Revext n1, vol 1, novembro de 2015
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Revext n1, vol 1, novembro de 2015
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE ALAGOAS - PRÓ-REITORIA DE EXTENSÃO - PROEXT UNIVERSIDADE ESTADUAL DE ALAGOAS PRÓ-REITORIA DE EXTENSÃO - PROEXT REVEXT ISSN 2447-2751 REVISTA DE EXTENSÃO DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE ALAGOAS – UNEAL ARAPIRACA/Nº 01/NOVEMBRO/2015 Universidade Estadual de Alagoas – Equipe Gestora Profº. Me. Jairo José Campos da Costa Reitor Profº. Me. Clébio Correia de Araújo Vice-Reitor Prof. Dr. Odilon Máximo Maximo de Moraes Chefe de Gabinete Prof. Me. Wellyngton Chaves Monteiro da Silva Pró-Reitor de Desenvolvimento Humano Profª. Me. Maria Helena de Melo Aragão Pró-Reitora de Graduação Prof. Dr. Cristiano Cezar da Silva Pró-Reitor de Pesquisa e Pós Graduação Prof. Me. Reinaldo Sousa Pró-Reitor de Extensão Editor Responsável Prof. Me. Reinaldo Sousa Contribuiu com este número o seguinte Conselho Editorial Prof. Dr. Odilon Máximo de Morais - Universidade Estadual de Alagoas Prof. Me. Antonio Marcos Pontes De Moura - Universidade Estadual de Alagoas Prof. Dr. Antonio Alfredo Teles de Carvalho - Universidade Federal de Alagoas Prof. Me. Gladyson Stelio Brito Pereira - Universidade Estadual de Alagoas Prof. Dra. Maria Francisca Oliveira Santos - Universidade Estadual de Alagoas Prof. Me. Wellyngton Chaves Monteiro da Silva - Universidade Estadual de Alagoas Prof. Me. Ricardo Jorge de Sousa Cavalcanti - Instituto Federal de Alagoas Profa. Me. Lucicleide da Silva - Universidade Estadual de Alagoas Prof. Me. Lenivaldo Manoel de Melo - Universidade Estadual de Alagoas Prof. Dr. Jose Lidemberg de Sousa Lopes - Universidade Estadual de Alagoas Profa. Me. Maria Helena de Melo Aragão - Universidade Estadual de Alagoas Prof. Me. Cosme Rogério Ferreira - Instituto Federal de Alagoas Prof. Me. Eudes da Silva Santos - Universidade Federal Rural de Pernambuco Profª. Me. Maria do Socorro B Macêdo - Universidade Estadual de Alagoas Prof. Me. Luziano Pereira Mendes de Lima - Universidade Estadual de Alagoas Profª. Me. Elizete Santos Balbino - Universidade Estadual de Alagoas Prof. Me. Rafael Matias de Moura - Universidade Estadual de Alagoas Profª. Drª Jane Barbosa - Universidade Estadual de Alagoas Trabalhos Técnicos Ana Maria da Silva Santos Capa Desta Edição Cosme Rogério Ferreira Página APRESENTAÇÃO ....................................................................................................................................................................................4 1 - O ENSINO DA EAD NAS DISCIPLINAS DE EXATAS: DISPOSITIVOS DE INSERÇÃO PARA AUMENTAR A INTERAÇÃO NO MOODLE..................................................................................................................................................................................................6 ALLAN GOMES DOS SANTOS, ...................................................................................................................................................................6 LUÍS PAULO LEOPOLDO MERCADO..........................................................................................................................................................6 2 - OS FILAMENTOS COESIVOS PARA A CONSTRUÇÃO DO SENTIDO NO GÊNERO DISSERTAÇÃO .......................................17 ADRIANA NUNES PAULINO ...................................................................................................................................................................17 DAIANE DOS SANTOS R OSENDOCARNAHÚBA .........................................................................................................................................17 JANYELLEN MARTINS SANTOS ..............................................................................................................................................................17 MARIA FRANCISCA OLIVEIRA SANTOS ...................................................................................................................................................17 3 - O GÊNERO TEXTUAL TORPEDO COMO PRÁTICA LETRADA NO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA NA EDUCAÇÃO BÁSICA ..................................................................................................................................................................................................30 HELENA VIEIRA DE ANDRADE ..............................................................................................................................................................30 4 - EDUCAÇÃO E LINGUAGEM: UMA INTERLOCUÇÃO POSSÍVEL ENTRE O LÉXICO TOPONÍMICO E O DICIONÁRIO ESCOLAR ENCICLOPÉDICO ................................................................................................................................................................40 PEDRO ANTONIO G OMES DE MELO .......................................................................................................................................................40 5 - A EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA COMO REFERENCIAL PARA A FORMAÇÃO DOCENTE: A EXPERIÊNCIA DO PROGRAMA PRÉ – UNEAL DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE ALAGOAS .................................................................................53 MARIA JOSÉ HOULY ALMEIDA DE OLIVEIRA ...........................................................................................................................................53 ANE LÉCIA DA SILVA AMORIM ..............................................................................................................................................................53 JULIENE S OARES DA SILVA....................................................................................................................................................................53 6 - QUILOMBAGEM E NEGRITUDE EM PALMARES – PE: OFICINAS SOBRE A HISTÓRIA DO QUILOMBO E ORGULHO NEGRO NA ESCOLA CAIC ....................................................................................................................................................................69 LWDMILA CONSTANT PACHECO ............................................................................................................................................................69 ELICÁCIA MARIA PEREIRA ....................................................................................................................................................................69 7 - PROJETO UNEAL NAS COMUNIDADES: UMA PARCERIA COM A FAMMA EM AÇÕES DE COMBATE À VULNERABILIDADE SOCIAL ..............................................................................................................................................................84 MARIA DO CARMO DUARTE DE FREITAS ................................................................................................................................................84 JAKELINE RIBEIRO SOUZA VIEIRA .........................................................................................................................................................84 LUÂNESSON CASTRO DE MELO .............................................................................................................................................................84 8 - O TEXTO LITERÁRIO PARA ALÉM DO PAPEL: CORPO, VOZ E INTERPRETAÇÃO UM RELATO DE EXPERIÊNCIA NA ESCOLA MUNICIPAL MÁRIO SOARES PALMEIRA EM SÃO MIGUEL DOS CAMPOS ...................................................................97 VITOR TENÓRIO OLIVEIRA ...................................................................................................................................................................97 9 - A TRANSDISCIPLINARIDADE E O INTELECTUAL ORGÂNICO NA SISTEMATIZAÇÃO DOS SABERES PARA EDUCAÇÃO DO CAMPO A PARTIR DA HORTA ESCOLAR .................................................................................................................................110 MARIA APARECIDA VIEIRA DE MELO .......................................................................................................................................................110 PAULO DE JESUS ..................................................................................................................................................................................110 10 - ÍNDIOS JIRIPANKÓ: TERRITORIALIDADE E PRÁTICAS RELIGIOSAS ..............................................................................................126 ANDERSON BARBOSA DA SILVA ..............................................................................................................................................................126 11 - PRÁTICAS INOVADORAS NO ENSINO DA MATEMÁTICA JOGOS E OFICINAS PEDAGÓGICAS....................................................147 AMANDA SILVA SANTOS .......................................................................................................................................................................147 LAÍS V ANESSA SILVA SANTANA ...............................................................................................................................................................147 12 - UTILIZANDO O TANGRAM PARA ENSINAR O CONCEITO DE FRAÇÃO: RELATO DE UMA EXPERIÊNCIA REALIZADA NO PIBID/UNEAL ........................................................................................................................................................................................158 AUDÁLIO LÚCIO WANDERLEI NETO.........................................................................................................................................................158 JOÃO FERREIRA DA SILVA NETO .............................................................................................................................................................158 LAURO LOPES PEREIRA NETO .................................................................................................................................................................158 13 - ECONOMIA SOLIDÁRIA: MAPEAMENTO E CARACTERIZAÇÃO DE EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA NO MUNICÍPIO DE ARAPIRACA ......................................................................................................................................................165 DIEGO LEONARDO DAVI SANTOS SILVA ...............................................................................................................................................165 PÂNMELA ALBUQUERQUE DOS SANTOS ...............................................................................................................................................165 JOSEFA SILANIA PINHEIRO DE FARIAS .................................................................................................................................................165 ORIENTADOR (A): MS. ACURCIO CASTELO DAVID ................................................................................................................................165 14 - FORMAÇÃO DOCENTE COM ÊNFASE NA ALFABETIZAÇÃOE INCLUSÃO DE CRIANÇAS COM AUTISMO: DIALOGO ENTRE ESCOLA, UNIVERSIDADE E TRATE ........................................................................................................................................................179 ELIZETE SANTOS BALBINO .....................................................................................................................................................................179 AMANDA MAGALHÃESB ARBOSA ............................................................................................................................................................179 JAQUELINE DA CRUZ Z ACARIAS ...............................................................................................................................................................179 NORMAS PARA SUBMISSÃO DE ARTIGOS.....................................................................................................................................199 3 SUMÁRIO APRESENTAÇÃO A REVEXT, Revista de Extensão da Universidade Estadual de Alagoas, se propõe ser uma ponte entre a universidade e a comunidade em geral. Sua meta, portanto, é a divulgação das principais ações de extensão universitária. Este primeiro número representa o primeiro passo, de uma série de outros, que pretendemos dar rumo à qualificação da nossa revista. O corpo editorial, composto por professores de reconhecida contribuição acadêmica na nossa instituição está comprometido a colaborar com esta meta. A organização da revista está sob a responsabilidade da Pró-Reitoria de Extensão, nesse momento representada pelo seu Pró-Reitor Reinaldo Sousa. Acreditamos no potencial dos nossos professores, técnicos e alunos no sentido de tornar nossa produção acadêmica mais sólida, consistente e a proposta da revista é contribuir no que for preciso para que isso aconteça. É preciso dar voz à academia e permitir que ela seja ouvida no além-muro de nossas IES. É preciso, também, divulgar as ações de extensão que, há muito, têm sido relegadas a um segundo plano em nossas academias. No mais queremos agradecer à equipe gestora da nossa IES que não mediu esforços no sentido de tornar esse sonho possível e que nesse momento está representada pelo Reitor Jairo Campos, seu Vice-Reitor Clébio Araújo, o Chefe de Gabinete Odilon Máximo e seus Pró-Reitores Reinaldo Sousa, Maria Helena de Melo Aragão, Sara Jane Cerqueira Bezerra, Cristiano Cezar da Silva, Rejane Viana Alves da Silva, além do seu Assessor de Governança e Transparência Wellyngton Chaves Monteiro da Silva e de Comunicação Carlos Alberto Júnior. Por fim, dizer que a revista está a serviço da comunidade acadêmica e da comunidade em geral e que suas metas não serão atingidas se não houver uma parceria entre todos os seguimentos. É preciso pensar a universidade para além dos muros que a cerca. Acreditar que é possível uma transformação e que ela começa com pequenas ações. Nesse sentido, é preciso somar as experiências, dar visibilidade. A Revext quer cumprir Reinaldo Sousa Editor Página 4 esse papel e ser o elo com a comunidade. 5 Página ARTIGOS 1 - O ENSINO DA EAD NAS DISCIPLINAS DE EXATAS: DISPOSITIVOS DE INSERÇÃO PARA AUMENTAR A INTERAÇÃO NO MOODLE Allan Gomes dos Santos, Luís Paulo Leopoldo Mercado [email protected] [email protected] Resumo Este artigo retrata a necessidade de unir estratégias didáticas com TIC no ensino superior com propostas de melhorar e aumentar a interatividade da aprendizagem na ferramenta fórum do ambiente virtual de aprendizagem da plataforma Moodle. A matemática e outras disciplinas das ciências exatas nos cursos de EAD necessitam ser munidas de melhores mecanismos de comunicação e interação para uma maior aprendizagem nos cursos de modalidade à distância, portanto, propomos que a ferramenta fórum não seja somente de texto, mas tenha um suporte de áudio conjugando as mensagens de voz e texto com intuito que fomente a relação de comunicação do processo de ensino-aprendizagem, e traga na relação aluno-tutor-professor mecanismos que façam do aprender, do ter dúvidas e da consistência da interatividade um produto de contribuições para um aprendizado mais significativo por parte dos alunos que estudam as disciplinas de cálculos. Além disso, recomendamos nesta composição de mídias uma implementação para aparelhos moveis, em forma de recepção e transições de SMS, trazendo celeridade, melhoria, rapidez e qualidade de interatividade, onde busque um fomento no aprender em EAD e melhore os estudos dos alunos das exatas que possuem muitas dificuldades teóricas e até de verbalizá-las no seu aprender. Palavras-chave: Moodle; Ferramenta fórum; Dispositivo SMS em EAD. Introdução Este busca focar em experiências inovadoras que use as estratégias didáticas com TIC no ensino superior. Dentro deste contexto procuramos desenvolver propostas que fizessem com que o papel do professor do ensino superior articulasse aulas inovadoras com o uso das tecnologias da informação e comunicação (TIC) através de estratégias de ensino e aprendizagem e desenvolvessem recursos tecnológicos que aumentem a relação interativa didática no processo de ensino da educação à distância (EAD). Buscamos relacionar uma exploração das metodologias para o uso das TIC e, conjuntamente, pensar em dispositivos que incrementem e melhorem as formas de comunicação e interacionais do Moodle para contribuir no contexto de aprendizagem dos Cursos a distância da Matemática e outras disciplinas das áreas de ciências exatas. de aprendizagem (AVA) tragam este novo modelo que a sociedade como um todo vem se redirecionando na prática educacional do processo de ensino e aprendizagem. Além disso, Página uma transformação pedagógica faz com que a EAD em conjunto com os ambientes virtuais 6 Neste universo do pensar, querer ou fazer algo novo que venha de encontro a este novo contexto tecnológico na educação proporciona alunos mais propenso a uma realidade de estudo menos passiva que as antigas aulas expositiva, centrada no professor, e recrie condições de acesso às novas informações, para que seja responsável pelo seu crescimento e suas necessidades. Os vários níveis de estudos e modalidades de ensino devem se preocupar com esta nova realidade, e escolas, universidades, cursos presenciais ou à distância necessitam buscar inovações em suas práticas de ensino ou até visualizar propostas que contribuam e fortaleçam as já existentes em suas realidades de aprendizagem. Propormos, primeiramente, uma ideia de inserção de mecanismo de contribuição interativa e de comunicação direta em forma de áudio ou mensagem de voz como alternativa as mensagens de texto que já existem na ferramenta fórum do Moodle, com o objetivo de dinamizar mais um apoio à aprendizagem e de melhorar a interação entre os agentes virtuais que fazem o ensino e o aprender das disciplinas de exatas. As discussões online que o fórum permite entre aluno-tutor-professor trazem atualmente uma proposta de mensagem de texto que nas disciplinas das Ciências Exatas fica muito distante do que realmente a relação conteúdo-aluno-tutor-professor requer para um maior apoio pedagógico-didático da EAD, pois ter apenas algo transcrito em forma de texto não atinge o verdadeiro alcance que o enlace colaborativo da união do áudio e texto pode trazer, tornando, a ferramenta um fator diferencial no aprender de várias áreas de estudo. O aprendizado virtual que empregamos no fórum com visual (texto) que é substancial e atraente, acompanhado do som (áudio), acarretará numa integração de mídias com recursos de linguagens diferentes na estimulação da aquisição do conhecimento e no manuseio da ferramenta. Para Stiubiener (2001), o recurso auditivo como mídia extremamente rica e envolvente, pode ser usado em explicações no geral e também para prender a atenção do aluno. Ainda afirma: [...] que existem muitas razões para inserir elementos auditivos na prática do ensino, pois através deste recurso é possível apresentar aos estudantes conceitos, chamar atenção para assuntos específicos e motivá-los, através da criação de um ambiente favorável ao processo de aprendizagem. incorporação no AVA, nos dispositivos móveis com recepção/transmissão direta em forma de mensagens. Portanto, nosso intuito é que o aprendizado virtual que empregaríamos no Página propor que todo o manuseio desta ferramenta seja disponibilizado, através de uma 7 Ampliando esta visão de enlace de mídias, texto e áudio, gostaríamos, também, de fórum com visual (texto) seja acompanhado do som (áudio) e disponibilizado em forma de SMS, acarretando assim benefícios numa integração de mídias com recursos de linguagens diferentes na estimulação da aquisição do conhecimento e num manuseio da ferramenta com avanços e adaptações tecnológicos que reflitam no contexto de uma aprendizagem mais rápida e colaborativa entre seus usuários. Neste sentido, a relevância deste estudo propõe uma análise na ferramenta fórum do Moodle e, elaborar uma proposta para dinamizar uma melhor interação e comunicação nesta ferramenta virtual com o intuito que os seus elementos do processo, aluno-tutorprofessor, utilizem e aproveitem as oportunidades de aprendizagem de forma mais significativa e relevante em seus aprendizados, pois os estudos das disciplinas de Cálculos, de forma geral, necessitam que o teórico abstrato seja transformado, em sua grande parte, numa forma mais concreta, transparente do que se quer estudar ou do que se quer tirar dúvidas. Além disso, propor que o texto que é visual (abstrato) se conjugue com uma forma auditiva (concreta) causará uma modelagem de reconhecimento mais significativo da aprendizagem como um todo, tornando-se uma ferramenta mais interativa e dinâmica que atenderia aos usuários e ofereceria mais facilidades para a manipulação das informações. E, assim, propor que estes usuários, aluno-tutor-professor, as utilizem e aproveitem este enlace de mídias através de transmissões/recepções de SMS para os dispositivos móveis por um dispositivo incorporado ao AVA que o disponibilize em forma de SMS todas as postagens na ferramenta, tornando mais rápida, instantânea, ampla e significativa o manuseio da ferramenta e o fazer e aprender das disciplinas de cálculos em Página 8 EAD. O professor das disciplinas de exatas no ensino da EAD e suas dificuldades A EAD é mediada por TIC, e traz uma proposta diferenciada da utilizada no ensino presencial, portanto, seu processo de ensino e aprendizagem é autônomo, colaborativo e dialógico com o emprego de ferramentas virtuais. Neste sentido, os elementos que compõem o fazer da EAD baseiam-se numa ponta na autonomia do aluno com suas responsabilidades em seu processo de construir sua aprendizagem e, do outro lado, projeta novos paradigmas na organização e o planejamento didático por parte dos professores neste contexto virtual. Há um grande número de professores que têm um discurso enfático sobre as TIC, no entanto, se limitam a transpor para o AVA a mesma aula do ensino presencial. (MORAN, 2002). Concordando com essa ideia, Bagno (2001, p. 1415) ressalta que: [...] é preciso que o professor não seja apenas um transmissor de conteúdos, mas alguém que ensina e aprender, que não só mostra os caminhos, mas também orienta o aluno, a fim de que possa desenvolver um olhar crítico que lhe permita trilhar o caminho que conduza às verdadeiras fontes de informação e de conhecimento. Constatada essa situação, há necessidade que o professor de EAD renove suas posturas para melhorar e inovar suas aulas virtuais, bem como as metodologias que facilitem o desenvolvimento dos conteúdos matemáticos nesta modalidade de ensino. Portanto, considerando o cenário de aprendizagem virtual, a preocupação com o estudo da Matemática e a realidade de construir algo que venha ao encontro das grandes transformações tecnológicas pelas quais a sociedade está passando (ACAUAN e PORTO, 2001), faz-se necessário enfatizar a importância de melhorar a interatividade das ferramentas disponíveis nos AVA que sustentam a interação e comunicação na realização das atividades propostas. Nesse aspecto, a Matemática e outras disciplinas de Cálculo no contexto do ensino à distância necessitam, como na modalidade presencial, tirar o preconceito de que são disciplinas difíceis, distante e complicada na visão dos alunos e, assim, buscar mecanismos que aumentem a autoestima e a identificação com os seus ensinamentos e aprendizados, através do desenvolvimento de metodologias que enfatizem a construção desafios do aprender desta área de ensino tão importante. Página coletivo e a autonomia proveniente da confiança na própria capacidade para enfrentar os 9 de estratégias, a dinamização de resultados, a criatividade, a iniciativa pessoal, o trabalho Todas estas circunstâncias caracterizam as várias dimensões que podem determinar as relações aluno-tutor-professor, e, assim, dimensionar o papel que o professor desempenha neste processo, pois o professor não se apresenta como um elemento externo à rede de significações vivenciadas pelos alunos: ele faz parte dela (LÉVY, 1995). Interação na EAD A EAD é uma modalidade educativa dentro do contexto educacional que promove a diversificação dos estudos à distância através das mediações de ferramentas tecnológicas e na construção de novos paradigmas para acesso do conhecimento, tornando o ensino mais abrangente em diferentes segmentos da sociedade. Para entender esta modalidade de ensino, Moore e Kearsley (2010, p. 2) menciona que a EAD: É o aprendizado planejado que ocorre normalmente em um lugar diferente do local do ensino, exigindo técnicas especiais de criação do curso e de instrução, comunicação por meio de várias tecnologias e disposições organizacionais e administrativas especiais. A modalidade de ensino e aprendizagem à distância deve sempre procurar aumentar as formas de interações e participações do aluno no ambiente de estudo com o intuito de fazer dessas trocas virtuais um maior fortalecimento para seu aprender. Desse modo, devemos sempre propor mecanismos, intensificar e ampliar condições que façam o conjunto aluno-tutor-professor e, também, os conteúdo programáticos terem possibilidades de ampliação da interatividade, com condições para construção de ações mais efetivas e participativas e buscar que todos os envolvidos no processo participem e se desenvolvam para um objetivo comum. Interações virtuais, por serem à distância, impõem desafios aos professores e alunos para a sua realização e para a sua manutenção com sucesso, em razão da ausência do contexto físico partilhado (BARROS e CRESCITELLI, 2008). Para tanto, os elementos que compõem os mecanismos da EAD necessitam desenvolver posturas diferenciadas em seus contextos de visões para ensinar, aprender, ensinar e aprender ou aprender e ensinar e, portanto, ampliar um maior estímulo e modificar alguns aspectos do seu fazer ensinar, pois, para Goldberg (1998), "educar é transformar”, mesmo que de forma gradativa e sugestiva, mas acompanhando os avanços, Página Por essa e outras razões, os professores que atuam na EAD devem procurar 10 confiança para utilizar os ambientes virtuais. pois um dos caminhos que enseja a possibilidade de gerar maior produtividade no processo ensino-aprendizagem à distância pode estar na diversificação das formas de abordagem de cada tema ou conteúdo a ser apresentado, a partir das quais é possível construir conhecimentos sólidos e significativos, pelas vias da interação, através de ferramentas e metodologias virtuais apropriadas que fomente o diálogo aluno-professortutor nos AVA com o intuito de facilitar a interatividade. O dispositivo de áudio na ferramenta fórum como mídia de interação A concepção da proposta adotada neste estudo implica no uso do fórum de discussão como ferramenta viável de aprendizagem na EAD. A aprendizagem virtual requer uma sustentação complexa, produzida por um aglomerado de mecanismos que cheguem à forma da aprendizagem verdadeiramente sólida, implicando a necessidade de novos paradigmas. Nesse sentido, esta proposta apresenta um papel importante no desenvolvimento do ensino e aprendizagem das disciplinas de Exatas na modalidade à distância, colocando ao alcance do aluno-tutor-professor um dispositivo de áudio, que auxilie a ferramenta virtual fórum no Moodle, a aumentar seu alcance de interatividade, comunicação e debate, transformando as interações entre os usuários em discussões que gerem melhores conhecimentos. Este objetivo inicial de nossa proposta recai em visualizar esta ferramenta como forma colaborativa de aprendizagem no AVA, em que os usuários contribuem com suas dificuldades e angustias em relação aos temas propostos, enfatizando a troca e interação. Portanto, a ação que discute os aspectos fundamentais do processo de interação vivenciado por aqueles que se utiliza do fórum no Moodle e nos cursos a distância trazida nesta proposta de trabalho é sustentada por uma ideia e não por uma modelagem ou protótipo virtual implementado que se caracteriza em vislumbrar um suporte de apoio de áudio (voz) com o intuito de auxiliar e aumentar a interatividade entre o texto e a voz, permitindo que a comunicação seja apoiada através de duas formas de mídias trabalhando em conjunto, áudio e texto, transformando a relação de aprendizagem nas disciplinas de especial, na área de Exatas, necessitam de aparatos que forneçam uma maior interatividade para adquirir uma maior interação entre aluno-tutor-professor. Assim, a Página Tal meta se dá em conhecer o significado que as disciplinas nos cursos online, em 11 cálculo à distância. proposta de inserir este mecanismo de áudio como forma alternativa da troca de texto ou mensagens ampliaria o leque de uso da ferramenta virtual e não diminui a importância e contribuição que este instrumento proporciona ao processo de ensino e aprendizagem na modalidade à distância, mas o sustenta com um propósito maior de uma ideia para complementá-lo com mais um instrumento midiático que explore um enlace mais eficiente no domínio e construção coletiva do conhecimento. A proposta surgiu de nossa prática com as disciplinas das Ciências Exatas e da angústia de obter uma maior interação com os alunos, suas dúvidas, dificuldades e, portanto, sua aprendizagem. Dentre as ferramentas virtuais do Moodle, o fórum é a que mais se projeta para a construção de uma aprendizagem colaborativa nas disciplinas de Exatas. Então, fortalecer a estrutura virtual da ferramenta alicerçando mais um canal/suporte de comunicação visibiliza uma interligação de forma mais relevante. Conforme Silva (2006), o fórum possui uma interface rica, capaz de potencializar a construção colaborativa e dialógica. No uso de uma ferramenta computacional o aluno, em seu manuseio, contextualiza o que está aprendendo e faz uma relação do problema com seus conhecimentos adquiridos, dando oportunidade de assimilar e transformar melhor o que aprende. Isso o faz ter uma aç~o mais “imediatista” nas suas ações e aquisiç~o de seu conhecimento cognitivo com o uso da máquina. Este estudo requer tratar e melhorar as questões pedagógicas virtuais e entrelaçar, texto e áudio, na conjuntura do fórum do Moodle como fator de domínio da Matemática e de outras disciplinas correlatas com o Cálculo, contribuindo para o enriquecimento de qualquer atividade virtual de aprendizagem. Este é um fator de extrema necessidade para a EAD e uma busca de respostas aos descontentamentos praticados por seus agentes na falta de uma maneira melhor de interação, interatividade e aprendizado no espaço do AVA. O dispositivo de áudio introduz no contexto da ferramenta fórum um modelo colaborativo com o já preexistente de texto, facilitando a forma de diálogo na aprendizagem e permitindo o manuseio de duas mídias na obtenção e Dentre as inúmeras vantagens de incorporar este mecanismo de áudio na ferramenta fórum do Moodle, o setor técnico do Ensino a Distância do Instituto Federal de Página aprendizado da Matemática e à resolução de conflitos. 12 realização da aprendizagem, gerando um ambiente lúdico de ensino, e necessário ao Alagoas pela Universidade Aberta do Brasil (UAB/IFAL) sendo procurado e vendo que era possível à implementação deste mecanismo de voz no manuseio da ferramenta o incorporou em fase de experiência como mais uma opção de interação e manejo, como podemos visualizar o link de áudio na figura 1. Figura 1: Link de incorporação do dispositivo de áudio na ferramenta fórum do Moodle. Ter formas variadas que desenvolva a comunicação virtual, certamente trará aspectos de crescimento seja com a disciplina em estudo ou com o Moodle e, portanto, as disciplinas de Cálculos necessitam conquistar mais seu aluno virtual ou vice-versa e entender que as TIC chegaram para transpor barreiras e cada vez que suas ferramentas virtuais forem mais aperfeiçoadas a Matemática e outras áreas de estudos abrirão caminho para uma melhor aprendizagem e identificação. Dispositivo SMS em EAD na ferramenta fórum Nossa outra proposta neste estudo se amplia e se faz complementar no sentido de propor uma extensão na interação e comunicação da ferramenta fórum com o uso de propomos que o envio seja complementado pela mediação entre a ação pedagógica (postagem) no ambiente da disciplina com o seu recebimento/transmissão de resposta, Página configuração, envio de postagens para email cadastrados no AVA, assim, da mesma forma 13 um manuseio para dispositivos móveis. A ferramenta fórum já disponibiliza, através de estudo e leitura por meio de mensagens SMS nos aparelhos móveis. Portanto, unir o estudo das disciplinas exatas com o manuseio de dispositivos móveis na EAD implicará continuidade e dinamismo as atividades de estudo/aprendizagem do AVA e permitirá uma mobilidade ao usuário na resolução de suas atividades virtuais. A relação conteúdos (tarefas)/aluno na ferramenta fórum permitirá que a interação, comunicação, participação, troca de informações e colaboração entre alunotutor-professor seja viabilizado de forma mais rápida, dinâmica e construtiva no manuseio da recepção/transmissão de mensagens SMS entre o AVA e os celulares. Apresentar que o AVA seja configurado de forma a incorporar o intercâmbio de agilidade no contexto educacional em complemento de nossa proposta inicial de unir as mídias texto e áudio no uso da ferramenta fórum é desenvolver estratégias inovadoras que transforme as interações entre os usuários em EAD em discussões que gerem melhores conhecimentos para o desenvolvimento de uma aprendizagem mais consistente e colaborativa. Metodologia A metodologia estudada nesta proposta foi da observação dos usuários do Moodle, que ampliou nossa visão das atividades de comunicação e discussão que a ferramenta fórum influenciava na qualidade de aprendizagem da EAD. Portanto, a experiência e observações no contexto educacional do ensino da Matemática e de outras disciplinas das áreas das Ciências Exatas na EAD sinalizou a ideia básica sobre o uso do suporte de voz, em conjunto, com o canal de texto, num crescimento do domínio de conhecimento matemático para melhorar o desenvolvimento das estratégias utilizadas pelo aluno-tutor-professor na resolução de tarefas e contribuir na construção de significados envolvendo relações entre objetos estudados. Dentro desse contexto da observação verificamos o enorme canal e suporte educativo que o celular como dispositivo móvel e, atualmente, popular e fácil manuseio e aquisição poderia contribuir de forma significativa na contribuição de movimentar uma mobilidade entre o canal de aprendizagem e seu usuário, criando novos espaços de Como continuação da proposta aqui apresentada, propõe-se a validação da ferramenta, através da implementação computacional deste dispositivo de áudio Página Propostas de trabalhos futuros 14 aprendizagem. incorporado na ferramenta fórum do Moodle e seu manuseio nos dispositivos moveis, pelos seus responsáveis técnicos do Moodle, demonstrando o enlace das capturas de escrita e voz para funcionamento e uso por parte dos usuários na recpção/transmissão de SMS. Dessa maneira, a arquitetura da ferramenta fórum atenderá as duas mídias no suporte da aprendizagem e uma maior agilidade em seu manejo de aprendizagem, ampliando a ferramenta e dando um grau maior de qualidade e interação usuárioambiente-usuário. Neste sentido, Barufi (1999, p.30), defende que o computador como ferramenta educacional é “[...] um instrumento excepcional que torna possível simular, praticar ou vivenciar verdades matemáticas, de visualizar situações e compreender a evoluç~o de um tema de maneira continua e pr|tica”. Noutro futuro trabalho, pode-se expandir o dispositivo complementando-o com o recurso da imagem, propondo estratégias didáticas maiores que envolvam os alunos como elementos ativos no processo, ampliando e motivando seus interesses com a EAD e seus estudos. Considerações finais A realização deste trabalho teve como propósito direcionar propostas de incorporar mecanismo de áudio (voz) ao contexto escrito (texto) da ferramenta fórum no Moodle e mostrar um caminho de apropriação que busque enlaçar o AVA aos seus usuários em seus domínios pedagógicos, através da recepção/transmissão de mensagens SMS por dispositivos móveis. Compreender como estas contribuições podem evidenciar melhorias na interatividade e interação desta ferramenta no processo de ensino e aprendizagem em cursos na modalidade à distância das disciplinas das áreas de Ciências Exatas, e analisar a importância que a inserção destas novas mídias trará na mediação pedagógica do professor e da participação significativa do aluno no fórum e em sua consistência no aprender, além de identificar as características e possibilidades desta ferramenta, permitir uma maior mobilidade de uso e agilidade de estudo, sugerindo-se alternativas relevantes de seu uso mais adequado na utilização com a Matemática e outras permitindo que as ferramentas virtuais utilizadas nos AVA proporcionem uma maior interação entre seus usuários e troca de informações como fator a conseguir uma Página Com o avanço das TIC, a EAD tem que buscar novos paradigmas educacionais, 15 disciplinas de cálculo. aprendizagem virtual mais sólida e dinâmica. Além disso, as dificuldades existentes com a Matemática no ensino virtual, tanto por parte dos alunos como dos propósitos dos professores, constituíram a grande motivação para o desenvolvimento deste estudo. Assim, apresentamos mecanismos para ser inserido como complementos na ferramenta fórum, onde integrarão e proporcionarão dentro do Moodle um processo mais dinâmico com melhorias nas condições de ensino e comunicação. A incorporação dos dispositivos de SMS e áudio (voz) que se torne um apoio ao mecanismo de texto já existente com o intuito de dinamizar o enlace das mídias, reproduzem uma melhor mediação pedagógica e qualidade desta modalidade de educação entre o aluno e o tutor-professor, que traduzam em condições necessárias para levantar posturas mais ativas diante do querer fazer e aprender e no produzir a aprendizagem colaborativa. Referências Bibliográficas Página 16 ACAUAN, Célia M. & PORTO, Adélia M. A informática na Educação. Dissertação de Mestrado. Santa Catarina: UFSC, 2001. BAGNO, M. Pesquisa na escola: como é, se faz. 6ª ed. São Paulo: Loyola, 2001, p.14-15. BARROS, Kazue S.; CRESCITELLI, Mercedes F. Prática docente virtual e polidez na interação. In: MARQUESI, Sueli C.; ELIAS, Vanda; CABRAL, Ana (orgs.). Interações virtuais: perspectivas para o ensino da Língua Portuguesa à distância. São Carlos: Clara Luz, 2008, p. 73-92. BARUFI, Maria C. A construção/negociação no curso universitário inicial. Tese de doutorado. São Paulo: USP, 1999, p.30. GOLDBERG, Marco C. Educação e qualidade: repensando conceitos. Revista Brasileira de estudos pedagógicos: São Paulo, 1998. LÉVY, P. As tecnologias da inteligência: o futuro pensamento na era da informática. Rio de Janeiro: Editora 34, 1995. MOORE, Michael; KEARSLEY, Greg. Educação à distância: uma visão integrada. São Paulo: Cengage Learning, 2010, p.2. MORAN, José. M. O que é educação à distância. Rio de Janeiro-RJ, 2002. SILVA, Marco. Educação online. 2. ed. São Paulo: Loyola, 2006. STIUBIENER, I. et. al. Video VS audio a study on web based teaching-learning environment. 2001. Disponível em: http://www.researchgate.net/publication/228830871_VIDEO_VS_AUDIO_A_study_on_web_based_t eaching-learning_environment. Acesso em junho de 2014. 2 - OS FILAMENTOS COESIVOS PARA A CONSTRUÇÃO DO SENTIDO NO GÊNERO DISSERTAÇÃO Adriana Nunes Paulino [email protected] Daiane dos Santos RosendoCarnahúba [email protected] Janyellen Martins Santos [email protected] Maria Francisca Oliveira Santos [email protected] Resumo O presente artigo tem como objetivo mostrar o estudo feito acerca da coesão na construção do sentido no texto, atentando-se para relação de mecanismos linguísticos na articulação textual a partir da remissão e da sequenciação. Dessa forma, almeja-se mostrar que o estudo da coesão pode ser visto para além da gramática, demonstrando que ela é importante na produção textual no que tange ao estabelecimento da textualidade e da argumentação nos gêneros argumentativos como a dissertação, que fora escolhida para análise nesta pesquisa. A investigação tem como referencial teórico os estudos voltados ao ensino interacionista a partir de Antunes (2003 e 2007), teorias acerca da Linguística Textual e da coesão textual por meio de Koch (2004, 2011, 2012, 2013 e 2014), pesquisas sobre o sentido no texto por Koch e Travaglia (2011) e estudos a respeito da produção textual com as contribuições de Xavier (2014). O corpus constitui-se de fragmentos de três dissertaçõesescolares, selecionadas dentre vinte produções adquiridas a partir de uma atividade de produção textual aplicada em uma turma de terceiro ano do ensino médio de uma escola da rede pública de ensino, que participou do projeto PIBID, em consonância com a Universidade Estadual de Alagoas (UNEAL). As análises mostram a funcionalidade dos articuladores textuais não somente no encadeamento textual, mas, sobretudo, na argumentação e na produção de sentido no texto. Palavras-chave: Argumentação.Coesão. Produção de sentido. Considerações iniciais O subprojeto de licenciatura em português “Gênero e Texto: encontros metodológicos e fruições”, inserido no Programa Institucional de Bolsa de Iniciaç~o { Docência – PIBID busca contribuir para ações e reflexões em torno de objetivos pedagógicos acerca do processo argumentativo dos gêneros discursivos, aliadas aoletramento em língua materna, numa perspectiva sociodiscursiva. O artigo mostra o resultado de intervenções em aulas no terceiro ano do ensino médio, na Escola Estadual Prof. José Quintella Cavalcanti, quando foi trabalhado o gênero supervisora Adriana Nunes Paulino ocorreu da seguinte maneira: tratou-se da função estrutural e social do gênero, estudaram-se a produção textual e os fatos gramaticais. Em Página orientação da coordenadora do PIBID, a Prof.ª Dr.ª Maria Francisca Oliveira Santos, e da 17 argumentativo dissertação escolar. A aplicação desse gênero em sala de aula, sob a seguida, foi proposta uma atividade de produção textual, desenvolvida a partir de um texto base, cujo tema proposto para discussão foi a mobilidade urbana no Brasil. A partir dessas produções é que se deu origem ao corpus do trabalho,constituído por fragmentos das dissertações. Foi feita uma análise do uso de articuladores textuais, com o intuito de mostrar a funcionalidade desses mecanismos, não somente no encadeamento textual, mas, sobretudo, na argumentação e na produção de sentido no texto por meio das marcas de remissão e sequenciação. A visualização e recapitulação teóricas desses assuntos serviram de embasamento para a melhoria do desempenho nas intervenções em sala de aula, podendo ser visto segundo dois ângulos: o do aluno docente, que procedia à transmissão do saber com caracteres reais da docência, tal a segurança que deixava transparecer; o do aluno secundarista, que transparecia ares de verdadeiro aprendiz, dada a clareza das explicações didáticas. A Textualidade e os entraves da gramática: a gramática x o texto Na realidade da educação brasileira, vê-se que o ensino de Língua Portuguesa ainda se encontra bastante defasado. A escola e os docentes ainda vivem sob uma perspectiva tradicionalista, segundo a qual basta ensinar regras gramaticais para que o educando seja eficiente no uso da língua, ou seja, saiba ler, escrever e interpretar devidamente, o que corresponde a um grande mito, como afirma Antunes (2007). Dessa forma, atividades descontextualizadas e repetitivas, limitadas ao estudo de frases soltas e de análises de identificação de categorias gramaticais ou sintáticas, que deixam de lado aspectos referentes à construção da textualidade, são o foco do ensino de língua em sala de aula. As práticas de leitura e interpretação, quando ocorrem, geralmente são subordinadas ao estudo de gramática. No entanto, o fato é que a língua não se esgota em normas, pois ela, como comenta Antunes (2007), constitui-se, antes de tudo, como um fato social, cultural, histórico, político e ideológico e, assim sendo, se constitui como um fato humano. Desse (2007, p.54) ressalta que produzir ou compreender um texto exige “muito mais que conhecimentos de gramática. Este é apenas parte do saber que se precisa dominar para o Página esses fatores e constituem-se como uma ferramenta eficaz de interação social. Antunes 18 modo, a maneira de se trabalhar a língua é através dos textos, afinal, eles abarcam todos desempenho satisfatório dessas atividades [...]”. Assim, é necessário trabalhar o conhecimento de mundo ou prévio, pois é preciso saber o que dizer sobre um determinado tema ou assunto, já que conhecimento linguístico algum poderá suprir a falta do que dizer. Antunes (2003) salienta que ter ideias e informações constitui uma condição prévia para a escrita e, também, para a compreensão textual. Então, necessita-se ir além das pistas que o próprio texto oferece e estabelecer relações com outras leituras para, assim, efetivar o entendimento. Além disso, também é necessário conhecer formas para a organização e progressão textual. É importante saber o tipo e o gênero textual a serem trabalhados, as estratégias de interação, o que será explicitado ou não no texto, quando se deve fazer uma citação ou uma paráfrase. Antunes (2007) ainda afirma que, ao se produzir um texto, objetiva-se relatar fatos pertinentes, ilustrar uma ideia ou opinião e não para simplesmente exercitar o uso de elementos gramaticais. Há, ainda, a questão das regras sociais de uso da língua que permeiam o comportamento dos sujeitos nas situações de comunicaç~o verbal. “Isto é, em toda cultura, prevalece um conjunto de normas que especificam quem pode falar, o quê, como, com quem e quando” (ANTUNES, 2007, p.63, grifo da autora). Dessa forma, toda manifestação de linguagem é regulada socialmente e não somente pelo conhecimento linguístico. Esses aspectos é que deveriam ser levados em consideração no ensino de língua, o que o tornaria, sem dúvida, mais discursivo do que meramente gramatical. Mas é importante deixar claro que é preciso sim ensinar gramática, afinal, não há falante sem conhecimento gramatical, pois quando alguém fala, ouve, lê ou escreve, ou seja, quando um sujeito se utiliza da língua nas práticas sociais, faz uso da gramática, já que ela faz parte da língua. A questão é que ela não é o único componente da língua, portanto não se deve ensinar apenas regras gramaticais. Vê-se, então, que a grande alternativa para tornar o ensino de língua mais interativo e relevante é propor o equilíbrio entre o ensino das normas gramaticais e a funcionalidade da língua através dos textos. Essa prática precisa Página para que assim o ensino de língua seja coerente com a realidade dos educandos. 19 ser incluída nas aulas de Língua Portuguesa de maneira constante e não eventualmente, As diversas definições de texto A concepção de texto pode ser dada a partir da ideia que se tenha sobre língua. Dessa forma, cada concepção que se tem acerca da língua gera uma definição de texto diferente. Koch (2011) aponta três concepções de língua: representação do pensamento, estrutura ou código e de lugar de interação. Na ideia de língua, como representação do pensamento, tem-se o texto como uma espécie de produto do pensamento do autor, implicando que o indivíduo apenas capte as intenções do locutor para obter o entendimento do texto. Essa denominaç~o “implica aceitar que a língua est| { disposiç~o de indivíduos que a utilizam como se ela n~o tivesse história” e “[...] que se confere ao sujeito da enunciaç~o, desta forma, o estatuto de fonte de sentido” (POSSENTI, 1993apud MARCUSCHI, 2008, p.69). Então, assim, ele é tido como um ser passivo e individual. A língua vista como código, o texto é tido como o resultado da decodificação. Desse modo, basta que o leitor tenha o conhecimento dos sinais gráficos presentes na superfície linguística para obter a compreens~o textual, “j| que o texto, uma vez codificado, é totalmente explícito” (KOCH, p.16, 2011). O sujeito que “ocupa o papel de locutor é dependente, repetidor, etc. [...] A fonte do sentido é a formação discursiva a que o enunciado pertence [...]” (POSSENTI, 1993apud MARCUSCHI, 2008, p.69). Vê-se, também, que o indivíduo é estritamente preso ao texto. Na concepção de língua como lugar de interação, o texto é visto como um meio de comunicação e interação entre os sujeitos que, dessa maneira, s~o ativos. Eles “se constroem e s~o construídos” (KOCH, 2011, p.17) a partir do texto e vão além dos elementos linguísticos subjacentes à superfície textual para a obtenção do sentido. Esta última é a concepção que vem sendo adotada pelos estudiosos da linguagem na atualidade que, por sua vez, se debruçam sobre as teorias discursivas e conversacionais. Essa noção de texto é a que deve ser veiculada pelos docentes nas aulas de língua, a fim de se propor um ensino mais bem contextualizado. Porém a realidade vista em sala é a voltada às duas primeiras noções apresentadas, segundo as quais os alunos são Os educandos devem ser levados a refletir que tudo “o que falamos ou escrevemos, em situações de comunicação, são sempre textos” (ANTUNES, 2010, p.30, grifo Página que texto é somente aquele relacionado ao padrão escrito da língua. 20 levados a crer que todo o sentido produzido advém somente do texto, além de acreditarem da autora), isto é, quando se quer expressar algo para comunicar-se com o outro, utiliza-se o texto. Dessa forma, como afirma Antunes (2010, p.30), “todo texto é a express~o de algum propósito comunicativo”. Portanto, tudo o que é dito possui uma função, uma finalidade. É preciso, ainda, que eles compreendam que “todo texto é a express~o de uma atividade social” (ANTUNES, 2010, p.31), pois exerce uma determinada funç~o em um determinado contexto, sendo parte constitutiva das atividades humanas. Como ressalta Marcuschi (2008, p.23): “n~o existe um uso significativo da língua fora das inter-relações pessoais e sociais situadas”. Com isso, toma-se o texto como um evento comunicativo, que atua em meio às atividades linguísticas, sociais e cognitivas. Schmidt considera (1978apud ANTUNES, 2010, p.31) o texto como um “conjunto ordenado de instruções” e, assim sendo, quando se fala ou escreve instruções s~o dadas para que o interlocutor consiga identificar os objetivos ou finalidades do locutor. Na realidade, “todo texto é um intertexto – dizem os especialistas – no sentido de que sempre se parte de modelos, de conceitos, de crenças, de informações já vinculados em outras interações anteriores” (ANTUNES, 2010, p.36), ou seja, todo texto possui outros textos, pois há uma intertextualidade que se faz presente quando se referencia algo que já foi dito em outro texto. A partir disso, vê-se queum texto não se limita à expressão de ideias ou à questão das regras de formação, pois ele estabelece a comunicação entre os indivíduos, proporcionando, assim,uma interação sempre em busca do sentido. Assim, o texto precisa ser tido como um evento comunicativo que perpassa pelas atividades linguísticas e cognitivas e, sobretudo, sociais. É necessário, ainda, que essa concepção de texto seja disseminada nos estudos de língua materna, para que os discentes compreendam que eles produzem uma unidade de caráter funcional que se realiza e constrói o sentido na interação. A coesão textual: a referenciação componentes da superfície textual. Essa reativação ocorre através da anáfora, que é a remissão a uma expressão já posta antes (para trás); e da catáfora, que é a remissão para Página reativação de referentes no texto que são necessários à sua compreensão, através de 21 A referenciação ou coesão referencial, segundo Koch (2013), promove uma frente, na qual o leitor é levado a efetuar um movimento prospectivo, como afirma Xavier (2014). A coesão referencial se utiliza de recursos de natureza gramatical ou lexical. A anáfora geralmente se efetua através de pronomes (pessoais – 3ª pessoa -, possessivos, relativos, demonstrativos, indefinidos e interrogativos), artigos (definidos), numerais (cardinais, ordinais, multiplicativos e fracionários) e advérbios pronominais (aqui, ali, aí, lá, onde). Utilizam-se, também, sinônimos, hiperônimos e nomes genéricos. Xavier (2014) ressalta que a utilização desses últimos mecanismos pode revelar a opinião do locutor sobre um determinado assunto, seja ela apreciativa ou depreciativa. Koch (2013, p.46) diz que se pode fazer a “reiteraç~o de um mesmo grupo nominal ou parte dele; e, finalmente, por meio da elipse”. A catáfora, por sua vez, se realiza por meio de pronomes demonstrativos e indefinidos (isto, isso, aquilo, tudo, nada), nomes genéricos, mas também através dos demais pronomes, artigos indefinidos, numerais e advérbios pronominais, conforme Koch (2013). Além dos elementos já apresentados, há ainda outros mecanismos que veiculam a anáfora e a catáfora. Têm-se as expressões adverbiais que operam anafórica ou cataforicamente: acima, abaixo, desse modo, a seguir, assim, etc. As expressões nominais que têm função remissiva quando antecedidos por artigos indefinidos ou pronomes demonstrativos. Nesse caso, o contexto é o que permite ativar instruções referenciais sobre o referente. Há as nominalizações, em que ocorrem transformações de ações verbais em nomes que, por sua vez, remetem essas ações posteriormente. Existem algumas formas verbais que também exercem função remissiva, como o verbo fazer, e são chamadas de pró-formas verbais. Geralmente elas vêm acompanhadas de elementos pronominais como o, isto, o mesmo, assim, entre outras. Fazem remissão a todo o predicado e não somente a um verbo em particular. Diante do exposto, vê-se que a referenciação promove relações textuais a fim de veicular a interpretação e, assim, estabelecer a textualidade. No entanto, além de propor transformando-o, uma vez que ele é dinâmico. Assim, o referente se (re)constrói e se completa textualmente. Página também modificam o referente, acrescentando-lhe traços na progressão textual e 22 sinalizações textuais, ela estabelece relações de sentido, pois as formas referenciais Por outro lado, ela também exerce funções argumentativas. Koch (2011) diz que as expressões referenciais não servem somente para referir, pois as funções cognitivas, semânticas, pragmáticas e interativas que elas exercem são multifuncionais e, dessa forma, colaboram com a construção do sentido no texto, assinalando pontos de vista e direções argumentativas. Operadores lógicos e argumentativos A coesão sequencial ou sequenciação estabelece a progressão do texto à medida que também permite a continuidade de sentido, como afirma Koch (2013). O avanço do texto e a construção de sentido ocorrem a partir do encadeamento de elementos que articulam o texto de maneira argumentativa, a fim de obter determinados efeitos de sentido (KOCH, 2013). Tais elementos são os operadores lógicos e argumentativos; estesestabelecem vários tipos de relações semânticas e/ou pragmáticas entre os segmentos textuais, destacando-se as conjunções e os advérbios. Os conectores que instituem relações lógico-semânticas são os operadores lógicos. Propõem as seguintes relações, conforme Koch (2004 e 2014): causalidade – na qual relacionam duas orações em que se encerram argumentos de causa e consequência (porque, pois, por isso, como, uma vez que, já que, visto que, etc.); condicionalidade - na qual há um enunciado que estabelece uma condição para a ocorrência de um fato num outro (se, desde que, caso, contanto que, a não ser que, a menos que); conformidade - tem-se a conexão entre duas orações em que em uma há a conformidade de uma ideia que é confirmada na outra (conforme, segundo, etc.); temporalidade – relacionam-se ações e/ou eventos entre duas orações localizados no tempo (quando, depois que, antes que, enquanto, logo que, etc.); e disjunção – por meio do conectivo ou se estabelece relações inclusivas ou exclusivas. Os conectores que estabelecem as relações discursivo-argumentativas são os operadores argumentativos. Segundo Koch (2012), esse termo foi denominado por Ducrot, considerado o criador da Semântica Argumentativa. Esses mecanismos promovem o nos enunciados. Destacam-se aqui as principais relações estabelecidas e os principais operadores a partir de Koch (2004) e (2012): conjunção, na qualhá a junção de Página determinadas conclusões [...]” (KOCH, 2004, p.89), ou seja, orientam a força argumentativa 23 encadeamento de atos de fala diferentes “em que se enunciam argumentos a favor de argumentos em favor de uma mesma conclusão (e, e também, e nem, ainda, como também, mas também, além disso, etc.); justificativa/explicação, em que um enunciado introduz uma explicação em relação a um enunciado anterior (porque, pois, já que, etc.); comparação, em quese tem uma relação comparativa entre enunciados a fim de uma determinada conclusão. Essa relação pode ser de igualdade, superioridade ou inferioridade (tanto quanto, tão quanto, etc.). Há a relação de conclusão, na qual se apresenta uma conclusão em relação a um enunciado anterior (portanto, pois, logo, por isso, etc.) e de disjunção, em quese introduzem argumentos alternativos que ocasionam em conclusões distintas (ou...ou, quer... quer, seja... seja, etc.). Por fim, tem-se a contrajunção, em que há relação entre enunciados com forças argumentativas opostas. Destacam-se o operador adversativomas e seus similares (porém, no entanto, entretanto, contudo, todavia, etc.) e operador concessivo embora e seus similares (apesar de, posto que, ainda que, etc.). Todos esses mecanismos estão inclusos na gramática da língua e têm funções importantes para a construção do sentido. Por outro lado, há estudos que demonstram que a coesão não é uma condição necessária para a produção textual, pois há textos que são destituídos desses elementos e não deixam de fazer sentido, como afirma Xavier (2014). Mas há, também, textos que possuem elementos coesivos que não estabelecem relações de sentido. A questão é que existem textos que necessitam do uso desses mecanismos para que tenham maior legibilidade, facilitando, assim, a interpretação. A má utilização dos operadores no gênero em estudo Dissertação escolar pode gerar ambiguidades e raciocínios ilógicos. Assim, é extremamente desejável e importante o uso, ou melhor, o bom uso desses mecanismos à promoção do encadeamento da superfície textual. A coesão no gênero dissertação na sala de aula Neste trabalho, serão apresentados fragmentos de três dissertações, escolhidas aleatoriamente entre vinte produções, adquiridas a partir de uma atividade de intervenção da professora Adriana Nunes Paulino,na qual foi desenvolvida uma atividade de produção Página ano do ensino médio da Escola Estadual Prof. José Quintella Cavalcanti, sob a supervisão 24 do projeto PIBID/UNEAL em Português do campus I, realizada em uma turma de terceiro textual que procurou simular a produção de redação do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) como forma de preparar os discentes para a realização posterior do exame. Dessa forma, foi produzida uma proposta de redação, na qual os alunos deveriam dissertara partir do tema “O caos na mobilidade urbana: uma quest~o pública ou individual?