o papel da escola inclusiva - Faculdade Cenecista de Vila Velha
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24 O PAPEL DA ESCOLA INCLUSIVA: UM OLHAR SOBRE O ALUNO COM SÍNDROME DE GILLES DE LA TOURETTE Camila Reis dos Santos 34 Resumo: A Síndrome de Gilles de La Tourette constitui-se um desafio no processo ensinoaprendizagem não só por parte dos alunos que possuem este tipo de patologia, como também para os professores, que precisam estar devidamente capacitados para a realização satisfatória deste trabalho inclusivo. Este estudo tem como objetivo geral entender os aspectos históricos, definição, características sintomáticas e diagnósticas da doença, no intuito de repensar as práticas realizadas no cotidiano escolar, em prol dos alunos com Tourette. Trata-se de uma pesquisa bibliográfica buscando mapear o que já foi escrito sobre o tema e trazer reflexões no que tange o papel da escola na formação e constituição do sujeito com esse tipo de patologia. Palavras-chave: Gilles de La Tourette. Ensino-aprendizagem. Trabalho inclusivo. Pesquisa bibliográfica. Abstract: The Gilles de La Tourette syndrome poses a challenge in the teaching-learning process, not only to students who suffer from this type of pathology, but also to teachers, who need to be able to deal satisfactorily with inclusion students. The general objective of this study is to understand historical aspects, the definition and the symptomatic and diagnostic characteristics of this disorder in order to rethink everyday school practices, for the sake of Tourette students. Through a bibliographical research, we try to map out what has been written so far, as well as to bring reflections on the role of the school regarding the formation of individuals with this type of pathology. Keywords: Gilles de La Tourette; Teaching-Learning; Inclusive Work; Bibliographical research. Breve análise histórica Os sons que vocês ouviram são da Tourette que tenho desde os seis anos. Estou aqui hoje por causa do amor e do apoio de muitas pessoas. Minha família. Minha família da escola. Meus alunos e todos os meus amigos. Dedico esse prêmio a todos vocês e dedico também ao mais severo e dedicado professor que já tive, minha companheira constante, minha Tourette. A Tourette me ensinou a lição mais importante de todas: nunca desistir de alcançar os sonhos. Seja trabalhar, jogar, encontrar um amor. É isso. Lidar com a Tourette me 35 deu uma grande lição! Licenciada em Ciências Biológicas pela Universidade Federal do Espírito Santo – UFES. Especialista em Educação Inclusiva pelo Instituto Superior de Educação e Cultura Ulysses Boyd (ISECUB). Mestranda em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Espírito Santo – UFES. 35 Trecho extraído do filme O líder da classe, do diretor Peter Werner, produzido em 2008 nos EUA. O filme conta a história de Brad Cohen, um homem que com seis anos de idade começou a manifestar tiques, e aos doze anos, por meio da observação de sua própria mãe e do que ela leu 34 Revista FACEVV / ISSN 1984-9133 / Vila Velha / Número 8 / Jan. / Jun. 2012 25 Em 1825, o médico francês Jean Marie Itard, descreveu inicialmente uma paciente com tiques e comportamentos, característicos da Síndrome de Gilles De La Tourette. A paciente era uma nobre francesa, a Marquesa de Dampièrre, portadora desde os sete anos, de tiques corporais constantes. A nobre emitia sons semelhantes a latidos e proferia obscenidades36 que a forçaram a viver reclusa pela maior parte de sua vida. Somente em 1884, esta patologia recebeu o nome de síndrome de Gilles De La Tourette, quando o aluno Gilles de La Tourette, no Hospital De La Salpêtrière, relatou a patologia como um distúrbio caracterizado por tiques múltiplos, incluindo o uso involuntário ou inapropriado de palavras obscenas (coprolalia) e a repetição involuntária de um som, palavra ou frase de outrem (ecolalia), baseado nos relatos do próprio médico Itard37.Desde sua primeira descrição, muitos aspectos relacionados à patologia de Tourette, permanecem obscuros. O fato justifica-se pelo desconhecimento de certos aspectos da doença, por parte de muitos profissionais da área da saúde. Aspectos estes, vinculados às características clínicas da Tourette e inconsistência em admitir causa