Revista O Brasil Feito à Mão- no. 12
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Revista O Brasil Feito à Mão- no. 12
Ano 4 - nº12 - Julho 2011 Year 4 - nº12 - July 2011 Entrevista com o estilista Ronaldo Fraga: “Eu sou um artesão da moda” Rede européia El Corte Inglés abre as portas para o artesanato brasileiro Uma viagem bela e rica à produção artesanal de várias regiões do Brasil Interview with stylist Ronaldo Fraga: “I’m a fashion artisan” European chain El Corte Inglés opens its doors to Brazilian handicraft A beautiful and rich journey into handicraft production throughout Brazil Editorial / Editorial 2 Artigo / Article 4 Oportunidades / Opportunities 8 Tesouros da floresta / Treasures of the forest 12 Arte em madeira / Art in wood 18 Tecidos e cores / Fabrics and colours 23 Dona Marlene / Mrs. Marlene 28 Cidade de teares / City of looms 33 Edição e projeto editorial / Ediction and editorial project Instituto Centro Cape e Central Mãos de Minas Editor / Editor Carlos Moreira Colaboradores / Colaborators Antônio Siúves Regiane Marques Sampaio Fotografia / Photography Alexandre Mota Elsio Moriani Fernando Chaves Pedro Gil Martinez Fotografia Wilkerson Kuroki/Amazonastur Revisão / Revision COM! Soluções em Comunicação Tradução de textos / Translation Luiz Augusto Ferreira Araújo / Supernova SCI Alpha Traduções Diagramação e arte / Diagramming and graphic arts Flávio Christo Gráfica / Printing company Difusora Editora Gráfica Tiragem / Drawing 5.000 exemplares Distribuição gratuita / Costless Distribution Foto da capa: Divulgação / Associação Acreana Buriti da Amazônia Elsio Moriani Abrindo passagem / Making the way 36 Entrevista / Interview 40 Eu faço / I make 47 CENTRO CAPE MINAS GERAIS Rua Grão Mogol, 662 - Sion CEP 30310-010 - Belo Horizonte - MG Tel. 55 31 3282 8300 Fax 55 31 3282 8301 CENTRO CAPE DISTRITO FEDERAL SNC, Quadra 5, Bloco A, sala 212 Ed. Brasília Shopping CEP 70710-500 - Brasília - DF Tel. 55 61 3328 0621 Fax 55 61 3328 5802 SHOW ROOM ESTADOS UNIDOS 7 West 34th Street Suíte 725.1001 New York City - NY - Phone 917 282 5838 [email protected] SHOW ROOM PORTUGAL Parque Industrial Meramar IV R. da Amendoeiras, / ZIP Code: 2645 097 Phone: 351 96 707 2538 [email protected] www.centrocape.org.br [email protected] 55 31 3281 6820 Editorial O artesanato é uma atividade desenvolvida em todo o país e com imenso potencial para exportação e geração de emprego e renda. Em dezembro de 2010, a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil) teve a satisfação de sediar, em Brasília, o evento de lançamento da Associação Brasileira de Exportação de Artesanato (Abexa) — a nova entidade nacional criada com o objetivo de fortalecer as exportações do artesanato brasileiro. Com a Abexa, pela primeira vez, os artesãos exportadores passaram a ser apoiados por uma entidade de âmbito nacional. Para nós, da Apex-Brasil, esse é um marco muito importante para a internacionalização do setor. Vimos apoiando as exportações de artesanato há vários anos, e a nossa expectativa é de que a criação da entidade fortaleça ainda mais a promoção comercial do setor. No início deste ano, a Apex-Brasil firmou convênio com a Abexa para a execução de um novo projeto para o setor, de dois anos de duração. As metas para 2012 são de reunir 330 empresas participantes e obter exportações de US$ 6,12 milhões, superando o valor de exportações (US$ 3,12 milhões) alcançado pelas 163 empresas que integraram, em 2010, os projetos da Apex-Brasil para o setor. Com o novo projeto, cujo foco será em artesanatos de moda e de decoração com maior valor agregado, artesanatos com forte componente de design e artesanatos orientados à tradição popular, a promoção comercial do artesanato brasileiro no exterior será unificada, fortalecendo a divulgação da imagem do produto nacional. Algumas ações previstas são a contratação de empresa de Relações Públicas na Europa e nos Estados Unidos e de contêiner/ Handicraft is developed as an activity throughout the entire country, having great potential for exportation, employment and income generation. In December of 2010, the Brazilian Trade and Investment Promotion Agency (Apex-Brasil) was glad to host the launching event for Abexa (Associação Brasileira de Exportação de Artesanato, Brazilian Handicraft Exportation Association) in Brasília — a new national organization with the purpose of strengthening Brazilian handicraft exportations. Through Abexa, exporting artisans have finally started to receive support from a national organization. Forus, fromApex-Brasil,this is a very important landmark for the sector’s internationalization. We’ve been supporting handicraft exportation for many years, and our expectation is that the creation of Abexa will strengthen the sector’s commercial promotion even more. In the beginning of this year, Apex-Brasil established a partnership with Abexa in order to execute a new two-year plan for the sector. The goals for 2012 are to gather 330 participant companies and reach US$ 6.12 million in exportations, surpassing the exportation value (US$ 3,12 million) achieved by the 163 companies which integrated Apex-Brasil’s projects for the sector in 2010. Through this new project, which will focus on fashion and decoration handicraft with higher aggregate value, on handicraft with strong design components, and on popular traditionoriented handicraft, the overseas Brazilian handicraft commercial promotion will be unified, strengthening the image marketing for this national product. Planned actions include hiring Public Relation companies in Europe and in the United States, as well as container/itinerant stores in order to promote the products in several loja itinerante para promover os produtos em diversos países da Europa, além da participação nas maiores feiras de artesanato do mundo, tais como a Maison Object na França, a Ambiente e a Tendence na Alemanha, a Bijoutex e a Intergift na Espanha, a Las Vegas Show e a Gift Fair nos Estados Unidos. Também serão realizadas atividades de capacitação e desenvolvimento dos artesãos. Além disso, estudos de mercado sobre o setor estão sendo produzidos pela Unidade de Inteligência Comercial e Competitiva da ApexBrasil. Os países-alvo da parceria, definidos pelo estudo de inteligência comercial desenvolvido pela Agência são Alemanha, Espanha, Portugal, França, Itália e Estados Unidos. É importante ressaltar que a Abexa foi criada após um trabalho de planejamento estratégico, com base em análise profunda das necessidades do setor (principalmente de capacitação) e de novos direcionamentos que devem ser dados para que o Brasil marque presença em todo o mundo com a beleza, criatividade e diversidade de seu artesanato. European countries, besides participations in the world’s largest handicraft fairs, such as Maison Object in France, Ambiente and Tendence in Germany, Bijoutex and Intergift in Spain, and Las Vegas Show and Gift Fair in the United States. In addition, qualification and development activities will be offered for artisans. Market studies on the sector are also being produced by Apex-Brasil’s Commercial and Competitive Intelligence Unit. The target countries for this partnership are Germany, Spain, France, Italy and the United States, selected through the Agency’s commercial intelligence study. It is important to highlight that Abexa was created through a strategic planning effort, based on a profound analysis of the sector’s needs (mainly concerning qualification) and of new directions to be established in order to increase the Brazilian handicraft footprint abroad, leveraging its beauty, creativity and diversity. Rogério Bellini Diretor de Negócios da Apex-Brasil / Apex Brasil Business Director FOTO / PHOTO Divulgação/Apex-Brasil OPORTUNIDADES E DESAFIOS na exportação para grandes lojas de departamentos Opportunities and challenges in exporting to large department stores ALEXANDRE DE BRITO SANTOS Consultor do Centro Internacional de Negócios da Federação das Indústrias de Minas Gerais (CIN/Fiemg) Consultant to the International Business Center of the Federation of Industries in Minas Gerais (CIN/Fiemg) A tendência atual de valorização da taxa de câmbio no Brasil tem levado os exportadores, tanto da indústria como do artesanato, a desenvolver novas estratégias de competitividade para se manter no mercado externo. Uma dessas estratégias é a concentração de vendas em poucos clientes. Neste caso, o objetivo dos empreendedores e artesãos é manter a venda ao exterior competitiva através de operações concentradas em poucos clientes compradores. Assim, evita-se a dispersão de esforços e de operações logísticas, concentrando as operações em um único comprador ou em poucos compradores. Este ganho financeiro advém, principalmente, da redução de gastos em operações complexas e pela queda nos gastos na contratação de frete. O que ocorre é que ,naturalmente, quando se tem várias cargas fracionadas para diferentes destinos, sempre existe a possibilidade de perda de eficiência na consolidação da carga. Normalmente, como se tratam de pequenas empresas e especialmente de artesanato, os volumes embarcados são pequenos, o que exige a consolidação da carga com outros produtos. Esta consolidação envolve produtos diferentes, de tamanhos e pesos distintos, o que acarreta custos maiores. Pelo lado dos compradores observa-se que, em muitos casos, apenas uma empresa receptora adquiriu toda a carga. Neste caso, o comprador receberá toda a carga do container. Outra possibilidade é que as cargas contidas tenham vários destinos e, nesta situação, cada importador deverá desembaraçar sua mercadoria. 4 artigo / article The current trend of exchange rate valuation in Brazil has led exporters both from factories and from arts and crafts, to develop new competition strategies in order to secure their places in the external market. One of these strategies is the concentration of sales around a few customers. In this case, the aim of entrepreneurs and artisans is to keep the international sales competitive through operations concentrated around a few buyers. This way the dispersion of efforts and logistic operations is avoided, concentrating the operations in a single buyer or around a few buyers. This financial gain comes mainly from cutting off costs in complex operations and from cutting off expenses in freight contracting. What occurs is that when you have many fractioned cargos to different destinations, there is always the possibility of loss of efficiency in the consolidation of cargo. Usually, as we are talking about small companies, especially arts and crafts ones, the volume shipped is small, demanding the consolidation of the cargo with other products. Such consolidation involves different products of different sizes and weight, leading to higher costs. From the buyers’ side it is observed that, in many cases, only one receiving company has acquired the entire cargo. In this case, the buyer will receive all the cargo in the container. Another possibility is that the cargo in the containers has many destinations and in this situation, each importer shall clear its own goods. As empresas que compram mercadorias de diferentes vendedores procuram organizar e gerenciar o processo de consolidação da carga no país de origem das mesmas, pois neste caso o peso do frete pode elevar sobremaneira os custos. Assim, este comprador tende a contratar os serviços de um operador logístico que será responsável pela contratação do frete, consolidação da carga e emissão da documentação. Nesse processo de negociação os artesãos e produtores vão vender para um único comprador e vão utilizar um único operador logístico. Isto torna a operação demasiado onerosa para o produtor, uma vez que ele se defronta com dois monopsonistas. Na literatura econômica, monopsonista é a situação onde só existe um comprador para vários vendedores. Neste caso, parte importante da margem de lucro vai ser transferida do produtor para o comprador. Os produtores são obrigados a aceitar os preços determinados tanto pela carga como pela operação de transporte e distribuição. Vender um número limitado de unidades para um comprador significa que este comprador é, em geral, uma organização que trabalha diretamente com o consumidor, não necessitando de estoques muito grandes de produtos. Nesta categoria estão enquadradas as grandes lojas de departamentos, os chamados magazines. Na Europa e nos Estados Unidos eles se confundem com a própria cidade onde estão estabelecidos e se transformaram em referência obrigatória para o turismo de compras. Em Paris, os mais famosos são as Galeries Lafayette e o Printemps, em Londres é a Harrods e, em Madrid, o El Corte Inglés. A estratégia de vendas destes grandes magazines é oferecer uma gama de opções para todos os consumidores, com áreas especializadas em vestuário, cosméticos e perfumaria, vestuário masculino, calçados, eletrônicos de consumo, artefatos de decoração, artigos de casa de campo, cama, mesa e banho, brinquedos e área gourmet. Isto atende aos anseios dos consumidores que buscam otimizar as compras e encontrar de tudo no mesmo lugar. As grandes redes apostam em temas da temporada e de alguma forma todas as áreas ligadas à moda e à decoração deverão estar de acordo com a linguagem da temporada. Ao lado de produtos de consumo tradicionais, aos quais freqüentemente estão incluídas algumas ofertas interessantes para atrair o público, estão expostos artefatos diferentes, produtos Companies that bought products from many different sellers try to organize and manage the cargo consolidation product in the country of origin of the products, as in this case the cargo weight might increase costs exceedingly. This way, this buyer tends to hire the services of a logistics operator that will be responsible for contracting services of cargo, cargo consolidation and documents issuance. In this process of negotiation artisans and producers sell to a single buyer and use a single logistics operator. This makes operation too costly to producers, since he has to deal with two monopsonists. In economy literature, monopsonist is the situation where there is only a single buyer to many sellers. In this case, a significant portion of the profit margin is transferred from the producer to the buyer. Producers are obliged to accept the prices determined both by the cargo and by the transport and distribution operation. Selling a limited number of units to one buyer means that this buyer is. In general, an organization that works directly with consumers, not requiring large stocks of products. This category comprises large department stores, called “stores”. In Europe and in the United States they get mixed with city where they are established and become a mandatory reference of shopping tourism. In Paris the most famous ones are the Galeries Lafayette and Printemps, Harrods in London and, in Madrid, El Corte Inglés. Sales strategies of these large stores is offering a range of options to all consumers with areas specialized in clothing, cosmetics and perfumery, men’s clothing, shoes, consumption electronics, decoration items, country house items, bedding and bath, toys and cookware. It fulfills the expectations of consumers who seek to optimize shopping and find everything at the same place. Large store chains invest in season themes and, somewhat, all the areas connected to fashion and decoration must be in agreement with the language of the season. Beside the traditional consumption products to which some interesting offers are frequently attached in order to attract audience, there are different products, handicraft items often originated from foreign countries and that are extremely valued in European countries. Over the last years, these large stores have artigo / article 5 de artesanato geralmente originários de países estrangeiros e que são extremamente valorizados nos países europeus. Nos últimos anos, estes grandes magazines tem aberto espaço para exibições de artesanato do Brasil. O nosso país esta na “moda”, atraindo interesse estrangeiro por produtos que reflitam o nosso ambiente cultural. Peças de artesanato, vestuário, bijouteria e com materiais brasileiros estão entre as mais demandadas pelos consumidores. Contudo, o fechamento de um contrato de venda é uma tarefa complexa para os produtores. Embora valorizem a originalidade do artesanato, os departamentos responsáveis pelas compras tendem a adotar as mesmas estratégias utilizadas em aquisições de grande volume – os preços oferecidos são reduzidos e as condições de pagamento, bastante rígidas. Ofertas de compras incluem mercadorias que serão pagas somente após efetiva venda, geralmente ao fim da temporada. Ou seja, em muitas situações cabe ao vendedor arcar com o capital de giro e financiar as vendas a prazo. Eventuais peças com defeito ou entregues fora do prazo são de responsabilidade exclusiva do vendedor e geram inclusive multas contratuais. Por tudo isto apesar de ser um mercado em expansão recomenda-se cautela na hora de assinar um contrato com estas empresas. Como qualquer outro comprador ela exige alta qualidade, pontualidade na entrega e logística eficiente e barata, não se responsabilizando por ocorridos problemas durante o transporte. Portanto, ainda que seja muito interessante a negociação de um contrato com um grande magazine, é importante que os produtores e vendedores estejam atentos para as exigências e imposições contratuais colocadas. allowed some room display handicraft from Brazil. Our country is fashionable, attracting international interest to products that mirror our cultural environment. Pieces of handicraft, clothing and jewelry made with Brazilian materials are among the most requested pieces by consumers. However, signing a sales agreement is a complex task to products. Although handicraft originality is valued, departments responsible for purchases tend to adopt the same strategies used in large volume acquisitions – prices offered are reduced and payment conditions are quite strict. Purchase offers include products that will only be paid after the sale is consolidated, generally by the end of the season. That means, in many situations sellers must have a substantial working capital in order to support credit sales. Occasional defective pieces or pieces not delivered on time will be under the exclusive responsibility of the seller and imply in contractual penalties. For all that, although is it a market in expansion, we recommend attention at signing contracts with these companies. Just like any buyer, they demand high quality, on-time delivery in addition to effective and inexpensive logistics, not taking responsibility for problems occurred during transportation. Thus, even though the negotiation of a contract with a large store is very interesting, it is important that producers and sellers are attentive to the contractual demands and impositions established. Onde encontrar artesanato brasileiro tipo exportação How can you find brazilian handicraft, prepared TO export www.ecoarts.bys www.brazilhandicraft.org.br www.artest.com.br www.fazerbrasil.org.br www.projetoartbrasil.com.br 6 artigo / article SEBRAE MAIS é gestão sob medida para pequenas empresas O Sebrae Mais é um programa nacional de consultoria sobre gestão. São soluções práticas para modernizar a gestão, ideais para quem não tem tempo: conteúdo aplicado imediatamente na empresa, menos tempo em sala de aula e presença de um consultor dentro do negócio, do diagnóstico aos resultados. Sua empresa cresceu? Acesse agora: www.sebraemg.com.br Quem tem conhecimento vai pra frente | 0800 570 0800 Portas abertas na Europa Open doors in Europe Carlos Moreira FOTOS / PHOTOS Divulgação – Centro Cape / Divulgação – Sebrae (DF) POR /BY O artesanato brasileiro está atraindo novos olhares do mundo, a partir da atenção que as pessoas começam a dispensar à sustentabilidade e ao consumo consciente. Originalidade, autenticidade cultural e o trabalho manual são características cada vez mais valorizadas por europeus e norte-americanos, com reflexos no interesse de grandes redes de lojas de departamento na produção artesanal, como a El Corte Inglés (Portugal e Espanha) e a Macy’s (Estados Unidos). 