Senda Gitana - PDF - Cáritas Portuguesa
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Senda Gitana - PDF - Cáritas Portuguesa
Senda Gitana Retrato Social da Comunidade Cigana No Concelho de Aveiro - Cáritas Diocesana de Aveiro Cáritas Diocesana de Aveiro 1 Agradecimentos Um reconhecido agradecimento a todas as pessoas e famílias de etnia cigana entrevistadas, pela disponibilidade manifestada, condição essencial à realização deste estudo. À Rede Europeia Anti-Pobreza/Portugal, ao seu Centro de Documentação e a toda a equipa, pela disponibilidade durante a pesquisa bibliográfica, em especial à Dr.ª Maria José Vicente que acompanhou desde o início, as várias fases de execução deste estudo. O projecto Novas Sendas (Cáritas Diocesana de Aveiro) agradece, ainda, a todas as instituições, que pelo seu âmbito e experiência, disponibilizaram documentação de leitura bibliográfica sobre a temática. Um agradecimento especial ao Alto Comissariado para a Imigração e o Diálogo Intercultural (ACIDI), anteriormente denominado Alto Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas (ACIME) e ao Secretariado Diocesano de Lisboa da Obra Nacional da Pastoral dos Ciganos na pessoa da Dr.ª Fernanda Reis. Um forte agradecimento ao Dr. Sérgio Aires, consultor e perito nas áreas da pobreza, exclusão e políticas sociais (com particular destaque para as problemáticas associadas às Comunidades Ciganas). O nosso reconhecimento do trabalho por ele desenvolvido e aqui apresentado, assim como do seu contributo na abertura deste documento. Mã…. Minha Estrela…. Em especial a ti! Porque Tu és o meu Eu…. E porque Contigo consegui…. Deste mundo: tão mais pequeno que o Teu! (Carla Fernandes) - Cáritas Diocesana de Aveiro 2 Índice Prefácio 4 I Apresentação 8 II Notas de Estudo 11 III Senda Gitana 15 IV Comunidade ou Comunidades Ciganas? 21 V Retrato da Comunidade Cigana de Aveiro 31 VI Habitação, Habitat e Comunidade(s) 46 VII Escolarização e Formação 58 VIII Trabalho, Emprego e Modos de Vida 66 IX Saúde e Doença 75 X Justiça 89 XI Participação Cívica e Cidadania 92 XII Considerações Finais 96 Bibliografia 105 Anexos 111 - Cáritas Diocesana de Aveiro 3 Prefácio - Cáritas Diocesana de Aveiro 4 Prefácio “As melhores fogueiras começam com pequenos ramos” Provérbio Cigano Antes de mais nada, uma importante premissa: pela forma como me tenho dedicado às questões relacionadas com a luta contra a pobreza e as comunidades ciganas, sou completa e assumidamente “suspeito”e totalmente privado de objectividade ao escrever este prefácio. Ainda mais assim é quando se trata de prefaciar um trabalho que acompanhei e com o qual me identifico de corpo e alma. Escrever um prefácio é sempre um privilégio. É ser considerado suficientemente capaz de escrever algo que abra o apetite do leitor. Não sei se reúno estas condições. Sei que escrever este prefácio é, de facto, para mim um privilégio, uma honra e uma enorme satisfação. Passo a explicar-me. É um privilégio porque me é dada, com toda a liberdade, a primeira palavra, o que me permite sublinhar e reafirmar algumas ideias que considero fundamentais. É uma honra porque o projecto que está na origem desta publicação é um dos projectos que mais admiro e que, na minha opinião, melhor conseguiu por em prática todos os princípios que defendo: enfoque nos grupos que mais fortemente são afectados por fenómenos de pobreza e exclusão social extrema; primado à investigação-acção; enorme disponibilidade para aprender avaliando; dinamização de fortes mecanismos de activa participação; forte envolvimento de todos os actores, particularmente daqueles que são o principal objecto da intervenção. Finalmente, é uma enorme satisfação porque se trata de prefaciar um trabalho de diagnóstico. Um trabalho de diagnóstico em Portugal continua a ser motivo de celebração. Um trabalho de diagnóstico sobre uma comunidade cigana, é caso para um júbilo sem fim com direito a, pelo menos, quatro dias e quatro noites de festa. Mas passemos aos factos. Quem tiver acesso a esta publicação está na presença, essencialmente, de um diagnóstico sobre uma comunidade cigana. Uma comunidade cigana do Concelho de Aveiro. Uma comunidade cigana que antes da intervenção de um projecto enfrentava gravíssimas situações de carência, pobreza e exclusão social. Uma comunidade cigana que, lamentavelmente, pode ser considerada representativa da situação que enfrentam uma boa parte das comunidades ciganas em Portugal. Mas este diagnóstico, é muito mais do que um “simples” diagnóstico. Por detrás desta publicação esconde-se um extraordinário desafio, uma enorme coragem, uma gigantesca determinação, temperada com intermináveis doses de humildade, paciência, tolerância e, quiçá o mais importante, amor. Muito amor. - Cáritas Diocesana de Aveiro 5 O Projecto Novas Sendas, promovido pela Caritas Diocesana de Aveiro, a meu ver, pode ser considerado um autêntico “estudo de caso” e um manual de como lutar contra a pobreza. É provável que quem apenas tenha acesso a esta publicação seja tentado a pensar que exagero. É por isso mesmo que penso ser muito útil explicar porque considero este projecto uma boa prática e um exemplo a seguir por todos aqueles que, verdadeiramente, ambicionem promover a inclusão e a promoção social de pessoas que enfrentam situações de tão grave pobreza, discriminação e exclusão social. Senão, vejamos: o projecto Novas Sendas escolhe intervir com um dos grupos que piores situações de pobreza e exclusão social enfrenta em Portugal e que, também em termos de intervenção social, mais se encontra desprotegido; o projecto Novas Sendas escolhe intervir numa comunidade que, apesar de viver no território português há mais de quinhentos anos, continua a ser desconhecida e sobre a qual existem e persistem os piores mitos e estereótipos; o projecto Novas Sendas escolhe uma comunidade cigana em específico que enfrenta uma das situações mais radicais de pobreza e exclusão social; o projecto Novas Sendas reconhece, à partida, que pouco sabe sobre este assunto e que necessita de aprender com quem sabe, disponibilizando-se para aprender com toda a abertura e humildade; o projecto Novas Sendas decide que qualquer que viesse a ser a intervenção possível esta teria que ter como base um profundo diagnóstico, diagnóstico este que deveria ser o mais participado quanto possível; o projecto Novas Sendas percebe que necessita de uma equipa multidisciplinar para fazer face a problemas que são, justamente, de diferentes dimensões; o projecto Novas Sendas percebe que tem que mobilizar de uma forma activa todos os actores relevantes e com responsabilidades pondo em campo uma enérgica parceria; o projecto Novas Sendas promove uma intervenção articulada e coordenada intersectorialmente não tendo medo de eleger prioridades e reconhecer limitações; e, finalmente, e o mais importante de tudo, o projecto Novas Sendas percebe e pratica com mestria a máxima de “trabalhar com” ao invés de “trabalhar “para” elegendo o envolvimento e a participação da comunidade cigana como principal eixo orientador de toda a intervenção, não descurando o envolvimento e participação da restante comunidade promovendo assim, e ao mesmo tempo, um enorme potencial de aprendizagem e convívio inter-cultural. Eis um “catálogo” de características que, na minha opinião deveria constituir um verdadeiro referencial de indicadores para todos os projectos de luta contra a pobreza e que o projecto Novas Sendas protagonizou na sua plenitude. Mas também é possível, sobretudo para os mais incautos e desatentos, que em termos de resultados finais, pareça que, pelo menos aparentemente, pouco mudou. Enganam-se. Enganam-se redondamente. E enganam-se porque, no fundo, não entendem que promover a inclusão social de comunidades e grupos sociais que se encontram tão fragilizados e há tanto tempo expostos a tão violentas formas de pobreza e exclusão exige, acima de tudo, tempo. Muito tempo. Lutar contra a pobreza obriga a políticas de pequenos passos. Políticas que têm que ser adaptadas ao contexto em que actuam, às pessoas a que se destinam. A mudança social em contextos desta natureza produz-se em gerações, acumulando vitórias, - Cáritas Diocesana de Aveiro 6 reconhecendo e avaliando derrotas, recuando por vezes dois passos para poder, com persistência, voltar a avançar. O projecto Novas Sendas foi precisamente um laboratório de tudo aquilo que acabo de dizer. Quem conheceu a comunidade cigana à qual se dedicou este projecto no seu início e tiver o privilégio de a ver agora, de falar com os seus membros, de observar as suas crianças, muito mais facilmente perceberá o que aconteceu e que tal não é devido a nenhum milagre mas a muito, muitíssimo trabalho e a uma enorme coerência e capacidade de concretização dos princípios enumerados. Mas… há sempre um “mas”. E neste caso é um “mas” demasiado importante. O projecto Novas Sendas foi um projecto. Não foi mais um projecto mas foi um projecto. É por isso que importa sublinhar que, se a sua continuidade não for assegurada, se não se der oportunidade a que as sementes que lançou à terra encontrem as condições necessárias para germinarem, poderá não ter passado disso mesmo, um projecto. Os tais importantíssimos resultados dos pequenos, mas estruturais, passos poderão perder-se com enorme velocidade e as suas potencialidades esfumarem-se com a poeira do tempo. Foi precisamente isto que aconteceu com tantos outros projectos ao longo dos últimos vinte anos. Lamentavelmente, esta lógica e investimento laboratorial e de inovação social não tem encontrado reflexos positivos ao nível da definição e implementação das políticas, perdendo-se assim a sua inerente capacidade de modelar novas formas de actuação e de, como seria desejável, contribuir para a definição de novos e mais adequados modelos e tipologias de intervenção. Tudo isto é ainda mais grave quando se trata de acções que arriscaram intervir e produzir conhecimento em terrenos tão complexos e votados ao abandono como o das minorias étnicas. Quero acreditar, no entanto – e tenho todas as razões para isso – que, neste caso, a história irá ser diferente. E, uma vez mais, a diferença fica a dever-se às condições de excepção em que este projecto foi desenvolvido a que não são de todo alheias a entidade que o protagonizou e os extraordinários profissionais que o concretizaram. O projecto Novas Sendas, pelos princípios a que obedeceu e como actuou, particularmente ao tão eficazmente ter sabido motivar e envolver todos os actores relevantes, avançou, pedagogicamente, de uma forma muito diferente de tantos outros projectos que, apenas teoricamente, se lhe assemelham: este projecto criou condições e um património para que, seja qual for o seu futuro, nada venha a ser como antes. O projecto Novas Sendas criou algo de fundamental para a mudança social sustentada: criou cultura social. E a partir de agora é minha convicção que, conforme diz o provérbio cigano “mesmo que montem um cavalo ao contrário ele continuará a andar para a frente”. Sérgio Aires Sociólogo e Consultor nas áreas da pobreza, exclusão e políticas sociais. - Cáritas Diocesana de Aveiro 7 I Apresentação - Cáritas Diocesana de Aveiro 8 I Apresentação Este “retrato social” inicia uma caracterização sócio-demográfica da população de etnia cigana do concelho de Aveiro. Atendendo à escassez de estudos (a nível nacional) relativos à comunidade cigana e à necessidade manifestada, pelos vários agentes sociais no meio, em conhecer melhor esta realidade, para também poder intervir de um modo mais eficaz face às diversas incidências de exclusão social nesta população, o projecto Novas Sendas atendeu numa das suas acções específicas, o diagnóstico social sobre as comunidades de etnia cigana residentes em acampamentos no concelho. A urgência de conhecer mais e melhor estas comunidades, emerge essencialmente dos primeiros tempos e projectos piloto da medida (do então) Rendimento Mínimo Garantido, assim como das várias constatações em termos de acção social, educativa e a nível da saúde. Deste modo, foi primordial definir em termos concelhios, qual seria o posicionamento deste estudo. A articulação com a Rede Social de Aveiro, surgiu, neste contexto, como uma forte potencialidade ao desenvolvimento do diagnóstico. Por outro lado, a aproximação cultural fruto do trabalho de terreno desenvolvido pelo próprio projecto Novas Sendas, permitiu uma maior agilidade na definição concreta de objectivos possíveis a atingir, questões e estratégias a adoptar, nas diversas fases da sua realização. Considera-se o início de uma caracterização, com a qual se pretende retratar em termos sócio demográficos, a população cigana do concelho. Que sirva, sobretudo, como um instrumento a consultar e a utilizar na reflexão, na análise e na reconsideração dos vários agentes, quanto a estratégias e medidas de intervenção junto e com as várias comunidades de etnia cigana do concelho. Assim, que se permita dizer, que se trata de um olhar atento às representações e percepções da comunidade cigana sobre as suas fragilidades, ou pressupostamente necessidades, face às diferentes áreas prioritárias de bem – estar e de inserção social: habitação, educação, saúde, emprego, protecção social e justiça. Na sua complitude, este trabalho assume apenas a recolha de discursos e de respostas em campo, nos acampamentos, cuja verdade poderá ou não corresponder a uma verdade de práticas usuais na população. Ao mesmo tempo, consideram-se apenas as necessidades sentidas pela população inquirida, as quais poderão ou não ir de encontro às necessidades diagnosticadas ou sentidas pelos serviços e agentes locais relativamente à população alvo de estudo. De facto, seria oportuna e sobretudo frutuosa essa comparação e confrontação, mas sublinha-se aqui este limite ou constrangimento de estudo: a falta de dados dos serviços, sistematizados nesse sentido, como condiz com a ética e a - Cáritas Diocesana de Aveiro 9 deontologia profissional, e como na prática, a heterogeneidade de tratamento de dados em casulos informáticos, impossibilita a articulação estatística, de tratamento e de análise de informação, bloqueando um pleno e actual conhecimento de determinada realidade. Que este retrato social (ou descrição social) das comunidades ciganas em Aveiro, seja, então, o ponto de partida para mais e futuras investigações, pormenorizando aspectos tão mais relevantes como os aqui apresentados. - Cáritas Diocesana de Aveiro 10 II Notas de Estudo - Cáritas Diocesana de Aveiro 11 II Notas de Estudo Universo em estudo: 206 indivíduos, 58 famílias (de etnia cigana) a residir nos 9 acampamentos1 no concelho de Aveiro. Natureza dos indicadores sociais: Em uniformidade ao painel de indicadores do diagnóstico social do concelho (Rede Social de Aveiro), assim como aos sectores estipulados e trabalhados pelo Instituto Nacional de Estatística e Instituto de Emprego, o estudo utiliza essencialmente: Estatísticas demográficas básicas, Indicadores habitacionais, sócio-profissionais, de escolaridade e de saúde, acção social. Envolvimento das Entidades Parceiras: Numa primeira fase do trabalho, houve uma discussão de grupo (em reuniões com os parceiros do projecto Novas Sendas), na qual se lançaram hipóteses de partida e de relacionamento de diferentes áreas (de intervenção e a estudar). Articulação com Rede Social de Aveiro Definição do universo de estudo junto dos vários elementos constituintes do grupo temático sobre minorias étnicas, Hipóteses de trabalho e áreas temáticas a estudar, Definição de indicadores viáveis e possíveis a atingir, Localização dos acampamentos de etnia cigana no concelho, Definição de estratégias para a primeira abordagem aos acampamentos, Disponibilidade de consultar os vários serviços de modo a obter uma caracterização geral da população cigana (recorrente aos serviços). Inquérito por questionário: principal instrumento de recolha de dados: 1 Conceito de acampamento, mediante a colaboração do Serviço de Habitação Social da Câmara Municipal de Aveiro e em referência ao Instituto Nacional de Habitação: espaço onde se localiza um conjunto de habitações com poucas condições de habitabilidade, marcadas pela escassez e / ou ausência de infra -estruturas básicas, alheio ao momento, de qualquer processo ou medida de realojamento habitacional. - Cáritas Diocesana de Aveiro 12 O inquérito é maioritariamente de perguntas fechadas, existindo um inquérito por indivíduo e ao mesmo tempo um inquérito para cada representante do agregado familiar. Assim, embora a maioria dos dados sejam micro analisados até ao indivíduo, existem algumas questões, relacionadas com o agregado ou com o alojamento que são tidas em conta apenas nas respostas dos representantes do agregado. Todas as questões de opinião e representações sociais também são obtidas através das respostas dos mesmos representantes. Aplicação: o inquérito por questionário foi aplicado de Julho a Outubro de 2006, contando apenas, com a situação de momento (“censitário”) do indivíduo ou agregado familiar. A sua aplicação foi antecedida de um pré-teste, do qual surgiram alguns ajustes ao modelo a aplicar. Na primeira ida aos acampamentos, foi feita a apresentação da equipa de terreno e principais objectivos de tal inquérito, junto da população. Essa visita teve o acompanhamento e mediação do técnico (de entre os vários serviços) mais próximo dos residentes. O complemento das entrevistas: De modo a esclarecer e pormenorizar alguns aspectos pontualmente referenciados no inquérito, foram aplicadas 3 entrevistas semi-directivas (2 mulheres e 1 homem). O conteúdo e desenvolvimento destas entrevistas permitiram reflectir sobre aspectos culturais, os quais foram descritos com alguma abertura por parte das mulheres entrevistadas, sendo que do sexo masculino, não houve tanta disponibilidade para “se conversar sobre esses assuntos”. No entanto, foi dada a “autorização” para as entrevistadas “falarem um pouco”. Em respeito à regra, conduta e organização cultural destas comunidades, assim se mantém o anonimato dos seus discursos aquando as entrevistas aplicadas em Agosto e Setembro de 2007. A pertinência da observação não participante: A observação não participante usada no decurso da aplicação do inquérito por questionário e entrevistas, permitiu recolher informação sobre o ambiente, as condições de vida, as expectativas, as actividades, os comportamentos e a fiabilidade das respostas. Atendendo a todas estas questões, a equipa de terreno (socióloga e educadora social) promoveu uma relação de empatia com a população, o que muitas vezes originou conversas informais e períodos de maior convivência e à vontade. Este - Cáritas Diocesana de Aveiro 13 clima proporcionou a atenção para determinados aspectos, que após a aplicação do questionário ou entrevista, foram anotados no campo “observações”: - À entrada do “bairro”, juntavam-se todos os elementos do agregados, sendo necessário, em termos estratégicos, ouvir as suas conversas e desbloquear a aplicação do inquérito de modo a garantir a privacidade das respostas. - Foi possível aplicar o inquérito à porta ou dentro do alojamento de cada agregado. - No início da “conversa”, os elementos do sexo masculino, observavam com atenção e algum cuidado, todos os comportamentos e questões levantadas. De certo modo, marcando a sua aprovação para a resposta ao inquérito. - Tomado o conhecimento e dada essa aprovação, no decurso da aplicação do inquérito, os mesmos elementos (do sexo masculino), muitas vezes, ausentavam-se do espaço. O enquadramento da pesquisa bibliográfica A pesquisa bibliográfica permitiu um maior conhecimento e reconhecimento da heterogeneidade e das semelhanças entre as comunidades ciganas. Todo este trabalho de pesquisa, consulta e leitura de enquadramento, foi feito ao longo de todo o percurso do estudo. Tratamento estatístico Para tratamento estatístico recorreu-se aos programas Excel e SPSS. Equipa de Trabalho: - Carla Fernandes (socióloga – projecto Novas Sendas) - Mariline Carvalho (socióloga – projecto Novas Sendas, desde Abril de 2007) Aquando o trabalho de campo e aplicação de inquérito por questionário, este estudo contou ainda com a colaboração da educadora social Marlene Henriques. Dr.ª Helena Santos (socióloga - Multiaveiro, projectos de formação investimentos, Lda.) acompanhou as diversas fases de realização do diagnóstico. - Cáritas Diocesana de Aveiro e 14 III Senda Gitana - Cáritas Diocesana de Aveiro 15 III Senda Gitana “ Movem-se como Sol e a Lua. São nómadas. Ou, antes, são como as ondas. Estão em toda a parte. Chegam e partem rápido. Parecem o vento. Num momento estão aqui. Numa lufada, deixam traços indeléveis da sua passagem no eco da sua música, no relinchar dos seus cavalos, no sorriso alegre das suas mulheres. Não, não são o vento. São os filhos do vento!”. BAÇAN (1992; 2) Percurso Histórico A história do povo cigano é ainda hoje pouco conhecida. A sua cultura ágrafa não permitiu registos dos factos ocorridos desde há centenas de anos, cabendo aos historiadores e investigadores ajudar a construir a sua história tendo como suporte documentos elaborados ao longo dos tempos. Embora esteja entre nós há cerca de quinhentos anos, o povo cigano está cimentado por uma cultura visivelmente diferente da cultura dominante Por este motivo, ao falar dos ciganos é fundamental referir as suas origens e compreender o percurso que os torna diferentes e eventualmente únicos, como um dos últimos povos nómadas contemporâneos. Oriundos do Norte da Índia, alvo de distúrbios e invasões, numa época de constantes mudanças, iniciaram as primeiras migrações por volta do ano 224. O primeiro movimento migratório, por várias circunstâncias, levou muitos grupos à Pérsia onde procuraram uma vida melhor. Possuidores de diferentes profissões, tinham no entanto, a semelhança da língua (Romani) e da religião (Hinduismo), o que os levou a misturarem-se socialmente e a promover casamentos entre os seus descendentes. Estas razões podem ter sido o motor para a constituição de um novo grupo étnico, autodenominado “Dom”, palavra cujo significado é “Homem”, e que nalgumas zonas da Índia serve para designar uma determinada casta. A evolução fonética da palavra, deu origem à palavra “Rom”. Ao longo do tempo são referidos movimentos migratórios levados a cabo por esta etnia, mas foi o estudo da linguística que permitiu aos estudiosos compreenderem o seu trajecto, já que foram assimilando termos em todos os países por onde passaram. Até ao século XIV, torna-se relativamente difícil encontrar concordância entre os diversos autores no que concerne ao percurso dos ciganos, uma vez que o número de documentos que se lhes refere é escasso e, alguns deles, díspares entre si. A partir deste século, a história dos ciganos começa a poder ser escrita com alguma certeza. É provável que todo este trajecto percorrido por estes grupos tenha sido efectuado a pé ou com mulas, às quais adaptaram as carroças que lhes permitiriam - Cáritas Diocesana de Aveiro 16 transportar a sua família e os seus haveres e que, em caso de mau tempo, serviriam de abrigo. Na Europa a sua presença é assinalada mais tarde, a partir do ano de 1100. No entanto, é sobretudo a partir de 1390 que os ciganos se vão dispersar pelos diferentes países do Continente Europeu, o que deu origem à chamada invasão da Europa pelo povo cigano. Ao longo da sua passagem em direcção ao Ocidente, há registos de várias medidas repressivas aplicadas aos ciganos, com base em “pecados sociais” diversos, como mendicidade não autorizada, pequeno furto, logro (negócios de compra e venda feitos sob falsa representação da mercadoria transaccionada), etc. Estas medidas repressivas acabaram por produzir enormes mudanças na vida dos ciganos na Europa. Para sobreviverem, tiveram de se adaptar, instalando-se quase sempre em zonas de fronteira (para uma mobilidade rápida relativamente a autoridades nacionais), dividindo-se em grupos (famílias) que não chamassem demasiadamente as atenções, ou agrupando-se em clãs ou tribos capazes de assegurar uma medida de autoprotecção. A passagem destas comunidades por regiões tão diversas e em muitos casos, a sua fixação, trouxeram forçosamente influências e apropriações em termos culturais e linguísticos, levando, naturalmente, à formação de muitos grupos, diferentes entre si, ainda que com raízes comuns. Este facto faz do povo cigano “um povo heterogéneo, dentro das suas semelhanças”. Os Ciganos constituem, pelo Mundo fora, um mosaico de grupos diversificados. (Liégeois, 2001:108) Apesar de possuir uma identidade cultural comum, a população cigana na Europa não é considerada como um grupo unitário, mas sim constituída por diversos grupos (comunidades). Os ciganos na Europa Actualmente, a população cigana é a principal minoria étnica europeia, estimando-se que vivam na Europa entre sete a nove mil milhões de pessoas ciganas, das quais cerca de 2/3 habitam nos países centrais e de leste. (SATISPEN: 2007) Grande parte desta população concentra-se nos países candidatos à adesão e nos membros mais recentes da União Europeia, tais como Roménia (cerca de dois milhões e meio), Hungria (600.000), Bulgária (perto de 500.000), República Eslovaca (cerca de 400.000) e Republica Checa (cerca de 300.000). (ibid) Antes da adesão dos novos países à União Europeia, em Maio de 2004, a Espanha, com mais de 650.000 ciganos, era o país da União Europeia com maior número de ciganos. (ibid) - Cáritas Diocesana de Aveiro 17 Os ciganos em Portugal Se efectuarmos uma análise sócio-histórica acerca da presença dos ciganos em Portugal, verificamos que essa história é marcada por conflitos, lutas e perseguições, reveladoras das representações sociais negativas da sociedade maioritária em relação a este povo. A partir do século XV começam a aparecer as primeiras referências literárias que falam da presença do povo cigano no território português. A primeira fonte literária data de 1510 com o poema de Luís Silveira intitulada “As Martas de D. Jerónimo”, que foi inserido no Cancioneiro Geral organizado por Garcia Resende. A segunda referência literária aos Ciganos é a “Farsa das Ciganas” de Gil Vicente, representada em 1521, na qual se descrevem as capacidades misteriosas que as mulheres ciganas têm em ler a sina nas linhas da mão, das suas habilidades para o canto e a dança, bem como as habilidades que os homens têm para o comércio. É igualmente por esta época que surge o primeiro documento legislativo contra os ciganos, o qual proibia a sua entrada e determinava a expulsão daqueles que já se encontravam no território português. Ao longo dos séculos são inúmeras as leis promulgadas com o intuito de expulsar os ciganos, desde castigos que passavam pela sua expulsão do reino, trabalhos nas galés, deportações para as ex-colónias portuguesas e até mesmo a pena de morte. No entanto, esta tentativa legislativa de assimilação dos ciganos aos costumes e à cultura da sociedade maioritária não teve sucesso, já que os ciganos partilham ainda hoje uma forte identidade étnica. Como refere Elisa Lopes da Costa, estas leis “tentam dissuadir a prática dos seus hábitos linguísticos e de trajar, alterar a sua organização social, em suma visam modificar os comportamentos sociais diferenciadores, a fim de os tornar iguais aos demais habitantes do reino”.