orgânica para o transtorno. Ao final do século XIX e início do XX, com o advento da psicanálise, foram elaboradas hipóteses psicogênicas para a síndrome. Estas permaneceram em voga até que os avanços da psicofarmacologia, na década de 1950, permitiram a elaboração de hipóteses biológicas38. O aumento da incidência da patologia de Tourette, nos últimos anos, despertou maior interesse de pesquisa e estudos acerca da doença. A grande em livros, foi diagnosticado com Síndrome de Tourette. O filme é baseado em fatos reais e inspirado no livro homônimo publicado por Cohen. Brad realiza seu sonho de lecionar para a educação infantil e ganha o prêmio de Professor do ano na única escola onde lhe deram oportunidade de trabalho. 36 Coprolalia: impulso mórbido que leva a proferir obscenidades, um raro sintoma da Síndrome de Tourette. Os números publicados variam muito, mas relativamente poucas pessoas com a Síndrome de Tourette apresentam coprolalia, que atinge mais homens do que mulheres. Normalmente, aparece entre os quatro e sete anos de idade, após o início de tiques, atinge o limite na adolescência e diminui consideravelmente na fase adulta. Já foram documentados casos de pessoas surdas, com coprolalia relacionada à Síndrome de Tourette, usando sinais para xingar excessivamente. 37 LOUREIRO N. I. V. et al. Tourette: por dentro da síndrome. Revista de psiquiatria clínica. V. 32, n 4. 2005. Disponível em: http://www.hcnet.usp.br /ipq/revista/vol32/n4/218.html. Acesso em 13 de março de 2012. 38 HOUNIE, A. G.; PETRIBÚ, K. Tourette's Syndrome - bibliographic review and case reports. Revista Brasileira de Psiquiatria, 1999, vol.21, n. 1. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516:44461999000100011&lng=en&nrm=i sso. Acesso em 14 de março de 2012 Revista FACEVV / ISSN 1984-9133 / Vila Velha / Número 8 / Jan. / Jun. 2012 26 relação etiológica da síndrome com o Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC) e com o Transtorno de Hiperatividade com Déficit de Atenção (TDAH), segundo Houni; Petribú tem despertado curiosidade nos profissionais da área da saúde, levando-os a questionar sobre uma possível base neurológica comum entre os três transtornos. No que tange a relação direta entre a Síndrome de Tourette e o TDAH, de acordo com Castilho; Castilho; Hounie39, temos que: O TDAH tem sido encontrado em 43 a 83% dos pacientes com ST. Além disso, até 12% dos adultos com TDAH e até 50% das crianças com TDAH apresentam tiques ou história familiar de transtorno de tiques crônicos. Estudos que tratam da relação estreita entre Tourette e o Transtorno Obsessivo-Compulsivo apontam que a frequência de TOC em pacientes com ST tem aumentado significativamente quando comparados com grupos de pessoas sem a síndrome. Observa-se uma frequência maior que 40% de TOC em pacientes touretticos. São encontradas taxas em torno de 23% de TOC em pacientes com Tourette, enquanto na população geral esta taxa alcança apenas 3%.40 Definição, características sintomáticas e diagnóstico da Síndrome de Tourette A Síndrome de Tourette é um distúrbio genético, de natureza neuropsiquiátrica, caracterizado por fenômenos compulsivos (perturbações), que, muitas vezes, resultam em uma série repentina de múltiplos tiques motores e um ou mais tiques vocais, durante pelo menos um ano, tendo início antes dos 18 anos de idade.Ramalho et al41 nos diz que Segundo a Associação de Psiquiatria Americana (2002)42, esta perturbação tem como critérios de diagnóstico os seguintes: (1) em CASTILHO, A. R. G. L.; CASTILHO, J. R.; HOUNIE, A. G. Déficit de atenção, hiperatividade e tiques: existe uma relação? In: HOUNIE, A. G.; MIGUEL E., org. Tiques Cacoetes, Síndrome de Tourette: um manual para pacientes, seus familiares, educadores e profissionais de saúde. Porto Alegre: Artmed, 2006. 40 ALMEIDA, A. G. et al. Tiques, cacoetes, manias, dúvidas e obsessões: existe uma relação? In: HOUNIE, A. G.; MIGUEL E., (Org.). Tiques Cacoetes, Síndrome de Tourette: um manual para pacientes, seus familiares, educadores e profissionais de saúde. Porto Alegre: Artmed, 2006. 41 RAMALHO, J. et al. Intervenção educativa na perturbação Gilles De La Tourette. Revista Brasileira de Educação Especial, 337 a 346. V. 14, n. 3. 2008. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rbee/v14n3/v14n3a02.pdf. Acesso em 16 de março de 2012. 42 ASSOCIAÇÃO PSIQUIATRIA AMERICANA. Manual de diagnóstico estatístico das perturbações mentais: DSM-IV-TR. Lisboa: Climepsi, 2002. 39 Revista FACEVV / ISSN 1984-9133 / Vila Velha / Número 8 / Jan. / Jun. 2012 27 algum momento durante a doença estão presentes múltiplos tiques motores e um ou mais tiques vocais, ainda que não necessariamente de modo simultâneo; (2) os tiques ocorrem muitas vezes durante o dia (normalmente em acessos) quase todos os dias ou intermitentemente durante um período de mais de 1 ano e durante este período de tempo, nunca há um período livre de tiques superior a mais de 3 meses consecutivos; (3) o início é anterior aos 18 anos de idade e não é devida a efeitos fisiológicos diretos de uma substância (por exemplo, estimulantes) ou a um estado físico geral (por exemplo, doença de Hungtington ou encefalite pós-viral). Os tiques característicos de Tourette podem ser classificados em motores ou vocais e ainda em segunda instância em simples e complexos. Segundo Loureiro et al43 , os tiques motores classificam-se de acordo com o grupamento muscular envolvido. Os tiques motores simples caracterizam-se por movimentos abruptos, repetidos e sem propósito, envolvendo contrações de grupos musculares funcionalmente relacionados (por exemplo, piscar os olhos e movimentos de torção de nariz e boca). Os tiques motores complexos são mais lentos, envolvem grupos musculares não relacionados funcionalmente e parecem propositais. Os tiques motores complexos incluem imitação de gestos realizados por outrem, sejam eles comuns (ecocinese) ou obscenos (ecopraxia) e a realização de gestos obscenos (copropraxia). São frequentemente observados compulsões e gestos balizados, simétricos ou mesmo movimentos violentos com arremesso de objetos. Os tiques vocais simples mais comuns traduzem-se em coçar a garganta, fungar, gritar ou grunhir. Os tiques vocais complexos definem-se pela coprolalia (uso involuntário ou inapropriado de palavras obscenas), palilalia (repetição de palavras ou frases) e ecolalia (repetição involuntária das frases de outras pessoas). Os tiques podem ser exacerbados por situações de ansiedade e/ou de tensão emocional, podem ser atenuados pelo repouso, por situações que exigem concentração e podem ser suprimidos pela vontade do sujeito por segundos ou horas, sendo seguidos, depois, por exacerbações secundárias 44. Cerca de um terço dos pacientes apresenta remissão completa ao final da adolescência, outros apresentam melhora dos tiques e o restante continua sintomático durante a vida adulta45. No que tange o diagnóstico dessa síndrome, este é feito com base na análise 43 Loureiro et al 2005, RAMALHO et al, 2008 45 HOUNIE; PETRIBÚ, 1999 43 44 Revista FACEVV / ISSN 1984-9133 / Vila Velha / Número 8 / Jan. / Jun. 2012 28 de sinais e sintomas característicos e pela história de surgimento desses sintomas46. Ainda não são existentes testes laboratoriais específicos que confirmem o diagnóstico da patologia, apenas exames complementares que podem servir de suporte para descartar outros distúrbios que possuam sintomas semelhantes. Um diagnóstico precoce de um paciente com Tourette nem sempre se faz ocorrer, pois seus sintomas são comumente atribuídos a transtornos psiquiátricos. Infelizmente, diagnósticos errôneos e/ou demorados em pacientes com essa síndrome, podem ocasionar danos irreversíveis como tratamentos dispendiosos e desnecessários. Entretanto, segundo Braunwald et al47, algumas características peculiares e o quadro clínico do paciente auxiliam no diagnóstico conclusivo da síndrome de Tourette, onde sintomas como: a presença de múltiplos tiques motores e vocais, com início antes dos 18 anos de idade, sem origem em nenhuma resposta fisiológica (por exemplo, uso de estimulantes), com ocorrências diárias, estendendo-se por mais de um ano e com comprometimento social, ocupacional e/ou emocional, tornam-se decisivos para a definição do quadro patológico. Tratamento O tratamento dessa síndrome consiste em duas abordagens associadas: o tratamento psicossocial e o farmacológico. Antes de iniciá-lo, deve-se fazer uma avaliação dos tiques quanto à localização, frequência, intensidade, complexidade, e