Uma constelação urbana Uma via para a cultura
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Uma constelação urbana Uma via para a cultura
PUB www.nyb.pt www.esta.ipt.pt D i r e c to r a : H á l i a co s ta s a n to s XIX Simpósium de Artes Gráficas, entre 20 e 21 de Abril, em Tomar. Tema geral do evento: SUPORTES P. 27 “No limits for design and graphic arts” www.artec2009.blogspot.com N.º 18 . Ano 7 . SEXTA-Feira, 30 de jANEIRO de 2009 A A23, que liga Torres Novas à Guarda, é um eixo de desenvolvimento? Que capacidade é que esta via tem de atrair empresas, instituições e pessoas? E contribui para dar sustentabilidade à actividade que já existe ao longo do seu percurso? Como é que se devem organizar as entidades, incluindo as autarquias, para tirar partido das vantagens de uma via de comunicação que, para alguns,é estratégica? E os pontos de interesse turístico e cultural também beneficiam de uma maiormobilidade? Tentativas de resposta ao longo desta edição. P. 3 a 11 Eixo de desenvolvimento? Uma constelação urbana Uma via para a cultura Augusto Mateus, consultor e ex-ministro, defende, em entrevista, que existe massa crítica de partida para potenciar o desenvolvimento da região que envolve a A23, sobretudo no território que está mais próximo da A1. Este especialista propõe, para o Médio Tejo, a criação da primeira cidade de média dimensão, com 150 mil habitantes, que resultaria de uma forte rede de cidades de pequena dimensão, em que cada P. 3 uma teria a sua especificidade. Riachos, Constância, Mação e Fundão são apenas quatro das várias localidades que, ao longo da A23, têm museus que beneficiam deste novo acesso. Os seus responsáveis acreditam que esta via de comunicação ajuda a “aproximar as pessoas” e, por isso, a divulgar o património. E a cultura também tira proveito da maior mobilidade. Carlos Carvalheiro, director da companhia de teatro de Tomar “Fatias de Cá”, não tem dúvidas: a A23 “é vital para o nosso funcionamento e para o público que nos acompanha”. P. 14 a 16 PUB Avenida D. João I, n.º270 Abrantes | ESTA JORNAL • 30 de Janeiro de 2009 esta J O R N A L E statuto Editorial A23 mas não só e dito r ial Hália Costa Santos O principal desafio desta edição do ESTAJornal é o de abordar a A23 nas suas diferentes perspectivas, procurando responder à pergunta óbvia: esta via é ou não é um eixo de desenvolvimento? Necessariamente, o que aqui se apresenta são apenas algumas das muitas abordagens possíveis, nas quais se enquadram contributos exteriores à redacção. A complexidade da questão faz com que tenhamos que assumir, desde logo, que não há respostas definitivas e absolutas sobre o assunto em questão. Depois de um conjunto de artigos específicos sobre o assunto, ao longo do jornal vão surgindo outros que abordam, de forma menos incisiva, a importância da A23. Embora as vertentes das empresas e das autarquias acabem por ser tocadas ao longo de vários textos, no resultado final destacam-se duas áreas essenciais: a formação/ensino e o turismo/cultura. Provavelmente, porque estas serão duas das apostas incontornáveis em termos de desenvolvimento desta região. Ao longo das páginas que se seguem aparecem artigos que surgem de formas distintas. Uns foram feitos especificamente para este jornal, no âmbito de unidades curriculares; outros foram desenvolvidos como meros trabalhos académicos adquirindo, depois, “honras” de publicação.Há ainda um tra- balho assinalável que resulta de dois estágios curriculares feitos no âmbito do Gabinete de Comunicação da ESTA e do próprio ESTAJornal Muitas das entrevistas e das reportagens que aqui se publicam são os primeiros trabalhos jornalísticos de um conjunto de alunos que há pouco mais de um ano ainda estavm no ensino secundário. É este salto – necessariamente rápido, por causa da duração dos cursos de 1º ciclo – que os estudantes têm que dar, cada vez mais depressa e com relativa segurança. E estão a fazê-lo... Necessariamente, o ESTAJornal acaba por evidenciar, também, as iniciativas da sua própria escola. E é por isso que se dá destaque a mais um projecto que um aluno de Engenharia Mecânica, acompanhado pelo docente Luís Miguel Ferreira, apresenta ao concurso internacional de SolidWorks, onde a ESTA tem sido largamente premiada. Finalmente (mas não em último), apresenta-se o trabalho desenvolvido por um grupo de quatro alunos de Comunicação Empresarial, orientados pelo docente Luís Nunes, que participou num concurso nacional promovido pelo Instituto da Juventude. Entre 46 trabalhos a concurso, foram atribuídos cinco prémios monetários e três menções honrosas. Uma delas veio para a ESTA, precisamente com este trabalho. Justifica-se, pois, o destaque dado. Sessão de abertura da 1ª Pós-Graduação-Formação Avançada em Gestão de Informação para a Saúde A 1ª edição do curso de Pós-Graduação-Formação Avançada em Gestão de Informação para a Saúde está já em funcionamento na ESTA. Depois de ter sido apresentada numa sessão solene, esta formação teve a sua primeira sessão presencial no dia 19 de Janeiro. Este curso, que tem a duração de um ano, pretende dotar os gestores de Serviços de Saúde dos conhecimentos necessários para definirem e conduzirem uma estratégia de desenvolvimento dos Sistemas de Informação dentro das Unidades de Cuidados de Saúde, de acordo com os avanços da tecnologia. O objectivo é dotar os gestores dos Serviços de Saúde de conhecimentos que permitam potenciar a utilização das tecnologias para resolver problemas concretos como, por exemplo, a longevidade dos registos clínicos. Uma vez que os docentes são de diferentes áreas geográficas, o curso é ministrado em Blended Learning, ou seja, a maioria das aulas realizam-se através de e-learning, sendo algumas delas presenciais. Patrícia seixas 2200-370 abrantes telefone: 241361169 fax: 241361175 E-mail: [email protected] • O ESTA Jornal adopta como lema e norma critérios de rigor, de absoluta independência e de pluralismo dos pontos de vista a que dá expressão. • O ESTA Jornal aposta, por isso, numa informação plural e diversificada, procurando abordar os mais diversos campos de actividade numa atitude de criatividade e de abertura perante a sociedade e o Mundo. • O ESTA Jornal considera como parte da sua missão contribuir para a formação de uma opinião pública informada, emancipada e interveniente - condição fundamental da democracia e de uma sociedade aberta e tolerante. • A democracia participativa e entendida para além da sua dimensão meramente institucional, o pluralismo, a abertura e a tolerância são os valores primaciais em que se alicerça a atitude do ESTA Jornal perante o Mundo. • O ESTA Jornal considera-se responsável única e exclusivamente perante a ambição e a exigência dos seus redactores, alunos do Curso de Comunicação Social da Escola Superior de Tecnologia de Abrantes e perante o público a que se dirige. O ESTA Jornal está por isso plenamente disponível e empenhado com os leitores, comprometendo-se a manter canais de comunicação abertos com quantos connosco queriam partilhar as suas ideias e inquietações. Na última edição, no artigo intitulado “Sol de muita dura”, as fotos publicadas não correspondem aos paineis utilizados pela empresa em questão, a Amper Central Solar SA, na Amareleja, Moura. Os paineis utilizados por esta central têm uma tecnologia diferente da que é apresentada. À Amper Central o ESTAJornal apresenta um pedido de desculpas. J O R N A L Morada: Rua 17 de agosto de 1808 O ESTA é um jornal de Escola, de pendor assumidamente regional, mas que nem por isso abdica da dimensão de um órgão de grande informação ou da ambição de conquistar o público para além do meio universitário. O ESTAJornal errou esta Fundado a 13 de Janeiro de 2003 propriedade da escola superior de tecnologia de abrantes • direc tora: Hália Costa Santos Colaboradores: António Borges Abel, sub-direc tora: raquel botelho Catarina Ramalho, Hugo Silva, Liliano Pucarinho, Mário Cordeiro, Patrícia Seixas, Sérgio Nunes, Vânia Constantino redacç ão: Alison Silva, Ana Rita Ferreira, Ana Rosa Patrício, André Amante, Cláudia Oliveira, Daniela Santos, Eleantino Évora, Joana Mendes, João Vasco Nunes, Luís Carlos Tomás, Marina Araújo, Marisa Rodrigues, Raquel Simões, Renato Lopes, Sara Pereira, Sílvia Carola, Simão Santana, Tatiana Pedrosa, Valter Marques Revisão: maria romana e Sandra Barata Departamento comercial: Ana Rosa Patrício Projec to gráfico e paginaç ão: joão pereira impressão: gráfica do instituto politécnico de tomar tiragem: 5000 exemplares 30 de Janeiro de 2009 • ESTA JORNAL | A23: Eixo de desenvolvimento? Augusto Mateus explica o potencial da A23 numa perspectiva de colaboração entre ensino superior, empresas e autarquias “Todos podem brilhar” Augusto Mateus, economista e consultor, é responsável, entre muitos outros projectos, pelo Plano Estratégico do IPT. Olhando para esta instituição enquadrada na A23, defende uma expansão sobretudo ao nível da prestação de serviços. Nesta região, o ex-ministro aposta ainda na criação da primeira grande cidade de média dimensão: uma constelação urbana marcada por uma especialização em cada cidade. Hália Costa Santos Uma das conclusões do Plano Estratégico do IPT aponta para o alargamento da área de influência da instituição. Decorrido mais de um ano, como é que se pode fazer isto para tornar o Instituto numa instituição de referência? A ideia chave é que o IPT está localizado num território em transformação, cujas grandes oportunidades têm muito que ver com duas grandes tendências de futuro: a sustentabilidade do Verde e do Azul (água e floresta) e tudo aquilo que tem a ver com mobilidade. Deste ponto de vista, há um cacho alargadíssimo de actividades, de competências, de conhecimentos e de áreas de investigação que são fundamentais para que o IPT possa ter uma função de agente protaganonista do desenvolvimento económico e social. Há muito tempo que não se justificam opções estratégicas que teriam apenas como função responder às necessidades de formação da população residente de uma pequena região de Portugal. Essa seria uma ideia errada do ponto de vista estratégico que conduziria ao definhamento da instituição. Terá que ter essa função, mas só poderá ter essa função se tiver muitas outras, incluindo a lógica de um duplo alargamento: das funções do Instituto e da área territorial. O alargamento não deve ser encarado no sentido expansionista de alargar território, mas sim no sentido de mercado, de área de influência, de ser capaz de ler e de responder a desafios. Brincando um pouco com as letras, trata-se de combinar o T de Tomar com o T de Tejo. Trata-se de combinar melhor investigação, formação e prestação de serviços, ligando muito mais o Instituto ao mundo empresarial e dando-lhe uma função de intermediário numa teia muito grande de relações, no mundo académico, no mundo empresarial, no mundo da ciência e da tecnologia aplicada. E dando-lhe também uma articulação com autarquias. Em que medida é que a A23 pode contribuir para o alargamento? A A23 tem de ser vista no seu conjunto com a A25 e com a A1. Temos também que pensar que na Penísnula Ibérica há três pólos principais: Barcelona (Catalunha), a Comunidade de Madrid e a Grande região de Lisboa e Vale do Tejo. Há um corredor de desenvolvimento principal que liga estes três pólos. Há um segundo corredor que é um corredor que se estabelece a Norte entre o sul da França e o Atlântico, combinando a região de Castilha/Leon e a região Centro de Portugal. A A23 situa-se na articulação destes dois corredores e é uma via de comunicação com enorme potencial de crescimento, nomeadamente na sua articulação com a A1. No seu território mais próximo da A1, a A23 tem condições privilegiadíssimas de localização empresarial, não para qualquer tipo de empresa, mas para as empresas que actuam numa lógica ibérica ou nacional portuguesa, que combinam Norte/Sul e Nascente/Poente. Hoje em dia não basta haver facilidade de localização, não basta haver mobilidade, é preciso haver serviços, competências, gestão de informação. Portanto, a A23 é um enorme potencial de desenvolvimento, mas se se perceber que as infra-estruturas mais importantes são hoje não propriamente as físicas, “É preciso estar, cada vez mais, organizado de uma forma descentralizada” mas aquelas que permitem a quem se instala sobre essas infra-estruturas físicas ter acesso aos serviços, aos conhecimentos e às competências que permitem a valorização dos investimentos. Já existem empresas suficientes com essas características para se fazer parcerias? Existe seguramente massa crítica de partida. E muitas vezes as coisas mais relevantes estão ora de lado as instituições de ensino ora do lado das empresas. No Politécnico de Tomar há uma actividade relevante à escala nacional, no que significa saber fazer emprego e riqueza a partir da conservação e valorização do património. Aí temos massa crítica do lado do conhecimento. Quando falamos de floresta, temos seguramente a Renova, que é um bom exemplo: é uma empresa bem gerida, com uma estratégia muito bem delineada, que é claramente um trunfo, para que de lado empresarial exista capacidade de puxar aquilo que está menos desenvolvido do lado académico. Não temos em nenhum dos terrenos a massa crítica suficiente para estarmos traquilos do ponto de vista de dizer que “isto só pode correr bem”, mas temos elementos suficientes para que esta estratégia possa ser enunciada. Estes corredores também facilitam a saída das pessoas... As pessoas saem sempre. Não é por não haver corredores que as pessoas deixam de sair. As pessaos saem quando não conseguem resolver a vida no sítio onde estão. Pode-se conceber estes corredores como corredores de progresso, que fazem o desenvolvimento do território do corredor, ou como “pipelines”, em que tudo passa e nada fica. Seguramente, o que não tem conectividade tem muito menos possibilidades de desenvolvimento do que aquilo que tem conectividade. Quando eu tenho um território conservado, de beleza natural, que pode ser um factor de desenvolvimento turístico, a primeira coisa que eu tenho que fazer é criar um aeródromo para poder levar turistas. Se não tiver conectividade, não tenho possibilidade de provir esse potencial. Não vale a pena dizer que a moblilidade terá como resultado acelerar a desertificação ou acelerar as saídas. Neste caso concreto, a melhoria da conectividade da região, a melhoria destes corredores é obviamente indutor de investimento e indutor de aceleração das escolhas de residência nestas regiões. O que é preciso é trabalhar para que elas tenham a qualidade. Do levantamento que fez no Médio Tejo, o que é fundamental para dar essa qualidade? Defendemos uma ideia que é basicamente situar no entroncamento da A1 com a A23 aquilo a que se pode chamar a Porta Norte Logística da Grande Região de Lisboa, que consiste numa aglomeração de actividades em matéria de ordenamento de território. De um modo geral, todos estes territórios estão polarizados por Lisboa. No entanto, não devem afirmar-se como periferia, mas antes como centralidade. Não ajuda muito dizer que Tomar é longe de Lisboa ou que Torres Novas é longe de Lisboa; o que é preciso dizer é que é suficientemente longe para estar longe da lógica das periferias urbanas, mas suficientemente perto para estar dentro de uma lógica estratégica de uma grande região europeia. Vejo com bons olhos aquilo que é uma novidade no caso português, que é não querermos todos a mesma coisa. Vejo com bastante força essa vontade de especialização, nomeadamente no quadro referencial de alargamento do Médio Tejo. Há uma ideia que é a formação de uma forte rede de cidades de pequena dimensão, uma espécie de constelação urbana. Todos podem brilhar, desde que sejam diferentes. Esta ideia poderá gerar a maior cidade média do nosso país: uma cidade espartilhada por um território mais vasto, suficientemente especializada, complementada “A A23 tem condições privilegiadíssimas de localização empresarial” e organizada para configurar uma cidade média, próxima dos 150 mil habitantes, o que lhe daria uma massa crítica absolutamente determinante para ser simultaneamente um pólo de produção, um pólo de consumo, um pólo de atracção de pessoas e de empresas. São coisas arrojadas mas suficientemente importantes para valerem a pena. Não são fáceis e esbarram muitas vezes com políticas públicas, concebidas numa lógica sectorial e não transversal, que desvalorizam o território. Mas o desenvolvimento das sociedades faz-se dessa maneira. O IPT já está relativamente expandido, desde Torres Novas até Vila de Rei. Considera que está no bom caminho? Exactamente. Eu tenho sugerido que se conceba o IPT não com uma sede onde tudo acontece, mas como uma rede de facilidades institucionais (edifícios, salas e laboratórios) suficientemente descentralizada para poder ter um território de influência bem definido. Temos que perder a noção de que uma universidade, uma faculdade ou um politécnico é um edifício ou um grupo de edificios concentrados num local. O que estrutura hoje o mundo científico e académico não são os edifícios, não são os equipamentos. É obviamente a capacidade de fazer ciência, a capacidade de a divulgar, a capacidade de prestar serviços. É preciso estar, cada vez mais, organizado de uma forma descentralizada. Portanto, não posso ver com melhores olhos a presença do Politécnico de Tomar de diferentes maneiras em vários sítios, desde que isso não seja indutor de desperdício, de duplicação de custos, de uma estrutura complicada. Tem que ser uma estrutura simples, muito bem gerida do ponto de vista económico, com a centralização do que deve ser centralizado (a massa crítica e científica, a capacidade de investigação, a capacidade de formar e desenvolver professores competentes). Onde tem que haver uma lógica de descentralização é na prestação de serviços. Tem que se estar muito mais próximo do mundo empresarial. Por outro lado, a lógica do Verde e do Azul obriga o Politécnico a deslocar-se. É preciso ir para junto dos rios e do património. Isso obriga a estar, eventualmente, em sítios mais recônditos. Também é possível aplicar as redes às instituições de ensino superior? Faz todo o sentido criar essas redes. Vejo com bons olhos que exista uma articulação entre o Politécnico de Tomar a a Universidade da Beira Interior. Com o processo de Bolonha os Politécnicos precisam de uma ligação forte no sentido de garantirem as melhores carreiras. Há um mundo muito mais interessante do que guerras burocráticas. O caminho é de colaboração. Todos precisam de ganhar massa crítica, todos precisam de fazer melhor. Onde é que gostaria de ver o IPT em 2013? Como uma instituição que tivesse ganho relevância nacional e internacional num número restrito de matérias, de especialidades, de cursos e de investigação; que tivesse resolvido todos os problemas de gordura, de desperdício e de menor racionalidade orgânica; que se tivesse tornado imprenscíndivel como protagonista do desenvolvimento económico e social de uma região alargada. Ou seja, que o IPT estivesse sempre presente quando se falasse de riqueza, de emprego, de interactividade urbana e de competetividade numa região alargada. | ESTA JORNAL • 30 de Janeiro de 2009 A23: Eixo de desenvolvimento? António Pires da Silva, presidente do IPT, defende uma lógica de parcerias Respostas diversificadas às necessidades da região D.R. “O IPT não pode ser apenas o Politécnico de Tomar, não pode ser sequer apenas o Politécnico do triângulo TomarAbrantes-Torres Novas. Terá que ser um Politécnico que sirva toda uma região que abarca o Médio Tejo e o Pinhal Interior. Só assim terá sustentabilidade e dará sustentabilidade a uma região, que mais uma vez o reafirmo, poderá ter a melhor qualidade de vida do país.” Foi desta forma que António Pires da Silva, presidente do IPT iniciou o seu discurso na cerimónia oficial de abertura do ano académico de 2008/09. Actualmente, o IPT oferece 20 cursos de licenciatura, 12 cursos de mestrado, 16 cursos de especialização tecnológica. Tem 4000 alunos, 250 professores e 120 funcionários, gerindo um orçamento de 15 milhões de euros, dos quais 40 % são de receitas próprias. Por isso, Pires da Silva garante que se trata de “uma instituição com uma situação financeira equilibrada, que consegue satisfazer todos os seus compromissos financeiros sem necessidade de contribuições extraordinárias do Orçamento do Estado”. Consciente de que se verificará “a saída em massa das populações do interior do país com destino ao litoral ou ao estrangeiro” se não houver “capacidade de reter os jovens”, Pires da Silva tem desenvolvido uma estratégia que procura responder às principais exigências dos jovens da região: possibilidades de qualificação num ambiente propício à inovação. Para além da Escola Superior de Tecnologia de Tomar (ESTT) e da Escola Superior de Gestão de Tomar (ESGT), o sucesso da estratégia de desenvolvimento para esta região permitiu ao IPT consolidar a ESTA que, apostando nas Tecnologias e na Comunicação, “criou já uma comunidade de mais de 600 alunos do ensino superior que começam a disseminar a tecnologia e o conhecimento científico pelas empresas da região”. Simultaneamente, respondeu às solicitações das autarquias vizinhas, abrindo Centros de Estudos Politécnicos em Torres Novas, Golegã, Sertã, Mação e Ferreira do Zêzere, possibilitando a estas localidades responder à procura de ofertas formativas estratégicas para o seu desenvolvimento, conservando os seus jovens e atraindo investimentos e trabalhadores mais qualificados. Numa lógica de alargamento, o IPT associou-se a várias autarquias que surgem ao longo da A23, desde Proença-a-Nova até à Golegã, para a implementação de Cursos de Especialização Tecnológica de interesse para essas regiões. A um outro nível, o IPT estabeleceu uma parceria com a Câmara Municipal de Mação, para implementar o Centro Europeu “Instituto Terra e Memória”, onde decorrem Mestrados e Doutoramentos Erasmus-mundus na área da Arqueologia, e com a Câmara Municipal da Golegã, para dinamizar o Centro de Estudos de Fotografia da Golegã. Destaca-se, também, o protocolo cele- Universidade da Beira Interior Património e inovação O Instituto Politécnico da Covilhã (IPC) nasceu em 1973. A aposta do Governo incidiu na criação de uma instituição de ensino superior para facultar aos seus naturais a possibilidade de prosseguirem os estudos pós-secundários, e assim contornarem os problemas da crise industrial na região da Covilhã. Os primeiros cursos a leccionar foram os de Engenharia Têxtil e Administração e Contabilidade; em 1986 o IPC tornar-se-ia na actual Universidade da Beira Interior (UBI). A UBI está hoje organizada por vários pólos, onde funcionam os departamentos de Matemática, Física e Química, Ciências e Tecnologias Têxteis, Engenharias, Ciências do Desporto, Ciências da Saúde, Gestão e Economia e Letras. Os vários pólos estão situados na cidade da Covilhã, uns no centro da cidade e os outros na periferia. Uma das características físicas mais interessantes da UBI resulta da recuperação de antigos edifícios, de elevado valor histórico, cultural e arquitectónico. Com um espaço físico que já atinge os 134.500 m2, a Universidade acolhe hoje mais de 5 mil alunos, distribuídos por 32 licenciaturas, 376 alunos de pós-graduação, 464 docentes e 408 funcionários. Instituto Politécnico de Castelo Branco Ensino e Cultura IPT. Uma instituição que, para além da estrutura central, aposta no alargamento regional brado com a Câmara do Entroncamento, que inclui serviços prestados pelo Centro de Línguas do IPT (CLIPT). Esta unidade também está a trabalhar com a Câmara da Sertã, com o Jardim de Infância da Graça (Entroncamento) e com o CEPTON (Torres Novas). Ao nível científico e tecnológico, o IPT Arquivo Pires da Silva. Presidente do IPT solidificou parcerias com unidades de investigação politécnicas e universitárias, desenvolvendo projectos aplicados e de interesse para a região, como são exemplos o Turiauta, o Patrimonarte, o Line.ipt, o projecto “Mil Anos de Sabedoria” em parceria com o Convento de Cristo, entre muitos outros. No campo da transferência de tecnologia e da valorização do conhecimento surgem parceiros estratégicos: a TagusValley - Parque Tecnológico do Vale do Tejo e a NERSANT. O IPT propôs e viu aprovada a entrada em funcionamento de Cursos de Mestrado em áreas pioneiras a nível nacional, como são os casos da Conservação e Restauro, Fotografia, de Desenvolvimento de Produtos Turístico Culturais, Técnicas Editoriais, Manutenção Técnica de Edifícios, Tecnologia Química. Finalmente, o IPT tem vindo a desenvolver e promover uma cultura de empreendedorismo junto dos alunos, através de estruturas como o Centro de Incubação de Ideias e Negócios. E a cultura não foi esquecida. Recentemente foi inaugurado o Centro de Arte e Imagem – Galeria-IPT. Criado em 1990, o Instituto Politécnico de Castelo Branco (IPCB) divide-se hoje em seis escolas: Agrária, Educação, Tecnologia, Gestão, Artes Aplicadas e Saúde. Entre as cerca de 30 licenciaturas, destacam-se aquelas que têm a ver com a região, como a Engenharia Florestal ou o Ecoturismo, ou com apostas em novas tendências, como o Design Multimédia e Audiovisuias. A Música, o Ensino, a Saúde, as Tecnologias e a Gestão são outros dos pontos fortes. Para além das Licenciaturas e de Cursos de Especialização Tecnológica (CET), o IPCB tem vindo a aumentar o número do Pós-Graduações e de Mestrados. Neste momento o IPCB tem cerca de 5000 alunos, 370 docentes e 250 funcionários. O IPCB tem também uma forte ligação à comunidade, tendo em curso mais de uma centena de protocolos com empresas e organismos, na sua maioria da região. Em colaboração com as autarquias e instituições regionais, o IPCB dinamiza também um conjunto de iniciativas de índole cultural. Para além disso, esta instituição tem vindo a fomentar um conjunto de relações institucionais com algumas das mais prestigiadas associações regionais, nacionais e internacionais, das quais é membro. Instituto Politécnico da Guarda Luta contra a interioridade O Ensino Superior Politécnico na Guarda (IPG) apresenta-se como “um factor determinante na luta contra a interioridade e desertificação do interior”. Nesta aposta surge a ligação com os meios empresarial, cultural e social da região, bem como a cooperação com outras instituições de ensino. O ensino superior na Guarda começou a ser projectado na década de 70, mas só em 1979 é que foi criada a Escola Superior de Educação, posteriormente integrada no IPG, constituído em 1985. A esta escola juntou-se a área da Comunicação e do Desporto e, hoje, o IPG é também constituído pela Escola Superior de Tecnologia e Gestão, pela Escola Superior de Saúde e pela Escola Superior de Turismo e Hotelaria (implantada em Seia). O IPG tem actualmente mais de 20 licenciaturas, 9 Pós-Graduações e dois Mestrados. Na área da Saúde, para além da formação de base, destaca-se o Curso de Pós-Licenciatura de Especialização em Enfermagem Médico-Cirúrgica e o Curso Bietápico de Licenciatura em Farmácia. O IPG tem também vindo a apostar na prestação de serviços, nomeadamente em áreas como realização de estudos geotécnicos e medições de ruído. 