o programa nuclear e o planejamento energético - DEE
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o programa nuclear e o planejamento energético - DEE
UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ CENTRO DE TECNOLOGIA DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA ELÉTRICA INDIRA PONTE RIBEIRO O PROGRAMA NUCLEAR BRASILEIRO E O PLANEJAMENTO ENERGÉTICO FORTALEZA 2014 1 INDIRA PONTE RIBEIRO O PROGRAMA NUCLEAR BRASILEIRO E O PLANEJAMENTO ENERGÉTICO Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Coordenação do Curso de Graduação em Engenharia Elétrica da Universidade Federal do Ceará Campus do Pici, como requisito parcial à obtenção do título de Graduação em Engenharia Elétrica. FORTALEZA 2014 2 __________________________________________________________________________ Página reservada para ficha catalográfica que deve ser confeccionada após apresentação e alterações sugeridas pela banca examinadora. Para solicitar a ficha catalográfica de seu trabalho, acesse o site: www.biblioteca.ufc.br, clique no banner Catalogação na Publicação (Solicitação de ficha catalográfica) ___________________________________________________________________________ 13 INDIRA PONTE RIBEIRO O PROGRAMA NUCLEAR E O PLANEJAMENTO ENERGÉTICO NACIONAL Trabalho de conclusão de curso submetido à Universidade Federal do Ceará para a obtenção do grau de Graduado em Engenharia Elétrica. Aprovada em: ___/___/______. BANCA EXAMINADORA ________________________________________ Prof. M.Sc. Tomaz Nunes Cavalcante Neto (Orientador) Universidade Federal do Ceará (UFC) _________________________________________ Prof. Dr. Ricardo Silva Thé Pontes Universidade Federal do Ceará (UFC) _________________________________________ Eng. Leila Cristina Jovina da Silveira Associação Técnico-Científica Eng.° Paulo de Frontin (ASTEF) 3 A Deus. 4 AGRADECIMENTOS À Deus, pela luz, força e inspiração necessárias ao longo dessa jornada. A meus pais, Sammy e Silvia, meus exemplos de dedicação e hombridade. Obrigada por todo o incentivo, compreensão, paciência e companheirismo. Obrigada por todos os esforços para me tornar quem sou hoje. A minha irmã, Marina, pelos cuidados com meu bem-estar, pelos conselhos e pelos momentos de descontração. A todos os meus mestres, pelo conhecimento repassado, em especial ao orientador desse trabalho, Tomaz Nunes, por todas as oportunidades fornecidas para o meu crescimento profissional. A ASTEF, por me guiar no início da minha jornada profissional. Aos meus colegas da gestão Laranja Mecânica, do Centro Acadêmico, em especial Samuel, pela ajuda fornecida tanto no desenvolvimento desse trabalho quanto ao longo do curso, e Cláudio Wagner, por todos projetos que elaboramos e executamos ao longo do curso. Ao engenheiro Lucas, pela ajuda e pelos conselhos valiosos na execução desse trabalho. A todos os meus amigos e colegas que me apoiaram nessa jornada, meus sinceros agradecimentos. 5 Nicolau Maquiavel 6 RESUMO Este trabalho visa ao estudo da participação das usinas termonucleares no cenário energético nacional. Serão abordadas as estruturas de uma planta termonuclear e o Programa Nuclear Brasileiro, analisando as motivações que conduziram à criação deste projeto, seu histórico, sua implantação e os avanços obtidos no domínio da tecnologia nuclear. Analisar-se-á a influência da fonte nuclear nos custos relativos à energia elétrica e as consequências da expansão do parque nuclear. Palavras-chave: Programa Nuclear Brasileiro. Cenário energético. Expansão. Planejamento Energético. Geração Termonuclear. 7 ABSTRACT This paper aims to study the contribution of the nuclear plants in the national energy scenario. Along for the text, the standard thermonuclear plant structure will be addressed, as well as the Brazilian Nuclear Program, analyzing the motivations that led to the creation of this project, its history, its implementation and the progress made in the field of nuclear technology. The effects of the nuclear source in the costs of electricity and the consequences of the expansion of nuclear power plants will be analyzed. Keywords: Brazilian nuclear program. Energy scenario. Expansion. Energy planning. Thermonuclear generation. 8 LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1- Esquemático de uma usina nuclear 29 Figura 2- Central Nuclear Almirante Álvaro Alberto 39 9 Gráfico 1- LISTA DE GRÁFICOS Geração de energia nuclear por país em 2013 20 Gráfico 2- Oferta de potência de geração elétrica 45 Gráfico 3- Geração termelétrica estimada página 51 Gráfico 4- Taxa de crescimento do PIB mundial: Período 2005-2030 52 Gráfico 5- Taxa de crescimento do PIB: comparação entre Brasil e Mundo 53 no período 2005-2030 Gráfico 6- Comparação dos custos 61 10 LISTA DE TABELAS Tabela 1- Número de países que possuem reatores nucleares em 19 operação/construção em 2013 Tabela 2- Densidade energética dos combustíveis 27 Tabela 3- Informações Angra I 40 Tabela 4- Informações Angra II 42 Tabela 5- Oferta de capacidade instalada de geração elétrica segundo 44 diferentes configurações Tabela 6- Capacidade instalada de geração elétrica/2013 45 Tabela 7- Comparativo da oferta interna da energia elétrica nacional 46 Tabela 8- Taxas de crescimento do nível de atividade 49 Tabela 9- Potencial de geração nuclear 55 11 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS PLD Preço de Liquidação das Diferenças PIB Produto Interno Bruto IAEA Agência Internacional de Energia Nuclear CNEN Comissão Nacional de Energia Nuclear MME Ministério de Minas e Energia CBTN Companhia Brasileira de Tecnologia Nuclear KWU Kraftwerk Union TNP Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares CNAAA Central Nuclear Almirante Álvaro Alberto PWR Reator a Água Pressurizada CNPE Conselho Nacional de Política Energética SIN Sistema Interligado Nacional APE Autoprodutor cativo Cativo EPE Empresa de Pesquisa Energética PDE Programa Decenal de Expansão PNE Programa Nacional de Energia ANEEL Agência Nacional de Energia Elétrica UTE Usina Termoelétrica CCEE Câmara de Comercialização de Energia Elétrica 12 Sumário 1. INTRODUÇÃO 1.1 2. ESTRUTURA DO TRABALHO A USINA TERMONUCLEAR .......................................................................................... 16 2.1 Histórico 2.2 A energia nuclear no mundo 2.2.1 Políticas energéticas nucleares em alguns países 2.2.1.1 Alemanha 2.2.1.2 China 2.2.1.3 Coreia do Sul 2.2.1.4 Estados Unidos da América 2.2.1.6 Japão 2.2.1.7 Rússia 2.3 A geração de energia 2.4 Estrutura da usina nuclear 2.5 Subprodutos e segurança nas usinas nucleares 2.5.1 Subprodutos 2.5.2 Segurança 2.6 Uso do combustível nuclear 3. O PROGRAMA NUCLEAR BRASILEIRO...................................................................... 33 3.1 Histórico 3.2 O Acordo Nuclear Brasil-Alemanha 3.3 Programa Nuclear Paralelo 13 3.4 Central Nuclear Almirante Álvaro Alberto 3.4.1 Angra I 3.4.2 Angra II 3.4.3 Angra III 4. O FUTURO DA ENERGIA NUCLEAR NO BRASIL ....................................................... 44 4.1 Características do sistema elétrico brasileiro 4.2 Planejamento Energético 4.2.1 Plano Decenal de Expansão 2022 4.2.2 Plano Nacional de Energia 2030 4.3 Justificativas para o incentivo da geração nuclear 5. ESTUDO DE CASO: IMPLANTAÇÃO DE USINA NUCLEAR NO CEARÁ .................. 60 5.1 Introdução 5.2 UTE Pecém I e II 5.3 Metodologia do estudo 5.4 Resultados 6. 6.1 CONCLUSÃO .................................................................................................................. 63 Trabalhos futuros REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................................ 65 14 1. INTRODUÇÃO Os recursos energéticos possuem papel fundamental para o desenvolvimento das nações. As decisões relacionadas a estes recursos, tomadas por cada país, devem levar em consideração as relações existentes entre os setores energéticos, econômicos, sociais e ambientais, tornando impossível a existência de uma única estratégia de sucesso. O Brasil, cuja abundância de recursos hídricos torna esta fonte responsável pela produção de 69,3% da energia, vive um período de incerteza quanto ao abastecimento de eletricidade. A demanda crescente de energia, cujo valor é superior ao PIB nacional, associada com as secas e os baixos níveis dos reservatórios, resultou no aumento do preço da energia elétrica no mercado de curto prazo, fazendo o Preço de Liquidação das Diferenças (PLD) bater seu valor máximo, permitido por lei, de R$ 822/MWh no primeiro semestre de 2014. Este aumento, que desestimula a negociação de contratos de venda a médio e longo prazo, pode ser justificado pela necessidade de acionamento de termoelétricas, cujo custo de operação é mais elevado, expõe a necessidade de uma estrutura forte de planejamento, a fim de reduzir os riscos de desabastecimento devido a fatores climáticos. Diante deste quadro, o incentivo a fontes com alto grau de confiabilidade se faz necessário. Dentre as opções, cita-se a geração termonuclear, que apresenta como principais vantagens a necessidade de pequenas áreas para sua implantação, a mobilidade, a ausência de emissão de CO 2, a independência de fatores climáticos e a elevada densidade energética do urânio. No entanto, esta fonte apresenta como grandes desvantagens o risco de acidentes nucleares e a geração de resíduos radioativos. Este trabalho foi motivado pela incerteza energética nacional e visa ao estudo da viabilidade da retomada do Programa Nuclear Brasileiro e à sua influência no planejamento energético do país. 1.1 ESTRUTURA DO TRABALHO Este trabalho é composto de cinco capítulos. No primeiro introdução e motivação ao estudo. faz-se uma 15 No segundo capítulo, é feita uma explicação sobre a energia nuclear, abordando o seu histórico, a geração de energia via urânio e os seus subprodutos. No terceiro capítulo, é feita uma análise do Programa Nuclear Brasileiro, citando seu histórico, suas motivações e o que foi implementado até o presente momento. O capítulo quarto envolve o estudo do planejamento energético e a análise da viabilidade de usinas termonucleares. O capítulo quinto se refere a um estudo de caso, em que se comparam os custos referentes a usinas térmicas a carvão e usinas nucleares. O sexto capítulo é a conclusão do trabalho. 