”( Rosemeire de Almeida Aguero (PG/UEMS) símbolo da cultura paraguaia), ao som de uma harpa, exaltando tudo o que há de grande e belo no Guarani, mas na penúltima UMA ABORDAGEM SEMIÓTICA DO TEXTO DA estrofe, ele começa a expor a situação atual do idioma que tanto CANÇÃO “ONDE ESTARÁ O MEU AMOR”, DO ama, citando “aqueles que não querem ver a formosura” que há COMPOSITOR CHICO CÉSAR 188 ABSTRACT: The main objective of this work is to analyze Rosemere de Almeida Aguero (UFMS/UEMS) Chico César´s song called “Onde estará o meu amor.” The starting point of this analysis will be Greimas´ theory, more RESUMO: Este estudo trata da análise semiótica da música specifically, his three complexity levels: fundamental structure, “Onde estará o meu amor”, do compositor Chico César. A narrative structure and discursive structure. análise utilizará como opção teórica os estudos semióticos KEY WORDS: Analyze, song, Greimas’ theory. desenvolvidos por A.J.Greimas e seus seguidores, pelo seu caráter de teoria vinculada essencialmente ao texto. Na perspectiva greimasiana a narratividade se constrói em três Onde estará o meu amor (Chico César) níveis de complexidade: estrutura fundamental, estrutura narrativa e estrutura discursiva, abordadas na análise. O estudo Como esta noite findará? se limitará apenas ao plano do conteúdo, que se reflete na E o sol então rebrilhará linguagem escrita, descurando de outras substâncias de Estou pensando em você expressão passíveis de serem analisadas na música. A escolha Onde estará o meu amor? do corpus justifica-se por ser um texto que possibilita investigar Será que vela como eu? o ser do sujeito e os efeitos de sentido passionais produzidos Será que chama como eu? em seu discurso. Será que pergunta por mim? PALAVRAS-CHAVE: Análise; texto; canção, Semiótica Onde estará o meu amor? greimasiana. Se a voz da noite responder Onde estou eu, onde está você? Estamos cá dentro de nós 189 Sós apresentações em bares. Em 1991 foi convidado para pequena Onde estará o meu amor? tourneé pela Alemanha, e o sucesso lá fora o animou a deixar o Se a voz da noite silenciar jornalismo para dedicar-se somente a musica. Formou a banda Raio de sol vai me levar Cuscuz Clã e passou a apresentar-se na casa noturna paulistana Raio de sol vai lhe trazer Blen Blen Club. Em 1995 lançou seu primeiro disco, o Onde estará o meu amor artesanal e independente Aos vivos, depois vendido à gravadora Velas. A Rádio Musical FM começou a tocar Mama África e A primeira vista, canção que logo se tornaria sucesso nacional na O autor e o corpus interpretação de Daniela Mercury, incluída na trilha sonora da novela 0 rei do gado, da TV Globo. Em 1996 consagrou-se com o lançamento de Cuscuz Clã (Polygram): ganhou o Prêmio Francisco César Gonçalves – ChicoCésar - nasceu em Catolé do Rocha - PB, em 26 de Janeiro de 1964. Foi criado no sertão, ouvindo cantadores e reisados, e aos nove anos já tinha seu primeiro conjunto, Super- Som Mirim. Trabalhando como vendedor em uma loja de discos de sua cidade, teve oportunidade de ouvir desde Teixeirinha até Rolling Stones. Ainda adolescente, mudou-se para João Pessoa PB, onde Sharp na categoria revelação e o de melhor compositor pela APCA. Em 1997, depois de tourneé pela Europa e pelo Japão, lançou seu terceiro disco, Beleza, mano, com participações especiais de Dominguinhos, Arnaldo Antunes, Arrigo Barnabé e outros. Suas composições misturam ritmos brasileiros, como carimbó, folia e forró, com musica pop, do reggae, a salsa e juju music. cursou a faculdade de Jornalismo. Transferiu-se para São Paulo SP, em 1985, e logo fez amizade com artistas de vanguarda como Itamar Assumpção e Arrigo Barnabé. Trabalhou como redator da seção de música da revista Elle e tentou algumas O corpus escolhido consiste na letra da canção “Onde estará o meu amor”, do compositor pernambucano. 190 A análise do corpus restringir-se-á ao plano do de dormir, pensando no seu objeto amoroso e se perguntando, a conteúdo, limitando-se à linguagem escrita. O processo todo momento, onde ele estará. Esse estado de disjunção considerará cada nível separadamente. potencializa a relação entre o sujeito e o objeto, mantida por Por uma questão metodológica, o estudo será iniciado pelo nível narrativo. meio do desejo de conjunção manifesto pelo sujeito e expresso no verso “Raio de sol vai lhe trazer”. O texto não apresenta a seqüência canônica completa A estrutura narrativa do percurso gerativo de sentido. Não percebemos nele as quatro fases clássicas, conhecidas como manipulação, competência, No nível das estruturas narrativas uma das primeiras perfomance e sanção. A letra restringe-se à fase da relações a serem consideradas é a existente entre o sujeito e o manipulação onde o sujeito assume o papel narrativo objeto, que se caracteriza pelo desejo do primeiro em relação (actancial) de destinatário. Esse sujeito sofre a ação de um ao segundo. Essa relação entre um e outro, denominada junção, destinador que o manipula e o leva a querer a conjunção pode ocorrer nos textos sob forma de enunciados conjuntivos e amorosa. Esse destinador-manipulador expressa-se na figura do disjuntivos. ser amado, que se confunde com o objeto-valor. Na situação No texto “Onde estará o meu amor” encontramos um analisada o destinatário (sujeito) encontra-se modalizado por sujeito passional distanciado do seu objeto amoroso, portanto um querer-ser, que manifesta-se por meio do desejo de entrar em estado de disjunção com o ser almejado.Esse sujeito quer em conjunção com o objeto amoroso, todavia falta-lhe o poder- entrar em conjunção com o objeto-valor, representado pelo ser ser, uma vez que nem mesmo sabe onde o objeto desejado se amado e o valor que almeja é a plenitude amorosa. O texto não encontra – “Onde estará...?”. Assim, falta-lhe a competência esclarece os motivos desse distanciamento, apenas nos dá conta para realizar a performance desejada. de um sujeito intranqüilo, que “vela” durante a noite, ao invés 191 Essa situação o imobiliza a ação e o transforma num sujeito tenso, intranqüilo, cujo estado de alma encontra-se uma transformação, tendo-se somente ao estado inicial do percurso. muito próximo à noite que atravessa em claro, velando. Nessa Imobilizado à ação o sujeito passional projeta perspectiva, no primeiro verso - “Como esta noite findará” - expectativas em torno dos possíveis estados de alma do pode-se atribuir dois sentidos à palavra “noite”: o sentido destinatário(ia): “Será que vela como eu? Será que chama denotativo, no qual “noite” opõe-se à “dia”, e o conotativo (ou como eu? Será que pergunta por mim?”. Constrói, ainda, um metafórico), no qual “noite” refere-se ao estado de alma do simulacro de que o destinador compartilha com ele o mesmo poeta. O segundo verso “E o sol então rebrilhará”, reforça estado de alma – “Estamos cá dentro de nós. Sós”. Desse ainda mais o sentido metafórico de que a “noite” (tristeza, modo, reconhece-se no texto o estado inicial do percurso de morte interior) só findará e o “sol” (alegria, vida) voltará a uma paixão complexa, denominada por Greimas (cf. BARROS, brilhar quando o objeto amoroso retornar ao estado de 1997) de “estado de espera”. O sujeito deseja o objeto (quer conjunção com o sujeito. ser) , mas momentaneamente nada faz para consegui-lo. É Narrativamente, portanto, temos um sujeito que quer estar em conjunção com o objeto amoroso. Entretanto, no texto, claro que esse estado pode se modificar caso o sujeito parta em busca do seu objeto amoroso, pronto a realizar a performance. o sujeito apresenta-se em estado de inércia. Falta-lhe competência para poder mudar esse estado, então constrói uma A estrutura fundamental expectativa em torno das próprias esperanças (“Raio de sol vai lhe trazer”). A falta de competência para realizar a ação gera a O nível fundamental é caracterizado por ser a estrutura paixão da angústia, da intranqüilidade, pois ele quer-ter, mais profunda do texto. De natureza abstrata, a estrutura todavia falta-lhe o poder-ter. Dessa forma o texto não apresenta fundamental estabelece uma relação entre dois termos antonímicos, que se opõem semanticamente, o que permite a 192 identificação das diferenças , exatamente por estarem dispostos numa relação de contradição. No texto analisado a solidão decorrente da perda do ser amado é sentida de maneira intensa, pois a existência do ser No texto analisado reconhece-se a oposição semântica do sujeito passa inextricavelmente pelo ser do outro. Por isso, entre duas categorias de natureza existencial representadas ele busca pelo outro para restabelecer o equilíbrio, perdido na pelas expressões só ( situação em que se encontra o sujeito no separação amorosa. O retorno ao estado de comunhão, nesse momento da enunciação) versus acompanhado (situação sentido, apresenta natureza eufórica, pois está vinculado ao ansiada pelo sujeito na enunciação). Essa oposição de base retorno do objeto-valor desejado. A solidão ou o estar só e o poderia, de igual modo, ser traduzida pelas expressões solidão seqüente estado de tristeza que se pressupõe daí, vincula-se à versus comunhão, a partir das quais constrói-se o sentido do perpetuação do estado de disjunção sendo, portanto, disfórica. texto analisado. As categorias descritas estão fundamentadas No texto se reconhece o desejo (querer) por parte do sujeito nos valores do amor romântico. passional, de passar desse estado de disforia para o de euforia, Os valores do amor romântico são relacionados à embora manifeste uma situação de espera. intersubjetividade, à reciprocidade e o desejo não impulsiona a ser apenas a alcançar o outro como objeto, mas busca A estrutura discursiva essencialmente o encontro com o outro, em toda a sua alteridade. O paradoxo desse encontro, entretanto, é a A última etapa da análise é a estrutura discursiva, que possibilidade da perda. A separação do ser amado assemelha- está identificada ao patamar mais superficial do texto. No se, na situação descrita, à “vivência da morte numa situação percurso gerativo de sentido os três níveis correspondem à vital: a morte do outro em minha consciência e a vivência da passagem do mais abstrato (nível fundamental) ao mais minha morte na consciência do outro.”(ARANHA & concreto. A análise da estrutura discursiva está mais próxima MARTINS, 2000 p. 337). ao processo de textualização e é nela que ocorrem processos 193 como os de figurativização, tematização, temporalização, “vela”, “chama”, “pergunta” - conseguem o efeito de espacialização, etc. A construção desses elementos ocorre por instaurar um tempo futuro concomitante ao momento de procedimentos de debreagem ou embreagem. referência presente, reforçando o efeito de proximidade e de No texto ‘Onde estará o meu amor’, percebe-se a intimidade compartilhado entre o narrador e o leitor-narratário. existência de um narrador implícito que constrói um efeito de Nota-se, ainda, no texto a existência de dois espaços proximidade, de subjetividade entre o enunciador e o texto, distintos: o “aqui” de onde fala o narrador e um ‘lá”, utilizando algumas marcas discursivas em primeira pessoa, tais subentendido, onde encontra-se o objeto-valor amoroso do como “Estou”, “meu”, “eu”. Esse processo cria um efeito de poeta. Projeta-se, desse modo, no enunciado um “eu” e um aproximação e de intimidade, cujo nome é conhecido por “agora” (esta noite) e um “aqui” (o espaço onde o narrador debreagem enunciativa. A existência do pronome em primeira implícito ‘vela’) e um “lá” ( onde o meu amor estará) pessoa instaura uma relação ‘eu-tu’, onde o ‘eu’ é o narrador estabelecidos entre dois espaços enunciativos carregados de (autor do texto) e os narratários são os leitores do poema- subjetividade, que também reforçam o sentido de aproximação música. Além dos pronomes citados, percebe-se ainda o entre enunciador e enunciatário. demonstrativo “esta”, que anteposto ao substantivo “noite” O texto é fundamentalmente de natureza temática, institui uma marca de tempo (agora) e também de espaço embora ocorra uma figuração esparsa, pois aborda sentimentos (aqui). O efeito dessa junção de marcas é causar no narratário a complexos como a angústia e o sofrimento causados pelo impressão de tomar parte na própria enunciação, participando distanciamento do objeto-valor. Mas também se utiliza de do estado de alma do narrador no momento em que a leitura ou algumas figuras de linguagem, aqui consideradas como figuras a audição da música se realiza. Percebe-se, ainda, que os verbos do discurso, como “noite” e “sol” (noite e dia dicotômicos) escolhidos - “findará”, “rebrilhará”, “estará” - todos do usados no sentido de produzir um efeito poético ao texto, futuro do presente, inscritos ao lado de formas no presente - reforçando o estado de alma do narrador. Essa recorrência de 194 tema e figura na letra da canção que, em princípio, poderia nos unidades semânticas de um mesmo percurso temático (idem, p. indicar a oposição abstrato-concreto, remete-nos entretanto ao 80). Já nas figuras antitéticas “sol/noite”, percebe-se a mundo natural, tanto aquele efetivamente existente como o construção de uma isotopia figurativa que, ao enfatizar os construído pelo enunciador, como reflexo do estado de alma do aspectos sujeito. A presença dessas figuras tem, também, o papel de “luz/escuridão”, pano de fundo para o tema da angústia concretizar os temas abstratos, instaurando, assim, efeitos de (tristeza) e do sofrimento proposto no texto. O papel dessas realidade ao texto (BARROS, 1997, p. 81). Trabalhando essa isotopias é assegurar a coerência semântica do texto, dando-lhe oposição entre o real e o fictício (metafórico), o narrador sugere unidade. Assim, a repetição desses traços semânticos na letra a realidade na perspectiva da enunciação, recriando-a e da canção estabelece, de certo modo,a leitura a ser feita. visuais, remete diretamente à dicotomia propondo a adoção de um ponto de vista ao narratário; uma O discurso dominante na letra é o do Romantismo e, interpretação do “real” proposto no texto. Esse efeito garante a nesse sentido, percebe-se a interdiscursividade presente nas proximidade entre um e outro. “vozes” que ecoam desse movimento estético, dominante na Nota-se, ainda, na letra a reiteração de certos Europa no final do século XVIII e no Brasil, no século XIX. simbolismos visuais tais como sol, rebrilhar (brilho), raio (de Percebe-se na letra da canção, compartilhando da visão de sol) que podem ser interpretados como conectores de isotopia Bakhtin, textos que se aproximam numa tecitura dialógica de (FIORIN, 2002, p. 87). Esse fenômeno está presente na várias vozes culturais que se completam, afirmando o primado redundância dos traços figurativos identificados na letra da do intertextual sobre o textual, pois a letra certamente deriva de canção por meio de figuras que se associam pelo efeito de outras leituras já feitas pelo autor, em outros contextos. O semelhança Nas próprio tema escolhido (angústia/ dor/ sofrimento/ solidão) expressões “brilho/sol/raio” constrói-se uma isotopia de remete-nos à temáticas aplaudidas no movimento romântico. A natureza temática cuja caracterização maior é a repetição de escolha da metáfora como opção imagística e discursiva visual que propõem (luminosidade). 195 comprova o dialogismo existente entre o discurso do narrador e entre as pessoas, que caracterizavam as sociedades tradicionais. os textos românticos, uma vez que essa figura de linguagem era Decorre daí o fenômeno que hoje conhecemos como “multidão uma das formas de expressão preferida de autores daquele solitária”. As pessoas convivem lado a lado, mas suas relações movimento. Esse dialogismo produz efeitos de polifonia, pois são superficiais e os contatos raramente se aprofundam. Nessas as vozes dos autores românticos deixam-se escutar nas palavras relações o “eu” não é suficientemente forte e as pessoas optam do autor. Seu estado de alma melancólico expressa-se de por não viver sentimentos profundos, dentre eles a experiência maneira emocional, relativista, procurando pela imaginação amorosa, exatamente para não ter de conviver com a escapar do espaço do mundo real da enunciação ( a noite que experiência da dor, da “morte” intersubjetiva. Dessa forma, as atravessa em claro) para um lugar fantasioso ( o lugar onde relações “estará o meu amor”). O que o impulsiona é a emoção, o possibilidade de aprofundarem-se. tendem a tornar-se superficiais, com pouca inconsciente e a paixão que o levam a tentar enxergar além da A sociedade contemporânea, permissiva, hedonista, razão. Decorre daí atitude de sonho (presente no apelo ao voltada para o consumo e para o individualismo narcisista elemento da natureza) melancolia e angústia expressos na letra acaba por moldar um indivíduo que busca o prazer imediato e da canção. Esse conjunto de traços revela a visão do amor se mostra inapto a suportar frustrações, tais como as causadas idealizado presente no texto e aparece em número suficiente pelas perdas emocionais. Nessa perspectiva, a satisfação para imediata, o desejo do prazer e emoções fugazes substitui a identificá-lo interdiscursivamente ao espírito do Romantismo. É estabilidade das relações, resultando em encontros superficiais importante observar que nas sociedades e amores breves. massificadas da contemporaneidade, há clara tendência ao enfraquecimento das relações interpessoais. Isso se deve ao desaparecimento de certos costumes envolvendo fortes relações Conclusão 196 Contrariando essa tendência das relações na ARANHA, Maria Lúcia de Arruda & MARTINS, Maria contemporaneidade, o texto nos traz um discurso passional e Helena Pires. Filosofando: introdução à filosofia. 3 ed., São revela a visão de um amor idealizado . Essa visão é um traço Paulo: Moderna, 2000. comum em textos de natureza poética – embora na contemporaneidade escreva-se muito pouco sobre o amor e BARROS, Diana Luz Pessoa de. Teoria Semiótica do Texto. mais sobre sexo - e também em alguns tipos de canções que São Paulo: Ática, 3ed., 1997. identificam-se com o gosto popular e em que privilegia-se a sentimentalidade voltada ao consumo da grande massa. ______ e FIORIN, José Luiz (orgs.). Dialogismo, polifonia, No texto analisado a junção do universo temático do narrador (dor/sofrimento/angústia/perda) com a imagem Intertextualidade: Em Torno de Bakhtin. 2 ed., São Paulo: Edusp, 2003. escolhida (cambiada do mundo físico: “noite”, “sol”), consegue representar de maneira intensa o mundo passional do CAMPEDELLI, Samira Youssef. Literatura História e Texto enunciador , ao mesmo tempo em que imprime força poética à vol. 2. São Paulo: Saraiva., 7ed., 1999. linguagem. Somam-se, portanto, no texto, temas e imagens CÉSAR, Chico. Enciclopédia da música brasileira. Art. característicos do universo romântico para representar o Editora universo passional do narrador. http://www.mpbnet.com.br/musicas/chico.cesar/ e Publifolha. Disponível Acesso em em 20/04/2007. Referências bibliográficas HERNANDES, Nilton (org.). Curso semiótica Narrativa e Discursiva. Três Lagoas - MS: UFMS, 2006. 197 “O SENHOR DAS ARMAS” (Lord of War) DISCURSO FIORIN, José Luiz. Elementos de Análise do Discurso. 11 ed., CÍNICO OU BELIGERANTE? São Paulo: Contexto, 2002. Eusvaldo Rocha Neto (CE/UEMS) “O Senhor das Armas” (Lord of War) Discurso Cínico ou Beligerante? Eusvaldo Rocha Neto (CE/UEMS) A essência humana não é algo abstrato, interior a cada indivíduo isolado. É, em sua realidade, conjunto das relações sociais. Teses Feuerbach Marx. Introdução o sobre (VI) 198 O discurso curto do protagonista aliado ao exemplo Tendo em vista a grande quantidade de filmes instantâneo do que foi dito remete-nos a uma apreensão estadunidenses que aborda direta ou indiretamente aspectos fragmentada e parcial da situação num contexto social, onde a “críticos” da situação global atualmente, esse projeto propõe-se atenção está focada apenas em uma pessoa ou sujeito, a estudar as relações entre tais produções e o seu contexto tornando-a desse modo, não no algoz de suas vítimas, ou ideológico (Pêcheux, 1997) e histórico, valendo-se de uma escravo das paixões egóicas, mas num ser/figura de abordagem analítico-discursiva. identificação empática por parte do telespectador. Para tanto, optou-se por um filme produzido na Atualmente o cinema se constitui enquanto um meio América do Norte, mas com capital europeu e que chegou aqui (mídia), uma ferramenta de reconstrução da realidade e (às videolocadoras brasileiras em 2005) com o nome de “O revelador de alguns de seus mecanismos. Assim, optamos por Senhor das Armas”. analisar um filme que traz uma temática discursiva e ampla e O filme é “narrado” na posição sujeito do protagonista em primeira pessoa que faz de uma maneira sucinta um relatório de uma trajetória no mundo do tráfico de armas. Sem crítica sobre o comércio internacional de armas. Antes de adentramos ao nosso estudo, faremos uma rápida incursão sobre a história do cinema. discurso de remorso ou de escrúpulos. Iury Orlov (o Nesse trabalho, a nossa abordagem será no discurso personagem interpretado pelo ator Nicolas Cage) relata as do personagem principal e na in/conseqüência desse discurso causas que levaram a esse caminho. No decorrer do filme dentro de um quadro geral dos discursos que os ligam a outras podemos não só acompanhar a narração curta e de retórica numa tradição discursiva literária e filosófica. beligerante como podemos observar comparando “as palavras” do narrador, as cenas que mostram o que é narrado sintetizado. Breve história do cinema 199 Cinema é a abreviatura de cinematógrafo que é a A princípio, o cinema que encantava o mundo era técnica de projetar fotogramas (quadros) de forma rápida e europeu e não possuía sonoridade. Era o chamado cinema sucessiva para criar a impressão de movimento, bem como a mudo. Porém, com o avanço da técnica em todos os setores foi arte de se produzir obras estéticas, narrativas ou não, com esta possível a partir de 1927 a produção de um musical americano técnica. “Jazz Singer” com alguns diálogos e cantorias sincronizados. Os inventores do cinematógrafo foram os irmãos Ao final de 1929 o cinema de Hollywood já era quase Lumiére no final do século XIX. Também é deles a primeira totalmente falado enquanto noutras parte do mundo, por exibição pública e paga de cinema a 28 de dezembro de 1895 questões econômicas e tecnológicas, a transição do cinema com filmes de curta duração. Apesar de existirem projeções mudo para o falado foi mais lenta. anteriores, a sessão dos Lumiére é considerada como marco inicial a nova arte. Os irmãos Até esta época, Itália e França tinham o cinema mas popular e poderoso do mundo, mas com a Primeira Guerra Lumiére produziram pequenos Mundial, a indústria européia de cinema sofreu um forte abalo. documentários dos quais se destacam, “Sortie de 1’ usine Hollywood começou a se destacar no mundo do cinema Lumiére à lyon” ou Empregados deixando a Fábrica Lumiére. fazendo e importando diversos filmes o que propiciaria a sua Após os Lumiére muitos outros pioneiros surgiram, cada qual transformação no mais importante centro cinematográfico do contribuindo com uma parcela de inovação técnica e arte planeta. nascente. Nos anos que se seguiram até a atualidade a indústria Nos anos iniciais do cinema os curta-metragens foram cinematográfica se desenvolveu e transformou-se em uma preponderantes. No entanto, a partir de 1906 é produzido o poderosa máquina de propaganda, promoção e veículo de novas primeiro longa-metragem da história do cinema (“The Story of idéias, formas de poder e relações ao redor do mundo. the Kelly Gang”) de setenta minutos. 200 Objetivo Geral Tentaremos nesse trabalho levantar algumas hipóteses Faremos uma análise e buscaremos compreender em sobre o discurso cinematográfico e suas possíveis interações quais posições sujeito se encaixam ou se constituem alguns com outros discursos que norteiam algumas correntes de discursos do referido trabalho cinematográfico. Para tanto pensamento; acompanharemos até onde o projeto do filme constitui-se em Como é sabido que todo discurso é um interdiscurso quanto crítica discursiva ou estilização da violência no mundo procurar-se-á inquirir até que ponto os discursos “críticos” moderno. Para isso tentaremos estabelecer uma relação atuais têm um suporte na tradição literária ocidental. Assim, discursiva entre a posição sujeito do personagem do filme e proceder-se-á um rápido olhar sobre a obra de autores que alguns personagens paradigmáticos da literatura ocidental (com tiveram posições críticas frente às instituições e o status quo, as devidas ressalvas). Observaremos até que ponto as relações para podermos conjecturar os pontos de semelhança e diferença interdiscursivas dialogam entre si ( teorias e ideologias) ou com a obra cinematográfica que aborda um tema crítico e atual separam de forma cruciante. como é a produção e consumo de armas. Por fim, cogitar-se-á uma possível relação entre (Diamante de Sangue)o jardineiro fiel o filão comercial do Corpus cinema “crítico” e sua função discursiva enquanto revelador do O discurso do personagem narrador (Iury Orlov) do filme estadunidense “O Senhor das Armas” (Lord of War, embate das ideologias na fase aguda do capitalismo mundial, que se configura hoje em todas as instancias discursivas. 2005). Conjuntura intelectual de surgimento da AD Hipótese 201 Existem várias maneiras de se estudar a linguagem, da intelectual á prática escolar, ou seja, ela ocupou partes do gramática à lingüística todos fazem um recorte necessário à sua terreno que pertencia a filologia e também à análise de textos investigação. A partir daí surgiu a análise do discurso que vem literários. Partindo desse pressuposto a AD se desenvolve no procurar entender o porquê de determinadas significações e sentido de esclarecer que as relações de linguagem são relações abordagens no campo da língua e da linguagem. Por isso, a AD entre sujeitos e relações de sentidos, que em última instância se constitui enquanto a disciplina que procura captar o são construídos historicamente. No Entanto, para se referir á movimento, a prática da linguagem que caracterizam todas as AD passa-se antes pelos conceitos lingüísticos e a maneira sociedades. como a análise do discurso trabalha-os. Segundo (Orlandi, 1999) a partir da década de 60 os Apesar da proliferação dos termos “análise do textos passam a ser tratados em sua materialidade lingüística e discurso”, pode-se em linha gerais associá-la a duas correntes: histórica. Isso se deve ao fato de que os três domínios AD francesa e AD anglo-saxâ. Uma se ocupando mais dos disciplinares que configuram uma ruptura com o século XIX se discursos institucionais, a outra dos discursos cotidianos. articularam no campo do saber para a produção de novas Assim, a Análise do Discurso se presta a evidenciar o jogo de abordagens da realidade. sentidos que se estabelece entre os discursos. Das relações entre Lingüística, Marxismo e Eni Orlandi ressalta-se que a AD é servida pela Psicanálise surge a Análise do discurso que traz em si Psicanálise, pela Lingüística e pelo Marxismo mas não se elementos fundamentais de cada uma dessas disciplinas. A AD restringe a nenhuma dessas disciplinas, ela se constitui como se firma então como uma ciência que tem o seu objeto de um recorte dessas disciplinas que estabelece para si um objeto estudo: o discurso. que perpassa as outras três constituindo-se enquanto instância e Para (Mainguenau, 1993) como toda ciência a AD faz parte de uma tradição. Essa tradição alia uma conjuntura fundamento de todas as ciências: o discurso. 202 O discurso constitui-se enquanto prática de enunciados nos trechos estudados. Assim, trataremos o discurso linguagem, palavras e movimentos (Orlandi, 1999). A AD do personagem principal (Iury Orlov) mais especificamente na estuda as formações discursivas (FD) que é aquilo que pode e sua materialidade lingüístico-discursiva. deve ser dito por um sujeito em posição discursiva num momento dado e numa conjuntura também dada (Pêcheux, Pressupostos teóricos 1975). Introdução ao Corpus – “O Senhor das Armas” Metodologia. Antes de selecionarmos as cenas e transcrevermos as Proceder-se-á ao levantamento do discurso do narrador/personagem do filme “O Senhor das Armas” (Lord of “falas” do personagem principal, faremos um breve resumo do filme. War, 2005), a seguir analisaremos semanticamente “suas falas” O filme inicia-se com o protagonista relatando as e a implicação delas dentro do contexto social a que se refere. estatísticas da quantidade de armas no mundo e do seu objetivo Cotejar-se-á o discurso do narrador e a retórica beligerante e em aumentá-las. Depois, ele faz uma breve exposição de sua individualista de outros discursos observados mediante leituras. vida enquanto imigrante ucraniano refugiado, que vive Procuraremos em ambos os discursos o seu ponto de conjunção disfarçado na América. Desde os dez anos, nos diz ele, é e disjunção. apaixonado por uma modelo famosa. Ao lado do irmão começa Enquanto material cinematográfico o filme apresenta a traficar armas para sair da vida monótona que ambos levam. além da linguagem verbal, uma ou outra não-verbal. Entretanto, O negócio se expande e ele se torna um dos maiores traficantes dados os limites e os objetivos do nosso trabalho, as imagens só de armas do mundo. Segundo ele, “internacionalista”, por serão discutidas quando colaboram na compreensão dos vender armas para matar seus próprios compatriotas. Ao longo 203 do filme ele (o personagem) é perseguido por um agente que medida que a câmera desce, podemos perceber que ele se acaba desmascarando-o á sua mulher. Ao fim, sem família, sem encontra na sacada de seu apartamento. Ele traz um cigarro irmão que fora morto numa transação na África, o personagem entre os dedos. Após voltar-se em direção ao apartamento, leva continua sua vida no mundo do crime por achar que a o cigarro à boca e dá uma tragada. Concomitante a toda a cena criminalidade faz parte da “sua natureza”. Importa observar que é dito pelo narrador em primeira pessoa: Enunciado 2 - “Aos analisaremos os enunciados de acordo com o grau de quatro meses e meio um feto humano tem um rabo de réptil... importância dos mesmos para a nossa analise e, não conforme uma lembrança da nossa evolução. Talvez seja disso que eu não aparecem cronologicamente no filme. consiga fugir. Você pode combater muitos inimigos e vencer, CENA I – após efetuar sua primeira venda de arma, mas se lutar contra sua biologia você perde sempre.” (tempo: Iury Orlov deita-se na cama de um quarto semi-escuro, dá um 01:32:30). Para a análise das duas cenas anteriores nos suspiro de alívio após ter feito a negociação e retira de sob suas serviremos de dois conceitos básicos da AD: Formação costas uma cápsula que ficara ali esquecida. Discursiva (FD) e Paráfrase. Simultânea a essa cena o narrador diz: Enunciado 1 - Definindo FD como uma posição ocupada pelo sujeito “Eu tinha fugido da violência a minha vida inteira, quando eu a partir de uma Formação Ideológica (FI), podemos observar deveria ter ido de encontro a ela. Está na nossa natureza. Os que o “narrador-personagem” esqueletos humanos mais antigos tinham pontas de lanças em poderíamos chamar de “determinista”, ou seja, que inclui e suas caixas torácicas”. (tempo 00:09:04), na cena seguinte, o resgata o discurso evolucionista de Darwin, ou seja, aquele para personagem coloca a cápsula na sua corrente como se fosse um o qual já está de antemão pré-determinado pela “natureza”, talismã. pelos “Genes” o desenrolar de uma situação. Portanto, o CENA II – A câmera focaliza o personagem em sua metade superior ao mesmo tempo em que enquadra o céu. À numa posição – sujeito que discurso do personagem opta por apresentar os aspectos básicos da cultura humana de forma naturalista. 204 Desse modo, no recorte da cena I, ao tentar justificar o fonte”. Para tanto atente ao enunciado recortado da cena I onde efeito de sentido (Pêcheux, 1997) que a violência tem sobre sua o personagem faz uma apologia do discurso da violência posição sujeito, ele a significa (a violência) a toda “natureza” enquanto fator constituinte da natureza humana, com a qual (a humana. Para justificar-se, ele lança mão de discursos violência) ele tratará de estruturar-se financeiramente. Agora, arqueológicos (Enunciado I – quando a posição sujeito relata o atende-se para essa discurso do personagem “Dolmancé” do encontro de pontas de lança na caixa tórax dos homens pré- Marquês de Sade de “A filosofia na alcova ou Os preceptores históricos) sem o endosso de outros discursos que poderiam imorais”. “ o assassínio não é do modo algum uma destruição; outros sentidos para o funcionamento da prática discursiva aquele que o comete nada mais faz que variar as formas; ele (históricos, também devolve à natureza elementos de que a mão dessa hábil poderiam fornecer uma visão prática discursiva. Na cena II, o natureza se serve imediatamente para recompensar outros personagem lança mão de uma “razão” biologicista para seres.” antropológicos, etnográficos) que justificar a sua volta ao tráfico de armas. Atende-se, também, Feitas as devidas ressalvas contextuais, ou seja, as de para o efeito de sentido de verbos que denotam ou lembram que o sujeito sadiano enunciava a partir de uma situação de beligerância (combater, vencer, lutar, perder) e a palavra revolução social (1789) e de que antes ele já se constituiu de “evolução” que é tão cara a algumas correntes científicas um discurso da imoralidade (Os preceptores imorais), o que (darwinismo e positivismo). não é o caso do sujeito principal de “O Senhor das Armas” O conceito de paráfrase que utilizaremos é aquele que (Iury Orlov) que faz discursivamente racionalizações para a vê como “...uma atividade de reformulação, pela qual se convencer a si mesmo da validade de seus discursos baseados restitui o sentido de um discurso (enunciado ou texto) já na sua sofrida condição de imigrante (refugiado). produzido”. (Fuchs, 1982). Assim, a reformulação deixa seus No recorte da cena II, depreende-se do conceito do traços nos discursos que nos permite lembrar o “discurso- protagonista o determinismo biológico, a saber, aquele que 205 sugere que a violência é intrínseca à natureza humana como se Do exposto acima, observa-se que o filósofo atribui essa fosse algo dado e não construído. Ao se constituir por um sentido negativo á paz (antibiológico) e um sentido positivo enunciar o discurso determinista naturalista da vida o á guerra. protagonista exclui outra tais como: a visão cultural, história e A primeira cena do filme é a de um homem vestido socialmente (terno, gravata) com uma pasta preta à mão. Ele social. Veja-se essa afirmação de Nietzsche no aforismo 215 está sobre um chão repleto de cápsulas. À sua volta ouve-se do seu livro “Der wille zur macht” ( S/d, 207) (Vontade de barulho de tiros e vêem-se ruínas de casa pegando fogo. De Potência) que assemelha-se, ao menos em superfície ao que foi repente, ele coloca-se de frente para a câmera e diz: Enunciado dito pelo personagem principal do filme supracitado: 3 - “Existem cerca de quinhentos e cinqüenta milhões de armas de fogo em circulação no mundo. Isso equivale a uma arma A escala de valores que serve hoje para para cada doze pessoas no planeta. A única pergunta é: como julgar as diferentes formas da sociedade podemos armar as outras onze?” (tempo: 00:01:12) identifica-se absolutamente á que empresta á Esse monologo do sujeito marca uma posição paz, um valor superior á guerra: mas uma discursiva constituída e atravessada por outras posições, isso é semelhante juízo é antibiológico, é até um o efeito de sentido desse monologo. Por ser os efeitos de produto da decadência na vida... A vida é sentido que interessam à análise do discurso (Mussalin, 2004), uma conseqüência da guerra, a própria destacamos a inversão da perspectiva e o direcionamento que o sociedade é um meio para a guerra... (p. 207) personagem dá ao seu discurso ao deixar explícito que a sua (grifo meu). função social não é minorar o número de armas de fogo, mas aumentá-lo. 206 Após essa introdução bem sintomática do que será sua Porém, o espectador que vai apenas “ouvir” o que aconteceu, prática no decorrer do filme, o personagem-narrador (que dificilmente questionará se a história tal qual a vê, é a única ficamos sabendo se autodenominar Iury Orlov) aparece agora versão através da qual a história pode ser contada. E pode ou na cena II sobre uma espécie de paliçada de frente para o mar. não acreditar naquilo que o narrador acredita, pelo seu efeito Antes de observarmos o enunciado relativo a essa cena, vamos discursivo. fazer uma observação a respeito do narrador, pois é ele quem No decorrer do filme ficamos sabendo do próprio enfoca as situações a serem abordadas e é dele a última palavra narrador que ele nos mentira a respeito de seu nome, e por se em tudo. tratar de refugiado ucraniano nos Estados Unidos vivia em um Enunciado 4 - “Vocês não precisam se preocupar. Eu não estou aqui para lhes contar um monte de mentiras para me lugar específico Little Odessa (comunidade ucraniana) a qual ele considerava como o fim da linha para o trem. fazer parecer bom. Só vou lhes contar o que aconteceu...” Enunciado 5 - Após presenciar um assassinato duplo, (tempo: 00:04:35). Do enunciado acima, compreendemos que o Iury racionaliza “Você entra no ramo de restaurantes porque as narrador não anunciará um discurso mentiroso. Ora, se pessoas sempre vão precisar comer. Naquele dia eu entendi que sabemos que o sujeito tal qual o discurso, é heterogêneo o meu destino era satisfazer uma outra necessidade humana (Mussalim, 2004) clivado e dividido, conjecturamos então que básica.” (tempo: 00:07:35) ele (o narrador/sujeito) nos enunciará “verdades” e que essas Do que foi enunciado, depreende-se o não enunciado, “verdades” o farão “parecer mal”. Atente-se aqui para a mas que fica na entre linhas pelo efeito de sentido, ou seja, a ambigüidade do verbo parecer que gramaticalmente é verbo de outra necessidade humana básica seria matar. Agindo dessa ligação e que não denota estado fixo de qualidades para o forma, o protagonista naturaliza as questões básicas da cultura sujeito. Desse modo, observamos que as “suas” verdades tanto humana e apaga os sentidos que poderiam trazer se elas fossem quanto as prováveis mentiras, não têm um estatuto permanente. historicizadas. 207 As “necessidades humanas básicas” aqui estão Então, partindo do “estado de natureza” do ser humano e do próximos dos conceitos biologicistas (alimentar-se, dormir, estabelecimento do direito natural chegamos pelas malhas do evacuar), no entanto, há uma clara dificuldade em incutir nessa interdiscurso ao sujeito do século XX que reclama não só a sua lista o pressuposto acima (matar). vida mas a de outros e que quer ter liberdade de dispor da vida Porém, se sabemos que há como se afirma na AD-3, o do outro, mesmo que seja a do próprio irmão, como é o caso do primado do interdiscurso sobre o discurso (Pêcheux, 1997) e o personagem analisado. E à busca da felicidade adiciona-se: “a interdiscurso é constituído por diversas FDs, podemos qualquer preço”, como uma posição discursiva. considerar o que disse (VALENZI, 2003) sobre o interdiscurso É certo que o sentido acima exposto não existe por si ser composto por “FDs e, consequentemente; FIs (Formações mesmo, ele se constitui à medida que se constitui o discurso. Ideológicas)” disponibilizando “inúmeras formulações já feitas No interdiscurso, no não dito é que se observa que esse sujeito, (e esquecidas)” e que devido às novas condições de produção agora interpelado pelo neoliberalismo sai em busca do discurso (CP), novos sentidos são produzidos nesse processo. da felicidade própria e auto-suficiência econômica utilizando Retomando o discurso de naturalização da cultura, retomamos a noção de “estado de natureza” do filósofo inglês do discurso constituído para matar seus rivais e depredar o planeta. (John Locke, 1969) segundo a qual os seres humanos possuem Tanto o discurso do “estado de natureza” quanto o características naturais próprias e universais a todos. Assim, discurso do protagonista se encaixam pelo seus efeitos numa esse discurso de naturalização dos homens têm seu suporte ou FD que podemos chamar de individualista (Enunciado I e constituição legal em muitas constituições de Estado, sobretudo Enunciado V) que se acham expressas respectivamente nas a dos Estados Unidos que entre outras coisas anuncia que a práticas discursivas políticas liberais e neo-liberais. vida, a liberdade e a busca da felicidade são condições inerentes a todos os homens pois estes são obras do Criador. 208 Em certa passagem do filme, ao se encontrar com outro traficante de armas (mundialmente famoso), o discursivo midiatico, mas especificamente hollywoodiano que exporta para o mundo todo o seu discurso e a sua maneira de encarar protagonista diz, entre outras coisas: e “resolver” os problemas de ordem ético Enunciado 6 - “Não há mais espaço no contrabando existencialistas. Se não podemos, nem precisamos fechar o de armas para a política, Si meon. Eu vendo pros da esquerda e assunto, ou a análise discursiva ao menos, podemos tentar da direita. Vendo pros pacifistas que não são os clientes classifica-lo como um discurso formado por Fds que habituais. É claro, você não é um verdadeiro internacionalista comportam sentidos deterministas das ações humanas e que até vender armas para matar os seus compatriotas”. (tempo: podemos conjectuar caiba perfeitamente dentro de uma FI pré- 00:43:05) científica. Observa-se do exposto acima, o discurso que oculta a razão da ação do personagem principal. Ele não explica o que Bibliografia entende por política, mas pode-se considerar que o sentido é de um internacionalismo, que não faz distinção de sentido entre ACHARD, P. Papel da memória. [et al]: tradução e introdução partidos José Horta Nunes. Campinas, SP: Pontes, 1999. ou credos. Essa impessoalidade do narrador/personagem (no discurso) deixa entrever o seu contrário, ou seja, ele vende para todos. O único critério de CARDOSO, S.H.B. Discurso e ensino. Belo Horizonte: diferenciação é o pagamento que pode ser em dinheiro, Autêntica, 1999. diamantes ou cocaína. Assim, para o personagem o importante é fazer bons negócios. Assim, não pretendemos esgotar o assunto, apenas levantar algumas questões que supomos pertinentes ao mundo DURANT, W. “História da Filosofia Ocidental”. Filosofia Moderna, Companhia Editora Nacional, São Paulo: 1969. 209 FUCHS, C., C.N.R.S in Langue Françoise, nº 53, Fívrier 1982. Orlandi [et al] – 3ª ed. – Campinas, SP: Ediotra da Unicamp, Revrie Irimestrille Larouse. 1997. MAINGUENEAU, D. Novas tendências em análise do SADE, discurso: trad. Freda Indursky. Campinas, SP: Pontes: Editora imorais).Editora Circulo do Livro S/A. São Paulo, 1988. M.D. A filosofia na alcova (os preceptores da Universidade Estadual de Campinas, 2ª edição, 1993. VALENZI, M.A.M. The Wonder Years – A identidade MUSSALIM, F.Introdução à lingüística. São Paulo: Cortez, americana na mídia televisiva, São Paulo – 2003. 2004. O Senhor das Armas, E.U.A., 2005, 122 minutos. ____. Introdução à lingüística: domínios e fronteiras, V.2 – 4ª ed. São Paulo: Cortez, 2004. A Possível Exclusõa das Comunidades Indígenas Ocasionada pelas Diferenças Lingüísticas NIETZSCHE, F. Vontade de potência. Editora Escala. São Michele Aparecidade Sá Paulo: S/d. Mesa 9 ORLANDI, E.P. Análise de discurso: princípios e procedimentos. Campinas, SP: Pontes, 1999. Literatura como Expressão do Sentimento (semiótica) Geane Carla Di Benedeto (G/FINAN) Deborah Negrine Ântico (G/FINAN) Pêcheux, Michel. Semântica e discurso: uma crítica à afirmação do óbvio/Michel Pêcheux; trad. Eni Pulcinelli 210 Rastros do Trágico na Obra “O Santo Inquérito” de Dias Mesa 10 Gomes A Importância de Contar História nas Escolas Ilma Benício Tavares (G/UEMS) Alaíde Pereira Japecanga Aredes (UEMS) Priscila Mendes Daosico (G/UEMS) Michelle Cristianne de Souza Gonçalves (G/UEMS) Rosemeiro Maziero Fernandes (G/UEMS) Gonçalo Mendes Ramires – Personagem como Metáfora na Obra de Eça de Queiroz A Importância dos Contos de Fada Liani da Silva Militão (G-UEMS Michelle Cristianne de Souza Gonçalves9 UEMS/NA Rosemeire Maziero Fernandes10 UEMS/NA Alaíde Pereira Japecanga Aredes11 UEMS/NA Introdução Sempre que pensamos sobre os contos de fada nos vêm à mente histórias de amor, nas quais tudo acontece de 9 Egressa do curso de letras da Unidade Universitária de Nova Andradina Egressa do curso de letras da Unidade Universitária de Nova Andradina 11 Docente na UEMS – Unidade Universitária de Nova Andardina. 10 211 maneira a garantir um final feliz, muitos castelos, princesas e os grandes clássicos da literatura, orientadas que eram por seus príncipes cuja única preocupação é levar à diante uma linda pais e preceptores; já a criança das classes mais populares não história de amor e sempre estão associados com a chamada tinha acesso à escrita e à leitura, portanto, tomava contato com literatura infantil, tipo de texto em que valores moralizantes e uma literatura oral e mantida pela tradição de seu povo. elementos educativos são os elementos mais importantes. Em Percebemos, dessa maneira, a inexistência da chamada parte, alguns aspectos dessa maneira de pensar estão corretos, literatura infantil, pois, oral ou escrita, clássica ou popular, a claro que haveria castelos, príncipes e princesas, além de fadas literatura veiculada para adultos e crianças era exatamente a de vez em quando, pois na época em que tudo começou isso mesma. era lugar comum. Agora, pensar que tanto os contos de fada, Desde a segunda metade do século XVIII, as como a literatura infantil, servem apenas para uma finalidade sociedades começam um processo de industrialização, novas didático-pedagógica, isso está completamente equivocado. classes sociais surgem. Valores são descartados em detrimento Para entender um pouco mais sobre literatura infantil e contos de fada, já que o imaginário popular ocidental os fez permanecerem unidos, vamos entender o processo por meio do qual os textos nascem na sociedade. de outros novos que despontavam com o poderio econômico de uma classe emergente: a burguesia. Nessa sociedade, sedenta de novos conceitos, métodos e técnicas movidas pelo poder econômico, iniciam-se as adaptações de clássicos da literatura como Cinderela, As mil e Contos de fada: um pouco de História uma noites e as Fábulas de Esopo, além de uma gama de histórias que tiveram a sua origem em classes intelectualizadas Conforme GREGORIN (1995:2), antes do século ou populares, essas últimas mantenedoras das novelas de XVIII, encontra-se uma separação bastante nítida do público cavalaria e de uma infinidade de contos ainda reeditados para infantil. As crianças pertencentes às altas classes sociais liam as crianças deste final do século XX. 212 Se considerarmos a interpretação mais apurada desses textos caracterizados como literatura infantil, verificamos visual). Portanto, o texto que se nomeia como infantil pressupõe um leitor intersemioticamente competente. serem eles portadores de uma estrutura profunda portadora de Os recursos verbais e visuais contidos no plano de temáticas que contêm valores humanos, já que os valores sobre expressão têm o propósito de fazer-crer estar em contato com os quais as sociedades são construídas não são infantis, adultos discursos que circulam no universo infantil e que, portanto, ou senis, são humanos, atemporais e fazem parte do imaginário tratam de temas infantis. Além disso, a sociedade, num cultural de uma sociedade, renovando-se e acrescentando processo de construção dialógica do conceito de criança , elementos que são construídos num processo histórico e produziu dialógico. Por meio de análises mais aprofundadas dessa modalidade de Por meio da análise de recursos utilizados na estrutura superficial e concreta (discursiva), verificamos vários elementos escolhidos pelos esses textos como verdadeiramente infantis. textos, percebemos que as sociedades (e neste trabalho estamos nos referindo somente às ocidentais), possuem um cardápio desses componentes textuais ao qual os enunciadores recorrem sujeitos da enunciação a fim de serem estipulados contratos entre enunciador/enunciatário com a finalidade de fazer-parecer o texto infantil e verdadeiro. no momento da enunciação. Temos, desse modo, uma lista de figuras que vem sendo produzida desde que a pedagogia propôs que se Observamos, então, que os textos produzidos para publicassem textos adequados ao mundo da criança, sendo, crianças são, geralmente, o resultado de dois textos: o visual e o então, uma produção cultural que vem sendo retro-alimentada à verbal, medida que novos valores vão sendo instaurados na sociedade. conseqüentemente produzidos por enunciadores distintos. Torna-se importante termos em mente que o Percebemos que a um plano de expressão com enunciatário virtual do texto é uma criança e a manifestação figurativizações apropriadas ao ser que se concebe como sendo textual integral é o resultado de duas semióticas (verbal e “criança” não implica um plano de conteúdo com temas do 213 mesmo teor, visto trabalharem-se temas atemporais, havendo uma etapa de desenvolvimento do ser humano, de seus afazeres um ponto de interseção no interior das estruturas textuais e dos textos que devem ser lidos nessa etapa da vida, um responsáveis pelo surgimento de um nível de manifestação conceito que se vai construindo através do tempo por textos chamado de literatura infantil. construídos para e por essa sociedade. Esse ponto é percebido quando tem início o processo Ao mesmo tempo, figuras e estruturas textuais de discursivização, ponto em que o enunciador escolhe, entre produzidas historicamente pelo saber humano e num processo outros elementos, o seu enunciatário e, conseqüentemente, opta gradual foram divulgadas através da literatura infantil foram por essa ou aquela manifestação textual, tudo com o objetivo de sendo cristalizadas no imaginário cultural do homem ocidental que seu texto e valores nele contidos sejam aceitos. e, por isso, tornam-se importantes instrumentos através dos Entendemos a estrutura social como a mantenedora de um universo pedagógico do qual são retiradas as figuras que quais um tema ou mensagem pode ser veiculado na sociedade, daí o seu reaproveitamento em outros tipos de texto. circulam nessa modalidade de literatura e em outros tipos de Assim, não é completamente incorreto associar os texto que circulam na sociedade, pois, sua organização textual e contos de fada à literatura para crianças, já que os dois larga veiculação na sociedade já fez criar uma grande parcela universos textuais têm muita coisa em comum, o importante é do imaginário cultural das sociedades. Essas figuras fazem vir à não termos uma visão reducionista de um ou de outro, já que os tona valores humanos e históricos, por intermédio de dois são portadores de valores sobre os quais a sociedade vem manifestações textuais com várias intencionalidades. sendo construída, a sociedade e as relações sociais, as relações Temos, hoje, uma concepção de criança e de seu sociais e a construção do nosso “eu”. universo, como sendo um conceito que se construiu no e pelo Também é comum confundir contos de fada com dialogismo, no sentido bakhtiniano do termo, ou seja, criança contos maravilhosos, os primeiros têm origem celta (surgiram para a nossa sociedade é um conceito histórico e dialético de como poemas sobre amores estranhos, fatais, eternos e foram 214 integrados no ciclo novelesco arturiano), dizem respeito ao Como um universo tão complexo de valores pode ser nosso universo individual (subjetivo) e se apresentam com ou trazido na literatura infantil? Importante lembrar que os contos sem a presença de fadas. Os contos maravilhosos têm outra de fada que chegam ao universo infantil já sofreram vários origem, Originam-se provavelmente de narrativas orientais e processos de adaptação, geralmente conservam-se neles o enfatizam a parte material, sensorial e ética do ser humano caráter de aventura ou as lindas histórias de amor, mas um (necessidades básicas, de sobrevivência física), mostram um olhar mais apurado e uma comparação atenta com os textos universo coletivo e não trazem as fadas como personagens na próximos do original colhido por estudiosos como os Irmãos efabulação. Grimm, constatam essa realidade de serem eles uma produção As fadas são elementos do folclore europeu ocidental, ideológica da própria sociedade, para discutir valores que ainda surgidos na criação poética céltico-bretã. Etimologicamente, a hoje, séculos depois, estão presentes na nossa construção como palavra fada vem do latim fatum, que significa destino, seres humanos. inúmeras línguas apresentam este vocábulo no seu léxico, como Desse modo, é importante que se percebam as várias exemplos, temos: fée (francês.), fairy (inglês), fata (italiano), florestas pelas quais inúmeras meninas se sentem atraídas ainda feen (alemão), hada (espanhol). hoje. Verificarmos que a figura do caçador bondoso que chega Muito importante é destacarmos a temática que os contos de fada apresentam. Como citamos anteriormente, ao para salvar avó e filha das garras do lobo nada mais é do que a sombra do macho a dominar a nossa sociedade. refletirem o universo subjetivo, os contos de fada vão narrar Importante é perceber a volta à normalidade dos vários conflitos como a questão da alteridade, do gênero e suas reinos que se desestabilizam entre o “era uma vez” e o final “e relações com a sociedade, do crescimento, das relações entre foram felizes para sempre”, sendo que esse último é apenas a pais e filhos, da sensualidade e da sexualidade. marcação da volta da estabilidade ao reino ou ao nosso próprio “eu” depois de colocado à prova. 215 COELHO, Nelly Novaes. Panorama Histórico da literatura Últimas Palavras Em última análise, ler contos de fada ou literatura infantil e juvenil. São Paulo: Ática, 1991. _____ A Literatura Infantil. São Paulo: Moderna, 2000. infantil é ter a postura de se colocar diante de uma narrativa que representa as nossas lutas com nós mesmos ou com a _____ O conto de fadas: símbolos, mitos, arquétipos. São sociedade, é observar o nosso crescimento enquanto sociedade, Paulo: DCL, 2003. sociedade essa que, anteriormente, não sabia o que era uma criança. CORSO, Diana Liechtenstein e CORSO, Mário. Fadas no Divã: psicanálise nas histórias infantis. Porto Alegre: Artmed, Referências Bibliográficas 2005. ARIÉS, Philippe. História social da criança e da família. 2.ed. GREGORIN FILHO, José Nicolau. A roupa infantil da Rio de Janeiro: LTC, 1981. literatura. Araraquara, SP: 1995. Dissertação apresentada à FCL-UNESP. BETTELHEIM, Bruno. Psicanálise dos contos de fada. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978. _____ Figurativização e imaginário cultural. Araraquara. SP, 2002. Tese apresentada à FCL-UNESP. CARVALHO, Bárbara Vasconcelos de. A literatura Infantil. São Paulo: Global, 1984. JOLLES, André. As formas simples. (trad. Álvaro Cabral) São Paulo: Cultrix, 1976. 