30 de Janeiro de 2009 • ESTA JORNAL | A23: Eixo de desenvolvimento? Uma via que facilita o acesso ao ensino A A23 é para muitos alunos do Instituto Politécnico de Tomar (IPT) a via escolhida para fazerem a viagem que liga as suas terras às cidades de Tomar e Abrantes. Sobretudo para aqueles que têm o seu próprio meio de transporte. Hália costa santos Raquel Simões Nuno Albuquerque Gaspar, aluno da Escola Superior de Tecnologia de Tomar (ESTT), utiliza todos os domingos a A23 para ligar Almada a Tomar. Este aluno de Fotografia explica que o caminho que percorre “é muito longo” e acrescenta que a A23 “é uma maneira de não passar tanto tempo na estrada”. Nuno lembra ainda que as viagens para Tomar costumam ser feitas ao domingo, normalmente a meio da tarde e sem companhia, o que as torna “mais aborrecidas”. A A23 é um eixo rodoviário que liga Torres Novas à Covilhã, facilitando a circulação dos estudantes dos Institutos Politécnicos de Tomar, Castelo Branco e Guarda e ainda da Universidade da Beira Interior, veio alterar alguns dos hábitos dos habitantes da região do Médio Tejo, afectando particularmente os estudantes do Instituto Politécnico de Tomar. Nuno Gaspar percorre em primeiro lugar a A1, a principal autoestrada do país, até entrar na A23, até chegar a Tomar. Sobre a A23 não tem dúvidas que “é uma auto-estrada com muito boas condições, para além de que tem pouco trânsito”. Passam poucos minutos das três da tarde quando, num domingo como qualquer outro, Nuno sai de Almada e apanha a A1 em Lisboa. Confessa que não gosta muito de fazer o percurso da principal autoestrada, porque “é uma via muito movimentada, tem excelentes condições de circulação, mas tem muito Uma estrada com boas condições faz a diferença no percurso Percurso. Para além da mobilidade, a A23 destaca-se pelas paisagens trânsito”. Apesar disso, a A1faz-se calmamente, até se chegar à saída de Torres Novas, que liga com a A23. Já na A23, com destino a Tomar, Nuno diz, sorridente: “Ao utilizar a auto-estrada poupo algum dinheiro no combustível, e também poupo tempo nas filas. Nas estradas nacionais o trânsito é sempre mais lento”. O dia estava solarengo e a A23, num instante, apresenta a saída para Tomar. Ao contrário dos alunos que vão para Abrantes, Nuno, após sair da A23, ainda tem de percorrer o IC3 até Tomar, um percurso curto e que também tem boas condições de circulação. Uma hora e meia depois de iniciar a viagem, o estudante da ESTT chega ao destino, para mais uma semana de estudo. A A23 faz toda a diferença no percurso do Nuno, pois facilita-lhe o acesso a Tomar em todas as medidas, poupando-lhe tempo e dinheiro. Cátia Romualdo, estudante de Comunicação Social, na ESTA, vive na Benedita, Alcobaça. Não vai todos os fins-de-semana a casa: “Vou de 15 em 15 dias, para poupar algum dinheiro”. Num outro domingo, a aluna está de de regresso a Abrantes. Saiu por volta das 19h00, já era noite e a chuva acompanhou-a durante toda a viagem. Cátia, tal como Nuno, inicia a sua viagem na A1. “Não gosto muito de viajar nesta auto-estrada, acho que é muito perigosa, principalmente em dias de chuva” - confessa a aluna da ESTA. A A1, que liga Lisboa ao Porto, regista um tráfego assinalável, sobreu- to no final dos fins-de-semana. Para Cátia, “as pessoas também andam muito depressa o que põe em perigo não só a vida delas próprias, como também as dos outros utentes da auto-estrada”. O percurso até à A23 é rápido, mas feito com cuidado e sempre a pensar nos outros. “A A23 é uma via mais calma, não tem tanto trânsito como a A1, mas em dias de chuva também é perigosa, como todas as outras estradas”. A noite continua fria e chuvosa. Ao entrar na A23, com destino a Abrantes, o trânsito diminui, mas a chuva começa a cair mais forte, dificultando a visão, e aumentando o perigo da via. O último troço da viagem faz-se devagar. “Foi uma boa aposta a construção da A23. Este troço de autoestrada ajuda em muito a população do Médio Tejo e da Beira interior, e facilita muito a vida aos estudantes”, comenta Càtia. São muitos os estudantes que utilizam a A23 como via de ligação entre as localidades onde vivem e as cidades onde estão a estudar. De Torres Novas até saída para Abrantes, são mais quilómetros do que até à sáida para Tomar. Há muito mais A23 para percorrer, “é um caminho que se faz muito surgem belos troços de paisagens, como por exemplo Constância, onde o Zêzere se junta ao Tejo. Ainda na A23, ao longe, já se consegue avistar a torre de Abrantes. Quando esta imagem surge é o sinal de que o destino, para quem estuda em Abrantes, está quase alcançado. Mas ainda faltam alguns quilómetros até ao centro. A chuva abrandou, facilitando assim a visão dos condutores. “O facto de se conseguir ver Abrantes da auto-estrada ajuda imenso, sintome próxima do destino” - diz Cátia. Quando finamente chega a saída para Abrantes, o caminho para a sua segunda casa é agora mais curto. “Se tivesse que fazer o caminho pela estrada nacional ainda não estava aqui, trânsito é sempre mais. A chover e de noite acho que até é mais perigosa que a auto-estrada”. Rede de transportes públicos não serve a todos Utilizando transporte próprio, uma viagem entre as Caldas da Rainha e Abrantes faz-se em cerca de uma hora. Mas para um estudante que dependa de transportes públicos, nem a A23 se apresenta como solução. Helena Silvestre aluna de Comunicação Social, na ESTA, vive nas Caldas da Rainha. Para se deslocar entre a cidade onde vive e a cidade onde estuda utilizaos transportes públicos duas a três vezes por mês. Ao contrário dos colegas que vêm de Lisboa ou dos que têm carro próprio, esta aluna lida com dificuldades em termos de transportes: “Sem dúvida, que entre Caldas da Rainha e Abrantes há muita falta de transportes públicos, tenho de me restringir aos poucos horários que há”. As opções de transporte são apenas duas: ir até Lisboa de comboio ou de Expresso e depois apanhar outro transporte para Abrantes; utilizar as “carreiras”que levam muito tempo porque param em todas as localidades até Abrantes. Helena diz que esta situação é insustentável visto ser um percurso tão Hália costa santos Facilidade. A A23 é, normalmente, uma via com pouco trânsito curto. “Estamos a falar de um percurso que se faz numa hora de carro”. Quanto aos comboios, “demoram cerca de quatro horas e é preciso mudar quatro vezes e o preço é exorbitante”, conta Helena. Na opinião da estudante de Comunicação Social, as redes de transportes públicos deviam ser alargadas, não só pelos estudantes, mas também pela população e pelo comércio. Enquanto a rede de transportes públicos não responder a estas necessidades, a maioria da população opta pela deslocação de carro, visto não haver compatibilidade de horários para sair e voltar das Caldas da Rainha no mesmo dia. Ao contrário do que acontece nas Caldas da Rainha, em Lisboa a situação é diferente. Naturalmente, o número de transportes públicos é maior. Daniela Santos é também aluna de Comuni- cação Social, em Abrantes. Utiliza os transportes públicos, em média, três vezes por mês. Visto quem tem uma maior facilidade em fazer viagens no mesmo dia de ida e volta, há meses em que faz mais viagens. “Utilizo muitas vezes os transportes públicos, em especial o comboio, porque a frequência é maior”. Para além dos meios ferroviários, os transportes públicos rodoviários também são em grande quantidade: a Rede Expresso tem uma vasta disponibilidade de horários de Lisboa a Abrantes. “No Expresso não temos de fazer mudança” - refere Daniela. Ao contrário do que acontece quando a origem da viagem é nas Caldas da Rainha, o percurso de Lisboa a Abrantes é maior, mas as facilidade de transportes também o são. R.S. | ESTA JORNAL • 30 de Janeiro de 2009 A23: Eixo de desenvolvimento? Jorge Rosa, Engenheiro de Máquinas e actual administrador da Mitsubishi “Os responsáveis por este investimento são os trabalhadores” Numa altura em que o país e o mundo enfrentam uma grave crise financeira e económica, o Tramagal vai receber um investimento de mais de 20 milhões de euros e duplicar o número de trabalhadores. Parece que aqui a crise não chegou, mas o actual administrador, Jorge Rosa, afirma que também ali se vai parar a produção e que este é um investimento para o futuro. vânia constantino não especializada, porque nós formamos os nossos próprios trabalhadores. Necessitam ter uma formação de base, do 9º ou 12º ano. Os trabalhadores que pretendem recrutar são sobretudo aqui da zona? Quando se quer 10 trabalhadores procuramos num raio de 10 quilómetros; se quisermos 20, provavelmente teremos que procurar num raio mais alargado. Mas aquilo que nós procuramos realmente são pessoas que queiram trabalhar connosco inde- Valter Marques Numa altura em que as notícias indicam que o sector automóvel está a passar um período negro assistindo-se à queda na produção e ao desemprego de milhares de pessoas, a Mitsubishi vai investir no Tramagal mais de 20 milhões de euros e vai duplicar o número de trabalhadores... É um facto que o mercado automóvel está a viver provavelmente a situação mais dificil de sempre. A situação económica está a assustar as pessoas e, como o automóvel não é um bem de primeira necessidade, as pessoas optam por não o ter como prioridade. Nós aqui não somos diferentes e aquilo que aparece nas notícias é algo para o futuro; é a atribuição de um modelo sucedâneo que vai começar a ser produzido em 2011. Não é algo para o presente e nós também vamos ter que parar a nossa produção nos próximos dias e no próximo semestre. Mas em 2011 vamos ser recompensados, quando iniciarmos a produção do novo modelo automóvel. Quem é o principal responsável para que esse novo modelo fosse produzido no Tramagal? Somos todos responsáveis, mas sobretudo aqueles que trabalharam cá ao longo dos tempos. Eles é que são os grandes responsáveis. Foram eles que deram mostras do seu valor, do seu trabalho e daquilo que se produz no Tramagal. Uma da melhores notícias é que vão duplicar o número de trabalhadores. É necessário perceber que o número de trabalhadores das fábricas “Investimentos destes são benéficos para o concelho” Futuro. Novo modelo começa a ser produzido em 2011 é quase directamente proprocional à sua produção. A nossa fábrica vai ter que produzir o dobro, então, vão trabalhar dois turnos. Como nós só temos um turno a trabalhar, basta criar mais um turno e duplicam-se os trabalhadores. É o que irá acontecer. Que tipo de mão de obra procuram? A mão de obra é preferencialmente pendentemente de onde sejam. Sentiu apoio do Governo português em todo este processo? O Governo apadrinhou a decisão de se produzir o novo modelo da Mitsubishi no Tramagal, mas, mais do que isso, o que esperamos que o Governo faça é cumprir a promessa que fez de construir a ligação entre Ponte de Sôr e Abrantes, que será uma grande ajuda para o desenvolvimento da região e das empresas que aqui estão. Assim como quando foi criada a A23 foi uma grande ajuda. A nova acessibilidade que o Governo prometeu perante todas as entidades que aqui estiveram presentes fará com que fiquemos ainda mais próximos de tudo e é uma grande ajuda para atrair mais investimento. Quem tem também apoiado muito a Mitsubishi no Tramagal é a Câmara Municipal de Abrantes. Não digo que não seja uma grande ajuda para nós, mas não somos priveligiados, porque é política da autarquia apoiar as empresas do concelho. A Câmara tem demonstrado grande abertura em tudo e demonstrado o seu total apoio, porque investimentos destes também são benéficos para o concelho. Qual é, concretamente, o apoio da Câmara? A autarquia disponibilizou-se para vender lotes na zona industrial aqui do Tramagal a um preço simbólico, o que nos permite aumentar ainda mais a nossa capacidade de produção. Mas não têm condições para aumentar a vossa produção neste momento, visto que vos basta criar mais um turno? Sim. Nós não precisamos desses lotes para aumentar a nossa produção. Mas é uma medida a pensar depois de 2011. Porque precisamos de ter condições e, se for necessário, aumentar ainda mais a nossa produção. Os patrões, pelo voz da CIP, têm-se demonstrado descontentes com a medida que entrou em vigor este ano de aumentar o salário mínimo para 450 euros. Está do lado dos patrões ou do Governo? Quero referir que essa não é uma medida que nos venha afectar, visto que nenhum trabalhador aqui na Mitsubishi recebe o ordenado mínimo. Mas é uma questão de elementar justiça qualquer trabalhador receber no mínimo 450 euros ou até mais. Nos dias de hoje é complicado alguém viver só com esse valor. Duas das cidades que se vêem da A23 apostam em logomarcas para ajudar a promover a imagem Covilhã e Entroncamento mostram o que são Ana Rita Ferreira A cidade da Covilhã é um exemplo. Recentemente, esta cidade apresentou uma nova marca, identificando-a como uma cidade cinco estrelas «para investir, para descobrir, para viver», tendo a A23 como uma mais valia, visto que facilita a acessibilidade à Covilhã. A Bus Consulting, empresa responsável pela criação desta nova logomarca, aproveitou a estrela, de seis pontas, já existente no antigo brasão, e criou mais quatro, ficando a logomarca com cinco estrelas. Cada uma delas tem uma cor e padrão diferentes. A amarela representa a hospitalidade, a azul inovação, a laran- ja proximidade, a vermelha tradição e a verde lazer. As estrelas encontram-se num movimento ascendente dando alusão ao crescimento da cidade. A A23 veio ajudar ao fomento nas cidades da Beira Interior, Covilhã inclusive, pois o acesso torna-se mais fácil e rápido, tal como o indicado pela estrela laranja. Através desta logomarca, esta cidade da Beira Interior, para além de se diferenciar de cidades como Castelo Branco e Guarda, tenta atrair novos investidores e turistas, não esquecendo os residentes, e tirando todo o partido possível da Serra da Estrela. Com todas as mais valias oferecidas pela A23, a nível de acessos, e a visão de expansão que a Covilhã demonstra com esta nova marca da cidade, esta dupla torna-se assim «cinco estrelas». Uma outra cidade, atravessada pela A23, que também aposta numa logomarca para se promover é a cidade do Entroncamento. Esta cidade «pretende renovar e reposicionar a sua imagem turística a nível nacional», diz Cristina Feio, secretária da Presidência do Entroncamento. Através da nova logomarca, a cidade do Entroncamento assumirá todo o seu passado histórico com base nas suas origens. De uma forma simples e agradável, esta cidade exibe-se como a CIDADE FERROVIÀRIA. Segundo Cristina Feio, a logomarca é «um ícone que de forma simples está ligado ao subconsciente de todo o mundo quando falamos em comboios e representa, de forma nostálgica, todo um passado ainda bem presente». A junção da A23 com esta nova logomarca da cidade do Entroncamento fará com que esta cidade cresça e se desenvolva “a todo o vapor”. De acordo com a opinião de Abrahim Baze Júnior, consultor em Comunicação e Marketing, hoje em dia fala-se muito acerca da «experiência de marca» que são «momentos únicos relacionados com as emoções que as marcas transmitem, e a satisfação dos seus consumidores com o produto escolhido». O consultor acrescenta ainda que a logomarca «é a visão externa da empresa ou cidade que a utiliza» a mesma visão que «está relacionada aos valores que essa empresa ou cidade quer passar para o mercado». Porém, da mesma forma que «uma boa logomarca pode “vender” bem o seu produto, uma má logomarca poderá ter o efeito contrário, afastando o público», ficando assim ao encargo dessas cidades ou empresas «identificar e estratificar os seus potenciais», sublinha Abrahim Baze Júnior. 30 de Janeiro de 2009 • ESTA JORNAL | A23: Eixo de desenvolvimento? “A administração central tem sido o principal obstáculo ao desenvolvimentodonossoconcelho” António Mendes, presidente da Câmara Municipal de Constância, acedeu a abrir o livro da sua vida política, explicando decisões, intervenções e também considerações sobre os projectos elaborados e a executar. Refere ainda a filosofia partidária que tem seguido ao longo de todos os anos de mandato. D.R. Sílvia Carola Porquê este partido? Não é este partido, é uma coligação. Eu estive ligado a um partido, o Partido Comunista, PCP. Desliguei-me do partido, mas as minhas ideias, os meus princípios, os valores que defendia, continuam a ser os mesmos dentro da coligação, que era entre o PCP, os Verdes e a Intervenção Democrática. Porque optou por esta coligação? Porque abria um leque em que alguma independência da vida, muito fechada sob o ponto de vista político, podia ser exercida. Era aqui que me revia sob o ponto de vista dos ideais que defendia, e das ideias que tinha para o concelho. Entendi que era por aqui que passavam as apostas do desenvolvimento do concelho. E qual foi a razão para continuar a sua candidatura por esta força política? A razão até é muito simples. É aqui que tenho muitos amigos e muitos companheiros que me têm ajudado a ser o porta-voz deste projecto, que não tem de maneira nenhuma sido só feito e exercido por mim. Eu sou o coordenador, mas vereadores, juntas de freguesia, Assembleia Municipal, os próprios técnicos e funcionários da Câmara, reconheço na intervenção de todos uma grande ajuda e uma grande força que muitas vezes me dão para continuar. E nunca foi convidado para concorrer por outros partidos? Tive efectivamente convites para integrar a lista de outros partidos, mas não me revia, porque nesta coligação já tinha muitas pessoas que me ajudaram e têm feito parte da equipa, de várias equipas, ao longo dos anos. Tem vindo sucessivamente a ganhar com maiorias absolutas, na ordem dos 60%, 70% num concelho que em outras eleições é dominado pelo Partido Socialista. Como explica esse fenómeno? As pessoas vêem trabalho, conhecem-nos; os eleitores votam nas pessoas. Isto acontece aqui como acontece em muitos concelhos do nosso País. Trabalho, confiança, acreditar, e isso tem acontecido da parte de quem vota. Diria que 90%, ou mais de 90%, vota nas pessoas. E vota no trabalho que estas têm feito. Concorda com a limitação dos mandatos autárquicos? Por um lado, concordo. Porque muitos anos provoca desgaste, cansaço. Mas, por outro lado, discordo. Acho que se limita a democracia, porque é limitando os mandatos que se retira a liberdade das pessoas votarem em quem querem. Por outro lado, não compreendo por que é que a limitação há-de ser só para os autarcas, não sendo também para os deputados e outros detentores de cargos políticos. António Mendes. “As pessoas vêem trabalho, conhecem-nos; os eleitores votam nas pessoas” Está a pensar candidatar-se novamente, dado que existe essa lei? É uma questão que neste momento nós, equipa, estamos a avaliar muito bem. A principal pessoa a decidir serei naturalmente eu, mas evidentemente que a questão tem que se colocar no contexto mais global da equipa com que trabalho. Não excluo, neste momento, a hipótese de me recandidatar, mas também não ponho de parte a hipótese de este ser o último mandato. Ainda não está definido. Que incentivos têm sido dados para atrair indústria e empresas? Desenvolvemos e promovemos um loteamento industrial, na zona industrial, em Montalvo, que neste momento dá emprego a 500 pessoas. Também vendemos e continuamos a vender os terrenos infra-estruturais a preço simbólico. Depois, sempre que há projectos que tomam a iniciativa de se desenvolverem, nós acompanhamolos. É o caso da Celulose do CAIMA e da própria Tupperware. E quando nos pedem uma intervenção de natureza política, nós damo-la. Que projectos é que Constância tem desenvolvido que fixem e atraiam novas pessoas? Temos desenvolvido muitos projectos que atraem as pessoas: na zona industrial, a modernização do comércio, mas também a reabilitação da zona histórica. Temos promovido urbanizações municipais em que temos projecto, temos terreno, vendemos ao preço de custo. Temos recuperado habitações da mesma maneira, temos apoiado os investidores no concelho, particularmente na vila, em que a parte nova está bastante desenvolvida. Perfil Gostava de ser recordado como um bom rapaz António Mendes, presidente da Câmara Municipal de Constância, tem como lema “trabalho, determinação, vontade e esperança”. É um dos autarcas portugueses no poder há mais anos e assume que dedica muito do seu tempo ao concelho. “Vem para Constância muitas vezes antes das sete da manhã e às oito e nove da noite ainda está a anotar coisas que possam não estar bem”, frisa C. Oliveira, um habitante local. Essa dedicação reflecte-se na sua vida familiar. A esposa e os dois filhos ressentem-se da ausência do marido e pai em casa. “Há grandes queixas da família. Os meus filhos, muitos finsde-semana, quase não me vêem” - diz António Mendes. Nado e criado em Santa Margarida, localidade do concelho de Constância, ainda aí reside. Agora com 58 anos, começou a trabalhar muito cedo, com apenas 14 anos. Estudava de noite, a tirar um curso profissional de Electricidade. Chegou a ser eleito presidente do Sindicato dos Electricistas e dos Ferroviários, até se tornar presidente da Câmara em 1986, pela CDU. A sua eleição foi uma surpresa para o próprio presidente. Mas, como diz C. Oliveira, “será sempre eleito, enquanto se apresentar em qualquer eleição para a autarquia. A primeira eleição foi a continuação de um trabalho que ele já vinha fazendo como vereador”. Além disso, “tem muito peso na equipa que está com ele. É um facto que a composição da equipa tem o seu peso nos votos desta população, mas é o António Mendes que arrasta os vereadores”. O trabalho de vereador que desenvolveu antes de liderar a autarquia era como opositor do partido dominante, o PS. Eram-lhe atribuídos pelouros com os quais se dedicava às necessidades das pessoas. Falta de água, de electricidade, educação, por exemplo. Agora, já nas funções de presidente, está a levar a cabo o Programa Viver Constância, que irá permitir devolver a dignidade a pessoas com casas degradadas. Os seus projectos passam também, para o futuro, pela área social e a educação. “Gostaria de ser recordado como alguém que se dedicou muito a este trabalho, se esforçou muito por ver feito no concelho aquilo que é necessário. Gostava de ser recordado como um bom rapaz” - conclui. | ESTA JORNAL • 30 de Janeiro de 2009 A23: Eixo de desenvolvimento? Abrantes Tomar Torres Novas • Vila Cardílio As ruínas desta “Villa” romana situam-se a cerca de três quilómetros de Torres Novas, surgindo já desde o início do século o interesse pelas mesmas. Porém, apenas em 1962 foram levadas a cabo escavações efectivas, sob a orientação do coronel Afonso do Paço. Anteriormente utilizadas pelas pessoas locais como pedreira, de onde estas extraíam materiais destinados à construção das suas próprias casas, nestas escavações, em 1963, foram descobertos um conjunto de alicerces, bases de coluna e pavimentos ornamentados com diversos quadros de “tesselas” (pedras de mosaico), de pedras azuis e brancas, misturadas com outras, de barro vermelho e amarelo, abundando os motivos geométricos. Do espólio encontrado podem-se destacar “moedas dos séculos II, III e IV d.C., cerâmicas, bronzes, vidros assírios e egípcios, estuques coloridos, anéis e até uma estátua de Eros. O nome que é atribuído a esta estação arqueológica devese a uma das inscrições que referem o nome de ‘Cardillium’, provável dono desta vila, em que não faltava um jardim, sistema de distribuição de água e aquecimento” (www. guiadacidade.pt). • Convento de Cristo Quando se passa por Tomar é incontornável visitar o famoso Convento de Cristo, dentro das muralhas do Castelo Templário. Fundado por Gualdim Pais, em 1160, “o mestre provincial da Ordem do Templo em Portugal, aí viveram as primeiras gentes de Tomar, e aí se alojaram durante muitos anos os guardiães da fé cristã. Em 1312, quando a Ordem do Templo foi extinta, foram-se os Templários, mas poucos anos depois, sob os auspícios de D. Dinis, foi fundada a Ordem dos Cavaleiros de Cristo, altura em que a nação portuguesa se abre para as descobertas marítimas, sendo Tomar a sede da Ordem e o Infante D. Henrique o seu Mestre. (www.rotas.xl.pt) O Convento conta com “maravilhosos jardins, majestosos claustros, o fabuloso templo denominado Charola, e a incontornável Janela Manuelina, num conjunto arquitectónico que encerra testemunhos do Romântico, do Templário, do Gótico, do Manuelino, ao tempo das Descobertas, do Renascimento Joanino, do Maneirismo e do Barroco”, segundo refere o sítio www.rotas.xl.pt. • Aquapolis O Aquapolis (Parque Urbano Ribeirinho de Abrantes) veio trazer um novo conceito de recreio, lazer e convivência social. Fundamental para a potencialização do espaço foi a construção de um espelho de água, criado a partir de um açude insuflável. Existem actividades que permitem a referida convivência social, como refere o sítio da Câmara Municipal de Abrantes, www.turismo.cm-abrantes. pt, “através de infra-estruturas para a prática de desportos ao ar livre (remo, pesca desportiva, voleibol de praia, canoagem, ténis, etc.), actividades lúdicas e espaços para a realização de espectáculos (animação cultural), Sardoal • Semana Santa Anualmente, na semana que antecede a Páscoa, realizam-se as cerimónias englobadas no que se denomina de Semana Santa de Sardoal, com diversos rituais. Coincidente com estas cerimónias surge a atracção que são, sem dúvida, as capelas enfeitadas. Todo o ambiente religioso referente a esta semana atrai pessoas vindas de diversos lugares, não só graças às cerimónias religiosas, mas também porque a cultura e o turismo vêm de mãos dadas com a religiosidade, pois não só os crentes, católicos e praticantes que acorrem a este evento. A manifestação religiosa mais saliente é dos Fogaréus, que a população adaptou para a Procissão da Visitação, com um conceito tradicional mas marcando a diferença de outras procissões existentes no País. A vila prepara-se especialmente para esta procissão, a mais espectacular, colocando pequenas lanternas nas janelas, varandas e sacadas, por onde passa a procissão. As luzes da rede pública são totalmente desligadas e a multidão de participantes, empunhando as suas velas, cria um ambiente de misticismo. Outro ponto de interesse durante a Semana Santa são as capelas, cujo chão é enfeitado com tapetes de flores e verduras naturais, formando motivos de cariz religioso, construídos geralmente por grupos de populares, nas seis capelas da Vila e também na Igreja da Misericórdia. Constância A1 Torres Novas Tomar • Centro de Ciência Viva Este Centro é um Parque Temático de Astronomia muito completo, o qual constitui um convite à participação em actividades baseadas na Astronomia. Outras áreas científicas, que envolvem observações de acontecimentos quotidianos, fazem parte deste conjunto. Um ponto de referência no Centro é o Observatório Solar (Laboratório de Heliofísica), que consiste num “edifício com sistemas de espelhos e lentes que permitem o estudo do Sol no domínio do visível e do H-alfa, bem como do seu espectro e identificação de alguns elementos químicos” (conforme folheto alusivo). Outras atracções são ainda um Globo Terrestre com cerca de dois metros de diâmetro, um Carrocel representando o Sol, a Terra e a Lua, uma Esfera Celeste com aros de 7,5 metros de diâmetro e um relógio de Sol Analemático. Possui, ainda como atracção invulgar, o Planetário, que se encontra quase soterrado, e abriga um equipamento que permite simular o céu observável em qualquer hora, data ou latitude. Constitui uma alternativa, quando o tempo não permite que o céu possa ser observável no exterior. (ver página 13) A23 Almourol Constância Sardoal Abrantes Mação Almourol • Castelo de Almourol Contam-se histórias de princesas encantadas, príncipes mouros e cavaleiros cristãos, quando se fala do Castelo de Almourol. A fortaleza de “Almorolan” (do árabe pedra alta) aponta as suas raízes para o século II a.C. O Castelo terá sido erguido no local de um primitivo castro lusitano conquistado pelos romanos durante a ocupação da Península Ibérica. Posteriormente terá pertencido a Alanos, Visigodos e Mouros. Terá sido conquistada por D. Afonso Henriques e doada a Gualdim Pais, mestre da Ordem dos Templários, encarregue da defesa da zona do Tejo. Este Castelo, como refere Pérsio Basso, representante do Turismo de Vila Nova da Barquinha, encontra-se “cercado pelas águas do rio Tejo”, destacando-se “num maciço granítico de uma ilhota do Tejo, entre Vila Nova da Barquinha e a freguesia da Praia do Ribatejo. A singular localização do Castelo torna-o um dos mais bonitos monumentos do País, tendo sido considerado Monumento Nacional em 1910”. A partir do seu terraço o olhar do visitante pode perder-se na deslumbrante paisagem, muito para além das margens do rio. tirando o maior partido possível das suas potencialidades turísticas e desportivas.” Ainda segundo o mesmo sítio, “o factor histórico não foi esquecido, fazendo-se sobressair um conjunto de pilares de uma antiga ponte de barcas do século XIX (também designados mourões) e a Fonte dos Touros (antigo lavadouro público, recentemente restaurado).” Existem alguns equipamentos neste Parque, como ciclovias, talude para