v`SIPl - Sindi
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£ ^fe^ & v'SIPl PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO ACÓRDÃO/DECISÃO MONOCRÁTICA REGISTRADO(A) SOB N° 120 ACÓRDÃO *03470771* Vistos, relatados e discutidos estes autos de Direta de Inconstitucionalidade Comarca de São n° Paulo, em 0225881-83.2009.8.26.0000, que é recorrente SINDICATO da DOS CLUBES DO ESTADO DE SAO PAULO sendo recorrido PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL DE CAMPINAS. ACORDAM, em Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "POR MAIORIA DE VOTOS, JULGARAM PROCEDENTE A AÇÃO. ACÓRDÃO COM EXMO. SR. DES. JOSÉ ROBERTO BEDRAN. FARÁ DECLARAÇÃO DE VOTO VENCEDOR O EXMO. SR. DES. WALTER DE ALMEIDA GUILHERME.", de conformidade com o voto do(a) Relator(a), que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Desembargadores REIS KUNTZ (Presidente), CORRÊA VIANNA, JOSÉ ROBERTO BEDRAN, EALTER DE ALMEIDA GUILHERME (com declaração de voto), JOSÉ SANTANA, ARTUR MARQUES, CAUDURO PADIN, GUILHERME G. STRENGER, RUY COPPOLA, BORIS KAUFFMANN, CAMPOS MELLO, GUERRIERI REZENDE e SAMUEL JÚNIOR com votos vencedores; MARCO CÉSAR MÜLLHER VALENTE, BARRETO FONSECA, CARLOS DE CARVALHO, MAURÍCIO VIDIGAL, LAERTE SAMPAIO, ARMANDO TOLEDO, JOSÉ REYNALDO e ROBERTO MAC CRACKEN com votos vencidos. São Paulo, 03 de fevereiro de 2011. JOSÉ ROBERTO BEDRAN Relator Designado PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO VOTO N° ADIN.N0. COMARCA REQTE. REQDO. 19449 0225881-83.2009.8.26.0000(994.09.225881-7) SÃO PAULO/CAMPINAS SINDICATO DOS CLUBES DO ESTADO DE SÃO PAULO PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL DE CAMPINAS Ação direta de inconstitucionalidade. Lei Municipal n° 13.582/2009, de Campinas, emanada de proposição do Legislativo. Imposição, aos clubes desportivos e de campo que possuam piscinas, de manter salva-vidas em tempo integral de seu funcionamento, nos locais que ofereçam risco de afogamento, com previsão de penalidades pelo descumprimento. Vício de iniciativa. Violação dos arts. 5o, caput, 25, 47, II, e 144, da Constituição do Estado. Inconstitucionalidade declarada. Ação procedente. 1. É ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pelo Sindicato dos Clubes do Estado de São Paulo, com pedido de concessão de liminar, visando à suspensão da eficácia da Lei Municipal n° 13.582, de 12 de maio de 2009, oriunda de proposta da Câmara Municipal, promulgada pelo seu Presidente, após rejeição do veto do Prefeito Municipal. Sustenta o autor, em síntese, que a lei impugnada, ao dispor "sobre a obrigatoriedade dos clubes desportivos e clubes de campo, que possuam piscinas, manter salva-vidas em tempo integral em suas dependências", com previsão de penalidades pelo descumprimento (fls. 42v°), violaria princípios e normas inerentes à liberdade de organização e funcionamento dos clubes e associações desportivas localizados naquele Município, bem como o art. 144, da Constituição do Estado. ARTES GRÁFICAS-TJ 41.0035 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO A liminar foi indeferida pelo relator sorteado (fls. 62/65) o que foi confirmado, por maioria de votos, em Agravo Regimental (fls. 108/121). A Procuradoria-Geral do Estado manifestou desinteresse na defesa do ato impugnado (fls. 88/90), sobrevindo resposta da Câmara Municipal (fls. 92/100). A douta Procuradoria-Geral de Justiça opinou pela improcedência (fls. 130/139). É o relatório. 2. Com a devida vênia da orientação contrária, é procedente a ação. 0 A impugnada Lei Municipal n° 13.582, de 12 de maio de 2009, do Município de Campinas, reza: "Art. 1o - Ficam os clubes desportivos e os clubes de campo, que possuam piscinas, obrigados a manter salva-vidas em tempo integral de seu funcionamento nos locais que ofereçam perigo de afogamento. Parágrafo Único - A proporção no número de salvavidas será a seguinte: a) para clubes desportivos e de campo que possuam de quinhentos a mil sócios - um salva-vidas; b) para clubes desportivos e de campo que possuam de mil e um a cinco mil sócios - dois salva-vidas; c) para clubes desportivos e de campo que possuam acima de cinco mil e um sócios - três salva-vidas. *n ADIN. N° 0225881-83.2009.8.26.0000 (994.09.225881-7) - CAMPINAS - VOTO 19449 AP ARTES GRÁFICAS - TJ 41.0035 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Art. 2o - A inobservância do disposto no artigo anterior acarretará as seguintes penalidades: I - Advertência, a fim de se adequar à lei no prazo de quarenta e oito horas; II - Multa de três mil UFICs - Unidades Fiscais do Município de Campinas, na primeira constatação do descumprimento; III - Na reincidência, lacramento das dependências do clube na parte em que se encontrem as piscinas; IV - Suspensão definitiva do alvará de funcionamento do Clube. Art. 3o - O Poder Executivo regulamentará esta Lei no prazo de trinta dias após sua publicação. Art. 4° - Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação" (Üs. 42v°). Conforme bem acentuado pelo eminente relator sorteado, não se vê o vício arguido na petição inicial, ou seja, de invasão de competência legislativa da União, bem porque o diploma municipal não cria e nem estabelece regras sobre a profissão de salva-vidas. Por tal fundamento, a ação não teria mesmo como vingar. Todavia, no