interferência na vida diária. O ambiente escolar, familiar, os relacionamentos, os fenômenos associados devem ser investigados e analisados. Faz-se necessário um julgamento criterioso quanto à necessidade de medicação. Até o presente momento, não há tratamento curativo, sendo o medicamento útil no alívio dos sintomas 48 . O tratamento psicológico inclui orientação aos pais e familiares e aqueles que convivem com a criança, como seus educadores. É importante fornecer informações a respeito da doença, suas características e o modo de lidar com o doente. O papel da escola e o aluno com Síndrome de Tourette LOUREIRO et al, 2005 BRAUNWALD, E.; et al. - Harrison Medicina Interna, 15th edition. McGraw-Hill Interamericana do Brasil, Rio de Janeiro, 2002 48 HOUNIE; PETRIBÚ, 1999 46 47 Revista FACEVV / ISSN 1984-9133 / Vila Velha / Número 8 / Jan. / Jun. 2012 29 A uma certa altura da vida, provavelmente depois que tiver passado boa parte dela, você abrirá os olhos e se verá por aquilo que é, especialmente por tudo que a tornou diferente das chatices das pessoas normais. E você dirá a si mesma “Eu sou esta pessoa”. E ai, nessa afirmativa, haverá uma espécie de amor49. A escola historicamente se caracterizou por um modelo de educação que delimitava a escolarização como privilégio de um grupo, uma denotação de exclusão que foi legitimada nas políticas educacionais que reproduziam convenção de ordem social. A partir do processo de democratização da escola, evidencia-se o paradoxo inclusão/exclusão quando os sistemas de ensino universalizam o acesso, mas continuam excluindo indivíduos 50 e grupos considerados fora dos padrões 51 homogeneizadores da escola. . De acordo com Ramalho et al . Todas as situações e comportamentos que apresentam características que não se assemelham aos modelos tidos como padronizados são vistos com mais atenção e são alvo de referencial de diferença. As crianças que apresentam comportamentos vistos como diferentes/desajustados, fora e dentro da sala de aula, são crianças em elevado risco de virem a manifestar um rendimento escolar inferior ao esperado. As crianças com a síndrome de Gilles de la Tourette quando entram formalmente na fase escolar, pela tipologia e sintomatologia desta perturbação, nomeadamente em termos posturais, que se traduz em dificuldades em permanecer sentado durante determinados períodos de tempo, em obedecer a regras e a padrões comportamentais adequados - o que acaba por resultar, normalmente, em dificuldades de relacionamento com os pares e com as figuras significativas - são crianças em elevado risco de virem a manifestar um rendimento escolar inferior ao esperado, daí que uma intervenção adequada tende a diminuir ou mesmo erradicar Trecho extraído do filme “A menina no país das maravilhas” do diretor Daniel Barnz, produzido em 2008 nos EUA. O filme relata a história de Phoebe Lichten, uma criança que ao longo da trama descobre que tem Síndrome de Tourette. Ela vive em um mundo do país das maravilhas e ao mesmo tempo no mundo dos adultos aonde ela tem que saber lidar com si mesmo, o que a deixa com muito medo e transtornada. As inscrições para a peça de teatro "Alice no pais das Maravilhas" iniciam em sua escola e com o sonho de participar a menina fica indecisa em se inscrever pelo a fato de ser sempre rejeita pelos colegas de classe. O seu comportamento piora a cada dia, o que deixa os seus pais mais preocupados. Eles tentam ajudar a filha, mas Phoebe se sente mais segura no seu mundo de fantasias e aos poucos a realidade começa a se confundir com o seu mundo de sonhos. 50 SÁ, E. D. de; CAMPOS, I. M. de; SILVA, M. B. C. Atendimento Educacional Especializado: Deficiência Visual. Brasília: SEESP⁄ SEED⁄ MEC, 2007. 