patins/skate, praia fluvial (um dos pontos de maior interesse, em fase de estudo), campo de rugby de praia, parque infantil e auditório, entre outros. Mação • Praias fluviais Carvoeiro e Ortiga são duas apelativas praias fluviais, pertencentes ao concelho de Mação, onde, ao invés da predominância do dourado da areia, é o verde do pinhal que prevalece, abrindo um horizonte para além das tradicionais praias marítimas. A praia do Carvoeiro é a única do distrito de Santarém distinguida com bandeira azul. É de notar que a Bandeira Azul, como é referido no sítio www.pinhaldigital.com, “traduz o reconhecimento atribuído pela Associação Bandeira Azul da Europa/ Fundação para a Educação Ambiental (ABAE/FEE) por preencher todos os requisitos solicitados no sentido de garantir o bem-estar e segurança dos seus utilizadores e o bom funcionamento do espaço”. A praia de Ortiga, como consta no sítio da Câmara Municipal de Mação, fica situada “na região sul do Concelho de Mação e, com a Barragem de Belver como pano de fundo (...) é, desde há muito, o local de eleição para quem visita Mação e para os próprios maçaenses.” A23 Vila Velha de Ródão 30 de Janeiro de 2009 • ESTA JORNAL | A23: Eixo de desenvolvimento? Vila Velha de Ródão • Escola de Escalada do Castelo Da parceria entre a Câmara Municipal de Vila Velha do Ródão e a empresa Incentivos Outdoor, surge a Escola de Escalada do Castelo Lda., sendo esta uma apetecível zona de escalada natural, implementada na zona quartzitica do Castelo do rei Wamba, actualmente com 12 vias de escalada disponíveis, devidamente equipadas. Esta escola tem como objectivo criar e manter um espaço dedicado à prática de escalada e ao desenvolvimento da actividade turística no sector do turismo activo e natureza na região desta Vila. Segundo o sítio escoladeescalada. blogspot.com, “este é um local de eleição para a prática da modalidade, pois encontra-se associado a um clima temperado”, onde existe “uma paisagem natural fantástica onde predomina a zona classificada das Portas do Ródão, local de nidificação da maior colónia de grifos em Portugal.” É de notar que as próprias Portas do Ródão são também um atractivo turístico, pelos seus valores geológicos (garganta epigénica do Ródão), paisagísticos (Serra das Talhadas, sítio Natura 2000), arqueológicos (Conhal do Arneiro e Foz de Enxarrique), históricos (conjunto do Castelo do Ródão, classificado como Imóvel de Interesse Público) e, principalmente, biológicos, já que, para além de grifos, apresenta-se um sem-número de aves, num total de 116 espécies, muitas delas raras ou em vias de extinção. Belmonte Covilhã • Património Histórico e Tradições Gastronómicas Para quem tiver curiosidade e interesse por vilas e aldeias com grande património histórico, são de realçar Idanha-a-Velha, com as ruínas de uma catedral visigótica, Sortelha, com as ruínas do seu castelo, muralhas e as suas casas típicas, Monsanto, com o seu castelo e aglomerado de casas tipicamente beirãs, Alpedrinha, chamada a Sintra das Beiras, com o seu chafariz D. João V, Linhares com tábuas de Grão Vasco, na sua igreja matriz, Santa Maria de Aguiar, com o seu convento de Cister, do século XIII. (surrealhu- manity_b_interior.blogs.sapo.pt). Segundo o mesmo sítio, a gastronomia da Covilhã é muito apreciada. Começando pelos seus únicos pastéis de carne, com folhado especial, que crescem e alouram no molho de açafrão, bem como a “típica panela no forno, um arroz de dobrada, lardeado de chouriço, farinheira e pé de porco, preferível em panela de ferro em forno de lenha. Também o cabrito assado, que é um prato apreciado em todas as zonas montesinas da Beiras, tem também um sabor especial, com recheio de vitela, e travo de zimbro”(idem). • Terra dos Cabrais Belmonte viu nascer Pedro Álvares Cabral, o descobridor do Brasil, filho de uma família “mui” nobre, que detinha grande poder na Vila Histórica, sendo “grandes proprietários rurais em tempos em que a terra era praticamente a única riqueza e aqueles que a possuíam tinham todos os privilégios”. ( www. projetomemoria.art.br). Mas a presença da família Cabral já vinha longe na História, desde antes do descobridor. Em 1932 foi atribuída a sua alcaiadaria a Luís Álvares Cabral. Posteriormente, em 1466, dá-se mais um importante episódio com a doação da vila e castelo por D. Afonso V a Fernão Álvares Cabral. Foi aí que, no seu afamado Castelo, atracção turística incontornável, se fixou a residência dos Cabrais. O castelo de Belmonte data dos séculos XII/XIII, sendo um elemento importante da história e paisagem de Belmonte. Trata-se de um edifício que atravessou as diversas fases cronológicas da Vila, tendo tido diversas funções ao longo dos tempos. Possui um traçado ovalado irregular e torre de menagem de planta quadrada adossada pelo exterior, com três pisos. No interior, construído no século XVIII para substituir o Paço do Castelo, destaca-se o Solar dos Cabrais, com um brasão datado do século XIX. Neste Solar irá ser instalado o Centro de Interpretação dos Descobrimentos “À Descoberta do Novo Mundo”, que o município pretende ser uma homenagem a um dos principais descobridores lusos e senhor de Belmonte” Castelo Branco • GeoPark NaturTejo da Meseta Meridional Dado o seu vasto e apaixonante património geomorfológico, geológico, paleontológico e geomineiro, este Parque apresenta elementos de relevância nacional e internacional. Como exemplos temos os geossítios, os icnofósseis de Penha Garcia, os canhões fluviais de Penha Garcia, das Portas do Ródão e de Almourão, a mina de ouro romana do Conhal do Arneiro e as morfologias graníticas da Serra da Gardunha e Monsanto. O Geopark Naturtejo conta com o Parque Natural do Tejo Internacional e com áreas protegidas no âmbito da Rede Natura 2000 (sítios Gardunha, Nisa e S. Mamede) e das Important Bird Areas (Penha Garcia – Toulões e as serranias quartzíticas do Ródão), que testemunham a sua riqueza ecológica. Quem quiser procurar uma alternativa mais tradicional, pode sempre partir à descoberta do património histórico de Castelo Branco: começando pelo Paço Episcopal, construído no século XVI, até ao Largo onde se encontra o Cruzeiro de S. João de estilo manuelino, ainda ao Palácio dos Viscondes de Portalegre, do século XVIII e, finalmente, à Ermida de Nossa Senhora de Mércoles, sendo sua edificação atribuída às freiras da Ordem do Templo. Covilhã Belmonte A23 Guarda Fundão Guarda Fundão Castelo Branco • Cerejeiras em Flor A23 Em meados de Março, na Serra da Gardunha, mais precisamente na região do Fundão, as cerejeiras metamorfoseiamse, começando a florir. A região do Fundão é a capital da cereja, sendo as suas árvores um pólo de atracção na Primavera. As encostas da Serra cobrem-se de um manto branco como neve e tornam-se uma atracção turística. Lá se deslocam imensas pessoas de propósito para ver este espectáculo da Natureza. São promovidas também actividades desportivas, sendo o mais destacado o prémio de atletismo denominado precisamente de “Cerejeiras em Flor”, sendo que atletas e turistas de todo o País vêm a este evento. Decorre também um circuito pedestre e actividades como BTT. Quem quiser visitar o Fundão fora da época das cerejeiras em flor, pode fazê-lo tendo em vista outras atracções da região, nomeadamente as aldeias históricas e as aldeias do xisto. Tomemos como exemplo a aldeia histórica de Castelo Novo, um dos lugares mais emblemáticos do concelho do Fundão. Esta aldeia é caracterizada por um património irrepetível, com o encanto das casas beirãs e solares, possuindo ainda como característica as fontes de granito. • Serra da Estrela De entre todas as atracções turísticas da cidade da Guarda, a que se destaca sem dúvida é a Serra da Estrela, sendo o seu Parque Natural uma área protegida inserida na Rede Nacional de Áreas Protegidas. Este Parque (PNSE), criado em 1976, apresenta-se em forma de planalto e estende-se numa superfície de 101.060 ha. É a mais extensa área protegida do País, e é no PNSE que se encontra o local mais elevado de Portugal, a 1993 metros de altitude. Passemos então a descrever algumas das características da Serra da Estrela: quanto ao clima, esta divide-se em dois macroclimas, o Temperado e o Mediterrânico. Quanto aos habitats, de entre 27 habitats naturais destacam-se cinco prioritários, sendo eles os charcos temporários mediterrânicos, charnecas húmidas atlânticas meridionais, formações herbáceas de Nardus, turfeiras de cobertura e florestas aluviais residuais. Em relação à flora e à fauna, pode verificar-se uma enorme diversidade. A flora é variadíssima, repartida por três andares altitudinais: basal, intermédio e superior. No basal, pode-se encontrar, por exemplo, sobreiros e azinheiras. O andar intermédio, entre outros, contém apenas urzais e giestais, devido aos incêndios que assolaram a área. No andar superior destacam-se as ervas aromáticas. A Serra da Estrela acolhe cerca de 40 espécies de mamíferos, 100 espécies de aves, 30 espécies de répteis e anfíbios, oito tipo de peixes e numerosas espécies de invertebrados. 10 | ESTA JORNAL • 30 de Janeiro de 2009 OPINIÃO A23 eixo de desenvolvimento? A ntes de se fazerem algumas considerações sobre a questão em análise – A23: Eixo de Desenvolvimento – importa que se compreenda claramente de que estamos a falar. Admito que se pretende reflectir sobre a possibilidade de a A23 deter características e potencialidades para consubstanciar um eixo de desenvolvimento. Que a sua existência possa dinamizar a sua envolvente de tal forma que possa ser entendida como um eixo de desenvolvimento. Neste âmbito, quais os fundamentos teórico-conceptuais que estão na base do conceito – Eixo de Desenvolvimento? Em que medida se podem operacionalizar os pressupostos identificados de modo a permitir a sua validação? Penso que só depois de uma resposta satisfatória a estas questões se pode responder, com um mínimo de seriedade e fundamentação, à questão que dá título a este artigo. Quanto à primeira questão, “Axes de communication et développement economique” é o título de um artigo escrito por P. Pottier em 1963 na Révue Economique. Este texto constitui normalmente a referência teórica de partida para qualquer reflexão que se pretenda fazer sobre aquilo que normalmente se designa por “Teoria dos Eixos de Desenvolvimento” (TED). Qualquer teoria que pretenda equacionar questões relativas ao desenvolvimento regional deve explicitar, pelo menos, duas componentes fundamentais: quais os factores específicos geradores de desenvolvimento e quais os canais privilegiados de propagação desse desenvolvimento. Não raras vezes, políticos e técnicos confundem eixos de comunicação com eixos de desenvolvimento, colocando em causa análises e a consequente eficácia das suas políticas. A diferença, como se verá, é substancial e decisiva. Um eixo de comunicação tem três componentes. Em primeiro lugar é necessário que exista um itinerário, ou seja, um território que pode ser atravessado com facilidade. Dito de outra forma, a existência de uma região ou um conjunto de regiões que estabelecem relações inter-regionais ou, mesmo, supra regionais. É um território que para além da aptidão para concentrar movimentos permite articular, também, uma cadeia de localizações e aglomerações humanas e económicas relevantes. Este território terá tendência para fazer a ligação entre dois pólos que se encontram nas extremidades e que reforçam, pelo dinamismo que detêm, a circulação ao longo do itinerário. A segunda componente é uma infra-estrutura complexa de comunicações justapondo, sempre que possível, diferentes técnicas e modos de transporte. Finalmente, é necessária uma densidade mínima de circulação de bens e de pessoas. São estas três componentes que, reforçando-se mutuamente, transformam um simples eixo de comunicação num eixo de desenvolvimento. Para isso, cada uma das componentes é essencial e nenhuma pode ser secundarizada face às restantes. Os eixos de comunicação desenvolvem dois efeitos como factores de desenvolvimento. Por um lado, são agentes de impulsão e, por outro, funcionam como vectores de propagação do desenvolvimento. Analisemos, brevemente, cada um destes efeitos. Os efeitos de impulsão decorrem de quatro elementos principais: os impulsos resultantes da construção de uma nova infra-estrutura, da diminuição dos custos de transporte, da expansão da procura das regiões de passagem e, finalmente, os impulsos ligados à difusão de informação e conhecimento que é possível potenciar. A construção de novas infra-estruturas re- Sérgio Nunes* presenta, frequentemente, uma concentração de investimentos públicos com efeitos multiplicadores importantes que se poderão estender a outras regiões. A construção de novas infraestruturas vai permitir a circulação de novos modos de transporte que irão, por sua vez, induzir ao aparecimento de novas actividades económicas. A diminuição dos custos de transporte tem um efeito tripartido. Em primeiro lugar, a diminuição dos custos de transporte alarga as áreas de mercado permitindo, deste modo, maiores economias de escala tornando, por isso, as diversas produções mais eficientes ,beneficiando os consumidores locais assim como podendo potenciar as exportações regionais e locais. Em segundo lugar, o alargamento das áreas de mercado permite, simultaneamente, a obtenção de limiares mínimos para outras actividades. O que isto significa é que actividades que antes não tinham mercado (procura) suficiente para serem economicamente viáveis passam, deste modo, a verem (potencialmente) atingido esse limiar. Em terceiro lugar, a redução dos custos de transporte permite o aumento das interdependências e promove, deste modo, as especializações regionais possibilitando o fortalecimento das vantagens comparativas e competitivas das empresas. Os impulsos da expansão da procura das regiões de passagem resultam da necessidade de resposta à procura de quem circula e às possibilidades destes fluxos poderem contribuir para a valorização dos recursos de âmbito local (actividades económicas, decorre da sua capacidade intrínseca para funcionar como vector de propagação do desenvolvimento. Os eixos de comunicação vão ter um impacto na forma como a actividade económica se distribui no território. Estes efeitos estão directamente ligados à teoria da localização e à teoria da renda fundiária. Quanto aos impactos sobre a localização podemos considerar dois canais de propagação essenciais. A teoria da localização das actividades económicas identifica como pontos de localização potencialmente preferenciais – para indústrias que pretendam minimizar os custos de transporte – o mercado, as fontes de matérias-primas, os pontos de transbordo e os nós das vias de comunicação. Ora, pela sua natureza, o eixo de comunicação vai, necessariamente, gerar múltiplos pontos desta natureza susceptíveis de virem a ser seleccionados como localizações de novas empresas ou mesmo como relocalizações de empresas já existes ou expansão das mesmas. Um segundo canal de propagação resulta do facto de o acréscimo de acessibilidade ao longo do eixo permitir diferentes escolhas residenciais pelas famílias podendo, também, modificar a organização espacial na prestação de múltiplos serviços às diversas famílias. Os impactos através do mecanismo da renda fundiária exercem-se sobretudo na distribuição das actividades agrícolas e na organização intraurbana, quer nas escolhas residenciais quer nas escolhas de produção. Maiores níveis de acessibilidade significa que se podem tornar rentáveis Um eixo de desenvolvimento implica obrigatoriamente um itinerário e uma densidade mínima de fluxos potenciais paisagem, património, cultura, etc.), principalmente numa perspectiva de exploração turística. Finalmente, os impulsos ligados à difusão do conhecimento e da informação. A informação e o conhecimento (que não se devem confundir) sempre foram factores de progresso técnico e organizacional, de inovação e de iniciativa empresarial. A difusão do conhecimento e da informação dependem fortemente da frequência e da natureza dos contactos. Acresce que, ao longo do eixo de comunicação, se maximiza a exposição à informação e ao conhecimento de diferentes origens, natureza e complexidade. A probabilidade de contactos aumenta com a frequência dos mesmos, criando maiores oportunidades de criação, difusão e absorção de conhecimento. O segundo papel dos eixos de comunicação produções agrícolas que não o eram até então ou afastar outras para espaços mais distantes. Desta forma é possível reorganizar espaços urbanos fortalecendo os seus centros através do alargamento das suas áreas de mercado e do poder de atracção dos seus lugares centrais. Estes dois efeitos – efeito de impulsão (criação) e de propagação (difusão) – tornam os eixos de comunicação em eixos de desenvolvimento, na perspectiva de Pottier. Facilmente se compreende que, neste sentido, a concepção de eixo de comunicação é substancialmente diferente das normais infra-estruturas de transporte. Torna-se desta forma evidente, que por mais modernas que sejam as infra-estruturas de transporte estas não bastam, por si próprias, para criar um eixo de desenvolvimento. Claro que a sua construção não é inócua para o dinamismo regional, mas na ausência do itinerário apenas actuarão (e em diversos graus, conforme a sua natureza) ao nível dos efeitos de propagação. Temos então, ainda que de forma breve, explicitados os principais fundamentos conceptuais da TED. É neste âmbito que se devem fazer as considerações sobre o caso específico da A23. Parece neste momento claro que faz pouco sentido falar na A23 – uma auto-estrada – como um eixo de desenvolvimento. Acresce que esta é uma infra-estrutura que, de per se, tem tendência para fazer sentir mais os seus efeitos nas extremidades ou na envolvente dos nós. Quando muito poderíamos tentar compreender se a A23 poderia fazer parte de uma estratégia de desenvolvimento regional suportada na TED. É precisamente neste âmbito que há ainda muito trabalho de investigação a realizar. Admitindo que sabemos definir com clareza o Eixo de Desenvolvimento associado à A23 – (ED-A23) – ou de que a A23 faz parte, conhecendo os pressupostos teórico-conceptuais do conceito importa, então, começar por desenvolver trabalho de investigação susceptível de responder a algumas questões de natureza orientadora (considerem-se estas questões como exemplificativas). Qual o conteúdo material e imaterial do eixo de desenvolvimento de que a ED-A23, supostamente, materializa? Quais os factores de desenvolvimento específicos geradores de desenvolvimento do ED-A23? Quais os canais de propagação do desenvolvimento do EDA23? A A23 tem 35 saídas. Como tem evoluído, por um lado, a concentração e a circulação de pessoas e bens e, por outro, o valor do solo e os indicadores de bem-estar económico e social na área de influência de cada saída? Qual a evolução do perfil do ED-A23 durante a última década? E qual a relação desse perfil com o perfil das exportações nacionais? Só com respostas a estas questões se pode começar a pensar em identificar linhas de respostas coerentes e fundamentadas à questão inicial. Este é um trabalho que é urgente realizar. Por outro lado, no âmbito desta discussão é imprescindível fazer uma outra reflexão. Uma estratégia de desenvolvimento regional baseada na TED não tem qualquer eficácia se a estratégia não decorrer do entendimento prévio dos diferentes actores (públicos e privados dos vários órgãos de poder territorial) dos diversos espaços regionais. Houve esse entendimento? Há uma visão de conjunto (por exemplo dos quatro distritos atravessados pela A23) sobre o que se pretende com essa estratégia, quais os objectivos, quais os instrumentos (materiais, humanos e financeiros) e quais as interdependências directas das acções de cada agente de poder regional/supra-regional? Já para não mencionar qual o local físico mais apropriado e com competências próprias para realizar esta reflexão. Por último, a TED foi proposta em 1963. Muita coisa mudou desde então, desde os agentes de política, às suas competências, ao entendimento que se faz do próprio desenvolvimento regional e dos instrumentos com eficácia para intervir no seu domínio, até aos recursos e factores do próprio desenvolvimento assim como o âmbito em que este se realiza. Em linhas muito gerais, o que mudou com impacto na discussão presente? Em primeiro lugar, o fenómeno da globalização, o aprofundar das interdependências entre territórios e a forma de conceber o crescimento e o desenvolvimento nesse âmbito, dando particular destaque ao papel do conhecimento enquanto recurso de dinamismo económico e factor de competitividade das regiões. Por outro lado, o aumento da impor- 30 de Janeiro de 2009 • ESTA JORNAL | 11 OPINIÃO tância dos eixos de comunicação a-espaciais e a sua articulação e integração numa estratégia de desenvolvimento regional que se sustente na TED tradicional. Neste âmbito, valoriza-se cada vez mais a capacidade de se estabelecerem relações independentemente da distância e a capacidade das regiões e do seu tecido económico e social (e até político-instituicional) integrarem redes inter-regionais (e mesmo internacionais) pouco ou nada condicionadas pelas fronteiras físicas ou administrativas tradicionais. Para algumas actividades, as redes em que importa participar são cada vez mais combinações não lineares de natureza territorial, trans-territorial e virtual (sem referenciação territorial). Sem o valor económico a que é possível aceder nessas redes, as regiões entram em processos de declínio económico, fruto de efeitos negativos auto-reforçantes de “lock in” produtivo, isto é, fecham-se sobre si próprias em trajectórias industriais obsoletas sem possibilidades para explorarem outros regimes tecnológicos. Finalmente, os meios de financiamento disponíveis (nomeadamente os seus montantes e as suas fontes) e as formas de organização do território (falta-nos um nível intermédio de poder) são elementos cada vez mais condicionadores das estratégias a implementar. Dito isto e face aos novos factores de enquadramento da criação de riqueza e de desenvolvimento das regiões, deve-se considerar que a TED – admitindo, claro, que seríamos capazes de respeitar as condições necessárias e suficientes – é ainda uma (ou parte de uma) estratégia de desenvolvimento válida e exequível? Face a estas breves considerações, necessariamente pouco profundas devido ao âmbito da análise, qual a nossa opinião sobre o assunto? Entendo, por princípio, que uma estratégia não é boa ou má em abstracto. É apropriada ou não face aos objectivos que pretendem atingir (estão definidos? Por quem?), face aos contextos espaciais onde se pretende aplicar (qual é a “região” em causa e a sua área de influência?) e face à capacidade que a região tem para identificar actores de natureza económica e política capazes de abraçarem com confiança mútua um projecto comum, mobilizando meios financeiros e humanos para a sua prossecução. Estarão reunidas estas condições prévias e necessárias? Penso que não. E tenho mesmo dúvidas que seja esta a estratégia mais apropriada para uma região como aquela que está em discussão e face aos desafios de competitividade e sustentabilidade económica e social que os territórios hoje enfrentam. Importa relembrar que mesmo nos anos subsequentes à apresentação do artigo de Pottier, cedo se percebeu que a teoria tinha mais poder explicativo do que propriamente eficácia em termos de política e estratégia de desenvolvimento. E a razão é simples. Um eixo de desenvolvimento implica obrigatoriamente um itinerário (cadeia de localizações e aglomerações humanas) e uma densidade mínima de fluxos potenciais. Ora a verdade é que os actores regionais e os responsáveis políticos apenas sabem actuar sobre uma das suas componentes: a infra-estrutura. Se se olhar para a história portuguesa nesta matéria, a TED está morta e enterrada há muito tempo. Não está no ADN nacional a capacidade de integrar os dois domínios, principalmente porque nunca fomos capazes de planear o território para além dos ciclos político-partidários e do frenesim do curto-prazo. Este é mais um dos conceitos muito populares dos anos 60 – assim como, por exemplo, os pólos de crescimento de Perroux – que mantendo alguma atracção analítica são utilizados politicamente pela sua forma sem cuidar minimamente do seu conteúdo. É essa, provavelmente, também uma das razões que infelizmente os levaram (aos conceitos) a cair em descrédito – enquanto instrumentos de política regional – contribuindo para a justificação centralizadora da organização do território. É uma pena. *Docente do IPT A23: uma miragem antónio borges abel* T al como chegaram até nós, os “Itinerários de Antonino” naturalmente enfatizam a rede de vias terrestres que o Império Romano teceu para efectivar quer o domínio político, administrativo e militar do território, quer para garantir a exploração económica das riquezas com que esse mesmo território contribuía para o engrandecimento e sede de riqueza da sede do Império: Roma. Porém, aqueles “Itinerários” ignoram ou obliteram a organização territorial pré-existente baseada nas “auto-estradas” da época: a navegação e, para o que nos interessa aqui, os cursos fluviais, “auto-estradas” sem custos para o “contribuinte”, já que eram uma dádiva da geografia/natureza. É assim que podemos imaginar um desenvolvimento regional, cujo início desconhecemos mas cujo resultado é ainda visível, embora moribundo – senão já morto e enterrado -, baseado na grande “auto-estrada” leste-oeste peninsular que é o Tejo, variando o calado das naves que o usavam em função da sua navegabilidade. Naturalmente que o Império mais não fez, tendo ainda em vista a exploração económica, protegida obviamente pelo corpo militar, que para outra coisa não serve, que estabelecer “postos de controle” (portagens dessa “auto-estrada”) alcandorados sobre a via fluvial, de que são exemplos Scallabis (Santarém), Aurantes (Abrantes), Norba Caesaria (Cáceres) ou Toletum (Toledo), com os respectivos arrabaldes ribeirinhos, esses sim verdadeiros “corações” da economia que a “auto-estrada” permitia e incentivava. Centrada a actividade naquela “via”, no século XIX ela viu-se substituída pelo caminho-de-ferro o qual, num “golpe baixo”, estabelece um traçado genérica e praticamente paralelo ao Tejo, retirando-lhe protagonismo (a incipiente industrialização, centrada na área da capital já era exigente no tocante à velocidade com que chegava a matéria-prima e à velocidade com que exportava para a província o produto acabado, estiolando desse modo a tão actualmente propalada tradição dos usos rurais e provincianos que, afinal, não é tão tradicional assim). De um único golpe, os TIR do Tejo – as fragatas - foram deixados a apodrecer nas praias (parques de estacionamento) que bordejam o rio até Lisboa, nem lhes tendo valido a importância de terem transportado o combustível dos grandes “motores”, de tiro ou de carga – o cavalo, o burro, o macho e a mula -, da actividade económica da capital: a palha que deu o seu nome ao grande estuário fronteiro a Lisboa. Assiste-se, assim, naquela época, à crescente importância das áreas adjacentes à via férrea e à “explosão” industrial de pequenos aglomerados rurais, implantando-se a indústria, como é seu mester, em terrenos aluvionares, logo de altíssima qualidade, uma vez que, sendo desde logo planos, permitiam uma poupança de investimento na construção dos grandes complexos que cresciam como cogumelos: de Sacavém a Vila Franca de Xira, da Ribeira de Santarém a Alferrarede, p.e., ou à localização de estações junto a indústrias (troque-se a ordem dos factores que nada altera à veracidade da relação) dependentes da matéria-prima que o “mercadorias” lhe traz – a Metalúrgica À semelhança do que aconteceu com os anteriores meios de comunicação, seria de esperar que ao longo da A23 se fossem fixando/implantando novas indústrias, novos pólos de desenvolvimento económico regional sustentável, novos “clusters” competitivos, pela excelência tecnológica e indutores de actividades económicas a montante e a jusante de si, cujo elo de ligação/dependência fosse