controle concentrado de inconstitucionalidade, o julgamento não se acha vinculado ao fundamento jurídico indicado no libelo, autorizando-se a declaração de inconstitucionalidade da lei impugnada por fundamento diverso, exatamente ADIN. N° 0225881-83.2009.8.26.0000 (994.09.225881-7) - CAMPINAS - VOTO 1B449 AP ARTES GRÁFICAS - TJ \ 41.0035 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO como afirmado por GILMAR FERREIRA MENDES e IVES GANDRA DA SILVA MARTINS: "É interessante notar que, a despeito da necessidade legal da indicação dos fundamentos jurídicos na petição inicial, não fica o STF adstrito a eles na apreciação, que faz, da constitucionalidade dos dispositivos questionados. É dominante no âmbito do Tribunal que na ação direta de inconstitucionalidade prevalece o princípio da causa petendi aberta" (Controle Concentrado de Constitucionalidade, 2 a ed., Saraiva, 2007, n° 3.4, pág. 241). Disso não discrepam LUÍS ROBERTO BARROSO (O Controle de Constitucionalidade no Direito Brasileiro, 2a ed., Saraiva, 2007, cap. III, item II, n° 4.1, nota 87, pág. 162) e ALEXANDRE DE MORAES (Direito Constitucional, cap. 12, item 10.8, pág. 756), nem tampouco a jurisprudência do Colendo STF (cf., p. ex., STF, 1 a T., RE 431.715 AgR/MG, rei. Min. Carlos Brito, RTJ, 204/390; STF, Pleno, ADI 2.728/AM, rei. Min. Maurício Corrêa, DJU de 20/02/04, pág. 16; STF, 1 a T., RE 357.576/SP, rei. Min. Moreira Alves, DJU de 14/03/03, pág. 41; STF, Pleno, MC em ADI 2.396/MS, rei. Min. Ellen Gracie, RTJ, 180/160), ou a deste Órgão Especial (cf., p. ex., ADIn 114.507-0/0-00, rei. Des. Walter de Almeida Guilherme, julgado em 11/05/05; ADIn 143.647-0/6-00, voto n° 8.262 do vogai Des. Palma Bisson). E a lei questionada, de fato, padece da imputada inconstitucionalidade, mas por vício formal de iniciativa. ADIN. N" 0225881-83.2009.8.26.0000 (994.09.225881-7) - CAMPINAS - VOTO 19449 AP ARTES GRÁFICAS - TJ 41.0035 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO A primeira vista, estaria a regular, na esfera privada, matéria de interesse local, por meio de lei de caráter geral, não fosse o evidente propósito de dispor sobre atribuições dos órgãos da administração direta, ainda que sob o disfarce de deixar, ao Executivo, sua posterior regulamentação (art. 3o). Nesse afã, o Legislativo local promulgou a norma impugnada, rejeitando o veto oposto pelo Prefeito Municipal, tornando indiscutível a ingerência administrativa e, nesse ponto, bem alertou o eminente Des. PALMA BISSON, em declaração de voto vencido, na oportunidade do julgamento do Agravo Regimental: "Por esse ângulo, a inconstitucionalidade da Lei n° 13.582, de 12.05.2009, do Município de Campinas, mais do que verossimilhante é gritante, pois nascida na Câmara Municipal para obrigar os clubes que possuam piscinas a manter salva-vidas em tempo integral em suas dependências e também para obrigar a Prefeitura a fiscalizar aqueles, impondo-lhes advertência, multa, lacrando suas dependências 'na parte em que se encontrem as piscinas' e suspendendo definitivamente seus alvarás de funcionamento (art. 2°J"(fls. 125). Com isto, o diploma impugnado subtrai do chefe do Executivo a discricionariedade da administração, vulnerando o princípio da separação dos poderes consagrado no artigo 5o da Constituição Estadual, que é de observância obrigatória também pelos Municípios (artigo 144 da mesma Carta). Não cabe o argumento de que o Município atua em atividade suplementar de normas emanadas do Estado, em assunto de seu ADIN. N° 0 2 2 5 8 8 1 - 8 3 . 2 0 0 9 . 8 . 2 6 . 0 0 0 0 ARTES GRÁFICAS - TJ (994.09.225881-7) - CAMPINAS - VOTO 19449 APj >— 41.0035' PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO peculiar interesse. Ainda que assim pudesse fazê-lo, o que seria questionável no peculiar caso versado, não estaria afastada a necessidade de observância do princípio da iniciativa legislativa, que, positivamente, não poderia ser, na espécie, do Poder Legislativo, que, de modo algum, exerceria atribuição concorrente. Depois de assinalar da tradição constitucional brasileira conferir-se ao executivo, com certa preeminência, o poder de iniciativa das leis, JOSÉ AFONSO DA SILVA lembra - o que, pelo princípio da simetria, também se aplicaria em relação aos Estados e Municípios - que "a Constituição vigente (...) confere o poder de iniciativa legislativa ao Presidente da República no citado art. 61, ressalvada a iniciativa exclusiva atribuída a outras pessoas ou entidades. A razão por que se atribui ao Chefe do Executivo o poder de iniciativa decorre do fato de a ele caber a missão de aplicar uma política determinada em favor das necessidades do país: mais bem informado do que ninguém dessas necessidades e dada a complexidade cada vez maior dos problemas a resolver, estão os órgãos do Executivo tecnicamente mais bem aparelhados que os parlamentares, para preparar os projetos de leis; demais, sendo o chefe também da administração geral do país e possuindo meios para aquilatar as necessidades públicas, só o Executivo poderá desenvolver uma política legislativa capaz de dotar a nação de uma legislação adequada, servindo-se da iniciativa legislativa". E, em outras passagens, acrescenta acerca das razões desse fenômeno contemporâneo, próprio do Estado