Os Principais Distúrbios Imuno-Alergológicos em Animais de
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Os Principais Distúrbios Imuno-Alergológicos em Animais de
Instituto Superior Politécnico de Viseu Escola Superior Agrária Os Principais Distúrbios Imuno-Alergológicos em Animais de Companhia Trabalho Final de Curso Enfermagem Veterinária Mauro Gomes Matias Viseu, 2011 Instituto Superior Politécnico de Viseu Escola Superior Agrária Os Principais Distúrbios Imuno-Alergológicos em Animais de Companhia Trabalho Final de Curso Enfermagem Veterinária Mauro Gomes Matias Orientador: Dr. João Mesquita Viseu, 2011 (Orientador da ESAV) __________________ (Dr. João Mesquita) “As doutrinas expressas são inteiramente da responsabilidade do autor.” “O futuro é passado no presente”. Anónimo AGRADECIMENTOS Quero agradecer ao meu orientador interno, Dr. João Mesquita, pelo auxílio incondicional, prontidão e rapidez ao longo da realização deste trabalho. De seguida quero agradecer ao Dr. Luís Montenegro, por me ter acolhido na sua equipa excepcional, e ter-me proporcionado desta forma, 6 meses de estágio, repletos de muitos conhecimentos e experiências que nunca esquecerei. Um muito obrigado a toda a equipa pela experiência inesquecível! Um especial agradecimento: Aos meus pais, pelo apoio e pela oportunidade de me ajudarem na formação do que realmente gosto e que me faz muito feliz, pois sem eles não teria sido possível a realização desta Licenciatura. Muito obrigado! À minha irmã, pelas opiniões, pelo conforto, pela força inesgotável ao longo destes anos, não só em termos académicos, mas também a nível pessoal. Obrigado por fazeres parte da minha vida. A uma pessoa muito especial, a Catarina, que tive o prazer de conhecer em Terras de Viriato e, que me acompanhou ao longo destes últimos anos. Estando sempre presente ao meu lado, e que me ajudou nos momentos académicos mais difíceis. O meu muito obrigado. Também, quero agradecer a todos as pessoas, com quem travei amizades em Viseu e no local de estágio, no Porto. Pessoas estas que estarão sempre comigo. Um obrigado a todos pelos conhecimentos, explicações, momentos inesquecíveis, alegrias e risos que ficarão sempre comigo. Por fim, mas não menos importante, estou agradecido a todos os professores da Escola Superior Agrária de Viseu, por todos os ensinamentos que transmitiram e que permitiram fazer-me crescer não só como Enfermeiro Veterinário mas também como pessoa. VI RESUMO A alergia é um estado de hipersensibilidade em que a exposição do animal a substâncias geralmente inofensivas, conhecidas como alergénios desencadeia uma reacção exagerada do sistema imunitário. A incidência destas reacções alérgicas tem aumentado quer em humanos, quer nos animais de estimação, gerando acrescida e justificada preocupação na área da Saúde Animal. As alergias mais importantes em clínica são no essencialmente três, a dermatite por alergia à picada de pulga, a dermatite atópica e a hipersensibilidade alimentar. As pulgas são os parasitas responsáveis pela dermatite alérgica à picada da pulga, uma das alergias mais frequentes nos animais. Os sintomas desta alergopatia incluem prurido na zona lombo-sagrada, na zona caudal e medial das coxas, no ventre e pode, inclusive, ser generalizado. A dermatite atópica é causada pela penetração de alergénios através da pele, que apresenta alterações da barreira epidérmica, sendo que após a penetração do alergénio existe uma resposta de hipersensibilidade tipo I. Para além da dermatite por alergia à picada de pulga e da dermatite atópica, há ainda a alergia alimentar, que engloba todas as reacções adversas que se produzem após ingestão de um alimento. À medida que se foram conhecendo os mecanismos que desencadeiam estas reacções, houve uma adaptação da terminologia a cada situação. Assim, irei abordar as etiologias, sinais clínicos, diagnósticos e tratamentos das respectivas hipersensibilidades. PALAVRAS-CHAVE: Alergia, Alergénios, Dermatite alérgica à picada da pulga, Dermatite atópica, Hipersensibilidade Alimentar, Prurido VII ABSTRAT Allergy is a state of hypersensitivity in which exposure of the animal to generally harmless substances known as allergens triggers an overreaction of the immune system. The incidence of allergic reactions has increased both in humans or in pets, causing increased concern and justified in the Animal Health. The most important clinical allergies are essentially three in the dermatitis caused by flea bite allergy, atopic dermatitis and food hypersensitivity. Fleas are parasites responsible for allergic dermatitis flea bite, one of the most common allergies in animals. Symptoms include itching in the loin-sacral area, in the area caudal and medial thighs, belly and can even be generalized. Atopic dermatitis is caused by the penetration of allergens through the skin, with alterations of the epidermal barrier, and after penetration of the allergen exists a type I hypersensitivity response Apart from dermatitis flea bite allergy and atopic dermatitis, there is still a food allergy, which includes all adverse reactions that occur after ingestion of a food. As they were getting to know the mechanisms that trigger these reactions, there was an adaptation of the terminology in every situation. So, I will approach the etiology, clinical signs, diagnosis and treatment of their sensitivities. KEY-WORDS: Allergy, Allergens, Allergic Dermatitis Flea Bite, Atopic Dermatitis, Food Hypersensitivity, Pruritus VIII ÍNDICE ÍNDICE GERALGERAL AGRADECIMENTOS…………………………………..……………………..…... VI RESUMO…………………………………………………………….….................... VII ABSTRAT...…………………………………………………….………….……….. VIII ÍNDICE GERAL…………………………………………………….…................... IX ÍNDICE DE FIGURAS E QUADROS……………………………………..……... XII ABREVIATURAS E SIGLAS………………………………………..…...……...... XVI 1.INTRODUÇÃO………………………………………………….……….….….... 1 2.REVISÃO BIBLIOGRÁFICA……………………………………..……...…….. 3 2.1. HIPERSENSIBILIDADES……………………………………………...…… 3 2.1.1. HIPERSENSIBILIDADE TIPO I……………………………............ 3 2.1.2. HIPERSENSIBILIDADE TIPO II…………………........................... 3 2.1.3. HIPERSENSIBILIDADE TIPO III……….......................................... 4 2.1.4. HIPERSENSIBILIDADE TIPO IV………......................................... 4 2.2. FACTORES INTENSIFICADORES DAS HIPERSENSIBILIDADES ALÉRGICAS………………………………………………………………………… 5 2.3. NOÇÃO DE LIMIAR DE PRURIDO………………………………..……… 7 2.3.1. PRURIDO………………………………………………………….…… 7 2.3.2. LIMIAR DO PRURIDO……………………………………………..…. 7 2.4. ATOPIA……………………………………………………………………… 9 2.4.1. PATOGÉNESE…………………………………………………………. 10 2.4.2. INCIDÊNCIA…………………………………………………………... 11 2.4.2.1. PRINCIPAIS RAÇAS PREDISPOSTAS…………………………. 11 2.4.2.2. HEREDITARIEDADE……………………………………………. 12 2.4.2.3. IDADE……………………………………………………………... 12 2.4.2.4. SEXO………………………………………………………………. 13 2.4.3. BARREIRA CUTÂNEA……………………………………………….. 13 2.4.3.1. SITUAÇÃO NORMAL…………………………………………… 13 2.4.3.2. EM CÃES ATÓPICOS……………………………………………. 13 2.4.4. SINAIS CLÍNICOS…………………………………………………….. 14 2.4.5. DIAGNÓSTICO………………………………………………………... 15 2.4.5.1. ANAMNESE………………………………………………………. 15 2.4.5.2. EXAME DO ESTADO GERAL…………………………………... 16 IX 2.4.5.3. EXAME DERMATOLÓGICO……………………………………. 17 2.3.5.4. RASPAGENS CUTÂNEAS………………………………………. 18 2.4.5.5. CITOLOGIA CUTÂNEA…………………………………………. 18 2.4.5.6. REACÇÕES INTRADÉRMICAS………………………………… 19 2.4.5.7. DOSEAMENTOS SEROLÓGICOS DE IGE……………………... 20 2.4.5.8. DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL………………………………… 21 2.4.6. TRATAMENTO………………………………………………………... 21 2.4.6.1. EVICÇÃO DO ALERGÉNIO……………………………………... 22 2.4.6.2. IMUNOTERAPIA…………………………………………………. 23 2.4.6.3. CORTICOSTERÓIDES…………………………………………… 24 2.4.6.4. CICLOSPORINA………………………………………………….. 25 2.4.6.5. AGENTES ANTI-INFECCIOSOS: ANTIBIÓTICOS E ANTIFÚNGICOS……………………………………………………………………. 25 2.4.6.6. ANTIFÚNGICOS…………………………………………………. 26 2.4.6.7. ANTI-HISTAMÍNICOS…………………………………………... 26 2.4.6.8 TÓPICOS…………………………………………………………... 27 2.4.6.9. CHAMPÔS………………………………………………………… 29 2.4.6.10. EMOLIENTES, HIDRATANTES……………………………….. 29 2.4.6.11. ÁCIDOS GORDOS ESSENCIAIS………………………………. 29 2.4.6.12. OUTROS…………………………………………………………. 30 2.5 ALERGIA ALIMENTAR……………………………………………………. 32 2.5.1. ETIOLOGIA……………………………………………………………. 32 2.5.2. PATOGÉNESE…………………………………………………………. 33 2.5.3. CÃES…………………………………………………………………… 34 2.5.3.1. IDADE……………………………………………………………... 34 2.5.3.2. RAÇA……………………………………………………………… 34 2.5.3.3. SINAIS CLÍNICOS………………………………………………... 34 2.5.4. GATOS…………………………………………………………………. 35 2.5.4.1. IDADE……………………………………………………………... 35 2.5.4.2. RAÇA……………………………………………………………… 35 2.5.4.3. SINAIS CLÍNICOS………………………………………………... 35 2.5.5. DIAGNÓSTICO……………………………………………………...… 36 2.5.5.1. TESTE ALÉRGICO INTRADÉRMICO………………………….. 36 X 2.5.5.2 TESTE SEROLÓGICO POR ELISA………………………………. 37 2.5.5.3. HIPOSSENSIBILIZAÇÃO………………………………………... 37 2.5.5.4. ENSAIOS DIETÉTICOS DE RESTRIÇÃO PROTEICA………… 37 2.5.6. DIAGNÓSTICOS DIFERENCIAIS……………………………………. 40 2.5.7. MANEIO………………………………………………………………... 40 2.5.8. TRATAMENTO E PROGNÓSTICO…………………………………... 40 2.6. HIPERSENSIBILIDADE À PICADA DA PULGA………………………… 42 2.6.1. ETIOLOGIA……………………………………………………………. 43 2.6.2. ETIOPATOGENIA……………………………………………………... 44 2.6.3. INCIDÊNCIA…………………………………………………………... 45 2.6.4. SINAIS CLÍNICOS…………………………………………………….. 46 2.6.4.1. CÃES………………………………………………………………. 46 2.6.4.2. GATOS…………………………………………………………….. 47 2.6.5. DIAGNÓSTICO………………………………………………………... 47 2.6.6. TRATAMENTO E PROFILAXIA………...…………………………… 47 2.7. PAPEL DO ENFERMEIRO VETERINÁRIO………….………………………. 54 3. CASO CLÍNICO……….…………………………………..……………………... 56 3.1. PRIMEIRO CASO CLÍNICO…………………..…..……………..………… 56 3.1.1. DADOS DO PACIENTE………………..……………………………… 56 3.1.2. EXAMES COMPLEMENTARES……………………………….…….. 56 3.1.2.1. TESTES ALÉRGICOS (ELISA)………..………………………… 56 3.1.3. DISCUSSÃO DE RESULTADOS………………...…………………………… 57 3.2. SEGUNDO CASO CLÍNICO………………………….……………………………. 58 3.2.1. DADOS DO PACIENTE………………………………………………………. 58 3.2.2. HISTÓRIA CLÍNICA………………………………………………………….. 58 3.2.3. EXAMES COMPLEMNETARES……………………………………………... 59 3.2.3.1. TESTES ALÉRGICOS (ELISA)…………………………………………. 59 3.2.4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS…………………………………………… 61 4.CONCLUSÃO…………………………………………………………………….. 62 5.REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS………………………………………….. 63 6.ANEXOS………………………………………………………………………….. 71 XI ÍNDICE DE FIGURAS E QUADROS Figura 1. Representação esquemática das lesões dérmicas provocadas pelo acto de coçar. A gravidade das lesões é proporcional à frequência e intensidade com que o animal se coça. Muitas vezes os pêlos apresentam-se partidos e a epiderme “descamada”…………………….………………………………………………..…………..7 Figura 2. O efeito cumulativo de diferentes alergénios – ambientais, alimentares ou parasitários – leva o cão a ultrapassar o seu próprio limiar de tolerância e provoca prurido acentuado....…………………………………………………………………..…….8 Figura 3. O temperamento do cão, que varia consoante a raça e o próprio indivíduo, influencia o seu limiar de tolerância e de reactividade em caso de prurido.......……………………………………………………………………………………8 Figura 4. A dermatite atópica pressupõe uma primeira sensibilização do cão aos alergénios (fase A). Neste processo participam diversas células e a sua activação provoca a libertação de mediadores inflamatórios (fase B) responsáveis por manifestações clínicas, como é o caso do prurido. Deste modo, quando um cão previamente sensibilizado, contacta com o alergénio, produz-se a desgranulação dos mastócitos, com consequente libertação de mediadores inflamatórios que, entre outros sintomas, originam o prurido………………………………………………..…….11 Figura 5. Corte histológico da pele………….……………………………….…………..13 Figura 6. Uma West Highland White Terrier, atópica de seis anos. À esquerda revela eritema, papúlas auriculares e uma ligeira otite. À direita, apresenta, a nível do abdómen ventral, eritema. Consultar caso clínico……………………………………...14 Figura 7. À esquerda, a distribuição esquemática ventral das lesões de atopia e, à direita a localização dorsal das lesões………….……………..…………………………18 Figura 8. À esquerda, a realização de teste alérgico intradérmico. À direita, o resultado de teste alérgico intradérmico, em que a seta vermelha indica o controlo XII positivo e, a verde o controlo negativo. As setas amarela e azul indicam, respectivamente, uma reacção positiva e a uma reacção negativa……….………….20 Figura 9. Principais linhas de acção terapêutica……………………………………….22 Figura 10. Para limitar a carga alergénica, pode revelar-se útil habituar o animal de estimação a dormir num colchão adaptado para evitar a proliferação de ácaros………………………………………………………………………………………..23 Figura 11. Consoante a raça, existem variações significativas ao nível do pH da pele. Provavelmente, este fenómeno é um dos factores que explica a frequência de superinfecções bacterianas em determinadas raças (Pastores Alemães)………………………………………………………………………………….…28 Figura 12. A curcumina ajuda no combate das infecções secundárias e podem, eventualmente, favorecer a redução dos tratamentos convencionais………………..31 Figura 13. Aloé vera…………………………………………………………………..……31 Figura 14. Representação esquemática da localização das lesões……………….…35 Figura 15. Imagem microscópica de um exemplar da espécie Ctenocephalides felis, com ampliação de 40x…………………………………………….……………………….44 Figura 16. Ciclo de vida da pulga…………………………………………….………..…44 Figura 17. Ilustração que esquematiza os vários sinais clínicos……………………..46 Figura 18. Distribuição esquemática das lesões de DAPP…………………………...47 Figura 19. À esquerda, a zona axilar do paciente com algum eritema e descoloração do pêlo, indicativo das constantes mordeduras pelo paciente, como forma de alívio. À direita, o paciente apresenta eritema evidente na zona abdominal ventral e inguinal…………………………………………………………………………………..…..59 XIII Figura 20. Nível da concentração de pólen do Pinus Pinaster presente no ar, no decorrente mês de Março………………………………………………………………….60 Figura 21. Nível da concentração de pólen do Pinus Pinaster presente no ar, no decorrente mês de Abril……………………………………………………………………60 Figura 22. Nível da concentração de pólen do Olea europaea presente no ar, no decorrente mês de Março……………………………………………………………….…60 Figura 23. Nível da concentração de pólen do Olea europaea presente no ar, no decorrente mês de Abril……………………………………………………………………61 Figura 24. Nível da concentração de pólen do Olea europaea presente no ar, no decorrente mês de Maio………………………………………………………………...…61 Quadro 1. Principais raças caninas com predisposição para a atopia. A doença também pode ocorrer em outras raças e em alguns cruzamentos……………….…..11 Quadro 2. Padrão de distribuição das manifestações clínicas da DA segundo Prélaud (1998)………………………………………………………………………………15 Quadro 3. Em 1986, um artigo que constitui ainda uma referência na matéria, Ton Willemse publicou uma lista dos critérios de diagnóstico principais e secundários que podem ser utilizados para corroborar uma suspeita de DA. O cão deverá apresentar, no mínimo, três de cada categoria………………………………………………………..16 Quadro 4. Estes diferentes critérios foram adaptados aos animais por Pascal Prélaud, em 1998 (os critérios de Willemse foram obtidos da medicina humana). Neste caso também, uma reacção positiva pelo menos a três das condições constitui uma forte suspeita de DA………………………………………………………………….17 Quadro 5. Principais antibióticos tópicos usados em animais atópicos….