“, sob o apoio dos textos motivadores presentes na proposta de produç~o que tratavam da temática. Para auxiliá-los na produção da dissertação, foi feita anteriormente uma discussão em sala de aula sobre a problemática da mobilidade urbana no Brasil e, para isso, foi solicitado aos educandos que pesquisassem previamente sobre a temática e que levassem para a aula, assim como as bolsistas, diferentes textos que tratassem do assunto, como notícias, reportagens, entre outros, com o objetivo de promover um debate em sala e, assim, obtivessem conhecimento do tema. Além disso, foi trabalhada a coesão textual, por meio de uma atividade com dois textos nos quais os alunos tinham de completá-lo com os conectores adequados, a fim de que eles observassem a importância dos conectores para o encadeamento do texto e para a argumentação e, assim, pudessem produzir textos coesos. Através disso, a análise consistiu em observar os fenômenos da coesão referencial e sequencial presentes nas produções, a fim de verificar suas contribuições para a construção de sentidos e da argumentação. Ressalta-se que os fragmentos estão escritos conforme as produções originais. A seguir, aparecem os fragmentos para a respectiva análise. Fragmento 1 [...] A maioria das pessoas têm grande dificuldade em se deslocar de suas casas para o trabalho, e isso é um problema, pois, são praticamente obrigadas a utilizar os transportes públicos. Vê-se que o aluno realiza um movimento remissivo anafórico através do demonstrativo isso que retoma toda a ideia veiculada na oração anterior. Além disso, efetua uma explicação em seguida a partir do operadorpois em relação ao que fora discutido anteriormente. Ao utilizar o hiperônimo transportes públicos, o educando Página diariamente. 25 deixa claro a que tipo de transporte ele se refere, no caso, aos que são de uso da população Fragmento 2 A questão é que muitos acabam passando mais tempo no ônibus ou metrô do que em suas próprias casas e com isso se torna cansativo acabam tendo um rendimento baixo e comprometendo, assim seu meio de sustento, sem falar das más condições dos transportes, o que torna a luta ainda mais difícil. Aqui, tem-se uma remissão anafórica através do nome genérico questão, que retoma a discussão do parágrafo anterior. Os pronomes possesivos em destaque (suas, seu) também realizam o movimento anafórico ao se referirem aos trabalhadores que necessitam dos transportes públicos. Os termos com isso e assim também fazem uma retomada das orações anteriores a eles. Ao falar em ônibus e metrô (hipônimos), o aluno particulariza a que transportes está se referindo. Fragmento 3 [...] Devido a precariedade, cada dia um transporte quebra e, dessa forma, os que têm acabam ficando lotados, tendo em vista que esses, não são suficientes para a população brasileira. Nessa passagem, o artigo os em destaque refere-se anaforicamente ao termo transportes, assim como esses. A expressão dessa forma resume a ideia posta anteriormente. Fragmento 4 Mobilidade urbana relaciona-se á possibilidade de um indivíduo se deslocar facilmente na cidade. No entanto, o que se observa no Brasil, diariamente, principalmente nas metrópoles são congestionamentos estressantes e um transporte público ineficaz. Nesse sentido, é importante que se criem condições de o brasileiro deixar o carro em casa quando precisa se locomover pelos centros urbanos do país. Nota-se que o operadorno entanto promove uma oposição à ideia anterior, dando um caráter argumentativo ao enunciado que introduz. A expressão nesse sentidoresume todo o enunciado anterior. Já o operador quando localiza num determinado tempo a ação veiculada na oração. Página Além disso, embora o transporte coletivo seja a única opção de muitos brasileiros, ele nem sempre atende a população de maneira eficiente. [...] hoje o que se vê são metrôs e trens superlotados e em situação precária e que não suprem totalmente a demanda daqueles que o utilizam. É preciso, portanto mais qualidade e eficiência no transporte público, para que ele se torne, de fato, uma boa opção para todos. 26 Fragmento 5 A utilização do termo inicial em destaque unifica o próximo argumento que fora colocado no parágrafo anterior. O operadorembora, por sua vez,anula a ideia posta no enunciado que introduz produzindo um efeito argumentativo, procurando convencer o interlocutor de que o transporte público não é eficiente, ideia posta no enunciado seguinte. O pronome pessoal ele faz uma remiss~o anafórica da express~o “transporte coletivo”. J| oadvérbio hoje coloca como atual a questão discutida. O elemento e unifica argumentos semelhantes. O conectorportanto, no enunciado seguinte, surge para concluir a ideia anterior e, depois, o discente determina a finalidade das práticas propostas por ele através do conectivo para que. Fragmento 6 Hoje, diante do enorme consumismo, todos querendo sempre ter coisas novas, objetos novos [...] e, diante disso, as pessoas valorizam bastante o setor automobilístico fazendo com que cresça o fluxo de automóveis, assim, causando caos, e brigas constantes por causa do trânsito. O educando inicia o parágrafo com o termo hoje para localizar os fatos discutidos no texto no presente. O termo diante (de) faz uma remissão catafórica, prospectiva, do enunciado que introduz assim como o pronome indefinido todos remete às pessoas de modo geral. Fragmento 7 Diante dos fatos mencionados somos levados a acreditar que essa questão de mobilidade e caos irá continuar, mas que podemos fazer algo por ela. É necessário que se construa mais linhas ferroviárias, metrôs, para que se possa diminuir o super loteamento dos ônibus e o engarrafamento acabar um pouco e a substituição de carros nas rodovias, por ônibus, pois diminuirá a quantidade de automóveis nas pistas. A expressão inicial em destaque resume tudo o que fora discutido anteriormente no texto para expor uma conclusão geral da questão que, logo em seguida, é contraposta pelo enunciado seguinte, introduzido pelo operador, mas, indicando que há outras possibilidades para a situação abordada que, por sua vez, são colocadas no próximo enunciado. A partir do operador para que se tem a finalidade de tais possibilidades e a norma culta padrão, os fragmentos apresentados apontam para uma boa articulação Página Numa análise geral, pode-se observar que, apesar da ocorrência de desvios da 27 justificativa desse propósito se dá por meio do conectivopois no enunciado posterior. textual, na qual se vê a realização eficaz tanto da reiteração quanto da sequenciação nos textos, promovendo, assim, a progressão textual e a formação do sentido. Diante dos fenômenos estudados, acerca da coesão referencial e sequencial, percebeu-se que há maior ocorrência da anáfora, principalmente pela utilização dos pronomes (pessoais, demonstrativos, possessivos e indefinidos) e nomes genéricos. A catáfora, por sua vez, aparece apenas em um dos fragmentos. Observou-se, também, o estabelecimento constante das relações lógicas e argumentativas como adição, justificativa, oposição, tempo e de finalidade, atentando-se para o uso recorrente dos operadores concessivos e adversativos (embora, mas e no entanto), demonstrando que os alunos dotaram seus textos de caráter argumentativo, fazendo jus à função do gênero produzido, que é levar o leitor a suas conclusões. Além disso, nota-se, ainda, que os educandos desenvolveram bem a proposta de produção textual. Considerações finais A partir da análise das marcas de remissão e sequenciação presentes nas produções de estudantes do ensino médio, por meio das intervenções em sala de aula, sob uma perspectiva interacionista, através do subprojeto PIBID/UNEAL em Português, percebeu-se o quanto o conhecimento do uso de mecanismos textuais é imprescindível para a construção do sentido no texto. Os alunos utilizaram os mecanismos linguísticos de acordo com suas intenções no texto, que forama promoção de uma discussão elaborada sobre a temática abordada e uma argumentação eficaz que levou o leitor às suas conclusões, mostrando, assim, sua importância para a compreensão do que está sendo discutido no texto, através da reativação de ideias presentes nele e na progressão do texto por meio da articulação argumentativa. Dessa forma, vê-se a importância da coesão na produção textual, sendo ela indispensável para o estabelecimento do sentido, principalmente, em gêneros de caráter argumentativo como a dissertação escolar que fora analisada nesta pesquisa. Observou-se, ainda, que os alunos desenvolveram uma boa discussão acerca da salienta-se que, para que os discentes tenham produções dotadas de sentido, é preciso saber não só quais elementos linguísticos usar, mas, sobretudo, de que forma usá-los e que Página (mobilidade urbana no Brasil), encontrando-se incluso na sua realidade. Em suma, 28 temática proposta para a produção, tendo em vista que se tratava de um tema atual efeitos de sentido eles podem gerar no texto. Assim, vê-se que a coesão textual necessita ser vista em sala, para além da dimensão gramatical e escolar e ser abordada numa perspectiva sociointeracionista, ou seja, a partir de numa discussão das práticas sociais. Página 29 Referências bibliográficas ANTUNES, Irandé. Aula de português: encontro & interação. São Paulo: Parábola Editorial, 2003. ANTUNES, Irandé. Muito além da gramática: por um ensino de línguas sem pedras no caminho. São Paulo: Parábola Editorial, 2007. ANTUNES, Irandé. Análise de textos: fundamentos e práticas. São Paulo: Parábola Editorial, 2010. KOCH, Ingedore G. V. Introdução à linguística textual. São Paulo: Martins Fontes, 2004. ___________________. Desvendando os segredos do texto. 7. ed. São Paulo: Cortez, 2011. ___________________. A inter-ação pela linguagem. 11. ed. São Paulo: Contexto, 2012. ___________________. O texto e a construção dos sentidos. 10. ed., 2ª reimpressão. São Paulo: Contexto, 2013. ___________________. A coesão textual. 22. ed., 3ª reimpressão. São Paulo: Contexto, 2014. MARCUSCHI, Luiz Antônio. Produção textual, análise de gêneros e compreensão. São Paulo: Parábola Editorial, 2008. XAVIER, Antônio Carlos. Como se faz um texto: a construção da dissertação argumentativa. Catanduva: Editora Respel, 2014. 3 - O GÊNERO TEXTUAL TORPEDO COMO PRÁTICA LETRADA NO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA NA EDUCAÇÃO BÁSICA Helena Vieira de Andrade [email protected] Resumo As práticas de ensino através da utilização de gêneros textuais estão se tornando cada vez mais frequentes no ensino de Língua Portuguesa e tornando-se objeto de estudo de diversos pesquisadores. Dessa forma, este trabalho tem por objetivo discutir o gênero textual torpedo como estratégia de letramento nas aulas de língua materna, apresentando-o como prática letrada capaz de dinamizar as aulas no ambiente escolar, propondo ao professor novas metodologias de ensino, atuando na formulação de respostas no contexto social que envolve esse gênero e sua infinidade de significados para o desenvolvimento da aprendizagem. Seguindo essa ideia, nosso trabalho pretende responder ao seguinte questionamento: É possível utilizar o torpedo e suas ferramentas auxiliares como estratégias de ensino em sala de aula? Na busca da resposta a essa problemática, recorremos, teoricamente, aos estudos de Austin (1990); Bakhtin (1997), Crystal (2001); Marcuschi (2000); Santos Filho (2006; 2008; 2012) e outros. Destacamos aqui enquanto ferramentas auxiliares ao gênero torpedo os emoticons e/ou smiles - objetos de interação utilizados em algumas redes sociais e que podem contribuir com o gênero textual torpedo. Através da análise textual de torpedos coletados entre alunos da educação básica, constatamos a utilização do internetês, variação da língua portuguesa comum em redes sociais. Observamos que o conhecimento e o uso dessa linguagem possibilitam ao educador rever as práticas desenvolvidas no cenário educacional, bem como tornar o espaço escolar atrativo aos alunos, principalmente por relacionar a aprendizagem da língua portuguesa com o cotidiano dos educandos através de seus aparelhos celulares. Palavras - chave (três): Gêneros textuais; Ensino de Língua Portuguesa e Práticas letradas. Introdução Por volta de 1980, surgem os primeiros telefones celulares. Esses pesavam de 09 a 10 quilos, consumiam muita bateria e tinham baixa qualidade de voz e, além disso, o sinal era analógico. Em 1992, esses aparelhos começaram a ser substituídos pelas redes digitais e em 1997 nasceu a tecnologia GSM (Global System for Mobile Communication), que possibilita o funcionamento do SMS (PAMPANELLI, 2004). Ainda nos anos 90, o texting, fenômeno que consiste em enviar mensagens escritas através do aparelho de telefonia móvel, dinamiza as ações sociocomunicativas, estabelecendo entre os indivíduos participantes relações mais diretas e rápidas. Isso aconteceu no Continente Europeu. O fato de disponibilizar uma quantidade limitada de caracteres fez com que surgissem os quem não domina esse tipo de tecnologia. Página na abreviação das palavras, tornando-se um universo praticamente desconhecido para 30 diálogos através de torpedos, uma linguagem conhecida como internetês, que se embasa A linguagem tenta definir sua significação, atrelando isso às formas de vida, adequando-se para diversas situações de uso. Dessa maneira, o usuário do internetês aproxima-se de seu interlocutor, tornando-se mais bem visto em cada grupo social, e isso ocorre através de um jogo de linguagem, que define a estrutura que aborda as novas relações de comunicação, através do uso de ferramentas digitais/digitalês, levando em consideração o contexto social, histórico, político e cultural em que ela se insere. Isso torna verossímil a tese de que a linguagem não é finita quanto à formulação de enunciados e que as mais diversas formas utilizadas para que tal fato seja possível também não são finitas. Nessa comunicação via telefone, à primeira vista, o diálogo parece complexo e as abreviações vão sendo identificadas conforme o contexto em que está inserido, pois, de acordo com o compromisso cognitivista (MARCUSCHI, 2000), a língua se encontra essencialmente ligada à atividade humana e é comandada por sua realidade sociocultural. Nesse sentido, estudar os diversos gêneros textuais possibilita vivenciar novas experiências em sala de aula, e a utilização do SMS – (Sigla do sintagma, em inglês, Short Message Service ou Serviço de Mensagem Curtas, em português) como uma ferramenta para o ensino/aprendizagem de Língua Portuguesa pode contribuir de forma bastante significativa para a construção interacionista entre professor e aluno, em que esse último pode ganhar na aprendizagem. Não queremos aqui generalizar que o uso do aparelho de celular esteja presente na vida de todos os alunos da educação básica brasileira, pois, dessa forma, estaríamos negando as desigualdades sociais presentes na sociedade, o que enfatizamos é que essa ferramenta de interação tem presença significativa em uma certa parte do contexto educacional, principalmente no que se refere a crianças e a adolescentes. Segundo o A partir da observação feita por esse pesquisador, pretendemos uma aproximação à prática das mensagens, com o objetivo de observarmos até que ponto o Página Aqui no Brasil, recentes pesquisas indicam que há um crescimento nesse tipo de interação, a troca de mensagens via celular, o que indica uma mudança de hábito dos usuários brasileiros, pois até recentemente esse fenômeno não era percebido em seu potencial comunicativo. Estima-se que atualmente no Brasil cerca de 600 milhões de SMS sejam enviados por mês. Mesmo assim, em nosso país, a prática de texting está distante do que acontece nos EUA, onde os adolescentes chegam a enviar em média 80 mensagens por dia (SANTOS FILHO, 2012, p. 22). 31 linguista Santos Filho (2012), referindo-se a contexto de 2010, comenta que torpedo pode ser utilizado como ferramenta para o ensino de língua portuguesa. A proposta é apresentar uma melhor compreensão sobre as interações nos dias atuais, decorrente dos avanços tecnológicos e a necessidade cada vez maior de comunicação entre os usuários da língua. Ainda levando em consideração as reflexões do linguista supracitado, sobre as pesquisas referentes ao SMS, ele afirma que em suas leituras sobre os estudos referentes aos torpedos que Apenas Crystal (2001) assume uma postura que deixa que seja visto ao longo de seus escritos a existência da circulação social de diversos gêneros nos torpedos. Entretanto, de modo amplo, a mensagem de celular foi/é compreendida como apenas uma ‘evolução’ dos gêneros bilhete e/ou recado (SANTOS FILHO, 2012, p, 25). Para Santos Filho (2012), o gênero torpedo é apenas visto como como uma forma “evoluída” do bilhete, logo, o mesmo se apresenta como a substituição de um gênero textual. Mas não é. Assim, podemos entender que a principal função é a de praticidade na troca de informações, bem como no processo de comunicação entre os sujeitos. As pessoas necessitam comunicar-se e as diversas ferramentas existentes permitem e facilitam essa interação entre os interlocutores. Por tais motivos, utiliza-se o SMS para abordar essa discussão sobre a possibilidade desse gênero como provedor de comunicação, seja ela informativa, publicitária, interacionista, discursiva, etc., tendo a língua papel relevante na construç~o do conhecimento, em que “essa competência deve ser um produto das interações sociais e n~o de uma mente isolada e individual” (MARCUSCHI, 2000, p.05). Nesse raciocínio, entendemos que o uso dessa ferramenta está se tornando uma prática comum e a cada dia o gênero de SMS possibilita maior agilidade no repasse de informações em diversos ambientes, promovendo interação de modo instantâneo. Nos dias atuais, a mensagem de texto via celular, o SMS ou torpedo, como é conhecido socialmente, “também est| sendo utilizado para a comunicaç~o entre instituiç~o e pessoa/grupos de pessoas ou até mesmo entre empresas” (SANTOS FILHO, 2008). É importante salientar que o torpedo é uma forma de comunicação assíncrona1. Em relação ao torpedo, partimos do pressuposto de que a língua vive em 1 O termo assíncrona indica uma forma de comunicação, normalmente de uma só pessoa para outra, embora possa ser de uma para várias, simultaneamente. Pode servir tanto a interação interpessoal quanto à comunicação institucional (ASSIS, 2007, p. 221). Página e o de que vivemos em uma época em que a comunicação eletrônica e as tecnologias estão 32 movimento, e a esse processo se juntam os fenômenos de ordem social, histórica e cultural proporcionando maior interação entre os sujeitos e até mesmo entre instituições. Assim, devemos aproveitar todo o contexto para a realização de práticas letradas para o ensino. Para tal, faz-se necessária a participação ativa do educando durante o momento de construção do conhecimento, para que ele consiga fazer parte do processo de ensinoaprendizagem. Essa participação, a partir do uso do torpedo em sala de aula, se dá pelo contato, proporcionado pelo professor, entre o aluno e o SMS de seu próprio aparelho celular, que relaciona diretamente o que fora apreendido nas aulas de língua portuguesa, bem como sua utilização em sua vida sócio/interacional. A seguir, apresentamos uma prévia análise de torpedos – mensagens de textos extraídas de um telefone móvel, com o objetivo de demonstrar como pode ser feita essa utilização em sala de aula como parte do processo de letramento em língua portuguesa. Análise de Torpedos como Unidade de Comunicação Significativa Partindo da ideia de que o texto é um enunciado, ou seja, a fala de um “eu” para um “outro”, apresenta-se como corpus de estudo as mensagens de celular – SMS, para identificar nas mensagens de texto quem é o “eu” da enunciaç~o, cuja finalidade é mostrar qual é o gênero textual e sua intenção na conversação. Abordamos aqui as estratégias de produção de sentido que um texto em SMS pode apresentar. Tal abordagem é feita analisando, de forma enunciativo-discursiva, as mensagens de celular, torpedos enviados por instituições de telefonia móvel, observando os contextos que influenciaram sua formação e que ideias estão sendo produzidas, e refletir sobre a construção do diálogo entre os interlocutores, observando o texto não como algo preso à estrutura ou morto, e, sim, identificar os aspectos que motivaram seu enunciado em um dado momento histórico, político/ideológico e cultural, no sentido de Por essa compreensão, entendemos que as relações interpessoais avançam conforme rege o avanço tecnológico. Dentre essas pode-se inserir o torpedo como prática Página Quando analisamos a linguagem nossa finalidade não é apenas analisar a linguagem enquanto tal, mas investigar o contexto social e cultural no qual é usada, as práticas sociais, os paradigmas e valores, a racionalidade, enfim, desta comunidade, elementos estes dos quais a linguagem é indissociável. A linguagem é uma prática social concreta e como tal deve ser analisada. Não há mais uma separação radical entre linguagem e mundo, porque o que consideramos a realidade é constituído exatamente pela linguagem que adquirimos e empregamos (AUSTIN, 1990, p.10) 33 que de letramento para o ensino de língua portuguesa, pois, seguindo as ideias de Bakhtin (1997), os sentidos dos textos não estão presos às palavras ou estruturas da língua, ao contrário, são forjados na relaç~o entre esses sujeitos que “dialogam” naquele texto. Como forma de melhorar o entendimento, segue análise de alguns torpedos. Nas duas mensagens, entende-se que há um grau de intimidade considerável entre os sujeitos envolvidos no torpedo. Tal intimidade permite que o interlocutor entenda o teor da comunicação, mesmo que essa apresente abreviações. Na primeira figura, a palavra “Ei”, é Figura 1 Transcrições de torpedos via celular (A) usada como vocativo, chamando a atenção do interlocutor para o recado que a segue. Logo após, vem o número “2”, ao invés do numeral cardinal, “dois”, o que demonstra a necessidade de reduzir o número de caracteres, assim como o uso do “q” (que), “vc” (você), “c/”(com) e “Bjo” (beijo) e a utilização do sinal de exclamação (!) para destacar o aviso, dando ênfase ao enunciado, que é não se esquecer de levar as blusas. O segundo torpedo visa informar sobre determinado evento (“despedida da Aline”), e nesse também se apresentam abreviações, como “Hj” (hoje) e a utilizaç~o de “eh”, que representa o verbo ser na terceira pessoa do singular “é”, no qual a letra “h” vem com o propósito de substituir o acento agudo, objetivando mostrar a tonicidade da vogal “e”. As abreviações s~o uma linguagem muito utilizada entre os usuários dessa nova ferramenta de comunicação, pois é através desses usos que os sujeitos promovem uma interação mais prática e instantânea. Por fim, a mensagem apresenta um convite, tendo em vista que finda com a pergunta/chamado “Vamos?”. Aqui estamos considerando que a língua por si só não providencia a determinação semântica das palavras e que as palavras isoladas não produzem tal sentido, somente uma rede lexical situada num sistema sócio interativo permite a produção de contidos nos torpedos buscando identificar os sentidos produzidos pelos sujeitos usuários da língua materna, que são gerados a partir do processo de letramento, que permite que o Página observações dos usos linguísticos nos aparelhos de celulares, observou-se os enunciados 34 sentidos (MARCUSCHI, 2000). Seguindo o raciocínio do pesquisador, a partir das objeto em estudo possa estabelecer comunicação com os sujeitos que fazem uso dessa ferramenta digital, causando, assim, interação, no processo em que os textos vão estabelecendo comunicação um com o outro. Segue análise de outros dois torpedos: A terceira mensagem traz uma abordagem ainda mais simples e mais direta do que as mostradas anteriormente. Quando em 3 o sujeito utiliza a expressão da língua inglesa “News”, de maneira interrogativa e exclamativa ao mesmo tempo, objetiva saber se há Figura 2 Transcrições de torpedos via celular (B) novidades, de forma a tornar ainda mais informal o teor da mensagem, tendo em vista que há descontração no modo como a pergunta foi feita. Ao colocar “#bomdia”, ele utiliza uma forma característica de um site de relacionamentos, o twitter, o jogo da velha (hastegue) que visa dar destaque ao cumprimento “Bom dia”, mostrando que h| o desejo de que o dia do interlocutor seja bom, e que tal enunciado não representa apenas um cumprimento por mera formalidade. Ainda no enunciado 3, o locutor faz uso de um emoticon (sorriso), para destacar que o dia do interlocutor seja feliz, prazeroso. Esses símbolos são utilizados de forma a construir interação entre os usuários digitais a partir do jogo de linguagem provocado pelo uso de diversos recursos semióticos, não apenas o linguístico. Desse modo, o uso dos símbolos ou emoticons são muito utilizados nesse tipo de interação textual, em virtude de possuírem diversos significados, podendo ser utilizados com diferentes finalidades no momento da interação. Geralmente esses símbolos vêm acompanhado de usos linguisticos e sua utilização surge para reforçar um sentido que agrega à escrita os gestos, a entonação da voz; os emoticons, por exemplo, funcionam como expressões faciais inseridas dentro de um contexto de interação digital. Diante dessa abordagem de comunicação, diversos mecanismos de textualização são utilizados para mensagem de celular foi compreendida como texto assíncrono, o qual autoriza a mistura Página etc., formando um sistema multissemiótico. Nessa compreensão, para Costa (2008), “a 35 proporcionar uma conversação, sejam eles os símbolos, as cores, os números, imagens, de registro e absorve traços da oralidade na escrita representando a fala em seus aspectos prosódicos” (COSTA, 2008, p.18). Na quarta mensagem, têm-se as abreviações da mesma forma das anteriores. Ao falar “a net caiu” o interlocutor usa uma express~o que se refere ao fato da conex~o com a rede mundial de computadores ter sido interrompida. Utiliza “aprvetr” (aproveitar), “ksa” (casa) e “bj” (beijo), de maneira a subtrair o número de caracteres, e à medida que as palavras vão sendo interpretadas vai produzindo sentido e significados, isso porque elas não se limitam aos fatos para produzirem significações presentes nas compreensões, são elas que fundam e constroem as significações que são atribuídas aos fatos. Nessa compreensão dos usos linguísticos e não linguísticos nos torpedos, o professor pode ainda utilizar esse gênero textual para atrair a atenção dos alunos durante as aulas de língua portuguesa, chamando-lhes a atenção para os tipos de gêneros textuais que são utilizados durante as conversações realizadas através do uso dos torpedos, tal como o uso da linguagem informal, que é uma característica marcante na interação que se dá através da utilização dos torpedos. Continuemos com a análise. Agora, as mensagens que seguem foram encaminhadas por uma empresa de telefonia móvel, que usou o torpedo para convencer o usuário sobre a aquisição de um novo aplicativo: Observando o texto 5 e o uso das abreviações utilizadas nos torpedos anteriores, observamos que essa é a linguagem da comunicação oficial utilizada por esse tipo de ferramenta, e isso permite maior praticidade no objetivo que se quer alcançar, seja no que refere a dar um Figura 3 Transcrições de torpedos via celular (C) recado ou vender um produto, ação que se tornou característica dos SMS. Assim, entendemos também que a comunicação estabelecida nos textos em estudo não ocorre ferramenta tentam estabelecer um diálogo e vender seus produtos. Página se estabelece com empresas e órgãos ligados ao sistema capitalista, que através dessa 36 apenas com os sujeitos enunciadores da conversação, pois esse processo de comunicação Ainda na mensagem 5, o enunciador cita o “facebook”, famosa rede mundial de comunicação para atrair o sujeito que possui letramento digital, pois só passa a fazer sentido se o interlocutor for letrado ao ponto de possuir habilidades para interagir através das redes sociais, caso o indivíduo não domine esse tipo de letramento não há diálogo estabelecido. Com o envio do torpedo pela empresa de telefonia móvel só é estabelecida a comunicação se o enunciado da mensagem utilizar uma linguagem totalmente destinada aos sujeitos com letramento digital, isso pode se confirmar observando o final do SMS, quando informam que “para obter mais informações é necess|rio acessar o site do aplicativo”. No enunciado 6, observarmos os mesmos recursos utilizados nos torpedos anteriores, porém, o que chama atenção no texto é a maneira como é enfatizado o fato de “saber falar inglês, é estar { frente das coisas do mundo”. A express~o “Não fique para trás” remete à ideia de que quem dominar a língua inglesa, atualmente a mais falada no mundo, tem maior vantagem e melhor desempenho perante à sociedade. O uso dos sinais de exclamação é visto em todos os torpedos para enfatizar a enunciação, a palavra “GRATUITA” foi realizada em caixa alta para destacar que os dez primeiros dias eram sem custo algum, se a promoção fosse aderida. Percebemos, ainda, que nos torpedos enviados por empresas também foi feito uso da abreviação de palavras, características das mensagens de textos, já que a diminuição das palavras ocorre pelo fato de tornar o texto o mais claro possível, visando à praticidade das informações. A respeito desses usos, é relevante salientar que cada sujeito promove a interação de acordo com sua visão de mundo, ideologia e posição social e que as significações sofrem alterações de acordo com as posições ocupadas por seu enunciador, pois compreendemos que “tanto o sujeito quanto os sentidos s~o históricos e ideológicos e que as condições de produç~o de um discurso s~o constitutivas de suas significações” (SANTOS FILHO, 2006, p.21). Após essas análises, entendemos que é o contexto e o grau de intimidade entre os fenômeno tecnológico, pode-se destacar a importância de formar os alunos não apenas como indivíduos letrados, mas sujeitos com letramento digital, capazes de identificar os Página totalmente sem rodeios, e restrito apenas aos participantes da conversação. Com esse 37 interlocutores que regem o sentido da mensagem, passando o “di|logo” a ser direto, diversos meios de interação e comunicação a sua volta, pois acreditamos que a utilização de novos significados e peformances para a linguagem proporcionam ao aluno a produção de novos sentidos a partir de seu entendimento individual, se desprendendo do ensino antes preso à estrutura e, dessa forma, passando a analisar a linguagem, a partir de diversas significações que produzem o significado do texto, já que entendemos que Aprender a falar é aprender a estruturar enunciados e não orações ou palavras isoladas. Os gêneros estabelecem as regularidades discursivas que permitem reduzir a inevitável assimetria entre as posições dos interlocutores a assegurar uma cooperação entre estes, já que, apesar de não impedirem a singularidade e criatividade no uso que o falante faz deles, têm um aspecto prescritivo e normativo. Assim, percebe-se que em qualquer troca verbal, escrita ou oral, cada locutor se serve de modelos – gêneros fixados pela tradição e isolados de características distintas e identificáveis – aos quais, consequentemente ou não, subordina seus enunciados (BAKHTIN, 1997). A esse respeito, em seu texto sobre ensino/aprendizagem da escrita e tecnologia digital, acerca do e-mail como objeto de estudo e de trabalho em sala de aula, Assis (2007) enfatiza o papel do professor de Língua Portuguesa no processo de letramento. Para ela, Tomar o professor de Língua Portuguesa como agente de letramento implica revestir suas ações de ensino/aprendizagem de um compromisso com o perfil dos cidadãos que nossa sociedade precisa construir. Isso significa tomar como objeto de ensino e de trabalho textos que efetivamente componham o universo das práticas discursivas, o que demanda, por conseguinte, no caso da escrita, a adoção de expedientes menos artificiais na tarefa de produção textual e, portanto, mais próximos da realidade e da necessidade (presente e futura) dos alunos (ASSIS, 2007, p. 236). Logo, o professor, em especial o de Língua Portuguesa, deve pensar o texto não como um ato isolado, mas considerando a utilização de diversos atos de fala que são produzidos no texto, não se limitando à estrutura em que as palavras são analisadas em separado, apresentando aos seus alunos as diversidades e variações que podem existir em um texto. Seguindo esse raciocínio, é necessária uma reformulação no sistema de ensino tradicional em que apenas o professor dita as normas, pois o perfil do aluno mudou e, dessa maneira, os educandos necessitam sempre estar em contato com novas informações, novas buscas, habilidades desenvolvidas coletivamente. Por isso, as escolas devem se adequar às mudanças do mundo, precisam os educadores desenvolver metodologias que envolvam a era da informação/tecnologias de comunicação digital. Nesse sentido, destacase a importância de desenvolver ferramentas que contribuam de modo significativo para o promover a inserção dessas ferramentas em sala de aula. Página precisam estar preparados para encarar esse novo desafio, buscando estratégias para 38 desenvolvimento de novas práticas digitais de ensino, ao tempo em que os professores Conclusão As discussões apresentadas nesse trabalho nos levam de maneira singela a traçar breves considerações sobre os resultados de nossa pesquisa. Considerando o que apresentamos, o que podemos concluir é que através das ideias abordadas ao longo da investigação, percebemos que o professor de língua portuguesa dispõe de diversos recursos textuais que contribuem de forma significativa para a melhoria do ensino. As análises feitas com os SMS (Short Message Services) mostram a importância da utilização desse gênero textual nas aulas de língua materna (português), podendo o professor utilizá-los com diversas finalidades. Observamos também que os educadores que lecionam a língua portuguesa devem enfrentar o desafio de trabalhar com as novas práticas de ensino a partir do uso dos gêneros textuais como ferramenta de letramento, superando as dificuldades e buscando desenvolver estratégias que possam contribuir para a facilitação da aprendizagem dos alunos. Levando em consideração que a língua é viva e vive em constante estado de transformação, é necessário que o educador possa se adequar aos novos cenários educacionais, que vão surgindo e se moldando ao longo do contexto histórico e social ao qual fazemos parte. Sabemos que os gêneros textuais são inúmeros, bem como as possibilidades de trabalhá-los, e, para isso, o professor precisa estar sempre buscando fazer uso de cada um desses gêneros, possibilitando, assim, um nível de letramento mais elevado aos estudantes de língua portuguesa, podendo ser ampliado para outras áreas. No entanto, não temos a pretensão de que nossa argumentação se esgote aqui, mas que possa suscitar outras pesquisas em torno da relevância da utilização dos gêneros textuais, em especial o torpedo, no processo de letramento no ensino da língua portuguesa. Portanto, espera-se, a partir desse trabalho, provocar discussões acadêmicas sobre o uso dos gêneros textuais como práticas letradas no âmbito do espaço escolar. Recomendamos a utilização das mensagens de SMS (torpedos) nas aulas de se refere à interpretação de textos e leitura, estimulando também o professor a Página tendo em vista que esse recurso impulsiona os alunos a adquirir um maior domínio no que 39 língua portuguesa como forma de aprimorar o letramento, tornando-as mais dinâmicas, desenvolver aulas interativas e de fácil aprendizagem, sem desconsiderar o meio social e cultural no qual o aluno está inserido. Referencias ASSIS, Juliana Alves. Ensino/aprendizagem da escrita e tecnologia digital: O e-mail como objeto de estudo e de trabalho em sala de aula. In: COSCARELLI, Carla. RIBEIRO, Ana Elisa. (orgs). Letramento digital: aspectos sociais e possibilidades pedagógicas. Belo Horizonte: Ceale; Autêntica, 2007. AUSTIN, J. L. Quando dizer é fazer. Porto Alegre: Artes Médicas, 1990 [1962]. BAKHTIN, Michail. Estética da Criação Verbal. São Paulo: Martins Fontes, 1997. COSTA, S. R. Dicionário de gêneros textuais. Belo Horizonte: Autêntica, 2008. CRYSTAL, David. Language and Internet. Cambridge, Cambridge University Press, 2001. MARCUSCHI, Luiz Antônio. Gêneros textuais: o que são e como se constituem. Universidade Federal de Pernambuco, UFPE. Recife: PE, 2000. _______. Do código para a cognição: o processo referencial como atividade criativa. 2000. PAMPANELLI, G. A. A evolução do telefone e uma nova forma de sociabilidade: O flash mod. 2004. SANTOS FILHO, Ismar Inácio. Gêneros do SMS: Torpedos e ações sociais em mudanças e recorrências. In: Gêneros textuais: práticas de pesquisa e práticas de ensino. REINALDO, Maria Augusta. MARCUSCHI, Beth. DIONISIO, Ângela. (Orgs). Recife: Ed. Universitária da UFPE, 2012. ______. Os mecanismos de textualização visuais em articulação com os linguísticos: os diversos recursos semióticos em tessitura para a composicionalidade do texto. Linguasagem, 2008. ______. Gêneros do SMS: Torpedos e ações sociais em mudanças e recorrências. 2006. (s.n.t.) Resumo Página Pedro Antonio Gomes de Melo [email protected] 40 4 - EDUCAÇÃO E LINGUAGEM: UMA INTERLOCUÇÃO POSSÍVEL ENTRE O LÉXICO TOPONÍMICO E O DICIONÁRIO ESCOLAR ENCICLOPÉDICO Este artigo propõe discutir, por meio de uma análise crítico-reflexiva, o não-acolhimento dos topônimos no texto lexicográfico do dicionário escolarenciclopédicobrasileiro para o Ensino Básico, à luz das teorias interdisciplinares da Linguística: a Toponímia e a Metalexicografia escolar, objetivando defender a inserção dos signos toponímicos como palavra-entrada de verbetes nestas obras lexicográficas pedagógicas, uma vez que estes vocábulos não são registros raros de uso da língua, tanto em sua modalidade oral como escrita, mas pelo contrário, são palavras comuns e frequentes, e mais, não são usados apenas com a função identificadora como elementos de referencialização espacial, mas sobretudo como elemento pragmático e discursivo de organização social e espacial. Sendo assim, são veículos de cultura, marcam influências, usos e costumes, atitudes, tradições e falares, atuando na construção de sentidos, ressaltando a relação simbólica de caráter línguo-cultural na ação de nomear lugares. Quanto à pertinência, este artigo se justifica à medida que poderá oferecer uma contribuição para a especialidade em questão, uma vez que não se registra, em abundância, estudos sobre este gênero de obra de referência. Palavras-chave: MetalexicografIa escolar; Léxico toponímico; Dicionário escolar. Considerações preliminares A prática de nomear lugares evidencia os efeitos da sociedade sobre a língua e a maneira pela qual o mundo nela se apresenta, sobretudo em seu léxico toponímico 2, refletindo e refratando o modo de ver a realidade exterior e a forma como seus sujeitos sociais organizam o meio que os circunda em seu trato diário com a língua. Sendo assim, é possível perceber como os falantes se valem da língua em sua multimodalidade para representar o mundo a sua volta e como o contexto extralinguístico é um relevante fator para o processo de aquisição e ensino/aprendizado do léxico. Nesse sentido, refletir sobre os topônimos brasileiros é retratar a história sociocultural da constituição lexical da língua portuguesa no país, na medida em que eles veiculam em seus conteúdos semânticos características geofísicas, ideológicas, políticas, culturais e históricas registradas numa memória toponímica, como também, mostrar os fundamentos do nome próprio em nossa civilização. Com isso, quer se dizer que estes locativos (re)adquirem diferentes aspectos da realidade de um grupo social e são receptores e refratores de determinantes físicos e antropoculturais de representações semânticas intencionais que podem revelar traços socioculturais da identidade de um povo mediante as particularidades cristalizadas nos topônimos. O pecúlio lexical toponímico corresponde a um corpus lexical vivo e funcional que (2012, p.116) define léxico toponímico como o conjunto de “unidades lexicais investidas da funç~o de nome próprio de lugar que podem reunir formas do vocabulário comum, alçadas à categoria de topônimos; nomes próprios de pessoas, de lugares, de crenças, de entidades sobrenaturais que são ressemantizadas com o fim precípuo de nomear um lugar. Página 2Isquerdo 41 se atualiza continuamente no léxico ao ser utilizado pelos falantes em todas as situações da fala, não se constitui em um rol passivo de nomes de lugares, apenas identificando acidentes físicos e/ou humanos. Mas, sobretudo, em um repertório aberto, quer dizer, capaz de se renovar e se ressignificar seguindo tendências de ordem biossocial que podem condicionar e/ou influenciar o surgimento, a permanência e/ou a mudança de topônimos. Daí, destaca-sea importância dos dicionários escolares enciclopédicos registrarem os topônimos e as inovações vocabulares toponímicas que vão surgindo no léxico toponímico e se incorporando à língua geral, como reflexo da evolução da sociedade contemporânea. A partir do supradito, percebe-se a relevância desse tipo de vocábulo na língua portuguesa, todavia, após uma observação preliminar dos dicionários de uso escolar: Michaelis (2014), Biderman (2012), Bechara (2011), Silveira Bueno (2007), Tufano (2005), Cegalla (2005), Mini-Aurélio (2001), não se detectou, em seu corpus lexicográfico, a presença de topônimos encabeçando verbetes nesses materiais pedagógicos atuais e considerados, pela crítica, como excelentes em sua função pedagógica e, em alguns casos, avaliados e indicados pelo Programa Nacional do Livro Didático, mais precisamente pelo PNLD – Dicionário, do Ministério da Educação (MEC). Além disso, também não se detectou dicionários escolares enciclopédicos brasileiros direcionados ao Ensino Básico, enfocando os topônimos. Desse modo, neste artigo, torna-se oportuno advogar a inserção do signo toponímico como palavra-entrada do enunciado-verbete no repertório dos dicionários escolares enciclopédicos monolíngues impressos em língua portuguesa, sobretudo em dicionários adotados em aulas do Ensino Médio, fundamentado teoricamente numa possível interlocução entre as subáreas da Linguística: Toponímia e Metalexicografia escolar. Cumpre ressaltar que pela carência de investigações lexicológicas/lexicográficas estatísticas no Português do Brasil que viabilizem à identificação de um vocabulário básico adequado ao público escolar, muitas decisões para confecção de dicionários ainda são tomadas com base na intuição, pois faltam pesquisas para subsidiá-las. Portanto, se faz diferentes abordagens. Página dicionário como objeto multifacetado, do qual resultam várias formas de examiná-lo sob 42 mister que estudos sejam realizados sobre o fazer dicionarístico, reconhecendo o Logo, quanto à pertinência e atualidade desta reflexão, entende-se que se justifica uma vez que trabalhos sobre o repertório lexical dos dicionários enciclopédicos e sua consideração como objeto de reflexão têm importância indiscutível na área de Educação e linguagem. Logo, acredita-se que este artigo se torna relevante à medida que poderá fornecer, enquanto reflexão científica, uma contribuição para a especialidade em questão. A Toponímia e a Metalexicografia escolar: uma interlocução possível. A Toponímia - do ponto de vista linguístico- pode ser compreendida como um recorte do léxico de uma língua, consiste num ramo da Onomástica (do grego antigo ὀνομαστική, ato de nomear, dar nome), ciência que integra a Linguística, mais particularmente às pesquisas lexicais, caracterizando-se pelo estudo dos nomes próprios em geral. Possui como eixo central de seus estudos o signo toponímico, seus significados, sua etimologia, sua formação, sua variação e mudança, como também os aspectos históricos, culturais e ambientais que influenciaram a criação de um nome a partir da intencionalidade que impulsiona o nomeador. Trata-se de uma disciplina linguística dinâmica e de caráter multidisciplinar, não se limita apenas a investigação dos aspectos linguísticos e à categorização dos nomes de lugar, mas se volta também para a investigação das motivações que impulsionaram o nomeador no ato da nomeação. De fato, o ser humano, desde o princípio de sua vivência, procura erguer ou encontrar lugares onde possa fixar-se e dar início a aglomerados sociais (vilas, aldeias, cidades), nomeando as localidades onde firmam suas moradias. Sob esse ponto de vista, Melo (2012, p. 66), explica que os estudos toponímicos podem ser compreendidos “como um indicador cultural, uma vez que o modo como a língua retrata a visão de mundo de um povo evidencia a inter-relação que se estabelece entre língua, cultura e sociedade”. Logo, quando se nomeia cidades no Brasil de forma primitiva e/ou quando se muda estas denominações ao longo do tempo, diferentes fatores podem motivar, influenciar e até determinar a escolha e/ou a mudança do topônimo, tanto vida das comunidades linguísticas que ocupam ou já ocuparam um determinado ambiente geográfico, histórico e cultural, no momento que um sujeito-nomeador determina um nome a um acidente humano ou físico revelam-se aí, tendências sociais, políticas, Página Os estudos toponímicos compõem um caminho para o conhecimento do modo de 43 de ordem físico-ambiental quanto antropocultural. religiosas, culturais, entre outras. Além disso, estas pesquisas viabilizam a compreensão de traços linguísticos e do homem denominador e, consequentemente, permite a percepção de vestígios das contribuições relativas aos aspectos do meio geofísico e sociocultural em que os topônimos foram gerados e suas transformações ao longo do tempo. É importante não confundir o nome do lugar com a localidade propriamente dita, em outras palavras “o topônimo n~o é o lugar em si, mas uma de suas representações, carregando em sua estrutura sêmica elementos da língua, da cultura, da época de sua formaç~o, enfim, do homem denominador.” (CARVALHINHOS, 2009, p. 83). Em outras palavras, Melo (2014, p.120) afirma que [...] o nome próprio é um fato da língua que não apenas identifica, mas também significa, por meio da investigação da motivação dos signos em função toponímica, é possível recuperar diversos aspectos da realidade de um grupo social. Daí reside a importância do dicionário escolar enciclopédico brasileiro registrar os topônimos que vão surgindo na Toponímia Brasileira, especialmente os nomes de cidades, e que se incorporam à língua geral. Estas obras são veículo de armazenagem e recuperação dos fatos linguísticos e extralinguísticos, devem ser compreendidas como um aparato que concentra a interligação entre a cultura e a língua materna e suas relações simbólicas, além de obra de referência para professores e aprendizes no contexto de sala de aula. No campo da Lexicografia, cumpre destacar que como disciplina linguística inicia a estruturar-se na primeira metade do século XVI, em diversos centros humanísticos europeus. Essa área de saber, é geralmente apontada como a "arte ou técnica de compor dicionários", que "ocupa um lugar histórico entre as disciplinas dedicadas ao léxico, pois milenar é sua atividade essencial" (Krieger & Finatto, 2004, p. 47). A elaboração de dicionários sempre foi apreciada ao longo dos tempos. Embora a produção de obras de cunho lexicográfico date de muitos séculos, é apenas no século XX questões relativas aos dicionários, tanto no que diz respeito a seu conteúdo científico Página Trata-se de uma |rea do conhecimento linguístico que se “ocupa de todas 44 que se expandem teorizações sobre a produção dos dicionários. [estudo do léxico], quanto à sua elaboração material e técnicas adotadas em sua realizaç~o” (DAPENA, 2004, p. 24). Com efeito, pode-se concebê-la em duas perspectivas: [...] como técnica de montagem de dicionário, ocupa-se de critérios para seleção de nomenclaturas ou conjunto de entradas, de sistema definitórios, de estrutura de verbetes, de critérios para remissões, para registro de variantes etc; (ii) como teoria, procura estabelecer um conjunto de princípios que permitam descrever o léxico (total ou parcial) de uma língua, desenvolvendo uma metalinguagem para manipular e apresentar as informações pertinentes (BORBA, 2003, p. 15). Na atualidade, as contribuições oriundas das novas teorias sobre linguagem e ensino de línguas são diversas, dessa maneira a lexicografia moderna expandiu-se. Atualmente, a preocupação não é somente produzir dicionários, mas também, na decomposição metodológica de produção lexicográfica, isto é, como e para que os dicionários vêm sendocriados. Sendo assim, a Lexicografia também consiste numa subárea da Linguística e divide-se em dois grupos – o primeiro, a Lexicografia Prática que se refere à produção dos dicionários e, o segundo a Lexicografia Teórica (doravante Metalexicografia) que tem por finalidade o exame do dicionário já pronto. Sob esse olhar, Melo (2015, p.282) afirma ser possível, ent~o, “a realizaç~o do estudo do léxico toponímico por meio da interface entre a Toponímia e Metalexicografia Pedagógica”, com o objetivo de defender a inclus~odos topônimos nos dicion|rios escolares brasileiros. Não há dúvida de que o dicionário – não apenas o escolar – possui um propósito pedagógico, no sentido de ser um material de referência. Desde do início desde século XXI, os dicionários escolares de língua portuguesa têm sido objeto de intenso interesse no Brasil. Eles consistem em um valioso instrumento de aquisição e ensino/aprendizagem do léxico. No entanto, no que tange aos dicionários escolares enciclopédicos no Brasil, não se tem conhecimento de pesquisas em grande quantidade sobre esse tipo de obra lexicográfica de uso escolar. Ao abordar questões lexicográficas na confecção de dicionários escolares no Brasil, Gomes (2011, p. 153), afirma que brasileiro, compreendida como a análise teórica que visa fornecer subsídios conceituais e técnicos para o fazer dicionarístico no âmbito escolar. Ela engloba os estudos descritivos, Página É nesse contexto que se encontra a Metalexicografia escolar no território 45 [...] o século XXI inaugura uma etapa de pesquisa e labor lexicográfico inéditos na tradição brasileira; começa-se a delinear critérios e paradigmas para construção de propostas lexicográficas adequadas ao público e à realidade brasileiros, oferecendo como produto final dicionários, de fato, escolares e não meros recortes de obras mais amplas da língua portuguesa. críticos e históricos, como também, a teoria da organização do trabalho lexicográfico, as reflexões sobre a metodologia de elaboração e sobre a classificação tipológica das obras lexicográficas direcionadas à sala de aula e ao processo de ensino/aprendizagem de uma língua. Em suma, esse ramo da Lexicografia Teórica, no ambiente escolar, ganha cada vez mais espaço no Brasil e tem como finalidade o fazer crítico de obras lexicográficas escolares existentes com o intuito de gerar reflexão linguística e metodológica sobre o próprio objeto de estudo, o dicionário escolar, específico por seu público-alvo, configuração gráfica, discurso lexicográfico e finalidade pedagógica. O signo toponímico e o texto lexicográfico didático-pedagógico: a inclusão da toponímia no dicionário escolar enciclopédico brasileiro O signo toponímico é o signo linguístico na função onomástica designativa de um espaço geográfico e/ou humano, estudá-lo é compreendê-lo em suas diversas potencialidades, identificando as razões que fazem com que o falante escolha um determinado nome, dentro de um eixo de possibilidades sêmicas para nomear um lugar, desvendando pontos de convergências entre léxico toponímico e mundo exterior. Estes signos toponímicos adquirem sentidos por meio de intersecções línguoculturais que estão atreladas a um sistema de práticas e valores, crenças e interesses coligados aos sujeito-nomeadores e continuam firmados nos topônimos mesmo no momento que a motivação toponímica, presente no ato de nomear, não mais exista de fato. Sendo assim, estes locativos fazem parte de um vocabulário sócio-histórico, no qual se pode reconhecer informações que se inter-relacionam com a Toponímia e o mundo biossocial no qual o signo toponímico está inserido. Quanto aos processos de formação lexical, eles podem ser caracterizados como elemento específico simples, elemento específico composto e elemento composto híbrido conforme sua estrutura morfossintática. O topônimo é formado por dois termos: o primeiro chamado de elemento genérico que é relativo à entidade geográfica que irá receber a denominação identificando- Quanto ao seu valor semântico, é interessante destacar, ainda, que o signo toponímico se contrapõe ao signo linguístico pela sua motivação, porém não há uma Página que é o topônimo propriamente dito, é o que particulariza a noção espacial. 