a A23. Contudo, embora fosse do conhecimento dos decisores, mas não considerado quando aqueles “traçavam” o IP6/A23 (a voracidade deve ter-lhes toldado a visão de futuro), eis que surgem em cena as NTIC (Novas Tecnologias de Informação e Comunicação), as deslocalizações produtivas (a China é, actualmente, a fábrica do mundo) e a emergência dos futuros líderes económicos e tecnológicos mundiais: o BRIC (Brasil, India e China), “esvaziando” de sentido de A A23 não será, nunca, a linha da Beira-Baixa, nem a “auto-estrada” chamada Tejo. Duarte Ferreira, no Tramagal, ou a Celulose do Caima, fronteira a Constância, são dois exemplos entre muitos – e da velocidade de escoamento dos produtos acabados. Obviamente que, com o desenvolvimento/ extensão do caminho-de-ferro, as travessias “sólidas” do Tejo (leiam-se pontes) multiplicam-se, ficando para a memória nostálgica actual quer a actividade de atravessamento do rio, quer os topónimos àquele associados: Vila Nova da Barquinha, Barca do Pego, etc, entre tantos outros já desaparecidos. Em pleno século XX, fruto da velocidade que os agentes financeiros impuseram à economia, foram vertidos na IP6/A23 milhões de euros, em quantidade directamente proporcional à necessidade que a Europa tinha/tem de alargar o seu mercado de consumo, à voracidade/rapidez que tinha/tem de predar os produtos regionais deste “cantinho à beira-mar plantado” e, não dispiciendo, à necessidade que as petrolíferas tinham/têm de aumentar indefinidamente os consumos, necessidade esta a que o Estado, sorvedouro e predador, não é alheio por via do ISP, entre outros impostos, taxas, etc. desenvolvimento económico a A23 (salvo se esta foi pensada para o escoamento do pêro bravo-môfo da região de dois nossos recentes primeiros-ministros) e, talvez por isso, pese embora os investimentos locais em Parques Industriais (cada um pertença da “coutada” municipal, mesmo que o município adjacente tenha estado a fazer o mesmo) na proximidade daquele eixo estruturante territorial, não se vê o aparecimento de actividades económicas de relevo, saldando-se a paisagem daqueles Parques pela implantação de pequenas oficinas, armazéns, lojas de venda a granel, serviços municipais (obras e limpeza) e pouco mais. Poderão objectar-me que há que dar “tempo ao tempo”. Porém este é um tempo que não tem tempo para dar, um tempo que não espera pelos que se atrasam, um tempo em que teremos que estar um passo adiantados ao tempo que está a passar, um tempo em que as transformações mundiais se sucedem a um ritmo nunca antes experimentado e que não se compadece com a nossa endógena falta de visão estratégica e a nossa exacerbada auto-confiança no “desenrascanço”. Os tempos de hoje já foram. A A23 não será, nunca, a linha da Beira-Baixa, nem a “auto-estrada” chamada Tejo. A “nova” A23 está na velocidade da comunicação digital e nas redes de cidades mas, fundamentalmente, na capacidade de estas atrairem investimentos em “tecnologias de ponta” que, por sua vez, atraiam agentes de alta qualificação académica e tecnológica, aos quais as cidades deverão dar condições de fixação no seu tecido urbano, este requalificado, evitando a dispersão daqueles pelos arredores, situação que acarreterá a necessidade de vultuosos investimentos nas redes de comunicação terrestre, e respectivos problemas de trânsito a jusante, vultuosos investimentos em infraestruturas urbanas, em equipamentos, etc... e irá deslocalizar os impostos de carácter local, inviabilizando a manutenção da própria cidade que os pretende acolher. *Arquitecto e Professor na Uni. de Évora 12 | ESTA JORNAL • 30 de Janeiro de 2009 AMBIENTE Água não se nega a ninguém A A23 passa por cima do rio Zêzere, quase no ponto em que se junta ao Tejo. Nessa zona, a história guarda episódios que hoje parecem demasiado distantes. O rio que hoje se usa, não só para abastecimento mas também para lazer, é um marco da região. cATARINA RAMALHO Alison Silva Negar água a quem quer que seja é uma atitude inaceitável, que vai contra os nossos costumes e tradições desde tempos imemoriais. Mas esta atitude foi uma realidade há não muito tempo, não muito longe de cada um de nós. Jaime Silva conta a história que transformou a sua infância, a história da terra que o viu nascer e que fez nascer poemas dos maiores poetas lusitanos. Constância é conhecida também como Vila Poema, por este motivo. Na terra onde Camões se retirou por amor e de amor escreveu, à semelhança de Fernando Pessoa, Vasco de Lima Couto e Alexandre O’Neill, os rios Zêzere e Tejo banham o povo que foi proibido de beber água. A história passa-se no final da década de 50, início de 60, do século passado. Conhecida pelos seus fontanários, Constância é terra onde a água corre sem medo. As pessoas abasteciam-se ali com bilhas de barro e cântaros à cabeça ou nas mãos. Nos gastos domésticos, a abundância do bem mais essencial não exigia que se pensasse em economizar. A maior parte da população não era letrada nem entendia coisa alguma de questões ambientais nem económicas. É então eleito um novo presidente da Câmara Municipal de Constância, o Tenente Soares, da Acção Nacional Republicana (ANP), sob regime do Estado Novo. Manda, então, fechar todos os fontanários da região e proíbe todos os habitantes de dar um copo de água aos próprios vizinhos, obrigando todas as famílias de fracos rendimentos a colocar água canalizada em casa. Esta é uma medida tomada em prol dos interesses económicos do Estado, mas que é inaceitável na nossa sociedade. Contudo, Vila Poema assim viveu ao longo de alguns anos. A situação era intolerável, o povo passava sede e os animais domésticos foram as outras verdadeiras vítimas desta atitude. A entrada do guarda-livros Aurélio Dias Nogueira, também da ANP, para a presidência da Câmara Municipal de Constância, ainda dentro do mesmo regime ditatorial, trouxe consigo nova esperança à Terra Mãe de muitos dos nossos poemas. Os fontanários foram reabertos e as pessoas voltaram a abastecer-se ali. Nesta época, o saneamento básico consistia na instalação de lajes subterrâneas que os encaminhavam até ao rio Tejo, onde ficavam a céu aberto. O rio era poluído sem qualquer remorso, enquanto o rio Zêzere era reverenciado. As suas águas eram límpidas e as PUB Zêzere. Até meados do século passado este rio era a principal fonte de abastecimento de àgua potável da região rochas que o calçavam eram visíveis a olho nu, mesmo nas zonas onde o caudal atingia mais de cinco metros de profundidade. Estes factores faziam com que o Zêzere fosse a principal fonte de abastecimento de água potável da região. Quando esta não estava em condições aceitáveis para consumo, uma mina em Vila Nova da Barquinha era a alternativa deste povo, dado o estado deplorável do Tejo. Hoje, Constância conta com uma rede de Conhecida pelos seus fontanários, Constância é terra onde a água corre sem medo esgotos e água canalizada na generalidade das suas habitações, correspondendo às necessidades dos seus mais de 4 mil habitantes. Apenas 2,7% da população não tem electricidade em casa e 4,1% não tem água canalizada, não sendo 10, 5% desta abrangida pela rede de esgotos, segundo dados da ECOS Ribatejo. A taxa de analfabetismo está reduzida aos 12,5% e mais de 65% da sua população compreende-se entre os 15 e os 64 anos. “Tal como a árvore, agarra-te à vida” Alison Silva A frase vencedora do concurso lançado pela Scutvias, para a criação de um Slogan promocional e um logótipo no âmbito do projecto de plantação de 20 mil árvores ao longo do eixo A 23, é da autoria dos alunos do 3ºA da Escola Básica dos Penedos Altos, da Covilhã. “Tal como a árvore, agarra-te à vida” é a frase que se pode ler nas camisolas dos 1700 alunos envolvidos no projecto que pretende minimizar os danos ambientais provocados pelas 11 mil viaturas que diariamente circulam na 3ª maior auto-estrada do país. Esta é uma frase que, segundo a Scutvias, tem “dupla conotação: Segurança Rodoviária e Protecção do Ambiente”. Três anos depois de ter sido lançado o projecto, estão plantadas 2 mil árvores das 20 mil inicialmente propostas. Os pinheiros e os carvalhos foram eleitos pela Scutvias, de acordo com o Governo Civil de Castelo Branco, para fazerem parte deste projecto como representantes da fauna característica da região. São fornecidos ainda em semente às escolas do 1º, 2º e 3º ciclo do distrito de Castelo Branco, ficando depois ao cuidado dos alunos durante um mês. Depois, as próprias crianças e jovens as irão plantar em locais sinalizados. A manutenção das árvores ficará a cargo da Scutvias, que pretende finalizar o projecto em 2010. Às escolas são fornecidos panfletos sobre as árvores em causa e a sua manutenção, cabendo-lhes o papel de aprofundar esses conhecimentos junto dos alunos. Para os alunos, este é um projecto interessante, que promove a responsabilidade ambiental. A Scutvias defende que as crianças demonstram “interesse pelo meio ambiente, pela segurança e bem-estar das nossas vias de comunicação”. O Governo Civil participou, também, no projecto através da dinamização do processo de mobilização das escolas e coordenou os transportes dos alunos. As autarquias locais da região colaboram na cedência desses mesmos transportes. O projecto lançado no dia 14 de Abril de 2008 contou com a presença do ministro da Administração Interna, Rui Pereira, que plantou uma árvore, como exemplo a seguir. 30 de Janeiro de 2009 • ESTA JORNAL | 13 CONHECIMENTO Constância alcança o espaço Desde há cinco anos que Constância deixou de ser apenas vila poema para ser também vila astronómica. Na Colina, selvagem e verdejante, perto das estrelas, Constância assiste de perto aos comportamentos da Ursa Maior e Menor. Tatiana pedrosa Tatiana Pedrosa Quatrocentos anos depois das primeiras observações astronómicas feitas por Galileu, e da consequente revolução científica que alterou a visão que se tinha do Universo, sentiu-se a necessidade de construir um espaço interactivo de divulgação e promoção da cultura tecnológica e científica entre os visitantes. Este espaço, Centro de Ciência Viva de Constância, surgiu da iniciativa conjunta entre a Ciência Viva, a Câmara Municipal de Constância e o coordenador científico, Máximo Ferreira, que explica que se “juntou o interesse da Câmara Municipal de Constância em que o centro fosse aberto cá e a minha disponibilidade para cooperar, visto também pertencer a esta terra”. O desenvolvimento e a investigação tecnológica, associados à exploração espacial, têm um carácter multidisciplinar e um impacto relevante na qualidade de vidas das sociedades modernas. Estes fundamentos fazem desta área uma ferramenta importante na promoção da ciência junto dos jovens e público em geral, pelo interesse e curiosidade que normalmente despertam. Segundo o coordenador científico, pretende-se que as pessoas saiam do Centro de Ciência Viva gostando daquilo que viram e nos seus dias da vida quotidiana, quer sejam estudantes ou não, se recordem de algumas coisas que viram e ouviram e depois, ao ver um documentário ou até mesmo um filme, já não as achem tão estranhas”. Também Tânia Machado, Estudante da ESTA, partilha da mesma opinião quando visita o Centro, achando que este tipo de centros de astronomia são uma mais valia para o conhecimento de todos Eventos. As observações nocturnas são uma das principais alterações do Centro de Ciência Viva de Constância os visitantes em geral. “Este tipo de espaços cativa todo o público, mais propriamente os jovens, não só pela interactividade com equipamentos diferentes, como também pelo conhecimento espacial que se adquire”, refere. Desfrutar melhor dos módulos Com a colaboração de seis elementos - o coordenador científico, quatro coordenadores pedagógicos e um guia - o Centro de Ciência Viva de Constância tem desenvolvido projectos e eventos relacionados com a exploração espacial, procurando estimular o interesse dos jovens e da população pela Ciência e pela Tecnologia, como refere o professor Máximo Ferreira. “Os eventos e os projectos que desenvolvemos são sempre orientados pelos nossos profissionais; Preparamos previamente não só as visitas, como também tentamos enquadrar os eventos que aqui decorrem, falando, no caso de estudantes, nas matérias que leccionam nas suas aulas”, afirma. Os eventos com relevância são marcados com o requinte que a ocasião merece, como é o caso dos eclipses e de outros fenómenos astronómicos em que o acontecimento é anunciado pela Comunicação Social, por exemplo. Nestas noites, excepcionalmente, o centro encontra-se à disposição de todos aqueles que queiram viajar até ao mundo das estrelas. Para observar no céu nocturno do Centro de Ciência Viva de Constância, normalmente, encontram-se ainda constelações, corpos celestes e planetas. Contudo, nem sempre o espaço/céu tem fenómenos que merecem especial atenção, daí não se justificarem observações nocturnas. São estas o maior entusiasmo para muitos dos colaboradores deste centro, como é o caso do coordenador pedagógico Mário Loureiro, que confidencia: “As observações nocturnas são das coisas que mais gosto de fazer nestes três anos em que me encontro aqui a trabalhar”. Porém, este tipo de interacção a horas tardias é mais frequentado por famílias do que propriamente por jovens estudantes, que são o público mais frequentador do centro. Uma luz ao fundo do túnel Os fenómenos de astronomia de que actualmente tanto se fala só são possíveis observar devido ao avanço tecnológico que os telescópios sofreram. O que acontece no Centro de Ciência Viva de Constância, que tanto impressiona os que lá passam, deve-se a isso mesmo, à sofisticação e investimento que o centro tem feito para melhorar o conhecimento dos seus visitantes. Para este ano de 2009 o Centro de Ciência Viva vai acolher um dos maiores telescópios do país. Este equipamento contou com o apoio da Fundação EDP, que doou ao Centro de Ciência Viva de Constância 56 mil euros. Esta Fundação irá também promover as actividades do Centro e cederá as instalações do Museu da Electricidade para que lá se possam realizar exposições e conferências. O centro encontra-se deslocado da zona habitacional, rodeado de natureza. Como descreve Tânia Machado: “é um espaço isolado muito bem conseguido que vive muito a natureza”, e conta já com um edifício principal onde têm implementado três observatórios, um auditório e um planetário, que é o único do país, não pela excelência do equipamento, mas pela localização, visto encontrar-se debaixo do chão, tendo que se percorrer um túnel para se chegar até ele. No que diz respeito aos módulos exteriores podemos encontrar uma representação do Sistema Solar, um Globo Terrestre, um Carrocel que interpreta o Sol, a Terra e a Lua, um Relógio Solar e ainda uma Esfera Celeste. Este espaço contempla-nos ainda com um parque de campismo para todos os que pernoitarem na exploração ao espaço. Tal como refere o coordenador científico com muito entusiasmo, “é um espaço onde podemos vir inúmeras vezes porque há sempre coisas novas para ver e para questionar”. Museu de Mação: o dinamismo passado e presente Hália Costa Santos Sílvia Carola É em Mação que podemos ir ao encontro de algo que nos transporta para outra dimensão e outras épocas, que é o museu de Arte Pré-Histórica e do Sagrado do Vale do Tejo. Este apresenta uma extraordinária exposição de artefactos dividida em duas colecções distintas, do Paleolítico e do Neolítico. Ideia original de João Calado Rodrigues, o museu, cujo projecto remonta aos anos 40, foi remodelado e inaugurado em 2005. Esta remodelação teve origem na descoberta de figuras rupestres no rio Ocreza. Segundo Margarida Morais, representante do museu, o dinamismo do mesmo assenta em vários Visitas. Margarida Morais conta a história do Museu e de cada peça factores. Um deles é o objectivo de levar as pessoas “a pensar de uma forma diferente de como se vivia naquela época”, e “fornecer o maior número de informação possível às pessoas para as levar a pensar que o património é importante”. Simultaneamente, o principal significado é “a protecção do património pela própria população”. Os serviços educativos dedicados às crianças são também são uma ideia-chave do Museu de Mação. Refere a representante do museu que estes consistem “em actividades que são desenvolvidas e programadas”, por forma “a dar uma educação às crianças sobre o património”. São actividades tanto práticas como teóricas. Em relação às actividades práticas, “eles podem mexer, tocar, é fazer objectos em cerâmica, polir, entre outras actividades”. A nível teórico existem, por exemplo, actividades como “fazer desenhos de peças” que têm no museu, e “descobrir como se chamam algumas peças específicas”. O objectivo é de que as crianças se divirtam e apren- dam, ficando ao mesmo tempo mais próximas. O mais recente projecto do Museu de Mação é uma inovadora exposição especialmente preparada para invisuais. Margarida Morais fala sobre este projecto, dizendo que “vem inserido num projecto europeu, que é o ‘Thouch or not to Touch’, e cada instituição que se candidatou apresentou uma ideia”. A exposição fazse com a ideia de, com réplicas das peças do museu, as pessoas poderem mexer e conhecer. São vários os pontos fortes do museu. Conforme a representante do museu existem “o acolhimento” que dão “às pessoas”, os já referidos serviços educativos, “o parque arqueológico do Ocreza a ser criado” e “a parte da investigação científica”. 14 | ESTA JORNAL • 30 de Janeiro de 2009 Museus ao longo da A23 Viver para a comunidade Numa das estreitas ruas de Riachos surge um museu com características particulares: vive da comunidade para a comunidade, conquistando novos públicos. A partir das temáticas agrícolas surgem objectos que contam a história das pessoas comuns. hália costa santos Sílvia Carola Num antigo lagar de azeite, em 1989, foi instalado o Museu de Riachos, o qual, segundo Mafalda Luz, directora do museu, tem uma vocação comunitária. Com cerca de 2000 visitantes por ano, este museu tem o intuito de dinamizar tanto as pessoas da vila como os visitantes, proporcionando, para além da exposição aberta ao público, uma interacção através de uma série de serviços. Mafalda Luz explica que uma das mais-valias do Museu dos Riachos é precisamente o conjunto de “serviços educativos, de conservação e restauro, de museologia e museografia. É à volta destes pilares que gira a vida do museu. Quer sejam as visitas guiadas, as exposições temáticas, as exposições de arte ou as oficinas, a que gostamos de chamar oficinas de ‘expressão’”. Nestas oficinas junta-se o grupo de artesãos do museu, que ocupam aí os seus tempos livres. Orientados por um antigo professor de Trabalhos Manuais, trabalham a madeira por gosto e para manter a tradição. A directora vinca que a temática que rege o museu deve-se “não só ao espólio” entretanto reunido, “mas também devido à própria terra em que está” inserido. Diz que “Riachos sempre foi uma terra muito ligada à agricultura”, não só pelo tipo de campo e áreas de cultivo que tem, como pela fertilidade das terras. E, neste contexto, também não se pode esquecer a importância do rio. Mafalda Luz refere ainda que nem só de espólio agrícola vive o Museu dos Riachos: “Temos, por exemplo, uma sala que tem alguns trajes (Sala do Trajo – Maria dos Santos Marques), algumas coisas do quotidiano. Temos aqueles trajes mais emblemáticos, que marcam a ruralidade de Riachos”. Com relação aos públicos, Mafalda Luz repara: “Temos projectos sobretudo para o público em idade escolar.” E quando fala de idade escolar vai desde o pré-escolar ao universitário e politécnico, destacando o apoio especial do Instituto Politécnico de Tomar. No caso do ensino superior, evidenciam-se os projectos que envolvem estágios. Em relação a estas experiências, a directora não tem dúvidas: “Estes estágios são uma mais-valia, são pessoas que vêm para aqui estagiar com outra maneira de pensar e que nos ajudam a desenvolver projectos”. Mafalda Luz declara ainda que a experiência para eles também é positiva, pois “envolvem-se no museu com uma dinâmica muito intensa”. A directora do museu acrescenta que a chave deste espaço são as pessoas: “Aqui tudo gira em torno das pessoas, para nós o património vivo, que são as pessoas, tem que ser preservado, porque esse é o mais fácil de desaparecer.” Por isso é que, no espaço do museu, se pode ver praticamente tudo o que está ligado à vida de antigamente das pessoas, da terra, dos animais, das profissões e de outras formas de subsistência. Desde uma PUB HiperMed Representação de Material Médico, Lda. Praça Barão da Batalha, 40 – 1º 2200-365 Abrantes Tel: 241 362 369 Fax: 241 377 101 www.hipermed.pt E-mail: [email protected] Brocas, Implantes, Endo Mecanizada, Suturas, Branqueamento, Instrumental Clínico e Cirúrgico, Compósitos, etc. Oficina. Num grupo de artesãos ocupa os seus tempos livres a trabalhar a madeira carroça, até mantas, passando por utensílios do campo e ainda por um oratório. Tudo o que faz parte de vidas passadas, mas ainda presentes na memória de muitos. E como preservar esse património? “Temos as fotografias que podemos reter, são os filmes e a recolha de memória oral”, que “é a única forma de preservar realmente esse património vivo”. Também por isso, uma das salas do museu é dedicada a fotos antigas de famílias e de grupos, que permitem aos mais novos imaginar como seria a vida de outros tempos e que permitem aos mais velhos recordar outras formas de vida. Quanto a exposições, o leque é variado: “Temos a exposição permanente, temos uma galeria de artes onde expomos desde pintura, fotografia, escultura”. O museu dos Riachos também tem uma colecção de presépios”. No fundo, o objectivo é o de abranger todo o tipo de exposições, contribuindo para “desmistificar os museus”. Porque, na opinião dos responsáveis por este espaço, “essa é a forma mais fácil de termos um público que normalmente não acede aos museus”. Mafalda Luz acrescenta outra vertente que desenvolvem para tentar levar ao museu todo o tipo de públicos. “Para além das exposições temporárias temos um auditório onde fazemos lançamentos de livros, concertos desde música clássica a música mais popular, a rock.” Para além de preparar actividades que cativem novos públicos, a directora do museu reconhece que a A23 também veio trazer desenvolvimento “ao museu, à comunidade, a este concelho e a outros.” E conclui: “Penso que esta ligação toda com a A23 ajuda muito como via de comunicação para aproximar as pessoas.” As memórias fluviais hália costa santos É num edifício que à partida passa despercebido, com uma entrada discreta, que se situa o Museu dos Rios e das Artes Marítimas de Constância. Sobem-se umas escadinhas e entrase num espaço acolhedor, intimista. Este museu foi fundado em 1998, englobado no Plano de Ordenamento das Margens do Tejo e do Zêzere (POMTEZ), cujo financiamento foi determinante. O objectivo seria, segundo Anabela Cardoso, directora do museu, servir como “um local onde se guardariam as memórias materiais e imateriais da vivência que as pessoas de Constância tinham com os rios”. O Museu dos Rios encontra-se dividido em três espaços principais, sendo um dedicado à pesca, outro ao transporte fluvial e ainda outro à construção naval. Existe ainda uma pequena sala que representa a festa anual em honra da N.ª Sr.ª da Boa Viagem. De acordo com a directora, a criação do museu foi uma consequência da “ ideia de preservar os objectos” que já tinham, “mas que não estavam tratados”. Anabela Cardoso diz ainda que a população de Constância sempre “viveu do rio, viveu junto ao rio, para o rio”. Dado isto, o objectivo é preservar as “antigas profissões e as antigas memórias”, porque geralmente “as pessoas, uma grande maioria”, não guardava os objectos de valor museológico, pois “não se dava valor”, e “as coisas iam desaparecendo”. Embora dizendo que recorreu a antiquários, a directora explica que muitas das peças do museu são também resultante de ofertas das pessoas da terra: “Agora, quando surge algo, já nos perguntam se queremos. Quando há achados no rio Tejo por parte de pescadores, telefonam-nos. Há esse interesse de falarem connosco.” Assim surgiram muitas das âncoras, fateixas e outro tipo de objectos de metal relacionados com a pesca no Tejo. Anabela Cardoso diz que “as pessoas sentem queo museu é um bocadinho delas, especial- Contribuição. Muitas das peças do museu foram ofertas das pessoas da terra mente as pessoas mais antigas”. Por isso é que “as pessoas com mais de 50 anos, que ainda se lembram bem da vida do rio, deram muitas peças para o museu”. Para os jovens, o Museu dos Rios “tem um carácter um bocado didáctico”. A directora explica que a mostra do museu “é um bocadinho para mostrar aos mais jovens que agora o Tejo é atravessado com água pelo joelho, mas que noutros tempos estava cheio de vida, quando grandes embarcações circulavam Tejo acima, Tejo abaixo”. A responsável pelo museu acrescenta ainda um facto interessante: a ligação das povoações predominantemente agrícolas com o rio. “O facto de as freguesias serem agrícolas não as distanciava do rio porque qualquer produto que fosse necessário comercializar teria de ser pelo rio.” Diz a directora que o museu é para o público em geral, mas que “há uma preocupação para com a classe estudantil”. Para as visitas guiadas que fazem “vêm muitos, muitos alunos, especialmente no período de aulas”, embora “no período do Verão estejamos a assistir a que venham meninos integrados no ATL e escuteiros”. Anabela Cardoso acrescenta que existe uma grande preocupação em promover actividades com as escolas (as quais aderem bem às iniciativas do museu), geralmente mais do jardim-de-infância e 1.