16 1. A USINA TERMONUCLEAR 1.1 Histórico A propriedade da emissão de radiação por sais de urânio foi estabelecida por Henri Becquerel em 1896, ao perceber que estes compostos conseguiam impressionar chapas fotográficas. Em 1898, Madame Curie e Schmidt descobriram, simultaneamente, que o tório possuía as mesmas propriedades radioativas do urânio. O casal Curie, que já explicava a radioatividade como propriedade atômica, descobriu o Polônio em 1898. Em 1910, Madame Curie descobriu o Rádio. Em 1934, através dos trabalhos de Frederick e Irene Joliot-Curie, obteve-se pela primeira vez a radioatividade artificial. O desenvolvimento e aperfeiçoamento do átomo como fonte de energia estão fortemente ligados ao nome do italiano Enrico Fermi. Através de seus experimentos envolvendo geração de átomos radioativos via bombardeio de nêutrons, pode-se observar o fenômeno da fissão nuclear, mas tarde comprovada por Otto Hahn. Após a sua partida da Itália para os Estados Unidos e diante da ideia da conversão em energia elétrica do calor liberado pela fissão nuclear, Fermi, juntamente com seus colaboradores, iniciou seus estudos sobre a possibilidade da liberação de nêutrons no processo de fissão. Esta ideia foi comprovada em 1939. O primeiro reator nuclear, construído pela equipe de Fermi na Universidade de Chicago, entrou em operação em 1942, com uma reação em cadeia autossustentável. Começava-se a era atômica. Ao longo da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), as pesquisas referentes à utilização da energia atômica se tornaram assunto militar. Após o encerramento do conflito, os Estados Unidos visaram ao desenvolvimento de um programa nuclear com finalidades pacíficas, de forma a manter a sua superioridade na tecnologia militar desta fonte. Em 1946, o primeiro reator europeu entrou em operação, na cidade de Moscou. Em 1951, em Idaho Falls, EUA, entrou em operação um pequeno reator 17 nuclear, cuja finalidade era o estudo das propriedades regeneradoras de um reator rápido. No ano de 1953 foi lançado o programa Átomos para a Paz, o qual propunha a utilização pacífica da energia atômica, a partir de colaborações internacionais. O programa, lançado pelo presidente Eisenhower, foi proposto pouco tempo após o primeiro teste de bomba atômica feita pelos soviéticos. A primeira planta nuclear de potência dos soviéticos foi inaugurada em 1954. Durante o período de 1955-1956, a cidade de Argo, em Idaho, EUA, tornou-se a primeira cidade a ser totalmente iluminada através de uma central nuclear. Em 1956, foi construído o primeiro reator comercial dos EUA, o qual operou até 1982. Em 1957, fundou-se a Agência Internacional de Energia Atômica. No dia 28 de março de 1979, ocorreu o pior acidente nuclear americano até então, na usina de Three Mile Island, o qual não causou vítimas fatais. Em 28 de abril de 1986, ocorreu o pior acidente nuclear até então da história, em Chernobyl, Ucrânia, que espalhou radioatividade por uma extensa área europeia. A explosão liberou mais radiação que a bomba de Hiroshima e não se sabe ao certo qual a extensão da mortalidade associada a este acidente. Em março de 2011, em Fukushima, ocorreu o pior acidente nuclear japonês até então. Após este incidente, muitas nações passaram a rever seus programas nucleares. 1.2 A energia nuclear no mundo Em decorrência do acidente de Fukushima, em março de 2011, toda a indústria nuclear se mobilizou, a fim de avaliar o evento e as providências a serem tomadas, de modo a evitar a ocorrência de desastres em outras centrais. Conforme o resultado da avaliação feita por cada país, uma série de providências foi gerada, sendo a maioria delas voltadas para a garantia da resistência dos reatores a eventos extremos, como terremotos e tsunamis, e para o comportamento dos sistemas de segurança e desligamento seguro das centrais. Atualmente, a energia nuclear responde por 12% da capacidade elétrica instalada. De acordo com projeções feitas em 2013 pela Agência Internacional de Energia Atômica (IAEA), a participação da fonte nuclear na capacidade instalada mundial subiria para, no mínimo, 17% até 2030. No entanto, ao se comparar as 18 estimativas para esta fonte até 2030, feitas em 2012 e 2013, percebe-se que a projeção mais recente foi inferior, refletindo o impacto do acidente nuclear de Fukushima e a queda no valor do gás natural. Apesar disso, o crescimento da capacidade instalada ainda continuará, sendo liderado por China, Coreia do Sul, Índia e Rússia. Até o final de 2013, 434 reatores nucleares de potência estavam em operação, com capacidade instalada de 371,7 GW e outros 72 estavam em construção, sendo este o melhor número desde 1989. Ainda segundo a Agência, dos 30 países que possuem usinas nucleares, 25 estão planejando ou expandindo seus parques nucleares. (IAEA, 2013) Na tabela 1, observam-se as características da geração nuclear no mundo. Deve-se destacar que em dois deles, Emirados Árabes Unidos e Belarus, iniciaram-se as obras de construção das primeiras usinas. 19 Tabela 1-Número de países operação/construção em 2013 que possuem reatores nucleares em Fonte: IAEA, 2013 No gráfico 1, observa-se a geração nuclear por país. Deve-se destacar considerável redução no Japão, que precisou desativar grande parte do seu parque nuclear para testes após os eventos de Fukushima, e na Alemanha, que optou pelo desligamento de suas usinas após março de 2011. Deve-se também observar que a maioria dos países aumentou a geração de energia por fonte nuclear. 20 Gráfico 1-Geração de energia nuclear por país em 2013 Fonte: The World Nuclear Industry Status Report, 2014 1.2.1 Políticas energéticas nucleares em alguns países 1.2.1.1 Alemanha A matriz energética alemã é bastante diversificada, composta por carvão (47%), gás (11%), hidrelétrica (5%), outras fontes renováveis (19%), óleo (2%) e nuclear (16%). Esta última possui capacidade atual de 12.068MW, fornecidas por 9 usinas autorizadas a operar. (Eletrobrás Eletronuclear, 2013) No ano de 2010, após longas discussões no congresso alemão, aprovou-se a proposta de expandir a vida útil das usinas em mais 8 ou 12 anos, dependendo da idade da instalação, em vez do término previsto das usinas existentes para 2022. No entanto, após o acidente de Fukushima, a posição adotada em 2010 foi revertida, desligando-se todas as 17 usinas por 3 meses, para realização de testes. Após esse período, as oito usinas mais antigas foram desligadas, ficando o fechamento das outras 9 conforme cronograma. O dano real provocado pela geração nuclear para pessoas ou para o ambiente tem sido extremamente baixo, em especial quando comparado com o registro de outras fontes. Isso se comprova por uma pesquisa realizada em 2012, 21 a qual mostrou que 77% dos alemães se preocupam mais com a manutenção da eletricidade acessível do que com o abandono da geração nuclear. (Eletrobrás Eletronuclear, 2013) Com esta medida, 10% da energia do país deixou de se gerada, tornando a Alemanha dependente da importação de eletricidade de fontes nucleares francesas, tchecas e russas. Além disso, houve aumento de 12% no custo da energia e de 10% na emissão de CO 2. Tais dados minam a credibilidade desta decisão, movida por forças políticas nacionais. Também deve-se citar como consequências desta decisão a perda de empregos e a redução na competitividade para a indústria, em especial a de metais. Não se sabe exatamente como a Alemanha cumprirá seus compromissos de redução das emissões de CO2 com a desativação de todos os reatores. Apesar do forte subsídio à geração solar e da grande aposta na eólica, mesmo que a participação destas fontes na matriz energética dobrasse, seria necessário o investimento de 122 bilhões de euros no setor, conforme estimativas do Ministério de Meio Ambiente e Conservação da Alemanha, excluindo-se desse valor os investimentos nas centrais a gás de back-up das renováveis, na expansão das linhas de transmissão e os custos de possíveis racionamentos de energia. Segundo o Instituto de Pesquisas Econômicas da Alemanha, os custos dessa decisão podem chegar a 200 bilhões de euros. 1.2.1.2 China A China é, atualmente, o maior consumidor de energia do mundo. O país possui pouca disponibilidade de petróleo e gás, mas possui vastas reservas de carvão, o qual responde por 83% da matriz energética chinesa. O Governo, no entanto, motivado por questões ambientais, planeja reduzir essa participação. A China, assim como o Brasil, dispõe de um importante potencial elétrico, e possui a maior hidrelétrica do mundo, Três Gargantas, com potência de 18.000 MW. (Eletrobrás Eletronuclear, 2013) O consumo de energia per capita chinês é aproximadamente metade do brasileiro, mas a população é quase 7 vezes maior. 22 Os incentivos chineses na geração nuclear visam à diversificação da sua matriz energética, a fim de evitar colapsos no fornecimento de energia. Ao todo, a China possui 18 usinas nucleares instaladas, fornecendo 14.742 MW, e prevê-se a construção de outras 54 nos próximos 50 anos. O país pretende atingir 70 GW de capacidade instalada em 2030, o que representará 5% de geração por fonte nuclear neste ano. (Eletrobrás Eletronuclear, 2013) 1.2.1.3 Coreia do Sul A Coreia do Sul possui a 4ª maior economia asiática. Sem reservas energéticas, o país importa cerca de 97% de suas necessidades. O carvão é a principal fonte energética coreana, respondendo por 42% da eletricidade gerada. A política energética da Coreia do Sul visa à redução da dependência de combustíveis fósseis, bem como à diversificação da matriz energética. Há um maior incentivo à geração nuclear, devido à confiabilidade do fornecimento de energia e à segurança. As pesquisas coreanas no campo nuclear são voltadas para o gerenciamento de resíduos, domínio do ciclo do combustível e desenvolvimento de reatores. Em 2009, a Coreia do Sul ganhou a concorrência para fornecimento de 4 reatores de 1.400 MW para os Emirados Árabes Unidos. Isso aumentou a aprovação popular do desenvolvimento da indústria nuclear para 88,4%. O país possui 23 reatores em operação, correspondendo a 20.700 MW de capacidade instalada. Em 2012, a produção dessas usinas correspondeu a 34,64% do total consumido no país. Espera-se que em 2015, a capacidade instalada das usinas nucleares coreanas chegue a 27 GW. (Eletrobrás Eletronuclear, 2013) 1.2.1.4 Estados Unidos da América Os Estados Unidos possuem 100 usinas nucleares em operação, com capacidade instalada de 98.560 MW, tornando-se o proprietário do maior parque nuclear do mundo. A capacidade instalada bruta sofreu uma redução em 2013, com o fechamento de 4 centrais, uma vez que o consumo da região em que 23 estavam instaladas não cresceu como desejado e que não seria econômico remodelá-las. (Eletrobrás Eletronuclear, 2013) Houve um expressivo aumento da capacidade instalada das usinas americanas nos últimos anos, como consequência da ampliação das suas capacidades, chegando a 6.862 MW em 2013, sem que usina alguma fosse construída. Deve-se também citar o aumento da vida útil para 60 anos de 73 usinas, equivalente a 66.735 MW funcionando por mais 20 anos, sem os custos de capital para a construção. (Eletrobrás Eletronuclear, 2013) Os efeitos de Fukushima nas políticas energéticas americanas não foram muito expressivos, limitando-se a revisões de segurança das instalações. A adoção de políticas para reduzir a emissão de gases causadores do efeito estufa incentivou o aumento na participação da fonte nuclear na matriz energética americana. Especula-se um aumento de 50 GW da participação nuclear até 2020, ano em que se espera um índice de 28% na emissão de CO 2. 