(Costa, 1997 apud Coelho, 1995:18) A situação dos ciganos é consideravelmente alterada com a Revolução liberal que através da Constituição de 1822 e da Carta Constitucional de 1826 garante formalmente a igualdade “de raças e reconhece a cidadania portuguesa a todos os nascidos em território nacional” e a partir desse momento os ciganos só podem ser perseguidos, se cometerem algum crime. (ibid) No entanto, estes regulamentos não afirmaram a plena igualdade e liberdade dos ciganos relativamente à sociedade maioritária, já que em Abril de 1848 foi decretado o uso de passaporte a todos os ciganos que passassem pelo reino. Esta portaria foi reforçada em 1920 pelo regulamento da Guarda Nacional Republicana, a qual referia “uma severa vigilância sobre os ciganos em ordem à prevenção e repressão dos seus frequentes actos de pilhagem”. (ibid) Durante o Estado Novo, os ciganos tiveram a sua entrada vedada em certos lugares e nem sequer podiam estar parados na rua a conversar, porque estariam sujeitos a uma multa. Sabe-se ainda que, a lei portuguesa impedia a permanência no mesmo - Cáritas Diocesana de Aveiro 18 local por um período superior a vinte e quatro horas: “(…) a polícia mandava-nos logo embora, ía para outro lado embora (…) andava sempre com o cavalo engatado”. (entrevista de terreno – 21 Set 2007 - Sr. Mário, 52 anos, Bairro da Dankal) De referir, que em 1980 deu-se a abolição das normas supraditas, já que estas traziam consigo aspectos discriminatórios e como tal eram consideradas inconstitucionais. Com a revolução do 25 de Abril de 1974, o povo cigano deixou de ser perseguido e assistiu-se à sua sedentarização. As representações sociais que a sociedade maioritária criou, ao longo da história, acerca das comunidades ciganas deram e continuam a dar origem a comportamentos racistas e de negação, despertando nas pessoas um sentimento de insegurança e de receio em relação a este povo. Da história da origem do povo cigano podemos concluir que este povo demonstrou uma grande resistência a todas estas medidas que muitas vezes violentas, possuíam um notório carácter de discriminação e de racismo. De referir, no entanto, que os ciganos quase nunca manifestaram interesse de se incorporarem na sociedade envolvente e viveram sempre afastados, numa tentativa de protegerem a sua cultura e os seus hábitos. Apesar de todos estes condicionamentos, o povo cigano acabou por se afirmar como uma “nação”, e embora não tenham uma pátria, possuem uma “língua”, uma “cultura”, uma “bandeira”, uma “lei” e um “hino” próprio. Actualmente, e apesar do enorme grau de incerteza e de imprecisão, os números oscilam entre os 30.000 e os 90.000 ciganos portugueses2. (SATISPEN: 2007) Segundo o estudo de Alexandra Castro3, são cerca de 20 mil ciganos4 existentes em Portugal Continental, sendo o distrito do Porto o que concentra um maior número absoluto de ciganos (2268), seguido dos distritos de Lisboa (1882), Faro (1688), Braga (1566) e Aveiro (1536). (Castro, 2004 apud SATISPEN, 2007: 13) 2 Segundo a Comissão Europeia contra o Racismo e a Intolerância são entre 50.000 e 60.000 ciganos existentes em Portugal. Second Report on Portugal, European Comision Against and Intolerante, Adoptado em 20 de Março de 2002, Estrasburgo, 4 de Novembro de 2002, p. 21. 3 O levantamento de dados foi efectuado no âmbito de um projecto de investigação financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (SAPIENS/POCIT) em 2004 – Os Ciganos vistos pelos outros: proximidade social em espaços de coexistência Inter-étnica. 4 Relativamente a estes dados deve-se ter presente que 96 concelhos não disponibilizaram informação. Por isso estes dados não podem ser considerados exaustivos. - Cáritas Diocesana de Aveiro 19 De realçar, que estes números são apenas aproximações à realidade, já que sendo os ciganos considerados cidadãos portugueses, estes não podem ser identificados de forma distintiva em relação aos outros cidadãos. - Cáritas Diocesana de Aveiro 20 IV Comunidade ou comunidades ciganas? - Cáritas Diocesana de Aveiro 21 IV Comunidade ou Comunidades Ciganas? Em termos sociológicos, o conceito de comunidade assenta em diversos factores como o território comum (seja bairro, aldeia ou região), a partilha da mesma língua e da mesma crença, a pertença à mesma etnia, entre outros. Pressupõe assim, relações sociais próximas e a existência de grupos primários com relações sociais directas entre os seus elementos, determinadas pela intimidade e a emoção, mas sobretudo pelas regras de controlo social específico. Deste modo, seria arriscado, para não dizer, completamente errado, falar de etnia cigana como uma comunidade única. As mudanças sentidas ao longo do tempo, os processos atravessados ao longo dos diferentes percursos de socialização, de convívio com outras culturas, assim como a existência de diferentes escalas de pirâmides de valores, conduzem à reflexão da existência de diferentes comunidades de etnia cigana, que regidas por uma mesma identidade étnica, se distinguem nos seus modos de estar e de viver, assim como nos seus níveis de participação cívica, de resistência, de abertura, de interculturalidade ou de isolamento. A noção de etnia desenvolve assim, a percepção de diferentes realidades dinâmicas que se vão modificando, (re)formando, desenvolvendo ou desaparecendo em função da mobilidade demográfica, ou do contacto com outros grupos sociais e culturais, sem jamais perder a sua essência e origem. Relativamente aos ciganos, são vários os registos dessas diferenças, desses mosaicos, conduzindo à reflexão temática de “etnia” e “comunidade” ou “comunidades”. Tendo em conta a realidade em estudo: comunidade cigana no concelho de Aveiro, e embora não tendo sido objecto de estudo a pormenorização deste aspecto, sentiram-se, na passagem de bairro para bairro, (e recorrendo à observação não participante paralela à aplicação de questionário), algumas diferenças assentes em aspectos reveladores de uma organização e de relações próprias de uma comunidade específica: - no casamento, - no luto, - nas relações familiares, - na relação conjugal, - na definição de papéis familiares (papel da mulher, do homem, dos mais velhos) - na influência da família extensa e alargada, - na relação com a comunidade não cigana, - Cáritas Diocesana de Aveiro 22 - nos modos de vida, - no tempo de residência nos bairros, - entre outros. Com a consideração necessária a todas estas diferenças, o estudo sobre a comunidade cigana de Aveiro, cinge-se à caracterização sócio-demográfica de um todo populacional, constituído pelos 9 bairros / acampamentos então existentes, não desenvolvendo pormenores de grupos, de relações, e sobretudo destaques culturais. Essa possível investigação colocaria à frente outras tantas questões de essência, como por exemplo, a consideração, ou não, de uma comunidade cigana ou de várias comunidades ciganas, atendendo a serem estudados bairros / acampamentos com diferentes modus vivendi. Fica em nota, como uma primeira abordagem, uma primeira caracterização e conhecimento da comunidade de etnia cigana no concelho, que por si, permitirá o avanço de novas e futuras iniciativas de inter-conhecimento, chegando mesmo a trabalhos pormenorizados qualitativamente quanto à cultura e às mentalidades. No entanto, e em recurso ao conteúdo das entrevistas aplicadas no terreno, são assim registados alguns pontos fundamentais para melhor enquadramento da realidade em estudo, e sobretudo, para uma melhor leitura dos diversos dados à frente apresentados nesta publicação, com a possibilidade de introduzir na sua interpretação e análise, aspectos essenciais de cultura, etnia e controlo social específicos. A lei cigana – o peso da palavra As comunidades ciganas regem-se por leis, que não estando escritas, são a forma mais sólida da tradição cigana, assegurando todo o controlo social dos grupos. Estas leis controlam e regulam a matriz cultural, as relações dentro da comunidade e entre as próprias comunidades. É aos homens mais velhos, considerados “homens de respeito” a quem cabe o papel da autoridade e da organização. Estes “homens de respeito” são aqueles que pela sua postura social e familiar, ao longo dos tempos foram colhendo o apoio e o respeito por todos.5 Trata-se de um estatuto a que todos tentam aspirar por ser muito prestigiante. Assim sendo, podemos afirmar que a estrutura familiar destas comunidades assenta na patriarcalidade – todo o poder de decisão está nos “homens de respeito”; vigiam quem cumpre e quem não cumpre as regras; decidem castigos, sanções e prémios. 5 Em muitas comunidades, também existem mulheres de respeito a quem lhes é conferido, igualmente, legitimidade e reconhecimento. - Cáritas Diocesana de Aveiro 23 À força da linhagem, acresce o prestígio, a palavra dada e a honra em cumprir com as obrigações e a aplicação da lei cigana. O papel da família “Os ciganos são muito felizes com os seus familiares e amigos.” (atelier Novos Rumos (Novas Sendas), 21 set 2004) A organização social das comunidades ciganas tem como unidade base a família, ela é considerada a “unidade económica na qual se exerce a solidariedade do trabalho, unidade educativa que assegura a reprodução social e a segurança, a protecção do indivíduo”. (Liégeois, 1989 apud Fernandes, 2002: 61) A noção de família para os ciganos é muito mais ampla que o usual, englobando não apenas a família nuclear, mas também a família extensa, os avós, os tios, os primos, podendo ir até à terceira ou quarta geração. Estes mantém entre si grandes relações de convivência e todos contribuem para o bem - estar, formando uma unidade organizacional. A educação da criança é feita colectivamente, sendo no seio da família que as crianças recebem os ensinamentos culturais, através dos quais edificam a “personalidade social cigana” (Montenegro et al, 2001:35). Partilham o seu dia a dia com várias gerações e é neste conjunto que a sua socialização decorre. Segundo João José Fernandes “este ambiente garante à família a coesão, a coerência , a continuidade e a segurança”. (2002: 70) Neste contexto cultural específico, a família constitui no plano do sistema de disposições e preferências (duradouras) a dimensão mais valorizada. É possível citar ainda outras, também elas de especial relevância, como o respeito pelos mais velhos, o casamento, a fidelidade conjugal, o cumprimento dos compromissos estabelecidos entre famílias, a importância atribuída à virgindade da mulher, o respeito pela criança, o respeito pelos mortos e o rigor associado ao luto. Todos estes elementos culturais permitem compreender a centralidade da instituição familiar, enquanto valor moral por excelência. O casamento cigano “Ainda agora há dias tivemos uma festa muito grande (…). Três dias: sexta, sábado e domingo. (…) botaram-na ao colo e deitaram-na ao ar e ela toda contente.” (entrevista de terreno - Set 2007) - Cáritas Diocesana de Aveiro 24 O casamento é uma das tradições mais preservadas entre o povo cigano, já que representa a continuidade da etnia. A união matrimonial é considerada pelo povo cigano como uma primeira etapa para a formação da família cigana. A endogamia faz parte da tradição do casamento cigano e quando se fala em endogamia, não se reporta apenas a casamentos dentro da mesma etnia mas também na própria família, já que é comum haver casamentos entre primos. Os casamentos com pessoas não-ciganas são evitados, pois aos olhos da comunidade cigana significa uma perda de reputação da família e, em algumas situações, existe o receio de se perder determinados aspectos culturais. O reconhecimento dessa união é feito pela comunidade cigana de acordo com as suas tradições, sendo considerada uma “união de facto” e por eles denominado por “casamento natural”. Como tal esta união não é reconhecida pelo modelo proposto pelo código civil português. O casamento é considerado a maior festa dos ciganos. A festa realiza-se no acampamento dos familiares dos noivos, que reúna todas as condições necessárias para acolher todos os convidados. O casamento faz-se ao ar livre e dura vários dias. As mulheres ciganas casam muito jovens e geralmente são prometidas pelos pais durante a sua infância. “(…) o pai gosta de um rapaz, e é o pai que promete a filha. Mesmo que a filha não goste, há pais que obrigam a casar com esse rapaz. Então eles fazem o pedimento…(…) o pedimento fazem uma festa, manda bebida e comida. Mesmo de barriga, quando está grávida faz o pedimento”. (entrevista de terreno - Ago 2007) Como já foi referido nem todos os bairros vivem as tradições da mesma forma, havendo comunidades em que é permitido à filha escolher o seu companheiro. “(…) Há muitos que manda escolher a filha, se a filha não gostar atira as cabaças. (…) Quando a mulher não gosta manda as cabaças”(idem) Com o casamento o jovem casal passa a viver em casa dos pais do noivo. No entanto, este jovem casal só será considerado um novo núcleo familiar, aquando do nascimento do primeiro filho, passando a viver na sua própria casa. A vinda de uma criança para esta comunidade resulta numa grande alegria, sendo desejado em primeiro lugar um rapaz, para assegurar a continuidade do nome da família, e só depois a rapariga para cuidar das tarefas domésticas e dos irmãos. Desse facto resulta que a mulher estéril seja considerada como uma pessoa doente pela comunidade cigana, já que não consegue assegurar a continuidade da “raça” cigana. Nestas situações, o homem cigano pode separar-se e casar-se com outra mulher cigana. Em algumas situações, existem raparigas de etnia cigana que insistem em escolher o seu par, e para que isso aconteça, fogem. Se a menina tem outra pessoa de quem gosta, poderá proceder no sentido de evitar casar, com quem está prometida. - Cáritas Diocesana de Aveiro 25 Assim, irá até às últimas consequências que será fugir com a pessoa amada. Foge com ele para casa de familiares. Curiosamente, apesar da fuga se destinar a garantir o casamento, mantém-se o respeito pela preservação da virgindade da rapariga até à oficialização do casamento. O familiar fala com os pais da menina para dizer que ela está com este, o pai manifesta o seu descontentamento pelo sucedido e toda a comunidade fica a saber que aquele pai está desgostoso. Na generalidade dos casos, a menina regressa e faz-se o casamento, dentro das tradições ciganas. A fuga também pode ocorrer se a noiva puser em causa a sua virgindade. “Ela foge com o namorado, e está dois ou três dias. (…) Volta diz que dormiu com o noivo e já está. Não faz festa, junta-se e já está”. (idem) Quando se verificam situações de infidelidade, a comunidade cigana pune o desertor expulsando-o. Nas situações de infidelidade por parte da mulher, esta é entregue à sua família de origem, sem os seus filhos, e será marginalizada por toda a comunidade cigana. Quanto ao homem, o castigo a aplicar será o mesmo, mas poderá voltar se a mulher assim o entender. Sabe-se, no entanto, que a mulher traída não tem liberdade para se casar novamente, caso seja essa a sua vontade, então os filhos são-lhes retirados e entregues aos avós maternos. Nestas situações e no caso de um cigano ser divorciado, este fica impedido de ser padrinho de futuros noivos, o que constitui para estas comunidades um factor de perda de estatuto e de reconhecimento social. O divórcio propriamente dito, não existe, mesmo que ocorra a separação esta é feita de acordo com o consenso comunitário, não se recorrendo aos tribunais. A importância da virgindade “Uma rapariga para casar tem que ter a virgindade (…).” (entrevista de terreno. Ago 2007) A cultura cigana sofreu, na Península Ibérica, grandes influências judaico-cristãs, e a questão da virgindade é uma delas. A noção de pureza e de limpeza é um elemento chave na matriz cultural cigana. Assim, a virgindade da rapariga é um dos principais valores que viabiliza o casamento segundo a lei cigana. Por isso mesmo, a censura e o controlo social é muito apertado, no que respeita às raparigas solteiras, exigindo-se destas uma elevada rigidez moral e de comportamentos. Sabe-se que a mulher cigana casa geralmente muito jovem, entre os 13 e os 16 anos, e é essencial para esta comunidade que a jovem preserve a sua virgindade até ao momento do casamento. Assim, a sua pureza é vista como uma reputação, e caso isso não aconteça, a mulher cigana perde a possibilidade de se casar e o respeito - Cáritas Diocesana de Aveiro 26 pela comunidade cigana na qual está inserida. A noiva deve comprovar a sua virgindade através da mancha de sangue no lençol que é mostrada a toda a comunidade cigana. Essa prova é feita normalmente pela anciã, pela cigana mais velha da comunidade cigana, a pedido do pai da noiva, e sempre na presença do seu noivo. “(…) é chamada a cigana mais velha no dia do casamento (…) a juntadora. (…) Chamam-lhe a hora da manhanada, a hora em que se mostra o lenço branco”. (idem) Se a noiva não for virgem será punida segundo as tradições ciganas. “Há zangas entre todo o mundo, e ela não pode ficar com o homem que ela vai casar”. (idem) Devido a esta pressão e controle grupal, não será de estranhar que esta tradição tenha repercussões no abandono escolar, nomeadamente ao nível das raparigas, já que existem receios por parte da comunidade cigana relativamente aos ensinamentos e à aculturação que as jovens ciganas poderão adquirir por parte da sociedade maioritária. Papéis familiares: homem e mulher “ O homem é livre, a mulher não”. (entrevista de terreno: Ago 2007) As comunidades ciganas caracterizam-se por serem comunidades patriarcais. É a partir do espaço doméstico que se constroem os símbolos e os significados do género e se legitima a dominação masculina. Segundo Maria Helena Chaves “O poder simbólico de dominação no interior da família ou da comunidade cigana, está organizado e institucionalizado de forma hierarquizada. Os discursos dominantes no interior do grupo têm a marca da masculinidade, e são estes que impressionam e dão colorido às atitudes, aos saberes e às ideologias socialmente compartilhadas” (2001:37). Os homens são os chefes de família, são eles que tomam as decisões e ditam a moral, as regras que moldam as condutas da comunidade cigana. “ O homem faz tudo o que ele quiser e não pede autorização a ninguém. O homem é livre, a mulher não! (…)”. (entrevista de terreno: Ago 2007) Ser mulher na comunidade cigana implica frequentemente obrigações familiares, característica das sociedades patriarcais. As mulheres ciganas não possuem liberdade estando sujeitas à submissão das regras ditadas pela tradição cigana. “A gente tem que cumprir, não mandamos em nós próprias. (…) queremos fazer uma - Cáritas Diocesana de Aveiro 27 coisa à nossa vontade a gente temos que pedir ordem. (…) eles não ouvem o nosso coração, só querem ouvir as opiniões deles.” (idem) Às mulheres compete a transmissão da cultura na educação dos filhos, as tarefas domésticas, apoiar os maridos nas suas actividades e o papel de reprodutoras para assegurar a continuidade social e a sobrevivência do grupo. “A cigana só cuida dos filhos, faz de comer e arruma a casa”.(idem) As diferenças de género começam a notar-se logo na infância, já que aos rapazes é dada total liberdade ao passo que as raparigas ficam no acampamento sob o olhar atento dos familiares e desde cedo aprendem a cuidar dos irmãos e das tarefas domésticas. “As meninas de treze, catorze anos sempre está o pai e a mãe, nunca ficam sozinhas”. (idem) Essas diferenças condicionam também as práticas sociais dessas crianças, como por exemplo ver televisão. O rapaz possui liberdade para ver o que quiser e quando quiser, o mesmo não se passa com a menina, que tem sempre alguém por perto no sentido de a privar de determinados programas de televisão. “Os rapazes podem ver tudo, as meninas não. Sempre está o pai ou a mãe, nunca ficam sozinhas”.(idem) O poder na família é definido pela idade, compete aos mais velhos, detentores de sabedoria e de liderança, tomar as decisões importantes. O luto “ A lei deles é assim, (…) durante um ano, a gente o luto que leva é muito pesado. (…) não pode tomar banho, não pode ver televisão, não pode ouvir música. Mas depois de passar um ano, (…) é muito diferente”. (entrevistas de terreno: Ago, Set 2007) A solidariedade funciona na unidade parental e manifesta-se, sobretudo, nos momentos de doença e de falecimento dum familiar. Sendo um povo solidário, estes nunca abandonam um ente doente, acompanhando-o sempre desde o surgimento da doença até ao momento da morte. Para os ciganos a morte é sagrada. O povo cigano tem grande respeito pelos mortos e procuram fazer-lhes os funerais com grande solenidade. O cuidado que têm em honrar o morto deriva da sua forte crença na existência de “fantasmas”, e temem que o morto, não satisfeito com as honras prestadas, possa voltar para os perseguir. Na generalidade, assiste-se à mobilização de toda a família no sentido de velarem o corpo dia e noite esteja ele onde estiver, este nunca fica só. A cerimónia fúnebre faz-se, normalmente, no acampamento do defunto e é realizada pelo pastor. Actualmente, os ciganos aceitam as leis do país onde vivem, e enterram os seus mortos nos cemitérios. - Cáritas Diocesana de Aveiro 28 Tradicionalmente, sabe-se que queimam e deitam fora todos os bens do defunto, visto acreditarem que o espírito do defunto poderá pairar sobre as coisas que ele usou. O luto, na cultura cigana, é vivido com grande rigor, no entanto convém referir que nem todas as comunidades ciganas vivenciam da mesma forma, havendo diferenças de acampamento para acampamento. No caso da viuvez da mulher, a sua importância social é diminuída, perdendo direitos dentro da comunidade. A mulher viúva, segundo a lei cigana, não deve ver televisão, ouvir música, falar em demasia e a sua participação em eventos sociais, como por exemplo a festa de Natal e o casamento, é anulada. O desmazelo na forma de tratar o corpo é outra das provas eternas de sofrimento e de recordação do ente querido. A mulher veste uma roupa preta cedida por uma outra viúva do acampamento onde vive, e é-lhe rapado o cabelo pela cigana mais velha. “Desde aquele momento em que eu vesti a roupa, tive que estar um ano sem tirar aquela roupa e a gente tem que cumprir”. “A avó dele, foi aquela mais velha que está ali ela sem pedir autorização a ninguém, chegou com a tesoura e cortoume o cabelo logo”.(idem) Por outro lado, deixa de poder usar qualquer coisa que a possa embelezar ou chamar a atenção para a sua feminilidade. Em determinados acampamentos, a mulher viúva não pode tomar banho, nem usar roupa interior durante um ano. “De certa idade não pode tomar banho, pode-se lavar mas tomar banho já não tomam. Porque a família vai falar mal dela. A mulher nova que fica viúva, está um ano sem se lavar (…) Só a partir do ano é que se pode lavar”(idem). A mulher cigana de luto não deve voltar a casar, já que nestas comunidades o luto é considerado para toda a vida. Não será de estranhar, que algumas mulheres de etnia cigana não aguentem o processo de luto e a única alternativa que encontre seja fugir, abandonando os filhos. “ (…) muitas mulheres não aguentam o luto e fogem. (…) abandonam os filhos, abandonam tudo”.(idem) Apesar de alguns acampamentos viverem o processo de luto da mulher de forma rigorosa, verifica-se noutros, um certo alívio deste ritual, devido a uma certa aculturação provocada pela sedentarização, mas o essencial mantém-se. “Morre, a mulher viúva é para toda a vida. Agora as que são novas já não, chega a um ano, dois anos tiram o luto. Passados dois anos pode voltar a casar. A lei antigamente não, os ciganos nos matavam. Fazíamos uma coisa assim, os ciganos nos apanhavam e com uma navalha cortavam-nos logo a cara. Agora já não”.