46 a e singularizando-a dentre outras semelhantes e o segundo termo é o elemento específico, relação direta entre linguagem e mundo, e sim um trabalho social designando o mundo por um sistema simbólico cuja semântica vai se construindo situadamente. Assim, é por meio da língua que dados são fornecidos para que se possa recuperar simbolicamente a realidade sociocultural e histórico-geográfica de um povo na construção do significado linguístico. Por conseguinte, os signos toponímicos são veículos de cultura, marcam influências, atitudes, tradições e falares. Eles atuam na construção de sentidos, em seus objetivos pragmáticos e discursivos, ressaltando a relação simbólica existente entre linguístico e seu contexto extralinguístico na ação de nomear lugares. Daí se percebe, pois, o valor patrimonial destes locativos, conforme assinala Dick (1996, p. 337), o topônimo “vai deixando de ser apenas um instrumento de marcaç~o ou de identificaç~o de lugar para se transformar em um fundo de memória, de natureza documental tão valiosa e significativa como os textos escritos”. Portanto, deveriam estar inclusos no corpus lexicográfico dos dicionários escolares enciclopédicos, sobretudo nos usados em sala de aula do Ensino Médio. No âmbito da confecção de dicionários, segundo Rangel (2006, p.28), [...] um dicionário prestará serviços tão mais adequados quanto mais ajustados ao público a que se dirige forem o seu zelo descritivo e a representatividade de sua cobertura. Por isso mesmo, todo e qualquer dicionário segue um plano próprio, orientado para uma situação de uso e um público determinados. A partir do supracitado, quanto ao projeto lexicográfico do dicionário enciclopédico escolar brasileiro, nesta reflexão entende-se que o enunciado-verbete correspondente ao topônimo da palavra-entrada deva conter sua categorização, detectando os padrões motivadores, sua estrutura morfossintática e processo de formação lexical, e mais o substrato linguístico da rede toponímica cuja origem possa remontar os diferentes étimos, viabilizando assim a reconstituição etimológica do léxico toponímico do Brasil. Como também alguns dados enciclopédicos sobre aspectos geohistóricos, socioeconômicos e antropolínguísticos da região no qual o signo toponímico está inserido. No aprendizado de uma língua e, conseguintemente na aquisição do léxico, o que linguísticas, mas todo um sistema de práticas e valores, crenças e interesses a ele 47 associados. Com efeito, estas obras lexicográficas direcionadas para sala de aula devem ser Página se adquire não é pura e simplesmente um código, com suas regras especificamente compreendidas como um gênero textual específico de suma relevância na prática pedagógica. Nelas, encontra-se não apenas informações linguísticas, mas também conhecimentos enciclopédicos, científicos e ideológicos que podem auxiliar na leitura e produção textual em diferentes práticas sociais. Os mais recentes trabalhos voltados à área da Metalexicografia escolarconsignam às necessidades de múltiplos dicionários, os adequando ao nível de conhecimento dos aprendizes e à serventia para a qual eles buscam esse apoio. Ao tratar sobre o dicionário de uso escolar, Ranchel (2011, p.38) explica que Um produto cultural como este é objeto de discussões em ao menos quatro esfera distintas: a acadêmica (no âmbito da lexicologia pedagógica, por exemplo), a prática didático-pedagógica, a da produção editorial (e/ou o da prática lexicográfica) e das políticas públicas voltadas para o livro didático e a leitura, em especial as do âmbito educacional. Os dicionários enciclopédicos de uso escolar envolvem conhecimentos não apenas linguísticos, mas também conhecimentos extralinguísticos na construção de sentidos. No que diz respeito aos topônimos, Dick (1990, p. 365) afirmar que “identificar acidentes geográficos, significando, é, sem dúvida, a primeira qualidade que se infere do signo toponímico”. Assim, eles podem viabilizar a compreensão de possíveis relações da língua com elementos internos e externos ao sistema linguísticos. Dentro desta perspectiva, o texto lexicográfico pedagógico adquiri sentidos que podem ser atribuídos aos nomes de lugares na produção e/ou recepção textual, assim como desvelar possíveis discursos vinculados a essas materialidades linguísticas e que não são levados a cabo em nossos dicionários escolares. Da mesma forma que os dicionários de língua geral, os de uso escolar, também dispõem de dois eixos básicos: macro e microestrutura. Assim sendo, a não-inclusão dos topônimos nas obras lexicográficas enciclopédicas causa um problema macro e microestrutural, como também quanti-qualitativo nos dicionários que, provavelmente, repercute nos aprendizes e professores em suas práticas, no processo de ensinoaprendizagem de língua portuguesa e na produção e recepção de texto, visto que nessas obras de cunho pedagógico também não serão identificados os diversos saberes e dizeres macroestrutural da obra escolar deve buscar suprir as necessidades de aprendizagem de 48 seu público alvo, incluindo palavras que façam parte das áreas do conhecimento com as Página que se materializam nos signos toponímicos. Vale apenas assinalar que a seleção quais ele tem contato nas diversas disciplinas escolares. Nesse sentido, os topônimos, em sua construção de sentido, se vinculam aos contextos tanto linguísticos como socioculturais. Dessa forma, dialoga com diferentes áreas do conhecimento. Nessa perspectiva, Coroa (2011, p. 67) chama atenção para o fato de como integrante de pr|ticas discursivas, o dicion|rio “constitui-se em produtivo instrumento de fazer linguístico: é mais um dos elementos simbólicos de que cidadãos leitores e produtores de textos dispõem para construir, e reconstruir, redes de significações e constituir sujeitos”. Assim, torna-se de fundamental relevância um trabalho com dicionário escolar que possibilite desvendar de forma crítica que sentidos possíveis podem ser atribuídos a dados verbetes, podendo desvelar as dimensões discursivas que configuram e caracterizam os efeitos de sentidos no fazer dicionarístico pedagógico. Na atividade docente, com o uso do dicionário escolar enciclopédico, deve-se ultrapassar o plano da forma, uma vez que a linguagem se pensada pelo viés discursivo, oportuna a apreensão de que a língua não serve unicamente como instrumento para comunicação; ela veicula, também, posições políticas e ideológicas na sociedade de classes da qual faz parte, provocando um deslocamento na rede de filiação dos sentidos, pois os sujeitos e os sentidos se deslocam, realizam suas próprias trajetórias. Cumpre lembrar, ainda, que o nomeador é um sujeito situado sóciohistoricamente inserido num tempo e num espaço determinado e os nomes por ele escolhidos para designar uma localidade remetem à intencionalidade do ser humano, em um determinado contexto línguo-cultural. Assim, os topônimos adquirem valores que transcendem o próprio ato de nomear lugares, pois podem designar várias iniciativas, como também, podem ser utilizados para propósitos muito diferentes e proceder de diversas intencionalidades. Sob esse olhar, advoga-se que topônimos não servem apenas para identificar lugares, ou seja, eles não teriam apenas uma função de referencialização espacial, mas uma representação intencional e objetiva na qual o nomeador, por meio da língua, faz conhecer a partir da atividade linguística uma demarcação expressiva de poder, enciclopédico. Página relevância no léxico da língua e, consequentemente no contexto do dicionário escolar 49 de posse, de identidade de domínio geográfico de dados grupo(s), portanto são de suma Além disso, pensando no quesito de frequência lexical, concorda-se que não seja desejável que o dicionário escolar apresente registros raros de uso da língua, mas sim focar o que é comum, típico e frequente. Nesse sentido, os topônimos são usados na língua geral, estando presentes na vida diária quando se utiliza a língua em diferentes práticas sociais. Logo, deveriam ser alçados à categoria de palavra-entrada de verbetes nestas obras lexicográficas pedagógicas já que não são registros raros de uso da língua, tanto em sua modalidade oral como escrita, mas pelo contrário, são vocábulos comuns e frequentes. Visto que estas obras lexicográficas de caráter pedagógico consistem em um produto linguístico, mas também, um produto histórico, cultural, social, temporal, econômico e ideológico. E mais, seu repertório lexicográfico está condicionado ao momento histórico no qual elas são produzidas; à situação cultural em que elas são geradas; ao valor de autoridade que lhe são atribuídas; à vigência das informações nelas contidas; ao custo econômico que implica em sua elaboração e aquisição; e à representação do mundo que elas oferecem. No entanto, professores e alunos do Ensino Médio, ainda, apresentam dificuldades na utilização de dicionários escolares no contexto de sala de aula, frequentemente não compreendem como esses materiais pedagógicos estão organizados e, na maioria das vezes, não têm condições de utilizá-los como uma ferramenta útil ao processo de ensino/aprendizagem, desconhecendo os diferentes tipos de dicionários e, desse modo, não se sentem capazes de selecionar um mais adequado às atividade a ser desenvolvida na escola formal. Considerações finais Os nomes de lugares recebem influências internas e externas à língua que podem ser únicas ou combinadas. Essas motivações toponímicas podem vir das condições geofísicas, históricas, culturais, sociais, etimológicas, semânticas, ideológicas, entre outras. Com efeito, os nomes de cidades brasileiras trazem informações diretas ou indiretas referentes à história do lugar ou e/ou do grupo social que constitui o local nomeado e seus No entanto, a partir de uma observação nos dicionários escolares monolíngues impressos em Português Michaelis (2014), Biderman (2012), Bechara (2011), Silveira Página toponímicos surgem. 50 significados resultam dos diferentes contextos sócio-históricos em que esses signos Bueno (2007), Tufano (2005), Cegalla (2005), Mini-Aurélio (2001) atestou-se o nãoacolhimento de topônimos como entradas de verbetes no corpus lexicográfico dessas ferramentas de consulta utilizadas pelos professores e aprendizes da Língua Portuguesa. Como também não houve registro de dicionário enciclopédico escolar brasileiro, focando os topônimos disponíveis para os alunos do Ensino Básico no Brasil. Sendo assim, em virtude desses materiais didáticos assumirem diversos papéis respondendo a questões linguísticas, mas também sociais, pragmáticas, culturais, ideológicas, didáticas, entre outras, eles devem ser vistos sob novas perspectivas. Portanto, torna-se fundamental desvendar os efeitos de sentidos constituídos no léxico toponímico e registrá-los no corpus lexicográfico enciclopédico pedagógico e, consequentemente incluir o signo linguístico em função onomástica como palavra-entrada de enunciado-verbete nestas obras lexicográficas direcionadas ao Ensino Básico, sobretudo no Ensino Médio. Isso se torna possível, quando se leva em consideração uma possível interlocução entre Toponímia e Metalexicografia escolar. É nesse cenário que se deve considerar a proposta de inserção dos topônimos que como entradas de verbetes no dicionário enciclopédico de uso escolar, visto que o verbete lexicográfico pedagógico deve se constituir de informações semânticas, pragmáticas, discursivas e ideológicas que se integram e se complementam na construção do sentido com todas as suas implicações. Cumpre enfatizar ainda que, nessa reflexão, concorda-se que não é desejável nos dicionários didáticos a presença de registros raros de uso da língua, mas sim unidades lexicais corriqueiras. Por conseguinte, também seguindo o critério de frequência lexical, defende-se a inserção dos topônimos com a justificativa de que estes signos toponímicos não são registros raros de uso da língua, tanto em sua modalidade oral como escrita, pelo contrário, eles estão presentes na vida diária quando se usa a língua em diferentes práticas sociais. Logo, deveriam ser alçados à categoria de palavra-entrada de enunciado-verbetes nestas obras lexicográficas pedagógicas. Por fim, quanto ao uso do dicionário escolarenciclopédico no Ensino Básico, monológica isolada, mas sim, da interação verbal no fenômeno social. Ela deve, dessa forma, ser estudada e entendida dentro da esfera da relação social organizada. Com efeito, Página linguagem não se constitui somente de formas linguísticas ou de uma enunciação 51 defende-se sua utilização como práticas pedagógicas discursivamente situadas, visto que a a prática pedagógica com dicionários de uso escolar e a construção de sentidos nesse processo não poderiam estar desvinculadas desse princípio, uma vez que o texto lexicográfico enquanto objeto simbólico produz efeitos de sentidos e estão investidos de significância para os sujeitos e pelos sujeitos. Página BORBA, Francisco. da Silva. Organização de dicionários: uma introdução à lexicografia. São Paulo : UNESP, 2003. CARVALHINHOS, P. J. 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O percurso metodológico consistiu da seguinte forma: curso pré-vestibular para 500 distribuídos em quatro campi da Universidade Estadual de Alagoas. Além do curso pré-vestibular foram realizadas formação continuada para professores do ensino fundamental, aulas de reforço para alunos do ensino fundamental e médio, palestras e um Aulão Beneficente para os alunos das escolas públicas. Percebe-se, portanto, que o curso de extensão Pré-UNEAL se mostra a cada dia como um ambiente propício no qual os alunos graduandos da Universidade Estadual de Alagoas (UNEAL) podem exercer o ato de ensinar e, dessa forma, possibilitar um bem estar mútuo, tanto aos alunos do curso, que podem ter mais chances de ingressar na universidade, quanto aos próprios graduandos, que por meio da ação docente possibilita a ressignificação de seus saberes, gerando novos contornos a sua identidade profissional, levando-os a atitudes reflexivas, questionadoras e transformadoras da realidade, a serviço da realização de uma sociedade independente, igualitária, voltada para os interesses concretos da população brasileira. Palavras - chave: Educação básica, escola pública, inclusão social. Introdução Atualmente, o Brasil é palco de muitos casos que evidenciam as desigualdades sociais como, por exemplo, problemas de ordem educacional, onde muitas pessoas buscam espaço no ensino superior e freqüentemente se deparam com dificuldades como a falta de condições financeiras para manter um curso universitário em uma universidade particular. Diante desse contexto vivido por grande parte dos brasileiros, percebe-se a necessidade de projetos e programas de extensão universitária a fim de integrar a sociedade à universidade, pois a extensão universitária é definida pelo Plano Nacional de Extensão (1991-2001) como “pr|tica acadêmica que objetiva interligar a universidade, em suas atividades de ensino e pesquisa, com as demandas da sociedade” (BRASIL, 2000). As funções da universidade (ensino, pesquisa e extensão) no senso comum, apenas se consolidam se estiverem em relação com a sociedade, constituindo-se permanentemente nessa relação. Dessa forma, a universidade passa a refletir e criticar os processos societários, pressupondo a valorização do fazer em relação com o saber (OLIVEIRA, 2004). Para Nogueira (2000) a universidade e, em especial, as pró-reitorias de extensão devem induzir programas e projetos que visem enfrentar os problemas específicos produzidos pela situação de exclusão. Para definir todo o contexto indissociável entre a universidades direcionam-se para a criação, a produção do conhecimento e a busca do saber através de atividades de ensino, pesquisa e extensão, onde a pesquisa desenvolve o Página discussão: universidade, educação, investigação, conhecimento e sociedade. As 54 sociedade e a universidade, Lamas (2006) apresenta como conceitos básicos para essa papel de investigar assuntos pertinentes à sociedade, comprovando a relação contínua entre universidade e sociedade. A Declaração Mundial sobre a Educação Superior para o Século XXI inclui os conceitos concernentes à missão social da educação superior contemporânea, tais como: (a) A pertinência da educação superior deve ser avaliada em função da adequação entre o que a sociedade espera das instituições e o que estas fazem. Isto exige padrões éticos, imparcialidade política, capacidade crítica e, ao mesmo tempo, melhor articulação com os problemas da sociedade e do mundo do trabalho, baseando as orientações de longo prazo em objetivos e necessidades societais, compreendidos o respeito pelas culturas e a proteção ambiental. A preocupação é de abrir acesso tanto à educação geral ampla como à educação especializada, específica para determinadas carreiras, muitas vezes interdisciplinar, centrada nas competências e aptidões, pois ambas preparam os indivíduos a viver em situações diversas e a poder mudar de ocupação. (b) A educação superior deve reforçar seu papel de prestadora de serviço à sociedade, especialmente orientada a erradicar a pobreza, a intolerância, a violência, o analfabetismo, a fome, a doença e a degradação ambiental, sobretudo mediante uma abordagem interdisciplinar e transdisciplinar na análise dos problemas e das questões. (c) A educação superior deve fortalecer sua contribuição ao desenvolvimento de todo o sistema educacional, sobretudo para o aperfeiçoamento dos docentes, do desenvolvimento curricular e da pesquisa educacional. (d) Finalmente, a educação superior deve visar a criação de uma nova sociedade, não violenta e não-exploradora, formada por indivíduos altamente esclarecidos, motivados e integrados, inspirados pelo amor à humanidade e guiados pela sabedoria (UNESCO, 2003 p. 20 ). Neste sentido, este trabalho tem como objetivo analisar a contribuição do Programa PRÉ-UNEAL para a democratização do ensino superior, bem como refletir sobre seus impactos, visando compreender o papel desse programa de extensão na formação dos alunos de diversos cursos dessa instituição e sua inserção como um importante lócus de atenção à Educação no Estado de Alagoas. Para este estudo discutiremos o tema “Extens~o universit|ria, um breve histórico”, considerado importante para o desenvolvimento da pesquisa: Extensão Universitária, Um Breve Histórico A Extensão universitária deve ser definida como a mola propulsora da Universidade, especialmente no mundo globalizado, pois ela tem um compromisso sério com a sociedade. O Plano Nacional de Extensão Universitária a define como o processo educativo, cultural e científico que articula o ensino e a pesquisa de forma indissociável e viabiliza a relação transformadora entre Universidade e Sociedade. A extensão reafirma o ainda, como o ir e vir de docentes, alunos, servidores e pessoas da comunidade. Estes Página programas e projetos, de acordo com as demandas da sociedade. Deve ser entendido 55 compromisso social da universidade promovendo ações de inserção por meio de buscam a solução de problemas da sociedade em todas as áreas do conhecimento (BARRAVIERA, 2004). Mendes et. al. (1978) afirma que a extensão universitária pode ser compreendida também como toda diligência universitária que aponte a relação universidadecomunidade. Para TOSCANO; LIRA (2012) a extensão universitária adquiriu forma oficial desde a vigência do Decreto-Lei No 252/67, de 28/02/67. Seu artigo 10 institui: “A universidade, em sua missão educativa, deverá estender à comunidade, sob forma de cursos e serviços especiais, as atividades de ensino e pesquisa, que lhe são inerentes". RUNIERI (1997) confirma que universidade é autônoma para eleger a forma como prestar essa extensão, bem como a maneira como se dará essa indissociabilidade; e a autonomia e a indissociabilidade tornando a universidade parceira do Estado e acrescenta: A universidade pública tanto quanto a privada recebem da sociedade insumos para oferecer esse tipo de trabalho. Na universidade pública, a sociedade financia inteiramente o trabalho universitário. Na universidade particular, a imunidade tributária reflete também um financiamento social. O fim da autonomia e o fim da indissociabilidade é a sociedade, e é apenas em função da sociedade que esses princípios têm sentido no nosso ordenamento jurídico Runieri (1997, p. 147). A extensão universitária passa a existir como instrumento a ser usado pela Universidade para a concretização do seu compromisso social e também como articuladora de suas relações. Ela vai auferir, desde o seu início, a responsabilidade de concretizar este compromisso com as comunidades. Esse papel articulador não deve, necessariamente, ser visto como a mudança para falhas no ensino e na pesquisa. Trata-se de um momento de construção em que extensão universitária é uma ferramenta necessária e útil para tornar os produtos da universidade mais próximos da sociedade SOUZA (1975). A extensão inicia uma trajetória para transformação da sociedade, transforma-se a si mesma e transforma sua relaç~o com os outros “fazeres” acadêmicos - ensino e pesquisa. No Brasil, ao final da década de 30 e inicio da seguinte, houve um período de grande efervescência, em termos de experiências de práticas educativas em extensão. Tendo como foco a cultura, são criadas salas de leituras, experiências de rádio difusão, Página soluções dos problemas sociais, SERRANO (2015). 56 difusão cultural, além dos cursos e conferências abertas objetivando a discussão e Extensão também se apresenta como uma forma de corrigir a ausência da universidade na problemática da sociedade. Entretanto, a formulação vai mais além, considera a universidade como ausente dos problemas da sociedade, MELO NETO (2012). Por meio da extensão, a universidade tem a oportunidade de levar até a comunidade os conhecimentos de que é detentora, os quais são produzidos com a pesquisa e que normalmente divulgam o ensino. É uma forma de a universidade socializar e democratizar o saber científico, de modo a este não se traduzir em privilégio apenas da minoria da população (universitária), mas difundido também à comunidade não acadêmica, consoante os próprios interesses dessa mesma comunidade. Posto isto, há de se afirmar que uma sólida formação universitária é um dos maiores contributos da universidade para a sociedade, SANTOS (2012). Compreender a prática de extensão universitária nas universidades públicas, supõe conhecer historicamente como se deu sua política na história da educação brasileira. A história da Extensão Universitária está ligada à origem das Universidades européias, caracterizando-se por campanhas de saúde e assistência às populações carentes, Castro, (2015 p. 4) apud Rocha (2002). O fenômeno da expansão universitária iniciou-se na segunda metade do século XX em todo o mundo, sendo seus cursos ofertados conforme as necessidades de mercado. No Brasil, foi a partir do Decreto nº 19.851, de 11/04/1931, da Constituição Federal Brasileira, que se começou a fazer referência à extensão como instância realizadora de cursos, conferências e outras atividades educativas no espaço acadêmico. Assim, passou a existir uma relação dinâmica e processual entre o fazer universitário e os interesses locais e regionais do entorno da universidade, refletindo diretamente nas políticas de expansão e privatização do Ensino Superior. Nas décadas de 1940 e 1950 poucas discussões ocorreram acerca da extensão universitária. Foi nos anos 60 que o conceito de universidade começou a ser atrelada ao trinômio ensino-pesquisa-extensão, período em que as instituições de educação superior natureza essencialmente marcada por atividades extracurriculares, com forte participação popular e comunitária, SANTOS (2012). Página contemplassem concepções e diretrizes para a extensão universitária. Em função da 57 passaram a discutir a questão da práxis universitária, incorporando políticas que No início da década de 1970 surgiu um grande paradoxo em relação à visão de extensão universitária: por um lado era vista sob o aspecto do fortalecimento dos movimentos sociais e, por outro, sob o caráter manipulador e assistencialista. Destaque-se que em meio a tal situação, surgiu um novo cenário – o início de negociações para a redemocratização do Brasil. Era o prenúncio do começo de uma nova década Oliveira e Garcia (2009, p.112 citado por Santos, p.12). Foi nos anos 80, apesar de conviver ainda com a crise de identidade, principalmente sob o estigma do assistencialismo, a extensão passou a ser objeto de estudos e debates que anunciavam sua participação definitiva como prática acadêmica necessária à formação (complementar) de docentes e discentes e indissociada do ensino e da pesquisa, SANTOS (2012). Na década de 1990, a extensão foi vista como um espaço privilegiado para viabilizar a interação do social e do institucional, em variadas e amplas dimensões, a fim de difundir e construir novos conhecimentos, articular um processo educativo, cultural e científico, ao lado do ensino e da pesquisa, gerado pelas possibilidades e pela força nascidas das relações sociais e comunitárias frutos da intensa reflexão provocada sobre paradigmas atuais (OLIVEIRA e GARCIA, 2009; SANTOS, 2012) As origens da extensão universitária no Brasil reportam-nos, em especial, ao papel que as universidades públicas foram “conclamadas” a assumir por parte dos órg~os governamentais a partir dos anos 30. A retórica em torno da qual se afirmava a extensão, versava sobre o dever da universidade em retornar à população (carente) suas produções e seus conhecimentos. Tratava-se de um processo de mão única (universidade-sociedade) imbuído de inúmeros preconceitos ideologicamente criados e reforçadores da sociedade de classes (SANTOS, 2012). No Brasil, a extensão surge oficialmente no Decreto 19.851, de 11 de abril de 1931, durante o Governo Provisório de Getúlio Vargas, com a chegada ao poder dos representantes dos escolanovistas. O ent~o ministro Francisco Campos lançou o “Estatuto da Universidade Brasileira” e nele aparecem as primeiras referências {s ações extensionistas, indicando a aproximação entre o ensino superior e a sociedade (ROCHA, 2012). No contexto histórico dos últimos 30 anos, no Brasil mudanças políticas, econômicas e sociais têm ocorrido influenciando nas discussões teóricas de caracterização mercantilista, que construídas historicamente se corporificam no exercício da prática curricular das atividades universitárias e expressam diferentes perspectivas ideológicas Página extensão universitária, quais sejam: a concepção assistencialista, a acadêmica e a 58 ou não da extensão como uma função da universidade, formulando-se três concepções de de universidade/extensão universitária e da relação universidade e sociedade (JEZINE, 2004). O Plano de Trabalho de Extensão Universitária estabelece ainda que a "Coordenação das Atividades de Extensão deverá articular-se com Organismos que servem de suporte à ação extensionista das Universidades, visando à garantia de uma linha de ação em comum e a promoção de atividades que possam garantir esta unidade". Mendes (1978, p. 2). Para Miranda (2009) a ampliação de competências profissionais, a pesquisa e a extensão são imprescindíveis. O processo de aprendizagem passa a fundamentar-se e depender de observações favoráveis, de atitudes reflexivas, questionadoras, que transcorrem do diálogo e da influência mútua com a realidade, para compreendê-la e transformá-la. Dessa forma, criam-se condições para que a formação do estudante não se limite apenas aos aspectos técnicos, formais e passe a mirar seus aspectos sociais e políticos, desertando a conscientização crítica. Em 1996, a Lei n. 9.394, de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, reafirma e detalha, entre os objetivos da universidade, a Extensão Universitária. A Extensão Universitária é o processo educativo, cultural e científico que articula o Ensino e a Pesquisa de forma indissociável e viabiliza a relação transformadora entre Universidade e Sociedade. A Extensão é uma via de mão-dupla, com trânsito assegurado à comunidade acadêmica, que encontrará, na sociedade, a oportunidade de elaboração da práxis de um conhecimento acadêmico. No retorno à Universidade, docentes e discentes trarão um aprendizado que, submetido à reflexão teórica, será acrescido àquele conhecimento, BRASIL (1996). Esse fluxo, que estabelece a troca de saberes sistematizados, acadêmico e popular, terá como conseqüências a produção do conhecimento resultante do confronto com a realidade brasileira e regional, a democratização do conhecimento acadêmico e a participação efetiva da comunidade na atuação da Universidade. Além de instrumentalizadora deste processo dialético de teoria/prática, a Extensão é um trabalho interdisciplinar que favorece a visão integrada do social CORRÊA (2007). estruturação de uma Política de Extensão para as Universidades Públicas brasileiras; política esta que possa delinear linhas gerais de atuação da ação extensionista, sem Página colocado à frente desta discussão, ajustando e tensionando posições no que fere a 59 Para Oliveira (2004), o Fórum Nacional de Pró-Reitores de Extensão tem-se negligenciar de sua operacionalidade, ou seja, do fomento para os projetos. A concepção tradicional de extensão sofre uma profunda inflexão, a partir do Plano Nacional de Extensão Universitária, de maio de 1998... É interessante apreender que a inflexão mencionada mostra outra concepção de universidade – e, logo, de extensão -, que sai na contracorrente da concepção predominante da reforma universitária concretizado pelo atual governo, através da prática da LDB. Expõem a tensão de forças políticas presentes na universidade brasileira, em que campos progressistas apontam presença no estabelecimento de diretrizes para a extensão universitária no país. No fim da década de 80, o reconhecimento legal das atividades acadêmicas de extensão, sua inclusão na Constituição e a organização do Fórum de Pró - Reitores de Extensão, proporcionaram à comunidade acadêmica as condições e o lugar para uma conceituação precisa da extensão universitária, BRASIL, (2000); PARREIRA, (2012). No Fórum a extensão foi conceituada como: Processo educativo, cultural e cientifico que articula o ensino e a pesquisa de forma indissociável e viabiliza a relação transformadora entre universidade e a sociedade. A extensão e uma via de Mão dupla, com transito assegurado a comunidade acadêmica que encontrara na sociedade, a oportunidade de elaboração da práxis de um conhecimento acadêmico. No retorno a universidade, docentes e discentes trarão um aprendizado que, submetido a reflexão teórica, será associado aquele conhecimento. Este fluxo que estabelece a troca de saberes sistematizado, acadêmico e popular, terá como conseqüência: a produção de conhecimento resultante do confronto com a realidade brasileira regional; a democratização do conhecimento acadêmico e a participação efetiva da comunidade na atuação da universidade. Alem de instrumentalizada deste processo dialético de teoria/ pratica, extensão e um trabalho interdisciplinar que favorece a visão integradora social BRASIL, (2012, p. 5). Para Araújo e Casimiro (2012) a extensão universitária mostra-se como uma obrigatoriedade constitucional aparelhada no artigo 207, da Constituição Brasileira. Alega que “as universidades gozam de autonomia did|tico-científica, administrativa e da gestão financeira e patrimonial e obedecerão ao princípio da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extens~o”. A extens~o por ser um espaço de divulgaç~o e articulaç~o, envolve processos comunicativos necessários que precisam ser eficientes para que a universidade cumpra seu compromisso com a sociedade. descritivos mediante o contato direto e interativo do pesquisador com a situação objeto de estudo, procurando entender os fenômenos, segundo a perspectiva dos participantes da Página A presente pesquisa foi qualitativa, pois objetivou-se a obtenção de dados 60 Metodologia situação estudada e, a partir daí, situou-se a interpretação desses fenômenos estudados através de um caráter descritivo e enfoque indutivo. Na pesquisa quantitativa, foram identificadas as pessoas entrevistadas por meio de critérios previamente definidos: sexo, idade, ramo de atividade, localização geográfica etc., sendo esses critérios obtidos por meio de questionários previamente elaborados para esse fim. A pesquisa quantitativa possibilitou a tradução de opiniões e informações em números, para classificá-las e analisá-las posteriormente, com o auxílio de recursos e técnicas estatísticas (percentagem, média, desvio-padrão, coeficiente de correlação, análise de regressão, etc.) (MINAYO, 2007; LAKATOS et al, 1986). Nesse sentido, a pesquisa qualitativa busca a subjetividade do pesquisador, ou seja, a organização de idéias e conceitos do mundo interno e externo do sujeito, baseada nas relações interpessoais, atribuindo um significado às experiências vividas (ALMEIDA e PETRAGLIA, 2006). Os procedimentos metodológicos consistiram da seguinte forma: inicialmente foi realizado um levantamento bibliográfico em livros, artigos científicos, revistas acadêmicas, sites e documentos oficiais com o objetivo de conhecer as diferentes contribuições científicas disponíveis sobre o tema estudado. Em seguida, foi feito um levantamento do perfil dos alunos beneficiados pelo projeto. Após o levantamento dos alunos, realizamos visitas aos campi I, III e IV, onde a pesquisa foi desenvolvida, a fim de obter mais informações sobre a capacidade por parte de cada campus de manter o projeto e o grau de interesse dos alunos pelo mesmo, dando início à pesquisa de campo, com visitas periódicas para analisar o aproveitamento que os professores e alunos fazem do PRÉUNEAL. Desde a sua criação em abril de 2007, o curso pré-vestibular atendeu cerca de 3120 alunos da rede pública de ensino, sendo 1120 alunos no Campus I – Arapiraca; 400 no Campus II em Santana do Ipanema; 600 no Campus III em Palmeira dos Índios; 900 no Campus IV em São Miguel dos Campos e 100 no Campus V em União dos Palmares. Para este trabalho destacamos programa PRÉ-UNEAL financiado pelo MEC/SESu/UNEAL realizado no período de 2012 a 2014. Fazem parte do Programa as seguintes atividades: no turno matutino e duas turmas no turno vespertino, em salas localizadas na UNEAL); Página Os estudantes assistiram aulas de segunda à sexta (04 turmas, sendo 02 turmas 61 Curso Pré-vestibular Fazem parte do programa das aulas as disciplinas: Biologia, Química, Física, Geografia, História, Matemática; Língua Portuguesa, Literatura, Redação e Inglês. Todas as aulas são voltadas para o vestibular e Prova do ENEM. A forma de avaliar a eficácia das aulas é através de simulados; As pessoas que ministram o curso são: alunos 4º ao 8º período dos cursos de Química, Biologia, Matemática, História, Geografia, Letras. Para os vestibulandos o curso foi totalmente gratuito. Para o licenciando foi fornecido pela UNEAL um certificado de participação no programa de extensão como monitor com a carga horária equivalente as aulas dadas e uma bolsa no valor de R$ 200,00 durante seis meses. Aulas de Reforço Para os alunos da rede pública do ensino fundamental e médio; Ensino Fundamental do 6º ao 9º ao ano - Português, Matemática; Ensino Médio do 1º ao 3º ano Matemática, Português e Química. Essa atividade beneficiou 1230 alunos da rede pública estadual e municipal e 41 alunos bolsistas de graduação das licenciaturas, os quais receberam uma bolsa de R$ 200,00. As aulas de reforço foram realizadas em seis escolas, sendo quatro escolas da rede pública municipal e duas da rede pública estadual, duas vezes por semana, sendo ministradas pelos alunos dos cursos de Pedagogia, Letras, Matemática e Química. Formação Continuada para Professores A formação teve uma carga horária de 40 horas e aconteceu na Universidade Estadual de Alagoas nas disciplinas críticas Português e Matemática. Participaram da Formação Continuada aproximadamente 100 professores do 1º ao 5º ano da rede Municipal de Educação Arapiraca. Realização de Palestras Para alunos e Professores do ensino Médio com os seguintes temáticas: Educação feitas as análises dos dados e descrição das observações realizadas. Página Adolescência.e “Tecnologia da Informaç~o e da Comunicaç~o em Educaç~o.” Por fim, foram 62 Ambiental; Drogas nas Escolas; Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST) e Gravidez na Resultados e Discussões De acordo com a análise dos dados socioeconômicos aplicados com os alunos do curso pré-vestibular PRÉ-UNEAL foi elaborado o perfil dos alunos beneficiados pelo programa. Observou-se que 60% dos pais dos alunos beneficiados pelo programa estudaram apenas do 1°ao 5° ano, 26% não estudaram, 8,57% cursaram até o 9° ano do ensino fundamental e apenas 5,7% concluíram o ensino médio. Para essa realidade Cury nos mostra quatro fatores a serem analisado, o primeiro deles seria a situação socioeconômica dessas pessoas para que encurtasse sua vida escolar “Sabemos todos que a distribuição de renda e da riqueza no país determina o acesso e a permanência dos estudantes na escola. Sabemos também que o aumento da permanência de estudantes na escola depende da realização do direito ao saber, sob um padrão de qualidade possível de ser incrementado” CURY (p.169, 2002). O segundo fator seria o novo conceito hoje dado { educação básica, ganhando assim uma nova significação. A educação básica torna-se, dentro do art. 4º da LDB, um direito do cidadão à educação e um dever do Estado em atendê-lo mediante oferta qualificada. E tal o é por ser indispensável, como direito social, a participação ativa e crítica do sujeito, dos grupos a que ele pertença, na definição de uma sociedade justa e democrática BRASIL (p.170, 1988). No terceiro fator Cury fala da obrigatoriedade do Estado e suas obrigações “a nossa Constituiç~o reconhece a educaç~o como direito social e dever do Estado” CURY (p.169, 2002). No quarto e último fator ele ressalta o primeiro fator, que fala das condições socioeconômicas, nos levando a falar da desigualdade social, “que atende pelo nome de pobreza ou de miséria e significa a exclusão histórica e atual de um número significativo de estudantes provindos de famílias de baixa renda” (CURY, p.179, 2002). Podemos observar uma grande diferença da realidade vivida pelos pais com relação aos filhos hoje, pois apesar de a questão educacional brasileira apresentar 97% dos alunos com acesso ao ensino fundamental, apenas 52% deles conseguem concluí-lo. Dos jovens beneficiados pelo projeto 50% são entre 16 e 18 anos, 44% são de 19 a 22 anos e 6% acima de 30 anos, Página O jovem brasileiro que chega ao fim do ensino médio é chamado a fazer escolhas profissionais e pode optar pela continuação dos estudos ou pelo ingresso imediato no mercado de trabalho. Uma das alternativas disponíveis para que o jovem continue seus estudos é a educação superior SPARTA; GOMES, ( p .46, 2005). 63 que já concluíram ou estão cursando o ensino médio. Observou-se através da análise que 86% dos alunos que estão frequentando o curso pré-vestibular Pré-Uneal tem como o principal objetivo o egresso na Universidade, 8% é para ter um bom emprego e 6% apenas para testar os conhecimentos adquiridos no ensino médio. Os resultados da pesquisa confirmam os estudos de Sparta; Gomes (p. 48, 2005): As expectativas traçadas foram de que a escolha pela continuação dos estudos através da educação superior apresentar-se-ia como meta prioritária em detrimento de outras possibilidades de formação, principalmente a profissional, ou do ingresso imediato no mercado de trabalho. Com relaç~o ao sexo “tem-se chamado a atenção para o acesso diferenciado de homens e mulheres ao ensino superior” (QUEIROZ, 2001), pois dos alunos analisados na amostra que pretendem ingressar no ensino superior 80% é do sexo feminino e os 20% restante são sexo masculino. Esses números mostram que a quantidade de homens e mulheres nas cadeiras das universidades hoje praticamente são iguais, ou o número de mulheres pode até ser superior dependendo do curso analisado. Dos alunos analisados 50% vai seguir a área das ciências biológicas, 25% a área das ciências humana, 4% a área das ciências exatas e apenas 17% não escolheu que área seguir. Com relação à escolha da área a seguir 22,9% dos alunos afirmaram que foram os pais que influenciaram na escolha, 40% a escola, 37,1% informações gerais (revistas, jornais, entre outros). 94,3% dos alunos também alegaram não ter condições para pagar um curso preparatório para vestibular. “Nas últimas décadas foram propostas políticas públicas, com programas específicos que contribuem para o acesso de estudante de baixa renda nesse nível de ensino” (CAÔN; FRIZO, p.1), como por exemplo, cursos prévestibulares gratuitos (CAÔN; FRIZO). A Universidade Estadual de Alagoas (UNEAL) vem desempenhando um papel muito significativo na vida de muitos jovens de Arapiraca e das cidades circunvizinhas, Craíbas, Taquarana, Coitè do Nóia, Feira Grande, Lagoa da Canoa, Girau do Ponciano, Traipu, entre outras. Esses alunos são da rede de pública de ensino. Desses alunos 66% nunca trabalharam, 20% já trabalhou mais no momento da pesquisa estava desempregado, 8% trabalha mais não tem carteira assinada e 6% trabalha por renda de até um salário mínimo e 17% menos de um salário mínimo. Verificou-se também que de acordo com a profissão dos pais 60% dos pais vivem da agricultura e apenas 17% Página Quanto a renda, 63% não possui nenhum tipo de renda mensal, 20% possui 64 conta própria. não trabalha. O Programa de extensão Pré-UNEAL durante o período de 2007 a 2014 obteve o índice de aprovação na média de 45% nos vestibulares da UNEAL e da UFAL. Com relação aos licenciandos, a vivência com a realidade profissional do cotidiano do trabalho do ato de ensinar contribui muito para a formação. Dessa forma, possibilitou um bem estar mútuo, tanto aos alunos do curso, quanto aos próprios graduandos, possibilitando a ressignificação de seus saberes, levando-os a atitudes reflexivas, questionadoras e transformadoras da realidade, a serviço da realização de uma sociedade independente, igualitária, voltada para os interesses concretos da população brasileira. O curso visou contribuir para o cumprimento das três funções básicas da universidade ensino, pesquisa e extensão, destacando a extensão como referencial para formação docente, bem como da melhoria da qualidade da educação brasileira por meio de um trabalho interdisciplinar, educativo cultural e científico, estimulando o desenvolvimento social e o espírito criativo dos estudantes e professores pautada na cidadania. Considerações Finais Este estudo apresentou um breve panorama histórico da origem da extensão universitária e conceitos, tendo como referencial a indissociabilidade do trinômio ensinopesquisa-extensão para formação docente na educação superior brasileira e o atual papel da extensão universitária na vida acadêmica de professores e alunos no século XXI. Podese depreender que Extensão Universitária vivência um momento muito importante para sua consolidação como fazer acadêmico, entretanto as práticas institucionais através do próprio fazer extensionista e das normatizações universitárias necessitam melhor disporse diante das funções acadêmica, social e articuladora da Universidade. O conceito de extensão universitária das universidades brasileiras passou por vários matizes e diretrizes conceituais. Desde a extensão de cursos, à extensão serviço, à extensão assistencial, à extens~o “redentora da funç~o social da Universidade”, { extens~o como m~o dupla entre universidade e sociedade, à extensão cidadã, a ideia de uma extensão a serviço de um processo transformador, emancipatório e democrático; e ainda, de uma extensão educador na prática da liberdade, educar e educar-se,“em di|logo com aqueles que, quase sempre, pensam que nada sabem, para que estes, transformem seu pensar que nada Página A esse respeito FREIRE, 2006; SERRANO, 2015: citam a importância do papel do 65 desenvolvida no diálogo e no respeito a cultura local (SERRANO, 2015). sabem em saber que pouco sabem, possam igualmente saber mais.” (Freire, 2006, p. 25). “O conhecimento se constitui nas relações homem-mundo, relações de transformação, e se aperfeiçoa na problematizaç~o crítica destas relações” (Freire, 2006 p. 36), onde todos possam ser sujeitos atuantes, que agem e pensam criticamente. Com relação a pesquisa sobre Programa de extensão de forma clara foi possível observar que o curso PRÉ-UNEAL vem atendendo um número significativo de alunos da rede pública de ensino como também um bom índice de aprovação nos principais vestibulares principalmente na instituição a qual é desenvolvido o programa, aumentando as chances reais de acesso aos estudantes das escolas públicas para ingressarem nas universidades públicas, prestando uma grande contribuição para democratização do ensino superior, integrando a universidade com as escolas públicas, além de proporcionar a oportunidade dos licenciandos da Universidade Estadual de Alagoas (UNEAL) de atuarem como monitores na área acadêmica a qual está cursando. Essas atividades extensionistas acrescentaram significativamente para a formação do profissional das diversas licenciaturas. Dessa forma, pode-se observar os impactos que o curso de extensão PRÉ-UNEAL tem causado no Estado de Alagoas desde sua criação visto que atende alunos não só das cidades as quais os campus estão instalados, como também das cidades circunvizinhas, contribuindo para o desenvolvimento integral dos estudantes e para uma sociedade mais justa e igualitária. Por fim, estudo, pesquisa, extensão troca de conhecimento será o grande diferencial do mundo contemporâneo, quem apostar no ensino de qualidade, principalmente o universitário, sairá na frente, à educação é o inicio, o meio e a solução Página Referencias ALMEIDA, C. e PETRAGLIA I. (2006) (Orgs.) Estudos de Complexidade. São Paulo: Xamã. in LORIERI, Marcos Antônio. Educação e Subjetividade na Cultura Globalizada: idéias a partir da Teoria da Complexidade de Edgar Morin. Disponível em: <www.hottopos.com/notand_lib_11/lorieri2.pdf . 2008.> Acesso em: 10 jul. 2011. ARAÚJO, Francisco de Paula; CASIMIRO, Lilian Cristina da S. R. 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Apesar de enredo quase clichê e estático do retrato do interior nordestino, a região foi parte do Quilombo dos Palmares, junto com o município de União dos Palmares em Alagoas, no século XVII. Isto é, em tempos remotos, a região era núcleo de resistência negra antiescravista. Porém, tendo em vista a destruição do quilombo e ocupação por bandeirantes e demais proprietários de terra, o histórico de resistência, negritude e cultura foi inoculado e a maior parte da população traz, em oposição aos antigos moradores quilombolas, a marca da passividade, opressão e alienação coronelista. Assim, no intuito de reparar essa lacuna histórica e amparar a população carente de referências positivas para se afirmar geográfica, racial e pessoalmente, trabalhamos a história e a memória do Quilombo no município de Palmares através de oficinas de contação de história, desenho, pintura, recital de poesia, músicas e filmes com crianças de 8 à 12 anos de idade de uma escola pública municipal, pertencentes ao Programa Mais Educação, que instaura o aumento da jornada escolar no Estado de Pernambuco. Tal projeto visou a promoção de ações lúdicas e de conscientização da presença quilombola na região, ajudando a construir ou fortalecer a identidade negra nas crianças participantes do projeto. Palavras-chave: Quilombo dos Palmares.Negritude.Educação. Introdução Palmares, município localizado a margem da BR 101, região de Zona da Mata Sul de Pernambuco, banhado pelo rio Una, é o centro de uma região que traz em sua história a manutenção de oligarquias políticas que sustentam uma economia baseada na produção de cana-de-açúcar por grandes latifúndios. Tal economia, que é comandada por oligarquias que fazem uso da monocultura, tende a gerar enormes desigualdades sociais onde se estabelece, pois centraliza a renda nas mãos de grandes proprietários cabendo a populaç~o “comum” disputar subempregos em suas fazendas e usinas, no comércio ou Martín-Baró (1998), intitula de fatalismo das minorias, onde a população pauperizada e sem perspectiva cristaliza um comportamento de apatia e conformismo. Porém, frente a Página Esse tipo de situação socioeconômica gera o que o psicólogo da libertação, 69 serem servidores públicos e autônomos. possibilidades outras, a população tende a criar alternativas para sua condição de silenciamento e invisibilidade. No geral, essa condição de inquietação que gera mudança é possibilitada através da educação, seja ela formal ou informal. E através dessa educação e acesso a informação é possível se construir uma identidade coesa capaz de produzir orgulho e organização comunitária tendendo ao comportamento politizado e à mudança. Identidade é o reconhecer-se e reconhecer o outro num diálogo afirmativo de quem se é e do que os outros são, descobrindo as similaridades e diferenças que a legitimam. No caso de Palmares, para se construir identidade no sentido afirmativo a população precisa ter um repertório comum sobre sua cidade e sua gente que lhe cause orgulho. Levando em consideração a atual conjuntura política e econômica do município, agravadas após a cheia de 2010 que destruiu parte da cidade, não haveria motivos suficientes para se orgulhar da cidade. Porém, Palmares é um dos berços da poesia pernambucana e também é parte do que foi o maior núcleo de resistência e luta contra a opressão colonial da América Latina: O Quilombo dos Palmares. Apesar de esse pertencimento estar comprovado pelos registros historiográficos e por haverem na cidade várias referências ao quilombo (rádio, bairros, símbolos, brasão do município) a população não identifica o território de Palmares como parte do antigo quilombo. Segundo Lindoso (2007), o Quilombo dos Palmares se estendia léguas ao norte do Rio São Francisco, entre os municípios de União dos Palmares e São José da Lage (AL) até as margens do Rio Una, na imediações da cidade de Quipapá, de Palmares até o local em que Ganga Zumba foi exilado – o Cucaú, em Pernambuco. O Quilombo dos Palmares, iniciado no território que hoje pertence ao Estado de Alagoas, aumentou seu contingente quilombola graças à invasão dos holandeses, visto que o conflito entre os holandeses e portugueses tirou de foco a necessidade de destruição do maior quilombo da América Latina possibilitando um período de certa tranqüilidade para sua organização e expansão. A partir desse aumento foi que o Quilombo ampliou suas fronteiras englobando regiões da zona da mata sul de Pernambuco. Porém, apesar dessa discursos palmarenses a presença da pertença quilombola em sua descrição. Pelo Página “Quilombos e enchentes como vestígio da Identidade Palmarense” n~o consta nos 70 constatação histórica, enquanto identidade, nas pesquisas iniciadas no Grupo de pesquisa contrário, percebe-se uma certa irritação nos discursos locais como se confundissem constantemente a cidade com o Quilombo por terem o mesmo nome (Palmares). Pensando nessa problemática surgida em pesquisa no intuito de contribuir para a conscientização dos palmarenses sobre sua história quilombola e, consequentemente, possibilitar valorização da negritude, fizemos ações educativas de extensão com ênfase na contação de histórias sobre a chegada dos africanos no Brasil, presença negra no Nordeste colonial, escravidão e formação de quilombos, história do Quilombo dos Palmares e valorização da estética (cabelos, peles) e cultura negras. Tais ações foram direcionadas aos alunos de ensino fundamental da rede pública, mais especificamente os que participam do Programa Federal “Mais Educaç~o”. Tal Programa foi instituído pela Portaria Interministerial nº 17/2007 e regulamentado pelo Decreto 7.083/10, constituindo-se como estratégia do Ministério da Educação para induzir a ampliação da jornada escolar e a organização curricular na perspectiva da Educação Integral. Contexto histórico do racismo e Metodologia de trabalho de extensão Apesar de ser informação do senso comum, vale a pena ressaltar que o Brasil, como colônia de exploração, foi fundado pela dominação e expropriação de seus bens naturais. Posteriormente, com o povoamento e escravização de indígenas e depois negros africanos e seus descendentes, houve uma tentativa de extirpar qualquer traço de cultura tida como primitiva e pagã. O Brasil então, percorreu os séculos desde sua descoberta com esses estigmas de inferioridade e submissão ainda hoje difíceis de apagar. Mais especificamente, a população a qual foi destinada os trabalhos forçados e humilhantes, àquela população destituída de alma em determinado momento histórico cristão, como forma de justificar a escravidão sem remorso do escravizador, traz como carga ancestral não só esse peso dos maus tratos e falta de consideração, mas também, após o período escravocrata, houve a instituição oficial do que hoje denominamos racismo. A população negra hoje ainda luta por condições igualitárias de acesso aos bens culturais e econômicos, como também busca através de uma solidariedade politizada, a características intelectuais e morais e, a partir disso executar práticas de inferiorização e exclusão (WIEVIORKA, 2007). Página caracterização de um grupo humano pelos atributos naturais, eles próprios associados às 71 construção de uma estética que a valorize e supere o racismo. O racismo consiste na O racismo é um aspecto estruturante da sociedade brasileira. Essa afirmação, segundo Gilroy (2001), ajuda a conter os desejos românticos de enxergar a cultura brasileira como signo único da possibilidade de um mundo sem raças. Sem ela é impossível abalar a desigualdade social, econômica e a hierarquia social ainda presente em pleno século XXI. Assim, reconhecer que o racismo ainda sustenta a estrutura social brasileira não é assumilo de forma fatalista, é fazer dele uma realidade a se combater. E para que esse combate seja possível, faz-se necessária a seleção de elementos culturais e históricos que possibilitem a base necessária para referências positivas pelas quais a população negra possa se apoiar e politizar-se. Nessa perspectiva, a história do Quilombo dos Palmares já foi eleita nacionalmente como uma das principais referências para o orgulho, resistência e luta dos negros e seus descendentes. A figura de Zumbi, último líder quilombola, é reverenciada em todo o país, sendo o dia 20 de novembro, data referente à sua morte, o dia que se comemora a Consciência Negra. Apesar de toda essa ênfase, no espaço geográfico onde se localizava parte do Quilombo dos Palmares, a população não se apropriou devidamente desses signos positivos para valorização e auto-estima negras e continuam com dificuldade em se afirmar negra e ou de descendência negra e, consequentemente, não se organizam em prol de melhorias na sua condição. Por isso, tratar da história do Quilombo dos Palmares nas escolas públicas do município de Palmares, Estado de Pernambuco, se tornou urgente, visto que as crianças ao qual o projeto de extensão que se segue foi direcionado, são crianças em sua maioria absoluta de aparência e/ou descendência negra. Assim, com amparo da Universidade de Pernambuco (UPE) e a aprovação do projeto de extensão no edital PFA/UPE 2014, pelo qual conseguimos uma bolsa para discente e auxílio material para a execução das oficinas, nosso principal objetivo ao propor um trabalho de extensão na Escola Municipal José do Rego Maciel-CAIC foipromover ações lúdico-educativas para apropriação da história quilombola por crianças palmarenses através de oficinas de contação de história; produzir materiais a serem expostos, como painéis e textos, como resultados das oficinas; difundir a história quilombola, as atividades local. O objetivo da extensão foi, assim, possibilitar acesso à história do Quilombo dos Palmares de forma fácil e divertida para as crianças; que a partir disso, se apropriassem Página assim, contribuir para apropriação da história quilombola palmarense pela população 72 e produções das oficinas, através da criação de blog e divulgação nas redes sociais; para dessa história, assim como das oficinas de valorização da negritude, onde foram enfatizadas a beleza da cor da pele, traços e cabelos negros, as músicas brasileiras de origem negra e etc, para que assim as crianças tivessem conhecimento histórico de seu município e motivos para se orgulhares de sua possível negritude. A equipe de trabalho foi composta por uma professora, três discentes de Serviço Social e um de logística, todos da Universidade de Pernambuco, Campus Mata Sul. Nosso público alvo foi uma média de 34 à 50 crianças por oficina, com idade entre 8 e 12 anos. As oficinas anteviram 2 meses de preparo para a iniciação das atividades com as crianças: Contatos com a escola, familiarização com espaço e público-alvo, formação de grupo de voluntários, aquisição de material para as oficinas, construção das mesmas e ensaios. Fizemos as ações com as crianças que estavam presentes no horário da tarde na escola, no espaço dedicado às aulas de reforço e aulas complementares destinadas aos atendidos pelo Programa Mais Educação. As escolas das redes públicas de ensino estaduais, municipais e do Distrito Federal que aderem ao Programa optam, de acordo com o projeto educativo em curso, por desenvolver atividades nos macro-campos de acompanhamento pedagógico; educação ambiental; esporte e lazer; direitos humanos em educação; cultura e artes; cultura digital; promoção da saúde; comunicação e uso de mídias; investigação no campo das ciências da natureza e educação econômica3.Tal Programa na escola CAIC de Palmares ainda não abarca todos os estudantes, e sim, àqueles que apresentam maiores dificuldades de aprendizagem, segundo informações da diretora. Cada oficina durou em média 3 horas. O período de realização foi de julho à dezembro de 2014. Oficina 1: Travessia. A primeira oficina elaborada e trabalhada com as crianças teve a intenção de descrever o traslado negreiro da África até o Brasil nos navios chamados de Tumbeiros. Relacionar cultura com lugar, isto é, as ecologias de pertencimento é ligar-nos ao espaço que ocupamos, mas não só, pois liga-nos também a outras terras através de uma mediação 3 disponível em: http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&id=16690&Itemid=1113 Página África expropriada no ontem, na obviedade de um território compartilhado e de território 73 do sofrimento com vínculos de consolação. Assim, falar do Brasil hoje se remetendo a uma mitificado e sagrado é situar-se e ter um ponto de referência para uma crítica da atualidade temporal (GILROY, 2001). Através de um escopo de recordação mútua podemos nos valer de informações de outros lugares como referência para nos posicionarmos em nosso espaço. Assim, para trabalhar o tema ‘travessia’ nos valemos de música e contaç~o de história. Contamos a historia do momento em que os africanos eram capturados na África tanto por brancos como pelos próprios negros, registrando a situação onde os mais fortes sobreviviam. Antes de começar a contar a história perguntamos se as crianças sabiam o que era África e responderam negativamente.Então, explicamos a elas algumas características do continente africano, a distância do Brasil com auxílio de um mapa, tipos de flora e fauna, dentre outras informações. Explicamos que os negros capturados eram levados para navios chamados de tumbeiros e viajavam no porão do navio um por cima do outro até chegarem ao seu destino, local onde seria vendidos e escravizados. Nos navios comiam e faziam suas necessidades e as mulheres que estavam grávidas tinham seus filhos nesse mesmo local. Aqueles que não sobreviviam eram jogados no mar. Contamos tal história usando música e leitura dramática. Depois de contar a história fizemos perguntas em relação a mesma e podemos perceber que eles prestaram atenção, mas, ainda não estavam familiarizados com o tema, pois não o comentavam, só reproduziam o que foi contado. Apesar dessa constatação, alguns já começaram a se identificar com atemática, enxergando que seus familiares também são negros. No fim, realizamos uma atividade de pintura em que registraram em desenho o que tinham apreendido da historia que foi contada. A concepção de Gilroy (2001), do que ele denomina de “sublime escravo”, traz como definiç~o formas de comunicaç~o típicas de culturas construídas pelos escravizados e seus descendentes que passam pela dor e prazer através, principalmente, da música.Percebemos que quando usamos a música ‘Y| Y| Massemba’ para finalizar a história da travessia, as crianças, ainda retraídas pelo primeiro contato com a equipe e com o tema, se soltaram e nos acompanharam com danças, crianças puderam participar conosco da atividade. Assim como pudemos constatar que houve absorção do que foi contado visto as representações em formato de desenhos Página Dessa forma, o vínculo se estabeleceu através do momento em que as 74 repetindo o refr~o da música: “Vou aprender a ler para ensinar meus camaradas”. expressando o navio negreiro, os africanos sendo roubados, torturados e chegando ao Brasil para serem vendidos e trabalharem