1.2.1.5 França A França possui 58 usinas nucleares em operação, com capacidade de 65.880 MW. Dada a população de 64 milhões de habitantes, o país possui mais de 1 GW de capacidade instalada por milhão de habitantes. Em decorrência do término da vida útil, 11 usinas foram fechadas. (Eletrobrás Eletronuclear, 2013) O país depende entre 75 e 85% da eletricidade de origem nuclear. É o maior exportador de energia da Europa e as suas emissões de CO 2, entre 70 e 80g/kWh, são menores que a média europeia. A França também produz a energia mais barata do continente. (Eletrobrás Eletronuclear, 2013) Uma característica do parque nuclear francês é a dificuldade na manutenção do alto desempenho de suas usinas, uma vez que elas não operam na base, sendo obrigadas a acompanhar as mudanças na carga. Outra característica a se destacar é o envelhecimento do parque gerador. Até 2022, 22 reatores franceses atingirão o término da vida útil, restando poucas opções para o suprimento da demanda energética que não a expansão da vida útil dessas plantas. 24 Os efeitos de Fukushima foram relevantes. Apesar dos testes realizados após esse evento atestarem um bom nível de segurança, o governo socialista começou a admitir a necessidade de diminuir a dependência das usinas nucleares, desejando implementar uma redução parcial da participação desta fonte para 50% até 2025, substituindo a capacidade cortada por fontes renováveis. No entanto, os investimentos para esse projeto são expressivos, chegando a 15 bilhões de euros, segundo o operador do sistema francês, o RTE. No entanto, esse projeto foi abandonado, uma vez que não se considerou viável a substituição da nuclear por outras fontes, investindo-se na pesquisa e desenvolvimento de reatores de quarta geração. 1.2.1.6 Japão O Japão é extremamente dependente de fontes externas de energia primária. Possui 50 usinas nucleares em condição operacional, com capacidade de 44.114 MW, 2 usinas em construção e 9 reatores fechados permanentemente. Com o acidente de Fukushima, todas as usinas foram desligadas para a realização de testes. Em setembro de 2012, apenas 2 haviam retornado à operação, ficando as demais no aguardo do término e aprovação dos testes, bem como da aprovação das prefeituras locais. O desligamento de todas as usinas resultou no aumento da importação de petróleo, gás e carvão para o despacho das térmicas convencionais, aumentando as emissões de gases do efeito estufa em 1,2 gigatones/ano. O desligamento das usinas nucleares também levou a uma solicitação de redução de consumo, a fim de evitar racionamento compulsório. (Eletrobrás Eletronuclear, 2013) As consequências desse acidente devem influenciar o Japão na formação do seu novo posicionamento energético. A dependência externa de combustíveis e os custos de alteração da matriz energética japonesa são outros fatores a se analisar. Até 2030, deverá ser tomada uma decisão entre 3 cenários, nos quais a participação da fonte nuclear varia de 0 a 20 ou 25%. (Eletrobrás Eletronuclear, 2013) Apesar das discussões quanto ao futuro da energia nuclear no Japão, o país continua com a sua política de exportação de tecnologia nuclear. 25 1.2.1.7 Rússia A Rússia possui 33 usinas em operação, com capacidade de 25.242 MW, 11 em construção e 44 planejadas, sendo que 20 destas possuem data de início de operação prevista. (Eletrobrás Eletronuclear, 2013) O enfoque da política energética russa na geração nuclear tem por objetivo a exportação do gás natural para a Europa, o que é mais lucrativo que seu uso para geração de energia nas térmicas convencionais, e na substituição do parque gerador. O governo russo estima que até 2020 a capacidade instalada desse parque gerador será de 30 GW, correspondendo a 25 ou 30% da energia do país nessa data. (Eletrobrás Eletronuclear, 2013) Os eventos de Fukushima levaram os russos a adotar os mesmos testes que os demais membros da União Europeia. Além disso, está em andamento um programa de inspeções nas centrais, relativos aos possíveis riscos associados à falta de água e energia de emergência para os sistemas de refrigeração. Deve-se também citar a ampliação do número de acordos comerciais e de cooperação firmados com diversos países, relativos à construção de novos reatores, desenvolvimento e exploração de combustíveis e pesquisas em geral. Segundo os seus dirigentes, a Rússia será fornecedora de 30% dos novos negócios na área nuclear. 1.3 A geração de energia A geração da energia nuclear baseia-se na fissão nuclear. Este processo é descrito como a desintegração, espontânea ou forçada, do núcleo, gerando dois novos átomos de peso atômico menor e fornecendo energia e nêutrons livres. Dentre as diversas metodologias para se induzir a fissão nuclear, cita-se o bombardeio por nêutrons, o qual apresenta como vantagem o fato do nêutron não ser repelido ao se aproximar do átomo. Caso esta partícula não possua velocidade tão alta, aumentam-se as chances de choque e se o impacto for suficientemente forte, ocorrerá a divisão do átomo. Caso os nêutrons liberados 26 pela divisão sejam absorvidos por outros átomos, inicia-se a reação em cadeia e aumentam-se as chances do processo tornar-se autossustentável. Apenas átomos de elevado peso atômico e mássico são físseis. Dentre os que possuem esta capacidade, cita-se o urânio, o último elemento químico natural da tabela periódica. Encontrado na forma de minério, o urânio possui dois isótopos naturais, o U238 e U235, na proporção de 1398/10. Este último isótopo, no entanto, é o mais visado para a produção de energia, uma vez que a probabilidade de ocorrência de fissão neste núcleo ser superior a de vários elementos. Para tanto, submete-se o urânio a um processo de enriquecimento, de forma a aumentar a proporção de U235 para 3,5%, podendo chegar a 5%. O enriquecimento do urânio pode ocorrer por diversos métodos, sendo os mais comuns a ultracentrifugação e a difusão gasosa. O processo de fissão geralmente resulta em perda de massa. Assim, conforme a equação de Einstein (1) observa-se que uma quantidade considerável de energia é liberada no processo. A tabela 2 permite a visualização da densidade energética do urânio, comparando-a com combustíveis. 27 Tabela 2-Densidade energética dos combustíveis Energia produzida(kWh) Combustível Massa Madeira 1 kg 2 Carvão 1 kg 3 Petróleo 1 kg 4 Gás natural 1 m³ 6 Urânio PWR) (reator 1 kg 60.000 Urânio FBR) (reator 1 kg 3.000.000 Fonte: Internacional Nuclear Societies Council, Report on nuclear power A geração nuclear deve garantir fornecimento de calor e ao mesmo tempo deve evitar que o núcleo do reator se torne supercrítico e derreta. Para tanto, é obrigatório o controle da reação em cadeia, a qual depende de vários fatores, como a velocidade dos nêutrons de bombardeio, a concentração de núcleos físseis e a distribuição geométrica do material físsil no reator. 1.4 Estrutura da usina nuclear A usina nuclear utiliza o ciclo de Rankine, que descreve a operação de turbinas a vapor para produção de energia. Neste ciclo termodinâmico, há a transformação da água em vapor, o qual acionará a turbina, produzindo energia. O ciclo é finalizado em um condensador, onde o vapor de exaustão é resfriado e a água resultante é devolvida a um trocador de calor para reiniciar o processo. Para estas plantas, que normalmente operam como usinas de base, é indispensável um sistema de resfriamento, condicionando a sua localização nas proximidades de rios, lagos ou mares. A composição de uma planta nuclear é semelhante à de uma térmica convencional, apresentando gerador síncrono, turbina a vapor, condensador, sistema de refrigeração, trocador de calor e reator nuclear. 28 O reator nuclear é definido como todo sistema capaz de produzir reação em cadeia de material físsil, sob condições efetivamente controláveis, mantidas no núcleo. A construção do reator nuclear deve levar em consideração os seguintes elementos: Moderador: é um dos elementos que caracterizam o reator. São materiais leves que regulam a velocidade dos nêutrons, desacelerando-os sem absorvê-los, ajudando a manter as condições de serviço controláveis; Refrigerante: é um dos elementos que caracterizam o reator. Sua função é manter a temperatura da reação em cadeia em níveis aceitáveis, extraindo calor. O fluido quente percorre um circuito fechado e, ao passar pelo trocador de calor, transmite a energia térmica para um gerador de vapor, o qual aciona a turbina; Barras ou varas de controle: sua função é o controle da taxa de nêutrons e, consequentemente, da taxa de fissão. São feitas de elementos químicos não físseis capazes de absorver nêutrons. Geralmente, são posicionados verticalmente dentro do núcleo do reator, podendo ser inseridos e colocados ou pela parte superior ou inferior do vaso de pressão, dependendo do tipo de reator adotado. As varas são usadas para variações rápidas de potência do reator, sendo parcialmente removidas do núcleo para permitir a ocorrência da reação em cadeia; Refletor de nêutrons: material que cerca o núcleo do reator, sua função é reduzir a perda de nêutrons por escape. A determinação da natureza do material que o constitui é dada pela distribuição energética dos nêutrons existentes no reator; Peças estruturais: devem ser capazes de resistir as radiações e as temperaturas de operação; Casca geral: sua função é reter o excesso de radiação, assegurando uma proteção adequada aos operadores. Deve ser feita de material denso e inerte. 