………….28 XIV Quadro 6. Principais tópicos anti-sépticos usados em animais atópicos……………28 Quadro 7. Algumas das situações em que se deve suspeitar de hipersensibilidade alimentar……………………………………………………………………………………..39 Quadro 8. Principais diagnósticos diferenciais no cão e no gato…………………….40 Quadro 9. Algumas características dos compostos utilizados somente nos hospedeiros no controlo de pulgas……………………………………………………….49 Quadro 10. Algumas características dos princípios activos recentemente utilizados nos animais no controlo de pulgas……………………………………………………….50 Quadro 11. Algumas características das substâncias utilizadas no controlo de pulgas, quer nos hospedeiros quer no ambiente……………………………………….52 Quadro 12. O papel do EV na divulgação, prevenção e aconselhamento das alergias………………………………………………………………………………………59 XV ABREVIATURAS E SIGLAS Siglas Ags – antigénios AIM – Autorização de Introdução no Mercado DA – Dermatite Atópica DAPP – Dermatite Alérgica à Picada da Pulga EEG – Exame do Estado Geral EV – Enfermeiro Veterinário IgE – Imunoglobulina E IgG – Imunoglobulina G IgM – Imunoglobulina M IL – Interleucina Lb – Linfócitos B Lt – Linfócitos T MV – Médico Veterinário Abreviaturas % - Por cento D – Dia Kg – Quilograma Mg - Miligrama XVI 1. INTRODUÇÃO A dermatologia é um campo muito complexo. Se, por um lado, o animal pode ser alvo de uma patologia de pele, por outro pode sofrer de alterações ou manifestações na pele que reflectem a presença de doenças ou alterações internas. A pele é um órgão que reflecte o interior do organismo (Silva, 2011). A palavra alergia foi introduzida no vocabulário médico pelo austríaco Clemens von Pirquet em 1906. No seu sentido etimológico pode ser entendida como uma força (-ergos) anormal (-al), ou seja, uma reactividade anormal do organismo face a estímulos externos. Os factores endógenos (predisposição individual) eram os mais importantes na génese dessa reactividade anormal, a qual tanto podia ser no sentido de um aumento como no de uma diminuição da reactividade imunitária. Contudo, a evolução histórica do termo alergia deu-se no sentido de actualmente se restringir o conceito às reacções de hipersensibilidade mediadas pelo sistema imunitário (Ferreira, 2011). O número de animais com alergias está a aumentar por várias razões. Existem raças com predisposição às doenças alérgicas, como os Golden Retriever ou o Bulldog Francês, raças cada vez mais procuradas. Para fazer frente a esta procura fazem-se cruzamentos consanguíneos entre animais, o que reforça a componente hereditária que apresenta a alergia. Todavia, existem cada vez mais, no nosso ambiente, novos alergénios, aos quais o sistema imunitário não está habituado e, para além disso, outros que se tornaram mais agressivos, como por exemplo alguns pólenes, que ao unirem-se às partículas de chumbo dos motores a gasóleo se tornam mais alérgicos. Outra teoria, é a da higiene, baseada no facto de que ao receberem muitas vacinas desde pequenos, o sistema imunológico dos animais não aprende a responder de forma adequada e pode fazê-lo de forma exagerada perante antigénios que em outras circunstâncias não reagiria (Silva, 2011). Por último, alerta-se ainda para o facto de que ao aumentar o conhecimento veterinário sobre esta doença, também se começa a diagnosticar mais (Silva, 2010). Uma vez que o número de casos de alergias tem tido uma evolução exponencial, torna-se evidente a sua melhor compreensão para prevenir, diagnosticar e tratar da melhor maneira possível. Visto esta ser uma patologia de elevada incidência e complexidade, o presente trabalho tem como objectivos: 1 Estudar quais os tipos de hipersensibilidades mais comuns (tipo I e tipo IV), nomeadamente a atopia, a alergia alimentar e a dermatite alérgica à picada da pulga; Avaliar quais são as razões para as alergias terem aumentado na última década; Compreender as várias etiologias, patogéneses, identificação dos sinais clínicos, e respectivos diagnósticos e tratamentos; Abordar o desenvolvimento de alimentos comerciais para cães e gatos, que contêm proteínas hidrolisadas, melhorando de forma substancial a fiabilidade dos testes dietéticos de eliminação e o tratamento a longo prazo da alergia alimentar; Divulgar qual o tratamento adequado ao estilo de vida de cada animal, no caso das hipersensibilidades à picada da pulga, assim como, os tratamentos mais recentes; Dar a conhecer o papel do enfermeiro veterinário, como a sensibilização e prevenção dos clientes. Estudo e apresentação de casos clínicos observados durante o estágio curricular no Hospital Veterinário Montenegro, no Porto; 2 2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 2.1. HIPERSENSIBILIDADES As hipersensibilidades (ou reacções de hipersensibilidade) são reacções excessivas mediadas pelo sistema imunitário, a estímulos que não seriam prejudiciais a um animal normal. Algo, como os grãos de pólen podem provocar sinais evidentes de prurido, conjuntivites e espirros persistentes em determinadas épocas do ano, a alguns animais, enquanto outros animais da mesma família ou animais co-habitantes não serão afectados (Brooks, 2010). Os quatro tipos de hipersensibilidade são classificados em tipos: um, dois, três e quatro e, são convencionalmente escritos em numeração Romana (I, II, III e IV). Na realidade, por vezes, as síndromes clínicas envolvem mais que um tipo (I-IV) de reacções de hipersensibilidade (Brooks, 2010). No inicio da década de 60, as reacções de hipersensibilidade foram divididas em quatro tipos por Coombs e Gell de tipo I a tipo IV. 2.1.1. HIPERSENSIBILIDADE TIPO I A hipersensibilidade do tipo I é também conhecida como hipersensibilidade imediata e é a base aguda das respostas alérgicas (Brooks, 2010). Assim, a hipersensibilidade tipo I são reacções mediadas por anticorpos imunoglobulina E (IgE) que se ligam a receptores específicos presentes na superfície de mastócitos e basófilos (Brooks, 2010). Quando os anticorpos IgE se ligam aos antigénios, os mastócitos e basófilos libertam substâncias (desgranulação) que causam manifestações clínicas (Oliveira, 2009; Brooks, 2010). A desgranulação, significa que os mastócitos estimulados libertam o conteúdo dos seus grânulos citoplasmáticos (Brooks, 2010). Essas reacções são rápidas e ocorrem dentro de minutos após a reexposição ao antigénio (Oliveira, 2009). 2.1.2. HIPERSENSIBILIDADE TIPO II Também conhecida como hipersensibilidade citotóxica, o tipo II de hipersensibilidade é uma resposta imune em que os elementos do sistema imune são dirigidos para o ataque das células do próprio organismo (Brooks, 2010). Estas ocorrem quando anticorpos imunoglobulina M (IgM) ou imunoglobulina G (IgG) se 3 ligam ao antigénio presente na superfície de células e activam a cascata de complemento (produção de proteínas em que uma se adiciona a outra) que leva à lise celular ou fagocitose por macrófagos (Oliveira, 2009). Isto ocorre porque as células-alvo podem ser inadequadamente marcadas com anticorpos, sendo identificadas como prejudiciais (Brooks, 2010). Um exemplo comum é a destruição de glóbulos vermelhos imunomediada. (Brooks, 2010). 2.1.3. HIPERSENSIBILIDADE TIPO III Neste tipo de hipersensibilidade, os danos teciduais resultam da acumulação de agregados de anticorpos e de antigénios - formando aglomerados de proteínas chamados complexos imunes (Brooks, 2010). Estes ocorrem quando os complexos formados por antigénio e IgG ou IgM se acumulam na circulação ou nos tecidos e, activam a cascata de complemento (Oliveira, 2009). Os aglomerados actualmente compõem a maioria das respostas imunes, mas estes geralmente são destruídos por células fagocíticas. Quando há estimulação imunológica excessiva, os complexos podem acumular-se e resistir à degradação. Os complexos imunes podem permanecer no seu local de formação ou podem circular pela corrente sanguínea e alojarem-se em outros tecidos. Onde quer que eles se formem, a presença destes complexos imunes estimula a inflamação local que causa danos aos tecidos vizinhos (Brooks, 2010). Essas reacções ocorrem dentro de horas após a um próximo contacto com o antigénio (Oliveira, 2009). 2.1.4. HIPERSENSIBILIDADE TIPO IV As reacções mediadas pela imunidade celular (hipersensibilidade do tipo tardia) são mediadas por linfócitos T (Lt). Após a activação dos Lt, estes libertam citoquinas (substâncias mensageiras que estimulam as células de defesa contra o invasor) que levam à acumulação e à activação de macrófagos, que causam danos locais (Oliveira, 2009). Esta hipersensibilidade é essencialmente uma resposta inflamatória, envolvendo células do sistema imunológico e que pode levar várias horas (24-72 horas) para se desenvolver após o animal ser exposto e sensibilizado para o estímulo a que é sensível (Brooks, 2010) 4 2.2. FACTORES INTENSIFICADORES DAS HIPERSENSIBILIDADES ALÉRGICAS São vários os factores que podem intensificar o desenvolvimento das alergias, apesar de ainda não serem todos conhecidos. No entanto, a predisposição hereditária, a idade, e o sexo, por vezes, são muito relevantes. Os principais factores intensificadores das hipersensibilidades são os aeroalergénios, os trofoalergénios, os irritantes, os auto-alergénios, os alergénios microbianos e as alterações comportamentais. Os aeroalergénios mais comummente relatados são os ácaros do pó da casa, especialmente o Dermatophagoides farinae (Reedy et al., 1997; Prélaud, 1991). Alergias à descamação da pele dos seres humanos, ao pólen e ao mofo são muito mais raras. Existem reacções cruzadas entre os ácaros do pó doméstico e os ácaros parasitários, como o Otodectes cynotis, o que pode explicar, em parte, a frequência aparente da sensibilização dos gatos aos ácaros da poeira doméstica. Os alergénios provenientes dos ácaros da poeira doméstica são os principais responsáveis pela sensibilização e pelo desenvolvimento dos sinais clínicos de doenças alérgicas. Estes ácaros vivem geralmente nas roupas da cama, carpetes, tapetes e outros materiais têxteis, onde se alimentam da descamação do epitélio humano, fungos, bactérias, detritos orgânicos e secreções humanas. A exposição a alergénios de baratas também tem sido referida como causa comum de sensibilização (Farias, 2007). Os trofoalergénios são capazes de induzir uma resposta de hipersensibilidade e têm origem nas proteínas de carnes bovinas, suína, equina e de frango, do leite, do ovo, do trigo, da aveia e de derivados de soja ou de fungos e algas presentes na água. Desta forma, a grande variedade de proteínas e ingredientes utilizados na composição da ração, bem como os seus métodos de processamento e conservação, têm sido responsáveis pela indução da resposta imunoalérgica (Farias, 2007) Vários irritantes, como a lã, os tecidos sintéticos, as carpetes, os tapetes, os agentes de limpeza ambiental ou das roupas, os irritantes químicos ou presentes na superfície de plantas ou gramíneas podem provocar a irritação mecânica, modificar o pH cutâneo, alterando a esta barreira e exacerbar a resposta inflamatória (Medleau, 1996; Farias, 2007; Nuttal, 2008). 5 Os auto-alergénios são um factor intensificador das hipersensibilidades muito relevante. O trauma contínuo da pele induzido pelo prurido tem conduzido à libertação de uma proteína citoplasmática do queratinócito que tem a capacidade de activar células T, levando à formação de IgE e à libertação de citoquinas, realçando a resposta imunoalérgica e o prurido, sendo um dos responsáveis pela perpetuação e cronicidade das lesões dermatológicas (Farias, 2007). Os alergénios microbianos provocam o excesso de citoquinas, que determinam uma subexpressão de genes responsáveis pela formação de péptidos antimicrobianos na pele levando assim à indução, exacerbação e manutenção da dermatite (Farias, 2007; Nuttal, 2008). As alterações comportamentais, como a indução de ansiedade e actos compulsivos são relevantes. Adicionalmente, a libertação de neuropeptídos por fibras nervosas epidermais, induzidos pelo stress, tem sido relacionada à diminuição da apoptose e ao aumento da meia-vida dos eosinófilos, o que colabora para a iniciação ou a perpetuação dos sinais relacionados com as alergias (Farias, 2007; Nuttal, 2008). 6 2.3. NOÇÃO DE LIMIAR DE PRURIDO 2.3.1. PRURIDO Do Latim pruritus ou prurire (ter ou provocar comichão). Sensação de comichão na pele relacionada com uma afecção cutânea, com um distúrbio sistémico ou sem presença de qualquer causa fisiológica detectável (Figura 1). Trata-se de um sistema e não de uma patologia (Dethioux, 2006). Este pode apresentar inúmeras etiologias, por vezes de forma cumulativa: parasitas, agentes infecciosos, bem como alergias (Dethioux, 2006). Figura 1. Representação esquemática das lesões dérmicas provocadas pelo acto de coçar. A gravidade das lesões é proporcional à frequência e intensidade com que o animal se coça. Muitas vezes os pêlos apresentam-se partidos e a epiderme “descamada” (Adaptado de Dethioux, 2006). 2.3.2. LIMIAR DO PRURIDO De acordo com o princípio limiar alérgico, o prurido de diversas doenças de pele simultâneas possui características cumulativas (Figura 2, Página 8). Cada animal tem um limiar abaixo do qual sinais clínicos de origem pruriginosa individual não são evidentes (Kunkle & Halliwell, 2003). As diferentes causas de prurido combinam-se até que o animal excede o seu nível de tolerância e comece a coçarse (Colin, 2010). Assim, quando se consideram diversas dermatites alérgicas, todas têm tendência para precipitar o animal para além do seu limite de tolerância (Dethioux, 2006). Se tomarmos o exemplo de um cão que é simultaneamente 7 alérgico a ácaros do pó da casa (dermatite atópica), dermatite alérgica à picada da pulga (DAPP) e à carne de vaca (alergia alimentar) vai ter muito prurido (Colin, 2010). No entanto, em muitos casos uma dieta adaptada (sem carne de vaca) associada a um tratamento anti-pulgas correctamente realizado, ajuda o animal a permanecer abaixo do “limiar” de prurido incontrolável e, por consequência, o seu maneio poderá implicar métodos menos agressivos ou não tão dispendiosos (Dethioux, 2006). Contudo, é indiscutível que existem variações individuais quanto ao limite a partir do qual o animal começará a coçar-se. Um Jack Russell, mais nervoso, irá reagir com mais rapidez e intensidade a uma situação de prurido do que o São Bernardo de personalidade mais calma (Figura 3) (Dethioux, 2006). Figura 2. O efeito cumulativo de diferentes alergénios – ambientais, alimentares ou parasitários – leva o cão a ultrapassar o seu próprio limiar de tolerância e provoca prurido acentuado (Adaptado de Dethioux, 2006). Figura 3. O temperamento do cão, que varia consoante a raça e o próprio indivíduo, influencia o seu limiar de tolerância e de reactividade em caso de prurido (Adaptado de Anónimo, 2010a; Luly 2011). 8 2.4. ATOPIA A dermatite atópica (DA), é uma tendência hereditária a desenvolver anticorpos IgE a alergénios ambientais (pólenes de gramíneas, árvores ou ervas, agentes epidérmicos, insectos ou ácaros) que se podem expressar através de sintomas respiratórios, digestivos, oculares ou dermatológicos (Scott, 1995; Reedy et al., 1997; White, 2002). Embora a teoria mais popular afirme que esta se desenvolva após uma sensibilização a alergénios ambientais através do tracto respiratório, com lesões a nível ventral, podal e facial, também algumas das lesões são devido à exposição percutânea Esta doença representa uma proporção significativa de doenças da pele do cão, tendo sido estimado que afecta 3-15% da população canina (White, 2002). Acredita-se que a dermatite atópica felina é uma reacção de hipersensibilidade do tipo I aos alergénios ambientais. Há muitos exemplos de reacções de hipersensibilidade cutânea e respiratória em gatos causados por exposição a aeroalergénios. A atopia felina pode causar sinais clínicos de origem focal ou difusa (White, 2002). A atopia é, depois da DAPP, o segundo distúrbio de pele alérgico mais comum em cães e gatos (White, 2002). A Dermatite atópica é considerada a segunda doença de pele mais comum em cães alérgicos (Griffin, 1993; Scott, 1995; Reedy et al., 1997). Em ambientes onde não há pulgas, a atopia é considerada a doença de pele alérgica mais comum (Griffin, 1993; Scott, 1993). Uma vez que este quadro dermatológico se desenvolve, os animais tendem a expressar clinicamente a doença de forma intermitente ou constante para o resto de suas vidas. Portanto, quando a um paciente é diagnosticado atopia, o Médico Veterinário (MV) necessita de fazer um compromisso com o tratamento e maneio desta doença para o resto da vida do animal (Rosser, 1999). 