(entrevista de terreno 21 Set 2007) O luto nos homens é diferente, na medida em que se trata de outro sexo. Os homens deixam crescer a barba e o cabelo e portanto não cuidam tanto da sua aparência. Estes não podem ouvir música, ir a festas e ingerir bebidas alcoólicas. - Cáritas Diocesana de Aveiro 29 Na generalidade, o cigano não escreve, nem lê o nome de um ente querido que já tenha falecido. Em conclusão… Caracterizar comportamentos e traços culturais e considerá-los como aspectos que tipificam uma população ou um grupo social será fixar, reificar e essencializar essas populações. Cada vez mais privados do espaço e do tempo socialmente definidos, assistimos ao aumento de várias entidades culturais em revolta contra o (durante tanto tempo defendido) universalismo. Com esta consciência, somos obrigados a atender ao engano ou talvez mesmo ao erro, de tantas vezes não reconhecer o indivíduo como um sujeito social, com uma cultura própria, uma identidade pessoal, grupal e societal que poderá ser bem diferente da do seu próximo. Este aspecto é fundamental, quando diversos olhos lêem, interpretam e analisam números, estatísticas ou descrições, sem atender ou não conhecer o complemento ou a cultura em estudo, os seus mecanismos de defesa, a sua história, ou posição numa cultura dominante. Nesta linha, será de respeitar esse direito à diferença, reconhecendo minorias com valores e formas de conduta próprias de estar, no intento de estabelecer um equilíbrio de intervenção (se necessária) sem provocar consciente ou inconscientemente “assimilações” de comportamentos maioritariamente aceites, que não se adequam, muitas vezes, à realidade específica. - Cáritas Diocesana de Aveiro 30 V Retrato da Comunidade Cigana de Aveiro - Cáritas Diocesana de Aveiro 31 V Retrato da Comunidade Cigana de Aveiro Este capítulo inicia, assim, a apresentação dos vários aspectos caracterizadores da população de etnia cigana, residente em acampamentos no concelho de Aveiro. Considerados teoricamente (entre outros), e vivenciados na prática, como indicadores de vulnerabilidade de pobreza e exclusão social6, alinhamos num primeiro retrato (1.ª apresentação), alguns pontos de caracterização sócio demográfica, reveladores de uma situação limiar, aquém das fronteiras previstas entre integração e exclusão social experimentada por estas comunidades: acampamentos e mobilidade geográfica, aspectos demográficos, família, sustentabilidade. Estas são, então, as primeiras características a descrever em relação ao universo em estudo, tendo em conta a sua associação e articulação com todas as restantes áreas analisadas e pormenorizadas em capítulos específicos posteriores. Acampamentos Quadro nº. 1 – Caracterização dos Acampamentos Acampamento n.º indivíduos n.º agregados n.º alojamentos Freguesia Avenida Nova 8 1 1 Vera Cruz N.ª Sr.ª Necessidades 8 4 2 Esgueira Dankal 15 4 4 Aradas Barrocas 5 2 1 Vera Cruz S.Bernardo 28 6 6 S. Bernardo Mamodeiro 25 7 6 N.ª S.ª Fátima 1.º Ervideiros 35 12 11 Esgueira 2.º Ervideiros 25 7 6 Esgueira 3.º Ervideiros 57 15 13 Esgueira 206 58 50 Total 6 Pobreza e exclusão são 2 conceitos que se cruzam quase no imediato, mas que não se confundem; a pobreza é uma parte integrante do processo de Exclusão Social, o qual emerge através de outros tantos factores, quer de índole material, social como cultural. Deste modo, Exclusão Social assume um carácter multidimensional, pelo facto de no mesmo processo se interligarem vários fenómenos sociais como a pobreza, o desemprego, a marginalização, a discriminação racial, entre outros. Trata-se assim, de um processo cumulativo de insucessos sociais. Por outro lado, é um conceito inteiramente associado a um padrão social específico de referência, o qual indica as principais dimensões condicionantes à inclusão / exclusão (ex: habitação, educação, saúde, emprego, justiça ) e decide aquele que é e aquele que não é excluído, mediante a sua posição face aquilo que deve ser e à sua participação social (cívica) no meio. Com base neste conceito, o presente estudo, assume como capítulos em documento, as designações específicas da s principais condições de vulnerabilidade à Exclusão Social, enunciadas. - Cáritas Diocesana de Aveiro 32 A maioria dos indivíduos concentra-se no conjunto dos 3 acampamentos de Ervideiros, totalizando 117 pessoas, correspondendo a 56,8% do total da população de etnia cigana a residir em acampamentos no concelho. O acampamento mais populoso é o 3.º “bairro” em Ervideiros, com 57 indivíduos, tendo também consequentemente um maior n.º de agregados (15) e alojamentos (13). Imediatamente a seguir com 28 indivíduos surge o “bairro” de S. Bernardo, seguindo-se Mamodeiro com 25 pessoas. Os acampamentos com menor n.º de residentes, e também mais pequenos (com menor n.º de agregados e alojamentos), são os “bairros” de N.ª Sr.ª das Necessidades (8 indivíduos, 4 agregados e 2 alojamentos), Avenida a Nova (8 indivíduos do mesmo agregado e do mesmo alojamento) e Barrocas (1 alojamento para 2 agregados com um total de 5 indivíduos). Quadro nº. 2 – Caracterização dos Acampamentos Freguesia n.º indivíduos % Esgueira 125 60,68 S. Bernardo 28 13,59 N.ª S.ª Fátima 25 12,14 Aradas 15 7,28 Vera Cruz 13 6,31 206 100 Total Tendo em conta a distribuição territorial por freguesia, verifica-se que na freguesia de Esgueira concentra cerca de 61% da população de etnia cigana a residir em acampamentos. Em menor escala, surge S. Bernardo, com 1 acampamento com 28 indivíduos e N.ª Sr.ª Fátima (Mamodeiro) com 25 residentes em 6 alojamentos. Vera Cruz, freguesia que constitui o principal núcleo da cidade concentra 2 acampamentos, com 1 alojamento cada, com um total de 13 pessoas. Aradas, bem próxima do centro da cidade, regista um acampamento (Dankal – o acampamento mais antigo do concelho) com 15 elementos a habitar em 4 alojamentos, (1 para cada agregado residente). Ora, segundo diversos autores, a forma como os indivíduos estão distribuídos no território, assume uma importância acentuada na dinâmica da própria exclusão social, atendendo ao facto de potenciar vários processos de vulnerabilização e segregação espaço-societais. (Blanquart,1997; Tebib, 1996; Viellard – Baron, 1996; Delarue,1991) - Cáritas Diocesana de Aveiro 33 O facto de se ocupar espaços sem licença de construção, próximos de zonas industriais, no meio de pinhais, situados na periferia leva a que as condições mínimas de habitabilidade não sejam atendidas, nestes acampamentos.7 Todo este contexto acarreta um conjunto de fenómenos ligados à ausência de equipamentos, fealdade, insalubridade, que “mutilam” o próprio contexto de vida dos indivíduos, e que associados a outros factores de exclusão social, condicionam a posição destas comunidades no meio envolvente. Quadro nº. 3 – Tipo de Alojamento tenda (materiais improvisados) barraca de madeira barraca de alvenaria (construção inacabada) construção clássica antiga construção de alvenaria acabada (tipo anexo) total Avenida Nova 1 0 0 0 0 1 N.ª Sr.ª Necessidades 0 0 0 0 2 2 Dankal 4 0 0 0 0 4 Barrocas 0 0 0 1 0 1 S.Bernardo 3 2 1 0 0 6 Mamodeiro 0 0 1 0 5 6 1.º Ervideiros 2 1 3 0 5 11 2.º Ervideiros 0 0 2 0 4 6 3.º Ervideiros 3 3 7 0 0 13 Total 13 6 14 1 16 50 A completar a reflexão anterior, observe-se os tipos de alojamento existentes nos “bairros”: construções tipo anexas (16), barracas de alvenaria (14), tendas feitas de materiais improvisados (13), barracas de madeira (6) e 1 construção clássica antiga. As tendas concentram-se nos acampamentos da Dankal (com 4 situações, equivalentes ao total de alojamentos aí existentes), na Avenida Nova (1 e único alojamento aí existente), S. Bernardo (3 situações) e nos 1.º e 3.º acampamentos de Ervideiros. Apenas existe uma construção clássica antiga, nas Barrocas, funcionando como único alojamento para os 2 agregados aí existentes. A Freguesia N.ª Sr.ª das Necessidades especifica-se pelo facto de ser um acampamento constituído apenas por construções de alvenaria tipo anexo. Os restantes alojamentos deste tipo situam-se em Mamodeiro e no 1.º e 3.º acampamentos de Ervideiros. O 3.º acampamento de Ervideiros, concentrando o maior n.º de alojamentos, também concentra o maior n.º de construções inacabadas, estando as restantes 7 - Este assunto será posteriormente desenvolvido, no capítulo Habitação e Redes de Sociabilidade. Cáritas Diocesana de Aveiro 34 distribuídas pelos restantes “bairros” de Ervideiros, S. Bernardo e Mamodeiro. O mesmo acontece em relação às barracas de madeira, embora não se tenham observado no 2.º “bairro” de Ervideiros e em Mamodeiro. Mobilidade Quadro nº. 4 – Mobilidade das pessoas inquiridas Tempo de Residência acampamento Total Av. Nova 0 N.ª Sr.ª Necessidades 1 Dankal Barrocas S.Bernardo Mamodeiro 1 2 0 6 meses - 2 anos 0 2 1 0 1 3 - 6 anos 0 0 1 0 7 - 10 anos 1 0 0 11 - 14 anos 0 0 15 ou mais anos 0 Total 1 < 6 meses 2 1.º Erv. 1 2.º Erv. 2 3.º Erv. 2 11 0 2 0 0 6 1 5 2 0 7 16 0 4 0 1 4 0 10 0 0 0 0 6 1 6 13 0 1 0 0 0 0 0 0 1 3 4 2 6 7 12 7 15 57 Durante muitos séculos, a população cigana portuguesa, permaneceu no nomadismo, embora nas últimas décadas, a tendência seja nítida quanto à sedentarização, bem mais acentuada nos meios urbanos e à volta das grandes cidades. No quadro anterior, constata-se uma escala relativamente ao tempo de residência que vai até aos 15 ou mais anos, podendo mesmo referir que existem situações com 30 e poucos anos de permanência no “bairro”. No acampamento da Dankal, em Aradas, regista-se um agregado com mais de 15 anos (cerca de 32 anos) de residência naquele “bairro”. Na maioria dos acampamentos, verifica-se a existência de agregados com um tempo de residência superior a 3 anos, variando até aos 14 anos de permanência. Ora este tempo, abarca a existência e a continuidade de pelo menos 3 gerações de crianças a frequentar o 1.º ciclo, facultando deste modo possíveis trabalhos de intervenção social (como se poderá analisar mais à frente a questão do Rendimento Social de Inserção) ou directamente exequíveis pelo sistema de ensino. Se esta questão da mobilidade geográfica, fica em aberto perante estes dados, (existência ou não de mobilidade geográfica), também encontramos nas comunidades, elementos que ainda foram ou se relacionam com parentes nómadas. Ao mesmo tempo, são ainda 17 os agregados que residem no “bairro” há menos de 2 anos, podendo corresponder a situações de mobilidade de distrito para distrito, situações que se verificam, igualmente, ao nível de alguns casais jovens que transitam de “bairro” para “bairro”. - Cáritas Diocesana de Aveiro 35 Naturalidade Quadro nº. 5 – Naturalidade dos inquiridos (representantes dos agregados) Naturalidade n.º indivíduos Distrito de Aveiro, concelho de Aveiro Distrito de Aveiro, outro concelho 14 29 Outro distrito - Centro Outro distrito - Norte Outro distrito - Costa de Lisboa 1 7 4 Outro distrito - Alentejo 1 Não responde 2 Total 58 Atendendo apenas à naturalidade dos representantes dos 58 agregados, a maioria (29 respostas) tem a sua origem no próprio distrito, ainda que em concelho diferente de Aveiro, seguem-se 14 elementos naturais do próprio concelho. As situações correspondentes a naturalidade em outros distritos, somam na sua totalidade, 13 situações. Ora, numa leitura focada apenas nesta informação, de novo se realça a tendência actual para algum sedentarismo (pelo menos a nível do concelho). Quadro nº. 6 – Aspectos Demográficos - Índice de envelhecimento 3,74% Índice de dependência total 116,84% Índice de dependência jovem 112,63% Índice de dependência idosos 4,21% % pop idade activa 46,12% % pop em idade escolar 26,21% Cáritas Diocesana de Aveiro 36 Gráfico nº. 1 – Pirâmide Etária Aspectos Demográficos Ao analisar as categorias sociais mais vulneráveis à pobreza e exclusão social, João Ferreira de Almeida, Luís Antunes Capucha e outros autores, apontam como característica particular das minorias étnicas, a estrutura etária jovem, com um elevado n.º de elementos em idade activa, assim como um elevado n.º de crianças e jovens em idade escolar (Almeida et al., 1994). Transportando este breve enquadramento à realidade em estudo, confirma-se, pelo desenho da pirâmide etária apresentada, o rejuvenescimento populacional destas comunidades, assim como a elevada percentagem de população em idade activa (46,12%). Acrescenta-se ainda a esta leitura, um índice de dependência jovem acima dos 100% (112,63%) em contraposição a um índice de envelhecimento que não chega aos 4% (3,74%). Conta para este facto, a idade de casamento nas comunidades ciganas, adiantando de igual modo a idade de ter o 1.º filho, contribuindo para um rejuvenescimento da população. Estamos assim, perante uma estrutura e dinâmica demográfica, tendencialmente contrária ao que se verifica na população em geral, nos países ditos desenvolvidos. Todas estas características abonam ao afastamento ou continuidade desta categoria à situação de pobreza e exclusão social (ibid). Assim, estamos perante uma população que apresenta um conjunto de factores e características que proporcionam situações de pobreza e de exclusão social: ausência de condições mínimas de habitabilidade; baixos níveis de escolaridade; dificuldades de acesso ao mercado de trabalho formal; dificuldades de acesso aos principais bens e serviços, entre outros. É a conjugação destes factores que tornam as comunidades ciganas como um dos grupos mais vulneráveis existentes. - Cáritas Diocesana de Aveiro 37 Ora, aproveitando o peso das camadas mais jovens, qualquer intervenção futura (sem cair em processos de aculturação ou assimilação), terá como potencialidade a maior abertura cultural (em termos de atitude e comportamental), próprias da irreverência dos mais novos. Outro aspecto importante de referir, é a elevada percentagem da população em idade activa, que em leitura sequencial, daria, (pelo modelo ocidental e representações sociais dominantes) fruto a uma elevada percentagem de elementos disponíveis para emprego / trabalho.8 Quadro nº. 7 – Estado Civil dos Inquiridos Estado Civil n.º indivíduos Solteiro(a) 1 União de facto 47 Casado(a) 1 Separado(a) de facto Divorciado(a) Viúvo(a) 4 1 4 Total 58 No universo dos 58 representantes de agregado, prevalecem as uniões de facto (57 situações), ou melhor o casamento cigano, dito “casamento natural” sem registo civil ou legalização. Gráfico nº. 2 – Famílias 58 29 casal sem filhos casal com filhos 8 11 1 2 7 família monoparental agregado composto outro tipo de núcleo isolado nº agregados 8 Total Condição não observada no universo em estudo, conforme se poderá concluir no capítulo Percurso e Situação profissional. - Cáritas Diocesana de Aveiro 38 Do total das 58 famílias, destacam-se 29 situações de casais com filhos. Com 11 situações registam-se as famílias monoparentais, correspondendo a situações de ausência do cônjuge, ou por motivos de reclusão, ou por motivos de “fuga” – às autoridades – problemas judiciais, ou devido a desistência e processos de infidelidade ao casamento. Quadro nº. 8 – Número de filhos dos Inquiridos (representantes dos agregados) escalões etários n.º de filhos Total 0 1 2 3 4 5 6 <=15 1 2 0 0 0 0 0 3 16-24 4 7 5 3 0 0 0 19 25-44 3 2 6 6 2 2 2 23 45-64 7 1 1 0 0 0 1 10 >=65 2 0 0 0 1 0 0 3 Total 17 12 12 9 3 2 3 58 De referir que o n.º de filhos registado corresponde ao n.º de filhos dependentes do agregado e em regime de coabitação. (fazendo parte do agregado), sendo visível o facto de se observar um n.º de filhos não tão elevado como de esperar e tipicamente comum nas comunidades ciganas. Por outro lado, é de referir que estamos perante casais maioritariamente jovens (entre os 16 e 24 anos por exemplo…) em que o n.º de filhos será uma pouco menor em relação ao que se verifica nos casais de escalões mais velhos, por si também já reduzidos. As situações sem filhos, correspondem a casais cujos filhos já se autonomizaram cedo devido ao casamento precoce e consequentes processos de requerimento de prestações sociais e ao mesmo tempo a situações de viuvez, e isolados (pessoas que vivem sozinhas), ou recém casais que ainda não têm filhos Situação socio-económica Uma das questões aplicadas em inquérito, aos representantes de cada agregado, foi relacionada com o Tipo de rendimentos do agregado. Num conjunto de opções, foram assinaladas aquelas que correspondiam à realidade da família. Desse levantamento, registaram-se como fontes de rendimento e com elevado n.º de respostas o Abono Familiar (41,1%) e o Rendimento Social de Inserção (35,8%) – 2 prestações sociais. - Cáritas Diocesana de Aveiro 39 Gráfico nº. 3 – Fontes de rendimento do agregado “Indique a origem do principal rendimento pergunta, as 58 famílias em estudo. Deste rendimentos “da qual vem mais dinheiro” é Agregados referiram o abono familiar rendimentos. do agregado.” - Responderam a esta total, 32 revelaram que a origem de o Rendimento Social de Inserção. 12 como sendo a principal fonte de São apenas 4 os agregados, cujos rendimentos mensais aumentam com o salário ou trabalho de algum dos elementos da família. Observa-se ainda 1 situação em que o agregado recorre à mendicidade como principal meio para obter rendimentos, e outra situação em que a família não regista qualquer tipo de rendimentos. Gráfico nº. 4 – Principal fonte de rendimentos salário / trabalho 32 prestação velhice prestação invalidez abono familiar 12 4 2 3 apoio particulares 3 rendimento social de inserção 1 1 n.º agregados - Cáritas Diocesana de Aveiro outro (mendicidade) ausência de rendimentos 40 Estes dados, embora cingidos à realidade concelhia (e respeitante apenas à população residente em acampamentos) ilustram um pouco a reflexão dos mesmos autores, quando, ao descreverem os principais modos de vida associados a situações de vulnerabilidade à pobreza e exclusão social, enunciam a convivialidade como sendo um deles (Almeida et al., 1994). Adoptado a este modo de vida, tendencialmente, os indivíduos desenvolvem como estratégia, a dependência dos subsídios da segurança social, jogando um pouco com o estatuto de pobreza nos relacionamentos sociais, incluindo as relações com os diversos serviços, nomeadamente com a protecção social, reivindicando e utilizando diversos esquemas “excepcionais” com fim a obter apoio na obtenção de recursos. 9 Incidência do Rendimento Social de Inserção10 Do esquema apresentado, e somando os agregados beneficiários do Rendimento Social de Inserção com os agregados, que no passado já foram abrangidos pela medida, obtém-se um total de 49 agregados (num universo de 58 famílias) com Segundo estes autores, a convivialidade predomina em famílias urbanas de rendimentos incertos, semi-legais ou ilegais e a ciganos pobres. A sua distribuição no espaço regista uma forte concentração nas zonas urbanas, prevalecendo um grande contraste com o meio envolvente, tornando assim mais visível a situação de pobreza. Como estratégia de vida os indivíduos recorrem ao expediente e dependência em relação aos serviços e apoios, valorizando ao mesmo tempo o prazer convivial. A sua relação com a sociedade envolvente é desenhada por contraculturas e algum ressentimento em relação à sociedade e ao destino. Procuram estar sempre actualizados quanto a novidades e são cometidos excessos lúdicos no consumo de bebidas e comidas (ainda que vivendo em situação de carência). São também adquiridos objectos de tecnologia moderna. A sua relação com o passado tem um forte valor afectivo (forte componente cultural). O presente é vivido com intensidade, não existindo qualquer preocupação ou plano para o futuro. 10 O Rendimento social de Inserção consiste numa prestação incluída no subsistema de solidariedade no âmbito do Sistema Público de Segurança Social, e num programa de inserção, de modo a conferir aos indivíduos e seus agregados familiares apoios adaptados à sua situação pessoal, de modo a contribuir para a satisfação das suas necessidades essenciais / básicas, promovendo também a progressiva inserção laboral, social e comunitária. Todos os indivíduos e famílias em situação de grave carência económica e com condições para atribuição, Podem requerer o RSI. 9 - Cáritas Diocesana de Aveiro 41 histórico de RSI. Concluindo assim a forte incidência desta política / medida social nas comunidades em estudo. Relativamente às áreas “assinadas” no acordo de inserção social do Rendimento social de Inserção, os 34 agregados beneficiários, reconhecem a assinatura, nas seguintes áreas: Quadro nº. 9 – Áreas assinadas no âmbito do Rendimento Social de Inserção área "assinada" respostas saúde educação 29 27 acção social 18 emprego 9 formação profissional 2 habitação 2 Gráfico nº. 5 – Titulares de RSI Saúde e educação são as duas áreas mais reconhecidas pelos 34 agregados beneficiários de Rendimento social de Inserção, com 29 e 27 respostas respectivamente. Segue-se a acção social com 18 respostas. Com um n.º de respostas mais reduzido, registam-se as áreas do emprego, formação profissional e habitação. Mais uma vez é de revitalizar aqui o facto de se estar a tratar de discursos e percepções dos próprios inquiridos e não de uma realidade concreta, neste caso, de - Cáritas Diocesana de Aveiro 42 uma verdade plena e existente / contratualizada no momento do acordo de inserção estabelecido. O objectivo deste estudo, passa exclusivamente por obter essa mesma percepção, não entrando em análise ou reflexão sobre outras questões como a existência ou não de respostas adequadas, etnicização ou não do Rendimento Social de Inserção (discriminação positiva), distância ou continuidade entre direitos sociais e direitos culturais das comunidades ciganas na prática do RSI (Branco, 2001). Assim, são reconhecidas como áreas assinadas e para cumprir essas áreas “exigem” um compromisso em relação sobretudo à população mais nova (crianças e jovens em idade escolar). Deste modo é possível verificar a cobertura da medida quando em capítulos posteriores se apresentar valores relacionados com a frequência escolar, cumprimento do Plano Nacional de Vacinação, entre outros. Ficam mais a descoberto as restantes áreas, que independentemente de todos os outros factores inerentes à execução desta medida social, não são por motivos culturais, ou mecanismos e estratégias de contorno ao sistema, reconhecidas, ou assimiladas como áreas a cumprir. Acrescente-se ainda, um factor a associar a este facto, o qual diz respeito aos níveis literários bastante reduzidos desta população, que não de uma forma isolada, poderão condicionar a interpretação de tal acordo, caso este não seja preparado, lido e explicado aos próprios. Avaliação da situação sócio-económica Uma das formas de recolher mais alguns dados relativamente à percepção destas comunidades no que diz respeito à sua situa sócio – económica, foi colocada directamente, aos representantes de cada agregado, a questão “ Como considera a situação sócio-económica do seu agregado?”. Dos 58 respondentes (representantes dos agregados), 35 consideraram a situação do agregado má ou muito má em termos sócio-económicos. Quadro nº. 10 – Avaliação da situação socio-económica avaliação da situação sócioeconómica - n.