MILONGA DE MIM Eu pensei que soubesse quem eu era Mas a
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MILONGA DE MIM Eu pensei que soubesse quem eu era Mas a
MILONGA DE MIM Eu pensei que soubesse quem eu era Mas a vida me mostrou que não Eu achei ter descoberto grandes coisas Mas os dias me disseram não Eu sentia ser amado imensamente Imaginava ser o que não pude ser Mas embora eu achasse, continuo procurando o que dizer Em conversas longas que tenho comigo Me surpreendo o quanto imaginei Me pergunto, me respondo, me alucino Mas confesso, às vezes, já cansei Felizmente tenho uma certeza Que acalenta algumas noites, sim Que é poder dormir sentindo o quanto tenho, de amor em mim. A noite, a chuva, o frio, o medo e o vento Se combinam pra judiar de mim Passeiam em frente a janela Num balé, parece não ter fim Mas com o sono aos poucos vão embora Só a noite insiste em não passar De repente é surpreendida pela lua Convidando pra dançar Pra que me conhecer, se desconheço Quem se diz conhecer tudo Se o mais desconhecido dos senhores É o conhecedor do mundo E quando acordo, insisto em me dizer Que pena que dormi, não pude ver A lua me mostrando coisas novas Que eu ainda vou viver UM ROMANCE NO BAILE Este toque de cordeona E o balanço da vaneira Minha alma salta das caixa Para bailar a noite inteira Meu pingo atado lá fora No galho de uma figueira Sabe que vai ter garupa De uma morena faceira Gaita, violão e pandeiro Num tranquito bem marcado De lá do canto do rancho Num olhar apaixonado Dois olhos verdes me miram E um sorriso delicado Que brilham clareando a sala Ante o candeeiro enfumaçado Repontando cantorias Chote, milonga e bugio A vaneira puxa a frente Alegrando o rancherio E um romance aquece a noite Que tirintava de frio Gaiteiro puxa esse fole No tranco desse pandeiro E o bordão desta guitarra Te amadrinhando, parceiro Mil gracias por esta noite Que pareceu tão pequena Levo comigo a saudade E os carinhos da morena A SAGA DE UM POVO Há cento e cinqüenta anos, em dezoito de janeiro, pisam em solo lourenciano, oitenta e oito guerreiros. A Coxilha do Barão foi o seu palco de guerra, de enxada e foice na mão, desbravaram esta terra. Aos pés da Serra dos Tapes vive um povo de escol; diamante de mil quilates, que brilha de sol-a-sol. Com a força de seu braço, bravura e dedicação, conquistaram o seu espaço, colonizando este chão. Muito suor derramado com lágrimas de incerteza e sonhos acalentados, junto à mãe natureza. Aos pés da serra dos Tapes vive um povo de escol; diamante de mil quilates, que brilha de sol-a-sol. Durante século e meio, por entre serra e planura, vive este povo obreiro, semeando pão e cultura. A colônia te enaltece, herói de terra e oceano, São Lourenço te agradece, nobre povo pomerano. Aos pés da Serra dos Tapes, Vive um povo de escol; Diamante de mil quilates, Que brilha de sol-a-sol. COPLAS DE UM RETORNO Pra trás a ternura, distância e saudade A frente um cogote e orelhas retesas... No peito o calor do apego sincero, De farta esperança e parcas certezas. A lua que adorna de prata o caminho Revela na sombra o retrato ancestral, De homem que encurta distância a cavalo, Chapéu de aba larga e capa “Ideal”. Trazia, na vinda, o peito pequeno Pra tanto carinho ansiando a chegada E a doce certeza da luz de um sorriso Despertando auroras no ermo da estrada. Não sabe de amores quem nunca estradeou, Rumando aconchegos, na paz de um domingo... Não bebe carinhos quem vaga sem rumo, Rejeita vertentes campeando respingos... E eu que andei, no rumo da fonte, Trompando a lonjura que dobra ao voltar, Sorvi beijos doces, remédio pras penas, Num campo de mate com céu de olhar. E tudo que trouxe, na volta pras casas, Me aquecendo a vida florindo, a lembrança Verteu-se em versos, regalo pra linda, Que adoça os amigos com mel de esperança. Trazia, na vinda, o peito pequeno Pra tanto carinho... YARA Yara princesa do mar Trançava esperança nas ondas Mas seu coração insistia E buscava um olhar pelo pampa Quis