Social: "Pois, o governo, enquanto atua e dirige a intervenção estatal, tem que assumir a iniciativa legislativa: a adoção de uma regulamentação que, desde que se^manifesta ADIN. N* 0225881-83.2009.8.26.0000 (994.09.225881-7) - CAMPINAS - VOT0TÍ9449 AP ARTES GRÁFICAS-TJ \ ' 41 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO através de leis em sentido técnico, postula a iniciativa do único órgão em condição de valorar todas as exigências, que é o Governo, para toda inovação e coordenação da Administração Pública da economia. De resto, o estender-se da intervenção estatal no campo econômico é conexo com o desenvolvimento paralelo da administração pela lei. Esta requer que a iniciativa da legislação seja assumida necessariamente pelo Governo como órgão que, superintendendo os vários setores da administração pública, é o único apto a cumprir a formulação política e a redação técnica dos projetos de leis, cujos fins são intimamente conexos com a iniciativa administrativa (...) é o governo o órgão mais apto a compreender as exigências globais da comunidade estatal, por ser - como disse Musso - o vértice da Administração, por dispor de meios de informação e de relevo necessário, a fim de propiciar à ordem social uma legislação adequada às necessidades coletivas, segundo o seu programa político-administrativo. O parlamentar se encontra em posição diversa: não dispõe daqueles meios, nem de informações sobre as exigências gerais da comunidade estatal, mas apenas tem conhecimento mais de perto dos interesses que o próprio colégio eleitoral lhe coloca como necessários" (Processo Constitucional de Formação das Leis, Malheiros, 2 a edição, págs. 142/151). Nem sob o pouco jurídico motivo de que estaria havendo omissão do Executivo no cumprimento de normas estaduais específicas sobre proteção e segurança de piscinas de uso público, porquanto, não bastasse, exatamente por isso, a inocuidade de edição de lei municipal impositiva de salva-vidas, não justificaria a atuação substitutiva do Legislativo na iniciativa de leis ou de normas de caráter regulamentar. ADIN. N" 0225881-83.2009.8.26.0000 (994.09.225881-7) - CAMPIHAS - VOTO 19449 AP ARTES GRÁFICAS - TJ 41.0035 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO 8 As providências para a omissão do Prefeito deveriam ser de outra ordem. Tampouco a relevância da matéria ou a bondade dos propósitos da legislação assim editada poderia justificar a confirmação de sua validade e eficácia. Como assinala J. J. GOMES CANOTILHO, o princípio da separação dos poderes configura forma e meio de limite de poder, assegurando uma medida jurídica ao poder do Estado e, portanto, "serve para garantir e proteger a esfera jurídico-subjetiva dos indivíduos. O princípio da separação como princípio positivo assegura uma justa e adequada ordenação de funções do Estado e, consequentemente, intervém como esquema relacionai de competências, tarefas, funções e responsabilidades dos órgãos do Estado. Nesta perspectiva, separação ou divisão de poderes significa responsabilidade pelo exercício de um poder" (cf. Direito Constitucional, Almedina, Coimbra, 6a ed., 1995, pág. 365). É exatamente por essa razão que a Constituição Estadual veda, de modo expresso, no § 1 o do artigo 5o, a delegação de atribuições de um Poder a outro. Não fosse assim, a própria idéia de separação de Poderes estaria ameaçada; perderia todo seu sentido. A capacidade de os Municípios se auto-organizarem, no que concerne aos seus poderes, está vinculada aos limites e às regras gerais, impostos na Constituição Federal e na Constituição Paulista. Na lição do saudoso HELY LOPES MEIRELLES, "A administração municipal é dirigida pelo Prefeito, que, unipessoalmente, como ADIN. N° 0225881-83.2009.8.26.0000 <994.09.225881-7) - CAMPINAS - VOTO 19449 AP ARTES GRÁFICAS-TJ \ , 41.0035 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Chefe do Executivo local, comanda, supervisiona e coordena os serviços de peculiar interesse do Município, auxiliado por Secretários Municipais ou Diretores de Departamento, conforme a organização da Prefeitura e a maior ou menor desconcentração de suas atividades, sendo permitida, ainda, a criação das autarquias e entidades paraestatais, visando à descentralização administrativa... As leis locais são votadas pela Câmara de Vereadores, órgão colegiado, com função legislativa precípua para todos os assuntos de peculiar interesse do Município e funções complementares de fiscalização e controle da conduta político-administrativa do Prefeito (julgamento de assessoramento suas contas, governamental cassação de (indicações mandato ao etc), Executivo) e de de administração de seus serviços auxiliares (organização interna da Câmara)" (Direito Administrativo Brasileiro, Malheiros Editores, 21 a edição, 1996, p. 671/672). Já em seu "Direito Municipal Brasileiro", ressalta que: "Em sua função normal e predominante sobre as demais, a Câmara elabora leis, isto é, normas abstratas, gerais e obrigatórias de conduta. Esta é a sua função específica, bem diferenciada da do Executivo, que é a de praticar atos concretos de administração. Já dissemos, e convém se repita, que o Legislativo prove in genere, o Executivo in specie; a Câmara edita normas gerais, o prefeito as aplica aos casos