Eudes Lopes Melo - PPG
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Eudes Lopes Melo - PPG
UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS LETRAS DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SOCIOLOGIA A FORMAÇÃO DE REDES DE PRODUÇÃO NA INDÚSTRIA DE VEÍCULOS SOBRE DUAS RODAS NO NORTE BRASILEIRO EUDES LOPES MELO MANAUS 2010 UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS LETRAS DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SOCIOLOGIA A FORMAÇÃO DE REDES DE PRODUÇÃO NA INDÚSTRIA DE VEÍCULOS SOBRE DUAS RODAS NO NORTE BRASILEIRO EUDES LOPES MELO Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal do Amazonas, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Sociologia. Orientadora: Profª Drª Maria Izabel de Medeiros Valle MANAUS 2010 EUDES LOPES MELO Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Central M528f Melo, Eudes Lopes A formação de redes de produção na indústria de veículos sobre duas rodas no norte brasileiro / Eudes Lopes Melo. - Manaus, AM : UFAM, 2010. 171 p.: il. color. ; 30 cm Dissertação (Mestre em Sociologia). Universidade Federal do Amazonas. Instituto de Ciências Humanas e Letras. Orientadora: Profa. Dra. A FORMAÇÃO DE REDES DE PRODUÇÃO NA INDÚSTRIA DE VEÍCULOS SOBRE DUAS RODAS NO NORTE BRASILEIRO Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal do Amazonas como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Sociologia. Aprovado em 12 de março de 2010. BANCA EXAMINADORA Profª Drª. Maria Izabel de Medeiros Valle - Presidente Universidade Federal do Amazonas – UFAM Prof Dr. Marcelo Bastos Seráfico de Assis Carvalho – Membro Universidade Federal do Amazonas – UFAM Prof Drª. Edna Maria Ramos de Castro Universidade Federal do Pará – UFPA Núcleo de Altos Estudos Amazônicos Dedico este trabalho à minha mãe, Tereza Lopes AGRADECIMENTOS O encerramento de uma etapa nos coloca frente a novos desafios. Por ora, a investigação deste tema não se encerra, mas representa apenas uma vírgula deste mar de coisas a ser pesquisado, devido a outras possibilidades de necessárias abordagens nesse vasto campo. Agradeço à professora Izabel Valle, minha orientadora pelo constante estímulo desde os primeiros momentos da pesquisa, sem o que seria extremamente difícil prosseguir essa simples, mas provocativa jornada. Agradecer, sobretudo, pela paciência de boa condutora em todo o curso desta pesquisa. Aos professores do programa que, ao seu modo, em vários momentos contribuíram para eu pensar melhor a forma de abordar o tema aqui desenvolvido. Ao professor Renan Freitas Pinto, à professora Selda Vale, com quem tive o privilégio de participar de suas aulas de seminários de dissertação juntamente com a professora Izabel Valle, à professora Marilina Bessa, ao professor Noval Benaion, ao professor Marco Aurélio, ao professor José Ricardo Ramalho, ao professor Antônio Carlos Vitikoski e à Professora Therezinha Fraxe. A todos os meus colegas de turma, nos quais encontrei companheirismo, solidariedade e fiz amigos. Ao Charles Falcão, ao Marco Antônio de Souza Brito, ao Márcio André, ao David Spencer, à Suzete Camurça, à Carla Moura, à Sâmia Feitosa, ao Tiago Jacaúna, ao Francinézio Amaral e aos demais, dessa turma muito especial. À minha mãe, pelo seu incondicional apoio do primeiro ao último minuto do tecido deste trabalho. Ao Daniel, meu sobrinho, que contribui não só com sua agradável companhia, como foi decisivo nos arranjos dos gráficos juntamente com o Marco Antônio Brito. Ao Heldicinei Lima pela sua grande contribuição, por ter sugerido a pista para achar a chave da porta que me levou aos entrevistados presentes nesta pesquisa, e por ter emprestado seus conhecimentos estatísticos para orientar na exposição dos mesmos e confeccionar parte deles. A todos os funcionários entrevistados da Moto Honda da Amazônia, pelos quais fui muito bem acolhido. Ao Antônio Neto, meu amigo, pelas conversas sempre estimuladoras e sugestivas. À Érika Almeida, pelas suas necessárias sugestões que ajudaram a melhorar o direcionamento deste trabalho. Ao professor Enos, ao Gilberto Vasconcelos e à professora Daniele Gonzaga, que emprestaram seus conhecimentos na correção deste texto, para possibilitar um melhor entendimento na sua leitura. À Marluce Lima de Carvalho, Arquivista de profissão e, circunstancialmente, secretária do PPGS, com seu profissionalismo e competência, a quem deixo aqui meus agradecimentos. A todos que, direta ou indiretamente, contribuíram para que esta pesquisa fosse concretizada. À CAPES e à FAPEAM, pela bolsa concedida, sem o que os obstáculos teriam sido muito maiores para a realização das disciplinas e desta pesquisa. “O que de fato está em jogo é o processo de auto-constituição circular do capital e auto-reprodução ampliada em sua forma mais desenvolvida” István Mészáros “Realmente, vivemos tempos sombrios! A inocência é loucura. Uma fronte sem rugas denota insensibilidade. Aquele que ri ainda não recebeu a terrível notícia que está para chegar. Que tempos são estes, em que é quase um delito falar de coisas inocentes, pois implica em silenciar sobre tantos horrores” Bertold Brecht “Não basta saber que é necessário mudar o mundo: é preciso acreditar que é possível” Valério Arcary RESUMO O quadro global pode ser caracterizado pelas metamorfoses que vêm sendo operadas no campo das organizações. Tendo como elemento principal, a intensificação do processo de interação, por meio de cadeias e redes produtivas e comerciais. Sendo a rede produtiva o foco deste trabalho na indústria de veículos sobre duas rodas na Amazônia, especificamente na cidade de Manaus. O objetivo deste trabalho consiste em investigar as estratégias e a rede de produção em processo de formação, tendo como firma matriz a MHA e a mais destacada empresa do Polo de Duas Rodas, devido a sua posição de líder no mercado nacional e SulAmericano em termos de produção e vendas de motocicletas, por ser uma das maiores empresas em extensão da Honda Motor Company. Escolhemos a abordagem teórica e empírica. A pesquisa teórica corresponde à primeira parte deste trabalho. A segunda parte deste fizemos uma abordagem geral sobre o Polo de Duas Rodas. E o na terceira parte do trabalho foi desenvolvido a partir da análise das vozes dos funcionários administradores e engenheiros da matriz da rede estudada. Detectamos assim, que a estratégia adotada, implementada desde o início dos anos de 1990 é de formação de rede de produção, por meio da interação entre a firma dominante e fornecedores locais. Atualmente cerca de vinte novas plantas industriais estão em fase de instalação no Polo de Duas Rodas em Manaus, além das vinte já estabelecidas. O processo de interação ocorre por meio do fornecimento de peças, componentes, subconjuntos pelo método Just-in-time/Kanban. Mas também por meio de assistência e intervenções técnicas e organizacionais, por meio do grupo de market share da empresa principal da rede. A trama da rede tem resultado na redução dos custos no processo produtivo para a empresa mais beneficiada pela estratégia das redes: a firma matriz da rede. ABSTRACT The general Idea could be described through its changes those are used by the organizations areas. The interaction process growth is the principal element, by productive and trade network. In the paper the productive network, the paper target in the automobile industry on two wheels in Amazon, specifically in Manaus. The paper objective is to investigate the strategies and the network production during its formation. The factory MOTO HONDA DA AMAZÔNIA – MHA is the most projected automobile industry on two wheels Polo de Duas Rodas, its showed by its position as the leader on National and South American motorcycle production and sale market, and through HONDA MOTOR COMPANY, one of its suppliers. We used theoretical and practical approach to understand this paper better. The second part deals with a general idea about automobile industry on two wheels. The third part deals with development of the identification and the interaction analyses between Moto Honda da Amazônia and its suppliers through employees, engineers and managers point of view. We noticed their strategy since 1990 is production network formation by the interaction between headquarter and suppliers. Nowadays, they are projecting about twenty new industry plants on Polo de Duas Rodas in Manaus, beyond the twenty already established. The interaction process occurs between parts supply, components, subsets method Just-intime/Kanban. It also happens through assistance and organization technical interactions; through headquarter groups of market share. The result is showed by cost reduction in the production process to the industry that benefits the company: The headquarter. LISTA DE QUADROS Quadro 1: Localização das unidades da Honda do Brasil 10 Quadro 2: Dados – Mão de obra 20 Quadro 3: Primeiras empresas produtoras de motocicletas e bicicletas instaladas no setor de duas rodas de Manaus 79 Quadro 4: Prazos dos tipos de estoque 124 LISTA DE TABELAS Tabela : 1 Evolução da Mão de obra da Moto Honda da Amazônia: 1990 a 2008 25 Tabela : 2 Produção Anual de Bicicletas no Polo de Duas Rodas – 1990 a 2008 Produção de Motocicletas do Polo Duas Rodas - 1990 a 2008 83 Tabela : 3 Tabela : 4 Tabela : 5 Tabela : 6 Produção MHA - 1990 a 2008 Produção YAMAHA - 1990 a 2008 86 89 91 92 Tabela : 7 Produção KASINSKI – 2002 a 2009 Produção SUNDOWN – 2002 a 2008 Tabela : 8 Vendas YAMAHA - 1990 a 2008 94 Tabela : 9 Vendas SUNDOWN- 2002 a 2009 95 Tabela : 10 Vendas KASINSKI – 2002 a 2009 96 Tabela : 11 Faturamento do Polo de Duas Rodas - 1990 a 2008 98 Tabela : 12 Empresas de Peças e Componentes Instaladas no Polo de 102 Duas Rodas Evolução da Mão-de-Obra do Polo de Duas Rodas - 1990 106 a 2008 Aquisição de insumos do Polo de Duas Rodas - 1990 a 111 2006 Tabela : 13 Tabela : 14 93 LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1: Produção Anual de bicicletas do Polo de Duas Rodas 1990 a 2008 84 Gráfico 2: Produção Anual de Motocicletas do Polo de Duas Rodas – 1990 a 2008 Participação em vendas do Polo de Duas Rodas em 2008 87 Gráfico 4: Faturamento do Polo de Duas Rodas - 1990 a 2008 Setor Industrial - Faturamento 99 Gráfico 5: Evolução Anual da Mão de obra do Polo de Duas Rodas – 1990 a 2008 108 Gráfico 6: Fornecedores Locais 125 Gráfico 3: 97 SUMÁRIO INTRODUÇÃO ........................................................................................ 15 22 CAPÍTULO I 1 1.1 1.2 1.3 1.4 1.5 1.6 1.7 1.8 1.9 2 INDUSTRIALISMO, ALTA PRODUÇÃO E CRISE DA ECONOMIAMUNDO ................................................................................................... MOTO HONDA DA AMAZÔNIA: UM MODELO JAPONÊS NO PÓLO DE DUAS RODAS DE MANAUS ........................................................... CONDIÇÕES DE TRABALHO NA MHA ................................................ PROCESSOS DE REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E SOCIAL NA MHA ........................................................................................................ EMPRESA: RACIONALIDADE E PRODUTIVIDADE ........................... 23 24 28 30 41 A CRISE NA ECONOMIA-MUNDO: RAZÕES DA ESTAGNAÇÃO NA PRODUÇÃO ........................................................................................... A REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA COMO ALTERNATIVA DO CAPITAL FRENTE À FASE RECESSIVA ............................................. AS REDES DE EMPRESAS NO PROCESSO DE GLOBALIZAÇÃO NA ZONA FRANCA DE MANAUS ......................................................... ESTRATÉGIAS GLOBAIS E A INSERÇÃO DAS TRANSNACIONAIS NA AMAZÔNIA ....................................................................................... A FORMAÇÃO DAS CADEIAS PRODUTIVAS 58 CAPÍTULO II 92 O POLO DE VEÍCULOS SOBRE DUAS RODAS NO NORTE BRASILEIRO .......................................................................................... 48 53 71 81 93 2.1 2.2 A INSERÇÃO DAS TRANSNACIONAIS E A PRODUÇÃO DE MOTOCICLETAS OCUPAÇÃO DO COMÉRCIO REGIONAL PELAS PRODUTORAS LOCAIS ................................................................................................... 100 108 131 CAPÍTULO III 3 AS REDES DE PRODUÇÃO NA MOTO HONDA DA AMAZÔNIA ....... 3.1 AS ESTRATÉGIAS DA MHA E SUA RELAÇÃO COM SEUS FORNECEDORES .................................................................................. AS VANTAGENS NA RELAÇÃO OBTIDA NO FORNECIMENTO DAS EMPRESAS LOCAIS AS DIFICULDADES ENCONTRADAS NA RELAÇÃO DE FORNECIMENTO PARA A MHA OS FATOES QUE DETERMINAM AS RELAÇÒES ENTRE A MOTO HONDA DA AMAZÔNIA E AS SUAS FORNECEDORAS DIMENSÃO ESTRUTURAL DA INTERAÇÃO ENTRE MHA E SEUS FORNECEDORES EM REDE ................................................................ INTERAÇÃO ADMINISTRATIVA E DE NEGOCIAÇÃO ................... 3.2 3.3 3.4 3.5 3.5.1 132 132 143 147 153 155 155 3.5.2 INTERAÇÃO NA QUALIDADE ......................................................... 156 3.5.3 INTERAÇÃO TÉCNICA E TECNOLÓGICA ...................................... 157 3.5.4 INTERAÇÃO NO TREINAMENTO .................................................... 159 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................... 162 REFERÊNCIAS ...................................................................................... 168 15 INTRODUÇÃO O desenvolvimento da indústria de duas rodas no Amazonas é uma das mais novas configurações no cenário atual do modelo da Zona Franca de Manaus. Além de ser o setor fabril que mais cresceu nestes últimos anos, o mesmo vem se destacando como o que possui o maior faturamento, depois do Polo Eletroeletrônico. É neste contexto que a Moto Honda da Amazônia – MHA – vem protagonizando uma rede de produção coadjuvada por dezenas de empresas fornecedoras. A MHA, agora como matriz de uma rede produção em formação, está em processo de consolidação da sua liderança na produção e vendas de veículos sobre duas rodas em nível nacional. Sob o fundamento dos métodos japoneses empregados nos processos de produção, a maior fábrica em extensão da Honda Motor Company, sediada em Manaus vem crescendo desde 1994, em todos os aspectos. A ampliação da sua infraestrutura corresponde ao aumento da produção e das vendas de motocicletas, especialmente nestes últimos catorze anos. O processo de flexibilização, reestruturação e racionalização (HARVEY, 1999), combinada a formação de redes produtivas correspondem às mudanças na economia-mundo1, uma vez que a dinâmica das novas estratégias nas estruturas organizacionais, com a introdução e experimentação de novos padrões de produção, as inovações organizacionais, a inserção das inovações tecnológicas e a relação com o mercado globalizado constituem o pano de fundo das modificações em todo o Polo de Duas Rodas de Manaus. O crescimento em todos os níveis dos processos produtivos, das vendas nacionais e locais, do faturamento, em decorrência de ter posto em prática as novas técnicas organizacionais, os novos princípios da fábrica mínima (CORIAT, 1994), a instrumentalização das técnicas nas relações interfirmas promovida pela MHA, em busca de resultados produtivos minimizadores são 1 Conceito cunhado por Immanuel Wallerstein (2003) para designar a ideia de universalidade do capitalismo como processo econômico geral. 16 indicadores do estabelecimento e consolidação de um novo padrão de produção instalado no Polo de Duas Rodas em Manaus. O Polo de Duas Rodas – PDR – é parte intrínseca do modelo Zona Franca de Manaus, criado no contexto do processo de globalização econômica e da descentralização da produção de bens de consumo. Sua motivação é a busca de lugares que ofereçam mais vantagens, tais como, baixo preço da mão de obra, concessão de incentivos fiscais e, sobretudo, a valorização e ampliação da acumulação de capital. As indústrias instaladas no Polo Industrial de Manaus - PIM têm, desde o princípio, a finalidade de produzir para abastecer o mercado local brasileiro (ALVES, 2005). No entanto, como já se sabe, vem exportando para vários países do continente americano. As crises econômicas mundiais recorrentes expressam a dependência do Polo de Duas Rodas, devido aos impactos tatuados nessas plantas fabris. Um dos mais emblemáticos momentos da trajetória das empresas do PDR e, em particular, da MHA ocorreu com a implementação das políticas econômicas do governo federal, que ficaram conhecidas como abertura econômica para os produtos estrangeiros, em 1991. Essas medidas desencadearam uma profunda crise de produção e de comércio, que afetou profundamente a produção e o mercado das empresas em Manaus. Essa crise impactou a produção em nível local, uma vez que o faturamento de grande parte dos setores industriais e do PIM sofreu uma redução de 28,58% naquele ano. O impacto ocorreu também no setor de Duas Rodas quando o mesmo apresentou uma diminuição no faturamento de 24,40% em 1992. As exceções foram os setores de bens de informática, o de química e o de brinquedos (ALVES, 2005). A crise também atingiu os empregos gerados pelas empresas do PIM, quando verificamos a redução de quase 50% da força de trabalho no período de 1990 a 1994, de 76.800 para 40.000 trabalhadores. Embora se perceba uma visível contradição entre a dispensa dos trabalhadores e a manutenção do aumento do faturamento. Em 1990, o faturamento foi cerca de 8 bilhões de dólares, e as indústrias empregavam 76.800 trabalhadores, em 1994 o faturamento saltou para a casa de 8,8 bilhões de dólares e a mão de obra era apenas de 40.000 trabalhadores. 17 É neste contexto que as grandes empresas vão definir as estratégias para superar a crise, redimensionar a produção e redefinir a sua relação com o mercado nacional e internacional. A combinação dessas novas estratégias resultou na alteração das estruturas e do comportamento organizacional das indústrias localizadas no PIM.2 O objetivo deste trabalho consiste em investigar a rede de produção em processo de formação pela MHA como empresa dominante ou focal, inserida no PDR, focalizando as condições estratégicas desta empresa como modo de reduzir os custos do processo produtivo e ampliação do capital. Nessa perspectiva, nosso propósito específico é identificar a formação dessas redes de produção como parte da reestruturação produtiva na Moto Honda da Amazônia, uma estratégia da nova estrutura organizativa empresarial, desenvolvida, sobretudo, com o aparato das inovações tecnológicas existentes na MHA, localizada no Polo Industrial de Manaus, como uma política empresarial abrangente. São decisões estratégicas tomadas por grandes corporações no âmbito da grande concorrência pelo mercado de produção de bens de consumo. Essas relações interfirmas se formam a partir das execuções de compra e venda de matéria-prima, peças e insumos. E, ao identificar a rede de fornecedores da MHA, consideramos necessário identificar e analisar como ocorre as interações entre a matriz e os fornecedores da rede. Com base nesse processo, entendemos ser necessário analisar atentamente esse fenômeno a fim de permitir sua compreensão, principalmente, no domínio das Ciências Sociais como um problema sociológico. Nesse sentido, é necessário aprofundar a reflexão do problema sobre a rede de produção promovida pela Moto Honda da Amazônia, uma vez que essas estratégias empresariais e suas complexidades são parte de um processo mais amplo das políticas empresariais globais impulsionadas, nessas últimas décadas, pelas grandes corporações. Trata-se de um processo que vem se intensificando a cada avanço da intervenção produtiva destas organizações nos diversos territórios alcançados pelo industrialismo, com a 2 A esse respeito: podem ser consultados os trabalhos dos autores FREITAS PINTO (1987), VALLE (2007), VIEIRA (2003), nos quais se encontram caracterizadas as circunstâncias, o contexto e as motivações que compreendem a instalação dessas empresas no PIM. 18 finalidade de garantir um espaço favorável no mercado competitivo da economia-mundo. O aumento da produtividade, como consequência da estratégia administrativa em questão, permite redimensionar todas as relações envolvidas na produção industrial porque possibilita reordenar ou reestruturar os processos de produção internos e externos da fábrica, uma vez que todo o processo produtivo: a força de trabalho empregada, a quantidade, a qualidade e o procedimento técnico da produção, esteja sob o comando imperativo da redução de custos. Vale dizer que essa abordagem está sendo realizada sobre uma das empresas da Honda Motor Company que mais emprega trabalhadores, em virtude da implantação mínima no aspecto da automação. Portanto, o foco desse estudo é a Moto Honda da Amazônia, empresa escolhida para análise em face: 1 - de sua posição de liderança no mercado nacional e latino-americano na modalidade de produção industrial de motocicletas; 2 – de constituir-se como a maior planta industrial, em extensão, da Honda Motor Company situada fora do Japão; 3 – da existência de poucas abordagens e pesquisas no subsetor de duas rodas do PIM. A título de metodologia, o período de análise compreende os anos de 1990 a 2008. Este período marca a articulação da rede entre a MHA e seus fornecedores em nível local, sob a premissa da glocalização3, que iniciou na década de 1990, com a abertura econômica e a nova política industrial do governo Collor. Delimitamos assim para compreender melhor todo esse processo ao longo da década de 1990 e durante os anos de 2000. A abordagem metodológica utilizada para a efetivação deste trabalho também exercitou, em primeiro lugar, a realização de uma pesquisa bibliográfica, em vista da dupla finalidade: por um lado, identificar as obras e os autores que pudessem fornecer o instrumental teórico capaz de sustentar a análise sobre o tema proposto; por outro lado, identificar as obras e os autores que focaram a MHA como objeto de estudo. Neste último caso, é possível afirmar a quase inexistência de trabalhos acadêmicos, à exceção da pesquisa realizada por ALVES (2005) que tomou para objeto de análise o 3 A glocalização remete-se à compreensão da ideia de que o local constitui-se em “nós” da rede global. Esse “nós” corresponde aos valores intrínsecos à dinâmica da economia e da vida social (CASTELS, 2006). 19 estabelecimento de comparação do subsetor de Duas Rodas com o subsetor Eletroeletrônico do PIM. Nesse sentido, consideramos ser pertinente a realização desta investigação, em decorrência da importância do tema aqui proposto, sobretudo, devido ao fato de haver uma quantidade mínima de bibliografias sobre o mesmo, possivelmente devido a inexistência de pesquisas que tratam do foco central, presente nesta abordagem. Assim, o trabalho se apóia largamente na contribuição de autores como Antunes (1995), HARVEY (1999), MÉSZAROS (2002) e WALERSTEIN (2002) que analisam o tema da Reestruturação Produtiva e das novas formas de acumulação de capital. Autores como CORIAT (1994), RAMALHO (2006) e COCCO (2001) auxiliam na compreensão das categorias fábrica enxuta, deslocamentos de produção, novas estruturas organizacionais e inovações tecnológicas entre outras. Para compreender o conceito de redes de produção, CASTELLS (2006) constitui-se em autor chave. Autores e pesquisadores regionais como VALLE (2007), SILVA (2000), SCHERER (2005), SERÁFICO (2009), FREITAS PINTO (1987), OLIVEIRA (2001), revelam-se importantes para a compreensão da dinâmica de desenvolvimento industrial da Amazônia, em particular, da Zona Franca de Manaus (ZFM). Em segundo lugar, para identificar a formação da rede de fornecedores da MHA, julgou-se necessário proceder a uma investigação junto às instituições locais, públicas e privadas, detentoras de dados relativos à temática investigada como, por exemplo, SUFRAMA, ABRACICLO e FIEAM. Em terceiro lugar, para identificar a rede de fornecedores da MHA, optou-se pelo trabalho empírico de levantamento de dados e entrevistas com as categorias de administração e de engenheiros da empresa investigada. O primeiro momento da pesquisa empírica realizada no segundo semestre de 2008 consistiu na busca de contatos para a obtenção da autorização do acesso à fábrica e aos atores que iriam participar das entrevistas. Pois, a princípio, as dificuldades ocorreram devido à ineficácia dos elementos intermediadores, isto é, as instituições escolhidas para fazer ponte não corresponderam, por várias razões. A primeira delas decorreu pelas dificuldades impostas pela própria fábrica, que proibiu visitas de estranhos, 20 alegando a segurança da garantia do segredo industrial. A segunda porque as pessoas procuradas por nós não representavam nenhum peso no alto escalão da empresa. E a terceira, por motivos de doença por parte do responsável, que seria a pessoa chave, como no caso da associação nipo-brasileira. Somente no final do primeiro semestre de 2009, conseguimos finalmente contato por influência do vice-presidente da FIEAM e presidente do sindicato das empresas do setor de veículos sobre Duas Rodas. O que nos possibilitou o contato com o diretor e o com o gerente do Departamento de Recursos Humanos. As entrevistas foram realizadas no início do segundo semestre de 2009. Optamos por entrevistar somente uma parte de engenheiros e administradores. Como critério, selecionamos, com ajuda do gerente do RH, os mais experientes e outro por ter um tempo médio de empresa, com variação entre 9 (nove) e 32 (trinta e dois) anos de firma. Ao todo, foram entrevistados 6 (seis) funcionários, sendo 3 (três) administradores e (três) engenheiros, sendo que um dos engenheiros atua na fábrica como administrador. Este foi também o período da realização da coleta de dados estatísticos relativos à Moto Honda da Amazônia. E, para apresentação dos resultados do trabalho teórico e empírico realizado, a dissertação compõe-se da seguinte estrutura: No primeiro capítulo, buscamos abordar as categorias que sustentam a análise que estamos realizando centralmente no âmbito das redes de produção, pelo conceito de reestruturação produtiva, acumulação flexível, fábrica enxuta, resguardando a sua abrangência teórica. Sobretudo, porque estas categorias emergem no contexto global de intensa alteração dos padrões de produção. Dentre as alterações, procuramos vislumbrar a inserção dessas indústrias no processo de deslocamento da produção e sua inserção nos novos territórios. Entendemos, assim, que este estudo é parte de um desses territórios locais, plugados com os aspectos gerais do processo global. Procuramos compreender o modelo Zona Franca de Manaus e o seu Polo industrial, como inseridas no contexto de intensificação da globalização e de reprodução da acumulação capitalista. No segundo capítulo faremos uma abordagem sobre o Polo de Duas Rodas, apoiando-nos em abordagens explicativas sobre cadeias produtivas e 21 redes de produção que relacionaremos com a descrição e caracterização da indústria de duas rodas em Manaus, onde estamos verificando a presença de inúmeras firmas, das quais parte delas fabrica motocicletas, bicicletas, triciclos e quadriciclos e outra parte produz peças, componentes e partes do processo produtivo. E, no terceiro capítulo, nossa abordagem será centrada na exposição dos resultados da pesquisa de campo, extraída diretamente da fábrica, que será realizada sobre o processo de formação de redes de produção na MHA. Refere-se à discussão da pesquisa desenvolvida na MHA, junto ao staff da empresa. No qual procuramos desenvolver os elementos formadores da interação entre a MHA e as suas fornecedoras. Concluímos que a rede de produção em formação, protagonizada pela Moto Honda da Amazônia, caracteriza-se pelas relações que a mesma vem estabelecendo com dezenas de empresas, no mesmo contexto da expansão da cadeia produtiva no Polo de Duas Rodas em Manaus. Ao mesmo tempo em que a relação é de subordinação e dependência, ocorrem também processos de parceria interativa nos aspectos da qualidade, da técnica, da tecnologia e de treinamento. 22 CAPÍTULO I 23 1. INDUSTRIALISMO, ALTA PRODUÇÃO E CRISE DA ECONOMIAMUNDO Entendemos que é necessário compreender a indústria de Manaus no marco geral da dinâmica do capitalismo para que possamos relacionar a crise do capital às inúmeras concessões de impostos federais, estaduais e municipais. Sendo estas oferecidas para facilitar a instalação dessas empresas, além de poderem contar com uma produção com baixos custos em encargos sociais. A concessão de impostos feita por parte das instâncias executivas pode ser pensada como medidas alternativas de beneficiamento e fácil instalação das transnacionais no Polo Industrial de Manaus e, especialmente, no PDR. Tais medidas são típicas das políticas gerais da indústria e do comércio internacional, cujo fim concorria para responder às crises cíclicas do capital. As crises do petróleo da década de 50 e a crise de 69-73 se constituem como marcos desse processo, uma vez que as grandes corporações, para voltarem a respirar, precisaram reestruturar-se inteiramente (HARVEY, 1999). O sistema capitalista como uma das características da sociedade moderna, entendida como economia-mundo obedece segundo WALLERSTEIN (2003) aos ciclos longos, mais conhecidos como ciclos de Kondratiev. A dialética alta produção versus crise de produtividade é intrínseca à sociedade capitalista. Isso explica um conjunto de fenômenos e movimentos ocorridos no domínio do capital. Assim, a acumulação flexível, conceito desenvolvido por HARVEY (1999) é sintomático da perda da capacidade de produção do industrialismo afetada pela crise estrutural da economia-mundo. Em alternativa a essa crise, as indústrias entraram na onda da fábrica mínima, analisada por CORIAT (1994), ou da fábrica enxuta ANTUNES (1995). A aplicação das estratégias pensadas para solucionar a crise das grandes corporações compreende os mecanismos idênticos aos utilizados nas indústrias estabelecidas no Polo de Duas Rodas em Manaus, dentre elas, a Moto Honda da Amazônia. Esta organização tem procurado transformar o processo produtivo nestes últimos anos. Parte dessas transformações 24 corresponde no modo de operar com a logística. Por isso, vem protagonizando a formação de uma rede produção de fornecedores locais no Polo de Duas Rodas em Manaus. 1.1 MOTO HONDA DA AMAZÔNIA: UM MODELO JAPONÊS NO POLO DE DUAS RODAS DE MANAUS Fundada no ano de 1948, na cidade de Hamamatsu, no Japão, a Honda teve, como primeiros líderes, Soichiro Honda e Takeo Jujisawa, segundo os quais, a filosofia deve guiar as ações: "A ação sem filosofia é uma arma letal. A filosofia sem ação é uma inutilidade". A Honda localizada no Japão se divide em Honda Trading4, Honda Express5 e Honda Access6. Em 1971, foi inaugurada a Honda Motor do Brasil, e, cinco anos depois, no ano de 1976, às vésperas do aniversário da primeira década da Zona Franca de Manaus, localizada no Distrito Industrial, era inaugurada a Moto Honda da Amazônia, a primeira fábrica de montagem de motocicletas na região que se diferenciava das indústrias maquiladoras, as quais eram as mais fortes do Polo Industrial de Manaus. O setor de duas rodas era extremamente insignificante, se comparado ao setor que reunia a força das grandes transnacionais do ramo eletrônico, tanto em produção, em vendas, em faturamento, em mão de obra e em infraestrutura. A Honda Motor Company possui somente no Brasil, 116 fornecedores e 613 concessionárias. As unidades da Honda no Brasil estão distribuídas conforme o quadro 1. A Moto Honda da Amazônia é parte de um complexo industrial de cerca de 60 indústrias da Honda Motor Company, espalhadas em diversos países e exporta para 70 países do planeta. 4 Responsável pela importação de peça, ferramentas e exportação de motocicletas. Setor de logística, antes instalada somente em São Paulo, agora se encontra estabelecida também em Manaus. 6 Setor de vendas de acessórios para motocicletas e automóveis. 5 25 Quadro-1 LOCALIZAÇÃO DAS UNIDADES DA HONDA DO BRASIL UNIDADES ATIVIDADES São Paulo Comercial, serviços, consórcio, suprimentos, administração. Depósito Anhanguera Logística, C.Q. Sumaré Planta automóvel, depósito de peças. Indaiatuba Centro Educacional de Trânsito. Manaus Planta Motocicleta, Quadriciclos e Motor de força. Fonte: Pesquisa de campo – 2009. O mapa logístico da MHA ilustra os problemas relacionados a distância, às dificuldades e os riscos de atrasos, com possibilidades de greves de caminhoneiros, assaltos, ou problemas naturais, que venham contribuir para a obstrução das estradas inviabilizando assim, o carregamento das mercadorias, além de outros riscos possíveis, uma vez que a distância pela rodovia de São Paulo para Belém é de 3.000 Km. E, a distância de Belém para Manaus pelo caminho dos rios compreende 1.700 Km. Essa trajetória geográfica é encarada como um grande problema de difícil controle para os administradores da MHA. (Ver mapa logístico do carregamento das mercadorias da MHA. Mapa 1). 26 Mapa 1 A MHA, na cidade de Manaus, estado do Amazonas, e a planta de Sumaré, em Sumaré, estado de São Paulo formam juntas as suas sucursais no Brasil, como parte da estrutura da Honda Motor Company. A planta de Sumaré inaugurou em 26 de outubro de 1971, sendo a primeira plataforma da Honda South American, ou Honda da América do Sul. A única atividade desenvolvida 27 neste período era a importação e distribuição de motocicletas, na sede situada no bairro de Vila Pompeia. ia. Atualmente a distribuição de peças está localizada na cidade de Sumaré, em São Paulo, assentada numa área construída de 32 mil m² (MARCELINO, INO, 2004). 2004) Em Manaus, a Moto Honda da Amazônia reúne no mesmo complexo fabril, a HDA7, a HCA8 e a HTA9. Possui, além destas mais duas coligadas: a Showa10 e a Keihin11. As três primeiras, juntas, totalizam um terreno de 661.000 m², e, um total de 193.000 m² de área coberta, conforme mostra a foto aérea, no mapa 2. Mapa2 Fonte: Honda – 2009. Adaptação do autor – 2009. 7 Honda da Amazônia: Produção e vendas de motocicletas, produtos de d força e quadriciclos. Honda Componentes da Amazônia: mazônia: Fabricação de peças para motocicletas. 9 Honda tecnologia da Amazônia: Ferramentas e produtos de força. 10 Produção de amortecedores rtecedores para motocicletas. 11 Produção de carburadores para motocicletas. 8 28 A planta com vista superior é representativa do modelo geral dos processos produtivos da Moto Honda da Amazônia. Esse complexo produtivo é subdividido em diversos setores. Dentre estes, estão: estamparia; solda; peças plásticas que está subdividida em injeção plástica e pintura; montagem que está subdividida em linha de montagem principal, linha de montagem body e montagem de motores; pintura de chassi; Power Train, subdividida em fundição e usinagem, planejamento de manutenção e Engine Quality; administração de materiais; Qualidade; e Engenharia (Fonte: Pesquisa de campo – 2009). Na HDA esse processo é dividido em produção de motor, que é subdividido em fundição, acessórios de fundição, sintetização, usinagem de aço, montagem de motor, acessórios de usinagem, fundição e manutenção de grupo de motor; Produção de chassi, que está classificado em Estamparia e solda de tanque, solda de chassi, injeção plástica e pintura de ABS, pintura de alumínio de tanque, pintura do SPC, linhas de montagem, assessório de produção de chassi, submontagem de assento e manutenção do grupo do chassi. Na HTA, são feitos o controle, suporte e ferramental. E, na HCA ocorrem os processos de estamparia e solda; polimento e galvanoplastia, pintura de escapamento e montagem de roda (Fonte: Pesquisa de campo – 2009). 1.2 CONDIÇÕES DE TRABALHO NA MHA Baseamo-nos nas informações oferecidas pelos administradores a respeito das condições do ambiente de trabalho na Moto Honda da Amazônia, consideramos que os itens selecionados permitem que tenhamos uma visão sobre as condições de trabalho nesta fábrica. Para cumprir com essas condições, dentre outros serviços internos, a MHA contrata o serviço de 40 empresas terceirizadas, somando um total de 1.500 trabalhadores. Esses serviços estão distribuídos entre limpeza, lavanderia, transportes internos, segurança, alimentação, cuidados com jardins, assim como com serviços relacionados a sistemas informacionais e administrativos da fábrica. 