PRODUÇÃO DE ANIMAÇÕES IRLANDESAS DE
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PRODUÇÃO DE ANIMAÇÕES IRLANDESAS DE
PRODUÇÃO DE ANIMAÇÕES IRLANDESAS DE TOMM MOORE Larissa Raduam Junqueira1 Resumo: The Secret of Kells e The Song of the Sea são duas animações produzidas pelo estúdio independente irlandês Cartoon Saloon, dirigidos por Tomm Moore. Ambas foram indicadas ao Oscar de melhor animação, mas perderam respectivamente para Up e Big Hero 6 - ambas grandes produções da Walt Disney Company. Comparando os filmes de Tomm Moore, as histórias se diferem muito uma da outra no enredo e ideia original, contudo apresentam características parecidas na questão de formas, cores e iluminação. Esta pesquisa se destina a descrever o processo de como surgiu a ideia de produzir filmes que abordassem uma temática diferente, como a cultura celta, e como as formas, cores e iluminação foram utilizados em The Secret of Kells e The Song of the Sea. Questionando o motivo de ambas as animações apresentarem formas mais circulares, pretende-se analisar se elas foram utilizadas para passar uma sensação de segurança enquanto as formas mais retas seriam para mostrar o “perigo”, assim como entender o que levou o diretor a criar tais roteiros e se ele teve influência de animações de outros países para isso. Para atingir os objetivos serão realizadas pesquisas bibliográficas e entrevista junto ao estúdio Cartoon Saloon e ao produtor de arte Adrien Merigeau. Palavras-chave: animação 2D, Irlanda, Cartoon Saloon, Tomm Moore. Abstract: The Secret of Kells and The Song of the Sea are two animations produced by the independent Irish studio Cartoon Saloon, directed by Tomm Moore. Both were nominated for Academy Award for Best Animated Feature, but lost respectively for Up and Big Hero 6 - both big productions of Walt Disney Company. Comparing Tomm Moore's films, the stories differ a lot from each other in the plot and original idea, but show similar characteristics in the matter of shapes, colors and lighting. This research aims to understand the methods of production of animations, outside the American circuit, with the main objective to describe the creation and production processes involved in the Cartoon Saloon’s animation, The Secret of Kells and The Song of the Sea, showing how did the idea of producing films that addressed a different theme emerged, such as the Irish culture, and how the shapes, colors and lighting were used. Questioning why both films present more circular shapes, we intend to analyze if they were used to introduce an idea of security as the most geometric shapes would be to show the "danger", as well as understand what led the director to create such scripts and if he had influence by animations from other countries to it. To achieve the 1 Acadêmica da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” - Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação - UNESP/FAAC. [email protected] 103 objectives will be conducted literature searches and interviews with the studio Cartoon Saloon and producer of art Adrien Merigeau. Keywords: 2D animation, Ireland, Cartoon Saloon, Tomm Moore. 1. Cartoon Saloon – estúdio e produção Foi em 1999 que Tomm Moore juntamente com Paul Young e Nora Twomey fundaram o Cartoon Saloon, um estúdio irlandês independente de animação, com sede na cidade de Kilkenny. Tomm Moore, nascido em 07 de janeiro de 1977, estudou animação clássica no colégio de ensino superior Ballyfermot College of Further Education e já atuou como diretor, diretor de arte e animador em projetos como propagandas, séries de TV e um grande número de pequenos projetos de filmes, explorando as possibilidades do design 2D e utilizando uma mescla de técnicas de desenho à mão com traços sutis de CGI para trazer seus trabalhos à vida, estilo distinto que caracterizou a empresa Cartoon Saloon mundialmente. The Secret of Kells é o primeiro