particulares ocorrentes. Daí não ser permitido à Câmara intervir direta e concretamente nas atividades reservadas ao Executivo, que pedem provisões administrativas especiais manifestadas em ordens, proibições, concessões, permissões, nomeações, pagamento, recebimentos, entendimentos verbais ou escritos com os interessados, contratos, : maienais aa ADIN. N" 0225881-83.2009.8.26.0000 (994.09.225881-7) - CAMPINAS - VOTO 19449 AP ARTES GRÁFICAS - TJ ^ 41.0035 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO 10 Administração e tudo o mais que se traduzir em atos ou medidas de execução governamental. Atuando através das leis que elaborar e atos legislativos que editar, a Câmara ditará ao prefeito as normas gerais da Administração, sem chegar à prática administrativa. A propósito, têm decidido o STF e os Tribunais estaduais que é inconstitucional a deslocação do poder administrativo e regulamentar do Executivo para o Legislativo. De um modo geral, pode a Câmara, por deliberação do plenário, indicar medidas administrativas ao prefeito adjuvandi causa, isto é, a título de colaboração e sem força coativa ou obrigatória para o Executivo; o que não pode é prover situações concretas por seus próprios atos ou impor ao Executivo a tomada de medidas especificas de sua exclusiva competência e atribuição. Usurpando funções do Executivo ou suprimindo atribuições do prefeito, a Câmara praticará ilegalidade reprimível por via judicial" (Direito Municipal Brasileiro, Malheiros Editores, 6a edição, 1990, p. 439/440 - os grifos não são do original). É substrato da própria idéia de separação dos poderes, fundamento do Estado Democrático de Direito, estabelecida no artigo 5o, da CE, pela qual o Legislativo, o Executivo e o Judiciário têm funções constitucionalmente definidas e, ao que aqui interessa, são comentadas na lição sempre precisa de JOSÉ AFONSO DA SILVA: "Os órgãos do Estado são supremos (constitucionais) ou dependentes (administrativos). Aqueles são os a quem incumbe o exercício do poder político, cujo conjunto se denomina 'governo' ou 'órgãos governamentais'. ADIN. N° 0225881-83.2009.8.26.0000 (994.09.225881-7) - CAMPINAS - VOTO 19449 AP ARTES GRÁFICAS - TJ 41.0035 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO 11 ... Governo é, então, o conjunto de órgãos mediante os quais a vontade do Estado é formulada, expressa e realizada, ou o conjunto de órgãos supremos a quem incumbe o exercício das funções do poder político. Este se manifesta mediante suas funções, que são exercidas e cumpridas pelos órgãos de governo. Vale dizer, portanto, que o poder político, uno, indivisível e indelegável, se desdobra e se compõe de várias funções, que fundamentalmente são três: a legislativa, a executiva e a jurisdicional. A função legislativa consiste na edição de regras gerais, abstratas, impessoais e inovadoras da ordem jurídica, denominadas 'leis'. A função executiva resolve os problemas concretos e individualizados, de acordo com as leis; não se limita à simples execução das leis, como às vezes se diz; comporta prerrogativas, e nela entram todos os atos e fatos jurídicos que não tenham caráter geral e impessoal. Por isso, é cabível dizer que a função executiva se distingue em função de governo, com atribuições políticas, co-legislativas administrativa, com e suas de três decisão, e missões função básicas: intervenção, fomento e serviço público" (Comentário Contextual à Constituição, Malheiros, São Paulo, 5a ed., p. Ou seja, na separação de funções em nosso regime constitucional, os Poderes do Estado não se confundem, nem tampouco se V ADIN. N* 0225881-83.2009.8.26.0000 (994.09.225881-7) - CAMPINAS - VOTO 19449 AP ARTES GRÁFICAS - TJ PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO 12 subordinam, mas se harmonizam na execução de suas respectivas atribuições, e desempenhando, de forma restrita, algumas outras, atinentes à cooperação institucional, que a Carta taxativamente lhes outorga. Desse modo, se ao Executivo cabe a função administrativa, somente a seu representante caberia a iniciativa ao projeto de lei visando a estabelecer regras de conduta aos munícipes, em especial o modo como clubes e associações desportivas devem tomar medidas de segurança dos associados, mesmo aquelas inerentes ao desempenho de suas atividades. A propósito, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 990.09.365484-9, de 27.10.2010, ficou muito bem acentuado: "Vem decidindo este Órgão Especial que cabe ao Chefe do Executivo Municipal, privativamente, exercer a direção superior da Administração, nos termos do art. 47, II, combinado com o art. 144, da Constituição Estadual. A respeito do tema, no julgamento da Adin n. 067.251-0/5-00, de que foi relator o Eminente Desembargador LUIZ TÂMBARA, louvou-se em lição de HELY LOPES MEIRELLES, nos termos seguintes: A propósito, têm decidido o STF e os Tribunais Estaduais que é inconstitucional a deslocação do Poder Administrativo e regulamentar do Executivo para o Legislativo. De um modo geral, pode a Câmara, por deliberação do Plenário, indicar medidas administrativas ao prefeito adjuvandi causa, isto é, a título de colaboração e sem força coativa ou obrigatória para o Executivo; o que não pode é prover situação ADIN. N° 0225881-83.2009.8.26.0000 (994.09.225881-7) - CAMPINAS - VOTOvÍ9449 AP ARTES GRÁFICAS - T J ^ 41 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO 13 concreta por seus próprios atos ou impor ao Executivo a tomada de medidas específicas de sua exclusiva competência e atribuição". Mas não é só. A interferência também se evidencia pela imposição de fiscalização e aplicação de penalidades pelo descumprimento, que são atividades próprias do Executivo, atinentes ao planejamento, regulação e gerenciamento dos serviços públicos locais, implicando geração de despesas, sem a indicação dos recursos correspondentes no orçamento. Ou seja, a iniciativa e promulgação do diploma legai pelo Legislativo local, contendo imposição de medidas coercitivas, traduziuse em usurpação daquelas atribuições, pois a ele não caberia impor ou dispor sobre parcela do poder de polícia administrativa municipal, outorgada exclusivamente ao Executivo. Se assim o fez, houve ingerência em assuntos ligados à Administração Pública local, com violação clara de princípios constitucionais de independência e harmonia dos Poderes, sobretudo em relação ao processo legislativo de competência privativa do Prefeito, configurando, em outras palavras, afronta os arts. 5o, caput, 25, 47, II, e 144, da Constituição do Estado. Cumpre observar que "a cláusula de reserva pertinente ao poder de instauração do processo legislativo traduz postulado constitucional de observância compulsória, cujo desrespeito - precisamente por envolver usurpação de uma prerrogativa não compartilhada - configura vício juridicamente insanável. A natureza especial que assume a cláusula \ ADIN. N° 0 2 2 5 8 8 1 - 8 3 . 2 0 0 9 . 8 . 2 6 . 0 0 0 0 ARTES GRÁFICAS - TJ (994.09.225881-7) ^ - CAMPINAS - VOTO \19449 AP V \ 41.0035 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO 14 referente à iniciativa reservada das leis caracteriza, em nosso sistema de direito, derrogação que excepciona o princípio geral da legitimação concorrente para a instauração do processo de formação das espécies legislativas" (STF - ADI n° 805-6/RS, Rei. Min. Celso Mello). E a falta de previsão específica, no orçamento, das despesas geradas, mais evidencia a inconstitucionalidade, valendo lembrar a lição de Hely Lopes Meirelles: "o processo legislativo, ou seja, a sucessão ordenada de atos para a formação das normas enumeradas na Constituição da República (artigo 59) possui contornos uniformes para todas as entidades estatais - União, Estados-membros e Municípios e Distrito Federal (artigos 60 e 69) - cabendo às Constituições dos Estados e às dos Municípios estabelecer, dentre as espécies normativas previstas, quais as adotadas pela entidade estatal. (...) Leis de iniciativa exclusiva do Prefeito são aquelas que só a ele cabe o envio de projeto à Câmara. Nessa categoria estão as que disponham sobre a criação, estruturação e atribuição das secretarias, órgãos e entidades da administração pública municipal; a criação de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica; fixação e aumento de sua remuneração; o regime jurídico municipais; e orçamentárias, o os plano plurianual, orçamentos dos servidores as diretrizes anuais, créditos suplementares e especiais" (Direito Municipal Brasileiro.^--^ ARTES GRÁFICAS-TJ ADIN. N° 0 2 2 5 8 8 1 - 8 3 . 2 0 0 9 . 8 . 2 6 . 0 0 0 0 (994.09.225881-7) ir ) 1 - CAMPINAS - VOTO 19449 AP \ 41 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO 15 Malheiros, 1994, 7a ed., p. 544 - os grifos não são do original). A isso, o E. Des. Luiz Elias Tâmbara, relator designado na ADIN n° 99.351.0/0, de São Paulo, acrescentou, com fundamentos pertinentes e aqui aplicáveis: "Ao atribuir competência privativa ao Poder Executivo para a iniciativa de leis sobre determinadas matérias, a Constituição levou na devida conta o fato de que sobre elas tem o Poder Executivo melhor visão do que o Legislativo, por as estar gerindo. A administração da coisa pública, não poucas vezes, exige conhecimento que o Legislativo não tem, e outorgar a este Poder o direito de apresentar os projetos que desejasse seria oferecerlhe o poder de ter iniciativa sobre assuntos que refogem a sua maior especialidade". Patente, por qualquer ângulo que se analise, a inconstitucionalidade da lei impugnada, valendo anotar que, nesse sentido, tem sido a reiterada e dominante orientação deste Colendo Órgão Especial: "Ação direta de inconstitucionalidade da lei n° 7.161, de 1 de setembro de 1995, do Município de Ribeirão Preto, decorrente de projeto de iniciativa parlamentar, aprovada pela câmara, vetado pelo Prefeito e transformado em lei mediante rejeição do veto e promulgação pelo Presidente da edilidade. Lei que declara obrigatória, no município, a instalação de sistemas de detecção de metais em ginásios esportivos e campos de futebol públicos ou particulares, com capacidade superior a três mil pessoas, cominando multa para o caso de infração, ADIN. N" 0 2 2 5 8 8 1 - 8 3 . 2 0 0 9 . 8 . 2 6 . 