29 Para fazer a limpeza e conservação das salas, vestiários, banheiros, corredores, ruas e outras em dependências das fábricas HDA, HCA e HTA foi contratada uma empresa para cada um dos serviços expostos. Uma só firma é contratada para fazer a conservação dos jardins, gramados, podagem e eliminação de árvores próximas à HDA, HCA e HTA. Apenas uma única empresa faz a lavagem, recolhimento e entrega dos uniformes de todos os trabalhadores da HDA, HCA e HTA. (Pesquisa de campo – 2009) Os transportes dos trabalhadores são realizados por 10 transportadoras envolvendo ônibus, micro-ônibus e vans, todos com ar-condicionado, conforme nos informou um dos administradores. Os ônibus, micro-ônibus e parte das vans servem para fazer o transporte externo, com rotas definidas, de acordo com os turnos da produção das fábricas HDA, HCA e HTA. Algumas empresas, por meio de vans, se ocupam em fazer o transporte interno às unidades da HDA, HCA e HTA. As rotas internas possuem paradas definidas com abrigo, para transporte preferencial dos funcionários e visitantes autorizados. (Pesquisa de campo – 2009) A alimentação é feita por uma firma terceirizada com sede no Sul do país. A mesma possui quase 30 anos e é líder no segmento de alimentos. Com 317 funcionários, essa empresa presta serviço à MHA há cerca de dez anos, em três turnos. Serve diariamente mais de 9.500 refeições, uma média de 10 mil lanches, distribuídos em 4 restaurantes na HDA e HCA. A mesma possui três métodos de avaliação de aceitabilidade dos alimentos servidos, feito por meio de pesquisa verbal (entrevista), pesquisa escrita (caderno de sugestões) e pesquisa em painel (eletrônico). (Pesquisa de campo – 2009) 30 1.3 PROCESSOS DE REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E SOCIAL NA MHA A rigor, a nova fase da produção industrial em todo o mundo é compreendida como a fase da reestruturação produtiva. De acordo com Antunes (1995), trata-se de uma contundente resposta das grandes empresas à crise da produção e do capital. Essa fase é também correspondente à concepção, desenvolvimento, experimentação/execução de uma variação de métodos para a nova organização da produção, concebidos e aplicados no interior das fábricas. Mescla-se a isso, em um plano mais holístico, as estratégias entrelaçadas de empresas subsidiárias que atuam como fornecedoras para alimentar a produção de uma ou mais empresas. Conforme COCCO (2003), a introdução das tecnologias telemáticas na produção recoloca o papel do operário como imperativo central no processo do trabalho, em que as redes de produção passam a ser compreendidas no domínio das disputas do mercado, da produção de bens de consumo, entendida por CASTELLS (2006) como cadeias produtivas. Nesse contexto, foi instalada a primeira planta, em 11 de novembro de 1976, na Zona Franca de Manaus, a Moto Honda da Amazônia, localizada na cidade de Manaus, quando e onde iniciou sua atividade com a produção e venda de motocicletas e motores de força. A implantação da Moto Honda da Amazônia ocorreu sustentada pelos benefícios de isenção de impostos oferecidos pelo Decreto-Lei n.º 288 em 28 de fevereiro de 1967, decreto que efetivou a Zona Franca de Manaus (BOTELHO, 2006). Ao estabelecer-se em Manaus, a MHA empreendeu a produção de motor estacionário (próprio para impulsionar a voadeira12 e canoas, mais conhecidos como motor de popa); de veículos chamados triciclos e quadriciclos, como se pode ver na sequência de fotografias, abaixo: 12 “Barco de motor de popa, muito veloz”. Dicionário: HOLANDA, A. Buarque de. 31 Quadriciclo: Fonte: Honda – 2009. Motor estacionário: Fonte: Honda – 2009. 32 Modelos de motocicletas: Fonte: Honda – 2009. Fonte: Honda – 2009. 33 A diversidade de produção apresentada é uma característica da MHA desde o seu estabelecimento em Manaus. Há produção considerável de todos esses produtos. Contudo, o foco da nossa abordagem será centrado nas variadas produções dos modelos de motocicletas, tal como se encontra acima ilustrado. A inovação tecnológica, o grande contingente de mão de obra e barata, (VALLE, 2007), a instalação de máquinas modernas, o fornecimento de insumos locais, a progressiva expansão de empresas fornecedoras locais, somado ao modelo da produção flexível – este último vem sendo aplicado desde 1990, têm sido fundamental para a produção dessa variedade de modelos de motocicletas em escala. Tem contribuído também para o aumento da produtividade desta organização. É possível perceber que a velocidade da produção é cada vez maior na fábrica da Moto Honda da Amazônia. Em uma visita que fizemos à MHA em abril de 2008 (somente em um dos setores de montagem), o apresentador nos informava que em uma das três linhas de montagem era concluída a produção de uma motocicleta simples a cada 32 segundos e em outra linha os operários encerravam uma moto das mais sofisticadas a cada 38 segundos. Agora em 2009 a montagem de uma motocicleta está sendo concluída em média 23 segundos (ver foto 1). 34 Foto 1 Honda – 2009 (Inspeção – após montagem final) A MHA vem ampliando suas vendas para o mercado externo. Em 2004, essa exportação representava 5%. (ALVES, 2004) Até setembro de 2008, a MHA alcançou o percentual (SINDI/FIEAM/CNI, 2008). de 9% de vendas para o exterior 35 Mapa 3 Exportando para o Mundo PAÍSES CBU + CKD FINLAND SWEDEN NORWAY GERMANY DENMARK IRELAND SWITZERLAND POLAND CZECH REP. SPAIN CANADA HUNGARY POTUGAL USA FRANCE HAITI BERMUDA MEXICO TURKEY JAMAICA GUATEMALA BELIZE EL SALVADOR MOROCCO IRAN DOMINICAN EGITO REPUBLIC THAIILAND LIBANON HONDURAS VENEZUELA ISRAEL NICARAGUA UAE UGANDA KENYA GUIANA COSTA RICA GUINE GUANA TANZANIA COLOMBIA MALAWI ANGOLA PANAMA TAHITI SINGAPORE BRASIL EQUADOR ZAMBIA MAURITIUS PERU URUGUAY ZIMBABWE BOLIVIA REUNION MOZAMBIQUE MADAGASCAR AUSTRALY COOK ISLAND SOUTH AFRICA ARGENTINA PARAGUAY NEW ZELAND CHILE << CAPA MOTOS NAC MOTOS EXP Fonte: Honda – 2009. NAFTA - (North American Free Trade Agreement) MERCOSUL - (Mercado Comum do Sul) ATV MOTOR ESTACIONÁRIO 36 Quadro 2 7.865 1.602 32 anos 116 9.583 Ref.: Fevereiro/09 Fonte: Honda – 2009. Os anos de 2006 e 2008 são expressivos do crescimento da mão de obra da MHA. Porque em apenas dois anos, o aumento de cerca de 3 mil trabalhadores significa um impacto no aumento da produção. O crescimento econômico do país foi fundamental para o aquecimento produtivo, o que motivou à MHA contratar mais trabalhadores para buscar a implementação da meta de produzir 2 milhões de motocicletas em 2009. O que não foi possível devido à crise econômica mundial, iniciada em setembro de 2008. 37 Foto 2 Linha de montagem - 2009 Os administradores da Moto Honda da Amazônia informam que não têm problemas para contratar mão de obra operacional. Porque o mercado possui uma enorme reserva de trabalhadores sem qualificação profissional. E estes especialmente são treinados dentro da MHA. Enquanto nós fazíamos as entrevistas, um grupo de trabalhadores recém contratados estava fazendo o curso de empilhadeira, no CT – Centro de Treinamento13 da empresa, em uma sala ao lado de onde estávamos. Conforme um administrador: 13 É o setor vinculado aos Recursos Humanos, que é responsável pelo treinamento e desenvolvimento de pessoal. (PESQUISA DE CAMPO: SATOSHI MIKI) 38 [...] no nível operacional ele é... são satisfatórios. É porque a Honda trabalha, assim com... A pessoa não precisa saber a atividade que ela vai desempenhar. Nós formamos aqui, ok? Que é a maioria, né? 85%, é... dos funcionários, são operacionais, ok? Então a gente não vê dificuldade de conseguir essa mão de obra (PESQUISA DE CAMPO: Ricardo Souza). Neste aspecto, administradores e engenheiros foram unânimes em afirmar sobre a satisfação, abundância e facilidade de encontrar operários sem ou com pouca qualificação profissional, em Manaus. Mas não é o mesmo o que acontece com os segmentos de trabalhadores qualificados. Segundo os mesmos, ou são raríssimos, ou não existem. Portanto, na ausência de engenheiros mecânicos, engenheiros de produção, engenheiros elétricos, dentre outros profissionais qualificados, procurados em nível local e não encontrados, a alternativa é buscar em outras regiões do país. A procura de trabalhadores culturalmente capacitados é uma exigência das grandes empresas transnacionais no local onde elas se estabelecem. Porque o salário de um operário ou qualquer profissional qualificado é muito mais elevado em países desenvolvidos do que nos periféricos. A força de trabalho profissionalmente qualificada atual dos países subdesenvolvidos deve passar hoje por essa seleção cultural. Isto significa dizer que as grandes organizações estão à procura de uma mão de obra barata em países e regiões onde a ofereçam. Trata-se de uma força de trabalho altamente capacitada. Segundo o SENNETT “[...] os empregos abandonam países de salários altos como os Estados Unidos e a Alemanha, mas migram para economias de salários baixos dotadas de trabalhadores capacitados e às vezes mesmo superpreparados” (2006: p. 84). [...] No nível superior, há uma carência muito grande aqui de contratação de engenheiros, principalmente mecânicos, não é? Na maioria das vezes, nós trazemos esse profissional de fora, né?, ou do Nordeste, né?, ou do Sudeste. São as áreas onde essas ... melhor adaptaram na região Norte, não é? Pode ser clima, pode ser alguma coisa assim, mas do Nordeste, principalmente, não é? Eles têm maior facilidade de adaptação 39 à cultura, ao próprio estilo de trabalho aqui da nossa empresa (PESQUISA DE CAMPO: Ricardo Souza). A contratação de especialistas é um problema em função de que gera, conforme reclamam os administradores, certo custo à MHA, que conta com a assessoria de empresas como a Avistar, o Grupo Selpe, o Grupo Foco, a RH Internacional, Eventos Recursos Humanos, do Sudeste e Inteligente e Capital Humano do Sul brasileiro, para recrutar e selecionar engenheiros. Após a chegada a Manaus, visita à fábrica e a realização das entrevistas, se aprovados os engenheiros retornam à sua cidade para preparar o seu ingresso à fábrica e a sua mudança para Manaus. A vinda desses profissionais qualificados não é garantia de estabilidade na fábrica e nem de adaptação à região e à cidade, uma vez que alguns engenheiros desistem do emprego, ou por não se identificarem com o trabalho, ou devido a conflitos familiares. Mas a maioria destes não fica por não se adaptarem ao clima ou à cultura regional. De acordo com Douglas14: Tem toda uma questão de... social, né?, familiar, cultural, não é? Enfim, então, isso pode levar com que essa pessoa que vem de fora, não são todas, lógico, essa falta dessa adaptação, faça com que ele retorne, não é? Pro local de origem. Então, não é, não é bom, né?, pra ambas as partes [...] Quando essa pessoa é casada, por exemplo, e a esposa já tem uma profissão em outro Estado, aí vem a dificuldade. Não é? Ele tá desempregado, ela tá empregada, aí começa a ter conflitos. Não é bom. (PESQUISA DE CAMPO: Ricardo Souza) No entanto, em termos de recursos humanos, a maior dificuldade está relacionada à carência de uma mão de obra de técnicos e profissionais qualificados, do ponto de vista interno, para contratação para a MHA. Não há problema quanto à força de trabalho operacional, porque essa categoria de que se exige menos qualificação profissional é extremamente vasta. A carência de trabalhadores qualificados decorre da necessidade que a MHA tem de produzir 14 O nome exposto do entrevistado é fictício. Douglas é administrador e ocupa a função de gerente de RH da MHA. 40 um tipo de produto, que exige um tipo de trabalhador altamente qualificado. Conforme Ricardo Souza15: Engenheiros, engenheiros mecânicos, que nós trazemos tudo de fora, é de São Paulo, é do Rio Grande do Norte, é do Nordeste em geral, nós trouxemos muitos engenheiros mecânicos. Trouxemos muitos[...]Veio muito da Paraíba, nós fizemos um convênio com a Universidade Federal da Paraíba[...]a maioria de São Paulo, grande parte é tudo de são Paulo, engenheiros (PESQUISA DE CAMPO: 2009). A absorção dessa mão de obra mais qualificada de fora do estado do Amazonas é decorrente da existência de pouquíssimos técnicos e menos ainda, de engenheiros. A MHA precisa fazer convênios com Universidades do Sudeste e Nordeste do País para a composição e satisfação do seu quadro de trabalhadores. Os poucos técnicos, técnicos mecânicos formados pelo antigo CEFETE, atual IFAM, ao saírem, imediatamente são absorvidos pelo mercado. Ricardo Souza continua... Tem engenheiros lá da Universidade do Rio Grande do Norte, também tem Minas. Pelo que eu vi aqui na fábrica nós temos uns 200 mecânicos, técnicos, mecânicos. Tudo que sai da Escola Técnica Federal o mercado já absorve, o pessoal da área de informática, o pessoal da Nokia. Antigamente da Sharp. O pessoal da Nokia, o treinamento de lá é muito bom. A gente contrata muita gente de lá. Realmente eles são bons (PESQUISA DE CAMPO: 2009). Com leves oscilações antes de 1994, os primeiros tropeços vistos no início desta série são tributados à política econômica do governo federal em 1991. Depois imperceptível, disso, em vê-se 2005. que ocorreu uma ligeira Ressalta-se que os sinais quebra, de quase recuperação aconteceram de fato, somente a partir de 1994. Percebe-se também que o aumento da mão de obra na MHA se deve, em termos objetivos, ao 15 O nome citado do entrevistado é fictício. Ricardo Souza é Engenheiro de produção de formação, atualmente é supervisor da divisão de peças. Trabalha na Honda há 22 anos, desde 1987. Antes da atividade que ocupa hoje na área administrativa como supervisor da divisão de peças, atuou no campo da engenharia, como engenheiro de projetos, engenheiro de análise de garantia de campo, e na área de PCP. 41 crescimento da economia brasileira nestes últimos anos, que tem permitido a expansão das vendas para o mercado nacional, bem como para as exportações. Do ponto de vista interno, uma série de procedimentos técnicos e de métodos tem contribuído para a elevação da produção, uma vez que quando cresce a capacidade de venda, o mercado força o aumento da produção e da força de trabalho. A MHA possui quatro tipos de contrato de trabalho: o temporário, que corresponde aos dois primeiros meses de adaptação; a experiência, quando os trabalhadores fazem uso dos três meses nas fábricas, antes da contratação efetiva ou dispensa; o tempo indeterminado são todos os operários aproveitados cujo talento corresponde às necessidades da MHA; e o estágio, período que os trabalhadores em processo de formação escolar em nível médio e em nível superior. Esses operários desenvolvem o processo produtivo em uma jornada de trabalho diversificada, distribuída em cinco turnos, sendo dois normais e três especiais. Nos turnos especiais, os operários e os chefes percebem diferentes gratificações, de acordo com o turno e com a função na empresa. 1.4 EMPRESA: RACIONALIDADE E PRODUTIVIDADE O desempenho da atividade industrial da Moto Honda da Amazônia no Polo Industrial de Manaus ocorreu dentro de um contexto no qual as mudanças das formas organizativas da produção, reestruturação empresarial se desenvolveram nos limites do crescimento da fábrica. A dinamização dessas estratégias que se confundem com a aplicação das técnicas de produção de trabalho é o fundamento do objetivo desta organização, que consiste em existir e melhor competir no mercado. Aos poucos se buscou desenvolver os processos produtivos na fábrica, a fim de viabilizar a racionalização produtiva. O toyotismo foi parte desses métodos utilizados no processo de produção, juntamente com fortes elementos do método fordista. 42 Tabela 1: EVOLUÇÃO DA MÃO DE OBRA DA MOTO HONDA DA AMAZÔNIA: 1990 A 2008 ANOS MHA HCA HTA TOTAL 1990 1.879 247 - 2.126 1991 1.784 271 - 2.055 1992 1.389 189 - 1.578 1993 1.221 179 102 1.502 1994 1.276 254 54 1.584 1995 1.530 332 41 1.903 1996 1.871 482 42 2.395 1997 2.264 660 53 2.977 1998 2.336 716 52 3.104 1999 2.458 682 59 3.199 2000 2.678 736 61 3.475 2001 3.075 801 66 3.942 2002 3.946 1.015 80 5.041 2003 4.451 1.077 106 5.634 2004 5.136 1.212 116 6.464 2005 5.189 1.062 115 6.366 2006 6.091 1.177 118 7.380 2007 6.935 1.384 118 8.437 2008 7.865 1.502 Fonte: Pesquisa de campo - 2009 116 9.583 As mudanças que ocorreram no setor de tratamento superficial16 refletem as transformações que ocorreram na MHA. O desenvolvimento e o aumento da produção, se deu no contexto da ressignificação do conceito de produção, em termos de qualidade e quantidade de produtos, segundo os administradores e engenheiros entrevistados. A exemplo disso, o setor contava antes com uma grande e única máquina para fazer vários processos em pequena escala de produção, atualmente três máquinas a substituem. Assim, hoje cada uma serve 16 Envolve o desenvolvimento da atividade com o revestimento químico de metais plásticos em escapamentos, que é uma especialidade fabril da Moto Honda da Amazônia, assim garante o engenheiro Bernardo. 43 a um processo separado e em grande volume. Segundo informa o engenheiro Bernardo17: [...] antes a gente tinha uma máquina pra fazer pequeno conjunto de peças. Vamos fazer guidão, vamos fazer aro, fazer a roda, pedais. Uma máquina só. Com o aumento produtivo a gente teve que comprar mais unidades galvânicas. Máquinas bem grandes pra poder fazer essa expansão, né? De maneira mais coerente. Houve uma... um desenvolvimento bastante grande na parte de automação. Antes a gente não podia pensar sequer em ter um robô. Hoje nós já temos 4, 6, robosinhos, já trabalhando na linha de solda né? Escapamento. Nós temos uma... uma pintura, uma unidade de pintura a pó. Seria uma coisa, também que nós na época não imaginávamos e uma unidade de pintura líquida pra alta temperatura com desenvolvimento do escapamento, que foi um atendimento à Lei né? (PESQUISA DE CAMPO). O desenvolvimento das formas de fabricação de mercadoria é parte de inúmeras transformações que ocorreram e estão ocorrendo no mundo da indústria moderna, sendo que hoje num patamar muitíssimo mais elevado em relação ao século XIX. Segundo Marx, o princípio da indústria mecanizada se tornou uma diretiva dominante, ao empregar processos mecânicos e químicos na divisão do trabalho, do processo de produção industrial. De acordo com Marx: [...] A maquinaria vai penetrando progressivamente nos processos parciais das manufaturas. A organização rígida e cristalizada destas, baseada na velha divisão do trabalho dissolve-se, dando lugar a transformações constantes [...] (MARX, 1996: p. 529). Os fatores que levaram à expansão da Moto Honda da Amazônia foram realizadas nos aspectos da infraestrutura e da estrutura. Para ilustrar essa afirmação, é demonstrativo o caso da Honda Componentes da Amazônia, pois, onde havia apenas um galpão, hoje são três só para produção de componentes. Ocorreram mudanças como o deslocamento da produção de componentes da HCA para a HDA. Tais transformações permitiram maior agilidade à coerentização do processo de produção na montagem. As mesmas foram necessárias, inclusive para evitar o transporte dos componentes. Outro 17 Bernardo é engenheiro químico de formação e trabalha na Moto Honda da Amazônia há 13 anos. Sua especialidade é a parte de tratamento superficial, galvanoplastia, pintura, e metais plásticos. 44 caso ilustrativo é o caso da transferência do setor de produção do assento que permitiu a realização de todo os processos produtivos desde roda até montagem e o embarque no caminhão. Esse deslocamento da produção de assento para uma fornecedora ocorreu em decorrência da falta de espaço interno. Bernardo descreve a abertura de novas linhas de produção de componentes: [...] Em termos, não só a expansão na forma de tamanho da fábrica, que hoje a gente tem, quando eu vim pra cá nós tínhamos um galpão. Passados alguns anos, nós fizemos outro galpão, fizemos dois galpões, hoje a HCA têm três galpões só na parte de componentes, né? Três galpões. Essa parte de produção, que a gente conseguiu também direcionar e fazer um pouco melhor foi é..., tentar corrigir, né? Algumas... coisas que ficaram pra trás, que foi, conforme ele se expandiu, a gente conseguiu uma linha de escapamento, uma linha de aro. Hoje tá mais definido isso, que antigamente não tinha. E tivemos que abrir mão de outras fábricas que a gente tinha, e hoje tão..., foram transferidas para a HDA, que são fábricas como a parte galvânica, são fábricas que não tem mais. A Honda não, de uma forma geral, não tem mais no Japão, né?, pelo menos. Por exemplo, a fábrica de acento, quando a Honda hoje faz uma moto alguém fabrica o acento pra eles e entregam o assento acabado. E nós temos uma fábrica de acento aqui, que era na HCA e por questão de espaço né? Por uma questão até de ajuste, porque o acento, ele pode se alocar bem na linha de montagem, né. A pessoa faz o acento e já entrega pra linha de montagem, já pra colocar na motocicleta. Então, até pra liberar um espaço, que pra nós era crucial, a gente teve que abrir mão da linha de acento, foi lá pra, pra Honda da Amazônia, a HDA, que a gente fala que é a parte de montagem de moto, né? Então, houve um crescimento bastante significativo da Honda, não só em termos tecnológico de... em termos de processos. Houve também crescimento de gente né? A gente percebe esses últimos anos a Honda tá uma quantidade enorme, falando da Honda componentes, né? (PESQUISA DE CAMPO: 2009). A MHA começou a implementar a automação em alguns dos processos produtivos no setor de estamparia. Seguindo a descrição de Bernardo, o emprego de robôs na linha de produção possibilita a precisão na aplicação da solda, a facilidade de movimentação da peça, cuja operação exige um grande esforço da força física do operário. É um movimento que nos permite presenciar os primeiros sinais de automação na HCA, isto é, em uma das unidades da MHA. Do ponto de vista técnico, a introdução do robô oferece 45 maior eficiência em relação à soldagem e libera a força física dobrada que o operário tem de fazer para movimentar a peça, transferindo a mesma ao robô. O operário ligado a essa operação é liberado da força física e do seu posto de trabalho da fábrica. Além disso, a inclusão do robô significa a garantia de maior qualidade no produto em processo de fabricação, principalmente em se tratando da soldagem do material, mas também oferece mais segurança no processo, uma vez que essa atividade é extremamente arriscada para o trabalhador que solda as peças. Tal como explica o engenheiro Bernardo: Tinha processo que a gente não conseguia garantir e colocava em risco a qualidade do produto. Você deve ter visto. Não era esse o caso, pelo amor de Deus, não é esse o caso, mas, por exemplo, eu lembro que tinha um cordão de solda num garfo, e aquilo é especificado, tem um comprimento, mesmo depois que você vai fazer a costura da solda, vai soldar uma peça com outra, né?, um tubo vai ter uma peça soldada, eles podem fazer o começo da solda, antes da peça e terminar um pouquinho depois, que é uma questão de segurança. Então, você não pode no meio da peça... ficar um pedacinho pra soldar. E a gente tinha dificuldade de fazer devido à posição de algumas peças, aí ficava aquele um milímetro. Faltou um milímetro. Você sabe de uma coisa? Vamos ver um robô. Volta! Garante um dispositivo que garante precisão e a gente fecha esse assunto, porque é bastante complicado às vezes de você colocar. Mas o trabalho também do robô, ele vem substituir alguns trabalhos, que solda não é bem o meu conhecimento, mas a gente percebe que, por exemplo, quando faz, quando eles fazem os garfos, quando faz aquele monte de solda, a peça fica toda torcida, por causa do calor e das contrações da solda. Então, muitas vezes o operário tem que fazer muita força pra colocar a peça num dispositivo, forçar a peça entrar numa... numa certa posição pra que ele amarre aquela posição e prenda até aquele jeito pra poder soldar algum reforço, que vai garantir que a peça fique naquela configuração que foi planejada (PESQUISA DE CAMPO: 2009). A automação, materializada na inserção do robô, substituindo a força de trabalho humana é simbólico da intensificação da técnica. Esse processo cumpre com o objetivo de baixar o preço da mercadoria, diminuir o tempo de trabalho do operário, ampliando o tempo de trabalho gratuito do trabalhador, que é apropriado pelo capitalista. Segundo MARX: 46 No sistema de máquinas, tem a indústria moderna o organismo de produção inteiramente objetivo que o trabalhador encontra pronto e acabado como condição material da produção. Na cooperação simples e mesmo na cooperação fundada na divisão do trabalho, a supressão do trabalho individualizado pelo trabalhador coletivizado parece ainda ser algo mais ou menos contingente[...] O caráter cooperativo do processo de trabalho torna-se uma necessidade técnica imposta pela natureza do próprio instrumental de trabalho” (1996: p. 440). É importante observar que o aumento contínuo da produção e da produtividade, da ampliação da MHA está acontecendo por conta de uma forte racionalidade nos processos produtivos, que envolve a introdução de tecnologias, com a finalidade de tornar-se mais competitiva entre as suas concorrentes, fabricantes de motocicletas, no mercado nacional e internacional. O gráfico abaixo certamente é explicativo da evolução do desempenho das atividades industriais da desta empresa. Quadro 3 Produtos Fabricados << CAPA MOTOS NAC ATV MOTOR ESTACIONÁRIO Fonte: Pesquisa de campo – 2009. Fornecido pela empresa. 1.277.669 1.551.724 2008 13.485.617 1.234.095 1.132.527 982.014 123.875 1.008.652 895.658 123.875 771.783 2004 908.213 88.509 3.986.933 ACUMULADO 819.704 59.094 2002 683.322 658.152 48.550 609.602 562.564 436.467 508.112 2000 1998 435.659 54.452 2.552.243 2.987.902 2.171.061 381.182 1.914.806 256.255 1996 1.734.472 EXPORTAÇÃO 180.334 1.623.367 64.317 111.105 1994 1.559.050 1.491.252 67.798 1992 1.399.048 92.204 1.291.978 MOTOS EXP 107.070 126.652 NACIONAL 1990 1.041.424 1.165.326 923.185 123.902 1988 118.239 819.575 103.610 1986 714.676 104.899 597.857 428.196 116.819 1984 169.661 278.790 149.406 1982 175.635 103.155 47.100 105.112 70.523 1980 29.021 58.012 1978 2.200 2.200 1976 26.791 28.991 1 MILHÃO 3.424.369 3 MILHÕES 2 MILHÕES 4.645.085 4 MILHÕES 742.426 5 MILHÕES 2006 5.387.501 6.207.205 7.102.863 6 MILHÕES 138.726 7 MILHÕES 843.288 8 MILHÕES 48.172 10 MILHÕES 9 MILHÕES 1.185.923 13 MILHÕES– Outubro de 2009 8.084.877 9.217.404 100.025 1.377.694 10.595.098 104.700 1.656.424 12.251.522 EVOLUÇÃO 47 Os dados no gráfico acima correspondem ao período dos anos de 1970 até o mês de outubro de 2009, e revelam a capacidade produtiva, de vendas nacionais e internacionais da MHA. Observamos também que esta empresa alcançou no mês de outubro de 2009 a produção de 13.485.617 unidades de motocicletas produzidas na planta de Manaus. Foto 3 Linha de montagem – 2009 48 A MHA é conhecida por ser pioneira como produtora de motocicletas em Manaus, desde os primeiros anos do antigo Distrito Industrial. Quando registrou a produção do primeiro ano de atividade, totalizando 12.800 motocicletas. Certamente seus administradores não vislumbravam esse nível de produção por muito tempo, uma vez que sua estratégia consistia em ocupar o mercado brasileiro e do sul da América. A realidade atual está evolutivamente confirmando essa estratégia no Brasil e no sul da América. Para isso, tornava-se necessário preparar o campo, afirmar e aplicar os conceitos organizacionais. Era fundamental aplicar o conceito de glocalização, segundo seus administradores, isto é, produzir onde se vive. Resumidamente significa atrair a maior quantidade necessária de fornecedores para perto da fábrica da MHA, ou seja, o sucesso da meta a ser alcançada por essa transnacional consistia em resolver primeiramente o problema da logística. Porém, a razão maior da inserção dessa corporação no mercado da região sulamericana, estava relacionada à crise econômica, pós-Segunda Grande Guerra, que fazia dessa a causa comum de inúmeras transnacionais migrarem dos seus países de origem para produzir e vender em regiões subdesenvolvidas. 1.5 A CRISE NA ECONOMIA-MUNDO: RAZÕES DA ESTAGNAÇÃO NA PRODUÇÃO Este período pode ser caracterizado, segundo WALLERSTEIN (2003) como o ciclo de Kondratiev, o qual irá iniciar em 1945 e vai até os dias de hoje. Trata-se dos chamados ciclos longos. Esses ciclos podem ser divididos em duas fases: a fase A e a fase B. A primeira que vai de 1945 a 1967-1973 com características de expansão econômica, e a segunda com característica de contração econômica que se inicia em 1967/1973 e deve prosseguir por alguns anos em frente. A fase A do ciclo de Kondratiev é parte do contexto do período da alta hegemonia dos Estados Unidos. Este país precisava manter sua estabilidade 49 para usufruir do seu momento de glória e, ao mesmo tempo, garantir um mercado para o escoamento da produção das empresas norte-americanas em pleno crescimento. Nesse sentido, foi fundamental primeiramente o estabelecimento da ordem mundial. Para isso, em 1945, foram criadas a Organização das Nações Unidas – ONU, o Fundo Monetário Internacional – FMI e o Banco Mundial como órgãos supranacionais, cujo objetivo era a manutenção da ordem. E, em segundo, o acordo de Ialta que separava as regiões entre o mundo capitalista em torno dos EUA e o “resto” na órbita da União Soviética. Enquanto a economia tipicamente fordista estava ancorada na política keynesiana, e apoiou-se nesta para expandir sua produção, internacionalizar o comércio dos seus produtos e aumentar seus lucros, o movimento da empresa capitalista se materializava na combinação do impulso político, por meio de incentivos do Estado-nação e da dinâmica produtiva das corporações capitalistas. Ford acreditava no poder produtivo do modelo corporativo. Pois o dia de 8 horas e o pagamento de cinco dólares, além de forçar o aumento da disciplina dos trabalhadores para adequá-los à nova linha de montagem de elevada produtividade, lhes proporcionaria também renda e tempo para o consumo da alta produção que as corporações estavam por fabricar (HARVEY, 1999). A implantação do fordismo encontrou dois importantes obstáculos: um deles foi a própria resistência à tecnologia de montagem de produção de massa. O outro tem a ver com o modo de intervenção política do Estado. Fato é que a realidade exigia das indústrias uma nova concepção de regulamentação compatível com a produção fordista. A favor disso, a derrota do movimento sindical, foi fundamental para a execução do controle da força de trabalho, isto é, significou um considerável componente para efetivar a imperativa imposição do capital sobre o trabalho (WALLERSTEIN, 2003). Assim, o fordismo aliado à concepção keynesiana18 conseguiu transcender as fronteiras nacionais, formando uma rede mundial de produção e 18 Teoria da Economia Política que ficou conhecido pela idéia do bem-estar-social. Política que consistia na democratização da renda, do consumo e elevação do padrão social de vida. 50 comércio, envolvendo inclusive as nações descolonizadas. O período após o ano de 1945 (o período pós-guerra) será um marco para o capitalismo, no qual conseguirá níveis de altas taxas econômicas, devido sua consistência produtiva e, por efeito, a elevação dos níveis sociais de vida. É nesse contexto que o fordismo, sustentado no keynesianismo, vai se configurar como um regime de acumulação pleno, com características próprias. Ele se constituiu também como a plataforma completamente estável de um longo período de expansão, que vai do pós-guerra até o ano de 1973. Isto permitiu que o capitalismo garantisse uma base industrial, a ponto de tê-lo possibilitado realizar a elevação dos padrões de vida de uma significativa parcela da sociedade norte-americana, por exemplo. Porém os Estados Unidos começaram a perder sua hegemonia quando a Europa Ocidental e o Japão iniciaram sua recuperação econômica. Essa retomada e crescimento da economia da Europa Ocidental e do Japão levaram ao esgotamento internacional do mercado e a uma dramática redução da rentabilidade de grandes setores industriais. “A deterioração da conjuntura da economia-mundo foi marcada por dois grandes acontecimentos: a necessidade de os Estados Unidos abandonarem o padrão-ouro e a revolução mundial de 1968” (WALLERSTEIN, 2003: p. 76). Este é o marco do ingresso no longo período de estagnação. O capitalismo passa a viver o drama do declínio das taxas de lucros derivados da produção. “[...] a taxa de acumulação, ou seja, da efetiva inversão em um parque de equipamentos produtivos, não cresceu durante os anos 80, como caiu em relação a seus níveis – já médios – dos anos 70. No conjunto dos países de capitalismo avançado, as cifras são de um incremento anual de 5,5% nos anos 60, de 3,6% nos anos 70, e nada mais do que 2,9% nos anos 80. Uma curva absolutamente descendente (ANDERSON, 1995: p. 16). É importante notar que o primeiro impacto da estagnação na década de 1970 se constitui na saída dos grandes empresários e investidores para formar seus lucros. A forma de lucrar passou, substancialmente, da esfera da produção para a esfera financeira. O segundo é o alto índice de desemprego em todo o planeta, e o terceiro consiste no fenômeno do deslocamento da 51 planta produtiva, em busca de substituir o pagamento de altos salários por lugares onde o trabalho é mais barato. É possível verificar neste aspecto não só o espetáculo da especulação financeira sendo realizada por um concentrado e seleto grupo de investidores, pelo menos até o estouro da bolha financeira, mas também o deslocamento da produção de países da Europa Ocidental, da América do Norte e do Japão para outras regiões do planeta, principalmente para os ditos países industrialmente em desenvolvimento. Podemos perceber, ainda, que esses países foram abrigo das grandes companhias menos rentáveis. O registro de desemprego foi extremamente alto não só nos países subdesenvolvidos, mas também, nos países desenvolvidos. A fase do ciclo de Kondratiev da economia-mundo consiste por parte das empresas em priorizar a redução de salários para facilitar o desenvolvimento das grandes organizações empresariais capitalistas como empresa competitiva no mercado. Enquanto nos anos 70, os investidores foram obrigados a mudar o curso da forma de lucros, decorrente da estagnação produtiva, nos anos de 1980, o mundo vai assistir à eclosão dos créditos para os países subdesenvolvidos, isto é, não só foram reduzidos os créditos mas também os países subdesenvolvidos perderam a capacidade de pagá-los. O que ficou conhecido como a crise da dívida, na qual o caso mexicano é o mais emblemático de todos. Este país foi o primeiro a anunciar que não tinha mais recursos para saldar a sua dívida. Em síntese, o quadro dos anos oitenta é marcado pela crise da dívida, pelo salto econômico dos tigres asiáticos, conhecido como o “voo dos gansos”, pelo fim da recessão e do alto índice de desemprego nos Estados Unidos, na ocasião da administração, com doses neoliberais, de Reagan, e, ainda, um quarto item dessa síntese, teve como produto da política da obtenção de lucros com base na especulação de curto prazo, decorrentes dos grandes empréstimos realizados pelas grandes empresas em detrimento de investimentos produtivos. Ou seja, tudo isso feito à base de amargas receitas para as camadas médias estadunidenses, devido ao baixo preço das suas atividades laborais. 52 Não é estranho falar que os grandes investidores envolvidos com a especulação financeira, permaneceram lucrando na década de 1980, ainda que o mundo da produção corresse como um automóvel com o motorista a freios puxados, na maior parte do planeta, com a exceção dos países do extremo oriente. Finalmente, os anos de 1990 serão conhecidos pela redução do potencial produtivo japonês. O mundo assiste à explosão da bolha especulativa do mercado imobiliário japonês, com a gigantesca redução do valor dos títulos de créditos. Isto certamente tem a ver com certos exageros de investimentos de capital cometidos ainda naquilo que ficou conhecido como os ciclos de endividamento, cuja tendência era o de preservar “a capacidade de gasto do sistema-mundo” (WALLERSTEIN, 2003: p. 82). O primeiro ciclo são os empréstimos aos países subdesenvolvidos e aos países ditos socialistas, o segundo são os do governo norte-americano e o terceiro são os das grandes organizações empresariais. Dois fatos recobram a importância da crise dos anos 90. O primeiro, a criação do euro como uma iniciativa da Europa Ocidental. Essa era uma medida para desconectar os estreitos elos que a ligavam aos Estados Unidos. A consequência disso foi a conquista da autonomia financeira da Europa Ocidental em relação aos Estados Unidos e a diminuição da eficácia econômica dos países da OTAN. O segundo fato está ligado à chamada Crise Asiática, na qual os tigres asiáticos estiveram inseridos. E o que virá depois, possivelmente será a esperada deflação dos Estados Unidos, o que quando ocorrer, segundo se espera, estará deflagrada a última subfase da fase descendente do ciclo Kondratiev vigente. A análise do ciclo de Kondratiev tem um significado importante para compreendermos o comportamento das indústrias, na atual fase da economia, a lógica da mobilidade industrial, dos deslocamentos e da motivação que levaram as empresas a reestruturarem a sua produção. O fato de as empresas terem sido dramaticamente afetadas reforça a importância dessa análise. Assim, a saída para a existência e sobrevivência dos seus negócios vai ser realizada por meio de políticas administrativas alternativas para enfrentar a concorrência no mercado e na produção internacional. 