º indivíduos boa 3 aceitável 19 má muito má 22 14 Total 58 Cáritas Diocesana de Aveiro 43 Contudo, destes 35, apenas 7 indivíduos sentem-se capazes de tomar algumas medidas para melhorar tal situação, entre as quais: Aumento da qualificação “aperfeiçoar a cestaria” “frequentar cursos de formação” Trabalho “vender cestos” “biscatada” “procurar trabalho” Organizar a vida familiar “pôr as crianças na creche” “alugar uma casa” Pela observação destes resultados, detecta-se por um lado, a noção por parte dos indivíduos, de que a situação familiar se encontra aquém das condições mínimas de estabilidade sócio-económica, e por outro constata-se uma certa impotência nessa resolução. Desta forma, essa incapacidade (que mediante as respostas dadas, se verifica em 28 das 35 situações de maior carência sócio-económica), converge com reflexões quanto ao modo de vida adoptado pela generalidade das comunidades ciganas pobres e outros estratos da população (referido anteriormente), por outro lado serve de registo à dinâmica de todo o processo de exclusão social vivido por esta população, que para além de se sentir incapacitada de participar activamente no seu processo de (re)integração, vê-se desprovida de recursos materiais, escolares e culturais, que lhes confere uma situação de desigualdade social (aos olhos dos quadros referenciais dominantes, com o nome de excluídos). - Cáritas Diocesana de Aveiro 44 Em conclusão… Distribuição Territorial: - 9 acampamentos no concelho, - maior concentração de indivíduos e agregados familiares de etnia cigana nos 3 acampamentos de Ervideiros (freguesia de Esgueira), Tipos de alojamento: - construções do tipo anexo, barracas de alvenaria, barracas de madeira e tendas. Naturalidade - Predominam os elementos respondentes com origem no próprio distrito de Aveiro. Aspectos Demográficos: - Rejuvenescimento populacional, - Índice de dependência jovem acima dos 100%, - 46,12% da população encontra-se em idade activa, Predomínio das uniões de facto (casamento cigano), ou dito casamento natural, - Realce do nº de casais jovens (como consequência da precoce idade de casamento). Situação sócio-económica - Principais fontes de rendimento: prestações sociais (Abono Familiar e Rendimento Social de Inserção), - A maioria dos agregados (49 agregados do total de 58) é ou foi beneficiária da medida social do Rendimento Social de Inserção. - Cáritas Diocesana de Aveiro 45 VI Habitação, habitat e comunidade(s) - Cáritas Diocesana de Aveiro 46 VI Habitação, habitat e comunidade(s) Não menos importante que a apresentação dos dados referentes a este tema, é a consideração inicial quanto ao próprio título deste capítulo: Habitação, habitat e comunidade(s). Como uma das áreas que mais alicerçam a qualidade de vida das populações, a habitação, é por isso, uma condição primária de (sobre)vivência pessoal e familiar. As diferentes posições quanto ao seu acesso, as diferentes condições habitacionais, a diferente distribuição das habitações no território, levam a que a Habitação se manifeste como um “indicador directo das desigualdades sociais”11. O acesso à habitação é um dos aspectos que mais afecta as camadas populacionais mais carenciadas. Situadas em bairros periféricos ou bairros de barracas, sem condições de habitabilidade, estas populações ficam condicionadas noutros sectores de integração e bem-estar, como a saúde, a escolarização, o acesso ao trabalho e ao mercado de bens de consumo. A situação das comunidades de etnia cigana face à habitação, é ainda pouco conhecida, no entanto, alguns estudos, revelam que um terço da população cigana do país, vive ainda em condições precárias de habitação12. Em respeito às comunidades em estudo, estamos perante uma população que reside em acampamentos, nos quais predominam barracas e tendas, e cujas condições de habitação, em relação às infraestruturas existentes (conforme se poderá verificar mais à frente), deixam estes agregados numa situação plena de vulnerabilidade em termos habitacionais. Habitar não representa apenas ter uma habitação para morar, significa também, residir num espaço de referência, ter uma vizinhança e estar localizado com maior proximidade ou distância dos equipamentos e serviços, bem como do centro da própria cidade. Ora, isto implica acentuar o conceito de Habitat. As pessoas agrupam-se, organizam-se em determinados espaços, apropriando-se desses mesmos espaços (em termos culturais e relacionais). À medida que o seu tempo de permanência nos bairros foi aumentando, foram reconhecendo determinados espaços como sendo seus, criando uma identidade espacial, e por isso, construindo desse modo o seu habitat. Por outro lado, não devemos esquecer, que apesar de pertencer a um grupo étnico, com uma história e uma cultura comum, as comunidades ciganas não deixam de revelar as suas diferenças, visíveis também na sua localização e distribuição no GUERRA, Isabel (1997), “Um olhar sociológico sobre o alojamento”, in Sociologia – Problemas e Práticas, n.º 24, p 168. 12 FARINHA, Tiago - “Habitação e Discriminação em Portugal, in Boletim Informativo, Fevereiro 2005, n.º26. 11 - Cáritas Diocesana de Aveiro 47 território, no modo de apropriação do “bairro”, nas suas relações de vizinhança, sem falar na sua condição socio-económica. Apesar de estarmos perante uma população em que todos os agregados residem em acampamentos, não deixam de existir diferenças entre si, sobretudo quando passamos de “bairro” para “bairro”. Este facto, se em termos descritivos e de investigação sócio-demográfica, não interfere nas conclusões e propostas a apresentar, não poderá ser esquecida no momento de definição de medidas nesta área de intervenção pois as condições e as características organizacionais de cada comunidade poderão ser, um dos aspectos mais relevantes num processo de “apoio habitacional”. Deste modo, o capítulo Habitação, habitat e comunidade(s) assume uma análise pertinente. Numa primeira fase, são retratadas as condições de habitabilidade, tendo presente o discurso da população que reside nestes acampamentos: situações de coabitação, divisões do alojamento, infra-estruturas, principais problemas de habitabilidade. Numa segunda fase, a questão habitat e comunidade(s) é revelada através de uma análise quanto ao sentido de pertença que os residentes têm ou não relativamente ao “bairro” onde se encontram. Mediante dados quantitativos obtidos através de questões aplicadas em inquérito, obtém-se a percepção dos residentes relativamente ao estado de conservação do bairro aos seus problemas, assim como os principais motivos para gostar ou não de residir no “bairro”. A utilização de alguns conceitos ligados a esta área temática, assim como a consideração de algumas questões a colocar em inquérito, contaram com o contributo do Serviço de Habitação Social da Câmara Municipal de Aveiro. Deste modo foi possível uniformizar alguns conceitos, assim como pormenorizar algumas questões úteis, que são importantes ter presente em termos de intervenção. Condições de habitabilidade Quadro nº.11 - Condições de habitabilidade Tipo de alojamento - n.º de alojamentos tenda (materiais improvisados) 13 barraca de madeira 6 barraca de alvenaria (construção inacabada) 14 construção clássica antiga 1 construção de alvenaria ( acabada - tipo anexo) 16 Total 50 Cáritas Diocesana de Aveiro 48 Conforme já havia sido referido no capítulo anterior, predominam nestes 9 acampamentos, as construções e as barracas de alvenaria (somando 30 alojamentos), as tendas feitas com materiais improvisados (13) e as barracas de madeira (6). Para além deste tipo de alojamento, existe ainda uma construção clássica antiga. Quadro nº.12 - Regime de propriedade Regime de propriedade n.º de alojamentos propriedade do agregado regime de arrendamento 39 2 cedida 7 ocupada pelo agregado 2 Total 50 Tendo em conta os dados obtidos ao nível do regime de propriedade, verificamos que do total dos 50 alojamentos, 39 são do próprio agregado que os habita, 7 alojamentos são cedidos e 2 são ocupados. Quadro nº.13 - Estado de Legalidade estado de legalidade n.º de alojamentos construção legal 1 construção clandestina 49 Total 50 Relativamente ao estado de legalidade, dos 50 alojamentos apenas 1 é uma construção legal, correspondendo à construção clássica antiga, que, aquando da aplicação do inquérito estava a ser “ocupada” pelos seus habitantes. Se considerarmos a privacidade como uma plataforma pertinente para o desenvolvimento harmonioso do indivíduo, quer em termos pessoais, como familiares, é bem visível, a não correspondência de tal facto, visto que o n.º de divisões dos alojamentos, nos quais predominam situações com uma só divisão é elevado (28 situações). Quadro nº.14 - Número de divisões/número de alojamentos n.º divisões - n.º alojamentos uma só divisão duas ou mais divisões 28 22 total 50 Cáritas Diocesana de Aveiro 49 Quadro nº.15 - Número de pessoas/número de alojamentos n.º de pessoas n.º de alojamentos 1 2 2 3 4 12 7 8 5 ou mais 21 Total 50 Relacionando o n.º de divisões dos alojamentos com o n.º de pessoas que neles habitam, é de referir as 21 situações em que residem no alojamento 5 ou mais pessoas. Verifica-se, igualmente, 8 situações de coabitação de agregados. Assim, pode-se salientar que estamos perante um cenário em que o n.º de elementos é superior às condições/divisões do alojamento, mesmo quando as habitações possuem mais do que uma divisão. Este facto, por sua vez, confirma as más condições de habitabilidade que estas comunidades vivenciam, pois, mesmo que a habitação tenha mais do que uma divisão, corresponde sempre a um alojamento com n.º de quartos reduzido para o n.º de pessoas que nele habitam. Quadro nº.16 - Número de agregados/número de alojamentos n.º de agregados n.º alojamentos 1 42 2 Total 8 50 Quadro nº.17 - Número de quartos/número de alojamentos n.º quartos n.º alojamentos 1 4 2 3 ou mais 14 4 Total 22 No quadro seguinte, estão expostas as infra-estruturas básicas que qualquer alojamento deveria possuir de modo a reunir as condições mínimas de habitabilidade. Seguindo a sua leitura, constata-se a ausência total de saneamento em qualquer um dos alojamentos. Segue-se a ausência de água canalizada em 43 dos 50 alojamentos. De referir, ainda as situações de carência de wc interno, banheiro/chuveiro, cozinha e sistema de escoamentos (fossas). Relativamente aos - Cáritas Diocesana de Aveiro 50 alojamentos que possuem electricidade, verifica-se que a proporção é mais elevada, já que estas comunidades a fazem através de instalações clandestinas e não através da requisição formal de tal serviço. Quadro nº.18 - Infra-estruturas em falha por alojamento infra-estrutuas n.º de alojamentos saneamento 50 água canalizada 43 fossa 41 banheiro / chuveiro interno wc interno 41 40 cozinha 36 electricidade 18 Dos 50 alojamentos, 17 são considerados desprovidos de qualquer infra-estrutura. Reavivando em análise, o facto de nos alojamentos residirem maioritariamente casais jovens com filhos ou famílias monoparentais, pode-se referir que estamos perante situações precárias que exigem respostas urgentes relativamente a necessidades básicas, cuidados a ter com as crianças, saúde e a higiene. Este facto ressalta, assim, a emergência das condições habitacionais para o cumprimento das diferentes áreas indispensáveis ao desenvolvimento do indivíduo. Paralelamente, verifica-se, que 48 dos 58 agregados, enunciam problemas de habitabilidade no alojamento em que habitam, focando três áreas fundamentais: ausência de condições de habitabilidade; a necessidade de reparações e a falta de privacidade. Quadro n.º 19 - Principais problemas de habitabilidade Principais problemas Ausência de condições de falta de infra-estruturas, casa habitabilidade em ruínas). Necessidade de reparações mau isolamento, falta de pintura, humidades, telhado). Falta de privacidade % de respostas 36,4 39,8 poucas divisões ou nenhumas, falta de portas e janelas, “alojamento pequeno para o agregado”. - Cáritas Diocesana de Aveiro 20,3 51 Quadro nº. 20 - Avaliação do estado de conservação do alojamento avaliação % de respostas muito bom 2,6 bom 10,3 aceitável mau 44,8 23,3 muito mau 19,0 Bairro Analisando os dados dos inquiridos relativos ao estado de conservação do bairro, verificamos que, a maioria dos agregados familiares (43) considera o estado de conservação do bairro como “bom” (34,5%) e “aceitável” (39,7%). Esta percepção, inversa relativamente ao seu parecer no que diz respeito ao estado de conservação do alojamento, relaciona-se provavelmente com o sentimento de pertença ao bairro e às relações familiares vincadas, já que 56 dos 58 agregados familiares residem com outros familiares no bairro. Falamos assim, de dois campos distintos na percepção dos residentes: por um lado o alojamento com todas as condicionantes relativas a condições de habitabilidade, condições de higiene e de saúde, etc, por outro, todas essas situações são colocadas em segundo patamar, quando se fala do “bairro”, do habitat, que apesar das suas limitações (problemas), não deixa de ser para muitos, um espaço aceitável, ou até mesmo bom para estar / viver. Quadro nº.21 - Avaliação do estado de conservação avaliação do estado de conservação do bairro % de respostas bom 34,5 aceitável 39,7 mau muito mau 17,2 8,6 Do total dos 58 agregados, 17 apresentam sugestões para melhorar o estado de conservação do bairro / acampamento, as quais passam pela criação de condições - Cáritas Diocesana de Aveiro 52 sanitárias, de acessibilidade ao bairro, assim como pela criação e implementação de alguns benefícios ao meio envolvente deste. “Alcatroar o caminho de acesso ao bairro” Criação de condições de acessibilidade “Colocar passadeiras na estrada junto ao bairro” “Fazer passar os transportes perto do bairro” “…um sanitário no bairro” Criação de condições sanitárias “…colocar luz e água no bairro” “limpar o mato” Beneficiar o meio envolvente do bairro “fazer um jardim…” “fazer obras…” Relativamente à existência de problemas no bairro, constata-se que, do total dos agregados familiares, 34 registam problemas no bairro. Dos vários tipos de problemas citados pelos agregados ressalta a falta de limpeza (com 25,3% das respostas), os poucos e maus acessos ao acampamento e a ausência de transportes públicos (17,3%), a distância dos serviços (13,3%) e a falta de segurança (9,3%). Curiosamente, sabendo que a falta de bens essenciais como a falta de electricidade e de água afecta a maioria destes agregados, apenas 2 agregados (correspondendo A 27% das respostas) ressalvaram este tipo de problema. É ainda de notar a visibilidade que cada um destes problemas tem mediante a localização dos acampamentos em relação ao centro da cidade: Ervideiros, Mamodeiro e S. Bernardo tomam maior preocupação com a distância relativamente aos serviços. Quadro nº.22 - Principais problemas no bairro Principais problemas no bairro - % de respostas Pouca limpeza 25,3 Ausência transportes públicos Maus / poucos acessos 17,3 17,3 Distância dos equipamentos e serviços públicos 13,3 Falta de segurança 9,3 Conflitos entre vizinhos 6,7 Outros problemas Falta de luz/água 5,3 2,7 Insegurança rodoviária junto ao bairro Falta de privacidade familiar 1,3 1,3 Cáritas Diocesana de Aveiro 53 Quadro nº.23 - “Gosta de viver no bairro onde reside?” tempo de residência no bairro n.º de respostas sim não < 6 meses 6 meses - 2 anos 5 4 6 2 3 - 6 anos 7 - 10 anos 11 8 5 2 11 - 14 anos 10 2 15 ou mais anos total 1 0 39 17 Dos 56 representantes dos agregados que responderam a esta questão, 39 dizem gostar de viver no bairro onde residem e 17 assumem não gostar. Se cruzarmos o tempo de residência nos bairros com o gosto por viver no bairro, observa-se que à medida que o tempo de residência vai aumentando, há uma evolução inversa das respostas “sim” e “não”. Repare-se no total de 11 agregados a residir há menos de 6 meses no acampamento, 5 dizem gostar de lá viver e 6 respondem que não. Por sua vez, esta proporção é logo alterada, quando se avança para um tempo de residência superior ao meio ano. Há uma maior proporção de agregados familiares que diz gostar de viver no bairro onde reside (39 respostas). À medida que aumenta o tempo de residência das comunidades ciganas no bairro, estes não só se apropriam de um território “ocupado” reconhecendo-o como seu, como também reforçam a sua identidade. De acordo com Alexandra Castro, “esta identidade – sinal da sua pertença ao bairro – é manifestada pela sua afectividade que mantêm com o espaço do bairro e pelo sentimento que demonstram pela sua especificidade nas suas formas de apropriação e no relacionamento com os outros”. (1995: 104) Dos 39 elementos que responderam (em representação do seu agregado) gostar de viver no bairro, 36 apontam as suas razões, das quais se destacam as relações familiares vincadas com 17 respostas. Não menos importante e com algum peso nas respostas dadas, aparece a boa localização/perto dos serviços (9), o forte sentimento de pertença (8), as boas relações de vizinhança, a tranquilidade no bairro e por último o gosto pelo ar livre13. 13 O espaço exterior assume um forte valor simbólico para estas comunidades. Além de tipicamente a casa cigana ter sempre a porta aberta, em termos de organização interior da mesma, não existem corredores. Dá -se maior importância a um espaço amplo, de acesso directo ao exterior, o qual muitas vezes funciona como cozinha e sala: é aí que as mulheres cozinham e tratam da roupa, as crianças brincam ou estudam e os homens conversam. Esse mesmo espaço serve para receber os familiares em dias de festa, quando não dá de todo para os receber no exterior, ao ar livre, tendo como ponto central a fogueira. - Cáritas Diocesana de Aveiro 54 Quadro nº.24 - Razões para gostar de viver no bairro Razões para gostar de viver no bairro Relações familiares vincadas Boa localização / "perto dos serviços" Forte sentimento de pertença “perto da família…” “a família é muito unida” “perto dos serviços…” “perto da escola…” “perto da cidade…” “São muitos anos a viver no bairro” “…esta é a zona onde cresci…” “O terreno é da família…” 17 “a vizinhança é boa” 6 “bairro sossegado…” “não há conflitos” “preciso de espaço e de ar livre…” 6 Boas relações de vizinhança Tranquilidade no bairro Gosto pelo ar livre" n.º de respostas 9 8 4 Dos 17 elementos que responderam não gostar de viver no bairro, 15 enunciam os principais motivos da sua resposta. Evidencia-se, assim, a falta de segurança/conflitos sociais (10 respostas), seguida do sentimento de não pertença em relação ao bairro (7), das más condições do bairro (6), do isolamento social (4) e da falta de condições de acessibilidade. Quadro nº.25 - Razões para não gostar de viver no bairro Razões para não gostar de viver no bairro Falta de segurança / conflitos sociais Não pertença Más condições do bairro Isolamento social Falta de condições de acessibilidade “falta de privacidade…” “muita gente e muitos conflitos…””problemas com a droga” “…a casa não é minha…” “este não é o meu sítio…” “…o bairro não tem condições…” “há muito lixo…” “… o bairro é muito fechado…” “… muito isolado…” “há falta de convivência com os outros não ciganos…” “distância dos serviços…” n.º de respostas 10 7 6 4 1 Perante a oportunidade de mudar de residência e de alojamento, 45 representantes dos agregados familiares, responderam que “sim”, em detrimento de 13 que responderam “não. Do total desses elementos que gostaria de mudar de residência e de alojamento, a maioria (41) gostaria de mudar para uma casa unifamiliar, sendo 4 os que preferem morar em “apartamento”. O concelho de Aveiro, foi a localidade eleita por 42 dos agregados familiares para viver. Nestes - Cáritas Diocesana de Aveiro 55 dados destacam-se três pontos de reflexão: o facto de a maioria dos agregados preferir mudar de alojamento (tendo oportunidade para tal), e isto com vista a obter melhores condições de habitabilidade, por outro, as preferências na mudança assumem e demonstram o valor dado ao espaço exterior, por opção a uma casa unifamiliar, e ao mesmo tempo, os laços criados no próprio concelho, fruto de algum (bastante) tempo de permanência nessa localidade. Quadro nº.26 - Habitação preferida Habitação preferida n.º de respostas Casa unifamiliar 41 Apartamento 4 Quadro nº.27 - Localidade preferida Localidade preferida n.º de respostas Distrito de Aveiro, concelho de Aveiro 42 Distrito de Aveiro, outro concelho Outro distrito 2 1 Um terceiro ponto tem a ver com as 13 respostas ditas “resistentes”, ou a preferir, os 13 elementos que tendo possibilidade de mudar de alojamento ou residência, não mudariam. As razões enunciadas vão de encontro às registadas pelos agregados que gostam de viver no bairro: o forte sentimento de pertença, as boas relações de vizinhança, o gosto pelo ar livre, as relações familiares e a acessibilidade aos serviços Quadro nº.28 - Razões para não mudar de residência - Razões para não mudar de residência n.º de respostas Forte sentimento de pertença / posse 7 Boas relações de vizinhança 3 Gosto pelo ar livre 3 Relações familiares vincadas Acessibilidade / perto dos serviços 2 1 Cáritas Diocesana de Aveiro 56 Em conclusão: Condições de habitabilidade: - Do total dos 50 alojamentos, apenas um é construção legal, - 17 alojamentos são considerados desprovidos de qualquer infra-estrutura básica, - Ausência total de saneamento no universo dos alojamentos em estudo, - Ausência de água canalizada na maioria dos alojamentos, - Poucas divisões ou nenhumas face à dimensão dos agregados (falta de privacidade). Bairro: - Principais problemas: pouca limpeza, ausência de transportes públicos, maus e poucos acessos ao “bairro”. - Principais sugestões para melhoria: criação de condições de acessibilidade, criação de condições sanitárias, benefícios ao meio envolvente ao “bairro”. - A maior parte dos agregados gosta de viver no “bairro” onde reside. As principais razões que apresentam para tal, vincam-se na força das relações familiares, atendendo a que a maior parte destes agregados tem familiares a residir no “bairro”. - Perante a oportunidade de mudar de residência ou de alojamento, 45 representantes dos agregados familiares responderam que sim, tendo preferência por uma casa unifamiliar, mantendo a residência no concelho de Aveiro. - Cáritas Diocesana de Aveiro 57 VII Escolarização e Formação - Cáritas Diocesana de Aveiro 58 VII Escolarização e Formação Várias ideias chave poderão entrar em discussão quando se reflecte sobre as comunidades de etnia cigana e a escola, visto que a escolarização é um factor de integração social. Relacionado com este factor encontra-se o futuro profissional e a facilidade / dificuldade de integração no mercado de trabalho (outra condição ao sucesso social do indivíduo). Porém, e quando nos focamos na escolarização dos elementos de etnia cigana em situações socio-económicas desfavorecidas, surgem algumas questões, muitas delas em voga actual de discussão e análise. Uma dessas questões tem a ver com um processo sociologicamente designado por assimilação. Ou seja, um processo pelo qual, um colectivo, é forçado a integrar-se noutro colectivo, tornando-se semelhante à força. Predomina uma relação de poder entre a cultura dominante e a cultura dita minoritária, pressupondo que o colectivo dito”dominado” venha a perder muito da sua cultura mãe, a qual será substituída por elementos culturais da cultura dominante. Muitas vezes o colectivo minoritário é considerado socialmente patológico, sendo tratado com uma atitude paternalista do grupo dominante. Talvez por um desconhecimento acentuado da cultura cigana, sequente da falta de diálogo cultural ou predisposição para tal, os baixos níveis académicos, as elevadas taxas de analfabetismo e de abandono escolar, continuam (não exclusivamente) associados às características socio-económicas destas comunidades. Inerente a esta relação de força e de poder, surge a questão da legitimidade e do arbítrio cultural entre sociedade dominante – minorias étnicas (comunidades de etnia cigana). Segundo Pierre Bourdieu em todos os casos, é na exclusão que reside o verdadeiro reconhecimento da legitimidade da cultura dominante e o correlativo reconhecimento da ilegitimidade do arbítrio cultural dos grupos dominados, a qual assume maior força simbólica, quando aparentemente toma aparências e formas de auto-exclusão. (Bourdieu e Passeron, 1971) Quando ao habitus primário e étnico14, é imposto um novo habitus, isto gera crise, e sobretudo crise de identidade, bem como mecanismos de defesa, transformações de fraquezas em forças pelos mesmos sentidas. Assim acontece com as comunidades de etnia cigana a este nível sócio-económico. Querer impor um sistema ou um modelo de ensino adverso à sua cultura, leva a processos de autoexclusão visíveis no abandono precoce da escola, taxas de absentismo, para não falar em taxas de analfabetismo e ausências de percurso escolar, ao mesmo tempo que a relação com a escola é muitas vezes conflituosa. 14 Termo usado por Maria José Casa Nova na sua obra “Relação dos Ciganos com a escola pública: contributos para a compreensão sociológica de um problema complexo e multidimensional”, 2006. - Cáritas Diocesana de Aveiro 59 Antes de apresentar qualquer dado estatístico e para melhor entender esta relação, recorremos ao estudo “Comunidades Ciganas – Representações e dinâmicas de exclusão / integração”, na qual os autores consideram que a escola tem duas funções: a função de qualificação e socialização e a função de custódia da infância e da juventude. (Dias et al., 2006) Qualificação e sociabilização A escola é frequentemente vista pela maioria das comunidades ciganas, como uma perda de tempo, isto é, não vêem utilidade da formação escolar. Alguns factores são aqui enunciados para tal facto, como por exemplo: a mobilidade geográfica e o facto da deslocação interferir na assiduidade escolar, razões de foro cultural como o predomínio da educação e socialização no seio familiar em detrimento da acção escolar e, por fim, a preferência por aprender habilidades específicas em vez de obter conhecimentos abstractos. Deste modo, a escola, não é vista pelos ciganos com este papel ou função de socialização ou qualificação. Custódia da infância e da juventude De todo esta função é reconhecida à escola. Em relação às raparigas, estas são educadas no sentido de cuidar desde cedo dos irmãos mais pequenos. Por outro lado, e com o objectivo de serem afastadas dos não ciganos, as raparigas depressa são preparadas para o casamento. Assim, neste sentido a sua frequência na escola é desde cedo condicionada e limitada. Outros factores são considerados, como a sujeição a ritmos, horários, posturas e sobretudo à autoridade detida pelos professores, a qual pode ser completamente contrária ao que se defende no seio familiar Todas estas considerações, servem um pouco de enquadramento aos dados que a seguir são apresentados. Quadro nº. 29 - Habilitações literárias (população com 10 ou mais anos) Habilitações literárias - n.º de indivíduos % não sabe ler nem escrever 47 35,9 < 4 anos de escolaridade 1.º ciclo (4.º ano) 2.º ciclo (6.