como escravos. Oficina 2: Formação do Quilombo. A escravidão foi a base econômica da colonização brasileira, além de ser o fundamento das esferas da vida social e política imprimindo a desigualdade e a excludência como regras básicas do convívio social (SILVA, 2009). A sociedade escravocrata se funda e se mantém pela força. E toda essa força foi imposta aos escravizados que, por sua vez, mantinham o regime funcionando. Ao negro escravizado (e ao alforriado e suas variações de condições no regime colonial escravocrata) foi negada a sua cidadania, e mais, a sua humanidade. Porém, a história da presença negra nos primeiros séculos do Brasil colônia não foi só marcada pelo sofrimento e submissão. Muitas formas de subverter o sistema foram empregadas através da resistência e enfrentamento, como as revoltas, fugas, suicídios, assassinatos de senhores, abortos e a constituição dos quilombos. Essa última forma de rebeldia e resistência foi a que mais preocupou os senhores coloniais, pois além de instigar a fuga em massa dos escravizados, o quilombo facilitava a organização e a formação do que Clóvis Moura (2001) define como contra-cultura. Isto é, os quilombolas ou papa-méis termo usado na época na Capitania de Pernambuco – não só negavam o sistema escravocrata como instituía uma nova sociedade, paralela ao sistema oficial que, de certa forma, ameaçava a estrutura vigente por sobreviver tantas décadas com relativo sucesso. O quilombo era um espaço de concentração de forças e de negação da escravidão e do racismo vigente. Os quilombolas não só se defendiam como construíram formas de sobrevivência e compartilhamento de cultura com pessoas de diferentes etnias africanas e indígenas. Assim, o quilombo representa, mesmo que muitas vezes de forma exageradamente romantizada, um oásis de resistência e lutas negras, além de possuir referências culturais e personalísticas para fundamentar o orgulho de ser negro hoje em dia. destinado à crianças em que seus personagens eram fantoches ao invés de atores, e contava de forma lúdica a história da formação do quilombo no Brasil, tendo como base a Página quilombo, teve o intuito de ilustrar tal importância. Para isso, usamos um vídeo educativo 75 Nessa perspectiva, a segunda oficina que tratou da história da formação do visão do branco em relação ao negro. Isto é, uma visão amena da situação do negro. Optamos por essa versão, pois ela é a mais corriqueiramente difundida e, por isso, provavelmente a versão que os que ouviram falar da história tiveram acesso, além da dificuldade de achar material com uma visão diferenciada. Mas, mesmo assim, após a exposição do vídeo, fizemos perguntas às crianças sobreo que acharam da história e se lembraram do que tinham estudado em sala de aula e visto na oficina anterior. Isso porque a escola nos informou através da diretora, que os professores das turmas atendidas pelas oficinas de extensão, aproveitando de nossa presença semanal na escola e de o tema da negritude e dos quilombos ter despertado o interesse dos alunos, introduziram em suas aulas os temas trabalhados, se aprofundando ainda mais. Assim, as oficinas junto com os professores envolvidos (do 2ºao 7º ano) iniciaram a proposta contida na Lei 10.639 que legitima a importância de se estudar a história da África e dos afro-descendentes no ensino fundamental. Ao contar a história da formação quilombola, perguntamos o que mais chamou a atenção deles, eles responderam que foi a tortura que os negros sofreram no vídeo mostrado. A dor e o sofrimento vividos por aqueles que identificamos como próximos ou iguais faz com que sintamos relativamente a dor em nós mesmos. A formação do sujeito perpassa pela identificação normativa e estruturante do eu através de uma outra ordem do existente externa a si: a cultura. A primeira encarnação dessa cultura está no outro cuidador, depois os cuidadores como um todo e, por fim, os pares exteriores a comunidade familiar (SOUZA, 1990). Identificar-se com as dores dos personagens animados em fantoches do vídeo que passamos é a prova da sensibilidade e aproximação dessas crianças com as condições dos negros escravizados do período colonial e seus correlatos quilombolas. Tais crianças fazem parte de comunidades periféricas da cidade de Palmares. Muitas delas consideradas “difíceis” e violentas pela escola. A própria escola CAIC é considerada pelos moradores do município a mais violenta, fato esse registrado pela fala de alguns moradores locais e também frente a negação de pedido de oficinas de capoeira e outras atividades que proposta do dia. Depois, como atividade complementar, usamos desenhos para colorir. As Página Dialogamos sobre o vídeo e as crianças demonstraram compreender muito bem a 76 requisitamos para nos dar suporte. cores mais usadas por elas para colorir os desenhos de meninos negros e indígenas foramas cores vermelha e preta. Oficina 3:História do Quilombo dos Palmares. Segundo Lindoso (2011), o Quilombo dos Palmares foi um fato social complexo criado em condições primitivas de organização social. Sua formação mocambeira atuava ao revés da plantation da sociedade oficial, ignorando as sesmarias que dividiam as terras em proprietários distintos fazendo uso coletivo da posse da terra. A sociedade palmarina se configurou pela junção de negros fugidos das Casas Grandes e senzalas das: Matas úmidas da Alagoa do Norte, nas adjacências da lagoa Manguaba, da Alagoa do Sul, nas adjacências da lagoa Mundaú, nas cabaceiras do Porto Calvo, nas matas úmidas do Quipapá, do Cucaú e do Serinhaém (LINDOSO, 2011, p. 11). A extensão do Quilombo dos Palmares ia das margens do Rio Mundaú até as margens do Rio Una. Atualmente compreende o Estado de Alagoas e o de Pernambuco, mais especificamente os municípios de União dos Palmares, em Alagoas, até o município de Palmares em Pernambuco. A importância histórica do Quilombo dos Palmares só foi valorizada a posteriore, como era de se esperar, visto que o mesmo corrompia e desestabilizava o sistema colonial escravocrata vigente. Entre a década de 70 e 80 do século XX no Brasil,o Movimento Negro Unificado reuniu pesquisas e discussões que definiam as figuras de Zumbi, Ganga Zumba, Dandara, entre outros, como referências históricas da luta contra a opressão e o racismo, e descobriram que em 20 de novembro de 1695 o grande e último líder de Palmares, Zumbi dos Palmares, fora assassinado. A despeito das controvérsias quanto a data e às condições da morte de Zumbi, a data se estabeleceu pelo projeto de lei número 10.639, no dia 9 de janeiro de 2003, e assim definido o dia nacional da Consciência Negra. Essa data assim como a história que representa se torna marco na defesa e luta das minorias raciais, assim como base para a construção de um orgulho negro, isto é, a negritude. Desse modo, no terceiro encontro com as crianças do CAIC tivemos como tema a Palmares. Através de uma pequena encenaç~o com recital do poema “Serra da Barriga” do alagoano de União dos Palmares, de Jorge de Lima, e músicas, contamos sobre a fundação Página dos Palmares que teve sua sede na Serra da Barriga, no atual município de União dos 77 História do Quilombo nas terras de Alagoas e Pernambuco. Isto é, a formação do Quilombo do quilombo por Aqualtune - mulher negra que fugiu da escravidão grávida, se tornandoa matriarca de Palmares. Na hora da encenação víamos os olhares fixos das crianças em cada detalhe, e o silêncio cúmplice, prova de que estavam interessadas. No fim, apresentamos uma das brincadeiras das crianças em comunidades quilombolas, que é uma brincadeira de roda com a música “Escravos de Jó”. Apesar de ser uma brincadeira conhecida, nenhum deles (nem os professores) sabiam que era de origem tão remota e quilombola. Dissecamos junto com eles a letra da música, além de brincarmos exaustivamente, pois eles adoraram a pediram para repetir. No fim, cantamos e dançamos a música em ritmo de reggae do cantor baiano Edson Gomes: “Dona Lili”, que fala da import}ncia da liberdade. Muitas crianças sabiam cantar a música. Ainda dialogamos sobre a atividade exposta e as crianças demonstraram atenção desde a primeira oficina, pois respondiam a todas as perguntas e em uníssono. Finalizamos com uma atividade de recortes, colagens e pinturas, onde as crianças deixaram mais explícito o que aprenderam: queriam recortar apenas pessoas negras e desenharam bem detalhados os personagens citados na encenação, como o Zumbi e Aqualtune grávida. Muitos desenharam Zumbi com super poderes, como um super herói. Visto que, na encenação, Zumbi não aparece, só é mencionado. Oficina 4: Identidade Negra, Relações Raciais, Racismo e Cultura Afro-Brasileira Raça, para além das tentativas vãs de distinção biológica do ser humano, é uma construção social e política (WIEVIORKA, 2007). Se durante a escravidão e, principalmente, após a abolição da escravatura no Brasil, os negros e mestiços foram colocados numa categoria de inferioridade estética, cultural e intelectual, e por isso nossa linguagem e cultura trazem a marca da raciologia em suas expressões - negro e preto são palavras que sempre denotam negatividade enquanto adjetivo (CARBONI; MAESTRE, 2003)-, na mesma proporção os movimentos culturais e políticos defensores da causa paramos de discutir sobre raça, visto que biologicamente não nos distinguimos assim, outros defendem que deixar de usar essa expressão que sempre teve o peso de deturpar e humilhar a condição do negro no Brasil só vai manter a situação como do racismo Página Enquanto alguns insistem na máxima de que o racismo se desfaz quando 78 negra no Brasil tentaram e tentam até hoje resignificar a presença negra em nosso país. cristalizado. E por isso, se valer de expressões racistas que sempre foram direcionadas à população negra e resignificá-la dando-lhe um peso positivo fomentará a identificação e a conscientização dos negros e negras oprimidos, tornando-os ativos e militantes. A forma mais viável de tornar esse projeto de valorização negra possível se deu através do uso da cultura brasileira, que é majoritariamente negra, da culinária ao ritmo e músicas. Na semana da quarta oficina, para abordar de forma ampla o tema da negritude, utilizamos o poema “Gritaram–me Negra” de Victória de Santa Cruz, recitando-o.Ao interpretarmos,as crianças ficaram com os olhares bem atentos a cada detalhe e acompanharam o poema, que foi recitado uma segunda vez, gritando os trechos “Negra” que são repetidos a cada estrofe do poema. Como momento cultural,exibimos as danças e músicas deixadas como herança cultural africana, como coco, frevo, samba, ciranda e roda de capoeira.Dançamos com eles todos os ritmos, ensinando alguns passos e sendo ensinados por eles, principalmente no momento da capoeira e do samba. Como atividade manual nesse encontro, realizamos a atividade do auto-retrato, que consiste em desenhar-se. Colocamos folhas de papel A4, lápis de cor, giz de cera e tintas para que as crianças se desenhassem. As crianças começaram a desenhar a si e, para nossa surpresa e alegria, a maioria se desenhou como negra. Uma das crianças nos chamou muito a atenção, pois não queria de forma alguma se identificar como negra e sim como morena.Ao dialogar com a criança a mesma contou que seu pai era negro e foraassassinado e por não se lembrar dele e ter essa história tão sofrida, não conseguia se ver como o pai. Além de alegar quer era muito pequena quando isso aconteceu, e só o conhece por fotos e mesmo assim, muito pouco, pois sua mãe não deixa olhar muito o retrato do pai. Então, observamos que aquela criança não se sentia a vontade para se identificar como negra por causa do pai.Depois da conversa, perguntamos se ela queria ainda desenhar-se e ela o fez. Sóque não se desenhou como negra.Depois, por conta própria, decidiu desenhar a imagem de seu pai. Fez a estrutura de um rosto, porém sem olhos, medo de serem xingadas e humilhadas pelos demais. Diziam serem negras sim, mas se assumissem isso seriam humilhadas. Então conversamos e informamos que quanto mais Página Tiveram outras crianças também que não se afirmaram negras porque tinham 79 nariz e boca, apenas uma mancha negra no centro do rosto. elas negarem sua identidade mais as pessoas irão continuar maltratando-as, pois negando elas confirmam que não é bom ser negro. Fazíamos isso de forma leve, tentando não força a nada. Tanto que muitos desenharam seus auto-retratos, mas também outras coisas, como suas casas, carros, árvores, etc. Ao decorrer da oficina algumas crianças acabaram pintando o rosto com tinta de cor preta, se afirmando “ser negro”, e foi muito divertido, pois quiseram nos pintar também.Fomos pintados por eles e no final da oficina, por mais que houve resistência de alguns ao se afirmarem negros,os rostos das crianças estavam negros e todos se afirmando negros.Foi um dos encontros mais produtivos, avaliado pela equipe. Seja porque o tema e a oficina possibilitaram maior participação das crianças, seja porque elas já estavam mais familiarizadas com o tema e conosco. Oficina 5: Consciência Negra Segundo o dicionário Aurélio, consciência é o atributo pelo qual o homem pode conhecer e julgar a sua realidade (FERREIRA, 2004). Consciência negra seria a condição do ser humano, seja ele branco, amarelo ou negro, de reconhecer a condição de vida da população negra e, a partir dessa conscientização, se afirmar, se reconhecer e lutar por seus direitos. A quinta e última oficina do projeto aconteceu no dia 20 de novembro de 2014, dia da consciência negra. Fomos agradecer a eles e a direção por ceder o espaço da escola.Levamos fotografias que foram registradas em todos os encontros para as crianças se verem expostas pela escola em varais de exposição. Por causa da data, conversamos sobre a importância de não esquecermos a história de Zumbi e seus companheiros e companheiras quilombolas. Antes mesmo de dizermos do que se tratava a data muitos já sabiam, graças a seus professores que vinham tratando da temática em sala de aula. Um dos professores nos contou que um grupo de alunos pediu para apresentarum trabalho sobre o quilombo na aula de história. Assim, com a ajuda das crianças, falamos um pouco sobre o que era a data da consciência negra e qual a importância dessa rememorização a do projeto de extensão. Conclusão Página brincamos com brincadeiras de oficinas anteriores e nos despedimos dessa primeira fase 80 Zumbi. Depois,disponibilizamos as fotos para que eles levassem para si.Dançamos, Retomando a história do Brasil Colônia, retomando a chegada e permanência do povo negro no país, entendemos que a colonização foi uma relação entre sociedade e espaço. Sociedade esta que se expande com fins exploratórios dos lugares e das gentes. E mesmo na independência do país de seu jugo colonial com Portugal, a relação sócioeconômica do Brasil não se altera. Segundo Silva (2012), o regime escravocrata, o latifúndio e a concentração de riqueza apenas se fortaleceram. Isso quer dizer que a estratificação social em classes e raças ainda é premente na sociedade brasileira. Tanto que se fazem necessárias as tão polêmicas políticas de reparação para a população, como as cotas raciais nas universidades e em outros espaços. A contradição brasileira que nega o racismo, e ao mesmo tempo combate políticas de ações afirmativas por justificar que elas não são necessárias (se não fossem necessárias não surgiriam como demanda, eis a contradição) institui um silêncio que é vigente e mantido desde o período escravocrata: aquele que reclama e denuncia supostas situações de racismo deve ter algum problema pessoal a ser trabalhado, pois se ver vítima de uma situação maniqueísta que a sociedade hegemônica não quer assumir. Na ordem social escravocrata, a representação do negro como socialmente inferior correspondia a uma situação de fato. Porém, a desagregação dessa ordem social e econômica e sua substituição pela sociedade capitalista tornou sua representação obsoleta. Por isso que, hoje em dia, em contraposição a essa cultura do silêncio, os movimentos culturais e o movimento negro, além da academia, tem produzido material para quebrar com essa situação e abrir espaços para as vozes negras serem ouvidas. Assim, o objetivo desse trabalho é contribuir mesmo que de forma pontual, para que algumas crianças da zona da mata sul de Pernambuco, que possuem condições econômicas e emocionais tão instáveis, possam ao menos sentirem-se amparadas por um discurso que valoriza sua ancestralidade e, consequentemente, seus traços fenotípicos negros. A escola que escolhemos para as oficinas é considerada uma das mais violentas de Palmares, se não a mais violenta no que se refere aos alunos do ensino fundamental. descrição de alguns em momentos paralelos das oficinas, dá conta de que existem usuários de drogas, vítimas e atores de violência física, crianças que passaram fome (“tia, eu comia Página emocional para serem delinquentes, marginais e temidos na comunidade. Mas, a própria 81 Imagina-se que crianças entre 7 e 12 anos não possuem nem força física, nem estrutura farinha seca”), crianças que tiveram parentes assassinados, etc. Mestres de capoeiras e voluntários locais se negaram a nos ajudar nas oficinas por terem experiências negativas na escola. Essa informação nos assustou, ao mesmo tempo que nos desafiou. Percebemos que a escola atende aos bairros mais pobres e zona rural de Palmares, atendendo assim, crianças em situação de vulnerabilidade social. Sendo uma escola que atende crianças carentes é inevitável que a grande maioria tenha traços físicos de origem africana. Dessa forma, vimos o quão importante foi dar motivos para que elas se orgulhem de sua ancestralidade através da história, cultura e política. Algumas passaram a se afirmar negras, se interessar por capoeira, escolher fazer trabalhos em sala de aula sobre Zumbi, Dandara, Aqualtune. Muitas nos diziam que o pai, a mãe ou eles mesmos tinham a cor de Zumbi dos Palmares, então, vimos que atitudes tão simples são tão relevantes para essa comunidade que não tem quem invista de forma alternativa nela. Bibliografia Página 82 CARBONI, Florence; MAESTRI, Mário. A Linguagem Escravizada. Língua, história, poder e luta de classes. São Paulo: Expressão Popular, 2003. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Miniaurélio. O minidicionário da língua portuguesa. 6 ed. Curitiba: Positivo, 2004. GILROY, Paul. O Atlântico Negro. Modernidade e dupla consciência. São Paulo: Editora 34. Rio de Janeiro: Universidade Cândido Mendes, Centro de Estudos Afro-asiáticos, 2001. GOMES, Flávio dos Santos. De olho em Zumbi dos Palmares – histórias, símbolos e memória social. São Paulo: Claroenigma, 2012. LINDOSO, Dirceu. A razão quilombola. Maceió: EdUFAL, 2011. ________.Poder Quilombola. Maceió: EdUFAL, 2007. MARTÍN-BARÓ, I. Psicología de la liberación.Madrid: Editorial Trotta, 1998. MOURA, Clóvis. História do Negro Brasileiro. São Paulo, 1994; _______. Os Quilombos na Dinâmica Social do Brasil. Maceió: EdUFAL, 2001. POLLACK, Michael. Identidade e Memória Social. Estudos Históricos. Vol. 5, n. 10. Rio de Janeiro, 1992. pp. 200-2012. SILVA, Simone Rezende da. Quilombos no Brasil: A memória como forma de reinvenção da identidade e territorialidade negra. Bogotá: XII Colóquio Internacional de Geocrítica Las independencias y construccion de estados nacionales: poder, territorialización y socialización, siglos XIX-XX, 2009. SOUZA, Neuza Santos. Tornar-se Negro. As vicissitudes da identidade do negro brasileiro em ascensão social. Rio de Janeiro: Graal, 1990. Universidade Federal de Pernambuco.OBSERVATÓRIO DO DESENVOLVIMENTO: Monitoramento e avaliação do Programa de Desenvolvimento Sustentável de Territórios Rurais na Zona da Mata Sul de Pernambuco. Recife: Departamento de Serviço Social, 2012. WIEVIORKA, Michel. O Racismo. Uma introdução. São Paulo: Perspectiva, 2007. Página 83 7 - PROJETO UNEAL NAS COMUNIDADES: UMA PARCERIA COM A FAMMA EM AÇÕES DE COMBATE À VULNERABILIDADE SOCIAL Maria do Carmo Duarte de Freitas [email protected] Jakeline Ribeiro Souza Vieira [email protected] Luânesson Castro de Melo [email protected] Resumo O texto a seguir, diz respeito a uma atividade de extensão realizada através do programa PIBEX (Programa Institucional de Bolsas de Extensão Universitária) edital 2013,que disponibilizou bolsas a alunos de graduação, sob coordenação de docentes efetivos da Universidade Estadual de Alagoas. A iniciativa do projeto Uneal nas Comunidades se deu pelo entendimento do apoio que uma instituição de ensino superior poderia ofertar a comunidades que se encontravam no contexto da vulnerabilidade social a qual estavam submetidas, nas quais podem ser observadas tanto no campo visual, através da observação da paisagem dos bairros próximo a instituição FAMMA (fundação de assistência aos meninos e as meninas de Arapiraca), quanto no dialogo com funcionários da fundação, as necessidades presentes e comuns as pessoas que moravam próximo e frequentavam a sede da instituição. Assim, foi pretendido na ação extensionista oferecer parte do conhecimento que é construído no âmbito acadêmico. Para tal propósito, a participação de docentes e discentes de diversas áreas do conhecimento, vinculados a Universidade Estadual de Alagoas, foi o ponto de desdobramento para a execução das atividades programadas, pois, elas foram configuradas de maneira a que se pudesse apresentar a diversidade do saber ao público alvo do projeto. Assim, a intenç~o de “levar” a Uneal até as Comunidades se fez importante para que o saber transpassasse o prédio da instituição até parte da sociedade. Palavras chave: Famma – Extensão - Projeto Introdução Em meio à um período onde grande parte da população brasileira depende de recursos advindos de programas de assistência social existem, também, vários casos onde o poder público faz vista grossa para programas e projetos que realizam trabalhos de inclusão social em várias partes do país. A Fundação de Meninos e Meninas de Arapiraca – FAMMA não está amparada à nenhum tipo de programa governamental e resiste ainda em funcionamento graças à doações da sociedade civil e ao auxílio da Universidade Estadual de Alagoas através do projeto de extens~o “UNEAL nas Comunidades”. poder público às instituições filantrópicas, onde grande parte da população não está habituada à cobrar severamente este tipo de ação da máquina pública. A grande Página do Governo Federal, podemos perceber que existem contradições no tocante à auxílio do 84 Tendo em vista a grande escala alcançada pelos programas de assistência social contradição aí está, de modo que grande parte da população não tem um nível de discernimento necessário para compreender criticamente a máquina pública, tampouco suas atribuições. Quando percebemos que existem pessoas que apresentam uma certa dependência de ajuda de programas como o da FAMMA que auxiliam diretamente às crianças e adolescentes, bem como suas famílias, podemos compreender que o auxílio do poder público para com esse tipo de programa seria necessário para manutenção de instituições como esta de Arapiraca, onde várias famílias se beneficiam e podem ter ali, uma esperança de uma possível mudança em sua realidade social. O projeto de extensão, a que esse trabalho se refere, teve como principio a promoção de ações que visaram o resgate dos valores sociais outrora apartados dos fundamentos humanos incutidos na sociedade, esquecidos por alguns, porém de grande importância para a comunidade em geral, especialmente os moradores dos Bairros Itapuã, Brasília, Novo Horizonte e adjacências dos mesmos localizados no município de Arapiraca – AL. Tais localidades são conhecidos por grande parte do município, principalmente na cidade, pela alcunha de periferias por se tratar de áreas, pelo o que se pode observar, que apresentam acentuações expressas na paisagem de desigualdade social, econômica e segregação socioespacial. Atendidos pela FAMMA, são os locais de intervenção social, consequentemente na qualidade de vida das crianças e adolescentes com faixa etária entre 06 e 17 anos, considerando que a educação eleva o nível de conhecimento e, assim, a mudança de hábitos, atitude e valores constantemente questionados no atual contexto social e, de expressiva importância para a formação do cidadão. Portanto, o trabalho proposto, teve sua importância no que se refere ao resgate dos valores humanos e cidadania das crianças e adolescente atendidos, haja vista que a própria sociedade cria estereótipos negativos sobre eles e a comunidade a qual pertencem, negando-as parte de seus direitos fundamentais como acesso a Educação de qualidade, Esporte e Lazer, garantidos por Todavia, o mesmo teve grande importância nos campos sociais e acadêmicos, uma vez que, as ações que foram propostas caracterizaram o cumprimento da função Página Educação Brasileira – LDB e a própria Constituição Federal de 1988. 85 normas como o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, Lei de Diretrizes e Bases social de extensão da Universidade Estadual de Alagoas – UNEAL, como executora e por ter como objetivo o desenvolvimento do publico atendido pela FAMMA nos campos de Educação, Direitos Humanos, Cidadania, Meio ambiente, Esporte e Lazer, realizado por alunos e professores voluntários ligados à Instituição de Ensino Superior – IES executora. Destarte, torna-se de grande valia por se tratar de um trabalho solidário que teve foco nas ações cidadãs, estimulando aos acadêmicos discentes e docentes da IES realizadora dos serviços de auxilio a comunidade por meio de oficinas de recreação, arte e cultura, reforço escolar, orientação social e familiar, atividades esportivas, trabalho comunitário (construção de horta no local), (re)construção dos valores de cidadania e reativação bem como a valorização dos preceitos familiares. Do Surgimento à Estruturação da Instituição: O Histórico da Famma e suas Ações em Parceria com a Uneal A fundação de Assistência as meninos e meninas de Arapiraca, FAMMA foi fundada em 04/03/1986 com intuito de promover assistencialismo social às famílias carentes - está situada a Rua Bela Vista n° 1459 Bairro Brasília – Arapiraca – AL CNPJ: 09.329.384/0001-65.O objetivo central foi ampliado ao longo do tempo e está presente nas ações desenvolvidas pela Instituição buscando sempre proporcionar a inclusão social de crianças e adolescentes do Bairro Brasília e Itapoã, na faixa etária de 07 a 14 anos, em situação de vulnerabilidade socioeconômica. A FAMMA visa, também, manter serviços assistenciais em benefício das crianças e dos adolescentes, de modo a levá-los se interessar por uma profissão, crescendo como cidadãos (as) e serem inseridos no contexto social. Foi instituída por um grupo de pessoas da sociedade que visavam amparar meninos e meninas sem referencial da família em situações sociais e econômicas adversas às demais crianças e adolescentes de mesma faixa etária. As ações afirmativas de combate à vulnerabilidade socioeconômica pensada e desenvolvidas pela Instituição visa promover o amparo das crianças e adolescentes atendidos por ela, oportunizando uma possibilidade de interação entre a IES executora, a Assisti-se hoje em dia a uma alteração da concepção e dos papéis a atribuir à assistência internacional. Estamos num momento de mudança em que são postas em questão as formas clássicas de assistência e de cooperação e em que começa a se impor a necessidade de transformar a Página planos de ação e contorno das dificuldades. 86 instituição parceira e o público alvo no que diz respeito a sua eficácia na execução dos “assistência” em “parceria”. Tanto os países que recém ajuda como os que a concedem buscam novas formas de cooperação assentes verdadeiramente na troca e na vantagem mútua. Num contexto em que, independentemente dos fatores locais, a maior parte dos problemas a resolver transcendem as fronteiras locais e regionais, a cooperação é uma exigência ao mesmo tempo política e prática. (DELORS, 2003, p. 201) Nessa relação que envolve os três pilares já citados, foi levado em consideração o que cada um necessitava e/ou seria beneficiado com as atividades e entendido que a participação efetiva desses três era essencial para seu desenvolvimento. Assim, buscou-se traçar uma linha de raciocínio na qual cada componente seria beneficiado e/ou beneficiador. A FAMMA é uma instituição que possui estatuto próprio, entre as disposições que nele se encontram, estão: Art. 3° - A fundação tem por finalidade: I – Promover o bem-estar, a proteção e a integração da criança e do adolescente na sociedade; II – criar, instalar e manter, sem finalidade lucrativa, estabelecimento de ensino fundamental, nos termos da legislação da legislação que rege a matéria (LDB); III – criar e manter serviços assistenciais em benefício das crianças e dos adolescentes, de modo a levá-los a se interessar por uma profissão. Art. 5° - Para a consecução dos seus objetivos a Fundação propõe-sea: I – firmar convênios ou contratos e articula-se,pela forma conveniente, com órgãos e/ou entidades, públicas ou privadas. As ações executadas foram trabalhadas objetivando uma implementação junto à Instituição FAMMA, pela necessidade de atender as comunidades dos bairros supramencionados. Conforme, o Plano de Desenvolvimento Institucional – PDI da UNEAL, que versa sobre as ações a serem desenvolvidas, tendo na prática ações pautadas no compromisso social como aduz (PDI-UNEAL, 2013-2017, p. 56): A política de extensão da Universidade Estadual de Alagoas objetiva fortalecer a inter-relação da Universidade com a sociedade pautada no compromisso social da referida IES, por meio de ações extensionistas orientadas pelas diretrizes de extensão universitária pactuadas no Fórum de PróReitores de Extensão das Universidades Públicas Brasileiras – FORPROEX: Interação Dialógica; Interdisciplinaridade e Inter-profissionalidade; Indissociabilidade Ensino – Pesquisa – Extensão; Impacto na Formação do Estudante; Impacto e Transformação Social. Assim sendo, a extensão aqui proposta tem como fundamento as diretrizes traçadas pelo PDI (2013-2017) acrescentando as normas vigentes relacionadas aos desse modo as relações entre a Universidade e a sociedade. Página e principalmente à indissociabilidade entre Ensino - Pesquisa – Extensão fortalecendo 87 objetivos propostos, atendendo aos requisitos de interação, diálogo, interdisciplinaridade Nesses termos, enfatiza-se que Educação e Direitos Humanos são duas das categorias que nortearam o trabalho de combate à pobreza e a vulnerabilidade social em que se encontram a comunidade atendida, visando assim, a promoção de uma contribuição efetiva, planejada e fundamentada nos teóricos acima citados a Universidade Estadual de Alagoas no pleno exercício da sua função social,entendendo a importância de ações que contribuam para a compreensão e garantia do uso das referidas prerrogativas para contribuir com a formação da cidadania das comunidades atendidas pela FAMMA. Do ponto de vista estrutural, é fundamental reconhecer a desigualdade. Como principal fator de explicação do excessivo nível de pobreza do país. É preciso conceber programas de natureza compensatória,com prioridade aos mais pobres, para enfrentar o horizonte de curto prazo e programas redistributivos estruturais, direcionadas sobretudo para uma intensa redistribuição de ativos na sociedade. (HENRIQUES, 2003. P. 68) Conforme os dispositivos legais que regem as diretrizes cabíveis em tal temática, como: artigos 1º em seu caput e parágrafo segundo, Art. 3º, Art.5º em seu caput e Art.6º da Constituição Federal de 1988, fundamenta a proposta apresentada bem como os artigos 1º, 2º 12º caput e parágrafo VI e 52º em seu caput, da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB. Bem como o Art. XXVI da Declaração Universal dos Direitos Humanos e o Art. 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA. As ações variaram desde a orientação familiar e social até as oficinas de letramento com assistência de reforço escolar visando a correção do fluxo educacional no período de execução das atividades prevista no projeto realizado com base nos dispositivos apresentados acima, lembrando que a educação, saúde, esporte e lazer são direitos fundamentais do cidadão e visa um combate efetivo à pobreza e a desigualdade social. Nesse sentido questiona-se no plano das políticas públicas voltadas à educação as medidas que podem trazer a luz uma mudança social e contribua para uma nova perspectiva para o público atendido. Como aduz Aloizio Mercadante: Como construir um novo modelo de desenvolvimento capaz de distribuir renda, de promover o crescimento comsustentabilidade, de promover a inclusão social e diminuir avulnerabilidade externa, depois desse longo período de política neoliberal? ... uma tarefa importante e difícil, porque não está escrita, não está pronta e ninguém a realizou até agora. (MERCADANTE, 2003, p. 40-41) básica pública e privada, foram incorporados ao projeto como voluntários afim de Página satisfatórios a ideia do projeto, professores universitários e alguns ligados à educação 88 Para que fossem trilhados os caminhos que possibilitariam resultados diminuir a vulnerabilidade presente na comunidade. Para tal finalidade, foram traçados objetivos que condissessem ao discurso empreendido. [...] a ênfase na ação voluntária faz com as mais variadas motivações sejam canalizadas numa única direção, ou seja, num projeto de sociedade que objetiva simplesmente amenizar ou mesmo administrar as sequelas da questão social.(BONFIM, 2003, p.88) Desse modo, as necessidades reais da instituição FAMMA foram analisadas e colocadas nos planos de trabalho da iniciativa, obviamente, levando em consideração ações que poderiam ser alcançadas pela equipe participante de sua realização, haja vista que a preocupação com os problemas socioeconômicos encontrados ainda seja uma constante a ser trabalhada em comunidades e/ou instituições que trabalham com um público carente (no sentido conotativo de necessidade de maior apoio do poder público) de não fazer promessas de inviável realização num curto espaço de tempo. Dificuldades na Realização de Ações de Intervenção Social: Relação Equipe e Público Alvo Embora as pretensões para com o projeto e seus objetivos tenham sido fundamentadas no combate à vulnerabilidade social e econômica, o cumprimento das metas lançados inicialmente e a execução trouxe à tona uma série de dificuldades que em alguns casos criaram empecilhos reais na busca pelos resultados esperados dos objetivos e ideias do projeto. As abordagens propostas eras necessárias e de certa forma, algo simples teoricamente, no entanto, a execução dos planos e objetivos tornaram-se um desafio a ser superado devido a disparidade existente entre teoria e prática, no que se referem às formas de comunicação com as crianças, adolescentes e famílias atendidas pela instituição, uma vez que eles eram o público alvo da iniciativa. Todos sentimos os perigos de desagregação em que estamos imersos. Essa desagregação em que estamos imersos. Essa desagregação não é uma opinião, mas um fato, um fato por dizer físico, ou, pelo menos, de física social. Com efeito, muito da desagregação corrente provém da velocidade das transformações por que estamos passando. A própria aceleração do tempo de processo social produz os deslocamentos, confusões e subversões a que todos assistimos e temos de remediar. (TEIXEIRA, 1977, p.141) atendida, deu-se, principalmente durante algumas das atividades, o vocabulário ainda desconhecido para eles, embora normal para os bolsistas e voluntários teve que ser Página problemas relacionados com a comunicação entre a FAMMA, a IES e a comunidade 89 Algumas das dificuldades oriundas da relação com o público, como é o caso dos adequado aos usos e costumes locais na tentativa de melhorar a forma de interagir com a comunidade. Isso ocorreu, sobretudo, devido à estranheza que a população recebeu inicialmente as atividades em exercício. Sérios conflitos sociais existentes na localidade, foram aos poucos apresentados ao grupo formando um verdadeiro desafio a ser superado, problemas como aIndisciplina das crianças e adolescentes atendidas era uma das maiores preocupações e estigma enfrentados por todos os envolvidos nas ações propostas em curso e as que seriam realizadas. Havia uma rotina e um verdadeiro abandono social desta comunidade, o poder público há muito não investia na área e com isso a comunidade não estava prepara para receber as ações e quando as recebera as enfrentaram com inicial desconfiança e até mesmo arredios. Com o passar do tempo as dificuldades na aprendizagem significativa, identificada como uma das primeiras causas da indisciplina foi dando espaço a uma troca de experiências, a quebra de estereótipos foi de suma importância para o estabelecimento de confiança e com isso uma melhor relação entre o público alvo e as instituições envolvidas. Essas dificuldades podem ter sido originadas, pela diferença dos cotidianos da equipe e de seu público, em relação à comunicação. No que diz respeito ao reforço e palestras muitos dos atendidos não frequentaram por muito tempo a escola, no caso dos pais das crianças e adolescentes, já no caso desses o obstáculo muito se dava pelo desinteresse pelo aprendizado ofertado e em alguns casos pela má formação escolar que alguns apresentavam até o momento. Outro ponto que pode ser considerado chave nessa dificuldade de comunicação foi o fato de muitos não entenderem o projeto a início e posterior a um entendimento, não considerarem importante o que era proposto, pois para a maioria dessas pessoas, a educação não representava algo importante pelo fato de não a reconhecerem como algo que seria proveitoso as suas vidas. Percebe-se que ao ter sido encontrada essa situação do público alvo, a dificuldade da realização foi um desafio a ser superado, em outras palavras poder-se-ia dizer que era equipe, visto que a maioria ainda não havia participado de uma ação de extensão e muito Página diante as questões que abalavam suas vidas. Uma situação, até então, desconhecida pela 90 preciso convencê-los que poderíamos dar alguma contribuição, mesmo que pequena menos vivenciado parte de um cotidiano diferente àqueles aos quais já estavam habituados. No decorrer das atividades a falta de interesse do público ao projeto era percebida sem grandes esforços, as crianças e adolescentes evitavam participar do reforço escolar oferecido pelos bolsistas. Muitas vezes ao participar pela primeira do reforço eles ao notarem que haviam sido detectadas suas deficiências de instrução, sentiam-se um tanto envergonhados, porém poucos apresentaram interesse em saná-las junto aos bolsistas que estavam oferecendo esse apoio. Por conseqüência desse desinteresse, o abandonado do reforço foi enorme, impondo assim um obstáculo ao alcance de um dos objetivos. Entretanto, as dificuldades não se relacionam apenas com a questão do público alvo, a execução das atividades também foi afetada por alguns fatores que fugiam da realidade pressuposta na proposta inicial, problemas como falta de recursos financeiros de ambas as instituições envolvidas dificultavam a aquisição de materiais básicos à concretização de atividades básicas e ao mesmo tempo essenciais na instituição parceira. Chama-se a atenção também no que diz respeito ao fator que em muito dificultou o andamento da proposta, a Infraestrutura precária em que se encontra a FAMMA, há uma área relativamente grande, mas, devido a limitação de recursos não existe uma quadra poliesportiva para a realização das atividades pelos amparados e voluntários. Outras questões como a falta de uma alimentação regular para o público atendido, a quase inexistência dos recursos físicos, e uma insuficiência de uma estrutura humana operacional limitados e em alguns segmentos funcionais chega a ser inexistente, ao associar tais problemas a insegurança nos arredores da localidade (abrangendo Rua, Bairro e apropria instituição) internamente e externamente falando. As adversidades que não diziam respeito ao público se davam por questões financeiras e de falta de auxílio sofrida pela instituição, que sofria com a falta de repasses da Prefeitura municipal de Arapiraca e apenas se mantinha com doações realizadas por O ambiente tanto físico, no que diz respeito à estrutura do local, e da convivência entre a equipe e público não era um dos mais tranquilos para o cumprimento das Página financeiro para a realização do projeto, assim foi apenas mantenedora das duas bolsas. 91 pessoas físicas ou jurídicas. Nesse quesito a IES executora não dispunha de suporte atividades. As adversidades já citadas, denotam a situação de um local de trabalho de um tanto árduo, evidentemente, não quer se dar o significado de que era impossível desenvolver aquilo que foi proposto e sim demonstrar que o confronto de realidades equipe/público era bastante intenso. Nesse sentido, pode-se ressaltar como uma das causas dessa intensidade, o fato de docentes e discentes estarem habituados a se relacionar, no âmbito universitário, com pessoas com melhores graus de instrução e que para por em prática uma tarefa ligada a Universidade, dificilmente tiveram que lidar com um público com linguagem não tão regida pela norma culta língua da língua portuguesa igual ao do projeto, com pessoas desprovidas de conhecimento sobre cidadania, pouca capacidade de discernimento sobre seus direitos e deveres, entre outros quesitos. Contudo, a experiência de ter uma adversidade nova para àqueles que participaram do projeto, sem dúvidas lhes renderam uma oportunidade inesquecível: a de lidar com uma realidade que até então muitos deveriam ter discutido dentro de sala de aula, mas nunca tiveram um contanto direto com ela. Por essas razões que a extensão como um dos entes do tripé, junto à pesquisa e ensino que constituem a razão da Universidade existir, é um desdobramento que se faz único por poder proporcionar momentos como o que aconteceu no projeto, que foi de defrontar com a sociedade e nesse caso ganha uma particularidade: o de fazer lembrar os contrastes existentes no espaço geográfico brasileiro, que podem ser eles sociais e financeiros, raciais, entre outros. O Abandono do Poder Público e a Falta de Políticas Publicas, Resultados Obtidos Pela Vivência A interferência do poder público na Fundação é algo quase que inexistente, através dos funcionários regulares que lá se encontram, frisando que os mesmos não são suficientes para promover o atendimento a todos os frequentadores. As instituições ligadas as esferas do poder público Municipal e Estadual pouco ou nada contribuem para a manutenção e permanência das ações voltadas à comunidade. A falta de repasses destas Página Porque não pode ser esquecido que, não constituindo atribuição do Governo Federal prestar serviços direitos à população brasileira, os erros de sua organização de governo são suscetíveis de produzir males infindáveis, desconfortos inacreditáveis, mas, não chegam a poder parar o País, como é o caso dos governos estaduais e dos governos municipais, que atuam em setores de interesse vital imediato para as respectivas populações. (TEIXEIRA, 2011, p. 139-140) 92 esferas acentuam o descaso presente na localidade, gerando um desconforto social. Como já foi dito, a segurança é falha e a área em questão torna-se de certa um ambiente estigmatizado pela presença de desigualdade, violência, desemprego, entre outras formas de degradação social. A criação de estereótipos atribuindo à comunidade resulta numa desvalorização à integridade e dignidade da pessoa humana, atribui-se a alcunha de periferia e os identificam por sua pobreza. A desvalorização das forças da vida inventa o pobre – o mal provido, pouco fértil, pouco produtivo, de pouco valor, mal dotado, desfavorecido, desprotegido, digno de compaixão, infeliz. A moral cria códigos de conduta e regras na direção de um campo impositivo, utilitário e finalista, configurando relações de dominação expressas em sentenças inabaláveis que modelam o que se deve pensar, como agir, em que acreditar. Num sentido oposto aos domínios da ética, a moralidade reforça a impotência, regula visibilidades invisibilidades daqueles que estão em toda parte: os pobres. ( CERQUEIRA, 2010, p.22) A desvalorização de suas ações e a subestimação da capacidade moral dos indivíduos, está inserida em relações as quais necessita positivações éticas e morais inserindo regras que tentam modelar os padrões vigentes no contexto social. O poder público não investe em medidas para o desenvolvimento do indivíduo, descontruindo as formas de pensar, no entanto, cobrame depois reprime. Quanto ao abastecimento de alimentos na Fundação, a maior parte é adquirida por meio de doações promovidas por pessoas ligadas a comunidade e pequenos comerciantes. Outra forma de aquisição, era o convênio com a CDLIFE, para agravar a situação, o convênio não foi renovado acarretando numa diminuição ainda maior dos alimentos servidos às crianças e adolescentes atendidas. [...] imaturidade e do despreparo das camadas populares para a participação e para a cidadania é uma constante na história do pensamento e da prática política. Os longos períodos de negação da participação são justificados porque o povo brasileiro não está, ainda, educado para a cidadania responsável. Nos curtos momentos de abertura, o ideal republicano volta, e o tema educar para a cidadania passa a ser repetido por políticos, intelectuais e educadores. Tanto nos longos períodos de exclusão do povo da participação, como nos curtos de abertura, o exercício da cidadania não é permitido porque o povo não está preparado, O que diferencia, neste particular, as elites autoritárias das liberais é que estas se declaram a favor de educar as camadas populares para, um dia, participarem: o dia em que essas elites as julgarem capacitadas. (BUFFA, 2010, p. 37) O exercício da cidadania nem sempre se dá como uma questão de cunho maduro, o despreparo de alguns representantes da própria comunidade promovem o não Página esferas politicas. 93 preparo e consequentemente a não participação dos moradores com assuntos ligados às Conclusões Quando se fala em humanizar essa sociedade que vive deixada de lado pelo poder público às margens do desenvolvimento que seja de uma educação de qualidade, saúde, emprego, moradia busca-se através de projetos com ações e propostas de alertar a UNEAL, e toda a sociedade se volte em procurar fazer, exigir, ensinar a cobrar o que estas comunidades têm direito. O tema trabalhado neste artigo “ A Uneal nas comunidades”, fez lembrar que ela também tem responsabilidade com a extensão em focar para o fortalecimento e também incentivar aos professores, alunos desde os primeiros momentos sobre a extensão e trabalhar voltados para a sociedade mais carente, envolver todo o corpo docente, discente e a instituição realizar essa linha do tripé que forma o que é Universidade. No que toca os objetivos do projeto, destaca-se o de tentar romper estereótipos em que toda comunidade pobre e quem mora nessas áreas trazem consigo o referencial de sujeitos incapazes de todo o processo social e seu potencial vale pensar que não se faz muito pelas comunidades porque para isso tem de sair da zona de conforto de um laboratório, núcleo de pesquisa ou sua própria casa com os luxos a que tem acesso e para evitar correr riscos, passar por aborrecimentos e atrair trabalhos causativos e que nem sempre tem reconhecimento. Fazer extensão sem uma política de investimento financeiro, principalmente se confunde com trabalho braçal. Ainda, a cultura institucional de alguns pesquisadores que protelam sobre a extensão é o desconforto de tal perfil. Portanto, a extensão sendo obrigatória em todos os cursos universitários do Brasil com uma carga horária de 10% de toda matriz curricular propõe-se que a Uneal tenha um olhar voltado para todas as regiões em que tenha uma unidade ou Campus com trabalhos voltados para as comunidades que não estão inseridas nos padrões que tanto se exige. Propõe-se ainda que cursos como Direito, Pedagogia, Matemática, Letras e Biologia sejam também inseridas nas comunidades e ações realizando atividades extensivas de acordo com suas áreas de formação em construção. O que se faz necessário é Dentro do rol dos resultados encontrados no período de desenvolvimento das ações observa-se uma grande disparidade entre a teoria e a pratica extensionista, a Página como Instituição de Ensino Superior do Estado de Alagoas. 94 que a Uneal não deve esperar pelo poder público, fazendo seu papel cidadão que lhe cabe Fundação recebeu a equipe executora de braços abertos, promovendo a disponibilização dos poucos recursos que lá existem, os bolsistas tiveram total apoio da direção da instituição e, consequentemente, de todos funcionários que facilitaram a socialização deles com o público alvo da extensão. Lembrando que as ações não eram apenas de caráter educacional, abrangiam áreas como Direito e Serviço social. Foi possível identificar casos críticos entre as crianças e adolescentes atendidas, variando de registro civil ou certidão de nascimento até mesmo matrícula escolar outrora negada para crianças fora de faixa etária pelas escolas do Bairro e adjacências. A intervenção ocorreu por meio da parceria, onde foi acionado o poder público via coordenação da ação extensiva em curso naquele momento. Outras atividades como oficinas de recreação e os cursos de orientação familiar, tinham como principal objetivo trabalhar a questão das famílias sem criar estereótipos. Oficinas como arte cênicas, cidadania e Direito de família foram trabalhados de modo que promoveram a conscientização da comunidade sobre o seu papel como indivíduo, inserido no contexto social que busca melhorias. Embora a instituição esteja prestes a completar suas três décadas de existência, a ação extensionista descrita no presente artigo foi, de maneira clara, a maior intervenção social já vista na sua história, pois tratou o público alvo e suas respectivas famílias durante todo processo proposto e realizado no período de Abril a Outubro de 2014, abrindo portas para outros projetos ali queiram serem implantados. Página ABREU, Paulo Roberto de. 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Contexto, 2013. 8 - O TEXTO LITERÁRIO PARA ALÉM DO PAPEL: CORPO, VOZ E INTERPRETAÇÃO UM RELATO DE EXPERIÊNCIA NA ESCOLA MUNICIPAL MÁRIO SOARES PALMEIRA EM SÃO MIGUEL DOS CAMPOS Vitor Tenório Oliveira [email protected] Resumo O presente artigo trata das atividades desenvolvidas durante a vigência do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID) na escola municipal Mário Soares Palmeira. A proposta central do Pibid/Unealencontra-se em execução por meio do subprojeto que põe em evidência a abordagem do texto literário em sala de aula. A partir deste, tem-se a intenção de provocar atitudes reflexivas sobre o quanto a prática e a necessidade da leitura são indispensáveis frente a urgência do indivíduo em estabelecer contato com meio em que vive, o qual, pode, ainda, ser percebido como construto desse mesmo meio. Também procurou-se, através das propostas efetivadas, realizar a quebra de pré-conceitos no trato com a literatura no âmbito escolar, usando uma diversidade de textos literários como ferramenta que comunica a importância da literatura no ensino aprendizagem de língua, mas também, no exercício da cidadania.O projeto em vigência atinge diretamenteà formação dos futuros docentes ao proporcionar a vivência da práxis pedagógica como fazer integrante e transformador na percepção do ser professor na atualidade. Palavras-chave: Projeto Pibid, Texto literário, Ensino. Introdução O projeto Institucional “Di|logo, Universidade e Escola: múltiplos olhares frente às metodologias de ensino/PIBID/UNEAL/CAPES”apresenta como proposta novos meios para viabilização do processo de ensino e aprendizagem nas escolas de educação básicaconveniadas. O projeto apresenta um contingente de 60 bolsistas distribuídos em escolas municipais e estaduaisconveniadas, sob a gerência dos coordenadores de campus Prof. Maria Betânia Rocha de Oliveira, Prof. Vitória Régia Costa, Prof. Soraya Fernandes da Silva; e supervisores lotados em suas respectivas unidades de ensino. Em relação à escola campo, tomada como referência para a elaboração deste trabalho, as atividades foram desenvolvidas através dos bolsistas:Adrielly Ferreira dos Santos (português), Catiane Gomes da silva (espanhol), Erica Matias dos Santos (espanhol), Luana Suame dos Santos Ramos (português), Maria Claudoete Batista dos equipe era assistida pela professora e supervisora do projeto,Rosilene Maria Idalino dos Santos. Página (espanhol),Rosilda Duarte dos Santos (português), Vitor Tenório oliveira (português). A 97 Santos (espanhol),Maria José Santos Cerqueira (português), Nelânia Santos da Silva Efetivamente a proposta central do PIBID/UNEAL encontra-se em execução por meio do subprojeto que põe em evidência a preocupação em proporcionar uma experiência inovadora no trato com o texto literário. Tal postura respinga nos agentes integradores de todo esse construto ao requerer destes a necessidade constante de inquietação e reflexão em reinventar-se no que diz respeito à recepção da literatura e, consequentemente, do ato da leitura no contexto sociocultural e educativo. A vivencia escolar experimentada pelos futuros docentes através do programa abre novos horizontes na perspectiva do ensino-aprendizagem ao propor a (inter) ação entre os agentes precípuos do cenário escolar, professor, aluno e sala de aula. Tem-se dessa forma uma busca incessante e reflexiva por aprimorar a conduta docente mediante a tríade relação particularidade-possibilidade-necessidade que se materializa apenas quando se está em contato com a existência palpável da rede pública de ensino na comunidade escolar local, através da elaboração e desenvolvimento dos planos de aula. Leitura: dever, necessidade e prazer O ato da leitura é tão crucial quanto a necessidade do corpo humano em hidratarse com a ingestão de líquidos. Saber ler é, sem dúvida,fazer-se entender como um cidadão apto a contribuir concretamente com as demandas comunicativas da sociedade em sua volta. A necessidade de comunicação acompanha o homem desde seus primórdios, o que torna incogitável pensar na dissociação entre linguagem e sociedade, por isso “[...] podemos afirmar que essa relação é a base da constituição do ser humano. A história da humanidade é a história de seres organizados em sociedade e detentores de um sistema de comunicação oral [e escrita], ou seja, de uma língua” (ALKMIM, 2008, p.21). Ao pensar nessa necessidade, evoca-se as demandas comunicativas e os conhecimentos prévios para que o ato da comunicação não seja prejudicado, e a leitura surge então como mediadora desse construto sócio-discursivo. Sabe-se que os avanços sociais instituem novas práticas discursivas, daí a multiplicidade de gêneros textuais na esfera social, compreendidos como “entidades sócio-discursivas e formas de ação social [...] exigem-se níveis de leitura e de escrita diferentes dos que satisfizeram as demandas sociais até há bem pouco tempo - e tudo indica que essa exigência tende a ser crescente. A necessidade de atender a Página por sua vez “ 98 incontorn|veis em qualquer situaç~o comunicativa” aos quais estamos submetidos o que essa demanda, obriga à revisão substantiva dos métodos de ensino e à constituição de práticas que possibilitem ao aluno ampliar sua competência discursiva na interlocução (BRASIL, 1998, p.23). É pois, incontestável a necessidade de formação e aprimoramento do indivíduo leitor e escrevente, uma vez que a “apropriaç~o dos gêneros é um mecanismo fundamental de socializaç~o de inserç~o pr|tica nas atividades comunicativas humanas”. (BRONCKART, 1999:103 apud MARCUSCHI, 2005, p.29). Com efeito, torna-se perceptível o grande desafio que os agentes do ensinoaprendizagem tem pela frente ao se deparar com a realidade do desprestígio da leitura, seja pela dificuldade de atribuição de sentido, seja pela ausência de culto e hábito, quando se espera que o aluno “compreenda a leitura em suas diferentes dimensões - o dever de ler, a necessidade de ler e o prazer de ler;”(BRASIL, 1998, p.51) E ainda “seja capaz de aderir ou recusar as posições ideológicas que reconheça nos textos que lê.” (id. ibid.)Tal contraste configura-se,atualmente, no principal imbróglio enfrentado pelos professores de línguas que lidam, como ferramenta de trabalho, com textos e, consequentemente, com a leitura destes. A discussão até aqui assumida endossa a crença sócio-interacionista ao reconhecer que todo saber linguístico é modificado pelo meio e nas relações dialógicas humanas. A partir dessa perspectiva e em consonância com os parâmetros curriculares nacionais que também se valem desse construto teórico, concebemos a leitura como [...] uma atividade interativa altamente complexa de produção de sentidos, que se realiza evidentemente com base nos elementos linguísticos presentes na superfície textual e na sua forma de organização, mas requer a mobilização de um vasto conjunto de saberes no interior de evento comunicativo (KOCH e ELIAS, 2013 p. 11) A interação provocada pela atividade da leitura sugere a necessidade de haver uma união intrínseca e harmônica entre autor-texto-leitor para que o último elemento dessa trindade torne-se perceptível, caso contrário, a atividade pode ser prejudicada e não Em síntese, pode-se cunhar tais estratégias no bojo das proposições levantadas por Orlandi (1988) apud Heine (2012) que instauram uma outra relação tríade no Página [...] um trabalho ativo de compreensão e interpretação do texto, a partir de seus objetivos, de seu conhecimento sobre o assunto, sobre o autor, de tudo o que sabe sobre a linguagem etc. Não se trata de extrair informação, decodificando letra por letra, palavra por palavra. Trata-se de uma atividade que implica estratégias de seleção, antecipação, inferência e verificação, sem as quais não é possível proficiência (PCN’s apud KOCH e ELIAS, 2013, p.12) 99 efetivada, pois um leitor que se toma por ativo tem de ser capaz de realizar processo de atividade de leitura ao discorrer sobre os caminhos tomados para concretização do ser leitor através da identificação de três estágios: a inteligibilidade, a interpretação e a compreensão. A inteligibilidade configura-se como o primeiro estágio a ser assumido pelo indivíduo leitor, equivale a apreender a superficialidade do texto no que diz respeito à sua constituição vocabular. Em seguida, tem-se como segundo estágio a interpretação, fase na qual o leitor estabelece as relações lógico-discursiva e encaminha-se para conferência de sentido ao conteúdo que se está acessando, no entanto ainda não atingiu a autonomia para realizações extralinguísticas e extratextuais que compreendem os implícitos e contexto sugeridos por um texto. A demonstração de tal atitude é definidora para o alcance da compreensão, último estágio do processo de leitura. É comum, portanto, que a dificuldade se concentre nesse último estágio, dada a complexidade da tarefa, bem como, a postura insistente do núcleo escolar em acomodar o aluno a assumir o texto como indivíduo passivo e não construtor.