53 1.6 A REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA COMO CAPITAL FRENTE À FASE RECESSIVA ALTERNATIVA DO A perda da capacidade internacional da funcionalidade do mercado mundial – a crise do capitalismo – e o declínio da taxa média dos lucros das grandes corporações são as combinações de fatores que levaram o grande capital a investir em formas alternativas de organização da produção e de trabalho. São estas as prerrogativas para o rearranjo de novas estratégias para recuperar os lucros e tornarem-se mais competitivas no mercado. As afirmações das novas estratégias de produção se difundiram e se sedimentaram mundialmente nesse contexto, respeitando suas especificidades nos diversos espaços, territórios, ilhas e arquipélagos. A ideia da empresa matriz da produção não é mais uma realidade única. As facilidades oferecidas pela tecnologia dos transportes, das comunicações possibilitaram a instalação das corporações nos diversos pontos do planeta. A difusão territorial dos processos produtivos consiste na descentralização da produção, fora da fábrica, na terceirização e em um processo ainda “mais complexo, que implica uma reversão da própria relação que liga a fábrica a seu meio entendido como território das relações sociais de cooperação” (COCCO, 2001: p. 97-8). Nesses termos, a mobilidade é uma válvula de escape que os novos investidores têm hoje por estratégia, ou seja, eles possuem a liberdade de produzir a baixos níveis de custos, no frio cálculo, de poder investir sem a preocupação com as obrigações sociais. Este movimento, no contexto da globalização é inaugural de uma dislexia entre gozar de liberdade para utilizarse da exploração e, ao mesmo tempo, desprezar as consequências deste comportamento. A presente realidade é significativa do fenômeno do deslocamento das organizações. Vejamos porque isso ocorre: A facilidade com que as fábricas ‘enxutas’ conseguem se deslocar de um espaço geográfico para outro, teria significado, 54 por um lado, o aumento do poder discricionário das empresas, sempre em busca de lugares com mão de obra barata e grandes incentivos fiscais (como acontece com os países tardiamente industrializados); por outro lado, teria feito crescer a importância econômica e política dos locais onde estão instaladas as empresas reestruturadas, a partir do momento em que esses locais passaram a fazer parte de um circuito global” (RAMALHO; SANTANA, 2006: p. 13). Intrínseco ao fenômeno da globalização, os deslocamentos são propiciados não só pelos transportes, mas também pela velocidade da comunicação, decorrente das inovações tecnológicas. O início dos deslocamentos é característico do processo de reestruturação produtiva, espalhados geograficamente pelo planeta, onde as indústrias não conheciam a diversidade e a complexidade tecnológica que permitem a produção de bens de consumo em regiões como a Amazônia por exemplo. A Amazônia se insere e se adapta ao perfil das indústrias locais, cujas instalações são oriundas da política industrial de isenção fiscal. A relação da economia global com a economia local permite-nos compreender melhor a dinâmica das estratégias de produção em nível local, bem como possibilita-nos perceber os métodos de organização da produção aqui desenvolvidos por estas empresas, de como elas podem aumentar suas capacidades de competir no mercado. A motivação encontrada para solucionar os problemas gerados pela economia capitalista tem início a partir da crise econômica, cuja expressão fundamental é a incompatibilidade da alta produção com o consumo. O plano de Keynes tinha por objetivo estabilizar a economia-mundo propiciada pelas estratégias administrativas e científicas, por meio do poder do Estado.19 As formas de intervenções estatais variaram de acordo com o desempenho dos gastos públicos, na organização do Estado de bem-estar social obtido nos diversos países. O fordismo no pós-guerra teve êxito, não só nos Estados Unidos, mas também na Europa, nos quais seus governos estenderam tal apoio com substancial investimento financeiro. Essa foi uma 19 O Estado teve de assumir novos (keynesianos) papéis e construir novos poderes institucionais; o capital corporativo teve de ajustar as velas em certos aspectos para seguir com mais suavidade a trilha da lucratividade segura; e o trabalho organizado teve de assumir novos papéis e funções relativos ao desempenho nos mercados de trabalho e nos processos de produção. (HARVEY, 1992: p. 125) 55 opção de ação da política econômica feita para um número significativo de países europeus. O fordismo do pós-guerra tem de ser visto menos como um mero sistema de produção em massa do que como um modo de vida total. Produção em massa significava padronização do produto e consumo de massa, o que implicava uma nova estética e mercadificação da cultura [...] O fordismo se apoiou na, e contribuiu para a, estética do modernismo – na inclinação desta última para a funcionalidade e a eficiência – de maneiras muito explícitas, enquanto as formas de intervencionismo estatal (orientadas por princípios de racionalidade burocráticotécnica) e a configuração do poder político que davam ao sistema a sua coerência se apoiavam em noções de uma democracia econômica de massa, que se mantinha através de um equilíbrio de forças de interesse especial (HARVEY: 1992: p. 131). O internacionalismo econômico aprofundou sua intervenção de modo a trazer em sua bagagem atividades na área de serviços financeiros, hoteleiros, turísticos, de terminais de transportes, dentre outras, e, se apoiou fortemente em capacidades recém-descobertas de reunir, avaliar e distribuir informações. Podemos afirmar, então, que a dinâmica da produção fordista será caracterizada pelas articulações sociais germinadas por novas estratégias que afetam as atividades imateriais de pesquisa e desenvolvimento da comunicação e do marketing, do design e da formação. As últimas décadas do século XX marcaram a desestruturação do ciclo de produção e da forma de reprodução do capital. A crise econômica, oriunda do modelo fordista, por efeito, levou a um deslocamento de vários setores da força de trabalho dos centros metropolitanos de produção, para desempenhar o processo produtivo em outros espaços territoriais. As análises que explicam a crise do capital do final da década de 1960 e início da década de 1970 põem em relevo o declínio da produtividade e dos lucros das empresas após 1966. Para estes analistas, a crise afetou diretamente a arrecadação pública dos Estados Unidos, que após a aceleração da inflação deu o status de moeda-reserva internacional (HARVEY, 1992; ANTUNES, 1999). 56 As grandes corporações deverão, obrigatoriamente, buscar uma alternativa para a crise gerada no pós-guerra: “Há hoje, não sem razão, um interesse crescente a respeito da necessidade de uma reestruturação da economia.” (MÉSZAROS, 2002: p. 1071) Essa necessidade por parte do capital é decorrente do diagnóstico e impacto na taxa média de lucro do grande capital mundial, a partir deste período. Conforme analisamos antes, as organizações entraram em uma busca desenfreada no sentido de achar uma solução para essa crise. Portanto, a reestruturação produtiva deve ser compreendida nos marcos da tentativa de recuperação e ampliação da sua taxa de lucro, estabilidade e condições favoráveis de disputa no mercado internacional. A reestruturação produtiva surge então, neste contexto, para responder e adequar o conjunto da produção à nova realidade da indústria e do mercado mundial. Para tanto, torna-se necessário remodelar a sua capacidade produtiva à mão de obra, às máquinas e equipamentos, tudo isto combinado à estratégia da descentralização da produção e à flexibilização dos direitos trabalhistas. A deflação entre os anos de 1973-1975 gerou uma séria crise “fiscal e de legitimação”. A falência técnica de Nova Iorque revelou o quanto o problema era grave. Simultaneamente a isso, a capacidade de criar excedente levou as corporações a lançarem-se numa desenfreada competição. Estes fatores explicam as razões da racionalização, reestruturação e intensificação do controle do trabalho (caso pudessem superar ou cooptar o poder sindical). A mudança tecnológica, a automação, a busca de novas linhas de produto e nichos de mercado, a dispersão geográfica para zonas de controle do trabalho mais fácil, as fusões e medidas para acelerar o tempo de giro do capital passaram ao primeiro plano das estratégias corporativas de sobrevivência em condições gerais de deflação (HARVEY, 1992: p. 136-7-140). A reestruturação produtiva é uma realidade dinâmica, diversa e multiplicadora. Da mesma forma como não se dá de modo dissociado dos interesses do modo de produção capitalista. Assim: Os enormes investimentos capitalistas na produção são a base material das atuais reestruturações produtivas de mais valias, 57 que se produzem e se reproduzem e se renovam sem parar. Não existe apenas uma reestruturação do processo de trabalho.[...] Essas reestruturações se multiplicam como cogumelos, na medida e na velocidade exata em que se aprofunda e se amplia globalmente o processo de valorização do capital[...] (MARTINS (1999: p. 47). As fortes mudanças na organização da produção industrial estão diretamente ligadas, em um primeiro momento, à impactante crise sobre a produção industrial a partir de 1973-1974, pelo frágil aumento de 7% da demanda, em decorrência do aumento do preço do petróleo, consequentemente, da gasolina, em mais de dez anos, sobretudo na Europa e no Japão e a diminuição da demanda de veículos nos Estados Unidos. O registro de veículos neste país, em particular, representou uma baixa de US$ 11,4 milhões em 1973 e de US$ 10,5 milhões 1988. O segundo momento do choque do petróleo ocorreu em 1979, quando o barril saltou de US$ 13,30 e, em seguida para US$ 26,00 dólares. Acrescente-se a isso a saturação do mercado de veículos no mundo: onde, “[...] a maioria dos países industrializados está perto de atingir o nível teórico da saturação, ou seja, o número máximo de veículos por mil habitantes que o país pode ter. Isso quer dizer que a única demanda de carros novos que subsiste, caso se alcance o nível de saturação, é a demanda de substituição. Em outras palavras, só comprarão automóveis as famílias que substituem seu carro usado (ou novas famílias que substituem as velhas). A demanda de substituição ocupa um lugar crescente: 47,9% do total em 1960, 49,1% em 1970, 58% em 1980[...]” (GOUNET, 2002: p. 16). Um dos efeitos da recomposição da lógica geral do capital é a falência de parques industriais inteiros de determinadas regiões que não apresentam condições de permanecer competindo no mercado em face do peso da concorrência desigual das grandes corporações e da força da empresa transnacional. No entanto, não menos afetado e destruído é o contingente enorme de trabalho e das forças produtivas, das populações que vivem de salário, em condições de trabalho precarizado, ou nas redes da informalidade. Por isso, inúmeras organizações vêm se valendo hoje de estratégias cujo objetivo é a sua permanência no mercado e com muita força competitiva. 58 Uma das alternativas encontradas é a constituição de redes produtivas. A rede informacional não é mais uma metáfora para a constituição das redes de produção, mas parte utilitária desse fenômeno. 1.7 AS REDES DE EMPRESAS NO PROCESSO DE GLOBALIZAÇÃO NA ZONA FRANCA DE MANAUS O fenômeno das redes de empresas vem se configurando como estratégia organizacional. É também um processo, cujo símbolo é a sua conexão com a rede de computadores, e tem-se materializado teórica e praticamente no fim das distâncias. Trata-se de uma mudança do caráter do espaço que, por um lado, se desprende da subordinação natural do corpo humano, por outro, esse descontrole dificulta a solidariedade, o controle dos conflitos interpessoais e demais resoluções físicas mediadas pela noção da proximidade. A nova realidade da rede mundial de informática reordenou também o aspecto geográfico. Isso explica o fato de o espaço cibernético poder assumir o lugar do planejamento do ambiente territorial-urbanístico-arquitetônico, embora este não seja comum a todas as pessoas. Porque nem todos têm o direito de acesso aos espaços, nem territoriais e nem virtuais. O acesso à informática, por exemplo, ainda é um privilégio de poucos. Admite-se, ainda, que seja possível separar pessoas por obstáculos físicos e distâncias temporais, sobretudo porque se trata de um processo ainda transitório (BAUMAN, 1999). Lévy (1997), ao fazer uma breve análise funcional sobre o fenômeno da rede digital mostra que a imprevisibilidade é uma característica da informática. A informática não possui uma identidade estável [...] porque os computadores, longe de serem os exemplares materiais de uma imutável ideia platônica, são redes de interfaces abertas novas conexões, imprevisíveis, que podem transformar radicalmente seu significado e uso [...] (LÉVY, 1997: 102). Há duas décadas, este autor analisava a natureza do domínio da rede digital. Naquele tempo, a rede digital além de não possuir a força e a abrangência da sua capacidade, não exercia a forte influência que tem em certos setores da 59 economia na atualidade. A digitalização é compreendida como tecido nuclear de concentração dos meios de comunicação. A digitalização tem a capacidade de fazer a conexão entre o cinema, o rádio, a televisão, o jornalismo, a música, a informática e as telecomunicações. Essa análise compõe o certificado do grande salto na inovação tecnológica realizada pela sociedade moderna, no entanto a nova realidade contemporânea, eivada de um sofisticado aparato tecnológico, vem experimentando o liame entre a condição humana de um lado e a sua perda de outro. Os padrões bipolares de mundo expõem, de um lado, uma realidade que oferece dignidade e de outro que oferece a humilhação. Por um lado, um mundo revelado pelos que ostentam riqueza, por outro o que experimenta social e materialmente a pobreza e a miséria. Este é também o contexto das novas estruturas organizacionais. A reorganização estratégica do capital se caracteriza, sobretudo, pela novidade dos setores de produção, serviços financeiros, elevadas taxas nos componentes das relações de produção, da tecnologia, do comércio, da ampliação do movimento do setor de serviços, por meio do desenvolvimento desigual entre setores, e até mesmo entre regiões, e, por meio da tecnologia informacional. Trata-se de potencializar a capacidade de criar novas indústrias em lugares antes inteiramente subdesenvolvidos. É o caso de algumas regiões que ficaram conhecidas como a “terceira Itália”, Flandres, dentre outras. As empresas permanecem buscando alternativas para evitar possíveis desvantagens na produtividade, no faturamento e na perda de espaço, na disputa no interior do mercado. Para isso, as empresas têm realizado interna e externamente um movimento no sentido de intensificar o desenvolvimento das redes telemáticas. A utilização deste recurso tecnológico exige uma intervenção maior dos trabalhadores na produção. Esta operação redimensionou em importância o papel dos trabalhadores, como elemento central no processo de produção (COCCO, 2001). Isso acontece pela necessidade decorrente da introdução e utilização das redes telemáticas, principalmente quando os trabalhadores mostram sua capacidade operacional dentro da fábrica, diante da máquina, frente à possibilidade de antecipar 60 imprevistos e possíveis falhas dos programas automáticos e dos sistemas integrados. Essa análise se reveste de significado, porque, a partir dela, pode-se perceber uma série de alterações ocorridas no domínio do trabalho, e ainda podemos ver sua recomposição em curso. Trata-se de uma recentralização no contexto e na compreensão das teorias que cercam o problema da centralidade e da crise do trabalho.20 Podemos perceber também que o trabalho vivo está assumindo e reassumindo uma nova centralidade face ao recuo da utilização dos recursos automáticos na indústria. Esse aspecto revela um dos inimigos mais temíveis e vorazes dos trabalhadores, o problema do alto índice de desemprego. O desemprego ganha nessa nova fase da economia a conotação de ser de natureza estrutural. Ele aparece não somente como fato, mas também, como forma de legitimação e, em uma alta velocidade. Carregada de capacidade de eliminação de habilidades, de postos de trabalho e de redução dos salários dos trabalhadores que permanecem na engrenagem da máquina produtiva, além da subcontratação, do recuo e controle do poder de fogo do movimento sindical. As grandes empresas estão integradas e se integrando às redes virtuais com a finalidade de estruturar-se. Essa recomposição do trabalho vivo é identificada com a ênfase dada à subjetividade do trabalho, na qual lhe é permitida a criatividade no processo de produção, sendo aproveitada pelas fábricas. As grandes empresas utilizam estes novos métodos gerenciais coexistentes com “as dimensões do trabalho” (COCCO, 2007: p. 100). A Benetton é um caso típico de rede produtiva. Trata-se de um tipo de organização em cadeias produtivas. É uma forma intermediária de arranjo entre a desintegração vertical por meio dos sistemas de subcontratação de uma grande empresa juntamente com as redes horizontais das pequenas empresas. É uma rede horizontal, mas baseada em um conjunto de relações entre 20 Claus Offe expôs a polêmica sobre a centralidade do trabalho como categoria de análise no cenário contemporâneo, em seu ensaio Capitalismo Desorganizado. O rompimento com as regras de regulamentação corporativa, na circunstância atual, encontra-se sob os regulamentos do mercado. (OFFE, 1989). Esse problema pode teoricamente, mas também, hoje, empiricamente ser amplamente questionada, uma vez que diversos estudos atuais tem indicado a permanência do trabalho devido ao aumento da sua complexidade, no que diz respeito à inovação tecnológica. 61 empresas periféricas e empresas centrais, tanto no lado da oferta quanto no lado da demanda do processo. No plano da organização das empresas, podemos explicitar a experiência da implantação de redes produtivas nos Estados Unidos, usada como estratégia para aumentar o controle financeiro, a expansão e a transparência no interior dos negócios de cada organização. Vislumbra-se, ainda que a transformação organizacional ocorreu de modo independente da transformação tecnológica. Conclui-se, disso, que a inserção das novas tecnologias de informação intensificou as mudanças organizacionais. Pelo menos seis experiências são identificadas por CASTELLS (2006) como modelos organizacionais em transformação. A primeira é a passagem da produção em massa, também conhecida como produção rígida, para a produção flexível. A segunda tem a ver com a crise das grandes corporações, e ao mesmo tempo, a flexibilidade das médias e pequenas empresas, nas quais se verificou não só um processo de inovação, mas também a criação de empregos. Como efeito da crise na produção, o cenário de transição da produção em massa para a produção flexível colocou as organizações tradicional e tipicamente rígidas em cheque. Essa crise atingiu as grandes empresas e pressionou as médias e pequenas empresas a flexibilizarem os procedimentos no processo de produção. Pois, [...] ao mesmo tempo, é verdade que as empresas de pequeno e médio porte parecem ser formas de organização bem adaptadas ao sistema produtivo flexível da economia informacional e também é certo que seu renovado dinamismo surge sob o controle das grandes empresas, as quais permanecem no centro do poder econômico na nova economia global. Não estamos testemunhando o fim das poderosas empresas de grande porte, mas estamos, sem dúvida, observando a crise do modelo corporativo tradicional baseado na tradição vertical e no gerenciamento hierárquico: o sistema de “funcionários e linha” de rígida divisão técnica e social do trabalho dentro da empresa” (CASTELLS, 2006: 214). O terceiro modelo está relacionado com os novos métodos de gerenciamento, dos quais a maioria deriva das empresas japonesas, como o kanban e o Just in time com o claro objetivo de minimizar custos. (Analisaremos abaixo). Sem dúvida as inovações tecnológicas foram 62 fundamentais para alavancar esse novo tipo de estratégia administrativa da produção industrial. Todos nós sabemos hoje que as inovações tecnológicas têm a capacidade de transcender para outras esferas. Um quarto modelo é intrínseco ao desdobramento do toyotismo. Pois o sistema de gerenciamento deste consiste menos em motivar a adaptabilidade e mais em diminuir as incertezas. Este sistema tem buscado também adotar a flexibilidade no processo de produção. O sistema de gerenciamento do toyotismo revela sua originalidade quando elimina “a função de trabalhadores profissionais especializados para torná-los especialistas funcionais” (CASTELLS, 2006: p. 216). Existem dois outros tipos de flexibilização organizacionais na esfera internacional. Trata-se de um quinto modelo, segundo o qual se vislumbra“[...] o modelo de redes multidirecionais posto em prática por empresas de pequeno e médio porte e o modelo de licenciamento e subcontratação de produção sob o controle de uma grande empresa” (CASTELLS, 2006: p. 218). O sexto modelo organizacional é uma nova tendência que está ocorrendo entre grandes empresas, este fenômeno ficou conhecido como alianças estratégicas. Esse tipo de aliança é diferente do que conhecemos como acordos oligopolistas, nos aspectos relacionados, à época, ao mercado, aos produtos e aos processos, bem como não exclui a concorrência em espaços que se encontram fora do acordo. Assim: [...] a grande empresa nessa economia não é – e não mais será – autônoma e auto-suficiente. A arrogância das IBMs, das Philips ou das Mitsuis do mundo tornou-se questão de história cultural. Suas operações reais são conduzidas com outras empresas: não apenas com as centenas ou milhares de empresas subcontratadas e auxiliares, mas dezenas de parceiras relativamente iguais, com as quais ao mesmo tempo cooperam e competem neste admirável mundo novo econômico, onde amigos e adversários são os mesmos (CASTELLS, 2006: p. 220-21). Para prevenir-se da imprevisibilidade das mudanças no mercado e das inovações tecnológicas, as empresas estão transformando o seu modelo organizacional. A transformação mais importante ocorre na mudança das 63 burocracias verticais para a empresa horizontal. A funcionalidade da empresa horizontal vislumbra sete tendências, quais sejam: Organização em torno do processo, não da tarefa; hierarquia horizontal; gerenciamento em equipe; medida do desempenho pela satisfação do cliente; recompensa com base no desempenho da equipe; maximização dos contatos com fornecedores e clientes; informação, treinamento e retreinamento de funcionários em todos os níveis. Essa transformação do modelo corporativo, especialmente visível nos anos 90 em algumas importantes empresas norte-americanas (como a ATT), acompanha a percepção dos limites do modelo da ‘produção enxuta’ experimentado na década de 1980 (CASTELLS, 2006: p. 221). O ritmo dessas mudanças levou os especialistas a perceberem os limites da fábrica enxuta. Baseado no custo mínimo da força de trabalho, articula-se ainda ao uso da automação, ao controle dos trabalhadores por meio informacional, à terceirização da mão de obra e à diminuição da produção. Ao mesmo tempo em que o modelo da fábrica enxuta reduziu custos, “perpetuou as estruturas organizacionais obsoletas enraizadas na lógica do modelo de produção em massa sob as condições de controle dos mercados oligopolistas” (CASTELLS, 2006: 221). Sustentando-se em IMAI, CASTELLS (2006) mostra que o processo de internacionalização dos negócios empresariais se fundamentou em três estratégias. A primeira e também a mais tradicional é a estratégia em que as empresas atuam a partir das suas plataformas nacionais no exterior, em uma grande quantidade de mercados locais. A segunda estratégia tem, por objetivo, intervir no mercado global. Ela organiza as diferentes atividades das empresas, nos diferentes espaços do mercado “integrados em uma rede estratégia global articulada” (CASTELLS, 2006: p. 222). A terceira estratégia está fundamentada em redes internacionais. Nesse tipo de redes internacionais, propiciado por um contexto mais avançado, em termos econômico e tecnologicamente, forma-se um cenário no qual as empresas estabelecem relações com vários mercados locais, bem como o de realizar trocas de informações entre esses mercados envolvidos pela rede. Essas empresas estão interessadas em atuar 64 diretamente nos mercados, ou seja, elas preferem intervir nas fatias de mercado estabelecidas para controlar as empresas de fora. Significa que: Essa estrutura internacional permite que pequenas e médias empresas se unam a empresas maiores, formando redes capazes de inovar e adaptar-se constantemente. Assim, a unidade operacional real torna-se o projeto empresarial, possibilitado por uma rede, em vez de empresas individuais ou agrupamentos formais de empresas. Projetos empresariais são implementados em campos de atividades, tais como linhas de produtos, tarefas organizacionais ou áreas territoriais (CASTELLS, 2006: p. 222). Diante da crise que atingiu os sistemas organizacionais, também chamadas de empresas rígidas, CASTELLS (2006) expõe um interessante diagnóstico desse fenômeno das novas estruturas organizacionais (das redes internacionais) ao analisar o desenvolvimento histórico das transformações nas estruturas organizacionais. Para o autor, “As redes são e serão os componentes fundamentais das organizações. E são capazes de formar-se e expandir-se por todas as avenidas e becos da economia global [...]” (idem.: p. 225). Certamente que isto é permitido pela utilização da informação decorrente do desenvolvimento do novo padrão de tecnologia. Assim, CASTELLS (2006) define a empresa em rede como: [...] aquela forma específica de empresa cujo sistema de meios é constituído pela intersecção de segmentos de sistemas autônomos de objetivos. Assim, os componentes da rede tanto são autônomos quanto dependentes em relação à rede e podem ser uma parte de outras redes e, portanto, de outros sistemas de meios destinados a outros objetivos. Então, o desempenho de uma determinada rede dependerá de dois de seus atributos fundamentais: conectividade, ou seja, a capacidade estrutural de facilitar a comunicação sem ruídos entre seus componentes; coerência, isto é, a medida em que há interesses compartilhados entre os objetivos da rede e de seus componentes (2006: p. 232). Portanto, podemos compreender até aqui, não só a importância do desenvolvimento da informação e do novo paradigma tecnológico, pois, os mesmos reúnem as condições e facilidades para a realização das conexões, na troca de informações entre as empresas redes. 65 Mas há, segundo CASTELLS (2006), uma diferença fundamental entre esses dois tipos de organizações: um deles é a burocracia. São organizações para as quais a reprodução de seu sistema de meios se transforma em seu objetivo organizacional fundamental. Os objetivos e as mudanças de objetivos das organizações modelam e remodelam de forma infinita a estrutura dos meios. Com base nessa diferenciação conceitual, vai-se propor um conceito de empresa rede: uma forma específica de empresa cujo sistema de meios é constituído pela interseção de segmentos de sistemas autônomos de objetivos. É como se cada empresa atuasse de modo autônomo. No entanto, cada uma é parte da cadeia intermediária da produção. Em sua tese afirma que: O surgimento da economia informacional global se caracteriza pelo desenvolvimento de uma nova lógica organizacional que está relacionada com o processo atual de transformação tecnológica, mas não depende dele. São a convergência e a interação entre um novo paradigma tecnológico e uma lógica organizacional. Contudo, essa lógica organizacional manifestase sob diferentes formas em vários contextos culturais e institucionais (CASTELLS, 2006: p. 210). A novidade emergente no cenário da produção é a noção de trajetórias da diversidade de organizações e métodos de produção. Refere-se a “procedimentos de sistemas de meios específicos voltados para o aumento da produtividade e competitividade no novo paradigma tecnológico e na nova economia global” (CASTELLS, 2006: p. 211). As inovações tecnológicas têm evidentemente uma influência capital na mundialização da cultura, formando a infra-estrutura material para que ela se consolide. Computador, fax, satélites possibilitam a comunicação a distância, favorecendo o desenvolvimento das cadeias televisivas planetárias e das firmas globais (ORTIZ, 1994: P. 62). É nesse ambiente das inovações tecnológicas onde irá ocorrer a materialização da intensificação da empresa-rede. Em uma forma definida de cultura econômica informacional/global e num movimento de atividades econômicas virtuais pelo processamento de conhecimento. Entendido dessa forma, a empresa-rede é hoje a metáfora da modernidade reflexiva, na qual está implicada uma conjugação incontável de conhecimentos técnicos, de 66 técnicas imputadas, de relações de confiança, de sistemas peritos, de um enorme exército de operadores operando esses sistemas por meio de computadores, pela internet, pelos sites, por e-mails, por telefone, dentre outros meios sofisticados de comunicação. São engenheiros de produção, administradores, marketings, que transformam estes recursos sofisticados do mundo eletrônico para trocar ideias, divulgar, administrar, orientar estratégias empresariais e ministrar conferências a distância. As empresas-redes podem ser compreendidas concretamente nas relações de negócios entre empresas adquirentes, ou compradoras e empresas adquiridas, ou fornecedoras. No estudo de CASTRO Et al (2008), são reveladores de mudanças que vem ocorrendo na dinâmica das negociações entre essas organizações. Essas metamorfoses podem intensificar as relações de interdependência entre as empresas implicadas na rede, dependendo do grau de interdependência dos fornecedores envolvidos na rede de acordo com o seu nível de organização e de como eles desenvolvem a troca. A preocupação deste estudo consiste, sobretudo, em identificar os pontos de mudança, as diferentes maneiras de compra e venda, as relações de inserção da adquirida e como as empresas são afetadas no relacionamento da adquirida com seus fornecedores no processo pósaquisição. As mudanças desenvolvidas nas empresas são teoricamente de ordem evolucionária e revolucionária. Essas mudanças no geral ocorrem no processo pós-aquisição. A primeira ocorre com mais freqüência, “por serem decorrentes do processo constante de interação entre os atores e implicam diretamente na manutenção dos atores conectados, atividades interligadas e vínculos de recursos dos relacionamentos (CASTRO et al, 2008: p. 815)”. As mudanças revolucionárias ocorrem com muita raridade. No geral são resultantes de “extinção de relações, com conseqüente quebra de conexões, interligações e vínculos ou no estabelecimento de novos relacionamentos” (CASTRO et al, 2008: p. 816). A interdependência das empresas é explicada pelas constantes influências recíprocas principalmente se o componente matéria-prima ou insumo for crítico para o processo produtivo. A frequência dos contatos 67 pessoais pode gerar as condições adequadas para a realização de relacionamento duradouro entre comprador e fornecedor. Ambiente adequado para a interação de conhecimento estratégico entre organizações empresariais. O critério preço pode não afetar a negociação entre comprador e fornecedor, porque as relações pessoais são, em certos casos, determinantes para a conclusão da negociação. A mundialização do processo produtivo é um fenômeno intrínseco à internacionalização generalizada do capital. As sedes das grandes organizações industriais não se concentram tão somente nos chamados países centrais, mas são parte da vida e da dinâmica de regiões, países e cidades distantes de suas matrizes. Essa dimensão “impatriótica” (in natura) do capital, suas tecnologias, seus padrões de produção, reproduzem a lógica capitalista da acumulação de capital por meio de novos modelos de organização da produção e do trabalho. Nesse sentido, o fordismo, o toyotismo dentre outros métodos de produção, estarão hibridizados numa teia de comando para orientar e ampliar a produtividade. Essas mudanças “são expressão da reorganização do capital com vistas à retomada do seu patamar de acumulação e ao seu projeto global de dominação” (ANTUNES, 2005: p. 50). O fenômeno da transnacionalização é em primeiro lugar, uma estratégia empresarial, cuja finalidade é a recuperação da taxa média da lucratividade dos capitalistas (ANTUNES, 2005) e da reconstrução da economia mundial (DUPAS, 2002), no qual as medidas econômicas estabelecidas no acordo de Bretton Woods de 1944 foram fundamentais. Momento também da criação do Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento - BIRD, o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional - FMI, hoje, entidades supranacionais, subordinadas às políticas dos Estados Unidos. Esse fenômeno, como uma das faces da chamada globalização é imprescindível de uma reflexão, breve que seja, para que possamos compreendê-la não de modo unilateral, mas buscando nos deter na realidade para absorver as possíveis variações do desenvolvimento da economia e da inserção das empresas transnacionais em diversos países e regiões do planeta. 68 Esse processo pode ser visto, a princípio, de modo contraditório. Por um lado, a globalização é analisada como uma questão positiva, em que as regras da globalização, medidas geralmente definidas em grandes fóruns supranacionais, entre líderes dos países de maior poder econômico, são dados como irreversíveis. Por outro, as regras da globalização podem ser questionadas dentro de um ponto de vista da soberania nacional e dos direitos de autodeterminação, por movimentos locais e regionais. Assim, por um lado, o nacionalismo, invocando, uma espécie de “paz perpétua”, como a de inspiração Kantiana, o que seria uma provável solução para conflitos e rebeliões internas ou nacionais, geralmente são tachados ou adjetivados como atos de irracionalidade de grupos ditos rebeldes, que entram em conflito contra a intervenção de empresas estrangeiras, por afetarem os interesses de segmentos econômicos locais. E, ao julgarem tais nações como irracionais, por não aceitarem as suas regras, condenam as mesmas ao isolamento da ordem e dos vínculos entre os países capitalistas. O que leva a BAUMAN (1999) chamar de criminalização da pobreza. Entretanto, quando não se pode apaziguar, apela-se para as forças repressivas. Do ponto de vista político, tanto o discurso da paz perpétua, quanto o uso da força repressiva acabam viabilizando a “própria tendência transnacionalmente expansionista do capital” (MÉSZÁROS, 2002: p. 227). Nessa perspectiva, a globalização não pode ser vista como fato meramente acidental, mas como processos hierárquicos.21 Por outro lado, os discursos conservadores de preservação do capitalismo são imperativos categóricos contra as vozes que evocam a defesa e libertação dos explorados e oprimidos, externados nos países subdesenvolvidos. E o fazem colocando um sinal de igualdade às vozes da teologia da libertação (representativa de setores religiosos, principalmente da Igreja Católica, cuja ideia inspira a opção pelos pobres) com o nacionalismo. Portanto, a religião e o nacionalismo de resistência, formariam juntos, uma poderosa força religiosa, figurando-se supostamente como um tipo de “pandemônio étnico”, visto que daria no mesmo resultado de comportamento 21 BAUMAN esclarece a condição do controle econômico, político e social no processo de globalização, no qual se vive e se assiste a uma nova distribuição de “privilégios e carências, de riqueza e pobreza, de recursos e impotência, de poder e ausência de poder, de liberdade e restrição”. (1999: p. 75-6) 69 irracional. Do mesmo modo, tanto a questão nacional, quanto a proposição da idealização do capitalismo pelas forças conservadoras liberais se encontram nas duas fórmulas possíveis, ou seja, se a solução não couber pela alternativa democrática, então que seja resolvida por meio da repressão (MÉSZÁROS, 2002). A realidade é demonstrativa de uma postura conservadora, de que os interesses econômicos dos países dominantes sempre foram por eles próprios defendidos, isto é, referimo-nos a incursão das grandes corporações multinacionais22 que atuam como empresas transnacionais nos países periféricos, e têm um caráter de empresas transnacionais, porém, em seus países de origem, essas corporações sempre foram protegidas, e seguem sendo verdadeiras entidades empresariais nacionais. A figura dessa afirmação se encontra, sem nenhum constrangimento, materializada na condição do quê, como, quanto, quando produzir e de quem controla a produção tecnológica, onde centralmente se dá esse processo. Os países dominantes jamais abriram mão, e continuam dando a sentença de que o controle seja operado nas artérias centrais da economia do mundo. As grandes firmas transnacionais são do ponto de vista da sua matriz, empresas que têm atuação econômica global. Robert B. Reich, por exemplo23, defende em seu livro o Trabalho das Nações, a integração do trabalho em cadeia mundial, e, simultaneamente um nacionalismo econômico positivo estadunidense. Essa anexação do trabalho, que projeta a utilização da mão de obra dos países periféricos feita por Reich é raciocinada sem o rigor das contradições do antagonismo de classes e das desigualdades congênitas do próprio capitalismo. Para o autor de o Trabalho das Nações, a tese de conciliação está fundamentada no estabelecimento de um ‘nacionalismo positivo’, num movimento combinado com a emancipação social dos ‘analistas simbólicos’ como uma nova categoria política dominante. Ou seja, o conteúdo 22 A expressão “multinacional” é freqüentemente usada de modo completamente equivocado, ocultando a verdadeira questão do domínio das empresas das empresas capitalistas de uma nação mais poderosa sobre as economias locais - em perfeita sintonia com as determinações e os antagonismos mais profundos do sistema do capital global. De modo geral, as nações capitalistas dominantes defenderam seus interesses com todas os meios à sua disposição – pacíficos enquanto possível, mas recorrendo à guerra se não houver outra forma. (MÉSZÁROS, 2002: p. 229) 23 Secretário do trabalho do então presidente dos EUA Bill Clinton e ex-professor da Universidade de Havard. 