9 2.4.1. PATOGÉNESE Antigamente considerava-se a via inalatória como uma das vias de entrada dos alergénios no organismo do animal, colocando-se também a hipótese de ocorrer a ingestão dos mesmos. Actualmente, a primeira teoria é rejeitada, por falta de evidências, ao contrário do que ocorre no homem (Scott, 1997; Olivry & Hill, 2001; Mauldin, 2006). Sabe-se hoje, que a principal via de penetração dos alergénios é a percutânea, facto este comprovado por estudos realizados por Thierry Olivry e seus colaboradores no fim dos anos 90 (Olivry & Hill, 2001; Marsella & Olivry, 2003; Mauldin, 2006; Dethiox, 2006). Esta doença tem sido descrita como uma reacção de hipersensibilidade do tipo I, existindo um envolvimento comum mas não estritamente obrigatório de IgEs. As IgGs estão também envolvidas nesta reacção apesar de não se conhecer bem o seu papel na DA (Mueller & Jackson, 2003). A forma como o animal reage após o contacto com um potencial alergénio é condicionada por factores genéticos, vários tipos de células inflamatórias (principalmente mastócitos, eosinófilos, neutrófilos, linfócitos, células dendríticas, células de Langerhans e células da família dos macrófagos), mediadores inflamatórios e por uma barreira cutânea deficiente. Assim as células dendríticas e as células de Langerhans processam e apresentam os antigénios (ags) aos Lt, de modo a que estes libertem interleucinas (ILs). Estas últimas vão activar os Linfócitos B (Lb), que por sua vez vão produzir as imunoglobulinas, mais especificamente IgEs, que se vão ligar à superfície dos mastócitos cutâneos – fase de sensibilização do animal aos alergénios. Mais tarde os mastócitos da derme, ao contactarem com os ags aos quais o animal é sensível, proporcionam a ligação entre estes e as IgEs que existem à superfície da referida célula inflamatória. Esta ligação provoca a desgranulação dos mastócitos, com libertação de substâncias inflamatórias como histamina, serotonina, enzimas, leucotrienos, citoquinas e o Factor α de Necrose Tumoral. As substâncias inflamatórias libertadas vão interagir com outras células inflamatórias desencadeando alterações vasculares relacionadas com a inflamação (edema, prurido, vasodilatação, quimiotaxia dos eosinófilos) e broncoconstrição – fase de libertação dos mediadores inflamatórios e consequentes manifestações clínicas (Figura 4, Página 11) (Hill & Olivry, 2001; Dethiox, 2006). 10 Figura 4. A dermatite atópica pressupõe uma primeira sensibilização do cão aos alergénios (fase A). Neste processo participam diversas células e a sua activação provoca a libertação de mediadores inflamatórios (fase B) responsáveis por manifestações clínicas, como é o caso do prurido. Deste modo, quando um cão previamente sensibilizado, contacta com o alergénio, produz-se a desgranulação dos mastócitos, com consequente libertação de mediadores inflamatórios que, entre outros sintomas, originam o prurido (Adaptado de Dethioux, 2006). 2.4.2. INCIDÊNCIA 2.4.2.1. PRINCIPAIS RAÇAS PREDISPOSTAS a) Cão Quadro 1. Principais raças caninas com predisposição para a atopia. A doença também pode ocorrer em outras raças e em alguns cruzamentos (Adaptado de White, 2002; Mueller & Jackson, 2003; Prélaud, 2005). American Staffordshire Bull Terrier Jack Russell Terrier Boston Terrier Labrador Retriever Boxer Lhasa Apso Bull Terrier Pastor Alemão Bulldog Francês Pug Bulldog Inglês Schnauzer Cairn Terrier Scottish Terrier Cavalier King Charles Setters Dálmata Shar pei Fox Terrier Shih tzu Golden Retriever West Higland White Terrier b) Gato No gato, a atopia é diagnosticada com menos frequência do que no cão, como tal, não existem dados de nenhuma predisposição (White, 2002). 11 2.4.2.2. HEREDITARIEDADE Devido à observação clínica de que a DA ocorre com mais frequência em certas raças de cães e em certas linhas familiares, presume-se que há uma predisposição genética para a doença (Nuttal, 2009). Não há dúvidas de que factores genéticos estão envolvidos, e que a sensibilidade pode ser transmitida de um animal para sua descendência (Colin, 2010). A predisposição genética tem que ser vista em perspectiva, já que as raças mais fortemente afectadas podem variar de país para país (Colin, 2010). Por isso, é possível criar linhagens de cães atópicos, sensibilizados desde uma idade muito jovem com quantidades ínfimas de alergénios (Sousa & Marsella, 2001; Colin, 2010). Assim, os animais com atopia não devem ser utilizados para a reprodução (Colin, 2010). Assim as consequências práticas destes trabalhos confirmam a importância de evitar a reprodução de animais afectados, pelo que se recomenda a esterilização dos machos e fêmeas atópicos (Dethioux, 2006). Diversos estudos avaliaram a hereditariedade desta afecção no cão. Provavelmente, o modo de transmissão é de carácter dominante, apesar de outros genes participarem igualmente no desenvolvimento da doença clínica (Sousa & Marsella, 2001). Num estudo em que foram utilizados cães Beagle, a capacidade de produzir níveis elevados de IgE estava determinada a ser geneticamente herdada de forma dominante. No entanto, os altos níveis de IgE podem ser produzidos se os animais foram sensibilizados com antigénios repetidamente entre a primeira e quarta semana de idade (Nuttal, 2009). 2.4.2.3. IDADE A DA é uma afecção observada em adultos jovens. De forma geral, os sinais clínicos manifestam-se em idades compreendidas entre o primeiro e terceiro ano, embora já tenham sido descritos casos em cães com três meses e com doze anos (Dethioux, 2006). A doença geralmente começa como uma dermatose pruriginosa com picos sazonais no Verão e no Outono. O problema pode ser transformado num modo sazonal (White, 2002). 12 2.4.2.4. SEXO Encontram-se representados ambos os sexos, embora os cães pareçam ter uma incidência ligeiramente maior (White, 2002). 2.4.3. BARREIRA CUTÂNEA 2.4.3.1. SITUAÇÃO NORMAL A pele é um órgão de grandes dimensões, uma vez que representa 24% do peso corporal em cachorros e entre 12 a 15% em cães adultos – é indispensável à vida. Funciona como barreira entre o organismo e o ambiente exterior (Figura 5). Confere protecção física e química contra traumatismos, produtos irritantes, raios solares, mas também contra microrganismos, perdas de água e de electrólitos. Esta função de barreira é desempenhada, essencialmente, pela epiderme (Dethioux, 2006). Figura 5. Corte histológico da pele (Adaptado de Dethioux, 2006). 2.4.3.2. EM CÃES ATÓPICOS A microscopia electrónica realizada aos lípidos intercelulares do estrato córneo de cães saudáveis e atópicos, revelou alterações nos indivíduos com DA. As lamelas eram heterogéneas e, quando presentes, apresentavam uma estrutura anormal. Para além disso, quando se compara a epiderme de um cão saudável com uma amostra recolhida numa zona ilesa de um animal atópico, constata-se uma alteração na continuidade e espessura das lamelas lipídicas intercelulares dos cães doentes (Inman, 2001). 13 Com base nestas observações, compreende-se facilmente que a epiderme dos cães atópicos tenha tendência para desidratar e seja menos estanque à penetração de antigénios. Em medicina humana, a utilização de tópicos hidratantes e emolientes faz parte do tratamento diário essencial dos doentes com dermatite atópica. Tendo em conta o obstáculo que o pêlo representa, bem como, as dificuldades associadas à aplicação de champô e loções nos carnívoros domésticos, potencializar a função da barreira cutânea através de alimentação afigura-se como uma solução alternativa muito interessante (Dethioux, 2006). 2.4.4. SINAIS CLÍNICOS De todos os animais afectados, 60-70%, tinham lesões visíveis na pele (White, 2002). O principal sinal da doença é o prurido, que o animal exibe coçando, lambendo, mordiscando ou esfregando a área afectada. Outros sinais incluem irritabilidade, e, por vezes, alterações de comportamento (perda de apetite, agressividade) (Dethioux, 2006). Os sinais clínicos são causados por lesões de autotraumatismo induzidos pelo prurido (Harvey & Wilkison, 1996). As áreas mais frequentemente afectadas são a face (especialmente a região periorbital e do focinho), região palmar/plantar, região ventral do abdómen, região axilar/inguinal, canal auditivo e pavilhão auricular (Figura 6). Quando o canal auditivo e, o pavilhão auricular são afectados, a otite externa ou média é uma complicação comum. Da mesma forma, quando a região afectada é a periorbital, desenvolve-se frequentemente a conjuntivite (Rosser, 1999). Na DA, o prurido tanto pode ser localizado (por exemplo, uma otite, representando o único sintoma da afecção, como sucede nas alergias alimentares), como generalizado, sendo esta última a situação mais frequente (Dethioux, 2006). Figura 6. Uma West Highland White Terrier, atópica de seis anos. À esquerda revela eritema, papúlas auriculares e uma ligeira otite. À direita, apresenta, a nível do abdómen ventral, eritema. Consultar caso clínico. (Original do autor). 14 Quadro 2. Padrão de distribuição das manifestações clínicas da DA segundo Prélaud (1998) (Adaptado de Nóbrega D, 2010). Formas Típicas Forma Clássica Forma Grave Localização do prurido: na face – pavilhões auriculares, lábios, pálpebras; e/ou nos dígitos; e/ou região inguinal, região axilar, cotovelo ou jarrete e região anal; Lesões: são primárias - eritema ou pápulas, por vezes com alteração da pigmentação dos pêlos; Uma xerose cutânea intensa pode traduzir-se numa pelagem com aspecto baço ou as lesões podem ser extensas e devidas ao prurido - alopécia, liquenificação, escoriações e hiperpigmentação; Maioria dos cães atópicos evolui para esta forma na ausência de tratamento. Desenvolve-se devido à cronicidade ou a uma associação com alterações importantes na formação da camada córnea; Prurido: violento; Estado geral: pode estar alterado; Infecções bacterianas e/ou fúngicas (Malassezia spp.) de superfície: quase sistemáticas; Esta forma é rara nos animais; Lesões: generalizadas por todo o corpo. Formas Atípicas São essencialmente as formas localizadas de DA: otite externa isolada, pododermatite bilateral e hiperqueratose perimamilar; Estas manifestações isoladas desenvolvem-se antes que o prurido constitua o motivo da consulta; O prurido, moderado ou nulo, pode não ser observado pelo proprietário. 2.4.5. DIAGNÓSTICO O diagnóstico da DA é baseado numa anamnese detalhada, Exame do Estado Geral (EEG) minucioso, exclusão de doenças que causam manifestações clínicas idênticas e provas alérgicas positivas, já que não existem sintomas e lesões patognomónicos desta afecção (DeBoer & Hiller, 2001; Halliwell, 2006). Devem então estar presentes uma combinação de sintomas e lesões fortemente associados com a doença (DeBoer e Hiller, 2001) e ser dada especial importância à dieta, idade das primeiras manifestações da doença, controlo anti-parasitário efectuado e presença ou não de sazonalidade ou variações associadas ao ambiente onde o animal vive (Vieira, 2008). A partir do momento em que se chega ao diagnóstico da doença existem duas opções, iniciar o tratamento sintomático e/ou utilizar os dados recolhidos nos testes alérgicos para instituir um tratamento etiológico (Halliwell, 2006). 2.4.5.1. ANAMNESE Esta parte da consulta é de importância extrema. De facto, o MV só poderá orientar o seu diagnóstico de forma precisa com base numa história detalhada. É imprescindível recolher toda a informação disponível sobre o caso, que permita confirmar ou excluir uma suspeita. Para além disso, conhecer o modo de vida do 15 animal, o seu ambiente, a eventual presença de congéneres, a evolução dos sinais clínicos, ajuda o MV a eliminar, logo à partida, diversos diagnósticos diferenciais (Dethioux, 2006). Para evitar esquecimentos, uma ficha-dermatológica, previamente preparada, revelar-se-á bastante útil (Dethioux, 2006). Dever-se-á dar particular destaque à dieta, aos tratamentos anti-parasitários, ao momento em que a sintomatologia se manifestou pela primeira vez na vida do animal, assim como as eventuais variações associadas à época do ano ou ao ambiente em que o animal vive (Dethioux, 2006). 2.4.5.2. EXAME DO ESTADO GERAL Antes de analisar as lesões dermatológicas e realizar exames complementares de diagnóstico, é indispensável realizar um EEG completo, sem esquecer a cavidade oral (uma afecção dentária pode estar na origem de sialorreia que, por sua vez, provoca uma queilite), as articulações, o sistema urogenital (incontinência responsável pela dermatite) (Quadro 3) (Dethioux, 2006). O eventual diagnóstico de afecções concomitantes influência a opção do tratamento (incompatibilidade de certas moléculas com o decréscimo de algumas funções biológicas) (Dethioux, 2006). Quadro 3. Em 1986, um artigo que constitui ainda uma referência na matéria, Ton Willemse publicou uma lista dos critérios de diagnóstico principais e secundários que podem ser utilizados para corroborar uma suspeita de DA. O cão deverá apresentar, no mínimo, três de cada categoria (Adaptado de Dethioux, 2006). Critérios principais Prurido Distribuição típica: facial e/ou digital, liquenificação ao nível do tarso e/ou carpo Dermatite crónica ou recorrente Antecedentes individuais ou familiares de atopia e/ou presença de predisposição racial Critérios secundários Aparecimento dos sintomas antes dos 3 anos d vida Eritema facial, Queilite Conjutivite bilateral Piodermite superficial estafilócocica Hiperhidrose Reacções cutâneas positivas em testes a alergénios ambientais Níveis elevados de IgE específicos Níveis elevados de IgG específicos 16 Quadro 4. Estes diferentes critérios foram adaptados aos animais por Pascal Prélaud, em 1998 (os critérios de Willemse foram obtidos da medicina humana). Neste caso também, uma reacção positiva pelo menos a três das condições constitui uma forte suspeita de DA. Critérios actualizados Aparecimento de sintomas entre os 6 meses e os 3 anos Prurido responsivo aos corticosteróides Pododermatite anterior interdigital bilateral eritematosa Eritema da face interna do pavilhão auricular Queilite 2.4.5.3. EXAME DERMATOLÓGICO O prurido é o sintoma mais referido, antes da presença de lesões. Um cão com DA tanto pode evidenciar uma diversidade de lesões dermatológicas como a total ausência de sintomas visíveis, com excepção do prurido que terá motivado a consulta (Dethioux, 2006). Uma vez que é uma afecção pruriginosa, é frequente a presença de lesões (escoriações) resultantes das diversas acções do animal para minorar o prurido: coçar, esfregar, mordiscar a zona em causa (Figura 7, Página 18). A descoloração do pêlo em áreas que são constantemente humedecidas pela saliva constitui um excelente indicador. Os pêlos brancos tornam-se vermelhos e os pêlos pretos adquirem uma tonalidade acobreada (Dethioux, 2006). À medida que a doença evolui, as lesões desenvolvem-se e tornam-se crónicas, observando-se então alopécia, liquenificação, escoriações e hiperpigmentação (Dethioux, 2006). Em caso de piodermatite, é observável a presença de pápulas e pústulas (lesões primárias), e colaretes epidérmicos ou crostas (lesões secundárias) (Dethioux, 2006). Frequentemente a atopia é complicada por infecções secundárias decorrentes de proliferações bacterianas e/ou fúngicas. Estes organismos infecciosos agravam o quadro clínico por desencadearem um prurido por vezes violento (Dethioux, 2006). Em certos casos, o EEG do animal apresenta-se alterado. A localização das lesões deverá orientar as hipóteses de diagnóstico (Dethioux, 2006). 