8 oportunidades / opportunities Brazilian arts and crafts have caught eyes from all over the world, derived from the attention people start to pay to sustainability and conscious consumption. Originality, cultural authenticity and manual work are characteristics more and more valued by Europeans and NorthAmericans, with reflections on the interest of large department store chains towards arts and crafts production, as it is occurring in El Corte Inglés (Portugal and Spain) and Macy’s (United States). Em maio último, uma missão de 14 compradores da rede européia visitou o Brasil e participou de rodadas de negócios nos Estados de Minas Gerais, Ceará e Distrito Federal, onde foram montadas exposições de produtos de diversas regiões do Brasil. Os compradores, com até 4 milhões de euros para aquisições, também visitaram ateliês e oficinas de tecelagem e mobiliário no interior de Minas Gerais. O Instituto Centro de Capacitação e Apoio ao Empreendedor (Centro Cape) já possui há mais de dois anos pontos de vendas nas unidades da El Corte Inglés em Gaia-Porto e Lisboa (Portugal) e em Madri (Espanha). Segundo a presidente da entidade, Tânia Machado, a boa aceitação dos produtos artesanais mineiros resultou no interesse da rede em abrir, no final do segundo semestre deste ano, um espaço destinado à venda de artigos brasileiros em suas lojas. A visita foi promovida por organizações governamentais, não-governamentais e empresariais, como o Centro Cape, Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil), Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg) e o Serviço Brasileiro de Apoio à Micro e Pequena Empresa (Sebrae). A escolha dos artesãos que participaram das negociações foi feita pelo Centro Cape, a partir de convites a profissionais, associações e cooperativas de todo país, que enviaram fotos de seus produtos para uma préseleção dos compradores da El Corte Inglés. Last May, a commission comprising 14 buyers of the European chain visited Brazil and participated in business sessions in the states of Minas Gerais, Ceará and Distrito Federal, where exhibitions of products from several regions in Brazil were being zheld. The buyers, who had up to 4 million euros for purchases, also visited weaving and furniture ateliers and shops in small cities of Minas Gerais. The Institute Center for Qualification and Support to Entrepreneurs (Centro Cape) has had, for over two years, purchase points in the El Corte Inglés units in Gaia-Porto and Lisbon (Portugal) and in Madrid (Spain). According to the president of the entity, Tânia Machado, the good acceptance of the handicraft products from Minas Gerais resulted in the interest by the company in opening, at the end of the second half of this year, a space intended to selling Brazilian items in its stores. The visit was promoted by governmental, nongovernmental and corporate organizations as the Centro Cape, the Brazilian Agency for Exports and Investments Promotion (Apex-Brazil), the Federation of Industries in the State of Estado de Minas Gerais (Fiemg) and the Brazilian Service for Support to Micro and Small Enterprises (Sebrae). The choice of the artisans who participated in the negotiations was made by Centro Cape, from invitations to professionals, associations and cooperative organizations from all over the country, which sent pictures of their products for a pre-selection by the buyers of the El Corte Inglés. Oportunidade única A single opportunity A visita mostrou que a exportação é um desafio e tanto para os artesãos, que precisam apresentar garantias de produção, preço e logística para que os negócios sejam concretizados. Até o fechamento desta edição, ainda não havia um balanço final das vendas, já que os pedidos foram colocados, mas os contratos ainda não haviam sido assinados. De qualquer forma, produtores de todo o país tiveram uma grande oportunidade de mostrar seu trabalho e estabelecer um contato valioso, ainda que não tenham concretizado as vendas. “A reunião com os espanhóis criou expectativa de mais vendas no futuro. Essa é a minha primeira experiência em exportação. Mesmo se não tivesse vendido, já sairia daqui satisfeito”, disse o artesão Elsio Moriani, de Brasília, que conseguiu vender seus objetos e biojóias em madeira . Thiago Silva, do ateliê ReThalho de Lagoa Santa (MG), ressalta a demanda por originalidade. “Querem tudo bem The visit showed that exporting is a big challenge both to artisans, who have to offer warranties of production, price and logistics in order to consolidate business. Until the closing of this edition, there was no final balance of sales, since the orders had been placed but the contracts had not been signed yet. Anyhow, producers from all over the country had a great opportunity to display their work and establish a valuable contact, even though sales have not been concretized yet. “The meeting with Spanish buyers generated expectations of more sales in the future. This is my first experience with exports. Even if I had not made any selling, I would leave here pleased”, said artisan Elsio Moriani from Brasília, who managed to sell his objects and biojewelry in wood. Thiago Silva, from atelier ReThalho de Lagoa Santa (MG), emphasizes the demand for originality. “They want it very Brazilian, full of color and calico (a type oportunidades / opportunities 9 produzir, até novembro, quando têm de enviar as mercadorias, 200 camisas, 200 almofadas e 200 panos de prato pintados à mão com figuras da fauna e flora da Floresta Amazônica. brasileiro, com bastante cor e bastante chita (tecido com estampas coloridas e chamativas)”, comenta. Suas peças, elaboradas com embalagens tetra pak e tecido, também tiveram boa aceitação. Já os artesãos da Cooperativa de Produtos e Serviços Econômicos e Solidários do Acre (Cooesa) terão de produzir 12 mil biojóias, entre colares, pulseiras e brincos, e 3.000 velas em ouriço. A produção terá de ser entregue em novembro e os artesãos já trabalham a todo vapor. “A Cooesa tem estrutura para atender à demanda, mas estamos nos organizando para que todas as fases da produção, que incluem a coleta, preparação das sementes e montagem das peças, ocorram sem problemas”, diz o presidente da entidade, Carlos Taborga, escolhido o representante das três organizações acreanas para cuidar do trâmite necessário para a exportação. Além da Coeesa, a Associação Acreana Buriti da Amazônia, fundada por Márcia Silva de Lima, recebeu pedido de 8.000 chaveiros, 7.500 pulseiras, 800 mandalas. “Do nosso encontro com os representantes da El Corte Inglés, surgiu um novo produto. Eles gostaram tanto das camisas pintadas à mão que encomendaram almofadas, que passamos a confeccionar”, disse a presidente da Cooper MAV, Othília Batista Melo de Sampaio, também do Acre. Como a produção é manual, e não se aprende pintura de um dia para o outro, a Cooper MAV acredita que vai conseguir 10 oportunidades / opportunities of fabric with bright and colorful patterns)”, he comments. His pieces made of tetra pak packages and fabric were also well accepted. The artisans of the Cooperative of Economic and Solidary Products and Services of Acre (Cooesa) will have to produce 12 thousand pieces of biojewelry among necklaces, bracelets and earrings, besides 3,000 candles in seed shells. Production will have to be delivered in November and artisans are already working in full swing. “Cooesa is structures in order to meet the demand, but we are organizing ourselves so that all the production phases occur free of trouble, including the gathering, preparation of seeds and assembly of pieces”, says the president of the entity, Carlos Taborga, elected as the representative to the three Acrean organizations to take care of the procedures required to exporting. In addition to Coeesa, the Acrean Association Buriti da Amazônia, founded by Márcia Silva de Lima, has received an order for 8,000 key-chains, 7,500 bracelets, and 800 mandalas. “From our meeting with the El Corte Inglés representatives emerged a new product. They liked the hand-painted shirts so much that ended up by also ordering cushions, which we started producing”, said the president of Cooper MAV, Othília Batista Melo de Sampaio, also from Acre. As the production is manual and painting cannot be learned in a day, Cooper MAV believes it will be able to produce, until November, when they have to ship the products, 200 shirts, 200 cushions and 200 hand-painted table cloths with figures of the Rain Forest fauna and flora. Cícero Resende Chaves, who produces and sells Cícero Resende Chaves, que produz e comercializa produtos têxteis em Resende Costa (MG), não chegou a fechar vendas para a rede européia, principalmente em função do preço e por já desfrutar de uma boa posição no mercado interno. Apesar disso, ele ficou satisfeito com o interesse em suas peças e com a possibilidade de negociações futuras. Sérgia Almeida, que representa duas cooperativas e 20 associações de artesãos do Estado de Pernambuco, também aprovou a oportunidade de negociar com a El Corte Inglés, embora confesse ter ficado frustrada por não ter havido a consolidação de vendas. “Eles ficaram encantados com nossos produtos”, afirma, referindo-se às redes, mantas, passadeiras, almofadas e cerâmicas que expôs. Aos interessados e à própria rede européia, ela avisa: “Nós temos um artesanato muito diversificado e plenas condições de produzir e entregar grandes quantidades. Estamos prontos para exportar”. Nas páginas seguintes, conheça mais sobre o trabalho de alguns dos artesãos que participaram das negociações com a El Corte Inglés. textiles in Resende Costa (MG), did not make any business deal with the European chain, mainly for the price and for already enjoying a comfortable position in the internal market. Despite all this, he was content with the interest showed in his pieces and with the possibility of future negotiations. Sérgia Almeida, who represents two cooperatives and 20 associations of artisans in the state of Pernambuco, has also approved the opportunity of negotiating with the chain El Corte Inglés, although she confesses being frustrated for not having consolidated any sales. “They were charmed by our products”, she says, meaning the hammocks, bed spreads, mats, cushions and pottery exhibited. And she warns the ones interested and the European chain itself: “We have offer diversified handicraft at full conditions for production and delivery in large scale. We are ready to export”. On the next pages, learn more about the work of some of the artisans who participated in the negotiations with the chain Corte Inglés. oportunidades / opportunities 11 Tesouros da Floresta Treasures of the Forest Associações se dedicam a organizar e divulgar a produção artesanal do Acre Entities dedicate themselves to organizing and promoting handicraft in Acre POR /BY Regiane Marques Sampaio FOTOS / PHOTOS Divulgação Numa segunda-feira de junho, Maria de Fátima e Carlos viajavam para Recife. Othília fazia curso de aprimoramento em São Paulo, enquanto Márcia terminava os preparativos para embarcar para o Rio Grande do Sul. Em comum, além da agenda ocupada por viagens, essas pessoas trabalham em torno de um mesmo objetivo: organizar e divulgar o artesanato do Acre – Estado encravado na Amazônia Brasileira, atuando como representantes de três entidades que reúnem artesãos acreanos das mais diversas especialidades. Como resultado desse trabalho, até o final do ano os consumidores espanhóis e portugueses poderão ver nas prateleiras da rede El Corte Inglés itens como biojóias, velas, mandalas e outros objetos com matérias-primas regionais, além de camisetas e almofadas pintadas à mão, com figures alusivas à fauna e à flora da Amazônia. O pedido da rede européia deixou a vida ainda mais corrida – há uma grande mobilização para atender às encomendas, mas todos estão muito felizes com isso. Com um território de 152 mil quilômetros quadrados em plena Floresta Amazônica, o Acre possui uma vasta riqueza natural. Sementes, folhas, sobras de madeiras e látex são transformados em objetos de arte por comunidades de artesãos. E ao aliar matéria-prima com talento e organização, os artistas acreanos estão ganhando mercado em outros Estados brasileiros e, agora, também no exterior. On a June Monday, Maria de Fátima and Carlos were traveling to Recife, as Othília was taking a specialization course in Sao Paulo, and Márcia was finishing packing to go on a trip to Rio Grande do Sul. In common, in addition to the schedule filled with trips, these people had the fact of being working for the same aim: organizing and promoting handicraft in Acre – A State encrusted in the Brazilian Amazon region, acting as representatives to the three entities that gather Acrean artisans with the most varied specialties. As a result to this work, Spanish and Portuguese consumers will enjoy, on the shelves of the El Corte Inglés department store chain, items such as biojewelry, candles, mandalas and other objects made of regional raw material, besides shirts and hand-painted cushions, with illustrating symbols of the Amazon fauna and flora, by the end of the year. The order received from the European chain has made life even busier – there is a massive mobilization towards delivering orders, though everyone is very happy about all that is going on. With a territory of over 152 thousand square kilometers in the very Amazon Rainforest, Acre presents vast natural wealth. Seeds, leaves, wood remainders and latex are transformed into art objects by communities of artisans. And, in joining raw material, talent and organization, Acrean artisans are gaining market share in other Brazilian states and now also abroad. 12 tesouros da floresta / treasures of the forest Maria de Fátima Taborga e Carlos Laran Taborga são, respectivamente, presidente e administrador da Cooperativa de Produtos e Serviços Econômicos e Solidários do Acre (Cooesa), que funciona desde 1997. O casal é o principal prospector da entidade e vive para divulgar os trabalhos dos cooperados e conquistar novos clientes. Para atender a El Corte Inglés, eles vão ter de trabalhar como nunca, pois receberam a encomenda de 15 mil peças, entre biojóias e velas de ouriço, a maior feita à Cooesa até hoje. A união em cooperativa permitiu que os próprios fabricantes de artesanato assumissem, por meio de concorrência pública, em 2005, a Casa do Artesão do Acre, que era administrada pela Secretaria de Estado do Turismo. A edificação, localizada na capital Rio Branco, foi cedida pelo governo estadual e é gerenciada pela Cooesa, que se profissionalizou para manter o local atrativo, lucrativo e como ponto de divulgação do artesanato do Acre. Hoje são 170 cooperados, mas a rede de beneficiados é muito maior, já que favorece desde os responsáveis pela coleta de matéria-prima até os artesãos. Coleta esta, cabe ressaltar, que é feita de maneira sustentável, sem agredir a fauna e a flora locais. Mensalmente, o cooperado conta com o depósito do dinheiro arrecadado com a venda dos seus produtos, sendo que 20% vão para a manutenção da Cooesa. Entre as mercadorias comercializadas pela cooperativa estão biojóias feitas com sementes; velas em ouriço – fruto da castanheira-do-brasil, camisetas e objetos de casa pintados a mão com desenhos da fauna e flora da Amazônia. São os animais e plantas que também estampam os trabalhos de marchetaria, em que caixas e outros objetos são ornamentados com figuras feitas com lâminas de madeira de várias cores. O látex, chamado de leite da seringueira, é transformado em bolsas, sapatos, porta-treco, jogo americano, toalhas e tapetes. Reunidos na Cooesa, os artesãos conseguiram maior visibilidade, não apenas por terem um local para exposição dos produtos, mas por contarem com o trabalho de divulgação feito por Maria de Fátima e Carlos Taborga. Os cooperados têm ainda o apoio do governo do Estado e da prefeitura, além de receberem orientação do Sebrae, como cursos de capacitação. Maria de Fátima Taborga and Carlos Laran Taborga are, respectively, the president and e administrator to the Cooperative of Economic and Solidary Products and Services of Acre (Cooesa), established in 1997. The couple is the main prospector to the entity and is fully dedicated to promoting the works of members and winning new customers. In order to deliver to El Corte Inglés they have to work as never before, as they received a 15 thousand piece order, the largest order Cooesa has received so far, among biojewelry and seed shells candles. The union as a cooperative enterprise allowed the artisans to undertake, through a public bid in 2005, the Casa do Artesão do Acre (Artisans’ House in Acre), which was managed by the State Secretariat of Tourism, back then. The building, located in the capital Rio Branco, has been given over by the state government and is managed by Cooesa, which in its turn pursuit qualification to keep the place attractive, profitable and a point of handicraft promotion in Acre. There are 170 members today, though the network of beneficiated people is much larger, as it favors from the ones responsible for gathering raw material to the artisans. It is important to highlight that such gather is done in a sustainable way, without harming the local fauna and flora. Monthly, members rely on the deposit of the money collected from the selling of products, of which 20% is destined to the maintenance of Cooesa. Among the goods sold by the cooperative are biojewelry made of seeds; candles made of seeds shells – fruits of the Brazil nut; shirts and home decoration objects hand-painted with Amazonian fauna and flora motifs. Animals and plants are also illustrated in marquetry works, where boxes and other objects are adorned with figures made of multicolored wood sheets. Latex, called the rubber tree milk, is transformed into bags, shoes, objects holders, placemats, towels and mats. Gathered at Cooesa, artisans gained more visibility, not only for having a place to exhibit their tesouros da floresta / treasures of the forest 13 Foi graças a uma dessas aulas que a artesã e cooperada e vice-presidente da Cooesa, Cesarina Pereira de França, 42, conseguiu agregar mais valor ao seu produto. Com a pesquisadora da Universidade de Brasília (UnB), Denise Vilela, ela e outros artesãos aprenderam técnicas de uso de óleos naturais que ajudam na conservação e aumentam a durabilidade da matéria-prima utilizada em seu artesanato. Nas mãos de Cesarina, sementes de jarina, conhecida como marfim vegetal da Amazônia, oriunda de uma palmeira, assim como o açaí, patuá, comaru-ferro são transformados em colares, pulseiras e brincos. Fundadora do grupo Biojóias da Amazônia, Cesarina participou da criação da Cooesa. Exfuncionária de uma panificadora, mas que fazia manualmente convites de casamento e festas de 15 anos, ela viu no artesanato a solução para os seus problemas financeiros, após ficar desempregada. “Quando descobri as sementes, me apaixonei de vez pelo artesanato, e até deixei a arte de fazer os convites”, relembra. Com o tempo, o trabalho de Cesarina e o lucro obtido com as sementes fizeram marido, filhos e o irmão aderirem à confecção de jóia, e hoje toda a família vive do artesanato. products but also for relying on the promotional work performed by Maria de Fátima and Carlos Taborga. Members of the cooperative enterprise also receive support from the state and city governments, besides receiving guidance from Sebrae, as qualification courses. Thanks to some of these classes the artisan, member and vice-president of Cooesa, Cesarina Pereira de França, 42, managed to add more value to her products. Together with Denise Vilela, a University of Brasília (UnB) researcher, Cesarina and other artisans learned techniques for the use of natural oils that help in the preservation and durability of the raw material employed in their art works. In Cesarina’s hands jarina’s seeds (also known as the vegetal ivory of Amazon, originated from a palm tree just like açaí, patuá, and comaru-ferro), are transformed into necklaces, bracelets and earrings. The founder of the group Biojewelry of the Amazon, Cesarina participated in the creation of Cooesa. A former worker in a bakery who would also produce, manually, debutant and wedding parties invitations, she saw in handicraft the solution to her financial problems, after becoming unemployed. “When I discovered the seeds, I totally fell in love with handicraft and even quit producing the invitations”, she recalls. As time passed the work of Cesarina and the profit made from the seeds made her husband, children and brother adhere to the production of jewelry, and now her entire family live from handicraft. 