0 0 0 0 ARTES GRÁFICAS-TJ (994.09.225881-7) - CAMPINAS - VOTOV.9449 AP Y-* 41.0035 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO 16 determinando a regulamentação da lei pelo Executivo no prazo de sessenta dias e estabelecendo que as despesas com a execução da lei corra por conta das dotações orçamentárias próprias, suplementares se necessário. Matéria atinente à administração pública de interesse local, reservada à iniciativa do processo legislativo correspondente reservada à competência privativa do chefe do executivo pelo art. 47, II, da Constituição Estadual, princípio este de observância obrigatória pelos municípios por força do art. 144, da Constituição Estadual. Lei que violou ainda a disposição do art. 25, da Constituição do Estado, por não indicar com precisão, a não ser genericamente, os recursos disponíveis próprios para atender à criação ou aumento da despesa decorrente da implementação da fiscalização do cumprimento das novas regras estabelecidas. Ação procedente" (ADIn n° 102.744.0/9-00, rei. PAULO SHINTATE, j . 20/08/2003, v.u.); "Inconstitucionalidade. Lei municipal que 'estabelece fiscalização pelo Município e amplia as sanções previstas na Lei Federal n° 8.069/90'. Matéria referente à administração pública municipal. Competência exclusiva do Chefe do Poder Executivo. Ofensa aos artigos 5o e 144 da Constituição Estadual. Ação julgada procedente. ...Com efeito, referida lei, além de impor ao Executivo procedimento de fiscalização a ser adotado com relação aos crimes e infrações administrativas previstos nos artigos 228 a 258 do Estatuto da Criança e do Adolescente, estabelece, para o ADIN. N" 0 2 2 5 8 8 1 - 8 3 . 2 0 0 9 . 8 . 2 6 . 0 0 0 0 TJ (994.09.225881-7) - CAMPINAS - VOTO 19449 AP \ 41.0035 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO 17 caso de inobservância das condutas descritas em mencionados dispositivos legais, a cassação da autorização de funcionamento dos respectivos estabelecimentos. Evidente que tais disposições referem-se à administração pública, que é de competência exclusiva do Chefe do Poder Executivo ... Patente a invasão da esfera de competência privativa do Prefeito Municipal, incide a lei impugnada em eiva de inconstitucionalidade, por violar o princípio da independência e harmonia dos Poderes, adotado no artigo 5° da Constituição Bandeirante"(ADIn n° 102.649.0/5-00, rei. JOSÉ CARDINALE, j . 10/03/2004, v.u.). "Ação direta de inconstitucionalidade 2.954/12.05.2008, do Município de Lei Municipal n° Tietê, de iniciativa parlamentar e promulgada pelo Presidente da Câmara Municipal após ser derribado o veto do alcaide, que 'Proíbe, no Município de Tietê, a montagem, instalação e estruturação de parques, circos e congêneres, na via pública urbana' (art. 1o), ainda dispondo que o seu descumprimento implicará multa, dobrada na reincidência, 'com a posterior cassação da licença de funcionamento, sem prejuízos penalidades previstas em lei' (art. 2o) - de outras típica polícia administrativa das atividades urbanas em geral, para a ordenação da vida na cidade - se organizar a cidade, mediante o exercício de poder de polícia, é sim atribuição administrativa, ao Prefeito portanto afeita, somente ele tem a exclusiva iniciativa de propor lei a respeito, padecendo do ADIN. N° 0 2 2 5 8 8 1 - 8 3 . 2 0 0 9 . 8 . 2 6 . 0 0 0 0 ARTES GRÁFICAS - TJ (994.09.225881-7) - CAMPINAS - VOTCX19449 AP 41.0035 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO vício respectivo e ainda violando o princípio da separação dos poderes aquela que com tal propósito foi pela Câmara concebida e promulgada - violação dos artigos 5o, 47 e 144 da CE - ação procedente" (ADIN n° 165.423.0/5-00, rei. PALMA BISSON, j . 01.10.2008, m.v.). E, mais recentemente: "AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE DE LEI. LEI DE INICIATIVA PARLAMENTAR, VETADA PELO PREFEITO E COM VETO REJEITADO PELA CÂMARA, OUE A PROMULGA. INVASÃO DA ESFERA DE ATRIBUIÇÕES DO CHEFE DO EXECUTIVO. VULNERAÇÃO AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DE PODERES. INCONSTITUCIONALIDADE DECLARADA. LEI MUNICIPAL QUE OBRIGATORIEDADE DISPÕE DE SOBRE A COLOCAÇÃO E DISPONIBILIZAÇAO DE EQUIPAMENTO COM ÁLCOOL EM GEL POR PARTE DE ESTABELECIMENTOS PÚBLICOS E PRIVADOS. INVASÃO DE ATRIBUIÇÃO DO CHEFE DO EXECUTIVO. PREVISÃO DE DESPESA SEM PROVISÃO E SEM INDICAÇÃO DOS RECURSOS. VULNERAÇÃO DOS ARTIGOS 5o, CAPUT, 25, 47, II, XIV, 144, 174, IIEIIIE DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE SÃO 176, I, PAULO. INCONSTITUCIONALIDADE DECLARADA. ADIN. N° 0 2 2 5 8 8 1 - 8 3 . 2 0 0 9 . 8 . 2 6 . 0 0 0 0 (994.09.225881-7) - CAMPINAS - VOTO 19449 AP \ 41.0035 PODER JUDICIÁRIO Ê TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO 19 Ação direta de inconstitucionalidade de lei por vício formal — iniciativa reservada ao Chefe do Executivo - e material. Diploma que cria obrigatoriedade de colocação e disponibilização de equipamento com álcool em gel por parte de estabelecimentos públicos e privados, em nítida invasão da esfera de atribuições do Chefe do Executivo e com evidente previsão de encargos financeiros sem indicação de recursos. Norma irrita à Constituição do Estado de São Paulo e que se impõe seja extirpada do ordenamento" (ADIN n° 990.09.373735-3, rei. RENATO NALINI, j . 14.07.2010-v.u.); "Ação direta de inconstitucionalidade - lei municipal de Itatiba, que cria a obrigatoriedade de empacotador em cada caixa de supermercado ou similar - vício de iniciativa - procedência da ação" (ADIN n° 994.09.229242-6, rei. EROS PICELI, j . 