ANTONIO RIBEIRO A Associação Para a Defesa e Divulgação do
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ANTONIO RIBEIRO A Associação Para a Defesa e Divulgação do
ANTONIO RIBEIRO A Associação Para a Defesa e Divulgação do Património Geológico do Alentejo e Algarve – DPGA decidiu prestar homenagem ao Prof. Dr. António Ribeiro, durante a realização do seu V Encontro de Professores de Geociências, na Escola Secundária de Albufeira. Haverá certamente poucos participantes neste Encontro que não tenham ouvido falar do Prof. Ribeiro, provavelmente o mais conhecido e um dos mais ilustres geólogos portugueses vivos. Atrevo‐me, contudo, a pensar que boa parte não conhece, ou conhece mal, a sua personalidade e a obra realizada. Daí que eu tenha sentido a necessidade de fazer uma síntese, ainda que muito breve, do seu percurso profissional e científico, e da sua figura como cidadão. Percurso Profissional O Prof. A. Ribeiro licenciou‐se em Ciências Geológicas pela Faculdade de Ciências de Lisboa, com 17 valores, fez o mestrado na Universidade de Paris, doutorou‐se na Universidade de Montpellier, fez provas de Agregação na Universidade de Lisboa onde foi Prof. Catedrático até à sua aposentação recente. Orientou ou co‐orientou 25 teses de doutoramento e 15 de mestrado. Foi geólogo dos Serviços Geológicos de Portugal, Director do Departamento de Geologia da Faculdade de Ciências de Lisboa, membro do Conselho Directivo do Instituto de Ciências da Terra e do Espaço, Presidente da Sociedade Geológica de Portugal e é membro correspondente da Academia de Ciências de Lisboa. A nível internacional, foi bolseiro do British Council na Universidade de Leeds, Inglaterra, membro do Conselho Directivo da União Europeia de Geociências e é membro da Academia Europeia de Ciências. Recebeu o prémio Boa Esperança de Ciência, e foi condecorado pelo Presidente da República. E, felizmente, continua ainda cientificamente muito activo….. Percurso Científico O Prof. A. Ribeiro tem centenas de trabalhos científicos publicados, na grande maioria em co‐autoria, por opção própria, pelo que não cabe nesta breve resenha proceder à sua identificação. Saliento apenas alguns daqueles que, nas várias áreas da geologia, mais contribuíram para o avanço do conhecimento geológico de Portugal, da Península Ibérica e da Europa. Área da Geologia Estrutural É provavelmente a área científica em que é mais conhecido, uma vez que foi o introdutor destes estudos em Portugal. Muitos dos geólogos estruturalistas portugueses são seus discípulos. Destaco aqui alguns dos seus trabalhos pioneiros que são referência obrigatória na história da geologia de Portugal, designadamente: ‐ A sua tese de doutoramento sobre a Tectónica de Trás‐os ‐Montes, documento que serviu de base para a futura interpretação da Cadeia Varisca do Noroeste Peninsular. RIBEIRO, A. (1974). Contribution a l’etude tectonique de Trás‐os‐Montes oriental. Memória nº 24, Serv. Geol. Port., Lisboa. ‐ O famoso livro azul sobe a Geologia de Portugal, publicado pelos Serviços Geológicos de Portugal, de que foi o principal coordenador. RIBEIRO, A.; ANTUNES, M.T.; FERREIRA, M.P.; ROCHA, R.B.; SOARES, A.F.; ZBYSZEWSKY, G.; MOITINHO DE ALMEIDA, F.; DE CARVALHO, D.; MONTEIRO, J.H. (1979). Introduction a la Geologie General du Portugal. Serv. Geol. Port. Lisboa. ‐Os artigos em co‐autoria, sobre a estrutura do Arco Ibero‐Armoricano (que terá funcionado como um promontório durante a colisão varisca), Falha Porto‐Tomar ( falha transcorrente ao longo da qual terá havido deslocamento de largas dezenas de quilómetros) e Faixa Blastomilonítica de Tomar‐Badajoz – Córdova ( interpretada com um ruptura intracontinental e cizalhamento esquerdo de grande envergadura) ANTONIO RIBEIRO MATTE, Ph. & RIBEIRO, A. (1975). Forme et orientation de l’ellipsoide de deformation dans la virgation hercynienne de Galice. Relations avec le plissement et hypotheses sur la genese de l’arc ibero‐armoricain. C.R.Ac.Sc. Paris, t.280, pp.2825‐28. BURG, J.P.; IGLESIAS, M.; LAURENT, Ph.; MATTE, Ph. & RIBEIRO, A. (1981). Variscan intracontinental deformation: The Coimbra‐Cordoba Shear‐zone (SW Iberian Peninsula). Tectonophysics, 78, pp.161‐77. DIAS, R.; RIBEIRO, A. (1995). The Ibero‐Armorican Arc: A collision effect against an irregular continent? Elsevier. Tectonophysics 246, pp.113‐ 128. ‐ A descrição da transversal entre