17 Figura 7. À esquerda, a distribuição esquemática ventral das lesões de atopia e, à direita a localização dorsal das lesões (Adaptado de Dethioux, 2006) 2.3.5.4. RASPAGENS CUTÂNEAS Estes exames devem ser realizados de forma sistemática. Muito embora sejam inúteis nas zonas liquenificadas (demasiado espessas e, em geral, crónicas), as raspagens de pele revelam a presença de diversos parasitas, pelo que deverão ser efectuadas em lesões recentes que não tenham sofrido ainda alterações. É aconselhável não tosquiar a área a examinar (em geral, os aparelhos de tosquia destroem a camada queratinosa, o que comporta o risco de removerem em simultâneo determinados parasitas), mas não existe qualquer contra-indicação em relação ao uso de tesouras para facilitar o acesso à pele (Dethioux, 2006). O material recolhido é espalhado numa lâmina após incorporação de uma gota de uma solução clarificante (lactofenol) ou óleo mineral, para favorecer uma boa fixação (Dethioux, 2006). 2.4.5.5. CITOLOGIA CUTÂNEA Este exame é indispensável para o diagnóstico de infecções secundárias bacterianas ou fúngicas muito frequentes na DA. Permite também monitorizar a evolução da patologia e a eficácia da terapêutica anti-infecciosa (Dethioux, 2006). A técnica adequada consiste na recolha de esfregaços, zaragatoas, ou o teste com fita adesiva, dependendo a escolha do tipo e localização da lesão. A 18 citologia do conteúdo de uma pústula diagnostica uma piodermite, muito embora na prática, a observação de pápulas, pústulas e coroas epidérmicas seja suficiente (Dethioux, 2006). Após a coloração da amostra, o exame microscópico permite identificar diferentes tipos de células envolvidas na reacção inflamatória bem como uma eventual proliferação de bactérias/leveduras (Dethioux, 2006). No caso de infecção bacteriana, devem ser observados neutrófilos para ser feito um diagnóstico conclusivo de piodermatite (Dethioux, 2006). 2.4.5.6. REACÇÕES INTRADÉRMICAS Consiste em mimetizar o que sucede num determinado indivíduo durante o episódio de atopia para tentar identificar as IgE (específicos para cada alergénio), fixados nos mastócitos da derme. Através da inoculação local do alergénio (razão do termo intradérmico), é possível observar uma reacção que corresponde à desgranulação dos mastócitos, que se traduz pela magnitude da formação de uma placa pruriginosa claramente visível (Figura 8, Página 20) (Dethioux, 2006). Os vários extractos de alergénios para uso veterinário contêm a maioria das potenciais sensibilizações a nível da Europa, muito embora seja necessário adaptar os testes à situação local. Estes produtos são de difícil conservação (armazenamento em frigorífico) e relativamente frágeis, uma vez que os extractos proteicos se encontram muito diluídos (Dethioux, 2006). Assim e por razões de ordem económica, é por vezes mais rentável para o clínico solicitar a realização dos testes intradérmicos junto de um colega especialista, do que investir num kit de testes dum prazo de validade bastante reduzido (Dethioux, 2006). Estes testes devem ser realizados, em média, duas a três vezes por semana, de forma a garantir precisão e consistência dos resultados, assim como, na sua interpretação (White, 2002). O melhor período do ano para realizar testes em animais com alergias sazonais é no fim da estação e depois dos sinais clínicos diminuíram. Os animais com alergias não sazonais devem realizar testes intradérmicos duas vezes por ano e, em períodos opostos (White, 2002). 19 Figura 8. À esquerda, a realização de teste alérgico intradérmico. À direita, o resultado de teste alérgico intradérmico, em que a seta vermelha indica o controlo positivo e, a verde o controlo negativo. As setas amarela e azul indicam, respectivamente, uma reacção positiva e a uma reacção negativa (Adaptado de Nóbrega D, 2010). 2.4.5.7. DOSEAMENTOS SEROLÓGICOS DE IGE Os testes de alergia in vitro podem ser úteis quando não é possível optar por um teste intradérmico, devido à sua indisponibilidade, a fármacos que possam causar interferência ou devido à má condição da pele (White, 2002). Consiste na identificação dos anticorpos específicos para os alergénios, em circulação no sangue do paciente. Utiliza-se a reacção de ELISA (Enzyme Linked ImmunoSorbent Assay). O RAST (Radio AllergoSorbent Test) é uma técnica desactualizada (Dethioux, 2006). Estes testes têm registado uma utilização crescente, uma vez que os reagentes são cada vez mais purificados e específicos. É relativamente fácil proceder à recolha de uma amostra de sangue e evita que o MV seja obrigado a investir num conjunto de antigénios com uma caducidade limitada. No entanto, é preciso não esquecer que consistem na medição das concentrações específicas de IgE presentes no soro, o que não implica necessariamente que o IgE em causa seja responsável pela reacção alérgica do animal em estudo. (Dethioux, 2006) Um estudo ainda não publicado (DeBoer D, no Simpósio OSU da Royal Canin, Outubro de 2005) confirma a necessidade de escolher criteriosamente o laboratório: amostras de cães saudáveis ou de soro de bovino revelaram-se positivas e o mesmo soro, enviado por diversas vezes ao mesmo laboratório, nem sempre apresentou resultados idênticos (Dethioux, 2006). 20 Num cenário ideal, a utilização de ambos os métodos permitiria, sem dúvida, obter o máximo de informação, mas a realidade financeira obriga a realizar escolhas (Dethioux, 2006). Os testes usados na clínica permitem detectar a presença de IgE séricos direccionados contra uma mistura de diferentes alergénios, frequentemente implicados na DA (Dethioux, 2006). Foi estabelecida uma associação entre os testes de alergia in vitro e a ocorrência frequente de falsos positivos (ou seja, identificada atopia em cães normais). Acredita-se que os resultados falsos positivos são devido aos altos níveis circulantes de anticorpos IgE contra endoparasitas ou ectoparasitas (White, 2002). 2.4.5.8. DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL (White, 2002) Alergias alimentar, de contacto e à picada de pulga; Pioderma superficial; Sarna/sarna notoédrica Dermatite por Malassezia Demodicose Dermatofitoses Hipersensibilidade aos parasitas intestinais (raro) 2.4.6. TRATAMENTO Se analisarmos a literatura disponível, quer a nível de medicina humana quer veterinária, constatamos que, embora a atopia seja descrita há já muito tempo, o tratamento tem-se revelado sempre bastante difícil. As recomendações actuais na prática veterinária recomendam uma abordagem global da afecção – fala-se de multiterapia (Figura 9, Página 22) (Dethioux, 2006). 21 Figura 9. Principais linhas de acção terapêutica (Adaptado de Dethioux, 2006). Considerando a natureza crónica, repetitiva e incurável da dermatite atópica, é essencial estabelecer uma boa comunicação com o proprietário desde o início (Colin, 2010). O objectivo principal é ajudá-lo a administrar o tratamento correctamente para que ele obtenha os resultados positivos e continue a ser motivado. Isto é útil para ajudá-lo a seguir os protocolos, por exemplo, com o pré-agendamento de procedimentos (datas de corticoterapia, champôs, injecções de dessensibilização, tratamentos anti-pulgas...) (Colin, 2010). Isto também é importante para incentivá-lo, ajudando-o a ver as melhorias entre os check-ups. O proprietário deve ser convidado a anotar regularmente o nível e aparecimento de prurido e outros sinais clínicos, e tirar fotos do animal, mostrando posteriormente as lesões (Colin, 2010). 2.4.6.1. EVICÇÃO DO ALERGÉNIO Como é óbvio, esta seria a opção ideal mas infelizmente, na prática, são raros os casos em que é realizável: Os alergénios são identificados através da anamnese (sazonabilidade, área do surto), de ensaios de provocação e testes alérgicos. 22 Os ácaros do pó doméstico (Dermatophagoides Farinae e D. Pteronyssinus) são vectores de alergénios frequentemente responsáveis pela DA. Detectam-se concentrações elevadas destes alergénios em almofadas, colchões, tapetes, bem como, em poltronas e sofás. É possível reduzir a carga antigénica através de medidas de higiene introduzidas no meio ambiente do animal: colchão anti-pulgas, aspiradores com filtros, acaricidas e desnaturantes (Figura 10). Assim, o tratamento das divisões da casa com benzoato de benzilo, aplicado cuidadosa e repetidamente, traduziu-se na negativização dos testes para detecção de ácaros e na melhoria dos sinais clínicos de animais atópicos (Swinnen & Vroom, 2004). Os aparelhos de ar condicionado e os desumificadores também podem ajudar a diminuir a pressão alergénica (Dethioux, 2006). Figura 10. Para limitar a carga alergénica, pode revelar-se útil habituar o animal de estimação a dormir num colchão adaptado para evitar a proliferação de ácaros (Adaptado de Dethioux, 2006). 2.4.6.2. IMUNOTERAPIA Se o alergénio ou alergénios forem identificados com precisão e se o proprietário estiver interessado e, experimentar o tratamento, a imunoterapia específica (por vezes referida como dessensibilização) é provavelmente, a melhor opção (Dethioux, 2006). a) Princípio e modo de acção A imunoterapia específica (ITE; SIT – Specific Immunotherapy) consiste na administração de doses crescentes de um extracto de alergénios aos quais o animal revelou sensibilidade. Designa-se muitas vezes de modo indistinto de dessensibilização e da hipossensibilização, no entanto, é preferível utilizar o termo imunoterapia específica (Dethioux, 2006). 23 Existem diversas hipóteses para explicar os mecanismos de dessenbilização. A teoria aceite nos últimos quarenta anos é que a inoculação de pequenas quantidades de alergénios específicos induz uma resposta do sistema imunitário que, posteriormente, desenvolve IgG ou anticorpos “bloqueadores” (Dethioux, 2006). Outras teorias sugerem a supressão das células-T, a alteração no rácio de Lt, a modificação da sensibilidade ao nível das células secretoras de mediadores, as menores concentrações das IgEs circulantes, o decréscimo de reactividade dos órgãos alvo, ou associação destas diversas hipóteses (Zur, 2002). b) Eficácia Os estudos publicados até à data demonstram uma boa resposta à imunoterapia específica. Muitas vezes este tratamento permite também reduzir as quantidades de fármacos administrados concomitantemente. De facto, um estudo retrospectivo conduzido em 169 cães revela uma resposta boa e excelente em 72% dos casos e que 19.5% dos animais não precisaram de qualquer outra forma de tratamento (Zurl, 2002). Noutro estudo, a taxa de sucesso situou-se em 64%. As melhorias foram rapidamente constatadas: no intervalo de 2 a 5 meses, apesar de habitualmente se convencionar que deva decorrer num período compreendido entre 6 e 9 meses para se chegar a uma conclusão (Schnbl et al, 2006). 2.4.6.3. CORTICOSTERÓIDES Ao longo dos últimos 30 anos, têm sido estes os fármacos prescritos com maior frequência, para o tratamento da DA (Dethioux, 2006). Quer sob a forma oral ou tópica (dermocorticóides), são sempre parte integrante do tratamento desta patologia (Olivry & Sousa, 2001). Os veterinários estão conscientes dos efeitos secundários destas moléculas, embora continuem a ser amplamente utilizadas para o tratamento de afecções dermatológicas pruriginosas, tal como para outras patologias, associadas ou não à pele (Dethioux, 2006). Não se recomenda o recurso a formas injectáveis de efeito retardado (tipo depósito ou de libertação prolongada) devido ao elevado risco de efeitos secundários (Dethioux, 2006). 24 2.4.6.4. CICLOSPORINA Recentemente foram publicados cerca de uma dezena de estudos para estabelecer a eficácia desta molécula no tratamento de DA (Dethioux, 2006). A sua eficácia é indiscutível: reduz o prurido e as lesões cutâneas. Os animais tratados com este produto evidenciam períodos de remissão mais longos comparativamente a animais com administração de metilprednisolona. Ao contrário do que sucede no ser humano, a ciclosporina não comporta nefrotoxicidade para esta espécie animal, nem induz hipertensão arterial. Os efeitos secundários indesejáveis são, sobretudo, de ordem digestiva (vómito, diarreia e fezes moles). Apesar de ser dotada de propriedades imunossupressoras muito interessantes, em comparação com os corticosteróides, a ciclosporina é pouco citotóxica (Dethioux, 2006). De entre os efeitos secundários descritos, destacam-se: perda de peso, hiperplasia gengival, papilomatose, hipertricose e mudas de pêlo excessivas. A maior desvantagem continua a ser o custo (Dethioux, 2006). Para além da DA, este fármaco é também utilizado com sucesso no tratamento da furunculose anal e de afecções menos comuns, como a paniculite nodular estéril, a celulite juvenil piogranulomatosa e a adenite sebácea granulomatosa (Dethioux, 2006). 2.4.6.5. AGENTES ANTI-INFECCIOSOS: ANTIBIÓTICOS E ANTIFÚNGICOS As infecções bacterianas secundárias são frequentes em animais com atopia, e podem originar episódios de piodermite superficial ou profunda que é indispensável debelar. Assim, a antibioterapia é o primeiro tratamento a aplicar. Deve optar-se por uma molécula de largo espectro, eficaz contra estafilococos, administrada na dosagem adequada e durante um período de tempo suficiente (Dethioux, 2006). Tendo em conta a imagem algo pejorativa que este tipo de medicamento apresenta junto do público em geral, o veterinário deve despender o tempo necessário para estabelecer uma boa comunicação com o cliente. Como é óbvio, a cooperação deste e a observância do tratamento são fundamentais (Dethioux, 2006). 25 A dermatite por Malassezia (levedura) constitui a outra família de complicações infecciosas frequentes na DA. Uma vez confirmada a sua presença através de citologia cutânea, deve ser tratada através do uso de antifúngicos tópicos ou sistémicos (Dethioux, 2006). 2.4.6.6. ANTIFÚNGICOS Estas moléculas não são isentas de toxicidade: muitas são teratogénicas, hepatotóxicas, eméticas, anorexigénicas, etc. Será necessário avisar o dono e monitorizar a função hepática através de análises sanguíneas regulares (Dethioux, 2006). Na prática, e sempre que possível, as infecções cutâneas provocadas por leveduras devem ser tratadas com tópicos específicos. Contudo, se estes não revelarem um grau de eficácia suficiente, ou se o proprietário for incapaz de os aplicar correctamente (duração mínima da aplicação dos champôs: 10 minutos), pode recorrer-se a fármacos administrados por via oral. A clorexidina, por si só, ou associada ao miconazol (nalguns países, esta combinação está disponível sob a forma de champô), revela bons resultados em utilização local (Dethioux, 2006). A griseofulvina é ineficaz contra a Malassezia (Dethioux, 2006). Utiliza-se, sobretudo, o quetoconazol, na dosagem de 10mg/kg/d, em uma ou duas administrações, ou o itraconazol, 5 a 10mg/kg/d, em dose única. Alguns especialistas prescrevem doses mais baixas (5mg/Kg/d) (Dethioux, 2006). As melhorias clínicas devem ser constatáveis no espaço de 7 a 14 dias, preconizando-se a manutenção do tratamento durante uma a duas semanas após a cura clínica. Na maioria dos casos estes medicamentos não possuem uma AIM para uso em cães (dermatite por Malassezia), para além de serem relativamente caros (Dethioux, 2006). 2.4.6.7. ANTI-HISTAMÍNICOS Bloqueiam os receptores da histamina (e não a sua libertação). Existem dois tipos de receptores: H1 e H2. Os primeiros são responsáveis, entre outras manifestações, por prurido e vasodilatação. Os anti-histamínicos anti-H2 são usados, sobretudo, em gastroenterologia (cimetedina, ranitidina) e não exercem qualquer acção sobre o prurido (Dethioux, 2006). 