29 A turbina a vapor é o componente da usina responsável pela conversão da energia térmica em energia mecânica, permitindo a expansão do vapor. A turbina aciona o gerador, que funciona a velocidades muito superiores do que nas usinas hidroelétricas. Apesar do processo de fazê-la funcionar a uma velocidade adequada, sincroniza-la e carrega-la a seu valor nominal ser bastante lento, uma vez que o gerador entra em operação, é capaz de reagir a mudanças muito elevadas de carga por minuto sem sofrer dano. Após passar pela turbina, o vapor é resfriado no condensador e o fluido resultante é devolvido a um trocador de calor, reiniciando o processo. Na figura 1, pode-se visualizar um esquemático de uma usina nuclear. Figura 1-Esquemático de uma usina nuclear Fonte: http://www.inovacaotecnologica.com.br 1.5 Subprodutos e segurança nas usinas nucleares 1.5.1 Subprodutos A produção de lixo radioativo, que ocorre em todos os estágios do ciclo do combustível nuclear, é uma das grandes desvantagens desta fonte, especialmente devido à propriedade denominada meia-vida, ou seja, o tempo necessário para que metade da quantidade original daquela substância decaia e que varia significantemente conforme o elemento considerado. Desta forma, 30 torna-se essencial a promoção de um armazenamento deste subproduto de forma segura e inviolável. A operação normal de uma usina nuclear resulta no despejo de resíduos líquidos juntamente com a água de resfriamento da turbina no meio ambiente e na produção de isótopos extremamente perigosos. No primeiro caso, no entanto, há um controle do despejo deste resíduo, a fim de não alterar a radioatividade natural do meio aquático. Existem 3 categorias de lixo radioativo: Resíduos de alto nível: consiste principalmente de rejeitos líquidos de alta atividade, gerados durante o reprocessamento, e combustíveis irradiados oriundos dos núcleos dos reatores. Esta categoria possui o subgrupo SNF (spend nuclear fuel), a qual é formada por isótopos que não podem ser reciclados. Para esses resíduos, existem duas estratégias de gerenciamento: o reprocessamento e tratamento como rejeito. Nos dois casos, o combustível irradiado é primeiramente armazenado na piscina do reator e depois em repositórios intermediários; Resíduos de nível intermediário: esta categoria engloba rejeitos químicos, peças de metal do reator e as latas de combustível que originalmente abrigavam urânio. Os subprodutos enquadrados nesta categoria devem ser blindados; Resíduos de baixo nível: são os subprodutos que não exigem blindagem durante o manuseio e transporte, como peças de proteção e equipamentos de laboratório que possivelmente entraram em contato com material radioativo. Muito se discute a respeito do destino final do lixo tóxico. A solução mais adotada, o armazenamento dos resíduos em caixas blindadas, acompanhadas pelo seu enterro, resulta, no entanto, em risco de contaminação da água e do solo. Além dos resíduos gerados pelo funcionamento normal de uma usina, devese considerar os provenientes da desativação do reator nuclear, uma vez que muitas das peças que o compõe se tornam radioativas. O processo de tratamento de uma usina nuclear após a sua desativação, chamada de descomissionamento, 31 não possui, no entanto, consenso sobre o melhor destino da edificação, podendo variar entre a retirada da estrutura, a sua cobertura com concreto ou o seu enterro. Uma vez que os custos do descomissionamento ainda são alvos de muita especulação, não se sabe como desmantelar, de forma segura e economicamente viável, uma usina nuclear. 1.5.2 Segurança Ainda que os riscos de acidentes em reatores sejam pequenos, não se pode prever todas as situações que conduziriam a isto, a fim de preveni-los. Assim, fazse necessária a exigência de um elevado grau de segurança em usinas nucleares. Generalizando, existem 3 objetivos primários de segurança: Controle da reatividade, o qual deve ser intrínseco ao projeto e que determina a possibilidade de eliminação da reação em cadeia; Remoção do calor por decaimento; Barreiras múltiplas para confinamento da radioatividade. Existem 3 tipos de sistema de segurança do reator: Sistema ativo: projetado de forma redundante, são baseados no controle ativo, elétrico ou mecânico de equipamentos; Sistema passivo: não dependem de mecanismos complexos ou da interferência humana para operarem, e sim de fenômenos físicos como, por exemplo, a gravidade; Sistema inerente: está fundamentado na eliminação de um dado risco por meio do uso de conceitos de projeto ou materiais específicos. Para que ocorra o licenciamento e o exercício de uma usina nuclear, é indispensável a elaboração do relatório de segurança. Esta exigência normativa visa à demonstração que a usina foi construída de modo que: A probabilidade de ocorrência de incidente seja mínima; Não haja danos à instalação, no caso de ocorrer um acidente; 32 As consequências de um acidente de grande porte sejam contidas sem resultar em danos a população das redondezas. 1.6 Uso do combustível nuclear Existe um grande debate sobre a utilização da fonte atômica. Desde a demonstração do seu poder destrutivo, com as bombas de Hiroshima e Nagasaki e com os acidentes nucleares ocorridos em Three Mile Island, Chernobyl e Fukushima, associa-se a geração nuclear um grande fator de risco a humanidade. Apesar da existência de rígidos controles da proliferação de armas nucleares por organizações internacionais e da redução dos riscos de acidentes em usinas, o risco ao meio ambiente continua como um problema sem solução, uma vez que a quantidade de resíduos é proporcional à capacidade de geração. Apesar destas desvantagens, muitos especialistas, inclusive ambientalistas, defendem o uso da fonte nuclear. Isso se deve ao fato desta geração ser capaz de produzir grandes blocos de energia em curto prazo, sem envolver a produção de gases poluentes. Além disso, usinas nucleares requerem menos combustível para a geração de eletricidade, tornando a energia produzida mais barata, em comparação com a produção via usinas térmicas. Também é citado como argumento o exemplo da França, onde mais de 75% da energia é produzida via usina nuclear e não houve, até o presente, nenhum acidente digno de menção. (Neto;Carvalho,2012) 33 2. O PROGRAMA NUCLEAR BRASILEIRO 3.1 Histórico O acompanhamento brasileiro da tecnologia nuclear ocorre desde 1938, ano em que foi descoberta a fissão nuclear. Após o término da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), o país adotou medidas que permitissem o seu desenvolvimento de fornecedor de matéria-prima a nação detentora do ciclo nuclear. A década de 1950 foi caracterizada pelo início das pesquisas tecnológicas brasileiras, envolvendo a criação de vários institutos. Esta fase foi marcada pela intensa atuação do almirante Álvaro Alberto, o pioneiro desta área no país. O almirante, que após os eventos finais da 2ª Guerra Mundial se interessou pelas aplicações militares da energia atômica, propôs que países exportadores de matéria-prima para as usinas nucleares fossem compensados através da transferência de tecnologia para pesquisa e produção de energia nuclear para fins pacíficos. Dentre os diversos feitos dos quais o almirante é responsável, cita-se a criação do Conselho Nacional de Pesquisa, em 1951, e pela compra de duas ultracentrifugadoras alemãs para estudos do enriquecimento do urânio, em 1953. Entretanto, a década de 1950 também ficou marcada pela ausência de um programa nuclear brasileiro global, permitindo o surgimento de uma política nuclear dicotômica, marcada pela coexistência de discursos defendendo a autonomia nacional neste setor com uma dependência às regras impostas pelos EUA, garantidas pelos acordos bilaterais firmados com este país, os quais garantiam a venda de urânio e tório a preços muito baixos e ao mesmo tempo autorizavam e expunham o potencial atômico brasileiro a minuciosas avaliações dos americanos.(Floripes,2009) A mudança na política nuclear brasileira se iniciou no governo de João Goulart, durante o qual ocorreu a sua reorganização, a garantia do monopólio brasileiro sobre seus minérios nucleares e pela reformulação da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN). No entanto, foi durante o governo militar que as diretrizes para o setor nuclear brasileiro foram invertidas. Durante este 34 período, a CNEN foi transferida para o Ministério de Minas e Energia (MME) e o Brasil estreitou seus laços com a Alemanha e a França, visando a um aumento na autonomia no plano nuclear. Ao longo da década de 1960, estudos visando à instalação de usinas nucleares de pequeno porte foram iniciados, mas nenhum foi implementado. Neste mesmo período, um levantamento energético da região Sudeste revelou a existência de reservas hídricas vastas o suficiente para garantir o atendimento à demanda da região por muitos anos. Este estudo também mostrou que seria necessária a instalação de usinas termoelétricas na região a partir da década de 1970. Em 1967, organizou-se um Grupo de Trabalho Especial, formado por representantes da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), MME, CNEN e Eletrobrás, para avaliar a viabilidade da implementação de usinas nucleares dentro deste novo contexto. A usina a ser instalada, recomendada pelo Grupo, possuía capacidade de 500MW e não era necessariamente competitiva com uma usina térmica convencional equivalente, mas possuía a capacidade de contribuir no suprimento da demanda da região, bem como fornecia ao país a oportunidade de obter experiência com esta nova tecnologia e incentivava a instalação de outras usinas nucleares. A confirmação da escolha da usina pelo Grupo ocorreu em 1968, através de um relatório feito por técnicos nucleares nomeados pelo IAEA. Em 1969, o Governo brasileiro autorizou a construção da primeira usina nuclear. Em 1972, um contrato de fornecimento do sistema nuclear foi assinado com a Westinghouse. O local escolhido para a instalação da primeira usina nuclear foi a Praia de Itaorna, localizada nas proximidades da cidade fluminense de Angra dos Reis. Deve-se observar que a falta de urgência na busca da completa tecnologia para construção de reatores de potência, bem como do domínio do ciclo do combustível foi resultado das oportunidades de exploração do potencial hídrico nacional, bem como dos preços acessíveis do petróleo. Em 1973, a crise do petróleo forçou o Brasil a reavaliar a sua dependência deste combustível. O país, que se encontrava num estado de euforia de -se com um problema energético gravíssimo. A ameaça ao desenvolvimento da nação se tornou mais 35 séria após estudos realizados pela Companhia Brasileira de Tecnologia Nuclear (CBTN) concluírem que haveria, até 1990, um progressivo esgotamento do potencial hidroelétrico da região centro-sul, o que levou o Brasil a procurar uma solução de geração de 10.000MW de energia complementar. A escolha da usina nuclear como fonte complementar foi justificada por diversos fatores, como o baixo valor do urânio e a competitividade da planta nuclear, quando comparada com a térmica convencional. Para a efetivação de um verdadeiro programa nuclear, foram necessárias duas ações simultâneas: a reorganização da estrutura administrativa do setor nuclear brasileiro e a escolha do parceiro altamente qualificado para a execução do programa nuclear, uma vez que o Brasil não possuía nem tempo nem a tecnologia necessária para executar um programa nuclear autônomo. Para a geração de 10000MW complementares, era necessária a construção de oito usinas, a serem instaladas ao longo do período de 1982-1990. Assim, já no primeiro semestre de 1974, iniciaram-se as negociações com países amigos, detentores da tecnologia de reatores para fins pacíficos, para um programa integrado de cooperação, envolvendo todas as etapas da indústria nuclear, principalmente a do ciclo do combustível. Os países com os quais o Brasil possuía programas de cooperação no campo nuclear