01.09.2010-v.u.). "Ação direta de inconstitucionalidade. Lei Municipal n° 6.570/2006, de Presidente Prudente, emanada de proposição do Legislativo. Imposição de instalação, nos parques municipais, de brinquedos destinados a crianças portadoras de deficiência física, com previsão de penalidades pelo descumprimento. Vício de iniciativa. Violação dos arts. 5o, caput, 25, 47, II, e 144, da Constituição do Estado. Inconstitucionalidade declarada. Ação procedente" (ADIn n° 143.352.0/0-00, rei. Des. JOSÉ ROBERTO BEDRAN, j . 28.01.2009). ADIN. K* 0225881-83.2009.8.26.0000 (994.09.225881-7) - CAMPINAS - VOTO 19449 AP ARTES GRÁFICAS - TJ PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO 20 3. Do exposto, julga-se procedente a ação, para declarar a inconstitucionalidade da Lei n° 13.582, de 12 de maio de 2009, do Município de Campinas. Façam-se as comunicações de praxe. v JOSÉ ROBEtfroSÊDRAN Relator Designado ADIN. N* 0 2 2 5 8 8 1 - 8 3 . 2 0 0 9 . 8 . 2 6 . 0 0 0 0 ARTES GRÁFICAS-TJ (994.09.225881-7) - CAMPINAS - VOTO 19449 AP 41.0035" PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO VOTO N° 12.353 DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N.° 0225881-83. 2009.6.26.0000 (994.09.225881-7) COMARCA: São Paulo REQUERENTE: Sindicato dos Clubes do Estado de São Paulo REQUERIDO: Presidente da Câmara Municipal de Campinas DECLARAÇÃO DE VOTO I - Lei Municipal n° 13.582/2009, do Município de Campinas, que obrigou os clubes desportivos e clubes de campo a manter salva-vidas em tempo integral de seu funcionamento nos locais que ofereçam perigo de afogamento, cominando multa pelo descumprimento. II - Alega o autor, Sindicato dos Clubes do Estado de São Paulo, que a lei fere os princípios da livre iniciativa, da autonomia da vontade, da livre concorrência, da proporcionalidade e da razoabilidade (arts. Io, IV, 170, caput e inciso IV, 5o, inciso LIV, da CF) que estão acolhidos no art. 144 da CE. III - Voto do relator, Des. Laerte Sampaio: o art. 170, caput e IV, da CF, dispositivos angulares para o julgamento da demanda, devem ser interpretados de forma sistemática com o art. Io, III, e 6o, caput, da CF, assinalando que o Município tem competência concorrente para zelar pela saúde e assistência pública (art. 23, II) e para legislar sobre a ARTES GRÁFICAS-TJ 41.003S PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO saúde local, suplementando a legislação federal e estadual (art. 24, XII, § 3o). Diz que a lei impugnada nada mais fez do que adaptar a legislação estadual às normas locais, estabelecendo igualdade de tratamento entre as piscinas de uso coletivo e as de uso coletivo restrito no tocante à exigência da presença de salva-vidas, fixando o número destes conforme a potencialidade de uso e especificando sanções. Entende que referida lei poderia ter sido de iniciativa do Legislativo, pois já existia a exigência de salva-vidas pela conjunção de normas estaduais e municipais anteriores que plasmavam o exercício da administração superior pelo Prefeito. Julga a ação, pois, improcedente. IV - Voto divergente do Des. José Roberto Bedran: há vício de iniciativa na lei em questão, pois esta somente poderia se originar de projeto remetido à Câmara de Vereadores pelo chefe do Poder Executivo, mácula que, embora não apontada na inicial, poder ser proclamada, de vez que a causa petendi, nas ações de inconstitucionalidade, é aberta. Assevera que a lei possui o evidente propósito de dispor sobre atribuições dos órgãos da administração direta, subtraindo do chefe do Executivo a discricionariedade da administração, vulnerando o princípio da separação dos poderes consagrado no art. 5o da Constituição Estadual, que é de observância obrigatória também pelos Municípios (art. 144 da C.E.). Julga, desfarte, procedente a ação. V - Meu voto. 1. Não vejo inconstitucionalidade na lei pelas razões invocadas na inicial. A ordem econômica está regulada na Constituição Federal, a demonstrar assumir o Estado brasileiro feição intervencionista Direta de Inconstitucionalidade n° 0225881-83. 2009.6.26.0000 - Voto 12.353 ^ As ARTES GRÁFICAS - TJ 41.0035 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO (Estado Social), não importando, aqui, qualificar o grau de intervenção (talvez a melhor forma de encarar o Estado seja atribuir-lhe o papel de regulamentador e indutor, não de controlador e produtor, como afirma Joseph Stiglitz, em O Mundo em Queda Livre). A livre iniciativa, que é um dos fundamentos da República Federativa do Brasil (art. Io, IV), é posta como um dos princípios da atividade econômica, que se guia, também, por outros princípios que estão indicados no art. 170. A lei imprecada, ao impor a exigência de salvas-vidas nas piscinas de uso coletivo (públicas) e de uso coletivo restrito (particulares) não afronta a livre iniciativa e tampouco o princípio da livre concorrência. A atividade econômica, seja estatal ou privada, não pode se orientar apenas em função do lucro, tendo que respeitar o fundamento da dignidade da pessoa humana, em seu aspecto mais abrangente (art. Io, III). Quando a Constituição Federal consagra a inviolabilidade do direito à segurança, está a dispor sobre o direito à preservação da vida, à saúde e incolumidade física, não podendo a livre iniciativa, proclamada como alicerce básico da ordem econômica, desrespeitar esses direitos. Em suma, a exigência da presença de salva-vidas, como disposto na lei impugnada, não desdenha do princípio da livre iniciativa e nem desfaz o princípio da livre concorrência, mas a eles se ajusta. Também não afronta o principio da discriminação de competências, pois é conferido aos Municípios suplementar legislação estadual ou federal, no que couber, isto é, na parte em que se relaciona com assunto de interesse local, que é o caso da lei sob exame. Direta de Inconstitucionalidade n° 0225881-83. 