14 tesouros da floresta / treasures of the forest União e força Union and power Após uma reunião na Secretaria de Pequenos Negócios do Acre e antes de embarcar para participar da Feira de Economia Solidária do Mercosul, no Rio Grande do Sul, a artesã Márcia Silva de Lima falou sobre a sua prioridade atualmente: atender à encomenda da El Corte Inglés à Associação Acreana Buriti da Amazônia, entidade fundada por Márcia e que terá que produzir 16.300 peças para a rede européia, que se junta agora a outros clients estrangeiros da entidade. Desde criança, Márcia gostava de artesanato. Na vida adulta, escolheu a palha e as sementes de buriti (uma espécie de palmeira) para trabalhar, e passou a ministrar cursos financiados por fundações, governos e entidades. Mas algo a incomodava: seus alunos, depois de formados, não conseguiam condições para colocar os conhecimentos em prática. Márcia reuniu 18 deles e dediciu fundar, há 17 anos, a Associação Acreana Buriti da Amazônia. Já no primeiro ano receberam uma encomenda da Escola de Samba Beija-Flor, do Rio de Janeiro, para confecção de bolsas. “Chamei os alunos, fizemos o design, os protótipos e todos adoraram”, disse Márcia. Mas como a encomenda era grande e não havia recursos, Márcia e os alunos fizeram rodízio na venda de sanduíches em uma escola e conseguiram, em um mês, dinheiro para a compra do maquinário. Daí em diante, Márcia não parou mais. Buscou parcerias no Sebrae, na Secretaria de Turismo do Acre, entre outros. Seu esforço resultou em vendas e a associação conseguiu juntar recursos para divulgar a arte com o buriti em várias partes do país e do mundo. “Passamos a adquirir estandes em feiras, onde fazíamos contato com compradores de todo o planeta”. Jóias, objetos de decoração e adorno da associação já chegaram a Itália, Holanda, Japão e Estados Unidos. After a meeting at the Secretariat for Small Business in Acre and before going to participating in the Mercosul Solidary Economy Exhibit in Rio Grande do Sul, artisan Márcia Silva de Lima commented on its current priority: delivering the order made by El Corte Inglés to the Acrean Association Buriti da Amazônia, an entity established by Márcia that receive the incumbency of producing 16,300 pieces to the European chain, joining now other foreign customers of the enterprise. As a child, Márcia already liked handicraft. In adult life, she has chosen the straw and seeds of buriti (a type of palm tree) as work material and started to offer courses funded by foundations, governments and corporations. Yet, there was something bothering her: her pupils, after taking the courses, could not make it to put the knowledge into practice. Márcia gathered 18 of them and decided to establish the Acrean Association Buriti da Amazônia, 17 years ago. Right at the first year they received an order from the Escola de Samba Beija-Flor (Beija-Flor Samba School), from Rio de Janeiro, to produce bags. “I gathered the students, we worked on design, prototypes and everyone loved it”, said Márcia. But, as the order was massive and resources scarce, Márcia and the students alternated shifts selling sandwiches in a school and managed to raise, within a month, money enough to buy the tools required. From there, Márcia has not stopped. She searched partnerships at Sebrae, at the Secretariat of Tourism in Acre, among other. Her efforts resulted in sales and the association managed to raise funds to promote artistic works using buriti in several places in the country and abroad. “We started to buy booths in exhibits, where we established contact with buyers from everywhere in the planet”. The jewelry and decoration objects produced by the association have already reached Italy, Japan and the United States. tesouros da floresta / treasures of the forest 15 A arte de vencer The art of winning Três amigas com habilidades diferentes para o artesanato, mas com a mesma dificuldade para expor e vender seus produtos. Se unissem forças, elas acreditavam que esse obstáculo seria vencido; e assim o fizeram. Em 2010, a união das amigas foi consolidada com a fundação da Cooperativa de Artesãos Mulheres Arte de Vencer (Cooper MAV), que hoje reúne 20 cooperadas. Os trabalhos são divididos em três linhas de produção. A moda casa, que deu inicio à cooperativa, em que são confeccionados panos de mesa, fogão, geladeira, tapetes e guardanapos, utilizando técnicas como o crochê, fuxico, macramê, costura e pintura. Moda família, com a produção principalmente de camisetas pintadas à mão. A linha de biojóias feitas com sementes, junto com os trabalhos em madeiras, com foco na reprodução de animais da floresta, como araras e tucanos. Para a rede El Corte Inglés, a cooperativa produzirá camisetas, almofadas e panos de prato pintados a mão, como informa a presidente da Cooper MAV, Othília Batista Melo de Sampaio. São 600 peças no total, que exigirão trabalho extra das artesãs, uma vez que a arte da pintura não pode ser ensinada no curto prazo. Em busca de aumentar a produção e permitir que mais acreanos tenham uma opção de renda, a cooperativa firmou parceria com o Rotary e as artesãs oferecem cursos para a formação de novos profissionais. E as próprias fundadoras também estão em reciclagem e aprendizado constante. Depois de participar do encontro em Brasília com representantes da loja de departamentos El Corte Inglés, Othília já esteve em outros Estados do país em busca do crescimento da cooperativa. Em São Paulo, junto com outras três cooperadas, Othília participou de cursos na Mega Artesanal, feira de oficinas de aprimoramento e divulgação de novidades aos artesãos. O artesanato rendeu frutos até na família de Othília. Sua filha Magali Sampaio, 35, também se tornou cooperada e realiza bordados em ponto vagonite - desenhos feitos com a trama de linhas. As três entidades vivem agora a expectativa de que seus produtos sejam bem aceitos pelos clientes da El Corte Inglés, abrindo um Mercado firme para o artesanato acreano na Europa. Three friends with different skills for handicraft, but experiencing the same difficulties to exhibit and sell their products. They believed that if they joined efforts such obstacles would be conquered, and so they did: in 2010, the union of friends was consolidated with the establishment of the Cooperative of Women Artisans Arte de Vencer (Cooper MAV), with 20 members, currently. Works are divided into three production lines: home fashion, which initiated the cooperative works and where table, stove and fridge cloths are produced besides mats and napkins, using techniques as crochet, fuxico (round pleated pieces of cloth), macramé, sewing and painting; family fashion, with the production of hand-painted shirts, specially; biojewelry line made with seeds and crafts in wood, focused on the reproduction of the rainforest animals such as macaws and toucans. As for the El Corte Inglés chain, the cooperative will produce hand-painted shirts, cushions and table cloths, as informed by the president of Cooper MAV, Othília Batista Melo de Sampaio. These will be 600 pieces in total, demanding extra work from the artisans, as art painting work cannot be taught in such short term. Seeking to increase production and allowing more Acreans to have an income option, the cooperative signed a partnership with the Rotary Club and artisans offer courses for the qualification of new professionals. And the founders themselves are in a continual process of re-qualification and learning. After participating in a meeting in Brasília with representatives from the El Corte Inglés department store chain, Othília has already visited other states in the country, aiming the expansion of the cooperative. In São Paulo, together with other three members, Othília participated in courses at Mega Artesanal, a qualification and promotion workshops exhibit for artisans. Handicraft has been productive even within Othília’s family. Her daughter Magali Sampaio, 35, has also become a member in the cooperative and performs embroidery in huckweaving stitch – drawings made by the woof of threads. The three entities now live the expectation of having the successful acceptance of their products by the customers of El Corte Inglés, opening a loyal market to Acrean handicraft in Europe. 16 tesouros da floresta / treasures of the forest PRESENTE NO AÇO QUE VOCÊ TOCA. PRESENTE NA ARTE QUE VOCÊ APRECIA. PRESENT IN THE STEEL YOU TOUCH. PRESENT IN THE ART YOU ENJOY. Orquestra de Câmara Jovem de Ipatinga Youth Chamber Orchestra of Ipatinga Para fazer parte da vida das pessoas, o aço Usiminas se apresenta de várias formas. Ele está nos eletrodomésticos, casas, carros, pontes e também na diversão, na cultura e no artesanato. A Usiminas é a maior investidora em cultura de Minas Gerais, e uma das maiores do Brasil. Foram mais de 1.500 projetos patrocinados em 18 anos. Por meio do Instituto Cultural Usiminas, a empresa investe na inclusão, formação e desenvolvimento do cidadão. Usiminas steel is found in many forms in people’s life. It’s in the home appliances, houses, cars, bridges, and also in the arts, entertainment and handcrafting. Usiminas is the largest investor in culture in Minas Gerais and one of the largest in Brazil, having sponsored more than 1,500 projects over the past 18 years. Through its Cultural Institute, Usiminas invests in the citizen’s education, inclusion and growth. Usiminas. Fazer melhor sempre. | Always doing the best. Pública www.usiminas.com All lumber is noble for a marquetry master Tacos, galhos e móveis velhos se transformam em arte nas mãos de Elsio Moriani Old furniture, branches and wooden floor tiles become art in the hands of Elsio Moriani Antônio Siúves FOTOS / PHOTOS Elsio Moriani POR /BY No final do século passado, aos 30 anos, Elsio Moriani (pronuncia-se Elcio) encontrou uma pedra no meio do caminho, mas essa pedra iria se transformar em madeira. O casamento de cinco anos tinha terminado. E também sua relação com a fotografia, que era seu ganha-pão há vários anos. Aprendera o ofício trabalhando no departamento de arte final de uma agência de publicidade, seu primeiro emprego formal, na virada dos 17 para os 18 anos, em Brasília, onde nasceu e vive até hoje. Depois de alguma errância, Elsio encontrou a redenção no talento manual da herança familiar. Foi o que permitiu que progredisse na seara artística. De cinco anos para cá, tornou-se um craque da marchetaria. Sua obra, que pôde ser vista até 2 de julho na exposição coletiva “Eu e o Meio Ambiente”, nas galerias do Senado, começa a ser conhecida nacionalmente. Em breve, também será apreciada na Europa, na vitrine das 82 lojas de departamento El Corte Inglés, distribuídas entre Espanha e Portugal. 18 arte em madeira / art in wood In the end of the last century, at age 30, Elsio Moriani found a rock on his path, but this rock would soon turn into wood. His five-year marriage was over, as well as his experience with photography, which had been his profession for many years. He had learned this craft while working in the artwork department of an advertising agency, his first formal job, between the ages of 17 and 18 in Brasília, where he was born and still lives. After some wandering, Elsio found redemption in the manual talent that runs in his family. This allowed him to progress in the artistic field. Throughout the last five years, he became an expert in marquetry. His work, having been displayed until July 2nd at the collective exhibition “Me and the Environment”, at the Senate galleries, started to gain national recognition. Soon, it will also be appreciated in Europe on 82 El Corte Inglés department stores, which spread between Spain and Portugal. De volta um pouquinho no tempo, a 1999. Sem o casamento e longe da fotografia, Elsio Moriani foi à luta. “Eu vivia uma situação meio sem rumo” – ele conta –. “Fiquei desempregado e fui pulando de emprego em emprego. Trabalhei no Senai aqui em Brasília, no Ministério do Trabalho e em outros lugares. Sei que não tenho dom para funcionário público”. Neto do marceneiro Mario Moriani – que tinha negócio próprio na Barra Funda em São Paulo e com quem conviveu um pouco na infância – e filho do também marceneiro e tapeceiro Walter Moriani, um pioneiro da Capital Federal que atendeu com seus serviços o Palácio do Planalto e o Itamaraty, o próprio Elsio chegou a trabalhar por seis meses, na adolescência, como auxiliar de marcenaria no então recém-criado Estado do Tocantins. Ele tinha, portanto, um background onde pudesse ancorar. A vontade de trabalhar por conta própria o levou a voltar os olhos para o artesanato. Em 2006, começou a fazer bijuterias, brincos e anéis, observando o trabalho de alguns artesãos e marcheteiros de Brasília. De ver fazer, aprendeu praticamente sozinho e procurou andar numa trilha que ele mesmo conseguisse abrir. Logo passou a criar “biojóias” – jóia feita com produtos naturais, como ele define – objetos e quadros decorativos que são mais propriamente esculturas em forma de painéis, compostas com tramas de pedaços de madeira talhada. “Pensava no meu pai, que era muito bom, um tremendo artista, e fui descobrir que tinha esse talento depois de velho”, diz Elsio. Ele se considera “um eterno aprendiz dessa área”. Para ele, a madeira é uma jóia que está ficando escassa na natureza, mas que, quando pode ser aproveitada, ou, na maioria das vezes, reaproveitada, torna-se ouro puro. Ele recolhe sobras de podas, galhos cortados de árvores velhas que ameaçam cair, e tudo mais que coleta Brasília afora, inclusive toras de mangueiras e abacateiros sacrificados na vizinhança. Leva para a pequena oficina, montada no pequeno terraço de fundos da casa onde vive sozinho, em Gama, madeira de demolição, portais, tacos jogados fora, pisos de madeira e verdadeiros tesouros que encontra na rua, no meio do caminho. Elsio demonstra uma intensa relação de afeto com a principal matéria-prima da atividade que hoje provê inteiramente seu sustento e o faz prosperar na vida. Para ele, toda madeira é boa, toda madeira é nobre, e algumas prendas que acha nas ruas são inesquecíveis, autênticos troféus. “Tenho que perder um pouco de tempo caçando essas madeiras. Outro dia, vindo da reunião de Let us go back in time a little, to 1999. With his marriage over and away from photography, Elsio Moriani decided to make a change. “I was living in a situation where I had no goals” – says Elsio –. “I was unemployed and kept going from job to job. I worked at Senai, here in Brasília, at the Ministry of Labor and other places. I know I have no talent to be a civil servant”. Being the grandson of carpenter Mario Moriani, who had his own business at Barra Funda, São Paulo and Elsio knew as a child – and the son of Walter Moriani, also a carpenter and a tapestry maker, a pioneer in the Federal capital, having provided his services to the Presidential Palace and the Ministry of Foreign Relations; Elsio himself worked for six months, during his teenage years, as a carpentry assistant in the recently created Tocantins State. Thus, he had a background which could provide him support. The desire to work for himself drove him to turn his attention handicraft. In 2006, he began making jewelry, earrings and rings, by watching the work of other artisans and marquetry makers in Brasília. He practically learned the craft by himself, only from watching, and started to seek his own signature path. He soon started creating “biojewelry” – jewelry made from natural materials, as he defines it – objects and decorative paintings which can be defined as panel-shaped sculptures, composed by weft and carved wood pieces. “I used to think of my father, who was very good, a tremendous artist, and I only discovered I had this talent at an older age”, says Elsio. He considers himself “an eternal apprentice in this area”. To him, wood is a jewel that is getting scarcer in nature, but when it’s used, or, most of the time, reused, turns into pure gold. He collects pruning remnants, branches cut from old, falling trees, and everything else available around Brasília, including logs from mango and avocado trees torn down along surrounding areas. He takes everything to his small workshop, set in a small terrace in the back of his house, where he lives alone, in the city of Gama; demolition wood, thrown away parquet floor tiles, hardwood floors and true treasures he finds on the street, on his path. Elsio shows an intense affection for the main raw material used in the activity that currently provides his living, and makes him prosper in life. To him, all lumber is good, all lumber is noble, and some treats he finds in the streets are unforgettable, authentic trophies. “I always need to put quite some time into hunting for wood. The other day, when I was returning from a meeting of the artisan arte em madeira / art in wood 19 uma associação de artesãos de que participo, vi uma cama de cerejeira, uma cama de casal inteira jogada fora. Para mim, isso é maravilhoso. É uma madeira linda. Provavelmente vai virar portajóias”, imagina. Os porta-jóias talhados são pequenas esculturas, com gavetas em formatos variados e desenhos sinuosos que lembram ora contorções vegetais do planalto central, ora bichos da fauna brasileira. Estão entre as peças de maior sucesso do seu catálogo e foram incluídas na encomenda do El Corte Inglês. Elsio também confecciona outros objetos de decoração utilitários, como fruteiras, bandejas, banquetas, além de brincos e anéis de grande aceitação. A madeira cortada é enriquecida com sementes e pedras – principalmente quartzo branco e verde, que recebe de um fornecedor de Cristalina, cidade vizinha no Estado de Goiás. Às vezes adiciona uma água marinha, raramente um toque de prata. Tal prática é a essência da marchetaria. Os painéis, ou esculturas chapadas, como ele explica essas obras, são criadas para ser dependurados na parede. As molduras ganham ricas composições de madeira recortada, com texturas e tons variados, sempre no colorido natural da matéria. O efeito harmonioso das tramas exprime o exercício criativo do artista. “Movimentos Geométricos”, “Janelas da Cidade”, “Cata-vento” são alguns dos títulos