longa-metragem animado de Moore, que teve estréia em 08 de fevereiro de 2009, no Festival Internacional de Berlim, ganhando oito prêmios no total. Foi só depois de cinco anos que seu segundo longa foi completado, The Song of the Sea, estreado no dia 6 de setembro de 2014, no Festival Internacional de Filmes de Toronto, recebendo um lançamento limitado nos cinemas da América do Norte em 19 de dezembro do mesmo ano - também sendo aclamado pela crítica - e só em 10 de julho de 2015 lançado oficialmente na Irlanda. The Secret of Kells foi nomeado ao oscar de melhor filme de animação em 2010 e The Song of the Sea em 2015, contudo ambos perderam, respectivamente, para Up e Big Hero 6. 2. Cultura Celta - animação A necessidade de criar um filme baseado na cultura celta já estava presente desde o início da carreira de Tomm, que começou a desenvolver The Secret of Kells em 1999, inspirado por The Thief and the Cobbler, uma produção do animador canadense Richard Williams, baseada na arte persa, que nunca foi 104 finalizada, Mulan, Samurai Jack e pelas obras de Hayao Miyazaki. O objetivo era fazer algo semelhante ao do Studio Ghibli, mas com arte irlandesa, onde a mitologia seria introduzida de uma maneira acessível a todos. Tanto The Secret of Kells quanto The Song of the Sea incluem vestígios do cristianismo combinado ao paganismo em seus enredos. A história de seu primeiro longa é baseada nas iluminuras coloridas da famosa bíblia medieval, o Livro de Kells, que é considerado por muitos especialistas como um dos mais importantes vestígios da arte religiosa medieval em função da sua técnica de acabamento, exposto permanentemente na biblioteca do Trinity College de Dublin. Redigido em letras maiúsculas com um estilo tipográfico insular, o Livro de Kells possui tintas e desenhos de várias partes do mundo, oportunidade para que a equipe criasse personagens representando cada uma das influências. Assim, os únicos amigos de Brendan - personagem principal - no ínicio da história são monges vindos da África, Itália e China. As cores preto, vermelho, violeta e amarelo, com prevalência desta última, foram utilizados durante a animação com base nas tintas das iluminuras. Há duas paletas de cores no filme: a primeira que é colorida e bastante detalhada imitando a arte medieval, e a segunda, que consiste em basicamente vermelho, preto e branco, que é utilizada sempre que os Vikings, vilões da trama, entram em cena, “sugando” todas as outras cores. A intenção dos produtores era passar a imagem de como Brendan imaginava os Vikings. Nos shapes em que esses inimigos aparecem, a câmera se inclina e a animação se torna algo mais 3D do que 2D, maneira sutil de usar a linguagem visual para fazer com que o espectador sinta um desconforto e uma ideia de perigo. Aisling, personagem feminina do filme, é o resumo do mundo fantástico e seu nome significa “sonho”, representando o espírito da Irlanda. No começo, Aisling e Brendan fariam um par romântico, mas então o roteiro foi reescrito, fazendo com que ela tivesse um caráter mais parecido com o de uma irmã travessa. Na cena onde Brendan passa pelo seu processo de crescimento foram utilizados, assim como na arte antiga, três painéis para indicar a passagem do 105 tempo, considerada uma versão medieval da sequência de Hakuna Matata, do filme O Rei Leão. Já a história do seu segundo longa-metragem nasceu no inicio da produção de The Secret of Kells. Segundo Moore, em uma de suas entrevistas, ele estava na Costa Oeste da Irlanda, quando seu filho avistou algumas focas cinzentas que haviam sido mortas por pescadores locais. Relatos da época sugerem que o abate aconteceu porque os pescadores culpavam os animais pela escassez de peixe. A crença no folclore na região era bem acentuado e as pessoas acreditavam nas criaturas míticas chamadas selkies - seres que vivem como focas no mar, mas possuem a capacidade de se tornarem