216 UM ESTUDO IDEOLÓGICO DE ALGUNS DISCURSOS PERROTTI, Edmir. O texto sedutor na Literatura Infantil. São MIDIÁTICOS TELEVISIVOS Paulo: Ícone, 1986. Olga Talita Furlan Mazzei SORIANO, Marc. Guide de la Literature pour la Jeunesse. (FAIS-Faculdade de Sorriso) Paris : Flamarion, 1975. VON FRANZ, Marie- Louise. A sombra e o mal nos contos de fada. São Paulo: Ed. Paulinas, 1985. _____ A interpretação dos contos de fada. São Paulo: Paulus, 1990. Mesa 11 Análise da Conversação José Amorim da Silva (G/FINAN) Um Estudo Ideológico de Alguns Discursos Midiáticos Televisivos Olga Talita Furlan Mazzei (FAIS) RESUMO: A interação social acontece através da linguagem que se caracteriza como a expressão de valores, julgamentos, críticas, vontades, opiniões. Mas quando se fala de linguagem, é necessário superar o conceito verbalista, uma vez que, linguagem é todo e qualquer sinal convencionado capaz de transmitir alguma mensagem, por isso, pode-se considerar as imagens como uma das formas mais fáceis e práticas de transmissão de informação na atualidade. Toda essa ação comunicativa torna-se uma atividade dotada de intencionalidade, ou seja, o sujeito emissor tenta atuar sobre o receptor fazendo com este saia da posição de mero receptor, a ativo na situação, modificando atitudes e compartilhando de algumas opiniões. Cada enunciação pode ter uma multiplicidade de 217 significações, visto que as intenções do sujeito produtor da ABSTRACT: The social interplay happen through language fala, ao elaborá-la, podem ser as mais diversas. O discurso that is describe as valours, judgement, critiques, volition and considerado neutro é apenas um mito: o discurso que se opinions. But, when to talk about language, it’s necessary to pretende neutro, ingênuo, contém também uma ideologia. overcome the conception verbaly, because, language is every Portanto não se tem no presente trabalho a pretensão de and anything establish sinal able to transmit some information, atribui uma única e verdadeira interpretação ao discurso em so, it can consider the pictures as a n of the easiest and the most análise, mas apenas demonstrar um primeiro estudo acerca pratice form to transmit information in the present time. Every da ideologia embutida em uma mensagem publicitária, this communicative accion get a activity full of intention, this combinando de want say that the emitter subject try to actuate in the receiver Análise do Discurso proporcionando uma leitura crítica e for this receiver leave of only receiver position and get a active abrangente dos processos de significação e de produção de subject that change attitude and to share some opinions. Each sentido. A diferença entre dizer e mostrar permite relacionar enunciation can have a mutiplicity of signification, because the linguagem, homem e mundo e sob esse aspecto se torna intentions of emitter subject, when he produce a talk , pertinente falar de ideologia na linguagem. Como objeto de developed too and these can be very diversity. The neuter análise, utilizamos o comercial da Fiat (2004), que foi discourse is only myth: the neuter discourse ou ingenuous apresentado através da mídia televisiva e que pode ser discourse has a ideology too. In as much as doesn’t have in this compreendido como um discurso contrário a algumas worl the pretension of imput only one e true interpretation on considerações sociais de inclusão, respeito e reabilitação. discourse in analyse, but demonstrate a first study about procedimentos teórico-metoldológico PALAVRAS-CHAVE: publicidade; discursividade; ideologia. ideology inserted in publicity message combining proceeding theory and methodology of Analyse Disourse providing a critique read and ample of the signification process and of 218 production of judgement. The difference between to say and to diminuída, as pessoas aproximadas, imagens e notícias em show permit to relate language, person and world and in this tempo real e a linguagem passou a ser estudada como ciência. aspect get coherent to talk about ideology in language. As study Com a globalização e os avanços tecnológicos pelo object to analyse, it use the comercial Fiat (2004), that it was qual o mundo passou nos séculos XVIII e XIX, a mídia introducing through mass comunication and can be televisiva surgiu e se desenvolveu tão rapidamente quanto comprehend like a discourse wich is contrary to some puderam perceber os maiores alvos desse processo: os considerations sociais of inclusion, respect and rehabilitation. telespectadores. KEY WORDS: Publicity; discourse; ideology. A televisão começa sua expansão nos anos 50, sofre alguns avanços na década e 60 com a Rede Record em São 1 Introdução Paulo, e é fundamentalmente com o surgimento da Rede Globo de televisão e o desenvolvimento e amadurecimento da Numa sociedade capitalista, em que o lucro é um dos objetivos principais, as relações de compra e venda são muito publicidade que a linguagem da TV se consolida. A mídia se tornou organizadora e divulgadora de importantes. Neste contexto, a propaganda veiculada através da discursos. mídia televisiva tem papel essencial como alavanca que conhecimento, produzir, reproduzir, inventar situações e colabora na efetivação e aumento de vendas, sendo conhecida mundos imaginários. Cabe a ela propagar ideologia, enriquecer como “a alma do negócio”. O mundo está entrelaçado pela E apesar de tanta tecnologia e inovação na área comunicação moderna. Temos o sujeito a serviço da linguagem midiática, constata-se que o veículo comunicativo mais e esta a serviço do sujeito. Tivemos muitas mudanças em acessado pela população brasileira atualmente é a televisão, e o relação a informação e interação comunicativa: a distância alto índice se mantém na região centro-oeste. Seria imprudente definir uma única forma que sobrepusesse as demais quanto à 219 difusão de ideologia, mas com certeza , a propaganda é uma positivamente alguns consumidores, que se mantém passivos e delas. Segundo SAMPAIO (1997) a manipulação planejada da ingênuos diante da publicidade veiculada todavia, deve-se ter a comunicação visa pela persuasão, promover comportamentos pretensão de se tornar telespectadores críticos e capazes de em benefício do anunciante que a utiliza. identificar os fatores históricos, sociais e econômicos Por isso o discurso das propagandas televisivas será o responsáveis pela produção do discurso. objeto de estudo deste trabalho. A ideologia, que é definida Nesta reflexão, amparados pela Análise do Discurso segundo Althusser (1970) como uma representação da relação francesa e à luz desta, considerando que o sujeito se constrói e imaginária dos indivíduos com suas condições reais de é construído pelo discurso, pretendemos analisar o comercial existência, é divulgada através das propagandas definidas de exibido pela Fábrica de automóveis Fiat em 12 e 14 de acordo com a intencionalidade e objetivos do criador do novembro de 2004. Tratava-se de uma campanha publicitária discurso. do veículo Pálio. A propaganda televisiva mostra um ex- Essa transmissão tende na maioria das vezes a presidiário que ao sair do presídio depara-se com um Pálio persuadir o ouvinte através do convencimento porém, esse estacionado na rua. A imagem então fica escura e escuta-se o processo pode ter efeitos deturpados. Ao proporcionar a barulho de quebra de vidro e aparece a frase “ Impossible to circulação de uma propaganda a determinado público alvo, o feel indifferent” que pode ser compreendida como “ ninguém discurso pode, além de convencer algumas pessoas, indignar resiste ao novo Pálio”. tantas outras. O discurso publicitário supracitado, pode ser avaliado É o que acontece quando percebemos a existência de como um desrespeito a população de determinada classe social. um discurso discriminatório, ou que incite a violência, ou que Há um intuito governamental de reduzir as desigualdades ainda explora determinada classe social, em determinada sociais e permitir a reabilitação para aqueles que pagaram pelos proposta publicitária. Pode ser que o anúncio consiga atingir 220 seus erros e desejam voltar ao convívio social, e esta propaganda vem de encontro a todas essas intenções. Ainda de acordo com Orlandi (2001), os sentidos dos dizeres são determinados pela maneira como estamos inscritos na língua e na história, os discursos não se originam em nós, 2 Análise do Discurso pois quando nascemos já estão em um processo que é contínuo; as palavras significam pela língua e pela história, existindo Segundo Orlandi (2001), a análise de discurso busca portanto, um já-dito, que se liga à memória, o chamado contribuir para uma reflexão e uma relação menos ingênua com interdiscurso. Ao pensar linguagem e discurso, a autora destaca a linguagem na medida em que busca problematizar as a paráfrase e a polissemia que se relacionam ao funcionamento maneiras de ler, perceber que estamos sujeitos à linguagem, da linguagem, representado a paráfrase um retorno aos mesmos que não é neutra, buscando compreender como um objeto espaços do dizer, produzindo uma variedade do mesmo e a simbólico produz sentidos, estando investido de significância polissemia, uma ruptura dos processos de significação, lidando para e por sujeitos. A autora lembra que não há discurso sem com o deslocamento, com o diferente. Não há discurso que não sujeito, sem ideologia, manifestada através da língua. O se relacione com outros discursos, numa intertextualidade, contexto ideológico e o contexto sócio-histórico estão incluídos numa relação de sentidos, sendo esta relação um dos fatores das nas condições de produção do discurso, daquilo que é dito e condições de produção do discurso, sendo outros fatores: o também daquilo que não é dito ou que poderia ter sido dito e mecanismo de antecipação, quando o sujeito se antecipa ao seu não o foi e em relação ao não-dito, a autora remete a Ducrot interlocutor, dirigindo seu dizer de acordo com o efeito que que destaca formas de não-dizer (o implícito), separando pensa em produzir; a relação de forças, quando o lugar a partir daquilo que deriva da linguagem, o não-dito mas presente (o do qual fala o sujeito interfere em seu dizer como, e, por fim, se pressuposto), daquilo que se dá em um contexto (o relacionando a estes mecanismos/fatores de funcionamento do subentendido). discurso, o que a autora chama de formações imaginárias, 221 sendo as imagens dos sujeitos envolvidos no discurso interação entre locutor e interlocutor está marcada por essa resultantes de projeções, implicando, por exemplo, a imagem relação. que o locutor faz de seu interlocutor, a imagem que ele pensa O conceito de discurso seria o da linguagem em que seu interlocutor faz dele e vice-versa. A autora diz que interação, “(...) nem a linguagem, nem os sentidos, nem os sujeitos são interlocutores, assim como o contexto; o ponto de vista da transparentes: eles têm sua materialidade e se constituem em Análise de Discurso instaura o discurso como objeto. Já a processos em que a língua, a história e a ideologia concorrem unidade da Análise de Discurso é o texto, que é uma unidade juntamente” (Orlandi, 2001, p.48). complexa de significação em relação a uma situação, podendo considerando a relação estabelecida pelos Orlandi (1996) diz que as diferenças de construções ter qualquer extensão, desde uma simples palavra até um dos discursos são em razão dos efeitos de sentidos desejados e conjunto de frases, não sendo fechado em si mesmo, mas tendo cita como exemplo a indústria cultural, em que os textos trazem relação com o contexto e com outros textos, na chamada outros sentidos, que não a informação estritamente, através de intertextualidade. A unidade do diálogo é a do texto e não é da efeitos como a persuasão, o nivelamento de opinião, a ideologia ordem de um dos interlocutores ou do outro, é interação, sendo de sucesso, a homogeneização, etc. Ao falar de sujeitos, a a relação dialógica básica para a caracterização da linguagem, autora chama a atenção para o sujeito leitor que, na medida em supondo ter todo texto uma relação dialógica que se constitui que tem contato com o texto seja ele verbal ou não-verbal, se pela ação dos interlocutores. constitui, se representa, se identifica, pois a compreensão não Se a Análise de Discurso se propõe desvendar o se dá em relação apenas à informação, mas faz entrar em conta discurso, mostrar que sua aparente “transparência” e “verdade” o processo de interação, a ideologia. O lugar que os estão amparados por uma ideologia, de que são constituídos o interlocutores ocupam numa formação social e desse modo na discurso e o sujeito, procurar demonstrar tudo isto em uma relação com a ideologia é constitutivo de seu discurso e a propaganda é o que se propõe a seguir. 222 escuta-se o som de um vidro sendo quebrado e de um alarme 3. Análise da Propaganda “Fiat” disparado. De imediato não se pode deixar de fazer algumas A propaganda televisiva mostra um presidiário que considerações, como a característica da pessoa que representa o está prestes a conseguir sua liberdade. Os policiais o chama presidiário, ele aparenta ter idade avançada, o que pode para conferir seus objetos pessoais e recebê-los, trocar sua significar que passou um bom tempo de sua vida no presídio, roupa e sair do presídio. Ao conferir seus objetos, olha para ou até mesmo que envelheceu por má qualidade de vida. algumas fotos que supostamente são de pessoas queridas e das Outro recurso que foi utilizado na propaganda é a quais ele deve estar sentindo muita saudade. Quando ele passa linguagem pelos colegas, companheiros do presídio, todos demonstram telespectadores. Durante todo o processo dentro do presídio, a grande alegria pela vitória dele, em conseguir sair de um lugar música é instrumental de ritmo lento, disfórico e melancólico. que através das imagens não parece ser nada acolhedor, ao No ambiente externo ao presídio, a música toma um ritmo mais contrário, escuro, frio, assim como os presídios da realidade. rápido e eufórico para demonstrar a oscilação da emoção do Ele se despede em silêncio, principalmente daqueles que ele sujeito em estar preso e em seguida ao conquistar a liberdade. musical, que mexe com o sentido dos aparenta ter mais afinidade. Quando o Presidiário está saindo, A iluminação do cenário é coerente ao contexto ele olha uma câmera na porta e percebe que estará sendo representado, na imagem do presídio é possível visualizar vigiado até que saia totalmente e a porta se feche. Lá do lado de paredes manchadas, sujas, imagens escuras e ouvir gotas fora, claridade, passáros cantando, árvores, e um automóvel, caindo no chão, para comprovar que o presidiário está saindo atrativo, bonito, pelo qual o ex-presidiário passa e observa de um lugar ruim, desconfortável e indo para um ambiente muito. Em seguida, a cena se fecha, fica tudo escuro, e apenas agradável, que revela imagens claras, lugar aberto, tendo a 223 natureza como cenário, pássaros que voa bem próximo a ele carro para roubá-lo. Mesmo depois de ter passado muito tempo para evidenciar a liberdade. no presídio, onde demonstrou ser um lugar tão ruim, ele Ao andar, vislumbrando tanta coisa do lado de fora, o preferiu correr o risco de voltar e ter aquele “sonho de sujeito se depara com um automóvel, o novo Pálio 2004. Ele consumo” que é o Novo Pálio. Nem se quer teria dado tempo demonstra admiração pelo carro, e o telespectador pode de rever as pessoa que ele admirava nas fotos com saudade, entender neste primeiro momento que a surpresa do ex- nem de ter chegado a uma possível casa onde houvesse pessoas presidiário é por ver um carro tão sofisticado, tão bonito depois esperando por ele. Estes valores sentimentais que antes a de tantos anos. Com certeza, um automóvel diferente dos que propaganda tinha conseguido despertar através da ausência, da costumava ver antes de ser preso em se tratando de tecnologia, falta que ele sentia, foram reduzidos, mostrou-se que não havia inovação e beleza. tanta importância diante do “Novo Pálio”. Mas, de repente a cena se escurece, só aparece a Ao mesmo tempo, é possível a reflexão de uma descrição do novo automóvel “ The new Fiat Pálio” - “O novo mensagem discriminatória. Aquele que um dia cometeu um Fiat Pálio” . Logo após ouve-se um vidro sendo quebrado como crime, não consiguirá se tornar uma pessoa honesta, na se tivesse sido estourado e um alarme que dispara. E a frase de primeira oportunidade, seus instintos criminais sobressairão e o desfecho da propaganda é “Impossible to feel indifferent” que indivíduo voltará a realizar algum ato contra a lei. pode ser compreendida como “Impossível se sentir Estar-se-á comprometendo toda uma classe social, que indiferente”, ou, “Ninguém resiste ao novo Pálio” que é a busca por direitos iguais e que luta por inclusão e que está versão utilizada na propaganda veiculada no Brasil. sendo submetida a um preconceito através de uma propaganda Nesse momento a compreensão do telespectador pode ser a mais variada; naturalmente pode-se subentender que o expresidiário não conseguiu resistir ao novo Pálio e arrombou o publicitária que leva em consideração apenas a relação de consumo e ignora a ideologia evidenciada. 224 Da mesma forma, pergunta-se: O que seria alvo de entre as pessoas, ela é a forma pela qual o sujeito expressa seus roubos nos dias atuais? Em relação a automóveis, de uma conhecimentos, seus sentimentos, suas convicções ideológicas, forma geral, aqueles que sejam considerados potentes, que evidenciando em que posição se encontra diante da esfera na sejam novos, que tenham um valor significativo e que dê qual está inserido. Essa posição é de certa forma persuasiva, status. Mas nem todos os consumidores gostariam de ter um porque demonstra que o emissor sabe usufruir dos recursos carro que fosse tão cobiçado e que portanto estivesse correndo lingüísticos em seu discurso e tem o conhecimento da força o risco de serem roubados. propulsora que eles contêm. A imagem do “Novo Pálio” poderia ser ainda a do carro dos ex-presidiários, ou, aquele que possui um Novo Pálio, Quando interagimos através da linguagem o tem porque roubou. Apesar de extravagante, essa (...), temos sempre objetivos, fins a serem interpretação seria aceita por se tratar da primeira lembrança atingidos; há relações que desejamos que traz a propaganda. estabelecer, efeitos que pretendemos causar, Assim como esta, muitas propagandas podem ser comportamentos que queremos ver analisadas e consideradas como fonte de propagação de desencadeados, isto é, pretendemos atuar ideologias que pregam a injustiça social entre as classes, o sobre o outro de determinada maneira a obter racismo, a imagem da mulher e/ou do homem de forma dele determinada reação. (KOCH, 2000.) pejorativa, entre outras que estão implícitas no discurso midiático das propagandas televisivas. De acordo com o que já falamos anteriormente, a linguagem é muito mais que uma forma de veicular informação. Além de ser um importante meio de interação O processo de produção da linguagem argumentativa/convicta pode ser observado desde as falas mais cotidianas até as mais elaboradas, como é o caso da linguagem utilizada nos discursos midiáticos, 225 principalmente dos publicitários televisivos que utilizam da As palavras mudam de sentido ao passarem linguagem verbal e não-verbal. de uma formação discursiva para outra. A publicidade televisiva, em foco na região centrooeste, atinge muitas pessoas, pois o meio de comunicação mais usado como forma de proporcionar informação às pessoas é a televisão. De acordo com a PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) de 2005, a porcentagem da população pertencente à região centro-oeste que recebe informação através da televisão é de 90,03%. Com tamanha audiência a televisão passou a visar principalmente o mercado consumidor, tendo como objetivo sua sustentação empresarial e a lucratividade. Fica evidente a conseqüência da amplitude que tomou a mídia televisiva. Ela atinge várias classes sociais e acarreta numa alienação associada ao desejo consumista; influi tão Assim, não somente as intenções que determinam o dizer. Há uma articulação entre intenção e convenções sociais. Há uma seleção em relação aos meios formais que uma língua oferece, seleção feita pelo falante que vai delimitando o que diz e, conseqüentemente, tudo o que seria possível dizer. Porém o sujeito não se apropria da linguagem num movimento individual: há uma forma social de apropriação da linguagem em que está refletido o modo como ele o fez, ou seja, sua ilusão de sujeito, sua interpretação feita pela ideologia. (ORLANDI, 1996) fortemente nas pessoas fazendo com que elas fiquem envolvidas, mudem de opinião, de gosto, de comportamento, exercendo assim sua função social. Em virtude dessas concepções é que a Análise do Discurso, de pensamento francês, é vista como essencial neste estudo por ser justamente a instanciação do modo de se 226 produzir linguagem, isto é, no processo discursivo fica claro ouvinte visando criar além do efeito de sentido citado por que a linguagem é um produto social. Pêcheux, uma relação de intersubjetividade. Ambos os Mussalim (2004) afirma que o estudo da Análise do participantes são considerados membros representantes de uma Discurso, inscreve-se num terreno em que intervêm questões determinada formação social. Assim qualquer discurso que seja teóricas relativas à ideologia e ao sujeito. Melhorando o teor produzido conjuntamente e interativamente decorre de relações dos argumentos, mudar-se-á o conceito formado pelos ouvintes de papéis sociais determinados, que são estabelecidos de e ainda, ter-se-á a oportunidade de convencimento do acordo com as imagens que cada um pressupõe existir. A interlocutor em aceitar a ideologia expressa no discurso. relação é sempre de dominação pela posse do discurso e o papel do ouvinte é a de dominado, isso pela situação, muitas A ideologia é bem um sistema de vezes de total inércia e passividade que tem o ouvinte naquele representações: mas estas representações não momento. têm, na maior parte do tempo, nada a ver com Ao produzir uma propaganda televisiva, fica-se atento a “consciência”: elas são na maior parte das a alguns aspectos ligados a situação psicológica, econômica e vezes imagens, às vezes conceitos, mas é social em que se encontra o consumidor. Assim, antes de antes de tudo como estruturas que elas se finalizar o trabalho publicitário, há um estudo direto quanto ao impõem à maioria dos homens, sem passar público alvo. A propaganda seduz nossos sentidos, mexe com por suas consciências.” (ALTHUSSER 1970) nossos desejos, revolve nossas aspirações, fala com o nosso inconsciente, nos propõe novas experiências, novas atitudes, Muitos dos discursos, principalmente os da propaganda televisiva, são elaborados a partir de uma relação verbal e não verbal emitida por um locutor em relação a um novas ações.” (SAMPAIO, 1997) O discurso da propaganda é justamente elaborado para excitar aquilo que é sentido como prazeroso ou 227 desejoso, mas nem sempre o efeito produzido é esse em é apenas a comunicação, não é apenas a persuasão, mas todos os ouvintes. Muitas vezes a realidade demonstrada nos também o reconhecimento pelo confronto ideológico. anúncios faz parte de uma realidade que fica apenas no plano das idéias do telespectador, e faz com que haja um pensamento crítico sobre injustiça social. Vale lembrar que muitas vezes é através da elaboração do discurso das propagandas que se inicia a distinção das classes sociais, do preconceito, do racismo e de tantas outras formas de É preciso parar de analisar o discurso das propagandas televisivas apenas como conjunto de signos, cujo significante e significado são observados abstratamente, e analisar a relação histórica, social e ideológica que estão embutidas nas práticas concretas resultantes de uma força maior ou de um poder. exclusão. gostaria de mostrar que o discurso não é 4 Considerações Finais uma estreita superfície de contato, ou de confronto, entre uma realidade e uma A análise do discurso trabalha com a exterioridade que envolve a linguagem. Há também outras ciências que o fazem, porém a Análise do Discurso procura estabelecer essa relação de exterioridade da linguagem de forma mais imanente, considerando as condições de produção que constituem o discurso. A reflexão lingüística acerca destas condições permite afirmar que não é apenas informar a função fundamental da linguagem, acrescentando-se que não língua, o intrincamento entre um léxico e uma experiência; gostaria de mostrar, por meio de exemplos precisos, que, analisando os próprios discursos, vemos se desfazerem os laços aparentemente tão fortes entre as palavras e as coisas, e destacar-se um conjunto de regras, próprias da prática discursiva. (...) não 228 mais tratar os discursos como conjunto de signos que ideologia, muitas vezes representam a identidade de uma povo, a de uma classe social, de um país, enfim demonstram representações), mas como práticas que representações sociais. Temos exemplos de propagandas que formam sistematicamente os objetos de retratam a abundância do Brasil, como a fauna, a flora, ou a que falam. Certamente os discursos são relação feitos de signos; mas o que fazem é mais humorísticamente o jeitinho brasileiro, também a musicalidade que utilizar esses signos para designar como o samba, as festas de carnaval, a imagem das mulheres coisas. É esse mais que os torna brasileiras que são bem exploradas em propagandas. Percebe-se irredutíveis à língua e ao ato da fala. É então que a produção midiática televisiva tem este poder de esse "mais" que é preciso fazer aparecer e ressaltar algumas características e manipulá-las de forma a que é preciso descrever. (FOUCAULT, divulgar o seu produto e convecer o receptor. remetem (elementos a significantes As propagandas, além de serem transmissoras de conteúdos ou 2003) que se faz do Brasil com o futebol, ou Assim sendo, pretende-se indicar os níveis daquilo que é dito nas propagandas televisivas e sempre analisar as É nessa vertente, da Análise do Discurso que trabalha com os processos e as concepções de produção de linguagem que este trabalho pretende confirmar que a cada situação, dependendo do ouvinte, do referente e da intenção, o discurso é elaborado de uma forma, em especial nos casos do discurso publicitário televisivo, que consegue criar imagens através da linguagem, seja ela verbal ou não-verbal. ideologias sociais embutidas no discurso midiático de algumas propagandas televisivas principalmente de circulação nacional para demonstrar como a linguagem pode ser fator excludente no discurso midiático publicitário televisivo identificando nas propagandas bastante conhecidas a clara distinção entre classes sociais e o efeito produzido nos telespectadores em decorrência 229 de algumas destas questões ideológicas explícitas e implícitas produção; por isso dada a diversidade dessas, o sentido do nos discursos. silêncio varia, isto é, ele é tão ambíguo quanto as palavras. O sentido do “explícito” que é o sentido de um nível (ORLANDI, 2001) semântico do qual podem surgir outros níveis de significação É possível observar portanto alguns fatores relativos à “implícitos”. Além disso, tem-se o implícito absoluto – que se delimitação daquilo que é dito e daquilo que é silenciado no introduz no discurso sem que o locutor o queira ou saiba que discurso publicitário midiático televisivo. Constata-se que está sendo dito e o implícito relativo – aquilo que o locutor quis aquilo que é não-dito se interpreta de forma diferente assim dizer, o interno do discurso. Torna-se claro que a atividade de como aquilo que é dito e essas interpretações devem sair do interpretação está em todo o momento da comunicação e funda- nível superficial para o de abstração, a interpretação crítica do se na suposição das intenções. Cabe ao processo de intelecção, implícito e do explícito. própria do interlocutor , a captação dessas intenções o que se Para se compreender um discurso publicitário deve-se prevê uma pluralidade de interpretação. De fato, nada impede perguntar: o que ele não está falando ao falar isto e o que ele que o locutor negue a responsabilidade do implícito; além está querendo falar ao falar isto? disso, o querer dizer do locutor pode tomar a forma bastante O profissional de Letras ou de qualquer outra área indireta de um consentimento ao que os outros queiram fazê-lo afim tem de estar apto a refletir acerca dos fenômenos dizer. midiáticos e a construir significados pertinentes e críticos sobre Quando, na propaganda tem-se o momento do os mesmos, e orientar a atuação em sua esfera social como silêncio, quebrado depois com os sons que sugerem o roubo, sujeitos capazes de discernir entre o real e o imaginário, o pode-se dizer que é o silêncio a estratégia usada para dizer adequado muita coisa, pois vale lembrar que “silenciar não é calar”. (...) o principalmente televisiva. silêncio, tanto quanto a palavra, tem suas condições de e o inadequado, proposto pela linguagem, 230 Referências PÊCHEUX, M. – Semântica do Discurso – Uma crítica a afirmação do Óbvio. Campinas: Ed. da Unicamp,1988. ALTHUSSER, L. Ideologia e Aparelhos Ideológicos de Estado. 3ªed., São Paulo: Presença, 1970. _________ O Discurso - estrutura ou acontecimento. Trad. de Eni P. Orlandi. Campinas: Pontes, 1983. FOUCAULT, M. A Ordem do Discurso. São Paulo: Loyola, 2003. SAMPAIO, Rafael. Propaganda de A a Z. Rio de Janeiro: Campus, 1997. KOCH, INGEDORE G. VILLAÇA. Argumentação e Linguagem. São Paulo: Cortez, 1996. Discurso e Charges Cleide Pires de Moraes (G/UEMS) ____________. A Inter-ação pela linguagem. 5ed.São Paulo: Contexto, 2000. MUSSALIM, F. BENTES, A. C. Introdução à Mesa 12 lingüística: domínios e fronteiras. São Paulo: Cortez, 2001. “Denis, O Pimentinha” Segundo as Teorias da Análise do Discurso _____________. A linguagem e seu funcionamento: as formas Renata Borba Fagundes (G/UEMS) do discurso. 4ª ed. Campinas: Pontes, 1996. Discurso e Identidade do Professor Construído pelo Aluno ORLANDI, E. P. ª Análise de discurso: procedimentos. 3 ed. Campinas: Pontes, 2001. princípios e Vanda Lúcia Godoi Garcia Marques (G/UEMS) 231 Discurso e Ideologia na Ignografia Representiva Sul- Reflexões sobre a Leitura em LE: pondo fim a Vacuidade de Matogrossense sentidos nos textos didáticos Anailton de Souza Gama (PG/UFMS/UEMS/FINAN) Maria Lígia Aguiar UEMS A Identidade Cultural de um Povo nas Letras de Música Country Mônica Aparecida Matos (UEMS) Mesa 13 O Teatro como Forma de Aprendizagem Claudia Alves Gomes (G-UEMS) A Importância dos Contos de Fada na Escola Michele Cristianne Souza Gonçalves (G-UEMS) Rosemeire Mazieiro Fernandes (G-UEMS) Aláide Pereira Japecanga Aredes(UEMS) A Literatura Infanto-Juvenil: despertando o prazer da leitura na sala de aula Ana Paula Machado (G-UEMS) 232 REFLEXÕES SOBRE A LEITURA EM LE: PONDO FIM À VACUIDADE DE SENTIDOS NOS TEXTOS DIDÁTICOS Maria Lígia Aguiar (UEMS) RESUMO: A leitura em uma língua estrangeira (LE) não trata apenas da decodificação de vocabulário, mas da construção de significados. É processo dinâmico de desenvolvimento e implementação de estratégias e deveria ser entendida como ampliação de conhecimento, instrumento de reflexão crítica e meio de transformação da sociedade, objetivo último da educação. PALAVRAS-CHAVE: ensino-aprendizagem de língua estrangeira; leitura em língua estrangeira; construção de sentidos; interação. ABSTRACT: Reading in a foreign language does not just mean vocabulary decoding, but rather a meaning construction. It is a dynamic process of developing and implementing strategies and should be seen as knowledge improvement, a 233 tool for critical thinking and means for society change, utmost conscientização de um ensino mais adequado com o texto em educational target. sala de aula tem sido o objeto de estudo de pesquisa já feita na KEY WORDS: foreign language teaching and learning; Lingüista Aplicada que, utilizando os subsídios oferecidos não foreign language reading; meaning construction; interaction. só pela Análise do Discurso como também pela Psicologia e outras ciências, parece estar encontrando repostas mais 0. Introdução satisfatórias do que as dadas pela lingüística teórica tradicionalmente. O objetivo deste estudo é refletir sobre o ensino- Assim, temos a intenção de realizar um breve estudo aprendizagem da leitura em LE e, particularmente, sobre a dessas contribuições e refletir sobre elas. Vemos, hoje, a leitura forma como têm sido tratadas as atividades de leitura propostas em LE ainda ser feita seguindo um método, no momento, por nos textos de livro didático usados na aula de LE, exemplo, de sua apresentação por meio de group e individual especialmente daquilo que se pode entrever nas instruções dos repetition e, após a apresentação, no trabalho de simples seus manuais de professor e da observação na prática. Existem decodificação de palavras isoladas do texto, quando então é muitas dificuldades a serem enfrentadas pelo professor de LE comum proceder-se a uma forma de reading comprehension na realização do trabalho com a leitura do texto em sala de que não explora os sentidos do texto e nem se compromete com aula. Cremos que estas sejam causadas pelo confronto entre as o seu autor. Numa forma incompreensivelmente banalizadora concepções de língua e de ensino de LE contidas nos livros do entendimento do aluno, tecendo perguntas cujas respostas didáticos e as tradições de ensinar e aprender LE dele mesmo, são óbvias demais e propondo atividades que, geralmente, professor, e dos alunos - associadas que foram por tanto tempo limitam-se à localização do respectivo grammar focus no texto, às práticas do método da gramática-tradução, conforme nos o professor tem seguido esse tipo de método, utilizando o texto ensina Almeida Filho (1993). Não obstante, o trabalho de geralmente apenas para ensinar a gramática. Importa salientar 234 que não nos detemos aqui na diferenciação entre abordagem, Krashen (1982) já alertara para o perigo da tripartição método e técnica, visando uma simples colocação do problema entre professores, pesquisadores de campo e pesquisadores restrito ao escopo deste estudo; de qualquer forma, para uma teóricos, pois a prática pode e deve ser ponto de partida para a discussão mais detalhada da questão, remetemos o leitor aos teoria e vice-versa, argumentando aliás, a esse respeito, que trabalhos realizados por Brown (1994) e Almeida Filho (1993). teoria alguma se esforça por ser prática, por não fazer parte de Diante do conceito de que a leitura é uma atividade sua natureza. que deveria levar o leitor a tirar do texto o sentido pleno, temos Widdowson (1979) afirma ter feito seus estudos sem a concepção de que o trabalho do professor de LE deveria saber se trariam ou não soluções efetivas aos problemas da caracterizar-se por uma orientação mais comprometida com os área, mas que julgava suas reflexões válidas mesmo assim, processos de mudança necessários à construção de uma porque elas poderiam ajudá-lo (e aos que o lessem) a olhar a sociedade mais crítica. Temos claro que as concepções de sua prática com outros olhos. Cita os versos de Elliot, sobre homem, educação e sociedade influenciam a prática do esse aspecto: “We shall not cease from exploration/ and the end professor de LE, e discutimos, portanto, a respeito das suas of all our exploring/ will be to arrive where we started/ and possibilidades de atuação com a habilidade da leitura. know the place for the first time” (T. S. Elliot, Little Gidding) Desse modo, cientes de que esse estado de coisas tem ou seja, “Não paramos nunca de colher de nossas explorações/ origem na tradição de métodos de ensino do século passado, é e o fim de todas elas/ será chegarmos ao lugar de onde saímos/ nosso intuito realizar uma reflexão a partir do que temos e encontrado na prática. (WIDDOWSON, 1979, p.ii). Chega, igualmente a Krashen, à conhecê-lo como se fosse pela primeira vez” afirmação de que os dois campos – teoria e prática - deveriam 1. A dicotomia teoria/prática no ensino de LE formar o caminho da profissão de ensinar. Perder-se-ia se assim não fosse. A teoria parte da 235 prática, mas distancia-se em seguida e, quando ela retorna, faz produção lingüística que definem o ato da interação lingüística” com que a vejamos com outros olhos. Olhos agora, voltados (MOITA LOPES, 1996:20). para a consciência daquilo que faz em sala de aula de LE e o No intuito de mediar subsídios teóricos da Análise do porquê desse fazer. No que concerne à pesquisa em LE, não Discurso, assim como de outras ciências, para a LA, este mais se concebe o professor que não seja reflexivo e crítico, estudo, enfim, insere a reflexão sobre alguns de seus conceitos, como bem explicam Barcelos e Vieira Abrahão (2006). em especial o de sociointeracionismo. Com base em Este estudo tem, pois, a intenção de realizar um concepções propostas por Coracini (1995), Kleiman (1991), levantamento daquelas que constituiriam algumas das bases Almeida Filho (1993), Moita Lopes (1996) entre outros, que teóricas nas quais alicerçar um ensino-aprendizagem bem- alertam para a importância de empreendermos um balanço do sucedido de leitura em LE. Em razão disso, fomos buscar na que tem sido efetivamente conseguido com a leitura em LE até abordagem comunicativa atual à leitura em LE, sinais de então e para a importância de se trabalhar com um conceito de direcionamento teórico que a fundamentasse, via Lingüística linguagem relacionado ao contexto sócio-cultural e histórico no Aplicada (LA), no sentido que Moita Lopes (1996:20) define: qual ela está inserida, verificamos que a prática dessa “a LA é uma ciência social, já que seu foco é um problema de habilidade precisa mudar se o objetivo for um ensino mais uso da linguagem enfrentado pelos participantes do discurso no significativo e menos mecânico. Suas visões de língua, ensino e contexto social, isto é, usuários da linguagem (leitores, aprendizagem influenciaram toda a concepção de como escritores, falantes, ouvintes) dentro do meio de ensino- trabalhar com a habilidade da leitura em sala de aula. Em aprendizagem e fora dele”. Outro princípio pertinente a este outras palavras, buscamos fazer um recorte interdisciplinar e tipo de investigação é o fato de se constituir em pesquisa que não apenas utilizar, portanto, a lingüística teórica. Trata-se de focaliza a linguagem do ponto de vista processual e que trata um estudo qualitativo, cuja meta é alcançar uma maior “dos tipos de competência e procedimentos de interpretação e compreensão daquilo que realmente ocorre na prática do 236 professor de LE, caracterizando, assim, o tipo etnográfico. Defende, portanto, a idéia de que não é possível explicar as relações entre teoria e prática, sem considerar o 2. A questão da ação do inconsciente na constituição do sujeito sujeito e sua constituição psicanalítica e social. Levando em dentro do ensino de LE conta, desse modo, o sujeito inconsciente, afirma ainda que “o inconsciente fala pelo sujeito; revela, pela opacidade da A influência direta, no ensino de línguas, da visão estruturalista da linguagem como um conjunto de hábitos lingüísticos, mascarou por muito tempo o potencial da leitura em LE. Coracini (1998) traça a seguinte conclusão, após análise de textos teóricos, aulas gravadas e opiniões de professores e alunos sobre leitura e escrita: linguagem, o que, conscientemente, ele desejaria abafar; faz emergir o indesejável, o estrangeiro que habita em nós...” (CORACINI, 1999:167). Este é o peso de elemento ideológico do inconsciente, e aqui a LA faz a mediação com a Psicologia, com seus métodos e objeto próprios. É o que se pode verificar quando deparamos com a seqüência tradicional: leitura em voz alta, estudo do vocabulário, repetição, interpretação (ínfima), tradução. Concordamos, portanto, com Coracicni (1999) A prática não é a aplicação direta de dados quando afirma que “há predominância da visão estruturalista e teóricos: a relação com a teoria não é tão da tradicional nessas atividades de leitura”, e questiona: simples quanto alguns lingüistas aplicados parecem acreditar devido à ação do inconsciente na constituição do sujeito. (CORACINI, 1998:33) É preciso que a escola entenda que produzir texto significa produzir sentido (no momento da leitura e/ou no momento da escrita) e que isso é muito mais do que reproduzir ou 237 repetir o que a escola ou o professor querem As teorias do discurso e da desconstrução ouvir ou ler (CORACINI, 1999:174). que compartilham a concepção de sujeito psicanalítico, - isto é, atravessado pelo inconsciente e, por isso mesmo, impossibilitado de se conhecer e de conhecer A resposta ao questionamento feito sobre o que o outro, - de se controlar e controlar o outro, encontramos na aula de leitura em LE hoje estaria, então, já que é fragmentado, esfacelado, emergindo naquilo que podemos inferir da seguinte pergunta de Coracini apenas pontualmente pela linguagem, lá (1999:14): “Como nos esvaziar dos sentidos que, numa trama onde se percebem os lapsos, atos falhos, densa, tecem nosso inconsciente, nossa subjetividade, sem, ao chistes... faze-lo, (re)produzir novas ilusões, (re)apresentar novos engodos?” E acrescenta sermos “...não só sempre dominados (embora às vezes aparentemente dominadores), como também não existem soluções para os problemas apontados,” O foco, então, “deve estar na investigação da concluindo que “é conflituoso”. Mas essa nada mais é que uma interação entre o aprendiz e o professor como sendo geradora característica do próprio discurso. Assim, talvez apenas de aprendizagem,” como afirma Moita Lopes (1996:90). Por devêssemos mostrar os conflitos e as negociações nesse outro lado, na perspectiva de desconstrução de Arrojo (1992), processo com que nos envolvemos no ato de ensinar leitura. temos que “o objeto não pode ser independente do sujeito, nem Sobre a ação do inconsciente na constituição do sujeito, separado Coracini (1999:11) afirma: acrescentando: deste por uma barreira de neutralidade”, 238 Sujeito e objeto são desmascarados em sua 3. Ensino de LE como sinônimo de adoção de livro didático relação simbiótica: ao mesmo tempo em que o cria, a partir de seu contexto, de suas circunstâncias e de sua psicologia, o sujeito também é criado e influenciado pelo objeto. Ou seja, como uma espécie de psicanálise, a leitura desconstrutivista pretende desnudar, Almeida Filho (1993:40) afirma que “ensinar uma LE é hoje quase sinônimo de adotar e seguir os conteúdos e técnicas de um livro didático”. Faz, porém, a ressalva de que: entre outras coisas, o desejo que se esconde por trás da necessidade de se manter objetivamente separados sujeito e objeto, homem e realidade, leitor e texto. (...) Quase todos [os livros didáticos] prometem “comunicação” na língua-alvo. Essa postura se opõe ao ensino de significados veiculados no discurso (...) e De todo modo, entre nós, a reflexão desconstrutivista ainda não se infiltrou nos paradigmas que vemos na prática, em que se percebe o professor ainda bastante imerso no esforço de sistematização vindo de um estruturalismo que parece ter criado raízes. retém comumente (e não exclusivamente) uma visão behaviorista das técnicas para a apresentação e a prática. (...) Na ausência de massa crítica dentre o professorado de línguas, a dependência do livro didático e suas receitas se torna maior. 239 Na análise de cenas do nosso cotidiano de ensino com os diferentes estilos de aprender” (ALMEIDA FILHO, hoje, Almeida Filho (1993:41) destaca “o material de ensino 1993:43). É interessante destacar também a necessidade de construído para o livro didático que não provoca, não abrirmos espaço para o diálogo entre as diferentes culturas. O problematiza e nem informa”. Adiante, em outra cena: próprio tão comentado processo de globalização pede que “exercícios mecânicos que não levam a verdadeiras ações de respondamos a esse desafio que é esse diálogo. Aliás, esse fazer algo significativo com a LE” (id.,ib.:41), e em outra diálogo deveria nos levar não apenas às questões de caráter ainda: “técnicas de fácil manipulação como repetições, cultural, mas também ao passado, à maneira de “ler” a história, transformações e perguntas-e-respostas que desconsideram o às vezes construída em torno de visões nacionalistas. Nesse envolvimento pessoal e as oportunidades de se trocarem modo se ver, o que é incomparável torna-se possível. O informações novas e autênticas”(id.ib.:42-43) tece, então, fechamento das leituras deve ser, então, evitado, buscando-se alguns significados do professor comunicativo (como desejado não “comparar o incomparável”. Coracini (1999:106) salienta hoje, pela maioria das tendências teóricas), a partir de posturas que “toda proposta pedagógica em LE veicula um ponto de como crer que “a significação e relevância das mensagens vista sobre o que seja ensinar e aprender uma língua, o que contidas nos textos, diálogos e exercícios para a prática de significa que a toda proposta pedagógica subjaz uma certa língua que o aluno reconhece como experiência válida de ideologia; todo manual que se encontra na base da prática transformação e crescimento intelectual; (...) a representação de docente não é inocente, nem neutro, e isso não é explicitado. temas e conflitos do universo do aluno na forma de problematização e ação dialógica” (id.ib.:43). Tem o autor a crença de que ser comunicativo tem a ver com dar “a devida atenção a variáveis afetivas tais como ansiedades, inibições, empatia com as culturas dos povos que usam a língua-alvo e A visão de linguagem que subjaz às atividades de leitura propostas na maioria dos livros didáticos enfatiza o desenvolvimento de uma competência na língua-alvo baseada em habilidades lingüísticas, com especial destaque para aquelas em que parece não haver espaço significativo para qualquer 240 questionamento, discussão ou argumentação sobre a atividade interação, ou seja, nem (só) no aluno, nem (só) no professor. com que estão trabalhando. Parecem mais interessados em que Mas sim no espaço entre os dois, ou seja, no discurso. Discurso o professor esteja atento ao uso correto da língua pelo aluno. que, Para além da forma e das funções da linguagem, há fronteiras a “reconhecimento da dualidade constitutiva da linguagem, isto é serem ampliadas, em que a linguagem poderia ser vista , no seu caráter ao mesmo tempo formal e atravessado por reflexivamente. A linguagem trazida por eles poderia, desse entradas subjetivas e sociais”. A interação é para a autora, modo mediar a interação dos alunos nos eventos comunicativos portanto, a linguagem enquanto discurso, que: conforme bem diz Brandão (1995:11) está no que efetivamente fazem parte de sua realidade, ou seja, da comunidade discursiva à qual pertencem. “não constitui um universo de signos que serve apenas como instrumento de 4. O “hot spot” do Inglês Instrumental e a interação em sala de comunicação ou suporte do pensamento. (...) aula de LE [A linguagem enquanto discurso] é um modo de produção social; ela não é neutra, inocente (na medida em que está engajada O ensino de inglês instrumental (English for Specific Purposes) atenderia a uma suposta recomendação básica do ensino moderno do inglês do ensino centrado no aluno. Ocorre que o ensino moderno, apoiado nos pressupostos da Análise do Discurso para a Lingüística Aplicada, deveria centrar-se na numa intencionalidade) e nem natural, por isso o lugar privilegiado de manifestação da ideologia. Ela é o sistema-suporte das representações ideológicas, (...) é o ‘medium’ social em que se articulam e defrontam agentes coletivos e se 241 consubstanciam relações interindividuais” metodologia centrada no aluno, nas suas (BRANDÃO, 1995:11). motivações, interesses e necessidades. Então, aprender uma língua estrangeira implicaria não apenas reter estruturas verbais De fato, de acordo com Moita Lopes (1996), o conhecimento é construído conjuntamente em sala de aula através de um processo que envolve controle, negociação, compreensão e falhas na compreensão entre aluno e professor até que possa fazer parte do conhecimento compartilhado na sala de aula. Na visão da psicologia cognitivista, o ensino em geral não pode estar desvinculado da aprendizagem, na medida para repeti-las, automaticamente, no momento oportuno, mas, sobretudo, agir sobre o objeto de ensino para ‘capturar’ o seu sentido e o seu funcionamento, de modo a ser capaz de interagir com o outro ou com o dizer do outro, com a cultura do outro (CORACINI, 1999:105-106). em que ele só terá sentido se estiver a serviço da aprendizagem. Conforme afirma Coracini (1999:105), na verdade: Desse ponto de vista, ensinar leitura em LE, portanto, quer dizer criar condições para que essa interação aconteça, A pedagogia de línguas estrangeiras viu-se diante da necessidade de alterar o seu enfoque: de uma pedagogia centrada no método e no saber (retenção do conteúdo transmitido) passou-se a propor uma possibilitando desse modo que conceitos já adquiridos defrontem-se com situações lingüísticas e culturais novas, resultando em aprendizado cognitivo do aluno. 242 5. A questão da “primazia” da habilidade da leitura sobre as demais dentro do ensino de LE O usuário de língua, ao falar, faz uso dos gestos, da expressão, da emoção, da entonação e do contexto para ajudar. Na leitura, não. Assim, quando mostra ilustrações, gráficos ou Com a leitura, temos condições de realizar diversos tipos de atividades como: atividades preparatórias (ativação do vocabulário, apresentação prévia do assunto, perguntas anteriores à interação), discussão prévia sobre aspectos tablelas, o professor (ou o livro didático) está auxiliando. Em outras palavras, com as outras habilidades, isto se tornaria mais difícil. Há ainda que se considerar o que Maingueneau (1996:39) preconiza: culturais e sobre os temas a serem analisados. Buscamos com isto mostrar ao aluno que, mesmo com um conhecimento lingüístico limitado, é possível compreender o texto. Ao utilizar as estratégias de leitura e compreensão, tais como a identificação da idéia central, inferir os significados das palavras pelo contexto, trabalhar com pistas oferecidas, entre outras, é possível ao aluno realizar o entendimento do texto. Isto só a leitura pode proporcionar, visto que ela é fixa, e não como a fala, que se esvai. Além disso, o desenvolvimento da habilidade da leitura de textos em LE oferece a possibilidade de A leitura é atividade cooperativa que leva o destinatário a tirar do texto o que o texto não diz, mas pressupõe, promete, implica ou implícita, a preencher espaços vazios, a ligar o que existe num texto com o resto da intertextualidade, de onde ela nasce e onde irá se fundir (MAINGUENEAU, 1996:39). aumentar o conhecimento. Assim, desenvolver as estratégias de leitura (que nada mais são do que planos para resolver problemas encontrados na construção do significado do texto) Assim, devemos ter em mente os princípios teóricos transforma-se em uma grande ajuda aos alunos, que podem propostos por Bakhtin (1895-1975) e Vygotsky (1896-1934), almejar (e conseguir) a sua autonomia. 243 que trouxeram uma visão mais socializada da sala de aula. O sala de aula. Assim como identificar o momento, ou seja, o aluno passou a ser agente ativo na construção do conhecimento quando e também o local (ou o onde) está se desenvolvendo o e o fator sociohistórico foi realçado dentro do contexto da sala processo de socioconstrução do conhecimento. Há ainda que se de aula. Suas posições foram essenciais para essa nova visão do compreender o porquê desses participantes se encontrarem ser humano, a de ser pensante e ativo, instituindo uma unidos nesse processo educacional. Só assim torna-se possível educação mais significativa para professor e aluno e para o uma abordagem sociohistórica da sala de aula de LE. Desse contexto escolar. modo, essa perspectiva centra-se em cada indivíduo presente em um dado momento particular de socioconstrução de conhecimento, como também na sua relação com o outro na 6. As contribuições de Bakhtin e Vygotsky para a visão social da aula de LE interação. Essa visão sociohistórica de conhecimento e da sala de aula, portanto, afirma que o outro exerce papel fundamental, de acordo com as perspectivas teóricas de Vygotsky (1985) e Bakhtin (1995), cujas idéias muito contribuíram para o desenvolvimento de uma nova forma de entender o processo de A visão sociohistórica da sala de aula de LE teve origem nos postulados dos pensadores russos Bakhtin e Vygotsky, ao privilegiarem a interação, assim como a importância que o outro possui no processo de construção do conhecimento. Num espaço historicamente localizado como é a sala de aula de LE, entender quem são os participantes da interação pedagógica é crucial para que possamos entender essa ensino-aprendizagem. Assim, vemos que os diversos estudos hoje realizados em sala de aula têm salientado a necessidade da criação de contextos interacionais em que os alunos e professores construam, conjuntamente, significados sobre o mundo no qual estão inseridos, tanto o interno quanto o externo à sala de aula. 244 A construção desse mundo se faz por meio da interação com o outro pela linguagem. Por sua vez, a linguagem é considerada a característica fundamental do homem enquanto ser social que é. Dessa forma, ao mesmo tempo em que o sujeito é influenciado pela sociedade que o cerca, ele vai também transformando-a e reconstruindo essa mesma sociedade. O mesmo ocorre na sala de aula, local em que, ao mesmo tempo em que o aluno constrói o seu conhecimento, vai igualmente contribuindo para a coconstrução do conhecimento dos outros participantes da interação, que são o professor e os outros alunos. Nesse ambiente, então, o aluno não pode ser visto como um produto apenas desse contexto escolar, mas como um agente ativo na construção desse mesmo contexto. Assim, devemos entender a educação como um processo de construção de conhecimento compartilhado e construído por uma ação conjunta de todos os participantes da interação em sala de aula. Pensamos ser correto concluir que há eficácia na abordagem interacionista no ensino da leitura em LE, uma vez que temos clara a concepção de que todo o homem se constitui como ser humano pelas relações que estabelece com os outros, e de que estamos inseridos em um tempo e um espaço em dinâmica constante. Desde o nosso nascimento, somos socialmente dependentes uns dos outros e entramos em um processo histórico. É por meio desse processo que formamos nossa visão de mundo e que construímos sentidos sobre ele. Só com a participação dos outros é que conseguimos nos apropriar do patrimônio cultural da humanidade, e construir nossa história, ou seja, as diversas visões de mundo com as quais o indivíduo convive e que vão transformando o homem no decorrer de sua vida e deixando marcas de sua própria história nele. Essa discussão teve origem em Vygotsky e Bakhtin, e vem sendo aprofundada desde então. Este breve estudo sobre a questão da leitura em LE procurou alçar o trabalho com esta atividade em sala de aula a um patamar mais alto do que tem 7. Considerações finais sido permanecido, esperando contribuir para uma visão mais crítica da realidade do ensino-aprendizagem da LE. Entre os 245 aspectos práticos relevantes para que o ensino de LE tenha êxito está, sem dúvida, o fato de que o uso e da forma da língua BARCELOS, Ana Maria Ferreira & VIEIRA ABRAHÃO, a ser ensinada devem estar contextualizados e a constatação de Maria Helena. Crenças e ensino de línguas: foco no professor, que o aprendizado de uma LE por meio da leitura é importante no aluno e na formação de professores. Campinas: Pontes, porque torna possível um contato com novas culturas e novos 2006. conhecimentos. BRANDÃO, Helena H. Nagamine. Introdução à Análise do Discurso. 4.ed. Campinas: Editora da UNICAMP, 1995. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALMEIDA, FILHO, José Carlos Paes. Dimensões comunicativas no ensino de línguas. Campinas: Pontes, 1993. BROWN, D. H. Teaching by Principles: na Iinteractive Approach to Language Pedagogy. Englewood Cliffs, New Jersey: Prentice Hall Regents, 1994. CORACINI, Maria José Rodrigues (Org.) O jogo discursivo na aula de leitura: língua materna e língua estrangeira. Campinas: ARROJO, Rosemary (Org.). O signo desconstruído: Pontes, 1995. implicações para a tradução, a leitura e o ensino. Campinas: Pontes, 1992. _____. A produção textual em sala de aula e a identidade do autor. In: CORACINI, Maria José. Interpretação, autoria e BAKHTIN, M. Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo: Hucitec, 1995. legitimação do livro didático. Campinas: Pontes, 1999. 246 _____. A teoria e a prática: questão da diferença no discurso VACUIDADE DE SENTIDOS NOS TEXTOS DIDÁTICOS sobre e da sala de aula. São Paulo, D.E.L.T.A. v. 14, n. 1, p. 33-57, 1998. Maria Lígia Aguiar (UEMS) KRASHEN, S. D. Principles and practice in second language acquisition. New York: Phoenix ELT, 1982. RESUMO: A leitura em uma língua estrangeira (LE) não trata apenas da decodificação de vocabulário, mas da construção de MAINGUENEAU, Dominique. Pragmática para o discurso literário. São Paulo: Martins Fontes, 1996. significados. É processo dinâmico de desenvolvimento e implementação de estratégias e deveria ser entendida como ampliação de conhecimento, instrumento de reflexão crítica e MOITA LOPES, Luiz Paulo. Oficina de Lingüística Aplicada: meio de transformação da sociedade, objetivo último da a educação. natureza social e educacional ensino/aprendizagem de línguas. dos processos de Campinas: Mercado de Letras, 1996. PALAVRAS-CHAVE: ensino-aprendizagem de língua estrangeira; leitura em língua estrangeira; construção de sentidos; interação. VYGOTSKY, L. S. Thought and Language. Cambridge, MA: The M.I.T. Press, 1985. ABSTRACT: Reading in a foreign language does not just mean vocabulary decoding, but rather a meaning construction. WIDDOWSON, H. G. Explorations in Applied Linguistics. It is a dynamic process of developing and implementing Oxford: Oxford University Press, 1979. strategies and should be seen as knowledge improvement, a REFLEXÕES SOBRE A LEITURA EM LE: PONDO FIM À tool for critical thinking and means for society change, utmost 247 educational target. sala de aula tem sido o objeto de estudo de pesquisa já feita na KEY WORDS: foreign language teaching and learning; Lingüista Aplicada que, utilizando os subsídios oferecidos não foreign language reading; meaning construction; interaction. só pela Análise do Discurso como também pela Psicologia e outras ciências, parece estar encontrando repostas mais 0. Introdução satisfatórias do que as dadas pela lingüística teórica tradicionalmente. O objetivo deste estudo é refletir sobre o ensino- Assim, temos a intenção de realizar um breve estudo aprendizagem da leitura em LE e, particularmente, sobre a dessas contribuições e refletir sobre elas. Vemos, hoje, a leitura forma como têm sido tratadas as atividades de leitura propostas em LE ainda ser feita seguindo um método, no momento, por nos textos de livro didático usados na aula de LE, exemplo, de sua apresentação por meio de group e individual especialmente daquilo que se pode entrever nas instruções dos repetition e, após a apresentação, no trabalho de simples seus manuais de professor e da observação na prática. Existem decodificação de palavras isoladas do texto, quando então é muitas dificuldades a serem enfrentadas pelo professor de LE comum proceder-se a uma forma de reading comprehension na realização do trabalho com a leitura do texto em sala de que não explora os sentidos do texto e nem se compromete com aula. Cremos que estas sejam causadas pelo confronto entre as o seu autor. Numa forma incompreensivelmente banalizadora concepções de língua e de ensino de LE contidas nos livros do entendimento do aluno, tecendo perguntas cujas respostas didáticos e as tradições de ensinar e aprender LE dele mesmo, são óbvias demais e propondo atividades que, geralmente, professor, e dos alunos - associadas que foram por tanto tempo limitam-se à localização do respectivo grammar focus no texto, às práticas do método da gramática-tradução, conforme nos o professor tem seguido esse tipo de método, utilizando o texto ensina Almeida Filho (1993). Não obstante, o trabalho de geralmente apenas para ensinar a gramática. Importa salientar conscientização de um ensino mais adequado com o texto em que não nos detemos aqui na diferenciação entre abordagem, 248 método e técnica, visando uma simples colocação do problema entre professores, pesquisadores de campo e pesquisadores restrito ao escopo deste estudo; de qualquer forma, para uma teóricos, pois a prática pode e deve ser ponto de partida para a discussão mais detalhada da questão, remetemos o leitor aos teoria e vice-versa, argumentando aliás, a esse respeito, que trabalhos realizados por Brown (1994) e Almeida Filho (1993). teoria alguma se esforça por ser prática, por não fazer parte de Diante do conceito de que a leitura é uma atividade sua natureza. que deveria levar o leitor a tirar do texto o sentido pleno, temos Widdowson (1979) afirma ter feito seus estudos sem a concepção de que o trabalho do professor de LE deveria saber se trariam ou não soluções efetivas aos problemas da caracterizar-se por uma orientação mais comprometida com os área, mas que julgava suas reflexões válidas mesmo assim, processos de mudança necessários à construção de uma porque elas poderiam ajudá-lo (e aos que o lessem) a olhar a sociedade mais crítica. Temos claro que as concepções de sua prática com outros olhos. Cita os versos de Elliot, sobre homem, educação e sociedade influenciam a prática do esse aspecto: “We shall not cease from exploration/ and the end professor de LE, e discutimos, portanto, a respeito das suas of all our exploring/ will be to arrive where we started/ and possibilidades de atuação com a habilidade da leitura. know the place for the first time” (T. S. Elliot, Little Gidding) Desse modo, cientes de que esse estado de coisas tem ou seja, “Não paramos nunca de colher de nossas explorações/ origem na tradição de métodos de ensino do século passado, é e o fim de todas elas/ será chegarmos ao lugar de onde saímos/ nosso intuito realizar uma reflexão a partir do que temos e encontrado na prática. (WIDDOWSON, 1979, p.ii). Chega, igualmente a Krashen, à conhecê-lo como se fosse pela primeira vez” afirmação de que os dois campos – teoria e prática - deveriam 1. A dicotomia teoria/prática no ensino de LE formar o caminho da profissão de ensinar. Perder-se-ia se assim não fosse. A teoria parte da Krashen (1982) já alertara para o perigo da tripartição prática, mas distancia-se em seguida e, quando ela retorna, faz 249 com que a vejamos com outros olhos. Olhos agora, voltados (MOITA LOPES, 1996:20). para a consciência daquilo que faz em sala de aula de LE e o No intuito de mediar subsídios teóricos da Análise do porquê desse fazer. No que concerne à pesquisa em LE, não Discurso, assim como de outras ciências, para a LA, este mais se concebe o professor que não seja reflexivo e crítico, estudo, enfim, insere a reflexão sobre alguns de seus conceitos, como bem explicam Barcelos e Vieira Abrahão (2006). em especial o de sociointeracionismo. Com base em Este estudo tem, pois, a intenção de realizar um concepções propostas por Coracini (1995), Kleiman (1991), levantamento daquelas que constituiriam algumas das bases Almeida Filho (1993), Moita Lopes (1996) entre outros, que teóricas nas quais alicerçar um ensino-aprendizagem bem- alertam para a importância de empreendermos um balanço do sucedido de leitura em LE. Em razão disso, fomos buscar na que tem sido efetivamente conseguido com a leitura em LE até abordagem comunicativa atual à leitura em LE, sinais de então e para a importância de se trabalhar com um conceito de direcionamento teórico que a fundamentasse, via Lingüística linguagem relacionado ao contexto sócio-cultural e histórico no Aplicada (LA), no sentido que Moita Lopes (1996:20) define: qual ela está inserida, verificamos que a prática dessa “a LA é uma ciência social, já que seu foco é um problema de habilidade precisa mudar se o objetivo for um ensino mais uso da linguagem enfrentado pelos participantes do discurso no significativo e menos mecânico. Suas visões de língua, ensino e contexto social, isto é, usuários da linguagem (leitores, aprendizagem influenciaram toda a concepção de como escritores, falantes, ouvintes) dentro do meio de ensino- trabalhar com a habilidade da leitura em sala de aula. Em aprendizagem e fora dele”. Outro princípio pertinente a este outras palavras, buscamos fazer um recorte interdisciplinar e tipo de investigação é o fato de se constituir em pesquisa que não apenas utilizar, portanto, a lingüística teórica. Trata-se de focaliza a linguagem do ponto de vista processual e que trata um estudo qualitativo, cuja meta é alcançar uma maior “dos tipos de competência e procedimentos de interpretação e compreensão daquilo que realmente produção lingüística que definem o ato da interação lingüística” professor de LE, caracterizando, assim, o tipo etnográfico. ocorre na prática do 250 Defende, portanto, a idéia de que não é possível 2. A questão da ação do inconsciente na constituição do sujeito explicar as relações entre teoria e prática, sem considerar o dentro do ensino de LE sujeito e sua constituição psicanalítica e social. Levando em conta, desse modo, o sujeito inconsciente, afirma ainda que “o A influência direta, no ensino de línguas, da visão estruturalista da linguagem como um conjunto de hábitos lingüísticos, mascarou por muito tempo o potencial da leitura em LE. Coracini (1998) traça a seguinte conclusão, após análise de textos teóricos, aulas gravadas e opiniões de professores e alunos sobre leitura e escrita: inconsciente fala pelo sujeito; revela, pela opacidade da linguagem, o que, conscientemente, ele desejaria abafar; faz emergir o indesejável, o estrangeiro que habita em nós...” (CORACINI, 1999:167). Este é o peso de elemento ideológico do inconsciente, e aqui a LA faz a mediação com a Psicologia, com seus métodos e objeto próprios. É o que se pode verificar quando deparamos com a seqüência tradicional: leitura em voz alta, estudo do vocabulário, repetição, interpretação (ínfima), A prática não é a aplicação direta de dados tradução. Concordamos, portanto, com Coracicni (1999) teóricos: a relação com a teoria não é tão quando afirma que “há predominância da visão estruturalista e simples quanto alguns lingüistas aplicados da tradicional nessas atividades de leitura”, e questiona: parecem acreditar devido à ação do inconsciente na constituição do sujeito. (CORACINI, 1998:33) É preciso que a escola entenda que produzir texto significa produzir sentido (no momento da leitura e/ou no momento da escrita) e que isso é muito mais do que reproduzir ou 251 repetir o que a escola ou o professor querem As teorias do discurso e da desconstrução ouvir ou ler (CORACINI, 1999:174). que compartilham a concepção de sujeito psicanalítico, - isto é, atravessado pelo inconsciente e, por isso mesmo, impossibilitado de se conhecer e de conhecer A resposta ao questionamento feito sobre o que o outro, - de se controlar e controlar o outro, encontramos na aula de leitura em LE hoje estaria, então, já que é fragmentado, esfacelado, emergindo naquilo que podemos inferir da seguinte pergunta de Coracini apenas pontualmente pela linguagem, lá (1999:14): “Como nos esvaziar dos sentidos que, numa trama onde se percebem os lapsos, atos falhos, densa, tecem nosso inconsciente, nossa subjetividade, sem, ao chistes... faze-lo, (re)produzir novas ilusões, (re)apresentar novos engodos?” E acrescenta sermos “...não só sempre dominados (embora às vezes aparentemente dominadores), como também não existem soluções para os problemas apontados,” O foco, então, “deve estar na investigação da concluindo que “é conflituoso”. Mas essa nada mais é que uma interação entre o aprendiz e o professor como sendo geradora característica do próprio discurso. Assim, talvez apenas de aprendizagem,” como afirma Moita Lopes (1996:90). Por devêssemos mostrar os conflitos e as negociações nesse outro lado, na perspectiva de desconstrução de Arrojo (1992), processo com que nos envolvemos no ato de ensinar leitura. temos que “o objeto não pode ser independente do sujeito, nem Sobre a ação do inconsciente na constituição do sujeito, separado Coracini (1999:11) afirma: acrescentando: deste por uma barreira de neutralidade”, 252 Sujeito e objeto são desmascarados em sua 3. Ensino de LE como sinônimo de adoção de livro didático relação simbiótica: ao mesmo tempo em que o cria, a partir de seu contexto, de suas circunstâncias e de sua psicologia, o sujeito também é criado e influenciado pelo objeto. Ou seja, como uma espécie de psicanálise, a leitura desconstrutivista pretende desnudar, Almeida Filho (1993:40) afirma que “ensinar uma LE é hoje quase sinônimo de adotar e seguir os conteúdos e técnicas de um livro didático”. Faz, porém, a ressalva de que: entre outras coisas, o desejo que se esconde por trás da necessidade de se manter objetivamente separados sujeito e objeto, homem e realidade, leitor e texto. (...) Quase todos [os livros didáticos] prometem “comunicação” na língua-alvo. Essa postura se opõe ao ensino de significados veiculados no discurso (...) e De todo modo, entre nós, a reflexão desconstrutivista ainda não se infiltrou nos paradigmas que vemos na prática, em que se percebe o professor ainda bastante imerso no esforço de sistematização vindo de um estruturalismo que parece ter criado raízes. retém comumente (e não exclusivamente) uma visão behaviorista das técnicas para a apresentação e a prática. (...) Na ausência de massa crítica dentre o professorado de línguas, a dependência do livro didático e suas receitas se torna maior. 