com os quais batiza esses trabalhos (podem ser visto em seu blog, no endereço http://artemoriani. blogspot.com/). As peças recebem uma camada de selador que o próprio Elsio prepara à base de cera de carnaúba ou de abelha, para conferir durabilidade. As obras são concebidas a partir do que a madeira encontrada sugere – quadro, porta-jóia ou bijuteria. Mas as ideias podem surgir a qualquer momento e lugar. “Ando sempre com uma agenda. A coisa acontece de repente”, descreve. “Estou dentro do ônibus e me vem a ideia de fazer alguma coisa. Vou e rabisco o que está na cabeça. Depois elaboro o desenho e vejo a viabilidade, se é possível produzir bastantes peças a partir daquele ideia”. Sabe que é preciso sempre apresentar novidades aos compradores e que se não fizer isso não vende. “Você é valorizado à medida que é capaz de colocar coisas novas na praça”, diz. 20 arte em madeira / art in wood association in which I take part, I saw a cherry wood bed, an entire double bed that had been thrown away. To me, that’s a wonderful thing. It is a beautiful type of wood. It will probably become a jewelry box”, he imagines. The carved jewelry boxes are small sculptures with drawers in several shapes and sinuous patterns that resemble the twisted vegetation of the central plateau and the animals of the Brazilian fauna. They are among the most admired pieces on his catalog and were also ordered by El Corte Inglés. Elsio also makes other utilitarian decor objects, such as fruit bowls, trays, stools and earrings and rings which are highly appreciated. The pieces of wood are enriched with seeds and stones – mostly white and green quartz sent by supplier form Cristalina, a neighboring city in the Goiás State. He sometimes adds an aquamarine and, rarely, a touch of silver. This practice is the essence of marquetry. The panels or plain sculptures, as he refers to these works, are made to be hung on walls. The frames are enhanced with cut wood compositions, with multiple textures and tones, always in the natural material colors. The harmonious effect of the frames expresses the artist’s creative efforts. “Geometric Movements”, “City Windows” and “Pinwheel” are some of the names he has given these works (which can be seen on his blog at http://artemoriani.blogspot.com/). T h e pieces receive a sealing layer, prepared by Elsio himself and based on carnaúba or beeswax, to grant durability. The works are conceived from what the collected wood suggests – flat sculptures, jewelry boxes, or imitation jewelry. But the ideas can arrive at anytime, anywhere. “I always carry a notebook. Things happen out of the blue”, he describes. “I’m on the bus, and the idea of doing something comes. I scribble what’s in my head. Then I elaborate the design and see if it is doable, if it is possible to make a piece from that idea”. He knows he needs to present new material to the buyers and that if he doesn’t, he won’t sell his products. “You are valued as long as you are capable of putting new things on the table”, he says. A marchetaria de Elsio frisa o sentido da palavra sustentabilidade e reflete um modo novo de ele encarar a vida. “Comecei a sentir a necessidade de mudar minha consciência com o trabalho de reaproveitamento. Mudei e continuo mudando, aprendendo a cada dia. É um processo. Isso me faz pensar no futuro que nossos filhos vão ver”, concebe. Elsio é pai de Henrique, de 15 anos, e Helena, que tem sete. Ele abriu uma empresa individual com suporte do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae); fora o apoio dessa instituição, lembra que teve uma ajuda da Secretaria do Trabalho do Distrito Federal no começo da nova carreira, uma ajuda financeira de R$ 2.000. Trabalha sozinho na pequena oficina em Gama – a dez minutos da região central de Brasília. Tem algumas poucas máquinas, duas serras, lixadeira e furadeira de bancada. Ali, produz ao todo, na média, mil unidades por mês, entre anéis, brincos, porta-jóias e outras peças. Os painéis demandam mais tempo, pelo menos um mês entre elaboração e acabamento. Às vezes, quando os pedidos apertam, contrata um ajudante diarista. A presença de Elsio na Feira Botânica, conhecida atração de Brasília dedicada a produtos sustentáveis, se reduziu a um comparecimento por mês. Aos poucos, está trocando o varejo pelo atacado. Tem clientes fixos entre os lojistas de Brasília e nos últimos dois anos começou a apresentar seu artesanato a lojas e butiques especializadas no país. Já viajou ao Ceará, Piauí, Rio de Janeiro, a São Paulo – onde participa do Salão do Turismo, que vai até 17 de julho, no Anhembi – e Minas Gerais. Elsio’s marquetry emphasizes the meaning of the word sustainability and reflects a new way of looking at life. “I started to feel the need of changing my conscience through my work with recycling. I changed and I keep changing, learning every day. It’s a process. It makes me think of the future our children will see”, he reflects. Elsio has two children, Henrique, age 15, and Helena, age 7. He started an individual business supported by Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas, Brazilian Service of Support to Micro and Small Businesses); besides this institutional support, he was also supported by the Department of Labor of the Brazilian Federal District in the beginning of this new career, receiving a financial aid of R$2,000.00. He works by himself at his small workshop in Gama – ten minutes away from Brasília’s central region. He owns a few machines, two saws, a sander and a bench drill. There he produces, on average, a thousand pieces a month, among earrings, rings, jewelry boxes and others. The panels demand more time, at least a month between development and finishing. Sometimes, when he has too many orders, he hires an assistant. Elsio’s presence at the Feira Botânica (Botanic Fair), a well-known attraction in Brasília dedicated to sustainable products, was reduced to one attendance per month. Little by little, he is changing from retail to wholesale. He has regular customers among Brasília’s shopkeepers and, in the last two years, he began to introduce his handicraft to specialty stores and boutiques throughout the country. He has been to the Ceará, Piauí, Rio de arte em madeira / art in wood 21 Já tem clientes no Rio e em São Paulo, de quem recebe pedidos por e-mail. A ampliação da escala de produção o levou a participar da rodada de negócios com executivos do El Corte Inglés, promovida no último dia 17 de maio, em Brasília. Elsio recebeu a encomenda de 600 peças – cem caixas porta-jóias, 200 brincos e 300 anéis. Na primeira semana de julho, quando falou com a “Brasil Feito a Mão”, ele aguardava a celebração final do contrato para iniciar a produção das peças, com entrega prevista para novembro deste ano; a assinatura do contrato agora vai permitir que ele trabalhe com tranqüilidade nos pedidos. Espera dar conta de confeccionar todas as unidades sozinho, com a aquisição de mais duas máquinas para a oficina, mas se precisar vai recorrer à ajuda necessária com a gente conhecida do bairro. A vida de produtor de arte sustentável de qualidade que descobriu deu a ele os rumos que procurava. Anda animado para cumprir o “batidão”, como se refere à jornada diária das 8h às 18h que mantém no ateliê-oficina. Para se aprimorar, espera conseguir se matricular em cursos de design industrial e de interiores. “Não sobrou grana para isso ainda”, ele explica. Até o fim do ano ele se casa pela segunda vez. 22 arte em madeira / art in wood Janeiro, São Paulo – where he attends the Salão do Turismo (Tourism Fair), which happens until July 17th, at Anhembi –, and Minas Gerais States. He already has clients in Rio and São Paulo who order his pieces via email. The expansion of the production scale led him to attend the round of negotiations with El Corte Inglés executives, held on May 17th, in Brasília. Elsio received an order of 600 pieces – 100 jewelry boxes, 200 earrings, and 300 rings. On the first week of July, when he spoke to the “Brasil feito a Mão”(“Handmade Brazil”) magazine, he was waiting for the final contract confirmation in order to begin producing the pieces, to be delivered in November; signing this contract will allow him to work calmly on his orders. He expects to produce all units by himself, after purchasing two new machines for the workshop, but if needed he will hire people from his own neighborhood. His newly discovered life as a sustainable art producer provided him with the goals he was looking for. He’s been enjoying his daily journey from 8 AM to 6 PM at the workshop. In order to improve his work, he seeks to enroll in industrial and interior design courses. “There is not enough money for that yet”, he explains. By the end of this year, he will be getting married for the second time. Mudança de vida e um salto de qualidade Life change and a quality leap Exportação muda patamar do artesanato com reciclados e tecidos de Thiago Silva Thiago Silva’s recycled product and fabric handicraft improves through exportation Antônio Siúves FOTOS / PHOTOS Martinez Fotografia POR /BY Dois acontecimentos mudaram a vida de Thiago Silva de um ano e meio para cá. Primeiro, ele tomou coragem para deixar um emprego estável, de funcionário administrativo concursado da Prefeitura de Lagoa Santa, para se dedicar integralmente ao artesanato. Logo em seguida, se viu diante de uma grande oportunidade inesperada, que não deixaria escapar. No começo de julho, havia dado os últimos passos para fechar um contrato de exportação com a rede de lojas de departamentos europeia El Corte Inglés e ver suas criações oferecidas a consumidores espanhóis e portugueses. Para isso, teve que redimensionar seu ateliê, o ReTHalho, e se preparar para os novos desafios, com o apoio do Instituto Centro de Capacitação e Apoio ao Empreendedor (Centro Cape). Thiago Silva has had two life changing events over the past year and a half. First, he took the courage to leave a steady job as a civil servant in Lagoa Santa in order to dedicate himself exclusively to handicraft. Next, he found himself facing a great, unexpected opportunity, which he wouldn’t miss. In early July, he completed the last steps to sign an export contract with the European department store El Corte Inglés and see his works offered to Portuguese and Spanish customers. In order to do so, he had to rescale his studio, called ReTHalho, and prepare for these new challenges with the support of Centro Cape (Centro de Capacitação e Apoio ao Empreendedor, Entrepreneurial Training and Support Center). tecidos e cores / fabrics and colours 23 Há seis anos, Thiago começou a fazer ecocarteiras – carteiras de dinheiro confeccionadas com embalagens de leite tetra-pak e forradas com tecido; hoje, produz 25 tipos de peças com material reciclado, retalhos e tecidos variados. Seus trabalhos incluem objetos de uso doméstico e decorativo, como anéis de guardanapos, quadros de recado, porta-chaves e vasos de flores. Logo, chamou atenção dos amigos e conquistou os primeiros clientes, mas o negócio ia devagar. “Não levava a coisa muito a sério, não conseguia atender às encomendas, era tudo meio confuso”, ele conta. Incentivado pelos sogros, com quem morava com a mulher e os dois filhos do casal, e com a colaboração de uma amiga, aos poucos se deixou convencer a apostar no próprio talento, talento que para ele ainda não era evidente. “Não tinha noção da minha capacidade de criação”, lembra. Depois de cinco anos no funcionalismo público municipal, resolveu dar uma guinada na vida. “Durante uma conversa, minha sogra me deu a ideia, por acreditar demais em mim, de eu largar tudo e investir nisso”, recorda Thiago. “Com a corda do pescoço”, como diz, custou a ceder, mas acabou por “meter as caras” no artesanato. Os sogros lhe emprestaram os primeiros recursos e ele então abriu o ReTHalho, ateliê que fica dentro de Lagoa Santa, no bairro Ovídio Guerra, a dez minutos do centro da cidade. O sucesso de Thiago acompanhou a expansão da Artessanta, feira de artesanato que acontece todo sábado, das 9h às 17h, na orla da lagoa que batiza o município da região metropolitana de Belo Horizonte, em Minas Gerais. Há mais ou menos três anos, apenas doces e panos de prato decorados eram vendidos no local, em meia dúzia de barraquinhas. A feira cresceu, recebe hoje 120 expositores e uma freguesia de bom poder aquisitivo. “Temos trabalhos deslumbrantes lá, e minha experiência é muito boa. Nossa clientela principal é formada por moradores dos condomínios de luxo ao redor de Lagoa Santa”, conta. 24 tecidos e cores / fabrics and colours Six years ago, Thiago started making ecowallets – wallets made from tetra-pak milk cartons and fabrics; nowadays, he produces 25 types of products with recycled material, different fabrics and patches. His work includes objects for domestic and decorative use such as napkin rings, note boards, key holders and flower vases. Soon, he caught the attention of his friends and conquered his first clients, but business was still slow. “I didn’t take it very seriously, I couldn’t deliver all the orders, it was all a little confusing”, he tells. Encouraged by his in-laws, with whom he lives along with his wife and two children, and with the help of a friend, he was eventually convinced to invest in his talent, which was still not evident to him. “I wasn’t aware of my own creation ability”, he remembers. After five years of municipal public service, he decided to take a serious turn in his life. “During a conversation with my mother-in-law, she suggested I should drop everything and invest in my handicraft, because she really believed in me”, Thiago remembers. “Having the rope on his neck”, as he says, he ended up giving in and finally decided to “dive into” his handicraft. His in-laws lent him the initial resources and he opened his studio, ReTHalho, at the Ovídio Guerra neighborhood, in the city of Lagoa Santa, ten minutes away from downtown. Thiago’s success followed the expansion of Artessanta, a handicraft fair held every Saturday, from 9 AM to 5 PM, by the lake after which this city was named, located in the metropolitan region of Belo Horizonte, Minas Gerais State, Brazil. Three years ago, only sweets and decorated dishcloths were sold, in only about half-dozen stands. The fair has grown and currently has 120 exhibitors, as well as customers with fine purchasing power. “We have marvelous works there, and my experience is very good. Our primary clientele is composed of people who live in luxury condos around Lagoa Santa”, he tells. e foi indicado para exibir sua produção em showroom montado no último Minas Trend Preview, realizado em Belo Horizonte no final de maio, especialmente para apreciação dos representantes da cadeia de lojas européia. O trabalho que realiza é cem por cento manual, qualidade que distingue seu artesanato. “Não uso máquina de costura porque não sei costurar. Hoje em dia tenho consciência da minha habilidade com as mãos e da minha facilidade para criar, que é um processo infinito, novas ideias sempre vêm”, garante. Além de tecido e embalagens tetra-pak, utiliza na confecção das peças perfis de madeira (MDF) e galhos de podas das árvores que são descartados em profusão na arborizada Lagoa Santa. Os vasos artificiais são feitos com esses galhos, que recebe folhas e flores recortadas em tecidos. Os quadros decorativos para quartos de crianças são feitos de madeira emoldurada com tecidos estampados e recebem motivos florais, pássaros e outros bichos. As caixinhas de leite, inicialmente usadas para a confecção das carteiras de dinheiro, foram adaptadas na criação dos nos anéis de guardanapos. A matéria-prima é obtida em casa – os dois filhos consomem uma doze caixas de leite a cada dez dias – e principalmente por meio de doações. “As pessoas me entregam sacolas cheias na feira, às vezes já limpas e abertas”, conta. Thiago está se preparando para começar a usar também garrafas pet no ateliê. Já tem um bom estoque limpo e cortado do material disponível no ateliê. A lida com matéria-prima reciclável é uma razão de ser da sua atividade. Está claro para o artesão que a produção sustentável agrega um valor social ao ofício que escolheu para ganhar a vida. “Isso é de extrema importância. Os benefícios não são só para mim, mas para meus filhos e para a cidade, com a expansão da consciência ambiental”, afirma. Foi por intermédio de duas amigas de Lagoa Santa, numa conversa durante um almoço, que Thiago soube da oportunidade de participar da seleção promovida pelo Centro Cape, em parceria com a Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), da mostra de artesanato a ser apresentada a uma missão de compradores do El Corte Inglés em visita ao Brasil. Incentivado, ele mandou fotos para os avaliadores do Centro Cape The work he creates is 100% manual, a distinguished quality mark. “I don’t use a sewing machine because I don’t know how to. Nowadays, I acknowledge my hand skills and my aptitude for creation, which is an infinite process, new ideas are always coming”, he assures. Besides fabric and tetra-pak packages, he also uses medium-density fiberboard (MDF) and pruned branches of trees in his production, all of which are abundantly found laying around Lagoa Santa. These branches are used in the making of artificial vases, also applied with trimmed leaves and flowers on fabrics. The decorative paintings for children’s rooms are made of framed wood and printed fabrics, displaying themes with flowers, birds and other animals. The milk cartons, initially used in the production of wallets, were adapted for the creation of napkin rings. The raw material is obtained at home – his two children consume a dozen milk cartons every ten days – and mostly from donations. “People bring me bags full of cartons, sometimes already clean and cut”, he tells. Thiago is also preparing in order to start using PET bottles at his studio. He already has a good clean and cut stock of available material. Dealing with recyclable raw materials is one of the reasons which fuel his work. This artisan clearly understands that sustainable production aggregates a social value to his profession of choice. “This is extremely important. The benefits are not just for me, but for my children and for the city, with the expansion of environmental conscience”, he says. It was through two friends from Lagoa Santa, in a conversation during lunch, that he heard of the opportunity to participate in Centro Cape’s selection, promoted in collaboration with Fiemg (Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais, Industry Federation of the Minas Gerais State), for a handicraft exhibition targeting a group of buyers from El Corte Inglés, who were visiting Brazil. Filled with encouragement, he sent pictures to the Centro Cape evaluators and was selected to display his products in a showroom at the last Minas Trend Preview, which took place in Belo Horizonte in the end of May, especially intended for the appreciation of this European chain store’s representatives. tecidos e cores / fabrics and colours 25 Os espanhóis gostaram do mostruário e, no caso do ReTHalho, demonstraram interesse especial pelos anéis de guardanapo, porta-chaves, quadro de recados, e quadros de decoração. Thiago então percebeu que a capacidade de produção do ateliê não era suficiente para satisfazer uma demanda de mais de cem peças por produto escolhido. Por enquanto, conta com apenas uma colaboradora a seu lado, a amiga Fabrícia Sá, cujo talento ele se orgulha de ter revelado. “Não estava preparado para aquilo, não imaginava essa realidade”, conta. Diante do gargalo, resolveu “correr atrás” de capacitação para reestruturar e criar condições de atender aos pedidos dos espanhóis. Thiago procurou o Centro Cape e ingressou no PQS (Programa de Qualidade Sustentável). O treinamento é dado em seu próprio ateliê, para onde se desloca um professor. Em cada etapa do PQS, o artesão aprende a se localizar na cadeia produtiva, definir custos financeiros e administrativos, os preços no atacado e varejo, e aprende a organizar o local de trabalho. Ao final é feita uma auditoria e o artesão aprovado recebe uma primeira remessa de selos de certificação IQS. No início de julho, Thiago tinha cumprido a segunda etapa do PQS, mas a reorganização do ReTHalho foi adiantada. Montou um mini showroom na casa e transformou o que era um quarto de entulhos num ateliê novinho em folha. “Agora, tenho um local preparado única e exclusivamente para trabalhar”, orgulha-se. E tem certeza de que seus clientes vão se surpreender quando virem as novas instalações. “O pessoal que chegar aqui vai cair para trás ao ver as mudanças”, garante. Em poucos meses, Thiago passou a conceber sua atividade sob nova perspectiva. “O treinamento dá uma segurança muito grande para a gente saber como trabalhar e negociar. Também aprendemos que se pode ganhar em escala diminuindo os preços e a ver se estamos ou não dentro das regras certas para fazer o dinheiro girar e o negócio crescer”, ele conta. 