2009.6.26.0000 - Voto 12.353 ARTES GRÁFICAS-TJ . i \ 41.0035 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO 2. Cuido, agora, da questão atinente à iniciativa da lei em debate. Poderia ter sido do Legislativo? A Lei 13.582/2009 estabelece a obrigatoriedade de os clubes desportivos e os clubes de campo, que possuam piscinas, manter salva-vidas, fixa a proporção de seu número, impõe ao Município o implícito dever defiscalizaro cumprimento da lei e comina penas por seu desrespeito. A atividade descrita na lei é nitidamente de caráter administrativo, tendo por objeto salvaguardar a vida, a saúde e a incolumidadefísicado freqüentador das piscinas. Mormente quando ordena a fiscalização por funcionários municipais que avaliarão, de forma gradativa, a penalidade que o descumprimento da lei acarreta. A função administrativa, exercida pelo Poder Executivo por excelência, consiste na prática de atos ou medidas de execução governamental, isto é, de conferir efeitos concretos à lei votada pelo Legislativo. Muitas vezes, o exercício da função administrativa exige a edição de lei, dando azo ao que se compreende como administração pela lei, e, por isso mesmo, é que o legislador constituinte disse ser, na hipótese, a iniciativa reservada ao chefe do Poder Executivo. Vale a respeito a lição de José Afonso da Silva, reproduzida no voto divergente do Des. José Roberto Bedran, a respeito desse fenômeno contemporâneo, próprio do Estado Social: "Pois, o governo, enquanto atua e dirige a intervenção estatal, tem que assumir a iniciativa legislativa: a adoção de uma regulamentação que, desde que se manifesta através de leis em sentido técnico, postula a iniciativa do único órgão em condição de valorar todas as exigências, que é o Governo, para Direta de Inconstitucionalidade n° 0225881-83. 2009.6.26.0000 - Voto 12.353 ARTES GRÁFICAS - TJ A 41.0035 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO toda inovação e coordenação da Administração Pública da economia. De resto, o estender-se da intervenção estatal no campo econômico é conexo com o desenvolvimento paralelo da administração pela lei. Esta requer que a iniciativa da legislação seja assumida necessariamente pelo Governo como órgão que, superintendendo os vários setores da administração pública, é o único apto a cumprir a formulação política e a redação técnica dos projetos de leis, cujos fins são intimamente conexos com a iniciativa administrativa (...) é o governo o órgão mais apto a compreender as exigências globais da comunidade estatal, por ser - como disse Musso - o vértice da Administração, por dispor de meios de informação e de relevo necessário, a fim de propiciar à ordem social uma legislação adequada às necessidades coletivas, segundo o seu programa político-administrativo. O parlamentar se encontra em posição diversa: não dispõe daqueles meios, nem de informações sobre as exigências gerais da comunidade estatal, mas apenas tem conhecimento mais de perto dos interesses que o próprio colégio eleitoral lhe coloca como necessários" (Processo Constitucional de Formação das Leis, Malheiros, 2a edição, págs. 142/151). Note-se que para cumprir o estipulado na lei, ou um órgão da administração pública deverá será criado ou haverá alteração na estrutura de algum já existente, sendo certo que lei desse jaez é de iniciativa reservada ao chefe do Poder Executivo (art. 61, § Io, II, "e", da CR). Em assim sendo, pelo princípio da simetria, isto é, em função dos contornos uniformes que a Constituição Federal impõe a todos os entes federativos no que atina com o processo legislativo, a iniciativa da lei sob foco deveria ter sido do Prefeito Municipal. Direta de Inconstitucionalidade n° 0225881-83. 2009.6.26.0000 - Voto 12.353 ARTES GRÁFICAS - TJ h\ 41.0035 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Houve, por conseguinte, invasão, pelo Legislativo de Campinas, da esfera de atribuição do chefe do Poder Executivo, ofendida, assim, a cláusula da separação de poderes, um dos sustentáculos do arcabouço constitucional da República Federativa do Brasil (art. 2o da CF), tanto que pétrea, disposta igualmente no art. 5o da Constituição do Estado de São Paulo. E sendo o processo legislativo um dos princípios que informam aquele da separação de poderes, restou violado também o art. 144 da Constituição do Estado. 3. De todo o exposto, com o devido respeito, alinho-me à divergência e também julgo procedente a ação para declarar a inconstitucionalidade da Lei n° 13.582/2009, do Município de Campinas, por contrariedade aos arts. 5o, caput, 25, 47, II e 144 da Constituição do Estado de São Paulo. WALTER DE ALMEIDA GtJILHERME Direta de Inconstitucionalidade n° 0225881-83. 2009.6.26.0000 - Voto 12.353 ARTES GRÁFICAS - TJ 41.0035