70 do desenvolvimento das empresas transnacionais, oculta o real sentido de sua atuação flexível nos países periféricos e a necessária proteção em seus países de origem, para a manutenção do capitalismo. Porque sua manutenção depende também do sucesso das grandes corporações. A interação entre o capital transnacional e os Estados matrizes das transnacionais pode ser esclarecida a partir da análise a respeito da idéia da individualidade política. Sustentado em A Filosofia do Direito de Hegel, Mészáros enfatiza criticamente que, por um lado, a designação da individualidade do Estado não garante a sua soberania. Essa individualidade é o pressuposto da liberdade legitimada pela soberania de cada Estado individualmente, detentor de poder absoluto. Contudo tal soberania está condicionada ao reconhecimento de outros Estados (seus países vizinhos). Logo, um determinado Estado, antes, com poderes irrestritos, depende agora do juízo e da vontade de outros Estados, que pode ser o juízo e a vontade de um Estado maior e mais poderoso. Seguindo essa lógica, Hegel oferece, por um lado, a estabilidade ao Estado-Nação como o poder absoluto e, por outro, a retira com a condição de que precisa ser mediada pelo reconhecimento dos Estados vizinhos. Nesse sentido, Hegel não permite a existência de uma solução necessária para resolver o problema da soberania nacional. Nessa perspectiva, as ações das grandes transnacionais podem ser pensadas como que sustentadas nessa mesma lógica, em que a hegemonia de um Estado reflete na intervenção monopolista do capital. Observando dessa forma, O capitalismo monopolista é um sistema constituído de empresas gigantes. Isto não quer dizer que não existam outros elementos no sistema, ou que é inútil estudar o capitalismo monopolista com abstração de tudo exceto das empresas gigantes. Será mais realista e mais esclarecedor incluir, desde o início, juntamente com o setor monopolista, em setor mais ou menos amplo de pequena empresa, pois esta participa, de muitas formas, nos cálculos e estratégias da grande empresa. Fazer abstração das empresas menores seria excluir do campo de investigação alguns determinantes do comportamento da grande empresa. (BARAN; SUEEZY, 1974: p. 60) Portanto não é possível separar o antagonismo da relação entre capital transnacional em processo de expansão e os Estados nacionais das 71 contradições existentes entre as dicotomias: monopólio e competição; do aumento da produção social e da apropriação seletiva dos resultados dessa produção; da expansão progressiva da divisão internacional do trabalho e do avanço da dominação das grandes empresas, no sentido de estas se afirmarem sobre os antagonismos estruturais do capital. 1.8 ESTRATÉGIAS GLOBAIS E A INSERÇÃO DAS TRANSNACIONAIS NA AMAZÔNIA No contexto de hegemonização da intervenção das grandes transnacionais, podemos perceber a combinação de processos de legitimação das grandes corporações, no geral, pertencentes a Estados industrial e tecnologicamente desenvolvidos, com a incorporação dos processos produtivos das suas indústrias em territórios diversos no planeta, acompanhados de um conjunto de inovações organizacionais e tecnológicas, bem como, com a aplicação dos distintos procedimentos produtivos, dentre eles, modelos ou técnicas japoneses, que se dissolvem nas transformações experimentadas desde a década de 1950. Nessa perspectiva, o toyotismo é parte dessas mudanças. Esse modelo ou método organizacional surgiu no cenário do pós-Segunda Guerra Mundial, numa economia em crescimento desacelerada. Trata-se de um ambiente com matizes e elementos contraditórios. Por um lado, tem-se um mercado interno fértil para o consumo de bens e serviços, e ainda, diversificado, típico desse modelo, por outro lado, uma demanda, dita pelos economistas, reprimida. A operação da demanda que determina a produção tem como núcleo central o esquema Just-in-time. Desse modo, o Kanban vem a ser a legitimação dessa produção sustentada pela reposição dos produtos. Na verdade, o método Toyota é descrito por Benjamim Coriat como “a combinação de dois princípios [...]. Estes pilares são, segundo os próprios termos do mestre japonês, “1) a produção Just in time, e 2) a ‘auto-ativação’ da produção” (OHNO apud CORIAT, 1994: p. 29). 72 Esse modelo é uma criação de experiências bem sucedidas na implementação em processos produtivos. A autonomação, por exemplo, foi inspirada no mecanismo aplicado com originalidade numa fábrica têxtil, unidade produtiva da mesma companhia japonesa, cujo fundador é Kiichiro Toyoda. A terminologia autonomação é a combinação de outras duas: autonomia e automação. A automação consiste na adaptação de um mecanismo às máquinas, possibilitando-as de funcionar sem a interferência direta da supervisão humana, e, sem produção de peças com defeito. Desse modo, diferente do modelo taylorista/fordista, agora apenas um operário é suficiente para manipular até cinco máquinas. O modelo toyotista possui a característica de concentrar múltiplas atividades num único espaço, considerando que um só trabalhador pode operar várias máquinas. Essa ideia levou a Ohno convergir as atividades para um sistema, no qual um único espaço poderia concentrar várias etapas da produção juntas, bem como: a de programação de máquinas, o planejamento e a coordenação da produção, além da manutenção do aparato produtivo e do controle de qualidade dos produtos, sem contar evidentemente com a transformação propriamente dita dos insumos e matérias-primas em produtos intermediários ou acabados (PINTO, 2007: P. 75-6). É dessa forma que vai surgir a ‘multifuncionalidade’, também conhecida como trabalho polivalente, ou seja, é a capacidade que o trabalhador possui de desenvolver múltiplas habilidades no processo de produção na fábrica. É o movimento da fusão de várias atividades. Porque antes cada função estava ligada a diferentes setores de atividades, isto é, a polivalência do trabalho leva os operários a agregar e cumprir com várias funções dentro da sua jornada de trabalho. A atividade no âmbito da ‘multifuncionalidade’ tinha por objetivo fazer e possibilitar aos trabalhadores assimilar o conhecimento de todo o processo produtivo. Esse procedimento permite o desenvolvimento de múltiplas habilidades, com possibilidades de reaproveitamento no dia-a-dia do trabalho dos operários, o que implica diretamente a elevação da produtividade. 73 A forma de organização científica do trabalho taylorista é pioneira, e sua forma de produção consistiu em primeiro lugar, na introdução da máquina, modo pelo qual vai ocorrer uma das características fundamentais deste método. Consistirá na separação/execução das tarefas, do tipo de trabalho. A outra forma de separação incidiu na distinção do trabalho manual do trabalho intelectual, ainda que o trabalho manual permaneça sendo a base inelutável do processo de trabalho (MORAES NETTO, 1991). Trata-se de um método, no qual Taylor decompõe atividades complexas em tarefas simples, o The one best way. O automatismo empregado por Ford representou, de certo modo, uma estratégia para reduzir o saber dos operários no processo de produção e, ao mesmo tempo, na diminuição do poder dos trabalhadores, consequentemente no controle gerencial sobre a força de trabalho (PINTO, 2007). O objetivo dos diversos padrões de organização da produção consiste em obter o conhecimento, para propiciar a destituição dos trabalhadores do controle produtivo. Dessa maneira, os operários tornam-se mais vulneráveis, recaindo sobre eles um controle cada vez maior. Para isso, Ohno pautou-se pela ideia da desespecialização. Trata-se de uma estratégia que vai exigir e gerar, ao mesmo tempo, as condições para a polivalência dos trabalhadores. Portanto, esse processo terá, por resultado, a ampliação do controle gerencial e sua intensificação sobre os mesmos. A estratégia de gestão de estoques consiste em produzi-la e reproduzi-lo no tempo necessário. A ideia concebida na década de 1950 por Kiichiro Toyoda foi aplicada por Ohno na Toyota, e, por experiência na Lokehead, uma fábrica têxtil, da mesma companhia japonesa. De acordo com as metas deste método, era necessário fabricar a quantidade determinada no tempo necessário. Essa técnica é uma adaptação típica, que na ocasião era uma prática apenas dos supermercados estadunidenses. O Just-in-time e a auto-ativação produtiva são os pontos centrais do método de Ohno. O início de sua aplicação do método kanban data dos anos de 1950 e 1960. Eles despertam o sentido da ideia de uma nova possibilidade da expansão da produtividade. Ohno estava preocupado com a ideia de minimizar os custos da fábrica (HIRATA, 1993). Dessa maneira, 74 A primeira descoberta de Ohno, muito embora apresentandose num primeiro exame como um truísmo, é no entanto cheia de conseqüências. Ela concerne simplesmente à proposição de que atrás do estoque há, e necessariamente, aquelas e aqueles que concorreram para produzi-lo; em outras palavras: atrás do estoque há um ‘excesso de pessoal’, excesso de pessoas empregadas em relação ao nível da demanda solúvel e efetivamente escoada. Da mesma forma, e necessariamente se o estoque é permanente, há atrás do estoque o excesso de equipamento. Assim, primeira descoberta de princípio: partir do estoque e daquilo que está sendo gerado pela produção indica e localiza as vias e os pontos de aplicação onde ganhos de produtividade podem ser obtidos: dispensando os estoques, dispensa-se também o excesso de pessoal, o excesso de equipamento (CORIAT, 1994: p. 32-3). O método de gestão de estoque é encarnado também pelas fábricas de automóvel, compreendido no desenvolvimento do fluxo contínuo, no qual cada trabalhador é abastecido com peças suficientemente possíveis do posto anterior. Nessa perspectiva, o posto anterior é o que determina o abastecimento e, portanto, a fabricação contínua. Por efeito rotineiro do fluxo de produção, efetivou-se paralelamente o fluxo inverso de informação, esse resultado consistia na orientação do posto anterior ao imediatamente posterior, possibilitando, assim, a fabricação necessária e exata. Os métodos de organizar a indústria por meio do fordismo, do toyotismo dentre outros, são inerentes às formas de conhecimento das técnicas da administração, da engenharia de produção que alcançaram níveis importantes de conhecimento reflexivamente aplicados. As redes de produção são partes dessa cadeia de conhecimento que vêm sendo aplicada. A indústria ligada aos diversos subsetores da Zona Franca de Manaus: eletrônica, motocicletas, relógios, brinquedos, dentre outros são exemplos desse movimento. É característica de um destes centros industriais, a possibilidade de estabelecer-se em qualquer lugar do planeta. Esse fenômeno é favorecido pela compartimentação dos processos produtivos, pela exigência mínima de qualificação da força de trabalho, pela dependência mínima da produção de insumos locais, bem como pelos baixos investimentos fixos. 75 Caracteriza-se, também, pela aquisição de insumos junto ao mercado extraregional, propiciada pela política industrial da Zona Franca de Manaus. Nesse sentido, observamos três condições para a criação de centros industriais de transformação: uma delas está ligada à grande quantidade de trabalhadores com disponibilidade e a baixos custos na troca de trabalho por salário. A segunda é a possibilidade de uma mão de obra semiqualificada poder participar da produção, em decorrência da fragmentação do processo produtivo. A terceira tem a ver com as facilidades oferecidas pelas comunicações e transportes, dadas as condições do desenvolvimento tecnológico (VALLE, 2007). Em decorrência da competitividade do mercado, as empresas estão cada vez mais dependentes do desempenho e das condições sociais. As empresas precisam cada vez mais de uma força de trabalho, formada, precisando cada vez mais de uma força de trabalho instrumentalizada e eficiente. Essa eficiência decorre também de instituições que ofereçam níveis e formas de conteúdo educacionais diversificados, “e, sobretudo, da amplitude e profundidade (política e social) dos espaços públicos de atualização da virtualidade produtiva embutida nessas dimensões sociais dos territórios” (COCCO, 2001: p. 103). Esse é o conteúdo do contexto da inserção do capital industrial internacional na Amazônia, no final da década de 1960, pela via da instalação do modelo da Zona Franca em Manaus. O modelo Zona Franca de Manaus é intrínseco e extensivo ao processo de globalização. Sua implantação vai ocorrer dentro de um quadro favorável, no qual as condições de ordem jurídica e política foram oferecidas às organizações industriais internacionais. As indústrias por sua vez, adaptaram desde o início a força de trabalho em um baixo padrão de remuneração. Além de serem favorecidas pela isenção de impostos, as indústrias foram beneficiadas pela força panóptica da ditadura militar. Ambientado num contexto político representativo da segurança para uma mão de obra disciplinada (SERÁFICO; SERÁFICO, 2005). Se compreendermos desse modo, vamos perceber a condição de dependência externa do modelo da Zona Franca de Manaus e da indústria que logo será instalada, em decorrência dos próprios investimentos tecnológicos e 76 econômicos significativamente externos. Simultaneamente, o padrão de produção da indústria dos “países centrais” vai, aos poucos, sendo adaptado à indústria local de acordo com a necessidade, dinâmica e ritmo de cada empresa local e interesse do capital transnacional. Essa nova dinâmica da política industrial e internacional da produção corresponde ao processo de deslocamento da produção industrial dos países “centrais” e à posição de produtor local, porém dentro do contexto global de produção. A criação da Zona Franca de Manaus, de acordo com SERÁFICO e SERÁFICO (2005), fundamenta-se no aspecto superestrutural: político-jurídico, centralizada politicamente pela ditadura militar. Trata-se de um contexto propício para a germinação de uma mão de obra comportada, adequada às metas do capital das multinacionais na Região, na qual o capital internacional se inseriu fundamentado no discurso da integração brasileira para o desenvolvimento regional. Mas, para garantir sua instalação, foram tomadas algumas iniciativas, cujo objetivo era o de redimensionar o quadro de estagnação econômica, no qual as condições de emprego eram negativas. A instalação da Zona Franca de Manaus deve ser compreendida como parte dos megaprojetos de sustentação da Amazônia. O que se torna claro com a Zona Franca de Manaus, através de atitudes explícitas dos poderes políticos do Brasil e de suas assessorias externas, é o fato de a única possibilidade posta para a manutenção da Amazônia anexada ao território nacional incluir duas noções muito caras, atualmente: a de desenvolvimento associado ao capital estrangeiro, hoje quase uma postura obrigatória e permanente das negociações de política externa dos dirigentes e/ou aproximados da intenção original (SILVA, 2000: p. 46). As grandes corporações de capital estrangeiro precisam realizar seus objetivos de lucros a partir da extensão das suas atividades em territórios que as ofereçam vantagens nos aspectos político-econômico-sociais. A expansão do capitalismo se tornou propício devido à criação das condições de infraestrutura e no sistema de transportes na região, na década de 1970 e 1980. A zona Franca de Manaus, materializada em primeira mão no seu parque 77 industrial, é produto da estratégia “de descentralização da produção capitalista e da difusão do padrão de desenvolvimento urbano-industrial ocidental no século XX” (VALLE, 2007 p. 110). Fruto do processo de descentralização da produção industrial em nível mundial, a indústria local, fixada na área do Distrito Industrial, nasce fundamentada numa forte política de renúncia fiscal. Seus investimentos, significativamente estrangeiros, focaram a política de substituição de importações, “em detrimento da indústria local ou nacional ligada ao setor tradicional” (VALLE, 2007: p. 125). A indústria de transformação encontrou uma maneira de ampliar seus lucros ao transferir a produção para países de terceiro mundo. Trata-se de uma estratégia inédita, e, esta será realizada em Estados com os quais os países centrais mantém estreitas relações diplomáticas. No que diz respeito ao projeto de indústria ligado à SUFRAMA, seria fundamental o estabelecimento de “uma área mínima de 10 mil Km2”, o que incluía Manaus e seu entorno; isenção fiscal de importação para as matériasprimas e produtos destinados à Zona Franca de Manaus; isenção de impostos de exportação para o estrangeiro; equivalência de exportação brasileira para o estrangeiro daqueles produtos destinados à Zona Franca, a fim de permitir condições de concorrência da produção nacional com a importação estrangeira. As condições requeridas para a instalação de zonas francas em países periféricos estavam diretamente relacionadas à possibilidade de maior lucratividade advindas da capacidade de intervenção do Estado na criação da infraestrutura necessária aos grandes investimentos estrangeiros e no estabelecimento de incentivos e subsídios fiscais; do controle, pelo Estado, das condições sociais e jurídico-políticas da força de trabalho (restrição dos direitos políticos e sociais) e da disponibilidade de força de trabalho local abundante e barata (VALLE, 2007: p. 108). O desenvolvimento da ZFM é emblemático de uma indústria que, embora não tenha se configurado como uma força autônoma, recebe uma forte 78 pressão externa, pela sua própria natureza. A base do capital da ZFM é fundamentalmente externa. Mas não somente isso, também é constituído por seu aparato tecnológico, gerencial, administrativo e econômico. O único elemento local de peso da formação do capital orgânico da indústria da ZFM é a força de trabalho, utilizada, sobretudo, no chão da fábrica. O Decreto-Lei n.º 288 de 28 de fevereiro de 1967, passou por várias mudanças para adaptação e atendimento de demandas diversas dos setores da indústria do Polo Industrial de Manaus, desde a sua aprovação. Estas alterações têm por finalidade regulamentar as ações empresariais e oferecer mais estabilidade da atividade industrial no Amazonas. Encontram-se assim, fundamentadas em uma série de decretos. Podemos citar alguns que são exemplares pela sua importância. Entre eles está o Decreto-Lei n.º 356/68, que amplia os benefícios ficais para a Amazônia Ocidental. Outro: o DecretoLei n.º 1435/75 trata da exigibilidade do Imposto Sobre Importação, na saída de matéria-prima, para qualquer ponto do país. Dentre outras alterações importantes faz parte o Decreto-Lei n.º 92560 de 16.04.86, que prorroga por mais 10 (dez) anos o prazo de vigência da lei de isenções fiscais, concedidas à Zona Franca de Manaus. Sobre o perfil da Zona Franca de Manaus, segundo VALLE (2007) podese elencar algumas características, em que a primeira diz respeito à forte atividade produtiva, com tecnologia avançada em montagem de bens de consumo duráveis. O setor eletroeletrônico confere o padrão dessa produção e o significativo volume na produção/montagem destes produtos. A segunda característica tem a ver com a prática oligopolista, devido à concentração da produção sob domínio de poucas empresas, fato que propicia alta margem de lucro para as mesmas. A terceira característica é reveladora de um polo industrial extremamente dependente de produção e desenvolvimento tecnológico, o que necessita adquirir de fora do país. A dependência se estende também para mercados consumidores dos seus produtos, de fora da região e de fornecedores de partes e componentes. A quarta característica desnuda um modelo pautado na aquisição de obtenção enorme de lucro em decorrência do pagamento de baixos salários e preços das compras dos insumos. 79 A Zona Franca de Manaus como um projeto que vislumbra o beneficiamento do capital externo, nasce, como historicamente tem ocorrido nas demais zonas francas implantadas em outras regiões do mundo, descompromissada com o desenvolvimento regional e alheia aos interesses da classe trabalhadora. Em termos de concepção, coube, a certos grupos interessados, o mero papel de aderir, ou seguir oportunamente ao projeto de industrialização. Na análise de OLIVEIRA (2001), a concepção endógena do projeto Zona Franca de Manaus é uma abstração. Como o é também a ideia de um projeto consensual, unitário e universal. “Assim, sob o amparo de um discurso de padrão planejado neutro, desprovido de conflitos sociais se implantou a ZFM e se pôs em prática uma das mais criativas formas de expansão do capital, dissimulado como um projeto de interesse de todos, através dos mecanismos de coerção explícita e dos mecanismos ideológicos fortemente introduzidos na educação e na propaganda de massa.” (OLIVEIRA, 2001: p. 98-9) SILVA (2000), apoiada em FREITAS PINTO, analisa as mudanças no quadro de empresas brasileiras estatais e privadas comparadas a empresas estrangeiras baseada na pesquisa “A nova divisão internacional do trabalho” verifica um movimento no qual, além de aumentar o setor do campo de exploração e da capacidade de produção das estatais, aumenta também a participação do capital estrangeiro. Assim, o quadro de investimentos de capital exibe na década de 1970 uma mudança, na qual nenhum aumento de investimento produtivo em empresas estatais é verificado em comparação com a elevação e com o investimento em capital estrangeiro, sob controle administrativo das indústrias nacionais. A questão das zonas francas é extremante complexa. Primeiro, porque certifica mudanças na esfera mundial nas relações econômicas. [...] de configuração de zonas e mercados emergentes e do seu papel nessa mudança, bem como propicia apreender que a transição da internacionalização para a globalização se dá num caso concreto de hibridismo, de protecionismo 80 estatal, com emancipação econômica das transnacionais e do Estado-Nação tradicional. O plano será baseado em três tipos de industrialização da Amazônia: a substituição de importações regionais, enclave de importação e enclave de exportação. O objetivo da industrialização da substituição de importações regionais deve ser o de criar as condições econômicas na Amazônia para transformar os enclaves de importação em enclave de exportação. Essa lógica colocaria certamente a Amazônia em condições de independência “das necessidades e interesses dos centros industriais dinâmicos através da intensificação das trocas inter-regionais e maior retenção de renda.” (SILVA, 2000: p. 44) A segunda estava baseada na ideia das vantagens derivadas dos investimentos industriais. E o terceiro é o enclave de exportação, “a menina dos olhos da elite aderente”, baseia-se na ênfase a exportação de produtos primários e o beneficiamento de projetos de mineração e produtos derivados da matéria-prima regional. A ideia desse modelo incluía a noção de que a Amazônia é uma fronteira de recursos e de que não se devia perder a oportunidade de explorar os recursos naturais, na medida em que estes atraíam divisas estrangeiras e supriam as necessidades das indústrias nacionais de obter matériasprimas básicas. (SILVA, 2000: 44-5) A criação da Zona Franca de Manaus é uma combinação de forças articuladas em ação coordenada com significado de comando internacional e intraregional. Apoiada em Admilton Salazar Silva observa que a implantação deste projeto estava também baseado no componente ideológico, isto é “no conjunto de esforços materializados na tecnocracia, cuja meta principal era reforçar o desenvolvimento colonizado no país” (SILVA, 2000: 44-5). A Zona Franca é uma oportunidade instrumental para a expansão do capitalismo. Ela possui o signo de ser um dos últimos espaços regulamentados de estado caudatário do protecionismo nacional. O deslocamento industrial capitalista vai ser também acompanhado pelo deslocamento da força de trabalho. No caso amazonense, os processos de 81 atração, expulsão e expropriação da Revolução Industrial, traduz-se aqui na transformação de índios, caboclos, ribeirinhos e coletores em operários do parque industrial instalado em Manaus. No próximo capítulo iremos discorrer sobre o processo de industrialização de veículos de duas rodas em Manaus, vislumbrando a evolução dessa indústria, pelas dimensões e pelas características, expressas no nível de participação, vistas pelos altos índices de produtividade, de mãode-obra e de faturamento. 1.9 A FORMAÇÃO DAS CADEIAS PRODUTIVAS Para analisar o desenvolvimento do novo perfil de produção, que compreende também o novo perfil da empresa transnacional e a intensificação da nova forma de distribuição do processo produtivo, motivado pelo caráter expansionista do capitalismo, passaremos a analisar os elementos que compõem a trama do processo de globalização da produção, objetivando entender melhor os desdobramentos desse processo, na formação das cadeias produtivas no mundo e suas relações com a indústria de Duas Rodas no Polo Industrial de Manaus. Os últimos dezesseis anos foram marcados pela expansão das empresas do polo de veículos de duas rodas na indústria de Manaus. Em face da intensa concentração cada vez mais forte da indústria de bicicletas, motocicletas, triciclos, quadriciclos, bem como de fábricas de partes, componentes e peças, observamos a existência de um processo inédito não só na indústria da ZFM, mas também no Polo de Duas Rodas, onde vem ocorrendo a constituição e intensificação da produção de veículos de duas rodas em cadeia produtiva local. Não estamos afirmando, aqui, que as fábricas focais como Moto Honda da Amazônia, Yamaha Motors, Prince Bike, dentre outras, dependem única e exclusivamente do fornecimento de insumos locais, porque estas também se servem de fornecedores nacionais e internacionais, bem como de componentes vindos de suas matrizes, além do que é 82 representativamente o essencial: a tecnologia, centralizada nas empresas sede. O que estamos presenciando é o aumento da escala de fornecimento local em detrimento do internacional, e, principalmente do nacional. Caso típico, o da Moto Honda da Amazônia que vem atraindo fornecedores do Sudeste e Sul do país para perto da sua fábrica em Manaus. O processo de formação de cadeias produtivas vislumbra um horizonte, no qual se faz necessário um novo perfil organizacional, do ponto de vista empresarial. Nesse sentido, para compreender melhor como está ocorrendo mundialmente esse fenômeno torna-se interessante discutirmos, brevemente, alguns modelos de firmas. Nesse sentido, a Nike é um caso emblemático da transformação do tipo clássico de organização da produção. É interessante notar que esta empresa não realiza nenhuma operação do processo produtivo de qualquer um dos modelos de Tênis dessa marca em um lugar fixo, ou em uma sede. É um empreendimento que emprega diretamente 15 mil trabalhadores. No entanto, a terceirização das suas atividades fabris rende diretamente 90 mil postos de trabalho. Outro caso ilustrativo é o da Microsoft, embora seja uma empresa típica do setor de serviços, suas atividades se identificam mais com processos organizacionais industriais. A racionalização organizacional compreende a atividade de grandes firmas como a da General Eletric, por atuar praticamente em dois dos grandes ramos do mercado simultaneamente. Esta empresa oferece mais serviços financeiros seus clientes do que propriamente operadoras do sistema financeiro como a American Express. Fato que leva a General Eletric lucrar mais no ramo financeiro do que no da indústria. Estes dois exemplos constituem o signo da nova dinâmica da economia capitalista. A partir dos quais podemos inferir a ideia de que estão em curso grandes transformações no modo organizacional da produção. Esse processo é característico da globalização e suas regras, que vêm impondo, ao mundo empresarial, qual visão do capital, um novo perfil na eficiência econômica. Aquilo que se conhece como necessidades em escalas crescentes, que passa a exigir mais concentração progressiva e a “redução do número de atores dinâmicos em cada setor” (DUPAS, 2001: p. 43). A partir do 83 que pode ser afirmado que a nova regra do sistema capitalista nos dias atuais consiste na intervenção em escala global, de um número reduzido de megagrupos organizacionais, acompanhado de um baixo nível de custos da planilha da produção. O Polo de Duas Rodas de Manaus é ilustrativo desse fenômeno. Parece que esta é uma tendência que vem sendo desenvolvida nos países capitalistas avançados. É o que SENNETT constata em sua pesquisa, segundo o qual: “este menosprezo da experiência mostrava-se particularmente acentuado entre os consultores, que têm interesse profissional em pensar dessa maneira” (2006: p. 93). Tentativas de proteção, acordos de mercado e demarcação de território para a exploração de mercado são ações que não estão descartadas como que numa busca de uma via harmoniosa como o encontro das águas do rio Amazonas com as do rio Negro. Mas a questão da competição continua a todo gás por uma posição favorável de venda no mercado. A pujança do setor de Duas Rodas no Polo Industrial de Manaus é resultado do fato de ser o único parque fabricante de motocicletas no país, gozando de inúmeras concessões fiscais. Ou seja, trata-se de um artigo e de um mercado abundante no Brasil, do ponto de vista da produção. Pois, antes da Yamaha e da Moto Honda da Amazônia, as motocicletas chegavam ao Brasil apenas para a revenda. A criação da Zona Franca de Manaus impulsionou uma geração de empresas montadoras, em seguida, fábricas de motos, e, atualmente em cadeias produtivas. Embora haja ainda, muita desigualdade, e guardadas as proporções, hoje essas empresas começam a competir relativamente entre si no mercado local, nacional e internacional. São rios que se encontram, mas não se misturam. Segundo Bruno Cavalcante24: Até oito anos atrás/seis anos atrás, o Brasil era de um único...fabricante, tinha 95% do mercado. Em nenhuma parte do mundo acontecia isso. Hoje uma marca tem 70% ainda. Em nenhuma parte do mundo acontece. ¾ (três quartos) do mercado que uma empresa só detém. Mérito dela, [não estou] de forma alguma estou desmerecendo[...] Acho que a concorrência vale justamente criar uma região mais sólida, e, principalmente o cliente ter mais opções. E o grande ganhador [...] todo mundo vai brigar pelo cliente. O cliente vai querer 24 O nome entrevistado é fictício. Bruno Cavalcante é diretor executivo da empresa DAFRA MOTOS. 84 pagar por uma moto boa e barata. Para criar desenvolvimento e tecnologia. [...] Nós temos uma estratégia de venda muito agressiva. Hoje a Dafra, ela vem dum grupo muito forte, um grupo que sabe vender carro, a maior vendedora de carro da América Latina é o grupo. Então ela entrou no Polo de Duas Rodas muito agressiva. Ela sabe vender. Ela tem uma excelente fábrica. Uma fábrica nova. Ela vem desenvolvendo toda uma área industrial que tem desenvolvida, né? E, uma área de pesquisa e desenvolvimento, que já investimos dezenas de milhões de Reais. Nós temos um laboratório específico, e pra criar uma área de desenvolvimento um pouco mais longo. Porém, a gente está firmando parcerias com empresas na Europa, na Ásia... (Pesquisa de campo - 2009). Porém a força predominante “é a luta por mercados abertos e uma competição enérgica” (idem.). Isso reflete a fala do representante da referida empresa, mostrando o nível de comportamento de competição, de concorrência e de agressividade para vencer no mercado, assim como ficar em condições de oferecer o melhor preço no mercado. Essa guerra de mercado e pelos mercados leva ao rebaixamento dos preços e conserva a qualidade dos produtos em nível global, na visão empresarial. A constatação desse fato é também a confirmação da eficiência do atual modo da anarquia oligopolista. O fato de a Dafra Motos oferecer uma motocicleta por R$ 5.200,00, com financiamento para pagamento em até 48 vezes é a reafirmação desse conceito de competição comercial. O Brasil se configura como um mercado consumidor extremamente abundante. As economias empresariais mais bem sucedidas foram aquelas que incorporaram e souberam fazer uso das novas tecnologias no contexto da “nova economia”, e da utilização de network. É claro, que a partir da década de 1970, as transformações no âmbito da socioeconomia, no que se refere ao processo de internacionalização da economia foram extremamente intensas. Verifica-se, desde então, uma radical transformação na forma organizativa da atividade produtiva, porque seu foco deixa de ser meramente a intervenção em mercados consumidores, assim a atividade produtora de bens passa a ser global. Isto, certamente tem como um dos fatores a inovação tecnológica. Tal fenômeno foi fundamental para dinamizar e dar maior mobilidade ao capital, necessário para o movimento da 85 produção global, ao propiciar o funcionamento, em tempo real, da atividade financeira. Mas, neste novo cenário permeado de contradições, por um lado, verifica-se uma força concentradora “de investimentos necessários à liderança tecnológica de produtos e processos e a necessidade de networks e mídias globais” (DUPAS, 2001: p. 39). Para seguir pressionando um processo de concentração, para possibilitar que algumas centenas de grandes organizações se tornem líderes das principais cadeias produtivas em nível mundial. Inicialmente o Polo de Duas Rodas tem somado um volume de investimentos no patamar de cerca de US$ 2,00 bi. Assim, o controle sobre quanto e como investir, quando e em que lugares produzir, tem ficado nas mãos das mesmas firmas. Este fenômeno ocorre simultaneamente em que essas grandes empresas realizam uma guerra intensa de competição para diminuir os preços e a elevação da qualidade dos produtos, cujo objetivo é o alcance do market share (participar dos lucros oferecidos pelo mercado) e a acumulação de capital. Essa corrida em direção à eficiência pelo alcance e garantia dos mercados em nível global pressionou para a criação “de fragmentação – terceirizações, franquias e informacionalização” (idem, p. 40). Esse processo vai gerar oportunidade para um conjunto de empresas, mas de porte menor, que irão realizar o abastecimento da cadeia produtiva para a matriz a baixo custo. São os casos de algumas empresas do Polo de Duas Rodas de Manaus como Facomsa da Amazônia, Sakura Exhausto do Brasil, Nipon Seiki do Brasil, Man + Hummel Brasil, Sumidenso da Amazônia, dentre outras do setor.25 Para entendermos melhor o que são as empresas transnacionais, basta olharmos para a conduta das megaoperações das dez maiores empresas, dentre elas a Mitsui (esta empresa faz parte da cadeia produtiva do setor de Duas Rodas), Mitsubishi, Toyota, General Eletric e Itochu, que passam a compor esse conjunto. Em 1999 elas alcançaram juntas cerca de 1,4 trilhão em vendas. Somados, Brasil, México Argentina, Chile, Colômbia e Peru, este valor representa 80% do total do PIB destes países. Ressalta-se ainda que 50% dos 25 Para fazermos essa classificação levamos em consideração o volume de investimentos iniciais dessas empresas. 86 ativos destas corporações encontram-se fixados no exterior. Além de venderem 60% de sua produção para o mercado internacional, 60% de sua força de trabalho estão fora do país de origem destas organizações. Estes dados podem, assim, traduzir o real sentido do que é uma empresa transnacional. A ênfase a ser dada aqui é pelo fato de o modelo oligopolista ser marcado por uma concorrência rigorosamente acirrada entre as grandes corporações líderes do processo produtivo. As decisões das grandes organizações globalmente dominantes têm a finalidade de destacar-se no processo de competição, buscando, com isso, combinar preço e qualidade. Sob o ritmo da economia global, as pequenas e médias empresas devem, ainda, manter-se, porque é por meio delas que se materializam os mecanismos de terceirização, franquias e as subcontratações, orquestradas pelas grandes empresas transnacionais, que decidem as estratégias, de todas articuladas às cadeias produtivas. Desse modo, podemos definir as características essenciais das transnacionais, assim como DUPAS (2001), seguindo o esquema de Poter Dcken: 1) Capacidade de controlar suas organizações ao mesmo tempo em qualquer região onde elas se fazem presente; 2) Essas corporações conseguem obter vantagens dos fatores de produção ofertados pelo Estado; 3) A flexibilidade geográfica que implica garantir a transferência de seus recursos e operações em nível global. Os fenômenos de exclusão e da inclusão residem tanto no plano individual quanto nas esferas do território. Vale dizer que os lugares onde não se oferece nenhum tipo de infraestrutura para a constituição de uma logística produtiva fatalmente não serão inseridos na economia internacional. É desse fator que resulta a separação entre a expressão, logísticas locais e o controle urbano das metrópoles. Conforme o texto abaixo, Essa tendência está por trás da transformação mais importante das formas urbanas de todo o mundo: a ascensão das megacidades, principais centros urbanos da atual economia informacional/global, que adquirem uma força particular nas regiões de industrialização recente (DUPAS, 2001: p. 48). 