26 tecidos e cores / fabrics and colours The Spanish liked the products and, in the case of ReTHalho, demonstrated special interest in napkin rings, key holders, note boards and decorative paintings. Thiago then realized that his studio’s production capacity wasn’t enough to meet a demand of more than one hundred pieces of each chosen product. For now, he only has one collaborator, his friend Fabrícia Sá, whose talent he is proud to have revealed. “I wasn’t ready for that, I couldn’t imagine this reality”, he tells. Facing this bottleneck, he decided to “go after” the necessary qualifications in order to restructure and create conditions to meet the requests of the Spanish buyers. Thiago sought Centro Cape and enrolled in PQS (Programa de Qualidade Sustentável, Sustainable Quality Program). He receives training in his own studio, visited by a teacher. In each stage of PQS, the artisan learns to locate himself in the production chain, to define his financial and administrative costs, his retail and wholesale prices, and learns how to organize the workplace. At its conclusion, an audit is made and the approved artisan receives the first shipment of IQS certification labels. In the beginning of July, Thiago had completed the second stage of PQS, but the reorganization of ReTHalho was ahead of schedule. He set a mini showroom in his house and transformed what used to be a storeroom in a brand new studio. “Now, I have a place which is exclusively prepared for work”, he proudly states. And he is sure his customers are going to be surprised when they visit the new installations. “They are going to drop their jaws when they see the changes”, he assures. In only a few months, Thiago acquired a new perspective on his activity. “The training gives us the confidence of knowing how to work and negotiate. We also learn that we can gain in scale by lowering the price and seeing whether we are complying with the right rules to make the money flow and the business grow”, he says. Indagado sobre o que ganhou com o curso até aqui, ele responde que “mudou completamente” sua abordagem da atividade. Para começar, mudou a maneira de lidar com seus clientes e receber as pessoas no ateliê remontado. Também aprendeu que deve definir uma rotina saudável de trabalho e está se adaptando às orientações recebidas no PQS. “Trabalhava mais quando estava mais inspirado, desde a tarde até de madrugada, às vezes até as 4h. Estou me ajustando para ter um horário definido para também cuidar da saúde”, diz. Sua jornada atual no ateliê vai das 13h às 20h, em média, mas ele está se preparando para começar no período da manhã. Thiago espera exportar, em três meses, cerca de 2.000 peças para a rede El Corte Inglés. Os últimos formulários tinham sido enviados no final de junho e a assinatura do contrato deveria ocorrer em seguida. Ele já tinha pré-estabelecido a ampliação da estrutura do ateliê e o número de pessoas a contratar para cumprir o pedido dos europeus. Na hora de exportar os produtos ele vai contar com a experiência da Associação Mão de Minas para cuidar das etapas de emissão de documentos, preparação das peças, embalagem e despacho, em troca de uma percentagem das vendas. Com o trabalho realizado em novo padrão, Thiago estabelece padrões de qualidade mais apurados, com mais atenção ao acabamento. Ele se sente cheio de energia e extremamente estimulado. “Este foi o maior acontecimento desde que comecei a trabalhar com artesanato. São portas enormes que se abriram para mim”, festeja. E agrega outros benefícios que teve nos últimos meses, como o acolhimento da sua obra pelo Centro Cape, o programa de treinamento, e o fato de ter se associado à Mãos de Minas. Ao mesmo tempo, Thiago trabalha para consolidar o ReTHalho no novo patamar. Ainda este ano vai participar de uma feira nacional no Expominas. Ele e mais quatro artesões de Lagoa Santa vem se reunindo semanalmente para planejar a abertura de um galpão onde serão construídos ateliês de produção. Querem se preparar para aproveitar o fluxo de turistas esperado na região em 2014, durante a realização da Copa do Mundo. “Quero estabelecer um padrão de qualidade crescente para conquistar cada vez mais a confiança do comprador”, anuncia. When questioned about what he has gained through the course so far, he says “it completely changed” his approach to the activity. For starters, he changed the way he deals with the customers and receives people in his reorganized studio. He also learned that one must define a healthy work routine, and he is adapting to PQS orientations. “I used to work mainly when I was inspired, from the afternoon to late night, sometimes until 4 AM. I’m adjusting to a more defined schedule so I can take care of my health as well”, he says. His current journey at the studio usually starts at 1 PM and lasts until 8 PM, but he is preparing to start working mornings. Thiago hopes to export, in three months, about 2,000 pieces to the El Corte Inglés chain. The last forms were sent in the end of June and the contract signature should follow. He had already predetermined the expansion of his studio structure and the number of people to be hired in order to fulfill the European`s requests. During product exportation, he will count on the experience of Associação Mãos de Minas for handling document emission, piece preparation, packaging and shipping, in exchange for a percentage of sales. By performing his work through new criteria, Thiago establishes more accurate quality standards, giving more attention to the finishing process. He is very excited and full of energy. “This was the greatest happening ever since I started working with handicraft. These are huge doors that have opened for me”, he celebrates. He also mentions other attained benefits throughout the last months, such as Centro Cape taking in his work, the training program, and the fact he has become a member of Mãos de Minas. At the same time, Thiago works hard to consolidate ReTHalho on this new level. Yet this year, he is also going to participate in a national fair at Expominas. He and four artisans from Lagoa Santa have been meeting weekly to plan the opening of a common space where three production studios will be built. They want to be prepared for the flow of tourists expected in the region for 2014, during the World Cup. “I want to establish an increasing quality standard in order to keep on conquering the buyer’s trust”, he states. tecidos e cores / fabrics and colours 27 A saga de dona Marlene às margens do Rio Negro The journey of Mrs. Marlene by the shores of Rio Negro Matriarca lidera comunidade e produção de artesanato em Iranduba, no Amazonas Matriarch leads community and handicraft production in Iranduba, Amazonas Antônio Siúves FOTOS / PHOTOS Wilkerson Kuroki/Amazonastur POR /BY Dona Marlene Alves da Costa vive no povoado de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, em Lago do Acajatuba, município de Iranduba. A sua gente está separa por hora e meia de lancha de Manaus, no Amazonas. A comunidade é a maior da localidade ribeirinha do Rio Negro, com 230 moradores. Seus filhos, dois homens e quatro mulheres, se juntam a amigos organizados em torno da Associação de Artesanato Sustentável Grupo Japiim, formada por 30 pessoas sob a liderança e inspiração de dona Marlene. “O nome da associação é uma homenagem ao pássaro que tem aqui em frente a nossa casa, na beira do rio e que nunca nos abandona. Ele figura na nossa logomarca”, ela explica. Japiim, japim, xexéu nomeiam a mesma bela ave de plumagem preta e amarelo vivo, com variações de preto e vermelho, muito comum no Rio Negro. Mrs. Marlene Alves da Costa lives in the Nossa Senhora do Perpétuo Socorro village, in Lago de Acajatuba, within the Iranduba municipality. She is an hour and a half by motorboat away from her people, in the Amazonas State. The community is the largest riverside village of Rio Negro, with 230 residents. Her children, two men and four women, as well as some friends, are part of the Associação de Artesanato Sustentável Grupo Japiim (Japiim Group Sustainable Handicraft Association), composed by 30 people who are led and inspired by Mrs. Marlene. “The association’s name is a tribute to a type of bird that appears in front of our house and by the river banks, never abandoning us. He appears in our logo”, she explains. Japiim, japim, xexéu are names for the same beautiful bird which has black and bright yellow plumage, also varying from black to red and very common in Rio Negro. 28 dona marlene / mrs. marlene A família de dona Marlene se dedica ao artesanato há 26 anos. A mãe, descendente de índios bugre, trabalhava com cerâmica e tecidos; o pai português foi um conhecido carpinteiro que fabricava canoas e objetos em madeira. “A gente não estudou, não é? É tudo cultura mesmo”, diz a matriarca. Ela fala com orgulho da filha, Caroline Costa, design do grupo, e do filho mais velho, o escultor Nei Costa. “Ele é meu grande amigo, que trabalha comigo na administração da comunidade”, conta. Primeiro membro da família a viajar de avião, Nei foi este ano ao Rio de Janeiro para apresentar, por iniciativa da Empresa Estadual de Turismo do Amazonas – Amazonastur, os produtos de Acajatuba na feira Fashion Business. Os trabalhos também foram mostrados aos empresários da rede El Corte Inglés, com sede na Espanha, em rodada de negócios promovida pela Fundação Centro de Análise, Pesquisa e Inovação Tecnológica (Fucapi). A visita foi organizada em maio pela Agência Brasileira de Promoção de Exportações (Apex Brasil), em conjunto com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) e a Associação Brasileira de Exportação de Artesanato (Abexa). As peças encantaram os compradores da cadeia europeia. “Viram na feira de Manaus e vieram até aqui conhecer de perto tudo que temos na nossa loja. Gostaram do que viram e foram separando algumas coisas que acharam legais. O que eles pediram ainda não estava em nosso catálogo, mas já estamos incluindo”, conta. Colares, peixes, canoinhas Dona Marlene recebeu a encomenda de 4.000 peças, entre colares longos matizados – “eles ficaram fascinados com esses colares, que ficam muito bonitos nas mulheres”, comenta – miniaturas em madeira de peixes, colheres e canoinhas. Também fizeram sucesso os porta-pratos que podem ser usados em casa ou restaurantes. Ela esperava a confirmação do contrato para a última semana de julho. Acostumada a pelejar com obstáculos diários comuns a quem vive isolado em um povoado amazônico, dona Marlene não se abala nem um pouco com os percalços para fazer a primeira exportação do artesanato de Acajatuba. “Estamos lutando para desenrolar os papéis, pois é difícil nos comunicarmos com nossos fregueses”, ela diz. Ainda sem acesso à internet na localidade, dá graças pela linha telefônica de que dispõe. Fora isso, é pegar o barco até Manaus tantas vezes quanto for preciso. Mrs. Marlene’s family has been engaged in handicraft fo.r 26 years. Her mother, an Indigenous descendant, worked with ceramics and textiles; her Portuguese father was a popular carpenter who made canoes and wooden objects. “We didn’t study. It’s all in our culture, really”, says the matriarch. She proudly talks about her daughter, Caroline Costa, the group’s designer, and about her oldest son, the sculptor Nei Costa. “He is a great friend, who helps me managing the community”, she tells. The first family member to travel by airplane, Nei went to Rio de Janeiro this year in order to present products from Acajatuba, through an initiative of Amazonastur (Empresa Estadual de Turismo do Amazonas, Amazonas State Tourism Company), in the Fashion Business fair. The works were also shown to entrepreneurs from the El Córte Inglés chain, headquartered in Spain, in a round of negotiations promoted by Fucapi (Fundação Centro de Análise, Pesquisa e Inovação Tecnológica, Analysis, Research and Technological Innovation Center Foundation). This visit was organized in May by Apex-Brasil, the Brazilian Trade and Investment Promotion Agency, along with Sebrae, the Brazilian Service for Supporting Micro and Small Businesses, and Abexa, the Brazilian Handicraft Exportation Association. The European chain buyers were fascinated by the pieces. “They saw them at the fair in Manaus and came all the way here to see everything we have in our store. They liked what they saw and selected some of the things they found interesting. The products they ordered were not in our catalog yet, but we are including them now”, he tells. Necklaces, fish, little canoes Mrs. Marlene received an order of 4,000 pieces, including long, tinted necklaces – “they were fascinated by these necklaces, which look very beautiful in women,” she says – miniature wooden fish, spoons and little canoes. They were also attracted by the dish holders, which can be used at home or in restaurants. She was expecting the contract confirmation by the last week of July. Used to struggle with ordinary daily obstacles for those who live in isolated Amazonian villages, Mrs. Marlene is not at all intimidated by the challenges involved in the first exportation of Acajatuba’s handicraft. “We are struggling to solve all the paperwork, because it’s difficult to communicate with our customers”, she says. Without Internet access in the village, she is grateful for the available telephone line. Other dona marlene / mrs. marlene 29 Ao se concretizar, a exportação para El Corte Inglés vai trazer um novo alento para o grupo de artesãos de Lago do Acajatuba. “É um passo além que estamos dando, uma oportunidade muito boa para quem vive no meio do mato, na Amazônia” – celebra dona Marlene –. “Espero que mais pessoas venham sentir aqui nosso calor humano, que venham ver o trabalho, que é simples, feito por pessoas simples que vivem como podem graças à madeira. Espero que esse trabalho seja reconhecido”, ela diz, em sua fala de doce acento nortista. A madeira na beira do rio A associação Japiim também confecciona uma gama de bijuterias, brincos, pulseiras, colares e outras peças. Todo o trabalho é manual e sustentável, inclusive o processo de tingimento natural. “Aproveitamos restos de madeira, de árvores que caem e aparecem na beira do rio, mais na época da seca”, explica dona Marlene. As madeiras mais utilizadas são itapuba, pauari e pau-santo. “São as melhores que existem para esculpir e as mais durativas”, ela explica. O colorido do artesanato é obtido com pigmentos naturais por meio de um longo processamento da casca da cebola amarela, da borra de café, de algumas madeiras e do urucum. Depois de cozimento, filtragens e misturas se extraem as tonalidades rosas, amarelas, alaranjadas e vermelhas que decoram o artesanato. 30 dona marlene / mrs. marlene than that, she needs to get on the boat to Manaus as many times as necessary. When finished, the exportation to El Corte Inglés will bring a new hope to the group of artisans of Lago de Acajatuba. “It’s a big step we’re making, it’s a great opportunity for those who live in the middle of the forest, in Amazonia” – she celebrates –. “I hope more people come here to feel our warmth and see our simple work, carried out by simple people who manage to make their living thanks to the forest’s wood. I hope this work is recognized”, she says, in a speech filled with a sweet northern accent. The wood on the river banks The Japiim Association also makes a wide variety of jewelry, earrings, bracelets, necklaces and other pieces. All the work is manual and sustainable, including the process of natural dyeing. “We use wood branches which fall down from trees and appear on the river banks, around the dry season”, explains Mrs. Marlene. The most commonly wood types are itapuba, pauari, and pau-santo. “They are the best to sculpt and the most durable”, she explains. Their handicraft colors are obtained using natural pigments, obtained through a long processing of yellow onion skin, coffee grounds, woods and urucum (annatto). Once cooked, filtered and mixed, tones of pink, yellow, orange and red are extracted and used to decorate the pieces. Diante do futuro na reserva sustentável A consciência ecológica é dado permanente para quem habita o interior de uma reserva biológica, a RDS (Reserva de Desenvolvimento Sustentável) do Rio Negro, dedicada ao manejo e à subsistência das comunidades ribeirinhas. “Sabemos que se nós acabarmos com tudo hoje, amanhã não existirá nada. Estamos aprendendo a ver o futuro. Aqui, de tudo que se colhe, um pouco é deixado para a natureza”, se expressa dona Marlene. As bijuterias recebem detalhes em palha de tucumã e tucum e delicadas incrustações com sementes de morototó e açaí colhidas em capoeiras nas proximidades. Com vistas à exportação para Ele Corte Inglés, a associação contratou um laboratório para fazer a certificação dessas sementes. O controle de qualidade dá garantias ao comprador quanto à resistência dos produtos em outros climas e imunidade ao bolor e outras possibilidades de deterioração. Qualificação e suporte no lago A Associação de Artesanato Sustentável Grupo Japiim tem se aprimorado por meio de uma série de cursos e palestras oferecidos pela Amazonastur, entre os quais uma preparação ministrada pelo Grupo A G, de Brasília. Durante um mês, os artesãos receberam aulas de associativismo, manejo, tingimento natural e comercialização. “Aprendemos a estabelecer o preço e saber se estamos vendendo ou dando nossa mercadoria”, comenta dona Marlene. A empresa ofereceu representação e suporte à comunidade do Lago de Acajatuba em cinco feiras de artesanato organizadas nos Estados. “Estão cumprindo com a palavra e ainda correndo com nossos produtos por aí”, alegra-se. Em Acajatuba, dona Marlene é mais do que uma líder da associação de artesãos cujo núcleo é a própria família. A ela recorre todo o povoado para se aconselhar e pedir auxílio na hora de um aperto. “Minha rotina é corrida. Sou mulher de 24 horas. Toda comunicação dentro da comunidade é comigo”, ela diz por telefone, em meio a um sorriso. Há 28 anos comanda, como auxiliar técnica, o posto de saúde da localidade. A reportagem pergunta se sua função no posto é de enfermeira. A resposta é uma síntese do que pode uma mulher brasileira habitante da Região Amazônica: “Num interior desses, mano, a gente é parteira, médico, tudo. A gente faz de tudo ou os amigos morrem”. Facing the reservation