253 Na análise de cenas do nosso cotidiano de ensino com os diferentes estilos de aprender” (ALMEIDA FILHO, hoje, Almeida Filho (1993:41) destaca “o material de ensino 1993:43). É interessante destacar também a necessidade de construído para o livro didático que não provoca, não abrirmos espaço para o diálogo entre as diferentes culturas. O problematiza e nem informa”. Adiante, em outra cena: próprio tão comentado processo de globalização pede que “exercícios mecânicos que não levam a verdadeiras ações de respondamos a esse desafio que é esse diálogo. Aliás, esse fazer algo significativo com a LE” (id.,ib.:41), e em outra diálogo deveria nos levar não apenas às questões de caráter ainda: “técnicas de fácil manipulação como repetições, cultural, mas também ao passado, à maneira de “ler” a história, transformações e perguntas-e-respostas que desconsideram o às vezes construída em torno de visões nacionalistas. Nesse envolvimento pessoal e as oportunidades de se trocarem modo se ver, o que é incomparável torna-se possível. O informações novas e autênticas”(id.ib.:42-43) tece, então, fechamento das leituras deve ser, então, evitado, buscando-se alguns significados do professor comunicativo (como desejado não “comparar o incomparável”. Coracini (1999:106) salienta hoje, pela maioria das tendências teóricas), a partir de posturas que “toda proposta pedagógica em LE veicula um ponto de como crer que “a significação e relevância das mensagens vista sobre o que seja ensinar e aprender uma língua, o que contidas nos textos, diálogos e exercícios para a prática de significa que a toda proposta pedagógica subjaz uma certa língua que o aluno reconhece como experiência válida de ideologia; todo manual que se encontra na base da prática transformação e crescimento intelectual; (...) a representação de docente não é inocente, nem neutro, e isso não é explicitado. temas e conflitos do universo do aluno na forma de problematização e ação dialógica” (id.ib.:43). Tem o autor a crença de que ser comunicativo tem a ver com dar “a devida atenção a variáveis afetivas tais como ansiedades, inibições, empatia com as culturas dos povos que usam a língua-alvo e A visão de linguagem que subjaz às atividades de leitura propostas na maioria dos livros didáticos enfatiza o desenvolvimento de uma competência na língua-alvo baseada em habilidades lingüísticas, com especial destaque para aquelas em que parece não haver espaço significativo para qualquer 254 questionamento, discussão ou argumentação sobre a atividade interação, ou seja, nem (só) no aluno, nem (só) no professor. com que estão trabalhando. Parecem mais interessados em que Mas sim no espaço entre os dois, ou seja, no discurso. Discurso o professor esteja atento ao uso correto da língua pelo aluno. que, Para além da forma e das funções da linguagem, há fronteiras a “reconhecimento da dualidade constitutiva da linguagem, isto é serem ampliadas, em que a linguagem poderia ser vista , no seu caráter ao mesmo tempo formal e atravessado por reflexivamente. A linguagem trazida por eles poderia, desse entradas subjetivas e sociais”. A interação é para a autora, modo mediar a interação dos alunos nos eventos comunicativos portanto, a linguagem enquanto discurso, que: conforme bem diz Brandão (1995:11) está no que efetivamente fazem parte de sua realidade, ou seja, da comunidade discursiva à qual pertencem. “não constitui um universo de signos que serve apenas como instrumento de 4. O “hot spot” do Inglês Instrumental e a interação em sala de comunicação ou suporte do pensamento. (...) aula de LE [A linguagem enquanto discurso] é um modo de produção social; ela não é neutra, inocente (na medida em que está engajada O ensino de inglês instrumental (English for Specific Purposes) atenderia a uma suposta recomendação básica do ensino moderno do inglês do ensino centrado no aluno. Ocorre que o ensino moderno, apoiado nos pressupostos da Análise do Discurso para a Lingüística Aplicada, deveria centrar-se na numa intencionalidade) e nem natural, por isso o lugar privilegiado de manifestação da ideologia. Ela é o sistema-suporte das representações ideológicas, (...) é o ‘medium’ social em que se articulam e defrontam agentes coletivos e se 255 consubstanciam relações interindividuais” metodologia centrada no aluno, nas suas (BRANDÃO, 1995:11). motivações, interesses e necessidades. Então, aprender uma língua estrangeira implicaria não apenas reter estruturas verbais De fato, de acordo com Moita Lopes (1996), o conhecimento é construído conjuntamente em sala de aula através de um processo que envolve controle, negociação, compreensão e falhas na compreensão entre aluno e professor até que possa fazer parte do conhecimento compartilhado na sala de aula. Na visão da psicologia cognitivista, o ensino em geral não pode estar desvinculado da aprendizagem, na medida para repeti-las, automaticamente, no momento oportuno, mas, sobretudo, agir sobre o objeto de ensino para ‘capturar’ o seu sentido e o seu funcionamento, de modo a ser capaz de interagir com o outro ou com o dizer do outro, com a cultura do outro (CORACINI, 1999:105-106). em que ele só terá sentido se estiver a serviço da aprendizagem. Conforme afirma Coracini (1999:105), na verdade: Desse ponto de vista, ensinar leitura em LE, portanto, quer dizer criar condições para que essa interação aconteça, A pedagogia de línguas estrangeiras viu-se diante da necessidade de alterar o seu enfoque: de uma pedagogia centrada no método e no saber (retenção do conteúdo transmitido) passou-se a propor uma possibilitando desse modo que conceitos já adquiridos defrontem-se com situações lingüísticas e culturais novas, resultando em aprendizado cognitivo do aluno. 256 5. A questão da “primazia” da habilidade da leitura sobre as demais dentro do ensino de LE O usuário de língua, ao falar, faz uso dos gestos, da expressão, da emoção, da entonação e do contexto para ajudar. Na leitura, não. Assim, quando mostra ilustrações, gráficos ou Com a leitura, temos condições de realizar diversos tipos de atividades como: atividades preparatórias (ativação do vocabulário, apresentação prévia do assunto, perguntas anteriores à interação), discussão prévia sobre aspectos tablelas, o professor (ou o livro didático) está auxiliando. Em outras palavras, com as outras habilidades, isto se tornaria mais difícil. Há ainda que se considerar o que Maingueneau (1996:39) preconiza: culturais e sobre os temas a serem analisados. Buscamos com isto mostrar ao aluno que, mesmo com um conhecimento lingüístico limitado, é possível compreender o texto. Ao utilizar as estratégias de leitura e compreensão, tais como a identificação da idéia central, inferir os significados das palavras pelo contexto, trabalhar com pistas oferecidas, entre outras, é possível ao aluno realizar o entendimento do texto. Isto só a leitura pode proporcionar, visto que ela é fixa, e não como a fala, que se esvai. Além disso, o desenvolvimento da habilidade da leitura de textos em LE oferece a possibilidade de A leitura é atividade cooperativa que leva o destinatário a tirar do texto o que o texto não diz, mas pressupõe, promete, implica ou implícita, a preencher espaços vazios, a ligar o que existe num texto com o resto da intertextualidade, de onde ela nasce e onde irá se fundir (MAINGUENEAU, 1996:39). aumentar o conhecimento. Assim, desenvolver as estratégias de leitura (que nada mais são do que planos para resolver problemas encontrados na construção do significado do texto) Assim, devemos ter em mente os princípios teóricos transforma-se em uma grande ajuda aos alunos, que podem propostos por Bakhtin (1895-1975) e Vygotsky (1896-1934), almejar (e conseguir) a sua autonomia. 257 que trouxeram uma visão mais socializada da sala de aula. O sala de aula. Assim como identificar o momento, ou seja, o aluno passou a ser agente ativo na construção do conhecimento quando e também o local (ou o onde) está se desenvolvendo o e o fator sociohistórico foi realçado dentro do contexto da sala processo de socioconstrução do conhecimento. Há ainda que se de aula. Suas posições foram essenciais para essa nova visão do compreender o porquê desses participantes se encontrarem ser humano, a de ser pensante e ativo, instituindo uma unidos nesse processo educacional. Só assim torna-se possível educação mais significativa para professor e aluno e para o uma abordagem sociohistórica da sala de aula de LE. Desse contexto escolar. modo, essa perspectiva centra-se em cada indivíduo presente em um dado momento particular de socioconstrução de conhecimento, como também na sua relação com o outro na 6. As contribuições de Bakhtin e Vygotsky para a visão social da aula de LE interação. Essa visão sociohistórica de conhecimento e da sala de aula, portanto, afirma que o outro exerce papel fundamental, de acordo com as perspectivas teóricas de Vygotsky (1985) e Bakhtin (1995), cujas idéias muito contribuíram para o desenvolvimento de uma nova forma de entender o processo de A visão sociohistórica da sala de aula de LE teve origem nos postulados dos pensadores russos Bakhtin e Vygotsky, ao privilegiarem a interação, assim como a importância que o outro possui no processo de construção do conhecimento. Num espaço historicamente localizado como é a sala de aula de LE, entender quem são os participantes da interação pedagógica é crucial para que possamos entender essa ensino-aprendizagem. Assim, vemos que os diversos estudos hoje realizados em sala de aula têm salientado a necessidade da criação de contextos interacionais em que os alunos e professores construam, conjuntamente, significados sobre o mundo no qual estão inseridos, tanto o interno quanto o externo à sala de aula. 258 A construção desse mundo se faz por meio da interação com o outro pela linguagem. Por sua vez, a linguagem é considerada a característica fundamental do homem enquanto ser social que é. Dessa forma, ao mesmo tempo em que o sujeito é influenciado pela sociedade que o cerca, ele vai também transformando-a e reconstruindo essa mesma sociedade. O mesmo ocorre na sala de aula, local em que, ao mesmo tempo em que o aluno constrói o seu conhecimento, vai igualmente contribuindo para a coconstrução do conhecimento dos outros participantes da interação, que são o professor e os outros alunos. Nesse ambiente, então, o aluno não pode ser visto como um produto apenas desse contexto escolar, mas como um agente ativo na construção desse mesmo contexto. Assim, devemos entender a educação como um processo de construção de conhecimento compartilhado e construído por uma ação conjunta de todos os participantes da interação em sala de aula. Pensamos ser correto concluir que há eficácia na abordagem interacionista no ensino da leitura em LE, uma vez que temos clara a concepção de que todo o homem se constitui como ser humano pelas relações que estabelece com os outros, e de que estamos inseridos em um tempo e um espaço em dinâmica constante. Desde o nosso nascimento, somos socialmente dependentes uns dos outros e entramos em um processo histórico. É por meio desse processo que formamos nossa visão de mundo e que construímos sentidos sobre ele. Só com a participação dos outros é que conseguimos nos apropriar do patrimônio cultural da humanidade, e construir nossa história, ou seja, as diversas visões de mundo com as quais o indivíduo convive e que vão transformando o homem no decorrer de sua vida e deixando marcas de sua própria história nele. Essa discussão teve origem em Vygotsky e Bakhtin, e vem sendo aprofundada desde então. Este breve estudo sobre a questão da leitura em LE procurou alçar o trabalho com esta atividade em sala de aula a um patamar mais alto do que tem 7. Considerações finais sido permanecido, esperando contribuir para uma visão mais crítica da realidade do ensino-aprendizagem da LE. Entre os 259 aspectos práticos relevantes para que o ensino de LE tenha êxito está, sem dúvida, o fato de que o uso e da forma da língua BARCELOS, Ana Maria Ferreira & VIEIRA ABRAHÃO, a ser ensinada devem estar contextualizados e a constatação de Maria Helena. Crenças e ensino de línguas: foco no professor, que o aprendizado de uma LE por meio da leitura é importante no aluno e na formação de professores. Campinas: Pontes, porque torna possível um contato com novas culturas e novos 2006. conhecimentos. BRANDÃO, Helena H. Nagamine. Introdução à Análise do Discurso. 4.ed. Campinas: Editora da UNICAMP, 1995. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALMEIDA, FILHO, José Carlos Paes. Dimensões comunicativas no ensino de línguas. Campinas: Pontes, 1993. BROWN, D. H. Teaching by Principles: na Iinteractive Approach to Language Pedagogy. Englewood Cliffs, New Jersey: Prentice Hall Regents, 1994. CORACINI, Maria José Rodrigues (Org.) O jogo discursivo na aula de leitura: língua materna e língua estrangeira. Campinas: ARROJO, Rosemary (Org.). O signo desconstruído: Pontes, 1995. implicações para a tradução, a leitura e o ensino. Campinas: Pontes, 1992. _____. A produção textual em sala de aula e a identidade do autor. In: CORACINI, Maria José. Interpretação, autoria e BAKHTIN, M. Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo: Hucitec, 1995. legitimação do livro didático. Campinas: Pontes, 1999. 260 _____. A teoria e a prática: questão da diferença no discurso sobre e da sala de aula. São Paulo, D.E.L.T.A. v. 14, n. 1, p. Mesa 14 33-57, 1998. VIda Cachoeirinha: um cenário de sonho Danieli Tavares (G-UEMS) KRASHEN, S. D. Principles and practice in second language acquisition. New York: Phoenix ELT, 1982. Uma Análise Sobre Atividade de Leitura em Língua Inglesa Bruna Bonancin Torrecilha Lopes (G-UEMS) MAINGUENEAU, Dominique. Pragmática para o discurso literário. São Paulo: Martins Fontes, 1996. Os Livros mais Vendidos: um estudo sobre a recepção como imposição às escolhas e gosto do público leitor MOITA LOPES, Luiz Paulo. Oficina de Lingüística Aplicada: a natureza social e educacional dos processos Daniele Alves Silva (PG/UEMS) de ensino/aprendizagem de línguas. Campinas: Mercado de 20:00 às 21:30 hs. Mesa redonda Letras, 1996. Questões de Discurso e de Gênero VYGOTSKY, L. S. Thought and Language. Cambridge, MA: The M.I.T. Press, 1985. O “Novo” domesticado: gênero como ritual da formulação diante do acontecimento discursivo no jornalismo WIDDOWSON, H. G. Explorations in Applied Linguistics. Oxford: Oxford University Press, 1979. Prof. Msc. Wedencley Alves Santana (UNICAMP\CAPES) 261 O “NOVO” DOMESTICADO: GÊNERO COMO RITUAL DA FORMULAÇÃO DIANTE DO ACONTECIMENTO DISCURSIVO NO JORNALISMO Wedencley Alves Santana (UNIVERSO) Pensar as práticas da mídia por uma análise de discurso, é pensar o lugar da mídia no processo de produção e constituição político-simbólicas, diferentemente das teorias sociais, nas suas múltiplas linhas, que buscam os processos de manutenção e transformação social. A AD se mira reprodução/transformação dos nos processos discursos, de enquanto materialidade ideológica. Ajuda a compreender também como se dá o acontecimento da textualidade – quando, de acordo com Orlandi (2001b, 65) a função autor “constrói uma relação organizada produzindo um efeito imaginário de unidade (com começo, meio progressão, não contradição e fim”) – sobre uma base lingüística ou simbólica qualquer. 262 Quando diante do objeto mídia, a AD poderá, como esses personagens são entrevistados, no recurso ou portanto, nos trazer o modo do funcionamento discursivo dele, rejeição de certos documentos, na apreciação ou silenciamento como ela, a mídia, opera sobre outros sentidos sociais, como se de certos dados. dão seus gestos de interpretação e, diante de seu amplo papel Trata-se já de uma prática discursiva, em que de referência social, como estes vão desencadear gesticulações geralmente aquele jornalista posicionado como veiculador de e/ou gestualizações na produção e na leitura. verdade, já aponta para a produção de um texto eminentemente Aqui nessa apresentação, objetivamos empreender um parafrástico. diálogo com as ADs que trazem reflexão sobre gêneros, mas Depois da seleção dos “dados”, passa-se à ordenação. propondo ver a notícia como um ritual de formulação, cuja É aqui possivelmente que o sintoma daquela formação prática discursiva é constituída a partir de uma formação objetivista se torna mais forte: A idéia de pirâmide invertida, discursiva, que se constitui no momento histórico da pirâmide truncada ou paralelepípedo, entre outras figuras, aproximação entre o jornalismo e saberes epistêmicos, de fundo remetem evidentemente à geometrização do texto jornalístico. cientista. Que por sua vez remete ao prestígio que os discursos Essa FD, a objetivista, com a qual boa parte se não estáveis das matemáticas. Jornalistas acreditam que atendem maioria dos jornalistas se reconhecem como sujeitos do nesse processo de levantamento e seleção de dados, discurso, tem como efeito formulações/textualizações mais ou documentos e depoimentos, a critérios de relevância. menos estandardizadas, e que tem como efeito-retorno a própria dominância da paráfrase sobre a polissemia. São muitas as discussões sobre os critérios de noticiabilidade, ou de relevância para a produção de conteúdos Lembramos que a formulação/textualização da jornalísticos. Esquece-se, no entanto, que estes conteúdos já notícia começa já na pauta, na escolha dos temas, na escolha foram pré-moldados, já se encontram com seus contornos das perguntas, no tempo dedicado a cada entrevistado, na forma estabelecidos, e se enquadram no espaço do dizível já previsto 263 no relato jornalístico. Em outras palavras: na notícia, os fatos já pela idéia de pirâmide – a mesma usada como ícone de são tomados como objetos de discurso mesmo antes de estatísticas sociais por exemplo, geometrização e controle de acontecer. dados. Os critérios de relevância são determinados por tantos Sob o rigor da figura piramidal, o jornalismo fatores que, se relacionados, mais do que definir o que é encontrou finalmente um espaço entre os discursos estáveis, notícia, trariam mais confusão. Não são os critérios de com reconhecimento positivo. Mas não é só isso. O lead relevância que definem a notícia. Até porque a notícia é uma apresenta de forma sintética uma informação que depois será forma de organização textual que remete a práticas discursivas desenvolvida em suas particularidades. O acidente e a morte, intercambiáveis na história. sem A ênfase sobre os critérios deve ser abandonada para se perguntar por que a relevância? Na verdade a própria pergunta pelos critérios de a placa e a localização específica, a decisão governamental, sem as considerações amiúde, o resultado do jogo sem o passo a passo da partida, é a função do lead. Por isso a apresentação por meio de seis perguntas básicas. relevância deve ser compreendida como um sintoma da A forma de raciocínio que vai do geral para o necessidade dessa prática discursiva de promover uma particular é o dedutivo, própria às matemáticas, e que com o hierarquização dos fatos, que se estabeleceu a partir da crescimento do seu prestígio acabou sendo o modus operandis chamada pirâmide invertida. básico da lógica moderna. Mais do que uma operação retórica, A ênfase das discussões sobre o jornalismo vem parece-nos que os critérios de relevância, seja em pirâmides recaindo sobre o termo errado: o problema não é o fato de ser invertidas ou outra figura geométrica aponta para o invertida (invertida em relação a um padrão de narrativa, que desenvolvimento dedutivo dos dados, e é por isso que parece teria abertura, problema e solução, mas que evidentemente não tanto ser mais natural e óbvia. compreende a totalidade de todas as narrativas), mas a obsessão 264 A humanização do parágrafo, o início por questões, ou contrastes, a exemplificação e a parábola, formas de mais noticiável por interesses do próprio veículo e daquilo que deve um tanto quanto escondido. abertura que encontram lugar nas chamadas reportagens E assim se organiza o mundo dos homens, (feature), ainda é menos comum entre os textos noticiosos. classificando-os, como se fossem objetos de uma ciência Poderia ser uma variante do discurso padrão. Mas em verdade natural. Mas e a notícia? O efeito interdiscursivo sobre a notícia não é, na medida em que ela serve apenas como “um é o de lhe conceder elementos cujo resultado é a evidência e a aperitivo”, para que as mesmas perguntas sejam respondidas. garantia de verdade, sem o qual a notícia perderá seu caráter de A noção de ordenação se estende à definição do que deve e pode constar numa “matéria principal” e o que vira retranca estabilidade lógica. ] A ordenação da notícia tende à repetição de uma (texto complementar à notícia) ou boxe (que tem memória discursiva, e o acidente, o acontecimento, só função suplementar à notícia); do que deve ficar no alto e à encontrará sua coerência se relatado dentro desse limite. Nesse esquerda (o lugar hierarquicamente mais importante do momento, os fatos serão feitos: paráfrases de outros fatos, que espelho) e o que deve ficar em baixo do mesmo lado (o lugar remetem a outros fatos, todos dotados de sentido, sem o qual menos visível aos leitores); do que vai para a página ímpar (as não existiram como tais, na sua aparente unidade. páginas de frente para o leitor) e as páginas pares (na Os fatos, objetos do discurso jornalístico, já estarão seqüência, a segunda a ser lida, obrigando o leitor a carregados de sentido, sem o qual não poderiam ser movimentar os olhos para a esquerda). vislumbrados com elementos de realidade – como em todo É sempre uma organização hierarquizada do mais importante para o menos importante, do mais relevante para o menos relevante, do mais urgente para o menos urgente, do discurso. Mas este efeito de estabilidade da notícia prefigura discursivamente mesmo o imprevisível. O acidente de avião será associado necessariamente a estatísticas que mostram se neste ano houve mais ou menos 265 acidente do que no ano passado. O efeito de realidade dias, através de suítes, análises, comentários, posicionamento incontestável e a eficácia discursiva da notícia está em nunca do veículo etc. dizer não para os sentidos já propostos. Não problematiza como as teorias críticas. Ao final do ano, deverá ganhar as páginas ou as cenas dos principais fatos do ano, nas retrospectivas. E aí será Uma votação para o sistema de governo pode ser lembrado no próximo fato similar como um acontecimento relacionado na cobertura noticiosa a outro plebiscito realizado histórico (a história no jornalismo é a história dos grandes num passado não muito remoto. Mas as motivações históricas acontecimentos jornalísticos e não grandes acontecimentos para o ressurgimento da proposta deve ser analisado, opinado históricos, isto é aqueles que tiveram maior repercussão: trata- por setores específicos do jornal. A notícia informará apenas o se de mais um critério quantitativo). resultado da peleja – com cobertura de números e opiniões devidamente tabuladas Contribui muito Referências Bibliográficas para a domesticação do acontecimento noticioso a repercussão, que passa a ser o Questões de Discurso e de Gênero Publicitário termômetro da importância do acontecimento discursivo. A Profa. Msc. Ana Lúcia Furquim de Campos (UNIFA- repercussão é a demanda de mercado, e deverá ser medida em CEF\UNIFRAN\UNESP) estatística de venda e procura dos exemplares. De novo o fato quantificado. Automaticamente, se a demanda é positiva, a repercussão se alastrará, como um efeito pedra no lago, Questão de discurso e de Gênero de Auto-Ajuda Profa. Dra. Sheila Fernandes Pimenta e Oliveira (UNIFACEF\UNESP) espacialmente por outras mídias, e temporalmente por outros 04\05\2007 266 DISCURSO E METODOLOGIA: TENSÃO NA ANÁLISE12 8:00 às 9:30 hs. Mesa-redonda A No Discurso e texto: Fronteiras e Aproximações funcionamento da linguagem, como veremos, o seu sujeito é constituído por O Funcionamento Textual-Discursivo nos Rótulos em Artigos gestos de interpretação que de Opinião concernem sua Profa. Dra. Maria Angélica Freire de Carvalho (UEZO\RJ) sujeito a Fazendo A AD e o Discurso Mítico Indígena é posição. O interpretação. significar, ele significa. (Orlandi, 2001: 22) Profa. Dra. Nara Sgarbi (UNIGRAN) Marlon Leal RODRIGUES13 UEMS/NEAD/UNICAMP14 Discurso e metodologia: tensão na análise Marlon Leal Rodrigues (UEMS) Introdução 12 Este texto faz parte ampliada de minha tese de doutoramento na UNICAMP, orientada pelo Prof. Dr. Sírio Possenti. Agradeço ao CNPq pela bolsa de doutorado (2002-2006). 13 Professor Adjunto da UEMS – Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, Unidade Universitária de Nova Andradina. NEAD – Núcleo de Estudos em Análise do Discurso. 14 Pós-Doutoramento supervisionado pela Profa. Dra. Eni P. Orlandi (UNICAMP). 267 A proposta neste texto é abordar uma descrição mais A pesquisa tem como objeto o discurso do do que discussão sobre alguns aspectos metodológicos em Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Análise do Discurso de linha francesa desenvolvidas na minha Terra, o MST. Restringe-se à análise dos dissertação editoriais do MST, em sua trajetória de mestrado e, posteriormente, tese de doutoramento. Notas de caminhos e descaminhos. histórica (Boletins no. 1 de 15/5/81 ao JST no. 189 de 5/99 – esta data foi contingência Questões Metodológicas: dissertação do trabalho, início do levantamento), e tem por finalidade levantar o suporte ideológico Segue de forma elementar o objetivo geral da que dá sustentação às atividades práticas e dissertação e sua problemática que de alguma forma já discursivas do Movimento. pressupõe um tipo de entrada na análise: A escolha dos editoriais como objeto de análise justifica-se por serem eles que Este trabalho se inscreve nesse quadro de exprimem, de forma sintética e concisa, as interdições: a exclusão social que impõe orientações, outras formas de interdições, como a da marcadamente ideológicas daquilo que está palavra, a do direito à terra, entre outras. no corpo dos boletins e jornais. Inscreve-se, também, como não poderia A compreensão dos acontecimentos sociais, deixar de ser, pela natureza dos agentes de uma perspectiva ideológico-discursiva, sociais, em um quadro de luta, de poder e de tem dois pressupostos: a presença do sujeito desejo de transformação social ou de – no caso, agente do MST – e a imposição de uma Nova Ordem. materialidade do discurso. O processamento propostas e bandeiras 268 da análise do discurso pode possibilitar a mestrado15: como analisar? O que analisar? Enfim, como verificação da constituição do suporte iniciar a análise? Um dos caminhos, além da orientação ideológico sobre o qual o Movimento se recebida, sustenta, as ideologias que “pulsam” em autores/pesquisadores e procurar entender como eles procediam cada enunciado, em cada texto, em cada as suas análises. Disto extrai algumas lições: o analista precisa palavra de ordem. De acordo com Rodrigues conhecer historicamente o seu objeto de pesquisa porque deste (1999: 1), considerando o comentário a conhecimento vai proporcionar em alguma medida o tipo de respeito da palavra de ordem: análise e sua especificidade, ou seja, o “discurso” (Pêcheux, é de praxe nos movimentos sociais a 2002) a ser analisado: elaborar questões pertinentes ao objeto, elaboração de palavras de ordem como estabelecer um objetivo geral do qual demanda objetivos forma de expressar e dialogar com os demais específicos, determinar qual o tipo de corpus: oral, escrito, o segmentos posição suporte, o “gênero” (Maingueneau, 1993, 2001) etc. Ao pensar propostas, no corpus é importante procurar “visualizar” como consegui-lo, reivindicações, origem do movimento (...) A ter acesso a ele e o que ele pode oferecer de recorte que atenda estrutura lingüística da PO pode ser um as primeiras elaborações/perguntas sobre o objeto. ideológica sociais, concisão marcando das sintagma nominal, sintagma verbal, uma proposição” (Rodrigues, 2001: 21-22). foi ler e estudar as análises de outros De forma muito empírica, ainda no início do mestrado, pesquisei em jornais e em revistas, tudo dos últimos anos. Consegui de doação uma caixa cheia de revistas e jornais Assim, a partir destas considerações iniciais, a metodologia se apresentou como uma questão desde o do SINDET - Sindicato dos Profissionais da Educação de Três 15 Dissertação de Mestrado em Letras, “Introdução ao Estudo da Ideologia que Sustenta o MST”, UFMS – Campus de Três Lagoas (2001), orientada pela Profa. Dra. Sílvia Helena Barbi Cardoso. 269 Lagoas e região, eles possuíam assinaturas. Foi uma caixa se “falava” do movimento. Mas, tive que pensar em outro (cheia) grande do tipo máquina de lavar de roupa, demorei três corpus. meses para recortar, colar e organizar em um arquivo. Além de Em conversas com amigos e comentando sobre a pedir um catálogo de matérias e reportagens de televisão sobre pesquisa, ou seja, das “angústias” de iniciante, uma amiga disse o MST (TV Cultura de São Paulo), a fitas gravadas eram caras que tinha a assinatura do Jornal do MST, fato que não sabia e demais para serem adquiridas. Tive que desistir logo, pois me “animou” de forma considerável além de resolver muitos havia outro problema, teria que transcrever horas e horas de dos meus problemas. Consegui o Jornal do MST (defini o programa de televisão. corpus), faltava a sua abrangência. Faltava definir o gênero: Mas sobre o jornal e a revista, “empolgado” fui seria entrevistas, depoimentos, narrativas, cartas, mensagens, conversar com a minha orientadora e ela com poucas perguntas editorial etc. A primeira etapa foi conseguir o material - ANCA me fez perceber que tudo o que tinha feito era em vão. – Associação Nacional de Cooperativas Agrárias-SP - (do Perguntou: que tipo de corpus? Que tipo de suporte? Se for o boletim nó. 01 de 1981 até a última edição do jornais, pois o jornal ou revista, o que eles oferecem? Entrevistas do MST (o boletim se converteu em jornal) ter contato com ele e movimento falando dele mesmo de forma direcionada) e/ou estabelecer um recorte e abrangência histórica (datas). Já estava entrevistas sobre o MST (alguém falando do movimento). Que definido, escolhi o jornal enquanto suporte, o editorial tipo de jornal/revista: do movimento ou dos meios de enquanto gênero, pois nele continha as metas, os objetivos, as comunicação de massa? Depois colocou outra questão: qual vai questões, as discussões do movimento, o contexto histórico, os ser o gênero do discurso? conflitos entre outras informações, orientações. Enfim, era o Não perdi todo o trabalho porque li o material como “discurso” (Pêcheux, 2002) do próprio movimento. conhecimento do movimento, o que os outros “falavam do Em relação ao período, resolvi que seria a partir do movimento”, o que o movimente “falava” de si e a forma como número um para ser ter uma visão do desenvolvimento 270 histórico do movimento, desde o nascedouro (1981) do que muitas vezes não se manifesta na superfície do enunciado movimento até o momento da pesquisa (1999). ou dos enunciados. Umas das maiores dificuldade foi o recorte dos De acordo com Orlandi16, “não se trata de analisar o “enunciados” (Pêcheux, 2002), mas precisamente a sua enunciado em si, mas sim analisar o que ele silencia”. Estas abrangência (pequeno, médio, grande), depois, o que ele considerações obrigam a elaborar questões aos enunciados poderia oferecer de análise para as questões do projeto, no antes de classificá-los em discursos. No total, classifiquei entanto, deixei-me levar por outros enunciados, seguindo um elementarmente cerca de trinta discursos, dos quais fiquei pouco a intuição e um pouco as questões do projeto. Uma apenas com sete deles, apenas com aqueles que em seu questão metodológica se colocou ao recortar o enunciado: tive conjunto poderia melhor expressar uma traço peculiar do que enumerá-los e fazer referência para ficar fácil de encontrar movimento e se oferecia melhor para análise. Até porque se o contexto caso fosse necessário. Tive que voltar várias vezes fosse analisar todos eles, com certeza não terminaria o seja para fazer um novo recorte, seja para aumentar ou diminuir mestrado no prazo previsto. o enunciado. Uma vez decidido pelos sete discursos, iniciou o Recortei cerca de mil enunciados, depois fui classificando os enunciados em discursos trabalho de indagar os enunciados em suas especificidades enquanto enquanto paráfrases um dos outros em maior ou menor “nível” “paráfrases” (Fuchs, 1982). Foi um trabalho cansativo porque de “sentido” (Pêcheux, 1997), ou seja, aqueles em é que certos enunciados dados as sua especificidade participava de possível classificar como enunciados pertencentes a um mesmo vários discursos. Esta classificação depende em parte do discurso ao ser indagado. Foi o momento também de reduzir o conhecimento do analista (seja de mundo, seja sobre o assunto ou ainda seja um conhecimento sobre questões da ordem do político), pois, envolve um certo olhar “político/ideológico” 16 Comentário feito quando ministrava uma disciplina em Análise do Discurso no IEL – Unicamp em 2004. 271 número de enunciados, ficando somente com os que ofereciam maior possibilidade de análise. Se for uma análise mais pautada nas materialidades discursivas (o que não exclui o caráter histórico), é possível, A análise de forma geral inicia-se já no recorte dos entre outras considerações, analisar a demanda de sentidos, a enunciados, o primeiro momento, no segundo é o da “polissemia” (Orlandi, 199), o tipo de paráfrase, o que se classificação em discurso, já no terceiro momento e mais longo mostra e o que silencia, isto sempre em relação aos outros. é confrontar as questões principais da dissertação (objetivos e Mesmo que seja uma análise com ênfase e mais pautada nas problemáticas) em relação ao discurso a ser analisado, é um materialidades discursivas, este fato não exclui a historicidade, momento lento que dependo de duas questões básicas: a ou seja, aquilo que Pêcheux (2002), concebe como “redes de primeira diz respeito a “habilidade” (Eni, 1999) com que o memória”. analista trabalha a teorias e a segunda, o nível de conhecimento É importante ressaltar o equilíbrio entre as duas técnico ou de mundo que o a analista possui sobre o “tema”, abordagens analíticas. Importa, de acordo com Orlandi (1996: isto de acordo com tipo de análise que ele pretende. 23) considerar “a relação entre o tipo e funcionamento é um Se for uma análise de abordagem mais histórica (o instrumento decisivo para o analista, pois, em grande parte, a que não exclui a “materialidade discursiva” (Pêcheux, 2002)), sua tarefa (explícita ou implícita) é distinguir modelos de procurar a relação do discurso em questão com outros discursos discursos” a partir de dois pontos: a primeira diz respeito às históricos e ver qual o tipo de relação que há entre ambos, questões e perguntas que o analista precisa elaborar, a segunda também analisar a “posição sujeito” (idem), os sentidos é observar o que o próprio recorte “oferece” ao analista para possíveis, “deslocamentos” (idem), aquilo que faz que o além de suas questões e perguntas e outras questões, pois, na discurso seja igual e ao mesmo tempo diferente, ou seja, quais linearidade dos enunciados, a cada “palavra” (Pêcheux, 1997), os sentidos que permanecem e o sentidos que deslizam para ser a cada sintagma, a cada fragmento sempre há possibilidade de tornar um outro. “algo” soltar aos olhos do analista. 272 No momento de analisar o discurso ocorre outro fato importante a ser considerado, de alguma forma o próprio ter terminado as análises e considerações, explicitar detalhadamente foi e ainda é uma questão de reflexão. discurso coloca questões para o analista, umas mais explícitas, Com estas considerações finalizo ainda que de forma na superfície discursiva, outras mais complexas, que depende insatisfatória as questões metodológicas da dissertação de de elaborações hipotéticas que poderão ou não ser sustentada mestrado. de acordo com a argumentação do analista. Em alguns momentos pode ocorrer a “tentação” de forçar os dados na Questões Metodológicas: doutorado teoria ou vice-versa para tentar legitimar a análise, é sempre um perigo para o analista considerando que analisar é também Se no tópico anterior as considerações foram post trabalhar “na tensão das relações significativas” (Orlandi, 2001: scriptum uma vez que foi feita após a dissertação, este tópico já 13). é um recorte na íntegra (salvo raras correções, ampliações e Assim, gostaria de comentar que apesar da descrição especificações que visão melhorar a questão) de tese de forma até aqui parecer esquemática como se tudo estivesse pensando, que serão feitas apenas algumas considerações breves sobre o organizado previamente, a questão metodológica foi se recorte e objetivos. seguindo mais ou menos de forma intuitiva na tentativa de encontrar “caminhos” e tentar sistematizar ou padronizar uma Segue, de forma elementar, as considerações a respeito da problemática e dos objetivos da tese: forma de analisar, uma forma de se deparar com os discursos e enunciados a partir das questões prévias e a partir das questões O que os próprios discursos e enunciados colocavam a cada discursivo não é um fato rotineiro, nem indagação. Isto é tão flagrante que o tópico metodologia ficou intencional e nem mesmo elaborado, mas resumido a poucas linhas de forma sintética, pois, mesmo após constituído surgimento no de bojo um das acontecimento relações de 273 reprodução/transformação das relações de no Brasil, outras questões se põem: a) que produção (Pêcheux, 1997: 191) sociais nas condições materiais de existência histórica quais se dão os processos discursivos (idem, propiciaram 161): um discurso novo é constituído no Considerando esse surgimento uma ruptura bojo das relações sociais políticas dadas as em relação aos discursos anteriores na luta condições de produção (Pêcheux, 1969: 75). pela terra, como se deu essa ruptura? c) Nesse sentido, o objeto específico de estudo quais acontecimentos históricos a sua volta desta pesquisa é o discurso da Reforma propiciaram sua irrupção? d) Na mesma Agrária pela Ocupação, suas condições de medida, quais acontecimentos a sua volta irrupção, materialização tentaram evitar sua irrupção? e) quais temas, discursiva e seu efeito de sentido em relação objetos, controle de sistema o constituíram a pelo em seu repertório discursivo? f) quais operariado, por exemplo. Considerando que enunciados colocaram em prática “todo jogo o surgimento de um discurso não é de regras” que definem o que pode e o que acontecimento corriqueiro, proponho duas não se pode constituir como elemento do questões. A primeira diz respeito ao fato de discurso? esse discurso ser novo17. E como um Estas são algumas das perguntas que discurso novo na história da luta pela terra norteiam a análise do discurso de Reforma outros sua forma discursos de já inscritos, seu surgimento? b) Agrária pela Ocupação e as condições de 17 A questão de o discurso do MST ser novo ou não foi inicialmente abordada de forma introdutória na minha dissertação de mestrado (2001). Faço uma retomada dessa questão. A minha posição permanece a mesma: o MST funda um discurso novo. existência do MST (Rodrigues, 2007: 1819). 274 212). Os recortes do discurso em enunciados “não chegam a Analisar discursos possui um princípio norteador: constituir um sistema, pois perdem sua “evidência” toda vez “toda descrição abre sobre a interpretação” (Pêcheux, 2002: 54) que questionamos sua validade. Os recortes são sempre e/para que “através das descrições regulares de montagens interpretativos” (idem, p. 213). discursivas, se possam detectar os momentos de interpretações A Análise do Discurso, no entanto, não possui uma enquanto atos que surgem como tomadas de posição [do metodologia específica, um modelo, um esquema já dado que analista] reconhecidas com tais, isto é, como efeitos de permita ou pudesse apenas “enquadrar” os dados, nem uma identificação assumidos e não negados” (idem, 57). Para forma de trabalhá-los. Isso significa que cabe ao analista adotar Pêcheux (2002: 57), a interpretação é “uma questão de ética e “princípios e procedimentos” (Orlandi, 1999: 59) a partir das política: uma questão de responsabilidade”. Para Orlandi perguntas e dos objetivos em relação aos dados. A construção (1999: 64), a interpretação é uma questão de “capacidade de dispositivos (id.) de análise é condição, a princípio, para analítica do pesquisador, pela habilidade que ele pratica a desenvolver um conjunto de práticas sobre os dados, de formas teoria, face a sua responsabilidade teórica”. A interpretação se de trabalhar os dados que por fim se constituem em constitui procedimentos metodológicos. a partir de determinados procedimentos metodológicos, por mais elementares que sejam, como recortar um enunciado a ler e elaborar uma pergunta a seu respeito. Talvez seja óbvio, mas analisar discurso coloca em questão o que analisar, primeiro passo metodológico, que se Considerando que o discurso “é concebido como um desdobra “automaticamente” em algumas perguntas a fazer, um fenômeno observável, um objeto empírico, constituído de uma objetivo a construir, algumas hipóteses, um objeto do discurso, seqüência linear de enunciados. É um acontecimento histórico” um corpus a ser recortado ou construído e, desse recorte extrair (Cardoso: 1994: 211) e enquanto hipótese de trabalho ele somente o que for significativo e relevante para as questões “serve apenas para certos fins teóricos de análise” (idem, p. elaboradas. Isso significa que em um dado corpus nem tudo vai 275 ser analisado, porém não equivale a dizer que o que ficou de fora da análise não seja significativo ou relevante, mas apenas O corpus é composto de editoriais dos boletins e dos que são as perguntas, os objetivos, as hipóteses e o objeto do jornais do MST que compreendem o período de 1981 (no. 01, discurso que norteiam, em alguma instância, o recorte para 15/05/1981) até 2004, (no. 240, 05/2004). A escolha dos análise. editoriais se dá em virtude de conterem, em seu aspecto e em É importante ressaltar que utilizarei o dado tipo seu formato material, de forma “objetiva” e assumida, as rentável (Possenti, 2002: 31). A seleção dos dados que orientações, as propostas, os objetivos, as reflexões, as constituem o corpus é, em geral, um passo estratégico bandeiras e o programa político do movimento. Além disso os (metodológico) do analista, pois, de acordo com Maingueneau editoriais constituem um lugar em que os discursos e as (1993: 20), “cada corpus estabelece problemas específicos”. ideologias se materializam com certo efeito, força e poder. Ainda, a respeito do dado, de acordo com Possenti (2002: 33), Os editoriais do Boletim e do Jornal Sem Terra foram o primeiro recorte de universo de possibilidades ou de o dado do “universo discursivo” (Maingueneau, 1993: 116). A escolha pesquisador, por mais que seu status dos editoriais se justifica por ser um espaço privilegiado de dependa da teoria. Afirmar que o dado existe orientação “programática” quer de jornais e revistas de independentemente do investigador não movimentos populares, de partidos políticos ou de jornais e de significa dizer que ele determine as opções e revistas de comunicação de massa, o editorial é um espaço que ações do investigador (...) é preciso admitir melhor expresse as orientações ideológicas assumidas ou não que o mundo existe independentemente da como posições ideológicas. teoria. existe independentemente A entrada no corpus para proceder a outros recortes de enunciados nunca é fácil, os discursos não “falam” por si só, 276 a entrada no corpus foi feita com a elaboração de algumas lingüísticas, como quadro, pintura, charge, tira de jornal, perguntas, com alguma intuição e também com um pouco de formas de composição, arte gráfica, cores etc.. atenção para as incidências de “curiosidades discursivas” que a A delimitação do enunciado é um trabalho do analista princípio não revelam possuir relação “direta” e “indireta” com que em grande maioria a partir das perguntas e questões que já os objetivos propostos, mas que no decorrer do contato e estão elaboradas previamente, mas não fixas, uma vez que o trabalho de “idas e vindas” com o corpus elas acabam às vezes recorte não pode ser aleatório a ponto de causar algum tipo de por significar algo importante, isso aconteceu, mas não foi uma estranhamente entre aquilo que o sujeito em sua posição constante. discursiva materializou lingüisticamente e aquilo que o analista A partir das perguntas fui procedendo aos recortes de recortou. Ou seja, tive o cuidado de no recorte não deturpar enunciados que respondiam e possuíam alguma relação “direta” nem a estrutura lingüística nem a linearidade construída pelo e “indireta” com os objetivos. Outro ponto importante é que no sujeito no “fio do discurso” (Pêcheux, 1997). O recorte dos decorrer do contato com o corpus algumas perguntam iam enunciados pode ser considerado como uma etapa da análise sendo re-elaboradas e até mesmo abandonadas em detrimentos muito significativa uma vez que ao recortar os enunciados, o fiz de outras. O contato com o corpus é um momento tenso para o já pensando naquilo que ele pode oferecer de produtividade. analista. À medida que ia recordando os enunciados, cerca de É importante ressaltar que os enunciados em AD não mil, ia enumerando-os e fazendo referência ao corpus. Isso é equivalem à oração, a proposição, a frase ou aos atos de fala. A importante porque no momento da análise, foi comum ter que sua materialidade lingüística pode coincidir como sintagmas voltar várias vezes ao corpus para verificar alguns aspectos dos verbal ou nominal ou como período composto de extensão enunciados em relação a sua linearidade, ou seja, o que tinha relativa de um texto pequeno ou parágrafo. O enunciado ainda antes e o que tinha depois do recorte. Em muitos casos na hora pode possuir em sua composição outras materialidades não da análise o recorte foi refeito, ampliado ou diminuído para 277 prestar melhor a análise. Essa estratégia apresenta uma discursos irem se inscrevendo, se repetindo, se parafraseando, vantagem de contar apenas aquilo que é interessante para o se transformando e se transformando gradativamente no analista, evita recortes grandes sem perspectiva de análise, mas repertório do MST. Cito dois enunciados com exemplo: que para um possível leitor pode oferecer questionamentos ao analista porque não analisou isto ou aquilo etc. No decorrer das (1) “como agricultor achamos que temos o análises muitos enunciados foram abandonados ou porque eram direito a ter um pedacinho de terra para paráfrases de outros “em maior ou menor grau” ou porque não plantar alimentos para nossas famílias e para fazia mais sentido, neste caso cabe ao analista verificar quais os da cidade” (Bol. No. 1, p. 1, 15/5/1981) dos enunciados se prestam melhor aos seus propósitos. (690) “NOSSA LUTA É CONTRA O A quantidade de enunciados é em decorrência de dois IMPÉRIO” (JST. 02/240/05/2004) fatores: o tamanho do corpus, editoriais de 1981, no. 01 até 2004, no. 240, eu queria poder olhar de uma perspectiva É possível constatar no enunciado (1) um discurso na histórica abrangente, ou seja, queria constatar os discursos que ordem do Estado, um sujeito autorizado a se inscrever. Era a iam se inscrevendo “a cada momento” de existência do inscrição do movimento no ordem do político marcando a sua movimento e sua relação com a conjuntura. Esta proposta, no existência em 1981. entanto, apresenta o inconveniente de “perder” o momento No enunciado (690) de 2004, a questão não é mais a exato da enunciação, as “condições de produção do discurso” da terra, o MST se inscreve a questão da terra como uma (Pêcheux, 1997), mas em contra partida, ampliei e tentei questão de política internacional, contra o Estado e o discurso descrever um contexto político mais amplo para compreender e capitalista. É importante ressalta que o movimento para passar relacionar às questões mais amplas de uma agenda política de uma “discursividade” (Pêchexu, 2002) a outra, foram nacional. Acredito ter sido um ganho porque pude verificar os 278 necessários vinte e três anos de embate na ordem do discurso (Orlandi, 1997). Assim, depois do recorte dos enunciados, fiz o esquema geral, ainda que elementar da tese, fui separando Assim, foi uma opção metodológica trabalhar com um conjuntos de enunciados de acordo com os objetivos e corpus considerável, se de um lado foi trabalhoso e cansativo, propostos gerais, os agrupamentos de enunciados são sempre em contra partida, pude escolher aqueles que se prestavam provisórios nesse primeiro momento podendo até mesmo melhor às análises e aos agrupamentos provisórios, no total participar de vários agrupamentos. fiquei com seiscentos e noventa enunciados. Um aspecto importante dos enunciados é que eles se Depois de recortados, os enunciados ainda não falam prestam a uma série de análises e abordagens de acordo com as por si só, a partir das perguntas e dos objetivos e também das perguntas que se faz a eles, de acordo com o agrupamento em descobertas (curiosidades e intuição) com o corpus, outras que estão inseridos ou organizados. Ou seja, à medida que questões foram surgindo, mas não a ponto de abandonar os tenho várias perguntas ao mesmo enunciado ele vai se objetivos e propósitos que me levou ao corpus, caso isso prestando às análises. Não cheguei esgotar analiticamente ocorra, talvez o analista tenha outro projeto de pesquisa ou a nenhum enunciado, confesso que fiquei predisposto, mas não o constituição do corpus não foi adequada. Um ponto fiz, o que não quer dizer que não seja possível esgotá-lo. fundamental antes de iniciar as análises foi após o recorte, fui Uma vez separado os agrupamentos por capítulos e/ou refletir sobre o conjunto de enunciados em sua totalidade e partes, fiz um outro recorte a partir dos objetivos e delimitações esboçar um primeiro esquema geral da tese, primeiro em partes específicos provisórias e depois em capítulos, já um pouco mais estáveis, agrupamentos considerando suas especificidades. Assim, no mesmo que de forma elementar e provisória. Foi no decorrer decorrer das análises por capítulos ou partes, um retorno ao das análises que as partes e os capítulos foram se constituindo e corpus foi uma constante como também um reajustamento dos se configurando estavelmente. agrupamentos, considerando a exclusão de certos enunciados, dos capítulos, ou seja, esquematizei os 279 inclusão de outros, e a redefinição linear ainda de alguns. Isso amparo quer nas materialidades discursivas, quer nas filiações para atender a demanda das questões, dos objetivos e das históricas e redes de memória discursiva. perguntas. Como tinha como proposta uma perspectiva histórica, Há uma tensão entre as questões, os objetivos e as adotei metodologicamente o ponto de vista da progressão linear perguntas em relação aos enunciados. Salvo os objetivos, desde de enunciação na maioria dos agrupamentos para análise. que consistentes, eles não se alteram no contato com o corpus. Iniciei as análises pensando na progressão e desenvolvimento Mas as questões e as perguntas não apenas no contato com o discursivo do movimento como condição de poder “capturar” corpus, mas sobre tudo no momento crucial das análises, elas e momentos de “surgimento” de algo diferente, algo novo que eles se constituem de uma relação ou um jogo tenso. Lembrava ainda não havia se revelado nas práticas discursivas. Foi nesse sempre de Pêcheux (2002: 57): “face às interpretações sem sentido que foi possível analisar o desenvolvimento discursivo margens nas quais o intérprete se coloca como ponto absoluto, do movimento como a posição de sujeito histórico na ordem do sem um outro nem real, trata-se aí, para mim, de uma questão Estado, como agricultor, para sujeito revolucionário que de ética e política: uma questão de responsabilidade”. Em questiona o próprio Estado e assim se tornando o outro do alguns momentos os enunciados questionavam as questões e as Estado. perguntas como querendo dizer que elas não eram adequadas Analisei também os pontos de tensão discursiva, a para eles; e em outros casos a relação era inversa, as perguntas constituição: posição sujeito, discursos, objetos, temas, e as questões questionavam se de fato os enunciados possuíam transposições de espaço, enunciatários, constituição do algum tipo de relação com elas. Este momento é delicado e instrumento discursivo, pontos de ruptura etc.. A visão linear “perigoso”, o que ocorre é um estranhamento, corre-se o risco de enunciação favoreceu de forma considerável as análises. de “forçar” ou construir uma análise sem consistência, sem um Aliás, a estrutura da tese e dos capítulos seguiu com certa regularidade este esquema. 