51 RAMALHO et al 2008, p.02: 49 Revista FACEVV / ISSN 1984-9133 / Vila Velha / Número 8 / Jan. / Jun. 2012 30 as problemáticas escolares associadas.52 . Gomes53, através de sua pesquisa com um aluno da rede pública regular de ensino, diagnosticado com Tourette, conclui em sua análise que: O aluno com ST é alvo de preconceito, de estigmatização, carregando o estereótipo de louco por parte de seus colegas, e eventualmente por parte de professores. Isso chega a ser percebido e incomodá-lo a tal ponto que, às vezes, ele não quer ir para escola, o que pode trazer um prejuízo em sua aprendizagem. Através de sua pesquisa, Gomes , nos mostra claramente a importância de prosseguirem estudos no sentido de maior busca de conhecimentos sobre as possíveis manifestações de preconceito perante os comportamentos que a Tourette induz, particularmente devido a serem manifestações que tangenciam o problema da indisciplina, muito presente em nossas escolas. O drama e a solidão de uma pessoa que é ridicularizada, estigmatizada, desqualificada, alvo, enfim, de todo um rosário de situações adversas para qualquer processo de aprendizagem, particularmente se o que provoca tal martírio social for involuntário, como na Síndrome de Tourette, é suficientemente intenso e contundente. Mostra-se, entretanto, um território fértil de lições sobre a importância de adequadas intervenções no contexto escolar, fazendo com que persista a necessidade de ampliarmos o conhecimento com pesquisas sobre esse tema, pois, entre ganhos e perdas, o aluno está frequentando a escola regular e ambos estão vivendo o desafio da inclusão, embora ainda muito seja necessário para melhorar tal convivência. Segundo Hounie et al54, a participação da família contra a adversidade e o auxílio mútuo à pessoa com Tourette nos momentos mais difíceis, costuma ser determinante de um melhor prognóstico. Os pais devem conhecer a perturbação de forma clara para auxiliarem o filho neste processo. Da mesma forma a escola, segundo Ramalho et al , deve propiciar o convívio com a diferença, em que a diferença seja percebida com algo natural (resultante da RAMALHO, et al, 2008.. GOMES, M. de C. O. Quando a gente não entende das coisas, a gente não sabe lidar com elas: estudo de caso de um aluno com Síndrome de Tourette cursando o ensino público regular. 2008. Dissertação (Mestrado em Distúrbios do Desenvolvimento) Programa de Pós-Graduação em Distúrbios dos Desenvolvimento – Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo 54 HOUNIE, A. G.; MIGUEL E., (Orgs.). Tiques Cacoetes, Síndrome de Tourette: um manual para pacientes, seus familiares, educadores e profissionais de saúde. Porto Alegre: Artmed, 2006. 52 53 Revista FACEVV / ISSN 1984-9133 / Vila Velha / Número 8 / Jan. / Jun. 2012 31 singularidade humana) e não como um rótulo negativista. Cada criança tem características, interesses, capacidades e necessidades de aprendizagem que lhe são próprias e os sistemas e programas educativos devem ser planeados e implementados tendo em vista a vasta diversidade destas características e necessidades. Ramalho et al nos mostra que: [...] quando se fala em intervenção educativa para o futuro, seja na ST, seja ou qualquer outra problemática, esta intervenção terá sempre mais probabilidade de sucesso quanto maior for o envolvimento da família na escola. Quando a cooperação existe e é efetiva, toda a 55 comunidade educativa e social sai beneficiada. Encerrando o âmbito de minhas considerações neste capítulo, acredito ser de grande relevância, citar a história de vida de Brad Cohen, retratada no filme O líder da classe. Brad é alvo de preconceitos do próprio pai que não vê “veracidade” nos tiques do filho, da escola onde vira motivo de “chacota” dos colegas e peça incômoda para os professores em sala de aula que não sabem como proceder com as perturbações criadas involuntariamente por Brad também vista por eles com “caráter duvidoso” de veracidade. Brad é exposto ao ridículo por uma professora e é obrigado a se desculpar à frente da classe pelos “barulhos chatos” que emitia e prometer que nunca mais os faria. Como se os tiques fossem escolha voluntária de Brad. Nem a própria comunidade médica, acredita nos tiques de Brad como decorrentes de uma patologia, e incentivam a mãe do garoto a procurar “ajuda psicológica” para o filho. Pelos esforços exaustivos da mãe, estudando e pesquisando em livros, finalmente descobre-se o diagnóstico da Síndrome de Tourette. Apesar das inúmeras adversidades enfrentadas, o apoio incondicional da mãe, do irmão e mais tarde do pai que reconhece a patologia do filho, Brad conclui sua faculdade e sai em busca do sonho de tornar-se professor. A luta contra o preconceito continua, porém agora no âmbito do mercado de trabalho. Como aceitar que um professor