future in a sustainable Environmental awareness is a permanent state for those who inhabit a biological reservation, the Rio Negro RSD (Reserva de Desenvolvimento Sustenvável, Sustainable Development Reservation), dedicated to the management and subsistence of riverside communities. “We know that if we use everything today, tomorrow there will be nothing. We are learning to see the future. Here, we always leave nature’s share among everything that’s gathered”, states Mrs. Marlene. The jewelry receives details in tucum and tucumã straw, as well as delicate inlays with morototó and açaí seeds which are collected nearby brushwood. Aiming to export to El Corte Inglés, the association hired a laboratory to perform the certification of these seeds. This quality control assures the buyer that the products will endure in other weather conditions, being immune to mold and other deterioration possibilities. Q ualification and support by the lake The Japiim Group Sustainable Handicraft Association has been improving itself through a series of courses and lectures offered by Amazonastur, including training offered by the A G Group, from Brasília. For a month, the artisans received classes on associations, management, marketing and natural dyeing. “We learned how to establish prices and to tell if we are selling or giving away our products”, Mrs. Marlene comments. The company offered representation and support to the community of Lago de Acajatuba for five handicraft fairs organized throughout the Brazilian States. “They are keeping their word and running around with our products”, she says with joy. In Acajatuba, Mrs. Marlene is more than just a leader of the artisan association, whose core is her own family. All the residents turn to her for advice and help when facing adversities. “My days are full. I’m a 24 hour woman. All communication in the community relies on me”, she says on the phone, with a smile. For 28 years, she has been in charge of the town’s health center as technical assistant. We asked her if she works as a nurse at the center. The answer is a synthesis of what a Brazilian woman inhabiting the Amazonia region can be: “In a place like this, man, we act as the midwife, the doctor, everything. We have to do everything or our friends die.” dona marlene / mrs. marlene 31 Artesanato Wariró está na mira Wariró handicraft in focus Catarina Pessoa, funcionária da Amazonastur, explica que a empresa de turismo selecionou trabalhos de artesãos do Amazonas para exposição em três feiras nacionais e duas internacionais. No Rio, a Fashion Business e a Bright; em São Paulo, a Paralela Gift. Representações também estiveram em Florença, na Itália, e em Lisboa, Portugal. A visita da comissão do El Corte Inglês à feira da Fucapi, em Manaus, parceira do projeto governamental “Artesanato Sustentável do Amazonas”, resultou na encomenda feita à Acajatuba, e num interesse especial pelo trabalho realizado por Gilda da Silva Barroso, de etnia baré, que também é gerente da Casa de Produtos Indígenas do Rio Negro – Wariró (FOIRN), em São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas. Da linha de produtos confeccionados por Gilda constam cerâmicas e cestarias trabalhadas com fibra de piaçava e tucum – uma palmeira da região –, desenvolvidos por meio de manejo florestal. Gilda também destaca as bolas batidas em novelo de tucum, bijuterias, cestinhas e samburás com tampa. Conforme o site da Oscip (0rganização Social de Interesse Público) Defender – Defesa Civil do Patrimônio Histórico, além de promover o comércio do artesanato indígena do Rio Negro de maneira justa, sem intermediação, a Wariró supervisiona o processo de retirada da matériaprima e a confecção do artesanato, com a finalidade de apoiar o desenvolvimento sustentável e a consciência ambiental dos povos indígenas. Os produtos da Wariró são comercializados na loja em São Gabriel da Cachoeira e podem ser encontrados em unidades redes Tok & Stok e Pão de Açúcar. Catarina Pessoa, an Amazonastur employee, explains that the tourism company selected works by artisans from Amazonas to be exhibited in three national fairs and two international fairs. Fashion Business and Bright, in Rio, and Paralela Gift, in São Paulo. They were also represented in Florence, Italy, and in Lisbon, Portugal. The visit of the El Corte Inglés commission to the Fucapi fair in Manaus, a partner of the “Sustainable Handicraft in Amazonas” government project, resulted in their Acajatuba product orders, as well as in special interests on works by Gilda da Silva Barroso, who belongs to the baré ethnicity and also manages the FOIRN (Rio Negro House of Indigenous Products – Wariró), in São Gabriel da Cachoeira, Amazonas State. Gilda’s product line is composed by ceramics, baskets decorated with piaçava and tucum fibers – a palm tree from the region –, and are developed using forest management efforts. Gilda also highlights the tucum balls, imitation jewelry, baskets and samburás with lids (a type of basket used by fishermen). According to the Defender Oscip website (a Public Interest Social Organization for Civil and Historical Patrimony Defense), besides promoting the commerce of Rio Negro’s indigenous handicraft in a just, intermediation-free manner, Wariró supervises raw material withdrawal and handicraft production processes in order to support the sustainable development and environmental awareness of the indigenous people. The Wariró products are sold at the store in São Gabriel da Cachoeira, and can be found in Tok & Stok and Pão de Açúcar chain stores. 32 dona marlene / mrs. marlene Uma cidade de Teares A city of looms Em Resende Costa (MG), artesanato é tradição familiar e atividade econômica consolidada In Resende Costa (Minas Gerais), handicraft is a family tradition and a consolidated economic activity. Regiane Marques Sampaio FOTOS / PHOTOS Fernando Chaves POR /BY Quando tinha 12 anos, Cícero Resende Chaves deixou de observar a mãe na arte do tear e passou também a transformar retalho de malha em tapetes, colchas e outros objetos de decoração. Hoje, é a filha mais velha do tecelão, de apenas 7 anos, que brinca de fazer crochê com a avó Tarcília Lindaura Chaves, 65. Na pequena Resende Costa, de 10 mil habitantes e vizinha das cidades históricas de São João del Rei e Tiradentes, onde para cada casa tem um tear, Cícero Chaves, atualmente com 32 anos, sustenta a família com o dinheiro ganho com o artesanato. “Como em 40% das moradias há pelo menos duas ou três máquinas, temos a mesma quantidade de casas e teares em Resende Costa”, diz Cícero Chaves, que também é presidente da Associação Empresarial e Turística de Resende Costa (Asseturc). When he was 12 years old, Cícero Resende Chaves stopped just watching his mother working at the loom and started transforming fabric remainders into mats, bedspreads, and other decoration objects. Today it’s the weaver’s elder daughter, of only 7 years old, who plays crocheting with her grandma, Tarcília Lindaura Chaves, 65. At the little Resende Costa, a 10 thousand inhabitant’s city close to the historical cities of São João del Rei and Tiradentes, where each house has a loom, Cícero Chaves, 32 years old, supports his family with the money made with handicraft. “As in 40% of dwellings there are at least two or three machines, we have the same quantity of houses and looms in Resende Costa”, says Cícero Chaves, who is also the president of the Business and Tourism Association of Resende Costa (Asseturc). cidade de teares / city of looms 33 O tear começou a gerar renda na região nos anos 60 e 70, na Comunidade de Pintos, onde a avó Tarcilia e outras tecedeiras produziam peças para vender. Mascates compravam as mercadorias e as vendiam pelo país, despertando o interesse de comerciantes pelas peças. O artesanato cresceu e se instalou em Resende Costa, sendo hoje a principal fonte de receita do município. Com o aumento do turismo em São João delRei e Tiradentes, no final dos anos 80, a população de Resende Costa passou a abrir lojas para expor os seus produtos. Hoje somam cerca de 80 estabelecimentos. Cícero Chaves inaugurou a sua loja na década de 1990, junto com sua irmã, Silvana. Com 600 metros quadrados, o espaço reúne o trabalho de cerca de 250 artesãos. “Uma peça pode ter a mão de dois, três ou mais pessoas; uma tece, outra pinta e assim por diante”, conta. No início da produção, era Cícero Chaves quem comprava a matériaprima e a entregava aos artesãos que trabalhavam para ele. Mas, com o aumento da demanda de mercadorias e também de pessoas trabalhando com o tear, os próprios artesãos passaram a comprar os fios e malhas para produzir as suas peças e, depois, entregá-las para Cícero Chaves e outros lojistas revenderem. Produção O processo de produção envolve várias fases e trabalhadores. Em Resende Costa, há lojistas que apenas comercializam os retalhos, comprados de malharias de Santa Catarina, Rio de Janeiro – principalmente de Petrópolis –, e de outros Estados. Na cidade, não há marceneiro que não saiba fazer um tear, e dificilmente encontra-se uma família que não tenha um tecelão. Não há livro nem escola para aprender a arte. Em Resende 34 cidade de teares / city of looms Looms began to generate income in the region in the 60’s and 70’s, in the Community of Pintos, where grandma Tarcília and other weavers would produce pieces for selling. Street vendors would buy them and sell them all over the country, calling the attention of merchants to the pieces. Handicraft increased and was established in Resende Costa, representing today the main source of income in the city. With the growth of tourism in São João del-Rei and Tiradentes, at the end of the 80’s the population of Resende Costa started opening small stores to display their products. Currently, there are around 80 shops. Cícero Chaves opened his shop in the 90’s. Now, featuring 600 square meters, the space gathers the work of approximately 250 artisans. “One piece may have been made by the hands of two, three or more people; one weavers, the other paints and so on”, he tells. At the beginning of the business, it was Cícero Chaves who used to buy raw material and deliver it to the artisans who worked for him. However, as the demand for products and number of people working at the looms increased, artisans themselves started buying the thread and fabric in order to produce their own pieces and delivering so that Cícero Chaves and other shop owners could resell them. Production Production process involves many stages and workers. In Resende Costa there are shop owners who sell only fabric pieces bought from fabric factories in Santa Catarina, Rio de Janeiro – mainly in Petrópolis –, and in other states. There is not, in the city, a single woodworker who cannot make a loom, and it is hard to find a family that does not have a loom. There are no books or schools to teach the craft. In Resende Costa to become a weaver is to watch someone weaving and then imitating the weave and the Costa, ser tecelão é ver alguém tecendo e, depois, imitar a trama e os movimentos. “Primeiro se faz um tapetinho, depois vai se aprimorando a técnica”, explica Cícero Chaves. Mas o que Resende Costa busca aprimorar agora é a infraestrutura para receber o turista. A oferta de restaurantes, bares e pousadas cresceu, mas a população demanda qualificação. “Temos uma história de trabalho individual, mas a cidade foi crescendo e estamos sendo muito mais do que um pólo de venda”, ressalta o presidente da Asseturc. No ano passado, a criação do Conselho Municipal de Turismo (Comtur) ofereceu suporte para o melhor atendimento aos turistas. Sustentabilidade Nem todo mundo que compra as peças sabe, mas os artesãos se orgulham de fazer artesanato com materiais que poderiam ir para o lixo. “Retalhos já significam descartes, mas quem vê nossas peças não enxerga a utilização de sobras ou resíduo”, conta Cícero Chaves. Outro motivo de satisfação é saber que cada trabalho é único, seja um pequeno tapete ou uma colcha. “Às vezes, vejo uma peça em um hotel de outra cidade ou até Estado e digo: ‘É da minha loja’. E quando confiro a etiqueta tenho a confirmação”, diz Cícero Chaves. O “tapetinho” é o carro-chefe do artesanato feito no tear. É a peça mais vendida aos turistas, aos visitantes em feiras e para os comerciantes do país e também do exterior. Esporadicamente, os lojistas de Resende Costa recebem encomenda de peças para o exterior, mas o forte é o mercado nacional. O valor agregado do produto dificulta a exportação, principalmente quando há concorrência de mercadorias similares de outros países. Esse foi um dos motivos, na avaliação do presidente da Asseturc, que inviabilizou a compra de peças pela rede de departamento El Corte Inglés, com sede na Espanha e Portugal. Uma comitiva visitou a cidade para conhecer o artesanato, no primeiro semestre deste ano, mas o valor da mercadoria e também problemas no cumprimento das exigências de exportação pelas empresas do setor têxtil, fornecedoras de matéria-prima, impossibilitaram a realização do negócio. “Todos os compradores são importantes, mas valorizo muito o mercado interno que hoje consome nossa oferta de peças”, declara Cícero Chaves. movements. “First your produce a little mat, then you go on improving the technique”, explains Cícero Chaves. But what Resende Costa seeks to improve, currently, is the infrastructure to receive tourists. The offer of restaurants, bars and inns has increased, but the population requires qualification. “We have a history of individual work, but the city evolved and now we represent much more than a purchase hub”, highlights the president of Asseturc. Last year, the creation of the City Council for Tourism (Comtur) offered support for better receiving tourists. Sustainability Nott everyone purchasing the pieces knows it, but the artisans take pride in making handicraft using materials that might end up in the trash can. “Fabric remainders would mean discard, but who sees our pieces does not see the reuse of remainders or waste”, says Cícero Chaves. Other reason of satisfaction is to know that each work is unique, be it a small mat or a bedspread. “Sometimes I see a piece in a hotel in another city or even in another state and I say: ‘It’s from store’. And when I check the tag I have the confirmation”, says Cícero Chaves. The “little mat” is the flagship of handicraft made on the loom. It is the best-selling piece to tourists, to exhibits visitors and to the traders in the country and abroad. Occasionally, the retailers of Resende Costa receive orders for delivers overseas, but its strength is in the domestic market. The product added value makes it difficult to export, mainly when they face the competition of similar products from other countries. This has been one of the reasons why the purchasing of pieces by the department store chain El Corte Inglés with head offices in Spain and Portugal is unfeasible, according to the president of Asseturc. The city received the visit of a commission in the first half of this year, intended to learn about the handicraft, but the price of the merchandise and some problems in complying with the demands for exporting by the companies in the textile industry and raw material suppliers made business impracticable. “All markets are important, but I appreciate the domestic market very much, as it is the one that absorbs our offer of pieces”, states Cícero Chaves. cidade de teares / city of looms 35 Artesanato de Pernambuco PEDE PASSAGEM Handicraft from Pernambuco makes way Negociações com El Corte Inglés não avançaram, mas associações e cooperativas estão prontas para atender à demanda internacional Negotiations with El Corte Ingles have not advanced, but associations and cooperatives are ready to meet international demand Carlos Moreira FOTOS / PHOTOS Divulgação POR /BY Sergia Almeida é uma mulher disposta a mover céus e terra, a lutar contra tudo e contra todos, desde que seja na defesa e divulgação do artesanato do Estado de Pernambuco. Gestora do braço local do Instituto Cearense de Artesanato, ela quer um lugar ao sol para as duas cooperativas e 20 associações de artesãos que representa. Para tanto, ela aposta na qualidade e capacidade de produção de seus associados e, claro, na beleza, originalidade e diversidade das peças que eles fabricam tanto nas cidades quanto nos mais remotos lugarejos do sertão. A diversidade é realmente grande. O portfólio representado por Sergia inclui trabalhos em tecelagem, como mantas, redes, passadeiras e Sergia Almeida is a woman that is willing to move mountains, to fight whatever gets on her way, as long as it is to defend and promote arts and crafts in the region of the State of Pernambuco. A manager to the local branch of the Cearense Handicraft Institute, she wants a place in the sun for the two cooperatives and 20 artisans associations she represents. For that, she trusts the quality and production capability of her associates and, of course, the beauty, originality and diversity of the pieces manufactured both in the cities and in the most remote villages in the sertão. Diversity is really great. The portfolio represented by Sergia includes weaving works such as bedspreads, hammocks, mats and rugs; 36 abrindo passagem / making the way tapetes; bordados nos mais diversos pontos; renda renascença, filé e richelieu; cerâmica figurativa (santos, homens, mulheres e animais); toalhas de crochê, trabalhos em fibra, almofadas e diversos outros produtos. “O que quiserem comprar, aqui tem”, assegura a gestora do ICA em Pernambuco. Com carreira profissional construída na área de vendas, Sergia se mostra até ansiosa para impulsionar as vendas de seus associados. Além da motivação comercial, ela quer rentabilizar e viabilizar o trabalho dos artesãos como uma forma de preservação das tradições culturais da região. “Eu não vendo produtos. Eu trabalho é com a história de pessoas da zona rural, principalmente mulheres, que precisam de apoio para dar continuidade ao seu trabalho, porque os filhos e netos dessas pessoas já não querem aprender o artesanato e, sem esse apoio, a tradição vai acabar”, alerta. Logicamente, boas vendas e projeção são atrativos importantes para que as crianças se interessem por ofícios e técnicas que vem se perpetuando por gerações e gerações de famílias artesãs. N o grupo de Sergia, estão reunidas mais de 40 comunidades espalhadas pelo sertão, agreste e zonas da Mata Sul e Norte de Pernambuco. “São pessoas que já nasceram fazendo isso. Temos uma associação, por exemplo, que produz rendas dentro de uma tribo indígena”, exemplifica. Uma das formas de apoio, segundo a gestora, é o investimento na capacitação dos artesãos. Entre seus representados, diz, o esforço próprio dos artesãos já trouxe melhorias na gestão do trabalho, o que inclui a capacidade de produção, negociações com preços justos e o afastamento da figura do atravessador – aquele intermediário interessado exclusivamente no lucro, com interferências negativas na qualidade do produto e no rendimento financeiro do trabalho. Outro ponto importante, segundo Sergia, é o trabalho de divulgação do artesanato nos mercados interno e externo. A carência de recursos produz poucos resultados, mesmo quando há o investimento na participação em eventos no exterior. “A gente vai a feiras em Madri, Frankfurt ou Paris, mas fica em um stand pobre e acanhado. A China monta um galpão, mostra tudo o que tem e consegue um volume muito maior de negócios”, exemplifica. Por tudo isso, Sergia encarou a rodada de negócio com a rede El Corte Inglés como uma oportunidade única de mostrar o artesanato de Pernambuco e fechar vendas de grandes