o destino unir Estas almas tão diferentes Mais fugir era a única forma De ter uma noite ardente Num campo de lida e suor Bonifácio é centauro afamado Mas traz no semblante uma angústia E uma solidão ao seu lado Mal sabiam os felizes amantes Que esta noite seria imortal O povo de Yara armara A emboscada e o tiro fatal Ao cruzar do campo pro mar Bonifácio Yara avistou Bastou uma troca de olhar E o tempo pra tudo parou Tombou Bonifácio pelo campo Lavando de rubro o capim Yara com o punhal da paixão Sem piedade pos na vida um fim Seria a história a juntar Dois mundos num só coração Nas diferenças da vida Um amor sem explicação Buscando o convívio eterno Yemanja com suas águas lavou O sangue sujo da terra E São Pedro os abençoou No balanço das redes a sina Casamento dentro do povoado Seu destino era viver na praia Com José herdeiro do pescado Na terra dois mundos tiveram No céu somente era um Ao lado de Deus descansaram E viveram esse amor incomum Bonifácio do campo era rei Domador, senhor da lida com o gado Mas foi se perder de amores Pela sereia do povoado Yara princesa do mar Bonifácio centauro sem rumo O amor foi fatal nesta vida Mais eterno em outro mundo. GAÚCHO PESCADOR Na minha terra o tropeiro é pescador Atira a rede como quem atira o laço Vai pra lagoa como se fosse pescar Volta pro rancho pra domar o seu cansaço O mar-de-dentro é o pampa inundado Onde capeia o sustento para os seus Do barco simples qual cavalo encilhado Vê na distância sua prenda dando adeus Bagres, corvinas, tainhas, lambaris, Fazem brilhar os olhos magros dos guris No alvorecer encilha o barco e vai pra lida Ouvindo o canto dos sabiás e bem-te-vís Segura o leme como quem segura a rédea Conduz o bote como quem conduz o gado A embarcação é um cavalo bem domado Que lhe devolve à terra firme carregado A gurizada faz a festa na chegada Terá comida no seu prato mais um dia A companheira com os olhos rasos d’água Prepara um mate festejando a pescaria Bagres, corvinas, tainhas, lambaris, Fazem brilhar os olhos magros dos guris No alvorecer encilha o barco e vai pra lida Ouvindo o canto dos sabiás e bem-te-vís VIEJO TOTO, GUITARRERO Quizás uno nunca sepa qué pena le azota el alma, con su vieja mueca ‘e calma de gaucho de antigua cepa; que ninguna duda quepa algo le lastima el alma... Viene al tranco en su azulejo muy sin apuro y pitando y algunas veces silbando milongas del tiempo viejo, paisano que es el reflejo de un tiempo que va mermando... Llega al boliche “El Fino” con su yeito muy p’adentro y alli está en su centro chupando un vasito ‘e vino, le saluda el tuerto Pino: ¡Salú y plata, y adentro! Se juntan los aparceros y esas almas solitarias se hermanan solidarias en los temas camperos, zambas y polcas canarias desfilan los guitarreros... Y el viejo cuando entra en calor siente el alma en la garganta, pela la guitarra y canta coplitas de campo y amor, su filosofía encanta y el corazón se abre en flor... MILONGA LOUCA Uma outra milonga me chegou de mansinho num bordonear de guitarra no canto do passarinho. Queria eu uma milonga louca, milonga inconstante com acordes diferentes, com versos livres saindo pela boca, queria eu outra milonga louca. Queria eu uma milonga pro Aureliano, uma milonga pro Caetano, uma milonga para a terra, outra milonga que seja contra a fome, pelo o fim das guerras pela a paz dos homens. Esta milonga se instalou no meu caminho, e assim me vou sozinho, a procura deste sonho, uma milonga que defenda o inocente e traga a igualdade para a nossa gente. HUMO Y LECHIGUANA Ya estoy puesto, espalda al viento tras un arbol escondido El caballo allá mas lejos al lado del monte tupido Conmigo solo mi poncho y el miedo de los bichitos Con um fueguito de esterco de caballo o de vacuno Al pié de aquel arbolito para taparles de humo Y convencer que se vayan usando el viento de rumbo Hasta mi perro barbudo que vive me acompañando Se da cuenta del peligro, queda de lejos mirando Cualquier mosca que le posa parece que esta