26 Estes anti-pririginosos não esteróides fazem parte das diversas ferramentas à disposição do clínico para manter o animal abaixo do limiar do prurido. O grau de sucesso é da ordem de 30%, valor que pode parecer relativamente baixo. No entanto, a ausência de efeitos secundários posiciona-os como agentes de grande utilidade numa abordagem global da patologia (Dethioux, 2006). São frequentemente utilizados em combinação com ácidos gordos essenciais (Dethioux, 2006). 2.4.6.8 TÓPICOS Um vasto número de estudos permitiu avaliar a eficácia dos tratamentos aplicados directamente sobre as lesões. Os diferentes fabricantes fornecem inúmeras provas que comprovam a eficácia dos lipossomas, dos esferulitas e doutros sistemas de libertação progressiva dos princípios activos a nível cutâneo (Dethioux, 2006). Os pêlos constituem um obstáculo considerável para a aplicação de tópicos em dermatologia veterinária. Em geral, é indispensável recorrer à tosquia, ou pelo menos, a uma tricotomia minuciosa do animal para que o princípio activo possa entrar em contacto com a pele. De seguida, é necessário que o agente terapêutico atravesse a camada queratinosa, cuja principal função consiste na criação de uma barreira entre o organismo e o mundo exterior. Diversos factores podem influenciar a barreira cutânea: a idade do animal, a eventual presença de alterações decorrentes de uma doença crónica (liquenificação) ou lesões (erosões), o peso molecular dos princípios activos e o seu revestimento num meio anfifílico, etc (Quadro 4 e 5) (Dethioux, 2006). Utilizam-se diversos parâmetros para medir as alterações das propriedades da pele (Dethioux, 2006). O mais conhecido é o pH da pele (Figura 11, Página 28), nomadamente as variações associadas à raça. A medição da perda de água trans-epidérmica permite avaliar a eficácia da barreira cutânea (Dethioux, 2006). Também é possível monitorizar as variações ao nível dos lípidos cutâneos, hidratação do estrato córneo, o número de corneócitos ou a natureza das bactérias superficiais (Dethioux, 2006). 27 Figura 11. Consoante a raça, existem variações significativas ao nível do pH da pele. Provavelmente, este fenómeno é um dos factores que explica a frequência de superinfecções bacterianas em determinadas raças (Pastores Alemães) (Adaptado de Dethioux, 2006). Quadro 5. Principais antibióticos tópicos usados em animais atópicos (Adaptado de Dethioux, 2006). Antibióticos tópicos Mupirocina Ácido fusídico Acção local; Reservado para lesões muito localizadas (acne, abcessos interdigitais, piodermite de calosidades). Activo contra todos os estafilococos (incluindo as penicilinases resistentes); Bacteriostático com boa penetração tecidular, uma vez que é lipofílico. Quadro 6. Principais tópicos anti-sépticos usados em animais atópicos (Adaptado de Dethioux, 2006). Tópicos anti-sépticos Peróxido de benzilo Iodopovidona Lactacto de Etilo Triclosan Clorexidina Poderoso antibacteriano (muito activo contra St intermedius), queratolítico, anti-pruriginoso, anti-seborreico; Em indivíduos atópicos, não deve ser utilizado em concentrações superiores a 2.5-3%. Bactericida, fungicida (eficaz em casos de dermatite por Malassezia); Irritante em áreas de pele mais fina; Alteração da coloração dos pêlos claros; Utilizar concentrações a 2%. Antibacteriano cuja acção reduz o pH da pele; É mais bacteriostático do que bactericida, mas evidência uma boa tolerância na concentração a 10%. Bactericida utilizado numa concentração de 0.5%; Ineficaz contra Pseudomonas. Este é o anti-séptico mais utilizado; O champô que associa a clorexidina e o micizanol ajuda a preservar a remissão dos cães atópicos. 28 2.4.6.9. CHAMPÔS Os champôs para seres humanos não devem ser utilizados, porque o seu pH é incompatível com o da pele dos animais de companhia. A selecção do produto deve ser feita em função da pele e da natureza da afecção dermatológica em causa: lavagem simples de peles saudáveis, anti-seborreicos e querato-moduladores (ácido salicílico, enxofre ou dissulfeto de selénio) (Dethioux, 2006). 2.4.6.10. EMOLIENTES, HIDRATANTES Evitam a desidratação cutânea e reidratam a camada queratinosa. A pele adquire maior flexibilidade e, sobretudo, maior capacidade de defesa. Estas substâncias são aplicadas na pele ainda húmida depois do animal ter sido cuidadosamente enxaguado, quer sob a forma de spray quer de loção amaciadora. Actualmente, diversos champôs contem componentes hidratantes (com base aquosa) de libertação progressiva (Dethioux, 2006). 2.4.6.11. ÁCIDOS GORDOS ESSENCIAIS A suplementação com ácidos gordos tem um duplo objectivo. Em primeiro lugar, proporciona os recursos necessários à pele que lhe permitam restabelecer a sua função de barreira, afectada em caso de DA. Numa segunda fase, combater a inflamação através da alteração da produção de mediadores pró-inflamatórios para a produção de prostaglandinas e leucotrienos não inflamatórios. É fácil compreender por que motivo, em dermatologia, as posologias para uma acção terapêutica ideal continuam a ser vagas. Contudo, estudos recentes permitiram validar a sua eficácia no tratamento da DA (Baddaky et al., 2005). Os ácidos gordos são agentes terapêuticos importantes, mas o seu uso tem de ser ajustado (Dethioux, 2006). Requer diversas semanas de suplementação antes de serem visíveis efeitos positivos. Este período justifica-se se considerarmos a fisiologia cutânea e o tempo necessário para a renovação celular, sobretudo do estrato córneo (Dethioux, 2006). É indispensável utilizar doses muito elevadas para obter uma acção sobre o prurido, (frequentemente, muito superiores às recomendadas pelos fabricantes) (Dethioux, 2006). Refira-se também que não existe um rácio ideal ω6/ω3 especificamente determinado. A maioria dos estudos situa-o ente 5 e 10, ou seja, o intervalo é 29 bastante amplo. Os efeitos secundários descritos (diarreia, pancreatite) são muito raros (Dethioux, 2006). 2.4.6.12. OUTROS Os avanços no conhecimento da fisiopatologia da DA abriu diversas portas terapêuticas. Para além dos tratamentos convencionais atrás referidos, o MV passou a dispor de um número considerável de ferramentas não negligenciáveis no domínio da fitoterapia e da nutrição (Dethioux, 2006). a) Antioxidantes As doenças inflamatórias crónicas (entre as quais se incluem a DA) são uma consequência dos ataques dos radicais livres (Cooke et al, 2003). O consumo regular de antioxidantes como a vitamina E, vitamina C e os carotenóides permite proteger as células cutâneas contra os ataques dos radicais livres, no entanto, é necessário uma associação de diversos antioxidantes, denominada, complexo, para poder beneficiar da sinergia positiva entre os diferentes ingredientes (Boelsma et al., 2001). b) As plantas chinesas Uma mistura padronizada de plantas “chinesas” revelou uma boa eficácia no tratamento da DA. Apresenta a vantagem der ser relativamente barata e muito bem tolerada pelos animais. (Nagle et al., 2001: Nuttal et al., 2004). Curcumina Também conhecida como cúrcuma ou açafrão da Índia (Figura 12, Página 31), é o extracto de uma planta (Curcuma longa) (Dethioux, 2006). Antioxidante: Poderoso inibidor da peroxidação dos queratinócitos e firbroblastos; Anti-inflamatório, quer a nível cutâneo, quer osteoarticular. Imunomodelador: decréscimo de IgE e IgM, aumento de IgG; Actividade anti-bacteriana. 30 c) Aloé vera Os benefícios dos extractos desta planta carnuda são reconhecidos em todo o mundo (Figura 13). As suas inúmeras propriedades curativas são amplamente utilizadas tanto em tópicos, como em produtos para administração oral (Dethioux, 2006). As propriedades terapêuticas do aloé vera podem ser descritas de acordo com as seguintes vertentes: Acção cicatrizante: através da presença de estimuladores da síntese de colagénio; Acção anti-inflamatória: presença de substâncias que regulam a inflamação; Estimulação de imunidade: graças aos carbohidratos imunoprotectores; Protecção contra os radicais livres: propriedades antioxidantes. Figura 12. A curcumina ajuda no Figura 13. Aloé vera (Adaptado de combate das infecções secundárias Chuluck M, 2011). e podem, eventualmente, favorecer a redução dos tratamentos convencionais (Adaptado de Dethioux, 2006). 31 2.5 ALERGIA ALIMENTAR A alergia alimentar (hipersensibilidade alimentar) é uma resposta imunológica a uma ou mais proteínas da dieta. É considerada a terceira doença dermatológica de hipersensibilidade mais comum em cães e a segunda mais comum em gatos (Hnilica & Medleau, 2001; Ihrke, 2001). A verdadeira incidência de doenças de pele associadas com reacções adversas aos alimentos é desconhecida e controversa. De acordo, com Reedy et al. (1997), os registos das incidências variam entre 1% a 23% da população. Estimativas da frequência de reacções adversas aos alimentos variam de 10% a 20% no que respeita a doenças de pele “de tipo alérgico” em cães. Na opinião do autor, a alergia ou intolerância alimentar como causa única de doença de pele em cães e gatos é pouco comum, mais frequentemente, a alergia ou intolerância alimentar coexiste com doenças de pele de tipo alérgico como a DA e a DAPP. Piodermites bacterianas secundárias, dermatites por Malassezia e otites externas também são comuns (Ihrke, 2001). As reacções adversas a alimentos estão bem documentadas em animais de pequeno porte. Os termos alergia alimentar e hipersensibilidade alimentar foram usados alternadamente na literatura médica em humanos e veterinários para descrever sintomas induzidos pela ingestão de alimentos ou, menos frequentemente, a um aditivo presente nesse alimento, que podem ser demonstrados ou que existem suspeitas de origem imunológica (Ihrke, 2001, White 2002). O agente interage assim com vários sistemas biológicos amplificadores, conhecidos e desconhecidos, na produção de sinais clínicos altamente variáveis. Apesar da necessidade do consumo de alimentos e da grande diversidade de alimentos consumidos, as reacções alimentares adversas aos alimentos são uma causa relativamente infrequente de doenças de pele em cães e gatos (Ihrke, 2001). Os termos intolerância alimentar e, ocasionalmente, sensibilidade alimentar são reacções adversas fisiológicas não imunológicas a um alimento ou a um aditivo alimentar. 2.5.1. ETIOLOGIA A contaminação dos alimentos, tais como bactérias patogénicas e toxinas, os aditivos alimentares, como a tartrazina, e as aminas vasoactivas, como a tiramina 32 em queijos, estão envolvidos ou suspeitos de se assemelharem à hipersensibilidade alimentar em seres humanos. Mas desconhece-se a sua importância nos pequenos animais (White, 2002). Os alergénios confirmados ou suspeitos são numerosos na literatura. Entre os alergénios confirmados como a carne bovina, a soja, os produtos lácteos e os cereais estão entre os mais comuns em cães. O leite, a carne bovina, trigo e o peixe é o mais comum em gatos. Têm sido descritos outros alergénios, como o queijo, o frango, os ovos de galinha, o cordeiro e o chocolate (White, 2002). O peixe é o alergénio responsável em 50% dos gatos com hipersensibilidade alimentar (White, 2002). A extensa lista de substâncias utilizadas nos alimentos comerciais de pequenos animais explica, juntamente com a variabilidade dos métodos de processamento, o amplo número de alergénios identificados (White, 2002). Especula-se que, em animais jovens, os parasitas intestinais ou as infecções intestinais podem prejudicar a mucosa intestinal, resultando numa anormal absorção de alergénios e com uma posterior sensibilização (Plant & Reedy, 2002). 2.5.2. PATOGÉNESE Não estão descritos exactamente os mecanismos da hipersensibilidade alimentar em cães e gatos. Foram observadas estas reacções nos alimentos que poderiam ser classificados como imediatos (por exemplo, hipersensibilidade do tipo I, que se manifesta em minutos ou horas após a ingestão) ou tardia (por exemplo, hipersensibilidade do tipo IV, que aparece em horas ou dias após a ingestão) (White, 2002). As glicoproteínas solúveis em água com pesos moleculares variando entre 10.000 e 70.000 daltons têm sido identificados em pessoas como sendo os principais alergénios alimentares (Silva C, 2011). Estas glicoproteínas são estáveis ao calor, a ácidos e a proteases. Moléculas alergénias alimentares específicas não foram ainda identificadas em medicina veterinária (Ihrke, 2001). 33 2.5.3. CÃES 2.5.3.1. IDADE Embora a idade de início seja variável, têm-se observado uma predisposição em cães mais jovens (≤ 1 ano de idade) (White, 2002). Rosser indicou que 51% de cães reactivos desenvolvem sinais clínicos entre 1 e 3 anos de idade com 33% desenvolvendo sinais clínicos antes do ano de idade e 16% após os 4 anos de idade. Harvey também registou que 52% dos cães começam a exibir sinais clínicos antes do ano de idade. Também foram registadas reacções em cães geriátricos. Assim, as reacções adversas aos alimentos deveriam ser sempre consideradas no diagnóstico diferencial de prurido em cães de qualquer idade (Ihrke, 2001). Os proprietários raramente relacionam o aparecimento dos sinais clínicos, com uma mudança na dieta (White, 2002). 2.5.3.2. RAÇA As predisposições raciais são controversas. Rosser registou que Labrador Retrievers, Golden Retrievers, Cocker Spaniels, Soft-Coated Wheaten Terriers, Dálmatas, West Higland White Terrier, Collies, Shar-peis, Lhasa Apsos, Springer Spaniels e Schanuzers miniatura estão em maior risco. Também foram mencionados Dachushunds e Boxers como estando sujeitos a um maior risco (Ihrke, 2001, White, 2002). 2.5.3.3. SINAIS CLÍNICOS O prurido não sazonal é o sinal clínico mais comum registado no cão (White, 2002, Ihrke, 2001). Cães com outras doenças alérgicas concomitantes podem apresentar prurido ao longo de todo o ano exibindo aumentos de intensidade prurítica associados com doenças sazonais (DA, DAPP) (Ihrke, 2001). A maioria das lesões pode ser atribuída ao prurido e a traumatismos autoinfligidos. O prurido é distribuído de forma semelhante à DA, principalmente na face e orelhas, nas extremidades e no abdómen ventral (Ihrke, 2001). O prurido limitado ou concentrado na região perianal e perioral também foi registado (Figura 14, Página 35) (Ihrke, 2001). Entre as lesões cutâneas observadas em cães incluem-se as 34 pápulas, o eritema, as escoriações, os colaretes epidérmicos, a pododermatite, a seborreia, a otite externa e as alopécias traumáticas auto-infligias. (Ihrke, 2001, White, 2002). Também são descritos sinais gastrointestinais (diarreia, vómitos, flatulência e aumento da frequência de dejecções) (Ihrke, 2001, White, 2002). Estes podem ser mais comuns do que se pensava antigamente (White, 2002). Os cães, em particular, podem mostrar sinais sugestivos de colite (White, 2002). A maioria dos cães com sinais gastrointestinais de reacções adversas aos alimentos não exibe sinais cutâneos concomitantes (Ihrke, 2001). Figura 14. Representação esquemática da localização das lesões (Adaptado de Anónimo, 2010b). 2.5.4. GATOS 2.5.4.1. IDADE O aparecimento dos primeiros sintomas é altamente variável. Foram registadas reacções adversas aos alimentos em gatos entre os 6 meses de idade e os 12 anos. As alergias alimentares deveriam ser consideradas no diagnóstico diferencial de prurido de qualquer idade. Crê-se que as reacções adversas aos alimentos são mais comuns nos gatos que nos cães (Ihrke, 2001). 2.5.4.2. RAÇA As predisposições raciais são controversas. Uma predisposição racial possível em Gatos Siameses foi referida em alguma literatura (Ihrke, 2001, White, 2002). 