280 Outro ponto importante foi a proposta metodológica agrupamentos e/ou dos discursos dependem do tipo de de análise que privilegiei: uma abordagem equilibrada entre as conhecimento que o analista se imbuiu para elaborar questões, materialidades discursivas e a abordagem histórica, pelo menos objetivos e adentrar nas análises. acredito ter conseguido. Esse fato é importante porque é A partir do exposto, é possível resumidamente elencar comum em muitos trabalhos em Análise do Discurso o analista as etapas que constituem metodologicamente a análise, elas são privilegiar ou uma abordagem das materialidades discursivas as seguintes, não necessariamente nessa ordem: ou uma abordagem mais histórica. Tive a impressão que as escolhas metodológicas sempre implicam em perdas, quando a) definição: de objetivo, de objeto, elaboração de hipótese e optei pelo um período longo (1981 – 2004), perdi, por exemplo, perguntas a fazer; em muitos casos, a conjuntura precisa de enunciação, tive b) proceder ao recorte de um corpus de todo corpora de um apenas, em alguma instância, aquilo que o conjunto de determinado universo discursivo (Maingueneau, 1993: 116); enunciados se referiam como pontos de ancoragem históricos. c) a partir desse corpus e das questões da letra “a”, proceder ao Assim, procurei não apenas analisar alguns aspectos primeiro recorte de enunciados (Pêcheux, 1969: 100) e suas das materialidades discursivas como também relacioná-las a paráfrases (Fuchs, 1982: 29) significativos e relevantes (ainda historicidade que a constituem com as condições históricas que que de forma intuitiva) que possam ser material de análise. É favorecem sua materialização discursiva e de tudo que pode importante numerá-los e fazer as devidas referências ao corpus; decorrer. d) agrupar os enunciados considerando suas especificidades de Ainda um último aspecto das análises, o conhecimento de alguns fatores históricos do analista se sentidos, de objetos e de temas materializados nos discursos; constitui em muitos casos de um fator significativo de e) classificar os grupos de enunciados em discursos, dando-lhes ancoragem das materialidades discursivas e ancoragem uma configuração; histórica. Ou seja, certas especificidades dos enunciados, dos 281 f) analisar os discursos (enunciados desse discurso) quanto a enunciados no entanto é importante considerar que os sua posição ideológica, sua relação com outros discursos, redes agrupamentos são, em alguma medida, instáveis e por isso de filiações históricas quanto ao interdiscurso e à memória podem revelar algum ponto de vista do analista. Os discursiva; agrupamentos são sempre provisórios e instáveis se o discurso g) analisar nos discursos as posições sujeito nas suas relações mudar em decorrência de sua relação tensa com outros grupos com as estruturas sociais; de enunciados ou conjuntura política distinta, que ressignificam h) analisar agrupamentos de enunciados independentemente de algumas unidades que aparentemente eram consideradas como se constituírem em discursos com o objetivo de verificar certas estáveis em relação aos sentidos. especificidades: analisar a “progressão e transformação” de sentidos considerando a sua materialidade; analisar conjuntos Se até aqui foi feita referência somente ao discurso e de enunciados que marcam aspectos da identidade dos sujeitos; não aos discursos do MST é tão somente para proceder à analisar conjuntos de enunciados que materializam objetos e análise, pois os discursos são constituídos em suas relações temas de discurso; com outros discursos, trazem em sua constituição outros i) proceder a um segundo recorte e exclusão de enunciados: discursos necessariamente. durante o percurso de análise, constata-se que alguns dos Assim, a metodologia foi sendo construída ao longo enunciados não foram analisados ou porque havia outros que se do trabalho e face à própria demanda dos objetivos e dos “prestavam” melhor a análise ou porque, durante o percurso de objetos da pesquisa. É importante ressaltar que tive a análise, eles deixaram de fazer sentido; “impressão” que o percurso metodológico se um lado se j) voltar ao corpus para efetuar um outro recorte específico a apresentava produtivo, de outro, parecia que “perdia” algo por partir de certos enunciados. Qualquer tentativa de agrupamento seguir este ou aquele caminho. Considero, ainda que de certo conjunto de enunciados, provoca exclusão de outros elementarmente, que este fato metodológico se constitui em um 282 dos próprios da Análise do Discurso, uma característica o positivismo lógico e a denominada peculiar face à teoria, ao objeto, ao objetivo e ao analista. filosofia analítica, uma corrente de pensamento que alcançou, de maneira Considerações singular na lógica formal e na metodologia da ciência, avanços muitos meritórios para o A questão metodológica ou como fazer análise em desenvolvimento do conhecimento. Análise do Discurso tem sido um certo tipo de “problema” que apesar de algumas reflexões de pesquisadores Orlandi (2001, 1996, 1999), Possenti (2002) e Voese (2004), ainda é possível A outra corrente com a qual promove ruptura é a fenomenologia, que de acordo com Trivinõs (2008: 47-48) constatar a “tensão” do aluno de pós-graduação ou iniciante em Análise do Discurso na hora de demonstrar sua habilidade de a fenomenologia exalta a interpretação do analista na aplicação teórica, ou seja, no momento de efetuar mundo que surge intencionalmente à nossa propriamente a análise. consciência. Por isso, na pesquisa, eleva o A AD ao se constituir enquanto disciplina, ela se opõe ator, com suas percepções dos fenômenos, à algumas correntes filosóficas que irão contribuir para a sobre o observador positivista. questão metodológica em Análise do Discurso, por exemplo: o (...) positivismo e a fenomenologia. De acordo com Triviños (2008: A fenomenologia, sem dúvida, representa 41): uma tendência filosófica que, entre outros méritos, o positivismo, sem dúvida, representa através de suas formas neopositivistas, como parece-nos, tem o de haver questionado os conhecimentos positivistas, 283 elevando a importância do sujeito no reconhece processo da construção do conhecimento. independentemente da consciência. que a realidade existe (...) Ao se opor ao positivismo e a fenomenologia, a AD O materialismo dialética é a base da não o faz em um campo do saber neutro ou para além das filosófica do marxismo e com tal realiza a ciências, ela se situa em algum aspecto no marxismo, naquilo tentativa de buscar explicações coerentes, que e lógicas e racionais para os fenômenos da metodológica) “crítica” da realidade a partir de algumas natureza, da sociedade e do pensamento. Por posições teóricas que para Trivinõs (2008: 50-51), um lado o materialismo dialético tem uma ele pode oferecer enquanto reflexão (teórica longa tradição na filosofia materialista e, por a importância o outro lado, que é também antiga concepção marxismo a concepção materialista da na evolução das idéias, baseia-se numa realidade interpretação dialética do mundo. torna que apresenta necessário para referir-se brevemente ao materialismo filosófico, já (...) sabemos que ele considera que a matéria é o O materialismo histórico é a ciência princípio primordial e que o espírito seria filosófica do marxismo que estuda as leis uma aspecto secundário. A consciência, que sociológicas que caracterizam a vida da é um produto da matéria, permite que o sociedade, de sua evolução histórica e da mundo se reflita nela, o que assegura a prática possibilidade que tem o homem de conhecer desenvolvimento o universo. A idéia materialista do mundo materialismo social dos da histórico homens, no humanidade. O significou uma 284 mudança fundamental na interpretação dos reflexão, mas necessariamente uma proposta metodológica sem fenômenos sociais que, até o nascimento do esquemas e modelos estruturados a priori. Ao contrário de marxismo, concepções pensar que é um problema, é possível considerar uma questão e idealistas da sociedade humana. (...) O uma virtude. Situação que impõe ao analista uma diversidade materialismo histórico ressalta a força das de questões de como analisar em Análise do Discurso. se apoiava em idéias, capaz de introduzir mudanças nas bases econômicas que as originou. Assim, a AD se beneficia dessas reflexões seja para refutar (positivismo e a fenomenologia), seja para estabelecer Referências Bibliográficas CARDOSO, S. H. B. Demonstrativo, dêixis e interdiscurso. Campinas: UNICAMP-IEL: Tese de Doutoramento, 1994. relações, no caso, necessariamente do materialismo histórico, naquilo que importa para compreender uma reflexão “crítica” FUCHS, C. A paráfrase, entre a língua e o discurso. Language do discurso, do sujeito, da língua/linguagem, das práticas Française. Larousse, n. 53, 1982. sociais etc.. A AD vai interrogar os estudos lingüísticos pela historicidade dos discursos, dos sujeitos e das formações MAINGUENEAU, D. Novas tendências em análise do sociais, mais ou menos o que Saussure (1990) excluiu em suas discurso. 2. ed. Campinas-SP: Pontes, 1993. dicotomias para a Lingüística se constituir em ciência. São estas questões estão na base da AD quando ela relaciona a Lingüística, o Materialismo Dialético e a Psicanálise para trabalhar no espaço limite entre o social e o lingüístico. Disto, resulta não apenas um novo campo de ____. Análise de textos de comunicação. São Paulo: Cortez, 2001. 285 ORLANDI, E.P. Discurso e texto. Formação e circulação dos sentidos. Campinas: Pontes, 2001. _____. Papel da Memória. In: Achard. P. et all. Papel da Memória. Campinas: Pontes, 1999. pp. 49-56. _____. Análise de discurso. Princípios e procedimentos. Campinas: Pontes, 1999. POSSENTI, S. Os limites do discurso. Curitiba-PR: Criar Edições, 2002. ____. As formas do silêncio. No movimento dos sentidos. 4ª. ed. Campinas-SP: Editora da UNICAMP, 1997. ____. Teoria do discurso: um caso de múltiplas rupturas. In MUSSALIN, F. e BENTES, A. C. Introdução à lingüística. PÊCHEUX, M. Semântica discursiva. Uma crítica à afirmação Fundamentos epistemológicos 3. São Paulo-SP: Cortez, 2004. do óbvio. Campinas-SP: Editora da UNICAMP, 1997. pp. 353-392 ____, PÊCHEUX, M. et al. Maio de 1968: os silêncios da RODRIGUES. M. L Introdução ao estudo da ideologia que memória. Et all. Papel da memória. São Paulo: Pontes, 1999. sustenta o MST. Três Lagoas-MS: UFMS, Câmpus de Três pp. 59-71 Lagoas-MS, Dissertação de Mestrado em Lingüística, 2001. ____ et al (orgs.) Gestos de leitura. 2. ed. Campinas-SP: ____. MST: Discurso de Reforma Agrária pela Ocupação: Editora da Unicamp, 1997. acontecimento discursivo. Campinas-SP. Tese Doutoramento em Estudos Lingüísticos – UNICAMP, 2007. a _____. O discurso. Estrutura ou acontecimento. 3 . ed. Campinas: Pontes, 2002. de 286 VOESE, I. Análise do Discurso e o Ensino de Língua Portuguesa. São Paulo-SP: Cortez Editora, 2004. NO ESCURO DO DISCURSO: RECORTES TEÓRICOS NA NÉVOA DISCIPLINAR Janaina NICOLA Nas malhas da AD: Obediências e travessuras (PG-UFMS/CPTL/CAPES) Janaina Nicola (UFMS) A perpetuação do Outro; o começo do Eu A investida sobre a qual se inclina esse estudo oferece uma apresentação de algumas noções básicas com que se ocupa esse campo investigativo da Análise do Discurso. Essa empresa pretende discutí-las e recuperar historicamente as condições de possibilidade com que trabalhamos na aventura teórica, obscura do/no discurso, conforme reclama a prática do campo investigativo supracitado. Mais precisamente, cuidamos de recuperar, históricopolítico e ideologicamente, alguns dos conceitos cristalizados pela AD que nos desafiam permanentemente diante dessa “aventura” nunca tranqüila, do/no discurso, “em que a análise precede, em sua constituição, a própria teoria”; ou seja, é pelo fato de o analista ter “um objeto a ser analisado que a teoria 287 vai-se impondo” (MALDIDIER, 2003). Daí as fases dos desde o aparecimento do Círculo de Praga (marcada pelos “tateamentos teóricos” sobre as quais fundamenta-se, também, trabalhos de Trubetskoï e Jakobson), até as conceituações nosso discurso (nossa prática). fundamentais para a semiótica do círculo de Copenhague (Hjelmslev). De lá, encaminhar-se-ia aos esboços da leitura 1 O evolar do ritual funcionalista; do descritivismo e gerativismo, às lingüísticas enunciativas. Vislumbraríamos as regulações do discurso o do Segundo as representações mais usuais, a Lingüística lugar que ele abre à ocupação do sujeito falante (Benveniste, irrompe com os estudos de Saussure, cujo Curso de lingüística Ducrot e Culioli) e, enfim, alcançaríamos as lingüísticas geral (CLG) inaugura uma doxa sobre a qual se define e de que discursivas se compraz a disciplina. Dos interesses lingüísticos do século morfossintáticos, XIX (desde a gramática comparada) aos movimentos de preocupada em restituir as filiações. que pretenderam crivando ultrapassar uma os progressão limites histórica desenvolvimento ulterior das asserções sobre a linguagem do Interessa, todavia, marcar especialmente o momento século XX: o caminho entre 1800 e 1900 que possibilita de um confronto teórico que possibilitou o aparecimento de compreender as conceituações ditas contemporâneas; os uma análise de discurso. O declínio dos movimentos encadeamentos. “estruturalistas”, a crise dos “marxistas”; o trágico Se o espaço de que dispomos não sofresse restrições desaparecimento de figuras que mantiveram esses movimentos impostas por um certo ritual em que nos inscrevemos, este durante os anos de 50 até meados de 80, como Althusser, estudo poderia propor um passeio cujo percurso levaria a Lacan, Pêcheux, Barthes, vincaram um vazio que se desenhou explorar as condições de emergência da gramática comparada, no início dos anos 1980 com esses desaparecimentos a ruptura operada pelo pensamento de Saussure com o CLG, as simultâneos. As décadas seguintes conheceriam o fim das implicações da interpretação estrutural-funcionalista abraçada utopias, dos embates heróicos, de tal modo que haveria, 288 mesmo, uma nova configuração dos saberes, pós-1980, denunciaria, na perspectiva que iria trabalhar o sujeito, a língua determinada por essas cisões (GREGOLIN, 2004). e a história. Os estudos da linguagem, a partir dos anos 60 do A Análise do Discurso que encontramos no Brasil século XX, foram surpreendidos por um novo acontecimento constituiu-se no espaço de discussões provocadas por três que sacudira a Lingüística de outrora. A lingüística campos do saber que remetem, ao mesmo tempo, a uma ruptura distribucional depara com o trabalho de Harris, cuja proposta com o século XIX: a Lingüística, a Filosofia e a Psicanálise. O ulterior ao clássico Discourse Analysis ditava que os estudos que interessa a esse momento de irrupção são três formas trabalhassem para além dos limites de uma única frase e que diferentes fossem realizados levando em consideração “as relações entre a perpassam a constituição desse novo campo investigativo. cultura e a língua”. Harris se desprende nesse momento dos Assim, considera-se da Lingüística a afirmativa segundo a qual trabalhos apontados pela lingüística do sistema, evocando um a língua não é transparente: tem uma ordem marcada por uma contexto sócio-cultural, um locutor e um objeto alheio aos materialidade específica. Do Marxismo, o fato de que a história limites da sentença; muda-se o discurso; faz-se reconhecida a também tem a sua materialidade: o homem faz a história, mas falta. Ressalta-se aquela exterioridade constitutiva. ela também não lhe é transparente, uma vez que manipulada. de materialidade, de não-transparência, que Quando Pêcheux se mobiliza a pensar a Análise do Por fim, com a Psicanálise, é o sujeito que se coloca ante a sua Discurso, o texto de Harris é recebido como texto fundador, em opacidade: o sujeito não é transparente nem para si mesmo, virtude de ter relacionado suas reflexões sobre o discurso à marcando aqui um deslocamento da noção de homem, de língua e ao contexto sócio-cultural em que ele é praticado indivíduo, para a de sujeito. Mais precisamente, ao invés do (INDURSKY, 2006). A Análise do Discurso inaugurada por sujeito nós teríamos, com a AD, uma posição-sujeito que Pêcheux em 1969, com Análise Automática do Discurso (AAD enuncia e que particularmente nos interessa. 69), já anunciava as novas inflexões que o estudo do discurso 289 Deixar-se atingir pelo conceito de “posição-sujeito” remete a deslocá-lo de sua estabilidade aparente, em que é campos para desembocar em uma teoria do discurso (PÊCHEUX e outros, 1981). concebido como indivíduo físico, e considerá-lo afetado por um Nesse sentido (e falar de sentido é sempre jogo imaginário de projeções que incide sobre sua constituição; questionável), a AD, antes de ser confundida com as teorias a isso corresponde dizer que há em toda língua mecanismos de supracitadas, as pressupõe, construindo um objeto e um método projeções que oferecem a possibilidade de passar da situação próprio, contornando-se da relação de três regiões científicas: sujeito para uma posição ocupada pelo sujeito no discurso, a) a teoria da ideologia, b) a teoria da sintaxe e da enunciação e conforme Orlandi, 2006, p. 15: c) a teoria que compreende o discurso como um processo de determinação O sujeito da análise de discurso não é o sujeito empírico, mas a posição sujeito projetada no discurso. (...) Portanto não é o sujeito físico, empírico que funciona no discurso, mas a posição sujeito discursiva. O enunciador e o destinatário, enquanto sujeitos, são pontos da relação de interlocução, indicando diferentes posiçõessujeito. histórica dos processos de significação (ORLANDI, 2006). É sob essa égide de pensamento, sob essas discussões que surge a Análise do discurso, a partir dos anos 60 do século XX, momento em que a leitura levantava questionamentos em torno da interpretação. Estudiosos como Althusser (na releitura de Marx), Foucault (A Arqueologia do Saber), Lacan (com sua leitura de Freud), Barthes (cujo pensamento nos alerta de que a Desenha-se, desse modo, o famoso tripé que sustenta leitura é uma escritura), entre outros, indagavam sobre o fato de a AD e que lhe propõe gerar uma teoria e um objeto novo, que que ler significava dizer. Ocorre então que alcançam o tocam as bordas desses domínios disciplinares, mas que, em reconhecimento de que a leitura deveria ser des-naturalizada; nenhum momento, pode ser confundido com eles (ORLANDI, necessitaria de se pautar em um artefato teórico que lhe 2006). Não se trata de realizar uma soma ingênua dos três permitisse a subsistência (idem). 290 A AD constitui-se como uma disciplina de entremeio, entre a Lingüística e as Ciências Sociais, interrogando a alguma conveniência, que os visitaram em diversas localizações e que os fizeram existir em terrenos outros. lingüística que pensa a linguagem e se esquece do sócio- Não sabemos ao certo o marco inicial de irrupção histórico e interpelando as Ciências Sociais que ignoram a dessas noções sobre a verdade e sobre o poder, uma vez que a linguagem em sua materialidade. A AD desloca-se desses busca da verdade, desde o século VI, com os poetas gregos, lugares em direção a um outro em que essas ciências traçam um “tende a exercer sobre os outros discursos (...) uma espécie de relacionamento complementar. Suas contribuições oferecem pressão e como que um poder de coerção” (FOUCAULT, 1998, hoje a teoria a que nos condicionamos. p. 18). Podemos afirmar, contudo, que, para esta pesquisa, Exibir nosso pressupostos teóricos, implica, enfim, importa considerar os apontamentos que sobre eles resgatar os trajetos históricos da constituição de alguns desenvolveu Michel Foucault (1999), entre outras diversas e conceitos, permitindo-nos rediscuti-los ante a nova condição de vigorosas escansões. Esse é o recorte. existência em que são postados hoje. Aqui nos subescrevemos Nesse crivo, Foucault permite-nos perceber não mais (ou nos inscrevemos) em uma prática, manifestando o evolar apenas as coerções repressivas que estabelecem o poder e sua do ritual que nos encaminha sob a névoa disciplinar. estreita ligação à institucionalização da “verdade”, à universalidade dos saberes para além do inconteste, mas, antes 2 Do poder e da verdade e diferente disso, ele nos posiciona em face das relações positivas que intrincam no espaço ocupado por essas noções, Não se faz restrita a lista de estudiosos, pensadores, deslocando o conceito de poder de uma significação negativa e filósofos, inquietos do conhecimento que se puseram a discutir impiedosa, de modo a endereçá-lo para fora da identidade as implicâncias do poder e da “verdade”, que os conceberam vincada na proibição. Ao contrário, o poder, para Foucault, é exaustivamente ou ao menos os mencionaram por razão de produtivo: 291 uma “consciência de todos”. Há algum tempo, todavia, não se Se o poder fosse somente repressivo, se não fizesse outra coisa a não ser dizer não você acredita que seria obedecido? O que faz com que o poder se mantenha e que seja aceito é simplesmente que ele não pesa só como uma força que diz não, mas que de fato ele permeia, produz coisas, induz ao prazer, forma saber, produz discurso. Deve-se considera-lo como uma força produtiva que atravessa todo o corpo social muito mais do que uma instância negativa que tem por função reprimir (FOUCAULT, 1999, p. 08). pede mais ao intelectual que desempenhe esse papel. Segundo Foucault (1999, p. 09), os intelectuais habituaram-se a trabalhar não no “universal”, no “exemplar”, no “justo-e-verdadeiropara-todos”, mas “em setores determinados, em pontos precisos em que os situavam, quer suas condições de trabalho, quer suas condições de vida (...)” (ibidem). Essa virada interessa-nos à medida que nos determina a observar esses pontos precisos de atuação, esses setores em que se os postam. Esses pontos dizem respeito aos lugares que Consideramos essas indicações a fim de levantar ocupam, de onde (nos) falam, em que lutam, nos quais desejam discussões relativas aos sujeitos envolvidos nos discursos permanecer e que, enfim, os autorizam a dizer o que dizem, de analisados, que nos brindam com os ranços de seus poderes maneira poderosa e progressiva. Investido em seu setor de cristalizados na instância enunciativa. Pensar esses sujeitos atuação, o intelectual ganhou uma consciência muito mais significa também, entre outras coisas, pensar o papel do concreta e imediata das lutas (ibid.). Esse é um ponto muito intelectual com relação a essa busca e essa legitimação da importante para o qual devemos olhar sempre e com verdade em nossa sociedade. desconfiança, uma vez que as considerações com que nos Ao intelectual incumbiu-se, durante muito tempo, envolvemos, e a sociedade em geral também, incidem dominar um acumulado de saberes vários cuja universalidade vigorosamente sobre esses conceitos de “verdade” a cerca do seria representativa da verdade e da justiça. A ele competiria qual haveremos de caminhar, para o bem ou para o mal. figurar como uma entidade clarividente que funcionasse como 292 O pensamento de Foucault direciona à assertiva segundo a qual “a verdade não existe fora do poder ou sem os seus posicionamentos, cuja função estreita-se aos dispositivos de verdade em nossa sociedade: poder”. As coerções do mundo produzem a verdade e ela, por sua vez, constrói efeitos regulamentados de poder. Dessa É então que sua posição - (a do intelectual) - maneira, cada esfera da circulação social, e ela mesma em uma pode adquirir uma significação geral, que esfera geral, possui os seus regimes de verdade; possui os seu combate local ou específico acarreta discursos que nela são produzidos e que concorrem para indicar efeitos, tem implicações que não são o verdadeiro, discriminando, em contrapartida, o falso, o alheio somente setoriais ou profissionais. Ele à verdade. funciona ou luta ao nível geral deste regime Esse intrincamento poderoso entre verdadeiro e falso, de verdade, que é tão essencial para as essa relação de (re)conhecimento e esquiva, de acolhimento e estruturas e para o funcionamento de nossa desprezo, de identificação e distanciamento está muito patente sociedade. Há um combate “pela verdade” nos estudos da língua, por exemplo. A tensão cristalizada entre ou, ao menos, “em torno da verdade” português-padrão e não-padrão, entre gramática e lingüística (e (parênteses nosso) (FOUCAULT, 1999, p. esta justaposição não quer dizer que eles se equivalem), enfim, 13) entre o privilegiado e aquele que sofre o preconceito por não obedecer à mesma ordem, permeia todo o nosso trabalho e Essa verdade de que nos fala Foucault, e que produz o sustenta as observações concernentes ao desmascarar dessas poder, negativa ou positivamente, não se precipita em referir ao “lutas de classes” evidenciadas na análise discursiva. Isso nos “conjunto das coisas verdadeiras a descobrir ou a fazer aceitar”, leva a perceber, conforme mencionado, como esses lugares se mas ao “conjunto das regras segundo as quais se distingue o constituem no que são, e o que externam as suas manifestações, verdadeiro do falso e se atribui ao verdadeiro efeitos 293 específicos de poder”, entendendo-se também que não se trata estudo reclama que aceitemos a hipótese de que não há a de um combate “em favor da verdade”, mas em torno do possibilidade de se dizer sem que, para isso, sejamos afetados regulamento da verdade e do papel econômico-político ao qual por um “exterior”, às vezes introjetado, mascarado. Isso pode filiar-se: “É preciso pensar os problemas políticos dos significa dizer, em outras palavras, que é de interesse deste intelectuais não em termos de “ciência/ideologia”, mas em trabalho investigar com quais possibilidades de existência os termos de “verdade/poder” (ibidem). sujeitos trabalham a construção dos seus discursos (ou às quais eles se rendem); o porquê da escolha ou manifestação de Não se trata de libertar a verdade de todo determinadas formulações e quais as implicâncias desse sistema de poder – o que seria quimérico na “exterior” constitutivo nos efeitos a que os sentidos podem medida em que a própria verdade é poder - remeter. mas de desvincular o poder das verdades das Para Orlandi (2006), as condições de produção formas de hegemonia (sociais, econômicas, compreendem os sujeitos e a situação do discurso. Segundo a culturais) no interior das quais ela funciona autora, podemos considerar as condições de produção em no momento (ibidem, p. 14). sentido estrito e em sentido lato. Se consideramos o primeiro, temos as circunstâncias da enunciação; o contexto imediato; o 3 As condições de produção “aqui e agora” do dizer. Já no segundo caso, a situação compreende o contexto sócio-histórico-ideológico, mais amplo. A assertiva que nos inquieta especialmente nesse Importa ressaltar ainda que essa separação faz-se legítima tópico é a de que “um discurso é sempre pronunciado a partir somente para fins explicativos, uma vez que na análise são de condições de produção dadas” (PÊCHEUX, 1990, p. 77). indissociáveis. Compreender a implicação dessa noção com relação ao nosso 294 Courtine (1981) transforma as condições de produção em simples circunstâncias, nas quais os “sujeitos do discurso” o resultado de um produto “forma”; uma afirmação de lugares (encontrados ou pretendidos). interagem e constituem a origem de relações discursivas das É nessa esteira que caminha o conceito de relações de quais são o portador ou o efeito. No âmbito discursivo, as forças, segundo o qual o lugar, a posição que ocupa o falante é condições de produção configuram o estado em que e a partir constitutiva do que ele diz: do qual os discursos são produzidos, em uma conjuntura social, cultural, política, histórica e ideológica. No processo de [...] o que anuncia, promete ou denuncia não construção do discurso, na situação enunciativa, implicam um tem o mesmo estatuto conforme o lugar que emissor que fala a um destinatário a respeito de um referente, ele ocupa; a mesma declaração pode ser uma sistematicamente. arma temível ou uma comédia ridícula O “como” falar, o que deve ou não ser dito, a escolha segundo a posição do orador e do que ele do léxico ou vocabulário, a articulação, “livre” ou imposta (de representa, em relação ao que diz [...] qualquer forma, nunca será livre) desses fatores, a manipulação (PÊCHEUX, 1990, p. 77) da estrutura ou estratégia, pelos quais o discurso se efetiva, tudo isso, enfim, é determinado por aquilo que as A “palavra” muda de sentido de acordo com a posição circunstâncias impõem aos sujeitos; pelo contexto (restritos e ocupada por aquele que a pronuncia; o “sentido das coisas” amplos) que os envolve (sujeitos e discursos) e no qual se altera-se, no mais, de acordo com a formação discursiva na inscrevem: eis as condições de produção. Dizer isso é aceitar o qual ele é concebido. Mas o que importa ressaltar nessa noção, assujeitamento em que se precipitam os discursos e os sujeitos. e o que nos atinge em nossa empresa, diz respeito à força que É dizer também que se pode enxergar, através dos esses lugares, que essas posições, aplicam ao discurso, protagonistas do discurso, não apenas os sujeitos falantes, mas 295 conferindo aos sujeitos uma autoridade absoluta com relação ao que busca a sua constituição, na identificação ou na esquiva, na que dizem. dívida ou na sublimação, mas ainda no encontrável, fazendo Dessa afirmação resulta outra: a de que o discurso que o dizer se sustente na relação com outros e que assim as deve ser remetido às relações de sentido nas quais é produzido. coisas façam sentido, ou efeitos de sentido. Os discursos As “relações de sentido” vêm nos dizer que não há discurso que amparam-se nessa fonte, nutrindo-se de seus benefícios ou não se relacione com outros, ou seja, eles dialogam entre si arriscando-se em seus vícios. Recuperar esses intercâmbios é o indiscriminadamente, posto que não podemos conceber um trabalho a que devemos nos inclinar. discurso escrito “sobre uma página branca”: 4 Entre as imagens [...] assim, tal discurso remete a tal outro, frente ao qual é uma resposta direta ou Partindo da premissa segundo a qual “os indivíduos indireta, ou do qual ele “orquestra” os são ‘interpelados’ em sujeitos-falantes (em sujeitos de seu termos principais ou anula os argumentos. discurso) pelas formações discursivas, que representam ‘na Em outros termos, o processo discursivo não linguagem’ tem, de direito, início [...] (PÊCHEUX, correspondentes” (PÊCHEUX, 1995, p. 161), tratamos, nesse 1990, p. 77). enxerto, de discutir as projeções (representações imaginárias; as formações ideológicas que lhes são ideológicas) que se estabelecem nos processos de construção Segundo Orlandi (2006), todo discurso é aberto em do discurso e, por fim, dos sujeitos que a ele emprestam suas relações de sentido. Isso significa dizer que o discurso submissão. O jogo das formações imaginárias preside todo sempre aponta para outros precedentes ou que o sucedem. E é discurso e incita-nos a perceber como se produzem e como se assim que ele obtém o seu reconhecimento; é assim também processam nos discursos as imagens dos sujeitos, assim como 296 do objeto de que se ocupa, dentro de uma conjuntura sócio- outros) com os quais se relaciona (ou pretende relacionar-se). histórica: Postamo-nos assim no campo do simbólico. Parece claro dizer que nem sempre esses processos de [...] o que processos projeções “espontâneas” se fazem livres; ou seja: muitas vezes, discursivos é uma série de formações essas representações imaginárias determinam a formulação do imaginárias que designam o lugar que A e B discurso, construindo a existência (ou a aparência) dos sujeitos- se atribuem cada um a si e ao outro, a falantes, uma vez que esses sujeitos são interpelados, em suas imagem que eles se fazem de seu próprio formações discursivas, por formações ideológicas que lhes lugar e do lugar do outro. Se assim ocorre, correspondem. Posto isso, faz-se importante pensar que as existem manifestações nos funciona mecanismos nos de qualquer imaginárias acenam ao sujeito com a formação social regras de projeção, que “compreensão” (“livre” ou imposta) que poderão elaborar ou estabelecem as relações entre as situações aceitar a respeito de si, do outro, do meio, do mundo, da (objetivamente definíveis) e as posições relação destes entre si e dele para com estes. representações dessas situações) (PÊCHEX, 1990, p. 82). Em conformidade com essas considerações, buscamos observar a maneira pela qual a posição ocupada pelos protagonistas do discurso intervém como condição de produção Dessa maneira, pode-se dizer que os discursos do discurso (ibidem, p. 83). As imagens, no discurso, remetem oferecem um espaço de confrontos ideológicos, do qual a às significações que as condições de produção (todas) e as funcionalidade permite absorver as representações que formações ideológicas (diversas) operam nesse sujeito, concorrem para que o sujeito se torne quem é (ou quem pensa remetendo àquilo que Pêcheux designou “forma sujeito”: o ser) e elabore as impressões daqueles (o “meio” e sujeitos 297 sujeito afetado pela ideologia; o indivíduo interpelado em sujeito por força do ideológico. Faz-se necessário, Isso implica que o orador experimente de aos estudos das imagens, certa maneira o lugar de ouvinte a partir deu considerar as projeções que envolverão o destinador (A), o próprio lugar de orador: sua habilidade de destinatário (B), o referente (R) e o código comum a A e B, nos imaginar, de preceder o ouvinte é, às vezes, termos daquele velho esquema elementar da comunicação decisiva se ele sabe prever, em tempo hábil, criticado por Pêcheux (1969), quando da Análise Automática. onde Essas representações imbricantes no acontecimento discursivo antecipação do que o outro vai pensar configuram as imagens inscritas na enunciação e orientam-nos parece constitutiva de qualquer discurso (...). a considerar algumas questões que, nos termos de Pêcheux Em certos casos, o ouvinte, ou o auditório, (1990), registram-se assim: Ia (a), Ia (b), Ia (r), como também: pode bloquear o discurso ou, ao contrário, Ib (b), Ib (a), Ib (r). Respectivamente: a imagem que A tem de apoiá-lo por meio de intervenções diretas ou A, a imagem que A tem de B e a imagem que A tem de R; e, a indiretas, imagem que B tem de B, a que B tem de A e a que B tem de R. (PÊCHEUX, 1990, p. 77-78). este ouvinte verbais o “espera”. ou Esta não-verbais Se fizermos intervir aqui o mecanismo de antecipação – que permite ao sujeito postar-se no lugar de seu interlocutor O interessante para este estudo é perceber, em relação para experimentar as suas palavras e adiantar uma resposta –, a esse imaginário, a posição social no discurso. São, pois, essas esse quadro se multiplica: todo processo discursivo supõe, “por presenças do imaginário que contornam os nossos discursos, parte do emissor, uma antecipação das representações do alertando-nos, de forma mais ou menos clara, daquilo que receptor, sobre a qual se funda a estratégia do discurso” estamos dizendo. Esse é o poder das formações imaginárias, à (ibidem). Em outras palavras: 298 medida que estabelecem direções pelas quais o discurso é contribuições teóricas da AD não se esgotam nessas argüições; guiado, conscientemente ou não. o objeto de que se ocupa a disciplina referida envolve-se com Como se pôde observar, essas questões envolvem mais complexidade e merece um sentimento de insatisfação muito mais que a compreensão dos sujeitos acerca dos fatores visceral ante a sua concepção. Tratamos, no entanto, de que os circundam e que incitam suas construções/produções. recuperar alguns posicionamentos que nos permitem pensar As formações imaginárias permitirão às nossas análises inicialmente sobre essa aventura que nos propõem os estudos recuperar a memória em que estão cristalizados os valores, da linguagem, e, em especial, os do discurso. negativos ou positivos, de que esses sujeitos produtores se valem e com que podem se contradizer. Importa considerar, Referências ainda, que, nessa perspectiva, as significações resultantes da articulação dessas imagens podem se cruzar com a COURTINE, J.J.; MARANDIN, J-M. Quel object pour I’ arbitrariedade, uma vez que a construção dessas referências é analyse du discours? In Matérialités discoursives. Lille: Presses particular a cada sujeito, ainda que tratemos de um grupo (ou Universitaires de Lille, 1981. círculo) incomum; ainda que a questionemos em uma mesma formação discursiva e/ou ideológica. FOUCAULT, Michel. A microfísica do poder. Rio de Janeiro: Graal, 1999. A ilusão do final __________. A ordem do discurso. Trad. Laura Fraga de Pretendemos com esse trabalho apresentar e discutir alguns pressupostos teóricos básicos com que se relaciona o campo investigativo da Análise do Discurso. Vale dizer que as Almeida Sampaio. 4.ed. São Paulo: Edições Loyola,1998. 299 GREGOLIN, Maria do Rosário. Foucault e Pêcheux na ________ e outros. Matérialités discursives. P. U. de Lille, construção da análise do discurso: diálogos e duelos. São 1981. Carlos: Claraluz, 2004. 08:00hs às 09:30hs. Mesa redonda B INDURSKY, Freda. O texto nos estudos da linguagem: especificidades e limites. In: Discurso e Lexicologia e Lexicografia Textualidade.Campinas: Editora Pontes, 2006. O Vocabulário da Erva-Mate no cone Sul ORLANDI, Eni P. Análise de Discurso. In: Discurso e Prof. Msc. Aparecido Lázaro Justiniano (FIP) Textualidade. Org. Suzy Lagazzi-Rodrigues e Eni P. Orlandi. Campinas: Pontes Editores, 2006. Um olhar para a Toponímia Sul-Matogrossense: resultados parciais PÊCHEUX, Michel. Análise Automática do Discurso. Em: Profa. Msc. Marineide Cassuci Tavares. GADET, F. e HAK, T. Por uma análise automática do Atlas Lingüístico de Ponta Porá-MS: notícias de um Atlas discurso. Uma introdução à obra de Michel Pêcheux. concluído Campinas: Ed. Da Unicamp, 1990.(1969) Profa. Msc. Regiane Coelho Pereira Reis (UEMS) _________. Semântica e discurso: uma crítica à afirmação do 10:00hs às 11:30hs. Mesa redonda óbvio. Tradução: Eni P. Orlandi [ et al]. 2. ed. Campinas: Editora da Unicamp, 1995. História, Discurso e Política 300 Discurso Apologético da escravidão “feliz”: Da Casa grande ao Sobrado Profa. Dra. Maria do Carmo Brazil (UFGD) TRADIÇÕES DISCURSIVAS E O ESTUDO DOS CORPORA DE LÍNGUA FALADA NAS COMUNIDADES QUILOMBOLAS DE MATO GROSSO DO SUL Tradições Discursivas e Comunidades Quilombolas de Mato Grosso do Sul Prof. Msc. Antonio Carlos Santana de Souza (UEMS\USP) Prof. Msc. Antonio Carlos Santana de Souza (UEMS/USP) E-mail: [email protected] O texto que ora apresentamos é uma reflexão acerca do texto “Sobre a historicidade de textos” do Professor Johannes Kabatek da Universidade de Tuebingen, Alemanha; discutido no âmbito do Grupo de Pesquisa Para a História do Português Brasileiro (PHPB) e aplicação aos diversos corpora com amostras do português falado no Brasil. Por ser tratar de uma versão modificada de um capítulo do livro "Die bolognesische Renaissance" (Kabatek, 2004) que veio a ser publicado em 2005, o presente texto foi traduzido a partir do alemão para os estudos do PHPB, com a anuência e a preciosa revisão e a necessária correção do autor, com quem mantivemos diálogo 301 por correio eletrônico, videoconferência e seminários durante a Apesar dos inúmeros trabalhos que nos últimos anos tradução do mesmo. Sem a sua colaboração, não seria possível giram em torno do tema das tradições discursivas (TD), parece nos mantermos fiéis ao verdadeiro espírito do texto em que ainda não há um consenso sobre onde verdadeiramente as reflexão. Também as notas de rodapé, quando em alemão no TD devam ser alocadas na teoria da linguagem.19 Nesse original, foram traduzidas. sentido, em diversos trabalhos, tentou-se definir o lugar das TD As linhas a serem discutidas nasceram da convicção do com relação à diferenciação de Eugenio Coseriu entre três professor em epígrafe acerca da importância continuada da níveis da linguagem20, o que, no entanto, não tem sido feito da lingüística histórica e de que, em sua opinião, um número forma idêntica por todos os autores. considerável das atuais questões centrais da teoria da linguagem só serão resolvidas se elas resistirem, de certa forma, a uma revisão desde a perspectiva histórica – bem ao contrário, portanto, do que afirmam erroneamente algumas tendências atuais anunciando a morte da lingüística histórica. Um segundo motivo é o fato de que ele ultimamente tem trabalhado no campo das assim chamadas tradições discursivas18, confrontando-se continuamente com o problema de que o status teórico-lingüístico das mesmas na verdade não está claro e parece necessário ser revisado mais uma vez. 18 Kabatek (2001) e Kabatek (2004). Sobre o conceito de tradições discursivas cf. Koch (1997), Aschenberg (2003). 19 As considerações seguintes referem-se, em linhas gerais, a um capítulo em Kabatek (2004). 20 “A fala é uma atividade universal genericamente humana, que é realizada individualmente em determinadas situações respectivamente por falantes individuais como representantes de comunidades lingüísticas com tradições comunitárias do saber-falar.” Coseriu (1988:70) Os três diferentes níveis são caracterizados por Coseriu da seguinte forma: “1. O falar representa aspectos universais genericamente humanos; ela o ‘falar em geral’. Todos os seres humanos adultos e normais falam. Inclusive o silêncio está em uma relação direta com o falar, pois silenciar significa ‘parar de falar’ ‘(ainda) não falar’ [...]. 2. Cada falar é falar uma determinada língua em particular. Na verdade, fala-se sempre em uma determinada tradição histórica [...]. 3. O falar é sempre individual, e notadamente em duas perspectivas: por um lado é sempre realizado por um indivíduo; não é um ato em coro. Cada um fala por si, e também no diálogo o papel do falante e do ouvinte é tomado em intercâmbio. Por outro lado, é individual na medida em que acontece respectivamente em uma determinada situação única. Para a denominação desse ato individual em uma determinada situação proponho – do francês discours – o termo ‘discurso’. Em alemão diz-se para esse nível também ‘texto’ [Text]; com isso é preciso, no entanto, levar em conta que se trata 302 A tentativa mais difundida nos últimos anos no âmbito ordem textual que atualizasse determinadas tradições da romanística enquadra as TD no nível histórico, que com isso discursivas, o que pode ser ilustrado de forma esquematizada se duplica:21 como segue: “No nível histórico é preciso distinguir entre dois campos. De um lado, é preciso falar de tradições discursivas, (gêneros, tendências estilísticas, formas conversacionais) [...]. De outro lado naturalmente interessa, sobretudo, cada uma das línguas históricas particulares.” (Koch/Oesterreicher 1994, 589) Dessa forma, a fala seria uma atividade universal cuja objetivo comunicativo língua particular (sistema e norma) tradição discursiva enunciado prática deveria passar por uma sorte de filtro de tradição duplo: Em oposição a esta visão, outros autores tentam alocar a intenção do ato comunicativo precisaria sempre ser alinhada as tradições textuais no plano individual, outros ainda postulam adequadamente à organização lingüística, onde os signos são que o adequado seria a duplicação de todos os três níveis, o que escolhidos seguindo uma ordem adequada às regras sintáticas significa dizer que, por um lado, seriam vistos como níveis do de uma língua particular (de acordo com um sistema e com a lingüístico, e por outro lado, como níveis do textual. realização comum de uma determinada norma). Não obstante a isso, deve-se pensar que será preciso Concomitantemente, seria necessário que ela se referisse a uma resolver em diferentes sentidos a questão do status das manifestações lingüísticas com respeito à relação entre TD e aqui em primeiro lugar da atividade em si e não do seu produto.” (ibidem, 70-71) 21 Cf. também Koch (1997: 45ss). língua, para chegar a uma clareza sobre a posição das TD na 303 teoria da linguagem. Para isso, parece, em primeiro lugar, Aborda-se, em primeiro lugar, acerca da historicidade necessário definir de maneira mais precisa o próprio conceito da língua. Esta ocupa aqui um lugar especial, uma vez que não de historicidade. É útil, nesse contexto, lembrar um debate no se trata da historicidade dos objetos, senão sobre a do próprio qual se procurava definir o que realmente se entende por homem como um ser histórico. A língua como língua particular historicidade na teoria da linguagem de Eugenio Coseriu, um é a história de uma comunidade internalizada no indivíduo. Ela debate anterior à noção das TD e no qual e se tratava dos atos é a forma primária do ser comunitário e o pressuposto para de fala. Por ocasião de uma discussão sobre a questão acerca da outras tradições culturais,23 “pois tudo que ali é criado deve ser historicidade dos atos de fala no ano de 1979, Eugenio Coseriu denominado por meio da linguagem e é transmitido como mesmo chamava a atenção de que o pressuposto básico para a conhecimento por meio da linguagem”.24 Por meio de uma correta situação do problema se dá através do esclarecimento língua particular, o indivíduo se torna um ser social,25 é por do que se entende realmente por historicidade. Nessa ocasião, meio dela que a existência do homem se torna realidade, já que Coseriu diferencia três conceitos distintos de historicidade:22 é uma existência compartilhada com uma comunidade, como diz Hegeli: - historicidade lingüística strictu senso (historicidade da língua dada), - historicidade como tradição (i.e., recorrência) de determinados textos ou de determinadas formações textuais, - historicidade genérica no sentido de uma “pertença à história”. 22 In: Schlieben-Lange/Weydt (1979), cf. também Coseriu (1978). 23 A linguagem é o pressuposto de todas as outras formas de organização humano-social: “A afirmação de que as tarefas sociais sejam resolvidas por meios lingüísticos, não se deve entender no sentido de que as tarefas constituam-se de forma extra- ou pré-lingüística. A línguagem, diga-se, está aí desde o início. As tarefas sociais só puderam ser instauradas e desenvolvidas desta maneira, sob a condição de que os integrantes da sociedade conversam entre si. A organização social também sempre se constitui por meios lingüísticos.” (Schlieben-Lange, 1983, 138). Cf. também Gadamer 1965, 268ss. 24 Coseriu 1978, 121. 25 Cf. Aristoles, Política, I. 304 “Com efeito, a linguagem é o ser-aí do puro Si, como a recria dentro de si como técnica aberta, a qual lhe permite a Si; pela linguagem entra na existência a singularidade ação lingüística criativa. para si essente da consciência-de-si, de forma que ela é para os outros.” 26 O segundo tipo de historicidade, ao contrário, refere-se a todos as manifestações culturais repetíveis, incluindo as lingüísticas. Trata-se aqui das tradições de uma comunidade, da recorrência na criação de objetos culturais, da possibilidade de Essa historicidade primária, que é condicionada por se referir a fatos culturais anteriores, evocados em fatos novos meio da alteridade, ou seja, pela “potencialidade inerente de por conta de semelhança funcional ou formal ou por parcial ser transferida a outros”,27 é própria apenas à língua como harmonia. Trata-se aqui daqueles objetos culturais disponíveis língua particular, uma técnica dada historicamente. Ela em uma comunidade para a repetição, a qual sempre inclui a condiciona a existência [So-Sein] do homem, o homem não mudança em duas direções possíveis: ampliando o modelo pode retroceder à linguagem, pois, na realidade, é por meio anterior ou particularizando-o.29 No que se refere à linguagem dela que ele existe como homem.28 O indivíduo falante como objeto fala-se aqui de textos que estabelecem uma incorpora na aquisição da linguagem uma língua particular, ele relação de tradição com outros textos. Essa pode dar-se, por um 26 Phänomelogie, VI, B, Ia. Coseriu reforçou repetidamente que o conceito de língua por ele desenvolvido (sobretudo em Sincronia, diacronia e história) remete, por um lado, no que tange a questão da historicidade e a origem da língua particular, a Aristoteles, mas também, por outro lado, quando fala da radicalidade com a que dá ênfase sobre a historicidade, ainda mais a Hegel. 27 Coseriu (1978, 121). O conceito de alteridade nessa forma em particular Coseriu assume de Antonio Pagliaro, cf. Schlieben-Lange (1998). 28 O que de forma alguma significa que o indivíduo estaria “preso” por uma língua em uma visão do mundo determinada, no entanto, ao contrário, ela possibilita-lhe o acesso a todas as línguas – o que, contudo, pressupõe sempre o domínio de uma língua primária. lado, pela repetição de uma determinada finalidade textual ou de um determinado conteúdo, e por outro lado, pela repetição de certos traços formais. O terceiro conceito de historicidade, por fim, refere-se a acontecimentos individuais, irrepetíveis e únicos,30 no sentido 29 Schlieben-Lange (1983:138). Sobre essa historicidade refere-se Foucault, quando ele fala da historicidade do discurso em contraposição à linguagem: “le discours, à la 30 305 do texto como indivíduo, ou seja, como cada texto em Com efeito, pode-se perguntar agora, se é particular.31 Aqui, trata-se do fato de que cada texto realizado é verdadeiramente preciso manter a diferenciação proposta entre situável como acontecimento em algum lugar historicamente. uma historicidade primária, da língua, e uma historicidade Essa forma de “historicidade” poderia, na verdade, ser secundária das tradições textuais. A partir daí, poder-se-ia desprezada na questão da tradição lingüística e textual, mas ela argumentar que uma fala que não esteja relacionada com está, porém, no centro da pesquisa filológica tradicional, e, determinadas tradições de textos não pode existir de forma sobretudo, porque características funcionais ou formais de um alguma. Mas aqui não se trata da questão se, visto de fora, cada texto individual servem como exemplo ou modelo para outros texto, no imenso arquivo de textos já realizados pelas pessoas, textos e um determinado texto é, por esse motivo, uma parte da já foi realizado alguma vez ou se um texto pode ser vinculado a tradição – e pode ser visto, por isso mesmo, também dentro do uma tradição. Na realidade, sempre é assim, mesmo em casos segundo aspecto de historicidade. de relação tradicional negativa: também um texto que rompe com todas as tradições precedentes é relacionável com elas, différence peut-être de la langue, est essentiellement historique”, uma vez que ele não é composto de “éléments disponibles”, senão de “événements réels et successifs”, que não se podem analisar fora de sua particularidade histórica (Foucault 1969, 260; veja-se também de la Higuera 1999,21ss). A língua é aqui, por esse motivo, a-histórica, porque ela é uma técnica intrínseca, não de forma temporal, para a criação de fenômenos lingüísticos particulares. 31 Essa “historicidade” do ato único é, com efeito, aquela que Foucault vê como verdadeiramente histórica, pois situa-se na história, enquanto que Coseriu nega essa historicidade e diz, “que a criação por si mesma não demonstra nenhum desenvolvimento e com isso não pode ter nenhuma história em sentido próprio: A Ilias, a Divina Commedia não se desenvolvem, elas permanecem idênticas a si mesmas eternamente, e por isso também só podem achar seu lugar em uma história do homem eterna e atemporal.” (Coseriu, 1978,118). Bem como Schlieben-Lange (1983:138): “Um texto em particular não tem uma história, ele é o produto respectivamente individual da ação comunicativa.” ainda que seja precisamente pela ruptura. Muito mais do que isso, trata-se aqui da questão se no ato de falar o vínculo com determinadas tradições textuais é dado primariamente e interiorizado no indivíduo da mesma maneira que o vínculo com uma língua. Esta questão não pode ser respondida completamente aqui, mas ela pode ser lançada em duas direções. Primeiramente, existe uma diferença fundamental entre a tradição internalizada da língua particular, cuja particularidade mais chamativa é precisamente que para o 306 sujeito falante ela esteja dissociada da tradição, e ela liberte o Um outro argumento contra a precedência da língua indivíduo da tradição já que, como técnica, como sistema poderia ser observado, por exemplo, no fato de que funcional, é um instrumento de liberdade; é um mecanismo de freqüentemente na tradição medieval das línguas europeias, fala que possibilita a criação livre de enunciados que não são mas também em outras situações históricas, encontram-se necessariamente realizações certos textos lingüisticamente mistos com relativa estabilidade anteriormente feitas. Em segundo lugar, existe uma diferença na forma textual. Parece ser que, nestes casos, a finalidade da qualitativa entre o fato de os falantes falarem uma língua mensagem e a forma textual são primárias, e a escolha da particular e o fato de se eles servirem das tradições textuais. língua é secundária. Trata-se aqui, no entanto, de casos Um texto (inclusive um texto lingüisticamente misto) é sempre particulares da comunicação em situações inerente a uma língua determinada; ele não pode ser “um lingüístico, nos quais a finalidade dos textos consiste pouco” ou “muito” português, alemão etc. O vínculo com precisamente na transferência de uma determinada forma tradições textuais, ao contrário, é gradual: existem formas textual de uma língua para outra. repetições de quaisquer de contato textuais tradicionais muito definidas, como, por exemplo, o Até aqui apenas falou-se da historicidade das línguas soneto, mas também formas muito pouco fixadas, como uma em particular, das formas textuais e de textos como fenômenos conversação descompromissada em um bar, a qual parece universais, mas não de atos de fala. Isso reside no fato de que, extremamente mais aberta e muito menos vinculada a uma como fenômenos universais, os atos de fala aqui foram tradição determinada.32 conscientemente deixados de lado, pois o universal até inclui o histórico, mas na verdade é a-histórico.33 Contra essa 32 A análise da conversação em parte demonstrou como, contrário ao que se pensava, também conversações livres são bastante regimentadas. A questão da definitude de tradição de todas as formas textuais não pode ser respondida de forma exaustiva aqui; e parece-me que também na pesquisa relativa a análise de conversação ela não foi respondida de forma definitiva. Aqui se trata, em primeira linha, de assinalar a gradualidade dos vínculos com a tradição textual. 33 A discutida questão sobre a universalidade dos atos de fala (SchliebenLange 1979,67ss. e 83ss.) deve aqui ser evitada pela inversão. Como atos de 307 interpretação poder-se-ia argumentar que pode sim haver atos posso pensar primeiro em fazer uma pergunta em alemão e só de fala que são tão históricos como uma língua determinada. depois, em um segundo passo, imaginar, se faço isso com uma Mas se em uma determinada língua existem técnicas para os determinada técnica do alemão. Ao contrário, eu preciso fazê- atos de fala universais, então essas técnicas pertencem com lo com uma técnica dessa língua. Por isso, onde há técnicas certeza à historicidade do primeiro nível, a qual é precisamente lingüísticas para atos de fala em uma língua, a historicidade dos a historicidade dessa língua em si: se em alemão uma ato de atos de fala coincide com a historicidade da língua mesma e fala “pergunta“ pode estar estar vinculado a uma determinada nenhuma historicidade de atos de fala além da historicidade da técnica, nesse caso, p.e., em certos casos com a inversão língua precisa ser assumida. Mas quando os atos de fala em sintática, então isto não é uma técnica acessória, da qual faz uso uma comunidade não são históricos no sentido de “pertencente o alemão, mas ela é uma técnica ancorada na língua alemã, que à língua”, eles só podem ser históricos no sentido do segundo pertence à essência [So-Sein] do alemão e com isso também ao nível, ou seja, tradicionais e acessórios. Ou seja, na realização próprio ser dos falantes dessa língua. Na historicidade vista desses atos, os falantes vinculam-se a determinadas tradições.34 nesse sentido, o sujeito e o objeto não podem ser separados. Essas tradições ou são formalmente definíveis, a saber, quando Quando eu falo alemão, então eu já estou nessa língua; para a expressão de um determinado ato de fala em uma eu não posso primeiro falar “universalmente” e depois, em um comunidade é comum uma determinada forma textual, ou elas segundo passo, fazer uso do alemão. Assim eu também não ainda são definidas de maneira mais precisa, quando um fala, são considerados aqui somente aqueles atos que são universais. Naturalmente os atos universais estão sempre ligados a formas históricas. Um outro problema atinge a historicidade dos atos de fala que estão ligados a instituições. Segundo Habermas (1971, 113) estes “não pertecem a universais pragmáticos”. Sua história é indissociável da história das respectivas instituições. Mas exatamente por este motivo também não se trata de atos universais, mas de elementos de tradição cultural em particular, que podem se manifestar tanto em línguas particulares como em formas textuais ou textos. 34 O caráter “acessório” das tradições textuais mostra-se através do fato de que a historicidade de formas textuais é comparável a outras formas culturais, algo como as tradições da arte, da música, do esporte, da religião etc. (Koch, 1997: 61), que estão vinculadas a comunidades culturais e não a comunidades lingüísticas. O caráter essencial da língua, ao contrário, mostra-se também em seu caráter “pre-comutado”: somente através da língua as outras tradições são acessíveis; a língua é o sistema de signos primário que define o sujeito e que é necessário para a assimilação de todos os outros sistemas de signos e tradições. 