humanos ao retirar suas peles de animal (lenda semelhante a do boto no Brasil), ou ainda, as almas das pessoas que foram perdidas no mar. Logo, a matança não foi bem vista pelos moradores, que alegaram que no passado esse tipo de desrespeito não aconteceria. Assim, o conto foi se formando na mente de Tomm, baseado nos mitos e lendas locais que eram passados de pai para filho e que estavam desaparecendo da cultura da Irlanda, e, depois de cinco anos de produção, a animação finalmente ganhou vida, com o suporte de cinco outros países (Reino Unido, Dinamarca, Luxemburgo, França e Bélgica), co-produtores do estúdio. Assim que a elaboração do segundo longa começou, Moore levou sua equipe de artistas para uma expedição ao redor da península de Dingle, que já havia inspirado o diretor décadas atrás por causa de suas colinas dramáticas e rochas escarpadas projetadas para fora do mar, para que eles fossem alimentados pelo sabor da paisagem. O drama em The Song of the Sea se baseia na vida de Ben que, depois de perder a mãe, tem dificuldade em aceitar sua irmã mais nova, Saoirse, além do pai ausente e da avó viciada em remédios. Assim eles embarcam numa jornada envolvendo diversos personagens folclóricos. A paleta de cores é menos vibrante do que a do The Secret of Kells, passando de marrom, usado para as cidades, verde, para as florestas, o branco e o tom azulado do mar que também são empregados nos shapes em que os personagens mágicos aparecem. Cores mais quentes e o cinza são usadas durante as cenas mais tensas, como, por exemplo, em todo o cenário da casa de Macha, a bruxa-coruja supostamente 106 má. O amarelo e dourado surgem como a representação da libertação de todos os espíritos no final do filme, que se levantam para voltar ao mundo das fadas. Os desenhos começam no papel, com o fundo em aquarela, parecendo pinturas em movimento. Assim, como cada quadro foi pintado à mão, a equipe de animadores não teve nenhum limite sobre o número de camadas de cada frame ou sobre os detalhes que pudessem ser inseridos neles. As músicas também foram alvo de elogios, considerada uma trilha sonora revolucionária, apresentando músicas lentas e românticas tocadas por instrumentos típicos, seguindo a tradição celta. A trilha foi composta pelo músico francês Bruno Coulais e a banda folk irlandesa Kila, que também trabalharam em The Secret of Kells. Ambas as animações apresentam formas bem geométricas realçando o clima infantil, mesmo abordando temas mais profundos e adultos. Os personagens possuem silhuetas bem simples para criar composições mais limpas, o que ajuda na hora de animar, mas bem rico na parte de texturização. A forma que mais se repete durante os filmes é o círculo, mais especificamente círculos concêntricos, que passam uma ideia mais orgânica de conforto e segurança, assim como a sensação de magia e mistério. Como contraste, formas mais retas, pontiagudas e triangulares sugerem o perigo e a hostilidade. Figura 1 – Brendan e Aisling na floresta em The Secret of Kells. Disponível em <https://sonataaosmeusfantasmas.files.wordpress.com/2014/09/kells.jpg> 107 Figura 2 – Cellach olhando para a muralha através da janela do monastério em The Secret of Kells. Disponível em: <https://sonataaosmeusfantasmas.files.wordpress.com/2014/09/kells.jpg> Figura 3 - Ataque viking em The Secret of Kells. Disponível <http://www.kino.no/incoming/article1125276.ece/binary/The%20Secret> em Figura 4 - Passagem do tempo onde Brendan cresce em The Secret of Kells. Disponível em: https://curlewriver.files.wordpress.com/2013/03/kells-triptych.jpg 108 Figura 5 - Cena final representando uma página do Livro de Kells em The Secret of Kells. Disponível em <https://www.youtube.com/watch?v=2NqV6501YMw> Figura 6 - Ben encontra o Grande Seanachai em The Song of the Sea. Disponível em <http://3.bp.blogspot.com/-FVHITAZanXE/VS1UsUBLniI/AAAAAAAAUbo/> 109 Figura 7 – Simples