volumes, embroidery in the most varied stitches; renaissance lace, filet and Richelieu; illustrated pottery (saints, men, women and animals); crochet towels, works in fiber, cushions and several other products. “Whatever you want to buy, it is here”, ensures the ICA manager, in Pernambuco. With a professional career built in the area of sales, Sergia is eager to propel the associates’ sales. Besides commercial motivation, she wants to make the artisans works profitable and feasible as a way to preserve the cultural traditions in the region. “I don’t sell products. I work with the history of these people in rural areas, mainly women, who need support to give continuity to their work, as the sons and grandsons of these people do not want to learn the craft and, without this support, tradition is going to die”, she warns. Obviously, good sales and projection are important attractions to make children interested in the craft and techniques that are passed from generation to generation of artisans’ families. In Sergia’s group there are over 40 communities scattered along the sertao, agreste and zona da mata in the South and North of Pernambuco. “These are people who do that from berth. We have an association, for example, that produces laces from inside an indigenous tribe”, she explains. One of the ways of support, according to the manager, is the investment in the qualification of artisans. Among her represented ones the efforts of artisans themselves have already brought improvement in the management of work, which includes production capability, negotiations with fair prices and the step out of the intermediary figure – that intermediary interested exclusively in the profit, with negative interference in the product quality and in the financial gains of the work. Another important point, according to Sergia, is the work of promotion of handicraft in the domestic and external market. The scarcity of resources produces a few results, even when there is no investment in the participation in international events. “We go to exhibits in Madrid, Frankfurt or Paris, but stay in a rustic and shy booth. China puts together a warehouse, displays everything they have and obtain a much higher business volume”, she explains. For all that, Sergia sees the business session with the El Corte Inglés chain as a unique opportunity to show handicraft from Pernambuco and close large abrindo passagem / making the way 37 garantindo atividade e renda para seu pessoal. “Seria uma vitória fora do comum, uma chance de decolar”, resume. “A compradora ficou muito impressionada com o produto e dei a ela a garantia de produção e entrega. Disse que o que ela quisesse, na quantidade que fosse, estaria embarcando no porto em novembro, que é o prazo para despachar as mercadorias”, conta. De acordo com gestora, as associações, individualmente, não teriam condições de atender grandes pedidos em prazos curtos, mas bastaria que ela distribuísse os pedidos pelas diversas comunidades para que os volumes fossem alcançados. Ou seja, era só uma questão de gerir corretamente a encomenda. Apesar de não ter conseguido concretizar negócios com a rede européia, Sergia não pretende desistir e seguirá em busca de contatos com compradores de grande porte. Hoje, os grupos de tecelagem já colocam seus produtos nas lojas da Tok Stok (mobiliário e decoração), Pão de Açúcar (hipermercados) e em pequenos varejistas da Itália. A comercialização no mercado regional já está consolidada, com showroom e vendas voltadas para turistas que visitam Pernambuco e para a população local. O que Sergia quer são voos maiores e conquistar mais respeito e admiração para o artesanato e os artesãos. Paixão imediata Apesar de representar pessoas que sustentam longas tradições culturais com o seu trabalho manual, a relação de Sergia com o artesanato é relativamente recente. Como dito anteriormente, ela fez carreira profissional na área de vendas e foi justamente isso que possibilitou um contato mais próximo com o setor. Em 2003, ela foi convidada pelo Sindicato dos Artesãos de Pernambuco para cuidar da parte comercial de um projeto que pretendia levar a produção local para pontos de venda nos Estados Unidos. O projeto não foi levado adiante, mas Sergia já havia sido contaminada pelo “vírus” do artesanato. Interessada pelo setor e pelas pessoas nele envolvidas, ela prosseguiu no trabalho de pesquisa e prospecção de entidades que ela pudesse representar comercialmente. A partir daí, ela acumulou um grande conhecimento da artesania pernambucana e desenvolveu uma relação afetiva com a produção local, como fica evidente em sua fala emocionada e aguerrida na defesa dos valores e da arte daqueles que representa. 38 abrindo passagem / making the way volume deals, ensuring the work and income to her people. “It would be an unprecedented victory, a chance to take over”, she summarizes. “The buyer was very impressed by the product, and then I gave her warranties of the product and delivery. I said that whatever she wanted, no matter what quantity, would be shipped from the port in November, that is the deadline to ship the goods”, says she. According to the manager the associations, individually, would not be able to cope with large orders within short periods, but it only takes dividing the order among the several communities and the quantities would be reached. That is, it is just a matter of properly managing the order. Although business have not been closed with the European chain, giving up is not in Sergia’s plans and she continues seeking contact with large scale buyers. Today, weaving groups can already place their products at the Tok Stok stores (furniture and decoration), Pão de Açúcar (hypermarkets) and at small retailers in Italy. Commercialization in the regional market is already consolidated, with showroom and sales turned to tourists who visit Pernambuco and to local population. What Sergia wants is to go farther and win more respect and admiration to handicraft and artisans. Passion at first sight In spite of representing people that carry long cultural traditions through their manual work, the relation of Sergia with handicraft is fairly recent. As previously said, she built a professional career in the sales area and that is what made possible a closer contact with the sector. In 2003, she was invited by the Union of Artisans of Pernambuco to take care of the commercial part of a project that intended to take local production to purchase points in the United States. The project was not carried on, but Sergia has already been contaminated by the “virus” of handicraft. Interested in the sector and in the people involved in it, she carried out the research and prospection works for entities she could represent, commercially. From there, she has accumulated great knowledge on handicraft from Pernambuco and developed an affection relationship with the local production, as it becomes evident in her emotional and brave speech in the defense of the values and art of those represented by her. In 2007 she met Benedito Monteiro, a.k.a. Sumé, founder of the Cearense Institute of Handicraft that invited her to be the manager of the entity’s branch in Pernambuco, where it still is. Em 2007, ela conheceu Benedito Monteiro, o Sumé, fundador do Instituto Cearense de Artesanato, que a convidou para ser a gestora do braço da entidade em Pernambuco, onde está até hoje. Nesse processo, Sergia acabou por criar uma linha de produtos própria em confecção e pretende trabalhar também com reciclados. Ela comercializa vestimentas para os praticantes da religião afrobrasileira do Candomblé e se orgulha da qualidade de seus produtos. “Eu faço axó (roupa ritual) só com percal, linho e renda richelieu de primeira qualidade. Eu vendo richelieu até para o Barack Obama, e a Michelle vai usar”, diverte-se. Para quem não conhece, as roupas do Candomblé são ricas em rendas e bordados, com cores específicas para cada orixá. Ela usa seu próprio caso, inclusive, para falar sobre a questão da qualidade no artesanato. Muitos, diz, fazem o axó com morim, um tecido mais barato e que perde o caimento depois de lavado. Da mesma forma, há quem produza o artesanato típico da região com materiais inadequados ou de baixa qualidade, seja por opção ou como reflexo de distorções do mercado e da perda da identidade cultural. Para quem se interessa pela qualidade e beleza das peças pernambucanas, porém, ela garante que entrega qualidade, preço e quantidade. Fica feito o convite. In this process, Sergia ended up by creating her own products line in weaving and she also intends to work with recycled materials. She sells outfits to practitioners of the Candomble, an Afro-Brazilian religion, and is proud of the quality of her products. “I make axó (a spiritual outfit) using only percale, linen and first quality Richelieu lace. I could sell Richelieu even to Barack Obama, and Michelle would wear it”, says she, amused. For those not familiar with it, Candomble outfits are rich in laces and embroidery, with specific colors to each orixá. She even uses her own case to talk about the issue quality in handicraft. Many people make axó using a cheaper and finer cotton fabric that loses fitting after it is washed. Likewise, there are people who produce typical handicraft of the region using improper or low quality materials, either as an option or a reflection from market distortions and from the loss of cultural identity. To those interested in the quality and beauty of the pieces from Pernambuco, however, she warrants she delivers quality, price and quantity. The invitation has been made. abrindo passagem / making the way 39 Entrevista / Interview Ronaldo Fraga Estilista de moda e proprietário da grife Ronaldo Fraga Fashion designer and owner of the brand Ronaldo Fraga Carlos Moreira FOTOS / PHOTOS Alexandre Mota POR /BY Ronaldo Fraga é um dos estilistas de moda mais respeitados do Brasil, atualmente. Embora seja formado pelo curso de estilismo da Universidade Federal de Minas Gerais, com pós-graduação na Parson’s School of Design de Nova York e pela Saint Martins School (Londres), a marca de seu trabalho não vem do banco da escola ou dos ateliês de alta costura, mas de uma profunda relação com a cultura brasileira e da observação das pessoas, dos contextos e da história de seu tempo. Ronaldo gosta de dizer que descobriu seu caminho ainda em seu primeiro emprego em uma loja de tecidos. Lá, ainda inexperiente, foi contratado para desenhar roupas para as mulheres que visitavam o estabelecimento. Da conversa com elas, quando buscava entender desejos e a relação de cada uma com a roupa, ele percebeu seu gosto e necessidade de entender os indivíduos e seu mundo, de enxergar as transformações culturais e incorporar tudo isso a seu trabalho. Em sua trajetória, Fraga passou pelo desafio de criar sua própria marca, produzir, vender e distribuir, mas sem perder sua identidade e o prazer pelo desenho. Ou seja, um caminho muito similar ao trilhado por quem se dedica ao artesanato. O estilista, aliás, tem relação íntima com o artesanato, tanto na participação em projetos de capacitação e geração de renda, quanto na incorporação de elementos genuínos da cultura brasileira a suas coleções, caso de um grupo de bordadeiras de Passira (PE), com quem desenvolveu um trabalho e que se tornaram fornecedores de sua grife. Confira. Ronaldo Fraga is one of the most respected fashion designers in Brazil, currently. Although he holds a fashion designer degree by the Federal University of Minas Gerais, with specialization by the Parson’s School of Design New York and by the Saint Martin’s School (London), the trade mark of his work does not come from a school bench or from couture ateliers, but from a deep relationship with Brazilian culture and from the observation of people, of contexts and of his contemporary history. Ronaldo likes to say he discovered his path right in his first job, in a fabric store. There, still inexperienced, he was hired to design clothes to women who visited the store. From conversations with them, while he tried to understand desires and the relationship of each one with the outfit, he started observing his taste and the need to understand individuals and their world, the need to see cultural transformations and incorporating everything to his work. During his journey, Fraga faced the challenge of creating, producing, selling and distributing his own brand, without losing his identity and pleasure of drawing, that is, a path very similar to the one followed by those who are dedicated to handicraft. By the way, the designer has a close relationship with handicraft, both participating in projects of qualification and income generation and in the incorporation of genuine elements of the Brazilian culture to his collections, which was the case of a group of embroiderers from Passira (PE), with whom he developed a work and became suppliers to his brand. Check it out. 40 entrevista / interview Do ponto de vista industrial, quando você começou a lançar suas coleções e teve que vendê-las, teve que produzir. O que você encarou nesse momento? Ronaldo Fraga – É difícil, a mesma coisa até hoje. É produção e distribuição. Tudo que eu produzo, eu vendo. O negócio é que eu fico segurando a marca para não crescer demais, por questões óbvias. Hoje, no Brasil, a gente está passando por uma situação em que a pequena e a micro empresa, na forma que está indo, estão com os anos contados, assim como a indústria têxtil brasileira. É caro produzir no Brasil. É mais negócio ter uma marca no Brasil e produzir na China. Isso é o mais barato, o mais viável. Então, desde que eu comecei, meu problema nunca foi venda, foi produção. É o grande gargalo. É a produção e, depois, a distribuição. E qual dos dois aspectos é mais desafiador, produzir ou distribuir? Ronaldo – A produção é mais porque você não cuida da distribuição daquilo que não se produz. Você tem que ter capacidade de produção. Tem um ano que estamos aqui (na confecção atual) e este galpão já está pequeno. Teremos que alugar o galpão ao lado, que é uma coisa que eu não queria. Não quero ser industrial, não quero ser empresário. From an industrial point of view, at the moment you started launching your collections and selling them, you had to produce.What challenges did you have to face, then? Ronaldo Fraga – It is hard, the same difficulties of today. It is production and distribution. Everything I produce I sell. Thing is, I keep holding the brand so it will not grow too much, for obvious reasons. Today, in Brazil, we are going through a situation in which small and micro enterprises, seeing the current conditions, have their days numbered, as well as the Brazilian textiles industry. It is expensive to produce in Brazil. It is more advantageous having a brand in Brazil and producing in China. This is the cheapest and most feasible. Thus, since I started, my problem has never been sales, but production. It is the biggest bottleneck. It is production and, then, distribution. And which of the two aspects is the most challenging one, producing or distributing? Ronaldo – Production is the biggest, because it is impossible to distribute what you have not produced. One has to have production capacity. We have been here for year (at the current atelier) entrevista / interview 41 Quero continuar viajando, quero ir para o interior do Brasil, quero continuar desenvolvendo projetos com comunidades, quero continuar fazendo figurino para cinema e televisão... E como você lida com esses opostos, com o seu prazer pela pesquisa e pela criação em oposição às demandas de ser empresário, de responder por uma marca, empregos e ações de mercado. Como você compara isso com a atividade do artesão? Ronaldo – Primeiro, o que me oxigena? É o que sempre me oxigenou, eu preciso entrar nesses universos para continuar fazendo o que eu faço. Não posso ficar enfiado dentro dessa confecção. Segundo, a história do artesanato... Eu não conheço ninguém que tenha se envolvido com artesanato por questão econômica. Quem entrou com vontade de ganhar dinheiro, simplesmente, não ficou muito tempo, porque a relação com o artesanato, antes de qualquer coisa, ela parte de um ponto que é visão de mundo, que é se emocionar por uma cultura brasileira, por uma cara brasileira feita à mão. E acreditar que isso não só pode como deve ser viabilizado para que não morra. Muito mais que uma coisa econômica, que o artesão produz ou não para venda, tem um caráter antropológico. Imagine o quanto a perda de um ponto de bordado no artesanato é um desastre cultural sem retorno. Sua consistência não é que você tem um traço característico, uma regularidade. É que tudo que você faz tem uma pesquisa, um tema, um envolvimento. Ronaldo – É verdade. E por que isso? Porque é um lugar de conforto para mim, eu escolhi fazer isso. Então, se eu tivesse, no meio do caminho, sido arquiteto ou qualquer outra coisa, certamente eu teria levado isso para minha história. O meu grande prazer é a pesquisa, é agora, neste momento, definir o meu objeto de trabalho para os próximos seis meses, porque ele vai me trazer um universo que não conheço, uma leitura de assuntos que eu não conheço e que provavelmente vai entrar no meu trabalho para não sair mais. 42 entrevista / interview and the warehouse is already becoming small. We have to rent the neighbor warehouse, which is something I would not like. I do not want to go industrial; I do not want to be a businessman. I want to continue traveling, going to small cities in Brazil, I want to continue developing projects with communities; I want to go on making costumes to films and television... And how do you deal with these opposites, with your taste for research and creation as opposed to the demands of being a businessman, of responding for a brand, jobs and market share. How do you compare that with the activity of an artisan? Ronaldo – Firstly, what drives me? Is what has always driven me; I need to be in these spheres to continue doing what I do. I cannot be locked inside this atelier. Secondly, the history of handicraft... I do not know anyone who has get involved with handicraft for economic reasons. Those who entered aiming to make money simply did not stay long, because the relationship with handicraft, before anything, starts from a point that is a vision of world, that is getting emotionally involved with the Brazilian culture, with a face behind something hand-made. And believing it can and must be made feasible so it will not die. Beyond an economic thing that artisans produce destined to be sold or not, it presents an anthropological character. Imagine how disastrous, beyond fixing, is it missing a stitch in the handicraft cultural embroidery. Your consistency is not translated into a characteristic aspect, into regularity. It is the research that is behind everything that you do, a theme, involvement. Ronaldo – That is true. And why is that? Because it is my comfort zone, I have chosen to do that. If I had chosen, in the middle of way, to become an architect or any other thing, I certainly would have taken that to my history. My biggest pleasure is research, it is now, at this moment, to define my goals of work for the next six months, because it going to bring me a universe that is unknown to me, a reading of subjects I do not know and that will probably enter my work to never leave again. Conte-nos sobre o trabalho com artesãos, tanto no que diz respeito à incorporação do artesanato a sua arte, quanto no envolvimento com a troca de experiências e projetos de geração de emprego e renda. Ronaldo – A relação com estes ofícios – uso essa palavra porque