308 determinado ato de fala é expresso através de um determinado uma perda, mas a uma ampliação das possibilidades, de como texto particular, uma fórmula por exemplo. determinados atos podem vir a ser históricos. Ainda é necessário insistir aqui que deixar de lado os O objetivo das linhas anteriores era de duas espécies: atos de fala na interpretação da historicidade lingüística e em primeiro lugar, o reforço à singularidade e à precedência da textual não nega nem a sua existência nem mesmo a sua historicidade lingüística, que não pode ser situada no mesmo historicidade. Diz-se apenas que os atos de fala não têm uma nível de outras historicidades ou tradições. No entanto, em historicidade própria dissociável das outras historicidades. Mas segundo lugar, com isso não se deve duvidar da importância eles podem ser transmitidos historicamente tanto através da das tradições discursivas para a teoria da linguagem, mas historicidade primária da língua como através da historicidade justamente o contrário. Sua situação adequada do ponto de secundária das tradições discursivas. E ainda mais: eles podem vista teórico-lingüístico é antes de mais nada o ponto de partida até ser transmitidos em ações simbólicas não lingüísticas,35 e para a descrição do que elas realmente são, como elas devem justamente nisso reside uma grande liberdade que possibilita ser definidas e quais serão as conseqüências para uma descrição grandes diferenças em relação à ancoragem de determinados histórico-lingüística que não se limite à evolução dum sistema atos em distintas comunidades: um ato como “prometer” pode, lingüístico abstrato senão que dê conta, ao mesmo tempo, das segundo cada tradição, ser simbolizado por uma ação não- tradições discursivas. verbal, ele pode ser realizado por uma repetição não modificada de uma determinado texto (uma fórmula), ele pode requerer uma determinada forma textual ou até mesmo estar ancorado diretamente no sistema lingüístico. A negação duma historicidade própria dos atos de fala não conduz, portanto, a 35 Austin (1962:121). Referências bibliográficas 309 ASCHENBERG, Heidi (2003): “Diskurstraditionen – Orientierungen und Fragestellungen”, in: Aschenberg/Wilhelm DE LA HIGUERA, Javier, Michel Foucault: La filosofía como crítica, Granada, Comares, 1999. (Org.), p. 1–18. FOUCAULT, ASCHENBERG, Heidi / Wilhelm, Raymund: Romanische Michel, L’archéologie du savoir, Paris, Gallimard, 1969. Sprachgeschichte und Diskurstraditionen, Tübingen, Narr 2003. AUSTIN, John Langshaw, How to do things with words, Oxford, Oxford University Press, 1962. COSERIU, Eugenio, Humanwissenschaften und Geschichte. Der Gesichtspunkt eines Linguisten, Det Norske VidenskapsAkademi-Årbok, Oslo, 1978, 118–130. ______________ L’ordre du discours, Paris, Gallimard, 1972. GADAMER, Hans-Georg, Wahrheit und Methode. Grundzüge einer philosophischen Hermeneutik, 2. Aufl. Tübingen 1965. HABERMAS, Jürgen, Vorbereitende Bemerkungen zu einer Theorie der kommunikativen Kompetenz, in: Habermas/Niklas Luhmann, Theorie der Gesellschaft oder Sozialtechnologie, Frankfurt, Suhrkamp, 1971, 101–141. ______________ Sprachkompetenz. Elemente einer Theorie des Sprechens, Tübingen, Narr, 1988. Jürgen 310 KABATEK, Johannes, „La lingüística románica histórica: Frank/Thomas tradición e innovación en una disciplina viva“, La Corónica mittelalterlicher Schriftlichkeit, Tübingen, Narr, 1997, 43–79. Haye/Doris Tophinke (edd.), Gattungen 31.2, 2003, 35-40. KOCH, Peter/OESTERREICHER, Wulf, Sprache der Nähe – ______________ “¿Cómo investigar las tradiciones discursivas Sprache der Distanz. Mündlichkeit und Schriftlichkeit im medievales? El ejemplo de los textos jurídicos castellanos”, in: Spannungsfeld von Sprachtheorie und Sprachgeschichte, Daniel Jacob u. Johannes Kabatek (Hrsg.): Lengua medieval y Romanistisches Jahrbuch 36 (1985), 15–43. tradiciones discursivas en la Península Ibérica: descripción gramatical - pragmática Frankfurt/Main-Madrid: histórica - metodología, Vervuert/Iberoamericana 2001 (Lingüística Iberoamericana, 12), S. 97-132. ______________ Die Bolognesische Renaissance und der Ausbau romanischer Sprachen – Juristische Texttraditionen und Sprachentwicklung in Südfrankreich und Spanien im 12. und 13. Jahrhundert, Tübingen: Niemeyer, 2004. KOCH, Peter, Diskurstraditionen: ______________ Gesprochene Sprache in der Romania: Französisch, Italienisch, Spanisch, Tübingen, Niemeyer, 1990. ______________ Schriftlichkeit und Sprache, in: Hartmut Günther/Otto Ludwig (edd.), Schrift und Schriftlichkeit. Ein internationales Handbuch / Writing and its Use. An international Handbook, 2 Bde., Berlin/New York, Mouton de Gruyter, 1994–1996, 587–604. zu ihrem sprachtheoretischen Status und ihrer Dynamik, in: Barbara 311 RAPHAEL, Lutz, Geschichtswissenschaft im Zeitalter der Extreme. Theorien, Methoden, Tendenzen von 1900 bis zur Gegenwart, München, Beck, 2003. VOELKER, P. (1886): „Die Bedeutungsentwickelung des Wortes Roman“, Zeitschrift für Romanische Philologie 10, 485-525. SCHLIEBEN-LANGE, Brigitte/WEYDT, Harald [mit Beiträgen von Eugenio Coseriu und Hans-Ulrich Gumbrecht], Streitgespräch zur Historizität von Sprechakten, Linguistische Berichte 60 (1979), 65–78. WILHELM, Raymund (2001): “Diskurstraditionen”, in: Martin Haspelmath/Ekkehard König/Wulf Oesterreicher/Wolfgang Raible (Org.) Language Typology and Language Universals. An International Handbook, I, Berlin/New York: de Gruyter, SCHLIEBEN-LANGE, Brigitte, Linguistische Pragmatik, pp. 467–477. Stuttgart, Kohlhammer, 1979. ______________ (2003). “Von der Geschichte der Sprachen ______________ Traditionen des Sprechens. Elemente einer pragmatischen Sprachgeschichtsschreibung, Stuttgart, Kohlhammer, 1983. ______________ Alterität als sprachtheoretisches Konzept, Zeitschrift für Literaturwissenschaft und Linguistik 110 (Thema: Alterität, 1998), 41–57. zur Geschichte der Diskurstraditionen. Für eine linguistische fundierte Kommunikationsgeschichte” in Aschenberg/Wilhelm (Org.), pp. 221-236. Sujeito Político e sua Constituição Profa. Msc. Edileuza Gimenes Morais (UNEMAT\UNICAMP) 312 13:00hs às 15hs. Comunicações Individual e Coordenada A Não-Coincidência das Palavras com as Coisas: o real da Mesa 1 Comunicação Coordenada língua a nomear Concepções teóricas da Semântica e da AD na formação do Carlos Magno Viana Fonseca (PG/UFC) professor Mesa 3 Concepções teóricas e as relações com a formação do professor Educação de Jovens e Adultos: questões de gênero Coordenadora: Adélia Maria Evangelista Azevedo (UEMS) Márcia Regina Adão de Souza (G/UNICAMP) A charge "Radical Chic" - a enunciação em foco Discurso e Identidade: as cotas na UEMS Elena Rodrigues Alarcon (G/UEMS) Lúcia Alves Demétrio (G/UEMS) A negação na crônica "Teleantevisão" Discurso de Cotas na UEMS: uma questão polêmica Tania Roberta Benites Carvalho (G/UEMS) Maria Francisca Valiente (G/UEMS) A formação do professor e a realizade do ensino Racismo e Preconceito nas Séries Iniciais do Ensino Sandra Regina Alez Herter Pereira (G/UEMS) Fundamental Maria Fêlix de Carvalho (G-UEMS) Mesa 2 Alguns Sentidos do Discurso sobre os Seios Femininos Caídos Fernanda Aline de Andrade (PG/UFMS) Alaíde Pereira Japecanga Aredes (UEMS) 313 NECESSIDADE DE SE TRABALHAR O ANTI-RACISMO JÁ NAS SÉRIES INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL Maria Félix de Carvalho36 UEMS/NA Alaíde Pereira Japecanga Aredes37 UEMS/NA INTRODUÇÃO Este trabalho consistiu em demonstrar que o problema do preconceito racial é algo muito presente nas escolas, desde pequenas as crianças aprendem a ser racistas e a escola contribui de maneira significativa neste cenário. Esta foi uma de nossas hipóteses iniciais. De fato, encontraram-se nas escolas pesquisadas vários elementos que nos fazem afirmar que o espaço escolar está contaminado de preconceitos de todos os tipos, mas de forma mais acentuada o preconceito em relação às crianças afrodescendentes. Quando ocorreu a idéia de desenvolver este projeto, a intenção era 36 37 Egressa do curso de Letras da Unidade Universitária de Nova Andradina Docente da UEMS 314 mostrar esta realidade e a possibilidade de amenizar o problema, escolas, especificamente nas classes de primeira a quarta séries do começando pelas séries iniciais. Ensino Fundamental das escolas de Nova Andradina, para que este O interesse por este tema, se deu em virtude de que fui possa ser minimizado a partir da infância. De maneira mais vítima várias vezes de preconceito e racismo dentro da escola. específica, esperou-se contribuir para que a escola possa refletir Muitas vezes senti-me humilhada diante de piadas e da sobre como está ensinando as crianças afrodescendentes de modo a marginalização que 38sofria. Lembro-me que desde meus primeiros fazer valer os direitos e deveres destas dentro das escolas públicas anos estes fatos já ocorriam comigo, embora, não soubesse ainda brasileiras, de maneira especial, nas escolas públicas de Nova defini-los, só sentia que não era algo bom, eu não me sentia bem Andradina. dentro da escola. Creio que ainda hoje estas coisas persistem. Esta Foram feitas entrevistas com professores, por sua vez pesquisa poderá trazer descobertas que contribui para o combate envolvidos com as séries iniciais do Ensino fundamental. Tais ao racismo não só dentro de Instituições como a escola, mas dentro entrevistas foram gravadas e depois transcritas. Analisaram-se da própria sociedade. E minha idéia é que tal trabalho seja feito livros utilizados nestas séries. Em relação às entrevistas, quando a criança começa a freqüentar este espaço chamado escola. centraram-se em saber quais são as concepções dos professores Acreditando ser este um momento de reparação da a respeito do racismo e do preconceito dentro das salas de aula histórica em relação opressão à situação política, econômica e e social da causa negra, vejo esta pesquisa como algo que poderá questionário aos professores, a fim de saber se na escola havia contribuir e muito nesta luta, na qual me sinto engajada. material que contribuísse para realização de um trabalho O objetivo principal foi pesquisar o problema do preconceito racial que se arrasta ao longo dos tempos dentro das conseqüentemente, dentro da escola. um voltado para o combate ao racismo e o que a escola já fazia neste sentido. 38 Vale enfatizar que com o ensino de 9 (nove) anos, a expressão “série” não existe mais e sim “anos” do ensino fundamental, por exemplo, 4º ano do Ensino Fundamental Apliquei O racismo na escola: como lidar com ele? 315 Como exemplo deste tipo de trabalho, podemos citar o da Dados de pesquisas mostram que a maioria dos professora Simoni Marambaia Lins de Carvalho da escola professores da rede pública de ensino ignora o problema e não fundação Bradesco, no Rio de Janeiro, a qual trabalhou sabe orientar os alunos quando surge um caso de racismo em máscaras Africanas com turmas da primeira série. Os alunos sala de aula, ora por omissão, ora por falta de preparo ou até pesquisaram curiosidades do continente africano até chegar à uma visão deturpada da questão, acabam reforçando os arte. Papelão, tinta e cola renderam modelos coloridos e preconceitos existentes na sociedade. divertidos. Outros estudos ainda mostram que a escola é o lugar Para a compreensão da realidade do negro no Brasil a onde a criança tem o primeiro choque ao descobrir o turma conheceu como era o cotidiano das crianças na época da significado do ser negro na sociedade brasileira. escravidão analisando imagens. As obras de Jean-Baptiste O trabalho de educação anti-racista deve começar Debret (1768-1848) que foram comparadas às fotografias cedo. Na educação infantil o primeiro desafio é o entendimento publicadas em jornais atuais dão um panorama critico da da identidade. A criança negra precisa se ver como negra e situação do passado e do presente. Chegou-se à conclusão que aprender a respeitar a imagem que tem de si e ter modelos que ainda há muito sofrimento e violência contra a criança negra. confirmem essa expectativa. Por isso deve ser cuidadosa a Por outro lado, o projeto propiciou às crianças o conhecimento seleção de livros didáticos e de literatura que tenham famílias da alegria e da majestade da cultura africana, explica a negras bem sucedidas, por exemplo, os heróis e heroínas professora, tudo como deve ser sem constrangimentos nem negras. mitos equivocados. (Revista escola. Abril. Com/edições/0177). Se a linguagem do corpo é especialmente destacada Ressalta a professora que com este trabalho sua aluna nas series iniciais, porque não apresentar danças africanas, Roseane de Souza Queiroz de oito anos, com cabelos lisos e jogos como capoeira e musicas como samba e maracatu? claros, pediu que estes fossem trançados e escuros como os da 316 colega de sala de aula, uma garota negra. Esta atitude projetos educativos adaptar, priorizar e acrescentar conteúdos surpreende, é muito mais comum a criança afrodescendente segundo suas realidades particulares, tanto ao que se refere às desejar se parecer com a maioria dos heróis dos contos de fadas conjunturas europeus, com modelos estampados em revistas e com colegas desenvolvimento dos alunos. que recebem maior atenção na sala todos brancos e loiros. sociais específicas quanto ao nível de Esse é um trabalho que embora complexo, pode ser As duas meninas participam sistematicamente de prazeroso e motivador na sala de aula, por falar de perto da discussões e projetos anti-racistas na escola. O desejo de realidade de vida daqueles que ali ensinam e aprendem, pela Roseane é um exemplo concreto de que é possível combater na enriquecedora oportunidade de conhecer a história de dignidade escola desde as séries iniciais o preconceito e estereótipos. de conquista e de criação de culturas e povos que constituem o De acordo com especialistas, uma das saídas para o Brasil, de tudo que sendo diverso, valoriza a singularidade de fim das desigualdades educacionais do Brasil é enfrentar as cada um e de todos nós. (Parâmetros Curriculares Nacionais, desigualdades raciais que estão presentes no ambiente escolar, p.5; Pluralidade cultural e orientação sexual) a começar pelo currículo, a história e a cultura negra têm pouco Por outro lado, Segundo Menegassi & Souza (2004), ou nenhum destaque, diferentemente da cultura Européia. Em um país onde 44% da população são A sociedade brasileira começa, mesmo que Afrodescendente, quantas pessoas conhecem a rainha Nzenga, timidamente, a despertar e a construir uma líder da libertação do reino Africano, ou Dandara guerreira de consciência em relação à opressão racial. Kilombo dos Palmares ao lado de Zumbi?(revista escola. Abril, Porém, o que ainda é possível perceber é que 2005). esse despertar necessita avançar muito no É importante salientar que cabe a equipe técnica, aos combate a essa discriminação presente na educadores ao elaborarem seus programas curriculares e sociedade. O ambiente escolar, uma das 317 instâncias sociais formadoras de ideologia, incapacidade com uma forte presença de está repleto de uma cruel realidade em que as baixa auto-estima. Esse aluno certamente diferenças étnico–culturais são assimila a desvalorização do negro presente respeitadas, difundindo e no livro didático, através dos papéis que lhe não preconceitos práticas racistas por todo o país. (p.01) são atribuídos, como por exemplo, o negro ser sempre o causador de confusões, ser o rebelde, ou até mesmo aparecer como a Os autores acima citados demonstraram que na maioria dos Livros Didáticos de 5ª a 8ª séries apresenta formas de discriminação e práticas racistas de maneira explícita em suas páginas, contribuindo para a manutenção da visão do preconceito. Essas ações preconceituosas atuam de maneira agressiva contra os grupos ou indivíduos que as sofrem, deixando marcas profundas, na maioria das vezes, em cidadãos criança suja da história; além de toda essa imagem deturpada, ainda pode-se perceber que a mulher negra aparece sempre na cozinha ou como serviçal, nunca como a patroa, isso apenas para dar idéia do que se encontra nos livros didáticos atuais (2004, p. 01). em formação, como crianças e adolescentes no contexto escolar. Afirmam eles: Não podemos ficar calados, diante da omissão de uma discussão sobre a presença discriminatória ao negro difundida em sala de aula através do livro didático; afinal, as pessoas É possível perceber essas marcas por meio de necessitam ser educadas para respeitar umas as outras com suas pequenos comentários de alunos negros em diferenças; é preciso começar a mudar, e nada melhor do que sala de aula, julgamentos de inferioridade ou 318 iniciar por aquele que exerce papel fundamental de difusor do influências conhecimento no cotidiano escolar: o livro didático. pertencentes ao grupo do qual foram associadas tais negativas, baixa auto-estima às pessoas “características distorcidas”. De acordo com Silva (1995, p.47), É visível que o livro didático é transmissor de imagens, que incutem valores negativos de determinados O livro didático, de modo geral, omite o processo histórico–cultural, o cotidiano e as experiências dos segmentos subalternos da sociedade, como o índio, o negro, a mulher, entre outros. Em relação ao segmento negro, sua quase total ausência nos livros e a sua rara presença concorrem em de forma grande estereotipada parte para a grupos étnicos, segundo as palavras de Freitag (1997 p.85): “a ausência de temas do aluno carente, do conflito de classes, da discriminação racial, quanto à presença de estereótipos” demonstra que é necessária a inclusão de temas referentes ao preconceito e às diversas formas de injustiça social. Assim, se pode perceber que a estrutura do livro didático precisa ser modificada, para melhor atender a prática educacional e combater qualquer tipo de discriminação. fragmentação da sua identidade e auto estima [...] Os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 2000 p.99) abordam a questão da pluralidade cultural, no contexto escolar, como um desafio, reconhecendo a riqueza dessa Isto significa que é possível constatar formas de diversidade etno-cultural, investindo na luta contra todo tipo de discriminação ao negro, além da presença de estereótipos, que discriminação, tomando como ponto de partida os direitos correspondem a uma espécie de rótulo utilizado para qualificar humanos. Dentro do conteúdo temas Transversais e Ética, de maneira conveniente grupos étnicos, raciais ou, até mesmo, propõem uma educação comprometida com a cidadania. Este sexos diferentes, estimulando preconceitos, produzindo assim documento foi elaborado como maneira de orientar os 319 professores quando se depararem com problemas nestes da história, uma massa de ex-escravos foi excluída pela aspectos dentro de suas salas e serve como base para que sociedade após a abolição. O estímulo à imigração européia possam realizar tal trabalho visto que a cidadania é algo que impediu a democracia aos negros e ainda limitou suas está ligado ao respeito mútuo e deve fazer parte do convívio possibilidades de participação no meio social de forma escolar, apesar das diferenças existentes entre cada pessoa, igualitária. Não é possível silenciar diante da presença de assim, “é inevitável que inspirados por preconceitos expressos estereótipos e discriminações na sociedade e principalmente no aqui e ali, alguns alunos se mostrem desrespeitosos com contexto escolar. colegas diferentes”. É importante observar a dimensão ideológica O tema Pluralidade Cultural permite, por meio da vida constituída pela política de “branqueamento” da população escolar, esclarecer eventuais preconceitos, colaborando para brasileira. Os reflexos desta política podem ser facilmente um convívio democrático. De acordo com os PCNs, (BRASIL, demonstrados através do depoimento de uma aluna negra, em 2000 p.59) ao “repudiar toda discriminação de raça/etnia, resposta dada à pergunta: “Você gostaria de ser diferente? classe social, crença e sexo”, é possível ensinar aos alunos o Hum... eu gostaria de ser branquinha” (“O Silêncio vai desenvolvimento de atitudes de empatia para com aqueles que acabar”, revista Nova Escola, 120, 1999, p.15), a questão sofrem qualquer tipo de preconceito. Nessa perspectiva, apresenta possibilidades de inferências, tais como: a menina observa-se que o exercício da cidadania deve considerar o poderia dizer que gostaria de ser magra ou até mesmo ter olhos princípio da eqüidade, isto é, a presença das diferenças que verdes, caso ela não possuísse tais características; contudo, devem ser levadas em conta para que a igualdade seja percebe-se que o fato de ser negra é algo que lhe incomoda verdadeiramente alcançada. tanto, a ponto de querer ser diferente do que ela realmente é. É A discriminação sofrida pelos negros produz efeitos negativos em relação à própria unificação do país. No decorrer a consolidação da política do branqueamento estampada e produzida no meio social escolar. 320 O ambiente escolar deveria favorecer a valorização da Portuguesa e História, aprovados pelo Ministério da Educação “pluralidade cultural” que nos consiste a convivência com os e Cultura no ano de 2002, através do Plano Nacional de Livro diferentes grupos sociais presentes no país. O mito de que o Didático. Brasil possui uma democracia racial apenas impede os grupos étnicos de conquistar o respeito e o espaço necessários na sociedade. A presença de estereótipos e de formas de discriminação pode ser facilmente constatada no contexto escolar através das referências deformadas por ilustrações preconceituosas, No entanto, percebe-se que o livro didático, nas raras caricaturas do segmento negro repassada aos alunos por meio ocasiões em que apresenta o negro, o focaliza como um elemento do livro didático. Também é importante ressaltar o silêncio dos muitas vezes à margem da sociedade, o fato é que tal professores diante de tais ações de desrespeito ao negro procedimento caracteriza a política de branqueamento, isto é, promovidas pelo livro didático e por toda a sociedade escolar, demonstra que a educação brasileira parece não ser desenvolvida como um todo. para alunos negros, pois os mesmos não conseguem se identificar diante das características que lhes são atribuídas, já que por vezes RESULTADOS DA PESQUISA DE CAMPO elas aparecem retorcidas no contexto escolar. Visando contribuir para a mudança deste fato e ainda Ao analisar a cartilha de alfabetização39 da primeira para a formação de uma escola voltada para a diversidade série do ensino fundamental da escola “Fernando Augusto”40, cultural pronta a respeitar as diferenças raciais, tomando como procurando identificar figuras ou falas racistas ou anti-racista, ponto de partida o livro didático, tendo em vista que o mesmo exerce forte influência na formação do aluno e do cidadão brasileiro, este trabalho apresenta análises de alguns livros didáticos das series iniciais do ensino fundamental de Língua 39 A cartilha adotada para alfabetização titula-se, Todas as Letras, de Marisley Augusto. 40 A fim de salvaguardar a fonte de informações, optamos por um nome fictício em relação á escola pesquisada. 321 logo nas paginas 6 e 7 esta traz figuras de crianças dentro de Nas paginas 62 a 65 o livro traz a história de Ganga uma determinada escola onde de 27 crianças somente 5 são Zumba e Zumbi, mas ao entrar nesta sala e abordar o tema do negras. E nesta escola , as salas pesquisada são compostas de racismo com as crianças desta série, eles disseram não crianças, em sua maioria, afrodescendentes. Para mim, isso conhecer a historia destes heróis negros. Questionei ainda se demonstra a falta de uma política pública concreta que teça costumam ler livros que têm personagens negros, eles disseram olhares para a questão étnica racial quando se trata do livro que não, ainda perguntei quais os livros foram lidos por eles didático. Se prõe a combater o racismo, propõe inclusive, neste ano, alguns responderam: Branca de Neve, O menino programas de reparação, como por exemplo, políticas Maluquinho etc afirmativas, enquanto em nível micro a situação continua Segundo Kramer, 1995, p.69 caótica. Nota-se que a criança afrodescendente ainda é vista como minoria no ambiente escolar e o que vemos na realidade. [...] Defendendo a idéia de que devemos Ao analisar o livro de história usado nesta escola, sempre rememorar a história – a de cada um tendo como referência o da terceira série que tem como titulo, de nós e de todos-conhecer a história, “História com reflexão”, da coleção horizontes, percebemos estudar a história, desatando a linguagem que a historia do negro é ainda contada a partir da escravidão, acorrentada por tão diversas mordaças na pagina 55 a historia do negro começa ser contada com o ameaças, correntes, grilhões. Destaco ainda, seguinte titulo; O trabalho escravo no Brasil. [...] Após 1550, os que os profissionais da educação precisam escravos negros vieram para o Brasil [...] discutir Em nem um momento é enfatizado o fato de o povo o racismo e seus próprios preconceitos, temas que, com freqüência, negro já ter uma vida antes de serem seqüestrados e trazidos a o não Brasil para o trabalho escravo. legitimamente pedagógica [...] têm sido reconhecido como 322 rainhas que não sejam brancos?Você não Solicitou-se à secretaria da escola que me acha isso um problema? Então imagine o que informassem a quantidade de alunos que se auto declararam significa ser despertado para o prazer da negros ou pardos, eles me orientaram falar com os próprio leitura sem ver sua raça representada de professores, ao procurar os professores, resolvemos fazer tal forma positiva nas paginas dos livros. (Daniel levantamento em forma de questionário, o qual entreguei às Aarão, professor de história, UFF). crianças, (o questionário era somente para que eu estivesse informada de quantos alunos se declaram negros ou pardos), e Entrevistou-se a professora E. B.M, a mesma afirmou para minha surpresa ninguém se declarou negro, mas todos que na escola onde trabalha todos seus colegas estão morenos, brancos ou claros. Percebemos aí como o fato de ser preocupados em como vão trabalhar a lei 10.639, pois não se negro parece assustador. encontram capacitados para isto, e ao lhe perguntar se já se Certamente ninguém ama aquilo que não conhece, ou que é sempre mostrado como minoria. deparou com algum caso de racismo dentro de sala de aula a mesma me disse que nunca, mas que se houvesse pensa que se sentiria perdida. Diante do exposto pediu para que eu fosse à [...] em sua sala professor, será território escola em que trabalha apresentar meu projeto, e falar um neutro?Por mais que você se preocupe em pouco da lei 10.639. Marcamos então para que este trabalho tratar todos da mesma maneira, os negros fosse realizado por volta do dia 20 de novembro onde continuam sendo discriminados. Quer ver comemoraremos o dia da consciência negra. como? Pense nos livros que a turma lê. Eles O estudo feito a respeito do racismo nas séries iniciais, mostram famílias negras de classe média, deixa explícito que este é um problema ainda persistente dentro felizes e bem sucedidas?Tem príncipes, reis e do ambiente escolar e existe também a dificuldade por parte 323 dos professores em saber trabalhá-lo, os resultados do hoje em dia, as pessoas admitirem o problema e desejarem questionário que apliquei para alguns professores (vide anexo), melhorar, foi isso que percebi quando visitei alguns espaços confirmam esta dificuldade. Embora o assunto esteja sendo escolares. bastante abordado em muitas áreas e é algo garantido em lei Os seres humanos não nascem racistas, se tornam que se trabalhe esta questão em sala de aula ainda é um racistas, ou seja, ao que parece, o racismo é algo construído no processo lento. seio das famílias, das religiões, dos espaços escolares, enfim, Alguns dos resultados apontam que o grau de de alguma forma são valores transmitidos. dificuldade de se falar sobre racismo em sala de aula é uma E a escola, sendo um espaço muito importante, realidade, e suas conseqüências são drásticas, a escola não tem valorizado pelas famílias e pela sociedade pode e deve cumprido seu papel que é também de fazer valer o direito e não contribuir para que tenhamos uma sociedade menos racista, só os deveres das crianças afrodescendentes no Brasil. porque não sei se é possível acabar com o racismo, assim como Percebemos também que muitos afirmam não saber como agir não é possível todos terem uma mesma religião, ou uma mesma quando surge um fato de preconceito racial entre as crianças filosofa de vida, as pessoas são diferentes, o que estamos dentro da sala de aula, embora existam muitos trabalhos e fazendo é um pedido para que as coisas sejam compreendidas livros que orientem o professor neste sentido. Faz se assim a de maneira científica, não queremos que o negro seja tratado necessidade de capacitá-los. O levantamento deste assunto nas como um coitado, onde todos têm que ter dó ou pena dele e o escolas fez com que dessem mais ênfase a este trabalho, e “aceite” na sociedade, o que queremos é respeito, espaço para muitos professores manifestaram a vontade de conhecê- nossas vozes soarem, espaços na Universidade, nas escolas, no loprofundamente. mercado de trabalho, no meio artístico, enfim, ser vistos como Em relação à capacitação, a maioria dos professores sente necessidade de fazê-la e está disposta, o que é muito importante pessoas normais. 324 Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor básica, por saber que a instituição escolar tem um papel de sua pele, por sua origem ou religião, para fundamental no combate ao preconceito e racismo, porque odiar, as pessoas precisam aprender; e se elas participa na formulação de atitudes e valores essenciais à formação podem aprender a odiar, podem ser ensinadas da cidadania de nossos educando. (CAD.cedes Campinas, vol. 25, a amar,pois o amor chega mais naturalmente n67, p. 378.388. set/dez/2005, www.cedes.unicamp.br) ao coração humano do que o seu oposto”. (Nelson Mandela, Para além do Racismo_abraçando um futuro diferente). A Profª Drª Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva, 59 anos, representante do conselho nacional da educação, concedeu uma entrevista muito interessante à folha de São Paulo, a qual está à disposição Em relação à escola, a questão racial deve começar fazer no site www.mulheresnegras.org/doc/texto_para_mulheres_negras.rtf. parte das discussões já a partir da Educação Infantil. As crianças Considerei a fala da referida professora um importante exemplo são capazes de expressar suas opiniões sem censura nesta fase da que poderíamos trazer para este momento. vida. Nossa busca é por uma educação igualitária e democrática, A história dos negros foi ensinada para Petronilha por sua pois dados revelam que as crianças negras apresentam índices de família, e não na escola onde estudou, em Porto Alegre (RS). Ela evasão e repetência maiores do que os apresentados por crianças conta que suas avós, mesmo pertencentes à raça negras chegaram brancas. A razão disso tudo, é devido os seguintes fatores: ao nível máximo de escolarização permitido a uma mulher no Conteúdo eurocentrico do currículo escolar dos livros início do século passado. Petronilha seguiu pelo mesmo caminho. didáticos e programas educativos, aliados ao comportamento Após seu doutorado em ciências humanas pela Universidade diferenciado do corpo docente diante das crianças negras e Federal do Rio Grande do Sul, fez pós-doutorado em teoria da brancas... Consideramos, pois de fundamental importância a educação na Universidade da África do Sul, em Pretória, onde foi inclusão do ensino da história da áfrica no currículo da educação professora visitante. Hoje, ela participa da coordenação do Núcleo 325 de Estudos Afro-Brasileiros da UFSCar (Universidade Federal de Desde "Casa Grande e Senzala" “de Gilberto São Carlos). Freyre, publicado em 1933” essa história foi Na entrevista a profª disse que não acusa o professor por não trabalhar o problema do racismo na escola. Afirma ela: floreada. Nós nos referimos aos africanos que vieram para o Brasil apenas como escravos. Mas as pessoas não se escravizaram, elas foram Há uma ausência quase absoluta de imagens da escravizadas. Foram trazidas para cá, mas antes população negra nas escolas. A gente vê figuras disso tinham uma história. Há uma experiência e cartazes da classe média, mas não vemos do interessante, na década de 80 na Bahia, de pobre, do negro, do gordo. No caso do povo formação de professores de história [...] [...] negro, a história no Brasil não é sequer Segundo ela, o problema é de falta de devidamente apresentada. As imagens de negros conhecimento real da história dos negros no em livros didáticos aparecem quase sempre de Brasil. Uma história que começa como lembra, forma negativa. A forma depreciativa com que se na África, e não na chegada dos escravos em solo trata a população negra faz com que o estudante brasileiro. Soluções para esses problemas, diz a se afaste da escola e não se identifique com ela. professora, deve ser discutido no CNE, órgão que tem a função de auxiliar o MEC na execução A Folha de São Paulo perguntou à Profª Petronilha se o fato de a história do negro ser de sofrimento, não estaria querendo e elaboração de normas e políticas públicas para o ensino. apresentar outra versão e isso não seria florear um fato histórico? Petronilha respondeu da seguinte forma: Como o preconceito racial afeta uma criança? 326 Em primeiro lugar a pergunta nos dá a oportunidade de E por fim, o conceito de racismo. Muitas pessoas dizem definir alguns conceitos importantes que geralmente aparecem que o racismo no Brasil afeta pessoas negras, pobres, indígenas, quando discutimos sobre relações raciais. São eles: preconceito gordas etc. Certamente essas pessoas querem dizer que esses racial, discriminação racial e racismo. Muitas vezes não os grupos também são discriminados e não que sofrem em diferenciamos ou não sabemos exatamente o que de fato cada decorrência do racismo, pois no conceito de racismo está presente termo quer dizer. Quando falamos de preconceito estamos nos a idéia de que existem raças superiores e inferiores e que disso referindo à idéia preconcebida, sem razão objetiva ou refletida. decorrem a opressão de um grupo racial sobre outro, legitimando Por exemplo: pensar que as pessoas negras são pouco as desigualdades sociais, econômicas, escolares etc. afeitas aos estudos e mais destinadas a trabalhos manuais é uma Por isso, quando falamos que a pessoa gorda tem idéia preconceituosa, porque não está de acordo com a realidade e problemas de aceitação social, não estamos falando do mesmo atinge a todo um grupo de pessoas. O fato de uma, ou outra pessoa fenômeno que desumaniza a pessoa negra ou indígena. Um caso se negra não gostar de estudar não pode ser aplicado a todo o grupo refere à discriminação e outro as conseqüências do racismo. racial. Na cidade de Campo Grande/MS, em 1983 numa escola Já a discriminação racial é uma atitude ou uma ação que pública municipal e em 2002 em uma oficina para crianças de 3 a objetiva diferenciar, distinguir e em geral prejudicar um grupo 14 anos de uma comunidade negra urbana chamada São João tendo por base idéias preconceituosas. Por exemplo: quando uma Batista aconteceram os seguintes episódios: professora não permite que uma menina negra represente uma princesa em uma peça de teatro argumentando que as princesas são Posso me sentar ao seu lado? –pergunta à brancas, ela está discriminando negativamente, porque está professora, uma linda menina negra de cabelos praticando uma ação que objetiva prejudicar uma criança devido trançados e seus sete anos. ao seu pertencimento racial. 327 -Claro, mas por que quer sentar-se aqui? - alternativas apresentadas e outras que lembrassem. A maioria perguntou-lhe intrigada, já que sou a única adulta repetiu o que foi dito. na sala de aula da 1ª série e há vários grupos de Perguntou-se às crianças que desenharam as ações crianças pela sala. violentas se de fato essas eram boas alternativas, algumas - É que você é a única igual a mim -, voltando resolveram apagar essa alternativa, outras decidiram mantê-la seus olhos para a sua pele. dizendo que era a única que resolvia. Terminada essa atividade, voltaram ao grupo maior para finalizar a oficina. Foi feita uma Outro episòdio: avaliação dos trabalhos daquela tarde, os adolescentes, principalmente, disseram que gostaram do livro porque eles se Numa determinada escola a professora discutiu sentiam bonitos como o menino marrom, etc., fizeram muitas após a leitura do livro O Menino Marrom do brincadeiras. Ziraldo, como era a discriminação na escola. Esses acontecimentos nos dão a dimensão de como o Várias crianças relataram que sofriam com os preconceito racial está presente na vida escolar e nos permite xingamentos, o deboche sobre o cabelo etc. inferir algumas conseqüências negativas para as crianças negras, praticado pelos seus colegas da escola. advindas dele. Tais como, rejeição, desvalorização, sentimento de solidão etc. O preconceito racial interfere drasticamente no A partir dos relatos a professora perguntou lhes o que rendimento escolar das crianças negras. poderiam fazer para eliminar essas situações. Elas indicaram várias Essas conseqüências serão vivenciadas de diferentes possibilidades, como por exemplo, contar para a diretora, para a maneiras. Tudo depende do instrumental que a criança possui para professora, para a mãe, dar “porrada” e fingir que não ouvia. enfrentá-las. Se tiver uma família com condições de conversar Depois que falaram, foi proposto que desenhassem no chão as sobre isso para ajudá-la a construir sua autoconfiança ela 328 percorrerá esse árido trajeto escolar e sobreviverá aos efeitos de É muito comum ouvirmos a frase: “mas o próprio negro é ser discriminada. Ou ainda, se encontrar algum suporte oferecido racista, ele não se aceita como negro.” O fato de não se aceitar pela escola para enfrentar a discriminação podemos dizer que não como negro chamamos de introjeção do preconceito racial, isto é, sairá ilesa desse processo, mas que pode construir possibilidades a pessoa negra aceita a idéia de inferioridade atribuída a sua de reação às situações e com isso permanecer na escola obtendo condição racial e para livrar-se disso nega-se como negra. E isso sucesso. jamais pode ser considerado uma atitude racista. Se assim o fosse, A idéia de que as crianças precisam ser cuidadas e estaríamos culpando a vítima pelo crime. Ser racista implica ser o protegidas deve nos mobilizar a agir sobre essa realidade, não opressor, ter o poder de subjugar, ter a hegemonia simbólica ou podemos deixar que busquem sozinhas soluções para problemas concreta da situação. E é isto quem herda são as pessoas brancas. tão graves. Essas crianças têm produzido, de maneira solitária, De acordo com Bento (2002), inúmeros jeitos de resistências no âmbito escolar que muitas vezes não são consideradas como resistência e ai vem os rótulos de: Na verdade, o legado da escravidão para o crianças agressivas, com baixa capacidade de concentração etc. branco é um assunto que o país não quer Hoje, encontramos várias crianças negras em sala de aula discutir, pois os brancos saíram da escravidão e estas têm atitudes racistas. Como poderemos trabalhar com uma herança simbólica e concreta pedagogicamente com essa questão? Como um educador das séries extremamente positiva, fruto da apropriação do iniciais pode abordar o assunto “racismo” em sala de aula, tendo trabalho de quatro séculos de outro grupo. Há alunos negros em sala? . Aqui temos um problema conceitual. Não benefícios concretos e simbólicos em se evitar é adequado considerar racista a criança negra que rejeita a sua caracterizar o lugar ocupado pelo branco na identidade ou manifesta qualquer reação negativa em relação a história do Brasil. (2002. P. 27). esse assunto. Ela não pode ser caracterizada como racista. 329 No caso em que estamos discutindo, quem herdou preconceitos, mas não resolverá todas as dimensões do problema benefícios das relações raciais estabelecidas no Brasil não foram as que é social. Ter essa consciência lhe dá tranqüilidade para crianças negras. Elas são vítimas da opressão racial da sociedade, enfrentar os muitos desafios que aparecem no trato dessa questão por isso jamais são racistas. Porém, apesar do equívoco conceitual na escola. na pergunta, a questão principal que ela contém precisa ser Há muitas formas de abordar o tema: palestras, trabalhos respondida. Ou seja, como um educador deve trabalhar o racismo, monográficos, teatro, música, poesias, leitura de textos, histórias, no sentido de combatê-lo em sala de aula, inclusive com crianças brincadeiras. A escolha da metodologia mais adequada depende negras presentes? da idade dos alunos, da série em que se encontra, do tempo que se Imagino que deva haver uma infinidade de caminhos para tem, do conteúdo a ser trabalhado. O fundamental é que o responder a essa questão. Meus estudos, por enquanto, me professor queira contribuir para a diminuição do preconceito permitem dizer que abordar o racismo em sala de aula não deve ser instalado na sociedade brasileira, esse deve ser o principal objetivo diferente quando se tem ou não crianças negras. A questão pedagógico. principal é o professor se preparar para o tema. É necessário Tenho colhido alguns depoimentos dos pais de estudar. Tenho dito que os professores estão acostumados à idéia algumas crianças negras e feito a leitura de textos tirados da de que, para ensinar matemática, português ou geografia etc. têm Internet e alguns depoimentos de crianças que sofrem com o que estudar, mas quando quer abordar temas como racismo, nem racismo nas escolas que estudam são chocantes e inadmissíveis, sempre se preocupa em estudá-lo, conta com o que sabe do senso por exemplo, uma menina negra conta que as crianças a xingam comum. Isso é um problema, pois assim ele pode incorrer em de ‘‘preta que não toma banho’’ e acrescenta: ‘‘Só porque eu graves erros conceituais e metodológicos. sou preta elas falam que não tomo banho.”Ficam me xingando Também é necessário compreender que o educador fará de preta cor de carvão”. “Ela me xingou de preta fedida. Eu sua parte no processo de desconstrução de conceitos e contei à professora e ela não fez nada’’. Dois meninos negros 330 eram chamados por uma professora de ‘‘filhotes de São Na escola de educação infantil, “Maria Clara Feijó” Benedito’’, porque ela os achava ‘‘o cão em forma de gente’’. (pólo) à convite de uma professora, fizemos uma fala com o Como conseqüência, a auto-estima dessas crianças e sua auto- intuito de esclarecer junto aos professores a importância da lei representação ficarão seriamente abaladas. A imagem de si 10.639 e de como existem meios para estarem sendo mesmas será inferiorizada e as crianças brancas que informados e realizarem o trabalho proposto pela lei, a mesma presenciaram as cenas provavelmente se sentirão superiores a afirmou que todos seus colegas se sentem perdidos, não sabem elas. Estabelece-se, assim, o círculo vicioso do racismo que como trabalhar o assunto, e que à eles nunca foi ensinado. estigmatiza uns e gera vantagens e privilégios para outros. (http://novaescola.abril.com.br/ed/157_nov02/html/plu ralidade.htm) Na conversa que tivemos com professores fizemos um breve relato da trajetória do negro no Brasil desde a escravidão, levei ao conhecimento deles a situação do povo Em uma das escolas que se visitou, uma mãe relata negro no Brasil , mostrando que este se encontra em que sua filha é constantemente humilhada e chamada de cabelo desvantagem em vários segmentos da sociedade, enfatizei a de bombril por alguns colegas de sala, fato esse que faz com importância das ações afirmativas para mudar este quadro, esta que a menina não goste de ir à escola e causa transtorno todos mudança deve partir das séries iniciais, pois a cidadania os dias aos pais quando chega o horário de ir à aula. Busquei capenga do adulto negro, tem início com sua exclusão desde a informação sobre o que foi feito nesta escola para trabalhar educação infantil. com estas crianças envolvidas neste episodio e a resposta da Quando perguntamos aos professores sobre a situação coordenadora de tal escola é que ela foi à sala de aula e tentou da biblioteca no que tange a livros que abrangem a questão explicar para as crianças que racismo dá cadeia, vale lembrar negra, afirmam que na escola existem muitos livros sobre a que estamos falando de crianças de uma quarta serie do ensino questão racial e outros afirmam que não, então fui à escola fundamental. solicitei à coordenadora que me emprestasse alguns livros que 331 abordassem o assunto do racimo, a mesma me pediu que deva ser lei que se trabalhe a cultura afro entrasse na biblioteca e procurasse, percebi então que realmente brasileira de forma isolada, não acho legal, os não existem, só gostaria de entender o porque 50% dos livros é que deveriam trazer já toda a cultura professores entrevistados afirmaram o contrario, alguns até se afro brasileira em suas páginas , e na escola omitiram e negaram que a escola não se preocupa com este deveria existir literatura assunto. Apenas um afirmou participar de capacitação a personagens negros. onde houvesse respeito do racismo. Lembrando que foram quatro professores entrevistados, nesta escola existem quatro salas do ensino fundamental uma de cada série, portanto. Porém, quando indagada sobre alguma capacitação a respeito da Lei, afirma que não. Em suas palavras: “Embora Perguntamos à professora N. F. R sobre sua concepção esta escola já tenha patrocinado, eu não pude participar pois de racismo, a mesma deu uma definição simples, isto é, dou aula em outra escola e me atrapalharia pois seria no mesmo “racismo é um tipo de discriminação que precisa ser horário.” combatido”. Afirma que em sua sala existem muitos alunos Quanto indagada sobre a questão de ter trabalhado negros e diz que já presenciou casos de preconceito, mas não neste ano, em algum momento, com seus alunos o tema com relação a cor. Quando indagada sobre a lei 10.639, diz a racismo em sala de aula? A resposta foi: professora: Não exatamente, mas quando minhas alunas Penso que seja importante e necessária , mas negras falam que seus cabelos são feios ou que deveria ser tratada de forma diferente , ruins, procuro dizer à elas que são lindas e assim como penso sobre cotas e outros meios que não existe cabelo ruim, percebo que as de ações afirmativas para negros, pensar que minhas alunas negras são as andam mais 332 arrumadas e sempre elogio suas tranças, procuro frequentemente levantar a auto Para isso preciso de ajuda, pois estima delas. desconheço esse tipo de literatura, vocês deveriam fazer um projeto de Indagamos sobre sua opinião ao auto-racismo, por que isso ocorre? A mesma afirma: “Porque levar ao conhecimento do professor isso é o que a este material, pois não temos nada nas sociedade impõe, que só cabelos lisos é que são bonitos.” escolas. Se você tiver alguma coisa que Refletimos a seguinte questão junto à professora possa me ajudar, eu necessito deste entrevistada, ou seja, se ela havia parado para pensar que toda tipo de colaboração. essa visão feia que a criança negra tem de si é pela falta de se identificar com o em que vivem como na escola com figuras de O desafio está lançado, estamos apenas começando, pessoas iguais a si que ocupem lugares importantes, por precisamos também de fôlego, de auxilio de autoridades, de exemplo, dentro dos contos de fadas as princesas são sempre compreensão da sociedade, enfim, estamos abraçando esta brancas, e os negros sempre ocupam os piores lugares. causa, sei que não será nada fácil, são poucas as Universidades Disse que concordava comigo. Indaguei: então que querem enfrentar esta realidade, às vezes por medo, ou por porque não buscar meios de mudar esta realidade para levantar preconceito, ou até mesmo por não saber como trabalhar. A a auto estima destas crianças, através de literaturas que tenham UEMS está aí, enfrentando o desafio e junto vamos nós. historias com princesas negras, filmes, ou ate mesmo levar ao conhecimento delas que a historia da África, suas danças e costumes, para que conheçam sua própria história? Ela nos respondeu Considerações finais 333 Percebo que embora como já ficasse clara de acordo com as pesquisas, a afirmação de alguns professores que não Referências Bibliográficas têm suporte para trabalhar o problema do racismo em sala de aula, existem sim livro que colaboram e muito para se realizar BIANCHI. tal trabalho, não sei se ignoram, ou por “falta de interesse não Pedagógica, Editora Cortez, São Paulo, 2000. Ana Maria, Plantando Axé-Uma proposta conhecem as diversas publicações”. Entrevistei o professor R. que dá aulas de matemática numa terceira série, o mesmo conta ter em uma de suas salas, CAD. Cedes Campinas, vol.25, n67, p.378.388.set/dez/2005, (www.cedes.unicamp.br) . um aluno extremamente e explicitamente racista, o professor relatou que nunca levou a sério os comentários que o aluno, às DIAS. Lucimar Rosa. Diversidade Étnico-racial e Educação vezes fazia a respeito de uma colega negra, pensava que era Infantil. Três Escolas. Uma questão. Muitas Respostas, “coisa de criança”, mas ficou assustado no momento que se Dissertação de Mestrado, UFMS, 1997. deparou com um desenho na lousa que esta criança fez, de um monstro, dizendo a todos que era a “negrinha”. Em nossa KAMEL, Ali, Não Somos Racistas: Uma reação aos que conversa ele afirmou que não imaginava que uma criança nesta querem nos transformar numa nação Bicolor, Editora Nova idade pudesse expressar tanta violência por uma coleginha de Fronteira, Rio de Janeiro, 2006. escola, pelo simples fato da sua cor de pele. Mais uma vez ficou claro que o maior problema que MENEGASSI, R.J, A representação do negro no livro didático ainda existe, é falta de consciência por parte dos professores de brasileiro que o racismo entre as crianças existe, e necessita de um 36,maio de 2004 trabalho que deve ser feito paulatinamente. de língua materna.Revista Espaço Acadêmico,n 334 MOURA. Clovis, História do Negro Brasileiro, editora Ática, São Silva,Ana Célia. A discriminação do negro no livro didático. Paulo, 1992. Salvador: CED-Centro Editorial Didático e CEAO-Centro de MUNANGA, Kabengele, Superando o Racismo na Escola, estudos Afro –orientais,1995 (organizador), 202 págs., MEC (disponível apenas em bibliotecas) www.prograd.ufes.br / arquivos_seminários MUNANGA, Kabengele, Negritude usos e Sentidos, Editora www.mulheresnegras.org/doc/ Ática, São Paulo , 1998. texto_para_site_mulheres_negras.rtf, Parâmetros curriculares nacionais, (Primeira à Quarta série) WWW.TVEBRASIL.COM.BR/SALTO Introdução, Pluralidade cultural e orientação sexual. MEC/SEF, 1997. Revista http://www2.uol.com.br/simbolo/raca/0299/cult2.htm escola.abril.com.br (edições/0177),acessada dia http://novaescola.abril.com.br/ed/157_nov02/html/pluralidade. 27/10/2005 htm ROCHA, Rosa Margarida de Carvalho, Almanaque Pedagógico http://www.acaoeducativa.org.br:8080/observatorio/internet2/re Afrobrasileiro, , Ed. Mazza. Acrobat Reader-Racismo sumo.jsp?id=160)24/07 ROSA,Sonia, O Menino Nito, Mesa 4 Editora Pallas – Ilustração Victor Tavares – 335 Sr. Trovões: polifonia e dialogismo em “O menino do dedo O DISCURSO DOS BONS EXEMPLOS NA LITERATURA verde” DE CORDEL: UMA FORMA DE ENTRETENIMENTO, Mariana Maciel dos Santos Souza (G/UEMS) INFORMAÇÃO E CORREÇÃO DE COMPORTAMENTO Reescritura e o Encontro com os Outros: uma análise desse Raymundo José da SILVA discurso UEMS) Eliza da Silva Martins Peron (PG/UFMS) RESUMO: Este trabalho pretende mostrar que a Literatura de Entre a Crítica e o Humor: polifonia, dialogismo e Cordel entretém, informa e retrata a sociedade sertaneja e, carnavalização em Charges Jorn sobretudo, costuma trazer com seu discurso exemplos morais Hellen Suzana da Cruz Miranda (PG/UFMS) nos poemas. Deste modo, são enaltecidas a justiça e a coragem de personagens virtuosas, enquanto a vilania será fatalmente O Discurso dos Bons Exemplos na Literatura de Cordel: uma castigada, na Terra ou no Além. forma Palavras-chave: cordel, exemplo, discurso. de entretenimento, informação e correção de comportamento Raymundo José da Silva (PG/UEMS) ABSTRACT: This work aims at demonstrating that the Cordel Literature entertain, inform and reflect the Brazilian Northeast society, and above all, frequently brings moral examples in its poems. So, justice, courage of virtuous people are regarded, while villainy are fatally chastised either in this World or in the supernatural one . 336 KEYWORDS: cordel, example, discourse Assim como ocorrera em Portugal muitos séculos antes, com os jograis do Trovadorismo andando de cidade em Introdução cidade, interpretando as cantigas, aqui no Brasil os cantadores ambulantes do cordel percorriam as fazendas, os arraiais e as O homem do campo no Brasil sempre gostou de feiras contando suas estórias. Quando se encontravam, contar estórias e isso era mesmo uma necessidade, já que no ocorriam improvisos, repentes e pelejas que serviam para sertão longínquo não havia acesso aos modernos meios de incentivar a venda dos livros artesanalmente xilografados. comunicação, hoje tão naturalmente incorporados à vida Qualquer fato que mereça grande atenção desse público rural quotidiana, tais como o rádio, jornal e a televisão. A escassez desejoso de novidades pode ser tema do cordel. Pode ser um de notícias fazia com que as pessoas se visitassem e se cataclismo como terremoto, o incêndio num circo, a morte ou a reunissem nas varandas das fazendas de gado, na casa grande e renúncia de um presidente da República. Há até mesmo quem nas roças para contar ou ouvir estórias reais, deturpadas ou diga que era tão grande o respeito por essas obras, que, nos simplesmente imaginárias. Essas estórias possuem uma origem tempos áureos, o sertanejo só acreditava de fato na notícia, muito antiga e, segundo alguns autores, derivam-se da longa depois que a tivesse visto confirmada no folheto. Ao leitor não tradição ibérica, dos romanceiros, das histórias de Carlos importava que a notícia fosse fiel ao fato ou completamente Magno e dos Doze Pares de França. Originaram-se também de desvirtuada, porque tão ou mais importante que a notícia, eram contos maravilhosos de “varinha de condão” em que podia os comentários, as impressões deixadas. haver poderes mágicos capazes de produzirem encantamentos e Inspirados, os autores tinham plena consciência de sua transformações de pessoas e animais. No Brasil, essa literatura função de poeta e porta-voz de uma comunidade. As estórias consolidou-se a partir de 1880. eram abundantes, e não havendo exigência quanto à veracidade, podiam ser exploradas a partir de uma rica gama de 337 temas, como: a fé, as superstições, as estórias de amor, a honra e religiosos. Nesse meio, não raro surgem grupos de cantadores da família, a traição, a ambição, o sucesso, ou a exaltação de que representam o pensamento popular. Conseguintemente, personalidades históricas. Nota-se, porém, que grande parte dos podemos perceber um quadro de pessoas representativas dessa temas desenvolvidos são dominados por um fundo moral, de realidade nas figuras de coronéis, sacerdotes, jagunços e modo que as qualidades positivas tais como a virtude, símbolo personagens de destaque como: o padre Cícero do Juazeiro, do bem, devem prevalecer sobre as negativas, símbolos do mal. Antônio Conselheiro, Antônio Silvino, Lampião e Maria Observa-se, portanto, que o cordel encontrou no Nordeste um Bonita. Assim como esses personagens, muitos cantadores solo fértil e, pelo menos até 1960, prosperou grandemente. ficaram célebres como os seguintes: Silvano Pirauá de Lima, Leandro Gomes de Barros, João Martins de Athayde e Patativa 1 Fundamentação teórica do Assaré. Os folhetos de cordel têm recebido ainda outros nomes, e os leitores que os compravam podiam chamá-los de Como é sabido, a literatura de cordel é uma poção rara da cultura brasileira, pois, de alguma forma faz menção “livrinho de feira”, “estória de meu padrim”, “romance” ou “ABC”. aos dados sócio-históricos de nossa sociedade e isso é A partir dessas informações, conclui-se que as obras retratado, ficcionalmente, por grandes nomes da literatura da literatura de cordel oferecem um amplo campo à pesquisa, popular. Assim, vale destacar a contribuição singular de seja na semântica, na morfossintaxe ou no estudo do léxico. Manuel D’Almeida Filho e Leandro Gomes de Barros entre Consideramos, todavia, que não menos rica que essas linhas de outros. abordagem é a filosofia de vida que permeia os vários textos, A esse respeito, vemos com Meyer (1980) que o ainda que sejam de temas e de autores diferentes. O sertanejo Nordeste contém peculiaridades sócioculturais merecedoras de caracteriza-se por ser místico, crente e conservador, mostrando- estudo e apreciação, sobretudo no que tange aos valores morais se, às vezes, como um radical observador dos valores morais. 338 Já se disse também que o poeta de cordel é o legítimo Independentemente representante de sua comunidade, o que torna natural a sintáticos, a literatura de cordel mostra-se riquíssima, já que presença de tais valores como a fé inabalável, as superstições e seus autores apresentam-nos um vivo e multicolorido panorama o sentimento da honra em sua obra. Referimo-nos aqui ao sócio-político-cultural do Nordeste, onde desfilam o homem fundo moral, freqüentemente representado por exemplos, que humilde, o coronel, o doutor, o sacerdote e o bandido. dos aspectos fonético-morfológico- funciona como fio condutor do pensamento de uma Muito freqüentemente, quando expomos nosso comunidade – a sertaneja – e aponta um caminho, mostrando ponto de vista, temos a nítida impressão de que estamos que a vilania será fatalmente castigada aqui na terra ou no sendo originais. Todavia, a esse respeito, eis o que diz além, visto que somente as qualidades e atitudes virtuosas são Baccega (1995: 30): dignas e valem a pena. É como se o poeta nos dissesse: “Os maus serão castigados”. Reconhece-se que, durante o século XX, a literatura de cordel teve os seus tempos áureos de produção e edições, mas depois o sucesso paulatinamente arrefeceu, sobretudo em virtude da urbanização do Brasil, o que provocou a natural mudança de hábitos da gente sertaneja com o fácil acesso aos meios de comunicação como o rádio, a televisão e o jornal impresso. Inquestionável, porém, é o interesse que essa literatura ainda desperta, seja em leitores comuns, seja em estudiosos da Literatura e da Lingüística, que vêem o cordel como uma genuína expressão da sociedade rural brasileira. Ao nascer o homem encontra, portanto, uma história em processo. É como se tomasse um trem numa determinada estação. Este trem, que carrega a cultura, está vindo de muitas e muitas estações, já transportou milhões e milhões de pessoas entre as várias estações. São (e/ou foram) pessoas que realizaram, juntas, um número incontável de ações, as quais se manifestaram numa pluralidade de significações que as palavras registraram em discursos. 