º ciclo. “O museu está feito de uma forma a interagir, especialmente a última sala”. Nesta, a ideia é que “possamos calafetar um barco. Está lá a estopa, está lá o martelo, estão lá as peças, e nós até calafetamos.” A directora remata: “É para o público em geral, mas tivemos a preocupação com crianças e jovens.” S.C. 30 de Janeiro de 2009 • ESTA JORNAL | 15 Museus ao longo da A23 Museu Municipal Carlos Reis, Torres Novas Missão de salvaguarda Com uma já considerável longevidade, dado ter sido fundado em 1937, este museu, segundo fonte do mesmo, Cláudia Plácido de Castro, tem desde a sua fundação “a missão de salvaguarda, protecção e divulgação do património das gentes torrejanas e do seu território físico e imaterial”. Carlos Reis, artista torrejano, dá nome ao museu. Nele estão expostas obras de sua autoria, que são “exemplificativas da dupla qualidade de paisagista e retratista”. Cláudia Plácido de Castro explica que, através das obras expostas se revê “a predilecção do pintor para retratar aspectos do quotidiano da vida campestre”. Para os responsáveis pelo Museu Carlos Reis, a melhoria de acessibilidades, nomeadamente a A23, “traduziu-se num acréscimo para o museu, alargando a sua área de influência”. Núcleo de Arte Contemporânea, Tomar De 1932 até à actualidade O Núcleo de Arte Contemporânea, inaugurado em 2004, deve o seu espólio a José-Augusto França que, enquanto historiador e crítico de arte, foi reunindo uma significativa colecção de Arte Contemporânea Portuguesa. Um dos responsáveis pelo museu adianta que “o conjunto de pinturas, esculturas, desenhos e fotografias”que ali se pode ver “abrange um arco cronológico que se estende de 1932 à actualidade”. Obras do Modernismo, como as de Almada Negreiros, do Surrealismo, com nomes como o de António Pedro, e do Abstraccionismo e Nova-Figuração, representados com, por exemplo, João Cutileiro, são algumas das expostas neste museu. É ponto forte do museu “a representatividade da sua colecção e o facto de permitir colocar Tomar no mapa da Arte Contemporânea”. Marco significativo deste facto são as parcerias feitas com o Instituto Português de Museus e a Sociedade Nacional de Belas-Artes. Museu Arqueológico Municipal José Monteiro, Fundão Acervo considerável Fundado em 2007, pelo próprio José Monteiro, o Museu Arqueológico direcciona-se para “o estudo e investigação, recolha, conservação, interpretação, exposição e divulgação do património cultural, com especial relevo para as colecções de Arqueologia”. Quem o diz é Joana Bizarro, uma das pessoas que dá vida ao museu. Esta responsável conta também que o ponto de partida para a fundação do museu foi o facto de existir “um acervo considerável de peças arqueológicas a necessitar de um espaço museográfico condigno e porque há interesse expresso pela autarquia na preservação e investigação arqueológicas”. Salienta-se uma das exposições de relevo, intitulada de “Construção de Memória”, em colabora- ção com o Instituto Politécnico de Tomar. A A23 poderá ter possibilitado uma maior afluência de pessoas de outras partes do país ao Museu Arqueológico. Museu Nacional Ferroviário, Entroncamento Património e sentido cívico O Museu Nacional Ferroviário é um dos mais recentes museus da região, tendo sido fundado em 2007. Rita Jardim Pereira, directora, explica que a missão deste espaço é “a preservação, divulgação e promoção do Património Ferroviário Nacional, pretendendo constituir-se como um pólo de atracção e desenvolvimento para o turismo cultural”. O motivo da escolha da localização do Museu Nacional Ferroviário no Entroncamento é claro: deve-se ao facto de esta cidade ter nascido dos caminhos-de-ferro, a partir de meados do século XIX. Um dos pontos fortes do museu é o recentemente criado Serviço Educativo. A directora adianta que “tem como objectivo o despertar do interesse da comunidade local para o respectivo património, “procurando acrescentar ao seu sentido cívico uma necessária consciência para a sua preservação e fruição”, principalmente no que toca às crianças, que são consideradas “os futuros responsáveis e usufruidores do património”. Museu da Guarda Acções de extensão cultural A missão do Museu da Guarda vem expressa no seu sítio da Internet: “Estudo, conservação e divulgação das suas diversas colecções, bem como o desenvolvimento de acções de extensão cultural que fomentam a sua capacidade de comunicação”. De entre muitas exposições significativas, realçam-se, por exemplo, a de Raul Lino (“100 anos Depois”), as de pintura de Manuel Cargaleiro e Eduarda Lapa, e também a exposição subordinada ao tema “Memórias desta Cidade”. Fátima Barbosa, uma das responsáveis pelo museu, salienta que a A23 veio trazer novos públicos, em resposta às suas “necessidades e solicitações”. Museu Judaico, Belmonte Único Criado em 2005, é o único espaço em Portugal que divulga a Cultura Judaica, e, segundo fonte do museu, é o único dedicado a esta, desde “os primeiros vestígios, principais realizações, áreas de implantação e zonas de influência”, até à recordação das vítimas da inquisição.” Um dos pontos fortes do museu é a divulgação das “práticas religiosas na actualidade, através de algo bem patente no museu, que integra exposição de várias peças, festas, entre outros”. É de relevar que esta comunidade que se situa em Belmonte, é a última CriptoJudaica do mundo. Para o museu de Belmonte, a A23 “trouxe não só benefícios para o museu, como também para Belmonte em si”, pois ficou “mais próximo dos grandes centros e do resto da Europa.” Museu de Lanifícios beneficia da distância vencida Ana Rosa Patrício Ana Rosa Patrício Na Beira Interior podem-se destacar os mais diversos pontos de atracção turística. A Serra da Estrela, como principal ponto de referência, abrange diversas cidades beirãs, cuja importância secular chegou aos dias de hoje. A Covilhã não é excepção. Dentro da sua diversidade, esta cidade destacou-se na indústria têxtil ao longo dos anos. O Museu de Lanifícios foi instituído com a finalidade de salvaguardar a área das tinturarias da Real Fábrica de Panos, uma manufactura do Estado, fundada pelo Marquês de Pombal em 1764 e actualmente integrada nas instalações da Universidade da Beira Interior (UBI). Classificado como Imóvel de Interesse Público, em 1982 destacou-se como ponto de referência histórica. Aproveitando a arqueologia industrial - musealização “in situ” - , e partindo do que ficou no terreno, procura-se que a matriz dos edifícios que actualmente albergam o Museu dos Lanifícios se identifique com a sua importância histórica. A coordenadora do Museu, Elisa Pinheiro, afirma que “a A23 veio beneficiar o museu e a região”, permitindo “vencer a distância”. Graças a esta via, “o interior já não é uma dificuldade”. E acrescenta, em tom de brincadeira: “Ainda sou do tempo em que se demorava seis horas de Lisboa à Covilhã”. No entanto, é com “pena” que nota que no eixo Coimbra – Covilhã ainda se verificam “dificuldades que as distanciam”. Exposições. A tradição aliada à inovação e à criatividade Em relação aos visitantes do Museu de Lanifícios, a coordenadora coloca os espanhóis como os finalidade contextualizar antropológica, económicoprincipais visitantes estrangeiros, seguindo-se os belgas, social, cultural, político-institucional e ambientalmente japoneses e muitas individualidades. Elisa Pinheiro não a actividade industrial. E tudo isto acontece numa vasta esconde que a Serra da Estrela é um ponto de atracção. No área que tem por matriz a Serra da Estrela e por centro seu caminho, os turistas nacionais e estrangeiros param histórico a cidade da Covilhã, afirmando-se como um na Covilhã e visitam o museu. centro de interpretação da rota turística peninsular Rota A recuperação do Museu dos Lanifícios também per- da Lã-TRANSLANA. mite as mais diversas actividades: exposições temporárias O Museu de Lanifícios é um museu polinucleado. temáticas ligadas com o museu (pastoreio, lã e têxteis), Nelse se encontra, o Núcleo da Real Fábrica de Panos exposição de fotografia sobre património industrial e (focalizado no período da pré e proto industrialização eventos ligados à UBI (nomeadamente através dos cursos dos lanifícios, séc. XVIII), o Núcleo das Râmolas de Sol de Engenharia Têxtil, Engenharia de Arquitectura, Design (ao ar livre constituído por um conjunto de râmolas de de Moda e Letras), lançamento de livros, apresentações de sol e um estendedouro de lãs) e o Núcleo da Real Fábrica grupos de teatro da universidade, entre outros. Veiga (Centro de Interpretação dos Lanifícios – Sede do Muito para além de um edifício, este museu tem por Museu desde 2004). Escondido no Castelo Abrantes tem muitos atractivos, escondendo-se um deles dentro das muralhas do Castelo, no interior da Igreja de Santa Maria do Castelo: um museu, denominado D. Lopo de Almeida. Diz Hugo Fernandes, representante do museu, que este “tem um mérito nacional”, pois” “foi um dos primeiros seis museus do País, fez parte da campanha dos museus da Primeira República”, sendo fundado em 1921. O responsável pelo espólio do museu deu pelo nome de Diogo Oleiro, um reconhecido intelectual e arqueólogo português, o qual passou uma parte da sua vida a reunir uma vasta colecção arqueológica. Actualmente o significado do museu é mais turístico, ficando este facto a dever-se à sua visibilidade e centralidade. Hugo Fernandes explica que “é um local de destino principal, o primeiro local de preferência dos turistas.” E acrescenta que “é para lá que as pessoas vão e pedem informações”, assumindo muitas vezes as funções que habitualmente são desempenhadas pelo posto de turismo. “E o que o serviço de turismo faz nós fazemos lá”, devido à naturalidade com que as pessoas vão ter ao local do museu. E quanto a exposições? Refere Hugo Fernandes que “a primeira foi sobre o Povo Visigótico, com esculturas no museu”, depois “tivemos uma sobre o Regimento de Infantaria n.º2 em Abrantes”, que “teve a colaboração do quartel” e que “até foi engraçada, porque foi a exposição maior, e estavam lá armas expostas, até estando tropas a guardar”. Seguiu-se uma exposição referente às invasões francesas a Abrantes: “tivemos uma exposição sobre o que aconteceu no 17 de Agosto de 1808, durante a primeira invasão”. Realizaram ainda uma exposição dedicada a algo actual e relevante: o achado dos vestígios dos Mouros em Abrantes. Hugo Fernandes relata: “Encontrámos os primeiros artefactos muçulmanos no ano passado. E o facto é que fizemos lá uma exposição com as cerâmicas declaradamente árabes”. A A23, para o museu, traz um efeito paradoxal. Se por um lado a estrada contribuiu para uma aproximação das pessoas com o turismo, por outro as pessoas passam e não param, sendo que acabam por não visitar os espaços turísticos da cidade. S.C. PUB Estamos no Ensino há mais de 50 anos 16 | ESTA JORNAL • 30 de Janeiro de 2009 ARTES Uma nova forma de olhar a arte Parceria selada André Amante Nuno Machado, 27 anos, licenciado em Arquitectura e autodidacta no campo das Artes Plásticas e Visuais, pretende explorar novos conceitos e visões com uma nova forma de ver a Arte Contemporânea. Na sua abordagem, junta a pintura, a escultura, a fotografia, o body paint, intervenções artísticas e design de espaços e objectos. Nelson de Carvalho, presidente do município de Abrantes, e Leonor Cintra Gomes, presidente da Secção Regional Sul da Ordem dos Arquitectos (OA), assinaram, no dia 17 de Outubro de 2008, um protocolo que procura criar uma parceria entre os municípios e os arquitectos. Segundo Nelson de Carvalho, “há um par de anos que mutuamente manifestamos a intenção para a criação deste protocolo”, um protocolo que promove o apoio dos especialistas nas intervenções efectuadas no espaço público, a formação dos técnicos das autarquias que lidam com as questões territoriais e a integração nas autarquias de arquitectos em fase final de formação, concretamente nos estágios. Este protocolo promete assim facilitar a interacção entre o município e a OA, de maneira a privilegiar o espaço público e a melhorar a divulgação dos projectos para que se possa aproximar a sociedade da Arquitectura e vice-versa. Abrantes junta-se, assim, após assinatura do protocolo, à lista de parcerias da OA onde já consta Vila Nova da Barquinha e a Comunidade Urbana do Médio Tejo. “A OA tem como objectivo que, a prazo, tenhamos esta parceria com todos os municípios do Médio Tejo”- diz Rui Serrano, do núcleo de arquitectos instalado em Abrantes. Daniela Santos Daniela Santos A Arquitectura foi uma peça essencial na progressão da arte de Nuno. Foi esta que lhe mostrou a importância do conceito na criação da obra e lhe despertou o interesse para outras formas de arte. “A Arquitectura é a mãe de todas as artes” - defende. Nuno Machado e o seu amigo Rodrigo Ribeiro fundaram os “ARTE2RX”. Esta foi a denominação escolhida para designar um projecto, que passa pela compreensão da arte no seu total e pela consolidação das ideias e dos objectivos que têm em conjunto. Percorrendo um caminho comum, questionam tudo e procuram respostas que os ajudem a compreender o significado da palavra “Arte”. Esse desafio passa pelo conhecimento de grandes obras e percursos de artistas influentes em todo o mundo. Neste momento, a pintura é o método mais desenvolvido e utilizado por Nuno Machado. Com a sua mão firme e com as ideias cada vez mais consolidadas, o artista exprime os seus ideais, opiniões e conceitos relativamente ao quotidiano que o rodeia. No fundo, os seus quadros são como a sua própria identidade, com todas as características do seu ser. “O meu próprio eu” - afirma. Nuno Machado foi influenciado por vários artistas de todo o tipo de arte: “Ainda hoje vejo muitos tipos de arte Pintura. Nuno Machado foi influenciado por vários artistas e tento perceber cada um deles, para depois me deixar influenciar por aqueles que para mim fazem mais sentido, tal como Mondrian, Keith Haring, Tadao Ando, Steven Holl, Zaha Hadid, Frank Gehry e outros”. Estas influências revelam-se na sua maneira de pintar e na procura da originalidade. Através de conjugações de símbolos, formas e cores entrelaçadas de uma maneira harmoniosa, transmite sensações e momentos da sua própria vida. No fundo, tenta ser único naquilo que faz, utilizando uma grande variedade de técnicas. Nuno defende que a cultura deveria ser livre para toda a gente, ou seja, que pobres e ricos, igualmente, deveriam ter acesso a todo o tipo de cultura para que assim não existisse diferenciação a nível do conhecimento. Por isso, expõe toda a sua arte em bares, discotecas, restaurantes e outros espaços públicos, Assim consegue que as suas obras sejam apreciadas por uma maior massa de pessoas. As pessoas que conhecem Nuno Machado dizem que “os seus quadros são uma mistura explosiva de cor que faz todo o sentido e que tem tudo a ver com a pessoa que ele é”. A sua arte tem algo que desperta a curiosidade dentro das pessoas. Hoje, Nuno Machado tem em braços uma tese com o tema “As cores” para assim concluir o Mestrado em Arquitectura. “Fatias de Cá”, teatro em diferentes espaços Luís carlos Tomás Luís Carlos Tomás “Em 1327 reúnem-se numa abadia os teólogos do Papa e os do Imperador para discutir a pregação dos Franciscanos, que chamam a Igreja de volta à pobreza evangélica e, implicitamente, à renúncia ao poder temporal. Guilherme de Baskerville, teólogo imperial, vê-se envolvido numa verdadeira história policial: um monge morreu misteriosamente nessa abadia, mas é somente o primeiro de sete cadáveres”. É desta forma que o “Fatias de Cá” apresenta o espectáculo de teatro “O Nome da Rosa”, baseado no livro com o mesmo nome, de Umberto Eco. Todos os Domingos, às 17h17m, o “Fatias” transforma o Convento de Cristo, em Tomar, no cenário ideal para o desenrolar de tão misteriosa e empolgante história. Algumas dezenas de homens e mulheres, vestidos à época, encarnam os personagens de Umberto Eco e encantam o público presente. Público que nunca falta à chamada do “Fatias”. Só assim se compreende que o espectáculo, estreado em 2004, ainda continue em cena. O segredo para o sucesso, diz Carlos Carvalheiro, director do “Fatias”, é o espaço onde todo o espectáculo acon- Cenário. A acção se desenrola-se em ambientes adequados a cada história tece e também a prestação dos actores e actrizes em “O nome da Rosa”. Mas, além de poder acompanhar a vida dos “monges”, assistir às suas conversas, tramas, segredos e desabafos, o público tem também oportunidade de os acompanhar em vários momentos de refeição. Ao longo da peça são cinco as vezes que a acção se desenrola precisamente no refeitório do Convento de Cristo e, nessas alturas, são servidas ligeiras refeições, perfeitamente enquadradas e contextuali- zadas no espectáculo. O facto de se ter a oportunidade de visitar lugares que normalmente não estão abertos ao público, é outro dos encantos de “O nome da Rosa”. Ver a Janela do Capítulo, iluminada, sob as estrelas da noite, é algo que não está ao alcance de quem visita o Convento de Cristo no horário normal de funcionamento. Corredores labirínticos, portas recônditas, escadas de madeira que conduzem a sótãos claustrofóbicos, tornam-se cenário de um agradável momento de teatro. No final de tudo, há ainda tempo para um café e umas deliciosas “Fatias de Tomar” – doce regional -, enquanto se conversa com os “monges”, agora já despidos do personagem interpretado. Foi precisamente no final do espectáculo que “Guilherme de Baskerville”, aliás, Carlos Carvalheiro, falou das dificuldades iniciais devido à mentalidade fechada à cultura em Tomar e também dos mais de 100 elementos que fazem parte da companhia de teatro tomarense. Mas se inicialmente se limitavam a espectáculos na cidade, em Tomar, actualmente o “Fatias” tem um raio de acção enorme. Conta com vários centros de acção teatral: Tomar, Chamusca, Constância, Coimbra, Vila Nova da Barquinha e Lisboa. E tudo isto é possível graças à boa rede viária, nomeadamente a A23, que classifica de “vital para o nosso funcionamento e para o público que nos acompanha”, até porque, salienta Carlos Carvalheiro, “em 90% dos casos os espectadores deslocam-se de mais de 70 kms de Tomar. O público é maioritariamente da zona de Leiria, Lisboa, Setúbal, Coimbra e também de Castelo Branco”. Acrescenta ainda que, “a A23 possibilita que, já por duas vezes, tenhamos montado espectáculo em Almeida, que fica a cerca de 200 kms”. Carlos Carvalheiro não tem dúvidas em afirmar que “existe uma relação entre a A23 e o desenvolvimento cultural das zonas que atravessa”. Para final de conversa, Carlos Carvalheiro deixou uma mensagem: “Só tenho o que dei. É uma frase esquisita. A gente quando a ouve parece que é uma tonteira. Quando se está a fazer teatro, a única coisa com que ficamos é as palmas por aquilo que demos. E se percebermos, pelo teatro, que só ficamos com o que damos, talvez percebêssemos que é mais importante servir do que servirmo-nos”. Produções do “Fatias de Cá” O “Fatias” iniciou a seu trajecto no ano de 1979, em Tomar, para tentar romper o clima de repressão cultural existente na cidade, como explica Carlos Carvalheiro. “Tomar era, à época, uma cidade muito fechada, agressiva contra a cultura, e foi um pouco para atirar uma pedrada no charco que surgiu a ideia de fazer um espectáculo chamado “Fatias de cá com Nini Ferreira”. Na sequência disso as pessoas acabaram por querer continuar uma actividade cultural. Aquele grupo de pessoas acabou por ficar e adoptou o nome do primeiro espectáculo. Passaram então a chamar-se “Fatias de Cá”. 30 de Janeiro de 2009 • ESTA JORNAL | 17 CINEMA João Ferreira, director do Festival de Cinema Gay e Lésbico de Lisboa “É um evento cultural e não é só o festival gay e lésbico” O Festival de Cinema Gay e Lésbico realiza-se há doze anos, sempre no final do Verão, início do Outono. A Associação Cultural Janela Indiscreta e o Queer Lisboa apresentam nomes nacionais e internacionais nesta área cinematográfica. João Ferreira, director do festival, sublinha que se trata, sobretudo, de “bom cinema”, que “provoca todo o tipo de reflexão social e estética”. Devido à temática geral do festival, ainda “continua a ser difícil chegar a novos apoios”. D.R. Alison Silva Este é um festival que tem crescido notoriamente ao longo dos anos, não só a nível de programação, mas também no número de visitantes. A que se deve este crescimento? Quando o festival apareceu, era o único em Lisboa e assim foi durante alguns anos. A programação era muito eclética, porque, no fundo, estava a preencher uma lacuna na própria sociedade. Houve uma série de realizadores que só surgiram, só apareceram, só foram vistos em Lisboa através desse festival. Isso foi um importante impulso. Com a vinda do Doc para Lisboa, que estava na altura em Loures, e com o aparecimento do Indie, tivemos que transformar o festival. Com isto tudo e com a perda de dinheiro, dos subsídios que tivemos, principalmente da Câmara de Lisboa, fomos obrigados a refazer o festival. Tivemos que reinventar o festival, pensá-lo de uma outra forma. Fomos procurando ir ao encontro do que eram as expectativas dos nossos espectadores ao mesmo tempo que tentámos criar uma personalidade própria do festival. Como é que o festival está organizado, de forma a responder a essas exigências do público? Mexe, fundamentalmente com a programação, com o tipo de filmes que programamos. Uma coisa boa é perceber que temos um público para diversos estilos cinematográficos, dentro deste género específico que é o cinema gay e lésbico. Temos público para um cinema mais comercial e temos público para um cinema mais experimental. Isso é um factor muito positivo, porque nos permite continuar a ser um festival muito eclético e ir ao encontro dos espectadores. Depois, começa-se a perceber que há determinadas cinematografias que funcionam e outras que não funcionam, como, por exemplo, o cinema americano. Que benefícios é que iniciativas como esta trazem para o enriquecimento intelectual da nossa sociedade? Este cinema tem uma particularidade: pode ser, e é com certeza, visto simplesmente como bom cinema e, nesse aspecto, provoca todo o tipo de reflexão social e estética. Mas tem uma componente social que é indissociável e fundamental para este festival. Há, por um lado, um público gay e lésbico que talvez só encontre nestes filmes as personagens que mais directamente lhes falam, retratos muito fiéis daquela que pode ser a sua realidade. Isso é uma característica fulcral deste cinema para esse público específico. Por outro lado, também é universal, ou seja, qualquer espectador, independentemente da sua sexualidade, também pode responder positivamente a este filmes, porque as histórias também são universais. Este cinema entra cada vez mais em questões muito específicas, como a transexualidade ou o transgénico. Há uma série de outros temas (médicos e clínicos, por exemplo) que tam- João Ferreira. “Fomos ao encontro do que eram as expectativas dos nossos espectadores” bém entram nestes filmes. Essa é, também, uma preocupação do programador: escolher filmes que não tenham sido criados com vista a um gueto. O festival é um espaço que se preocupa com a abertura de mentalidades? Preocupamo-nos, obviamente. Sentimos que, de ano para ano, há uma participação maior do público, mas ainda não é o número de espectadores que pretendemos e que temos capacidade para acolher. Felizmente, em termos de subsídios, temos a capacidade para acolher muita gente com muita variedade de filmes. Mas isso ainda não é fácil. Há zonas onde isso começa a ser mais fácil, por exemplo, em relação à imprensa. Há um interesse crescente por parte dos media em relação ao festival. Essa certificação ajuda os espectadores a lá irem, sentem que é legítimo frequentar aquele espaço porque é um evento cultural e não é só o festival gay e lésbico. Isso aos poucos tem vindo a crescer. Mas há muito trabalho a fazer a esse nível, nomeadamente ao nível da procura dos parceiros privados para o festival. É a barreira maior que nós temos. O festival proporciona aos parceiros a projecção desejada? Certamente que sim. Os apoios privados que temos conseguido voltam a apoiar o festival. Têm sido raros aqueles que foram pontuais. Há interesse, porque, por exemplo, em termos de turismo, o festival funciona. Tem 30 ou 40 convidados internacionais por ano. É um número significativo que enche um hotel. É uma imagem boa e todos aqueles que estão associados ao festival beneficiam disso. Mas continua a ser difícil chegar a novos apoios, porque há sempre a barreira do facto de o festival ser um festival gay e lésbico. Nós notamos que há empresas que apoiam uma série de festivais nacionais, mas “Qualquer espectador, independentemente da sua sexualidade, pode responder positivamente a estes filmes” que o nosso nunca apoiaram. Continuam a ter essa resistência. Qual é o balanço do último festival em relação aos outros? Este último cresceu em termos de público. Tivemos mais 2000 espectadores em relação ao ano anterior. Também é muito gratificante termos conseguido um leque grande de filmes que nos permitiu organizar o festival por secções. Uma boa forma de promover este cinema é apresentá-lo tematicamente, e não só nas secções competitivas, que variam muito. Temos um ciclo sobre, por exemplo, o HIV, sobre a luta contra a obscenidade ou as meias-noites. Há um ciclo sobre a religião e sexualidade, trabalhamos a guerra colonial. Ou seja, são aliciantes porque muitos destes filmes não são conhecidos, as pessoas não chegam lá pelo nome do realizador. Alguns realizadores são conhecidos, mas são 20 ou 30% dos que estão programados. Há uma série deles que não são conhecidos pelo público e temos que criar aliciantes para as pessoas irem. Neste último festival já conseguimos fazer isso. Estivemos com 180 filmes. Conseguimos organizá-los dessa forma e isso resultou muito bem. As pessoas foram muito ao encontro dos ciclos, interessadas num determinado tema e responderam bem, não só os espectadores, mas também a imprensa. Que tipo de respostas permitem perceber o que o público acha dos festivais? Temos vários indicadores. Um deles é, por exemplo, o prémio do público. Temos a secção competitiva das curtas-metragens, que é votada pelo público, de um a dez, à saída de cada sessão. Isso é um indicador importante, não só pelo número de pessoas que aderem a votação, que são cada vez mais, mas também para percebermos que tipo de filmes é que elas gostam mais. Há, também, pessoas que se dirigem a nós através de e-mails com queixas, mas também com aquilo que gostavam no festival. Temos a nossa equipa toda no cinema, temos os nossos escritórios lá montados, estamos sempre lá e conseguimos perceber a reacção dos espectadores na sala e eles falam connosco. Temos essa proximidade que é muito vantajosa. O público tem sentido e respondido às mudanças que o festival tem sofrido? Sim, sim. E falam nisso, referem todos os anos. Grande parte do público fala da melhoria do festival e ainda bem. E isso nota-se a vários níveis: a mudança para o cinema S. Jorge, uma maior qualidade nas projecções e o facto de termos mais filmes (o que resulta de uma parceria). Tudo isso são factores que têm melhorado no festival. Há, também, o facto de termos cada vez mais apoios privados, incluindo uma série de bares de Lisboa que organizam festas. Há toda uma movimentação à volta do festival que ajuda à sua projecção e à motivação dos espectadores. E há sempre campanhas que algumas editoras fazem. A FNAC faz, às vezes, nestas alturas do festival, vendas de DVD’s de temática gay e lésbica. Nós, no festival, temos também uma loja que tem crescido todos os anos, na venda de DVD’s e livros, temos um acordo com as maiores editoras e distribuidoras portuguesas que têm, todos os anos, e cada vez mais participado nesta iniciativa, nessa perspectiva da venda do livro e do DVD. Tudo isso tem sido aliciante para o público. Quais são as perspectivas para o próximo festival? Há um modelo que está, até certo ponto, conseguido, em termos de diversificar as temáticas e de ter uma programação por secções. Há outras coisas que revemos todos os anos: a questão dos eventos paralelos, dos debates, que temas é que afectam o público, que tipos de modelos é que vamos manter, o que é que vamos mudar. E há certas coisas que vamos trabalhar de forma diferente no próximo ano. A coisa que queremos fazer é entrar na área da formação, abrindo workshops em termos de escrita e realização, aproveitando para haver maior contacto entre os convidados, os profissionais e os estudantes das diversas áreas. No ano passado os concursos para apresentação de trabalhos resultaram e, obviamente, vamos manter isso para o ano, revendo alguns aspectos, para os tornar mais aliciantes para profissionais e para estudantes. 