Trás‐os Montes e a região do Porto, onde enquadrou no tempo e no espaço as grandes unidades autóctones, parautóctones e alóctones da Cadeia Varisca do Norte de Portugal. RIBEIRO, A.; PEREIRA, E. & DIAS, R. (1990). Allochtonous sequences: strucuture in the Northwest of the iberian Peninsula. Pre‐mesozoic geology of the iberian Peninsula, Dallmeyer, R.D. and Martinez Garcia, E. (Eds). Springer‐Verlag, pp.220‐236. ‐ A interpretação estrutural da Zona Sul Portuguesa e da Faixa Piritosa em particular, neste caso com estruturação tectónica do tipo pelicular ( thin skinned). SILVA, J.B.; OLIVEIRA, J.T. & RIBEIRO, A. (1990). South Portuguese Zone‐Structural outline. Pre‐Mesozoic geology of the Iberia Peninsula, Dallmeyer, In” R.D. and Martinez Garcia, E. (Eds)” Springer‐Verlag, pp.348‐362. ‐A identificação do Ofiolito de Beja‐Acebuches, que esteve na base de futuras publicações sobre a interpretação estrutural da Zona de Ossa Morena. MUNHÁ, J.; OLIVEIRA, J. T.; OLIVEIRA, V.; QUEZADA, C.; KERRICH, R. (1986). Beja‐Acebuches ophiolite: characterization and geodynamic significance. Maleo, v.2, n.13, p.31. ‐A modelização estrutural da Cadeia Varisca Ibérica, com base no conceito de Terreno RIBEIRO, A.; QUESADA, C. & DALLMEYER, R.D. (1990). Geodynamic Evolution of the Iberian Massif. Pre‐Mesozoic geology of the Iberian Peninsul. In “, Dallmeyer, R.D. and Martinez Garcia, E. (Eds)” Springer‐Verlag, pp.399‐409. ‐ O seu conhecido modelo de estruturação pop up da cadeia Alpina na Bacia Lusitaniana. RIBEIRO, A.; KULLBERG, M.C.; KULLBERG, J.C. & PHIPPS, S. (1990). A review of Alpine tectonics in Portugal: Foreland detachment in basement and cover rocks. Tectonophys., v.184, pp.357‐366. ‐ A recente re‐interpretação da Cadeia Varisca portuguesa, à luz da identificação do Terreno Finisterra, e do significado do Ofilolito de Beja ‐ Acebuches e dos ofiolitos internos que ocorrem da Zona de Ossa Morena. António Ribeiro, Jose´ Munha´, Rui Dias, António Mateus, Eurico Pereira,Luísa Ribeiro, Paulo Fonseca, Alexandre Araújo,3 Tomás Oliveira, Jose´ Romão,Helder Chamine´, Carlos Coke and Jorge Pedro, 2007. Geodynamic evolution of the SW Europe Variscides. TECTONICS, VOL. 26 ‐ Foi também co‐autor de várias Cartas Geológicas na escala 1/5000 e da velhinha Carta Tectónica de Portugal . Área da Neotectónica e Sismotectónica. O Prof. Ribeiro foi também pioneiro na introdução destes estudos em Portugal. É bem conhecida a sua publicação, com João Cabral ,da Carta Neotectónica de Portugal, na escala 1:1000000. Deram também muito que falar no país os seus trabalhos sobre a neotectónica da região da falha de Ferrel, Peniche, que contribuiu para o abandono da construção de uma central nuclear naquela zona, e também na região de Sayago, Espanha, perto da fronteira com Trás‐os Montes, que também foi factor determinante para o abandono da construção de uma central nuclear. São também conhecidas as suas contribuições para a interpretação da sismicidade em território nacional e na margem Atlântica de Portugal J. Cabral., A. Ribeiro, 1988. Carta Neotectónica de Portugal Continental. S. G. P. Área da Tectónica de Placas ANTONIO RIBEIRO Foi também um dos primeiros a introduzir esta teoria em Portugal, que aplicou na interpretação da cadeia Varisca Ibérica. Mais recentemente, os seus trabalhos sobre a geologia da margem Atlântica estiveram na base da publicação do seu livro “ Soft Plate Tectonics” publicado pela editora Elsevier. É bem conhecida a sua interpretação segundo a qual está em curso o desenvolvimento de uma zona de subducção na margem Atlântica de Portugal. RIBEIRO, A., (2002). Soft Plate and Impact Tectonics. (with a contribution by A. Mateus). Springer-Verlag. Área do Impactismo Com José Fernando Monteiro, foi pioneiro na aplicação em Portugal da recente teoria do impactismo de corpos celestes na Terra, do seu registo geológico e da devastação ambiental que provocaram, nomeadamente a nível da extinção de espécies animais e vegetais. A identificação da Cratera de Tore no Atlântico e de elementos químicos e estruturas minerais associadas a impactos no Cretácico superior da região da Nazaré conduziram à hipótese de que aquela cratera terá resultado do impacto de um meteorito no Cretácico Superior. MONTEIRO, J. F.; MUNHÁ, J. AND RIBEIRO, A. (1998). Impact ejecta horizon near the Cenomanian‐Turonian Boundary, North of