com tiques barulhentos e estranhos possa educar crianças? Felizmente, após inúmeras tentativas, Brad consegue uma oportunidade e prova de forma brilhante que sua “companheira” como ele mesmo descreve sua Tourette, jamais seria capaz de inibir suas capacidades e talentos indiscutíveis de 55 Ramalho et al 2008, p.08 Revista FACEVV / ISSN 1984-9133 / Vila Velha / Número 8 / Jan. / Jun. 2012 32 professor. Através de sua patologia, Brad “planta” em suas crianças, valores preciosos como aceitação, respeito, superação, amor. Destaca-se por sua forma peculiar de ensinar e ganha o prêmio de Professor do Ano em sua primeira experiência profissional. Devemos trabalhar no sentido da desmitificação da deficiência, compreendida como uma característica, um traço peculiar da condição humana, diferenciando necessidades autênticas e fictícias. Um dos aspectos rotineiros em nosso trabalho é o enfrentamento das atitudes e valores sociais, injustos e errôneos, genericamente difundidos acerca da deficiência. Tais estereótipos podem ser assumidos inclusive pelos portadores de deficiência, refletindo uma tendência dos grupos, considerados minoritários pela sociedade, de introjetar a imagem estereotipada a eles atribuída.56 A escola é o reflexo da sociedade em geral, e a história de Brad nos ensina que somente uma escola que seja acolhedora seguindo uma orientação de inclusão e de não estigmatização, que combata as ações discriminatórias, pode originar sociedades abertas e interdependentes57. Referências ALMEIDA, A. G. et al. Tiques, cacoetes, manias, dúvidas e obsessões: existe uma relação? In: HOUNIE, A. G.; MIGUEL E., (Org.). Tiques Cacoetes, Síndrome de Tourette: um manual para pacientes, seus familiares, educadores e profissionais de saúde. Porto Alegre: Artmed, 2006. ASSOCIAÇÃO PSIQUIATRIA AMERICANA. Manual de diagnóstico estatístico das perturbações mentais: DSM-IV-TR. Lisboa: Climepsi, 2002. BRAUNWALD, E.; et al. - Harrison Medicina Interna, 15th edition. McGraw-Hill Interamericana do Brasil, Rio de Janeiro, 2002. CASTILHO, A. R. G. L.; CASTILHO, J. R.; HOUNIE, A. G. Déficit de atenção, hiperatividade e tiques: existe uma relação? In: HOUNIE, A. G.; MIGUEL E., org. Tiques Cacoetes, Síndrome de Tourette: um manual para pacientes, seus familiares, educadores e profissionais de saúde. Porto Alegre: Artmed, 2006. GOMES, M. de C. O. Quando a gente não entende das coisas, a gente não sabe lidar com elas: estudo de caso de um aluno com Síndrome de Tourette cursando o ensino público regular. 2008. Dissertação (Mestrado em Distúrbios do Desenvolvimento) Programa de Pós-Graduação em Distúrbios dos Desenvolvimento – Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo. HOUNIE, A. G.; PETRIBÚ, K. Tourette's Syndrome - bibliographic review and case reports. Revista Brasileira de Psiquiatria, 1999, vol.21, n. 1. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516:44461999000100011&lng=en&nrm=isso. Acesso em 14 de março de 2012. HOUNIE, A. G.; MIGUEL E., (Orgs.). Tiques Cacoetes, Síndrome de Tourette: um manual para pacientes, seus familiares, educadores e profissionais de saúde. Porto Alegre: Artmed, 2006. LOUREIRO N. I. V. et al. Tourette: por dentro da síndrome. Revista de psiquiatria clínica. V. 32, n 4. 2005. Disponível em: http://www.hcnet.usp.br /ipq/revista/vol32/n4/218.html. Acesso em 13 de março de 2012. RAMALHO, J. et al. Intervenção educativa na perturbação Gilles De La Tourette. Revista Brasileira SÁ, E. D. de. Educação Especial: construindo espaços de formação. Em: <http://www.defnet.org.br/elizabet.htm>. Acesso em: 16 de março de 2012. 57 RAMALHO et al, 2008. 56 Revista FACEVV / ISSN 1984-9133 / Vila Velha / Número 8 / Jan. / Jun. 2012 33 de Educação Especial, 337 a 346. V. 14, n. 3. 2008. Disponível http://www.scielo.br/pdf/rbee/v14n3/v14n3a02.pdf. Acesso em 16 de março de 2012. em: SÁ, E. D. de; CAMPOS, I. M. de; SILVA, M. B. C. Atendimento Educacional Especializado: Deficiência Visual. Brasília: SEESP⁄ SEED⁄ MEC, 2007. SÁ, E. D. de. Educação Especial: construindo espaços de formação. Em: <http://www.defnet.org.br/elizabet.htm>. Acesso em: 16 de março de 2012. Revista FACEVV / ISSN 1984-9133 / Vila Velha / Número 8 / Jan. / Jun. 2012
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