339 ideológicas, o discurso cita outros discursos. Os mesmos percursos temáticos e figurativos Como se pode ver, segundo as autoridades das se repetem. teorias da análise do discurso, essa originalidade não passa de ilusão, porque nenhum indivíduo será considerado senhor absoluto do seu discurso. Mesmo os poetas oriundos de um povo como o nordestino e criadores de um tipo de literatura com características tão particulares como a do cordel, embora não o reconheçam, não possuem o discurso original, inédito. Entende-se, portanto, que a ideologia referente aos bons exemplos de honra, virtude e lealdade não estão circunscritos às vozes dos repentistas da literatura de cordel. Trata-se de experiências cristalizadas, há muito vividas por outras comunidades, cujos pensamentos já foram expressos em outras épocas e noutros lugares. Ilustram bem o que foi dito essas palavras de Fiorin ( 2003: 41): Disto resulta, para muitos enunciadores, a viva sensação de serem os primeiros criadores de certas formações discursivas, mas, na verdade, estão apenas citando, mediante a organização de textos diferentes, os mesmos discursos anteriores. Como dissemos, o poeta do cordel, ao construir sua obra, apresenta-se como legítimo representante da comunidade rural nordestina. Filho da terra, crescia imbuído dos princípios dos nativos que o rodeavam e, no decurso de toda uma vida, ao menos até meados do século XX, quase nunca conhecia lugares e pessoas de costumes muito diferentes dos seus. Tal característica pode ser observada nos folhetos, mediante alguns Todos os discursos têm, para usar uma expressão de Edward Lopes, uma “função citativa” em relação a outros discursos. Por isso ele não é único e irrepetível. Na medida em que é determinado pelas formações aspectos como os temas que representam de modo natural os valores e as crenças do povo sertanejo. Isto significa que, embora seja visto pelos leitores como um artista, e como tal se considere, o repentista é o próprio sertanejo, o natural porta-voz dotado de todas as condições para aglutinar, registrar e tornar 340 públicos a psicologia, a história e o pensamento universalmente sem levar muito em conta a verdade. Por isso, freqüentemente aceitos pela gente do sertão. Pode-se dizer que se trata de um surgem títulos exóticos com personagens locais ou de outras porta-voz naturalmente engajado, mas sem faz-de-conta, ou origens que prenunciam a fantasia ou o misticismo, como: “A artificialismo. O poeta, tendo nascido e se criado no sertão, chegada de Lampião no céu”; “A duquesa de Sodoma”; “As torna-se engajado porque ele é tão-somente um elemento que astúcias de Camões”; “Encontro de Lampião com Adão no expressa de forma natural a própria voz da sua comunidade. A Paraíso; “A princesa Anabela e a Filha do Lenhador” e outras linguagem apresenta um léxico simples, da comunidade local, centenas de títulos semelhantes. Deste modo, a literatura de que pode trazer as incorreções habituais de concordância e de cordel perpassa alguns ortografia, como se nota na capa do folheto de Manoel caros ao sertanejo: a fé, as superstições, o casamento, a honra D`Almeida Filho “Os dois amigo leais”. Essas escorregadelas familiar e a coragem, fazendo com que algumas personagens gramaticais não diminuem o valor da obra, como se poderia assumam atitudes idealizadas, heróicas, quase épicas. aspectos e objetivos de vida muito supor, uma vez que ratificam e expressam o caráter genuíno do O mais importante é que o leitor se translada para esse cordel: uma literatura representativa. Evidentemente que, sendo mundo imaginário, identifica-se de certo modo com as arte, as estórias contadas são livres para trazerem episódios personagens, sobretudo as corajosas e justa extraindo um fantasiosos ou inverídicos “ocorridos” em lugares distantes exemplo, uma lição que, por universal, satisfaz os anseios e com personagens lendárias. São comuns, portanto, informações adapta-se perfeitamente à mundivivência do homem do campo. como estas: “Num reino distante.... um príncipe valente”; ou Para os atos de bondade, recompensas como a promoção social então “Um dia a bruxa malvada se transformou... ”. Não alcançada pelo casamento com a pessoa amada, a herança e a obstante esse deslocamento no tempo e no espaço, o leitor do felicidade definitiva após a quebra de um encanto ou feitiço; folheto ou ABC manifesta sua aprovação e encantamento para os atos de maldade, o castigo terreno do vilão pela perda porque, no mínimo, essas estórias os entretêm e os informam, dos bens materiais ou do amor, a morte em combate com o 341 herói, ou alguma maldição que o levará a trágico sumiço como U`a moça muito rica , afogamento, o fogo terreno ou o eterno fogo do inferno. Porém, sendo muito feia, Não tinha quem a quisesse Apresentação e análise do corpus 2 Para este trabalho, elegemos o texto A camponesa e o Nem por uma hora e meia. Alguém até lhe chamava príncipe encantado de Manoel D’Almeida Filho, para análise A rainha da feiúra, do discurso contido no poema. Porém ela sendo rica Sempre fazia uma jura A camponesa e o príncipe encantado. Que a riqueza lhe dava Autor: Manoel D`Almeida Fil Um pouco de formosura. (...) Houve em toda Babilônia Chamava-se Messalina, Passados misteriosos Feia, magra e amarela; Que às vezes assombraram Tinha ciúme das moças Os entes mais corajosos Fosse esta, fosse aquela, Como também destruíram Pois todo rapaz bonito Alguns seres invejosos Só queria para ela (...) Pelo menos existia Vamos deixar Messalina Numa populosa aldeia Mergulhada na feiúra 342 Para seguir no rumo Que havia visto a cobra Duma linda criatura E conversado com ela, Moça pobre, porém tinha A serpente perguntando Fé, bondade e formosura. Se queria o amor dela. Chamava-se Maria, E dizendo: - Eu não sou cobra, Uma linda camponesa Sou um príncipe encantado Que não possuía nada, Que por mão de uma fada Porém a Mãe Natureza Me vejo tão castigado Ofertou-lhe uma coroa Até o dia que seja Com os dotes da beleza. Com uma moça casado. (...) E no tal príncipe encantado Porque só quando casar Alguém falava de sobra Tomarei a forma humana, Que aparecia às moças Receberei a coroa Transformado numa cobra, Da mão da fada tirana Porém ninguém na aldeia Para governar meu reino Acreditava na “obra”. Com a minha soberana. (...) Tinha moça que jurava Porém é que a maioria Até pela alma dela Tinha medo da manobra; 343 Havia até quem dissesse: (…) A minha pobreza dobra, Maria olhou para a cobra Porém o diabo é quem vai E arrepiou-se de medo, Se casar com uma cobra. Porém tinha garantido (…) De aceitar o enredo; Sustentou que não morreria Até que a camponesa Sem descobrir o segredo. Certo dia trabalhando (...) Numa roça sertaneja Quando correu a notícia Ela viu se aproximando Que a moça ia casar Uma enorme serpente Com uma cobra horrenda, Que com calma foi falando: Todo povo foi olhar – Até Messalina, a feia, - Maria, venho pedir-te Também foi testemunhar. Como um verdadeiro amigo Pelo amor de Jesus Quando aproximou-se o dia Me salva deste perigo Na hora a cobra chegou, Porque eu só sou feliz As testemunhas correram, Se te casares comigo. O sacristão desmaiou, O padre ainda correu Com medo, porém voltou 344 (...) Só Maria não moveu-se E a rica Messalina Do lugar aonde estava; Disse: - Chegou minha hora; Enquanto esperava a cobra, Com toda essa feiúra A todo mundo animava, Vou por este mundo afora E, não havendo motivos, Em procura duma cobra Alguém que “correu”, voltava. Para me casar agora (...) O padre voltou tremendo, Assim Messalina foi Começando o himeneu Com a sua idéia má, Fez logo a pergunta clássica: Encontrou uma cascavel - Sim, a cobra respondeu. Em um pé de manacá E a moça, também falando, Contendo já vinte e cinco A mesma resposta deu. (...) Enrugas no maracá. As moças agora vendo Quando ela viu a cobra, Maria rica e feliz Disse: - Encontrei meu amor! Com coroa de rainha Vem logo, querido príncipe, Nos braços do rei Luiz, Para sentir meu calor Por isso todas tiveram E tirar meu coração Uma inveja infeliz. Deste fogo abrasador. 345 (...) (...) Ela foi se aproximando; Messalina disse: - Venha A cobra se preparou, Fazer o meu casamento. Lambeu-se e armou o bote – Disse o padre: - Deus me livre, A moça desconfiou, Pois veneno eu não agüento! Ficou falando de longe O sacristão já estava Porém perto não chegou. Agarrado com São Bento. (...) (...) Messalina vendo a hora Nessa hora a cascavel Pela cobra ser mordida, Que já estava se assanhando Arranjou um gancho grande Deu um bote em Messalina Em uma vara comprida E ficou dependurado, E pôs no pescoço dela Ela disse: - Foi um beijo Para agarrá-la em seguida. Que levei de meu amado. (...) (...) O vigário, quando soube, Abraçou a cascavel Desconfiou da manobra Também tentando morder, E disse: - Por que as moças Porém foi ficando cega Só casam agora com cobra? E assentando o cabelo... Isso vai dar em “sujeira” Em dois minutos estava Para completar a obra. Já mais fria do que gelo. 346 (...) amarela, orgulhosa e rica. Esta última qualidade aparentemente Assim morreu Messalina, positiva não a favorece e volta-se contra a própria vilã, se A feia, rica, orgulhosa; comparada à pobreza de Maria. Temos, por conseguinte, duas E Maria foi feliz personagens carregadas de qualidades opostas que se rivalizam Porque não era invejosa; durante o episódio. Entretanto, em vista dos quesitos negativos Enquanto o orgulho morre, que o autor empresta a Messalina, com o intuito de ressaltar as A humildade goza. diferenças e talvez conquistar a simpatia do leitor, já se sabe que a antagonista não terá chance de um final feliz. Local do 2.1 Análise do poema episódio: a histórica, bíblica e lendária Babilônia, cujo cenário distante não significa empecilho para que o repentista ou o No poema acima, nota-se o confronto entre o bem e o leitor aceitem a lógica da estória; pelo contrário, trata-se de mal. O bem, simbolizado pela angelical camponesa Maria, cujo elemento auxiliar que impregna o poema de fantasia e lenda, nome simples e a bondade da heroína, reporta implicitamente à assim como sucede na maioria dos contos “Era uma vez num lembrança da mãe de Jesus. Do outro lado, o mal representado reino distante...” mostrando que determinados pela moça Messalina, homônima da terceira mulher do sobretudo humanos, perenes, universais. valores são imperador romano Cláudio, mesclando-se, deste modo, Quanto às personagens, a livre imaginação do poeta ou mitologia e história e simbolizando a mulher ambiciosa, cruel e do leitor permite que Maria ou Messalina sejam representadas promíscua. Parece evidente que o autor do folheto posiciona-se por qualquer camponesa do Nordeste, ou ao menos aceita-se ao lado da protagonista quando diz que Maria era linda, pobre e que algumas Marias e algumas Messalinas hão de existir por humilde, que tinha fé e bondade, enquanto Messalina é aqueles sertões. Por outro lado, a presença de um animal impiedosamente descrita como “a rainha da feiúra”, magra, bíblico – a cobra – lembra-nos a serpente do Éden e completa a 347 flagrante analogia com o conto de fadas, quando este retrata, povo mediante uma lição, um exemplo. Ratifica-se, portanto, a por exemplo, uma ave que era uma linda princesa, ou o sapo semelhança com os discursos dos contos de fadas, que que se transforma em garboso príncipe. invariavelmente apresentam uma sanção positiva ou negativa, Ocorre, portanto, uma empatia entre os leitores do folheto e os protagonistas, de modo que, embora de forma segundo a índole das personagens e os atos praticados. Por isso, ao final deste folheto, Messalina é castigada. idealizada, tais personagens satisfazem os sonhos e os Ainda que não tenha feito diretamente nenhum ato princípios da gente do sertão. Também verifica-se a marca da monstruoso, não será perdoada, por ter praticado o pecado da religiosidade ou misticismo sertanejos pela presença do clero, inveja e demonstrado uma obsessão mortal pelo casamento. nas figuras do padre, pela fé do sacristão agarrado à imagem Com efeito, morre picada por uma cascavel de verdade, de São Bento (santo protetor contra mordida de cobra) ou pelo enquanto a bondosa Maria é premiada casando-se com um próprio encantamento do príncipe. Maria e Messalina se príncipe, enfim desencantado.Também poder-se-ia juntar aqui opõem, mas indiretamente, uma vez que, na estória, mal se um estereótipo: invariavelmente a criatura feia é sempre má, - conhecem, e a rivalidade acontece à distância, no campo de um as bruxas são sempre feias - que se trata de memória discursiva, sentimento sabidamente antiqüísssimo e perverso: a inveja, um herança dos antigos modelos de estórias de monstros e de dos sete pecados capitais. Deste modo, o repentista constrói o príncipes. cenário ideal com todos os elementos para a composição de sua Embora alguns textos apresentem um cunho estória. Estória que naturalmente diverte e informa um certo humorístico, porque a comicidade é inerente ao caráter do tipo de leitor afastado dos centros urbanos e carente de nordestino, nas várias estórias repetem-se lições e exemplos novidades. Pelo menos essa era a realidade até a década de 70. morais repletos de valores. É o que se pode ver em títulos Entretanto, pela ênfase que se dá ao desfecho, percebe-se que o sugestivos como estes: História do Lenhador e o Dedal poema certamente traz um objetivo maior: ensinar e corrigir o Misterioso; João Soldado, o valente praça que meteu o diabo 348 num saco; O rapaz que virou bode no Estado do Pará; A moça que bateu na mãe e virou cachorra; A chegada de Getúlio Referências Bibliográficas Vargas no céu e seu julgamento, etc. BACCEGA, M. A. Palavra e Discurso: História e literatura. Considerações finais São Paulo: Editora Ática, 1995. Conclui-se, por conseguinte, que os livros de cordel, enquanto funcionam como fonte de divertimento e de CALMON, Pedro. História do Brasil na poesia do povo. Rio informação, vão corrigindo e ensinando. E mesmo que as de Janeiro: Bloch, 1973. informações nem sempre primem pela veracidade, isso parece irrelevante para o leitor do folheto, nem diminui o prestígio da obra. O humor cai bem ao seu gosto, e de certo modo ameniza a dura impressão da tragédia, como é possível perceber, FILHO, Manoel D`Almeida . Os dois amigo leais. São Paulo: Editora Luzeiro Ltda, 2001. examinando-se os versos do poema com a descrição e a fala de Messalina: “...a rainha da feiúra” e “Encontrei meu amor”. _______ A camponesa e o príncipe encantado. São Paulo: Enfim, para o sertanejo, o mais importante são as lições Editora Luzeiro Ltda, 2001. freqüentemente impregnadas do sobrenatural que esses poemas trazem, estabelecendo modelos de comportamento que parecem estar sempre a dizer: Os maus serão fatalmente castigados pelos homens, ou pelo destino, enquanto os justos hão de vencer, recompensados de uma ou de outra forma. FIORIN, J.L. Linguagem e ideologia. São Paulo: Ática, 1997. 349 MAINGUENEAU, D. Pragmática para o discurso literário: Mesa 5 leitura e crítica. São Paulo: Martins Fontes, 1996. Práticas Interacionistas no Ensino de Língua Inglesa Fernandes Ferreira de Souza (UEMS) _______ Gênese dos discursos. Curitiba, PR: Criar edições, 2005 Produção Textual – uma perspectiva interacionista a partir do discurso relatado Geraldo José da Silva (UEMS) MAXADO, Franklin. O que é literatura de cordel? Rio de Janeiro: Codecri, 1980. MEYER, M. Autores de Cordel: literatura comentada. São Paulo: Abril Educação, 1980. ORLANDI, P. E. Análise de discurso: Princípios e Procedimentos. Campinas, SP: Pontes, 6ª edição, 2005. PELEGRINI, F. A. Literatura de cordel em questão. Rio de Janeiro: Presença, 1984. 350 PRODUÇÃO TEXTUAL - UMA PERSPECTIVA INTERACIONISTA A PARTIR DO DISCURSO RELATADO Geraldo José da Silva (UEMS) RESUMO: Este trabalho objetiva apresentar as características da produção textual midiática e a utilização do discurso relatado no periódico O Estado de S.Paulo, verificando a articulação argumentativa usada pelo locutor na construção do texto polêmico, numa perspectiva interacionista observando os aspectos constitutivos da enunciação como autor, portador, tema e interlocutor. PALAVRAS-CHAVE: produção textual, interação verbal, texto social, discurso relatado. ABSTRACT: This objective work to present the characteristics of the midiatics literal production and the use of the reported speech in the periodic O Estado de S.Paulo, being verified the used argumentative joint for the jounalist in the construction of 351 the controversial text, in a interacionist perspective observing Frente ao exposto, o artigo objetiva a) analisar a the constituent aspects of the articulation as author, carrier, produção do texto escolhido, a fim de verificar a relação autor- subject and interlocutor. portador-tema-interlocutor, KEYWORDS: literal production, verbal interaction, social text, argumentativa, via discurso relatado com ênfase ao discurso reported speech. direto, que os articulistas utilizam para tecer o texto, b) observar a articulação vislumbrando a interação com o interlocutor. Após a Considerações iniciais fundamentação teórica, será apresentado o texto “Universidade: escola pública terá 50% das vagas”, e A produção textual deve levar em conta alguns Demétrio Weber e Leonêncio Nossa, que servirá de base para a aspectos relevantes como: a escolha de um determinado gênero análise. A escolha do texto supracitado justifica-se devido a sua e isso se faz em função de para quê se escreve, para quem se construção que subsidiará a discussão proposta e, também, pelo escreve, em que esfera e sobre que suporte deverá circular o jogo articulatório na elaboração dos enunciados que constituem texto produzido. Assim, é pertinente observarmos em sua o discurso relatado posto em cena pelos locutores. macroestrutura a bipolaridade que o objeto texto encerra, ou Nosso enfoque analítico considerará a perspectiva seja, aspectos de conteúdo e de forma em sua materialidade interacionista no que respeita à produção de textos, tendo como lingüística. Isto posto, impute-nos saber que a linguagem não aporte teórico balizador Bakhtin (2004), sem com isso descartar existe por acaso, mas imbricada numa rede de valores a contribuição singular de outros estudiosos sobre o processo discursivos de vários níveis. Dessa forma, todo o universo enunciativo e a interação verbal que abordam o tema polêmico, lingüístico constrói-se, existe e funciona num universo social, como é o caso das cotas nas IES federais. coletivo, e não pode ser abstraído dessa condição. Inúmeras discussões têm sido travadas no que se refere ao sistema de cotas no Brasil e em torno das políticas de 352 ação afirmativa, principalmente nos movimentos sociais: minorias políticas, em especial de negros e índios. Frente a esse negros e Ongs. O debate assume proporção volumosa, pois traz panorama social, a questão das cotas ganha força e os debates à tona o problema das medidas compensatórias a grupos ocorrem com maior freqüência no Governo atual, quando historicamente discriminados e perseguidos, como o caso das algumas iniciativas começam a ser propostas e efetivadas. A idenizações recentemente pagas às vítimas do Holocausto, mídia incumbe-se de relatar os fatos e promover o debate entre reacendendo uma preocupação cada vez mais presente no os indivíduos e, com isso, dar a sua contribuição reflexiva à ocidente: o racismo e os seus feitos nefastos na geopolítica sociedade ledora. O discurso midiático assume papel de atual. retratação da história, como afirma Barbosa (2003: 112): O tema em questão não é novo, pois nos Estados “Enunciar que o jornalista exerce uma função significativa na Unidos, década de 60, se instituíram as chamadas “políticas de escrita da história de uma nação não é novidade. Os próprios discriminação positivas” representadas por políticas públicas jornalistas reivindicam para si essa responsabilidade...”. Há dirigidas aos segmentos sociais afro-americanos. Naquele país, que se notar que no discurso midiático, embora se tenha como as chamadas ações afirmativas foram instituídas na década de premissa a objetividade e a imparcialidade, sempre ocorre – em 60 pelo Presidente John Kennedy, num momento em que o país menor ou maior grau – um deslocamento posicional, o que nos vivenciava o auge de seus conflitos raciais. Determinou-se, na permite dizer que a objetividade total é uma ilusão. ocasião, que firmas e universidades deveriam reservar cotas ou abrir vagas de forma proporcional ao peso dos negros no total 1 Revisão da literatura da população americana, cuja fatia era 12%. É sabido que o Estado brasileiro sempre desempenhou A linguagem é uma atividade humana e passível de ações que passam longe de uma perspectiva eqüitativa de adequação no tempo e no espaço, levando-se em conta o seu justiça social, quando o objeto refere-se aos direitos das uso em determinada sociedade. Isso implica a noção de 353 competência de produção e compreensão de enunciados e a Garcez (1998: 47) lembra que, com os estudos de habilidade do indivíduo na construção de sentenças apropriadas Austin (1962), Searle (1969), Benveniste (1970) e Ducrot à situação. Assim, é preciso ter clara a noção de adequação (1972), a interação verbal e as relações coletivas e sociais, como: o quê, quando, com quem, onde e de que maneira falar. constitutivas dos jogos de linguagem passam a ser elementos Garcez (1998: 47) assevera que “a experiência social, fundamentais na conjugação e articulação da língua. Nessa as necessidades e as motivações alimentam a aquisição da acepção, a língua deixa de ser entendida apenas como um língua, e a língua promove uma renovação das experiências, objeto imutável de memória coletiva e passa a ser concebida das necessidades e motivações num círculo infinito”. Para a também como uma forma de ação, um modo de vida social, no autora, “os modelos teóricos de linguagem que ultrapassam a qual a situação da enunciação e as condições discursivas são visão idealista vêm abarcar as diversas funções da linguagem determinantes de sua função e, logo, de seu significado e de sua para dar conta do caráter social da conduta comunicativa, pois interpretação. A linguagem não é neutra em se tratando de compreende-se que a língua é organizada e usada para enunciação, pois toma sentido em vários níveis e considera o lamentar, rejeitar, suplicar, advertir, persuadir, comandar, etc.”. eu, o aqui e o agora na sua efetivação e, além do mais, nela Vê-se que a mobilidade da linguagem ancora sua utilidade e funcionamento quando da necessidade pode estar presente uma rede de valores discursivos. de Em consonância com a autora, percebemos que dada à comunicação em situações distintas. Vale lembrar que escrever multiplicidade de recursos expressivos que a língua encerra, não tem como objeto único o leitor particular ou real, mas as nenhum enunciado, isoladamente, é suficiente para termos uma representações de leitor e de autor com as quais o autor gostaria interpretação unívoca, ele depende de diversos contratos sociais de se identificar e, também, um conjunto de representações e de como: situação, contexto, relação entre interlocutores, leis idéias mais complexo e difuso com o qual quer contribuir e ao conversacionais e sistemas de referência para que se constitua qual pretende pertencer. como tal. 354 Para Koch (2002: 26), textos são resultados da atividade verbal de indivíduos atuantes, na qual estes comunicabilidade se instaure. A esse respeito consideramos o que Bakhtin assevera: coordenam suas ações no intuito de alcançar um fim social, de conformidade com as condições sob as quais a atividade verbal O pensamento não existe fora de uma se realiza. Conforme a autora, podemos depreender que a expressão potencial e conseqüentemente fora produção textual é uma atividade verbal, consciente, criativa e da orientação social dessa expressão e o interacional. Oportuno lembrar que toda interação leva em próprio pensamento. Assim, a personalidade conta a negociação de uma definição da própria situação e das que se exprime, apreendida, por assim dizer, normas que a governam o que nos leva a entender que as do interior, revela-se a um produto total da estratégias interacionais estão para um jogo de linguagem que inter-relação social. (...) Quando a atividade diz respeito à produção de sentido na consecução da mental se realiza sob a forma de uma macroestrutura textual. enunciação, a orientação social à qual ela se Ao nos reportarmos à interação verbal, é válido ter em submete adquire maior complexidade graças mente que “toda palavra comporta duas faces e ela é à exigência de adatapção [sic], adaptação ao determinada tanto pelo fato de que procede de alguém, como contexto social imediato do ato de fala, e, pelo fato de que se dirige para alguém” (BAKHTIN, 2004: acima de tudo, aos interlocutores concretos 113). Nesse contexto, a palavra deve ser o território comum do (BAKHTIN, 2004: 117). locutor e do interlocutor, levando-se em consideração a situação de uso imediato. Num processo interativo da Outro fator que merece atenção quando tratamos de linguagem, o interlocutor determina o dizer do locutor, uma vez enunciação e de interação verbal é a ideologia, pois sabemos que o contexto social imediato serve de base para que a que toda palavra é ideológica e esta é inerente ao locutor que a 355 utiliza para se comunicar e exprimir seus pontos de vista, tanto momentânea que o autor chama “enunciação”. Adverte o autor oral quanto escrito, sobre determinada realidade. Isto posto, que o sentido do enunciado é simplesmente o que a enunciação destacamos o que Bakhtin (2004: 123) discorre sobre o obriga: “A enunciação é, pois, ainda, descrita, como uma discurso escrito: “O discurso escrito é de certa maneira parte reação motivada pela representação de uma situação, mas o integrante de uma discussão ideológica em grande escala: ele fato de se representar esta situação – que é o tema da pergunta responde a alguma coisa, refuta, confirma, antecipa as respostas e da resposta – é dado como produto de uma decisão e objeções potenciais, procura apoio, etc.” conversacional” (DUCROT, 1987: 176). No tocante à enunciação, destacamos o que Ducrot Ainda no que respeita à discussão sobre enunciação e (1987) assevera: “enunciação é entendida como ação que enunciado, Ducrot (1987) traz à tona as funções enunciativo- consiste em produzir um enunciado, isto é, dar a uma frase uma discursivas, nas quais apresenta como elementos constitutivos realização concreta”. Assim, convém mencionar as três do enunciado as figuras do locutor e do enunciador. O autor acepções que o autor atribui à enunciação, ou seja, como ele a entende por locutor vê: 1ª) designa a atividade psico-fisiológica implicada pela enunciado, apresentado como seu responsável, ou seja, alguém produção do enunciado (acrescentando-lhe eventualmente o a quem se deve imputar a responsabilidade deste enunciado. É jogo de influências sociais que a condiciona; 2ª) é o produto da a ele que se refere o pronome EU e as outras marcas de atividade do sujeito falante, quer dizer, um segmento de primeira pessoa presentes no discurso. Vale lembrar que esse discurso, ou, em outros termos, enunciado; 3ª) é o locutor, ser do discurso, é diferente do sujeito falante, empírico, acontecimento constituído pelo aparecimento de um enunciado. real. Vê-se que o locutor fala, relata, ou seja, ele é dado como a A realização de um enunciado é de fato um acontecimento fonte do discurso, podendo suas atitudes discursivas serem histórico: é dado existência a alguma coisa que não existia atribuídas a enunciadores dos quais se distancia ou se antes de se falar e que não existirá mais depois. É esta aparição aproxima, dependendo da cena enunciativa posta em voga. O um ser que é, no próprio sentido do 356 autor alerta que em uma enunciação atribuída a um locutor, posições: a primeira, denominada autonímia pode ocorrer outra enunciação atribuída a outro: é o caso do simples, consiste em apenas exibir esse discurso relatado em estilo direto. fragmento como um objeto estranho, pela Dada à complexidade enunciativa, está em evidência utilização de termos metalingüísticos, de segundo Authier-Revuz (1990: 25) o distanciamento, graus de diacríticos ou de outros mecanismos que comprometimento, deslocamentos marquem a delimitação do texto e o caráter enunciativos, polifonia, desdobramentos ou divisão do sujeito pluriarticulado do discurso. Por outro lado, enunciador tantas são as noções que – em quadros teóricos nos diferentes - dão conta de formas lingüísticas discursivas ou autonímica, o locutor, ao mesmo tempo em textuais alterando a imagem de uma mensagem monódica. que menciona o fragmento, faz uso dele, Assim, para Authier-Revuz (1990), “a heterogeneidade integrando-o à cadeia discursiva, num mostrada inscreve o outro na seqüência do discurso – discurso continuum estrutura. (BENITES, 2002: 56). desnivelamentos ou chamados casos de conotação direto, aspas, formas de retoque ou de glosa, discurso indireto livre, ironia – relativamente ao estatuto das noções Parafraseando Benites (2002: 57) vemos que, na enunciativas”. Segundo a autora, um discurso é heterogêneo heterogeneidade mostrada, o discurso citado introduz um porque se constitui sempre de outros discursos. Ainda sobre a distanciamento muito variável entre o locutor citante e o heterogeneidade mostrada, merece destacar o que Benites locutor citado. O sentimento do locutor citante se apóia como (2002) considera: um “não estou afirmando nada; estou apenas relatando o que outro falante disse sobre o assunto”. Esse tipo de abordagem Ao mostrar o fragmento discursivo inserido discursiva é muito comum no texto midiático, uma vez que o no seu, o locutor pode assumir duas locutor citante utiliza a voz do locutor citado como recurso para 357 expor o fato podendo se aproximar ou não do dito por outrem. Bakhtin (2004) argumenta que o discurso citado é o É sabido que no dizer jornalístico há que se buscar a discurso no discurso, a enunciação na enunciação, mas é, ao objetividade, a imparcialidade e, assim, o locutor citante mesmo tempo, um discurso sobre o discurso, uma enunciação manipula o discurso sempre calcado nesse paradigma de sobre a enunciação. Menciona, também, que o discurso citado é escritura midiática. visto pelo falante como a enunciação de uma outra pessoa, Para Ducrot (1987: 142), a enunciação – tal como a apresenta o enunciado – aparece como a realização de diversos completamente na origem, dotada de uma construção completa, e situada fora do contexto narrativo. Alerta ainda que: atos, por exemplo, atos ilocutórios (asseverar, prometer, etc). Segundo o autor, “na medida em que o enunciado e seu sentido são veiculados pela enunciação, as propriedades jurídicas, argumentativas, causais, etc, por eles atribuídas a ela, não poderiam ser vistas como hipóteses feitas a propósito da enunciação, mas como a constituindo”. Notamos em Ducrot (1987) que relatar um discurso em estilo direto seria dizer que palavras foram utilizadas pelo autor deste discurso. Dessa forma, o autor prefere caracterizar primeiro a categoria tomada na sua totalidade e afirma que ela consiste fundamentalmente em uma apresentação da enunciação como dupla: o próprio sentido do enunciado atribuiria à enunciação dois locutores distintos. Toda transmissão particularmente sob forma escrita, tem seu fim específico: narrativa, processos legais, polêmica científica, etc. Além disso, a transmissão leva em conta uma terceira pessoa – a pessoa a quem estão sendo transmitidas às enunciações citadas. Essa orientação para uma terceira pessoa é de primordial importância: ela reforça a influência das forças sociais organizadas sobre o modo de apreensão do discurso (BAKHTIN, 2004: 146). 358 Convém lembrar que os atores sociais ajudam a próprio enunciado. Assim, todo enunciado se elabora em formar a consciência, construindo e constituindo os fenômenos função do outro o que nos permite considerar que o interlocutor sociais coletivamente. Cabe aqui a participação do jornalismo é constitutivo do próprio ato de produção da linguagem. Logo, em noticiar os fatos e que deve ser imparcial e objetivo, pois um enunciado deve ser analisado levando-se em conta sua essa característica do texto jornalístico deve ser levada a termo orientação para o outro. Diante disso, vemos que a relação pelos da autor (locutor) e o interlocutor em seus níveis real, virtual no notícia/reportagem não se reduz a uma mera técnica, a simples texto em análise sugere uma interação verbal em que se deva mobilização de regras e normas dos manuais de redação, mas considerar um grau de criticidade e saberes partilhados em que é no trabalho da enunciação que os jornalistas produzem torno do assunto em pauta para que a produção de sentido não discursos e por meio de múltiplas operações articuladas pelos seja prejudicada. articulistas. Notamos que a construção processos da própria linguagem, a audiência é construída com O discurso jornalístico é produzido com base no certa antecipação. No jornalismo, a linguagem não é apenas um concurso e do efeito daquilo que lhe ofertam outros códigos, campo de ação, mas a dimensão constitutiva. É a condição pela isto é, outras vozes e múltiplas polifonias provenientes de qual o sujeito constrói um real, um real midiatizado. outros campos culturais. Cada vez mais o discurso jornalístico Para Bakhtin (2004), a língua é um produto sócio- se insinua como uma espécie de saber explicativo dos histórico e uma forma de interação social realizada por meio de processos sociais. Dessa forma, o processo de enunciação enunciações. “a interação verbal constitui, assim, a realidade jornalística fundamental da língua” (BAKHTIN, 2004: 123). Em generalizados e que se encontram estabelecidos em espécie de consonância com o autor, vemos que o outro está sempre macrocódigo: a língua, as matrizes culturais, as regras sociais, a presente nas formulações do autor e tem tanto a função de ética e as ideologias. Temos também os microcódigos como os quem recebe como também de quem permite ao locutor o seu códigos é regulamentado particulares por estabelecidos procedimentos pelas empresas mais de 359 comunicação, os manuais de redação. Na enunciação jornalística predomina o valor referencial e, assim, pressupõe a veracidade dos fatos a que se refere e a autenticidade do seu UNIVERSIDADE: ESCOLA PÚBLICA TERÁ 50% DAS VAGAS relato. O pressuposto dessa veracidade institui um contrato de autenticidade entre jornalista e a sua audiência. Porcentual anunciado ontem por Lula para as federais inclui cotas para negros e índios. 2. Apresentação do corpus BRASÍLIA – O presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciou ontem, O presente texto se constitui de uma reportagem veiculada no jornal O Estado de S.Paulo, Cad. Educação de 14/05/2004, p. A11, sob o título de “Universidade: escola pública terá 50% das vagas”, de Demétrio Weber e Leonêncio Nossa, cuja tessitura é notadamente construída de discurso indireto e discurso direto. Por esta dinâmica textual envolver um locutor citante que articula a voz do locutor citado, tem-se uma amostra muito produtiva de heterogeneidade mostrada – via discurso relatado - desenvolvida pelos articulistas responsáveis pelos enunciados que apresentam o embate das vozes dos locutores que se manifestam nas cenas enunciativas do todo textual. durante a reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES), que o governo enviará ao Congresso projeto de lei para garantir a reserva de metade das vagas das universidades federais a alunos que concluírem o ensino médio em escolas públicas. Lula argumentou que a proposta vai promover a igualdade racial e privilegiar parcelas da população discriminadas, como negros e índios. Para o presidente, com isso serão abertas 60 mil vagas por ano para esses alunos. Lula também anunciou que vai enviar ao Legislativo outro projeto, este para criar o Programa Universidade para Todos, que abrirá vagas em instituições privadas de ensino superior a alunos de baixa renda e professores da educação básica da rede pública, além do Projeto Soldado Cidadão, que 360 terá como objetivo empregar 30 mil jovens de baixa renda nas federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Wrana Panizzi. Na Forças Armadas. UFRGS, o número de estudantes oriundos do ensino médio O ministro da Educação, Tarso Genro, disse que a público caiu de 50% para 40% em menos de dez anos. proposta para as federais “muda radicalmente” o modelo de Negros e índios – Tarso explicou que o projeto está ensino superior no País. “O governo não teme o debate. pronto para ser enviado ao Congresso. Pela proposta do Quando não há reação de privilegiados e poderosos é porque governo, o sistema reserva ainda para negros e índios uma não há política afirmativa”, disse. parcela dos 50% das vagas destinadas a alunos de escolas A notícia pegou de surpresa reitores das universidades públicas. “Pela primeira vez na história do País, o processo de federais. Anteontem, os 47 dirigentes das instituições haviam ensino se envolta para a parcela da população de renda mais se reunido com o ministro e nenhuma palavra foi dita a respeito baixa”, afirmou. O presidente da União Nacional dos do projeto. “50% de reserva de vagas é uma tragédia aqui”, Estudantes, Gustavo Petta, elogiou a proposta do governo. “A disse o reitor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), UNE sempre defendeu essa medida”, disse. Ulysses Fagundes Neto. A instituição tem cerca de 300 vagas a Para a presidente da Associação dos Dirigentes das cada vestibular e já aprovou um projeto de cotas para negros e Universidades Federais (Andifes), Ana Lúcia Gazzola, o estudantes de escolas públicas, mas com porcentual de 10%. aumento das vagas em cursos noturnos já funcionaria como um Vários reitores ouvidos pelo Estado destacaram que a bom instrumento de inclusão. Na federal de Minas, que ela expansão no número de vagas e o investimento no ensino dirige, 59% dos alunos do noturno vêm de escolas públicas e médio público seriam medidas mais eficazes para a 38% são negros e pardos. No diurno, os números são de 36% e democratização do ensino superior. “É preciso valorizar a 30%, respectivamente. A Andifes entregou no ano passado um escola pública e as próprias universidades podem contribuir projeto ao MEC pedindo a criação de 25 mil novas vagas em com isso qualificando professores”, completou a reitora da cursos noturnos. 361 Para Tarso, o projeto valoriza a escola pública e global de discurso direto e discurso indireto. Interessa-nos aqui protege as camadas populares. “A proposta está de acordo com realçar a força discursiva tecida pelos articulistas numa as políticas afirmativas”, disse. “É um processo de valorização perspectiva de cumprir o papel da mídia frente a um debate de da escola pública e de um espaço onde está a ampla maioria proporção social em que formações discursivas distintas vão se dos estudantes de média-baixa, baixa e baixíssima renda. E configurando ao longo do texto. Pretendemos também verificar acho que não há nenhum prejuízo para ninguém, porque fica a relação autor-portador-tema tendo como fim o interlocutor um enorme número de vagas disponíveis para a disputa numa perspectiva interacionista. Destacamos o tecer textual, ou universal”, disse. seja, o jogo articulatório que os articulistas utilizam de forma a Tarso afirmou que o vestibular vai continuar sendo o manter a interação com o leitor. Os articulistas, ao compor o mesmo. “Não tem nenhuma relação entre o nível da texto midiático em tela, utilizam de discurso direto e, também, universidade e este projeto.” Ele disse que a classe média-alta e de discurso indireto na apresentação dos argumentos que os ricos do País não somam mais de 3% a 4% da população. representam pontos de vista divergentes em torno do tema em (Colaborou Renata Cafardo) debate. (Texto de Demétrio Weber e Leonêncio Nossa extraído do Além desse recurso estilístico, a ocorrência de aspas Jornal O Estado de S.Paulo - Cad. Educação, em 14/05/04, p. está evidente no içamento das falas dos locutores que defendem A11). seus pontos de vista, ora relacionados à posição governo, ora relacionados à posição das IES federais no que respeita à 3 Análise e discussão do texto reserva de vagas nas universidades públicas federais. Os articulistas manipulam as informações com certo O texto em questão constitui-se marcadamente por distanciamento, pois é sabido que é típico do discurso midiático heterogeneidade mostrada, mesclando-se em sua estrutura tal característica, embora nem sempre essa isenção seja 362 completa, mas há um esforço por parte dos articulistas e para Em se tratando da constituição dos enunciados dos isso lançam mão do discurso direto e do aspeamento como parágrafos supracitados, vemos que os articulistas constroem- forma de registro das opiniões das vozes manifestadas no texto, nos com a predominância do discurso indireto, isto porque tem- sem que se comprometam com o dito de outrem. O corpus em se a intenção de chamar atenção do leitor para o embate que sua macroestrutura se apresenta como um jogo argumentativo será travado discursivamente no decorrer do texto. Dessa em que formações discursivas se posicionam a respeito de um forma, dois verbos são criteriosamente usados: anunciar que tema instigador que é a reserva de vagas nas universidades assume valor declarativo-descritivo no primeiro período do públicas federais a alunos que concluírem o ensino médio nas primeiro parágrafo. Esta mesma forma verbal é retomada no escolas públicas. início do segundo parágrafo com valoração semântica Os parágrafos 1 e 2 se mostram como introdutórios e reforçativa e é modalizada pelo intensificador “também”. situam o leitor na discussão que será discorrida. Assim temos Ainda no que respeita à utilização dos verbos, um relato da atitude do governo federal que propõe o envio do destacamos o verbo avaliativo argumentar que desencadeia e projeto de lei para garantir a reserva de vagas nas universidades marca ‘precocemente’ o ponto de vista governamental que será públicas federais a alunos que concluírem o ensino médio nas abordado até o final do primeiro parágrafo. escolas públicas. Além disso, é anunciado também a criação do Verificamos que nos parágrafos 3 e 4 os articulistas Programa Universidade para Todos. Nestes parágrafos, fica colocam em cena todo um torneio discursivo-opinativo posto que o Governo quer promover a igualdade racial e referente ao tema em questão, ora citando a voz da situação implementar as ações afirmativas em prol das classes menos governo (Lula, Tarso e UNE) que suscita e demonstra uma favorecidas incluindo negros e índios, possibilitando-lhes o posição favorável à reserva de vagas nas IES federais; ora a acesso à universidade pública federal. voz dos reitores das IES federais, nitidamente contrária à proposta do governo. Vale lembrar que, estrategicamente, os 363 articulistas tecem o texto mostrando pontos de vista favoráveis locutor (articulistas) ao relatar a posição de Tarso, por meio de às reservas de vagas (posição governo) nos parágrafos 1, 2, 3, uma narratividade linear, expande o lead contido nos 6, 8 e 9 e, também, pontos de vista contrários à reservas de parágrafos 1 e 2 do texto. Além disso, traz a voz de Tarso vagas nos parágrafos 4 e 5. Essa articulação provoca um efeito aspeada, via discurso direto, como elemento enfático ao de sentido que prende atenção do leitor, pois, por meio de um discurso governamental em torno de uma causa social. jogo de idéias opostas sobre um determinado tema, os Ressaltamos a incidência de verbo dicendi dizer no articulistas mantêm a progressão textual. Notamos que ao terceiro parágrafo, ocasião em que serve de base para o relatar essas posições e vozes entre aspas, as usam como discurso citante: “[...] Tarso Genro, disse que a proposta para recurso enfático ao dito por outrem, embora sejam os as federais ‘muda radicalmente’ o modelo de ensino superior responsáveis pela materialização dos enunciados. no país” e, também, para o discurso citado: “O governo não Ainda tratando da macroestrutura textual, percebemos teme o debate. Quando não há reação de privilegiados e na fala de Tarso, ao longo do texto, uma recorrência temática já poderosos é porque não há política afirmativa”, disse. apresentada pelos articulistas de forma indireta nos parágrafos Notamos que, num mesmo enunciado, o verbo dicendi 1 e 2 no uso de sintagmas nominais como: a proposta, o desempenha função expressiva formal e sígnica: num primeiro projeto. Essa organização textual nos permite perceber a momento, por meio do discurso indireto e, num segundo manutenção temática que se confirma nos enunciados: “[...] momento, no discurso direto. Outra ocorrência desse verbo é Tarso Genro, disse que a proposta para as federais ‘muda grafada no oitavo parágrafo para citar duas falas de Tarso em radicalmente’ o modelo de ensino superior no país”; “[...] estilo direto: “A proposta está de acordo com as políticas Tarso explicou que o projeto está pronto para ser enviado ao afirmativas”, disse. “É um processo de valorização da escola Congresso” e “Para Tarso, o projeto valoriza a escola pública pública e de um espaço onde está a ampla maioria dos e protege as camadas populares”. Isto posto, vemos que o estudantes de média-baixa, baixa e baixíssima renda. E acho 364 que não há nenhum prejuízo para ninguém, porque fica um dos enorme número de vagas disponíveis para a disputa universal”, constituída em torno do texto. disse. Essas falas revelam o empenho do ministro em defender a proposta do governo. enunciados materializados em toda a enunciação Valendo-se do aspeamento os articulistas mostram o discurso citado em estilo direto tanto de Tarso como das IES Podemos notar, ao longo do texto, o uso dos verbos federais. É notória a predominância da ocorrência das falas de dicendi dizer e afirmar , mesmo sendo considerados neutros, Tarso no texto nos parágrafos 3 “O governo não teme o debate. não garantem totalmente a isenção ou o distanciamento do Quando não há reação de privilegiados e poderosos é porque locutor citante da fala/voz do locutor citado. Nota-se que a não há política afirmativa”, disse; 6 “Pela primeira vez na manifestação do locutor citado vem sempre entre aspas, história do País, seguida da flexão do verbo dicendi que rege a citação. Isto nos parcela da população de renda mais baixa”, afirmou ; 8 “A leva a crer que os articulistas manipulam bem o discurso do proposta está de acordo com as políticas afirmativas”, disse. outro a seu favor o que confirma a premissa de que “não sou eu “É um processo de valorização da escola pública e de um que estou dizendo, mas sim o outro quem o diz”. Essa espaço onde está a ampla maioria dos estudantes de média- modalização imprime um certo grau de verossimilhança ao baixa, baixa e baixíssima renda. E acho que não há nenhum texto, partindo do ponto de vista do locutor citante, uma vez prejuízo para ninguém, porque fica um enorme número de que, essa característica é própria do discurso midiático. Veja-se vagas disponíveis para a disputa universal”, disse; e 9 Tarso que as formas verbais dizer e afirmar cumprem a função afirmou que o vestibular vai continuar sendo o mesmo. “Não conativa por buscar a adesão do leitor à informação. Outro tem nenhuma relação entre o nível da universidade e este recurso marcante na tessitura do texto em análise é o uso do projeto.” em detrimento das falas das IES federais. Isto nos aspaeamento utilizado para içar o discurso direto que denota permite inferir que o discurso do governo deva prevalecer em um distanciamento por parte do locutor citante na construção relação ao discurso contrário que é representado, nesse evento o processo de ensino se envolta para a 365 textual discursivo, pela fala das IES federais, constantes nos nos parágrafos 6 e 8 na anunciação da voz do Ministro “A parágrafos 4 “50% de reserva de vagas é uma tragédia aqui”, proposta está de acordo com as políticas afirmativas”, “ É um disse o reitor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), processo de valorização da escola pública e de um espaço Ulysses Fagundes Neto e 5 “É preciso valorizar a escola onde está a ampla maioria dos estudantes de média-baixa, pública e as próprias universidades podem contribuir com isso baixa e baixíssima renda. E acho que não há nenhum prejuízo qualificando professores”, completou a reitora da federal do para ninguém, porque fica um enorme número de vagas Rio Grande do Sul (UFRGS), Wrana Panizzi. Assim, o disponíveis para a disputa universal” e ratificadas pela voz da discurso direto usado pelos articulistas serve como estratégia UNE “A UNE sempre defendeu essa medida”; do outro lado, é discursiva ao relatar o fato que envolve uma ampla discussão possível perceber a posição contrária das IES federais no que sobre um tema de abrangência nacional. Os articulistas concerne à idéia apresentada por parte do governo nos promovem o debate entre as Formações Discursivas que se parágrafos 4, 5 e 7. Isto é perceptível, principalmente, no constituem no texto e se isentam, uma vez que a imparcialidade enunciado “É preciso valorizar a escola pública e as próprias por parte da mídia deve ser levada a termo, e, dessa forma, universidades lançam mão do aspeamento como recurso lingüístico e como professores”. podem contribuir com isso qualificando âncora discursiva que lhes garanta um certo distanciamento Há que se registrar ainda no parágrafo 5 o locutor frente aos fatos relatados e também para enfatizar as vozes dos citante (os articulistas) manipulando e interpretando a voz do locutores citados com sua força persuasiva em defesa de seus outro (reitores) por meio do discurso indireto: “Vários reitores pontos de vista. ouvidos pelo Estado destacaram que a expansão no número de Veja-se que, ao longo do texto, vão se configurando vagas e o investimento no ensino médio público seriam posições ideológicas distintas: de um lado, temos a governista medidas mais eficazes para a democratização do ensino anunciada nos parágrafos 1, 2 e 3 e, em seguida, corroboradas superior”. Em seguida, concluem o parágrafo com o discurso 366 citado “É preciso valorizar a escola pública e as próprias conclusivo da reportagem, sendo que esta é finalizada por mais universidades qualificando um discurso citante “Ele disse que a classe média-alta e os professores”. O uso das duas modalidades de discurso nesse ricos do País não somam mais de 3% a 4% da população”. parágrafo nos possibilita observar a seguridade da tessitura que Diante do exposto pelos articulistas é nos possível ver que estes os articulistas utilizam para mencionarem o ponto de vista apresentam o texto midiático de tema conflitivo, mostrando as desfavorável ao que está posto pelo governo. Essa abordagem posições dos locutores citados usando de recursos lingüísticos se mostra como elemento discursivo que provoca a como é o caso mais evidente o discurso direto e do aspeamento. continuidade do embate argumentativo sobre o tema em pauta. Dessa forma, procuram se isentar e se distanciarem dos pontos Vale nesse contexto de vista postos em cena. Vê-se que a imparcialidade a que o especificamente, faz um jogo articulatório, trazendo à baila jornal se propõe nem sempre é garantida tanto em discurso uma questão que implica muita reflexão de toda a comunidade relatado de forma direta como o de forma indireta, uma vez que acadêmica e, também, por parte do governo no que concerne à sendo o locutor responsável pelo enunciado pode ou não resolução do problema. assimilar a voz de um ou de outro locutor. lembrar podem que o contribuir com isso texto midiático, Ao concluir o texto, os articulistas usam o verbo dicendi afirmar para relatar um discurso citante “Tarso afirmou que o vestibular vai continuar sendo o mesmo” e, ainda incidindo sob a regência desse mesmo verbo apresentam o discurso citado “Não tem nenhuma relação entre o nível da universidade e este projeto”. (fica implícita a forma elíptica do verbo afirmou). Verificamos que a articulação discursiva é hábil por parte dos articulistas ao construírem o enunciado No que se refere ao discurso indireto Bakhtin (2004: 160) assevera que a enunciação de outrem pode ser apreendida como uma tomada de posição com conteúdo semântico preciso por parte do falante, e nesse caso, através da construção indireta, transpõe-se de maneira analítica sua composição objetiva exata (o que disse o falante). Ainda sobre o discurso indireto Benites (2002: 60) menciona que no discurso indireto, o locutor citante, como um tradutor que faz uso de suas 367 próprias palavras para transmitir idéias de outro, passa a filiarem a esta ou àquela formação ideológica. Isto lhes é impressão de ser um simples porta-voz a serviço da transmissão garantido por meio dos recursos argumentativos e lingüísticos neutra de sentido de uma mensagem anterior. Essa impressão, utilizados na confecção do texto jornalístico. Além disso, a no entanto, é também falsa, na medida em que o locutor composição textual é estrategicamente elaborada de forma a seleciona do discurso do outro o trecho que lhe interessa, assegurar a progressão textual e a manutenção temática. submete-o a um filtro próprio e adapta-o a seus objetivos. Notamos que a organização textual é alicerçada num jogo Diante disto, consideramos Benites (2002: 61) quando articulatório em que parágrafos são constituídos de modo que assevera que o uso de aspeamento nunca é neutro, pois este apresentem pontos de vista de locutores distintos, ou seja, implica uma tomada estratégica de posição face ao discurso posições ideológicas divergentes acerca da proposta do governo relatado, resultante na aprovação do dito, na sua ridicularização no que se refere à reserva de vagas nas IES federais. ou na sua negação; revela intenções variadas do locutor que Percebemos que essa estratégia desempenha função cita, quer no sentido de resguardar-se, protegendo-se de conativa em relação ao interlocutor que se sente ‘convidado’ a polêmicas porque “foi o outro quem o disse”, quer no sentido interagir com o locutor, com o tema e com o portador na inverso do condição de leitor, respeitando o seu centro de interesse pronunciamento alheio numa seqüência textual-argumentativa temático e analítico. Dessa forma, o autor (locutores) interage que lhe é sutil ou declaradamente divergente ou convergente. com o interlocutor real tido como o leitor primeiro do jornal, de expor-se a elas, pelo enquadramento O texto midiático em questão trata de um tema com o interlocutor virtual de acordo com o centro de interesse, polêmico, cotas nas IES federais, e isto suscita uma leitura nesse caso, grupos representativos das minorias discriminadas, crítica e mobiliza o leitor frente a uma discussão apresentada Ongs, movimentos sociais como o negro, com a academia, pelos locutores. Notamos que os locutores, ao tecerem seu representação texto, se resguardaram o direito de exporem o assunto sem se acadêmicos (UNE) e com o interlocutor superior que é a do governo (MEC), representação dos 368 ideologia marcada pela posição governo (políticas de ação e interlocutor levando-se em conta as condições de produção e afirmativas/sistemas de cotas) e pela posição das IES federais interesse temático. No caso do texto, objeto dessa análise, o (contrária à posição governista). Esse jogo de opiniões relatado tema polêmico assume uma dimensão fértil para que a pelos articulistas promove, ao nosso ver, uma interação verbal interação verbal se efetive. entre locutor e interlocutor, principalmente nos níveis real e A forma de apresentação do embate entre as vozes virtual, pois o que está em pauta constitui, por si só, um tema dos locutores postas em cena, através de parágrafos conflitivo. constituídos por contraste, chama atenção do alocutário Vale ressaltar que, sendo o portador (O Estado de imprimindo um maior grau de adesão ao que está sendo S.Paulo) um jornal de projeção nacional com sua significativa reportado e isso configura-se capacidade de captação da notícia e alto nível de circulação, estrategicamente produzida pelos articulistas. em forma de interação este desempenha sua função de disseminar as informações sobre vários aspectos da vida nacional. Tido como um dos vinte Considerações finais melhores jornais do mundo, sua credibilidade se firma dada à qualidade formal e conteudística no Brasil. Seu público ledor constitui-se em sua maioria de pessoas de classe média acima com um nível apurado de formação intelectual, acadêmica, empresários, etc., uma vez que os informes veiculados por esse meio de comunicação supõe um leitor competente e agudez crítica. Assim, ao considerar a palavra como um território comum do locutor e do interlocutor, percebemos a possibilidade da interação verbal entre portador, autor (locutor) Considerando que o discurso midiático requer perícia articulatória no dizer jornalístico, cuja função primeira é relatar os fatos com a maior imparcialidade possível verificamos, no corpus analisado, que os articulistas souberam usar dos recursos textuais para tal modalidade, destacando-se o uso do discurso direto e do aspeamento como forma de isenção e distanciamento do dito por outrem. A questão abordada na reportagem envolve duas posições ideológicas distintas: por um 369 lado, a posição governo em defesa da reserva de vagas nas IES que “a expansão no número de vagas e o investimento no federais para aluno que concluírem o ensino médio em escolas ensino médio público seriam medidas mais eficazes para a públicas, com o envio de projeto de lei ao Congresso, numa democratização do ensino superior”. tentativa de promover a igualdade racial e privilegiar parcelas A análise do texto midiático, objeto deste artigo, da população discriminada, como negros e índios; por outro possibilitou-nos ver que, por meio de um jogo articulatório, os lado, há o repúdio à proposta do governo por parte dos reitores articulistas apresentaram um tema polêmico, registrando das IES federais, que defendem a idéia de que é preciso posições ideológicas distintas sobre o assunto e utilizando dos valorizar a escola pública e as próprias universidades podem recursos contribuir qualificando os professores, além disso, expandir o demonstrar que é possível a interação verbal nessa modalidade número de vagas e o investimento no ensino médio seriam de texto, principalmente pela forma de composição da medidas mais eficazes para a democratização do ensino reportagem na qual expõem as vozes citante e citada superior. engendrando o todo textual da enunciação. Diante do exposto, argumentativos e lingüísticos, conseguiram Como em todo discurso há algumas contradições e fica-nos evidente que a interação verbal entre locutor e reações, percebemos que embora haja uma tentativa de interlocutor nos seus níveis real, virtual e superior é plausível linearidade nas posições ideológicas, a posição dos reitores das nesse tipo de texto. IES federais deixa claro que a arena de conflitos no trato da coisa pública é inevitável. O jogo de forças fica nítido quando Referências bibliográficas ao institucionalizar o sistema de cotas nas universidades, abrese precedente de exclusão, pois ao reservar vagas para uns, exclui-se outros. Dessa forma, a polêmica continua e se representa na voz dos reitores das IES federais ao mencionarem AUTHIER-REVUZ, J. Heterogeneidade(s) enunciativa(s). Caderno de Estudos Lingüísticos, v. 19, p.25-42, 1990. 370 BAKHTIN, M .(VOLOCHÍNOV). Marxismo e filosofia da linguagem. 11 ed. Trad.M.Lahud e Y. E.Vieira. São Paulo: Hucitec, 2004. BARBOSA, P.L.N. Discurso e mídia: a cultura do espetáculo. 1 ed. Maringá: EDUEM, 2003, p. 111-124. KOCH, I.G.V. O texto e a construção de sentidos. São Paulo: Contexto, 1997. WEBER, Demétrio & NOSSA, Leonêncio. Universidade: Escola Pública terá 50% das vagas - Porcentual anunciado ontem por Lula para as federais inclui cotas para negros e BENITES, S. A . L. Contando e fazendo a história: a citação no discurso jornalístico. São Paulo: Arte & Ciência, 2002. CARNEIRO, A .D.