2.5.4.3. SINAIS CLÍNICOS O prurido não-sazonal é o sinal clínico mais comum registado no gato. Da mesma forma que os cães, os gatos com outras doenças alérgicas concomitantes 35 podem apresentar prurido ao longo de todo o ano exibindo aumentos de intensidade prurítica associados com doenças sazonais (DA, DAPP). Uma vez que os gatos tendem a ser alimentados (ou se lhes for permitido ter à disposição) com uma dieta mais variada que os cães, o prurido pode aumentar e/ou diminuir de forma mais variável (Ihrke, 2001, White, 2002). A localização do prurido na cabeça e no pescoço é comum. White (2002) registou esta ocorrência em 42% dos gatos afectados e Ihrke (2001) registou prurido na cabeça e no pescoço em 65% dos casos. Assim, a distribuição do prurido pode ser localizada na zona da cabeça e do pescoço, ou pode ser generalizada e envolver o tronco, a zona ventral e os membros. As lesões cutâneas são variáveis e podem incluir alopécia, eritema, dermatite militar, alopécias simétricas associados com escovagens excessivas, lesões de complexo granuloma eosinofílico, escoriações, ulcerações, crostas e escamas (Ihrke, 2001, White, 2002). Ao que parece, algumas placas eosinofilicas e úlceras indolentes respondem positivamente às dietas de eliminação. Em gatos com hipersensibilidade alimentar também há registo de angioedema/urticária pruriginosa e úlcera eosinofílica (White, 2002). A otite externa por Malassezia ou ceruminosas podem ser observadas (Ihrke, 2001). Podem também surgir em simultâneo sinais gastrointestinais (diarreia, vómitos). Estes podem ser observados conjuntamente com sinais cutâneos podem ser ainda menos frequentes no gato que no cão (Ihrke, 2001). Nos gatos, a hipersensibilidade alimentar manifesta-se como uma colite linfocítico-plasmocitária (White, 2002). Em geral, a magnitude da auto-mutilação observada em gatos é maior que a que se observa em cães (Ihrke, 2001). 2.5.5. DIAGNÓSTICO 2.5.5.1. TESTE ALÉRGICO INTRADÉRMICO O teste intradérmico é pouco fiável no diagnóstico de hipersensibilidades alimentares. Jeffers demonstrou que o teste alérgico intradérmico teve uma sensibilidade de 10%, uma especificidade de 96%, um valor preditivo positivo de 60% e um valor preditivo negativo de 62% indicando que o teste teve uma capacidade muito pobre na detecção de verdadeiros positivos embora fossem 36 detectados alguns falsos positivos. Kunkle também mostrou que, comparativamente, uma percentagem mais alta de cães (17%) com testes dérmicos negativos aos alimentos responderam a uma dieta de eliminação relativamente a cães com teste dérmico positivo (10%). Assim, os testes dérmicos com produtos alimentares não podem ser recomendados. (Ihrke, 2001). 2.5.5.2 TESTE SEROLÓGICO POR ELISA O teste por ELISA também é pouco fiável no diagnóstico de reacções adversas aos alimentos no cão. Jeffers demonstrou uma sensibilidade de 14%, uma especificidade de 87%, um valor predictivo positivo de 49% e um valor predictivo negativo de 61% (Ihrke, 2001). Não foram publicados estudos semelhantes para o gato. Porém, a falta de correlação evidenciada em cães e em humanos indica que é improvável que estes testes pudessem ser úteis no gato (Ihrke, 2001). 2.5.5.3. HIPOSSENSIBILIZAÇÃO A taxa de sucesso dessa terapia varia entre 50% e 80% na maioria dos estudos. As melhorias não são esperadas nos primeiros meses da terapia. A imunoterapia deve ser administrada, por um período mínimo de um ano, qualquer período inferior a este é considerado ineficaz e descontinuado (Kunkle & Halliwell, 2003). 2.5.5.4. ENSAIOS DIETÉTICOS DE RESTRIÇÃO PROTEICA (IHRKE, 2001) 1. A única hipótese diagnóstica útil na determinação de reacções adversas aos alimentos no cão e no gato seria alimentá-los com uma dieta teste de restrição proteica e subsequentemente retomar a dieta original do paciente. As proteínas na alimentação são a fonte mais comum de antigénios que originam reacções adversas. 2. Animais dentro de casa/fora de casa – é difícil de conduzir um bom ensaio dietético de restrição em cães que estejam dentro e fora de casa quando querem. Dentro de casa é virtualmente impossível conduzir um ensaio dietético de restrição em gatos aos quais é permitido vaguear pela casa não podendo ser controlado o consumo de potenciais alergénios contidos em pássaros, ratos, peixes, comida 37 roubada da cozinha, lixo ou outros. Por esta razão, é requerido um confinamento físico. 3. Tempo de decurso – Idealmente, deveriam ser executados ensaios dietéticos de restrição durante um mínimo de 8 a 12 semanas. Porém, se pelo menos uma resposta parcial não for observada durante as primeiras 6 semanas do ensaio, uma reacção adversa aos alimentos é uma causa improvável da doença de pele. 4. Selecção de uma Dieta de Restrição – Múltiplos estudos demonstraram que a maioria dos animais consumiu a proteína ofensiva durante pelo menos 6 meses antes da doença de pele se tornar clinicamente relevante. Esta informação é contra-intuitiva para a maioria dos donos e para muitos clínicos. Uma história dietética completa deve ser obtida. O clínico necessita de obter informações acerca de dietas comerciais, comida de mesa, guloseimas, brinquedos de couro mastigáveis, vitaminas mastigáveis, medicamentos mastigáveis com sabores (especialmente antibióticos, anti-parasitários preventivos, inibidores do desenvolvimento de certos insectos) quer actuais quer passados e sobre o uso de pastas de dentes aromatizadas para animais de companhia. Ou é seleccionada uma fonte proteica que o animal não consumiu previamente ou é escolhido um hidrolisado proteico. Nunca deveriam ser usados peixes como fonte de proteína numa dieta de restrição para gatos uma vez que virtualmente todos os gatos consumiram produtos de peixe previamente. 5. A “Dieta de Eliminação Ideal” – de acordo com Roudebush (2001), a dieta de eliminação ideal deveria conter ou um número reduzido de fontes proteicas originais altamente digestíveis ou hidrolisados proteicos. Deveria evitar excessos proteína, evitar aditivos e aminas vasoactivas e deveria ser nutricionalmente adequada à fase de vida e à condição do animal. A digestibilidade e o excesso de proteína podem ser factores importantes a considerar uma vez que proteínas incompletamente digeridas podem conter proteínas ou polipeptídos residuais alergénicos. Teoricamente, deveriam ser evitadas fontes de proteína como o peixe uma vez que podem conter níveis elevados de histamina e outras aminas vasoactivas que podem alterar o limiar do prurido. 6. Dietas Caseiras de Restrição Proteica – As vantagens das dietas caseiras incluem a restrição a uma única fonte de proteína nova, o controlo da fonte de carbohidratos e a eliminação de agentes como corantes, conservantes, 38 estabilizadores e outros aditivos. As desvantagens incluem relutância frequente dos donos em cozinhar em casa para o seu animal, a falta de equilíbrio nutricional e a palatibilidade. As proteínas comummente recomendadas para uso em ditas caseiras incluem o peixe, carne de porco, de coelho, de veado, de pato e o tofu (soja) no caso do cão e a carne de veado, de coelho, de pato ou de cordeiro no caso do gato. Os gatos podem ser menos atreitos a consumir dietas caseiras. 7. Dietas Comerciais de Restrição Proteica – As dietas comerciais são usadas como uma alternativa às dietas caseiras quando o dono está pouco disposto ou impossibilitado de cozinhar para o seu animal de estimação. Além disso, como produtos nutricionalmente equilibrados que são, são usados para manutenção a longo prazo uma vez alcançado um diagnóstico. Como a qualidade das dietas comerciais de restrição proteica aumentou dramaticamente durante os últimos anos, um maior número de MV está a usar estes produtos como teste primário de dieta de eliminação. 8. Dietas Comerciais Contendo Hidrolisados Proteicos – O desenvolvimento de novas dietas comerciais que contêm ingredientes proteicos hidrolisados é um progresso original e excitante no controlo das alergias alimentares. Os hidrolisados proteicos foram usados com bastante sucesso em medicina humana em fórmulas infantis e no controlo de várias doenças gastrointestinais. Estes produtos oferecem vantagens teóricas significativas em relação às dietas comerciais tradicionais ou às ditas de eliminação caseiras uma vez que os hidrolisados proteicos de peso molecular apropriado pode não originar uma resposta imunitária e assim pode ser considerado verdadeiramente hipoalergénico. Não são requeridas fontes de proteína novas ou originais. 9. Dietas Comerciais Contendo Restrição de Proteína Integrais – Ingredientes usuais: a. Comida para cão - arenque, peixe-gato, salmão, peixe branco, pato, carne de veado, coelho, canguru, batata, arroz, polpa de beterraba, aveia b. Comida para gato - cordeiro, carne de veado, pato, coelho, batata, arroz. Quadro 7. Algumas das situações em que se deve suspeitar de hipersensibilidade alimentar (Adaptado de White, 2002). Não aparecimento sazonal de lesões de pele pruriginosas. Ausência de resposta em cães e gatos com esteróides e outros fármacos anti-inflamatórios, não exclui, no entanto, qualquer diagnóstico de hipersensibilidade alimentar se os corticosteróides mostrarem ser eficazes no controlo do prurido. Falta de resposta a fármacos progestational em gatos. 39 2.5.6. DIAGNÓSTICOS DIFERENCIAIS Quadro 8. Principais diagnósticos diferenciais no cão e no gato (Adaptado de Nuttal, 2009) Diagnóstico Diferencial Cão Gato Atopia Atopia Dermatite alérgica à picada da pulga Dermatite alérgica à picada da pulga Outros ectoparasitas Outros ectoparasitas Alergia a fármacos Alergia a fármacos Foliculite superficial Hipersensibilidade à picada dos mosquitos, Dermatite por malassezia Dermatofitoses Dermatite de contacto Dermatite miliar idiopática Defeitos na queratinização Complexo de granuloma eosnifilico idiopático Linfoma epitéliotrópico Alopécia psicogénica Pioderma 2.5.7. MANEIO Idealmente, os cães e gatos com alergias alimentares provadas, deveriam ser mantidos com uma dieta comercial completa e equilibrada para animais de companhia, com restrição proteica ou com hidrolisados proteicos e, para o resto das suas vidas. Se não se encontrar uma dieta para animais de companhia que seja bem tolerada pelo animal, então uma dieta caseira nutricionalmente equilibrada, como as que foram formuladas por Roudebush (2001) deve ser preconizada. Outra causa concomitantes de prurido como sejam as doenças de pele de tipo alérgico, as piodermites secundárias ou as dermatites por Malassezia devem ser controladas, minimizadas ou prevenidas por um longo período de tempo. 2.5.8. TRATAMENTO E PROGNÓSTICO 1. Tratar outras patologias secundárias presentes na pele, mesmo infecções auriculares com terapias adequadas (Hnilica & Medleau, 2001). 2. Instituir um programa de controlo de pulgas para evitar as picadas das pulgas, que agravam o prurido (Hnilica & Medleau, 2001). 40 3. Não usar alergénio(s) alimentares ofensivos. Ração balanceada, preparação caseira ou preparados comercias de alimentos hipoalergénicos são uma boa opção (Hnilica & Medleau, 2001). 4. Se o gato se recusar a comer alimentos hipoalergénicos, a terapia de longo prazo com glucocorticóides sistémicos, anti-histamínicos, e suplementos de ácidos gordos, pode ser implementada. Contudo, a terapia médica é muitas vezes ineficaz (Hnilica & Medleau, 2001). 5. O prognóstico é bom se o animal aceitar a dieta hipoalergénica. Se houverem recidivas, devem-se descartar outras patologias como o desenvolvimento da hipersensibilidade alimentar à nova dieta, dermatofitoses, ectoparasitas, e em simultâneo a DA e DAPP (Hnilica & Medleau, 2001). 41 2.6. HIPERSENSIBILIDADE À PICADA DA PULGA Em algumas partes do mundo, a DAPP é a doença alérgica mais comum e uma das principais causas de prurido em cães e gatos. Em outras partes, é um problema significativo apenas em determinadas épocas do ano (Patel & Forsythe, 2008). Esta é uma doença de pele pruriginosa, causada pela hipersensibilidade a antigénios da saliva da pulga (Welsh, 2005). Esta é causada por proteínas salivares da pulga que são injectadas durante a picada. Há algumas evidências, em que a exposição intermitente às pulgas pode ser mais propensa a causar sinais alérgicos do que a exposição constante às pulgas (Mueller, 2005). Uma vez que a alergia se tenha estabelecido, uma picada de pulga por semana será capaz de mantê-la (Willemse, 1992). A hipersensibilidade à picada da pulga é uma reacção alérgica tanto do tipo imediata como tardia; o prurido começa imediatamente e tende a persistir por muito tempo depois das pulgas serem eliminadas. Uma mordedura é o suficiente para desencadear essa reacção. Os sintomas são piores no meio do verão pois é quando existem também mais pulgas. No entanto, os animais que vivem em casa podem sofrer durante todo o ano, se as pulgas estiverem presentes (Eldredge et al., 2007). Esta patologia não é apenas mais uma doença de pele comummente observada em animais de pequeno porte, em geral, na prática da maioria dos países do mundo. Surpreendentemente, esta patologia é ainda relativamente comum em todo o mundo, apesar dos recentes avanços no controlo das pulgas (Ihrke, 2006a). Embora a DAPP seja a principal condição associada às pulgas, uma distinção entre o prurido resultante da infestação de pulgas graves e uma resposta de hipersensibilidade deve ser feita. Em cachorros e gatinhos muito jovens, as infestações por pulgas graves provocam vários graus de prurido, mas os pacientes apresentam mais frequentemente sinais de letargia, fraqueza e anemia. As pulgas também são vectores de organismos infecciosos como Bartonella felis, Rickettsia spp e Haemoplamas (Patel & Forsythe, 2008). Esta hipersensibilidade tem sido bem caracterizada e, geralmente, não apresenta nenhumas dificuldades diagnósticas ou terapêuticas. Mesmo quando não há a evidência directa de pulgas, os produtos modernos de controlo de pulgas são tão eficazes que podem ser usados para ensaios terapêuticos. Assim, deste modo o 42 tratamento é usado como diagnóstico e terapia (Ritzhaupt, 2002; Medleau, 2002; Dickin, 2003a; Schenker, 2003; Dryden, 2005). 2.6.1. ETIOLOGIA A comum pulga do cão e de gato, Ctenocephalides canis e C. felis (Figura 15, Página 44), são os parasitas causadores da DAPP (Nesbitt, 1983). O ciclo de vida da pulga pode ser completado em menos de 12 dias e pode demorar até 190 dias (Figura 16, Página 44). A temperatura ideal é de 21 a 26°C e a humidade elevada é o ideal. Os ovos são colocados no hospedeiro 1 a 2 dias após uma refeição. Estes não se aderem ao pêlo e, desta forma, caiem. Os ovos eclodem em cerca de uma semana sob condições ideais. As larvas são pequenas (2-5mm) e semitransparentes com um corpo esbranquiçado e uma cabeça amareloacastanhada. Estas são muito activas e alimentam-se de restos orgânicos e fezes de pulga. As larvas podem-se mover vários metros do local onde nasceram e são fototáxicas negativas e geotáxicas positivas. Assim, estas tendem a esconder-se debaixo dos móveis, em ambientes fechados. A humidade abaixo de 50% causa a dissecação dos ovos, temperaturas elevadas matam-nos, e temperaturas baixas atrasam o seu desenvolvimento (Mueller, 2005). O terceiro estado larvar tece um casulo de seda, que é húmido e branco, que se torna revestido por detritos (camuflagem). Estas passam por duas fases dentro do casulo em 8-9 dias. O adulto pré emergido do casulo é o estado mais resistente aos insecticidas (não é destruído pelas convencionais piretrinas ou organofosforados). Pode permanecer no casulo durante 174 dias. Reproduzem-se em questão de segundos e saltam em direcção ao hospedeiro sobre uma adequada estimulação (vibrações, pressão física, mudanças na intensidade da luz, dióxido de carbono e calor). Os adultos podem sobreviver vários dias antes de tomar uma refeição de sangue, que dura cerca de 5 minutos. Após 48 horas da refeição, a fêmea iniciará a postura. Serão apenas colocados 3-18 ovos, mas uma fêmea pode colocar até 2000 ovos durante o seu período de vida, que é cerca de um ano (Mueller, 2005) 43 Figura 15. Imagem microscópica de um exemplar da espécie Ctenocephalides felis, com ampliação de 40x (Adaptado de Kin O, 2010). Figura 16. Ciclo de vida da pulga (Adaptado de Anónimo, 2011). 