“O que se vê nas escolas e nos livros did|ticos é um processo de leitura que termina gerando um sujeito passivo, que apenas extrai informações prontas dos textos.” (HEINE, 2012, s/p.). O resultado disso é a fragilidadesociocognitivaa que boa parte dos alunos estão submetidos, originando e repercutindo a inaptidão ao receber um texto. Percebe-se então que a receptividade do texto e, consequentemente, a efetivação da tríade autor-texto-leitor só se torna possível ao se levar em consideração o leitor enquanto presença precípua dessa conjuntura, quando este atinge o processo tríade de leitura supracitado para finalmente compreender“o dever de ler, a necessidade de ler e o prazer de ler” (BRASIL, 1998, p.51). Texto literário e performance É nítido o descaso e depreciação do texto literário no ambiente escolar, criou-se uma notada apatia tanto por parte do aluno quanto pelo professor e atribui-se tal feito à Dessa forma, os entraves arrojam-se no trato dado pelo docente ao texto literário, atingindo de forma direta na recepção do texto pelo aluno. Depreende-se daí a necessidade de Página coletivo como piegas; e ainda às formas estereotipadas de lidar com o texto em questão. 100 ausência do hábito de leitura desse gênero textual, erroneamente, assumido no consciente [...] além de levar o texto até o aluno, também [...] propor uma apresentação desse texto que desempenhe um papel atrativo e aguce a curiosidade no sentido do aluno desejar ler o texto, envolverse com sua leitura e expressar o resultado de sua interação com o texto lido. (PEREIRA, 2012, p.60) A própria linguagem assumida pela obra literária exige do público leitor um posicionamento diferenciado em relaç~o aos outros gêneros. Para Filho (2007, p.33): “A linguagem que a caracteriza é necessariamente ambígua e em permanente atualização e abertura, vinculadas estreitamente ao caráter conotativo que a singulariza.” A quest~o expõe a capacidade do texto literário em realizar artimanhas de ressignificações ao que se é dito através da língua, metaforizando-a e acomodando-a no plano das realizações abstratas, ambíguas e simbólicas, pois “Sendo a obra de arte literária matéria ficcional, claro está que a realidade nela revelada não se confunde com a realidade socialmente dada.” (ibidem, 2007, p. 39). Ao assumir os aspectos apontados no parágrafo acima,pode-se pensar que, por isso mesmo, a obra literária revela-se um possível instrumento de acesso ao alcance da proficiência de leitura, quando esta se pauta na identificação das entrelinhas. O fato do texto literário não corresponder, necessariamente,à realidade, mas a um universo imaginado, ficcional e conotativo - embora “A arte é um dos meios de que se vale o homem para conhecer a realidade.” (FILHO, 2007, p.15) E ainda “A problem|tica permanece, com acentuada tendência de muitos a considerar que o texto literário é um simulacro de referente e de outros a entender que algo da realidade abriga-se nos espaços do ficcional.” (FILHO, 2007, p. 75) - exige do público leitor-apreciador um comportamento de construtor e complementador no momento em que se está em contato com a obra literária, a tarefa requerida choca-se com a apatia comentada no início da discussão e acrescesse a esse panorama a inadequação do material frente à (i)maturidade cognitiva do indivíduo na recepção do texto literário escolhido, o que, consequentemente, empurra a questão para a incompreensão da linguagem. Nessa perspectiva, a interação entre autor-texto-leitor ganha relevo ao se pensar que “É preciso considerar ainda que só h| literatura onde existe um povo e, [...] se pluraliza em função do universo cultural dos falantes; prende-se, portanto, às diferenças de camadas socioculturais e ao processo de desenvolvimento da cultura. Fácil é concluir que a literatura, apoiada num sistema de signos linguísticos que representam o mundo e revelam dimensões profundas Página conotação, típica da linguagem literária, 101 consequentemente, o desenvolvimento de uma cultura.” (FILHO, 2007, p.36) Além disso, a do ser humano, traduz o grau de cultura de uma sociedade. E mais: por força de sua natureza criadora e fundadora, pode configurar-se como espelho ou como denúncia, como conservadora ou como transformadora. (ibidem, 2007, p.38-39) Em torno dessa circunstância, a necessidade pela eleição/seleção de temas que aproximem o espaço ficcional do espaço sociocultural do leitor reflete no interesse deste; na possibilidade de, no mínimo, ser movido por uma curiosidade capaz de problematizar o tecido textual na busca da mensagem que tal obra possa transmitir, atingindo a intenção do texto liter|rio no qual “por força ainda do mistério da criaç~o em literatura, com mensagens capazes de revelar muito da condição humana. Caracteriza um mergulho na direç~o do ser individual, do ser social, do ser humano.” (FILHO, 2007, p.41). Ainda nas proposições de Filho (2007) Temas, metonimizados na tessitura da obra literária, como: traição, ciúmes, infidelidade amorosa, violência urbana, a astúcia humana no trato das relações interpessoais e sociaishá muito discutidos na literatura e ainda em voga, pela atualidade que o perseguem, parecem despertar a atenção do leitor na recepção positiva do gênero textual em discussão. Ademais, o texto torna-se acessível quando, no trato das tematizações apontadas, n~o sobredoura “uma realidade apoiada em vivências humanas” (ibidem, 2007, p. 15) por meio de uma linguagem cheia de rebuscamentos. Outro aspecto de crucial importância do texto, mas quase banido no tratamento dado ao texto literário no ambiente escolar, reporta ao ato da leitura oral. Aderindo as considerações de Zumthor (2007) Ao partir da ideia de literatura enquanto tradutora do belo, do acontecimento do fazer poético, necessita-se, pois encarar tal objeto como o é e para além do suporte no qual é apresentado, questionando-se a partir de ent~o: “Toda "literatura" n~o é fundamentalmente teatro?” (ibidem, 2007, p.18) A verbalização oral da obra literária é tomada à luz das definições deZumthor (2007) pelo que ele denomina de performance, conceituando-a como a postura corporal (oral, gestual) assumida pelo leitor literário na intenção de tornar o texto mais perceptível sua natureza teatral; a leitura precisa ser circunstanciada pelas inspirações que o texto sugere no que se refere a sua pontuação, estado emocional do eu lírico e/ou personagens Página Na percepção do autor, o texto literário deve ser resgatado e tratado a partir de 102 no plano da sensorialidade humana. que o integram. São elementos demarcadores de como a entonação deverá se processar, pois [...] o que produz a concretização de um texto dotado de uma carga poética são, indissoluvelmente ligadas aos efeitos semânticos, as transformações do próprio leitor, transformações percebidas em geral como emoção pura, mas que manifestam uma vibração fisiológica. Realizando o não-dito do texto lido, o leitor empenha sua própria palavra às energias vitais que a mantêm. [...] E se nenhuma percepção me impele, se não se forma em mim o desejo dessa (re)construção, é porque o texto não é poético [...]. É por isto que o texto poético significa o mundo. É pelo corpo que o sentido é aí percebido. O mundo tal como existe fora de mim não é em si mesmo intocável, ele é sempre, de maneira primordial, da ordem do sensível: do visível, do audível, do tangível. [...] Ora, a leitura do texto poético é escuta de uma voz. O leitor, nessa e por essa escuta, refaz em corpo e em espírito o percurso traçado pela voz do poeta: do silêncio anterior até o objeto que lhe é dado, aqui, sobre a página. (ZUMTHOR,2007, p.53-54, 78, 87) Prosseguindo, ainda, nessa linha de raciocínio, pode-se afirmar que o propósito existencial do texto literário se encontra, por assim dizer, no prazer de se realizar, artisticamente, no leitor e, por consequência, gerar neste o gosto prazeroso pelo ato da leiturae pela reflex~o do belo, aqui “A beleza vem a mais, como uma graça. Mas da presença gera-se um prazer. E o prazer é o mais alto valor do espírito, pois é ao mesmo tempo alegria e signo: o signo de uma vitória de e sobre a vida, esta vitória que nos faz humanos.” (ZUMTHOR, 2007, p. 109). Sabe-se que na perspectiva do ensino de língua, a literatura parece, ainda, ser um meio pelo qual não se encontra uma pronta utilidade na vivência cotidiana e por conta disso é esquecida, quando muito, banida no rol da práxis pedagógica, no entanto, tal posicionamento deve ser repensado, tendo em vista a linha de raciocínio que pensa a literatura pelo enfoque dos gêneros discursivos, uma vez que A literatura fica na aula de língua pelo princípio de que quanto mais amplo o leque de gêneros discursivos trabalhados, mais ampla será a possibilidade de desenvolvimento da capacidade textualdiscursiva. [...]. Assim, a proposta é a de incluir cada vez mais textos literários nas aulas de língua, como um trabalho discursivo-contrastivointra e interlinguístico, em que as diversas práticas verbais (leitura, escrita, produção oral, escuta e, quando couber, tradução) estejam inter-relacionadas. (SERRANI, 2005, p.47) Em suma, as discussões travadas apontam, não para uma solução salvífica e estanque, mas para a necessidade de se elaborar novos caminhos no trabalho da literatura (FILHO, 2007, p.17) Mas um instrumento que posiciona o homem na problematização deste frente às suas crenças e situação sociocultural, ao mesmo tempo que o conduz para Página seu ponto de partida, procedimento bastante comum na realidade pedagógica brasileira.” 103 no contexto escolar que n~o sirva apenas “como pretexto para a compreensão da língua, um estado de deleite, prazer e “Dado que prazer e interesse propiciam concentraç~o, tais textos são pedagogicamente valiosos, sobretudo, se abordados de uma perspectiva nãonormativista” (WEBSTER, 2002 apud SERRANI, 2005, p. 48). Relato de Experiência O início das atividades pedagógicas em sala de aula como parte da efetivação do projeto deu-se em 21 de maio de 2014, a princípio, com a turma 8º ano “E” noturno. A partir do segundo semestre constatada a problemática da evasão escolar, a equipe de gestores da escola decidiu fazer uma nova configuração de turma com os casos mais gritantes, entre estes estava o 8º ano “E” e o 8º ano “F” que, após a decis~o, tornaram-se uma única turma. Anterior a esse acontecimento e ainda no segundo semestre houve a chegada de duas integrantes a mais na equipe de acadêmicos bolsistas, a saber: Luana Suame dos Santos Ramos e Rosilda Duarte dos Santos. Mediante o novo cenário a equipe foi fragmentada e intercalada nos dias/horas de aulas. Com o intuito de averiguar até que ponto estava cognoscível para o alunado a particularização da linguagem literária, bem como, prepará-lo para o contato com essa linguagem, foi elaborada, pela equipe, uma oficina com o título “Descobrindo o pé da letra”. A atividade proposta girava em torno da linguagem não verbal em exercício na exposição fotográfica apresentada. As fotografias foram retiradas do Pequeno dicionário ilustrado de expressões idiomáticas Brasileiras (1999), no qual Marcelo Zocchio e Everton Ballardin interpretam expressões em seu sentido literal, usando corpos e objetos. O procedimento em sala de aula deu-se mediante uma breve elucidação para turma sobre o que veriam naquela noite. Enfatizou-se no diálogo o trabalho de Zocchio e Ballardin e suas perspectivas sobre o que, popularmente, se conhece por ditados populares. Em seguida, realizou-se um trato com a turma: à medida em que as imagens fossem projetadas, esta teria que adivinhar o ditado popular que estava representado pela imagem e após a identificação, a interpretação desse ditado. construção do texto literário, são inteligíveis, perceptíveis e ainda, de forma sub-reptícia, o quanto a literatura está próxima de nossa conjuntura social, cultural e humana, daí sua importância. Decerto, a tarefa pensada tinha a intenção de fazer os alunos perceberem tal Página quanto a conotação, em voga nas expressões idiomáticas e, primordialmente, na 104 Concluída a tarefa, percebeu-se, a partir da participação entusiasta da turma, o alcance sem estudos exaustivos, mas com a instauração de um ambiente que proporcionasse certa descontração. A aula seguinte estava voltada para as olimpíadas de Língua Portuguesa, cujo tema abordado era “O lugar onde vivo” buscou-se então por algo que provocasse a elaboração de textos sob o gênero textual memórias literárias. Vale ressaltar que, anterior à chegada da equipe de acadêmicos bolsistas, a professora supervisora do programa já tinha trabalhado os aspectos estruturais do gênero em pauta. Chegou-se ao consenso de que seria exibido o longa-metragem Narradores de Javé (2004),cujo enredo trata de um povoado ribeirinho prestes a desaparecer com a construção de uma hidrelétrica e para que isso não ocorra a população, em sua maioria de analfabetos, decide registrar, após incumbir dessa função o único morador alfabetizado do lugar, suas memórias desde a fundação até a atualidade do povoado. Em discussão na película estava o fazer literário, como a ficção é impactada pelo meio do indivíduo escritor e de como essa fábrica de invenção encontra-se em funcionamento a partir das vivências humanas e seus dramas coletivos e individuais e daí a margem para as inúmeras possibilidades de interpretação que a construção literária incide, basta suscitar a lembrança do enredo que impulsiona o longa apresentado. Após a exibição do filme que se deu em duas sequências, houve a abertura para discussão acerca do material, o qual foi recebido por entre risos devido à veia cômica em que este se reveste para tratar das questões supracitadas. Consideramos positivos os apontamentos levantados e na aula da semana posterior sugeriu-se a elaboração de um texto memorial descritivo sobre o enredo da obra cinematográfica. Tendo realizado uma espécie de estudo introdutório à linguagem literária e já no decurso do segundo semestre, planejou-se e executou-se uma segunda oficina com o título:“Do outro lado do tempo, memórias ao vento”. A proposta mediou-se através da exposição de fotos antigas da cidade e demonstração de objetos antigos. Na abertura, houve a leitura performática, através de um monólogo apresentado Ambos versavam sobre a imposição do tempo na fragilidade humana. A criação dessa atmosfera propiciou o surgimento de relatos passados de geração em geração no núcleo Página compilados os textos de Rubem Alves, Sobre as memórias; e Vinícius de Moraes, Poética. 105 por um componente da equipe. Para a ocasião, foram selecionados, adaptados e familiar dos alunos que, empolgados, foram falando suas recordações. O advento facilitou a redação final do texto voltado para as memórias literárias. A aula seguinte, previamente planejada, foi dedicada à apreciação do gênero textual poema. O início da discussão, marcado pela leitura performática, pautou-se nos textos:Merda e ouro,Cai e Erra uma vez, todos de autoria de Leminski;No meio do caminho, de Drummond e Amor é um Fogo que Arde sem se Ver, de Camões. Espontaneamente, entre uma aula e outra, os alunos, num misto de espanto, riso e estranhamento, comentavam sobre a beleza no momento de condução da leiturae faziam pedidos para que na próxima aula o fato se repetisse. A reação da turma também foi influenciada pelo contato com as novas formas de conceber poemas ou no fato de dizer que “aquilo” era um poema, como ficou claro ao se deparar com o poema de Leminski intitulado Merda e ouro, onde o eu lírico exalta as fezes da pessoa amada ou o poema concreto Cai, de mesma autoria, e ainda, o No meio do caminho, de Drummond. Noutra ocasião, mostrou-se através dos poemas Metade,de Oswaldo Montenegro e Construção, de Chico Buarque, na apresentação deste último contou-se com a presença de uma turma de ensino médio que teatralizou a música-poema, como as letras de músicas e os poemas estão em sintonia e como muitas vezes poemas escritos ganham uma performance musicalizada. No encontro posterior, tendo em vista o que já tinha sido explorado acerca do gênero poema, propôs-se, como atividade, a construção de um varal de poesia com obras autorais. Os poemas estariam escondidos em cartões origamis no formato de camisas. Levando-se em conta a discussãona aula anterior acerca dos haicais, e já vislumbrando esse momento, aproveitou-se aquela ocasião para ampliar a questão e discorrer sobre outras artes de longo alcance da cultura oriental, especificamente, o origami. Após a instrução das dobras para a confecção dos cartões camisas e finalizada a elaboração dos poemas, foi armado um espaço na sala de aula para pendurar as camisas linguagem.Além disso, as cores dos cartazes que se tornaram camisas e os poemas autorais, cativaram e atraíram os olhares e a atenção de todos, de igual modo, da comunidade escolar. Na aula da semana seguinte houve a apresentação do portal de Página desafiante é a tarefa do escritor literário ao manipular os aparatos constitutivos da 106 poéticas. O trabalho de construção proporcionou a experimentação do quão árdua e vídeosToda poesia (2014) vinculado ao meio cibernético através da plataforma Youtube. O projeto, em voga desde fevereiro do ano passado,pretende reunir, em vídeos, pessoas declamando seus poemas favoritos com a intenção de provocar um manifesto livre em prol da arte. Em seguida, exibiu-se alguns vídeos de poemas já trabalhados em sala e na sequência discutiu-se em relação a forma como o poema era, nova e originariamente, apresentado. Para finalizar a apreciação com o gênero poema, na aula procedente discorreu-se sobre a produção literária no Estado de Alagoas e, restritamente, em São Miguel dos Campos. Na ocasião, houve a apresentação de alguns autores e suas obras. Destaca-se a surpresa com que o alunado reagiu ao ter conhecimento da produção autoral de seus conterrâneos. Refletiu-se ainda sobre como esse desconhecimento gera a desvalorização do patrimônio cultural do Estado e do Município e em certa instância, como respinga no espaço dado por esses artistas fora de suas terras. A abordagem ao gênero conto deu-se na aula seguinte, inicialmente, com a apreciação do texto O inimigo secreto, de Caio Fernando Abreu. Além da leitura performática, dissecou-se o conto na perspectiva estrutural, realizando uma explanação de cada elemento da narrativa. O texto envolveu a todos por sua linguagem simples e de certo modo agressiva, mas também, pela forma como o enredo foi concebido. A obra trata dos dramas nas relações familiares, interpessoais e sociais como causadores de um desequilíbrio emocional que, em última instância, conduz o homem ao suicídio. O enfoque e encaminhamento dados ao tema na narrativa tornou-se motivo de uma acalorada e interessante discussão na turma, fator crucial para a classificação da atividade como positiva. Como continuidade do estudo sobre o conto, apresentou-se na aulaprocedente o texto Vai,de Ivan Ângelo, sob o mesmo procedimento adotado para a discussão do conto trabalhado anteriormente. Em foco na trama estavam as relações amorosas sob a ótica da progressivamente, durante a execução das outras atividades sugeridas pela equipe de acadêmicos bolsistas. Página direcionamento dado pela turma, a qual, apresentou o mesmo comportamento exibido, 107 infidelidade. O tema entendido como atual, ganhou abrangente e atenciosa repercussão no Na aula seguinte houve o encerramento das aulas e o momento foi conduzido através de um diálogo descontraído entre todos os envolvidos no projeto, onde discorreuse sobre as atividades desenvolvidas, pontos positivos e negativos. Após esse instante, deu-se início ao amigo doce. Os alunos demonstram-se desejosos pela continuidade do projeto e interrogavam se no próximo ano a equipe estaria com eles ou noutra turma. Considerações Finais As atividades desenvolvidas pela equipe durante o ano letivo foram pensadas levando-se em conta o desafio que se impõe quando se refere a prática de leitura e o envolvimento com texto literário no âmbito escolar. Mais desafiante ainda foi acompanhar a necessidade de inovação que este espaço tem requerido na abordagem do conteúdo curricular, fator encarado, pela equipe de futuros docente, como fonte de aprendizado. Procurou-se apresentar os textos sempre através de uma leitura performática com objetivo de desmistificar as ideias depreciativas tão comuns quando se trata da relação tríade texto-literatura-leitura. A constante inquietação da equipe por criar momentos que despertassem o gosto e a atenção dos alunos no deleite dos materiais apresentados, parece ter sido correspondida à medida em que se percebia um maior empenho do alunado com o desenvolvimento das atividades, essa participação conferiu o sucesso ao projeto. O retorno por parte do alunado foi, ainda, recebido, positivamente, pela equipe como um estímulo para dar sequência ao plano de trabalho traçado, assim como, um acréscimo de responsabilidadeem torno da expectativa com que a equipe era esperada para o esclarecimento da próxima atividade. Segundo a turma, a proposta seguinte deveria sempre superar as antecedentes e, sendo assim, aguardava que tal anseio fosse de fato correspondido. A escolha dos gêneros textuais literários e dos textos era sempre motivo de preocupação devido às questões já levantadas ao longo desse trabalho e às fragilidades comuns com que se reveste o período noturno escolar. Insistiu-se em focar numa face da Têm-se ciência que, ao lidar com a construção de propostas que integrem a prática pedagógica, o resultado nunca é estanque, estático, mas contínuo, evolutivo. Não se sabe o quanto da intenção da equipe, em aproximar mais o alunado para o trato da Página em conteúdo, ao contexto situacional do alunado. 108 literatura menos explorada que se aproximasse, ao máximo, tanto em linguagem quanto literatura na valorização do texto literárioe da leitura,foi apreendida pela turma, no entanto, tornou-se evidente a demonstração de interesse pela questão e, a longo alcance, pelas possibilidades de uso da língua. Portanto, acredita-se que, através do plano de trabalho executado, foi possível vislumbrar a concretização do que Borges (2000:55) apud Serrani (2005, p.48) diz: “se juntamente com o prazer de conhecer uma estória obtivermos o prazer adicional da dignidade do verso, então algo grande terá acontecido. Referências Página 109 ALKMIM, Tânia Maria. Sociolinguística. In: Fernanda Mussalim, Anna Cristina (Org.). Introdução à linguística I: domínios e fronteiras. V.1. São Paulo: Cortez, 2008. BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental: língua portuguesa. Brasília: MEC/SEF, 1998. FILHO, Domício Proença. A linguagem literária. 8. ed. São Paulo: Ática, 2007. HEINE, Palmira. Texto, leitura e sentidos: uma perspectiva discursiva. In: Revista Língua Portuguesa. Disponível em: <http://linguaportuguesa.uol.com.br/linguaportuguesa/gramaticaortografia/39/artigo274941.asp>. Acesso: 03 maio 2015. KIRCHOF, Edgar Roberto; PEREIRA, Mara Elisa Matos; SOUZA, Luana Soares. Literatura infantojuvenil. Curitiba: InterSaberes, 2012. (Série Por dentro da literatura). KOCH, Ingedore Villaça; ELIAS, Vanda Maria. Ler e compreender. 3. ed. São Paulo: Contexto, 2013. MARCUSCHI, Luiz Antônio. Gêneros Textuais: definição e funcionalidade. In: Angela Paiva Dionísio, Anna Rachel Machado, Maria Auxiliadora Bezerra (Org.). Gêneros textuais e ensino. 3 ed. Rio de Janeiro: Lucerna, 2005. SERRANI, Silvana. Discurso e Cultura na aula de língua. Campinas, SP: Pontes, 2005. ZUMTHOR, Paul. Performance, recepção, leitura. Tradução: Jerusa Pires Ferreira, Suely Fenerich. 2. ed. São Paulo: Cosacnaify, 2007. 9 - A TRANSDISCIPLINARIDADE E O INTELECTUAL ORGÂNICO NA SISTEMATIZAÇÃO DOS SABERES PARA EDUCAÇÃO DO CAMPO A PARTIR DA HORTA ESCOLAR4 Maria Aparecida Vieira de Melo [email protected] Paulo de Jesus [email protected] Resumo A educação na perspectiva da transdisciplinaridade tende a corroborar com a inclusão epistemológica dos saberes oriundos da cotidianidade. Daí a importância do intelectual orgânico que pode viabilizar o processo de ensino-aprendizagem de maneira que permeie os saberes dos povos do campo, ressignificando-os com a prática da horta escolar. Nesse sentido, o presente estudo pretende reconhecer a prática pedagógica dos intelectuais orgânicos a favor da sistematização dos saberes dos povos do campo, considerando as dimensões ontológicas, epistemológicas e metodológicas em prol da sistematização do conhecimento. A inquietação parte do pressuposto de que os saberes do cotidiano nem sempre são valorizados na formação formal dos alunos da escola do campo. Sendo assim, busca-se entender como os intelectuais orgânicos compreendem a transdisciplinaridade em suas práticas? Por conseguinte, procura-se investigar a presença da transdisciplinaridade na prática pedagógica dos intelectuais orgânicos no contexto escolar. Metodologicamente desenvolve-se a partir de uma revisão de literatura, a luz de teóricos como Moraes (2008); Nicolescu (2001); Arroyo (1999); Candau (2005); Sormerman (2006) e outros que vem abordando temas emergentes como este. Todavia, se faz pertinente tal estudo por contribuir para compreensão da essência da transdisciplinaridade no contexto de formação seja formal ou informal e especialmente a que é desenvolvida pelos intelectuais orgânicos. Palavras-Chave: Transdisciplinaridade. Intelectual Orgânico. Educação do Campo. Introdução A educação contemporânea tem se efetivado mediante a premissa da transdiciplinaridade que trás em seu bojo suas conjecturas atuais que convergem para a integralização dos saberes, concepções, modos e práticas de vida. Sendo assim, o presente estudo busca reconhecer a intimidade que permeia a transdisciplinaridade entre a agroecologia e os intelectuais orgânicos atravessados pelas múltiplas dimensões e referências concernentes à prática da agroecologia por meio da horta escolar no contexto educacional do campo. Assim, é importante fazer jus ao que considera Nicolescu (2002); 4 Este artigo é parte da pesquisa desenvolvida para o Mestrado em Educação, Culturas e Identidades da Universidade Federal Rural de Pernambuco em parceria com a Fundação Joaquim Nabuco. Sob a orientação do professor Titular-Livre Paulo de Jesus. Página Partindo da visão destes autores, tentam-se fazer aproximações para ressignificar os 110 Carmo (2008), Resende (2005), Arroyo (2005), Moraes (2008), Candau(2005) e outros. saberes dos povos do campo a partir da lógica do terceiro incluído que não deixa nada de fora, não dicotomiza, não faz jus à linearidade do conhecimento, mas que através do diálogo, da interação e integralização dos saberes, os quais são ressignificados em prol da aquisição do conhecimento dos povos do campo, dando ênfase aos saberes do senso comum, com o que os intelectuais orgânicos permeiam suas metodologias de ensino, especialmente por meio da horta escolar que faz jus aos saberes da ciência da agroecologia. Ciência esta, que nos espaços do campo está sendo bastante aceita, por trazer formas de lidar com a terra respeitando e cuidando da mãe natureza, a qual dar a condição da existência humana. Desse modo, o presente artigo tem por finalidadereconhecer a prática pedagógica dos intelectuais orgânicos a favor da sistematização dos saberes dos povos do campo, considerando suas dimensões ontológicas, epistemológicas e metodológicas em prol da sistematização do conhecimento. Bem mais especificamente identificar a prática pedagógica dos intelectuais orgânicos pela transdiciplinaridade e por fim, reconhecer a produção do conhecimento pelos intelectuais orgânicos. Para tal, este artigo é desenvolvido pela prática da metodologia de revisão de literatura a luz de autores como Nicolescu (2002); Carmo (2008), Resende (2005), Arroyo (2005), Moraes (2008), Candau (2005) e outros que dialogam sobre a transdisciplinaridade,intelectual orgânico e a educação do campo. Daí a importância do pensamento ecológico que corrobora para todas as conexões existenciais entre o homem e a natureza. Os movimentos sociais em seu movimento de reivindicações e contestações acerca da desigualdade social sãobastanteevidentes a fim da contextualização dos saberes que norteiam a produção do conhecimento, exercendo assim o intelectual orgânico. Dessa maneira, é possível reconhecer que a transdisciplinaridade juntamente com a postura dos intelectuais orgânicos por meio de suas práticas de ensino agroecológico usando a horta escolar, permeiam com respeito e ética uma postura inovadora acerca da ontologia, epistemologia Página do campo.] 111 e metodologia que envolve a todos neste universo de saberes interligados para os povos Intelectual orgânico e a prática transdisciplinar Entender a premissa da práxis é de fundamental importância para ressignificar os saberes oriundos dos conhecimentos do cotidiano e sistematizá-los a favor da transformação e emancipação social dos sujeitos do campo. Dessa maneira, permite-se compreender e aceitar o que defende Vásquez (1977, p.406) ao mencionar acerca da premissa de: Entendermos a práxis como atividade material humana, transformadora do mundo e do próprio homem. Essa atividade real, objetiva, é, ao mesmo tempo ideal, subjetiva e consciente. Por isso insistimos na unidade entre a teoria e a prática, unidade que implica também em certa distinção e relativa autonomia. Por conseguinte, é sob este ponto de vista que se acredita que as relações interpessoais corroboram para o desenvolvimento integral do ser humano, na medida em que os homens interferem na organização da sociedade para que todos os seres humanos possam desenvolver suas faculdades plenas e sociais em prol da consolidação teórica e prática que perpassam a sociedade. A sistematização da teoria e prática torna-se possível com a mobilização dos intelectuais orgânicos que sendo politizados e conscientes do processo binário do qual estão inseridos interferem de modo significativo na consolidação das políticas públicas situados nos pressupostos ontológicos, epistemológicos e metodológicos, trazendo consigo novas bases para renovação filosófica eeducacional ao priorizar as relações, as interações, as emergências, as redes e seus processos auto-ecoorganizadores, dialógicos, recursivos e emergentes (MORAES, 2008). Elementos que podem ser encontrados nas práticas pedagógicas dos intelectuais orgânicos ao trabalharem com a horta escolar. Pois o trato com a horta escolar requer desdobramentos procedimentais, atitudinais e conceituais mediados por um diálogo horizontal dos saberes, uma vez que todos os envolvidos podem contribuir com a sistematização do processo de aquisição do conhecimento. Tendo em vista que os intelectuais orgânicos lidam com questões reais concernentes as necessidades dos sujeitos que vivem organizados socialmente, dialogam com a disseminação de conteúdos da matriz curricular, mas aquele que percebe as questões sociais inerentes ao contexto escolar, de acordo com as problematizações sociais Página intelectual orgânico no contexto escolar aquele professor/educador que se preocupa não 112 acerca das especificidades inerentes ao campo social. Assim, pode ser considerado e consequentemente contextualiza-as em sua sala de aula, tais problemáticas que fazem parte da vida cotidiana daqueles sujeitos. Por isso pode ser considerado esta prática sendo permeada pela transdiciplinaridade, uma vez que esta é uma etapa superior de integração, significando a construção de umsistema total, sem fronteiras sólidas entre as disciplinas(SOMMERMAN, 2006).Dessa forma, conceitua Gramsci (1982, p.3-4), o sentido epistemológico do intelectual orgânico, sendo: Cada grupo social, nascendo no terreno originário de uma função essencial no mundo da produção econômica, cria para si, ao mesmo tempo e de um modo orgânico, uma ou mais camadas de intelectuais que lhe dão homogeneidade e consciência da própria função, não apenas no campo econômico, mas também no social e no político: o empresário capitalista cria consigo o técnico da indústria, o cientista da economia política, o organizador de uma nova cultura [...] Deve-se anotar o fato de que o empresário representa uma elaboração social superior, já caracterizada por uma certa capacidade dirigente e técnica [...]. Nesse sentido, não há somente um tipo de intelectual orgânico, mas vários tipos de intelectuais de acordo com os grupos sociais em suas especificidades. Dessa forma, comunga-se das considerações de Semeraro (2003, p.271) no entendimento de que: Os intelectuais orgânicos às classes populares, ao contrário, caracterizam-se pela democratização do poder, pela expansão dos direitos, pela eliminação da violência e do embuste. Ao desvendar as contradições na sociedade e ao socializar o poder, os intelectuais populares, por um lado, subvertem a concepção de dominação, de autoritarismo e de burocratismo, e, por outro, criam uma nova concepção de política fundada sobre o conceito de hegemonia, de democracia, de ‘dirigentes’ de uma nova civilização. Assim, fica explicito que os intelectuais orgânicos combatem as formas de opressão, burocratização e autoritarismo, ações cartesianas do desenvolvimento cognitivo e social, a favor do acesso democrático aos bens sociais, políticos, econômicos e culturais. Os quais pressupõem também a necessidade de se trabalhar a multidimensionalidade humana a partir deestratégias de aprendizagem que envolve não apenas os aspectos racionais, técnicos e simbólicos,mas também os aspectos intuitivos, míticos, mágicos, afetivos, as múltiplas linguagens que dão sentidos esignificados a existência humana (MORAES, 2008).Nesse pressuposto, os sujeitos que se destinam a serem intelectuais orgânicos estão associados a organizações sociais, das quais são representantes. O multirreferenciais que permeiam o contexto sócio histórico de todos os seres humanos. Por conseguinte, afirma Resende (2006, p.6) o papel inerente à essência do: Página necessidades dos sujeitos de direito considerando os pressupostos multidimensionais e 113 intelectual orgânico tende por finalidade reformular as políticas públicas especificas as Orgânico, em síntese, é o intelectual que participa, que age, que ajuda na formulação de uma nova hegemonia ou se engaja na manutenção da hegemonia existente. De um lado e do outro, a organicidade vem do comprometimento, da participação, na formulação de ideia que ajudem na ação política, seja ela hegemônica ou contra hegemônica. Quando o professor/educador permeia um ensino voltado para as questões sociais em evidência como a sustentabilidade ambiental, tem de envolver os alunos no processo de apropriação do conhecimento necessário para que ressignifique sua existência no contexto do qual está inserido. Daí evidencia-se a essência da transdisciplinaridade, sendo que: É neste repensar de novas práticas pedagógicas, trabalha-se, simultaneamente, com os operadores cognitivos da complexidade, com a lógica ternária e com o que acontece nos diferentes níveis de realidade e de percepção dos sujeitos aprendentes. Assim, a transdisciplinaridade não combina com pensamento único e com práticas instrucionistas, já que valoriza o pensamento complexo e relacional, o pensamento articulado, auto-eco-organizador e emergente. Valoriza os processos críticos, criativos, dialógicos e recursivos, reconhecendo a autonomia relativa do sujeito aprendente e a responsabilidade individual e coletiva. Trabalha com o conceito de aprendizagem integrada, lembrando que os fenômenos cognitivos são inseparáveis dos fenômenos biofísicos (MORAES, 2008, p. 78). Assim acontece no contexto escolar quando o educador por meio da horta escolar trabalha a educação ambiental a favor da conscientização, politização e desenvolvimento integral, do senso crítico fazendo com que os alunos entendam que o ato de cuidar do meio ambiente depende da atitude de cada um, mas que quando um grupo social se une os resultados são mais visíveis e imediatos. Dessa forma, o educador pode em regime de colaboração contar com a participação de uma pessoa mais experiente que maneje a terra, podendo ser até um dos responsáveis dos alunos para ajudá-lo a sistematizar o canteiro da horta escolar que geralmente não necessita de muito espaço e que se faz uso da reciclagem, como de garrafas pet e lixo orgânico, sendo este considerado como restos de frutas e legumes. Assim, em parceria alguns valores são desenvolvidos como a solidariedade, colaboração, cooperação, ajuda mútua, partilha e comunhão. E nesse artefato vivencia-se uma educação O sentido epistemológico dessa educação concerne ao desenvolvimento integral dos sujeitos de direito que tendem a libertação de todas as formas de pressão, exploração e expropriação dos direitos fundamentais, como a dignidade a vida, a educação, saúde, Página Educação omnilateral abrange a educação e a emancipação de todos os sentidos humanos, pois os mesmos não são simplesmente dados pela natureza. O que é especificamente humano, neles, é a criação deles pelo próprio homem. 114 omnalateral que de acordo com os pressupostos de Meszáros, (1981, p. 181), essa: moradia e outros inalienáveis a todos os seres humanos. Nessa premissa comunga Frigotto (2012, p. 265) ao conceituar a educação omnilateral, dessa forma Educação omnilateral significa, assim, a concepção de educação ou de formação humana que busca levar em conta todas as dimensões que constituem a especificidade do ser humano e as condições objetivas e subjetivas reais para seu pleno desenvolvimento históricos. Essas dimensões envolvem sua vida corpórea material e seu desenvolvimento intelectual, cultural, educacional, psicossocial, afetivo, estético e lúdico. Entender que a educação ambiental não estar desvencilhada dessa educação supracitada, é bastante pertinente para compreender que a educação da contemporaneidade deve seguir esse pressuposto da transdisciplinaridade que não dicotomiza absolutamente nada, justamente por ser fundamentada na complexidade, diferentes níveis de realidade e a lógica do terceiro incluído (NICOLESCU, 2001). Nesse sentido, as informações mediadas corroboram para tornar os seres humanas mais e melhores, uma vez que o ser humano deve ser fruto da educação que recebe em toda sua vida, e esta educação deve ser de qualidade e em sua totalidade. Neste sentido da totalidade inserem-se todas as dimensões objetivas e subjetivas inerentes ao cerne de todo ser humano, o que necessariamente transdisciplinar. Compreende-se que no ato do educador/professor trabalhar pedagogicamente em sala de aula a horta escolar, ele promove essa educação porque lida com a sensibilização dos alunos, suas emoções ao apresentar dados dramáticos da desigualdade social, da fome, da poluição ambiental, do desperdício alimentar, da desnutrição e das condições atuais da natureza devido às ações antrópicas do homem para com a natureza. A horta escolar vem corroborar com a educação transdisciplinar necessária para a modernidade, uma vez que muitas práticas sociais devem ser repensadas em prol da sustentabilidade ambiental e a educação é de suma importância para permear a conscientização e politização das práticas a favor de uma sociedade mais justa, igualitária e fraterna, favorecendo assim condições para uma vida digna em sua totalidade. não importando muito as consequências futuras, que a sociedade produz significativamente. Entretanto, o cenário contemporâneo tem mudado devido à degradação ambiental e consequentemente a extinção da população humana. A favor de Página A sociedade brasileira vive em um colapso de informação e de modos de viver, 115 A agroecologia e a transdiciplinaridade combater esse desiquilíbrio entre o homem e a natureza surge a ciência da agroecologia que apresenta um modelo de equilíbrio socioambiental em prol da sustentabilidade. Destarte, se faz necessário compreender o sentido epistemológico da agroecologia que se apresenta se não como a única alternativa, mas como uma excelente alternativa de permear a harmonia socioambiental. Assim, de acordo com o que Carmo (2008, p.7 apud Caporal e Costabeber, 2002)conceituam que a agroecologia é: O campo do conhecimento que proporciona as bases científicas para promover a transição do padrão de agricultura convencional para estilos de agriculturas ecológicas, na direção de também transformar o modelo convencional de desenvolvimento para modelos sustentáveis de desenvolvimento rural. Em sendo assim, a ‘transformaç~o da agricultura convencional para estilos de agricultura ecológica’ corroboram com as novas atitudes e concepções de desenvolvimento do ecossistema, pois os seres humanos mudam de convicção de como lidar com a terra, o que plantar, como cuidar e, enfim se estabelece uma nova relação socioambiental entre o homem e a terra. Tudo isso, em prol do desenvolvimento sustentável e de melhores condições de qualidade de vida e soberania alimentar. Contudo conceituar a agroecologia somente não basta é preciso vivenciar nas práticas diárias e na escola é possível conceber essa abordagem de forma simples e prática para que desde criança os sujeitos entendam que o modo de produção destruindo a natureza erradicará a humanidade se atitudes sensatas não ferem tomadas há tempo. A função social da escola comunga dessa concepção de forma holística, no sentido de que para a sociedade não entrar em colapso é preciso assumir ações sustentáveis, e a horta escolar permeia essas ações, pois no ato de sua feitura todos os sujeitos se envolvem em prol de um único objetivo, o da sustentabilidade. Dessa forma, Carmo (op.cit.) argumenta que: A agroecologia, então, é vista como uma nova abordagem científica, multidimensional, na medida em que procura o aporte das mais diferentes disciplinas para construir seu escopo teórico, tendo sempre como unidade de estudo o agroecossistema. desenvolvimento no princípio da tecnologia que em nome de seu progresso causa danos irreversíveis. Em contrapartida, na visão multidimensional de Altieri (1998, p.18) objetiva a agroecologia no sentido de: Página ações dos homens no ecossistema natural, modificando assim a natureza em prol do 116 O agroecossistema surge a partir do principio da agroecologia que condiz com as Trabalhar com e alimentar sistemas agrícolas complexos em que as interações ecológicas e sinergismos entre os componentes biológicos criem, eles próprios, a fertilidade do solo, a produtividade e a proteção das plantas. Na concepção da agroecologia conforme os postulados supracitados percebe-se que a agroecologia está embasada na multidisciplinaridade que envolve o processo de ensino-aprendizagem de forma holística a favor de novas atitudes de forma de viver. Daí compreende-se que a transdisciplinaridade é evidente nesta concepção, uma vez que faz uso da complexidade, da multidimensionalidade, do pensamento ecológico de que tudo está interconectado. Daí, trabalhar a terra requer não somente o fato de produzir, mas o como produzir para não destruir, assim a premissa da agroecologia verte a favor da sustentabilidade. Dessa forma, acredita-se que esta ciência é incorporada na multidimensionalidade, nesse ensejo sopesa Carmo (2008, p. 8) ao mencionar que: A base epistemológica da agroecologia vem da contribuição das várias disciplinas do conhecimento, com uma visão integradora e sistêmica do estudo da realidade. É nesse somatório que ela procura sua estrutura de conhecimento, com enfoque teórico e metodológico próprios, dentro, ainda do aporte das experiências de distintos atores sociais que interagem ativamente com os recursos naturais. Entende-se que o surgimento dessa ciência é intimamente transdisciplinar e ao mesmo tempo interdisciplinar, pois há integração das disciplinas, norteadoras do desenvolvimento cognitivo, bem como parte das preocupações ambientais dos sujeitos coletivos que interagem diretamente com a terra, como os movimentos sociais, especialmente o MST (Movimento Sem-Terra), pois os movimentos sociais têm suas metodologias alternativas, através de místicas, dinâmicas próprias para despertar a conscientização e politização dos sujeitos, assim promovem-se novas atitudes em reparação aos danos causados ao meio ambiente e consequentemente aos seres humanos. Agroecologia permeia as ações que vem de encontro com o equilíbrio ambiental, a sustentabilidade e as práticas agrícolas no modelo da permacultura, que viabiliza o trato com a terra de forma sustentável, advindas dos grupos sociais que lidam com agricultura, especificamente os agricultores familiares que vivem organizados socialmente. Desta Isso significa que os camponeses ao manejarem a terra, levando em consideração os princípios agroecológicos conseguem resultados significativos sem causar danos ao Página O conhecimento camponês sobre os ecossistemas resulta em formas produtivas multidimensionais de uso da terra, com as quais conseguem obter, dentro de limites técnicoecológicos, a autossuficiência alimentar das comunidades. 117 forma, acredita-se no que Altieri (1998), divulga sobre: meio ambiente, ao contrário ressignificam sua relação socioambiental. Por conseguinte, trabalhar na perspectiva da agroecologia a horta escolar corrobora para disseminar um modo diferenciado de permear a produção agrícola. Sendo assim, mediante os pressupostos de Altieri e Nicholls (2014, p.6) identificam que a: Agroecologia seguraria a fertilidade do solo, a regulação natural das pragas e a produtividade das culturas. A redefinição do sistema envolve a transformação da estrutura e funcionalidade dos agroecossistemas promovendo o manejo dirigido para otimizar os processos do tipo ciclagem de nutrientes, acúmulo de matéria orgânica, controle biológico das pragas e produção equilibrada. Assim, essas ações advindas da agroecologia assemelham-se com as atividades da horta escolar que têm a finalidade de contribuir com as mudanças nas práticas agrícolas que tendem a agredir o meio ambiente a favor da sustentabilidade, do desenvolvimento da relação de pertencimento identitário e cultural do seu contexto social, valorizando o modo de produção que lhes garante a soberania alimentar. Assim sendo, a horta escolar juntamente com o principio da agroecologia desenvolvida pelos grupos sociais lhes inserem socialmente nos grupos que vivem organizados socialmente nos seus respectivos movimentos sociais. Daí considera-se o que Carmo (2008, p. 8) menciona sobre: A competência dos grupos étnicos da localidade está na convivência com os ecossistemas que lhes arbitra um saber sobre o ambiente, a vegetação, o solo, animais, clima, entre outros, fruto da sua permanência, às vezes por gerações, naquele lugar. Esse conhecimento vai além dos aspectos produtivos incorporando decisões de caráter multidimensional para a utilização da terra e a reprodução social. Assim, a educação ambiental mediada pela horta escolar a favor da efetivação da prática da agroecologia em sua transdisciplinaridade é desenvolvida pelos povos do campo, os quais vivem de acordo com suas culturas e identidades, bem como os seus cultivares e leguminosas e enfim todas as vegetações cultivadas no solo do campo dos povos que vivem de acordo com a natureza, buscando uma relação reciproca de respeito, ética e cuidado com a mãe natureza (CANDAU, 2009). Isso significa que a transdisciplinaridade permeia a essência da vida em sua multimensionalidade, multirreferencialidades, complexidade, em seus diferentes níveis de realidade e a conexão, onde tudo está integrado, acoplado, unido. O que significa a capacidade de articular a (SOMMERMAN, 2002, p. 9). Página numa postura sensível, intelectual e transcendentalperante si mesmo e perante o mundo 118 multirreferencialidadee a multidimensionalidade do ser humano e do mundo.Ela implica A desigualdade social ainda neste século é bastante pertinente, tendo em vista que as teorias advindas da construção do conhecimento sistematizado ainda são insipientes para encontrar uma solução definitiva para problemas sociais que se originaram desde primórdios da historia brasileira. Desta forma, hoje se pretende buscar soluções alternativas para intervir na sociedade mediante seus problemas geracionais, considerando que a ciência de modo geral se preocupa com todas as questões sociais, mas que nos parece que não encontrou o fio da meada. Assim, há quem pense que a solução esteja nos procedimentos tecnológicos produzidos pela sociedade capitalista, mas a verdade é que todo avanço tecnológico gera suas degradações, principalmente ambiental. Em se tratando dos avanços tecnológicos para as monoculturas, quantos danos ambientais não foram causados em prol do aumento da produtividade? Mas isso, não foi levado em consideração. Assim, conforme nos apresenta Carmo (2008, p. 2), sendo: A tecnologia idealizada para transformar a agricultura tradicional acabou se generalizando sem levar em consideração as características básicas das diferentes regiões do planeta, inviabilizando a superação das restrições do crescimento da produção colocadas pela dotação dos recursos produtivos de cada país ou região. Depreende-se que os povos do campo/quilombola não se enquadram nessa premissa da agricultura tradicional, uma vez que eles não têm como manterem a produção em alta escala e o que geralmente tende a acontecer é que busquem formas diferenciadas para cultivar seus cultivares. Consequentemente, surgem novos modelos de produção que permeiam fazer uma nova agricultura, diante do que nos afirma Carmo (2008, p.7): Pensando na contraposição local versus global, aagroecologia está se firmando como uma novapossibilidade de transformação, não apenas da baseprodutiva, mas também da inclusão humana namodificação de agroecossistemas, em uma visãoevolutiva sociedade-natureza. Daí a importância dessa nova performance produtiva, pois além da agroecologia ressignificar o modo de vida dos povos do campo/quilombolas, permeia a inclusão humana na modificação dos ecossistemas que estão intimamente ligados a existência humana. Essa atividade é concernente com as multirreferências que se estabelecem no decorrer das mudanças ocorridas em prol da sustentabilidade tanto da sociedade quanto econômica e identitária dos sujeitos fazedores desta prática. Dessa forma, Carmo (2008) comunga da ideia de que: Página múltiplos que se sistematizam ao longo das necessidades de sobrevivência social, cultural, 119 da natureza. A relevância dessa prática agrícola requer de seus praticantes saberes A agroecologia, então, é vista como uma nova abordagem científica, multidimensional, na medida em que procura o aporte das mais diferentes disciplinas para construir seu escopo teórico, tendo sempre como unidade de estudo o agroecossistema. O objetivo é “trabalhar com e alimentar sistemas agrícolas complexos em que as interações ecológicas e sinergismos entre os componentes biológicos criem, eles próprios, a fertilidade do solo, a produtividade e a proteção das plantas” (ALTIERI, 1998, p.18). Por conseguinte o entendimento de que a agroecologia pode ser tratada como nova, porque esta trás em seu bojo o que é concernente ao desenvolvimento sustentável dos seres humanos e também da natureza como um todo. Diante das multirreferências embutidas na premissa da agroecologia, esta se distingue das mais variadas formas da existência simbiótica entre a sociedade-natureza. Daí é fato que a agroecologia é uma ciência que parte dos diferentes níveis de realidade do qual esta se encontra mediante os mais variados ecossistemas, sendo estudadas nas mais variadas perspectivas. De acordo com o que Carmo (2008) em suas conjecturas considera, salienta que: Enquanto uma ciência em construção, a base epistemológica da agroecologia vem da contribuição das várias disciplinas do conhecimento, com uma visão integradora e sistêmica do estudo da realidade. É nesse somatório que ela procura sua estrutura de conhecimento, com enfoque teórico e metodológico próprios, dentro, ainda do aporte das experiências de distintos atores sociais que interagem ativamente com os recursos naturais. Entender a agroecologia como uma ciência sistêmica, a qual é fruto de abordagens epistemológicas naturais e sociais é comungar do principio da transdiciplinaridade, quando se leva em consideração o elo entre as ciências da terra, a ecologia, os saberes dos distintos atores sociais que unidos vão além do que é pragmático. Dessa forma, abordar a agroecologia como fundamental para a sustentabilidade ambiental é considerar também que é sob esta égide que se solidifica as relações integrais entre os sujeitos e a natureza, mantendo a busca pelo equilíbrio sociocultural e econômico da sociedade como um todo. Os conhecimentos que se tem acerca dos modos de lidar com a terra possuem inúmeras variáveis que devem ser consideradas para que a sustentabilidade seja promovida ao mesmo tempo em que os ecossistemas sejam alterados em prol do Divulgaque o conhecimento camponês sobre os ecossistemas resulta em formas produtivas multidimensionais de uso da terra, com as quais conseguem obter, dentro de limites técnicoecológicos, a autossuficiência alimentar das comunidades. Portanto, os sistemas tradicionais de conhecimento trazem aos agroecologistas informações sobre as técnicas agrícolas adequadas aos controles de riscos Página (2008) usa do aporte de Altieri (1998), para nos fazer entender que se: 120 desenvolvimento da produção para o consumo humano. Diante desse pensamento Carmo no uso da base de recursos ambientais, e das necessidades dos grupos nativos de agricultores.Produção estável, sustentável, só é possível ocorrer contando com uma organização social que resguarde a integridade dos recursos naturais, base da produção, e ao mesmo tempo propicie a harmonia entre seus membros. São mediantes as formas produtivas multidimensionais que os saberes se solidificam em seus construtores. Pois os conhecimentos dos povos do campo/quilombolas são considerados pelos agroecologistas que buscam referencias do modo de produção dos povos tradicionais. Até porque, muitos dos adeptos a este modelo de produção são pessoas preocupadas com o meio ambiente e assim, tentam minimizar as entropias ambientais causadas pelos homens: A abordagem agroecológica incentiva os pesquisadores a penetrar nas práticas dos agricultores, resgatando seu conhecimento, para desenvolver agroecossistemas com uma dependência mínima de insumos químicos e energéticos externos. Almeja um agroecossistema perfeitamente equilibrado entre seus componentes, plantas, solo, nutrientes, luz solar, umidade e organismos coexistentes, com o intento de superar, naturalmente, as perturbações sofridas com os sistemas artificializados de produção agrícola. A finalidade sempre é restaurar a resiliência e a força dos agroecossistemas, combatendo as causas dos estresses e restabelecendo o equilíbrio. No limite, quando da total regeneração e estabilização do agroecossistema não seriam mais necessários os insumos externos. Nessa linha fica fácil perceber que a intenção é a otimização do sistema como um todo no longo prazo e não, a busca a qualquer preço, de altos níveis de produtividade no curto prazo. Apreende-se que as novas formas de cultivar diante de métodos alternativos que se apresentam como solução para o meio ambiente, a sustentabilidade deve ser uma prática inerente a todos os sujeitos que lidam com a terra. Em sendo assim, percebe-se que a educação agroecológica prima pelo desenvolvimento sustentável do ecossistema. Tendo em vista que se faz um paralelo com as práticas de cultivo da produção, pois o que se visa não é a quantidade em curto prazo de tempo, mas a qualidade mesmo que seja em longo prazo. Daí surge os produtos orgânicos que são produzidos sem agrotóxico e com tratos saudáveis para com a terra sem ter que degradar o meio ambiente. Educação do campo a favor da diversidade história da sistematização da educação. Assim, o campo das políticas públicas se fortalece na medida em que a educação do campo vai sendo consolidada, uma vez que esta sempre Página públicas tendo como precursores os movimentos sociais que vem lutando ao longo da 121 A educação do campo atualmente se vê inserida nas discussões das politicas foi tratada como elementar e que por ser assim o ensino deveria ser elementar. Conforme Arroyo (1999, p. 12) aponta ao manifestar que: O movimento social é mais exigente. Porque nos situa no terreno dos direitos, nos leva a vincular educação com saúde, cooperação, justiça, cidadania. O direito coloca a educação no terreno dos grandes valores da vida e da formação humana. É aí, que vocês estão colocando a educação básica: por quê educar o trabalhador no campo, a trabalhadora, os sem terra, por quê? Porque são sujeitos de direitos. É perceptível que o campo da educação básica nas escolas rurais, desde primórdios foi tratado como irrelevante para os povos do campo, pois os camponeses não precisavam das letras para arrastar terras para os pés, bem como para servir ao mercado de trabalho da cidade. Assim, os povos do campo recebiam formação elementar e consequentemente viviam cumprindo seu papel social de forma elementar. Daí, entender que a função educativa vai além das primeiras letras é de sobremaneira importante, uma vez que a escola não é o único local de formação. Nesse sentido, entende-se que a escola, segundo Arroyo (1999, p.14)é: Maisum dos lugares onde nos educamos. Os processos educativos acontecem fundamentalmente no movimento social, nas lutas, no trabalho, na produção, na família, na vivência cotidiana. E a escola, que tem a fazer? Interpretar esses processos educativos que acontecem fora, fazer uma síntese, organizar esses processos educativos em um projeto pedagógico, organizar o conhecimento, socializar o saber e a cultura historicamente produzidos, dar instrumentos científico-técnicos para interpretar e intervir na realidade, na produção e na sociedade. A escola, os saberes escolares são um direito do homem e da mulher do campo, porém esses saberes escolares têm que estar em sintonia com os saberes, os valores, a cultura a formação que acontece fora da escola. Por conseguinte, a educação se dá por processos educativos que devem ser sistematizados através do projeto pedagógico, o qual é construído coletivamente e levado em conta todos os saberes historicamente produzidos pela sociedade, como os costumes, as crenças, os processos culturais e identitários dos povos do campo, principalmente porque a grade curricular votada para o ensino do campo é baseado pela grade curricular da cidade. Esta por último descaracteriza a especificidade do campo. Diante dessa premissa, se fundamenta a necessidade de repensar a educação do campo. Conforme nos solicita Arroyo (1999, p. 15) entender a necessidade da educação Daí que o modelo de educação básica queira impor para o campo currículos da escola urbana, saberes e valores urbanos como se o campo e sua cultura pertencessem a um passado a ser esquecido e superado. Como se os valores, a cultura, o modo de vida, o homem e mulher do campo fossem uma espécie em extinção. Uma experiência humana sem mais sentido a ser superada pela experiência Página para os povos do campo: 122 do campo para o campo significa repensar e refazer todas as práticas sociais inerentes urbano-industrial moderna. Daí que as políticas educacionais, os currículos são pensados para cidade, para a produção industrial urbana, e apenas lembram-se do campo quando se lembram de situações "anormais", das minorias, e recomendam adaptar as propostas, a escola, os currículos, os calendários a essas "anormalidades". Então, é imprescindível que o campo seja abordado dentro de seu território, diante dessas conjecturas sociais urbanocêntricas, faz-se necessário repensar sobre o que é peculiar dos povos do campo, para não discursar uma coisa e se praticar outra. Uma vez que se julga que os povos do campo não necessitam de uma formação integral capaz de fazer-lhes sujeitos emancipados socialmente. Isso porque menosprezam os povos do campo em função das necessidades oriundas dos povos da cidade. Daí, como faz refletir Arroyo, ao minimizar a prepotência dos povos da cidade em detrimento dos povos do campo sobre o processo de ensino-aprendizagem. Essa preocupação é nítida mediante os resultados teórico-práticos a favor das escolas do campo, uma vez que muitas escolas vêm sendo fechadas. Provocando o deslocamento das crianças para as cidades. Nesse sentido, Arroyo (1999. P. 17) nos alerta: Quando situamos a educação como um processo de transformação humana, de emancipação humana, percebemos quanto os valores do campo fazem parte da história da emancipação humana. Então como a escola vai trabalhá-los? Será que a escola vai ignorá-los? Será suficiente pegar o livro da cidade e apenas adaptá-lo? A questão é mais fundamental, é ir às raízes culturais do campo e trabalhá-las, incorporá-las como uma herança coletiva que mobiliza e inspira lutas pela terra, pelos direitos, por um projeto democrático e também pede educação. Superar a visão de que a cultura do campo é estática paralisante, voltada para a manutenção de formas e valores arcaicos. O movimento social do campo mostra como incomoda pelo que traz de avançado, de dinâmico. Assim, os movimentos sociais têm deixado suas marcas nos vários seguimentos sociais, pois a militância em prol da educação pública e de qualidade tem significado muito para os povos do campo, bem como as práticas pedagógicas tem sido reorganizadas em prol da alteridade e do protagonismo dos sujeitos sociais, sujeitos esses que são pluriétnicos, diversos, sujeitos coletivos. Conclusão Ao que concerne sobre o que foi exposto até então é o fato de que a contribuição do intelectual orgânico para promover o conhecimento e o reconhecimento dos saberes orgânicos podem sistematizar os saberes concernentes à sistematização do conhecimento de forma procedimental, atitudinal e conceitual. Página atividades práticas através da instalação da horta escolar subsidiada pelos intelectuais 123 interconectados,eé, de sobremaneira importante, no sentido de que os alunos por meio de Nesse sentido é interessante perceber que a horta escolar é uma prática pedagógica intimamente transdisciplinar, pois ela exige a multidimensionalidade, a multirreferencialidade, a complexidade do ecossistema, a lógica do terceiro incluído, onde esta última se reconhece pela agroecologia com sua forma dinâmica de interação entre as espécies que se autodefendem e autoproduzem, sem uso de agrotóxico,fertilizante químico, mas através da dinâmica própria de auto-organização entre as espécies mediadas pela atitude consciente dos seres humanos. Assim os movimentos sociais tem uma contribuição importante no contexto da educação do campo, pois visam a contextualização dos saberes, para que o processo de aquisição do conhecimento seja de fato efetivado a partir da transformação e emancipação social dos povos do campo, levando sempre em consideração os saberes do senso comum, as experiências de vida em suas múltiplas dimensões e referências que são construídas ao longo das trajetórias sociais, politicas, econômicas, culturais, éticas e diversas que permeiam a essência da humanidade. Dai compreender a essência da mãe natureza que corrobora para a pedagogia da práxis libertadora concernente aos povos do campo que veem sentido a tudo o que lhes cercam e em movimento, seguem buscando efetivar cotidianamente as causas pelas quais lutam, reivindicam e desejam, pois mediante o diálogo, a interação é possível a humanização e o pleno desenvolvimento dos seres humanos que encontram-se inseridos neste contexto sócio histórico de culturas diversas, emoções e sensibilidades natas que devem e merecem um olhar atencioso para tais questões. Assim, aqui não é possível dominar ou esgotar esta prerrogativa, imagina é apenas um ensaio do qual pode nortear ou suscitar o interesse em aprofundar os modos outros de vida dos povos do campo que em sua singularidade são plurais, diversos e complexos, com suas crenças, valores, manifestações culturais, sentidos e significados. O que é muito bem ressignificado pelos intelectuais orgânicos em suas práticas consideradas ALTIERI, M. A. 