picando Que hago yo agachado con dos lazos tras la rama Si me encontrára un pueblero diria que hago macana1 Tal vez no tenga probado el dulce miel de lechiguana El mayor riesgo se pasa cuando se empieza el fueguito Pues tiene, que estar al punto, bien cerca de los bichitos Salir soltando los lazos en silencio y despacito Sacudiendo el arbolito por tironear a los lazos Se agitan y se hacen malos, tapan la soga a puazos Mi caballo atrás me espera si ellos persiguen mis pasos Parece una gran maldad sacarles la miel de ahí Laburadoras que son otro rancho han de construir Para llenarlo de miel y ojalá cerca de aquí Es toda una ciencia gaucha, huno y lazo que alborota Pero despues en las casas disfrutaré cada gota De pensar mientras laburo ya siento dulce la boca 1. Arte, “boa coisa não é” REBENTAÇÃO O sol encontra a areia que espera o beijo do mar a onda, ao longe, rebenta a água se movimenta enquanto paro a pensar... E se a vida fosse onda? E a areia, meus desenganos? A imensidão dessa enchente arrastaria da gente, tantas mágoas que guardamos Rebentou onda no mar nesse mar que não tem fim são as águas dessa vida querendo encontrar guarida pras ânsias que vêm de mim! Por isso a cada aurora enfrento a força dos ventos em meio às ondas inquietas a esperança alça velas naufragando os meus tormentos Talvez um dia me canse de ilusões e ventanias aí minh’alma de mar em outro cais, vai buscar remansos pra o fim dos dias... DE TODA TRANÇA São quatro tentos por parelhos bem trançados São quatro patas, alma, sangue, pêlo e couro, São mãos campeiras pulsos firmes para um pealo Quando uma armada encontra as mãos brutas d’um touro. São corações e olhares tensos nesse instante São dois fronteiros seres “gauchos” pela estampa, São quatro tentos que se mesclam nesse embate De pele, patas, alma, sangue e um couro pampa. Que linda imagem, na nobreza desse encontro Eternizado entre o céu e o campo vasto, De um taura rude pés no chão firmando o “golpe” E um touro pampa que d’um tombo “beija o pasto”. São quatro tentos numa armada e um destino São corações pulsando juntos num compasso, São pêlo e patas alma rude de um “ser” touro Tal qual a alma de quem vem firmando o laço. São quatro patas, pele, sangue, terra e couro São quatro tentos mesclando pêlo e flexilha, São mãos campeiras pulsos firmes para um pealo De “toda trança” sustentando na presilha. O BARQUEIRO A vida tem seus caminhos de constantes incertezas repleta de estreitas curvas até que meu olhar turva denunciando estas tristezas! Navegar nos rios do peito pra encontrar dentro de mim o porquê de pescar sonhos nestes mares tão tristonhos que parecem não ter fim! Diz a lenda do sem fim que a noite finda mais pobre. Sem luar na madrugada e o barqueiro na cruzada troca alma por dois cobres Quando a esperança se esvai eu perco o rumo do norte pois meus olhos não têm luz e o barqueiro me conduz nos descaminhos da morte! Pra os que perderam o brilho o barqueiro estende a mão encerrando algum viver... Pois prefiro então morrer que entregar-me à solidão Este é o tal preço da vida pra quem encerra a existência tem que pagar um valor pra o barqueiro condutor remar nos charcos da ausência! ESTRONCA Na cabeceira se encontra a estronca bem falquejada. Pra garantia dos pilas no serviço da empreitada, firmando junto ao rabicho as sete cordas espichadas. Ta no “tanteio” do arame a manha do alambrador, que vai baixando as paletas judiado do socador. E traz as mãos calejadas templado a frio e calor. No rigor das estações as cercas vão se estendendo, no inverno a geada castiga, no verão o sol ardendo. Cem metros feitos por dia serviço bruto rendendo. Em cada vão dos moirões cinco tramas atilhadas, arame liso e farpado na divisão de invernadas. Capricho visto de longe na cerca bem alinhada. O principal nisso tudo muitos custam se dar conta. Traz madrugadas consigo trabalha de ponta a ponta. Escorando a lida bruta o alambrador é uma estronca.
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