eram Alemanha, França e EUA. No entanto, apenas aos dois primeiros foi proposto acordo de cooperação em um programa para o desenvolvimento e aplicação da tecnologia nuclear no país. Esta proposta foi acolhida favoravelmente tanto pela Alemanha quanto pela França. Os EUA, por sua vez, não apareceram como opção para este programa porque, apesar de possuírem toda a tecnologia desejável, não poderiam transferi-la, devido a proibições da legislação americana. Além disso, a experiência obtida na primeira usina nuclear brasileira, na qual houve completa dependência dos EUA, desmotivou o país a procurar firmar futuros acordos com os americanos. A França, apesar de aceitar instalar uma fábrica de urânio enriquecido no Brasil, não concordou com a transferência de tecnologia, contrariando a ambição 36 brasileira de, num estágio seguinte, atingir uma tecnologia própria, a partir da elaboração de uma consciência profissional no setor nuclear. A Alemanha, por sua vez, atendeu prontamente ao desejo brasileiro de um programa abrangente. Assim, em 27 de junho de 1975, assinou-se o Acordo Nuclear Brasil-Alemanha. Em 2002, assinou-se com França um acordo de cooperação para o uso pacífico da energia nuclear. Este país participa do projeto de Angra III, fornecendo tanto serviços de engenharia quanto equipamentos. A participação francesa nesse projeto pode ser explicado pela incorporação da Siemens/KWU pelo conglomerado francês Areva NP. 3.2 O Acordo Nuclear Brasil-Alemanha O Acordo Nuclear Brasil-Alemanha, assinado em 1975, estabelecia um comprometimento entre as duas nações para desenvolver um programa que abrangesse tanto a construção de oito reatores nucleares de potência, quanto a implantação no Brasil de uma indústria teuto-brasileira para a fabricação de componentes e combustíveis para os reatores, ao longo de 15 anos. Apesar de não incluir a opção pela tecnologia de urânio enriquecido, o acordo permitia ao Brasil desenvolvê-la dentro do país. Para a Alemanha, representada pelo grupo Kraftwerk Union (KWU), do grupo Siemens, o acordo com o Brasil possuía diversas vantagens, como: Ampliação de seu mercado consumidor na América Latina; Garantia de suprimento de matérias-primas físseis e férteis; Aumento do volume de negócios com o maior país sul-americano, situado geograficamente na zona de influência de seu principal competidor. A fase de negociação do acordo, ocorrida entre 1974 e 1975, foi mantida em sigilo, uma vez que este acordo contrariava interesses comerciais de muitos países, os quais poderiam pressionar os bancos internacionais para impedir o financiamento deste projeto. No entanto, após a sua assinatura, o acordo foi 37 duramente criticado dentro e fora do país e sofreu muitas pressões da imprensa e do Congresso americano. A recusa do Brasil em assinar o Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares (TNP), em 1968, gerou preocupações em quase todos os grandes países. Como resultado destas pressões, a Alemanha forçou o Brasil a assinar, em 1976, um acordo tripartite com a IAEA, em que se estabeleceram salvaguardas mais rígidas que as previstas no TNP. Este acordo determinava a extensão do controle internacional sobre qualquer desenvolvimento posterior de tecnologias adquiridas aos alemães, implicando também em submeter a inspeções da IAEA até instalações ou setores nacionais que entrassem em contato com qualquer elemento da RFA trazido pelo acordo. Os resultados não satisfatórios do Acordo Brasil-Alemanha incentivaram os militares brasileiros a elaborar seu próprio programa de desenvolvimento de tecnologia para o enriquecimento de urânio, o qual ficou conhecido como Programa Nuclear Paralelo. 3.3 Programa Nuclear Paralelo Iniciado em 1979, o Programa Nuclear Paralelo foi fruto da insatisfação de militares de alta patente, políticos e cientistas, os quais acreditavam que as salvaguardas impostas pelo Acordo Nuclear Brasil-Alemanha colocavam todos os itens do programa sob estrito controle internacional, interrompendo o desenvolvimento da tecnologia nuclear brasileira. O programa paralelo visava ao domínio completo do ciclo do combustível nuclear, preferencialmente através de tecnologia desenvolvida nacionalmente. As três armas se dedicaram a opções diversas, no entanto apenas a Marinha, que objetivava o desenvolvimento de um submarino de propulsão nuclear, aparentava ter condições de desenvolver atividades em nível industrial. Para o alcance de tal objetivo, algumas medidas foram tomadas, entre elas: Envio de pesquisadores brasileiros ao exterior, a fim de acelerar o esforço tecnológico próprio. Ao todo, 700 bolsas foram concedidas para estudantes civis e militares entre 1979 e 1983, os quais retornaram como especialistas, mestres e doutores em diversas áreas, como segurança de reatores, materiais nucleares, infraestrutura de pesquisa e desenvolvimento, dentre outras; 38 Remoção do então presidente do CNEN, prof. Hervásio de Carvalho, que não era considerado um incentivador da tecnologia nacional, sendo substituído pelo prof. Rex Nazaré Alves. Como resultado destas medidas, obteve-se elevado nível de autonomia tecnológica, estimado em até 80%. O Programa Nuclear Paralelo começou a se tornar público em 1986, quando uma reportagem do jornal Folha de São Paulo revelou a existência de covas e cisternas na Serra do Cachimbo, no Pará, destinadas a realização de testes nucleares. Investigações do Ministério Público e do Congresso Nacional revelaram a existência de diversas contas bancárias associadas ao Programa Paralelo. Em setembro de 1987, o domínio do ciclo do urânio, objetivo principal do Programa Paralelo, foi anunciado pelo então presidente José Sarney. 3.4 Central Nuclear Almirante Álvaro Alberto A Central Nuclear Almirante Álvaro Alberto (CNAAA), assim nomeada em homenagem ao pesquisador pioneiro da tecnologia nuclear no Brasil, é o resultado do Programa Nuclear Brasileiro, iniciado na década de 1950. O CNAAA possui potência total de 2007 MW e já produziu mais de 200 milhões de megawatts. 39 Figura 2-Central Nuclear Almirante Álvaro Alberto Fonte: Eletronuclear A CNAAA, constituída pelas usinas termonucleares Angra I, Angra II e Angra III, estando esta última em construção, está localizada às margens da rodovia BR101, na Praia de Itaorna, no munícipio de Angra dos Reis, Rio de Janeiro. A escolha deste local como sede do complexo nuclear deve-se a três fatores: Proximidade do mar; Proximidade dos três principais centos de carga do país, isto é São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte; Facilidade de acesso para os componentes pesados, como o urânio. Operada pela Eletronuclear, a Central Nuclear Almirante Álvaro Alberto, além das três usinas, é composta por: Centro de Gerenciamento de Rejeitos; Laboratório de Monitoração Ambiental; Subestação principal: composta por três transformadores monofásicos de 25/525 kV, receberá a energia gerada por Angra III; 40 Subestação de Furnas: de 500kV, recebe a energia produzida na CNAAA e interliga a rede com três subestações, sendo duas localizadas no estado do Rio de Janeiro e uma em São Paulo; Subestação de 138kV: realiza outra interligação com o Sistema Furnas, para o caso de perdas no sistema de 500kV. 3.4.1 Angra I Angra I é a primeira usina nuclear brasileira. Fruto de um acordo com a Westinghouse, Angra I teve suas obras iniciadas em 1972 e entrou em operação em 1985. Seus indicadores de eficiência são superiores aos de muitas usinas similares. Opera com reator de água pressurizada (PWR) e possui potência instalada de 657 MW, sendo capaz de suprir sozinha a demanda de uma cidade de 1 milhão de habitantes, como São Luís ou Porto Alegre. fechado, em que não se previa a transferência de tecnologia por parte dos fabricantes. Ainda assim, devido à experiência acumulada ao longo dos anos de operação de Angra I, garantiu-se à Eletronuclear a capacidade de realizar programas de melhoria tecnológica, incorporando os mais recentes avanços da indústria nuclear. Na tabela 3, pode-se visualizar outros dados referentes à Angra I. Tabela 3-Informações Angra I Situação atual Em operação Tipo de reator Água pressurizada (PWR) Fornecedor do sistema WESTINGHOUSE Potência elétrica bruta 640 MW Faixa operacional contínua 80%-100% Rendimento térmico 34,2% (Temp. água do mar 27º C) Material combustível Urânio enriquecido 41 Número de estágios da turbina Enriquecimento do combustível 1 AP, 2 BP no 4% recarregamento Frequência de carregamento Aproximadamente 12 meses Refrigerante H2O Tipo de refrigeração do condensador Água do mar Fonte: Eletronuclear 3.4.2 Angra II Angra II é a primeira da série de oito usinas previstas no Acordo Nuclear Brasil-Alemanha. A segunda termonuclear brasileira teve suas obras iniciadas em 1981, mas devido à crise econômica que assolava o país nesta década, teve seu ritmo de construção desacelerado em 1983 até chegar a sua parada, em 1986. As obras foram retomadas em 1994 e concluídas em 2000. No ano de 2001, a usina entrou em operação, amenizando as consequências do racionamento de energia ao permitir a economia de água nos reservatórios. A construção de Angra II propiciou transferência de tecnologia para o país, conduzindo o Brasil a um desenvolvimento tecnológico próprio, dominando todas as etapas do ciclo do combustível, e a uma qualificação dos profissionais. No ano de 2009, Angra II foi a 33ª em geração de energia dentre as 436 usinas em operação mundialmente, segundo a publicação especializada em energia nuclear Nucleonics Week(encontrar data desta publicação). No mesmo ano, a usina foi a 21ª dentre as 50 melhores usinas americanas, conforme análise dos indicadores de desempenho da Associação Mundial de Operadores Nucleares (Wano). (Eletrobrás Eletronuclear, 2012) Angra II, assim como Angra I, possui reator a água leve pressurizada (PWR). Sua potência, de 1350 MW, é capaz de alimentar uma cidade de 2 milhões de habitantes, como Belo Horizonte. Na tabelo abaixo, apresentam-se os dados de Angra II. 42 Tabela 4-Informações Angra II Situação atual Em operação Tipo de reator Água pressurizada (PWR) Fornecedor do sistema SIEMENS/KWU Potência elétrica bruta 1350 MW Faixa operacional contínua 80%-100% Rendimento térmico 35,8% (Temp. água do mar 27º C) Material combustível Urânio enriquecido Número de estágios da turbina 1 AP, 3 BP Enriquecimento do combustível no 4%(atual) recarregamento Frequência de carregamento Aproximadamente 13 meses Refrigerante H2O Tipo de refrigeração do condensador Água do mar Fonte: Eletronuclear 3.4.3 Angra III Angra III é a segunda da série de oito usinas previstas no Acordo Nuclear Brasil-Alemanha. Único projeto nuclear em andamento no país, a usina terá potência de 1405 MW e capacidade de geração superior a 10 milhões de MWh/ano, equivalente ao consumo do Uruguai. As obras de Angra III foram iniciadas