18 | ESTA JORNAL • 30 de Janeiro de 2009 CINEMA A persistência do núcleo duro Com sete anos de existência, o objectivo do projecto Espalhafitas continua a ser a consolidação do mesmo. Dar à cidade bom cinema e, ainda, o que move este grupo. ana rosa patrício Marisa Rodrigues São 21 horas e 30 minutos e o futebol terminou. Está na hora de ir até ao Cineteatro São Pedro, em Abrantes, assistir a mais um filme, a mais uma proposta do Espalhafitas. O filme é “Aquele Querido Mês de Agosto”. O local de exibição não se encontra cheio. Um grupo de alunos liderados pela sua professora entra enfadonhamente para assistir a um filme obrigatório com a expectativa de que acabe rápido, pois o frio cai em demasia para se estar na rua àquela hora. Mediante a fraca plateia, o pequeno grupo que constitui o projecto Espalhafitas não desanima e volta a fazer mais uma das suas quartas-feiras de cinema em Abrantes. O projecto Espalhafitas está inserido na Associação Palha de Abrantes. Esta completa 12 anos de existência e é a progenitora de vários projectos culturais que existem na cidade abrantina, nomeadamente o grupo de Teatro Palha de Abrantes, que hoje em dia já é independente, como também a universidade da terceira idade. Assim, o projecto Espalhafitas nasce da necessidade de existir cinema em Abrantes, através da vontade de um pequeno núcleo de pessoas que ainda hoje se mantém, tais como Carlos Coelho, Lurdes Martins e Paula Dias entre outros. Este projecto criado há sete anos, onde todos os seus integrantes têm em comum o gosto pelo cinema, quis oferecer à cidade de Abrantes cinema de qualidade, pois na época não existia cinema em Torres Novas. Para Lurdes Martins, as quartas-feiras não são apenas um filme, está muito trabalho por cima disso. Desta forma, explica que este dia foi o escolhido para a exibição do filme porque era o único que estava disponível para a sociedade abrantina. Esta licenciada em Línguas Modernas pelo Instituto de Línguas e Administração de Santarém diz que, apesar de a audiência ser pouca em algumas épocas, este núcleo duro nunca desiste, confessando que “nunca houve da nossa parte nenhum desvio do projecto por esta razão, mantendo o projecto no seu objectivo que é prestar bom cinema”. Cineclube. Lurdes Martins. Carlos Coelho, Ana Paula Dias e Nuno Alves partilham o gosto pelo cinema Outro dos objectivos delineados pelo Cineclube é o crescimento a longo prazo deste projecto. Associando este crescimento ao de uma pessoa normal, Lurdes Martins diz que este projecto vai tendo ambições e, consequentemente, novas ideias. Quando questionada sobre a relação entre os filmes e o público, Lurdes Martins admite que a selecção dos filmes para projecção está, de certa forma, ligada a um factor financeiro . Apoiados pelo Instituto de Cinema, Audiovisual e Multimédia (ICAM), estão sujeitos a uma série de regras que têm de ser cumpridas. Desta forma, revela que “basta uma quota não estar preenchida que são logo penalizados, custando isso o projecto”. O circuito comercial entra apenas nos 10% a que estão restritos, negando a ideia relativamente ao possível rejeição por parte dos jovens do tipo de filmes aqui exibidos. Assim, na opinião de Lurdes Martins, não faz parte do Cineclube Espalhafitas fazer parte de um circuito comercial. Apesar de um dos professores da ESTA, Carlos Coelho, estar presente neste Cineclube, Lurdes Martins confessa a falta de adesão dos alunos desta instituição de ensino a este projecto. Referindo que, apesar de existir um curso de cinema no estabelecimento acima referido, “conta pelos dedos de uma mão o número de pessoas do curso que foi ao cinema”. Como projectos futuros confessa que este núcleo tem apenas um propósito: “O projecto do presente foi sempre o projecto do passado que é consolidar o projecto”. Fazer com que o Cineclube dure e tenha pernas para andar. Para Lurdes Martins o mais importante é a continuidade e a consistência. Desta forma, propõemse a continuar com as semanas dos diferentes países, revelando que a próxima é já Itália, e o Animaio. O Animaio tem como objectivo a projecção de curtas-metragens para as escolas, para as crianças. Este projecto já vai no seu quarto ano e pretende desta forma continuar. Existem também os pequenos documentários para registar a história local, na forma de imagem, e os cinemas musicados “o importante é mesmo que as coisas cresçam devagarinho, de forma solidificada”. A base de Vídeo e Cinema Documental parte da Engenharia A ideia partiu do interesse pelo cinema. É assim que Carlos Campos Coelho descreve a criação do curso de Vídeo e Cinema Documental (VCD), a nova aquisição da ESTA. A preocupação com a situação do documentário em Portugal foi outras das razões que levou este mestre em engenharia dos materiais a criar o curso de VCD, reconhecendo que uma das maiores dificuldades foi “convencer o ministério da tutela da importância do curso e da lacuna existente no ensino deste género do cinema.” Uma das contribuições para o nascer do curso foi a contratação de docentes, cujo critério foi apenas que estes tivessem “qualidade reconhecida”. Assim, segundo Carlos Coelho, a ESTA teve um enorme prazer em poder contar com José Costa, assessor principal da Cinemateca, e Luís Falcão, ligado à Escola Superior de Teatro e Cinema. O docente de engenharia afirma que as expectativas iniciais para o curso nunca foram muito elevadas, pois “o processo de arranque deu-se tarde e pouco tempo houve para publicitar a sua existência.” As expectativas acabaram por ser ultrapassadas com a procura do curso a nível nacional. Desfazendo a ideia de investimento superior, e consequente esquecimento dos restantes cursos, Carlos Coelho assegura que todos os cursos, no seu arranque, tiveram investimentos elevados. No que respeita às visitas de estudo que os alunos de VCD já realizaram em tão curto espaço de tempo, declara que “estas são e serão oportunidades de formação que todos os alunos devem aproveitar.” O membro do Cineclube e da Federação Portuguesa de Cineclubes espera ainda “organizar alguns seminários e mini-cursos com especialistas da área e a participação de alunos em actividades relacionadas com o cinema.” 30 de Janeiro de 2009 • ESTA JORNAL | 19 CURSO “O documentário não será ensinado em gaveta separada da história do cinema” José Manuel Costa é licenciado em Engenharia Eletrotécnica mas assume nunca ter exercido qualquer actividade nessa área. Ligado ao cinema desde muito cedo, o professor de História da Arte e Teoria do Cinema revela os segredos do novo curso da ESTA, Vídeo e Cinema Documental, e parte da sua vasta experiência em cinema. marisa rodrigues Marisa Rodrigues Como é que uma pessoa com um vasto curriculum no cinema é licenciado em Engenharia no Instituto Superior Técnico? Acho que há uma incoerência neste curriculum, o que significa que eu optei desde cedo por não fazer engenharia e por me dedicar ao cinema. E costumo dizer que não sou engenheiro, sou formado em engenharia. Toda a minha actividade profissional está relacionada com o cinema. E foi essencialmente em torno do trabalho na Cinemateca. Dediquei-me desde cedo a trabalhar no contexto do museu do cinema, que é isso que as Cinematecas são, e dentro desse âmbito fiz de tudo. Trabalhei em programação, em documentação e depois, a partir de certo ano, trabalhei sobretudo na área da conservação cinematográfica. Foi a partir do trabalho na área da conservação que acabei por me ligar a toda uma série de iniciativas de âmbito nacional e internacional em torno do cinema como património e o que há a fazer para salvá-lo, mantê-lo e valorizá-lo. Qual foi o maior contributo que as formações em que esteve presente lhe trouxeram, nomeadamente o estágio em Pequim? No âmbito das iniciativas que desenvolvi na área da programação na Cinemateca, organizei alguns ciclos de cinema. Em particular para o desenvolvimento de catálogos, de obras escritas que foram publicadas para a ocasião, esses ciclos levaram-me a fazer pesquisas prévias nalguns centros de arquivos estrangeiros. E isso aconteceu desde bastante cedo, e também chegou à Cinemateca de Pequim. No caso desta foi um estudo sobre cinematografia chinesa, antes e depois da revolução. Qual foi a reacção inicial com o convite da ESTA para leccionar o primeiro curso de Vídeo e Cinema Documental? A reacção inicial foi de grande curiosidade e logo a seguir de bastante entusiasmo. Isto foi um encontro de oportunidades. Por um lado, da escola que estava a lançar este curso e por outro, um momento em que me interessava variar sobre o percurso anterior. Eu quis concentrar-me para já por um ano no ensino. Eu tinha experiência de ensino. Aconteceu que isso coincidiu com o lançamento deste curso e, em conversa com o engenheiro Carlos Coelho, fiquei rapidamente entu- Aposta. José Costa acredita num curso que corporize o impulso que se sente em torno do documentário siasmado com esta oportunidade e isso trouxe-me aqui. Porquê? É preciso dizer que tenho desenvolvido um gosto particular pela história do documentário. Fui uma das primeiras pessoas num grupo maior a lançar a associação APORDOC (Associação pelo Documentário), uma associação relevante no panorama do cinema nacional. Devido a este meu gosto pelo do- vertentes que acho que têm sido descuradas. O facto de haver muita gente a trabalhar no documentário não produz necessariamente, para além da quantidade, um desenvolvimento da qualidade, do aprofundamento, da densidade do documentário em Portugal. Isto pode passar pela questão da formação. Há hoje muitas pessoas a fazer documentário acreditando que se tiver um bom assunto à frente da ção artística. Se a pessoa quiser fazer este curso para depois se dedicar a um documentário de ordem mais didáctica, científica ou jornalística poderá fazê-lo. Nós partimos de uma ideia que me parece lógica: ninguém pode ensinar arte no sentido de ensinar como fazer. Não é possível dar regras para fazer arte. Pode-se falar de história e teoria. Não só do documentário mas também do cinema, da arte em geral. Fazer as pessoas analisar as obras que já foram feitas, as correntes, os movimentos. E, no pólo oposto, proporcionar experimentação. Acha que os alunos correspondem às expectativas deste novo curso? Os alunos estão a corresponder com enorme entusiasmo e isso vê-se na participação destes no curso. É o princípio, mas é gratificante saber que isso está a acontecer. É um grupo de alunos que está extremamente empenhado. É um desafio para os alunos e para os docentes. Estamos todos a tentar fazer qualquer coisa de diferente, é um trabalho que vai sendo avaliado e corrigido a par e passo. Que tipo de meios acha que ainda faltam para este curso funcionar em pleno? “O que estamos a fazer aqui é, pela primeira vez em Portugal, dar uma oportunidade de formação, que integra o documentário na arte cinematográfica e na história do cinema” cumentário, tenho pensado no que tem sido a evolução recente do documentário em Portugal e, ligado a isso, o que tem sido a experiência de formação do documentário. Não havia nenhuma licenciatura realmente dedicada ao documentário em Portugal apesar dos cursos, das acções de formação. Há muitas iniciativas, mas faltava um curso que, de algum modo corporizasse esta energia, este impulso que se sente em torno da área do documentário. Senti que era preciso complementar o que está a acontecer nas outras formações com câmara produz um bom filme. Isso é uma situação que exige uma urgente correcção. O que faz a grandeza de um documentário não é o assunto que se filma mas a descoberta de um olhar próprio sobre as coisas. E isto resolve-se com muito talento mas também com algum esforço de formação de tipo diferente. E foi essa reflexão que me levou a querer experimentar algo de diferente aqui. Diferente em quê? Começando por assumir que quando falamos de documentário estamos realmente a falar de forma- Não posso responder pelo conjunto da licenciatura, mas para já a maior carência não é a nível de docentes. Temos seis disciplinas no curso e a equipa responsável por estas disciplinas está animada e com espírito de grande comunhão de ideias. Esta equipa é a certa para lançar este curso. Falta ainda alguma coisa ao nível do equipamento e ao nível das infraestruturas. Não é uma falta que nesta fase me preocupe excessivamente. A escola está toda ela em transição e aquilo que falta ao nível do equipamento está a ser colmatado. A vertente prática de experimentação vai acentuar-se no segundo ano da licenciatura e espero que nessa fase já haja os meios necessários para isso. Para que o curso se vá implantando é necessário constituir acervos documentais e material para trabalhar, complementarmente às aulas, que terão de ser desenvolvidos de forma progressiva e cumulativa. Temos de desenvolver uma base de obras também para poder constituir uma videoteca de referência que não tem de ser restrita à área do documentário. O documentário não será ensinado aqui em gaveta separada da história do cinema. Quais os projectos futuros para este curso? Engloba duas vertentes. Uma, complementar às disciplinas, será a dos seminários internacionais. Seminários que farão da escola um pólo de intercâmbio de experiências de ideias, de conhecimento de obras no sentido da investigação. Por outro lado, construir um centro de produção que, a prazo, possa servir também no sentido da irradiação da experiência da escola para fora. Queremos que sirva de interface entre o curso e a vida profissional futura dos alunos. Se tivesse de convencer um aluno a integrar o Curso de Vídeo e Cinema Documental, quais eram os principais argumentos? Se o aluno tem gosto pelo cinema e tem alguma curiosidade pelo documentário, o que diria que estamos a fazer aqui é, pela primeira vez em Portugal, dar oportunidade de uma concentração, de uma formação, de um mergulho profundo que integra o documentário na arte cinematográfica e na história do cinema. Se a pessoa à partida está desperta para essa área, esta é uma oportunidade de durante três anos dedicar-se a exercitá-la, a pensá-la e conhecê-la de uma forma que não tem equivalente na formação em Portugal. 20 | ESTA JORNAL • 30 de Janeiro de 2009 MÚSICA Revolucionar a música portuguesa Músicos provenientes de algumas regiões da auto-estrada A23 demonstram amor pela música, mas criticam a falta de apoios para desenvolverem os seus talentos. D.R. Eleantino Évora O grupo CBX é uma banda musical de jovens originária de Abrantes, formada por quatro elementos entre a faixa etária dos 20 e 21 anos, que privilegiam principalmente o rock português. O grupo existe há dois anos e pretende, futuramente, ser uma mais-valia para a música e cultura em Abrantes. Para isso reclamam por mais oportunidades e mais apoios. “Só existem apoios para aqueles que já são reconhecidos como bons, mas, para aqueles que querem e gostam de ser bons, não existem”, desabafa André Alves, o baterista do grupo que se mostra confiante quanto ao futuro da banda mas, ao mesmo tempo, ansioso por oportunidades tanto a nível regional como a nível nacional. Entretanto, o grupo já deu mostras do seu talento ao participar em algumas festas folclóricas regionais, como nas de São Lourenço e Setieiras, mas também já participaram em concertos de solidariedade para ajudar pessoas, em parceria com igrejas. O CBX já conta com quatro canções da sua própria Skapa. Um jovem de Guarda que é uma promessa do Hip Hop e do R&B autoria, que foram gravadas num estúdio improvisado pela banda. “A nossa música é muito melancólica, pois pretende transmitir sentimentos e são músicas feitas no momento e dependem do nosso estado de espírito, ou seja, se estamos contentes fazemos uma canção alegre e se estamos tristes fazemos uma mais triste, às vezes tentamos fazer um misto de sentimentos em algumas músicas” - afirma André Alves. Para ele, o rock influencia-os muito, mas, apesar disso, tentam criar um estilo musical único. Grandes referências do rock, como os Xutos e Pontapés, Linda Martini e Vicious Five, são as suas musas inspiradoras. O grupo CBX de Abrantes ainda conta com o contributo de João Alberto Mendes (guitarrista e voz) de 21 anos, Didi Alves (baixista e voz) de 20 anos e Bruno Cardoso (guitarrista e voz principal) de 21 anos. Da cidade de Tomar surge um jovem talento com o nome artístico de Raze Beats, de 24 anos. Trata-se de um cantor e produtor musical que privilegia o Hip Hop, que se iniciou muito cedo na música, mas só nos anos de 2002 e 2003 começou a demonstrar toda a sua capacidade na área da produção. Raze Beats acredita que a sua música beneficia a cultura tanto regional como também a nacional, à medida que vai acrescentando mais inovações ao nível do Hip Hop, tanto a cantar como a produzir. Por outro lado, afirma que a sua música depende do seu estado de espírito e mostra-se surpreendido e radiante pela aceitação do público ao seu estilo. No entanto, acha que o mercado musical não é favorável à sua música e critica a comunicação social quando afirma que “hoje em dia, mais que nunca, o Hip Hop está a ser muito bem aceite nos meios de comunicação, mas para isso temos de adaptar a nossa música a esses meios e isso não me agrada e, por isso, acredito que não temos em Portugal mais de meia dúzia de artis- tas da minha área a viver da música”. Na discografia de Raze destacamse produções musicais recentes: em 2006 lançou uma colectânea intitulada “Sem Dados Disponíveis vol. 1”, que se trata de uma compilação de vários rappers de todo o país, em 2007 o álbum “Babalaze” de Azagaia, álbum “Xeque Mate” (em 2008) de L Hyo e vários outros projectos musicais. No que concerne a concertos, Raze Beatz deu vários concertos para a divulgação da compilação “Sem Dados Disponíveis”, nas FNACs de Coimbra, Almada e outras, no FlowFest de Coimbra e em Lisboa no Santiago Alquimista. Skapa é um jovem talento da Guarda, de apenas 16 anos de idade, e que revela ser a mais recente promessa do Hip Hop e R&B português. Nota-se a vontade e determinação deste jovem que lamenta a falta de apoios para poder progredir. “Eu canto por amor à música e ao que faço. Mas tenciono também contribuir para a nossa cultura hip-hop, tornar o “movimento” mais verdadeiro... Tenciono trabalhar arduamente para evoluir e um dia poder ser uma referência para os jovens músicos” - salienta Skapa que prefere transmitir mensagens românticas e de incentivo. Talvez seja por isso que a sua música – divulgada através da Internet - é muito bem aceite pelas pessoas que o rodeiam porque, explica, tem tentado criar o seu próprio estilo, apesar de não esquecer os artistas que o inspiram: Pac Man, Sam The kid, Alkatraz e outros. Luís Carlos Évora, baixo, guitarra e rapper dos C4 Jovens cabo-verdianos espreitam oportunidades O grupo C4 foi fundado em 2002 na ilha do Sal e é a banda do momento em Cabo Verde. Os principais elementos vieram para Portugal para estudar, mas o percurso de sucesso continua. Já conseguiram pôr no mercado o primeiro trabalho discográfico: “True Storie”. Luís Carlos Évora, músico e estudante de Engenharia Mecânica na ESTA, tem esperança de conseguir oportunidades para mostrar a Portugal o valor do grupo. Quem formou o grupo C4? O grupo C4 é um grupo de jovens cabo-verdianos que já existe há seis anos, constituído por sete elementos: Nelito, Jamie, o Delton, o Sandro, o Luis Carlos Évora (sou eu) e o Maurício. O grupo foi formado por mim, pelo Maurício e por um ex-elemento, o Luís Filipe. Como é que surgiu esta ideia de formar o grupo? Surgiu a partir das festas do fim de ano em que os jovens cantam de porta em porta em troca de alguns tostões, e foi a partir daí que surgiu a influência de tocar instrumentos de cordas. Passámos a tocar mais vezes e a aprender muito, descobrimos outros talentos e foi assim que conseguimos formar o nosso grupo. E foi com o mesmo espírito de sacrifício que conseguimos o nosso sonho, que era pôr o nosso primeiro CD no mercado. E como foi o vosso percurso para chegar onde chegaram? Foi muito difícil principalmente por causa das condições financeiras, porque sempre sentimos falta de apoios. No nosso país em vias de desenvolvimento, sempre dão prioridade a outros investimentos. Por isso, travam a cultura mais moderna para poderem preservar aquilo que é mais tradicional e, neste âmbito, não dão oportunidades aos novos talentos. Entretanto, já temos o nosso CD no mercado, mas foi lançado com muito trabalho e com muito sacrifício e com a ajuda de poucas pessoas, que confiaram em nós e acreditaram no nosso trabalho. Agradecemos a essas pessoas porque contribuíram com o empréstimo de um instrumento musical e salas de ensaio, ajudas que significaram muito para nós. Mas por que razão não foram apoiados? Acho que isso tem mais a ver com o nosso estilo musical. Infelizmente é como se fosse uma barreira, também pelo facto de existirem poucas pessoas que gostam dum grupo de jovens com um outro estilo musical e, por isso tudo, foi muito difícil lançar o nosso trabalho discográfico. E o porquê deste nome C4? O que significa C4? Nós quando vamos ao palco muitas pessoas pensam que temos um guitarrista, um percussionista, duas vozes, um teclista e um baterista, o que contabilizaria sete elementos. Todavia, as pessoas perguntam: mas porquê o nome C4? É interessante, mas C4 não tem nada que ver com essas suposições. C4 significa um explosivo potente que pode causar danos catastróficos e decidimos por este nome, porque também queríamos ter um nome único. Quais são os géneros musicais que o vosso grupo privilegia? Somos um grupo que nunca investiu num só género. Com as nossas composições e letras, fomos tentando adaptar-nos a um estilo diferente, o nosso próprio estilo. Os géneros que priveligiamos são: Zouk, guetto-zouk, R&B, Zouk das Antilhas ou kizomba, Raggae music, Reggaeton e Ragga. Inspiram-se em alguma banda ou artista para fazer a vossa música? Qualquer grupo ou artista, quando começam, têm como exemplo alguém ou banda musical que admira. Todavia nós, dentro dos C4, temos gostos diferentes, cada um gosta dum género musical diferente e apreciam os seus próprios artistas e, por isso, tentamos adaptar os gostos de cada um. Por outro lado, acho que não temos um grupo ou artista de referência que nos inspira para fazermos a nossa música, porque sempre quisemos criar o nosso próprio estilo musical. Porém, a música moderna influenciou-nos, tanto a de Cabo Verde como a dos outros países. Fomos influenciados pelo alemão Gentleman que vive na Jamaica, pelo rei do guetto-zouk, o cabo-verdiano Nelson de Freitas, o Johnny Ramos, Craig Daivid, William e outros. A vossa música pretende transmitir o quê? Que mensagens? O nosso objectivo é precisamente transmitir boas mensagens para os jovens. Todavia, 70% da nossa música são mensagens de amor. Também transmitimos algo sobre os bons valores da sociedade, algo sobre a nossa vida boémia, festas, partidas e a saudade e ainda mensagens sobre a droga e outros problemas da juventude. No entanto, tentamos sempre transmitir mensagens duma forma divertida e engraçada. Têm tido muito sucesso em Cabo Verde com a vossa música. E em Portugal? Não, aqui em Portugal ainda não conseguimos. Estamos aqui a estudar, os elementos do grupo estão separados uns dos outros, eu em Abrantes, outros em Viana de Castelo e Lisboa, por isso não temos tempo para ensaiar e é difícil assim. A nossa música não foi aqui divulgada porque as nossas músicas são cantadas em crioulo e não em português, mas temos ainda esperança que apareçam oportunidades e concertos para podermos divulgar a nossa música. Outra condicionante é o facto de o nosso CD ainda não estar nas lojas de música dos PALOP aqui em Portugal. Já foram convidados a participar em algum espectáculo ou evento cultural aqui em Portugal? Como foi? Já sim. Fomos convidados para tocar em Tomar, em Leiria, Covilhã, Bragança e também já fomos convidados para tocar com um artista em Lisboa, o cabo-verdiano Gilson Gee. Mas em Bragança fomos convidados a participar numa festa cultural dois anos seguidos e nas outras cidades tocámos em salões de música. Os nossos espectáculos foram muito agradáveis para nós e sentimos que o público gostou muito. E.E. 30 de Janeiro de 2009 • ESTA JORNAL | 21 TECNOLOGIA Gonçalo Brito dá a conhecer o outro lado da imprensa de videojogos nacional “Existe um videojogo para todos” Gonçalo Brito, jornalista de videojogos, esteve envolvido, em primeiro lugar, na “Mega Score”, uma revista nacional conceituada dentro do ramo. Depois passou pela revista “Hype!”, englobada na rede “My Games” e que se extinguiu no seu décimo número, há poucos meses. Defende que há videojogos para todos os gostos. “Diz-me o que é que gostas e eu arranjo-te um jogo que tu vais gostar de certeza absoluta”. D.R. Renato Lopes O jornalismo de videojogos em Portugal não é encarado com muita seriedade. O que é que o levou a escolher este ramo do jornalismo precisamente em Portugal? Eu sempre fui fã de videojogos e sempre tive bastante interesse nessa área numa perspectiva sociológica e antropológica. A oportunidade de trabalhar na área surgiu quando o Nelson Calvinho me convidou a enviar o currículo através do fórum da “Mega Score”, o que é um bocado insólito – arranjar um emprego através de um fórum – mas foi assim exactamente que aconteceu. Ele gostou do meu currículo e de conversar comigo, e acabei por lá ficar, e tem sido fantástico. Começou por ser um leitor da “Mega Score”? Sempre joguei, desde o “Spectrum”, mas comecei a interessar-me pelo outro lado dos videojogos graças aos fantásticos redactores da “Mega Score” – Frederico Teixeira, Jorge Vieira e Nelson Calvinho –, que davam uma perspectiva diferente da área ao fazer uma integração e um cruzamento da indústria com a cultura Pop e com aquilo que nós somos. É bom não esquecer que os videojogos são feitos por pessoas para pessoas e que não são feitos por máquinas para máquinas, como muitas vezes as pessoas pensam ou levam a crer. Contudo, o que é realmente interessante é ver como é que um ser humano faz e joga um videojogo. Interessa-se mais pelo lifestyle do que propriamente pela cultura por detrás do videojogo? Acho tão interessante estar em casa com os amigos a jogar como estar num determinado evento e ver as pessoas que normalmente não pegariam num jogo, a jogar. Penso que aquela ideia de que os videojogos são para um determinado tipo de pessoas não existe, porque, de uma forma ou de outra, toda a gente joga alguma coisa e toda a gente joga videojogos. Consegue-se encontrar videojogos em todo o lado. Portanto, aquela ideia de que só joga videojogos quem gosta de videojogos é falsa. Toda a gente gosta de videojogos da mesma forma que toda a gente gosta de ver televisão. Por isso é que eu me interesso sobre o que é que leva as pessoas a jogarem. Os videojogos acabam por ser um método de estudo do comportamento humano? Sim, em grande medida. Isso até se fala muito em relação ao “The Sims”(jogo eletrónico de simulação de vida real). No futuro os psicólogos deixarão de dizer «fale-me um pouco sobre si» para dizerem «deixe-me vê-lo a jogar um bocadinho de “The Sims”», porque este jogo diz muito sobre uma pessoa. Por isso é que as pessoas que o jogam nem sequer gostam que estejam a vê-las a jogar. Porque, ao jogarem, elas estão a reflectir o seu próprio comportamento. O que é que diria a uma pessoa para a introduzir nesta indústria e neste estudo do comportamento humano? Diria que toda a gente gosta de se divertir, e que por isso vão gostar de videojogos de certeza. Existe um videojogo para todos; há videojogos de todos os tamanhos e feitios e de todas as Presente. Gonçalo Brito defende que ser jornalista nunca foi um desafio maior do que é agora medidas. Há muita gente que pensa que não gosta de jogar simplesmente porque ainda não encontrou o jogo certo para si, mas a essas pessoas naturalmente diria: «Procura, experimenta e diz-me o que é que gostas e eu arranjo-te um jogo que tu vais gostar de certeza absoluta». Seria impossível falar de si sem mencionar a “Hype!”