2.6.2. ETIOPATOGENIA Há quatro reacções básicas de um hospedeiro à pulga: histamínicas, hipersensibilidade, enzimáticas e refractárias. A primeira dessas reacções é visto em todos os animais, mas uma reacção sustentada ocorre somente naqueles que são imunologicamente competentes e hipersensíveis. Compostos de histamina, da saliva da pulga são os mediadores iniciais desta reacção. A reacção enzimática é também mediada pela secreção do parasita; as enzimas ajudam a dissolver o tecido e a 44 fornecer ao parasita o sua local de predilecção. Quando as enzimas da saliva são injectadas no tecido do hospedeiro tornam-se antigénicas e/ou citolíticas. Como resultado da absorção de antigénios no local da infestação, os animais podem tornar-se sensibilizados, com a hipersensibilidade a tornar-se aparente na exposição subsequente (Nesbitt, 1983). As pulgas são uma espécie primária presente em cães e gatos. As pulgas adultas começam a alimentar-se (injecção do antigénio) quase imediatamente após terem encontrado um hospedeiro. As empresas anunciavam os seus produtos com o mito de que matavam as pulgas antes delas sequer poderem morder. Estudos têm mostrado que a maioria das pulgas consegue se alimentar num período de 5 minutos no hospedeiro antes do mais moderno produto a matar. Portanto, estes devem ser mais eficazes, de forma a diminuir este período, impedindo a alimentação do parasita. A gravidade da DAPP é dependente da gravidade da alergia, do número de pulgas que se alimentaram e da quantidade de antigénio injectado. Assim, os produtos que matam rapidamente as pulgas devem diminuir a alergia de forma mais eficaz (Ihrke, 2008). Historicamente, o controlo das pulgas tem exigido o tratamento dos animais e do ambiente. Hoje, a terapia tópica e sistémica anti-pulgas mais rápida e mais eficaz pode ser apenas a gestão que é necessária. Os agentes iniciais que criaram este paradigma incluem o fipronil, imidaclopramida, selamectina, nitenpiram, lufenuron, S-metopreno, e piriproxifena. Apesar de matarem as pulgas relativamente rápido, nenhum destes produtos impede que as pulgas se alimentem antes de serem mortas. No entanto, estes produtos reduzem uma carga de pulgas no animal suficiente para diminuir os sinais clínicos de DAPP (Ihrke, 2008). 2.6.3. INCIDÊNCIA A incidência da DAPP é relacionada geograficamente. É um grande problema clínico dermatológico em áreas com temperaturas moderadas e humidades moderadas a altas e, é incomum em altitudes superiores a 5000 pés com humidade baixa (Nesbitt, 1983). Não há predisposição sexual e a sensibilização pode ocorrer em qualquer idade, mas parece ocorrer principalmente em animais com mais idade. A exposição 45 intermitente está associada ao aumento da sensibilização, enquanto a exposição contínua pode resultar em alguma tolerância (Patel & Forsythe, 2008). Esta alergia raramente é observada em animais com menos de 6 meses de idade. Os cães Pastores Alemães e Bouviers des Flandres parecem ter uma predisposição para a alergia (Willemse, 1992). 2.6.4. SINAIS CLÍNICOS A DAPP é caracterizada por prurido intenso com inflamação da pele e formação de pápulas vermelhas concentradas no local do corpo onde as pulgas existem com maior abundância, nomeadamente, sobre a garupa, base da cauda, área caudal do dorso, flancos, zona inguinal e abdómen ventral (Eldredge et al., 2007). A vigilância das lesões, bem como a erradicação de pulgas, deve ser mantida, a fim de manter o prurido abaixo do limiar prurítico (Schaer, 2010). 2.6.4.1. CÃES Esta alergia é caracterizada no cão por prurido e pápulas crostosas (Eldredge et al., 2007). A dermatite pruriginosa encontra-se na base da cauda, região lombar, períneo, membro posterior ou área umbilical (Figura 17). A dermatite húmida aguda pode estar presente no tronco dorsal e lateral (Schaer, 2010). Os cães mastigam e esfregam as áreas afectadas como forma de alívio. O pêlo começa por cair e a pele torna-se seca e escamosa. Em alguns casos, a pele fica muito danificada e desenvolvem-se áreas de escoriações que se tornam em crostas e locais de infecção. Com o tempo, a pele torna-se espessa e mais pigmentada (Eldredge et al., 2007). Os problemas secundários comuns no cão incluem otite externa e piodermite superficial (Schaer, 2010). Figura 17. Ilustração que esquematiza os vários sinais clínicos (Adaptado de Anónimo, 2011). 46 2.6.4.2. GATOS Nos gatos, a DAPP é a doença de pele mais comum e podem apresentar também dermatite militar, alopécia não inflamatória e complexo granuloma eosinofílico (Figura 18) (Eldredge et al., 2007). Os problemas secundários comuns nos gatos incluem placas eosinofílicas e úlceras indolentes (Schaer, 2010). O controlo de pulgas é o mais importante no diagnóstico de gatos que apresentem qualquer um desses sinais clínicos (Eldredge et al., 2007). Figura 18. Distribuição esquemática das lesões de DAPP (Adaptado de Ihrke, 2007). 2.6.5. DIAGNÓSTICO O diagnóstico pode ser presumido se forem encontradas pulgas e se forem observadas erupções cutâneas características (Eldredge et al., 2007). A hipersensibilidade à picada da pulga é confirmada pela resposta a um correcto controlo de pulgas. Os testes intradérmicos e os testes sorológicos também têm sido recomendados, mas não vão identificar todos os animais com DAPP e (com um resultado negativo) pode realmente aumentar a relutância do cliente para um correcto controlo de pulgas (Mueller, 2005). 2.6.6. TRATAMENTO E PROFILAXIA As pulgas parasitam animais em qualquer parte do Mundo, com excepção dos locais acima dos 1500 metros de altitude e das regiões com pouquíssima humidade (como os desertos). Deste modo, a simples profilaxia desta dermatite é algo difícil, devido à enorme capacidade de colonização destes agentes e ao facto de se tratar de uma reacção alérgica, pelo que muitas vezes é mais eficiente a 47 concentração de esforços nos planos de controlo (que incluem o tratamento e a profilaxia) destes ectoparasitas (Mueller, 2005). A melhor abordagem incorpora tanto medidas físicas como químicas sobre os três elementos referidos: animal, co-habitantes e ambiente (Sousa, 2005). Deste modo, o controlo da DAPP deve incluir o tratamento etiológico e sintomático do animal afectado e dos animais com os quais contacta, assim como a descontaminação do ambiente (interno e/ou externo) frequentado pelo hospedeiro (para prevenir reinfecções). Adicionalmente, quaisquer infecções secundárias devem ser tratadas com medicação oral e/ou tópica apropriada (Mueller, 2005). O sucesso do controlo depende da educação e do empenho do dono, que deve saber que os animais e o ambiente devem ser tratados ao mesmo tempo, e que nem sempre se consegue a erradicação completa das pulgas. O MV deve ainda informar o seu cliente que é necessário um controlo desta doença, nomeadamente dos seus agentes, a intervalos de tempo regulares. Os animais também devem ser lavados com champôs adequados e bem secos, antes da aplicação tópica de qualquer produto de controlo (Eldredge et al., 2007). De referir que a primeira aplicação de qualquer produto tópico deve ser feita pelo MV ou Enfermeiro Veterinário (EV) para demonstrar o procedimento correcto ao dono. Quanto ao tratamento etiológico dos animais, as substâncias maioritariamente utilizadas, respectivas doses, vias e frequências de administração são as seguintes: Inibidores do desenvolvimento de insectos: o Lufenuron – 10-15 mg/kg, PO, uma vez por mês; Selamectina – 6-12 mg/kg, em unção punctiforme, cada 2 semanas a uma vez por mês; Nitempiram – 1 mg/kg, PO, cada 1-3 dias; Imidacloprid – 10 mg/kg, em unção punctiforme, cada 2 – 4 semanas; Reguladores do crescimento de insectos: o Metopreno – Ambiente: aplicar spray cada 6 meses, Animal: unção punctiforme (combinação com fipronil) o Fenoxicarb – Ambiente interno: aplicar spray cada 12 meses, Ambiente externo: aplicar spray cada 6-12 meses em ambientes secos; 48 o Piriproxifeno – Ambiente: aplicar spray cada 6 meses, Animal: 2 mg/kg, em unção punctiforme; Fipronil – 10-15 mg/kg, em spray ou em unção punctiforme, cada 2-8 semanas (Mueller, 2007a). Algumas características dos compostos utilizados apenas nos hospedeiros no controlo de pulgas estão mencionadas no Quadro 9: Quadro 9. Algumas características dos compostos utilizados somente nos hospedeiros no controlo de pulgas (Adaptado de Ihrke, 2008). Princípios Activos Características Imidaclopramida Larvicida e elimina as pulgas adultas por contacto dentro de 24 horas após a aplicação; Não tem acção repelente; Eficácia diminuída após banhos; Não têm actividade contra carraças; Muito seguro para o uso em mamíferos; Actividade residual. Inibidores do desenvolvimento de insectos (Lufenuron) Nitenpiram Selamectina Manutenção de níveis sanguíneos eficazes durante algumas semanas após a ingestão (libertação lenta a partir das reservas adiposas); Não são conhecidas reacções adversas; Não usar como único método de controlo, excepto em animais sem acesso ao exterior; Pode ser utilizada em cães que requerem banhos frequentes. Baixa toxicidade para mamíferos; Início rápido de acção sistémica (15-20 minutos após a administração oral); Mata 95% das pulgas adultas em quatro a seis horas após a ingestão; 94 a 97% é rapidamente eliminado em natureza pela urina (24 a 36 horas depois); Actividade de 24 a 48 horas (sem actividade residual); Pode ser administrado diariamente, cada dois dias, duas ou três vezes por semana; Pode ser usado em cães que requerem banhos frequentes. Mata mais de 98% das pulgas em 24 a 36 horas; Actividade ovicida e larvicida (morte rápida das pulgas em gatos); Mata carraças e ácaros (Sarcoptes, Notoedres, Cheyletiella, Otodectes); Nenhuma acção repelente; Efeito persiste durante um mês, excepto com banhos; Taxa de eliminação de pulgas mais lenta do que a do fipronil e do imidacloprid. Devido à elevada eficácia destes compostos, Ihrke (2008) defende que o tratamento via hospedeiro, sistémico ou tópico, é suficiente para o controlo das pulgas na maioria dos casos, optando por tratar o ambiente somente nos casos mais exuberantes. Os resultados de um estudo desenvolvido por Dickin (2003b) 49 confirmaram que a selamectina reduziu a gravidade dos sinais clínicos, sem o recurso a medidas de controlo ambiental e com intervenção terapêutica mínima. Recentemente surgiram novos produtos de utilização nos animais no mercado com um potencial elevado, acerca dos quais ainda não há muitas opiniões formadas porque ainda há algumas características dos mesmos por esclarecer, carecendo de experimentação pelos clínicos e respectivos clientes. Os princípios activos em questão são os seguintes: spinosad, dinotefuran (fórmula comercial com permetrina e piriproxifeno), metaflumizona (a fórmula comercial para cães inclui amitraz) e piriprole (Ihrke, 2008). O Quadro 10 apresenta algumas características desses princípios activos. Quadro 10. Algumas características dos princípios activos recentemente utilizados nos animais no controlo de pulgas (Adaptado de Ihrke, 2008). Princípios Activos Dinotefuran (fórmula comercial com permetrina e piriproxifeno) Metaflumizona (fórmula comercial para cães inclui amitraz) Piriprole Spinosad Características Novo insecticida neonicotinóides; Aplicação tópica mensal; Actuação rápida; Produto exclusivo para cães; Diminuição da eficácia após banhos. Aplicação tópica; Mata/debilita pulgas adultas por contacto; Eficaz contra carraças; Não tem acção repelente; A eficácia diminui com o banho; Ainda não se confirmou se impede a produção de ovos e se provoca reacções no local de aplicação. Administração tópica; Elimina pulgas adultas por contacto; Eficaz contra carraças; Nenhuma acção repelente; A eficácia diminui com o banho. Administração oral mensal (barra mastigável, com sabor a carne de vaca); Resposta sistémica rápida para um produto mensal; Mata as pulgas adultas antes de iniciarem a postura dos ovos; A eficácia não é afectada por banhos. Ihrke (2008) recomenda: A maioria dos cães responderão ao fipronil com o S-metopreno, à imidaclopramida com ou sem o lufenuron ou com ou sem a permetrina, à selamectina, ao spinosad, ou ao dinotefuran com permetrina e piriproxifeno. Cães sem acesso à rua com reduzida possibilidade de exposição a pulgas necessitarão do lufenuron com ou sem um produto tópico (unção punctiforme), do spinosad mensalmente ou do nitempiram cada 2-3 dias; 50 Cães que nadam ou que requerem banhos regulares beneficiarão do nitempiram cada 1-2 dias ou do spinosad mensalmente; Cães com DAPP severa requererão fipronil com S-metopreno ou imidaclopramida mais permetrina, juntamente com nitempiram com ou sem lufenuron. Animais com exposição a carraças beneficiam do fipronil e do S-metopreno, da imidaclopramida mais permetrina (apenas em cães), e coleiras de piriproxifeno com amitraz (também somente em cães). As novas formas de apresentação destes compostos (pipetas, coleiras, comprimidos, barras mastigáveis) associadas ao prolongamento da actividade residual melhoraram a adesão dos donos à prevenção e ao controlo, evitando assim as reinfecções. Apesar da propaganda das indústrias farmacêuticas, Ihrke (2008) afirma que nenhum dos produtos referidos previne a picada das pulgas, apenas reduzindo rapidamente a sua carga o suficiente para diminuir os sinais clínicos de DAPP. A experiência clínica deste autor leva-o também a mencionar que cães e gatos com DAPP severa têm melhores resultados quando os produtos em unção punctiforme são aplicados como forma de controlo cada três semanas em vez de mensalmente, e parece-lhe que a eficácia de todos eles se degrada significativamente com os banhos (mesmo os que têm a indicação contrária). Embora muitas vezes se suspeite de resistência quando as medidas de controlo falham, Ihrke (2006b) considera que a ineficácia destes princípios activos resulta maioritariamente da incompreensão do ciclo biológico da pulga, da má técnica de aplicação e da reaplicação pouco frequente das substâncias. O tratamento sintomático tem por objectivo aliviar os sintomas consequentes da reacção alérgica, concretamente o prurido. Para este fim, a utilização de um corticoesteróide por via oral geralmente é suficiente, desde que a população de pulgas esteja controlada: Prednisona/prednisolona – dose de 1 mg/kg/dia, PO, durante 5 a 7 dias e posteriormente em dias alternados (segundo a necessidade). Em alternativa: o Acetato de metilprednisolona – dose de 5 mg/kg, SC, cada 12 semanas. 