87 A essas metrópoles, CASTELLS (2006) chama de nós da economia global. São lugares onde as atividades do alto escalão das corporações são realizadas, podendo ser ilustrados pelos escritórios de tecnologia de administração e os de produção. Nesse sentido, “são centros de dinamismo econômico, tecnológico e social em seus países e, na escala global, centros de inovação [...] e pontos de conexão com redes globais de todo tipo” (DUPAS, 2001: p. 49). Manaus figura apenas como um lugar de operação do processo produtivo das transnacionais, bem como de um espaço de consumo dos produtos localmente produzidos. Outra estratégia para o barateamento de custos e ampliação da qualidade é a formação de cadeias de produção como a producen driven, que consiste no controle e coordenação das networks pelas grandes manufaturas, isto é, por “indústrias capital tecnologia intensiva”; e, buyer driven, que envolve a distribuição das vendas por meio de vários exportadores, especialmente por grandes varejistas, designers e trading networks. Estes mecanismos são utilizados geralmente em países em desenvolvimento. Neste caso, designers e trading companies são elementos que vão protagonizar a organização de networks de produção (DUPAS, 2001). Esse tipo de cadeia é desenvolvida de modo descentralizado. Essas indústrias estão localizadas em diversos países e regiões. Elas não têm, como foco de sua atividade, a fabricação de nenhum produto, mas o controle do lugar, dos mecanismos, de quanto vai lucrar e das fases do processo produtivo em toda a cadeia. Podemos exemplificar os casos de Nike e Reebock, ambas as firmas apenas desenham seus produtos, mas nada fabricam. Desse modo, essas empresas liberam e transferem para terceiros todos os riscos possíveis. Na verdade, essas firmas acharam uma maneira de afastar problemas como falência, emprego de trabalho formal, certos tipos de agressão ao meio ambiente, até mesmo a possibilidade de sonegação fiscal. O que significa também um modo de buscar afastar tais problemas que possam comprometer a sua imagem (DUPAS, 2001). As regras sob as quais está ocorrendo a produção dizem respeito ao sistema globalmente descentralizado, no qual a concorrência ocorre entre as 88 grandes organizações. Este é um lado desse processo. O outro é característico da integração de pequenas e médias empresas incorporando-se ao esquema das novas cadeias produtivas, como forma de poderem sobreviver no mercado. Pode-se dizer que todas as novas lógicas organizacionais ordenam as cadeias produtivas em forma de networks ou redes de empresas. A network conseguiu superar boa parte dos problemas apresentados pelo modelo anterior – a empresa integrada verticalmente –, já que apresenta maior flexibilidade e agilidade ante as necessidades de respostas rápidas do mercado, permitidas pela descentralização de suas unidades juntamente com a crescente autonomia outorgada a cada uma delas (DUPAS, 2001: p. 51). Para CASTELLS (2006), a economia mundial não pode ser confundida com a economia global. Apoiado em WALLERSTEIN e BRAUDEL, parte para uma distinção dessas duas formas de ação do capital, em que a primeira consiste na capacidade de ampliar, processualmente sua acumulação pelo mundo inteiro. Diferentemente, a economia global é característica também da acumulação, porém com a força de intervenção e realização em tempo, propiciada pela informação em nível global. Tal fenômeno passou a ser uma realidade a partir do século 20, proporcionado pelo aprimoramento das tecnologias da informação e da comunicação, além da contribuição de fatores como as facilidades fiscais criadas e aplicadas pelos governos e entidades internacionais. O fato de a maior parte da produção e dos empregos serem regionais e locais, leva-nos a dizer que a economia global não é um fenômeno dominante. A afirmação sobre a economia globalizada pode ser feita [...] porque as economias de todo o mundo dependem do desempenho de seu núcleo globalizado. Esse núcleo globalizado contém os mercados financeiros e o comércio internacional, a produção transnacional e, até certo ponto, ciência e tecnologia, e mão de obra especializada. É por intermédio desses componentes estratégicos/globalizados da economia que o sistema econômico se interliga globalmente... uma economia cujos componentes centrais têm a capacidade institucional, organizacional e tecnológica de trabalhar em unidade e em tempo real, ou em tempo escolhido, em escala planetária (CASTELLS, 2006: p. 142-3). 89 As novas tecnologias tornaram possíveis, de modo inédito, o funcionamento ininterrupto do sistema financeiro, em nível mundial e seu gerenciamento integrado no mercado global. Possibilitaram ainda a movimentação entre economias em prazos curtíssimos de tempo. São movimentações financeiras como poupança, investimentos de créditos, bancos, fundos de pensão, bolsas de valores e câmbio. A elevação dos fluxos financeiros em velocidade, em volume, em complexidade e em capacidade de conexão é tributada a este fenômeno. Em países ditos em desenvolvimento esse processo irá ocorrer nas esferas dos fluxos financeiros e da velocidade da internacionalização dos seus bancos na década de 1990. O comércio de divisas é um fato substancial na globalização financeira, porque os países são levados a fazer as transações de suas moedas nacionais, determinando a perda, pelo menos em parte, da autonomia dos governos nos assuntos de política monetária. Essa interdependência financeira dos mercados ocorre devido a um conjunto de fatores tais como a flexibilização dos mercados financeiros em um número significativo de países e a viabilização de livre movimentação no mercado internacional; do estabelecimento de um aparato de geração de tecnologia, com apoio de um elevado nível no aspecto das telecomunicações, possibilitados ainda, por sistemas que propiciam a realização de transações financeiras e comerciais das mais complexas; do fator de conectividade como produto dos serviços financeiros, fruto das novas e constantes invenções, a exemplo dos derivativos; da especulação de fluxos financeiros, feitos por meio da desvalorização dos derivativos, realizados nos diversos mercados; e por último, devido a determinação das regras, geralmente estabelecidas pelas firmas que fazem avaliação de mercado, tais como Standard & Poor, Moody’s, etc. (CASTELLS, 2006). Neste cenário, são possíveis duas tendências comerciais, uma a de liberalização de comércio, a outra de criação de blocos comerciais, estes buscaram estabelecer- se em todo o mundo. O mais importante destes foi a União Europeia, que teve a iniciativa, propositiva para a constituição de uma economia regional, tal qual a mesma vinha se caracterizando. Para CASTELLS (2006), a função dessas economias teve um caráter de estado em rede, tendo 90 como característica principal, mais que um bloco comercial, uma economia unificada. O processo de formação de blocos regionais representou uma derrota do ponto de vista do capital. Aqueles países que, de algum modo, permaneceram nessa condição evoluíram, transformaram-se em uma espécie de economia de integração total. A dissolução da regionalização da economia foi redimensionada para um tipo de estrutura de padrões comerciais de diferentes formas de redes comerciais. As redes de empresas são elementos constitutivos dessas unidades comerciais, pelo menos, é o que se pode dizer das firmas que intervém no mercado mundial. E, de fato em grande parte graças às novas tecnologias da comunicação de dos transportes, existem canais e oportunidades para negócios em todo lugar. Entretanto, essa afirmação merece algumas ressalvas, pelo fato de que os mercados domésticos representam a maior parte do PIB na maioria dos países e que nos países em desenvolvimento, as economias informais, voltadas principalmente para os mercados locais, constituem a maior parte dos empregos urbanos (CASTELLS, 2006: p. 156-7). Desse modo, há um novo modelo de cultura organizacional de empresas, fundadas nas redes internacionais, um tipo de subunidades empresariais. Isto é assim, porque os modelos explicativos que tinham, como base, a empresa multinacional não estão mais dando conta de demonstrar a dinâmica das culturas organizacionais atuais. A fim de melhorar a compreensão desse processo, CASTELLS (2006) sintetiza em cerca de cindo tipos de redes: 1. Redes de fornecedores – Incluem subcontratação, acordos OEM (Fabricação do Equipamento Original) e ODM (Fabricação do Projeto Original) entre um cliente (a “empresa focal”) e seus fornecedores de insumos intermediários para produção. 2. Redes de produtores – Abrangem todos os acordos de coprodução que oferecem possibilidade a produtores concorrentes de juntarem suas capacidades de produção e recursos/humanos com a finalidade de ampliar seus portfólios de produtos, bem como sua cobertura geográfica. 91 3. Redes de clientes – São os encadeamentos à frente entre as indústrias e distribuidores, canais de comercialização, revendedores com valor agregado e usuários finais, nos grandes mercados de exportação ou nos mercados domésticos. 4. Coalizações-padrão – São iniciadas por potenciais definidores de padrões globais com o objetivo explícito de prender tantas empresas quanto possível a seu produto proprietário ou padrões de interface. 5. Redes de cooperação tecnológica – Facilitam a aquisição de tecnologia para projetos e produção de produtos, capacitam o desenvolvimento conjunto dos processos e da produção e permitem acesso compartilhado a conhecimentos científicos genéricos e de P&D (p. 251). O contexto mundial da produção industrial, o movimento dinâmico das multinacionais e as estratégias das transnacionais não são diferentes do jogo das transnacionais que atuam no setor de Duas Rodas do norte brasileiro, uma vez que empresas como a Moto Honda da Amazônia, Yamaha – apenas para exemplificar as duas maiores – servem-se do fornecimento de componentes, peças e partes de dezenas de indústrias locais para a produção de motocicletas em suas fábricas. A Moto Honda (como mostraremos no terceiro capítulo) em particular, desenvolve sua produção em regime de co-produção, uma vez que a mesma oferece condições de logística, tecnológica, de treinamento, dentre outros, para as empresas que fabricam e fornecem peças e acessórios. 92 CAPÍTULO II 93 2 O POLO DE VEÍCULOS SOBRE DUAS RODAS NO NORTE BRASILEIRO O desenvolvimento do Polo de Duas Rodas é acompanhado do aumento acelerado da qu antidade de firmas de duas rodas entre produtoras de motocicletas e fábricas de peças e componentes para este setor. O desenvolvimento dessa indústria é constituído pela cadeia produtiva de fábricas de bicicletas, motocicletas, partes, peças e componentes dessa mesma modalidade industrial, uma vez que inúmeras dessas empresas, num movimento vivo de inter-relação interfirmas, encontram-se instaladas, outras ainda em fase de instalação, além de outras que ainda serão instaladas, ou que já estão funcionando, mas não foram aprovadas, portanto, não participam do benefício da isenção fiscal e demais prerrogativas oferecidas pela SUFRAMA. Nossa intenção é demonstrar, neste capítulo, a inserção das firmas transnacionais na indústria de veículos sobre duas rodas no PIM, no desenvolvimento da produção local em cadeias produtivas, pela via da transferência da produção industrial, juntamente com fábricas de pequeno e de médio porte, pela dinâmica acelerada sob o regime da produção flexível, com o novo padrão de organização do trabalho e da produção. Trata-se de um processo em desenvolvimento, a consolidação dessa indústria que, a priori, se aproveita do regime da isenção fiscal para instalar-se e garantir a sua funcionalidade e do trabalho barato, ordenado pelos esquemas da terceirização, quarteirização, que permitem a partir destas produzirem bicicletas, motocicletas e triciclos, quadriciclos para produzir e fornecer para as empresas focais partes, peças e componentes. Discutiremos sobre o desenvolvimento das empresas do Polo de Duas Rodas com a finalidade de demonstrar a dinâmica do processo de formação das cadeias produtivas deste setor. Somente assim, em nosso modo de ver, será possível dar o tratamento analítico que o tema merece, pela sua relevância na perspectiva sociológica. A inovação tecnológica, o novo padrão organizacional, somados à estratégia da cadeia produtiva local, está transformando a indústria de veículos 94 de Duas Rodas na região Norte do Brasil em um dos maiores setores em venda e em faturamento do Polo Industrial de Manaus. Conforme dados de 200626, o Polo de Duas Rodas representa 16,8% de participação no faturamento total do Polo Industrial de Manaus, ocupando, assim, a segunda posição depois do Polo Eletroeletrônico, com 34,6%. O Polo de Duas Rodas é constituído por empresas montadoras e fábricas de bicicletas, de triciclos, de quadriciclos e montadoras e fábricas de motocicletas a partir de 100 cc – cilindradas –, além de pequenas, médias e grandes indústrias fornecedoras de peças para a fabricação de bicicletas, triciclos, quadriciclos e motocicletas. Quadro 2 PRIMEIRAS EMPRESAS PRODUTORAS DE MOTOCICLETAS E BICICLETAS INSTALADAS NO SETOR DE DUAS RODAS DE MANAUS EMPRESAS INÍCIO DA ATIVIDADE PRINCE BIKE 1969 CALOI 1974 HONDA 1976 YAMAHA 1985 Fonte: CGPRI, CGMER/COCAD E/COISE/CGPRO (2008) ELABORAÇÃO: COISE/CGPRO/SAP. Adaptação do autor – 2009. A atividade inicial da indústria do Polo de Duas Rodas, há quarenta anos, começou com a instalação das primeiras fábricas de bicicletas e motocicletas. A mais antiga entre as manufatureiras de bicicletas está Prince Bike. A Caloi Norte27 foi instalada três anos depois em Manaus. Ambas figuram como as pioneiras no Polo de Duas Rodas neste ramo. As duas primeiras fábricas de motocicletas no subsetor de Duas Rodas são a Moto Honda da Amazônia e a Yamaha Motor da Amazônia. Como parte do desenvolvimento da indústria da Zona Franca de Manaus, em relação às suas características de um comportamento de economias de aglomeração, adquiridas em zonas que são tipicamente industriais com características de multinacionais, o Polo de Duas Rodas vai se 26 27 SUFRAMA: COISE/CGPRO/SAP – 1998-2006. A empresa Caloi Norte está desativada no Pólo de Duas Rodas. 95 inserir também em suas características essenciais. Não só como investimentos de capital estatal, nacional e internacional, mas também por serem indústrias móveis, que se enquadram no tipo de indústrias de concentração global de empresas multinacionais, cujas atividades estão articuladas com um tipo determinado de produção descentralizada. Pode-se dizer que este processo está combinado com a descentralização parcial da produção. Refere-se a um tipo de capital com um caráter móvel, diferente de um padrão de capital em que o processo de produção, ou todo ele é fixado em um lugar determinado. Este capital tem a capacidade de se deslocar a produção ou parte do processo de produção para a periferia, mas também de realizá-la em qualquer lugar do planeta. Nesse nível de compreensão a Moto Honda da Amazônia, constitui um dos tentáculos no Polo de Duas Rodas no PIM, da Honda Motor Company, cuja sede está localizada em Tóquio, cidade sede desta transnacional. O deslocamento dessas empresas corresponde a uma forma de atuação típica das transnacionais em “áreas de “marketing”, de desenvolvimento tecnológico, de finanças e de administração. Esse deslocamento do capital tem, no transporte e na comunicação da fonte fornecedora dos bens intermediários, a principal base de todo o cálculo (FREITAS PINTO, 1986; SALAZAR, 1992). É importante considerar o custo unitário da força de trabalho, por ser determinante no cálculo dos componentes de salários, encargos sociais, produtividade, flexibilidade do trabalho e horas extras. A implantação de empresas como Moto Honda, Yamaha, Caloi e Prince Bike foram beneficiadas pelo Estado pela flexibilidade nas políticas fiscais e na legislação trabalhista. Essas condições são mais rigorosas nos países de economias centrais, porque sua mão de obra é menos flexível, e, em tempos de crise, é mais difícil de demiti-la. Tais concessões são significativas da necessidade que têm estas multinacionais em arrancar do Estado a legitimidade para aplicar e ampliar a mais-valia sobre a classe trabalhadora, além de requerer, por meio da flexibilidade fiscal, a obtenção de mais recursos. Pode-se inferir a ideia de que a opção em produzir em Manaus é uma alternativa à crescente alta da taxa de salários, dos pesados encargos sociais, da falta ou baixa flexibilidade do trabalho e da legislação, do ponto de vista das 96 empresas, nas economias como a japonesa, a estadunidense e a europeia. Por isso, para descentralizar a produção, além do baixo custo da força de trabalho, é preciso que haja também o controle político das organizações trabalhistas e a liberdade para o movimento de capitais. Condições estas que não foram difíceis de se encontrar em Manaus. Nesse sentido, o Polo de Duas Rodas vai seguir as regras originais do modelo de indústria da Zona Franca de Manaus, baseado na maquilagem dos produtos, na produção para o mercado nacional, dentre outras, tais como a utilização dos benefícios fiscais, na ocasião da sua instalação, por distintas razões. Uma dessas distinções se refere à alta concentração cada vez maior na fabricação de peças e componentes no próprio polo; a segunda pela produção e intensificação da produção em cadeia fabril local. Apenas uma indústria desse polo hoje atua com 20 fornecedoras. O polo inteiro possui hoje cerca de 30 empresas ligadas à SUFRAMA,28 operando em cadeia. O processo de realocação da produção mundial está fundado no desenvolvimento tecnológico, base sobre o qual a produção industrial será viabilizada, mas com certo nível de dependência de transportes e de técnicas de comunicação. Nesse processo, a inovação tecnológica vem facilitando cada vez mais o processo produtivo em unidades independentes e de simples operação, tornando desnecessária a utilização de mão de obra especializada. (FREITAS PINTO, 1987) É a partir do segundo estágio de implantação da ZFM, cujo objetivo era o de corrigir as distorções e as irregularidades existentes, do ponto de vista dos empresários, que se começou a efetivar a ocupação do então Distrito Industrial. A pretensão que se queria com essas mudanças era a de redefinir a política industrial para a ZFM. No entanto, o objetivo principal era substancialmente a consolidação do parque industrial de Manaus, com a significativa diminuição das importações e criação de mecanismos para a elevação das exportações, como fim da obtenção do equilíbrio da Balança Comercial, bem como gerar mecanismos para estreitar o vínculo dessas indústrias com o mercado regional e local, para criar as condições fundamentais para o desenvolvimento “auto28 A quantidade de empresas que produzem peças para bicicletas e motocicletas é bem maior, se considerarmos todas aquelas que não possuem incentivos fiscais, isto é, aquelas que são aprovadas no CODAM-SEPLAM, mas não conseguem aprovação no CAS-SUFRAMA. 97 sustentado que deveria substituir os incentivos fiscais em vigor” (SALAZAR, 1992: p.158). Ainda que os aspectos levantados tenham sido adotados como medidas, por meio da Resolução n.º 001/85, do Conselho de Administração da SUFRAMA, persistiram problemas da ordem da morosidade na implementação da primeira medida, relativa a implantação de mais pólos industriais. Um dos problemas é a ausência muito grande de uma mão de obra especializada, que as instituições de ensino de nível técnico e de nível superior em Manaus não estão preparadas para formar, nos diversos níveis e categorias necessários para os níveis de exigência tecnológica das indústrias, tanto para as que já existem quanto para aquelas que estão se instalando e, aquelas que ainda vão chegar ao Polo de Duas Rodas. Tal é a expectativa dos executivos da Moto Honda da Amazônia Ltda., para o que as indústrias do pólo têm buscado no centro-sul, no exterior e, atualmente, em universidades do nordeste brasileiro. Pode-se concluir, deste aspecto, que os efeitos sociais da permanência desse quadro não têm contribuído para a agregação de valores, para o aumento da integração dessas indústrias com a região. A quantidade de bicicletas produzidas em 2006 foi inferior à produção dos anos anteriores no Polo de Duas Rodas. De 1990 a 1999, à exceção de 1997, nunca foi superior a 1 milhão de motocicletas. Somente a partir de 2000 até 2005, o ramo produtor de bicicletas vai superar essa marca. 98 Tabela 2 PRODUÇÃO ANUAL DE BICICLETAS NO POLO DE DUAS RODAS – 1990 A 2008 TOTAL 1990 91.645 1991 101.793 1992 135.335 1993 436.339 1994 822.922 1995 979.507 1996 899.043 1997 1.208.971 1998 910.411 1999 886.605 2000 2001 1.140.286 1.125.028 2002 1.176.849 2003 1.117.570 2004 1.178.466 2005 1.034.634 2006 736.367 2007 1.141.979 2008 794.695 15.918.445 Fonte: CGPRI, CGMER/COCAD E COISE/CGPRO (2008) Adaptado pelo autor – 2009 É possível percebermos, no período em foco, um processo de intensificação da expansão do Polo de Duas Rodas a partir dos anos 90. Para que isso viesse acontecer, a estratégia empresarial de ampliação do capital, bem como a necessidade de garantir maior estabilidade na dinâmica da concorrência. Isso explica, em parte, a finalidade da implantação do Polo industrial de Duas Rodas no Norte do Brasil. Esse processo é característico do local de produção, cuja identidade é inerente às regiões subdesenvolvidas, no qual se utiliza o aproveitamento da presença de mão de obra, da existência de uma infraestrutura moderna e a concessão de isenções de obrigações com taxas alfandegárias. 99 Gráfico 1 PRODUÇÃO ANUAL DE BICICLETAS DO POLO DE DUAS RODAS – 1990 A 2008 1,400,000 1,208,971.0 1,140,286.0 1,200,000 1,125,028.0 979,507.0 1,000,000 800,000 822,922.0 899,043.0 910,411.0 1,117,570.0 1,141,979.0 1,034,634.0 736,367.0 794,695.0 436,339.0 400,000 0 1,178,466.0 886,605.0 600,000 200,000 1,176,849.0 91,645.0 135,335.0 101,793.0 Fonte: SUFRAMA (2008) Adaptação do autor – 2009. A produção chegou a índices superiores em relação à quantidade de motocicletas. As manufaturas de bicicletas chegaram a fabricar cerca de 1,2 milhões de unidades, enquanto a produção de motocicletas alcançou o patamar de 4,3 mil, neste mesmo ano. O Polo de Duas Rodas compreende a produção de bicicletas, motores de força, triciclos e quadriciclos, no entanto, nossa descrição irá focar doravante, especificamente a dinâmica da produção, das vendas e do faturamento de motocicletas, bem como relacionar o processo produtivo dos veículos de duas rodas motorizados à cadeia produtiva formada e em fase de consolidação no Polo de Duas Rodas de Manaus. 100 2.1 A INSERÇÃO DAS TRANSNACIONAIS E A PRODUÇÃO DE MOTOCICLETAS A atividade da indústria do Polo de Duas Rodas sofreu uma mudança estrutural no PDR a partir de 1990, em escala de produção, em vendas, em faturamento, e também em termos físico, uma vez que, ao que se refere a este último fator, o PDR foi reconfigurado, devido à expansão da planta das fábricas já existentes no referido polo, pelo estabelecimento de diversas produtoras de motocicletas, e, pela implantação de inúmeras fábricas fornecedoras de peças e componentes. Essa mudança coincide com as medidas do governo federal em 1990. A tabela 1 é ilustrativa desse movimento, que registra a ampliação da produção de motocicletas. Além disso, podemos perceber que os números crescentes do consumo de motocicletas têm redimensionado o setor de Duas Rodas como um dos setores que mais cresceram no PIM. Conforme podemos ver os números da tabela a seguir, segundo os quais, a produção evoluiu de modo crescente. Isso demonstra o crescimento do setor, em decorrência do aumento da instalação de produtoras de motocicletas e de empresas produtoras de peças, componentes e subconjunto (SUFFRAMA: COISE/SAP/CGPRO, 2008).29 29 SUFRAMA. Indicadores de Desempenho do Pólo Industrial de Manaus. História do PIM em Tabelas e Gráficos, 1988 a 2006: p. 67. 101 Tabela 3 PRODUÇÃO DE MOTOCICLETAS DO POLO DE DUAS RODAS - 1990 A 2008 ANOS PRODUÇÃO DE MOTOCICLETAS 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 TOTAL 143.533 123.159 82.518 83.361 145.346 243.133 295.957 430.398 482.113 505.352 641.607 778.334 865.602 954.823 1.052.941 1.253.149 1.516.444 1.880.326 1.848.925 13.327.021 Fonte: SAP/CGPRO/COISE¹: (2008). Adaptado pelo autor - 2009 A capacidade produtiva do Polo de Duas Rodas no ano de 1998 tem refletido a utilização da sua capacidade instalada. O aumento da produção do ano de 1997 representou um crescimento de 70% de aproveitamento produtivo em relação aos anos anteriores.30 Em 2006, as motocicletas apresentaram um crescimento de 263,3 mil unidades produzidas. A quantidade de motocicletas produzidas neste ano foi de 1,52 milhão. Comparada ao ano de 2005, que foi de 1,25 milhão de unidades produzidas, verifica-se que a produção no Polo de Duas Rodas foi elevada em 21%.31 30 31 FIEAM - Desempenho Anual da Indústria no Amazonas – 1998-1997. FIEAM - Desempenho - Polo Industrial de Manaus – 2006: p. 39. 102 Gráfico 2 PRODUÇÃO ANUAL DE MOTOCICLETAS DO POLO DE DUAS RODAS – 1990 A 2008 2000000 1,880,326 1,848,925 1800000 1600000 1,516,444 1400000 1,253,149 1200000 1,052,941 954,823 865,602 778,334 1000000 800000 641,607 505,352 482,113 430,398 600000 400000 295,957 243,133 145,346 123,159 82,518 83,361 143,533 200000 0 Fonte: SAP/CGPRO/COISE32: (2008). Elaboração da pesquisa – 2009. A produção industrial destinada ao mercado internacional pode ocorrer independentemente do nível de desenvolvimento e das condições específicas de um determinado país. É interessante notar que o tipo de produção intensiva de capital, voltada para o mercado mundial, com o nível tecnológico existente, pode operar com uma força de trabalho não e semiqualificada nas diversas fases da produção. A realocação do trabalho intensivo implica em atividades que não exigem mão-de-obra qualificada ou especializada. A abertura econômica de 1991 promovida pelo governo federal, embora tenha impactado menos; as vendas internas da indústria de duas rodas destes quinze anos últimos foram de 92% e as internacionais representaram 8%. (ALVES, 2005) O Polo de Duas Rodas foi impactado também por esse 32 Idem. 103 processo em função da queda nas vendas nos anos de 1991, 1992 e 1993. E, só voltou a se recuperar em 1994. Essa diminuição das vendas pode ser atribuída a outros fatores, que podem influenciar nas importações. Na avaliação da FIEAM: O avanço tecnológico, inclusive, representa elevação na possibilidade de exportações, já que o mercado internacional é muito competitivo e não abre espaços para penetrações que não atendam às suas expectativas, ou seja, o consumo busca muito mais atender aos desejos pessoais do que as necessidades básicas... Assim sendo, as especificações tecnológicas são fundamentais para produzirem expectativas de compra. (FIEAM, 2006: p. 4-5) Os dados da produção da Moto Honda da Amazônia entre os anos de 1991 a 1993 retratam o impacto das medidas da política econômica, das políticas alfandegárias do governo federal, ainda que o conjunto das empresas do Polo de Duas Rodas não tenha sido tão afetado quanto as empresas de outros setores da produção local. É possível observarmos, assim, que a redução da produção dos anos de 1992 e de 1993 chega a aproximar-se de cinquenta por cento das unidades produzidas do ano de 1990. 104 Tabela 4 PRODUÇÃO MHA - 1990 A 2008 ANO UNIDADES % 1990 107.071 73 1991 92.204 79,3 1992 67.798 78,7 1993 64.313 77,1 1994 111.105 78,7 1995 180.734 83,2 1996 256.255 89 1997 381.174 89,4 1998 435.659 91,6 1999 436.441 92,1 2000 562.258 88,6 2001 658.094 87,4 2002 741.769 86,1 2003 817.925 85,7 2004 895.343 84,7 2005 981.590 80,9 2006 1.131.374 80,1 2007 1.376.880 79,4 2008 1.600.270 74,7 Fonte: ABRACICLO – 2008. Adaptado pelo autor - 2009 Por se tratar de uma empresa líder em termos de produção, vendas nacionais e internacionais, deter- nos-emos um pouco mais na análise sobre a MHA, para enfatizar a importância das estratégias postas em prática por esta empresa, que pode nos ajudar a entender o desenvolvimento das demais firmas do setor. Desse modo, facilitará a compreensão do seu objetivo que consiste em superar o potencial de produção deste polo, gerar capacidade de vender e de disputar no mercado nacional e mundial. Nesse sentido, é importante observar que, a partir de 1994, a evolução da produção da MHA expandiu ininterruptamente até o ano de 1998. Em termos comparativos, em 2006, esta empresa passou a produzir, em um mês, a totalidade de motocicletas produzidas em todo o ano de 1994. É válido observar também que a ampliação da produção desta organização saiu da quantidade de dezenas de milhares para a casa de um 105 milhão de motocicletas em cerca de uma década apenas, ao passo que, empresas como a Yamaha que é praticamente contemporânea do começo da atividade no PDR continuam ainda na casa das centenas de milhares. Porém a soma da crescente produção das produtoras concorrentes da MHA concorre para a pulverização da produção. Nesse sentido, a participação em números percentuais torna a visualização mais nítida dessa dinâmica e contínua alteração da distribuição da produção no Polo de Duas Rodas. Assim, como podemos perceber, a posição dominante da MHA neste polo, percebemos também um crescimento até o ano de 1999, ao contrário disso, a partir do ano seguinte, a MHA passa a acumular consecutivas quedas anuais no percentual de participação em termos de produção. Certamente esses dados não representam somente o equilíbrio entre a MHA e as demais produtoras, mas fundamentalmente a expansão do setor em termos de produção. É importante ressaltar a mudança de comportamento, em termos produtivos, que a MHA teve a partir de 1991. Quando na ocasião houve uma queda significativa na quantidade de produção de motocicletas, passando a ser retomada a sua expansão, que ficou por dois anos na casa de noventa por cento, mas depois segue em declínio até estabilizar-se na casa de 70%. A Yamaha é a empresa que mais tem se destacado, depois da MHA em toda a trajetória do PDR de Manaus. 106 Tabela 5 PRODUÇÃO YAMAHA - 1990 A 2008 ANO UNIDADES % 1990 32.779 22,3 1991 20.070 17,3 1992 18.396 21,3 1993 19.145 22,9 1994 22.983 16,3 1995 25.621 11,8 1996 27.646 9,6 1997 35.943 8,4 1998 29.914 6,3 1999 30.308 6,4 2000 56.816 8,9 2001 82.649 11 2002 108.245 12,6 2003 129.008 13,5 2004 143.060 13,5 2005 190.195 15,7 2006 211.884 15 2007 260.009 15 2008 328.524 15,3 Fonte: ABRACICLO – 2008. Adaptado pelo autor – 2009. A produção de motocicletas da Yamaha representa a segunda a se destacar entre as produtoras do Polo de Duas Rodas. Hoje, com uma produção bastante diversificada, conta com 14 diferentes modelos como: NEO AT 115, YBR 125, FACTOR YBR 125, XTZ 125, XTZ 250, TTR 125, TTR 230, YS 250, FAZER N 600, FAZER S 600, XVS 650, XTR 660, MT-03 660 e XVS A 950. Essa empresa produz motocicletas de 100 e acima de 800 cilindradas. Sendo que, no início de suas atividades, em 1985, produzia apenas quatro modelos de 100 até 400 cilindradas. A Yamaha possui também uma fábrica de componentes, que produz blocos de cilindros e cabeçotes para motores. Produz, além de peças para motores de explosão, árvore de came para veículos de duas rodas. Na qualidade de produtora, a Yamaha se serve da cadeia produtiva, formada pelas firmas fabricantes de peças e componentes do Polo de Duas Rodas, inclusive, das empresas coligadas da Moto Honda da Amazônia, como a Showa que fornece amortecedores. (Pesquisa de Campo) 107 A Yamaha vem se consolidando como a vice-líder deste polo em termos de produção. De 1990 a 2008, esta empresa ultrapassou a marca dos vinte por cento em apenas dois anos intercalados. É importante destacar que, até 2004, a sua produção total anual era comparável à produção mensal da Moto Honda da Amazônia. Porém a elevação da produção alcançada em 2005 permite ver a mudança daquele perfil. Essa mudança vem se acentuando, tal como mostram os números da produção dos dois últimos anos da tabela 6. Tabela 6 PRODUÇÃO KASINSKI – 2002 A 2009 ANO UNIDADES % 2002 7.719 0,9 2003 5.777 0,6 2004 6.653 0,06 2005 5.227 0,4 2006 3.584 0,3 2007 6.831 0,04 2008 7.829 Fonte: ABRACICLO – 2008 Adaptado pelo autor – 2009 0,4 O estabelecimento de empresas com tecnologias coreanas e chinesas no Polo de Duas de Rodas cresceu bastante nestes últimos sete anos. A Kasinski é um dos exemplos de empresa de capital nacional e tecnologia da Hyosung – Coreia que, desde 2002, vem produzindo motocicletas de 100 até acima de 800 cilindradas, no Polo de Duas Rodas. Apesar da modesta quantidade produzida em relação à Yamaha e à MHA, a Kasinski tem assegurado uma média de produção estável nestes últimos quatro anos, pois, possui uma quantidade razoável de modelos diversificados como: SUPER CAB – 50, PRIMA 50, MIDAS 110, GE 125, CRUISE 125, MAGIK 125, FÚRIA 250, MIRAGE 250. É válido dizer os números que acompanham o nome dos modelos, correspondem a cilindradas que possui cada modelo. 108 Tabela 7 PRODUÇÃO SUNDOWN – 2002 A 2008 ANO UNIDADES % 2002 3.405 0,4 2003 1.910 0,2 2004 12.277 1,2 2005 36.505 3 2006 65.106 4,6 2007 87.859 5,1 2008 78.320 Fonte: ABRACICLO – 2008 Adaptado pelo autor – 2009 3,7 A Sundown é parte de um conjunto de empresas que vem se consolidando no Polo de Duas Rodas. Dentre as produtoras de motocicletas, possui uma quantidade também expressiva em termos de diversidade produtiva de modelos de motocicletas, como: HUNTER 90 cc, WEB / WEB EVO, HUNTER 100 cc, HUNTER / MAX 125 cc, FUTURE 100 cc, MOTARD 200 cc, STX 200 cc, VBLADE 250 cc. Observa-se que a quantidade e a participação percentual de motocicletas são superiores à Kasinski. Ao contrário desta, a Sundown cresceu consecutivamente desde o ano de 2003 até 2007, embora tenha apresentado uma baixa quantidade na produção e uma considerável queda na participação percentual. 2.2 OCUPAÇÃO DO COMÉRCIO REGIONAL PELAS PRODUTORAS LOCAIS Em 1995, o Polo de Duas Rodas cresceu no mercado consumidor nacional cerca de 30% nas vendas.33 Esse crescimento é tributado ao aumento do poder de compra, em decorrência da facilidade de crédito e da conjuntural estabilidade econômica. Em 2004, 2005 e 2006, as vendas no mercado interno cresceram 18,3%,34 e em 2007 a participação das vendas de motocicletas 33 34 Desempenho Anual da Indústria Amazonense, 1996-1995; FIEAM: p. 8. Desempenho – Indústria do Amazonas, 2007: FIEAM: p. 30. 109 representou 31% do faturamento total do Polo de Duas Rodas.35 O crescimento das vendas de motocicletas é a razão principal dessa elevação. Neste aspecto, os produtos mais destacados nas exportações de 2006 foram as motocicletas de 50 cm3 (cilindradas) e as de 125 cm3 (cilindradas).36 Em 2007, as motocicletas aparecem como sendo os principais produtos fabricados de todo o PIM, o que reflete não só o desenvolvimento do PDR, mas a expansão física do setor, cuja consequência tem sido o progressivo aumento das vendas de motocicletas dos diversos modelos. O que passamos a mostrar por meios dos dados abaixo, extraídos da página da ABRACICLO. Tabela 8 VENDAS YAMAHA - 1990 A 2008 ANO UNIDADES % 1990 23.004 18,7 1991 17.989 16,5 1992 10.834 20,3 1993 14.519 21,4 1994 17.679 13,9 1995 19.599 9,8 1996 25.412 9,2 1997 30.894 7,6 1998 29.886 6,5 1999 26.738 6,1 2000 50.906 8,9 2001 70.226 10,1 2002 98.925 12,5 2003 110.773 13,1 2004 121.176 13,3 2005 147.306 14,4 2006 179.327 14,1 2007 226.798 14,2 2008 249.732 13,3 Fonte: ABRACICLO. Adaptado pelo autor – 2009 A Yamaha sofreu o impacto da abertura econômica tanto quanto as outras indústrias do Polo de Duas Rodas. Particularmente sua recuperação ou superação após 1990 ocorreu somente em 1996. Porém, curiosamente, é a 35 36 Desempenho – Indústria do Amazonas, 2007: FIEAM: p. 29. Desempenho – Polo Industrial de Manaus, 2006: FIEAM: p. 20. 