em 1984 e paralisadas em 1986, devido à crise econômica que repercutia no Brasil na década de 1980. Em 2007, o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) autorizou a retomada da construção de Angra III e em 2010 o CNEN concedeu a Licença de Construção da usina. No ano de 2013, firmou-se um acordo entre a Eletronuclear e a empresa 43 francesa Areva para o fornecimento de serviços de engenharia e equipamentos importados para Angra III. A decisão do CNPE em retomar as obras de Angra III foi justificada pelo consumo crescente de energia no Brasil, superior ao PIB. As análises dos cenários energéticos nacionais futuros, feitas pelos Planos Decenais de Energia, indicaram a necessidade da expansão dos parques termonucleares, uma vez que as térmicas a gás natural apresentam sérias desvantagens, como a dependência da importação do combustível, a perspectiva do aumento do preço do gás natural e as dificuldades de garantia de suprimento do mesmo. Angra III possui grande semelhança com Angra II e este fato permitiu o aproveitamento de grande parte do projeto de engenharia a ser usado na nova usina. Está prevista para maio de 2018 a entrada em operação de Angra III. 44 O FUTURO DA ENERGIA NUCLEAR NO BRASIL 4.1 Características do sistema elétrico brasileiro Para fins de planejamento e operação, o sistema elétrico nacional é dividido em dois blocos: sistemas isolados e Sistema Interligado Nacional (SIN). O segundo compreende sete subsistemas: Sul, Sudeste/Centro-oeste, Norte, Nordeste, Manaus, Acre e Rondônia. Em dezembro de 2013, o Brasil dispunha de uma oferta total de potência de 132,6 GW, sendo 126,8 GW de capacidade instalada distribuídas em 3097 usinas, e 5,9 GW obtidos via importação. Destes 132,6 GW, 3,3GW são provenientes dos sistemas isolados, 10,4 de APE cativo e 118,9 GW do SIN, conforme pode ser visualizado na tabela 5. Na tabela 6 apresentam-se as participações de cada fonte na capacidade instalada. É interessante se observar a supremacia das hidrelétricas, representando 69,3% da capacidade instalada. Deve-se observar também a participação dos autoprodutor cativo (APE Cativo), em especial na geração térmica. No gráfico 2, visualiza-se a oferta de potência de energia elétrica. Deve-se ressaltar a participação das fontes renováveis na matriz nacional, de aproximadamente 80%, especialmente quando comparada com a média mundial, de 20%. Tabela 5-Oferta de capacidade instalada de geração elétrica segundo diferentes configurações Fonte: Resenha Energética 2013 45 Gráfico 2- Oferta de potência de geração elétrica Fonte: Resenha Energética 2013 Tabela 6-Capacidade instalada de geração elétrica/2013 Fonte: Resenha Energética 2013 O Plano 2015 (Eletrobrás, 1992) estimou em 260 GW o potencial hidrelétrico brasileiro. Destes, 30% corresponde ao potencial aproveitado e os outros 70% encontram-se na Amazônia e no Cerrado. Nessas zonas se apresenta de forma 46 muito nítida o debate acerca da definição de políticas e práticas de manejo ambiental sustentável. Ainda no ano de 2013, a entrada em operação de novas usinas e de novas unidades em usinas em expansão somou 5889 MW. Destes, 2611 MW são provenientes de usinas térmicas a combustíveis não renováveis. Analisando-se os últimos 40 anos, percebe-se que o Brasil apresentou uma queda na participação de petróleo e hidráulica na matriz energética. Observa-se também um aumento na participação do gás natural e de fontes renováveis, como a biomassa e a eólica. Na tabela 7, comparam-se as estruturas da matriz energética nacional. Tabela 7-Comparativo da oferta interna de energia elétrica nacional Fonte Período 1973 2013 Petróleo 7,2% 3,6% Gás 0 11,3% Carvão mineral 1,7% 2,4% Nuclear 0 2,4% Hidráulica 89,4% 70,7% Biomassa/eólica/outras 1,7% 9,6% Total (TWh) 65 610 Fonte: Resenha Energética 2013 47 4.2 Planejamento Energético Por planejamento energético entende-se a determinação da estratégia de expansão do sistema, de forma a atender à demanda futura de energia elétrica, garantindo custos mínimos de expansão, bem como condições para a operação econômica e segura do sistema elétrico. O planejamento do setor energético abrange todo um processo, incluindo estudos para desenvolvimento do setor energético, o levantamento do potencial energético, os estudos comparativos de fontes geradoras de energia e as iniciativas para o gerenciamento da demanda. Para que se determinem a metodologia e o processo de planejamento, bem como o processo de comercialização de energia, faz-se necessário conhecer as características do setor elétrico. Podem-se diferenciar no planejamento de sistemas elétricos duas acepções principais: o planejamento da expansão e o planejamento da operação. A primeira diz respeito à formulação de uma estratégia de expansão, de modo que atenda à demanda projetada de forma segura e econômica, considerando os recursos energéticos e tecnológicos disponíveis. Tem como objetivo a determinação da data de entrada em operação dos empreendimentos necessários para o atendimento do crescimento da demanda de energia. O planejamento de operação visa ao atendimento da demanda, de forma a minimizar o custo de operação para um nível de segurança preestabelecido, diante da estratégia de expansão formulada. No caso brasileiro, em que há predominância da geração hidroelétrica e um grau de regularização variável, torna-se necessário decidir, a cada instante, qual o nível de geração termoelétrica e/ou quanto depleciar os reservatórios. Desta forma, o planejamento da operação envolverá decisões sobre o uso imediato ou futuro do estoque de água, minimizando o valor esperado do custo total e o planejamento de expansão se baseará em decisões e compromissos entre o uso imediato ou futuro dos recursos de capital disponíveis para a expansão do sistema. 48 O planejamento da expansão da oferta de energia é efetuado baseando-se nas normas do CNPE. Assim, para fins de otimização do problema de planejamento, considera-se o momento ideal para expandir a capacidade instalada quando o custo marginal de operação se iguala ao custo marginal de expansão, com risco máximo de déficit permitido em cada subsistema do SIN de 5%. Utiliza-se o modelo NEWARE, com a consideração de 2000 cenários hidrológicos, para realizar as simulações energéticas necessárias tanto às ampliações nas interligações quanto ao ajuste do plano de oferta de energia. Este modelo também é utilizado para o planejamento da operação. É de responsabilidade da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) a realização de estudos, projetos e atividades de planejamento energético, incluindo o tratamento de questões sócio-ambientais, em apoio à execução de atividades na área de planejamento do setor energético sob responsabilidade do MME. Os estudos são unificados no Plano Decenal de Expansão (PDE), cujo horizonte é de 10 anos, e no Plano Nacional de Energia (PNE), com horizonte mínimo de 30 anos. Para o PNE, realizam-se análises de estratégias de expansão das fontes de energia e da rede elétrica, bem como prospecções tecnológicas nas áreas de geração e transmissão de energia. O PDE formaliza o programa de obras de novas usinas e interligações regionais, levando em consideração as estratégias de longo prazo definidas no PNE, além de elaborar estudos complementares de geração, cuja necessidade se define à medida que são realizados os estudos no horizonte decenal. 4.2.1 Plano Decenal de Expansão 2022 Para a elaboração do cenário de referência para o Plano Decenal de Energia2022 (PDE 2022), foram adotadas certas premissas, as quais mantém a possibilidade de alto crescimento econômico brasileiro nos próximos anos. Neste cenário, há a perspectiva de recuperação da economia mundial, ainda que de forma moderada, aumentando a participação dos países emergentes no comércio internacional. Espera-se que, ao longo do horizonte de estudo deste plano, o Brasil mantenha taxas de crescimento da economia superiores à média mundial, assumindo valores entre 4,5% a.a e 5% a.a, conforme pode ser visto na tabela 8. 49 50 Tabela 8-Taxas de crescimento do nível de atividade Fonte: IBGE e FMI/EPE Em relação às premissas demográficas, espera-se um crescimento populacional médio de 0,6%, sendo este resultado maior nas regiões Norte e Centro-oeste. Isso, no entanto, não afeta a estrutura da população, que continuará concentrada nas regiões Sudeste e Nordeste. Prevê-se também que o número de domicílios particulares se elevará em ritmo superior ao crescimento da população do país. Nas premissas setoriais, estima-se queda na participação das indústrias como consequência do crescimento do setor de serviços acima da média do valor adicionado. Nas projeções de consumo e de carga de energia, considerou-se que, até 2022, ocorrerá a interligação do sistema Tucuruí-Macapá-Manaus ao subsistema Norte, bem como a interligação do sistema Boa Vista. Logo, ao longo do horizonte do estudo, estima-se um aumento na capacidade de geração, partindo de 119,5GW para 183,1 GW. Ainda assim, ao se comparar esta projeção com as previstas no PDE 2021, observa-se que a carga de energia verificada em 2012 é 335 MWmédios inferior, como consequência de uma expansão da economia mais modesta que a prevista no plano anterior. Neste horizonte de estudo, pode-se verificar um grande potencial de oferta de energia proveniente de fontes renováveis, Até o final de 2022, estima-se um total de 19917 MW provenientes de novos projetos elétricos a serem viabilizados entre 2018 e 2022. Estima-se que 12965 MW, provenientes de alguns empreendimentos de grande porte, os quais possuem longo período de motorização, estejam disponíveis no final do horizonte do PDE 2022. Dentre as outras fontes renováveis, espera-se uma expansão média anual de 10%, com destaque para as plantas eólicas. 