º ano) 43 29 12 32,8 22,1 9,2 Total 131 100,0 Cáritas Diocesana de Aveiro 60 Da leitura do quadro anterior, constata-se uma taxa de analfabetismo de cerca de 36%, predominando os baixos níveis de escolaridade (constituindo na maior parte das vezes um constrangimento para ingresso em outras áreas como a formação ou o emprego). Frequência Escolar (população com 6 ou mais anos) Do total de 153 elementos com 6 ou mais anos… 55 frequentam o 97 não frequentam sistema de ensino, o sistema de dos quais… ensino, dos quais… 23 do sexo 32 do sexo 69 já 28 não têm masculino feminino frequentaram (no qualquer percurso passado) escolar Em termos de frequência escolar, e de acordo com as respostas dos inquiridos, observamos que, de um total de 153 pessoas com idade entre os seis ou mais anos, existem 55 indivíduos que frequentam o sistema de ensino, dos quais 23 são do sexo masculino e os restantes 32 do sexo feminino. Se por outro lado, analisarmos a frequência escolar de acordo com os vários escalões etários da população estudada, verificamos que os indivíduos com idades compreendidas entre os seis e os nove anos frequentam na sua totalidade o sistema de ensino, com excepção de três crianças que no momento embora já tivessem seis anos de idade, não frequentavam a escola, mas já se encontravam inscritas para esse ano lectivo. Na faixa etária entre os 10 e os 15 anos de idade, a taxa de frequência escolar é ligeiramente superior no sexo masculino (92.3%) do que no sexo feminino (81%). Tal situação deve-se ao facto das meninas terem que abandonar o ensino mais cedo para cuidarem dos irmãos mais novos e se ocuparem de outras obrigações familiares, ao mesmo tempo que se encontram em idade para casamento (conforme foi já referido no início do capítulo). Esta situação inverte-se, quando analisamos as respostas dadas pelos inquiridos com idades compreendidas entre os 16 e os 24 anos. Para além de se verificar uma queda acentuada na frequência do sistema de ensino, essa só se regista por parte das mulheres. Ao mesmo tempo que os rapazes – homens tomam liberdade para abandonar a escola, as raparigas - mulheres (muitas delas já casadas) assumem novas responsabilidades e funções familiares. Nesta situação e provavelmente em - Cáritas Diocesana de Aveiro 61 período a requerer o Rendimento Social de Inserção, o agregado assume (mediante acordo de inserção) um conjunto de obrigações, que sendo a mulher titular de tal acordo e o homem muitas vezes excluído por incumprimento, é no comportamento e no compromisso por parte da mulher, que reside a manutenção do acordo assinado, fazendo valer a contratualização social, o que a obriga, a continuar a frequentar a escola.15 Esta mesma posição face ao Rendimento Social de Inserção, justifica (também) as maiores taxas de frequência escolar nos escalões etários em idade escolar obrigatória. Gráfico nº.6 - Cobertura da medida Rendimento Social de Inserção: Área Educação A ilustrar a reflexão anterior, o gráfico demonstra (e seguindo as respostas obtidas pelos inquiridos) a relação entre o facto de o agregado ter nos seus rendimentos a prestação pecuniária de tal medida e a frequência dos elementos na escola. Pela sua leitura, verifica-se que todas as crianças em idade escolar estarão a frequentar o sistema de ensino.16 A escola é então vista como uma obrigação, e não como algo que é valorizada nas suas funções de socialização e de integração social. No quadro seguinte registam-se os graus académicos obtidos por quem já não se encontra a frequentar o sistema de ensino. 15 De recordar que o principal meio de subsistência destes agregados corresponde à prestação pecuniária da medida do Rendimento Social de Inserção (conforme dados apresentados em capítulo 8 – Retrato da Comunidade Cigana de Aveiro. 16 No escalão etário dos 6 aos 9 anos, a percentagem não assume os 100% atendendo às 3 crianças com 6 anos, que embora inseridas neste grupo de idades, ainda não frequentam a escola, ainda que estejam já matriculadas para frequentar o ano lectivo próximo. - Cáritas Diocesana de Aveiro 62 Quadro nº.30 - Nível Académico Obtido Nível académico obtido n.º indivíduos < 4 anos de escolaridade - regular 7 1.º ciclo (4.º ano) - regular 2.º ciclo (6.º ano) - regular 6 4 < 4 anos de escolaridade - recorrente 1.º ciclo (4.º ano) - recorrente 2.º ciclo (6.º ano) - recorrente Não sabe 40 5 6 1 Total 69 Destaca-se a importância do Ensino Recorrente, abrangendo 40 indivíduos, os quais não conseguiram obter o 1.º ciclo completo. A completar esta informação, apresenta-se os dados relativos aos motivos para não frequentar o sistema de ensino e que foram apresentados por 90 pessoas (que deixaram de frequentar ou que nunca frequentaram a escola). Quadro n.º31 - Principais motivos de abandono escolar Motivos % de respostas Deveres familiares – questões culturais 28,6% Extinção 1.º ciclo do E.R. 25,0% pouca utilidade da escola Mobilidade geográfica 15,2% 8,9% Dificuldades financeiras "Não gosto da escola" 7,1% 3,6% Idade < 6 anos 2,7% Doença 2,7% Outro Falta meios de transporte 2,7% 1,8% Conclusão das habilitações pretendidas 1,8% Em desfecho das várias questões colocadas no início deste capítulo, anotam-se como principais motivos de não frequência do sistema de ensino os deveres familiares e as questões culturais, a extinção do 1.º ciclo do Ensino recorrente (e por isso a ausência de uma obrigação) e ainda a consideração por parte dos elementos, da escola como sendo pouco útil. - Cáritas Diocesana de Aveiro 63 Quadro nº.32 - Frequência do pré-escolar Escalões Etários sim não Total < 3 anos 0 27 27 3 - 5 anos 6 - 9 anos 15 13 11 7 26 20 10 - 15 anos 16 - 24 anos 5 1 29 39 34 40 25 - 44 anos 0 39 39 45 - 64 anos 0 16 16 >=65 anos 0 4 4 34 172 206 Total Verifica-se maior frequência do pré-escolar nos escalões mais novos, entre os 3 e os 9 anos. Além de todas os factores anteriormente mencionados, refira-se os trabalhos de intervenção e de sensibilização junto das famílias, que, não caindo em processos de aculturação, permitem estes resultados de ingresso das crianças no ensino pré-escolar. Na sua opinião, a criança cigana enfrenta algumas dificuldades / constrangimentos na escola? Discriminação Racismo nos direitos “Os ciganos não gostam da escola” Do universo de 58 representantes dos agregados, apenas 5 respondem que a criança de etnia cigana passa por dificuldades ou constrangimentos na escola, enunciando o racismo, a discriminação nos direitos e ainda ao facto de “os ciganos não gostarem da escola”. Dessas 5 pessoas, surgiram duas sugestões para melhorar essa situação: - “Ensinar os professores a ensinar os ciganos”, - “Educar as outras crianças a aceitar os colegas ciganos”. - Cáritas Diocesana de Aveiro 64 Face aos baixos níveis de habilitações literárias, e muitas vezes à ausência ou ténue percurso escolar das comunidades de etnia cigana, algumas das iniciativas e medidas de intervenção no terreno, passam por explorar campos formativos mediante as condições académicas da população e suas aspirações e preferências, desenvolvendo com isso novas formas de obtenção de competências (literárias e profissionais). Deste modo, verifica-se a frequência de alguns elementos em acções de formação. Em análise ao universo em estudo, é de referir, a frequência de 14 elementos (do total de 98 pessoas com 16 ou mais anos) em acções de formação (com duração de 60h), muitas das quais promovidas pelo projecto Novas Sendas (de essência comunitária junto das comunidades ciganas de Ervideiros, (freguesia de Esgueira), bairros nos quais se concentra grande parte da população de etnia cigana a residir em acampamentos no concelho. Quadro n.º33 - Áreas de formação: Arraiolos Conserto e tratamento de roupa Construção civil Cozinha Novas tecnologias de informação e comunicação Promoção da inserção socio-profissional Promoção pessoal e da cidadania Em conclusão… -Incidência de uma taxa de analfabetismo de 36%, - Predomínio dos baixos níveis académicos, - 28 elementos (com 6 ou mais anos) sem qualquer percurso escolar, - As crianças dos 6 aos 9 anos frequentam, na sua totalidade, a escola, - Forte cobertura da medida do Rendimento Social de Inserção. - Principais motivos para não frequentar a escola: deveres familiares e questões culturais, extinção do 1.º ciclo do E.R., pouca utilidade da escola. - Principais sugestões: “ensinar os professores a ensinar os ciganos”, “educar as outras crianças a aceitar os colegas ciganos. - Cáritas Diocesana de Aveiro 65 VIII Trabalho,emprego e modos de vida - Cáritas Diocesana de Aveiro 66 VIII Trabalho, emprego e modos de vida O emprego assume, talvez um dos principais elementos de destaque quando se aborda a questão da Exclusão Social. Isto porque na sociedade ocidental capitalista é modelo e condição básica o acesso ao mercado de trabalho e emprego, para iniciar ou manter todo um processo de inserção e sucesso social. Resta, então, esclarecer ou relembrar o que é entendido por trabalho e por emprego. Segundo Anthony Giddens, “ o trabalho é a realização de tarefas que envolvem esforço físico e mental, a fim de produzir bens e serviços para satisfazer necessidades humanas. É a base do sistema económico(…)Uma ocupação ou emprego é o trabalho efectuado em troco de salário regular”(1997:579). Deste modo se estabelece a diferença entre trabalho e emprego. Uma situação de trabalho poderá não corresponder a uma situação de emprego, uma vez que o conceito de emprego implica a legitimação de uma actividade de trabalho através da relação contratual entre ambas as partes. Emprego, é assim sinónimo de trabalho com salário. Este capítulo aborda, por isso, a exposição de um modelo que define e pondera toda a problemática de Exclusão Social. Segundo este modelo, é através do emprego que se organiza todo o acesso ao mercado de consumo, ao rendimento, aos direitos e à protecção social, assim como todas as outras questões relacionadas com estima e desenvolvimento psico-social ligadas à utilidade, sociabilidade e identidade sociais. Assim, se entende, (pela linha de pensamento de vários autores) a importância e o predomínio da exclusão no mercado de trabalho, em relação a todas as outras áreas e dimensões da exclusão social. (Castel,1998; Gaujelac e Leonetti,1994; Paugam,1996). Como acontece em todos os modelos, surgem algumas lacunas ou falhas, as quais poderão ter graves ou leves consequências, mediante a abrangência que assumem. Neste caso, retomamos como objecto de reflexão, a posição ou condição de exclusão das comunidades ciganas no país17. Ora, por este modelo (salarial), é imediatamente esquecido, ou (porque não usar o vocabulário) excluído o entendimento cultural de trabalho e emprego por parte da etnia cigana, que como marca da sua identidade, assim se distingue do modelo em vigor na sociedade dominante. 17 Para esta reflexão contam os conteúdos apresentados no capitulo Conceitos e Dimensões da Problemática da Exclusão Social / Integração Social nas Comunidades Ciganas, na obra Comunidades Ciganos – Representações e dinâmicas de exclusão / integração . Eduardo Costa Dias, Isabel Alves, Nuno Valente, Sérgio Aires. - Cáritas Diocesana de Aveiro 67 Ora, nas disposições culturais dos ciganos, o trabalho é visto em segundo plano na sua pirâmide de valores. Para estes, “o trabalho é concebido como uma necessidade, não um fim, e deve deixar o homem livre para se ocupar das questões sociais (reuniões, visitas de famílias, recepções, visitas a doentes, etc) e para desenvolver as suas relações (…) um dos elementos mais marcantes que constitui a identidade do cigano e itinerante é o suporte da conservação da identidade (Liégeois, 1989:72). O trabalho é visto como uma condição à sobrevivência e não como objectivo. É uma necessidade; deixando de ser necessário, cessa. Assim, em volta de um conjunto de relações não económicas (mas muito mais familiares), ser trabalhador não significa ter um status e o trabalho não chega a ser uma categoria reconhecida. É no seio da família que se organiza toda a lógica económica dos ciganos. Predominam as actividades por conta própria, que lhes permite um grau de autonomia e de liberdade favorável aos seus modos de vida. As actividades tendem a ser exercidas em grupo e o rendimento é distribuído consoante a qualidade e quantidade do trabalho que fazem. Muito raramente se sujeitam a autoridades exteriores ao seu grupo de pertença, ou a horários rígidos.18 Vive-se o dia a dia, sem planos. As necessidades do quotidiano são garantidas no imediato, não se perspectivando o futuro. As actividades passam pela “ recolha e venda de ferro velho, fabrico de cestaria artesanal, negócio de compra e venda de equídeos, venda ambulante de porta em porta, ou em feiras. O facto de não terem uma ocupação fixa que lhes permita um rendimento regular leva-os, frequentemente, a recorrer à mendicidade e a expedientes de natureza mais ou menos ilegal.” (Pinto, 2000;71-72) Servem estes pressupostos de enquadramento, para iniciar uma análise dos dados respeitantes à população de etnia cigana a residir nos acampamentos do concelho de Aveiro. Assumindo muitas destas características, e tendo em comum este modus vivendis, a posição destas comunidades face ao emprego e o seu percurso profissional, não deverá cair num modelo interpretativo dito “dominante”, com o risco de se banalizar mais uma vez o teor cultural a ter em conta em medidas e iniciativas a desenvolver para a integração social destas comunidades. Em termos metodológicos, é de notar que alguns conceitos ligados ao tema Emprego reconhecidos pelo Instituto Nacional de Estatística e pelo Instituto de Emprego, foram esclarecidos e trabalhados em termos estatísticos em articulação com o Centro de Emprego de Aveiro 18 Este aspecto é notório, aquando a leitura das respostas dos inquiridos relativamente às principais dificuldades ou constrangimentos da comunidade cigana face ao mercado de trabalho. - Cáritas Diocesana de Aveiro 68 Quadro n.º 34 - Situação face ao Emprego por sexo Sexo TCO 1.º Emp. DLD Estud. Reform. Nunca trabalhou / não proccura emp. Total M 2 9 9 0 2 22 44 F 0 7 1 2 2 42 54 Total 2 16 10 2 4 64 Quadro n.º 35 - Situação face ao Emprego por escalões etários 98 Escalões Etários TCO 1.º Emp DLD Estud. Reform. Nunca trabalhou / não proccura emp. Total 16-24 anos 25-44 anos 1 0 10 5 0 7 2 0 0 0 27 26 40 38 45-64 anos 1 1 3 0 2 9 16 >=65 anos 0 0 0 0 2 2 4 Total 2 16 10 2 4 64 98 Ao observar (mediante os quadros anteriores) a situação destas comunidades ciganas face ao emprego, e atendendo a duas variáveis: sexo e escalões etários, são retiradas algumas notas válidas quanto à sua caracterização sócio-económica. Verifica-se, assim, a partir das respostas obtidas que, de um total de 98 indivíduos com 16 ou mais anos, apenas 2 indivíduos (do sexo masculino), estão empregados. Na totalidade, existem 26 desempregados, dos quais 16 procuram primeiro emprego e 10 são desempregados de longa duração. Existem apenas 2 estudantes, e 4 reformados. De realçar, que a maior parte desta população, ou seja 64 indivíduos, diz nunca ter trabalhado nem estar à procura de emprego, sendo esta situação equitativamente distribuída por todos os escalões etários em idade activa, não se revelando diferenças entre os dois sexos. Quadro n.º36 - Estrutura da população com 16 ou mais anos Situação face ao emprego n.º de indivíduos População >=16 anos 98 População em idade activa (16 – 64 anos) 94 Trabalhadores por conta de outrem (TCO) 2 Desempregados de Longa Duração 10 Procura de 1.º Emprego 16 Desempregados a trabalhar 4 Não procura emprego (nunca trabalhou nem procura emprego, desempregado que não procura emprego, estudante) - Cáritas Diocesana de Aveiro 76 69 Do total das 98 pessoas com 16 ou mais anos, 94 encontram-se em idade activa. Desse total, os dois elementos que estão empregados, são trabalhadores por conta de outrem (guarda-nocturno e serviços gerais). A taxa de desemprego nestas comunidades assume valores superiores a 90%. Dos 26 indivíduos desempregados, 10 são desempregados de longa duração e desses 10, 4 elementos (do sexo masculino) desenvolvem alguns trabalhos informais, tendo como actividades a venda em feiras, a venda de cestos feitos pelos mesmos, a sucata e arte de amolar. Ainda relativamente ao universo dos elementos desempregados, 16 indivíduos (dos escalões mais jovens) dizem estar à procura do 1.º emprego, apontando como áreas preferidas: Cuidar de crianças e idosos Costura Cozinha Informática Limpezas Cestaria Construção Civil Electricista Guarda Nocturno Se tivermos em linha de conta os indivíduos que nunca trabalharam e nem procuram emprego, os desempregados que não procuram emprego e os estudantes, somamos um conjunto de 76 elementos que têm em comum o facto de não procurar emprego. Ora, esta constatação evidencia um notável desfasamento entre o n.º de pessoas em idade activa para trabalhar e a população activamente disponível para tal. Ou seja, se houvesse a possibilidade de cruzar esta informação com as entradas / inscrições no Centro de Emprego de Aveiro, de certo os números estariam muito distantes entre si. Isto porque muitas das pessoas que dizem nunca terem procurado emprego, estão inscritas no Centro de Emprego de Aveiro19. Mas de facto, conseguir emprego não é um objectivo. Para estas comunidades o emprego não é visto como uma necessidade. A sua passagem pelos centros de emprego é feita, cumprindo uma obrigatoriedade, de modo a aceder ao Rendimento Social de 19 Só haveria essa possibilidade, no momento em que o sistema de informação interno dos serviços, discriminasse a população que a si se dirige, estabelecendo uma categorização por etnia. Por razões evidentes, tal não acontece. - Cáritas Diocesana de Aveiro 70 Inserção.20 Repare-se, que a área emprego é uma das áreas menos reconhecidas pela população, aquando da assinatura de acordo de inserção. Quadro n.º37 - Cobertura da medida Rendimento Social de Inserção – Área Emprego (População com 16 ou mais anos) Indivíduos pertencentes a famílias beneficiárias do Rendimento Social de Inserção Procura emprego Não procura emprego Total 8 51 59 Dos 59 indivíduos com 16 ou mais anos, cujas famílias estão abrangidas pela medida do Rendimento Social de Inserção, 51 dizem “não procurar emprego”, enquanto apenas 8 assumem procurar activamente emprego. Quadro n.º38 - Motivos para não procurar emprego Motivos masculino feminino total de respostas Motivos familiares Motivos culturais 1 3 24 21 25 24 Doença 9 12 21 Não reune habilitações /formação necessária 5 1 6 A estudar / frequentar curso de formação "Não há emprego / trabalho 2 4 6 5 0 5 "Não gosto de trabalhar" Discriminação racial 4 3 0 0 4 3 Idade avançada 1 1 2 Sem documentos de identificação Outros motivos 0 1 1 1 0 1 Aos 76 indivíduos que não procuram emprego, colocou-se a seguinte questão “Se não anda à procura de emprego/trabalho, qual(s) os motivos?”. 20 Conforme descrições sobre os modos de vida das populações de etnia cigana em situação de carência sócio económica, assiste-se a uma dependência dos serviços dada a irregularidade dos rendimentos através das actividades que se vão realizando de um modo também irregular e informal (ver capítulo 8: Retrato da Comunidade Cigana de Aveiro - Cáritas Diocesana de Aveiro 71 Mediante as respostas obtidas, observa-se que os motivos familiares (com 25 respostas) e culturais (com 24), seguidos da doença (com 21) são aqueles que pesam mais na decisão de não procura de emprego. Concentrando a análise para a comparação entre as respostas dadas por ambos os sexos, verifica-se que os motivos culturais e familiares assumem de imediato os primeiros lugares quanto a razões apontadas pelas mulheres para efectivamente não procurar emprego. Apontam-se como motivos “cuidar dos filhos e da casa”, “…a mulher cigana não trabalha”, confirmando de igual modo a forte influência da família em todas as decisões a tomar, sobretudo as de ordem e lógica sócioeconómica, já para não pormenorizar a relação entre papel e funções da mulher na comunidade e a sua relação com o exterior. A doença, constitui um motivo enunciado por ambos os sexos, concentrando, no entanto, maior n.º de respostas, no sexo masculino. De facto, os motivos culturais e familiares não atingem tanto os homens, sendo a estes concedido maior grau de liberdade e autonomia, mesmo em relação à comunidade e vivências fora do habitat. A doença assume, a posição de motivo mais sério ou legítimo a apresentar, ficando em dúvida, até que ponto estas 9 respostas correspondem a uma verdadeira limitação por motivos de doença ou fragilidades na saúde, ou, se assumem uma categoria a saber “aceitável” junto da sociedade dominante, para um indivíduo não trabalhar ou não procurar emprego. Este constrangimento de verdades e discursos, acentua-se, sobretudo, nestas questões com as quais se “toca” indirectamente em focos culturais e de mentalidades, que através de um inquérito por questionário não ficam de todo conhecidos. Para além da doença, os indivíduos do sexo masculino destacam também a ausência de habilitações e formação necessária, ausência de respostas de emprego (ambos os motivos com 5 respostas). De referir ainda a resposta “Não gosto de trabalhar”, considerada como motivo por 4 elementos, aparecendo em primeiro lugar, no quadro de leitura, ainda antes da “discriminação racial” (com 3 respostas). Estes dois últimos motivos enquadram-se também no leque das principais dificuldades (segundo os inquiridos) sentidas pelas comunidades ciganas no mercado de trabalho. Na sua opinião, as comunidades ciganas enfrentam dificuldades ao nível da inserção no mercado de trabalho?”. Dos 55 representantes dos agregados familiares que responderam, 20 denunciam existir constrangimentos na inserção das comunidades ciganas no mundo do trabalho. - Cáritas Diocesana de Aveiro 72 E a esta pergunta directa, destaca-se como “racismo/estereótipos/preconceitos” (18 respostas). primeira resposta o Em seguida surge “a falta de habilitações” com 8 respostas, sendo que estes 8 elementos reconhecem a condição literária como condição de acesso ao mercado de trabalho. As auto-representações dos ciganos como “os ciganos não gostam de trabalhar para as outras pessoas”, “os ciganos fazem muitas asneiras” e “os ciganos têm pouco cuidado com a imagem”, são também reflectidas por 4 indivíduos. Por último a diferença cultural entre etnia cigana e sociedade dominante, é apresentada como constrangimento e dificuldade à inserção das comunidades ciganas no mercado de trabalho. Por esta sequência de respostas repare-se na distância e ao mesmo tempo proximidade entre si: por um lado as auto-representações desfavoráveis, por outro, um sentimento de discriminação. Quadro n.º 39 - “Na sua opinião, as comunidades ciganas enfrentam dificuldades ao nível da inserção no mercado de trabalho? Dificuldades Racismo, estereótipos, preconceitos “Os patrões não aceitam os ciganos como deve ser” N.º de respostas 18 “Ninguém conhece, nem quer conhecer os ciganos” Falta de habilitações Auto-representações dos ciganos 8 “Os ciganos não gostam de trabalhar para outras pessoas” “Os ciganos fazem muitas asneiras” 4 “Os ciganos têm pouco cuidado com a imagem” Culturas diferentes 1 Das 20 pessoas (representantes dos agregados) que denunciam as dificuldades sentidas pelas comunidades ciganas na inserção ao mercado de trabalho, 10 apresentam algumas sugestões para melhorar tal situação: com destaque na aposta da formação tanto escolar como profissional da população cigana (com 8 respostas). Importante também, seria a implementação de medidas de modo a pôr um fim no racismo e nos preconceitos relativamente aos ciganos (5 propostas). Uma última sugestão apontada, seria uma empregabilidade mais favorável às comunidades ciganas (4 respostas), com o aumento do número de feiras e com “propostas de emprego que os ciganos possam aceitar”. - Cáritas Diocesana de Aveiro 73 Quadro n.º 40 - Sugestões para maior inserção das comunidades ciganas no mercado de trabalho Sugestões Formação escolar e profissional para a população cigana “Aumento da escola” Terminar com o racismo, estereótipos, preconceitos “Conhecer melhor os ciganos” Empregabilidade favorável às comunidades ciganas “Aumento do n.º de feiras” N.º de respostas “Mais formações para os ciganos” 8 5 “Propostas de emprego que os ciganos possam aceitar” 4 Em conclusão… - Taxa de desemprego acima dos 90%, - Apenas 2 elementos em idade activa, em situação de emprego, - Notável desfasamento entre o n.º de pessoas em idade activa para trabalhar (94 elementos) e a população activamente disponível para tal (76 pessoas assumem não procurar emprego). - Principais motivos para não procurar emprego: motivos familiares e questões culturais, motivos de doença, - Principais dificuldades ao nível da inserção no mercado de trabalho: racismo, estereótipos e preconceitos em relação aos ciganos, falta de habilitações, autorepresentações negativas em relação aos ciganos, a diferença cultural. - Principais sugestões: formação escolar e profissional para a população cigana, terminar com o racismo e os estereótipos e preconceitos, empregabilidade favorável aos ciganos. - Cáritas Diocesana de Aveiro 74 IX Saúde e Doença - Cáritas Diocesana de Aveiro 75 IX Saúde e Doença A saúde e a doença são dois conceitos inseparáveis e socialmente construídos, que vão sendo definidos, construídos e estipulados por cada cultura ao longo dos tempos. Em senso comum, a definição de um destes conceitos remete para a ausência do outro. No entanto, e atendendo ao âmbito (cultural) deste estudo, será de reflectir um pouco sobre o enquadramento desta temática, quanto mais não seja pela necessidade de considerar a emergência e a constante reformulação de tais conceitos, mediante o ritmo das mudanças e contextos sócio-culturais considerados. Independentemente do conteúdo biológico, para que haja saúde, ou para que haja doença, é necessário que determinada sociedade e cultura considerem como tal. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a saúde é entendida como um estado de bem estar físico, mental e social e não apenas como uma ausência de doenças ou enfermidades. É um direito humano fundamental e, como tal, todas as pessoas devem ter acesso aos recursos de saúde básicos e necessários. Ao bem - estar físico, mental e social, rapidamente se associa o termo de qualidade de vida dominado pelas percepções do indivíduo sobre a sua posição face às condições de saúde, os seus sentimentos e comportamentos quotidianos, o seu acesso aos serviços e a sua relação com o meio. Chegamos assim ao ponto em que a saúde se torna sobretudo um dos principais indicadores de igualdade ou desigualdade de oportunidades. E desta consideração emerge a sua importância na integração e inclusão dos indivíduos, que conjugada com outros factores determinantes como as condições de habitabilidade, a educação / escolarização e o emprego condicionam o exercício pleno de cidadania. Atendendo ao universo em estudo e à complementaridade das diversas áreas em reflexão, apontamos algumas notas de análise, no campo da saúde, ao longo da caracterização da população de etnia cigana (residente em acampamentos no concelho). Cingido apenas às percepções e discursos dos inquiridos, este estudo (diagnóstico), contou com a colaboração da equipa técnica do Centro de Saúde de Aveiro, que mediante os critérios usados pela entidade, programas e conceitos, participou na elaboração de algumas questões, assim como na uniformidade de tratamento e análise de dados. Assim, a primeira informação a ser recolhida, e que numa leitura imediata fornece alguma noção de abrangência de serviços, (ou se entendermos, alguma noção quanto à relação distância – proximidade, comunidades – serviços de saúde), foi relativa ao número de inscrições em Centros de Saúde. - Cáritas Diocesana de Aveiro 76 Ao total de 206 indivíduos, foi colocada a seguinte questão “está inscrito no centro de saúde”. A partir das respostas obtidas, observou-se que a maior parte da população está inscrita no centro de saúde – 196 pessoas. Gráfico n.º 7 – Inscrições em Centro de Saúde Das 196 pessoas inscritas em centros de saúde, 162 estão inscritas em Aveiro, 9 noutro concelho do distrito, e 19 estão inscritas noutro distrito que não o de residência. Confirma-se assim, um primeiro contacto com o centro de saúde, em relação à maioria da população em estudo, não sendo, ainda de concluir, quanto à regularidade ou frequência do seu recurso. Este cuidado em análise, toma a sua proporção, quando da totalidade dos 58 agregados, 51, preferem recorrer primeiro aos hospitais em situações de doença. Tal dado entra em concordância com algumas características escritas no Guia para a Intervenção com a Comunidade Cigana nos Serviços de Saúde (2007), nomeadamente o facto de as comunidades ciganas sentirem a necessidade imediata de curar as doenças da forma mais rápida possível, atendendo à forte associação doença / morte. Deste modo se observa o elevado ou excessivo recurso aos serviços de urgência, independentemente do estado ou ponto de situação da doença. Tendo presente a concepção e percepção dos inquiridos, quanto à doença, foi-lhes colocada a questão “Teve ou tem algum problema de saúde grave?”. Responderam a esta questão, 204 indivíduos, dos quais 38 disseram passar ou já ter passado por - Cáritas Diocesana de Aveiro 77 situações de doença, havendo maior concentração de respostas afirmativas nos escalões etários superiores, a partir dos 25 anos. Quadro nº.41 - “Teve ou tem algum problema de saúde grave?” Escalões Etários sim não total < 3 3 24 27 3 - 5 1 25 26 6 - 9 1 19 20 10 - 15 16 - 24 1 5 32 35 33 40 25 - 44 45 - 64 11 13 27 3 38 16 >=65 3 1 4 total 38 166 204 Quadro nº.42 - Principais problemas de saúde Áreas / problemas de saúde Respostas Osteo-articular 9 Cardiovascular 7 Outra Dos sentidos Psiquiatria - dependências Gastro-intestinal 7 6 5 4 Renal Deficiência mental 3 3 Hematológica 3 Pulmonar Infecciosa 3 3 Oncológica 2 Dos problemas de saúde denunciados, destacam-se os problemas do foro osteoarticular (9 respostas), cardio-vascular (7 respostas) e dos sentidos (6 respostas). De referir a categoria «outro», que mereceu 7 respostas. Foram ainda assumidas (por elementos do sexo masculino), aquando a aplicação do inquérito, 5 situações problema do foro de psiquiatria – dependências, correspondendo a um 4.º lugar no quadro das doenças que mais afectam a população. Este facto assume uma certa relevância, atendendo ao próprio contexto em que estas situações foram assumidas, visto que o inquérito foi aplicado em terreno, nos próprios acampamentos, havendo possibilidade de estas respostas serem ouvidas ou conhecidas pela restante comunidade residente. Por outro lado, embora prevalecendo uma relação de empatia entre a equipa de terreno e a população - Cáritas Diocesana de Aveiro 78 inquirida, as inquiridoras não deixaram de ser elementos estranhos à comunidade e aos próprios indivíduos, facto que poderia condicionar a abertura destas respostas.21 Quadro n.º43 - Seguimento / Tratamento em Serviços de Saúde Serviço(s) de Saúde situações Hospital 18 Centro de Saúde 14 Centro de Saúde, Hospital e Médico Particular 2 Especialidade – Centro de Atendimento a Toxicodependentes 1 Total 35 Das 38 situações com registo de problemas de saúde, 35 já tiveram ou têm (à data da aplicação do inquérito) seguimento / tratamento em serviços de saúde. Desse total, nota-se a preferência de 18 situações com recurso ao hospital, 14 em centros de saúde, 2 conjugando os vários serviços e 1 em serviço de especialidade (CAT). Seria precipitado concluir com estes dados a preferência da população de etnia cigana em termos de serviços de saúde, com indicação dos hospitais em 1.º recurso. Isto porque, será de atender à existência ou não de respostas em cada serviço para o tipo de problema / doença em causa e o devido encaminhamento para serviços complementares ou especializados. Aos problemas de saúde, acrescenta-se mais 2 indicadores de informação quanto ao estado e condições de saúde da população inquirida: Quadro n.º44 - Número de famílias com situações de deficiência Tipo de Deficiência 21 N.º famílias Deficiência física 2 Deficiência física e sensorial 1 De conhecimento bibliográfico e seguindo um pouco as linhas de orientação do Guia para a Intervenção com a Comunidade Cigana nos Serviços de Saúde, é frequente, nas comunidades de etnia cigana a recusa deste tipo de problema, devido à vergonha, implicações e consequências junto da comunidade, assim como (por vezes) às resistências culturais a processos de tratamento. - Cáritas Diocesana de Aveiro 79 Quadro n.º45 - Interrupção de gravidez (aborto) N.º abortos N.º mulheres 1 9 2 3 3 1 5 1 Total 14 Das 76 mulheres com 10 ou mais anos22, 14 inquiridas assumem ter já sofrido interrupção de gravidez (voluntária ou involuntária), sendo duas com idades compreendidas entre os 10 e os 15 anos. Relativamente ao n.º de situações de interrupção de gravidez por mulher, verificamos, mediante as respostas obtidas, a prevalência de 9 situações com um caso de interrupção. Uma das formas de ponderar sobre a atitude de uma população relativamente à saúde, é observar e analisar os seus comportamentos quanto à prevenção, e por isso seguimento ou não dos cuidados de saúde primários. O inquérito tem igualmente como objectivo questionar a população quanto ao cumprimento / frequência de consultas e programas de saúde. 22 Em respeito à tendência cultural da etnia cigana, para uma maternidade precoce, logo seguida de um “casamento” também precoce, para efeitos de análise, foram consideradas para esta informação, todas as mulheres, incluindo adolescentes a partir dos 10 anos, salvaguardando as fortes possibilidades de existência de situações de interrupção de gravidez nestas idades. De conhecimento de intervenções e projectos em terreno, assim como da leitura do Guia para a Intervenção com a Comunidade Cigana nos serviços de Saúde, constata-se o domínio das elevadas taxas de maternidade precoce e muitas vezes sem acompanhamento médico durante a gravidez ou de pós-parto, assim como um elevado n.º de partos sem assistência médica. No universo a caracterizar, não foi possível obter essa informação junto das pessoas inquiridas. Por opção, da equipa de estudo, estas questões não foram directamente colocadas, com vista a desviar qualquer impedimento de resposta a todas as outras questões, desbloqueando qualquer tipo de constrangimento na relação inquirida – inquiridor – restante comunidade. Por sua vez, de novo se reforça, que se trata de discursos, respostas individualizadas, que poderão ou não corresponder a uma verdade plena caracterizadora. No entanto estes são os valores assumidos por 14 num universo de 76 mulheres. - Cáritas Diocesana de Aveiro 80 Gráfico n.º 8 – Cumprimento / Frequência das consultas e programas dos serviços de saúde, da área de residência “No caso particular, cumpre, actualmente, com as consultas dos serviços de saúde da sua área de residência?” A esta pergunta, cerca de 81% do total da população afirmou cumprir com as consultas e programas dos serviços de saúde da área de residência, e cerca de 19% (39 casos) admitiu não cumprir. Por sua vez, nota-se alguma diferença entre ambos os sexos. Do total de mulheres, cerca de 89% dizem cumprir, e da totalidade dos homens, cumprem 71%. Uma diferença nas respostas que poderá precisamente coincidir com as práticas, indo ao encontro da constatação do que se observa nos serviços de saúde (e que é transversal à população em geral): os homens não estão tão sensibilizados para a prevenção de doenças. Salvaguarda-se ainda o facto de estas percentagens (elevadas) de cumprimento poderão estar relacionadas com a cobertura e cumprimento do acordo celebrado no âmbito da medida do Rendimento Social de Inserção. Também é de acrescentar nesta análise, alguns frutos e resultados mais positivos de um trabalho de terreno de alguns anos, consolidado, de sensibilização e de intervenção junto das comunidades, com o esforço e ajuste estratégico dos serviços correspondentes. - Cáritas Diocesana de Aveiro 81 Gráfico n.º 9 – Cumprimento / Frequência de consultas e programas de saúde, por escalão etário A associação de todos estes factores é ainda mais notória, quando observamos a evolução deste facto, por escalão etário. É bem visível a cobertura e o pleno cumprimento de consultas e programas de saúde, nas crianças entre os 6 e os 9 anos (crianças em plena idade escolar). Esta situação poderá estar relacionada com a articulação de serviços escola – saúde, a obrigatoriedade de cumprimento de medida de Rendimento Social de inserção, assim como a reprodução de aprendizagens e interiorizações previstas na educação para a saúde e saúde escolar, proporcionando uma plena abrangência dos serviços de saúde nestes grupos etários. De realçar ainda, que a relação proporcional de resposta sim – não, vai aumentando à medida que se avança para escalões etários superiores, nos quais escassa a abertura para a educação para a saúde, para a mudança de alguns comportamentos, predominando a resistência de alguns tabus quanto à visão do próprio corpo, doença, sexualidade, saúde, etc. Facto que poderá estar relacionado, igualmente, com o enraizamento dos costumes culturais, sendo mais dificil a alteração de comportamentos de saúde. Também nos escalões mais velhos, se verifica a diminuição da frequência no sistema de ensino, dificultando de igual modo, processos de sensibilização e de interiorização de alguns hábitos e comportamentos fundamentais para a promoção de um estado saudável. Neste contexto, relacionando frequência do sistema de ensino e frequência de serviços de saúde, verifica-se uma relação / associação positiva entre as duas - Cáritas Diocesana de Aveiro 82 variáveis, sem que com esta constatação se possa concluir garantidamente uma relação causa – efeito. Gráfico 10 – Cumprimento / Frequência de consultas e programas de saúde – frequência do sistema de ensino (pop. >=6 anos) Dos 54 indivíduos a frequentar o sistema de ensino, apenas dois dizem não cumprir com as consultas e com os programas. Porém, quando nos debruçamos sobre os indivíduos que não frequentam o sistema de ensino, verificamos que o n.º de situações de não cumprimento aumenta, ou seja, das 96 pessoas, existem 31 que dizem não cumprir com os cuidados de saúde primários. Quadro n.º46 - Cobertura da Medida do Rendimento Social de Inserção – Área Saúde Situação face ao RSI Rendimento Social de Inserção Agregado beneficiário de RSI - n.º indivíduos % RSI(rendimento do agregado) Agregado não beneficiário de RSI n.º indivíduos total n.º indivíduos % RSI(rendimento do agregado) cumprimento / frequência das consultas dos serviços de saúde da área de residência sim não Total 115 89,1% 14 10,9% 129 100,0% 48 25 73 65,8% 34,2% 100,0% 163 39 202 Cáritas Diocesana de Aveiro 83 Tendo em conta a principal fonte de rendimento da maioria da população em estudo, ser a prestação pecuniária do Rendimento Social de Inserção, e o facto da área da saúde, ser uma das principais áreas reconhecidas pela população no seu compromisso de acordo celebrado, serve o quadro anterior para ilustrar a leitura da possível relação / associação destas variáveis. Assim, do total dos 202 respondentes às perguntas direccionadas nesse sentido, 129 inquiridos, cerca de 64% fazem parte de agregados beneficiários da medida, sendo de 36% os indivíduos cujo agregado, à data de aplicação de inquérito não usufruía de tal prestação e não tinha acordo celebrado. Verifica-se, que dos 129 elementos cujo agregado beneficia do Rendimento Social de Inserção, cerca de 89% (115 pessoa) dizem cumprir com as consultas e os programas de saúde primários existentes na sua área de residência, sendo apenas de 11% as situações de não cumprimento. Esta percentagem de não cumprimento aumenta para cerca de 34% quando se avança para os indivíduos pertencentes a agregados não beneficiários da medida. Mediante esta constatação, entra em linha de factores associativos ao comportamento da população face à saúde, a questão da medida social do Rendimento Social de Inserção, que não só pela pressão de compromisso junto dos agregados, mas também pela sequente articulação de serviços e projectos de intervenção no seu trabalho de sensibilização e investimento de informação corrente e acessível às comunidades, têm proporcionado alguns resultados mais positivos, sobretudo nas camadas populacionais mais jovens. Não deixa de ser pertinente reflectir um pouco sobre a percepção, ou pelo menos o discurso tido pelos vários inquiridos, relativamente à sua posição e cumprimento / frequência dos vários serviços ou programas de saúde existentes e específicos aos mesmos destinados. Planeamento Familiar e Ginecologia: Das 64 mulheres entre os 10 e os 44 anos, 23 dizem frequentar as consultas de planeamento familiar, ficando a descoberto 41 elementos. – Ora, este comportamento ou posição face ao planeamento familiar está condicionado por vários factores culturais, como a posição e o papel reprodutivo da mulher na comunidade, a formação de uma família numerosa, o carácter imperativo da decisão do homem na opção de ter ou não mais filhos. Das 11 mulheres com 45 ou mais anos, 2 dizem fazer o rastreio do cancro da mama e do colo do útero. – A prevenção primária e a redução de risco, o rastreio e a detecção precoce, anterior a qualquer manifestação dos primeiros sintomas, são as medidas mais eficazes na redução de gravidade da doença, reduzindo taxas de morbilidade e mortalidade pelo cancro. Não fazendo esse rastreio, estas mulheres (de etnia cigana) ficam a descoberto de cuidados essenciais à sua saúde. - Cáritas Diocesana de Aveiro 84 Muitas vezes as consultas de ginecologia e este tipo de exames / diagnósticos estão de tal modo mistificados, que criam sentimentos de angústia e de medo nas mulheres ciganas. De novo se embate no “muro cultural” que separa a percepção e concepção das mulheres ciganas sobre o seu corpo, saúde e sexualidade, e o sistema de saúde (muitas vezes inadequado a essas condições culturais). Saúde Infantil: Das 105 crianças com 15 ou menos anos, 95 frequentam as consultas de saúde infantil. Destas 105 crianças, a maioria frequenta o sistema de ensino, havendo neste ponto, todo um processo de articulação e sensibilização para tal cumprimento. Por outro lado, será de não esquecer os aspectos relevados anteriormente quanto à pressão interventiva no âmbito do Rendimento Social de Inserção, que no que toca à saúde infantil e juvenil, se manifesta rigoroso e ao mesmo tempo é reconhecido por toda a população. Plano Nacional de Vacinação Quadro n.º 47 - Cumprimento de Plano Nacional de Vacinação Escalões Etários Sim Não Total < 3 3 - 5 6 - 9 24 21 19 0 1 0 24 22 19 10 - 15 28 2 30 16 - 24 7 19 26 25 - 44 45 - 64 3 0 22 11 25 11 >=65 0 3 3 total 102 58 160 No que concerne ao Plano Nacional de Vacinação, verifica-se que das 160 pessoas respondentes, 102 dizem respeitar o calendário do Plano Nacional de Vacinação. De acordo com o quadro, e tendo em conta a idade de cumprimento da saúde infantil, dos 0 aos 15 anos, verifica-se uma cobertura de aproximadamente de 100% das crianças, registando-se apenas 3 crianças que não cumprem com o plano nacional de vacinação. Com a idade adulta e à medida que se avança para escalões etários mais velhos, a situação inverte-se, ou seja, o número de não cumpridores é superior ao número de indivíduos que têm as suas vacinas em ordem. - Cáritas Diocesana de Aveiro 85 Com este facto, denuncia-se a importância da educação para a saúde no âmbito da saúde infantil e da saúde escolar, assim como todos os outros factores relacionados com a intervenção directa e que funcionam como mecanismos de pressão, obrigando ao cumprimento destes cuidados, sobretudo junto das crianças. Medicina Familiar Constata-se a partir dos dados obtidos que, dos 58 agregados inquiridos, existem 37 que têm pelo menos um elemento familiar a frequentar a medicina familiar, ou por outras palavras, a recorrer às consultas junto do respectivo médico de família. De referir os 21 agregados desprovidos de tal comportamento ou atitude de prevenção / cuidado com a saúde familiar e individual, podendo a saúde, nestas situações, não ser considerada como uma necessidade prioritária, com vários pontos a contribuir: - não existir abertura à educação para a saúde, - os hábitos culturais serem mais vinculativos nesta posição e comportamentos, - não existir tanta proximidade com os serviços, - comunidades mais descobertas de acompanhamento / intervenção social, - ausência de benefício da medida de Rendimento Social de Inserção, e por isso, ausência de obrigatoriedade nesses cuidados, - entre outros. Quadro n.º 48 - Não cumprimento de cuidados de saúde primários / motivos Motivos Falta de meio de transporte Respostas 1 Desconhecimento dos serviços e das consultas 3 Por achar não ser necessário Falta de médico 20 4 Não estar inscrito nos serviços da área de residência Não gostar de ir ao médico - falta de hábito 12 4 Dos 39 elementos que assumem não cumprir com os cuidados de saúde primários e por isso não frequentar consultas ou programas de saúde existentes na sua área de residência, 35 apresentaram os seus motivos, sendo de destacar o motivo “por achar não ser necessário” com 20 respostas. Facto que vai ao encontro da análise tida anteriormente. - Cáritas Diocesana de Aveiro 86 “Como considera a sua relação com os profissionais dos serviços de saúde? Para finalizar a problemática da saúde, questionámos a comunidade cigana acerca da sua relação com os profissionais dos serviços de saúde. A esmagadora maioria dos agregados familiares (57), considera a sua relação com os profissionais dos serviços de saúde como muito boa e boa, não apontando quaisquer constrangimentos/problemas ou falhas nos serviços de saúde da sua área. Dado que contraria um pouco, a constatação geral tida no Guia para a Intervenção com a Comunidade Cigana nos Serviços de Saúde (2007). Talvez, precisamente, porque uma das orientações apontadas, tenha já sido estratégia de intervenção no concelho de Aveiro há já algum tempo: - maior proximidade dos serviços (equipas do centro de saúde) junto da população, - articulação de serviços e respostas (mesmo no âmbito do Rendimento Social de Inserção), - articulação com projectos de intervenção em campo (ex: projecto Novas Sendas), - complementaridade e interdisciplinaridade de respostas na área. Contudo, não se deve deixar de lado, a consideração de que alguns agregados poderão ter respondido a esta escala de opinião, sem qualquer conhecimento dos serviços de saúde e por isso, sem consciência de resposta. No entanto, e atendendo aos resultados positivos obtidos e observados em termos de trabalhos executados no terreno há já alguns anos, será de validar esta posição das comunidades ciganas residentes nos acampamentos. Em conclusão… - A maior parte da população em estudo está inscrita em Centros de Saúde (196 das 206 pessoas), - Do universo de 206 pessoas, 38 dizem passar ou já ter passado por situações de doença, - Principais problemas de saúde denunciados: problemas do foro osteo-eaticular, cardiovascular e dos sentidos, - Das 76 mulheres com 10 ou mais anos, 14 inquiridas assumem já ter sofrido interrupção de gravidez (voluntária ou involuntária), - 81% do total da população afirmou cumprir com as consultas e programas dos serviços de saúde da área de residência, - Cáritas Diocesana de Aveiro 87 - Forte relação entre Rendimento Social de Inserção e cumprimento, - Das 64 mulheres entre os 10 e os 44 anos, 41 dizem não frequentar as consultas de planeamento familiar, - A grande maioria das crianças (95 das 105 crianças com 15 ou menos anos) cumprem com as consultas de saúde infantil. - A maior parte das pessoas diz cumprir o calendário do Plano Nacional de Vacinação. - Os elementos que não cumprem as consultas e programas dos serviços de saúde da área de residência, apontam como principal motivo, o facto de não acharem ser necessário. - Cáritas Diocesana de Aveiro 88 X Justiça - Cáritas Diocesana de Aveiro 89 X Justiça Distanciando os diversos factores, “Justiça” será talvez uma área melindrosa a estudar, tendo em conta os dois campos de observação: Por um lado, a lei portuguesa e o seu cumprimento (ou não), no que diz respeito à discriminação no exercício de direitos por motivos baseados na raça, cor, nacionalidade ou origem étnica. Muitas comunidades ciganas continuam a ser alvo de inúmeras acusações e de discriminações no acesso a alguns direitos básicos. Tão notória é esta constatação, que, ao ler as diversas definições de “cigano”, em dicionários de língua portuguesa, encontramos: “Cigano, s.m. indivíduo da raça dos Ciganos; adj. Trapaceiro; ladino; traficante de mercadorias subtraídas aos direitos; pop. Avaro; impostor”. (Dicionário de Língua Portuguesa, 1994, Porto: Porto Editora) Ora, lemos um conjunto de características muitas vezes apenas associadas a situações de pobreza e de exclusão social, sem qualquer ligação com a etnia propriamente dita. Ficam subjacentes os preconceitos e estereótipos que por si conduzem ao sistema de justiça “injustiçar” os ciganos por pertencerem a tal etnia. Assistimos à lógica do assistencialismo, da protecção dos ciganos face aos direitos e deveres em sociedade em geral, tantas vezes funcionando como o meio mais fácil a atenuar receios e conflitos com o “desconhecido ou estranho” e por isso “perigoso” e muito longe da tolerância da diferença cultural. Por outro lado, os elevados números de tráfico de droga e de conflitos associados a esta etnia, que sendo reais, transparecem outras questões de fundo de integração social (de novo o predomínio de estereótipos). Ainda neste ponto, acresce-se a questão da identidade jurídica, da identificação muitos ciganos têm alcunhas ou existem na mesma família várias pessoas com nomes idênticos, não havendo uma coincidência com o nome legal, o que dá origem a frequentes erros processuais. Longe do aprofundamento de todas estas questões, os dados obtidos e analisados na área da justiça, neste estudo caracterizador, merecem algumas considerações de introdução. Aquando o levantamento das áreas de estudo, objectivos e hipóteses de trabalho, pelas várias entidades envolvidas no estudo, a área da justiça não levantou urgência e pormenorização em termos de dados, Por conversas informais no terreno, a equipa de investigação observou que existia uma proporção relativa de reclusão à data ou no passado, por um ou mais elementos no agregado. Pelas características próprias de um inquérito por questionário e obedecendo a estratégias de aproximação e empatia com os inquiridos, a equipa reconheceu o “melindre” em falar de justiça (sinónimo de reclusão), evitando assim, constrangimentos nas restantes perguntas – respostas, - Cáritas Diocesana de Aveiro 90 Finalmente, o instrumento de recolha de dados (inquérito por questionário) apresenta/apresentou como constrangimento a ausência de uma pergunta “Já foi ou está a ser acompanhado por parte de uma equipa do Instituto de Reinserção Social?”, já que esta questão foi formulada a nível concelhio. Ora, esta questão limitou as respostas dos indivíduos que embora não acompanhados pela equipa de Aveiro, estavam ou foram acompanhados por outras equipas então distritais. Deste modo, e mediante os dados