51 De acordo com Bevier (2004), a DAPP geralmente não responde a antihistamínicos nem a ácidos gordos ómega 3/ómega 6, mas há clínicos que ainda os usam: Hidroxizina – dose de 2,2 mg/kg TID (cada 8 horas), PO. Ou: Clorfeniramina – dose de 0,4 mg/kg TID, PO. O fipronil e os reguladores do crescimento de insectos também podem ser usados na descontaminação do ambiente, assim como os seguintes compostos (os quais também podem ser usados nos animais): Poliborato de sódio – pó para uso em interiores (ingestão pela larva da pulga); Piretróides: o Exemplo: permetrina – spray, unção punctiforme e champô; unção punctiforme: 744 mg/ml a cães com peso <15 kg, 1488 mg/2 ml a cães com peso >15 kg, cada 3-10 dias; Piretrinas – spray e pó, cada 24-72 horas. O Quadro 11 apresenta algumas características das substâncias utilizadas no controlo de pulgas, quer nos hospedeiros quer no ambiente. Quadro 11. Algumas características das substâncias utilizadas no controlo de pulgas, quer nos hospedeiros quer no ambiente (Adaptado de Ihrke, 2008). Carbamatos e organofosfatos Fipronil Piretrinas Acção maioritariamente adulticida; Potencialmente muito tóxicos, particularmente para gatos e animais jovens; Actualmente muito pouco utilizados, devido à existência de substâncias alternativas mais seguras e eficazes. Altamente específico para invertebrados; Acção 100% adulticida até às 24 horas após aplicação; Uma única aplicação tem uma acção até três meses; Banhos 48 horas após a administração não afectam a eficácia do produto (incorporado nas secreções sebáceas do hospedeiro); Muito pouco eficaz em gatos; Em áreas com elevadas populações de pulgas recomenda-se o uso conjunto da forma tópica com o spray. Naturais; Pouco estáveis à luz ultravioleta, à humidade e ao ar; Minimamente tóxicas para os mamíferos. 52 Piretróides (ex. permetrina, deltametrina, tetrametrina, ciflutrina) Poliborato de sódio Reguladores do crescimento (ex. metopreno, fenoxicarb e piriproxifeno) Sintéticos; Mais estáveis do que as piretrinas; Um pouco mais tóxicos para cães do que as piretrinas, e extremamente tóxicos para gatos. Elevada margem de segurança para mamíferos; Eliminação total das pulgas em três a seis semanas. Específicos para insectos; Sem efeitos adversos nos animais e nas pessoas; Elevada segurança; Elevado sucesso na interrupção do desenvolvimento de ovos e larvas. A descontaminação do ambiente interno (casa) é muito difícil e requer uma higiene completa e rigorosa. A infestação é máxima nos locais de repouso, mas toda a casa pode estar infestada. Assim, recomenda-se a aspiração de toda a casa com uma máquina potente, insistindo especialmente nos locais de permanência e de repouso dos animais. Todos os objectos em contacto com os hospedeiros devem ser bem aspirados, lavados e secos, tendo o cuidado de colocar no saco do aspirador um insecticida associado a um regulador de crescimento das pulgas (ex. spray contendo piriproxifeno + permetrina ou ciflutrina) para garantir que as mesmas são destruídas (Gamito, 2009). Mueller (2007b) recomenda mesmo o uso frequente no ambiente deste tipo de combinação. Em relação ao ambiente externo, como estes ectoparasitas só se desenvolvem em áreas húmidas e protegidas do sol, devese remover toda a vegetação morta nas áreas exteriores frequentadas e restringir o acesso a possíveis áreas problemáticas, de modo a prevenir e a controlar estes organismos. Recomenda-se também o tratamento das mesmas com pesticidas ou biopesticidas (ex. nemátodes que se alimentam de larvas e pupas no solo), tal como o tratamento dos automóveis e de outros veículos de transporte dos animais por aspiração e uso de pesticida de baixa toxicidade e de acção curta (piretrina). Em casos de infestações exteriores, aplicar ciflutrina ou permetrina em spray cada 7 a 10 dias. A hiposensibilização de cães com DAPP por imunoterapia com saliva de pulga ainda é controversa, para além do seu custo proibitivo. 53 2.7. PAPEL DO ENFERMEIRO VETERINÁRIO O papel dos EV é fulcral para fornecer informações ao proprietário, convencendo-o de que o tratamento é justificado e destacando os elementos da receita do veterinário. Como os animais de companhia estão sujeitos a diversos tipos de alergias ao longo das suas vidas, é extremamente útil se todo o corpo clínico souber actuar com o proprietário para ajudá-lo a monitorizar melhor o seu animal (Quadro 12). Quadro 12. O papel do EV na divulgação, prevenção e aconselhamento das alergias (Adaptado de Dethioux, 2006). Aconselhar o dono do paciente prurítico • Incentive-o a agendar uma consulta o mais rapidamente possível para evitar o agravamento das lesões; • Enquanto isso, ressalte fortemente o problema da automedicação. Informações sobre a correcta desparasitação • Informar sobre a aplicação, posologia e próxima data de aplicação; • Em casos severos, deve-se incluir o tratamento do meio ambiente e de outros animais. Higienização do ambiente • Enfatizar a eliminação da poeira da casa: use o aspirador com filtro limpo todos os dias; • Banhos regulares do animal com um champô específico; • Sugerir o uso de material anti-ácaros e camas com tecidos antialérgénicos e laváveis. Alimentação • Nos casos de animais atópicos: apoiar o uso a longo prazo de uma dieta comercial: o Correctamente balanceada; o Alimento bem tolerado e proteínas de fácil digestão; o Enriquecido com nutrientes benéficos para a saúde da pele; o Fabricado de acordo com padrões rígidos, evitando a contaminação por alergénios. • Nos casos de animais com alergia alimentar, que seja necessário o uso de dieta de exclusão com base em proteínas seleccionadas ou hidrolisadas: o Insistir no uso contínuo do alimento determinado, sem pausas; o Se o proprietário quiser fornecer petiscos, aconselhá-lo a utilizar uma parte da dieta hipoalergénica para esta finalidade. 54 Sucesso do tratamento • Ajudar a criar um calendário; • Verifique se o proprietário entendeu a dose, frequência e duração de todos os tratamentos; • Verifique se o cliente está utilizando produtos tópicos correctamente; • Certifique-se que os check-ups de saúde são observados; • Incentive uma nova consulta para qualquer novo sintoma que apareça. Motivação do proprietário • Ajudar a criar um diário com fotos; • Felicitar o progresso sem criticar os erros; • Reunir proprietários e criar um grupo de discussão sobre "como conviver com um cão atópico"; organizar reuniões regulares para se discutir as boas práticas, dificuldades encontradas e como superá-las. 55 3. CASO CLÍNICO 3.1. PRIMEIRO CASO CLÍNICO 3.1.1. DADOS DO PACIENTE: Espécie: Canídeo Raça: West Highland White Terrier Sexo: Feminino Data Nascimento: 01/01/05 Habitat: Interior/Exterior Estado: Não esterilizada Data 14/08/10 02/02/11 31/03/11 28/04/11 09/05/11 18/07/11 03/08/11 08/09/11 Historial clínico Apresentou-se à consulta com uma otite externa. O problema tem sido as lesões dermatológicas. Desparasitação e antibioterapia. Apresenta eritema e prurido. Iniciou-se uma dieta comercial hipoalergénica durante um mês. Não houve melhorias, apresentou-se na clínica com pápulas, pústulas e otite. Realizaram-se testes de alergias. No controlo, apresentou infecção de pele e otite. O resultado dos testes alergia: positivo aos ácaros. Recidivas. Vai-se iniciar a imunoterapia. Temperatura: 39.4°C. Iniciou-se o protocolo de imunoterapia. Não melhorou. Realizou até ao momento um frasco, tendo iniciando o segundo. Antibioterapia. 3.1.2. EXAMES COMPLEMENTARES 3.1.2.1. TESTES ALÉRGICOS (ELISA) 56 3.1.3. DISCUSSÃO DE RESULTADOS: Da última vez que a paciente se apresentou à consulta, não apresentava qualquer melhoria, uma vez que o protocolo de imunoterapia implementado ainda é 57 relativamente recente para que se possam observar melhorias. Para além disso, os níveis de ácaros ainda estão relativamente altos, devido às temperaturas elevadas anormais para a época. Inicialmente, os donos confinavam a paciente, principalmente ao interior de casa (por pensarem que poderia ser uma alergia ambiental, como acontece com outro animal co-habitante), piorando assim o quadro clínico até ter sido feito o diagnóstico. Os donos também nunca recorreram à corticoterapia e ao uso do colar isabelino, o que de forma indirecta, também agravou o caso. Uma vez que a paciente apresenta atopia, mais propriamente aos ácaros, Acarus siro e Tyrophagus putrescentiae, foram implementadas várias medidas para diminuir o contacto com estes. A antibioterapia, os banhos frequentes, a lavagem regular do cesto, lavagem dos objectos com que o animal tem um elevado nível de contacto, o recurso a uma alimentação hipoalergénica e a limpeza/lavagem/aspiração frequente da casa, foram algumas das medidas realizadas. 3.2. SEGUNDO CASO CLÍNICO 3.2.1. DADOS DO PACIENTE Espécie: Canídeo Raça: Basset Hound Sexo: Masculino Data Nascimento: 16/10/07 Habitat: Interior/Exterior Estado: Não esterilizado 3.2.2. HISTÓRIA CLÍNICA O paciente apresentou-se à consulta com eritema e prurido. O dono descreveu um aparente prurido sazonal, associado a algumas épocas de polinização. O paciente tem sido correctamente desparasitado, não co-habita com outros animais em casa e já fez dietas de exclusão, mas sem melhoria dos sinais clínicos. Assim, os donos optaram por fazer os testes alergénicos. 58 Figura 19. À esquerda, a zona axilar do paciente com algum eritema e descoloração do pêlo, indicativo das constantes mordeduras pelo paciente, como forma de alívio. À direita, o paciente apresenta eritema evidente na zona abdominal ventral e inguinal. 3.2.3. EXAMES COMPLEMENTARES 3.2.3.1. TESTES ALÉRGICOS (ELISA): Foram testados vários alergénios, mas apenas são apresentados os alergénios das árvores, uma vez que os outros não têm importância para o caso clínico. Árvores Mistura de Árvores (Betula, Corylus, Alnus) Pinheiro (Pinus Pinaster) Ligustro (Ligustrum vulgare) Oliveira (Olea europea) NEGATIVO * POSITIVO * NEGATIVO * POSITIVO * Arizónica (Cupressus sempervirens) NEGATIVO Plátano (Platanus vulgaris) NEGATIVO Choupo (Populus alba) NEGATIVO Roble (Quercus robur) NEGATIVO Os exames revelaram que o animal é alérgico ao pólen do Pinheiro e da Oliveira. Assim, quando os níveis polínicos eram elevados, o animal apresentava maior desconforto. Na época de maior exposição alergénica polínica, o animal deveria ser confinado ao interior de casa para diminuir a exposição aos pólenes, resultando assim numa diminuição dos sinais clínicos. 59 Deste modo, segundo a Sociedade Portuguesa de Alergologia e Imunologia Clínica, as concentrações dos pólenes da espécie Pinus Pinaster (Pinheiro) em ar ambiente, no Porto, durante o meu período de estágio, verificou-se principalmente nos meses de Março e Abril, como se pode ver pelos seguintes gráficos: Figura 20. Nível da concentração de pólen do Pinus Pinaster presente no ar, no decorrente mês de Março. Figura 21. Nível da concentração de pólen do Pinus Pinaster presente no ar, no decorrente mês de Abril. Também para a espécie Olea europaea (Oliveira) se verificou um aumento da concentração dos pólenes em ar ambiente nos meses de Março, Abril e Maio, como se pode ver pelos seguintes gráficos: Figura 22. Nível da concentração de pólen do Olea europaea presente no ar, no decorrente mês de Março. 60 Figura 23. Nível da concentração de pólen do Olea europaea presente no ar, no decorrente mês de Abril. Figura 24. Nível da concentração de pólen do Olea europaea presente no ar, no decorrente mês de Maio. 3.2.4. DISCUSSÃO DE RESULTADOS Apesar do paciente apresentar grande desconforto quando os níveis de pólenes agressores eram elevados, também ocorreram quando os níveis polínicos eram baixos, o que se poderá justificar as patologias de pele concomitantes. Desta forma, o paciente deve ser confinado ao interior de casa para diminuir a carga alergénica presente no ambiente exterior. O animal ao estar confinado ao interior de casa, estará mais protegido dos pólenes agressores, havendo assim uma diminuição dos sinais clínicos e melhoramento do conforto animal, se esta for a causa principal da patologia. Deve-se ter em atenção outras patologias de pele simultâneas, como as infecções de pele, resultantes da auto-mutilação. Os banhos regulares são importantes, uma vez que diminuem o contacto dos polénes agressores presentes no pêlo que estão em contacto permanente com a pele. Recorrer à antibioterapia, se necessário. 61 4. CONCLUSÃO Na última década, as alergias têm ganho uma grande importância devido ao crescimento exponencial de casos, sendo essencial a sua melhor compreensão por parte dos clínicos. Desta forma, ainda são necessários vários progressos para que exista um melhor domínio deste quadro complexo e cada vez mais comum. Estima-se que as alergias tenham aumentado devido a alterações do meio ambiente, estilos de vida, crescente urbanização, poluição, tabagismo passivo e alterações dos hábitos alimentares, sendo estes alguns factores que promovem o desenvolvimento de alergias. Em Portugal, as temperaturas elevadas têm-se prolongado ao longo do ano, havendo também um aumento de casos de DA e DAPP associado ao aumento da quantidade de alergénios presentes no ar, assim como o aumento populacional de pulgas típicas das temperaturas amenas. Alguns hábitos sociais também podem interferir no aumento dos casos de hipersensibilidade em animais. Isso verifica-se quando, por exemplo, os proprietários dos animais de estimação fumam ao pé dos mesmos. Assim, os cães e gatos tomam a posição de fumadores passivos, que advém em várias patologias futuras. Também a procura de várias raças com predisposição para alergias tem aumentado, assim, os criadores cruzam raças predispostas dando continuidade à patologia através da descendência. Cada vez mais os animais de estimação fazem parte de uma família. Assim, estes deixam de viver na rua e são protegidos em casa, onde dormem muitas vezes na cama dos donos. Desta forma, algumas correntes defendem que as alterações observadas relativamente às alergias pode estar relacionada com a protecção excessiva do organismo quando os animais são ainda muito pequenos, através de uma exposição mínima a agentes patogénicos externos, o que leva o sistema imunitário a atacar todas as proteínas comuns na vida quotidiana As alergias são um mundo de extrema complexidade, em que ainda são necessários estudos para a sua melhor compreensão, tendo em conta que nem todos os sistemas imunitários dos animais respondem da mesma forma aos vários alergénios. 62 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Anónimo (2010a). 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CASUÍSTICA DO HOSPITAL VETERINÁRIO MONTENEGRO - PORTO Aparelho Respiratório 24 Cardiologia 8 Cirurgia 89 Dermatologia 25 Endocrinologia 19 Estomatologia 7 Gastroenterologia 61 Hematologia 12 Neurologia e Sistema Musculo‐esquelético 54 Oftalmologia 3 Oncologia 31 Reprodução 7 Toxicologia 10 Urologia 37 Total 387 Casuística do Hospital Veterinário Montenegro ‐ Porto 7% 5% 2% 17% 3% 24% 15% 2% 10% 3% 2% 9% 1% Cardiologia Cirurgia Dermatologia Endocrinologia Estomatologia Gastroenterologia Hematologia Neurologia e Sistema Musculo‐esquelético Oftalmologia Oncologia Reprodução Toxicologia Urologia 73 Casuística das espécies 40% Cães 60% Gatos Casuística de Raças Caninas 1% 1% 0% 2% 1% 1% 2% 1% 0% 5% 0% 0% 3% 4% 4% 0% 5% 1% 3% 2% 1% 30% 2% 11% 3% 6% 0% Basset Buldog Francês Cocker Spaniel Husky Siberiano Pastor de Brie Puggy 0% 2% Beagle Buldog Inglês Dálmata Labrador Retreiver Pequinois Raça Indeterminada 1% 1% 3% Bobtail Caniche Dog Alemão Pastor Alemão Pinscher Rafeiro Alentejano Boxer Chiuaua Golden Retriever Pastor Belga Podenco Português Rottweiler Casuística de Raças Felinas Europeu comum 81% Korat Siamês Persa 8% 2% 1% Main Coon 6% 2% Bosques da Noruega 74 Distribuição da casuística em Cães de acordo com a idade 5% 3% 1% 1% 1% 1% 10% 8% 7% 3% 5% 6% 6% 5% 10% 5% 5% 5% 7% 3% Inferior a um ano Cinco anos Dez anos Quinze anos Um ano Seis anos Onze anos Dezasseis anos Dois anos Sete anos Doze anos Dezasete anos Três anos Oito anos Treze anos Dezanove anos Quatro anos Nove anos Catorze anos Vinte anos Distribuição da casuística em Gatos de acordo com a idade 3% 3% 1% 6% 2% 1% 5% 20% 3% 4% 6% 2% 6% 6% 5% 7% 2% 8% 5% 5% Inferior a um ano Cinco anos Dez anos Quinze anos Um ano Seis anos Onze anos Dezasseis anos 1% Dois anos Sete anos Doze anos Dezasete anos Três anos Oito anos Treze anos Dezoito anos Quatro anos Nove anos Catorze anos Dezanove anos 75