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VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez. Filosofia da práxis. Tradução de Luiz Fernando Cardoso. 2. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1977. 10 - ÍNDIOS JIRIPANKÓ: TERRITORIALIDADE E PRÁTICAS RELIGIOSAS Anderson Barbosa da Silva [email protected] Resumo Este texto propõe um estudo sobre os índios Jiripankó, territorializados no município de Pariconha, alto sertão do estado de Alagoas, apresenta um pouco da história, cultura, crenças e luta desse povo por um território. Falar sobre povos indígenas em Alagoas é um tema novo, que no passado não houve preocupação em se estudar ou relatar, ressalvando, a escrita empreendida pelo colonizador Europeu - objetivando a dizimação desses povos - ou por alguns teóricos que queriam minimizar ou negar nossa formação cultural, baseada na miscigenação de várias raças e culturas, consequentemente, negar os direitos desses na sociedade. Frente a isso, propomos um diálogo entre História e Antropologia Indígena a partir de autores como: Clifford Geertz, Nestor Canclini, Carlo Ginzburg, Barth, Arruti, Siloé Amorim, Estevão Pinto, Rodrigo Grunewald, Edwin Reesink, Amaro Hélio, entre outros; com entrevistas orais de lideranças indígenas Jiripankó, cacique Genésio Miranda, Pajé Elias Bernardo e Cícero Pereira. Entrevistas colhidas a partir dos pressupostos da história oral como ferramenta de pesquisa em campo. Apresentamos a origem Jiripankó, suas lutas de resistência, sobrevivência e busca por um território, focando em suas práticas religiosas. Apresenta o sincretismo religioso, o espaço do terreiro, a dança do toré, os praiás e os encantados, elementos norteadores de suas práticas religiosas. Palavras-chave: Índio. Território. Religiosidade. Formação Do Território Indígena Jiripankó Os índios Jiripankó5 estão localizados no município de Pariconha, a cerca de 360 quilômetros de Maceió, na mesorregião do alto sertão alagoano, cidade típica sertaneja de vegetação conhecida como caatinga, possui uma população de 10 246 habitantes segundo IBGE (2010), a principal fonte de renda está na administração pública, no comércio e na agricultura. A aldeia Jiripankó ocupa uma área demarcada de 215 hectares, compreendida através da união das aldeias do Ouricuri, Figueiredo, Serra do Perigoso e Volta do Moxotó, reside um total de 400 famílias, distribuídas nessas aldeias, com população de 2.270 habitantes6. No centro desse conjunto de aldeias, está a aldeia Ouricuri, que se tem Encontram-se várias denominações em referência ao nome dessa comunidade indígena, entre eles: Geripancó, Jiripankó e Jeripankó, optamos por Jiripankó, com base na oralidade da aldeia e o processo de adequação da língua portuguesa que indica o uso do “J” em palavras de origem indígena. Diz Amorim (2010, p.196) ao relatar sobre o processo de troca do “C” por “K”, faz parte de um aspecto técnico, introduzido com a incorporação das letras Y, K e W em nosso alfabeto, utilizados em termos científicos. Daí algumas aldeias optam por essa mudança. 6 Dados colhidos em entrevista com o índio Jiripankó Cícero Pereira dos Santos, em 2012. 7 Segundo Cícero Pereira dos Santos, em 2012. Página 5 126 referência como aldeia principal, com população de 1.0707. O povo Jiripankó faz parte, junto aos Kalankó, Karuazu, Katokinn, Koiupanká e Pankararu de Delmiro Gouveia – grupos que vivem no sertão de alagoas – de um movimento de diáspora e resistência de povos da etnia Pankararu do Estado de Pernambuco8. Etnia que passou por um processo de diáspora ocorrido na segunda metade do século XIX, período marcado pela transição das relações de trabalho para o capitalismo, além da decorrência de más condições de sobrevivência e pela promulgaç~o de leis públicas, criadas para “organizar” a quest~o fundiária no território brasileiro. (ARRUTI, 1995). Entre essas leis, está a Lei das terras que estabelecia a compra como a única forma de acesso à terra – ou por doação de Dom Pedro II – abolindo em definitivo o regime de sesmaria, vigente até a presente data. Em 1872 ocorre a extinção dos aldeamentos da Província, sendo incorporados ao domínio público. Com isso, os indígenas perdem os direitos que tinham sobre a terra que habitavam, ficando susceptíveis a invasões e expulsões, por parte de quem adquiriu o direito (baseado na Lei das Terras) para usufruir dessa terra e expulsar os povos que ali estivessem. Locais que tinham se constituído territórios tradicionais, ocorrendo assim, a desestruturação das organizações sociais, políticas, culturais e étnicas desses povos, entende-se que território representa o acondicionamento, a legitimação e a organização do contexto social, político, cultural e étnico de toda e qualquer sociedade. É o que ocorreu com os Pankararu, índios que viviam aldeados em uma missão na região de Brejo dos Padres e tiveram suas terras repartidas em linhas de lotes distribuídos entre posseiros, assim, esse período ficou conhecido na memória dos índios como tempo das “linhas”, modo como foi dividido esses lotes. Em meio a isso, índios que já tinham tido seu território invadido pela ação missionária9, começam a serem perseguidos, expulsos ou mortos, obrigados a saírem de suas terras tradicionais, dispersam-se por regiões circunvizinhas. Alguns chegaram à região do sertão de Alagoas, que apesar de estar situada numa região sertaneja, tida como Página Esse povo é oriundo da região Pernambucana de Canabrava (atual Tacaratu), das ilhas do São Francisco (Sarubabel, Acará e Várzea) ou de Curral dos Bois (hoje Santo Antônio da Glória), onde existiam várias aldeias, que foram aldeados pelos missionários, em terras doadas pela Coroa Portuguesa, na localidade de brejo dos padres, na região da cidade de Tacaratu (PE), em 1802. (ATLAS apud MATTA, 2005) E segundo Amorim, esse povo foram aldeados pela primeira vez, muito antes, por volta do século XVII na Ilha Sarubabé, às margens do rio Pajeú, tributário do rio São Francisco. Hoje, seu território está entre as cidades de Tacaratu, Jatobá e Petrolândia. 9 Há relatos que esse aldeamento missionário foi criado provavelmente pelos padres Oratorianos ou Capuchinhos (AMORIM, 2010; ARRUTI, 1995). Segundo Silva A. (2007) em “Serra dos Perigosos – guerrilha e índio no sertão de Alagoas”, Frei Vide Frescarolo, foi o responsável por esse aldeamento. 127 8 seca e inóspita pela literatura brasileira, mas que também possui terras boas, verdes e produtivas. É nesse espaço, que se forma o território dos Jiripankó que apesar das dificuldades encontradas na área sertaneja, encontrou terras férteis, com nascentes, que os índios resistentes de Pernambuco encontram um lugar para viver e tentar formar um novo território. Digo tentar, pelas dificuldades encontradas nesse novo território, inclusive com os “privilegiados do sistema” os ditos coronéis, barões ou grandes fazendeiros, que dominavam a região. As diásporas de pessoas tornaram-se comum em toda região Nordeste, pessoas tendo que abandonar o local em que vive para buscar a sorte em outro, principalmente nos períodos de estiagens, buscando-se a sobrevivência em terras melhores, já que a falta de água torna impossível à vivência. Na oralidade Jiripankó encontra-se relatos desse processo de dispersão do povo Pankararu que não ocorreu somente por causa perca de território, mas por questões climáticas, levando essas pessoas a procurarem um lugar melhor para viver. Segundo Amorim (2010) essas diásporas, eram frequentes, ou seja, o grande ápice foi a desterritorialização, mas no decorrer dos tempos continuaram a ocorrer por causa das estiagens frequentes. Corroborando com essa afirmação, o cacique da aldeia Jiripankó, Genésio Miranda, ao descrever a formação da aldeia, relata como ocorreu essa diáspora 10 Fala do cacique Genésio Miranda da Silva, em entrevista concedida, em fevereiro de 2010. (Grifos nossos). Página A primeira história daqui da aldeia é do primeiro índio que chegou aqui, [...] Depois de 1500, 1600, veio o Português lá de Portugal de nome Manuel Cavalcante, primeiro veio Pedro Álvares Cabral depois veio Manuel Cavalcante em 1600, chegando nas aldeias, atacou os índios, [...] invadiu aqui, chegou na aldeia Pankararu em Pernambuco invadiu, Manuel Cavalcante acabou com os índios. Meu bisavô, com o nome de Zé Carapina, se sentiu mal quando viu o seu pai na cela preso. Mataram o pai dele, o tio dele e um jovem de 18 anos, aí ele correu de lá, quando ele chegou em cima daquela serra, daquela serra para cá, avistou, encontrou a prima dele, o resto Cavalcante já tinha matado, aí convidou ela para correr, aí ela combinou e correu com ele, quando chegaram já aqui no estado de Alagoas, encontraram com a patroa do Major Marques e pediu apoio a ele, [Major] aí ele liberou isso aqui, para ele. Ele chegou aqui e se apoiou com o apoio do major Marques por uma temporada. Aí quando já tinha família, o Major Marques queria tirá-los da terra, aí foi ao conhecimento do barão de Água Branca, o Barão fez uma limitação desse terreno aqui para o índio Zé Carapina, que era meu bisavô [...]. 10 128 dos índios de Pernambuco para o sertão de Alagoas. Nesse relato temos uma breve descrição do processo de formação da aldeia Jiripankó, o cacique confirma o fato do aldeamento na região do aldeamento de brejos dos Padres em Pernambuco e a diáspora ocorrida na região, motivada pelo processo invasão de suas terras, citando o nome de um dos invasores, Manuel Cavalcante, que promulgou uma chacina aos que resistiam. Percebe-se, de certa forma, no discurso do cacique Genésio, certo receio em falar do processo de invasão em 1500 e sobre Pedro Álvares Cabral, ocorrendo em sua fala uma diminuição do tom de voz, indicando certo receio sobre esse tema citado por ele próprio. A chegada do Zé Carapina com uma prima11 para o sertão de Alagoas inaugura o processo de estabelecimento de índios em terras sertanejo-alagoanas, seguido por outros índios Pankararu que foram sendo convidados a vir para essa nova terra, formando assim, o território indígena Jiripankó. São citados os nomes do Major Marques e do Barão de Água Branca12, segundo Silva, A. (2008), esses nomes reúnem o poder político, econômico e policial num tempo em que o poder circulava nas mãos dos coronéis, representantes do poder local, um jogo político que se alastrou por muito tempo e permanece até os dias de hoje, perpassado de pai para filho na política de Alagoas, como também em grande parte do Brasil. A formação desse território sempre foi marcada pela luta em busca da terra, do reconhecimento étnico e da tradição. Segundo o cacique Genésio, esse processo de busca de um espaço territorial foi marcado por conflitos com os coronéis da região, não diferente na atualidade, pois grande parte das terras pertencentes ao povo Jiripankó ainda encontram-se ocupadas por fazendeiros da região. Segundo Brito apud Farias (2011), atualmente os índios Jiripankó tem posse de 215 hectares regularizados e 1100 ha já delimitados, esperando as fases seguintes de demarcação. Esse processo vem se arrastando por muitos anos e até hoje grande parte dessas terras continuam ocupadas. Antes de iniciar esse processo de luta pela terra, foi necessária, aos índios, a 11 12 Em relato trazido por (SILVA, A., 2008, p. 101), Sr. Genésio cita o nome dessa moça como Isabel. Joaquim Antonio de Siqueira Torres (Barão de Água Branca) pertencente à família Vieira Sandes, que se tornou proprietária de grande parte das terras do alto sertão, constituindo-se entre os primeiros povoadores dessa região. (SILVA, A., 2008, p. 105). Página como pertencentes a uma etnia, o que Amorim (2010) chama de “busca pelo etnônimo” 129 busca pelas raízes, buscando a etnogênese indígena. Buscava-se assim, o reconhecimento que é a busca de uma identidade que vem de seus ancestrais, uma identidade coletiva que os reconhecem como pertencentes a uma etnia. Sendo assim, essa identidade funciona como o “atestado de pertença” que é a principal característica de comprovação etnológica, fundamental para o processo de reconhecimento dos povos indígenas. Esse faz parte de um movimento dos povos indígenas ocorrido em todo o Brasil, em busca da delimitaç~o das “fronteiras étnicas” (BARTH, 2000) que forneça meios para a busca dos direitos e garantias promulgadas na Constituição Federal de 1988. Os grupos étnicos possuem padrões valorativos que os definem em quanto tal, e a forma como cada grupo ou cada um irá se portar em contato com outros grupos, na interação interétnica, com o intuito de adquirir visibilidade e dialogar com outro. No entanto esses padrões não são fixos, podem mudar e ressignificar-se em outro momento, conforme o contexto social (BARTH, 2000). Esses indivíduos sempre se reconheceram como indígenas, apesar de, em certos casos haver a negação dessa identificação, por receio da sociedade que reprimia o ser “diferente”, estes através dos mais velhos se autoidentificavam e cultuavam essa pertença, porém, sem uma especificidade étnica, ou seja, sem um etnônimo historicamente reconhecido. E quando essas comunidades veem condições política e histórica, além da experiência de algumas outras comunidades que conseguiram o reconhecimento oficial ao buscar por esse etnônimo, também partem para essa busca. É o que ocorre no sertão de Alagoas, onde o reconhecimento do povo Jiripankó serviu de inspiração para outras comunidades circunvizinhas partilhadoras do mesmo etnônimo, ocorrendo entre os anos de 1998 a 2002 com os Kalankó, Karuazu, Koiupanká e Katokinn que buscaram esse “ressurgimento”, culminado com uma grande festa em comemoraç~o chamada de “A Festa do Ressurgimento” (AMORIM, 2010, p. 63). Festa em comemoraç~o { resistência, o reconhecimento e a afirmação desses povos. Tal evento foi marcado pela participação de outros povos, órgãos indigenistas e pela mídia para que a sociedade e os órgãos povos indígenas do sertão alagoano, ocorreu através do encontro com tronco formador dessa etnia, nesse caso, buscaram-se as raízes com o povo Pankararu que funciona como base formadora histórica, consistente nas experiências, nas tradições e nos rituais, porque Página Esse processo de busca pelo reconhecimento Jiripankó, como com os demais 130 institucionais pudessem reconhecer essa afirmação étnica. é isso que vai dar a sustentação e afirmação desse povo perante os órgãos oficiais de proteção e tutela, como também, para a sociedade envolvente. A história para os índios do serão alagoano é, fundamentalmente, a história de pertença a uma comunidade e a uma tradição. Essa busca pelo pertencimento fundamenta a ressurgência desses povos na contemporaneidade, fornece a identidade indígena, fundamentada em uma história de vida resistente dos povos indígenas, um sentimento de pertença a uma sucessão de gerações que fundamenta a identidade do índio (SILVA, A., 2009). Esse processo é muito importante, pois em meio aos processos subjugação cultural sofrido por esses povos e o processo de “hibridaç~o cultural” 13 a busca por uma especificidade étnica, por um elemento de pertencimento étnico serviu para que esses povos tradicionais pudessem ser reconhecidos. O próprio nome dado a aldeia Jiripankó foi com base nos grupos que formam os Pankararu, “entre outros grupos, os Pankaru, Geritacó, Calancó, Umã, Canabrava, Tatuxi, Fulê” (VIEIRA, 2010, p.06). Assim, com o intuito de demonstrar essa pertença ao tronco Pankararu, foi nomeada de Jiripankó, com base nos Geritacó. Segundo o cacique Genésio Miranda, “como nós somos da descendência Pankararu, tivemos direito a um desses nomes, aí registramos Jiripankó [...]”.14 O próprio povo Pankararu autorizou mediante reconhecimento de parentesco, que os Jiripankó se utilizassem desse nome para renomear esse novo território que se formara. Ser reconhecido pelos pares (outros povos indígenas) é necessário nesse processo de busca por seus direitos. Entre os povos “ressurgidos”, o fenômeno de “renomear” foi observado entre os Geripankó, Kalankó, Koiupanká e Katókinn. Segundo sua oralidade, cada “rama de tronco” permite a formação ou o “levantamento” de uma aldeia com seu próprio, o que só pode acontecer com o apoio do “tronco”, que oferece condições de legitimação para a identificação, delimitação e demarcação de terras indígenas. (AMORIM, 2010, p. 196). Com o processo de diáspora no século XIX em Brejo dos Padres, os índios ficaram por muitos tempos misturados a população em geral, foram perdendo o contato com as 14 Entendemos “hibridação cultural”, a partir de Nestor Canclini (2003), que conceitua cultura em meio aos tempos contemporâneos de globalização. “(...) entendo por hibridação processos socioculturais nos quais estruturas ou práticas discretas, que existiam de forma separada, se combinam para gerar novas estruturas, objetos e práticas”. Aponta assim, que as culturas não são puras, nem homogenias, elas sofrem processos de hibridação entre si. Essa é uma visão mais contemporânea, basicamente da última década do século XX, desenvolvida para se tentar descrever, os processos interétnicos, de descolonização e processos atuais, frente ao acesso a Globalização Mundial. Entrevista concedida, em fevereiro de 2010. Página 13 131 origens, obrigados a permanecerem escondidos, sem poder se autoidentificar como indígenas e muito menos, praticar sua religião. Já nos séculos XX e XXI, inaugura um novo olhar sobre esses povos, a promulgação de leis que reconhecem direitos a esses povos faz surgir aos poucos, esses processos de voltar as origens objetivando o reconhecimento como povo tradicional. Amorim (2010) chama de busca pelo “tronco” onde a pertença a esse tronco d| fundamento para a criaç~o de “rama” e “ponta de rama” que s~o esses novos grupos que se formam a partir da ressurgência. Assim, o “tronco” tem que reconhecer a “rama” para que esses novos grupos possam “renomear” e criar novas aldeias na contemporaneidade como povos resistentes. Entende-se por resistência ou tradição de resistência, além da questão histórica, cultural e religiosa, também a luta pela terra. O território para os índios é de extrema importância, nesse espaço, desenvolvem-se todas as coisas vitais para a vida. Território é condição para a vida dos povos indígenas, não somente no sentido de um bem material ou fator de produção, mas como o ambiente em que se desenvolvem todas as formas de vida. Território, portanto, é o conjunto de seres, espíritos, bens, valores, conhecimentos, tradições que garantem a possibilidade e o sentido da vida individual e coletiva. A terra é também um fator fundamental de resistência dos povos indígenas. É o tema que unifica, articula e mobiliza todos, as aldeias, os povos e as organizações indígenas, em torno de uma bandeira de luta comum que é a defesa de seus territórios. (...) O território indígena é sempre a referência à ancestralidade e a toda a formação cósmica do universo e da humanidade. É nele que se encontra presente e atuante os heróis indígenas, vivos ou mortos. (BRASIL, 2006. p. 101). A história indígena está associada à luta pelo território desde a primitividade, ao gerar conflitos tribais, depois contra a invasão portuguesa e até a atualidade, contra os posseiros. Sempre esses povos tiveram de lutar pelo seu espaço físico, de resistência, e sobrevivência. É nesse espaço, que se manifesta a vida, onde a religião se funde com o sobrenatural, onde habitam as crenças, os espíritos e os valores. Buscam a alimentação, o vestuário de rituais, as ervas medicinais, etc.. Como foi citado, o território é onde se “desenvolvem todas as formas de vida”, sem ele n~o h| a materializaç~o da vida e nem das crenças. Por isso que os indígenas são considerados protetores da natureza, eles se sentem parte dessa natureza, cuidam dela, isso está ligado não somente a causa material, transforma em um protetor dessa natureza, um guardião, um guia espiritual e quando se preserva essa natureza ou quando eles praticam os rituais, acredita-se está cultuando Página natureza tem um protetor encantado, acredita-se que quando uma pessoa morre se 132 mas envolve a religião, as crenças. Tudo para eles depende e vem da natureza, tudo na esses encantados. Assim o invisível, esses espíritos, fazem parte do visível, que no caso é a natureza. Daí a importância do território para essas pessoas, por esta intimamente ligada a um encantado. Falar de povos indígenas nordestinos é falar da luta por um território, luta resistente de um povo e de uma cultura, que por muito tempo foi negada e massacrada, tanto por fatores climáticos, como principalmente, pelo jogo de interesses que se perpetua desde a chagada dos Portugueses, tomando-os seus territórios e explorado sua mão de obra. É nesse contexto histórico que se funda a busca Jiripankó, por um novo território, em que pudessem encontrar melhores condições de vida, necessárias para a sobrevivência e para preservação da cultura de seus ancestrais, presentes nas suas festas e rituais, ou seja, em suas crenças. A Formação de um Sincretismo Não diferente dos povos indígenas de quase todo o Brasil, os Jiripankó sofreram o processo de catequização e aculturação portuguesa, praticados pelos Padres jesuítas que iam às aldeias catequiza-los para que estes fossem conquistados e submetidos aos interesses Coroa Portuguesa: mão de obra e fim do empecilho que representavam para a dominação do novo território. Na famosa Carta de Pero Vaz de Caminha tem-se um relato das intenções prenunciadas aos índios. Parece-me gente de tal inocência que, se nós entendêssemos a sua fala e eles a nossa, seriam logo cristãos, visto que não têm nem entendem crença alguma, segundo as aparências. E portanto, se os degredados que aqui hão de ficar aprenderem bem sua fala e os entenderem, não duvido que eles, segundo a santa intenção de Vossa Alteza, se farão cristãos e hão de crer na nossa santa fé, à qual praza a Nosso Senhor que os traga, porque certamente esta gente é boa e de bela simplicidade. E imprimir-se-á facilmente neles qualquer cunho que lhes quiserem dar, uma vez em Nosso Senhor lhes deu bons rostos, como a homens bons. E o ele nos para aqui nos trazer creio que não vão sem causa. E portanto, Vossa Alteza, pois tanto deseja acrescentar a santa fé católica, deve cuidar da salvação deles. E prazerá a Deus que com pouco trabalho seja assim! (CAMINHA, 1963, p.6, grifos nossos). Nos primeiros contatos com os índios já se pensava em catequização, isso marcou profundamente toda a vida desses povos, tiveram suas crenças negadas e subjulgadas pelo verdadeira transculturação europeia forçada para essa sociedade. Por muito tempo essa visão perpetuou-se, levas e levas de padres e jesuítas empreenderam-se terra à dentro no Página tempo, não foram consideradas, o europeu com sua visão eurocêntrica, promulga uma 133 colonizador. Essas crenças, cultuadas e perpetuadas por seus ancestrais desde muito território brasileiro, sobre a égide da cruz e da espada, retirando o índio de sua cultura empreendida nas matas, para serem ditos “civilizados” sob a égide da coroa Portuguesa. Assim, foram tirados de suas aldeias, de onde perpetuavam sua cultura, cultos, línguas e crenças para serem levados para os ditos aldeamentos missionários, onde eram ensinados a abandonar seus hábitos tradicionais e incorporar os novos, pelos jesuítas. Foi o que ocorreu com os índios Pankararu, Aldeados em Brejo dos Padres, os aldeamentos tinham a funç~o de facilitar o acesso e agregar esses povos na “sociedade” assim, n~o atrapalhassem a política colonizadora que estava se formando. Gruzinski (2003) a partir de sua análise sobre o período de colonização das sociedades indígenas no México espanhol, que processo empreendido contra as sociedades aborígenes da América, os aldeamentos isolavam esses dos grupos a que pertenciam para serem transformados em religião e idolatrias, o conjunto de manifestações das culturas indígenas sofriam uma redução lastimável. A conquista os inseria à força num espaço totalmente inventado pelo ocidente, imposto pelos espanhóis e banalizado por termos de conceitos estabelecidos, suas superstições, crendices, cultos, sacrifícios, adorações, deuses, ídolos, cerimônias etc. eram taxadas de erros e falsidades. Esse processo não foi algo fácil, deixou marcas profundas, presentes até hoje, queriam e conseguiram subjugar a cultura dessas sociedades e introduzindo a cultura europeia, ocorrendo uma drástica redefinição na vida dessas sociedades. Nesses aldeamentos ocorreu certa “transculturaç~o forçada” para a crença portuguesa, como mostrado nas imagens a seguir, já as crenças Figura 4 Igrejas no centro da aldeia Jiripankó, indígenas foram obrigadas a ir para a símbolos da catequização. Foto: CLIND-AL. Essas crenças começam a serem cultuadas longe dos olhos da sociedade, para não sofrer perseguições, muitas vezes são incorporados símbolos da religião católica nessas crenças, prática muito usada também pelos negros, que usavam imagens que tinham duas faces, de um lado Iemanjá, do outro Nossa Senhora dos navegantes, por exemplo. Esses usos serviam para driblar a sociedade dominante e os perseguidores. Página 15 134 clandestinidade15 por serem rejeitadas e perseguidas pelo modelo religioso português. Com isso, houve um grande processo de sincretismo religioso presentes na cultura dessas comunidades, havendo presença entre a cultura indígena, da religião católica e afro-brasileira, formando a crença desses povos. Nosso objetivo não é buscar traços singulares dessa mistura, mas perceber de forma homogênea, como ocorre a Figura 5 Índios Jiripankó. Segundo relatos, essas cruzes presentes nesses adereços, chamados de cinta, são resquícios do processo de catequização e serviam para driblar perseguições. Foto: Anderson Barbosa. religiosidade entre os povos indígenas. Quando falo em práticas religiosas, entende-se que apesar de toda essa mistura de crenças, formou uma prática religiosa sincrética, mas que não deixa de ser uma religião. Muitos autores falam em rituais, toré, xamanismo, catimbó, etc. sem referência a uma crença de caráter religioso. Como por exemplo, Grunewald (2005) que aponta para a possibilidade do toré praticado pelos índios não ter caráter tão religioso assim, apontado mais para um xamanismo16. Um dos argumentos dado por ele é a ligação, entre outras coisas, com a religião católica ou evangélica que os índios participam e se autoidentificam como adeptos. Segundo Oliveira apud Vieira, Embora a ação missionária tenha sido efetiva, o que permite que a maioria se autodefina como católica, seguidora do cristianismo, cultue Santo Antônio (padroeiro), promova missas, casamentos e batizados na igreja, com igual fervor é vivenciada a religião Pankararu, presente em várias situações como a festa do menino do rancho, corrida do Imbu, além de outros rituais realizados praticamente durante todo o ano, de acordo com a necessidade ou a vontade de quem queira promovê-los, podendo este acontecer ao mesmo tempo em várias casas ou aldeias. (2010, p.16, grifo nosso). Ocorre nas aldeias a assimilação das religiões católicas e protestantes, mas sem perder a identidade indígena fornecida pelos rituais, perpetuados de geração a geração desde seus ancestrais, onde para Oliveira, esses rituais são a religião Pankararu, cultuados com a mesma importância que os rituais das outras religiões. Até mesmo, se considerarmos esses rituais, como conjunto de crenças de um povo, perpetuados de 16 “Conjunto de crenças e pr|ticas associadas {s atividades dos xam~s” (AULETE, 2011, p. 900). Página religião independente de sua prática. 135 geração em geração, que propiciam contato com um sagrado ou um plano espiritual, é O Tor e os Rituais no Nordeste Os índios do Nordeste são conhecidos por praticar um tipo de ritual conhecido como toré, que se tornou símbolo de identidade, religião, cultura e reivindicação. Esse ritual tornou-se fundamental para a busca de direitos e garantias, previstos na Constituição Federal de 1988. De uma forma muito sintética, toré é a reunião de um determinado povo em torno de uma crença, de origem mística, cultuada e passada de geração em geração que se caracteriza em torno de uma dança de fins específicos, embalados por cantos, instrumentos musicais, bebidas energéticas e bebidas alucinógenas. Com outro olhar, este representa a performance executada nos rituais, mas o conjunto desses, representa o elo com o sagrado, com os encantados, buscando-se gratidão, preces e comemorações, além de encomendações de corpo , como parte de rituais fúnebres. Sua execução depende de um espaço físico, onde ocorra a materialização da crença, que é terreiro. Espaço de chão de terra, formato irregular, medindo cerca de 20 a 40 m², (MATTA, 2005). Local em que Figura 6 Índios Jiripankó executando o toré, no terreiro da aldeia. Foto: Anderson Barbosa. se materializa toda a crença, pelo contato com o sagrado, pelas práticas de cura, e a socializaç~o do grupo. “O terreiro é o ‘centro’ da aldeia e deve ser um espaço reservado, extensivo ao grupo ou a uma comunidade específica da própria ou de cada etnia” (AMORIM, 2010, p.36). Assim, a fundação de uma aldeia implica a criação de um terreiro, este é uma peça fundamental da aldeia, sendo uma extensão dela. Reesink (2000) aponta para a existência de três tipos de rituais entre os índios do Nordeste: toré, ouricuri e praiá. Esses rituais são bastante parecidos em sua essência, tem a mesma funcionalidade e mesmos objetivos, mas, no entanto conservam algumas etnia Pankararu e suas ramas. Já o toré, se popularizou em todo o Nordeste como uma dança e principalmente, como requisito essencial para o reconhecimento por parte dos órgãos indigenistas, como o SPI (Serviço de Proteção ao Índio) órgão que atuou nesse Página Xucuru-Kariri e Kariri-Xocó. O praiá - alusão aos executores do ritual - é praticado pela 136 individualidades, representam etnias diferentes, como é o caso do ouricuri praticado pelos reconhecimento. Ocorreu assim, certa elevação do toré, seja consciente ou inconscientemente, como ritual padrão de todo o Nordeste. A grande difusão nordestina do toré não quer dizer que ele se apresenta de forma única, pois cada grupo estabeleceu um regime próprio de características, com múltiplos sentidos e significados (GRUNEVALD, 2005). Considerando a formação desse ritual pela hibridação de culturas e diversas manifestações religiosas, como indígenas, afrobrasileiras e caboclas (como o Catimbó17), cada grupo étnico ressignificou esse ritual impondo suas próprias características. "O toré em si é um termo pluri-semântico, já que representa tradições das mais diferentes entre si (indígena, negra, rural, urbana, antiga, moderna, e tantas outras)” (ALBUQUERQUE, 2011, p.202). Canclini (2003) explica esse processo de interação cultural a partir do conceito de hibridação, cujo enfoca as combinações identitárias e não mais os aspectos fisionômicos e cromáticos da mestiçagem como em séculos passados. A formação cultural ocorre como um processo de interação entre as culturas, de fundição de suas estruturas ou práticas, que se reestruturam e formam novas. O toré pela sua importância e relevância, carrega em sua essência, todo um jogo de performance, com um complexo de significados, levando em conta a ocasião e o público presente. Tem característica estética (dança, pinturas corporais, vestimentas e adereços) por “embelezar” o ritual, tornando interessante sua observ}ncia. Político, por servir de divulgaç~o da cultura indígena, até mesmo como “atrativo turístico” (GRUNEWALD, 2005) ou para reivindicar algo, junto órgãos oficiais, quando executados em público. E religioso por ser um ritual que traz consigo toda uma crença, em torno de um sagrado, de um plano espiritual. Arruti (2004) acrescenta o toré como “m|quina de guerra”, símbolo da mobilização no contexto de suas lutas fundiárias, da legitimação da territorial. O toré, enquanto ritual religioso caracteriza-se pelo transe mediúnico, nele ocorrendo possessão ou, se preferirmos usar categorias nativas kariri, “enramar” ou “manifestar”. É através dessa possessão que os encantos se “manifestam”. A comunicação com os encantos, ou encantados, é o objetivo do ritual. (NASCIMENTO, 2005, p.40) (GEERTZ, 2008), os detentores dessa cultura tentam privar esses conhecimentos, uma 137 Catimbó é uma manifestação religiosa do Nordeste brasileiro, segundo Ribeiro (1992), “Toré é o mesmo que catimbó” por possuir as mesmas manifestações, como fechamento de corpo, manipulação de ervas medicinais, transe, Pajelança, etc. Página O toré como performance religiosa carrega em si uma “teia de significados” 17 medida de preservar sua cultura que passou por vários processos de subjulgação e espoliação em toda a história brasileira. Assim, estudar a cultura indígena é trabalhar com “indícios” (GINZBURG, 1990), pistas dessa cultura. Basicamente a crença dos povos indígenas gira em torno do culto aos antepassados, índios que ao morrerem, tornaram-se encantados18. Os rituais são justamente o momento em que busca-se o contato com esses encantados, que através da dança do toré e de “transe mediúnico”, orienta esses povos na busca de curas, conselhos, trabalhos, etc. Segundo Geertz (2008) os símbolos sagrados não trazem apenas valores positivos, mas também negativos, e as culturas buscam meios de interpretar problemas que venham a surgir, meios que torne possível conviver com esses problemas, buscam combater o mal que venham a surgir numa luta entre o bem e o mal. Essa é a função dos encantados, proteger, guiar e ajudar essas sociedades. Os rituais exigem uma série de regras e preparativos para serem realizados, entre elas, exige-se a participação somente de membros do grupo e uma preparação nos dias que antecedem o ritual. Essa preparação consiste em jejum por vários dias, abstinência sexual e do álcool, essas são medidas para evitar o enfraquecimento do corpo que podem deixar o indivíduo susceptível a doenças, males ou incorporações de espíritos (MOREIRA; PEIXOTO; SILVA, 2008). Antes de iniciar os rituais, h| “preparaç~o do terreiro”, que consiste na defumação e/ou borrifação de alguma bebida no chão, objetivando atrair os encantados e afastar os maus espíritos (NASCIMENTO, 2005). Durante os rituais, há um alto consumo de fumo e de uma bebida a base de várias plantas, entre elas a Jurema19. “A jurema é uma planta de poder por proporcionar acesso ao mundo espiritual, através dos quais curas (de diversas ordens) são realizadas em níveis individuais e coletivos, bem como instruções de luz são também alcançadas para pessoas e coletividades” (GRUNEWALD, 2008, p. 17). Mostra assim o uso dessa planta enteógeno 19 No caso dos índios Jiripankó, acredita-se que esses encantados, são guias, protetores da aldeia e o culto a eles, representa o elemento principal da crença. São muitas as plantas usadas nessa bebida, varia de etnia a etnia, a jurema é a mais conhecida e difundida no Nordeste. Existem três tipos dessa planta: Mimosa nigra, Acacia hostilis e mimosa hostilis, (NASCIMENTO, 2005). Todas com grandes propriedades psicoativas e curativas. Página 18 138 pelos indígenas nos rituais, inclusive de rituais de cura, por proporcionar o acesso ao sagrado. Os índios Jiripankó, além da jurema, ingerem uma bebida a base de rapadura20 diluída em água, pela grande quantidade de glicose, torna-se uma fonte de energia necessária aos longos períodos dos rituais. Esses rituais quando envolvem o uso de plantas enteogênicas ou alucinogênicas promovem acessos ao mundo espiritual, transe e práticas de cura, inserem-se no que os índios chamam de pajelança, já no meio acadêmico, entende-se por xamanismo. Essa prática acontece por intermédio de um líder espiritual, o pajé, que preside as cerimônias religiosas, pessoa responsável pela mediação do transe no ritual, processo de contato, que são realizadas curas, rezas, remédios, defumações e aconselhamentos. No toré faz-se a procura do nome da moléstia e a adivinhação mágica. Além da defumação, usa-se ervas, dentre elas, se destaca a jurema, em cujos poderes mágicos os sertanejos acreditam piamente. É portanto, medicina mágica, onde seu executor é o mestre presidente do toré. (RIBEIRO, 1992, p.7). O toré é fundamental para as práticas xamânicas e ritualísticas. A dança, a defumação, a ingestão de bebidas e a crença, propiciam o contato com o sobrenatural, e esse, por intermédio do pajé, indica a causa de doenças, de infortúnios, ou até mesmo, presságios21. Essas pr|ticas xam~s s~o conhecidas popularmente como “mesa”, entre os índios Kariri-Xocó22, A “mesa” é composta por uma esteira e alguns objetos: um crucifixo e dois recipientes, um contendo um preparado à base de jurema e uma cruz feita com fumo e alho pisado e embebido em cachaça. Esse último recipiente é colocado geralmente para “mesa-de-branco”, pois ele tem a função de atrair o espírito que está causando problema. A “mesa” não tem tempo determinado. Dependendo do problema, pode se estender por várias horas, até que o que esteja ocasionando o infortúnio no paciente seja extirpado. O “mestre de mesa” é pessoa de grande habilidade. Quando o problema esta sendo ocasionado por um espírito, ele tem que saber negociar para afastá-lo. (SILVA, C., 2003, p.75). Muitos não índios chegam a procurar esses xamãs para livrar-se de infortúnios, e para esses, que não participam da crença usufruir desse ritual, são usados artifícios diferenciados de preparo, tudo para que o ritual ocorra de forma esperada. Percebe-se que o objetivo desse ritual, apresenta-se em três fazes, primeira, o diagnóstico para tentar saber a causa, para empenhar-se no melhor método. A segunda, o tratamento que consiste no método a ser usado, apontado pelo encantado ou pelo xam~, geralmente ocorre “rezas, 21 22 Doce de origem Nordestina, “fabricado a partir da fervura do caldo de cana, e em seguida, é moldada e seca.” (EMBRAPA, 2012). São adivinhações do futuro, avisos, podendo ser de coisas boas, como também más. Índios de Porto Real do Colégio, Alagoas. Página 20 139 toques e sopros no corpo do paciente” (SILVA, C., 2003), além de chás, garrafadas, banhos, etc. E o terceiro é a cura do paciente, esse é o objetivo central do ritual, que consiste em devolver para a sociedade, o individuo livre dos infortúnios que o incomodava. O toré Jiripankó está inserido no mesmo contexto e características citadas. Acrescento o toré como dança, ocorrendo principalmente nos fins dos rituais, é o momento em que a comunidade participa dos rituais “toré como brincadeira” 23, dança com os praiás, realiza promessas e agradece por pedidos alcançados. O toré difundiu-se em todo o Nordeste, mas adotando em cada região ou em cada etnia características próprias, ressignificadas pelo contexto histórico-cultural de cada um, assim, essas características descritas são uma pequena introdução desse tema tão imenso, importante e rico para a cultura nordestina. Existem muitas outras características, métodos de execuções, significâncias e usos nos rituais do nordeste, mas a partir daqui, daremos ênfase aos rituais Jiripankó, nosso objetivo principal. Os Rituais Jiripankó: Os Encantados, os Praiás e o Terreiro. Os índios Jiripankó, como todos os povos do sertão alagoano, descendentes Pankararu, partilham dos mesmos rituais e crenças, em torno dos encantados, dos praiás e do toré. O culto aos encantados é a peça fundamental da crença desse povo, Acredita-se que os antepassados encantaram-se e vivem na natureza em um plano espiritual, representam uma ligação de Deus com o plano terreno, habitam um local tido como sagrado, que é a Cachoeira de Itaparica no Estado da Bahia. Hoje, esses espíritos encantados atuam nas aldeias como protetores dos seus descendentes. O praiá é tido como um sacerdote com o dom de incorporar os espíritos dos antepassados e é a figura central no ritual. Sua vestimenta é composta por: Tunã, máscara que encobre toda a cabeça, e que recai sobre os ombros; saiote, parte presa na cintura – esses dois, confeccionados da palha de caroá –; rodela de plumas encima da cabeça fixada no tunã; penacho enfeite de plumas de peru; túnica ou cinta, pano enfeitado que recai sobre as costas; e os instrumentos musicais: maracá, o bordão de compasso e a gaita de 23 Termo utilizado por Albuquerque (2011). Página 140 marcação (PINTO apud ALBUQUERQUE, 2011). Para vestir essa vestimenta, ser um praiá, é necessário haver uma determinação dos encantados, eles são quem determinam o escolhido, ordenam a confecção da vestimenta e é esse encantado que incorporará nesse praiá. Os Figura 7 Praiá executando performance, durante rituais na aldeia Jiripankó. Nota-se todo o conjunto de apetrechos que forma sua vestimenta. Foto: Anderson Barbosa. praiás são um tipo de sociedade religiosa secreta, onde sua vestimenta esconde a identidade de quem a usa e apenas os homens detêm os segredos ritualísticos. São iniciados geralmente aos doze anos, dependendo da vontade do encantado, que determina o “levantar de prai|” que consiste na reuni~o de um grupo para fabricar a roupa e iniciar o garoto nos segredos do ritual. O terreiro é o local sagrado que ocorre a materialização dessa crença, é tido como um local essencial para os rituais, fora desse espaço até pode ocorrer a dança dos praiás, – como ocorre em vários eventos públicos, nas casas de pessoas ou em cidades, como em São Paulo24 – mas o ritual em si, que realiza-se curas, trabalhos, etc. só ocorrem no terreiro da aldeia. É nesse espaço que os encantados se comunicam com o plano terreno, intermediados pelos praiás. No território Jiripankó existe vários terreiros, os principais são os da comunidade Ouricuri – tido como o principal – e outros mais afastados, espalhados nas demais povoações que formam o território Jiripankó, alguns fundados Em busca de melhores condições de vida, muitos índios Pankararu partiram de Pernambuco e foram tentar a vida em São Paulo, partilhando do mesmo movimento de ressurgência do sertão de Alagoas, atualmente, formaram uma associação de moradores e estão implantando nessa cidade, suas crenças, realizando a dança dos praiás, segundo Albuquerque (2011), hoje, somam mais de 2000 índios nessa cidade, mas que, pela impossibilidade de abrir um terreiro em meio à cidade, a prática de rituais, como pagamento de promessas, por exemplo, realizam em Pernambuco no terreiro Pankararu. Página 24 141 antes do reconhecimento oficial, e outros que vão se formando na contemporaneidade. Cada terreiro tem um “dono”, sua construç~o depende de sua vontade, tornando esse, o “dono” do espaço e sendo o ente principal referenciado. Em volta do terreiro, geralmente existem duas construções, o poró, que é a casa dos praiás, local onde ficam guardadas as vestimentas e durante os rituais os praiás se vestem e se preparam ritualmente. Nesse local não é permitida a entrada nem de mulheres, nem de estranhos à cultura, deixando uma aura de mistério sobre o que ocorre lá dentro. A outra construção é uma espécie de cozinha, local onde se prepara o almoço servido nos rituais, lá não possui mobília, apenas fogões de lenha que não são suficientes para a quantidade de alimentos a serem preparados, por isso, vários fogareiros são improvisados com pedras, fora dessa construção. Por meio desses rituais, proporcionados pelo culto aos encantados e dança dos praiás, as pessoas também realizam preces, pagam promessas e comemoram graças alcançadas. Essa crença, esta diretamente ligada a saúde e a espiritualidade, por intermédio dos encantados alcançam-se a cura de doenças. O ato da “promessa” é uma prática recorrente e bastante difundida no nordeste, esta ligada a um tipo de “dívida” que uma pessoa adquire com algum encantado, no caso dos índios, pela realização de algum pedido, geralmente, ligado a cura, desejo material, saúde, etc. O ritual é a forma de agradecimento dessas graças alcançadas e são realizados a pedido dessas pessoas. Quando o pagamento da promessa envolve uma festa de agradecimento, toda a comunidade participa, ajudando a pessoa agraciada na preparação e execução desse agradecimento. Até mesmo outras comunidades participam (AMORIM, 2010). O tipo de pagamento depende da promessa do pedinte, mais geralmente, dura o dia inteiro; executa-se o toré pelos praiás; há a distribuição de comida para os encantados, praiás, população e convidados; e em outro período do dia, há a entrega simbólica de oferendas ao encantado cedente da graça alcançada. São vários os rituais praticados pelos índios Jiripankó, o principal tido como a de pagamento de promessas são o Menino do Rancho e a Cerimônia das Três Rodas. Esses 25 Sobre esses rituais, ver monografia de graduação na íntegra, (SILVA, A., 2013). Página rituais em Brejo dos padres, onde todas as “ramas” participam25. Outros rituais específicos 142 Festa do umbu, além de Queima do Cansanção, Ritos funerários, entre outros, inclusive dois são realizados como forma de agradecimento pela cura de crianças26. Os dois envolvem a participação dos praiás, de um menino agraciado, sua família e convidados. Inicia-se com toantes27 e performance dos praiás, o primeiro citado, ocorre com a colocação do menino em um rancho de palha, no segundo, acontece só a performance em forma de três rodas e repetido a toante a cada três vezes, depois é servido o almoço, logo após, os praiás entram no terreiro com a criança carregada no colo, sendo o praiá “dono da criança” 28 que a carrega. No centro do terreiro, essa criança é abençoada e benzida por todos os praiás, finalizando todos juntos, inclusive a população dançando o toré. O pagamento da promessa fecha um círculo de “dar, receber e retribuir”. Uma vez feito o pedido e alcançada a graça, o ritual marca o pagamento de uma dívida simbólica entre a família ou pessoa específica para com os encantados, este momento, normalmente, vem repleto de significados, um deles é o de divulgar, pôr em circulação a graça ou o benefícios alcançados pelo pedido a um ser sagrado. (AMORIM, 2010). Essas promessas servem de divulgação, unificação e status para a comunidade, é um pedido individual, mas que no executar, torna-se um bem para a coletividade. Essas promessas fortalecem o indivíduo pedinte, seu grupo e a comunidade em geral, envolvem todos no processo desde busca de doações, ajuda na preparação, na divulgação e como plateia no dia do ritual. Todos participam. Considerações Finais Para efeitos finais desse trabalho, torna-se necessário retomar algumas considerações importantes para se compreender a cultura dessa etnia. Entre elas, que essa cultura esta diretamente ligada a natureza, acreditam que tudo funciona em sintonia com ela, habitada por entes encantados que regem toda uma cosmologia. A crença indígena é sincrética, formada pela hibridação de várias raças, motivo que encontramos nas aldeias elementos negros, europeus, etc. Nossa intenção não foi distingui esses elementos, nem seria possível frente o Página 26 Ver (SILVA, A., 2014), monografia de especialização que traz um estudo etnográfico sobre o Ritual menino do rancho. 27 Toantes são os cantos, que embalam o toré e os rituais. 28 A família pede pela cura do garoto a um encantado, o praiá que incorpora esse encantado, é tido como o dono dessa criança, assim, torna-se o mediador do ritual de agradecimento. 143 processo de opressão sofrido, mas mostrar como esses índios enfrentaram e como tentam dar a volta por cima, lutar pela terra que lhes foi tomada, pela cultura e religião que tanto foi negada e subjugada no decorrer da história. Esses povos lutam para preservar a tradição, restaurar a memória do grupo, para que as futuras gerações tenham uma identidade e cultuem suas origens. Entidades vivas e mortas habitam o mundo terreno, vivem na natureza e o conjunto de crenças se estabelece numa relação de troca com essas entidades. O homem sempre estabeleceu relações de troca com o mundo sagrado, principalmente quando acometidos de certas doenças, recorrem a preces e rituais - isso é prática comum em todas as culturas - numa constante renovação entre os dois mundos. Assim, a crença se renova a cada momento, por intermédio dos elementos: pedido, graça alcançada e pagamento, mantendo constante a relação entre o mundo terreno e esse mundo sagrado. Os rituais representam essa constante relação, deixam os indivíduos mais próximos dessas entidades, firmam o pacto de devoção e retribuem graças alcançadas. Os rituais, a crença, o terreiro e os encantados formam os elementos da etnicidade indígena, importantíssimos para o reconhecimento, a busca pelos direitos e garantias assegurados, entre eles, direito a diferença, reconhecimento e espaços que condicionem essa diferença. 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Itabaiana: GEPIADDE, Ano 4, Volume 8 |jul-dez de 2010. 