possíveis, do total do universo em estudo, 8 responderam já terem sido acompanhados pelo Instituto de Reinserção Social de Aveiro, dos quais 6 têm idades compreendidas na faixa etária dos 25 aos 44 anos. No que diz respeito à Protecção de Crianças e Jovens de Aveiro, constata-se através das respostas dadas que, 5 dos 57 agregados familiares estão ou já foram acompanhados por esta entidade. Esses 5 agregados familiares caracterizam-se por serem: 3 famílias monoparentais, 1 família isolada e 1 casal com filhos. - Cáritas Diocesana de Aveiro 91 XI Participação Cívica e Cidadania - Cáritas Diocesana de Aveiro 92 Falar em cidadania é falar em acesso e acessível. Quer isto dizer, cidadania é a expressão primeira de um conjunto de direitos da pessoa, tendo esta, a possibilidade de participar activamente na vida e no governo do seu povo, o que lhe implica o cumprimento dos seus deveres perante o outro, em comunidade e em sociedade. Não exercendo cidadania, o sujeito está marginalizado ou excluído da vida social e da tomada de decisões, ficando numa posição de inferioridade dentro do grupo social. De referir ainda que este exercício remete ao conhecimento, à consciência e ao reconhecimento de tais deveres e direitos – passos e fases essenciais a considerar em todo o processo de integração social de qualquer pessoa. Não deixa de ser um processo de aprendizagem; aprende-se, exercendo. E tomar conhecimento e consciência de direitos e deveres, obriga, sobretudo à sua existência, implementação e prática. No caso específico das comunidades ciganas, todo este processo é novo. Conhecendo há pouco tempo a que tem direito um cidadão português cigano, haja espaço para interiorizar a sua aplicabilidade e ao mesmo tempo fazer corresponder os seus deveres. Falamos de comunidades, que só há pouco tempo lhes foi reconhecida “cidadania”, ao mesmo tempo que aprendem com as tribulações próprias de um país ainda “verde” em democracia e liberdade. Neste ponto, pelo enfoque das tantas situações de pobreza, é-lhes acentuada uma acumulação de processos de exclusão social, que sendo transversais a outros grupos, assim se realçam no meio da sua fragilidade e vulnerabilidade sociais. Aqui conta a presença de estereótipos, preconceitos e descriminações, que acrescidos de receios e desconhecimento intercultural fomentam e fazem prevalecer a tão falada e mal percebida “Desigualdade de Oportunidades”. Assim se revela a importância das várias instituições em garantir esse percurso, de modo a incentivar e promover a participação dos mais excluídos, nos seus próprios processos de reintegração social, devolvendo-lhes algum poder de acção e capacitação individual em projectos de vida e pleno exercício da cidadania e participação cívica. Esta área, em termos de diagnóstico sobre a comunidade cigana residente no concelho, embora visível ao longo de todas as áreas de estudo, foi instrumentalizada em três aspectos correspondentes a três questões em inquérito, que embora não sendo tutores de um exercício pleno de cidadania, indicam, por si e no seu conjunto, alguns dados reveladores do exercício (ou não) de cidadania e participação (ou não) cívica. - Cáritas Diocesana de Aveiro 93 - Identidade jurídica (posse ou não de documento de identificação), - Recenseamento (“É recenseado?” “Costuma votar nas eleições?”), - Associativismo (“Pertence a alguma associação?”) Identificação Jurídica – Documento de identificação Por norma, os cidadãos, estando vinculados à ordem jurídica de um Estado, possuem um documento da sua identificação jurídica. Um documento que lhe garante alguma identidade e autenticidade na sociedade. Este registo confere ao indivíduo um conjunto de deveres e de direitos instituídos e praticados em sociedade. Este documento funciona como “senha” de uma cidadania. Sem documento de identificação, não se conhece a sua existência; não se reconhece como cidadão. Nas comunidades ciganas, verifica-se, muitas vezes, uma ausência de registos de nascimento, a caducidade e a ausência de documentos pertinentes enquanto cidadãos, tais como: bilhete de identidade do cidadão nacional; cartão do utente (de saúde); cartão de beneficiário (segurança social); cartão de contribuinte; cartão de eleitor, entre outros. Esta situação, poderá estar relacionada com o facto deste processo ainda não ser reconhecido e interiorizado pelos próprios ciganos, como a aquisição de direitos e deveres. No universo em estudo, quando se solicitou aos inquiridos, a apresentação de um documento que os identificasse, observou-se que do total de 206 indivíduos, 26 não apresentaram qualquer tipo de identificação, pressupondo dificuldades em qualquer tipo de pedido ou requerimento, acesso a serviços, ou outro processo exigido: seja na matrícula na escola, na inscrição para emprego, nos serviços de saúde, etc. Recenseamento - “É recenseado?” “Costuma votar nas eleições?” Dos 89 inquiridos com idade para recenseamento, apenas 26 se encontram recenseados, dos quais 7 dizem votar nas eleições. Transparece assim, algum desinteresse e despreocupação relativamente à sua participação cívica na sociedade que integram. Uma participação nula nas decisões políticas; uma presença esquecida numa sociedade democrática; um silêncio na voz, na opinião, nas necessidades e na crítica. Recorremos, talvez, à consideração da hierarquia de necessidades, que não sendo cumprida na sua base, (nas condições mínimas de sobrevivência), depressa se destoa nas questões de realização pessoal, comunitária e social. - Cáritas Diocesana de Aveiro 94 Torna-se imprescindível consciencializar os cidadãos a exercerem os seus direitos de cidadania, já que não se vive democraticamente se todos os membros da sociedade não exteriorizarem as suas opiniões e as suas vontades. Associativismo - “Pertence a alguma associação?” A esta pergunta, predominou com o total das respostas, o “Não”. Do universo em estudo, ninguém pertence a qualquer associação, seja local, de pais, municipal, de cidadãos ciganos, ou qualquer outra. Confirma-se por estes dados, que realmente, são também os grupos mais deficitários, as populações mais pobres, aquelas que menos se fazem representar junto do poder político e social. Esta relação de distanciamento e uma certa apatia com as organizações do Estado, revela a fraca representatividade destas comunidades nas instâncias de tomadas de decisão política. Claro, que poderá haver uma tradução na debilidade e desadequação das medidas por desconhecimento, sensibilidade, ou ausência de tomada de consciência de uma realidade “apagada”. Uma das formas de combater esta tendência e de transformar excluídos em grupos de poder, capazes de expressarem os seus ideais e de se fazerem representar através das suas organizações de poder é o associativismo, sinónimo de emancipação destes grupos. Os indivíduos tomam consciência das suas necessidades comuns, essa consciência torna-se social e leva a uma forma de organização e de mobilização, com vista ao reconhecimento de direitos, reivindicação de garantia de resposta às suas necessidades. Integrando e participando em associações, estes grupos vêm os seus interesses a serem representados e defendidos, ao mesmo tempo que consolidam uma autonomia de acção, vendo-se e sentindo-se em igualdade social no acesso aos recursos, quer materiais, quer simbólicos, sem que com isso desvaneça a sua identidade cultural. Em Portugal, começa a surgir um movimento associativo cigano, de modo a promover e incentivar uma maior abertura, um maior inter-conhecimento com a restante sociedade. Estas associações começam a fazer valer o exercício de cidadania de um cigano português, apesar de ainda se encontrarem em fase muito embrionária, com todas as dificuldades de início e constrangimentos. - Cáritas Diocesana de Aveiro 95 XII Considerações Finais - Cáritas Diocesana de Aveiro 96 Este último capítulo surge pela consideração do enriquecimento e mais valia a ter, aquando a recolha das diferentes reflexões e considerações dos próprios agentes do meio, perante a apresentação e leitura dos dados apresentados. Assim, tomando em (re)conhecimento desta caracterização sócio-demográfica da população de etnia cigana residente nos vários acampamentos do concelho, os vários interlocutores das diferentes áreas em estudo, foram convidados a expor as suas considerações, com base na análise e reflexão de determinados campos alusivos ao problema de exclusão social destas comunidades. Foi assim apresentado a cada agente interlocutor23 um conjunto de subpontos a ter em conta aquando a reflexão desta temática: Principais problemas e necessidades diagnosticadas, Prioridades de intervenção, Propostas interventivas / estratégias a adoptar, Resultados a esperar. Mediante esta grelha, foi possível a cada elemento emitir a sua análise pelas diferentes áreas de estudo: Situação sócio económica e protecção social, Habitação, Escolarização e formação, Percurso e situação profissional, Saúde / doença, Justiça, Participação cívica e cidadania. Deste modo, serviu este instrumento de reflexão, para “guiar” o Encontro Temático do projecto Novas sendas, realizado no dia 6 de Dezembro de 2007, tendo como mediador de mesa o Dr. Sérgio Aires24. Nesse momento de partilha, foi possível dar a conhecer em plateia, as percepções e representações que estas comunidades de etnia cigana têm sobre a sua posição ou condição de in ou exclusão social, assim como, colocar em mesa de discussão, as diferentes áreas (serviços) correspondentes às diversas necessidades sentidas ou diagnosticadas. 23 Elementos e organismos parceiros do projecto Novas Sendas e representantes de cada área de estudo. 24 Sociólogo e Consultor nas áreas da pobreza, exclusão e políticas sociais. - Cáritas Diocesana de Aveiro 97 Desse encontro, registaram-se as várias intervenções e conclusões retiradas, no sentido de permitir neste mesmo documento, abrir o debate entre percepções e discursos das comunidades e “diagnósticos” e prioridades de intervenção dos serviços. Habitação25 Principais problemas e necessidades diagnosticadas: Ausência e insuficientes condições de habitabilidade / infra-estruturas básicas. Prioridades de Intervenção: O problema da falta de habitação e precariedade das condições habitacionais das famílias de etnia cigana deverá ser objecto de análise em contexto alargado, junto do tecido institucional, sociedade civil e poder local, no sentido de se delinear propostas de intervenção consertadas com vista à integração e socialização das famílias de etnia cigana sem desrespeito pela sua trajectória e identidade étnica. O alojamento destas famílias não pode ser dissociado de outras áreas de intervenção que preconizam a inserção social dos grupos sociais mais vulneráveis, nomeadamente, Educação, Emprego, Formação Profissional, Saúde, Protecção e Solidariedade Social, entre outras. O problema da habitação carece, portanto, de respostas de responsabilidade partilhada. Propostas interventivas / estratégias a adoptar: - Sensibilizar as famílias com rendimentos para a procura de repostas habitacionais no mercado de arrendamento normal; - Elaborar estudo dos núcleos habitacionais onde residem estas famílias, no sentido de avaliar a possibilidade da melhoria dos alojamentos existentes, se de acordo com os instrumentos de planeamento em vigor aplicáveis, com o objectivo de as fixar nos locais onde se encontram a residir – Auto construção ou implantação de estruturas com as necessárias condições de habitabilidade, em parceria com todas as entidades envolvidas com intervenção e responsabilidade na área do social; - Realojamento em habitação social assente no pressuposto da necessidade de ponderar as características de cada núcleo familiar, do percurso efectuado e trajectórias face à apropriação do espaço onde residem e tendo, por referência, os seus valores culturais, crenças e rituais étnicos. 25 - Dr.ª Irene Bártolo – Câmara Municipal de Aveiro – Serviço de Habitação Social Cáritas Diocesana de Aveiro 98 Resultados a esperar: Melhorar as condições de habitabilidade, das famílias que foram objecto de estudo de investigação, estruturante no seu processo de inserção social, contrariando lógicas de exclusão e auto-exclusão social. Escolarização / Formação26 Principais problemas e necessidades diagnosticadas: Baixa escolaridade, em função do abandono precoce da escola ou não frequência da mesma. De uma forma geral, estas famílias não prestam qualquer apoio aos filhos nas suas actividades escolares, quer proporcionando-lhes um espaço adequado à realização das tarefas, quer ajudando-os na realização dos trabalhos ou ainda na aquisição de livros ou material didáctico. Baixa aptidão da população de etnia cigana em frequentar formação profissional. Prioridades de Intervenção: Sensibilização das famílias para a real necessidade da aquisição de novas competências e saberes. Continuação do apoio às crianças, quer na ocupação dos tempos livres, com actividades adequadas a um desenvolvimento harmonioso, quer na ajuda à realização dos trabalhos escolares e na aquisição de métodos de estudo e trabalho. Actuação dirigida essencialmente à população mais jovem, com o objectivo de escolarização/ /profissionalização da mesma . Propostas interventivas / estratégias a adoptar: Urgente arranque de um projecto de substituição do “Novas Sendas”/Trampolim, que poderá ter características idênticas a este. Actuação ao nível do encaminhamento de jovens para acções de formação a desenvolver no Centro de Formação Profissional de Aveiro, enquadrado em Plano de Formação. 26 Professor João Esteves - Agrupamento de Escolas de Esgueira e Dr. António Marques - Centro de Emprego de Aveiro. - Cáritas Diocesana de Aveiro 99 Resultados a esperar: Ocupação correcta dos tempos livres das crianças. Sucesso escolar. Aumento de escolaridade/ /formação profissional da população de etnia cigana, com vista à inserção profissional no Mercado de Trabalho. Emprego (situação profissional)27 Principais problemas e necessidades diagnosticadas: Quase total inexistência de percurso profissional anterior por conta de outrem, que dificulta, para além de outros aspectos, a inserção profissional. Muitos elementos de etnia cigana estão inscritos no Centro de Emprego mas apenas para cumprir uma das obrigações para ter acesso ao Rendimento Social de Inserção. Na realidade, estes beneficiários não estão em condições de aceder a qualquer das ofertas de emprego disponíveis e, quando essa possibilidade existe, confrontam-se com problemas de discriminação. Prioridades de Intervenção: Intervenção ao nível da sua escolarização/formação, com vista à sua posterior inserção no Mercado de Trabalho, essencialmente ao nível da população mais jovem, mais disponível para tal, visto que alguns adultos afirmam que não gostam e nem querem trabalhar. Propostas interventivas / estratégias a adoptar: Encaminhamento para um percurso formativo de dupla certificação, com vista à possível inserção no Mercado de Trabalho. Resultados a esperar: Com o aumento da escolaridade / /profissionalização, será mais viável a inserção no Mercado de Trabalho, que permitirá constituir um percurso profissional que dê garantias para o futuro. 27 - Dr. António Marques - Centro de Emprego de Aveiro. Cáritas Diocesana de Aveiro 100 Protecção e Acção Social28 Principais problemas e necessidades diagnosticadas: Independentemente da importância de tal medida e dos progressos que a mesma permitiu, existe uma grande dependência destas comunidades em relação ao Rendimento Social de Inserção. Prioridades de Intervenção: Da parte das comunidades continua a existir uma forte necessidade de trabalhar os constrangimentos (culturais e outros) que continuam a favorecer um posicionamento passivo e de acomodação na construção dos projectos de vida. Propostas interventivas / estratégias a adoptar: É fundamental aumentar as expectativas face ao futuro (particularmente dos seus filhos) trabalhando os níveis de qualificação e educação para uma positiva inserção laboral. Mas tudo isto tem que ser feito – como foi feito neste projecto – respeitando os ritmos dos beneficiários e concertando estes ritmos com os objectivos e prioridades das medidas e dos técnicos; Mas aumentar as expectativas das comunidades não é suficiente; é imprescindível que se combatam as discriminações de que são alvo sob pena de existir em permanência um muro intransponível impeditivo de uma verdadeira inclusão social; É importante reconhecer – e agir coerentemente face a esta constatação – que as políticas e as respostas existentes nem sempre são as mais adequadas para estes públicos. É importante que as medidas contenham maior possibilidade de flexibilidade e adaptação a públicos específicos. Saúde / Doença29 Principais problemas e necessidades diagnosticadas: Privilegiam a saúde curativa em detrimento da saúde preventiva. Prioridades de Intervenção: Antes prevenir que adoecer. Incentivar a promoção para a saúde. 28 Dr.ª Emília Oliveira – Centro Distrital de Segurança Social de Aveiro 29 Dr. Vítor Gomes – Centro de Saúde de Aveiro. - Cáritas Diocesana de Aveiro 101 Incentivar o acesso às consultas, pelo menos uma vez/ano, a continuação dos tratamentos. Consciencializar o cumprimento dos actos em Saúde, particularmente a partir dos 16 anos. Encaminhamento para abonos complementares e ajudas técnicas, Fazer cumprir os acordos (RSI), Incentivar o Rastreio do Cancro da mama e do útero, Incentivar a ida às consultas, Incentivar a ida às consultas com o companheiro, Vigilância para manter o actual nível de execução, Desmistificar as respostas dadas, Manter esta boa relação com visitas assíduas aos bairros, pelos técnicos, enfermeiros e médicos, Apresentar os recursos existentes e como fazer. Propostas interventivas / estratégias a adoptar: O CSA e a Equipa devem continuar a sistematizar e até aumentar as acções no terreno no âmbito da Prevenção e da Promoção da Saúde. As actividades devem continuar a serem programadas e calendarizadas com antecedência para aliar os escassos recursos disponíveis (Entre a Equipa e os representantes institucionais que fazem a ligação com as respectivas Instituições; Saúde - TSSS Vítor Gomes). O CSA e a Equipa devem continuar a fomentar a necessidade do cumprimento de todos os actos em saúde pré-determinados ou a determinar, promovendo estratégias conjuntas, nomeadamente monitorizando a eficácia dos acordos de inserção. Promover a saúde da mulher. - Cáritas Diocesana de Aveiro 102 O CSA, a Equipa e a Escola devem continuar a promover a SI e o PNV, através da informação para os direitos, incentivando a sua inscrição em médico de família no CSA, mantendo uma articulação transversal e permanente. Resultados a esperar: Continuar a baixar a mortalidade infantil e a morbilidade, Levar a taxa de execução de consultas e de tratamentos aos 95%., Manter a taxa de 100% no PNV e elevar aos 100% a cobertura na SI, Atingir os 60% no cumprimento do PNV nos indivíduos com idade > a 16 anos, Aumentar a eficácia da monitorização dos procedimentos, Monitorizar todos os acordos de Inserção do RSI, Atingir os 100% na cobertura do rastreio do Cancro da mama e do útero, Atingir os 90% na cobertura da saúde da mulher, Atingir os 85% na cobertura do Planeamento Familiar, Atingir os 90% dos indivíduos com idade > aos 16 anos em recorrerem ao médico de família pelo menos uma vez por ano, Manter o elevado grau de confiança e fiabilidade nos profissionais de saúde, Atingir os 95% de inscritos no CSA. - Cáritas Diocesana de Aveiro 103 Em reflexão final… palavras e significados a ter em conta: Assume um duplo efeito: por um lado a falta de competências escolares e profissionais, visíveis na taxa de analfabetismo, Exclusão Social insucesso escolar dos mais jovens, ausência de percursos formativos, etc, por outro lado, a discriminação racial e estigmatização da qual os elementos de etnia cigana ainda são alvo. Necessidade Intervenção Social de um trabalho articulado e com forte responsabilização dos vários agentes e sectores do meio. Agentes Sociais Promoção do diálogo cultural, do inter-conhecimento. Deste modo evitam-se processos de segregação (no meio escolar e Interculturalidade laboral, sobretudo) Um excluído é um dos muitos sinais de que o sistema não está bem. Políticas Activas Grande parte das fragilidades enunciadas neste documento, são transversais a várias camadas da população em geral. Porém, pela situação agravada de desigualdade e sobretudo de isolamento sócio-cultural, estas comunidades de etnia cigana sofrem, processos muito mais sintomáticos e visíveis aos outros (não ciganos). Activar medidas, será corrigir o que de menos bom ocorre no sistema Sobretudo das próprias comunidades em causa. A começar pela sua caracterização, a sua história, a sua revelação e Dinamismo - Implicação conhecimento, de modo a se transformarem simples destinatários de medidas, em agentes principais de Políticas Activas no seu processo de integração. - Cáritas Diocesana de Aveiro 104 Bibliografia - Cáritas Diocesana de Aveiro 105 Bibligrafia AIRES, Sérgio e outros (2006), Comunidades Ciganas: representações e dinâmicas de exclusão/integração, Lisboa: Ed. Alto Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas. ALFARO, A. G. e outros (1999), Ciganos e Degredos, Lisboa: Ed. Centre de Recherches Tsiganes e Secretaria Entreculturas. ALMEIDA, João Ferreira et al (1992), Exclusão Social – Factores e Tipos de Pobreza em Portugal. s.l.: Celta editora. ALMEIDA, João Ferreira; COSTA, (1990), Valores e Representações Sociais, Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian. ALMEIDA, Júlio “Agras contra Famílias Ciganas”. O Aveiro, 2/11/2000. 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Acampamento Aveiro, Julho de 2006 Localidade Freguesia N.º Questionário Alojamento Agregado Indivíduo N.º Elementos do Agregado Familiar 1 - Dados Pessoais 1.1.Identificação Nome Sexo Idade Data Nasc. Estado Civil Solteiro(a) União de Facto Casado(a) Separado(a) de Facto Divorciado(a) Viúvo(a) Bilhete de Identidade Cédula Pessoal Assento Arquivo Data de Emissão Naturalidade NIF (Contribuinte) 1.2. Escolaridade (assinalar com x) Não sabe ler nem escrever < 4 anos de escolaridade Completa 1.º ciclo (4.º ano) 2.º ciclo (6.º ano) 3.º ciclo (9.ºano) Ensino Secundário Ensino Superior Não sabe Não responde - Cáritas Diocesana de Aveiro 113 2.Educação / Aprendizagem ao longo da vida e Formação 2.1. Frequenta, actualmente, o sistema de educação / ensino? Sim Não (passar à questão 2.1.2.) Não responde (passar à questão 2.1.2.) 2.1.1. Se sim, indique o grau. (assinalar com x) regular recorrente 1.º ciclo 2.º ciclo 3.º ciclo Ensino Secundário Ensino Superior Não sabe (passar à questão 2.2.) Não responde 2.1.2. Se não, no passado, já alguma vez frequentou o sistema de educação / ensino? Sim Não (passar à questão 2.1.5.) Não responde (passar à questão 2.2.) 2.1.3. Se sim, indique com que idade deixou de estudar Não sabe Não responde 2.1.4. Nível académico (então) obtido (assinalar com x) regular recorrente < 4 anos de escolaridade Completa 1.º ciclo (4.º ano) 2.º ciclo (6.º ano) 3.º ciclo (9.ºano) Ensino Secundário Ensino Superior Não sabe Não responde - Cáritas Diocesana de Aveiro 114 2.1.5.Se não está a frequentar e nunca frequentou o sistema de educação / ensino, indique o(s) motivo(s) (assinalar com x) sim não Dificuldades financeiras Pouca utilidade da escola Mau acolhimento no meio escolar Falta de meios de transporte Más instalações da escola Deveres familiares / questões culturais Conclusão das habilitações pretendidas Idade < a 6 anos Outro motivo (indicar) Não sabe Não responde 2.2. Frequenta/frequentou a Educação Pré-Escolar? Sim Não Não sabe Não responde 2.3. Na sua opinião, a criança cigana enfrenta algumas dificuldades/constrangimentos na escola? Sim Não Não sabe (passar à questão 2.4.) 2.3.1. Se sim, indique as 3 (passar à questão 2.4.) Não responde (passar à questão 2.4.) principais dificuldades / constrangimentos que a criança cigana enfrenta na escola. ___________________________________________________________________________ ___________________________________________________________________________ ___________________________________________________________________________ 2.3.1.1.Perante tais dificuldades, tem alguma sugestão / proposta para melhorar a integração escolar da crianças cigana? Sim Não (passar à questão 2.4.) Não responde (passar à questão 2.4.) 2.3.1.2. Se sim, Indique as 3 principais sugestões. ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ 2.4 Já frequentou alguma acção de formação? - Cáritas Diocesana de Aveiro 115 Sim Não (passar ao grupo 3) Não sabe 2.4.1. Se sim, indique: Quantas (passar ao grupo 3) Não sabe Não responde Não responde (passar ao grupo 3) (passar ao grupo 3) 2.4.2. Nome da última acção e / ou área Duração da última acção 2.4.2.1. A última acção que frequentou, correspondeu às suas expectativas? Sim (passar ao grupo 3) Não Não responde (passar ao grupo 3) 2.4.2.1.1.Se não, qual(s) o (s) motivo(s)? ____________________________________________________________________________ ____________________________________________________________________________ ____________________________________________________________________________ 3-Habitação e Local de Residência 3.1. Tipo de Alojamento do Agregado Familiar (assinalar com x) Viatura ou caravana Tenda (materiais improvisados: lona, e outros) Barraca de Madeira Barraca de Alvenaria (construção inacabada) Construção Clássica Antiga Construção de Alvenaria (acabada – tipo anexo) 3.2. Regime de Propriedade do Alojamento do Agregado Familiar (assinalar com x) Propriedade do Agregado Regime de Arrendamento Cedida Ocupada pelo Agregado Outra situação (indicar) - Cáritas Diocesana de Aveiro 116 3.3. Estado de Legalidade do Alojamento do Agregado Familiar (assinalar com x) Construção legal Construção clandestina 3.4. Propriedade do Terreno (assinalar com x) O Próprio Agregado Outro Proprietário Privado Estado Município Desconhecido 3.5. Divisões do Alojamento (assinalar com x) 1 só divisão (passar à questão 3.6.) 