110 empresa que vai permanecer com o percentual de participação relativamente alto em relação às demais produtoras de motocicletas associadas da ABRACICLO. Constata-se também que a taxa de participação de vendas ocorrida no período de recuperação teve uma queda de 50% em relação aos anos anteriores, relativos aos que culminaram com a abertura econômica. No aspecto de vendas a Yamaha segue sendo a segunda empresa que mais vende depois da Moto Honda da Amazônia. De 1994 a 2008, a participação em percentual, não foi maior do que a participação dos anos anteriores, ao que se refere do período da análise. Constata-se também que do ano de 2000 em diante, a participação da Yamaha em vendas cresceu consecutivamente, à exceção de 2008, ano cuja crise econômica começou no primeiro mês do último quadrimestre. O crescimento da participação é reflexo da expansão da quantidade de motocicletas vendidas por esta empresa. Tabela 9 VENDAS SUNDOWN- 2002 A 2009 ANO UNIDADES % 2002 3.049 0,4 2003 2.149 0,3 2004 12.277 1,3 2005 36.505 3,6 2006 65.106 5,1 2007 87.859 5,5 2008 78.320 Fonte: ABRACICLO Adaptado pelo autor – 2009 4,2 O ano de 2000 corresponde ao período de recomposição da economia, sintomático de um novo ciclo de crescimento. Nesse sentido, o ano de 2003 é ilustrativo da retomada da expansão econômica, concretizada na contínua elevação das vendas e do faturamento no setor de motocicletas. O início das atividades da Sundown coincide com a evolução do crescimento da economia mundial, tal como podemos perceber na tabela relativa às vendas acima. 111 Tabela 10 VENDAS KASINSKI – 2002 A 2009 ANO UNIDADES % 2002 7.719 1 2003 5.777 0,7 2004 6.653 0,7 2005 5.227 0,5 2006 3.576 0,3 2007 6.783 0,4 2008 6.633 Fonte: ABRACICLO Adaptado pelo autor – 2009 0,4 Com o volume de produção e venda menores, a participação da Sundown e da Kasinski, Bramont, e agora, a da Dafra tem contribuído para a uma pequena pulverização do mercado, embora, como podemos observar no gráfico de participação em vendas, a fatia dominante do mercado continua sendo a da MHA. É interessante observar a posição da Dafra Motos no ranking de participação em vendas, que possui um percentual em vendas idêntico ao índice de produtoras menores como Sundown, uma vez que esta última já está no mercado há oito anos como produtor, no Polo de Duas Rodas de Manaus e a primeira iniciou suas atividades em janeiro de 2008. 112 Gráfico 3 PARTICIPAÇÃO EM VENDAS DO POLO DE DUAS RODAS EM 2008 1% 5% 4% MHA 13% YAMARA DAFRA SUNDOWN 77% KASINSKI Fonte: ABRACICLO. Adaptado pelo autor - 2009 O crescimento das vendas do faturamento do Polo de duas Rodas a partir do ano de 1994, dentre outros fatores, é uma consequência do adensamento da expansão da produção e do fornecimento local de partes, componentes e peças para a produção de motocicletas e bicicletas. Isso tornou estes veículos mais competitivos e mais acessíveis ao consumo popular, ao mesmo tempo, o estabelecimento de novos produtores, da expansão da cadeia produtiva contribuiu para ampliar a pulverização do mercado, em relação a maior produtora de motocicletas do Polo de Duas Rodas de Manaus. O faturamento do Polo de Duas Rodas é a expressão do conjunto dos fatores levantados acima, além das estratégias de vendas locais e nacionais e das exportações. Os dados do faturamento esboçados nestes últimos seis anos são significativos dessa estratégia agressiva de vendas internas e externas que as grandes organizações do setor vêm desenvolvendo. O Polo de Duas Rodas representa 24% da totalidade do faturamento geral do PIM.37 37 Desempenho – Indústria do Amazonas, FIEAM; 2007: p. 37. 113 Tabela 11 FATURAMENTO DO POLO DE DUAS RODAS - 1990 A 2008 (VALORES EM US$) SETOR INDUSTRIAL ANO FATURAMENTO 1990 740.965.734 1991 452.751.721 1992 328.632.938 1993 401.044.669 1994 756.803.620 1995 1.014.187.134 1996 1.245.705.837 1997 1.674.820.555 1998 1.662.009.229 1999 1.070.979.051 2000 1.579.445.964 2001 1.554.779.557 2002 1.325.839.716 2003 1.848.842.202 2004 2.347.461.760 2005 3.154.706.723 2006 4.192.007.520 2007 5.948.155.842 2008 7.639.510.142 Fonte: CGPRI, CGMER/COCAD E COISE/CGPRO (2008). Adaptado pelo autor – 2009. O crescimento do setor de duas rodas é uma realidade em Manaus, uma vez que a inserção de inúmeras produtoras tem obtido cada vez mais resultados maiores em termos de produção e de vendas, elevando assim, o faturamento deste setor. O aumento de produtoras e tecnologias, no geral, oriundas da Coreia e da China, tem contribuído também com a ampliação dos empregos, embora, a quantidade de empregos por elas oferecidos esteja aquém do que elas poderiam gerar, tendo em vista, que o mínimo processo produtivo que as mesmas desenvolvem no início das atividades, que são meramente as de montagem das motocicletas. 114 Gráfico 3 FATURAMENTO DO POLO DE DUAS RODAS - 1990 A 2008 (Valores em US$ 1,00) SETOR INDUSTRIAL FATURAMENTO 7.,6 6,0 3,2 4,2 2008 2007 2006 2005 2004 2003 2002 2001 2000 1999 1998 2,3 1,7 1,7 1,1 1,6 1,6 1,3 1.8 1997 1996 1995 1994 1993 1992 1991 0,7 0,5 0,3 0,4 0,8 1,0 1,2 1990 9,000,000,000 8,000,000,000 7,000,000,000 6,000,000,000 5,000,000,000 4,000,000,000 3,000,000,000 2,000,000,000 1,000,000,000 0 Fonte: CGPRI, CGMER/COCAD E COISE/CGPRO (2008). Adaptado pelo autor – 2009. O gráfico acima é demonstrativo da oscilação que as vendas sofreram de 1990 a 2006. A variação entre a subida e a descida das vendas reflete a conjuntura de crises econômicas mundiais que também afetaram o país, lugar da maior fatia do consumo dos veículos de duas rodas produzidos em Manaus. Observa-se que o faturamento a partir de 2002 é sempre ascendente. Uma possível explicação está relacionada com a conjuntura de crescimento da economia internacional e nacional. Mas também estão presentes fatores como o estabelecimento de diversas firmas produtoras de motocicletas no Polo de Duas Rodas de Manaus. Os dados acima revelam que as mudanças estruturais operadas no PDR são representativas do desenvolvimento da indústria de veículos de duas rodas em Manaus. Isto está ocorrendo porque os empresários do polo estão acelerando a diminuição da dependência estrutural do modelo original da ZFM, desde os anos 90, em relação à estrutura e à produção dos componentes, peças e aquisição de insumos, o que em parte, está modificando a relação comercial em termos de importação e exportação tanto em relação ao mercado externo, como em relação ao mercado nacional. Portanto, o que se tem verificado é a ampliação dos horizontes, do ponto de vista dos representantes deste polo, em relação ao mercado internacional, buscando minimizar os custos dos componentes importados. E, já se sabe que minimizar custos com 115 importados, significa atrair empresas fornecedoras de peças e componentes, investir em infraestrutura local para reduzir os custos com a logística. Essa estratégia tem contribuído com a redução da dependência das empresas fornecedoras do mercado nacional e internacional. O que significa, em primeira análise, pensar que as transnacionais e seus representantes planejam a criação de cadeias produtivas locais/regionais, com a finalidade de concretizar suas metas de produzir a custos mais baixos. Isto fica claro no documento da FIEAM: Desempenho Industrial do Amazonas – Análise setorial e perspectivas, segundo o qual: A superintendência projeta que a partir do próximo ano já seja possível colher bons resultados com os intercâmbios contatados, que tem como alvo os países da América Central e do Norte, não só pela proximidade geográfica, como pelas expectativas promissoras de bons negócios. [...] É importante lembrar que a importação de componentes representa 65% dos custos operacionais das empresas do setor. Com essa etapa concluída, as empresas esperam dar um passo decisivo para diminuir a dependência da importação de componentes (verticalização da indústria) e, assim, reduzir custos de operação e ampliar a competitividade no mercado. (FIEAM/CDE, 2001: p. 4) Essa posição da FIEAM esclarece e permite compreender sobre o que significa a implantação de uma logística da produção industrial e fornecimento dos insumos necessários para reduzir a dependência da importação externa à região, bem como, a minimização dos custos a partir da logística local, vai permitir a diminuição dos riscos de perdas e atrasos, o que ocasiona prejuízos, do ponto de vista da empresa. O processo de industrialização em Manaus com a emergência da Zona Franca de Manaus foi reestruturado, em decorrência do novo perfil da economia mundial, cujo cenário foi redesenhado, concomitante ao processo de reconfiguração da divisão internacional do trabalho. Essa nova dinâmica da indústria foi levada a readequar-se ao novo perfil da lógica da produção ordenada pelas grandes organizações empresariais, no contexto expansivo do capitalismo. A história das primeiras fábricas implantadas no então Distrito Industrial de Manaus, entre o final da década de 60 e meados da década de 80, pertence 116 também às fábricas ligadas ao Polo de Duas Rodas, como as do ramo de bicicletas: Prince Bike Norte Ltda, em 1969 e a Caloi Norte e de motocicletas, como a Moto Honda da Amazônia, em 1976 e a Yamaha Motor da Amazônia, em 1981. Foram, em princípio, duas representantes do ramo de bicicletas e duas de motocicletas, e as quatro têm, ainda, em comum, um perfil meramente de atividade de montagem. A mudança no processo de expansão do domínio das multinacionais levou as empresas a não só venderem seus produtos, como já vinha sendo feito antes, mas passam agora a produzi-los (ver quadro 1: pag. 9). O foco consumidor, a princípio era a elite econômica dos países e regiões subdesenvolvidos. Como estamos percebendo, Manaus está inserida neste processo. A presenças de empresas fabricantes de peças revela, em parte, essa mudança de comportamento de perfil e de atividade de montagem com a instalação de duas empresas fornecedoras de peças e componentes, como a Honda Componentes da Amazônia Ltda e a Showa do Brasil S.A. No geral, não foi só uma mudança na lógica da distribuição do produto acabado, mas também fundamentalmente na forma de distribuição do processo de produção, que buscou-se fazer nessas regiões ou países o acabamento de certos artigos produzidos para serem comprados diretamente no próprio espaço de produção, e, até como vem ocorrendo, exportar para outros países, o que criou ao mesmo tempo, uma massa de novos consumidores, estimulando e expandindo cada vez mais. HOBSBAWM ao analisar esse fenômeno a geração dessa “nova divisão internacional do trabalho”, segundo o qual : Uma maciça transferência de indústrias que produziam para o mercado mundial, da primeira geração de economias industriais, que antes as monopolizavam, para outras partes do mundo. Isso se deveu em parte à deliberada mudança, por empresas do velho mundo industrial, de parte ou de toda a sua produção ou estoques para o Segundo e Terceiro Mundos. Seguida eventualmente por algumas transferências até mesmo de processos bastantes sofisticados em indústrias de alta tecnologia, como pesquisa e desenvolvimento. A revolução nos transportes e comunicações modernos tornou-se possível e econômica uma produção verdadeiramente mundial. Também se deveu aos esforços deliberados de governos do Terceiro Mundo para industrializarem-se, conquistando mercados de 117 exportação, se necessário (mas preferentemente não) à custa da velha pretensão de mercados internos. (1998: p. 354) Os investimentos iniciais das empresas representadas na tabela 12 permite-nos compreender o emprego do volume de investimentos, da ordem de US$ 2.462.347.591. As duas empresas de bicicletas juntas expressaram inicialmente cerca de US$ 90,9 milhões em volume de investimentos. Pode-se ver também o grande destaque em números para a Prince Bike Ltda, com a maior soma de investimentos nessa modalidade de veículos de duas rodas. Tabela 12 EMPRESAS DE PEÇAS E COMPONENTES INSTALADAS NO POLO DE DUAS RODAS INVESTIMENTOS EMPRESAS (EM US$ 1,00) ASAP CICLO COMPONENTES LTDA 5.875 216 15.958.000 1.430.000 13.958.000 4.769.000 7.320.154 3.288.000 10.275.000 56.818.000 4.958.000 CURVA TUBOS DA AMAZÔNIA LTDA DAIDO IND. CORRENTES DA AMAZÔNIA LTDA FACOMSA DA AMAZÔNIA LTDA FEDERAL MOGUL IND. DE AUTOPEÇAS LTDA HONDA LOCK DO BRASIL LTDA HTA INDÚSTRIA E COMÉRCIO LTDA MANN + HUMMEL BRASIL LTDA NIPPON SEIKI DO BRASIL LTDA NISSIN BRAKE DO BRASIL LTDA SAKURA EXHAUST DO BRASIL LTDA SUMIDENSO DA AMAZÔNIA IND. ELÉTRICAS LTDA Fonte: SUFRAMA – 2009. Adaptado pelo autor - 2009 3.595.864 É possível dizer que o forte investimento tanto na MHA Componentes da Amazônia Ltda e na Showa Motor do Brasil reforça a ideia de que começa a se concretizar a fabricação de partes, componentes e peças no Polo de Duas Rodas, na indústria local, assim como um processo de produção em cadeia. O desenvolvimento das atividades industriais da cadeia no Polo de Duas Rodas inicia um processo de diversificação. É possível encontrar mais de uma empresa fabricando o mesmo componente. Significando, ao mesmo tempo, o aumento de opções para as produtoras e o princípio da concorrência interna no setor. Empresas como a Facomsa da Amazônia é fabricante de componentes como mecanismo para medidor do nível de combustível e mecanismo para 118 velocímetro/odômetro (standard); outra indústria, a Federal Mogul Indústria de autopeças, produz faróis, luzes indicadoras de manobras; a Mann + Hummel do Brasil é fabricante de filtros de entrada de ar para motores a explosão a diesel; a Nippon Seiki do Brasil é produtora de medidor do nível de combustível, velocímetro do painel, partes e peças; Jogo de fios para velas de ignição e outros fios para veículos. Isto é, em nível local, são todas fornecedoras de empresas focais como Moto Honda da Amazônia e Yamaha. Percebe-se que diferentes empresas estão fabricando peças e componentes. O fato de distintas empresas fabricarem as mesmas peças leva-nos a pensar que um ambiente de competição está aberto no nível da produção local. Percebemos assim, que firmas como a Facomsa da Amazônia e a Nippon Seiki, como produtoras de medidores de uma mesma peça serem potenciais concorrentes, essas firmas fabricam as mesmas peças para as fabricantes de motocicletas do Polo de Duas Rodas. Outra hipótese é a de que ambas forneçam para as indústrias focais por acordo. Sendo essa uma maneira de as empresas fabricantes de motocicletas serem beneficiadas pela quantidade de fornecedoras, o que pode ser uma forma de dar mais estabilidade à produtora focal. A expansão do Polo de Duas Rodas, decorrente da ampliação da quantidade de empresas, tem sido fundamental para a elevação da mão-deobra, vista neste último período. Podemos dizer que está ocorrendo um aumento considerável no número de empresas fabricantes de motocicletas. A tabela 12 demonstra o crescimento de firmas produtoras de partes componentes e peças. Estas últimas constituem o conjunto fabril que estão adensando a cadeia produtiva do Polo de Duas Rodas no PIM. Até o ano de 2006 essa cadeia de produção de veículos de duas rodas empregou quase 13 mil trabalhadores. Portanto, o aumento da mão de obra pode ser, em grande medida, tributada ao crescimento do subsetor de Duas Rodas. A quantidade de mão-de-obra das empresas fornecedoras contratada é compatível com o volume de investimentos que as mesmas apresentam no projeto inicial. Percebe-se que a maior parte destas contratações foram realizadas pela Moto Honda da Amazônia. É interessante notar que somente a 119 Showa do Brasil Ltda, como uma indústria de componentes,38 é responsável por quase mil contratações, um número idêntico à Yamaha Motor, concorrente da Moto Honda da Amazônia. Além da ampliação do índice de nacionalização dos componentes, de matéria-prima e partes, a inexistência de fabricantes de componentes e peças e, de concorrentes destes produtos, com alta sofisticação tecnológica têm favorecido o impulsionamento para a instalação de diversas empresas de componentes, se aglomerando em torno das grandes fabricantes de bicicletas, triciclos, quadriciclos e motocicletas no Polo de Duas Rodas. Após a instalação das primeiras plantas de veículos de duas rodas, foram necessários, pelos menos 15 anos para aparecer os primeiros sinais da ponta da cadeia produtiva. Esse Processo vai se intensificar ainda mais com a instalação de diversas transnacionais neste polo. Diante da falta de mais recursos para viabilizar políticas educacionais, que possam propiciar a formação e treinamento de operários, a fim de capacitar e especializar a mão de obra local, além de fazer com que estes recursos possam viabilizar o desenvolvimento socioeconômico, inovação tecnológica, cultural-educativo, infraestrutural-habitacional, urbano-sanitário dessa região, a destinação dos lucros, em forma de royalties ao país de origem, termina frustrando a possibilidade pensar em desenvolvimento cultural e social da nossa região. A remuneração dessa mão de obra é característica das Zonas Francas. Os salários oscilam, mas para baixo, em relação à inflação. Não há uma oscilação da massa salarial para cima. Em 1999, o trabalhador sofreu um prejuízo de cerca 22% em relação ao ano de 1998, com a queda da massa salarial. E nisso consiste a atualidade dessa característica. Daí a importância e a necessidade, do ponto de vista das empresas continuarem a produzir no Polo Industrial de Manaus. RAMALHO (2006) chama atenção para este aspecto, quanto ao fato de o baixo custo dos salários constituir uma das principais motivações para as indústrias automobilísticas buscarem novos lugares para a produção nos anos de 1990. 38 começou suas atividades fabricando cilindro interno do amortecedor para veículo de duas rodas – standard. SUFRAMA 120 Os dados da tabela 13 são reveladores da existência da alta concentração de uma força de trabalho não especializada e semiespecializada, como resultado e adequação do processo de transferência de parte da produção das firmas transnacionais. A soma das três primeiras faixas salariais, fixadas entre 1,5 a 4 salários mínimos é representativa da maior parte dessa mão-de-obra. Pois, se tomarmos o último ano dos quais estamos analisando, as referidas faixas salariais expressa por si quantificando mais de 70 mil trabalhadores de um universo de cerca de 90 operários. Ressalta-se que, das sete faixas salariais a maior parte estão concentradas em três e a menor quantidade de trabalhadores está registrada nas quatro faixas salariais, que são a maioria. É claro que a utilização do trabalho sem qualificação e do não especializado terá uma implicação direta no rebaixamento da renda familiar. É quando a contradição de ganhos se torna claro como o dia, pois, de um lado, o barateamento da remuneração do trabalhador, de outro os altos lucros auferidos no processo de produção. O que vai implicar uma das características a ser destacada do caráter de “enclave” da produção industrial, que corresponde à contradição da distribuição entre os ganhos sociais e o lucro dos capitalistas. É interessante insistir em mais uma caracterização, e, nesta vamos perceber que em regiões ou países de enclave, nos quais serão localizadas a produção, serão feitos grandes investimentos na área de comunicação e transportes, dentre outros, em troca de pouquíssimos benefícios. No entanto, pelo lado das empresas, que intervém nesses locais de enclave, sua instalação vai representar baixos custos e alta lucratividade. O que significa dizer que aos locais de enclave cabe concretamente o financiamento de parte significativa da logística urbana (ANCIÃES et al, 1984). Conforme a tabela 13, podemos perceber um aumento evolutivo na quantidade de trabalhadores empregados no setor. 121 Tabela 13 EVOLUÇÃO DA MÃO-DE-OBRA DO POLO DE DUAS RODAS - 1990 A 2008 SETOR INDUSTRIAL ANOS MÃO-DE-OBRA 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 39 Fonte: SAP/CGPRO/COISE (2008) Adaptação do autor – 2009. 4.056. 2.979 2.713 2.660 3.135 3.700 3.671 4.575 5.147 4.943 5.709 6.566 7.490 9.052 10.264 11.303 12.831 A abertura econômica como um fenômeno mundial e impulsionada pelo governo Collor no Brasil, impactou fortemente as indústrias do Polo Industrial de Manaus. Na avaliação de SALAZAR (2006), isto constitui uma espécie de terceira fase desestabilizadora, em vista das medidas que resultaram na eliminação das quotas anuais de importação, os índices de nacionalização e instituição do processo produtivo básico - PPB. O impacto social em Manaus das medidas federais que ficaram conhecidas como abertura comercial do país, rendeu em cerca de 40 mil operários desempregados neste período. Ao observarmos a tabela 13, veremos que, após abertura econômica, as indústrias demoraram a responder em decorrência, segundo o seu ponto de vista, do clima de incerteza nos investimentos. Conforme registro do Desempenho Anual da Indústria Amazonense - FIEAM/CDE “A abertura econômica e a incerteza ainda reinante podem ser os fatores que explicam 39 SUFRAMA. Indicadores de Desempenho do Polo Industrial de Manaus. História do PIM em Tabelas e Gráficos, 2003 a 2008: p. 98. 122 essa menor capacidade em gerar novos postos de trabalho” (1994: p. 7). No entanto, a partir do final da década de 90, começa a se ouvir os representantes das indústrias falarem na possibilidade de formação de cadeias produtivas, como alternativa estratégica para todo o Polo Industrial de Manaus. Foi nessa perspectiva que o Desempenho Zona Franca de Manaus expressou a importância da redução do volume de importação como “estratégias a redução no volume de importação e, por consequência, os custos operacionais, o que garante maior competitividade para melhor posicionamento no mercado” (FIEAM: 1999 - 1998: p. 1). O aumento das contratações do Polo de Duas Rodas comparado ao ano de 1990 quando emprega 3,5 trabalhadores representa 266%.40 A partir do ano de 2000, o crescimento da quantidade de trabalhadores será sempre ascendente até 2006. A massa salarial do Polo de Duas Rodas cresceu 10,38%, até novembro no ano de 2000. A pequena elevação em 1,2% das horas trabalhadas registradas ocorreu devido à recuperação da demanda sazonal, da ampliação do emprego e das horas extras. O fato é que este polo passa a ser o segundo do Polo Industrial de Manaus que mais emprega conforme os dados esboçados em 2006. Pode-se observar, pelos números expostos acima, que o nível de emprego do primeiro ano da tabela se equipara à totalidade do volume de empregos, correspondente aos recém-inseridos no Polo de Duas Rodas. A produção deste mesmo ano é operada com um quadro duas vezes superior ao quantitativo de trabalhadores dos primeiros anos das indústrias do setor. É importante comparar a quantidade total de empregos de 1990 com a quantidade contratada inicialmente no período da apresentação do projeto. É interessante ver que uma única indústria (ver tabela 12) tinha na sua base de contratação quase o dobro dos empregos relativos ao referido ano. Verificamos, assim, que, somente no ano de 2003, as empresas deste setor vão recompor a quantidade de empregos ofertada no início das atividades produtivas em Manaus. Ressalta-se, ainda, que essa recomposição vai ocorrer num contexto de expansão das empresas no Polo de Duas Rodas, pelo que 40 FIEAM Desempenho Polo Industrial de Manaus – 2006: p. 48. 123 pode-se se afirmar que as empresas estão cada vez mais produzindo em maior escala de produtos, com uma quantidade menor de força de trabalho. Gráfico 5 EVOLUÇÃO ANUAL DA MÃO DE OBRA DO POLO DE DUAS RODAS 1990 A 2008 Milhares 25 20.8 20 15.6 15 12.8 11.3 10.3 9.1 10 7.5 6.6 5 4.6 4.1 3.0 2.7 2.7 3.1 3.7 5.1 5.7 4.9 3.7 0 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 Fonte: SUFRAMA (2008). Adaptação do autor – 2009. Assim, somadas as atividades produtivas, com as novas instalações de plantas o Polo lo de Duas Rodas gerou 58.694 novos postos de trabalho. Desse total de empregos gerados, 51.838 são para trabalhadores efetivos e os demais são para contrato temporário e terceirizado. terceirizado. Por efeito, o crescimento no nível de emprego é representativo de 4,7% em relação ao ano de 2001. (FIEAM: Desempenho do P Polo Industrial de Manaus - 2002: p. 4) Em 2005 o Polo lo de Duas Rodas figurou na terceira colocação o ranking da oferta de empregos, egos, que contratou pouco mais de 1,04 mil trabalhadores, número que adicionado alcançou o patamar de 11,3 mil trabalhadores empregados. Sua participação em nível de empregos foi de 12,74% em relação 124 ao conjunto dos empregos ofertados no PIM.41 Já em 2006 o crescimento foi superior em relação ao ano de 2005, pelo alcance de um crescimento de 13,5% no volume de empregos, promovendo uma elevação da quantidade total de empregos de 11,3 mil para 12,8 mil funcionários. A soma das compras de insumos pode contribuir para a nossa compreensão do processo de formação das cadeias produtivas na indústria de duas rodas de Manaus. Nesse sentido, a fim de tornar mais clara nossa exposição, do ponto de vista metodológico, inserimos os dados das aquisições em nível regional, nacional e internacional. Assim, podemos verificar a extrema dependência de insumos, peças e componentes, que continuam sendo trazidos de fora, vulneráveis aos riscos nos transportes dessas mercadorias para a montagem não só no Polo de Duas Rodas, mas também, em geral, no PIM. Essa característica ainda é dominante nos diversos subsetores do Polo Industrial de Manaus, mas é também uma hipótese que começa a contradizer essa realidade, quando verificamos a existência de uma produção local que começa a se desenvolver neste mesmo conglomerado industrial. Ainda que do ponto de vista do conjunto do Polo Industrial de Manaus esta seja uma tendência, o setor de Duas Rodas indica a produção de bens por esse caminho, no sentido da formação de cadeias produtivas. Entretanto, é preciso frisar que isso só será possível ocorrer aqui, em virtude do aproveitamento dos incentivos fiscais e do trabalho barato. O Desempenho do Polo Industrial de Manaus torna explícita a dependência que ele tem em termos de matérias-primas, insumos e componentes para a produção local, que devem ser importados de outros lugares do Brasil ou de países estrangeiros. Não somente por esse motivo, mas em decorrência da busca de maior competitividade as empresas começam a desenvolver suas atividades em cadeia de produção, na forma de clusters. Esse processo coincide com a terceira fase da indústria do Polo Industrial de Manaus. Segundo o documento da FIEAM: 41 FIEAM: (Desempenho – Polo Industrial de Manaus – 2005: p. 36) 125 As empresas estão trabalhando no sentido de conquistarem caminhos mais viáveis para operar no mercado de forma que lhes permitam abstrair dos incentivos fiscais da União. Para isso, empresários continuam buscando mecanismos que possam adensar a cadeia produtiva local apontado na viabilização de uma indústria de componentes, em especial para o setor eletroeletrônico da ZFM (2002: p. 9). Trata-se de uma estratégia que visa à minimização do volume de importação. Significa afirmar um movimento que já se evidencia como uma prática no Polo de Duas Rodas. Inversamente à compra externa, a compra regional vem sendo ampliada consecutivamente desde 1994. O documento da FIEAM constata a redução no volume das importações em 23,8% nos anos de 1998, 1999, 2000, 2001 e 2002. Isso representou US$ 805,1 milhões a menos. Comparativamente, esse dado é a expressão da redução da balança comercial, uma vez que as exportações cresceram 585,3%, o que quer dizer em valores de US$ 876,0 milhões. Mas também de estratégias das aquisições regionais de insumos, componentes e matérias-primas, tal o que indica a perspectiva econômica de subsetores como o de Duas Rodas. (FIEAM DESEMPENHO DO POLO INDUSTRIAL DE MANAUS – Análise Setorial e Perspectiva, 2002: p. 9) 126 Tabela 14 AQUISIÇÃO DE INSUMOS DO POLO DE DUAS RODAS - 1990 A 2006 EM US$ SETOR INDUSTRIAL AQUISIÇÃO DE INSUMOS ANOS REGIONAL NACIONAL EXTERIOR TOTAL 1990 114.320.007 1991 66.333.726 1992 62.379.919 1993 48.716.886 1994 188.680.341 1995 227.422.601 1996 341.131.907 1997 492.255.418 1998 467.804.358 1999 321.764.262 2000 411.696.677 2001 434.088.156 2002 472.337.243 2003 594.069.780 2004 641.486.280 2005 858.420.020 2006 1.172.949.290 2007 1.631.478.246 2008 2.092.062.383 42 Fonte: SAP/CGPRO/COISE Adaptação do autor – 2009. 119.926.235 94.187.424 85.630.938 74.015.059 228.158.724 210.313.632 240.337.391 334.440.129 307.768.778 204.165.115 272.821.913 283.167.958 281.133.373 346.816.141 416.345.955 588.350.424 858.708.195 1.138.280.680 1.490.697.165 64.844.747 39.845.729 43.797.828 72.949.332 128.176.479 252.755.377 215.846.909 336.701.807 254.165.219 193.202.000 309.386.579 272.682.099 239.126.458 284.132.589 260.671.275 348.626.842 537.933.363 754.141.260 1.332.768.287 377.090.989 200.366.879 191.808.685 195.681.277 545.015.544 690.491.610 797.316.207 1.163.397.354 1.029.738.355 719.131.377 993.905.169 989.938.213 992.597.074 1.225.018.510 1.318.503.510 1.795.397.286 2.569.590.847 3.523.900.186 4.915.527.835 O dados explicitados na tabela 6 são reveladores da tendência de uma expansão substancial na aquisição de insumos nacionais em relação às aquisições de insumos do exterior no subsetor de Duas Rodas. Percebe-se, ainda, que, nestes dez últimos anos, de 1996 a 2006 ocorreu proporcionalmente uma significativa elevação da aquisição de insumos regionais por este subsetor em relação às aquisições de insumos nacionais e do exterior. Esse movimento foi consideravelmente impulsionado pela empresa líder do subsetor de Duas Rodas: a Moto Honda da Amazônia, que analisaremos mais de perto no próximo capítulo. As mudanças que estão sendo apontadas a partir da série na tabela 14 são, na verdade, reveladora de uma novidade jamais vista nas diversas fases anteriores da indústria da Zona Franca de Manaus, em relação ao Polo de Duas Rodas. Porque, naquelas fases, os componentes eram produzidos 42 SUFRAMA. Indicadores de Desempenho do Polo Industrial de Manaus. História do PIM em Tabelas e Gráficos, 1988 a 2006: p. 15. 127 majoritariamente na região Centro-Sul do país, quando não adquiridos junto a fornecedores internacionais (ALVES, 2005). Os dados referentes ao período indicado nestes dez anos sinalizam um movimento de uma ampliação progressiva da produção regional do subsetor de Duas Rodas, não só por ter optado em aumentar suas aquisições de fornecedores locais, mas também pelas vantagens auferidas na natureza dos custos de produção. Ao compararmos o crescimento das aquisições regionais em relação às aquisições nacionais e do exterior, verificamos uma significativa ampliação de empresas fornecedoras que ora vêm orbitando, acompanhando e se desenvolvendo num movimento sincronizado com as empresas deste subsetor da indústria local. Ressalta-se, ainda, que os novos centros produtivos, no qual o Polo de Duas Rodas do Polo Industrial de Manaus se insere, concentram a “produção intensiva em trabalho, a produção de alto consumo de matérias-primas e energia e de alta contaminação.” (VALLE, 2007: p. 105) Trata-se de uma mudança político-jurídico-administrativa no âmbito do “novo regime da Política Industrial e de Comércio Exterior, desencadeada a partir do início dos anos 90 do século passado e estruturada no conceito de competitividade” (BOTELHO, 2006: p. 35). Nesse sentido, os empresários fazem lobby junto aos parlamentares, manifestam suas preocupações em relação às condições de competitividade, buscando orientar a forma como a bancada deve se comportar, isto é, chegam ao limite de dizer que os parlamentares devem arregimentar força para alcançarem alianças regionais estratégicas com o objetivo de organizarem o desenvolvimento de toda a região. No fundo, o que está em questão é o atrelamento das ações dos parlamentares regionais aos interesses das transnacionais do PIM. Dizem eles que o maior problema por eles enfrentados é “a dependência de fornecimento de matéria-prima importada, pesados encargos trabalhistas e as condições pouco favoráveis do comércio exterior” (FIEAM - Desempenho Indicadores Industriais Amazonas, 2000: p. 9). Na esfera regulatória, a promulgação da Lei 8.387 de 30.12.1991, que institui o índice mínimo de nacionalização para as etapas básicas da produção 128 irá redimensionar o conjunto da produção no Polo Industrial de Manaus. O primeiro efeito dessa mudança pode ser sentido a partir da instalação de máquinas modernas nas plantas das fábricas do conjunto do PIM. E isto teve uma implicação direta na planta básica dessas fábricas, inclusive no Polo de Duas Rodas. A regionalização da produção expressa na regionalização da aquisição de insumos ilustra, por efeito, a expansão da produção de partes e componentes. A Moto Honda da Amazônia, por exemplo, será impactada com essa mudança. Isto fica mais claro ao olharmos os valores da Utilização da Capacidade Instalada - UCI.43 Em dezembro de 1991, a UCI da MHA representava 53 apenas; em dezembro de 1992, a UCI foi reduzida a 31; em dezembro de 1993, a UCI indicava 56; em 1994, 1995, 1996, 1997 e 1998 a UCI não só alavancou mas também estabilizou em cem por cento, à exceção dos meses de janeiro de 1997, que a UCI fixou em 96 e agosto e dezembro de 1998, que ficou reduzido em 81 e 75, respectivamente. Após a baixa de 1999, que ficou fechou dezembro com 85, os anos subsequentes de 2000 a 2006 a UCI fechou todos os meses destes anos em cem por cento da sua capacidade produtiva. (SINDI/FIEAM/CNI, 2008)44 A produção de motocicletas no subsetor de Duas Rodas se expande numa evolução crescente a partir do ano de 1992 a 2006, conforme o quadro acima. Embora tenha variado numericamente no período entre 1990 e 1991, a produção deste período deu um salto significativo em relação aos resultados da produção dos anos anteriores. Este crescimento pode ser em parte explicado pela intensificação do movimento sincronizado realizado entre as empresas do subsetor de Duas Rodas e seus fornecedores. Em entrevista a Paulo Ricardo Braga do site Automotive Business45, Moacyr Paes, diretor executivo da ABRACICLO declara: “Para minimizar as dificuldades na absorção dos preços dos insumos, fabricantes e fornecedores de componentes trabalham próximos para equacionar custos e margens, buscando oportunidades de crescimento 43 Corresponde à capacidade de produção instalada e operada. Os valores podem refletir se a fábrica opera com todas máquinas instaladas ou somente com parte da sua capacidade. 44 FIEAM. Desempenho – Polo Industrial de Manaus, 2008) 45 http://www2.uol.com.br/canalexecutivo/notasemp/emp070120052.htm. 129 conjunto.” (Abril, 2004) A expansão da produção é realmente considerável, se compararmos o que foi a produção em 1992 e seus resultados no ano de 2006. O faturamento do subsetor de Duas Rodas é emblemático da variação de alta e queda nos seus valores. É importante observar que os valores dos primeiros anos de 1990 são extremamente modestos. É importante lembrar que os baixos valores refletem o processo de adaptação da abertura alfandegária do governo federal em 1991 (ALVES, 2005) No entanto, vale ressaltar que, a partir dos anos de 2003 em diante até o ano de 2006, o faturamento apresentou cifras crescentes. A evolução do faturamento especialmente a partir do ano de 1994 a 2006 é sempre progressiva. A dinâmica do comércio neste subsetor da indústria local será distinta dos demais subsetores. De 1990 a 2004, as exportações das indústrias de duas rodas cresceram 975%. No último ano do período em análise, as indústrias do PIM reduziram suas exportações em cerca de 12%, enquanto as exportações das empresas de duas rodas elevaram-se em 43,75%, contra redução de 30% no polo eletroeletrônico. O bom desempenho da economia brasileira em 2004 não afetou o comportamento do setor de duas rodas. Na média dos anos do período em análise, as exportações do polo de duas rodas representaram 19,5% de toda a exportação do PIM e 14,5 % das exportações de todo o Estado do Amazonas. Ao longo dos primeiros anos do século XXI, portanto, dobrou a participação do polo de Duas rodas sobre as exportações totais das indústrias do PIM, ampliando suas relações com o resto do mundo via comércio internacional. (ALVES, 2005: p. 78-9) A análise de ALVES (2005) enfatiza não só a importância econômica do subsetor de Duas Rodas e sua viabilidade industrial, mas também a capacidade do mesmo manter-se competitivo em conjunturas economicamente desfavoráveis em relação a outros setores da indústria. A oposição exclusão versus inclusão, como uma das contradições atuais dessa fase do capitalismo, vislumbra, ao mesmo tempo, um crescente índice 130 de desemprego, tanto nos países que sofrem o deslocamento, quanto nos países, regiões e lugares para onde as fábricas foram deslocadas. Esse fenômeno está estampado na dinâmica da estrutura do capital, devido à pressão para baixo dos preços dos produtos em nível global. O processo de inclusão de regiões é gerado nessa contradição. Regiões como Ásia e América Latina são bons exemplos dessa inclusão de fábricas que se estabeleceram nestas últimas décadas. Destacamos alguns tipos de organizações como a chinesa, a coreana, bem como as diversas formas de métodos organizacionais, a fim de relacionar à empresa focal, mas também buscamos focar a forma japonesa de organização, para vislumbrar a caracterização da Moto Honda da Amazônia, o que faremos no capítulo seguinte em virtude de ser o foco principal de nossa abordagem. Significa dizer que o peso da MHA e o volume de investimentos, produção, vendas, faturamento, mão de obra e aquisição de insumos, caracterizam a dominação dessa empresa sobre as demais. 