silhuetas de Ben e sua mãe Bronagh em The Song of the Sea. Disponível em <https://www.youtube.com/watch?v=thT6hyWoFLE> adaptado por “Larissa Raduam” Figura 8 - Formas circulares ao longo das cenas em The Song of the Sea. Disponível em <https://www.youtube.com/watch?v=thT6hyWoFLE> adaptado por “Larissa Raduam” 110 Figura 9 - Formas e linhas retas ao longo das cenas em The Song of the Sea. Disponível em <https://www.youtube.com/watch?v=thT6hyWoFLE> adaptado por “Larissa Raduam” Figura 10 - Cores douradas durante a cena final de libertação dos espíritos mágicos em The Song of the Sea. Disponível em <http://4.bp.blogspot.com/t5Ce97DRyJ4/VRPix76A-nI/AAAAAAAAEco/> e <http://31.media.tumblr.com/c9be90b2a097f20926dd8b352ab170d6/tumblr_nm4aab8 C0Y1t11ar7o3_540.gif> adaptado por “Larissa Raduam” 111 2. Quadros Quadro 1 – Premiações do longa-metragem The Secret of Kells. ANO PRÊMIO 2008 Directors Finders Award no Directors Finders Series na Irlanda. 2009 Audience Award no Annecy International Animated Film Festival. 2009 Audience Award no Edinburgh International Film Festival. 2009 Roy E. Disney Award no Seattle's 2D Or Not 2D Film Festival. 2009 Grand Prize no Seoul International Cartoon and Animation Festival. 2009 Audience Award no 9˚ Kecskemét Animation Film Festival. 2010 Best Animation Award no 7˚ Irish Film and Television Awards. 2010 European Animated Feature Award no British Animation Awards. Fonte: disponível na internet por http <https://en.wikipedia.org/wiki/The_Secret_of_Kells> Acesso em 19 de set. 2015 em Quadro 2 – Premiações do longa-metragem The Song of the Sea. ANO PRÊMIO 2014 Prix Spécial du Jury no Festival Internacional des Vois du Cinéma d’Animation. 2015 Best Animated or Mixed Media Feature no 19˚ Satellite Awards. 2015 Best Film no 12˚ Irish Film & Television Awards. Fonte: disponível na internet por http em <https://en.wikipedia.org/wiki/Song_of_the_Sea_(2014_film)> Acesso em 19 de set. 2015 3. Considerações Finais Percebe-se que o estúdio Cartoon Saloon tem como objetivo alcançar um público mundial mesmo apresentando uma cultura não tão popular e, apesar dos dois filmes abordarem temas folclóricos irlandeses, eles se diferem em questão de cores, roteiro e inspiração, contudo se assemelham nas formas e 112 traços - as curvas sendo uma representação da segurança e as retas de algo mais ofensivo. Ambas fogem do estilo comum de animação, o que fica marcado como característica própria de Tomm Moore, que prefere desenhos feitos à mão e texturas em aquarela, usando pouca computação gráfica, silhuetas simples e formas orgânicas. REFERÊNCIAS Song of the Sea. Disponível na internet por http em: <http://songoftheseamovie.blogspot.co.uk/> Acesso em 21 de jun. 2015 Cartoon Saloon Oficial Site. Disponível na internet por http <http://www.cartoonsaloon.ie/2009/06/feature-films-song-of-the-sea/> em: Acesso em 22 de jun. 2015 DESOWITZ, BILL. Immersed in Movies: Tomm Moore talks “Song of the Sea” and first look new teaser. Disponível na internet por http em: <http://blogs.indiewire.com/animationscoop/tomm-moore-talks-song-of-the-sea> Acesso em 23 de jun. 2015 HOPEWELL, JOHN. Moore’s ‘Kells’ follow-up framed as Euro co-prod. Disponível na internet por http em: <http://variety.com/2011/biz/news/cartoonsaloon-partners-on-song-1118033711/> Acesso em 18 de set. 2015 LAMBIE, RYAN. Song of the Sea: how an animated treat was made. Disponível na internet por http em: < http://www.denofgeek.com/movies/song-ofthe-sea/36038/song-of-the-sea-how-an-animated-treat-was-made> Acesso em 18 de set. 2015 LAMBIE, RYAN. Tomm Moore and Paul Young: making Song of the Sea. Disponível na internet por http em: <http://www.denofgeek.com/movies/song-ofthe-sea/36039/tomm-moore-and-paul-young-making-song-of-the-sea> Acesso em 18 de set. 2015 113 LEE, LAVALLE. Interview with Song of the Sea Director Tomm Moore. 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