11 - PRÁTICAS INOVADORAS NO ENSINO DA MATEMÁTICA JOGOS E OFICINAS PEDAGÓGICAS Amanda Silva Santos [email protected] Laís Vanessa Silva Santana [email protected] Resumo Esse artigo apresenta como objetivo despertar nos alunos do nível de ensino médio, o raciocínio lógico para resolução de problemas que envolvam as operações matemáticas do ensino fundamental, a criatividade e o interesse pela disciplina, de forma dinâmica e participativa. Para atingir os objetivos propostos foi realizada uma pesquisa bibliográfica visando a leitura e fichamento de obras clássicas, pesquisa em rede e a pesquisa de campo. A escolha desse tema se deu a partir de uma conversa informal realizada com os professores de matemática em uma escola da Rede Estadual de Ensino de Ensino Médio. Ao indagar a seguinte pergunta, até que ponto a utilização de práticas inovadoras de ensino a partir de jogos e oficinas pedagógicas envolvendo as quatro operações podem melhorar o rendimento dos alunos do Ensino médio? A resposta foi unânime: a falta de pré-requisitos no que nomearam “as quatro operações”: adiç~o, subtraç~o, multiplicação e divisão. Ao indagarmos quais as causas dessas deficiências eles responderam que se devem à troca de escolas, grande rotatividade de professores, formação deficiente do professor do ensino fundamental, bloqueios, entre outros. Conclui essa pesquisa dizendo que com a experiência obtida na sala de aula e os resultados satisfatórios pode-se dizer que, a aprendizagem por meio dos caminhos lúdicos é simples e eficaz, basta somente que o professor se desfaça de suas amarras que o impede de atuar como facilitador durante o processo de ensino e aprendizagem da matemática. Seu trabalho deve ser o de proporcionar meios que permitem seu aluno a aprender. Palavras – Chave: Criança. Matemática. Noções de número. Introdução Esse artigo apresenta como objetivo despertar nos alunos do nível de ensino médio, o raciocínio lógico para resolução de problemas que envolvam as operações matemáticas do ensino fundamental, a criatividade e o interesse pela disciplina, de forma dinâmica e participativa. O Ensino da Matemática está cada vez mais se identificando com situações concretas, vivenciadas, resoluções de problemas e com a inclusão digital, isso porque segundo Fiorentini e Miorim (1990) este é o avanço das discussões a respeito do papel e anos, sofrendo modificações e tomando feições diversas. Página que revelam a utilização, na sala de aula, de matérias concretos ou jogos, ao longo dos 147 da natureza da educação, que contribuíram, historicamente, para as teorias pedagógicas Lorenzato (2006) confirma que o material concreto facilita a observação e a análise, desenvolve o raciocínio lógico, o pensamento crítico e científico, isso contribui para a melhoria da qualidade de ensino, visto que auxilia o aluno na construção de seus conhecimentos, desenvolvendo a criatividade e tornando-o mais participativo nas aulas. Se para uma determinada criança a compreensão de 4 + 1 = 3 + 2 torna-se mais fácil com um exemplo concreto, por que não utilizá-lo? (PETEROSSI e FAZENDA,1983, p. 19) Lorenzato diz também que, esses recursos didáticos interferem fortemente no processo de ensino aprendizagem; como qualquer instrumento, as consequências de seu uso dependem do profissional que os emprega e ressalta que a utilização dos mesmos depende do conteúdo a ser estudado, dos objetivos a serem atingidos e do tipo de aprendizagem que se espera alcançar. Dentre a importância de ensinar a matemática com o auxilio de materiais concretos, foi realizado um projeto de intervenção, em uma escola da Rede Estadual de Ensino de Ensino Médio com alunos de 1º ano do Ensino Médio, com o tema Práticas Inovadoras No Ensino Da Matemática - jogos e oficinas pedagógicas, onde os jogos envolviam as quatro operações básicas (adição, subtração, divisão e multiplicação), com o intuito de identificar qual a maior dificuldade dos alunos em relação ao tema. Esta pesquisa propõe-se assim, a analisar práticas pedagógicas no ensino das quatro operações matemáticas do ensino médio. Para atingirmos o objetivo proposto perseguiremos os seguintes objetivos específicos: • Analisar as principais práticas pedagógicas envolvidas no ensino da matemática; Identificar as principais dificuldades na aprendizagem da matemática. Identificar os principais métodos para o ensino da matemática; Para atingir os objetivos propostos utilizamos a pesquisa bibliográfica visando à leitura e fichamento de obras clássicas, pesquisa de campo e pesquisa em rede. Processo de Operacionalização escola apresentavam mais dificuldades, mas não deixarão de apresentar, também, alguns desafios e aspectos relacionados com o cotidiano. Página alunos na escola. Os jogos foram criados dentro dos assuntos nos quais os alunos dessa 148 A escolha dos jogos foi feita mediante uma pesquisa efetuada com os próprios No primeiro momento com a turma, foi aplicado um jogo em que relacionamos as quatro operações matemáticas, e no final do jogo indagamos algumas perguntas para melhor avaliar o nível em que eles se encontram. Jogo: Estrela Matemática O processo de ensino- aprendizagem requer um trabalho sério e motivador, a Matemática é uma disciplina que exige do aluno: raciocínio lógico, atenção, senso de percepção daquilo que está ao seu redor correlacionado com a matemática e responsabilidade nos estudos diários. Esta atividade tem como característica Figura 8 Estrela Matemática. Disponível em principal despertar no aluno o interesse para o www.educador.brasilescola.com ensino da matemática. As regras do jogo consistiam em grupos de apenas quatro alunos e que todas as fichas estivessem viradas para baixo, os materiais utilizados para desenvolver este jogo na sala de aula foram: Estrela Matemática (cópias), Fichas com valores (cópias), Marcadores. Figura 9 Fichas com Valores Fonte: www.educador.brasilescola.com (2014) Um dos jogadores retira duas fichas, tenta formar um dos números da estrela. Para isso, ele pode usar adição, subtração, multiplicação, divisão e potenciação; e ainda extrair a raiz quadrada de qualquer número de suas duas fichas ou do resultado de combinação entre elas. linha. Se ninguém conseguir, vence quem tiver o maior número de fichas na estrela. Página Ganha o jogo a equipe que primeiro conseguir três números consecutivos e na mesma 149 Se conseguir formar um dos números da estrela, coloca seu marcador sobre ele. Formamos grupos de quatro pessoas, aplicamos o jogo e pedimos que a cada jogada anotassem a expressão que eles formaram para chegar a tal resultado e depois com os resultados em mãos, observamos as seguintes dificuldades: Jogo dos sinais, potenciação e a multiplicação. Apesar de estarem no 1º ano do ensino médio, eles sentiam dificuldades ao realizar as operações, quando na expressão surgia um número negativo e outro positivo, ou os dois negativos e mais ainda, quando além dessa dificuldade já citada, havia a multiplicação. Também notamos que eles não tinham conhecimento das propriedades da potenciação, por isso que o resultado das expressões dava errado. Diante das necessidades apresentadas pelos alunos, elaboramos a partir de nossos conhecimentos e meios de busca de informações uma ‘’espécie’’ de oficina, onde inicialmente, daríamos uma breve revisão do conteúdo onde se apresentava o maior desafio e depois aplicamos jogos, com o intuito de avaliar se eles teriam compreendidos. No inicio da aula, mostramos de forma ética os erros cometidos na aula anterior, e logo em seguida aplicamos a oficina. Potenciação é um assunto muito recorrente no ensino médio. Além de ser um assunto muito importante para os alunos. Saber as regras de potenciação é fundamental para aqueles que buscam passar no ENEM visto que esse é um assunto que costuma cair com frequência nas provas do ENEM. Outro bom motivo para aprender essas regrinhas de potenciação deve-se ao fato desse conteúdo estar presente em outras ciências afins como na química e na física. Dessa forma, depois de dar uma breve revisão, sempre focando as dificuldades presentes na sala de aula, esclarecendo as duvidas que foram surgindo no decorrer da explicação, aplicamos outros jogos, pois além de entenderem melhor, ainda participavam e ficavam atentos o que é muito importante para que eles se desenvolvam e comecem a pensar criando sua próprias ideias. adição, subtração, multiplicação, divisão, jogo de sinais na multiplicação e divisão e Página O dominó dos números inteiros tem a finalidade de expressar os cálculos de 150 Jogo: Dominó dos Números Inteiros propriedades das operações entre números com o mesmo sinal e sinais diferentes, referentes aos números inteiros. O jogo segue as regras do dominó tradicional, as pedras oferecem cálculos e respostas que devem ser colocadas na ordem correta, a pedra ‘’branca’’ substituir| qualquer resultado ou operação. Pode jogar 2, 3 ou 4 alunos. Dois alunos: 7 pedras para cada; 14 pedras constituirão o monte, caso alguém não tenha a pedra para jogar deverá comprar no monte. Quatro alunos: 7 pedras para cada um. No jogo com quatro alunos não teremos o monte, aquele que não obter o resultado para jogar passa a vez para o próximo. Figura 10 Pedras do Dominó. Fonte: www.matematica.seed.pr.gov.br (2014) Jogo: Múltiplos e Divisores Este jogo tem como objetivo trabalhar conceitos de múltiplos e divisores. Pode ser organizado individualmente ou em duplas. As regras deste jogo são: Resolver as questões propostas na coluna "Questão". Localizar a resposta encontrada na coluna "Respostas". Identificar a sílaba correspondente à resposta encontrada. Transcrever a sílaba identificada no quadro "Frase", tendo como identificadores Ganha o jogador ou dupla que descobrir primeiro a frase correta. A frase correta que responde ao desafio é "Tudo é possível quando se quer". Página "N° da questão" do quadro "Frase". 151 correspondentes o número da questão (coluna N°) do quadro de questões e linha Figura 11 Quadro de Questões. Fonte: www.educador.brasilescola.com (2014) Aspectos Históricos Sobre o Uso dos Jogos no Ensino Aprendizagem A Relação Entre a Matemática e o Jogo Despertar a curiosidade, inata ao homem e vivacíssima no menino, eis o primeiro empenho do professor, num método racional. Da curiosidade nasce a atenção; da atenção a percepção e a memória inteligente. (Rui Barbosa) Estudos mostram a importância de se buscarem alternativas, a fim de tornar o ensino da Matemática mais significativo para o educando. Borin (2004) diz que os jogos contribuem para o “desenvolvimento de habilidades de raciocínio como organizaç~o, atenç~o e concentraç~o [...]”. Não é recente o uso dos jogos em aulas. Platão (427-347 a.C.) defendia e utilizava atividades lúdicas na educação de crianças com até dez anos. Locke (1632-1704) via na experiência, na tentativa e no erro, agentes contribuidores a uma aprendizagem concreta; (1891-1976), dentre outros, trouxeram contribuições com a criação e confecção de materiais manipuláveis. Página a uma aprendizagem libertadora. Posteriormente, Montessori (1870-1952) e Cuisenaire 152 Rousseau (1712-1778) e Claparède (1873-1940) concebiam essas práticas como estímulo No sentido de valorizar a prática onde as situações de aprendizagem sejam variadas, com aulas diversificadas, há uma urgente necessidade de que a Matemática seja trabalhada dentro do contexto de vida dos alunos. É nesse contexto que o jogo ganha um espaço como a ferramenta ideal da aprendizagem, na medida em que propõe estímulo ao interesse do aluno, que como todo pequeno animal adora jogar e desenvolve níveis diferentes da sua experiência pessoal e social. (ANTUNES, 1998, p. 36). O trabalho com jogos pode estimular a curiosidade dos alunos para que eles pensem, criem, formule suas próprias ideias, que saibam a origem dos assuntos que estudam. O jogo é muito mais do que simples meios de transmissão de conteúdos, como formas estimulantes do raciocínio e da capacidade de resolução de problemas do dia-a-dia, ele deve contribuir para a quebra do velho paradigma da matemática como a disciplina mais difícil, reservada aos mais inteligentes e inacessível a uma boa parte dos alunos. Dessa forma, despertar e identificar nos alunos do nível de ensino médio, o raciocínio lógico para resolução de problemas que envolvam as operações matemáticas que são abordadas com mais abrangência no ensino fundamental, afim de identificar também o grau de conhecimento e onde sentem maior dificuldade nos conteúdos a criatividade e o interesse pela disciplina, de forma dinâmica e participativa. Ao analisar a História da Matemática, é possível perceber que esta ciência foi constituída pelo homem através dos tempos e que, sendo desenvolvida por meio de jogos, torna-se um poderoso instrumento didático para possibilitar que os alunos raciocinem e desenvolvam operações mentais criativas. Sendo assim, não faltam argumentos que reforcem as potencialidades pedagógicas da utilização de jogos matemáticos como um excelente recurso didático. Para Piaget (1989, p.5), “Os jogos n~o s~o apenas uma forma de divertimento, mas s~o meios que contribuem e enriquecem o desenvolvimento intelectual. Para manter seu equilíbrio com o mundo, a criança necessita brincar, criar, jogar e inventa”. A palavra “jogo” se planejado e enriquecido, que possibilita a aprendizagem de várias habilidades. Página reconhecido como meio de fornecer à criança um ambiente agradável, motivador, 153 origina do vocábulo latino ”ludus”, que significa divers~o, brincadeira. O jogo é O ‘’Desinteresse’’ do Aluno: Causa ou Consequência? É comum ouvir de professores, em reuniões de conselho de classe, que os alunos são desinteressados, preguiçosos e não querem nada com a vida, mas será que eles são desinteressados ou a metodologia utilizada pelo professor que não permite seu aluno formular suas próprias ideias, fazendo com que ele sinta interesse pelo conteúdo apresentado em sala? Algumas pesquisas mostram que, com o passar dos tempos e com todos esses avanços da tecnologia o professor vem tentando adapta-se a essa nova realidade, porém nem sempre é possível desempenhar um bom papel, devido à falta de condições materiais e de capacitação profissional, fazendo com que o professor acabe tornando-se um mero transmissor de conhecimento ou apenas de informações, repassando para os alunos, somente, fórmulas prontas e acabadas, impedindo os alunos de pensar, experimentar e criar suas próprias hipóteses e conclusões. Tudo mudou e continua mudando a cada dia, porém a educação não conseguiu acompanhar esse ritmo, todas essas transformações. É comum ver nas as escolas as aulas sendo ministradas sempre da mesma maneira, com os mesmos recursos de uma metodologia tradicionalista: giz, quadro-negro e o livro didático. Não há empenho de alguns professores a buscar novas práticas para o ensino. Mas mesmo assim, querem alunos participativos e atentos. Interessados em quê? Participativos como? Se a metodologia adotada pelo professor na sala de aula, não está dando um bom rendimento, é responsabilidade do mesmo, verificar o que estar acontecendo e com pode fazer para mudar esse quadro. Pois quando o ensino é descontextualizado, não ira fazer sentido para o aluno e não despertará o interesse e, consequentemente, não haverá atenção e participação. Outro ponto que deve ser levado em consideração é a realidade do aluno, como vive, o que faz, coisas que formam sua personalidade. passam apenas uma parte do dia nas escolas, o resto é em casa. Por isso, existem diversos Página Muitos professores não levam em conta o ambiente em que vive o seu aluno, eles 154 Sabemos que o contexto social no qual a pessoa está inserida influi fortemente em seu modo de pensar e de agir, em seus interesses e necessidades e na hierarquização de seus valores (LORENZATO, 2006, p.15). fatores que devem ser analisados antes de dizer que os alunos não querem nada com a vida. A escola precisa ser um espaço que envolva o aluno, que o incentive, pois sem interesse não há atenção e se existe e o interesse, a atenção fica presa ao que está se fazendo. Mas para conseguir essa motivação com o aluno, é necessário que o professor tenha amor pela profissão, que haja respeito entre ambos, visto que educar é um ato de amor. Por isso, que é importante a forma como o professor age na sala de aula desde o primeiro dia, é preciso que ele transmita segurança a seus alunos, que aceite as opiniões e criticas as sugestões deles e que possam ajuda-lo a melhorar, mostre a seus alunos que ele também pode aprender com eles como um eterno aprendiz. Deve haver e ser mantido sempre esse elo entre professor e aluno, o professor tem que ser amigo de seus alunos, pois o fracasso ou sucesso depende sim em partes de como é o professor na sala de aula. O sucesso ou fracasso dos alunos diante da matemática depende de uma relação estabelecida desde os primeiros dias escolares entre a matemática e os alunos. Por isso, o papel que o professor desempenha é fundamental na aprendizagem dessa disciplina, e a metodologia de ensino por ele empregada é determinante para o comportamento dos alunos (LORENZATO, 2006, p.01) Precisamos de professores compromissados com a educação, que estejam preparados para a docência, e percebam que somente através da educação podemos transformar a sociedade. Enquanto não houver professores assim, nossos alunos serão desinteressados pelos estudos. A escola é um lugar possível de educação consciente, crítica, criativa e participativa desde que seus integrantes acreditem em um processo político de educação, e que possam produzir mudanças nas relações interpessoais e social (DALMÁS, 199, p.29 apud SANTOS 2003, p.47). A matemática é vista como já citado anteriormente como a disciplina mais difícil, aquela que tem apenas cálculos complicados e fórmulas prontas que precisam ser ‘’decoradas’’ fazendo dessa maneira com que o aluno n~o tenha confiança em si mesmo, em suas respostas, pois já estão prontas e não podem ser resolvidas de outra maneira o Desde as primeiras séries, os alunos aprendem a não confiar na própria maneira de pensar; é comum crianças apagarem rapidamente suas respostas corretas quando lhes é perguntado como as conseguiram (CARVALHO, 1994, p.98). Página problemas matemáticos. 155 que não é verdade. Existem várias maneiras de entender os conteúdos e de responder os Considerações Finais A necessidade de se trabalhar com o aluno atividades que os leve a experimentar, exprime o caráter dinâmico e investigativo da matemática. Os materiais concretos que foram criados para estimular a aprendizagem no aluno dos conceitos matemáticos básicos deve ser utilizado pelo professor como suporte para que estimule no aluno a construção desses conceitos de forma mais simples. O jogo vem sendo utilizado como recurso para a aprendizagem já a duas décadas com o objetivo de permitir que o aluno consiga estabelecer o conteúdo escolar estudado com o mundo que vivencia. O jogo é uma das formas de resgatar o gosto pela matemática, que é algo muito importante no processo ensino aprendizagem da matemática já que existe um velho paradigma da matemática, como a disciplina mais difícil, reservada aos mais inteligentes e inacessível a uma boa parte dos alunos. A prática com os jogos não deve ser desenvolvida em sala de aula como uma linha única, mas como uma proposta alternativa para despertar a motivação, o interesse, a criatividade e a autonomia dos alunos para a matemática, fazendo com que os alunos sintam prazer em aprender. Os jogos desenvolvem a habilidade de convívio em grupo, o raciocínio lógico e a motivação. Diante do que foi trabalhado, conseguimos perceber onde estava a maior necessidade desses alunos, dificuldades essas que acabava prejudicando os demais conteúdos que envolviam esses requisitos, simples, mais que fazem uma enorme diferença. Os alunos foram bastante participativos, a maioria tiraram suas duvidas durante a aula de revisão, obtendo assim resultados satisfatório, vistos através da última aula que foram aplicados os jogos, depois de esclarecer duvidas e rever as quatro operações. É importante ressaltar, que o interesse pela disciplina teve um aumento por parte dos alunos, que foi despertado pelos jogos, uma aula diferente mostrou que a matemática é fundamental em nossa vida e que seus conteúdos não são complicados de entender, o o mesmo também o ajudaria em relação aos seus alunos. Página bastante interessante e colaborou muito com a aplicação deles na sala de aula dizendo que 156 professor da turma também questionou que não conhecia alguns dos jogos e que era Finalizamos essa pesquisa dizendo que com a experiência obtida na sala de aula e os resultados satisfatórios podemos concluir que, a aprendizagem por meio dos caminhos lúdicos é simples e eficaz, basta que o professor se desfaça de suas amarras que o impede de atuar como facilitador durante o processo de ensino e aprendizagem da matemática. Seu trabalho deve ser o de proporcionar meios permitem seu aluno aprender. Referências Página 157 LARA, Isabel Cristina Machado de. Jogando com a Matemática de 5ª a 8ª série. São Paulo: Rêspel, 2003. GROENWALD, C. L. O. TIMM, U. T. Utilizando curiosidades e jogos matemáticos em sala de aula. Disponível em: <http://www.somatematica.com.br.> Acesso em: 3 out. 2014. D ‘AMBRÓSIO, U. Etnomatem|tica. 2 ed. S~o Paulo: Ática , 1993. FIORENTINI, D. Alguns modos de ver e conceber o ensino de matemática no Brasil . In:. Zetetiké, São Paulo, ano 3, n. 4, 1995. GROENWALD, C. L. O.; TIMM, U. T. Utilizando curiosidades e jogos matemáticos em sala de aula. Disponível em: http://www.somatematematica.com.br . Acesso: fev/2002 ___. Jogando com a matemática na Educação Infantil e Séries Iniciais. São Paulo: Editora Rêspel, 2005. 12 - UTILIZANDO O TANGRAM PARA ENSINAR O CONCEITO DE FRAÇÃO: RELATO DE UMA EXPERIÊNCIA REALIZADA NO PIBID/UNEAL Audálio Lúcio Wanderlei Neto [email protected] João Ferreira da Silva Neto [email protected] Lauro Lopes Pereira Neto [email protected] Resumo Neste trabalho, relatamos uma experiência em sala de aula sobre a utilização do Tangram no ensino e aprendizagem de frações no 6º do ensino fundamental. Ele é fruto de atividades realizadas por um projeto interdisciplinar vinculado ao Programa de Incentivo a Iniciação à Docência – Pibid desenvolvido pela Uneal. O estudo de fração é essencial nas aulas de Matemática, uma vez que auxilia os discentes a desenvolver as habilidades lógicas cognitivas e a compreender diversos conteúdos os quais poderão fazer uso. Neste relato de experiência, destacamos o Tangram como ferramenta alternativa para o ensino do conceito de frações. Constatamos que os alunos compreenderam melhor o conceito de fração, indicando que a utilização de atividades diferenciadas é uma boa alternativa para o ensino de Matemática. Além disso, os resultados também contribuíram para nossa formação enquanto licenciando, bem como para a formação da professora supervisora. Palavras-Chaves: Tangram, Matemática, Frações. Introdução Neste trabalho, relatamos uma experiência em sala de aula sobre a utilização do Tangram no ensino e aprendizagem de frações no 6º do ensino fundamental. Ele é fruto de atividades realizadas por um projeto interdisciplinar vinculado ao Programa Institucional de Iniciação à Docência – Pibid. Este é um programa da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) que fomenta a iniciação à docência, contribuindo para o aperfeiçoamento da formação docente e para a melhoria da qualidade da educação. O desenvolvimento das ações do Pibid tem permitido a reflexão dos professores sobre a prática, atenuando o distanciamento entre esta e a teoria. Em decorrência disso, ele efetivamente tem contribuído para a superação das dificuldades encontradas na Como várias outras instituições de ensino superior, a Universidade Estadual de Alagoas – Uneal – que há 43 anos oferta cursos de formação de professores no interior do Estado, desenvolve o projeto institucional: Articulação entre a universidade e escolas de Página docente e pela melhoria do ensino e da aprendizagem escolar. 158 prática docente, visto que seus objetivos são norteados pela valorização da profissão educação básica: múltiplos olhares teórico-metodológicos na formação docente, constituído por diversos subprojetos e atendendo licenciaturas em cinco campi. No Campus III, somos participantes do subprojeto interdisciplinar Matemática e Pedagogia: “Pr|tica Reflexiva do Professor de Matem|tica: atividades investigativas na sala de aula”. Esse subprojeto desenvolve ações quem envolvem professores e licenciandos do curso de Pedagogia e Matemática e professores da Educação Básica. Em torno deste projeto, realizamos diversas experiências relevantes para nossa formação enquanto professores em formação. As atividades do subprojeto, iniciadas em 2014, se desenvolveram continuamente por meio de reuniões, estudos individuais e em grupos, minicursos, visitas as escolas e permanente contato como os professores da Educação Básica. Elas se nortearam na concepção de que “atividades formativas que trabalham a complexidade da prática docente, articulando teoria e prática, contribuem fortemente para a melhoria no ensino e aprendizagem da Matem|tica” (SILVA NETO, SILVA E PEREIRA NETO, 2013, p.13). De modo a cumprir os objetivos do subprojeto, os 22 alunos dos cursos de licenciatura em Matemática e Pedagogia do Campus III da Uneal foram divididos em grupos menores constituídos por licenciandos dos dois cursos e uma professora da Educação Básica. Nosso grupo, constituído por quatro licenciandos e uma professora supervisora, desenvolveu suas atividades numa turma de 6º ano noturno do Ensino Fundamental. Os integrantes do grupo são três licenciandas em Pedagogia e um licenciando em Matemática. Para conciliamos esses dois cursos, estabelecemos como propósito a interação entre os integrantes, refletindo sobre o ensino de Matemática desde os anos iniciais. Inicialmente, havia um distanciamento entre os membros do grupo, pois as licenciandas da Pedagogia não se consideravam capazes de ensinar Matemática. Em cumprimento aos objetivos do subprojeto, os coordenadores de área nos propuseram discussões reflexivas, sob o acompanhamento constante da professora supervisora. Página reuniões no grupo menor após as primeiras observações na escola, estudos de texto e 159 desenvolver atividades no 6º do Ensino Fundamental. Para isso, eles proporcionaram Vivemos diversas experiências que foram muito importantes para a nossa formação, pois nos possibilitou observar a complexidade da ação docente. De modo particular, neste texto, relatamos a experiência de ensinar frações na turma que observamos. Essa observação foi de fundamental relevância para selecionarmos o conteúdo, além dele também ter sido uma das sugestões elencadas pela professora supervisora. Os números fracionários constituem um conteúdo bastante importante para os cálculos matemáticos, contudo os alunos apresentam diversas dificuldades em aprendê-lo. Concordamos com Lessa (2011) quando afirma que há diversos significados associados ao conceito de número fracionário e, em decorrência disso, diversas interpretações relativas ao contexto no qual estão inseridos. Diante disso, o ensino desse conteúdo precisa ser bem planejado e mobilizar várias situações. Nesse cenário, utilizamos o Tangram como alternativa de desenvolver uma compreensão de frações. Esse tipo de quebra-cabeças chinês de origem milenar é formado por apenas sete peças – dois triângulos grandes, um triangulo médio, dois triângulos pequenos, um quadrado e um paralelogramo. Os alunos tiveram mais motivação e aproximação com as atividades, visto que alguns deles não conheciam ainda esse jogo. Por meio do jogo, mostramos uma maneira diferenciada de ensinar fração. Percebemos que os livros didáticos utilizam a pizza como primeira situação para apresentar o conceito de fração. Por exemplo, o livro didático dos alunos em que desenvolvemos este trabalho também utilizava a pizza e barras de chocolate pra isso. Segundo Mühlen et al., a divisão de pizza e barras de chocolates, pode não ser um bom recurso para ensinar frações, o que nos leva a pensar em alternativas para seu ensino. Por outro lado, desde quando estudávamos na Educação Básica, o conceito de fração era representado inicialmente pela pizza. Diante disso, os coordenadores sugeriram Página Não é de se estranhar portanto, que os alunos tenham dificuldades, e que certos conceitos e procedimentos tem permanência curta, resistindo quando muito, do dia do ponto ensinado' ao dia da prova. e incorporadas as estruturas de pensamento dos alunos ... A equivalência Esses mesmos estudos sugerem que o ensino de frações deve ser realmente conceituadas é utilizada para introduzir ou explorar as porcentagens...” (Mühlen; Castro; Rosa; Corbellini; Thomas, p.1). 160 Sobre isso, Lopes escreve: que trabalhássemos com atividades que levassem em consideração os conhecimentos prévios dos alunos. Como a turma é constituída de alunos trabalhadores de idades variadas, entendemos que esse jogo poderia ser uma alternativa pertinente. Os números fracionários e suas representações Inicialmente, procuramos identificar o que os alunos sabiam sobre fração. Eles apresentaram um conceito intuitivo de fração, do seu cotidiano, mas que muitas vezes não é levado em consideração pelo professor na aula. Segundo Boyer a origem do número inteiro é a mais antiga das ideias da matemática e é atribuída à antiguidade pré-histórica, porém, as tribos primitivas não sentiam a necessidade de usar frações, pois para calcular quantidades pequenas, os homens utilizavam unidades suficientemente pequenas. A necessidade da utilização da fração, assim como sua notação, parece ter surgido durante a Idade do Bronze com as culturas mais avançadas como a egípcia. Assim, além da escrita dos números, o povo egípcio também é conhecido por ter desenvolvido o conceito de fração. (BOYER, 1991, p. 9). O objetivo deste trabalho é apresentar uma experiência de ensinar o conceito de fração a partir do TANGRAM. Para isso, é importante entender como esse conceito se construiu na história da humanidade. Conhecer a síntese histórica do conceito matemático implica em investigarmos a história da matemática a partir dos seus primórdios como forma de proporcionar ao professor (responsável pela atividade pedagógica) subsídios para organizar o seu ensino de modo que a apropriação do conhecimento matemático do seu aluno se assemelhe à forma com que o homem apropriou-se dele historicamente. (PERLIN; LOPES, 2013, p.4) Percebemos que os alunos apresentam bastantes dificuldades sobre o conceito de fração. Muitos dizem é um número em cima do outro. Por exemplo, a representação 1 2 é compreendida como dois números por muitos alunos. Desse modo, os alunos transferem o conceito de números inteiros para as frações. Consideramos que a ideia básica de fração pode ser mais bem compreendida quando se estabelece relação entre a parte e o todo. Nesse sentido, a utilização de atividades que trabalhem a ideia de equivalência é maneira sequencial em se desenvolve a maioria das aulas de Matemática, podem motivar o Página Por exemplo, quando for proposto que 1 2 é igual a 0,5, a sobreposição de figuras equivalentes ajuda nessa compreensão. Além disso, essas atividades, diferenciadas da 161 imprescindível e, para isso, o Tangram é uma alternativa potencial. aluno, na medida em que o faz compreender diferentes representações de um mesmo objeto.Segundo DAMM (2008), essas diferentes representações não são facilmente percebidas pelo aprendiz. Por isso, ele recomenda a utilização de situações didáticas diferenciadas que possibilitem a conversão de registros de representação, tendo em vista a importância desse fenômeno na compreensão dos conceitos. A apreensão conceitual dos objetos matemáticos somente será possível com a coordenação, pelo sujeito que apreende, de vários registros de representação. Ou seja, quanto maior for a mobilidade com registros de representação diferentes do mesmo objeto matemático, maior será a possibilidade de apreensão desse objeto. (DAMM, 2008, p.177). Nessa linha de pensamento, as atividades desenvolvidas foram bastante pertinentes, pois permitiram essa mudança de registros e, em decorrência disso, uma melhor apreensão do objeto matemático frações. Descrevendo a Atividade O trabalho foi desenvolvido em quatro partes, com o objeto de apresentar o conceito de fração. Perguntamos se eles já tinham ouvido falar do Tangram ou até mesmo jogado esse jogo. Como já dissemos, durante toda a atividade, seguimos uma sequência diferente daquela que ocorre na maioria das salas de aula – definição ou conceito, exercício resolvido pelo professor e exercício de fixação. Nessa direção, entregamos inicialmente as peças de um Tangram para cada aluno e solicitamos que eles construíssem o quadrado. Incentivamos que eles construíssem outras figuras, pois houve dificuldades na construção do quadrado, visto que ele é construído por uma forma pouco utilizada na matemática do livro didático. Após o contato maior com as 7 peças, juntamente com os alunos, formamos o quadrado. Essa atividade inicial foi importante para que eles assimilassem o nome das peças do jogo e se familiarizassem com elas. Na 2ª atividade, pedimos que eles formassem figuras geométricas, utilizando apenas duas ou três peças do Tangram. Objetivando que eles entendessem o conceito de quadrado. Página quadrado. Em seguida, perguntamos qual a relação entre o triângulo pequeno e o 162 metade, solicitamos que eles pegassem dois triângulos pequenos e formassem um Percebemos que os alunos possuem um conceito de metade bastante solidificado. Todavia, quando pedimos para representar a metade, eles não sabiam como fazê-lo. Entendemos que o conceito de fração ensinado na escola não está articulado ao conhecimento do aluno. Continuamos com a ideia de metade e solicitamos que eles pegassem dois triângulos pequenos e formassem um paralelogramo. Em seguida, pedimos que eles construíssem um retângulo, utilizando o quadrado menor e dois triângulos pequenos. Após essa atividade, pedimos que construíssem o mesmo retângulo, retirando o quadrado pequeno e utilizando o paralelogramo para formar um retângulo. Na construção do retângulo, trabalhamos o conceito de equivalência, visto que o quadrado ou o paralelogramo equivale 2 triângulos pequenos. Na representação matemática formal, 2 1 trabalhamos que 4 = 2 . A terceira atividade perguntava quantos triângulos pequenos formavam o triângulo grande. Os alunos tinham algumas dificuldades, mas o ato de sobrepor, utilizando para isso as peças de outro colega, foi bastante pertinente para a realização da atividade e para compreensão dos alunos. A quarta atividade solicitava que os alunos construíssem o quadrado grande com apenas uma das peças. Para isso, perguntamos: Quantos triângulos (pequenos, médios, e grandes, respectivamente) cabem no quadrado grande? Quantos quadrados pequenos cabem no quadrado grande? Quantos paralelogramos cabem no quadrado grande? Depois disso, solicitamos que, com base nas atividades jogo, eles representassem por meio de frações as relações de cada figura (parte) correspondentes ao quadrado grande (todo). De modo prático, eles precisavam representar que: 1 O triângulo pequeno corresponde a 16 do quadrado grande; O quadrado pequeno corresponde a 8 do quadrado grande; O paralelogramo corresponde a do quadrado grande; O triângulo médio também corresponde a 8 do quadrado grande; O triângulo grande corresponde a 4 quadrado grande. 1 1 8 Os resultados demostram que os alunos possuem um nível de conhecimento razoável sobre o conceito de fração. Por outro lado, em termos de representação dessas Página 1 163 1 frações, eles a veem como dois números e não conseguem estabelecer a ideia de metade, ou seja, para eles a representação 0,5 é diferente de ½. Vale destacar que alguns alunos escreveram a palavra metade, mas não representaram matematicamente a metade. Esse fato nos indica que a matemática ensinada na escola parece não ter significado para o aluno. Considerações Finais Nesse estudo, apresentamos um relato de uma experiência de ensinar frações utilizando o jogo TANGRAM. Embora o conceito de frações esteja muito associado a problemas cotidianos, os alunos têm muitas dificuldades de aprendê-lo na matemática escolar. Diante dessa realidade, as atividades foram ainda mais importantes, pois possibilitaram que os alunos compreendessem melhor essas representações. Por exemplo, na segunda atividade que utilizávamos a relação de quarta parte, os alunos a representaram mais facilmente. Constatamos que eles compreenderam melhor o conceito de fração, indicando que a utilização de atividades diferenciadas é uma boa alternativa para o ensino de Matemática. Além disso, os resultados também contribuíram para nossa formação enquanto licenciando, bem como para a formação da professora supervisora. Página BOYER, C. B. A história da matemática. 1991, p. 9 CASTRO, D. M. et al. Projeto de investigação sobre o ensino de frações. In: Anais do IV Encontro Ibero-americano de coletivos escolares e redes de professores que fazem investigação na sua escola. Lajeado, 2005. Disponível em: <http://www.matematicahoje.com.br/telas/autor/artigos/artigos_exclusivos.asp>. Acesso em 29/04/2015 DAMM, R. F. Registros de Representação. In: MACHADO, S. D. (org.). Educação matemática: uma (nova) introdução, 3ed, São Paulo, educ, 2008. LESSA, V. E. A compreensão do conceito de número fracionário: significado medida. In Anais do XIII Conferência Interamericana de Educação Matemática. Recife, 2011. LOPES, A. J. Reflexões sobre o ensino de frações no currículo de matemática. In: Anais do IV Encontro Ibero-americano de coletivos escolares e redes de professores que fazem investigação na sua escola. Lajeado, 2005. SILVA NETO, J. F, SILVA, S. S. PEREIRA NETO, L. L. Formação de Professores de Matemática em Igaci – AL: um olhar sobre as dificuldades da prática docente e as expectativas dos professores quanto à melhoria do processo de ensino aprendizagem. In: Anais do XI Encontro Nacional de Educação Matemática. Curitiba, 2013. 164 Referências 13 - ECONOMIA SOLIDÁRIA: MAPEAMENTO E CARACTERIZAÇÃO EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA NO MUNICÍPIO DE ARAPIRACA DE Diego Leonardo Davi Santos Silva [email protected] Pânmela Albuquerque dos Santos [email protected] Josefa Silania Pinheiro de Farias [email protected] Orientador (a): Ms. Acurcio Castelo David [email protected] Resumo O presente artigo propõe mapear e caracterizar os empreendimentos de economia solidária de Arapiraca (AL) como fomento para geração de trabalho, rendas, produção e valorização do cidadão; através de pesquisas exploratórias qualitativas e quantitativas onde de inicio foi feito um breve levantamento de literatura do que venha a ser Economia Solidária, e em segundo momento foi realizada uma pesquisa de campo, com a coleta de dados junto às comunidades em questão. O mapeamento feito demonstra a importância dos empreendimentos para o município, assim como para os colaboradores que veem nesses empreendimentos um complemento da renda, sendo possível dessa forma notar que os participantes puderam melhorar sua qualidade de vida. Palavras-chave: Economia Solidária – Mapeamento – Gestão Social Introdução Encontra-se na metade do século XIX, na Europa, o que podemos dizer ser a raiz da economia solidária, durante o processo de revolução industrial, surgindo como uma forma de combate a extrema exploração praticada pelo capitalismo aos trabalhadores, ocasionando uma necessidade de elaborar modelos cooperativistas de sobrevivência e independência econômica (CULTI et al., 2010.p 15). Conceitualmente a economia solidária aparece com mais força nos anos 80, o que não significa que antes não se tinha pensadores dedicados ao tema. Segundo CULTI et al. (2010, p.16) “Seus principais pensadores foram: Robert Owen (1771-1858), Willian King (1786-1865), Charles Fourier (1772-1837), Philippe Buchez (1796-1865) e Louis Blanc (1812-1882).” da Secretaria Nacional de Economia Solidária (Senaes) vinculada ao Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). O Senaes, desde então, tem promovido políticas públicas de Página aos altos índices de desemprego. O Presidente Lula, em 2003, aprovou o projeto de criação 165 No Brasil, a exemplo dos outros países, a economia solidária aparece em resposta combate à pobreza e de reforma agrária. (SINGER, 2004). Os primeiros mapeamentos nacionais de economia solidária se iniciam em 2006: Os estudos sobre a economia solidária no Brasil dispõem de uma importante fonte de informações desde 2006, oriunda dos primeiros Mapeamentos Nacionais da Economia Solidária que formou o Sistema Nacional de Informações em Economia Solidária (SIES), na Secretaria Nacional de Economia Solidária (SENAES) do Ministério de Trabalho e Emprego, com apoio do Fórum Brasileiro de Economia Solidária. O mapeamento mostra a gênese dos empreendimentos econômicos solidários, suas estratégias de desenvolvimento e os benefícios para seus integrantes e para as comunidades onde ela se desenvolve. (CULTI et al , 2010.p 21) Nesse contexto o presente trabalho elaborado por meio do projeto de extensão intitulado “Economia Solid|ria: Mapeamento e Caracterizaç~o de Empreendimentos de Economia Solidária no Município de Arapiraca” no período de outubro de 2014 a Abril de 2015 surgiu da necessidade de se analisar a situação de risco ou de vulnerabilidade socioeconômica em que determinada população se encontra, para isso buscou-se investigar sua participação no mercado de trabalho e na produção de riqueza do município de Arapiraca (AL), através de empreendimentos com caráter solidário como forma da superação das dificuldades percebidas. O presente artigo será estruturado nas respectivas seções: Conceitos de economia solidária, onde serão apresentados os conceitos de estudiosos no assunto, a exemplo de Paul Singer; As características da economia solidária, demonstrando quais aspectos idealizam um modelo de economia solidária; Vantagens e desvantagens, objetivando a exposição dos benefícios e dificuldades inerentes ao modelo solidário; Comparação entre os modelos de economia solidária e capitalista; Economia solidária no Brasil; Economia solidária em Arapiraca; e por fim as considerações finais. Conceitos A economia solidária é vista como um modo diferente para produzir, vender, comprar e trocar o que é necessário para viver, sem depender da exploração de outros indivíduos, sem querer levar vantagem, e agindo em consonância com o desenvolvimento sustentável, atuando como agente de inovação na geração de trabalho e renda, Fruto da organização de trabalhadores e trabalhadoras na construção de novas práticas econômicas e sociais fundadas em relações de colaboração solidária, inspirada por valores culturais que colocam o ser humano como sujeito e finalidade da atividade econômica, em vez de acumulação privada de riqueza em geral e de capital particular. (FBES, 2006, p.3). Página Brasileiro de Economia Solidária (FBES), a economia solidária é: 166 contribuindo significativamente para a inclusão digital (MET, 2009). Para o Fórum Para Paul Singer: Economia Solidária é uma forma de produção, consumo e distribuição de riqueza (economia) centrada na valorização do ser humano - e não do capital - de base associativista e cooperativista, voltada para a produção, consumo e comercialização de bens e serviços, de modo autogerido, tendo como finalidade a reprodução ampliada da vida. Assim, nesta economia, o trabalho se transforma num meio de libertação humana dentro de um processo de democratização econômica, criando uma alternativa à dimensão alienante e assalariada das relações do trabalho capitalista (1997). Conforme Barbosa (2007, p.24), “a Economia Solid|ria apresenta-se com uma alternativa, uma experiência a ser utilizada junto à população que se encontra desprotegida de direitos e de oportunidades de trabalho formal”. Para Leandro Pereira Morais: A economia solidária compreende uma diversidade de práticas econômicas e sociais organizadas sob a forma de cooperativas, associações, clubes de troca, empregos autogestionárias, redes de cooperação, entre outras que realizam atividades de produção de bens, prestação de serviços, finanças solidárias, trocas, comércio justo e consumo solidário. Dentre os conceitos expostos, identifica-se algumas dimensões que caracterizam as bases da economia solidária, sendo que todas inevitavelmente acabam por convergir para a valorização do ser humano. Características A Economia Solidária pode ser reconhecida dentre as diferentes formas de produção por se fundamentar em princípios sociais, democráticos, humanistas e de solidariedade; apresenta assim características atreladas a tais princípios: Apresentam as seguintes características (os empreendimentos de economia solidária): são organizações urbanas ou rurais, de produtores, de consumidores e de crédito, baseadas na livre associação, no trabalho cooperativo, na autogestão e no processo decisório democrático, sendo a cooperativa a forma clássica de organização de um empreendimento da economia solidária. (CULTI et al , 2010.p 21) Dentre as características dos empreendimentos de economia solidária, temos: Cooperação: em vez de força a competição o que prevalece é a existência de interesses e objetivos comuns, a união dos esforços e capacidades, a propriedade coletiva trabalhadores); associações comunitárias de produção; redes de produção, comercialização e consumo; grupos informais produtivos de segmentos específicos Página organização coletiva: empresas autogestionárias ou recuperadas (assumida por 167 de bens, a partilha dos resultados e a responsabilidade solidária. Envolve diversos tipos de (mulheres, jovens etc.); clubes de trocas etc. Na maioria dos casos, essas organizações coletivas agregam um conjunto grande de atividades individuais e familiares. Autogestão: os trabalhadores das organizações exercitam as práticas participativas de autogestão dos processos de trabalho, das definições estratégicas e cotidianas dos empreendimentos, da direção e coordenação das ações nos seus diversos graus e interesses, desta maneira não estão mais subordinados a um patrão. Os apoios externos, de assistência técnica e gerencial, de capacitação e assessoria, não devem substituir nem impedir o protagonismo dos verdadeiros sujeitos da ação. Solidariedade: O caráter de solidariedade nos empreendimentos é apresentado em diferentes dimensões: na justa distribuição dos resultados alcançados; nas oportunidades que levam ao desenvolvimento de capacidades e da melhoria das condições de vida dos participantes; na responsabilidade com um meio ambiente saudável; nas relações que se estabelecem com a comunidade local; na participação ativa nos processos de desenvolvimento sustentável de base territorial, regional e nacional; nas relações com os outros movimentos sociais e populares de caráter emancipatório; na preocupação com o bem estar dos trabalhadores e consumidores; e no respeito aos direitos dos trabalhadores e trabalhadoras. Dimensão econômica: é uma das bases de motivação da agregação de esforços e recursos pessoais e de outras organizações para produção, beneficiamento, crédito, comercialização e consumo. Envolve o conjunto de elementos de viabilidade econômica, permeados por critérios de eficácia e efetividade, ao lado dos aspectos culturais, ambientais e sociais. Vantagens e Desvantagens O Brasil é referência mundial em economia solidária; Paul Singer acredita que a participação efetiva da sociedade civil é fundamental para o desenvolvimento desse sistema. Contudo, assim como em todo sistema, há vantagens e desvantagens em relação As vantagens apontadas no modelo de economia solidária são: Maior possibilidade de se afirmarem economicamente, visto que, não dependem de patrões ou Página Vantagens 168 ao modelo. de Estado; Ganhos de produção rateados entre os participantes; Gerencialismo simplificado; Menor custo de registros. Na economia solidária há a participação e envolvimento constante da sociedade, nas decisões em benefício as pessoas envolvidas no projeto, ou seja, participa de todo o tema social do projeto e isso trás a diminuição social da desigualdade entre os povos da mesma nação, que é causado pelo capitalismo tradicional. As funções dentro de uma cooperativa pode ser desempenhado por todos, isso faz com que acha crescimento pessoal em todos os aspectos, algo que não limita o colaborador. Ninguém entra na Economia Solidária para levar vantagens, mas para participar de um conjunto justo e solidário, da produção o produto final, seja ele matéria ou imaterial, trabalhando de forma cooperada e com foco no ser humano (SINGER, 2008). Segundo as deliberações da I Conferência Nacional de Economia Solidária, indicavam a necessidade da política de economia solidária expandir-se e interagir com diferentes órgãos do Governo Federal, Estadual e Municipal, articulando os programas e ações em uma estratégia de desenvolvimento endógeno, autogestionário e solidário. Além disso, propunha que na construção e implementação de uma Política Pública Nacional de Economia Solidária, deve-se buscar uma ação integrada e complementar entre os Entes da Federação, evitando-se a sobreposição de iniciativas e a fragmentação de recursos. Neste sentido, apresentou a proposição de criação de um Sistema Nacional de Economia Solidária. Desvantagens Em relação às desvantagens da economia solidária tem-se, segundo RAZETO (1990) a ampla informalidade das economias latino-americanas, várias iniciativas de Economia Solidária prosperam sem deixarem de ser informais. Mas, nesse caso, os trabalhadores por via de regra, passam das suas modalidades usuais de economia para situações em que precisam controlar os fatores produtivos e ter em vista conseqüências situações e influenciar o ritmo das transformações. Essa mutação é favorecida quando se utilizam os recursos dos indivíduos e de suas redes de relações, conseguindo explorá-los sem descaracterizá-los: opera-se uma metamorfose das relações de comensalidade, Página circunstâncias e conceber a própria atividade como uma força suscetível de criar novas 169 futuras. Necessitam abandonar a percepção da vida como uma constante adaptação às ancoradas nos laços pessoais e no costume, a uma lógica econômica propriamente empreendedora e solidária, sustentada em relações de cooperação. E Gaiger (2006) ainda afirma que esse substrato, as iniciativas de Economia Solidária assumem a perspectiva de superar a instabilidade e a incerteza que afetam a vida material dos pobres. Objetivam então reduzir o grau de subordinação aos ditames da economia e ampliar as margens de retenção do valor excedente que produzem. Quando sacrificam para isso os próprios trabalhadores, o fazem mediante um esforço coletivo deliberado que por vezes posterga, sem descartar, futuras compensações advindas da consolidação do empreendimento. A falta de recursos é o maior desafio para a economia solidária, ser gestor público nessa área é fazer do pouco, muito. É ir atrás de parcerias, fazer contatos com deputados e vereadores, com secretarias, muitas vezes, é preciso ter mobilização social para se conseguir recursos. O professor Sandro Sguarezi, representante da UniTrabalho, afirma que a liç~o que fica é a de que “devemos aprofundar o debate e trocar experiências. Nós estamos em um momento de transição e ninguém sabe ainda muito bem como fazer isso. Estamos aprendendo e precisamos encontrar uma forma de dialogar com o Estado e encontrar maneiras de argumentar como a Economia Solidária pode ser uma resposta ao desemprego e à falta de perspectivas. É preciso sensibilizar o gestor público e, depois que você mostra resultados, tudo flui”, concluiu. Dentro do sistema capitalista predomina o empreendimentos privados, cujo seu principal objetivo é o lucro, totalmente diferente da economia solidária, no qual seu principal desafio é mantersse ao longo do tempo já que sua visão não é o lucro. Essa é uma preocupação que resulta da observação de cooperativas, que diante da necessidade de acumular recursos e inovar, tiveram que centralizar sua administração ou transforma-las em empresas privadas para que não acabacem. Dessa forma as cooperativas busca forma e inovação para se manterem no processo da competitividade Economia Solidária e Capitalista: Concepções Sobre o Trabalho diferentes concepções surgiram com o passar dos tempos, cada uma de acordo com os sistemas que ás propõe. Para Marx: Página tornando-se algo inerente ao ser humano, passado de geração para geração, assim 170 O trabalho sempre teve papel fundamental em todas as épocas da humanidade, Ao pressupormos o trabalho numa forma em que pertence exclusivamente ao homem. Uma aranha executa operações semelhantes às do tecelão, e a abelha envergonha mais de um arquiteto humano com a construção dos favos de suas colmeias. Mas o que distingue, de antemão, o pior arquiteto da melhor abelha é que ele construiu o favo em sua cabeça, antes de construí-lo em cera. No fim do processo de trabalho se obtém um resultado que já no inicio deste existiu na imaginação do trabalhador e, portanto, idealmente [...]