eles são bem diversos – já é longa. Eu trabalhei por dois anos em São Borja, na divisa do Rio Grande do Sul com a Argentina, com artesanato de crina de cavalo e lã. Um ano e meio com um grupo de couro de peixe no Pantanal; de bordado cheio e bordado labirinto na Paraíba e grupo de renda renascença na divisa da Paraíba com Pernambuco. Em Minas, também, lá na cidade de Salinas. Como tudo e todo objeto de pesquisa das minhas coleções, esses ofícios entram na minha vida, no meu trabalho, para não sair mais. De alguma forma, eles estão ali. De uma forma mais clara e explícita em algumas coleções ou mais implícita em outras. O bordado e o feito à mão sempre se fazem presente nas minhas coleções. Da mesma forma que eu vou definir os tecidos e a estamparia da próxima estação, eu defino também os bordados e que grupo vai fazer isso. Então, na maioria das vezes eu nem divulgo, porque isso para mim já é absolutamente natural. Eu acho que é legal quando você chega nesse ponto, nesse tipo de relação. Por exemplo, tem um grupo de Itabira com o qual trabalho desde 2005, na coleção dedicada ao Carlos Drummond de Andrade. Hoje, ele é fornecedor como outro qualquer. Um fornecedor com quem eu brigo para poder entregar, e brigamos por causa de preço. Não tem essa relação paternalista. Tell us about the work with artisans, both regarding the respect to the incorporation of handicraft to your art and in the involvement with the expertise exchange and projects of generation of jobs and income. Ronaldo – The relationship with these crafts – I use this word because they are very different – is long. I worked for two years in São Borja, at the border between Rio Grande do Sul and Argentina, with horse mane and wool handicraft. A year and a half with a fish skin group in Pantanal; of full embroidery and labyrinth embroidery in Paraíba and a group of renaissance lace in the border between Paraíba and Pernambuco. Also in Minas, in the city of Salinas. As everything and every object of research in my collection, these craft enter my life and my work not to ever leave again. Somehow, they will be there. In a more clear and explicit way in some collections or more implicit in others. Embroidery and hand-made items have always been present in my collections. The same way I am going to define fabrics and patterns for the nest season, I also define the embroidery and the group who is going to make it. So, most of times, I do not even disclose it, as for me it is absolutely natural. I think it is nice when you reach this point, in this type of relationship. For example, there is a group from Itabira with whom I have worked since 2005, in the collection dedicated to Carlos Drummond de Andrade. Today, they are a supplier just like any other. A supplier with whom there is struggle for delivery, there is struggle for price. There is no paternalist relationship. E qual o seu critério para incorporar o artesanato ao seu trabalho? Como garantir que haja geração de renda e preservação da atividade? And what are your criteria to incorporate handicraft to your work? How to ensure there is income generation and preservation of the activity? Ronaldo – Eu sempre fiz esse tipo de trabalho com artesãos, mas pouquíssimos deles eu trouxe para o meu trabalho, para a minha marca, porque eu sempre tive muito pudor com relação a isso. Eu coordenava o trabalho, as artesãs desenvolviam uma coleção, um produto, que era lançado numa feira tal e elas usavam meu nome para poder vender. E eu sempre vi essa dificuldade de ponto de venda. As pessoas iam para a feira, faziam o maior sucesso, vendiam rápido. Mas depois o comprador Ronaldo – I have always done this type of work with artisans, but not all these groups, only a few of them, I have brought to my work, to my brand, because I have always been very timid in this regard. I coordinated the work, artisans developed a collection, a product that was launched in a given fair and they used my name in order to sell. And I have always seen this difficulty in the purchase point. People would go to the fair, make successful sales, and sell very quickly. But then buyers could entrevista / interview 43 não conseguia encontrar o grupo de novo, o telefone estava cortado, o envio da encomenda é caríssimo. Enfim, nada para facilitar e tudo para dificultar. Com as bordadeiras de Passira (PE), eu pensei “tenho uma pontos de venda, tenho acesso, tenho que trazer isso para dentro da minha loja. Então, a partir da coleção “Turista Aprendiz” (verão 2010/2011), todas as minhas peças têm uma etiqueta com o nome da bordadeira, em que comunidade foi feita peça e o contato delas. Esse grupo de Passira, por exemplo: tem empresas de enxoval de luxo de São Paulo, de cama, mesa e banho, de acessórios, que, através desse contato, chegou diretamente a elas. No trabalho com os artesãos, tanto entre os que você desenvolve coleções, quanto os que você agrega como fornecedores, o que você percebe como dificuldades e desafios? Ronaldo – Tem uma coisa que é difícil em qualquer processo industrial ou empresarial, que é a gestão. Gestão de produção e de pessoal é uma coisa difícil não para os artesãos, mas para todo mundo. Então, pegar esse talento, a alma genuína desse produto, aparar arestas para que isso chegue a um determinado público que se quer atingir e coordenar de forma redonda toda essa produção não é uma coisa fácil. Se pouquíssimos têm condições para ser um estilista ou designer, menos ainda para ser um administrador, um gestor. Esse é um grande problema: gestão e organização de todo o processo de produção. E o que acontece com seus fornecedores? Há esses problemas? Ronaldo – Vou dar um exemplo. Hoje, o Brasil não produz linho. Se quiser um linho de qualidade, tem que importar. Em uma coleção, comprei o linho branco, cortei as peças e mandei para as bordadeiras de Passira. Llá elas têm uma chefe de produção que montou uma força-tarefa, dobrou o número de bordadeiras e otimizou a produção. Uma ficou com a manga, outra com as costas, outra com a frente. Aí, bordaram, engomaram e despacharam. Chegou a tempo, tudo certo. Quando a gente começou a montar, uma frente era marrom, a outra amarela... Simplesmente porque ninguém pensou que estávamos lidando com o agreste pernambucano. Então, uma engomou com 44 entrevista / interview not find the group again, phone were cut off, the shipping of orders is very costly. In summary, nothing for and all against. With the embroiderers from Passira (PE) I thought “I have purchase sales, I have access, and I have to bring it inside my store. Then, since the collection “Apprentice Tourist” (2010/2011 Summer), all my pieces have a tag with the name of the embroiderer, the community where it was made and their contact info. This group from Passira, for example, has some businesses of luxury bed and bath and accessories in São Paulo that, through this contact, have been put in direct contact with them. At the work among artisans both among the ones with whom you develop collections and among those aggregated as suppliers, what do you see as difficulties and challenges? Ronaldo – There is something that is difficult in any industrial or business process, which is management. Production and staff management is something hard not only to artisans, but to everybody. Thus, taking this talent, the genuine soul of this product, trim these ends so that it can reach a specific desired audience and properly coordinating all this production is not an easy task. If only a few ones have conditions to be a fashion designer, only fewer could be administrators or managers. This is a big problem: management and organization of the entire production process. And what happens to your suppliers Do they face these problems? Ronaldo – Let me give you an example. Brazil does not produce linen, currently. If I want some quality linen, I have to import. For a collection, I bought white linen, cut the pieces and sent them to the embroiderers from Passira. There, they have a forewoman who gathered a task-force, doubled the amount to embroiderers and optimized production. One was in charge of the sleeves, another one of the back, of the front, and so on. They embroidered, ironed and shipped. It arrived on time, everything right. When we started to put the pieces together, one front was brown, the other was yellow... Simply because nobody thought we were dealing with the agreste in Pernambuco. So, one ironed using water from the river, another one água do rio, outra com água da cisterna. Imagine a encrenca, foi tudo perdido. Então, há uma questão delicada. Tem que haver a preservação cultural, a autenticidade, mas tem que haver uma profissionalização para que a produção atenda aos requisitos. Ronaldo – Sim, claro. Na verdade, é um grande ciclo. Por mais que eu fale em andar à parte do poder público, não tem jeito. Essa gestão, essa organização, tem que vir das esferas do poder. Sou extremamente otimista. Estamos discutindo isso no Ministério da Cultura, que tem elementos facilitadores nesse sentido. Mas, para começar, esses ofícios de determinada região têm que estar na escola. As pessoas têm que aprender a bordar na escola, como parte do currículo. Todas as rendas que o Nordeste produz estão sendo produzidas na China por um terço do preço. Se grandes indústrias não conseguem competir com a China, há como artesãos enfrentarem isso? Se for ver só a questão da viabilidade econômica, a gente desiste. Já escutei muito que é inviável trabalhar com artesanato no Brasil. Você acha que o artesanato brasileiro é negligenciado de alguma forma? Ronaldo – A relação que nós temos com artesanato no Brasil ainda é uma relação de país colonizado. É coisa de pobre, feita por pobre que as pessoas compram para ajudar. Então, as pessoas se ofendem quando querem comprar alguma coisa e descobrem que o preço é maior do que elas imaginavam. Isso demanda cultura, demanda uma apropriação cultural das pessoas em relação ao país. E, principalmente, um investimento no fim do paternalismo, porque a história do “comprar para ajudar” é um paternalismo. O que eu vejo de melhor na arte contemporânea do país tem influência da arte popular. No diálogo entre esses segmentos, ganha o país e nós temos condições de desenvolver um produto sem similar no mundo, com uma percepção de valor completamente diferente. from the pit. Imagine the trouble. It was all lost. So, there is a sensitive issue.There must be cultural preservation, authenticity, but there must also be qualification, so that production can meet the requirements. Ronaldo – Yes, of course. Actually, it is a big cycle. Although I talk about acting independently from public power, there is no way out. This management, this organization has to come from the power spheres. I am extremely optimistic. We are discussing it at the Ministry of Culture, which has facilitating elements, in this sense. But, to start with, these crafts of a given region must be at schools. People need to learn embroidering at school, as a part of the course syllabus. All the income the Northeast produces is being produced in China for a third of the price. If large industries cannot compete with China, is there any way artisans can face it? If we take it only from the economic feasibility perspective, we give up. I have heard a lot about how it is impossible to work with handicraft in Brazil. Do you think that Brazilian handicraft is neglected, somehow? Ronaldo – The relationship we have with handicraft in Brazil is still a colonized country relationship. It is something poor, made by the poor and people buy it as a way of helping. So, people get offended when they want to buy something and find out the price is higher that they imagined. It requires culture, requires a cultural appropriation of people in relation to the country. And, mainly, investment towards the end of paternalism, because the story of “buying to help” is paternalist. What I see that is best in the contemporary art of the country receives the influence of popular art. In the dialogue between these segments, there is gain to the country and we have conditions to develop a product without a similar product in the world, with a completely different perception of value. entrevista / interview 45 Feiras e Eventos Fairs and Events Gift Fair 3º Salão Especial 27/08/2011 a 30/08/2011 Local: Expo Center Norte – São Paulo – São Paulo www.grafitefeiras.com.br 05/10/2011 a 07/10/2011 Local: Serraria Souza Pinto – Belo Horizonte – Minas Gerais www.centrocape.org.br Art Mundi – 8ª Feira Mundial de Artesanato Salão Internacional do Artesanato – 4ª Exposição Internacional de Artesanato 02/09/2011 a 11/09/2011 Local: Mendes Convention Center – Santos – São Paulo www.artmundisp.com.br 02/11/2011 a 06/11/2011 Local: Pavilhão de Exposições Expobrasília – Brasília – Distrito Federal www.salaodoartesanato.com.br FEIARTE – 30ª Feira Internacional de Artesanato 16/09/2011 a 25/09/2011 Local: Centro de Eventos do Pantanal – Cuiabá – Mato Grosso www.feiartemt.com.br, Natal Artesanal – 6ª Feira de Artigos Natalinos Artesanais 10/11/2011 a 15/11/2011 Local: Complexo Cultural da Urca – Poços de Caldas – Minas Gerais www.feiradenatalpocosdecaldas.com.br 22ª Feira Nacional de Artesanato ART VALE – Edição Sorocaba – 3ª Feira Internacional de Cultura e Artesanato e Festa das Nações 14/10/2011 a 23/10/2011 Local: Clube União Recreativo – Sorocaba – São Paulo www.tmlpromoeventos.com.br 46 eu faço / i make 22/11/2011 a 27/11/2011 Local: Centro de Exposições Expominas – Belo Horizonte – Minas Gerais www.feiranacionaldeartesanato.com.br Eu Faço / I Make Aline Veloso de Matos FOTOS / PHOTOS Pedro Gil “EU VIVO DO LIXO!” Esta é a forma a um só tempo sintética e múltipla com a qual Aline Veloso de Matos define aquilo que é, hoje, seu trabalho e sua forma de ver o mundo. Afinal de contas, são 17 anos vividos a transformar resíduos em arte, boa parte deles dedicados também a ensinar o ofício e a mostrar aos mais diversos públicos que há beleza e utilidade onde a maioria enxerga apenas restos de consumo, que embalagens vazias, latas, tampas, pedaços de plástico e papel trazem em si formas e objetos que dependem apenas da criatividade para se revelar. Graduada em Relações Públicas, o que Aline menos fez em sua vida foi exercer essa profissão. Pouco depois de formada, percalços da vida a desafiaram a buscar uma alternativa de atividade e renda. A solução foi encontrada no gosto por reaproveitar coisas, gosto este que já a havia ajudado a pagar seus estudos com a venda de papel artesanal e produtos derivados, como agendas e pastas. Da união do gosto com a necessidade nasceram bijuterias de garrafa pet, bolsas de lata, brinquedos de embalagem tetra pak e o que mais os materiais e a criatividade permitissem. Vendidos inicialmente com a ajuda de amigos e no boca a boca, hoje seus objetos podem ser vistos até em outros países, como Itália, Espanha e França, onde encontraram espaço na loja da De Bruille, que reúne artesanato de resíduos do mundo todo. Nessa trajetória, Aline testemunhou uma mudança de mentalidade na sociedade. Quando começou, sua passagem pelas ruas à cata de material era vista com um misto de estranheza e pena. Ao longo dos anos, ela viu essa percepção se transformar em admiração, na medida em que a consciência ambiental abriu os olhos das pessoas para a importância e a beleza dos objetos nascidos do reaproveitamento de restos. Autodidata, Aline se tornou instrutora, ministrando oficinas para catadores de recicláveis e para comunidades por meio de contratos com o Instituto Nenuca de Desenvolvimento Sustentável (Insea) e com a Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig). Seu objetivo é ver os catadores aderirem ao artesanato com resíduos como forma de agregar valor ao seu trabalho. “I LIVE OUT OF GARBAGE!” This is the synthetic and multiple definition with which Aline Veloso de Matos describes her current work and the way she perceives the world. After all, she has made a living out of transforming waste into art for 17 years, good part of which also dedicated to teaching the craft and showing a wide variety of audiences that there is beauty and utility where most people only see garbage, demonstrating that empty packages, cans, lids, pieces of plastic and paper carry shapes and objects which only depend on creativity to be revealed. Although having a public relations degree, Aline has never exercised this profession. Shortly after graduation, mishaps in life challenged her to look for an alternative activity and income source. The solution was found through her joy in reusing things, something that had already helped her paying for her education, by selling handcrafted paper and related products, such as notebooks and folders. From this union between joy and necessity, PET jewelry, tin bags and milk carton toys were created, as well as anything else allowed by her materials and creativity. Initially sold with the help of friends and by word of mouth, her objects can be currently found abroad, in countries such as Italy, Spain and France, having conquered their space at De Bruille stores, which gather waste material handicraft from all over the world. Throughout her journey, Aline has witnessed a shift in society’s thinking. In the beginning, her wandering through the streets collecting material was perceived with a mixture of strangeness and pity. Throughout the years, she saw this perception change into admiration, since environmental awareness opened people’s eyes to the importance and beauty of objects created from recycled waste. Being a self-taught person, Alice became an instructor and promotes workshops for recyclable material collectors and communities through partnerships with Insea (Instituto Nenuca de Desenvolvimento Sustentável, Nenuca Sustainable Development Institute) and Cemig (Companhia Energética de Minas Gerais, Minas Gerais State Power Company). Her goal is to influence the collectors to adopt waste handicraft as a way of aggregating value to their work. eu faço / i make 47 Onde Encontrar WHERE TO FIND Associações do Acre (Página 12 / Page12) Cooperativa de Produtos e Serviços Econômicos e Solidários do Acre (Cooesa) Carlos e Maria de Fátima Taborga Tel. 55 68 3223-8062 / 3223-0010 / 9981-1394 / 9978-7543 [email protected] Cooperativa de Artesãos Mulheres Arte de Vencer (Cooper Mav) Othília Batista Melo de Sampaio Tel. 55 68 3224-1973 / 9971-2452 / 8121-4752 [email protected] Associação Acreana Buriti da Amazônia Marcia Silvia de Lima Tel. 55 68 3026-1678 / 68 9995-9388 [email protected] Elsio Moriani (Página 18 / Page 18) Brasília – Distrito Federal Tel. 55 31 3382-3485 / 8408-4696 E-mail: [email protected] Thiago Rethalho (Página 23 / Page 23) Tel: 55 31 3686-7440 / 9443-2034 E-mail: [email protected] http://rethalhoarte.blogspot.com/ Marlene Alves da Costa e Gilda da Silva Barreto (Página 28 / Page 28) Dona Marlene Tel: 55 92 9239-5239 Gilda Barreto Tel: 55 97 8114-9152 Cícero Resende Chaves (Página 33 / Page 33) Tel. 55 32 3354-1588 Caixa Postal nº 12 CEP: 36.340-970 Resende Costa - MG [email protected] Artesanato de Pernambuco (Página 36 / Page 36) Sérgia Almeida Tel. 55 81 3227 2687 / 8764-2234 [email protected] [email protected] 22ª Feira Nacional de artesanato O Brasil Feito a Mão WELL COME Toda a diversidade do artesanato e da cultura brasileira em um só lugar All the diversity of brazilian handcraft and culture in just one place Expominas - Belo Horizonte - MG 22 a 27 22rd to 27th de novembro of november dia 22 só para lojistas 22rd only for professional buyers www.feiranacionaldeartesanato.com.br 31 3282 8280 - [email protected]
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