. Como é que se sente acerca desta perda? A “Hype!” foi, acima de tudo, um ganho. Foi uma perda, obviamente, por ter acabado, mas aprendeu-se imenso e teve-se espaço para criar coisas que nunca foram criadas daquela forma em Portugal e apenas em poucos sítios do mundo. Tentámos cultivar uma perspectiva antropológica evitando o apartheid vídeolúdico. Não houve ali qualquer tipo de discriminação entre as pessoas que habitualmente jogam e as outras. Houve uma tentativa de humanização dos leitores. A “Hype!” era vista como a “Edge” portugue- sa. O objectivo era fazer bom jornalismo de videojogos como se faz lá fora? Não concordo com a ideia de que o bom jornalismo de videojogos se faz, em regra, lá fora. Acho que existe bom jornalismo de videojogos em todo o mundo, e de certeza que existirá em países cuja língua não compreendemos, tal como eles lá fora não sabem se nós somos bons ou não porque não compreendem Português. Mas falando do exemplo dos anglo-saxónicos, existe realmente um ou outro bom jornalista. Por outro lado, se calhar os anglo-saxónicos são os principais responsáveis pelo apartheid e o machismo que existe na indústria dos videojogos. Basta ir a um site como o “Gamespot” e encontrar um jogo que envolva uma rapariga para podermos ver piadas sexistas. Se queremos fazer jornalismo “a sério”, o jornalismo “a sério” é isento e não balança para nenhum lado nem em termos de raças, nem credos, nem sexos. Nesse sentido falta ainda muito ao jornalismo de videojogos crescer e em especial àquele que nós compreendemos, nomeadamente o anglosaxónico. Tens bons exemplos: o “Kotaku” tem bons jornalistas, que fazem algumas coisas que também escusavam de fazer, mas isso tem mais a ver com a linguagem do próprio jornalismo actual, que passa muito por tentar chegar aos mais novos com uma linguagem mais informal. Esse tipo de atitude por vezes colide um pouco com a ética do jornalismo, mas fora isso eles conseguem encontrar ali um tipo de equilíbrio. Eu próprio, no meu blogue, tento encontrar esse equilíbrio: o que está ali é factual, só que como é um blogue de autor e é um artigo de opinião, eu posso dar a minha opinião. Mas quando eu estou a fazer uma review de um jogo, por exemplo – que é uma opinião – eu não acho que deva estar a dar a minha opinião do que é o jogo de uma forma justificada e inabalável. Em 2003 integrou a banda “Qwentin”. O que é que o levou a seguir esse rumo diferente do jornalismo de videojogos? A música já está na minha vida desde os 14 anos. Sempre fui músico, sempre tive bandas e sempre foi um complemento. Os “Qwentin” surgem como uma conclusão de uma caminhada que foi a adolescência, em que se tocou de tudo – covers, músicas de outras bandas, músicas originais... Se as outras pessoas iriam gostar ou não foi algo secundário. Numa entrevista ao “Curto Circuito” explicaram que foi uma tentativa de experimentar algo diferente e com fortes influências no cinema, uma coisa que não é muito vulgar no ramo da música. Infelizmente, já vai sendo, embora que na altura em que tivemos a ideia não fosse tanto. Mas também os videojogos têm uma influência bastante presente na música porque todos nós adoramos jogar acima de tudo. Nós até fizemos uma cover da versão “Spectrum” da música do “Robocop”, que tocamos ao vivo, sempre, com vídeo e tudo, e que é das músicas mais bem recebidas pelas pessoas. Acho que a cover está fantástica (nós ainda não a gravámos, mas quando o fizermos depois colocamos online). O que é que diria a um jovem que gostaria de ser jornalista de videojogos? O mais importante é ter uma grande vontade de dizer a verdade e ter uma “ganda lata” para ir descobrir as verdades (risos). A internet veio facilitar a troca de informação, mas ao mesmo tempo veio trazer muito lixo e muita desinformação. Antigamente, o jornalista ia falar com pessoas, fazer notícias locais e entrevistar as pessoas envolvidas e resolvia aí o problema. Hoje em dia, há mil sites a dizer uma coisa e dois mil a dizer outra coisa... É preciso ter resistência, e essa vontade de cruzar as informações todas e de descobrir o que é que é realmente “a verdade”. Ser um jornalista nunca foi um desafio maior do que é agora. Anda a jogar alguma coisa? Sim, tenho andado a jogar bastante (risos). Ando a jogar “Fallout 3”, que estou a adorar. E o “Pro Evolution Soccer 2009” e o “Fifa 09”, que também ando a experimentar para ver se corresponde ao que falam dele. Acabei há pouco tempo o “Mass Effect”, que é bom, sem ser genial... 22 | ESTA JORNAL • 30 de Janeiro de 2009 DESPORTO A equipa da Usseira encara o Paintball como um verdadeiro desporto e não como uma brincadeira Um desporto diferente que marca pontos numa pequena localidade Simula-se um combate entre duas equipas. Em vez de armas, os jogadores usam marcadores de pressão, que atingem os adversários com bolas de tinta biodegradável. Trata-se de um desporto de acção, com altos níveis de adrenalina. Para além do exercício físico, o Paintball ajuda a combater o stress. Condições essenciais: pensamento rápido e trabalho em equipa. Marina araújo Marina Araújo O dia escolhido para assistir a um treino do Núcleo de Paintball da Usseira (NPU) foi um domingo, no fim-de-semana que antecede o do Open Lisboa. Estranhamente não há muita tensão entre os jogadores, como seria de esperar antes de tal prova, mas há sim um ambiente de descontracção e companheirismo. Talvez isso se deva ao facto de nas últimas duas fases terem conquistado o segundo lugar, o que lhes dá o primeiro lugar na classificação geral. Logo que chegam, os membros da equipa desmontam o equipamento e um deles, Elcio Araújo, mostra as instalações: “Isto era o campo de futebol da Usseira (uma vila perto de Óbidos)”. E acrescenta: “Estava abandonado e nós recuperámo-lo.” O recinto é constituído por três campos, um deles para jogos recreativos com obstáculos fixos, e outros dois com insufláveis e que são usados para os treinos. Estes também servem para outras actividades, como o Open Centro, agendado para Janeiro. Mostra também o bar e os balneários, masculino e feminino, agora recuperados pelo NPU, o que significa, também, passar a dispor de água quente. Depois de um momento de preparação de equipamento em que o ar é repleto dos tiros sem bolas dos marcadores (o nome dado às armas deste desporto) e em que, por mais de uma vez, me assusto com a violência do som, Andreia Quitério, a capitã e única mulher da equipa, chama os jogadores. Após um aquecimento rápido, começam a discutir estratégias. Está frio e, apesar das corridas que fizeram, os jogadores parecem não estar muito quentes. Estão, sim, ansiosos por algo que os ponha em movimento. Porém, parece que afinal a equipa sente alguma pressão em relação à próxima etapa do Open Lisboa. O NPU tem onze pontos de vantagem, mas Andreia Quitério confessa que “não é muito”. E acrescenta: “Qualquer deslize é suficiente para começarmos a descer”. Há mais um momento de preparação antes da próxima fase do treino, em que os jogadores fazem os últimos acertos e se colocam nos equipamentos. As jerseys e as calças parecem bastante finas e, para além de uma t-shirt, os jogadores não podem usar nada por baixo do equipamento, a não ser as outras protecções, como Marina araújo “Somos uma mais valia. Trazemos mais vida à vila e com o Open Centro iremos trazer várias equipas para uma terra que pouca gente sabe onde é” por exemplo joelheiras. Só no caso de estarem menos de 5ºC é que lhes é permitido usarem uma camisola por baixo da jersey. O vento faz com que a tenda improvisada, que é a zona dos jogadores, abane. Mais sons de tiros sem bolas e, à medida que se anda entre os jogadores, pisam-se bolas caídas no chão, que por vezes rebentam debaixo dos pés, colorindo a terra castanha com tinta amarela, cor de laranja e, outras vezes, azul ou verde. “Não podemos voltar a usar as bolas que caem ao chão” - diz Paulo Vaz Fontes. “Ficam sujas e qualquer partícula pode danificar o marcador por dentro, já que são super-sensíveis.” Enquanto alguns vão confirmar a velocidade a que as bolas são disparadas (há regras para isso) e outros enchem os tubos dos battlepacks, ouvem-se risos e piadas, numa camaradagem de uma equipa que se quer divertir. “Isso é o mais importante, se ganharmos melhor” - declara Andreia Quitério com um sorriso. O treino vai começar, primeiro com alvos parados e em seguida em situação de jogo. Mesmo quem assiste deve colocar uma máscara. É um elemento crucial em termos de segurança pois, mesmo com as limitações de torneio, as bolas viajam a um mínimo de 250 pés por segundo. Não entro no campo mas, mesmo no exterior, vejo as bolas a pousarem a menos de cinco metros dos meus pés ao serem disparadas do outro lado do campo, e dou dois passos para trás. apesar de estar interessada. Quando se colocam em situação de jogo, o ar fica completamente repleto de gritos dos jogadores, de tiros, de bolas a rebentar contra os insufláveis. Mesmo enquanto mera espectadora, sinto-me repleta de adrenalina. O jogo acaba e toda a equipa volta para a zona de jogadores. Há marcadores para afinar, estratégias para discutir e sede para matar. As garrafas de água vazias vão para a reciclagem, para o lado de um enorme monte de caixas de cartão onde vinham as bolas que são usadas. “Usamos uma média de quinze caixas por prova, cada caixa tem 2000 bolas, é só fazer as contas” - comenta Nuno Miguel. Grande parte da equipa volta para o campo, mas Olavo Sousa fica na zona de jogadores, pois um dos marcadores precisa da sua atenção. Curiosa, e sabendo que ele foi um dos grandes difusores do Paintball naquele grupo, pergunto-lhe como é que ele tomou conhecimento do desporto. “Foi um amigo meu, o Rui Félix, que há uns dez anos atrás vendia material de desportos radicais. Acabou por experimentar Paintball, gostou e depois juntámos um grupo de mais ou menos trinta pessoas que formou um núcleo para comprar material em segunda mão.” Começou por ser apenas um grupo de amigos que ia jogar e, para juntar dinheiro, organizava jogos recreativos em matas e depois numa fábrica abandonada. Aos poucos, cada um foi tendo oportunidade de jogar em competição em vez de apenas em recreativo e foram seduzidos. “A adrenalina é completamente diferente, o próprio convívio com os outros jogadores e temos oportunidade de ir a outros lugares no país” - conta Andreia Quitério. Mais tarde criaram o NPU e, sendo Olavo Sousa da vila, juntaram-se à Associação Recreativa e Cultural da Usseira (A.R.C.U.), que lhes deu todo o apoio necessário. Recebem também ajuda monetária da Câmara Municipal de Óbidos e contam com mais de uma dúzia de patrocínios. No fim-de-semana que se segue ao do Open Lisboa, a população da Usseira organiza um grupo de pessoas para rebocar as estruturas recuperadas pelo NPU. “Somos uma maisvalia. Trazemos mais vida à vila e com o Open Centro iremos trazer várias equipas para uma terra que pouca gente sabe onde é” - reconhece Elcio Araújo. “A população agradece e retribui.” Aproxima-se a hora do almoço e, com isso, o fim do treino. Os jogadores prestam novamente atenção aos equipamentos. Os marcadores são limpos e comenta-se acerca do torneio da próxima semana, porém nada de muito sério. Haverá uma reunião a meio da semana onde poderão discutir os últimos pormenores acerca da próxima fase. O NPU encontra-se confiante para as próximas fases mas, acima de tudo, querem divertir-se e beneficiar a Usseira, uma localidade que tanto os ajudou. 30 de Janeiro de 2009 • ESTA JORNAL | 23 DESPORTO “Francis Obikwelu poderia ter atingido marcas muito superiores nos 200 metros” José Santos, responsável máximo da velocidade português, fala do percurso profissional do velocista e lança-lhe um desafio: ajudar na promoção da modalidade junto dos jovens portugueses. simão santana Simão Santana Qual o aspecto mais aliciante na personalidade de Francis Obikwelu? O Francis Obikwelu é um atleta com grande convicção, com grande poder de trabalho, muito profissional e por isso é que atingiu as marcas que atingiu durante a sua carreira. É de facto um atleta completo. Quatro anos antes de Atenas, existiam esperanças na medalha de prata para Francis Obikwelu? O Francis Obikwelu já era um atleta de grande nível mesmo quando ainda treinava com Fausto Ribeiro em Portugal, quando atingiu o 3º lugar no Campeonato do Mundo de Sevilha com uma marca abaixo dos 20 segundos com apenas 22 ou 23 anos, de maneira que já se perspectivava uma grande marca em Atenas. Contudo nunca pensei que fosse nos 100 metros, apostava muito mais nos 200 metros, mas a aposta incidiu nos 100 metros e o resultado foi positivo. Nos Jogos Olímpicos de Pequim acreditava que ele era capaz de vencer uma medalha nos 100 metros? Como responsável máximo da velocidade em Portugal eu ia sentindo, ao longo deste último ano, que o Francis Obikwelu não estava nas devidas condições, pois não tinha atingido marcas que justificassem ele ganhar uma medalha nos Jogos Olímpicos de Pequim. Mas a este nível não se pode fazer futurologia, de maneira que acreditámos sempre que ele pudesse estar bem e que conseguisse chegar a mais uma final olímpica. Não aconteceu… só lamento isso, mas de certeza que ele se esforçou durante toda a época para conseguir essa final que acabou por não aparecer. José Santos. “Era preciso ficarmos entre as 16 primeiras equipas mundiais, ficámos em 20º” Obikwelu “tem uma fase de aceleração, uma velocidade máxima muito forte” Terá existido um excesso de confiança? Eu nunca abordei isso com ele nem com a treinadora dele, espanhola, nem mesmo em conversas que tivemos no início de época quando me desloquei a Madrid. O que me foi dito é que o Francis iria apostar nas provas indivi- duais, primeiro os 100 metros e depois os 200. Propus-lhe ainda várias vezes levarmos uma equipa de estafeta a Pequim, porque tínhamos uma estafeta muitíssimo boa e até poderíamos alcançar uma final Olímpica, mas a primeira opção era de facto estarmos nos Jogos Olímpicos. Era preciso ficarmos entre as 16 primeiras equipas mundiais, ficámos em 20º lugar, não conseguimos atingir esse objectivo. Penso que não houve da parte de Francis Obikwelu uma ajuda suficiente para isso acontecer, contudo o objectivo dele era uma medalha nos Jogos Olímpicos a nível individual. Porque é que sendo um atleta vocacionado para os 200 metros nunca conseguiu ter os resultados que teve nos 100 metros? Na minha perspectiva pessoal o Francis Obikwelu nos 200 metros teria atingido marcas superiores e de melhor nível em relação aos 100 metros, primeiro porque ele não parte muito bem, mas depois tem uma aceleração fortíssima e uma fase de velocidade máxima também fortíssima. Ora não sendo ele um atleta que parta muito bem, os 100 metros condicionamno, pois a distância é bastante curta. Nos 200 metros, mesmo não partindo tão bem, como ele tem uma fase de aceleração, uma velocidade máxima muito forte e uma resistência também bastante significativa, penso que nos 200 metros podia ser a disciplina que mais se adequasse. O que pensa da decisão de não participar nos 200 metros em Pequim? Eu não quero estar aqui a criar um clima de instabilidade, até pelo respeito que eu tenho pelos atletas e pelos treinadores, mas não sei por que é que não participou nos 200 metros, penso que o devia ter feito. Aproveito para deixar aqui um recado a Francis Obikwelu, porque eu penso que ele podia ser ainda muito útil à velocidade a Portugal, pois é um ídolo para todos os jovens, por isso podíamos aproveitar e, em conjunto com a federação, criar um projecto de promoção da disciplina junto dos jovens e das escolas. É um desafio que eu lhe lanço, pois é um indivíduo que sabe estar junto dos jovens, e eu posso-o ajudar nesse projecto. A própria fundação que ele está a criar no Algarve poderá ajudar a realizar esse desejo? Também, como é lógico, pois é um atleta com um bom carácter, é um atleta que gosta daquilo que faz, é um atleta que quer promover a velocidade, mesmo num país que não é o dele mas do qual ele gosta, de maneira que era bom que ele pudesse contribuir para este projecto. Simão Santana, estudante e atleta de alta competição “O sucesso depende de mim” Joana Mendes Simão Santana, 19 anos, foi campeão nacional de andebol de júniores, em 2007/08, pelo Centro Desportivo de São Bernardo, em Aveiro. Passou para o atletismo quase por acaso, assumindo o risco da mudança. Mas os resultados da aposta já são visíveis: recentemente assinou contrato com o Futebol Clube do Porto. O jovem atleta admite que este passo lhe dá mais visibilidade. “Se não aproveitasse agora esta oportunidade, poderia correr o risco de nunca mais voltar a ter.” O aspecto monetário também é importante: “No ano passado nunca recebi salário, só recebi prémios por medalhas.” A oportunidade de passar para o atletismo surgiu quando, um dia, na pista de Aveiro, se deparou com mário cordeiro o técnico nacional de velocidade. “Testou-me e gostou de me ver correr” – conta Simão. Depois, mais um episódio de “sorte”. O seleccionador olímpico do Brasil também estava em Aveiro. “Ele fez dois treinos comigo e disse ao meu actual treinador que eu tinha um grande potencial e que podia chegar abaixo dos 10 segundo se 30 centésimos aos 100 metros.” Foi nesse momento que decidiu mudar do andebol para o atletismo. A mudança para o atletismo coincidiu com o primeiro ano no ensino superior. Simão Santana entrou para a ESTA, para o curso de Comunicação Social. “Foi complicado, porque houve uma altura em que eu não estava a conciliar os treinos com a escola.” Hoje já consegue conciliar, mas admite que “não é fácil”. Mas, como quer “chegar longe no atletismo”, cada vez mais aposta na organização do seu tempo. Entre uma carreira como atleta e como jornalista, escolhe a primeira até porque tem o sonho de chegar aos Jogos Olímpicos. Mesmo assim reconhece que a sua faceta de atleta pode ser importante numa carreira como jornalista desportivo. Na qualidade de estreante na modalidade, Simão Santana começou a época de atletismo em desvantagem em relação aos outros atletas. Por isso, começou a treinar dois meses antes do que é normal. Começou a treinar a 15 de Julho e, um mês depois, o treinador admitiu a possibilidade de Simão ir ao campeonato de Europa deste ano com a Selecção Nacional. O atleta tem clara noção do que isso implica: “Tenho de trabalhar mais que os outros para ser igual a eles.” Entretanto Simão Santana lesionou-se. “Felizmente foi só uma rótula deslocada, são três meses de paragem, mas em velocidade é preciso ter paciência e já estou em recuperação. Tenho pena de não estar na pista coberta, mas posso vir a estar numa pista ao ar livre. Eu acredito em mim até não ter mais possibilidades. Continuo a treinar mesmo que não esteja a cem por cento. Quero ainda fazer algumas provas na pista coberta nem que seja para voltar à competição e ter algum ritmo. O sucesso depende de mim e é por isso que eu trabalho.” 24 | ESTA JORNAL • 30 de Janeiro de 2009 DESPORTO Marco Chagas, ex-ciclista e actual comentador desportivo da RTP1 Hugo Silva “O ciclismo não é a ovelha negra do desporto” fala sobre o momento actual que o ciclismo atravessa, a nível internacional e nacional. Aponta alguns dos problemas da modalidade e identifica jovens talentos. João Vasco Nunes Como vê o actual momento do ciclismo, depois dos inúmeros escândalos de doping que se têm registado na modalidade? É provavelmente um dos momentos mais complicados da modalidade, principalmente depois do que aconteceu na Volta a França há uns anos atrás, com aquilo que se designou “ Caso Festina”. A partir daí foi tomado um caminho, que eu nunca pensei que fosse seguido, porque quando esse escândalo “rebentou” inicialmente (final dos anos 90), quem andava na modalidade percebia que havia uma diferença entre os atletas, nomeadamente dos Portugueses para os estrangeiros. Quando havia provas internacionais, o nível com que eram confrontados era um “choque” para eles, e a mim, que já tinha participado em inúmeras provas do estilo, custava-me um pouco porque nos últimos anos senti já uma enorme diferença, principalmente para a Espanha, que o ciclismo não tinha antes. Mais tarde isso veio a confirmar-se, quando se percebeu a influência que os médicos tinham na modalidade, porque o grande problema do ciclismo foi a entrada de um conjunto de pessoas (médicos conceituados do desporto), que em vez de serem sérias, minaram todo o ciclismo e passaram a ser as grandes figuras das equipas, eram eles que ganhavam mais e que ditavam as leis dentro da equipa, passando os Directores Desportivos à margem disto. Este foi o grande problema do ciclismo, porque se essas pessoas fossem sérias e mandassem os corredores trabalhar, se os acompanhassem e se os apoiassem, tudo estaria bem. Nos últimos anos não se conseguiu ultrapassar logo esta situação, tem havido uma “luta” entre a evolução da “caça” ao doping e a evolução em termos científicos, da parte dos laboratórios e desses médicos, para estarem sempre um passo à frente. Acho que agora está tudo equilibrado, e eles (médicos) começam a dar passos atrás, mas durante os últimos oito, dez anos, foi uma luta perdida e que marcou muito a modalidade. Esta polémica está a retirar credibilidade à modalidade e a tirar um pouco da paixão que existia nos “amantes” do ciclismo? Sim, as pessoas ultimamente têm dificuldade em perceber, mesmo que se tente explicar, que o ciclismo não é a “ovelha negra” do desporto. O ciclismo foi a modalidade que andou sempre na frente da luta contra o doping, mas depois não tem sabido tirar partido disso, e nos momentos decisivos não tem sabido dizer: não! Isto é fazer batota! Isto não se pode fazer, ponto final. O anunciado regresso de Lance Armstrong à competição pode ser o “volte-face” nesta polémica? Sim, o regresso de Lance é muito importante. Acredito que ele tenha decidido voltar por isso mesmo, porque havia a necessidade de fazer algo mais pela modalidade, que só ele pode fazer. Não há nenhum corredor neste momento que tenha o carisma de Lance. Aos 37 anos, eu tenho dúvidas que ele vá à Volta a França se não sentir que está em condições de ganhar, mas só o regresso dele já é muito bom. Partindo para um panorama mais Nacional, com que olhos viu os últi- mos sucessos da Selecção Nacional de Sub – 23, que triunfou na última edição da Taça do Mundo. Acha isto importante para o futuro do ciclismo Nacional? Sim, é muito importante. A categoria de Sub – 23 anos tem alguns corredores de grande qualidade, o Rui Costa é um corredor excepcional, o Vítor Rodrigues é muito bom também, depois tem ali mais um conjunto de mais quatro ou cinco corredores também de destaque. Aproveitando o exemplo de Rui Costa, qual o futuro que prevê para o corredor; poderá ser um Joaquim Agostinho, ou até mesmo um próprio Marco Chagas no futuro? O Rui tem um potencial enorme, ele consegue associar um conjunto de pormenores importantíssimos para ser um corredor bom: é inteligente, é completo, anda bem no contra-relógio, o que é fundamental, passa bem as subidas, mesmo tecnicamente é bom também. E eu tenho uma boa referência, que é o sítio onde ele trabalhou. Ele começou no Santa Maria da Feira (Feirense) e o Manuel Correia, que é o responsável pela equipa, rapaz de quem eu tenho o prazer de ser amigo e que foi meu colega de equipa no Sporting e que trabalha muito bem os miúdos, é provavelmente o que trabalha melhor os jovens até este escalão. Ele disse-me algo que sempre tenho como referência, que dos corredores todos que lhe passaram pelas mãos, o Rui Costa é claramente o melhor. Houve ali um período que ele baixou nitidamente de forma, talvez por opção estratégica, mas nos momentos decisivos esteve bem e é realmente um corredor bom. Eu, pessoalmente, gosto. D.R. Marco Chagas. ”O grande problema foi a entrada de pessoas que, em vez de serem sérias, minaram o ciclismo” Ruben Gamito, campeão nacional “Ser feliz e andar de skate até não poder mais” Cláudia Oliveira Foi no Bairro das Flores, em Santo André, que Ruben Gamito, actual campeão nacional de skate, viu pela primeira vez um skate. Tinha na altura 10 anos. “Quando ia para a escola via sempre lá um grupo de jovens, meus amigos, a andar e comecei a gostar daquilo, um dia cheguei a casa e pedi um skate ao meu pai, quando fiz anos ele ofereceu-me um skate todo novo. A partir dai pratiquei sempre, até hoje”. E hoje, com 21 anos, é o actual campeão nacional da modalidade. “Em 2002 fui campeão nacional iniciante, em 2005 fui vice campeão amador, em 2006 fui vice campeão nacional e em 2008 fui campeão nacional da categoria profissional”, conta. Afastado das grandes comunidades do skate nacional, a vitória do título mudou muita coisa na sua vida, nomeadamente a nível da obtenção de patrocínios, uma ajuda fundamental uma vez que contribuem com material técnico (tábuas), equipamento e ténis. “O facto de andar com skates novos é bastante importante”, frisa. Mesmo assim Ruben Gami- to afirma ser impossível pagar as contas com o skate em Portugal: “Os patrocinadores não conseguem pagar aos skaters mensalmente o ordenado mínimo, mas lá fora já se torna possível”. Apesar disso o actual campeão nacional considera que esta é uma modalidade que está a crescer no nosso país. “Antigamente não havia tanto conhecimento sobre o skate, não havia tantos jovens a andar e hoje em dia os praticantes são cada vez mais”, afirma. E continua: “As pessoas ainda vêem o skate como um acto de vandalismo, não é um desporto muito bem aceite pelas pessoas”. Para inverter esta situação seria importante apostar na divulgação deste desporto e contar com mais apoios das câmaras municipais, nomeadamente através da criação de mais skateparks e a promoção de eventos relacionados com esta modalidade. A nível pessoal, para o futuro, Ruben Gamito quer continuar para sempre ligado a este desporto. “Daqui a 20 anos acho que já não consigo andar de skate, mas quero ficar sempre ligado ao skate!”, afirma. E se tivesse direito a três desejos o actual campeão nacional só necessitaria de dois: “Ser feliz e andar de skate até não poder mais”. 