51 No que se refere às plantas térmicas, espera-se que a sua capacidade instalada no SIN seja de aproximadamente 21 GW no final de 2015, em consequência de leilões realizados até esta data. No período compreendido entre 2018 e 2022, estima-se uma expansão de 1500 MW nas regiões Sudeste/Centrooeste e Sul, a fim de atender de forma adequada ao crescimento da carga. Esta expansão, no entanto, depende da disponibilidade de combustível e da competitividade desses projetos em leilões futuros. Para efeitos de simulação e apresentação de resultados, considerou-se que a expansão será feita por termelétricas a gás natural. Em caso de inviabilidade deste combustível, adotar-se-ão outras fontes, como o carvão mineral. A expansão das plantas nucleares se dará exclusivamente pela implantação de Angra III, prevista para 2018. Esta expansão aumentará a potência do parque nuclear existente em 70%. O PDE 2022 cita dois motivos para a expansão das térmicas se restringir a Angra III: a realização de estudos para seleção de novos sítios e os prazos necessários para implantação de novas usinas, estimados em 10 anos e contados a partir da data de definição de sítios para localização da central nuclear e da decisão para o início das medidas efetivas para a sua implantação. No gráfico 3, pode-se visualizar a expectativa de geração termelétrica no horizonte de planejamento do PDE 2022. Gráfico 3-Geração termelétrica estimada Fonte: EPE 52 4.2.2 Plano Nacional de Energia 2030 Para se realizar um estudo prospectivo da demanda de energia, devem-se definir as premissas para o crescimento econômico, uma vez que a correlação entre eles é bastante significativa. Para a elaboração do Plano Nacional de Energia 2030 (PNE 2030), utilizou-se a técnica dos cenários, considerada a mais indicada para estudos cujos horizontes são tão amplos. A construção dos cenários mundiais foi realizada considerando 3 elementos básicos de incertezas: padrão de globalização, estrutura do poder econômico e solução dos conflitos. Diante disso, formularam-se 3 cenários distintos: Mundo Uno: o mais favorável dos cenários. Caracterizado por um equilíbrio de forças na estrutura do poder político e econômico mundial, pelo multilateralismo e pela atenuação de divergências étnicas, religiosas e sociais; Arquipélago: cenário intermediário. Caracterizado por conexões assimétricas, dividindo as nações em blocos em que o regionalismo predomina de forma significativa, e pela apresentação em diferentes estágios, conforme o bloco, das inseguranças devido aos conflitos; Ilha: cenário mais desfavorável, marcado por padrões instáveis nas conexões entre nações, protecionismo, lenta recuperação econômica, devido à rupturas das relações comerciais sino-americanas e alta difusão das inseguranças resultantes de conflitos religiosos, étnicos e sociais. No gráfico 4, pode-se observar a estimativa do crescimento econômico mundial. Deve-se destacar que em nenhum dos casos há o retorno ao crescimento vigoroso observado nos anos anteriores ao estudo. 53 Gráfico 4-Taxa de crescimento do PIB mundial: Período 2005-2030 Fonte: EPE A elaboração dos cenários nacionais considerou as potencialidades e os obstáculos a se superar diante dos cenários mundiais anteriormente descritos. Os 6 cenários nacionais concebidos seguiram a orientação estratégica que considera o desenvolvimento das competências nacionais, de forma a aproveitar as oportunidades e se defender das ameaças presentes no ambiente mundial. Destes 6 cenários, 2 foram excluídos na formulação do planejamento, uma vez que a análise de todas as opções não resultaria em benefícios em termos de posicionamento estratégico. Os 4 cenários restantes foram associados aos 3 -se notar que em nenhum dos cenários admitiu-se crescimento do PIB nacional inferior ao mundial, conforme pode-se observar no gráfico 5. 54 Gráfico 5-Taxa de crescimento do PIB: comparação entre Brasil e Mundo no período 2005-2030 Fonte: EPE Em relação à estrutura setorial do PIB, espera-se queda na participação da indústria, como consequência do aumento da participação do setor de serviços. O setor primário não deverá diminuir a sua parcela na formação do PIB, em virtude do seu atual estágio de desenvolvimento no país e a reconhecida vantagem comparativa da agropecuária. Quanto às premissas demográficas, projeções do IBGE estimam que, em 2030, a população brasileira ultrapasse 238 milhões, com taxa de crescimento médio de 1,1% a.a. Combinando a premissa demográfica com as hipóteses formuladas para a expansão da economia, tem-se que a renda per capita nacional pode evoluir, até 2030, entre 1,2% e 4,1% a.a, dependendo do cenário adotado. Para tornar o planejamento energético mais eficaz, é necessário que se identifiquem os determinantes de maior relevância para a evolução do setor de energia dentro do horizonte estudado. Analisando-se o contexto energético atual, o PNE 2030 indica os preços internacionais do petróleo e do gás natural, o desenvolvimento tecnológico e os impactos ambientais como os principais condicionantes da matriz energética nacional. Estima-se que, em 2030, o consumo energético estará entre 950 e 1250 TWh/ano. Estes valores, em especial quando comparados com o consumo de 55 2013, de 516,3 TWh, indicam a necessidade de investimentos pesados na expansão da oferta da energia elétrica. Caso esta expansão priorize as hidroelétricas observa-se que, mesmo com a instalação adicional de 120 GW, elevando para 80% o uso do potencial desta fonte, ainda assim haveria o risco do não atendimento da demanda, indicando o esgotamento desta fonte. O suprimento crescente da fonte hidrelétrica, segundo PNE 2030, será possível até 2015, caso se explore o potencial da bacia Amazônica, nos locais onde se acredite não existir impacto ambiental relevante, e das demais bacias, até um índice de 70% de utilização. A partir de 2010, outras fontes aumentarão a participação no quadro de geração de eletricidade, utilizando-se, num primeiro momento, o gás natural, que apresenta capacidade complementar em média de 480 TWh/ano, o que possibilita o suprimento da necessidade de energia elétrica, e num segundo momento, a partir de 2020, outras fontes renováveis, como a eólica e a solar, que devem apresentar preços mais competitivos e tecnologias mais maduras. A geração nuclear, segundo o PNE 2030, é uma alternativa em uma perspectiva de longo prazo que não pode ser descartada. No horizonte de estudo do PNE 2030, o potencial de geração de energia por esta fonte é dado pela potência que poderia ser instalada a partir da disponibilidade do recurso, ou seja, do tamanho das reservas, do consumo do combustível, do tempo de operação das usinas e do regime operativo. Desta forma, para efeito do cálculo do potencial estimado, consideraram-se apenas as reservas nacionais de urânio, as quais foram classificadas conforme o custo estimado de operação, gerando 3 cenários possíveis: Cenário 1: custo de exploração inferior a US$ 40/kg U 3O8; Cenário 2: custo de exploração entre US$ 40 e US$ 80/kg U3O8; Cenário 3: custo de exploração superior a US$ 80/kg U3O8. Assim, adotando-se o cenário 1, potência unitária de referência de 1000MW estima-se que, até o final de 2030, haverá expansão da oferta nuclear em 4 mil MW, conforme tabela 9. 56 Tabela 9-Potencial de geração nuclear Cenário Volume de Potencial Potencial novas usinas reservas total T U3O8 MW MW Unidades 1 66200 7800 4500 4 2 177500 20800 17500 17 3 309370 36400 33000 33 Fonte: PNE 2030 Deve-se observar que, apesar do grande potencial, a participação efetiva desta fonte na matriz energética brasileira depende do exame de outros aspectos, como a competitividade relativa a outras fontes, estratégia nacional para diversificação da matriz, capacitação da indústria nacional, aspectos ambientais e regulatórios, dentre outros. 4.3 Justificativas para o incentivo da geração nuclear O Brasil é a sétima economia do mundo e o décimo consumidor mundial de energia. Conforme já citado, sua matriz energética é fortemente apoiada na geração hidrelétrica, correspondendo a 69,3%. No entanto, conforme avaliação do PNE 2030, há indícios de esgotamento desta fonte, sendo necessários investimentos na expansão das plantas térmicas. Diante disso, para se garantir o atendimento da demanda energética nos próximos anos e manter baixos os índices de emissão de gases do efeito estufa, conforme solicitado pela ONU, a geração nuclear se apresenta como uma alternativa que não pode ser desprezada. Conforme estudos do PNE 2030, o potencial de geração de energia por esta fonte é dado pelo tamanho das reservas de urânio. Atualmente, o Brasil possui a 6ª maior reserva de urânio, com reservas nos estados da Bahia, Ceará, Paraná e Minas Gerais, sendo as duas primeiras as principais. A única mina de extração no país é a de Caetité, na Bahia. A jazida de Santa Quitéria, embora possua reservas geológicas de 142,5 mil toneladas de urânio, sendo a maior reserva 57 nacional, tem a sua viabilidade econômica dependente da exploração do fosfato associado ao combustível. É importante se ressaltar que apenas 25% do território nacional foram prospectados. Ainda segundo o PNE 2030, espera-se que até 2030 sejam construídas de 4 a 8 usinas termonucleares. Com base nesse planejamento, a Eletrobrás Eletronuclear iniciou a seleção de sítios propícios para abrigar as novas centrais nucleares. Uma vez que o documento aponta o Nordeste como prioridade na construção das usinas, o estudo foi iniciado nesta região, focando no litoral entre Recife e Salvador, os dois maiores centros de carga do Nordeste, e no vale dos grandes rios que desembocam nesse litoral. Espera-se que metade da potência a se instalar seja alocada no Nordeste, ficando a outra metade no Sudeste. Quando comparada com as térmicas convencionais, devem-se citar 3 características principais da geração nuclear: a elevada densidade energética, explicada no capítulo 2, o preço do combustível e o fator de capacidade da usina. Conforme determinação da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), o valor da receita fixa da Eletronuclear pela venda de energia, em 2014, será de R$ 2,146 bilhões. Ao se dividir a receita fixa pela energia contratada para ser comercializada, obtém-se preço médio de R$156,79/MWh. A título de comparação, no 8º Leilão de Energia Nova, realizado em agosto de 2009, e um dos últimos em que foi vendida energia proveniente de termelétricas convencionais, o preço médio da energia foi de R$ 144,60/MWh. Pode-se também citar que o preço de venda da energia produzida por Angra I e II, em dezembro de 2013, foi de R$ 135,69/MWh, aproximadamente 67% inferior à média do preço de um grupo nos últimos 2 anos de 15 termelétricas despachadas na base pelo Operador Nacional do Sistema (ONS), da ordem de R$ 410/MWh. (Eletronuclear, 2014) O fator de capacidade, parâmetro de avaliação essencial para sistemas com predominância da geração hidrelétrica e que caracteriza o comportamento das usinas, é definido como a relação entre a geração da usina e sua potência instalada. Usinas nucleares possuem fator de capacidade médio de 85%, contra 40% das termelétricas convencionais. Isso significa que a geração nuclear opera 58 por mais de 7400 horas/ano, enquanto as demais usinas não chegam a operar 3500horas/ano. Entretanto, o longo prazo para construção de usinas de grande porte, como Angra II e III, somadas a descontinuidades políticas, que resultaram na paralisação das obras destas duas usinas, a produção de rejeitos radioativos e o risco, tanto de acidentes quanto de proliferação de armas nucleares, são fatores que geram desconfianças quanto à expansão do parque nuclear. Com os eventos de Fukushima, a Eletrobrás Eletronuclear, após a realização de revisões técnicas, iniciou as ações para reduzir riscos associados à ocorrência de acidentes severos. Deve-se ressaltar que a probabilidade de ocorrência de um acidente como o de Fukushima em território nacional é muito baixa, uma vez que o país se encontra distante das bordas da placa tectônica que o abriga. O risco de proliferação de armas nucleares poderia ser eliminado com a adoção do tório como combustível, uma vez que, durante a operação da usina, ele não gera plutônio ou outros materiais que podem se destinar a armas nucleares. Além disso, esse combustível é 4 vezes mais abundante que o urânio no planeta e os depósitos conhecidos em vários países, inclusive no Brasil, poderiam fornecer energia por milhares de anos. O longo tempo de construção de usinas nucleares pode ser reduzido caso se optasse pela instalação de usinas com reatores de pequeno porte. Essa decisão possui uma série de vantagens, como a possibilidade de desenvolvimento de tecnologia própria, com possibilidades de transformar o país em fornecedor desse tipo de serviço para países de economias menores, como o fez a Coreia do Sul; melhor atendimento a locais hoje abastecidos por sistemas isolados; utilização do aprendizado obtido com usinas anteriores; padronização e serialização de sistemas e componentes de usinas, dentre outras. Também deve se destacar que o Brasil possui como consequências do Programa Nuclear Paralelo o domínio do ciclo do combustível nuclear e o aprofundamento dos conhecimentos da tecnologia de reatores nucleares, e que realizou estudos visando ao desenvolvimento de reatores de pequeno porte para propulsão naval. 