2 /+ divisões 3.5.1. n.º quartos n.º salas 3.6. Quantas pessoas residem no Alojamento? 3.7. Quantos agregados residem no Alojamento? - Cáritas Diocesana de Aveiro 117 3.8. Infra – Estruturas do Alojamento (assinalar com x) sim não Electricidade Água canalizada Fossa Saneamento Cozinha interna WC interno Banheira / chuveiro interno 3.9. Como considera o estado de conservação do seu Alojamento? (assinalar com x) Muito Bom Aceitável Mau Muito Mau Bom No interior (por dentro) No exterior (por fora) 3.10. O seu Alojamento tem alguns problemas / carências em termos de habitabilidade? Sim Não (passar à questão 3.11.) Não sabe (passar à questão 3.11) Não responde (passar à questão 3.11) 3.10.1. Se sim, indique os 3 principais problemas / carências que detecta no seu Alojamento em termos de habitabilidade. _______________________________________________________________________ _______________________________________________________________________ _______________________________________________________________________ 3.11. Há quanto tempo reside neste bairro? ___________________________ 3.12. Para além do agregado, tem outros familiares a residir no bairro? Sim Não Não responde 3.13. Como considera o estado de conservação do bairro onde reside? - Cáritas Diocesana de Aveiro 118 Muito Bom Aceitável Mau Muito Mau Bom 3.14. No bairro onde reside, existem alguns problemas / carências)? Sim Não (passar à questão 3.15.) Não sabe (passar à questão 3.15.) Não responde (passar à questão 3.15.) 3.14.1.Se sim, indique as principais carências / problemas que sente no bairro onde reside. (assinalar com x) sim não Falta de segurança Pouca limpeza Ausência de rede de transportes públicos Distância em relação a equipamentos e serviços públicos Maus / poucos acessos Conflitos entre vizinhos Outra (indicar) Não sabe Não responde 3.15. Tem alguma sugestão / proposta para melhorar o estado de conservação do bairro/meio onde vive? Sim Não (passar à questão 3.16.) Não sabe (passar à questão 3.16.) Não responde (passar à questão 3.16.) 3.15.1. Se sim, indique as suas 3 principais sugestões. ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ 3.16. Gosta de viver no bairro onde reside? Sim Não (passar à questão 3.16.2.) Não responde (passar à questão 3.17.) 3.16.1. Se sim, quais as razões? _________________________________________________________________ _________________________________________________________________ _________________________________________________________________ 3.16.2. Se não, quais as razões? _________________________________________________________________ _________________________________________________________________ _________________________________________________________________ - Cáritas Diocesana de Aveiro 119 3.17. Se tivesse oportunidade de mudar de local de residência e de alojamento, aceitaria tal proposta? Sim Não (passar à questão 3.17.3.) Não sabe Não responde (passar ao grupo 4) (passar ao grupo 4) 3.17.1. Se sim, indique o tipo de habitação preferida. (assinalar com x) Casa unifamiliar Apartamento Outra (indicar) 3.17.2. Se sim, indique a localidade preferida. _________________________________ 3.17.3. Se não, indique os 3 principais motivos. ___________________________________________________________________________________________ ___________________________________________________________________________________________ ___________________________________________________________________________________________ 4-Percurso e Situação Profissional 4.1. Situação Face ao Emprego (assinalar com x) Empregado Empregado - Trabalhador por Conta Própria Profissão (passar à questão4.6.) Empregado - Trabalhador por Conta de Outrem Profissão (passar à questão4.6.) À procura do 1.º Emprego Desempregado Desempregado (<12 meses) Desempregado (+=12 meses) Idade <16 anos Outra situação (passar ao grupo 5) Estudante Reformado Nunca Trabalhou e Não Procura Emprego / Trabalho (passar à questão4.5.3.) Outra Situação (especificar) Não responde 4.2. Em caso de não estar empregado, tem algum trabalho? Sim Não (passar à questão 4.3.) 4.2.1.Se sim, indique qual: Não responde (passar à questão 4.3.) _________________________ 4.2.2. Esse trabalho é realizado com regularidade? Sim Não Não responde (passar à questão 4.3.) 4.2.3.Com que regularidade? ________________________________(passar à questão 4.6.) - Cáritas Diocesana de Aveiro 120 4.3. Em caso de não estar a trabalhar, qual(s) motivo(s) para tal situação? (assinalar com x) sim não Não trabalha por motivo de doença (passar à questão 4.5.) Não trabalha por motivos familiares (cuidados com o lar, crianças ou idosos) “ “ Não trabalha por motivos culturais “ “ “ Não reúne as habilitações / formação necessárias “ “ Discriminação racial “ “ “ Não procura emprego “ “ “ “ “ Outro motivo (Indicar) (passar à questão 4.5.) Foi despedido / dispensado Não (passar responde 4.5.) à questão 4.4. Se foi despedido / dispensado, qual (s) a (s) razão(s) (no seu entender) do despedimento? (assinalar com x) Fim de Contrato Falência da empresa / estabelecimento Diminuição de trabalho / redução do n.º de trabalhadores Incumprimento das obrigações laborais Não integração no local de trabalho Outra (indicar) Não sabe Não responde 4.5. Não estando a trabalhar, anda à procura de emprego / trabalho? Sim Não (passar à questão 4.5.3.) Não responde (passar à questão 4.7.) 4.5.1. Se sim, o que gostaria de exercer? ___________________________________________________________________ 4.5.2. O que não gostaria mesmo de fazer? (passar à questão 4.6.) ___________________________________________________________________ 4.5.3. Se não anda à procura de emprego/trabalho, qual(s) os motivos? (assinalar com x) - Cáritas Diocesana de Aveiro 121 sim não Por motivo de doença Por motivos familiares (cuidados com o lar, crianças ou idosos) Por motivos culturais Não reúne as habilitações / formação necessárias Discriminação racial Outro motivo (Indicar) Não responde 4.6. Se está a trabalhar, ou se já trabalhou, com que idade começou a trabalhar? 4.6.1. Em que sector / área começou a trabalhar? ______________________________________ 4.7. Na sua opinião, as comunidades ciganas enfrentam dificuldades ao nível da inserção no mercado de trabalho? Sim Não (passar ao grupo 5) Não sabe (passar ao grupo 5) Não responde (passar ao grupo 5) 4.7.1.Se sim, indique as 3 principais dificuldades. ___________________________________________________________________________ ___________________________________________________________________________ ___________________________________________________________________________ 4.7.2. Perante tais dificuldades, tem alguma sugestão para melhorar a inserção e o acesso das comunidades ciganas no mercado de trabalho? Sim Não (passar ao grupo 5) Não responde (passar ao grupo 5) 4.7.2.1. Se sim, indique as 3 principais sugestões. _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ 5-Condições de vida (situação sócio-económica) e Protecção Social (apoio social) 5.1. Tipo de rendimentos do agregado. (assinalar com x) sim não Salário / Trabalho (passar à questão 5.3.) Sub. desemprego “ “ “ Prest. velhice “ “ “ Prest. invalidez “ “ “ - Cáritas Diocesana de Aveiro 122 Abono familiar “ “ “ Apoio de IPSS’S “ “ “ Apoio de Particulares “ “ “ Outro(indicar) (passar à questão 5.3.) Rendimento Social de Inserção ▼ Não responde (passar à questão 5.2.3.) 5.2. Se o agregado familiar beneficia, actualmente, do Rendimento Social de inserção, quantos elementos estão a beneficiar? 5.2.1.Qual o nome do titular?_________________________________ 5.2.2. Quais as áreas do Acordo de Inserção do Agregado Familiar? (assinalar com x) Sim Não Educação Formação Profissional Emprego Habitação Saúde Acção Social Não sabe Não responde (passar à questão 5.3.) 5.2.3. Caso o seu agregado familiar não esteja, actualmente, a beneficiar do Rendimento Social de Inserção, já alguma vez beneficiou? Sim Não Não responde 5.3. Indique a origem do principal rendimento do agregado. (assinalar com x) Salário / Trabalho Sub. desemprego Prest. velhice Prest. invalidez - Cáritas Diocesana de Aveiro 123 Abono familiar Apoio de IPSS’S Apoio de Particulares Rendimento Social de Inserção Outro (indicar) Não responde 5.4. Como considera a situação sócio – económica do seu agregado? (assinalar com x) Muito Boa Boa Aceitável Má Muito Má 5.5. Quais as 3 principais razões para considerar tal situação sócio-económica? ___________________________________________________________________________________ ___________________________________________________________________________________ ___________________________________________________________________________________ 5.6. No caso de considerar a sua situação económica má ou muito má, sente-se capaz de tomar algumas medidas para melhorar a situação? Sim Não Não sabe (passar ao grupo 6) (passar ao grupo 6) Não responde (passar ao grupo 6) 5.6.1. Se sim, indique as 3 principais medidas que sente poderá fazer para melhorar? _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ 6-Justiça 6.1. Já foi ou está ser acompanhado por parte da equipa do Instituto de Reinserção Social de Aveiro? Sim Não (passar à questão 6.2.) Não responde (passar à questão 6.2) 6.1.1. Se sim, indique o ano de início de acompanhamento. _____________ - Cáritas Diocesana de Aveiro 124 6.2.A família já foi ou está a ser acompanhada pela Comissão de Protecção de Crianças e Jovens em Risco de Aveiro? Sim Não Não responde 7-Participação Cívica e Cidadania 7.1. É recenseado? Sim Não (passar à questão 7.2) Não responde 7.1.1.Se sim, costuma votar nas eleições? 7.2. Pertence a alguma associação? Sim 7.2.1. Se sim, qual? Sim Não Não (passar ao grupo 8) (passar à questão 7.2) Não responde Não responde (passar ao grupo 8) ________________________________ 8-Saúde e Doença 8.1. Está inscrito no Centro de Saúde? Sim Não (passar a questão 8.3) Não responde (passar a questão 8.3) 8.2.Se sim, indique: Centro de Saúde N.º Nome (de) médico família utente 8.3.Em caso de doença de um membro do agregado familiar, a que serviço recorrem em primeiro lugar? (assinalar com x) Hospital (urgências) Centro de saúde Médico particular Farmácia Curandeiro Outro local Não responde 8.4.Teve ou tem algum problema de saúde grave? Sim - Não (passar à questão 8.5.) Não responde (passar à questão 8.5.) Cáritas Diocesana de Aveiro 125 8.4.1. Se sim, indique qual(s)? * ____________________________ *___________________________________ *___________________________ 8.4.2.Essa (s) situação (s) teve ou tem seguimento no tratamento? Sim Não (passar à questão 8.5.) Não responde (passar à questão 8.5.) 8.4.2.1. Se sim, indique em que serviço: Centro de Saúde Hospital Outro (indicar) 8.5. Existe alguma situação de deficiência na família? Sim Não (passar à questão 8.6.) Não responde (passar à questão 8.6.) 8.5.1. Se sim, indique qual: Deficiência Física Deficiência Intelectual Ambas as deficiências 8.6.No caso particular, cumpre, actualmente, com as consultas dos serviços de saúde da sua área de residência? Sim Não (passar à questão 8.6.2.) Não responde (passar à questão 8.7) 8.6.1. Se sim, indique a área de acompanhamento (consulta). (assinalar com x) sim não Planeamento Familiar Rastreio do Cancro da Mama e do Colo do Útero Saúde Materna Saúde Infantil Plano Nacional de Vacinação Saúde do Adulto (médico de família) Estomatologia Oftalmologia Alcoologia Toxicodependência Outras (Indicar) Não sabe Não responde (passar à questão 8.7.) - Cáritas Diocesana de Aveiro 126 8.6.2. Se não cumpre, quais os motivos? (assinalar com x) sim não Falta de meio de transporte Falta de aviso / informação Desconhecimento dos serviços e das consultas Por achar não ser necessário Mau acolhimento por parte dos serviços Falta de médico Outros (indicar) Não responde 8.7. No agregado, há algum elemento que tenha (ou teve) tratamento de serviço de enfermagem domiciliário? Sim Não Não sabe Não responde 8.8. Como considera a sua relação com os profissionais dos serviços de saúde? (assinalar com x) Muito Boa 8.9. No Boa sistema / serviços Aceitável de saúde da sua área Má de Muito Má residência, detecta alguns problemas/ constrangimentos? Sim Não (passar à questão 8.10) Não sabe (passar à questão 8.10) Não responde (passar à questão 8.10) 8.9.1. Se sim, indique os 3 principais problemas que identifica. ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ 8.9.2.Tem alguma sugestão para superar essas dificuldades? Sim Não (passar à questão 8.10) Não sabe (passar à questão 8.10) Não responde (passar à questão 8.10) 8.9.2.1. Se sim, indique as 3 principais sugestões.. _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ - Cáritas Diocesana de Aveiro 127 8.10 Alguma vez teve um aborto? Sim Não Não sabe Não responde 8.10.1. Se sim, indique quantos? Campo de Observações: - Cáritas Diocesana de Aveiro 128 Anexo II – Inquérito por questionário aplicado ao indivíduo. - Cáritas Diocesana de Aveiro 129 Acampamento Localidade Freguesia N.º Questionário Alojamento Agregado Indivíduo N.º Elementos do Agregado Familiar 1 - Dados Pessoais 1.1.Identificação Nome Sexo Idade Data Nasc. Relação de Parentesco face ao inquirido(a) Esposa / companheira Marido / companheiro Filho(a) Neto (a) Irmão (a) Tio (a) Primo (a) Avô /avó Sobrinho (a) Nenhum parentesco Bilhete de Identidade Cédula Pessoal Assento Arquivo Data de Emissão Naturalidade NIF (Contribuinte) 1.2. Escolaridade Não sabe ler nem escrever < 4 anos de escolaridade Completa 1.º ciclo (4.º ano) 2.º ciclo (6.º ano) 3.º ciclo (9.ºano) Ensino Secundário Ensino Superior Não sabe Não responde - Cáritas Diocesana de Aveiro 130 2.Educação / Aprendizagem ao longo da vida e Formação 2.1. Frequenta, actualmente, o sistema de educação / ensino? Sim Não (passar à questão 2.1.2.) Não responde (passar à questão 2.1.2.) 2.1.1. Se sim, indique o grau. (assinalar com x) regular recorrente 1.º ciclo 2.º ciclo 3.º ciclo Ensino Secundário Ensino Superior Não sabe (passar à questão 2.2.) Não responde 2.1.2. Se não, no passado, já alguma vez frequentou o sistema de educação / ensino? Sim Não (passar à questão 2.1.5.) Não responde (passar à questão 2.2.) 2.1.3. Se sim, indique com que idade deixou de estudar Não sabe Não responde 2.1.4. Nível académico (então) obtido (assinalar com x) regular recorrente < 4 anos de escolaridade Completa 1.º ciclo (4.º ano) 2.º ciclo (6.º ano) 3.º ciclo (9.ºano) Ensino Secundário Ensino Superior Não sabe Não responde - Cáritas Diocesana de Aveiro 131 2.1.5.Se não está a frequentar e nunca frequentou o sistema de educação / ensino, indique o(s) motivo(s) (assinalar com x) sim não Dificuldades financeiras Pouca utilidade da escola Mau acolhimento no meio escolar Falta de meios de transporte Más instalações da escola Deveres familiares / questões culturais Conclusão das habilitações pretendidas Idade < a 6 anos Outro motivo (indicar) Não sabe Não responde 2.2. Frequenta/frequentou a Educação Pré-Escolar? Sim Não Não sabe Não responde 2.4 Já frequentou alguma acção de formação? Sim Não (passar ao grupo 4) Não sabe (passar ao grupo 4) 2.4.1. Se sim, indique: Quantas Não sabe Não responde (passar ao grupo 4) (passar ao grupo 4) Não responde (passar ao grupo 4) 2.4.2. Nome da última acção e / ou área Duração da última acção 2.4.2.1. A última acção que frequentou, correspondeu às suas expectativas? Sim (passar ao grupo 4) Não Não sabe (passar ao grupo 4) Não responde (passar ao grupo 4) 2.4.2.1.2.Se não, qual(s) o (s) motivo(s)? ____________________________________________________________________________ ____________________________________________________________________________ ____________________________________________________________________________ - Cáritas Diocesana de Aveiro 132 4-Percurso e Situação Profissional 4.1. Situação Face ao Emprego (assinalar com x) Empregado Empregado - Trabalhador por Conta Própria Profissão (passar à questão4.6.) Empregado - Trabalhador por Conta de Outrem Profissão (passar à questão4.6.) À procura do 1.º Emprego Desempregado Desempregado (<12 meses) Desempregado (+=12 meses) Idade <16 anos Outra situação (passar ao grupo 6) Estudante Reformado Nunca Trabalhou e Não Procura Emprego / Trabalho (passar à questão4.5.3) Outra Situação (especificar) Não responde 4.2. Em caso de não estar empregado, tem algum trabalho? Sim Não (passar à questão 4.3.) Não responde (passar à questão 4.3.) 4.2.1.Se sim, indique qual: _________________________ 4.2.2. Esse trabalho é realizado com regularidade? Sim Não Não responde (passar à questão 4.3.) 4.2.3.Com que regularidade? ________________________________(passar à questão 4.6.) 4.3. Em caso de não estar a trabalhar, qual(s) motivo(s) para tal situação? (assinalar com x) sim Não trabalha por motivo de doença não (passar à questão 4.5.) Não trabalha por motivos familiares (cuidados com o lar, crianças ou idosos) “ Não trabalha por motivos culturais “ “ “ Não reúne as habilitações / formação necessárias “ “ Discriminação racial “ “ “ Não procura emprego “ “ “ Outro motivo (Indicar) “ “ “ (passar à questão 4.5.) Foi despedido / dispensado Não (passar responde 4.5.) - à questão Cáritas Diocesana de Aveiro 133 4.4. Se foi despedido / dispensado, qual (s) a (s) razão(s) (no seu entender) do despedimento? (assinalar com x) Fim de Contrato Falência da empresa / estabelecimento Diminuição de trabalho / redução do n.º de trabalhadores Incumprimento das obrigações laborais Não integração no local de trabalho Outra (indicar) Não sabe Não responde 4.5. Não estando a trabalhar, anda à de procura emprego / trabalho? Sim Não (passar à questão 4.5.3.) Não responde (passar ao grupo 6) 4.5.1. Se sim, o que gostaria de exercer? ___________________________________________________________________ 4.5.2. O que não gostaria mesmo de fazer? (passar à questão 4.6.) _________________________________________________________________ 4.5.3. Se não, qual(s) os motivos? (assinalar com x) sim não Motivos de doença Motivos familiares (cuidados com o lar, crianças ou idosos) Motivos culturais Não reúne as habilitações / formação necessárias Discriminação racial Outro motivo (Indicar) Não responde 4.6. Se está a trabalhar, ou se já trabalhou, com que idade começou a trabalhar? 4.6.1. Em que sector / área começou a trabalhar? ___________________________ - Cáritas Diocesana de Aveiro 134 6-Justiça 6.1. Já foi ou está ser acompanhado por parte da Equipa do Instituto de Reinserção Social de Aveiro? Sim Não (passar ao grupo 7.) Não responde (passar ao grupo 7) 6.1.2. Se sim, indique o ano de início de acompanhamento. 7-Participação Cívica e Cidadania 7.1. É recenseado? Sim Não (passar à questão 7.2) Não responde 7.1.2.Se sim, costuma votar nas eleições? 7.2. Pertence a alguma associação? Sim 7.2.1. Se sim, qual? Sim Não (passar à questão 7.2) Não responde Nã o (passar ao grupo 8) Não responde (passar ao grupo 8 ____________________________ 8-Saúde e Doença 8.1. Está inscrito no Centro de Saúde? Sim Não (passar a questão 8.4) Não responde (passar a questão 8.4) 8.2.Se sim, indique: Centro de Saúde N.º (de) Nome médico família utente 8.4.Teve ou tem algum problema de saúde grave? Sim (passar à questão 8.6.) Não Não responde (passar a questão 8.6) 8.4.1. Se sim, indique qual(s)? * ____________________________ *___________________________________ *___________________________ 8.4.2.Essa (s) situação (s) teve ou tem seguimento no tratamento? Sim - Não (passar à questão 8.6.) Não responde (passar a questão 8.6) Cáritas Diocesana de Aveiro 135 8.4.2.1. Se sim, indique em que serviço: Centro de Saúde Hospital Outro (indicar) 8.6.No caso particular, cumpre, actualmente, com as consultas dos serviços de saúde da sua área de residência? Sim Não (passar à questão 8.6.2.) Não responde (passar a questão 8.10) 8.6.1. Se sim, indique a área de acompanhamento (consulta). (assinalar com x) sim não Planeamento Familiar Rastreio do Cancro da Mama e do Colo do Útero Saúde Materna Saúde Infantil Plano Nacional de Vacinação Saúde do Adulto (médico de família) Estomatologia Oftalmologia Alcoologia Toxicodependência Outras (Indicar) Não sabe Não responde (passar à questão 8.10.) 8.6.2. Se não cumpre, quais os motivos? (assinalar com x) sim não Falta de meio de transporte Falta de aviso / informação Desconhecimento dos serviços e das consultas Por achar não ser necessário Mau acolhimento por parte dos serviços Falta de médico Outros (indicar) Não responde - Cáritas Diocesana de Aveiro 136 8.10 Alguma vez teve um aborto? Sim Não Não sabe Não responde 8.10.1. Se sim, indique quantos? Campo de Observações: Data de Aplicação: ___________________ - O inquiridor ____________________ Cáritas Diocesana de Aveiro 137 Anexo III – Guião de Entrevista. - Cáritas Diocesana de Aveiro 138 1 - Identidade e Cultura da Comunidades Ciganas O que é ser cigano... O que quer dizer Cigano? A Cultura cigana é diferente da cultura não cigana? Em que aspectos é que se distingue da não cigana? Fale um pouco sobre a cultura cigana... Aspectos positivos e negativos da cultura cigana... As comunidades ciganas têm sofrido alterações ao longo do tempo? Se sim, quais e porquê? Acha que existem diferenças entre as comunidades ciganas? Se existem, porque é que existem? Quais são essas diferenças? Quais as principais dificuldades que as comunidades ciganas enfrentam actualmente? 2 - Redes de relacionamento e sociabilidade Como se relaciona com os restantes membros da comunidade cigana? Relaciona-se com outras comunidades ciganas do Conselho de Aveiro? Considera-se integrado na comunidade cigana? Quais são os elementos mais importantes para que um membro da comunidade cigana esteja integrado nessa mesma comunidade? Quais são os actos ou acções que poderão levar á expulsão de um elemento cigano da sua comunidade? 3 - Relação com a sociedade envolvente Relaciona-se com os não ciganos? Se sim, em que situações? Se não, porquê? Como considera a relação das comunidades ciganas com a comunidade em geral? Como considera que a sociedade em geral vê as comunidades ciganas? Porquê? Na sua opinião, que sugestões apresenta para diminuir as práticas de discriminação de que as comunidades ciganas são alvo? De que forma se torna possível conhecer melhor as comunidades ciganas? Sugestões? O que é preciso fazer? 4 - A Escola e as Comunidades Ciganas Que papel a escola assume no seio das comunidades ciganas? Pensa que a escola poderá ser um factor importante para o futuro das crianças ciganas? Como caracteriza a relação com a escola? Principais problemas? Porquê? Que sugestões apresenta face aos problemas apresentados? - Cáritas Diocesana de Aveiro 139 Quais as principais razões que levam ao abandono escolar e ao forte absentismo das crianças ciganas (rapazes? raparigas?) 5 - O mercado de trabalho e as Comunidades Ciganas Como subsistem a maioria das comunidades ciganas? Quais os principais problemas que as comunidades ciganas enfrentam na inserção do mercado de trabalho? Porquê? Sugestões para resolver esses problemas? 6 - A Saúde e as Comunidades Ciganas Como é que tem sido as suas experiências com os profissionais de saúde? Enfrenta algumas dificuldades, quando acede aos diversos serviços de saúde? - Numa urgência – como resolvem a situação? Que sugestões apresenta? Mulher e Planeamento Familiar - nº de filhos, - dimensão das famílias ciganas, - Casais jovens, autonomização do casal, idade para ter o primeiro filho, - acompanhamento na gravidez - As comunidades ciganas cuidam da sua saúde? Fazem a prevenção (vacinação, cuidados de higiene, consultas de maternidade? Saúde infantil?) - Consumo de drogas – toxicodependência - Cáritas Diocesana de Aveiro 140 Anexo IV – Grelha (considerações finais) - Cáritas Diocesana de Aveiro 141 Senda Gitana – Retrato Social da Comunidade Cigana no Concelho de Aveiro Principais Objectivos: - Caracterizar a população de etnia cigana no concelho de Aveiro, - Facultar junto da comunidade em geral, com especial destaque da entidades locais, a informação necessária à reflexão sobre a necessidade urgente em enfrentar com a comunidade cigana, as principais fragilidades que a afectam na sua integração no meio social, - Acelerar a promoção de pistas estratégicas de inserção junto e com a comunidade cigana, pelas principais áreas de inclusão social. Considerações finais – propostas de intervenção (pistas de intervenção no concelho de Aveiro, por área de estudo) Entidade_________________________________________ Área de estudo Principais problemas / necessidades diagnosticadas Prioridades de intervenção Propostas interventivas / estratégias a adoptar Resultados a esperar Condições de vida (situação sócioeconómica) e Protecção Social (apoio social) Habitação e redes de sociabilidade Escolarização Formação Percurso e situação profissional Saúde e doença Justiça Participação cívica e cidadania - Cáritas Diocesana de Aveiro 142