Nazaré, Portugal. Meteorites and Planetary Sci., v.33, 4, suppl., 112‐3. O Homem e o Cidadão Conheço o Prof. A. Ribeiro desde os tempos das lutas estudantis em Lisboa nos princípios dos anos sessenta do século passado e desde então tenho tido o privilégio de ser seu amigo. Foi por sua mão que entrei para geólogo dos Serviços Geológicos de Portugal, após o meu regresso de Angola.Com ele aprendi a usar as ferramentas da geologia estrutural e foi ele que me incentivou a prestar provas de doutoramento na Universidade de Lisboa, tendo‐se prontificado a ser meu orientador e proponente, com o amigo comum Prof. Galopim de Carvalho. O Prof. Ribeiro foi ainda membro do júri, como arguente principal, das minhas provas de Agregação na Universidade do Porto. Deu‐me também o privilégio de ser seu co‐autor em vários artigos científicos. Compreenderão agora o cunho, eventualmente demasiado pessoal, dos comentários que aqui deixo sobre a sua personalidade, como pessoa e como cidadão. Como disse anteriormente, conheci o Prof. Ribeiro no decurso das lutas estudantis universitárias dos anos sessenta. Jamais esquecerei as intervenções apaixonadas daquele jovem, magrinho e irrequieto, nos comícios em que intervinha, incentivando os jovens caloiros como eu a participarem no movimento estudantil contra o estado de ensino universitário, em última análise contra o regime político vigente. Esta é uma das principais características da sua personalidade: é um idealista, bate‐se pelas suas ideias, exerce a cidadania no seu sentido mais elevado, tem princípios de que não abdica. Ainda em meados dos anos sessenta, enquanto estudante de doutoramento em França, aparecia na Associação de Estudantes da Faculdade de Ciências onde, à volta de uma mesa, falava aos futuros geólogos sobre conceitos de geologia estrutural, de que nós não ouvíramos falar, como polaridades, clivagem xistenta, lineações, estiramentos, cizalhamentos, etc. Aqui está outra faceta da sua personalidade, o gosto pelo ensino, pela transmissão de conhecimentos, pela divulgação científica. Como Aristóteles, gostava de o fazer no campo, ao ar livre. Ficaram famosos os seus exames de geologia estrutural no campo, que pela sua novidade e imprevisibilidade chegavam a criar algum incómodo (direi infundado) nalguns alunos!!. Como disse antes, a grande maioria dos trabalhos publicados, em livros e revistas nacionais e internacionais, foram em co‐autoria, normalmente com contribuição decisiva da sua parte. Esta sempre foi uma atitude que lhe proporcionou alegria, que tentava disfarçar, porque sempre acreditou na preponderância do trabalho colectivo em detrimento do trabalho individual. ANTONIO RIBEIRO De entre muitas conferências e palestras que proferiu, recordo aqui uma que ocorreu durante um Curso de Formação de Professores em Lisboa, organizado pela APG. Estava‐se na aurora da teoria da tectónica das placas, assunto da conferência. Quando, no seu final afirmou que era inevitável que o Oceano Atlântico fechasse, e que Lisboa iria chocar com Nova Iorque, foi o espanto generalizado da vasta assistência a que se seguiu estrondosa salva de palmas. Eram assim as suas conferências, sempre intensamente vividas e com algo de novo a transmitir. O Prof. A. Ribeiro tem uma cultura científica e humana muito acima do comum e é possuidor personalidade forte, interventiva, clarividente, o que faz com que por vezes seja incompreendido. Contudo, não conheço ninguém, mesmo entre alguns dos que lhe criticam esta sua faceta, que lhe aponte um acto mal intencionado, uma deslealdade, uma traição. O Prof. Ribeiro tem um comportamento recatado, algo modesto, avesso às luzes da ribalta. Quando lhe comuniquei que a nossa Associação gostaria de lhe prestar uma homenagem, a sua primeira reacção foi de distanciamento e para o convencer foi necessário insistir, usar de alguma persuasão. Muito mais haveria que dizer sobre a vida e obra do Prof. Ribeiro. Ele é um dos cientistas mais destacados do País, reconhecido internacionalmente, um geólogo cuja actividade ficará na historiada da geologia de Portugal, uma personalidade que faz do seu modo de vida um acto contínuo de exercício de cidadania responsável. As lembranças que temos para lhe oferecer significam, antes de mais, o nosso apreço e a nossa gratidão pelo que de bom tem feito pelo nosso País. J. Tomás Oliveira Presidente da Associação DPGA