59 Analisando-se as políticas energéticas dos países citados no capítulo 2, percebe-se a eficácia da expansão dos parques nucleares: a política nuclear francesa permite que o país possua os títulos de maior exportador europeu de energia e de país que gera a energia mais barata e com menor emissão de gases do efeito estufa; o Japão, país altamente dependente de importação de fontes primárias de energia e exportador de tecnologia nuclear, ainda não decidiu pelo abandono completo da geração nuclear; a Alemanha, país que possui matriz energética diversificada e optou pelo desligamento de todos os reatores, não se encontra completamente livre da geração nuclear, uma vez que passou a importar grandes quantidades de energia produzidas por esta fonte, além de sofrer como consequências do abandono desta fonte o aumento nos preços da energia, a perda de empregos e de competitividade nas indústrias, além de instabilidades nos sistemas de produção e distribuição de energia; a China incentiva a geração nuclear como forma de se proteger da oscilação dos preços de combustíveis fósseis; a Coreia do Sul incentiva a geração nuclear, a qual possui altos índices de aprovação no país, e tornou-se exportador de tecnologia de reatores, apesar de depender da importação de fontes primárias de energia; e Estados Unidos, que retomou a expansão desses parques, devido às vantagens desta fonte. Diante da comprovação mundial da viabilidade da implantação da geração nuclear, associadas ao potencial brasileiro nesta área, percebe-se a viabilidade da expansão dos parques nucleares no país. A adoção desta medida possibilitaria ao Brasil não somente a proteção contra flutuações nos preços de combustíveis fósseis e de gás natural, como também contribuiria para o atendimento à demanda energética futura. Além disso, com a expansão do número de usinas, o Brasil poderia assumir uma posição de maior destaque no campo nuclear, seja através da exportação de combustível enriquecido, seja pela exportação de reatores de pequeno porte, caso adote a ideia de desenvolvimento de uma linha própria de reatores, aproveitando a experiência que já possui. 60 4. ESTUDO DE CASO: IMPLANTAÇÃO DE USINA NUCLEAR NO CEARÁ 5.1 Introdução Conforme a Eletronuclear, espera-se a implantação de duas usinas nucleares no Nordeste brasileiro até 2030. Diante desta expectativa, realizou-se uma análise comparativa entre os custos, para o Sistema Elétrico, correspondentes a uma usina nuclear fictícia e usinas a carvão, tomando como referência as UTE Pecém I e II. Para este estudo, considerou-se a metodologia adotada por (Mathias;Lima, 2007). 5.2 UTE Pecém I e II As UTE Pecém I e II localizam-se em São Gonçalo do Amarante, a 59km de Fortaleza e ao lado do complexo portuário e industrial do Pecém. As usinas, integrantes do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do Governo Federal, possuem potencial instalado de 1085 MW, sendo 720 MW provenientes de Pecém I, também conhecido como Energia Pecém, e os outros 365 MW advindos de Pecém II. Metade da participação dos negócios é detida pela MPX. Um total de 891 MW médios foi contratado nos leilões de energia nova A-5, de setembro e outubro de 2007, em contratos de 15 anos. As usinas, alimentadas a carvão mineral importado da Colômbia, produzem energia capaz de atender a 1,5 milhão de casas populares, e se posicionam como uma das usinas térmicas mais baratas do subsistema Nordeste, com Custo Variável Unitário (CVU) de R$ 104,62, segundo o ONS. Pecém II possui renda fixa anual de R$ 269,2 milhões, enquanto a Pecém I é de R$ 567,2 milhões. 5.3 Metodologia do estudo A metodologia abordada nesse estudo envolve a análise dos custos associados à produção e contratação de energia das usinas que participam dos leilões de energia nova, realizados pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE). Esses custos, integralmente assumidos pelas distribuidoras e repassados aos consumidores finais, são relativos aos riscos hidrológicos, e 61 correspondem aos custos variáveis de operação e manutenção e aos custos decorrentes a exposições financeiras no mercado de curto prazo. Este último, no entanto, não foi considerado na avaliação devido à dificuldade de previsão dos valores do Preço de Liquidação de Diferenças (PLD) e ao fato que o PLD é igualmente aplicável aos desvios de suprimento de todas as termelétricas. Desta forma, determina-se o custo de produção e contratação de energia elétrica de plantas térmicas, por unidade de energia, como: (2) sendo: CT: custo total por energia contratada [R$/MWh] RF: receita fica anual [R$/ano] CVU: custo variável unitário [R$/MWh] EC: energia contratada [MWh/ano] EG: energia gerada [MWh/ano] A avaliação dos custos correspondentes às UTE Pecém I e II é feita baseado no fator de utilização das mesmas, calculado como a razão entre a energia gerada e a energia contratada. Para se fazer a comparação dos custos com as UTE Pecém I e II, adotou-se uma usina nuclear hipotética de 1000MW com a mesma energia contratada das termelétricas de referência. Tomando-se como referência os valores de tarifa estimados pela Eletronuclear para a comercialização da energia de Angra III, tem-se os seguintes dados: Potência Nominal: 1000 MW Energia contratada: 891 MWmédios Fator de capacidade: 89,1% Tarifa prevista: R$ 140,00/MWh Custo do combustível: R$ 22,00 Deve-se observar que o custo com combustível já está considerado na tarifa, logo este não é classificado como um custo adicional para o sistema elétrico. 62 5.4 Resultados No gráfico 6, pode-se observar os resultados do estudo. Verifica-se que, como os custos da usina nuclear fictícia independem do custo do combustível, a sua curva corresponde a um segmento de reta paralelo ao eixo horizontal. Conforme dados do Boletim Diário de Operação do ONS, a energia gerada pelas UTE Pecém I e II é de 731,62 MW, com fator de utilização de 86,64% e CT=R$207,13/MWh. Desta forma, pela análise do gráfico, pode-se constatar que os custos da usina nuclear fictícia são inferiores, comprovando a viabilidade econômica desta fonte de geração. Gráfico 6-Comparação dos custos Fonte: O autor 63 5. CONCLUSÃO A demanda crescente por energia, a volatilidade dos preços de combustíveis fósseis e gás natural, a segurança do abastecimento de energia e as preocupações com as mudanças climáticas fazem da energia nuclear uma alternativa que não pode ser descartada no planejamento energético a longo prazo. Esse fato se torna evidente ao se constatar que, apesar do acidente de Fukushima, a maioria dos países produtores de energia nuclear optou por não abandoná-la. Outros, que ainda não a incluíram nas suas matrizes energéticas, pretendem fazê-lo futuramente. Os poucos países que decidiram desativar todas as suas usinas não se encontram completamente livres de questões nucleares, uma vez que devem lidar com o descomissionamento e gestão dos resíduos. A perspectiva de alterações na matriz energética brasileira, diante do indício de esgotamento da fonte hidrelétrica, torna necessário maior incentivo à geração termelétrica. Nesse ponto, deve-se incentivar a retomada do Programa Nuclear Brasileiro, dado o enorme potencial que o país possui. Essa retomada, além de benefícios no campo energético, pode dar ao país uma posição de maior relevância dentro do setor energético, por representar oportunidade de desenvolvimento de uma tecnologia nacional, como o fez a Coreia do Sul. Além disso, conforme comprovado pelo estudo de caso realizado no capítulo 5, tomando-se como variáveis o fator de utilização e o custo associado à produção e contratação de energia das usinas, é mais viável a implantação de plantas nucleares. Embora sejam fortes as críticas à geração nuclear e o país possua poucos incentivos para aumentar a participação desta fonte na sua matriz energética devido a diversos fatores, como a excelente oportunidade de expansão da produção de energia por meio de fontes renováveis, a geração térmica será indispensável, especialmente devido a sua confiabilidade. Para tanto, deve-se, primeiramente, desmistificar a geração nuclear, abordando a avaliação de políticas energéticas de outros países e comparando as alternativas para o atendimento energético à população nacional. Com um melhor esclarecimento das características das opções que o país dispõe nesse setor, pode-se realizar um amplo debate, a fim de se fazer a melhor escolha para a nação. 64 6.1 Trabalhos futuros Recomendam-se como trabalhos futuros os seguintes temas: Influência da expansão do parque termonuclear nas tarifas energéticas; Avaliação do uso do tório como combustível, comparando-o tanto com o urânio quanto com os combustíveis convencionais; Análise das mudanças nos despachos de usinas térmicas. 65 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS PRÄSS, A.R. Energia Nuclear Hoje: Uma Análise Exploratória. Porto Alegre, 2007. FLORIPES, F.V. Economia e Política da Energia Nuclear no Cone Sul: Os caminhos Cruzados de Brasil e Argentina. Florianópolis, 2009. MATHIAS, S.G.; LIMA, A.G.C. Análise comparativa entre os custos correspondentes às usinas termelétricas vencedoras do leilão de energia nova realizado em 16/10/07 e os custos previstos para a usina nuclear Angra 3. Economia e Energia, n. 65, 2007/2008. 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