131 CAPÍTULO III 132 3 AS REDES DE PRODUÇÃO NA MOTO HONDA DA AMAZÔNIA 3.1 AS ESTRATÉGIAS DA MHA E SUA RELAÇÃO COM SEUS FORNECEDORES A atuação da Moto Honda da Amazônia no Polo de Duas Rodas de Manaus é, em geral, correspondente à forma de intervenção das demais transnacionais, cuja estratégia é a de reduzir os custos de produção para permitir a sua existência e a sua competitividade no mercado local e mundial. Certamente que não se trata apenas de uma estratégia para possibilitar a redução de custos de produção, ou a minimização de custos com a logística, que tem sido um dos problemas-chave enfrentados pela MHA. Do ponto de vista desta, a racionalidade no aspecto logístico constitui a ação imperativa de atração de outras transnacionais fornecedoras de peças e subconjunto para perto da sua fábrica em Manaus, a fim de atender o processo produtivo, o que significará superar as necessidades e dificuldades no fornecimento nacional e internacional. A realização do processo produtivo da MHA está associada ao princípio de que a empresa deve produzir onde está localizada. Significa dizer que a cadeia produtiva deve ser fixada na região, ou mais precisamente na mesma cidade local. Esse princípio corresponde também a uma estratégia em si. Porque, além de afastar vários tipos de dificuldades e necessidades, há, nela embutida, certa lógica, no que diz respeito aos efeitos tal processo pode fazer por estar voltada à produção local, em termos de emprego e desenvolvimento. A atividade fabril local com fornecedores locais é estratégica, em decorrência da utilização dos benefícios da isenção fiscal oferecidos pela SUFRAMA. Isso pode explicar em parte o crescimento do Polo de Duas Rodas, a intensificação da produção de motocicletas e o adensamento da sua cadeia produtiva no Polo de Duas Rodas em Manaus. Mas, a minimização dos estoques, cuja finalidade é diminuir os custos da produção, tem levado a MHA a tornar-se um polo aglutinador de empresas fornecedoras. Além disso, por se tratar de uma 133 empresa japonesa, a localização da produção segue a influência dos princípios filosóficos estabelecidos e adotados na empresa, segundo o qual: deve-se produzir onde se está. Dito pelos próprios administradores. Como afirma João Paulo46: Nós temos a filosofia estabelecida pelo nosso fundador o Sr. Soichiro Honda e uma delas chama-se: glocalização, temos de produzir aonde nós estamos. No passado era importado. Nós estamos aqui em Manaus, então nós temos de ter a cadeia próximo da fábrica. Raciocínio... Anteriormente também era muitos... Todos de São Paulo... estamos convidando para trazer mais pra cá. Justamente... gerar riqueza no local onde nós estamos... empregos. (PESQUISA DE CAMPO: 2009) A glocalização está associada ao processo de reestruturação produtiva no mundo, sendo caracterizado pelo “reordenamento do mercado”, verifica-se o aumento da produtividade pelo novo processo de difusão das inovações tecnológicas percebidas nas cadeias produtivas. Essas mudanças ocorreram na América Latina, no mesmo instante em que se deu a transformação do modelo de industrialização pela substituição de importações. As mudanças são observadas no âmbito das “relações interfirmas, no mercado de trabalho e na comercialização de produtos, na mobilidade do trabalhador e nos requisitos profissionais” vêm ocorrendo desde a década de 80 (ABREU, 2000: p. 27). Combinado a isso, as transnacionais buscam maximizar seus resultados sob o regime da produção flexível, se materializando por meio da desregulamentação do trabalho e da fragmentação das organizações sociais.47 Pesquisas feitas por Gitahy, Leite e Rabelo ilustram quantitativa e significativamente empresas que iniciaram o emprego de novos modelos focados “na eficiência, e em novas metas e princípios organizacionais em que a externalização das atividades produtivas era uma questão relevante” (ABREU, 2000: p. 28). 46 O nomes deste e dos demais entrevistados são todos fictícios. “Estudos como o de Gitahi, Leite e Rabelo (1993) mostram que muitas empresas, para enfrentar a crise econômica, começaram a enfrentar novos modelos centrados na eficiência, e novas metas e princípios organizacionais em que a externalização das atividades produtivas era uma questão relevante. Esse processo de reestruturação ainda está ocorrendo e foi fortalecido pela estabilização da economia em meados da década de 90. (ABREU, 2000: p. 28) 47 134 A partir da análise sobre o grau de difusão das inovações tecnológicas e organizacionais, presentes no interior das empresas, e de como essas transformações afetam a redistribuição e as atividades na produção em toda a extensão da rede de empresas sob o foco do conceito de cadeia produtiva, entende-se que “o processo de externalização das grandes empresas vem produzindo uma forte recomposição dos trabalhadores industriais dos setores envolvidos.” (ABREU, 2000: p. 31) Esta hipótese é indicativa de um quadro de transformações na estrutura dos empregos e nas relações de trabalho, e, indica, ainda, novas perspectivas para os trabalhadores e para as suas organizações sindicais. Estudos como o de ABREU et al (2000) têm demonstrado em que medida o emprego de novas tecnologias e novos regimes organizacionais influenciaram nos novos formatos das relações interfirmas (verticais e horizontais), além das relações entre empresas de diferentes instituições. Esta pesquisa ao perceber a difusão das inovações tecnológicas e organizacionais, buscou verificar a coerência, a estratégia das empresas, o mercado de trabalho e as instituições locais. Pode-se perceber um aumento na produtividade, nos investimentos, no faturamento e uma substancial redução dos empregos da indústria. De acordo com Abreu (2000), a década de 1990 vai marcar o início de importantes transformações estruturais na indústria automotiva e implicará a intensificação da produção na cadeia automotiva do Brasil, no contexto da reestruturação. Na década de 80 a reação à crise forjava uma abertura para fora, mas na década de 90, ao contrário, abertura é realizada para dentro. Pois, a entrada de automóveis importados no Brasil, levou à compra de componentes no exterior. A estabilização da economia mundial vai propiciar a aceleração da reestruturação, novos investimentos, novas instalações e relocalização industrial, numa dimensão de combinação de fatores. A indústria automobilística no Brasil nasceu internacionalizada em decorrência da política nacional de substituição de importações e da reestruturação realizadas nessa indústria. As inovações organizacionais ou tecnológicas, em processo de implementação nas empresas investigadas, no estudo Produção flexível e relações interfirmas: a indústria de autopeças em 135 três regiões do Brasil, conclui que estas estratégias destinam-se à diminuição de custos de produção (ABREU, 2000). As mudanças nas relações entre clientes decorrem da reestruturação das empresas do setor de autopeças. Entre as quais se destaca uma forte dinâmica na internalização/externalização das atividades na empresa, no que se refere às atividades auxiliares e às produtivas, e tem por consequência o redimensionamento da divisão do trabalho entre as empresas envolvidas. É um processo complexo, heterogêneo e dinâmico, com características de ensaio e erro. Assim, o movimento pela qualidade está relacionado à reestruturação de grandes corporações e, ao mesmo tempo, ligado à focalização, flexibilização e diminuição de custos. De acordo com CARRILLO e MIKER, sustentados em RAMÍREZ (1995) está em curso o desenvolvimento de novas experiências fabris no cenário do novo modelo de indústrias. Nesse sentido, aquele autor afirma que [...] o novo modelo de industrialização está baseado em uma intensa e complexa rede de transações de insumos-produto, caracterizada fundamentalmente por fortes relacionamentos interfirmas. (2000: p. 193) Nossa pesquisa indica que a necessidade de se produzir no local está associada às dificuldades que se têm quando as peças estão distantes da produção das motocicletas. Porque a distância dos fornecedores pode gerar diversos riscos à programação da produção. Parte dessas dificuldades são os riscos por atrasos nos transportes de caminhão, ou problemas de congestionamento nas estradas, por acidentes, por assaltos, por greves de caminhoneiros, tornam-se as causas para as peças não chegarem no tempo preciso da produção. As respostas a tais dificuldades poderão inversamente estar relacionadas à minimização dos estoques da MHA. Segundo Ricardo Souza: Melhorar o estoque pra justamente a gente não ter muito problema. Vir de São Paulo existe problema de transporte, a carreta quebrou, é greve, é atraso na balsa. Existe vários problemas. Então pra tentar minimizar os problemas, os fornecedoras estão chegando aqui em Manaus. A tendência é vir cada vez mais fornecedores, tá? Tá chegando, inclusive de aço, de aço, não sei se é a Mangels que chegou. Ele fornecedor de aço. Também veio aqui pra Manaus. Veio mais 136 Sodecia, que é um grupo português, que fornece só parte de estamparia também. Do Japão também veio a Keihin, que nos fornece carburadores. Também a Honda Lock, que fornece conjunto travas, essas aí são empresas coligadas da Honda, né? A Honda Lock, a Keihin, a Showa, que fornece amortecedores, são todas empresas coligadas da Honda. A Honda tem participação. Elas são coligadas da Honda (PESQUISA DE CAMPO: 2009). Bernardo é enfático ao dizer que, [...] é lógico que a gente trazendo, eu penso né? Se você estiver com seu fornecedor aí do ladinho, nossa, aí você está muito mais prevenido. Porque você imagina as peças virem lá do Sul, com Containeres que chegam a 60, 70 graus Celsius; passíveis de serem furtados e tombados; afundados no rio, e com toda essa logística louca. Essa logística, que tanto o pessoal que trabalha no COMAT, você sabe que tem uma malha rodoviária que essa transportadora... você hoje consegue identificar aonde que tá cada caminhão, em qualquer lugar né? Porque é imprescindível que nós saibamos o que o caminhão que está carregando não sei o quê, está, onde está? E se pode adiantar. É muito importante (PESQUISA DE CAMPO: 2009). Confirmando tais afirmações diz Augusto48: [...] Então com certeza, você vai poder oferecer um insumo, ou então, uma peça com um preço bem acessível. Então, isso aí é questão de estratégia, né? Porque se você tem um... porque se a gente for analisar né? Todos... todos insumos, a maioria desses insumos vêm de fora, né? Então vindo pra cá acho que facilita muito porque, se produz aqui e se vende né? (PESQUISA DE CAMPO: ESMERALDO). A diminuição dos custos é um objetivo constante da MHA, em diversos aspectos da produção, mas também em logística. Reduzir os custos no aspecto da logística é uma estratégia que a MHA está desenvolvendo porque a sua realização é extremamente cara para a empresa. A utilização de todos os mecanismos que ofereçam a redução de custos, bem como essa estratégia de aproximar o fornecedor permite a produtora baixar o preço da motocicleta, para ficar mais acessível e, simultaneamente, torná-la mais competitiva com as motocicletas das suas concorrentes que estão se estabelecendo em Manaus. Esses mecanismos são cruciais para a MHA, e esse processo é feito 48 O nome do entrevistado é fictício. Augusto é engenheiro de formação e trabalha na Moto Honda da Amazônia há 9 anos. 137 preservando a qualidade e as especificações da produção, por ser, conforme seus administradores, uma das exigências indicadas da MHA. Além da redução dos custos com a logística, a utilização dos benefícios da isenção fiscal, oferecidos pela SUFRAMA consiste em importante motivação para a MHA, bem como tem sido este um dos principais motivos do estabelecimento das produtoras de motocicletas e bicicletas, no Polo de Duas Rodas de Manaus, numa crescente intensificação da cadeia produtiva deste polo, assim como do seu adensamento. Certamente a isenção fiscal, como motivação da produção é também representativa para a MHA, que tem sido a maior beneficiada, uma vez que as produtoras de peças que a abastecem também são beneficiadas. Luciana49 explica que o fato de a MHA [...] optar pela compra de peças e insumos de empresas locais, é ... estão relacionados primeiro: a questão da rapidez de logística; né? Segundo: a geração de emprego local, e, obviamente, os incentivos que a própria Zona Franca oferece, né? ... É ... deixam o produto, com certeza, mais barato, né? ...a fabricação e, evidentemente, mais acessível ao consumidor (PESQUISA DE CAMPO: 2009). A redução de custos na produção consiste em uma das estratégias das grandes firmas transnacionais, geralmente acompanhadas por métodos como o Just in time e o kanban. Conforme ABREU et al (2000), no atual processo de reorganização produtiva e do trabalho, o kanban vem sendo utilizado como método de programação e controle da produção. De acordo com Ricardo Souza: “Nós chamamos de kanban. Just-in-time ou kanban, né? A ideia era realmente enxugar o estoque” (PESQUISA DE CAMPO: 2009). Para os administradores da MHA, os método do Just-in-time/Kanban se aplicam também à logística. Porque, nos seus pontos de vista a ausência de um fornecedor local gera muitos estoques. Em relação às peças que chegam de um fornecedor de São Paulo é gerado imediatamente o primeiro estoque. Quando vai para outro fornecedor fazer a pintura é gerado novo estoque. O retorno dessas peças à fábrica, mais um estoque é gerado. É importante 49 O nome da entrevistada é fictício. Luciana Trabalha na área de recursos humanos da Moto Honda da Amazônia, mais especificamente no subsistema de recrutamento, seleção, orçamento de pessoal e remuneração. Possui 21 anos de empresa. Atualmente sua atividade é na gestão de Recursos Humanos. 138 ressaltar que se trata da utilização do método Just-in-time- Kanban externos, isto é, que ocorre na relação entre a empresa produtora e seus fornecedores. A aplicação do Just-in-time/kanban é uma estratégia que a HDA vem utilizando a partir dos seus fornecedores locais com a finalidade de reduzir custos, mas, sobretudo, para maximizar o controle de estoque ao estabelecer o desenvolvimento da produção por meio do estoque zero. A exploração do sistema Just-in-time/kanban pelo estoque zero ocorre numa combinação com os fornecedores. Nesse perspectiva verificamos que a MHA desenvolve o Just- in-time/kanban externo com os seus fornecedores locais nas suas atividades produtivas. A utilização desse processo permite à MHA que o controle e a determinação do tempo da entrega das peças ocorra nos prazos por ela determinado. Na MHA o Just-in-time/kanban é realizado pelo setor de controle de materiais. Há um tempo estabelecido para que certo modelo de motocicleta seja entregue no horário preciso. Implica dizer que o fornecedor que vai abastecer determinada peça deve apresentar-se em tempo preciso na plataforma, determinado pela programação de poucos minutos de antecedência. Portanto, o fornecedor é obrigado a estar no horário programado para que as peças possam ir para linha de montagem. Dependendo do fornecedor local, as entregas diárias das peças variam entre quatro ou cinco vezes. A diferença entre os fornecedores locais e os fornecedores nacionais e internacionais ocorre devido a distância que, por esse motivo, necessariamente, é gerado um estoque de dias, ao contrário dos fornecedores locais para os quais não é preciso que seja gerado nenhum estoque. A exemplo do fornecedor nacional, especificamente os de São Paulo, em que o estoque é no máximo de três dias. A MHA evita fazer estoque superior a três dias. Assim, a regra desenvolvida pela MHA é fazer com que todo o estoque esteja em trânsito, menos no seu almoxarifado. Essa é a compreensão de estoque enxuto para os administradores da MHA. Já para as peças dos fornecedores internacionais, o estoque leva um tempo maior, de dez dias. É importante ressaltar que a técnica do estoque enxuto não eliminou a figura do almoxarife, uma vez que o estoque zero serve a apenas aos fornecedores 139 locais. Portanto, essa função na fábrica ainda é necessária porque o serviço de estoque segue sendo uma necessidade devido aos três dias de estoque nacional e aos dez dias de estoque das peças importadas do exterior. Diz Ricardo Souza: Se acontecer alguma coisa nós paramos. Entendeu? O estoque é muito enxuto. Nós trabalhamos com estoque muito, muito enxuto. Então, tudo, nós chamamos de estoque em trânsito. Tudo é estoque em trânsito. É tudo estoque em trânsito. Nós reduzimos nosso estoque, pra reduzir os custos o máximo possível. Trabalhar com menos estoque possível. (PESUISA DE CAMPO: 2009) Para João Paulo50: É mais harmonioso a redução de estoque, né? Você tem um fornecedor em São Paulo de comprar matéria-prima, você tem que ter a matéria-prima em estoque, vai pro fornecedor fazer a usinagem, pintura, gera outro estoque, pra trazer de lá pra cá, tem que ter um estoque no trânsito, na carreta. Tem um estoque da fábrica, ele tando aqui ao lado, não, né? Da Nissin, por exemplo, aqui é pouco trânsito, né? A própria linha de montagem ela tem uma enxuta, entregando, no kanban, no Just-in-time, entrega na hora. Não tem estoque, o sistema japonês. (PESQUISA DE CAMPO: 2009) Conforme Ricardo Souza: [...]Tudo é pra gente melhorar no mercado, pra reduzir custos, pra se tornar mais competitivo também com as motos chinesas que estão entrando. Nós temos que reduzir os custos e para nos tornar mais competitivos. Porque as motos chinesas são muito baratas. A qualidade é ruim, mas são muito barata. Então nós temos que manter a qualidade, né? E tornar uma moto competitiva. Então o que nós temos que fazer? Reduzir os custos da motocicleta. Então pra isso nós temos que fazer vários trabalhos, trazer fornecedores, reduzir os custos dos fornecedores, pra gente realmente, ter uma moto competitiva no mercado. (PESQUISA DE CAMPO: 2009) 50 O nome do entrevistado é fictício. João Paulo tem 32 anos de atividade na Moto Honda da Amazônia. João Paulo fez carreira dentro da Moto Honda da Amazônia. Começou trabalhando como contínuo da fábrica, hoje trabalha na supervisão de CKD. 140 Quadro 3: PRAZOS DOS TIPOS DE ESTOQUE TIPO DE ESTOQUE ESTOQUE ESTOQUE ESTOQUE LOCAL NACIONAL INTERNACIONAL 0 3 10 PRAZOS EM DIAS Fonte: Pesquisa de campo – 2009. A continuação da atividade de fornecimento nacional e internacional é a expressão de que a MHA não se liberou completamente do estoque. A mudança constatada consiste no estabelecimento e na ampliação da quantidade de fornecedores locais no Polo de Duas Rodas. Esse fenômeno vem contribuindo para a redução da aquisição de peças, de componentes extralocal. Essa minimização do estoque pode ter também o efeito de transferência de estoque, uma vez que, por um lado, os custos são reduzidos na produtora – no caso, a MHA – por outro, surge uma despesa a mais para fornecedora. Porque o estoque é compreendido como uma forma de custo de produção, logo, aquele que se incumbe de fazer o estoque, toma para si o ônus dos custos com o mesmo. Portanto, a racionalidade do controle de estoque é uma técnica que oferece um benefício unilateral, isto é, somente à produtora. Entretanto, todas saem beneficiadas, em relação a certos aspectos, como o que se a firma fornecedora adotar o sistema de produzir e entregar os produtos no tempo preciso. Por isso, a tendência é a de ampliação de fornecedores para o adensamento do complexo do Polo de Duas Rodas em Manaus. No início das atividades nesta cidade, a MHA era uma empresa extremamente verticalizada, isto é, a produção das motocicletas era finalizada somente internamente. Como exemplo, a Showa é sua mais antiga fornecedora local e funcionava dentro das dependências da MHA. Hoje, com um número de 20 fornecedores, conforme gráfico abaixo, a MHA vem alterando o processo produtivo, distribuindo-o para outras fábricas de peças, formando uma rede de fornecimento, tornando sua produção mais horizontalizada. 141 Fornecedores Fornecedores Locais Fonte: Moto Honda da Amazônia, 1999. 142 A lista de fornecedores que forma a rede da MHA deverá ultrapassar a quantidade de 40. A matriz da rede planeja a instalação de pelo menos mais 20 empresas até 2012, de acordo com a previsão dos administradores informantes. À exceção do setor de parafusos, também por questões estratégicas, ainda não vai fazer parte desse novo quadro de fornecedores da MHA. Os mesmos servem a grandes empresas automotivas como a GM, a Wolksvagen, a Ford, dentre outras automotivas do Sudeste brasileiro. O volume de produção e fornecimento para o Polo de Duas Rodas é ainda muito pequeno. Assim, setores como os de injeção plástica, estamparia, aço, afiação, que estão em processo de consolidação, e nestes setores, estão empresas como Nipon Denso, que fornece material de afiação à MHA; a Nissin são produtoras de freios; a FCC que fabrica embreagem; a Scorpion é do ramo de estamparia e solda, entre outras. [...] Então, em função da logística, se estudou, se analisou... melhor então, que os fornecedores ficassem próximos da fábrica, né? Aí seria em termos de logística, em termos de estoque, nós íamos reduzir muito. Então a política da empresa foi trazer fornecedores de São Paulo pra próximo da fábrica. Aí trabalharia como kanban, aí tudo teria hora, nós não teríamos mais estoques intermediários, nós reduzimos o estoque. Alguns problemas de logística, de transportes, tudo isso aí, nós estamos resolvendo, né? Então os maiores fornecedores de São Paulo e do Japão se instalaram aqui em Manaus. Aqueles que realmente, nós falamos, esse aqui vamos trazer pra cá, porque não é know how da empresa [...] (PESQUISA DE CAMPO: 2009) A MHA tem atraído produtoras de peças e subconjuntos necessárias, mas fundamentalmente, aquelas empresas especializadas na produção de determinados produtos, cuja tecnologia não é desenvolvida pela MHA. Constitui-se num tipo de conhecimento particular de produção de componentes do ramo de duas rodas que não pertence ao know how desta fábrica, o que é visto como um benefício para esta produtora, em vista de que, se fosse produzido em suas dependências o custo seria maior, em decorrência da geração de estoque, de equipamentos e de pessoal, necessários para a fabricação desses artigos. 143 A escolha desses grandes fornecedores foi feita de modo criterioso. Critérios como o da qualidade, da boa saúde financeira e da compatibilidade do know how tecnológico incidiram na contratação com a MHA. Do ponto de vista desta, a necessidade de desverticalizar a produção foi fundamental para a escolha dessas empresas para a formação da rede em nível local. Portanto, a formação e a tendência do crescimento da rede, implementadas a partir da MHA são decorrentes da política de atração dos grandes fornecedores que estavam localizados em São Paulo, de aproximá-los da mesma, para reduzir os custos de logística e de estoque, fundamentalmente. E, ao explorar a técnica do Just-in-time/kanban, resolveria o problema do estoque intermediário. Isso tudo ocorreu em função do estabelecimento dos grandes fornecedores no Polo de Duas Rodas de Manaus, antes instalados em São Paulo e no Japão principalmente. 3.2 AS VANTAGENS NA RELAÇÃO OBTIDA NO FORNECIMENTO DAS EMPRESAS LOCAIS O benefício mais impactante é no controle do estoque conforme afirma José Bernardo, segundo o qual, o fornecimento longe do local de produção gera intranquilidade, ou seja, é muito mais confortável ter um fornecedor atendendo em lugar próximo da produtora. Além do que o fornecimento local gera a eliminação do estoque na própria fábrica, consequentemente, esse estoque será transferido para a fábrica do fornecedor. Nesse sistema a fornecedora assume o estoque que seria de responsabilidade da MHA. Porque os fornecedores locais não poderão entregar as peças antes da programação, ou antes do tempo de entrar na linha de produção, mas no tempo exato da produção. O preço da peça produzida por um fornecedor local pode não ser tão determinante para a MHA se a peça tem qualidade. Neste caso, os compradores negociadores de peças da MHA certamente podem optar por comprar a peça do fornecedor local, se ela tem a mesma qualidade da peça 144 que se compraria no Sul do país, ainda que haja uma intensa negociação para a redução do seu preço. De acordo com o administrador Douglas: Então, vantajoso seria esse... esse sistema de trabalho. Seria o Just-in-time, não é? Você consegue colocar as peças naquele horário aqui, pré-determinado, de acordo com a produção que vai ser efetuado no dia a dia ali. É a grande vantagem de ter o fornecedor local, não é? Fora esse acompanhamento, não é? In loco, que essas áreas que foram citadas anteriormente pode ter com maior freqüência e olhar, né? Desvantagem, de terem aqui, é mais vantagem, possa ser que há desvantagem, mas aí é uma outra questão. De repente a peça que ele tá produzindo aqui comparando com uma outra categoria, do mesmo setor, que tá sendo produzido lá no Sul, esteja mais barato, aí tudo bem, aí é outra questão, mas tem que se avaliar porque que esse preço tá mais alto aqui, não é? Aí tem toda uma justificativa, né? Porque nem sempre, o que é mais barato, que tá sendo produzido lá no local X é o melhor, né?, é garantia não é? E aqui, apesar do produto ser um pouquinho mais caro, digamos assim, desse fornecedor, a qualidade é garantida, né? Não só pelo fornecedor, mas também pela Honda. Então, eu não vejo muita desvantagem não com relação a... as fornecedoras que estão aqui, instaladas aqui. (PESQUISA DE CAMPO: 2009) Ainda, nesta mesma linha de raciocínio, Bernardo diz: [...] Primeiro seria a ausência de estoque na fábrica, o estoque passa a ser do fornecedor, eu começo a regular o meu estoque, aqui de uma forma diferente né? Porque o estoque da Honda tá assim, tem um pouquinho na fábrica, tem pouquinho na estrada e tem mais um pouco lá no estoque lá no almoxarifado de São Paulo pra embarcar no caminhão. Então essa logística toda é muito problemática, é muito dinheiro. Então, o que eu acho que o benefício maior é... se a gente colocar em ordem de importância, eu acho que primeiro, você começa ter um pouco mais de controle, sem você precisar gastar tanto dinheiro, sob seu estoque. Você tá lá com o teu fornecedor, e o teu fornecedor fabrica as peças, guarda aí dois segundos aí que amanhã você me entrega. Então isso daí já é um baita dum benefício. Então a relação de compra com os fornecedores locais eu acho que... é... a primeira coisa mais impactante seria essa, esse controle dos estoques né?, fica mais fácil. (PESQUISA DE CAMPO: 2009) 145 O estoque da fábrica conforme diz Bernardo corresponde às peças fornecidos pelas empresas do Sul do Brasil, isto é, pelo fornecimento nacional. Não se trata, neste caso, do estoque do fornecimento das firmas locais. De acordo com Augusto: [...] as vantagens de você comprar de fornecedores locais, primeiramente é em função do estoque né? Que hoje você sabe. A maioria da empresas não trabalha com estoque né? Então nosso estoque fica no fornecedor. Então nossa vantagem é essa e outra coisa, você não precisa, é fazer planejamento com um mês de antecedência, com dois meses, assim tipo: eu vou comprar uma peça hoje e daqui um mês ou quarenta e cinco dias a peça tá chegando, né? Então, como fornecedor, como o fornecedor é próximo, facilita muito nesse ponto, mais a parte de logística e estoque né? Estoque você fica no fornecedor. (PESQUISA DE CAMPO: 2009) A diminuição do estoque é estratégica para a redução geral dos custos de produção. Por isso, uma das preocupações centrais da MHA consiste em pressionar o fornecimento para reduzi-los também com logística. Os mesmos representam sério problema desde as dificuldades já elencadas até os custos com o estoque, que são muito elevados. A entrega das peças é compreendida como um grande benefício por parte da MHA quando o fornecedor local faz a entrega das peças no tempo preciso da produção. Esta é uma forma de resolver o problema da logística em relação às compras produtivas necessárias para serem feitas no fornecedor local, desde que obedeça aos critérios da qualidade. Nessa perspectiva, o fornecimento local soluciona dois problemas imediatos: o de logística e o de estoque. Além de a MHA dispensar os custos, riscos e, por efeito, possíveis prejuízos, a mesma ficará isenta de custos com o estoque, porque o mesmo foi transferido para o fornecedor. 146 Segundo os administradores da matriz da rede, o fornecimento local é compreendido como se o processo produtivo de componentes fosse feito em um dos departamentos de produção da própria MHA. Uma fornecedora como a IFER, ou outra é entendida como se fossem parte de algum dos departamentos de produção da Honda, muito embora ela funcione fora do seu terreno. Neste caso, o importante para os administradores, é que as peças produzidas naquela empresa devem estar no horário programado para serem montadas no tempo estabelecido. Além do que, nesse sistema a MHA está isenta de possíveis surpresas, como que de as peças serem roubadas no meio da estrada, dentre outras possibilidades que possam constranger ou impossibilitar a chegada das mercadorias. Conforme Bernardo: Esse gerenciamento... disso é outra coisa. Se a Honda tem com a IFER, na verdade essas empresas começam a trabalhar como se fosse um de nós aqui. Como a HCA trabalha, né? Então você tá fazendo a produção da Honda, o teu estoque tá lá, e você me trás de manhã o que eu vou usar durante o dia. Bom demais pra mim, né? Do que eu precisar tá lá com o caminhão, que chegue pelo menos dois dias antes. Que eu precise locar o caminhão, abrir, checar. Já pensou, você abre um caminhão e descobre que não tá o teu material? Então, eu acho que o benefício é isso... (PESQUISA DE CAMPO: 2009) Portanto, para a Honda, uma das formas de diminuir os custos é reduzir os gastos com transporte e baixar os riscos com a perda de peças. É também deixar, por exemplo, de correr riscos de uma peça não chegar por causa de greves de caminhoneiros, ou por qualquer tipo de problemas que possam ocorrer nas estradas. Nesse sentido, é muito mais interessante ter o fornecedor próximo, porque, ao mesmo tempo, eliminam-se os riscos e os estoques. Os custos com a manutenção dos estoques são em si extremamente elevados, portanto eliminá-los representa benefício à MHA. 147 3.3 AS DIFICULDADES ENCONTRADAS NA RELAÇÃO DE FORNECIMENTO PARA A MHA As dificuldades entre a MHA e suas fornecedoras podem expressar processos de interação, são também formas de demonstração da parceria existente na rede. Essa parceria é a forma de comunicação entre os atores empresariais envolvidos diretamente na relação do processo produtivo. Diz Augusto: ...a relação da Honda com a empresa é relação de parceria, né? Não é aquela relação de..., tipo assim, vamos supor, patrão e funcionário né? É relação de parceria mesmo. Tanto é que ela não deixa o... a empresa na mão, né?, não abandona de uma hora pra outra. Então, ela, em termos de qualidade, ela interfere também, assim pra que o produto seja... saia cem por cento de qualidade. Então, isso aí ela interfere bastante, tá? Se não atender ela pega no pé, até que a empresa se alinhe, né? (PESQUISA DE CAMPO: 2009) A relação entre a MHA e suas fornecedoras é estrutural. A mesma ordem na qual se encontram as dificuldades com a qual os executivos da MHA se deparam na relação com os seus fornecedores. Entre as quais, a falta de capacidade das fornecedoras conseguirem acompanhar a dinâmica produtiva e tecnológica da MHA. Constatamos, assim, que a incompatibilidade financeira e técnica de equipamentos é um dos maiores problemas na relação entre a empresa dominante da rede e suas fornecedoras. A incapacidade e a morosidade de adequação aos novos processos produtivos, a mentalidade dos fornecedores de pensar e agir como empreendimentos pequenos ou médios são apontados como os maiores problemas enfrentados pela MHA. Algumas das fornecedoras têm dificuldades de acompanhar o seu crescimento. Esse problema se expressa quando a MHA precisa modificar ou sofisticar alguma peça ou componente dos seus artigos. Para isso, a fornecedora precisaria comprar um novo equipamento para atender a esta nova necessidade. A resposta da fornecedora geralmente leva 148 um tempo considerável para a compra do suposto equipamento. Para o administrador Ricardo Souza: ... Os fornecedores são limitados, né? Então eles... não pode de hoje pra amanhã comprar um equipamento caríssimo, pra aumentar a produtividade, aumentar a produção. Então essa é uma dificuldade muito grande. A estrutura do fornecedor aqui em Manaus tem limitações, não chega a ser precária, mas eles respondem muito demoradamente, são lentos. Enquanto nós compramos um equipamento em 6 meses, eles levam um ano, até mais. Entendeu? Aí quando eles compram aqui, aí nós já estamos num outro patamar. Entendeu? Então, sempre com um pouco de atraso. Então a gente sente um pouco assim essa dificuldade com os fornecedores, da estrutura do fornecedor. (PESQUISA DE CAMPO: 2009). Assim também diz Augusto: [...] nós trabalhamos, no setor de peças, nós sofremos um pouco em relação a isso, porque a prioridade número um desses fornecedores é a produção né? Então no momento em que as vendas aumentam, então o atendimento de peças diminui, mas pra assistência técnica, né? Que a linha não pode parar, né? Aí que que acontece com os fornecedores? Eles trabalham em ritmo de hora extra, ou final de semana, fazendo viradões, mas aí, assim mesmo, existe fornecedores que estão no gargalo, tá? (PESQUISA DE CAMPO: 2009). A estrutura limitada dos fornecedores da MHA tem gerado problemas de ordem técnica, além de dificuldades para a assistência e o abastecimento da produção na empresa dominante da rede. Esses problemas são identificados no processo e em circunstâncias de aquecimento das vendas do mercado. Ocorre principalmente quando a fábrica precisa acelerar a produção para ampliá-la, a fim de atender à demanda comercial. Tal atendimento chega a ser feito com muita dificuldade, e o é feito em virtude da utilização de horas extras e a ocupação dos fins de semanas. Nessas circunstâncias, os fornecedores convocam seus operários para produzir com a finalidade de atender à demanda da MHA. Nessa perspectiva, a estrutura produtiva de alguns fornecedores ainda não está à altura das metas de produção da matriz da rede, ou que não tem a capacidade suficiente de atender a essa meta que a mesma estabelece. Significa dizer que parte dos fornecedores não está preparada para 149 o crescente volume de produção que a firma principal da rede vem desenvolvendo. Segundo Ricardo Souza: Nós temos todo um know how pra fazermos escapamento. Existe pessoas que produzem aí fora, mas não no nível que nós necessitamos, né? Que tem um projeto, aí nós temos que temos produzir conforme o projeto tal. Porque se você mudar um tubinho desse escapamento já acaba a qualidade do motor, altera tudo (PESQUISA DE CAMPO: 2009). O principal problema apontado se refere à falta de recursos financeiros por parte do fornecedor. Além disso, falta-lhes know how sobre o funcionamento das novas tecnologias, ampliando, assim, as dificuldades nessa relação. Porque a falta de estrutura gera uma resposta demorada no atendimento dos fornecedores às necessidades de dinamização da produção da firma dominante da rede. Essa limitação é decorrente da estrutura do fornecedor. É o que ocorre com organizações de pequeno ou médio porte se comparado à estrutura e às necessidades da empresa matriz da rede. A distribuição dos processos de produção da MHA são internos e externos à fábrica. A decisão de distribuir interna e externamente ocorre por causa de problemas de falta de espaço interno, de know how e pela operacionalidade dos custos de produção. Nesse sentido, a produção de certos componentes é feita fora, isto é, por fornecedores. Isto é assim, pelas vantagens tanto da redução de custos, quanto pelo know how, que gera qualidade à mercadoria, além de economia de espaço na MHA. No entanto, em decorrência da propriedade do know how dos especialistas da desta empresa sobre certos componentes, torna-se mais vantajoso produzi-lo internamente. As vantagens principais estão implicadas em primeiro lugar nos custos reduzidos, e em segundo porque a empresa detém o know how necessário para a sua produção. É o caso do escapamento, que é uma especialidade da própria MHA. Isto é também o que a diferencia de outros produtores desse componente. Somada à falta de estrutura e ao know how sobre a confecção de componentes, a falta de agilidade figura como uma terceira dimensão das 150 dificuldades enfrentadas pela MHA51, uma vez que a demora existe na maior parte das vezes porque o fornecedor também não possui know how tecnológico, não tem domínio do conhecimento sobre os produtos que se propõe fazer. A Honda desloca um corpo de especialistas para avaliar, propor monitoria para avaliar as condições de produção dos componentes, para ver a possibilidade de adquiri-los do fornecedor. No fundo, as três dificuldades estão de certa maneira articuladas umas às outras. Devido à ausência de estrutura, a falta desse know how pode ser uma consequência, e em razão disso, termina comprometendo a agilidade, porque o atendimento oferecido pelo fornecedor é muito lento. Diz Bernardo: Os empreendedores aqui em Manaus, ainda não acordaram, né? Então, os empreendedores aqui, eu não quero citar nomes, mas, por exemplo, nas empresas de tratamento superficial são indignas as empresas que tem aqui no Amazonas, são indignas de frases... E a gente era obrigado a usar,... e cria toda uma estrutura da Honda pra poder você ter... olha como você quer comprar daquele cara?, só tem aquele cara. Você tem que fazer um time de profissionais pra ir lá, pra ver se o cara produz, pra ver se o cara... a qualidade que o cara tá fazendo, o cara não monitora?, Então, vou eu monitorar. Então, você leva químico, o especialista, o medidor, o soldador... Tudo pro cara te fazer uma peça, e a Honda tem que ficar dando toda a assistência pra poder aceitar, em termos de qualidade (PESQUISA DE CAMPO: 2009). As dificuldades entre a MHA e os seus fornecedores transcendem a dimensão técnica, em decorrência das limitações que são dessa mesma natureza. No geral, os fornecedores desta possuem pouco know how organizacional. O que leva à mesma deslocar seus especialistas, como os técnicos, os engenheiros mecânicos da fábrica para as empresas dos seus fornecedores. Nessa perspectiva, a firma dominante da rede oferece assistência, por meio de suporte técnico, oferece ainda know how tecnológico, 51 A ideia da agilidade, de acordo a Filosodia Honda, trata-se da Política de Gestão da Honda, segundo a qual, “para aproveitar nosso tempo e o tempo dos outros de forma mais eficaz, devemos cuidar dos preparativos e cumprir o cronograma” (Filosofia Honda, 2003: p. 23). Assim, é preciso dar velocidade no processo, isto é, agir rápido. 