. (2002. P. 140-150) Há sem dúvidas algumas semelhanças, mas principalmente dessemelhanças entre os modelos de economia solidária e capitalista: Queiramos ou não, há uma ligação dessa economia (economia solidária) com o mercado, visto que, nele, em medidas variáveis, mesmo priorizando as trocas e/ou comércio entre os empreendimentos solidários, estes buscam subsídios, informações, formação e insumos para produzir, vender ou trocar seus serviços e produtos ou bens materiais e imateriais. (CULTI et al , 2010.p 21). Para SINGER (2004) “a economia solid|ria propõe abolir o capitalismo e a divis~o de classes que lhe é inerente. A economia solidária é atualmente concebida como uma economia de mercado, em que os cidadãos participam livremente, cooperando e competindo entre si, de acordo com os seus interesses e os contratos que celebram”. Na economia solidária os desafios são inerentes da necessidade de romper com o capitalismo e a forma com que o trabalho é organizado em tal sistema, assim emerge como alternativa, a elaboração de ambientes democráticos e que não consolidem trabalhos alienantes. É necessário homogeneizar força física com à intelectual nas atividades laborais inserir o trabalhador de nível operacional no processo decisório (CATANI, 2003). Para Coraggio: [...] o empreendimento solidário não objetiva acumular capital, mas melhorar a qualidade de vida de seus membros. A unidade doméstica é a célula da economia solidária e popular, podendo ser formada por vínculo de sangue, ou ainda por pessoas da comunidade, por vizinhos ou amigos que se unem e articulam estratégias a fim de reproduzir a vida. (2000), Sobre o sistema capitalista, Marx diz que: [...] de poderoso meio de substituir trabalho e trabalhadores, a maquinaria transformou-se imediatamente em meio de aumentar o número de assalariados, colocando todos os membros da família do trabalhador, sem distinção do sexo e de idade, sob o domínio direto do capital... (1968, livro I, v. 2, p. 449). Página O trabalhador se torna tão mais pobre quanto mais riqueza produz, quanto mais a sua produção aumenta em poder e extensão. O trabalhador se torna uma mercadoria tão mais barata quanto mais mercadorias criam. Com a valorização do mundo das coisas aumenta em proporção direta a desvalorização do mundo dos homens. O trabalho não produz só mercadorias; produz a si mesmo e ao 171 Ainda segundo Marx: trabalhador como uma mercadoria [grifos do autor], e isto na proporção em que produz mercadorias em geral (1989, p. 148) Como podemos ver a principal diferença nas perspectiva de trabalho entre a economia solidária e o capitalismo, consiste que, respectivamente um procura a valorização do ser humano como propósito, e outro a busca incessante pelo acumulo de capital por meio da exploração do homem sobre o próprio homem. Asseguir no quadro 1, veremos uma distinção entres o modelo solidário e o capitalista: Quadro 1: Comparação modelo capitalista e solidário CAPITALISMO Busca incessante pelo lucro ECONOMIA SOLIDÁRIA Prioriza o bem coletivo Alta rotatividade de funcionários Estabilidade no emprego Exploração dos empregados Partilha dos ganhos Hierarquia (figura do chefe) Autogestão e igualdade Elaboração: os autores Economia Solidária no Brasil No Brasil, a exemplo dos outros países, a economia solidária aparece em resposta aos altos índices de desemprego. O Presidente Lula, em 2003, aprovou o projeto de criação da Secretaria Nacional de Economia Solidária (Senaes) vinculada ao Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). O Senaes, desde então, tem promovido políticas públicas de combate à pobreza e de reforma agrária. (SINGER, 2004). Os primeiros mapeamentos Página Os estudos sobre a economia solidária no Brasil dispõem de uma importante fonte de informações desde 2006, oriunda dos primeiros Mapeamentos Nacionais da Economia Solidária que formou o Sistema Nacional de Informações em Economia Solidária (SIES), na Secretaria Nacional de Economia Solidária (SENAES) do Ministério de Trabalho e Emprego, com apoio do Fórum Brasileiro de Economia Solidária. O mapeamento mostra a gênese dos empreendimentos econômicos solidários, suas estratégias de desenvolvimento e os benefícios para seus integrantes e para as comunidades onde ela se desenvolve. (CULTI et al , 2010.p 21) 172 nacionais de economia solidária se iniciam em 2006: Na respectiva seção serão apresentados dados referentes a economia solidária no Brasil, a partir de análises feitas no site do Sistema Nacional de Informações em Economia Solidária(SIES) , que consiste em um banco de dados dos empreendimentos de economia solidária de todo país. Segundo o SIES, existem cerca de 19.708 empreendimentos de economia solidária no Brasil, concentrando a maior parte na região nordeste, com cerca de 40% do total. Dos 19.708 empreendimentos citados: cerca de 65% são exclusivamente rurais, 35:% exclusivamente urbanos e 10% rurais e urbanos. Como resposta as necessidades de determinada população, a economia solidária costuma atuar mais fortemente nas regiões de maior vulnerabilidade socioeconômica, a exemplo do nordeste, que segundo o censo 2010 realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), tem participação de apenas 13,1% do Produto Interno Bruto (PIB) e tem o pior índice de Desenvolvimento Humano do país, segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), onde 6 de seus 9 estados, estão nas ultimas posições do Ranking do IDH nacional, em contrapartida temos a região sudeste que concentra cerca de 54,6 % do PIB. Um dos pontos principais da economia solidária é a representatividade de classes, em especial a classe feminina, estima-se em 43% a participação das mulheres nos empreendimentos solidários, número por si só bastante expressivo, e tornando-se ainda mais notório quando comparado ao congresso nacional, que conta com apenas 10% de participação classe feminina, segundo o segundo o boletim da União Interparlamentar (UIP), e segundo o site Congresso em Foco: Os índices brasileiros de engajamento de mulheres na política estão abaixo da média mundial, de 22,1% e também do percentual do Oriente Médio, 16%. E ainda segundo o site, países que tradicionalmente impõe diversas restrições às mulheres, como dirigir veículo, a exemplo da Arábia Saudita, estão a frente do Brasil, em termos de engajamento político. Esses dados demonstram a economia solidária como um modelo de inclusão no processo democrático, tendo em vista que a maior parte solidária, com 55% de participação, seguido dos artesãos, 18%. As boas práticas na agricultura é uma necessidade cada vez maior, não só a nível nacional, mas também global. No mundo são usados aproximadamente 2,5 milhões de toneladas de agrotóxicos, e no Página Identifica-se na agricultura familiar o segmento mais presente da economia 173 da população e do colégio eleitoral é formada por mulheres. Brasil o consumo anual tem sido superior a 300 mil toneladas de produtos comerciais, onde nos últimos 40 anos esse consumo aumentou em 700%, enquanto no mesmo período a área agricola aumentou 78% (EMBRAPA). Na contramão dessa banalização do uso de agrotóxicos, os empreendimentos solidários de agricultura familiar buscam disseminar a produção totalmente orgânica, ou seja, sem o uso de agrotóxicos, que além de serem benéficos a saúde, é apontado como responsável por uma redução considerável da fadiga do terreno e por uma diminuição no consumo de água, pois elimina o uso de produtos químicos. Em todos os seguimentos citados, e em muitos outros como sociabilidade, renda, emprego, a economia solidária vem despontando como agente de mudanças siginifcativas na sociedade brasileira, tornando-se forte alternativa a milhões de pessoas que vivem a margem da sociedade. Economia Solidária m Arapiraca A seguir será apresentada uma contextualização sobre as características socioeconômicas do município de Arapiraca-AL, procurando demonstrar a realidade da região; em seguida serão apresentados os resultados do mapeamento e caracterização dos empreendimentos de economia solidária da região. Características Socioeconômica de Arapiraca O município de Arapiraca está situado a 135,70Km da capital Maceió, na Mesorregião Agreste Alagoano, têm uma população aproximada de 230 mil habitantes, é o segundo pólo de geração de riquezas do Estado, contemplando 7,35% do PIB, em decorrência da grande oferta de serviços para toda Região Agreste e apresenta o terceiro maior Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM). Detém localização privilegiada e estratégica no estado, como grande entreposto comercial. Município tradicional produtor de fumo, também se destaca na hortifruticultura (JÚNIOR, 2011). A partir de dados retirados do Atlas do Desenvolvimento no Brasil, com se na média nacional >0,6 e <0,699, ocupando a 3136ª posição, em 2010, em relação aos 5.565 municípios do Brasil; No quesito educação, mesmo com os notórios avanços nas Página Arapiraca está localizada no estado com o pior IDHM do país, seu índice (0,649) encontra- 174 informações referentes ao ultimo censo de 2010, foi possível constatar que: apesar de ultimas duas décadas, Arapiraca apresenta menos de 30% de sua população, entre 18 e 20 anos, com ensino médio completo e 28,6 % de analfabetos com mais de 25 anos; seu índice de GINI29 é de 0,55 e 58,82% da renda está concentrado como os 20% mais ricos; possui uma população ativa de 62,5%, dos quase 19,92% trabalham no campo. Caracterização e Mapeamento dos Empreendimento de Economia Solidária de Arapiraca: resultado e discussões Os empreendimento solidários de Arapiraca totalizam-se em treze, que dentre suas características gerais destacam-se: Caracterização de 7 desses empreendimentos como rurais e urbanos e 6 como exclusivamente rurais; 8 desenvolve algum tipo de ação social ou comunitária; principal atividade sendo a de produção ou produção e comercialização; e um número total aproximado de 1069 membros. Assim como na economia solidária a nível nacional, os empreendimentos solidários de Arapiraca atuam na defesa de classes, levando-se em conta que 57% dos membros são do sexo feminino e analisando o percentual que, 22% das famílias possuem como chefes, mães sem fundamental completo e com filhos menores de 15 anos. As mulheres também ocupam o maior percentual de coordenação e/ou direção dos empreendimentos, cerca de 55%. Número que denotam um alto grau de representatividade, ainda mais quando se comparado ao 10% de participação femina no Congresso Nacional. A principal motivação que levou a criação dos empreendimentos solidários foi por ser uma a alternativa ao desemprego, seguido, de ser uma fonte complementar de renda. Dentre os empreendimentos encontrados no municípios, foram escolhidos três, como etapa de campo do projeto de extensão, para identificar in loco alguns aspectos, O Coeficiente de Gini consiste em um número entre 0 e 1, onde 0 corresponde à completa igualdade (no caso do rendimento, por exemplo, toda a população recebe o mesmo salário) e 1 corresponde à completa desigualdade (onde uma pessoa recebe todo o rendimento e as demais nada recebem). Página 29 175 como demostrado na tabela a seguir: Tabela 1- Aspecto da economia solidária em Arapiraca-AL Variáveis de Estudo Nome da Organização Área de Atuação Público Meta Ano da Fundação Número de colaboradores Origem dos recursos para manutenção Situação da Organização Onde de localiza Urbana ou Rural Categoria social e Econômica Classificação Escolaridade do Líder Comunidade que Representa Motivo da Criação Forma de Organização Principais Dificuldades Empreendimento A Empreendimento B Empreendimento C Andorinhas Amplo Bolos Doce Arapiraca Produção e comercialização de doces Produção e comercialização de bolos e doces Produção de doces diversos Geral Geral Geral 2014 2011 2009 10 6 Próprio Próprio Próprio Funcionando Funcionando Funcionando Baixa da Hora Baixa da Onça Bálsamo Rural Rural Rural e urbano Agricultores e Aposentados Agricultores e Aposentados Mulheres agricultoras Produção Produção Produção Ensino Fundamental Ensino Superior (Pedagogia) Ensino Fundamental Rural Rural Rural Oportunidade de Negócio e complemento de renda Oportunidade de Negócio e complemento de renda Oportunidade de Negócio e complemento de renda Associação Associação Associação Estrutura do Local e falta de recursos para compra de novas máquinas Falta de recursos para compra de máquinas e escoamento da produção Dificuldades em conseguir crédito (empréstimos) 10 Fonte: Os autores - Entrevista de mapeamento único idealizador que pode ser apontado como o “Pai” dessa iniciativa, mas sim da necessidade de uma resposta aos meios de exploração abusivos praticados pelo sistema Página Sabendo-se que economia solidária não nasceu de um decreto de lei ou de um 176 Considerações Finais capitalista de produção e da necessidade que o ser humano tem de conviver em cooperação, a partir de princípios como igualdade, democracia e respeito mútuo, os empreendimentos solidários, para além de uma mera fonte extra de renda vem se consolidando como um diferencial no enfrentametno das desiguadades socioeconômicas, não apenas de Arapiraca, mas também do país. Cada vez mais se faz necessário iniciativas que fomentem a cultura solidária-empreendedora afim promover o desenvolvimento sustentável e igualitário. Um dos aspectos mais satisfatório nesse tipo de empreendimento é a possibilidade de todos os integrantes participarem dos processos decisórios, o que gera um alto grau de realização e de sensação de pertencimento ao grupo, elevando dessa forma a autoestima. Não se restringindo apenas ao Governo, Instituições e Agências de fomento ao desenvolvimento, a responsabilidade de incentivar essa cultura solidária, a sociedade como um todo deve agir em prol dessa causa, por meio de atitudes simples como: Comprar produtos de empreendimentos solidários, se associar algum ou apoiar a criação de um novo, participar de fóruns e feiras de economia solidária, dentre outros. Por fim, a partir do presente artigo pode-se abrir outras frentes de estudo, a exemplo da qualidade de vida no trabalho em empreendimentos solidários, grau de incentivo governamental em empreendimentos solidários, indicadores socioeconômicos desses empreendimentos. Página Agência Embrapa de Informação Tecnológica. Disponível em: <http://www.agencia.cnptia.embrapa.br/gestor/agricultura_e_meio_ambiente/arvore/CONTAG01 _40_210200792814.html> Acesso em 5 Junho 2015. Atlas Digital da Economia Solidária. Diponível em: <http://sies.ecosol.org.br/atlas> Acesso em 29 Maio. BARBOSA, Rosangela N. de Carvalho; A economia solidária como política pública: uma tendência de geração de renda e ressignificação do trabalho no Brasil; São Paulo; Cortez; 2007. CATTANI, Antônio David. A outra economia: os conceitos essenciais. Porto Alegre: Veraz Editores, 2003, p. 9-14. CORAGGIO, J. L. Da Economia dos setores populares à economia do trabalho: entre a realidade e a utopia. 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A partir dessa percepção, desenvolveu-se um projeto de extensão que viesse tanto a potencializar a formação das estudantes do curso de Pedagogia da Uneal- CampusI, através da ênfase no processo de alfabetização de crianças com autismo atendidas no Espaço de Reabilitação e Reintegração de Crianças com Autismo – Espaço Trate, quanto ampliar as possibilidades educativas das crianças. Esse trabalho se justifica pela necessidade de contribuir para a eliminação das barreiras que impedem a efetividade da inclusão escolar dessas crianças, além de aproximar a universidade das escolas e outras instituições produzindo e conduzindo saberes visando à transformação social.Trata-se de uma pesquisa em andamento, que tem como objetivo analisar como a formação docente com ênfase na alfabetização de crianças com autismo, pode potencializar a formação do professor e, consequentemente, contribuir na efetivação da inclusão da criança com autismo na escola regular. A metodologia foi a pesquisa bibliográfica e de campo, utilizando um aporte teórico da abordagem qualitativa,utilizando para a coleta de dados entrevistas semiestruturadas com duas gestoras do Espaço Trate e quatroestudantes do curso de Pedagogia, inseridas no projeto de extensão. Os resultados mostraram que a formação com ênfase na alfabetização e inclusão de crianças com autismo, possibilita um aprofundamento teórico-prático enriquecedor e necessário para o dia-adia em sala de aula epromove a inclusão social e pedagógica das crianças com autismo. Palavras-chave: Alfabetização. Autismo. Formação docente. Introdução A cidade de Arapiraca está situada no centro geográfico do Estado de Alagoas e é considerada a principal cidade do interior, apresentando-se como importante centro comercial do agreste. Atualmente, vem se destacando entre os municípios que mais crescem e se desenvolvem economicamente no Estado. No que diz respeito à educação, a cidade desenvolve um trabalho cujo reconhecimento alcançou todo o país, e vai desde inclusão social e o atendimento de crianças com deficiência. Em 2011, foi inaugurado em Arapiraca, o Espaço de Reabilitação e Reintegração de Crianças com Autismo – Espaço Trate, primeiro espaço público para crianças com Página programas voltados ao incentivo da leitura e aprendizagem dos alunos do município, à 179 a implementação das escolas de tempo integral, ao desenvolvimento de projetos e autismo do Brasil, ligado ao Sistema Único de Saúde – SUS. De acordo com o departamento de imprensa da prefeitura (2011) o Espaço Trate possui modernas instalações, com salas climatizadas e foi construído com o apoio de um grupo de 46 empresários locais que doaram material de construção, móveis, equipamentos visuais, entre outros materiais, destinados ao trabalho dos profissionais no atendimento diário das famílias e crianças com autismo. No ano de 2013, a Secretaria Municipal de Educação e Lazer lançou o projeto “Esportes Sem Limites” com o objetivo de valorizar os jovens com deficiência através de atividades esportivas, na premissa de ter, a longo prazo, esses jovens incluídos na sociedade. Segundo a assessoria do Minuto Arapiraca (2014) o projeto inclui atividades de vôlei sentado, bocha, basquete adaptado para cadeirantes, natação, atletismo, entre outras modalidades ofertadas para o público com deficiência física e mental. Dessa maneira, percebe-se que já há alguns anos, o município de Arapiraca vem desenvolvendo ações pontuais e conjuntas com outras instituições, para atender esse público, no entanto, as ações em prol da inclusão nas escolas regulares ainda são insuficientes para promover a sua efetividade. É notório que o número de crianças com deficiência e autismo matriculadas em escolas regulares, tem aumentado consideravelmente. De acordo com dados do censo da educação básica de 2014, houve um crescimento de 4,5% entre 2012 e 2013 e em relação às crianças com autismo, no município de Arapiraca, de um total 57 escolas, 48 têm crianças com autismo matriculadas. Entretanto, observa-se que a permanência dessas crianças nas escolas tem sido prejudicada por inúmeros fatores desde a resistência familiar para contribuir com o processo educativo, já que a escola não pode caminhar sozinha, até a ausência de uma concepção inclusiva por parte do próprio professor. Diante desses desafios enfrentados para efetivar a inclusão e escolarização da criança com autismo e da percepção de que essas crianças se encontram muitas vezes à estudantes do Curso de Pedagogia do Campus I da Universidade Estadual de Alagoas, orientados pela professora da disciplina de Educação Inclusiva vêm desenvolvendo desde 2012, pesquisas com abordagem qualitativa, em escolas de educação básica das redes Página sanar as dificuldades que estão postas na concretização desse processo. Nessa perspectiva, 180 margem do processo educativo, surge a necessidade de implementar ações que visem pública e privada do município de Arapiraca e outros municípios do estado de Alagoas. Através dos resultados obtidos, é possível evidenciar que os aspectos que dificultam a efetividade da inclusão e escolarização são decorrentes principalmente das lacunas existentes na formação docente, desde a formação inicial até a continuada, uma vez que o estudante, agora professor, não teve e não tem grandes oportunidades de construir um conhecimento teórico e prático favorável ao trabalho com crianças com autismo. Segundo Cunha (2013, p. 43-44): Vê-se que, na busca por respostas às questões geradas pela demanda da inclusão, no que tange às práticas docentes, os professores ainda se apoiam nas teorias tradicionais de ensino e aprendizagem, pois não há a consolidação de um arcabouço teórico específico. É visível a fragmentação formativa [...] em diferentes instâncias formadoras. Cientes disso, desenvolvemos o projeto “Formaç~o docente com ênfase na inclusão e alfabetização de crianças com autismo: diálogo entre Escola, Universidade e Trate”, quese mostra relevante, pois potencializa a formação inicial e continuada de professores, em uma época que se faz preciso novos delineamentos específicos que favoreçam a formação dos futuros e atuais docentes, contemplando a articulação metodológica e didática para a intervenção e o planejamento de ações transformadoras, voltadas também para o favorecimento da inclusão escolar, na tentativa de oferecer a atenção pedagógica adequada às necessidades de cada aluno (DENARI, 2006). O projeto beneficia, atualmente, 11 estudantes do curso de Pedagogia da Uneal do Campus I e 12 crianças atendidas no Espaço Trate com idades e níveis de aprendizagem diferenciados. Nesse projeto, a formação inicial é favorecida, na medida em que propicia fazer um contraponto entre a teoria e a prática, por meio da oportunidade de desenvolver competências e habilidades inclusivas e alfabetizadoras com crianças com autismo, atendidas no Espaço de Reabilitação e Reintegração de Crianças com Autismo, localizado no município de Arapiraca – AL. O desenvolvimento de ações voltadas para a alfabetização dessas crianças se faz necessário, pois como é de conhecimento coletivo somente a inserção das mesmas nas escolas regulares não é muito mais para a criança com esse diagnóstico. Página alfabetização representa uma enorme conquista na vida de qualquer ser humano e 181 suficiente para garantir o aprendizado. Para Moreira; Dias (2009) a possibilidade de Já a formação continuada será beneficiada, uma vez que seu objetivo é desenvolver ações formativas voltadas para o processo de escolarização de crianças com autismo que venham a contribuir para que esses professores, tanto da rede pública quanto da privada, nas quais os alunos do Trate estão matriculados, possam através de ações direcionadas, alcançar melhorias em sua própria formação, eliminar as barreiras que dificultam e até mesmo impedem o acesso, a permanência e o sucesso das pessoas com deficiência na escola regular. A formação continuada constitui-se como imprescindível, pois de acordo com Cunha (2014), a grande maioria dos professores atuantes em sala de aula, provavelmente, ainda está condicionada à práticas de ensino provenientes das tendências pedagógicas que foram incorporadas ao senso comum, em razão do modelo que predominou na educação por muitos anos, de modo que essa maneira de ensinar, transmitida de geração em geração, não dá mais conta da diversidade que há nas salas de aula. A proposta apresenta duas vertentes, a primeira que já se encontra em andamento, visa por meio de ações dos estudantes da graduação de pedagogia contribuir na ampliação das possibilidades de aprendizagem dessas crianças quando inseridas na escola regular e a segunda que ainda será iniciada, objetiva contribuir na formação continuada, uma vez que o estudante extensionista estará desenvolvendo um trabalho interventivo nas escolas com ênfase no desenvolvimento de práticas inclusivas. Desse modo, para alcançar a transformação social desejada com o projeto, serão realizadas: aulas de reforço e/ou alfabetização para alunos com autismo, grupos de estudos com os licenciandos, formação continuada com suporte teórico e prático para professores, coordenadores e diretores, palestras para os pais dos alunos, pesquisa e elaboração de artigos científicos. Essa é uma pesquisa em andamento,que apresenta a proposta de um projeto de extensão e tem como objetivo, analisar de que maneira a formação docente com ênfase na alfabetização de crianças com autismo, pode potencializar a formação do professor e, consequentemente, contribuir na efetivação da inclusão da criança com não só bibliográfica, mas também de campo, utilizando um aporte teórico da abordagem qualitativa. A abordagem qualitativapermite ao pesquisador ver os fenômenos sociais Página Assim, para alcançar o objetivo propostonessa pesquisa, optamos pela pesquisa 182 autismo na escola regular. holisticamente. Isso explica por que estudos de pesquisa qualitativa aparecem como visões amplas em vez de microanálises. Quanto mais complexa, interativa e abrangente a narrativa, melhor o estudo qualitativo. Os modelos gráficos multifacetados de um processo ou de um fenômeno central ajudam a estabelecer esse quadro holístico (CRESWEL, 2007, p.187). Gibbs (2008) corrobora dizendo que esse tipo de pesquisa visa a abordar “o mundo lá fora” (e não em contextos especializados de pesquisa, por exemplo, os laboratórios) e entender, descrever, e às vezes, explicar os fenômenos sociais “de dentro” de diversas maneiras diferentes: Analisando experiências de indivíduos ou grupos. As experiências podem estar relacionadas a histórias bibliográficas ou a práticas (cotidianas ou profissionais), e podem ser tratadas analisando-se o conhecimento, relatos e histórias do dia-a-dia. Examinando interações e comunicações que estejam se desenvolvendo e Investigando documentos. O instrumento de coleta de dados foram as entrevistassemiestruturadas, realizadas com as duas gestoras responsáveis pelo Espaço Trate, e quatro estudantes do curso de Pedagogia participantes do projeto de extensão. A escolha por essa técnica se deu, pois ela garante uma melhor amostra de resultados, uma vez que os entrevistados ficamlivres para emitir suas opiniões sobre os questionamentos que foram previamente estruturados pelo entrevistador. Segundo Flick (2012, p. 114-115) as entrevistas semiestruturadas, são baseadas em um guia da entrevista que apresentam algumas vezes, diferentes tipos de perguntas a serem respondidas, com maior ou menor grau de abertura e extensão, com o objetivo de obter visões individuais dos entrevistados sobre um tema. Os roteiros das entrevistas foram elaborados e aplicados, para que pudéssemos através das falas, analisar qual oponto de vista das entrevistadas acerca de como a formação docente com ênfase na alfabetização de crianças com autismo pode As entrevistas foram gravadas, transcritas e posteriormente analisadas e dividas por segmentos. De acordo com Creswell (2007, p.146) a an|lise dos dados “envolve a organização dos dados, a realização de uma leitura preliminar da base de dados, a Página inclusão da criança com autismo na escola regular. 183 potencializar a formação do professor e consequentemente, contribuir na efetivação da codificação e organização dos temas, a representação dos dados e a formulação de uma interpretaç~odeles.” Iniciamos o desenvolvimento da pesquisa, abordando informações essenciais sobre a temática da inclusão, desde o seu nascimento para contrapor o paradigma da exclusão, perpassando a Declaração de Salamanca, cuja resolução foi imprescindível para fundamentar a garantia dos direitos da pessoa com deficiência. Nessa etapa, também apresentamos os benefícios que a inclusão traz para o desenvolvimento das crianças em todos os seus aspectos, desde o social ao de aprendizagem e reforçamos a necessidade de investimento na formação docente, seja ela inicial e/ou continuada, na premissa de que através do aprofundamento teórico e prático, contribuímos na ampliação das possibilidades de inclusão e alfabetização das crianças com autismo nas escolas de ensino regular. Dando continuidade apresentamos os resultados parciais obtidos através das entrevistas, nos quais evidenciamos que a formação com ênfase na alfabetização e inclusão de crianças com autismo, possibilitam um aprofundamento teórico-prático enriquecedor e necessário para o dia-a-dia em sala de aula e que ampliam as possibilidades de promover a inclusão social e pedagógica de crianças com autismo, uma vez que as estudantes inseridas no projeto estudam, planejam e desenvolvem atividades respeitando o nível de aprendizagem e necessidade das crianças, bem como avaliam os resultados positivos e negativos de cada ação realizada. Por fim, apresentamos a conclusão da pesquisa realizada, mostrando a importância do desenvolvimento de estratégias que venham preencher as lacunas existentes nos cursos de formação, dentre elas, as ações de extensão e a necessidade da contribuição da Universidade frente ao processo de inclusão. Desenvolvimento A educação é feita de paradigmas, ou seja, modos de conceber e compreender contrapor ao paradigma da exclusão escolar, em que alguns alunos eram segregados da escola regular por apresentarem características diferentes das esperadas pela instituição escolar. Nesta perspectiva, a escola regular deve estar apta para receber todos os Página defende a escola regular como espaço educacional de todos os alunos. Nasceu para se 184 a realidade. Atualmente, o mais novo paradigma educacional é a inclusão escolar, que alunos, independente das características que possam apresentar. Ela é o espaço educacional que deve ser usufruído por todos. Os alunos não devem mais ficar “fora da escola” e mais do que isso, não devem mais ser segregados em espaços escolares diferenciados ou mesmo excluídos dentro da classe comum (VELTRONE; MENDES, 2007). Entretanto, é preciso ter cuidado para que as escolas não apenas incluam os alunos com deficiência e sim que ofereça também um ensino que possibilite a aprendizagem dos mesmos. A Declaração de Salamanca, documento que trata sobre o princípio da educação inclusiva, estabelece que a escola deve atender a todas as necessidades educativas dos alunos (BRASIL, 1994). A inclusão de alunos com deficiência, principalmente de alunos com autismo, nos espaços de educação formal e regular, está cada vez acontecendo haja vista as implicações positivas que esse processo exerce no desenvolvimento dos mesmos, não apenas no que se refere ao progresso da aprendizagem, como também aos avanços nas relações de convívio social. Sobre a inclusão, Mantoan (2006, p. 18) destaca que “[...] temos de considerar as suas desigualdades naturais e sociais, e só essas últimas podem e devem ser eliminadas. Se a igualdade traz problemas, as diferenças podem trazer muito mais! ” Em vista disso, compreendemos que a pluralidade faz parte do contexto escolar como um todo, e que a inclusão ressalta mais ainda esse fato. Contudo, praticar a inclusão e conseguir promover a alfabetização dealunos com autismo nas escolas regulares não é algo de fácil execução, tendo em vista, principalmente a magnitude desse transtorno global do desenvolvimento. Segundo Cunha (2014, p.19): O autismo pode surgir nos primeiros meses aparentes por volta dos três anos. Percebe-se emocionais e de comunicação, além da falta de bastante limitada, as expressões gestuais são simbólico a eles. de vida, mas, em geral, os sintomas tornam-se na criança o uso insatisfatório de sinais sociais, reciprocidade afetiva. A comunicação não verbal é inexistentes, porque a criança não atribui valor comunicação e comportamento. Essas áreas de comprometimento, são amplamente utilizadas no modelo tradicional de alfabetização, e é por este motivo que não atendem na Página de uma tríade, na qual se encontram as falhas nas habilidades de interação social, 185 De uma forma geral, as características do autismo podem ser delineadas através maioria das vezes, as especificidades das crianças com autismo, tendo em vista que elas geralmente não respondem aos mesmos estímulos que as crianças neurotípicas. Na concepção de Reis (2012) as palavras representam objetos, isso é símbolo e antes de simbolizar é preciso observar, direcionar o interesse, vivenciar, guardar na memória, agrupar categorias, depois selecionar para expressar de forma adequada o que se pensa.Para ler a criança tem que ter ritmo, saber que uma palavra se compõe de letras transformadas em som e que um som vem antes do outro. Tem que saber sequenciar e dominar outros tantos conhecimentos. Para escrever é preciso desenvolvimento motor, tônus muscular adequado, coordenação e para ambos é necessário saber imitar e se apropriar de forma adequada daquilo que se imita, mas é preciso também ter consciência corporal, definir lateralidade, entre outros, ou seja, precisa ter uma série de pré-requisitos que na maioria dos casos são inexistentes em crianças com autismo. Nesse sentido, não é possível alfabetizar a criança com autismo sem antes quebrar os preceitos de que a criança tem que se adaptar a esse modelo que se faz presente nas escolas. A maior resistência dos professores com relação ainclusão, se dá especialmente, porqueela traz novos desafios e exigências, dentre elas a de reestruturação do fazer pedagógico, ou seja, leva o professor a ter que aprender novas formas de alfabetizar e conduzir o ensino, atendendo as principais necessidades da criança. Conforme Almeida (2008),a leitura e a escrita são processos cognitivos que são desencadeados e elaborados em um ambiente socialmente favorável. Assim, quanto mais características alfabetizadoras tiver o ambiente, mais possibilidades o aluno terá de acessar e absorver toda a dinâmica dos processos. É claro que, na questão que envolve as características do ambiente deve-se prevalecer o bom senso, uma vez que as crianças com autismo podem apresentar o transtorno do processamento sensorial, ou seja, maior ou menor sensibilidade aos estímulos, sejam eles visuais ou sonoros. grupos: Adaptações Metodológicas e Adaptações Didáticas, que consistem nos seguintes procedimentos: situar os alunos nos grupos com quais possam trabalhar melhor; adotar métodos e técnicas de ensino- Página tanto nas adaptações estruturais, quanto curriculares, estas por sua vez, feitas em dois 186 Assim, para que seja possível construir um ambiente inclusivo, se faz necessário pensar aprendizagemespecificas para o aluno na operacionalização dos conteúdos curriculares e sem prejuízo para as atividades docentes; utilizar técnicas, procedimentos e instrumentos de avaliação da classe quando necessários, isso sem alterar os objetivos da avaliação nem seu conteúdo; propiciar apoio físico, visual, verbal e gestual ao aluno impedido temporária ou permanentemente em suas capacidades, de modo a permitir a realização das atividades escolares; [...] eliminar atividades que não beneficiam o aluno ou restrinjam sua participação ativa e real ou, ainda, as que ele esteja impossibilitado de executar [...] (FIQUEIRA, 2011, p. 86-87). Para iniciar o processo de alfabetização, é preciso compreender de antemão, a escola como um todo, e fazer uma reflexão acerca da inclusão, tanto das concepções, quanto das práticasque precisam ser desenvolvidas em prol da construção desse processo, seja no que diz respeito ao currículo escolar ou sobre a formação docente. No tocante à reflexão curricular frente à inclusão escolar, Alves (2014, p. 29) aponta as seguintes questões: O que o aluno precisa primordialmente? O que é mais importante ensinar? São questões que necessitam ser respondidas para o início da organização curricular, não com base em nossos conhecimentos, mas a partir das carências do educando, em seus aspectos afetivos, sociais e pedagógicos. Reis (2012) afirma que o que uma criança típica aprende e desenvolve naturalmente, a criança com autismo precisa ser orientada com persistência para fazer. Por isso é preciso pensar em desenvolver tudo o que está imaturo, trabalhar muito mais seleção, classificação, consciência corporal, orientação espacial, coordenação viso-motora, ordenação temporal, sequência lógica. Tudo de forma adequada àquele sujeito. Geralmente as técnicas comportamentais dão muito resultado. Isso significa estruturar o que será ensinado com uma rotina visual, elogiando muito os acertos, ignorando os comportamentos inadequados. Ao considerar as especificidades do autismo, a alfabetização desses alunos precisa ser pautada em suas necessidades. A proposta curricular deve almejar, dentre outras coisas, o desenvolvimento da atenção, coordenação motora grossa e fina, interação social e aprendizagem dos mesmos. A dificuldade na interação social, por parte das das mesmas. De acordo com Silva (2011, p. 30): No que diz respeito à dificuldade nas interações sociais, percebe-se por parte das pessoas com autismo, uma dificuldade em estabelecer relações interpessoais, nota-se algumas vezes uma falta de Página tida como um dos fatores que agrega maior dificuldade na efetivação da inclusão escolar 187 pessoas com autismo em relação às demais pessoas e ao meio no qual estão inseridas é reação e interesse pelas outras pessoas, tais dificuldades são percebidas desde os primeiros anos de vida. Entretanto, cabe ressaltar que quando as crianças com autismo são trabalhadas em um ambiente repleto de pluralidade, que por sua vez é uma característica inerente as salas de ensino regular, as dificuldades de socialização podem ser aos poucos diminuídas. Além disso, tendo em vista a dimensão da importância e dos desafios na prática da inclusão e alfabetização de alunos com autismo, compreende-se que o desenvolvimento de tal processo não ocorre de um modo instantâneo, ao contrário, se dá de uma maneira gradativa e tem maior possibilidade de sucesso quando as instituições escolares e o grupo familiar possuem uma mesma perspectiva e tornam-se parceiras nesse processo. Seguindo esse pensamento, para garantir que a inclusão escolar aconteça Freitas (2006) afirma que para efetivar a inclusão é preciso, portanto, transformar a escola regular em sua estrutura organizativa, começando por desconstruir práticas segregacionistas, o que implica questionar concepções e valores, abandonando modelos que descriminam pessoas com deficiência ou qualquer aluno. Entendida dessa forma, a inclusão significa um avanço educacional com importantes repercussões políticas e sociais, visto que não se trata de adequar, mas de transformar a realidade das práticas educacionais em função de um valor universal que é o do desenvolvimento do ser humano. E para que essa transformação ocorra é preciso investimento na formação dos professores. A formação tem que ser vista como um dos fatores essenciais para a garantia de um ambiente escolar inclusivo e propício a escolarizaçãodosalunos com deficiência, já que ela fundamenta a postura dos professores diante dos desafios pertencentes nas salas de aula, orientando suas práticas. Desse modo, a formação docente se mostra extremamente importante e necessária, seja inicial ou continuada. Silva (2009) aborda que na formação inicial dos profissionais para diversidade do ambiente educacional, deve ser realizada deste cedo, ainda em sua fase acadêmica, acostumados. Todavia, há uma lacuna na formação inicial dos docentes que não os possibilita para as práticas inclusivas, e esse fato compromete de um modo significativo, tanto seu desempenho profissional, quanto o rendimento dos alunos. Página especial aqueles que não se enquadram no modelo educacional histórico a que estamos 188 sendo preparado para as dificuldades como planificar, gerir e avaliar seus alunos, em O atual e grande desafio posto para os cursos de formação de professores é o de produzir conhecimentos que possam desencadear novas atitudes que permitam a compreensão de situações complexas de ensino, para que os professores consigam desempenhar de maneira responsável e satisfatória o seu papel de ensinar e aprender para a diversidade (PLETSCH, 2009). Diante desses desafios, os docentes do ensino regular, de um modo especifico, precisam de uma variedade de formação continuada que consiga atender as necessidades que os alunos com deficiência ou algum transtorno, como é o caso do autismo apresentam. Para Mantoan (2009) os professores do ensino regular consideramse incompetentes para lidar com as diferenças em sala de aula, especialmente para atender os alunos com deficiência, pois seus colegas especializados sempre se distinguiram por realizar apenas esse atendimento e exageraram essa capacidade de fazê-lo aos olhos de todos. Essa realidade ressalta, ainda mais, a importância da formação inicial e continuada como um suporte no desenvolvimento de práticas inclusivas, tendo em vista que alunos com autismo exigem de seus professores, criatividade, atenção e adaptação das atividades desenvolvidas em sala de aula, bem como um olhar diferenciado no intuito de compreender as suas variações de comportamento e reações ao que lhe é apresentado. Um elemento que tem que ser considerado também, quando falamos da formação de professores para o respeito à diversidade encontrada na sala de aula, diz respeito ao que Balbino (2010, p.89) coloca: [...] é necessário considerar que a formação dos profissionais da educação, mais especificamente de professores, também recebe influências das mudanças ocorridas na sociedade, no mundo do trabalho e na economia do país. Sendo assim, esta formação também acompanha a educação inclusiva que é fruto da mudança de concepção de sociedade, do avanço das políticas públicas e dos movimentos sociais que pressionam o Estado na consolidação dos direitos da pessoa com deficiência que são sujeitos sociais. Por isso que essa formação deve contemplar diferentes formas de estudo e crítica sobre os processos políticos e educacionais é a função principal dos cursos que formam professores (ALMEIDA, 2005). Página ao futuro professor formação com embasamento teórico e capacidade de reflexão 189 conteúdo, de acordo com a realidade social e econômica da região e do país. Proporcionar Assim, esta formação será mais efetiva a partir da relação colaboradora entre o sistema educacional, a universidade, os serviços sociais disponíveis em cada comunidade, a administração educacional em todas as suas instâncias, e o setor privado, transformando o sistema educacional em um marco de desenvolvimento de práticas pedagógicas e investigação de sua ação. Para tanto, há que se fomentar a colaboração entre o ensino público e os programas de formação universitária (DENARI, 2006). No entanto, vale lembrar que: A formação do professor não se constrói por acumulação (de cursos, de conhecimentos ou de técnicas), mas sim através de um trabalho de reflexibilidade crítica sobre as práticas e de (re) construção permanente de uma identidade pessoal. Por isso é tão importante investir na pessoa e dar um estatuto ao saber da experiência (NÓVOA, 1995, p.25). Resultados A formação docente com ênfase na alfabetizaçãoe inclusão de crianças com autismo é o eixo dessa pesquisa, em andamento, oriunda de um projeto de extensão e os resultados parciais desse estudo serão apresentados a partir do que dizem as estudantes do curso de Pedagogia da Uneal e as gestoras no Espaço de Reabilitação e Reintegração de Crianças com Autismo. Inicialmente serão analisadas as entrevistas realizadas com as estudantes que estão em diferentes períodos do curso de pedagogia e aqui identificadas como Sandra, Teresa, Carine e Bianca. Assim, partindo do objetivo que foi elaborado para a pesquisa a análise segue as seguintes temáticas:contribuição que a experiência está trazendo para a formação inicial; estratégias pedagógicas utilizadas como suporte para o processo de alfabetização; nível de alfabetização das crianças atendidas pelo projeto e a avaliação da aprendizagem e por fim as contribuições da Universidade na formação dos professores frente ao acolhimento e a aprendizagem das crianças com autismo no contexto escolar. A primeira temática trata das contribuições que a experiência nesse projeto Bem, na prática eu pude perceber o quanto a teoria da disciplina de inclusão está sendo levada a sério. Porque antes a gente pensava que a teoria não ia se encaixar com a prática, mas hoje eu posso ver que a teoria se encaixa com a prática e, sendo assim, tenho a necessidade de me preparar cada vez mais (SANDRA, 2015) 190 Muitas e principalmente na qualidade de minha formação, por ser uma área que eu gosto muito e onde procuro pesquisar cada vez mais sobre o tema (TERESA, 2015). Página está trazendo para a formação inicial das estudantes. Asrespostas foram: Eu busco o máximo obter melhores resultados [...], não pretendo concluir meu curso e já ir atuar, mas sim ir além e buscar o que há de melhor para a minha profissionalização. Com isso, vejo que é essencial essa experiência tanto para o meu conhecimento pessoal, como profissional (VITÓRIA, 2015). São várias as contribuições, pois uma experiência como essa irei levar para o resto de minha vida. Por ter sido a primeira na minha trajetória acadêmica e por ser na área que a cada dia tenho mais amor, vontade em trabalhar. [...] (BEATRIZ, 2015) Nota-se que as estudantes compreendem a influência positiva que o projeto traz para a formação inicial de cada uma, ressaltando a oportunidade de articulação entre teoria e prática, além das ricas possibilidades de aprendizagem que encontram no decorrer das ações. Também é importante destacar, que as graduandas fazem parte desse projeto concluíram o curso com um perfil profissional diferenciado, voltado à consolidação dos conhecimentos práticos a respeito da aprendizagem de alunos com autismo. Nesse sentido esse projeto vem auxiliar a escola, pois na opinião de Rodrigues (2012, p.70) “enquanto construímos a escola que queremos, precisamos lançarmão dos diferentes recursos existentes para atendermos, da melhorforma possível, as crianças que chegam especialmente às nossas escolasinfantis.” A segunda temática aborda as estratégias pedagógicas utilizadas como suporte para o processo de alfabetização, as entrevistadas relataram o seguinte: Jogos, alfabeto móvel, a brincadeira que ele mais gosta, personagens, vou vendo a habilidade que ele tem em cada processo e daí então exploro cada vez mais (SANDRA, 2015) Utilizo jogos didáticos e atividades (TERESA, 2015). Em todos os encontros eu uso atividades de livros didáticos, seguidos por jogos que tenham ambos o mesmo objetivo. Utilizo jogos, fantoches junto de histórias contadas para que ele se interesse mais, alfabeto e números móveis, atividades feitas de emborrachados, enfim, faço o mais lúdico possível, porém sempre abordando algum objetivo específico (VITÓRIA, 2015). contato entre professor e aluno, além disso, é uma excelente oportunidade de estimular a atenção e aprendizagem das crianças com autismo. Conforme Cunha (2014, p. 92) falar de forma serena, explicita, nomeando objetos a atividades, buscando cativar a atenção, Página A utilização de materiais pedagógicos alternativos e lúdicos favorece o 191 [...] busquei estratégias e atividades para tentar explorar e melhorar o conhecimento dele a partir do que ele já tinha um pouco de conhecimento, que era o alfabeto e os números até 50, porém com o passar dos encontros percebi bastantes dificuldades, mesmo ele conhecendo todo alfabeto. Procuro sempre trabalhar a questão do nome dele, pois ele tem a dificuldade na leitura, levo atividades planejadas e uso como suporte os alfabetos móveis disponibilizados lá no espaço (BEATRIZ, 2015) olhando sempre nos olhos do aluno são ações que estimulam seu desenvolvimento e fortalecem sua aprendizagem. A terceira temática ainda trata da alfabetização, questionamos as estudantes acerca do nível de alfabetização do aluno que atendem e sobre a forma como cada uma costuma avaliar a aprendizagem dos mesmos. Os depoimentos revelaram que: O nível dele é silábico alfabético, é um aluno muito interessado, todas as atividades que eu proponho ele chega junto, faz, às vezes me surpreende, porque às vezes eu não ia até certo nível e ele me instiga a ir até o outro nível. Ele é bastante inteligente! E como eu costumo avaliá-lo de uma forma a ver se ele realmente chegou até o limite da atividade, [...], vendo até onde pode chegar e ele me supera bastante (SANDRA, 2015) [...] Ele é uma pessoa basicamente alfabetizado, sabe lê, sabe escrever, sabe contar e eu costumo avaliá-lo a partir basicamente do que ele já sabe e tentar fazer com que aprenda os principais pontos onde têm dificuldades (TERESA, 2015). Ele é alfabetizado. Sabe ler corretamente, inclusive sílabas complexas, escrever, contar, inclusive na casa dos milhares, enfim o que basta que ele desenvolva é a interpretação. (VITÓRIA, 2015). Acredito que [...] ainda não esteja totalmente alfabetizado, por ele conhecer apenas o alfabeto e fazer seu nome. Costumo avaliá-lo através das atividades propostas e a partir disso vejo que até mesmo o seu nome ele tem dificuldade na leitura, é como se ele tivesse gravado as letras que compõe o nome completo e na hora da leitura ele sai lendo letra por letra (BEATRIZ, 2015). As crianças assistidas pelas estudantes entrevistadas encontram-se em diferentes níveis do processo de alfabetização. Fator esse que as instiga a observá-los e propor atividades que incentivem o desenvolvimento dos alunos de acordo com a necessidade e desenvolvimento dos mesmos. Normalmente, a concentração para atividades pedagógicas é pequena. Mas, ainda que seja exíguo o tempo de atenção, a perseverança em repeti-lo de maneira lúdica e agradável, produzirá resultados. O aluno carece de uma educação individualizada, com ênfase na mudança de alguns e aprendizado de outros. (CUNHA, 2014). Assim, o processo de aprendizagem e alfabetização de alunos com autismo não é algo imediato, requer por parte de quem ensina uma diversificação metodológica capaz de atender as necessidades destes. Por fim, as contribuições da Universidade na formação dos professores frente ao Tivesse mais disciplinas de inclusão ou que a própria disciplina daqui da instituição abrangesse mais, tivesse estágio, que não [...]. A carga horária que aumentasse ou estágio obrigatório, coisa do tipo acho que seria bastante proveitoso (SANDRA, 2015). Página estudantes falaram que: 192 acolhimento e a aprendizagem das crianças com autismo no contexto escolar, as Buscar mais a qualificação, eu acho que precisa mais de disciplinas que sejam voltadas para esse tema, não só para esse como para outros, porque a gente como futuras professoras, irá passar muito por esse processo e tem que ter essa qualificação (TERESA, 2015). Podem e deveriam fazer muito mais! Apenas um período de disciplina Educação Inclusiva é pouquíssimo para te dar suporte para que seja aplicado na prática. Seria necessário mais carga horária na disciplina, estágios para que o aluno lidasse desde a sua formação, além de estímulos vindos da IES, como: Palestras, Simpósios e Congressos (VITÓRIA, 2015). Acredito que de início deveriam aumentar a carga horária da disciplina de Educação Inclusiva e visar à necessidade de disciplinas como está em todas as licenciaturas, pensando também nas possibilidades de cursos de férias ou especializações específicas na área para trabalhar com alunos com autismo e até mesmo com as demais deficiências (BEATRIZ, 2015). Há, por parte das entrevistadas, o esclarecimento de que as instituições de ensino superior responsáveis pela formação de profissionais da educação precisam aderir às necessidades do mercado de trabalho, pois mesmo que não haja o investimento necessário no processo formativo dos professores, os alunos que apresentam deficiência ou transtornos no seu desenvolvimento também compõem as salas de aula do ensino regular, exigindo dos educadores o conhecimento técnico que possa possibilitar sua inclusão e mediação da aprendizagem. É necessário incluir entre as matérias que devem ser cursadas, conteúdos relativos ao modelo de educação inclusiva- tanto teoria como prática- e a como dar respostas à diversidade. Também deve ser objeto de estudo as experiências de colaboração, a pesquisa e a reflexão. Isso deve ser aprendido de forma ativa, assumindo a construção de conhecimento por partes dos estudantes (DÍEZ, 2010). As IES precisam pensar a formação inicial, considerando entre outros aspectos o contexto dealargamento do papel social da escola e da função docente, precisa enfrentar o desafio dasuperação do conteudismo e do tecnicismo que marcaram os currículos dos cursos delicenciatura e se aproximar das atuais perspectivas de ensino e aprendizagem que permeiam a prática docente (MESQUITA, 2007). Em seguida destacam-se os relatos das psicólogas Fernanda e Raquel gestoras do Espaço Trate, instituição parceira nesse projeto,que desempenham um papel de crianças, motivação, expectativas e primeiras impressões sobre as ações desenvolvidas no projeto. Página discussãoas seguintes temáticas: critérios utilizados para selecionar as 193 grande relevância no acompanhamento das crianças com autismo. Serão colocadas em A princípio, perguntamos quais foram os critérios utilizados para selecionar as crianças que participariam do projeto, e os relatos foram os seguintes: A equipe interdisciplinar selecionou crianças que já conseguiam atender a comandos simples, e que conseguem ficar por algum tempo com o comportamento mais adequado para um ambiente escolar (FERNANDA, 2015). As crianças foram selecionadas pelas terapeutas que as acompanham, vários fatores foram levados em consideração, tais como: atenção e concentração da criança; interesse pelas atividades escolares; nível de atividade na média (conseguir manter-se sentado e executar algumas atividades); obedecer a comandos e seguir algumas regras, entre outros fatores (RAQUEL, 2015). Compreendemos, desse modo, que o processo de desenvolvimento das crianças com autismo é algo contínuo e também dependente de estímulos sociais, por meio do acompanhamento com profissionais de áreas divergentes, mas com o objetivo em comum, que é contribuir para o alcance da independência máxima, de acordo com as particularidades de cada criança. Assim, à medida que elas respondem positivamente, vão adquirindo também condições de receberem outros estímulos, como no caso das que são atendidas pelo Espaço Trate e fazem parte do projeto. Questionamos ainda, a respeito do que as motivaram a pensar no desenvolvimento de um projeto na área da educação, especificamente voltado à alfabetização das crianças com autismo, e obtivemos as seguintes respostas, com base nas experiências das entrevistadas: Devido às várias e constantes dificuldades relatadas por pais Transtorno do Espectro Autista (FERNANDA, 2015). e professores de crianças com As constantes queixas das famílias no processo de alfabetização e reforçar o papel da educação no processo de reabilitação(RAQUEL, 2015). Há, por parte dos pais e professores, muita inquietação acerca do desenvolvimento da aprendizagem escolar das pessoas com autismo, já que as particularidades que elas apresentam, somadas muitas vezes ao despreparo profissional dos educadores com relação ao assunto, acaba interferindo no rendimento das mesmas. A esse respeito, Montoan (2009, p. 17) afirma que “os professores [...] pode ser atribuído a uma formação profissional que não contempla as exigências do campo de atuação docente. Página especificamente para atender os alunos com deficiência.” Tal fator, na maioria dos casos, 194 consideram-se incompetentes para lidar com as diferenças em sala de aula, Com relação as expectativas que elas possuem acerca do desenvolvimento do projeto, temos que: Pretendemos auxiliar o processo de educação de crianças com Transtorno do Espectro Autista e ajudar a formar pedagogos mais preparados para lidar com as várias características do Transtorno (FERNANDA, 2015). Promover a maior integração entre a teoria e a prática dos alunos, permitindo que os acadêmicos possam compreender melhor o Transtorno do Espectro Autista, e juntamente com a universidade lutem por propostas educacionais que respeitem a capacidade de cada aluno. Reforçar que não é a criança que se adapta à escola, mas a escola que para recebê-la deve se transformar (RAQUEL, 2015). Percebe-se que as expectativas são positivas, e que o fato das estudantes estarem em contato com os conhecimentos teóricos adquiridos na graduação, contribui para isso. Dessa maneira, a formação profissional docente uma vez que, notavelmente, influenciam no processo de ensino e aprendizagem das pessoas com deficiência ou qualquer outro transtorno por considerar a multiplicidade, a subjetividade e as diferenças dos sujeitos (SILVA, 2014). No que diz respeito às primeiras impressões que elas têm com relação as ações que estão sendo desenvolvidas, as entrevistadas nos informaram: Os benefícios já estão sendo colhidos, alguns relatos de pais afirmam que crianças estão demonstrando mais interesse nas atividades da escola. O investimento feito no aluno do projeto faz com que a escola procure respostas e adequações para aquele aluno. E o carinho que os responsáveis pelo projeto vêm apresentando no desenvolvimento do mesmo (FERNANDA, 2015). São alunas empenhadas, que vêm desenvolvendo um trabalho diferenciado. Percebo também, a satisfação das famílias de participar do projeto (RAQUEL, 2015). A percepção e satisfação das famílias das crianças com relação ao desenvolvimento do projeto, dentre outros pontos importantes, é citado nos relatos, chamando a atenção para a relevância que a parceria entre família e profissionais da educação exerce sobre as crianças, contribuindo para o melhor rendimento delas. De acordo com Voivodic (2013) é notório a grande importância de incluir a família no processo educacional e terapêutico da criança. suas famílias e os demais profissionais que estão inseridos no projeto. Página beneficiando todas as pessoas envolvidas, as graduandas, os alunos com autismo e 195 Na verdade, a partir do que foi exposto, ficou evidente que o projeto está Conclusão As pesquisas realizadas em torno da temática do autismo e da inclusão escolar, mostram que cada vez mais que as lacunas na formação docente têm estreita ligação com as dificuldades em implementar e efetivar a inclusão e alfabetização de crianças com autismo. Nesse sentido, compreende-se a necessidade de complementar a formação docente com ações de extensão, para que os futuros professores possam aliar conhecimentos teóricos e práticos acerca da temática, construindo um aprendizado mais significativo, que lhe possibilitem desenvolver um ambiente inclusivo na sala de aula regular, com os requisitos básicos para promover a permanência da criança com autismo na escola, garantindo não só a sua socialização, mas a aprendizagem que lhe for necessária. Através dessa pesquisa em andamento, é evidente a importância desse projeto tanto para as crianças participantes, quanto para as estudantes do curso de pedagogia que estão desenvolvendo as ações de alfabetização. Por meio das entrevistas realizadas com as estudantes inseridas no projeto, constata-se que elas acreditam que a formação docente com ênfase na inclusão e alfabetização de crianças com autismo, possibilita a compreensão de que a teoria e a prática devem caminhar juntas, de modo que o que é estudado acerca da inclusão e alfabetização dessas crianças, pode sim, ser efetivado na prática, embora, para que isso aconteça é preciso que além de infraestrutura básica, o professor passe a investir cada vez mais em conhecimento, não só teórico, mas prático. A perspectiva de dar ênfase a inclusão e alfabetização de crianças com autismo, mostra-seainda, de grande valia para a formação pessoal e acadêmica, uma vez que possibilita a vivências de novas experiências e a construção de novos conhecimentos a partir dessas experiências planejadas, concretizadas e avaliadas de cada realidade. Além disso, através das falas das participantes, ficou claro que essa formação contribui na efetivação da inclusão ao passo que as estudantes desenvolvem atividades que incentivam a interação entre professor-aluno, estimulam o Para reafirmar a importância do projeto, identifica-se nas falasdas gestoras do Trate a grande contribuição social resultante das ações de extensão, uma vez que Página suas dificuldades diárias e facilitando e reforçando o trabalho do professor. 196 desenvolvimento da aprendizagem através de métodos diferenciados, amenizando assim fortalecer o processo educativo de crianças com autismo, não somente traz benefícios para elas, mas também para seus pais e professores. Destarte, considera-se que os resultados iniciais obtidos nessa pesquisa, são importantíssimos para reafirmar a necessidade de desenvolver mais ações que privilegiem os aspectos da educação inclusiva e a universidade tem inúmeras formas de contribuir nesse processo, visto que é a responsável pela formação inicial dos professores, que estarão lidando diariamente com os desafios inerentes a sala de aula Página Referências ALMEIDA, C. E. M. Educação especial nos cursos de licenciatura das universidades de MatoGrosso do Sul. 2005. 167 f. Dissertação (Mestrado em Educação) –Universidade Católica Dom Bosco. Campo Grande, MS, 2005. ALMEIDA, G. P. de. Práticas de alfabetização e letramento. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2008. ALVES, M. D. F. Um currículo inclusivo. In: CUNHA, E. (Org.).Práticas pedagógicas para inclusão e diversidade. 4. Ed. Rio de Janeiro: Wak, 2014, p. 25-31. ASSESSORIA. Minuto Arapiraca, Arapiraca, 27 mar. 2014. "Esporte sem Limites" garante inclusão para deficientes físicos. 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NORMAS PARA SUBMISSÃO DE ARTIGOS Página DA COMPOSIÇÃO: Título (centralizado, negrito, Maiúsculo, 12); Subtítulo (centralizado logo abaixo do subtítulo, maiúsculo/minúsculo, negrito); Nome(s) do(s) Autor(res) (Centralizado logo baixo do subtítulo ou título, negrito, 12, maiúsculo/minúsculo); Instituição (centralizado logo abaixo do(s) autor(res), negrito, 12, maiúsculo/minúsculo); E-mail (centralizado, sem negrito, 12, minúsculo); Resumo (espaço simples, 11, logo abaixo do e-mail, justificado, máximo de 300 palavras contendo uma introdução genérica, justificativa, objetivos, metodologia, resultados etc); Palavras - chave (máximo três, fonte 11, logo abaixo do resumo); Corpo do Texto (“Introduç~o, desenvolvimento, conclus~o”, logo abaixo das palavras – chave seguindo as normas estabelecidas); Referências (ao final); Será permitido o envio de no máximo 02 (dois) artigos desde que o proponente seja apenas co-autor no segundo. FORMATAÇÃO: Mínimo de 12 e máximo de 18 laudas; Margens: 3cm para esquerda e 2,5cm para as demais; Folha: A4; Fonte: Times New Roman; Tamanho da Fonte: 12 para o título e corpo do texto; 11 para resumo, citações e rodapé; Espaçamento entre linhas: 1,5 para o corpo do texto; simples para os demais casos. OBSERVAÇÕES IMPORATNTES: O uso de figuras, quando muito necessário à explicação, deverá se apresentar em escala de cinza; Não é permitido o uso de anexos nem apêndices; Se discente, o artigo deverá vir, obrigatoriamente, em co-autoria com um Professor Graduado; O artigo deve ter, obrigatoriamente, caráter de extensão (resultados de ações empíricas ou estudos teóricos sobre a perspectiva da extensão) CONTATOS: Os artigos devem ser encaminhados para o seguinte e-mail até a data prevista na chamada: [email protected] Contatos: (82) 3521-3341; (82) 98833-4258 199 Os artigos científicos, a serem submetidos à Revext, devem ser de caráter inédito e obedecer às seguintes orientações: REVEXT Revista de Extensão da Universidade Estadual de Alagoas – Uneal Diretor da Editora: Prof. Roberto Silva de Souza Conselho Editorial da EdUNEAL Presidente: Prof. Roberto Silva de Souza. Titulares: professores Osvaldo Batista Acioly Maciel, Ana Carolina Beltrão Peixoto, Sandro Guedes Fernandes, Maria Silene da Silva, Jeová Silva Santana e, representante do Sistema de Bibliotecas (SIBI), Márcia Janaína Lima de Souza. Suplentes: professores Antônio Alfredo Teles de Carvalho, Lucio Luiz Isidro da Silva, Juracy Pinheiro dos Santos, Rubens Pessoa de Barros, Cristiano Cezar Gomes da Silva e, representante do Sistema de Bibliotecas (SIBI), Eliúde Maria da Silva. Editora associada Revisão: dos autores Formato: 20x26cm Papel: Tipo de Capa: Páginas: Impressão: Contatos: Tel.: (82) 3521-3341 [email protected] Página 200 PS. O conteúdo contido nos artigos que compõem esta revista é de inteira responsabilidade dos seus proponentes. Este material pode ser reproduzido, no todo ou em parte, desde que sem fins lucrativos e garantindo a divulgação da fonte.