(Org.) O Discurso da mídia. Rio de Janeiro: Oficina do Autor, 1996. índios. Jornal O Estado de S. Paulo, São Paulo, 14 maio de 2004. Caderno Educação, p. A11. O Ensino de Língua Inglesa sob Aspectos Culturais Bruna Bonacin Torrecilha Lopes (G/UEMS) Total Physical Response DUCROT, Oswald. O dizer e o Dito. Trad. Eduardo Reinaldo Coimbra de Oliveira (UEMS) Guimarães. Campinas-SP: Contexto, 1997. Ideologia e a Morte da Luta de Classe: para onde vamos? GARCEZ, L. H. C. A escrita e o outro: os modos de participação na construção do texto. Brasília: UNB, 1998. Alaíde Pereira Japecanga Aredes (UEMS) 371 IDEOLOGIA E A MORTE DA LUTA DE CLASSE: PARA ONDE VAMOS? Alaíde pereira Japecanga Aredes41 UEMS/NA Escrever sobre ideologia e suas relações com a luta de classes não é uma tarefa nada fácil, mas necessária para o contexto em que estamos vivendo principalmente diante de demagogos que dizem falar e agir em nome da democracia, mas suas ações são voltadas para por em prática a pedagogia do medo (Spinoza). No interior das Universidades públicas esta é uma prática muito comum, de maneira especial quando se fala em orçamento. Todos arregalam os olhos e ficam desesperados quando alguém quer mais explicações sobre o dinheiro que deveria ser gasto e não foi. 41 Doutora em Educação pela Unesp – Marília e docente da UEMS – Unidade Universitária de Nova Andradina 372 Nas mangas tais pessoas têm de se lançar de um discurso ideológico e perseguir àqueles que de certa maneira aparência das coisas como se esta fosse a essência das próprias coisas. questiona posturas consideradas inadequadas. Pois bem, como isso acontece? Por que isso acontece? Por que algumas pessoas preferem administrar sem que possam ser questionadas? E realmente não são? Para tentar responder estas questões, considero importante relembrarmos o que Marx entende sobre ideologia. Fazendo isso relembrarei também a concepção marxista de homem, de sociedade, de mundo etc, algo esquecido pelos intelectuais no contexto atual, afinal a luta de classes está ai, nunca deixou de existir. Marx afirma que a consciência humana é sempre social e histórica, isto é, determinada pelas condições concretas de nossa existência. Isso não significa, porém, que nossas idéias representem a realidade tal como esta é em si mesmo. Se assim fosse, seria incompreensível que os seres humanos, conhecendo as causas da exploração, da dominação, da miséria e da injustiça nada fizessem conta elas. Nossas idéias, historicamente determinadas, têm a peculiaridade de nascer a partir de nossa experiência social direta. A marca da experiência social é oferecer-se como uma explicação da Não só isso. As aparências – ou o aparecer social à consciência – são aparências justamente porque nos oferecem o mundo de cabeça para baixo: o que é causa parece ser efeito, o que é efeito parece ser causa. Isso não se dá apenas no plano da consciência individual, mas, sobretudo no da consciência social, isto é, no conjunto de idéias e explicações que uma sociedade oferece sobre si mesma. Feuerbach estudara esse fenômeno na religião, designando-o com o conceito de alienação. Marx interessa-se por esse fenômeno porque o percebeu em outras esferas da vida social, por exemplo, na política, que leva os sujeitos sociais a aceitarem a dominação estatal porque não reconhecem quem são os verdadeiros criadores do Estado. Ele o observou também na esfera da economia: no capitalismo, os trabalhadores produzem todos os objetos existentes no mercado, todas as mercadorias; após havê-las produzido, as entregam aos proprietários dos meios de 373 produção, mediante um salário; quando vão ao mercado não conseguem comprar essas mercadorias. A ideologia é um fenômeno histórico-social decorrente do modo de produção econômico. À medida que, numa formação social, uma forma determinada da divisão Olham os preços, contam o dinheiro e voltam par casa de mãos vazias, como se o preço das mercadorias existisse por si mesmo e como se elas estivessem à venda porque surgiram do nada e alguém as decidiu vender. Em outras palavras, os social se estabiliza, se fixa e se repete, cada indivíduo passa a ter uma atividade determinada e exclusiva, que lhe é atribuída pelo conjunto das relações sociais, pelo estágio das forças produtivas e pela forma da propriedade. trabalhadores não só não se reconhecem como autores ou produtores das mercadorias, mas ainda acreditam que elas Cada um, por causa da fixidez e da repetição de seu valem o preço que custam e que não podem tê-las porque lugar e de sua atividade, tende a considerá-los naturais (por valem mais do que eles. Alienaram dos objetos seu próprio exemplo, quando alguém julga que faz o que faz porque tem trabalho e não se reconhecem como produtores da riqueza e das talento ou vocação natural para isso; quando alguém julga que, coisas. por natureza, os negros foram feitos para serem escravos; quando alguém julga que, por natureza, as mulheres foram A inversão entre causa e efeito, princípio e feitas para a maternidade e o trabalho doméstico). conseqüência, condição e condicionado leva à produção de imagens e idéias que pretendem representar a realidade. As A naturalização surge sob a forma de idéias que imagens formam um imaginário social invertido – um conjunto afirmam que as coisas são como são porque é natural que assim de representações sobre os seres humanos e suas relações, sejam. As relações sociais passam, portanto, a ser vistas como sobre as coisas, sobre o bem e o mal, o justo e o injusto, os naturais, existentes em si e por si, e não como resultados da bons e os maus costumes, etc. Tomadas como idéias, essas ação humana. A naturalização é a maneira pela qual as idéias imagens ou esse imaginário social constituem a ideologia. produzem alienação social, isto é, a sociedade surge como uma 374 força natural estranha e poderosa, que faz com que tudo seja Passam a acreditar na independência entre a necessariamente como é. Senhores por natureza, escravos por consciência e o mundo material, entre o pensamento e as coisas natureza, cidadãos por natureza, proprietários por natureza, produzidas socialmente. Conferem autonomia à consciência e assalariados por natureza etc.. às idéias e, finalmente, julgam que as idéias não só explicam a realidade, mas produzem o real. Surge a ideologia como crença A divisão social do trabalho, iniciada na família, prossegue na sociedade e, à medida que esta se torna mais na autonomia das idéias e na capacidade de as idéias criarem a realidade. complexa, leva a uma divisão ente dois tipos fundamentais de trabalho: o trabalho material de produção de coisas e o trabalho Ora, o grupo dos que pensam – sacerdotes, intelectual de produção de idéias. No início, essa segunda professores, artistas, filósofos, cientistas – não nasceu do nada. forma e trabalho social é privilégio dos sacerdotes; depois, Nasceu não só da divisão social do trabalho, mas também de torna-se função de professores e escritores, artistas e cientistas, uma divisão no interior da classe dos proprietários ou classe pensadores e filósofos. dominante de uma sociedade. Os que produzem idéias separam-se dos que produzem Como conseqüência, o grupo pensante (os intelectuais) coisas, formando um grupo à parte. Pouco a pouco, à medida pensa com as idéias dos dominantes; julga, porém, que tais que vão ficando cada vez mais distantes e separados dos idéias são verdadeiras em si mesmas e transformam idéias de trabalhadores materiais, os que pensam começam a acreditar uma classe social determinada em idéias universais e que a consciência e o pensamento estão, em si e por si mesmos, necessárias, válidas para a sociedade inteira. separados das coisas materiais, existindo em si e por si mesmos. Como o grupo pensante domina a consciência social, tem o poder de transmitir as idéias dominantes para toda a 375 sociedade, através da religião, das artes, da escola, da ciência, humanos, da sociedade e do poder político encontra a causa da filosofia, dos costumes, das leis e do direito, moldando a fora e antes dos próprios humanos e de sua ação, localizando a consciência de todas as classes sociais e uniformizando o causa originária nas divindades. A ideologia propriamente dita pensamento de todas as classes. surge quando, no lugar das divindades, encontramos as idéias: o Homem, a Pátria, a Família, a Escola, o Progresso, a Ciência, Os ideólogos são membros da classe dominante e das o Estado, o Bem e o Justo. classes aliadas a ela, que, como intelectuais, sistematizam as imagens e as idéias sociais da classe dominante em Com isso, podemos dizer que a ideologia é um representações coletivas, gerais e universais. Essas imagens e fenômeno moderno, substituindo o papel que, antes dela, idéias não exprimem a realidade social, mas representam a tinham os mitos e as teologias. Com a ideologia, a explicação aparência social do ponto de vista dos dominantes. São sobre a origem dos homens, da sociedade e da política consideradas realidades autônomas que produzem a realidade encontra-se nas ações humanas, entendidas como manifestação material ou social. São imagens e idéias postas como universais da consciência ou das idéias. abstratos, uma vez que, concretamente, não corresponde à Assim, por exemplo, julgar que o Estado se origina realidade social, dividida em classes sociais antagônicas. Assim, por exemplo, existem na sociedade, concretamente, capitalistas e trabalhadores, mas na ideologia aparece abstratamente o Homem. das idéias de estado de natureza, direito natural, contrato social e direito civil é supor que a consciência humana, independentemente das condições históricas materiais, pensou nessas idéias, julgou-as corretas e passou a agir por elas, A ideologia torna-se propriamente ideologia quando não aparece sob a forma do mito, da religião e da teologia. Com efeito, nestes, a explicação sobre a origem dos seres criando a realidade designada e representada por elas. 376 Que faz a ideologia? Oferece a uma sociedade dividida em classes sociais antagônicas, e que vivem na forma da luta de entre poder econômico e poder político, pode ser respondida agora: em virtude da ideologia. classes, uma imagem que permite a unificação e a identificação Para finalizar, deixo uma mensagem a todos, social – uma língua, uma religião, uma raça, uma nação, uma pátria, um Estado, uma humanidade, mesmos costumes. observemos bem os fatos que ocorrem ao nosso redor, principalmente no que tange à infiltração de políticas do Banco Assim, a função primordial da ideologia é ocultar a Mundial para as Universidades Públicas Brasileiras. A origem da sociedade (relação de produção como relações entre ideologia que está por traz pode por fim aos nossos sonhos. meios de produção e forças produtivas sob a divisão social do Reflitamos. trabalho), dissimular a presença da luta de classes (domínio e exploração dos não-proprietários pelos proprietários privados dos meios de produção), negar as desigualdades sociais (são imaginadas como se fossem conseqüência de talentos Referências Bibliográficas diferentes, da preguiça ou da disciplina laboriosa) e oferecer a imagem ilusória da comunidade (o Estado) originada do contrato social entre homens livres e iguais. A ideologia é a lógica da dominação social e política. Porque nascemos e somos criados com essas idéias e nesse imaginário social, não percebemos a verdadeira natureza FEUERBACH, A essência do Cristianismo. Campinas: Papirus, 1988. Karl Marx e Friedrich Engels Ideologia Alemã. São Paulo: Boitempo Editorial, 2007. de classe do Estado. A resposta à Segunda pergunta de Marx, qual seja, por que a sociedade não percebe o vínculo interno Ludwig. Mesa 6 377 A Questão da Identidade em Dorian Gray Estrangeirismos: invasão ou enriquecimento lingüístico? Mara Regina Pacheco (PG-UEMS) Thiago Teodoro Rupere (G-UEMS) Fernandes Ferreira (UEMS) Mesa 8 A Questão Étnica na Obra “Viva O Povo Brasileiro” de João Dos Diáris Íntimos Tradicionais ao Blogs Virtuais Ubaldo Ribeiro Luciane Silva Castro(G-UEMS) Rosana Pereira de Souza (G-UEMS) A Construção Colaborartiva do Plano Municipal de Edcuação Memória coletiva e Construção de Identidade: aproximações e de Nova Andradina-MS Considerações Ana Claudia Duarte Mendes (UEMS) O Texto Escrito e a Imagem: na Obra Marcelo Marmelo Martelo e o Outras Histórias A Memória Coletiva Presente em “Minha cidade Era Assim” Nilza Pires dos Santos Silva (PIBIC/UEMS) de Emmanuel Marinho Kátia Silene Rodrigues (PG-UEMS) Falando Através da Escrita: uma característica da linguagem dos Webchats Mesa 7 Juliana Ceobaniuc da Silva Michelini (UEMS) Aspecto do Português em Macau: uma questão de dialeto Alaíde Pereira Japecanga Aredes (UEMS) Geraldo José da Silva (UEMS) Maria Conceição Alves de Lima (UEMS) Raymundo José da Silva (UEMS) 15:00hs. Às 17:00hs. Comunicação Individual e Coordenadas 378 Mara Regina Pacheco (G/UEMS) Mesa 9 Comunicação Coordenada Estudos do Léxico Regional O DISCURSO DA TRÍADE: PODER, SEXO, DINHEIRO EM ARTHUR AZEVEDO O Léxico na Música Regional de Mato Grosso do Sul Mara Regina Pacheco Coordenadora: Marineide Cassuci Tavares (PIF) (UEMS) Vocabulário de Fronteira: a influência cultural do Paraguai Andréia dos Santos Fernandes (FPI) Nábia Massaroto da Silva (FIP) RESUMO: A tríade, poder, sexo e dinheiro, é responsável pela tensão na construção do discurso da obra A Capital Federal, de Arthur de Azevedo. Esse tripé é explorado de forma cômica, Uma Visão da Linguagem da Religião e da Crença Cíntia Arce (G/FIP) irônica, e até mesmo sarcástica, numa visão crítica da sociedade fin de secle da capital do Brasil. Analisaremos como o escritor articula os aspectos fundadores da AD ao produzir as Mesa 10 Os Quadros Sociais da memória: a poesia de Flora Egídio Thomé e Raquel Naveira Ana Cláudia Duarte Mendes (UEMS) O Discurso da Tríade: poder, sexo, dinheiro em Arthur de Azevedo personagens, suas características, intenções e objetivos por meio das vozes que proferem no seu discurso. PALAVRAS CHAVE: discurso – poder/sexo/dinheiro literatura ABSTRACT: The tripod, power, sex and money, it is responsable by the tension of speech construction in the work A Capital Federal, by Arthur Azevedo. This speech is explored of 379 a comic, ironic, and sarcastic way, in a critical point of view of dos cidadãos do Rio de Janeiro do final do século XIX, com the “fin de secle” Brazilian capital society. We will analise humor e sarcasmo. É ponto marcante na obra o desenrolar de how the writer articulates the bases aspects of Speech Analise inúmeros discursos, sendo sempre de duas frentes antagônicas: to produce the characters, their characteristics, intentions and seja de classe, rica/pobre; de etnia, branco/negro; cultural, objectives by the voices the speech emits. culto/caipira; e assim por diante, mas onde sempre a classe de KEY WORDS: speech – power/sex/money - literature dominantes valorizando o estrangeiro, e dos dominados, nativos do Brasil que sublimam alguma ascensão social. A obra de Arthur Azevedo, A Capital Federal, foi Para tratar do aspecto discursivo tomaremos como escrita sob uma visão crítica da sociedade da capital brasileira referência Pêcheux (Apud, Orlandi, 1999), que é o estudioso do final do século XIX, onde o tripé poder/sexo/dinheiro maior a AD francesa. Para ele, a análise do discurso reside em serviram de base para a construção do discurso da produção três regiões do conhecimento científico: o materialismo literária em análise. histórico, suas formações sociais, suas transformações e A obra em questão encena assuntos cotidianos da vida ideologias; a lingüística, e seus mecanismos sintáticos e de carioca, observando hábitos da capital federal como os enunciação; e a teoria do discurso, com sua determinação namoros, as infidelidades conjugais, as relações de família e histórica dos processos semânticos. Ao aprofundar o estudo amizade, as cerimônias festivas e etc. A comédia se fixa em sobre análise do discurso em Pêcheux percebemos que analisar aspectos da vida da sociedade e da evolução da capital a língua é diferente de dizer analisar o discurso, uma vez que a brasileira, apresentando uma visão crítica do crescimento materialidade lingüística é a palavra vestida de sentido. urbano personagens Pêcheux (Idem) foi buscar no psicanalista Lacan a explicação estigmatizados. Apoiando-se em esteriótipos de alguns para a ilusão que temos de que nós é que construímos nosso seguimentos sociais, o autor exibe um panorama geral do perfil próprio discurso. Segundo ele, o sujeito do discurso pensa que e suas contradições através de 380 sabe o que está dizendo, mas, esse determinado discurso é interpretação dos sujeitos falantes, e a produção de sentidos que sempre a junção de discursos anteriores já pré-estabelecidos, já dela advêm como parte do ser social que é, materializando sua ditos, uma vês que somos um ser fragmentado que carrega ideologia pela linguagem em forma de discurso. Há de se dentro de si o consciente e o inconsciente ao mesmo tempo e considerar que os sentidos das palavras não são fixos e que que invariavelmente há sempre atrás deste discurso uma possuem sim uma pluralidade de entendimentos o que colabora historicidade, uma ideologia pré-concebida. Ao pensar o e muito para que a obra em estudo consiga ter seu tom jocoso, discurso em Bakhtin (Apud Fernandes, 2007) há de se sarrista e divertido. Em observação a esta idéia podemos citar considerar um sujeito sempre social com base em duas Pêcheux (1997, p. 190) que diz: “ O sentido de uma palavra, de concepções: na dialogia, que trata do sujeito social com o uma expressão, de uma proposição, etc., não existe ‘em si outro; e na alteridade, que trata da relação com o enunciado. mesmo’ (...) mas, ao contrário, é determinado pelas posições Para o estudioso, o fluxo de linguagem se dá em resposta a um ideológicas colocadas em jogo no processo histórico-social no outro discurso já posto, onde a palavra do outro é sempre qual as palavras, expressões e proposições são produzidas”. constituída do sujeito social que é, das suas diferentes vozes e Arthur Azevedo utiliza desse jogo dos sentidos para provocar constituição. Segundo o russo, enunciado e enunciação se riso na crítica à sociedade da capital brasileira. completam, de forma tal que é impossível formar textos que se Fernandes (2007, p.45) diz que assim como a desvincule o sujeito, ou seja, sem interferência do local identidade, o sujeito não é fixo, e está sim em um processo de pertencente ao sujeito. Orlandi (1999, p. 15) pensa no discurso eterna construção e mutação onde: o sujeito se constitui por como ação social, onde: “a palavra discurso, etimologicamente, difusas tem em si a idéia de curso, de percurso, de correr por, de heterogeneidade e conflitos; que a polifonia constitutiva do movimento, prática de linguagem: com o estudo do discurso discurso do sujeito vem de vozes oriundas de diferentes observa-se o homem”. Ou seja, analisar o discurso implica em espaços sociais; e que há uma heterogeneidade nas formas de vozes sociais, sendo marcado por intensa 381 presença das diversas vozes constitutivas do discurso do história, a superfície lingüística, o meio social, tudo isso sujeito. somado faz parte da significação. Foucault (2000) também colabora para o entendimento A Capital Federal escrita em 1897 tem uma forma de da análise do discurso quando diz que o discurso é dominado discurso associada ao fruto do pensamento social e político da pelo interdiscurso, ou seja, é tecido de discursos outros época da história dessa comunidade em particular, ou seja, (dialogismos). Afirma que o discurso é heterogêneo, é registra um padrão de humor nacional com uma valiosa perpassado por outros discursos, por discursos de outros. Cita descrição dos costumes de um período decisivo na formação da que existe uma memória discursiva onde circulam formulações sociedade urbana brasileira. A mulata faceira e sensual, o anteriores já enunciadas, já ditas, e que a formação discursiva é caipira ingênuo, a cortesã estrangeira esperta, o corrupto e um conjunto de inúmeros enunciados, conceitos e escolhas ainda outros que até hoje encontram espaço no cenário temáticas que descrevem sistemas de dispersões na busca de nacional. A descrição cenográfica da obra dá-se em lugares que verificar como o discurso se organiza, o que significa, sua representavam a capital federal, como por exemplo, o Grande ordem, suas relações, funcionamento, transformações e outros. Hotel, o Largo de São Francisco, o Belódromo, a Rua do Para Pêcheux (Apud Orlandi, 1999) o discurso é um Ouvidor e outros, onde transcorrem questões cotidianas como efeito de sentido entre interlocutores. Para Orlandi (1999) o vícios dos mais variados tipos, de jogos (cartas, roleta, corrida discurso é uma prática: “Discurso pode ser visto como a de cavalos), corrupções e amores imorais. Para Giacon (2002. instanciação do modo de se produzir linguagem que é social”. p. 104) “toda escritura nacional é um discurso.” Sendo assim, A Ela acrescenta que não há como conceber o discurso como Capital Federal é a tradução do discurso da vida carioca do meio de divulgação de informação, mas sim do efeito de final do século XIX. Para a estudiosa, ao escrever, o escritor sentido entre interlocutores. Segundo ela, os interlocutores, sua utiliza-se de diferentes artifícios discursivos para significar a identidade nacional, ou seja, o autor monta um discurso usando 382 elementos da história e culturais com uma pitada de sarcasmo e significação do que se quer dizer através do não-dito, há um ironia para fazer uma crítica à sociedade da época. Azevedo sentido no silêncio. para dar sustentação a esse discurso, usa como pilares três itens de interesse público comum: o poder, o sexo e o dinheiro, e O sentido não pára, ele muda de caminho. O suas múltiplas implicações. silêncio é assim a “respiração” (o fôlego) da Essa maneira de escrever comicamente e com ironia os significação; um lugar de recuo necessário acontecimentos de sua época, culmina com o pensar de Orlandi para que se possa significar, para que o (1988, p. 48) sobre as relações e inter-relações de sentido sentido faça sentido. Reduto do possível, do dentro de um discurso. Segundo ele, a significação não se múltiplo, o silêncio abre espaço para o que desenvolve sobre uma linha reta, calculável, segmentável. Os não é “um”, para o que permite o movimento sentidos são dispersos, se desenvolvem em todas as direções e do sujeito. O real da linguagem – o discreto, o se fazem por diferentes matérias. Arthur Azevedo usa desse um – encontra sua contraparte no silêncio. subterfúgio ao escrever: faz uso da dualidade, da ambigüidade, (Orlandi, p. 13) da alteridade, da multiplicidade, da complexidade. O autor se utiliza ainda de um recurso descrito por Orlandi (1988, p. 87) O funcionamento do silêncio atesta o como: a “retórica da resistência”, ou ainda “retórica da movimento do discurso que se faz na opressão”. A censura policia, proíbe, e o efeito do sentido dado, contradição entre o “um” e o “múltiplo”, o o sentido que se pretende, se compreende através da mesmo e o diferente, entre paráfrase e necessidade da ideologia que constitui os sentidos e sujeitos polissemia. Esse movimento, por sua vez, envolvidos. No implícito, no silêncio, se encontra a real mostra o movimento contraditório, tanto do sujeito quanto do sentido, fazendo-se no 383 entremeio entre ilusão de um sentido só e o administração e população em toda a história da humanidade, e equívoco de todos os sentidos. (Idem, p. 17). isto não foge a regra na obra de Azevedo. O segundo, a questão do sexo, que de acordo com Foucault, se superpõe ao primeiro: Em A Capital Federal podemos detectar “silêncio múltiplos”: o silêncio das emoções, o da contemplação, o da É o dispositivo da sexualidade: como o de introspecção, o da revolta, o da resistência, o da disciplina, o do aliança, este se articula aos parceiros exercício do poder, o da derrota da vontade e etc. Aqui sexuais... O dispositivo de aliança se estabelece-se a tríade sexo, poder e dinheiro, três forças estrutura em torno de um sistema de regras poderosas de embate eterno que Azevedo usa para dar tensão e que define o permitido e o proibido, o fluência cômica e crítica ao seu discurso. Foucault (1997, p. prescrito e o ilícito; o dispositivo de aliança 16) no livro História da sexualidade, sustenta a idéia de um conta, entre os seus objetivos principais, o de tripé assim posto: poder-saber-prazer, o que vem de encontro reproduzir a trama de relações e manter a lei com a idéia que este trabalho apresenta. Segundo ele, esses três que as rege; o dispositivo da sexualidade pontos determinam o funcionamento das (inter)relações engendra, uma extensão permanente dos humanas, ou seja, a maneira do poder penetrar e controlar o domínios das formas de controle. (Foucault, prazer cotidiano (os efeitos entre o biológico e o econômico), p. 101) ou seja, a maneira como poder e desejo se articulam. Para o estudioso, existe um primeiro ponto, considerado ‘denso’ nas Foucault (idem, p.101) deixa claro que no caso da relações de poder, como por exemplo, entre homens e mulheres aliança, o que é pertinente é o vínculo entre os parceiros com (Lola X Eusébio; Figueiredo X Benvinda), jovens e velhos, status definido. Já para a sexualidade, o importante são as pais e filhos (D. Fortunata X Juquinha), educadores e alunos, sensações do corpo, a qualidade dos prazeres, a natureza das 384 impressões. Todos esses aspectos fazem parte da narrativa da última vez obra em estudo. Michel Foucault acrescenta ainda: tinha ainda falhado; mas como que lhe falei, não não o vejo há muitos dias, receio Enfim, se o dispositivo de aliança se articula que a sorte afinal se cansasse. fortemente com a ecomonia devido ao papel FIGUEIREDO – Então o seu que o poder desempenha na transmissão ou amor regula-se pelos caprichos da na circulação das riquezas, o dispositivo de bola da roleta? sexualidade se liga à economia através de LOLA – É como se diz. Ah! Eu articulações numerosas e sutis, sendo o cá sou franca! corpo a principal – corpo que produz e FIGUEIREDO consome. (Foucault p. 101) (Azevedo, 2002, p. 75) – Vê-se. O jogo do amor, sexo e poder fica bem claro em E ainda, essa mesma tríade, a relação de Eusébio e personagens como Lola e sua relação com Gouveia, uma vez Lola: ela vê no fazendeiro uma forma de ascensão social pelos que ela só diz amá-lo porque ele tem sorte no jogo como bens que ela supõe que ele possui e usa do seu poder sexual e podemos ver no trecho abaixo: esperteza para seduzi-lo, ou seja, troca sua sexualidade por relações econômicas. FIGUEIREDO – Continua a amálo? LOLA (Só.) – Os homens não LOLA – Sim, continuo, porque a compreendem que o seu único primeira dúzia pelo menos até a atrativo é o dinheiro!... Oh! 385 Também a mim, quando eu ficar de maneira a tirar proveito fazendo rir e criticando velha ninguém vai me querer! Os sarcasticamente. homens têm o dinheiro, nós temos Ou ainda a negra Benvinda, que leva na sua voz, um a beleza; sem aquele e sem esta, discurso próprio da identidade nacional negra, mestiça, de nem eles nem nós valemos coisa elementos pertencentes à cultura afro-brasileira e dominada, e nenhuma. (Idem, p. 90) que, ao abandonar seus patrões por Figueiredo, muda de nome (Fredegonda) e de discurso, passando a exibir na sua forma de Há de se fazer ainda uma ressalva em relação ao falar sua nova condição de vida. Figueiredo, um homem discurso de Eusébio onde Azevedo embute no personagem a especialista em lançar mulatas, personagem que tem no seu voz do silenciado em contrapartida ao discurso de Lola. Numa discurso todo um conhecimento acumulado num mundo de sociedade onde supõe-se da voz masculina ser a dominadora subversão de resgatar mulatas para o meio da prostituição em relação à feminina, fazer o jogo oposto implica um elegante, com seu discurso lobista promete casamento a estranhamento, que na obra é ponto ironia, uma vez que Lola é Benvinda, fala sedutoramente da vida como uma dama, portadora do discurso dominante sobre o caipira. Essa inversão promete-lhe casa, roupas bonitas e ensinamentos de bons de valores de “quem domina quem” é vestida em Lola numa modos de comportamento em sociedade. Ela também se vende, caracterização de uma sociedade dita moderna como apregoa se vence pela ascensão, pelo poder de ser alguém socialmente. Hall (2000, p. 17) “as sociedades da modernidade tardia são Ao mudar suas vestimentas, adquire novas atitudes, nova caracterizadas pela ´diferença`, são atravessadas por diferentes postura (de mulher europeizada) divisões e antagonismos sociais que produzem uma variedade (afrancesado), porém essa transformação leva as gafes que de diferentes ´posições do sujeito`”. Arthur Azevedo usa produzem efeito cômico. O próprio nome da negra em si que de inteligentemente desses conhecimentos e os aplica em sua obra Benvinda passa a ser Fredegonda, e toda essa transformação é e maneira de falar 386 apresentada à sociedade formalmente no baile à fantasia oferecido por Lola por ocasião do seu aniversário, com toda a Que beleza! pompa no Grande Hotel, como aparece na página 104. Meus senhores aqui está (Entra Figueiredo, vestido de Radamés, trazendo pela mão A trigueira Benvinda, vestida de Aída.) FIGUEIREDO - Mais faceira Eis Aída De São João do Sabará! Conduzida Pela mão de Radamés Diz tolices. Vem chimbante, Parvoíces, Se Coruscante, abra a boca pra falar; Da cabeça até os pés!... Se se cala Que lindeza! Se não fala, 387 TODOS (Inclinando-se.) – Dona Pode as pedras encantam! Fredegonda! Eu a lanço FIGUEIREDO (Baixo a Benvinda.) – Cumprimenta. Sem descanso! BENVINDA – Ó revoa! FIGUEIREDO (Baixo.) – Não! Na pontíssima estará Au revoir é quando a gente vai embora e não quando chega. A trigueira BENVINDA – Entonces... FIGUEIREDO (Baixo.) – Cala-te! Mais faceira Não De São João do Sabará! Convidado pela gentilíssima Lola digas nada!... (Alto) – para comparecer a esse forrobodó FIGUEIREDO – Minhas senhoras elegante, e meus senhores, apresento a magnífico ensejo, que se me Vossas Excelências e Senhorias, oferecia, de iniciar a formosa dona Fredegonda, que – depois, Fredegonda nos bem entendido, das damas que se mistérios da acham aqui presentes – é a estrela fluminense! Espero que Vossas mais cintilante do demi-monde Excelências e Senhorias queiram carioca! recebê-la não quis com perder o insondáveis galanteria benevolência, 388 dando o necessário desconto às só é possível, já que o sujeito e o sentido se constituem clássicas emoções da estréia, e ao mutuamente, pela sua inscrição no jogo das múltiplas fato de ser dona Fredegonda uma formações discursivas”. simples roceira, quase tão A promessa de fazer parte do mundo dos dominadores selvagem como a princesa etíope seduz Benvinda, uma vez que todo dominado almeja mudar de que o seu vestuário representa. lado. Esse sonho evidencia como vê Giacon (2002, p. 115) “ a (pág. 104) posição de inferioridade do negro brasileiro em relação aos outros povos”. A personagem Fredegonda tenta usar do recurso Pêcheux (Apud Orlandi, 1988, p. 178) fala que “a descrito por Bernd (1999, p. 17) “proposta de base identidade do sujeito é imediatamente afetada enquanto sujeito antropofágica: devorar o outro, apropriar-se dos elementos da do discurso pois, sabe-se, a identidade resulta de processos de cultura do outro”, tornando-se assim, dama reconhecida da identificação segundo os quais o sujeito deve-se inscrever em sociedade ao tentar engolir a cultura francesa na tentativa de uma (e não outra) formação discursiva para que suas palavras apagar aquela que lhe é nata. Porém ao mudar de lado, tenham sentido. Ao mudar de formação discursiva, as palavras passando de mucama roceira para madama que fala francês, ela mudam de sentido.” E isso é o que acontece com as não se encontra, e cerca-se de ridículos entraves, e desanimada, personagens Benvinda/Fredegonda e até mesmo na mudança de sente que perde sua identidade e decide voltar ao seu estado discurso de Lola quando está na presença de Eusébio. Para anterior de dominada abrindo mão da pretendida ascensão que Pêcheux (idem, p. 20) “O discurso é feito de sentido entre antes almejara. Colabora com essa idéia o pensamento de locutores. Compreender o que é efeito de sentidos é Orlandi (1988, p. 180) quando fala do efeito da relação da compreender que o sentido não está (alocado) em lugar nenhum análise de discurso estabelece com o texto para dele extrair um mas, se produz nas relações: dos sujeitos, dos sentidos, e isso sentido, mas sim para problematizar essa relação, ou seja, 389 tornar visível sua historicidade e observar a relação de sentidos verter para apagar a lembrança do que se estabelece. A ironia presente nos trechos de meu amor desgraçado! (Abraça apresentação de Fredegonda, instaura-se em diversos trechos da Eusébio escondendo o rosto nos obra tornando-os os mais cômicos assim como as entradas ombros dele, e soluça.) Sou muito triunfais e glamurosas de Lola. É cômica a situação de sedução infeliz! de Lola sobre Eusébio no primeiro encontro quando ele pede a EUSÉBIO (Depois de uma pausa, ela que deixe Gouveia livre para a sua filha, e Lola já sabendo em que faz muitas caretas.) – da bancarrota do moço, reverte a situação de maneira favorável Então, madama?... Sossegue... A para o seu lado, na caça de um novo mantenedor. madama não perde nada...(À parte.) – Que cangote cheiroso! LOLA (Entre lágrimas.) – Perder LOLA (Olhando para ele, sem o meu adorado Gouveia! Oh! O tirar a cabeça do seu ombro.) – senhor pede-me um sacrifício Não perco nada? Que quer dizer terrível! com isso? (Pausa.) compreendo... Mas é EUSÉBIO – Quer dize que... sim mulher quero dize... Home, madama, tira perdida e a menina casta e pura; a cabeça daí, porque assim eu não entre o vício e a virtude, é o vício acerto c´as palavras! que deve ceder... Mas o senhor LOLA (Sem tirar a cabeça.) – não imagina como eu amo aquele Sim, minha porta se fechará ao moço e quantas lágrimas preciso Gouveia... Mas onde irei achar necessário... Assim eu Entre a 390 consolação?... Onde encontrarei meu, se estás preso pela tua Lola, uma alma que me compreenda, que não te deixará fugir?... Basta um peito que me abrigue, um a mim o teu amor e uma coração que vibre harmonizado choupana! (Abraça-o) Dá-me um com o meu? beijo! Dá-mo como um presente EUSÉBIO – Nós podemos entra do céu! (Eusébio limpa a boca num ajuste. com o braço e beija-a) Ah! (Lola LOLA (Afastando-se dele num fecha os olhos e fica como num ímpeto.) - Um ajuste?! O senhor êxtase.) quer talvez me propor dinheiro!... EUSÉBIO (À parte.) Seu Eusébio Oh! Por amor dessa inocente tá perdido! (Dá-lhe outro beijo.) menina, que é sua filha, não ( p. 94) insulte os meus sentimentos, não ofenda o que eu tenho de mais Como no trecho apresentado acima, Lola usa de sagrado!...... diferentes artimanhas para conseguir o que quer. Diz sonhar LOLA (Com veemência.) – Desde com jóias, colares, coisas caríssimas com o intuito de possui- que transpuseste aquela porta, las. Assim ela fez com Eusébio: “ – ...A propósito de sonho... senti que uma força misteriosa e foste tu ver na vitrine do Luís de Rezende o tal broche com que magnética me impelia para os teus eu sonhei?” (Azevedo, p. 122), assim faz com Dunquinha (um braços! Ora, o Gouveia! Que me rapazote que por ela se apaixona): “Eu tinha levado à Lola importa a mim o Gouveia, se és 391 umas pérolas com que ela sonhou... Vocês não imaginam como LOLA – Sim, não digo que não... aquela rapariga sonha com coisas caras!” (Idem, p. 161). é uma boa gulodice... mas não é O trecho da obra onde aparece o personagem isso... Dunquinha é carregado de características peculiares: de ironia, DUNQUINHA – Então que é? quando nos versos ele a proclama santa das santas (pág. 132), e LOLA – Faça favor de me dizer Lola satiriza: “ Santa? Eu!... Isto que é liberdade poética!” (p. para que inventaram os ourives. 133). O moço vai visitá-la com flores e versos para ela escritos. DUNQUINHA Lola dá um jeito de tirar proveito da situação com sua percebo... Eu devia trazer-lhe uma esperteza, como podemos verificar a seguir: jóia! – Ah! Já LOLA – Naturalmente. As jóias LOLA - O senhor trouxe-me são o “Sésamo, abre-te” destas flores... trouxe-me versos... não cavernas de amor. ( pág. 134) me trouxe mais nada? DUNQUINHA – Eu? Ou ainda na página 134 quando Dunquinha diz: “Eu LOLA – Sim... Os versos são quis trazer-lhe uma jóia; mas receei que a senhora se bonitos... as flores são cheirosas... ofendesse...”, e instantaneamente ela retruca: “Que me mas há outras coisas de que as ofendesse?... Oh! Santa ingenuidade!... E não me apareça aqui mulheres gostam mais. sem uma jóia”, ela finaliza. Quanto aos versos que ele tão DUNQUINHA – Uma caixa de apaixonadamente dedica à sua musa, Lola pragueja: “Confesso marrons glacês? que as jóias exercem sobre mim um fascínio maior que a literatura; não sou mulher a quem se ofereçam versos...Vejo 392 que o senhor não é da opinião de Bocage...”, e continua ainda na página 135, com Dunquinha retrucando: “Oh! Não me fale Tem a manola! em Bocage!”. E ela finaliza o discurso dizendo: “ Que mania essa de não nos tomarem como somos realmente! Guarde os Não é chalaça! seus versos para as donzelinhas sentimentais, e ande, vá buscar o ´Sésamo, abre-te.` e volte amanhã.” Não é parola! No parágrafo acima vemos claramente como Lola brinca com o sentimentalismo dos versos de Dunquinha. Ela deixa Não se agita claro o que quer dele (jóias=bens materiais) e ainda por cima insinua que preferiria que os versos dele fossem mais parecidos Como rebola! com o de Bocage, e não cheios de puritanismo como os dele. O jovem deixa transparecer que os comentários da amada é uma Isto os excita! ofensa a seus versos, ainda assim promete pedir dinheiro à mãe e voltar com um jóia para Lola. O que deixa claro a relação de Isto os consola! total submissão de Duquinha em relação a Lola. Importante ressaltar ainda na obra A Capital Federal, a O olhar brejeiro questão do erotismo, que aparece em trechos representados por Lola onde ela erótica e ensinuantemente canta: De uma espanhola Do mais matreiro Vejam que graça 393 inferior. Apesar de todos os três terem mudado de lado, Transtorna a bola, acabaram voltando para o seio amoroso do campo, da roça, E sem pandeiro, ou não. Nem castanhola! retornaram as suas reais origens, ainda que por escolha própria (p. 110) Sintetizando, o jogo poder- sexo- dinheiro, na obra acontece de forma cíclica, é uma briga de submissão X submisso, (uma guerra de poderes). Isso leva a pensar a Ou ainda na cena da página 116, de Lola com Eusébio sexualidade como algo racionalizado, que nada mais é do que o onde ele diz estar com seus hormônios em ebulição: “Oh! Sou sexo erótico, e este usa de suas artimanhas e estratégias para uma fogueira aqui dentro! Mas é tão bão!... E também na conseguir em troca algum tipo de barganha. O único amor página 130, com o personagem Duquinha quando ele diz: sentimental do livro é o de Quinota por Gouveia, seu único “...Não pude resistir! A Lola é tão bonita... outro dia me lançou desejo é estar ao lado do seu amor, ter um casamento feliz e uns olhares tão provocadores, que tenho sonhado todas as estar junto da sua família, o que ela considera ser a pedra noites com ela.” Outro ponto bastante erótico é a festa de Lola angular da sociedade. Junta-se ainda a esta personagem, não no Grande Hotel que não deixa de ser um espetáculo com apelo corrompida pela sociedade, a personagem de D. Fortunata, que erótico. apresenta na sua passagem pelo texto ser vítima dos altos e Em suma, os personagens de Eusébio, Gouveia e baixos do poder: quando é mulher do fazendeiro Eusébio Benvinda são os grandes corrompidos pela erronia idéia de que hospeda-se no Grande Hotel, tem empregados, e, uma vez que pertencer à sociedade urbana era o melhor negócio, o marido a abandona por Lola, Fortunata se vê morando numa acompanhar a evolução da capital federal era estar em alta, espelunca, sem apoio financeiro do seu ex, sem qualquer almejavam ascensão social uma vez que se sentiam em posição suporte material. Porém, quando Eusébio retorna e pede para 394 ser recebido, ela não o rejeita, aceita-o de volta, não com a enunciações o sentido ideológico que o autor quer dar para que intenção de recuperar o bem material, mas, por querer ver a se produza o efeito que intenciona. As personagens em análise família unida novamente. A matriarca acredita na família e já posta, são dotadas de polifonia e heterogeneidade tal para passa essa concepção de vida para a filha que também busca fazer o que se propôs: uma crítica escraxada à sociedade do fim para si o mesmo. Gouveia e Benvinda também chegam juntos e do século da Capital Federal do Brasil. são acolhidos da mesma forma, dizendo que eles foram infectados pelo “micróbio da pândega”, expressão usada na BIBLIOGRAFIA época para definir a susceptibilidade das pessoas aos amores imorais e ao jogo, o que tinha por conseqüência a AZEVEDO, Arthur. A Capital Federal. São Paulo: Martin desestruturação da família. E tudo volta a recuperar o equilíbrio Claret, 2002. natural de antes. Percebemos então que o discurso dentro de uma obra se instaura, modifica e adequa de acordo com a personagem de BERND, Zilá; LOPES, Cícero Galeno. Identidades Estéticas e Compósitas. Porto Alegre: PPG-Letras UFRGS, 1999. modo a atender às suas necessidades e exigências, ou seja, cada discurso é construído para um fim determinado e específico FERNANDES, Cleudemar Alves. Análise do Discurso: para vir de encontro ao propósito ao qual se quer chegar. O Reflexões Introdutórias. São Carlos: Editora Claraluz, 2007. discurso usado por Azevedo em A Capital Federal atende a diferentes tipos de classe econômicas, pobre/rico; a diferentes FOUCAULT, Michel. A ordem do discurso. São Paulo: etnias, Layola, 2000. branco/negro; diferentes forças de poder, dominador/dominado. Há na escrita de Azevedo um sujeito discursivo pra cada personagem que coloca nas suas 395 __________. História da sexualidade. I - A vontade de saber. 2.a edição. Rio de Janeiro: Editora Graal, 1997. Mesa 11 O Preconceito e o Racismo nas Escolas Públicas e Particulares GIACON, Eliane Maria de Oliveira. Viva o povo brasileiro: de Nova Andradina história e identidade. Dissertação de Mestrado. UNESP – Leuzeni Moreira Dias (G/UEMS) Assis, 2002. Alaíde Pereira Japecanga Aredes (UEMS) HALL, Stuart. A Identidade Cultural na Pós-Modernidade. O Burnout: a síndrome de desistência que pode causar a Rio de Janeiro: DP&A, 2000. falência na educação Ednalva Regina Oliveira Alves (G/UEMS) ORLANDI, Eni Puccinelli. Análise do Discurso – princípios e procedimentos. Campinas: Pontes, 1999. A construção da Leitura e da Escrita num Adulto, Trabalhador Rural _________. As formas do silêncio. 2.a edição. São Paulo: Regina Albano da Silva (SP) Editora da Unicamp, 1988. O Teatro Inserido como Apoio Pedagógico no Ensino PÊCHEUX, Michel. Semântica e Discurso – uma crítica à Fundamental informação do óbvio. Campinas: EDUNICAMP, 1997. Vilma Marques Dutra da Cruz Natal (UEMS) Alaíde Pereira Japecanga Aredes (UEMS) Ex-Ribeirinho: discurso e identidade Neuraci Vasconcelos Reginaldo (PG/UFMS) Mesa 12 396 A Análise do Discurso nas Produções de Texto. O Caso da E. O discurso de resistência nas crônicas do Acre M. Efantina de quadro Marília Lima Pimentel (PG/UNESP) Alaíde Pereira Japecanga Aredes (UEMS) Michelli Fernanda de Souza Dan (G/UEMS) Mesa 14 Letícia de Fátima Dias Wedekin de Oliveira (G/UEMS) Diversidade de Gêneros Textuais como Incentivar à Leitura Mauro Eduardo de Souza (G/UEMS) Beatriz Aparecida Alencar Uma Reflexão sobre Formação de Professores Diversidade de Gêneros Textuais como Incentivo à Leitura Rita de Cássia Marcon (G/UEMS) Luana Cândida de Carvalho (G/UEMS) Estela Natalina Mantovani Bertoletti (G/UEMS) Mesa 13 Coordenada Silvane Aparecida de Freitas Martins (UEMS) Análise do Discurso: múltiplos objetivos O Mau Uso da Língua Portuguesa Os Múltiplos Objetos da Análise do Discurso: da ordem fixa do Juliana Marques de Matos Amorim (G/UEMS) arquivo à oscilação do ordinário Coordenadora: Mara Rúbia de Souza Rodrigues Morais Aurelinho e Dicionário Ilustrado Ilustrado de Português: uma (PG/UNESP) análise lexicográfica Sandra Cristina Miotto de Gouvêa (PG/UFMS) Mulher e política: limites de discursos, de poder Fernanda Fernandes Pimenta de Almeida Lima (PG/UNESP) A Linguagem Escrita: considerações sobre a produção textual do ensino fundamental 397 Anaísa Nantes de Araújo (G- UEMS) Elza Sabino da Silva Bueno (UEMS) VOZES NEGRAS NO BRASIL: UMA ANÁLISE DO DISCURSO UBALDIANO EM VIVA O POVO BRASILEIRO Vozes Negras no Brasil: uma análise do discurso ubaldiano em Eliane Maria de Oliveira Giacon “Viva o Povo Brasileiro” (UNESP-SJRPR/UEMS) Eliane Maria de Oliveira Giacon (UNESP-SJRPR/UEMS INTRODUÇÃO Numa estante ou até mesmo amontoados em caixas nos cantos de um cômodo, os livros despertam a nossa curiosidade pelo o que pode haver dentro do deles. Isso talvez se explique pelo fato de que eles foram tidos durante muitos anos como sendo uma “forma oculta” de discurso (PÊCHEUX, 2002, p. 55), guardadora de segredos, entre vivos, os mortos e os deuses, favorecendo assim uma relação misteriosa entre o conteúdo e o efeito de sentido (PÊCHEUX, 1997, p. 164) dos mesmos e a forma como eles foram escritos. Assim os livros se ultrapassam o poder (FOUCAULT, 1997) simbólico, inscrevendo-se em unidades “individuais” e dramáticas do passado com um discurso histórico ”que se produz em 398 condições determinadas e projeta-se no futuro [...] porque cria segundo Pêcheux (1997, p. 162) “é o lugar de constituição do tradição, acontecimentos.” sentido”, que utiliza uma língua que “se apresenta [...] como a (ORLANDI, 1990, p. 35), e se intensifica no efeito de sentido, base comum de processos discursivos diferenciados, que estão que se reflete na produção de uma diversidade de compreendidos nela, nos quais (grifo nosso) os aspectos textos(ORLANDI, 1990), os quais ao longo do tempo são ideológicos simulam processos científicos” (Idem, p. 91), que carregados de significados que “cada leitor confere de acordo se incorporam ao discurso histórico, no qual e do qual ele está com certa leitura” (MANGUEL, 1997, p. 236), que podem inserido. passado e influencia novos também variar de acordo com o corpus teórico tomado, a fim Para Orlandi (1990, p. 37) “o discurso histórico de delimitar alguns fatores relativos ao texto como o da época estabiliza a memória [...] e a reduz” a medida em que ela se histórica e da concepção filosófica discursiva do autor torna uma instância propiciadora do interdiscurso, que se (Foucault, 1997), os temas recorrentes; o que faz ser um configura como ”um lugar importante para organizar as evento histórico-literário; a relação dele com as correntes diferentes vozes” (PÊCHEUX, 1997, p. 166), que se filosóficas discursivas do seu tempo e com a lingüística manifestam pelas “diferentes classes [...] envolvidas numa luta (SAUSSURE, 2004, p. 13). Um texto, enquanto unidade do propriamente simbólica para imporem a definição do mundo discurso, cumpre de acordo com a abordagem articulada de sua social (BOURDIEU, 2002, p. 11 ), que segundo Possenti( leitura um papel, que extrapola o limite de seu tempo ao tornar- 2002, p. 41) se operacionaliza “através de uma história, se não mais um meio de conhecimento do enunciado que concebida como [...] uma luta que se dá tanto em torno de bens segundo Foucault (2002, p. 99) é “uma função que cruza no materiais quanto em torno de bens simbólicos”, os quais domínio da estrutura de unidades possíveis fazendo com que permeiam tanto a História de um povo, quanto a sua Literatura, apareçam conteúdos concretos no tempo e espaço”, mas uma “na construção” de um discurso, cujo efeito de sentido seja enunciação capaz de constituir uma formação discursiva, que capaz de abarcar um conjunto de enunciados”que derivam de 399 uma mesma formação discursiva” (RODRIGUES, 2004, p 96), analista de discurso consegue (grifo nosso) mostrar os sendo pois constituído “nas relações que [...] palavras, mecanismos dos processos de significação que presidem a expressões ou preposições mantêm com outras palavras e textualização da discursividade” (Idem). Os mecanismos em expressões de mesma formação discursiva. (PÊCHEUX 1997, questão dependem da “escolha” da obra, que possa servir de p.161) artefato literário discursivo no intuito de descobrir como e em Logo o discurso seja ele histórico ou literário é quais circunstâncias históricas e literárias, ela foi produzida e segundo Orlandi (1999, p. 15) a palavra em movimento [..] e qual a ideologia que perpassa tanto a sua produção quanto o tem em si a idéia de percurso [...] , prática de linguagem; com o sentido das vozes dos discursos que perpassam a enunciação. estudo do discurso observa-se o homem falando” e ao mesmo Ao depararmos com essa singularidade de inserindo-se num contexto maior que o faz passar de não- trabalharmos com uma obra literária via Análise do Discurso sujeito a sujeito, num processo no qual a formação discursiva surge a possibilidade de construirmos um projeto de pesquisa se torna um local de constituição de sentido, que por sua vez com discurso de Viva o povo brasileiro (1984) de João Ubaldo representa um complexo ideológico, no qual sujeito, história e Ribeiro”, cujo efeito ideológico de sua publicação, “coincide linguagem interpretam e re(interpretam),cujo sentido só é com o período da abertura política, pois (grifo nosso) a percebido pela análise do discurso, que media a língua e o proposta de releitura da história brasileira que a obra encerra só discurso com o objetivo de “descrever o funcionamento do poderia ser encenada em uma atmosfera livre de quaisquer texto. Em outras palavras, a AD tem (grifo nosso) a finalidade cerceamentos”(BERND, 2003, p. 81)42 cujas 673 páginas de explicitar como um texto produz sentido” (ORLANDI, 200l, compõem a epopéia do povo brasileiro, que dá voz a fala do p. 23). Assim sendo uma obra literária, no sentido de Foucault, povo em contraponto com a voz da elite num processo que garante produção de sentido como um objeto de análise tanto do tempo do “narrador” como do texto narrado quando “o 42 A opção por esta autora é devido ao fato dela trabalhar com a obra de João Ubaldo Ribeiro. O mesmo e aplica para Utëza. 400 segundo Schüller (1989, p. 33) “distribuem em duas vozes: a determinar e sintonizar o negro na (re) leitura da História do voz dos dominadores e a voz dos dominados. As vozes Brasil. conjugam-se como máscaras [...] hostilizando-se sem que uma silencie a outras.” numa alteridade discursiva na qual segundo 1. JOÃO UBALDO E VIVA O POVO BRASILEIRO Bernd; Utéza (2001, p. 142) a maior dom do autor “é o de escrever na tensão dos contrários [...] inscrevendo nesse espaço A obra Viva o povo brasileiro, como um conjunto de intervalar elementos de desestabilização da estruturas político- discursos agrupados pelo autor, que se caracteriza por uma sociais brasileira”, a fim de construir após a queda da ditadura certa unidade, fundada numa espécie de discurso humanistico militar brasileira um caminho que pudesse “recuperar”, centrado no homem de todas com uma fundamentação sócio- demonstrar e “abrir”um espaço para discursos sobre a questão política, que entrelaça os textos nos quais há uma imensa do negro no Brasil - na História e na Literatura -; a Literatura polifonia (BAKHTIN, 2002) que propicia a convivência de engajada; a obra como agenciadora de discursos e o gírias, de termos de outras línguas, de palavras originadas nos comportamento literário do autor como “um princípio de certa diversos extratos da cultura brasileira, de outras criadas pelo unidade de escrita [...], que é configurado (grifo nosso) numa autor, enfim várias manifestações lingüísticas discursivas, que espécie de foco de expressão” (FOUCAULT, 1997, p. 53), que fazem de João Ubaldo Ribeiro não apenas um contador de no caso de João Ubaldo é um sujeito, numa posição histórica causos, mas um articulador da linguagem, cujos textos são dos primeiros anos pós-ditadura de 64, que de acordo com a compostos de um mosaico discursivo, no qual “o não-sujeito é sua geração está imbuído de “aguda consciência crítica” da interpelado realidade nacional, propondo-se a agrupar discursos díspares, (PÊCHEUX com um efeito de sentido de protesto, que pretende transformar, antropológica do negro no Brasil, o pensamento filosófico – constituído 1997, p.155), em é sujeito pela resgatado ideologia” numa visão discursivo brasileiro sobre a negritude, a forma como o negro 401 aparece na História e na Literatura Brasileira e por fim como fatos sobrepostos dos quatro séculos de História do Brasil, indo um romance de forma “engajada” pode trabalhar questões desde a colonização século XVI até o século XX, no período relativas a re(leitura) da História Oficial tomando por base a Médici, uma das fases mais violentas da Ditadura Militar de 64. oralidade e a luta de classes na composição de quatro séculos Após esse pequeno intervalo, voltemos às questões de Brasil. pertinentes aos discursos que se processam no interior e no Conheçamos um pouco mais do romance Viva o povo exterior da obra. No exterior há dois pontos a serem discutidos: brasileiro (1984), antes de tratarmos da relação da obra com a o primeiro quanto à posição da obra quanto à Literatura História da Literatura; a História Oficial do Brasil; a ralação engajada do seu tempo e a segunda quanto à posição do escritor dela com a antropologia e com o pensamento filosófico em relação a Ciências Políticas. Segundo Silverman (2000, p. brasileiro; dela com engajamento sócio-político do seu tempo e 18) “no início dos anos 80, todos os seguimentos do Brasil por fim um pouco de João Ubaldo e sua formação política. estavam Comecemos fazendo um inventário do livro, que está dividido apreensão”que culmina numa produção literária com um em 20 capítulos e cada capítulo é dividido em três ou quatro “contínuo refinamento do projeto romanesco”(Idem, p. 33), que partes menores A narrativa estrutura-se em torno de dois eixos: culmina em diferentes manifestações literária, que retratam um a história dos descendentes de Amleto Ferreira, que traça a Brasil sob muitas facetas tais como O dia de Ângelo (1987) de trajetória da classe dominante e a história dos descendentes do Frei Beto, que se aprofunda no valor histórico da narrativa caboclo Capiroba e Dadinha que contam a história da classe catalogando a tortura da Ditadura de 64 e A ordem do dia dominada. Em vários momentos as histórias dos dois núcleos (1983) de Márcio Souza, que relata o início da década de 80, se cruzam na narrativa, considerada como um conjunto de criticando ao Governo Militar da época. E meio a uma discursos “organizados” pelo autor, cuja organização temporal Literatura de Protesto e Engajada, o autor João Ubaldo Ribeiro não ocorre de forma cronológica, pois um capítulo pode conter escreve Viva o povo brasileiro (1984), um romance histórico unidos num estado de bloqueio pessoal e 402 contemporâneo, cujo enunciado-título, de acordo com Pêcheux, igreja católica) e o barão (representando o senhor de escravos), trabalha com “os conflitos pessoais em torno de classe e raça no qual o cônego diz que os negros são “a raça mais atrasada refletindo (grifo nosso) uma questão coletiva mais profunda: a sobre a face da terra, os descendentes degenerados das disparidade entre o fato e a falácia, entre a realidade histórica e linhagens camíticas” (RIBEIRO, 1984, p.119), justificando a a oficial. “ (SILVERMAN, 2000, p. 244) . Se por um lado as escravidão devido ao fato que essa linhagem descendente de duas primeiras obras irão compor um painel metafórico do Noé seria a mais atrasada e portanto, no Brasil só servia de base período de 64 até os primeiros anos da década de 80 do século genética para a criação do mestiço. O autor destaca, nessa 20, o livro de João Ubaldo saí do círculo do “vou contar um passagem, segredo para desabafar” e trabalha com uma análise mais (PÊCHEUX, 1997), o “vazio” retórico que caracteriza o crítica dos diferentes discursos, que compõem a mentalidade discurso das classes dominantes impregnado de um discurso do social e política do brasileiro, na tentativa de fazer um resgate cientificista, que marcou o século 19 e que serviu, com suas via negritude das vozes discursivas negras, que ficaram teorias racistas, de justificativa à manutenção da escravidão” politicamente interditadas (ORLANDI, 1999, p. 63) durante (BERND; UTÉZA, 2001, p. 91) e seu desdobramento, que quatro séculos da História e da Literatura Brasileira. apaga a presença do negro na Literatura como é possível “através de um hábil jogo interdiscursivo Os discursos que se processam no interior da obra observar tomando como contraponto a obra Os Sertões (1902) atêm-se a questões antropológicas, filosóficas e literárias para de Euclides da Cunha e uma passagem de Viva o povo justificar pela elite dominante a escravidão, enquanto há outros brasileiro (1984). que evidenciam o apagamento do negro na Literatura e na Se por um lado, Euclides da Cunha (BERND, 2003, p. História do Brasil. Para exemplificar tomemos um diálogo da 560) “estabelece um contraste entre o rude sertanejo, o obra Viva o povo brasileiro entre Amleto (representante da degenerado mulato e o fraco negro”; João Ubaldo Ribeiro não burguesia do início do século 19), o cônego (representando a só integra o mulato e o negro à Guerra de Canudos como 403 também os considera como fortes, e comandantes da resistência cidade, estudantes e a ação popular dão novo impulso à política ao poder. Nisso é possível observar com Foucault (1997, p. 41) brasileira. Observa-se que os anos mais terríveis da Ditadura de que “para resistir, é preciso que a resistência seja como o poder 64 ocorrem entre 1968 e 1978, após esse período marcado por [...] que venha de baixo e se distribua estrategicamente”, na torturas intenção minar os alicerces do poder, que estão distribuídos na sindicalistas, políticos, camponeses e estudantes, há o que obra Viva o povo brasileiro em discurso econômico, discurso poderíamos chamar de um período de “novos ares”, mas antropológico, discurso histórico, discurso literário, discurso repletos de desconfiança e de suspeitas sobre o que poderia vir político e discurso retórico. Sendo, pois, essas formas de poder a acontecer, o que influencia muito o discurso da intelectual dessacralizados com discursos que se contrapõem e se brasileiro, que acostumado com a metáfora para falar sobre o sobrepõem num emaranhado discursivo de baixo - das Brasil, se vê diante de um contexto histórico, no qual ele entrelinhas do texto - para cima na estrutura da obra –, a fim de precisa agir, a fim de obter uma organização discursiva sobre construir um discurso heterogêneo de identidade nacional, seu país. Para tanto os fatos históricos relativos à política, à fomentado pelo contexto histórico dos primeiros anos da economia,aos movimentos populares, aos partidos políticos, às década de 80 do século 20. práticas do governo militar, à luta pelos direitos humanos e dos militares e movimentos de levantes de redemocratização do Brasil influenciam diretamente na sua 2. (1984) ISTMO ENTRE DITADURA E ( RE) DEMOCRATIZAÇÃO DO BRASIL produção literária dos escritores, entre eles João Ubaldo Ribeiro. A forma encontrada, nesse projeto, para delimitar os O ano de 1984, data da publicação de Viva o povo fatos do período que vai de 1978 e 1985 foi utilizar as balizas brasileiro, marca o final simbólico de um processo político, temporais dos anos, seguidos dos fatos, a fim de situar que inicia em 1978, quando trabalhadores do campo e da historicamente o leitor: 404 como o PTB e o PDT são reativados pelos trabalhadores. 1978 – A LSN ( Lei de Segurança Nacional) sofre a primeira alteração desde o AI 5 de 1968, que consiste na supressão da pena de Alguns conservadores da ARENA e do MDB criaram o PP. O delegado Fleury é apontado como torturador pela Pesquisa BNM. morte e prisão perpétua. Isso graças a 1981- Realizou-se a Conclat( Confederação da Classes pressão de organismos internos e externos Trabalhadoras), na qual os delegados elegeram os membros da contra as torturas, que eram praticadas Pro-CUT. contra presos políticos. Explodem três bombas: uma na OAB do Rio de Janeiro, outra na Câmara Municipal do Rio de Janeiro e por fim Impulso das atividades sindicalistas com greves em São Paulo, Rio, Bahia entre outros estados. Surge a VAR (Vanguarda Armada Revolucionária de Palmares) a última organização de esquerda em São Paulo. É fundado o Comitê Brasileiro pela Anistia. 1979 – Ano da Anistia; o governo militar acaba com o a Bomba do RioCentro, que explodiu na mão de um militar Guilherme Pereira do Rosário do serviço secreto do Exército. 1982 - Ocorrem as eleições para prefeito, vereador, deputado estadual, federal e senador, num clima de abertura, que consagrou as oposições. 1983 – Criação da CUT. bipartidarismo, instituído por ele. Assim o partido de esquerda O governo tenta passa o reajuste salarial em torno de MDB e dae direita ARENA são extintos surgindo deles os 80% do INPC, o que não passa no Congresso. No final o seguintes partidos: PMDB, a partir do MDB; o PDS a partir da governo consegue passar o arrocho salarial, num índice ARENA, que hoje é o PSDB. Outros partidos novos são inflacionário alto, pois após o período de “pseu-estabilidade” criados como é o caso do PT, e outros que estavam desativados financeira e com a alta do petróleo, o Brasil, que até então dependia de energia externa se viu num furacão inflacionário. 