151 já que o projeto dos componentes é realizado pela Honda Motor Company. De acordo com João Paulo: Existem problemas técnicos de produção normais, qualidade. Chega uma peça, então um problema: não consegue montar a peça. Houve alguma avaliação no processo. Isso aí acontece normalmente, né?, da parte do profissional. Não deveria acontecer, mas ainda acontece (PESQUISA DE CAMPO: 2009). Para Bernardo: [...] A Honda precisa dar suporte. A Honda precisa ir atrás, entrar com o técnico, entrar com... às vezes até com subsídio, né?, no sentido de dar tecnologia mesmo pro cara aprender a trabalhar, modo correto de fazer, normatizado. Às vezes a gente leva o técnico lá pra fazer. Eu já participei de uma intervenção, uma intervenção assim, numa empresa, pela Honda (PESQUISA DE CAMPO: 2009). A qualidade é uma dimensão das dificuldades identificadas pela MHA, geralmente decorrente da falta de estrutura, lentidão no processo produtivo, limitação em termos de know how a respeito do processo de produção. O que tem levado a MHA a interagir com as suas fornecedoras de componentes, a fim de solucionar certos problemas frequentes que surgem quando as fornecedoras passam a apresentar erros na produção. É quando os seus especialistas e os seus market share’s entram em ação. Os administradores e engenheiros da matriz da rede chamam de intervenção nas empresas fornecedoras, para fazer algum tipo de treinamento, assistência tecnológica, estudo sobre o processo produtivo, administrativo, etc. As relações interempresas podem ser relações de cooperação, relações de subordinação por conveniência e relações de subordinação por dependência. Conforme RUDUIT (2002), as relações de cooperação são caracterizadas por fortes condições de vínculo, consubstanciadas por vínculo indeterminado de manutenção, negociação de prazos de entrega, autonomia de mercado e administrativa; por intercâmbio moderado, que inclui troca de informações técnicas, exceto comercial, sem troca de equipamentos, cooperação para treinamento de mão de obra; e por fortes laços de confiança; 152 desenvolvimento conjunto de novos produtos, ausência de apoio para a reestruturação organizacional. “A complexidade e a especificidade técnica dos serviços envolvidos impõem práticas de cooperação entre as partes.” (p. 419) As relações interempresas de subordinação por conveniência são relações “com maior assimetria de poder do que as de cooperação e menor do que as de subordinação por dependência.” (RUDUIT, 2002: p. 420) Esse tipo de relação é caracterizada por moderada negociação das condições de vínculo, que inclui contratos relativamente extensos, ausência de negociação de prazos de entrega, relativa autonomia de mercado e administrativa; por intercâmbio fraco, quase inexistente, refere-se a ausência de troca de informações, ausência de empréstimo de equipamentos, fraca cooperação para treinamento da força de trabalho e de frágil laços de confiança; ausência de apoio para inovação tecnológica e para reestruturação organizacional. Nessa relação ocorre um predomínio e satisfação dos interesses da empresa contratante sobre a contratada, porque é conveniente para ambas. Nas relações de subordinação por dependência, a firma contratada admite os critérios da empresa contratante “porquanto depende do mercado na rede, na medida em que presta serviço de baixa complexidade e amplamente oferecido no mercado.” (RUDUIT, 2002: p. 420) Essa relação é caracterizada pela falta de negociação das condições de vínculo, refere-se a contratos de curta duração, falta de negociação de prazos de entrega, dependência de mercado e administrativa; por intercâmbio fraco, quase inexistente, consiste na ausência de informações ou de equipamentos, cooperação débil, cooperação pra treinamento para a força de trabalho, e por frágeis ou quase inexistentes laços de confiança, que se refere ao que arbitrariamente chamaremos de atendimento, falta de apoio para inovações tecnológica e para reestruturação organizacional. 153 3.4 OS FATOES QUE DETERMINAM AS RELAÇÕES ENTRE A MOTO HONDA DA AMAZÔNIA E AS SUAS FORNECEDORAS A relação firmada entre a MHA e seus fornecedores é mediada por rigorosos critérios. Dentre eles, encontram-se os da capacidade e da qualidade dos equipamentos, as condições financeiras, o conceito da empresa na opinião do mercado e o potencial produtivo. Usa-se ainda o sistema do conhecido 5 S’s. Conforme Ricardo Souza: O fornecedor... você vai avaliar a capacidade dele, equipamento, o que ele tem de equipamento, a parte financeira, se realmente ela é uma boa empresa. Se avalia tudo dentro do fornecedor, né? A parte de qualidade, equipamento, de produção, a capacidade produtiva, a empresa como um todo, né? A parte de 5s, se é uma fábrica limpa. A gente avalia tudo desde na parte financeira dela até a aparte produtiva, da qualidade e tudo. (PESQUISA DE CAMPO: 2009) Ressalta-se, como vai afirmar Augusto, que a relação entre a MHA e seus fornecedores é de parceria. Trata-se, na opinião de seus engenheiros, de uma relação simétrica. Contudo, a MHA interfere diretamente na qualidade do produto principalmente quando ocorrem falhas na produção. Tal interferência acontece com o objetivo de dar ao componente a máxima qualidade exigida pela própria MHA, apesar de a mesma não abandonar o seu fornecedor. O fornecedor, por seu lado, para não perder um cliente do porte da MHA submete-se às exigências feitas pela mesma para atender à qualidade necessária, dentro do seu padrão de produção. Conforme a opinião dos administradores, a relação é de confiança e de parceria. Essa relação é de parceria e também de compartilhamento. O aspecto do compartilhamento pode ser visto em diversas dimensões. O compartilhamento nessa relação é realizado, sobretudo, quando os problemas são diagnosticados, em termos de falhas administrativas detectadas pela MHA internamente à empresa e nas empresas fornecedoras, como as falhas nos equipamentos do fornecedor da rede, inclusive em treinamento e na troca de tecnologia, e, até quando surge alguma demanda, na hora de negociar o preço de uma determinada peça. 154 Em termos de qualidade, a MHA procura compartilhar com os fornecedores da rede local um know how, de domínio de toda a Honda Motor Company, denominado NHC - New Honda Circle. Há também o CCQ que consiste na formação de equipes, em que cada uma fica incumbida de apresentar um projeto de melhoria em um determinado setor da fábrica. O projeto irá diagnosticar o problema daquele setor, e a equipe irá estudá-lo, a fim de oferecer uma solução. Nesse sentido, a equipe é designada para estudar um determinado item que pode ser administrativo, ou relativo ao processo produtivo. Esse procedimento, corriqueiro no interior de toda a Honda Motor Company, é compartilhado também com os fornecedores da rede local da MHA. Trata-se de um know how, a que os administradores da MHA recomendam a aplicação desse procedimento nos fornecedores da rede. Tal como descreve Ricardo Souza: [...] nós temos um negócio chamado de NHC, que mundialmente é conhecido como Círculo de Qualidade Honda, internamente nós chamamos de New Honda Circle. Existe também o NHCS, que é o NHC do fornecedores, que é New Honda Circle Surplay. Então esse know how nós passamos para os fornecedores. E o quê que é o CCQ? Você monta equipes, né? E cada equipe vai apresentar um trabalho de melhoria, né? Então, chega num setor, ou noutro setor, ou qualquer outro setor, eles se juntam e falam: o quê que nós vamos fazer, não, vamos fazer um trabalho de custo. Eles vão lá, analisam o setor, analisam a produção, analisam assim. Então, esse aqui tá com maior custo, então vamos entrar em cima disso. Então, pra reduzir o custo disso, o quê que nós temos que fazer? Ou quê que está dando maior custo? É esse item? Então vamos trabalhar nesse item. Aonde que a gente pode reduzir o custo daqui. Ou melhoria de qualidade, ou melhoria no equipamento. Esse equipamento tá levando muito tempo. O que a gente pode fazer pra reduzir o tempo de usinagem. Não, vamos trocar esse dispositivo, vamos fazer isso aqui. Então, dentro da Honda existe esse trabalho. E isso aí foi passado para os fornecedores, essa idéia. Então, nós temos acho que mais de 500, 600 grupos internamente (PESQUISA DE CAMPO: 2009). Esse tipo de avaliação organizacional da Honda Motor Company é realizado anualmente em cada uma de suas unidades. Essa avaliação converte-se num tipo de treinamento e aperfeiçoamento também do seu Know how. Geralmente é feito um revezamento das equipes entre os diversos grupos 155 formados em cada bloco. O da HSA realiza a sua avaliação, que geralmente ocorre em Manaus ou São Paulo. Terminados os procedimentos em cada conglomerado regional, os melhores trabalhos são apresentados nos países concentrados pelo Japão, ou pelos dos Estados Unidos, ou pelos dos China, cujo objetivo é a troca dos novos conhecimentos desenvolvidos. 3.5 DIMENSÃO ESTRUTURAL DA INTERAÇÃO ENTRE MHA E SEUS FORNECEDORES EM REDE 3.5.1 INTERAÇÃO ADMINISTRATIVA E DE NEGOCIAÇÃO A negociação de preços é da competência administrativa, cujo fim é a redução dos custos. Dentro da lógica da competitividade, a empresa deve oferecer o melhor preço para o mercado. Este é o raciocínio com o qual os administradores da Honda percebem essa esfera da sua relação com os executivos dos fornecedores da rede. A questão se torna crucial devido à instalação cada vez em maior quantidade de empresas chinesas no Polo de Duas Rodas em Manaus. Porém, o principal aspecto que se pode vislumbrar é o fato de que a MHA, sob a motivação de chegar ao menor custo possível de uma determinada peça do fornecedor da rede, investe em estudos nos níveis da administração e da produção. A MHA disponibiliza todos os Market Share na fábrica do fornecedor. O processo interativo desse aspecto em específico se converte no aprendizado do corpo técnico e administrativo do fornecedor da rede. Conforme Ricardo Souza: Nós ajudamos eles. Colocamos nosso pessoal de qualidade. Tudo. Todo mundo vai lá dentro. Não... não se abandona. Nós colocamos pessoas lá dentro pra ajudar. Pra ver aonde está errado, nós ajudamos a administrar, a melhorar. Então se ela quiser, né?, se ela autorizar, nós entramos com nosso pessoal dentro da fábrica dela. Porque é melhor pra ela. É bom pra ela, nós vamos passar o nosso know how pra ele. Entendeu? 156 Então, analisa-se a produtividade, a qualidade, o que está ruim. Aí nós apontamos as falhas, geramos relatório geral. Você tem que melhorar aqui tem que fazer isso, tal, tal. Nós passamos todas as melhorias que ele tem que fazer, aqui, aqui. Existe investimento aqui. Nós passamos todinho pra eles, pra vê se ele melhora (PESQUISA DE CAMPO: 2009). No geral, os fornecedores da rede da MHA atendem a vários clientes ao mesmo tempo. Embora haja uma considerável relação de confiança, a MHA está sempre no controle do processo de organização e contratação. Para o fornecedor aumentar o preço de um determinado componente, deve buscar convencer com no mínimo um argumento, cujo conteúdo carregue um forte investimento tecnológico. 3.5.2 INTERAÇÃO NA QUALIDADE Toda a solicitação de qualquer produto feito pela MHA é submetida a uma rigorosa avaliação técnica de qualidade, porque precisa minimamente atender às exigências do padrão de qualidade Honda. Mas, segundo Ricardo Souza, para alcançar esse nível o fornecedor tem de investir em tecnologia, que possa garantir, para convencer uma produtividade e um faturamento maior. A Honda diz assim: eu quero um produto assim, e esse produto é passado numa avaliação dentro da Honda, que tem o setor de qualidade né?, pra ver se atende as exigências né? Aí, agora a parte de, essa parte tecnológica mais o fornecedor mesmo que procura melhoria né? Então se o fornecedor quiser ter uma produtividade maior com certeza ele vai ter um ganho maior né? Então ele tem que investir na tecnologia com que ele consiga reduzir as despesas né? Pra poder ter um faturamento um retorno melhor né?, mas ela não interfere tanto assim não, tá? (PESQUISA DE CAMPO: 2009) 157 3.5.3 INTERAÇÃO TÉCNICA E TECNOLÓGICA A MHA contribui com os fornecedores da rede, geralmente em forma de comodato, quando a fornecedora precisa de um equipamento que está muito além do seu poder de aquisição. Então, para facilitar, a MHA investe no equipamento, em tecnologia e em pessoal também, para permitir que o fornecedor possa fabricar o componente necessário. Conforme descreve Ricardo Souza: São peças de segurança vital e são peças de know how da Honda, tipo coca-cola, eles não abre aquilo lá. Existe o know how da Honda. São peças do motor, são peças principais, peças de segurança vital que nós chamamos. Esse aí sim, nós fazemos questão, como é peça de segurança, então nós produzimos internamente. Isso é uma coisa que é know how da empresa e tem coisa que sai muito caro produzir fora, sai muito mais custo menor nós produzirmos internamente, tipo um escapamento (PESQUISA DE CAMPO: 2009). A externalidade da produção consiste em peças complexas e em peças simples. Porém a MHA não abre mão de fabricar determinados componentes. Todo o processo produtivo de certos componentes é feito internamente em decorrência, em primeiro lugar, do segredo industrial, porque faz parte do know how, que é restrito à Honda, cujo escritório de produção tecnológica é centralizado no Japão; em segundo, porque são produtos, cuja qualidade não é encontrada em outra fábrica, uma vez que somente quem possui esse know how é a própria MHA; em terceiro lugar, porque a produção de determinadas peças sai mais barato processar internamente do que produzir com um fornecedor. Assim descreve Ricardo Souza: [...] Todo projeto das motos é feito no Japão. É muito grande. É um escritório só de trabalho com desenvolvimento. Eles desenvolvem moto pra todas fábricas do mundo, não é só para o Japão. Tem Estados Unidos, nós temos 52 ou 60 fábricas no mundo todo. É Japão, é Tailândia, Filipinas, Irã. Então, todo o projeto é feito no Japão. Então o Japão faz o projeto de todas as fábricas no mundo, não é só aqui. Então, ela tem um 158 corpo assim, de pesquisadores, projetistas muito grande no Japão. Chama-se HGA, no Japão. Desenvolve projetos (PESQUISA DE CAMPO: 2009). O nível de automação é muito alto, por isso, inclusive, a quantidade de trabalhadores com doenças ocupacionais no Japão é menor que no Brasil. Na Honda Japonesa, é muito grande a quantidade de robôs. Há cerca de dez robôs existentes na MHA. A tendência para o futuro desta, segundo seus administradores, é a automatização de vários processos. Na HDA, uma parte do processo de produção do chassi já está automatizada. É possível encontrar vários robôs no setor de solda da MHA. Conforme os engenheiros, por um lado, a automatização evita problemas relativos à segurança do trabalho, por outro, amplia a capacidade de produção com aumento da produtividade e ainda garante maior precisão no processo. Ricardo Souza diz que, Isso. Porque aí, melhoria da qualidade também porque sempre vai fazer do mesmo jeito. Não vai mudar, né? Sempre da maneira correta, tal... tal... não muda. O operador não... O operador, acho que, no início do processo ele faz tudo certinho, chega no final, ele já não tá fazendo direito e tal. É cansativo... é não sei o quê. Então, existe esses padrões, né?, que tem nos dado muito problema de qualidade (PESQUISA DE CAMPO: 2009). Os engenheiros da MHA possuem domínio sobre as máquinas, as tecnologias que envolvem a produção ou a fabricação de peças e produtos e insumos das fornecedoras. O que acontece é uma distribuição de tarefas entre os membros do corpo de engenheiros que atendem aos fornecedores da rede. O Departamento de Qualidade divide seus quadros para cada fornecedor, e assim acontece com os demais departamentos. Esse processo permite saber que a MHA tem o controle dos equipamentos, do know how, da tecnologia e de todo o processo de produção dos seus fornecedores da rede. No processo de contratação das peças, são estabelecidos vários critérios. O que pesa muito na contratação de uma determinada peça é a capacidade do equipamento, o tamanho da peça. Mas, avalia-se também tecnicamente o preço, a qualidade do estoque do fornecedor, e a similaridade 159 da peça. Quando existem vários fornecedores, o que vai determinar a contratação da compra da peça é a qualidade e o delivery, isto é, o prazo de entrega. O que significa dizer que o preço não é o principal critério. Primeiro, avalia-se a qualidade e o delivery, para depois, negociar o preço. 3.5.4 INTERAÇÃO NO TREINAMENTO O treinamento da MHA recebe apoio direto do Departamento de Coligadas, que oferece apoio técnico e de treinamento aos fornecedores da rede. A equipe de treinamento, do Departamento de Coligadas da HSA é quem faz o treinamento técnico, de gestão e de motivação dos funcionários, técnicos, engenheiros e executivos dos fornecedores da rede em Manaus. Os outros dois setores em nível local, que desenvolvem atividades junto aos fornecedores são o CQ – Controle de Qualidade e o DCP – Departamento de Compras Produtivas. O setor de Controle de Qualidade é o que dá todo o apoio aos fornecedores em relação às peças que eles fornecem à MHA. Na ausência do Departamento de coligadas da HSA, o Departamento de Recursos Humanos da MHA faz o apoio local, encarregando-se de fazer o treinamento diretamente na fábrica do fornecedor da rede. Portanto, os fornecedores recebem o apoio de quatro setores da Honda para o desenvolvimento das atividades de treinamento e assistência técnica. A pesquisa: “Aprende-se com as empresas japonesas? – Estudo comparativo entre empresas brasileiras e mexicanas”, de FLEURY e FLEURY (1998) mostra, com base numa reflexão empírica, a possibilidade de transferência de tecnologia na relação entre empresas locais e empresas japonesas. As experiências das empresas mexicanas e brasileiras revelam, mesmo com desigualdades, processos de transferência de tecnologia por meio de assistência, com idêntico padrão, concedidos pelas subsidiárias japonesas às suas fornecedoras locais. O estudo revela que os tipos de assistência são de ordem de controle de qualidade; projeto de produto; especificação de materiais; e custos e finanças. 160 A pesquisa revelou que a relação entre o fornecedor local e a subsidiária japonesa tende, com o tempo, a aumentar a quantidade de conflitos. Foi constatado, no Brasil, que, quando a subsidiária japonesa estabelece um contrato de produção com um fornecedor, conforme as especificações definidas pela mesma subsidiária, esta garante ao fornecedor local forte apoio nas circunstâncias da implantação do processo produtivo. Porém a relação enfraquece, e, na maioria das vezes, a subsidiária some após a aprovação do try out (FLEURY e FLEURY, 1998). O estudo constata que a Honda do Brasil é a única subsidiária japonesa a diferenciar-se das características das demais, indicando e, simultaneamente, confirmando o comportamento dessa organização japonesa da produção de motocicletas, o que diz um dos seus engenheiros que a MHA jamais abandona os seus clientes, isto é, os seus fornecedores locais recebem assistência do início ao fim do contrato. Essa afirmação expressa também a existência de continuidade de assistência. A Honda buscou fazer um tratamento diferenciado das demais subsidiárias japonesas com a criação de mecanismos como seminários estruturados para suprir as debilidades técnicas, ou seja, aquelas deficiências mais comuns a determinados grupos de fornecedores, cuja finalidade interessava à capacitação tecnológica destes. Buscou também dar assistência individualizada na própria empresa fornecedora, naquelas consideradas preferenciais (FLEURY e FLEURY, 1998). O sucesso desse sistema teve por limite os processos de crise. E como alternativa, a Honda além de reduzir os seminários, deu prioridade às grandes empresas, adotando-as como preferenciais. Mas é fato que a Honda é a única empresa segundo FLEURY e FLEURY (1998), que ao desenvolver os processos de redes fornecedores, transfere tecnologia e técnicas de gestão da produção. Mas há uma diferença no que diz respeito ao treinamento relacionado ao aspecto tecnológico. Porque, quando o fornecedor adquire um equipamento novo, a responsabilidade de treinar os trabalhadores é da proprietária da tecnologia. Portanto a equipe da produtora do equipamento vai até a fábrica do fornecedor, faz a instalação do equipamento, usa a técnica da multiplicação 161 para treinar uma equipe e a designa para repassar aos demais operários. É nessas oportunidades que pode acontecer uma troca inversa de conhecimento, de os engenheiros e técnicos especializados da MHA receberem treinamento ou informações de um novo equipamento, comprado pelo fornecedor da rede da MHA. Certamente que a MHA não compartilha desse momento quando a equipe está treinando os multiplicadores. Tal como descreve Bernardo: [...] Na Metal Fino fui três vezes pra tentar ajudar. Fui na IFER, na Metal Fino, Nissin, Showa, Soldécia, parte de pintura... já fui. Já na Keihin... mas na Keinhin, eu fui aprender, olha uma coisa que eu fui ver. Uma coisa nova. Porque na Keihin, o que acontecia agente queria mudar um processo, e interessante que a Honda não conseguiu o produto pra cá, e a Keihin conseguiu (PESQUISA DE CAMPO: 2009). No caso acima, o produto foi adquirido junto a uma empresa norteamericana, de tecnologia norte-americana, a empresa produtora veio até a Keihin para fazer o treinamento para operação do equipamento. Neste caso, tratava-se de um equipamento que interessava aos engenheiros ligados à estamparia da MHA. Segundo seu engenheiro, este equipamento seria aproveitado para a otimização produtiva do setor daquela fábrica. No entanto, os mesmos não conseguiram adquirir o mesmo. Por isso, esta equipe foi até a Keihin para conhecer a máquina nesta fornecedora. Nesse contexto é que ocorre a interação entre a MHA e as suas fornecedoras. No geral, é a MHA que dá assistência às suas fornecedoras por meio de serviços de acompanhamento, de treinamento, de estudos para minimização de custos. No caso, mostrado a cima, ocorreu o contrário, a fornecedora foi quem possibilitou o acompanhamento e o treinamento. 162 CONSIDERAÇÕES FINAIS O presente estudo teve a preocupação de abordar a rede de fornecedores formada pela Moto Honda da Amazônia, por meio do qual, nos possibilitou chegar a alguns resultados. Os mesmos são reveladores do enredo constituído pelos diversos elementos propositivos de múltiplas interações organizacionais e dos papéis consistentes representados pela MHA, como atriz principal e pelas demais atrizes, empresas fornecedoras locais, no processo de interação interfirmas. A rede de fornecedores é uma realidade estratégica para as unidades produtoras fabris presentes no Polo de Duas Rodas pois, ao contrário da década de 1980, o mercado brasileiro de motos era praticamente produtivo e comercialmente monopolizado pela Moto Honda da Amazônia, o mesmo já não ocorre hoje, devido ao visível aumento da concorrência, principalmente das firmas de motocicletas asiáticas, cujas sucessivas instalações de fábricas de veículos sobre duas rodas vêm contribuindo para o aumento da concorrência nacional deste produto. Diminuindo, portanto, a influência da MHA que já chegou a dominar mais de 90% do mercado brasileiro. Nesse sentido, constatamos o desenvolvimento da indústria de motocicletas em forma de cadeia produtiva, com um crescimento acelerado e de consolidação em curso. O ordenamento e a organização fabril e do trabalho no processo produtivo de motocicletas estão baseados nos novos padrões organizativos de produção, como que pelo regime flexível. A cadeia produtiva de veículos sobre duas rodas é uma estratégia, cujo objetivo é a maximização da produtividade, expansão do faturamento, das vendas para o mercado interno e externo. O desenvolvimento da cadeia produtiva de motocicletas no Polo de Duas Rodas em Manaus representa a compatibilidade do mercado brasileiro e demais mercados externos vizinhos da América do Sul. A partir dos anos de 1990, os aspectos da produção, das vendas, das exportações e da mão de obra tiveram uma importante evolução relativas a todas as empresas do setor, conforme nos informa os números da SUFRAMA (2008). Esses dados são 163 reveladores da capacidade produtiva do Polo de Duas Rodas com a utilização da sua capacidade instalada. Comparado aos anos anteriores significa dizer que o aumento da produção pode explicar o crescimento em cerca de 70% do aproveitamento produtivo do setor em 1997. Os anos que seguem após a abertura alfandegária no início de 1990, promovida pelo governo federal, principalmente a partir de 1994 até 2008, obedecerão a uma sequência evolutiva, quase ininterrupta em relação à produção do setor inteiro. Contudo, ao mergulharmos no polo, e, se compararmos, por dentro, o desempenho de cada empresa, perceberemos a desigualdade entre as diversas produtoras. Entre as quais, a MHA se destaca pelo volume de motocicletas produzidas, pela quantidade das vendas tanto para o mercado local, quanto para o mercado externo, e ainda, pelo significativo número de trabalhadores que emprega em sua fábrica no Polo de Duas Rodas de Manaus. Elementos estes que nos ajudam a compreender porque a MHA se destaca entre as demais empresas do setor representando 77% de participação nas vendas em 2008. Comparada à segunda produtora que mais vende, a Yamaha que foi responsável por 13% em vendas neste mesmo ano, podemos fazer uma ideia de que uma possível equidade nos níveis de produção, vendas e emprego de mão de obra ainda é consideravelmente distante entre as empresas que constituem o parque industrial de veículos de duas rodas. O destaque em vendas do setor de duas rodas se deve principalmente às vendas das motocicletas, que tem ocorrido principalmente a partir de 1995. Verificou-se ainda, que o aumento da produção, o estabelecimento de empresas locais para fornecerem peças, componentes, subconjuntos, a instalação de novos produtores de motocicletas e a ampliação da cadeia produtiva tem sido fundamental para a pulverização do mercado, por mais tímida que seja, em relação à produtora líder do polo. Podemos perceber também que o potencial produtivo do setor tem demonstrado um crescimento significativo. Fato verificável, pelos dados de 2007, ano em que as motocicletas aparecem como os principais produtos fabricados do Polo Industrial de Manaus inteiro. 164 Constatou-se ainda que o desenvolvimento do Polo de Duas Rodas vem ocorrendo devido às mudanças nos níveis tecnológicos, logísticos e infraestruturais. Tais mudanças estão ocorrendo em função do fato de que as empresas do setor têm reduzido sua dependência das regras originais da Zona Franca de Manaus, em relação à produção local, isto é, a fabricação na própria cadeia regional de peças, componentes. Fato que lhes têm possibilitado a compra desses insumos, permitindo-os, assim, reduzir os custos de produção, e, ao mesmo tempo, potencializar a expansão da sua capacidade de produção e de vendas. Esse mesmo processo realiza importantes mudanças na relação comercial nacional e internacional, no que diz respeito à importação e exportação. Nesse sentido, verificamos inúmeras empresas se instalarem no Polo de Duas Rodas entre os anos de 1994 e 2008, são produtoras de motocicletas e bicicletas e firmas fornecedoras de peças, componentes e insumos. Nessa perspectiva, as aquisições de insumos regionais, nacionais e internacionais, como dados indicadores, possibilitaram-nos ao compará-los, perceber evolutivamente a desigualdade construída ao longo do referido período. Focadas na busca de superar um dos seus principais obstáculos, a logística, essas empresas têm procurado centrar suas estratégias na produção local, para viabilizar a redução de custos. O caminho tomado pela MHA não tem sido diferente das demais firmas do setor de duas rodas, pelo menos neste aspecto. Verificamos, por meio deste estudo, que a estratégia de produzir localmente está relacionada ao princípio Honda, segundo o qual se deve produzir no local onde se vive. A combinação entre princípio e estratégia permitiu à MHA desenvolver políticas para atrair as empresas fornecedoras já instaladas e outras que ainda virão a se estabelecer para o barateamento dos custos do processo produtivo. Segundo a MHA, a importação de peças nacionais e internacionais é uma operação extremamente delicada, passiva de transtornos de toda a ordem, desde atrasos na chegada dos produtos, em decorrência de congestionamento de caminhões nas estradas ou de greves de caminhoneiros, da perda de peças por assaltos, dentre outros. A logística é vista centralmente como o maior dos problemas na ordem de custos, por causa 165 dos gastos com transportes em si e, centralmente, devido ao fato de necessariamente o mesmo gerar estoque, além do custo que será gerado a partir do mesmo. Em decorrência dos problemas causados pela logística, a MHA optou pela estratégia do desenvolvimento da rede de fornecedores para, além de facilitar o processo produtivo, baratear os custos de produção, operando e utilizando o método Just-in-time/kanban externo. Este método é uma realização da reorganização da produção e do trabalho que consiste na programação e controle do processo produtivo. O Just-in-time/kanban permite que a MHA, como empresa focal, isto é, como firma principal da rede, estabeleça o tempo de chegada das peças, muito embora isto ocorra em forma de acordos celebrados entre esta e as empresas fornecedoras, entre as quais o tempo de chegada dos produtos é determinado pela MHA. Daí a diferença entre os fornecedores locais e os nacionais/internacionais. O Just-in-time/kanban em relação aos fornecedores locais é aplicado diretamente na linha de produção, enquanto que os nacionais/internacionais devem passar pelo estoque. Porque as compras produtivas nacionais geram um estoque da média de três dias e as compras produtivas internacionais gera um estoque da média de dez dias. Segundo a MHA, o estoque é um acontecimento propositivo ainda de elevados custos para a fábrica. No entanto, constata-se que a MHA é grande beneficiária em relação ao estoque zero, uma vez que com a aplicação do Just-in-time/kanban externo, a mesma transferiu a responsabilidade do estoque para as suas fornecedoras locais, transferindo o custo consequentemente para estas. Verificamos, também, que os benefícios da estratégia para superar os problemas com a logística é a inspiração da continuidade e ampliação da lista de fornecedores locais, além das vinte já existentes, que virão do Japão, bem como de outros países e de São Paulo para adensar ainda mais a cadeia geral do PDR e servir fundamentalmente à MHA. A rede produtiva até aqui formada tem dado um caráter mais horizontalizado em termos gerenciais e produtivos, uma vez que o controle das peças e subconjuntos produzidos fora desta fábrica é compartilhado com as fornecedoras que os fabricam. 166 As vantagens obtidas pela MHA na relação de fornecimento das empresas locais, além da redução dos custos e riscos é o controle do estoque, em decorrência da eliminação do aspecto referido. Pois, segundo a empresa, o fornecimento local resolveu dois problemas: o primeiro está relacionado à logística em função do controle do estoque. E o segundo, pela redução dos custos. No entanto, essa relação apresenta uma série de dificuldades estruturais, que muitas vezes atrapalha a relação entre essas firmas. Tais dificuldades são inerentes às limitações das empresas ligadas à rede centralmente a respeito da incompatibilidade técnica de equipamentos e financeira. A partir deste aspecto, surgem outros, como a demora em solucionar os problemas que vão surgindo, como o de adequação às novas necessidades tecnológicas. Para isso, torna-se necessária a compra de um novo equipamento para atender a tais necessidades. No entanto, além da falta de atualização de algumas fornecedoras da rede, esbarra-se também nos limites financeiros das empresas. Tais limitações são sentidas, conforme diz a empresa, que a morosidade ocorre também na falta de celeridade do atendimento de peças, em ocasiões necessárias, como o que ocorre em períodos de aquecimento do comércio, ameaçando afetar as metas de produção da empresa focal. Além da falta de know how sobre as novidades tecnológicas, em termos de peças e componentes mais adequados em termos de qualidade, e da falta de agilidade das firmas fornecedoras, decorrente da inadequação estrutural, o que ameaça prejudicar a dinâmica do processo produtivo e o atendimento ao mercado da empresa focal. À falta de agilidade, às limitações técnicas e de equipamentos e financeira se somam a debilidade do know how organizacional. Tais complicadores estão expressos na debilidade técnica dos especialistas das firmas fornecedoras. Para o que a MHA precisa muitas vezes mobilizar o seu market share para solucionar os problemas que surgem tanto no processo produtivo, quanto no aspecto organizacional. Ainda que os administradores da atriz principal da rede digam que sua relação com os fornecedores é de parceria. Percebemos que em certos aspectos a relação é de subordinação, uma vez que a determinação dos 167 prazos, da utilização do tipo de tecnologia, do uso dos equipamentos implicados no processo produtivo, da quantidade e da qualidade das peças, componentes, subconjuntos a serem produzidos é da organização principal da rede. E, de dependência, porque as empresas fornecedoras estão sempre necessitando de assistência tanto dos especialistas da MHA, para solucionar seus problemas relativos ao processo produtivo, quanto do market share para resolver as dificuldades de ordem organizacional. Portanto, consideramos que mais três aspectos caracterizam a rede da MHA, entre os quais, o primeiro diz respeito ao fato de percebemos que há uma interação entre a organização focal e as fornecedoras da rede. Essa interação ocorre nos aspectos da qualidade, porque se trata inclusive, de um dos critérios para a contratação do fornecimento, o que implica uma das maiores exigências da atriz principal da rede. O segundo está relacionado à técnica e a questão tecnológica, uma vez que a protagonista da rede interfere na compra de equipamentos para as suas fornecedoras, quando isto é necessário. E o terceiro tem a ver com o treinamento para a transferência de conhecimento da MHA aos especialistas das fornecedoras da rede e, em algumas ocasiões, são compartilhados para a troca de experiência na rede. 168 REFERÊNCIAS ABREU, Alice Rangel de Paiva et al. Produção Flexível e Relações Interfirmas: A Indústria de Autopeças em Três Regiões do Brasil. In: ABREU, Alice Rangel de Paiva (ORG.). Produção Flexível e Novas Institucionalidades na América Latina. Editora UFRJ: Rio de Janeiro, 2000. ALVES, Marcelo Magaldi. Os impactos da abertura econômica na Zona Franca de Manaus e o desempenho do setor externo dos polos eletrônicos e de duas rodas no período de 1990 a 2004. Mimeo. ANDERSON, Perry. (Org). Balanço do Neoliberalismo. In: PÓS- NEOLIBERALISMO: As Políticas Sociais e o Estado Democrático. Rio de Janeiro: Editora Paz e terra, 1998. ANTUNES, Ricardo. Os sentidos do Trabalho: Ensaio sobre a afirmação e a negação do trabalho. 5.ª edição; São Paulo: 1999. __________. 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