30 de Janeiro de 2009 • ESTA JORNAL | 25 ESTA Abertura do ano lectivo na ESTA Qual o futuro do ensino superior? liliano pucarinho Sílvia Carola “Nos nossos dias um curso superior não garante nada. É bom que vocês tenham consciência disso”. Este foi o aviso deixado por Miguel Pinto dos Santos, director da Escola Superior de Tecnologia de Abrantes (ESTA), na cerimónia de abertura do ano lectivo do curso de Comunicação Social. Um cenário cada vez mais sombrio? Provavelmente sim. Com a evolução da sociedade moderna, cada vez mais os jovens ingressam na universidade. O director da ESTA teceu considerações em relação a esta situação: “à medida que a incidência de licenciados em toda a população de países mais desenvolvidos (como a Finlândia, a Dinamarca ou a Suécia) ultrapassa os 30%, e em Portugal estamos aproximadamente nos 20%, o número de operários licenciados aumenta significativamente”. Miguel Pinto dos Santos deixou ainda um alerta: “a licenciatura deixa de garantir um desempenho de cargos de chefia ou de técnicos superiores como até aqui.” Pode-se depreender de todas estas afirmações que os estudantes devem tornar-se polivalentes e flexíveis, dado que se deve “desempenhar várias tarefas no mesmo emprego”, “inovar a função”, e “mudar cinco, 10, 15 vezes de emprego”. É que, ao contrário de há décadas atrás, onde somente uma elite frequentava o ensino superior, e lhe eram garantidos emprego e pertença a uma classe média desafogada, hoje em dia, com a democratização do Licenciados. Alunos formados pela ESTA voltaram à escola para falar da entrada no mercado de trabalho ensino, a concorrência e a competição são cada vez maiores. Isso leva os novos licenciados a necessitar de uma grande versatilidade e de ganhar cada vez mais competências para enfrentar outras pessoas com as mesmas habilitações a concorrer ao mesmo posto de trabalho. Estas foram precisamente algumas das dificuldades relatadas pelos três ex-alunos convidados para partilharem com os actuais alunos da ESTA as suas experiências profissionais. João Damasceno, Sónia Matos, Bruno Ribeiro. Foram estes os ex-alunos convidados a dar o seu testemunho acerca da sua entrada na vida profissional, depois de terminado o curso de Comunicação Social na ESTA, na cerimónia de abertura do ano lectivo em curso. E todos eles, no seu discurso, alertam para as dificuldades no mundo do trabalho. “Temos que ser auto-didactas”. Sónia Matos, directora de contas na Multicom, resume nesta frase o essencial do seu pensamento acerca do que terá que ser a vida após a formatura. Há que tentar “absorver ao máximo”, segundo ela, que acrescenta ainda que é necessário “ter muita humildade” e trabalhar muitas horas, mesmo quando não são remuneradas. Para quê? Para crescer como profissional. Bruno Ribeiro, jornalista de desporto na TSF, reflecte sobre as principais dificuldades na entrada no mundo profissional da comunicação social. São essencialmente duas coisas, sendo elas a pressão e a concorrência, os “piores inimigos” do jovem profissional. Pressão devido à responsabilidade da informação exacta e concorrência entre “colegas As ligações entre a política e os Media liliano pucarinho José Luis Dader, professor catedrático em Jornalismo da Universidade Complutense de Madrid, foi o convidado especial da cerimónia da abertura do ano lectivo de Comunicação Social da ESTA. O especialista identificou as novas tendências que influenciam o processo político, nomeadamente ao nível da comunicação. Para isso, recorreu a casos concretos e mostrou alguns dos novos instrumentos que estão a ser usados, como foi o caso de vídeos de campanha e de “comic books”. Sob o tema de “Opinião Pública e Eleições sob o Contexto Mediático dos Desafios Actuais da Tecnopolítica em Campanhas”, José Luis Dader, especialista em Comunicação Política, explicou que algo de vital no conceito de política é a capacidade dos líderes saberem estar em frente às câmaras. O político tem de “ser capaz de, em dez segundos, dizer uma frase chamativa” que “no dia seguinte todos os media a apresentem como o grande destaque”. Estas novas formas de discurso são apelidadas de “soundbytes”. Para José Luis Dader, o fenómeno da ciberdemocracia não implica que se esteja a produzir maior reflexão. “O que se está a produzir é o aumento do circo mediático, onde a política e os novos híbridos nos dão uma nova forma de apresentar a actividade política.” No lugar da política de intervenção séria, surgem novas “personagens José Luis Dader, Professor de Jornalismo híbridas, que são uma fusão de jornalistas e humoristas”. E este elemento surge através de espaços humorísticos, com “uma visão da política muito caricaturada”. José Luis dader abordou também o fenómeno Youtubemania, que permite que o cidadão comum dê a sua opinião. Segundo José Luis Dader, este efeito abre um espaço “onde a seriedade e o humor, a exactidão e a falsidade, tudo será ouvi- do, tudo será mesclado”. Mas o Youtube não está sozinho, e aí surgem os meios de comunicação tradicionais. Os vídeos são colocados na rede, mas sofrerão de uma multiplicação de “downloads” se forem referenciados, por exemplo, na televisão. Surge ainda a tendência de que “o uso das emoções se pode usar em todos os sentidos, podem-se usar emoções para atacar os outros, e também se podem usar emoções para defender os próprios interesses”. O professor de Jornalismo recorreu ao exemplo de um vídeo musical defensor da campanha presidencial de Barack Obama (“Yes We Can”), para demonstrar como se pode “puxar” pelo sentimento dos possíveis eleitores. José Luis Dader deu, ainda, uma aula aberta de Jornalismo. Para o Professor Catedrático, “o mais importante para o jornalista é ser clarividente” e ser “capaz de descobrir quais são as chaves interpretativas do que está a ocorrer”, ao invés de recorrer ao sentimentalismo ou a um “sectarismo ideológico”. Diz ainda que os jornalistas se sentem assustados com a baixa do lucro comercial das suas antigas fórmulas. Na sua opinião, isso traduz-se no seguimento de uma “simplicidade inconsciente” com a “compaixão afectiva ou a frívola adulação das curiosidades banais” insubstanciais, como, por exemplo, novidades rotineiras das celebridades. S.C. e órgãos”. Também João Damasceno, assessor de comunicação da Lift Consulting, faz uma reflexão sobre o que considera a entrada no mundo do trabalho, comentando que “há histórias de pessoas que chegam às redacções” sem qualquer tipo de apoio. É-lhes “atribuído” um jornalista sénior para coordenar o estágio, mas, na maior parte das vezes, “ele está-se borrifando para o estagiário”. Fazendo uma retrospectiva do tempo que passaram na ESTA, os exalunos foram bem claros na sua opinião. Bruno Ribeiro considera que os alunos desta Escola têm muita sorte: “Nós estamos aqui numa conchinha, somos acarinhados, somos amados pelos professores, pelos nossos colegas”. João Damasceno acrescenta que a ESTA “é a minha casa, será sempre a minha casa”. E Sónia Matos partilha da mesma opinião: “Aproveitem o que a cidade tem para vos dar e o que os professores têm para vos dar, que não encontram isso em lado nenhum.” A ex-aluna continua, realçando que a escola tem como potencialidades “um jornal e um site, professores que estão sempre em contacto com exalunos, estúdios de televisão, estúdios de rádio”. E diz ainda que há algo com grande importância, que são os estágios. “Aproveitem os estágios, não os levem de ânimo leve, pensando que é mais um estágio e que não vão ficar”. Mas diz, em jeito de encorajamento, “muitos não ficam, mas em 100 há um que fica sempre. E eu fiquei.” Web Marketing em foco na ESTA O potencial das novas tecnologias Web no desenvolvimento das acções de Comunicação e Marketing, num contexto onde são criadas semanalmente mais de dez milhões de novos sites, foi o tema da conferência sobre Web Marketing que decorreu em Dezembro, na ESTA, com o especialista na área, João Neves, que mostrou quais os instrumentos e técnicas utilizados para assinalar a existência e posicionamento de empresas na Internet. Através de técnicas de Web Marketing, João Neves explicou que para que o nosso blog ou site de empresa seja visto e venda, a estratégia é simples: “O que colocamos on-line têm que ser visto pelas pessoas, que são potenciais visitantes e/ou compradores dos nossos produtos”. Quando é colocada uma palavra-chave numa ferramenta de busca ligada à Internet, existem sites que aparecem em topo, outras usam palavras ou conceitos chave através do SEO – Search Engine Optimization. Existem empresas das mais variadas áreas comerciais que utilizam estas técnicas, pois conseguem, com poucos meios financeiros, chegar mais facilmente ao público-alvo pretendido. João Neves referiu ainda que “compensa mais criar um site pensando no SEO ou num bom conceito para difundir a mensagem pretendida do que pagar para aparecer no topo da pesquisa e o público-alvo saber que se está a pagar por isso”. A.R.P. 26 | ESTA JORNAL • 30 de Janeiro de 2009 CONCURSO Lagar tradicional em 3Dimensões Sílvia Carola Sílvia Carola O lagar de azeite da Ortiga, em Mação, tem uma particularidade já difícil de encontrar. Mantém-se a trabalhar de uma forma tradicional. Evoluiu muito na parte da higiene, a nível do processo do produto”: o azeite “vai para depósitos de inox enquanto antes eram umas coisas de chapa” e a parte do encapachador é feito com uma máquina e já não com uma pá. É um longo processo. Carlos Filipe, mestre do lagar, aluno da ESTA e o grande responsável pela participação este ano da escola no Solidworks design contest (ver entrevista em baixo), diz que no lagar têm que “ter atenção de como é dada a entrada da azeitona”. Depois tem que ser armazenada “de forma a que ela não perca as qualidades e conserva-se dentro de água e sal para não apodrecer”. Futuro. A manutenção das máquinas é o principal problema O processo seguinte é da lavagem nos tanques, de onde sai para ser moída. “Quando é lavada vai para dentro da tremonha”. Depois, a tremonha, quando se abre, liberta a azeitona para o moinho, onde esta é moída até “ficar com uma dimensão reduzida”. Depois, diz o mestre, “temos experiências de espessura, vemos se está numa espécie de espessura aceitável. A partir daí vai para a zona de aquecimento da massa,”, onde fica com “uma temperatura na ordem dos 28o”. Posteriormente é enceirada e vai para debaixo da prensa, onde é prensada “até uma pressão de 350 kg por m2. Com essa força, o líquido é separado da parte sólida e o conjunto de líquido vai para dentro da tarefa”. Na tarefa, por diferença de densidades, o azeite, estando misturado com água a cerca de 30o, vem ao de cimo e separa-se da água. Carlos Filipe refere que a partir daí “o azeite é todo tratado manualmente. Vai para dentro de outro depósito chamado ‘banho’, onde é lavado para retirar as partículas sólidas que possam ainda ir”. De seguida, o azeite vai para os depósitos “de captação de líquido”, onde “está dois ou três dias a repousar”, e então vai para os “depósitos finais”. A partir daí “é para o consumidor”. Carlos Filipe declara que as perspectivas de futuro para o lagar não são favoráveis. “O grande problema é a nível da manutenção”. Porque as máquinas já não se fabricam, torna-se mais difícil a manutenção das mesmas. “Há que tomar uma decisão a curto prazo. É pena parar este processo tradicional mas não há, para já, metalurgia nesta área de processo tradicional”. Além disso, as “novas normas não acautelaram os pequenos processos tradicionais. Foram pensados processos industriais” e não “as pequenas indústrias tradicionais”, que estão “a levar por tabela porque há coisas que muitas vezes são impossíveis de cumprir uma vez que não há verbas que possam suportar esse investimento”. “Já somos uma referência em termos de design técnico” Este ano a ESTA volta a marcar presença no SolidWorks design contest. Carlos Filipe, do 2º ano de Engenharia Mecânica, vai ser o representante da escola com o projecto de um lagar. Luís Miguel Ferreira, o professor responsável pelo acompanhamento do projecto, explica a importância desta iniciativa para a ESTA. hália costa santos Este projecto consiste na aplicação do software SolidWorks. Porquê escolher um lagar de azeite? Este tema foi proposto pelo aluno. Como era uma ideia nova e interessante, porque ninguém fez nada disso em termos de concurso, o aluno propôs e visto que ele trabalhava lá, se conseguia conciliar a parte profissional dele com a parte interessante também para o curso, foi uma opção fácil de tomar. Pode explicar o projecto que se está a preparar para o concurso? A estrutura é toda desenhada em 3D, os componentes são todos desenhados, depois são todos montados na mesma ordem e nas mesmas posições em que está efectivamente construído, neste caso o lagar. Em relação à elaboração propriamente dita do projecto, o aluno é que sabe, porque percebo pouco do equipamento. É dos poucos lagares a trabalhar tradicionalmente, são equipamentos com 50 ou mais anos. Em que consiste o processo do concurso? Até ao ano passado, a última vez que participámos, nos moldes em que estava, consistia em construir modelos, inovadores ou não, em 3D. Há vários tipos de fases. Há a parte de modelação 3D simples, a parte da análise em elementos finitos (que também é uma parte em que se calculam as estruturas), há também a parte das imagens fotorealistas, ou seja, uma série de fases a que se pode concorrer. Nós só concorremos à parte estrutural, não é nada inovador, é inovador sim o projecto que apresentamos. Quais são os antecedentes da participação da escola neste concurso? Só houve uma vez em que participámos e que não ganhámos nada, no ano passado. Até agora A nível internacioanl, a ESTA é a escola mais premiada do mundo no SolidWorks, um software topo de gama Luís Miguel Ferreira. O que é inovador não é a parte estrutural, mas sim o próprio projecto tivemos uma menção honrosa, um terceiro lugar e um primeiro lugar, a nível internacional, o que faz de nós a escola mais premiada de todo o mundo a nível de SolidWorks. Qual é a componente mais aliciante do projecto? Para já o software em si é aliciante para os alunos. A maioria dos alunos gosta de trabalhar porque vê o trabalho, é um software topo de gama, vê o trabalho a mover-se, é como se estivéssemos realmente a construir algo. Não é muito difícil motivar as pessoas para isto, é muito engraçado de fazer. E a motivação do concurso? É ser uma mais-valia para o currículo de um aluno. Por exemplo, eu fui contactado por empresas interessadas em contratar os alunos que ganharam o concurso há dois anos. Eles não foram, mas porque tinham acabado de iniciar o curso. Foram imediatamente contactados porque há uma divulgação a nível mundial destes resultados. Quais são as principais dificuldades que encontra? É estarmos a concorrer com escolas de todo o mundo. Todas as escolas têm SolidWorks, desde escolas técnico-profissionais a universidades. Todas participam. Japão, América - só na América são imensas -, Europa: Espanha, Itália, França, Alemanha... E somos, creio, nós Portugal, o país com mais prémios. E nós somos a Escola que mais ganhou. Numa escola com um curso com apenas sete anos é obra. Já somos uma escola de referência. Que importância é que este concurso tem para a ESTA e para a sua comunidade escolar? A ESTA já é uma referência em termos de design técnico, em termos de SolidWorks. Para além dos prémios que ganhámos, vamos também agora abrir cursos de SolidWorks para o exterior, não só dados no curso de Mecânica, mas também para as empresas virem. Empresas e não só, quem quer que esteja disposto a aprender. E esses concursos dão-nos essa divulgação. Dá-nos esse prestígio de sermos capazes e de sermos dos melhores do mundo a trabalhar neste tipo de ferramenta. S.C. 30 de Janeiro de 2009 • ESTA JORNAL | 27 CRIATIVIDADE Algures numa praça Renato Lopes Algures numa praça vozes miudinhas enchem o ambiente. O cheiro a café domina e o vento empurra as preocupações de forma leve e despreocupada. Nessa praça há um rapaz perdido das suas raízes, que é balançado para trás e para a frente pelos empurrões estranhos e os tropeções violentos. Inevitavelmente, cai. Cai mas não se levanta. Cai mas continua estendido pela calçada num gesto que confirma uma hesitação; um sinal de derrota. Uma mão vinda e cheia de nada surge como mote para esperança nos olhos do pequeno rapaz, que os ergue em direcção ao vazio. Que vê ele? Uma silhueta tapada pela luz, destinada a causar desilusão. A mão chega mais perto mas muda subitamente de direcção para apanhar A praça do Chave uma moeda caída, soltando um sorriso matreiro de cor branca na face ofuscada. Os olhos enchem-se de lágrimas e o miúdo caído murmura algumas palavras que se desintegram no vazio silencioso da multidão, sem chegarem ao seu receptor, que já vai acolá, em passo apressado na direcção de uma tabacaria. O miúdo agarra o calçado com unhas de fera e exerce uma pressão superior à sua capacidade e consegue pôr-se de joelhos para chorar o momento em que largou a mão da mãe, orientadora e educadora deste futuro cidadão que se afogou na sociedade. Enxuga as lágrimas num lenço que esvoaçava perto, preso a uma árvore, e olha em redor mais uma vez. Parece ver a mãe ali ao fundo, a entrar numa pastelaria. Corre com todas as forças, mas a meio caminho, parece vê-la de onde viera, a cruzar uma passadeira em direcção a outra praça mais abaixo. Perde-a de vista. Sente-se confuso e perdido. Olha em redor esperançoso e vê-a ao fundo a entrar num pequeno café após uma passadeira ao lado esquerdo. Vira o olhar em frente e vê-a a entrar numa papelaria. Volta novamente e vê-a numa esplanada logo a seguir. Vê-a em dois sítios quase ao mesmo tempo e sente-se desorientado. Sente-se um mendigo vagante na areia de um deserto grande, sob o Sol do meio-dia, também, e com sinais de fome. Cai mais uma vez. Cai, não; senta-se. Senta-se num dos degraus gigantes que fazem a divisão da praça. Ao seu lado uma estátua de pedra confortao, dizendo que a sua mãe virá em breve com um sorriso no rosto, uma mão esticada e uma aura radiante. Mas o rapaz não acredita. A ingenuidade e a inocência de criança já não é suficiente para o fazer acreditar numa esperança vã, numa ilusão, e cai na realidade. A estátua cala-se, as silhuetas da mãe desaparecem e o lenço desfaz-se em partículas minúsculas ao sabor do vento, rapidamente substituído por um Sol escaldante. O rapaz imprime uma cara triste e um olhar vago, vazio, reflectindo claramente os seus sentimentos, a sua paranóia e desespero pessoal… Um outro rapaz passa a comer um pastel de nata de mão agarrada à mãe. Faz-lhe inveja e olha-o. O rapaz anónimo sente raiva pelo seu infortúnio e revolta-se. Pega numa pedra e atira à cabeça do idiota feliz inconsciente da sua sorte. A mão cai, a pedra voa, a cabeça abre-se, o corpo jaz no chão e o sangue espalha-se na calçada. Gritos. Gritos. Gritos. Gritos e berros. Drama e horror. Desespero e raiva, e um rapaz de pescoço cortado ao pé de uma montra partida, ouvindo feliz o choro da sua mãe a seu lado. Passagem onde Fico renato lopes Marina Araújo Sara Pereira Ele nunca soubera o verdadeiro nome daquela praça. Sempre lhe tinham dito a “praça do Chave” e era assim que ele a conhecia. Passara ali muitos dos seus tempos de estudante, rindo, bebendo café, “curtindo” (e por vezes aturando) bebedeiras, e por vezes – muito poucas –, estudando. Agora voltava ali e tinha de dizer que era, tal como se lembrava, um lugar agradável, acolhedor onde numa agradável manhã de Outono as pessoas se reuniam. Normalmente agraciada por uma suave brisa – coisa rara naquela abafada cidade – era uma praça repleta de cafés, onde o doce tradicional era vendido aos turistas, entre bolos de aspecto mais artificial. Entre eles, lojas de toldos coloridos viviam a sua rotina matinal e, nas esplanadas, pessoas conviviam, bebendo café, comendo bolos e outras iguarias. Sentado na esplanada do Chave (o café que dava o nome à praça) ele mesmo deliciavase com o café, numa xícara que, talvez, há muitos anos atrás, já passara pelos seus lábios. Suspirou, sorriu e cheirou o ar límpido e claro daquela manhã de Outono. Só no momento percebeu o quanto sentira falta daquela cidade, só então percebeu o quanto amar – e ainda amava – aquela praça. Acabou de beber e levantou-se. A caminho, viu uma placa com o nome da praça. Sorriu. Afinal não era a praça do Chave, mas sim Barão Batalha… Encolheu os ombros. “Uma rosa por qualquer outro nome, cheiraria igualmente bem” dizia Shakespeare. Sem ofensa ao grande bardo, mas para ele aquela praça não seria a mesma se ela não a continuasse a chamar “a praça do Chave”. Numa hora surpreendente, fui guiada para um lugar que é já parte de mim, onde cresci, onde corri atrás dos pombos quando os havia, onde caí e esfolei os joelhos e onde me refugio quando agora caio e esfolo a alma. Já passou. Aqui já assisti a alguns dos momentos desta cidade, com amigos que não se esquecem. Já passou. E agora, o que me traz a esta praça que é o coração que pulsa para fazer Abrantes viver, bombeando gente nas várias direcções, numa lufalufa diária? O que me traz? E o que vejo? “Olá Dona… como vai essa saúde? Oh, uns dias piores, outros assim-assim, que dias melhores tardam”. “Olhe, para mim era uma água e um café curto”. Momentos a que nunca dei atenção mas que hoje, por alguma razão, ecoam alto. Alguém que já aqui passou uma milhena de vezes, como eu, hoje passa a ver este lugar com mil olhos. Já passou. Tenho de filtrar tudo o que me chega, uma coisa de cada vez. Sinto uma febre pessoana de sentir tudo de todas as maneiras. Autocontrolo. Uma coisa de cada vez. O ruído aumenta à medida que chega a hora dos intervalos da manhã. Motivações diferentes trazem pessoas diferentes e só se quedam aqueles que estão presos nas escadas que dividem a praça, numa mudez de bronze. As três pastelarias nas suas costas, a “Mercearia”, a “Demorada”, a “Nova Iorque”, rebaptizadas entre risos e groselha fresca. Já passou. Aliás, tudo passa nesta praça de passagem onde os únicos que ficaram foram o senhor de idade, sozinho; o jovem descontraído, que esperará alguém; a mãe que segura o filho pelo cós das calças, inconsciente de que ele nunca se afastará muito; e o meu coração, preso a este coração citadino por um elástico: por muito que se afaste daqui, sempre voltará e mais rapidamente do que partiu. XIX ARTEC, em Tomar, para enriquecer a cultura gráfica SUPORTES é o tema do XIX ARTEC, um simpósio organizado pelos alunos de Design e Tecnologia das Artes Gráficas, do IPT. O evento vai decorrer nos dias 20 e 21 de Abril, em Tomar, e pretende “proporcionar a todos que neles participam, de forma activa ou passiva, uma visão alargada sobre novas soluções de impressão em suportes high tec”. De acordo com a organização do simpósium, o tema SUPORTES foi escolhido por ser “universal e, naturalmente, por dizer respeito a todos os que aprendem e ensinam design gráfico ou o exercem em consciência”. Por outro lado, o facto de os suportes terem evoluído, ao longo dos últimos anos, a “um ritmo vertiginoso”, justifica o debate. Os alunos que estão a organizar o ARTEC deste ano sublinham que “a indústria gráfica, juntamente com os seus suportes, têm vindo a incorporar e a tirar partido do desenvolvimento tecnológico, que lhe permite agora ter novas formas de impressão que há poucos anos atrás seriam impensáveis”. Esta é a 19ª vez que os estudantes de Artes Gráficas apresentam esta iniciativa. Para além do tema geral, no evento serão também abordadas questões como o manuseamento, acondicionamento, tintas e processos. O que se pretende é “permitir que empresários, profissionais e alunos possam interagir de forma serena, troacndo conhecimentos e enriquecendo a sua cultura gráfica”. esta J O R N A L Sexta-Feira, 30 de Janeiro de 2009 Reduzir a Sinistralidade Rodoviária: Construir um novo Mapa Mental dos condutores portugueses Uma reflexão sobre as causas e uma possível abordagem para alterar os comportamentos perigosos dos condutores portugueses, reduzindo os excessos de velocidade e a consequente sinistralidade rodoviária. A sinistralidade rodoviária em Portugal constitui um flagelo que coloca o país num dos piores lugares na União Europeia nesta matéria. As consequências sociais - traduzidas anualmente por centenas de mortes e milhares de feridos - e económicas, assumem uma dimensão nacional que motiva o investimento realizado no combate a este drama, tanto ao nível das condições das infra-estruturas rodoviárias, como ao nível da prevenção e sensibilização dos condutores. Uma das principais causas desta sinistralidade encontra-se no excesso de velocidade praticada pelos condutores portugueses. As campanhas de sensibilização para a prevenção rodoviária têm assentado na premissa que os condutores necessitam de informação para alterarem os seus comportamentos perigosos. As mensagens construídas nesta perspectiva podem resumir-se em duas tipologias: a) Informação sobre o quadro normativo e regras de segurança; b) Informação sobre as consequências da condução perigosa. Esta abordagem tradicional assume, que o comportamento do condutor é um comportamento racional sistémico, determinado pelo conhecimento e pela informação disponível - tanto sobre o quadro normativo como das consequências negativas de uma condução perigosa. Parece-nos, contudo, que os condutores não só dispõem da informação essencial sobre as normas de conduta (transmitidas desde o ensino da escola de condução até à sinalização nas estradas) como têm perfeita consciência das consequências de uma condução perigosa sobre vidas, saúde e bens. Importa pois identificar outras causas para a continuada prática da condução perigosa, designadamente, da condução com excesso de velocidade. Propõe-se que o paradigma da informação e da sensibilização que tem caracterizado o grosso do esforço realizado na prevenção rodoviária, seja substituído integralmente por uma abordagem nova, perspectivando o problema na óptica do paradigma do poder. Da reflexão e análise sobre as causas da condução perigosa, designadamente do excesso de velocidade, concluiu-se que essa prática perdura porque os condutores simplesmente acham que podem praticá-la, isto é, que dispõem do poder para o fazer. Teoricamente, o comportamento individual é controlado e formatado em sociedade através de um conjunto de mecanismos de controlo e pressão social e de dinâmicas de grupo. Esses mecanismos podem ser mais ou menos formalizados, designadamente através de quadros normativos legais, aceiteis pelo colectivo. O Código da Estrada enquadra-se nesta categoria normas, procurando regular o comportamento individual no contexto da dinâmica de grupo patente na organização do trânsito. O problema do desvio comportamental começa quando o condutor entra na sua viatura, assumindo que - na perspectiva do seu mapa mental - está a entrar no seu - reino -, num domínio próprio onde a força do quadro normativo e da pressão social diminuem e onde o seu poder individual se sobrepõe ao poder dos restantes sujeitos. Ou seja, o condutor sente que dispõe de A mensagem a dirigir ao sector automóvel é claramente um apelo à responsabilidade um poder individual - enquanto recurso seu - com uma força superior ao poder atribuído ao quadro normativo e aos mecanismos disponíveis para a sua implementação e fiscalização. A afirmação e demonstração desse poder passam a ser requisitos da afirmação do seu ego perante os outros, e como uma aparente evidência de libertação do condutor face às limitações e restrições impostas pelo colectivo. O risco para a segurança individual é um elemento percebido mas integrante - e talvez indispensável - para este mapa mental. Esta imagem de poder individual - que não deve ser confundida com o conceito de impunidade, pois o indivíduo sabe que pode ser punido - é reforçada quer pela competitividade, comparação e imitação com os restantes condutores individuais, como pela comparação entre os recursos de que dispõe para afirmar esse poder individual face aos recursos disponibilizados a quem foi atribuído o poder de controlo e fiscalização das normas aplicáveis. No mapa mental dos condutores estes recursos de poder individual são ainda exacerbados, por exemplo, pela imagem que é construída pela publicidade aos veículos que conduzem, projectada em realidades virtuais de super-heróis e personagens estereotipadas e socialmente reconhecidas. Novo Mapa Mental Propõe-se assim uma abordagem assente na reconfiguração deste mapa mental dos condutores, procurando já não a assimilação de mais informação e conhecimento, mas uma verdadeira mudança comportamental baseada numa diferente percepção do papel individual e num maior equilíbrio entre o poder individual e o poder atribuído ao contexto colectivo. Mais do que desenvolver novas campanhas de comunicação, de publicidade, de sensibilização, etc., com variações nas mensagens ou nas estratégias de meios, defende-se a necessidade de adoptar uma estratégia multifacetada baseada na mudança dos elementos do processo de comunicação tradicionais, importando envolver neste processo os agentes mais relevantes na formação do mapa mental do condutor. Se for verdade que o problema dos comportamentos rodoviários de risco derivam de um Mapa Mental assente na imagem do poder individual em conflito com o poder colectivo, devemos concluir que as mensagens têm sido transmitidas por entidades que representam esse poder colectivo. Ou seja, as mensagens têm sido transmitidas por entidades que representam o poder oposto ao que determina o comportamento individual. Assume-se que esta hipótese constitui um forte bloqueio na aceitação e eficácia das próprias mensagens. Por outro lado, admitindo como verdadeiro que esse Mapa Mental é potenciado pelas características percebidas dos próprios veículos e que essas características são geralmente comunicadas pelas próprias marcas automóveis nos seus anúncios, então devemos concluir que a origem do problema pode residir precisamente aqui. Uma análise das mensagens publicitárias veiculadas pelas marcas automóveis permite identificar a construção destas realidades virtuais em que os veículos, em muitos casos, assumem ou conferem super-poderes aos seus condutores. Na maioria destes casos, os próprios anúncios violam as regras do código da estrada e as normas prudenciais, induzindo comportamentos dos condutores reais análogos aos comportamentos ficcionados no mundo virtual da publicidade. E o excesso de velocidade (quer normativo, quer prudencial) é notório em muitos destes anúncios. A nossa proposta passa por este ponto fundamental: a prevenção rodoviária deve começar pelos próprios anunciantes da indústria automóvel que constroem boa parte do imaginário do condutor e do seu Mapa Mental. O esforço das entidades competentes pela prevenção rodoviária deve pois ser deslocado e em vez de se dirigir ao condutor, deve focarse nos anunciantes do sector automóvel que, além do mais, dispõem de meios muito mais significativos para investimento em publicidade. Logo, a capacidade de promover um novo Mapa Mental dos condutores é superior aos investimentos relativamente marginais realizados através das campanhas tradicionais de prevenção rodoviária. A mensagem a dirigir a este sector é claramente um apelo à responsabilidade corporativa e social que a indústria automóvel deve assumir perante este problema. Preconiza-se, por exemplo, a criação de um selo de qualidade ou de confiança a atribuir pela PRP aos anúncios ou marcas de automóveis que cumpram uma política publicitária mais responsável. À semelhança das estrelas de segurança que algumas marcas já ostentam nos seus suportes de comunicação, este selo da PRP deve ser um novo atributo que atesta o compromisso e a preocupação das marcas com o problema da prevenção rodoviária em Portugal. Mas existem outros agentes económicos que devem ser envolvidos e integradas activamente neste esforço, destacando-se por exemplo as companhias seguradoras que têm, evidentemente, interesses próprios na redução da sinistralidade rodoviária. Resumo do trabalho desenvolvido no Atelier de Comunicação Empresarial I, por Joana Mendes, Luísa Arrieche, Pedro Bragança e Tatiana Pedrosa sob orientação de Luís Nunes. Trabalho distinguido com uma Menção Honrosa no concurso nacional promovido pela Fundação da Juventude “Mais vale perder um minuto na vida, do que a vida num minuto”