405 Intensificam a campanha “Diretas Já”. levou dos porões dos navios negreiros até as favelas brasileiras 1984 – O Ano da “Diretas Já”. Chega ao auge a no século 20, num espaço histórico marcado por um conflito de campanha da “Diretas Já” com a votação da emenda de Dante classes,no qual a elite branca criou segundo Chauí (2000,p. 89) de Oliveira, que estabelecia a eleição para presidente do Brasil. “uma sociedade colonial escravista [...] marcada pela estrutura Surge uma emenda deixando as eleições para 1988. Com isso o hierárquica do espaço social que determina a forma como a PDS vota contra e a emenda das “Diretas Já” consegue 298, sociedade fortemente verticalizada operacionaliza (grifo nosso) vinte e dois a menos do que ela precisava para passar. a relação entre superior [...] e inferior ”, em cuja base dessa 1985 - Forma-se a Aliança Democrática, que elege em pirâmide social estão os negros e mulatos que “não participam janeiro, com 480 votos do Congresso, o senador Tancredo de todos os estratos sociais[...] logo não há miscigenação em Neves. O que virá a seguir somente a História e as historias todos os estratos sociais” (OLIVEIRA et alli, 1998, p.55) orais contarão. ocasionando a seguinte situação:”os brancos estão no topo do poder 3. NEGRO: UM DISCURSO A SER LIDO E/OU RE( LIDO) e do prestígio, e os pretos e pardos estão excluídos”(Idem). A mesma elite branca criou ao longo da História do Para Wolf (2003, p. 327) “é preciso poder político para Brasil, o discurso do “mito da democracia racial”, que seduz e estabelecer, para manter e para [...] determinar as forças do encanta “os próprios críticos das relações raciais harmônicas mundo que influenciam os povos” a serem analisados como brasileiras (Ibidem, p, 57) num processo aniquilação da própria ocorre com o negro no Brasil, que foram trazidos para o Brasil, condição de ser negro ou mulato no Brasil, pois esse discurso é enfrentaram toda sorte de violências desde o fato de serem mais danoso do que se fosse racista e discriminatório. O mercadoria, que segundo Pinsky (1994, p. 33) “não terá sido discurso de ilusão da harmonia entre as raças sem luta por das menores violências perpetradas contra o negro”, que o melhores condições sociais e econômicas das classes inferiores 406 - os negros e mulatos - se renova de tempos em tempos com má-sorte vozes desde o abolicionista Joaquim Nabuco (2000,p. 81), bandidagem; e as negras dos prostíbulos e dos becos das quando diz “a ilegalidade da escravidão é assim insanável, grandes cidades, sendo elas, as que continuaram a ser quer que se considere no texto e nas disposições da lei, quer na “coisas”por mais tempo que os homens. Assim o Brasil entre força e na competência da mesma lei” até o presidente no século 20 e os portadores do Pensamento Filosófico Fernando Henrique Cardoso (Apud OLIVEIRA, 1997, p.14), Brasileiro como Silvio Romero (1980, p. 246), utilizam o que assumiu publicamente que “nós, no Brasil, de fato pensamento positivista do século 19 para justificar a raça negra, convivemos com discriminação e preconceito”, o que nos leva que segundo ele “ a grande singularidade das gentes negras é a observar, que a condição de ser negro ou afro-brasileiros não haverem [...] chegado a conhecer a organização patriarcal passa na atualidade por um processo de revisão, que se da família [...] o que ver-se-á a conseqüência de tudo isso na fundamenta num poder político através dos movimentos negros psicologia geral do brasileiro”. Para ele a escravidão “serviu que o leva o discurso de “ninguendade” de Darcy Ribeiro para vincular pretos e brancos” (Idem, p.134) num processo (2000, p. 131) como forma da comunidade negra se identificar civilizatório, que corrobora com o discurso do mito da com o Brasil ao de “alguendade” dessa raça, que se apresenta democracia racial, ao qual se contrapõe os discursos da História hoje com discursos eivados de consciência política e cultural. Oficial, da Literatura, da Política e da Educação. O processo de libertação do negro não se resolveu engrossando Contribuamos as para fileiras esse dos estudo presídios com e da algumas coma “Lei Áurea” (1888), que segundo Valente (187, p. 22) observações sobre a presença do negro na História do Brasil, na “fez com que os escravos [...] fossem expulsos das fazendas e qual há períodos, em que houve o “apagamento”do negro, pois não tivessem para onde ir [...] o que resultou numa massa de muitos fatos que se referem a movimentos negros como é o negros perambulando pelas fazendas” sem ter para onde ir e caso da Revolta de Palmares (1695) com a figura de Zumbi,que nem tendo para onde voltar muitos deles se tornaram vítimas da resistiu por muito tempo no quilombo doe Palmares; A 407 Conjuração Mineira (1798), que teve como líderes o mulato de quem procura uma civilização muito antiga, tudo isso graças João de Deus do Nascimento e a negra Domingas Maria a duas linhas de um discurso de uma Lei Áurea que diz “É Nascimento; Revolta do Malês (1835) em Savador-BA, na qual declarada extinta a escravidão no Brasil,/Revogam-se as os negros foram liderados por Manuel Calafate, um líder disposições em contrário”,pois pretendia-se acalmar os ânimos muçulmano contra as tropas imperiais; a Revolta da Chibata dos políticos da época com o fim da escravidão, contudo o que (1910) liderada por Antônio Candido, acunhado na MPB como se observou foi que isso não ocorreu e que os fazendeiros “o navegante negro”, que se revoltou contra os castigos escravocratas derrubaram a Monarquia e aderiram ao conceito aplicados aos marinheiros; a Revolta de Canudos (1897) entre que excluía o negro com sua língua, sua cultura e suja religião. outros dados, que não foram registrados pela História Oficial A República não é escravocrata, mas sim detentora da sem referendar explicitamente a participação do negro e que só desigualdade social, que continua até os nossos dias. O agora após o “Estatuto de Igualdade Racial” ( 2001) e a resultado desse processo foi que o Brasil precisou de um século Conferência de Durban – África do Sul”, no mesmo ano, foi para que a Constituição de 1988 frisasse a pluralidade do povo possível definir os contornos dos movimentos negros, que a brasileiro, assumindo em lei, o que desde o final da década de partir daí a História do Negro, no Brasil, passa a ser pesquisada 70 do século 20, os ativistas do MNU (Movimento Negro de forma intensifica num trabalho etnográfico e de arquivo, nos Unificado) já vinham orientando os ativistas na luta pelo quilombos(história oral) e nos dados históricos(história escrita) reconhecimento de uma identidade negra. Percebe-se que a guardados na Biblioteca Nacional e nos arquivos da UFF liberdade do negro no Brasil, é feita a conta gostas e que cada (Universidade Federal Fluminense). Além de pesquisas em vitória deriva de lutas e movimentos, que geralmente terreiros de Candomblé - Bahia e Maranhão - e nas Irmandades coincidem com momentos políticos decisivos como a de Minas Gerais, entre outras fontes. Em termos estamos proximidade da Proclamação da República (1889) ou com a procurando uma história até mesmo recente com mecanismos 408 passagem da Ditadura Militar de 64 para a Re(democratização de Bernardo Guimarães; no caso do discurso do poema O (1985). Navio Negreiro (1875) de Castro Alves, o eu-lírico “não entrou E como o negro é representado na Literatura? Nos na pele do negro para ser seu porta-voz, mas que apenas tomou discursos literários desde os poemas de Gregório de Matos o escravo e a escravidão como temática de eleição” (BERND, século 17, “a matéria negra [...] surge na literatura brasileira 1988, 57), contudo há do mesmo período “o discurso de Luiz como no poema Bahia [...] ‘Dou ao demo os insensatos/ Dou Gama, que pode ser considerado o discurso do negro, por sua ao demo a gente asnal/ que estima por cabedal/ Pretos, mestiços completa inserção na causa negra.(Idem). Na obra O Mulato e mulatos” (PROENÇA FILHO, 2002, p. 01) até Viva o povo (1881) de Aluísio de Azevedo, os discursos marcam o dilema brasileiro (1984), no qual “o negro é [...] um elemento ativo no de um mulato entre querer ser branco e ser rejeitado pelos discurso de identidade nacional” (GIACON, 2002, p. 96) que brancos, o restante das obras irão tocar na questão do negro de segundo Proença Filho (2002, p. 7) a obra se constitui na “luta forma superficial ou muitas vezes tomando a negra como permanente pela liberdade” Nesse intervalo há momentos em exótica e sedutora como é o caso do discurso do poema “Nega que houve como no caso de José de Alencar (século 19), que Fulô” (1929) de Jorge de Lima – Modernismo. Um dos nomes (BERND 2003 p. 51) “a exemplo dos escritores do século que anterior a Jorge Lima tratará da questão do preconceito XVIII, não contemplou, no século 19, (grifo nosso) o negro racial foi Lima Barreto em Clara dos Anjos (1904). Contudo o nesse plano em que foram minuciosamente retratados o negro como formador da identidade nacional aparecerá em sertanejo, o gaúcho, o índio, o bandeirante, além do duas obras que se contrapõem, pois na primeira Macunaíma colonizador branco”, a fim de criar um discurso hegemônico da (1928 ) de Mário de Andrade, o negro Macunaíma torna-se origem da nacionalidade brasileira como sendo fruto da branco ao banhar-se numa fonte mágica o que lhe dá um certo civilização branca com o exotismo indígena. O branqueamento status, reforçando “o mito da democracia racial”; já em Viva o do negro ocorre no discurso da obra A Escrava Isaura (1872 ) povo brasileiro (1984), o negro passa por um processo de luta 409 de classes, que forjam seus heróis como Zé Popó e Maria da os índices de escolaridade dos brancos eram maiores que as Fé, que se constituem porta-vozes de defesa do povo brasileiro. médias nacionais, o que demonstra o quanto a população negra Dessa forma podemos concluir com Zilá Bernd que o discurso do Brasil está longe de atingir os níveis mínimos de cidadania. seja da poesia ou da prosa negra “não é o reflexo de uma Os dados corroboram para referendar uma discussão, ideologia exterior [...] é o local de geração de ideologia” que permeia o universo acadêmico sobre a questão das cotas (Ibidem, 91). para negros (afro-brasileiros) nas universidades públicas, sendo Se a presença do negro na História e na Literatura é que um dos primeiros estados a publicar uma lei foi o Rio de um discurso em re(estruturação), na Educação, por sua vez, a Janeiro com o Decreto número 30.766 de 04/03/2002, que sua situação é uma realidade a ser mudada, porque segundo os prevê a cota de até 40% de vagas para esta etnia e em Mato dados do IBGE (Apud OLIVEIRA, 2002, p.4) o número de Grosso do Sul a UEMS (Universidade Estadual de Mato negros entre 5 e 14 anos no Ensino Fundamental corresponde a Grosso do Sul) desde 2004 prevê 20% de suas vagas para afro- 79,6% contra 42% dos brancos. A média de permanência do brasileiros, num sistema de cotas, que é instituído pela Lei aluno negro nos bancos escolares é de 4,5 anos contra 6,7 dos Estadual 2605/06/2003 e regulamentado pela resolução alunos brancos. Os dados acima observados se completam com COUNI/UEMS 245 de 17/07/2003. Logo o sistema de cotas, outros que demonstram que “nos 18 cursos superiores nos estados, atende a Constituição de 1988, no sentido de analisados pelo MEC, no exame de 2000, os afro-brasileiros diminuir contribuíram com apenas 15% dos formados [...] sendo que discriminatórios, que essa população vem sofrendo com a (grifo nosso) 8,2 dos brancos têm Ensino Superior completo aplicação de ações afirmativas, que segundo Silva (2003, p.2 ) contra 2,0% de negros, muito embora eles constituam 45% da “Consistem em políticas públicas (e também privadas) voltadas população brasileira”. (OLIVEIRA, 2002, p. 4) Em todos os à concretização do princípio constitucional da igualdade dados analisados nesse projeto, foi possível verificar, que todos material e à neutralização dos efeitos de discriminação racial, gradativamente o impacto dos efeitos 410 de gênero, de idade, de origem nacional e de complexidade segundo Rajagopalan (2002, p. 77) é “a mais difícil de ser física”, que só ocorrem por força do poder político, que institui pensada diferentemente, isto é,como algo em constante regras, as quais podem dar voz e vez aos negros e afro- processo de reconstrução”, que necessita que o sujeito pensante brasileiros. Portanto a luta por um discurso de identidade tenha conhecimentos de sua existência, a fim de que ele possa continua. no decorrer do processo de auto-reconhecimento, conhecer o mundo real, que está a sua volta. 4. UMA QUESTÃO DE IDENTIDADE A partir da forma como o sujeito ideológico se identifica nos seus discursos, ele aprende a lidar com o mundo O termo identidade é constituído por discursos “como real que o circunda, recebendo e doando inferências ideológicas uma prática social e histórica’(POSSENTI, 2002, p. 43), que se num espaço osmótico “no qual o indivíduo passa (grifo nosso) desdobra em diferentes conceituações que dependem “da a ser visto como mais localizado e definido no interior das história de construção dos sentidos [...], cuja (grifo nosso) grandes estruturas e formações sustentadoras da sociedade organização dos sentidos é trabalho ideológico”(ORLANDI, moderna” (HALL, 2000, p. 30), nas quais o discurso de 2003, P. 7), que norteia esse projeto com a pretensão de identidade do sujeito é uma formação discursiva que se arregimentar os sentidos, que determinam o termo. constitui via alteridade, pois o sujeito, constrói um discurso de Segundo Possenti (2002, p. 45) “há grupos identidade, que o faz integrar-se ao grupo ao qual ele pertence organizados em torno dos sentidos das palavras e que lutam ou o faz repelir um determinado grupo em relação ao outro. para que alguns sejam vitoriosos e, outros eliminados”num Logo a identidade é um termo, que segundo Claude Levi- processo conflitante, no qual o significação depende do Strauss (Apud Bernd, 2001, p. ) se apresenta como “um contexto histórico e social, no qual a palavra esteja inserida. entidade abstrata, sem existência real, mas indispensável como Desta forma comecemos com a identidade do indivíduo, que ponto de referência”, sendo pois um conceito “que não pode 411 afastar-se da alteridade” (Idem), pois ela deve ser reflexiva e um povo, que em alguns livros como O povo brasileiro de possuir a dimensão de exterioridade, que segundo Hall (2000, Darcy Ribeiro e Viva o povo brasileiro organizam diferentes p.3 0) “é algo formado, ao longo do tempo, através de discursos sobre a identidade, que no caso do romance processos inconscientes, e não algo inato, [...] ela está sempre ubaldiano a identidade do negro brasileiro passa por uma incompleta, está sempre em processo, sempre sendo formada” releitura, na qual os afro-brasileiros representam uma construindo um dispositivo discursivo que representa identifica consciência coletiva na construção da identidade nacional, uma comunidade. sendo eles portadores de um saber que, mesmo tendo sido Assim o discurso de identidade de individual passa a reelaborado aqui no novo mundo, é proveniente de um passado ser coletivo na medida em que o sujeito constrói via remoto, arcaico, situado na origem da humanidade e representação lingüística os mecanismos de identificação de um transportado para Itaparica (cuja etimologia quer dizer, em tupi, grupo com o uso da história, da filosofia, da religião, das "cerca de pedra"), que por sua geografia se configurou em um lendas, do sistema familiar, enfim formas discursivas que agem receptáculo, que o guardou, revelando-o nos discursos de como um processo “em permanente movimento de construção/ alguns representantes desse povo como Dadinha, Júlio Dandão, desconstrução, criando espaços dialógicos [...] concebidos Cego Faustino e Maria da Fé. Portanto podemos finalizar com como continuidade, como síntese inacabada” (Bernd, 2001, p. Bernd (2001, p. 22), que “a identidade nunca é dada, recebida 18) do conceito de identidade que se revela muito útil para a ou definitivamente atingida”, pois ela é um discurso em leitura de textos, nos quais ela possa estar associada ao fruto do movimento a ser mecanismo da AD. pensamento intelectual e político de cada época da história de uma comunidade. Assim obras antropológicas e literárias são discursos organizados em função de uma representação da identidade de OBJETIVOS 412 Muitas leituras foram feitas até que um embrião de Analisar o agencimento dos discursos históricos, idéias sobre como o autor, o organizador dos discursos, João científicos, antropológicos, literários e políticos sobre o negro Ubaldo Ribeiro, por intermédio de seus personagens “vozes no Brasil do século 18 ao 20 na obra. anônimas que representam o autor” (FOUCAULT, 2002,p. 118) na obra Viva o povo brasileiro (1984) consegue resgatar o papel do negro na História, na Literatura, na Antropologia e na Política do Brasil. Analisar a contribuição do negro na formação da identidade nacional no discurso do autor João Ubaldo. Para que os objetivos supracitados sejam alcançados há a necessidade de uma metodologia, que atenda às O objetivo geral desse projeto de pesquisa pretende perspectivas de um trabalho, cujo suporte teórico aliado ao analisar os discursos de constituição do negro brasileiro na obra prático (análises e estudos) possa vir ao encontro de uma do sujeito João Ubaldo Ribeiro. produção científica, que pretende contribuir para o estudo da Objetivos específicos: Análise do Discurso. Analisar o discurso de resgate da memória do negro apagado pela História Oficial do Brasil. HIPÓTESE Analisar o apagamento do negro dos setores sociais, políticos, literários e históricos pelo discurso mítico da democracia racial brasileira. A hipótese desse projeto tentará analisar o efeito de sentido dos discursos “organizados” pelo autor João Ubaldo, na Observar a constituição político ideológica do sujeito obra Viva o povo brasileiro, que, no âmbito literário emprestam João Ubaldo, quando da produção da obra nos anos 80 do a voz ao negro silenciado pelo discurso da História século 220. Oficial.Tentar-se-á, portanto, responder o porquê de, no Brasil, toda posição-sujeito em defesa do negro vir sempre pelo empréstimo da voz do outro representado por intelectuais, 413 literatos, artistas e estudiosos que se “comprometem” com a Proceder ao recorte de enunciados; causa social negra. Agrupá-los em discursos e caracterizando-os de acordo com as questões levantadas como: a questão do negro METODOLOGIA no Brasil, o negro e a literatura, a literatura comprometida, a representação do negro na literatura, o agenciamento de A proposta de analisar um discurso possui o princípio discursos na obra, os reflexos do momento histórico e da norteador de que “toda descrição abre sobre a interpretação” posição ideológica do autor no agrupamento dos discursos de (PÊCHEUX, 2002, p. 54), que se constitui a partir de Viva o povo brasileiro. determinados “princípios e procedimentos” (ORLANDI, 1999, Analisar os discursos quanto à posição ideológica, a p. 64) metodológicos, que o analista adota, a fim de delimitar posição dos sujeitos extra e intertexto analisar os aspectos de determinado corpus identidade dos sujeitos. a ser analisado, que nesse projeto pretendo trabalhar com o tipo rentáve (POSSENTI, 2002, p. 31), que abre perspectiva para uma análise independente do ANÁLISE DO DISCURSO DAS VOZES: DO TÍTULO A pesquisador, mas que em de termos é arregimentada por ele de SEUS DESDOBRAMENTOS acordo com as opções de discursos a serem analisados. As etapas que constituirão metodologicamente a Antes de iniciarmos a análise do discurso do título análise serão as seguintes, não necessariamente nessa ordem: “Viva o povo brasileiro”, procuraremos nos ater ao que seria o Leitura e organização do referencial teórico; campo do conhecimento da Análise do Discurso, que Leitura da obra Viva o povo brasileiro (1984) de João chamaremos de AD, que segundo Foucault (2002, p. 137) Ubaldo Ribeiro sobre o enfoque da AD; Recorte do corpus; “mostra como os diferentes textos remetem-se uns aos outros, [...] entram em convergência com instituições e práticas, e 414 carregam significações que podem ser comuns a toda uma eixos: o primeiro quanto ao efeito de sentido das palavras época”, na qual o texto está inserido. Logo o objetivo da AD é “viva”e “povo” e o segundo pelo deslocamento do sentido descrever o funcionamento do texto. Em outras palavras, sua histórico-político desses termos: “Viva!” – quando do finalidade é explicar como um texto produz sentido. nascimento de Daê (Vevé) em 1815; “Viva nós!”- quando da (ORLANDI, 2001, p. 23). fundação da Irmandade do Povo Brasileiro em 1827; “- Viva A AD, nos anos 60 do século 20, torna-se um estudo, nós! Disse sorrindo Budião. – Viva nós! Respondeu Zé Pinto, que engloba assuntos de lingüistas, historiadores, filósofos e muito sério”em 1870”e “Via o povo brasileiro! Viva nós” em psicólogos, que se constituiu no intervalo entre “a lingüística e 1897. as outras ciências, [...] na região das questões que dizem Comecemos pelo que diz o Dicionário Houaiss sobre respeito à relação da linguagem( objeto lingüístico) com a sua os dois termos: /viva/ pode assumir o significado de verbo exterioridade (objeto histórico) (ORLANDI, 1999, p. 27), a fim como imperativo do viver e como substantivo masculino sendo de seja apreendida a historicidade pelo discurso histórico que expressão de felicitação; / povo/, substantivo que evoluiu do “se produz em condições determinadas, e projeta-se no futuro, latim populus (multidão), que tomaremos três concepções entre mas também é histórico porque cria tradição, passado e as dezesseis, que o mesmo dicionário traz: conjunto de pessoas influencia novos acontecimentos , atuando (grifo nosso) sobre a que estão ligadas por origem, religião ou qualquer outro laço; linguagem e operando no plano da ideologia. (ORLANDI, conjunto de pessoas que pertencem a classe mais pobre, plebe; 1990, p.35). conjunto dos cidadãos de um país, excluindo-se os dirigentes e Entende-se por discurso qualquer enunciado, que por a elite econômica. força da ideologia do sujeito possa servir de corpos para um O enunciado “Viva o povo brasileiro”sem ponto de exercício analítico, que, no presente projeto, pretende trabalhar exclamação abre várias possibilidade de sentido que se o enunciado-título da obra “Viva o povo brasileiro” por dois “constitui em cada formação discursiva, nas relações que tais 415 palavras [..] mantêm com outras de mesma formação discursiva partir da posição do sujeito Dadinha, em relação ao (Pêcheux, 1997, p. 161)constituindo um lugar de sentido, no posicionamento dos escravos, representa uma presságio de qual a palavra “viva”significa uma saudação de desejo de mudanças para aqueles que até então viviam sem a consciência felicidade ao povo brasileiro, tomado na obra como o povo de povo. negro e também como uma ordem de que esse povo, deveria No segundo discurso “Viva nós!”( Idem, p. 209) viver por meio de sua história, de sua religião e de sua cultura, pronunciado pelo sujeito Dandão, um negro malê do Islão a fim de superar a elite branca. Pela palavra “povo” entende-se Negro, quando da fundação da Irmandade do Povo Brasileiro, como representado em 1827) vem acompanhado do gesto de “levantar o punho ideologicamente sob a forma da intersubjetividade” (Idem, p. fechado e esmurrar o ar à frente do rosto”(Idem), que o autor 129) , que muda de posição de acordo com o sujeito que as capturou do discurso e de Malcom X emprega. Party44, que somente mais um século depois influenciariam os um “processo da identificação, Nessa esteira de raciocínio, o autor - sujeito que organiza os discursos, distribuiu ao longo da 43 e dos Black Panthers negros dos EUA contra a discriminação racial, que levou obra atletas negros em 1968, a fazerem esse mesmo gesto quando o desdobramentos do título, que acompanham o processo de Hino Nacional Americano era tocado. Não só o gesto torna-se identificação ideológica do negro, durante o século 19, em uma marca de interdiscurso entre os fatos históricos do tempo relação a releitura de sua história. Para tanto o discurso do autor e o tempo da obra como também a saudação “Viva “Viva!”(RIBEIRO, 1984, p. 44) pronunciado por vó Dadinha, nós”inicia uma processo de egregora de identificação entre os matriarca e gangana dos negros da Senzala de Pirapuama, saudando em 1815, o nascimento de Daê (Vevé), cujos olhos são esverdeados e ela possui uma marca sobre o olho esquerdo como símbolos de predestinação. O discurso pronunciado a 43 (1925-1965) Líder negro político-religioso( muçulmano), que denunciou como a polícia e a política dos EUA tratavam os negros do Harlen 44 O PARTIDO DAS PANTERAS NEGRAS – grupo político-social que visava proteger a comunidade negra da Califórnia ( EUA), após ela ter sofrido sucessivos abusos da polícia na década de 60 do século 20. 416 membros daquela irmandade, que assegurou a com continuidade da tradição de um povo. mudam de sentido segundo as posições sustentadas por aqueles que as empregam” (Pêcheux, 1997, p. 160). No terceiro enunciado discursivo, que ocorre quando da volta de Budião da Guerra dos Farrapos (1835-1845), que BIBLIOGRAFIA encontra Zé Pinto e diz “- Viva nós! Disse sorrindo Budião – Viva nós! Respondeu Zé Pinto” (Idem p.337). Observa-se com BERND, Zilá. Introdução à Literatura Negra. São Paulo: Orlandi (1990, p. 37) que “um dos efeitos ideológicos do Brasiliense, 1988. discurso [...] é o da unicidade do sujeito com a linguagem”, que nesse texto produz a ruptura, pois o que deveria ser senha para BERND, Zilá. Literatura e Identidade Nacional. 2.ed. Porto eles, representa uma forma discursiva, na qual, os sentidos são Alegre: Editora da UFRGS,2003. díspares, pois se um “viva” constitui um ordem de vida longa, o outro representa uma posição de desagrado. No último discurso “Viva o povo brasileiro!, Viva nós.!”( Idem, p. 566) o sujeito Maria da Fé numa egregora BERND, Zilá; UTËZA, Francis. O caminho do meio: uma leitura da obra de João Ubaldo Ribeiro. Porto Alegre: Editora/ UFRGS, 2001. fecha dois pontos da análise proposta: o primeiro quanto a palavra /viva/como imperativo do verbo viver, que é saudação BAKHTIN, Mikhail. Problemas da Poética de Dostoievski. e constatação que a partir daquele momento, a identidade negra Trad. Paulo Bezerra. 3.ed.Rio de Janeiro: Forense,2002. sobreviveria a História Oficial; o segundo relaciona-se com a simetria entre o substantivo /povo/ e o pronome pessoal /nós/, BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. Trad. Fernando que se tornam uma reflexo da outra, passando a significar- nós Tomaz. 7.ed. São Paulo; Bertrand, 2002. (negros) somos o povo brasileiro- .pois “as palavras [...] 417 CHAUI, Marilena. Brasil: mito fundador e sociedade MANGUEL, Alberto. Uma história da leitura. 2.ed. São Paulo: autoritária. 1.ed. São Paulo: Abramo, 2000. Companhia da Letras, 1997. FOUCAULT, Michel. Microfísica do Poder. 6.ed. NABUCO, Joaquim. Abolicionismo. Rio de Janeiro: Nova Trad.Roberto Machado. Rio de Janeiro: Graal, 1997. Fronteira, 2000. FOUCAULT, Michel. O que é o autor. Trad. Antonio Fernando OLIVEIRA, Dijaci David de ( et. Alli) A cor do medo: Cascais (et alli). 3.ed São Paulo: Passagens, 1997. homicídios e relações raciais no Brasil. Brasília: Editora da UnB, 1998. FOUCAULT, A arqueologia do saber.Trad. Luiz Felipe Baeta Neves. 6.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. ORLANDI, Eni Puccinelli. Terra à vista: discurso do confronto: velho e novo mundo. São Paulo: Cortez, 1990. GIACON, Eliane Maria de Oliveira. Viva o povo brasileiro: história e identidade.Dissertação de mestrado. UNESP- ORLANDI, Eni Puccinelli. Análise de discurso: princípios e Assis/SP, 2002. procedimentos. Campinas-SP: Pontes, 1999. HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Trad. ORLANDI, Eni Puccinelli. Discurso e Texto: formação e Tomás Tadeu da Silva [et alli] 4.ed. Rio de Janeiro: DP&A, circulação dos sentidos. Campinas-SP, 2001. 2000. ORLANDI, Eni Puccinelli.(org) Discurso Fundador. 3.ed. Campinas-SP: Pontes, 2003. 418 PÊCHEUX, Michel. Semântica e Discurso: uma crítica a RIBEIRO, João Ubaldo. Viva o povo brasileiro. 16. reimp. Rio afirmação do óbvio.Trad. Eni Pulcinelli Orlandi [et alli] 3.ed. de Janeiro: Nova Cultural, 1984. Campinas-SP: Editora Unicamp, 1997. RODRIGUES, Marlon leal. “O lugar do sujeto MST na PINSKY, Jaime. A escravidão no Brasil. 13.ed. São Paulo: modernidade”In Revista Ave Palavra. N. 5, agosto/2004. pp. 94 Contexto, 1994. –137. POSSENTI, Sírio. Os limites do discurso: ensaios sobre ROMERO, Silvio. História da Literatura Brasileira. 7. ed. Rio discurso e sujeito. Curitiba-PR: Edições Criar, 2002. de Janeiro: José Olímpio, 1980. v.1. PROENÇA FILHO, Domício. A trajetória do negro na SAUSSURE, Ferdinand. Curso de Lingüística Geral. literatura brasileira. Antonio Chelini (et alli).26.ed.São Paulo: Cultrix, 2004. Disponível em http// www. Scielo.br, Trd. 2002. Acesso em 14/06/2006. p.p 1-35. SILVA, Luiz Fernando Martins. Sobre a implementação de RAJAGOPALAN, Kanavillil. “A Construção de identidade e a cotas e outras ações afirmativas para os afro-brasileiros. política da representação. In FERREIRA, Lúcia M. A [et alli] Disponível (org). Fernando_2.htm/ 20003. Acesso 12/06/06. Linguagem, Identidade e Memória Social. Rio de Janeiro: DP&A, 2002. RIBEIRO, Darcy. O povo brasileiro: a formação e o sentido do Brasil. 2.ed. , 15.reimp.São Paulo: Companhia da Letras, 2000. em: http://www.achegas.net/numero/cinco/l 419 SILVERMAN, Malcolm. Protesto e o novo romance brasileiro.Trad. Carlos Araújo. 2. ed. Rio de Janeiro: AS RELAÇÕES DE TRABALHO NO COTIDIANO ESCOLAR À LUZ DA TEORIA DA AÇÃO COMUNICATIVA DE HABERMAS Civilização Brasileira, 2000. Alaíde Pereira J. Aredes (UEMS) Japecanga @uems.br VALENTE, Ana Lúcia E. F. Ser negro no Brasil hoje.12.ed. São Paulo: Moderna, 1987. Candido Vieitez Guiraldez (UNESP/ MARÍLIA) [email protected] WOLF, Eric. Antropologia e Poder. Trad. Pedro Maia Soares. São Paulo: Editora Unicamp, 2003. Abstract The paper that is presented says about a reflection Mesa 15 around Habermas' theory and its contribution for the understanding of the work relationships at school. As these As Relações de Trabalho no Cotidiano Escolar à Luz da Teoria da Ação Comunicativa de Habermas Alaíde Pereira Japecanga Aresdes (UEMS) Candido Vieitez Guiraldez (UNESPE/MARÍLIA) relationships are constituted in power relationships, the Habermas' indicatives in relation to the communication take us to believe that beginning would be linked to the subject of the democracy in the institutions. The school while institution needs that beginning while the place that looks for to constitute relationships based in the democracy. Key Word - work relationships at school, Habermas' theory, Communicative Action, Democracy. 420 Resumo: O artigo que ora apresentamos é uma reflexão em definidos. Na verdade, são cumpridores destas sem poder torno da teoria de Habermas e de sua contribuição para a formalmente45 questioná-las. compreensão das relações de trabalho na escola. Como estas Nesse sentido é indispensável apontar qual tem sido a relações se constituem em relações de poder, as indicativas de atuação deste profissional. Vale a pena indagar: quem é o Habermas em relação à comunicação nos levam a crer que este diretor hoje na escola? Como foi projetado dentro de um princípio estaria ligado à questão da democracia nas sistema que é capitalista? Existe alguma semelhança entre a Instituições. A escola enquanto Instituição necessita deste organização do trabalho na escola e a organização do trabalho princípio enquanto espaço que busca constituir relações na empresa capitalista? Responder estas questões parecem baseadas na democracia. imprescindíveis, à medida que possibilitam a compreensão das Palavras – chave: Relações de trabalho na escola, A teoria de relações de trabalho dentro da escola, as quais delimito, a Habermas, Ação Comunicativa, Democracia. priori, como relações de poder. Estas, da forma como são representam um entrave às relações democráticas. Por outro lado, se a escola deve ser uma organização Introdução semelhante à organização capitalista, até que ponto as As relações de trabalho na escola pública quase modificações nas relações de trabalho nesta organização tem sempre se constituem em relações de poder. Fazer esta sido consideradas dentro da escola? Segundo Antônio Nóvoa afirmação, ao que parece, coloca em questão a forma como se (1992), existe um movimento de renovação científica e de organiza o trabalho nesta instituição. Geralmente predomina na mudanças de políticas educativas, mas isso tem sido olhado escola um poder centralizador exercido pelo diretor. Deste emanam todas as decisões. As regras são consideradas imutáveis e todos que lá estão têm um papel previamente 45 É possível detectar atualmente no interior das escolas públicas certa "infidelidade normativa", (Barroso, 1996). Isso significa que existem formas de atuação dos profissionais que nem sempre obedecem aos órgãos decisórios. Na verdade, a clandestinidade parece ser um elemento bastante relevante neste contexto. 421 com desconfiança no meio pedagógico, o que provoca zonas de compreensão das instituições escolares em resistência. Uma delas tem sido a recusa a importar para o toda sua complexidade técnica, científica e campo educativo idéias e ações do mundo empresarial e humana. (p.16). econômico. Enfatiza o autor: É importante esta observação para enfatizar a seguinte [...] a é idéia: as relações no interior das empresas capitalistas parecem fundamental para dificultar uma transferência estar mudando, ao menos teoricamente. Ao que parece há um acrítica perspectivas interesse na participação dos trabalhadores, embora, parcial, organizacionais para o espaço escolar. As mas a idéia está sendo enfocada, isso é relevante do ponto de escolas são instituições de um tipo muito vista da sociedade capitalista. É importante assinalar que se fala particular, que não podem ser pensadas como muito na idéia de estabelecer a comunicação como um caminho qualquer fábrica ou oficina: a educação não nas relações de trabalho neste tipo de empresa. No entanto, a tolera a simplificação do humano(das suas escola parece ser um mundo à parte de todo o processo. experiências, relações e valores), que a Detectam-se problemas que são originados, principalmente, da cultura da racionalidade empresarial sempre forma como são encaradas as relações dentro dela. Fala-se com transporta. E, no entanto, a afirmação da muita tranqüilidade em escola democrática, que democracia é especificidade radical da acção educativa não esta se as pessoas sequer têm o direito a falar? Que dirá pode justificar um alheamento face aos organizar alguma coisa, por exemplo, o trabalho? Realmente há campos de saber e de intervenção. Mais do que se pensar nas formas de trabalho na escola que nos que nunca, os processos de mudança e de remeterá à questão das relações de trabalho, que nem sempre inovação presença e destas redutora educacional 'resistências' das passam pela 422 são encaradas como responsáveis por muitas tentativas que não estrutura de relação de poder semelhante à do Estado dão certo nesta instituição. autoritário? Seriam projetados para tal? Portanto, para discutir as relações de trabalho na escola considero relevante traçar alguns caminhos. Esta é a situação que se mostra no nível da escola. É comum encontrarmos regimentos, planos globais, enfim, as Primeiramente pretende-se apontar até que ponto estas relações diretrizes que regem as escolas repletas são relações de poder com o auxílio dos estudos de Michael democráticas, e no fluxo de poder das diversas esferas da Foucaut(1979) organização e Max Weber(1991). Baseando-se nas pedagógica-administrativa em de nuanças geral, ações investigações de Vitor Paro, apontarei uma breve discussão antidemocráticas, conteúdos sem significado para os alunos, o sobre a função determinada pelo Estado ao diretor da escola que reforça uma estrutura repressora. pública. Em seguida, ousa-se apontar a teoria da ação comunicativa de Habermas como um dos caminhos para a Diante deste contexto se faz urgente repensar as relações de poder na escola na extremidade. Afirma Foucault: transformação das relações de trabalho na escola. Na realidade, pretende-se mostrar que a escola pode e deve adotar a Captar o poder em suas extremidades, em pedagogia da comunicação. Acredita-se que desta forma muitos suas últimas ramificações, lá onde ele se torna trabalhos nesta instituição seguirão com sucesso. capilar, captar o poder nas suas formas e instituições As relações de trabalho na escola são relações de poder? mais principalmente no regionais ponto e em locais, que, ultrapassando as regras do direito que o Nos discursos dos educadores está presente o desejo organizam e delimitam, ele se prolonga, de uma escola democrática e de qualidade, dir-se-ia que este é penetra em instituições, corporifica-se em muito consistente. Mas por que suas ações reforçam uma técnicas e se mune de instrumentos de 423 intervenção material, eventualmente violento. homens e mulheres. Mesmo nesta estrutura, o grupo se (Foucault, 1979, p.182) organizava através de troca de poderes. Ao nosso ver poderes necessários até para se ter uma determinada organização. Compreender as relações de poder na escola é necessário no sentido de apontar propostas que enfatizem Imagino que neste tipo de comunidade, o poder existia em prol de interesses comuns. relações que possibilitam a participação de todos os atores Com a sociedade capitalista, dividida em classes, a (alunos, pais, sindicato, professores, diretores, coordenadores forma de se utilizar deste poder toma um outro rumo. Ao que etc). A participação acredita-se, é o que torna uma instituição parece, este começa a ser utilizado para interesses individuais, mais democrática. Talvez isso signifique a "distribuição"46 do não mais em busca de um bem comum, mesmo que poder. Mas, será que o poder é necessário? É possível a uma ironicamente usam desta idéia para consolidar tal poder. instituição numa sociedade, cujo sistema é capitalista, Percebe-se que o poder está intimamente ligado a economia, ou sobreviver sem poder? seja, ele está nas mãos de quem tem o controle do capital e daí Responder a estas indagações não é fácil. Porém, emanam outros poderes, tais como: político, social e cultural. ousa-se apontar algumas idéias que no nosso entendimento Nota-se que esta forma de organizar a sociedade capitalista, podem, quem sabe, direcionar caminhos. reflete na organização escolar, principalmente, no que tange as Partindo das comunidades primitivas, é possível identificar como características a coletividade pequena, a relações, impedindo um trabalho que esteja voltado para um bem comum, interesses comuns. propriedade comum e um caráter democrático que se Para Weber (1979, p. 43), poder "significa a consolidava através de um conselho formado por adultos probabilidade de impor a própria vontade, dentro de uma 46 Na realidade, quando falo em distribuição do poder quero referir-me ao fato de que o poder existente atualmente é totalmente centralizador, portanto, se faz urgente uma organização escolar que tenha as rédeas da situação. Então, é nesse sentido, que enfatizo a idéia de distribuição do poder. relação social, mesmo contra a resistência e qualquer que seja o fundamento desta probabilidade". Então, nesse sentido, o 424 poder consiste na potencialidade de influir no comportamento alheio, ter poder, neste caso, implica, mesmo que potencialmente, dispor de certa autoridade. Na escola nem Segundo Vitor Paro (1991), a questão da administração escolar é algo muito complicado. Em geral, sempre o diretor está fazendo cumprir ordens delimitadas por ele mesmo. A autoridade de que este profissional está investido [...] os trabalhos teóricos sobre administração para comandar um grupo de subordinados, por exemplo, pode escolar, derivar de um poder exterior a ele: dos proprietários da implícita ou explicitamente, o pressuposto empresa, na iniciativa privada, ou do próprio Estado, no caso básico de que, na escola, devem ser aplicados de uma instituição estatal. Sua autoridade está sendo realizada os para impor a vontade de outrem. Na realidade, é o Estado quem adotados na empresa capitalista. (p.24). publicados mesmos no princípios Brasil, adotam, administrativos dita como serão as relações, como deve ser estruturada a escola, nem sempre o poder que se pratica nela emana-se de Nesse sentido, a assim chamada Administração Geral vontade própria. Embora não esteja descartada uma relativa passa a ter validade universal. Seus métodos e técnicas podem autonomia no exercício dos profissionais da escola, porém, ser utilizados em qualquer forma de organização. Dessa forma, desde que não contrarie a autoridade central. Percebe-se, que a Administração Escolar é assumida como uma das aplicações mesmo agindo na clandestinidade, são cumpridas as principais da Administração Geral. regras. Podemos verificar esta questão, quando enfoca-se a Sendo assim, função que o Estado capitalista-burguês delimita para o diretor de escola. [...] a administração especificamente capitalista, que, mercê dos condicionantes A função determinada para o diretor de escola sociais e econômicos de um particular modo 425 de produção, se apresenta, tanto no nível atividade de seus trabalhadores, deixando de lado, a não ser no estrutural, quanto no superestrutural, como discurso, mediadora da exploração e domínio de uma produtividade. Com isso, faz teoricamente e não efetivamente dada classe social sobre as demais, é tida, no a escola funcionar como uma empresa. os conceitos de racionalidade, eficiência e âmbito da teoria da administração, quer 'geral', quer escolar, como tendo validade Embora, no nível do discurso, se pretenda a eterna e universal. (Paro, 1991, p. 125). eficiência e racionalidade na obtenção dos objetivos - constituindo isso, inclusive, Nesse sentido, a preocupação da Administração justificativa para Escolar passa a ser com os aspectos técnicos e administrativos administração tipicamente em detrimento do pedagógico. escola -, no nível da ação, acabam por Por outro lado, eficiência, racionalidade a aplicação da capitalista na e prevalecer apenas os mecanismos mais produtividade são princípios sagrados dentro de uma empresa propriamente gerenciais, relacionados ao capitalista. Além de controlar os trabalhadores através dos controle do trabalhador “. (Paro, 1991, p. diversos métodos e técnicas, a empresa capitalista estabelece 130) mecanismos para assegurar e garantir o alcance dos seus objetivos. Portanto, tais princípios são metas indiscutíveis, pois Portanto, nas escolas de ensino fundamental e garantem a acumulação do capital, fim último desse tipo de médio permanece a dimensão política da administração empresa. Para Paro (1991), na escola as coisas parecem capitalista, ou seja, o controle gerencial do trabalho alheio caminhar de modo diferente. Permanece o controle dos em detrimento dos aspectos técnicos considerados essenciais trabalhadores, ou seja, o diretor-gerente procura controlar a 426 dentro dessa administração para o alcance de resultados especificidade da escola, que é o pedagógico, a realização do efetivos. ensino. O que se verifica nas escolas é um leque de normas e regulamentos vindos de cima para baixo, desconectados da realidade e inadequados às soluções dos vários problemas. O que se percebe é que estes se agravam. Está presente dentro desta instituição uma irracionalidade com a presença de uma burocracia velha, ultrapassada, que não permite a participação de seus atores, emperrando a busca eficiente na realização de seu fim educativo. É bem verdade que o diretor-gerente enquanto controla o trabalho alheio também é o que dá a decisão final. Aqui há uma grande semelhança ao funcionamento das empresas capitalistas, ou seja, o sistema hierárquico. E o diretor, na escola, ocupa o topo da hierarquia. Aproveitandose disso ele é o que decide, é o principal responsável pela escola. Ao que parece esta responsabilidade torna-o um profissional distante do aspecto pedagógico. Há então papéis extremamente diferentes dentro de uma unidade escolar, e quase sempre tais papéis não estão voltados para a Esta adoção de mecanismos gerenciais da administração capitalista leva o diretor a assumir posições contraditórias, pois tem que exercer funções que a princípio são incompatíveis, isto é, ser educador e fazer cumprir os objetivos educacionais e, enquanto gerente e responsável último pela escola, ele precisa fazer cumprir as ordens emanadas dos órgãos superiores, que muitas vezes atropelam o alcance dos objetivos educacionais. Estes órgãos bombardeiam a unidade escolar com normas, pareceres, leis, resoluções, portarias, etc, que fazem com que o diretor tenha pouco tempo para se dedicar ao que é essencial na escola: o ensino. Na verdade, o diretor, segundo Paro (1991), se vê entre a cruz e a espada. De um lado as reclamações de professores e alunos que querem medidas que vão ao encontro de melhores condições de trabalho, promovendo a melhoria do ensino, de outro os bombardeios sofridos dos órgãos superiores, que o punirão se ordens forem descumpridas. Diante dessa impotência do diretor, "com o papel de gerente que o Estado lhe reserva” fica a seguinte afirmação: há o 427 fortalecimento dos interesses dominantes com relação à ter relações democráticas na escola, possibilitando, portanto, educação escolar. Em que sentido? No sentido de não ocorrer uma gestão autoritária, onde princípios norteadores não efetivamente e qualitativamente a socialização do saber condizem com uma escola pública popular. Penso que seria de elaborado historicamente pela humanidade, requisito para que extrema relevância a busca por uma gestão diferente, onde o o indivíduo ingresse na sociedade como sendo capaz de lutar trabalho seja de fato coletivo e significativo. Dito de outro por melhores condições de vida, lutar sua cidadania. modo, a gestão democrática é uma questão vital. E os germes Para Paro (1991, p. 136), enquanto a empresa dessa alternativa passam por um projeto político pedagógico capitalista alcança com sucesso seu fim último, que é a coletivo exeqüível que conduza com rigor o processo de produção da mais-valia, democratização das relações de poder no cotidiano escolar. Por outro lado, com viabilizar este processo? Penso [...] a escola com sua ineficiência em cumprir que uma forma seria fazer da organização escolar um espaço seus objetivos educacionais, acaba por onde possa acontecer a ação comunicativa. (Habermas: 1989). colocar-se também contra os interesses gerais Acredito que este pode ser um dos caminhos com o intuito de da sociedade, na medida em que mantém superar as formas atuais de relações de trabalho na escola. apenas na aparência sua função específica de distribuir a todos o saber historicamente A ação comunicativa na escola: um olhar Habermasiano para as acumulado. relações de trabalho. Percebe-se, que o Estado reservando esta função para No início deste artigo afirmava-se que as relações de este profissional, delimita um espaço onde é exercido um trabalho na escola são relações de poder. Na verdade, nesta determinado poder. Poder este que prejudica a hipótese de se organização estão presentes atores que vivem se degladiando. 428 Talvez, a forma como acontecem as relações de trabalho na percebem a razão de forma bastante pessimista. Para eles a escola representa um dos maiores entraves ao estabelecimento presença da razão instrumental explica o avanço de regimes de consensos, extremamente necessários na realização do totalitários no século XX e a própria Segunda Guerra mundial. trabalho coletivo. Em nível micro, percebe-se uma relação Neste ponto todos concordam, inclusive Habermas. Entretanto, entre professores e alunos que mais parece um cenário de não é concebível limitar o poder da razão. Tais teóricos verdadeiros inimigos. Nota-se, dessa forma, que a escola supervalorizaram a preocupação com a crítica à razão tornou-se um local onde poucos se identificam, até parece que instrumental. Eles restringiram o conceito de razão atribuindo estão em um barco onde remam, mas para direções totalmente à racionalização societária a própria racionalização do sistema opostas. capitalista, ou seja, confundem a racionalidade do sistema com Diante deste contexto é que se propõe a teoria da ação a racionalidade da ação. Habermas acredita no poder da razão comunicativa de Habermas como uma das alternativas no que ressalta a comunicação. Esta razão comunicativa é uma tocante a questão das relações de trabalho na escola. Na retomada ao projeto e programas originais, ou seja, uma teoria realidade, Habermas tenta introduzir um novo paradigma, o social crítica com intenções práticas dentro de uma pesquisa qual chamamos de razão comunicativa. A razão comunicativa interdisciplinar que estabeleça uma nova relação entre filosofia surge contrapondo à razão instrumental. e as Ciências do Homem. A grande diferença entre Habermas e Segundo Mühl (1998), Habermas, um dos expoentes aqueles pensadores era a maneira de entender a razão. da Escola de Frankfurt, apresenta uma visão otimista em Habermas enfatiza a necessidade de se ter uma relação à razão. Para Habermas esta tem um papel postura otimista em relação à disposição democrática de emancipador que deve ser retomado. Tal visão se contrapõe à dialogar e alcançar um consenso como função da racionalidade visão dos primeiros pensadores da aludida Escola. Entre eles das ações e não por mecanismos coercitivos. É por isso que destacam-se, Adorno, Horkheimer e Weber. Estes autores este autor, sem perder de vista o potencial emancipatório que a 429 razão humana contém, propõe o abandono do paradigma da consciência, ao qual se pautavam Adorno, Horkheimer e Como deixa claro Habermas em seu artigo conhecimento e interesse (1983) apud Aragão (1992, p.13), é Weber, para lançar um novo paradigma, o da comunicação. Segundo Pinto (1994:66), [...] o paradigma da [...] a tendência para a 'comunicabilidade', consciência é calcado na idéia de um pensador solitário que para o diálogo e para o consenso, que ele busca entender o mundo a sua volta [...], o que mostra uma acredita ser imanente à própria humanidade, relação de subordinação do objeto em relação ao sujeito, pois está inscrita na linguagem, (...), é o traço insustentável na ótica de Habermas. Para ele, as relações devem distintivo da humanidade, o que lhe dá sua se dar de forma intersubjetiva, onde a comunicação representa característica a busca de um entendimento sobre algo no mundo que os linguagem está inscrita a inclinação para a sujeitos do ato da comunicação pretendem validar. A 'comunicabilidade', racionalidade seria construída a partir dos fundamentos do entendimento, então pode-se dizer que a processo de comunicação intersubjetiva, na busca de um comunicabilidade entendimento. distintivo do ser humano.(p.13) essencial, para é e na própria alcançar também um um traço O paradigma da comunicação coloca à tona a relação que existe entre a razão e as relações que o homem processa Todo otimismo teórico de Habermas está calcado com o mundo em que vive. A razão (comunicativa) neste nesta premissa, no sentido de uma melhoria e transparência das sentido, é produto das relações que são compartilhadas formas de relações humanas e sociais. É por isso que ele além intersubjetivamente com os sujeitos participantes do ato de de construir uma teoria do agir comunicativo que se baseia em comunicação. uma situação ideal de comunicação, procura encontrar na razão 430 os fundamentos daqueles supostos, construindo os conceitos de Ele é dividido em três componentes tidos como estrutura "ação comunicativa" e "mundo-da-vida". simbólica: cultura, sociedade e a pessoa. A cultura seriam os O conceito de ação comunicativa pressupõem uma conhecimentos acumulados os quais subsidiam a compreensão atitude calcada na racionalidade caracterizada pela expressão do mundo pelos atores. A sociedade sugere ordens que regulam lingüística, que coloca à crítica as pretensões de validade as relações no grupo social, legitimando-as. A pessoa se através da intersubjetividade ao qual se dá. Ao contrário, a ação compõe pela própria personalidade onde o sujeito age e fala de instrumental estaria calcada em ações individuais, não- acordo com sua competência. comunicativas e dirigidas que caracteriza o isolamento de um pretensão, ou seja, a subjetividade. Assim, os dois conceitos ação comunicativa e mundo da vida possuem uma relação de interdependência. O primeiro O conceito de ação comunicativa pressupõe a é o ato pelo qual as estruturas simbólicas do segundo - mundo intersubjetividade, a saída de uma visão egocêntrica de mundo da vida - são reproduzidas, garantindo a renovação do saber e a entrada de uma relação entre sujeito e outro sujeito, cultural através dos atos comunicativos, o entendimento mútuo, sugerindo que estes, no ato da comunicação, cheguem a um a coordenação das ações, a integração social e a formação da entendimento quanto a pretensão de validade criticáveis. personalidade individual. (Pinto, 1994:71) Este conceito tem como objetivo alcançar E a escola como pode ser vista neste contexto? entendimento. Mas este entendimento deve ser entendimento Assinala Mühl (1998), que a escola é vista como um espaço de algo no mundo, fruto do acúmulo de conhecimento ou onde será desenvolvida a competência comunicativa. Por outro mesmo do consenso cultural capitalizado que entendemos lado, é sabido que esta organização não tem trabalhado no como um pano de fundo desta situação. O mundo da vida é este sentido de se afirmar como um espaço de ação comunicativa. pano de fundo no qual se inserem os atores comunicativos e se Ao contrário, ela tem se resumido ao administrativo, tem realizam seus proferimentos situados espaço-temporalmente. propiciado a apatia de professores e alunos, atores 431 protagonistas neste cenário. Na verdade, é um mundo à parte, Durante a escrita deste artigo defendeu-se a idéia de não se identifica muito com as práticas sociais, permanece que as relações de trabalho na escola básica estão pautadas em fechada ao diálogo, transmitindo saberes fragmentados. Para relações de poder, quando deveriam ser pautadas na Habermas, isto se deve a racionalidade sistêmica assumida democracia e que Habermas, com sua teoria da ação pela escola. Esta tem assumido a razão instrumental, a razão comunicativa poderia contribuir neste cenário. Mesmo no que tenta controlar os pensamentos alheios, que tenta conduzir Estado do Mato Grosso do Sul, onde as eleições diretas para todos que lá estão à uma falsa cidadania. diretor é algo já efetivado em Lei, não se percebe relações Para trabalhar dentro dos pressupostos da ação democráticas entre os atores do espaço escolar. Considera-se, comunicativa, a ação deve assumir um trabalho que seja portanto, importante enfatizar que para se ter a democratização cooperativo e multidisciplinar, além disso, reconstruir a nas relações de trabalho na escola são necessários a relação teoria-prática num modelo segundo o qual a reflexão viabilização das questões práticas se torne inerente à teoria e vice-versa. autoritarismo centralizado; 2) a diminuição da divisão de Penso que se a escola pública adotasse esta pedagogia, poder- trabalho que reforça as diferenças e o distanciamento em se-ia ter outras relações de trabalho, relações que estejam relação, principalmente a comunidade; 3) a eliminação do voltadas para a construção da competência comunicativa em binômio dirigente/dirigido; 4) a participação efetiva dos detrimento da competência instrumental. Dito de outro modo, diferentes relações de trabalho que objetivam uma prática significativa conscientizando a todos de que são atores da história que se faz para todos. no dia-a-dia. Nesse sentido, a escola poderá ser vista pelas de alguns segmentos elementos: sociais na 1) a tomada extração de do decisões, classes trabalhadoras como um espaço vital na luta a favor da Considerações finais continuidade da vida. Para tanto, é relevante construir um espaço onde não se pratica mentiras e omissões. Neste jogo, o 432 importante é esclarecer as possibilidades e limites de uma responsabilidades para com a organização e o funcionamento sociedade capitalista. A título de exemplificação, basta da escola. observar o corrente discurso em torno da educação para o trabalho. Que trabalho? Eis uma questão séria e carente de REFERÊNCIAS debates na realidade brasileira. Por outro lado, em busca da efetiva democratização ARAGÃO, Lúcia Maria de Carvalho Razão comunicativa e das relações de trabalho na escola é necessário lembrar que esta teoria social crítica em Jürgen Habermas / Lúcia Maria de se situa no âmbito de um Estado autoritário, que, no mínimo, Carvalho Aragão. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1992 permite a participação controlada. Não devemos esquecer que o Estado intervém diretamente na escola. A organização do BARROSO, João. Autonomia e gestão das escolas. Editado trabalho não é feita pelos trabalhadores do ensino. Este é um pelo ministério da educação – Lisboa – 1996. espaço onde a autonomia é definitivamente mal interpretada. Diante disso é necessário criar um espaço onde seus COHN, Gabriel. A teoria da ação em Habermas. In: Teorias da trabalhadores o possuam, cooperativamente, como grupo. Este ação em debate. São Paulo: Cortez, 1993. é o caminho da autogestão da escola no Brasil. Acredita-se que esta se constitui numa tarefa extremamente difícil e FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder. 7ªed., Rio de problemática, mas esta instituição terá sentido tanto para Janeiro, Civilização Brasileira/Graal, 1979. alunos, como para pais, professores, diretores etc, se estes experimentarem o autogoverno. Provavelmente ter-se-á uma HABERMAS, Jürgen. Teoria de la acción comunicativa: prática onde todos os atores da unidade escolar estarão aptos a complementos y estudios previos. Tradução de Manuel tomarem decisões no local de trabalho e também, todos terão Jiménez Redondo. Madrid: Ediciones Cátedra, 1989 433 Resende Pinto. MÜHL, Eldon H. Modernidade, racionalidade e educação: a reconstrução da teoria crítica por Habermas. In: A educação Campinas, SP: UNICAMP, 1994 (Tese Doutorado) Petrópolis, 1998. PRESTES, Nadja H. O polêmico debate da educação na contemporaneidade: A contribuição Habermasiana. In: A educação danificada: contribuições à teoria crítica da educação. Ed. Vozes – Petrópolis, 1998. NETTO, José Paulo. Nótula à teoria da ação comunicativa de WEBER, Max. Economia e Sociedade. Brasília, Habermas. In: Teorias da ação em debate. São Paulo: Cortez, UnB, 1991. danificada: contribuições à teoria da educação. Ed. Vozes – 1993. 20:30 às 21:30 hs. ENCERRAMENTO NÓVOA, Antônio. (org). Para uma análise das instituições escolares. In: As organizações escolares em análise, Lisboa, Limites e Perspectivas dom Quixote, 1995 - 2 Ed. AD: Novos objetos, Novas Práticas Analíticas PARO, Vitor Henrique. Administração escolar: introdução Profa. crítica. São Paulo: Cortez: Autores Associados, 1991, 5º ed. (UNESP\ARARAQUARA) PINTO, José Marcelino de Resende. A AD como Teoria dos Textos Administração e liberdade: um estudo do Conselho de Escola à luz da teoria da ação comunicativa de Jürgen Habermas / José Marcelino de Dra. Maria do Prof. Dr. Sírio Possenti (UNICAMP) Rosário Gregolin 434 i N.T.: a tradução da citação foi colhida em Hegel, Georg Wilhelm Friedrich (1990). Fenomenología do espírito. Parte II. Tradução de Paulo Meneses com a colaboração de José Nogueira Machado, SJ. Petrópolis. Editora Vozes, p.48 [508].